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TEXTO BASE – Aula 5 – Genética Geral e Humana

Disciplina: Genética Geral e Humana


Aula: 5
Oncogenética

PARTE 1 – Oncogenética

Hoje vamos conhecer de que maneira uma célula normal pode dar origem a um
tumor; entender por que o câncer é uma doença genética, mas não necessariamente
hereditária; conhecer alguns tipos de câncer considerados hereditários; e entender a
importância do aconselhamento genético para o acompanhamento do câncer familiar.

Câncer: um problema de saúde pública


A área da medicina que une o tema da oncologia à genética é chamada de
Oncogenética. Seu principal foco é identificar indivíduos que apresentam um
aumento do risco de desenvolver câncer por causa de suas características genéticas e,
assim, auxiliá-los.
Várias doenças podem envolver componentes genéticos no seu desenvolvimento e
não ser hereditárias.
O próprio câncer é uma doença genética, já que resulta de alterações no DNA das
células, mas essas alterações não são necessariamente transmitidas para as próximas
gerações.
O câncer é uma das doenças mais graves e comuns para a medicina e, se não for
tratado, é sempre fatal.
É um processo patológico caracterizado pela proliferação descontrolada das células,
levando ao aparecimento de uma massa, ou um tumor, capaz de invadir tecidos
vizinhos que rodeiam a região de origem.
As mudanças que transformam uma célula normal em uma tumoral são causadas
gradualmente durante o crescimento e a proliferação celular.

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Esses mecanismos são conhecidos como carcinogênese.


A ocorrência de danos ao DNA facilita a multiplicação das células alteradas, além de
modificar as funções delas.
Esses danos, somados à divisão irregular e ao crescimento desordenado, fazem com
que essas células atuem de forma anormal.
Essa massa de tecido anormal pode surgir em diferentes partes do corpo e é chamada
de neoplasia ou tumor.
Você sabe a diferença entre as neoplasias benignas e malignas?
As neoplasias benignas possuem crescimento lento e organizado, com limites bem
nítidos, e são incapazes de invadir tecidos adjacentes.
Já as neoplasias malignas, o câncer, apresentam crescimento descontrolado e a
capacidade de invadir tecidos vizinhos e se disseminar por metástase para outras
regiões do corpo.
É importante ressaltarmos que tumores que não possuem a capacidade de
invasão ou metástase não são cancerosos. Sendo assim, o diagnóstico da presença
de um tumor não significa que o paciente esteja com câncer!
O câncer é um problema de saúde pública com uma incidência cada vez maior no
Brasil e no mundo.
Esse fato pode ser associado à industrialização e à expansão da área urbana, além de
um aumento na exposição a agentes carcinogênicos com potencial mutagênico.
O risco para o desenvolvimento de câncer pode ser encontrado nas condições
ambientais, ser associado às características biológicas do indivíduo ou ser reflexo de
seu estilo de vida e seus hábitos.
O próprio envelhecimento dos seres humanos é apontado como um fator que
aumenta a suscetibilidade às alterações malignas nas células, fazendo com que a taxa
de aparecimento da doença seja maior entre idosos.
Isso é explicado tanto pelo tempo de mudanças que naturalmente ocorrem nas células
quanto pelo fato de que os idosos apresentam maior período de tempo de exposição
a fatores de risco.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, cerca de 40% dos óbitos por câncer
poderiam ser evitados. Assim, a prevenção é indispensável no controle do
desenvolvimento do câncer.

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Essa prevenção engloba um conjunto de parâmetros que, quando seguidos, auxiliam


na redução da exposição a fatores de risco para vários tipos de câncer.
Entre eles está a adoção de um estilo de vida saudável, como alimentação equilibrada,
prática de exercício e o distanciamento de fatores de risco.
Mas quais são as causas das neoplasias?

Figura 1 Causas das neoplasias.

Como causas externas, é possível citar a ação de microrganismos, irradiação e


substâncias químicas.
Por outro lado, como parte das causas internas, podemos mencionar a relação com
condições imunológicas, hormonais e genéticas.
Diante de tudo que vimos, fica evidente a necessidade de participação dos
profissionais de saúde nos programas de educação comunitária, em que sejam
abordados temas sobre a importância dos hábitos saudáveis.
Assim como a prevenção, a detecção precoce também se torna um fator essencial, já
que, quanto antes a doença é identificada, maiores são as chances de cura e resposta
ao tratamento.
Isso é feito, basicamente, por rastreamento e diagnóstico precoce.

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Figura 2 Detecção precoce.

O rastreamento pode ser feito por meio de exames de rotina em uma população-alvo,
sem que esses indivíduos apresentem sinais ou sintomas sugestivos. Ele é aplicado
como estratégia de controle da doença, e, quando aponta resultados positivos, outros
procedimentos são necessários para se chegar ao diagnóstico final.
Já o diagnóstico precoce é uma estratégia de detecção do câncer direcionada a
indivíduos que apresentam sinais e sintomas sugestivos, com objetivo de identificar a
doença no estágio mais inicial possível. Essa estratégia envolve a possibilidade de
aplicação de terapias mais simples, que contribuem para a retenção do estágio em que
a doença se encontra.
Entre os benefícios do rastreamento está o fato de que a descoberta do câncer em
estágios assintomáticos permite a aplicação de tratamentos menos impactantes com
maior probabilidade de sucesso e aumento da sobrevida.
Já no diagnóstico precoce, o objetivo principal é confirmar o diagnóstico o mais
rápido possível, uma vez que já existem sinais ou sintomas.
Entendemos, então, o que é o câncer. Vimos que apenas as neoplasias malignas, que
podem invadir outros tecidos, são consideradas cancerosas. Entendemos também que
o câncer é um problema crescente de saúde pública e que o rastreamento e o
diagnóstico precoce são fundamentais para o seu controle.

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PARTE 2 – Aspectos genéticos e genômicos das neoplasias

Que tipo de alteração genética pode levar ao câncer?


As alterações que ocorrem nos genes que controlam a divisão celular.
O câncer ocorre em razão das mutações que acontecem ao longo da vida de um
indivíduo ou das mutações herdadas de gerações anteriores.
Essas mutações levam a um processo de múltiplas etapas que resulta no surgimento
do tumor. E raramente essas situações envolvem apenas uma única mutação gênica.
Milhões de células sofrem divisões todos os dias no organismo adulto normal. Esse
processo é controlado rigorosamente. E todo esse controle faz com que as células
permaneçam organizadas e estejam presentes onde e quando necessário.
Por outro lado, as células “anormais” apresentam danos ao DNA e a capacidade de
escapar dos mecanismos de controle, dando origem à proliferação descontrolada da
neoplasia.
Os genes que participam do desenvolvimento de tumores são, principalmente, aqueles
que atuam no controle do ciclo celular, no reparo de DNA e na apoptose nas células.

Figura 3 Genes que participam do desenvolvimento de tumores.

Nesse sentido, existe um subconjunto de genes que se mostram mutados em várias


amostras do mesmo tipo de câncer ou aparecem frequentemente em múltiplos tipos
de câncer.

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Esses genes são considerados “condutores”, pois possuem mutações que


possivelmente provocam o desenvolvimento ou a progressão do câncer.
Ao sofrerem mutações, os genes condutores perdem o controle dos mecanismos
pelos quais são responsáveis, o que favorece o surgimento da doença.
As alterações envolvem principalmente três diferentes categorias de genes: os proto-
oncogenes, os genes supressores de tumor e os genes de reparação do DNA.
Vamos conhecer cada um deles.
Vamos começar pelos proto-oncogenes.
São genes que atuam como reguladores positivos do crescimento e produzem fatores
que levam ao aumento da proliferação celular
Quando mutados, esses genes passam a ser chamados de oncogenes e continuam a
produzir esses fatores de crescimento, porém de maneira excessiva e descontrolada,
favorecendo a formação de tumores.

Figura 4 Proto-oncogenes e oncogenes.

As mutações que envolvem oncogenes são do tipo “ativadoras” e podem ser


originadas por mecanismos como: translocação cromossômica, amplificação gênica,
mutação pontual e inserção retroviral.

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Os produtos que resultam dessa ativação atuam de modo dominante, ou seja, um


único alelo mutado pode ser suficiente para atuar na desregulação do processo
associado.
E os supressores de tumor?

Figura 5 Genes supressores de tumor.

Os supressores de tumor são genes normais encontrados em todas as células, que


produzem inibidores de proliferação.
Eles são necessários para o equilíbrio de crescimento das células.
Mutações nesses genes levam à perda da expressão dos inibidores de proliferação,
fazendo com que as células se proliferem de maneira anormal e desordenada,
formando tumores.
A natureza dessas mutações inativadoras também pode variar desde mutações do tipo
missense, nonsense ou de frameshift até deleções gênicas ou perda de uma parte de um
cromossomo ou mesmo o cromossomo todo.
Ao contrário dos oncogenes, para levar ao aparecimento de neoplasias, a perda da
função dos genes supressores de tumor deve ocorrer em ambos os alelos.
Finalmente, chegamos aos genes de reparo de DNA.

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Figura 6 Genes de reparo de DNA.

Eles codificam para as enzimas de reparo de DNA, que corrigem rapidamente a


grande maioria dos erros no processo de replicação do DNA.
Sendo assim, o desenvolvimento do câncer também pode estar associado à ocorrência
de mutações inativadoras em um dos genes do sistema de reparo de DNA.
Uma célula com menor capacidade de corrigir a sequência complementar da fita de
DNA leva ao evento de sucessivos erros que se acumulam ao longo do tempo e
contribuem para o surgimento do câncer.

Mecanismos epigenéticos no surgimento do câncer


A epigenética é o estudo dos mecanismos de regulação da expressão gênica sem que
ocorram alterações na sequência de DNA.
Atualmente o termo epigenética compreende uma série de mecanismos que incluem
a metilação de DNA, as modificações pós-traducionais de histonas e a atuação de
RNA não codificador.
As alterações epigenéticas podem surgir por influência de vários fatores, como
ambiente, idade e mecanismos associados a determinadas doenças.
É fato que os mecanismos de alterações epigenéticas estão ligados ao surgimento do
câncer.
A metilação do DNA é um fenômeno epigenético que ocorre com frequência e
desempenha um papel importante no surgimento de neoplasias por meio da expressão
de oncogenes e do silenciamento de genes supressores de tumor.

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Existem diversos estudos que provaram a associação desse evento epigenético com o
desenvolvimento tumoral.
Taxas aumentadas de metilação em ilhas de CpG em genes considerados alvos da
progressão tumoral foram identificadas em pacientes com câncer de mama e cólon.
Nesse contexto, a hipermetilação do gene IRX4 leva à diminuição da sua expressão,
afetando a função de outros genes supressores tumorais. Alterações na regulação
desse gene estão associadas ao câncer de pâncreas.
Além disso, estudos realizados com sangue periférico mostraram que a metilação
positiva do gene SOCS3 aumentou de maneira significativa o risco de câncer gástrico.
Outros exemplos de alterações epigenéticas associadas ao câncer incluem o gene
Xist/Krit1 e o câncer de fígado; o gene CDH1 e os cânceres de cabeça e pescoço; e
o gene MINT1 e o câncer colorretal.
Podemos concluir, então, que o câncer evolui, ao longo de diversas linhagens no
interior dos tumores, à medida que eventos mutacionais e epigenéticos ocorrem de
maneira aleatória nas diferentes células.
A perda de controle do crescimento tumoral acontece graças à ativação de oncogenes
que paralisam os mecanismos que conservam a integridade do genoma.
Isso, por sua vez, leva a alterações genéticas que podem ativar novos oncogenes,
resultando em um círculo vicioso que dificulta ainda mais o controle do crescimento.

Alterações cromossômicas das neoplasias


Além de alterações genéticas e epigenéticas, é possível que alterações cromossômicas
ocorram nas células somáticas ao longo da vida e deem origem a neoplasias malignas.
Algumas alterações cromossômicas específicas podem ser apontadas como agentes
indutores da tumorigênese, como ocorre na maioria das leucemias e linfomas.
Nem sempre a ativação de oncogenes acontece por mutações no DNA. Existem casos
em que essa ativação é resultado de uma mutação subcromossômica que ativa o proto-
oncogene.
Assim, translocações cromossômicas podem ativar os oncogenes de forma transitória
ou permanente, resultando em expressão anormal desses genes, que são responsáveis
pela progressão do tumor e pela metástase.

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Um exemplo de translocação cromossômica associada ao câncer é a translocação do


cromossomo 9 e 22, conhecido como Cromossomo Filadélfia.
Essa translocação é responsável pelo desenvolvimento da leucemia mieloide crônica.
Esse cromossomo surge da fusão de parte do oncogene ABL no cromossomo 9 com
o gene BCR localizado no cromossomo 22.
Essa translocação resulta na síntese de uma proteína nova, BCR-ABL, que contém a
atividade da tirosina quinase aumentada codificada pelo gene quimérico, causador da
doença.
Vimos, então, como diferentes mecanismos genéticos podem levar à formação das
neoplasias malignas.
Conhecemos os proto-oncogenes, os supressores de tumor e os genes de reparo de
DNA e como as mutações nesses genes estão envolvidas na formação de tumores.
Por fim, vimos como mecanismos epigenéticos de metilação e alterações
cromossômicas também podem causar câncer.

PARTE 3 – Câncer familial e aconselhamento genético

A maioria das neoplasias está relacionada com interações de aspectos genéticos e


fatores ambientais, mas uma porcentagem dos casos ocorre por alterações genéticas
herdadas.
Isso significa que existe uma maior predisposição ao desenvolvimento da doença por
indivíduos que herdam essas alterações.
Atualmente, estima-se que cerca de 5 a 10% dos casos da doença estejam associados
à predisposição hereditária.
Entre os recursos usados no Brasil e no mundo com o objetivo de avaliar o risco de
câncer, a história familiar se destaca.
Além do baixo custo, ela permite tratamento preventivo e intervenção precoce.
Por meio da coleta e do registro do histórico pessoal e familiar, os profissionais da
área oncológica classificam os indivíduos quanto à possibilidade de apresentar câncer
com caráter hereditário.

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Dessa forma, os indivíduos que apresentam um familiar afetado devem se manter


atentos à possibilidade de a doença ser hereditária, procurando conhecer seu grau de
parentesco com o familiar e a idade de aparecimento da doença no familiar afetado.
A história familiar é importante tanto para o diagnóstico como para a avaliação dos
riscos.
Com base nos conhecimentos sobre herança mendeliana, o geneticista consegue
avaliar o risco que determinado indivíduo apresenta em desenvolver a doença que
acometeu algum parente.
Assim, a avaliação familiar tem como objetivo fornecer ao médico dados que vão ser
convertidos em conhecimento sobre o impacto que a composição gênica do paciente
apresenta à sua saúde.
Para que uma história familiar seja considerada completa, é ideal que ela contenha
alguns elementos essenciais, como: informações de no mínimo três gerações; dados
sobre a idade de cada familiar envolvido; relato de causa das mortes dos falecidos;
etnia dos antepassados; informações sobre saúde, doenças e idade do diagnóstico;
testes genéticos realizados e consanguinidade entre os indivíduos.
A identificação de indivíduos com risco potencial para câncer hereditário é de extrema
importância no controle da doença na população.
Primeiramente porque eles podem apresentar risco cumulativo de anormalidades
genéticas superior à média da população da mesma faixa etária, o que favoreceria o
desenvolvimento de tumores.
Em segundo lugar, é possível orientar e auxiliar os familiares do indivíduo afetado
que podem apresentar riscos da doença, uma vez que os filhos têm 50% de chance de
herdar a mutação por apresentar padrão de herança autossômica dominante.
Terceiro ponto e o mais importante é que identificar os portadores da doença
precocemente permite planejar maneiras de redução do risco, tratamentos adequados
e cirurgias profiláticas.
É importante ressaltar ainda que a alta probabilidade de desenvolver câncer em uma
família nem sempre é associada aos distúrbios genéticos herdados.
Em alguns casos, essas famílias podem apresentar os efeitos ambientais associados
com o aumento da suscetibilidade às variações genéticas. Isso significa que, nesses
casos, as doenças seriam consideradas como de causas multifatoriais.

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Nesse contexto, é importante que sejam relatados aos médicos alguns fatores
ambientais, como dieta e comportamento, já que membros da mesma família podem
compartilhar esses fatores.
É importante enfatizar o fato de que existem poucos centros assistenciais, públicos
ou privados, que priorizam diagnosticar câncer hereditário no Brasil.
O termo Síndrome de Câncer Hereditário é usado para se referir a disfunções
genéticas em que as alterações benignas ou malignas acometem indivíduos de uma
mesma família, seguindo os padrões mendelianos de dominância dos genes.
Atualmente, já foram descritos em torno de cinquenta tipos de síndromes hereditárias.
Mas quando uma pessoa deve procurar o aconselhamento genético?
Não seria possível avaliar o risco de desenvolvimento do câncer em toda a população
por meio do sequenciamento em razão do custo dos procedimentos. Além disso, a
alteração de um gene isolado não indica a presença da doença.
Por isso, é ideal que a solicitação de testes genéticos ocorra após a realização de
estudos familiares e história de câncer na família.
Existem alguns critérios em que os indivíduos devem se encaixar para serem
considerados candidatos à investigação quanto ao risco de desenvolver a Síndrome
de Câncer Hereditário. São eles:

• Ter dois ou mais parentes de primeiro grau com diagnóstico de câncer.


• Ter um indivíduo da família com diagnóstico de câncer em uma idade inferior
a 50 anos.
• Possuir diagnóstico do mesmo tipo de câncer em mais de um parente na
família.
• Possuir um ou mais membros da família com diagnóstico de câncer
considerado muito raro.
Grande parte das pessoas não conhece os fatores de risco ao desenvolvimento do
câncer nem as oportunidades e os recursos que já existem para tomar medidas
preventivas.
Dessa forma, o acompanhamento periódico, com atuação na avaliação das
características clínicas e perfil de risco dos pacientes, tem se tornado um serviço
essencial para permitir que estratégias da oncogenética sejam aplicadas.
Uma parte fundamental da avaliação dos pacientes com risco de desenvolver as
síndromes de predisposição hereditária ao câncer é o aconselhamento genético.

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O aconselhamento genético é um recurso comunicativo usado por profissionais


treinados que lidam com os problemas de indivíduos em relação à presença, ou ao
risco de recorrência, de doenças genéticas familiares.
Segundo Resta e colaboradores, esse processo tem como objetivo ajudar as pessoas e
seus familiares a compreender a situação diagnóstica com suas implicações
terapêuticas, assim como incorporar tais informações à valores pessoais, espirituais e
religiosos.
Assim, o principal foco do aconselhamento genético está na identificação precoce da
doença em indivíduos assintomáticos.
A primeira etapa do aconselhamento genético é a realização de uma consulta com
profissionais que atuam no estudo do histórico do paciente para efetuar uma coleta
de informações.
Nela será criado um heredograma das gerações com os relatos fornecidos. Caso os
profissionais julguem necessário, a indicação de exames mais específicos pode ser
solicitada ao indivíduo para confirmar ou rejeitar o diagnóstico.

Figura 7 Aconselhamento genético.

É importante que ocorra a revelação dos resultados junto com a interpretação do


teste, seguidas pela explicação do significado dos pontos apresentados, das limitações
e dos impactos psicológicos em relação ao indivíduo.
Nesse contexto, o indivíduo deve ser estimulado a comunicar os familiares sobre os
resultados, incluindo os riscos associados ao desenvolvimento do câncer hereditário.

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Após a confirmação diagnóstica, os profissionais de aconselhamento genético vão dar


suporte ao paciente diante dos seguintes aspectos:

• Estimativa de risco: aqui, os riscos reais associados ao desenvolvimento do


câncer são definidos, incluindo as chances de transmitir para as próximas
gerações e os riscos reprodutivos.
• Transmissão da informação: nesse momento, existe uma conversa com o
paciente para passar as informações relevantes diante da possível evolução da
doença, assim como condutas a serem tomadas para amenizar ou reduzir os
riscos associados.
• Avaliação psicológica: ela deve ocorrer em diferentes momentos e levar em
consideração o emocional afetado diante do histórico e os fatos.
• Suporte e seguimento: é uma orientação quanto a possíveis suportes da
evolução da doença, como o encaminhamento para grupos de pacientes e
planejamentos de acompanhamento profissional e psicossocial.
Conhecemos, então, o aconselhamento genético.
Vimos que algumas neoplasias malignas podem estar ligadas a fatores hereditários e
que o aconselhamento genético é uma ferramenta essencial para tratar desses casos.
Conhecemos os critérios para definir quais indivíduos devem ser alvo dessa prática e
as diferentes etapas do aconselhamento.

PARTE 4 – Métodos laboratoriais

Além do levantamento do histórico familiar e do aconselhamento genético, a


aplicação de testes moleculares é uma ferramenta essencial para identificar pessoas
com risco elevado de desenvolver o câncer.
Vamos conhecer um pouco mais sobre eles?
A execução do diagnóstico precoce de neoplasias de origem genética é amparada por
recursos tecnológicos e passa por constantes modificações.
Com base nos dados coletados após a consulta, os especialistas avaliam alguns
aspectos para solicitar exames mais específicos.
Entre esses aspectos são levados em consideração os riscos, os benefícios e as
limitações associadas ao indivíduo.

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Isso é essencial para que ocorra a realização do teste mais apropriado, bem como o
direcionamento para as possíveis implicações de seu resultado.
Um dos principais pontos negativos relacionados ao diagnóstico molecular para a
identificação das alterações nos genes com relação às doenças de estudo está
associado à metodologia aplicada.
Os métodos que fornecem as informações importantes para a orientação dos
indivíduos requerem alta infraestrutura de equipamentos, materiais de alto custo e
profissionais especializados.
Por esses motivos, os testes não são encontrados em muitos locais de saúde ou
laboratórios, o que dificulta o acesso dos indivíduos com menos recursos financeiros.
No entanto, as técnicas de sequenciamento de nova geração estão permitindo a
diminuição dos custos e do tempo de realização dos procedimentos, para garantir o
maior acesso ao diagnóstico pela população.
Grandes avanços têm marcado a trajetória das análises e dos diagnósticos moleculares,
e a detecção de mutações no DNA se tornou um padrão para o rastreio de muitas
doenças hereditárias, incluindo alguns tipos de câncer.
Mas as diferentes metodologias não permitem a detecção de todos os tipos de
mutação.
As mutações que acometem a maior parte das neoplasias malignas não obedecem a
um padrão simples.
Raramente existe uma única mutação associada ao câncer. Na maioria dos casos,
dezenas de alterações genéticas podem estar ocorrendo para que um indivíduo
desenvolva a doença.
Os testes genéticos geralmente são aplicados em casos de indivíduos que já têm a
doença ou em casos de grande suspeita.
Quando uma mutação é detectada, o processo de identificação dos possíveis
familiares portadores é facilitado.
Para isso, basta realizar o sequenciamento da região do gene específico onde a
alteração foi encontrada anteriormente.

Avaliação de sequências gênicas por sequenciamento de DNA


Um dos testes mais utilizados é o sequenciamento do DNA.

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Essa técnica é considerada essencial na investigação de mutações descritas em genes


associados ao câncer hereditário, já que essas mutações estão relacionadas com a
substituição de nucleotídeos, pequenas deleções e inserções.
O método se fundamenta na determinação de cada uma das bases nitrogenadas dos
genes-alvo da pesquisa para identificar mutações pontuais, seguindo padrões
mendelianos das doenças hereditárias.
Outras metodologias de triagem das diferentes regiões dos genes-alvo de estudo
também podem ser aplicadas, mas todas elas exigem a aplicação do PCR direcionado
para as áreas gênicas codificadoras de proteínas.
O PCR permite produzir milhares de cópias de DNA a partir da amostra coletada,
por meio de sucessivas reações de amplificação.
As análises dos testes genéticos empregados na identificação de mutações pontuais,
pequenas inserções ou deleções envolvem normalmente as seguintes etapas:

• Isolamento de DNA: para isso, inicialmente é realizada a coleta de sangue


periférico, em um volume de 5 a 10 mililitros, o suficiente para fornecer em
torno de 200 a 500 microgramas de DNA para a análise. Esse material passa
por um protocolo para extração de DNA genômico, em que podem ser usadas
diferentes metodologias, como fenol e clorofórmio, ou por precipitação de
proteínas em condições de alta salinidade.
• Amplificação do DNA: é realizada pelo PCR com o objetivo de fornecer várias
cópias de determinada região do gene de interesse. Para isso, é feita a adição
dos reagentes, como a enzima taq polimerase e um conjunto de
oligonucleotídeos iniciadores chamados de primer. Lembrando que a maioria
dos primers relacionados aos genes dos tumores hereditários já existem e são
vendidos comercialmente.
• Sequenciamento do DNA: a partir da fita de DNA amplificada, é possível
observar a sequência exata de nucleotídeos que ocorre dentro da molécula pelo
sequenciamento de DNA. Essa técnica basicamente consiste na revelação da
sequência de nucleotídeos registrados por detectores que resulta no
aparecimento de picos em diferentes intensidades de fluorescência. A
sequência de DNA existente na amostra é lida, então, a partir dos picos em
um cromatograma.
• Interpretação dos resultados: a interpretação dos picos fornecidos pelo
eletroferograma pode apontar a ocorrência de uma mutação, como quando

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existe na sequência sobreposição de picos para diferentes nucleotídeos em


determinada posição.

Outros métodos de triagem


Além do sequenciamento de DNA, existem outros métodos de análise de possíveis
alterações associadas ao câncer hereditário?
A resposta é sim! Alguns métodos utilizam a eletroforese em gel de acrilamida e a
identificação associada à capacidade migratória das amostras aplicadas, como o
método de polimorfismos de conformação de fita simples de DNA, a eletroforese em
gel com gradiente de desnaturação e a análise de mobilidade de heteroduplexes de
DNA.
Conhecemos, então, o passo a passo do sequenciamento de DNA, o principal método
laboratorial para detecção de cânceres hereditários.
Também vimos que existem outros métodos, mas que não apresentam a mesma
sensibilidade de sequenciamento, o que dificulta a pesquisa por mutações existentes.

PARTE 5 – Síndromes de predisposição hereditária ao câncer

A Síndrome de Câncer Hereditário prevalece em indivíduos de uma mesma família


em que alterações dos genes associados seguem um padrão de herança mendeliano
altamente definido, geralmente do tipo autossômico dominante.
Isso significa que há 50% de chance de serem transmitidos para os descendentes, a
cada gestação que ocorrer, sem depender do sexo do filho.
Além disso, o indivíduo portador da mutação possui grandes riscos de desenvolver
ao longo de sua vida as lesões correlacionadas ao câncer hereditário, fenômeno
conhecido como taxa de penetrância alta.
Os portadores da síndrome que desenvolvem o câncer normalmente são jovens e
apresentam os sintomas associados à doença cerca de 10 anos antes da idade
considerada média na população em geral, e são diagnosticados com o mesmo tipo
de tumor.
A primeira caracterização dessa síndrome ocorreu no início do século 20.
Nela foi relatada a história de uma família que, por 4 gerações, foi acometida por
diversos casos de câncer em diferentes órgãos, incluindo cólon, útero e estômago.

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Após aproximadamente 50 anos desse achado, um médico chamado Henry Lynch


identificou a presença de câncer familiar do sistema digestivo.
O agrupamento de descobertas envolvendo o desenvolvimento tumoral na mesma
família o motivou a investigar a ocorrência associada aos fatos.
A identificação dessa Síndrome de Câncer Hereditário fez com que a doença, a
Síndrome de Lynch, carregasse o seu nome até hoje.
Em torno de cinquenta tipos de síndrome de predisposição hereditária ao câncer já
foram reconhecidos ao longo de anos de estudo e definidos quanto às suas
características.
Vamos conhecer os principais.

Síndrome de Lynch
Começando pela Síndrome de Lynch.
Ela está associada, principalmente, ao aumento do risco de desenvolvimento do
câncer colorretal, além de outras neoplasias que são comumente encontradas nos
grupos familiares que apresentam indivíduos com essa doença.
Essa síndrome ocorre em razão de mutações que exercem a inativação de genes do
sistema de reparo de DNA.
Modificações nesse sistema geram um acúmulo de mutações somáticas por inserção
e deleção de genes.
Como exemplos essenciais de genes dentro dessa categoria é possível citar os genes
MLH1, MSH2, MSH6 e PMS2, mas quase 90% das mutações encontradas em
indivíduos com a síndrome ocorrem nos genes MLH1 e MSH2.
Estudos afirmam que indivíduos que carregam as mutações nos genes MLH1 e MSH2
em seu genoma apresentam maiores riscos de desenvolver câncer em idade precoce
em relação à média populacional, entre 40 e 50 anos de idade.
Já indivíduos que carregam mutações no gene MSH6 apresentam uma tendência a
desenvolver câncer colorretal em idade mais avançada, entre 50 e 65 anos.
O tratamento de pacientes com câncer colorretal e Síndrome de Lynch é diferente do
que é realizado em pacientes com câncer colorretal esporádico, ou seja, não
hereditário.

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Isso porque indivíduos com predisposição genética para a doença possuem maiores
chances de desenvolver outros tipos de lesão ou novos tumores.

Cânceres de mama e ovário hereditários


Agora vamos falar dos cânceres de mama e de ovário hereditários.
Estudos apontam que de 5 a 10% das ocorrências de câncer de mama e ovário estão
associadas com a presença de mutações germinativas dos genes autossômicos
dominantes de alta penetrância. Entre eles, de 60 a 80% das mutações acometem os
genes BRCA1 e BRCA2.
BRCA1 e BRCA2 são genes que expressam proteínas supressoras de tumor que atuam
no mecanismo de reparo de DNA.
Entre 55 e 65% das mulheres com mutações no gene BRCA1, e 45% com BRCA2
mutado vão desenvolver câncer de mama até a idade de 70 anos.
Além de estarem associados à causa dos cânceres de mama e ovário, os genes citados
também são apontados como causadores de outros tipos de neoplasias malignas,
como o câncer de endométrio e de próstata.
O exame genético para detectar essas mutações deve ser indicado após uma avaliação
feita com base no histórico familiar e deve conter os seguintes aspectos:

• existência de pelo menos três parentes próximos que desenvolveram o câncer


de mama ou ovário;
• existência de dois indivíduos portadores das doenças com idade inferior aos
50 anos, sendo do mesmo lado da família;
• existência de indivíduos que desenvolveram a doença com idade abaixo de 40
anos, com parentesco de primeiro ou segundo grau;
• existência de dois ou mais parentes com mutação nos genes BRCA1 e BRCA2
que desenvolveram câncer.
O rastreamento para detecção precoce do câncer de mama é uma estratégia já aplicada
para a população em geral, com a realização do autoexame e o teste de mamografia
com periodicidade anual para as mulheres a partir dos 40 anos.
No entanto, a pesquisa por mutações nos genes BRCA1 e BRCA2 é considerada um
procedimento complexo e de alto custo.

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TEXTO BASE – Aula 5 – Genética Geral e Humana

A confirmação da existência do câncer de mama hereditário pelo diagnóstico


molecular leva a equipe médica a solicitar o acompanhamento da paciente e dos
familiares que apresentam os riscos.
Após a confirmação diagnóstica sobre as mutações associadas, a mastectomia bilateral
é considerada o método mais eficaz para reduzir os riscos de desenvolver o câncer de
mama.
O procedimento é irreversível e consiste na remoção do tecido mamário de ambos os
seios com o objetivo de reduzir o risco de contrair a doença futuramente.

Polipose adenomatosa familiar do cólon


Por último, vamos ver a polipose adenomatosa familiar do cólon.
Ela é uma síndrome com predisposição hereditária com herança autossômica
dominante e penetrância de aproximadamente 100%.
A característica que predomina no desenvolvimento desse tipo de câncer é o
aparecimento de pólipos adenomatosos no cólon ou no reto do indivíduo portador
da doença.
O surgimento da polipose é relacionado com mutações no gene APC, um supressor
de tumor.
As mutações nesse gene interferem nos mecanismos associados ao controle do ciclo
celular.
Os indivíduos portadores dessa doença apresentam maior risco de desenvolver câncer
colorretal, assim como adenocarcinoma de duodeno e região periampular e
adenocarcinoma de estômago.
Uma média de 70% a 80% dos indivíduos portadores da doença apresenta história
familiar compatível com herança autossômica dominante.
No entanto, de 20 a 30% dos casos da doença que não são hereditários, há o risco de
transmitir a mutação para as gerações futuras.
Existem algumas atitudes relacionadas à prevenção desse tipo de câncer que podem
reduzir os riscos associados, como ingerir alimentos ricos em fibras vegetais, restringir
a ingestão de gorduras animais, praticar exercícios regularmente e manter hábitos
saudáveis em geral.

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TEXTO BASE – Aula 5 – Genética Geral e Humana

A colectomia, procedimento que envolve a retirada do cólon do paciente, pode ser


indicada como medida profilática ao indivíduo portador.
No entanto, mesmo após a cirurgia, os pacientes permanecem com risco aumentado
de desenvolver outros tipos de tumor. Por esse motivo, devem ser submetidos a
avaliações periódicas, com foco no trato gastrointestinal superior.
Aprendemos, então, o que é a Síndrome de Câncer Hereditário e conhecemos três
das principais formas da doença: a Síndrome de Lynch, os cânceres de mama e de
ovário hereditários e a polipose adenomatosa familiar do cólon.

REFERÊNCIAS

ADOBE STOCK. Disponível em: https://stock.adobe.com/br/. Acesso em: 15


set. 2021.

ENVATO. Disponível em: https://elements.envato.com/pt-br/. Acesso em: 2 set.


2021.

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