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FACULDADE DE DIREITO
GRADUAÇÃO EM DIREITO
Salvador- BA
2022
MARCOS ANTÔNIO AZEVEDO CARNEIRO
Salvador
2022
MARCOS ANTÔNIO AZEVEDO CARNEIRO
Salvador, 2022
Banca Examinadora
RESUMO
Este trabalho versa sobre a oferta online de conteúdo audiovisual programado por
meio de subscrição. Tem como principal objetivo analisar o regime jurídico-regulatório
atualmente aplicável ao serviço em decorrência do entendimento fixado no acórdão
nº 472, proferido pelo Conselho Diretor da Agência Nacional de Telecomunicações
em 10 de setembro de 2020. O marco teórico do presente trabalho é composto pelo
que ora se chama de teorias de regulação de serviços pós-convergência. Essas
teorias, em suma, se debruçam sobre a questão do modo como o Estado Regulador
deverá regulamentar serviços de telecomunicações e internet no contexto da pós-
convergência tecnológica. Este trabalho pretende verificar se a atuação da agência
reguladora brasileira na definição do regime jurídico regulatório da oferta online de
conteúdo audiovisual programado observou as prescrições normativas estabelecidas
nestas teorias. Para viabilidade da empreitada, a análise do objeto deste estudo tem
como vetor de orientação a proposta do professor Victor Fernandes (2018) de
agrupamento das prescrições normativas em três variáveis conceituais que as
caracterizam (2018). A metodologia é pautada em revisão bibliográfica e análise
qualitativa de fontes secundárias. No que tange a estrutura da investigação, de início,
o trabalho traz uma breve revisão de literatura sobre os serviços over the top, categoria
da qual decorre o objeto deste estudo. Em seguida, analisa a suposta
substitutibilidade entre os serviços over the top e a TV por assinatura tradicional, em
especial, a substitutibilidade entre esta e o serviço over the top de conteúdo
programado. Ato contínuo, aborda a dicotomia existente no direito brasileiro entre
serviços de telecomunicações e serviços de valor adicionado e as controvérsias
envolvendo a atuação da ANATEL no que diz respeito à observância da linha
demarcatória existente entre essas duas espécies normativas. Esta discussão
introduz e dá suporte a análise acerca do atual enquadramento jurídico regulatório
conferido pela agência reguladora ao serviço over the top de conteúdo audiovisual
programado no Brasil à luz de prescrições normativas para regulação dos novos
serviços no contexto da pós-convergência tecnológica (FERNANDES,2018). Da
análise empreendida, observou-se a insuficiência da dicotomia normativa entre
serviços de telecomunicações e serviços de valor adicionado; o caráter
incrementalista na atuação da entidade reguladora e a não observância dos princípios
prescritivos-normativos de horizontalidade e estabilidade na definição do regime
jurídico do serviço over the top de conteúdo audiovisual programado.
ABSTRACT
This monography deals with the online offer of programmed audiovisual content
through subscription. Its main objective is to analyze the legal and regulatory regime
currently applicable to the service as a result of the understanding established in
judgment nº 472, issued by the Board of Directors of the Brazilian National
Telecommunications Agency (ANATEL) on September 10, 2020. The theoretical
framework of this work it is composed of what is now called post-technological
convergence theories of service regulation. These theories address the question of
how the Regulatory State should regulate telecommunications and internet services in
the context of the post-technological convergence era. This work intends to verify if the
performance of the Brazilian regulatory agency in the definition of the regulatory legal
regime of the online offer of programmed audiovisual content observed the normative
prescriptions established in these theories. For the feasibility of the undertaking, the
analysis of the object of this study has as a guiding vector the proposal of Professor
Victor Fernandes (2018) of grouping normative prescriptions into three conceptual
variables that characterize them (2018). The methodology is based on bibliographic
review and qualitative analysis of secondary sources. With regard to the structure of
the investigation, at first, the work brings a brief review of the literature on over-the-top
services, the category from which the object of this study stems. Then, it analyzes the
supposed substitutability between over-the-top services and traditional pay TV, in
particular, the substitutability between this and the over-the-top service of programmed
content. Then, it addresses the dichotomy existing in Brazilian law between
telecommunications services and value-added services and the controversies
involving ANATEL's performance with regard to the observance of the existing
demarcation line between these two legal categories. This discussion introduces and
supports the analysis of the current regulatory legal framework conferred by the
regulatory agency to the over-the-top service of audiovisual content programmed in
Brazil in the light of normative prescriptions for the regulation of new services in the
context of technological post-convergence (FERNANDES, 2018). From the analysis
carried out, it was observed the insufficiency of the normative dichotomy between
telecommunications services and value-added services; the incremental nature of the
regulatory entity's actions and the non-compliance with the prescriptive-normative
principles of horizontality and stability in defining the legal regime of the over-the-top
service of programmed audiovisual content.
DTH – Direct-To-Home
HD – High-definition
IN – Instrução Normativa
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 10
REFERÊNCIAS......................................................................................................... 97
10
1 INTRODUÇÃO
Pretende-se com essa discussão entender se há entre os dois serviços (TV paga
e OTT de vídeo programado) aspectos funcionais equivalentes que possam ensejar
questionamentos relativos à eventual incidência de determinados regramentos
jurídicos e regulações setoriais.
Pretende-se com essa discussão entender se há entre os dois serviços (TV paga
e OTT de vídeo programado) aspectos funcionais equivalentes que possam ensejar
questionamentos relativos à eventual incidência de determinados regramentos
jurídicos e regulações setoriais.
1 Entre alguns destes estudos, podemos destacar a análise de Fernandes (2018) sobre os serviços
over the top de voz, assim entendidos como os serviços oferecidos a partir da internet que
disponibilizam capacidades de comunicação baseada no tráfego de sinais de voz, entregando aos seus
usuários funcionalidades semelhantes aos tradicionais serviços de telefonia fixa e móvel, mas que não
são juridicamente considerados serviços de telecomunicações e, portanto, não estão submetidos ao
mesmo regime jurídico setorial.
2 Essas são as conclusões do estudo de Ragazzo e Oliveira (2017) ao analisarem o atual status legal
normatividade vigente foi um argumento constante no debate travado entre a Claro S/A e TOPSPORTS
no âmbito do processo administrativo nº SEI 53500.057279/2018-66 instaurado pela Superintendência
de Fiscalização da ANATEL em razão de supostas ilegalidades da FOX na prestação de serviços de
televisão por assinatura (ANATEL, 2018)
16
Não raro, também é corriqueiro encontrar a expressão over the top sendo
utilizada por agências reguladoras, organismos nacionais e internacionais para se
referir aos próprios serviços, as características técnicas que os identificam ou a forma
específica de sua execução6.
4
A mesma observação foi feita pelo Relatório sobre os Serviços OTT do Organismo de Reguladores
Europeus das Comunicações Eletrônicas (BEREC): “OTT é um termo frequentemente usado, mas
muitas vezes não definido de forma precisa” (BEREC, 2016, tradução livre).
5 O uso da expressão calcado na figura do agente econômico foi empregado, por exemplo, na Avaliação
da Comissão Europeia sobre o quadro regulamentar das comunicações eletrônicas e que acompanhou
a proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho da União Europeia para o
Estabelecimento do Código Europeu de Comunicações Eletrônicas. Diversas vezes, o documento
utiliza a expressão OTT players para se referir aos agentes que “estão atualmente fora do âmbito de
intervenção do quadro regulamentar (embora existam divergências de abordagem quanto à linha
divisória) e que teria atrapalhado em parte o negócio modelo de fornecedores de comunicações
electrónicas "tradicionais". (EUROPEAN COMMISSION, 2016)
6 Esse foi o conceito adotado pelo Estudo desenvolvido para o Comitê do Mercado Interno e da Defesa
do Consumidor (ICMO) do Parlamento Europeu: nós usamos o termo over the top (OTT) para nos
referirmos a serviços online que podem substituir em algum grau os serviços tradicionais de mídia e
telecomunicações” (GODLOVITCH et al. 2016, tradução livre). Nesse sentido, a União Internacional de
Telecomunicações (UIT) já usou o termo para se referir a aplicações e serviços acessíveis através da
Internet e transmitidos por provedores de acesso à Internet, como redes sociais, e sites de agregação
de vídeos amadores, dentre outros” (UNIÃO INTERNACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES (UIT),
2013)
17
estes autores estão, em linhas gerais, elegendo uma entre duas perspectivas para
analisar um mesmo fenômeno, as quais foram qualificadas em sua obra como os
sentidos subjetivo e objetivo do conceito de over the top (FERNANDES, 2018).
Essa escolha não ignora, contudo, a existência da categoria serviços over the
top e que esta abrange outros tipos de serviços não analisados no presente trabalho.
Ao contrário, aqui se reconhece os serviços over the top enquanto um gênero do qual
se extrai o objeto de estudo dessa pesquisa - a oferta onerosa de canais de televisão
por assinatura pela internet - na condição de uma espécie derivada da categoria.
Feita essa estabilização semântica, a próxima seção irá desenvolver uma breve
revisão de literatura sobre a emergência dos OTT de vídeos e seu potencial
substitutibilidade em desfavor dos serviços de telecomunicações, em especial a tv por
assinatura. Sem pretensão de esgotar o tema, buscar-se-á apresentar os serviços
emergentes de comunicação audiovisual mais recorrentes (serviços OTT de vídeo)
com vistas a localizar o objeto dessa pesquisa dentro desse universo de novos
entrantes, buscando entre semelhanças e/ou diferenças, identificar a sua real posição
nesse mercado e as controvérsias que advieram desde o nascedouro dessa espécie
de serviço OTT.
7
Dentre diversos trabalhos nacionais voltados à temática, destaca-se o Estudo Preliminar Sobre os
Serviços de Vídeo sob Demanda (VoDs) publicado pela ANCINE em 2019 como forma de contribuir
com o debate travado no Brasil sobre a modelagem de um marco regulatório que fosse capaz de lidar
com a “maturidade e sofisticação da estrutura dos serviços de VoD no país" (ANCINE, 2019, p. 66).
Segundo o referido documento, essa espécie de serviço over the top enseja o “enquadramento legal
de suas características e a definição de obrigações de forma mais articulada e integrada ao
ordenamento da comunicação audiovisual'' e que, a despeito da obrigação de obediência dos novos
players aos “preceitos gerais dessa disciplina jurídica”, também se faz necessário um “tratamento
regulatório específico” que verse sobre a “estrutura e a organização lógica de funcionamento” da
cadeia de atividades dos Serviços de VoD (ANCINE, 2019).
8 Nesse sentido, a “Avaliação da OCDE sobre Telecomunicações e Radiodifusão no Brasil” constatou
que o setor de comunicações do país não dispõe de uma política pública abrangente para a
radiodifusão, a TV por assinatura e os serviços emergentes de OTT/VoD e que essa política se faz
necessária em um “ambiente cada vez mais convergente” (OECD, 2020).
21
Por seu turno, agentes incumbidos dos serviços OTT contestam essa alegação
sob o argumento de que os serviços prestados diretamente na internet não estariam
submetidos ao regime jurídico das telecomunicações ou qualquer regulação setorial,
se tratando, em verdade de serviços disruptivos que não foram antevistos pelo direito
vigente e que, portanto, estariam isentos, até o momento, de regulamentação 10.
Feita essa breve digressão da questão sob uma perspectiva ampliada, ressalta-
se que este estudo irá trabalhá-la dentro do contexto da disputa protagonizada pelos
prestadores de conteúdo audiovisual no ambiente da internet e o tradicional serviço
de televisão por assinatura. Debate do qual decorre as discussões sobre uma nova
forma de ofertar canais de televisão para o usuário final, sua eventual equiparação à
tradicional televisão paga e, por conseguinte, a incidência de regulações setoriais
decorrentes da aludida qualificação.
9 O argumento acima foi utilizado no Relatório Final do Ministério das Comunicações voltado para a
questão da necessidade de atualização da Lei nº 12.485/2011, que unificou os serviços de TV paga no
Brasil sob o mesmo regramento jurídico. Segundo o referido relatório, a lei supracitada não abarca as
aplicações e produtos OTTs e que este vácuo normativo enseja o desbalanceamento em termos de
carga regulatória entre a televisão por assinatura tradicional e os novos modelos de negócio (Brasil,
2021).
10 A natureza disruptiva do serviço e sua incompatibilidade com a normatividade vigente também foi um
argumento constante no debate travado entre a Claro S/A e Fox Latin America Channels do Brasil Ltda.
no âmbito do processo administrativo nº SEI (Processo SEI nº 53500.056473/2018-24) instaurado pela
Superintendência de Fiscalização da ANATEL em razão de supostas ilegalidades da TOPSPORTS na
prestação de serviços de televisão por assinatura (ANATEL, 2018)
22
Fonte: elaborado pelo autor com base nos dados extraídos do Painel de Dados da Anatel
(ANATEL, 2022)
12 Inclusive, esse crescimento pontual verificado à época foi veiculado com ressalvas pelos maiores
portais do Brasil sobre Telecomunicações. A maior parte da mídia especializada destacou que a
mudança na metodologia de cálculo tornou mais complexo a análise dos dados veiculados e que o
crescimento experimentado se deve à inclusão do Serviço de TV Livre Via Satélite na base do serviço
tradicional da Televisão por assinatura. (FLESCH, 2022)
24
Esse movimento foi se intensificando com o decorrer dos meses, revelando uma
evidente tendência ao arrefecimento do mercado, que se apresentava menor a cada
medição. Nessa toada, a crise do mercado de TV por assinatura atingiu um novo
marco quando, em setembro de 2022, registrou-se o mais baixo patamar na base de
acessos da tv paga desde a implementação da mudança na metodologia de
agregação dos dados: 14.443.558 acessos (ANATEL, 2022).
13
O Serviço de Distribuição de Sinais de Televisão e de Áudio por Assinatura via Satélite - DTH é uma
modalidade especial de serviço de acesso condicionado que distribui os sinais de televisão ou de áudio,
bem como de ambos, por meio de satélites, a assinantes localizados na área de prestação. Antes do
processo de unificação dos serviços de televisão por assinatura pela Lei de Comunicação Audiovisual
de Acesso Condicionado (Lei n 12.485/11), a TV por satélite (DTH) era regida pela Norma no 008/1997
aprovada pela Portaria no 321/1997 do Ministério das Comunicações.
14 Essa nomenclatura é recorrentemente usada por agentes do mercado, mídia e não raro pela própria
ANATEL em seus documentos e relatórios oficiais disponíveis em sua página eletrônica na internet.
Inclusive, os painéis de dados da agência sobre o serviço de TV paga no Brasil costumam segmentar
as informações em dois grupos, o “Padrão” e o “Livre Via Satélite”, sendo que o primeiro se refere à
televisão paga tradicional e o segundo faz alusão ao modelo de negócio "Sky Livre" e similares
(ANATEL, 2022)
25
Seguindo a mesma tendência, no último trimestre de 2021, pelo menos 89% dos
brasileiros conectados à internet afirmaram utilizá-la para assistir conteúdo
audiovisual na forma de programas, séries e filmes, segundo dados extraídos do
Módulo Temático de Comunicação e Informação da mais recente Pesquisa Nacional
por Amostragem de Domicílios Contínua do IBGE, a " PNAD Contínua" (IBGE, 2021).
15Esta premissa fática é verificada por diferentes estudos. Nesse sentido, o Relatório do GT-SeAC do
Ministério das Comunicações indicou que, no Brasil, a televisão por assinatura passa por um processo
de redução da sua base de assinantes (BRASIL, 2021), enquanto se observa o aumento no consumo
dos serviços de transmissão de vídeo na internet dentro de um contexto de avanços no ambiente
tecnológico que propiciam o desenvolvimento de novas empresas, modelos de negócio e iniciativas
voltadas ao mercado de transmissão de vídeos online (BRASIL, 2021).Essas duas tendências inversas
também foram esquadrinhadas pela ANCINE em estudo preliminar sobre os serviços de vídeo sob
demanda (ANCINE, 2019). Naquela ocasião, o documento já previa que essa espécie de serviço OTT
seria o “segmento com horizonte de expansão mais significativo” (ANCINE, 2019).
26
Nesse ponto, se faz salutar o resgate da análise proposta por Fernandes (2018)
sobre a questão do aumento exponencial da demanda por serviços OTT de voz
(Telegram™, WhatsApp™, dentre outros). Nela, o referido autor indicou algumas
características econômicas, intrínsecas ao modelo de negócio online, que explicariam
o sucesso comercial dos provedores dessa modalidade de serviços (FERNANDES,
2018).
Mesmo que suas observações tenham sido direcionadas aos OTT de voz,
ressalta-se que essas características são sim observáveis em outras modalidades de
serviço OTT, uma vez que estão menos atreladas à utilidade ou à finalidade gerada
(vídeo, voz, texto) e mais associadas ao próprio modo de execução do serviço (a
oferta online do serviço). Ou seja, guardadas as devidas proporções e sem
desconsiderar as especificidades contidas em cada caso, o modus operandi dos
serviços over the top é, em regra, compartilhado ou reproduzido com mais ou menos
semelhanças entre as suas diferentes espécies, ocupando o próprio núcleo identitário
do conceito amplo de serviços OTT.
16
O Relatório Final do GT- SEAC pormenorizou alguns desses melhoramentos, destacando a
importância dessas inovações para o desenvolvimento do mercado serviços over the top, dos quais
destacamos a otimização das tecnologias de compressão de vídeo, a expansão da capacidade de rede,
o aperfeiçoamento dos protocolos de comunicação para suporte à transmissão (BRASIL, 2021).
27
Diante do reconhecimento dessa atratividade dos serviços over the top de vídeo
para o consumidor final e, por conseguinte, do crescimento exponencial desse modelo
de negócio, alguns estudos vêm se debruçando sobre uma eventual relação causal
existente entre o sucesso dos novos entrantes e o arrefecimento do mercado da TV
por assinatura, especialmente no que tange há uma eventual relação de
substitutibilidade entre os serviços, aqui entendida como a capacidade desses
serviços concorrerem potencialmente entre si.
17As estimativas de 2018, apontavam para um número próximo de 21.3 milhões de assinaturas únicas
de serviços audiovisuais OTT no Brasil (KATZ, 2019)
30
Outra pesquisa que apontou a importância dos perfis de usuários para leitura
dos resultados obtidos é a de Fudurić, Malthouse e Viswanathan (2018). Estes autores
usaram os dados de uma importante operadora de TV por assinatura nos Estados
Unidos para identificar e descrever os principais segmentos de telespectadores. A
amostra abrangeu 1,5 milhão de assinantes de 12 estados dos EUA entre 2014 e
2015. Os resultados desta pesquisa apontam que a intenção de substituir ou
complementar o serviço de TV por assinatura com serviço OTT não é uniforme em
18 Cabe salientar que para além da demografia familiar, o referido estudo listou outros fatores que
influenciaram decisões de migração das famílias, como o uso de dispositivos habilitados para OTT, e
a disponibilidade de serviços de streaming de vídeo gratuitos ou baseados em assinatura. De acordo
com a conclusão extraída dos dados coletados no estudo empírico, os fatores considerados mais
importantes para impulsionar a migração entre os segmentos OTT variaram de acordo com a natureza
da própria migração. Por exemplo, os dispositivos parecem desempenhar um papel importante na
migração de famílias que apenas consumiam TV por assinatura e passaram a complementar o
consumo de vídeo com serviços OTTs. Por sua vez, o abandono da TV paga parece estar mais
associado às questões de demografia: famílias relativamente jovens, menos abastadas ou asiático-
americanas (BANERJEE, ALLEMAN e RAPPOPOR, 2013)
31
19
Na subseção seguinte, essa pluralidade de serviços será melhor explorada
20 Embora a discussão não esteja sendo tratada no âmbito dos serviços OTTs de vídeo, o trecho
transcrito a seguir ilustra muito bem a observação dos autores sobre multifuncionalidade dos novos
players: “...compleja. Así, por ejemplo, WhatsApp permite la comunicación interpersonal tanto de
mensajería como de voz, en grupo entre los usuarios que cuentan con la aplicación, envío de archivos
y fotografías. El servicio tradicional de SMS se limita a los textos, por lo que su comparación con los
OTT resulta imprecisa, más aún que se necesitarían los datos específicos de mensajes OTT de texto
y/o de voz. Al respecto, Arnold, Hildebrandt, Tas y Kroon (2017) señalan que las aplicaciones como
iMessage, Facebook Messenger y WhatsApp ofrecen más bien una “experiencia integral de Internet”,
con una gama amplia de funciones que rebasa la ofrecida por los servicios tradicionales. Estos autores
mapean 23 diferentes funciones al analizar las aplicaciones más populares en el mundo y agregan que
el uso de los OTT se caracteriza por la interacción (voz, mensajes, fotos y videos), y no solo por la
comunicación entre personas” (ESCOBAR-BRIONES; CONDE-MENCHAÇA, 2019)
33
Nesse sentido, Fernandes (2018) também entende que o cerne da questão está
no desafio de compreender se esses novos entrantes fazem uso de recursos ou
técnicas inovadoras que transformaram a própria essência dos serviços ofertados ou,
se estes, na verdade, apenas propiciam novas formas e configurações para um
mesmo serviço, sem prejudicar ou descaracterizar a sua natureza ontológica.
Segundo o autor, em caso de confirmação da segunda hipótese, o potencial de
substitutibilidade se confirmaria e o debate sobre a possibilidade de aplicação da
regulação específica dos serviços tradicionais aos novos players se justificaria
(FERNANDES, 2018).
No entanto, essas discussões serão antecedidas por uma breve passagem pelo
movimento de contestação do mercado audiovisual por parte dos OTT players. Esse
exercício tem o intuito de demonstrar, ao avançar das linhas, o contexto de
assimilação de experiências da televisão tradicional pelos serviços de vídeo prestados
a partir da internet, conjuntura que viabilizou o surgimento do OTT de vídeo objeto
deste estudo. Analisar esse contexto contribuirá para a compreensão da natureza
ontológica do serviço de oferta de conteúdo audiovisual programado e, por
conseguinte, a questão do possível grau de substituição desse novo serviço em
relação à TV por assinatura.
Em que pese essa seção não tenha o intuito de fazer uma genealogia dos
serviços over the top de vídeo, para efeito de entendimento do processo de
assimilação de recursos e funcionalidades da TV por assinatura, é preciso resgatar o
fato de que esses novos serviços são em sua origem produtos de um movimento de
contestação ao formato televisivo de exibição de conteúdo e, de outro lado, prestígio
à maximização do controle da experiência audiovisual por parte do usuário.
Em sua origem, os serviços over the top de vídeo estão bastante atrelados à
proposta de oferecer ao usuário o poder de determinar o momento mais conveniente
de fruição do conteúdo, viabilizando recursos como o da repetição, pausa, avanço ou
interrupção da reprodução de cada obra. Sob a insígnia de maior representante desse
momento está o serviço over the top de vídeo sob demanda:
21Percebe-se que a definição de vídeo sob demanda da ANCINE é mais abrangente do que o segmento
de VoD aqui trabalhado. Para a agência, o VoD é um segmento de mercado que abrange modalidades
não adstritas aos serviços de internet (ANCINE, 2019). Contudo, estão excluídas da nossa análise as
espécies de VoD que não são consideradas OTT.
22Essa proposta tripartite de classificação também foi adotada pela ANCINE em seu estudo sobre o
26 Ao final de 2018, cerca de 9,4 milhões de domicílios norte-americanos consumiam serviços de sVOD.
Desse universo, mais de 1,3 milhão de lares voltaram a consumir conteúdo no formato tradicional dos
canais de televisão, isto é, com uma programação organizada temporalmente pelo próprio exibidor,
contudo, com a peculiaridade de que a oferta ocorre em ambiente digital (NIELSEN, 2019). No cenário
americano, os denominados Virtual Multichannel Video Programming Distributor (vMVPD) já encontram
diversos representantes, dentre os quais destacamos os serviços Sling TV, Direc TV e Hulu Live (Lobo
et al., 2021). No Brasil, conforme será exposto adiante, serviços similares também vêm ganhando força,
trazendo consigo todo um debate sobre a necessidade de regulamentá-los ou condicioná-los aos
regramentos setoriais vigentes.
27 O SVoD Disney Plus lançou o “Premier Access”, um serviço para assinantes que permitia acesso a
filmes inéditos da empresa no mesmo dia do lançamento nos cinemas mediante o pagamento de uma
quantia adicional. Entretanto, este serviço foi descontinuado em 2021 (BP MONEY, 2021)
28 Em 2018, o Youtube™, uma plataforma de vídeo totalmente gratuita lançava oficialmente a sua
Desse universo, mais de 1,3 milhão de lares voltaram a consumir conteúdo no formato tradicional dos
canais de televisão, isto é, com uma programação organizada temporalmente pelo próprio exibidor,
contudo, com a peculiaridade de que a oferta ocorre em ambiente digital (NIELSEN, 2019). No cenário
americano, os denominados Virtual Multichannel Video Programming Distributor (vMVPD) já encontram
diversos representantes, dentre os quais destacamos os serviços Sling TV, Direc TV e Hulu Live (Lobo
et al., 2021). No Brasil, conforme será exposto adiante, serviços similares também vêm ganhando força,
37
32 No contexto americano, uma pesquisa de mercado encomendada pela Telaria, Inc. demonstrou que,
apesar do declínio constante de assinantes, uma das principais razões indicadas por aqueles que
optaram por manter o serviço estava na percepção do usuário de que somente uma conexão linear
poderia entregar conteúdo de televisão ao vivo (42%). O segundo e o terceiro motivos mais recorrentes
foram a variedade de canais (34%) e o interesse em conteúdos específicos veiculados por redes
tradicionais (32%). A referida pesquisa foi realizada nos Estados Unidos, entre 6 de abril a 9 de maio
de 2018 e contou com pessoas entre 21 e 54 anos, divididas em três grupos: usuários de televisão por
assinatura (Cable-Keepers), usuários de plataformas do tipo vMVPDs (Live- Streamers) e usuários de
serviços de conteúdo audiovisual sob demanda sem acesso a TV por assinatura tradicional (App/On
Demand Only). O método utilizado foi o da amostragem por quota. (TELARIA, 2022)
39
Este serviço vem ganhando cada vez mais espaço no Brasil, onde inicialmente
foi atrelado a soluções de over the top voltadas para o consumo de conteúdos
esportivos. Contudo, aos poucos, também foi se consolidando como uma alternativa
de mercado para o consumo online de diversos canais televisivos tradicionais, muitas
vezes oferecendo recursos altamente atrativos como catálogos mais enxutos e
econômicos ou moldáveis ao gosto do usuário.
Sobre essa nova espécie de serviço OTT não há, de fato, um consenso
semântico. São recorrentes o uso de expressões como TV Linear Online, TVLAI33
(Televisão linear por assinatura na Internet) e até mesmo a expressão americana
Virtual Multichannel Video Programming Distributors (vMVPD)34. Essa imprecisão
terminológica não impede, contudo, melhor entendimento sobre os caracteres básicos
da sua compleição ontológica.
33 Estas duas denominações são bastante recorrentes no âmbito da Tomada de Subsídios para
Avaliação das Ofertas de Conteúdo Audiovisual Programado via Internet por meio de Subscrição
Processo nº 53500.022476.2019-450, que será apresentada no próximo capítulo.
34 Em tradução livre: Distribuidores de programação de vídeo multicanal virtual
40
Não por acaso, a Área Técnica da Anatel promoveu um estudo para delimitar os
mercados relevantes nos quais ambos os produtos estão inseridos, bem como quanto
às relações de substitutibilidade ou de complementaridade existentes entre eles. O
41
A Área Técnica partiu do arcabouço teórico proposto por Porter (1980), no qual
é proposto o modelo de análise mercadológica conhecido como as “Cinco Forças de
Porter”, para delimitar os mercados relevantes nos quais ambos os produtos estão
inseridos, bem como as relações de substitutibilidade ou de complementaridade
existente entre eles (ANATEL, 2019).
A partir desses dados, a Área Técnica concluiu que os dois serviços contrapostos
fazem parte do mesmo mercado relevante, desde que haja a efetiva oferta do produto
de acesso pago a conteúdo audiovisual programado (ANATEL, 2019). Contudo,
aponta que a verificação da substitutibilidade esbarra no impedimento fático de que
em 2.631 municípios brasileiros não há efetiva oferta de produtos alternativos ao
SeAC (ANATEL, 2019).
35Os dados foram extraídos do levantamento realizado para elaboração do Plano Estrutural de Redes
de Telecomunicações (PERT).
43
Por outro lado, questionou a exclusão automática dos municípios que não
possuem o backhall de fibra óptica, mas que atendem à velocidade mínima
considerada essencial, uma vez que, da perspectiva do consumidor, não há influência
direta das características da infraestrutura e da tecnologia na experiência de utilização
de uma plataforma de vídeo, desde que a rede que lhe sirva de substrato atenda as
supostas condições mínimas de velocidade arbitradas pelo estudo (ANATEL, 2019).
Para além desses argumentos, cabe ressaltar que o estudo sob a análise é de
2019 e desconsidera a grande expansão no consumo de plataformas de vídeo via
dados móveis 36.
36
Vide dados registrados pela última PNDA CONTÍNUA do IBGE e comentados na seção 2.2.2
44
37 Art. 21. Compete à União: [...] XI- Explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou
permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos
serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais; (BRASIL, 1988)
38 A referida emenda alterou a redação dos incisos XI, XII, do art. 21, oportunizando à União a
Nesse ponto, Laender (2005) sustenta que há uma distinção entre as espécies
de serviços de telecomunicações e as “modalidades de serviços de
telecomunicações”. Segundo o autor, a ANATEL teria estipulado como elemento
característico ou pressuposto qualitativo dos serviços de telecomunicações o tipo de
utilidade que estes proporcionam. Dessa forma, seriam considerados semelhantes os
serviços que conferissem o mesmo benefício/ utilidade aos seus usuários. A contrário
sensu, este mesmo critério seria utilizado para distingui-los quando verificado
diferenças na utilidade proporcionada por cada um (LAENDER, 2005). Ainda
seguindo as preleções do referido autor, a eleição do critério finalístico enquanto linha
demarcatória de cada espécime de serviço de telecomunicações, teria restado
consignada no art. 22 do RST:
40
Laender esquadrinhou cada atributo previsto no art. 69. Pela precisão da escrita e a qualidade das
informações segue na íntegra a descrição por ele elaborada: “A LGT cita os seguintes atributos que
podem ser ponderados na definição das modalidades: finalidade, âmbito de prestação, forma, meio de
transmissão e tecnologia empregada, bem como outros atributos a serem escolhidos pelo ente
regulador. Forma, meio de transmissão e tecnologia empregada dizem respeito unicamente à rede de
telecomunicações. Âmbito de prestação é característica do serviço, porém intimamente ligada à
abrangência geográfica da rede”. Conforme veremos a seguir, o autor não considera a “finalidade” um
atributo, mas o próprio pressuposto qualificante do serviço de telecomunicações (LAENDER, 2005).
49
Outros autores não fazem esta dissociação entre a finalidade e os atributos dos
serviços de telecomunicações. Simplesmente tratam o elemento finalístico como mais
um dos atributos do serviço, apesar de distingui-lo em relação aos demais em grau de
importância por força do art. 22 do RST. Nesse segmento, há consenso relativamente
estável de que a finalidade é o critério de maior preponderância na definição de
classificações. Caso, por exemplo, de Mascarenhas (2008) e Fernandes (2018).
Nesse sentido, Fernandes (2018) ressalta que embora a agência não disponha
de poder para ultrapassar o núcleo legal do conceito de serviços de telecomunicações,
nos últimos anos, esta entidade vem exercendo um papel relevante na adaptação de
regimes de cada espécie desses serviços diante das mudanças associadas à
emergência de novas tecnologias. Segundo o autor, a indefinição normativa no que
diz respeito aos limites de cada espécie de serviços de telecomunicações vem sendo
41
O autor ainda sustenta que distinção entre serviços e modalidades de serviços pode ser percebida
na própria LGT, embora de maneira oblíqua: “O art. 64, parágrafo único, da LGT, ao dispor sobre a
prestação em regime público, a impõe como compulsória às modalidades do Serviço Telefônico Fixo
Comutado (STFC). O STFC, portanto, não é modalidade, mas sim um serviço” (LAENDER, 2005)
50
42
“Art. 29. A atividade de distribuição por meio do serviço de acesso condicionado é livre para empresas
constituídas sob as leis brasileiras, com sede e administração no País, sendo regida pelas disposições
previstas nesta Lei, na Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, e na regulamentação editada pela Agência
Nacional de Telecomunicações - ANATEL. Parágrafo único. A ANATEL regulará e fiscalizará a
atividade de distribuição” (BRASIL, 2011)
51
43
No mesmo sentido, o Regulamento do SeAC , aprovado pela Resolução nº 581/2012, refletindo a
definição da Lei nº 12.485/2011, define o serviço da seguinte maneira: “Art. 4º O SeAC é o serviço de
telecomunicações de interesse coletivo, prestado no regime privado, cuja recepção é condicionada à
contratação remunerada por assinantes e destinado à distribuição de conteúdos audiovisuais na forma
de pacotes, de canais de programação nas modalidades avulsa de programação e avulsa de conteúdo
programado e de Canais de Programação de Distribuição Obrigatória, por meio de tecnologias,
processos, meios eletrônicos e protocolos de comunicação quaisquer. § 1º Incluem-se no serviço a
interação necessária à escolha de conteúdo audiovisual, à aquisição de canais de programação nas
modalidades avulsas e outras aplicações inerentes ao serviço. §2º Entende-se como interação qualquer
processo de troca de sinalização, informação ou comando entre a URD e os equipamentos e sistemas
da Prestadora; § 3º O SeAC é considerado, para todos os efeitos, serviço de televisão por assinatura.
[...]” (BRASIL, 2011)
53
Esta seção não pretende esmiuçar as regras legais ou infra legais do Serviço de
Acesso Condicionado ou adentrar nas especificidades do regime jurídico de sua
espécie. A tarefa aludida resta reservada aos próximos capítulos desse estudo. Por
ora, basta o estabelecimento de duas premissas.
44
“Art. 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se: I - Assinante: contratante do serviço de acesso
condicionado” (BRASIL, 2011)
45
“Art. 8° Fica criada a Agência Nacional de Telecomunicações, entidade integrante da Administração
Pública Federal indireta, submetida a regime autárquico especial e vinculada ao Ministério das
Comunicações, com a função de órgão regulador das telecomunicações, com sede no Distrito Federal,
podendo estabelecer unidades regionais” (BRASIL, 1997)
55
Por seu turno, o art. 61 da LGT define como Serviço de Valor Adicionado (SVA)
qualquer serviço que esteja relacionado com o acesso, armazenamento,
apresentação, movimentação ou recuperação de informações, mas que necessitem
necessariamente de um serviço de telecomunicações como suporte para o
processamento de suas funcionalidades. Ou seja, enquanto se servem do substrato
tecnológico dos serviços de telecomunicações, os SVAs lhe agregam valor,
melhorando o processamento de informações e outras atividades relacionadas. Não
coincidentemente receberam o nome de “serviço de valor adicionado” ou “serviço de
valor agregado”.
56
Aqui se faz preciso destacar que não há um conceito legal para Rede de
Telecomunicações. Em que pese a LGT versar sobre a sua implantação,
funcionamento e organização, a única definição jurídica existente no ordenamento
brasileiro é encontrada no art. 3º, VII, do Regulamento Geral de Interconexão – RGI,
aprovado pela Resolução do Conselho Diretor da Anatel nº 693, de 17 de Julho de
2018: “conjunto operacional contínuo de circuitos e equipamentos, incluindo funções
de transmissão, comutação, multiplexação ou quaisquer outras indispensáveis à
operação de serviço de telecomunicações” (ANATEL, 2018).
57
Em que pese o SVA seja um conceito positivado, há nele uma abertura normativa
intrínseca, tal qual a encontrada no conceito de “serviços de telecomunicações”, que
abre um importante espaço para atuação da ANATEL no que tange a materialização
da linha demarcatória posta in abstrato entre os serviços de telecomunicações e os
serviços de valor adicionado (FERNANDES, 2018).
Por outro lado, o serviço over the top de conteúdo audiovisual programado não
é legalmente regulado. Hoje, a clarificação do seu atual status jurídico demanda uma
análise mais minudente sobre a qualificação jurídica que lhe foi atribuída por parte do
Conselho Diretor da Anatel no âmbito do julgamento do Acórdão nº 472/2020, que
46 Fernandes destaca que, apesar do principal objetivo da Norma 004/95 tenha sido regulamentar o
relacionamento entre as chamadas “Entidades Exploradoras de Serviços Públicos de
Telecomunicações (EESPT) e os “Provedores e Usuários de Serviços de Conexão à Internet”, o
documento em questão foi pioneiro no uso e conceituação da expressão “serviço de valor adicionado”
(FERNANDES, 2018)
47 Em nota pública sobre a Consulta nº 41/2022 da ANATEL, que acerca da simplificação da
regulamentação de serviços de telecomunicações, o COMITÊ GESTOR DA INTERNET NO BRASIL
(CGI.br) no uso das atribuições que lhe confere o Decreto nº 4.829/2003, reiterou a relevância da Norma
004/1995 para a “expansão e democratização dos Serviços de Conexão à Internet no país, tornando o
Brasil referência em qualidade, conectividade e resiliência”, apoiando ainda a decisão da agência
reguladora de não incluir a revisão da norma no debate da simplificação da regulamentação de serviços
(COMITÊ GESTOR DA INTERNET NO BRASIL, 2022).
59
tomou como ponto de partida justamente a linha demarcatória posta in abstrato entre
os serviços de telecomunicações e os serviços de valor adicionado. Na próxima
seção, serão apresentadas brevemente as razões de decidir que embasaram o
referido julgamento.
48
Anunciado em abril de 2018, o serviço de streaming FOX+ (Fox Plus) chegou ao Brasil oferecendo o
conteúdo de canais de televisão por uma assinatura mensal. Na ocasião, o serviço só estava disponível
para quem já era cliente de alguma empresa prestadora de Serviço de Acesso Condicionado.
Entretanto, não demorou para que a Fox Latin American Channels do Brasil LTDA (Fox Brasil)
disponibilizasse o serviço para qualquer usuário independentemente da referida autenticação
(ANATEL, 2018)
49
O Esporte Interativo era uma antiga marca regional de esportes da programadora Turner Brasil,
empresa de mídia e entretenimento pertencente à WarnerMedia, que contava com dois canais de TV
por assinatura (Esporte Interativo e Esporte Interativo 2) e um canal na TV aberta (Esporte Interativo
BR), todos com programações dedicadas exclusivamente à cobertura esportiva. A partir de agosto de
2018, a referida programadora passou a oferecer ao público a plataforma de vídeo “Esporte Interativo
Plus” (EI Plus), identificado como um serviço online que dava acesso ilimitado a todos os conteúdos
dos três canais em tempo real (ANATEL, 2018)
60
Para o Relator, restou incontroverso que o SeAC e novo modelo de negócio são
serviços integrantes de um mercado relevante e que a relação de substitutibilidade
entre os dois serviços pode ser verificada quando estes estão disponíveis em uma
mesma dimensão geográfica. (ANATEL, 2020)
50
De fato, o item 51 da agenda do referido biênio estipulava como meta a reavaliação do mercado
relevante de distribuição de pacotes ou conteúdos audiovisuais, no entanto, o referido item foi revogado
pela Resolução Interna nº 1, de 04 de dezembro de 2020, sem sequer ser implementado, esvaziando,
desse modo, a prescrição contida no voto vencedor. Apesar de ter revogado o item 51, a Resolução
interna da ANATEL nº 1, de 04 de dezembro de 2020 também aprovou a agenda regulatória para o
biênio 2021-2022, na qual restou incluída a Revisão dos mercados relevantes e das medidas
regulatórias assimétricas previstas no Plano Geral de Metas de Competição - PGMC. Entre os diversos
mercados a serem analisados, a revisão inclui a reavaliação do mercado relevante de distribuição de
pacotes ou conteúdos audiovisuais, em linha com as determinações constantes do Processo SEI nº
53500.079841/2017-21. (ANATEL, 2017)
63
Quando contrapostos, esses dois serviços divergem quanto à forma pela qual
são postos à disposição dos seus usuários. Enquanto a televisão por assinatura é
distribuída sobre uma rede de telecomunicações condicionada à contratação, o
serviço de distribuição online de conteúdo audiovisual se caracteriza como um
verdadeiro meta-serviço (WIMMER, PIERANTI, ARANHA, 2009), do qual a oferta e a
fruição dependem da prévia adesão do usuário a um provedor de conexão à internet.
Não por acaso, Richard Whit criou a alegoria dos silos verticalizados para ilustrar
esta tendência regulatória no âmbito do mercado de comunicações que consiste em
formular políticas públicas e estruturas normativo-regulatórias a partir de um serviço
tecnologicamente delimitado pela sua rede ou infraestrutura base. Segundo o autor,
as referidas molduras jurídicas partem da premissa de que há uma relação biunívoca
entre os serviços de telecomunicações e a infraestrutura de rede que lhe caracteriza
(WHIT, 2004).
apriorística de serviço que, por sua vez, estava vinculada a uma estrutura normativa
e seu respectivo conjunto de obrigações regulatórias. Nesse sentido, ao analisarem a
conformação do quadro legal e regulatório concernente às telecomunicações na
realidade norte-americana, Bar e Sandvig ilustraram muito bem essa diversificação de
tratamento jurídico com base no suporte tecnológico:
independente do seu conteúdo. Tal característica permitiu que, no mundo virtual, toda
e qualquer forma de comunicação preexistente ganhasse um serviço digital
correspondente.
Nesse ambiente em que as fronteiras entre as redes se tornam cada vez mais
nebulosas e no qual os serviços são digitalizados e adaptáveis a diferentes substratos
técnicos, torna-se pertinente se debruçar sobre os desafios envolvidos na
estruturação de novos modelos jurídicos-regulatórios.
Assim, o uso deste arsenal teórico acerca dos desafios e parâmetros a serem
discutidos no contexto de regulação de serviços funcionalmente equivalentes em um
cenário de pós-convergência pode, de alguma maneira, consubstanciar a análise da
atuação da ANATEL na definição do regime jurídico do serviço over the top de
conteúdo audiovisual programado.
Para viabilidade da empreitada, a análise do objeto deste estudo tem como vetor
de orientação a proposta do professor e pesquisador brasileiro Victor Fernandes
70
Como vimos, alguns autores defendem que a LGT é dotada de uma relativa
plasticidade normativa que foi projetada propositadamente pelo legislador ordinário,
preocupado em não restringir ou mesmo antever as múltiplas variações e
possibilidades da telecomunicação no mundo hodierno. Por essa razão, no lugar de
apresentar um rol taxativo com todas as possíveis espécies do gênero “serviços de
telecomunicações”, o legislador elaborou um conceito jurídico “aberto e abrangente",
cuidando tão somente do pressuposto ontológico da categoria disposta no caput do
art. 60.
Não por acaso, Quelho (2011) caracteriza a LGT como uma lei-quadro que
estabelece estruturas conceituais e principiológicas direcionadas aos formuladores e
implementadores da política nacional de telecomunicações, com o fim de que estes
editem normas ditas substantivas (como aquelas relativas a políticas públicas e à
regulação de serviços de telecomunicações); para concretização das diretrizes do
marco legal.
Com relação à camada de conteúdo, entretanto, a autora relata que a LGT não
revogou a disciplina legal e regulatória previamente existente dos serviços de
radiodifusão e os serviços de televisão por assinatura. Segundo a autora, a opção
feita pelo legislador preservou diversas “ilhas regulatórias” que diversificam o
ecossistema jurídico das telecomunicações no Brasil (QUELHO, 2011).
51
Assim como Barroso (2011) este trabalho adotará as expressões como sinônimas. Segundo o autor,
a Comunicação Social está inserida em um amplo universo formado pelas liberdades de expressão, de
informação e de empresa e tem sido frequentemente associada ao desenvolvimento dos meios
midiáticos veiculadores de conteúdo, sobretudo aqueles que propiciam uma “comunicação coletiva” ou
“multicast” (BARROSO, 2008). Para o ilustre professor, o termo “comunicação social” vem sendo
frequentemente associado à ideia de “comunicação de massa”, expressão entendida em sua obra como
o ato de transmitir mensagens/conteúdo a um grupo heterogêneo e indiferenciado de pessoas. Barroso
ainda preleciona que o texto constitucional prevê a distinção entre meios de comunicação de massa
(para cuja regulamentação abriu um capítulo específico: Comunicação Social) e os meios de
comunicação “interpessoal” ou “unicast” (serviços postais, telefônicos, telegráficos...) e que há um
tratamento especial do texto constitucional dispendido em relação ao primeiro grupo em razão do risco
potencial que este oferece aos direitos fundamentais (BARROSO, 2008).
77
52
Vide art. 61, § 1, da LGT (BRASIL, 1997)
53
Caso dos serviços de radiodifusão sonora e de imagens e da televisão por assinatura como também
todo e qualquer meio técnico que permita veicular mensagens a um público amplo, ou seja, que possa
ser qualificado como espécie da “comunicação de massa” ou comunicação social. A diversificação das
possíveis plataformas midiáticas insertas neste conceito é uma das preocupações da nossa Carta
Magna, que serve de guarida para regras e princípios específicos que norteiam todo o setor, a ponto
de se falar em um Regime Constitucional de Comunicação Social (BARROSO, 2008).
78
Para Quelho, em que pese estes serviços serem formalmente qualificados como
SVA, da análise dos seus pressupostos ontológicos, se depreende que estes não
constituem verdadeiramente um “valor adicionado”, mas, ao contrário, caracterizam a
própria utilidade buscada pelo usuário. Constatações empíricas que, segundo a
autora, denunciam a incompatibilidade dos novos serviços com o conceito in abstrato
do art. 61 da LGT (QUELHO, 2011).
54
Para Wimmer, Pieranti e Aranha (2009), o quadro desenhado acima ainda contribuiu para o
deslocamento do foco da intervenção estatal, que deixa de abarcar o serviço de produção ou
distribuição do conteúdo propriamente dito e fica adstrito à regulação da infraestrutura ou substrato
técnico que lhe serve de suporte.
79
comunicação social no Brasil de forma mais abrangente, não se deve olvidar a posição
central que esta temática ocupa no ordenamento brasileiro. Não por acaso, Barroso
defende a ideia de que há um verdadeiro Regime Constitucional de Comunicação
Social e explicita com maestria a razão de sua existência (BARROSO, 2008):
Como vimos, a LGT não apresentou um rol taxativo das espécies do gênero
“serviços de telecomunicações”. Esta escolha é interpretada por diferentes autores
como uma opção do legislador em estabelecer um conceito jurídico “aberto e
abrangente” de modo a possibilitar que a regulamentação destes serviços se desse
de forma cambiante o suficiente para seguir o fluxo da inovação tecnológica”
(MARQUES NETO, 2000)
Contudo, conforme visto na seção anterior, em que pese a lei brasileira não ser
necessariamente verticalizada, isso não impede a existência de determinadas ilhas
regulatórias ou limitações normativas no que tange à aderência da legislação
brasileira às repercussões da pós-convergência tecnológica.
Nesse ponto, vem sendo observado por diferentes autores uma importante
limitação da lei no que tange à dicotomia normativa entre SVA e serviços de
telecomunicações. Como visto, novos players vêm contestando a suposta linha
demarcatória entre as duas espécies jurídicas ao levarem para o ambiente da internet
utilidades até então restritas a um substrato tecnológico específico e tradicionalmente
associado a um serviço de telecomunicações.
55
Art. 3º Não constituem serviços de telecomunicações: I - o provimento de capacidade de satélite; II -
a atividade de habilitação ou cadastro de usuário e de equipamento para acesso a serviços de
telecomunicações; III - os serviços de valor adicionado, nos termos do art. 61 da Lei 9.472 de 1997.
Parágrafo único. A Agência poderá estabelecer outras situações que não constituam serviços de
telecomunicações, além das previstas neste artigo (ANATEL, 1998)
82
56De fato, o conceito legal da atividade de distribuição engloba a responsabilidade final do distribuidor
pelas atividades complementares de comercialização, atendimento ao assinante, faturamento,
cobrança, instalação e manutenção de dispositivos, entre outros. O conceito vem sendo utilizado pelos
defensores da tese da inaplicabilidade da Lei do SeAC aos serviços over the top (BRASIL, 2011). Para
aqueles que se opõem ao argumento, o dispositivo traz atividades meramente exemplificativas que não
comprometem a compleição normativa do serviço de acesso condicionado: a transmissão, entrega ou
provimento do conteúdo, sendo irrelevante a especificação prévia do eventual processo técnico que
venha a viabilizar a entrega do material televisivo (BRITO, 2020)
57 O Regulamento do SeAC prevê, por exemplo, que a Prestadora é responsável perante o Assinante
e a Anatel pela execução e qualidade do serviço, inclusive no que concerne ao correto funcionamento
da Rede de Telecomunicações, ainda que essa seja de propriedade de terceiros (ANATEL, 2012)
84
No primeiro capítulo deste trabalho, foi avaliada uma série de estudos empíricos
sobre a questão da substitutibilidade existente entre os serviços over the top de vídeo
e a tv por assinatura, aqui juridicamente qualificada como serviço de acesso
condicionado. No que tange especificamente ao serviço over the top de conteúdo
audiovisual programado, ainda nos debruçamos sobre uma Análise da Área Técnica
da Anatel que versou sobre a temática.
Segundo estes mesmos autores, durante a tramitação deste último PL, uns dos
principais argumentos veiculados no bojo dos pareceres publicados pelas Comissões
da Câmara para justificar a imposição da referida restrição foi o referente à intenção
de promover a competitividade do setor a partir da ampliação do número de atores
deste segmento e da limitação à capacidade de alguns agentes econômicos com
excessivo poder de mercado (OLIVEIRA e RAGAZZO, 2017)
Na ADI 467958, o Ministro Relator Luiz Fux versou justamente sobre as referidas
medidas de restrições, asseverando que a vedação à propriedade cruzada entre as
empresas de telecomunicações e do audiovisual, bem como a vedação à
verticalização da cadeia de valor do audiovisual pretendem, de forma imediata,
concretizar as diretrizes constitucionais voltadas a coibir o abuso do poder econômico,
bem como realizam, de forma mediata, a dimensão objetiva do direito fundamental à
liberdade de expressão e de informação, especialmente no que tange à atividade
diretiva do Estado de promover a diversificação das fontes de produção e a redução
da concentração do poder comunicativo:
58
Em 18 de novembro de 2011, o Partido Democratas (DEM) ajuizou perante o Supremo Tribunal
Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4679) contra diversos dispositivos da Lei
12.485/2011. Em seu bojo, o partido alegou que o amplo poder de regulação do conteúdo audiovisual
conferido à ANCINE pela lei em debate infringia o direito de liberdade de expressão garantido pela
Constituição, em seu art. 5°, inc. IX; bem como restringia o direito de criação artística, assegurado no
artigo 220. A legenda sustentou que a norma questionada também fulminaria regras basilares da ordem
econômica. Com esses argumentos, o Democratas pediu a declaração de inconstitucionalidade dos
artigos 9º (parágrafo único); 10; 12; 13; 15, na parte em que acrescenta o inciso VIII ao artigo 7º da
Medida Provisória 2.228-1, de 2001; 16; 17; 18; 19; 20; 21; 22; 23; 24; 25; 31; 32 (parágrafos 2º, 13 e
14); 36; 37 (parágrafos 5º, 6º e 7º); e 42, da Lei 12.485/11. O DEM ainda pediu que fosse dada
interpretação ao artigo 29 da supracitada lei de modo a declarar que o a existência do aludido
dispositivo não afastaria as diretrizes constitucionais para as contratações públicas contidas nos artigos
21 (inciso XI), 175 (caput) e 37 (caput e inciso XXI) da CRFB/88. Em oito de novembro de 2017, por
maioria e nos termos do voto do Ministro Relator Luiz Fux, o Plenário do STF julgou a referida ação
parcialmente procedente apenas para declarar a inconstitucionalidade do art. 25 da Lei nº 12.485.
88
Para além de canais delimitados pelo interesse público de sua matéria ou por
uma vinculação de ordem institucional, o inc. I do art. 32 incluiu, no âmbito de
incidência do carregamento obrigatório, os canais das estações geradoras locais de
radiodifusão de sons e imagens59. Trata-se de uma política de incentivo ao consumo
da produção audiovisual local que opera pela imposição de um grau interventivo
considerável nas atividades empresariais da prestadora de SeAC, mas que já foi
referendada pelo STF quando do julgamento da ADI 4679.
59
O art. 6° do Regulamento do Serviço de Retransmissão de Televisão e do Serviço de Repetição de
Televisão, aprovado pelo Decreto Federal nº 5.371/2005, define a Estação Geradora de Televisão
como um o conjunto de equipamentos, incluindo os acessórios, que realiza emissões portadoras de
programas que têm origem em seus próprios estúdios (BRASIL, 2005). Essa premissa é importante,
pois o inc. I do art. 32 não versa sobre as Estações Repetidoras e as Estações Restramissoras de
Televisão, uma vez que estas não produzem conteúdo próprio em seus estúdios e consistem em
apenas um conjunto de aparelhos que, não balizado por um contrato de concessão, simplesmente
reproduz/ repete os sinais de uma geradora de televisão ou de outras repetidoras ou retransmissoras.
90
60
A título de exemplificação, a operação de TV por satélite (DTH) tem, necessariamente, abrangência
nacional, de modo que o conteúdo transmitido é o mesmo para todo o País. O que torna, realmente,
inviável a entrega direcionada dos canais de geradoras de TV locais para as suas respectivas áreas de
concessão, sendo igualmente claro que não seria nem técnica, nem economicamente factível a
imposição de que as operadoras de TV por satélite incluíssem, em seus pacotes, uniformemente para
todo o Brasil, todos os canais de geração local do País. Ainda assim, a Anatel concebeu uma fórmula
regulatória para viabilizar o carregamento de alguns (mas não todos) canais de geração local pelas
prestadoras de SeAC via satélite: uma geradora local de radiodifusão de sons e imagens poderá se
habilitar ao carregamento obrigatório de uma distribuidora de TV por assinatura via satélite desde que
essa geradora local passe a se estruturar como um conjunto de estações integrado por outras
geradoras afiliadas ou mesmo por meras retransmissoras. Mas não só, é necessário que esse conjunto
de estações cumpra requisitos específicos, sendo eles: a presença em todas as regiões geopolíticas
do país, o alcance mínimo de pelo menos um terço da população brasileira e o provimento da maior
parte da programação por uma das estações para as demais (ANATEL, 2012)
91
houver outro canal de programação gerado por programadora brasileira que veicule
majoritariamente conteúdos jornalísticos no horário nobre (art. 18).
De acordo com Heverton Souza Lima (2015), o elemento basilar dessa política
de fomento é a ideia de “espaço qualificado” sobre o qual incidem as cotas.
Legalmente, o espaço qualificado é definido pela via da exceção, sendo qualificado
como toda e qualquer programação veiculada no canal programado que não se
confunda com conteúdo religioso ou político, eventos esportivos, concursos,
publicidade, televendas, infomerciais, jogos eletrônicos, propaganda política
obrigatória, conteúdo jornalístico e programas de auditório ancorados por
apresentador (BRASIL, 2011).
Art. 16 Nos canais de espaço qualificado 61, no mínimo 3h30 (três horas e
trinta minutos) semanais dos conteúdos veiculados no horário nobre 62
deverão ser brasileiros e integrar espaço qualificado, e metade deverá ser
produzida por produtora brasileira independente (BRASIL, 2011)
61Art. 2, II, da Lei do SeAC qualifica como Canais de Espaço Qualificado os canais de programação
que, no horário nobre, veiculem majoritariamente conteúdos audiovisuais que constituam espaço
qualificado;
62 Por horário nobre, o art. 13 da IN 100 define as sete horas compreendidas entre as 11h às 14h e
entre às 17h e às 21h nos canais direcionados para crianças e adolescentes. Já nos demais canais, o
horário é definido pelas seis horas compreendidas entre as 19h às 24h (ANCINE, 2012).
92
Esta última regra impõe que a cada três canais de espaço qualificado
disponibilizados aos usuários, pelo menos um deles deverá ser formatado por
programadora brasileira. O diploma legal ainda exige que, no mínimo, 1 ⁄ 3 dos canais
brasileiros oferecidos seja formatado por programadora brasileira independente.
Mas não só: como vimos, o serviço over the top de vídeo programado leva para
o ambiente da internet conteúdo audiovisual de natureza constitucional: a
comunicação social ou de massa, matéria com imensa capacidade de impacto sobre
a formação da opinião, da ideologia e da agenda social de um povo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Também restou constatado que o referido diploma legal transferiu para a Anatel
a incumbência de definir no âmbito administrativo cada modalidade de serviços de
telecomunicações (BRASIL, 1997). Por sua vez, no âmbito infralegal, a agência
reguladora passou a fixá-las levando em consideração a utilidade final de cada serviço
ao usuário, independentemente da tecnologia empregada (ANATEL, 1998).
Contudo, em que pese a estrutura da LGT não ser em sua origem verticalizada,
a potencial capacidade de adaptabilidade da estrutura jurídico regulatória ao mundo
convergente vem sendo comprometida pela imunidade regulatória dada aos SVAs.
96
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