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Concretizando o livro:

Amor e
auto-estima
de Michel Esparza
Intuição é uma fusão de vivências e realidade, enriquecida por experiências próprias e
alheias. Este livro é uma jornada para cristãos que buscam melhorar seu amor,
mas também pode ajudar aqueles fora da fé.

O orgulho e a humildade são temas centrais. A autoestima humilde é extremamente


importante, contrapondo-se ao orgulho que compromete relacionamentos.
É abordada a relação entre ser amado, amar a si mesmo e amar os outros, enfatizando
que o amor divino é a base para aceitar a própria fragilidade.

A maturidade humana e cristã se complementam, oferecendo uma visão equilibrada


da vida. O conhecimento do amor divino, vivido e não apenas teórico, é essencial para
desenvolver uma humildade autêntica.

Avançar no abandono da autoestima nas mãos de Deus requer querer, saber e poder.
A graça divina facilita essa jornada, fortalecendo a vontade, iluminando a compreensão
e curando a incapacidade.

PRIMEIRA PARTE:
O orgulho e seus problemas
1) EM BUSCA DA DIGNIDADE

1.1) Autoestima e humildade

O tema da relação consigo mesmo não é novo, mas ganhou destaque atualmente,
especialmente com a psicologia destacando a importância da autoestima. No entanto,
o conceito de autoestima precisa ser abordado com cautela, evitando métodos
duvidosos que podem ser prejudiciais. A autoestima saudável não deve ser alcançada
a qualquer custo, mas sim através do reconhecimento sincero de nossas próprias
qualidades e falhas.

A ênfase na autoestima nos Estados Unidos, por exemplo, às vezes resultou em


distorções, onde os alunos superestimavam suas habilidades, revelando uma
desconexão com a realidade. Portanto, é fundamental abordar a autoestima de
maneira equilibrada, reconhecendo tanto nossas virtudes quanto nossas limitações.

A humildade, por outro lado, é essencial para aceitar a verdade sobre nós mesmos,
sem exagerar em nossas virtudes ou defeitos. Devemos evitar tanto a arrogância
quanto a autoimagem negativa exagerada. A verdadeira humildade nos permite
reconhecer nossas falhas com compaixão e buscar melhorias de forma realista.
A esterilidade traz vergonha, mas devemos aprender a lidar com ela diante de Deus.
A autoestima e a humildade, quando compreendidas corretamente, se
complementam. A autoestima saudável está enraizada na verdade, enquanto a
humildade nos lembra da importância de uma visão equilibrada de nós mesmos.
O objetivo final é cultivar uma autoestima humilde, que reconhece nossa dignidade
intrínseca enquanto aceita nossas imperfeições com compreensão e amor próprio.

1.2) Um problema grave que vem de longe

O orgulho é uma causa comum de conflitos e infortúnios ao longo da história humana.


Suas consequências são evidentes e graves, como ilustrado em conflitos tribais
africanos onde a busca por diferenças gera ódio.

A origem do orgulho remonta à natureza humana, evidenciada desde a infância com


comportamentos egoístas e buscando atenção. Mesmo bebês podem manipular para
chamar a atenção dos pais, mostrando a raiz precoce desse defeito.

A explicação para essa tendência orgulhosa remonta ao pecado original, um mistério


além da compreensão humana.

1.3) O orgulho é competitivo e ofuscante

O orgulho é um tirano que nunca se satisfaz, sempre buscando mais além do que os
outros têm. Sua natureza competitiva gera inquietação quando alguém nos iguala
em méritos. Além disso, o orgulho cega e distorce a realidade, projetando rivalidades
e dominância sobre os outros. Se não for controlado, leva à insatisfação e a todos os
tipos de tensões na vida pessoal e profissional.

Este vício se esconde sob diversas aparências e contamina até mesmo os ideais mais
nobres, como a busca pela verdade e justiça. Por sua natureza insaciável e competitiva,
o orgulho leva à inveja, à insatisfação e à competição incessante. Sua presença
obscurece a percepção de si mesmo e dos outros, gerando falsidade e rivalidade onde
deveria haver cooperação e respeito.

A rebelião contra Deus, motivada pelo orgulho humano, resulta na perda da dignidade
e do respeito como pessoa. A história humana testemunha as consequências nefastas
da negação de Deus, refletidas na violação da dignidade humana e na busca
desenfreada pelo poder e pela supremacia.

1.4) Uma vida inteira amadurecendo

Cultivar uma autoestima humilde é uma jornada vitalícia que todos enfrentamos de
forma única. Influências genéticas, educacionais e escolhas moldam essa busca desde
cedo, especialmente durante a infância e a adolescência.

Na infância, a consciência da própria inadequação surge, mas a compreensão da


dignidade pessoal ainda não está presente. A orientação dos pais é crucial para mitigar
a busca por atenção e garantir que a criança se sinta valorizada independentemente
de suas realizações.
A educação dos filhos é um desafio complexo, onde os pais podem inadvertidamente
transmitir seus próprios defeitos. Uma abordagem eficaz combina comportamento
exemplar com aceitação e amor pelas limitações próprias e dos filhos.

A busca pela perfeição sem aceitação de si mesmo pode criar tensões e levar a uma
busca irrealista de um eu idealizado, resultando em frustração e repressão do
verdadeiro eu.

1.5) Três estágios na vida

O desenvolvimento da autoestima é moldado por figuras significativas em diferentes


fases da vida: infância, adolescência e idade adulta.

Na infância, os pais exercem forte influência na percepção da própria valia. Durante a


adolescência, ocorre uma transição para uma identidade independente, com os
amigos e o interesse romântico se tornando interlocutores relevantes. Nessa fase, a
busca por autoafirmação pode levar a comportamentos extremos, influenciados pela
aceitação social.

Na idade adulta, a maturidade emocional é crucial para uma autoavaliação


independente. Muitos adultos continuam a depender da opinião dos outros,
sacrificando sua autenticidade para serem aceitos. O medo da rejeição pode levar à
busca desenfreada por aprovação.

Para evitar essa escravidão aos julgamentos alheios, é essencial encontrar segurança
na própria identidade, reconhecendo-se como Deus nos vê, alcançando assim uma
independência saudável de opiniões externas.

1.6) Uma vida inteira à procura de amor

O amor desempenha um papel vital em nossa jornada para a maturidade. Enquanto


buscamos reconhecimento e estima, o amor é o bálsamo que sacia nossa fome
interior. Nada nos eleva mais do que ser amados. Além do sucesso e das conquistas,
o amor é a fonte mais poderosa de autoestima.

Porém, o amor humano, por mais profundo que seja, não é capaz de preencher
completamente nosso anseio por estima. Ao longo da vida, buscamos esse amor em
diversas formas: o amor incondicional dos pais na infância, a busca pela independência
na adolescência e a paixão romântica na juventude.

A paixão nos ilude temporariamente, oferecendo um vislumbre do divino, mas também


nos cega para as imperfeições e limitações do outro. Somente o amor de Deus pode
saciar verdadeiramente nossa necessidade de estima. O amor humano é um reflexo
desse amor divino, mas sua qualidade determina sua capacidade de fortalecer nossa
autoestima.

Portanto, enquanto o amor humano é um ponto de partida importante, é o amor divino


que fundamenta e estabiliza nossa autoestima e nossos relacionamentos. É essa
experiência vertical do amor com Deus que completa e dá sentido pleno ao amor
humano em todas as suas formas.

2) PROGREDIR NO AMOR

2.1) Confiança recíproca

Cultivar uma autoestima humilde é crucial para melhorar nossos relacionamentos e


combater o orgulho. A confiança mútua é essencial para a união amorosa,
baseando-se na entrega recíproca.

A confiança é uma forma de doação e entrega. O medo e o orgulho podem impedir a


plena entrega no amor. Deixar-se amar requer humildade e coragem, pois
reconhecemos nossa necessidade de amor. Esconder nossas fraquezas nos torna
defensivos, mas somente no amor verdadeiro podemos ser autênticos.

A verdadeira aceitação de nós mesmos e dos outros vem do amor genuíno, que nos
permite ser autênticos e espontâneos. O conhecimento do amor de Deus desde a
infância pode nos libertar das máscaras que usamos na vida.

2.2) O amor ideal e suas qualidades

Sem autoestima humilde, compromete-se não só a capacidade de receber amor, mas


também a retidão de intenção e a liberdade interior ao expressá-lo. É fundamental
compreender as nuances do amor ideal, que se aplicam a diversas relações, não
apenas amorosas. O início de um relacionamento é atraente, mas o amor maduro é
mais profundo e valoriza o interior sobre o exterior.

Filmes recentes podem sugerir que o aspecto físico e romântico é o ápice do amor,
mas muitas vezes essa abordagem resulta em desilusão. O amor verdadeiro vai além
da paixão inicial e se baseia na entrega mútua e na busca pelo bem do outro.
A qualidade do amor é medida pela capacidade de sacrifício e pelo respeito à
liberdade do parceiro.

O amor verdadeiro é altruísta, desinteressado, respeitoso e livre. Estas qualidades


invisíveis estão ligadas à verdade e à liberdade no amor. A retidão de intenção garante
que os motivos não sejam egoístas, enquanto a liberdade interior permite uma entrega
genuína e autêntica. No amor, a capacidade de dar e receber livremente é essencial
para uma conexão verdadeira e duradoura.

2.3) Orgulho e qualidade no amor

Alcançar as qualidades invisíveis do amor ideal, como liberdade interior e retidão de


intenção, é mais difícil do que melhorar as qualidades visíveis. A autoestima humilde
é essencial para isso. O orgulho compromete tanto as qualidades visíveis quanto as
invisíveis do amor ideal.

A generosidade ao dar e a humildade ao receber são fundamentais no amor. O


egoísmo de dar pode ser alimentado pela vaidade, enquanto a incapacidade de
receber pode indicar uma falta de humildade. É necessário dar-se e receber-se
no amor para que seja verdadeiramente completo.

A independência excessiva pode prejudicar as relações amorosas, enquanto a


maturidade humana e a generosidade afetiva são essenciais para um casamento ideal.
Os cônjuges devem ser independentes emocionalmente, mas comprometidos em
fazer o outro feliz.

2.4) Dependência e independência

A jornada da adolescência à maturidade nos mostra que nossa autoestima não deve
depender exclusivamente das opiniões alheias. À medida que nos conhecemos
melhor, aceitamos nossas limitações. No entanto, devemos ter cuidado para não nos
tornarmos indiferentes às pessoas no processo de amadurecimento.

Não é correto pensar que ser independente emocionalmente nos impede de nos
realizarmos pessoalmente. Essa ideia nos leva à indiferença em vez da verdadeira
independência. A verdadeira liberdade vem do amor desinteressado, não da frieza.
Devemos aprender a não buscar validação externa para nossa autoestima.

À medida que crescemos, podemos equilibrar a independência saudável com a


dependência saudável no amor. Esses aspectos não são contraditórios. Uma pessoa
madura sabe quando dizer sim e quando dizer não, mantendo-se sensível e firme.
A autodependência é a síntese entre independência e dependência, evitando
extremos prejudiciais como o servilismo e a autossuficiência.

A autossuficiência é mais prejudicial do que a dependência, pois nos isola dos outros.
É preferível reconhecer nossas necessidades do que fingir que não precisamos de
ninguém. Devemos evitar a vaidade que busca aprovação constante, mas também não
devemos menosprezar os outros. A verdadeira humildade vem da preocupação com o
que é certo, não da indiferença ao que os outros pensam.

Na prática, equilibrar independência e dependência é desafiador, mas necessário para


uma vida plena.

2.5) As energias do coração

O coração é uma força ambivalente: ele impulsiona o amor e também a posse


irracional. A maturidade emocional é essencial para equilibrar essa dualidade.
A afetividade facilita a empatia, mas pode obscurecer a razão e impedir o
desprendimento. No âmbito da vontade, promove a generosidade, mas também
aumenta o sentimento de posse.

O coração, forte e frágil, garante resiliência diante das adversidades, mas aumenta a
vulnerabilidade à tristeza. A pessoa sensível, se não purificar suas emoções, pode
buscar excessivamente aprovação externa, levando a decepções dolorosas e
alimentando fantasias.

No entanto, o coração também é uma fonte incrível de bondade. Amar é desejar o bem
para o outro, e quando o coração está envolvido, a vontade se torna mais determinada.
A integração da inteligência, vontade e afeto a serviço do amor é essencial para uma
vida plena.

A ausência de afeto no ambiente de trabalho pode levar à priorização de cifras sobre a


dignidade humana. Relacionamentos familiares e sociais também sofrem quando falta
humanidade, resultando em formalismo e tristeza. O mundo sem relações
interpessoais genuínas é desolador.

2.6) Afeto desprendido como ocorre entre amigos

O afeto desprendido, característico da amizade ideal, é sutil e amigável, sem coerção


na busca por reciprocidade. Em contraste, o desejo possessivo revela formas de
egoísmo, buscando validação e temendo a rejeição. O amor genuíno, porém, é
vulnerável e requer coragem para enfrentar incertezas. Evitar o apego excessivo é
essencial para manter a liberdade interior e a pureza do afeto.

A verdadeira amizade, baseada em entendimento, amor e respeito mútuos, serve de


modelo para os demais tipos de amor. A benevolência é fundamental para purificar o
afeto, permitindo uma conexão autêntica e desinteressada. A autoestima humilde é a
chave para superar o orgulho e cultivar um desapego saudável.

É preciso equilibrar o afeto intenso com o desprendimento, evitando a dependência


excessiva e a frieza emocional. A purificação do coração é essencial para evitar o
sentimento de posse e permitir uma entrega autêntica. A aversão ao sentimentalismo
pode levar à atrofia do coração, privando a vontade de energia e levando ao
voluntarismo.

2.7) O voluntarismo

O voluntarismo, problema que afeta quem busca perfeição moral e amorosa,


negligencia sentimentos e razão em favor da vontade. Este desequilíbrio compromete
a qualidade do amor, sendo necessário harmonizar coração, intelecto e vontade.

O excesso de vontade, característico do voluntarismo, desconsidera recursos afetivos


e sobrenaturais, levando à inflexibilidade e ignorando a graça.

O voluntarismo, um problema de orgulho, compromete a liberdade interior, resultando


em perfeccionismo. É superado pela utilização equilibrada de recursos e pela
humildade.

Apesar do esforço do voluntarismo, é preferível buscar a perfeição de maneira


imperfeita e purificar tais aspirações. O ideal é contribuir para a felicidade dos outros
de forma altruísta, superando o estágio imperfeito do amor.

Todo grande ideal requer esforço, mas a santidade, como perfeição do amor,
transcende o heroísmo. Enquanto o herói se entrega por algo, o santo se entrega por
alguém, motivado pelo amor a Deus e ao próximo.
2.8) Aprender a se comunicar

O sucesso conjugal não se resume ao amor. É preciso aprender a se comunicar para


fortalecer a vida a dois. Casais admiráveis podem enfrentar dificuldades por falta de
entendimento mútuo.

A falta de comunicação deteriora o relacionamento, gerando mal entendidos evitáveis


com uma melhor preparação. Homens e mulheres têm formas diferentes de
expressar afeto e precisam compreender isso. As mulheres valorizam o amor como
fonte de autoestima, enquanto os homens temem a incompetência.

Mal-entendidos entre cônjuges são comuns e merecem compreensão. A confiança no


amor mútuo é essencial para evitar uma crise conjugal. É preciso humildade e
compreensão para superar crises. Indiferença é o estágio final da deterioração do
relacionamento, onde o encanto se perde e surge a desconfiança.

Para evitar crises, é necessário querer, saber e poder se comunicar. O amor e a


comunicação são essenciais para o progresso no relacionamento conjugal.

2.9) Querer, saber e poder

Querer, saber e poder são os alicerces do sucesso moral. Na busca por um amor de
qualidade, é essencial mais do que a vontade; exige conhecimento e capacidade
ligada à saúde mental. Da mesma forma, as causas do mal moral, como má vontade,
ignorância e incapacidade, podem se entrelaçar na prática.

Progresso na qualidade do amor é crucial para a felicidade no casamento. Aqueles


enfrentando crises no casamento merecem compreensão, mas quebrar um
compromisso livre e válido é imoral. Além disso, a ruptura não é a melhor solução;
os problemas podem ser resolvidos com boa vontade e aconselhamento adequado.
A sociedade deve resistir à mentalidade de divórcio que se espalha, lembrando que o
casamento é uma união indissolúvel.

Oferecer soluções em vez de julgamentos é fundamental para aqueles com


dificuldades no casamento ou em compromissos amorosos. A misericórdia deve
prevalecer sobre o julgamento rígido, cultivando uma renovação da paixão e
autoestima humilde.

3) A ATITUDE IDEAL EM RELAÇÃO A SI MESMO

3.1) A humildade não consiste em desvalorizar-se

A humildade não é subestimar-se. O orgulho prejudica todas as qualidades do amor


ideal. A autoestima baixa alimenta o desejo possessivo e prejudica o desprendimento
afetivo. A humildade é realista e oposta à soberba, não se trata de autodesprezo, mas
de reconhecer a própria verdade.
Educamos para a humildade, não para a modéstia excessiva que leva ao desânimo.
A humildade não gera angústia; é estar abaixo sem perder a dignidade. Colocamo-nos
ao serviço dos outros, sem perder de vista nossa dignidade.

Ser humilde é mais do que parecer humilde; é uma atitude ampla. Desvalorizar-se por
falsa modéstia pode ser tão prejudicial quanto o orgulho.

3.2) A humildade é a verdade entre dois extremos

A humildade é reconhecer nossas qualidades e limitações, ao contrário do orgulho


que distorce a realidade e afeta nossas relações.

Há extremos opostos: o exagero na autoconfiança e a autocontenção por medo.


O transtorno bipolar e variações de humor mostram nossa dificuldade em julgar com
sobriedade. O envaidecimento e a auto rejeição são formas de orgulho que ocultam a
falta de autoestima.

3.3) O esquecimento de si mesmo e os auto enganos

O auto esquecimento é a essência da humildade genuína, distante da falsa modéstia.


Não se trata de subestimar-se ou exibir humildade, mas sim de estar genuinamente
interessado nos outros. O verdadeiro humilde é alegre e interessado, não preocupa-se
consigo mesmo nem busca demonstrar humildade.

Por vezes, uma compreensão equivocada da humildade dificulta o auto


esquecimento. Alguns assumem falsamente serem inferiores, enquanto outros usam a
humildade como desculpa para menosprezar suas habilidades.

O auto engano leva à deterioração moral, obscurecendo a verdadeira estima de si


mesmo e dos outros. Ele priva a consciência e o entendimento. Quem perde a
consciência da verdade se perde a si mesmo, tornando-se uma mentira.

3.4) Humildade e personalidade

Compreender a humildade cristã é crucial para o equilíbrio pessoal, evitando o auto


engano e promovendo paz interior. Contrariamente à visão simplista, ser humilde não
significa perder a identidade, mas sim morrer para o orgulho e viver na consciência da
própria dignidade. Essa consciência permite dar-se aos outros livremente,
impulsionado pelo amor divino que amplia a identidade pessoal, levando à plenitude
no amor.

O amor verdadeiro envolve entregar-se por amor, não para negar a própria
personalidade, mas para transcender o egoísmo em prol da felicidade do amado.
O cristianismo não anula a personalidade, mas aprimora-a com liberdade e grandeza
espiritual. A mensagem cristã corretamente compreendida não leva à
despersonalização, mas à autêntica liberdade interior.
O medo de perder a autonomia legítima pode levar à recusa da dependência amorosa,
mas a verdadeira liberdade cristã reconcilia a humildade com uma autoconfiança
saudável, reconhecendo a necessidade de Deus e dos outros. O perigo não está em
ter uma personalidade forte, mas em tornar-se autossuficiente, ignorando a
importância de Deus e do próximo.

3.5) Duas atitudes em relação a si mesmo e aos demais

A postura ideal consigo mesmo envolve a autoestima humilde e a busca pela paz
interior, evitando o autoengano. Por outro lado, ao considerar o amor recebido, dado e
mantido, introduzimos os conceitos de amor puro de si e amor-próprio.

O amor a si é fundamental para o desenvolvimento pessoal, desde que esteja alinhado


com a verdade e a hierarquia de valores.

O amor próprio equilibrado promove harmonia pessoal, enquanto o amor-próprio


desordenado gera narcisismo e inveja. Ambos são inversamente proporcionais, e a
baixa autoestima muitas vezes alimenta o amor-próprio. A relação entre amor próprio e
egoísmo é evidente: quem não se ama não consegue amar os outros.

Refletir sobre nossas atitudes pode revelar motivos ocultos para sentimentos
negativos em relação aos outros. Assumir humildemente a verdade é essencial para
resolver conflitos e promover relacionamentos saudáveis.

3.6) O orgulho coloca a saúde mental em risco

A atitude consigo mesmo é crucial para a felicidade. A autoestima humilde promove a


paz interior e uma generosa dedicação aos outros, enquanto o orgulho gera tensões
internas e conflitos com os demais.

A suscetibilidade, característica do orgulho, surge diante de qualquer indício de


desprezo ou crítica ao valor pessoal, afetando até mesmo a capacidade de raciocínio.

Manter a estabilidade psicológica é como gerenciar o combustível de um veículo,


evitando o esgotamento causado pelo estresse. O aumento das doenças neuróticas na
sociedade moderna é atribuído à competição exacerbada e à deterioração dos laços
familiares.
SEGUNDA PARTE:
Em busca de uma
solução definitiva
1) CONVERSÃO AO AMOR

1.1) Ir ao fundo dos problemas

Abordamos diversos problemas como: autossuficiência, respeito humano, imaturidade,


amor egoísta, possessividade, problemas conjugais, autoengano, suscetibilidade,
insegurança e doenças neuróticas... Todos eles, de uma forma ou de outra, têm suas
raízes no orgulho, afetando tanto a autoestima quanto os relacionamentos
interpessoais. Diante dessa questão é fundamental investigar a origem dos problemas,
corrigir suas causas internas e buscar soluções duradouras.

Para enfrentar esse desafio, é preciso purificar o coração e preenchê-lo com o Amor de
Deus, contando com a ajuda da graça divina. O esforço pessoal é importante, mas não
é capaz por si só de resolver os problemas do orgulho, que podem ser
comparados a uma doença crônica como o diabetes: controlável, mas não curável.
É necessário encontrar uma terapia eficaz para manter o orgulho sob controle.

Essa terapia envolve reconhecer a presença do orgulho em nossas vidas e


compreender que a vontade humana, por si só, é limitada para superar suas
manifestações. Todos nascemos com uma certa inclinação para o orgulho, o que gera
conflitos internos e nos deixa vulneráveis diante de nossas fraquezas. Além disso,
é preciso entender que a mudança real requer uma transformação nos paradigmas
fundamentais, não apenas uma modificação superficial de comportamento.

Para alcançar uma verdadeira mudança, é necessário uma colaboração entre a graça
divina e a nossa vontade. A purificação do coração, guiada pelo amor de Deus,
é essencial para neutralizar o orgulho e promover uma vida de virtude.

Embora o caminho da purificação interior seja longo e misterioso, ele é fundamental


para nosso crescimento espiritual. A colaboração entre a graça divina e nossa
liberdade pessoal é um mistério que só pode ser compreendido através da experiência
e da reflexão profunda.

O cuidado gera cuidado, como exemplificado por Barnabé e Paulo.


Assim como Cristo investe em nós, somos chamados a investir na vida dos outros.
Comece hoje, mesmo que seja com pequenos gestos.
1.2) Uma graça que dignifica e cura

Felizmente, a graça divina nos capacita a enfrentar a profunda transformação interior


que essas reflexões evocam. A redenção por meio de Cristo nos concede uma graça
que cura as consequências do pecado e restaura a dignidade de filhos de Deus
perdida no pecado original. Esta é uma verdade de fé que sustenta a esperança do
cristão. Agora, a graça de Cristo nos liberta do orgulho e estabelece uma autoestima
humilde, permitindo-nos alcançar a felicidade que vem do amor verdadeiro.

Durante a Última Ceia, Jesus deu aos seus discípulos o “novo mandamento” de amar
uns aos outros como Ele nos amou. Ele nos prometeu assistência para cumprir esse
mandamento, pois reconheceu que o amor exigido por Ele não é alcançável apenas
com nossos próprios esforços. Esse amor só se torna possível através de um dom
recebido, chamado graça santificante.

Essa graça, obtida por Cristo na Cruz, nos transforma internamente e nos capacita a
amar como Cristo ama. O Espírito Santo opera em nós para iluminar nosso
entendimento sobre o Amor de Deus, inflamar nossa vontade para desejar contribuir
com Ele e purificar nossos corações.

A graça cura nossa incapacidade de amar adequadamente e nos eleva à dignidade


de filhos de Deus. Cristo é o modelo e a fonte de amor perfeito, ensinando-nos a amar
e capacitando-nos a amar como Ele ama. Com a ajuda da graça, podemos alcançar a
santidade e a perfeição do amor. A contribuição da graça não diminui a importância da
luta para adquirir bons hábitos e neutralizar as más tendências.

1.3) A maior dignidade

Para sustentar essa graça, devemos examinar nossa vida, aceitar limitações e
encontrar remédio no Amor de Deus. Cada um de nós é tudo para Ele. A chave para
neutralizar o orgulho está em compensar nossa miséria com a dignidade de sermos
imensamente amados por Deus.

Devemos nos saber amados singularmente, como exceção. O Amor de Deus confere
uma dignidade inestimável, tornando insignificantes as considerações sobre nosso
valor externo ou insegurança interna. Devemos valorizar como Deus nos vê e nos
valoriza, priorizando Sua estima sobre o julgamento humano. Isso nos traz liberdade e
paz interior.

1.4) O amor e os amores

O amor de Deus ultrapassa o melhor dos amores humanos. Ele se doa plenamente, ao
contrário do amor humano, limitado pelo próprio ser. Deus habita na alma que recebe
Sua graça, enquanto nosso amor se dirige apenas a pessoas específicas. O Amor divino
satisfaz nossos anseios mais profundos, preenchendo um vazio que nada além dEle
pode ocupar.
Ao contrário do amor humano, o Amor de Deus é constante e incondicional. Ele
purifica, harmoniza e enobrece nossos relacionamentos humanos. Devemos colocar o
Amor de Deus em primeiro lugar, evitando que o amor às criaturas se torne nossa
única fonte de autoestima. A felicidade verdadeira independe das circunstâncias
externas; devemos buscar a felicidade na maravilhosa realidade de sermos amados
por Deus.

1.5) Enfrentar a verdade acerca de si mesmo

A conversão interior exige que abandonemos desculpas e encaremos nossas falhas


sem medo. Devemos reconhecer nossa realidade e decidir mudar se necessário.
Às vezes, podemos reorientar nossas vidas, entregando-nos ao Amor de Deus.

Diante dos defeitos, há duas opções: aceitá-los e ficar deprimido ou enganar-se e


sobreviver. O cristianismo oferece a possibilidade de viver plenamente, abrindo-se à
verdade sobre si mesmo.

Mudar não é fácil, o orgulho e a insegurança podem impedir. A oração é remédio para
o auto engano. Buscar um momento diário para conversar com Deus é importante,
pois Ele conhece nossas fraquezas e nos ama como somos. Jesus Cristo nos ensinou
a orar sinceramente, mostrando que a oração não é uma brincadeira, mas uma busca
sincera por orientação divina.

1.6) O filho pródigo da parábola

A conversão interior é desafiadora para os cristãos excessivamente confiantes em sua


virtude. Isso reflete a postura dos fariseus no Evangelho, criticados por cumprir a lei
meticulosamente para se sentirem superiores, não por amor a Deus. A parábola do
filho pródigo ilustra essa dinâmica e nos leva a refletir sobre a conversão ao amor
como solução para o orgulho.

O filho mais novo pede sua herança, esbanja-a e retorna ao pai após passar por
dificuldades. O pai o recebe calorosamente, mas o irmão mais velho fica ressentido.
Esta parábola revela duas formas de conversão: a do filho mais novo, que retorna
humildemente, e a necessidade de conversão do filho mais velho, dominado pelo
orgulho.

O irmão mais velho, embora cumpra a lei, revela um coração endurecido pelo
orgulho. Ele se ressente do amor do pai pelo irmão e exibe sua própria virtude. O filho
mais velho representa aqueles que, apesar de obedientes, precisam se converter do
Deus da lei ao Deus do amor.

A conversão do filho mais velho é mais complexa, pois seu orgulho está oculto em sua
virtude aparente. Ele precisa reconhecer sua necessidade de amor misericordioso e
superar a autossuficiência. A entrega confiante ao amor verdadeiro liberta a alma da
escravidão do orgulho.
1.7) Retidão de intenção na vida cristã

O filho mais velho da parábola enfrenta um problema de intenção. Seu cumprimento


meticuloso dos deveres morais é manchado pelo orgulho. Na vida cristã, o
perfeccionismo pode levar ao mesmo moralismo. Identificar intenções egocêntricas é
desafiador, mas necessário para uma consciência honesta.

O orgulho pode transformar a vida cristã em busca de ambição pessoal. Mesmo aqueles
que se dedicam a Deus podem buscar reconhecimento e criticar os outros. A santidade
não é alcançada por perfeição pessoal, mas por amor a Deus e humildade em
reconhecer falhas.

O orgulho dificulta a compreensão da santidade, que é baseada no amor e na


humildade. A autoestima humilde não se compara aos outros e se alegra com o sucesso
alheio. O orgulho leva à comparação e à busca de superioridade, como no exemplo do
fariseu na parábola.

Apesar das imperfeições, é melhor buscar a perfeição do que desistir. A santidade é


alcançada pela purificação dos desejos e pela paz interior na confiança em Deus.

1.8) Reciprocidade: sintonia com o amado

Conectar-se com as expectativas divinas é essencial na vida cristã. Amar a Deus


reciprocamente é fundamental. A falta de sintonia com Deus leva a uma fé superficial ou
a um legalismo ético. Deus anseia pelo nosso amor, e nossa felicidade depende disso.

Deus, impassível e compassivo, compartilha nossa alegria e dor. Seu amor transcendente
e envolvente é um mistério insondável. Mesmo sendo infinito, Ele se importa
profundamente conosco.

2) DIVERSAS MANIFESTAÇÕES

2.1) Saber, sentir e tocar

Saber e sentir não são suficientes para que o amor de Deus permeie nossas vidas. São
Josemaria diz que o amor de Deus se torna tão real quanto uma farpa na alma. Tocar, ir
além do sentir e do saber, é penetrar no coração de Cristo. Devemos viver totalmente da
experiência desse amor para testemunhá-lo aos outros.

Essa consciência profunda do amor de Deus se forma ao longo da vida pela ação da
graça e nossa colaboração. Só podemos conhecer autenticamente o amor de Deus
através da humilde oração e generosa disponibilidade. Nossa resposta à graça se mani-
festa na busca, no tratamento e no amor ao Senhor. Com o tempo, sua presença se torna
essencial em nossas vidas.
Para facilitar essa colaboração com a graça, vamos considerar as manifestações mais
dignas do amor de Deus: a filiação divina, a Encarnação e a Redenção. O mesmo amor
de Deus nos cria, nos adota como filhos e, mesmo após nossa rejeição, se encarna
para nos redimir.

2.2) Filiação divina

Perceber nossa filiação divina em Cristo é crucial para compreender nossa dignidade
como cristãos. No Antigo Testamento, Deus revela seu amor por cada um de nós. São
João, no Novo Testamento, maravilha-se com o amor do Pai ao nos chamar de seus
filhos. Esse relacionamento não é apenas um título, mas uma realidade alegre.
A consciência dessa filiação nos impele a reconhecer nossa dignidade.

A divinização prometida por Cristo nos oferece perspectivas maravilhosas. Cristo se fez
homem para que os homens pudessem se tornar deuses. Embora seja uma realidade
difícil de compreender, podemos aceitar a oferta divina e nos tornarmos filhos de Deus.

Viver conscientes dessa filiação nos permite abordar a vida cristã com familiaridade e
confiança. Vivemos na casa de Deus e somos da sua família. Esse entendimento nos
liberta do temor servil, substituindo-o pelo temor filial, próprio de quem conhece e
ama o Pai.

O Amor de Deus é gratuito e incondicional, precedendo sempre o nosso. Ele nos ama
como filhos únicos, independentemente de nossos méritos. Sabendo disso, podemos
crescer em retidão de intenção, fazendo tudo por amor a Ele e aos outros. Seu amor
busca reciprocidade, identificando-se conosco em nossa dor e alegria.

2.3) Amizade recíproca com Cristo

O caminho para Deus culmina em nossa filiação divina, mas passa por uma íntima
amizade com Jesus Cristo, tornando mais fácil uma relação de amor recíproca.
Embora seja um mistério insondável, os sentimentos de Jesus são imagináveis,
tornando-o o “caminho” para o Pai.

São Josemaria expressa a alegria de Cristo em se tornar homem, mostrando a


maravilha de um Deus que ama com coração humano. O fato de Deus compartilhar
nossa natureza humilde nos mostra o quanto se preocupa conosco e nos dignifica.

Verdadeiro Deus e verdadeiro homem, Cristo possui duas naturezas infinitamente


diferentes, unidas na mesma pessoa. Não há confusão entre essas naturezas,
permitindo-nos tratá-lo como homem e Deus simultaneamente.

Contemplando o Evangelho, percebemos os sentimentos de Cristo, seu amor pelas


crianças, amigos e o sofrimento pelos que estão em dor. Seu afeto é intenso e
desprovido de egoísmo, impelindo-nos a corresponder a seu amor.

A amizade com Cristo é acessível através da oração, levando-nos à união íntima com
ele. Essa amizade, que começa na terra, culmina na contemplação amorosa no céu.
A vida de oração não negligencia o amor ao próximo, pois o amor de Deus purifica
nossos amores e nos identifica com a felicidade de cada ser humano. Somos chamados
a redimir com Cristo, tornando-nos sensíveis à salvação de todas as almas.

2.4) Corredimir com Cristo

O mistério pascal, abrangendo paixão, morte, ressurreição, ascensão e glorificação de


Cristo, é o cerne da fé cristã. É um mistério fascinante que mudou a história, dando novo
significado e valor à vida humana.

Essas verdades iluminam nossa dignidade, nossos sofrimentos e ações, especialmente


ao retribuir o amor de Cristo. A paixão de Cristo, ao mostrar a dor de Deus por nossos
pecados, inspira nossa generosidade e nos dignifica.

A Paixão também revela a qualidade máxima do amor. Cristo sacrificou-se livremente,


podendo ter evitado o sofrimento, mas escolheu sofrer por amor. Ele sofreu ativamente,
sem perder a consciência, mostrando seu poder sobre a morte.

Por que Cristo sofreu tanto? Porque era a vontade do Pai, cumprida por amor. Sua dor
revela o amor do Pai pelos homens em toda sua profundidade. Ambos sofrem e
respeitam a liberdade humana.

A Paixão também demonstra o respeito de Cristo pela liberdade, sua intenção pura e sua
liberdade interior. Ele sofreu como homem e como Deus, sem resistir aos torturadores
humanos.

O sofrimento de Cristo revela o amor e a dor do Pai, ensinando-nos a transformar nosso


sofrimento em amor redentor. Aceitamos ou rejeitamos o convite para participar desse
sacrifício. Os santos vivem a teologia da Cruz, amando e desejando a dor por amor a
Cristo e às almas. Eles entendem que a dor dos redimidos é corretiva.

O mistério do sofrimento está ligado ao grande mistério da corredenção com Cristo.


Ele media entre Deus e os homens, mas quer que nos associemos ao seu sacrifício. Ao
carregarmos sua Cruz como bons cireneus, ajudamos a levá-la. Identificados com Ele,
participamos ativamente na obra da Redenção, tornando-nos “outro Cristo”. São Paulo
diz: “Estou crucificado com Cristo” ou “Completo em minha carne o que falta à Paixão de
Cristo”.

Uma das feridas de Jesus, a do flanco, ainda não sarou. O desgosto fere o Coração de
Cristo e o amor o consola. Com aquela dor de amor, Jesus nos redime, enquanto nossos
atos amorosos acalmam seu Coração ferido.

Jesus estará em agonia até o fim do mundo. Assim como um anjo confortou Jesus no
Jardim das Oliveiras, nós também podemos consolar seu Sagrado Coração ferido
pelos pecados dos homens ingratos. Tudo o que fazemos por amor a Jesus compensa o
desgosto que Ele recebe. Como Santa Teresinha disse, “nosso pequeno amor enxuga as
lágrimas que os maus o fazem derramar”.
Os santos percebem essas realidades porque seu amor por Cristo faz nascer neles a
ânsia de compreender suas lágrimas e ver seu sorriso.

O sofrimento é poderoso quando é voluntário como o pecado. Nossas pequenas cruzes


se tornam a própria Cruz de Cristo. Enquanto a carregamos, Ele não precisa carregá-la.
Embora nossas cruzes sejam pequenas, ainda fazem parte da única Cruz redentora.
Quando Ele nos pede um sacrifício, nos convida a carregar sua Cruz.

Maria, associada ao sacrifício redentor, tornou-se nossa Mãe. Ela aceitou se associar ao
sacrifício para sustentar seu Filho, consolar o Pai e obter a graça salvadora para nós. Com
ela aprendemos a converter nossa existência em corredenção e oração.

3) O AMOR MISERICORDIOSO

3.1) Diante do tribunal de misericórdia

No tribunal da misericórdia, o amor genuíno nos impulsiona a esquecer nossas próprias


necessidades em favor dos outros. Prestar atenção à pessoa amada é fundamental, o
que requer superar o egocentrismo e reconhecer as necessidades alheias, reduzindo
o foco em si mesmo e aumentando o foco nos outros. O amor de Deus intensifica essa
dinâmica, visto que a Paixão de Cristo nos inspira a viver fora de nós mesmos, atendendo
às necessidades alheias e buscando alívio para suas dores.

Reconhecer-se como filhos de um Pai misericordioso garante paz interior, tornando-se


incompatível com o sentimento de ser esmagado pelos erros. Ao recorrermos ao
tribunal da misericórdia divina com arrependimento e confiança, compartilhamos a dor
do pecado e a alegria da reconciliação com Deus. O sacramento da reconciliação, com
suas palavras de misericórdia, restaura a paz à alma, permitindo-nos exclamar com
gratidão: “Feliz culpa!”.

3.2) O que significa ser misericordioso?

A misericórdia divina, expressa na compaixão e identificação com os necessitados,


reflete-se na maternidade amorosa e no exemplo de Jesus. Compreendida como sofrer
com quem sofre, a misericórdia não denota superioridade, mas amor autêntico e
compartilhamento de sentimentos.

O coração misericordioso de Cristo revela-se na Encarnação e na Redenção, onde o


amor divino vence o mal. A misericórdia é essencial para a paz pessoal e social, exigindo
coragem e promovendo reconciliação.

3.3) Coração misericordioso

O coração misericordioso de Cristo revela a profunda compaixão do Pai pelos


necessitados. Cristo nos ensina a reconhecer humildemente nossas necessidades e a
confiar em Sua misericórdia. Seu olhar misericordioso nos convida à reconciliação e à
paz interior.
3.4) Justiça e misericórdia

Justiça e misericórdia se combinam em Cristo, inspirando-nos a ser exigentes e


compreensivos conosco e com os outros. Devemos equilibrar exigência e compreensão,
buscando sempre a santidade através da luta ascética e da misericórdia. A justiça de
Deus não exclui Sua misericórdia; ao contrário, Ele deseja nossa salvação e nos oferece a
oportunidade de nos reconciliarmos com Ele. É crucial reconhecer nossa
responsabilidade moral diante de Deus e buscar a Sua misericórdia através do
arrependimento sincero. Deus, em Sua infinita misericórdia, nos perdoa e nos concede
uma alegria que corresponde ao Seu amor.

3.5) Miséria e grandeza

Se nos arrependemos e buscamos reparar nossas vidas, a realidade de nossa miséria se


torna secundária. O exemplo dos santos mostra uma humildade realista combinada com
uma confiança na misericórdia de Deus. Eles reconhecem sua fraqueza, mas também a
grandeza de serem amados por Deus. Esta consciência não os perturba, pois confiam na
bondade divina.

Os santos revelam uma humildade que não se baseia na modéstia, mas sim na
segurança de serem amados por Deus. Eles reconhecem suas limitações, mas confiam
em Deus e se dedicam a iniciativas ousadas. Em suma, a força dos santos reside em sua
humildade diante de Deus e em sua confiança na Sua misericórdia.

3.6) Cabe o orgulho da própria fraqueza?

Será que podemos orgulhar-nos de nossa fraqueza? Sim e não. Para alguns, essa
reflexão basta para reconciliar-se consigo mesmo, mas outros precisam explorar mais o
Amor misericordioso, especialmente os afetados pela falta de autoestima. Uma incursão
na saúde mental revela a complexidade do problema: medicamentos aliviam sintomas,
mas não resolvem causas profundas.

Aceitar-se não é suficiente; precisamos amar a nós mesmos mesmo conhecendo


nossos defeitos. O amor próprio vai além da aceitação, envolvendo reconhecer que
somos amados por nossa própria essência. Esse orgulho saudável surge ao
compreendermos que Deus nos ama apesar de nossas falhas e até por causa delas.
Aceitar nossa fraqueza se torna uma fonte de alegria ao percebermos que somos
valorizados por Deus mesmo em nossa imperfeição.

3.7) Duas condições

Para superar o orgulho em relação às nossas fraquezas, precisamos de duas coisas: boa
vontade e amor recíproco. Sem combater nossos defeitos, nosso amor não será genuíno.
Da mesma forma, é inútil esperar que Cristo ame nossas fraquezas se não o amarmos de
volta. Ele perdoa quando sinceramente pedimos perdão, mas não nega a culpa.
Por isso, devemos lutar contra nossas fraquezas com boa vontade. Não são as obras que
nos salvam, mas a fé no Amor de Deus em Cristo. Portanto, devemos lutar sem esperar
sempre a vitória, buscando sempre amar a Deus sinceramente. Por outro lado, o orgulho
da própria fraqueza só é possível com o amor a Cristo.

Se não nos importamos com Ele, não podemos aceitar nossas fraquezas com
humildade. O amor a Cristo nos faz perceber a importância das nossas fraquezas na Sua
presença misericordiosa. Devemos nos alegrar tanto nas vitórias quanto nas derrotas,
pois o amor verdadeiro nos leva a oferecer sacrifícios generosos e a permitir que
sejamos amados mesmo em nossos erros. Enquanto o orgulho nos faz buscar apenas as
vitórias, o amor a Cristo nos leva a aceitar os fracassos com humildade, sabendo que Ele
nos ama apesar das nossas imperfeições.

3.8) Vida de infância espiritual

Santa Teresinha nos presenteou com a “infância espiritual”, uma forma de se relacionar
com Deus que revolucionou a espiritualidade cristã. Ela ensinou que Deus não apenas
ama apesar de nossas fraquezas, mas também por causa delas. Isso significa que Ele
tem predileção pelos mais fracos, pois quando reconhecemos nossa fraqueza, Ele pode
se voltar mais para nós.

A vida de infância espiritual nos lembra de confiar em Deus como crianças confiam em
seus pais, sem preocupações ou esforços excessivos. Ela nos imuniza contra atitudes
voluntaristas e nos ensina que a santidade está na perfeição do amor, não em esforços
titânicos para compensar nossas fraquezas.

Devemos aprender a ser como crianças, reconhecendo nossa pequenez e confiando na


Providência amorosa de Deus. Essa atitude nos ajuda a viver em constante conversão,
sempre voltando para os braços misericordiosos de Deus quando nos afastamos. Ao
aceitar nossas fraquezas e não nos levarmos tão a sério, podemos experimentar a
humildade que nos aproxima do amor misericordioso de Deus.

4) CONCLUSÃO

Os problemas encontram solução no Amor de Deus. Experiências compartilhadas


mostram uma melhoria na vida daqueles que se entregam ao amor de Cristo. Sentir esse
amor muda nossa atitude e nos liberta de motivações egoístas. A humildade torna-se
natural ao reconhecermos o amor divino, trazendo paz interior e alegria. A
correspondência ao amor de Deus, mesmo em nossas fraquezas, é essencial. O Amor de
Deus nos ama como somos e deseja apenas o amor de nosso coração. Ele nos conhece
profundamente, aceita nossas imperfeições e nos convida a amá-Lo como somos. Isso
nos liberta da busca pela perfeição e nos permite viver em paz conosco mesmos, com
Deus e com os outros.

A humildade nos leva à verdadeira felicidade, que consiste em contribuir para a


felicidade do Senhor e dos outros. O Amor de Deus é nosso refúgio, e Maria, nossa Mãe,
nos conduz a Ele com seu sorriso misericordioso.

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