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I-Juca-Pirama
Livro 133
'o (rasil, segundo a Lei n) *&+-, no seu artigo ., os direitos patrimoniais do
autor perduram por setenta anos contados de / de janeiro do ano subsequente
ao de seu falecimento& O mesmo se observa em Portugal& 0egundo o 12digo dos
%ireitos de 3utor e dos %ireitos 1one4os, em seu captulo 56 e artigo 7), o
direito de autor caduca, na falta de disposi"#o especial, 8- anos ap2s a morte
do criador intelectual, mesmo que a obra s2 tenha sido publicada ou divulgada
postumamente&
O nosso Projeto, que tem por !nico e e4clusivo objetivo colaborar em prol da
divulga"#o do bom conhecimento na 5nternet, busca assim n#o violar nenhum
direito autoral& 9odavia, caso seja encontrado algum livro que, por alguma
ra$#o, esteja ferindo os direitos do autor, pedimos a gentile$a que nos informe,
a fim de que seja devidamente suprimido de nosso acervo&
:speramos um dia, quem sabe, que as leis que regem os direitos do autor sejam
repensadas e reformuladas, tornando a prote"#o da propriedade intelectual
uma ferramenta para promover o conhecimento, em ve$ de um temvel inibidor
ao livre acesso aos bens culturais& 3ssim esperamos;
> isso;
5ba ?endes
iba@ibamendes.com
BIOGRAFIA
A melhor parte da lírica dos Cantos inspira4se ora da naturea, ora da religi1o,
mas soretudo de seu car'ter e temperamento. ;ua poesia B eminentemente
autoiogr'fica. A consci2ncia da inferioridade de origem, a saJde prec'ria, tudo
lhe era motivo de tristeas. 6oram elas atriuídas ao infortJnio amoroso pelos
críticos, es<uecidos estes de <ue a grande pai1o do 7oeta ocorreu depois da
pulicaç1o dos Iltimos cantos. /m "$", partiu Gonçalves Dias para o Korte em
miss1o oficial e no intuito de desposar Ana AmBlia 6erreira do 5ale, de "* anos,
o grande amor de sua vida, cu=a m1e n1o concordou por motivos de sua origem
astarda e mestiça. 6rustrado, casou4se no 9io, em "$%, com -límpia Carolina
da Costa. 6oi um casamento de conveni2ncia, origem de grandes desventuras
para o 7oeta, devidas ao g2nio da esposa, da <ual se separou em "$. 3iveram
uma filha, falecida na primeira infncia.
Eis os meus últimos cantos, o meu ultimo volume de poesias soltas, os últimos
harpejos de uma lira, cujas cordas foram estalando, muitas aos balanços
ásperos da desventura, e outras, talvez a maior parte, com as dores de um
espírito inferno,— fictícias, mas nem por isso menos agudas,— produzidas pela
imaginação, como se a realidade já não fosse por si bastante penosa, ou que a
espírito, afeito a certa dose de sofrimento, se sobressaltasse de sentir menos
pesada a costumada carga
elhor que ningu#m o sabes- podes a teu grado sondar os arcanos da minha
consci'ncia, e não te será difícil descobrir o segredo das minhas tristes
inspiraç"es .s meus primeiros, os meus últimos cantos são teus- o que sou, o
que for, a ti o devo,— a ti, ao teu nobre coração, que durante os melhores anos
da juventude bateu constantemente ao meu lado,— a aragem benfazeja da tua
amizade solicita e desvelada,—a tua voz que me animava e consolava,— a tua
intelig'ncia que me vivificava— ao prodígio de duas índoles tão assimiladas, de
duas almas tão irmãs, tão g'meas, que uma delas rematava o pensamento
apenas enunciado da outra, e aos sentimentos uníssonos de dois coraç"es, que
mutuamente se falavam, se interpretavam, se respondiam sem o au&ilio de
palavras $uplicada a minha e&ist'ncia, não era muito que eu me sentisse com
1
forças para abalançar(me a esta empresa% e agora que em parte a tenho
concluído, # um dever de gratidão, um dever para que sou atraído por todas as
pot'ncias da minha alma, escrever aqui o teu nome, como talvez seja o
derradeiro que escreverei em minhas obras, o ultimo que os meus lábios
pronunciem, se nos paro&ismos da morte se poder destacar inteiramente do
meu coração
Entrei na luta, e por mais algum tempo continuarei nela, variando apenas o
sentido dos meus cantos / f# e o entusiasmo, o *leo e o pabulo da l+mpada
que alumia as composiç"es do artista, vão(se(me esfriando dentro do peito% eu
o conheço e o sinto% se pois ainda persisto nesta carreira # por teu respeito-
continuarei — at# que satisfeito dos meus esforços que digas- basta0 — Então,
já to hei dito, voltarei gostoso á obscuridade, donde não devera ter saído, e —
como um soldado desconhecido— contarei os meus triunfos pelas minhas
feridas, voltando a habitação singela, onde me correrão, não felizes, mas os
primeiros dias da minha inf+ncia
inha alma não está comigo, não anda entre os nevoeiros dos 1rgãos, envolta
em neblina, balouçada em castelos de nuvens, nem rouquejando na voz do
trovão 2á está ela0 — lá está a espreguiçar(se nas vagas de ) arcos, a
rumorejar nas folhas dos mangues, a sussurrar nos leques das palmeiras- lá está
ela nos sítios que os meus olhos sempre virão, nas paisagens que eu amo, onde
se avista a palmeira esbelta, a cajazeira coberta de cip*s, e o pau d3arco coberto
de flores amarelas /li sim, — ali está—desfeita em lagrimas nas folhas das
bananeiras — desfeita em orvalho sobre as nossas flores, desfeita em harmonia
sobre os nossos bosques, sobre os nossos rios, sobre os nossos mares, sobre
tudo que eu amo, e que em bem veja eu em breve0 /í, outra vez remoçado e
vivificado de todos os anos que desperdicei, poderei en&ugar os meus vestidos,
voltar aos gozos de uma vida ignorada, e do meu lar tranquilo ver outros mais
corajosos e mais felizes que eu afrontar as borrascas desencadeadas no oceano,
que eu houver para sempre dei&ado atrás de mim
2
I-JUCA PIRAMA
7
!o meio das tabas de amenos verdores,
8ercadas de troncos — cobertos de flores,
/lteiam(se os tetos d9altiva nação%
)ão muitos seus filhos, nos +nimos fortes,
:emíveis na guerra, que em densas coortes
/ssombram das matas a imensa e&tensão
3
8uidosos se incubem do vaso das cores,
$os vários aprestos da honrosa função
77
Em fundos vasos d9alvacenta argila
Aerve o cauim%
Enchem(se as copas, o prazer começa,
Beina o festim
4
!o passo horrendo>
Conra das tabas que nascer te viram,
Aolga morrendo
777
Em larga roda de nov#is guerreiros
2edo caminha o festival :imbira,
/ quem do sacrifício cabe as honras,
!a fronte o canitar sacode em ondas,
. enduape na cinta se embalança,
!a destra mão sopesa a iverapeme,
.rgulhoso e pujante — /o menor passo
8olar d9alvo marfim, insígnia d9honra,
=ue lhe orna o colo e o peito, ruge e freme,
8omo que por feitiço não sabido
Encantadas ali as almas grandes
$os vencidos :apuias, inda chorem
)erem gl*ria e brasão d9imigos feros
5
6em a terreiro o mísero contrário%
$o colo < cinta a muçurana desce-
D$ize(nos quem #s, teus feitos canta,
D.u se mais te apraz, defende(teD 8omeça
. índio, que ao redor derrama os olhos,
8om triste voz que os +nimos comove
76
eu canto de morte,
4uerreiros, ouvi-
)ou filho das selvas,
!as selvas cresci%
4uerreiros, descendo
$a tribo tupi
$a tribo pujante,
=ue agora anda errante
?or fado inconstante,
4uerreiros, nasci%
)ou bravo, sou forte,
)ou filho do !orte%
eu canto de morte,
4uerreiros, ouvi
;á vi cruas brigas,
$e tribos imigas,
E as duras fadigas
$a guerra provei%
!as ondas mendaces
)enti pelas faces
.s silvos fugaces
$os ventos que amei
E os campos talados,
E os arcos quebrados,
6
E os piagas coitados
;á sem maracás%
E os meigos cantores,
)ervindo a senhores,
=ue vinham traidores,
8om mostras de paz
. velho no entanto
)ofrendo já tanto
$e fome e quebranto,
)* qu9ria morrer0
!ão mais me contenho,
!as matas me embrenho,
$as frechas que tenho
e quero valer
Então, forasteiro,
8aí prisioneiro
$e um troço guerreiro
8om que me encontrei-
. cru dessossego
$o pai fraco e cego,
Enquanto não chego
=ual seja, — dizei0
7
!a noite sombria,
/ s* alegria
=ue $eus lhe dei&ou-
Em mim se apoiava,
Em mim se firmava,
Em mim descansava,
=ue filho lhe sou
/o velho coitado
$e penas ralado,
;á cego e quebrado,
=ue resta> — orrer
Enquanto descreve
. giro tão breve
$a vida que teve,
$ei&ai(me viver0
6
)oltai(o0 — diz o chefe ?asma a turba%
.s guerreiros murmuram- mal ouviram,
!em pode nunca um chefe dar tal ordem0
@rada segunda vez com voz mais alta,
/frou&am(se as pris"es, a embira cede,
/ custo, sim% mas cede- o estranho # salvo
8
— $ebalde
— )im, voltarei, morto meu pai
— !ão voltes0
bem feliz, se e&iste, em que não veja,
=ue filho tem, qual chora- #s livre% parte0
— /caso tu sup"es que me acobardo,
=ue receio morrer0
— s livre% parte0
— .ra não partirei% quero provar(te
=ue um filho dos :upis vive com honra,
E com honra maior, se acaso o vencem,
$a morte o passo glorioso afronta
67
— Ailho meu, onde estás>
— /o vosso lado%
/qui vos trago provis"es% tomai(as,
/s vossas forças restaurai perdidas,
E a caminho, e já0
— :ardaste muito0
!ão era nado o sol, quando partiste,
E frou&o o seu calor já sinto agora0
— )im demorei(me a divagar sem rumo,
?erdi(me nestas matas intrincadas,
Beaviei(me e tornei% mas urge o tempo%
8onv#m partir, e já0
— =ue novos males
!os resta de sofrer> — que novas dores,
9
=ue outro fado pior :upã nos guarda>
— /s setas da aflição já se esgotaram,
!em para novo golpe espaço intacto
Em nossos corpos resta
— as tu tremes0
— :alvez do afã da caça
— .h filho caro0
Fm qu' misterioso aqui me fala,
/qui no coração% piedosa fraude
)erá por certo, que não mentes nunca0
!ão conheces temor, e agora temes>
6ejo e sei- # :upã que nos aflige,
E contra o seu querer não valem brios
?artamos0 —
E com mão tr'mula, incerta
?rocura o filho, tateando as trevas
$a sua noite lúgubre e medonha
)entindo o acre odor das frescas tintas,
Fma id#ia fatal ocorreu(lhe < mente
$o filho os membros g#lidos apalpa,
E a dolorosa maciez das plumas
8onhece estremecendo- — foge, volta,
Encontra sob as mãos o duro cr+nio,
$espido então do natural ornato0
Becua aflito e pávido, cobrindo
Gs mãos ambas os olhos fulminados,
8omo que teme ainda o triste velho
$e ver, não mais cruel, por#m mais clara,
$aquele e&ício grande a imagem viva
/nte os olhos do corpo afigurada
!ão era que a verdade conhecesse
7nteira e tão cruel qual tinha sido%
as que funesto azar correra o filho,
Ele o via% ele o tinha ali presente%
E era de repetir(se a cada instante
/ dor passada, a previsão futura
E o presente tão negro, ali os tinha%
/li no coração se concentrava,
Era num ponto s*, mas era a morte0
— :u prisioneiro, tu>
— 6*s o dissestes
— $os índios>
— )im
10
— $e que nação>
— :imbiras
— E a muçurana funeral rompeste,
$os falsos manitHs quebraste a maça
— !ada fiz aqui estou
— !ada0 —
Emudecem%
8urto instante depois prossegue o velho-
— :u #s valente, bem o sei% confessa,
Aizeste(o, certo, ou já não foras vivo0
— !ada fiz% mas souberam da e&ist'ncia
$e um pobre velho, que em mim s* vivia
— E depois>
— Eis(me aqui
— Aica essa taba>
677
D?or amor de um triste velho,
=ue ao termo fatal já chega,
6*s, guerreiros, concedestes
/ vida a um prisioneiro
/ção tão nobre vos honra,
!em tão alta cortesia
6i eu jamais praticada
Entre os :upis, — e mas foram
)enhores em gentileza
11
E quando eu for s* na terra,
8erto acharei entre os vossos,
=ue tão gentis se revelam,
/lgu#m que meus passos guie%
/lgu#m, que vendo o meu peito
8oberto de cicatrizes,
:omando a vez de meu filho,
$e haver(me por pai se ufane0D
as o chefe dos :imbiras,
.s sobrolhos encrespando,
/o velho :upi guerreiro
Besponde com torvo acento-
6777
D:u choraste em presença da morte>
!a presença de estranhos choraste>
!ão descende o cobarde do forte%
?ois choraste, meu filho não #s0
?ossas tu, descendente maldito
$e uma tribo de nobres guerreiros,
7mplorando cru#is forasteiros,
)eres presa de vis /imor#s
12
:eus amigos, se amigos tiveres,
:enham alma inconstante e falaz0
7I
7sto dizendo, o miserando velho
/ quem :upã tamanha dor, tal fado
;á nos confins da vida reservara,
6ai com tr'mulo p#, com as mãos já frias
13
$a sua noite escura as densas trevas
?alpando — /larma0 alarma0 — . velho pára0
. grito que escutou # voz do filho,
6oz de guerra que ouviu já tantas vezes
!outra quadra melhor — /larma0 alarma0
— Esse momento s* vale a pagar(lhe
.s tão compridos transes, as angústias,
=ue o frio coração lhe atormentaram
14
DEstas lágrimas, sim, que não desonramD
I
Fm velho :imbira, coberto de gl*ria,
4uardou a mem*ria
$o moço guerreiro, do velho :upi0
E < noite, nas tabas, se algu#m duvidava
$o que ele contava,
$izia prudente- — Deninos, eu vi0
15
BREVE ANÁLISE
7ba endes
INTRODUÇÃO
?oema desenvolvido em dez cantos, tendo como tema central o drama vivido
pelo último descendente da tribo tupi
BREVE ANÁLISE
I - Juca Pirama # o último descendente da tribo tupi )abe(se que havia no @rasil
inúmeras tribos indígenas Lo pr*prio poema fala da tribo dos :imbirasM =ual
então a razão pela qual 4onçalves $ias elegeu especificamente um guerreiro da
tribo tupi> . que havia de tão especial nessa tribo>
16
8/!:. 7-
.s índios aqui são retratados como seres fortes, soberanos da imensa terra
brasileira% são os verdadeiros senhores desta terra, que reinam majestosa e
livremente sobre o solo que lhes pertenciam legitimamente
17
. narrador utiliza o adjetivo nob! para definir o prisioneiro /presenta(o como
um guerreiro especial, que descende de igual modo de uma tribo especial
relevante notar que, ao narrar a cerimHnia de preparação do sacrifício, o poeta
incorpora inúmeros elementos da cultura indígena, tais como- derrubar o teto
da prisão do índio% convidar as tribos vizinhas para a cerimHnia% adornar a maça
LarmaM com penas% raspar a cabeça do prisioneiro etc
/ causa da prisão do guerreiro tupi foi e&atamente a guerra . tupi vivia para a
guerra :inha, da sua força e da sua coragem, profundo orgulho, associado a
uma verdadeira pai&ão de gl*ria 6encer um inimigo era a maior ufania de um
guerreiro tupi
8/!:. 77-
7 ( ;uca ?irama aguarda o momento pelo qual será sacrificado !ão fosse o fato
de seu velho pai ser cego e doente, haveria por parte do guerreiro aceitação do
ritual com toda a normalidade que era pr*pria das tribos
18
9ue temes, / guerreiro:
!ão era comum entre os índios o fato de um guerreiro temer a morte :al
atitude era considerada um ato de covardia
8/!:. 777-
8/!:. 76-
7 ( ;uca ?irama, aprisionado pelos timbiras, declara o seu canto de morte e pede
ao cacique dessa tribo que o dei&e ir para cuidar do seu pai que padece
enfermidades L)* o narrador fora preso, o pai ficará distanteM
19
<eu >timo amigo,
+em ar, sem abrigo
?aiu #unto a mi
?om %;cido rosto,
+ereno e com%osto,
acerbo desgosto
?omigo sori
4 "eo no entanto
+orendo #; tanto
3e ome e quebranto,
+/ qu(ria morrer
2!o mais me conteno,
2as matas me embreno,
3as recas que teno
<e quero "aer
3ei&ai-me "i"er
/titude desse tipo não condizia com um verdadeiro guerreiro, por esse motivo,
os que o aprisionara viram nesta súplica um sentimento de temor e covardia
LM
=uerreiros, n!o coro
3o %ranto que coro*
+e a "ida de%oro,
Também sei morrer
20
?ara os inimigos que o preparava ao sacrifício ritual, o her*i ( ao chorar (
mostrava covardia Lnão parecia um guerreiro tupi, senão um tupiniquimM $essa
forma, o guerreiro a ser sacrificado não era digno das galas da morte como J7 (
;F8/ ?7B//K
8/!:. 6-
8/!:. 67-
8/!:. 677-
)ob alegação de que os tupis são fracos, o chefe dos timbiras não quer aceitar a
consumação do ritual no qual se provaria a honra dos tupis
8/!:. 6777-
21
+eres %resa de "is 'imorés
!os quatro primeiros versos, a estranheza do pai 8omo poderia seu filho
chorar, se era um bravo guerreiro> !os quatro versos seguintes começa a
admoestação ao filho JmalditoK
/ maldição paterna reúne o conjunto de tudo aquilo que significava horror para
os selvagens, especialmente a transformação da natureza em punição e solidão
8/!:. 7I-
8/!:. I-
www.poeteiro.com
22
O LIVRO DIGITAL – ADVERTÊNCIA
#ba 9endes
São Paulo, 2014