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ARTIGO DE REVISÃO

Câncer de mama: novidades no diagnóstico e no tratamento

Câncer de mama: novidades no diagnóstico e no tratamento


Afonso Celso Pinto Nazário1*, Gil Facina2, José Roberto Filassi3
1
Professor-associado Livre-docente, Chefe da Disciplina de Mastologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), São Paulo, SP
2
Professor Adjunto Livre-docente da Disciplina de Mastologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), São Paulo, SP
3
Professor-associado Livre-docente, Chefe do Setor de Mastologia da Disciplina de Ginecologia do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP

Trabalho realizado na Disciplina de


Mastologia do Departamento de Resumo
Ginecologia da Escola Paulista de
Medicina da Universidade Federal de São
Paulo (EPM-UNIFESP) e no Setor de
Os autores discutem as principais novidades no diagnóstico e no tratamento do
Mastologia da Disciplina de Ginecologia da câncer de mama, particularmente no diagnóstico por imagem, no rastreamen-
Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (FMUSP), São Paulo, SP
to e nas terapêuticas locorregional e sistêmica.

Artigo recebido: 14/10/2015


Palavras-chave: câncer de mama, diagnóstico, tratamento.
Aceito para publicação: 19/10/2015

*Correspondência:
R. Nova York, 609, apto. 73-L
CEP 04560-001
São Paulo – SP
nazarioafonso@hotmail.com

http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.61.06.543

Introdução ano, possivelmente em virtude da detecção precoce e da


O câncer de mama constitui-se, atualmente, na neoplasia melhora na terapêutica. No Brasil, é responsável pelo maior
maligna mais frequente entre as mulheres nos países de- número de mortes por neoplasia maligna entre as mulhe-
senvolvidos, excluindo-se os tumores de pele não melano- res, e a taxa de mortalidade continua elevada e em cresci-
ma. Nos Estados Unidos, foram estimados 231.840 casos mento na maioria dos estados, porque a doença ainda é
novos no ano de 2015, o que correspondeu a 29% das ocor- diagnosticada em estádios avançados. Quando o diagnós-
rências de câncer feminino naquele país. O Brasil acompa- tico é tardio, o tratamento é mutilante e agressivo. Dessa
nha a mesma tendência, e estimaram-se para 2014 57.120 maneira, todos os esforços devem ser realizados no senti-
casos novos, o que coloca essa neoplasia maligna como a do de se detectar a doença o mais precocemente possível.
mais comum também entre as mulheres brasileiras. Em O câncer de mama é resultado da incapacidade da re-
relação à incidência, entre 1980 e 1987, verificou-se, nos gulação normal das funções celulares de proliferação e di-
Estados Unidos, aumento de 4% ao ano, provavelmente em ferenciação, decorrente de várias alterações genéticas, cul-
decorrência da intensificação dos programas de rastrea- minando na transformação maligna. A carcinogênese
mento mamográfico. Entre 1987 e 2002, a taxa continuou mamária é processo extremamente complexo e, do ponto
a crescer, mas em menor intensidade (0,3% ao ano). Entre de vista didático, pode ser dividida em três etapas: inicia-
2002 e 2003, diminuiu em 7,5%, provavelmente pela que- ção, promoção e progressão. Na iniciação, uma célula ge-
da em 50% da prescrição de terapia hormonal na pós-me- notipicamente normal transforma-se em maligna, em ge-
nopausa naquele país, após a divulgação do estudo WHI ral passando por fase intermediária de atipia celular. Os
(Women’s Health Initiative), permanecendo estável após mecanismos genéticos estão envolvidos nessa etapa, po-
2007. Além da elevada incidência, o câncer mamário ain- dendo ser herdados (câncer de mama hereditário) ou ad-
da apresenta alta taxa de mortalidade, sendo a segunda quiridos ao longo da vida (câncer de mama esporádico).
causa de óbito por neoplasia maligna entre as mulheres A forma hereditária é responsável por apenas 10% dos
americanas, só perdendo para o câncer de pulmão e brôn- casos de câncer mamário, e a principal alteração genéti-
quios. Em 2015, foi responsável por 40.920 óbitos nos Es- ca encontrada é a inativação de genes supressores de tu-
tados Unidos. Entretanto, a mortalidade, que era crescen- mor. O distúrbio genético encontra-se presente já desde
te entre os anos de 1975 e 1990, com aumento anual de o início da vida, transmitido por células germinativas (he-
0,4%, declinou entre 1990 e 2002, com queda de 2,3% ao rança autossômica dominante germinativa) e, por isso,

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tende a ocorrer em idade mais precoce, isto é, na pré-me- dimensão, seu tamanho duplica a cada 100 dias. Do ponto
nopausa e, com frequência, de forma bilateral. Os prin- de vista clínico, na iniciação e nas etapas primordiais da pro-
cipais genes envolvidos são o BRCA1 e o BRCA2. O BRCA1 moção, o diagnóstico pelos métodos propedêuticos dispo-
localiza-se no cromossomo 17, e a portadora de sua mu- níveis não é possível. Entretanto, nas fases mais tardias da
tação apresenta alta suscetibilidade para o câncer de mama promoção neoplásica, com as lesões precursoras (hiperpla-
(até 65% ao longo da vida) e para o de ovário (39%). O sia atípica e carcinoma ductal in situ) já estabelecidas, é pos-
BRCA2 situa-se no cromossomo 13 e associa-se à alta sus- sível a detecção precoce por meio da mamografia. Acredita-
cetibilidade para o câncer de mama (45%) e de ovário -se que entre o epitélio mamário normal e o carcinoma
(11%), e para o câncer de mama masculino (RR = 15). invasor, ocorram fases intermediárias de hiperplasia típica,
Na grande maioria dos casos, contudo, as alterações atípica e carcinoma in situ, ainda que não obrigatoriamente.
genéticas não são herdadas, mas adquiridas ao longo da Na fase de progressão, o carcinoma já consolidado
vida, constituindo o câncer de mama esporádico (70% dos rompe a membrana basal, invade os vasos linfáticos e san-
casos). É definido como aquele em que nenhum caso da guíneos, e é capaz de atingir tecidos a distância (metás-
doença foi observado em duas gerações completas de 1º e tase) e se proliferar. Apresentam papel de destaque nessa
2º graus. O defeito genético decorre, em geral, da ativação fase a angiogênese e as enzimas proteolíticas, como a ca-
de um ou mais proto-oncogenes, presentes em células sa- tepsina D. O carcinoma passa a formar nódulos palpá-
dias. A maioria dos oncogenes codifica fatores de cresci- veis, passíveis de serem detectados no exame físico e no
mento e seus receptores. O câncer de mama familiar cor- autoexame. Inexoravelmente, a doença avança, produz
responde a 20% dos casos e, embora haja antecedentes em metástases a distância e os principais sítios são ossos, pul-
parentes de 1º ou 2º graus, o pedigree autossômico domi- mões e pleuras, o fígado e o cérebro.
nante não é caracterizado. Por meio da ativação de um pro-
to-oncogene ou da inativação de genes supressores, a célu- Diagnóstico
la alterada transmite o erro às células filhas de forma O diagnóstico do câncer de mama nos dias de hoje, com
sucessiva. O erro genético pode ser reparado ou a célula muita frequência, é feito em sua forma subclínica, através
pode ser induzida a sofrer apoptose. Quando isso não ocor- de mamografia de rotina ou por programas de rastreamen-
re, o erro genético pode se perpetuar, e a célula neoplásica to (screening) populacional. Nos Estados Unidos, o diag-
é estimulada a se dividir, com a formação de clones celu- nóstico mais precoce reduziu em 30% a mortalidade em
lares mutados, caracterizando a fase de promoção. mulheres acima de 50 anos e em 19% entre 40 e 49 anos.
Destacam-se, entre os fatores promotores do câncer Com a sua implantação como método de rastreamento,
mamário, aqueles que mantêm o lóbulo em constante surge o BI-RADSTM (Breast Imaging Reporting and Data
processo de divisão celular, o que dificulta os processos System), sistema de relatório e de padronização de termi-
fisiológicos de reparação. Estímulos externos (exógenos) nologia, permitiu a classificação as anormalidades obser-
ou internos (endógenos) favorecerão a multiplicação das vadas nos exames de imagem em categorias, preconizada
células que contêm as alterações genéticas. Os clones celu- pelo American College of Radiology (Tabela 1).
lares mutados, entretanto, ainda não têm a capacidade de
invadir os tecidos adjacentes, ficando restritos à membra- TABELA 1 Classificação BI-RADSTM.
na basal (carcinoma in situ). Na promoção, assumem gran-
Categoria Definição Risco de câncer (%)
de importância os esteroides sexuais e os fatores de cres-
0 Resultado inconclusivo Necessita-se de
cimento. Assim, os principais fatores promotores do
avaliação adicional por
câncer de mama são de natureza reprodutiva, como a me-
método de imagem
narca precoce, a menopausa tardia, a nuli ou oligopari-
1 Achados negativos 0
dade e a primeira gestação tardia. O denominador co-
2 Achados benignos 0
mum é o estímulo estroprogestativo cíclico (ovulatório)
3 Achados provavelmente <2
continuado, sem a pausa reparadora da gravidez e da lac-
benignos
tação; os esteroides sexuais, de forma sinérgica, mantêm
o lóbulo mamário em constante proliferação. 4 Achados suspeitos 3-94

O período pré-clínico, isto é, o intervalo de tempo en- 5 Achados altamente ≥ 95

tre a primeira célula mutada e a formação de um nódulo suspeitos

maligno de 1 cm (que apresenta 109 células) é relativamen- 6 Biópsia prévia positiva 100
te longo, cerca de 8 anos. Entretanto, uma vez atingida essa para câncer

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O exame mamário apresenta moderada sensibilidade e boa


especificidade para a detecção do câncer mamário, e o va-
lor preditivo varia de acordo com a idade. A sensibilidade é
de 57 a 83% entre os 50 e 59 anos e de 71% entre os 40 e 49
anos. Já a especificidade é maior, de 88 a 96% entre os 50 e
59 anos e 71 a 84% entre as mulheres de 40 a 49 anos. É par-
ticularmente útil nas mulheres mais jovens, pela limitação
da mamografia nesse grupo etário (mamas densas).
A mamografia é o método padrão para diagnóstico e
rastreamento do câncer de mama. Nos casos em que o
quadro clínico é suspeito, deve ser indicada com o obje-
tivo de avaliar a extensão do tumor e de detectar focos
subclínicos multicêntricos ipsilaterais e na mama contra-
lateral. Apresenta sensibilidade de 46 a 80% e especifici-
FIGURA 1 Nódulo mamográfico espiculado. BI-RADSTM 5.
dade de 82 a 99%. Seu valor preditivo depende do tama-
nho e da localização da lesão, da densidade mamária, da
qualidade dos recursos técnicos disponíveis e da habili-
dade do interpretador. Entretanto, mesmo utilizando téc-
nica de excelência, a taxa de falso-negativo é de 10 a 15%,
podendo chegar a 40% em pacientes com mamas densas.
Nesse sentido, a anormalidade palpatória clínica não deve
ser desprezada se a mamografia for normal, e a investiga-
ção deve continuar com outros métodos semióticos, como
a ultrassonografia, a punção aspirativa com agulha fina
ou grossa, ou com a biópsia convencional a céu aberto.
Os principais sinais mamográficos do câncer de mama
são: (a) nódulo espiculado (Figura 1); (b) calcificações
agrupadas pleomórficas (Figura 2) e (c) área de assime-
tria focal com distorção arquitetural do parênquima ma-
mário. Essas imagens associam-se ao câncer mamário em
FIGURA 2 Calcificações agrupadas pleomórficas (em aspecto de
90% dos casos.
letras chinesas). BI-RADSTM 5.
Recentemente, introduziu-se na propedêutica a ma-
mografia digital. De forma geral, o valor preditivo desse Do ponto de vista ecográfico, o câncer de mama pro-
novo método ainda não se mostrou superior ao analógi- duz nódulo sólido, de forma irregular, margens impre-
co; entretanto, na pré-menopausa, em mulheres com me- cisas e com microlobulações ou espiculações (Figura 3).
nos de 50 anos e em mamas densas, a eficácia diagnóstica Os ecos internos são heterogêneos, o que produz som-
revelou-se maior. Além disso, como as imagens são ime- bra acústica posterior. O diâmetro anteroposterior do
diatamente analisadas na estação de trabalho, permite que nódulo maligno é comumente igual ou maior do que o
incidências mamográficas adicionais sejam prontamente longitudinal.
indicadas, evitando-se reconvocação da paciente. A ressonância magnética é método propedêutico de
Embora a ultrassonografia seja método não ionizan- aplicação recente e que vem assumindo um papel cada vez
te e mais confortável, apresenta valor preditivo menor mais importante nos últimos anos. É o exame de imagem
que a mamografia para o diagnóstico de câncer mamá- de maior sensibilidade para a detecção do câncer de mama,
rio. Não demonstra as calcificações mais tênues e, por- mas deve ser solicitado com cautela, pois a taxa de falso-
tanto, não é eficaz no rastreamento de forma isolada. Deve -positivo ainda não é a ideal, o que leva a procedimentos
ser indicada como auxiliar nas condições em que a ma- desnecessários. Além disso, o custo ainda é alto e o real
mografia não elucida o diagnóstico, como nas assimetrias impacto na redução da mortalidade por câncer de mama,
e em mamas densas. Por outro lado, as glândulas gordu- desconhecido. Está indicada quando a extensão da lesão
rosas dificultam a transmissão do feixe acústico, limitan- suspeita não é determinada pelos métodos convencionais,
do o diagnóstico. como nas mamas densas, ou quando o diagnóstico é de

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TABELA 2 Detecção precoce e rastreamento do câncer


de mama.
Ministério da Saúde (2004)
Grupo sem risco 40 – 49 anos: exame físico anual
50 – 69 anos: exame físico anual
mamografia a cada 2 anos
Grupo com alto risco A partir de 35 anos: exame físico anual
mamografia anual
Sociedade Brasileira de Mastologia (2002)
40 – 49 anos: mamografia anual
50 – 69 anos: mamografia a cada dois anos
≥ 70 anos: a depender da expectativa de vida
American Society of Breast Diseases (2006)
A partir de 40 anos: mamografia anual
FIGURA 3 Aspecto ultrassonográfico do câncer de mama. Nódulo American Cancer Society (2015)
irregular e com espiculações. 45 – 54 anos: mamografia anual
Após 55 anos: mamografia a cada 2 anos (desde que expectativa de
carcinoma lobular; em mulheres com alto risco para de- vida seja superior a 10 anos)
senvolver câncer de mama, como as portadoras de muta-
ção dos genes BRCA1 e BRCA2; na monitoração da respos- Nos casos de lesões suspeitas, damos preferência às bióp-
ta à quimioterapia neoadjuvante; na avaliação da sias percutâneas. A primeira é a biópsia com agulha fina
integridade das próteses e na propedêutica do carcinoma (BAF), método ambulatorial de baixo custo e relativamen-
oculto de mama (isto é, presença de metástase axilar sem te simples. A agulha utilizada (gauge 25/6) torna o procedi-
evidência de doença primária pelo exame clínico, mamo- mento confortável e praticamente isento de riscos. Pode ser
grafia e ultrassonografia). feita pela palpação, mas dá-se preferência à punção orien-
Recentemente foi introduzida a tomossíntese, ou ma- tada pela ultrassonografia, pelo maior valor preditivo. A BAF
mografia 3D, com a promessa de detectar mais lesões do está contraindicada na investigação de calcificações suspei-
que a mamografia digital. Entretanto, não se comprovou tas. Apresenta como desvantagens o fato de não ser possí-
ainda se seu uso rotineiro diminui a mortalidade. vel avaliar invasão e o grau histológico; além disso, é muito
A American Cancer Society of Breast Diseases pre- difícil determinar o tipo histológico e a expressão dos recep-
coniza que o rastreamento mamográfico se inicie aos 40 tores hormonais. A taxa de falso-positivo é muito baixa (en-
anos e seja anual a partir dessa idade. Já o Ministério da tre 0 e 2%); entretanto, a de falso-negativo é de 5 a 20% dos
Saúde recomenda, para mulheres de baixo risco para o casos, decorrente principalmente da técnica inadequada, em
desenvolvimento do câncer de mama, que a mamogra- particular em relação aos cuidados na fixação do material.
fia seja bianual a partir dos 50 anos; para mulheres de Assim, se a alteração de imagem for suspeita, mas a BAF for
alto risco, orienta que o exame seja realizado anualmen- negativa, insatisfatória ou incompatível com o diagnóstico
te a partir dos 35 anos ou dez anos antes da idade de clínico e de imagem, a propedêutica deve continuar.
diagnóstico do parente mais jovem afetado. A Socieda- A core biopsy consiste na biópsia por agulha grossa (BAG)
de Brasileira de Mastologia sugere que a mamografia seja com propulsor automático, que impulsiona e retrai a agu-
anual entre os 40 e 49 anos e, posteriormente, bianual. lha que secciona o tecido. Está indicada nos nódulos sus-
Em 2015, a American Cancer Society passou a preconi- peitos maiores que 1 cm ou em calcificações suspeitas ex-
zar que a mamografia seja feita anualmente entre 45 e tensas. Nessas condições, a sensibilidade é de 48 a 100%, e
54 anos e, posteriormente, bianual. Em São Paulo, a pro- a especificidade, de 91 a 100%. Por outro lado, está con-
porção de casos entre 40 e 49 anos (21,3% dos casos) é traindicada em alterações de imagem profundas (risco de
muito próxima àquela verificada entre 50 e 59 anos (27% pneumo e hemotórax), nas distorções fibroglandulares, nas
dos casos). Assim, preconizamos a mamografia anual a assimetrias suspeitas, nas pacientes com hipomastia ou
partir dos 40 anos, com término quando a expectativa em lesões próximas à prótese mamária.
de vida seja menor que cinco anos. A Tabela 2 resume as Apresenta como vantagens o fato de ser método ambu-
diversas orientações. latorial, exigindo apenas anestesia local. Possibilita avaliar

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a invasão, o tipo histológico e a expressão imuno-histoquí-


mica, além de permitir o planejamento terapêutico pré-ope-
ratório. Como desvantagens, alinham-se o custo (modera-
do), a fragmentação do material e a mobilização do tecido
mamário simulando invasão e/ou embolização. Em pacien-
tes mais ansiosas, o exame pode ser desconfortável.
Já a mamotomia na biópsia por agulha grossa (BAG)
utiliza-se de sistema a vácuo com cânula oca, a qual gira
em alta rotação, cortando o tecido, que é aspirado para
fora da mama. É também denominada BAG vácuo-assis-
tida. Está especialmente indicada em nódulos menores
que 1 cm, calcificações suspeitas tênues, distorções fibro-
glandulares e densidades assimétricas. A sensibilidade é
de 93%, e a especificidade, de 98%.
Assim como a core biopsy, a mamotomia apresenta como
vantagens o fato de ser método ambulatorial, exigindo ape-
nas anestesia local. Possibilita avaliar a invasão, o tipo histo-
lógico e os marcadores imuno-histoquímicos. Além disso, os
fragmentos retirados são maiores (em tamanho e número),
a mobilização do tecido mamário é menor e o aparelho é in-
troduzido de uma só vez, trazendo maior conforto para a pa-
ciente, além de ser mais prático para o médico. Por fim, per-
mite o planejamento terapêutico pré-operatório. Alinham-se FIGURA 4 Marcação pré-cirúrgica com arpão metálico – “agu-
como desvantagens o desconforto que a punção pode pro- lhamento”.
duzir em pacientes ansiosas e, principalmente, o alto custo.
A marcação pré-cirúrgica consiste na localização pré-
-operatória de lesões mamárias não palpáveis suspeitas.
Pode ser feita com fio guia metálico em forma de arpão
(“agulhamento”) (Figura 4) ou por injeção de substância
radioativa, técnica denominada ROLL (radioguided occult
lesion localization) (Figura 5). Em ambos os casos, a mar-
cação pode ser realizada com auxílio da mamografia es-
tereotáxica ou da ultrassonografia.
Quando se utiliza a mamografia estereotáxica, o ar-
pão inserido antes da cirurgia deve ultrapassar a lesão em
1 cm, permitindo que, mesmo havendo alguma migração
do reparo, ainda continue bem próximo da área a ser biop-
siada. No ROLL, a emissão cintilográfica é detectada na
superfície cutânea por meio de sonda detectora de raios
gama no intraoperatório. É mais preciso e menos invasi- FIGURA 5 Localização intraoperatória com sonda de detecção de
vo; necessita, contudo, do concurso da equipe de medici- raios gama – ROLL.
na nuclear e o custo é maior. Nas calcificações suspeitas,
é fundamental a mamografia da peça operatória, para tesia, a cicatriz cirúrgica maior e a possibilidade de altera-
confirmar a retirada da lesão previamente marcada. ção na imagem em mamografia ou ultrassonografia sub-
A marcação pré-cirúrgica apresenta como vantagens, sequentes. Além disso, as lesões BI-RADS 4 são benignas
em relação aos métodos de biópsia percutânea, o fato de em cerca de 80% dos casos, em média, isto é, em 20% das
o material ser abundante para o estudo anatomopatológi- vezes a cirurgia é realmente necessária. A taxa de insuces-
co, permitindo melhor definição diagnóstica e adequada so na extirpação varia de 0,2 a 22%, com média de 4%.
avaliação das margens de ressecção. Como desvantagens, Uma vez feito o diagnóstico do câncer mamário, este
destacamos a necessidade de internação hospitalar, de anes- deve ser estadiado. O estádio clínico do câncer de mama é

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baseado na classificação TNM (T = tamanho do tumor; N habitualmente a mastectomia total com preservação dos
= comprometimento axilar; M = metástases a distância). O músculos peitorais. A mastectomia está também indicada
estadiamento é clínico (cTNM) e patológico (pTNM). na forma multicêntrica in situ ou invasiva da doença (Figu-
ra 6). Eventualmente, quando a mama é volumosa, pode-se
Tratamento indicar a cirurgia conservadora em tumores entre 3 e 5 cm
Halsted, no final do século XIX, postulava que o câncer de associada a técnicas de oncoplastia, em virtude da relação
mama era uma doença local, disseminando-se de forma entre volume do tumor e a mama ser favorável.
ordenada e centrífuga para os linfonodos regionais axila- Quando se pratica a mastectomia total, pode-se reali-
res, que atuariam como verdadeira barreira para a dissemi- zar a reconstrução mamária, o que atenua o impacto da am-
nação da doença. Daí a importância da ressecção da mama putação mamária. Pode ser imediata ou tardia. Habitual-
e dos linfonodos da forma mais radical possível, para erra- mente, é feita com retalho miocutâneo do músculo reto
dicar a afecção e melhorar a sobrevida. Os tratamentos ci- abdominal (TRAM), com dermoexpansor e posterior inclu-
rúrgicos e radioterápicos de alta radicabilidade predomi- são de prótese, inclusão imediata de prótese e eventualmen-
naram na primeira metade do século XX, mas logo te com retalho miocutâneo do músculo grande dorsal. No
começaram a mostrar resultados desanimadores, porque TRAM, o retalho mono ou bipediculado do músculo reto
pacientes com neoplasias pequenas tratadas daquela ma- abdominal é transposto ao leito da mastectomia. A técnica
neira agressiva sucumbiam, de forma paradoxal, em tem- é trabalhosa, aumentando o tempo cirúrgico e anestésico;
po relativamente pequeno. com frequência, é necessária a infusão de hemoderivados.
Fisher, nas décadas de 1970 e 1980, demonstrou por Entretanto, é a que produz melhor resultado estético em
meio de vários ensaios clínicos, que a teoria mecanicista de longo prazo. Já o emprego de dermoexpansores e implantes
disseminação do câncer de mama não era adequada. De fato, é mais rápido e simples; são inseridos sob o músculo peito-
um tumor com 1 cm3 possui 1 bilhão de células e é capaz de ral maior e, no caso dos expansores, são gradualmente ex-
produzir micrometástases. Propôs que o câncer de mama, pandidos no pós-operatório, com a finalidade de aumentar
em fase muito precoce de desenvolvimento, disseminava-se a elasticidade cutânea e permitir a introdução posterior de
de forma hematogênica, podendo ser considerado como próteses mamárias. São indicados, particularmente, em pa-
doença sistêmica já de início. Postulou que os linfonodos cientes magras e, portanto, com subcutâneo abdominal pou-
regionais não eram barreiras eficazes e que sua importância co espesso e que não se beneficiariam da técnica do TRAM.
residiria apenas na avaliação do comportamento biológico A linfonodectomia axilar é realizada quando a axila
e na capacidade metastática da neoplasia. Dessa maneira, a está clinicamente comprometida ou quando o tumor é vo-
linfonodectomia não influenciaria na sobrevida, tendo im- lumoso (mais do que 5 cm). Caso contrário, realiza-se a re-
portância apenas como fator prognóstico. A teoria de Fis- tirada do linfonodo sentinela, que é o primeiro linfonodo
cher levou ao desenvolvimento, com base científica, de vá- a receber a drenagem linfática da glândula mamária.
rias formas de tratamento sistêmico de câncer de mama, A marcação do linfonodo sentinela é feita basica-
como a quimio e a endocrinoterapia e, em última análise, mente por dois métodos: tintorial e por marcador ra-
justificou a procura de técnicas cirúrgicas menos agressivas dioativo. No primeiro método, injeta-se azul patente na
e mutilantes no controle locorregional da afecção. região peritumoral ou na periareolar. Após alguns mi-
O consenso atual é de que o câncer de mama deve ser nutos, o corante drena e marca o linfonodo sentinela (Fi-
considerado uma doença heterogênea. Embora, na maio- gura 7). Na segunda forma, injeta-se radioisótopo (usual-
ria dos tumores pequenos, as metástases sejam tardias, mente o tecnécio 99) ligado a um coloide, que se fixa ao
bastando o tratamento locorregional, há casos em que a linfonodo sentinela. A injeção é feita horas antes da ci-
disseminação metastática é precoce, demandando trata- rurgia, e o sucesso do procedimento é confirmado por
mento sistêmico complementar. A seleção dos pacientes linfocintilografia pré-operatória. A emissão de radioa-
elegíveis para a terapêutica sistêmica adequada é feita tividade pelo linfonodo marcado é detectada por uma
através da análise de fatores prognósticos histopatológi- sonda de detecção de raios gama no intraoperatório (Fi-
cos e imuno-histoquímicos. gura 5). A técnica apresenta ótimo valor preditivo, mas
O tratamento cirúrgico do câncer de mama em fase ini- requer treinamento cirúrgico específico, concurso da
cial (tamanho do tumor ≤ 3 cm) consiste na quadrantecto- equipe de medicina nuclear, além do custo ser maior.
mia ou ressecção segmentar mamária, isto é, na retirada do Com a exérese do linfonodo sentinela, evita-se a dissec-
quadrante ou segmento em que se localiza a neoplasia (tra- ção axilar extensa rotineira e seus efeitos colaterais in-
tamento conservador). Em tumores maiores, preconiza-se desejáveis, como o linfedema e a neuropatia. Por outro

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Câncer de mama: novidades no diagnóstico e no tratamento

lado, a dissecção do linfonodo sentinela é indicada ape- nores que 5 cm nos quais se realiza tratamento conser-
nas no câncer de mama inicial, condição em que a axila vador seguido de tratamento sistêmico e radioterápico
se encontra, com frequência, livre de acometimento. Na- adjuvantes, quando até dois linfonodos sentinelas estão
queles casos em que o exame intraoperatório de conge- comprometidos, a ressecção apenas dos linfonodos sen-
lação for positivo para malignidade, pratica-se a linfo- tinelas apresentou as mesmas taxas de recorrência local
nodectomia axilar completa. Recentemente, ensaio e de sobrevida global em relação à linfonodectomia axi-
clínico randomizado comprovou que, em tumores me- lar total. Outro estudo comparou a linfonodectomia axi-

Tumor (T)

≤ 3cm > 3 cm Multicêntrico

Quadrantectomia Mastectomia total com preservação dos mm. peitorais


(com ou sem reconstrução imediata)

Redução do
Quimioterapia neoadjuvante
volume tumoral

Axila

N0; T ≤ 5 cm N1; T > 5 cm

Biópsia do linfonodo
Linfonodectomia axilar
sentinela (LS)

Positiva

T ≤ 5 cm
Cirurgia conservadora
Tratamento sistêmico +
Radioterapia
Até 2 linfonodos sentinela positivos

Somente biópsia do
linfonodo sentinela

FIGURA 6 Fluxograma do tratamento cirúrgico do câncer de mama inicial.

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Nazário ACP et al.

A B

FIGURA 7 Linfonodo sentinela. (A) Injeção de azul


patente; (B) linfonodo sentinela marcado com azul patente;
(C) excisão do linfonodo sentinela marcado com azul
C
patente.

lar com a radioterapia axilar quando a biópsia do linfo- timento axilar não é intenso (1 a 3 linfonodos comprome-
nodo sentinela era positiva e não observou diferença na tidos), há a tendência de se indicar a radioterapia adjuvante
sobrevida em ambos os braços do ensaio. após a mastectomia. Por fim, a radioterapia pode ser indi-
Na quadrantectomia ou ressecção segmentar mamá- cada nas metástases ósseas, particularmente quando há dor
ria, a radioterapia está formalmente indicada para evitar a ou risco de fratura patológica, e nas metástases cerebrais.
recidiva local no restante da glândula. Irradia-se a mama Entre os principais fatores prognósticos do câncer de
na dose de 5000 cGy (fracionada em 200 cGy/dia) e, depois, mama, destacam-se: tamanho do tumor, comprometi-
aplica-se reforço no leito cirúrgico de 1000 cGy (fraciona- mento axilar, tipo histológico, grau histológico, recepto-
da em 200 cGy/dia). Quando não é realizada, a recidiva lo- res hormonais e c-erb B2.
cal é extremamente elevada, na ordem de 30% (versus 8% O tamanho do tumor está diretamente relacionado ao
com radioterapia). Alguns protocolos vêm sendo ensaiados prognóstico e ao comprometimento axilar. Assim, a sobre-
para avaliar a eficácia da radioterapia intraoperatória, apli- vida em cinco anos para carcinomas menores do que 2 cm
cada em dose única. Embora os resultados preliminares se- é de 75% e cai para 16% quando mede mais do que 7 cm.
jam promissores, não há ainda dados de seguimento em Por outro lado, quando o tumor mede menos que 5 cm, o
longo prazo para determinar a real eficácia e segurança ra- comprometimento axilar ocorre em 3% dos casos; já quan-
diobiológica. Em relação à radioterapia hipofracionada, isto do é maior que 1,5 cm, é de 35%. O comprometimento axi-
é, quando doses maiores são aplicadas em intervalo menor, lar desempenha importante papel prognóstico. Quando
estudos randomizados e metanálises demonstraram ser op- há acometimento de 1 a 3 linfonodos, a sobrevida em dez
ção segura e eficaz no câncer de mama inicial. anos é de 31 a 54%; já quando mais de quatro linfonodos
Nos tumores maiores que 5 cm ou quando há mais de contêm metástases, a sobrevida cai para 13%.
quatro linfonodos comprometidos, a radioterapia está tam- O tipo histológico mais comum de carcinoma de
bém indicada após a mastectomia, com o mesmo intuito, mama é o ductal ou invasivo não especial (90% dos casos),
isto é, evitar a recidiva local. Nesse caso, irradia-se a mama seguido do lobular (5 a 8%). Em pequena percentagem
e as cadeias de drenagem linfática (torácica interna e supra- dos casos, identificam-se outros tipos histológicos, de
clavicular). Nos últimos anos, mesmo quando o comprome- melhor prognóstico, como o tubular, o mucinoso ou co-

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Câncer de mama: novidades no diagnóstico e no tratamento

loide, o adenocístico e o papilífero. Os de pior prognós- pia em carcinoma inicial receptor hormonal positivo e sem
tico são o ductal, o indiferenciado, o de células em anel comprometimento axilar, como o oncotype e o mammaprint.
de sinete, o inflamatório e o metaplásico. Quando os escores indicam alto risco de recorrência, está in-
O grau histológico leva em conta a capacidade de dife- dicada a quimioterapia além da endocrinoterapia.
renciação tubular da neoplasia, o grau nuclear e a conta- As principais drogas quimioterápicas utilizadas são a
gem mitótica. Para cada parâmetro, atribui-se uma nota, e ciclosporina, as antraciclinas (adriamicina e epidoxorrubi-
o escore final define se o tumor é bem diferenciado (grau I), cina) e os taxanos (docetaxel e paclitaxel). Quando a ex-
moderadamente diferenciado (grau II) ou pouco diferen- pressão do HER-2 é positiva (c-erb B2 3+ ou FISH+), pre-
ciado (grau III). A sobrevida em cinco anos nos carcinomas coniza-se o tratamento com herceptin (trastuzumabe). As
de grau histológico I é de 81% e nos de grau III, de 34%. drogas quimioterápicas são diversas e vários esquemas são
Tornou-se rotina a avaliação dos receptores hormonais, eficazes no tratamento do câncer de mama. Na doença ini-
para auxiliar na estimativa do prognóstico e na previsão de cial, em particular quando a axila não está comprometida,
resposta à endocrinoterapia. São analisados o receptor de há tendência de se utilizar os esquemas CMF (constituído
estrogênio e de progesterona. Faz parte também da avalia- por ciclofosfamida na dose de 500 mg/m2, metotrexato 70
ção imuno-histoquímica determinar a expressão do c-erb mg/m2 e fluorouracil 500 mg/m2) e AC (ciclofosfamida
B2 (HER-2/NEU). O c-erb B2 é o receptor do fator de cres- 500 mg/m2 e epidoxorrubicina 60 mg/m2). As drogas são
cimento codificado pelo proto-oncogene HER-2, e faz par- administradas por via endovenosa, em um dia, repetindo-
te de um sistema de receptores para fatores de crescimento -se a cada 14 dias, por quatro ciclos. No câncer de mama
superexpressos no câncer de mama, que incluem o HER-1 avançado ou nas pacientes com axila comprometida, op-
(EGFR ou erb B1), o HER-3 (erb B3) e o HER-4 (erb B4). O ta-se pelos esquemas FAC, FEC ou AC. No último caso,
c-erb B2 (HER-2) pode ser avaliado pelo estudo imuno-his- após o término do esquema AC, acrescenta-se o paclitaxel,
toquímico convencional ou pelo Herceptest, testes padro- na dose de 175 mg/m2, por via endovenosa, a cada 14 dias,
nizados para a avaliação da proteína HER-2. Ambos são ex- completando mais quatro ciclos. Alguns ensaios vêm de-
pressos em escores 0, 1+, 2+ e 3+. O HER-2 também pode monstrando a eficácia da associação da gencitabina com
ser detectado pela técnica de FISH, método de hibridização a cisplatina, mas os resultados ainda são preliminares.
molecular in situ que utiliza sondas de DNA marcadas com O trastuzumabe é o anticorpo monoclonal humaniza-
fluoresceína. Embora mais específico, o FISH é de custo do anti-HER-2 e está indicado nas pacientes com câncer de
maior e necessita de microscópio de fluoresceína. Assim, os mama com superexpressão daquele oncogene. A associação
carcinomas de mama são classificados do ponto de vista mo- do trastuzumabe com taxanos aumenta a sobrevida de pa-
lecular em luminais (receptor de estrogênio e/ou progeste- cientes com câncer de mama metastático, e vários estudos
rona positivo), triplo-negativos (receptores de estrogênio e vêm demonstrando sua eficácia também na adjuvância. É
progesterona negativos e HER-2 negativo) e em HER-2 po- administrado a cada três semanas, durante um ano.
sitivo. Os luminais são os de melhor prognóstico. As pacientes com carcinoma de mama com receptores
A quimioterapia está formalmente indicada na doença hormonais positivos devem receber endocrinoterapia. A res-
metastática (quimioterapia paliativa) e na localmente avan- posta é melhor quando ambos os receptores são positivos.
çada (quimioterapia neoadjuvante ou primária). A quimio- O tratamento inicia-se após o término da quimioterapia,
terapia neoadjuvante também é preconizada para reduzir o quando realizada. A principal forma de endocrinoterapia é
volume tumoral e permitir uma cirurgia conservadora, em o uso de tamoxifeno na dose de 20 mg ao dia, por via oral,
casos que inicialmente seriam elegíveis para mastectomia. durante cinco anos; estudo randomizado recente demons-
Na doença inicial, emprega-se a quimioterapia quando trou que o uso de tamoxifeno por dez anos associou-se com
o tumor mede mais que 2 cm (quimioterapia adjuvante) ou menor recorrência e maior sobrevida quando comparado
quando a axila se encontra comprometida. Em tumores en- com o seu uso por cinco anos. O tamoxifeno é um antago-
tre 1 e 2 cm, não há consenso de indicação, mas há tendên- nista competitivo do receptor estrogênico na mama. Sua
cia em indicá-la quando: (a) o carcinoma é pouco diferen- principal contraindicação é o antecedente pessoal de trom-
ciado; (b) os receptores hormonais e o HER-2 são negativos bose venosa profunda. Nos últimos anos, demonstrou-se
(câncer de mama triplo-negativo); (c) quando o HER-2 está que a utilização de inibidores de aromatase de terceira gera-
superexpresso e (d) a faixa etária é menor do que 40 anos. ção na pós-menopausa produz mais benefício na diminui-
Recentemente, foram introduzidos painéis que avaliam ção da taxa de recorrência em relação ao tamoxifeno. Assim,
a expressão de vários genes relacionados com a proliferação os inibidores de aromatase devem ser incluídos em algum
e que auxiliam na decisão de se indicar ou não quimiotera- momento da endocrinoterapia na pós-menopausa.

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Nazário ACP et al.

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