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3 ATIVIDADES DE OCUPAÇÃO TERAPÊUTICA – INTERVENÇÕES DE

ENFERMAGEM ESTRUTURADAS EM REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL


| Carlos Melo-Dias1; Amorim Rosa2; Alberto Pinto3 |
RESUMO
A ocupação na sua dimensão terapêutica associada ao tratamento de pessoas com doença mental foi-se implementando, ganhando
credibilidade e difundindo desde o início do século XX. Contudo, só recentemente passou a ser entendida como um processo adap-
tativo contínuo que permite à pessoa desenvolver habilidades, competências e identidade, participando em processos ocupacionais
diversos ao longo do seu percurso de vida e nos diferentes contextos ambientais onde se insere. O processo de reabilitação e de recupe-
ração psicossocial tem como objetivo intrínseco, ensinar e treinar os indivíduos incapacitados pela doença mental para o desempenho
das habilidades físicas, emocionais e intelectuais necessárias à sua vida autónoma, num nível superior de bem-estar, e com a menor
ajuda possível de profissionais de saúde. Este ensaio teórico tem como finalidade propor o conceito de Atividade Ocupacional Ter-
apêutica (AOT) em Enfermagem, estabelecendo uma dinâmica particular entre os seus três elementos nucleares: enfermeiro-cliente-
atividade, bem como com os seus domínios de utilização. Sintetizam-se também algumas das formulações teóricas que sustentam a
prática clínica de Enfermagem e alguns modelos de compreensão das intervenções no comportamento social. Em análise descritiva
enumeram-se os objetivos, os determinantes e benefícios das AOT’s em ambiente de Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, para
por fim expor os fundamentos do processo de planeamento com enfase no papel autónomo do enfermeiro no diagnóstico, prescrição,
execução e avaliação das intervenções.
PALAVRAS-CHAVE: Atividade ocupacional terapêutica; Enfermagem; Reabilitação psicossocial; Saúde mental

RESUMEN ABSTRACT
“Actividades de ocupación terapéutica – intervenciones de en- “Therapeutic occupation activities – nursing structured inter-
fermería estructuradas en rehabilitación psicosocial” ventions in psychosocial rehabilitation”
Desde el inicio del siglo XX, la ocupación, en su dimensión tera- In its therapeutic dimension associated with the treatment of peo-
péutica asociada al tratamiento de personas con enfermedad men- ple with mental illness, occupation has been gradually implement-
tal, ha ido implementándose, ganando credibilidad y difundién- ing, gaining credibility and spreading since the beginning of the
dose. Sin embargo, solo en fechas muy recientes ha pasado a ser 20th century. However, it was only recently that it started being
entendida como un proceso adaptativo continuo que permite a la understood as a continuous adaptive process which allows indi-
persona desarrollar habilidades, competencias y una identidad, viduals to develop skills, competencies and their own identity, by
participando en diversos procesos ocupacionales a lo largo de su participating in various occupational processes throughout the life
trayectoria de vida y en los diferentes contextos ambientales en los cycle and within different environmental contexts.
que se encuentra. The process of psychosocial rehabilitation and recovery has the in-
El proceso de rehabilitación y recuperación psicosocial tiene como trinsic goal of teaching and training mentally impaired individuals
objetivo intrínseco enseñar y formar a los individuos discapacita- to perform the physical, emotional and intellectual skills needed
dos por una enfermedad mental en torno al desempeño de las for leading an autonomous life, with a higher level of well-being
habilidades físicas, emocionales e intelectuales necesarias para ll- and the least possible help from health professionals.
evar una vida autónoma, en un nivel superior de bienestar y con la This theoretical essay aims to propose the concept of Therapeutic
menor ayuda de profesionales sanitarios posible. Occupational Activity (TOA) in Nursing, while establishing a spe-
Este ensayo teórico tiene como finalidad proponer el concepto de cific dynamics between its three core elements, nurse-client-activ-
Actividad Ocupacional Terapéutica (AOT) en Enfermería, estab- ity, as well as with its fields of use. Some theoretical formulations
leciendo una dinámica particular entre sus tres elementos nucle- which sustain clinical nursing practice are also synthetized, as well
ares: enfermero – cliente – actividad, así como con sus dominios as some models of understanding interventions in social behavior.
de utilización. Asimismo, se resumen algunas de las formulaciones Using descriptive analysis, the goals, determinants and benefits of
teóricas que sostienen la práctica clínica de enfermería y algunos TOAs in Mental and Psychiatric Health Nursing settings are listed
modelos de comprensión de las intervenciones en el comporta- to describe the foundations of the planning process with emphasis
miento social. En un análisis descriptivo se enumeran los objeti- on the nurse’s autonomous role in the diagnosis, prescription, per-
vos, los determinantes y los beneficios de las AOT en entornos de formance and evaluation of interventions.
enfermería de salud mental y psiquiátrica, para, por último, ex-
poner los fundamentos del proceso de planificación centrado en el KEYWORDS: Therapeutic occupation activities; Nursing; Psy-
papel autónomo del enfermero en el diagnóstico, la prescripción, chosocial rehabilitation; Mental health
la ejecución y la evaluación de las intervenciones.
DESCRIPTORES: Actividades ocupación terapéuticas; Enfer- Submetido em 06-03-2014
mería; Rehabilitación psicosocial; Salud mental Aceite em 30-05-2014

1 Doutorando em Enfermagem na Universidade Católica Portuguesa, ICS - Porto; Investigador na Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem (UICISA-E);
Professor Adjunto Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (ESEnfC) – UCP Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, Rua 5 de Outubro, Coimbra, cmelodias@esenfc.pt
2 Doutorando em Ciências de Enfermagem no ICBAS; Investigador na UICISA-E; Professor Adjunto na ESEnfC – UCP Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, amorim@
esenfc.pt
3 Doutorando; Investigador na UICISA-E; Professor Adjunto na ESEnfC - UCP Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, mpinto@esenfc.pt
Citação: Melo-Dias, C., Rosa, A., & Pinto, A. (2014). Atividades de ocupação terapêutica – intervenções de enfermagem estruturadas em reabilitação psicossocial. Revista
Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (11), 15-23.
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INTRODUÇÃO Numa proposta de consenso, ensaia-se aqui a definição
do conceito de AOT – enquanto atividade ou conjunto
O cuidar em Enfermagem promove os projetos de
de atividades organizadas e sistemáticas que estrutur-
saúde que cada pessoa define, na procura da satisfação
am e dirigem o desempenho funcional do participante,
global das suas necessidades, concretizando o seu fun- enquadradas na relação interpessoal enfermeiro-clien-
cionamento social. te e na avaliação das necessidades humanas fundamen-
Este princípio convoca intrinsecamente a reabilitação tais (NHF), utilizando técnicas terapêuticas seleciona-
psicossocial na perspetiva das pessoas virem a atingir das e prescritas consoante o/s objetivo/s pretendido/s,
o seu máximo potencial de funcionamento e participa- com efeitos psicoterapêuticos, psicoeducacionais, psi-
ção na sua comunidade. comotricionais, psicossociais, socioterapêuticos, e es-
A ocupação terapêutica parece ser algo comum e an- pirituais, no sentido de promover, prevenir, habilitar,
cestral. Para os ambientes terapêuticos de Enfermagem, manter e/ou recuperar e desenvolver as habilidades da
é algo intrínseco à prática clinica, que urge estabelecer pessoa na obtenção do potencial máximo de desem-
como construto científico. penho, de autonomia e de satisfação nas suas NHF, nas
Com este ensaio propomos uma definição de Ativi- atividades de vida, na ocupação para a realização, e na
dade Ocupacional Terapêutica (AOT) de uso univer- recreação.
sal e transversal em Enfermagem, prescrita por Enfer- A utilização da ocupação como atividade terapêutica
meiros, clinicamente focada, enquanto ação conjunta estabelece uma dinâmica particular entre os seus três
com o cliente para o seu máximo desempenho, autono- elementos nucleares: terapeuta-cliente-atividade. Em
mia e satisfação. algumas situações, a atividade funciona como objeto
Foi uma construção com processo de maturação de al- intermediário entre o terapeuta e o cliente, noutras é
guns anos, edificada com os fundamentos conceptuais o terapeuta que funciona como intermediário entre o
que usamos na nossa prática da Docência, e com o cliente e a atividade.
histórico da diversidade de experiencias clínicas, aliado A ocupação terapêutica, entendida como um processo
adaptativo e contínuo no qual a pessoa desenvolve a sua
à atual experiencia na supervisão de estudantes de li-
identidade e competência, participando em atividades
cenciatura e de mestrado em Enfermagem.
ocupacionais, ao longo do ciclo vital, e nos diferentes
Apresentamos neste artigo o que entendemos por
contextos ambientais onde se insere, permite a ex-
AOT, enquadrando as suas caraterísticas e domínios.
pressão individual, a construção identitária e o desen-
É definido o enquadramento conceptual das interven- volvimento de vínculos sociais e culturais, e possibilita-
ções autónomas e das escolas de pensamento elencadas lhe sentir-se elemento ativo da sociedade, com reflexos
nas competências de pensamento e ação do cliente, no no seu bem-estar, e na sua saúde global.
sentido de racionalizar o contínuo de independência/ As atividades de ocupação terapêutica em enfermagem
dependência, e permitir a tomada de decisão clínica. de saúde mental e psiquiátrica têm como características
Descreve-se também todo o processo de organização e fundamentais:
planificação com ênfase nos benefícios, no impacto na O = Objetiva - orientada por objetivos e clinicamente
saúde e no funcionamento social da pessoa e da comu- validada por indicadores de avaliação.
nidade. C = Congruente - apresenta sintonia e congruência
com o quotidiano.
Sobre o Conceito de AOT – Atividade Ocupacional U = União - envolve e une o terapeuta e cliente, quer no
Terapêutica plano, quer na ação.
O princípio major do processo de reabilitação psicos- P = Prescrição - O enfermeiro na utilização do seu
social é oferecer às pessoas incapacitadas pela doença raciocínio clínico, cientificamente fundamentado, pre-
screve o programa/sessão de AOT, respeitando a aval-
mental, a oportunidade de atingir o seu máximo poten-
iação das NHF, em triangulação com o exame do es-
cial de funcionamento independente na comunidade,
tado mental do cliente.
ensinando-lhes o desempenho de habilidades físicas,
A = Adaptada - é adaptada ao ambiente e é gradativa,
emocionais, e intelectuais necessárias à vida em auto-
permitindo sucesso na atividade. Os processos, o am-
nomia, no nível mais alto possível de bem-estar, e com biente, os instrumentos, os materiais de trabalho, são
a menor ajuda possível dos profissionais de saúde (Me- adaptados e atingidos através da execução de passos/
lo-Dias, p.60, 2014). etapas gradativos sensíveis ao setting.

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C = Consentimento - o/a participante devidamente Na dimensão temporal podemos compreender a idade
esclarecido e informado consente a sua participação e cronológica do cliente, o seu estádio desenvolvimental,
envolvimento na atividade. a posição/papel na sua fase de vida (ex: carreira pro-
A = Acrescenta - é de alguma forma significativa para o fissional, formação, educação), e ainda défices e co-
cliente, acrescentando sempre algo à sua forma de sen- morbilidades. Na dimensão ambiental podemos com-
tir, perceber, executar, desempenhar, e memorizar. preender o aspeto estrutural (refere-se aos “objetos”),
O = Orientação - dirige-se sempre para a qualidade de social (refere-se às pessoas significativas, aos grupos
vida, autonomia e satisfação do funcionamento pessoal sociais, à influência das normas sociais e as expectativas
e social do participante. de desempenho de papéis) e cultural (refere-se às cren-
ças, hábitos, padrões de comportamento, expectativas
Domínios de Utilização da AOT passadas de geração em geração, fatores sociopolíticos,
Os domínios em que as AOT podem ser clinicamente oportunidades de educação/aprendizagem, trabalho/
relevantes e decisivos para a reabilitação psicossocial empregabilidade, e suporte financeiro).
do cliente são: Quadro Conceptual
 t1FTTPBMF%PNÏTUJDPoQPSFYFNQMP BUJWJEBEFT Intervenções Autónomas de Enfermagem
básicas de gestão pessoal, gestão do espaço pessoal e
O exercício clínico da enfermagem centra-se na relação
doméstico, treino de habilidades, etc.
interpessoal entre um enfermeiro e uma pessoa/grupo.
 t 3FDSFBÎÍP F EF -B[FS o QPS FYFNQMP  BUJWJ-
O estabelecimento da relação terapêutica, neste âmbito,
dades de prazer, alegria e bem-estar, habitualmente fei-
distingue-se pela formação e experiência do enfermeiro
tas porque se quer, e não porque as temos de fazer.
que lhe permite entender e respeitar os outros, num
 t &YQSFTTÍP 1FTTPBM o NÞTJDB  ESBNB  QTJDP-
quadro onde procura abster-se de juízos de valor e de-
motricidade, jogos, artes plásticas.
senvolver em parceria as suas capacidade (Ordem dos
 t 'PSNBÎÍP"QSFOEJ[BHFN  1TJDPFEVDBÎÍP 
Enfermeiros, 2001). As intervenções de enfermagem
Educação para a Saúde.
tomam por foco de atenção a promoção dos projetos
 t3FMBÎÜFT*OUFSQFTTPBJTEJOÉNJDBEFHSVQPT 
de saúde que cada pessoa vive e persegue. Procura-se
resolução de problemas, treino de motivação, treino de
prevenir a doença e promover os processos de readap-
assertividade, reuniões.
tação após a doença. Procura-se, também, a satisfação
Para uma correta ponderação dos objetivos a estabel-
das NHF e a máxima independência no funcionamento
ecer e para uma pertinente escolha dos indicadores de
pessoal e social, incluindo a adaptação funcional aos dé-
avaliação, deveremos focar-nos nas pessoas nas suas
fices e a adaptação a múltiplos fatores em desequilíbrio
dimensões: Sensoriomotora, Cognitiva, e Psicossocial.
– frequentemente através de processos de aprendiza-
Sensório-neuro-motora - pode ser descrita em senso-
gem do cliente (OE, 2001).O exercício de Enfermagem
rial (sinais recebidos pelos sentidos…), neuromuscular
insere-se num contexto de atuação multiprofissional,
(como reflexos, amplitude de movimentos, tónus mus-
distinguindo-se dois tipos de intervenções de enferma-
cular, força, resistência e postura), e motora (coordena-
gem: as intervenções interdisciplinares, iniciadas por
ção de movimentos, controlo motor).
outros técnicos, e as intervenções autónomas, iniciadas
Cognitiva - refere-se à capacidade de utilizar as funções
pela prescrição do enfermeiro (OE, 2001). No âmbito
mentais mais complexas: estar alerta, categorização, se-
do exercício autónomo, o enfermeiro presta cuidados
quenciamento, generalização, orientação, memória, ca-
e realiza atividades de enfermagem com a finalidade de
pacidade de compreender e organizar a informação, de
obter, em parceria com o cliente, a satisfação relativa
dar forma aos pensamentos e ideias, amplitude da aten-
das suas necessidades. As atividades de enfermagem
ção, resolução de problemas, a habilidade de aprender.
devem ser entendidas como intervenções cujo âmbito
Psicossocial - refere-se à gestão das inter-relações e ao
requer uma relação e interação social, num formato
processamento das emoções: o autoconceito, os inter-
potenciador dos cuidados e obrigatoriamente integra-
esses e os valores; a habilidade de gerir o tempo, os seus
das na mesma planificação sistémica e sistemática, com
papéis de vida e a participação nas interações sociais,
o mesmo foco global de atenção, visando a satisfação
adaptação aos estímulos do ambiente.
das necessidades, mais especificamente nos aspetos que
Apresenta-se também relevante para a planificação e
abordam a decisão, a ação e a interação com o cliente,
sensibilidade das AOT a noção de contexto, podendo
procurando a máxima adaptação funcional através de
ter uma dimensão temporal e uma dimensão ambien-
processos de aprendizagem cognitiva, comportamental
tal.
e afetiva.
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É neste enquadramento conceptual e clínico que in- Acresce ainda, por ex. nas PP que as pessoas são sen-
serimos as AOT enquanto intervenção autónoma, cuja síveis à crítica, evitando ou escapando às situações em
responsabilidade pela prescrição e implementação téc- que podem ser criticados ou nas quais possa haver con-
nica da intervenção, pertence ao enfermeiro, implican- flito, apresentando elevados níveis de depressão e baixa
do a capacidade de tomada de decisão que orienta o autoestima (Yusupoff et al. 1996, citados por Coelho et
exercício profissional autónomo. al. 2002; Coelho e Palha, 2006).
Nas PH, por ex. as pessoas expressam mais sentimen-
Competências de Receção, de Compreensão, e de En- tos depressivos, mal-estar pessoal, autoavaliação nega-
vio tiva, agressividade verbal e menos conteúdo com vista
Considerando as competências em geral, reconhec- à solução de problemas.
emos três tipos: No comportamento não-verbal, as pessoas com PP, por
 t $PNQFUÐODJBT EF 3FDFÎÍP  DBQBDJEBEF EF ex. apresentam expressões faciais inapropriadas, gestos
perceber de forma eficiente pistas ou sinais relevantes; e posturas inadequados, e tendência para evitar o con-
 t$PNQFUÐODJBTEF1SPDFTTBNFOUPDBQBDJEBEF tacto ocular, sentindo-se desconfortáveis em situações
de avaliar a informação recebida, de identificar os obje- sociais em que este é importante. Nas PH, por ex. as
tivos a médio e longo prazo, e de planear uma resposta pessoas apresentam menor expressividade facial e cor-
comportamental que antecipe as possíveis consequên- poral, assim como menor contacto ocular com o inter-
cias; locutor.
 t $PNQFUÐODJBT EF &OWJP  DPNQPSUBNFOUPT No comportamento paralinguístico, nas PP, por ex. em
verbais, não-verbais e comportamentos paralinguísti- determinados indivíduos, a voz é monótona, tem me-
cos que entram na interação social (Coelho e Palha,
nos entoação vocal, e o fluxo verbal é lento, o que além
2006).
de desagradável na conversação, torna difícil a interpre-
As competências de receção e de processamento (ou
tação (Bellack et al. 1997, citados por Coelho e Palha,
perceção social) implicam-se na habilidade do sujeito
2006). Nas PH as pessoas falam lentamente, mostram
em interpretar as pistas dos estímulos sociais relacio-
nando-as com a experiência passada, de forma a ser ca- pausas mais longas, e levam mais tempo a responder
paz de as usar num vasto leque de diferentes situações às interpelações dos outros, e com um tom monótono
sociais. (Segrin, 2000).
Por exemplo, às pessoas com perturbações psicóticas
(PP) faltam frequentemente as habilidades percetivas Modelos Teóricos
devido a perturbações na seleção das pistas (Mueser No ‘Modelo Cognitivo Comportamental’ tendo como
& Sayers, 1992 citados por Coelho e Palha, 2006). As principal objetivo encorajar a mudança comportamen-
pessoas com perturbações do humor (PH) têm o pes- tal, o Enfermeiro ao longo da AOT regista tudo aquilo
simismo e perfecionismo, que conduzem ao excesso que o cliente é capaz de fazer e todos os reforços que se-
de realismo, à desesperança e ao desamparo (Segrin, jam significativos para esse cliente, oferecendo-lhe esse
2000). Esta tendência para uma avaliação pessoal e so- reforço em cada passo alcançado com vista ao compor-
cial negativa, concorre e conduz a um défice na perfor- tamento desejado.
mance das habilidades sociais.
Na mesma perspetiva, quando a resposta não é a ade-
Nas competências de envio, muitos clientes exibem
quada o enfermeiro pode ir fornecendo pistas que per-
um pobre comportamento interpessoal precisamente
mitirão ao cliente alcançar esse passo e generalizar para
porque o seu foco de atenção é primariamente interno
atingir os seguintes.
e apenas intermitentemente e seletivamente direciona-
do para o outro. No ‘Modelo de Aprendizagem Social’ as consequên-
Mesmo fora de um contexto terapêutico, estes indi- cias do comportamento influenciam a sua repetição, a
víduos raramente percebem os outros pontos de vista e observação de modelos exteriores (e.g. pessoas, filmes,
mostram pouco interesse nos outros. livros, …) acelera mais as aprendizagens do que se esse
Esta dificuldade de atender à maioria das pistas rele- comportamento tivesse de ser executado pelo “apren-
vantes parece ainda mais agravada com a falta de ha- diz” por si só.
bilidades em pedir esclarecimentos, em generalizar São aquisições de comportamentos que resultam da in-
alternativas, e na falta de iniciativa para lidar com os teração (interna e externa) por observação e imitação
problemas do quotidiano. de um modelo.

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São quatro os determinantes deste modelo: ‘Processo Estes seis níveis podem constituir uma base teórica
de Atenção’ (por modelos mais disponíveis e mais sig- crucial para definir/avaliar os indicadores de avaliação
nificativos); ‘Processo de Retenção’ (o modelo com ca- do desempenho dos clientes nas AOT.
raterísticas significativas será o mais recordado quando A necessidade de ocupar-se com vista a realizar-se
não estiver presente); ‘Processo de Reprodução’ (tra- refere-se à vontade de realizar coisas para si, de as-
duz as conceções do comportamento armazenado na sumir os diferentes papéis que lhe incubem em função
memória em ações correspondentes); ‘Processo de Re- da sua idade e género, de cumprir as tarefas associadas
forço’ (um comportamento recompensado tem mais aos diferentes estados do seu desenvolvimento (papel
probabilidades de ser imitado pelos observadores de estudante, de trabalhador, de esposo/a, de pai/mãe,
(Bandura, 1977; Woolfolk, 2000). e ainda o papel de doente que é marcado pelo nível de
adesão e colaboração às indicações terapêuticas (Pha-
Colheita de Dados, Raciocínio, e Técnicas neuf, 2001).
Específicas a Utilizar nas Sessões É fundamental contar com o papel da motivação na
Teoria das Necessidades Humanas Fundamentais gradação do conceito deste continuum.
O modelo de Virgínia Henderson congrega a Saúde, as Em termos pragmáticos a motivação é o conjunto de
Necessidades Humanas Fundamentais (NHF), e o Cli- forças percebidas que levam a pessoa a agir, influen-
ente como agente da sua própria saúde e independência ciada pelas suas experiências e outros fatores externos
na satisfação das necessidades e ainda o papel do en- (Ryan & Deci, 2000; Deci & Ryan, 2000), ou seja, o es-
fermeiro em todos estes processos, nomeadamente na forço ou energia que a pessoa está disposta a despender
sua função única de ajudar a pessoa na realização e sat- para realizar uma tarefa.
isfação das necessidades e atividades que realizaria se Considerando que o comportamento do ser humano
tivesse força, vontade, e conhecimento necessários po- é impelido por motivações intrínsecas e extrínsecas
dendo construir novamente um estado de autonomia e (Sprinthall & Sprinthall, 1993), podemos considerar
independência no seu projeto de vida. O conceito “Ne-
diferentes níveis de motivação na procura da inde-
cessidade” define-se como necessidade vital que a pes-
pendência: ausência total; extrínseca (suscitada pela
soa deve satisfazer a fim de conservar o seu equilíbrio
equipa prestadora de cuidados); e intrínseca (determi-
físico, psicológico, social ou espiritual, e de assegurar o
nada internamente pela sua convicção e não pela vul-
seu desenvolvimento (Phaneuf, 2001), mas também de
défice, falta de algo que pode ser superado pelos cuida- nerabilidade).
dos prestados por enfermeiros (Powers, 2006; Fortin, Assim, a independência só pode ser real e durável se a
2006; Amar & Gueguen, 2007 citados por Rosa e Basto, motivação e convicção para agir for intrínseca.
2009). Para Henderson a saúde é uma abordagem glob-
al, em que o ser humano é considerado como um ser
completo, com um conjunto diverso de NHF, correta-
mente integrado no seu meio (Berger & Malloux-Prier,
1995), numa visão biopsicossocial e espiritual dos cui-
dados. A satisfação das necessidades apresenta variação
relativa num continuum independência/dependência,
segundo o grau (qualidade/quantidade) de ajuda que a
pessoa requer ou precisa (quadro 1).
Quadro 1 - Contínuo de Independência/Dependência
Independência Dependência
Nível 0 Nível 1 Nível 2 Nível 3 Nível 4 Nível 5
Satisfaz por si próprio Têm necessidade Têm necessidade Conta com alguém Conta com alguém Depende total-
as suas necessidades de de alguém para lhe de alguém para para realizar as ações para realizar as ações mente de alguém
maneira relativa que ensinar como deve seguir o tratamen- necessárias à satisfação necessárias à satisfa- para a satisfação
permite assegurar a fazer para conservar to adequadamente das suas necessidades, ção das necessidades, das necessidades,
homeostasia. ou reconquistar a ou para utilizar ou para o seu trata- ou para o seu trata- ou para aplicar o
Segue um tratamento independência e as- uma ajuda téc- mento, pois apenas mento, pois tem uma seu tratamento,
adequadamente ou uti- segurar a homeosta- nica, pois apenas consegue participar participação mínima. pois não consegue
liza uma ajuda técnica sia, para se assegurar consegue partici- pouco. participar.
sem ajuda. que o faz bem. par parcialmente.
Fonte: Phaneuf, Margot (2001) Planificação de cuidados: um sistema integrado e personalizado. Quarteto, Coimbra.
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Raciocínio e Decisão Clínica na Seleção da Atividade t$PODFOUSBSPQBSUJDJQBOUFFNBMHPÞUJM EJTUSBJOEPP
Ocupacional Terapêutica da sintomatologia e da doença);
Raciocínio clínico na prática de enfermagem será um t.FMIPSBSBDPPSEFOBÎÍP BQPTUVSBFPUØOVTNVTDV-
processo de pensamento do Enfermeiro, fundamentado lar;
nos conhecimentos (teóricos e práticos) e experiência t%JNJOVJSBBOTJFEBEF
(profissional e pessoal), envolvendo toda a complexi- t&TUJNVMBSPSFMBDJPOBNFOUPJOUFSQFTTPBM
dade, reflexividade, criatividade, intuição e cognição t 0CUFS DPPQFSBÎÍP F JOUFSFTTF EP DMJFOUF QBSB P TFV
(do enfermeiro, do cliente em foco, e do contexto), de tratamento;
modo a sistematicamente selecionar, comparar, testar, t'BDJMJUBSBJOUFHSBÎÍPOPNFJPGBNJMJBSFQSPĕTTJPOBM
inferir e decidir sobre as evidências clínicas do per- t1SFQBSBSQBSBBWJEBOBDPNVOJEBEFFOPUSBCBMIP
curso clínico do cliente, gerando decisões e conclusões t 1SFWFOJS P SJTDP EF EFUFSJPSBÎÍP F EF JOUFSOBNFOUP
que permitam atingir resultados esperados (Melo-Dias prolongado;
e Lopes, 2010). t1SPNPWFSIÈCJUPTEFWJEBTBVEÈWFJT
O raciocínio suporta-se ainda das seguintes razões t1SPNPWFSPEFTFOWPMWJNFOUPEPBVUPSSFTQFJUPFBV-
clínicas: Minimiza o erro aumentando a precisão e acu- torresponsabilização;
idade; Modela os cuidados; Pode ter efeitos significa- t1SPNPWFSPVTPDPOTUSVUJWPEPUFNQPEFMB[FS
tivos na rapidez de obtenção de resultados, e na brevi- t%FTFOWPMWFSIBCJMJEBEFTEFBVUPDVJEBEP
dade da alta clínica (Magalhães e Lopes, 2013). t1SPQPSDJPOBSSFFEVDBÎÍP
O processo de raciocínio clínico aplicado às AOT em t.BOUFSPNÈYJNPOÓWFMEFGVODJPOBNFOUPQFTTPBMF
Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica (ESMP) social;
corresponde à decisão e escolhas de tratamento, em
t3FEV[JSDPNQPSUBNFOUPTQSPCMFNÈUJDPT
que o terapeuta perante as possibilidades e opções dis-
poníveis constrói um modelo/tipo de atividade dirigi-
Determinantes das AOT em Enfermagem de Saúde
do ao(s) cliente(s) e às suas necessidades, respeitando
Mental e Psiquiátrica
os princípios científico, ético, e estético.
As indicações terapêuticas para prescrever AOT em Existem variáveis que determinam a escolha e decisão
ESMP expondo o participante a uma variedade de do tipo de AOT a prescrever:
respostas potencialmente eficazes para lidar com a
situação problemática, são: 1-Manutenção do máximo - Relacionadas com o setting:
bem-estar; 2-Promoção das funções biopsicossociais; a) Estigma social;
3-Promoção da adaptação/integração social; 4-Imple- b) Normas e filosofia de cuidados da instituição;
mentação da recuperação/reabilitação; 5-Avaliação das c) Dificuldades de financiamento dos programas;
situações clínicas: défices, incapacidades; 6-Prevenção d) Motivação dos terapeutas.
da “degradação” cognitivo-comportamental; 7-Pre-
venção da hospitalização prolongada, e do fenómeno - Relacionadas com a pessoa:
“porta-giratória”. a) Biofísica: Perda ou limitação de capacidades motoras,
dor, e atraso/perturbação no desenvolvimento global;
Objetivos, Determinantes, e Benefícios da AOT b) Psicológica: incapacidade de realizar o teste de re-
Objetivos alidade; ausência de insight crítico; incapacidade para
Apresenta-se intencionalmente, uma coleção de objeti- estar atento e concentrado; ausência ou diminuição da
vos, disponíveis para serem utilizados no planeamento capacidade de perceber/evitar os riscos/perigos;
de programas ou sessões de AOT. Note-se que os obje- c) Psicossociológica: Limitação das habilidades co-
tivos poderão ser organizados e dirigidos à sessão pro- municacionais; limitação/pobreza no relacionamento
priamente dita (serão assim objetivos gerais ou finali- interpessoal; incapacidade de participar em grupos;
dades) e/ou organizados e dirigidos ao desempenho alterações estruturais ou funcionais do ambiente de
dos participantes (sendo assim objetivos específicos ou vida; estigma e falta de conhecimentos sobre recursos
resultados esperados): disponíveis;
t*NQMFNFOUBSFTUSBUÏHJBTEFHFTUÍPEBTJODBQBDJEBEFT d) Ocupacional: Incapacidade de se autocuidar; dificul-
t.BOUFSPDPOUBDUPDPNBSFBMJEBEFEPTTFUUJOHT dades na aprendizagem; limitações nas habilidades
t(FSJSBTSFTQPTUBTEPEPFOUFBPTGPDPTFNEÏĕDF
funcionais de jogar/trabalhar.
t.FMIPSBSBRVBMJEBEFEFWJEB
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Benefícios das AOT em Enfermagem de Saúde Men- As estratégias, ações e atividades específicas são descri-
tal e Psiquiátrica tas em pormenor de forma a proporcionar uma melhor
integração do cliente na sua escolha e elaboração, bem
Os benefícios correlacionados com os objetivos especí-
como proporcionar que sejam avaliadas por pares de
ficos dos clientes são:
forma a aferir a sua utilidade, eficiência e eficácia.
t 1SPNPÎÍP EB PSHBOJ[BÎÍP DPNQPSUBNFOUBM  B OÓWFM
O desenho base de qualquer AOT em ESMP quer numa
individual e grupal;
só sessão ou várias, será:
t0GFSFDFTFOUJEPEFVUJMJEBEFTPDJBM PAOPWPQSJNFJSP t 5FNB PV 5ÓUVMP *OEJDBÎÍP EB %BUB  )PSB  -PDBM  F
passo’ para o retorno ao trabalho/família, ou descoberta Duração prevista.
de novos interesses ou aquisição da destreza necessária; t 1PQVMBÎÍP BMWP JOEJDBÎÍP EPT DSJUÏSJPT EF FTDPMIB
t&EJĕDBÎÍPEBBVUPFTUJNBFBVUPJNBHFN EFTQFSUBOEP dos participantes).
interesses; t0CKFUJWP(FSBMPV'JOBMJEBEF
t3FTTPDJBMJ[BÎÍP SFTQPOTBCJMJEBEFFDPPQFSBÎÍPQFMBT t0CKFUJWPT&TQFDÓĕDPTPV3FTVMUBEPT&TQFSBEPT
atividades grupais; t&TUSBUÏHJBTF.FUPEPMPHJB EFTDSJÎÍPDPNQMFUBFDSP-
t3FEVÎÍPEPTDPNQPSUBNFOUPTJOBQSPQSJBEPTEFTBE- nológica de todas etapas a realizar).
equados/problemáticos; t3FDVSTPTOFDFTTÈSJPT EJWFSTPTIVNBOPT NBUFSJBJT 
t1SFWFOÎÍPEBEFUFSJPSBÎÍPGÓTJDBFDPHOJUJWBHFSBM financeiros, estruturais, intelectuais).
t $POTUSVÎÍP EF VNB JNBHFN HSBUJĕDBOUF EP &OGFS- t "WBMJBÎÍP JOEJDBÎÍP EPT DSJUÏSJPT PV JOEJDBEPSFT
meiro na execução e realização de AOT’s em ESMP. mensuráveis).
t<"TQFUPTÏUJDPTBDPOTJEFSBS TFGPSOFDFTTÈSJP
>
Processo de Planeamento das AOT
Avaliação do Desempenho dos Participantes
As respostas humanas aos processos de desenvolvim-
Esta avaliação é feita através dos indicadores de avalia-
ento, de doença e às necessidades específicas de cada
ção definidos no planeamento, sintónicos com os ob-
cliente, bem como o tempo e tipo de internamento, as
jetivos específicos ou resultados esperados (de uma ou
caraterísticas culturais e demográficas, as expetativas e
todas as dimensões sensoriomotora, cognitiva, e psi-
projetos de vida, as perturbações causadas pelos novos
cossocial), e que se concretizem sensíveis à intervenção
papéis, a dor e sofrimento (físico, mental e social), as
do Enfermeiro, explicitando quantitativamente e quali-
dificuldades de adaptação e o comprometimento das
tativamente resultados clínicos.
capacidades psíquicas, influenciam o desenho das in-
tervenções de enfermagem nas AOT (McGurk, et al. Papel do Enfermeiro
2013; Melo-Dias, 2014; Rainforth, & Laurenson, 2014). O papel terapêutico do enfermeiro em AOT’s contêm
As AOT deverão proporcionar o máximo de utilidade os demais requisitos básicos de intervenção na área
das suas intervenções ao máximo de clientes possível, científica da saúde, assegurando-se da eficiência e eficá-
mantendo o vínculo com a personalização, especifi- cia com pessoas com doenças mentais, nomeadamente
cidade e habilidades disponíveis e a desenvolver, ga- excelentes competências interpessoais, familiaridade
rantindo o seu fundamento na evidência científica com os princípios das teorias de desenvolvimento e das
(Mueser, Deavers, Penn, & Cassisi, 2013). terapias cognitivo-comportamentais, entusiasmo pelo
As formas e procedimentos de colheita de dados, de in- trabalho, resiliência para gerir procedimentos minu-
tervenção e de avaliação deverão ser estabelecidos de ciosos, bem como adaptá-los às exigências situacionais,
acordo com os problemas/focos de enfermagem e re- e ainda a capacidade de recolher dados comportamen-
spostas humanas apresentadas, acrescendo a condição tais para processos de feedback e feedforward.
de doença e a fase clínica, numa perspetiva global do Consideram-se princípios gerais da ação socioterapêu-
tempo de duração do tratamento. tica do Enfermeiro nas AOT’s:
O planeamento de uma AOT é sempre centrado na 1. Tomada de consciência de si mesmo durante a rela-
pessoa, alvo da sua intervenção, sendo perspetivado ção terapêutica.
pelo Enfermeiro a interação das três variáveis: a pessoa, 2. Conhecimento dos procedimentos/intervenções da
a ocupação, e o ambiente. atividade;
O programa de AOT respeita sempre a avaliação prévia 3. Conhecimento das habilidades e das necessidades
das NHF e as preferências dos clientes e estilo de vida, humanas fundamentais dos clientes, não perspetivando
mantendo a adequação clínica, num cliente adequada- desenvolvimentos acima dos níveis pré-formação (e/ou
mente informado. pré-mórbidos).
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4. Instrui o mais sensível possível, numa rotina semel- Encorajamos a utilização desta ferramenta terapêutica,
hante ao quotidiano do cliente. porque, para o Enfermeiro, um resultado significativo é
5. Reforço e supervisão prevenindo o esquecimento do prevenir a morbilidade e promover os processos de re-
doente. adaptação, procurando-se a satisfação das necessidades
6. Encorajamento, sem pressionar o cliente. humanas fundamentais e a máxima independência na
7. Utilização de ajudas técnicas na ausência de capacid- realização das atividades da vida (OE, 2001).
ades motoras e/ou sensoriais.
8. Flexibilidade na adaptação dos procedimentos às Esperam os autores desenvolver nos enfermeiros
sugestões dos clientes. leitores deste artigo, um movimento que vá, neces-
9. Sintonia de todos os que trabalham com o cliente, sariamente, além da aceitação passiva da razoabilidade
conhecendo o que está a ser trabalhado. desta proposta de intervenção sistematizada de enfer-
(Hoeman, 1996; Coelho, 1999; Cordo, 2003; OE, 2011) magem e pensem, como diria Paulo Freire, de forma
implicante e dialética, ou de forma mais pragmática –
CONCLUSÃO colocar em prática e depois pensar como fazer melhor
(Freire, 2001).
Apresentamos a proposta de definição de Atividade
Ocupacional Terapêutica em Enfermagem de Saúde
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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da decisão, desde logo, através do consentimento in- Bandura, A. (1977). Self efficacy: toward a unifying
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vai “alimentar” as diferentes dimensões, sejam de na- Cordo, M. (2003). Reabilitação de pessoas com doença
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é possível construir conhecimento, e podemos ainda Freire, P. (2001). Pedagogia da autonomia: Saberes ne-
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para a população. Terra.
De facto, as variáveis que interferem na forma como
se pensa, se sente e se age convocam que haverá ativi- Hoeman, S. (1996). Rehabilitation nursing: Process and
dades e indicadores estruturados que poderão ser gen- application (2nd ed.). St. Louis: Mosby.
eralizáveis, embora não de forma metódica de todos os
resultados a todos.

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