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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

ANDRÉ LUIZ SILVA MIGUEL

FATORES HUMANO-ORGANIZACIONAIS:
MODELO PREDITIVO PARA ANÁLISE DE RISCOS

Palhoça
2018
UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA
ANDRÉ LUIZ SILVA MIGUEL

FATORES HUMANO-ORGANIZACIONAIS:
MODELO PREDITIVO PARA ANÁLISE DE RISCOS

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado ao Curso de graduação em
Ciências Aeronáuticas, da Universidade
do Sul de Santa Catarina, como requisito
parcial à obtenção do título de Bacharel
em Ciências Aeronáuticas.

Profa. Dra. Conceição Aparecida Kindermann

Palhoça
2018
3

ANDRÉ LUIZ SILVA MIGUEL

FATORES HUMANO-ORGANIZACIONAIS:
MODELO PREDITIVO PARA ANÁLISE DE RISCOS

Este trabalho de conclusão de curso foi


julgado adequado à obtenção do título de
Bacharel em Ciências Aeronáuticas e
aprovado em sua forma final pelo Curso
de Graduação em Ciências Aeronáuticas
da Universidade do Sul de Santa
Catarina.

Tubarão, 21 de junho de 2018.

Profa. Orientadora Conceição Aparecida Kindermann, Dra.


Universidade do Sul de Santa Catarina

Prof. Cleo Marcus Garcia, Msc.


Universidade do Sul de Santa Catarina
4

A todas as pessoas que enxugaram suas


lágrimas após ter perdido o pôr do sol, a
fim de ver as estrelas...
5

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus e aos espíritos de bondade, a minha família, a minha


amada Thamires Ramos, a Kiko e Milla, a minha orientadora e a todo homem e
mulher que em seus corações se dedicam silenciosamente à construção de uma
fraternidade. Na qual a ignorância se desfaz diante da simplicidade de um olhar.
Existe algo mais sincero que um olhar? Olhar que espelha a alma e reflete o
universo dentro de cada ser, olhar que transcende os olhos e transpassa a alma?
Não o sei... E continuarei sem o saber, pois, a dúvida é um dos maiores presentes
concedidos à humanidade, a dúvida nos torna humildes, nos faz humanos, nos
permitiu em alguns milhares de anos sairmos de simples artefatos de pedras para
uma sociedade que se lançou ao espaço interplanetário. Graças à dúvida, Graças à
necessidade de ver para crer! Mas ver em verdade não é enxergar - é duvidar!
Afinal, “o essencial não e invisível aos olhos?” De forma que não enxergar não
signifique não ver. E duvidar não signifique não saber. Para que a natureza através
de nosso olhar verdadeiro nos presenteie com a beleza da criação, quando
extrapolarmos a necessidade de nos recolher em nossa própria caverna mental
dominada por necessidades egocêntricas e possamos sair à luz para que nossa
visão se torne verdadeira e “amando uns aos outros contemplemos a face de Deus”.
Portanto, devo agradecer também a Dúvida, pois só ama verdadeiramente aquele
que busca entender enquanto crer é apenas consentir. Agradeço, pois a essa
verdadeira Dúvida fundamentada integralmente no amor e na vontade de entender
os milagres que todos presenciamos todos os dias!
6

“Não é possível prever quando um acidente vai ocorrer, mais é possível


saber quando é mais provável que o mesmo ocorra.” (Próprio autor, 2018).
7

RESUMO

Esta pesquisa tem como objetivo avaliar se a percepção subjetiva dos operadores
sobre um sistema permite propor modelos preditivos. Foi utilizado o tipo de pesquisa
exploratória com abordagem qualitativa, em relação à coleta de dados, trata-se de
uma pesquisa bibliográfica. Foram consultadas obras de autores consagrados como
James Reason (1990), Wiegmann e Shappell (2000) e Snook (2002). Ao fim do
estudo foi possível de forma clara denotar a inter-relação entre os fatores humanos e
organizacionais, além de posicionar os operadores do sistema como elemento
primordial para a segurança do mesmo, fator motivador fundamental para proposta
de um modelo para análise de riscos de forma preditiva – que possa ser
implementado. A partir da análise dos dados, constatou-se que os operadores de
sistemas percebem de forma subjetiva, em suas esferas de atuação as condições de
perigo presentes na organização, de forma que a opinião desses reflete a situação
organizacional, tornando-se possível elaborar métricas preditivas a partir dessas
informações.

Palavras-chave: Segurança operacional. Acidente/incidente. Análise Preditiva.


Aviação.
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ABSTRACT

This research aims to evaluate if the subjective perception of the operators on a


system allows to propose predictive models. We used the type of exploratory
research with a qualitative approach, in relation to data collection, it is a
bibliographical research. Works by well-known authors such as James Reason
(1990), Wiegmann and Shappell (2000) and Snook (2002) were consulted. At the
end of the study it was possible to clearly denote the interrelationship between
human and organizational factors, in addition to positioning the system operators as
a primary element for the safety of the same, a fundamental motivating factor for the
proposal of a model for risk analysis of predictive form - that can be implemented. At
the end of the research, it was observed that the system operators subjectively
perceive, in their spheres of action, the dangerous conditions present in the
organization, so that their opinion reflects the organizational situation, making it
possible to elaborate predictive metrics from information.

Keywords: Operational safety. Accident / incident. Predictive analysis. Aviation.


9

SUMÁRIO

1INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 10
PROBLEMA DA PESQUISA ..................................................................................11
OBJETIVOS ...........................................................................................................12
Objetivo geral .......................................................................................................12
Objetivos específicos...........................................................................................12
JUSTIFICATIVA .....................................................................................................12
METODOLOGIA.....................................................................................................13
Natureza da pesquisa e tipo de pesquisa ..........................................................13
Materiais e Métodos .............................................................................................13
Procedimentos de coleta de dados ....................................................................14
Procedimentos de análise dos dados ................................................................14
ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO ..........................................................................14
2 CONTEXTO GERAL DA SEGURANÇA OPERACIONAL ..................................16
3 O MODELO DE REASON E A GESTÃO DO RISCO..........................................19
O MODELO REASON E A SEGURANÇA OPERACIONAL...................................19
O ESPAÇO DE SEGURANÇA ...............................................................................30
A DERIVA PRÁTICA ............................................................................................. 34
GERENCIAMENTO DO ERRO ..............................................................................35
CRÍTICA AO MODELO DE REASON ....................................................................37
4 O MODELO HFACS ............................................................................................ 40
5 PROPOSTA DE MODELO................................................................................... 43
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................45
REFERÊNCIAS.........................................................................................................47
10

1 INTRODUÇÃO

A Associação Internacional de transportes aéreos (IATA) estima que, em


2035, sete bilhões de pessoas utilizarão o modal aéreo anualmente. (IATA 2016).
Representando um grande aumento da demanda aérea e consequente avanço,
provável, de toda indústria da aviação.
Independente dos avanços de mercado, tecnológicos, ou quaisquer
outros possíveis para a indústria em questão, dois fatores, historicamente, sempre
acompanharam a atividade aérea: fatores humanos e os advindos do meio
organizacional.
Esse fato é parcialmente demonstrado pelos esforços internacionais na
regulamentação da atividade aérea em seus tenros anos, conforme observado na
Convenção Internacional de Varsóvia de 1929. E posteriormente nos anexos da
Convenção de Chicago, em 1944, que propôs medidas para o desenvolvimento
seguro e ordenado da aviação civil. (SILVA 2018, p. 24).
Entretanto, a história do transporte aéreo ensinou através de trágicas
lições que a regulamentação essencial para redução da assimetria informacional:
entre reguladores e regulados, prestadores de serviços e clientes. Não garante a
segurança das operações em sua totalidade. Conforme, demonstrado pelos
acidentes aéreos de Tenerife1977, Valujet 1996, LAPA em 1994, entre outros.
(CAMPOS 2014).
Nesse cenário de catástrofes aeronáuticas, vários casos foram
considerados, de forma simplista, como “erro do piloto” à luz da época em que
ocorreram. Devido à perspectiva sob o foco individual para a análise do acidente em
detrimento à abordagem de todo o sistema. (REASON,1990).
Ressalta-se, ainda, que o termo fatores humanos relacionados define
mais precisamente a realidade, pois, com base na abordagem do sistema os
acidentes se expressam devido a um conjunto de situações. As quais nem sempre
estão diretamente presentes no lócus da causalidade. Ou seja, um problema
operacional pode ter suas origens mapeadas até outras fontes organizacionais.
(REASON, 1990).
Nesse panorama mesmo após inúmeros anos de avanços tecnológicos e
aprimoramentos de regulamentos, a segurança de voo continua inseparável dos
11

fatores humanos e organizacionais, assim como no passado. Resumidamente, a


época é outra, mas os fatores são basicamente os mesmos. De forma que as
ocorrências relatadas a fatores humanos figuram como cerca de oitenta por cento
em relação ao total de acidentes. (USA,2016, p. 2-2).
O que abre espaço para um primeiro questionamento, se oitenta por
cento das causas relacionadas a acidentes são fatores humanos, qual a influência
dos fatores organizacionais sobre esses? Uma vez que segundo Reason (1990) a
falhas de nível operacional geralmente tem origens fora de seu lócus de atuação.
Seriam falhas inerentes durante a concepção do sistema que intensificam o
fenômeno do desvio prático das ações – tornando a forma de realizar as atividades
rotineiras cada vez mais distintas dos procedimentos previstos? (SNOOK, 2002).
Independente dos inúmeros questionamentos possíveis o professor
Reason em seu livro “HumanError” nos felicita com uma simples metodologia:
através da análise das tarefas, das condições de trabalho e do indivíduo – se torna
possível entender as origens das falhas. Metodologia aprimorada por Wiegmann e
Shappell(2003) através do modelo para análise e classificação de erros relacionados
a fatores humanos. Contudo, este trabalho não explora o três fatores mencionados
e se limita ao indivíduo - não como forma de reducionismo- mas, sobretudo com a
finalidade de responder a uma pergunta.

PROBLEMA DA PESQUISA

Os operadores de sistemas percebem de forma subjetiva, em suas


esferas de atuação, as condições de perigo presentes na organização, de forma que
a sua opinião reflita a situação organizacional, tornando-se possível elaborar
métricas preditivas?
12

OBJETIVOS

Objetivo geral

Avaliar se a percepção subjetiva dos operadores sobre um sistema


permite propor modelos preditivos.

Objetivos específicos

 Apresentar o modelo Reason;

 Caracterizar a gestão de riscos;

 Pesquisar sobre Segurança de Voo;

 Propor modelo preditivo.

JUSTIFICATIVA

Os fatores humanos e organizacionais são preocupação internacional,


não apenas em relação à regulamentação, mas principalmente ao exercício diário e
à implementação de metodologias sistemáticas para manutenção do nível aceitável
de segurança operacional (NASO), conforme o doc9859 da ICAO de 2013, citado
por SANTOS (2014, p. 16). Esses fatos impelem ao questionamento posterior, uma
vez que a regulamentação é condição necessária, porém não encerra em si própria
todas as resoluções sobre a mitigação de riscos.
O Brasil é em um estado signatário da convenção internacional de
Chicago de 1944, que estipulou a ICAO como órgão internacional para
13

desenvolvimento seguro e ordenado da aviação civil no mundo. Portanto, o estado


brasileiro possui em seu ordenamento jurídico normas que ratificaram as
recomendações dessa organização internacional em sua legislação. As ações para
prevenção de acidentes e incidentes aeronáuticos foram definidas através do
decreto número 6.780 e das diretrizes do programa de segurança do estado
brasileiro (PSO-BR) pela portaria conjunta número 764/GC5. Essas leis validaram as
práticas recomendadas pelo doc9859, da entidade internacional já mencionada, no
Brasil em 2009. (SANTOS, 2014, p.18).

METODOLOGIA

Natureza da pesquisa e tipo de pesquisa

A pesquisa e do tipo exploratória, pois, objetiva a familiarização com o


conteúdo (Gil, 2008), através da solução de um questionamento, o procedimento de
pesquisa empregado é a revisão bibliográfica das teorias de James Reason, Scott A
Snook, Wiegamann e Shappell e livros didáticos da UNISUL; e documentais, de
acordo com GIL (2002, pág.43), através da pesquisa em materiais de instituições
internacionalmente conhecidas. Quanto à natureza da pesquisa é qualitativa e
quantitativa, pois é esperado que se possível o modelo forneça dados mensuráveis.
(KINDERMANN et al, 2016).

Materiais e Métodos

O procedimento para a coleta de dados é bibliográfico e documental, uma


vez que ambas se baseiam na coleta de informações de fontes escritas, se
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diferenciado apenas em relação às fontes de obtenção de dados, que são primários


por meio de documentos e secundários quando bibliográficos. (MOTTA et al, 2013).

Procedimentos de coleta de dados

Conforme já mencionado, os procedimentos para a coleta de dados


utilizados durante os estudos serão pesquisa bibliográfica e documental,
consultando publicações de instituições renomadas como o doc9859 da ICAO e
documentos da FAA.

Procedimentos de análise de dados

A análise qualitativa de dados requer a imersão do pesquisador nos


mesmo para obtenção de familiaridade, a fim de identificar padrões e
relacionamentos entre eles, que ajude o pesquisador na compreensão, e posterior
apresentação das informações estudadas. A análise dos dados e os fatores inter-
relacionados incluem a questão da pesquisa, o referencial teórico e o uso das
técnicas é que dão sentido aos dados obtidos.(KAWULICH, 2004).

ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

O trabalho é constituído por seis capítulos: Na introdução, faz-se a


apresentação do trabalho, expondo a problemática, os objetivos e a metodologia.
Também é demonstrada a importância de estudar os fatores humanos e
organizacionais no âmbito da segurança operacional. Já no segundo capítulo, o
15

objetivo é contextualizar o leitor através do desenvolvimento histórico da segurança


de voo. No terceiro, são aprofundadas de forma interdisciplinar as ideias
apresentadas no capítulo anterior, terminando, pois, com uma crítica. Essa crítica é
o ponto inicial para a introdução da quarta parte que versa sobre o sistema HFACS.
Já o quinto capítulo consiste em concatenar algumas das ideias anteriores, a fim de
atingir o objetivo geral do trabalho respondendo, pois, ao questionamento motivador.
Concluindo no sexto, o qual retoma os pontos mais relevantes do estudo e sugere
novas pesquisas sobre o tema.
16

2 CONTEXTO GERAL DA SEGURANÇA OPERACIONAL

Nesse capítulo, é abordado de forma geral o desenvolvimento histórico da


segurança dos primórdios do voo até os dias atuais, além de serem introduzidos
conceitos indispensáveis ao entendimento do trabalho, afim de que seja possível
aprofundar as ideias no próximo capítulo.
Segurança operacional pode ser entendida como o estado no qual a
ameaça de danos a pessoas e propriedades decorrentes da atividade aérea é
mantida em determinado nível de risco considerado aceitável ou abaixo deste - nível
aceitável de segurança operacional (NASO). (ICAO SMS, 2013).
Os aspectos relacionados à segurança podem ser abordados sob duas
perspectivas a do indivíduo ou do sistema. Aquela considera o erro como oriundo de
processos mentais anormais e falhas individuais, enquanto essa objetiva
compreender toda a organização em busca das relações entre a fatalidade e os
fatores contribuintes – sob essa perspectiva o erro humano é considerado mais
como consequência do que como a causa dos acidentes. (REASON, 1990).
Contudo, esses aspectos são complexos e constituídos por uma grande
quantidade de fatores inter-relacionados, com algumas variáveis não pré-
determinadas. (CAMPOS, 2014).
A preocupação em entender tais variáveis visando à segurança, é
demonstrada parcialmente no preâmbulo do documento que deu origem a
Organização Internacional de Aviação Civil (ICAO) - durante a convenção
internacional de Chicago de 1944 – na qual um dos objetivos supremos é o
desenvolvimento da aviação de forma segura. (ICAO doc7300, 1944).
Entretanto, o desenvolvimento das camadas de defesa - tecnologia,
treinamento e regulamentos, as quais dão confiabilidade e segurança ao sistema de
Aviação - ocorreram sob perspectivas distintas ao longo das eras da segurança de
voo. (ICAO doc9859, 2013).
Na era técnica: a partir do ano 1900 a aviação emergiu como uma forma
de transporte em massa, e as falhas e acidentes ocorridos eram relacionados a
fatores técnicos e tecnológicos. (ICAO doc9859, 2013).
A partir de 1970, devido aos avanços tecnológicos, a incidência de
acidentes diminuiu. Contudo, desastres continuaram a ocorrer, e os estudos
17

passaram a se concentrar nas interações da interface homem-máquina,


considerando os fatores-humanos. Entretanto, o campo da segurança de voo nessa
época abordava apenas os indivíduos que operavam o sistema. (ICAO doc9859,
2013).
Foi apenas a partir de 1990, com a divulgação das ideias do professor
James Reason, que a segurança de voo passou a ser abordada através de uma
perspectiva mais abrangente, que incluía as questões organizacionais como
condições latentes para a ocorrência de acidentes- nessa época surgiu o termo
acidente organizacional. A partir de então a expressão fatores humanos foi
estendida para englobar não apenas os pilotos, mas todos os envolvidos no sistema
da Aviação Civil: desde os diretores e donos das empresas até os níveis
estritamente operacionais. (ICAO doc9859, 2013).
Atualmente, os erros são considerados como um conjunto de fatores que
se relacionam de forma acumulativa e rompem as camadas de proteção em um
sistema, conforme proposto por Reason (1990). Nesse contexto existem dois tipos
de perigo: as que se manifestam na operação e as que vagam silenciosamente de
forma latente por ela em suas atividades rotineiras até se manifestarem sob a forma
ativa em determinadas condições operacionais. (REASON, 1990).
Os princípios propostos por Reason foram utilizadas por Wiegmann e
Shappell (2003) para propor o modelo Human Factors Analysis and Classification
System (HFACS) – que é utilizado para analisar e investigar as origens das falhas
em sistemas complexos de forma sistemática e ordenada.
Já em 2002, o ex-militar e professor Scott A Snook divulgou suas idéias
sobre o Pratical Drift – o desvio ou deriva prático das ações e procedimentos - a fim
de explicar como duas aeronaves da Força Aérea Americana erroneamente
abateram dois helicópteros Black Hawk durante um cessar fogo na operação Iraq
Freedom, em 1994. Suas idéias demonstram que a incompatibilidade entre as
normas e a demanda de atividades diárias gera um desvio de ações que são
adaptadas a fim de realizar as tarefas de formas mais simplificadas, mas que
acabam por se afastar das práticas recomendadas de segurança causando
acidentes. (SNOOK, 2002).
O desvio prático não pode ser evitado é algo natural em um sistema
principalmente em organizações complexas, onde devido à demanda de situações
cotidianas emergem situações inesperadas. (CAMPOS, 2013).
18

Dessa forma o desvio prático das ações ocorre em qualquer sistema,


independente de quão cuidadoso e bem planejado o mesmo foi feito. Algumas das
razões do desvio prático pode incluir a tecnologia que nem sempre funciona como
descrito; procedimentos que não podem ser executados conforme o planejado em
determinadas situações; regulamentos que não são aplicáveis em alguns contextos;
introdução de mudanças no sistema, a interação com outros sistemas, etc .
No entanto, permanece o fato de que, apesar de todas as deficiências
que levam o sistema a um desvio prático as pessoas que atuam nesse ambiente o
fazem funcionar diariamente através de adpatações. (ICAO doc9859, 2013).
Nesse capítulo, foi abordado de forma geral o desenvolvimento histórico
da segurança desde os primórdios do voo até os dias atuais, além de serem
introduzidas algumas ideias consagradas, as quais são indispensáveis ao
entendimento do trabalho nos capítulos seguintes.
19

3 O MODELO DE REASON E A GESTÃO DO RISCO

Como observado no capítulo anterior, as ideias do professor Reason


(1990) atualmente são a base dos estudos de segurança operacional. Nesse
capitulo, busca-se aprofundar: a distinção entre perigo e risco, a gestão e a
avaliação de riscos, o modelo do queijo suíço de Reason (1990) e o conceito
ALARP, sob uma ótica interdisciplinar a fim de que possam ser utilizadas
ferramentas teóricas que propiciem a tentativa de alcançar o objetivo do estudo,
além de e fornecer uma nova visão para o leitor.
Já na seção 3.1é apresentada a gestão de risco sob a ótica da
abordagem do sistema, conforme postulado por Reason (1990). Na 3.2 é
apresentado o conceito de espaço de segurança proposto por Reason (1997). Na
seção 3.3 é apresentada a teoria do desvio ou deriva prática dos procedimentos de
Scoot A. Snook (2002). A seção 3.4 faz uma retomada sobre aspectos importantes
relacionados ao gerenciamento do erro, a fim de que na parte 3.5 seja apresentada
a crítica ao modelo de Reason.
Esse capítulo de forma geral tem por objetivo apresentar um estudo sobre
a segurança operacional.

O MODELO REASON E A SEGURANÇA OPERACIONAL

Inicialmente,faz-se necessário diferenciar o conceito de perigo e risco.


Enquanto aquele é definido como qualquer condição real ou potencial que possa
causar lessão, ou danos materiais. O Risco é qualificado como a avaliação dos
perigos com base em suas implicações de possibilidade e consequências, conforme
mencionado pela FAA (USA,2016) e expresso sistematicamente pela figura abaixo,
feita pela mesma agência já mencionada.
20

Figura 1- Matriz de avaliação de risco

Fonte:FAA(USA, 2016).

As linhas horizontais da matriz acima denotam a possibilidade da


ocorrência de condições perigosas e as colunas demonstram os possíveis cenários,
com base nessas avaliações a intersecção da coluna com a linha determina o risco
potencial de uma situação. (USA,2016).
Contudo, apesar das metodologias existentes para avaliação de risco, um
fator se torna preponderante perante os demais: os fatores humanos. Para
exemplificar, considere a figura abaixo, originária do sítio eletrônico do governo do
Estado de São Paulo. Pensando em uma viagem, quais os possíveis riscos?
Figura 2: rodovia com neblina.

Fonte: São Paulo, 2018.

Ainda, para dificultar, o carro está com problemas elétricos de iluminação


e faltam duas horas para o sol se pôr, a distância entre o local de origem e destino é
de 190 km. Você faria a viagem? Provavelmente, existirão divergências entre as
opiniões, caso não ocorra entre duas pessoas - certamente em um grupo as
21

distinções serão notáveis. Essas divergências de opiniões na avaliação são


inerentes à atuação humana. (USA, 2016).
Existem vários fatores do meio, no qual o indivíduo vive e atua que
colaboram para a tomada de decisões sob determinada forma. Entretanto, a atuação
humana se mostra correlacionada à educação, treinamento, nível intelectual, etc.
Dessa forma, a atitude dos indivíduos é composta por variáveis nem sempre
predetermináveis as quais delineiam a tomada de decisão no campo das
probabilidades conjuntamente com a segurança operacional. (USA, 2016).
A experiência proposta acima resguarda distinções em relação à atividade
aérea, pois se trata de um carro. Contudo, ambos os sistemas são compostos por
uma interface homem-máquina e apresentam variáveis não determinadas,
notadamente devido à atuação do elemento humano, e ausência de linearidade -
uma vez que uma mesma situação pode conduzir às diferentes avaliações,
caracterizando, pois, um sistema complexo, conforme Campos (2013).
Foi cativado por essas questões, com variáveis não pré-determinadas
devido à atuação humana, que o professor Reason em seu livro “Human Erro”
descreveu através de uma abordagem sob o ponto de vista do sistema,uma teoria
para explicar como ocorrem acidentes. Popularmente conhecida como modelo do
Queijo Suíço. Esse modelo ilustra que a ocorrência de um acidente se relaciona com
a quebra de múltiplas camadas de proteção em um sistema. (REASON, 1990).
Na Aviação, devido às inúmeras proteções em um ambiente complexo,
pontos com falhas pontuais são extremamente raros. Brechas nas camadas de
proteção podem ter origens nos mais elevados níveis de decisões da organização,
permanecendo em situações latentes até que sejam ativadas por situações
operacionais específicas. Nessas situações específicas, o fator humano se expressa
em falhas ativas que atuam no rompimento da camada de proteção, provocando
possíveis acidentes. Esse modelo considera que todo acidente é uma combinação
de situações latentes e ativas. (ICAO, 2013, pág.2-2).
Situações latentes são aquelas que não têm origem direta na operação:
podem ser má alocação de recursos, clima organizacional não motivador, falta de
um ambiente justo que faça distinção entre erros e violações. Já as falhas ativas são
esquecimento, erros psicomotores, enfim estão mais diretamente relacionados à
operação. (REASON, 1990).
22

Figura 3: Modelo do Queijo Suíço

Fonte: ICAO doc9859, 2013.

Na figura acima existem seis quadriláteros, os três mais à esquerda no


sentido do leitor, representam as atividades inerentes a vida da organização desde
seu nível gerencial, perpassando pelos fatores higiênicos do ambiente de trabalho:
Fatores geradores de Stress, Ruído, etc. Já no nível operacional representam as
pessoas que atuam diretamente nos sistemas como mecânicos e aviadores.
Enquanto os quadrados da direita, considerando o mesmo sentido de observação,
constituem as principais camadas de proteção do sistema. (REASON, 1990).
As camadas de proteção são rompidas devido ao conjunto de fatores
humanos, técnicos e organizacionais e suas interações com os esforços produtivos e
de segurança. Pois, embora essa seja necessária para evitar possíveis danos
materiais e humanos os recursos para tal atividade são provenientes da própria
produção, de forma que raramente a distribuição de recursos é igual, é um dos
processos predominará de acordo com as circunstâncias. (REASON, 1997).
Interpretando a afirmação de Reason (1997) acima, sob a perspectiva
econômica e considerando a escassez de recursos - princípio fundamental da
Economia o qual ocorre em toda organização - pode-se denotar a alocação dos
recursos destinados a produção (esforços de produção) e a segurança (esforços de
segurança) sob uma curva de possibilidade de produção (CPP). De acordo com
Vasconcellos (2006) a CPP é um conceito teórico que representa efetivamente como
estão alocados os recursos.
23

Figura 4: Curva CPP

Fonte: Adaptado de Economia Micro e Macro, Vasconcellos 2006.

Na figura 4, em conformidade com Reason (1997), os Esforços de


Produção (Ep) e os Esforços de Segurança (Es) são bens concorrentes. Ou seja,
embora os Es sejam necessários para evitar possíveis danos materiais e humanos
os recursos para tal atividade são provenientes da própria produção, de forma que
raramente a distribuição de recursos é igual, é um dos processos predominará de
acordo com as circunstâncias. (VASCONCELLOS, 2006).
Ainda nesse panorama, considerando a figura acima, o formato da curva
CPP se justifica, pois, ela é decrescente em virtude do sacrifício que tem de ser feito
ao optar-se por realocar os recursos que estão plenamente empregados: há um
aumento de custos inerentes apenas a movimentação dos recursos.
(VASCONCELLOS, 2006).
Antes de continuar, faz-se necessário retomar, nas palavras de
Vasconcellos (2006), que a CPP é um conceito teórico e representa efetivamente
como estão alocados os recursos, já o valor utilidade marginal e total são conceitos
da Economia que podem ser úteis no entendimento de como as pessoas percebem
de forma subjetiva o valor dos recursos efetivamente empregados, ou seja, mesmo
que uma organização destine mais de 50% de suas finanças para os Esforços de
Segurança no valor de um de R$ 1.000.000 por mês, pode ser que as pessoas
através de suas percepções não deem valor a tal realidade devido ao fato de que “a
segurança não está fazendo falta no momento”. Dessa forma, as curvas de utilidade
24

total e marginal representam a intenção das pessoas acerca de que é mais útil a
partir da forma como elas percebem as circunstâncias. (VASCONCELLOS, 2006).
Nesse panorama, segundo Reason (1997), existe uma espécie de
percepeção do valor utilidade da: produção e da segurança, conforme as
circunstâncias.
Ainda, segundo esse autor, a mentalidade de segurança tende a se
deteriorar com o tempo. De modo que ocorre um desvio prático dos níveis da
mesma. A erosão ocorre então,devido ao fato de as pessoas esquecerem coisas
que raramente acontecem, acidentes e incidentes, principalmente diante dos
imperativos produtivos tais como lucro, crescimento, etc. De modo que, o conceito
de utilidade marginal em relação ao tempo, pode demonstrar a erosão da percepão
dos Es.
A utilidade marginal demonstra a redução da satisfação pela obtenção de
mais um bem do mesmo tipo, ou seja, o bem tem sua utilidade reduzida uma vez
que “esse não faz falta ou esta abundante” na mentalidade das pessoas.
(VASCONCELLOS,2006).

Figura 5: Utilidade Marginal.

Fonte: Economia Micro e Macro, Vasconcellos 2006. Adaptado pelo autor.

O gráfico acima referem-se à percepção de um baixo valor de utilidade


marginal dos esforços de segurança para uma organização, em um périodos livre de
acidentes ou incidentes, dessa forma, conforme mencionado por Reason, a erosão
da segurança aumenta com o tempo (1997). De maneira que a segurança pode ser
considerada como um bem intangível sujeito à percepção de seu valor utilidade
pelas pessoas que atuam na organização.
25

Inicialmente, a erosão da segurança não corresponde a grandes


problemas, pois apesar da percepção das pessoas, os recursos destinados aos Es
são suficientes para manter em níveis adequados as atividades relacionadas a
propia proteção do sistema: treinamentos, compra de peças para manutenção, etc.
Contudo, de forma gradual com o passar do tempo, a erosão conduz a um estado no
qual os esforços de segurança são postos em detrimento diante dos esforços
produtivos pela administração, gerando,pois, um ambiente organicional vunerável a
fatores causadores de acidentes quando os recursos são marjoritariamente
destinados a produção. (REASON, 1997).
Ainda, em relação à produção, conforme Reason (1997), as empresas
tendem a maximizar seus ganhos, pois, é desses ganhos que vem toda fonte de
renda da organização, logo o Esforço de produção tem uma elevada utilidade total
na mentalidade dos indivíduos:

=

Figura 6: Curva de utilidade total.

Fonte: Economia Micro e Macro, Vasconcellos 2006. Adaptado pelo autor.

Dessa forma, conforme Reason (1997), a erosão da segurança que


inicialmente não correspondia a grande problemas de forma gradual, conduz a uma
situação na qual os esforços de segurança são postos em detrimento aos esforços
produtivos, gerando,um ambiente organicional vunerável a fatores causadores de
acidentes, de forma que após determinado tempo a queda da percepção do valor
utiidade dos Es induz a redução dos valores destinados a essa atividade pela
26

administração, a fim de direciona-los à produção. É nesse ponto, segundo Reason


(1997), que o risco se torna maior, pois se antes havia o investimento sem o
comprometimento, agora há redução de investimento e do comprometimento, de
modo que com a erosão da segurança sem controle, a administração passa a
direcionar a maior parte dos recursos para os esforços de produção(EP), e a falta de
comprometimento dos funcionários operacionais aumenta e se intensifica com a
diminuição da percepação do valor utilidade dos Es– ocasionado, pois, grande
chances de acidentes. (REASON, 1997).
Geralmente, é somente após um acidente grave, que algumas proteções
aparecem como forma de mitigar riscos associados ao acidente, na mentalidade
das pessoas que administram determinada empresa, de forma que melhorias na
segurança geralmente são posta em prática após fatalidades. . (REASON, 1997).
Dessa forma nas figuras: 4 5, 6 e em seus respectivos textos. O objetivo foi
interpretar Reason (1997) sob uma nova ótica.
Retomando, pois, os conceitos para avaliação de risco demonstrada na
figura 1, e concatenando-os com os conceitos ALARP as low reasonable as
praticable, que segundo Santos (2014), caracteriza-se como a iniciativa de reduzir os
riscos de forma praticável sem aceitar riscos alarmantes e desnecessários, porém
não atuando diretamente sobre os que são toleráveis e podem ser gerenciados por
procedimentos de rotina, e que se reduzidos acarretariam custos desproporcionais
aos benefícios advindos. Nesse contexto, o risco pode ser mensurado de acordo
com Almeida (2004) como:
=
A variável P, na equação acima,representa a probabilidade de ocorrência
de 0 a 1, nesse caso, 0 representa 0% de chance do evento ocorrer enquanto 1
significa 100% de chance, ou seja, a certeza da ocorrência. E a variável C da
mesma equação é uma estimativa dos custos envolvidos caso o acidente ou
incidente relacionado ao risco ocorra. (ALMEIDA, 2004).
Dessa forma, conforme descrito por Santos (2014), depois de
identificados os perigos, recorre-se à análise com a da matriz de risco e
possibilidade apresentada na figura 1 para avaliá-los qualitativamente e eliminar os
não aceitáveis. Enquanto uma análise quantitativa, utilizando equações como a de
Almeida (2014), se faz útil na avaliação do ponto de equilíbrio ALARP. De forma que,
a relação Es/Ep ideal possa ser determinada. Essa relação entre os esforços
27

produtivos e os de segurança deve ser reavaliado continuamente a fim de evitar a


ocorrência de desequilíbrios no sistema, os quais podem ocorrer quando os esforços
produtivos aumentam e os de segurança permanecem inalterados, conforme
Reason (1997).
A matriz de avaliação de riscos da figura 1: que é utilizada durante o
processo de identificação e avaliação de perigos. Em Conjunto com as idéias
contidas na figura 7, abaixo. Resultam em uma matriz com critérios, conforme a
figura 8.

Figura 7: Critérios para avaliação de Riscos

Fonte: Associação Brasileira de Aviação Geral (ABAG), 2018.

Figura 8: Matriz de Riscos com Critérios aplicados

Fonte: ABAG, 2018

Na figura 8, os números representam a possibilidade de ocorrência de um


acidente enquanto as letras se referem à severidade das consequências advindas
desse. (SANTOS,2014).
28

Com base nessas possibilidades e probabilidades presentes na matriz em


conjunção com o conceito ALARP é definido o nível máximo praticável, bem como
os riscos intoleráveis e os toleráveis, conforme a figura 9, abaixo:

Figura 9: Regiões de Risco e ALARP

Fonte: ABAG, 2018.

Conforme os critérios de severidade e probabilidade de ocorrência são,


pois como definidas a regiões, da figura acima, segundo Santos (2014):

 ACEITÁVEL - não é necessário adotar medidas mitigadoras, a menos que se


possa reduzir mais o risco com pouco custo ou esforço.
 TOLERÁVEL - significa que as organizações afetadas estão preparadas para
suportar o risco. Entretanto, é recomendável que sejam adotadas ações
mitigadoras para reduzir o risco.
 INTOLERÁVEL - significa que as operações nas condições atuais devem ser
interrompidas até que o risco seja reduzido até que se torne tolerável.

Com base nesses critérios, após identificar os perigos e avaliá-los, a


organização deve em seguida, com base em sua capacidade de Recursos e nas
recomendações de segurança, fazer o controle/mitigação dos riscos, avaliando
aqueles que devem ser mitigados e os que podem ser aceitos sem grandes
prejuízos de proteção para o sistema, mas que caso fossem mitigados ocasionariam
29

uma necessidade de recursos alocados em segurança desproporcionais aos


benefícios advindos. Conforme demonstrado na figura 10. (SANTOS, 2014).
A figura abaixo demonstra importantes conceitos relacionados aos custos e aos
esforços de segurança, conforme o conceito ALARP. Nessa figura, o ponto ALARP -
nível de risco considerado tolerável e que não pode ser mais reduzido sem gasto de
recursos desproporcionais em relação aos benefícios advindos- pode ser calculado
pela fórmula utilizada por Almeida (2004), de modo que esse pode ser mensurado
quantitativamente pelo limite inferior ao se considerar todos os custos da região
aceitável e tolerável que não foram mitigados, durante o processo de gestão do
risco.

Figura 10: ALARP, Risco e Custos

Fonte: Santos,2014 adaptação do autor.

Formula utilizada por Almeida (2004):


=

Dessa forma, no momento inicial após gestão do risco e alocação de


recursos, o ponto ALARP representa o nível desejável dos Es, de forma que a
relação Es/Ep é ótima, considerando a gestão realizada corretamente. Contudo,
conforme mencionado por Reason (1997), as organizações passam por questões
como a erosão dos Esforços de seguranças estágios de imperativos produtivos, de
forma que não basta saber o ponto ideal para o ALARP, e se torna necessário que
sejam elaboradas medidas quantitativas que possam medir direta ou indiretamente
de forma aproximada, quais são os limites máximos de variação entre os Es/Ep, a
30

fim de determinar mais precisamente o espaço de segurança, relacionado a valores


financeiros para cada organização.
No entanto, é preciso retomar que embora na CPP e no gráfico de
conceito ALARP sejam demonstrados os recursos realmente alocados em relação
aos seus valores e iniciativas iniciais, é a mentalidade das pessoas acerca do valor
desses recursos que vai determinar em grande parte o sucesso ou insucesso das
medidas de proteção alocadas bem como a forma como essas serão re-alocadas no
futuro. De maneira que a relação entre o valor utilidade dos Esforços de segurança
em relação ao valor utilidade dos Esforços de Produção (UEs/UEp) possam ser
medidos, a fim de definir mais precisamente o espaço de segurança, proposto por
Reason (1997).
Relembrando, segundo Reason (1997), embora a segurança seja
necessária para evitar possíveis danos materiais e humanos, os recursos para tal
atividade são provenientes da própria produção, de forma que raramente a
distribuição de recursos é igual, é um dos processos predominará de acordo com as
circunstâncias. De maneira que os fatores presentes no espaço de segurança
estejam relacionados a dois macros fatores: segurança e produção.

O ESPAÇO DE SEGURANÇA

O conceito do espaço de segurança consiste em uma idealização teórica


que de forma gráfica representa o atual estado da segurança/inseguranças
presentes em uma organização. (REASON, 1997)
Existem diversos fatores que colaboram para o posicionamento
bidimensional do espaço de segurança, posição que depende de um processo de
identificação e mitigação de riscos e da qualidade das defesas do sistema em dado
momento. (REASON, 1997).
Mesmo que a posição indicada represente a segurança absoluta do
sistema, isso não e verdadeiro, uma vez que existem perigos naturais relacionados a
condições latentes, falhas humanas e situações com alterações contínuas dos
31

fatores relacionados à segurança/insegurança, dado que a probabilidade de um


acidente nunca é zero. (REASON, 1997)
Para Reason (1997), pouquíssimas organizações ocupam um espaço de
segurança estático, em sua maioria o mesmo se encontra em movimento constante,
de forma que quando são atingidas posições extremas de forma natural surgem
forças que provocam o retorno a pontos anteriores. (REASON,1997).
Por conseguinte, a ocorrência de acidentes recorda a administração da
necessidade de segurança de modo mais presente que a produção – ainda que de
forma temporária. Além das pressões das agências reguladoras e da opinião pública
que devido à memória relacionada à ocorrência de acidentes recentes exigem mais
segurança. Nesse panorama, a forma de manter a segurança adequada em um
sistema consiste em tornar as flutuações limitadas ao uma zona de resiliência
máxima. (REASON,1997).

Figura 10: Espaço de Segurança

Fonte: James Reason, doc9859. Adaptado pelo autor.

A figura acima demonstra a relação entre os Esforços de Produção e


segurança a fim de relacioná-los com o espaço de segurança. Na figura acima, a
região delimitada pelas linhas tracejadas é a zona de resiliência máxima, de acordo
com Reason (1997).
Contudo, para esse autor pouquíssimas organizações ocupam um espaço
de segurança estático, em sua maioria o mesmo se encontra em movimento
32

constante, de forma que quando são atingidas posições extremas de forma natural
surgem forças contrárias. Ou seja, é a utilidade dos Esforços de Segurança em
relação aos Esforços de Produção que estão continuamente mudando e não
necessariamente a efetiva alocação de recursos. (REASON,1997).
É preciso ratificar: no momento inicial, após gestão do risco e alocação de
recursos, o ponto ALARP representa o nível desejável dos Esforços de Segurança,
de forma que a relação Es/Ep é ótima, considerando a gestão realizada
corretamente. Todavia, conforme mencionado por Reason (1997), as organizações
passam por questões como a erosão dos Esforços de seguranças e estágios de
imperativos produtivos, dado que não basta saber o ponto ideal para o ALARP, e se
torna necessário que sejam elaboradas medidas quantitativas que possam medir
direta ou indiretamente de forma aproximada, quais são os limites máximos de
variação do espaço do segurança baseadas na percepção do valor utilidade da
mesma.
Independentemente da alocação de recursos, o professor James Reason
(1997) postulou, ainda, que existem três forças responsáveis pelo direcionamento da
segurança:
 Comprometimento: relacionado ao domínio dos modelos e boas práticas de
segurança, motivação, ou pelos recursos alocados a fim de atingir os
objetivos de segurança.
 Consciência: atitude em relação à identificação os perigos e mitigação dos
riscos, uma organização consciente vê a manutenção da segurança de forma
proativa, sempre buscando identificar riscos e mitigar, principalmente em
longos períodos sem acidentes ou incidentes.
 Competência: relaciona aos instrumentos de informações de segurança em
uma organização.

Isso posto, apesar de a segurança e a produção determinarem


parcialmente o espaço de segurança em relação à alocação de recursos, segundo
Reason (1997), existe conjuntamente a Consciência acerca da segurança, a
competência e o Comprometimento que resguardam relações diretas com os
recursos, uma vez que os indivíduos têm uma espécie de percepção acerca do valor
utilidade da segurança, que se torna maior após a ocorrência de acidentes e que se
afastam durante os períodos livres de acidente.
33

Desse modo, talvez, seja útil avaliar a utilidade dos Esforços de Segurança/ utilidade
dos esforços de Produção.

Figura 11: Espaço de Segurança e valor utilidade do Es

Fonte: Vasconcelos, 2006. Adaptado pelo autor.

Ressalta-se que até este ponto foram abordadas organizações com uma
postura reativa, que corrigem as falhas somente após os acidentes, em relação à
segurança, pois naquelas onde a segurança é feita de forma pró-ativa e/ou preditiva
as oscilações do espaço de segurança são reduzidas através de iniciativas da
gestão, porém os mesmo efeitos descritos anteriormente ocorrem, sendo apenas
amortecidos pelo gerenciamento contínuo e constante - conforme previsto no
doc9859, afim de que ocorra o retorno a situação desejável existente no momento
imediatamente anterior ao processo de Gestão do Risco.(ICAO doc9859, 2013).
A fim de atingir um bom nível aceitável de segurança operacional, o
gestor deve saber o que e possível gerenciar, pois não é possível eliminar todos os
riscos, mas se pode mitigar, não é possível eliminar todos os atos inseguros de uma
só vez, mas é possível eliminá-los gradativamente a partir de uma visão sistemática.
Além disso, faz-se necessário constantemente medir e melhorar os processos que
34

foram identificados como contribuintes para ocorrência de atos inseguros. De forma


reativa, proativa ou preditiva. (REASON, 1997).
As medidas Reativas são uma forma de se aprender com acidentes já
ocorridos, quais são as brechas de segurança, o rompimento, quais camadas de
proteção foram decisivas para manifestação do acidentes, as condições latentes que
contribuíram, a fim de que através da coleta dos dados provenientes, a análise
posterior seja realizada sob uma minuciosa investigação e possa demonstrar o que
deve ser melhorado ou modificado para que a mesma situação ou similares não
ocorram. Dentro do âmbito das investigações, considera-se a transparência total
das informações e a previsão da não existência de punição, o objetivo é corrigir as
falhas objetivando implementar a segurança. (ICAO doc9859, 2013).
No Brasil, o órgão responsável pela investigação de acidentes
aeronáuticos é o Comando da Aeronáutica através do Centro Nacional de
Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (CENIPA), que tem por
finalidade planejar, gerenciar, controlar e executar as atividades relacionadas com a
prevenção e investigação de acidentes aeronáuticos. E tem como atribuições:
Planejar, normatizar, orientar, coordenar, controlar e supervisionar as
atividades de prevenção de acidentes aeronáuticos envolvendo a infraestrutura
aeronáutica brasileira, incluindo, entre outros, a aviação militar, a aviação civil, os
operadores brasileiros de aeronaves civis e militares, a infraestrutura aeroportuária
brasileira, o controle do espaço aéreo brasileiro, a indústria aeronáutica brasileira e
todos os segmentos relacionados. (CENIPA, 2018).
De forma pró-ativa: baseia-se no constante e continua identificação de
perigos e avaliação de riscos, baseia-se ainda em uma rede de reporte voluntário no
qual a informação provê medidas sobre o estado de segurança/insegurança
presente nas atividades em seus diversos níveis. (ICAO doc9859, 2013).
A forma preditiva consiste em captar em tempo real informações acerca
dos níveis de segurança/insegurança presentes em um sistema, utilizando-se de
diversas metodologias a fim de garantir uma eficiente competência em relação à
segurança. (SANTOS, 2014).

A DERIVA PRÁTICA
35

Scoot A Snook,emseulivro friendlyfire: The ShootdownoftwoBlackhawks


over northernIraq, 2002, desenvolve uma teoria a fim de explicar a degradação do
nível de segurança do sistema devido ao desvio das normas.
Segundo Campos(2013), em sistema complexos, ocorrem situações
inesperadas nas quais os operadores têm que adaptar, são nessas adaptações que
surgem as condições para que as ações apresentem desvios da norma. De acordo
com Snook(2002), essas adaptações ocorrem devido a: introdução de mudanças no
sistema, adição de novos componentes; interação com outros sistemas; etc. No
entanto, permanece o fato de que, apesar de todas as deficiências do sistema que
levam à deriva, as pessoas que operam dentro da deriva prática fazem o sistema
funcionar diariamente, aplicando adaptações locais. Dessa forma, esses desvios
embora feitos afim de fazer o sistema funcionar, podem conduzir à acidentes, sob
determindas condições operacionais.

GERENCIAMENTO DO ERRO

O gerenciamento do erro é constituído por dois elementos após a fase de


identificação e avaliação de riscos: Redução do erro e Retenção do Erro. Enquanto
essa se refere a medidas a fim de reduzir a ocorrência de erros, aquelas se
relacionam ao fato de que uma vez que nem todos os erros podem ser evitados, é
preciso então limitar os efeitos decorrentes desses. Sendo que, na identificação dos
perigos, a abordagem reativa, ainda é a mais utilizada, ou seja, geralmente se
aprende com acidentes e incidentes. (REASON, 1997).
Uma ferramenta de gerenciamento de riscos deve:
 Garantir a detecção do erro;
 Minimizar a probabilidade de ocorrência de erros;
 Identificar, avaliar e eliminar fatores de produção de erros no ambiente de
trabalho;
 Diagnosticar fatores organizacionais que colaboram para situações de erro
 Garantir que o erro seja detectado;
36

 Aumentar a tolerância a erros pelos operadores nos locais de trabalho e


melhorar a resistência da organização em relação à segurança.
Em conformidade com Reason (1997), os erros que se manifestam
durante os atos inseguros são originados em diferentes níveis na organização e se
relacionam às condições do ambiente e às influências organizacionais,de forma que
a avaliação do erro deve englobar uma visão abrangente do sistema analisado, a fim
de que sejam identificados todos os fatores que contribuíram para que o acidente
acontecesse, de modo que os erros são consequências e suas causas estão
geralmente relacionadas a uma cadeia de eventos.
No mercado, existem muitas ferramentas para o gerenciamento do erro
tais como: análise de tipo e efeito da falha (FMEA- Failure Mode and Effects
Analysis), Árvore da falha (FTA- Failure Tree), etc. Contudo, segundo Reason
(1997), a maior parte das ferramentas foca mais no erro individual.
Uma ferramenta para gerenciar riscos deve ter uma filosofia para alcançar
objetivos de segurança possíveis, uma forma integrada de pensar sobre os
processos que interrompem a operação segura e instrumentos para medir esses
processos que afetam a segurança. (REASON, 1997).
Dentro desse panorama, a maioria dos erros não é aleatório, indivíduos
diferentes cometem o mesmo erro quando submetidos às mesmas situações,as
quais podem ser ambientais, relacionadas à supervisão ou a influências
organizacionais, fatores esses relacionados ao espaço de segurança. (REASON,
1990).
Através de uma análise sobre os erros é possível elaborar um banco de
dados, no qual seja possível identificar, avaliar e classificar o erro a fim de erguer
barreiras que evitem sua repetição. (CAMPOS, 2013).
No âmbito da proposta e com o objetivo de eliminar as carências dos
modelos basicamente reativos, Wiegmann e Shappell propuseram o modelo HFACS,
em 2000.
37

CRÍTICA AO MODELO DE REASON

O sistema para análise e classificação de fatores humanos (HFACS-


human factors analysis and classification system), justifica-se inicialmente devido ao
fato de atualmente cerca de 70% a 80% dos acidentes serem relacionados a fatores
humanos. No entanto, a maioria dos sistemas de reporte de acidentes foi projetada
sem qualquer estrutura teórica relacionada aos fatores humanos, fato que torna a
maioria dos bancos de dados inúteis em relação à análise desses fatores, e sua
identificação tornando as possíveis estratégias de intervenção onerosas. É preciso
uma estrutura completa sobre os fatores humanos que propicie métodos de
investigação e possibilite a atualização dos bancos de dados existentes. O modelo
HFACS foi desenvolvido para preencher essas necessidades, e foi empregado na
aviação geral, militar e comercial para sistematicamente analisar fatores humanos,
até então ocultos, de forma mais teoricamente adequada. (WIEGMANN; SHAPPELL,
2000).
No “queijo suíço” de Reason (1990), existem quatro níveis de falha
humana, cada uma influenciando a próxima. A partir do acidente, se tem que o
primeiro nível é o de atos inseguros, esse consiste em falhas cometidas pelos
operadores no nível operacional sob determinadas condições que conduzem
diretamente ao acidente. Sob a ótica simplista de apenas considerar o nível
operacional, tem-se o erro do piloto ou da tripulação. (WIEGMANN; SHAPPELL,
2003).
A maior parte das investigações aeronáuticas é orientada apenas sob a
análise dos fatores inerentes à interação homem-máquina, de forma que usualmente
apenas os fatores relacionados a falhas ativas são descritos como contribuintes para
ocorrência do acidente. (WIEGMANN; SHAPPELL, 2003).
Ações ou omissões relacionadas a erros, como falhar em realizar
adequadamente as tarefas de leitura de instrumentos de forma padronizada durante
um voo, ou inadvertidamente continuar a voar por auxílios, quando autorizado
apenas ao voo visual, constituem brechas nas camadas do queijo de Reason, essas
falhas ativas geralmente são as últimas que antecedem o acidente. (WIEGMANN;
SHAPPELL,2000).
38

O mérito do modelo de Reason para a análise de acidentes consiste em


orientar o investigador a tentar relacionar às falhas ativas – as cometidas pelos
operadores, com as falhas latentes- aquelas que permanecem dormentes no
ambiente organizacional até que uma série de brechas nos níveis faz com que, sob
determinadas condições operacionais, esse conjunto de buracos nas proteções são
ultrapassados e se manifestam sob a forma de falhas ativas. (WIEGMANN;
SHAPPELL, 2000).
O conceito de falhas latentes descreve três novos níveis de falhas
humanas além da operação. O primeiro são os fatores ambientais que afetam a
tripulação, tais como: ruído: falta de coordenação entre os membros da tripulação
(CRM) e comunicação inadequada. Esses são referenciados como pré-condições
para atos inseguros. Mas porque ocorrem falhas de comunicação e coordenação?
Na maioria das vezes,a falha, no gerenciamento dos recursos da
tripulação, pode ser diretamente relacionada à Supervisão Insegura. Caso dois
pilotos inexperientes sejam escalados para uma missão noturna com condições
meteorológicas adversas, o desastre pode ser iminente. De forma ainda mais grave
pode haver falta de treinamento e qualidade no gerenciamento de recursos da
tripulação. Tripulações escaladas sob essas formas são praticamente enviadas para
falhar, uma vez que o gerenciamento adequado e o desempenho já estão
comprometidos antes da decolagem. (WIEGMANN;SHAPPELL, 2000).
O modelo de Reason (1990) não para no patamar da supervisão, uma vez
que a própria organização pode afetar a segurança e provocar o surgimento de
brechas de proteção em todo o sistema. Por exemplo, em épocas, nas quais os
recursos são mais escassos, os direcionadosà proteção são reduzidos, uma vez
que, conforme Reason (1990), a produção e a segurança competem pela alocação
de recursos em uma organização.
Entretanto, essas reduções nas medidas de proteção afetam os
treinamentos relacionados à qualidade de gerenciamento de recursos da tripulação
(CRM) e faz com que os supervisores não tenham alternativas e acabam por escalar
tripulações inexperientes para realizar tarefas complexas, e nessas situações
surgem várias pré-condições propícias para o surgimento de atos inseguros e,
conseguintemente, acidentes. Logo se torna imperativo uma abordagem que analise
as falhas além do cockpit, a fim de reduzir os níveis de acidentes. (WIEGMANN;
SHAPPELL,2003).
39

O modelo proposto por Reason pode ter revolucionado a visão sob os


acidentes relacionados à falha humana ao demonstrar através das condições
latentes que essa pode se originar em elevados patamares hierárquicos através de
várias falhas humanas que se refletem sob vários fatores.
Esse modelo, no entanto, não apresenta muitos detalhes em relação à
sua real aplicação no mundo real, de modo que Reason nunca define claramente o
que são os buracos no queijo, nem demonstra a teoria através de contextos reais. E
esse conhecimentos e faz necessário, para reconhecer com precisão os
contribuintes de um acidente, ou de forma ainda melhor evitar que esses ocorram.
(WIEGMANN; SHAPPEL,2000).
Nesse capitulo que se encerra, buscou-se aprofundar: a distinção entre
perigo e risco, a gestão e a avaliação de riscos, o modelo do queijo suíço de Reason
(1990) e o conceito ALARP, as idéias de Snook (2002) e Wiegmann e Shappell
(2000) sob uma ótica interdisciplinar a fim de que possam ser utilizadas ferramentas
teóricas que propiciem a tentativa de alcançar o objetivo do estudo, além de e
fornecer uma nova visão para o leitor. Concluindo-o com uma crítica ao modelo de
Reason (1990), análise essa que prossegue no próximo capítulo.
40

4 O MODELO HFACS

Nesse capítulo, apresentar-se-á o modelo HFACS, a fim de ampliar o


entendimento do modelo de Reson (1990), visto anteriormente.
A proposta do modelo HFACS é aplicar o modelo de Reason de forma
sistemática a casos reais de acidentes, afim de que sejam finalmente identificados
os buracos do Queijo, de forma clara. Dentro desse panorama, foram analisados sob
uma abordagem do sistema, cerca de 300 acidentes da aviação naval nos Estados
Unidos por Wiegmann e Shappell (2000).
A partir do modelo proposto por Reason de falhas ativas e latentes, o
HFACS descreve quatro níveis para ocorrência dessas: Atos inseguros, Pré-
condições para atos inseguros, Supervisão Insegura e influencias organizacionais.
Segundo Reason (1997), acidentes organizacionais são difíceis de ocorrer, contudo,
conforme as mesmas ideias postuladas por esse autor, o erro engloba todo um
sistema. De forma quando é referido no tema do trabalho presente fatores
organizacionais deve-se entender que embora nem todos acidentes sejam
organizacionais, todos ocorrem no âmbito de organizações com contribuições de
diferentes formas e níveis que nem sempre são determinados, devido à
complexidade inerente ao sistema.
Antes de introduzir propriamente a estrutura do modelo mencionado
acima, retomando Reason (1997), existe uma percepção subjetiva da segurança por
partes das pessoas que atuam em uma organização. Desse modo,a orientação a os
objetivos que se iniciam na direção da empresa influenciam todos os níveis abaixo e
modifica a percepção dos funcionários, e dessa maneira surge uma sensação de
maior insegurança ou segurança, principalmente por parte dos funcionários
operacionais. Por conseguinte, um aviador prestes a iniciar o exercício de sua
função, embora não saiba todos os acontecimentos que rondam a organização em
relação à alocação dos recursos de segurança, este sente subjetivamente que há
algo errado, notadamente devido às pré-condições que se fazem presentes em seu
ambiente de trabalho de forma física ou mesmo psicológica, conforme mencionado
por Wiegmann e Shappell (2000).
41

O modelo HFACS de Wiegmann e Shappell (2000) foi pensando com a


finalidade de propiciar uma análise e classificação sistemática dos erros, a estrutura
para abordagem dos erros na visão desses autores é demonstrada em conformidade
coma figura 12, abaixo, na qual cada pequeno quadrado na parte inferior representa
um tipo de erro, e as partes acima tem por objetivo mapear as origens da falha ativa
através de todos os níveis da organização de forma sistemática.

Figura 12: Estrutura do modelo HFACS

Fonte: Wiegmann e Shappell, 2000.

Resumidamente, o modelo HFACS foi estruturado conforme figura acima


por Wiegmann e Shappell(2000), a fim de propiciar uma visão mais clara do modelo
do queijo suíço de Reason. Esses autores especificaram cada uma das falhas em
seus diversos tipos e níveis e usaram exemplos práticos de acidentes reais, a fim de
melhorar a usabilidade das ideias de Reason em um contexto prático.
Não será tratado cada um dos tipos de erro, contudo um dos aspectos
ratificados por Wiegmann e Shappell (2000) é a influência dos níveis
hierarquicamente superiores sobre os operacionais, de forma que as condições
inseguras advêm de um somatório de condições latentes.
42

Nesse panorama considerando que a orientação a os objetivos que se


inicia na direção da empresa influencia a percepção do valor utilidade da segurança
em todos os níveis, através de uma sensação de maior insegurança ou segurança,
principalmente no âmbito operacional. De forma que um aviador prestes a iniciar o
exercício de sua função, mesmo que não saiba todos os acontecimentos que
rondam a organização em relação à segurança, pode perceber subjetivamente, em
seu local de trabalho, um somatório de condições latentes desde o nível
organizacional até o de pré-condições que afetam a segurança do voo e sua própria
integridade física, conforme denotado pela estrutura do modelo HFACS de
Wiegmann e Shappell (2000).
Portanto, é possível que a opinião do aviador, prestes a iniciar um voo,
possa conter importantes questões relacionadas à segurança de todo o sistema,
desde que seja resgardado o anônimato, para que seja analisado o sistema e não as
pessoas, de acordo com os princípios consagrados da cultura de reporte, conforme
Reason(1990).
43

5 PROPOSTA DE MODELO

Nesse capitúlo, são utilizadas as ideias já desenvolvidas anteriormente, a


fim de apresentar um modelo que se enquadre nas propostas do objetivo geral do
trabalho.
A FAA em sua publicação , pilot`s Handbook of Aeronautical Knowledge
de 2016, propõe na página 2-7 um modelo de formulário para avaliação de riscos
pessoais antes do Voo. Vale ressaltar que o modelo apresentado é apenas um
exemplo, figura 13, abaixo:
Figura 13: Formulário de avaliação de risco prê-voo.

Fonte: FAA (USA,2016).

Na figura acima, o aviador responde às questões e pontos são


computados eao finalsomados,abaixo existe ainda um gráfico a fim de que o piloto
perceba o nível de risco envolvido no seu voo.
44

No panorama da cultura de reporte como elemento crucial para obter


informações de forma mais precisa sobre perigos.Conforme Reason (1990), a
maioria dos erros não é aleatória e indivíduos diferentes cometem o mesmo erro
quando submetidos às mesmas situações. (REASON, 1990).
Através da coleta de informações sob a ótica do aviador na fase
antecedente ao início do voo, é possível montar um banco de dados para cada
organização e, posteriormente, analisar os possíveis desvios, de forma indireta, em
relação a:valor utilidade dos Esforços de Segurança em relação ao Valor utilidade
Esforços de Produção. (UEs/UEp), percebido pelos aviadores.
Uma vez que diante dos imperativos produtivos a quantidade de situações
não previstas é maior, é possível que, conseguintemente, a percepção dos riscos
associados ao voo pelos aviadores, prestes a iniciar o exercício de sua função,
também o sejam – porém, como forma de atingir as exigências produtivas, ocorra
desvios pelos mesmos: dormir menos que o recomendado, voar mesmo que se
sentindo fisicamente indisposto, etc.
Dessa forma, talvez possa ser definido um desvio máximo aceitável em
relação à percepção dos riscos por esses em relação ao número de voos ou horas a
serem voadas, após uma coleta e análise de dados apropriada. Sendo que esses
desvios podem ser utilizados para definir o deslocamento do espaço de segurança
através do uso do conceito de valor utilidade. De forma que se defina um, conforme
a equação abaixo:
UEs
á =
UEp
A equação acima pode, por exemplo, representar o risco percebido pelos
aviadores, através do somatório de pontos obtidos no formulário, em relação ao
número de voos em determinado período, de forma que são esperados períodos
recorrentes com desvios máximos a exemplo de feriados prolongados e fim de ano,
datas em que o volume de operações aumenta.
Contudo, é preciso a aplicação do modelo com o uso de dados reais. Além de que
como mencionado acima no modelo proposto na figura 13, é apenas de um exemplo
que não exclui, mas sim torna imperativa a busca por melhores formas de captar as
reais condições dos aviadores prestes a realizar um voo.
45

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho teve como objetivo avaliar se a percepção subjetiva dos


operadores sobre um sistema permite propor modelos preditivos. Para se chegar a
este objetivo, desenvolveu-se uma pesquisa do tipo exploratória com uma
abordagem qualitativa. Foram utilizados como base para a análise autores como
James Reason (1990), Wiegmann e Shappell (2000), ScootA.Snook(2000), além de
documentos como o ICAO doc9859 (2013) e livros da autoria de professores da
Universidade do Sul de Santa Catarina.
Conduziu a uma revisão bibliográfica na qual ficou claro como o tema
relacionado à segurança operacional é abrangente, principalmente ao se estudar
asideias de Reason (1990), nas quais um erro engloba diversos fatores, passando
por algumas novas ideias como as de Scoot A Snook (2002)e complementando com
Wiegmann e Shappell (2000) que enriquecem a teoria de Reason ao propor um
modo de torná-la mais utilizável no mundo real em situações práticas, além do
doc9859 com as práticas recomendadas a âmbito internacional.
O Estudo da bibliografia da segurança operacional apresenta diversas
possibilidades de interpretação interdisciplinar, fato que o autor tentou realizar
parcialmente com alguma das ideias, e buscou uma forma de calcular o ponto de
ALARP, através da equação utilizada por Almeida (2004), além do uso de conceitos
econômicos como tentativa de dar uma nova visão sobre o tema aos possíveis
leitores, para motivar e instigar os mesmo a tentativas de entender a segurança
operacional sob diversas perspectivas.
Já na tentativa de propor o modelo e concatenar a ideias foi demonstrada
a relação direta entre a percepção dos operadores e as condições da organização
notadamente através das pré-condições – conforme evidenciado pelo modelo
HFACS de Wiegmann e Shappell (2000), sendo, portanto, a opinião dos operadores
importantes instrumentos para elaboração de métricas preditivas.
Retoma-se, o problema da pesquisa: os operadores de sistemas
percebem de forma subjetiva, em suas esferas de atuação, as condições de perigo
presentes na organização, de forma que a sua opinião reflita a situação
organizacional, tornando-se possível elaborar métricas preditivas?
46

A partir da análise dos dados, foi possível demonstrar que os operadores de


sistemas percebem de forma subjetiva, em suas esferas de atuação, as condições
de perigo presentes na organização, de forma que as suas opiniões refletem a
situação organizacional, tornando-se possível elaborar métricas preditivas a partir
dessas.
Entretanto, em relação às limitações desta pesquisa, a sugestão de
proposta elaborada precisaria ser testada com dados reais.
De modo que se tornam imperativas novas pesquisas, a fim de testar o
modelo, além de um estudo no campo da psicologia organizacional com foco na
atividade aérea para que possam ser desenvolvidos formulários mais eficazes que o
exemplo apresentado na figura 13, a fim de que a realidade da segurança
operacional seja descrita com a melhor aproximação possível.
47

REFERÊNCIAS

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componente crítico de uma gestão do risco aplicado aos recursos hídricos.
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