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RODRIGO SÁVIO DE ANDRADE BEZERRA

Mestre Solon
e o Mamulengo
Invenção Brasileira

CARPINA-PE, 2021
Copyright © 2021 by Rodrigo Sávio

Direitos reservados ao autor

Pesquisa: Rodrigo Sávio

Digitação, diagramação e tratamento de imagens: Rodrigo Sávio

Transcrição audiovisual de peças e entrevista: Rodrigo Sávio

Capa: Rodrigo Sávio

Revisão textual: Maria José de Barros

Fotos da capa: Acervo da família do mestre Solon

Carpina-PE, 2021
Em homenagem aos 100 anos de
Mestre Solon (1920 – 2020)
AGRADECIMENTOS

A Deus,

A Raiane Vanessa,

A Maria José de Barros,

A Yale Rayane Silveira da Silva,

A Mariana Pinto Peixoto,

A Luciano Borges, diretor do Museu do Mamulengo,


de Olinda-PE,

A Giselle Santa Cruz,

A Marly e Rayanne Sarandão, filha e bisneta de Mestre


Solon, respectivamente,

A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a


realização deste trabalho.
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO 11

1. QUEM FOI MESTRE SOLON? 15

2. COMO TUDO COMEÇOU 25

3. AS PRIMEIRAS APRESENTAÇÕES 31

4. EVENTOS E HOMENAGENS 35

5. “INVENÇÃO BRASILEIRA”: Um mamulengo


está na praça sob inspiração das estrelas 39

6. MESTRE SOLON: um brasileiro alegre 45

7. CENTRO CULTURAL MESTRE SOLON 51

8. DOAÇÃO DO ACERVO DE SOLON PARA O


MUSEU DO MAMULENGO, EM OLINDA 55

9. ENTREVISTAS 61

10. A CENA DOS CANGACEIROS 75


11. A PASSAGEM DE SIMÃO E SUA MÃE 81

12. A PASSAGEM DE SIMÃO E O PATRÃO 89

REFERÊNCIAS 101
Rodrigo Sávio

APRESENTAÇÃO

Mamulengo é o nome dado em Pernambuco ao tea-


tro popular de bonecos praticado no Nordeste brasileiro.
Este mesmo termo também é muito utilizado nos estados
do Centro-Sul do país. Contudo, em outras regiões, tam-
bém é chamado de João Redondo (Rio Grande do Norte),
Babau (Paraíba) e Cassimiro Coco (Ceará e algumas re-
giões do Piauí e do Maranhão).
O espetáculo consiste na representação de histórias
através de bonecos, em um pequeno palco (popularmente
chamado de “barraca”, “impanada”, “torda” ou “tenda”),
geralmente feito com madeira e tecido, dentro do qual fi-
cam as pessoas que dão vida aos personagens.
Segundo Santos (1979), os mamulengos, de um
modo geral, podem ser divididos em dois grandes grupos:
os mamulengos de luva (com cabeças e mãos esculpidas em
madeira, vestidos com túnica de pano, cujo movimento é
produzido pela mão, colocando o dedo indicador na cabe-
ça e o polegar e o médio nos braços) e os mamulengos de va-
reta (geralmente configurados de corpo inteiro, mostrando
braços, tronco e pernas, sendo esses bonecos produzidos
em madeira ou outro material, cuja articulação e movimen-
tação são feitas por meio de varetas).
De acordo com Borba Filho (1966), é impossível

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

indicar quando ocorreram as primeiras manifestações do


teatro de bonecos no Brasil, visto a ausência de documen-
tação a esse respeito. Diante dessa situação, o que nos resta
é apenas supor que os bonecos vieram acompanhados dos
primeiros exploradores, uma vez que, na época da coloni-
zação do Brasil, a Europa vivia o auge do teatro de mario-
netes.
Contudo, ainda conforme Borba Filho, é apenas no
século XVIII, que se tem a primeira notícia sobre a prática
do teatro de bonecos em nosso país, cuja informação é tra-
zida por Luiz Edmundo, em sua obra O Rio de Janeiro no
tempo dos vice-reis (1932).
Com relação à entrada do teatro de bonecos no Bra-
sil, supõe-se que ela tenha ocorrido sob a forma de Presé-
pio, representando o nascimento de Jesus Cristo. Esse era
um espetáculo muito utilizado pela Igreja Católica na Ida-
de Média, o qual se utilizava das marionetes para difundir
o espírito religioso e para atrair a atenção dos fiéis de um
modo mais direto e objetivo.
Sendo assim, o teatro de bonecos, que inicialmente
partiu da representação do nascimento de Cristo, passou,
posteriormente, a representar cenas da Bíblia, culminando
por incluir em seus espetáculos os fatos do dia a dia.
Quanto à origem do nome mamulengo, esta é
controversa, mas segundo uma das versões existentes,
acredita-se que tal nomenclatura se originou de mão molen-
ga (mão mole), ideal para dar vida ao fantoche.

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Rodrigo Sávio

Em 2015, o Mamulengo foi reconhecido pelo Insti-


tuto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN,
como Patrimônio Cultural do Brasil.
Em relação a Pernambuco, Borba Filho (1966) afir-
ma que este é o único estado onde se pode acompanhar
com mais precisão a história do desenvolvimento do teatro
de bonecos no Brasil. Nele, surgiram vários mamulenguei-
ros famosos, a exemplo do mestre Solon de Carpina, que é
tema deste trabalho.
Sendo assim, este livro objetiva falar um pouco
sobre este importante mamulengueiro pernambucano,
buscando trazer para os leitores: informações biográficas,
relatos, reportagens de época, fotografias, entrevistas e
transcrições de peças de Solon.
Por conseguinte, com a finalidade de compartilhar
conhecimento, reunindo em um único documento, diver-
sos dados e matérias sobre Solon e o Mamulengo Inven-
ção Brasileira, este trabalho procura ser mais uma fonte
de pesquisa para quem busca informações sobre este tema
cultural.

Rodrigo Sávio
Graduando do curso de Bacharelado em História pela Uni-
versidade Federal de Pernambuco – UFPE

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Rodrigo Sávio

QUEM FOI MESTRE SOLON?

Solon Alves de Mendonça, mais conhecido como


Mestre Solon, foi um dos mais importantes representantes
da arte do mamulengo em nosso país.
Filho de Avelino Alves de Mendonça e Francisca
Maria dos Prazeres, nasceu no dia 25 de fevereiro de 1920,
na localidade denominada Cachoeira do Salobro, no atual
município de Feira Nova.
Aprendeu a ler em uma escola pública, tendo fre-
quentado-a entre os anos de 1930 e 1934. Em suas memó-
rias, ele relembra que, para ir ao estabelecimento de ensi-
no, precisava viajar 8 km de ida e 8 km de volta, todos os
dias. Da escola, “só não gostava quando ficava de joelho,
quando levava uma reguada nas costas ou um bolo de pal-
matória”1.
Sua relação com os bonecos começou quando tinha
apenas 8 anos, ao assistir pela primeira vez, em Carpina,
uma apresentação do Mamulengo de Chico Presepeiro,
também conhecido como Chico da Guia, ficando fascinado
com aquela brincadeira de bonecos.

1 Revista Suplemento Cultural, edição de agosto de 1996, pág. 19.

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

No ano de 1937, também em Carpina, criou o Ma-


mulengo Invenção Brasileira, apresentando-se tanto nesse
município, quanto em outras localidades do estado. Con-
tudo, com o aparecimento de novos meios de entreteni-
mento, a exemplo do rádio e da televisão, o mamulengo
começou a sofrer sérias crises.
Durante esse período, o mestre deixou um pouco
de lado o seu mamulengo, passando a fazer parte de uma
companhia de teatro, obtendo êxito nos papéis que repre-
sentava. Posteriormente, fundou uma sociedade recreati-
va, montou um caboclinho, um cavalo-marinho, chegando
até a ser Velho de pastoril e palhaço de circo.
Em Carpina, no dia 23 de julho de 1966, fundou,
juntamente com outras pessoas, a Escola de Samba Estu-
dantes de Santo Antônio, cuja primeira diretoria ficou as-
sim constituída:
Presidente: Solon Alves de Mendonça
Vice-presidente: João Antônio da Silva
1ª Secretária: Marly Sarandão (filha de Solon)
2ª Secretária: Dolores Hermínio da Silva
1º Tesoureiro: José Dionízio Rodrigues
2º Tesoureiro: Manoel Joaquim da Silva
Diretor do Patrimônio: João Dionízio Rodrigues
Padrinho: Manoel Joaquim da Silva
Compositor: Josué Horácio da Silva
Presidente de Honra: Manoel Dionízio Rodrigues

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Rodrigo Sávio

Inicialmente, a agremiação carnavalesca funciona-


va em sua residência, localizada à Rua Antônio Bezerra de
Menezes, nº 164, no Bairro Santo Antônio, mas em seguida,
transferiu-se para o nº 180.

Mestre Solon, caracterizado de “caboclinho”, no desfile da Escola de Samba Estu-


dantes de Santo Antônio (E.S.E.S.A.), em 1969.

Foto: Acervo da família

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Na década de 1970, o brincante criou a escola de


samba infantil Nova Geração com mais de 20 integrantes.
Segundo Marinho (2006), todos os instrumentos da bateria,
exceto a frigideira, eram em madeira, confeccionados por
ele. Durante três anos, as crianças desfilaram pelas ruas de
Carpina, nas manhãs de carnaval.
Depois de participar de todas essas atividades e se
enriquecer cada vez mais culturalmente, Mestre Solon re-
solveu reativar seu mamulengo, uma vez que essa mani-
festação folclórica voltou a ser valorizada – desta vez pelos
turistas e pelos órgãos governamentais. Dessa forma, ne-
cessitando de mais tempo para se dedicar ao Invenção Bra-
sileira, Solon não pôde mais administrar a escola de samba
infantil, vindo essa a extinguir-se.
De volta à ativa, ele fez apresentações e participou
de eventos em várias partes do estado de Pernambuco e
também do país, além de receber homenagens e reconheci-
mento por seu trabalho.
Com o tempo, o mestre passou a ser conhecido não
somente no cenário nacional, mas também no exterior.
Seus bonecos são encontrados em vários países, entre eles
Portugal e China, e muitos de seus mamulengos já foram
expostos em Atlanta, nos Estados Unidos (MARINHO,
2006).
Além disso, vale ressaltar que ele criava os próprios
bonecos e as histórias que animavam suas apresentações.
Ao longo dos anos, confeccionou 120 personagens diferen-

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Rodrigo Sávio

tes para as suas 25 histórias. É importante destacar também


que a sua companheira, Maria Dolores, era a responsável
por costurar as roupas dos bonecos.
Em suas apresentações, levava alegria por onde
passava. Além da brincadeira, suas histórias também tra-
ziam críticas sociais, denunciando as injustiças sofridas pe-
las pessoas.
Solon destacou-se também pela produção de bone-
cos movidos mecanicamente, na qual, através de tal méto-
do, procurava reproduzir cenas que faziam parte da reali-
dade nordestina, como era o caso das casas de farinha, dos
grupos de cangaceiros, entre outras.
Quanto à estrutura funcional do Invenção Brasilei-
ra, Santos (1979) ressalta que, no final da década de 1970,
Solon conservava em seus espetáculos, o número de qua-
tro instrumenteiros (nome dado aos integrantes do mamu-
lengo responsáveis pela execução das músicas que eram
tocadas nas apresentações).
Estes eram formados pelo sanfoneiro, que também
interpretava o Mateus (personagem que tem a função de in-
termediário entre os bonecos e o público), pelo triangueiro
(tocador de triângulo), pelo bombeiro (tocador de bombo,
de zabumba) e pelo pandeirista (tocador de pandeiro).
Segundo Santos (1979):
No espetáculo [do Mamulengo Inven-
ção Brasileira], os instrumenteiros se
colocam em frente à tenda, que é uma

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

barraca feita em lona e morim, do tipo


mais encontrado no litoral. Ela tem de
um metro e quarenta a um e sessen-
ta centímetros de largura, por dois e
meio de altura, a profundidade não
indo além de um metro e meio, onde
um telão pintado com motivos figura-
tivos completa a parte de baixo da fa-
chada (SANTOS, 1979, p. 116).

Torda do Mamulengo Invenção Brasileira

Fonte: Documentário Brinquedo Popular do Nordeste, 1977

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Rodrigo Sávio

Mestre Solon morreu no dia 07 de julho de 1987,


vítima de atropelamento em Brasília, quando participava
da Feira dos Estados, a convite da Cruzada de Ação Social
de Pernambuco.
Diante da morte desse grande artista, representan-
tes da cultura manifestaram-se sobre o fato:

Tudo o que se fizer para divulgar a


importância de Solon, na cultura per-
nambucana, é importante. O folclore
será eternamente agradecido pela con-
tribuição dele recebida. O seu desapa-
recimento enfraquece muito o alicerce
do folclore que é a raiz e o espírito de
um povo - Mário Souto Maior, folclo-
rista.

Reconhecer a importância do mamu-


lengueiro Mestre Solon de Carpina é
relevar todas as vidas de luta e perse-
verança do artista popular pernambu-
cano e nordestino que, a exemplo des-
te criador vem, com uma resistência
imbatível, preservando as nossas mais
autênticas manifestações culturais, na
solidão e no desamparo de suas ofici-
nas, suas tendas, seus palcos, praças e
pontas de rua - Jaci Bezerra, poeta e
presidente da FUNDARPE.

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Pernambuco perdeu, com a morte do


Mestre Solon, um de seus maiores e
mais dignos representantes da cultura
popular. Pessoas como o Mestre Solon
não podem morrer completamente
como desejava um dos nossos poetas.
Prefiro acreditar, como Guimarães
Rosa, que “as pessoas não morrem;
ficam encantadas”. Ele encantou-se e
continuará nos encantando através da
vida que viveu e da arte onde foi um
de seus expoentes neste Estado - Ma-
ximiano Campos, Secretário de Turis-
mo, Cultura e Esportes do Governo
do Estado.

Mestre Solon é um dos maiores sím-


bolos da resistência da cultura po-
pular. Dele ficará gravada na nossa
memória, eternamente, a imagem de
um artista que, além de ator, mamu-
lengueiro e artesão, teve a coerência
de vida muito fiel ao verdadeiro es-
pírito da alma criativa do nosso povo
- Leda Alves, diretora-executiva da
Fundação de Cultura da Cidade do
Recife.

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Rodrigo Sávio

Mesmo passados mais de trinta anos de sua partida,


a memória de Solon ainda perdura nos dias atuais, através
de seu importante legado cultural. Além de ser uma refe-
rência do mamulengo em nosso país, ele foi responsável
por elevar o nome da cidade onde morava, Carpina-PE, no
cenário estadual e nacional e inspirar novos artistas a se-
guirem nesse gênero da cultura brasileira.

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Rodrigo Sávio

COMO TUDO COMEÇOU

Neste e no próximo capítulo, será o próprio Solon


quem nos contará sua história. O texto2 a seguir traz uma
narrativa a respeito da primeira vez em que o mestre assis-
tiu a uma apresentação de mamulengo, fato este ocorrido
no ano de 1928:

Meu pai negociava, [era] ambulante, para manter as res-


ponsabilidades que a ele competia. Sobre as costas de um animal,
todas as vezes que se aproximava de casa, dava um estalo de relho
para avisar que ia chegando.
Eu, com 8 anos de idade, ele chegou um belo dia de sába-
do e disse: “Vá dormir para à noite a gente ir ao presépio de Chico
da Guia, na casa de Zé Giroime, na Ribeira” (o nome do bairro
aonde ele tinha o armazém, que ele era credenciado). Eu procu-
rei dormir, sem ter sono, preocupado com o convite porque era
uma das primeiras diversões que ia assistir. O leitor pode chegar
a conclusão de como era esse tempo. Ninguém reclamava nada,

2 O texto deste capítulo é um trecho do livro “Um Brasileiro Feliz”, de


autoria de Solon e que não chegou a ser editado, o qual foi reproduzido
na revista Suplemento Cultural, edição de agosto de 1996, pp. 19 e 20 e
também no site: https://sites.google.com/a/mamulengo.org/mamu-
lengo-presepada.

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

tudo estava bom e, também, não tinha a quem reclamar. Meu pai
falava com meu tio em Artur Bernardo e Washington Luiz. Ao
anoitecer, se preparou a turma e seguimos para a diversão.
De frente, uma barraca, toda rodeada de pano, coberta de
pano, bem afastada da porta do armazém. O espaço cheio de ban-
co para o povo sentar. Na barraca, ninguém chegava perto, a não
ser os que iam representar a brincadeira. Assistência aguardava
ansioso para o início. Minutos depois, começou uma música de
instrumento de corda e pandeiro, com uma perfeição extraordi-
nária.
A barraca tinha duas bocas de cena; uma em primeiro
plano e outra em segundo plano. Em primeiro plano, começou
o som do violino. O cenário: o sol, a lua, as estrelas, as nuvens.
Aquelas nuvens apresentavam uma imagem dizendo: “Eu sou o
pai! Aí está o sol, a lua, as estrelas. Agora vem água com todos
os seus viventes”.
Naquele cenário marítimo tinha toda qualidade de pei-
xe. Falava o pai: “Eu sou o pai eterno e criador”. Aí, vem terra
com muito arvoredo, animais, passarinho, flores e fruteiras que
servirão de alimento para quem lhe cultivar. Tudo isto aparecia
com um fundo musical em vários sentidos. Aí, aparecia a figura
de um homem no tamanho de 30 cm. O pai dizia: “És o filho da
terra. Ela ti dará tudo o que precisares. Comas estas frutas para
te alimentares. Tiras água para beberes mas, nem todas as frutas
poderás comer. Vais dormir que logo cedo venho te visitar”.
O pai se retirava e ficava aquele homem olhando para
todos os lados, andando bem devagarinho. Depois deitava e ador-

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Rodrigo Sávio

mecia. Em poucos instantes, aparecia o pai e dizia: “Adão, acorda


que todos os passarinhos estão cantando para ti. Será um paraí-
so”. Adão falou, pela primeira vez: “Senhor meu Pai, tudo está
bom. Seria melhor se eu não vivesse sozinho”. O pai respondeu:
“Então, vá dormir. Antes de acordar, uma companhia a ti che-
gará”. Retira-se o pai. Adão deita e dorme. Vem outra figura, de
uma mulher, e fica junto de Adão. Aparece o pai e chama: “Adão,
desperta que está aí a tua companhia”. Adão levanta, e ficam
olhando um para o outro. O pai dizia mais uma vez: “Nem toda
fruta te servirá de alimento. Se comeres de tudo estarás pecando
contra ti mesmo”.
Se retira o pai. Ficou Adão e Eva andando bem devagar,
no meio de tantas flores e frutas. Aí aparece uma serpente junto
de uma fruta. A serpente falou: “Olha que boa de se comer. Pega,
ao menos, uma e come”. Eva apanha uma e dá a Adão. Ficaram
indecisos, depois, com a insistência da serpente, comeram a fru-
ta. Ao terminar, a serpente diz: “Apareçam”. Aí, escutaram o
ruído do trovão. Ficaram os dois com medo. A seguir veio o pai e
chamou Adão. Ele nem estava presente e nem respondeu. O pai
falou: “Já sei que comestes do fruto proibido e perdeste a fé em
que tinha em teu poder. A partir de hoje crescei e multiplicai-vos.
Vais trabalhar para te alimentares e viveres”. O pai se retira.
Adão e Eva aparecem, cada um com duas folhas de parreira ser-
vindo de veste.
Prezado leitor, neste momento, estou me sentindo naque-
la mesma noite que o meu sentido, o meu olho, não tinha tempo
de fechar. A garganta secava, eu não sentia sede. Foi uma gravu-

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

ra de metal que jamais esqueci. Daquele momento, o meu maior


problema era o tamanho dos personagens que falavam como se
fossem vivos.
Os que assistiam era o mesmo que uma plateia de tea-
tro, vendo e ouvindo o ato do espetáculo. Se alguém falava, era
baixinho. Quando terminou a cena de Adão e Eva, fechou a boca
de cena e abriu a segunda. Mudou o ritmo musical para samba e
batucada. Aí, foi que eu fiquei hipnotizado; saiu um homem pe-
quenino das pernas moles, pulando e dançando. Deitado, em pé,
dava pulo de todo tamanho; era o palhaço.
Este homem pequenino dizia poesia e falava abertamen-
te com uma voz semelhante. Depois do palhaço, saiu o Negro
Valente que eu só via a dentadura próxima. Aí eu queria ver os
pés do negro. A seguir, saiu um velho aonde travaram uma for-
te discussão; atacou uma paulada no velho que matou. O velho
morto, ficou só a cabeça e os braços, o resto desapareceu. Aí eu
fiquei logo com o coração batendo. Eu olhava para os outros...
todo mundo quieto! Depois veio a polícia para prender o negro.
Foi outra confusão danada! Eu fiquei engolindo em seco até que
juntou o negro, a polícia, formaram aquele bolo danado. Caiu
tudo em baixo de uma vez.
Apareceu uma velha, um boi e o filho da velha. A velha
cismou de querer tirar leite no boi, porque quem vendeu o boi,
disse que dava leite. O filho dizia a ela que era mentira! O boi
ficou brabo e danou chifrada. O filho socorreu a velha. O boi dava
chifrada... Eu fiquei com pena da velha porque o boi imprensava
ela no pau da barraca que era capaz de partir a velha em dois

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Rodrigo Sávio

pedaços. Com esse movimento me achei cansado e o sono me do-


minou, até que horas, não sei.
Quando meu pai e mãe me despertaram, já foi pra vir pra
casa. Eu completamente traumatizado com aquele estado de coi-
sa. Quando amanheceu o dia, eu perguntei a meu pai de onde era
aquele povo tão pequenininho que cantava e brigava tanto. Meu
pai respondeu: “É boneco de madeira vestido de pano” - depois ele
me levaria em outro pra eu entender melhor. (...)

Com muita emoção, Solon nos relata, com detalhes,


aquela noite mágica que ficou gravada em sua memória.
Nesta narrativa, ele nos apresenta características interes-
santes acerca de suas reações enquanto criança e também
da apresentação do Mamulengo de Chico Presepeiro, o
qual ainda trazia um caráter religioso presente no espetá-
culo (hoje, praticamente extinto na forma atual do mamu-
lengo) que foi representado através da cena da Criação.
Tanto aquela apresentação que ele assistiu naquela
noite, quanto os espetáculos que viu posteriormente, servi-
ram de inspiração para que, em 1937, Solon estreasse o seu
próprio mamulengo com os bonecos que ele mesmo criou.

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Rodrigo Sávio

AS PRIMEIRAS APRESENTAÇÕES

Nesta narrativa3, Solon nos conta quando e como


ocorreram suas primeiras apresentações:

Com os meus 17 anos, já com namorada que me comu-


nicava por senha (não podia chegar perto por causa dos pais), o
mais importante eram os bonecos que eu tinha montado. Está
faltando o bombo, outros chamavam zabumba. Aí um dos meus
colegas fez ciente que era bom couro de gato, e ele sabia quem
tinha um gato ladrão que queria matar. Aí, resolvemos apanhar
dois cachorros de caça e três garotões para matar o gato. Quando
avistamos ele, botamos os cachorros e travamos a luta até matar
o gato. Trouxemos para casa e tiramos o couro.
Nessa altura, já sentia entusiasmo sobre a luta. Faltava
mais um couro. Tornamos a sair e, o primeiro gato que encon-
trássemos, seria a vítima. O problema era o bombo para o mamu-
lengo até que arranjamos outro couro. Para completar a monta-
gem do bombo, uma lata cilindro de 10 quilos vazia, meia peça de
corda, dois arcos de jenipapo. Eu já possuía o triângulo e um dos

3 O texto deste capítulo é um trecho do livro “Um Brasileiro Feliz”, de


autoria de Solon e que não chegou a ser editado, o qual foi reproduzido
na revista Suplemento Cultural, edição de agosto de 1996, p. 20.

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

meus cunhados tocava gaita de boca. Estava pronto o conjunto.


O problema da torda (chama também de barraca) foi saco que
carregava farinha. A lona que cobria a carga do cavalo faltou; de
um lado eu coloquei o meu cobertor e ficou pronto para estreia do
Mamulengo do Solon. Juntou-se a meninada para o mamulengo.
Cada um tinha uma função; batia o bombo, começou a batucada e
começaram a sair os bonecos.
Os bonecos dançavam, cantavam, botavam sorte... quan-
do o Mateu chegava que dava bravo à sorte, entregava uma folha
de mato. Aí, no meio da brincadeira, o Mateu dava um grito de
longe: “Bravo à sorte, um senhor de bem e família nobre, mandou
400 réis em uma moeda!”. Foi a maior novidade no mamulengo.
No final da brincadeira, tive um convite para no outro sábado ir
brincar em frente de uma venda. A vizinha, vendo a minha luta
no mamulengo (nessa época não havia outra diversão), começou
a me ajudar. O meu pai tinha dois animais, deu um pra mim. Eu
pedi a ele pra vender e empregar a importância no mamulengo; o
velho combinou.
Vim a Carpina, comprei 20 sacos vazios de farinha de tri-
go. Minha mãe emendou os sacos todos. Aí, o mamulengo tomou
outro rumo moral.
Havia um mamulengueiro, por nome de Sebastião In-
glês, que possuía uma sucata de mamulengo. Aí, eu tornei a falar
com meu pai para ir comprar a sucata. Ele deu o sim e eu comprei
por 30 mil réis. Eu ajeitei tudo direitinho. As minhas irmãs me
ajudavam, minha mãe me ajudava... tudo aquilo que eu precisava
para o mamulengo se tornava fácil. Eu me sentia feliz, já com

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Rodrigo Sávio

uma missão de dirigir a brincadeira, com 8 componentes e meu


próprio pai, que era quem transportava as malas do mamulengo
no animal. Quando terminava a brincadeira ele fazia a crítica se
foi ou não boa a brincadeira.

Nota-se, através deste texto, que a estreia de Solon


na arte do mamulengo foi marcada pela sua determinação
e força de vontade, contando com a ajuda de familiares e
vizinhos. As primeiras apresentações foram realizadas no
ano de 1937, no município do Carpina, e com o tempo, foi
se estendendo a outras localidades do estado. A partir das
avaliações que recebia em seus espetáculos, Solon procu-
rava caprichar cada vez mais, aperfeiçoando-se na brinca-
deira.

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Rodrigo Sávio

EVENTOS E HOMENAGENS

Ao longo de sua vida, Mestre Solon fez apresenta-


ções e participou de eventos em várias partes do estado de
Pernambuco e também do país. Como exemplo, podemos
citar:

• Participação no I Encontro de Mamulengos do Nordes-


te, Natal-RN, em dezembro de 1976, onde promoveu
espetáculos com a participação de 110 bonecos e apre-
sentou as peças Três Palhaços, Mateus Velho do Rosário,
São José fugindo do Egito, entre outras;

• Participação no II Encontro de Mamulengos do Nor-


deste, Natal-RN, em novembro de 1977;

• Participação na IV Exposição de Artesanato Folclórico,


realizada em Brasília, entre os dias 10 e 13 de dezem-
bro de 1979. Essa exposição, que vinha sendo realizada
desde 1976, visava divulgar, informar e motivar a co-
munidade, a respeito dos valores da cultura popular
e contava com a participação de artesãos de vários es-
tados. Nesse evento, Solon se propôs a confeccionar,

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

expor e comercializar seus produtos, assim como fazer


algumas apresentações do mamulengo para os visitan-
tes;

• Apresentações na Casa da Cultura, no Recife, em feve-


reiro de 1981;

• Participação no Festival Internacional de Bonecos, no


Maranhão, em julho de 1983;

• Participação na I Mostra de Mamulengo, no Centro de


Arte Popular de Olinda, em agosto de 1983;

• Presença na XXIII Feira da Providência, no Rio de Ja-


neiro, em novembro de 1983, evento esse que contou
com a participação de vários estados do Brasil e mais
de vinte países, dentre os quais, Alemanha, Arábia
Saudita, Bolívia, Bélgica, Canadá, Espanha, Equador,
Estados Unidos, França, Grécia, Holanda, Hungria,
Iraque, Itália, Japão, Líbia, México e Portugal;

• Apresentação no Circo Voador, no Rio de Janeiro, em


junho de 1984;

• Temporada de vinte dias em Minas Gerais, em abril de


1985, onde além fazer oito apresentações com o Inven-
ção Brasileira, expôs no Palácio das Artes, no Centro

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Rodrigo Sávio

Mineiro de Artesanato, aproximadamente 105 bonecos


do seu mamulengo. Simultaneamente aos espetáculos
e à exposição, Solon também ministrou o curso de “Ar-
tesanato de Bonecos”, destinado a 26 artistas e profes-
sores do 1º e 2º graus;

• Apresentação no XIII Festival Brasileiro de Teatro de


Bonecos, no Paraná, em julho de 1985.

Solon também recebeu, no decorrer de sua trajetó-


ria, homenagens e reconhecimento por seu trabalho. Em
13 de maio de 1984, por exemplo, o presidente da FUN-
DAJ, Fernando de Mello Freyre, o agraciou com a Meda-
lha do Mérito da Fundação Joaquim Nabuco – honraria
criada para homenagear aqueles que prestaram relevante
contribuição à cultura brasileira, especialmente do Norte/
Nordeste.
Já no dia 14 de setembro de 1984, recebeu da FUN-
DARPE, o troféu “Homenagem à Cultura Viva de Pernam-
buco”, premiação que atualmente faz parte do acervo do
Museu do Mamulengo de Olinda.

37
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Troféu “Homenagem à Cultura Viva de Pernambuco” recebido por Solon, em


1984

Foto: Yale Rayane | Peça do acervo do Museu do Mamulengo, Olinda-PE

38
Rodrigo Sávio

“INVENÇÃO BRASILEIRA”
Um mamulengo está na praça sob
inspiração das estrelas

Texto: Lêda Rivas4

Famosos desde o século XVIII, os mamulengos – popu-


lares na Zona da Mata pernambucana – continuam a proliferar
por todo Interior do Estado e, também, pela Capital. Uma forma
primitiva da marionete, o divertimento é ainda conhecido, em
Pernambuco, pelo nome de “babau”, tendo, como figuras de proa
o cabo Setenta, preto Benedito, Zé Rasgado, Simão e Etelvina.
Um dos mais conhecidos mamulengos pernambucanos é
o Invenção Brasileira, criado por Solon Alves de Mendonça em
1937, no município de Carpina, e que já percorreu todas as nos-
sas cidades interioranas.
O interesse de Solon pelo mamulengo vem desde a in-
fância, quando, acompanhado do pai, assistia aos espetáculos de
bonecos nas feiras (“e pensava que era tudo vivo, que aquilo era
gente”). Ainda menino, vendeu uma poltrona que havia rece-
bido de presente, para comprar o que chamaria depois de “ins-

4 Este texto foi publicado no Diario de Pernambuco, edição de 21 de janei-


ro de 1981. Crédito: Arquivo DP/D.A Press.

39
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

trumentos de trabalho”, os bonecos que utilizaria no mamulen-


go Invenção Brasileira. A princípio dedicou-se a apresentações
domésticas, só para a família e alguns poucos amigos e quando
viu que “tinha jeito para a coisa”, enfrentou o público, estreando
na localidade de Quatis, em Carpina, no final da década de 30.
“Foi um sucesso” – conta. “Ganhei quatrocentos réis, me lembro
ainda, era uma moeda grande”.

Foto: Rodger Rodrigues (1981) | Crédito: Arquivo DP/D.A Press

Repetindo histórias que ouvira de outros mamulengos


e criando outras, Solon foi assim organizando seus espetáculos.
À mesma época, montou um conjunto, com amigos, de sanfona,
bombo e triângulo, para acompanhar as apresentações. Hoje, não
sabe mais quantas vezes levou às feiras do Interior um texto de
sua autoria, “A Festa de São Sacode”, inspirada na imaginária

40
Rodrigo Sávio

terra de São Saruê, do folclore nordestino. E tampouco recorda


quantas histórias criou, espelhadas no cotidiano, “nos altos e bai-
xos da vida”.
- As pessoas gostam de histórias apimentadas, cheias de
palavrões – diz. Mas estas, eu não sei contar. Prefiro criticar as
coisas que vejo, todos os dias, na minha terra. De vez em quando
me pedem uma historinha pornofônica, mas eu reajo. Só quando
o palavrão escapole, é que não tem jeito.
Com o Invenção Brasileira, Solon e equipe já percorre-
ram quase todas as cidades do Interior, a pé e no lombo de burros,
atravessando rios e pedindo caronas nas estradas. Até que um
antigo prefeito de sua cidade interessou-se em ajudá-los, encami-
nhando-os à Empetur que, hoje, se pretende contratá-los, fornece
todas as condições de locomoção.
Houve um tempo em que Solon trabalhou como operário,
mas ele mesmo confessa que não deu certo. “Eu fugia para não
fazer serão, não queria perder o mamulengo. Ou então passava o
dia inteiro inventando histórias, não tinha jeito de me concentrar
no trabalho”.

OS BONECOS DE SOLON

Além de viver pelas estradas com seu espetáculo, Solon


Mendonça também fabrica bonecos de mamulengo, em madeira.
Reproduz figuras bíblicas, animais e personagens vários do di-
vertimento, que vende, quer através da Empetur, quer através da

41
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Coordenadoria Cultural do Nordeste. Em sua casa, à Rua Anto-


nio Bezerra de Menezes, 164, em Carpina, centraliza as vendas
para o Interior, assessorado pela mulher, responsável pela con-
fecção das roupas dos bonecos. Os preços oscilam entre 150 a
700 cruzeiros, sendo os bonecos disputados nas praças do Rio e
São Paulo. O maior orgulho do artista é dizer que o Mamulengo
Só-Riso levou muitas de suas peças, ano passado, para presentear
amigos nos Estados Unidos, quando de sua última apresentação
no Festival de Bonecos realizado em Washington.
- Os rapazes – diz, referindo-se à turma do Só-Riso – me
dão um valor tremendo, e não só me estimulam, como compram
peças minhas e divulgam meu trabalho.

Foto: Rodger Rodrigues (1981) | Crédito: Arquivo DP/D.A Press

42
Rodrigo Sávio

Apresentando-se em festas populares, feiras, residências,


colégios e entidades governamentais, Solon Mendonça cobra,
atualmente, cinco mil cruzeiros por um espetáculo de duas ho-
ras, em que apresenta oito histórias, podendo até baixar o preço,
“dependendo da pessoa que pede”. “Porque – explica – não estou
muito interessado em ganhar dinheiro. Só quero mostrar o ma-
mulengo”.
Garante o artista que suas histórias não são copiadas da
televisão, embora admita que a TV venha influenciando “muita
gente que escreve”. Da televisão, só está interessado nos comer-
ciais. “Bem que eu gostaria de fazer um, com o meu mamulengo.
É só achar quem patrocine...”.
Trabalhando há quarenta e três anos com o Mamulengo
Invenção Brasileira e confeccionando bonecos, “que não chegam
para quem quer”, Solon Mendonça diz que não enriqueceu “de
dinheiro”, mas que é milionário “em liberdade e saúde”, apesar
de ter, como todos os pobres mortais, “probleminhas de coluna”.
Bem relacionado com a intelectualidade pernambucana e com um
sem número de políticos, o artista carpinense diz, com orgulho,
ser amigo do governador Marco Maciel, que, ano passado, se dei-
xou fotografar com um braço em volta do seu ombro. A histórica
foto, logicamente, está aposta em lugar de honra de sua casa.

“ORA, DIREIS, OUVIR ESTRELAS...”


Mas é isto mesmo que Solon quer. Não só ver, mas lite-
ralmente, ouvir e sentir as estrelas. Com este propósito (um velho
sonho de menino, quando só dormia depois de achar que tinha

43
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

visto “todas” as estrelas e acordava cedinho para ouvir, antes


dos outros, o canto do xexéu), vendeu sua parte num terreno da
família, para comprar – por 56 mil cruzeiros – um telescópio. Há
quinze dias, instalou o aparelho em sua casa, que tem sido o alvo
favorito dos amigos e curiosos. Pretende, ainda, colocar o telescó-
pio nas festas e nas praças de Carpina, para que a população veja
a lua e as estrelas. Isto, assegura, porque sempre gosta de levar
para a cidade, aquilo que ali as pessoas desconhecem.
Mas além de um sonho, o telescópio é o pagamento de
uma promessa. “Houve um tempo – conta Solon – que a maré
estava braba e eu pensava que não ia contornar a crise. Tomei
como penitência ficar olhando para as estrelas, fazendo meus pe-
didos. Uma noite senti um arrepio, como um aviso. No outro
dia, a situação começou a melhorar. Só pode ter sido influência
de alguma estrela, de algum planeta. Então prometi a mim mes-
mo fazer de tudo para comprar um telescópio e ficar, com ele,
toda noite, adorando os astros. Mas não queria esta alegria só
pra mim. Queria levar para o povo e é por isso que vou montar o
telescópio na praça”.
E se a praça é do povo, o telescópio também pode ser dos
poetas, garante Solon, que já se dispõe a emprestar o aparelho aos
nossos vates, “para que se inspirem, olhando as estrelas”.

44
Rodrigo Sávio

MESTRE SOLON: um brasileiro alegre

Texto de Sônia Medeiros5

De repente, pensando em Shakespeare, desconfio que o


“ser ou não ser, eis a questão” tem muito da realidade da vida.
Tudo é uma questão de ser ou não ser. Os indivíduos, muitas
vezes, se perdem no caminho da busca, num caminho, às vezes,
de idas sem voltas. A sabedoria do príncipe Sidharta (Buda) se
alicerça no ser e no ser-se. E o saber ser talvez seja o segredo da
vida e da felicidade.
O Mestre mamulengueiro Solon de Carpina foi uma pes-
soa que soube ser. Foi feliz entre nós, com a sabedoria dos filósofos
simples, e se foi no dia sete de julho, na madrugada possivelmente
fria de Brasília, longe dos seus, mas com os seus. Todos nós sa-
bíamos, mesmo de longe, do seu acidente na avenida moderna
demais, cruel demais, que não perdoou a simplicidade de quem
queria conhecer a pé a moderna Brasília artificial dos arquitetos.
Sou animadora cultural, porém não sou “dona” de ne-

5 Este texto, de autoria da então professora de História do Colégio Ra-


dier e animadora cultural do SESC - Santo Amaro e da FUNDARPE,
foi publicado na revista Suplemento Cultural, edição de julho de 1987, p.
14.

45
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

nhum artista popular. Contudo, sobre o Mestre Solon desejo fa-


lar, porque nossas vidas, algumas vezes, se cruzaram. Sempre de
uma forma boa. Nasci em Carpina e, de vez em quando, saía da
rua Estácio Coimbra para ver e ouvir o Invenção Brasileira,
criado em 1937 pelo Solon Alves de Mendonça. Ao redor dos
bonecos e da zabumba ouvíamos o Mestre Solon denunciar as
injustiças que o atingiam, bem como à comunidade simples em
que vivia. E, de repente, saía da crítica para a mais extremada
brincadeira, deixando na criança o riso, a fantasia, o gosto do ser
criança.

Solon e dois dos seus bonecos | 1978

Fonte: Revista Suplemento Cultural, edição de agosto de 1996

46
Rodrigo Sávio

Em Carpina, Solon era tão famoso quanto o doutor Ara-


nha, Murilo da Farmácia ou Biu Medeiros da loja Salgado. Um
dia ele foi embora para o Rio de Janeiro, em busca do velho so-
nho da realização maior nas grandes cidades. Durante 19 anos
deixamos de ver Solon, suas sátiras, sua religiosidade misturada
com crenças astrológicas, seu fatalismo, seu moralismo místico.
Deixamos também de ver o artesão de bonecos.
Solon dizia que, quando fazia um boneco, já pensava na
história que iria desenvolver. E, logo depois do espetáculo, ven-
dia, pessoalmente, alguns bonecos, explicando, ao comprador, a
história de cada um. O folclorista Mário Souto Maior conside-
ra Solon o mais urbano dos mamulengueiros, possivelmente em
função dos quase 20 anos passados no Rio de Janeiro. Entretanto,
a grande cidade não tirou do mestre mamulengueiro a ternura
do simples. Muitos anos depois o reencontrei no Recife, com o
mesmo sorriso largo e manso.
Na FUNDARPE criei o programa Homenagem à Cul-
tura Viva de Pernambuco, onde recebíamos propostas de ho-
menagens, e as analisávamos, com uma comissão, sobre a sua
viabilidade ou não. Foi com grande alegria que recebemos do
poeta Francisco Bandeira de Melo a proposta de homenagem ao
Mestre Solon. O Teatro dos Oliveira, na rua Oswaldo Cruz, fi-
cou pequeno para receber tantas pessoas. O Mestre, com seus
bonecos, não cabia em si de contentamento, e quando agradeceu
a homenagem lembrou o mamulengueiro Chico Presepeiro, que o
emocionou quando criança.
Disse Solon, na época: “Quando terminei de ver o espe-

47
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

táculo do Presepeiro, disse pra mim mesmo: um dia ainda faço


uma brincadeira dessa”. Na última sessão pública do programa
Músicos na Praça, realizado pela FUNDARPE, em Itamaracá,
no dia 14 de março deste ano, lá estava o Mestre Solon, brincando
com as crianças, tirando prosa com Valdeluza d’Arce e Fernanda
d’Oliveira, e, na sua humildade, agradecendo um jantar que lhe
foi oferecido.
Na última vez em que conversei com o Mestre Solon, na
Casa da Cultura, falei pra ele que o Centro de Atividades SESC-
Santo Amaro iria homenageá-lo no dia 22 de agosto, e perguntei-
lhe o cachê do Invenção Brasileira. Na sua pouca preocupação
com o material, me falou: “Só me diga a hora; o preço é você quem
diz”. O Mestre Solon, ultimamente, cobrava de dois a três mil
cruzados por apresentação. Se necessário, usava até transporte
próprio e trazia o seu conjunto de zabumba, sanfona e triângulo.
Chamei-lhe a atenção várias vezes. Se o seu espetáculo era bonito
e impecável, deveria cobrar mais caro. Ele me disse: “Não, profes-
sora. A brincadeira é a vida de Solon. Se cobro mais caro, não me
contratam e fico sem brincar”.
O maior sonho de Solon era publicar o seu livro Um
Brasileiro Feliz [...]. No livro, diz o Mestre Solon: “O texto
deste livro é bem curioso; em uma época em que estamos atraves-
sando, com tantas coisas para se definir, aparece este brasileiro fe-
liz. Aqui, eu murmuro: será que o prezado amigo vai me chamar
de imbecil? O que me contenta é que cada cabeça é um mundo.
Primeiro, se vossa excelência avistasse o lugar onde eu nasci...
E mais: Já escutei alguém dizer que a felicidade não existe. Eu

48
Rodrigo Sávio

protestei. A felicidade é quase nada”.


Solon morreu aos 67 anos “brincando”. Fez a campanha
da vacinação, com a Secretaria de Saúde e a FUNDARPE e, em
Brasília, representava Pernambuco na Feira dos Estados. Foi en-
viado pela Cruzada de Ação Social, de dona Madalena Arraes.
Muitas homenagens o esperavam, por seus 50 anos como mestre
mamulengueiro. Ele sabia destas homenagens; decerto iria a to-
das e se emocionaria, principalmente se fossem festas simples.
A morte o levou de nós. Estamos mais tristes e mais sós.
No Encontro Cultural de Pernambuco, a FUNDARPE o home-
nageará. Na Semana do Folclore, o SESC-Santo Amaro preserva-
rá a sua homenagem de há muito planejada. Outras instituições
culturais, decerto, farão o mesmo. Mas estamos sem o Mestre
Solon. Falta o seu gosto em fazer bonecos e em brincar com eles.
E falta, sobretudo, a sua ternura simples e boa, muitas vezes luz
no fim do túnel.

49
Rodrigo Sávio

CENTRO CULTURAL MESTRE SOLON

Em 12 de março de 2009, foi inaugurado em Carpi-


na, no casarão localizado ao lado da prefeitura, na Praça
São José, o Centro Cultural Mestre Solon, cujo objetivo era
reunir os trabalhos dos artistas e artesãos da cidade.
O espaço contava com cerca de sete salas, onde ha-
via a exposição de diversas produções como esculturas,
sandálias decoradas, roupas, bordados, etc; um espaço
para a União Carpinense de Escritores e Artistas - UCEA;
uma sala para exposição de peças do Mestre Solon e de
outros mamulengueiros de Carpina, contendo também in-
formações sobre os mesmos; espaço para apresentações e
oficinas; além de contar com a realização de cursos de vio-
lão e flauta e aulas de língua estrangeira.
Contudo, este importante espaço cultural, que re-
cebeu o nome de Mestre Solon, em homenagem a este im-
portante mamulengueiro, durou pouco tempo, vindo a ser
extinto anos depois de sua inauguração.
Hoje, enquanto muitas instituições e museus, não
só de Pernambuco, mas também de outras partes do país,
abrigam e valorizam as peças e a história do Mestre So-
lon, Carpina, cidade onde ele viveu, não possui um espaço
para enaltecer a sua memória.

51
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Casarão onde funcionou o Centro Cultural Mestre Solon

Foto: Rodrigo Sávio | Novembro de 2017

Peças de artistas locais presentes no Centro Cultural Mestre Solon, quando ele
ainda estava em funcionamento

Foto: Giselle Santa Cruz | Novembro de 2009

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Rodrigo Sávio

Pôster do Mestre Solon que ficava em exposição no Centro Cultural

Foto: Giselle Santa Cruz | Novembro de 2009

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Peças de mamulengueiros de Carpina que integravam uma das salas do Centro


Cultural Mestre Solon

Fotos: Giselle Santa Cruz | Novembro de 2009

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Rodrigo Sávio

DOAÇÃO DO ACERVO DE SOLON


PARA O MUSEU DO MAMULENGO,
EM OLINDA

Foto: Alice Mafra | www.olinda.pe.gov.br

Em julho de 2017, o acervo do mestre foi doa-


do para o Museu do Mamulengo – Espaço Tiridá, lo-
calizado em Olinda. As peças foram doadas pela filha
do mestre, Marly Sarandão, no dia 13 daquele mês. A
solenidade ocorreu no próprio museu, que até então ti-
nha sua sede na Rua de São Bento, 344, Varadouro6

6 Atualmente o museu está sediado no Mercado Eufrásio Barbosa, loca-

55
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

e contou com a presença do então secretário de Patrimônio


e Cultura de Olinda, Gilberto Sobral.
O museu já possuía algumas peças de Solon, as
quais estavam em exposição na ala dos mestres e que eram
apreciadas pelos visitantes. Com relação aos novos bone-
cos, o secretário argumentou que “eles agora passam a ser
tombados e se tornam patrimônio da cidade, deixando essa
arte para gerações”. Já Luciano Borges, diretor do museu,
afirmou que “a memória da família está bem guardada e
cuidada”.
A filha do mestre, Marly Sarandão, levou seus dois
netos, Rayanne e Rogério Júnior para a solenidade de doa-
ção. Na ocasião, a família relatou que esta foi uma forma
de ver a obra de Solon valorizada, já que as gestões muni-
cipais de Carpina não se prontificavam em receber e cui-
dar das obras. “Cresci vendo a criação do meu pai e várias
vezes eu até ajudei costurando as peças. Fico feliz de ver a
arte dele sendo bem zelada. Ter suas obras expostas sem-
pre foi um sonho dele e nosso”, contou.
Depois de passar pelos processos de tombamento
e de restauração, as peças doadas foram expostas em maio
de 2018, no próprio museu, na exposição “Solon Vive”.
Dentre o material que foi doado, além dos próprios
bonecos, encontram-se instrumentos musicais, fitas K7,
cartazes, fotografias, prêmios e certificados, painéis figura-
tivos que eram utilizados na barraca e estandartes de agre-
miações carnavalescas criadas por Solon.

lizado na Av. Joaquim Nabuco, S/N - Varadouro, Olinda.

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Rodrigo Sávio

Peças de Solon em exposição na sala dos mestres


Foto: Yale Rayane | Peças do acervo do Museu do Mamulengo, Olinda-PE

Um dos painéis figurativos utilizado no Mamulengo Invenção Brasileira


Foto: Yale Rayane | Peça do acervo do Museu do Mamulengo, Olinda-PE

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Fotografia de Mestre Solon e o boneco da Morte


Foto: Yale Rayane | Peça do acervo do Museu do Mamulengo, Olinda-PE

Estandarte do bloco de caboclinhos criado por Solon


Foto: Yale Rayane | Peça do acervo do Museu do Mamulengo, Olinda-PE

58
Rodrigo Sávio

De acordo com Luciano Borges, em relato apresen-


tado durante sua participação no seminário virtual “100
Anos de Mestre Solon”, realizado pelo Núcleo de Cultura
Popular/UERJ, em setembro de 2020, desde que o museu
foi criado, em 1994, nunca houve o recebimento de uma
coleção inteira, com mais de 100 peças, de uma única vez.
Ainda segundo ele, das mais de 100 peças de Solon, cerca
de 70 estão expostas na sala dos mestres. Além disso, Lu-
ciano ressalta que o Museu do Mamulengo de Olinda é o
maior detentor de peças do mamulengueiro, no Brasil.

59
Rodrigo Sávio

ENTREVISTAS

Entrevista 1

A entrevista7 a seguir foi concedida ao ator e produtor tea-


tral Humberto Braga, durante o II Encontro de Mamulen-
gos do Nordeste, realizado em Natal-RN, em novembro de
1977:

Humberto Braga: O nome do seu mamulengo é Invenção Bra-


sileira...

Solon: Eu botei Invenção Brasileira para criar um título dife-


rente dos outros mamulengueiros porque tem também criação
minha, tem números exclusivamente meus. A minha primeira
apresentação foi no ano de 1937.

Humberto Braga: Quer dizer que há 40 anos o senhor trabalha


com mamulengo?

Solon: Passei uma temporada morta porque o mamulengo

7 Revista Mamulengo, nº 7, 1978, pp. 34 a 36.

61
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

chegou a uma fase de ninguém querer saber dele. Ele só volta


a aparecer depois que o turismo veio divulgar a dar o valor, o
reconhecimento, inclusive com a cobertura do Governo, o pró-
prio Presidente da República. Aí, deu condições pra gente reviver
aquilo que já estava se apagando, já estava a nada...

Humberto Braga: Que tipos de condições foram essas que o se-


nhor disse?

Solon: A condição é a seguinte: dentro de uma apresentação o


Presidente da Empetur presenciou, a convite do Prefeito, e ele
achou que aquilo merecia uma ajuda porque achou que era um
trabalho que tinha lógica, que tinha fundamento para uma diver-
são. Já veio gente também do Rio filmar aqui. Agora, esse amigo,
um moreno, tem uma alcunha, ele é lá da Funarte, ele parece que
mora em Botafogo. Eu já morei no Rio também...

Humberto Braga: Os seus pais também eram mamulenguei-


ros?

Solon: Não, meu pai tinha defeito de um olho, que ele sofreu
naquela epidemia. Mas negociava e dava condições pra gente se
criar sem ser oprimido.

Humberto Braga: O senhor é relativamente novo, desculpe per-


guntar, qual é a sua idade?

62
Rodrigo Sávio

Solon: Já estou com 57 anos.

Humberto Braga: Então o senhor começou a trabalhar com ma-


mulengo com 17 anos, não foi?

Solon: Ou antes, porque o primeiro que eu vi tinha oito anos. E


daí eu guardei aquilo. Ficava entusiasmado vendo os bonecos ba-
tendo um no outro, eu pensava que aquilo tudo era vivo, de ver-
dade. Via eles brincando, dando cacetada um no outro, aí fiquei
horrorizado com aquilo. Pra mim tudo aquilo era vivo. Então eu
guardei aquilo na memória e disse: ainda faço uma brincadeira
daquela, até que realizei. Meu pai e minha mãe me deram apoio
total, eles riam quando eu fazia aquilo, achavam graça, e aí me
enchia de vida com aquilo. Era justamente o que eles podiam me
dar: achar graça naquilo que eu fazia. Naquele tempo, nem escola
existia. Eu viajava uma média de quatro quilômetros a pé pra ir
e voltar da escola. Fiz o 5º ano primário, mas esse mesmo quinto
ano primário que eu fiz, hoje estou equiparando quase com esse...
um artigo que tem aí...

Humberto Braga: Quantos mamulengueiros que o senhor co-


nhece, no interior de Pernambuco?

Solon: Eu conheço três, mais ou menos. Um lá mesmo em Car-


pina que se chama João Redondo; tem um outro que se chama Zé
Banana, e tem um outro perto da Serra Nova que se chama Mané
Bilu. São esses três que eu tenho aproximação. E o primeiro que

63
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

brincou comigo, ou seja, eu aprendi muito com ele, se chama Sa-


muel, mas já morreu. Era mamulengueiro. Mas o primeiro san-
foneiro que tocou no meu mamulengo ainda é vivo, mora lá perto
de mim. Está velho, aposentado.

Humberto Braga: Esse sanfoneiro trabalhou só com o senhor


ou...

Solon: Não, ele toca comigo e tem um teatro em casa para fazer
ponteira, cordão, mas diz que aquilo não dá para ele viver. Está
sacrificado e eu também não posso ajudar a ele porque vivo lutan-
do com dificuldade, e a gente vem vivendo assim...

Humberto Braga: O senhor dá uma gratificação a ele?

Solon: É, eu gratifico por cada apresentação. Digo a ele: olha, isso


não é pagamento, isso é uma gratificação, porque esse dinheiro
não vai recompensar o nosso trabalho.

Humberto Braga: Sempre que o senhor viaja, é o senhor e o


sanfoneiro só?

Solon: O sanfoneiro e mais três ou quatro.

Humberto Braga: Mas são ajudantes?

Solon: São ajudantes...

64
Rodrigo Sávio

Humberto Braga: Não trabalham dentro da tenda com os bo-


necos?

Solon: Me ajudam. Me entregam o boneco e eu falo. Tem vezes


que falo por quatro vozes. Falo por quatro ideias.

Humberto Braga: No seu entender, que tipo de auxílio poderia


ser dado para que essa manifestação continuasse existindo?

Solon: Olhe, não individual porque a gente dentro da socie-


dade não pode ter proveito individual. Mas, pra mim, a única
coisa que podia me ajudar, pra tranquilizar o meu estado, porque
eu não tenho condições de subir dois metros acima do chão, eu
fico logo perdendo os equilíbrios, eu brinco sentado. Eu fiz uma
instalação sentado porque eu não aguento em pé. Mas, se por
acaso eu tivesse uma aposentadoria, aí eu tranquilizava, ficaria
até me apresentando em instituições sem tanta exigência porque
eu já tinha o meu garantido. Infelizmente, isso acho que vai ser
muito difícil; na segunda ideia a única coisa que pode ajudar o
mamulengueiro, não é bem ajudar, é ele ter uma satisfação, é
ele ter uma viagem dessas de instrução. Por exemplo, eu tenho
uma vontade louca de ir a São Paulo, ou ao Rio, ou a Brasília,
fazer uma apresentação. Eu estava quase doido na semana
passada, liso, devendo, sem saber o que fazer. Só olhando pros
bonecos... Quando eu menos espero, batem na porta: era o rapaz
da Empetur. Eu digo: abriu o céu pra mim. Ele disse: “Você vai
a Natal”. Aí eu mudei... Foi o mesmo que dizer: “Eu nasci hoje”.

65
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Eu estava devendo na venda, devendo a luz, água, não sabia onde


ia arranjar o dinheiro. Quando ele disse “você vai a Natal”, eu
corri e disse na venda: “Se prepare que eu vou fazer uma viagem
e vou lhe pagar”. Minha filha dá o almoço, mas o café da manhã
e de noite eu tenho que arrumar. O café eu faço na minha casa.

Humberto Braga: Quer dizer que o senhor vive desse trabalho?

Solon: Atualmente eu não vivo porque a minha filha me ajuda.


Mas eu parei o trabalho que exercia como carpinteiro porque eu
sofri um acidente, me prejudiquei da coluna. Então os meus pés
ficaram de um jeito que eu não posso calçar sapato de sola, só
pano. Eu fui ao INPS e os médicos me deram seis meses de licença
de benefício, depois me tiraram do Instituto, aí eu perdi aqueles
direitos. Eu não tinha outro recurso, o jeito que tinha era desistir
porque eles estavam ganhando mais dinheiro comigo do que eu
com o INPS. O gato tem que levar tudo porque o rato não tem
nada. O mamulengo me ajuda também. Mas o essencial quem me
garante é minha filha.

Humberto Braga: O senhor se apresenta diariamente ou nos


fins de semana?

Solon: Eu me apresento sempre assim a convite no Recife, sem-


pre em vários bairros do Recife, só a convite, porque depende de
ajudante depende de transporte e aí tem despesa a pagar...

66
Rodrigo Sávio

Humberto Braga: O senhor cobra um cachê?

Solon: Uma média de mil cruzeiros, oitocentos, depende.

Humberto Braga: Agora, as estórias, os temas são todos criados


pelo senhor?

Solon: Bem, umas são criadas. Outras tirei cópia de outros ma-
mulengueiros. Eu faço pequena modificação e apresento porque
o mamulengo quem tem vocação para mamulengueiro tem con-
dições de criar. Eu criei a estória de um cangaceiro que acabou
com o baile na bala, e então prendeu gente, pintou o sete, e coisa,
e fez o que quis, aí o mesmo cangaceiro foi morto pelo dono da
fazenda, e aí acabou o cangaceiro. Aí, sai uma parte também de
cultura porque eu trago assunto do meio social, direito que nós
temos pelo INPS, tudo aquilo dentro da cena, eu acho que quem
está assistindo nota...

Humberto Braga: É o senhor mesmo quem confecciona os seus


bonecos?

Solon: Eu mesmo que faço. Compro a madeira, faço o entalhe, até


costurar a roupa, sou eu que costuro.

Humberto Braga: O senhor confecciona a partir da estória ou


depois do boneco pronto é que cria?

67
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Solon: Não, quando vou fazendo os bonecos eu já vou fazendo a


estória. Esse é tal, vai fazer isso, aquilo; esse aqui é tal até quando
eu completo a cena, paro e passo para outro.

Humberto Braga: O senhor não tem um filho que esteja se inte-


ressando em continuar o seu trabalho?

Solon: Meu filho agora está com 24 anos. O caçula dos homens.
Eu tenho uma filha caçula com 10 anos. Então, ele não. Eu tenho
um neto, dessa filha que me ajuda, que é alucinado por boneco.
Quando ele crescer vai trabalhar comigo. Ele se chama Rogério,
ele é alucinado. O pai dele disse: “Eu sei que você vai fazer ma-
mulengo mesmo”.

Entrevista 2

Esta entrevista foi concedida por Mestre Solon, em


1985, durante a gravação de um programa para a Univer-
sidade Estadual de Campinas - UNICAMP. A transcrição
foi feita por Rodrigo Sávio, de forma literal, a partir da gra-
vação que foi disponibilizada no Youtube, cuja referência
encontra-se no final desta obra. Vale ressaltar que, no ví-
deo, os editores preferiram suprimir algumas perguntas,
deixando apenas as respostas de Solon de maneira sequen-
ciada:

68
Rodrigo Sávio

Solon: Olhe, eu comecei a trabalhar depois que eu fiquei alu-


cinado com a primeira vez que eu vi o mamulengo em 1928, eu
tinha oito anos de idade. E depois que eu conheci o mamulengo, o
nortista que tem muita astúcia de brincar de mão mole, faz a mão
molenga que é feminino, aí criou o mamulengo no masculino.
Quer dizer: com a cabeça de madeira e dois braços de madeira,
um vestido, aí ele apresenta o boneco de mamulengo, é... cha-
ma-se boneco de mamulengo, figura de mamulengo e brincar de
mamulengo.

Se me ofertar o melhor emprego do Estado eu agradeço, porque


no tempo que eu podia ser empregado, não chegou oportunidade.
Agora o meu único recurso será os bonecos. Não pertendo sair
deles mais, a não ser quando vestir a roupa de madeira.

Entrevistadora: Sim, e depois do senhor, como ficará o seu tra-


balho?

Solon: Olhe, eu espero que o meu nome seja reconhecido como


um dos brasileiro, porque mesmo com os sacrifício que eu já pas-
sei e a luta que vivo, me considero um brasileiro feliz.

Olhe, eu sofri muito pra me dedicar ao mamulengo, viajei pelo


sertão, comeno queijo com rapadura e bebeno água e rompendo
trinta quilômetros, vinte e quatro, vinte e seis, pra chegar, fazer
uma apresentação... dormi por dentro do mato. Mas, hoje, eu es-
tou tendo um reflexo com uma cobertura com esse povo tão im-

69
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

portante, com esse poder eletrônico que a gente estamos desfru-


tando, a gente saindo aí na imagem ao ar e daonde eu vim, dum
lugar tão humilde, tão pobre, que nem eu nunca imaginaria que
chegasse a esse ponto. Atual eu não tenho bons reflexos, dizer de
poderio de dinheiro, mas eu desfruto daquele... daquela atenção
que o povo me dão, gente muito mais de nível elevado do que o
meu, só porque eu conservo uma... um espaço de... primitivo do
século... porque esta cópia que eu tenho é do século XIX, não é do
século XX. Quer dizer, toda essa apresentação tá um enredo do
século passado. Foi a única coisa que eu consegui gravar e ainda
hoje tenho esse argumento. Os boneco é uma geração, é a vida
duma geração passada.

Porque eu estou com quarenta e oito anos de mamulengo e nos


próprios encontro, os mais velho é dez, oito, seis de mamulengo.
Eu que faço o mamulengo, faço a cabeça do boneco, boto a roupa
e dou a vida a ele, tem pouco fazendo nesse... trabalhando neste
ritmo. No estado de Pernambuco, me parece que eu sou o único
no estado de Pernambuco que tô fazendo esse tipo de trabalho,
passando à frente a arte com a vida, a história e biografia. Toda
minhas peça tem a música, tem história e como é que eles se apre-
senta e a vida de quem. E lá em São Paulo, um cidadão de... já
idoso, disse que veio com a distância de quarenta quilômetro pa
me ver. Quer dizer, eu digo: “Será que eu sou merecedor?” Ele
disse: “É mais”. Agora, sendo que houve um negócio no horário
da apresentação que num deu... é... ficou meio cansativo. Mas,
isso pra mim, tudo são alegria, porque eu já escrevi um rascunho

70
Rodrigo Sávio

de um livro, que já está datilografado e tá em pasta e botei: “Um


brasileiro feliz”. Mai eu fui criticado por causa disso, porque ele
disse num existia brasileiro feliz. E eu digo: existe, porque a feli-
cidade são momento, tem que ser respeitada e colhido com cari-
nho. Momentos de felicidade.

Quando entro dentro da cabine, que ela dá o nome de torda, bar-


raca, cabine, eu aí me transformo; eu esqueço que tenho família,
esqueço que tenho filho, eu me transformo completamente num
boneco. Passo a fome, não sinto fome, porque eu ali, parece que
eu encarno numa vida que está esperando por mim e aí eu terá
que fazer a apresentação total. Num toco em álcool. Se eu puder
adoçar a garganta com um confeito, que chama de bala, pra mim
é paliativo, mas eu gosto de entrar no meu... tranquilo e calmo
pra eu purificar a memória e apresentar. Agora tem hora, que eu
digo que é Deus que me ajuda porque vem mensagem que eu toco
naquilo ali, sem eu esperar. Eu abro a boca é mermo que quer
dizer: eu num abro a boca pra dizer besteira, eu digo uma coisa
que é aproveitada, dentro do gênero do folclore, né? Às veze eu
faço uma crítica, mas... crítica hoje diz que a gente estamos na
democracia, então eu faço uma crítica cabíve. Mas, se eu levasse a
sério, eu diria que tem muita coisa errada que talvez... é capai de
num ter nem conserto, dentro do nosso país.

Entrevistador: Mestre Solon e como é que é a sua reação com o


público?

71
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Solon: A reação para o público ela tem sido na íntegra bem cheia,
porque o povo vibra duma maneira que, às vezes, ele joga nota,
dinheiro, assim: “eu quero ver ele morto”, “quero ver matar, dar
uma surra nele”, “e pega ele”, “segura ele” – vibrando com os
boneco. A gente às vez também ri com aquilo... tem outro que
abre assim, os lábios e fica imunizado, né? A gente faz dois furim
pra ver o povo no lado de fora. E dentro do Recife, a minha pla-
teia é uma média de duzenta, até quinhentas pessoa pra assistir
o espetáculo, quando eu pego praça pública. E no teatro, sempre
dá lotação. Um dos lugares que mais eu tive aplauso, foi no Tea-
tro Marília, de Belo Horizonte, que eu mandei parar, se não eles
me matava de tanto aplauso. Agora, não é que com isto eu vou
exigir aplauso em todos os lugare porque, digamos: se eu tô aqui,
com cinquenta pessoas ou cem, eu não vou exigir desse povo que
venha me aplaudir, porque estão concentrados, vê se aproveita
alguma coisa que estou dizendo. Então ele não vai se preocupar
em me aplaudir, eles querem escutar... ver se se aproveita alguma
coisa que eu vou pronunciar.

Não, eu não considero meu trabalho político. Eu acho que é uma


cultura que eu conservo como primitiva e dando ela sempre a
renovação, de acordo com a nova geração. Na minhas apresenta-
ções, eu protesto as frase apimentada, porque eu olho e tem sem-
pre três, quatro criança na minha frente, e eu respeito muito a
criança.

É justamente isso que me fere. Eu estou sendo explorado pela

72
Rodrigo Sávio

minha boa vontade, o meu jeito pacato, humilde, que eu recebo


isso como uma ingratidão. Eu acho que, não é isso que eu espe-
rava. Eu às vezes digo: eu espero uma palavra amiga, porque eu
tenho um coração muito limpo da malícia e sofredor porque o
meu signo é Peixe, muito sensíve, qualquer coisa me fere, mas
acho que aquilo já é dependente mermo dos astro.

Eu num uso máquina pra fazer boneco. O pessoal diz montar


oficina. Não! Eu não monto oficina, eu dou é curso, como é que se
trabalha dentro do artesanato. O artesanato não é feito com má-
quina, o artesanato é feito com a mão, com carinho e com amor.
Então, com aquela madeira, a gente entalha ele aqui e bota, pro-
cura a posição, ajeita ele direitinho, costura, aí sai o verdadeiro
artesanato. O artesanato que leva máquina... porque ele levando
a química da indústria já tá com muita coisa! Porque usa o cal,
a tinta e... mas ele tem que ser feito com a mão, é o verdadeiro
artesanato, com matéria-prima da região. O artesão é que se iden-
tifica e diz daonde é.

73
Rodrigo Sávio

10

A CENA DOS CANGACEIROS

A seguir, temos a transcrição de uma peça de ma-


mulengo do Mestre Solon, que faz parte do seu livro iné-
dito Um Brasileiro Feliz e que foi reproduzida na íntegra,
inclusive com o linguajar regional, presente no original do
autor, na revista Suplemento Cultural, edição de agosto de
1996, p.20:

Personagens:

D. Quitéria – Patroa
Simão – Empregado
Rosinha – Filha de D. Quitéria
Marieta – Empregada
Curisco – Cangaceiro
Jararacá – Cangaceiro

A violência no abismo tem seu fim. Tem um refle-


xo de tradição no mamulengo, na cultura passada não se
podia fazer comentário de violência. Mais os bonecos de
mamulengo em cena: Servia de interprete de ato semelhan-
te que era uma atração de grande influência diversa o ma-

75
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

mulengueiro fazia aquela pesquisa e atuava uma cena que


tinha efeito coletivo.

Carpina, 3/8/83

Solon Alves de Mendonça

Para se apresentar um teatrinho de Bonecos se im-


provisa uma cabine a onde se acomoda dois autores ou
três.

A 1ª

Figura sai em cena e um palhaço de vareta ou de


luva, ai diz: Boa tarde distinto público. Repete por duas ou
três vezes, pesquisando os mais próximo de comunicação.

O Palhaço: Ora muito bem senhor, estão dizendo por ai


que hoje ia chegar um palhaço aqui, mais eu como não gosto de
palhaçada, vim primeiro do que ele porque sou um trabalhador e
vou louvar.
Quem não gosta do trabalho, não tem amor a ninguém,
é um volume sem destino, que fica no vai e vem, e uma casa sem
segurança que não sabe o valor que tem.

Depois que ele começa a Dialogar com assistente


controla o Tempo. Não cansativa e anuncia o próximo nú-

76
Rodrigo Sávio

mero, pede licença para se retirar e sai de cena.


E começa o que foi anunciado.

Solon Alves de Mendonça

Em Cena Dona Quitéria dançando um forró com


o empregado Simão, e Rosinha sua filha, e a empregada
Julieta. Uma festinha familiar. O Capitão Raimundo está
viajando, Dona Quitéria manda parar e diz o Simão: Vocês
não sabem cantar uma melodia que tenha mais atração, eu não
estou gostando deste forró.

Simão: Patroa eu não sei cantar, faz muito tempo que


eu cantava no sertão, as músicas de lampião, depois ele morreu e
tudo acabou, agora ninguém se lembra dele, porque os lampiões
de agora ele nem canta nem dança, ele mata e corre para casa do
advogado. Mas se a senhora quiser, parece que eu ainda sei de
uma, que é mulher rendeira!

D. Quitéria: Ora Simão, Lampião foi um herói no sertão


e a gente não pode esquecer. Cante essa mesmo para gente ver.

Simão: Patroa, se eu cantar a senhora dança agarradi-


nho comigo?

D. Quitéria: Ora Simão, não tenha dúvidas, Manezinho


não está em casa, a vida é nossa, vamos brincar, vamos dançar.

77
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Simão vira-se para o público e diz: Parece que ela está


gostando deu.

O Sanfoneiro: visse a conversinha dela.

[Simão:] Puxa o Fole sanfoneiro, Vamos cantar Mulher


Rendeira.
Olê, mulher rendeira, olê mulher rendáaa. Lampião des-
ceu a serra foi parar em Cajazeira, convidou os camaradas para
cantar mulher rendeira. Olê mulher rendeira, olê mulher ren-
dáaa, tu me ensina a fazer renda, que eu te ensino a namorar
(Bis).

A seguir se escuta dois ou três disparos de espo-


leta, ou traque surpresa, nesse tiroteiro. D. Quitéria com
as filhas, as empregadas foge de cena. Simão fica sozinho
procura-se esconder num recanto tremendo de medo. Che-
ga em cena dois cangaceiros, Curisco e Jararacá armados
de Carabina, dando voz de prisão para parar: Qual foi esse
atrevido que estava cantando a música do Cangaceiro velho? Vo-
cês não sabem que ele já morreu há muito tempo? Ninguém pode
cantar esta música que é falta de respeito à esse.
A onde está o governo para mandar essa ordem, é preciso
que a gente veja essa esculhambação. O Cangaceiro ver Simão
escondido: Ai Sujeito, dessa daí, e venha falar comigo, se não eu
atiro, sujeito.

78
Rodrigo Sávio

Simão: O senhor estava falando comigo é? Eu não sou


homem não. Você pensa que todo homem que veste calça é ho-
mem.

Cangaceiro: É você mesmo sujeito, da Cara de mamão


macho. Esta conversando muito, ou desce ou lá vai bala, vai
morrer sujeito.

Simão: Espere aí doutor, sendo assim eu vou, eu quero


dar bênção à mãe antes de morrer.

Cangaceiro: Vocês não sabem que esta música não po-


dem cantar? Seu cara de jumento sem mãe. Só lhe resta este pe-
dido. Vá dar bênção a sua mãe para morrer. Quando voltar e não
demore. Olhe eu vou cuspir no chão e antes de secar você tem que
voltar.

Simão: Eu agora vou dizer a mãe que vou morrer.


Simão sai de cena.
Os dois cangaceiros ficam tramando o massacre de
Simão, em cena: Vamos dar um quilo de sal para ele comer.
Vamos procurar uma cobra para ele comer, dar também uma gar-
rafa de vinagre para ele beber, fazer uma fogueira bem grande e
amarrar ele perto e acender a fogueira e mandar ele cantar mu-
lher rendeira.
Simão vem chegando em cena bem devagarinho
(com um) armado com um porrete e escutou toda conversa

79
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

dos cangaceiros, ele da um grito e fala o porrete cantando


velocidade os cangaceiros com um susto e a pancadario
não tem tempo de se defender, sai correndo e apanhando
pedido socorro.
Simão na lucidez fica batendo tudo que encontra e
dizendo: Ainda tem cangaceiro por ai? Simão para de bater e
diz puxa o fole, e fala, o forró sanfoneiro.
Chega D. Quitéria em cena.

Simão: Venha cá minha patroa, mais o homem só em-


pregado mesmo. Que beleza.

Continua outra cena.

Solon Alves de Mendonça

80
Rodrigo Sávio

11

A PASSAGEM DE SIMÃO
E SUA MÃE8

A cena começa com a música a seguir, cantada por


Simão, que de início ainda não aparece no cenário:

É coisa que a gente vê,


Não se cansa de olhar
Na Unicamp de Campina
Que eu vou me apresentar

Tanto faz daqui pra lá,


Como daqui pra li,
Como daqui pra lá

No dia nove do mei


Comecei a viajar (Nesse momento, Simão aparece)

Eu passei em Maceió
Foi uma grande animação

8 Esta passagem foi transcrita por Rodrigo Sávio, de forma literal, a par-
tir de uma gravação feita por Solon para a UNICAMP, em 1985, cuja
referência está no final desta obra.

81
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Junto com meus companheiro


cantando samba-canção

É coisa que a gente vê,


Não se cansa de olhar
Na Unicamp de Campina
Onde eu vou me apresentar

Eu passei lá na Bahia
Também tem o seu valor
É terra de Marta Rocha
Ruy Barbosa era dôtô.

Nesse momento, a mãe de Simão aparece em cena:

Mãe: Ô, cachorro! Como é que tu estás tão alegre agora


cantando?

Simão: Mai mãe, já vem atrasar aqui minha aboia9, mãe?

Mãe: Oia, porque eu sube que tu agora tava entrano pelo


cano.

Simão: Mãe, conversa é essa, mãe, entrar pelo cano?

9 No sentido de aboiar, cantar.

82
Rodrigo Sávio

Mãe: Apois, é. Disse tava numa danada duma tevelisão.


Tu entrano pelo cano todo dia, saino na tevelisão.

Simão: É tevelisão não, mãe, é televisão. Ah, véia burra


sendera!10

Mãe: O que é, cachorro, que tu tai me dizendo? O que é


que tu tai pensando da tua mãe? Eu te meto a mão na cara,
eu te cuspo!

Simão: Mãe, deixe de brabeza, mãe. Ah, mãe! A besta de


mãe, besta mãe.

Mãe: O que é?

Simão: Eu tô dano a bença, mãe, a bença!

Mãe: O quê?

Simão: Ah, véia moca11... Ah, véia moca da gota serena,


oxente!

Mãe: O que é?

10 Sendeira: mulher separada do marido; mulher divorciada; mãe


solteira.
11 Mouca: que não ouve ou ouve muito pouco; surda.

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Simão: Eu tô dano a bença, mãe, bença, bença mãe! Você


tá beba, tá?

Mãe: O que cachorro? Soi, soi, soi, soi...

Simão: Soi o que, mãe?

Mãe: Um cavalo bem gordo pra carregar esse pessoá todo


amontado.

Simão: Mai mãe tenha... mãe, me trate de outro jeito, mãe.


Como é que a senhora... um filho tão bonito que nem eu.

Mãe: Olha lá, cachorro. Tu num te lembra quando tu era


novim que só queria mamar, dizia: “mamãe eu quero ma-
mar, quero mamar”.

Simão: Tá aí, agora... agora danosse tudo. Ô mãe, sabe


duma coisa? É melhor mãe ir pra casa.

Mãe: Ah, eu no vo não porque agora tem um tá de Nova


República. Eu quero ver Nova República.

Simão: Mãe, deixe de bobage! Isso é... isso é piada de mal


gosto, mãe. Acabe com esse negócio de Nova República
porque, ói, só falta um pra completar o jogo agora do time,
mai tá tudo na mesma coisa.

84
Rodrigo Sávio

Mãe: Peraí, cachorro, tu no... tu no vai duvidar o que eu


estou te dizeno, cachorro?

Simão: Mai... mai ah véia sendera da gota serena!

Mãe: Quê? Quê que tá dizendo? Peraí que eu vou ver um


remédio bom pra tosse!

A mãe de Simão desce e volta com um cacete.

Simão: Mãe, que isso, mãe? Oxem, duma hora pra outra
mãe ficou doida?

Mãe: Doida o que, cachorro? Oia aqui, ó, o que eu trouxe


pra tu, cachorro! (Ela fala isso esfregando o porrete no ros-
to de Simão)

Simão: Ô navaia cega da mulesta. Ô mãe, sabe duma coi-


sa? Vá guardar esse pau, vamo tratar de outras conversa.
A senhora parece quer entrar na política. Ói, oia acabe com
esse negócio de política se não o seu cabelo voa no pau.

Mãe: O quê? Tu sabe que eu sou muito velha e conheço


muito bem a política de Washington Luiz. Eu ainda fui...
eu ainda trabalhei de babá para Washington Luiz.

Simão: Eita cá mulesta, oia, foi babá de Washington Luiz?

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Mai a véia é bem véia mesmo. Me diga uma coisa, a senho-


ra se lembra quando descobriu o Brasil?

Mãe: Bem, eu nessa vez eu vim com Pedro I, mai depois eu


voltei pra Portugal.

Simão: Tá mãe, agora já tá...

Mãe: O que, mentino o que, cachorro? Diz, diz de novo...


(E bate em Simão com o cacete)

Simão: Ai, mãe pera aí, mãe. Não bate neu não mãe, não
bata neu não mãe. (E a mãe bate novamente)

Mãe: Oia cachorro, cachorro tá vendo como é que tu apa-


nha ainda, cachorro. Tu pensa que eu tenho medo desse
bigode? Toma, cachorro! (Bate mais uma vez).

Simão: Mãe...mãe... peraí, mãe! Me dê esse pau, mãe, me


dê esse pau. Não bata mai em ninguém não porque eu po...
(Durante esse diálogo, Simão tenta tirar o cacete das mãos
da mãe. Em meio a essa tentativa, ele vira-se bruscamente
e acaba atingindo-a).

Mãe: Cachorro!

Simão: É não mãe, o pessoal dali tá veno, ói, tá veno, ói...

86
Rodrigo Sávio

(Simão fala essa frase interagindo com o público e, ao vi-


rar-se de volta, atinge a mãe propositalmente).

Mãe: Cachorro, tu tá bateno em mim, cachorro?

Simão: Não, mãe, batendo é se eu tivesse assim, ói... Assim


eu fazia... (Começa a bater na mãe).

Mãe: Cachorro! Eu te excomungo, ca... (Nessa hora, os dois


começam a disputar o cacete).

Simão: Solte esse pau... Não, peraí mãe... Solte... Solte,


mãe... Solte esse cacete, mãe... Solte esse cacete, mãe... Solte
esse pau, mãe... Eita danado... Peraí, solta.

Mãe: Cachorro...

Simão: Peraí, sabe duma coisa, mãe? Vamo embora pra


casa, mãe, vamo embora, vamo embora, mãe, vamo em-
bora.

Nesse momento, os dois saem de cena e a passagem se en-


cerra.

87
Rodrigo Sávio

12

A PASSAGEM DE SIMÃO
E O PATRÃO12

A cena tem início com a chegada do patrão, que


vem dançando ao som de um forró. Logo em seguida, co-
meça a cumprimentar o público:

Patrão: Senhores e senhoras, muito boa noite! Sou eu ca-


pitão Raimundo Rodoleiro Pinta Cédula. Cheguei dire-
tamente de São Saruê nesta capital. Tive um convite pra
apresentar aqui um espetáculo, eu sendo um caixeiro via-
jante não posso demorar. Espero encontrar um cidadão
competente pra ficar no meu lugar. Segundo eu fui infor-
mado, disse que tinha aqui um senhor por nome de Simão.
Se por acaso ele entrar num acordo, então a gente chegaria
uma conclusão. Segundo me parece que ele mora por aqui
mesmo. Ô da casa! Ô da casa!

Simão: Ô de fora, quem é que tá aí fora me chamando?

12 Esta passagem foi transcrita por Rodrigo Sávio, de forma literal, a


partir de uma gravação feita por Solon para a UNICAMP, em 1985, cuja
referência está no final desta obra.

89
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Patrão: Sou eu. Seu Simão?

Simão: É eu mesmo, já vou, já vou já. Ô mãe me dê um


chazinho de carbureto aí que eu vou lá fora. Me dê minha
cueca e meus tamanco. Mai ninguém pode mai dormir sos-
segado.

Patrão: Como é, seu Simão, vem ou não vem?

Simão: Já vou, patrão, já vou.


Eita lá, boa noite! (Nesse momento, Simão entra em
cena)

Patrão: Boa noite, seu Simão. Me diga uma coisa: como é o


seu nome?

Simão: Olhe, eu sou Simão de Lima Condessa Pereira Gon-


çalves Rego Ramos querido das menina, tá aí ela que não
deixa eu mentir.

Patrão: Tá certo. Eu sou capitão Raimundo Rodoleiro Pinta


Cédula.

Simão: Nome de ladrão de cavalo. (Diz isso virando-se


para o público)

Patrão: Que é que o senhor tá dizendo, rapaz?

90
Rodrigo Sávio

Simão: Não, eu tô dizendo que a minha vaca o chocai13


dela perdeu o badalo.

Patrão: Tá certo, tá certo. Bom, eu mandei chamar porque eu


preciso de um empregado que tenha bastante capacidade.

Simão: Ah, patrão! Ói, desde que eu nasci já nasci com


a capacidade. Ói, trabalhar é eu e uma criança. Eu gosto
tanto de trabalhar, dôtô, que quando eu chego no trabalho
assim que vê o nêgo batendo, batendo, batendo, eu chega
sinto uma tristeza lá no coração. Eu sou daquele brasileiro
que fica com a boca aberta esperano que cai de cima um
milagre pra encher a barriga.

Patrão: Que é que ocê está dizendo, seu Simão?

Simão: Não, eu tô dizeno aqui minha poesia que eu sou


poeta também, patrão. Se por acaso o senhor tiver algum
lugar pra fazer poeta eu também sou poeta.

Patrão: Tá certo. Então você é um rapaz bem preparado.

Simão: Demais até!

Patrão: Me diga uma coisa: quanto é que você quer ficar

13 Chocalho: tipo de sineta que se prende ao pescoço do gado.

91
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

como meu empregado?

Simão: Patrão é quem sabe.

Patrão: Bem, eu lhe dou... dez.

Simão: Mai, tá, patrão, tudo tá bom, mai o senhor tá ven-


do o jeito que o cruzeiro tá desapareceno. Todo dia ele tá
perdendo o ponto. Tá ficano dest’amaím pra eu ficar por
dez, patrão? Pra enfrentar isso... Olhe, dez não dá nem pra
pagar o café da manhã.

Patrão: Tá certo. Mas você agora diz quanto fica.

Simão: Bem, eu fico por cinco.

Patrão: Pera lá. Cinco é mai do que dez?

Simão: Bom, na minha conta é.

Patrão: Qualé a sua conta?

Simão: Olhe, é cinco de manhã, cinco às seis e meia, cinco


quando eu me levantar...

Patrão: Já vai quinze!

92
Rodrigo Sávio

Simão: Cinco pra eu sentar na mesa pra tomar café...

Patrão: Vinte!

Simão: Cinco pra me levantar e acender o cigarro...

Patrão: Vinte e cinco!

Simão: Cinco pro senhor me dizer aonde é que eu vou tra-


balhar.

Patrão: Trinta e chega! Assim no há quem possa lhe pagar.

Simão: Bem, patrão, o senhor tá vendo, né...

Patrão: Bom, eu vou fazer minha segunda proposta. Eu


vou lhe dar dez. O senhor tem... tem férias, direito à féria,
tem casa pra morar, tem almoço, janta, ceia, café a hora que
você quiser, tem seguro de vida, décimo terceiro salário,
fundo de garantia.

Simão: Ah, o patrão dano o fundo eu fico, né?

Patrão: Pera aí, rapai! É um dinheiro que eu boto no banco.


Você quando sair vai receber.

Simão: Ah, é uma lapa de cédula dest’amaim que eu vou

93
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

receber no banco da miséria.

Patrão: Me diga uma coisa: quando é que você vai começar


a trabalhar?

Simão: O patrão é quem sabe.

Patrão: Bom, nesse caso, que dia é hoje?

Simão: Bom, hoje... hoje eu não posso não, porque eu te-


nho um encontro aí, coisa e tal. Hoje eu não posso, patrão.
Tenha paciência.

Patrão: Bom, nesse caso você começa amanhã que é sexta-


feira. Você começa amanhã!

Simão: Tá, patrão, peraí. Sexta-feira é dia de eu bater


bombo aí numa macumba, um rapai tá doido pa se casar.
Aí eu já marquei com ele pra bater dois vintém de bombo.

Patrão: Bem, nesse caso você começa no sábado.

Simão: Tá aí, patrão, sábo não dá também porque eu vou


fazer a (trecho não compreendido) de mãe. Ela precisa...
ela não pode, ela já tá velhinha, já tá com... foi no tempo de
Dom Pedro I, coisa e tal.

94
Rodrigo Sávio

Patrão: Tá certo. Bem, então nesse caso você começa no


domingo.

Simão: Tá aí, patrão, tudo comigo eu faço, mai trabalhar no


domingo jamaaais! Patrão e quem trabalha no domingo é o
povo que ainda tá esperando alguma coisa na vida. Eu no
espero mais nada porque a gente tá vendo que o negócio tá
apertando todo dia.

Patrão: Tá certo. Bom, nesse caso você começa segunda-


feira.

Simão: Tá aí, patrão, segunda-feira não dá também porque


é dia das aima e se eu for trabalhar vou pro inferno e eu
não quero quando morrer ir pro inferno.

Patrão: Me diga uma coisa: qualé o dia que o senhor quer


trabalhar?

Simão: Bem, patrão, o senhor é quem sabe, né?

Patrão: Bom, nesse caso você começa na terça.

Simão: Olhe, terça-feira não dá porque é dia de eu entregar


uma roupa que faz é dia que tá lá em casa. Mãe recebeu pra
lavar e todo dia diz: Simão, vai entregar essa roupa. Eu aí
digo: Bom, então mãe, eu vou entregar na terça-feira.

95
Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Patrão: Tá danado, eu já tô esquentano a cabeça!

Simão: Pera aí, patrão, no esquente a cabeça não que tem aí


gelo pro senhor bota uma bolsinha, e coisa, e esfria.

Patrão: Bom, nesse caso você começa terça-feira!... na quar-


ta-feira!!! Certo?

Simão: O senhor já tá errando aí já, no é, também?

Patrão: Bem, eu no errei, é porque eu já tô esquentano a


cabeça.

Simão: Bem, na quarta-feira num vai dar porque é o único


dia que eu tenho pra tirar o feixinho de lenha pra velha co-
zinhar o feijão. E o senhor sabe, eu faço a feira e coisa e tal.
E é isso. Sem comer ninguém pode viver. E aí eu tenho que
tirar o feixe de lenha pra mãe cozinhar o feijão.

Patrão: Sabe de uma coisa? Se dane, vá pro inferno que eu


num quero mais conversa com você! Você é um imbecil e
eu vou chamar a patroa pra ver se ela pode lhe entender!

Simão: Ah, e o patrão tem patroa, não tem?

Patrão: Mas é claro!

96
Rodrigo Sávio

Simão: Se ela for bonita eu fico é de graça. (Fala isso intera-


gindo com o público)

Patrão: Que é que você está dizendo, rapai?

Simão: Não, eu tô dizendo aí que tem um camarada ali


tomano cachaça.

Patrão: Tá certo. Bem, eu já vou, vou chamar a patroa.

Nesse momento, quando o patrão vai saindo de cena, Si-


mão o chama:

Simão: Ei, patrão!

Patrão: Que é que você quer, rapai?

Simão: Quando é que o senhor vai me dar meu aumento?

Patrão: Que aumento se você no começou trabalhar ainda,


rapai?

Novamente, quando o patrão vai se retirando, Simão volta


a chama-lo:

Simão: Bem... Patrão, venha cá, venha cá! E o décimo tercei-


ro vai sair ou não vai? Ói, se o senhor num der eu faço greve!

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Patrão: Se dane, vá pro inferno que eu não quero mais con-


versa com você!!! (E sai de cena)

Simão: Mai o patrão não quer acertar a escrita dele dado


comigo, mai se a patroa chegar e coisa...

Nesse momento, a patroa aparece em cena.

Patroa: Ô, Simão... É você que é o Simão?

Simão: Sou eu todinho, patroa.

Patroa: Me diga uma coisa: você... como é o seu nome?

Simão: Ói eu sou Simão de Lima Condessa Pereira Gon-


çalves Rego Ramos, querido das menina tá aí ela que não
deixa eu mentir.

Patroa: Bem, me diga uma coisa: você fuma, bebe, joga?

Simão: Eu nem fumo, nem bebo, nem jogo, nem danço,


nem durmo, nem como. Olhe, quando estou empregado eu
fico só lá de coca, lá no terreiro, botando sentido em tudo
que é do patrão.

Patroa: Bem, então vou falar com Manezinho. Parece que


você serve.

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Rodrigo Sávio

Ô Manezinho! Ô Manezinho!

Patrão: Oi!

Patroa: Venha cá depressinha que eu preciso falar com


você. (O patrão volta à cena).
Me diga uma coisa... Bom Manezinho, parece que
o rapai serve.

Patrão: Bem, se ele não servir manda ele embora, porque


eu já combinei com ele. Caso você... Ele... Qualquer coisa
você dá o direito que ele tem e manda ele embora.

Patroa: Bom Manezinho, então vamo dançar aqui um pou-


quinho pra ver se você num sai assim... você tem que via-
jar, apanhar o próximo avião.

Patrão: Pois é, as maletas já tão pronta.


Música mestre, música.

Simão: Eu vou lá embaixo tomar um chá de carbureto ago-


ra.

Simão sai de cena e fica apenas o casal dançando no cená-


rio. Depois, o patrão vai embora e Simão chega para dan-
çar com a patroa.

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Mestre Solon e o Mamulengo Invenção Brasileira

Simão: Venha cá, patroa. Mas óia, óia, mas óia pra eu, óia.
Só eu dano um beijim logo assim.... Ô, danadinha, óia. (Si-
mão beija a patroa)

Simão sai de cena e fica apenas a patroa dançando em cena,


encerrando a passagem.

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Rodrigo Sávio

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