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EU E O OUTRO

Já examinamos como o nosso desenvolvimento, nossas próprias dores e


máscaras afetam os relacionamentos. Também já pudemos iluminar a influência
dos nossos pais em nossa vida e relações. A esta altura desse estudo sobre o Novo
Casamento, é hora de incluirmos o outro, o parceiro, em nosso campo de
atenção. Nesse sentido, eu diria que as primeiras questões a serem examinadas,
as mais importantes, são as seguintes: quem em você está se relacionando com o
outro? Por quê? Para quê? Essas perguntas levantam questões importantes para as
quais não damos a devida importância. Porque embora o relacionamento seja a
universidade da vida, existem alguns que querem continuar eternamente na
universidade, mesmo que a vida esteja sinalizando que o curso terminou, ou está
terminando. Eu estou me referindo à codependência, um vício muito comum nos
relacionamentos. Quando estamos apegados a um relacionamento que já não
promove o nosso crescimento, isso significa que estamos presos ao vício da
codependência.
As pessoas encontram muitas razões para permanecerem presas num
relacionamento doentio. Por exemplo, se o casal tem uma moral religiosa muito
forte, muitas vezes, os parceiros acabam ficando juntos pelo medo de desagradar
a família, o padre ou Deus. Eles têm medo das consequências, afinal, se casaram
para a vida toda e têm que ficar juntos até que a morte os separe. Então, eles
permanecem na relação por medo, porém fechados, esperando a morte chegar
e trazer a solução para o problema.
É possível que o seu karma determine que você fique com essa pessoa por toda
a vida, e não há nada de errado com isso. O engano está em acreditar que
dependemos do outro para encontrar a felicidade e a paz duradoura. Felicidade
implica liberdade. Liberdade implica abrir mão de qualquer tipo de
codependência. Em algum momento, você vai ter que usar a espada da vontade
para se livrar desse vício.
Até porque essa felicidade que procuramos não se encontra no
relacionamento. Por mais importante que seja o relacionamento com o outro, ele
é somente uma passagem. Em algum momento da nossa jornada, teremos que
aprender a ficar sozinhos. O relacionamento com o outro, mesmo o mais maduro
e perfeito, é somente um portal para um tipo de conhecimento que nos permite
enxergar a verdade. Tenho observado que a razão do sofrimento das pessoas, em
90% dos casos, são os dramas de relacionamento. E vejo que a principal causa é
a crença de que dependemos do outro para encontrar a felicidade. Mas isso não é
real. A felicidade está no encontro com Deus. Se estivermos comprometidos a
evoluirmos na relação, não com os jogos e distrações do ego, podemos até ter
momentos felizes com o outro, podemos até aprender o caminho que nos leva à
felicidade duradoura, porque o Novo Casamento pode nos dar vislumbres disso.
Mas serão somente vislumbres. Durante essa etapa, aprendemos através do
outro, crescemos por meio dessa troca, porque o outro serve como espelho para
nosso autoconhecimento. Mas chega um momento em que somente a solidão
pode atuar como espelho. Ela é como um espelho com lente de aumento:
começamos a nos ver com muita nitidez. Começamos a ver tudo aquilo que não
nos pertence e tudo isso começa a se dissolver.
A maior parte das pessoas reage com medo a esse encontro com a solidão.
Tememos a loucura e a perda das referências e tentamos fugir. Sentimos um
grande impulso para ver televisão, ler revistas, fazer compras, encontrar os
amigos, ver pornografia ou... entrar novamente em um relacionamento, como
uma rota de fuga. Tudo isso porque o contato com a solidão significa a morte de
nossa falsa identidade. Por isso tentamos fugir dessa morte, que ao mesmo tempo
é um renascimento. Porque para renascer, uma parte de você tem que morrer.
Essa passagem é inevitável, pois a verdadeira felicidade se encontra em Deus —
o seu coração. O outro é somente um veículo, uma seta para que você possa se
voltar para o seu coração.
Essa armadilha pode nos manter presos por muito tempo. Porém tenho visto
muitos amigos ainda viciados nessa codependência, o que irremediavelmente os
lança ao sofrimento. Em algum momento, dentro desse estudo do
relacionamento, eles se perderam. Ficaram identificados com algum aspecto da
sua criança ferida, projetando os próprios pais no outro, sem nenhuma
consciência disso. E, assim, desperdiçam a vida tentando transformar o parceiro,
para fazer dele aquilo que acreditam que ele tem que ser. Mas isso também não é
possível.
Um relacionamento baseado na codependência pode ser comparado a um
comércio. Há uma constante negociação por atenção, consideração, carinho,
respeito, ou seja, amor. No fundo, o que estamos querendo é amor, e o preço que
pagamos nessa negociação é a nossa liberdade. Mas amor verdadeiro não é
forçado; é de graça. Se você ama de verdade, você não pede nada em troca. Se
você negocia amor é justamente porque é incapaz de amar. Funciona assim: “é
atenção que você quer? Eu te dou atenção, mas você vai ter que fazer
exatamente o que eu quero, e como eu quero”. Esse é um jogo nefasto, cujo
objetivo é fazer do outro um escravo para atender às nossas necessidades e
expectativas. Codependência implica depender da miséria do outro para se sentir
feliz. Dessa forma, os parceiros seguem tirando energia um do outro e
reforçando a falsa ideia de eu. Eles pagam esse preço exorbitante, que é a perda
da liberdade, porque estão completamente dependentes, e o pior é que ainda
chamam isso de amor.
Uma das formas de perpetuar a codependência é o jogo de acusações, pois ele
desperta culpa no outro. Quando fazemos o outro sentir-se culpado pela nossa
incapacidade de amar, fazemos mal de verdade. Recebemos uma satisfação
momentânea, pois somos invadidos por uma energia e nos sentimos poderosos,
mas o peso de fazer o outro sentir-se assim é muito pesado. Quando aponta o
dedo para o outro e diz: “você é culpado pela minha miséria!”, você faz com que
ele entre no inferno para tentar ser amado. E o outro cai nesse inferno
justamente por ainda estar identificado com a criança ferida que tem
necessidade de amor exclusivo. Alguns fazem qualquer coisa por uma migalha
de atenção. Portanto, a carência é o alimento da codependência.

O CAMINHO DO CORAÇÃO

Como ir além dessa necessidade de amor exclusivo? Como ir além da


carência afetiva? A resposta está dentro das próprias relações humanas.
Precisamos aprender a criar união. Precisamos aprender a cooperar uns com os
outros e a dar força para o outro brilhar. Para isso, temos que ir além da ideia do
eu e do meu . Temos que ir além do egoísmo. E isso somente é possível quando
podemos ouvir a voz do coração.
O que o seu coração está pedindo? O que a sua alma está pedindo nesse atual
momento de evolução? A resposta está no encontro entre o Ocidente e Oriente —
no caminho do meio, que também podemos chamar de caminho do coração.

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