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Brasília - DF
2022
MATHEUS SOARES SALGADO NUNES DE MATOS
Brasília - DF
2022
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa
Biblioteca Ministro Moreira Alves
22 p.
Inclui bibliografia.
CDD: 341.361
4
THE MORE RAILROADS THE BETTER? THE RISKS OF THE CRITERIA FOR
GRANTING RAILROADS AUTHORIZATIONS
RESUMO
O presente artigo visa analisar comparativamente a Lei n. 14.273/2021, que institui o modelo de
exploração ferroviária mediante autorizações administrativas, também denominado Marco Legal das
Ferrovias, em relação ao modelo vigente de exploração ferroviária no Brasil, bem como comentar sobre
possíveis elementos de risco relacionados aos critérios de outorga de autorizações ferroviárias. Para
tanto, realizou-se análise pontual das principais inovações trazidas pela Lei n. 14.273/2021, bem como
avaliação crítica acerca dos requisitos previstos na legislação e na proposta de regulamentação do tema,
tendo sido identificados riscos que merecem atenção do regulador e da comunidade jurídica. Ao fim e
ao cabo, conclui-se que, muito embora os riscos identificados a partir da análise dos critérios de outorga
de autorizações ferroviárias merecem acompanhamento no curso do desenvolvimento prático da Lei e
da regulamentação aplicável, dada a possibilidade de que se frustrem os objetivos da política pública
atual do setor de ferrovias.
Palavras-chave: Autorizações. Ferrovias. Critérios de Outorga.
ABSTRACT
This article aims to comparatively analyze Law n. 14,273/2021, which establishes the model of railway
exploitation through administrative authorizations, also called the Legal Framework of Railways, with
the current model of railway exploitation in Brazil, as well as to comment on possible elements of risk
related to the criteria for granting railway authorizations. For this purpose, a spot analysis of the main
innovations brought by Law 14.273/2021 was carried out, as well as a critical evaluation of the
requirements provided for in the legislation and in the proposed regulation for the matter, what led to
possible risks that deserve the attention of the regulator and the legal community. In the end, we conclude
that the risks identified from the analysis of the criteria for granting railroad authorizations deserve
monitoring during the practical development of the Law and the applicable regulation, given the
possibility of frustrating the objectives of the current public policy in the railroad sector.
Keywords: Authorization. Railroads. Granting criteria.
5
1 INTRODUÇÃO
O Marco Legal das Ferrovias buscou construir a base jurídica para que a construção e a
exploração de ferrovias no Brasil pudessem ser feitas de forma mais simples, com maior
autonomia pela iniciativa privada. Para tanto, o Governo Federal lançou mão, em 2021, do
programa Pro Trilhos2.
1
BRASIL. Lei nº 14.273, de 23 de dezembro de 2021. Estabelece a Lei das Ferrovias; altera o Decreto-Lei nº
3.365, de 21 de junho de 1941, e as Leis nºs 6.015, de 31 de dezembro de 1973, 9.074, de 7 de julho de 1995,
9.636, de 15 de maio de 1998, 10.233, de 5 de junho de 2001, 10.257, de 10 de julho de 2001, 10.636, de 30 de
dezembro de 2002, 12.815, de 5 de junho de 2013, 12.379, de 6 de janeiro de 2011, e 13.448, de 5 de junho de
2017; e revoga a Lei nº 5.917, de 10 de setembro de 1973. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-
2022/2021/lei/L14273.htm#:~:text=Art.,associadas%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias.
Acesso em: 03 jun. 2022.
2
MINISTÉRIO DA INFRAESTRUTURA. Pro Trilhos – Programa de Autorizações Ferroviárias. Disponível
em: https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/assuntos/transporte-terrestre/programa-de-autorizacoes-ferroviarias.
Acesso em: 11 jun. 2022.
6
Apesar disso, é preciso dizer que qualquer tentativa de esgotamento do tema seria
leviana neste momento, dado que a Lei n. 14.273/2021 entrou em vigor em dezembro de 2021,
restando, inclusive, veto pendente de apreciação pelo Congresso Nacional. Ademais, não se
tem notícias de ferrovias autorizadas em operação, igualmente, de forma que o presente
trabalho, ao fim e ao cabo, é um convite ao acompanhamento do desenvolvimento e
implementação do modelo de autorização de ferrovias, notadamente quanto aos pontos aqui
abordados.
3
Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão,
sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.
4
BRASIL. Constituição Federal de 1988, de 10 de maio de 1988. Constituição da República Federativa do Brasil.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 04 jun. 2022.
5
BRASIL. Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação
de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras providências. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8987cons.htm. Acesso em: 08 jun. 2022.
6
BRASIL. Lei nº 9.074, de 07 de julho de 1995. Estabelece normas para outorga e prorrogações das concessões e
permissões de serviços públicos e dá outras providências. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8987cons.htm. Acesso em: 13 jun. 2022.
7
O marco inicial das concessões ferroviárias remete ao final da década de 1990 com a
ocorrência dos leilões de concessão das malhas regionais, com a segmentação geográfica
promovida para oferecimento dos antigos ativos da RFFSA a empresas privadas. Conforme
comenta Paulo Pessoa Guerra Neto, a rede ferroviária da antiga RFFSA foi dividida em sete
regionais geográficas: Oeste, Centro-Leste, Sudeste, Tereza Cristina, Sul e Sudeste9.
Atualmente, a partir de informações da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT),
estão em curso dezesseis10 contratos de concessão ou subconcessão, quando há transferência de
parte das incumbências da concessão obtida a um terceiro.
7
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 30ª ed. São Paulo: Atlas, 2016. p.
394.
8
ARAGÃO, Alexandre Santos. Direito dos Serviços Públicos. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 142.
9
NETO, P. P. G. Evolução dos Contratos de concessões de ferrovias. Instituto Serzedello Corrêa - Tribunal de
Contas da União. Coletânea de Pós-Graduação [Governança e Controle da Regulação em infraestrutura],
v. 4, n. 18, p. 48, 1 jan. 2019. p. 22.
10
AGÈNCIA NACIONAL DE TRANSPORTES TERRESTRES – ANTT. Concessões Ferroviárias. Disponível
em: <https://www.gov.br/antt/pt-br/assuntos/ferrovias/concessoes-ferroviarias>. Acesso em: 01 jul. 2022.
8
As autorizações aqui discutidas encontram suas balizas constitucionais no, art. 21, inciso
XI e XII11 da Constituição de 1988. Diferentemente do regime de concessões e permissões, que
são os meios utilizados em caráter geral pelo Estado para prestação dos serviços públicos, a
teor do art. 175 da Constituição, o art. 21 do texto constitucional enumera serviços específicos
passíveis de serem explorados pelo Estado também mediante o regime de autorizações, sem
atribuir a esses o caráter público, tal qual no art. 175.
11
Art. 21. Compete à União: XI - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os
serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a criação de um
órgão regulador e outros aspectos institucionais; XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão
ou permissão: a) os serviços de radiodifusão sonora, e de sons e imagens; b) os serviços e instalações de energia
elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água, em articulação com os Estados onde se situam os
potenciais hidroenergéticos; c) a navegação aérea, aeroespacial e a infraestrutura aeroportuária; d) os serviços de
transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites
de Estado ou Território; e) os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros; f) os
portos marítimos, fluviais e lacustres;
12
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo
Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse
coletivo, conforme definidos em lei.
13
ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes. Art. 21, da Constituição da República Federativa do Brasil. In:
CANOTILHO, José Joaquim Gomes et al. Comentários à Constituição do Brasil. 2. ed. São Paulo: Saraiva
Educação, 2018. p. 792-796.
9
O Marco Legal das Ferrovias segregou com clareza as regras de exploração ferroviária
sob o regime público (concessões, que não se extinguiram com a promulgação da Lei de
Autorizações Ferroviárias, diga-se de passagem) e de regime privado (autorizações). A título
de ilustração, em seus art. 6º14, inciso III e 8º, incisos I e II15, o Marco é explícito ao mencionar
tal divisão. A partir de análise detida do texto do Marco Legal das Ferrovias, é possível traçar
comparação direta entre os dois modelos, notadamente no que diz respeito à liberdade tarifária
e capacidade de transporte das ferrovias. Vejamos no quadro abaixo tais elementos de
comparação:
Quadro 1 – Comparação entre as regras de exploração de ferrovias sob regime público e regime privado
14
Art. 6º A exploração de ferrovias classifica-se em: (…). III – quanto ao regime de execução: a) em regime de
direito público; b) em regime de direito privado.
15
Art. 8º A exploração indireta de ferrovias será exercida por operadora ferroviária: I - em regime privado,
mediante outorga de autorização; II - em regime público, mediante outorga de concessão.
10
16
CONGRESSO NACIONAL. Vetos em Tramitação no Congresso Nacional. Disponível em:
<https://www.congressonacional.leg.br/materias/vetos/-/veto/detalhe/14905.>. Acesso em: 08 jul. 2022.
17
MINISTÉRIO DA INFRAESTRUTURA. Pro Trilhos – Programa de Autorizações Ferroviárias. Disponível
em: https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/assuntos/transporte-terrestre/programa-de-autorizacoes-ferroviarias.
Acesso em: 11 jun. 2022.
18
BRASIL. Medida Provisória nº 1.065, de 30 de agosto de 2021. Dispõe sobre a exploração do serviço de
transporte ferroviário, o trânsito e o transporte ferroviários e as atividades desempenhadas pelas administradoras
ferroviárias e pelos operadores ferroviários independentes, institui o Programa de Autorizações Ferroviárias, e dá
outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-
2022/2021/Mpv/mpv1065.htm. Acesso em: 08 jul. 2022.
19
CÂMARA DOS DEPUTADOS. Exposição de Motivos da Medida Provisória n. 1.065/2021. Disponível em:
<https://www2.camara.leg.br/legin/fed/medpro/2021/medidaprovisoria-1065-30-agosto-2021-791688-
exposicaodemotivos-163608-pe.html.>. Acesso em: 09 jul. 2022.
11
utilização da malha ferroviária, a qual 30% ou possuía operação ineficiente ou não possuía
operação comercial, aumentando a participação do modal ferroviário na matriz logística
nacional; (ii) desburocratizar a construção e operação de ferrovias, com especial atenção às
short lines20 para instalações próprias e; (iii) permitir que a iniciativa privada financiasse a
instalação de ferrovias, especialmente em um período de escassez e supressão dos
investimentos públicos em função do cenário de crise econômica, à época intensificada pelo
ápice da pandemia da COVID-19.
Pode-se dizer que o modelo de autorizações ferroviárias tem sido bem-sucedido no que
diz respeito ao interesse manifestado pelo mercado. Até o momento, segundo dados oficiais do
Ministério da Infraestrutura, há 78 pedidos de autorização em análise, com projeção de
construção de cerca de 20,33 mil km de extensão de malha ferroviária e expectativa de
investimentos de R$ 237 bilhões21. Específica e programaticamente, a Lei materializou os
objetivos da política pública gestada em princípios norteadores e diretrizes em arts. 4º e 5º22.
20
Short lines são ferrovias que possuem área de abrangência limitada (municipal e estadual), tendo como principais
características a integração de indústrias que possuem ferrovias para uso particular, alimentação de tráfego em
ferrovias maiores e transporte de passageiros. LANZA, João Felipe Rodrigues. Shortlines no Brasil: O primeiro
passo da abertura de mercado, 2019. Disponível em:
https://fgvcelog.fgv.br/sites/gvcelog.fgv.br/files/artigos/shortlines_market.pdf. Acesso em 11 jul. 2022.
21
MINISTÉRIO DA INFRAESTRUTURA. Pro Trilhos – Programa de Autorizações Ferroviárias. Disponível
em: https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/assuntos/transporte-terrestre/programa-de-autorizacoes-ferroviarias.
Acesso em: 11 jun. 2022.
22
Art. 4º A política setorial, a construção, a operação, a exploração, a regulação e a fiscalização das ferrovias em
território nacional devem seguir os seguintes princípios: I - proteção e respeito aos direitos dos usuários; II -
preservação do meio ambiente; III - redução dos custos logísticos; IV - aumento da oferta de mobilidade e de
logística; V - integração da infraestrutura ferroviária; VI - compatibilidade de padrões técnicos; VII - eficiência
administrativa; VIII - distribuição de rotas de determinada malha ferroviária entre distintas operadoras ferroviárias,
de modo a impedir a concentração de origens ou destinos; IX - defesa da concorrência; X - regulação equilibrada.
Parágrafo único. Além dos princípios relacionados no caput deste artigo, aplicam-se ao transporte ferroviário
associado à exploração da infraestrutura ferroviária em regime privado os princípios da livre concorrência, da
liberdade de preços e da livre iniciativa de empreender. Art. 5º A exploração econômica de ferrovias deve seguir
as seguintes diretrizes: I - promoção de desenvolvimento econômico e social por meio da ampliação da logística e
da mobilidade ferroviárias; II - expansão da malha ferroviária, modernização e atualização dos sistemas e
otimização da infraestrutura ferroviária; III - adoção e difusão das melhores práticas do setor ferroviário e garantia
da qualidade dos serviços e da efetividade dos direitos dos usuários; IV - estímulo à modernização e ao
aprimoramento da gestão da infraestrutura ferroviária, à valorização e à qualificação da mão de obra ferroviária e
à eficiência nas atividades prestadas; V - promoção da segurança do trânsito ferroviário em áreas urbanas e rurais;
VI - estímulo ao investimento em infraestrutura, à integração de malhas ferroviárias e à eficiência dos serviços;
VII - estímulo à ampliação do mercado ferroviário na matriz de transporte de cargas e de passageiros; VIII -
estímulo à concorrência intermodal e intramodal como inibidor de preços abusivos e de práticas não competitivas;
IX - estímulo à autorregulação fiscalizada, regulada e supervisionada pelo poder público; X - incentivo ao uso
racional do espaço urbano, à mobilidade eficiente e à qualidade de vida nas cidades.
23
GOVERNO FEDERAL; EMPRESA DE PLANEJAMENTO E LOGÍSTICA S.A.; MINISTÉRIO DA
INFRAESTRUTURA. Plano Nacional de Logística (PNL) 2035. [s.l: s.n.]. Disponível em:
12
ferrovias brasileiras que somavam cerca de 21 mil km de extensão e apenas 0,20% do modal
de transporte nacional, teria sua representatividade em termos de market share do modal de
transportes nacional duplicado. É possível dizer que a política pública concretizada no Plano
Nacional de Logística está em curso, ainda em estágios iniciais, mas aparentemente
confrontando os problemas levantados pelo Poder Público no setor de ferrovias.
Porém, muito embora o Marco traga consigo diversos aspectos positivos, inclusive a
partir da concretização de objetivos nobres no que diz respeito à política pública de transportes
do Estado brasileiro, do estudo da legislação e episódios práticos ocorridos já quando da
vigência da nova Lei decorrem algumas preocupações de ordem prática e regulatória, às quais
nos dedicaremos a explorar no próximo tópico deste capítulo, qual seja: os critérios para outorga
de autorizações ferroviárias elencados no Marco Legal de Ferrovias e regulamentação em
elaboração.
<https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/assuntos/politica-e-planejamento/politica-e-
planejamento/RelatorioExecutivoPNL_2035final.pdf>. Acesso em 11 jul. 2022.
24
Art. 2º. (…) § 2º A União pode delegar a exploração dos serviços de que trata o inciso II do caput deste artigo
aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, observada a legislação federal, nos termos do § 2º do art. 6º da
Lei nº 12.379, de 6 de janeiro de 2011.
13
Em uma primeira leitura, não se depreende preocupações evidentes do texto legal. Nota-
se, em verdade, mais um indicativo do estímulo legal de simplificação conferido à outorga de
autorizações ferroviárias. Porém, ao destrinchar a estrutura do texto da Lei, nos parece haver
elementos de riscos sobre os quais entendemos ser necessário manter os olhos atentos no curso
do desenvolvimento e implantação das ferrovias autorizadas.
Primeiramente, cumpre registrar que, até o presente momento, a Lei n. 14.273/2021 não
foi regulamentada, estando a proposta de regulamentação acerca do requerimento da
autorização ferroviária submetida a consulta pública no âmbito da ANTT25. Embora ainda se
esteja em processo de coleta de consultas públicas sobre a regulamentação pretendida, a ANTT
já disponibilizou as minutas de relatório e proposta de regulamentação26 sobre o tema.
No que diz respeito à indicação das fontes de financiamento, a opção regulatória foi de
exigir do requerente da autorização a indicação se os recursos financeiros necessários ao
empreendimento serão próprios ou de terceiros e se a sua natureza será pública ou privada,
25
AGÊNCIA NACIONAL DE TRANSPORTES TERRESTRES – ANTT. Audiência Pública com objetivo de
colher subsídios e informações adicionais para o aprimoramento da proposta de regulamentação do art. 25
da Lei Federal nº 14.273, de 23 de dezembro de 2021, que trata do processo de autorização para exploração
de ferrovias. Disponível em:
<https://participantt.antt.gov.br/Site/AudienciaPublica/VisualizarAvisoAudienciaPublica.aspx?CodigoAudiencia
=500.>. Acesso em: 14 jul. 2022.
26
AGÊNCIA NACIONAL DE TRANSPORTES TERRESTRES – ANTT. Audiência Pública com objetivo de
colher subsídios e informações adicionais para o aprimoramento da proposta de regulamentação do art. 25
da Lei Federal nº 14.273, de 23 de dezembro de 2021, que trata do processo de autorização para exploração
de ferrovias. Disponível em:
<https://participantt.antt.gov.br/Site/AudienciaPublica/VisualizarAvisoAudienciaPublica.aspx?CodigoAudiencia
=500.>. Acesso em: 14 jul. 2022.
27
Art. 25 (…). § 1º O requerimento deve ser instruído com: (…). II - relatório técnico descritivo, no caso de
autorização para ferrovias, com, no mínimo: a) indicação georreferenciada do percurso total, das áreas adjacentes
e da faixa de domínio da infraestrutura ferroviária pretendida; b) detalhamento da configuração logística e dos
aspectos urbanísticos relevantes; c) características da ferrovia, com as especificações técnicas da operação
compatíveis com o restante da malha ferroviária; d) cronograma de implantação ou recapacitação da ferrovia,
incluindo data-limite para início das operações ferroviárias; (…).
14
conforme se depreende do atual §2º, do art. 4º, da minuta de resolução em elaboração pela
ANTT.
A opção pela mera indicação, pelo operador privado das fontes de recursos a serem
utilizadas, chama atenção e nos parece ser um elemento substancial de risco financeiro de um
projeto, por dois principais motivos: (i) a possibilidade de ausência de concretude da
informação submetida ao regulador e; (ii) ausência de base legal para exigência de envio de
documentos financeiros e eleição de critérios de avaliação de viabilidade econômica do projeto,
quando indicado que o projeto será autofinanciado pelo requerente.
Quanto ao item (i), é de se pontuar, pela lógica do dispositivo legal, que no momento da
apresentação do requerimento de autorização, a requerente já possua informações suficientes
acerca do projeto que se pretende implementar. Porém, no que diz respeito à obtenção de
recursos para financiamento de projetos de infraestrutura, há dificuldades inerentes à situação
macroeconômica do Brasil, bem como a dificuldade de obtenção de crédito junto a instituições
públicas e privadas, que miram rentabilidades agressivas, fazendo com que os investimentos se
concentrem em regiões mais ricas e desenvolvidas, capazes de gerar maior fluxo para as
empresas em termos de pagamento de tarifas28.
Nesse sentido, a mera declaração por parte do requerente da autorização pode resultar,
ao fim e ao cabo, que se trate de um excelente projeto, mas sem possibilidade de execução,
notadamente em projetos greenfield e em regiões com menor tráfego ferroviário (e geração de
tarifas), levando o regulador a decidir pela aprovação de um projeto que não necessariamente
reunirá condições de se concretizar por completo, ou mesmo sair do papel.
O que nos leva ao item (ii), que é a ausência de base legal para requerer e realizar
avaliação das condições financeiras também através dos documentos financeiros da empresa
requerente da autorização, quando indicado o autofinanciamento do projeto requerido. Apesar
de não ser um elemento determinante, a identificação de ausência de caixa disponível para a
assunção de novos investimentos pela própria titular poderia ser um elemento de mitigação de
projetos inviáveis financeiramente.
28
MEDEIROS, Victor. RIBEIRO, Rafael Saulo Marques Ribeiro. Investimento em infraestrutura: uma estrada
para o desenvolvimento. Disponível em:
https://www.valor.com.br/sites/default/files/infograficos/pdf/CepalEnsaio2_03012019.pdf. Acesso em: 15 jul.
2022.
15
Note-se que tal preocupação tinha sido endereçada na alínea “e” do §1º, do inciso II, do
art. 25 do Marco Legal29, que, quando de sua promulgação, veio a ser vetada pela Presidência
da República. A alínea “e” estipulava que, dentre os documentos a serem apresentados ao
regulador ferroviário, deveria constar relatório executivo e estudos de viabilidade econômica
da ferrovia planejada.
Indo adiante, de uma experiência prática, temos um outro elemento que nos parece
oferecer riscos ao desenvolvimento ferroviário eficiente, conforme pretendido pelo legislador
e pelo Governo Federal, através da política pública em execução: o critério de viabilidade
29
Art. 25 (…). § 1º O requerimento deve ser instruído com: (…). II - relatório técnico descritivo, no caso de
autorização para ferrovias, com, no mínimo: (…); e) relatório executivo dos estudos de viabilidade técnica,
econômica e ambiental
30
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Mensagem de Veto a Dispositivos da Lei n. 14.273/2021. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/Msg/VEP/VEP-726.htm.>. Acesso em: 15 jul. 2022.
31
ALLONDA AMBIENTAL. Viabilidade técnica, econômica e ambiental em obras de infraestrutura.
Disponível em: <https://allonda.com/blog/infraestrutura/a-importancia-dos-estudos-de-viabilidade-tecnica-
economica-e-ambiental-em-obras-de-infraestrutura/>. Acesso em: 15 jul. 2022.
16
locacional elencado como um dos elementos de análise pelo regulador. Com o pedido de perdão
pela simplificação proposta, ainda que haja necessidade de observação dos critérios técnicos da
ferrovia, o critério de viabilidade locacional parece indicar que “se for possível, faça-se”.
Para o primeiro trecho, a VLI teria realizado o pedido de instalação de linha férrea logo
após a então vigente MP n. 1.065/2021. A Rumo, pouco tempo depois, solicitou a alocação de
ferrovia logo ao lado do trecho da VLI. O mesmo veio a ocorrer no trecho do estado de Minas
Gerais e no Porto de Santos. Ao menos para o trecho de Água Boa (GO) e Lucas do Rio Verde
(MT), foram concedidas autorizações para Rumo e para a VLI, ambas para construção de
ferrovias de 508 km e ambas se encontrando em estágio de assinatura do contrato de adesão
para autorização34.
Tal fato desperta questionamentos acerca da possibilidade de que condutas como essa
se tornassem corriqueiras, de forma que operadoras ferroviárias utilizem da tática como um
meio de inibição de concorrentes, agindo de maneira contrário à lógica de maximização da
eficiência da rede ferroviária no Brasil. De outro lado, a questão também convida à reflexão
sobre se em tais situações, estar-se-ia caminhando em convergência com os princípios do Novo
Marco Legal, como distribuição de rotas de determinada malha ferroviária entre distintas
operações, defesa da concorrência e eficiência de serviços.
32
AMORA, Dimmi. Guerra ferroviária leva Rumo a pedir autorização para trechos solicitados pela VLI e operados
pela MRS. Agência Infra, 2021. Disponível em: <https://www.agenciainfra.com/blog/guerra-ferroviaria-leva-
rumo-a-pedir-autorizacao-para-trechos-solicitados-pela-vli-e-operados-pela-mrs/>. Acesso em: 16 jul. 2022.
33
A chamada "Ferradura de Santos" é uma linha férrea curta, em forma de "U", com apenas 19 quilômetros na
margem direita e 24 quilômetros na esquerda do porto. Controlado pela MRS este é, talvez, a menor trecho
ferroviário brasileiro. E, com certeza, o mais cobiçado. A linha é o único acesso de trem ao Porto de Santos, o que
a transforma no negócio mais rentável do setor. TEREZA, Irany. Acesso a Santos pode mudar lei ferroviária. O
Estado de São Paulo, 2005. Disponível em:
<https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/305677/noticia.htm?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso
em: 16 jul. 2022.
34
MINISTÉRIO DA INFRAESTRUTURA. Pro Trilhos – Programa de Autorizações Ferroviárias. Disponível
em: https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/assuntos/transporte-terrestre/programa-de-autorizacoes-ferroviarias.
Acesso em: 11 jun. 2022.
17
Importante que se registre que não se está indicando que o regulador ferroviário não
estará apto a realizar tal avaliação ou que há qualquer tipo de prática ilegítima ou estímulo a
ineficiências por parte do Novo Marco, mas apontando itens que, em nosso sentir, são
elementos lacunosos quando levados à prática. Mesmo porque, na proposta de regulamentação
em elaboração pela ANTT, não foram identificadas balizas para a avaliação de elemento
importante relacionado ao papel do regulador quando da avaliação dos requerimentos: a
convergência da ferrovia requerida com a política ferroviária.
Pois bem. Tais pontos são realmente delicados, principalmente ao se considerar que, os
requerimentos de autorização que preencham o checklist previsto na legislação devem ser
deferidos, salvo por incompatibilidade com a política nacional de transporte ferroviário
(conceito jurídico não delimitado na atual minuta de regulamentação) ou por motivo técnico-
operacional relevante, mediante justificação36.
35
DAYCHOUM, Mariam Tchepurnaya. SAMPAIO, Patrícia Regina Pinheiro. Regulação e Concorrência no
Setor Ferroviário. 1ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017. p. 60.
36
Art. 25. (…). § 6º Cumpridas as exigências legais, nenhuma autorização deve ser negada, exceto por
incompatibilidade com a política nacional de transporte ferroviário ou por motivo técnico-operacional relevante,
devidamente justificado.
18
Portanto, nos parece louvável que o Marco Legal tenha avançado em buscar cumprir
com os objetivos do Estado brasileiro em promover a diversificação da matriz de transportes
brasileiro, condições para maior integração de linhas ferroviárias e desconcentração do das
malhas ferroviárias nacionais. Contudo, elementos como os apontados no presente tópico se
apresentam como desafios de ordem conjuntural, econômica e regulatória que, até o presente
momento, não contam com soluções postas. Recomenda-se olho-vivo ao longo do percurso.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar dos números dos programas serem impressionantes no que diz respeito à
quantidade de requerimentos de ferrovias autorizadas e investimentos pretendidos, elementos
relacionados ao regramento dos critérios de outorga de ferrovias autorizadas suscitam riscos
que são merecedores de atenção.
Não se pretende, com o presente trabalho, fadar o Marco Legal Ferroviário ao insucesso,
mesmo porque os números públicos divulgados até o presente momento dão indicativo de que,
até o presente momento 78 pedidos de autorização estão em análise perante a ANTT, com
projeção de construção de cerca de 20,33 mil km de extensão de malha ferroviária e expectativa
de investimentos de R$ 237 bilhões no setor.
REFERÊNCIAS
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pela VLI e operados pela MRS. Agência Infra, 2021. Disponível em:
<https://www.agenciainfra.com/blog/guerra-ferroviaria-leva-rumo-a-pedir-autorizacao-para-
trechos-solicitados-pela-vli-e-operados-pela-mrs/>.
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2013. p. 142.
BRASIL. Lei nº 14.273, de 23 de dezembro de 2021. Estabelece a Lei das Ferrovias; altera o
Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, e as Leis nºs 6.015, de 31 de dezembro de
1973, 9.074, de 7 de julho de 1995, 9.636, de 15 de maio de 1998, 10.233, de 5 de junho de
2001, 10.257, de 10 de julho de 2001, 10.636, de 30 de dezembro de 2002, 12.815, de 5 de
junho de 2013, 12.379, de 6 de janeiro de 2011, e 13.448, de 5 de junho de 2017; e revoga a
Lei nº 5.917, de 10 de setembro de 1973. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-
2022/2021/lei/L14273.htm#:~:text=Art.,associadas%20e%20d%C3%A1%20outras%20provi
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CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 30ª ed. São Paulo:
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NETO, Paulo Pessoa Guerra. Evolução dos Contratos de concessões de ferrovias. Instituto
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Disponível em:
<https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/305677/noticia.htm?sequence=1&isAll
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