Você está na página 1de 11

Por Trás do Roteiro Audiovisual

Aula 1
Sobre o que é esta história?

Indicações:

- Story, Mckee (livro)


- Scriptnotes (podcast)
- Transparent (prime)
- Beleza Americana (netflix)

● Autoconhecimento:

- Para criar boas histórias e personagens, é preciso entender a Natureza humana. A


melhor maneira para isso é conhecer a própria natureza.
- Busque suas verdades, você tem que saber sobre o que quer falar.
- Exercício de Autoanálise:
- Pergunte-se:
Por que isso me faz rir?
Por que isso me faz chorar?
Por que essa história me prendeu?
- Mapear filmes que te tocam e analisar por que.
- Identificar se você gosta mais de ver um espelho ou uma projeção.
- Desenhar sua própria história: marcos da vida, grandes insights.

● O poder da identificação:

- As pessoas querem se ver nas telas:

ESPELHO:
“Isso sou eu!”
PROJEÇÃO:
“Isso é o que eu gostaria de ser.”

- VOCÊ tem que se identificar profundamente com o seu protagonista.


- Encontrar um denominador comum, uma característica marcante no seu
personagem que faz você se identificar com ele. Um denominador que exista entre
eu e o meu personagem, algo que eu consiga me relacionar com as minhas
vivências.
- Coming of age story: Ladybird, As Vantagens de ser Invisível. São histórias em
que há grande processo de crescimento dos personagens. Uma fase de
transição, como um adolescente virando adulto.
- As verdades humanas são a base de qualquer bom roteiro.

● Ideia Governante:

- Procurar passar uma mensagem: é o que responde à pergunta: “sobre o que é esta
história?”.
- A mensagem tem que ser verdadeira, focar na mensagem que te toca. A questão é
ser inovador no meio de passar a mensagem, mas ainda sim ser verdadeira.
Exemplo: Harry Potter. O mundo é completamente mágico, mas a verdade é que ele
só quer pertencer, fazer parte de alguma coisa. Ele quer encontrar seu caminho.
- Ser menos intelectual e mais visceral. Tirar a ideia do conceito e traduzir em ação.
- Conceito de nugget de Joan Schekel: qual é a verdade emocional da sua história? É
a bússola da trilha. Exemplo: O Mágico de Oz. Qual é a verdade emocional (nugget)
dessa história? “O Lar é onde o coração está”. A protagonista passa a história
procurando o caminho de volta pra casa, mas descobre que o lar é onde o coração
está.
- A ideia governante é a verdade emocional por trás da sua história.
- A ideia governante traz recorte, o foco da sua lente. Tomar cuidado para não ser
uma sucessão de fatos. O que define o recorte é a mensagem que eu quero passar.
Se você não sabe sobre o que é a sua história ainda, faça perguntas. Exponha as
dúvidas do seu personagem.

● Tese/Anti-tese:

Primeiro, se cria a tese. Depois, o seu personagem precisa começar a história acreditando
na anti-tese, para que, ao longo de sua jornada, ele se depare com a tese e por fim, ele
aprende a tese e a coloca em prática. É um caminho bem desenhado de jornada do
personagem.

Exemplo: Divertidamente

A tese desse filme é: “A tristeza é tão importante quanto a alegria.”

No começo do filme, a Joy acredita que a Tristeza não serve pra nada. As circunstâncias
desse filme fazem Joy perceber que na verdade ela precisa da Tristeza. Normalmente,
ocorre um momento de conflito, em que o personagem é posto diante de duas escolhas:
uma representando a tese, e a outra a anti-tese. Em Divertidamente, esse momento
acontece quando a Joy vai largar a Tristeza para trás, para que ela suba no tubo que leva
para o HQ. Ao perceber que a Tristeza também é essencial para Riley, Joy entrega as
lembranças para ela.
- Desenha a jornada do personagem e afirma o tema.
- Seu protagonista

● Todos os seus personagens devem ser de variações do mesmo tema:

- Alguns vão negar o tema, e outros vão reforçá-lo.


- Você não deve ter personagens com a mesma função dramática. Caso aconteça,
você pode ou excluir um personagem, ou unir um no outro.

Exemplo: Beleza Americana

Ideia governante: As aparências são inimigas do nosso “eu verdadeiro”.

- LESTER: cansado das aparências | busca seu eu verdadeiro.


- ESPOSA: idolatra aparências | desconectada de seu eu verdadeiro.
- FILHA: odeia aparências | faz as pazes com seu eu verdadeiro.
- VIZINHO: se esconde atrás das aparências | teme seu verdadeiro eu.
- FILHO DO VIZINHO: vê através das aparências | conectado com seu eu verdadeiro.
- AMIGA DA FILHA: refém das aparências | esconde seu eu verdadeiro.

Aula 2
Personagens

Indicações:

- NerdWriter (yt);
- Now You See It (yt);
- Lessons From The Screenplay (yt);
- Psicanálise no roteiro (pesquisar);
- Homodeus (Harari);

● Partindo da Ideia Governante - 5 pilares de sustentação para os personagens


dentro da estrutura narrativa:

1. Jornada
2. Motivações
3. Stakes
4. Misbehaviour
5. Aprendizado

1. Jornada:

- Todo personagem precisa de uma curva dramática: precisam chegar no fim da


história diferente de como começaram;
- A jornada vai trazer TRANSFORMAÇÃO do protagonista (ex: George Clooney, Up in
the Air);
- A transformação estará inteiramente ligada com a ideia governante;

2. Motivações:

- Desejo consciente: motivação externa, prática, racional. O personagem não


necessariamente sabe.

É algo material, ser vitorioso em alguma coisa, ganhar um amor. É uma desculpa para fazer
o que o personagem quer.

- Desejo inconsciente: motivação interna, emocional.


É algo psicológico, subjetivo. É onde sobressai a vontade humana, é o que move o
personagem. Ex: ser amado, pertencer, ser reconhecido.

- O desejo consciente e inconsciente devem estar alinhados.

3. Stakes:

O QUE ESTÁ EM JOGO?

- O que o meu personagem tem a perder caso não consiga atingir seu objetivo?
- Para personagens mais complexos, é importante colocar um antagonista dentro
dele mesmo.

4. Misbehaviour:

O CALCANHAR DE AQUILES

- Qual a característica do seu personagem que mais o atrapalha?


- Misbehaviour é o antagonista dentro do próprio personagem;
- Ajuda a mapear o personagem. Onde ele vai derrapar?

5. Aprendizado:
- O que o personagem precisa aprender para se transformar?
- Consagração da curva;
- O aprendizado reforça a jornada - ajuda a entender para onde seu personagem
precisa ir;
- Frequentemente é o oposto complementar do misbehaviour.

TEMA > JORNADA > MOTIVAÇÕES > STAKES > MISBEHAVIOUR > APRENDIZADO

● Backstory do personagem:

- Bons personagens são HUMANOS.


- Por onde começar?
- Nem sempre a backstory é presente nas narrativas, mas sua importância é
igualmente essencial.
- Não cair no erro de encher a obra de backstory;
- Evitar flashbacks - podem ser ótimos, mas podem ser muletas;
- É o presente que possui carga dramática.

DEFINIR A CRIANÇA DO PASSADO

- Todo mundo reproduz padrões da infância na vida adulta;


- O que aconteceu na infância do seu personagem para que ele seja assim hoje?
- As pessoas não têm problemas “de relacionamento”. Elas têm questões da infância mal
resolvidas.
- Crianças com pais ausentes tem questões de abandono no futuro;
- Crianças constantemente criticadas podem se tornar adultos com muito medo de
rejeição, ou que tenham muita dificuldade em tomar decisões.

● Contradições:

- Paradoxos e contradições dão vida e complexidade aos personagens;


- Contradição é inerente e inconsistência é um furo de roteiro;
- Você não pode trair o personagem ou deixá-lo inverossímil;
- As contradições tornam o personagem mais complexo.

● Escudos:

- Todo mundo tem uma máscara, o ser humano está sempre se protegendo de
alguma forma;
- Os escudos são mecanismos de defesa para esconder quem realmente somos;
- Ex: timidez, arrogância, agressividade, humor, generosidade, etc;
- São muito bons para o sub-texto. É quando o personagem fala algo com palavras
escolhidas, mas não é o que ele realmente quer dizer.
GÊNIO INDOMÁVEL

- Ideia governante: “A vulnerabilidade liberta”

Will acredita que ser vulnerável é uma fraqueza, é a anti-tese. Suas atitudes corroboram a
anti-tese. Primeiro frame do filme, Will está em seu apartamento, pequeno e de cortinas
abaixadas e janelas fechadas, representando seu estado de espírito no início do filme. No
final, ele está em um carro, numa estrada, num plano aberto.

Will:

Desejo consciente: evitar a cadeia


Desejo inconsciente: evitar dor emocional (necessidade: liberdade). É complexo, por um
lado ele age sempre para evitar se aprofundar, evitar crescer, ficar na zona de conforto.
Por outro, existe um segundo desejo inconsciente, mais oculto ainda. que é o de se
libertar.

O psicólogo serve como um personagem confrontador da realidade de Will.

Will não se pauta pelo que quer. Ele só EVITA coisas que ele considera ruins. Sean o
confronta e pergunta: “o que você quer?" - e ele não sabe responder.

Aprendizado: sair da zona de conforto/correr riscos


Misbehaviour: auto-sabotagem (que o deixa em sua zona de conforto)

Obs: a melhor forma de entender seu personagem é questioná-lo.

A infância de Will foi traumática, ele foi abandonado por quem mais deveria tê-lo amado.
Sua vulnerabilidade foi usada contra ele na infância. O filme é mais fácil de ser analisado
justamente porque o personagem faz terapia.

A cena em que Will pede ao amigo para ir na entrevista em seu lugar é a auto-sabotagem
em ação, conceito de “Don’t tell it, show it”. A cena do Sean explicando ao professor é uma
oposição a esse conceito, mas que é extremamente funcional.

Escudos de Wil: humor, evita contato visual, muda de assunto, usa sua inteligência para
intimidar, deboche.

Na cena da primeira consulta com Sean, ele analisa todos os detalhes do escritório do
psicólogo para escolher suas armas.

A cena do abraço que Will dá em Sean é o momento do clímax. O corpo de Will está rígido,
ele o empurra para longe, agressividade como escudo, além de usar outras coisas como
escudo. É catártico para o telespectador.

BREAKING BAD
Walter White:

Desejo consciente: prover dinheiro para a família.


Desejo inconsciente: poder/reconhecimento.

Para prover a família, ele vende drogas. Ao vender drogas, ele coloca a família dele em
risco. O desejo inconsciente é o que coloca sua família em risco. Inconsistente seria se ele
doasse todo o dinheiro para a caridade, que poderia ser caracterizada como uma
motivação incoerente a construção do personagem. O Walter é inteligente, mas fazer
besteiras é um fator consistente para o seu desejo inconsciente.

● Observações finais (conversa):

- Phoebe Waller-Bridge fala que comédia e drama andam juntos, pois quando o
telespectador está rindo, é seu momento mais vulnerável, então é nesse momento
em que entra a pancada do drama.

- A questão da quarta parede em Fleabag é porque a personagem quer,


desesperadamente, se conectar com alguém. As duas pessoas que a personagem
mais se identificava morreram, por isso ela fala muito com o público, como forma
de ganhar uma conexão. Na primeira temporada, a protagonista fala muito mais
com o público do que na segunda temporada, em que ela conhece o padre. Nos
momentos de diálogo entre eles, ela vai gradativamente interagindo menos com a
câmera, representando a conexão crescente entre os dois. No momento em que
essa conexão se solidifica, o padre também repara sua “fuga” da realidade. É o
momento também que a vulnerabilidade da Fleabag sai do interior da personagem.

Aula 3
Estrutura

● Divisão de tramas:

- Trama A, B, C…
- Exemplo: Divertidamente. A trama A é da Alegria com a Tristeza. A trama B é o que
acontece no HQ com as outras emoções. A trama C é o que acontece com a Riley.
São pensados de forma individual.
- É uma divisão por personagem.

● Organização em tabela do Excel:


- Funciona bem com séries, e para isso, identificar se a série é episódica - com
acontecimentos que se desfecham em um mesmo episódio, como Friends - ou se a
série é serializada - quando tem uma sucessão de acontecimentos e o desfecho é ao
final da temporada, como Breaking Bad, Dark…
- Acrescentar na tabela o tema e o gancho, para ter sempre uma boa visualização de
tudo que acontece em um plano aberto.
- No caso de séries, dividir por personagens e episódios, que assim é possível
visualizar o que acontece com cada personagem em um determinado episódio, e
também tem como visualizar a trajetória do personagem ao longo da temporada.
- No caso de filmes, dividir por personagens e os atos.
- É uma maneira mais simples de identificar furos e inconsistências nas tramas.

● Divisão de atos (modo clássico):

Primeiro Ato:

- Apresentação dos personagens;


- Status quo: universo em equilíbrio;
- Anti-tese;
- Incidente incitante: por que agora? Exemplo: Gênio Indomável. Will é preso.
Exemplo 2: Divertidamente. A Riley se muda.
- Universo muda;
- Conflito central estabelecido.

Segundo Ato:

- Início da jornada;
- Objetivo central (desejo consciente);
- Stakes. Exemplo: Divertidamente: com as ilhas se desmoronando, a Riley não vai
mais poder ser feliz;
- Ticking clock é o que dá uma moldura temporal. Exemplo: Divertidamente. As ilhas
de personalidade da Riley começam a desmoronar.
- Obstáculos;
- Escalada de conflitos;
- Aumento dos stakes;
- Flerte com a tese;
- Fundo do poço (lowpoint).

Terceiro Ato:

- Entendimento da tese;
- Início da resolução de problema;
- Clímax;
- Aplicação da tese na prática;
- Resolução de conflito;
- Novo equilíbrio.

Obs: se você tem um problema no terceiro ato, você tem um problema no primeiro. O
primeiro ato tem que te dar combustível para atravessar o segundo ato inteiro até chegar
no clímax.

● Escaleta: pré-roteiro; contém ações e não pensamentos ou sentimentos. Cenas


mais visuais, evitando a literatura. É para ser prático, com a descrição de cada cena,
na ordem certa. É como se na escaleta tivesse a sinopse de cada cena.

● Abrindo o roteiro:

- Entender o coração de cada personagem (responder a pergunta “sobre o que é essa


história?).

● Diálogo:

- O diálogo vem por último, depois que tudo isso já está claro:

história;

Personagens;

Motivações;

Funções dramáticas da cena.

- Definir seus personagens por ações, a partir da construção das características,


escudos e motivações.
- Cada um tem uma intenção em cada cena, e o diálogo vai expor isso de alguma
forma.

● Subtexto:
- Revela conflitos internos dos personagens, mas não de forma óbvia.
- O que o meu personagem deseja manter em segredo?
- Ter em mente que a primeira versão do diálogo é mais expositiva, é para trabalhar
em cima da exposição e daí, esconder as ações nas palavras. (Ex: uma briga por
quem vai dirigir um carro é símbolo de briga por poder)
- Os escudos ajudam na hora de montar o subtexto.

● Diálogos naturalistas:

- A fala oral é diferente da fala escrita.


- É preciso treinar os ouvidos: Como as pessoas falam na vida real?
- Pedir para as pessoas lerem seus diálogos em voz alta é um bom exercício para ver
onde engasgam, ou seja, não está natural.
- Estudar bons diálogos em português.
- Diálogos naturalistas são uma opção, mas é importante que siga a dinâmica de
pessoas conversando na vida real.
- É muito frequente falarmos sem ouvir. A gente espera a nossa vez de falar.
- Pessoas querem ouvir sua opinião saindo da boca dos outros - característica de nos
espelharmos nos outros.

Aula 4
Ferramentas

● Pesquisas:

- Parte inicial do processo, mas não é realidade no Brasil.


- Otimizar a pesquisa:

Escreva sobre o que você conhece;

A fim de retratar outra realidade, pesquise e estude para ter propriedade e


escrever a respeito.

A pesquisa destrava e oferece pontos de partida.

- Tipos de pesquisa: Google, entrevistas, observação, análise de referências…

● Referências:

- Referências dão repertório.


- Consumir de tudo para ampliar as referências. Fazer uma análise e tirar referências,
como beats, stakes, ações e diálogos.

● Inspiração:

- Pesquisa e referências são ótimas fontes de inspiração.


- O Twitter é uma boa fonte de humor.
- Pesquisar diretores, como Tarantino, que deixam suas referências bem claras em
seus filmes.
- Inspiração não é a mesma coisa que cópia.

● Simbologia:

- Símbolo: algo concreto que representa algo abstrato.


PARASITA

Todo mundo consegue assistir esse filme e ver algo visceral, mesmo sendo uma língua
incomum. O filme traz muitos símbolos, como a pedra, a ascensão quando a família Kim vai
até o novo trabalho, e o caminho de volta (e para baixo) que eles fazem mais para o final do
filme.

O tempo todo o conflito entre pobreza e riqueza é mostrado, um dos maiores conflitos já
retratados no cinema e na televisão.

Repetição de símbolos

Um símbolo pode aparecer apenas uma vez, ou ser um símbolo recorrente do longa na
obra. Por ser recorrente, precisa agir a favor do tema ou ideia governante.

É muito poderoso quando um símbolo é ressignificado ao longo da obra, como se o próprio


símbolo tivesse uma curva dramática.

No caso de Parasita, o filme tem símbolos específicos para aquela história.

● Símbolos universais:

Pássaro → liberdade;

Fogo → purificação;

Flor → delicadeza;

Borboleta → metamorfose;

Água → emoção.

- Enquanto roteirista, temos que ter repertório. Não adianta resolver tudo no
diálogo. Os diálogos servem para aquilo que tem que ser falado, não mostrado.
Para mostrar, use ações.

● Arquétipos:

- Mitologia, astrologia, tarot…


- Arquétipos bem construídos se perpetuam.
- Ajudam a criar personagens e a comparar símbolos.

Você também pode gostar