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Na era do consumidor:
uma visão do mercado lácteo brasileiro

Kennya Beatriz Siqueira


Editora técnica

Juiz de Fora, MG
2021

–1–
Supervisão editorial e revisão do texto
Kennya Beatriz Siqueira

Editoração impressa
Rodrigo Henriques

Normalização bibliográfica
Inês Maria Rodrigues (CRB-6/1689)

Capa
Rafael Dorneles

1ª edição
Online (2021)

Todos os direitos reservados.


A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou em parte,
constitui violação dos direitos autorais (Lei no 9.610).

Dados Internacionais de Catalogação na publicação (CIP)

Siqueira, Kennya Beatriz.

Na era do consumidor: uma visão do mercado lácteo brasileiro / Editor Técnico, Kennya
Beatriz Siqueira. – Juiz de Fora, MG : edição do autor, 2021.

220 p. il. color


ISBN 978-65-00-27898-9

1. Mercado lácteo. 2. Consumo. 3. Tendências. 4. Perfil do consumidor. 5. Demanda.


6. Laticínios. I. Título. Embrapa Gado de Leite.

CDD 338.1

Inês Maria Rodrigues CRB-6/1689 ©2021

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Autores

Alice Pereira Reis


Bacharela em Ciência e Tecnologia de Laticínios, Viçosa, MG

Amanda Fernandes Pilati


Nutricionista, mestra em Ciência e Tecnologia do Leite e Derivados,
Juiz de Fora, MG

Breno Canto Ferreira Ramalho


Engenheiro-agrônomo, Juiz de Fora, MG.

Cíntia Clara Viana


Engenheira-ambiental, mestranda em Ciência e Tecnologia do Leite e
Derivados, Juiz de Fora, MG

Davi Oliveira Chaves


Estudante de Estatística, Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de
Fora, MG

Denis Teixeira da Rocha


Zootecnista, mestre em Economia Aplicada, analista da Embrapa Gado
de Leite, Juiz de Fora, MG

Edson Brilhante Júnior


Mestrando em Ciência e Tecnologia do Leite, fiscal agropecuário do
Instituto Mineiro de Agropecuária, São João del Rei, MG

Emerson Augusto Priamo Moraes


Analista de Sistemas, doutor em Administração de Empresas, professor
do IF Sudeste MG, Juiz de Fora, MG

–3–
Emerson Wendelin Alves Moreira Campos
Estudante de Engenharia Mecatrônica, IF Sudeste MG, Juiz de Fora, MG

Fábio Homero Diniz


Engenheiro-agrônomo, doutor em Desenvolvimento Sustentável,
analista da Embrapa Gado de Leite, Juiz de Fora, MG

Flávia Queiroz Ferreira


Química, mestranda em Ciência e Tecnologia do Leite e Derivados,
Bom Jardim de Minas, MG

Glauco Rodrigues Carvalho


Economista, doutor em Economia Agrícola, pesquisador da Embrapa
Gado de Leite, Juiz de Fora, MG

João Pedro Junqueira Schettino


Estudante de Estatística pela Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz
de Fora, MG

José Maria David


Bacharel em Engenharia Elétrica, doutor em Engenharia de Sistemas e
Computação. professor do Departamento de Ciência da Computação,
Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, MG

Kennya Beatriz Siqueira


Engenheira de alimentos, doutora em Economia Aplicada, pesquisadora
da Embrapa Gado de Leite, Juiz de Fora, MG

Lorildo Aldo Stock


Engenheiro-agrônomo, Ph.D. em Economia Rural, analista da Embrapa
Gado de Leite, Juiz de Fora, MG.

–4–
Mairon Neves de Figueiredo
Engenheiro-agrônomo, mestre em Solos e Nutrição de Plantas,
pesquisador da Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG

Marden Sant’Ana de Faria


Bacharel em Agronegócio, Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG

Maria de Fátima Avila Pires


Médica Veterinária, doutora em Ciência Animal- Produção Animal,
pesquisadora da Embrapa Gado de Leite, Juiz de Fora, MG

Nedson Donato Soares


Engenheiro de Controle, mestrando Ciência da Computação na
Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, MG

Nívea Maria Vicentini


Engenheira Agrônoma, doutora em Agronomia, pesquisadora da
Embrapa Gado de Leite, Juiz de Fora, MG

Patrícia Blumer Zacarchenco


Engenheira de alimentos, mestre e doutora em Tecnologia de Alimentos,
pesquisadora científica do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital)
da APTA/SAA/GESP, Campinas, SP

Priscila Vanessa Zabala Capriles Goliatt,


Biomédica, doutora em Modelagem Computacional, professora da
Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, MG

Rafaela Oliveira Neto


Estudante de Engenharia de Alimentos, Universidade Federal de Viçosa,
Viçosa, MG

–5–
Regina Maria Maciel Braga Villela
Bacharel em Informática, doutora em Engenharia de Sistemas e
Computação, professora titular, Universidade Federal de Juiz de Fora,
Juiz de Fora, MG.

Silvia Carvalhaes de Albuquerque


Economista, pós graduação em Engenharia Econômica, analista da
Embrapa Gado de Leite, Juiz de Fora, MG

Thaliã Morais Junger Almeida


Estudante de Engenharia de Alimentos, Universidade Federal de Viçosa,
Viçosa, MG

Thallys da Silva Nogueira


Engenheiro Computacional, doutorando em Modelagem Computacional
Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, MG

Therys Senna de Castro Oliveira


Estudante de Engenharia de Alimentos, Universidade Federal de Viçosa,
Viçosa, MG

Vinicius Pimenta Delgado Ribeiro Nardy


Economista, analista de novos negócios na Agripoint, Juiz de Fora, MG

Ygor Martins Guimaraes


Estudante de Ciências Econômicas, Universidade Federal de Juiz de
Fora, Juiz de Fora, MG

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Apresentação

Não faz muito tempo que o consumidor é o centro das atenções. Henry
Ford criou toda a lógica de produção em alta escala para a indústria
automobilística e dizia que “o cliente pode escolher a cor do carro, desde
que seja preta.”

Aqui no Brasil frases como “o cliente tem sempre razão” são muito
mais retóricas de venda que propósitos das empresas. Além da
inspiração fordista, o modo artificial com que criamos a indústria no
Brasil explica este comportamento do nosso mercado. A indústria
no Brasil, desde o final dos anos quarenta até o Governo Collor, foi
baseada em protecionismo externo e baixa competição interna. A partir
daí evoluímos, mas ainda somos um país em que a oferta empurra a
demanda e não a demanda puxa a oferta.

Mas, o mundo mudou. Os consumidores cada vez têm muito mais


informações sobre os produtos e serviços que adquirem e têm mais
opções.

O consumidor deseja consumir mais do que o produto em si, suas


qualidades objetivas. Ele busca narrativa e identidade de propósitos no
que adquire. Ele quer conexão do produto com a sua visão de mundo.
Os valores subjetivos cada vez têm mais peso no momento da decisão.

Estamos na Era do Consumidor!

Este livro preenche uma lacuna até então existente no setor de leite e
derivados. É o primeiro que aborda, de modo amplo e profundo, um
personagem ainda pouco conhecido, mas que movimenta R$ 100 bilhões
ao ano com o que adquire. E é isso que encontraremos nas páginas a
seguir. Vamos entender quem é o consumidor de leite. Organizados em
cinco grupos temáticos, o livro analisa o consumo de leite e derivados

–7–
de modo estrutural e aprofunda ao detalhe, por se valer de informações
relevantes obtidas nas redes sociais.

O livro é uma coletânea de artigos originalmente publicados nos


melhores veículos de comunicação especializada brasileira, escritos
por 31 autores, e que contou com o apoio da Abraleite na realização de
pesquisa de mercado. É, portanto, resultante de uma parceria inusitada,
e reúne professores, pesquisadores e alunos em textos pequenos e leves,
mas sem perder o rigor científico.

Ao comemorar 45 anos de existência que completamos este ano a


Embrapa Gado de Leite já está nesta nova era. Na era do Consumidor.

Paulo do Carmo Martins


Chefe-geral Embrapa Gado de Leite

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Índice

Prefácio........................................................................................................ 13

SEÇÃO I
Um panorama do consumo de lácteos no Brasil
Reflexões sobre o nível de consumo de leite do brasileiro................ 17
Um retrato do consumo de lácteos no Brasil......................................20
A geografia brasileira do consumo domiciliar de leite...................... 23
A evolução do consumo domiciliar de leite e derivados
no Brasil sob a ótica do Novo Guia Alimentar Brasileiro................. 27
O desempenho dos produtos lácteos em 2018................................... 31
O mercado consumidor de lácteos brasileiro em 2019..................... 35

SEÇÃO II
Uma análise do consumo de derivados lácteos no Brasil
Comportamento do consumo de leite UHT em diferentes
classes sociais.......................................................................................... 41
Análise do consumo de leite UHT no Brasil...................................... 46
O consumo de queijos pelos brasileiros.............................................. 53
O mercado de queijos artesanais no Brasil......................................... 56
Evolução do consumo de queijos fundidos no Brasil........................ 61
Evolução do consumo de queijos finos no Brasil............................... 67
Consumo domiciliar de leite em pó integral nas
diferentes regiões do Brasil................................................................... 72
A popularização dos leites fermentados no Brasil............................. 76
O leite condensado brasileiro............................................................... 83
Novos horizontes e mercados da manteiga......................................... 89
O mercado de produtos imitadores de lácteos no Brasil.................. 95

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SEÇÃO III
Fatores que afetam o consumo de lácteos no Brasil
O impacto da renda no consumo de lácteos no Brasil................... 103
É cringe consumir lácteos?.................................................................. 108
A confiança do consumidor brasileiro de leite................................ 112
O poder das marcas............................................................................ 116
Webrooming para leite e derivados.................................................... 120
Alimentos Lácteos Funcionais............................................................ 123
O empoderamento do consumidor.................................................. 127
Valorização do bem-estar animal pelo mercado consumidor....... 134
O que podemos aprender com o mercado de café?........................ 129
Tendências para o mercado lácteo em 2021.................................... 137
Quanto os consumidores de lácteos estão pagando a
mais por saudabilidade?..................................................................... 140
Estudos mostram potencial dos lácteos no tratamento
de Artrite Reumatoide........................................................................ 144
Teor de sódio nos queijos brasileiros................................................ 148

SEÇÃO IV
O consumo de lácteos no Brasil durante a pandemia de Covid-19
Características do consumo de lácteos durante a pandemia......... 153
Efeitos da pandemia no mercado de lácteos em Minas Gerais..... 157
O efeito renda no consumo de lácteos no Brasil –
uma análise do período da pandemia.............................................. 163
O que aprendemos com o coronavírus?........................................... 167
A evolução do consumo domiciliar durante a pandemia.............. 170

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SEÇÃO V
Uma análise do consumo de lácteos no Brasil sob a ótica
das redes sociais
Análise dos sentimentos expressos na rede social
Twitter em relação ao queijo.............................................................. 177
Quais os tipos de queijos mais comentados no Twitter................. 182
Análise exploratória de leite e derivados mais
comentados no Twitter e Google Trends......................................... 187
Tendências de consumo de queijo coalho no Nordeste................. 192
Análise exploratória da imagem dos lácteos em
tempos de coronavírus....................................................................... 195
O que mudou no consumo de lácteos com a pandemia?
Uma visão das redes sociais............................................................... 203
O impacto da pandemia no consumo de lácteos no Brasil -
uma abordagem das redes sociais..................................................... 209
Covid-19 e o impacto no consumo de leite e derivados................. 214

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Prefácio

Durante muitos anos, a produção dominou o consumo de alimentos


no Brasil e no mundo. Por isso, é possível encontrar inúmeros estudos
analisando variáveis que afetam a produção de leite. No entanto, com o
maior acesso à informação devido às novas tecnologias, o consumidor
se empoderou e, com isso, entender o mercado consumidor e as
variáveis que o afetam se tornou fundamental para os agentes do setor
e stakeholders.

Assim, esta obra foi criada com a finalidade de abordar esta lacuna
nos estudos de comportamento do consumidor brasileiro de leite e
derivados, bem como nas tendências de consumo neste mercado. Ela
é composta de uma coletânea de textos publicados em revistas e sites
especializados no setor lácteo brasileiro (Milkpoint, Revista Indústria
de Laticínios, Revista Leite Integral, Revista Balde Branco) discorrendo
sobre questões relativas ao consumo de leite e derivados no Brasil entre
meados de 2019 e meados de 2021.

Os textos iniciais traçam um panorama do consumo de produtos lácteos


no Brasil, apresentando padrões, mudanças e evoluções. Na sequência,
são apresentados textos relacionados aos diversos derivados do leite,
apresentando características de consumo, bem como peculiaridades de
cada produto.

Os fatores que afetam o consumo e algumas variáveis de mercado são


analisados na terceira parte do livro, assim como as tendências de
consumo para o período considerado. Além disso, essa publicação traz
alguns avanços científicos e questões relativas à saúde e saudabilidade,
que impactam o consumo de lácteos no Brasil.

Na parte final do livro é abordado o cenário de consumo de leite e


derivados durante a pandemia de Covid-19 no Brasil, apresentando as

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mudanças de comportamento ocorridas neste período. Finalmente, são
apresentados resultados da ferramenta Observatório do Consumidor,
desenvolvida pela Embrapa em parceria com UFJF e IFSudeste para
monitorar o comportamento do consumidor e as tendências de consumo
de lácteos por meio de informações das redes sociais. Essa ferramenta
começou a ser usada no início da pandemia do novo coronavírus no
Brasil e permitiu acompanhar as mudanças de consumo de lácteos neste
período.

Com isso, o livro fornece além de uma visão panorâmica do consumo


de leite e derivados no Brasil, um aprofundamento dos diversos fatores
que afetam este este consumo, gerando insights relevantes para todos os
agentes dessa cadeia produtiva tão importante para o País.

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SEÇÃO I

Um panorama do consumo
de lácteos no Brasil

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Reflexões sobre o nível de consumo de
leite do brasileiro*

Kennya Beatriz Siqueira

A Embrapa Gado de Leite estima que, em 2018, o brasileiro con-


sumiu, em média, 166 equivalentes litros de leite no ano, o que corres-
ponde a 455 ml/dia. Nesta estimativa, todos os derivados lácteos foram
transformados para leite para se chegar a este número. Mas, este nível de
consumo é alto ou baixo?
Quando se fala de consumo de leite e derivados no Brasil, é co-
mum encontrar a afirmação de que o nível de consumo do brasileiro
é baixo ou que está aquém das recomendações de consumo. Mas quais
são essas recomendações?
Na verdade, não existe recomendação de consumo de leite e deri-
vados para o Brasil. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Food
and Agricultural Organization (FAO) não recomendam quantidades
específicas de alimentos por dia, com exceção de vegetais e frutas. Na
sua principal publicação sobre leite e derivados, o livro “Milk and dairy
products in human nutrition”, de 2013, a FAO afirma que, como os paí-
ses diferem em termos de disponibilidade de alimentos, socioeconomia,
hábitos alimentares e cultura, não é apropriado fornecer recomendações
globais para alimentos individuais, exceto onde haja evidência científica
suficiente para fazer tal recomendação (como é o caso das frutas e vege-
tais). Assim, a publicação apresenta uma compilação de recomendações
de consumo de leite e derivados para alguns países (Tabela 1).
O Brasil não aparece na tabela, mas pode-se observar grandes di-
ferenças nas recomendações de consumo nos diversos países elencados.
No seu Novo Guia Alimentar para a População Brasileira, lançado em
2014, o Ministério da Saúde não fornece recomendação de quantidades

*
Publicado em Milkpoint

– 17 –
a serem consumidas de alimentos. A única recomendação apresentada
é “Prefira sempre alimentos in natura ou minimamente processados e
preparações culinárias a alimentos ultraprocessados”.

Tabela 1. Recomendações de consumo de lácteos para países selecionados


Continente País Idade / grupo populacional Recomendações diária
4 - 11 anos 2 porções
12 - 18 anos 3 porções
Oceania Austrália 19 - 60 anos 2 porções
Mais de 60 anos 2 porções
Grávidas e Lactantes 2 porções
2 - 3 anos 2 xícaras
América do
USA 4 - 8 anos 2,5 xícaras
Norte
9 - 18 anos 3 xícaras
Áustria Recomendação Geral 3 porções
Finlândia Recomendação Geral 500 ml
Alemanha Recomendação Geral Consumir diariamente
Recomendação Geral 3 porções
Irlanda Adolescentes Pelo menos 5 porções
Europa
Grávidas e Lactantes Pelo menos 5 porções
Noruega Recomendação Geral 500 ml
Idosos 4 porções
Suíça
Recomendação Geral 3 porções
Reino Unido Recomendação Geral Consumir diariamente
Recomendação Geral 2 xícaras
Argentina Crianças, adolescentes, mulheres grávidas e 3 xícaras
lactantes
América do 2 - 5 anos 3 xícaras
Sul
10 - 18 anos 4 xícaras
Chile
19 - 59 anos 3 xícaras
Mais de 60 anos 3 xícaras
Ásia Japão Recomendação Geral 2 porções
7 - 13 anos 500 - 750 ml
14 - 25 anos 250 - 500 ml
África África do Sul
25 - 60 anos 250 ml
mais de 60 anos 250 ml

Obs: O tamanho das porções varia de um país para o outro. Em alguns países, uma
porção equivale a 200 ml de leite, em outros equivale a 250 ml.

– 18 –
Dentre os alimentos in natura ou minimamente processados es-
tão o leite pasteurizado, ultrapasteurizado ou em pó e iogurtes (sem
adição de açúcar). A manteiga é considerada preparação culinária. Já os
queijos são considerados alimentos processados e os sorvetes, iogurtes
e bebidas lácteas adoçados e aromatizados são tidos como alimentos
ultraprocessados.
Portanto, não se pode afirmar que o brasileiro não atende às re-
comendações de consumo de leite, já que o País não possui este tipo de
recomendação. Ademais, considerando que 1 xícara ou 1 porção de leite
é equivalente a 200 ml, o nível de consumo de leite de um adulto brasi-
leiro (455 ml/dia) está até superior ao de alguns países apresentados na
tabela, como por exemplo África do Sul, Argentina e Austrália.
Mas e se analisarmos apenas o consumo de leite fluido? Conside-
rando leite fluido como a soma de leite UHT e leite pasteurizado (sem
incluir o leite em pó reconstituído), a Pesquisa Industrial Anual (PIA)
do IBGE mostra que o brasileiro consumiu 73 ml de leite fluido/dia em
2017. No mesmo ano, o USDA informou que os americanos consumi-
ram 64 ml/dia. Portanto, os brasileiros têm nível de consumo de leite
fluido equivalente ao dos americanos e a ideia de que o nosso nível de
consumo é baixo está ultrapassada.

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Um retrato do consumo de lácteos no Brasil*

Kennya Beatriz Siqueira

A última Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE


apresenta um retrato do consumo de alimentos e bebidas no País em
2017-2018. Os dados mostram que os brasileiros consomem, em média,
32,2 kg de laticínios por ano. Os produtos mais consumidos são o leite
fluido, queijos e iogurte (Tabela 1). Dentre os queijos, a preferência na-
cional é pelo queijo mozzarella, seguido pelo queijo minas e requeijão.
Tabela 1. Aquisição alimentar domiciliar per capita anual (kg)

Fonte: IBGE.

*
Publicado em Revista Indústria de Laticínios

– 20 –
A Tabela 1 também permite observar diferenças regionais no con-
sumo. A região Sul se destaca como a maior consumidora de leite e deri-
vados, consumindo, em média, 48,271 kg/ano. Isso é quase 4 vezes mais
do que a média de consumo de lácteos da região Norte, que é a que me-
nos consome estes produtos. No entanto, a região Norte se destaca no
consumo de leite em pó integral, consumindo, 2 vezes mais que a média
brasileira e quase 6 vezes do que o Sul, região que menos consume esse
derivado do leite.
Já, para o leite em pó desnatado, o maior nível de consumo se en-
contra na região Nordeste, seguido pelo Norte e Sudeste. Este último, se
sobressai no consumo de queijo parmesão, queijo prato e outros queijos
(que engloba queijos finos e artesanais).
O leite fluido, chamado pelo IBGE de leite de vaca pasteurizado,
é mais consumido no Sul do País. Essa região também se sobressai por
um nível de consumo superior de queijo prato, creme de leite, leite con-
densado, queijo mozzarella, iogurte e leite fermentado, dentre outros
lácteos. Por fim, o Centro-Oeste é a região que mais consome manteiga
e queijo não especificado.
Além das diferenças regionais, os dados do IBGE discriminam
ainda diferenças significativas de consumo provocadas pela renda fa-
miliar. A Figura 1 mostra como o consumo de lácteos se comporta à
medida que a renda familiar varia. É possível notar incrementos signi-
ficativos na aquisição domiciliar a cada faixa de renda, de modo que no
nível de rendimento mais elevado (acima de R$ 14.310,00) consome-se,
em média, quase 3 vezes mais leite e derivados do que na menor faixa de
renda (até R$ 1908,00).

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TOTAL DE LÁCTEOS
56,212

45,614
38,284
Unidade (kg)

32,659
27,370
20,377

Até de R$1908,00 de R$2862,00 de R$5724,00 de R$9540,00 Mais de


R$1908,00 a R$2862,00 a R$5724,00 a R$9540,00 a R$14310,00 R$14310,00
Figura 1. Aquisição domiciliar per capita por faixa de renda no Brasil (kg).
Fonte: IBGE. Elaborado pelos autores.

Esse retrato da aquisição domiciliar de leite e derivados no País


nos permite identificar algumas variáveis que afetam o consumo de lác-
teos. É possível perceber que a renda é um fator determinante do consu-
mo no Brasil, mas não é o único. Assim, como há uma heterogeneidade
entre os produtores de leite do País, há também heterogeneidade entre
os consumidores. Numa população de mais de 212 milhões de pessoas,
de diferentes raças, crenças, origens, culturas e ideologias, está claro que
não existe um único mercado de leite e derivados no Brasil. Não existe
um único perfil de consumidor. Existem n diferentes perfis de consu-
midores que se agrupam no que hoje chamamos de tribos. Identificar o
produto certo para atender às necessidades de cada tribo é, atualmente,
o grande desafio da indústria de laticínios.

– 22 –
A geografia brasileira do consumo
domiciliar de leite*

Kennya Beatriz Siqueira


Ygor Martins Guimaraes
Thallys da Silva Nogueira

O consumo domiciliar de alimentos no Brasil é medido pela Pes-


quisa de Orçamentos Familiares (POF) do Instituto Brasileiro de Geo-
grafia e Estatística (IBGE). A última POF brasileira ocorreu em 2017-
2018 e os dados permitem observar como a dinâmica de consumo de
lácteos se alterou entre as regiões do País.
Primeiramente, é possível perceber que o consumo domiciliar de
lácteos no Brasil caiu 36% entre 2003-2004 e 2017-2018. Esta queda se
deu principalmente para leite fluido (26%), o lácteo mais consumido
do País. Contudo, alguns derivados vêm ganhando espaço na mesa dos
brasileiros, como o creme de leite, leite em pó, os queijos e o leite fer-
mentado.
Dentre as regiões brasileiras existe grande diferença de consumo
domiciliar de lácteos, como mostra a Figura 1. As regiões Sul e Sudeste
lideram o ranking de consumo registrado na última POF. Já as regiões
Norte, Centro-Oeste e Nordeste foram as que apresentaram as maiores
quedas de consumo em relação ao levantamento realizado em 2008-
2009. Essas quedas foram respectivamente de 50%, 45% e 31%.
Os dados da Figura 1 revelam uma maior concentração do consu-
mo de derivados do leite no Sul e no Sudeste do País, com destaque para
Santa Catarina e Rio Grande do Sul como os dois estados que mais con-
somem esses produtos. Outra informação importante é o descompasso
entre a Região Norte e o restante do País, a qual apresenta as menores
taxas de consumo domiciliar de lácteos.

*
Publicado em Milkpoint

– 23 –
Figura 1. Distribuição do consumo domiciliar de lácteos per capita no Brasil (2017-
2018).
Fonte: IBGE, 2020. Elaborado pelos autores.

A liderança do Sul e Sudeste no consumo de lácteos pode ser


explicada por vantagens competitivas, como a proximidade dos lo-
cais de produção, maior poder aquisitivo, maior taxa de urbaniza-
ção, entre outras. O eixo Sul-Sudeste concentra 67% da produção
nacional de leite, representa 72% do PIB brasileiro e tem 88,9% de
taxa de urbanização.
De certa forma, a geografia do consumo de lácteos no Brasil se
assemelha com a geografia da distribuição de renda no País. No entan-
to, características culturais e regionais também parecem influenciar
no consumo, visto que Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Minas Ge-
rais apresentam níveis de consumo de lácteos superiores aos do estado
de São Paulo, que concentra a maior renda do Brasil.
Os dados do IBGE evidenciam também diferenças regionais
de consumo por derivado lácteo. Na Tabela 1 é possível identificar
os 5 estados que apresentam maior consumo per capita por deriva-
do do leite.

– 24 –
Tabela 1. Ranking de consumo domiciliar per capita de lácteos no Brasil
Produtos/ranking 1o. 2 o. 3 o. 4 o. 5 o.
Total de lácteos SC RS MG SP PR
Creme de leite SC PR DF SP GO/RN
Leite condensado RS SC SP RJ PR
Leite de vaca pasteurizado SC RS SP MG PR
Queijos RJ SC PE SP RS
Iogurte RS SC SP MS PR
Leite fermentado SC PR SP RS RN
Manteiga GO AP BA AC SE
Leite em pó AM RR PI PA PE

As cores na tabela representam as regiões: em rosa tem-se o Norte, em azul, o Nordeste,


em amarelo o Centro-Oeste e em laranja o eixo Sul-Sudeste.
Fonte: IBGE. Elaborado pelos autores.

Novamente, os dados da Tabela 1 evidenciam a importância dos


estados do Sul, e principalmente de Santa Catarina no consumo domi-
ciliar per capita de lácteos. O estado aparece em sete dos nove produtos
analisados, estando na primeira colocação em quatro deles e na segunda
posição em três produtos.
Os estados do Sul e Sudeste representam 66% do ranking dos top
5 estados que mais consumem lácteos, ocupando a primeira colocação
em sete dos nove produtos listados na Tabela 1. Por sua vez, as regi-
ões Norte e Nordeste se destacam no consumo domiciliar per capita de
manteiga e leite em pó, o que evidencia que estes são os produtos lácteos
mais representativos nestas regiões.
Assim, os dados sugerem que não há um padrão único de
consumo domiciliar de lácteos no Brasil. Assim como ocorre com a
produção de leite, o consumo de lácteos também é influenciado por
muitas variáveis. Existe a influência da renda, dos preços, da cultura
e tradição, das características da população (sexo, idade, perfil), das
crenças, etc. Portanto, para aumentar o consumo de lácteos no Bra-

– 25 –
sil, cabe ao setor identificar estas variáveis e trabalhar em conjunto
para ofertar os seus produtos de modo a atender às necessidades des-
sa população tão heterogênea.

– 26 –
A evolução do consumo domiciliar de leite
e derivados no Brasil sob a ótica do
Novo Guia Alimentar Brasileiro*

Kennya Beatriz Siqueira


Ygor Martins Guimarães

O IBGE publicou recentemente os primeiros resultados da Pes-


quisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2017-2018. Esses resultados
são reveladores sobre o novo padrão de consumo dos brasileiros.
Assim como vem ocorrendo em muitos países ao redor do mundo, o
consumo domiciliar de lácteos caiu ao longo dos anos no Brasil. Na POF de
2002-2003, o brasileiro consumia 49,906 kg de leite e derivados. Em 2008-
2009, passou a consumir 43,707, ou seja, uma queda de 13% com relação
a 2002-2003. Já, na POF de 2017-2018, o nível de consumo domiciliar de
lácteos no País foi de 32,211 kg de leite e derivados, apresentando queda de
26% em relação à pesquisa de 2008-2009 e queda de 36% desde 2002-2003.
Outros produtos típicos da alimentação brasileira também apre-
sentaram redução de consumo desde a última pesquisa, como, por
exemplo o arroz (26%), o feijão (34%), e as farinhas de trigo (34%) e de
mandioca (56%). Esses dados revelam que o País está passando por um
processo de transição nutricional.
A transição nutricional consiste num conjunto de transformações
(sociais, econômicas e demográficas) que refletem em mudanças no per-
fil nutricional da população. Na atualidade, essas mudanças se caracte-
rizam principalmente pela redução do consumo de alimentos in natura
e o aumento do consumo de produtos processados ou ultraprocessados.
Um grande exemplo dessa transição nutricional são os Estados Unidos,
que viram seu consumo interno de leite fluido cair 40% desde 1975 e ser
substituído por seus derivados lácteos processados.

*
Publicado em Milkpoint

– 27 –
De acordo com o Novo Guia Alimentar para a População Brasilei-
ra, os lácteos in natura ou minimamente processados são leite pasteuri-
zado, leite UHT, leite em pó e iogurte (sem adição de açúcar). Dentre os
alimentos processados, tem-se os queijos. Já, os lácteos ultraprocessados
são sorvetes, iogurtes e bebidas lácteas adoçados e aromatizados, leite
condensado, leite fermentado e creme de leite. A manteiga é considera-
da ingrediente culinário. A Figura 1 apresenta a evolução do consumo
de lácteos segundo a classificação do guia alimentar.

60

44,4
45
37,4
kg per capita

30
25,6

15

3,9 4,8 5,0


1,8 0,32 1,9 0,27 1,9 0,32
0
2003 2009 2018
In natura Processados Ultraprocessados Ingrediente Culinário
Figura 1. Evolução do consumo de lácteos no Brasil, conforme a classificação do Novo
Guia Alimentar para a População Brasileira.
Fonte: (IBGE, 2020). Elaborado pelos autores.

Pela Figura 1, é possível observar que os produtos in natura (leite


UHT, pasteurizado e pó) foram os que tiveram maior queda de consu-
mo no período analisado, uma vez que representavam 75% do consumo
de lácteos na pesquisa de 2002-2003, 73% na pesquisa de 2008-2009 e
68% na última pesquisa.
Na categoria dos processados, os queijos, por sua vez, tiveram
um crescimento tímido na pesquisa de 2017-2018, de apenas 1%. Ain-

– 28 –
da muito presentes na alimentação brasileira, os queijos se mantiveram
praticamente no mesmo patamar de 2008-2009, representando 15% do
consumo domiciliar de lácteos no Brasil. No entanto, este é um segmen-
to em que o consumo fora do domicílio é muito significativo.
Pela Figura 1 também é possível perceber que os produtos ultra-
processados vêm ganhando cada vez mais espaço na alimentação domi-
ciliar do brasileiro. Um exemplo, é o leite condensado, que apresentou
um incremento de consumo de 30% em relação à pesquisa de 2008-
2009, respondendo por 2% do consumo de lácteos em 2017. O leite
condensado é o derivado do leite que mais se enquadra na categoria
de alimentos indulgentes, ou seja, aqueles que promovem prazer. Neste
sentido, é importante ressaltar que os brasileiros, assim como os povos
latinos, têm como característica marcante no consumo, a busca por ali-
mentos indulgentes, mesmo nos momentos de crise.
Outros produtos ultraprocessados que se destacaram foram o
leite fermentado e o creme de leite, que tiveram um aumento de con-
sumo de 28% e 22%, respectivamente, entre as POF’s de 2008-2009 e
2017-2018. O leite fermentado enquadra-se na categoria de alimentos
funcionais ou que promovem a saúde e o bem-estar e que está em
franco crescimento no País. Já o creme de leite é ingrediente muito
usado no setor de confeitaria, que também apresenta tendência de
crescimento nos últimos anos.
O iogurte, outro derivado do leite, apresentou queda no consumo
domiciliar, de 25% em relação à POF de 2008-2009. Após ser considera-
do um dos símbolos do ganho real de renda do brasileiro na implanta-
ção do plano real, a indústria do iogurte vem sofrendo com a crise eco-
nômica instaurada no Brasil nos últimos anos. Por ser um produto de
valor agregado maior, a tendência do consumidor é substituir o iogurte
em momentos de perda de poder aquisitivo.
Por último, na categoria de ingrediente culinário, o consumo do-
miciliar de manteiga cresceu cerca de 10% em relação à pesquisa de
2008-2009, muito em função dos avanços científicos apontando os seus

– 29 –
benefícios à saúde. Após estudos demonstrarem que a manteiga oferece
mais benefícios à saúde do que a margarina, a substituição desses pro-
dutos vem ocorrendo, o que provocou queda de consumo de margarina
de 27% no período.
Portanto, os dados de consumo de lácteos no Brasil mostram que
está havendo uma substituição parcial dos produtos in natura pelos
ultraprocessados, considerando a alimentação dentro do domicílio, o
que evidencia um processo de transição nutricional. Essa substituição
é muito influenciada pelos novos estilos de vida da população que en-
volvem a maior urbanização, mais mulheres no mercado de trabalho,
envelhecimento da população, entre outros fatores. Além disso, vale
ressaltar a habilidade da indústria de alimentos em atender às novas de-
mandas dos consumidores: praticidade, conveniência, saudabilidade e
funcionalidade, criando sempre produtos cada vez mais atrativos e que
oferecem inúmeros benefícios.

– 30 –
O desempenho dos produtos lácteos em 2018*

Kennya Beatriz Siqueira


Glauco Rodrigues Carvalho

Cautela é a palavra que define o comportamento do consumidor


brasileiro em 2018. Isso é o que diz o estudo Consumidores e Catego-
rias, desenvolvido pela Kantar, que avaliou o consumo de 70 categorias
de produtos, consideradas categorias de alto giro, comercializadas no
autosserviço brasileiro (inclusive derivados do leite). Para isso, foram
acompanhados semanalmente 11,3 mil domicílios em todo o Brasil.
Em 2018, em média, o brasileiro foi 83 vezes aos pontos de ven-
da, uma queda de 28% em relação ao ano anterior, mas aumentou
o seu tíquete médio (valor gasto em cada compra) de R$ 37,00 para
R$ 50,00. Com isso, o gasto médio anual manteve-se relativamente está-
vel: R$ 4.251,00 em 2017 e R$ 4.149,00 em 2018.
Os produtos lácteos analisados neste estudo foram: creme de leite,
leite condensado, iogurte funcional, iogurte grego, iogurte líquido, re-
queijão e leite longa vida. Na Tabela 1 são apresentadas algumas carac-
terísticas do consumo desses produtos.
Pode-se observar que o leite longa vida (UHT), o leite condensado e o
creme de leite são os derivados do leite que estão presentes em quase todos
os lares brasileiros, ou seja, todos eles têm mais de 89% de penetração. Já, os
iogurtes funcional e grego apresentam taxas mais baixas de penetração por
serem produtos lançados mais recentemente no mercado brasileiro.
Quando se analisa a classe econômica que mais comprou esses
itens em 2018, nota-se que o iogurte funcional, o iogurte grego e o re-
queijão são produtos mais consumidos pela população de renda mais
elevada (classe A/B), ao passo que todos os outros produtos tiveram na
classe C o seu maior volume de compras. Aliás, considerando-se todas

*
Publicado em Balde Branco

– 31 –
as 70 categorias analisadas no estudo, a classe C foi a responsável pelo
maior percentual de compras (49%).
Tabela 1. Características do consumo de derivados do leite em 2018
Tamanho Criança Gasto Frequência Tíquete
Penetração Classe da até 12 médio
Produto de compra médio (R$) /
(%) econômica família anos anual
(pessoas) (%) (R$) (vezes/ano) Compra

2017 2018 2017 2018


Creme de
89,7 C 3a4 48,8 42,30 7,4 7,4 5,50 5,70
leite
Leite 90,1 C 3a4 49,7 54,80 7 7,4 7,70 7,37
condensado
Iogurte
20,5 A/B 1a2 39,7 36,22 3,2 4,2 9,50 10,20
funcional
Iogurte 32 A/B 3a4 40,2 31,14 3,5 4,2 8,20 8,42
grego
Iogurte
75,8 C 3a4 60,1 46,08 6,1 7,46
líquido*

Requeijão 64,5 A/B 3a4 41,6 34,10 5,1 5,2 6,60 6,61

Leite UHT 91,6 C 3a4 54,2 250 19 17,8 13,30 14,09

*O iogurte líquido foi incluído na pesquisa apenas em 2018 e por isso não apresenta
dados para 2017.
Fonte: Abras. Elaborado pelos autores.

Já os dados referentes às famílias evidenciam que o iogurte fun-


cional é mais consumido em lares com menor número de pessoas (1 a 2
pessoas) e, geralmente, sem crianças. Todos os outros derivados do leite
são mais comprados por famílias com 3 a 4 pessoas, sendo que o iogurte
líquido e o leite UHT estão mais presentes em casas que têm crianças.
Quando se analisa o gasto médio com as categorias de lácteos,
o leite longa vida se destaca fortemente, com gasto médio anual de
R$ 250,00. Aliás, de todas as categorias de produtos analisados, o gas-
to médio anual com leite UHT perde apenas para fraldas descartáveis
(R$ 412,00) e cerveja (R$ 338,00), estando à frente inclusive de refrige-
rantes (R$ 186,50) e café torrado (R$ 183,50).
O brasileiro manteve estável a frequência de compras para creme
de leite e reduziu para leite longa vida. Ao contrário da maioria das 70

– 32 –
categorias analisadas no estudo, os demais produtos tiveram aumento na
frequência de compras entre 2017 e 2018. As maiores frequências de com-
pras ocorreram para leite longa vida, creme de leite e leite condensado.
O leite condensado foi o único produto com queda no tíquete mé-
dio (-4,3%) e o requeijão manteve o tíquete médio estável. Já os outros
produtos tiveram incrementos que variaram de 2,7% (iogurte grego) a
7,4% (iogurte funcional). Outra informação interessante que se pode
tirar da Tabela 1 é que os produtos lácteos que tiveram incremento tanto
na frequência de compra quanto no tíquete médio são produtos mais
consumidos pela classe A/B, ou seja, menos suscetíveis a crises econô-
micas. Além disso, as classes A/B foram as únicas que registraram cres-
cimento da massa de renda no início de 2019, com expansão de 7,2%
na classe A e 7,4% na classe B considerando os dados do 1º trimestre de
2019 em relação ao mesmo período do ano anterior, segundo dados do
IBGE. As classes C (0,2%) e D/E (-0,9%) continuam com restrição de
renda em função do fraco desempenho da economia e do elevado nível
de desemprego, mas são exatamente as classes com maior contingente
de famílias e que são de grande relevância nos produtos de consumo em
massa (Figura 1).
Classe A;
3,9%
Classe B;
14,7%

Classes
D/E;
55,7% Classe C;
25,7%

Figura 1. Variação da massa de renda do trabalho do 1º tri de 2019 x 1º tri de 2018.


Fonte: IBGE/Tendências consultoria/Valor econômico.

– 33 –
Os três últimos indicadores analisados (gasto médio anual, fre-
quência de compras e tíquete médio) mostram que, no geral, os lácteos
tiveram um bom desempenho, destacando-se mais do que outros pro-
dutos típicos da dieta brasileira. Apesar do cenário econômico intimi-
dador que provocou redução na frequência de compras da maioria dos
produtos pesquisados, os lácteos, especialmente aqueles que têm um
apelo para a saúde e bem-estar, ampliaram tanto a frequência de com-
pras quanto o tíquete médio, evidenciando que esta tendência da busca
por alimentos saudáveis, nutritivos e funcionais deve continuar.

– 34 –
O mercado consumidor de lácteos
brasileiro em 2019*

Breno Canto Ferreira Ramalho


Kennya Beatriz Siqueira

O ano de 2019 está caminhando para o fim e a instabilidade po-


lítica e econômica continua afetando o mercado. Esse cenário tem im-
pactado a performance das categorias de consumo massivo, na qual os
lácteos estão incluídos. Neste artigo vamos apresentar uma avaliação do
comportamento do consumidor brasileiro ao longo do ano, destacando
os produtos e canais que se sobressaíram, bem como os que perderam
espaço na cesta de compras da população. Para isso, serão apresentados
dados de diversos levantamentos da Kantar realizados ao longo do ano.
O último levantamento na cesta composta de 108 categorias ana-
lisada pela Kantar mostrou que o consumo retraiu 1,7% na maioria dos
países da América Latina, apesar do valor de vendas da categoria de
consumo massivo ter aumentado 6% e a frequência de compra ter au-
mentado 2% no segundo trimestre do ano comparado com o trimestre
anterior. E, a cesta mais afetada foi a de lácteos, com retração de 5% no
Equador, 3% no Brasil e 2% no México.
Nos últimos 12 meses terminados em maio, a frequência de com-
pras do brasileiro tinha caído 9%, o que representa a maior queda desde
2016. Neste período, a queda mais significativa no volume de unidades
compradas ocorreu nas classes AB (3,9%) e na região Sul (4,4%), con-
forme pode ser observado na Tabela 1.
É interessante notar que, no trimestre terminado em maio de 2019,
apenas o Norte/Nordeste e o Interior de São Paulo apresentaram cresci-
mento de consumo. No entanto, o levantamento do segundo trimestre
do ano, que vai até julho, mostrou resultados positivos na Grande São

*
Apresentado no XXV Workshop de Iniciação Científica da Embrapa Gado de Leite

– 35 –
Paulo (1,1%), interior de São Paulo (1,2%) e Leste e interior do Rio de
Janeiro (1,1%). Já, nas regiões Centro-Oeste e Grande Rio de Janeiro, os
índices de volume de compra caíram ainda mais.

Tabela 1. Variação de unidades compradas por região do País até maio/19 (em %).
Ano móvel (últimos 12 Janeiro a Maio
Trimestre
Região meses terminados em (comparação com o
(Mar/Abr/Maio)
maio) ano anterior)
N+NE 0,3 -1,1 2,6
Centro-Oeste -2,6 5,8 -6,4
Leste+Interior RJ 0,1 -0,4 -0,7
Grande RJ -3,5 -4,7 -5,4
Grande SP -2,5 -1,6 -0,6
Interior de SP -3,2 -3,2 1,4
Sul -4,4 -4,5 -4,4

Fonte: Kantar.

Em todos os levantamentos desse ano, dois derivados do leite


estão entre os que apresentaram melhor performance no consumo:
sorvete e leite fermentado. A justificativa para este resultado positivo
é que esses derivados do leite envolvem conveniência, praticidade
e indulgência, que são características valorizadas neste cenário de
incertezas.
O consumo de leite fermentado foi impulsionado por duas cate-
gorias de consumidores: os idosos (acima de 65 anos) e as donas de casa
de até 34 anos. Segundo a Kantar, o número de lares com idosos au-
mentou 1,2 milhão entre julho de 2017 e 2019, chegando a um total de
9,4 milhões de lares no Brasil. Desses, 64% têm entre 1 e 2 pessoas, 86%
não têm crianças de até 12 anos e têm renda média domiciliar mensal
9% maior do que o restante da população. Esse público foi o único que
apresentou desempenho positivo nas compras: aumento de 2,1% em
unidades, 0,6% em volume e 5,3% em valor desembolsado nos últimos
12 meses terminados em julho.
Além do leite fermentado, as donas de casa de até 34 anos impul-
sionaram o consumo de petit suisse e leite em pó. Neste ínterim, vale

– 36 –
ressaltar o papel das crianças no consumo. Elas são as principais respon-
sáveis pela maior penetração de iogurtes nos lares brasileiros (60% do
consumo é de indivíduos até 12 anos), já que 28,7% optam pelo produto
no café da manhã e 37,8% no lanche da tarde. O petit suisse é o preferi-
do pelo público até 6 anos. Os iogurtes, assim como as bebidas lácteas
também se destacaram nas lancheiras escolares nos 12 últimos meses
terminados em junho de 2019, sendo esta escolha associada à saudabi-
lidade em 41% dos casos.
Já o sorvete conquistou 4,2 pontos de penetração entre agosto de
2018 e o mesmo mês deste ano, o que corresponde a 2 milhões de novos
lares consumindo sorvete no País. Com isso, o consumo do produto
cresceu 12,9% em volume e 7% em valor. A Tabela 2 apresenta mais
informações sobre o consumo de sorvete no Brasil.

Tabela 2. Características do consumo de sorvete nos lares brasileiros em 2019.


Grupo
Variável Local Frequência do grupo
Predominante

No Lar 1,5 L
Formato
Fora do Lar Picolé 60%
Sabor No Lar Napolitano -
Tipo de família No Lar Com 3 pessoas 53%
Idade No Lar Mais de 50 anos 40%
No Lar ABC 87%
Classe social
Fora do Lar C -
No Lar Grande RJ 63,6% de penetração
Região
Fora do Lar SP -
Ocasião No Lar Jantar -
No Lar R$ 8,35 -
Ticket médio
Fora do Lar R$ 21,17 -

Fonte: Kantar.

Pela Tabela 2 observa-se que o consumo maior de sorvete nos la-


res brasileiros em 2019 ocorreu na Grande Rio de Janeiro, mas foi se-
guido de perto pela Grande São Paulo (cuja média de consumo é de 2

– 37 –
vezes por semana) e pela Região Sul. No entanto, é interessante notar
que o valor gasto com essa sobremesa fora de casa é bem superior ao do
consumo doméstico: R$ 21,17.
Já, o leite longa vida, presente em 91,5% dos lares brasileiros,
tem encontrado dificuldades de expansão. O que não aconteceu com al-
guns dos produtos concorrentes. O leite pasteurizado apresentou 10,3%
de aumento de volume vendido nos últimos 12 meses terminados em
março de 2019. Os produtos sem lactose também estão se fortalecendo
no mercado brasileiro. Só em 2018, 20% dos lares compraram pelo me-
nos uma vez este tipo de produto.
Diante do exposto, é possível notar que alguns derivados do leite
têm conseguido se manter e até apresentar crescimento mesmo neste
cenário econômico instável. A base deste crescimento está muito ligada
às tendências de saudabilidade, conveniência e indulgência (esta última,
é uma característica marcante do consumidor brasileiro), assim como o
direcionamento para públicos específicos.

– 38 –
SEÇÃO II

Uma análise do consumo de


derivados lácteos no Brasil

– 39 –
– 40 –
Comportamento do consumo de leite UHT
em diferentes classes sociais*

Breno Canto Ferreira Ramalho


Kennya Beatriz Siqueira

O Brasil possui cerca de 210 milhões de habitantes, divididos en-


tre as diferentes classes econômicas. De acordo com FGV (2019), a clas-
se econômica predominante no Brasil é a C (55,3%), seguida por D/E
(30,3%) e A/B (14,4%). É importante notar que essa divisão de classes
econômicas tem impacto no consumo.
Assim como acontece com todos os produtos de origem animal, o
consumo de leite e derivados sofre grande impacto da renda. No Brasil,
Hoffman (2010) mostrou que a demanda por lácteos é bastante sensível
às variações de renda do consumidor. Isso corrobora com estudos da
FAO (2013) realizados em vários países, evidenciando que os produtos
lácteos sofrem maior influência da renda do que outros produtos ali-
mentícios, como carnes e peixes, por exemplo.
No Brasil, com exceção dos anos de 2015 e 2016, em que o País
passou por um período de recessão econômica, a renda anual média
da população brasileira aumentou 10,57% no período de 2008 a 2017
(IBGE, 2020). Com isso, o consumo de lácteos cresceu 33% no mesmo
período (ABLV, 2017). Dentro do segmento de leite e derivados, o leite
longa vida é o produto mais consumido, principalmente pela classe C,
apresentando maior valor de vendas em 2017 (IBGE, 2020). O consumo
de leite UHT cresceu de 4,437 bilhões de litros em 2008 para 4,944 bi-
lhões de litros em 2017, o que representa aumento de 11,42%.
No entanto, pouco se sabe sobre o consumo de leite UHT por
classes econômicas no Brasil. Diante disso, o presente artigo visa in-
vestigar o comportamento de consumo do leite longa vida nas dife-

*
Apresentado no XXV Workshop de Iniciação Científica da Embrapa Gado de Leite

– 41 –
rentes classes sociais do Brasil, como forma de entender melhor esse
mercado.
Para isso, foram coletados dados do consumo de leite UHT por
classe de renda no período de 2010 a 2019. A fonte de dados foi o estudo
“Consumidores e Categorias”, elaborado pela Kantar Worldpanel para a
Abras. O estudo descreve a frequência de compra, gasto médio, tíquete
médio, classe social do consumidor e penetração do leite longa vida nos
lares brasileiros. Já os preços do leite longa vida, foram coletados do
Instituto de Economia Agrícola (IEA).
O leite longa vida é o produto lácteo mais consumido nos lares
brasileiros, registrando 91,6% de índice de penetração no último ano. Os
dados mostram que a classe econômica de maior representatividade na
categoria leite ultrapasteurizado no Brasil é a classe C. Em 2019, essa clas-
se respondeu sozinha por 52% das vendas de leite longa vida, seguida pela
classe A/B com 33% e, por último, a classe DE, com 16% (Figura 1).

60

50

40

(%) 30

20

10

0
2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019
Classe Econômica A/B Classe Econômica C Classe Econômica D/E

Figura 1. Representatividade de cada classe social (A/B, C, D/E) no total de vendas da


categoria leite longa vida no período de 2010 a 2019.
Fonte: Abras. Elaborado pelos autores.

– 42 –
A classe C representou, em 2010, a maior parcela da população
brasileira, composta na época por 94,5 milhões de pessoas (50,5% da
população) e manteve o posto com 115,3 milhões de pessoas em 2018,
ou 55,3% da população (Valor Econômico, 2019). Durante todo o pe-
ríodo analisado, a classe C manteve-se na liderança na aquisição de
leite longa vida. No entanto, a sua representatividade nesse consumo
aumentou consideravelmente, passando de 40,8% em 2010 para 52%
em 2019.
A classe econômica A/B é caracterizada por certa estabilidade
em relação a sua representatividade nas vendas de leite longa vida com
o decorrer dos anos. Já a classe D/E apresentou redução de 21,8 pon-
tos percentuais (pp) no período analisado. É importante destacar que
a maior redução da representatividade dessa classe ocorreu em 2011,
caindo 11,8 pontos percentuais. A partir daí, a classe D/E deixou de ser
a vice-líder nas compras de leite UHT.
Com relação ao tíquete médio, em todas as classes houve aumen-
to no valor gasto por ocasião de compra do leite. O tíquete médio prati-
camente dobrou entre o período de 2010 a 2019, saindo de R$ 7,67 para
R$ 14,09, representando aumento de 83,70%. As classes sociais A/B,
C e D/E aumentaram as despesas em 70,97%, 81,90% e 90,89%, nessa
ordem.
Já o preço do leite longa vida no varejo cresceu em 52,83%, de
R$ 2,12 para R$ 3,24 por litro no mesmo período. Além disso, a frequ-
ência de compras diminuiu para todas as classes no período considera-
do. Com isso, pode-se inferir que a quantidade de leite adquirido por
ocasião de compra, por família, diminuiu mais expressivamente para a
classe A/B, que consumia 100,77 litros/família/ano e passou para 92,02
(Figura 2), reduzindo o consumo em 8,75 litros/família/ano. A classe
D/E e C, apresentaram decréscimo de 1,44 e 0,43 litros/família/ano, res-
pectivamente, ao longo do período analisado.

– 43 –
Tabela 1. Evolução do consumo de leite longa vida por classe econômica.
A/B C D/E
2010 2019 2010 2019 2010 2019
Tíquete (R$) 9,13 15,61 7,68 13,97 6,26 11,95
Frequência 23,4 19,1 21,9 18,3 19,1 14,9
(vezes/ano)
Preço/litro (R$) 2,12 3,24 2,12 3,24 2,12 3,24
Consumo 100,77 92,02 79,33 78,90 56,39 54,95
Total/família/ano (L)
Fonte: Abras. Elaborado pelos autores.

Pode-se concluir que o comportamento de compra do leite UHT


diverge entre as classes econômicas, sendo a classe C a que menos re-
duziu o consumo do produto e ao mesmo tempo responde sozinha por
mais de 50% das vendas. Isso comprova que se trata de produto muito
popular e conveniente para a massa.
A quantidade de leite UHT adquirida por ocasião de compra au-
mentou em todas as classes sociais, se relacionarmos apenas os tíquetes
e o preço do leite, mas quando a frequência é inserida na análise, obser-
va-se redução do consumo das famílias de todas as classes. Portanto, o
tíquete médio, provavelmente só aumentou em razão do maior preço do
produto e da inflação e não pelo fato dos consumidores estarem adqui-
rindo maiores quantidades de leite longa vida.

– 44 –
Referências Bibliográficas
ABLV – Associação Brasileira da Indústria de Leite Longa Vida.
Relatório Anual 2017. São Paulo, [2018]. 30 p.

CLASSES A e B voltam a crescer e atingem 14,4% da população.


Valor Econômico, 2019. Disponível em: <https://valor.globo.com/
brasil/ noticia/2019/10/29/classes-a-e-b-voltam-a-crescer-e-atingem-
144-da populacao.ghtml>. Acesso em: 10 fev. 2020.

FAO – Food and Agriculture Organization of the United Nations.


Milk and dairy products in human nutrition. Rome, 2013.
Disponível em: <www.fao.org/docrep/018/i3396e/i3396e.pdf>. Acesso
em: 20 fev. 2020.

HOFFMAN, R. Estimativas das elasticidades renda de várias categorias


de despesa e de consumo, especialmente alimentos, no Brasil, com
base na POF de 2008-2009. Revista de Economia Agrícola, São Paulo,
v. 57, n. 2, p. 49-62, jul./dez. 2010.

IBGE. - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese


de indicadores sociais. Uma análise das condições de vida da
população brasileira 2016. Brasília, DF, 2020. Disponível em: <www.
ibge.gov.br>. Acesso em: 10 fev. 2020.

– 45 –
Análise do consumo de leite UHT no Brasil

Glauco Rodrigues Carvalho


Vinicius Pimenta Delgado Ribeiro Nardy
Denis Teixeira da Rocha
Kennya Beatriz Siqueira

O leite ultrapasteurizado (UHT) foi lançado no Brasil em 1972, mas


suas vendas decolaram apenas na década de 90, se tornando atualmente
o derivado lácteo mais consumido no País. No entanto, o dinamismo no
consumo desse produto perdeu força nos últimos anos. Por isso, o obje-
tivo deste artigo é analisar a evolução das vendas de leite UHT no Brasil,
fazendo um paralelo com o mercado de queijos, que tem se mostrado
bem competitivo. Os dados utilizados são da Pesquisa Industrial Anual,
do IBGE, e considera o volume e o valor das vendas da indústria.
Entre 2005 e 2016, a disponibilidade interna de leite no Brasil,
calculada pela produção inspecionada mais as importações desconta-
das as exportações, aumentou 54,1%, saltando de 16,082 bilhões para
24,782 bilhões de litros. Nesse mesmo período, o valor total das vendas
do setor, corrigido pelo IPCA, passou de R$ 24,72 bilhões para R$ 43,62
bilhões, alta de 76,5%.
Neste cenário, as vendas per capita de leite UHT tiveram um cres-
cimento modesto, passando de 20,16 litros por habitante em 2005 para
22,39 litros em 2016. Já os queijos, grupo que, em conjunto, represen-
ta o segundo derivado lácteo mais consumido no Brasil, apresentaram
maior dinamismo, com vendas passando de 1,71 quilogramas por ha-
bitante em 2005 para 3,75 quilogramas em 2016. Em termos de valor
real de vendas, o leite UHT cresceu 26,94% entre 2005 e 2016, atingindo
R$ 10,35 bilhões. Já nos queijos a expansão foi de 227,07%, para
R$ 10,37 bilhões. Com isso, enquanto o leite UHT teve sua participação

*
Publicado em Balde Branco

– 46 –
no faturamento total do setor reduzida de 33% para 23,74% no perío-
do analisado, os queijos saltaram de 12,9% para 23,8%. Em volume de
vendas, o leite ultrapasteurizado registrou crescimento de 24% no perí-
odo analisado, chegando a 4,8 bilhões de litros vendidas em 2016. Já os
queijos tiveram um crescimento de 124% no volume total vendido no
mesmo período, atingindo a marca de 785 mil toneladas em 2016.
Algumas variáveis de mercado foram determinantes para a dife-
rença de comportamento nas vendas de leite UHT e queijos ao longo
do período analisado. Apesar do fraco desempenho econômico do País
após 2012, a renda real média efetiva do trabalho, medida pela Pesqui-
sa Mensal do Emprego do IBGE, teve crescimento de 22,6% de 2005 a
2016. Além disso, houve um aumento de cerca de 14% no número de
famílias com rendimentos entre 3 e 5 salários mínimos mensais e de
9% daquelas com rendimentos maiores que 5 salários mínimos. É im-
portante salientar que a elasticidade consumo-renda, definida como a
variação na quantidade consumida proporcionada por um incremento
de renda, é alta para os queijos, especialmente para a população de baixa
renda. Isso porque, nesta parcela da população, os incrementos de renda
aumentam o consumo daqueles que já compram o produto, mas tam-
bém fazem com que aqueles que não tinham o queijo como alimento
comum na dieta passem a ter. A Figura 1 ilustra o comportamento das
vendas per capita de leite UHT, queijos e a evolução da renda no Bra-
sil. Pode-se observar que, ao longo do período analisado, as vendas de
leite longa vida tiveram crescimento inferior ao da renda, enquanto os
queijos registraram desempenho bem superior. Há de se destacar que,
mesmo no período de crise enfrentado pelo País a partir de 2014, o mo-
vimento do consumo de queijos permaneceu ascendente, evidenciando
que outros fatores têm afetado este mercado.

– 47 –
220,00 Leite UHT

Queijos
200,00
Renda Real Média Efetiva do Trabalho
180,00

160,00

140,00

120,00

100,00

80,00
2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
Figura 1. Evolução do volume de vendas per capita de leite longa vida e queijos e da
renda real média do trabalhador (Índice base 2005 = 100).
Fonte: IBGE: Elaboração dos autores.

Além da renda, os preços também exercem grande influência no


consumo de derivados do leite. No caso do leite UHT, em função da
baixa diferenciação do produto há uma enorme competição via preços
entre as empresas, o que acaba reduzindo as margens de comercializa-
ção dos laticínios. O valor médio por unidade vendida de leite UHT, que
era de R$ 2,19/litro em 2005, atingiu R$ 2,24 em 2016, crescimento de
apenas 2,72% no período. Nos queijos, por sua vez, o valor médio subiu
de R$ 10,00/quilo em 2005 para R$ 13,15/quilo em 2016, aumento de
32,88%. No entanto, é importante lembrar que o valor médio dos quei-
jos envolve produtos muito diferenciados (Figura 2).

– 48 –
140,00
132,88
130,00

120,00

110,00
100,00 102,72
100,00

90,00

80,00
2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Leite UHT Queijos


Figura 2. Evolução do preço médio de vendas do leite UHT e queijos (Índice base
2005 = 100)
Fonte: IBGE: Elaboração dos autores.

Tendências

Pela avaliação histórica dos dados pode-se observar que as vari-


áveis de mercado têm sido mais favoráveis ao aumento do consumo de
queijos do que de leite longa vida. No mercado de queijos, apesar do
grande salto de consumo observado nos últimos anos, ainda há espaço
para ampliação, sobretudo com investimentos em qualidade, mix de
produtos, mudanças hábitos de consumo e dinâmica macroeconômi-
ca do Brasil, com perspectivas de melhoria e distribuição de renda.
Quando se analisa os locais com maior consumo per capita de quei-
jos do mundo, observa-se a predominância de países de renda mais
elevada (Tabela 1). Interessante notar que o patamar brasileiro está
bem abaixo dos demais países, mesmo comparando com os vizinhos
Uruguai e Argentina. Isso indica o enorme potencial de crescimento
desse mercado.

– 49 –
Tabela 1. Ranking dos países com maior consumo per capita de queijos no mundo em
2016.
Países Consumo per capita (kg/hab)
Dinamarca 28,1
Islândia 27,7
Finlândia 27,3
França 27,2
Chipre 26,7
Alemanha 24,7
Suíça 22,2
Holanda 21,6
Itália 21,5
Áustria 21,1
União Européia 18,6
Argentina 11,6
Uruguai 8,7
Brasil 3,8
Fonte: The International Dairy Federation (IDF).

Já para o leite UHT, o cenário é mais complicado. Mesmo que


haja aumento na renda da população brasileira, a elevação no consumo
de leite longa vida deverá ser tímida, sobretudo nos segmentos menos
diferenciados, fato que tem sido observado também em outros países.
Nos Estados Unidos, o consumo de leite fluido veio recuando ao longo
das últimas décadas e as novas gerações consomem menos leite fluido
quando comparadas às anteriores. Enquanto os nascidos na década de
1970 consumiam 227 ml por dia, aqueles que nasceram no decênio de
2010 consumiam 140 ml diários, uma redução de quase 39%. A Figura
3 ilustra este movimento.

– 50 –
250
227

196
200 184

160
150 140
ml/dia

100

50

0
1970 1980 1990 2000 2010
Figura 3. Consumo diário de leite fluido por geração nos Estados Unidos - em
mililitros (2013).
Fonte: USDA (2013).

No Brasil, as diferentes gerações da população também apresen-


tam diferentes hábitos de consumo de laticínios. No caso do leite UHT,
o maior consumo está entre idosos e crianças. No entanto, há espaço
para crescimento de vendas de outras variantes do leite UHT no País.
Pesquisa realizada pelo Datafolha em 2017 mostrou que a intolerância à
lactose atinge 35% dos brasileiros acima de 16 anos (cerca de 53 milhões
de pessoas). Dessa forma, a atuação em nichos de mercado como o do
leite sem lactose é uma oportunidade. Este produto está presente em
somente 11% dos lares brasileiros e representa apenas 1,4% do total do
leite UHT vendido. O leite A2A2, indicado para aqueles que apresentam
alergia à proteína caseína, também tem sido bem aceito pelo público
jovem e deve ganhar espaço nas gôndolas dos supermercados nos próxi-
mos anos. Para atender ao público idoso e, principalmente às crianças, a
oferta de leites enriquecidos ou fortificados com vitaminas e minerais é
uma opção para incremento de margens de comercialização, já que tais
produtos, em geral, possuem um ágio nos preços de venda.

– 51 –
Outra possibilidade de diferenciação é por meio das embalagens.
Embalagens que se utilizam de materiais com apelos mais sustentá-
veis têm ganhado a preferência dos consumidores modernos na hora
da compra, já que os consumidores conscientes estão dispostos a pagar
mais. Neste mesmo quesito, entra também a praticidade e conveniência
do consumo. Por isso, mercados internacionais já investem em leites em
embalagens menores (de 180 a 240 ml), muito práticas para as crianças
levarem à escola.
Uma tendência que vem se consolidando entre os consumidores
é a informação mais detalhada sobre a origem do produto. Os consumi-
dores querem saber de onde vem o leite que estão consumindo e como
ele é produzido. Por isso, contar a história por trás do produto e mostrar
preocupações com bem-estar animal e meio ambiente podem também
ser um diferencial no mercado de leite UHT, assim como também, apre-
sentar um rótulo “limpo”, com menos ingredientes adicionados ou arti-
ficiais. Uma pesquisa sobre o tema no mercado americano mostrou que
69% dos consumidores acreditam que é importante ou extremamente
importante que os fabricantes forneçam informações detalhadas sobre
os alimentos, 83% querem mais informações sobre os produtos con-
sumidos e 80% são mais propensos a ser leais a uma marca que é mais
transparente.
Portanto, pode-se observar que existe oportunidade de amplia-
ção do mercado de leite UHT no Brasil, tanto em função da melhoria
de renda da população, mas principalmente por meio de inovações nos
produtos para atender a um consumidor cada vez mais exigente, infor-
mado e excêntrico.

– 52 –
O consumo de queijos pelos brasileiros*

Kennya Beatriz Siqueira


João Pedro Junqueira Schettino

O queijo é um dos derivados lácteos mais consumidos no mun-


do. De acordo com a FIL/IDF (2020), os laticínios mais consumidos no
mundo são os lácteos frescos, que inclui leite fluido e iogurte, que res-
pondem por 17% do consumo mundial de lácteos. Em seguida, tem-se
manteiga, com 15% do consumo e queijos com 14%.
No Brasil, os queijos também são muito apreciados. Conforme a
Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE, eles perdem ape-
nas para o leite fluido, representando quase 10% dos lácteos consumi-
dos no País.
Dentre os queijos mais citados pelos brasileiros na pesquisa do
IBGE estão, nesta ordem: queijo mozzarella, queijo minas, requeijão e
queijo prato. No entanto, é interessante notar que questões regionais pro-
vocam diferenças no consumo dos diferentes tipos de queijos (Tabela 1).

Tabela 1. Percentual de consumo per capita por região brasileira comparado com a
média nacional.
Produto NO NE SE SU CO
Total de 29% 71% 128% 119% 94%
Queijo minas 16% 119% 131% 20% 102%
Queijo mozzarella 37% 52% 130% 133% 114%
Queijo não especificado 76% 96% 93% 120% 141%
Queijo parmezão 20% 47% 162% 82% 62%
Queijo prato 37% 44% 94% 303% 26%
Outros queijos 9% 61% 142% 115% 80%
Requeijão 20% 57% 141% 116% 83%
Fonte: IBGE. Elaborado pelos autores.

*
Publicado em Milkpoint

– 53 –
Em relação ao total de queijos, a região brasileira que mais con-
some é a Sudeste, com um nível de aquisição do produto 28% acima da
média do País. Logo em seguida, vem a região Sul. Por outro lado, a re-
gião que possui um nível de consumo mais discrepante de todos e, com
isso puxa a média nacional para baixo, é a região Norte. O consumo per
capita do Norte equivale a menos de 1/3 da média nacional.
O Sudeste se destaca com o maior consumo por habitante de qua-
se todos os queijos citados na pesquisa, com exceção de queijo moz-
zarella, queijo prato e queijo não especificado. Para o queijo prato, os
maiores consumidores estão localizados no Sul do País, com média de
consumo 3 vezes maior do que a média nacional.
No entanto, os habitantes do Sul do Brasil não são grandes apre-
ciadores do queijo minas, assim como no Norte. As maiores médias de
consumo para o queijo minas estão no Sudeste, Nordeste e Centro-O-
este, nesta ordem.
O Centro-Oeste tem consumo per capita superior ao nacional
para queijo minas, queijo mozzarella e queijo não-especificado. No en-
tanto, a sua média de consumo de queijo prato é a menor do País. A
Figura 1 ilustra melhor essas preferências de consumo de queijo por
região do Brasil.

Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste


Queijo minas Queijo mozzarella Queijo não especificado
Queijo parmezão Queijo prato Outros queijos
Requeijão
Figura 1. Consumo per capita de queijos por região brasileira.
Fonte: IBGE. Elaborado pelos autores.

– 54 –
É possível perceber que não existe um tipo de queijo que seja pre-
ferência brasileira, isto é, que seja o mais consumido em todas as regi-
ões. Além disso, nota-se um nível de consumo de queijos bem inferior
na região Norte.
Dentre os estados, em termos de consumo per capita, os maiores
consumidores de queijos são, nesta ordem: Rio de Janeiro, Pernambuco,
São Paulo, Distrito Federal, Minas Gerais, Rio Grande do Norte, Goiás,
Paraíba e Mato Grosso. Ao contrário do esperado, o estado que mais
consome queijo minas, não é Minas Gerais, e sim, Pernambuco. Minas
Gerais é o 6º. no ranking.
No caso do queijo mozzarella, os maiores consumidores estão nos
estados de São Paulo, Mato Grosso e Distrito Federal. Os paulistas tam-
bém são os principais compradores de queijo parmesão, seguidos por
moradores do Rio de Janeiro e Distrito Federal.
O estado do Rio de Janeiro também está na liderança do consumo
per capita de queijo prato. Na segunda colocação, está a Bahia, seguida
de perto por São Paulo e Pernambuco. Por fim, no consumo de requei-
jão se destacam as três unidades da federação da região Sudeste, nesta
ordem: Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais.
Em resumo, os dados evidenciam algum efeito da renda e de pre-
ferências regionais no consumo de queijo no Brasil. No entanto, não é
possível identificar uma característica regional específica que determine
este consumo. Assim como apresentado no Novo Guia Alimentar para
a População Brasileira, do Ministério da Saúde, a população brasilei-
ra possui características alimentares que são muito peculiares de cada
região. Neste âmbito, os queijos levam vantagem em comparação com
outros lácteos, devido a sua diversidade. O fato de haver uma variedade
grande de queijos, com texturas, sabores, odores e características orga-
nolépticas distintas, permite ao brasileiro diversificar no consumo e as-
sim buscar o tipo de queijo que se adapte melhor não só ao seu paladar,
mas também aos seus hábitos de consumo.

– 55 –
O mercado de queijos artesanais no Brasil*

Marden Sant’Ana de Faria


Kennya Beatriz Siqueira
Fábio Homero Diniz

Na última década, a produção de queijos vem se destacando como


alternativa estratégica para a indústria de laticínios brasileira. De acordo
com a ABLV, em 2018 foram destinados 8,310 bilhões de litros de leite
para produção de queijos no Brasil, o que representa incremento de 46%
em relação a 2009 e crescimento percentual superior ao do leite UHT
(31%), considerado um produto chave para o setor.
Dados da Pesquisa Industrial Anual (PIA) do IBGE (2019), mostram
que a produção brasileira de queijos cresceu 165% de 2005 a 2016. Com
isso, os queijos mais consumidos no Brasil são: os queijos frescos (muçarela,
ricota, etc.) com 51% do mercado, seguido do grupo de queijos de massa
dura ou semidura (15%), que inclui queijos do tipo provolone, prato, par-
mesão, etc (Figura 1) e os queijos do tipo Minas (frescal ou padrão), cuja a
demanda crescente, atingiu 12% do mercado total (IBGE, 2019).

Queijos frescos: mussarela, ricota, etc.

Queijos de massa semidura ou dura (prato,


provolone, parmesão, gouda, gruyere, etc.)
Queijo Minas (frescal e padrão)

Queijo tipo Petit-Suisse

Queijos fundidos

Queijos ralados ou em pó

Queijos de massa macia (tipo "camembert", "brie",


etc.)
Coalhadas

Queijos de outros tipos (cobocó, montanhês, etc.)

Queijos de pasta azul (tipo gorgonzola, "roquefort"

Figura 1. Participação por tipo de queijo no valor total das vendas – 2016
Fonte: IBGE (2019).

*
Publicado em Revista Indústria de Laticínios

– 56 –
Pela Figura 1, pode-se observar que os queijos Minas frescal e pa-
drão são preferências nacionais. Apesar disso, os produtores de leite têm
como alternativa a fabricação de queijos artesanais, cujo consumo tam-
bém tem crescido. A produção artesanal agrícola no Estado de Minas
Gerais caracteriza-se por sua simplicidade e localização típica, dispersa
nas diversas regiões, sobrevivendo às pressões da modernização sobre
os processos de produção, não só pelo apego às tradições, mas também
pelo isolamento das propriedades rurais. Esses fatos fizeram com que
se preservassem produtos de características próprias, de imenso valor
cultural e econômico, dentre eles, os queijos artesanais, a exemplo do
Queijo do Serro e da Canastra, conhecidos não só no Estado, como
em outras regiões do País e cuja produção se iniciou no Século XVIII
(EMATER, 2004).
A fabricação do Queijo Minas Artesanal (QMA) é reconhecida
como patrimônio cultural imaterial brasileiro pelo Instituto do Patri-
mônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN, 2019). Além da sua im-
portância cultural, o tradicional jeito de fazer o QMA, também é fun-
damental para geração de renda de 9.500 famílias produtoras de queijos
artesanais, distribuídas em sete regiões do estado que dão a denomi-
nação de origem ao produto: Serro, Cerrado, Serra do Salitre, Araxá,
Campo das Vertentes, Serra da Canastra e Triângulo Mineiro. Em 2018,
a produção do queijo artesanal nestas regiões, chegou a movimentar
cerca de R$ 370 milhões, mediante o comércio de aproximadamente 35
mil toneladas do produto (EMBRAPA, 2018).
No entanto, apesar dos diversos estudos históricos, edafoclimáti-
cos e técnicos realizados para caracterizar o produto e normatizar a fa-
bricação, este segmento produtivo carece de análises econômicas, con-
siderando o grande número de famílias produtoras e o fato da cadeia de
produção ser pouco estruturada. Para avaliar a agregação de valor no
QMA, foi realizada uma coleta de preços em mercados virtuais de cinco
produtos: Canastra, Araxá, Serro, Serra do Salitre e Cerrado. Além dos
preços destes QMA, foram coletados também dados de preços do queijo

– 57 –
Minas padrão nos mesmos mercados. Os resultados são apresentados
na Figura 2.
Na análise dos preços, empregou-se o gráfico Boxplot que é com-
posto por: uma caixa (box), que contém 50% dos dados; uma linha den-
tro da caixa que indica a mediana, ou seja, o valor do meio do conjunto
de dados; uma marcação representando a média dos valores; hastes ou
caldas inferiores e superiores que se estendem até o último ponto da
amostra dentro do limite de 1,5 vezes a altura da caixa; círculos pretos
que representam os outliers, ou seja, valores atípicos ou discrepantes.
Esse tipo de gráfico é ferramenta descritiva útil para se avaliar a varia-
bilidade dos dados.
Variação de preços do queijo Minas artesanal e Minas padrão no mercado virtual

120

100

80

60

40

str
a
ax
á
rr
o re ad
o

o
Se lit
na Ar .S
a er
r
Pa
d
Ca Sr C as
in
M
Figura 2. Variação de preços do QMA e queijo Minas padrão no mercado virtual, em
reais.
Fonte: Resultados da pesquisa.

– 58 –
Os resultados apontam grande variabilidade dos preços em alguns
QMA, sendo que os produtos de Araxá e Serra do Salitre têm varia-
bilidade menor quando comparadas com os demais queijos artesanais.
Observa-se ainda que a variação do preço do QMA em geral, é conside-
ravelmente maior que a do queijo Minas padrão.
O queijo do Serro foi o que apresentou maior preço disponível
no comércio virtual (R$ 119,00/kg), porém com maior concentração
de preços abaixo de R$ 74,00/kg. Por outro lado, os preços do queijo
artesanal Araxá estão mais concentrados entre R$ 63,00 a R$ 93,00/kg,
chegando a ser comercializado ao máximo de R$ 109,00/kg.
O menor preço registrado (R$ 26,80/kg) foi do queijo Serra do Sa-
litre, sendo que nenhum preço deste produto ficou acima de R$ 78,00/kg.
Este resultado pode estar associado ao fato de a Serra do Salitre ser a mais
nova microrregião produtora de QMA, sendo que o produto conquistou
a denominação de origem apenas em 2014.
Ao analisar o gráfico, é possível verificar que os cinco QMA
selecionados neste estudo são vendidos, a preços mais altos quando
comparado ao preço médio do queijo Minas padrão no mercado vir-
tual. No entanto, pelo gráfico Boxplot só é possível afirmar que exis-
te diferença estatisticamente significativa entre os preços médios do
queijo de Araxá e Serra do Salitre, já que as caixas (box) dos dois quei-
jos artesanais previamente citados, encontram-se em níveis distintos
(deslocadas no eixo vertical) da caixa do queijo Minas Padrão. Neste
caso, fica evidente que alguns produtores e comerciantes de QMA es-
tão conseguindo agregar valor ao produto, conquistando nichos de
mercado que pagam um “preço prêmio” pela diferença do produto ar-
tesanal em relação ao industrializado. No entanto, os resultados indi-
cam também que ainda há QMA no mercado que não conseguiram se
diferenciar e estão sendo comercializados ao mesmo preço do queijo
industrial. Portanto, a questão que fica é: o que falta para estes queijos
conseguirem agregar mais valor?

– 59 –
Referências Bibliográficas

EMATER. Queijo Minas Artesanal: tradição e qualidade que revelam


Minas. Revista da EMATER – MG, v. 22, n. 80, p. 8-9, Agosto de 2004.

ANUÁRIO leite 2018: Indicadores, tendências e oportunidades para


quem vive no setor leiteiro. São Paulo: Texto Comunicação Corporativa,
2018. 114 p. Disponível em: <https://www. embrapa.br/busca-de-
noticias/-/noticia/36560390/anuario-do-leite 2018-e-lancado-na-
agroleite>. Acesso em: 12 abr. 2019.

IPHAN. O Modo Artesanal de Fazer Queijo de Minas. 2008.


Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br/uploads/publicacao/Dossie_
Queijo_de_Minas_web.pdf>. Acesso em: 10 abr. 2019.

– 60 –
Evolução do consumo de queijos fundidos no Brasil*

Edson Brilhante Júnior


Kennya Beatriz Siqueira
Lorildo Aldo Stock
Vinicius Pimenta Delgado Ribeiro Nardy

A indústria de laticínios vem crescendo consideravelmente ao lon-


go dos anos. Em 2018, teve faturamento de 68,7 bilhões, ficando atrás
apenas do setor de derivados da carne. Entre os derivados lácteos mais
consumidos, estão leite UHT e queijos (SIQUEIRA, 2019). Este último
merece destaque, pois apresentou crescimento de 110% no consumo per
capita entre 2008 e 2017 (IBGE, 2019).
Em 2017, o Brasil atingiu a marca de 912 milhões de toneladas de
queijo produzido, movimentando cerca de R$ 12 bilhões no ano. O pro-
duto ainda apresenta outros números muito positivos, como o aumento
de 451% no valor de vendas agregado entre 2008 e 2017 e o crescimento
de 134% do volume total vendido no mesmo período (IBGE, 2019).
Dentre os queijos mais consumidos no País estão os queijos fun-
didos, que se caracterizam por serem uma mistura balanceada de di-
versos tipos de queijos, adicionados ou não de ingredientes como água,
manteiga, saborizantes, entre outros, que fazem com que possam ser
oferecidos de muitas formas. Os queijos fundidos podem ser comercia-
lizados em copos, fatias, porções ou pré-preparados para fondue, po-
dendo ser consumidos puros ou em preparo de refeições (ABIQ, 2019).
Com essa diversidade de tipos, os queijos fundidos apresentaram
crescimento significativo de consumo nos últimos anos, com destaque
para o requeijão, que é o principal queijo fundido consumido no Brasil
e que se tornou o principal queijo do mercado de commodities, assumin-
do o lugar da muçarela a partir de 2012 (BDT, 2019).

*
Publicado em Revista Indústria de Laticínios

– 61 –
A importância do requeijão também é evidenciada quando se
analisa dados do aplicativo Desrotulando, que funciona como uma bi-
blioteca colaborativa, tendo em sua memória, rótulos de diversos ali-
mentos encontrados em supermercados brasileiros. Considerando os
691 queijos disponíveis na base de dados do aplicativo em agosto de
2019, 24,5% dos queijos eram requeijão e 6,8% eram queijo muçarela,
indicando a existência de um volume maior de marcas de requeijão no
mercado brasileiro. Além disso, o requeijão é encontrado no portfólio
de dez das treze maiores indústrias de laticínios do Brasil.
Diante da representatividade dos queijos fundidos no mercado
lácteo nacional, torna-se oportuno analisar a evolução do consumo des-
se produto no Brasil no período de 2008 a 2017 de forma a identificar
alguns fatores que afetaram este consumo. Para isso, foram utilizados
dados da série histórica da Pesquisa Industrial Anual (PIA) do IBGE e
dados relativos ao Produto Interno Bruto (PIB) no mesmo período.
Assim como ocorreu com outros derivados do leite, o consumo de
queijo fundido apresentou crescimento constante até por volta de 2010.
A partir daí ocorreram oscilações até 2017, apresentando seu pico de
consumo no final do período avaliado. Para analisar melhor este com-
portamento, a Figura 1 apresenta, na forma de índice, uma relação entre
a evolução do consumo per capita de queijo fundido e a variação do
Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.
É possível observar forte simetria de movimentos entre as duas
variáveis no período analisado. Naturalmente, é esperado que não
haja total simetria entre os gráficos, pois existem outras variáveis
que afetam o consumo de lácteos e, portanto, de queijo fundido no
período avaliado. Entretanto, pela análise da Figura 1, fica eviden-
te o impacto que o PIB, ou seja, a variação de renda da população
brasileira, exerce sobre o consumo de queijos fundidos, podendo ser
assim considerado, um dos principais fatores que afetam o consumo
desse produto. Isso corrobora com Siqueira (2019) que mostra que
a renda e o crescimento econômico são alguns dos fatores que mais

– 62 –
afetam diretamente o consumo de produtos de origem animal, in-
cluindo o leite e seus derivados.
250 130

200 125
120
150
115
100
110
50 105
0 100
2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017

Consumo Per Capita Queijos Fundidos PIB


Figura 1. Índice da variação do consumo per capita de queijo fundido no Brasil e do
PIB brasileiro (ambos em base 100 = 2006).
Fonte: IBGE (2019).

Além dos fatores citados, outro que merece destaque como im-
portante driver do consumo de lácteos, é o preço desses produtos. Si-
queira (2019) afirma que o impacto dos preços tende a ser maior que
o de variação de renda nos produtos de origem animal. Para analisar
o impacto dos preços no consumo de queijos fundidos, empregou-se
dados do Milkpoint Mercado (2019), da variação de preços do requeijão
(principal queijo fundido brasileiro) e da muçarela no período de no-
vembro/17 a outubro/19 (Figura 2).
De acordo com a Figura 2, pode-se observar que o preço do re-
queijão (de qualquer tipo) é menos volátil do que o preço da muçarela.
Além disso, pode-se notar que o requeijão em bisnaga apresenta preços
menores que todos os demais, em especial o requeijão em bisnaga com
amido. Ainda, é importante ressaltar que os dados acima referem-se à
muçarela em peça, enquanto o consumo maior no mercado brasileiro é
da muçarela fatiada, que normalmente tem preço maior que o da peça.
De acordo com Rabelo (2015), a muçarela e o queijo prato são os
queijos mais populares entre os consumidores de baixa renda, enquanto

– 63 –
o requeijão é consumido pela população em geral. Em levantamento da
Abras (2019) verificou-se que o requeijão tem penetração (percentual
de lares compradores da categoria) de 64,5%, sendo que 90% do consu-
mo está concentrado nas classes A, B e C.

25,00

20,00

15,00
R$/Kg

10,00

5,00

0,00
17 8 8 18 18 9 9 19
/1 /1 8 8 /1 /1 9 9
v/ ar ai/ l/1 t/1 v/ ar ai/ l/1 t/1
no jan m m ju se no jan m m ju se

Requeijão pote puro Muçarela


Requeijão bisnaga amido Requeijão bisnaga puro

Figura 2. Variação de preços de muçarela, requeijão (puro em pote, bisnaga e bisnaga


com amido) entre novembro/17 e setembro/19.
Fonte: Milkpoint Mercado (2019).

Deve-se considerar ainda que o preço mais baixo do requeijão


com amido em bisnaga é de grande interesse para o setor de alimenta-
ção, pois este é empregado como ingrediente de vários produtos como
pizzas, tortas e salgados. Assim, o requeijão está também ocupando um
espaço que, até pouco tempo atrás, era apenas da muçarela.
Portanto, os resultados mostram que o futuro, em termos do con-
sumo de queijos, está especialmente ligado ao desempenho da econo-
mia brasileira, assim como aos preços do produto. Considerando que os
agentes da cadeia não são capazes de controlar o desempenho econômi-
co do País, a variável preço do produto deve ser acompanhada de perto
no mercado de queijo fundido.

– 64 –
Em vista da grande diversidade de tipos e marcas de requeijão dis-
poníveis no mercado brasileiro, a estratégia de preços pode trazer bons
resultados. No entanto, o fortalecimento da marca não pode ser esque-
cido como importante estratégia para este mercado, visto que estudo da
Fiesp (2017) mostrou que entre 2010 e 2017 aumentou o percentual de
brasileiros que afirmaram que a marca é o principal driver do consumo
de requeijão.

– 65 –
Referências Bibliográficas

ABRAS – Associação Brasileira dos Supermercados. Revista


Superhiper. 2019. Disponível em:<http://superhiper.abras.com.br/
pdf/245.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019.

ABIQ - Associação Brasileira das Indústrias de Queijos. Disponível em:


<https://www.abiq.com.br/>. Acesso em: 29 out. 2019.

BDT - Brasil Dairy Trends 2020. Tendências do mercado de produtos


lácteos. Campinas: Ital, 2017. 343 p.

FIESP - Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. A mesa dos


brasileiros: transformações, confirmações e contradições. São Paulo,
2019. Disponível em: <www.fiesp.com.br/amesadosbrasileiros>. Acesso
em: 7 set. 2019.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Sidra. Disponível


em: <https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/industria/9042-
pesquisa-industrial-anual.html?t=o-que-e&utm_source=landing&utm_
medium=explica&utm _campaign=pib>. Acesso em: 29 out. 2019.

MILKPOINT MERCADO. Disponível em:<https://www.milkpoint.com.


br/mercado/>. Acesso em: 25 nov. 2019.

RABELO, M. Boas perspectivas no mercado de lácteos: queijos e


proteína do soro do leite em alta. Sistema Faeg, mar. 2015. Disponível
em: <http://sistemafaeg.com.br/noticias/artigos/11466-boas
perspectivas-no-mercado-de-lacteosqueijos-e-proteina-do-soro-do leite-
em-alta>. Acesso em: 16 mar. 2019.

SIQUEIRA, K. B. O Mercado Consumidor de Leite e Derivados. Juiz


de Fora: Embrapa Gado de Leite, 2019. 17 p. il. (Embrapa Gado de Leite.
Circular Técnica, 120.).

– 66 –
Evolução do consumo de queijos finos no Brasil*

Kennya Beatriz Siqueira


Cíntia Clara Viana
Davi Oliveira Chaves
Lorildo Aldo Stock

No processo de produção de queijo, o leite passa por diversas fa-


ses, como a adição de coalho, extração de ácido lático, coagulação, corte
da coalhada, sinérese e armazenamento. Esse processamento pode gerar
produtos que apresentam diferentes níveis de umidade. De acordo com a
Portaria nº 146, os queijos de baixa umidade, com até 35,9%, são classi-
ficados como queijos de massa dura e os queijos de massa semidura são
caracterizados como de média umidade, entre 36,0% e 45,9% (BRASIL,
1996). Tais categorias são denominadas, comercialmente, de queijos fi-
nos ou especiais. Para o mercado consumidor, essa denominação sugere
maior elaboração e qualidade do produto e tem relação com seu públi-
co-alvo, que são as classes sociais mais elevadas (REZENDE et al., 2019).
Os queijos finos ou especiais no Brasil apresentaram incremento
de consumo nos últimos anos, passando de 5,6 kg per capita em 2007
para 7,1 kg per capita em 2018 (IBGE, 2020). Com isso, o consumo to-
tal de queijos finos aumentou 41% no Brasil e o consumo per capita
aumentou 28% no período. Esse incremento no consumo de queijos fi-
nos, aliado à alta competitividade e à baixa lucratividade do mercado de
queijos comuns, fez com que várias indústrias de laticínios investissem
na produção de queijos especiais (REZENDE et al., 2019).
No entanto, ainda existem poucos estudos sobre o mercado de
queijos finos no Brasil. Neste sentido, este artigo pretende analisar o pa-
norama do consumo de queijos finos no País de forma a identificar fa-
tores que influenciaram esse mercado. Primeiramente, foram utilizados
dados da série histórica de vendas de queijos de massa dura e semidura

*
Publicado em Revista Indústria de Laticínios

– 67 –
da Pesquisa Industrial Anual (PIA) do IBGE (2020) e dados relativos
ao Produto Interno Bruto (PIB) para o período 2007 a 2018 (Figura 1).

25%
20%
15%
10%
5%
0%
Ano 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018
-5%
-10%
-15%
-20%
-25%
-30%

Variação do consumo de queijos finos Variação do PIB


Figura 1. Variação percentual do consumo per capita de queijos finos no Brasil (kg/
hab/ano) e do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.
Fonte: Resultados da pesquisa.

Pela Figura 1 observa-se algumas similaridades entre a variação


do consumo per capita de queijos finos e o PIB brasileiro apenas no
início do período analisado. Além disso, a magnitude da variação é bem
maior para o consumo de queijos finos do que para o PIB.
Apesar dos estudos mostrarem que os lácteos são muito sensíveis
à variação da renda, cada derivado apresenta uma elasticidade renda
diferente. Elasticidade renda da demanda é um conceito econômico que
mede a variação percentual na quantidade demandada de um determi-
nado bem, diante de uma variação percentual na renda do consumidor.
De acordo com Vaz e Hoffmann (2020), a elasticidade renda da despesa
com leite e derivados no Brasil é de 0,563, o que indica que um aumento
de 10% na renda implicaria em um aumento 5,6% no consumo de leite

– 68 –
e derivados. Para os queijos, de acordo com Carvalho e Chaves (2020),
a elasticidade renda do dispêndio pode chegar a 1,22, ou seja, sendo
superior a da maioria dos lácteos.
O preço dos produtos também é um aspecto que merece ser res-
saltado, pois é um importante determinante no consumo de lácteos. A
Figura 2 apresenta o preço médio de venda de queijos finos no Brasil.
16
14,38
13,79
14 13,54
12,49
12 11,48
10,31 10,33
10,06
10
9,06
8,29 8,09
7,65
8
6,91

0
2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018
Figura 2. Preço médio de venda de queijos finos (em R$/kg).
Fonte: Resultados da pesquisa.

De acordo com Siqueira (2019), o impacto do preço sobre o con-


sumo tende a ser maior que a variação de renda nos produtos de ori-
gem animal, especialmente, em países em desenvolvimento. No entan-
to, para os queijos especiais, os dados mostram aumento significativo
do preço médio no período analisado: de 81% (Figura 2), com alguma
queda apenas nos últimos anos. De um modo geral, quando os pre-
ços dos alimentos aumentam, o consumo tende a diminuir, o que não
ocorreu no mercado de queijos finos no Brasil. Apesar desse aumento
significativo nos preços, e variações relevantes na renda da população

– 69 –
durante o período analisado, os brasileiros aumentaram o consumo
do produto.
Esse crescimento do consumo pode estar atrelado a algumas ten-
dências do mercado de alimentos. Uma delas é a busca do consumidor
por produtos gourmet, exóticos e sofisticados. Isso foi evidenciado por
Pinto et al. (2013) em pesquisa realizada com consumidores de queijos
finos. Na época, os aspectos identitários dos consumidores brasileiros
de queijos especiais eram: ousadia, polidez, requinte, poder aquisitivo e
vínculos sociais. Isso indica que o consumo do produto está associado
com status e sofisticação. Para este tipo de produto, o preço mais elevado
tende a ser mais um atrativo para o consumo.
Portanto, pode-se notar que os queijos finos se caíram no gosto do
brasileiro, de modo que o consumo deve permanecer em crescimento.
Apesar da atual crise econômica gerada pela pandemia, os dados do
segmento refletem um produto que se estabeleceu no mercado, poden-
do até se sair fortalecido dessa crise.

– 70 –
Referências Bibliográficas

BRASIL. Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento. Portaria


n. 146, de 07 de março de 1996. Aprova os regulamentos técnicos de
identidade e qualidade dos produtos lácteos. Diário Oficial da União,
Brasília, DF, 07 março. 1996.

CARVALHO, G. R; CHAVES, D.O. Impactos da renda da população


sobre o consumo de lácteos. Milkpoint Mercado, 2020. Disponível
em:< https://www.milkpoint.com.br/mercado/int/analises/2249>.
Acesso em: 10 abr. 2021.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Sidra.


Disponível em: <https://sidra.ibge.gov.br/tabela/5938#resultado>.
Acesso em: 13 jan. 2021.

PINTO, C. L., VIEIRA, K. C., SETTE, R. S. Ter e ser, essa é a questão:


Analisando a identidade do consumidor de queijos finos. SEMEAD
- Seminários em Administração, 15., 2013. Disponível em: <http://
sistema.semead.com.br/16semead/resultado/an_ resumo.asp?cod_
trabalho=629>. Acesso em: 22 jan. 2021.

REZENDE, D.; VIVAN, A. M.; LÚCIO DE ÁVILA, M. O mercado de


queijos finos no Brasil e sua relação com o comportamento estrategista
das indústrias oligopolistas. Revista de Economia e Sociologia Rural,
v. 37, n. 2, p. 9–30, 2019.

SIQUEIRA, K. B. O Mercado Consumidor de Leite e Derivados. Juiz


de Fora: Embrapa Gado de Leite, 2019. 17 p. il. (Embrapa Gado de
Leite. Circular Técnica, 120.).

VAZ, D. V.; HOFFMANN, R. Elasticidade-renda e concentração das


despesas com alimentos no Brasil: uma análise dos dados das POF de 2002-
2003, 2008-2009 e 2017-2018. Revista de Economia, v. 41, n. 75, 2020.

– 71 –
Consumo domiciliar de leite em pó integral nas
diferentes regiões do Brasil*

Kennya Beatriz Siqueira


Rafaela Oliveira Neto

O leite é uma das commodities mais importantes do mundo, tanto


em termos de produção quanto de consumo. Ao todo, são produzidos
anualmente no mundo 852 milhares de toneladas de leite e a FAO esti-
ma que, todos os dias, bilhões de pessoas consomem leite e derivados
no mundo.
O leite também é um dos produtos mais versáteis da indústria de
alimentos, podendo ser consumido em vários formatos. No entanto, o
consumo de alguns desses produtos tem se reduzido em alguns países.
No Brasil, dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE
demonstraram queda no consumo de laticínios nos lares brasileiros de
aproximadamente 35% entre 2002-2003 e 2017-2018. Entretanto, um
derivado lácteo que apresentou comportamento inverso, ou seja, cres-
cimento de consumo domiciliar, foi o leite em pó integral. O consumo
de leite em pó integral no Brasil cresceu, em média, 34% no período de
2002-2003 para 2017-2018.
Segundo o USDA, o Brasil é o segundo maior consumidor de leite
em pó do mundo. No entanto, existem grandes diferenças regionais na
aquisição de leite em pó integral no Brasil (Figura 1).
Pela Figura 1 é possível observar níveis de consumo per capita de
leite em pó integral superiores nas regiões Norte e Nordeste do País. Em
2017-2018, o leite em pó integral ocupou a segunda posição dentre os
lácteos mais consumidos nas regiões Norte (2,089 kg) e Nordeste (1,853
kg), perdendo apenas para o leite fluido. Os estados que mais consomem
leite em pó integral no Brasil são o Amapá (3,238 kg) e o Piauí (2,633 kg).

*
Publicado em Revista Balde Branco

– 72 –
Aquisição alimentar domiciliar per capita 2,5

2,0
anual (kg/pessoa/ano)

1,5

1,0

0,5

0,0
Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste
2002-2003 2008-2009 2017-2018

Figura 1. Variação da aquisição alimentar domiciliar per capita anual (kg) de leite em
pó integral nas regiões do Brasil durante os períodos de análise.
Fonte: IBGE (2020). Elaborado pelos autores.

O consumo domiciliar de leite em pó integral no Norte teve um


aumento de 8% no período de 2002-2003 a 2008-2009, e no Nordeste de
14%. No período de 2008-2009 a 2017-2018, esses incrementos foram
ainda maiores, sendo de 14% na região Norte e de 19% no Nordeste.
Ao agregar à análise o tamanho da população em cada região,
tem-se que o Nordeste sozinho foi responsável por cerca de 36% do con-
sumo domiciliar de leite em pó integral no Brasil em 2017-2018. Esse
resultado é justificado pela substituição do leite UHT na região pelo
leite em pó. Pelo fato de ser diluído em água para consumo, o leite em
pó rende mais, sendo portanto, mais vantajosa a compra do leite em pó
integral do que do leite UHT.
Outra característica que justifica a substituição do leite longa vida
pelo leite desidratado seria o armazenamento. O fato de poder ser con-
servado em temperatura ambiente, sem necessidade de refrigeração, é
uma característica importante para consumidores de baixa renda que
não dispõem de refrigeradores em casa. Considerando que as regiões

– 73 –
Norte e Nordeste têm grande parte da população com baixa renda, ou
até, em situação de vulnerabilidade, a possibilidade de armazenamento
em temperatura ambiente caracteriza-se como uma vantagem para o
leite em pó.
Entretanto, nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste é possível ob-
servar índices inferiores de aquisição alimentar domiciliar de leite em
pó integral. Em 2017-2018, o nível de consumo per capita de leite em pó
integral na região Norte (2,089 kg), equivale a quase 6 vezes o nível de
consumo na região Sul (0,368 kg), demonstrando uma diferença signifi-
cativa no perfil de consumo domiciliar deste produto no Brasil.
Assim, os dados de consumo de leite em pó integral no Brasil
evidenciam que as diferenças de consumo estão relacionadas com as
diferenças de renda, visto que as regiões de maior consumo (Norte e
Nordeste) são as de menores Produto Interno Bruto (PIB). Por outro
lado, as regiões de maior PIB (Sul, Sudeste e Centro-Oeste) são as que
têm menores níveis de consumo per capita de leite em pó integral.
Quando se analisa as faixas de renda nas diferentes regiões, têm-
se indícios de que o consumo de leite em pó integral associa-se posi-
tivamente com a renda. No entanto, essa análise foi realizada com um
número reduzido de dados, de forma que não é possível afirmar sobre a
existência de um padrão de consumo associado à renda em todo o País
(Figura 2).

– 74 –
Aquisição alimentar domiciliar per capita anual 3,5

3,0

2,5
(kg/pessoa/ano)

2,0

1,5

1,0

0,5

0,0
Até Mais de Mais de Mais de Mais de Mais de
1,908 1,908 a 2,862 2,862 a 5,724 5,724 a 9,540 9,540 a 14,310 14,310
Classse de rendimento total e variação patrimonial mensal familiar (R$)

Norte Nodeste Sudeste Sul Centro-Oeste


Figura 2. Variação da aquisição alimentar domiciliar per capita anual (kg) de leite em
pó integral nas regiões do Brasil em relação a classe de rendimento total e variação
patrimonial mensal familiar durante o período de 2017-2018.
Fonte: IBGE (2020). Elaborado pelos autores.

– 75 –
A popularização dos leites fermentados no Brasil*

Kennya Beatriz Siqueira


Mairon Neves de Figueiredo

Os leites fermentados são uma categoria de lácteos bem diversa,


que abrange desde leites cultivados, kefir, leite acidófilo, alguns tipos de
iogurte, coalhada e kumys. Esses produtos são resultado de um processo
de fermentação microbiana controlada que os confere sabor, textura e
aroma característicos, e muitas vezes exclusivos. O grande diferencial
dessa categoria de produtos está na necessidade de apresentar micror-
ganismos específicos abundantes e viáveis durante todo o prazo de va-
lidade. Deste modo, os produtos devem seguir padrões de fabricação e
identidade, que garantem ao consumidor final um produto microbiolo-
gicamente ativo, padronizado, seguro e de qualidade (BRASIL, 2007).
O conjunto de atributos microbiológicos permite que os leites fer-
mentados sejam classificados como alimentos funcionais, ou seja, alimen-
tos que conferem benefícios à saúde, atendendo não só as funções nutricio-
nais básicas, mas gerando efeitos metabólicos e/ou fisiológicos benéficos ao
consumidor (ANVISA, 1999). Neste aspecto, os leites fermentados, devido
a sua composição rica em probióticos, apresentam benefícios relacionados
à imunidade, síntese de vitaminas e até prevenção contra certos tipos de
câncer, como de colo (LEBLANC e PERDIGÓN, 2005).
A preocupação com a alimentação saudável vem crescendo en-
tre os consumidores e segue impulsionando esse mercado. Pesquisa da
Fiesp (2019) indica que cerca de 71% dos brasileiros buscam alimentos
benéficos à saúde, sendo este um fator decisivo durante o processo de
aquisição do alimento.
Esses produtos seguem assim, uma forte tendência de mercado
voltado ao seu elevado potencial nutricional. A Allied Market Research

*
Publicado em Revista Indústria de Laticínios

– 76 –
(2020) estima que, em 2018, o mercado dos produtos à base de leites
fermentados movimentou cerca de US$ 264,77 bilhões no mundo e pro-
jetam que em 2026 esse mercado chegará a US$ 396,87 bilhões.
Apesar de atender a essa tendência de consumo de alimentos sau-
dáveis e benéficos à saúde, o consumo de produtos lácteos, de um modo
geral, é bastante sensível às variações de renda do consumidor. Assim, o
presente artigo visa avaliar a evolução do consumo de leite fermentado
no Brasil, elucidando diferenças regionais, bem como a influência da
renda nesse mercado.
Para isso, foram analisados dados extraídos das Pesquisas de Or-
çamentos Familiares (POFs) realizadas pelo IBGE. O instituto coletou
dados por meio de amostragens residenciais por todo o País, nos anos
de 2002-2003, 2008-2009 e 2017-2018. Assim, foram obtidos dados re-
ferentes à aquisição e consumo de leites fermentados por regiões, bem
como as médias para o Brasil nos referidos períodos.
Por meio da POF também foram obtidos valores da aquisição de
leites fermentados por classe de rendimento do domicílio. Essas classes
de rendimento ajustadas e categorizadas, foram classificadas atendendo
critérios estabelecidos pela FGV Social (2014), com valores aproximados
para classes econômicas no período 2018-2019. Dessa forma, foram clas-
sificados como classe econômica A/B, aqueles domicílios com rendimen-
to familiar mensal total acima de R$ 9.540, classe C entre R$ 2.862,00 e
R$ 9.540,00, e as classes D/E com rendimentos inferiores a R$ 2.862,00.
As classes definidas pelo IBGE nas POFs foram organizadas e
agrupadas para cada pesquisa, formando três níveis categóricos: infe-
rior, médio e superior. Logo, infere-se que as diferentes POFs associem
os mesmos níveis categóricos, ou seja, as mesmas classes de rendimento,
após ter sua renda ajustada ao período em que foi avaliado. Deste modo,
foram avaliadas a aquisição de lácteos por região do país, assim como a
distribuição da aquisição de lácteos por classe econômica.
Em 2003, os quase 180 milhões de brasileiros consumiram cerca
de 50 milhões de quilos de leites fermentados. Já em 2018, com 210

– 77 –
milhões de pessoas, esse valor saltou para quase 200 milhões de qui-
los. Nestes 15 anos, o consumo de lácteos fermentados teve aumento
de aproximadamente 400%, diante do aumento populacional de apenas
16,5 %. Com isso, o consumo per capita de leites fermentados, em 2003,
que era de 0,27 kg atingiu, em 2018, quase 1 kg (Figura 1).
1,6
Consumo per capita (kg/hab)

1,4

1,2

0,8

0,6

0,4

0,2

0
Brasil Centro-Oeste Nordeste Norte Sudeste Sul

2003 2009 2018


Figura 1. Evolução da aquisição domiciliar per capita anual de leite fermentado por
região do Brasil.
Fonte: IBGE. Elaborado pelos autores.

Pelo País, regiões antes pouco expressivas, com o passar do


tempo, impulsionaram o consumo destes lácteos. Um exemplo, é o
Centro-Oeste, que apresentou a maior taxa de crescimento para o pe-
ríodo, com o consumo saltando de 0,06 kg per capita em 2003 para
0,7 kg em 2018, ou seja, uma evolução de 1.067%. Entretanto, as re-
giões Sul e Sudeste ainda representam os maiores mercados consu-
midores de lácteos fermentados do Brasil. A região Sul, que em 2003
consumia apenas 0,25 kg de leite fermentado/hab., agora é a região de
maior consumo de lácteos fermentados no Brasil com média per capi-
ta de 1,5 kg, bem acima da média nacional.
O aumento no consumo, corrobora com o aumento na diversida-
de de produtos e justifica a inserção de novas marcas no mercado, que

– 78 –
se torna cada dia mais abrangente e diversificado. Com isso, o aumento
na aquisição e consumo de leite fermentado já engloba todas as classes
sociais.
Em 2003, o acesso ao consumo de leites fermentados se restringia
às classes A/B, em grande parte devido ao seu maior poder aquisitivo
(Figura 2). O consumo nacional ainda era baixo e as classes A/B já con-
sumiam 70% mais que todas as outras classes somadas. No mercado, os
produtos comercializados se resumiam a alimentos especiais e gourmet
de pouca acessibilidade a maior parte da população. Ao longo dos anos,
as classes A/B passaram de 0,5 kg de consumo per capita ao ano, em
2003, para 1,7 kg em 2009, chegando a cerca de 2 kg consumidos em
2018, ou seja, o dobro da média nacional. Entretanto, as classes A/B
incluem cerca de 30 milhões de pessoas, o que representa apenas uma
pequena parcela da população brasileira (14,4%).

2,5
Consumo per capita (kg/hab)

2,0

1,5

1,0

0,5

0,0
2002/2003 2008/2009 2017/2018

D/E C A/B Média


Figura 2. Evolução da aquisição domiciliar per capita anual de leite fermentado por
classe de rendimento no Brasil.
Fonte: IBGE. Elaborado pelos autores.

Em 2018, dos quase 210 milhões de brasileiros cerca de 87,6%


compõem as classes sociais C, D e E. Essas classes que, antes não apre-
sentavam consumo expressivo de leites fermentados, já vêm incorpo-

– 79 –
rando estes produtos na sua dieta. As classes D/E por exemplo, que em
2003 apresentavam consumo per capita anual de 0,02 kg, apresentaram
um incremento de consumo de 20 vezes, chegando a consumir 0,45 kg/
hab. em 2018. Com o maior acesso aos lácteos fermentados, o consumo
das classes C, D e E que antes era irrisório, atualmente representa quase
65% do mercado brasileiro.
Portanto, a aquisição média nacional não segue mais puxada ape-
nas pelas classes de renda mais elevadas. Quando analisada isoladamen-
te, neste período, a classe C representava 116 milhões de brasileiros com
consumo de 1,12 quilos de leite fermentado/hab/ano, valor que supera a
média nacional de 0,95 kg/habitante. Logo, os fatores consumo e repre-
sentativa das classes, reafirmam a importância das classes mais baixas
na formação da crescente demanda por esses produtos.
Com isso, os leites fermentados, antes pouco conhecidos, hoje re-
presentam um grande segmento dentro do mercado lácteo brasileiro.
As últimas décadas, colaboraram para a incorporação dos leites fermen-
tados na dieta e seu consumo segue crescendo. Assim sendo, essa ten-
dência de crescimento da demanda hoje atinge todas as classes sociais,
ainda que as classes A/B apresentem maior consumo per capita. Este
aumento pode estar atrelado às maiores exigências nutricionais pelos
consumidores e às tendências para incorporação de hábitos mais sau-
dáveis na dieta.
Esses consumidores preocupados com saúde e saudabilidade de-
vem se manter fiéis ao leite fermentado mesmo durante a crise econô-
mica gerada pela pandemia de Covid-19 no Brasil. Pesquisa da Embra-
pa (SIQUEIRA, 2020) realizada entre abril e maio de 2020, evidenciou
que 69% dos consumidores de leite fermentado mantiveram o consumo
desses produtos durante a pandemia. Portanto, a expectativa é que o
segmento não sofra muito com a crise econômica.

– 80 –
Referências Bibliográficas

AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (ANVISA).


Resolução nº 19, de 30 de abril de 1999. Aprova o Regulamento
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o Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade de Leites
Fermentados, anexo à presente Instrução Normativa. Diário Oficial da
República Federativa do Brasil. Brasília, 24 out. 2007. Seção 1, p.4.

FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS SOCIAL – FGV SOCIAL. Qual a


faixa de renda familiar das classes. Rio de Janeiro, 2014. Disponível
em: <https://cps.fgv.br/qual-faixa-de-renda-familiar-das-classes>.
Acesso em: 27 ago. 2020.

FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESTADO DE SÃO PAULO


- FIESP. A mesa dos brasileiros: transformações, confirmações e
contradições. São Paulo, 2019. Disponível em: <http://hotsite.fiesp.
com.br/amesadosbrasileiros/>. Acesso em: 07 set. 2020.

– 81 –
IBGE. Pesquisa de Orçamentos Familiares. Brasília, DF, 2020.
Disponível em: <www.ibge.gov.br>. Acesso em: 10 fev. 2020.

LEBLANC, A. M.; PERDIGON, P. Reduction of beta- Glucuronidase


and nitroreductase activity by yoghurt in a murine colon cancer
model. Biocell, Apr;29(1):15-24, 2005.

SIQUEIRA, K. B. O consumo de lácteos na pandemia. CILeite, 2020.


Disponível em: <www.cileite.com.br>. Acesso em: 07 set 2020.

– 82 –
O leite condensado brasileiro*

Rafaela Oliveira Neto


Kennya Beatriz Siqueira

Na indústria de laticínios, o leite condensado é um dos principais


produtos lácteos concentrados. Sua produção foi iniciada nos Estados
Unidos, em 1856, por Gail Borden. Entre 1861 e 1865, ocorreu a Guerra
Civil Americana, onde o leite condensado tornou-se conhecido por ter
mais calorias e manter os soldados alimentados. Pouco tempo depois,
o produto chegou à Europa e se popularizou pelo mundo. No Brasil, o
produto chegou em 1890 (VASCONCELLOS, 2019).
A produção mundial de leite condensado na década de oitenta
foi dominada por União Europeia (UE), Estados Unidos (EUA) e ex-U-
nião Soviética. Atualmente, os maiores produtores de leite condensado
do mundo são EU, EUA, América do Sul, ex-União Soviética e Extremo
Oriente, nesta ordem. A IDF (2019) estima que a produção mundial de
leite condensado, em 2018, foi de cerca de 4,1 milhões de toneladas, sendo
o Brasil, o segundo maior produtor deste derivado lácteo do mundo. Em
2018, o Brasil produziu 655 mil toneladas de leite condensado, o que cor-
responde a aproximadamente o dobro da produção de 2005 (IDF, 2019).
Nos anos 2000, o número de indústrias de médio e grande por-
te nacionais que produzem leite condensado aumentou, fato observado
nas várias marcas encontradas no mercado. Segundo DOS SANTOS et
al. (2009), o custo de produção do leite condensado brasileiro é compe-
titivo no mercado internacional, o que pode ser justificado principal-
mente pelo preço do açúcar nacional. Assim, dentre os derivados lác-
teos, o leite condensado caracteriza-se como um produto de frequentes
exportações brasileiras e de crescente consumo no mercado interno.

*
Publicado em Revista Indústria de Laticínios

– 83 –
Dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE (2020)
mostram que o leite condensado respondeu por 2% do consumo domiciliar
de lácteos em 2017-2018. De acordo com a Associação Brasileira de Su-
permercados (ABRAS, 2020), em 2019, o leite condensado esteve presente
em 90% dos lares do País, o que mostra o elevado nível de penetração do
produto. Apenas 11 alimentos têm índice de penetração maior que o leite
condensado. Dentre os derivados do leite, somente o leite UHT e o creme
de leite estão presentes em mais lares brasileiros do que o leite condensado.
A região Sudeste possui maior importância em relação às vendas
de leite condensado nos supermercados, representando 52,3%, o que
equivale a 6 vezes mais a importância da região Centro-Oeste. Isso de-
monstra uma diferença significativa no perfil de compra deste produto
nas diferentes regiões do Brasil.
Os dados da Abras (2020) também mostram que a classe econô-
mica de maior representatividade no total de vendas na categoria leite
condensado no Brasil é a classe C. Em 2019, essa classe respondeu so-
zinha por 48,6% das vendas do produto, seguida pela classe A/B com
32,7% e, por último, a classe D/E, com 18,7% (Figura 1).
60

50

40

30
%

20

10

0
2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019

Classe Econômica A/B Classe Econômica C Classe Econômica D/E

Figura 1. Representatividade das classes sociais no total de vendas de autosserviço da


categoria leite condensado no período de 2012 a 2019.
Fonte: ABRAS (2020). Elaborado pelos autores.

– 84 –
A representatividade da classe C aumentou 19% do ano de 2012
para 2019. Esse aumento pode ser explicado tanto pela mobilidade so-
cial das pessoas que migraram da classe D/E para a C devido ao au-
mento de renda, quanto pela mudança de hábitos dos consumidores da
classe C.
A classe econômica A/B é caracterizada por certa estabilidade no
decorrer dos anos em relação a sua representatividade nas vendas de
leite condensado. Durante o período analisado, a classe D/E obteve re-
presentatividade nas vendas inferior às outras classes. Além disso, esta
classe apresentou uma redução significativa de 26% entre 2014 e 2015.
O principal foco dos consumidores na compra de leite condensa-
do é o abastecimento da despensa, sendo que 60,1% do produto com-
prado é direcionado para essa missão de compra, o que sugere maior
organização e planejamento por parte das famílias, e pode estar atrelado
à redução do número de vezes que essas famílias vão ao supermercado
para adquirir este produto. No que se refere aos dias de compras do leite
condensado, há maior concentração aos sábados, seguido pelas sextas-
feiras.
Em relação ao tíquete médio, ou seja, quanto cada consumidor
gasta por ocasião de compra do produto, em termos reais, houve va-
lorização do leite condensado. Assim, o padrão médio por compra do
brasileiro em 2019 foi R$ 7,74 gastos com o produto, que representa o
dobro do tíquete médio de 2008. Além disso, vale ressaltar que em todas
as classes sociais houve aumento do tíquete médio no período de 2009 a
2019. No entanto, o aumento do tíquete médio, em alguns períodos, está
relacionado com o aumento do preço do produto e da inflação e não
ao fato dos consumidores estarem adquirindo e consumindo maiores
quantidades de leite condensado.
Já a frequência de compra, ou seja, o número de vezes que os con-
sumidores vão aos pontos de venda para comprar leite condensado au-
mentou 9% entre 2008 e 2019. É interessante notar que entre 2018 e 2019
houve aumento da frequência de compra apenas na classe social D/E, de

– 85 –
17%. Apesar disso, essa classe continua com frequência de compra me-
nor que as demais. A classe social A/B manteve liderança em relação à
frequência de compra do ano de 2009 a 2019. No último ano, essa classe
foi 8,1 vezes ao supermercado para comprar leite condensado.
Com os dados da ABRAS (2020) de tíquete médio e frequência
de compra média, bem como o valor do IPCA divulgado pelo IBGE
(2020a) foi possível calcular o consumo médio de leite condensado por
família ao longo dos anos (Figura 2).
13,00
12,57
12,50
Consumo t ota l/ fa mília (kg)

12,06
11,96
12,00 11,73
11,66
11,47 11,49
11,50
11,15 11,06 11,15
11,00 10,89
10,64
10,50

10,00

9,50
2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019
Figura 2. Evolução do consumo médio de leite condensado por família de 2008 a 2019
(em kg).
Fonte: Elaborado pelos autores.

A Figura 2 mostra aumento de 18% nas compras desse produto


de 2008 a 2019, equivalente a 1,93 kg de leite condensado por família. É
possível também observar que o consumo de leite condensado ao lon-
go dos anos analisados apresentou grandes oscilações. Com exceção do
ano de 2019 (maior consumo da série), pode-se notar que o consumo de
leite condensado apresenta ciclos, com picos a cada 4 anos (2010, 2014 e
2018), os quais coincidem com anos de Copa do Mundo. Esse fato cor-
robora com Siqueira (2018), que mostrou variações positivas no consu-
mo aparente de leite e derivados no Brasil nos anos de Copa do Mundo.
Uma explicação para este fato é que durante o campeonato mundial, os

– 86 –
brasileiros tendem a se reunir em casa ou em bares e restaurantes para
assistir aos jogos. Nestes momentos, o consumo de alimentos indulgen-
tes como por exemplo, cerveja, refrigerantes, snacks, chocolate e leite
condensado, tende a aumentar.
Os produtos indulgentes são aqueles que promovem bem estar
e prazer. Estão muito associados com momentos de festividades, mas
também tendem a ter seu consumo mantido ou aumentado nos mo-
mentos de crise, quando as pessoas buscam aliviar a tensão por meio
da ingestão desses alimentos. Isso aconteceu também neste período de
pandemia, quando as indústrias viram as compras de leite condensado
aumentar significativamente. E, considerando que a crise ainda não pas-
sou, essas vendas ainda podem continuar elevadas por um tempo.

– 87 –
Referências Bibliográficas

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Super Hiper. CONSUMIDORES E CATEGORIAS. Ano 46, número
527, 2020. Disponível em: <https://www.abras.com.br/ >. Acesso em:
19 ago. 2020.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA


- IBGE. Pesquisa de Orçamentos Familiares - POF. Brasília,
DF, 2020. Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/estatisticas/
sociais/educacao/24786-pesquisa-de-orcamentos-familiares-2.
html?edicao=27139&t=resultados>. Acesso em: 19 ago. 2020.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA -


IBGE. Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA.
Brasília, DF, 2020a. Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/
estatisticas/economicas/precos-e-custos/9256-indice-nacional-de-
precos-ao-consumidor-amplo.html?=&t=o-que-e>. Acesso em: 25 ago.
2020.

DOS SANTOS, M. C. et al. Avaliação de aspectos normativos do leite


condensado brasileiro e no mundo. Revista do Instituto de Laticínios
Cândido Tostes, v. 64, n. 369, p. 39-47, 2009.

INTERNATIONAL DAIRY FEDERATION – IDF. Bulletin of the


International Dairy Federation 501/2019, 2019.

VASCONCELLOS, L. Curiosidades: quem inventou o leite


condensado? .Disponível em: <https://www.milkpoint.com.br/
artigos/espaco-aberto/curiosidades-quem-inventou-o-leite-
condensado-217447/>. Acesso em: 19 ago. 2020.

– 88 –
Novos horizontes e mercados da manteiga*

Flávia Queiroz Ferreira


Kennya Beatriz Siqueira
Lorildo Aldo Stock

Ao redor do globo, aproximadamente 600 milhões de pessoas vi-


vem do leite, seja na produção ou na transformação desta commodity
tão versátil. Isso corresponde ao emprego de uma em cada sete pessoas
no mundo e pelo menos 10% de toda a proteína consumida pela popu-
lação do planeta (GDP, 2017).
A indústria de laticínios é, dentre as indústrias de alimentos do
País, o segundo segmento mais importante em termos de faturamento,
ficando atrás apenas do processamento de carnes (ABIA, 2019). O leite
UHT e os queijos são os principais produtos lácteos comercializados
no Brasil, mas com a elevada demanda por alimentos saudáveis, outros
derivados lácteos apresentaram expansão de mercado.
O mercado tem se desenvolvido por conta do crescimento de ni-
chos específicos de alimentos saudáveis, especialmente de derivados
lácteos. Um desses é a manteiga. Originalmente produzida pela agitação
do creme de leite, a manteiga voltou a ser consumida e passou a consti-
tuir uma alternativa àqueles que buscam uma opção de gordura natural
e mais saudável do que a margarina. Esta última é obtida pelo processo
de hidrogenação de óleos vegetais e tem em sua composição gorduras
trans, que os estudos científicos mostraram estar associadas a possíveis
elevações nos níveis de colesterol (CAVENDISH, 2009).
Assim como ocorreu com o ovo, a manteiga já foi uma das prin-
cipais vilãs quando o tema colesterol começou a ser debatido, mas a
partir da última década voltou a ser valorizada e reconhecida não como
alimento prejudicial, mas como alimento recomendado para consumo

*
Publicado em Revista Indústria de Laticínios

– 89 –
regular. Além disso, surge agora como um produto com novas versões
funcionais e propriedades consideradas vantajosas para a saúde. Rica
em ácidos graxos considerados essenciais ao organismo humano, a
manteiga está voltando aos lares brasileiros como uma proposta de ex-
celente fonte de gorduras boas para a dieta e também fonte de proteínas
e vitaminas. Além disso, o produto que era apenas comercializado nas
versões com e sem sal, atualmente já pode ser encontrado em diversas
outras composições no varejo: temperado, aromatizado, orgânico, sem
lactose, com baixo teor de sódio, entre outros.
Diante do exposto, o presente artigo tem como objetivo avaliar a
evolução do consumo da manteiga no Brasil ao longo dos últimos anos.
Para isso, analisou-se o consumo per capita de manteiga no Brasil e a
variação dos preços médios de venda no período de 2006 a 2017, com
base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE,
2019). Os valores médios de venda foram calculados pela divisão do
valor de venda do produto pela quantidade produzida. Analisou-se
também dados que correlacionam o consumo per capita de manteiga à
renda da população.
O consumo per capita de manteiga no Brasil passou de 290 gra-
mas/habitante em 2006 para 460 gramas/habitante em 2017, ou seja, um
crescimento de 75%. Apesar dessa taxa de crescimento representativa,
a manteiga não ficou entre os maiores aumentos de consumo per capita
dentro do segmento de lácteos, perdendo para muitos queijos, creme de
leite, iogurte, bebida láctea, leite condensado, entre outros.
Já a margarina apresentou declínio de 4,3% no consumo no mes-
mo período, passando de 2.330 gramas/habitante para 2.220 gramas/ha-
bitante. Apesar da queda no consumo per capita da margarina, pode-se
perceber que o nível de consumo desse produto ainda é muito superior
ao nível de consumo da manteiga.
Para avaliar melhor o mercado de manteiga, a Figura 1 apresenta,
em conjunto, a evolução de duas variáveis: consumo per capita de man-
teiga e preços da manteiga.

– 90 –
R$ 16,00 0,5

0,45
R$ 14,00
0,4
R$ 12,00
0,35
R$ 10,00
0,3

R$ 8,00 0,25

0,2
R$ 6,00
0,15
R$ 4,00
0,1
R$ 2,00
0,05

R$ - 0
2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017
Valor médio de venda Per capita (kg)

Figura 1. Consumo per capita e valor médio de venda de manteiga no Brasil, no


período de 2006 a 2017.
Fonte: Elaborado pelos autores com base em dados do IBGE (2019).

Ao longo do período analisado, observa-se tendência de aumento,


tanto do volume per capita consumido quanto do preço médio da man-
teiga no Brasil. Isso sugere que, ao contrário do que diz a teoria econô-
mica, o aumento do preço da manteiga não desestimulou o consumo
do produto. Apesar de preços maiores entre o início e o fim do período,
ainda assim, ocorreu aumento no consumo per capita do produto. No
entanto, pesquisa de 2018, da Mintel mostra que dois terços dos brasilei-
ros comprariam mais manteiga se o preço fosse mais acessível.
Além do preço, outro fator que a teoria econômica considera
como driver do consumo é a renda. Com maior poder aquisitivo, as fa-
mílias podem passar a consumir de forma mais variada e a demanda
por alimentos pode ser direcionada para itens de maior valor agregado.
O impacto da renda sobre o consumo de manteiga no Brasil pode ser
melhor visualizado na Figura 2.
Pela Figura 2, pode-se observar que à medida que a renda aumen-
ta, o consumo de manteiga também aumenta, sendo que na maior faixa

– 91 –
de renda, o consumo aumenta quase 3 vezes. Dados da Abras (2015)
reforçam a importância da renda neste mercado, mostrando que, em
2014, a classe A/B respondia sozinha por quase 50% das vendas de man-
teiga no Brasil. De acordo com a FGV (2019), em 2018, a classe A/B era
composta por cerca de 30 milhões de pessoas, representando 14,4% da
população brasileira.

0,8
Aquisição per capita anual em Kg de

0,7 0,753
0,6
0,5
manteiga

0,4
0,3 0,23 0,257
0,222
0,172 0,275
0,2
0,1
0
até 830 Mais de 830 Mais de Mais de Mais de Mais de
a 1.245 1.245 a 2.490 a 4.150 a 6.225
2.490 4.150 6.225
Classes de rendimento (em reais)
Figura 2. Variação da aquisição alimentar per capita anual (2008-2009) em quilograma
por classes de rendimento em reais.
Fonte: Elaborado pelos autores com base em dados de REGO (2017).

O nível mais elevado de consumo de manteiga pela classe A/B


pode ser explicado, não só pela renda, mas também pelo maior nível
educacional que, consequentemente, reflete em maior conhecimento
dos avanços científicos. Dados da FGV (2019) mostram que a escola-
ridade média na classe A/B é 13,2 anos, contra 8,7 da média geral da
população e a quantidade de pessoas que fazem educação executiva
(MBAs) na classe A/B é cinco vezes maior que a média.
Outro fator que também tem impactado no consumo de mantei-
ga são as mudanças de hábitos e preferências dos consumidores. Com
a universalização do conhecimento, os consumidores estão mais exi-
gentes, e, na hora da compra, além do preço, eles consideram também

– 92 –
fatores relacionados à nutrição, saúde e bem-estar. Com isso, opções al-
ternativas de consumo, como uso direto da manteiga na culinária e sua
supervalorização no mercado gourmet também levam ao consumidor
novas experiências e sabores. Atento às novidades, muitas vezes ele está
disposto a pagar um preço mais elevado para experimentar produtos
inovadores e que tragam também praticidade e funcionalidade.
Diante desse cenário, pode-se concluir que o futuro parece ser
promissor para a manteiga no Brasil, seja nos moldes tradicionais, seja
na oferta de variedades mais sofisticadas. Poucos produtos atualmente
conseguem ficar isentos das variações de renda e preço, como foi ob-
servado para a manteiga, além de atender a várias novas tendências de
consumo. Com isso, a indústria de manteiga no Brasil encontra-se em
posição privilegiada, podendo atacar outros entraves do setor, como lo-
gística e distribuição, gerenciamento, custos, entre outros.

– 93 –
Referências Bibliográficas

ABIA - Associação Brasileira da Indústria de Alimentos. Números


do setor. Disponível em https: <//www.abia.org.br/vsn/anexos/
faturamento2018.pdf.> Acesso em: 13 nov. 2019.

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Superhiper. 2015. Disponível em:<http://superhiper.abras.com.br/
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CAVENDISH T.A, LEMOS P.B, YOKOTA R.T, VASCONCELOS T.F,


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GDP - Global Dairy Platform. Annual Review 2016. Rosemont, IL,


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Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/
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Acesso em: 29 out. 2019.

REGO, R. A. Brasil Dairy Trends 2020. In: Fatores de influência


do mercado de produtos lácteos. Cap 2. Disponível em: <http://
brasildairytrends.com.br/48/index.html>. Acesso em: 26 jan. 2020.

– 94 –
O mercado de produtos imitadores de
lácteos no Brasil*

Alice Pereira Reis


Kennya Beatriz Siqueira

Nos últimos tempos, o mercado lácteo tem enfrentado a concor-


rência dos produtos à base de plantas (plant-based products). Também
chamados de bebidas vegetais ou bebidas alternativas, esses produtos
vêm substituindo o leite e seus derivados.
Uma das grandes diferenças entre as bebidas vegetais e o leite, está
em sua origem. Enquanto as bebidas vegetais são produzidas através de
grãos, como o arroz, aveia, castanha, amêndoas e soja, o leite possui ori-
gem animal, sendo extraído de mamíferos, como vacas, búfalos e cabras.
As características sensoriais e o valor nutricional entre estes produtos
também diferem: o leite é uma bebida com sabor e odor característicos,
possuindo um teor de gorduras saturadas maior, bem como um elevado
teor de cálcio, enquanto as bebidas vegetais possuem sabor mais leve,
um valor menor de gorduras saturadas e baixo teor de cálcio (FONSE-
CA et al., 2016).
Com a expansão da categoria de bebidas não alcóolicas no Brasil,
houve também o aumento na procura por bebidas vegetais no mercado
brasileiro. Tal fato está relacionado ao crescente número de pessoas com
alguma restrição alimentar, como intolerância à lactose ou alergia à pro-
teína do leite, bem como aqueles que não consomem produtos de ori-
gem animal, como é o caso dos veganos e vegetarianos (FONSECA et al.,
2016). Estima-se que 4% da população brasileira, cerca de 7,6 milhões de
pessoas, seja vegetariana e, grande parte, vegana (RIBEIRO, 2019).
Dessa maneira, é notável a expansão do mercado nesse nicho:
cerca de 40% ao ano, desde 2018 (RIBEIRO, 2019). Há poucos anos,

*
Publicado em Revista Indústria de Laticínios

– 95 –
as opções de produtos prontos para o consumo nessa categoria eram
bem menores (RIBEIRO, 2019). Atualmente, a indústria de bebidas ve-
getais vem buscando ampliar a oferta de novos sabores e melhorias na
qualidade dos produtos, visando uma popularização do consumo dos
mesmos. É importante também destacar que o mercado de produtos à
base de plantas se abriu para outros alimentos, além das bebidas, como
por exemplo, queijos, iogurtes e manteigas, todos feitos a partir de ma-
térias-primas vegetais.
Porém, há uma diferença significativa entre as proteínas encon-
tradas em alimentos de origem animal e vegetal, que está relacionada ao
conteúdo dos aminoácidos. Alimentos vegetais não possuem proteínas
com todos os aminoácidos essenciais em sua composição, ao contrário
do que ocorre com alimentos de origem animal. Além disso, a diges-
tibilidade das proteínas vegetais é menor quando comparada com as
proteínas animais (JOHNSON, 2018).
No entanto, pouco se sabe sobre o tamanho e características desse
mercado concorrente dos produtos lácteos. Portanto, o objetivo desse
artigo é analisar os produtos imitadores do leite disponíveis no mercado
brasileiro, como forma de identificar tendências e características desse
segmento que vem crescendo tanto.
O presente trabalho foi desenvolvido a partir de informações
coletadas no aplicativo Desrotulando. Esse aplicativo foi desenvolvido
por nutricionistas e fundamentado no Guia Alimentar para a Popu-
lação Brasileira, do Ministério da Saúde, visando auxiliar o usuário a
fazer uma melhor escolha nutricional. O aplicativo apresenta o rótulo
de produtos disponíveis no mercado brasileiro, apresentando as infor-
mações nutricionais desses produtos, bem como a lista de ingredientes
dos mesmos. Para este feito, foi realizado um levantamento de todos os
produtos imitadores de lácteos, como iogurtes, bebidas, queijos e man-
teigas, disponíveis na base de dados do Desrotulando. Foram coletadas
as seguintes informações: nome do produto, segmento em que ele está
inserido, descrição do produto, ingredientes, link onde o produto é en-

– 96 –
contrado, imagem e afirmação ou apelo que o fabricante disponibiliza
sobre o produto, como por exemplo, a ausência de glúten e lactose.
A coleta de dados foi realizada em novembro de 2020, chegando a
um total de 225 produtos imitadores dos lácteos, podendo-se notar, en-
tão uma diversidade de matérias-primas para a fabricação dos mesmos,
principalmente das bebidas vegetais. Pode ser visto na Figura 1 que a
maioria das bebidas é feita a partir de soja, seguido por arroz.

80

70

60
Quantidade de produtos

50

40

30

20

10

0
Soja Arroz Amêndoa Coco Castanha Aveia
de Caju
Figura1. Matérias-primas dos produtos à base de vegetais no mercado brasileiro.
Fonte: Dados da pesquisa.

A soja se destacou por ser o vegetal usado inicialmente na pro-


dução de imitadores dos lácteos. Além disso, o Brasil se sobressai como
grande produtor mundial de soja. Porém, alguns dados mostram que a
produção de bebidas vegetais à base de amêndoas e coco cresceu entre
2017 e 2018, enquanto o consumo de bebidas à base de soja diminuiu
(Euromonitor, 2019). Isso pode estar relacionado com o aumento do
número de consumidores preocupados com o consumo consciente eco-
logicamente, uma vez que a produção da soja, até alguns anos atrás, era
marcada por sua baixa sustentabilidade ambiental (GAZZONI, 2012).

– 97 –
O sabor também é outro fator preponderante, pois bebidas à base
de castanhas, amêndoas e coco, por exemplo, possuem sabor mais agra-
dável em relação às bebidas de soja (CORDOVA, 2019). Assim, para
se ter uma experiência sensorial mais satisfatória, o consumidor acaba
pagando um valor mais elevado no produto, visto que essas matérias
-primas são mais caras (CORDOVA, 2019).
Outro fator que foi observado durante a pesquisa, é que a dis-
ponibilidade de bebidas vegetais no Brasil é bem maior que de outros
produtos à base de vegetais. Na Figura 2, é possível notar que existe no
mercado brasileiro: queijos, iogurtes e até manteigas vegetais, porém na
comparação com bebidas, a diferença ainda segue discrepante.

250
211
200
Quantidade de produtos

150

100

50

5 5 3
0
Bebidas Iogurtes Queijos Manteigas
Figura 2. Produtos à base de vegetais disponíveis no mercado brasileiro.
Fonte: Dados da pesquisa.

Entretanto, o mercado de produtos feitos à base de vegetais é pro-


missor. Como mencionado anteriormente, é notável o crescimento da
população vegetariana e vegana no Brasil, além daqueles que necessitam
restringir o consumo de lácteos por questões de saúde, como é o caso
de intolerantes à lactose ou alérgicos ao leite. Notando isso, algumas
indústrias do setor lácteo vêm investindo também na produção de be-

– 98 –
bidas vegetais. No levantamento realizado, foram encontradas 6 empre-
sas tradicionalmente do setor lácteo, que possuem atualmente em seu
portfólio de produtos, as bebidas e produtos à base de vegetais também.
No mercado nacional, existem ainda aquelas empresas cujo nome
no setor de bebidas vegetais já aparece há anos, como é o caso da Ades.
Inúmeros são os sabores disponíveis das bebidas de soja oferecidas pela
empresa. Outra grande empresa que possui um relevante portifólio no
nicho de bebidas de soja é a Yoki, que da mesma forma que a Ades,
tem diversos sabores disponíveis. A americana Almond Breeze é outra
companhia do setor que ocupa uma grande parcela no mercado nacio-
nal, mas, oferecendo aos consumidores, bebidas à base de amêndoas.
Além dessas, vários outros nomes foram observados ao longo do estu-
do. Alguns focados em bebidas vegetais de um cereal específico, outros
desenvolvendo além de bebidas, também iogurtes e outros produtos
imitadores de lácteos.
De maneira geral, todos os produtos e empresas possuem o mes-
mo apelo comercial que têm como foco destacar a ausência de lactose
nos alimentos oferecidos, bem como a ausência de ingredientes de ori-
gem animal. Alguns itens ainda destacam a ausência de açúcares e o
baixo teor de colesterol dos produtos à base de plantas. Tudo isso, bus-
cando atingir seu público-alvo e captar cada vez mais os consumidores
que preferem um estilo de alimentação saudável e diferenciado.
Por fim, com esse estudo, pode-se concluir que o mercado se
abre cada vez mais para produtos feitos à base de vegetais, uma vez que
a procura por eles, aumenta dia após dia. Seja por motivos de saúde, por
questões ambientais ou até mesmo por convicções individuais, o con-
sumidor brasileiro se mostra cada vez mais adepto a esses produtos, de
modo que várias empresas de laticínios já desistiram de competir com
eles, passando a produzi-los.

– 99 –
Referências Bibliográficas

CORDOVA, A.G. Consumo de Bebidas Vegetais no Brasil: Análise


da Percepção do Consumidor, pelo uso de Word Association. Trabalho
de Conclusão de Curso. Florianópolis: Universidade Federal de Santa
Catarina, 2019.

EUROMONITOR INTERNATIONAL. Mercado de bebidas vegetais


cresce a dois dígitos no Brasil. Disponível em: <https://www.
milkpoint.com.br/noticias-e-mercado/giro-noticias/com-excecao-
das-de-soja-mercado-de-bebidas-vegetais-cresce-a-dois-digitos-no-
brasil-211516/>. Acesso em: 28 dez 2020.

FONSECA, R.C; ARAÚJO, F.I.R.O. e SIQUEIRA, K.F. Elaboração


e Caracterização Físico-Química de Bebida Vegetal de Diferentes
Tipos de Arroz (Integral, Parboilizado e Quirera). Revista Processos
Químicos, Jul/Dez 2016.

GAZZONI, D.L. Sustentabilidade da Soja no Brasil. In: CONGRESSO


BRASILEIRO DE SOJA, 6., Cuiabá, MT, 2012. Anais... Cuiabá, 2012.

JOHNSON, J. What is the difference between animal and plants


proteins?. Medical News Today, 21 de agosto de 2018.

RIBEIRO, U. L. A ascensão do consumo ético de produtos vegetarianos


e veganos no mercado brasileiro. Revista Observatório de La
EconomíaLatinoamericana, julho 2019.

– 100 –
SEÇÃO III

Fatores que afetam o consumo


de lácteos no Brasil

– 101 –
– 102 –
O impacto da renda no consumo de lácteos no Brasil*

Kennya Beatriz Siqueira


Ygor Martins Guimaraes

A nova Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE apre-


senta alguns insights interessantes sobre o consumo de lácteos no País.
O primeiro deles é que o consumo per capita de alguns produtos lácteos
caiu entre 2008-2009 e 2017-2018. A principal queda se deu para leite
fluido, que é o derivado lácteo mais consumido no País. Por outro lado,
a maioria dos derivados do leite apresentou aumento de consumo no
período, com destaque para leite fermentado, manteiga, muçarela e cre-
me de leite (Tabela 1).

Tabela 1. Evolução do consumo de lácteos no Brasil.


Aquisição alimentar
domiciliar per capita anual Variação
Produto
(em kg) percentual
2008-2009 2017-2018
Creme de leite 0,384 0,469 22%
Leite condensado 0,666 0,737 11%
Leite de vaca pasteurizado 25,641 20,112 -22%
Leite em pó desengordurado 0,110 0,058 -47%
Leite em pó integral 0,800 0,947 18%
Total de queijos 2,154 2,185 1%
Queijo minas 0,683 0,565 -17%
Queijo mozarela 0,653 0,809 24%
Queijo não-especificado 0,093 0,094 1%
Queijo parmezão 0,062 0,074 19%
Queijo prato 0,332 0,267 -20%
Outros queijos 0,085 0,092 8%
Requeijão 0,246 0,285 16%
Iogurte 2,051 1,554 -24%
Leite fermentado 0,718 0,946 32%
Manteiga 0,273 0,351 29%
Outros 0,078 0,101 29%
Fonte: IBGE. Elaborado pelos autores.

*
Publicado em Milkpoint

– 103 –
Outra questão interessante que pode ser observada nos dados da
POF é a influência que a renda exerce sobre o consumo de lácteos. A
Figura 1 apresenta como o consumo de lácteos se comporta à medida
que a renda familiar varia. É possível notar incrementos significativos
na aquisição domiciliar a cada faixa de renda, de modo que no nível de
rendimento mais elevado (acima de R$ 14.310,00) consome-se 176%
mais leite e derivados do que na menor faixa de renda.

Laticínios
60

50

40
kg/hab

30

20

10

0
Até R$1908,00 de R$1908,00 de R$2862,00 de R$5724,00 de R$9540,00 Mais de
a R$2862,00 a R$5724,00 a R$9540,00 a R$14310,00 R$14310,00
Figura 1. Aquisição domiciliar per capita de lácteos por faixa de renda no Brasil (2017-
2018) (em kg).
Fonte: IBGE. Elaborado pelos autores.

De um modo geral, a Figura 1 representa o comportamento que


se replica para a maioria dos derivados do leite, com as faixas de renda
mais elevadas consumindo significativamente mais lácteos do que as
famílias de classe de renda menor. Isso revela que a renda é um limi-
tador de incremento de consumo no País. A exceção é apresentada na
Figura 2.

– 104 –
Leite em pó integral
1,2

1,0

0,8

0,6

0,4

0,2

0,0
Até R$1908,00 de R$1908,00 de R$2862,00 de R$5724,00 de R$9540,00 Mais de
a R$2862,00 a R$5724,00 a R$9540,00 a R$14310,00 R$14310,00
Figura 2. Aquisição domiciliar per capita de leite em pó integral por faixa de renda no
Brasil (2017-2018) (em kg).
Fonte: IBGE. Elaborado pelos autores.

Como pode ser observado na Figura 2, o único derivado lácteo


que foge à regra da renda é o leite em pó integral. Para este produto, à
medida que a renda familiar aumenta, o consumo decresce. O mesmo
não ocorre para o leite em pó desnatado. Inclusive este derivado está
entre os produtos que apresentam maior incremento de consumo na
maior faixa de renda (Tabela 2).

– 105 –
Tabela 2. Aquisição domiciliar per capita por faixa de renda no Brasil (2017-2018) (em kg/hab).
Variação percentual
De De De De
Até Mais de da última faixa em
Produtos R$1908,00 a R$2862,00 a R$5724,00 a R$9540,00 a
R$1908,00 R$14310,00 relação à penúltima
R$2862,00 R$5724,00 R$9540,00 R$14310,00
faixa de renda
Creme de leite 0,183 0,286 0,484 0,615 0,975 1,021 5%
Leite condensado 0,324 0,510 0,776 1,006 1,300 1,385 7%
Leite de vaca
pasteurizado 11,678 16,882 21,382 24,663 28,341 32,642 15%

Leite em pó
desengordurado 0,035 0,039 0,044 0,047 0,119 0,220 85%

Leite em pó
integral 1,130 1,020 0,852 0,878 0,850 0,859 1%

Total de queijos 0,737 1,226 1,820 2,975 5,105 6,855 34%

– 106 –
Queijo minas 0,288 0,340 0,428 0,637 1,395 1,817 30%
Queijo mozarela 0,222 0,457 0,782 1,199 1,699 2,126 25%
Queijo parmesão 0,017 0,026 0,052 0,095 0,181 0,350 93%
Queijo prato 0,080 0,165 0,217 0,370 0,735 0,724 -1%
Outros queijos 0,017 0,026 0,052 0,117 0,204 0,556 173%
Requeijão 0,062 0,147 0,221 0,443 0,761 0,906 19%
Iogurte 0,787 1,057 1,435 2,023 2,700 3,913 45%
Leite fermentado 0,334 0,564 0,983 1,271 1,766 2,333 32%
Manteiga 0,185 0,200 0,243 0,421 0,579 1,486 157%

Fonte: IBGE. Elaborado pelos autores.


Esses dados indicam que os produtos que têm maior incremento
de consumo na maior faixa de renda são: outros queijos (173%), man-
teiga (157%), queijo parmesão (93%) e leite em pó desnatado (85%).
Apesar do leite fluido ser o produto mais consumido em todas as fai-
xas de rendimento, os produtos apresentados anteriormente são os
que tem o consumo mais impulsionado por rendas mais elevadas.
Entre os “outros queijos” estão incluídos muitos queijos finos
que, como o próprio nome indica, são produtos mais sofisticados. Na
comparação com a aquisição domiciliar do primeiro extrato de renda
(até R$ 1.980,00), o consumo de “outros queijos” da elite brasileira é
3.171% maior. Isso se justifica pelo preço dos produtos que, por si só,
é sinônimo de qualidade, bem como pelo requinte, status e gourmeti-
zação associados ao consumo desses derivados lácteos.
A manteiga é um derivado lácteo que foi desmistificado pela ci-
ência como sendo maléfico para a saúde coronariana e caiu nas graças
dos grandes chefs de cozinha. Assim como ocorreu no resto do mun-
do, os últimos anos foram marcados pelo boom do consumo da man-
teiga em detrimento da queda do consumo de outras gorduras, como
por exemplo, a margarina.
O queijo parmesão na forma original (a peça inteira) também
está associado com pratos e eventos elitizados, apresentando preços
bem elevados para a população de baixa renda. Por fim, o leite em pó
desnatado tem sido muito preconizado em dietas e recomendações
médicas.
Assim, é possível notar que, apesar dos produtos lácteos serem
tão importantes para a saúde e estarem na base da cesta básica, a pes-
quisa do IBGE mostra que o setor só conseguirá incrementos do con-
sumo se a renda da população aumentar, visto que eles são marcada-
mente produtos de rendas mais elevadas.

– 107 –
É cringe consumir lácteos?*

Kennya Beatriz Siqueira


João Pedro Junqueira Schettino
Thaliã Morais Junger Almeida

Há alguns dias, foi matéria nas diversas mídias, uma discussão


entre preferências das gerações Y e Z. Com isso, o tema das diferentes
gerações tornou-se mais conhecido no País.
Esse conceito de gerações vem sendo mais empregado nos últimos
anos para avaliar comportamentos de consumo e traçar estratégias de
marketing. Atualmente, tem-se 6 gerações convivendo juntas no País. A
geração silenciosa é composta por aqueles indivíduos nascidos antes de
1946 ou 1950 (esses limites variam de acordo com o autor considerado).
Essa parcela da população nasceu em um período conturbado de guerras.
Hoje em dia são aposentados e possuem preferência por estabilidade.
Os baby boomers compreendem indivíduos nascidos entre 1946-
1951 e 1964-1965. Esse nome está relacionado à explosão de natalidade
que ocorreu após a Segunda Guerra Mundial. Geralmente são focados
no trabalho, pouco influenciados por marcas, buscam sempre a qualida-
de dos produtos e recebem uma forte influência da TV.
A geração X é constituída por aqueles que nasceram entre 1965 e
1976-1980. É a parcela da população que começou a ter contato com o
meio acadêmico e com experiências internacionais. São influenciados
por marcas, famosos e são tradicionais em suas escolhas.
A geração Y ou milênios compreende os nascidos entre 1976-1980
até 1990-1995. É a geração da tecnologia. São pessoas individualistas,
capazes de realizar várias tarefas ao mesmo tempo, não são influencia-
das por marcas, sendo extremamente questionadores. Além disso, pos-
suem grande preocupação com o impacto ambiental. É a geração que,

*
Publicado em Milkpoint

– 108 –
atualmente, dita as regras, gerando mais impacto sobre o consumo de
alimentos no mundo.
A geração Z engloba os nascidos a partir de 1995 até 2009-2015
e são indivíduos ansiosos, ainda mais individualistas que a geração an-
terior e não são influenciados por marcas. Já a geração alpha envolve
os nascidos a partir de 2009 e 2015. Por ainda se encontrarem na fase
infantil, ainda não se tem muitos estudos sobre estes indivíduos.
De acordo com os dados do IBGE, hoje a maior parte da popu-
lação brasileira é composta das gerações Y e Z (Figura 1). A geração Z
representa quase 34% da população do País e a geração Y representa
pouco mais de 31%. Juntas, as duas gerações mais materialistas, indivi-
dualistas e multitarefas, respondem por quase 70% da nação.

Geração
Silenciosa;
6,56%
Geração Baby
Bommers;
13,48%
Geração Z;
35,93%

Geração X;
12,51%

Geração Y;
31,52%

Figura 1. Divisão da população brasileira de acordo com as gerações.


Fonte: Elaborado pelos autores com base nos dados do IBGE.

– 109 –
Devido a essa grande representatividade e também por seu po-
der de influenciar nas redes sociais, essas duas gerações têm sido o foco
das empresas no lançamento de produtos. No entanto, há alguns dias,
o termo cringe tornou-se popular para descrever a vergonha alheia que
a geração Z sente da geração Y e outras que vieram antes dela. Assim,
neste conflito de gerações, como ficou explícito na internet nas últimas
semanas, para a geração Z é cringe tomar café da manhã, tomar cerveja
de litrão, etc. Mas, será que é cringe consumir lácteos?
Para responder a essa pergunta, foram empregados dados da Pes-
quisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2017/18 do IBGE. Utilizou-se
os dados de consumo de 5 grupos de lácteos: leite fluido, queijo, iogurte,
outros laticínios e total (soma de todas as outras categorias). Em outros
laticínios considerou-se o total de lácteos menos leite fluido, queijo e
iogurte. Assim, em outros laticínios encontram-se manteiga, leite fer-
mentado, leite condensado, creme de leite. Etc. Os valores de consumo
médio e seus respectivos desvios padrões foram determinados por uma
regressão linear não paramétrica que utilizou como variável categórica
preditora a geração do informante.
Para a análise das gerações foram consideradas as seguintes datas
de corte: geração silenciosa (nascimento anterior a 1951), baby boomers
(entre 1951 e 1965), geração X (entre 1966 e 1975), geração Y (entre
1976 e 1995) e geração Z (entre 1996 e 2008). A Figura 2 apresenta os
resultados.

– 110 –
30000

25000

20000

15000

10000

5000

0
Leite fluido Queijo Iogurte Outros laticinios Total
Silenciosa Baby boomers X Y Z
Figura 2. Consumo anual estimado em gramas por geração.
Fonte: Resultados da pesquisa.

Pela Figura 2, é possível perceber que a geração Z não é muito fã


de queijos e iogurtes. Dentre todas as gerações analisadas, a Z foi a que
apresentou menor consumo destes produtos.
Para leite fluido, os maiores níveis de consumo per capita foram
verificados para os dois extremos da população analisada: a geração si-
lenciosa e a geração Z. Porém, a taxa de consumo da geração silenciosa
supera em 1,7 vezes o consumo dos indivíduos da geração Z.
No entanto, quando se considera os demais lácteos (excluindo lei-
te fluido, queijos e iogurte), é que a geração Z se destaca. O consumo
dessa geração é bem superior aos demais, chegando a cerca de 7 vezes
mais consumo do que as gerações silenciosa e X. Assim, no total de lác-
teos consumidos no País, a geração Z é a maior consumidora. Portanto,
pode-se concluir que não é cringe consumir lácteos no Brasil.

– 111 –
A confiança do consumidor brasileiro de leite*

Kennya Beatriz Siqueira

Num país de dimensões continentais como o Brasil, realizar pes-


quisas de mercado para identificar preferências de consumo e tendências
é muito dispendioso. Por isso, muitos organismos utilizam os índices de
confiança do consumidor como um indicativo do comportamento dos
consumidores, já que pesquisas recentes afirmam que estes índices estão
correlacionados com o consumo agregado.
Neste sentido, a consultoria Edelman publicou recentemente o
Barômetro de Confiança no mundo, baseado em entrevistas com 33.000
indivíduos em 27 países, sendo em média, 1.150 por país, conduzidas
no período de outubro a novembro de 2018. Uma característica inte-
ressante dessa pesquisa foi a divisão da população em dois grupos: a
população geral e o público informado. O público informado foi um
grupo selecionado com base em 4 critérios: i) idade entre 25-64 anos; ii)
nível universitário concluído; iii) pertencer ao grupo dos 25% de maior
renda familiar por faixa etária do país; e iv) ter consumo significativo de
mídia e engajamento com notícias sobre políticas públicas e negócios.
O público informado representa 16% do total de entrevistado, enquanto
que aqueles indivíduos acima de 18 anos, que não se enquadravam den-
tro das características do público informado, foram incluídos no grupo
“população geral” que representou 84% dos entrevistados. A Figura 1
mostra que há uma diferença significativa no índice de confiança entre
os dois grupos no Brasil.

*
Publicado em Milkpoint

– 112 –
Diferença
2019 2019 de Confiança
Público Informado População Geral Confiança (60-100)
Neutralidade
64 Global 27 50 Global 27 14 (50-59)
88 China 76 China 12 Desconfiança
84 Arábia Saudita 69 Indonésia 14* (1-49)
83 Índia 69 Arábia Saudita 15
83 Indonésia 68 Emirados Árabes 15
83 Emirados Árabes 66 Índia 17*
74 Canadá 60 Singapura 9
70 Malásia 58 Malásia 12
69 Singapura 54 Canadá 20*
68 México 54 México 14
67 Holanda 54 Holanda 13
66 Hong Kong 52 Hong Kong 14
64 Reino Unido 51 Colômbia 5
61 Coreia do Sul 47 EUA 13
60 Alemanha 46 Austrália 13
60 EUA 46 Itália 7
59 Austrália 45 Argentina 8
59 França 44 África do Sul 9
56 Colômbia 44 Coreia do Sul 17*
53 Argentina 43 Brasil 8
53 Itália 42 Alemanha 18*
53 Japão 41 França 18
53 África do Sul 41 Irlanda 7
* maior
53 Turquia 41 Turquia 12 desigualdade
51 Brasil 40 Reino Unido 24* na confiança já
48 Irlanda 39 Espanha 8 registrada
47 Espanha 37 Japão 16
35 Rússia 28 Rússia 7

Figura 1. Índice de confiança Edelman 2019.


Fonte: Edelman (2019).

O índice de confiança é a porcentagem média da confiança em


ONGs, empresas, governo e mídia1. Pela Figura 1 pode-se observar que,
no caso do Brasil, além de apresentar nível de confiança abaixo da mé-
dia mundial, há uma diferença de 8 pontos percentuais entre o índice
de confiança do público informado e a população geral. Com isso, o

1
O índice de confiança foi construído a partir da pergunta: Segue abaixo uma lista de instituições. Indique o quanto você
confia que cada uma dessas instituições atua corretamente, utilizando uma escala de nove pontos, em que um significa
que você “não confia de forma alguma” e nove significa que você “confia bastante”. Escala de 9 pontos; 4 primeiros, confio.
Público informado, média global de 27 mercados.

– 113 –
público informado está com um índice de confiança neutro enquanto
a população geral apresenta desconfiança. Este cenário é desfavorável
para a indústria em geral, setor de serviços e, para a economia como um
todo. Mas não para a indústria de alimentos e bebidas, conforme mostra
a Figura 2.
Porcentagem de confiança Mudança de 2018 para 2019

83
82
80
78
77
74
74
74
73
73
71
71
69
68

68
67
66
65
65
64
64
64
58
57
54
47
45

16
11
11

10
9

9
7
7
6

6
6
5

5
4
3

3
3

2
2

2
1
0
-1

-1
-3

-5

Figura 2. Porcentagem de confiança na indústria de alimentos e bebidas, em 2018.


Fonte: Edelman (2019).

A Figura 2 mostra que o Brasil é um dos países que mais acre-


dita na sua indústria de alimentos e bebidas (78%), apresentando um
incremento de 16 pontos percentuais em relação ao ano anterior. No
mundo, a média de confiança na indústria de alimentos e bebidas é de
68%, sendo que os níveis maiores de confiança são observados para os
segmentos de mercearias, agricultura e pesca.
Além disso, pesquisa da Fiesp, realizada em 2010 e 2017 mostrou
que, na hora da compra de alimentos, o primeiro fator que os brasileiros
levam em consideração é a marca do produto, mesmo em momentos de
crise econômica. E o leite fluido foi um dos produtos em que a marca

– 114 –
se tornou mais importante, com crescimento de 11 pontos percentuais
entre 2010 e 2017.
Corrobora com essa informação, resultado da pesquisa de Brei-
tenbach e Brandão (2019) realizada no Rio Grande do Sul que entrevis-
tou 1015 consumidores para identificar variáveis que influenciam a de-
cisão de compra de leite fluido. A Figura 3 mostra que a marca foi o item
mais valorizado pelos consumidores, estando acima inclusive de preços.
Ou seja, mais de 90% dos entrevistados consideram a marca como um
fator importante na hora da compra de leite fluido.

Sem importância Pouco importante Importante Muito importante

PROMOÇÃO DE VENDAS 20 33 34 13

EMBALAGEM/RÓTULO 25 34 32 9

RECOMENDAÇÃO DE AMIGOS 23 34 36 8

PREÇO 10 23 47 20

ORIGEM DO LEITE 20 25 32 24

MARCA 4 5 40 51

Figura 3. Grau de importância que o consumidor atribui às variáveis na compra de


leite fluido (em %).
Fonte: Breitenbach e Brandão (2019).

Diante do exposto é possível notar uma possibilidade de agregação


de valor e aumento do volume de vendas para leite fluido no Brasil através
da construção de uma relação de confiança da marca com o consumidor.
A maioria dos consumidores têm uma marca de sua preferência e são fiéis
a ela. Portanto, construir uma marca de confiança parece ser uma estraté-
gia inteligente num mercado tão pulverizado e competitivo.

– 115 –
O poder das marcas*

Kennya Beatriz Siqueira

Num mercado de dimensões continentais e características cultu-


rais, ambientais e socioeconômicas tão distintas como o Brasil, tornar-
se competitivo no ramo de alimentos é uma verdadeira batalha. Por isso,
acompanhar as tendências de mercado e identificar variáveis que afetam
a decisão de compra do consumidor brasileiro é tão importante.
Pesquisas da Fiesp realizadas em 2010 e 2017 mostraram que, no
ramo de alimentos, o fator que mais influencia a decisão de compra dos
brasileiros é a marca. Este item está à frente de sabor e até do preço,
mesmo nos períodos de crise. E o leite está entre os alimentos em que a
marca se mostrou mais relevante (Figura 1).
Para entender melhor a importância das marcas é interessante
analisar um estudo divulgado recentemente pela Kantar, que identificou
as marcas de bens de consumo não duráveis mais adquiridas pelos bra-
sileiros em 2018. Analisando 297 marcas disponíveis no mercado brasi-
leiro, o estudo atribuiu um indicador chamado Consumer Reach Point
(CRP), que considera a quantidade de consumidores que adquiriram
uma marca (penetração) e a frequência com que isso aconteceu. Assim,
um valor de CRP de 100 significa que a marca foi escolhida 100 milhões
de vezes pelos consumidores brasileiros em 2018. A Tabela 1 apresenta
as top 20 marcas no Brasil.

*
Publicado em Milkpoint

– 116 –
2010 2017

Arroz 44 +13p.p.
57
Feijão 36 +18p.p.
54
Café 32 +16p.p.
48
Leite 24 +11p.p.
35
Iogurtes 19
16
Bolachas e biscoitos 14 +7p.p.
21
Alimentos semi prontos 13
10
Macarrão 12 +13p.p.
25
Queijos 12
13
Suco pronto para beber 12
9
Chocolates e bombons 11
9
Óleos para cozinhar 10 +11p.p.
21
Achocolatados em pó 9 +4p.p.
13
Requeijões 9
10
Embutidos 8
9
Suco em pó 6 +4p.p.
10
Peixe e drutos do mar 6
8
Pães 5 +5p.p.
10
Produtos diet e light 4
4
Barras de cereais 3
4
Goiabadas, marmeladas e geléias 3
3
Chás prontos para beber 3
3
*Molhos prontos 15
Nenhum deles 4
11
NS / NR 1
1

Figura 1. Alimentos em que a marca é fundamental na hora da compra, em %.


Fonte: Fiesp (2017).

– 117 –
Tabela 1. Ranking das 20 marcas mais escolhidas no Brasil.
Posição Marca CRP (em milhões)
1 Coca-Cola 489
2 Ypê 485
3 Colgate 304
4 Italac 293
5 Tang 253
6 Nissin 245
7 Nescau 231
8 Soya 232
9 Piracanjuba 229
10 Vitarella 225
11 Qualy 221
12 Sadia 213
13 Omo 210
14 Itambé 204
15 Perdigão 195
16 Sorriso 195
17 Maratá 189
18 Marilan 185
19 Nestle 183
20 Sazon 176
Fonte: Meio e Ambiente.

Entre as 20 marcas mais compradas pelos brasileiros em 2018 es-


tão 5 marcas de produtos lácteos: Italac, Piracanjuba, Qualy, Itambé e
Nestle. Isso evidencia a importância do leite no cenário nacional, já que
5 marcas de produtos lácteos se sobressaíram no País, ficando à frente
de produtos típicos da culinária brasileira, como por exemplo, arroz e
feijão, e até de marcas de café, considerado um dos produtos mais im-
portantes do agronegócio brasileiro.

– 118 –
Além disso, Italac e Itambé figuram também no ranking das 10
marcas que mais cresceram em CRP dentro das Top 100. Ambas apre-
sentaram crescimento de 12%, num ano em que as vendas de supermer-
cados cresceram 2,07% e o faturamento teve crescimento nominal de
0,7%.
As estratégias dessas 5 marcas de produtos lácteos são distintas,
mas vale ressaltar que as duas primeiras (Italac e Piracanjuba) têm se
destacado em campanhas televisivas, assim como nas mídias digitais.
Aliás, as mídias digitais, apesar de amplamente utilizadas por outros se-
tores da economia como o principal canal de comunicação atual com os
consumidores, ainda têm sido ignoradas ou menosprezadas por muitas
empresas de laticínios.
Nas suas últimas campanhas publicitárias, a Italac destacou que é
a marca de lácteos mais comprada do Brasil, construindo, assim, uma
relação de confiança com o consumidor através da diferenciação da
marca. Já a Piracanjuba investiu no marketing dos produtos sem lactose
e em um dos símbolos da geração Y (Bruna Marquezine) para se dife-
renciar no mercado. Com isso, a empresa tornou-se uma das marcas de
lácteos mais bem inseridas nas redes sociais, mostrando que a constru-
ção de uma marca de confiança tem sido uma estratégia eficiente num
mercado tão pulverizado e competitivo como o de leite no Brasil.

– 119 –
Webrooming para leite e derivados*

Kennya Beatriz Siqueira

Os brasileiros estão entre os maiores usuários de internet do mun-


do, atrás apenas dos chineses, indianos e norte-americanos. Em 2018, dos
210 milhões de brasileiros, 70,7% foram usuários de internet, apresentan-
do um percentual maior do que a média mundial, que foi de 54,4%.
Com esse universo de usuários, a rede mundial de computadores
tem movimentado grande volume de negócios no Brasil. Em 2017, fo-
ram gerados 111,2 milhões de pedidos no e-commerce brasileiro, geran-
do um total de R$ 47,7 bilhões em compras.
No entanto, a interação entre mercado físico e mercado online tam-
bém aumentou e dois novos comportamentos já se tornaram tendência: o
showrooming e o webrooming. Showrooming é quando o consumidor vê o
produto na loja física, mas compra online e webrooming é o contrário, ou
seja, o consumidor pesquisa o preço e características do produto na in-
ternet e depois vai na loja física comprar. Mas, especialistas afirmam que
o webrooming está crescendo mais do que o showrooming e estimam que
até o próximo ano, 45% das vendas offline serão influenciadas pela web.
Quando o webrooming começou geralmente se aplicava a compras
de eletrodomésticos, eletrônicos, entre outros produtos de alto valor.
No entanto, agora está se estendendo também para outras categorias de
produtos, como mercearia, produtos de beleza e cuidados pessoais. A
facilidade que a internet oferece para comparação de preços, especifi-
cações dos produtos e até comentários de clientes que já têm o produto,
impulsionaram o webrooming.
De acordo com pesquisas recentes, 78% dos consumidores afir-
mam ter pesquisado produtos online pelo menos uma vez nos últimos
12 meses. Além disso, 80% das buscas na internet terminam em uma

*
Publicado em Milkpoint

– 120 –
venda, e cerca de 75% dessas vendas são feitas na loja física, às vezes no
mesmo dia.
À medida que a webrooming se generaliza, a indústria de alimentos
não pode mais se permitir ignorar a influência da tecnologia nos hábitos
de compra dos consumidores, Dentro do segmento de alimentação, o
webrooming funciona, além da comparação de preços, para examinar
listas de ingredientes e verificar requerimentos nutricionais online antes
de comprar o produto na loja física. Um estudo recente indica que 48%
dos entrevistados em toda a Europa, Oriente Médio e África já estão
usando a internet para comparar alimentos e bebidas e 17% freqüente-
mente mudam de opinião sobre a compra de alimentos e bebidas depois
de verificar as informações online.
Dentro da prática do webrooming, destaca-se também a rede so-
cial Instagram. Pesquisa realizada em abril de 2018, mostra que 50% dos
brasileiros já compraram produtos ou contrataram serviços que desco-
briram no Instagram, sendo que 83% dos entrevistados segue alguma
empresa ou marca na rede social.
Dentre os principais praticantes dessa estratégia de compras está o
público jovem. Pesquisa do Urban Land Institute mostrou que mais da
metade dos milênios (nascidos do início da década de 1980 até o final da
década de 1990) buscam informações na internet antes de ir à loja física
e comprar o produto desejado, em comparação com 11% desse público
que opta pelo showrooming. A tendência é maior entre os clientes com
mais de 25 anos. Os estudos mostram que, tanto o webrooming, quanto
o showrooming são realizados porque as pessoas buscam uma experiên-
cia de compra que seja rápida, confortável e conveniente.
No entanto, poucas indústrias de laticínios brasileiras parecem es-
tar atentas a este comportamento. Considerando as maiores indústrias
de laticínios do país, uma busca na rede social Instagram mostra que
nem todas possuem um perfil ativo na rede e apenas duas empresas têm
um perfil com mais de 100 mil seguidores: Nestle e Laticínios Bela Vista
(marca Piracanjuba).

– 121 –
Por outro lado, não é difícil encontrar empresas do setor que já
vislumbraram o potencial do Instagram para o webrooming. A Ghee Me
More, por exemplo, ainda não tem 100 mil seguidores, mas tem uma
taxa de engajamento muito significativa, com elevado número de curti-
das, visualizações, compartilhamentos e até marcações. Outro exemplo
de laticínios que tem usado a rede Instagram com sucesso é a Verde
Campo. São mais de 230 mil seguidores só na página da empresa e eles
ainda contam com muitos digital influencers pra divulgar a marca. Além
de oferecerem produtos diferenciados e de maior valor agregado, essas
empresas estão conquistando, principalmente o público mais jovem e,
com isso, estão se tornando referência no seu segmento.
Apesar de o Brasil ter uma população que ainda tem na televisão,
a sua principal mídia influenciadora, vale ressaltar também que os in-
vestimentos em marketing na internet tendem a ser bem menos dispen-
diosos do que os investimentos na mídia televisiva. Assim, parecem ser
uma grande alternativa para a indústria de laticínios especialmente nos
momentos de crise que o país vem vivendo.

– 122 –
Alimentos Lácteos Funcionais*

Kennya Beatriz Siqueira

Por definição, alimentos funcionais são aqueles que oferecem be-


nefícios à saúde, além de suas funções nutricionais básicas. Nos últimos
anos, este tipo de alimento tem aparecido em todas as pesquisas de ten-
dências de consumo no mundo, pois a preocupação dos consumidores
com saúde e bem-estar aumentou muito. Estudos da Kerry Group (em-
presa líder do setor de ingredientes para alimentos no mundo) mostram
que, atualmente, 65% dos consumidores mundiais buscam benefícios
funcionais com seus alimentos e bebidas. E os cinco principais ingre-
dientes percebidos para oferecer esse tipo de benefícios são ômega-3,
chá verde, mel, café e probióticos.
De acordo com relatório da consultoria Grand View Research, o
mercado global de alimentos funcionais foi estimado em USD 161,49
bilhões em 2018. No Brasil, pesquisa da Fiesp realizada em 2018, aponta
que oito em cada dez brasileiros se esforçam para ter uma alimentação
saudável e 71% dos entrevistados buscam produtos que tragam benefí-
cios à saúde.
Neste âmbito, os lácteos levam vantagens, alguns por já serem na-
turalmente alimentos funcionais e outros devido à facilidade de manipu-
lação para se tornarem funcionais. Por isso, em 2018, os lácteos lideraram
as vendas no mercado de alimentos funcionais no mundo (Figura 1).

*
Publicado em Anuário do Leite

– 123 –
Cereais e Confeitaria
Lácteos
Carnes, Peixes e Ovos
Derivados da Soja
Óleos e Gorduras
Outros

Figura 1. Participação dos principais grupos de produtos no mercado mundial de


alimentos funcionais, 2018 (%).
Fonte: Grand View Research.

A saúde do coração foi o segmento dominante no mercado de ali-


mentos funcionais, mas os benefícios à saúde intestinal têm sido atual-
mente mais demandados pelos consumidores. Houve um aumento de in-
teresse por alimentos funcionais que promovam a saúde intestinal, já que
os estudos têm mostrado que um intestino saudável é a base para o bom
funcionamento de todo o organismo. Só em 2018, as vendas de bebidas
fermentadas cresceram 20% no mundo. Neste sentido, o kefir passou a
ser mais consumido e os iogurtes, que são ótimos veículos de inclusão de
probióticos na dieta, estão em alta.
No entanto, para este ano, os iogurtes terão de disputar esse merca-
do com vários outros produtos. Em 2020, será possível encontrar probió-
ticos em uma gama muito maior de alimentos, que variam desde queijos
e iogurtes até batata frita. Começam a surgir também mais produtos sim-
bióticos, que misturam probiótico e prebiótico no mesmo alimento.
Ainda dentro da preocupação com a saúde intestinal, estão sur-
gindo no mercado, alimentos focados em proporcionar maior conforto
digestivo. Neste âmbito, despontam os alimentos com baixo FODMAP
(Fermentable Oligossacharides, Dissacharides, Monossacharides And
Poliols). FODMAPS são certas fibras e açúcares que causam desconforto

– 124 –
digestivo em algumas pessoas, como por exemplo, a lactose. Os lácteos
que têm baixo teor de FODMAP e podem chamar a atenção dos con-
sumidores são: leite sem lactose, iogurte sem lactose, manteiga e queijos
curados como cheddar, parmesão, brie e camembert. Nesta categoria, en-
tram também os leites alternativos ou leites vegetais.
Com o envelhecimento da população mundial e brasileira, além dos
alimentos funcionais com ação intestinal, os consumidores têm buscado
também os alimentos nootrópicos, ou seja, aqueles que têm efeito sobre o
desempenho cognitivo, através da memória, concentração, motivação ou
atenção. Foi neste contexto que surgiu o interesse pelo canabidiol (CBD).
Diferente do THC (Tetra-hidrocanabinol), que é o principal componente
psicoativo da maconha, o CBD não produz euforia, dependência, nem
intoxicação e ainda tem potencial para aliviar a dor, estimular a memória
e controlar a ansiedade. Mas, por enquanto, os chefs de cozinha têm usa-
do mais este ingrediente do que as indústrias. Mesmo assim, já é possível
encontrar sorvete e outros lácteos com CBD.
Também no quesito alimentos funcionais, despontam as chamadas
“gorduras boas”. Assim como ocorreu com o ovo, a manteiga já foi uma
das principais vilãs quando o tema colesterol começou a ser debatido,
mas na última década voltou a ser valorizada e reconhecida como ali-
mento recomendado para consumo regular. Com isso, surge agora como
um produto com novas versões funcionais e propriedades consideradas
vantajosas para a saúde. Rica em ácidos graxos considerados essenciais ao
organismo humano, a manteiga está voltando aos lares brasileiros como
uma proposta de excelente fonte de gorduras boas para a dieta e também
fonte de proteínas e vitaminas. Além disso, o produto que era apenas co-
mercializado nas versões com e sem sal, atualmente já pode ser encontra-
do em diversas outras composições no varejo: temperado, aromatizado,
orgânico, sem lactose, com baixo teor de sódio, entre outros. Outro de-
rivado do leite que também está aproveitando essa onda das “gorduras
boas” é o ghee. Produto típico da culinária indiana, o ghee é um tipo de
manteiga clarificada, muito semelhante à manteiga de garrafa brasileira,

– 125 –
que é considerado uma gordura mais saudável do que a manteiga e que
tem baixo teor de FODMAPs.
Por fim, no quesito alimentos funcionais é interessante falar de cor.
Em 2020, a cor que remete aos alimentos funcionais é o roxo. Sinônimo
de saudável, o roxo é a cor natural de alguns dos considerados supera-
limentos como mirtilo, amora e couve roxa. Com isso, já é possível en-
contrar muitos lácteos roxos no mercado, como, por exemplo, sorvete,
iogurtes e até queijos.
Portanto, é possível observar que no mercado de alimentos funcio-
nais, os lácteos se destacam. Alguns já são naturalmente reconhecidos pe-
los consumidores como produtos funcionais. Outros, com pouco esforço
da engenharia de alimentos, podem se tornar lácteos funcionais. Mas, no
fim, todos eles são produtos de maior valor agregado e que atendem a
uma das principais tendências no consumo: alimentos que forneçam be-
nefícios à saúde.

– 126 –
O empoderamento do consumidor*

Kennya Beatriz Siqueira

Nós já estamos no terceiro mês do ano, mas ainda há tempo para


falar de tendências para o mercado lácteo em 2020. De acordo com os
grandes institutos de pesquisa, os próximos anos devem se caracterizar
por três macrotendências: fragmentação do mercado, porções individu-
ais e envelhecimento da população. Neste primeiro artigo, vamos tratar
apenas da fragmentação do mercado, dando sequência aos demais as-
suntos nos próximos meses.
Depois dos áureos anos da indústria de transformação, da pro-
dução agrícola e até da internet, agora estamos vivendo a era dos con-
sumidores. O crescente uso das tecnologias da informação e comu-
nicação (TIC) está transferindo o poder do mercado de fornecedores
para consumidores. Com uma maior disponibilidade de alimentos nos
supermercados, associada ao aumento do poder de compra e mais in-
formação disponível sobre tudo e todos, ocorreu o empoderamento do
consumidor. Atualmente, 70% da população brasileira já tem acesso à
internet, ou seja, cerca de 126,9 milhões de pessoas pesquisam diaria-
mente conteúdos na rede virtual. Com mais conhecimento e acesso à
informação, agora são os consumidores que mandam e por isso é tão
importante entender a sua lógica de pensamento.
No entanto, enganam-se as empresas que ainda acreditam que
conseguem apenas manter seu portfólio histórico de produtos para
atender a todos os consumidores do país. O mercado de alimentos,
principalmente, está vivenciando uma fragmentação de tribos. Essa
megatendência, que veio pra ficar, se caracteriza pela divisão de consu-
midores em tribos com objetivos e filosofias de vida e saúde específicos.
Esse comportamento é resultado de uma mudança de comportamento

*
Publicado em Milkpoint

– 127 –
dos consumidores, que deixaram de ouvir apenas conselhos de médicos
e profissionais de saúde. Atualmente, pesquisas médicas recém publica-
das são amplamente divulgadas nas diversas mídias e os influenciadores
digitais se encarregam de tornar o conteúdo digerível, de fácil acesso e
muito mais atrativo para todos. Com isso, dados da PwC mostram que
77% das decisões de compra hoje no Brasil são influenciadas pelas redes
sociais. De acordo com uma pesquisa da Spark, entre os itens mais com-
prados a partir da indicação de um influenciador digital estão os pro-
dutos de beleza (52%), seguidos por livros e acessórios de moda (42%),
alimentos e bebidas (30%) e smartphones (29%).
Há uma mudança visível no comportamento do consumidor em
sua independência e determinação em participar ativamente na co-cria-
ção de valor das empresas. Com isso, as pessoas estão buscando aquilo
que mais se adequa ao seu estilo e perfil e formando inúmeras tribos.
Tem as tribos dos que amam leite e a dos que odeiam. A tribo dos aman-
tes de plantas e dos cultivadores de micróbios do intestino. A tribo dos
que buscam saúde acima de tudo e a dos que não dispensam o prazer
proporcionado pela alimentação. Alguns consumidores vêem o valor
no preço, ou na qualidade. Outros na honestidade da marca. Mas todos
esperam que as empresas entendam e atendam suas necessidades. No
entanto, pesquisa da Salesforce aponta que 63% dos consumidores acre-
ditam que as empresas não os conhece, enquanto um levantamento da
Wantedness encontrou que 79% dos americanos considera ter relações
com marcas que, de fato, os compreendam e que demonstrem preocu-
pação com o seu público. Isso sugere que o relacionamento entre marca,
produto e cliente deve ser estreitado. Indica também que não importa
se você vende o produto X ou Y, mas sim se você vende o produto que
atende às exigências do consumidor da tribo A, B ou C.
A boa notícia é que há espaço para todo tipo de produto, desde
os mais excêntricos, até os mais naturais e tradicionais. O que mudou
é o tamanho dos mercados. As grandes empresas que estavam, antes,
acostumadas a ter um produto de massa que atenderia a grande parcela

– 128 –
da população, agora precisam ter vários produtos distintos para aten-
der a essa mesma parcela da população. Mas não significa que os lucros
serão menores. Os lucros podem até ser bem maiores, dependendo da
agregação de valor percebidos pelos consumidores. E mudou também
o marketing desses produtos, que devem ser direcionados para a tribo
ou nicho específico a que ele se destina, especialmente nas redes sociais.
E como tudo isso se encaixa no universo dos lácteos? Como
existem muitos nichos, eles são menores em tamanho e o sucesso das
marcas será medido pela habilidade de se atender duas, três ou mais
tribos aos mesmo tempo. Assim como no mercado financeiro, o mo-
mento é para as empresas de laticínios apostarem na diversificação,
ofertando tanto o leite in natura até o leite vegano, ou até mesmo um
blend dos dois. Existe consumidor para os lácteos com sabores exóti-
cos. Mas também existe aquele que quer mesmo o sabor da roça, da
infância, da fazenda. Assim, inovar ou diferenciar o seu produto (seja
na forma, sabor, textura, embalagem, etc) tornou-se tão importante
quanto o gerenciamento de custos ou de lucro, pois as tribos são mu-
tantes e buscam sempre novidades.

– 129 –
Valorização do bem-estar animal pelo
mercado consumidor*

Kennya Beatriz Siqueira

Os últimos estudos de tendências de mercado no mundo têm


mostrado um mercado consumidor muito fragmentado, dividido em
tribos, com objetivos e filosofias bem específicos. Uma dessas tribos que
vem ganhando muitos adeptos no mundo todo é a que valoriza susten-
tabilidade e bem-estar animal.
Diante das mudanças de valores sociais, das condições climáticas
e econômicas e da instabilidade política, as pessoas estão questionando
crenças antigas, incluindo a noção de que o crescimento a qualquer cus-
to não é aceitável. Assim, os consumidores estão incentivando as orga-
nizações a reconsiderar sua visão de mundo em seus negócios.
Pesquisa da Nielsen de 2015 mostrou que 66% dos consumidores
no mundo estão dispostos a pagar mais por empresas comprometidas
com o meio ambiente, o que inclui o bem-estar animal. Já a Eccon Solu-
ções Ambientais encontrou que 90% dos consumidores mundiais con-
sideram sustentabilidade na decisão de compra; 95% estão dispostos a
pagar por sustentabilidade e 65% pagaria 10% a mais por um produto
sustentável.
No Brasil, já existem algumas pesquisas sobre o tema. No entanto,
as mais significativas não têm foco no leite. Uma pesquisa do Instituto
COPPEAD de Administração, da Universidade Federal do Rio de Janei-
ro, realizada em 2010, fornece resultados interessantes sobre a reação
dos consumidores com relação ao bem estar animal no mercado de car-
nes. Os consumidores foram incentivados a imaginar uma situação de
compra de carne em um supermercado, com duas opções, sendo uma
certificada e a outra não. Do total de entrevistados, 90% escolheram o

*
Publicado em Anuário do Leite

– 130 –
produto com o selo de garantia. Além disso, os resultados mostraram
que somente cerca de 14% dos respondentes não estariam dispostos a
pagar mais caro pela certificação. Os demais:
• 31,8% pagariam um adicional de até 20%;
• 21,8% pagariam até 40%; e
• 32% estariam dispostos a pagar um adicional superior a 40%.
Esses dados dão uma dimensão do valor agregado que o leite e
seus derivados certificados podem ter no mercado brasileiro.
Outro estudo científico realizado em 2017, avaliou a preferência
dos brasileiros pelo tipo de produção (confinado ou não) para dife-
rentes animais (bovinos de corte, frangos de corte, galinhas poedeiras,
matrizes suínos ou leitões em amamentação). Os resultados indicaram
preferência significativa pelos métodos que proporcionam mais liber-
dade aos animais. Apesar de também não incluir a produção de leite
na análise, este estudo reforça a ideia de que as práticas de criação de
animais que são associadas às restrições de movimento podem não estar
alinhadas com as expectativas de grande parte consumidores.
Encomendada pela World Animal Protection, pesquisa da Ipsos
realizada em 2016 no Brasil mostrou que 82% dos consumidores com-
prariam produtos que tivessem um selo de bem-estar animal (Figura 1).
Desse total, 47% pertence à classe A e 45% têm entre 40 e 45 anos. Ou
seja, o grau de preocupação com o bem-estar animal no Brasil varia de
acordo com a renda e idade.

– 131 –
Com certeza não compraria 4%

Provavelmente não compraria 3%

Não sei se compraria 12%

Provavelmente compraria 46%

Com certeza compraria 36%

0% 10% 20% 30% 40% 50%


Figura 1. Intenção de comprar produtos com selo de proteção com bem-estar animal.
Fonte: Pesquisa Ipsos/World Animal Protection.

Os resultados também indicam que 91% dos entrevistados acre-


ditavam que animais produzidos com bem-estar dão origem a produtos
de maior qualidade. No Brasil, 73% dos consumidores acreditam que os
produtos com selo de produção com bem-estar animal são mais caros.
No entanto, apenas metade dos consumidores afirmaram ler os rótulos
dos produtos de origem animal antes de comprar.
Essa preocupação crescente com o meio ambiente fez com que a
bolsa de valores e futuros do Brasil, a B3 criasse o Índice de Sustenta-
bilidade Empresarial (ISE) em 2005, como forma de valorizar empre-
sas e grupos comprometidos com sustentabilidade, estabelecendo um
parâmetro de diferenciação destas em relação aos concorrentes. Este
foi o primeiro índice de sustentabilidade em bolsas da América Latina.
O ISE mede a sustentabilidade corporativa de empresas que negociam
suas ações na bolsa de valores, medindo o retorno médio de uma car-
teira teórica de ações de empresas de capital aberto listadas na B3 que
têm as melhores práticas em sustentabilidade. Para compor este índice
são levados em consideração os seguintes fatores: eficiência econômica,
equilíbrio ambiental, justiça social e governança corporativa. Busca-se,
desse modo, a valorização de empresas e grupos comprometidos com

– 132 –
sustentabilidade, estabelecendo um parâmetro de diferenciação destas
em relação aos concorrentes.
A criação desse índice é um incentivo à adoção de boas práticas
ambientais pelas empresas, além de permitir mensurar a influência po-
sitiva dessas práticas no desempenho financeiro das empresas. Os dados
da B3 mostram que empresas da carteira ISE têm valor de mercado 10-
19% maior que o grupo controle.
No entanto, não há nenhuma indústria de laticínios com capital
na B3. Além disso, apesar de, no Brasil, já haver certificação e selo para
bem-estar animal, poucos agentes do setor lácteo têm esta certificação,
já que isso exige um certo grau de investimento. Isso sugere que, apesar
do interesse e demanda do consumidor, o setor lácteo ainda não está
investindo nisso. Mas, num futuro próximo, provavelmente as empresas
serão mais cobradas e precisarão pensar na certificação não como uma
agregação de valor, mas sim como uma necessidade para se manterem
no mercado, pois a medida que o consumidor vai ficando mais informa-
do, ele exige mais das empresas.

– 133 –
O que podemos aprender com o mercado de café?*

Kennya Beatriz Siqueira

Você já ouviu falar sobre as Ondas de Consumo do Café? Cada


período da história do consumo do café é chamado de onda. São mo-
mentos históricos ou fases que mostram a evolução do consumo da be-
bida no Brasil e no mundo.
A primeira onda marca a popularização do consumo de café, com
muitas marcas disponíveis nas prateleiras dos supermercados. Neste pe-
ríodo, o café era apenas uma commodity.
A segunda onda surgiu com as cafeterias e os cafés espressos, que
eram mais intensos, mas sem a preocupação com a qualidade do grão.
Nesse período, consumir café espresso era sinônimo de glamour. Além
disso, outras misturas começaram a ser apresentadas ao consumidor:
café com leite, cappuccino, etc.
Já a terceira onda remete a uma experiência sensorial. O café co-
meçou a ser degustado, assim como o vinho. Com isso, a rastreabilida-
de, denominação de origem e qualidade dos grãos ganhou relevância.
Ou seja, o protagonista passou a ser o grão de café.
Estudiosos já falam na quarta onda do café, quando os cafés gour-
met e especiais podem ser encontrados nas gôndolas dos supermerca-
dos. As pessoas já têm mais conhecimento sobre o processo de produ-
ção e origem dos grãos e até fazem a própria torrefação em casa.
Portanto, pode-se observar que o mercado de café já é bem evolu-
ído, passando por 4 ondas de consumo. Mas, e o mercado do leite? Em
que onda de consumo se encontra?
Analisando o consumo de leite no Brasil ao longo dos anos, ob-
serva-se um incremento expressivo. Entre 2000 e 2013, o consumo per
capita de leite e derivados cresceu 41%. Se considerarmos um período

*
Publicado em Milkpoint

– 134 –
mais distante, como 1980, o aumento foi mais significativo: 74%. Nesse
período, o número de marcas de leite longa vida (derivado lácteo mais
consumido) se multiplicaram nos supermercados, fazendo com que o
produto se tornasse praticamente uma commodity. Isso, se parece muito
com a primeira onda de consumo do café.

180 175,9 175,5


173,3 172,2
169 168,7 170,8
170 166,6 167,9
160
160
153
150
141
140 136 136
132
130 127 128
124 124
121
120

110

100
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019
Figura 1. Evolução do consumo aparente per capita de leite e derivados no Brasil.
Fonte: Embrapa.

No entanto, o mercado lácteo parece não ter tido uma segunda


onda semelhante a do café, mesmo porque o setor não tem nada similar
às cafeterias para trazer o glamour ao consumo de leite e derivados. Em
termos de restaurantes ou franquias específicas para o consumo de lác-
teos, existem as sorveterias e queijarias. Algumas até com muito requin-
te e glamour. Na verdade, existem também algumas iniciativas isoladas,
como o The Loft Restaurant at the Traderspoint Creamery, em Indiana,
nos Estados Unidos, cujos lácteos são a atração principal do menu.
Porém, dentro do mercado de leite e derivados, está mais nítido
um movimento semelhante à terceira onda do café, em que as vacas se
tornam mais protagonistas. Impulsionado pela pressão do consumidor,
pode-se observar nos últimos tempos, uma preocupação maior com a
rastreabilidade dos derivados lácteos, com a denominação de origem,
no caso dos queijos, entre outros fatores. A experiência sensorial e emo-

– 135 –
cional também tem se sobressaído recentemente, com lançamentos de
produtos com embalagens mais atraentes, que remetem a saudabilidade,
ou regionalismo, ou conveniência. Conhecer a história por trás do pro-
duto consumido, já é uma demanda dos amantes dos lácteos.
Com isso, o slogan “Da semente à xícara” usado no mercado cafe-
eiro, pode ser transformado para “Da vaca ao copo de leite”. No entan-
to, vale ressaltar que ainda estamos no início dessa onda de consumo
do leite. O mercado ainda não atingiu um nível de maturação. Mas, já
se observam mudanças de comportamento, no sentido de consumo de
produtos mais gourmet, mais especiais. Neste caso, os produtos espe-
ciais podem ser com mais nutrientes, com mais história, com mais pra-
ticidade, com mais excentricidade. Enfim, com algum valor agregado
que faça o consumidor querer degustar esse derivado lácteo, como se
degusta um bom café ou um bom vinho.

– 136 –
Tendências para o mercado lácteo em 2021*

Kennya Beatriz Siqueira

2021 começou e com ele a expectativa de dias melhores. Começa


também a necessidade de encarar o novo e buscar as novas tendências
para os 365 dias que virão. No ramo de alimentos e bebidas, o ano de
2021 deve fortalecer algumas tendências que se destacaram durante a
pandemia., que são:
1) A popularidade dos produtos e bebidas à base de plantas
2) Busca por fortalecimento do sistema imune
3) Perda de peso
4) Sustentabilidade
Embora o setor lácteo mundial tenha observado o crescimento
do consumo em 2020, a popularidade dos produtos ou bebidas vegetais,
ou seja, à base de plantas, está aumentando. No início da pandemia, es-
ses produtos alternativos dos lácteos ficaram encalhados nas prateleiras
dos supermercados. Mas, agora a demanda por eles aumentou, de forma
que a Global Market Insights estima que esse segmento deve chegar a
US$ 21 bilhões em 2026.
No mercado brasileiro, os produtos à base de plantas já são encon-
trados em grande número e variedade. E não se restringem só a bebidas.
Atualmente, já se encontram também no Brasil: iogurtes, queijos e man-
teiga. E a base desses produtos, não se limita apenas à soja, como era na
década passada. Existem também produtos à base de arroz, amêndoa,
coco, castanha de caju e aveia. No mercado internacional, é possível en-
contrar ainda produtos que são um mix de vegetais e leite de vaca, o que
mostra que o setor está se reinventando.
Mas as principais inovações no setor lácteo em 2021 devem ser no
sentido de oferecer produtos voltados para o fortalecimento do sistema

*
Publicado em Milkpoint

– 137 –
imune. Com a pandemia, a busca por este tipo de produto aumentou e
isso deve continuar em 2021. De acordo com Innova Consumer Sur-
vey, 6 de cada 10 consumidores no mundo está buscando alimentos e
bebidas para aumentar a sua imunidade. Assim, pelo menos no início
do ano, as inovações e oportunidades para os lácteos devem focar na
adição de ingredientes para aumentar a imunidade, como por exemplo,
vitaminas C, B6 e ômega 3.
Isso reforça a oportunidade para alimentos de alta densidade nu-
tricional, como os lácteos. Os iogurtes, em especial, devem se beneficiar
dessa tendência, visto que já são reconhecidos como alimentos que au-
mentam a imunidade. A empresa de pesquisa de mercado Technavio
estima uma taxa composta de crescimento anual de mais de 5% para o
mercado de iogurte.
Ainda na tendência de fortalecimento da imunidade, as cores e sa-
bores se tornam atrativos para os consumidores, pois, por exemplo, cores
vibrantes e sabores cítricos remetem à vitamina C, enquanto o roxo está
associado aos superalimentos (batata doce, mirtilos, couve-roxa, etc).
Ainda neste sentido, a preocupação com a saúde intestinal e cere-
bral deve permanecer em alta, numa abordagem mais holística da saúde.
A busca por alimentos que beneficiem a saúde intestinal já vem há algum
tempo, com produtos direcionados para atuação na microbiota intestinal,
mas que resultam em melhorias de problemas metabólicos, controle de
peso, melhoria da imunidade e bem-estar emocional. Nesse sentido, os
lácteos têm uma vantagem, já que são ótimos veículos para prebióticos,
probióticos e simbióticos, atuando assim, na saúde intestinal.
Além do intestino, a saúde cerebral começa a ganhar destaque
desde o ano passado. Mesmo antes da pandemia, os alimentos nootró-
picos estavam no radar da indústria de alimentos. Alimentos nootró-
picos são aqueles que têm efeito sobre o desempenho cognitivo, seja
através da memória, concentração, motivação e atenção. Como os ido-
sos se tornaram a atenção da sociedade durante a pandemia, este tipo
de alimento que fortalece e previne um dos problemas relacionados à

– 138 –
velhice, ajudando a envelhecer bem, deve se sobressair, embora em pro-
porção muito menor do que os alimentos destinados ao fortalecimento
do sistema imune.
Outra questão que está no centro das atenções dos consumidores
atualmente é o ganho de peso extra durante a quarentena. Os ameri-
canos criaram até um termo para se referir a esse ganho de peso: Qua-
rantine 15. Assim, para perder esses Quarantine 15, os consumidores
devem buscar os exercícios físicos associados a alimentos que auxiliem
na perda de peso, ou que forneçam mais benefícios em menos calorias.
Nesse sentido, os lácteos, em especial, os lácteos funcionais, se sobres-
saem oferecendo proteínas, além de muitos outros nutrientes essenciais.
Por fim, a pandemia fortaleceu uma tendência que já existe há
um certo tempo: a sustentabilidade. Estudos mostram que cerca de dois
terços dos consumidores desejam ter um impacto positivo no meio am-
biente por meio de suas ações diárias. E isso inclui as compras de ali-
mentos e bebidas. Assim, as indústrias de laticínios devem demonstrar
seu compromisso com a sustentabilidade em todo o ciclo do produto,
pois os consumidores querem conhecer os bastidores da produção. Nes-
se setor tão rotulado pela emissão de gases de efeito estufa e maus tratos
aos animais, a chave para o sucesso pode estar na forma de comunicar
os esforços de sustentabilidade para o consumidor final.
Em suma, existe muito espaço para inovação no setor de laticínios
em 2021. Essa inovação pode se dar por novos produtos, incorporação
de ingredientes, comunicação com o consumidor, investimentos em no-
vas cores, sabores, benefícios e formatos. Mas, no fim, o que consumi-
dor de 2021 está buscando são produtos de maior valor agregado.

– 139 –
Quanto os consumidores de lácteos estão
pagando a mais por saudabilidade?*

Kennya Beatriz Siqueira


Therys Senna de Castro Oliveira
Davi Oliveira Chaves

Que a pandemia provocou mudanças profundas no mundo todo,


ninguém pode negar. E não foi diferente no mercado de alimentos e be-
bidas. Neste segmento, uma das mudanças de comportamento do con-
sumidor que ganhou força foi a busca por saudabilidade.
De acordo com o dicionário, saudabilidade é a qualidade do que
é saudável, mas quando se fala de tendências de mercado, esse concei-
to é mais abrangente, envolvendo hábitos alimentares que visam mais
qualidade de vida, bem-estar e saúde. Esse conceito surgiu em paralelo
com o crescimento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs)
relacionadas aos maus hábitos alimentares, sedentarismo e obesidade
da população. No entanto, o termo ganhou ainda mais destaque no pe-
ríodo da pandemia do novo coronavírus.
Para enfrentar os desafios dessa nova doença, as pessoas estão in-
vestindo em uma alimentação mais saudável. Neste sentido, os produ-
tos probióticos se sobressaíram, visto que os estudos comprovam sua
atuação sobre a saúde intestinal, a qual tem inúmeros reflexos sobre o
funcionamento de diversos órgãos.
No segmento lácteo, os iogurtes são os principais lácteos comer-
cializados com ação probiótica. Apesar do consumo regular de iogurte
já estar associado com a proteção contra enterites, melhoria das respos-
tas imunológicas, prevenção do câncer intestinal, redução do colesterol,
redução de Diabetes tipo 2, entre outras coisas, os iogurtes probióticos
apresentam ainda mais benefícios para os consumidores. Estudos apon-

*
Publicado em Revista Leite Integral

– 140 –
tam que, com o consumo regular de iogurte probiótico, há a regulação
do trânsito intestinal, limitação da resposta à estimulação química, que
ocorre na musculatura lisa do ceco e atividade anticarcinogênica do có-
lon, com a inibição da formação de células tumorais. A ação probiótica
também atua sobre doenças autoimunes, problemas da pele e transtor-
nos de humor. Quando se trata de transtornos de humor, as formulações
probióticas atuam ainda de forma positiva no aumento dos níveis de
serotonina, podendo ser adjuvantes à terapia padrão do tratamento de
depressão moderada.
Todas essas vantagens do iogurte probiótico se refletem em um
valor agregado maior para o consumidor. Para analisar o quanto o con-
sumidor está pagando a mais por essa saudabilidade do iogurte probi-
ótico, nós avaliamos 123 produtos nos meses de fevereiro e março de
2021. Foi realizada uma coleta de preços de iogurtes tradicionais e pro-
bióticos, em embalagens econômicas (a qual chamamos de G) e emba-
lagens individuais (a qual chamamos de P), por meio do site Bluesoft
Cosmos, que apresenta preços médios para o Brasil.
Para comparar os preços foi empregado o gráfico Boxplot. Este
gráfico é composto pelos seguintes elementos: uma caixa (box), que
contém 50% dos dados; uma linha no interior que representa a mediana
(valor do meio desse conjunto de dados em questão); marcação que re-
presenta a média dos valores; limitado por hastes ou caldas inferiores e
superiores, com característica de extensão até o último ponto da amos-
tra dentro do limite de 1,5 vezes a altura da caixa ; outliers representados
por um círculo preto, sendo estes valores atípicos ou discrepantes. Este
gráfico é uma ferramenta de análise descritiva, que permite comparar
os preços que o consumidor pagou pelo iogurte probiótico, em relação
ao iogurte tradicional, em ambos os tipos de embalagem. A Figura 1
apresenta os resultados.

– 141 –
4

Tradicional G Probiótico G Tradicional P Probiótico P


Figura 1. Variação de preços dos iogurtes tradicionais e probióticos no mercado
brasileiro.
Fonte: Resultados da pesquisa.
Obs: Os preços foram todos normalizados para R$/100 g.

Na análise do boxplot, quando as caixas (box) estão totalmente se-


paradas é um indicativo de que há diferença significativa entre os dados.
Neste caso, podemos observar que tanto para a embalagem econômica
(G), quanto para a embalagem individual (P), há separação das caixas
entre os iogurtes tradicional e probiótico. Portanto, há diferença signifi-
cativa nos preços desses produtos.
Assim, na categoria de embalagem econômica, o consumidor bra-
sileiro pagou, em média, em fev-mar/21, R$ 0,81/100 gramas de iogurte
tradicional. No mesmo período, o preço médio pago pelo iogurte pro-
biótico foi de R$ 1,20/100 gramas. Portanto, o consumidor pagou quase
50% a mais pelo iogurte probiótico, em comparação com o iogurte tra-
dicional.
Na comparação feita para a embalagem individual, a diferença foi
ainda maior. Pelo iogurte tradicional na embalagem individual, o con-
sumidor pagou, em média, R$ 1,23/100 gramas do produto, ao passo

– 142 –
que para o iogurte probiótico, o preço pago foi, em média, R$ 2,32/100
gramas. Com isso, a população está pagando quase 90% a mais para
adquirir o iogurte probiótico.
Como o preço reflete o equilíbrio entre oferta e demanda, os va-
lores mais elevados do iogurte probiótico indicam que realmente, a
tendência de saudabilidade está em alta no País, visto que, mesmo em
um momento de crise econômica, as pessoas estão pagando mais por
produtos que ofertam mais benefícios à saúde. Além disso, a diferença
de preços entre as embalagens analisadas evidencia que a conveniência
também é um fator importante para aqueles consumidores que buscam
a saudabilidade, pois o preço pago pelo iogurte probiótico em embala-
gem individual encontra-se em um patamar bem superior ao dos de-
mais produtos.
Assim, a empresa que souber posicionar seus produtos dentro
dessas tendências de mercado pode auferir lucros significativos, ape-
nas atendendo às necessidades do consumidor neste período tão de-
safiador.

– 143 –
Estudos mostram potencial dos lácteos no
tratamento de Artrite Reumatoide*

Kennya Beatriz Siqueira

A artrite reumatoide (AR) é um tipo de reumatismo, uma doença


autoimune caracterizada por inflamação crônica de múltiplas articula-
ções, erosão óssea e destruição da cartilagem, podendo levar a transtor-
no articular progressivo, dor significativa e incapacidade funcional. A
prevalência de AR varia de 0,5 a 1% entre os adultos em todo o mundo,
com uma maior incidência em mulheres. Ela afeta dezenas de milhões
de pessoas no mundo e está associada ao aumento da mortalidade por
complicações sistêmicas e cardiovasculares, podendo ocorrer em qual-
quer idade, sendo mais comum entre 20 e 50 anos.
Apesar dos inúmeros estudos sobre a AR, a etiologia exata da
doença ainda não é completamente conhecida. No entanto, estudos
recentes têm indicado que algumas bactérias da microbiota comensal,
presentes no trato gastrointestinal, podem inibir ou acentuar a resposta
imunológica associada a AR, sugerindo que a modulação da microbiota
intestinal pode ser uma estratégia terapêutica efetiva para o tratamento
adjuvante dessa doença.
Uma forma alternativa e natural de se modular a microbiota in-
testinal seria o consumo de produtos probióticos, prebióticos e simbió-
ticos. Probióticos são microrganismos vivos, que quando administrados
em quantidades adequadas, conferem benefícios à saúde do hospedeiro.
Eles atuam na microbiota intestinal humana. Prebióticos são carboidra-
tos não-digeríveis que estimulam o crescimento e/ou a atividade de um
grupo de bactérias no colo, trazendo benefícios à saúde do indivíduo.
Simbióticos são compostos pela mistura de probióticos e prebióticos em
um mesmo produto.

*
Publicado em Milkpoint

– 144 –
Neste sentido, várias cepas de probióticos já foram testadas em
laboratório para avaliar o impacto sobre a evolução da AR. Algumas
cepas que apresentaram resultados positivos sobre o tratamento da AR
foram:
• Lactobacillus rhamnosus GR-1 em associação com L. reuteri
RC-14
• Lactobacillus casei 01
• Lactobacillus helveticus HY7801
• Bacillus coagulans GBI-30
• B. coagulans e o prebiótico inulina
Entretanto, os melhores resultados clínicos e na resposta meta-
bólica em pacientes com AR foram obtidos por Zamani et al. (2017),
que administraram um produto simbiótico contendo Lactobacillus aci-
dophillus, Lactobacillus casei e Bifidobacterium bifidum e inulina. Após
8 semanas, os pacientes apresentaram redução significativa nos níveis
de proteína C reativa, melhora no escore de atividade da doença e na
Escala de Avaliação Visual de Dor.
Assim, há indícios de que os probióticos, prebióticos e simbióticos
tenham uma ação imunomoduladora com redução do processo infla-
matório na AR e estão sendo propostos como uma alternativa para ma-
nipular a microbiota intestinal e, consequentemente, reduzir o risco de
desenvolver e, ou tratar a AR. Sabe-se também que, no ramo alimentí-
cio, uma das melhores bases para adição de probióticos, são os produtos
lácteos e, em especial, os produtos lácteos fermentados. Por serem ali-
mentos fáceis de serem fortificados ou enriquecidos, muitos derivados
do leite servem de base para adição de probióticos, sendo mais comum a
presença de probióticos nos bioiogurtes e leites fermentados. Entretan-
to, os queijos também podem ser veículos de probióticos e no mercado
internacional, encontram-se até sorvetes com adição de probióticos.
Isso, somado ao fato de que o consumo de alimentos funcionais
e a busca por alimentos que se traduzam em benefícios à saúde têm
aumentado entre os consumidores do mundo todo, faz dos probióticos

– 145 –
em base láctea, uma alternativa interessante para se alcançar melhorias
no tratamento da AR. Soma-se a isso, estudo recente de Bordoni et al.
(2017) que evidenciou que produtos lácteos, de um modo geral, exibem
uma atividade anti-inflamatória em humanos. Quando analisadas as ca-
tegorias de produtos lácteos, os derivados fermentados se destacaram,
apresentando uma resposta anti-inflamatória única. Pei et al. (2018)
reforçaram isso, ao demonstrar que o consumo de iogurte desnatado
reduz alguns biomarcadores de inflamação crônica.
Diante do exposto, os avanços recentes da ciência mostram-se
animadores para a cadeia produtiva do leite, visto que reforçam o papel
dos lácteos como alimentos funcionais. Com isso, abre-se um universo
de possibilidades para os lácteos, pois os alimentos funcionais represen-
tam uma tendência de mercado que veio para ficar e têm apresentado
franco crescimento de vendas nos últimos anos.

– 146 –
Referências Bibliográficas

BORDONI, A.; DANESI, F.; DARDEVET, D.; DUPONT, D.;


FERNANDEZ, A.S.; GILLE, D.; SANTOS, C.N.; PINTO, P.; RE,
R.; REMOND, D.; SHAHAR, D.R.; VERGERES, G. (2017) Dairy
products and inflammation: A review of the clinical evidence. Critical
Review in Food Science and Nutrition, 57:12, 2497-2525, DOI:
10.1080/10408398.2014.967385

PEI, R.; DIMARCO, D.M.; PUTT, K.K.; MARTIN, D.A.;


CHITCHUMROONCHOKCHAI, C.; BRUNO, R.S., BOLLING, B.W.
(2018) Premeal Low-Fat Yogurt Consumption Reduces Postprandial
Inflammation and Markers of Endotoxin Exposure in Healthy
Premenopausal Women in a Randomized Controlled Trial. J. Nutr. Jun
1;148(6):910-916.

ZAMANI, B.; FARSHBAF, S.; GOLKAR, H.R.; BAHMANI, F.; ASEMI,


Z. (2017) Synbiotic supplementation and the effects on clinical
and metabolic responses in patients with rheumatoid arthritis: a
randomised, double-blind, placebo-controlled trial. British Journal of
Nutrition, p.1-8. doi:10.1017/S000711451700085X

– 147 –
Teor de sódio nos queijos brasileiros*

Kennya Beatriz Siqueira


Amanda Fernandes Pilati
Patricia Blumer Zacarchenco
Silvia Carvalhaes Albuquerque

Os queijos estão entre os produtos mais importantes do setor lác-


teo brasileiro, representando 3% dos gastos com alimentação no País e
26% dos gastos com produtos lácteos. Em termos de valor de vendas, os
dados do IBGE (2019) mostram que o grupo dos queijos perdeu apenas
para o leite UHT em 2017 (Figura 1). De acordo com a ABIQ (2019), em
2018, cada brasileiro consumiu em média 5,61 kg de queijo.
Leite pasteurizado; Manteiga; 2,9% Leites fermentados; 1,3%
3,1% Doce de leite; 0,8%
Creme de leite;
4,3%
Bebidas lácteas;
4,5% Leite UHT; 23,1%
Leite resfriado;
5,8%

Iogurte; 5,9%

Outros; 6,4%
Queijos; 22,1%

Leite
condensado;
6,7% Leite em pó;
13,1%
Figura 1. Participação por categorias de produtos lácteos no valor de vendas em 2017.
Fonte: IBGE (2019). Elaboração Embrapa Gado de Leite.

*
Publicado em Milkpoint

– 148 –
Mas, este produto tem sido incluído dentro do grupo de alimen-
tos que mais contribui para a ingestão de sódio por grama de alimento
consumido. Isso acontece porque o sal (sódio) é adicionado a todos os
tipos de queijo, já que a salga do queijo é uma etapa essencial durante o
processamento do produto.
Como os estudos mostram que a ingestão de sódio na dieta se cor-
relaciona com a pressão arterial sistólica e diastólica e um risco maior de
comorbidades e mortalidade cardiovascular, o teor de sal nos alimentos
tem sido um dos principais focos de atenção da indústria de alimentos
e dos governos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda
uma ingestão diária de sódio <2 g, correspondente a <5 g de sal.
Com isso, muitos países ao redor do mundo já implementaram
políticas para redução do consumo de sódio. No Brasil, em 2013, o Mi-
nistério da Saúde e a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos
assinaram um acordo de redução voluntária do teor de sódio de 16 ca-
tegorias de alimentos processados, até 2020.
No entanto, a pergunta que fica é: no caso dos queijos, como existe
uma grande variedade de tipos, será que todos podem ser considerados
alimentos com alto teor de sódio e que devem ser minimizados na dieta?
Para responder a esta pergunta, tabulamos as informações nutri-
cionais dos rótulos de 607 queijos disponíveis nos supermercados brasi-
leiros. Para comparar os produtos usamos a classificação do Ministério da
Saúde (MS). O MS define produtos com alto teor de sódio como aqueles
com mais de 400 mg de sódio por 100 g de produto; produtos de sódio
moderado como aqueles com teor de sódio variando de 80 a 400 mg por
100 g de produto; produtos com baixo teor de sódio, como os que variam
de 40 a 80 mg de sódio por 100 g de produto; e teor de sódio muito baixo
como aqueles com menos de 40 mg de sódio por 100 g de produto.
Entre as diferentes categorias de queijos, a análise mostrou que a
maioria dos queijos brasileiros foram classificados como produtos com
alto teor de sódio, com níveis de sódio superiores a 400 mg / 100 g de
produto (Figura 2).

– 149 –
muito baixo baixo moderado alto

0% 4%

32%

64%

Figura 2. Distribuição dos queijos brasileiros de acordo com o teor de sódio.


Fonte: Resultados da pesquisa.

Esse resultado indica que a indústria de laticínios ainda tem es-


paço para melhorar e atender a esta exigência do mercado, visto que já
existem técnicas para se alcançar um teor reduzido de sódio, sem preju-
ízo para o sabor e durabilidade do produto. Do lado dos consumidores,
esse levantamento permite notar que já há no mercado brasileiro em-
presas preocupadas com a saúde e bem-estar e que já atendem a padrões
nacionais e, até mesmo, internacionais, de teor de sódio. Resta então,
ficar atento às informações dos rótulos dos produtos.

– 150 –
SEÇÃO IV

O consumo de lácteos no Brasil


durante a pandemia de Covid-19

– 151 –
– 152 –
Características do consumo de lácteos
durante a pandemia*

Kennya Beatriz Siqueira


Davi Oliveira Chaves

A Embrapa Gado de Leite/Centro de Inteligência do Leite realizou,


entre os dias 23 de abril e 03 de maio, uma pesquisa por meio das redes
sociais para acompanhar o comportamento do consumidor brasileiro de
leite e derivados durante a pandemia do novo coronavírus. Participaram
da pesquisa 5.105 consumidores distribuídos em todo o território brasi-
leiro, que responderam sobre o consumo de 13 produtos lácteos.
Neste estudo foi considerado o consumo domiciliar, ou seja, os
produtos adquiridos pelo consumidor no autosserviço (supermercados,
padarias, mercearias, etc) para consumo na sua residência. Com isso, a
pesquisa não considerou a alimentação fora do lar (bares, restaurantes,
hotéis, etc), categoria que apresentou as maiores quedas de consumo
durante a quarentena.
A pesquisa mostrou que a grande maioria dos consumidores que
participaram da pesquisa mantiveram seus hábitos de consumo durante
a pandemia, consumindo a mesma quantidade de produto que consu-
miam anteriormente. Ao contrário do ocorrido com a maioria dos de-
rivados do leite, para dois derivados do leite ligados à indulgência (sor-
vete e doce de leite), houve uma porcentagem maior de consumidores
que afirmou ter diminuído o consumo domiciliar desse produto (Tabela
1). O sorvete, por ser alimento sazonal, geralmente tem seu consumo
reduzido nesta época do ano no Brasil. Já, o doce de leite parece estar
perdendo espaço para sobremesas preparadas em casa, o que fortaleceu
as vendas de leite condensado, outro derivado do leite que também é
considerado um produto indulgente.

*
Publicado em Milkpoint

– 153 –
Tabela 1. Porcentagem de variação no consumo de lácteos durante a pandemia,
segundo os participantes da pesquisa.
Produto Aumentou Diminuiu Manteve
Leite Pasteurizado 15,1% 15,4% 69,6%
Leite UHT 20,7% 9,3% 69,9%
Leite em pó 18,5% 11,8% 69,6%
Leite Condensado 24,7% 11,2% 64,2%
Leite Fermentado 13,8% 17,6% 68,6%
Queijos 27,9% 10,5% 61,6%
Iogurte 20,2% 13,8% 66,0%
Manteiga 22,9% 6,6% 70,5%
Bebida Láctea 13,9% 16,6% 69,5%
Doce de Leite 14,8% 19,7% 65,5%
Sorvete 15,6% 30,0% 54,4%
Creme de Leite 22,9% 10,3% 66,8%
Petit Suisse 12,7% 25,3% 62,0%
Média 18,8% 15,2% 66,0%
Fonte: resultados da pesquisa.

Dentre os fatores analisados na pesquisa que mostrou relação com


o consumo de lácteos está a renda. Análises estatísticas evidenciaram
que a renda de até um salário mínimo (SM) está associada com a redu-
ção do consumo para todos os derivados do leite analisados na pesquisa
(Tabela 2).

– 154 –
Tabela 2. Média da porcentagem que a mudança no consumo representa por classe de
rendimento, contando todos os produtos.
1 SM 2 a 5 SM 6 a 10 SM acima de 10 SM
Aumentou 15,1% 14,3% 13,1% 15,6%
Diminuiu 21,1% 12,0% 10,3% 7,7%
Manteve 41,7% 47,4% 49,9% 48,3%
Não tenho o hábito
de comprar 22,1% 26,3% 26,8% 28,3%

Fonte: Resultados da pesquisa.

Já a localização também revelou algumas informações importan-


tes com relação à variação de consumo de lácteos durante a pandemia.
O estado de Goiás, por exemplo, está associado com o aumento de con-
sumo de leite pasteurizado (Figura 1). Já Acre e Ceará estão associa-
dos com o aumento do consumo de sorvete no período de quarentena,
enquanto Pernambuco está associado à redução no consumo de leite
fermentado.
Apesar dessa pesquisa ter sido realizada com o intuito de medir o
comportamento do consumo de lácteos nas residências brasileiras ape-
nas no período de isolamento social da população, ela forneceu impor-
tantes informações e insights sobre este mercado. As informações refe-
rentes à renda, por exemplo, são muito importantes para os produtos
mais populares, dirigidos para as classes de renda mais baixa e que, ge-
ralmente usam a estratégia de diferenciação de preço, pois os resultados
indicam que estes podem ter maior retração na demanda.

– 155 –
Leite Pasteurizado

Rio Grande do Norte


Mato Grosso do Sul

Rio Grande do Sul


Distrito Federal

Santa Catarina
Rio de Janeiro
Espírito Santo

Minas Gerais
Mato Grosso

Pernambuco
Amazonas

Maranhão

Rondônia

São Paulo

Tocantins
Roraima
Alagoas

Paraíba

Sergipe
Amapá

Paraná
Ceará

Goiás
Bahia

Piauí
Acre

Pará
2.98
Aumentou 2.49
2
1.51
Diminuiu 1.02
0.53
Manteve 0.04
-0.45
-0.94
Não tenho o hábito de comprar -1.43
-1.92

Sorvete

Rio Grande do Norte


Mato Grosso do Sul

Rio Grande do Sul


Distrito Federal

Santa Catarina
Rio de Janeiro
Espírito Santo

Minas Gerais
Mato Grosso

Pernambuco
Amazonas

Maranhão

Rondônia

São Paulo

Tocantins
Roraima
Alagoas

Paraíba

Sergipe
Amapá

Paraná
Ceará

Goiás
Bahia

Piauí
Acre

Pará
2.43
Aumentou 1.93
1.44
0.94
Diminuiu 0.45
0.04
Manteve -0.54
-1.03
-1.52
Não tenho o hábito de comprar -2.02
-2.51

Figura 1. Teste de independência entre as variáveis as variações no consumo durante


a pandemia e o estado.
Fonte: Resultados da pesquisa.
Obs: o teste de independência ilustra a associação entre duas variáveis. Nesse teste
estatístico, os círculos azuis representam associações positivas e quanto mais forte for
o azul, maior é a associação.

– 156 –
Efeitos da pandemia no mercado de lácteos
em Minas Gerais*

Kennya Beatriz Siqueira


Davi Oliveira Chaves
Glauco Rodrigues Carvalho

O primeiro caso de Covid-19 no Brasil ocorreu em fevereiro de


2020. No mês seguinte, com o início do isolamento social, muitas dúvi-
das se concentraram no comportamento do consumidor, no perfil das
compras das famílias e no próprio impacto dessa pandemia em suas
rendas. Diante disso, a Embrapa Gado de Leite/Centro de Inteligência
do Leite, em parceria com a Abraleite, realizou uma pesquisa em forma-
to de questionário, por meio de redes sociais, para acompanhar o com-
portamento do consumidor brasileiro de lácteos durante a pandemia de
Covid-19. Foi investigado o consumo domiciliar, ou seja, os produtos
adquiridos pelo consumidor no autosserviço (supermercados, padarias,
mercearias, etc) para consumo na sua residência. Com isso, a pesquisa
não considerou o food service (bares, restaurantes, hotéis, etc), categoria
que apresentou as maiores quedas de consumo durante a quarentena.
Essa pesquisa foi realizada entre os dias 23 de abril e 3 de maio com um
total de 5.105 respondentes.
Como Minas Gerais é o maior produtor de leite do País, sendo
responsável por um em cada quatro litros de leite processado (25%),
este artigo avalia os dados dos 1.933 respondentes da pesquisa que se
encontram neste estado. O referido questionário abordou como questão
social, a renda das famílias respondentes. Além disso, retratou pontos
que permitem analisar a situação do comércio de lácteos durante a qua-
rentena, analisando a disponibilidade desses produtos nas prateleiras
dos mercados, a mudança na quantidade consumida pelas famílias e o

*
Publicado em Revista Indústria de Laticínios

– 157 –
os fatores determinantes da compra de lácteos neste período. Na pesqui-
sa, foram investigados 13 derivados lácteos.
Quanto à renda familiar, 6% dos mineiros entrevistados têm ren-
da mensal de até 1 salário mínimo (SM), 36% entre 2 e 5 SM, 26% entre
6 e 10 SM e 32% acima de 10 SM. De acordo com o IBGE, 25% das famí-
lias mineiras possuem renda superior a 6 SM e 19% têm renda até 1 SM.
Com isso, observa-se que a amostra teve um peso maior das classes de
renda mais altas em relação à realidade do Estado. No entanto, os dados
levantados estão alinhados com outros estudos de mercado e refletiram
o momento atual.
Com relação à disponibilidade dos produtos lácteos nas pratelei-
ras dos mercados, 84% das pessoas que responderam essa questão afir-
maram encontrar esses itens com facilidade, o que mostra que o abaste-
cimento continuou ocorrendo normalmente.
A pesquisa mostrou que a maioria dos consumidores mante-
ve o volume consumido de lácteos considerados na pesquisa, com
exceção do leite fermentado, leite pasteurizado e petit suisse. Nesses
casos, a maioria dos respondentes relatou que não tem o hábito de
consumir. Os queijos, a manteiga, o leite condensado e o creme de
leite obtiveram incrementos consideravelmente acima da média de
14,1%, correspondentes a 27%, 22%, 20% e 20%, respectivamente. É
interessante notar que esses produtos se constituem em ingredientes
de receitas de comidas típicas mineiras. De acordo com pesquisa da
Opinion Box, durante a pandemia, 33% dos brasileiros começaram a
cozinhar. Com isso, a demanda por ingredientes de receitas aumen-
tou significativamente.
Já, a porcentagem de respondentes que afirmou ter reduzido a
quantidade consumida dos produtos lácteos foi menos significativa,
com média de 10,4% para todos os produtos analisados. A exceção é o
sorvete, cujo consumo reduziu em 23% das famílias que participaram
do questionário, resultado que vai ao encontro de pesquisa da Nielsen
mostrando queda no consumo de sorvete. Dois fatores podem ter con-

– 158 –
tribuído para essa queda. Primeiro, sorvete não é um bem essencial e,
segundo, o início do inverno geralmente reduz a demanda por este pro-
duto sazonal, especialmente em época de combate a uma doença viral
relacionada às vias respiratórias.
Ao analisar a relação entre a mudança no consumo de lácteos e a
renda das famílias, verifica-se que para a maioria dos produtos analisados
houve uma associação significativa entre essas variáveis, com exceção do
leite fermentado, do sorvete e do petit suisse. Em geral, a associação mais
forte se deu entre a redução do consumo dos produtos e as famílias que
recebem até 1 SM. A Tabela 1 ilustra melhor isso. Ela apresenta a média
da porcentagem da modificação no gasto por classe de rendimento. A re-
dução nas compras foi reportada por 18% das famílias com renda de até
1 SM. Apesar de ser um percentual relativamente baixo, foi o grupo com
maior redução de compras, indicando que aqueles com a renda menor
se encontram com maior necessidade de conter os gastos com produtos
lácteos durante essa crise econômica gerada pela pandemia.

Tabela 1. Média da porcentagem que a mudança no consumo representa por classe de


rendimento, contando todos os produtos.
1 salário mínimo 2a5 6 a 10 acima de 10
Aumentou 11% 14% 13% 16%
Diminuiu 18% 12% 11% 8%
Manteve 46% 49% 51% 46%
Não tenho o hábito de comprar 24% 26% 26% 28%
100% 100% 100% 100%
Fonte: Elaboração própria dos autores a partir dos dados do questionário.

Outro resultado observado é o fato de famílias com menor clas-


se de renda possuírem menor propensão ao consumo de produtos como
queijos e iogurte, que geralmente possuem maior valor agregado e preço
mais elevado. A Figura 1 apresenta os residuais de Pearson resultantes dos
testes Qui-Quadrado, que ilustram a associação entre a classe de renda e
o comportamento das famílias para alguns derivados lácteos. Nesse teste
estatístico, os círculos azuis representam associações positivas e quanto

– 159 –
mais forte for o azul, maior é a associação. Ou seja, nos queijos, as famílias
com renda mais elevada estão mais associadas ao aumento de consumo
enquanto as famílias de menor renda estão mais relacionadas com a res-
posta “não tenho o hábito de comprar”, seguido da redução no consumo.
Resultado semelhante foi observado para os iogurtes.
É interessante também analisar os resultados para dois importan-
tes produtos lácteos: o leite UHT e o leite em pó. Para ambos, verifi-
cou-se uma associação forte entre a queda do consumo e as famílias
com renda de até 1 SM, além da ausência de ligação com aquelas que
recebem mais de 10 SM, como esperado. Para o leite em pó, também se
observou uma associação forte entre a redução do consumo e aqueles
com renda de 2 a 5 SM.

Queijos Iogurte
acima de 10 salários mínimos

acima de 10 salários mínimos


6 a 10 salários mínimos

6 a 10 salários mínimos
2 a 5 salários mínimos

2 a 5 salários mínimos
1 salário mínimo

5.45
1 salário mínimo 2.35
Aumentou 4.63
3.8
Aumentou 1.93
1.5
2.98 1.08
Diminuiu 2.16 Diminuiu 0.66
1.33 0.24
Manteve 0.51
-0.31
Manteve -0.18
-0.6
-1.14 -1.02
Não tenho o hábito de comprar -1.96 Não tenho o hábito de comprar -1.44
-2.78 -1.86

Leite UHT Leite em pó


acima de 10 salários mínimos

acima de 10 salários mínimos


6 a 10 salários mínimos

6 a 10 salários mínimos
2 a 5 salários mínimos

2 a 5 salários mínimos
1 salário mínimo

1 salário mínimo

2.77 2.59
Aumentou 2.27
1.77
Aumentou 2.06
1.53
1.27 1.1
Diminuiu 0.77 Diminuiu 0.48
0.27 -0.05
Manteve -0.23
-0.73
Manteve -0.58
-1.11
-1.23 -1.64
Não tenho o hábito de comprar -1.73 Não tenho o hábito de comprar -2.16
-2.23 -2.69

Figura 1. Residuais de Pearson resultantes dos teste qui-quadrado para a associação


entre renda e comportamento de consumo para 4 derivados lácteos.
Fonte: Elaboração própria dos autores a partir dos dados do questionário, pelo RStudio.

– 160 –
Os fatores determinantes da decisão de compra de lácteos tam-
bém foram analisados no questionário. Em geral, os fatores que mais in-
fluenciaram foram o preço, a qualidade do produto e a marca. Enquanto
isso, os benefícios nutricionais dos alimentos, as atitudes das empresas
durante o isolamento social e a preferência por empresas locais foram
considerados por poucas famílias na compra de lácteos, o que chama a
atenção em um momento de pandemia, em que manter a imunidade
elevada e uma alimentação adequada é desejável. Apesar disso, para al-
guns produtos, esses fatores se mostraram relativamente importantes.
A média das pessoas que dão preferência a empresas locais foi de 5%,
porém, para o leite pasteurizado, os queijos e o doce de leite, essa por-
centagem simboliza 11,8%, 8,9% e 7,2% respectivamente. Isso mostra
que para esses produtos em específico, as empresas locais parecem ter
um peso maior na hora da compra.
Avaliando-se estatisticamente a relação entre o que é importante
na hora de adquirir os lácteos e a renda das famílias, verificou-se rela-
ções significativas entre essas variáveis para todos os produtos. As asso-
ciações mais fortes dizem respeito à importância do preço para as clas-
ses de renda de até 1 SM e de 2 a 5 SM. Outra associação que também
chama atenção é a da influência que a qualidade do produto e a fideli-
dade às marcas que já compram tradicionalmente têm nas pessoas que
recebem acima de 10 SM. Isso fica claro ao analisar a tabela da média
de porcentagem do que é importante na hora das compras por classe de
renda (Tabela 2). Observa-se que para aqueles que recebem até 1 SM, o
preço representa 56% do total. Enquanto isso, para aqueles que recebem
mais de 10 SM, a marca e a qualidade do produto, juntos, retratam 72%
das decisões de compra.

– 161 –
Tabela 2. Média de porcentagem que os fatores de importância representam por classe
de rendimento, contando todos os produtos.
1 salário minimo 2a5 6 a 10 acima de 10
Atitude da empresa durante a crise 3% 3% 4% 2%
Benefícios nutricionais 2% 2% 3% 2%
Empresa local 4% 5% 5% 4%
Marca que já compro tradicionalmente 26% 35% 44% 47%
Preço 56% 38% 24% 19%
Qualidade do produto 9% 17% 21% 25%
100% 100% 100% 100%
Fonte: Elaboração própria dos autores a partir dos dados do questionário.

Portanto, os resultados da pesquisa indicaram mudanças de com-


portamento de consumo mais significativas nas famílias que possuem
menor renda, o que é esperado devido a menor disponibilidade de re-
cursos deste grupo social. Isso evidencia a importância de políticas de
melhor distribuição de recursos financeiros, especialmente durante a
pandemia.
Aqueles que fazem parte da classe que recebe até 1 SM apresen-
taram as associações mais fortes com a redução do consumo e com a
importância do preço na hora de comprar alimentos lácteos. No outro
extremo, os que ganham acima de 10 SM não exibem nenhuma associa-
ção com a redução no consumo e nem com a importância dada ao preço
dos produtos. Na verdade, essas famílias dão maior atenção à qualidade
dos produtos e à marca no momento da compra.
Com isso, o estudo evidenciou informações importantes sobre o
mercado consumidor de lácteos em Minas Gerais, especialmente para
as empresas que atuam no setor, as quais podem direcionar melhor suas
vendas neste período, de acordo com o perfil dos seus consumidores.

– 162 –
O efeito renda no consumo de lácteos no Brasil –
uma análise do período da pandemia*

Kennya Beatriz Siqueira

Que a renda tem impacto no consumo de alimentos já é de conheci-


mento geral. Especialmente em países em desenvolvimento como o Bra-
sil. E durante a pandemia não tem sido diferente. A Embrapa realizou
uma pesquisa entre os dias 23 de abril e 03 de maio de 2020 que revelou
detalhes interessantes do efeito renda no consumo de lácteos no Brasil.
No início dessa pandemia, dos 5105 respondentes, 82,72% encon-
travam produtos lácteos com facilidade. No entanto, este percentual va-
riou muito de acordo com a faixa salarial (Figura 1).

Encontro com facilidade Encontro em quantidades reduzidas


Não a marca que costumo comprar Não encontro

87,14%
83,65%
80,17%
63,09%
25,32%

14,22%

11,85%

7,68%
6,87%

5,38%

5,06%
4,72%

4,03%
0,47%
0,23%

0,12%

1 SM 2 -5 S M 6 -1 0 S M ACIMA DE 10 SM
Figura 1. Nível de acesso aos produtos lácteos durante a pandemia, de acordo com a
faixa de renda familiar (em salários mínimos).
Fonte: Siqueira (2020).

*
Publicado em Milkpoint

– 163 –
O percentual daqueles que têm renda familiar de até 1 salário
mínimo e encontravam lácteos com facilidade foi de 63,09%. Quando
a renda familiar passa para de 2 a 5 salários mínimos esse percentual
já muda para 80,17%. E na faixa de renda mais elevada (acima de 10
SM), o percentual dos que encontravam os lácteos com facilidade foi de
87,14%. Ou seja, há um crescimento gradual conforme as faixas de ren-
da familiar vai aumentando, com uma diferença de mais de 20 pontos
percentuais entre a primeira e última faixa de renda neste estudo.
Quando os entrevistados foram perguntados se diminuíram,
mantiveram ou aumentaram o consumo de lácteos durante a pandemia,
para todos os produtos analisados, a maioria respondeu que manteve o
consumo. No entanto, pode-se também observar diferenças nesta esta-
bilidade do consumo quando a renda varia (Tabela 1).

Tabela 1. Estabilidade no consumo de lácteos durante a pandemia, de acordo com a


faixa salarial da família.
Até 1 SM 2 a 5 SM 6 a 10 SM Acima de 10 SM
Leite Pasteurizado 30,48% 34,72% 37,94% 34,62%
Leite UHT 37,25% 52,05% 55,53% 58,97%
Leite em pó 43,26% 41,67% 42,94% 40,85%
Leite Condensado 49,77% 56,39% 56,91% 55,51%
Leite Fermentado 34,52% 37,57% 42,92% 40,16%
Queijos 47,95% 59,74% 62,84% 58,70%
Iogurte 46,73% 57,75% 59,02% 60,29%
Manteiga 57,40% 66,28% 69,41% 66,86%
Bebida Láctea 44,83% 42,89% 44,07% 40,80%
Doce de Leite 35,27% 41,69% 42,50% 39,99%
Sorvete 36,84% 40,18% 43,63% 42,20%
Creme de Leite 51,89% 59,38% 63,35% 63,14%
Petit Suisse 26,29% 26,04% 26,96% 26,20%
Fonte: Siqueira (2020).

– 164 –
De acordo com a Tabela 1, o produto que apresentou menor va-
riação de estabilidade de consumo conforme a faixa de renda foi o petit
suisse, que também foi o produto com menor estabilidade de consumo
dentre todos os analisados. Já as maiores variações de estabilidade do
consumo entre a primeira e a última faixa de renda ocorreram para leite
UHT: 21,72 pontos percentuais (pp). Em seguida, tem-se iogurte (13,56
pp), creme de leite (11,25 pp), queijos (10,75 pp) e manteiga (9,46 pp).
Para todos os produtos, a menor faixa de renda foi a que menos manteve
estabilidade de consumo, com exceção do leite em pó e bebida láctea.
No entanto, a influência da renda fica mais nítida quando se com-
para os dois fatores mais decisivos na hora da compra de lácteos na
pandemia: preço e marca (Figura 2). Neste caso, é possível perceber a
relação direta entre o aumento da renda e a importância do fator marca
na compra de lácteos durante a pandemia, e a relação inversa do fator
preço com a renda. Ou seja, para as famílias que ganham até um salário
mínimo, o preço é o fator determinante na aquisição de derivados do
leite durante a pandemia, enquanto para aqueles que ganham acima de
10 salários mínimos, o preço perde importância para o fator marca.

Fator Preço
60,00%
50,00%
40,00%
30,00%
20,00%
10,00%
0,00%

1 SM Acima de 10 SM

– 165 –
Fator Marca
60,00%
50,00%
40,00%
30,00%
20,00%
10,00%
0,00%

1 SM Acima de 10 SM
Figura 2. Relação entre a renda salarial e os fatores preço e marca na hora da compra
de lácteos durante a pandemia.
Fonte: Siqueira (2020).

Portanto, observa-se que a renda familiar exerce grande influência


no consumo de derivados do leite no Brasil, sendo inclusive, um fator
mais determinante para este consumo do que o preço dos produtos. Isso
sugere que, medidas governamentais que têm impacto sobre a renda,
como o auxílio emergencial por exemplo, podem ter grande impacto no
consumo de leite e derivados no Brasil.

– 166 –
O que aprendemos com o coronavírus?*

Kennya Beatriz Siqueira

O novo coronavírus veio nos ensinar inúmeras coisas, que vão


desde os cuidados com saúde, higiene e limpeza, até a questões econô-
micas. Do lado do consumidor de leite e derivados, o novo coronavírus
nos ensinou que o setor lácteo se sai muito bem nas crises. Composto
por produtos que variam desde itens da cesta básica, produtos funcio-
nais até alimentos indulgentes, o setor viu as suas vendas crescerem con-
sideravelmente no período da pandemia.
Num primeiro momento, os produtos essenciais e de elevada vida
de prateleira tiveram destaque nas vendas, por conta do esperado desa-
bastecimento, que nunca ocorreu. No entanto, com o avanço da pande-
mia, a indulgência e praticidade foram os fatores decisivos do consumo.
O comportamento chamado de “emotional eating” ou “stress eating”
(alimentação emocional ou por estresse), em que as pessoas usam os
alimentos para lidar com situações estressantes, pode ter ajudado neste
cenário. Assim, leite condensado, doce de leite e sorvete levaram van-
tagem. Mas, outro derivado do leite, que não é considerado produto
indulgente, também saiu fortalecido da pandemia: os queijos.
De acordo com a FIL/IDF, no mundo todo, os queijos estão entre
os lácteos que tiveram melhor desempenho de vendas no ano de 2020.
Nos EUA, muitos restaurantes e chefs migraram para o ramo da pizza,
para driblar a crise provocada pela pandemia. As grandes redes de piz-
zaria viram significativo crescimento de vendas neste período. Só no dia
da eleição americana, pizzarias de Los Angeles reportaram aumento de
250% nas vendas, comparado com o ano anterior.
No Brasil, o cenário não foi diferente. O aumento no consumo do-
miciliar de queijos compensou a queda nas vendas institucionais (res-

*
Publicado em Milkpoint

– 167 –
taurantes, bares, etc) devido ao fechamento do comércio. E, para alguns
tipos de queijos houve aumento das vendas.
Por outro lado, as redes com foco em saladas viram suas vendas
declinar substancialmente, saindo como um elo perdedor nessa pande-
mia. Na competição pelo consumidor, as bebidas vegetais, que vinham
em franco crescimento antes da pandemia, perderam espaço para os
lácteos. Esse comportamento foi reportado em diversos países ao redor
do mundo.
O que aprendemos com isso? Primeiro, que, apesar de estarmos
vivendo uma crise de saúde, a saudabilidade alimentar não é o fator de-
terminante de decisão do consumidor atualmente. Conveniência, prati-
cidade e preço são fatores mais decisivos na escolha do consumidor de
alimentos durante essa crise. Por isso, os restaurantes de comida saudá-
vel viram suas vendas declinarem. Por outro lado, os deliveries de fru-
tas e vegetais in natura cresceram consideravelmente, visto que é muito
mais prático e barato preparar estes alimentos em casa.
O preço também pode ter sido fator decisivo para a queda no
consumo de bebidas vegetais. No entanto, é interessante notar que o
fato desses alimentos serem considerados saudáveis pelos consumido-
res, não manteve e nem impulsionou o seu consumo durante a crise de
saúde vivenciada.
Portanto, o que aprendemos com o novo coronavírus é que os lác-
teos entregam muito mais do que benefícios nutricionais e funcionali-
dade. Os lácteos estão entre os alimentos que melhor se sobressaíram
nesta crise pela sua diversidade de produtos e funcionalidades. O setor
lácteo é um dos segmentos mais amplos da indústria de alimentos. É
difícil pensar em um setor que tenha uma variedade tão ampla de pro-
dutos. Dentre os lácteos, tem-se produtos da cesta básica, sobremesas,
produtos salgados, ingredientes culinários, produtos funcionais, produ-
tos gourmet, produtos premium, etc. Apesar de algumas empresas ainda
não terem percebido, isso dá ao setor um dinamismo muito grande para
lidar com diversas situações.

– 168 –
Além disso, essa diversidade de produtos, torna os lácteos essen-
ciais. É difícil imaginar uma cozinha sem lácteos, uma receita sem ne-
nhum derivado do leite, um lanche matutino sem qualquer resquício de
laticínios. Os lácteos estão presentes em mais de 90% das casas brasilei-
ras. E isso não é mérito apenas da sua riqueza de nutrientes. É mérito de
uma indústria que soube se diversificar. Que oferece nutrientes, sabor,
textura, praticidade, conveniência, saudabilidade, indulgência, regiona-
lismo e sustentabilidade.

– 169 –
A evolução do consumo domiciliar
durante a pandemia*

Kennya Beatriz Siqueira

Com grande parte da população brasileira ainda confinada em


suas casas, o consumo domiciliar tem sido o principal propulsor da eco-
nomia. Por isso, acompanhar o comportamento desse consumo é pri-
mordial para as empresas do setor no momento.
A Associação Brasileira dos Supermercados (ABRAS) tem alguns
índices que permitem monitorar as tendências de consumo no Brasil.
O primeiro deles é o índice de vendas Abras. Este índice mensal mede
o desempenho das vendas (em valor) do setor supermercadista. Ele en-
volve dados de aproximadamente 100 supermercados brasileiros que
representam cerca de 60% das vendas totais do setor. A Tabela 1 mostra
a evolução desse índice desde o início da quarentena, em abril de 2020.

Tabela 1. Variações do Índice Nacional de Vendas da Abras em % de abril de 2020 a


março de 2021.
Mês x Mês anterior Mês x mesmo mês ano anterior Acumulado do ano YTD
abr/20 -4,29 12,40 4,80
mai/20 3,75 10,24 5,15
jun/20 -4,82 11,93 5,63
jul/20 4,68 2,78 3,47
ago/20 2,56 6,16 3,86
set/20 -2,05 4,44 3,94
out/20 7,35 12,43 5,94
nov/20 -0,41 9,57 8,87
dez/20 18,13 11,54 9,36
jan/21 -18,45 12,00 12,00
fev/21 -6,75 5,18 7,57
mar/21 11,11 4,31 7,06
Fonte: Abras.

*
Publicado em Milkpoint

– 170 –
Pode-se observar um incremento real de 7,06% (deflacionado
pelo IPCA) no primeiro trimestre de 2021 em relação ao mesmo perí-
odo do ano anterior. Isso mostra que as pessoas estão comprando mais
este ano nos supermercados do que compravam nos meses anteriores ao
início da quarentena no País.
Em relação ao mês de fevereiro de 2021, a alta foi de 11,11%. No
entanto, deve-se considerar o efeito do calendário, com três dias a mais
de consumo em março, comparado com fevereiro. Na comparação com
março de 2020, ou seja, exatamente o mês em que o isolamento social se
iniciou em grande parte do País, a alta foi de 4,31%. Vale ressaltar que
março de 2020 foi marcadamente um período de tensão e histeria, em
que a população se direcionou para os supermercados com o intuito
de estocar alimentos e bens de primeira necessidade. Portanto, este nú-
mero indica que em março de 2021, o consumo domiciliar aumentou,
mesmo se comparado com o período de pânico vivenciado no mesmo
mês do ano passado. A Tabela 2 mostra mais alguns dados do setor su-
permercadista.

Tabela 2. Variações do Índice de tíquete médio (em %) e de idas ao ponto de venda


(em pontos percentuais) de abril de 2020 a janeiro de 2021.
Índice Tíquete médio (%) Idas ao PDV (p.p)
mês x mesmo mês do ano anterior mês x mesmo mês do ano anterior
abr/20 36,7 -1,1
mai/20 -9,3 0,2
jun/20 9,6 -0,1
jul/20 -4,6 0,1
ago/20 0,9 -0,1
set/20 2,3 0,0
out/20 -4,8 0,0
nov/20 -5,5 -0,1
dez/20 -2,3 -0,1
jan/21 4,7 0,6
Fonte: Kantar/Abras.

– 171 –
O primeiro dado da Tabela 2 reforça o que foi dito anteriormen-
te. O índice de tíquete médio aumentou consideravelmente no início
do isolamento social no Brasil, ou seja, no de março abril. No mesmo
período, as idas ao supermercado diminuíram. O tíquete médio é uma
medida de quanto em valor monetário, em média, as pessoas gastam,
cada vez que vão ao supermercado. Este índice é uma parceria da Kantar
Wordpanel com a Abras e considera os gastos com 96 categorias de lar-
go consumo, das cestas de alimentos, bebidas, higiene e limpeza. Apesar
de ter apresentado algumas quedas ao longo do ano passado, o índice
de tíquete médio voltou a subir em janeiro de 2021. No mesmo mês,
pode-se observar também ligeiro aumento do número de idas ao PDV
(Ponto de venda).
Esses dados indicam, ainda que preliminarmente, um consumo
domiciliar ainda aquecido. Para os próximos meses, o fator pandemia
e o contínuo isolamento social devem potencializar, nos supermer-
cados, a procura por itens da estação mais fria do ano. No caso do
setor lácteo, os produtos que se favorecem mais com o inverno são
os queijos. Os fondues e os queijos consumidos com vinho devem se
sobressair. Aliás, vale ressaltar o desempenho do vinho durante a qua-
rentena. A bebida foi alçada ao status de preferida durante a quarente-
na. Isso pode favorecer o consumo de queijos também, especialmente
os finos e artesanais.
Outros itens que devem se beneficiar do inverno são leite con-
densado, creme de leite e demais lácteos usados como ingredientes de
receitas típicas de festa junina. Além das tradicionais festas juninas, du-
rante o inverno brasileiro acontecerá as Olimpíadas de Tóquio. Nestas
ocasiões, os brasileiros já têm tendência de valorizar a premiunização e
a indulgência. Com a permanência do isolamento social, estas caracte-
rísticas devem ser ressaltadas. Porém, como estas categorias de produtos
já tiveram um salto de consumo no ano passado, este ano não deve ha-
ver um crescimento acentuado. No entanto, elas devem permanecer em
patamares superiores aos observados antes da pandemia.

– 172 –
Com isso, e lembrando das incertezas no âmbito econômico, o
grande desafio do setor no momento é equilibrar as diversas variáveis
deste período ainda tumultuado da história brasileira para acertar na
previsão de demanda.

– 173 –
– 174 –
SEÇÃO V

Uma análise do consumo de lácteos


no Brasil sob a ótica das redes sociais

– 175 –
– 176 –
Análise dos sentimentos expressos na rede social
Twitter em relação ao queijo*

Emerson Wendelin Alves Moreira Campos


Nedson Donato Soares
Thallys da Silva Nogueira
Kennya Beatriz Siqueira
Emerson Augusto Priamo Moraes

O queijo é um dos derivados lácteos mais consumidos no mundo.


Importante fonte de proteínas de alta digestibilidade, os queijos também
são ricos em nutrientes. Devido as suas grandes vantagens nutricionais,
o queijo possui grande importância nos hábitos de consumo da popula-
ção brasileira, sendo parte integrante da dieta nacional.
Graças à popularização da internet, o consumidor se encontra
cada vez mais informado, mais exigente e mais consciente a respeito
dos diversos tipos de queijos presentes no mercado. O acesso a essas
informações contribui de fato para tal conhecimento e a ascensão das
redes sociais possibilitou ao mercado novos modelos de negócios base-
ados em análise de dados extraídos das redes sociais. Portanto, as redes
sociais tem se tornado importante para as grandes empresas devido ao
enorme fluxo de dados trocados diariamente, o que facilita a compreen-
são sobre sentimentos e opiniões expressos por seus usuários.
Estas postagens são utilizadas para descrever as experiências
pessoais e memórias que os usuários tiveram na utilização de um dado
produto ou serviço, fornecendo às empresas uma base de dados im-
portante para a tomada de decisão. Porém, nem sempre esses comen-
tários são de todo favoráveis à empresa, o que pode comprometer a
sua reputação e sobrevivência no mercado competitivo (TARANNUM
et. al., 2015).

*
Apresentado no XXV Workshop de Iniciação Científica da Embrapa Gado de Leite

– 177 –
Uma plataforma popular nos dias de hoje é o Twitter que, sozinho,
possui mais de 200 milhões de usuários, que compartilham cerca de 400
milhões de tweets por dia (CHA et. al., 2010). Nessa rede, pesquisadores e
empresas conseguem coletar dados para análises de conteúdo em grande
escala (CELEBRATING, 2020). Por meio desses dados, pode-se acompa-
nhar um determinado fluxo de posts para identificar oportunidades de
vendas de um produto baseados nas opiniões de seus consumidores.
Métodos para análise de sentimentos estão cada vez mais popu-
lares visando desenvolver aplicações que tem como objetivo apresentar
informações sobre as necessidades de diversos tipos de consumidores
no mercado. Porém, no segmento de queijos do Brasil não se tem co-
nhecimento de pesquisas que se aprofundam em avaliar a opinião dos
usuários do Twitter. Portanto, nesse trabalho, objetiva-se elucidar esse
contexto, aplicando técnicas de inteligência artificial para analisar os
sentimentos de raiva, desgosto, medo, alegria, tristeza e surpresa dos
usuários do Twitter em relação ao queijo.
Para a realização do estudo, fez-se o uso do software Orange Can-
vas. O Orange Canvas é um software desenvolvido na Linguagem Pyton
para visualização e análise de dados. Após a coleta das informações, foi
realizado um pré-processamento desses dados para melhor selecioná
-los, eliminando nessa etapa informações irrelevantes para o estudo. Em
seguida, as informações obtidas foram mineradas com o uso de algorit-
mos de agrupamento, criando clusterização das mensagens de texto em
grupos específicos por ordem de relevância ao que cada usuário escre-
veu. Com as informações tratadas, fez-se o uso de padrões de filtragens
para melhor compreender e visualizar o sentimento dos usuários quan-
do se referiam a assuntos relacionados ao tema queijo.
A pesquisa analisou informações expressas em mensagens de tex-
to no Twitter sobre a palavra queijo, com a finalidade de descobrir a
existência de algum padrão entre as informações contidas no mesmo.
A aplicação Orange Canvas nos permite também trazer outras análises,
como o uso do widget Word Cloud, como já descrito, para visualização
de dados. A WordCloud ou Nuvem de Palavras é formada com base na
periodicidade das palavras no conjunto de tweets que após processada
nos mostra a maior incidência delas escritas pelos usuários.

– 178 –
Figura 1. Nuvem de palavras apresentando os itens que mais se relacionaram com o
tema queijo no Twitter.
Fonte: Resultados da pesquisa.

Quando analisados os termos mais citados dentre os tweets, per-


cebem-se quais são as palavras que estabelecem maior conexão com o
assunto, tais como pão de queijo. Também é possível apresentar a análi-
se de sentimentos dos tweets, baseado na busca pelo reconhecimento do
sentimento do usuário em concordância com palavras usadas pelo mes-
mo. Para esse estudo foram classificadas seis diferentes categorias: raiva,
desgosto, tristeza e medo como polaridade negativa. Alegria e surpresa
como polaridade positiva.

48,68%

26,34%
19,43%

3,94%
1,00% 0,62%

1
Surpresos Alegres Medo Tristeza Desgosto Raiva
Figura 2. Análise de sentimento dos usuários do Twitter sobre queijo.
Fonte: Resultados da pesquisa.

– 179 –
Os resultados indicam que a maior parte dos usuários que escre-
veram sobre queijo no Twitter demonstraram sentimentos positivos
(75%). Cabe salientar que resultados pontuais podem ser afetados por
recursos computacionais e o seu poder de processamento das informa-
ções. Tais resultados devem ser analisados apenas como um indicador
de emoções em constante transição e não como parâmetro decisivo so-
bre o tema estudado.
Neste trabalho foi feita a análise de sentimentos dos usuários do
Twitter quando pesquisados pelo tema queijo. Como conclusão foi pos-
sível identificar a importância da mineração de dados junto ao mercado
atual no apoio à tomada de decisão. A análise observou grande acei-
tação dos usuários quando se referiam a palavra queijo, porém é im-
portante ressaltar que as informações pós processadas não só remetiam
propriamente ao queijo como um todo, mas também como componente
base para outro alimento de grande destaque pelos usuários do Twitter,
como o pão de queijo.
Como trabalho futuro, sugere-se uma análise mais aprofundada
utilizando outras técnicas de mineração, com amostras maiores de da-
dos a fim de poder comparar e discutir os métodos mais adequados para
evidenciar o tema abordado neste estudo.

– 180 –
Referências Bibliográficas

CELEBRATING. Blog Twitter 2020. Disponível em:: <https://blog.


twitter.com/official/en_us/a/2013/celebrating-twitter7.html>. Acesso
em: Feb 28 2020.

TARANNUM, N., RIZVI, S.H., KEOLE, R.R. A Preliminary Review of


Web-Page Recommendation in Information Retrieval Using Domain
Knowledge and Web Usage Mining. International Journal of Advance
Research in Computer Science and Management Studies. Volume
3, Issue 1. ISSN: 2321 – 7782. Research Article / Survey Paper / Case
Study, 2015. Disponível em: www.ijarcsms.com. Acesso em: 17 fev.
2020.

M. CHA, H. HADDADI, F. BENEVENUTO, and K. P. GUMMADI.


Measuring User Influence in Twitter: The Million Follower Fallacy. In
Int’l AAAI Conference on Weblogs and Social Media (ICWSM), 2010

– 181 –
Quais os tipos de queijos mais
comentados no Twitter*

Nedson Donato Soares


Emerson Wendelin Alves Moreira Campos
Thallys da Silva Nogueira
Kennya Beatriz Siqueira
José Maria Nazar David
Regina Maria Maciel Braga Villela

Conteúdos compartilhados em redes sociais tendem a demons-


trar características associadas ao perfil de cada usuário, principal-
mente seus interesses e opiniões relacionadas a diferentes assuntos.
Com redes sociais contendo uma quantidade significativa de usuários
ativos e podendo ser acessadas de diversos dispositivos, uma grande
quantidade e diversidade de conteúdo é produzido diariamente. Nesse
cenário, o Twitter destaca-se como uma das maiores redes sociais da
atualidade, possuindo mais de 300 milhões de usuários ativos men-
salmente. O Brasil tem o segundo maior número de usuários da rede,
logo atrás dos Estados Unidos, com mais de 27,7 milhões de contas
ativas (EMARKETER, 2016). O Twitter ainda disponibiliza gratuita-
mente uma Application Programming Interface (API) para mineração
de dados públicos criados por seus usuários, facilitando a obtenção
dessas informações.
Segundo Pak & Paroubek (2010) e Araújo et al. (2014), analisar
os conteúdos compartilhados em redes sociais pode auxiliar no enten-
dimento da opinião das pessoas sobre diferentes assuntos, e, a partir
desta análise, dentre diversas outras aplicações possíveis, empresas po-
dem saber mais sobre o que os seus consumidores pensam sobre seus
produtos ou serviços (PUSHPAM & JAYANTHI, 2017).

*
Apresentado no XXV Workshop de Iniciação Científica da Embrapa Gado de Leite

– 182 –
Assim, as redes sociais podem ser uma alternativa às pesquisas de
mercado tradicionais, que, muitas vezes, são dispendiosas, demoradas
e sem representatividade num país de dimensões continentais como o
Brasil. Neste contexto, o presente trabalho visa analisar o mercado de
queijos brasileiros por meio do Twitter. Os queijos estão em segundo
lugar no ranking dos derivados lácteos mais consumidos no Brasil em
2017, e por isso se apresentam como uma boa oportunidade para análi-
se de conteúdo. Em volume total de vendas, os queijos obtiveram cres-
cimento de 124% no período de 2005 a 2016 (SIQUEIRA, 2019). Assim,
este estudo propõe o desenvolvimento de uma arquitetura que permita
identificar os tipos de queijos mais comentados no Twitter, como forma
de captar as preferências dos consumidores de queijo no Brasil.
Este trabalho apresenta a construção de uma arquitetura por meio:
(i) da mineração de dados textuais que continham as palavras “queijo”
e “#queijo” no Twitter; (ii) do processamento de linguagem natural dos
textos extraídos; e (iii) da criação de uma ontologia para organização
semântica do conhecimento no setor de produção de queijo.
O resultado do processo de coleta se deu em 82.868 tweets da lín-
gua portuguesa do Brasil durante o período de 10 dias. Por meio do pré
-processamento do conteúdo, foram removidos 33.269 tweets duplica-
dos e extraídos 3.590 tweets que citam, pelo menos uma vez, as palavras
que correspondem aos tipos de queijos mais conhecidos.
Considerando o conjunto de palavras dos tweets extraídos, a Fi-
gura 1 apresenta um histograma contendo a distribuição de frequências
das 10 palavras mais frequentes. Por meio desta, foi possível observar
que a palavra correspondente ao tipo de queijo mais citado foi a palavra
coalho, ficando à frente de requeijão e cheddar.
Torna-se importante ressaltar que a palavra coalho, não necessaria-
mente refere-se ao queijo coalho. Ela pode se referir ao coalho usado na
produção de queijo artesanal. No entanto, as palavras requeijão e cheddar
referem-se aos tipos de queijos consumidos. Neste ponto, é interessante
ressaltar que, apesar do curto período de tempo analisado, a pesquisa re-
fletiu a realidade, já que o requeijão é, atualmente, o principal queijo do
mercado de commodities, assumindo o lugar da muçarela a partir de 2012.

– 183 –
reino
Frequência
brie
gorgonzola
suico
muçarela
parmesão
prato
cheddar
requeijão
coalho

0 200 400 600 800


Figura 1. Histograma dos 10 tipos de queijo mais comentados no Twitter.
Fonte: Resultados da pesquisa.

A ontologia desenvolvida reflete parte da árvore genealógica do


leite, acrescida de informações sobre queijos mineiros e outros. Como
a palavra coalho foi a que mais se destacou no período analisado, e esta
está relacionada ao queijo coalho, que é um queijo artesanal, uma aná-
lise preliminar de ontologia foi realizada para Queijo Minas Artesanal
(QMA), visto que este possui mais informações detalhadas do modo de
fazer e características do que o queijo coalho. A Figura 2 apresenta uma
visão sub expandida da classe “Queijo” na ontologia desenvolvida.

Queijo

Pingo Queijo Minas QMA Serra da


Artesanal Canastra

Sem Tratamento Coalho


Térmico Leite Cru

Figura 2. Visão sub expandida dos relacionamentos inferidos pela ontologia.


Fonte: Resultados da pesquisa.

– 184 –
De acordo com a taxonomia do queijo organizada, a ontologia foi
capaz de classificar indivíduos na classe “QueijoMinasArtesanal”. Além
disso, ela ainda infere relação com a classe “SemTratamentoTermico”,
que corresponde ao processo de produção do QMA. Um exemplo des-
sas relações pode ser observado na Figura 2, onde “QMASerraDaCa-
nastra” é o indivíduo exemplo em questão.
A abordagem desenvolvida permitiu a coleta de tweets sobre o
queijo em tempo real. Porém, para concluir o tipo de queijo mais consu-
mido no Brasil, é necessária uma mineração de dados variada, ou seja,
em diferentes repositórios e coletados em diferentes períodos do dia e
tempo. Contudo, este primeiro passo sugere que a arquitetura desenvol-
vida está em conformidade com a realidade.
A ontologia desenvolvida organiza o conhecimento baseado na
árvore genealógica do leite em linguagem OWL. Trabalhos futuros de-
vem focar no desenvolvimento de uma API para processar as informa-
ções dos queijos retiradas dos tweets.

– 185 –
Referências Bibliográficas

ARAÚJO, M., GONÇALVES, P., CHA, M., & BENEVENUTO, F. iFeel.


In: International Conference on World Wide Web - WWW, 23., 2014.
Proceedings... ACM Press, 2014. 14 Companion.

EMARKETER. Twitter’s User Base to Grow by Double Digits


This Year. 22, julho 2016. Disponível em: <https://www.emarketer.
com/Article/Twitters-User-Base-Grow-by-Double-Digits-This-
Year/1014243>. Acesso em: 18 fev. 2020.

PAK, A., & PAROUBEK, P. Twitter as a Corpus for Sentiment


Analysis and Opinion Mining. In: International Conference Language
Resources and Evaluation (LREC’10), 7., 2010. Proceedings... Valleta,
Malta, , 2010.

PUSHPAM, C. A., & JAYANTHI, J. G. Overview on Data Mining


in Social Media. International Journal of Computer Sciences and
Engineering, v. 5, p. 147-157, 11 de 2017.

REBALA, G., RAVI, A., & CHURIWALA, S. An Introduction


to Machine Learning. Springer International Publishing, 2019.
doi:10.1007/978-3-030-15729-6_10. 263 p.

SIQUEIRA, K. B. O Mercado Consumidor de Leite e Derivados. Juiz


de Fora: Embrapa Gado de Leite, 2019. 17 p. il. (Embrapa Gado de
Leite. Circular Técnica, 120.). Disponível em: <http://www.infoteca.
cnptia.embrapa.br/infoteca/handle/doc/1110792>. Acesso em: 18 fev.
2020.

– 186 –
Análise exploratória de leite e derivados mais
comentados no Twitter e Google Trends*

Thallys da Silva Nogueira


Nedson Donato Soares
Emerson Wendelin Alves Moreira Campos
Kennya Beatriz Siqueira
Priscila Vanessa Zabala Capriles Goliatt

O leite é um dos produtos mais consumidos no mundo e está pre-


sente em alimentos como manteiga, biscoitos, queijos, chocolates, den-
tre outros. De acordo com Carvalho (2020), a cadeia produtiva do leite
movimenta cerca de US$ 10 bilhões, empregando 3 milhões de pessoas.
Segundo Siqueira (2019), dentre os lácteos mais consumidos no Brasil
em 2016, o leite UHT e os queijos representavam, conjuntamente, cerca
de 49,7% do valor de vendas das categorias de produtos lácteos no Brasil.
No entanto, entender o perfil do consumidor de lácteos e as ten-
dências desse mercado é uma tarefa complicada. Mas com o advento
das redes sociais, a captura dessas informações tornou-se mais rápida,
menos dispendiosa e confiável. Com um crescente número de usuários
conectados na rede, empresas e produtores podem se aproveitar desse
grande volume de dados gerados com o intuito de obter novos insights
sobre as atuais tendências de consumo.
O Twitter é uma rede social que oferece aos seus usuários um
espaço para conversação, compartilhamento de conteúdos escritos, fo-
tografias e vídeo. De acordo com In Digital (2020) essa é a sexta rede
social mais usada no Brasil, com cerca de 48% da população utilizando
essa plataforma.
O Google Trends é uma ferramenta capaz de acompanhar a evolu-
ção do número de buscas por uma determinada palavra-chave ao longo

*
Apresentado no XXV Workshop de Iniciação Científica da Embrapa Gado de Leite

– 187 –
do tempo. Com ela é possível analisar e entender o que usuários buscam
no site do Google.
Diante disso, o objetivo geral deste trabalho foi realizar uma aná-
lise exploratória do leite e seus derivados mais comentados no Twitter e
Google Trends como forma de entender melhor as tendências do mer-
cado lácteo nacional.
Utilizando a técnica de mineração de dados (Cortês, 2002), foi
desenvolvido um script em R para a realização de uma busca no Twitter
utilizando 16 palavras-chave como “queijo” e “sorvete”, obtidas a partir
de Árvore do Leite (2020) e de Siqueira (2019). Utilizando o Google
Trends, foi feita uma comparação dos quatro derivados do leite mais
comentados no Twitter no período de 12 a 19 de fevereiro de 2020.
A pesquisa identificou 91.202 postagens no Twitter referentes a
leite e derivados. Os derivados com maior número de comentários são
apresentados na Figura 1.

Margarina (2.207) Creme de Leite (1.899)


2% 2%
Outros (1.276)
Leite em Pó (2.732) 1%
3%

Manteiga (3.099)
3%

Iogurte (3.848)
4%

Requeijão (4.521)
5% Queijo (46.314)
51%
Doce de Leite (5.128)
6%

Leite Condensado (7.780)


9%

Sorvete (12.398)
14%

Figura 1. Gráfico apresentando os derivados lácteos mais comentados no Twitter.


Fonte: Resultados da pesquisa.
Em laranja claro estão representados os produtos com número de comentários pouco
representativo: farinha láctea (818), leite desnatado (256), leite integral (179), leite
pasteurizado (16) e leite UHT (7).

– 188 –
Pela Figura 1, pode-se observar que dentre os principais trends, a pa-
lavra “queijo” apresentou maior destaque com 50,8% em aparições nos co-
mentários dos internautas, seguido de sorvete, leite condensado e doce de
leite. Esses quatro produtos mais comentados foram analisados no Google
Trends e apresentados na Figura 2. Nessa figura, valores mais próximos de
100 indicam maior interesse dos usuários por um determinado tema.

100 Queijo
Sorvete
Leite Condensado
80 Doce de Leite

60
Interesse

40

20

0
13/02/2020 14/02/2020 15/02/2020 16/02/2020 17/02/2020 18/02/2020 19/02/2020
Dias da semana 12 a 19 de Fevereiro de 2020
Figura 2. Gráfico apresentando o percentual de interesse pelos produtos lácteos por
dias no intervalo de 12 a 19 de fevereiro de 2020, de acordo com o Google Trends.
Fonte: Resultados da pesquisa.

É possível observar pela Figura 2 que há um padrão e que a pa-


lavra “queijo” manteve-se superior às demais palavras pesquisadas, du-
rante todo o período estudado. Já a expressão “leite condensado” apre-
sentou um maior interesse em certas horas dos dias quando comparado
à palavra “sorvete” a partir do dia 16 de fevereiro de 2020. É importante
destacar que os 4 termos mais comentados não correspondem aos pro-
dutos mais consumidos (exceto queijos), mas sim aos produtos que têm
maior apelo de indulgência no Brasil (exceto queijos).
Dentre os usuários que comentaram os produtos e que estavam
com a localização dos dispositivos ativadas no momento da postagem,

– 189 –
pode-se observar que as regiões que mais comentaram sobre os deri-
vados do leite foram as regiões Sul e Sudeste, que coincidem com as
regiões de maior renda e consumo per capita do Brasil.

Figura 3. Mapa do Brasil apresentando a localização (pontos em azul) das postagens


no Twitter sobre leite e derivados.
Fonte: Resultados da pesquisa.

Este trabalho sugere que as técnicas de mineração de dados po-


dem facilmente identificar fatores e características inerentes a tendên-
cias e mercado consumidor de lácteos no Brasil. Para trabalhos futuros,
uma sugestão é a utilizar dados de outras redes sociais para fazer uma
análise comparativa do que tem sido comentado utilizando técnicas de
aprendizado de máquina e análise de sentimentos para classificação
destes comentários, bem como ampliar o período de análise.

– 190 –
Referências Bibliográficas

ÁRVORE DO LEITE. Árvore Genealógica do Leite. Available at:


<https://www.arvoredoleite.org/>. Accessed on: feb. 26 2020.

CARVALHO L.A, NOVAES L.P, MARTINS C.E et al. Sistema


de produção de Leite (Cerrado). Available at: <https://
sistemasdeproducao.cnptia.embrapa.br/FontesHTML/Leite/
LeiteCerrado/introducao.html>. Accessed on: feb. 26 2020.

CORTÊS S.C, PORCARO R.M, LIFSCHITZ S. Mineração de dados -


Funcionalidades, Técnicas e Abordagens. 2002.

RELATÓRIO IN DIGITAL 2020.Available at: <https://datareportal.


com/reports/digital-2020-brazil>. Accessed on: feb. 26 2020.

SIQUEIRA K.B. Consumo de leite e derivados no Brasil. In: Anuário


do leite 2019. Embrapa. 2019

– 191 –
Tendências de consumo de queijo coalho
no Nordeste*

Thallys Silva Nogueira


Kennya Beatriz Siqueira
Nedson Donato Soares
Emerson Wendelin Alves Moreira Campos
Emerson Augusto Priamo Moraes
Regina Maria Maciel Braga Villela
José Maria Nazar David
Priscila Vanessa Zabala Capriles Goliatt
Maria de Fátima Ávila Pires
Fábio Homero Diniz
Nívea Maria Vicentini

O consumo de queijos no Brasil vem crescendo ao longo dos anos,


passando de 3,6 kg/habitante em 2009 para 5,31 kg de queijo/habitante em
2019, considerando todos os tipos de queijos, de acordo com a Associação
Brasileira das Indústrias de Queijo (ABIQ). Neste contexto, os queijos arte-
sanais têm se destacado, visto que atendem a várias tendências de consumo
da atualidade, como o regionalismo, a volta às origens, a busca pelo bucó-
lico e natural, o conhecimento da história e narrativa por trás do produto.
Dentre os queijos artesanais brasileiros merece destaque, em fun-
ção do maior volume estimado de produção, o queijo coalho. O queijo
coalho artesanal é produzido em todo o Brasil. Apesar de controversa, a
origem desse derivado lácteo é atribuída à região Nordeste, onde ainda
é fabricado tradicionalmente utilizando o leite cru. Como ainda existem
poucas informações sobre o consumo de queijos artesanais no Brasil,
este artigo vem apresentar resultados de um levantamento realizado
pelo Observatório do Consumidor – OC. O OC é uma ferramenta de-

*
Publicado em Milkpoint

– 192 –
senvolvida pela Embrapa, UFJF e IFSudeste para identificar o perfil do
consumidor e tendências de consumo de leite e derivados por meio das
redes sociais. No seu primeiro ano de funcionamento, o OC estudou as
publicações sobre queijos artesanais na rede social Twitter.
Entre 30/04/20 e 18/02/21, foram publicados 43.339 tweets sobre
queijo coalho no Brasil. Desse total, 19.071 tweets possuíam a localiza-
ção ativada, o que permitiu realizar uma análise separada do queijo co-
alho tradicional ou regional do Nordeste. Assim, foram estudados 8.873
tweets provenientes da região Nordeste, representaram 46,5% do total
de postagens sobre queijo coalho no Brasil. Os restantes (10.198 posta-
gens ou 53,5% dos tweets) eram provenientes das demais regiões, e não
foram considerados nesta análise.
No Nordeste, Pernambuco foi o estado que apresentou o maior
número de publicações sobre queijo coalho. O maior número de posts
referia-se a acompanhamentos e receitas que empregam o queijo coalho
(1.451). Dentre essas receitas, as mais citadas foram: tapioca (27,3%),
carne de sol (23,5%), pizza (9,7%) e arroz (7,3%). Nas postagens que
envolviam a tapioca, geralmente havia a combinação desta com queijo
coalho e outros produtos que remetem à indulgência, ou seja, ao con-
sumo por prazer, como por exemplo, mel e doce de leite. Já em relação
aos acompanhamentos para este tipo de queijo, a carne (14,1%) e o pão
(9,8%) foram os mais citados enquanto o café (38%), seguido de leite
(28,2%), suco (13,2%), cerveja (6,5%) e chá (6%) representaram as be-
bidas que frequentemente acompanharam o queijo tipo coalho. Com
relação à textura, a maioria das postagens fazia referência à cremosidade
(35%) e com relação à composição, o orégano foi o ingrediente mais
citado, referindo-se principalmente ao consumo de dadinhos de queijo
coalho com orégano.
O conteúdo publicado no Twitter sobre queijo coalho nas demais
regiões do Brasil apresentou algumas similaridades com o conteúdo pu-
blicado no Nordeste. Nas demais regiões, o maior número de postagens
também foi de acompanhamentos e receitas. Para os acompanhamen-

– 193 –
tos, o pão ficou em primeiro lugar com 22,3% das citações, seguido por
carne (12,9%) e tucumã (7,4%). Para as receitas, novamente a tapioca fi-
cou em primeiro colocado, com 29,9% das postagens, seguido por carne
sol com 11,7%, pizza com 8,7% e arroz com 7,7% das citações. Porém, as
associações da tapioca com o queijo coalho nas demais regiões do País
foram acompanhadas de manteiga ou banana e tucumã, o que difere do
consumo indulgente observado para o queijo coalho no Nordeste. No
quesito bebidas para acompanhar o queijo coalho nas 4 regiões do Bra-
sil (Norte, Sul, Sudeste e Centro-Oeste), o café foi novamente o mais ci-
tado com 28,6% das menções. Na sequência, observou-se leite (21,1%),
cerveja (15,3%) e suco (14,1%). No entanto, não foi possível analisar ou-
tros atributos relacionados ao consumo deste tipo de queijo devido ao
reduzido número de publicações a este respeito. Portanto, nota-se uma
tendência de consumo indulgente do queijo coalho na região Nordeste.
Apesar do estudo não ter avaliado os momentos das refeições, podemos
inferir que o queijo coalho é consumido preferencialmente no café da
manhã ou no lanche da tarde, visto que pão e café apareceram como
acompanhamentos muito citados. Além disso, tem o leite também que é
uma bebida mais relacionada a este tipo de refeição. As demais citações,
como arroz, carne de sol, pizza, etc., podem se referir tanto a almoço
quanto jantar. A tapioca também pode ser consumida em qualquer re-
feição, inclusive como sobremesa. Isso indica que o queijo coalho apre-
senta grande versatilidade de consumo no Brasil. Apesar das diferenças
regionais, o produto tem sido consumido amplamente nas mais diversas
formas, refeições e acompanhamentos. Com isso, é possível entender a
sua popularidade de Norte a Sul do País.

– 194 –
Análise exploratória da imagem dos lácteos em
tempos de coronavírus*

Kennya Beatriz Siqueira


Thallys Silva Nogueira
Emerson Wendelin Alves Moreira Campos
Nedson Donato Soares
Emerson Augusto Priamo Moraes
Regina Maria Maciel Braga Villela
José Maria Nazar David
Priscila Vanessa Zabala Capriles Goliatt

O mundo está vivendo, no momento, um estado de pandemia,


onde milhares de pessoas encontram-se confinadas em suas casas usan-
do a internet e, principalmente, as redes sociais para se comunicar com
o resto do mundo. Com isso, a internet tornou-se uma importante fer-
ramenta de análise de comportamento e tendências.
De acordo com pesquisa da TIC Domicílios realizada em 2018,
70% dos brasileiros têm acesso à internet, o que inclui metade da popu-
lação rural e das classes D e E. Com relação ao tempo que os brasileiros
gastam na internet, as redes sociais se destacam, com média de 3 horas
e 34 minutos (TIC Domicílios, 2018).
Os conteúdos compartilhados na internet, e em redes sociais, tendem
a evidenciar características associadas ao perfil de cada consumidor, real-
çando seus interesses e opiniões relacionadas a diferentes assuntos. Nesse
cenário, o Twitter destaca-se como uma das maiores redes sociais da atu-
alidade, possuindo mais de 300 milhões de usuários ativos mensalmente.
O Twitter é uma rede social que oferece aos seus usuários um espaço para
conversação, compartilhamento de textos, fotografias e vídeo. De acordo
com In Digital (2020) essa é a sexta rede social mais usada no Brasil, com

*
Publicado em Revista Indústria de Laticínios

– 195 –
cerca de 48% da população utilizando essa plataforma. O Brasil tem o se-
gundo maior número de usuários da rede, logo atrás dos Estados Unidos,
com mais de 27,7 milhões de contas ativas (EMARKETER, 2016).
Segundo Pak & Paroubek (2010) e Araújo et al. (2014), analisar os
conteúdos compartilhados em redes sociais pode auxiliar no entendi-
mento da opinião das pessoas sobre diferentes assuntos, e, a partir desta
análise, dentre diversas outras aplicações possíveis, empresas podem sa-
ber mais sobre o que os seus consumidores pensam sobre determinados
produtos e serviços (Pushpam & Jayanthi, 2017).
Assim, as redes sociais são no momento, uma alternativa às pes-
quisas de mercado tradicionais, já que há um maior número de pesso-
as em casa, se comunicando, gerando maior tráfego de informações na
web e principalmente nas redes sociais. De acordo com levantamento
da Fundação Dom Cabral (FDC, 2020) realizado nas redes sociais, na
última semana, os posts relacionados ao coronavírus ultrapassaram 226
mil/dia no Brasil. Isso indica um grande número de pessoas publicando
e expressando suas opiniões na internet. Diante disso, torna-se oportu-
no avaliar esse conteúdo para analisar o que os consumidores de leite e
derivados têm expressado no Twitter como forma de identificar com-
portamentos e tendências de mercado neste período de crise.
De acordo com o último post da ComScore (24 de março de 2020),
foi possível observar que grandes marcas de produtos diminuíram suas
ações em redes sociais em cerca de 9%, mostrando que as marcas não
estão sabendo como engajar o público para os seus produtos durante
esse período de pandemia. Mas como será que o mercado do leite e de-
rivados está se saindo diante deste cenário?
O Twitter disponibiliza gratuitamente uma Application Program-
ming Interface (API) para mineração de dados públicos criados por seus
usuários, facilitando a obtenção dessas informações. Neste trabalho, fo-
ram minerados posts através de um script na linguagem de programação
R (R Core Team, 2013), 5 grupos de palavras-chave combinadas como é
mostrado abaixo no período de 20 a 27 de março de 2020:

– 196 –
1. quarentena + {leite}
2. coronavirus + {leite}
3. pandemia + {leite}
4. covid + {leite}
5. isolamento social + {leite}
em que {leite} refere-se aos seguintes termos: creme de leite, doce
de leite, iogurte, lactobacilos, leite condensado, leite em pó, leite UHT,
leite, manteiga, queijo, requeijão, sorvete, leite longa vida, bebida láctea,
leitinho, ghee, leite pasteurizado, leite de saquinho, leite barriga mole,
lácteos, laticínios, derivados do leite, derivados lácteos, ricota, mussa-
rela, muçarela, brie, gorgonzola, lactose, leite fermentado, kefir. Alguns
nomes de queijos também foram inseridos nas buscas que são: provo-
lone, queijo artesanal, queijo canastra, parmesão, camembert, roquefort,
cottage, mascarpone, queijo prato, pecorino, gruyere, edam, estepe, em-
mental, queijo do reino e gouda.
Além disso, foi empregado o software Orange Canvas desenvolvido
na Linguagem Pyton, aplicando técnicas de análise de sentimentos para
analisar os sentimentos associados às postagens no Twitter. O Orange
Canvas é um conjunto abrangente de software baseado em componentes
para mineração de dados e aprendizagem de máquina, desenvolvido no
Laboratório de Bioinformática, da Faculdade de Computação e Ciência
da Informação da Universidade de Ljubljana, Eslovénia, juntamente com
a comunidade de código aberto (ERJAVEC, 2013). O Orange Canvas tra-
balha com blocos de construção de fluxos chamados Widgets para análise
de dados que são montados no ambiente de programação visual do siste-
ma. Os Widgets são agrupados em classes de acordo com sua função.
A combinação das palavras visa identificar as opiniões de con-
sumidores que publicam conteúdos lácteos associados à pandemia do
novo coronavírus. A Figura 1 apresenta o total de tweets. No total foram
buscados 14.537 tweets no intervalo de 20 a 27 de março de 2020 (dados
puros). Realizando a remoção de tweets duplicados foi contabilizado
um total de 12.185 tweets (dados tratados).

– 197 –
Quantidade de tweets minerados de 20 a 27 de março de 2020
Dado puro Dado tratado
15.000
12.768

10.583
Quantidade de tweets

10.000

5.000

815 745 517 460 325 288 115 99


0
Quarentena Coronavírus Pandemia Covid Isolamento Social

Palavras Chave
Figura 1. Total de tweets minerados no período de 20 a 27 de março de 2020.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Pode-se observar que o maior número de resultados foi encontra-


do para a palavra quarentena associada à lácteos, o que já sugere uma
maior preocupação dos brasileiros não apenas com a doença causada
pelo coronavírus, mas sim com o isolamento e confinamento em casa.
A Figura 2 apresenta os principais derivados lácteos mencionados no
Twitter no período analisado.

– 198 –
Quantidade de menções dos derivados do leite nos tweets
Outros 635
4,4%
Creme de Leite 200
1,4%
Leite em pó 243
1,7%
Requeijão 312
2,2%
Queijo 421
2,9% Leite 6.796
Iogurte 485 47,1%
3,4%
Doce de leite 495
3,4%
Manteiga 498
3,5%
Lactose 786
5,4%
Leite condensado 1.237
8,6%
Sorvete 2.325
16,1%

Figura 2. Quantidade de menções dos derivados do leite nos tweets.


Fonte: Elaborado pelos autores.

A palavra leite foi retirada da análise por retornar muitos tweets com
conteúdo não relacionado, o que corrompe os resultados. Assim, os cinco
derivados do leite mais comentados em tweets relacionados ao coronavírus
foram: sorvete, leite condensado, lactose, manteiga e doce de leite.
É interessante notar que três desses derivados são produtos re-
conhecidamente indulgentes: sorvete, leite condensado e doce de leite.
Alimentos indulgentes ou com apelo à indulgência são aqueles consu-
midos pura e simplesmente por prazer. De acordo com a ciência, isso é
natural de ocorrer, pois o hormônio cortisol, conhecido como hormô-
nio do estresse, é liberado em situações de emergência, medo e peri-
go. Ele gera um aumento de um neurotransmissor chamado NPY que
estimula o apetite. Além disso, há a redução de dopamina e serotonina
que fornecem a sensação de bem estar e prazer. Assim, a consequência
em situações de estresse como a que estamos vivendo no momento é a
busca por alimentos que forneçam essa sensação de prazer, ou seja, os
alimentos indulgentes.

– 199 –
Com os dados coletados do Twitter foi gerada uma nuvem de pa-
lavras mais mencionadas nos posts no intervalo de tempo considerado
(Figura 3).

Figura 3. Nuvem de palavras gerada com base nos tweets analisados.


Fonte: Elaborado pelos autores.

A nuvem de palavras evidencia novamente muitas palavras rela-


cionadas ao momento de estresse e à busca por prazer. Além dos lácteos
indulgentes, a nuvem de palavras apresenta outros produtos com apelo
à indulgência: brigadeiro, pipoca, Nescau, pastel, biscoito. Além disso, é
possível notar que, ao falar sobre lácteos e coronavírus, poucos consu-
midores consideram os nutrientes e benefícios que os derivados do leite
podem trazer para o sistema imune. Ou seja, tudo indica que neste pri-
meiro momento, o estresse está falando mais alto do que a preocupação
com a saúde e a busca por lácteos tem sido mais para atender ao prazer
do que à prevenção e aumento da imunidade. A análise de sentimentos
realizada também corrobora com esse resultado (Figura 4).

– 200 –
6.036
6K

5K

4K
Número de registros
3K

2K

1.027 1.124
1K

0K
N NEU P
Negativo, neutro e positivo

Figura 4. Gráfico de polaridade com a distribuição dos sentimentos Negativo, Neutro


e Positivo.
Fonte: Elaborado pelos autores.

A Figura 4 evidencia que o conteúdo postado sobre lácteos e a


pandemia reflete muito o lado negativo da situação, o que, reforça os
resultados da situação de estresse e busca por satisfação e prazer.
Portanto, pode-se concluir que, num primeiro momento de isola-
mento social e expansão dos casos de novo coronavírus no Brasil, os lác-
teos mais procurados e desejados são aqueles que têm o poder de acalmar
e tranquilizar o organismo humano. Muito mais do que nutrientes, sau-
dabilidade e prevenção, os brasileiros, inicialmente, estão precisando de
alimentos para aliviar o estresse provocado por toda essa turbulência. No
entanto, mesmo os alimentos indulgentes não estão intactos à crise. Esse
estudo reflete apenas o comportamento do consumidor nos primeiros
dias de contato com a pandemia. Após os ânimos se acalmarem, a busca
por saudabilidade que já era tendência antes da crise, pode ganhar força,
especialmente se isso for bem administrado pelos agentes do setor.

– 201 –
Referências Bibliográficas

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This Year. 22 julho 2016. Disponível em: <https://www.emarketer.
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Year/1014243>. Acesso em: 18 fev. 2020.

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Machine Learning Research, p. 2349-2353, 2013.

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informação e comunicação nos domicílios brasileiros. São Paulo :
Comitê Gestor da Internet no Brasil, 2019. PDF.

– 202 –
O que mudou no consumo de lácteos com a
pandemia? Uma visão das redes sociais*

Kennya Beatriz Siqueira


Thallys Silva Nogueira
Emerson Wendelin Alves Moreira Campos
Nedson Donato Soares
Emerson Augusto Priamo Moraes
Regina Maria Maciel Braga Villela
José Maria Nazar David
Priscila Vanessa Zabala Capriles Goliatt

Acompanhar o comportamento do consumo de lácteos em tempo


real, entendendo o que os consumidores estão comprando e o que irão
comprar, é um desejo dos agentes do setor, especialmente num momen-
to de crise econômica, política e de saúde, como o atual. No entanto, as
pesquisas de mercado tradicionais, com sondagens entre consumidores,
grupos focais e dados de venda de varejo, são lentas, caras e, muitas ve-
zes, incompletas.
Com o avanço da internet, a pesquisa de mercado está se moder-
nizando. Atualmente, já é possível monitorar o mercado consumidor
por meio das redes sociais, pois o conteúdo compartilhado nessas redes
expressa sentimentos, desejos, interesses e opiniões dos consumidores.
Considerando que 70% dos brasileiros têm acesso às redes sociais,
o que inclui todas as classes econômicas e que o Twitter é uma das redes
sociais mais usadas no Brasil, um estudo da Embrapa Gado de Leite,
Universidade Federal de Juiz de Fora e Instituto Federal do Sudeste de
Minas Gerais, empregou essa rede para analisar as mudanças de pre-
ferências dos consumidores de lácteos antes e durante a pandemia do
novo coronavírus.

*
Publicado em Milkpoint

– 203 –
Utilizando a técnica de mineração de dados foi desenvolvido um
script para a realização de uma busca no Twitter utilizando 14 derivados
do leite nos seguintes períodos:
- 12 a 16 de fevereiro: antes da pandemia
- 21 a 28 de março: primeiras semanas de quarentena
- 14 a 21 de abril: um mês de quarentena
A pesquisa identificou um aumento no número de tweets sobre
leite e derivados durante a pandemia (Figura 1).
Comparação do número de tweets
200.000
160.348
150.000 125.266
Quantidade de tweets

100.000 85.157

50.000

0
12 a 19 de Fevereiro 21 a 28 de Março 14 a 21 de Abril
Semanas
Figura 1. Evolução no número de tweets sobre leite e derivados entre fevereiro e abril
de 2020.
Fonte: Resultados da pesquisa.

Nas primeiras semanas da pandemia, houve um aumento de qua-


se 50% nos tweets relacionados a leite e derivados em comparação com
o mês de fevereiro de 2020. Já em abril, o aumento foi de 88% em relação
a fevereiro do mesmo ano. No entanto, esse aumento pode ser apenas
reflexo do maior número de pessoas em casa utilizando a internet por
mais tempo.
Dentre os produtos lácteos mais mencionados no Twitter não se
observou grandes mudanças: queijo e sorvete figuraram nas primeiras
colocações em todos os períodos. Entretanto, o terceiro colocado va-
riou. Em fevereiro e março, foi o leite condensado o terceiro item mais

– 204 –
citado, o qual está na categoria de produto indulgente, ou seja, aque-
les que proporcionam prazer, especialmente nos momentos de estresse,
como o pânico inicial gerado pela pandemia. Em abril, o terceiro produ-
to mais citado passou a ser a manteiga, que já é um produto mais ligado
à saúde e culinária.
O doce de leite, que também se enquadra na categoria de produto
indulgente, ocupou a quarta colocação nos produtos lácteos mais men-
cionados no Twitter em fevereiro. Mas em março, o leite em pó foi o
quarto produto mais falado nessa rede social. É interessante notar que
o interesse pelo leite em pó aumentou nas redes sociais, justamente no
início da pandemia, quando os dados de mercado também mostram au-
mento da demanda por este produto, muito associado a sua maior vida
de prateleira, preço mais acessível e facilidade de estocagem.
Por fim, em abril, a quarta posição no ranking dos produtos mais
tweetados foi ocupada pelo leite condensado. Neste ponto, é importan-
te notar que a queda do leite condensado no ranking, de terceiro para
quarto colocado entre março e abril revela uma mudança de comporta-
mento do consumidor. No início da pandemia e quarentena, o nível de
estresse estava elevado com as incertezas e o desconhecido futuro que
viria. Neste momento, já era de se esperar que os alimentos indulgentes
tivessem maior apelo pois, sem muitas opções de lazer e bem-estar, o
consumidor busca prazer na alimentação. Já em abril, após um mês de
quarentena, os brasileiros já estão mais adaptados à rotina e, com isso,
os produtos indulgentes perdem um pouco a relevância.
Assim, no mês de abril, os produtos lácteos mais comentados no
Twitter foram: queijo, sorvete, manteiga, leite condensado e doce de lei-
te. A Figura 2 mostra a variação percentual no número de tweets dos
derivados lácteos pesquisados.

– 205 –
Fevereiro Março a Abril

Queijo -25.46%
73,94%
Sorvete 167,08%
6,68%
Leite Condensado 95,50%
-11,05%
Doce de Leite 49,24%
36,99%
Requeijão 42,91%
14,64%
Iogurte 45,50%
-20,81
Manteiga 339,63%
31,66%
Leite em Pó 224,49%
-39,23%
Creme de Leite 107,00%
4,02%
Farinnha Láctea 62,84%
-10,14%
Leite Desnatado 2,73%
-20,9%
Leite Integral 29,05%
31,60%
Leite Pasteurizado -31,25%
-54,55%
Leite UHT -57,89% 171,43%

-100,00% 0,00% 100,00% 200,00% 300,00% 400,00%


Figura 2. Variação percentual dos tweets dos derivados lácteos no período analisado.
Fonte: Resultados da pesquisa.

A análise das redes sociais permite inferir que há um interesse


maior pelos temas mais citados. Assim, observa-se certa mudança de
interesse dos consumidores brasileiros de leite e derivados ao longo dos
últimos 3 meses. No início da quarentena, os únicos produtos que apre-
sentaram redução de tweets em relação ao mês anterior, foram o queijo e
o leite pasteurizado. Já os produtos que tiveram os maiores incrementos
percentuais neste período foram: manteiga, leite em pó, leite UHT, sor-
vete e creme de leite.
Já no mês de abril, em comparação com março, metade dos pro-
dutos teve redução de tweets. As maiores quedas foram: leite UHT, leite
pasteurizado e leite em pó. Já os produtos que tiveram maior incremen-
to percentual neste período foram: queijo, doce de leite e manteiga. Os
produtos que apresentaram incremento de interesse por parte do con-

– 206 –
sumidor durante toda a quarentena foram: sorvete, doce de leite, requei-
jão, manteiga, creme de leite e leite integral.
A nuvem de palavras formada em cada período também fornece
informações interessantes sobre o mercado lácteo.

Figura 3. Nuvens de palavras mais citadas no Twitter. Em I, nuvem referente à semana


12 a 19 de fevereiro, em II nuvem referente à semana 21 a 28 de março e III nuvem
referente à semana 14 a 21 de abril de 2020.
Fonte: Resultados da pesquisa.

A nuvem de palavras mostra uma mudança de comportamento


do consumidor brasileiro ao longo do período analisado. Na primeira
semana de quarentena, as palavras condensado, sorvete, manteiga e pó
tornam-se mais relevantes do que antes da pandemia. Observa-se tam-
bém um maior número de palavras relacionadas ao prazer e indulgên-
cia, como por exemplo pipoca e brigadeiro. Além disso, há um destaque
para a palavra quarentena, sugerindo que os consumidores estão asso-
ciando os lácteos com o período de quarentena.
No mês de abril, a palavra manteiga torna-se ainda mais relevante,
enquanto que a palavra pó desapareceu da nuvem de palavras. Outras
informações relevantes desse período são a perda de importância da pa-
lavra quarentena e o aumento do número de palavras citadas, engloban-
do tanto alimentos indulgentes (frita-referente a batata frita, coca – refe-

– 207 –
rente a coca-cola, brigadeiro) quanto produtos do dia a dia (arroz, feijão,
carne, frango) e alimentos mais saudáveis (fruta, banana, morango).
Essa pesquisa revela certa mudança de pensamento, perspectiva e
interesse dos consumidores brasileiros de lácteos. Sugere que no início
da quarentena os produtos indulgentes e os de maior vida de prateleira
(ligados ao estoque em casa) chamaram mais a atenção da população
brasileira. No entanto, este comportamento parece estar mudando. Da
estocagem e busca por prazer pelos alimentos, os consumidores agora
parecem estar deslocando sua atenção para os itens essenciais (o que
pode estar relacionado à queda na renda) e busca por saudabilidade
(fato ligado ao aumento dos casos da doença no Brasil e preocupação
com manutenção da imunidade elevada).

– 208 –
O impacto da pandemia no consumo de lácteos no
Brasil – uma abordagem das redes sociais*

Kennya Beatriz Siqueira


Thallys Silva Nogueira
Nedson Donato Soares
Emerson Wendelin Alves Moreira Campos
Emerson Augusto Priamo Moraes
Regina Maria Maciel Braga Villela
José Maria Nazar David
Priscila Vanessa Zabala Capriles Goliatt

O ano de 2020 começou com tendências positivas para o consumo


de leite e derivados. A expectativa era de retomada da economia brasi-
leira e, consequentemente, do crescimento das vendas de lácteos. Mas a
pandemia do novo coronavírus assolou o mundo e muita coisa mudou.
Algumas mudanças importantes ocorreram no âmbito do consu-
mo domiciliar de leite e derivados. Para acompanhar tais mudanças, a
Embrapa Gado de Leite, junto com a Universidade Federal de Juiz de
Fora e o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sudeste
de Minas Gerais, monitorou as postagens relacionadas a leite e deriva-
dos na rede social Twitter.
De acordo com a literatura, o conteúdo compartilhado nas redes
sociais revela interesses e preferências dos indivíduos, o que permite re-
alizar inferências sobre o consumo de bens e serviços. No caso do mer-
cado lácteo, o acompanhamento das postagens no Twitter evidenciou
aumento de interesse e, provavelmente, de consumo de leite e derivados
durante a pandemia (Figura 1).

*
Publicado em Revista Indústria de Laticínios

– 209 –
250000

200000

150000

100000

50000

Figura 1. Evolução temporal da quantidade de tweets sobre leite e derivados.


Fonte: Dados da pesquisa.

A Figura 1 mostra aumento considerável na quantidade de tweets


sobre lácteos durante a pandemia. Na primeira coleta de dados realizada
antes da pandemia (fevereiro de 2020), o total de tweets sobre o tema
não chegava a 100 mil. No final de março (início do isolamento social no
Brasil), esse número chegou a 125 mil e no final de junho alcançou o seu
máximo chegando a quase 240 mil tweets. Depois disso, a quantidade de
postagens versando sobre leite e derivados oscilou bastante, mas sempre
em patamares bem superior ao verificado antes da pandemia (média de
180 mil tweets), o que revela aumento de interesse dos consumidores
brasileiros por estes produtos.
Passada a histeria inicial dos meses de março e abril, a partir de
maio, as postagens apresentaram um comportamento cíclico, com picos
e vales se alternando a cada 4 semanas. Ou seja, a cada 8 semanas (2
meses), os consumidores apresentaram picos de interesse pelos lácteos.
Isso perdurou até final de julho. A partir de agosto, os picos passaram
a ocorrer a cada 4 semanas, mas com valores totais menores do que os

– 210 –
primeiros picos. As oscilações também diminuíram, mas, na média, o
interesse dos consumidores ficou num patamar menor do que no início
da pandemia e maior do que antes da pandemia.
No âmbito dos produtos mais comentados no Twitter, o queijo
ficou em primeiro lugar ao longo de quase todo o período. Ele perdeu
para o sorvete, segundo colocado no ranking, em apenas 3 semanas. Ao
contrário dos demais produtos, as postagens de queijo caíram na pri-
meira semana de isolamento social, quando comparado com antes da
pandemia. No entanto, nas semanas que se seguiram, as postagens sobre
queijos se consolidaram em um patamar muito superior ao verificado
antes da pandemia (Figura 2). O mesmo aconteceu com o sorvete, a
manteiga, o leite condensado e o doce de leite.

80000
70000
60000
50000
40000
30000
20000
10000
0
fev mar abr mai jun jul ago set out nov

Queijo Sorvete Manteiga


Leite Condensado Doce de Leite
Figura 2. Média mensal da quantidade de postagens dos 5 derivados lácteos mais
comentados no Twitter.
Fonte: Dados da pesquisa.

Comparando as médias de postagens dos meses da pandemia com


o mês de fevereiro (antes da pandemia), os aumentos percentuais mais
significativos ocorreram para a manteiga e o sorvete (Tabela 1). Para
estes dois produtos, o interesse dos consumidores mais que dobrou.

– 211 –
Tabela 1. Variação percentual nas postagens dos derivados lácteos mais comentados
no Twitter (mês comparado com fevereiro de 2020).
Produto mar abr mai jun jul ago set out nov
Queijo -25% 30% 52% 57% 59% 45% 44% 52% 32%
Sorvete 167% 185% 320% 260% 259% 374% 335% 372% 250%
Manteiga 340% 479% 524% 443% 462% 411% 383% 355% 334%
Leite condensado 96% 74% 132% 77% 73% 48% 34% 32% 56%
Doce de leite 49% 104% 134% 93% 97% 75% 45% 91% 72%
Fonte: Dados da pesquisa.
Obs: os dados acima refletem variação de postagens e, portanto, de interesse dos
consumidores pelos derivados lácteos. Não refletem a magnitude do aumento do
consumo.

Infelizmente, não possuímos dados mensais de postagens do ano


de 2019, o que serviria de uma base de comparação melhor. Mas, usar
os dados de fevereiro como base de comparação, permite observar uma
mudança significativa nos patamares de interesse e preferência dos con-
sumidores.
Os alimentos chamados de indulgentes, ou seja, aqueles consu-
midos apenas para atender a uma necessidade de prazer e satisfação,
ganharam atenção do consumidor. São eles: sorvete, leite condensado
e doce de leite. De acordo com a empresa de inteligência de mercado
Horus, a categoria de consumo indulgente apresentou aumento de 4,2
pontos percentuais no segundo trimestre deste ano, comparado com o
primeiro trimestre. Esse resultado se justifica principalmente porque
nos períodos de estresse, o consumo de alimentos indulgentes geral-
mente se intensifica.
No caso da manteiga e do queijo, houve realmente uma mudança
de hábitos. Muitas pessoas passaram a incluir estes produtos na dieta
principalmente por estarem preparando suas refeições em casa. Com
a elaboração de novas receitas e principalmente lanches, os queijos e a
manteiga ganharam espaço na mesa dos brasileiros.
Mas, com o relaxamento das medidas de isolamento social e reto-
mada das atividades econômicas, esse cenário tem mudado um pouco.

– 212 –
No caso dos queijos, os dados da Figura 1 e Tabela 1 já mostram que
no mês de novembro, as postagens voltaram para o patamar de abril de
2020. Com o fim da pandemia, as pessoas não devem continuar prepa-
rando tantas receitas em casa, com isso os produtos indulgentes muito
provavelmente devem retornar aos níveis de consumo da normalidade,
já que o seu consumo está atrelado ao estresse.
No entanto, alguns hábitos realmente mudaram. Isso provavel-
mente ocorreu para queijos e manteiga. Principalmente para os queijos.
Os brasileiros conheceram mais tipos de queijos durante a pandemia.
Experimentaram inúmeras formas de consumi-los. Surgiu um gosto
mais apurado para o produto. Isso é uma mudança de hábito que deve
se perpetuar. Com o fim do isolamento social, o consumo domiciliar de
queijos certamente não será tão elevado quanto foi durante a pandemia.
Mas, provavelmente, se manterá em um patamar superior ao que era
antes da pandemia, se o brasileiro não sofrer com quedas significativas
de renda.

– 213 –
Covid-19 e o impacto no consumo
de leite e derivados*

Kennya Beatriz Siqueira


Thallys Silva Nogueira
Nedson Donato Soares
Emerson Wendelin Alves Moreira Campos
Emerson Augusto Priamo Moraes
Regina Maria Maciel Braga Villela
José Maria Nazar David
Priscila Vanessa Zabala Capriles Goliatt
Fabio Homero Diniz
Maria de Fatima Ávila Pires
Nívea Maria Vicentini

Em fevereiro de 2020, surgiu o primeiro caso de Covid-19 no Bra-


sil. Em março, o País começou a sentir os efeitos da pandemia com o
fechamento do comércio e serviços não essenciais e medidas de isola-
mento social, o que resultou em crise econômica e crise sanitária. Tudo
isso provocou uma mudança de hábitos dos consumidores brasileiros.
Para avaliar essas mudanças sobre leite e derivados, a Embrapa Gado de
Leite, em parceria com a Universidade Federal de Juiz de Fora e o Ins-
tituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sudeste de Minas
Gerais, monitorou as postagens na rede social Twitter.
Estudos mostram que os conteúdos compartilhados nas redes
sociais podem ser usados para identificar características do perfil dos
consumidores, evidenciando interesses e opiniões relacionadas a dife-
rentes assuntos. Portanto, as redes sociais, no momento, são uma ótima
alternativa às pesquisas de mercado tradicionais.

*
Publicado em Anuário do Leite

– 214 –
Entre 01 de maio de 2020 e 29 de abril de 2021, foram minerados
posts através de um script na linguagem de programação R (R Core
Team, 2013). Foram empregadas 293 palavras-chave relacionadas com
os seguintes derivados lácteos: leite, iogurte, leite condensado, mantei-
ga, queijos, doce de leite, sorvete, creme de leite, leite fermentado e bebi-
das lácteas. A Figura 1 apresenta a evolução do número de tweets sobre
leite e derivados durante o período citado.

2020 2021
1.000.000
818.176 853.937 812.065
773.392 802.308 752.483 807.916
750.000 672.641
622.527 658.653
Total de tweets

546.975 551.592
500.000

250.000

0
Mai. Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez. Jan. Fev. Mar. Abr.

Figura 1. Evolução da quantidade de tweets sobre leite e derivados durante a pandemia


de Covid-19 no Brasil.
Fonte: Resultados da pesquisa.

No total, foram coletados 8.672.665 de tweets discorrendo sobre


leite e derivados e é possível perceber certa variação na quantidade de
tweets ao longo do período selecionado. Estudos preliminares indica-
ram que a maioria dos tweets sobre leite e derivados são positivos, ou
seja, ensejam informações favoráveis sobre os derivados citados. Assim,
pode-se afirmar que a variação na quantidade de postagens sugere mu-
danças de interesse do consumidor brasileiro pelos produtos lácteos, o
que se reflete no consumo propriamente dito.
Pela Figura 1, nota-se maior número de postagens e, consequen-
temente, maior interesse pelos laticínios na primeira fase da pandemia,
até outubro de 2020. Neste período, a média de tweets sobre lácteos es-
tava em torno de 800 mil/mês. Nos meses que se seguiram, essa média

– 215 –
caiu para cerca de 640 mil/mês, evidenciando a queda de interesse pelos
lácteos neste período à medida que as medidas de isolamento social fo-
ram sendo flexibilizadas. Assim, de novembro de 2020 a abril de 2021,
com exceção do mês de janeiro, houve um conteúdo menor de posta-
gens sobre os produtos lácteos no Twitter. Vale ressaltar, que em janeiro
de 2020, foram divulgados dados de compra do governo federal que, en-
globavam grande volume de leite condensado, o que repercutiu na mí-
dia nacional e elevou os tweets sobre este produto e, consequentemente,
sobre o total de lácteos neste mês. Os derivados lácteos mais citados
no período todo foram: queijos, sorvete, leite condensado e manteiga
(Figura 2).

Creme de Leite 217.522


2,5%
Iogurte 231.865
2,7%
Leite 232.162
2,7%
Doce de Leite 426.550
4,9% Queijos 3.533.300
Manteiga 698.672 40,7%
8,1%

Leite Condensado
10,5%

Sorvete 2.421.528
27,9%

Figura 2. Quantidade de tweets por categoria de derivados lácteos durante a pandemia


de Covid-19 no Brasil.
Fonte: Resultados da pesquisa.

Os queijos foram, de longe os derivados mais comentados. Eles


estiveram presentes em 40,7% das postagens relacionadas à lácteos du-
rante o período do estudo no Brasil. Esse total pode ser resultado da
incorporação de hábitos da cultura moderna ocidental ao estilo de vida

– 216 –
brasileiro, que inclui sanduíches, pizzas e outros pratos de fast food que
têm queijos como ingrediente. Assim como ocorreu em outros países,
o consumo deste tipo de alimento aumentou durante a pandemia, seja
pela praticidade de preparo dessas receitas em casa, seja pelo aumento
dos deliveries, ou simplesmente pela indulgência que eles oferecem.
Os alimentos considerados indulgentes, ou seja, aqueles que são
consumidos unicamente pelo prazer que eles proporcionam, geral-
mente apresentam incremento de consumo durante os momentos de
estresse e crise. E não foi diferente durante a pandemia de Covid-19.
O segundo e terceiro lácteos mais comentados na rede social Twitter
durante a pandemia, são considerados alimentos indulgentes: sorvete e
leite condensado.
Isso nos mostra que, em termos de consumo de lácteos, a pande-
mia do novo coronavírus no Brasil se resumiu a aumento de consumo
de produtos indulgentes. Apesar de ser uma crise de saúde pública, a
indulgência, e até a conveniência, falaram mais alto do que a saudabili-
dade.

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