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1 1.

I
! aBOIOBIOLOGIA
aHlllSA
Gabriel raubert / .Pierre GrepoD
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Postos hoje em evidência pela


ciência ocidental, os ritmos biológicos
fazem parte da ciência médica
chinesa há milênios. A Cronobiologia
Chinesa explica como esses
ritmos, que enfluenciam nossa vida cotidiana
em todos os seus aspectos, se
integram em uma visão tradicional que
vê na energia (Tchi em chinês
e Ki em japonês) a constante universal
em ação em toda a natureza. [
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LIVROS QUE
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Postos hoje em evidência pela
ciência ocidental, os ritmos
biológicos fazem parte da ciência
médica chinesa há milênios.
Os autores deA Cronobiologia
Chinesa .explicam como esses ritmos
influenciam nossa vida cotidiana em
todos os seus aspectos, se integram
em uma visão tradicional que vê na
energia (Tchi em chinês e Ki em
japonês) a constante universal em
ação em toda a natureza. Todos os
fenômenos são.interdependentes e
regidos pelas mesmas leis de
mutação: podemos, por isso,
equilibrar nossa saúde seguindo
certas regras precisas que derivam
dos princípios fundamentais da
cronobiologia. Estes princípios estão
na base da arte de viver do Extremo
Oriente, notadamente da prática das
artes marciais e da meditação.
(conli/l/./a /la 2." orelha)
Gabriel Faubert, um dos autores, foi
iniciado na acupuntura pelos mestres
Wou Wei Ping, em Formosa, e
Leung Kock Yuen, em Hong-Kong.
Pratica as artes marciais e teve como
mestre de karatê Hoang Nam,
Harrada Taichi Kase e Portocarrero,
aluno do mestre Tsuneyoshi Ogura.
Nesta obra, ele expõe de maneira
muito profunda as leis de equilíbrio
energético que a antiga tradição
médica oriental da acupuntura trouxe
à luz graças a uma prática milenar.
A obra tem a originalidade de
estudar paralelamente o fundamento
das leis do movimento nas artes
marciais, que na mesma corrente de
pensamento aliam o estudo e a
prática do movimento no equilíbrio
energético do homem.
A Cronobiologia Chinesa constitui
"um guia precioso para os
terapeutas, os educadores e aqueles
que aprofundam na sua prática
pessoal a exigência do
desdobramento da natureza humana
em sua mais bela dimensão.
Compreender o movImento, o
não-movimento e a energia do
Impr
homem é ir às raízes das leis da vida".
0304

com
GABRIEL FAUBERT
Doutor em acupuntura
da Escola e do Hospital de Taipé (Formosa)
Diplom ado pelo Instituto de A Cllpunlllra
Ch inesa de Hong-Kong

PIERRE CREPON

Dadol de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional


(Cãmara Brasileira do L1vro,SP, Brasil)

Faubert. Gabriel.
A cronobiologia chinesa I Gabriel Faubert e
A
Pierre Crepon ; tradução de Isa Silveira leal e
Miroel Silveira; prefácio de Evel~n Holzapfel.
são Paulo : IBRASA. 1990. -- (Biblioteca saúde
v. 28)
CRONOBIOLOGIA
1. Acupuntura 2. Biorritmos 3. Caratê 4. Espíri-
to e corpo - Terapias 5a Medicina chinesa I. Crepon,
Pierre. 11. Título. 111. Série.
CHINESA
CDD-574.1882
-610.951
-615.851
-615.892
90-0931 -796.8153
Prefácio do Dr. Evelyn Holzapfel
Indices para catálogo sistemático:
1.• Acupuntura: Terapêutica 615 . 892
2. Caratê : Esportes 796.8153
3. Cronobiologia : Biologia 574.18B2
4. Espírito e corpo : Terapias mentais 615.B51 Tradu ção de
5. Medicina chinesa 610.951 Isa Silveira Leal
e
Miroel Silveira

IBRASA
INSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE DIFUSÃO CULTURAL LTDA.
SÃO PAULO
Título da edição francesa:

LA CHRONOBIOLOGIECHINOISE

Copyright © 1983 by sUMÁRIO


ÉD\TIONS ALBIN MICHEL, S.A.
22, rue Huyghens, 75014, Paris

PRIMEIRA PARTE

As Manifestações da Energia
Direitos exclusivos para a língua portuguesa da
mRASA
INSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE DIFUSÃO CULTURAL LTDA. I. Tchi: a energia,
17
Na origem, 18
As manifestações do Tchi, 19

Rua Treze de Maio, 361 lI. O Yin e o Yang, 23


03047 - SÃO PAULO - S. P.
III. Os cinco elementos, 31
Yin/Yang e cinco movimentos, 31
O ciclo de procriação, 35
Publicado em 1990 O ciclo de destruição, 37
O ciclo de desprezo, 39
As classes definidas pelos cinco elementos, 40
O fígado - O coração - O baço - Os pulmões - Os rins
Tudo está em tudo, 45

IV. As manifestações da energia humana, 51


As três sedes e a integração das energias, 51
A energia ancestral: Yuen Tchi - YeungTchi e Kou Tchi - As energias
produzidas - A repartição das três sedes - A comunicação entre as três
sedes
A circulação da energia, 59
Os órgãos e as funções - Os meridianos
IMPRF..sSO NO BRASIL - PRINTED IN BRAZIL
Os pontos .
A doença, 67 Passai-no-kata - Kushanku-no-kata ou Koshokun -
Causas internas e externas Lorei-no-kata ou Rohai
Prática do karatê e entidades viscerais, 155
V. Os ritmos biológicos, 71 Reflexões sobre o kimé e sobre o kiai, 156
Troncos celestes e ramos terrestres, 72 Os perigos da prática, 160
Os troncos celestes, 73
Os movimentos hospedeiros X. A meditação, 163
e convidados
Descrição do zazen, 165
Os ramos terrestres, 78 O zazen e a circulação da energia, 167
Relação dos ramos terrestres e dos cinco elementos - Energias hospe-
deiras e energias convidadas O espe1ro de zazen, 170
União das influências celestes e terrestres, 85

ANEXO

As Origens do Karatê por Pierre Portocarrero, 175


SEGUNDA PARTE A sucessão dos mestres, 176
Os diferentes estilos, 180
Naha-te - Shllri-te - Tomari-te
As principais escolas de Okinawa em nossos dias, 181
A Arre de Viver Fontes, 182

VI. O psiquismo, 95
As entidades viscerais ou funções psíquicas, 96
O Chenn - O I - O Pro - O Tche - O ROlln
As interações com os órgãos, 99
Da concepção até o adulto, 104

VII. A alimentação, 109


Os cinco sabores, 110
O Yin e o Yang na alimentação, 115
Horários e estações, 119
Ambiente e adaptação, 121

VIII. A respiração, 125


Os papéis da respiração, 127
Alguns métodos de respiração, 128
A respiração fundamental, 130

IX. As artes marciais, 137


Aspecto externo, aspecto interno, 138
O sentido profundo dos katas, 145
Prefácio

Gabriel Faubert foi iniciado na acupuntura pelos mestres


Wou Wei P.ing, em Taiwan, e Leung Kock Yuen, em
Hong-Kong, e fôi beneficiado com o ensinamento da
tradição médica chinesa por Lavier e Laville-Méry, na
França. Pratica as artes marciais e teve como mestre de
karatê Hoang Nam, Harrada Taichi Kase e Portocarrero,
aluno do mestre Tsuneyoshi Ogura.
Nesta obra, o autor expõe de maneira muito profunda
as leis do equilíbrio energético que a antiga tradição mé-
diça oriental da acupuntura trouxe à luz graças a uma
prática milenar.
Sua obra tem à originalidade de estudar paralelamente
o fundamento das leis do movimento nas artes marciais
que na mesma cO:frente de pensamento aliam o estudo e
a prática do movimento no equilíbrio energético do ho-
·mem.
Expõe essa tradição com uma autenticidade e verdade
que tira de sua experiência, além do conhecimento inte-
lectual.
iI Compreender o movimento, o não-movimento e a
energia do homem é ir às raízes das leis da vida.

11
Esta obra constitui um guia precioso para os terapeutas,
os educadores e aqueles que aprofundam na sua prática
pessoal a exigência do desabrochamento da natureza hu-
mana em sua mais bela dimensão.
A vocação de todo homem não é reencontrar o respeito
do ser humano e da ordem da vida? Mestre Taisen Des-
himaru dizia: "É quando nos tornamos verdadeiramente
homens gue põdeinus-tõriiar-nos Deus ou Buoa".
.::- . -- - PRIMEIRA PARTE ®
17 de novembro de 1982
As manifestações
Dr. Evelyn Holzapfel da energia

12
~
o homem é um com o céu e a terra, com todos os seres de todos os
tempos, porque a lei do universo é única, operando em todos os seres
e os caracterizando segundo seu grau de desenvolvimento.
CHAO YONG

A visão chinesa do homem e do universo, para ser COID-


Jeéndida, exige ue o ocidental se inicie num certo
número de gran es rincípios que fundamentam to@...ll
sitem ª- _ ~ ..I~2! enta ão 'lo m:ui\do nô E xt re1 1 9. ~ Qrien te.
semesses rincí ios torna-se de fato im ossí eLapr..een-
d~r as leis que sustentam a medicina chine ~ a $ portanto,
a fortiori, aplicar suas regras elementares.
Sem dúvida, uma boa compreensão dessas noções exige
no começo um certo esforço intelectual. Entretanto, esse
ligeiro esforço é necessário a fim de não cair no erro
corrente que consiste em querer Jazer coincidir em tudo
as teorias chinesas com nossas noções ocidentais: é assim,
por exemplo, que QTchi é traduzido sem mais comentáriQ
como enrgia ~ ue Yin e Yang são simv.lesmente assimi-
l.L.os a princíQios absolut.Qs negativos e ..Qsitivos, e que a
lei dosciIiCõelementos eVOClLum universo sim ~
Esta simplificação abusiva se acha habitualmente asso-
ciada a uma esquematização do sistema do ser humano e
a uma enfadonha descrição dos pontos do meridiano da
acupuntura, que não podem realmente servir senão para

15
práticos da acupuntura. De tudo isso, o leitor conserva
apenas algumas imagens estereotipadas que lhe dão uma
idéia da medicina chinesa muito afastada da realidade .
.Qe fatQ, _a ori i naliciade_do pensamento chinês com
relaçª o_à nQsa., _ :r~side na visão de síntese do cosmos. Ela I
n ~ ~r ~ ur ~2 P<? !: ~ os . di v er §~ el ~Jl!R tos mas sim ligá-los-
por grandes leis de mutação que. eXElicam os diversõs
Tchi: a energia
A

fenomenos como ou ras antas manifestações da mesma


UI~dae subjacente. O sê r - liüm an o, ~ em - particular, não
vive separad-º _ ºQresto do universo, mas em harmonia éàm
gem ---- a§§ID1
- .- a vlôa. e a morte e exprimem
- "-
e1e.Do macrocosmo ao microcosmo, as m esmas leis re-
- o princípio--..... uni-
versal: o Tao. ~ - ..-
-~'
Todos os grandes ,princípios expostos nesta obra perten-
cem ao fundo comum do ensamento chinês e são utiliza-
dos tanto no domínio da medicina como no da filosofia,
da.cosmologia, do ritual etc. Em cada domínio as teorias
originais se enriqueceram no percurso dos séculos e pare-
ce difícil traçar um quadro completo das diversas especu-
lações que foram elaboradas sobre o assunto. ' Contudo,
quanto ao que diz respeito à noção do Tchil, é necessário
ultrapassar o quadro estritamente médico para apreender
. seu verdadeiro significado, e evocar o significado que tem
. na cosmologia dos filósofos taoístas.
As duas traduções francesas do mesmo ideograma Tchi
mostram assim que ele cobre uma noção muito larga que
é preciso conservar no espírito para compreender sua
litilização na medicina. Os orientalistas (Maspero, ~
~ , Wieger), que se referem aos escritos cosmoló icos e
filosóficos, traOuzem realmente Tchi como "so ro" en-
quanto·os acupuntores preferem utilizar a {>alavra "ener:
_ _...... ___ . -._'" ... '" a _ _

1. O ideograma chinês é, às vezes, transcrito como Chi e a tradução do japonês se faz


geralmente como Ki.

16 17
~ '. É este segundo termo, energia, que utilizaremos o envoltório do céu e da terra, o céu e a terra, ~ alo
adiante, mas explicando antes o que é o "sopro" ~i Z ter a -e todos os ser es ue ãí lveram _ uma ~ efêmra
m--ºradia formam apenas um amontoado de so ros, ~ m

Na origem int~
----
riõ
,
s emT~
imtes, senão precários e relativos"3.
~-=.,

Os textos cosmológicos do taoísmo estão esparsos e dão As manifestações do Tchi


descrições da origem do universo ligeiramente diferentes.
Apesar desta diversidade, o Tchi, primordial, isto éL-0 O Tchi reúne diversos graus de manifestações que cons-
sopro primordial, aIJarece sempre como elemento pre- tituem outro tanto de fenômenos naturais porque, como
éXlstente na forma ão do céu e da terra. Assim, o capítulo diz o So Ouenn 4 (capítulo 66): " N ~ mensidão do ~ s aso
42 do Tao Te King descreve a criação do mundo da seguin- existe uma energia essencial, })mitb;a, ue ç tª1!~g o
te maneira: . átodos os elementos .e nel §. .l! ~ gr ~ ". E assim que o
Tchi dá nascim ento ao céu e à terra: os sopros ligeiros,
o Tao deu nascimento a Um mais Yang, se elevam e formam o céu; os sopros pesaCIOs,
Um deu nascimento a Dois
Dois deu nasci.mento a Tr,ês ~s Yin,seaoalXam e formam a terra. .
Três deu nascimento aos dez mil seres. , Entre o céu e a terra se encontra o homem. Ele poSSUI
Os dez mil seres carregam o Yin nas costas e abraçam o Yang. , sua energia própria, resultado de diversos compn~tes,
e é submetido às energias celestes eterrestres. O conjunto
Nesse versículo J c .h L ~ d _ e ~ ser identificado em dpis das .i nterações entre essas diversas energias que,. de outro
níveis. Por um lado, "Um" representa o caos isto é o lado, são todas submetidas a leis de mutações cpmuns é o
sQpro primordial, a unidaae-!irimitiva ae onde proc ~ m objetivo da medicina chinesa, estudo da integração do
Ó Yin e o Yang (Dol§ ): Por outro ladõ, p ara retomar um homem riO universo. Voltaremos a isso nos capítulos se-
texto chamadõ Comentário de Ho-chang-Kong: "O Yin e guintes. .
o Yang produzem os três so ros-energias: 0Y_1!!0,"2. !.mp,u- Entretanto, há outro_aspect.9_que é importante as ~ in ªJ ar
ro e a mistura ~,J .2or sua vez, constituíram resp-ectiya- porqueoãarrIeoiôãda distância e-utre os conceifôs orien-
mente-o_cé.u,_aJerra o homllill"2. tais e ocidentais: trata-se da ~}ação entre energia e maté-
Vemos que esse curto texto taoísta dá um sentido mais
ria. Na verdade, para o Ocidente, só s ~ tratou, durante
largo ao Tchi, como não é f~ito na representação habitual muito-tempo, de matéria. Quando o éônceito de energiâ
de uma simples energia circulando nos meridianos, à qual aparece, é 'de -in íéÍo para evocar uma noção abstrata da
nos habituaram as obras suçintas sobre a acupuntura. ]2Q qual a física avalia os efeitos sem chegar a definir verda-
so ro primordial, ue preexistiu à criação, ao universo
. organizado, o Tchi absorve t ú d õ : ~ ' ~ sim, para os Airtigos,
3. J. Schatz e outros,Aperçusde lIlédcCÍIlC chilloise traditionel/e, Maisonneuve, 1979, p.
47
2. Ver Max Kaltenmark, "La Naissance du Monde en Chine", La Naissance du nwnde, 4. So Oueml constitui, COI11 oLillg Tchrou, os dois livros doNá Ting, obra fundamenta l '
Le Seuil, 1959, pp. 463-464.
da medicina chinesa.

18 19
deiramente o próprio conceito. A energia fica assim asso-
ciada a uma das manifestações: energia térmica, hidrállli-
ca, mecânica etc. Enfim, é só com a pesquisa científica
mais moderna, te_oJ."ia_pa relatividade, dos guanta, da me-
cânica ondulatória, que se começa a estabelecer · uma
li~ntre energIa e matéria? -
No Extremo Oriente, ao contrário, onde o pensamento
exprime antes de tudo uma visão sintética do universo, as
noções de matéria e de energia são indissociáveis. De fato,
a pró ria ' ia é energia na medida em lle o Tchi está
presente em todas as coisas. SIm, o Tchi rimordial se
manifesta no céu como uma substância abstrata en Uãilto
c[u ~ ~ ~ ~a - teg~L s~ transfQ,r ma numa substância concreta.
~ Aformaçãd~ mundo vivo resulta da int;ração dessas
duas substâncias. .
A_matéria ine t~} ~ão é, portanto, senão uma manifes-
tação da energia, como a energia, fluida e invisível, é outra.
) Diante desses grauS-ae maniféstações, pode-secrrzerque
'! a matéria é a energia mais manifesta, ou mais diferenciada
/ (mais pesada, mais Yin) e a "~nergia abstrata uma ener-
\. gia menos manifesta ou menos diferenciada (mais leve,
mais Yang). -
Os seres vivos são, eles mesmos, manifesta!;;ões do Tchi
onde coexistem com a energia abstrata e com a energia-
n1ãreria Estão portanto submetidos às grandes leis que
regem a energia: "Quando um ser toma formª,j sso gller
Q!ze(gue a energia se transforma. Quando a vida material
desaparece, is~o _ c _ orespnd _ a - UmaJIlutçã ' o daenergia".
(SoOuenn, capo 66.) .
"

5. Sobre esse assunto, é preciso salientar que certos físicos começam a se voltar para
a tradição extremo-oriental onde encontram concordâncias com suas próprias
pesquisas. Ver F. Capra, O Tao da jrsica.

20 21
11

OYin e o Yang

/
A profunda unida ~ ue im . regna o l!nivet so provém de
suãOrigem comum: o Tchi rimordial. Essa unic g ad . ~ da
substância não impede a manifesj~ção x:éâl de uma multi-
plicidade de fenôriiê 'iiõ . Entre o Um e o múltiplo reinam,
contudo, grandes leis de mutação que ordenam todo o
universo. A primeira delas é a lei que os taoístas reconhe-
.~
cem como o mottfr flliiàâinéntã l dasÍÍláillfestações fen o-
"_ ~ 'NSP'* e5J:;:- _,..." ~

menais: a lei âo Yin/Yang!.. Assim, ã úiiiâaâe do Tchi se


junta outro. princípio, de natu~ cont!@itórla; crn.e.s.e
~orna a base da eXp'liG.aÇ[ M ªcjo!lê4. _ ~osI!Q . ; .,: U!1.X ip,
Um Yang, é o Tao" (Yi King). . . .
- Se nos repõrtarmos ao versículo cosmológico do Tao Te
King, citado no capítulo precedente, "o Tao deu nascimen-
to a Um, Um deu nascimento a Dois", nós temos, a partir
âe ~ energia primeira única, uma diferencraçãõ.9!!e
cOnduz ãaiSfinção ~ m dua~ . energias: YifiTYãllg.Êsta
aistinção é o pivo das transformações, araiz das diferên:'
ças, poiSYIileYâi1g nao aparecem comõ dois aspectos
separados, mas, ao cofifiáriü; como doistermoSãõIlleSmo
\ . empo opostõSêcomplementares. -Eles se geram mutua-
. -~

23
Yang é o ..9!lente e Yin o frio, será sempre com rela ão ao
'-------- '
mente e é por isso que há sempre Yin no Yang e Yang no
Yin. . - --
I. ,

outro e nã o. e m. teIlo ~ d e ., ª b .~ p l \l to.


- Para compreender a interdependência de Yin e Yang, ~ bem presente ao espírito a oposição relativa e a
é preciso reportar -se às figuras 2 e 3. A primeira (figura 2) natureza rítmica do Yin/Y ang, é necessário dar alguns
é bastante conhecida: ~xprime a interpenetração do Yin exemplos do caráter binário dos fenômenos. Conhecemos
e yang no interior do princípio do Tao. Mostra que no certos pares de termos dos quais nos servimos corrente-
interior do Yang subsiste sempre Yin e vice-versa, e evosa mente para os ilustrar: a noite, o frio, o feminino o _rnq-
o fato de que Yin e Yang estão sempre em movi
.. __ _ __ - ~ nto. "I
lhado, a terra pertencem a } n co ~ ~ el ~ s~o aQ__dia, ao
Calor, ao mascliliftó; ao seco, -. ao
. ~
céu .
que ~ ~
t r e p ..... -----
»~ a
y a ng.: Não procuraremos ~ aqui estender indefinidamen::e
tal lista que reencontramos em numerosas obras senao
para insistir apenas sobre o caráter de repouso que se
prende a Yin com relação ao caráter de dinaffilsmo que
se~rend a Yang. Em compensação, é interessante aplicar
i i olaridade do Yin/Yang à manifestação da energja
desde o Tchi rimordial atéOliomem.
N a origem, o ~ i se manifes.!!!lll ~ rgias Y aI~K 9 ?
céu e energias Yin da terra. As caractenstlCa,s .das Rnmel-
fãSSâüSüTile za, leveza, menos ~i ifest '! s. As das segun-
da ~ sãº-grosse'ria ~ 2-eso, 1!l ais manifes .t a s.Aeu ergi ~ s _ Ya~g
2. Símbolo de Yin e Yang. 3. A roda de Lao Tseu. dão as energias i nvi ~ íve is __q1!e ani 1p~ _ m . As _energias Ym
dão a mat-.érigt.·
A segunda (figura 3) é menos ut iI izada para representar N o ser humano, a mesma distinção se opera entre ener-
Yin/Yang, mas tem a vantagem de estabelecer o caráter gia invisível Yang e matéria Yin. Para mais comodidade
relativo desses termos. A [9da de Lao TseuJ9u fit ~ _ de -se convenciona chamar a energia menos manifesta Yang:
M o ebi l!~).J figurada nesse' esquema, não comporta real- energia e a energia mais manifesta Yin: sangye. Est~dIS­
.mente senão uma face da qual se pode seguir o encami- tinção é -importante porque veremos que a boa proporção
nhamento infinito. Do mesmo modo, não existe Yang do sangue e da energia no interior do corpo humano em
absoluto, nem Yin absoluto. Inversamente, em dado nível . . geral e de cada órgão em particular, deve ser respeitada.
da fita, constata-se a presença de duas faces, como Yin e ~) Por outro lado, com . ~in e Yang se geram mutuamen- .
Yang estão presentes em cada aspecto da vida fenomenal. te, chegamos a subclassIfIcações que marcam a passagem
Oposição e complementaridade, relagvidade e I!}oyi- de um para o outro. Um bom exemplo desta subclassifi-
~ nto s , ~o as c..eIacterístlcas fUfiâament qis _de Yin/Yang cação reside na repartição do Yin/Yang no corpo humano.
que é p ~ ciso nunca erder de vista: quando são abQrdados Com efeito, o alto e a eSQuerda são Yang em relação ao
----
s eus aspectos mais específiC'õ's."ASsim, quando se diz que
.. ~ ~
baixo e à direita que .são Yin . .Q}ega-se pois a uma classi:
_ ____ ....., ___ .-...r---='

24 25
ficação Yin/Yang de cada parte que se exprime por: Yang Esta subclassificação pode se dar também no interior
de Yang; Yin cÍe Yang, Yin de Yin, Yang de Yin. da relãção enrgia/sIl~, e de toda refãção Yin/ ~ mg,
sui gi:riâo -nóvas divisões que poderão se repetir indefini-
damente.
1ANG Yang do Yang de Yang
Yin do Yang de Yang
Yang de Yang Yang do Yin de Yang
YANG Yin de Yang Yin do Yin de Yang
YIN Yang de Yin Yang do Yang de Yin
Yin de Yin Yin do Yang de Yin
Yang do Yin de Yang
Yin do Yin de Yin

Enfim, a capacidade de mutação do Yin/Yang encontra

*-
sua melhor ilustração no desenvolvimento das estações, o
que tam -ém rios permite assim.-a reenaer exatamenfe- o
caráter de movimento er étuo ~
. ~
resl e à sua exist ~ n-
Cla.
Sobre a figura 5, o v ~ rão, assoçiarclQao máximo de calor,
corres onde à nlenitude do Yang. Nesta lenitude, o Yin,
que não cessou de decres.çer. anteriormente e atingiu seu
ponto mais lJãiXo, vai começar a ressurgir enquanto que o
Y ãiK.Ç o m §~ ~ - ãf' r r a Oeqü rn o ci o o oy to-
no, haverá mais Yin que Yang e osolstíclO ôê i1íVêriiÕ será
o --apogeu do YÍII.-O -movimento inverso de Yin/Yang
YIN
marca o período que vai do inverno à primavera. A pri-
Figura -I.
mavera é o jovem Yang que se desprende do Yin para
fazer subir a seiva da vegetação, assim como o sangue do

26 27
homem e do animal. A duração do dia é igual àda noite A diminuição do movimento do metabolismo vegetal
no equinócio. durante o outono e o inverno entrava sua eclosão que só
O verão é o velho Yang, as sementes e os frutos das acontece na primavera seguinte, quando o vegetal recu-
árvores amadurecem. O dia é mais longo do que a noite. pera sua atividade vital, isto é, quando a energia Yang se
O calor vence o frio. O solstício do verão assinala seu dia liberta do Yin.
mais longo. O inverno é o velho Yin, as noites são mais longas
porque Yang está encolhido e não tem mais poder. O calor
desapareceu. Ao solstício de inverno corresponde a noite
mais longa.
Os símbolos dos diferentes estágios de Yang e de Yin
se traçam com a ajuda de uma linha contínua - para
Yang e de uma linha descontínua - - para Yin .

. ~
,,-J'}'\
.\b~ o~.-:_ co?
velho Yang =-= jovem Yimg
PR.,tA.."E.~ .~ v ~ ~. oUTONO
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~ ~'()
IJ- a.. .,--
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velho Yin =-= jovem Yin
~
O 771
f",m údnq \ '\ , ,fi V ' < f J Vefl1 1
I) ,~ '" . " ",li É com a ajuda de combinações de traços semelhantes
que são representados os hexagramas do Yi-King. ~
Notemos, além do mais, que um esquema semelhante
~/S+16;' ao das estações e representando os ciclos opostos e com-
• plementares do Yin/Yang se inscreve no interior de cada
velho i 'YJ
dia (fig. 6). A integração dos dois ciclos faz ressaltar o
iNveRNO máximo de Yang ao meio-dia do solstício de verão e
5. A mutação do yin/yang durante as estações . o máximo de Yin à meia-noite do solstício de inverno.
. O outono é o jovem Yin, é o declínio da energia Yang.
Esta fase é necessária porque sua finalidade é proteger o
organismo vegetal contra os rigores do inverno, fase de
adormecimento do ciclo de desenvolvimento da planta.
Alguns dias de tempo morno e úmido bastariam para
apressar em pleno inverno a germinação da semente ou a
eclosão dos brotos, o que provocaria a destruição da plan-
ta desde a baixa seguinte de teinperatura.

28 29
~y
SOL ~STRO
~"' YA ftJ 4
111
.JZ h
Os cinco elementos

~J8h
A doutrina dos cinco elementos tem uma importância
tJOilf igual à do Yin/Y ang para compreender os mecanismos da
medicina chinesa. Nas obras em língua ocidental, ela se
acha tradicionalmente exposta sob esse nome de teoria
dos . cinco elementos, mas seria mais exato escolher a
denominação de cinco movimentos a fim de salientar bem
que não se trata de uma concepção de um universo está-
tico. Trata-se, ao contrário, de uma lei de muúição que
procura esclarecer a interação dos diversos elementos em
perpétuo movimento. Aliás, os caracteres chineses Wou
Hing, que designam essa teoria, significam: Wou, cinco e
Hing: caminhar, a~ir, avançar alternàtivamerite com os
6. As mutações do yin/yang durante o dia.
dois
_ pés, isto
~-
é, cinco
....---.,.,..".,.. . . . _c...o ___ "__ não.. cinco
movimentos, ~'_ ""__
_~
elementos:

Yin/Yang e cinco movimentos


Seria supérfluo procurar aqui retraçar uma gênese à
teoria dos çinco elementos, cuja origem remonta a vários
milênios. E interessante, pelo contrário, evocar como se
pode passar de uma divisão fundada sobre quatro CIfras, .

30 31
q,ue decorre diretamente do sistema-binário Yin/Yang a Madeira = primavera - leste
uma repartição em cinco termos. As figuras 5 e 6 repro- Fogo = verão - ,sul
dUZiêlas atrás no's fõfiIecem-para isso uma excelente intro- Metal = outono - oeste
dução. Se nos baseamos no ciclo do Yin/Yang, chegamos
Água = inverno - norte
efetivamente a uma repartição em quatro pontos - Yang
supremo, jovem Yang, Yin supremo, jovem Yin - à qual Coloca-se o problema de inserir o elemento Terra nesta
já pudemos associar várias características. sucessão. De fato, a Terra é associada, por um lado, ao
centro que, para os Chineses, é uma direção que orienta
o espaço com o mesmo motivo que os outros pontos
cardinais e, por outro lado, a uma quinta estação. A lista
precedente se completa portanto por:

Terra = quinta estação - centro

o primeiro esquema lógico da disposição dos cinco


movimentos é então a figura 8.

Figura 7.

A originalidade do pensamento chinês é a de introduzir,


nesta repartição em quatro classes, o ponto do centro para
chegar a uma repartição em cinco classes. Cada uma
dessas classes se encontra assim definida 'por li m termo
genérico, Madeira, Fogo, Terra, Metal, Agua (os cinco
elementos que deram seu nome à tradução de Wou Hing
em idioma europeu) e submetida a leis cíclicas que deter-
minam as interações entre as diferentes classes.
Se retomarmos as características evocadas na figura 7 a Ficamos, é claro, levados a precisar o que delimita a
propósito das mutações do Yin/Yang, chegamos à classi- quinta estação. De início, é preciso saber que as quatro
estações chinesas não correspondem exatamente às nos-
ficação seguinte de quatro dos elementos:
sas estações oficiais. O equinócio e o solstício que marcam
32 33
o começo das estações em nosso sistema são aqui situados
mais ou menos no meio das estações. Podemos dar apro-
ximadamente as datas seguintes como início das quatro
estações:

Primavera: 4 de fevereiro, "M..ttõ.t/&U ~.'Y


I

Verão: 4 de maio,
Outono: 4 de agosto,
Inverno: 4 de novembro.

De fato, as datas variam segundo os anos. O início da


primavera começa com a festa do Ano Novo chinês que é
fixada no dia seguinte ao da lua nova mais próxima de 4
de fevereiro. 9. Lugar de intercalação nas quatro estações,

Notemos que essa datação modifica sensivelmente a


apreciação das estações. Eu estou redigindo, por exemplo,
o ciclo de procriação
-~. .... -
este texto em 22 de fevereiro, época que é considerada rio Apesar do lugar central do elemento Terra e o papel
Ocidente como pleno inverno, quando se trata da prima- intercalar da quinta estação, a doutrina dos cinco movi-
'Y-: vera segundo o sistema chinês. É preciso levar em conta mentos foi levada a situar de modo diferente esse elemen-
esta difernçª-J~a utilizar as leis rítmicas da medicina to no ciclo de procriação mútua. Segundo os chineses, as
chinesa. -- mutações sucessivas dos elementos são na verdade imutá-
.A quinta estação se intercala entre duas das outras veIS:
estações. É um período de dezoito dias que se situa no fim • A Madeira procria o Fogo.
das estações, reduzindo-as a períodos de setenta e três • O Fogo procria a Terra (o fogo se reduz em cinzas,
dias. Com relação à lei de mutação da figura 8, somos a cinza se mistura com a terra).
portanto levados à modificação visível na figura 9. . A Terra procria o Metal (os metais nascefi? nas
Em termos de mutação energética, podemos considerar , entranhas da terra). ,
que há retorno e redistribuição de energia pelo elemento • O Metal procria a Agua (todo metal pode tornar-se
Terra no fim de cada estação. Isto é importante porque, líquido e a água representa os líquidos em geral).
como veremos adiante, cada elemento é associado a um • A Água procria a Madeira (a água é necessária para
órgão do corpo humano. No caso do elemento Terra, o crescimento dos vegetais).
trata-se di> baço, e este órgão é visto como tendo um papel A representação final do ciclo normal dos cinco movi-
fundamental de djstribuição de energia com ~ação aos mentos fica portanto modificada e vai para a figura 10,
outros órgãos. - chamada ciclo Cheng ou ciclo de procriação.

34 35
fato em cada um dos outros movimentos que alimenta e
possui um papel de distribuição. Por outro lado, sua ação
culmina entre o fim do verão e o começo do outono e
evoca então a idéia da maturação.
O Metal, o outono, corresponde à idéia de interação.
Sai da parte mais Yang (o Fpgo - o verão) para se dirigir
para a parte mais Yin (a Agua - o inverno). O Metal
contép1 a idéia de ajuntar, de coletar.
A Agua, o inverno, corresponde ao máximo de Yin, na
concentração, da qual vai renascer o Yang que se dirige
para a Madeira.

Madeira .-.:. início de movimento


10. O ciclo de geração dos cinco elementos. Fogo - expansão
Terra - distribuição
Neste ciclo cada elemento se acha convencionalmente Metal - recolhimento

'* denominado i'a mãe" do elemento seguinte e "o filho" do Água - concentração
elemento precedente. Por exemplo, a Água pr~ci a
Madeira ql}e produz por sua vez o Fogo: a Madeua e a . Tal sucessão valoriza o ritmo cíclico da vida e a aptidão
"filha" da Agua e a "mãe" do Fogo. para a mutação que cada um dos elementos possui. Con-
Por outro lado, os elementos são associados a etapas siderar um destes sem levar em conta os outros é, na ótica
precisas da mutação gerada pelo des~molar das estações. da medicina oriental, um erro do mesmo tipo daquele que
A quinta estação, apesar de possUIr um papel .a A ca~ consiste em erigir o Yin ou o Yang como entidade autô-
mudança de estação, acha neste caso . uma culmmancla noma. A doutrina dos cinco movimentos, ou cinco ele-
entre o verão e outono, chamada fim do verão. mentos, se afirma portanto, antes de tudo, como uma
Assim o elemento Madeira, a primavera, possui a ca- doutrina sintética que estuda os movimentos cíclicos do
pacid~ de pôr em movimento, de dar nascimento. Ela mundo do qual é preciso apreender o conjunto antes da
vem do Yin e se dirige para a culminância do Yang, para análise de cada um desses termos.
o sol (ela é associada ao leste e portanto ao sol levante).
Ela contém a idéia de exteriorização.
O elemento Fogo, o verão, significa o movimento de o ciclo de destruição
expansão. Ele tem a tendência de espalhar o que recebeu
da Madeira. A lei dos cinco movimentos comporta um ciclo de
O papel da Terra se situa em dois ní:reis. De ~I? parte, destruição, o ciclo Ko, que completa o ciclo de procriação.
ela tem um lugar central e serve como mtermedlana entre Este ciclo existe simultaneamente ao primeiro porque
duas ;mutações (esquema 9). Ela se integra devido a esse todas as coisas no universo se criam e se destroem. Não se

36 37
~,rat p,0~tano de um "mau" cicl? que se oponha a um o ciclo de desprezo
bom cIclo, mas de uma outra leI que rege as interações
entre os elementos. . Este ciclo rião é um ciclo "normal" das mutações dos
O ciclo de destruição, ou de submissão se caracteriza cinco movimentos e ele é produzido em caso de perturba-
pelos dados seguintes: ' ções ligadas a excessos ou insuficiências. O So Ouenn o
explica no capítulo 65:
A Madeira domina a Terra
A ':Çerra domina a Água Se a energia do órgão predominante está em plenitude grande
A Agua domina o Fogo demais, ela enfragu~c ~ órgão do qual triunfa, e excita o órgão do
O Fogo domina o Metal qual não pode triunfar. Se a energia do órgão prêclominante está
O Metal domina a Madeira ,vaga, ela sofre o ataque simultâneo do órgão do qual triunfa e do
.órgão do qual nãopõde triunfar. -- ----
. Os fenômenos lig.ad~s aos dois tipo~ de interações regi-
dos 1?elos de procnaçao e de destrUIção se manifestam As interações se manifestam portanto no sentido con-
s~m mterrupsão e sobretudo em nosso organismo. É as- trário dos ciclos normais ( figura 12 ).
SIm que as leIs de acupuntura, ,de alimentação do psiquis- Por exemplo, se a energia da Madeira está em plenitude
mo, ~nt!e outr~s! se referem sempre à interdependência grande demais (excesso), ela ataca a energia da Terra -
isto é, do órgão do qual ela triunfa no ciclo normal de
®
dos orgaos deflruda por esses dois ciclos.
A figura 11 representa a integração final dos dois ciclos destruição - assim como a energia do Metal, isto é, do
da doutrina dos cinco movimentos. órgão que çleveria atacá-la pelo ciclo Ko mas contra o qual
ela se volta segundo o ciclo de desprezo. Dizemos então
que o "neto" se volta contra a "avó".
-Çogo

terra

,
. lI , Integração dos ciclos de gerilção e destruição dos cinco elementos,
A&UA
Figura 12.

38 39
o inters~
deste ciclo é evidente para compreender as No domínio do mundo orgânico:
conseqüências dos desajustes energéticos.
ÓRGÃOS EN1RANHAS CAMADAS SENTIDO SENTIMENTOS

Madeita fígado vesícula biliar músculos visão cólera


As classes definidas pelos cinco elementos Fogo coração intestino delgado vasos tato alegria

Terra baço estômago carne paladar preocupaçóes

o pensamento chinês reconhece uma similitude entre Metal' pulmões intestino grosso pele e pêlos olfato tristeza

todos os componentes do universo, tanto ao nível do Água rins bexiga ossos audição medo
macrocosmo como do microcosmo. Esta visão de síntese
se exprime com a doutrina dos cinco elementos que colo-
Esses dois quadros dão um apanhado das classificações
ca, ao lado de cada um deles, uma série inteira de fenô- possíveis (ver um quadro mais completo no fim deste
menos sem ligação aparente. capítulo). Voltaremos a eles mais particularmente em
Os fenômenos naturais, como os fenômenos fisiológi- domínios específicos. .
cos' são assim .divididos em cinco classes que comportam É interessante notar como se pode estabelecer a corres-
cinco entidades que. se associam a um dos elementos pondência entre os diferentes fenômenos classificados
distintivos. Já citamos atrás as estações e as orientações e sob uma só rubrica. O Dr. Nguyen Van Nghi dá este
podemos fazer o mesmo com as energias climáticas, com exemplo na sua obra Patogenia e patologia energética na
as cores, os sabores, os órgãos internos, os estados psíqui- medicina chinesa:
cos etc. No domínio do mundo externo, a classificação de
alguns aspectos se faz como a seguir: Na primavera, a vegetação nasce e começa a crescer. A primeira
manifestação da energia vital é o brotar das folhas, reconhecíveis
por sua cor verde. O elemento Madeira é pois o símbolo da prima-
vera.
ENERGIAS
CORES SABORES ODORES ESTAÇÕES
CLIMÁTICAS Eis aqui colocadas três analogias:
Madeira vento verde azedo rançoso primavera
Fogo calor vermelho amargo queimado verão primavera -+ a madeira -+ verde
Terra umidade amarelo doce perfumado 5~ estação .
Metal secura branco picante acre outono Por outro lado,
Água frio negro salgado pútrido inverno
O organismo humano segue esse movimento de transformação
da natureza. Entre os cinco órgãos, é o fígado, graças a suas funções
de regUlador, que responde perfeitamente a essa transformação.
Ora, segundo o princípio de Yin e de Yang, o fígado (Yin) está em
relação direta com a vesícula biliar (Yang). Por sua circulação

40 41
energética profunda, o fígado se comunica com o exterior ao nível Por outro 'lado, o fígado rege o sangue e a plenitude deste
dos olhos e, por sua ~irculação superficial, seu meridiano principal se manifesta pela cólera e um vácuo por ansiedade e medo.
se ramifica com os músculos e com os tendões. Ele está em corTeS'j}õndênCia com a vesícula biliar.
Possuímos então esta seqüência de similitudes: • O coração
Ele se coloca atrás da rubrica designada pelo elemento
Primavera -+ Madeira -+ Verde -+ Fígado -+ Vesícula
Fogo (verão, sul).
biliar -+ Olhos (portanto visao) -+ Músculos Sabor: amargo
Cor: vermelho
Através de raciocínios semelhantes chegamos às classi- Símbolo vegetal: arroz
ficações das cinco rubricas que se colocam atrás de cada Símbolo animal: carneiro
elemento. A importância dessas classes toma todo o seu O coração rege as artérias, a língua e seu componente
valor no estudo médico pelas similitudes que elas estabe- psíquico é a alegria.
lecem entre os diferentes aspectos orgânicos e fisiológicos O So Ouenn escreve (cap. 67):
do ser humano. Eis aqui as grandes características que
podem ligar-se aos cil}-co órgãos de base. A alegria fere o coração, o medo que depende dos rins triunfa da
alegria. O calor fere o coração, o frio que depende dos rins triunfa
• Ofígado do calor, a amargura fere a energia do coração, o gosto salgado que
Ele se coloca na rubrica designada pelo elemento Ma- depende dos rins triunfa da amargurá.
deira (primavera, leste)
Sabor: azedo-ácido O coração em plenitude se manifesta pelos risos, em
Cor: verde ~ cuo por gemidos. .
Símbolo vegetal: trigo Para estimular sua energia, é preciso prescrever ~ .eé­
Símbolo animal: frango e cão cies medicinais picantes.
As similitudes precedentes permitem agir sobre o fíga- Elé está em correspondência com o intestino delgado.
do - comendo frango ou uma alimentação azedo-ácida,
por exemplo - assim como sobre os outros órgãos devido • O baço
aos ciclos de procriação, de destruição e de desprezo Ele se coloca sob a rubrica designada pelo elemento
ligados aos cinco movimentos (uma t ~ an de sabor doce Terra (quinta estação, centro).
é, por exemplo, benéfica em caso de plenitude do fígado). Sabor: doce
O fígado rege os músculos, a visão e seu componente Cor: amarelo
psíquico é a cólera. Todos esses aspectos ficarão pertur- Símbolo vegetal: milho
bados se o fígado é atingido. Símbolo animal: boi
Assim, uma alimentação azeda demais prejudica os O baço rege a carne, a boca e seu componente psíquico
músculos (contrações) e age sobre p. tendência colérica. é a reflexão.

42 43
o baço sofre de excesso de umidade e neste caso con- Tudo está em tudo
vém prescrever plantas medicinais de s.abor salgado.
Ele está em correspondência com o eStômago. A evocação da doutrina dos cinco elementos não fi~ar
completa se nos limitássemos a uma visão reducionista
• Ospulmões desta, considerando um universo repartido em cinco gran-
Eles se colocam sob a rubrica designada pelo elemento des classes. Realmente, no interior de cada movimento,
Metal (outono, oeste). de cada elemento existem cinco outros movimentos que,
Sabor: picante eles também, se subdividem, isso indefinidamente. Um
Cor: branco bom exemplo pode ser dado com as relações entre os
Símbolo vegetal: aveia órgãos dos sentidos e as atividades sensoriais. Pela subdi-
Símbolo animal: cavalo visão natural das classes, podemos compreender que cada
Os pulmões regem a pele e o nariz (olfato), seu compo- órgão contém potencialmente os outros e que assim o
universo nos aparece como uma imbricação sem fim dos
nente psíquico é a tristeza.
cinco elementos em perpétua mutação.
Os pulmões em plenitude serão aliviados por uma tisa-
Ao seguir as classificações feitas precedentemente, che-
na de sabor azedo-ácido. -
gamos aos encadeamentos seguintes:
Eles estão em correspondência com o intestino grosso.

• Os rins
, Eles se colocam sob a rubrica designada pelo elemento Madeira -+ fígado -+ visão
rro, vermelho
amarelo
-+
-+
-+
fígado
coração
baço
-+
-+
-+
Madeira
Fogo
Terra
branco -+ pulmões .... Metal
Agua (o inverno, norte). ....

r"
negro -+ rins Água
Sabor: salgado ....
-+ fígado Madeira
Cor: negro calor -+ coração .... Fogo
Símbolo vegetal: ervilha . Fogo .... coração .... tato umidade .... baço .... Terra
Símbolo animal: porco secura .... pulmões .... Metal
frio .... rins .... Água
Os rins regem os ossos e as orelhas (ouvido), seu com-
ponente psíquico é o ~ visceral. Eles também estão ....
l'~cidO
-+ fígado Madeira
em relação com os órgãos genitais e o ânus e, do ponto de amargo -+ coração ....
Fogo
Terra . -+ baço . -+ paladar doce -+ baço -+ Terra
vista psíquico, com a yonta9$. ~ picante -+ pulmões -+ Metal

Eles sofrem com a secura e, neste caso, é preciso pres- salgado -+ rins -+ Água

crever espécies medicinaisde sabor amargo.


r~o ~
fígado -+ Madeira
~

Eles estão em correspondência com a bexiga. queimado -+ coração ....


Fogo
Metal -+ pulmões -+ olfato perfumado -+ baço -+ Terra
acre -+ pulmões -+ Metal
pútrido -+ rins -+ Água

44 45
r
fígado Madeira ·
O olfato corresponde-se com o Metal cuja qualidade é
~ ~

LÁ ~ coração ~
Fogo
Água ~ rins ~ ouvido MI ~ baço ~ Terra o ajuntamento, a interiorização.
• O ranço provoca o ajuntamento da energia do fígado.
~L
~
pulmões ~
Metal
~
rins ~ Água • O queimado provoca o ajuntamento da energia do
coração.
Além do mais, se considerarmos os elementos do ponto • O perfumado provoca o ajuntamento da energia do
de vista de sua especificidade de movimento, percebere- baço.
mos que as diversas sensações têm propriedades diferen- • O acre provoca o ajuntamento da energia dos pul-
tes com relação às mutações de energia. mões.
• O pútrido provoca o ajuntamento da energia dos rins.
A visão corresponde-se com a Madeira, cuja qualidade
é a de pôr em movimento. As cores terão portanto um
papel fisiológico sobre seu órgão específico:
• O verde põe em movimento a energia do fígado.
• O vermelho põe em movimento a energia do coração.
• O amarelo põe em movimento a energia do baço.
• O branco põe em movimento a energia dos pulmões.
• O negro põe em movimento a energia dos rins.

O tato corresponde-se com o Fogo, cuja qualidade é a


expansão, o início de circulação. As sensações táteis e
climáticas terão portanto um papel fisiológico: .
• O vento faz circular a energia do fígado.
• O calor faz circular a energia do coração.
• A umidade faz circular a energia do baço .
. • A secura faz circular a energia dos pulmões.
• O frio faz circular a energia dos rins.

O paladar· corresponde-se com a Terra, cuja qualidade


é a distribuição.
• O azedo distribui a energia do fígado.
• O amargo distribui a energia do coração.
• O doce distribui a energia do baço.
• O picante distribui a energia dos pulmões.
• O salgado distribui a energia dos rins. Figura 13.

46 47
TABELA DE CORRESPONDÊNCIA DOS CINCO ELEMENTOS
A audição corresponde-se com a Água cuja qualidade
é a concentração. MADEIRA FOGO TERRA METAL ÁGUA

• A nota dó concentra a energia do fígado. Tempo


Espaço
primavera
leste
veráo
sul
5a. estação
centro
outono
oeste
inverno
norte
• A nota lá concentra a energia do coração. Clima vento calor umidade secura frio
Energia
• A nota mi concentra a energia do baço. hospedeiro TsiueYin Chao!Yang TaeYin YangMing Tae Yang
• A nota ré concentra a energia dos pulmões. Energia TaeYin Yang/Ming Chao Yang Tae Yang Tsiue Yin
convidada Chao Yin
• A nota sol concentra a energia dos rins. Tronco Kia - Yi Ping - Ting Wou -Ki Keng- Tsin len - Kouei
celeste (1) (2) (3) (4) (5) (6) (7) (8) (9) (10)
Ramo Yin-Mao Ssen - Wou Tchen - Wei Chen Vou HaiTse
Também, assim como na "roda de Lao Tseu", que terrestre III IV VI VII V VIII IX X XII I
aparece como o melhor símbolo do Yin/Yang, a figura 13 Su Tcheou
XIII
apresenta uma boa representação do que poderia ser uma Movimento colocação em expansão distribuição in teriorização concen tração
movimento
visão limitante da doutrina dos cinco movimentos. Órgão fígado coração baço pulmões rins
Entranhas vesícula intestino estômago intestino bexiga
biliar delgado grosso
Características olhos língua bo·ca nariz orelha
fisiológicas músculos vasos carne pele ossos
unhas pele lábios pêlos dentes
Manifestações lágrimas suor saliva muco urina
gritos riso canto choro gemido
Entidade Roun Chenn I Pro Tche
psíquica
Traços coléra alegria reflexão tristeza medo visceral
psíquicos desconten- angústia preocupações medo tremores
e tamento julgamento memória receio vontade
sentimentos imaginação pwwf'lÇáooom boa adminis- instinto astúcia e
audácia as conveniências tração circunspec- esperteza
rito boa-fé ção sabedoria
fidelidade justiça
Percepção visão tato gosto olfato ouvido
Cor verde vermelho amarelo branco preto
Odor ranço queimado perfume acre pútrido
adocicado
Sabor ácido amargo doce picante salgado
Animais cão carneiro boi cavalo porco
ave
Vegetais trigo arroz painço aveia ervilha
trigo candial meloso cevada pêssego trigo-mouro
ameixas abricó milho pimenta soja
vinagre café tâmara chalota casta nha
malva chicória açúcar lótus sa l
bardana alho alho-poró cebola
den te-de-Ieão 7 aromas azukis
Notas musicais Kyo:dó Tchi: lá Kong:mi Chang: ré Yu:sol
Planeta Júpiter Marte Saturno Venus Mercúrio
Pedra preciosa turquesa rubi topázio safira esmeralda
Metal estanho ferro chumbo ouro mercúrio
Número 8 7 5 9 6

48 49
\
IV

As manifestações da
energia humana

Conforme o princípio da unicidade da energia e da multi-


plicidade de suas manifestações, o ser humano apresenta
vário,s tipos de energias, todas qualificadas pelo mesmo
ideograma Tchi, associado a um outro caractere que de-
termina sua especificidade. Esquematizando, podemos
dividir essas energias distintas em duas grandes partes: aS
, energias das diversas origens que são transformadas pelo
organismo; as energias vindas da integração das preceden-
tes,'que se repartem no conjunto do corpo, segundo ciclos
determinados.

As.três sedes e a Integração das energias

o cO,nceito das três sedes ~ que são algumas vezes


denominados três forneiros, três queimadores ou triplos
aquecedores - é uma noção muito antiga de que já se faz
menção no Nei Ting. É uma função energética ligada aos
órgãos e às entranhas, cujo papel é garantir a integração
das diferentes energias que participam da vida do ser
. jmmano. Estas são em número ile três: a energia ancestral,
. . .
é!- energia que provém dos alimentos e aquela que provém
.

51
do ar. Estas en,ergias se unem e se transformam graças ao seu esgotamento e da sua desa"Qari ão. É por isto que
-;istema das três sedes que no término dO processo distri- Yuen c I eve ser sempre protegIda e conservada como
bui as novas energias criadas no corpo humano. preciosidade. ~ importância. das_ asceses extremo-orien-
tais e de seu meto do de resplraçao aparece notadamente
quanto .a esta função. . ..
A energia ancestral: Yuen Tchi A energia or,igiaal nasce nos rins e se encontra pnncl-
palmenté lõ cahza a ll<l parte inferiur do abdômen, entre
Yuen Tchi nasce no momento da união do óvulo e do o umbigo e o púbis, na região chamada sede iiiIerior do
espermatozóide, está ria origem da vida e traz consigo o campo de cinábno, que descreveremos mais adiante. Ela
pódigo genético de cada 'ser. Trata-se :portanto de uma também está presente em todas as células do · corpo e
verdadeIra energIa heredItária, e é neste sentido que a circula com a energia Y ong nos meridianos. .
chamamos comumente energIa ancestral. Remi Maspero exp1ica que teorias ~ i f ernts se .têm
N a verdade, haveria maior fidelidade com a tradição se defrontado quanto à localização fisiológica exata de Yuen
traduzíssemos por energia original, porque o ideograma . Tchi, mas que todos concordam quanto à importância da
Yuen significa origem. O sin(>logo Remi Maspero, em sua pa~te baiXa do abdômen (o hara dos japoneses):
o.1;Jra O Taoísmo e as religiões chinesas!, traduz, aliás, Yuen
Tchi por sopro original. o sopro original, se nasce no rim esquerdo, dele sai pela porta .
do Destino e vai para o Oceano do Sopro, qihai. As identificações
Este sopro original, diz ele, é no homem a correspondência dos dos nomes da região inferior com órgãos reais eram bem menos
sopros primordiais que, por ocasião da criação, formaram o céu e estabelecidas do que nas Outras duas regiões do corpo, provavel-
a terra '" é o princípio vital. mente porque o ventre onde se faz todo o trabalho da formação do
embrião havia sido, desde a origem, objeto de especulações com
E O Yuen Zun, tratado do sopro original, acrescenta: tendência fisiológica entre os taoístas, de tal modo que velhas
teorias ( ... ) se chocavam com teorias modernas que elas incomoda-
o sopro original é a fonte do sopro vivo; é o sopro em movimento vam: a Porta do pestino e o Oceano do Sopro às vezes são o próprio
entre os rins; é a base das cinco vísceras, a raiz das doze veias, a campo de cinábrio, às vezes ficam fora dele; e a expressão Pqrta do
porta da expiração e da inspiração, a fonte dos três forneiros; este Destino se aplica às vezes ao rim esquerdo apenas, às vezes ao
sopro é a raiz do homem: se a raiz é cortada, as vísceras, os intervalo entre os dois rins. Em todo caso, todos estão de acordo
receptáculos, os nervos, as veias são como os ramos e as folhas (da em admitir que o sopro original deve ocupar o campo de cinábrio,
2
árvore .cuja raiz é cortada); quando a raiz é destruída, os ramos e enchê-lo todo . .
secam.

a
. . Yuen Tchi representa potencialidade da vida do ser • Yeung Tchi e Kou Tchi( G{,{) CEL)
humano em seu nascimento. Ele decresce durante todo o
período de vida e a morte natural, isto é, a !llorte não São designados por esses termos a energia proveniente
acidental nem conseqüente de lesões funcionais resulta de do ar (Yeung Tchi) e a que provém dos alimentos (Kou
1. Éd. Gallimard. 2. H. Maspero, op. cit., pp. 504 ·505.

52 53
Tchi). Estas duas energias representam o acréscif!1o do 1. Tsong Tchi. Éa energia essencial que provém da
ambiente à vida do homem. Yeung Tchi é a energia do reunião da energia do ãi e da energia dos alimentos. y
~ , ~ ou TchJ, a energia d ~ : - 2. Energia alimentícia Yong. Ela provém da eriergia dos
alimentos e se encarrega de manter a vida no organismo,
A vida é gerada pela reunião da energia da terra com a do céu. garantindo a nutrição de todos os elementos. O So Ouenn,
A vida conserva a essência desta combinação. Esta essência é no capítulo 43, diz que ela é "a essência da nutrição"; ela
composta de dois elementos, um dos quais provém do cosmos, regulariza os cinco órgãos e as seis entranhas; ela se
enquanto o outro provém dos alimentos (Li/! Tchroll, capo 8) . encontra nos meridianos e nas artérias e circula por eles
no organismo". iu~,
Se tomarmos a figura 1, reproduzida no capítulo sobre 3. Energia defensiva Oé. O ideograma Oé que designa
a energia, e nela integrando Yeung Tchi e Kou Tchi, esta energia simboliza perfeitamente seu papel. Nele en-
chegamos assim ao esquema da figura 14. contramos reunidos. os caracteres que significam "agir" e
"couro", sendo este último o símbolo da couraça do guer-
~ dq d;J.. .h,~ reiro, portanto da proteção.
I 1$).
("~
Sobre esse assunto, J. Lavier, emAs Bases tradicionais
da acupuntura chinesa escreve: "Oé contém além do mais
TCH\ ~ yUEM TCHl • ~ uma alusão à pele (couro), órgão de proteção e uma outra
~ . da !iJvu.-~§ a uma possibilidade de ação (agir) de caráter defensivo.
Chegamos então à definição exata do sinal Oé: 'A senti-
. ~ nela cuja dupla missão é proteger e defender' ".
Fig/.lra 14.
A energia Oé circula fora do círculo dos meridianos e
se espalha nos tecidos. Ela efetua cinqüenta voltas no
Assinalemos entretanto que as energias do céu e da organismo em vinte e quatro horas: vinte e cinco voltas de
terra não agem sobre o homem unicamente por intermé- dia, vinte e cinco voltas de noite. ~ l a circula de dia no
dio da energia alimentar e da energia do ar, mas também
por i@luência dos ritmos energéticos (os troncos e os
K
J ~ de noite no Yin, conforme o ambIente natural.
propósito das energias Y ong e é oL mg l'chrou diz no
ramos: ver o capítulo seguinte). . - capítulo 18:
A energia vindo do estômago, deste passa aos pulmões para
• As energias produzidas alimentar os cinco órgãos e as seis entranhas. A energia pura se
chama energia Yong, a que é impura se chama energia Oé. A
Existem vários tipos destas energias, correspondentes a energia Yong circula nos meridianos, a energia Oé fora dos meri-
dif~rents funções. dianos. A énergia Yong circula sem cessar, após ter realizado
E preciso, entretanto, não esquecer que essas energias, cinqüenta vezes o seu ciclo, ela recomeça. Yin e Yang circulam
qúe etiquetamos sob nomes diferentes, não são senão as alternadamente neste ciclo, ao passo que a energia Oé faz vinte e
m~nifestaçõ da mesma energia geral que enche o corpo cinco voltas no Yin e vinte e cinco voltas no Yang, isto é, durante o
humano. dia e durante a noite.

54 55
4. Tcheung Tchi. É a energia verdadeira, combinação da .

energia ancestral Yuen Tchi e a energia essencial Tsong


"rclIi (ela mesma é a reunião de Y eung Tchi e Kou Tchi).
Tcheung Tchi surge ao nível dos pulmões como resultado
~ . ..
e
._-- ... -.. .- ._.- ._._--- ----_._._._-
SEDE SUPERIOR
P'VLM ~E5
das diversas transforinações energéticas operadas pelo
sistema das três sedes. A energia alimentar Y ong e a
- _. \. 1;G~ ~, ~; :~; :~ :~·o-
. _. y.
energia defensiva Oé, que vao garantir a circulação da
energia no organismo, estão contidas em Tcheung Tchi.
.-._' _. ~ ·- : ~·SEDJt.TRiõ- _.~ .
:
YEUNGTCHI
energia do ar
1 TSONGTCHI
-1~. '~t:". ~1It,: ~'o.:<i_",-
energia essencial
KOUTCHI YONG
energia dos elementos TCHEUNG TCHI alime~Jtr
energia verdadeira OE 15. As três sedes.
[ defensiva
YUENTCHI
YUENTCHl
1. A sede superior engloba os pulmões e o coração mas
energia ancestral este último não participa de sua função. Seu papel é de
------" receber a energia do céu assimilando a energia do ar,
energias recebidas energias prod lIzidas
Y eung Tchi ("Pelas narinas e pelos pulmões, o organismo
absorve a energia do céu" Ling Tchrou, capo 56). Além do "
• A repartição das três sedes mais, ela rege a partida da energia essencial proveniente
da transformação da união de Yeung Tchi e de Kou Tchi .
.' 2. A sede média compreende o fígado, a vesícula biliar,
As três sedes ocupam três regiões anatômicas, três ní-
veis, no corpo humano. . . o baço e o estômago. Seu papel é de produzir energia a
partir da absorção dos alimentos e de eliminar os resíduos
1. A sede superior (Chang Tsiao) se situa no tórax, da sligestão para a sede inferior.
acima do diafragma. E graças à sede média que a energia dos alimentos Kou
2. A sede média (Tchong Tsiao) se situa entre o diafrag- Tchi se transforma em energia Yong ou energia alimentí-
ma e uma horizontal passando pelo umbigo. . cia.
3. A sede inferior (Hsia Tsiao) se situa entre uma 3. A sede inferior reúne os rins, o intestino delgado, o
horizontal passando pelo umbigo e o púbis. Esta zona se intestino grosso, a bexiga assim como a função de repro-
chama também Tan Tienn: campo de cinábrio. du~o. .
O papel desta sede é múltiplo. De um lado, ela se
encarrega de eliminar os resíduos da digestão enviados
pela sede média. Por outro lado, ela elabora a energia
56 57
defensiva Oé. Finalmente, ela contém a energia ancestral A circulação da energia
Yuen Tchi.
Apesar de a energia estar presente em todo o corpo
h~o? pois constitui sua própria substância, podemos
• A comunicação entre as três sedes dlstmgulr no organismo redes energéticas precisas onde a
energia circula sem cessar. Essas redes, chamadas Tching
Apesar de sua repartição anatômica e o papel fisiológi- em..c.hinês , foram traduzidas por Soulié de Morand pelo
co específico de cada uma, as três sedes ficam em estreita termo: meridiano.
interdependência umas das outras. Isto é verdadeiro ao Distinguem-se vários grupos de meridianos, com fun-
nível dos órgãos e vísceras que contêm e que estão em ções diversas, que só lembraremos aqui. Os meridianos
relação com o circuito dos meridianos e com a lei dos cinco principais são em número · de doze, aos quais é preciso
elementos, mas também ao nível de seus papéis de inte- acrescentar Os vasos governantes e determinantes que
gração e de produção energética. ta:n bém comportam pontos importantes para a prática da
A ligação é garantida pelo ! chong Mo, rede energética acupuntura: Os meridianos principais são designados pe-
que não pertence ao sistema clássico dos doze meridianos. los nomes dos órgãos e das funções às quais estão ligados.
O Ling Tchian (cap. 3B) diz sobre o assunto: "O meridiano
curioso Tchong Mo é o mar dos cinco órgãos e das seis • Os órgãos e asfunções
vísceras. Isto significa que os cinco órgãos recebem dele a
sua energia". Seu trajeto é o seguinte: "Ele começa nas A tradição chinesa se refere à existência de cinco ór-
partes genitais, eleva-se para a parte superior do corpo, gãos, cinco vísceras e duas funções. Os órgãos são Yin com
circula no exterior do corpo, dispersa-se sobre o peito. relação às vísceras que são Yang. Órgãos e vísceras se
Circula igualmente nos meridianos, passa para as artérias prendem aos pares a um dos cinco elementos. As concor-
que sentimos bater ao lado do umbigo. Através dessas dâncias são as seguintes: .
artérias, a energia do Tchong Mo se atira nas ramificações
da energia da região abdominal ao mesmo tempo que nas ÓRGÃOS (YIN) VÍSCERAS (YANG) ELEMENTOS DE
ramificações do meridiano do estômago. A energia de REFERÊNCIA
Fígado (F) Vesícula biliar (VB) Madeira
Tchong Mo se integra no meridiano dos rins para descer Coração (C) Intestino delgado(ID) Fogo
sobre a face interna do membro inferior e para se jogar Baço (B) Estômago (E) Terra
nas ramificações da energia, na barriga da perna" (Ling Pulmão (P) Intestino grosso (IG) Metal
Tchian, capo 62). . Rim (R) Bexiga (Bg) Água
O Tchong Mo leva o calor da alimentação, isto é, a
energia e o sangue, a todos os órgãos do corpo. Ele tam- :As duas funções são chamadas três sedes 3 (TS) e cons-
~ bém regulariza a temperatura do corno fazendo funcionar tntor do coração (CC). A função das três sedes está em
o relac ionamento entre a energia (Yang-quente) e o san-
3. . As três sedes foram outrora consideradas como uma entranh a; daí provém a
gue (Yin-frio). expressão "cinco órgãos e seis entranhas", freqüente no NeY Ting.

58 59
relação com o sistema que a designa. A função do constri- -'t;> As três sedes são como a c~mporta de uma barragem
tor do coração está em relação com o coração onde desig- que serve para manter os níveis.
na a vasomotricidade. . A bexiga é como o mandarim da subprefeitura, é um
As três sedes são Yang com relação ao constritor do órgão secundário que armazena os produtos de excreção.
coração que é Yin. É a fase terminal da energia. Estas doze funções devem
As três sedes e o constritor do coração estão em corres- estar sempre em perfeita harmoni~
pondência como elemento Fogo (C-ID-TS-CC). Em re- Por outro lado, existem certas vísceras chamadas "cu-
lação a dois apenas para os outros elementos é permitido riosas" que não possuem meridiano próprio. Entre essas
passar dos cinco elementos às seis energias quando o Fogo entranhas curiosas, é preciso notar o cérebro, a tiróide, o
se desdobra em Fogo fmperador e Fogo ministerial (ver o útero etc.
capítulo seguinte) ..Por intermédio da lei dos cinco ele- Enfim, os órgãos e as entranhas contêm quantidades
mentos, os órgãos regem outros aspectos fisiológicos e diferentes de sangue, isto é, de energia mais manifesta, e
correspondem a fatores eJ<ternos (ver o quadro dos cinco de energia menos manifesta. A relação entre sangue e
elementos). energia permite a termorregulação do organismo, o san-
As funções dos órgãos. ficam assim expostas de maneira gue (mais Yin) produzindo frio e a energia (mais Yang)
figurada no capítulo 8 do So Ouenn. À pergunta do impe- produzindo calor.
rador Hoang Ti: "Pode dizer-me quais são as funções dos A quantidade de sangue e de energia, segundo os órgãos
cinco órgãos, das seis vísceras, dos doze meridianos?" o e as vísceras, é a seguinte:
médico Khi Pa lhe responde: "O .coração é um órgão real;
--
ele representa o rei; nele reside o espírito".
: .~ FUNÇÕES ÓRGÃOS (YIN) ENTRANHAS (YANG)
Os pulmões são os ministros; eles regem a energia do
exterior, da pele. ' , - . F' d
19a o
{+ _ energia
sangue Vesícula
biliar {
- san!7l1e
+ en~gia
O fígado é o general que elabora os planos.
A vesícula biliar é o juiz que decide e condena. Três - san!7ue
Coração
- san!7ue
o .
Intestino + sangu~
O constritor do coração são os funcionários; deles po- sedes { + ene7-gia { + energia delgado { - energia

dem vir alegria e prazer. Músculos + sangue - san!7ue Estômago sangue = energia
O baço e o estômago são os celeiros, os depósitos de do coração } - energia
Baço
{ + energia
o

alimentos.
O intestino grosso transforma. Pulmão { - sangue Intestino sangue = energia
+ energia . grosso
O intestino delgado contém o excesso (como um lago
regulariza a correnteza de um rio). Ele faz passar para o - san"lIe Vasos
r
) + sangue
Rim
organismo o alimento transformado. { + en~gia l-energia
Os rins geram o poder, a força.
o . , - - -

60 61
• Os meridianos Qua~to à circulaçã.o .d a energia, sabemos apenas que a energia
y ong ~Ircul ~ n.os mendIanos e nas artérias, ao passo que a energia
A estrutura dos meridianos é complexa porque integra d.efensIva Oe cIrcula fora deles. A energia ancestral de Tchong Mo
vários grupos de redes energéticas. cIrul~ ~o ~esmo tempo com as energias Y ong e O é. As energias
Realmente, seria falso imaginar o meridiano como uma mater.IaIs sao representadas p elo sangue, as energias imateriais pela
simples corrente de energia separada do resto do organis- energIa.
mo. Sua ação sobre os órgãos prova, aliás, a existência de
um sistema de ramificações energéticas elaboradas, que
seria inútil descrever em detalhe nesta obra.
A título indicativo damos um panorama que resume a
organização geral dos meridianos e a figura 16 que mostra, )

-
em corte, a imbricação das diferentes redes energéticas. (

----
ORGANIZAÇÃO GERAL DOS MERIDIANOS

l
12 Tching: 12 meridianos principais
Tching _ 12 Tching Pei: 12 meridianos "distin-

T'hi,gLo~
. tos", relações órgãos- meridianos
_ 8 vasos irregulares

_ 15 vasos Lo ligam um meridiano Yin


e um meridiano Yang .
Lo _ 12 ~aso Lo, mais finos, com ramifi-

---
caçoes
_ Soen Lo: vasos muito finos.
\ Os capilares são Soen Lo
Relação
Relação com o FOU: entranhas
como ;.Ta-/ING- P5r. ylN

----
interno { Tsang: órgãos
externo ~Yl'"
eo Relação Músculos - Tching Kann: 12 meridia- .1M~íu:t ~ yA~.
interno com o nos tendinomusculares
\~- ~ ór~ÃoS
1
externo Pele - Pi Po: passagens
~AN6jFOIJ
na pele
16. Orga nização geral dos meridianos.
N a verdade, os ciclos energéticos só se referem aos doze
meridianos principais. A energia, após sua elaboração
pelas três sedes, surge no circuito dos meridianos ao nível A o.rd~m de sucessão dos meridianos percorridos pela
dos pulmões. Trata-se então da energia Y ong e da energia energ:a fIca sempre identificada e se constata um fluxo de
ancestral assim como esclarece o Ling Tchrou no capítulo energIa em horas constantes (horas dadas em horas sola-
67: res):

62 63
Pulmões 3 a 5 horas Estas horas de plenitude normal de energia nos meri,-
Intestino grosso 5 a 7 horas dianos são primordiais para o trabalho da energia. E
Estômago 7 a 9 hora:, necessário colocá-las em relação com os "ramos terres-
Baço 9 a 11 hora ~
tres" estudados no capítulo seguinte: "Os ritmos biológi-
Coração 11 a 13 hora:: cos".
Intestino delgado 13 a 15 hora:, A partir dos pulmões, a energia circula também ~os
Bexiga 15 a 17 horas vasos governadores e concepção (Tou Mo e J en Mo) cUJos
Rim 17 a 19 horas traçados ficam situados sobre a linha média do corpo (face
Constritor do coração 19 a 21 horas anterior e face posterior) e que a1cançamjuntos o rosto e
Três sedes 21 a 23 horas entre o ânus e o sexo.
Vesícula biliar 23 a Os meridianos principais se comunicam entre si nas
Fígado 1 a 3 horas regiões exatas, porque seu ponto de partida e de cheg~da
se situa sempre numa das quatro partes do corpo: peIto,
cabeça, mão, pé.
• O meridiano do pulmão parte do peito e termina nas
mãos.
• O meridiano do üitestino grosso parte das mãos e
termina na cabeça.
. . • O meridiano do estômago parte da cabeça e termina
nos pés.
• O meridiano do baço parte dos pés e termina no
, peito. .
• O meridiano do coração parte do peito e termina nas
mãos.
• O meridiano do intestino delgado parte das mãos e
termina na cabeça.
• O meridiano da bexiga parte da cabeça e termina nos
pés.
• O meridiano dos rins parte dos pés e termina no
peito.
• O meridiano do constritor do coração parte do peito
e termina nas mãos.
• O meridiano das três sedes parte das mãos e termina
17. Circulação da energia nos meridianos. na cabeça.

64 65
• o meridiano da vesícula biliar parte da cabeça e 1º ponto Tsing -. Madeira (primavera)
termina nos pês. 2º ponto Y ong -. Fogo (verão)
• O meridiano do fígado parte dos pés e termina no 3ºponto Yu5 -. Terra (5ª estação)
peito. 4ºTching -. Metal (outono)
. A esquematização' desses trajetos (figura 18) põe em 5ºHo -. Água (inverno)
evidência a simetria de seu ciclo.
Quanto às vísceras (Yang) as relações são:
CASEÇA CASEÇ-A

1º pontoTsing - . Metal
2º ponto Y ong - . . Água
3º pontoYu - . Madeira
4º pontoTching - . Fogo
5ºponto Ho - . Terra

Estes pontos permitem intervir em função das estações


e de todos os ritmos biológicos que animam o cosmos.

PÉ A doença
18. Esqucma do trajeto dos lilcridianos no corpo humano.
Admite-se hoje que a medicina chinesa é uma medicina
• Ospontos energética e que as causas da doença, de acordo com se~
sistema de referência, devem ser procuradas nos deseqw-
Os meridianos são balizados com pontos específicos líbrios energéticos. Entretanto, depreende-se daí que as
sobre os quais se pode agir por intermédio da acupuntura, perturbações da circulação da energia nos meridianos. são
de moxas4, de massagens etc. . o resultado da deficiência de certos órgãos~ Para mwtos,
Não insistiremos aqui senão sobre pontos particulares basta então picar o ponto de acupuntur-a ligado 'ao órgão
situados na extremidade dos membros (entre a ponta dos considerado e a energia, por uma espécie de reflexotera-
dedos da mão e o cotovelo ou entre a ponta dos dedos do pia de tipo mágico, torna a circular livre~nt. .,
pé e o joelho). Estes pontos são em número de cinco por De fato, como o leitor que tenha lIdo os capItulos
meridiano e cada um deles está em relação com um ele- precedentes já terá percebido; a re~lida ' da tradiç~o
mento. Quanto aos órgãos (Yin) , as relações são as seguin- chinesa é ao mesmo tempo mUlto maIS complexa e mwto
tes: mais dependente da interdependência dos fenômo~ do
universo para se limitar a um raciocínio tão esquemátIco.
4. Mecha dc algodão qu c sc qu cima sob re o ponto, q U:lll do cste se ilc ha es timul ado
pelo calor.
5. Para os órgãOS este ponto Yu é confundido com o ponto Yuen ou ponto·fonte.

66
67
Certamente, a doença é o resultado de um desequilíbrio· des, sob a forma das energias convidadas, que se super-
energético, mas suas causas não podem ser reduzidas a um põem à sucessão ideal das mutações energéticas. Aconte-
órgão afetado e o meio de prevenir ou remediar deve levar ce o mesmo com o ser humano e é normal que as pertur-
em c?nta todas .as leis de mutação da energia a que nos bações afetem, por diversas razões que voltaremos a tratar
refenmos antenormente; adiante, a circulação de suas energias internas.
De um certo ponto de vista, todo ser é doente ou mais O conhecimento dos ritmos energéticos tem justamen-
o~ menos, as características pessoais de cada indivíduo te o interesse de facilitar o reequilíbrio constante desses
refletem suas características energéticas, isto é, a soma de
pequenos desajustes e de evitar as perturbações mais
s~u desequilíbrios energéticos. Tal temperamento (colé-
nco, fogoso, tímido ... ), tal tipo físico (grande, magro, gor- graves. Realmente, poderíamos, de maneira esquemática,
do ... ), tal quantidade psíquica (espírito de síntese, imagi- distinguir três níveis de perturbações. O primeiro se refe-
nação, memória) revelam uma entidade energética a cada re aos desajustes cotidianos inerentes à existência. O se-
vez diferente e portanto com características específicas. gundo traz consigo manifestações secundárias e a irrupção
Tal indivíduo será mais Yin ou mais Yang, ele será mais do que denominamos doença, com seus sistemas especí-
do tipo madeira ou fogo ou metal, ele apresentará uma ficos mais ou menos importantes. Esta doença pode às
fraqueza crônica de Gleterminado órgão ou um agrava- vezes ser normal e benigna num indivíduo (por exemplo,
mento em outro etc. certos tipos de doenças infantis), mesmo apresentando
Como escreveu J acques Lavier: sinais exteriores bem visíveis (erupções cutâneas); ela
pode também ser mais perniciosa e não apresentar sinais
Estar com boa saúde não é, contrariamente ao que de início se exteriores tangíveis, segundo nossas normas ocidentais.
. poderia pensar, ter suas funções normais, no sentido de que esta Enfim, o terceiro nível de doença se manifesta quando
normalidade resulta de uma estimativa estatística baseada no nú- há lesão de órgãos e que se verifica ser impossível voltar
mero mais ou menos grande de indivíduos todos semelhantes, ~ que ao estado energético anterior. Esse estágio não provoca
é pura e simplesmente impossível. Realmente, somos, pelo coiÚrá- forçosamente a morte e um novo equilíbrio energético
rio, todos fundamentalmente diferentes uns dos outros, e se algu-
pode ser realizado (por ocasião da ablação de um órgão,
mas características, de ordem estritamente quantitativa, nos · são
comuns (morfologia geral, anatomia) etc. inúmeros fatores ·qualita- por exemplo). O objetivo da medicina chinesa permanece,
tivos nos diferenciam, o que permite compreender que a normali, entretanto, o de investir, tanto quanto possível, no quadro
dade não deve, absolutamente, ser procurada no conjunto dos dos dois primeiros níveis.
outros indivíduos, mas, ao contrário, na própJ'ia pes o a ~6

Em tudo isso, seria inútil procurar um equilíbfio perfei- Causas internas e externas
to. Todo o cosmos está em perpétua mutação e as energias As doenças são resultado de um desequilíbrio produzi-
do céu e da terra manifestam, elas também, singularida-
do por dois tipos de causas: os fatores internos e os fatores
6. J. Lavier, M('dccill c chill Oisc, II/('dcci/lc tola/c, Grassc t. externos.

68 69
Os fatores internos podem ser devidos às carências
hereditárias, à má nutrição (excessos alimentares ou ali-
mentação desequilibrada), a choques psicológicos (as en-
tidades psíquicas quando têm ação sobre os órgãos). Os
fatores externos provêm das agressões climáticas que são
denominadas energias perversas. Estas energias p"erversas v
se manifestam durante a estação, ou durante o dia, quando
há uma perturbação exterior: quando o clima não corres- Os ritmos biológicos!
ponde à estação, quando a estação se manifesta com atra-
sos ou com adiantamento. Os fatores externos não podem
ter domínio sobre o organismo senão quando há carência
anterior. Por exemplo, se a energia Oé é deficiente de-
mais, a energia perversa mergulha e ataca o órgão que no
momento está em repouso.
Por outro lado, como os órgãos estão ligados entre si A ciência dos ritmos celestes e terrestres da tradição
segundo as relações definidas pelos ciclos dos cinco ele- chinesa fundamenta-se sobre conceitos tão diferentes dos
mentos, o ataque de um órgão agirá, por repercussão, nossos que, à primeira vista, parece difícil aplicar as suas
sobre outro órgão. A partir de uma simples carência he- regras. Sem o conhecimento desses ritmos, portanto, a
reditária, é possível chegar à combinação dos ciclos e pela prática da :medicina do Extremo Oriente se reduziria a
agravação devida aos ritmos biológicos e horários a ver- uma reflexoterapia sem envergadura; torna-se indispen-
dadeiras desordens energéticas que se traduzem pelo sur- sável conhecer os princípios básicos para compreender a
gimento da doença. coerência de um sistema que integra as influências crono-
biológicas (influência do tempo) e as bioclimatológicas
(influência do clima) em um todo harmonioso no qual o
ser humano não pode deixar de participar: "Entre o céu e
a terra se encontra o homem. Conseqüentemente, a ener-
gia do homem é influenciada por estas combinações de
energias céu e terra. Sucede o mesmo com todos os seres
viventes deste mundo" (So Ouenn, capo 68).
Com efeito, a idéia básica da ciência chinesa dos ritmos
biológicos é que o ser humano se acha submetido às
influências externas na medida em que ele é uma parte

1. As páginas deste capítulo parecerão árduas ao leitor não iniciado na medicina


chinesa. Elas lhe permitirão, contudo, avaliar a amplitude dos estudos sobre os
ritmos cósmicos na antiga China e desconfiar das simplificações abusivas.

70 71
integrante do cosmos. Estas influências externas provêm e têm uma correspondência celeste. Esta inversão de
das energias do céu e das energias da terra, as quais se termos po?e confundir o espírito ocidental, mas ela é
manifestam desde o início da criação do mundo. Energias característIca do pensamento chinês, fixado na interpene-
celestes e terrestres obedecem a leis de mutação precisas, tração dos dois termos como explica Marcel Granet2:
entre as quais as do Yin/Y ang e d9s cinco movimentos, e
se influenciam reciprocamente. E como está escrito no Esta inversão significativa atesta a interdependência dos dois
Nei King: ciclos. Podemos supor que, ligada à classificação por seis, a concep-
ção de um ciclo duodenal se referia às representações do céu e do
A terra é mantida no espaço pela grande energia do universo ... tempo, do mesmo modo que, solidário da classificação por cinco, a
Todas as coisas e todos os seres se transformam ... a energia do céu concepção de um ciclo decenário provém das representações de
vai à terra e a energia da terra vai ao céu. Uma se encontra no alto, terra e de espaço. Mas, entre o espaço e o tempo, o céu e a terra,
a outra embaixo. Uma e outra se atraem, uma ascendente outra nenhuma independência é concebível, e a ligação dos dois ciclos
descendente ... Simultaneamente, há o lado em repouso e o lado em não tem menos importância do que sua oposição. Ambos figuram
movimento; um age sobre o outro, o outro é gerado e se transforma. o conjunto dos sítios e das ocasiões que cada qual permite dispor
em uma tal ordem que convenha à terra e se impõe ao céu ou que,
significativo do céu, governe a terra.
Quanto ao homem, propriamente, "criado neste movi-
mento de cruzamento perpétuo destas duas forças" deve
se harmonizar ao processo contínuo de transformação, se Os troncos celestes
não quiser sofrer em conseqüência de desordens energé-
ticas. O estudo das influências externas é, portanto, pri-
mordial para aquele que deseja alcançar o lugar que lhe é Os troncos celestes correspondem aos cinco elementos.
reservado no cosmos. Agir sobre o desequilfbrio das ener- Es~e últi~os, na verdade, ~e e~prim segundo a bipo-
gias no organismo deve-se referir tanto aos fatores exter- landade Y m/Y ang, o que da dOIS troncos para cada movi-
nos quanto aos internos porque estes últimos, 'quão im- mento' um Yang e outro Yin.
portantes sejam eles, não têm função autônoma relativa": A numeração dos troncos se faz sempre em algarismos
mente ao seu ambiente. . árabes (algarismos romanos para os doze ramos terres-
tres): os algarismos pares correspondem ao Yin e os ím-
pares ao Yang. · ' .
Troncos celestes e ramos terrestres A lista dos troncos é a seguinte:

O estudo das interações das energias do céu e da terra 1 Kia 6Ki


é elaborado a partir do conhecimento do que os chineses 2 Yi 7 Keng
denominam os troncos celestes, em número de dez, e dos 3 Ping 8 Tsin
ramos terrestres, em número de doze. 4 Ting 9 len
Os troncos celestes possuem uma correspondência ter- 5Wou 10 Kouei
restre'e seu número de dez provém da existência dos ,cinco
elementos. Os ramos terrestres provêm das seis energias 2. M. Grane t, La Pellsée chillOisc, Albin Michel, Coll. "Evollltion de I'HlIlllanité".

72 73
A correspondência com os cinco elementos se apresen- O interesse destes troncos celestes é o de permitir
ta assim: calcular as influências do tempo que passa. Realmente,
cada tronco é predominante durante um dia, o que nos dá
5 ELEMENTOS TRONCOSYANG TRONCOSYIN
um primeiro ciclo de dez dias que recomeça indefinida-
Madeira Kia (1) Yi (2) mente.
Fogo Ping (3) Ting (4)
Terra Wou (5) Ki (6)
Metal Keng (7) Tsin (8) 1º dia Kia Madeira Yang
Água Jen (9) Kouei (10) 2º dia Yi Madeira Yin
3º dia Ping Fogo Yang
Esta correspondência entre os troncos e os elementos 4º dia Ting Fogo Yin
traz inevitavelmente uma ligação entre eles e os órgãos e 5º dia Wou Terra Yang
as vísceras. Os troncos Yang ficam então em relação com 6º dia Ki Terra Yin
as vísceras e os troncos Yin coin os órgãos. Além do mais, 7º dia Keng Metal Yang
os troncos Yang têm uma ação mobilizadora da energia 8º dia Tsin Metal Yin
enquanto que os Yin estão em relação com a energia de 9º dia Jen ~gua Yang
reserva. O quadro seguinte indica as correspondências 1Oº dia Kouei Agua Yin
entre os troncos celestes e o organismo.
Por outro lado, os troncos celestes dominam também
{ Kia (Yang) vesícula biliar cada ano seguindo sua ordem normal. Eles determinam
Madeira
- Yi (Yin) fígado assim "grandes movimentos" cujo nome define o ano
segundo um novo esquema de analogia:
{ Ping (Yang) intestino delgado
Fogo Ting (Yin) coração Kia (1) Yang
(Yang) estômago
Ki (6) Yin } Terra
{ Wou
Terra
Ki (Yin) baço
Yi (2)
Keng (7)
Yang
Yang } Metal

Metal { Keng
Tsin
(Yang)
(Yin)
intestino grosso
pulmão
Ping (3)
Tsin (8)
Yang
Yin } Água
Ting (4) Yang
} Madeira
Água { Jen
Kouei
(Yang)
(Yin)
bexiga
nm
Jen (9)
Wou (5)
Yang
Yang
} Fogo
Kouei (10) Yin

74 75
Finalmente, a correspondência entre os troncos celes- Estamos dando neste quadro os anos atuais de referên-
tes e os grandes movimel'itos de cada ano servem para cia a partir dos quais é fácil estabelecer um calendário:
calcular o estado de energia durante esse ano. Esse cálculo
se faz considerando que a energia anual é a do "grande
movimento" correspondente se o tronco celeste é Yang e DENOMINAÇÃO
TRONCOS MOVIMENTOS ENERGIA ANOS CHINESA DAS
da energia que o domina segundo o ciclo Ko de destruição CELESTES NORMAL ENERGIAS
se o tronco é Yin:.
A partir das correspondências entre as energias e os Kia (1) Terra umidade 1974 Tae Yin
elementos: Yi (2) Metal calor 1975 Chao Yang

---
ChaoYin

---
Ping (3) Água frio 1976 Tae Yang
Terra umidade

---
Ting(4) Madeira secura 1977 YangMing
Metal secura Wou (5) Fogo calor 1978 Cha:oYang

---
Água frio Chao Yin

---
Madeira vento Ki (6) Terra vento 1979 TsiueYin
Fogo calor Keng (7) Metal secura 1980 YangMing
Tsin (8) Água umidade 1981 Tae Yin
Jen (9) Madeira vento 1982 Tsiue Yin
e do ciclo de destruição dos cinco movimentos reproduzi- Kouei (10) Fogo frio 1983 Tae Yang
do na figura 19, é portanto possível determinar a energia
normal dos movimentos que têm um percurso cada ano
para um ciclo de dez anos:
Os movimentos hospedeiros e convidados
A energia normal dos movimentos do ano cuja deter-
minação partiu do estudo dos troncos celestes é modulada
pela existência de movimentos chamados "hospedeiros"
e "convidados" que se sucedem durante o transcorrer do
ano.

DATA MOVIMENTO ENERGIA


(APROXIMATIVA) HOSPEDEIRO CORRESPO NDENTE

21- 1 3- 4 Madeira vento


4- 4 15 - 6 Fogo calor
16- 6 27- 8 Terra umidade
28- 8 8-11 Metal secura
19. o ciclo de destruição. 9-11 20- 1 Água frio

76 77
Os movimentos "hospedeiros" são os movimentos nor- o00 ....
o o
mais das estações que se sucedem em cinco períodos de ~ ~
o -
13
setenta e três dias, cada qual caracterizado por um ele-
mento. A sucessão dos movimentos hospedeiros se faz na
ordem de produção dos elementos a partir de Madeira no ....
~
o00 o.... § o
8 o - OJ) 'c
começo do ano. Esta sucessão é sempre imutável, qual- <1) ~ 13 "C:C .....
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quer que seja o ano.
Os movimentos "convidados" são superpostos aos pre- ~ ~ ~

cedentes e servem para explicar as anomalias nas energias ~ .. al ~ o .!::: o o~ 15 ~ al ro ~ ~


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dos movimentos. Eles se sucedem no correr do ano nas r 6 '<, t:i

mesmas épocas e na mesma ordem de aparecimento que


os movimentos "hospedeiros", mas o primeiro movimen-
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to convidado corresponde ao grande movimento do ano. .&; 1§ 'O
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Se o tronco celeste de um áho é Kia ou Ki, seu grande ""g'
movimento será pois a :rerra e a sucessão dos movimentos r-~4_+ 2
convidados acontecerá como vem a seguir: Terra - Metal ..,e
....
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- Água - Madeira - Fogo. o - til

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O quadro da página seguinteresume a superposição dos til


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movimentos hospedeiros e convidados, com sua energia r-~;_+41 e


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correspondente, pura cada movimento anual. E ~


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Os ramos terrestres o
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, ~ V)

Os ramos terrestres representam a divisão do dia em 'O


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doze partes iguais. Cada hora chinesa equivale a duas '3


r-4_+~1 ~
horas européias e coincide com um ramo terrestre. Du- 01)
u
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rante a hora que lhe compete, cada ramo manifesta sua ....,
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qualidade própria e a sucessão das horas corresponde a


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um ciclo no q ua} dominam, cada uma por sua vez, as o C


-<,...;
~
influências dos doze ramos terrestres.

78 79
A numeração dos ramoS terrestres se faz em algarismos Cada energia se acha em relação corri dois ramos terres-
romanos: tres:

I Tse 23 a 1 hora Chao Yin


---
--- Tse (I) e Wou (VII)

---
11 Tcheou · 1 a 3 horas Tae Yin Tcheou (11) e Wei (VIII)

---
111 Yin 3 a 5 horas Chao Yang Yin (III) e Chen (IX)

---
IV Mao 5 a 7 horas Yang Ming Mao(IV) e You (X)

---
V Tchen 7 a 9 horas Tae Yang Tchen (V) e Su (XI)
VI . Sseu 9 a 11 horas Tsiue Yin Sseu (VI) e Hai (XII)
VII Wou 11 a 13 horas
VIII Wei 13 a 15 horas
IX Chen 15 a 17 horas . Por outro lado, cada ramo terrestre é acoplado com um
X You 17 a 19 horas meridiano. A plenitude de energia nesse meridiano em
XI Su 19 a21 horas determinada hora se explica por sua correspondência com
XII Hai 21 a 23 horas o ramo terrestre do momento:

Da mesma maneira que os troncos celestes estão em RAMOS TERRESTRES MERIDIANOS


relação com os cinco el~mntos, os ramos terrestres estão
em relação com as seis energias. Estas seis energias são I Tse vesícula biliar
descritas no capítulo 66 do So Ouenn intitulado "Estudo II Tcheou fígado
do cosmos". Com relação às energias dos cinco elementos, III Yin pulmão
IV Mao intestino grosso
a passagem para seis energias se faz desdobrando a ener-
V Tchen estômago
gia do elemento Fogo, o calor, em Fogo imperial (calor VI Sseu baço
extremo) e Fogo ministerial (calor). VII Wou coração
VIII Wei intestino delgado
AS SEIS ENERGIAS IX Chen bexiga

Tsiue Yin
---
---
vento XI
X You
Su
rins
coração mestre
Chao
Chao
Yin
Yang
---
---
fogo imperial
fogo ministerial
XII Hai forneiro triplo

Tae
Yang
Tae
Yin
Ming
Yang
---
---
umidade
secura
frio
Os ramos terrestres determinam ciclos com relação aos
dias, aos meses e aos anos. Eles possuem também uma
versão simbólica com o nome de um animal.

80 81
VERSÃO DIAS M~CHIN CORRES- CORRES-
SIMBÓLICA POND~CIA ANO OND~CIP N esta linha os ramos que correspondem ao qualificati-
APROXIMA- APROXIMA
TIVA TIVA vo "restante" de cada elemento têm como símbolo a
I Tse rato 1° 11° dezembro 1° 1972 Terra. A partir do ramo Yin que marca o início do ano
11 Tcheou búfalo 2° 12° janeiro 2° 1973 chinês, a evolução do ano vai, realmente, desenvolver-se
1lI Yin tigre fevereiro
3° 1° 3° 1974 da forma seguinte:
IV Mao gato 4° 2° março 4° 1975
V Tchen dragão 5° 3° abril 5° 1976

{
Madeira preparada, começa a manifestar-se Yip III
VI Sseu serpente 6° 4° maio 6° 1977 Primavera Madeira pura, está no máximo MaoIV
VII Wou cavalo 7° 5° junho 7° 1978 Madeira restante, retoma à Terra Tchen V
VIII Wei cabra 8° 6° julho 8° 1979

{
IX Chen mac..'.aco 9° 7° agosto 9° 1980 Fogo preparado, começa a manifestar-se Sseu VI
X Vou ga lo 10° 8° setembro 10° 1981
Verão Fogo puro, está no máximo Wou VII
Fogo restante, retoma à Terra Wei VIII
XI Su cão 1 ~ 9° ou tubro 11° 1982
XII Hai porco 12° 10° novembro 12° 1983

{
Metal preparado, começa a manifestar-se ChenlX
Outono- Metal puro, está no m:íximo YouX
Metal restante, retoma a Terra SuXl
~-

Relação dos ramos terrestres e dos cinco elementos


{
Água preparada, começa a manifestar-se HaiXlI
Inverno Água pura, está no máximo Tsel
Esta relação é feita considerando-se os cinco elementos Água restante, retoma à Terra Tcheou II
em sua posição original, isto é, com a terra no meio que
intervém ao nível energético, no fim de cada estação.
Esta classificação, que interessa ao funcionamento or-
As correspondências se estabelecem a partir desta pri-
me ira classificação: gânico dos seres humanos, desemboca sobre ~ quadro
seguinte das correspondências ramos terrestres-Clllcomo-
I Tse Água pura vimentos.
11 Tcheou Água restante
111 Yin Madeira misturada
IV Mao Madeira pura MOVIMENTOS RAMOS TERRESTRES
V Tchen Madeira restante
Madeira Yin I1I, Mao IV
VI Sseu Fogo misturado
VII Wou Fogo puro Fogo Sseu VI, Wou VII
VIII Wei Fogo restante Terra Tchen V, Wei VIII, Su XI, Tcheou 11
IX Chen Metal misturado Metal Chen IX, You X
X You Metal puro Água Hai XII, Tse I
XI Su Metal restante
XII Hai Água preparada

82
)
Energias hospedeiras e energias convidadas 21. Pouca neve
22. Neve abundante TaeYang
23. Solstício de inverno frio
Estas energias servem para determinar a energia nor- 24. Frio pouco intenso
mal (energia hospedeira) durante as diferentes estações
assim como suas perturbações (energia convidada). As energias convidadas variam de acordo com os anos
As energias hospedeiras se sucedem durante o percurso e são função do ramo terrestre que comanda o ano. Há
do ano, invariavelmente, na ordem seguinte: duas energias convidadas por ano: a primeira, de origem
Tsiue Yin vento celeste, domina a primeira metade do ano; a segunda, de
Chao Yin fogo imperial origem terrestre, domina durante os seis últimos meses.
Chao . Yang fogo ministerial A determinação das energias convidadas segundo os ra-
Tae Yin umidade mos terrestres é explicada no So Ouenn (cap. 66) e se
Yang Ming secura traduz como no seguinte quadro:
Tae Yang frio
RAMOS TERRESTRES ENERGIAS CONVIDADAS ENERGIAS
Cada uma delas determina quatro divisões energéticas ANUAIS DOS SEIS PRIMEIROS CONVIDADAS DOS
de um período de cerca de quinze dias. Estes períodos MESES ÚLTIMOS SEIS MESES

correspondem às diveIsas fases da lua: um vai da lua nova Tse (I), Wou (VII) ·Chao Yin YangMing
até a lua cheia, outro da lua cheia até a lua nova. fogo imperial secura

Cada período é numerado de 1 a 24 e caracterizado por Tch.eou (11), Wei (VIII) TaeYin Tae Yang
um nome. Cada uma das quatro estações compreende seis umidade frio
desses períodos.
Yin (I1I), Chen (IX) Chao Yang Tsiue Yin
.'
)
L Grande frio fogo ministerial vento
2. Começo da primavera Tsiue lnn
3. Chuva fina de primavera vento
Mao (IV), You (X) YongMing Chao Yin
4. Despertar dos vermes e dos micróbios . secura fogo im "erial

)
5. Equinócio da primavera
6. Luz pura Chaolnn Tchen (V), Su (XI) Toe Yong Toe Yin
7. Aguaceiros de primavera fogo imperial frio umidade
8. Começo do verão
Sseu (VI), Hai (XII) Tsiue Yin Chao Yong

)
9. Começo da época das inundações vento fogo ministerial
10. Começo da época das semeaduras Chao Yang
1L Solstício do verão fogo ministerial
12. Calor moderado
13. Grandes calores União das influências celestes e terrestres
14. Começo do outono
15. Calores secos
16. Nevoeiro denso
) TaeWin
. umidade
Já definimos nas páginas precedentes alguns dos diver-
17. Equinócio de OUlOno sos ciclos energéticos que animam o cosmos. Alguns são
18. Nevoeiro espesso e fresco
19. Queda de olvalho
20. Começo do inverno ) Yang Mfng
secura
de origem celeste, outros de origem terrestre e todos têm
influência sobre o homem. Igualmente, o perfeito conhe-

84 85
cimento dos ritmos biológicos deve levar em conta a
integração dos diversos ciclos: união dos movimentos hos-
pedeiros e convidados, união das energias hospedeiras .e
convidadas, união dos troncos celestes e dos ramos terres-
tres. Esta síntese é tanto mais complexa pois que estamos
na presença de ciclos que se referem às horas, assim corno
os dias, assim corno os anos e que esses ciclos estão r:- e
\O ;,;

algumas vezes na base 5 ou 10 (os movimentos e os troncos 2 Ir) f-;

celestes), algumas vezes na base 6 ou 12 (as energias e os ~-+4


o cO o
ramos terrestres), algumas vezes na base de 60 (integração o
co c
.: co _co co
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00

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dos ciclos dos troncos celestes e dos ramos terrestres). 00
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Corno exemplo, damos no quadro da página seguinte os ü;>:;>< ó;.=:;>:
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dados energéticos anuais de alguns anos futuros . . '" 1--------- ~

O interesse desses ciclos é explicar o estado energético ~ Ü

do ambiente num dado momento e permitir tratar o de-


sequilíbrio de energia num ser humano levando em conta
as influências externas. Contudo, é preciso confessar que
sua extrema complexidade é um obstáculo para sua utili-
zação comum por todos nós, tanto mais que é preciso levar
em conta as combinações entre energias que, segundo o
caso, dão resultados favoráveis ou desfavoráveis.

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c
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~ E Ü

86 87
Na verdade, a descrição desses ciclos energéticos com-
plexos procura levar-nos a tomar consciência de que o
cosmos se acha em perpétua mutação e que os ritmos que co co
V\ .-<
'"
.-< o
o agitam têm uma influência sobre nós da qual não é N

possível fugir. Concretamente, há em essência três ciclos o


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dos quais é fácil se recordar: 0 0>- :2

- Um ciclo circadiano caracterizado por doze períodos co co


~ 1"
o
de duas horas durante as quais um órgão e seu meridiano
C\
.-< 1"

experimentam uma plenitude de energia. V\


V\
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- Um ciclo anual caracterizado pelas cinco estações e '"


~ o
1"

suas correspondências com os cinco órgãos. .


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- Um ciclo de sessenta anos definido pela associação, - 1" -

a cada ano, de um tronco celeste e de um ramo terrestre V) V)


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que determinam, por sua vez, todos os momentos e ener- ...::::
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gias do ano. O quadro Qa página seguinte mostra os anos o o


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do ciclo que terminou em 1983 e do ciclo seguinte. Basta 1"
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verificar nos quadros precedentes para achar as caracte-


rísticas energéticas maiores de cada ano.
Por outro lado, é preciso sempre levar em conta a
diferença do estado virtual da energia e seu estado real. r;:;;t;
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Esta diferença se percebe ao nível climático quando o
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tempo reinante não corresponde aQ tempo que deveria V)


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o. o
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fazer em certo momento, em função da estação. É assim - 1"

que é possível ter uma primavera chuvosa, um verão frio, .,. .,.
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um inverno suave ou que uma estação pode estar adianta- 1-0 U r :.:: o.
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0. 0
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da ou atrasada. Estas anomalias se explicam pelas imbri-


cações dos diferentes ciclos energéticos e se traduzem
pelas energias perversas que podem atacar o organismo e
ser causa de desajustes energéticos que produzem, se o
indivíduo não reage, o aparecimento da doença.
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t::
0 _
t1
~ t:

88 89
SEGUNDA PARTE

A arte de viver
o ser humano é caracterizado por uma quantidade de
vida, o sing, reunião do físico e do psíquico. O sing é
formado pelas energias do céu às quais a tradição liga a
personalidade e pelas energias da terra que correspondem
à individualidade. Se existe um desequilíbrio entre as
energias do céu e da terra, a vitalidade se enfraquece e o
sing dos seres diminui.
A fim de tirar o melhor partido de seu sing, o homem
deve submeter-se às regras tradicionais da arte de viver.
Estas dizem respeito ao seu comportamento psíquico, sua
alimentação, seu método de respiração e as práticas tais
como as artes marciais e a meditação que, no Ocidente,
são reservadas a alguns indivíduos isolados, mas que de-
veriam ser tão espalhadas quanto os esportes, porque elas
contribuem poderosamente para o desabrochar psíquico
e físico. É por isso que apresentamos, na segunda parte
desta obra, as fases fundamentais dessa arte de viver que
é o corolário indispensável para o aspecto teórico da
manifestação da energia.

93

1
VI

o psiquismo

Segundo a tradição chinesa, o ser humano constitui uma


só entidade energética e não é suscetível de ser dividido.
O psiquismo não pode portanto, em caso algum, ser dis-
sociado do físico: ambos representam manifestações dife-
rentes da mesma energia, eles seguem as mesmas leis e
estão em interdependência completa, corno as duas faces
da mesma folha de papel. No caso de perturbações, seja
do psiquismo ou do organismo, não se poderia em abso-
luto tratar de um sem referência ao outro; os princípios
que nossa medicina psicossomática (à qual, aliás, seria
preciso acrescentar o segundo qualificativo de somatopsí-
quica) descobre atualmente formam a base da medicina
há milênios.
De um ponto de vista energético, o somático, o físico, é
considerado como a energia rriais manifesta, portanto
mais Yin. O psiquismo, o mental, é energia menos mani-
festa, mais sutil, mais Yang. Os dois aparecem de maneira
virtual desde a união do óvulo e do espermatozóide, e se
desenvolvem sofrendo influências dó ambiente, primeiro
na vida intra-uterina e após o nascimento.

95
As entidades viscerais equilíbrio psíquico. Ele tem um papel de centralizador e
ou funções psíquicas de regularizador das outras entidades viscerais. .
O Chenn representa a inteligência global, que sintetiza
o conjunto do psiquismo é formado por cinco funções, as informações recebidas, o julgamento que decorre das
geralmente designadas por Charles Laville-Méry pelos referências ao passado. Todo o psiquismo lhe é ligado e
termos de "entidades viscerais". Cada uma delas se acha ele simboliza a Consciência, a Razão, a Sabedoria, o Amor
em relação com um órgão e portanto com um elemento, (não no sentido de amor-paixão ou de amor-emoção mas
e apresenta características e manifestações psíquicas que sim de amor transcendente em que o ego desaparece pa-
lhe são específicas. O ·equilíbrio do psiquismo em geraI ra se unir à energia universal). Ele pertence, em partes
provém do equilíbrio mútuo das entidades. iguais, ao domínio do hereditário e ao domínio do adqui-
A denominação dessas entidades se faz pelos termos rido. As manifestações exteriores do Chenn são a alegria,
chineses por não haver correspondentes exatos com o o riso, a afetividade, a busca espiritual do absoluto.
vocabulário ocidental. Se está em excesso, há superexcitação mental, riso inex-
tinguível, depressão por excesso de fogo e ressecamento
ELEMENTOS ÓRGÃOS ENTIDADES VISCERAIS dos líquidos nutrientes.
Madeira fígado Roun Se está insuficiente, há timidez, medo, queixas contí-
Fogo coração Chenn nuas, inquietação, esquecimento.
Terra baço I
Metal pulmões Pro
Água rins Tche • OI

Sua morada é o baço (Terra)


• O Chenn O I representa a memória, isto é, a faculdade de repetir
as imagens das quais se tem consciência, a concentração
Sua morada é o coração (Fogo). do espírito, a reflexão, o desejo, a compreensão. Ele se
O Chenn tem dois papéis no funcionamento geral do manifesta nos hábitos, na receptividade, nas preocupa-
pSlqUlsmo. ções, nas idéias fixas. O I pertence sobretudo ao domínio
Por um lado, é a entidade específica do coração e possui do adquirido.
então suas próprias características. Por outro lado, ele Se está em excesso, há tendência para a rotina, para as
garante o papel de coordenador de todas as entidades manias, para a obsessão, para a rigidez mental. As depres-
viscerais. Ele fica, neste caso, no lugar supremo que resul- sõespor excesso se traduzem por um exagero das preocu-
ta da reunião das particularidades psíquicas de todos os pações' tristeza e falta de coragem.
elementos. Se é insuficiente, há perda de memória, mau trabalho
Realmente, o Chenn é o reflexo dos fenômenos da intelectual, falta de concentração, distração, preguiça,
natureza e seu bom funcionamento é indispensável ao aborrecimento pela atividade (ausência de desejo).

96 97
• O Pro inveja. O Roun pertence sobretudo ao domínio do here- .
ditário.
Sua morada é nos pulmões (Metal). Se está em exc~so, há agressividade, irascibilidade,
O Pro representa o ip.stinto: instinto de conservação e mau caráter, sonambulismo.
inteligência da célula. E traduzido às vezes pelos termos Se é insuficiente, há angústia, falta de imaginação e de
de "memória do futuro" porque deduz o futuro a partir do coordenação, apatia. . .
passado. Ele se manifesta pelas pulsões e repulsões, seja O conjunto das cinco entidades viscerais está submeti-
no nível físico com os órgãos dos sentidos, sobretudo o do, é claro, às leis de interação da teoria dos cinco elemen-
olfato, ou no nível psíquico (projeção mental). Ele se tos. Contudo, o papel de síntese de Chenn lhe confere um.
traduz pela tristeza, lamentações, choro. O Pro pertence lugar especial que se traduz pela possibilidade de agir
sobretudo ao domínio do hereditário. diretamente sobre todas as funções psíquicas.
Se está em excesso, há tristeza, temor do futuro, pessi-
mismo, gemidos.
Se está insuficiente, há choro, perda do instinto de As interações com os órgãos
conservação (procura da morte ), sensibilidade exagerada,
vulnerabilidade. Cada entidade se acha em estreita relação com um
órgão e as manifestações psíquicas possuem por esse mo-
tivo correspondências fisiológicas:
• O Tche • A cólera faz voltar a energia para ·a parte alta do
corpo. Nos casos graves, ela produz vômitos de sangue ou
Sua morada é nos rins (Água). diarréias.
O Tche representa a vontade, a faculdade da realização, • A alegria produz paz, a energia Y ong circula facil-
o espírito de decisão, a tenacidade. Ele se manifesta tam- mente.
bém pelo medo visceral, pelos gemidos. O Tche pertence • A angústia provoca uma constrição do coração e uma
sobretudo ao domínio do adquirido. dilatação dos pulmões. A energia da sede superior não
Se está em excesso, há temeridade, autoritarismo, obs- circula mais e Y ong se dispersa pouco a pouco.
tinação. . • O medo bloqueia a sede superior. A energia, então,
Se está insuficiente, há medo visceral, pânico, indeci- não pode mais passar, não circula mais no organismo e se
são, gemido, falta de autoridade, complexo de inferiorida- verificam inchações do ventre. .
de e tendência anti-social. • A estafa física provoca uma dispersão excessiva da
energia. A estafa intelectual bloqueia .a circulação da
energia .
• O Roun Estes poucos exemplos clássicos podem ser multiplica-
dos, se utilizarmos as interações dos cinco elementos. O
Sua morada é o fígado (Madeira). Lin Tchrou apresenta, assim, no capítulo 8, vários casos de
O Roun representa a imaginação, a emoção. Também ataque ao órgão por manifestações psíquicas. A análise
se manifesta pela violência, pela cólera, pelos gritos, pela destes casos sob a visão dos cinco elementos permite
98 99
apreender a complexidade das relações psiquismo-órgão- • Segundo caso: "A cólera prejudica os rins. O d~eIit
estação. perde a memória, não pode curvar-se nem para dIante
• Primeiro caso: "Se o coração tem preocupações nem para trás. Ele morrerá no fim do verão".
excessivas, ou se desencadeia, a tez se altera. O doente, A cólera corresponde ao Roun e, em excesso, provoca
atingido por preocupações demais, morrerá no inverno". o vácuo do fígado. Os rins se esgotam para mantê-lo. e no
Realmente, as preocupações correspondem à entidade
fim do verão (quinta estação) o baço em sua plerutude
visceral de I, portanto ao baço, e seu excesso esgota este,
que fÍca então no vácuo. O coração, que é a mãe do baço atacará os rins (figura 21).
segundo o ciclo de procriação, vai esgotar-se também, Podemos, do mesmo modo como antes, encontrar os
para lhe fornecer energia. Durante o inverno, os rins vão alimentos convenientes para uma tal situação (sobretudo,
encontrar o máximo de energia e atacar o coração vulne- evitar o sabor doce que corresponde ao baço):
rável porque no vácuo, segundo o ciclo Ko de destruição O Ling Tchrou dá ainda mais-três casos (para cada um
(figura 20). dos elementos) que não é necessário desenvolver (o pro-
E interessante notar como se pode, nesse caso, manter cesso é igual).
o órgão pela alimentação. Será preciso consumir os ali-
mentos específicos do baço e do coração, mas sem excesso
para não provocar novas carências (ver o capítulo "A
alimentação"): sabor doce, milho, carne de vaca para o
: .. '.~
baço, sabor amargo, arroz, carneiro para o coração. Por .....
outro lado, será preciso evitar, sobretudo no inverno, o
sabor salgado, o porco, as ervilhas que correspondem aos
, v
1-

rins.
FlSAPOO

V ;:::.
RINS'
Figura 21.
R'WS
Se as manifestações psíquicas podem atacar os órgãos,
podem' também controlar-se mutuamente. Para isso, é
preciso utilizar o ciclo Ko (figura 22).
100 101
A propósito da energia Yin e Yang:
A energia dos órgãos em plenitude: sonhamos que estamos atra-
vess.ando o mar e teinos medo.
A energia Yang exterior em plenitude: sonhamos com incêndio.
Se as energias Yin e Yang estão todas em plenitude: sonhamos
coin batalhas.
A .p arte superior do corpo em plenitude: sonhamos que estamos
voando; a parte inferior em plenitude: sonhamos que estamos cain-
do.

A propósito 'dos órgãos em plenitude:


o fígado em plenitude: sonhamos que estamos encolerizados.
Os pulmões em plenitude: sonhamos que temos medo, que cho-
ramos e que voamos.
O coração em plenitude: sonhamos com risos.
Q.baço em plenitude: sonhamos que estamos muito alegres, que
cantamos, que o corpo está muito pesado .
. Os rins em plenitude: sonhamos que a coluna vertebral está
A cólera controla o excesso de reflexão. destacada do corpo.
A alegria controla o excesso de tristeza.
A reflexão controla o excesso de medo. A propósito dos órgãos em vácuo:
A tristeza controla o excesso de cólera.
O medo controla o excesso de alegria. O coração.em vácuo: sonhamos com montanhas, fogos e fumaças.
Este controle pode também exercer influência entre O fígado em vácuo: sonhamos com florestas.
manifestação psíquica e órgão. Contudo, se o órgão con- O baço em vácuo: sonhamos com abismos nas montanhas, com
trolado está em vácuo, o controle se transforma então em tempestades.
ataque e se torna uma ação nefasta. . - Os rins em vácuo: sonhamos que nos afogamos.
Por outro 'lado, se o psíquico pode influenciar sobre o
somático, o somático influi da mesma maneira sobre o A propósito das vísceras em vácuo:
psíquico. O capítulo 43 do Ling Tclú'ou contém assim
A bexiga em vácuo: sonhamos com cânticos.
numerosos exemplos das relações entre o estado energé- O intestino delgado em vácuo: sonhamos que estamos em gran-
tico dos órgãos e dos sonhos. des cidades.
É interessante citar a seguinte passagem, praticamente A vesícula biliar em vácuo: sonhamos que lutamos, que estamos
em sua integralidade. com processos legais, que nos suicidamos.

102 103
Da concepção até o adulto ção psíquica não podem, portanto, ser dominados pelo
Chenn como serão mais tarde.
No momento da concepção o Chenn (o Espírito) só No nascimento, o Roun e o Pro, cujo caráter hereditário
existe virtualmente. A ordem de aparecimento das dife- é majoritário e cujas manifestações específicas terão sido
rentes entidades é a seguinte: condicionadas pelos fenômenos que produzem estresse
da vida intra-uterina, só poderão ser controlados pelo
OI o baço Chenn, que dirige o conjunto do psiquismo e influenciado
O Tche os rins pelo I e pelo Tche cujo caráter é mais adquirido do que
O Chenn o coração hereditário. O Roun (a imaginação - a emoção) e o Pro
O Pro os pulmões serão portanto determinados pela tendência psíquica ge-
O Roun o fígado ral de um indivíduo.

. O baço, que aparece em primeiro lugar, só toma sua


forma definitiva no fim desse ciclo (que corresponde ao
ciclo Ko).
A formação do equil{brio psíquico se faz em partes
durante a vida intra-uterina graças às informações perce-
bidas e registradas. Aliás, é preçiso chamar a atenção
so bre a importância desse período de vida fetal que é, com
excessiva freqüência, ·negligenciado.
A mãe deverá buscar o equilíbrio físico, pela alimenta-
ção, os exercícios ginásticos e a respiração apropriados. O
equilíbrio psíquico, no casal e com as relações exteriores,
é igualmente primordial quando seguimos as relaçoes
profundas do organismo e do psiquismo.
Todas as manifestações que atingem a mãe, sejam os
estresses externos (agitação, barulhos) ou internos (emo-
ções diversas) se repercutem sobre'o feto após haver sido
mais ou menos temporizados pelo Chenn materno. As
características físicas e psíquicas do recém-nascido já for-
temente condicionadas pela hereditariedade (a energia Figura 23.
vital), serão assim influencidas por toda a vida intra-ute-
rin,a. Acrescenten:os que o Chenri, como síntese do psi- Por outro lado, as funções psíquicas preponderantes
qUl~mo que controla esses mecanismos, só é virtual duran- podem combinar-se entre si para dar diversos tipos psí-
te a gestação. Os traumatismos que atingem alguma fun- quicos. Vejamos o exemplo do Roun, a imaginação. Se

104 105
está associado a um I, reflexão, em excesso, verificaremos paroxísmicos na criança porque seu Chenn ainda não
uma imaginação baseada sobre a repetitividade. recebeu informações suficientes. Além do mais, o I e o
Caso contrário, se o Roun está associado a um I e a um Tche (desejo e vontade) podem alimentar a cólera do
Pro de modo harmonioso, teremos a síntese: imaginação Roun.
+ reflexão + instinto (memória do futuro). A imaginação
poderá estruturar suas imagens a partir do passado e Se o Roun está em vácuo, o fenômeno de exteriorização
projetá-las no futuro; ela se tornará criadora. Quando não se produzirá, sem que, por isso, apareça uma tendên-
acrescentamos a esses três elementos o Tche (a vontade) cia para a interiorização que depende do Pro. O indivíduo
e O" Chenn (a razão, a moral), a criatividade pode então será então um ser "apagado", com pouca imaginação e
realizar-se. uma visão restrita das coisas.
O Roun e o Pro permitem assim definir duas grandes No adulto, o excesso ou a insuficiência do Roun podem
tendências psíquicas que reencontramos em todos os in- ser dominados por um Chenn normal que tenha recebido
divíduos: a tendência para a exteriorização, mais Yang, e suficientes informações. A moral e a serenidade podem,
a tendência para a interiorização, mais Yin. A primeira segundo for o caso, frear o excesso de exteriorização ou
corresponde à aspiração do Roun, a segunda à aspiração compensar sua ausência. Por outro lado, se o próprio
do Pro. Elas se manifestam pelas perturbações do com- Chenn está em excesso, haverá tendência para o absolutis-
portamento se não são dirigidas pelas outras entidades, mo, para o misticismo. Essa tendência ' será tanto mais
sobretudo o Chenn. avançada na medida em que o Roun apresentar plenitude.
CHENN E se o Roun manifesta carências, a tendência s~ transfor-
I
O o mará em raciocínio e julgamento frio e avançado.
r!! )lAN& ~
A problemática do Pro, cuja inclinação natural é para

h~
se fechar no Yin, portanto para a interiorização, é eviden-

7v:N.. =
temente do meSJ)1O tipo. O Chenn representará aí um
papel ainda mais importante porque tem uma ação direta
sobre o Pro, por intermédio do ciclo Ko. As características
da tendência para a interiorização quando elas não são
o controladas peio Chenn são as mesmas que as que defi-
TCHE~ nem o excesso e a insuficiência do Pro.
24. As du as grandes tendências do psiquismo. N os dois casos, o papel do Chenn aparece como primor-
dial. Sua formação é tanto hereditária como adquirida. O
Se o Roun está em excesso, o fenômeno de exterioriza- papel da família, da educação, da sociedade, que forne-
ção se traduzirá pelo da agressividade, da maldade, pelo cem as informações, facilitam. sua .integração e dãO . a
fogo da cólera. Todas estas manifetações são agravadas possibilidade de sua síntese, assumem então toda a ..sua
pela fraqueza do Chenn e elas explicam certos fenômenos importância.
106
107
Notamos enfim que os mestres espirituais tradicionais
(e isto é verdadeiro também com relação às artes mar-
ciais) tomam cuidado, sempre, seja para reequilibrar as
tendências excessivas para a exteriorização como para a
interiorização dos discípulos que se empenham para en-
trar num caminho espiritual. VII

A alimentação

As regras dietéticas provenientes dos princípios da medi-


cina chinesa ficam muito mais próximas do "bom-senso"
e das maneiras de alimentação tradicionais que dos regi-
mes confusos que se usam atualmente. Contudo, essas
regras podem oferecer-nos muito, na medida em que elas
concebem os regimes alimentares como um verdadeiro
encadeamento da energia que leva em conta todas as leis
cíclicas enunciadas aqui, anteriormente.
Na verdade, é preciso relembrar que a energia alimen-
tar, Kou Tchi, depende da qualidade e da quantidade de
alimentação e que, por esse fato, todo o nosso ser delas
depende, sob o ponto de vista energético, seja pelo aspec-
to físico, seja pelo aspecto psíquico. Assim, por intermédio
da lei do Yin/Yang, da lei dos cinco elementos, ou daquela
dos ritmos biológicos, uma alimentação pode igualmente
provocar perturbações energéticas como ajudar na volta
dos desequilíbrios anteriores.
Para isto, é preciso levar em conta as incidências destas
leis sobre a escolha dos alimentos (em função dos cinco
sabores e de sua qualidade Yin/Yang) e sobre as horas ou

108 109
as estações de absorção (os ritmos biológicos). Além do Recordemos, de início, as correspondências dos sabo-
mais, cada pessoa deve l~var ep1 consideração os impera- res com os órgãos:
tivos ligados à sua situação. E evidente que o lugar de
habitação, a profissão, o sexo, a constituição fisiológica, os
hábitos ligados à educação representam um papel princi-
Madeira { vesícula
fígado
biliar
-----+ agroácida -----+
sulfato de
magnésio
paI na composição dos alimentos. coração
Tal evidência está longe, infelizmente, de ser admitida intestino delgado cloreto de
por todos, porque assistimos a um elogio dos regimes que
propõem uma nutrição padrão julgada válida, com algu-
Fogo
{ três sedes
constritor
do coração
-----+ amargo -----+
magnésio

mas adaptações, para qualquer pessoa. A interpretação


mais corrente da macrobiótica, que no entanto se diz Metal { pulmões
in testino grosso -----+
picante
acre -----+
cloreto de
potássio
fundada na tradição extremo-oriental, se apresenta como
- uma doutrina dogmática que ignora as mutações perpé- Terra { estômago
baço -----+ doce -----+
cloreto de
cálcio
tuas que animam o universo.
De fato, podemos afirmar que não há regras absolutas
que possam determinar este ou aquele regime. É preciso,
Água { rinsbexiga -----+ salgado -----+
cloreto
de sódio
de preferência, procurar uma harmonia na nutrição a fim Em geral, o sabor correspondente do órgão o tonifica
de permitir ao ser humano que se adapte melhor ao seu e l~e é benéf~co se está em vácuo. Ao contrário, se o órgã~
ambiente. Nestas condições, não nos é possível senão esta em plerutude, o sabor correspondente lhe será nefas-
apresentar certas leis que constituem outros tantos crité- to e também atacará o órgão do qual triunfa segundo o
rios a partir dos quais cada pessoa deve organizar seu ciclo Ko.
próprio modo de nutrição. O sabor agro ácido (nos alimentos ou nas tisanas) terá,
p~r exemplo, uma ação salutar sobre um fígado pouco
Os cinco sabores atIVO mas provocará uma reação nociva se o fígado está
tenso e, em seguida, prejudicará o baço. -
Os cinco sabores e a correspondência que eles mantêm
com os órgãos segundo a doutrina dos cinco elementos SABOR SABOR
constituem o fundamento da dietética chinesa. Seu p'rin- ESPECiFICO REGULARIZADOR
cípio permite estimular ou temperar os órgãos, seja dire-
tamente ou por intermédio dos diferentes ciclos da lei dos Fígado (vesícula biliar) agroácido doce
Coração (intestino delgado) amargo acre-picante
cinco movimentos. Além do mais, cada sabor possui tam- Baço (estômago) doce salgado
bém sua própria especificidade: por exemplo, a ação dis- Pulmão (intestino grosso) acre-picante agroácido
persadora do picante ou a ação ajuntadora do amargo. Rins (bexiga) salgado amargo

110 111
Outros sabores podem, por desforra, agir sobre um - O salgado está em relação com o sangue (por inter-
órgão em excesso. O quadro anterior dá, para cada órgão, médio dos rins). O excesso de alimentos ou de tisanas
os sabores específicos que os tonificam e os sabores regu- deste sabor provoca uma vagarosidade da circulação san-
ladores que os acalmam quando eles estão em excesso. guínea. Além do mais, o estômago é obrigado a produzir
As correspondências entre os órgãos e os aspectos fisio- mais líquido e por esse motivo provoca sede.
lógicos que delas dependem permitem também verificar - O picante está em relação com a energia (por inter-
outras relações. A regra geral é que o sabor corresponden- médio dos pulmões). O excesso de alimentos ou de tisanas
te a um grupo de entidades fisiológicas as prejudica, se for deste sabor prejudica a energia.
absorvido em excesso. A ·seguir, os aspectos fisiológicos - O amargo está em relação com as três sedes. O
ligados ao elemento que prossegue no ciclo Ko (figura 25) excesso de alimentos ou de tisanas impede o bom funcio-
também serão atacados. ' namento das três sedes. A energia repele esse excesso de
- O agro ácido está em relação com os músculos (por amargo e provoca vômitos, portanto.
intermédio do fígado). O excesso de alimentos ou de - O doce está em relação com o estômago. O excesso
tisanas desse sabor provoca contrações. de alimentos ou de tisanas deste sabor torna o estômago
hipotônico e a sede superior é perturbada.
Os exemplos dados acima são aqueles que, pela expe-
AMAf{GO riência, aparecem com mais freqüência. Outras relações,
entretanto, podem estabelecer-se a partir do quadro reca-
~
11 pitulativo dos cinco elementos (ver a tabela de correspon-
dência dos cinco elementos ao fim do capo III).
Certos elementos também estão em relação com os
órgãos. Neste caso, seu efeito estimulante ou calmante é
do mesmo tipo que o dos sabores: estimulante do órgão
correspondente, portanto nocivo quando há excesso.
Damos a seguir alguns exemplos de alimentos específi-
cos de órgãos. Esta lista poderia sem dúvida ser aumenta-
da, mas fica difícil estabelecer correspondências certas na
medida em que muitos alimentos apresentam afinidades
com vários órgãos. É por isto que se pode duvidar sobre
as correspondências publicadas por certos autores.
Fígado (vesícula biliar): cão!, ave, trigo, ameixa ácida,
malva, bardana, vinagre.

25. As interações dos sabores de acordo com o ciclo de destruição. 1. o cão era antigamente consumido no E,tremo Oriente. Apesar de seu valor
energético, damos este exemplo somente a título de informação.

112 113
Coração (intestino delgado): carneiro, arroz, frutos algum em particular. A mesma expressão é ta~bém ~m­
amargos, café, chicória, alho, dente-de-leão. pregada de modo poético para evocar a harmorua realIza-
Baço (estômago): carne de vaca, milho' miúdo, cevada, da como no versículo do sutra budista "Hokyo Zan Mai"3:
milho, alho, tâmara, maçã, açúcar, sete aromas. "Como os cinco gostos da planta chisso" que designa a
Pulmões (intestino grosso): cavalo, aveia, pêssego, pi- sabedoria de Buda.
menta, alho, lótus.
Rins (bexiga): porco, trigo mourisco, soja, ervilha, fei-
jão, cebola, sal, castanha. o Yin e o Yang na alimentação
N otemosque esses alimentos têm um efeito adoçante
Certos regimes dietéticos recentes no Ocidente intro-
sobre o órgão que triunfa de seu elemento específico
segundo o ciclo K02: duziram a noção do Yin/Yang na alimentação (o macro-
- Se o fígado está em excesso, é preciso consumir os biótico principalmente). É assim que os alimentos foram
alimentos atribuídos aos pulmões. colocados em longas listas que sublinham sua relação com
'- Se o coração está em excesso, é preciso consumir os a categoria Yang ou a categoria Yin, e que alguns princí-
alimentos atribuídos aos rins . . pios simples foram erigidos ao nível. de ~ogmas que basta
- Se o baço está em excesso, é preciso consumir os seguir sem refletir: para um deseqmlíbn? q~e tenda para
alimentos atribuídos ao fígado. o Yin, é preciso Yang, para um deseqmlíbno que Ate~da
- Se os pulmões estão em excesso, é preciso consumir para o Yang é preciso Yin. Sem entrar numa pol:rruca,
os alimentos atribuídos ao coração. gostaríamos de dar aqui alguns elementos de reflexao que
- Se os rins estão em excesso, é preciso consumir os mostram o caráter relativo e sutil da teoria do Yin/Y ang
'alimentos atribuídos ao baço. que não se deveria utilizar tão simplesmente com inter-
A lei dos cinco sabores permite também afirmar duas pretação abusiva.
coisas. Por um lado, a menos que haja doença grave que É preciso, antes de mais nada, e isto é válid~ p~ra to?~s
necessite tal escolha, não se deve suprimir completamente os domínios, que a afirmativa "o excesso de YU; e co:r~gl­
um sabor e os alimentos correspondentes de um órgão. do pelo acréscimo de Yang e o excesso de Yang e corngl~
Tal situação provo a automaticamente um desequilíbrio pelo acréscimo de Yin" corresponde a uma compr~ensa
no ciclo dos cinco movimentos onde todos os elementos sumária e dualista do Yin/Y ang. O 50 Ouenn exphca que
participam da harmonia geral. Por outro lado, o regime "para regular duas en~gias -: a:r:g e Yi~, é precis? conh~­
equilibrado ~ aquele que garante uma parte igual para cer as sete espécies de mfluenclas nOCIvas ~ as alto espe-
cada sabor. E por isto que a expressão "cinco sabores" cies de influências benéficas, senão pode-se provocar um
designa no Extremo Oriente o prato mais perfeito no qual gasto rápido da energia" (cap. V). Portanto, a utilização
todos os sabores estão presentes sem que possa distinguir do Yin/Yang para corrigir um excesso ou um vácuo de um

2. É preciso também levar em conta a estação e suas correspondências com os sabores 3. Tradução deste sulra em Taisen Deshimaru,La Pratique C/U Ze/l, Albin Michel , col!.
dos órgãos (ver adiante). "Spiritualités vivantes".

114 115
ou do outro, deve levar em conta a estação, o clima Os cinco sabores podem ser classificados segundo seu
verdadeiro, o tipo de região, a constituição da pessoa e do caráter relativo, antes Yin ou antes Yang, continuando no
caráter agudo ou crônico da perturbação energética. Yin porque o sabor é Yin.
Além do mais, um excesso de Yin pode atacar o Yin ou Assim, o sabor picante, relacionado com os pulmões, e
Yang e o mesmo acontece quanto ao Yang. É preciso, o sabor doce, relacionado com o baço, se exalam e se
realmente, subdividir o Yin em Yin de Yin e Yin de Yang, transformam em Yang.
e o Yang erri Yang de Yang e Yang de Yin para poder Eles se colocam, portanto; no Yin de Yang.
manejar com acerto o seu princípio no controle da ener- Os sabores agro-ácidos, ligados ao fígado, e amargos,
gia. Um órgão de natureza Yin pode apresentar, por ligados ao coração, descem e vão para o Yin. Eles se
exemplo, uma plenitude Yin e um vácuo de Yang. colocam no Yin de Yin.
Compreende-se, nestas condições, que a utilização do Quanto ao salgado, apresentado geralmente como sím-
Yin/Yang não possa reduzir-se a uma simples dicotomia . . bolo da nutrição Yang, parece que ele possui as duas
Uma doença do tipo Yang pode alguinas vezes necessitar tendências. O salgado é ligado, portanto, aos rins nos quais
de um acréscimo de Yang, assim como é costume tomar é preciso distinguir o rim direito que é mais sanguíneo,
bebidas quentes nos países quentes. Qualquer generaliza- mais Yin, e o rim-esquerdo que é mais energético, mais
ção permanece, portanto, abusiva. . Yang. Ó salgado pode ser assim decomposto em dois
Apesar dessas restrições, é possível analisar a nutrição sabores: amargo, portanto Yin, e picante, portanto Yang.
sob a luz do Yin/Yang. Em primeiro lugar, o So Ouenn
(cap. V) esclarece que, na alimentação, o sabor é Yin e a

<
energia Yang. Ele também nos diz que "alimentação (de
sabor) forte é Yin, a que é menos forte é Yin no Yang. A amargo Yin
energia que é forte é Yang; a energia menos forte é Yang salgado
no Yin". O resumo desta afirmativa dá o quadro seguinte: picante Yang

Energia mais forte


- Yangde Yang
Yang ------
Sabor menos forte
- ' Yinde Yang Ao nível das interações entre os órgãos segundo o ciclo

-
Ko, o ataque dos rins sobre o coração poderá, por esse
Energia menos forte Yang de Yin fato, ser diminuído em dois: ataque do rim esquerdo

-
Yin ------ (Yang) sobre o constritor do coração (função do coração
Sabor mais forte Yin de Yin que se relaciona com a vasomotricidade e com o sangue,
portanto mais Yin) e ataque do rim direito (Yin) sobre o
É preciso, pois, distinguir num alimento entre seu sabor coração (parte que se relaciona com a energia e com o
e sua energia. músculo cardíaco, portanto mais yang, figura 26).

116 117
a energia profunda dos órgãos. As outras camadas se
rep'artem entre estes dois extremos.
E assim que o excesso de um sabor terá uma repercus-
são diferente sobre o organismo segundo sua aparência
definida acima.
/ - O picante e o doce se manifestam no Yin de Yang e,
FlqADO Cr-....---......~:.>J-fAçO em excesso, atacarão o Yang de Yang, isto é, as camadas
mais superficiais do organisnio. Por exemplo:
- O excesso de picante desequilibrará os pulmões e
esse desequilíbrio aparecerá ao nível da pele (que é regida
pelos pulmõeS) . .
- O excesso de doce desequilibrará o baço e se mani-
festará pornaúseas(ou também um excesso de açúcar se
N
traduzirá pela acne).
PULMOES O agroácido e o amargo se manifestam no Yin de Yin
e, em'excesso, atacarão o Yang de Yin, isto é, as camadas
.
26. A dupla ação do salgado.
relativamente profundas do organismo .
- O excesso de amargo desequilibra o coração e pro-
voca problemas cardiovasculares.
Esta repartição dos sabores permite esclarecer o cará- - O excesso de agro ácido dese.quilibra o fígado e age
ter que eles podem manifestar. Realmente o So Ouenn sobre os músculos.
escreve que "o excesso de Yin torna doentes os Yang". Se O problema do salgado é diferente porque, segundo
nos reportarmos ao quadro precedente, o excesso de sa- . uma fraqueza inicial do rim esquerdo ou do rim direito, o
bor, portanto de Yin, ataca o Yang do modo seguinte: desequilíbrio atacará o constritor do coração, isto é, o
coração.
Yang de Yang
Yin de Yang r picante-doce Horários e estações
. Yang de Yin
Yin de Yin r agro amargo A escolha dos alimentos e dos sabores não é, evidente-
mente, o único critério determinante de um modo de
Por outro lado, esta subdivisão do Yang e do Yin cor- alimentação. Tudo que diz respeito ao horário das refei-
responde a uma localização das diferentes camadas do ções, assim como a atenção dada à estação do momento,
org.anismo. ~? .Y an~ de Yang correspondem as camadas são também fatores importantes, sobretudo na tradição
maIs.superfICIaIS, taiS como a pele ou os cabelos; ao Yin chinesa que desenvolveu, há muito tempo, o estudo dos
de Ym correspondem as camadas mais internas, tais como ritmos biológicos . .

118 119
Portanto, como já vimos, os órgãos possuem, cada qual, Enfim, Ojantar deve ser leve, pois se situa no início da
sua hora específica na qual se nota um afluxo de energia fase de repouso que não exige esforço energético.
em seu meridiano. Se o órgão está em plenitude e absor- Todas estas regras devem ser modificadas segundo as
vemos alimentos que o estimulam demais, podem então considerações externas, tais como a prOfissão (trabalha-
surgir perturbações importantes, bloqueio da energia, na dores à noite etc.).
hora exata. A atenção dedicada ao desenvolvimento do tempo du-
Certas dificuldades de adormecimento ou o despertar rante o ano, às estações, se traduz sobretudo ao nível da
do sono, durante a noite, podem ser produzidos, por
exemplo, por perturbações agravadas nas horas de pleni- escolha dos alimentos.
tude4 dos órgãos: a vesícula biliar entre 23 e 1 hora, o Nesse domínio, as regras elementares são muito mais
fígado entre 1 e 3 horas, os pulmões entre 3 e 5 horas. simples e alcançam a,s indicações de toda dietética subme-
Além do mais, o bloqueio de energia ao nível d~ um tida ao bom-:senso. E preciso, evidentemente, consumir
órgão provoca um vácuo no órgão que o sucede, segundo com prioridade os produtos da estação em curso, que são
a ordem de circulação da energia: um bloqueio ao nível a melhor garantia de adaptação à ordem universal.
da vesícula produz um vácuo do fígado, um bloqueio ao Contudo, as estações podem comportar, perturbações
nível do fígado produz um vácuo dos pulmões etc. climáticas e estar adiantadas ou atrasadas. E preciso, por-
Sobre esse problema do sono, é portanto aconselhável tanto, interpretar a lei geral e corrigir as influências nefas-
não com~r demais nem 'muito tarde à noite, e sobretudo tas trazidas por essas perturbações. Neste caso, pode-se
não comer alimentos que estimulam os órgãos em pleni- ser levado a consumir produtos do inverno durante o
tude natural, à noite. Aliás, o alimento absorvido tarde verão, para se defender das energias perversas, se o verão
demais tem a tendência de perturbar o funcionamento das for muito frio.
três sedes e, por esse fato, prejudicar a qualidade e a
quantidade da energia Yang.
Realmente, os horários de alimentação devem respei- Ambiente e adaptação
tar as variações energéticas durante o dia. Assim, um
desjejum de boa qualidade situado entre 5 e 7 horas (levar As regras gerais enunciadas nas páginas precedentes
.em conta a deslocação horária) é importante para ajudar não poderiam ser completas se não insistíssemos sobre a
ã elevação energética no começo da fase de preparação.
importância que é preciso dar ao ambiente, seja geográfi-
O almoço, acompanhado de um tempo de repouso, é
necessário para apoiar a elevação energética. Deverá lo- co, climático ou profissional, social etc. A virtude primor-
calizar-se relativamente cedo, entre 11 e 13 horas. Note- dial da dietética chinesa é, na verdade, a adaptação; as
mos que essa verificação é contrária aos hábitos de certos características do ambiente representam um papel funda-
países (sobretudo a Inglaterra) e aos ritmos de trabalho, mental no modo de nutrição.
assim como a jornada contínua, mais espalhada atual- ~I
Sob o ponto de vista da localização geográfica, é 'eviden-
mente. te, por exemplo, que as pessoas que habitam à beira-mar
ou na montanha não tenham necessidade da mesma ali-
4. Trata-se aqui , acentuamos mais uma vez, de horas solares. menÚlção. Notemos de passagem que os regimes dietéti-
120 121
cos propostos nas revistas em geral não dão atenção a esta las e vasilhas de louça, de preferência a certos metais
evidência. industriais. .
Entretanto, o excesso inverso a considerar que não se A apresentação da refeição e dos pratos é também
devem consumir produtos do mar na montanha, e vice- determinante para a boa integração da energia. Uma
versa, conduz também a graves desequílibrios. A lei dos refeição produzida em série, engolida às pressas numa
cinco elementos ,esclarece a necessidade da presença de atmosfera barulhenta, não produzirá o valor energético
cada elemento. E por isto que em certas épocas (ou em que os mesmos alimentos preparados com concentração
certas regiões) que não conheciam os meios de transporte e amor, e comidos calmamente, num meio sem tensões.
e o comércio modernos, carências graves podiam afetar Sem dúvida, as condições impostas pela vida moderna
populações inteiras. É preciso portanto consumir, com estão em contradição com todos .esses princípios e nem
prioridade, os alimentos da região, com as maneiras de sempre é fácil pô-los em aplicação. O eft~vo da população
preparo tradicionais, mas compensando os prováveis de- nas grandes cidades impede o acesso aos produtos locais
sequilíbrios pelo acréscimo de outros produtos (acrésci- e frescos os quais, devido ao comércio e às culturas indus-
mo de iodo nas regiões montanhosas, por exemplo). triais, foram substitUídos por alimentos cultivados, na
O clima da região considerada também entra no jogo. maioria, com métodos antinaturais. Comer produtos da
Não vale a pena insistir longamente sobre a diversidade estação não quer dizer muito, ainda que se saiba distin-
dos alimentos que convêm às regiões frias, temperadas ou guir, o que não é sempre o caso, entre as diferentes
tropicais. Em geral às regiões frias corresponde o quente estações e suas anomalias climáticas.
(pratos quentes, sopas), às regiões quentes corresponde o Além do mais, o estilo de vida (pequenos apartamentos
frio (alimentos crus, saladas). Ainda aí não existe o abso- em grandes edifícios, tetevisão etc.) e a falta de tempo
alteraram as tradições, e para muitos se transformou em
luto (é a dialética do Yin/Yang) e serão encontrados os
verdadeira mágica o respeito aos horários de acordo com
alimentos frios nos países frios e quentes nos países quen- os ritmos fisiológicos.
tes. A alimentação permanece, portanto, um elemento fun-
Vejamos o exemplo das regiões quentes onde o calor damental da ciência de viver, pois a qualidade da natureza
(Yang) provoca a transpiração (de caráter mais Yin). Esta influi sobre nossa entidade energética. Apesar de todas as
será tanto mais importante porque o Yang do organismo dificuldades, parece vital para o desenvolvimento pessoal
será atacado (fraqueza). Para evitar uma dispersão do Yin, do ser humano que ele preste o mínimo de atenção à sua
o quente será então recomendado porque ele tonifica o alimentação.
Yang. Esta atenção não significa o exagero de aceitar sem
A qualidade dos alimentos e dos utensílios da cozinha reflexão um regime alimentar preestabelecido e dogmáti-
condiciona também o valor energético da alimentação. É co. Ao contrário, a variedade e a criação no domínio da
preciso evitar, tanto quanto possível, os produtos vindos nutrição, como em todos os outros, são fatores que permi-
das culturas que empregam produtos químicos (adubos, tem aumentar o desenvolvimento biológico de cada um.
pesticidas) que deterioram sua qualidade energética. Do Basta que essa variedade respeite as grandes leis cósmicas
mesmo modo, é preciso utilizar pratos de cerâmica, pane- e se adapte às condições específicas de cada pessoa.

122 123

I
Segundo a idade e o sexo, a atividade, mental e física, o
ambiente, urbano ou campesino, a constituição fisiológica
e os hábitos alimentares provindos da educação, cada
pessoa deve criar sua alimentação, conhecendo as leis
fundamentais dos cinco elementos e do Yin/Yang.
Enfim, é necessário lembrar que, se a alimentação se VIII
relaciona com os produtos absorvidos por via bucal, exis-
tem também outros alimentos transmitidos pelos órgãos
dos sentidos que influem sem cessar sobre nossa entida- A respiração
de-energia. Tocar, cheirar, ouvir, ver nos transmitem tam-
bém vibrações a partir de corpos sólidos, de gás, de ondas
sonoras, de ondas luminosas que participam de nossa vida
e constituem,o fundamento da relação entre nosso ser e o·
ambiente.

No Ocidente, a respiração continua a ser considerada,


principalmente, como uma função que se refere a movi-
mentos favorecedores das trocas gasosas e portanto loca-
lizada sobretudo no nível torácico. Sem dúvida, para al-
guns, a prática das técnicas corporais permitiu um conhe-
cimento mais aprofundado da colocação em movimento
de certos grupos musculares, seja para a inspiração, seja
para a expiração, seja quanto à aplicação de respirações
específicas em função de certas disciplinas. Entretanto, a
respiração sempre ficou ligada à imagem da ventilação
pulmonar. O melhor exemplo nesse _sentido reside nas'
técnicas respiratórias utilizadas nos meios espOrtivos on-
de apenas a parte alta do corpo é levada em conta.
Poderão retorquir-nos que o emprego da respiração
abdominal começa a se espalhar em alguns meios especia-
listas das novas terapias ocidentais (relaxamento, psicote-
rapia). É verdade, mas essa respiração foi introduzida,
justamente, devido à difusão das técnicas orientais e nada
existe, talvez, a não ser técnicas pouco conhecidas de
124
125
certas ordens monásticas além das disciplinas elaboradas Os papéis da respiração
ligadas à respiração, que não seja de introdução recente.
Ao nível da fisiologia chinesa que nós detalhamos nos
No Oriente, tanto na Índia como noutros lugares, como
primeiros capítulos, a respiração representa um papel
na China ou no Japão, uma concepção mais vasta do praticamente em todos -os níveis. Sua função é, sem dúvi-
fenômeno da respiração se desenvolveu em relação íntima da, a de garantir a absorção de ar puro e de rejeitar o ar
com uma visão global do homem e do universo. Na verda- viciado. Contudo, os termos empregados para descrever
de, o problema da respiração ultrapassa até uma simples essa função demonstram já uma análise diferente daquela
questão de bom funcionamento do aparelho respiratório que conhecemos. Em vez de falar de ar puro e de ar
tal como ele é imaginado no Ocidente mas está em ligação viciado, é realmente da absorção das energias do céu sob
com a circulação da energia em todo o corpo, isto quer a forma de Yeung Tchi (energia do ar) e da rejeição de
dizer que há uma incidência sobre a harmonia dos órgãos energias impuras que é preciso falar.
pela lei dos cinco movimentos e sobre o equilíbrio ener- De outro modo, a respiração se integra no mecanismo
gético do organismo em geraL Além desta função, aTespi- das três sedes que representam a verdadeira c'entral ener-
ração está ainda em relação com a consciência, de onde gética de todo o organismo. Assim, um~ boa respiração
surge um papel fundamental em todas as disciplinas espi- favorece a união de Yeung Tchi (o ar absorvido) com Kou
rituais. Notemos ainda que ela se integra na visão cosmo- Tchi (a energia dos alimentos) e portanto a formação de
- lógica tradicional pois a respiração é uma das manipula- Tsong Tchi, a energia essencial.
ções do sopro, portanto da energia. Ainda mais, a respiração profunda desce ao nível da
Este relacionamento sopro-energia fornece a melhor sede inferior onde, por um lado, ela favorece a produção
aproximação para se compreender o fenômeno da respi- de energia defensiva Oé e, por outro lado, intervém sobre
ração, tal como é considerado no Extremo Oriente. Já a energia ancestral Yuen Tchi. Esta intervenção é funda- o
sublinhamos atrás que esses dois termos serviram para mental porque põe em movimento essa energia ancestral,
traduzir em francês o mesmo ideograma: Tchi, mostrando reservatório de todas as potencialidades do ser humano.
Assim, a respiração se encontra misturada a toda a produ-
desse modo que duas idéias que nós exprimimos em duas
ção energética das três sedes, não só ao nível da absorção
palavras diferentes se associam no mesmo conceito, na e da rejeição, mas também ao da misteriosa alquimia que
China. Igualmente,-a respiração que, no Ocidente, é prin- age entre energias externas, energia original, e energia de
cipalmente reconhecida como uma troca ~ntre os seres defesa e de nutrição do corpo.
vivos e o ar do ambiente, se torna, no Extremo Oriente, Este papel da respiração sobre a circulação da energia
uma troca de energia entre os seres e o ambiente, e -no interior das três sedes tem uma conseqüência direta
também uma combinação das energias internas no mesmo sobre o estado energético dos órgãos. Uma respiração
interior de cada ser. Na medida em que todo o ser não é apropriada favorece o funcionamento normal dos órgãos
senão energia, a prática da respiração se torna portanto o em sua tarefa específica ao passo que a má introduz
teatro privilegiado das mutações energéticas. desajusres. A lei dos cinco movimento's e as relações entre

126 127

1
os órgãos e suas entidades viscerais conferem então um e eficaz sob o ponto de vista energético como aquele que
papel para a. respiração que ultrapassa a visão que lhe vamos descrever adiante, em vez de nos atrapalharmos
atribuíamos em geral. . com uma porção de técnicas de finalidade duvidosa2 •
.' Enfim, a respiração se acha ligada ao problema da Apesar destas restrições, achamos interessante assi-
consciência. Este vínculo é atestado por todas as asceses nalar para o leitor a existência no Extremo Oriente de
ou meditações que utilizam métodos respiratórios. Ele técnicas respiratórias muito elaboradas das quais não se
pode ser valorizado por intermédio da ação da respiração conhecem equivalentes no Ocidente. Citaremos os exem-
sobre Yuen Tchi, a energia essencial, como demonstra, plos dados pelo mestre zen Taisen Deshimaru, em sua
entre outras, esta passagem de Maspero sobre as técnicas obra La Pratique de la concentration 3 (A Prática da con-
taoístas: centração ), a p,ropósito de formas de respiração que visam
estabelecer o equilíbrio energético e que são descritas em
Ao conduzir o sopro aspirado pelo nariz através do corpo até o tratados budistas:
ventre onde ele se mistura com a Essência, e fazendo-o subir de
novo pela medula espinhal até o cérebro, reforçamos a união do 1. Jo-Soku, ou respiração alta: é uma respiração que carrega na
Sopro e da Essência e alimentamos o Espírito l . força de ação da expiração; ela começa suavemente, depois acentua
seu movimento na medida em que desce para o abdômen. Ela afasta
a sonolência, o peso mental.
Além do mais, podemos considerar que seu papel sobre 2. Ge-soku, ou respiração baixa: o inverso da precedente; a força
a regulamentação energética dos órgãos age sobre suas da expiração, poderosa no início, vai decrescendo ao penetrar no
entidades viscerais, e garante 'desse modo um estado de abdômen. Ela tem um papel eficaz na dispersão mental.
consciência o menos submisso possível às pulsões devidas 3. Man-soku, ou respiração plena; a inspiração enche a caixa
aos desajustes orgânicos. torácica; tem um valor eficaz sobre os corpos secos ou emagrecidos
demais.
4. Sho-soku, respiração abrasadora: utilizar com muita circuns-
Alguns métodos de respiração peção e unicamente em caso de grande fraqueza do aparelho
genital; além disso, ela trata das congestões.
Não desejamos desenvolver aqui os diferentes métodos 5. Zo-cho-soku, ou respiração longa e crescente: estimula as
?e respi:ação utilizados, no Extremo- Oriente, seja pelos energias deficientes; com a primeira, a respiração elevada é muito
lOgues hmqus, os adeptos do taoísmo ou os monges budis- importante para o zazen 4• '
tas. A característica desses métodos continua, realmente, 6. Metsu-e-soku, respiração evanescente e decrescente: equipa-
a ser a necessidade de os aprender sob a direção de um rada à precedente; ela restabelece o equilíbrio das energias exce-
mestr~, sua prática sem a orientação de uma pessoa dentes.
especIalIzada pode tornar-se extremamente perigosa,
cnando desordens fisiológicas e psíquicas. Além do mais,
2. Pe~amos, neste caso, nas técnicas respiratórias que visam à aquisição de "poderes".
achamos que é melhor adotar um método simples, IÍatural 3. &htlons Retz, p. 112. ', ,
4. O zazen é a meditação praticada e preconizada pelos monges zen. Voltaremos ao '
1. H. Maspero, ob. cit., p. 45. assunto no último capítulo.

128 129

1
7. Dan-soku, ou respiração quente: consiste na concentração
máXima da expiração na irradiação abdominal. Trata de um excesso naturalmente e o ar penetra profundamente no corpo.
de frio. Não há bloqueio da respiração entre inspiração e ~ x pira­
8. Rei-soku, ou respiração fria: a inspiração é plena e a força da ção. O fim da expiração corresponde ao desenvolvImento
expiração se exprime no começo, d~pois decresce rapidamente. máximo da energia, é o momento em que o combatente
Trata de um excesso de energia quente. de artes m~rcias desenvolve toda a sua força vital. O Kiar,
9. Sho-soku, respiração conflitual; sho significa: empurrar, ata- que pode traduzir-se por aquele grito que se tornou céle-
car,'bater. Ela trata da má circulação do sangue, dos bloqueios e
bre pelos filmes simplistas, focalizadores das artes mar-
das obstruções; facilita a evacuação das toxinas. Como indicll; o
ideograma sho, a expiração é brutal e breve. ciais é executado nesse instante. Sobre o assunto, é pre-
. 10. Ji-soku, respiração prolongada: trata dos estremecimentos, ciso,' aliás, salientar que existem diversas tonalidades do
dos calafrios devidos, por exemplo, a uma absorção excessiva de Kiai: com seu vigor.
excitantes: Ela é longa e calma. O trajeto da energia posta em movimento pela inspira-
11. Wa-soku, respiração harmoniosa e pacífica: ela alimenta e ção ·e pela expiração permite que aprecim~s o papel
harmoniza os cinco elementos (Terra, Água, Ar, Fogo, Metal) e
cuida de modo geral de todas as doenças de ordem energética.
energético da respiração: interv~ção no !linc~aeto
do sistema das três sedes, melhor mtegraçao e dIfusao das
energias humanas. Salientemos, .antes do mais, o valor
A respiração fundamental relativo Yin/Y ang da inspiração e da expiração.
Para algumas pessoas, a inspiração seria assimilada a
O niétodo de respiração que vamos descrever e do qual uma fase Yin porque o ar penetra no interior do corpo,
tentaremos analisar os efeitos energéticos é a respiração região que é Yin com relação ao exterior. De fato, t:rata-se
utilizada nas artes marciais e na meditação zen çIa qual os .bem de. um movimento descendente, de um mOVImento
autores deste livro têm conhecimento prático. E também de interiorização, portanto Yin, mas o ~r que é inspirado
a respiração praticada naturalmente pelas crianças de representa a energia cósmica, isto é, o Yang celeste.
pouca idade antes que os estresses da vida lhes imprimam
bloqueios e as condicionem para uma respiração artificial. Igualmente, a expiração é um movimento a~cendt
A maioria dos animais utiliza também este método e num de exteriorização, portanto Yang, mas o ar que e expulsa-
provérbio zen é chamada de "respiração da vaca". do vem do Yin. Além do mais, a expiração provoca uma
Esta respiração se pratica com a boca fechada, com o ar expansão, movimento Yang, da parte inferior do abd.ômen
circulando pelo nariz5. A expiração é longa e profunda, e que representa a parte mais Yin, isto é, o Yin de Ym.
provoca uma expansão da parte subabdominal, a sede Em resumo, durante a inspiraçã6 .0 Yang efetua um
inferior (campo de cinábrio) onde mora a energia ances- movimento Yin, e durante a expiração o Yin efetua um
tral Yuen Tchi. No fim da expiração, a inspiração se faz movimento Yang que sobe. E~ta sucessão de fases evoca
a roda de Lao Tseu onde o Yin e o Yang estão íntima e
5. A descrição seguinte corresponde à prática da meditação. Durante um combate,
pode haver ligeiras diferenças mas o princípio permanece o mesmo. harmonis~te misturados. '

130 . 131
ponto é uma sede de energia muito importante porque
está em relação com um ramo profundo do Tchong Mo
assim como com os outros meridianos. Dali, a energia
sobe de novo ao longo das costas, seguindo o trajeto do
meridíano vasogovernador, para chegar às narinas, no fim
da inspiração.
Durante a expiração, que segue a inspiração sem tempo
. de espera, uma grande parte do ar, ~ mais impura, é
expulsa enquanto que outra parte, a ma~s pura, se concen-
tra na sede inferior e age sobre a energia ancestral (Yuen
Tchi). ' -
Ao nível do sistema das três sedes e da produção ener-
gética, a importância da respiração tal com<? acaba de ser
descrita não oferece a menor dúvida. Enquanto que uma
respiração torácica se limita a uma ação s~bre a enr~ia
do ar e fica localizada ao nível da sede supenor, nosso tIpO
de respiração permite pôr em contato as três sedes e
auxilia a circulação de todos os componentes energéticos.
Sobre a inspiração, a energia do ar desce profundamen-
te e entra em contato com a energia alimentar (ao nível
da sede média) depois, com um ramo do Tchong Mo que
está em relação com a energia ancestral: a síntese das três
INSPIRAR EXPIRAR energias de base pode então real~zs sem difcula~s.
Figura 27.
A expiração permite expulsar mtelramente as energIas
impuras e representa um papel de mobilizador da sede
inferior: a difusão da energia ancestral e da energia Oé
Por outro lado, durante a inspiração, a energia do ar fica melhorada.
(Yeung Tchi) depois de ter penetrado pelo nariz e atra- O estudo do movimento da respiração pode também
vessado a garganta, chega a um ponto situado a meia fazer-se com relação aos cinco órgãos.
distância entre o umbigo e o esterno, o ponto 12 do Durante ~ inspiração, a energia desce em primeiro lugar
meridiano vaso concepção (12 V.c.), onde se mistura com até o baço depois até o fígado e os rins. A expiração rejeita
a energia alimentar (Kou Tchi). Estas energias atravessam esse sopro dos rins para o coração e os pulmões, passando
em seguida o corpo para a região posterior, de onde saem pelo baço (papel do baço como distribuidor de energia).
de novo no ponto Ming Menn (o ponto 4 do meridiano Enfim, este método de respiração está em relação com
vasogovernador: 4 V.G.), que significa Porta Divina. Este as entidades psíquicas pOr duas razões. Por um lado, essas
132 133
entidades são manifestações energéticas da mesma quali- Em definitivo, a respiração fundamental que propomos
?ade que os outros elementos do organismo e uma melhor é radicalmente diferente, nos meios e nos objetivos, das
Integr~ção e circulação da energia agem sobre todo o respirações de tipo esportivo propostas no Ocidente. Tra-
orgamsI?-0' ~or outro. lado, a própria prática da inspiração ta-se,·antes de tudo, da colocação na circulação da energia
e d~ expIraçao necesSIta um desbloqueio dos nós psíquicos pela concentração. O fato de que o sopro desce até o baixo
a fIm de que o ar possa circular livremente sem que o ventre permite, além das facilidades para a união Yeung
corpo oponha tensões musculares. Tchi e Kou Tchi, que atue sobre a energia ancestral Yuen
Sobre este assunto, aliás, é preciso sublinhar mais uma Tchi, que, com demasiada freqüência, se acha bloqueada
vez o ~specto nef~sto. do bl~quio da respiração a qual- num abdômen cheio de tensões musculares. Neste senti-
q~ler mvel que seja (fIm .da InspIração ou fim da expira- do, trata-se verdadeiramente de uma manipulação do
çao). Na verdade, a motI~a.çã consciente do psiquismo sopro interno, como o chamam os taoístas, de uma volta
com, notadamente, a p~rtICação do I (reflexão, desejo) para a energia original e é por isso que a fase maior
ou ~o Tche (vontade) nao pode senão entravar uma respi- continua a ser a expiração que é concentração no campo
raçao certa que deve tornar-se pouco a pouco inconscien- de cinábrio, o centro vital do abdômen.
te. Vamos concluir com mestre Deshimaru: 6
Este método respiratório permite controlar e até parar a ativida-
,. EXPIR ..
. ,,:":(
de mental da consciência. Esta condição mergulha o ser em estado
de profunda concentração, e a harmonia no seio da tríade céu-terra-
homem se instaura; é aquilo que, no zen, se chama a ordem cósmica.
INSPIR.

28. Trajeto da energia durante a respiração.


6. Ob. cit., pp. 110-111.

134
135
IX

As artes marciais

o judô, graças ao seu impacto depois de 1945, revelou ao


mundo ocidental um aspecto das artes marciais existentes
no Extremo Oriente, sobretudo no Japão. A beleza dos
movimentos, a técnica do combate:" a cortesia, a humilda-
de, o uso do quimono favoreceram a eclosão dessa disci-
plina' depois sua irradiação.
Em seguida, outras artes marciais, tais como o aikido, o
kendo, o karatê-do se propagaram no Ocidente a ponto
de se tornarem, nestes últimos anos, uma verdadeira mo-
da. Assim, parece agora necessário fazer com que o públi-
co tome consciência de certos problemas fundamentais
ligados à prática das artes marciais tradicionais em geral
e do karatê-do em particular.
A fim de bem definir nossa posição, não falaremos
sobre o problema da competição. Não porque queiramos
negar todo valor ao espirito de competição, mas porque
seria entrar no domínio do esporte. Ao contrário,nosso
~'
propósito é valorizar o que representa a arte marcial, no
caso o karatê-do, e isto não em função de qualquer refe-
rência mística duvidosa, mas sim à luz dos dados tradicio-
nais· da energética chinesa.

137
De fato, uma arte marcial comporta dois aspectos: demoremos um pouco sobre a leitura dos ideogramas
aspecto externo e aspecto interno. A via externa é a via Kara e Te que podem ser compreendidos de duas manei-
obrigatória pela qual deve passar todo praticante, ao passo ras. Numa, o primeiro ideograma se lê Kara e significa
que a via interna, que fica escondida da maioria dos vazio, o segundo se lê Te, no sentido de mão. Ou seja,
praticantes, constitui a finalização e a essência das artes karatê-do, "o caminho da mão vazia", sentido geralmente
marciais. Colocar em evidência esse aspecto interno é conhecido e que define o aspecto externo: trata-se de uma
aquilo que pretendem as explanações seguintes, pelas técnica de combate com as mãos nuas. .
quais fazemos questão de agradecer a Pierre Portocarre- , Menos conhecida é a segunda leitura dos mesmos dois
ro, 4º dan de karatê, por sua preciosa colaboração. ideogramas de origem chinesa. O primeiro se lê Ku, 'que
significa igualmente vazio, mas no sentido "estado de
vazio, vacuidade"; o segundo se lê também Te, mas aí no
Aspecto externo, aspecto interno sentido de "técnica, método, arte". Neste caso, a leitura se
torna "arte para atingir o estado do vácuo" ou "arte da
Golpes de pé saltados, todos azimutes, quebras de todo plenitude pelo vácuo". Esta segunda leitura é primordial
gênero, desde a telha até a pilha de gelo, mito da invenci- pois representa o complemento indispensável do aspecto
bilidade, campeonatos de ligas na França, na Europa, no evocado pela primeira leitura: uma não existe sem a outra.
mundo etc. Estas imagens, entre muitas outras, obcecam Acrescentemos de passagem que todos os "katas" (se-
o espírito de certo público que se separa cada vez mais em qüências de movimentos pré-arranjados; com freqüência
dois grupos bem diferentes: de um lado os desanimados, de origem chinesa) contêm esses dois aspectos. Voltare-
amedrontados, explorados para os quais "o karatê, nunca mos ao assunto mais adiante. Antes disso, queremos abor-
mais ... " porque não passa de violência, competição, am- dar alguns aspectos da prática para os fazer voltar ao seu
biente malsão de clubes; de outro lado, os incondicionais verdadeiro lugar. Qualquer pessoa pode fazer o gênero de
da vitória nos golpes, para os quais a própria essência da verificações enunciados àdiante, basta para isso observar
'virilidade só pode ser avaliada pela confrontação muscu- e "sentir".
lar, onde haja um vencedor e um vencido, e para os quais A beleza do estilo, com um pouco de talento para
praticar por outra coisa que não seja vencer fica fora d~ imitação e de treino, fica ao alcance de muitas pessoas.
sua compreensão. Entretanto, se não há nem espírito nem eficácia, resulta
O verdadeiro problema reside no fato de que, na maio- na má coreografia e um dançarino, mesmo de grande
ria dos casos, as pessoas estão ligadas a uma pálida defor- talento, não é um karateka. A rapidez sem força nem
mação da arte original. Uma deformação, ela mesma, da precisão não serve para nada.
Pulverizar uma pilha de telhas é coisa aparentada à
parte mais superficial do karatê-do, de certo modo a parte façanha de atletas como existem muitos nos estádios e nas
emergida do iceberg, que não representa, pelo menos, nem salas de halterofilismo, sem que por isso tais atletas se
a décima parte da arte do karatê. presumam karatekas.
Coexistem dois aspectos: o karatê-do é, ao mesmo tem- Se houver flexibilidade, enfim, e se são executados
po, arte de combate e via de busca interior. Basta que nos maravilhosos golpes de pé no rosto, está realizada uma
138 139
...
coisa bela e boa. Mas, no plano prático, um adversário de pelo contrário, as perturbações psíquicas e físicas, e pode
nível médio não será surpreendido por um ataque no trazer como conseqüência, doenças e perturbações gra-
rosto, e então se chega à acrobacia. E há acrobatas extra- ves.
ordinários que não se consideram karatekas. Todo gesto, mesmo de aparência anódina, tem um efei-
O exterior não é a finalidade do karatê-do. Mesmo que to profundo sobre nosso organismo e nosso psiquismo.
seja necessário, não se deve esquecer que o importante é Quantos karatekas sabem que as posturas exageradas no
o interior: aquilo que nos tornamos em relação a nós exterior, se são excelentes para reforçar os membros infe-
mesmos e não em relação aos outros. Um excelente com- riores, perturbam, no entanto, o campo energético do
batente, um especialista, mesmo de alto grau, pode não corpo?
passar de um simples "amador" como se designa em acu- Normalmente, a prática do karatê-do deveria levar a :
puntura aqueles que sabem reduzir certos sintomas, mas 1. Desbloquear pouco a pouco os complexos que per-
não restabelecer a harmonia dos circuitos de energia. turbam nosso espírito e prejudicam o livre emprego de
Sem dúvida, o karatê não deixa de ser uma arte marcial, nosso psiquismo e de nosso corpo. .
e a eficiência no combate é uma das conseqüências pos- 2. Encontrar harmonia, equilíbrio, paz, alegria, felicida-
síveis de certo treino regular. Mas esta eficácia potencial de, liberdade em si mesmo.
deveria traduzir-se pela melhoria visível da personalida- 3. Possuir um corpo sadio, sabendo tirar proveito da
de, ao passo que, infelizmente, muitas pessoas se des- doença para se reequilibrar, tendo sua forma ótima com
troem, bloqueadas numa concepção estreita da prática. relação à idade, e dando confiança à perfeição da nature-
Na verdade, o karatê-do vai muito mais longe do que za.
pensam muitos praticantes (mesmo em Okinawa ou no 4. Preservar-se, e isto compreen,de igualmente a auto-
Japão). As pesquisas interiores formam a essência de sua defesa e o reequilíbrio energético em caso de perturba-
prática. Como nos explicou mestre Ogura, dominar a ção.
técnica exige uma dezena de anos de prática assídua. Ora, a prática malcompreendida pode desequilibrar ao
Entre quinze e vinte anos, pode-se dominar a arte no mesmo tempo o espírito e o corpo. Esse caminho pode
extenso do termo. Eliminar o ego e liberar o verdadeiro passar pela má musculação até as perturbações orgânicas,
ser interior exige cinqüenta a sessenta anos. até a loucura, com dificuldades respiratórias, perturba-
Em Okinawa, dizem que o desabrochar técnico e físico ções do comportamento e perda da vitalidade.
acontece nos arredores dos cinqüenta anos: estamos bem Tomemos dois exemplos mais precisos. Todo pratican-
longe dos jovens campeões que têm de vinte a trinta anos, te sabe que, durante o treino, somos tocados em numero-
roídos pela vontade de poder e de glória efêmera. sos lugares, e damos golpes, por exemplo, no antebraço,
O verdadeiro domínio do karatê-do (como, aliás, de nas tíbias ou nos pés. Ora, esses pontos, quando se tornam
. qualquer outra pesquisa iniciática) provoca um desabro- dolorosos de maneira crônica, podem ter conseqüências
char da personalidade, afasta os bloqueios físicos e psíqui- insuspeitáveis sobre o organismo e a vitalidade, seja ime-
cos, atenua os efeitos do envelhecimento, conserva a saú- diatamente, ou mais tarde, se não soubermos como com-
de. A má prática, ou a má concepção da prática, aumenta, pensá-los.

140 141
Os pontos situados ao longo dos meridianos de acupun- Se não se pratica conservando sem cessar o desejo de
tura se picam, se queimam (moxas) ou se comprimem se conhecer a si mesmo para melhorar, a eficácia que
(shiatsu) para tonificar ou dispersar. Em caso de desequi- aumenta em combate pode perturbar os espíritos.
líbrio energético, esses mesmos pontos, tocados e torna- A agr~sivde existe em todo homem como em todo
dos dolorosos de maneira repetitiva, podem provocar animal. E um instinto natural de preservação. Nesse cam-
perturbações!. Para remediar as perturbações possíveis, po, os animais no estado natural são equilibrados; em
certas práticas visam neutralizar os efeitos. Certos gestos compensação, os homens se desajustam facilmente. Psi-
muito herméticos são de fato verdadeiros "mudras" que cólogos, psiquiatras e sociólogos colocam em causa, geral-
têm por fim carregar ou descarregar certos centros ener- mente, certos complexos de frustração dos quais nos libe-
géticos. ramos pela violência. Nosso meio social, cada vez mais
Tudo isto se torna extremamente importante quando separado das leis naturais, é a sua causa. Se o treino é
envelhecemos. A saúde na velhice se preserva desde a unicamente físico, esportivo, ele agrava a agressividade,
mais tenra idade, e como a capacidade de compensação porque a exacerba erri vez de a canalizar, de sublimar,
de certos excessos, em todos os domínios, diminui com a produzindo progressivamente a deterioração das funções
idade, convém observar certas precauções muito cedo. do hipotálamo, cujo papel é essencial para a sobrevivência
Originalmente, o karatê-do, em sua forma chinesa e do indivíduo e da espécie.
indiaria, é uma terapêutica, pois a autodefesa não é senão Todas as coisas se compensam na vida (ver a teoria do
um derivado natural e não uma finalidade em si mesma. Yin e do Yang); se a agressividade se desenvolve, ela
Por outro lado, qualquer prática que toque o fundo do ser produz outras deteriorações mentais e físicas. O instinto
pode levá-lo além de sua condição inicial ou do lado de de fuga se desenvolve mais quando se é agressivo, então
cá... E isto nos leva ao nosso exemplo seguinte. .. . mais nos' tornamos covardes com relação a nós mesmos e
O psiquismo é extremamente frágil, nós somos todos aos outros. Então nos conduzimos cada vez com maior
um pouco ou muito perturbados. Uma certa prática me- selvageria; a ponto de sermos matadores em potencial,
lhora, outra agrava essas perturbações e então surge peri- não para preservarmos nossas vidas, mas por desregra-
go tanto para o karatê como para os que estão em seu mento. Em vez de estar em paz e liberto em si mesmo,
ambiente. Isso pode mesmo tornar-se muito grave, partin- embora cercado pela multidão ou isolado, o indivíduo se
do do complexo de agressividade até a verdadeira loucura conduz cada vez de modo pior com relação aos que o
assassina. Basta verificar o comportamento de certos com- cercam.
petidores em campeonatos para ficar convencido: desde É por isso que, tradicionalmente, somos tão exigentes
a impolidez até a grosseria, passando pela falta de sangue
frio, ausência de controle nos golpes etc. Enquanto que, com as "maneiras" (cumprimento, hierarquia, falta de
vamos repetir mais uma vez, o karatê-do deveria levar ao respeito e de humildade etc.) que, bem compreendidas,
desabrochar pessoal; ma1compreendido, ele perturba, não passam de barreiras. O mestre Gichin Funakoshi
tanto mental como fisicamente. (1869-1957) dizia sempre aos seus alunos que o karatê-do
começava com a cortesia e terminava com ela. Aborde-
1. V'!r adiante "Os perigos da prática". mos, agora, alguns pontos que se concernem aos cumpri-

142 143
mentos efetuados normalmente no começo e no fim de quilíbrio mental engendrado por pensar que o trabalho
um treino. . técnico basta para o progresso.
At~a1men, estes cumprimentos são, quase sempre, Quem não compreende a saudação não pode compre-
malfeItos ou francamente inexistentes na maioria dos clu- ender a essência do karatê-do. A meditação (mokuso) em
bes ocidentais: para que serve isso? submissão servil! postura sentada sobre os calcanhares (seiza) seguida das
obsequiosidade asiática inútil etc. Tradicionalmente, com saudações são os primeiros passos na realização de uma
exceção dos cumprimentos dirigidos ao professor titular postura correta (shizei). Esquecer isso e colocar a charrua
(Sensei), aos antigos do dojo (o lugar onde é estudada a diante dos bois não impede, certamente, que se progrida
Via) e aos debutantes, existe um do qual nunca se fala e até um alto nível técnico relativo à eficácia no combate,
que, no entanto, é o mais importante: o cumprimento ao mas esse nível e essa eficácia não são forçosamente os
santuário (shinden) executado por todos, do mais jovem corolários de um desabrochar da personalidade. Certas
principia!lte até os graduados mais antigos, diante do pessoas, com freqüência muito interessantes do ponto de
kamiza. E, tradicionalmente, um altar orientado para o vista "prático", podem incontestavelmente representar
. norte do dojo. Uma simples representação simbólica bem um perigo para seus alunos. Cada qual deve saber escolher
escolhida pode ser suficiente (foto do mestre desapareci- segundo suas próprias concepções: não s,e diz que o aluno
do ou atual, ideograma, figura geométrica etc.). Este lu- tem o mestre que merece, e vice-versa?
gar, kamiza, não é senão o centro dos kami, ou dizer de Em resumo, o karatê-do malcompreendido pode
outro ~od, de certas forças da natureza. Ele age como perturbar em profundidade o inconsciente e acrescentar
um effilssor-receptor, catalisador de forças. camadas de bloqueio · às camadas preexistentes. Então
No começo do treino, os karatekas nele recolhem ener- pode permitir que tais camadas sejam arranhadas delica-
gia e nele descarregam eventuais energias perversas, a fim damente, uma por uma, até que se recupere o sentido do
de se I?urificarem e de se recarregarem; depois, ao final movimento natural e espontâneo, tanto voluntário como
do tremo, eles agradecem e recarregam o altar com as involuntário, a fim de que o espírito permaneça calmo,
forças acumuladas durante a prática. lúcido e livre. Isto se ensina de maneira diferente segundo
Tal ritual pode ser difícil de compreender e, para al- cada um, sem que se negligencie por isso a eficácia e a
guns, difícil de praticar no começo. No entanto, seu valor técnica.
e sua eficácia existem realmente para aqueles que o se-
guem e é penoso verificar que muitos dos mais graduados,
p!etens?me?te especialistas ou campeões, o negligen- o sentido profundo dos katas
CIam. Aí esta o resultado da má compreensão do karatê-do
e de seu ensinamento. Os katas representam a herança sutil dos Antigos, códi-
É muito grave (para todos) que um antigo se comporte go gestual esotérico que permite o mergulho dentro de
pior do que um principiante (desprezo dos debutantes, nós mesmos. Ne·gligenciados pela maioria dos praticantes
falta de humildade, etiqueta negligenciada... ). É o começo atuais, suas práticas e suas aplicações (bunkai), tanto ex-
de uma deteriorização da personalidade, devida ao dese- ternas como internas, representavam originalmente quase
144 145
noventa por cento do treino. Isto sublinha sua importância brotar o espontâneo a partir de um quadro imposto bem
fundamental. definido.
É possfvel c~mpar o kata a uma espécie de enigma Há um segundo-nível de bunkai. Aquele que explica o
gestual. E precIso, na verdade, decodificar o significado gestual com relação à condução da energia (Tchi) no
de cada gesto para compreender seu sentido e, para isso corpo em função da ori_entação, do ritmo respiratório, da
-" '" . ...
e necessano que um IlllcIado dê, de vez em quando, no
' horà, do dia, da estação etc.
momento ?portuno, uma chave de compreensão que abra eertas posições podem mesmo ser relativas aos cinco
certos honzontes e permita evitar interpretações errône- elementos. No karatê-do adiantado, tem-se por exemplo
as. Outrora, isto se fazia apenas no quadro estreito de uma um verdadeiro ciclo dos cinco movimentos aplicados com
transmissão de mestre para discípulo confirmado e não as armas naturais da mão (trata-se então da verdadeira
numa pseudoprática de massa. arte marcial de alto nível):
Atualmente, por defeito de transmissão de sua essência
Água
não,s~ vê nos katas mais do que seu aspecto exterior: um~ Madeira
tomada
--+
--+
Fogo
punho fechado
--+
--+
Terra
palma
--+
--+
Metal
trinchante
--+
--+ lança
especIe de encadeamento de movimentos estritamente (Kakete) (Seiken) (Shotei) (Shuto) (Nukite)
codificados, que insiste no aprendizado e parecendo na
execução com uma espé.cie de dança guerreira. Isto é Mas interrompainos imediatamente aqueles que pen-
verdade e~ parte, c~mo é verdade que não fazer com que sam compreender o aspecto interno dos katas sem conhe-
os katas sejam pratIcados somente nesse nível se torna cer o externo. Antes de mais nada, é preciso consagrar um
logo pouco atraente porque muito limitado. certo tempo de prática e de pesquisa a assuntos extrema-
Vamos limitar-nos a dizer que o kata é como uma mente concretos. Lembremos, a respeito, o antigo ditado
cebola: é preciso tirar as camadas, uma a uma, para poder "hito kata san nem": "um kata de três anos". Esses três
contemplar o centro. A primeira camada é na verdade a anos, segundo nossa experiência, representam a integra-
mtegraç~o
. - do encadeamento das técnicas próprias "
ao ka- ção das técnicas e do esquema que permite um trabalho
ta, respeItando as grandes orientações dos deslocamentos interessante.
segu~do ~ertos .eixos diretores precisos (embu-sen). E~ Além disso, há outros estágios: executar um kata de
segUld~, e precIso co~prend seu ritmo de execução olhos fechados, em simétrica (como se fosse visto ao
(hyoshI) para o fazer VIver, "sentir" e visualizar as situa- . espelho) pensando absolutamente noutra coisa (canções,
ções de combate que ele evoca. É preciso então conhecer cálculo mental ou outro). Chegar a esses estágios indica já
a~ apli~ções (b~nkai) de cada movimento. No primeiro um primeiro grau de domínio de um kata que pode levar
lllvel ficam aplIcações precisas que correspondem ao ao desabrochar ou à loucura.
esqu~ma exato. do ·kata. Em seguida, cada movimento Na verdade, entre nossos gestos e a atividade de nosso
co~te uma ~ared quas~ in!inita de aplicações e se dá cérebro há um "biofeed-back" permanente. Praticar um
maIS ImportancIa a sensaçao mterna desse movimento kata corretamente desperta a atividade de certas zonas do
com relação a uma execução técnica estrita. São as primei- .córtex e reciprocamente seu desbloqueio provoca uma
ras chaves de que falamos, aquelas que permitem fazer melhoria ao nível do gesto e da técnica, isso durante dez,

146 147
vinte, trinta, cinqüenta anos. Fatalmente um dia ou outro
" "
v~ce t.?car~ ~o fundo do cérebro em oitenta por cento, que significados se esclarecem diferentemente segundo o ní-
nos n~o utI~zamos/drne ~os.a existênc~. A partir daí, vel de progresso do aluno). . _ .
tudo e pOSIV~l. Dai a Import~nca de um gUla competente Os velhos katas eram um instrumento de transmIssao
sobre. essas VIas cada vez maiS tortuosas, à medida que se no qual certas partes do código fo~am volunÜ~iaI?et
prognde.
deformadas para reservar o conhelm~ aos d.IS~lpuos
~tualmen, existem muitos estilos de karatê que foram instruídos apenas sobre essa alteração, a Ílm de dISSImular
f?rJado~ desde o século IX até nossos dias, e o praticante a essência do kata a concorrentes pouco escrupulosos ou
fIca mUltas .vezes desorientado pelo fato de que o mesmo a eventuais adversários. Certos gestos, portanto, continua-
kata se executa, com freqüência, de modo diferente se- ram a ser transmitidos por pessoas que não possuíam as
gundo os cânones de diversos estilos. '
explicações necessárias. .. .
/ Quanto a? desagrado de alguns, afirmamos que grande Tradicionalmente, há três etapas pnmordIaIS para se
numero de mterpretações modernas dos katas são uma dominar uma arte: ,
deformação importante das formas de origem, devida a 1. "Shu": respeitar, seguir o modelo. E a etapa do aluno
uma compreensão superficial do seu bunkai. em que ele deve procurar manter-se tecnicamente limita-
N o" en~ato, algumas ml;ldanças na forma não alteraram do aos ensinamentos do seu mestre.
a essenCIa do kata. Tais mudanças foram realizadas com
ple~o conhecimento de causa por praticantes de nível
mUlto alto .. Outras modificações são devidas simplesmen-
ultrapassa a primeira. °
2. "Ha": libertar-se do esforço de aprender. Esta etapa
esforço pessoal se torna ~uito
importante, mas continua visando à perfi~ã? do esulo.
~e a uma mterpretação exterior de certos movimentos 3. "Ri": afastar-se da forma. Nesse estaglO, o mestre
mc?mpreensíveis sem a explicação do bunkai. Todos os nada mais tem para ensinar ao aluno, que pode continuar
estIlos modernos estão atulhados com esses movimentos a progredir e ensi~ar suas próprias. ~onceçõs. Neste
trun<:.ados e deformad?s quanto ao aspecto marcial, quan- nível a técnica, o estIlo, o aspecto codlÍlcado e ultrapassa:-
?o nao se tornam pengosos no que se refere ao aspecto do e transcendido. . .
mterno. .
No kata, é a aplicação espontânea dos bunkai, fora da
~al.ie?tmos que os katas que atualmente a maioria dos forma convencional.
prmcIpIantes aprende são katas recentes, criados entre o Todos os estilos atuais extraem seus katas de uma vin-
começo ?est~ ~écuo e mantid~s agora pela preocupação tena de origens (anteriores ao século XIX) repartidos
de uma sImplIfIcaçao que permIta um aprendizado rápido pelos três estilos de base de Okinawa: shuri-te, naha-te e
e port~n .melhor di~São (em detrimento da qualidade, tomari-te.Esses três estilos são geralmente agrupados sob
como mfelIz~nt nao ~odems deixar de verificar). o termo de Okinawa-te (a mào de Okinawa), ou tode (to:
.Outrora, fIcava-se mUlto tempo nos velhos katas, com- o que vem do continente, no caso por extensã?, a Chin~,
pndos e complexos, de aprendizado delicado mas de de contração de te, técnica) referente ao contmente ChI-
be~fcios_ndrv. É deli.beradamente qu~ os bun- nês, de onde provém a maior parte desses velhos katas,
kaI nao sao explIcItos no ensmamento tradicional (os senão na forma, pelo menos na concepção; sobretudo no
148 que se refere às pesquisas internas.

\ 149

I
Eis a lista desses katas. • Passai-no-kata
Kushanku ou Kosoku (Kanku)2 Sanseru Este kata é o mais antigo transmitido em. Okinawa
Passai (Bassai) Shisochin segundo certas fontes. Dele se faz menção num dos raros
Wanshu (Empi) Kururunfa escritos de Okinawa, como já sendo praticado em 1380.
Chinto (Gankaku) Esse kata passou por numerosas modificações, mas o
Seishan ou Seesan (Hangetsu)
Lorei ou Rohai (Meikyo) essenciaL de certas sensações é conservado mesmo nas
Suparumpei ou Superrimpai
Wankan (Matsukase) formas de execução recente.
ou Suparinpei (Suparipa)
Ouseishi (Gojushiho) Seipai A forma original exata é conhecida pelo nome de "Oyá-
-Chintei
SancJ:1Ín domari-Passai", nome de um dos alunos de um especialis-
Jiin
Koshiki Naifanchi (Tekki) ta chinês do Sul que o transmitiu na aldeia de Tomari. As
Niseishi (Nijushiho) Jion principais variantes dele são: Matsumura-no Passai, To-
Unsu (Unsui) Jitte . mari-no-Passai e Jishiminé-no-Passai e mais tarde "Itosu-
Saifa
Sochin no-Passai", que fica na base das formas praticadas em
Seienchin (Saipa) Shotokan, Wado-Ryu e Shito-Ryu modernos. .
No estado atual de nossos conhecimentos, o criador
E~ 1907, ~koh I,tos~ criou os cinco katas de Pinan desse kata continua desconhecido. Ele se compõe de duas
(HeIa.n)a pa.rtIr das tecmcas e das sensações de Kusanky' palavras: "Pas" (quebrar ou atravessar de lado alado) e
PassaI e Tchmto. ' "Sai" (a fortaleza) e pode traduzir-se por "atravessar a
Lápor 1920~Chojun Miyagi cria os dois Gekisai, assim fortaleza" ou "destruir as fortificações".
como Tesho, smtese de Tao chinês "Rokishu" No plano físico e técnico, dele se desprende realmente
p,..ssinalemos igualmente a existência de doi's katas em urna impressão de poder, na execução que se ilustra por
deslocamentos muito curtos e muito secos. (O tema do
Okma~, Ananku (Hanenko) e Kente, já simplificação
dos antIgos katas, que foram criados no século XIX. combate imaginário é buscar a destruição do círculo es-
treito de vários adversários que atacam a curta distância.)
A esco~a Uechi-R~, cujo essencial provém de Naha-
. No plano mental, ele pode levar ao desenvolvimento de
~e, pOSSUl katas partl.culares trazidos da China pelo fun- um espírito forte e penetrante que permite "destruir as
dador Kambun Uechl: Kanshiwa, Seirui, Konchin.
fortificaç6es" de nossos complexos e inibições, que nos
Abordemos agora alguns exemplos mais preciosos. 3 aprisionam. A sensação essencial desse kata é "Koshi".
Este termo designa a parte de Tanden (Tantien, campo
2. A primeira leitura é de origem chinesa ou de Ok' ,
Entre parênteses, o nome do kaca e -
(J" .' lIlawa (as vezes damos as duas). de cinábrio inferior) situado na região da terceira vértebra
certos estilos. m llIloua Japonesa quando fOi modificado em
lombar. O essencial da dinâmica dos movimentos é impri-
3. As descrições completas desses kalas ser' I .
aqui. Os praticantes do karatê pode '- Iam on~as demaIs para sercm inscridas mido por essa forte empurrada de energia, ao nível dos
acrescentar-lhes as nossas cÀJliações~o encontra-Ias nas obras especializadas e
quadris e do lombo ..
150 151

I
A melhor maneira de se beneficiar das vantagens liga- Realmente, o movimento de subida das duas mãos para
das à sua prática é saber que, praticado entre 11 e 13 horas o céu frente ao sol tem um significado marcial e outro .
ele acumula uma dispersão da energia do coração, e entr~ simbólico e energético. Este kata se executa normalmente
13 e 15 horas, produz uma tonificação desse mesmo órgão. voltado para leste, entre o nascer do sol e o zênite, e mais
Um dos primeiros movimentos desse kata (Sasae-Uke en precisamente entre 7 e 9 horas da manhã (atividade má-
Kosa-~chi), técnica de bloqueio forçado, visa igualmen- . xima do estômago), correspondendo à subida da energia
te a estImular e proteger o meridiano do coração ao nível da terra. As mãos formam um triângulo, símbolo de equi-
dos pontos 4º,5º, 6º e 7º desse meridiano. . líbrio entre o céu, o homem e a terra; elas protegem Yuen
Este kata é igualmente um daqueles cujas sensações de Tchi, a energia ancestral concentrada no campo de ciná-
combate levam a uma eficácia real em cáso de combate brio inferior, ligado à terra.
noturno ou de cegueira: sensações e pesquisa de estabili- Na inspiração, as mãos sobem para o céu, o olhar as
dade e de percepção não visual, perfeitamente ilustradas acompanha. O máximo da inspiração coincide com a visão
pelas posturas Sagurite-no-Kamae (guarda das mãos que do sol no triângulo formado pelas .mãos, provocando um
buscam às apalpadelas) no fim do kata. deslumbramento sobre a cor amarela (ligada ao baço, ao
pâncreas, ao estômago e ao elemento Terra).
. As mãos descem de novo num arco de círculo sobre a
• Kushanku-no-kata (ou Koshokun) expiração, com aceleração e empurrada do hara no fim
dessa mesma expiração, o gume da mão direita batendo
Este kata recebe seu nome da transcrição okinawana do na palma da mão esquerda, quando o movimento gera o
~ome do especialista chinês que introduziu sua práticá na fim do kata. O encadeamento em seu gestual e sua sensa-
Ilha em 1761. Este especialista, Kung-Hsian-Chun (ou ção implicam um ciclo Ko (triunfo) da Madeira (fígado)
Kwang-Shang-Fu segundo os vocábulos chineses), era um sobre a Terra (baço), temperada pela energia ligada a este
grande praticante do estilo Shaolin do norte da China, de elemento.
onde recebemos a essência da velha forma do kata: des- O movimento do início corresponde, na verdade, à
locamentos longos, escorregados, ágeis, numerosas técni- absorção da energia que sobe.da terra, para receber a que
cas de p.ernas, entre as quais um golpe saltado de pé. Era vem do sol sob forma de energia do sol levante, a con~e­
também um taoísta de alto nível e acupuntor, além do trar tudo (o movimento de círculo, símbolo igualmente do
mais, o que é muito pouco conhecido. Tao, indica a harmonia entre o céu e a terra com o homem
Gichin Funakoshi não se enganou quando japonizou.o em seu lugar, no meio) e para misturar Tsong Tchi (a
nome do kata para o introduzir no Japão. Ele o chamou energia essencial), trazida pelo céu e pela terra, a Yuen
de Kanku, o que significa "olhar o céu" ou "contemplar o Tchi (a energia ancestral) a fim de melhorar a qualidade
vácuo original". Este nome reflete perfeitamente a essên- desta última assim como a longevidade (movimento de
cia profunda da prática deste kata, expressa desde os empurrar ao fim da expiração).
primeiros movimentos. Existem numerosas variantes e deformações deste kata,
sobretudo Kushanku-Dai e Sho criadas por Matsumura.
152 153
A forma de origem foi transmitida até nós no Chotoku Prática do karatê e entidades viscerais
Kyan, grande especialista de Tomari-Te.
A pessoa que se inicia na prática d~ ~a:tê ou de ~utr.a
• Lorei-no-kata ou Rohai arte marcial está orientada para a aqulSlçao de uma tecm-
ca corporal. Esta será ant~s de tu~o uma ação n;~etiva
o nome japonês deste kata é Meikyo, o que significa que tende ao automatismo core~ do ge~to qu.e e Impor-
"espelho claro". tante analisar em função das entIdades VlsceraIS:
Se o seu criador é desconhecido, este kata tem, no
entanto, uma longa história em Okinawa. Seu nome evoca Concentração I (baço)
o estado de consciência que culmina pela sua prática Realização, decisão Tche (rim)
regular e aprofundada. Movimento, exteriorização Roun (fígado)
Uma lenda (Kojiki, Crônica das coisas antigas) conta física, memória da imagem
Pro (pulmão)
que a deusa da luz Amaterasu O Mikami tinha discutido Reflexos vitais
com os outros deuses. Então, se isolou numa gruta herme-
ticamente fechada por uma porta de pedra. Assim, a noite O Chenn (coração) representa o consciente, I?as é o
se espalhou pela terra. mais coordenador, o regularizador das outras .e?-tIdades.
Para fazê-la sair de sua caverna, um deus teve a idéia de Nos primeiros tempos, o Pro será po~c sol~CItad por-
organizar uma grande festa. Com a barulheira noturna e que as técnicas de base, chamadas Kihon, sao antes de
a curiosidade feminina, Ámaterasu O Mikami entreabriu tudo o estudo da forma. A importância do Pro, como
sua porta. Ela deu de cara com sua própria imagem num manifestação dos reflexos vitais, aparecerá mais tarde e
espelho, segurado pelo deus esperto que organizou a notadamente o kimé (ver adiante).
festa. Se considerarmos o progresso na prática do karatê, tal
A deusa tinha os reflexos lentos. Ficou tão estupefata como ela se efetua mais geralmente hoje, isto é, com um
de se ver que ficou imóvel alguns instantes. Os deuses treino cada vez mais continuado e rigoroso, cuja finalida-
aproveitaram esse tempo para abrir bem a porta. de é a competição, vemos que ficamos encerrados ~uma
Assim a luz iluminou de novo o mundo. só dimensão: o físico, ligado à técnica gestual. E um
Tal é o símbolo desse kata. A luz está em cada um de método que tende para a busca da eficácia imediata,
nós, mas precisamos descobri-la, porque ela está bloquea- referindo-se a certas condições físicas: força (muscula-
da mentalmente por nós, assim como pelo ego usurpador. ção), agilidade, categorias de peso .
. A prática de Lorei pode permitir que se obtenha de si Tal prática, cujo único fim é ganh~, .ser o melh~r,
mesmo essa imagem clara e adquirir o espírito necessário negligencia certas técnicas, ou até as rejeIta q~ando .sao
para aceitar a idéia de nos olharmos de frente, chegando proibidas no quadro da competição. O verdadeIro ensma-
ao estado puro do espírito que pode então tudo refletir mento transmitido fica então reduzido à sua expressão
como a superfície de um lago (o espírito receptivo: Mizu- mais simples, apesar de que a prática dos katas ga.rante
No-Kokoro, palavra por palavra: o espírito da água). uma certa autenticidade. Assim, o karatê, arte marcIal, se

154 155
transpor esse limiar numa situação particular, desenvolveremos
torna um simples esporte de combate, com suas regras, uma força superior à vida comum.
suas divergências, suas novas tendências. Não fica nada Pensamos que o princípio do kimé pode explicar-se sob
mais do que manifestações de movimentos do nível mais a luz da teoria dos cinco elementos aplicada às entidades
superficial, mais externo. Aliás, valorizaram essa força viscerais. N otem~ de início que o eixo de referência do
física, isto é, sua forma mais externa, impedindo assim o kimé é: Pro (pulmões) : Roun (fígado), isto é: interior-
espectador de compreender os princípios muito menos exterior.
aparentes.
Em função de tudo quanto foi dito a propósito dos
grandes princípios da medicina chinesa, podemos com-
CHE NN
c,oraç.ao
..
preender os desequilíbrios que podem resultar de tal
prática. ,o, ser humano deve viver em harmonia consigo
mesmo e com o que cerca, e a verdadeira pesquisa nas

artes marciais pode ser uma via espiritual: como o corpo
e o espírito são indissociáveis, uma ação sobre o psiquismo
repercute sobre os órgãos e inversamente. Portanto, se é
• .
I
baç.o
- -I.~
PRO..
pU'mao
,

!•
certo que o principiante em artes marciais deve, inicial-
mente, adquirir a forma de base, isto é, a técnica gestual,
esta não deve levá-lo por isso à competição, e é indispen-
sável que um mestre, ou seus discípulos, o guiem para uma
autêntica pesquisa espiritual. TCHE.
rins
Reflexões sobre o kimé e sobre o kiai Figura 29.

Existe um limiar psíquico que impede o corpo humano Por outro lado, se considerarmos os diferentes tipos d~
de funcionar a partir de certa situação, e permite assim ao energia, notamos o papel central do baço e seus entrela-
ser numano conservar um equilíbrio psíquico e físico ao çamentos com os pulmões e os rins (figura 30).
mesmo tempo. O kimé é um breve instante que ultrapassa
esse limiar, fugindo ao consciente que faz o papel de freio.
Kensi Tokitsu4 explica assim a importância do kimé nas
artes marciais:

Existe um limiar psíquico que não nos permite fazer funcionar


nossos músculos na plenitude de seus meios. Se for conveniente

4, La Voie du karaté. Pour une théorie das arts martiaux japonais, Le Seuil.
157
156
CORAÇÃO a força e a violência estão então no máximo no movimento
• executado (figura 31). O consciente se manifesta em se-
guida para trazer de volta o equilíbrio entre o físico e o
psíquico .
• BAÇO


RINS PULMÕES

I (Baço) - idéia, concentração energia


alimentar
KouTchi
Pro (pulmões) - pulsações instintivas energia
do ar
Yeul1gTchi
Tche (rins) - vontade, decisão energia
al1cestral
YCUI1 Tchi'
I + Pro + Tche -----;> Tcheul1g Tchi, energia verdadeira No que se relaciona com o kiai (ver o capítulo sobrea
respiração), podemos ver que ele vem do Yin pro~nd,
Figura 30.
pois é produzido pela expiração e o sopro em sua orIgem
nos rins (que entesouram a energia ancestral). Dos rins,
Esta associação pulmões-baço-rins se revela portanto ele vai para os pulmões, passando pelo baço, e nós reen-
completa no' plano da energia mas ela não fornece um contramos o papel das três sedes:
equilíbrio no plano psíquico. Nesse momento, parece que
o Chenn (o consciente) tenha interrompido a informação rins sede inferior
das outras entidades, mas ele só pode agir como regulador. baço sede média
Na verdade, é como se os elementos se tivessem libertado pulmões sede superior
da tutela do consciente. O instinto de conservação (Pro)
aliado à realização (I + Tche) se torna a realização desse O kiai pode ser sonoro (pulmão-+ Pro-+ grito) e modula .
instinto de conservação que se manifesta exteriorizand9- certas sonoridades diferentes que têm uma ação inibidora
se pela memória do gesto, o movimento (Roun, o fígado): sobre certos órgãos do adversário. Ele pode também con-
158
159
tinua~ interno e não adotar o circuito de rejeição pelos
pulmoes. Ele permanece então no Yin de Yin e se mani- Os golpes repetidos no mesmo lugar do corpo podem
festa. num movimento ·de empurrão abdominal (sob o gerar toda espécie de ações. Logo de início, uma ação
u~n.bIgo) ou tendo, por exemplo, uma ação de exterioriza- direta que se manifesta pelos sintomas ligados ao ponto
çao pelo olhar: fígado~ Roun~ vista (figura 32). de impacto: hematomas, dores, desconforto muscular e
articulares. Além do mais, esses desregramentos, que são
qualificados de funcionais quando surgem ao nível dos
meridianos, podem produzir, na continuação das repeti-
ções traumáticas, perturbações lesionais, isto é, a manifes-
tação de um desequilíbrio importante ao nível do próprio
órgão, com as conseqüências psíquicas que logicamente
possam advir. As perturbações lesionais serão tanto mais
favorecidas se uma carência genética para elas predispu-
ser o orgarusmo.
Esse tipo de desequilíbrio energético pode ser comba-
tido quando não são seguidas as regras energéticas chine-
sas: alimentação apropriada, respiração profunda que fa-
voreça a produção e a circulação da energia defensiva Oé,
32. As manifestações do kiai.
automassagem, tal como a contração e relaxamento do
punho, que desbloqueia a energia do braço, reforço dos
Os perigos da prática músculos protetores.
Aliás, a função de certos movimentos dos katas é justa-
mente a de restabelecer a boa circulação da energia.
As l~.i d~ medicina chinesa permitem encarar certas
consequencIas possíveis da prática das técnicas de comba- Entretanto, se as perturbações se manifestam ao nível
lesional, os métodos terapêuticos só poderão atenuar os
te. Com? ~ energ,ia circula .em todo o corpo, em particular
efeitos, e é por isso que, em caso de predisposição gené-
nos mendIanos, e na verdade lógico que, se um obstáculo .
tica, se desaconselha a prática de certas artes marciais.
en~rav sua saída, apareçam desordens fisiológicas e psí-
qUIcas. . .
. ~ste aspecto da prática permance pouco conhecido na
maIOr p~rte dos clube~ de artes marciais, quando devería-
mos leva-lo .~m consIderação, sempre. Nesse domínio,
como em mUItos outros, a presnç~ de um mestre, ou pelo
:n~os de um .bom educador, se Impõe, porque ele é o
uruco a advertlr cada praticante.

160
161
x
A meditação

Uma visão sobre a arte de viver, tal como se desenvolveu


no Extremo Oriente, não ficaria completa se se limitasse
às técnicas alimentar, respiratória ou corporal. Na verda-
de, é preciso acrescentar a elas a prática maior que cons-
titui o seu coroamento, a meditação.
Em seu conjunto, as diversas técnicas de meditação do
mundo sino-japonês se apresentam sob um outro aspecto,
que não é aquele que se conhece no mundo mediterrâneo.
As tradições judia, cristã e islâmica privilegiaram, real-
mente, uma pesquisa espiritual voltada para o Outro, para
a transcendência divina, na qual a meditação se resume
principalmente na prece e onde as técnicas corporais são
pouco utilizadas.
As práticas provindas do taoísmo e do budismo se ins-
crevem, ao contrário, nessa concepção do universo que já
descrevemos ao longo desta obra na qual o corpo, o espí-
rito e o cosmos inteiro são unidade; a meditação só visa,
então, a reencontrar o humano tal como é em si mesmo,
isto é, a fazê-lo reencontrar sua verdadeira natureza que
é unidade com o universo, para além dos dogmas e dos

163
o~strangimec .estabelecidos pela lei social. Nesta pes-
qwsa da harmo~ ~ndametl, a meditação aparece meditação proveniente das. esco.las budistas do ~ha na
China e do zen -no Japão .e dIfundIda na Europa, ha qUlllze
como a fonte e a fmalIdade de todas as outras técnicas da anos, pelo mestre zen Taisen Deshimaru, recentemente
arte de viver pois ela coloca o homem diante de si mesmo.
Marcel Granet, em sua obra-prima, La Pensée chinoise1 ~ .
Esta técnica de meditação provém realmente do budIs.-
des~rv assim a importância da meditação na prática do~ mo 'indiano primitivo mas teve um v~rdaeio prog:esso
sáblOS taoístas (que, aliás, utilizam outras técnicas diferen-
tes): na ,China após a implantação do budIs~o chan ~o seculo
VI de nossa era. Mais tard~, o chan fOllllfluencIado pelo
A meditação solitária é a única via do saber e do poder (tao): taoísmo, depois se difundiu para o J apão, onde as. escolas
"Conhecer o outro não passa de ciência; conhecer-se a si mesmo é do zen se desenvolveram a partir do século XIIII, mfluen-
compreender". A civl~ação degrada a natureza: tudo é convencio- ciando grandemente toda a civilização japonesa (e princi-
nal no que a observação pode atingir. A dialética só tem um inte- palmente as artes marciais). .
resse negativo: ela demonstra o arbitrário de tudo saber que não é Esta meditação, que chamamos zazen segundo o nome
devido só à meditação. Esta última basta para o santo. Para além que lhe é dado no Japão, representa poi~ a quintes~ca
do artificial, ela o faz apreender de uma só vez o real e a vida. Basta das técnicas utilizadas tanto no yoga llldIano, no taOlsmo
.que ele se recolha em si mesmo: "~squecndo na imobilidade" tudo chinês como no budismo em geral.
quanto não passa de saber convencional, ele purifica seu coração O zazen oferece também a vantagem de utilizar uma só
de todos os falsos desejos e de todas as tentações que a sociedade
post~ra .do· corpo, só um tipo de respiração e uma só
inventou. Ele restitui assim, em si mesmo, a simplicidade perfeita,
que é o estado natural de todo ser e do universo inteiro. Para
atitude do espírito, pois cada um desses aspectos repre-
reencontrar em si o homem natural e a Natureza, basta que ele se senta a expressão mais evoluída em seu campo.
:o.rne de novo ele mesmo e "conserve em paz a essência de vida que
e lllerente ao seu eu".
Descrição do zazen
N es~ do.mínio da meditação não nos era possível apre- A práÚca dozazen necessita de uma almofada redonda
·; entar tecrncas que só se fundam em descrições livrescas. (o zafu) para sentar. Cruzam-se as p-ernas como. l?tus
Como em todos os outros capítulos desta obra, fizemos (cada pé repousa sobre a coxa oposta) ou em defil-~tus
questão, d.e só fornecer informações que correspondem a
(um só pé sobre a coxa oposta, a outra repousa no chao) ..
uma p~atlc pessoal e esta regra se verifica tanto mais
essencIal no que ~e rela~ion à prática da meditação, da Se se e-ncontra uma impossibilidade, convém cruzar as
qual todos os escntos salIentam a importância do ensina- pernas de tal modo que oS joelhos possam apoiar-se for-
~eto direto e da transmissão oral. É por isso que nos temente no chão.
hffiltaremos a apresentar aqui uma só meditação pratica- A bacia deve ser empurrada para a frente, o que permite
da por um dos autores, durante muitos anos. Falamos da o fato de ficar bem sentado no centro da almofada, ' e a
1. Ob. cit., p. 424. 2. Para uma aproximação do zen, ver T. Deshimaru, La Pratique du zen , Albin Michel.
Ver também, Le BoI et le Bâto/!, 120 comes zen , ed. Cesare Ranclho.

164
165
c~luna verterbral se ergue n~turalme9- a partir da quinta inconsciente, passar como nuvens no céu - sem se opor
vertebra lombar. As costas ficam retas, o queixo é baixado a elas, sem se prender a elas. .
e a nuca estendida: Deve-se ter a impressão de empurrar Enfim o córtex fica em repouso, enquanto que o
a terra com os joelhos e o céu com a cabeça . cérebro primitivo, esquecido na via cotidiana, desperta.
. Essa postura fope e vigorosa é acompanhada por uma Inconscientemente, pensamos com o corpo e, como s?m-
dIstensao dos musculos do ventre que permite como bras diante de um espelho, as emanações do subconscIen-
veremos adiante, adotar a respiração apropriada. i3, preci- te passam, repassam e desaparecem. Chegamos. então,
so atenção para não pender nem para a direita, nem para apesar de estarmos completamente acordados, ao mc?n~­
a esquerda, nem para a frente, nem para trás, o nariz e o ciente profundo, para além de todo pensamento (hIShI-
umbIgo devem ficar na mesma linha vertical, as orelhas e ryo) , que é o segredo do zazen._ _ _ _ _ _
~ ROE ~AE

as espáduas no mesmo plano vertical. . .


Colc~-se então a mão esquerda na mão direi ta, palmas 't 10UMO
para o ceu, o rebordo das mãos contra o abdômen. Os ...;.,..-IJ-----..t,,--:J ENN MO ,
pol~gares em contato por sua extremidade, estão agora
~-':rSI"W iSING
honzontaIs, mantidos por uma ligeira tensão; eles não
formam nem vale nem montanha. As espáduas caem na-
turalmente, como suprimidas e rejeitadas para trás. A
ponta da língua toca o céu da boca acima dos dentes. O
olhar se coloca naturalmente cerca de um metro de distân- _~-I'i+:rO\WG KOANN
cia. Na realidade ele 'está voltado para o interior. Os olhos,
en!recerrados, nada olham mesmo que, intuitivamente, /'1ERIPIANO DO RIM
. vejam tudo. .~_ _ _ _ íSR\ Hkl
A respiração é do mesmo tipo que aquela que j á descre- "'ER\DIAND DO BAÇ~ (KI K'" íAI)~N
MtRIDi~o tIO Flc,~ ,
vemos no capítulo desta obra que lhe é consagrado. Há
uma concentração sobre uma expiração suave, longa e
profunda, que provoca um empurrão para baixo, na parte
.?O v~ntr sItuada sob o umbigo (o campo de cinábrio). A
mspIr~çao se faz naturalmente, ao fim de cada expiração.
AsSIm como a respiração certa só pode surgir de uma
postura correta, a atitude do espírito decorre naturalmen- o zazen e a circulação da energia
te de ~ma profunda concentração sobre a postura física e
A postura de zazen é esncia~mt um todo ~ue
a respIração. Ao contrário das meditações que privilegiam
permite, quando praticada de maneu.a c~reta, regulanzar
uma concentração do espírito sobre imagens mentais
naturalmente a circulação das energias mternas e harmo-
preestabelecidéils, durante o zazen se deixam as imagens,
nizar-se com as energias externas. No entanto, esta regu-
os pensamentos, as formações mentais ·que surgem do
167
166
l~riZÇão e esta harmonização se operam em todos os relação com os cinco elementos e com os ritmos biológicos
mV~I ao mesmo tempo (postura, respiração, atitude do que animam o cosmos (ver pp. 66 e 67). Além do mais,
espInto) de maneira específica para cada indivíduo. Por- meridianos secundários partem dos pontos do joelho, par-
. tant?, não se podem sublinhar senão alguns pontos gerais, ticularmente solicitados durante o zazen, e penetram em
~ deIXar que cad~ um tenha o cuidado de certificar subje- profundidade diretamente na direção dos órgãos internos.
tIvamente os efeItos do zazen com relação à sua própria • A respiração, ao insistir sobre a expiração profunda,
entidade energética. 3 estimula o centro vital da energia do corpo situado sob o
• O zazen favorece o equilíbrio dos dois meridianos umbigo que, aliás, se' encontra "aberto" graças à postura
Tou Mo (vasogovernador) e Jenn Mo (vasoconcepção) do corpo (bacia atirada para a frente, pernas cruzadas).
que ~arc a linha meridiana do corpo. Um controla as Não há necessidade de repetir os efeitos benéficos desse
fu~çoes de m~egração superior, o outro as funções vege- tipo de respiração, que já foram analisados atrás. Anote-
tatIvas. Eles fIcam em equilíbrio perfeito pela postura do mos simplesmente que a respiração excerce também uma
z~en: o Tou Mo, atrás, Yang, tenso, o J enn Mo, na frente, massagem poderosa nos intestinos, que constituem a
Ym, aberto, depois solto. maior fonte de desequilíbrio energético, e que ela estimu-
. .• Os meridianos principais têm uma disposição muito la a circulação sanguínea.
dIferente. no zazen do que 'nas posturas da vida comum: • O diafragma, livre durante a expiração, abre o ponto
~la perfilte uma troca interna máxima, e trocas externas "Tchong Koann", "barreira do meio", situado a quatro
hfiltad~. As extr~das são fechadas, aproximd~ do distâncias do umbigo e a três distâncias da base do esterno.
centro vIta! do orgamsmo, o centro de gravidade do corpo Este ponto donúna a sede média. .
sob o umbIgo, sede de Yuen Tchi. • As costas, h.abituadas a ficar curvas na vida cotidiana,
As mãos se tocam, os polegares um diante do outro e são reerguidas durante o zazen. Muitas vezes, aparecem
por s~u intermediário, os dois ramos do meridiano d~ tensões. São reencontrados os estágios dos diversos ór-
pulmao,. que governa a energia, se juntam. gãos segundo os pon~s da segunda cadeia do meridiano
A posIção d<?s membros i?feriores alonga os meridianos da bexiga, ao longo da coluna ver.tebral, a duas polegadas
Yang no extenor, e compnme os meridianos Yin na raiz de um lado e de outro. Em cada espaço intervertebral se
das coxas. acha um ponto que controla um órgão ou uma víscera
É nas extrnúd~s que se fazem as trocas Yin/Yang. deternúnada. As tensões e as fraquezas da postura são o
No C?rpo em açao, essas trocas se fazem de maneira reflexo do funcionamento dos órgãos internos; o trabalho
cen!nfuga, durante o zazen se fazem de maneira centrípe- da postura influencia as funções profundas.
ta: e o retorno à fonte. .. -
• A cabeça reta, nuca estendida, é a única posição que
O~ pontos que trabalham ·mais nos membros são aque- pernúte liberar o vazio occipltal. Isso abre a comunicação
les sItuados entr~ os pés e os joelhos, sobretudo aqueles dos meridianos da cabeça com o resto do corpo e inversa-
pontos que, no numero de cinco por meridiano, estão em mente. Ora, a cabeça tem uma situação energética privi-
3. Os parágrafos seguintes se referem a um artigo do Dr. Évelyne Holzapfel "Zaze legiada: os meridianos Yang chegam unicamente à cabeça
et acupuncture", publicado no boletim nQ 25 da Association Zen d'Europ~ (1978)~ ou dela partem; o Yin chega através de ramos secundários
168 169
particulares. Na base do crânio existem pontos muito O fenômeno de observação que se produz durante o
importantes, "janela do céu", cuja estimulação melhor~ a zazen não abrange apenas o corpo mas também o espírito.
comunicação cabeça-corpo, a relação funções centrms- Ao ver nossos próprios pensamentos surgirem do sub-
funções vitais. Estes pontos ficam com freqüência blo- consciente, podemos então conhecer melhor nossas ten-
queados com numerosas doenças, sobretudo nas desor- dências psíquicas às quais estamos constantemente sub-
dens psicossomáticas. metidos durante a vida corrente sem que, em geral, as
• A parte superior do crânio, onde se encontra um percebamos. O mesmo fenômeno que com relação às
ponto capital (Pae Roe) para toda a atividade cerebral e tensões do corpo - tomada de consciência, apaziguamen-
psíquica, o controle da energia Yang, se encontra alinhada to - se produz então relativamente a essas tendências
com Kikai Tandem que controla a sede inferior e portanto psíquicas (aliás, as duas são paralelas em total interdepen-
a energia vital. dência). Além do mais, o surgimento de certas sensações,
sobretudo a visão de cores específicas, permite, por inter-
médio da teoria dos cinco elementos, detectar fraquezas
o espelho de zazen energéticas.
Os parágrafos anteriores mostraram a importância da A prática do zazen aparece também como um espelho
postura do corpo e da respiração durante o zazen quanto no qual se reflete a entidade corpo-espírito. Reflexão que
ao estímulo e à regularização da circulação energética no se produz inconscientemente e que deixa o corpo-espíri-
organismo. Mais ainda do que ao nível desse estímulo to harmonizar-se naturalmente com as energias do céu e
direto do sistema energético, a contribuição essencial do da terra; "os joelhos empurrando sobre a terra e a cabeça
zazen se situa ao nível da tomada de consciência de si empurrando para o céu", o que simboliza perfeitamente
mesmo que ele provoca. . , a tríade terra-homem-céu.
Assim, o próprio fato de sentar tentando tomar uma Só nesse momento, na imobilidade perfeita do corpo e
postura correta revela a todos as tensões e todos os blo- do espírito, podemos compreender que a fonte de nosso
queios que enchem nosso corpo. Cada tensão e cada ser é unida com todo o cosmos. "Estudar seu corpo e seu
bloqueio é o sintoma de desregramento energético da espírito é esquecer seu corpo e seu espírito; esquecer seu
entidade corpo-espírito. E a tomada de consciência se corpo e seu espírito, é ser certificado por todas as existên-
efetua ao mesmo tempo que se restabelece o equilíbrio cias", dizia o mestre Dogen. E, em verdade, na profunda
natural. Além do mais, a postura evolui como as energias concentração do zazen, na harmonia do sopro original,
internas e externas; a prática regular permite assim se podemos abandonar todas as coisas. Assim se realiza o
adaptar ao nosso ambiente e de revelar os desregramentos Tao dos taoístas, a Via dos budistas, unidade com a COllS-
orgânicos importantes cujos siI?-tomas persistem a fim de ciência cósmica.
serem tratados por uma intervenção médica apropriada (é
evidente que o reequilíbrio energético provocado pelo
zazen não poderia ser suficiente para substituir uma inter-
venção exterior em caso de desregramentos graves).

170 171
ANEXO
I
As origens do karatê

por Pierre Portocarrero

Nós nos propomos, neste anexo, trazer alguns elementos


de reflexão sobre as origens do karatê-do, sob a forma de
apresentação de dados históricos e de características téc-
nicas referentes aos estilos antigos do arquipélago de
Ryu-Kyu. Deve-se notar. que, se a ignorância do público
considerado informado é considerável em matéria de bo-
xe chinês, é pelo menos igualmente considerável no que
se refere ao Okinawa-te. De fato, o período que se estende
do início deste século até nossos dias é relativamente bem
conhecido e, embora numerosos erros grosseiros sejam
encontrados em muitas obras, existem outras bem docu-
mentadas. Assim acontece com a etapa da introdução do
Okinawa-te no Japão, após a chegada de Gichin Funako-
shi, seguida por Chojun Miyagi e Kenwa Mabuni, que
assinala a elaboração dos estilos modernos Shotokan, Go-
ju-Ryu e Shito-Ryu nos anos de 1920 a 1930. Essa etapa é
seguida de perto pelo Wado-ryu criado por Hironori Ot-
suka, então .perito confirmado de jiu-jitsu e discípulo ja-
ponês de Funakoshi, e em seguida pelo aparecimento de

175
uma miríade de estilos e de escolas (com a criação da I I
competição esportiva intervindo depois da Segunda
Guerra Mundial).
Por outro lado, antes do fim do século XIX, a ausência
de documentos escritos e a situação de encruzilhada co-
mercial e estratégica do arquipélago de Riy-Kyu, que o
submeteu, no decorrer de séculos, a múltiplas influências
I
culturais, políticas e econômicas, em nad.a facilitam as
r--
pesquisas. Contudo, encontrar as diferentes escolas é mais ;--
c
OI
~
fácil do que na China, onde as múltiplas realidades etno- ::J E
o
E
lógicas, lingüísticas e geográficas suscitaram a criação de I'" ::J
Cf)
~
I
c
numerosos estilos. O arquipélago de Ryu-Kyu, pelo con- ~
cri Q)
-'"
o
trário, é minúsculo e Okinawa, a ilha mais importante, nãQ I......- ~
Cf)

mede além de 120 quilômetros de comprimento por 5 a


20 quilômetros de largura. No curso dos séculos, houve ali
uma focalização dos elementos técnicos vindos da China
e encontramos em Okinawa dois grupos bem distintos de
escolas, cujas características fundamentais são tão mar- r--
cantes quanto aquelas dos estilos do Norte e dos estilos do
g-
.. ::J

Sul da China. --....j


Vamos, portanto, tentar traçar uma genealogia dos peritos
e dos estilos tão completa quanto possível, com as principais
referências histórca~ pois daremos as principais caracterís-
ticas técnicas dos diferentes estilos e sua origem chinesa, r=-:::::-
o
quando houver (ver o quadro anexo que segue). c73-8
o 'u criN
"O Q) OI
OI.!: -'"
c
Eg_ C
Z
OI

U Cf)
L--
A sucessão dos mestres ro Q)
"0"0

~ ~
Q)
E
o
c
Sakugawa é o primeiro nome conservado de maneira ~

segura nos documentos antigos. Trata-se de um habitante de


Shuri (Okinawa) originário da localidade de Akata, que fez
numerosas visitas à China, onde estudou diversas escolas
chinesas, que juntou às técnicas locais por ele conhecidas. Em
c
seu regresso, ensinou essas técnicas que foram conservadas o
«
Cf)

sob o nome de karatê Sakugawa. Sakugawa morreu em 1735.

176 177
Notamos que, depois de cinco séculos, houve trocas A partir de então e ao longo de todo o século XVIII,
comerciais e diplomáticas entre a China e o reino de desenvolveram-se as grandes tendências das escolas oki-
Ryu-Kyu. Nessa época, os estilos chineses,notadamente nawanas. Essencialmente, elas são em número de três:
do Sul, penetraram largamente no arquipélago; devido à Shuri-te, Tomari-te e Naha-te, do nome das localidades
dominação chinesa estabelecida no século XV, sob a di- onde essas escolas tiveram origem (shuri-te = técnica ou
nastia Ming, por Hasshi, da dinastia Sho, originária da mão de Shuri).
província de Chuzan. A proibição do porte de armas nessa As?n, adido militar, teve como discípulos Sakyiama,
época enseja a aparição dos ko-budo, com o emprego de GUShl e Tomayose, todos os três de Naha. Iwah, ' outro
instrumentos agrários (tonfa, nunchaku etc.) e o desen- adido militar, ensinou Matsumura de Shuri, assim como
volvimento de treinamentos duros. A viagem regular de Maesato e Kogusoku, de Kume. Matsumura seguiu o
emissários, adidos militares e imigrantes acentuou a in- mesmo ensinamento de Kushanku, perito chinês falecido
fluência de técnicas chinesas, conhecidas então pelo ter- em 1790, de cujo ensinamento o essencial perdura sob a
mo genérico Tode (de to, que designa tudo quando vem forma do kata que leva seu nome. Waishingzan ensinou
da China e o próprio país, e te, que quer dizer técnica em Shimabuku de Uemonden (aldeia das regiões monta-
okinawano ). nhosas de Okinawa) e Higa, Senaha, Gushi, Nagahama,
Todavia, foi em 1609, co'm a brutal invasão do arquipé- Aragaki, Kunae e Hijaunna de Kunonboya (subúrbio de
lago e a destruição da dinastia Sho por Shimazu, do clã Naha).
Satsuma (ilha de Kyushu, Japão), instaurando nas Ryu- Paradoxalmente, foi Kanryo Hijaunna que deu cartas
Kyu uma verdadeira ditadura militar, que as técnicas mais de nobreza ao Naha-te, enquanto o ramo criado por Ason
s~ extinguiu com Tomigusuku, discípulo de Sakiyama.
duras se desenvolveram. Os treinamentos passaram .a vi-
Fmalmente, um perito da China do Sul, cujo nome per-
sar o máximo de eficácia mortal e a desenvolverem-se no manece desconhecido, teve como discípulo Gusukuma,
mais profundo segredo. A origem das sensações determi- Kanagusuku, Matsumura, Uyadomari, Nakazato, Yama-
nadas de certos katas remonta a esse período, notadamen- da, ,Y ahazato ~ ToyaI?a, todos de Tomari. Aquele perito,
te "Koshiki Naifanchi", que se praticava muitas vezes à fugmdo da Chma, fOI parar com seu barco em Okinawa,
noite, sobre rochedos cobertos de algas, à beira-mar, afim onde encontrou refúgio.
de não ser visto pelos samurais japoneses. O resto da genealogia é suficientemente claro, dispen-
Parece, porém, que durante todo esse longo período os s~no comentários. Notemos, porem, que Itosu e Azato,
okinawanos contentaram-se em trabalhar as formas chi- dlSClpulos de Matsumura (Shuri-te), ensinaram todos os
nesas,jálongamente aprovadas e elaboradas, às vezes com dias sua arte a Gichin Funakoshi, nascido em Shuri em
a contribuição de concepções locais, mas sem ainda forjar 1868. Itosu beneficiou-se igualmente do ensinamento de
verdadeiramente escolas originais no verdadeiro sentido Gusukuma (Tomari-te). Kenwa Mabuni, outro discípulo
qa expressão, exceto talvez ao nível de pequenos grupos. de Ankoh Itosu, criador dos Pinan-no-kata, trabalhou
E preciso, parece, esperar Sakugawa de Akata para ver igualmente com Kanryo Hijaunna (Naha-te). Da síntese
aparecer um ensinamento verdadeiramente original mi- desses dois ensinamentos nasceu o estilo moderno Shito-
nistrado por um okinawano. ryu, atualmente muito difundido no Japão.

178 179
Chojun Miyagi, nascido em 1888, principal discípulo de • Shuri-te
Hijaunna, criou o estilo Goju-ryu, talvez pouco tempo
depois da morte de seu mestre, em 1915. Implantou defi- Estilo mais aparentado com o norte da China, enquanto
nitivamente esse estilo no Japão em 1928. Seu discípulo o Naha-te é tipicamente originário dos estilos do SuL Um
Yamaguchi encontra-se atualmente à testa dÇ> Goju japo- de seus principais mestres foi Matsumura, que introduziu
nês. Em Okinawa, Metoku Yagi e Eiichi Miyazato, condis- o kata bassai na prática.
cípulos de Yamaguchi, recusam a evolução japonesa mo- Técnicas imitadas dos animais (notadamente o grou),
derna e transmitem de fato o antigo Naha-te. Soshin com grande lugar para técnicas dos pés, mesmo com
Nagamine, nascido em 1906, herdeiro por direito de li- saltos, importante trabalho de esquivas, movimentos de
nhagem do Tomari-te, trabalhou igualmente o Shuri-te emolamento e absorção tirados do Hsing-i. Sensações
com Soshin Chibana, discípulo de Ankoh Itosu. Hoje em mais longas e ligeiras do que no Naha-te. Poucos katas,
dia, ele continua a ensinar sua arte em N aha. mas ricos e complexos: Kushanku, Chinto, Wanshu, Bas-
sai etc.

Os diferentes estilos
• Toman-te

• Naha-te Diferencia-se do precedente sobretudo por suas con-


cepções em matéria de aplicação das técnicas: bloqueios
É o estilo chamado "duro", embora alguns de seus katas trabalhados no nível "jodan", absorções mais extensas
sejam muito corridos, circulares e aparentemente pouco com estudo da recuperação de força nos desequilíbrios,
poderosos (Saifa, por exemplo). Posturas estáveis e po- movimentos de ataques com esquiva do corpo e importan-
derosas (Sanchin-dachi e todos os ' seus derivados), mas I te ação dos quadris. Aliás, a aparência exterior é ,muito
semelhante à do Shuri-te. Notemos igualmente um traba-
igualmente muito móveis e flexíveis (Neko-ashi-dachi).
lho de derrubadas, chaves e projeções muito desenvolvi-
Golpes de pé nos níveis baixo e médio, nunca com saltos; das, katas, ni-sei-shi, sochin e unsu.
técnicas de mãos originais para certos Tang-Lang do Sul
(o manta religioso), bloqueios circulares (mawashi-shuto-
uke), técnicas de mãos colantes muito próximas do Wing- As pr incipais escolas de Okinawa em nossos dias
tseun, trabalho das palmas das mãos. Trabalho de res-
piração ventral sonoro (Ibuki e Nogare), permitindo a Okinawa ken kai (Yagi)
Okinawa Goju Ryu-Kyu karatê-do Kyokai (Miyazato)
absorção de choques violentos e a tonificação do corpo.
Okinawa karatê-do Renmei (Nagarnine)
Influência evidente do ioga. Katas de uma riqueza extra- Kobayashi Ryu karatê-do Kyokai (Tomokan)
ordinária (alguns originários do ramo extinto desenvolvi- Uechi Ryu karatê-do Kyokai (Uechi)
do por Ason): Sanchin, Saifa, Seishan, Saip~l. Shisochin, Okinawa Kempo Renrnei (Hira)
Sanseru, Suparipa, etc. Nansei Shoto Ko Budo Kyokai (Taira e Nakamura) /'
180 181
Fontes

Gichin Funakoshi,. Karate-do kyohan, reeditado em


1972 sob os cuidados de Tsumotu Oshima, um de seus
últimos discípulos diretos. Edit. Kodansha International,
France-Shotokan para a tradução francesa.
Tadahiko Otsuka, Koshiki Okinawa Karate-do shin no II
waza (Espírito e técnicas do velho karatê-do de Okinawa),
4 volumes, edição privada, Tóquio ..
Diversos documentos forncecidos pelo mestre Ogura,
entre os quais as anotações pessoais de Kenwa Mabuni,
arquivos de Gembukan.

Impresso nê\l~_r"'.I1 r;n" ..,


03043 Rua Martlm Burchard. 246
Brás· São Paulo· SP
Fone : (01 1) 270·4388 (PABXl
com filmes fornecidos pelo Editor.

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