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Relatório Nº.

-CV

CABO VERDE

Desenvolvimento do Turismo em Cabo Verde:


Terá chegado o momento de abandonar o modelo all-inclusive?

13 de Novembro, 2013

Desenvolvimento do Sector Privado e Financeiro


Região África

Documento do Banco Mundial

Este documento tem uma distribuição restrita e só poderá ser utilizado pelos destinatários no desempenho das
suas funções oficiais. O conteúdo não poderá ser divulgado sem a autorização do Banco Mundial.
ABREVIAÇÕES E ACRÓNIMOS

€ Euro
Departamento de Desenvolvimento do Sector Financeiro e Privado da Região África
AFTFP
–Finance and Private Sector Development Department of the Africa Region
AI All-Inclusive
APTM Agência de Promoção do Turismo das Maurícias
ASA Aeroportos e Segurança Aérea
ATM Autoridade de Turismo das Maurícias
B&B Bed and Breakfast
CIS Conselho de Investimentos das Seychelles
CPE Centro de Políticas Estratégicas - Gabinete do Primeiro Ministro
CTS Conselho de Turismo das Seychelles
CVE Escudos Cabo Verdianos
DECRP Documento Estratégico de Crescimento e Redução da Pobreza
DGT Direcção Geral do Turismo
DNTT Delegação Nacional de Turismo da Tunísia
EHTCV Escola de Hotelaria e Turismo de Cabo Verde
EIA Estudo de Impacto Ambiental
FDI Investimento Directo Estrangeiro
FMI Fundo Monetário Internacional
FVF Frutas e Vegetais Frescos
INE Instituto Nacional de Estatísticas
IVA Imposto sobre o Valor Acrescentado
ODI Overseas Development Institute
ONT Organização Nacional do Turismo
PIB Produto Interno Bruto
PMA País Menos Avançado
PRM País de Rendimento Médio
PSIA Avaliação do Impacto Social e da Pobreza - Poverty and Social Impact Assessment
QUIBB Questionário Unificado de Indicadores Básicos de Bem-Estar
Receita por quarto disponível (i.e. TMD multiplicada pela taxa de ocupação de
RecPQD
quartos)
SDTIBM Sociedade de Desenvolvimento Turístico da Boa Vista e Maio
Avaliação Estratégica Ambiental e Social – Strategic Environmental and Social
SESA
Assessment
SIB Conselho de Investimentos das Seychelles
Marca de Sustentabilidade do Turismo das Seychelles – Seychelles Sustainable
SSTL
Tourism Label
STB Conselho de Turismo das Seychelles
TACV Transportes Aéreos de Cabo Verde
TBC Turismo Baseado na Comunidade
TMD Taxa Média Diária
WTTC Conselho Mundial de Viagens e Turismo – World Travel and Tourism Council
ZDTI Zona de Desenvolvimento Turístico Integrado

Vice-presidente: Makhtar Diop


Directora para o País: Vera Songwe
Director do Sector: Gaiv Tata
Gestor do Sector: Paul Noumba Um
Líder da Equipa Tarefa: Andres F. Garcia

i
TABELA DE CONTEÚDOS

I. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................... 1
II. CONTEXTO MACROECONÓMICO ................................................................................................... 2
III. O DESEMPENHO DO SECTOR DO TURISMO E A QUOTA DE RESORTS ALL-INCLUSIVE . 4
A. CHEGADAS ................................................................................................................................................. 4
B. ALOJAMENTOS ........................................................................................................................................... 5
C. ACESSO AÉREO .......................................................................................................................................... 5
D. PRINCIPAIS MERCADOS DE ORIGEM ......................................................................................................... 6
IV. O IMPACTO ECONÓMICO DO TURISMO ................................................................................... 7
A. CONTRIBUIÇÃO PARA O PIB ...................................................................................................................... 7
B. RECEITAS DO GOVERNO PROVENIENTES DO TURISMO ............................................................................ 8
C. EMPREGOS NO SECTOR DO TURISMO ....................................................................................................... 9
D. FLUXOS INDIRECTOS PARA A ECONOMIA PROVENIENTES DA ACTIVIDADE TURÍSTICA ......................... 9
E. DESPESAS DE TURISMO NA ECONOMIA LOCAL ...................................................................................... 10
F. EFEITO DO TURISMO NA POBREZA ......................................................................................................... 10
G. VAZAMENTOS ........................................................................................................................................... 12
V. ANÁLISE DO MODELO DE DESENVOLVIMENTO ALL-INCLUSIVE ......................................... 13
A. A DEPENDÊNCIA DE CABO VERDE DOS RESORTS ALL-INCLUSIVE.......................................................... 13
B. RAZÕES QUE LEVARAM AO SURGIMENTO DO MODELO ALL-INCLUSIVE ................................................ 14
C. OPINIÃO PÚBLICA RELATIVAMENTE AO TURISMO DE LARGA ESCALA................................................. 15
D. O IMPACTO ECONÓMICO LOCAL DOS RESORTS ALL-INCLUSIVE ........................................................... 16
E. IMPLICAÇÕES PARA UM FUTURO MODELO DE DESENVOLVIMENTO DO TURISMO ............................... 20
VI. OPORTUNIDADES PARA OPTIMIZAR O MODELO ALL-INCLUSIVE ................................... 21
A. ENQUADRAMENTO INSTITUCIONAL ........................................................................................................ 21
B. CADEIA DE ABASTECIMENTO DA PESCA ................................................................................................. 24
C. EMPREGOS NO SECTOR DO TURISMO ..................................................................................................... 28
D. PROTECÇÃO AMBIENTAL ........................................................................................................................ 29
E. MELHORAR O AMBIENTE DE NEGÓCIOS PARA O SECTOR DO TURISMO ............................................... 31
VII. CONCLUSÕES ................................................................................................................................. 33
REFERÊNCIAS ........................................................................................................................................... 35

ii
Tabelas, Figuras e Caixas

Tabelas
TABELA 1: PRINCIPAIS INDICADORES DE TURISMO ............................................................................................. 8
TABELA 2: TAXA DE POBREZA NO TURISMO, AGRICULTURA E PESCAS, 2010 ................................................... 12
TABELA 3: PERCENTAGEM DE AQUISIÇÕES LOCAIS DE VEGETAIS, ALIMENTOS FRESCOS E PEIXE .................... 13
TABELA 4: DIMENSÃO, TAXA DE OCUPAÇÃO E ESTIMATIVA DO NÚMERO DE HÓSPEDES NOS OITO AI ............. 14
TABELA 5: QUOTA DE CONTEÚDO LOCAL NOS HOTÉIS SELECCIONADOS .......................................................... 20

Figuras
FIGURA 1: PRINCIPAIS ACTIVIDADES ECONÓMICAS EM PERCENTAGEM DO PIB, 1998 A 2011 ............................ 3
FIGURA 2: CHEGADAS INTERNACIONAIS DE TURISTAS, 1999-2011 ..................................................................... 4
FIGURA 3: O DOMÍNIO DO MERCADO CHARTER NO TRANSPORTE AÉREO PARA CABO VERDE, 2011 .................. 6
FIGURA 4: PRINCIPAIS MERCADOS DE ORIGEM (2000-2011)............................................................................... 6
FIGURA 5: VALOR ACRESCENTADO DAS ACTIVIDADES DE TURISMO EM PERCENTAGEM DO PIB EM 2010 ......... 7
FIGURA 6: SATISFAÇÃO DOS TURISTAS E QUALIDADE DAS EXCURSÕES, ÉPOCA DE INVERNO 2011/12 ............. 10
FIGURA 7: ALTERAÇÕES NA INCIDÊNCIA DE POBREZA DE 2000 A 2010 ........................................................... 111
FIGURA 8: CHEGADAS DE TURISTAS A CABO VERDE POR PARTE DE UM OPERADOR TURÍSTICO EMISSOR ...... 144
FIGURA 9: DESEMPENHO DOS HOTÉIS E CONTEÚDO LOCAL .............................................................................. 19
FIGURA 10: PESCA CUMULATIVA PELA FROTA ARTESANAL POR ESPÉCIE, 1990-2005 (TONELADAS) ............... 25
FIGURA 11: CADEIA DE ABASTECIMENTO ACTUAL DE PEIXE NO SAL E BOA VISTA .......................................... 26
FIGURA 12: RANKING NO ÍNDICE DE FACILIDADE EM CONDUZIR NEGÓCIOS EM 2012 ...................................... 32

Caixas
CAIXA 1: INCENTIVOS FISCAIS PARA O SECTOR DO TURISMO EM CABO VERDE .................................................. 9
CAIXA 2: TURISMO BASEADO NA COMUNIDADE – UM MODELO PARA O FUTURO? ........................................... 21
CAIXA 3: MODELOS DE ONTS DAS MAURÍCIAS, SEYCHELLES E TUNÍSIA ........................................................... 23
CAIXA 4: ESTIMAR O CUSTO DO PEIXE IMPORTADO DE ESPANHA ..................................................................... 25
CAIXA 5: A MARCA DE SUSTENTABILIDADE DO TURISMO DAS SEYCHELLES .................................................... 31

iii
Prefácio
Este estudo foi preparado sob a supervisão de Andres F. Garcia e Eneida Fernandes (AFTFP)
em colaboração com Manuel Pinheiro e João Tavares do Centro de Políticas Estratégicas (CPE)
do Gabinete do Primeiro Ministro de Cabo Verde. O consultor Jonathan Mitchell (Coffey
International, mas associado à ODI durante a preparação deste relatório) liderou a pesquisa de
terreno e a elaboração do relatório em conjunto com o consultor Pedro Martins (ODI). A análise
de pobreza foi liderada por Ericka G. Rascon com apoio de Thomas I. Martin (Universidade
de Essex, Instituto para a Pesquisa Social e Económica), e em parceria com António Duarte e
Rene Charles Sylva (Instituto Nacional de Estatísticas de Cabo Verde). O consultor Bradley
Weiss, do Banco Mundial, apoiou a fase final de elaboração do documento. Foram fornecidas
orientações durante a fase de concepção e implementação do estudo por parte de Alvaro
Gonzalez, Fernando Blanco, Jean Michel Marchat, Jose de Bettencourt, Hannah Messerli, Phil
English, Ricardo Varsano, Tanya Lisa Yudelman, and Vincent Palmade (Banco Mundial). A
liderança e a orientação geral foram providenciadas por Vera Songwe (Directora para o País),
Gaiv Tata (Director do Sector), Paul Noumba Um (Gestor do Sector), e Marie-Chantal
Uwanyiligira (Coordenadora do Programa para o País). Este estudo foi financiado pelo Trust
Fund PSIA.

Este estudo é baseado no conhecimento prévio do sector do turismo de Cabo Verde e em cerca
de 60 entrevistas com intervenientes baseados em Cabo Verde e em outros locais com interesse
na cadeia de valor de turismo. Em Cabo Verde, as entrevistas foram conduzidas na Praia, Fogo,
Santo Antão, São Vicente, Sal e Boa Vista. Este é um método baseado em pesquisa-acção, que
tem uma base empírica que prioriza a análise da informação de mercado dos principais
stakeholders obtida nas viagens de colecta de dados ao arquipélago. Assim sendo, grande parte
dos dados estatísticos não envolvem amostras estatisticamente significantes, que estavam além
do âmbito e recursos disponíveis.

A análise de pobreza foi realizada em colaboração com o Instituto Nacional de Estatística


utilizando dados dos agregados do Questionário Unificado de Indicadores Básicos de Bem-
Estar (QUIBB) de 2007 e do Censo de 2010. A incidência de pobreza foi estimada a nível de
ilha, concelho e freguesia baseado no método desenvolvido por Elbers e Lanjouw (2003).

iv
I. Introdução
1. Durante duas décadas no período pós-independência em 1975, a economia de Cabo
Verde era dominada pelo sector primário (principalmente agricultura, com alguma pesca e
actividade mineira), alguma indústria (principalmente processamento de alimentos, bens e
serviços de utilidade pública e serviços de expedição internacional) e remessas recebidas das
vastas comunidades emigrantes e expatriadas. A escassez de recursos naturais significava que
as exportações eram muito limitadas. Apesar de ter um bom clima e vários quilómetros de praia
não explorada, o turismo internacional no período anterior a meados da década de 1990 era
restrito principalmente a membros da diáspora1 que regressavam para visitar amigos e
familiares - um fluxo regular de 20.000 a 30.000 por ano. Todavia, em 1993, o Governo
começou a reconhecer o potencial do turismo enquanto fonte de moeda estrangeira e de criação
de emprego. O Governo iniciou então a aquisição de terrenos amplos no Sal e Boa Vista, duas
ilhas com praias atractivas e pouca população. Adicionalmente, criaram-se zonas especiais de
desenvolvimento do turismo (ZDTIs) para encorajar o investimento estrangeiro (Twining-
Ward-2010). Em 1999, as duas ilhas já contavam com 20 estabelecimentos de alojamento e as
chegadas de turistas atingiram 67.000.

2. O ritmo das novas construções acelerou no início e até meados da década de 2000,
especialmente no segmento de grandes projectos de alojamento. Os investidores estrangeiros
foram responsáveis pela maioria dos projectos, e mesmo quando os investidores domésticos se
envolviam era tipicamente em conjunto com firmas internacionais. Em linha com a oferta
crescente, as chegadas desde 2004 cresceram a ritmo notável atingindo 428.000 em 2011.
Adicionalmente, a contribuição do turismo para o PIB cresceu de 5% em 2000 para cerca de
20% em 2011. Este aumento nas receitas provenientes do turismo é um dos principais factores
que levou Cabo Verde a graduar do estatuto de País Menos Avançado (PMA) em Dezembro
de 2007.

3. O crescimento do turismo em Cabo Verde adveio do posicionamento como um destino


de «sol, mar e areia», principalmente nos mercados de média distância na Europa Ocidental
que podem ser alcançados em 4 a 5 horas. Embora Cabo Verde demonstre uma cultura nacional
vibrante que reflecte uma mistura única de influências Europeias e da África Ocidental, e é
internacionalmente reconhecido pelos seus estilos de música autóctones (particularmente a
música tradicional morna), o turismo cultural representa apenas uma fracção da indústria. O
desenvolvimento do turismo em geral, e especialmente os projectos mais recentes, tende a
favorecer o modelo de resorts all-inclusive de larga escala (AIs)2. Os alojamentos mais
pequenos e centrais localizados em vilas e cidades tendem a servir a população local ao invés
de visitantes internacionais.

4. O modelo AI tem sido objecto de cepticismo em alguns stakeholders. A sabedoria


convencional é que este tipo de resorts têm altos níveis de «fugas» ou vazamentos, o que leva

1
As estimativas da dimensão da diáspora Cabo Verdiana a viver no exterior variam substancialmente, mas até as estimativas mais
conservadoras sugerem que há mais pessoas com descendência de Cabo Verde a viver no estrangeiro do que a população residente de
450,000 no arquipélago (Jorgan Carling «Policy Challenges Facing Cape Verde in the areas of migration and diaspora contributions to
development» International Peace Research Institute Oslo (PRIO) Abril de 2008).
2
Neste relatório, utilizamos o termo “all-inclusive” para todos os resorts no Sal e Boa Vista embora alguns só ofereçam meia pensão
(pequeno-almoço e jantar). Agrupámos todos os resorts sob este termo porque as estruturas e hábitos de despesas são bastantes similares.

1
a uma integração reduzida na economia nacional. Os resorts AI são maioritariamente detidos
por não nacionais, resultando isto numa repatriação dos dividendos para o estrangeiro.
Também, os resorts AI tendem a desencorajar os turistas de sair das instalações, o que limita
as despesas directas dentro da economia local. Todavia, empregam trabalhadores nacionais,
pagam impostos, e adquirem alguns produtos alimentares localmente. Um dos principais
objectivos deste estudo é providenciar uma análise profunda e empírica do impacto económico
local dos resorts AI quando comparados com outros tipos de alojamento em Cabo Verde.

5. Os resultados desta análise podem providenciar uma base a partir da qual se poderá
construir um modelo de desenvolvimento de turismo que Cabo Verde poderá seguir nos anos
seguintes. O turismo é um dos três clusters de topo identificados na versão inicial do
Documento de Estratégia de Crescimento e de Redução da Pobreza (DECRP III) - em conjunto
com o agro-negócio e economia marítima - que podem ter um impacto mais significativo na
redução da pobreza e geração de crescimento. Adicionalmente, o Governo de Cabo Verde irá
iniciar em breve a preparação da nova edição da Estratégia de Desenvolvimento do Turismo.

II. Contexto Macroeconómico


6. Cabo Verde enfrenta alguns desafios macroeconómicos inerentes. O país tem uma base
limitada de recursos naturais, uma quantidade reduzida de terras aráveis, e ausência de recursos
energéticos tradicionais. Isto cria uma dependência excessiva de importações. Adicionalmente,
a população pequena e relativamente dispersa limita as economias de escala, enquanto cria
indivisibilidades dispendiosas na administração pública (Banco Mundial 2013).

7. No entanto, apesar destes desafios, Cabo Verde tem desfrutado de um sucesso


económico notável ao longo da última década e meia. Desde o final dos anos 90, a economia
mais do que duplicou em volume em termos nominais e o rendimento per capita cresceu a uma
média anual de 4,6%, atingindo 3.270 USD em 2010 (Banco Mundial 2013). A pobreza tem
sido significativamente reduzida durante este período em conjunto com melhorias sustentadas
em diversos planos do desenvolvimento social e humano.

8. Muito do sucesso de Cabo Verde pode ser atribuído à boa governação baseada numa
democracia estável de cariz multipartidário. O país tem sido amplamente elogiado por
promover políticas económicas que reflectem as suas vantagens comparativas. Neste âmbito,
as políticas que mais se destacam são as que estimularam a indústria do turismo, em particular
o nicho de mercado «sol e mar». De particular importância foram os pacotes de incentivos
generosos oferecidos a investidores estrangeiros, um regime de taxa de câmbio que liga o
Escudo Cabo Verdiano (ECV) ao Euro, e alguns investimentos estratégicos em infraestruturas
físicas. O potencial de outros activos de turismo - tais como a biodiversidade rica, a cultura e
as paisagens, e a diversidade ecológica existente em todo o arquipélago - ainda não foi
realizado.

9. Os resultados do apoio ao sector do turismo foram volumes substanciais de


investimento directo estrangeiro, e a transição impressionante de uma economia dominada pela
agricultura e indústria ligeira para a economia actual baseada maioritariamente em serviços.
Os serviços representam agora mais de 70% do PIB e 90% das exportações (Banco Mundial

2
2012). A importância fundamental do turismo na economia nacional é óbvia, mesmo a partir
desta visão superficial. Com base em estimativas do INE, desde 2008 o turismo tem
representado quase 20% da economia nacional de Cabo Verde3.

10. Os sectores primário e industrial, conforme ilustrados na Figura 1, têm decrescido de


cerca de 20% do PIB no final da década de 90 para apenas 5% e 6% em 2011, respectivamente.
Isto reflecte duas tendências. A primeira é a contração económica impressionante destes
sectores. Mesmo em termos nominais, o rendimento de ambos os sectores decresceu para quase
metade ao longo da última década. A segunda é o aumento notável da dimensão do resto da
economia em que foi necessário um crescimento forte em todos os sectores não turísticos
somente para manterem as suas proporções relativas. A construção foi excluída do sector
secundário nesta análise devido à forte associação que tem com o desenvolvimento do turismo.
A sua exclusão ajuda a clarificar a tendência de declínio do sector industrial em Cabo Verde.

11. Os dois grandes fluxos de transferências que têm sustentado a economia de Cabo Verde
- remessas e ajuda oficial - encontram-se num processo de mudança em termos relativos e
absolutos. As remessas têm crescido gradualmente em termos nominais, mas com o
crescimento da economia ao longo da última década, a sua dimensão em termos relativos
decresceu. A graduação de Cabo Verde do estatuto de País Menos Avançado irá significar a
perda de acesso à maioria da ajuda concessional a partir de 2013, o que irá quase certamente
resultar numa redução dos fluxos da ajuda - tanto em termos relativos como absolutos.

Figura 1: Principais Actividades Económicas em Percentagem do PIB, 1998 a 2011.

25%

20%
% do Produto Interno Bruto

Turismo
15%
Transporte Aéreo
10% Sector Primário

5% Indústria

0%
1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010

Fonte: Banco Central 2012a e 2012b

12. Como consequência, Cabo Verde tornou-se fortemente dependente do turismo. As


vulnerabilidades associadas à diversificação económica limitada do país são amplificadas pelo
facto de que a vasta maioria dos turistas são provenientes da Europa Ocidental. No entanto,
durante a crise económica mundial de 2008 que afectou particularmente a Zona Euro, a
indústria de turismo de Cabo Verde provou ser resiliente com as chegadas de turistas a

3
As estimativas da contribuição do turismo para o PIB variam substancialmente, especialmente tendo em conta que Cabo Verde não tem
contas satélite do turismo.

3
crescerem 6,7% em 2008, quase 1% em 2009, e a recuperarem em pleno em 2010 com um
crescimento de 17% e em 2011 com 27%.

13. Embora as políticas contra-cíclicas adoptadas em anos recentes tenham sido capazes de
mitigar os efeitos do abrandamento económico mundial, Cabo Verde já esgotou o seu espaço
orçamental e encontra-se assim exposto a riscos acrescidos de uma deterioração na crise da
dívida da Zona Euro. Isto deixa o país com flexibilidade limitada para enfrentar algum futuro
choque externo. Os desafios orçamentais actuais são amplificados pela redução na
disponibilidade de endividamento concessional a partir de Janeiro de 2013 como consequência
do novo estatuto de Cabo Verde como País de Rendimento Médio. Como resultado, o
financiamento do investimento público através de um acréscimo de dívida pode reduzir o
crescimento de longo prazo (Banco Mundial 2013). O futuro apoio do Governo de Cabo Verde
ao sector do turismo deverá ter estes factores em consideração.

III. O Desempenho do Sector do Turismo e a Quota de Resorts All-


Inclusive
A. Chegadas
14. Até meados da década de 90, as chegadas não excederam 30.000 por ano e consistiam
principalmente de membros da comunidade da diáspora que visitavam família e amigos. No
entanto durante o período de 1999 a 2011, as chegadas internacionais de turistas cresceram
cerca de 18% por ano (de 67.000 para 428.0004). Esta taxa de crescimento impressionante
representa cerca de quatro vezes a média global durante o mesmo período (ligeiramente acima
de 4%). O país registou crescimento mesmo durante a crise económica global de 2008-2009
(ver a Figura 2).

Figura 2: Chegadas Internacionais de Turistas 1999-2011

500.000
Chegadas internacionais de

400.000

300.000
turistas

200.000

100.000

0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Fonte: Banco Mundial WDI (2013)

4
As estatísticas internacionais de chegadas de turismo são disputadas uma vez que as estimativas da empresa de gestão aeroportuária em
Cabo Verde (Aeroportos e Segurança Aérea) são baseadas no tráfego aéreo internacional e incluem visitantes que estão em trânsito e que
são trabalhadores migrantes (i.e. pessoas que chegam aos aeroportos de Cabo Verde mas não são turistas). É por esta razão que este estudo
utiliza dados do Banco Mundial, que excluem os passageiros em trânsito e os migrantes das estatísticas do turismo.

4
B. Alojamentos
15. Os alojamentos turísticos em Cabo Verde estão fortemente concentrados nas ilhas do
Sal e Boa Vista, uma tendência que tem aumentado de forma constante desde o início da década
de 2000. Em 2011 existiam 7.901 quartos em 195 hotéis espalhados pelas 9 ilhas habitadas, no
entanto cerca de 75% destes quartos estavam localizados no Sal e Boa Vista com uma
repartição semelhante entre estas duas ilhas. O número de noites dormidas por visitantes em
2011 revelam que as duas ilhas têm uma percentagem de cerca de 90% da quota de mercado.
Tendo em conta a abertura de novas unidades hoteleiras na Boa Vista, é provável que estas
duas ilhas continuem a dominar o mercado de hotéis em Cabo Verde no futuro próximo.

16. Mesmo no Sal e Boa Vista, a actividade dos turistas encontra-se fortemente concentrada
num pequeno número de grandes resorts AI. Os quatros maiores hotéis de cada uma destas
ilhas têm um total combinado de 4.157 quartos, ou 53% de todos os quartos de hotel no país.
Adicionalmente, estes resorts AI acomodam uma percentagem ainda maior do fluxo de turistas
uma vez que têm uma taxa elevada de ocupação de quartos duplos e também de ocupação geral.
Estima-se que em 2011 estes hotéis tenham acomodado cerca de 326.900 turistas, o que
representa cerca de dois terços do total de chegadas de turistas a Cabo Verde.

17. Dos oito resorts AIs, três são propriedade da empresa RIU Resorts. Estes têm uma
dimensão média de 901 quartos e representam cerca de 34% do stock nacional de alojamento.
Este facto reflecte a proeminência do Grupo TUI5, um operador turístico Europeu que detém
uma percentagem significativa da RIU Resorts. Estima-se que a TUI seja responsável por cerca
de metade de todas as chegadas a Cabo Verde.

C. Acesso Aéreo
18. Cerca de três quartos das chegadas internacionais (e a maioria esmagadora dos turistas)
não utilizam voos comerciais regulares, e o transporte aéreo como um todo é por isso dominado
pelo sector charter. O Grupo TUI (sob as marcas Thomson, TUI Fly Nordic, Jet Air Fly e TUI
Fly GMBH) transporta mais passageiros do que as duas maiores companhias de serviços aéreos
regulares combinadas. Adicionalmente, as companhias charter Italianas (NEOS SPA), Alemãs
(Hapag Lloyd Fluggesellschaft) e Portuguesas (SATA Internacional) transportam 20.000
passageiros internacionais adicionais de e para Cabo Verde anualmente.

19. Actualmente Cabo Verde tem apenas duas grandes companhias de transporte aéreo
internacional regular: TAP Air Portugal e a companhia nacional, TACV. Em 2011, apenas 27%
dos 457.037 passageiros internacionais aéreos chegaram ou transitaram em Cabo Verde a viajar
nestas companhias (ver Figura 3). Este facto reflecte parcialmente o facto de que os serviços
regulares actuais servem os principais mercados para emigrantes Cabo Verdianos (i.e. Portugal
e os EUA) e não os principais mercados de origem dos turistas. Também reflecte os
constrangimentos regulatórios para outras companhias que querem estabelecer serviços aéreos
frequentes a partir dos principais mercados que fornecem turistas para Cabo Verde.

5
A TUI Nordeste inclui o Reino Unido e os mercados nórdicos e a TUI Europa Central inclui principalmente o mercado Alemão com
cobertura dos mercados Austríaco e Polaco.

5
Figura 3: O Domínio do Mercado Charter no Transporte Aéreo para Cabo Verde, 2011

Chegadas Internacionais de Passageiros em 2011


51.622
69.992 TAP Air Portugal
23.291
TACV

Companhias do Grupo TUI


48.825 55.159
NEOS Spa (Itália)

Hapag Lloyd Fluggesel. (Alemanha)


54.954
Sata International (Portugal)

153.194 Outros

Fonte: ASA (2012)

D. Principais Mercados de Origem


20. O crescimento do turismo tem sido sustentado pelos mercados da Europa Ocidental.
Em 2000, o principal mercado Europeu era Portugal (22,2%), o que não surpreende tendo em
conta as ligações históricas e linguísticas (ver Figura 4). O segundo e terceiro mercado em 2000
eram a Itália (19,7%) e a Alemanha (12,2%), respectivamente. Portugal manteve-se como o
principal mercado de origem até 2011, quando foi ligeiramente ultrapassado pela França. A
quota de mercado da França duplicou de 7% em 2000 para 14% em 2011. A quota de mercado
de Itália decresceu para 11,9% em 2011, em parte devido às condições económicas difíceis
nesse país. A quota de mercado da Alemanha aumentou ligeiramente entre 2000 a 2011 para
12,7%. É também importante notar que o número de turistas provenientes de outras origens
que não estes cinco países da Europa Ocidental aumentou ao longo deste período, de 36,7%
em 2000 para 44,7% em 2011 (INE 2012). Este facto indicia uma melhor diversificação dos
mercados de origem.

Figura 4: Principais Mercados de Origem (2000-2011)


Quota de Percentagem das

Other Markets
Outros Mercados
France
França
Chegadas

Spain
Espanha
Germany
Alemanha
Portugal
Portugal
Itália
Italy

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
Fonte: INE (2012)

6
IV. O Impacto Económico do Turismo
A. Contribuição para o PIB
21. De acordo com o INE, o valor acrescentado pelo turismo e actividades complementares
corresponde a cerca de 20% do total de valor acrescentado (ver Figura 5). A informação de
despesas realizadas por turistas confirmam esta estimativa. Em 2011, as despesas brutas por
turista atingiram 1.300 USD. O Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC) calcula que
que 63% das despesas de turismo se traduzem em valor acrescentado ao PIB, significando isto
que as despesas brutas por turista acrescentaram 824 USD ao PIB, o que representa 21,5% do
PIB per capita de Cabo Verde de 3.790 USD (Banco Mundial 2013). A implementação das
contas satélite de turismo irá facilitar um cálculo mais preciso da contribuição do turismo para
o PIB.

Figura 5: Valor Acrescentado das Actividades de Turismo em Percentagem do PIB em 2010


25,0
Arts, sport,
Artes, recreative
desporto activitiesrecreativas
e actividades

Rental
Aluguer
20,0
Quota de Percentagem do PIB

Tour operators
Operadores de viagens

15,0 Telecomunications
Telecomunicações

Restaurants
Restaurantes

10,0 Hotels
Hotéis

AirTransporte
Transportation
Aéreo

5,0 Sea Transportation


Transporte Marítimo

Transporation Services
Serviços de transporte

0,0

Fonte: INE

22. De acordo com o Banco Central de Cabo Verde, as receitas geradas pelo turismo
atingiram 27,8 mil milhões de ECV (€190 milhões) em 2011, representando aproximadamente
21% do PIB (ver Tabela 1). Estes dados marcam um aumento impressionante de 26,4% nas
receitas geradas desde 2010, quando as receitas geradas pelo turismo correspondiam a 17,8%
do PIB. Em 2011, a percentagem do turismo em todos os serviços era de 60,8%, o que é também
significativamente mais alto do que a percentagem registada em 2010.

7
Tabela 1: Principais Indicadores do Turismo

2009 2010 2011


Número de Dormidas 1.897.552 2.217.563 2.703.909
Receita Total (milhões de ECV) 20.912 22.023 27.848
Receita do Turismo (em % do 18,1 17,8 21,1
PIB)
Percentagem dos Serviços 55,2 52,2 60,8
Fonte: Banco de Cabo Verde (2013)

B. Receitas do Governo provenientes do Turismo


23. A contribuição total estimada da indústria do turismo para os cofres do Governo é de
cerca de €59M6 por ano ou um sexto do total da despesa do Governo. A nossa estimativa inclui
o seguinte:

 IVA de 6% do total de serviços de turismo (€330M) equivalente a €20M;


 Os inquéritos nos hotéis sugerem que as taxas aduaneiras associadas à importação de
alimentação e bebidas correspondem a cerca de €46 por turista, o que equivale a
pagamentos aduaneiros de €19.7M por ano;
 Vistos (€25 por visto para cerca de 428.000 chegadas internacionais estimadas durante
2011) equivalem a €10.7M;
 Taxas aeroportuárias (€15 por chegada para cerca de 428.000 chegadas internacionais
estimadas durante 2011) equivalem a €6,4M;
 Imposto sobre o rendimento de 4% sobre 8.204 empregos directos e um número
assumido como igual de empregos indirectos e induzidos é equivalente a €2,1M7.

24. A contribuição total de impostos deverá ser contrabalançada com o custo dos incentivos
fiscais à indústria do turismo (descritos na Caixa 1). Em 2011, o custo nominal dos incentivos
fiscais foi estimado em €25M (2,7 mil milhões de CVE), 75% dos quais provenientes das
políticas aduaneiras e os restantes 25% de concessões tributárias. Esta metodologia oficial é
ligeiramente problemática uma vez que assume que a mesma indústria turística teria existido
na ausência destes incentivos. No entanto, tomando com certos estes dados, podemos concluir
que por cada €1 de incentivos fiscais temporários providenciados à indústria do turismo, o
Governo recebe pelo menos €2,3 em rendimento.

25. Em Maio de 2013 foi implementado um novo imposto sob o turismo através do qual os
turistas pagam €2 por noite passada em hotel até um máximo de 10 noites. O Governo espera
que este imposto gere mais de €5M por ano, montante que será usado para melhorar os serviços
oferecidos aos turistas e para promover o sector do turismo. Adicionalmente, para todos os
novos investimentos com contratos assinados a partir de 2013, as companhias terão que pagar
15% de IVA quando comparado com a taxa de 6% cobrada anteriormente.

6
A nossa estimativa é conservadora uma vez que exclui todos os pagamentos associados à segurança social (15% dos salários pagos pelos
empregadores mais 8% pagos pelos empregados) e os impostos pagos pelas empresas.
7
Esta cifra utiliza rendimentos mensais médios de €298 e €238 para cada emprego directo e indirecto, respectivamente.

8
Caixa 1: Incentivos Fiscais para o Sector do Turismo em Cabo Verde
Sob a Lei de Investimento Externo n⁰89/IV/93 de 13/12/93:
 Os dividendos e lucros são livres de tributação durante os 5 anos após o registo do investimento
estrangeiro quando os lucros são reinvestidos na mesma actividade económica em Cabo Verde (Artigo
13);
 Após este período serão sujeitos a uma taxa única de 10% (Artigo 14).

A Lei de Infraestrutura do Turismo n⁰55/VI/2004:


 Os projectos de infraestrutura do turismo estão isentos de tributação durante os primeiros 5 anos após
o investimento;
 E são taxados a 10% após esse período.

A somar às isenções de imposto sobre o rendimento colectivo, e provavelmente com maior expressão em
termos de valor, os investidores estrangeiros registados estão isentos de pagamentos aduaneiros em bens de
capital (e.g. equipamentos de construção e veículos) importados para Cabo Verde.

C. Empregos no Sector do Turismo


26. O Censo de 2010 demonstra 6.441 empregos em hotéis e restaurantes (4,4% do total da
força laboral de 147.223)8. Se 52 chegadas internacionais geram 1 emprego no sector do
turismo (336.000 chegadas e 6.441 empregos em 2010), podemos estimar que 428.000
chegadas em 2011 geraram 8.204 empregos no sector nesse ano. Destes empregos, uma
percentagem relativamente elevada de 87% são ocupados por Cabo Verdianos. De facto, em
todas as ilhas excepto a Boa Vista, pelo menos 95% dos empregados dos hotéis são Cabo
Verdianos, mesmo tendo em conta a propriedade estrangeira do hotel e a respectiva gestão
efectuada por expatriados. Na Boa Vista, apenas 72% dos empregados do turismo são Cabo
Verdianos. Isto é consequência da baixa população da ilha e da falta de preparação para o actual
boom de turismo. Os inquéritos nos hotéis indicam um salário médio de €298 por mês9.

D. Fluxos Indirectos para a Economia provenientes da Actividade Turística


27. O turismo produz fluxos indirectos para a economia quando as despesas turísticas
estimulam a actividade fora do sector — por exemplo os salários da construção dos hotéis e a
aquisição de alimentação e bebidas. No sector da construção, que tem disparado devido ao IDE
no turismo, cerca de 15% dos trabalhadores da construção10 são Cabo Verdianos com um
salário médio de €250 por mês. Os 428.000 turistas internacionais, que têm uma estadia média
de 8 dias (1/46 do ano), irão apenas representar uma procura por alimentação e bebida
equivalente a 9.380 pessoas residentes durante o ano inteiro, ou cerca de 1,9% da população
total de Cabo Verde. Os outros efeitos indirectos incluem pessoas a trabalhar numa indústria
relacionada com serviços turísticos. As entrevistas com empregados de lojas turísticas de
retalho sugerem um rendimento médio mensal de €250 por mês.

8
Se incluirmos o sector das viagens, este número atinge mais de 14.628 empregos directos associados ao sector de viagens e turismo
durante 2010 em Cabo Verde.
9
Os salários dos empregados dos hotéis variam substancialmente em função do local. No Sal e Boa Vista, o salário médio mensal de um
empregado de hotel é de €347; Em outras ilhas o salário médio é apenas 40% deste número (€141 por mês), calculando-se assim uma média
ponderada de €298 por mês para todo o país.
10
Com base no Censo de 2010, existiam 21.537 trabalhadores na indústria de construção.

9
E. Despesas de Turismo na Economia Local
28. Não existe informação fiável em Cabo Verde acerca do nível de despesas de turistas
fora dos hotéis nas principais áreas de fluxo turístico. Muitos estudos em outros países
demonstraram que as despesas discricionárias fora dos hotéis podem ter um impacto
significativo nos empreendedores locais. Existem todavia diversas razões para suspeitar que
em Cabo Verde as despesas locais são reduzidas.

29. Os grandes resorts AI, enquanto modelo, não são geralmente caracterizados por altos
níveis de despesa local. A maioria da despesa ocorre dentro do próprio hotel em alimentação e
bebidas, bens básicos pessoais, e souvenirs. Os inquéritos nos resorts AI indicam que a média
das despesas discricionárias varia entre €7 e €13 por turista durante um dia. Tipicamente, entre
um terço e metade desta despesa ocorre fora do hotel.

30. Um dos principais impedimentos a uma maior despesa local é de que as áreas fora dos
grandes resorts AI são pouco atractivas para os turistas. Existe uma falta de opções de
entretenimento e os incómodos são comuns (Sustainable Travel International 2012). É útil
comparar o feedback dos turistas de viagens a Cabo Verde com outros destinos alternativos.
De notar que o feedback refere-se a excursões providenciadas por um único operador dentro
de um hotel. As excursões em Cabo Verde recebem uma notação baixa por parte dos turistas
em todos os critérios quando comparados com a média das excursões do próprio operador e
também com as notações para outros destinos. A taxa baixa de excursões em Cabo Verde
confirma este feedback, e a despesa média por chegada no Inverno de 2011/12 caiu para €21
por turista. Esta cifra representa cerca de metade das despesas em excursões para o mesmo
período em Marrocos e Egipto e é mais baixa que na Tunísia, e todos estes destinos têm opções
mais atractivas para turistas (ver a Figura 6).

Figura 6: Satisfação dos Turistas e Qualidade das Excursões, Época de Inverno 2011/12

90

80

Média por Operador


70
Tenerife
60
Cabo Verde

50 Egipto
Tunísia
40
Marrocos
30
Variedade de Qualidade/preço Guia Avaliação global
excursões das excursões

Fonte: Resultados financeiros dos operadores turísticos (2012)

F. Efeito do Turismo na Pobreza


31. A pobreza desceu significativamente desde 2000, especialmente nas ilhas onde o
turismo é a principal actividade económica (ver a Figura 7). A taxa de pobreza de Cabo Verde

10
em 2000 era de 37%, descendo para os 27% em 201011. As ilhas com mais IDE de turismo têm
a mais baixa incidência de pobreza em Cabo Verde: a taxa de pobreza no Sal é de 10% e na
Boa Vista é de 11%. Adicionalmente, estas duas ilhas apresentam decréscimos significativos
na pobreza durante o período de 2000-2010, com a pobreza a descer no Sal em 59% e na Boa
Vista em 52%, tornando-se assim duas das três ilhas que mais reduziram a pobreza (em
conjunto com São Nicolau). Uma vez que estas duas ilhas são quase totalmente dependentes
dos resorts AI, isto sugere que o sector do turismo - incluindo o modelo de desenvolvimento
do turismo com base em AI - tem o potencial de tirar pessoas da pobreza.

Figura 7: Alterações na incidência de pobreza de 2000 a 2010

70% Incidência de Pobreza (%)


Ilha 2000 2010
Mudanças na Incidência de Pobreza (2000-

60%
Sal 25 10
50% S. Nicolau 44 21
40% Boa Vista 23 11
S. Vicente 29 17
2010)

30%
Maio 34 21
20% Santiago 37 28
10%
S. Antão 48 41
Brava 43 38
0%
Fogo 42 40
Total 37 27

Fonte: INE e cálculos dos autores

32. É possível isolar ainda mais o impacto do turismo na pobreza através da análise do
QUIBB de 2007 e do Censo de 2010, que indicam o nível de pobreza por sectores de emprego.
Os dados mostram que as famílias ligadas ao sector do turismo, que inclui hotéis e restaurantes,
têm uma baixa incidência de pobreza (ver a Tabela 2). Embora a taxa de pobreza nacional seja
aproximadamente 27%, a pobreza entre as famílias dependentes do sector do turismo é mais
reduzida (cerca de 12%). No entanto e como em todos os países, as famílias a trabalhar na
agricultura e pescas estão numa situação significativamente pior do que a média nacional -
especialmente aquelas ligadas à agricultura. A agricultura tem uma incidência de pobreza de
44% e as pescas de 35%.

11
O estudo de pobreza realizado pelos autores apresenta o resultado do exercício do Mapa da Pobreza ao nível de ilha, concelho e freguesia.
Estes resultados são baseados num modelo de regressão nacional da despesa anual per capita utilizando variáveis comparáveis entre o
Censo de 2010 e o QUIBB de 2007.

11
Tabela 2: Taxa de Pobreza no Turismo, Agricultura e Pescas, 2010

Todos Turismo Agricultura Pescas


Praia 12 9 20 22
Santiago 28 14 45 35
Santo Antão 41 23 48 39
São Vicente 17 15 29 26
Fogo 40 19 51 53
São Nicolau 21 12 20 37
Sal 10 8 16 18
Boa Vista 11 9 8 10
Maio 21 9 22 26
Brava 38 23 41 44
Nacional 27 12 44 35
Fonte: Cálculos dos autores utilizando dados do QUIBB 2007 e Censo de 2010

G. Vazamentos
33. Os vazamentos ou fugas do turismo podem ocorrer a vários níveis. Em primeiro lugar
estão os lucros expatriados por proprietários estrangeiros, em segundo estão os salários pagos
a trabalhadores estrangeiros, e em terceiro a importação de bens para servir o sector do turismo.
Em Cabo Verde, a maior parte dos estabelecimentos mais amplos de alojamento são detidos
por estrangeiros sendo que por isso assumimos que a maioria dos lucros são enviados para o
estrangeiro. Os vazamentos relacionados com o trabalho são limitados tendo em conta o alto
nível de emprego local (87%). As posições de gestão são todavia dominadas por estrangeiros.
Com um salário médio de €347 para cargos não administrativos, um rácio de empregados por
quarto no Sal e Boa Vista de 0,75 e cerca de 2.500 camas na Boa Vista, isto representa um
potencial vazamento ou fuga de benefícios na ordem dos €2,2M cada ano somente na Boa Vista
(cerca de 525 empregos).

34. No que toca a peixe, frutas e vegetais frescos, os vazamentos são bastante altos.
Estimamos que os hotéis importem 80% do peixe. A maior parte dos resorts AI importam o
peixe consumido no hotel, em contraste com os hotéis mais pequenos que adquirem o seu peixe
localmente. Adicionalmente, são importadas 7.600 de toneladas de peixe, frutas e vegetais
frescos todos os anos, com as unidades AI a importarem a totalidade deste tipo de alimentos.

35. A tabela 3 mostra a percentagem de aquisições locais por diferente tipos de alojamento
no Sal, Boa Vista, Fogo e Santo Antão. No Sal e Boa Vista, os grandes resorts AI importam
quase todo o seu peixe, frutas e vegetais frescos. Por outro lado, os resorts mais pequenos e os
B&Bs adquirem todo o seu peixe localmente e adquirem uma proporção da fruta e vegetais
frescos (FVF) também no mercado doméstico. Os hotéis mais pequenos baseados no Fogo e
Santo Antão estão mais ligados à economia local, resultado de uma produção agrícola mais
substancial nessas duas ilhas.

12
Tabela 3: Percentagem de Aquisições Locais de Vegetais, Alimentos Frescos e Peixe
% de Aquisições
Locais
Ilha Tipo de Alojamento FVF Peixe
Topo de mercado, grandes resorts
Sal AI 0 3
Pequenos Hotéis B&B 50 100
Boa Vista Grandes Resorts AI 0 0
Resorts Médios AI 20 100
Fogo Pequenos Hotéis 25 100
B&B de Topo 50 100
Santo Antão Hotéis Médios 60 100
Pequenos Hotéis 100 100

V. Análise do Modelo de Desenvolvimento All-Inclusive


36. Esta secção examina o modelo AI em maior detalhe. Inicia com uma discussão sobre a
dependência profunda que Cabo Verde tem dos AI. Seguidamente examina as condições que
ajudaram a criar o desenvolvimento do modelo de turismo AI, reconhecendo que muitas destas
prevalecem actualmente. A discussão evolui então para o impacto actual dos AI, iniciando pela
percepção local e evoluindo depois para uma análise empírica dos benefícios específicos para
a economia de Cabo Verde.

A. A Dependência de Cabo Verde dos Resorts All-Inclusive


37. É possível constatar uma concentração significativa no desenvolvimento do turismo em
Cabo Verde, tanto em termos geográficos como em termos de propriedade. Conforme
mencionado anteriormente, uma percentagem maioritária dos turistas que visitam Cabo Verde
ficam em um dos oito resorts AI do Sal e Boa Vista. Estes hotéis são descritos na Tabela 4 em
termos de dimensão, ocupação e número estimado de hóspedes.

38. Os três resorts RIU são de longe os maiores. Isto é indicativo da enorme influência do
Grupo TUI, que detém uma parte significativa do RIU e cujo operador turístico controla mais
de um terço das chegadas internacionais (ver a Figura 8).

13
Tabela 4: Dimensão, Taxa de Ocupação e Estimativa do Número de Hóspedes nos oito AI
Hotel Nº Média Hóspedes Média Taxa Ocupação Número
Quartos por Quarto dos Quartos estimado de
hóspedes em
2011
SAL:
RIU Garopa & Funana 1.072 2,5 90% 110.000
Grupo Oásis Belorizonte e 363 2,0 66% 25.000
Novorizonte
Tortuga Melia 271 2,3 75% 19.000
Crioula Clubhotel & Resort 244 2,0 70% 15.400
Subtotal 1.950 169.400
BOA VISTA:
RIU Touareg 881 2,5 90% 48,200Ꞌ
RIU Karamboa 750 2,0 90% 60.800
Ibero Star 276 2,2 70% 22.200
Royal Decameron 300 2,1 80% 26.300
Subtotal 2.207 157.500
Total 4.157 326.900
Notas:
a) Num período de 12 meses, o Touareg conseguiria acomodar 72.400 hóspedes - mas o hotel abriu apenas em Maio de 2011.
b) As figuras em itálico são estimativas conservadoras para hotéis que não foram visitados pela equipa do estudo.

Figura 8: Chegadas de Turistas a Cabo Verde por parte de um Operador Turístico Emissor

180.000
160.000
140.000
Número de Passageiros

120.000
100.000
TUI Europa Central
80.000
TUI Nordeste
60.000
40.000
20.000
-
2007 2008 2009 2010 2011 2012

Fonte: TUI 2012

B. Razões que levaram ao surgimento do modelo All-Inclusive


39. Ao examinar o modelo do desenvolvimento do turismo em Cabo Verde, é importante
ver os AI no Sal e Boa Vista como parte de um sistema mais amplo de turismo global. Devido
ao acesso aéreo regular dispendioso e limitado para Cabo Verde, a aposta em companhias
charter para abrir o sector foi provavelmente essencial. As companhias charter são tipicamente
geridas por grandes operadores turísticos no contexto dos AI, o que garante taxas de ocupação
consistentemente altas.

40. Existem argumentos sólidos para o desenvolvimento inicial do sector do turismo com
base em grandes unidades hoteleiras. Esta abordagem cria as economias de escala e
aglomerações necessárias para construir um sector do turismo forte e gerar receita para o

14
investimento em infraestrutura básica. As fundações proporcionadas pelos resorts AI têm
criado algumas janelas de oportunidade para outros fornecedores de alojamento,
especificamente estabelecimentos de gama alta no Sal e Boa Vista. Todavia, além destes
existem actualmente poucas oportunidades viáveis para pequenos estabelecimentos que servem
os viajantes independentes. Um dos constrangimentos críticos é o número ainda limitado de
voos regulares a partir dos mercados de origem de turistas. Outro dos grandes constrangimentos
é o clima de investimento pobre12 em que os estabelecimentos têm que operar. Isto afecta os
estabelecimentos pequenos e independentes de forma desproporcional uma vez que estes não
ficam aptos a beneficiar dos generosos pacotes de incentivo oferecidos a investidores
estrangeiros do tipo AI.

41. Este clima de investimento pobre manifesta-se de várias formas, embora nenhuma seja
mais nociva para os negócios locais do que os altos custos dos inputs. Uma grande porção dos
bens de alimentação e de bebida têm de ser importados tendo em conta a capacidade modesta
de Cabo Verde para a agricultura doméstica, especialmente no Sal e Boa Vista, e as
dificuldades em transportar produtos alimentares a partir das ilhas com produção agrícola. Esta
situação aumenta substancialmente os custos uma vez que os bens importados de alimentação
e bebidas são sujeitos a taxas aduaneiras elevadas (e.g. peixe 25%, carne 20-30%, cerveja 96%,
e vinho 58%), assim como a custos estruturais e de transporte também altos. Adicionalmente,
os operadores hoteleiros enfrentam custos de energia e água também muito elevados. Isto
resulta em grande parte devido à geografia do arquipélago, à sua população dispersa, às
indivisibilidades no fornecimento de serviços de energia e água, e à isolação relativa das
grandes áreas de resorts dos grandes centros populacionais. Como consequência, a capacidade
do Governo de enfrentar estes custos é limitada.

42. Embora os resorts AI também sofram de custos de input elevados, estão melhor
protegidos através dos incentivos que recebem e das economias de escala que conseguem
atingir. A análise do desempenho financeiro confirma isto, baseado nas entrevistas com
grandes operadores hoteleiros (acima de 250 quartos) no Sal e Boa Vista13. As margens brutas
operacionais dos grandes hotéis entrevistados atingem em média 25%, um nível razoável, mas
inferior à meta de 30% comum neste sector. Estes níveis de retorno também se comparam de
forma favorável com o custo de capital em Cabo Verde, que é actualmente cerca de 12% ao
ano. Estes factores devem permitir um retorno sob o investimento num período de 12 a 15 anos,
que embora seja longo, não é excessivo. Todavia, a grande maioria dos hotéis mais pequenos
e outros a operar num modelo que não o AI estão a colher retornos substancialmente inferiores,
até ao ponto em que alguns estão a operar fora das margens da viabilidade.

C. Opinião Pública relativamente ao Turismo de Larga Escala


43. Ao avaliar as virtudes do modelo de desenvolvimento do turismo com base nos AI,
torna-se útil medir a opinião pública no que toca à presença destas unidades. Em 2010, a
Universidade de Córdoba em Espanha e a Universidade de Jean Piaget em Cabo Verde
entrevistaram 1.622 residentes espalhados por oito ilhas do arquipélago (todas as ilhas

12
No relatório Doing Business 2012, Cabo Verde ficou colocado em 119 de 183 países.
13
A maioria dos hotéis cooperou com o inquérito, embora o maior fornecedor de alojamento, Grupo RIU, não tenha fornecido dados
comerciais.

15
habitadas excepto o Maio) acerca das suas atitudes em relação ao turismo. Os resultados são
esclarecedores e fornecem um complemento importante às análises estritamente quantitativas.

44. Nas ilhas com um foco mais forte no turismo, Boa Vista e Sal, 77,5% e 64,2% dos
residentes entrevistados respectivamente estão ligados ao turismo através do seu emprego
actual. Uma proporção ainda maior informou ter um membro familiar ligado ao sector. Uma
maioria muito forte de entrevistados nestas ilhas (78,2% e 72,7%, respectivamente)
expressaram o desejo de vir a trabalhar no sector do turismo no futuro. Nas outras ilhas, cerca
de um terço dos entrevistados estão actualmente ligados ao turismo, mas novamente uma
maioria substancial (mais de 60%), expressaram o desejo de trabalhar no sector.

45. Os residentes também foram questionados acerca do seu apoio ao desenvolvimento de


turismo de larga escala na sua área local. Em Santiago, Fogo, Sal, e Boa Vista, entre dois terços
a três quartos dos entrevistados descreveram o seu apoio como «muito forte» ou «relativamente
forte», e apenas um décimo dos entrevistados não expressou nenhum tipo de apoio (com a
excepção do Sal, onde um quarto dos entrevistados não apoiou o desenvolvimento significativo
do turismo). Em Santo Antão e São Vicente, por contraste, menos de metade de todos os
entrevistados apoiaram a possibilidade de desenvolvimento turístico significativo e uma
maioria significativa (cerca de um terço) era oposta a isto. Em suma, as atitudes em relação ao
turismo são geralmente muito positivas entre os residentes das ilhas com mais actividade
turística, sendo que por sua vez as atitudes tendem a ser mais conflituosas entre os residentes
que têm menos contacto directo com o sector.

D. O Impacto Económico Local dos Resorts All-Inclusive


46. Embora os resultados dos inquéritos sugiram que os residentes locais estão a retirar
benefícios das unidades AI, continua a subsistir a necessidade de dados empíricos sobre o
impacto económico local destas unidades. Para esse efeito conduzimos um inquérito profundo
junto dos proprietários de hotéis no Sal, Boa Vista, Fogo e Santo Antão. Para se conseguirem
obter comparações úteis, conduziram-se inquéritos junto de proprietários de todos os tipos de
alojamentos (AIs, B&Bs, e hotéis), tendo em conta também a dimensão (grande, média e
pequena), e o intervalo de preços (gama alta, média e económica).

47. A análise na Figura 9 examina os benefícios locais gerados pelos diferentes tipos de
alojamento e apresenta os resultados como uma escala de benefício local por quarto de hotel
por dia, representado como uma área de círculo. O benefício local é definido como a soma dos
salários dos empregados locais, a aquisição de bens alimentares e de bebida, e impostos.

48. Existem duas limitações importantes a esta análise. Primeiro, a definição de «benefício
local» é parcial e limitada aos dados disponíveis. A soma de critérios adicionais para o cálculo
dos «benefícios locais», como por exemplo impacto ambiental, embora benéfico, não se
encontra no âmbito deste estudo. Segundo, esta análise foca-se quase inteiramente nos
estabelecimentos turísticos e não considera os efeitos de derrame além dos perímetros dos
hotéis. Assim, a análise não toma em conta os benefícios totais dos hotéis que encorajam os
seus hóspedes a passarem tempo fora do hotel. Actualmente o derrame da despesa de turistas
fora dos hotéis é no entanto muito limitado.

16
49. Na Figura 9, os círculos que representam o benefício local ilustram duas estatísticas
importantes relativamente ao desempenho dos hotéis. A primeira é a Taxa Média Diária
(TMD), que é calculada como a taxa média cobrada por quarto ocupado. A TMD é apresentada
no eixo horizontal. Muitos dos hotéis do Sal e Boa Vista têm uma TMD que excede os €100
por dia. No passado recente, os investidores em hotéis mostraram alguma preocupação de que
a oferta ampla de alojamento de qualidade modesta por parte dos resorts RIU poderia de
alguma forma minar o mercado de alojamento de alta qualidade nas ilhas turísticas de Cabo
Verde. Todavia, em 2011 a empresa The Resort Group abriu o Tortuga Melia no Sal, uma
unidade com 271 quartos de gama alta AI, e tem agora duas unidades adicionais sob construção.
A melhoria de gestão em outros resorts demonstra que Cabo Verde ainda consegue atrair taxas
diárias robustas. No Fogo e Santo Antão, as TMDs são substancialmente mais baixas, em média
cerca de €50 por quarto ocupado por dia.

17
Figura 9: Desempenho dos Hotéis e Conteúdo Local
(a área do círculo representa o benefício local por quarto por dia em €)
140
Escala

120 €100
por Gama alta, Grandes AI,
Sal
quarto
por dia
Médios AI,
Receita média por quarto disponível por dia (€)

100 Boa Vista

80
Grandes AI,
Boa Vista

Grandes AI/Meia Pensão,


Sal
60

Gama Alta B&B,


Fogo Gama alta, B&B Médios,
Sal

40

Pequenos hotéis B&B,


Pequeno Hotel, Sal
Santo Antão
20

Pequeno Hotel,
Fogo
Hotel Médio,
Santo Antão
0
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180
Taxa Média Diária por quarto ocupado por dia (€)

Fonte: Entrevistas dos autores e cálculos

50. O eixo vertical apresenta a segunda estatística chave do desempenho dos hotéis, a
receita média por quarto disponível por dia (RecPQD). A RecPQD é importante uma vez que
toma em conta a taxa de ocupação de quartos no hotel. A distinção entre a TMD e a RecPQD
é crítica para entender o turismo em Cabo Verde. Nas «ilhas turísticas» do Sal e Boa Vista, não
só as taxas TMD são boas como as taxas de ocupação de quartos também são robustas. Com
uma ocupação média de cerca de 70%, a cifra RecPQD é somente um terço mais baixa do que
a cifra TMD para estes hotéis.

51. Fora dos principais fluxos turísticos nas ilhas do Fogo e Santo Antão, as taxas de
ocupação de quartos são substancialmente mais reduzidas - frequentemente inferiores a 50% -
o que gera uma cifra RecPQD bastante mais reduzida do que a cifra TMD. As consequências
da diferença entre a TMD e a RecPQD são profundas para o modelo de desenvolvimento de
turismo em Cabo Verde.

52. Diversos documentos de estratégia para o turismo têm criticado os grandes hotéis no
Sal e Boa Vista por terem ligações limitadas com a economia de Cabo Verde, e como
consequência têm defendido o estabelecimento de unidades mais pequenas, não AI, em outras

18
ilhas14. Esta análise providencia provas empíricas de que esta política aparentemente intuitiva
não está baseada em factos. Primeiro, torna-se claro que os quartos de hotéis no Sal e Boa Vista
geram benefícios financeiros significativos para Cabo Verde através dos salários para os
empregados nacionais, aquisições de produtos locais, e impostos (ver a Tabela 5). Os salários
no Sal e na Boa Vista são substancialmente mais altos do que nas ilhas mais periféricas, alguns
dos bens alimentares são produzidos localmente com preços altos e as taxas aduaneiras são
pagas sob as importações. Por fim, uma vez que as taxas diárias para os quartos são robustas e
as taxas de ocupação são elevadas, as receitas dos impostos sob a actividade económica - como
o IVA - são significativas.

53. De forma inversa, embora os hotéis do Fogo e Santo Antão tendam a ser mais integrados
com a economia local em termos de percentagem de conteúdo local e cadeias de valor, a escala
absoluta de benefício local é inferior por quarto e por dia. No Fogo e Santo Antão, o benefício
local médio é ligeiramente inferior a cerca de €14 por quarto ocupado por dia. No Sal e Boa
Vista o benefício local médio é cerca de cinco vezes superior com €67 por quarto por dia.
Deverá ser realçado que isto ocorre numa escala relativa, baseado nos dados de quartos por dia.
Quando se observa a escala absoluta de benefícios locais, com os AI a ofuscar os outros hotéis
em termos de número de quartos, a diferença em termos de impacto económico local é ainda
mais acentuada.

14
«Serão desenvolvidos programas específicos para ligar as áreas rurais ao sector do turismo através da cadeia de valor e para promover o
turismo ecológico e rural» Cabo Verde 2016. Ver também IFC Programme to mobilise investment: tourism component Grant Thornton
(2007), Plano Estratégico para o Desenvolvimento do Turismo PD Consult (2008)

19
Tabela 5: Quota de Conteúdo Local nos Hotéis Seleccionados
Total de Percentagem de Conteúdo Local (%)
Conteúdo
Local por
quarto
por dia Quadros não
Ilha Tipo de Alojamento (€) administrativos Alimentação Bebidas Impostos
Topo de mercado,
Sal grandes resorts AI 53 32 1 4 63
Pequenos Hotéis B&B 102 29 34 2 36
Boa Grandes Resorts AI 28 20 0 6 74
Vista Resorts Médios AI 64 25 25 13 37
Pequenos Hotéis 14 27 14 5 54
Fogo
B&B de Topo 27 36 13 4 47
Santo Hotéis Médios 9 28 17 5 50
Antão Pequenos Hotéis 10 21 5 31 43
Fonte: Entrevistas dos autores e cálculos

54. No geral, os hotéis com mais conteúdo local são os B&B nas ilhas turísticas. Estes
estabelecimentos têm as mesmas características que os grandes AI: taxas diárias e de ocupação
altas, e salários e impostos elevados. No entanto, adicionalmente, têm um gasto maior em
alimentação do que os AI uma vez que a alimentação e bebidas são uma importante fonte de
receita - mais do que um simples custos, como no caso dos AI - tendo em conta que o
restaurante atrai clientes adicionais. No entanto os B&B são mais pequenos do que os AI, e por
isso na maioria dos casos têm um impacto económico local menor. Dentro da categoria AI, as
unidades de gama alta e geridas mais localmente têm um conteúdo local mais elevado.

E. Implicações para um Futuro Modelo de Desenvolvimento do Turismo


55. É importante para os governantes reconhecerem a profunda importância que os AI têm
na economia Cabo Verdiana. Conforme é descrito neste relatório, o tipo certo de modelo de
desenvolvimento de AI em Cabo Verde pode gerar uma quantidade significativa de benefício
local, e tem mesmo o potencial de tirar pessoas da pobreza. Os governantes devem também
compreender que uma mudança a favor de estabelecimentos mais pequenos, de propriedade
local, não irá ser viável no curto prazo tendo em conta que as fraquezas no actual ambiente de
negócios são altas e tendo em conta também os altos custos de viagem enfrentados por viajantes
independentes. Sendo assim é importante que o Governo não acelere políticas que possam
alienar os AI. A manutenção de relações fortes e de um diálogo activo com os grandes
operadores é também vital.

56. Embora a mudança para um modelo de desenvolvimento que se foque em alojamentos


mais pequenos e independentes - especialmente aqueles localizados fora das ilhas turísticas - e
mesmo turismo baseado na comunidade (ver Caixa 2) possa não ser viável actualmente, as
evidências empíricas dos inquéritos aos hotéis indicam que o Governo deveria ter em conta
alguns ajustamentos estratégicos ao modelo de desenvolvimento de turismo actual. Mais
especificamente, o desenvolvimento deverá focar-se em unidades AI de gama alta e em B&Bs,
e em aumentar o desenvolvimento integrado em termos de ligações com a economia local. As
unidades AI de gama alta têm uma «pegada» económica local maior do que qualquer outro tipo

20
de estabelecimento de alojamento. Estas unidades empregam um número substancial de
trabalhadores locais e a sua dimensão e rentabilidade resultam em pagamentos tributários
elevados. Os B&Bs de gama alta, particularmente nas ilhas turísticas, também geram um
benefício económico local considerável tendo em conta as TMDs elevadas e a percentagem
relativamente alta de aquisições locais de alimentação e bebida.
Caixa 2: O Turismo baseado na Comunidade - Um Modelo para o Futuro?
O turismo baseado nas comunidades (TBC) como uma forma alternativa ao turismo de grandes AI tem algum
apelo intuitivo. Porque é que não pode ser desenvolvido um produto de turismo que tenha uma escala humana
maior e com enfâse na propriedade e benefício locais? Este não é um sonho impossível e existem diversas
parcerias com sucesso entre as comunidades e o sector privado em torno de lodges de gama alta no Sul da
África (ver Mitchell & Ashley 2010). Todavia, muito frequentemente o potencial do TBC é minado por
promotores que realizam erros básicos e desenvolvem produtos sem as ligações adequadas aos fluxos de
turismo e com a indústria de turismo. A consequência disto é que muitos projectos TBC têm standards de
serviço baixo (e por isso também taxas reduzidas) e baixa ocupação, e como resultado, a grande maioria não
são financeiramente viáveis (Dixey, 2005). Resulta então que muitos projectos de TBC falham no objectivo
primário que é o de transferir recursos para as famílias com menor rendimento.

As estadias em casas familiares em Santo Antão são um exemplo disto. Existem actualmente onze propriedades
que foram desenvolvidas com o próposito de proporcionar este tipo de estadias, embora actualmente só sete
estejam operacionais. Os turistas reservam as estadias através de operadores internacionais e locais. Ao longo
de cinco anos a procura média por estadias familiares tem sido de três grupos de 10-11 pessoas por mês - e os
operadores relatam uma média de duração de estadia de 3 dias. Assumindo que cada estabelecimento familiar
tem dois quartos e que estes são para ocupação dupla, isto implica uma capacidade mensal para receber 840
hóspedes e uma procura real de 99 hóspedes - implicando uma taxa de ocupação de quartos na ordem dos 11%.
Os quartos duplos são cobrados a cerca de 1.500 ECV (ou €13 por noite), o que implica uma receita média
bruta de €640 por mês ou cerca de €90 por cada estadia por mês - ou cerca de um quarto do benefício local de
um único emprego numa unidade grande AI. De forma similar, este projecto TBC gera um benefício local por
quarto de €1,42 por dia (com uma TMD de €13 e RecPQD de €1,42) - sendo que por isso, embora os benefícios
do turismo sejam retidos localmente, estes quartos geram pouco benefício a reter uma vez que as taxas diárias
são baixas e o nível de ocupação é de 11%.

Poderá haver um âmbito para o TBC em Cabo Verde (se, por exemplo, o Governo designasse parte da zona
turística como terrenos para propriedade da comunidade e apoiasse a estruturação de parcerias entre os
operadores do sector privado e as comunidades). Todavia, o estilo «arcaico» de TBC que a equipa de estudo
observou em Santo Antão não oferece uma alternativa viável para o desenvolvimento do turismo em termos de
escala de benefícios para a economia local.

VI. Oportunidades para Optimizar o Modelo All-Inclusive


57. Tendo em conta a informação apresentada na secção anterior, é difícil negar o papel
crítico que os AI continuam a desempenhar na economia de Cabo Verde. No entanto,
continuam a existir oportunidades importantes para os AI aumentarem as suas ligações à
economia doméstica minimizando entretanto os impactos ambientais. As sugestões para
melhorar as ligações locais são providenciadas nesta secção.

A. Enquadramento Institucional
58. O sector do turismo é actualmente supervisionado pela Direcção Geral do Turismo no
Ministério do Turismo, Indústria e Energia (MTIE). Os stakeholders entrevistados e mesmo o
Plano Estratégico de Desenvolvimento do Turismo em Cabo Verde (2010/2013) indicam que
a DGT não tem a capacidade adequada para gerir o sector, muito como resultado da autonomia
limitada no Ministério e do orçamento reduzido que resulta em recursos humanos insuficientes.

21
Entretanto, a promoção de Cabo Verde como destino turístico é actualmente gerida pela Cabo
Verde Investimentos (CVI), mas com um âmbito limitado, reflectido no foco reduzido do portal
online oficial do destino actualmente com o slogan «Um país, 10 destinos». Nos casos da Boa
Vista e Maio, o investimento é gerido na sua maioria pela SDTIBM. O Documento Estratégico
de Crescimento e Redução da Pobreza (DECRP) III realça que existe alguma sobreposição de
funções entre as várias organizações que trabalham no sector do turismo. Adicionalmente, uma
vez que a CVI decidiu sair da promoção de Cabo Verde como um destino a partir de 2014, isto
cria um vácuo que necessitará de ser preenchido por uma expansão das responsabilidades da
SDTIBM, ou então através da introdução de uma instituição público-privada como uma
agência de turismo.

59. A capacidade do Governo de efectivamente gerir o sector tem sido também


constrangida por uma falta de continuidade no enquadramento institucional. Ao longo da
década passada, o sector do turismo tem ficado sob três ministérios diferentes e a certo ponto
o sector teve inclusive o seu próprio ministério.

60. Uma área particulamente importante que tem sido por vezes negligenciada pelas
autoridades governamentais responsáveis pelo turismo são as relações com o sector privado,
incluindo com os AI. O documento draft do DECRP III confirma as ligações pouco firmes
entre o sector público e privado. Esta falta de diálogo público-privado é particularmente
preocupante num contexto onde o destino é dominado por um pequeno número de grandes
operadores europeus.

61. Outra questão que afecta a gestão governamental do sector do turismo é a falta de dados
fiáveis, que são essenciais para a formulação de boas políticas. Este facto é sublinhado pelo
ranking 2013 de Cabo Verde em 111º de 140 países na compilação de dados sobre viagens e
turismo «Comprehensiveness of Travel & Tourism Data» do Índice de Viagens e Turismo do
Fórum Económico Mundial15. Um dos aspectos mais fundamentais com falhas significativas é
a colecta de dados sobre chegadas internacionais de turistas. Outra ferramenta crítica para o
seguimento do desempenho e impactos do sector são os inquéritos sobre as despesas e
satisfação dos turistas. Estes devem ser conduzido duas vezes por ano (uma vez na época baixa
e outra na época alta). Infelizmente, a sua realização em Cabo Verde tem sido algo esporádica.

62. As recomendações sobre como melhorar o enquadramento institucional que serve o


sector do turismo são apresentadas de seguida:

Criar uma Agência de Turismo e Promover uma Colaboração Público-Privada para Melhorar
a Gestão do Sector do Turismo

63. O Governo deverá reunir-se regularmente com representantes da indústria para discutir
formas de aumentar a competitividade do sector e fortalecer as ligações com a economia
doméstica. O Conselho Nacional de Turismo (CNT) providencia um fórum para este diálogo,
mas a sua eficiência tem sido minada por capacidade limitada e por realizar-se apenas uma
reunião por ano. O CNT foi estabelecido pelo anterior Ministério da Economia, Crescimento e
Competitividade e assegura a participação do sector privado no desenvolvimento de políticas

15
O Índice de Viagens e Turismo do Fórum Económico Mundial avalia 140 países em 75 indicadores sob 14 pilares diferentes.

22
e estratégias para o sector do turismo. A capacidade do CNT deverá ser fortalecida para que
consiga efectuar decisões com base em provas empíricas e reunir trimestralmente ao invés de
anualmente.

64. Além do diálogo público-privado realizado pelo CNT, Cabo Verde deverá também
considerar a criação de uma estrutura que providencie uma colaboração público-privada mais
sustentada, assim como uma continuidade e eficácia reforçadas na gestão do sector do turismo.
Esta é uma recomendação importante presente no draft do DECRP III, que chama à criação de
uma agência para desenvolver e gerir a actividade turística de uma forma integrada. Este tipo
de organização, que existe em muitos países orientados para o turismo no mundo, é geralmente
referenciada como uma Organização Nacional de Turismo (ONT)16. As ONTs não operam
regularmente no ministério que supervisiona o turismo. Estas organizações são tipicamente
independentes ou entidades semiautónomas, embora sejam geralmente influenciadas ou
tenham que reportar directamente ao ministério que tutela o turismo. Algumas têm um
Conselho de Administradores constituído quase na íntegra por oficiais públicos, mas a
tendência global é para Conselhos com uma mescla público-privada. Em alguns casos, as ONTs
são apenas responsáveis pelo marketing de turismo enquanto, no outro lado do espectro,
algumas assumem a maioria da gestão do sector e o ministério do turismo só se foca em criar
e talvez implementar políticas. Para dar uma melhor ideia dos vários tipos de estruturas ONT,
são apresentados na Caixa 3 exemplos de três competidores africanos (Maurícias, Seychelles,
e Tunísia).
Caixa 3: Modelos de ONTs das Maurícias, Seychelles e Tunísia
Os modelos de ONT variam consideravelmente em termos de estrutura e funções. Aqui apresentamos modelos
em três países africanos que se podem considerar entre os competidores mais próximos de Cabo Verde:
Maurícias, Seychelles e Tunísia

As Maurícias criaram a Agência de Promoção do Turismo das Maurícias (APTM) em 1996 para promover o
país no estrangeiro. A APTM é semiautónoma mas encontra-se sob a tutela do Ministério do Turismo e Lazer
(MTL) que foi criado em 1988. A APTM tem um Conselho de Administração com 8 membros (três do Governo
e cinco do sector privado). Em 2004 as Maurícias criaram uma outra agência, a Autoridade de Turismo das
Maurícias (ATM), para gerir o licenciamento de negócios de turismo e também para o seguimento do sector.

O Conselho de Turismo das Seychelles (CTS) é também uma ONT semiautónoma, com uma mescla público-
privada de directores (três do Governo e quatro do sector privado). Todavia, no caso das Seychelles, a ONT
precedeu o Ministério - o Ministério do Turismo e Cultura (MTC) foi somente criado em Março de 2012.
Embora o MTC seja principalmente responsável pela política de turismo, o CTS gere a implementação de
actividades relacionadas com o marketing, relações públicas, formação, standards e desenvolvimento de
produto. A promoção do investimento em turismo é tratado pelo Conselho de Investimento das Seychelles
(CIS), mas o enquadramento institucional permite ao CTS influenciar as decisões de investimento. O CIS deve
contactar com o CTS para parecer durante o investimento inicial. Os CEOs de ambas as entidades têm presença
no Conselho da Autoridade de Planeamento das Seychelles, que tem a palavra final na aprovação dos projectos
de investimento.

Na Tunísia, o Ministério do Turismo é responsável pela política de turismo, planeamento estratégico, formação
profissional, promoção do investimento, e regulação da indústria. A ONT, Delegação Nacional de Turismo da
Tunísia (DNTT), é responsável pela implementação de políticas na área de marketing, relações públicas,

16
Os nomes das ONTs variam consideravelmente de país para país. Os mais comuns são «Escritório do Turismo», «Conselho do Turismo»,
e «Autoridade do Turismo».

23
pesquisa e desenvolvimento de produto. A DNTT responde directamente ao Ministério do Turismo e é
administrada por um conselho de assessoria totalmente público. A DNTT dispõe também de escritórios em 16
países estrangeiros vistos como mercados estratégicos (Ministério do Turismo da Tunísia, 2013).

65. Um Conselho de Turismo em Cabo Verde seria responsável por implementar a


Estratégia de Turismo do Governo, marketing de Cabo Verde como um destino turístico, assim
como a gestão das relações públicas, monitorização de standards, e desenvolvimento de novos
produtos e mercados de turismo. O Conselho de Administração desta entidade necessitaria de
representar os sectores público e privado, incluindo representantes dos AI de modo a facilitar
o diálogo público-privado.

Providenciar Assistência Técnica para Melhorar a Colecta de Estatísticas e o Seguimento do


Sector

66. Um seguimento efectivo do sector do turismo só pode surgir através de uma melhoria
na colecta e análise de estatísticas. Isto inclui a implementação de uma metodologia mais fiável
de contabilização das chegadas e a realização mais regular de inquéritos de satisfação e de
despesas dos turistas. Esta informação deveria então ser disseminada para as agências
governamentais assim como para o sector privado. Isto ajudaria a determinar se as medidas de
política estão a ter o efeito desejado e até que ponto é que necessitam de ser alteradas.

B. Cadeia de Abastecimento da Pesca


67. A pesca tem sido considerada um dos maiores recursos naturais disponíveis em Cabo
Verde. Todavia, o sector estagnou (ver a Figura 10) e a contribuição das pescas para o PIB caiu
de 2% em 2000 para uma estimativa de 0,7% em 2011 (Banco Espírito Santo 2011). No início
dos anos 90, as pescas empregavam cerca de 7% da força laboral. Este valor decresceu para
5% em 2000 e está agora estimado em 3%, com cerca de 3100 pescadores artesanais, 840
pescadores industriais e cerca de 1000 mulheres empregues na venda de peixe, perfazendo um
total de 5000 trabalhadores no sector. Com base na análise de pobreza, cerca de um terço dos
trabalhadores da pesca vive na pobreza.

24
Figura 10: Pesca Cumulativa pela Frota Artesanal por Espécie, 1990-2005 (toneladas)17

8000

7000

6000

5000
Outros
4000 Demersais
3000 Pelágicos
2000 Atum

1000

Fonte: Poseidon (2007)

68. As grandes oportunidades para apoiar o sector, somar valor acrescentado, e criar mais
emprego estão a ser perdidas devido às aquisições limitadas de peixe por parte dos hotéis. As
entrevistas nos hotéis sugerem que no total menos de 20% do peixe é fornecido localmente
com alguns dos AI a importarem todo o peixe consumido. As entrevistas com intermediários
de venda a grosso indicam que cerca de 80 toneladas de peixe congelado (dois contentores para
o Sal e Boa Vista) são importados por mês. Isto equivale a cerca de 0,5 quilogramas de peixe
importado por quarto de hotel por dia, o que implica um custo com peixe para o hotel de cerca
de €13 por quilo. A análise da cadeia de abastecimento na Caixa 4 corrobora esta estimativa de
custos.
Caixa 4: Estimar o Custo do Peixe Importado de Espanha
 Uma pesquisa de preços de mercado de venda a grosso de peixe congelado em Espanha sugere um
preço de €5,11/kg (bacalhau) e €5,5/kg (pescada) no mercado pesqueiro Mercamadrid (o segundo
maior mercado de peixe do mundo). É normalmente assumido que o corte ou filetar do peixe resulta
numa perca de peso de 30% - por isso o preço por grosso de filetes de peixe branco é estimado em €8
por kg em Espanha;
 Com base no custo mais baixo de transporte de um contentor refrigerado de 40 pés de Espanha para o
Sal/Boa Vista entre €4000 - €7000 e com um peso assumido de 20 toneladas - o custo de transporte
situar-se-ia entre apenas €0,2 a €0,35 por kg de peixe;
 Assumindo uma taxa aduaneira de 25% (dados de 2011), a taxa seria de €2 por kg;
 Assumindo uma margem de 30% de margem grossista para cobrir custos de capital, armazenamento,
entrega e de operação, isto representa €3.1 por kg e implica um custo de mais de €13 por kg de filetes
ou bifes de peixe branco congelado.

17
Os peixes pelágicos são encontrados perto da superfície (e.g. atum e marlim), e os peixes demersais são encontrados perto do fundo (e.g.
bacalhau).

25
Figura 11: Cadeia de Abastecimento Actual de Peixe no Sal e Boa Vista

Canal 1 Canal 2 Canal 3

Barcos de São Vicente Barcos do Sal /Boa Vista Mercado venda a grosso
Espanha
€1,8/kg €3,2/kg €5,1/kg peixe fresco
33% margem bruta 33% margem bruta €8/kg filetes congeladas

Grossista Vendedoras Grossista Emicela


€0.3/kg custos de transporte
€2/kg €3,9/kg €2/kg taxas aduaneiras
20% margem bruta 20% margem bruta 30% margem grossa

Voo para a Boa Vista 80 toneladas/mês


20 toneladas/mês
Transporte €1/kg 960 toneladas/ano
240 toneladas/anos
Volumes €13/kg
desconhecidos
€3,9/kg €13/kg

Hotel no Sal e Boa Vista

69. Mesmo tendo em conta os preços mais altos do peixe na Boa Vista e Sal, o peixe local
está normalmente disponível por cerca de €4 por kg. Essencialmente, situa-se em cerca de um
terço dos €13 por kg que os hotéis estão a pagar pelo peixe importado (ver Figura 11). O peixe
local não é apenas bastante mais barato, é também de qualidade mais alta - é normalmente
pescado com linha e é fresco. Adicionalmente, o atum, a garoupa e a cavala são peixes
localmente mais valiosos do que a pescada ou o bacalhau. O atum é vendido tipicamente por
€7 a €10 por kg — 50% a 100% mais do que as espécies pelágicas — quando é vendido fresco
para os mercados europeus.

70. Isto é ainda mais relevante quando se tomam em conta as aquisições em grande escala
por parte de grandes unidades AI. Com base em informação recebida das entrevistas nos hotéis,
o peixe representa 27,5% dos custos totais de alimentação para os hotéis do Sal e Boa Vista.
Isto equivale a cerca de €6,9 gastos em peixe por quarto de hotel por dia - ou cerca de €15M
para cerca de 6.000 quartos de hotel nas duas ilhas por cada ano.

71. A principal recomendação para melhorar a penetração do peixe local nos AI é


apresentada de seguida:

26
Aumentar a Oferta Local de Peixe através de um Processo Certificado de Manuseamento

72. O fornecimento local de peixe fresco para o sector turístico no Sal e Boa Vista é uma
das ligações locais ideais a desenvolver. Estas duas ilhas são onde 90% das noites dormidas
por turistas acontecem e representam por isso o grosso do mercado de peixe consumido por
turistas. A razão mais mencionada para os hotéis não adquirirem peixe local é a preocupação
com a qualidade do peixe uma vez que qualquer caso de intoxicação alimentar pode
potencialmente afectar uma época turística inteira. Nesse sentido, para alterar os actuais
padrões de aquisições, é necessário investimento para melhorar o processo de manuseamento
pós-pesca e a certificação da qualidade do peixe.

73. Esta é claramente uma proposta de desenvolvimento viável que pode providenciar
numerosos benefícios. Se os hotéis em ambas as ilhas turísticas trocassem 75% das 960
toneladas de peixe que importam anualmente por peixe local, a um preço de €4 por kg ao invés
de €13 por kg, isto pouparia aos hotéis cerca de €8M por ano e melhoraria a experiência
turística. De forma mais importante ainda, esta substituição iria potencialmente aumentar a
ligação local com os pescadores em cerca de €3M (720 toneladas de peixe vendido aos hotéis
a €4 por kg). Estas aquisições poderiam a seu tempo gerar cerca de 420 empregos para
pescadores e 130 para intermediários associados, com impacto em cerca de 500 vidas18.

74. Embora os beneficiários principais sejam os pescadores do Sal e Boa Vista,


entrevistámos vendedores de peixe em São Vicente que transportam peixe fresco de Mindelo
para as ilhas turísticas através da TACV a um custo de cerca de €1 por kg. Existem por isso
intermediários que podem ligar outras ilhas ao mercado hoteleiro do Sal e Boa Vista,
potenciando assim as frotas mais amplas de Santo Antão/São Vicente e Santiago. Isto servirá
também para difundir a pressão pesqueira gerada pelo turismo a todo o arquipélago e beneficiar
as ilhas com níveis de pobreza mais elevados.

75. Do ponto de vista ambiental existem dados contraditórios acerca da saúde dos stocks
pesqueiros de Cabo Verde. Os stocks de atum e cavala parecem ser robustos. Todavia, os stocks
de lagosta estão sob pressão e pode ser vantajoso para Cabo Verde continuar a importar
espécies que estão sob pressão (lagosta) e não disponíveis nas águas locais (camarões). É por
esta razão que assumimos que apenas 75% do peixe importado pode ser substituído por peixe
local. É importante também relembrar que 428.000 turistas internacionais são equivalentes a
cerca de 9.380 residentes permanentes, o que constitui menos de 2% da população de Cabo
Verde.

76. Em Cabo Verde, a certificação do peixe pode ser implementada nas ilhas do Sal e Boa
Vista. A implementação de um programa de certificação deverá ser facilitado e seguido pelo
Governo, mas implementado pelo sector privado. A certificação do peixe em Cabo Verde irá
requerer um grau de acção colectiva para permitir que as comunidades pesqueiras melhorem
as condições de higiene e organização dos locais de desembarque, para fornecer inputs
regulares e fiáveis como gelo, e para formar uma entidade legal que esteja certificada como

18
Isto é baseado em estimativas do Instituto Nacional de Pescas de que existem cerca de 3100 pescadores artesanais e cerca de um milhar
de mulheres associadas ao sector (Iniciativa 2011). Tendo em conta que a pesca artesanal tem atingido em média 5100 toneladas desde
1991, podemos estimar que cada pescador tem uma taxa anual de pesca de cerca de 1,7 toneladas por ano.

27
uma marca reconhecida pelos hotéis e restaurantes. No caso do Sal, uma fábrica de gelo
actualmente em construção pelo Projecto de Pescas Regional da África Ocidental pode ser o
pilar de lançamento para tal certificação.

77. Nas Seychelles foi implementado um programa de certificação que permite aos
pescadores o fornecimento dos hotéis e restaurantes. A Associação de Pescadores de Barco das
Seychelles tem trabalhado num programa de etiquetagem para pesca de linha e anzol desde
2009, em colaboração com os hotéis e restaurantes. O programa procura os mercados
domésticos e internacionais para assegurar os clientes de que o peixe cumpre os standards de
qualidade e é pescado de forma responsável. Neste caso os proprietários de barcos e operadores
cumprem com um código de conduta e seguem as práticas acordadas relacionadas com a
captura, armazenamento, manuseamento e rastreabilidade.

C. Empregos no Sector do Turismo


78. Embora a taxa de emprego local seja relativamente alta no sector do turismo, o emprego
de trabalhadores não locais representa um vazamento importante num país com uma taxa de
pobreza de 27% e com uma taxa elevada de desemprego jovem. O emprego de mais Cabo
Verdianos no Sal e Boa Vista pode ser uma forma efectiva de transferir recursos de outras ilhas
sob a forma de remessas. De facto muitos empregados de hotéis no Sal e Boa Vista são
originalmente de outras ilhas com altos níveis de pobreza como Santo Antão.

79. É possível identificar dois factores que impedem o crescimento na percentagem de


trabalhadores empregues localmente. O primeiro é a falta de formação, principalmente a nível
vocacional/profissional. Isto é corroborado pela posição de Cabo Verde em 82 de 140 países
na rubrica «Educação e Formação» do Índice de Competitividade de Viagens e Turismo
compilado pelo Fórum Económico Mundial. A Escola de Hotelaria e Turismo de Cabo Verde
(EHTCV), construída com o apoio do Governo Luxemburguês e inaugurada em 2011, tem
aumentado de forma inquestionável o número de trabalhadores qualificados para turismo. No
entanto a EHTCV não consegue enfrentar todas as necessidades da indústria, especialmente
para serviços básicos hoteleiros tais como serviço de mesa e limpeza.

80. O segundo grande factor são as condições pobres de alojamento para os trabalhadores
hoteleiros. Isto é particularmente problemático na Boa Vista uma vez que constitui um factor
que constrange a capacidade que os hotéis têm de recrutar Cabo Verdianos de outras ilhas. Esta
constitui também uma das principais razões pela qual os hotéis na ilha empregam o maior
número e proporção de trabalhadores estrangeiros. A maior parte dos trabalhadores na Boa
Vista são alojados em «barracas», estabelecimentos informais no centro da cidade de Sal Rei
que se pensa possam albergar cerca de 4000 pessoas numa ilha com uma população total de
apenas 920019. Tendo em conta a falta de alternativas, os trabalhadores dos hotéis pagam cerca
de €100 por mês por quarto sem acesso a saneamento ou outros serviços básicos. Isto tem um
impacto importante qualidade de vida dos trabalhadores dos hotéis, e também representa um

19
Sob a estrutura actual de mercado e de regulação, o alojamento é claramente responsabilidade dos trabalhadores e do Governo, e não dos
empregadores.

28
risco de saúde para os turistas nos hotéis. Qualquer surto de doença, mesmo que confinado a
um só hotel, pode afectar seriamente a imagem do país como destino turístico.

81. São apresentadas em seguida duas séries de recomendações sobre como aumentar a
participação da força laboral local:

Oferecer Formação Vocacional ao nível da Escola Secundária

82. O Governo pode ajudar a preparar uma percentagem ampla da população para o
trabalho no sector do turismo através da oferta de formação vocacional de turismo e de
hospitalidade nas escolas secundárias. Este conceito foi adoptado por vários países orientados
para o turismo, embora utilizando modelos ligeiramente diferentes. Na Nova Zelândia esta
formação foi implementada de forma piloto em várias escolas secundárias. O sucesso dos
cursos levou a que quase todas as escolas do país oferecessem pelo menos dois cursos opcionais
de turismo aos estudantes (Massey High School 2013). Outro modelo, visível em países como
a Turquia, inclui a criação de várias escolas secundárias especialmente apetrechadas para
fornecerem formação em hospitalidade e turismo. No Canadá, os estudantes que acreditam que
podem vir a ter um interesse no sector do turismo podem inscrever-se em cursos gratuitos em
paralelo com os estudos secundários (Go2 British Columbia Tourism HR Society 2013).

Melhorar as Condições de Habitação dos Trabalhadores do Turismo na Boa Vista

83. Devem ser tomadas medidas imediatas para melhorar as condições de vida dos
trabalhadores de turismo na ilha da Boa Vista. Isto irá ajudar no recrutamento de mais Cabo
Verdianos, e também representa um imperativo de política social e pode reduzir o perigo de
contágio de doenças infecciosas para os hóspedes dos hotéis. Esta função pode ser assumida
pela SDTIBM. A receita pode ser proveniente de uma fracção do valor da venda dos terrenos
a investidores na ilha. Esta receita pode também ser complementada por alguns dos fluxos
gerados através da taxa de turismo. Esta iniciativa melhoraria drasticamente o bem-estar dos
trabalhadores dos hotéis, e ajudaria o país a cobrir alguns dos vazamentos ou fugas associadas
ao emprego de trabalhadores estrangeiros.

D. Protecção Ambiental
84. As ilhas de Cabo Verde são consideradas uma das 11 zonas em maior risco em termos
de perigo para a biodiversidade marinha. O país abriga cinco tipos de tartarugas marinhas e
representa a segunda maior área de nidificação no Atlântico Norte para a espécie tartaruga-
cabeçuda. Um total de 22 espécies de golfinhos e baleias podem ser encontradas nas suas águas,
que servem também como uma área importante de alimentação e reprodução para as baleias
jubarte. Tendo em conta o isolamento geográfico do arquipélago, as ilhas de Cabo Verde têm
um alto nível de endemismo entre as espécies da fauna e flora (Ministério do Turismo, Indústria
e Energia-DGT e WWF 2010).

85. No entanto a biodiversidade de Cabo Verde está a ser colocada sob pressão intensa de
forma directa e indirecta. Os desenvolvimentos turísticos de larga escala, incluindo os AI, estão
geralmente localizados dentro das ZDTIs. Embora as ZDTIs sejam legalmente mandatadas a
terem planos de ordenamento, somente as que se situam na Boa Vista e Maio têm e incorporam
as respectivas directrizes ambientais. Adicionalmente, embora todos os hotéis sejam obrigados

29
a realizar um Estudo de Impacto Ambiental (EIA), o processo de revisão e aprovação é fraco.
Um exemplo é de que os locais de construção se situam por vezes a menos de 80 metros do
mar, um limite estipulado pela Lei de Cabo Verde. A capacidade para implementar as
recomendações dos EIA é igualmente fraca e as recomendações nem sempre são seguidas. A
pressão sobre a biodiversidade também surge do desenho insensível dos projectos. Como
exemplo, as tartarugas recém-nascidas ficam por vezes desorientadas pelas luzes brilhantes dos
hotéis e não conseguem chegar ao mar (Ministério do Turismo, Indústria e Energia-DGT e
WWF 2010). A construção associada ao turismo, bem como da infraestrutura relacionada, cria
também um incentivo ad hoc para a apanha de areia que o Governo não consegue gerir, com
impacto directo na biodiversidade e qualidade ambiental, bem como na qualidade do produto
do turismo.

86. As actividades turísticas, senão forem praticadas de forma responsável, podem ter um
impacto nocivo no ambiente local. O uso não controlado de buggies nas dunas pode levar à
perca de flora endémica e pode afectar as áreas de nidificação das tartarugas. Os jet-skis e
outros barcos motorizados podem também afectar a fauna marítima e poluir a água. Por último,
a actividade dos hotéis gera uma procura considerável por água potável e electricidade e cria
quantidades amplas de resíduos sólidos, que nem sempre são tratados de forma apropriada.

87. Embora Cabo Verde tenha um enquadramento legislativo sólido para a protecção
ambiental, as regulamentações não são frequentemente aplicadas. De facto, o Índice de
Competitividade de Viagens e Turismo classifica o país em 95 (de 140) em termos de
«Aplicação de Regulamentações Ambientais». Em alguns casos isto pode ser atribuído à falta
de coordenação entre as autoridades envolvidas na implementação das regulamentações
ambientais. Estas incluem uma série de ministérios (Ambiente, Habitação e Ordenamento
Territorial; Desenvolvimento Rural; Infraestrutura e Economia Marítima; e Turismo, Indústria
e Energia) bem como diversos departamentos, institutos, e autoridades portuárias.

88. São apresentadas em seguida duas séries de recomendações sobre como melhorar a
protecção ambiental:

Melhorar a Integração do Ambiente no Planeamento do Turismo e a Coordenação da Aplicação


de Regulamentações Ambientais

Existe uma necessidade de preparar e implementar planos de ordenamento e loteamento


territoriais, Plano de Ordenamento Turístico (POT), para as restantes ZDTIs e garantir a
integração dos aspectos ambientais nos Planos Directores Municipais (PDMs). Isto irá requerer
a clarificação de determinadas tarefas e responsabilidades institucionais de vários ministérios
e autoridades, e garantir que existe capacidade para enfrentar as questões ambientais existentes.

Deverá ser implementado um mecanismo entre as autoridades relevantes para melhorar os


esforços de coordenação e implementação. Este mecanismo poderia tomar a forma de um
fórum nacional que se encontra de forma regular para discutir os desafios de implementação e
controlo e criar soluções viáveis que são seguidas e implementadas a nível local. Esta
autoridade poderia também criar um sistema de implementação e controlo, aplicando multas
pesadas aos transgressores.

30
Adaptar ou Criar um Sistema de Certificação que incorpore a Protecção Ambiental

89. Os mecanismos de certificação podem fornecer outra forma de incentivos para


encorajar os hotéis e operadores turísticos a melhorar a sustentabilidade ambiental e social das
suas operações. Isto poderia incluir investimentos em tecnologia mais eficiente em termos de
energia, participação em programas de reutilização e reciclagem, adopção de políticas de
gestão de recursos aquíferos, e criação projectos de desenvolvimento da comunidade. Cabo
Verde poderia escolher adoptar um dos muitos programas de sustentabilidade de turismo que
já existem. De forma alternativa, Cabo Verde poderia desenhar o seu próprio programa para
garantir que toma em conta as circunstâncias locais (ver Caixa 5). Em qualquer caso, o
programa pode providenciar aos participantes um veículo de promoção útil, especialmente
quando se quer focar mercados mais preocupados com questões ambientais.

90. Os stakeholders mais importantes do turismo, e em particular as grandes unidades AI,


devem ser envolvidos para se comprometerem com um programa de certificação. Se assim
fosse, os programas internacionais já existentes poderiam ser avaliados e eventualmente
alterados de forma a determinar quais seriam os mais adequados para Cabo Verde. Se não
emerge uma massa crítica de apoio entre os proprietários de negócios ligados ao turismo -
talvez porque o processo é demasiado oneroso - deverá ser formulado um código de conduta.
Este código significaria um compromisso não vinculativo para a sustentabilidade entre os
signatários.
Caixa 5: A Marca de Sustentabilidade do Turismo das Seychelles
A Marca de Sustentabilidade do Turismo das Seychelles (SSTL) foi lançada em 2012 e é gerida pelo Conselho
de Turismo das Seychelles. O programa foi desenhado em colaboração com o PNUD, adaptando os standards
de sustentabilidade internacional ao contexto das Seychelles. No total, os hotéis são avaliados em 105 critérios
categorizados em oito grandes pilares: práticas de gestão, gestão de resíduos, uso de água, uso de energia,
tratamento dos empregados, práticas de conservação, envolvimento da comunidade e satisfação dos hóspedes.
Os candidatos devem preencher primeiro uma auto-avaliação. Se a notação se situar acima de um determinado
limiar, é enviado um assessor externo por parte do Conselho de Turismo das Seychelles. Os hotéis que passarem
a avaliação são certificados com a Marca, que podem posteriormente utilizar nos materiais de marketing. Os
hotéis que não passarem recebem um feedback apontado a apoiar um esforço subsequente.

Em Outubro de 2012, as primeiras três certificações foram atribuídas. Estas incluíram os maiores hotéis nas
ilhas: o Berjaya Beau Vallon Resort & Casino de propriedade malaia e o Constance Ephelia de propriedade
maurícia. Uma série de outros hotéis, incluindo algumas cadeias internacionais de grande perfil apresentaram
candidaturas e encontram-se em fase de melhoria dos processos em linha com os critérios da SSTL.

E. Melhorar o Ambiente de Negócios para o Sector do Turismo


91. O ambiente de negócios fraco torna os alojamentos locais e independentes, assim como
outros negócios na cadeia de valor do turismo, menos competitivos. O custo dos inputs, como
serviços base de electricidade e água, da alimentação e bebidas importadas e de transporte, são
muito altos. Conforme mencionado no DECRP III, o sector do transporte ilustra as ineficiências
embutidas no sector do turismo. O transporte aéreo inter-ilhas é custoso e as ligações por
transporte marítimo necessitam de várias melhorias. A conectividade limitada inter-ilhas

31
constrange o movimento de turistas entre as ilhas e o transporte de produtos agrícolas das ilhas
mais produtivas (Santiago, Fogo e Santo Antão) para o Sal e Boa Vista.

92. Outro constrangimento importante identificado pelo sector é a burocracia e as


dificuldades associadas ao lançamento de um negócio. Desde processos complexos e longos,
como uma proposta para lançar uma nova companhia aérea doméstica, até projectos mais
simples como implementar instalações sanitárias na Praia de Kite no Sal, a maioria dos
processos podem demorar um período longo a serem aprovados. Esta é uma questão de toda a
economia que afecta todos os investidores, estrangeiros e domésticos, mas diversos
investidores locais mencionaram que a burocracia é particularmente onerosa para os
empreendedores locais. Por último, os operadores turísticos identificaram o sistema ineficiente
de vistos à chegada. Em outros países, tais como o Cambodja, a maioria dos turistas pode
candidatar-se e receber o visto online.

93. Estas conclusões são largamente corroboradas pelo Relatório Doing Business de 2012
do Banco Mundial (ver Figura 12) Cabo Verde regista um bom desempenho na «aplicação de
contratos» e relativamente bom no «comércio internacional», «registo de propriedade» e
«acesso a electricidade». Por outro lado, tem um desempenho pior em outros indicadores-chave
como «acesso a crédito» (126º), «iniciar um negócio» (131º), «protecção dos investidores»
(133º) e «resolução de insolvências» (183º). Em suma, Cabo Verde tem um desempenho pior
de que as Seychelles e muito pior do que a Tunísia e Maurícias. Isto sugere que o ambiente
regulatório representa um desafio sério aos negócios locais, incluindo aqueles que operam no
sector do turismo.

Figura 12: Ranking no Índice Doing Business em 2012

Ease of doing
Facilidade business
em conduzir 119
negócios
Starting a business 131
Iniciar um negócio

Construction
Licenças permits
de construção
116

Getting
Acesso electricity
a electricidade 70

Registo de propriedade
Registering property 61
Tunisia
Tunísia
Acesso a crédito
Getting credit 126 Cape
CaboVerde
Verde
Protecção de
Protecting investors
investidores 133 Mauritius
Maurícias

PagamentoPaying taxes
de impostos 104 Seychelles
Seychelles

Comércio internacional
Trade across borders 61

Aplicação de contratos
Enforcing contracts 37

Resolução de
Resolving insolvency
insolvências 183

0 50 100 150 200

Fonte: Banco Mundial (2011)

32
94. As principais recomendações sobre os passos iniciais para melhorar o ambiente de
negócios são apresentadas em seguida:

Coordenar a Implementação de um Lista Priorizada de Melhorias

95. O programa do Governo «Mudar para Competir» inclui uma lista compreensiva de
acções necessárias para melhorar o ambiente de negócios em Cabo Verde. As agências públicas
mandatadas para providenciar infraestrutura de turismo (SDTIBM, MTIE e Municípios), em
conjunto com o representantes do sector privado e de toda a cadeia de valor de turismo, devem
identificar e priorizar acções a serem implementadas de forma a melhorar o clima de
investimento do sector. O potencial Conselho de Turismo pode liderar e coordenar o diálogo e
as reformas. Algumas das reformas não têm custo de capital para o Estado, como por exemplo
resolver o impasse regulatório nos preços da energia na Boa Vista, e muitas são simplesmente
organizacionais, como garantir que as despesas de capital que são atribuídas à infraestrutura
são geridas de forma cautelosa de forma a minimizar os desperdícios.

VII. Conclusões
96. Este estudo procurou testar a ideia aparentemente intuitiva que os all-inclusive (AI) têm
pouco impacto na economia de Cabo Verde. As conclusões revelam impactos económicos mais
amplos do que aqueles que são tradicionalmente atribuídos a este tipo de alojamentos,
incluindo o potencial para a redução da pobreza. Mais especificamente, os AI de gama alta têm
a maior contribuição local em termos absolutos e os B&B de gama alta, particularmente nas
ilhas turísticas, são os que têm melhor desempenho numa escala relativa.

97. Com base neste dados empíricos, é recomendável que o Governo encoraje o
desenvolvimento adicional de mais AI e B&B de gama alta. Uma forma importante de
conseguir isto é através de ajustamentos estratégicos nos incentivos ao investimento. Isto
poderia surgir na forma de uma escala progressiva que favorecesse mais os que procuram
investir em estabelecimentos de alta qualidade que tenham mais ligações com a economia Cabo
Verdiana.

98. O Governo também deveria implementar políticas e actividades que maximizassem os


benefícios económicos locais dos AI em simultâneo com a minimização dos impactos
ambientais. Os aspectos ambientais poderiam ser diagnosticados através da realização de uma
Avaliação Estratégica Ambiental e Social (SESA), que procura avaliar os custos e benefícios
ambientais e sociais ao longo da cadeia de valor do turismo e identificar recomendações
concretas para enfrentar os desafios identificados.

99. O nível actual de vazamentos ou fugas ao longo da cadeia de valor do turismo pode ser
reduzido através de melhorias na cadeia de valor local das pescas, assim como através de
programas que incentivem a contratação local. As alterações no enquadramento institucional -
incluindo o estabelecimento de um Conselho de Turismo - podem também promover uma
melhor coordenação da gestão do sector, fortalecer a imagem de Cabo Verde como destino
turístico, e melhorar o diálogo público-privado. Estas iniciativas devem ser consideradas de

33
alta prioridade e seguidas no curto prazo. Afortunadamente, nenhuma delas requer gastos de
capital significativos que somariam ao stock da dívida do país.

No médio longo prazo, o país deve colocar um maior foco na diversificação da oferta turística.
Isto pode ajudar a reduzir a dependência do país de um pequeno número de grandes operadores
de AI, enquanto providenciaria mais oportunidades para os negócios locais. No entanto e de
forma a conseguir isto, o Governo necessitaria de trabalhar proactivamente na melhoria do
ambiente de negócios em simultâneo com a busca de oportunidades para melhorar o transporte
inter-ilhas.

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