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Segredos e mentiras...

Vivi toda a minha vida envolta em subterfúgios por uma única


razão.

Ao longo dos anos, vivi mais como um enigma do que como um


homem.

Por tanto tempo, neguei ter um coração batendo por conta própria.

Até ela. Até ela desenterrar o navio faminto dentro de mim,


obrigando-me a reconhecê-lo, forçando-me a entender que sou
capaz de sangrar como qualquer outro.

Por isso, nós pagamos. Ainda estamos pagando.

No entanto, ela ainda exige isso, esse coração inútil do ladrão


impiedoso e vilão sem vergonha, ela não se importa. Ela se
apaixonou. Meu medo é que eu não seja mais esse homem.

Com as mentiras que contei, a vida que levei, meus erros estão
começando a me alcançar, dia a dia, um por um.

Esta é minha última chance, e não tenho a intenção de perdê-la


novamente, mas como a decepção do meu passado começa a se
desvendar e a se fechar, derramando minha humanidade pode ser
a única coisa que pode salvar a nós dois.

Talvez já seja tarde demais.


Quarenta e três anos

Saint-Jean-de-Luz, França

— Viens ici, Ezequiel, — Venha aqui, Ezequiel. Caminho


até onde ele está, sua mão abaixada, uma concha marrom
redonda com um fundo plano em sua palma. Quando vou pegá-
la, ele a move para fora do alcance.

— Qu'est-ce que c'est? — O que é isso?

— Un clypéastre, un dollar de sable. Lorsque tu en


trouveras un, garde-le. Et lorsque tu seras prêt, alors tu le
casseras. Mais tu dois le faire bien au milieu pour pouvoir en
récupérer son trésor. — É um dólar de areia 1 . Quando você
encontra isto, você o guarda. E somente quando estiver pronto,
poderá quebrá-lo. No entanto, você tem que fazer isso bem no
meio para reivindicar o tesouro.

— Quand serai-je prêt? — Quando estarei pronto?

Ele bagunça meus cabelos.

1 Dólares de areia são espécies de ouriços-do-mar, enterrados na areia da praia.


— Tu le sauras. — Você saberá.

De pé à beira mar, eu pulo as pedras ao longo das ondas


espumosas que inundam meus pés. Não me lembro de toda a
conversa daquele dia em que meu pai me trouxe aqui; apenas
o olhar do mar, um vislumbre de areia, o brilho dos primeiros
raios de sol que espreitam por trás, e a estranha concha em
sua palma. Foi em minha última visita à instituição que ele
recordou nosso bate-papo durante um de seus raros e lúcidos
momentos. Contou-me a história de seu filho, Ezequiel, e
repetiu nossa conversa naquele dia com surpreendente clareza
minutos antes de me pedir que o procurasse.

Quer tenha sido um sinal, destino, ou algo além disso


brincando comigo, encontrei um dólar de areia na praia, em
perfeitas condições, no dia em que eu comecei a obra da casa.
Embora ele não tenha refrescado minha memória até anos
depois, o porquê do que me atraiu para guardá-lo quando o
encontrei ficou claro. De alguma forma, sem saber os detalhes,
eu sabia o significado disso.

É irônico e cruel como a mente funciona, especialmente


a minha. Algumas memórias revivo regularmente, mas faria
qualquer coisa para esquecer, os detalhes tão vívidos, tão
arraigados, que chegam a ser torturantes. Enquanto outras,
as memórias que mais prezo, às vezes me escapam. Mas é a
minha memória instável que plantou uma semente naquele dia
e o instinto que me fez esconder aquela concha – o que torna
tudo mais significativo. E não foi até que pesquisei o
significado do 'tesouro' que entendi seu estado de espírito
naquele dia, um estado muito parecido com minha própria
mente agora.

Nunca fomos próximos porque minha mãe fugiu dele por


causa de seu temperamento e doença mental – esquizofrenia,
mas sinto alguma conexão com ele agora. Porém, tenho tido
medo desde o dia em que o encontrei décadas depois, coberto
de sua própria merda e divagando em francês frenético com
qualquer estranho que passasse por ele naquelas ruas de
Paris. Vê-lo naquele estado deu lugar a uma tremenda
ansiedade de que um dia eu sofreria o mesmo destino – que
todos que alegavam cuidar de mim acabariam me
abandonando – devido a uma doença mental e à falta de
controle. Um medo que me aleijou durante anos e me privou
ainda mais de me entregar, em acreditar plenamente nas
pessoas.

Para mim, o amor sempre foi condicional – até ela.

Minha mãe nunca entendeu completamente a extensão


da doença do meu pai. Agora acredito que ela presumiu que
ele tivesse enlouquecido. Embora isso seja parcialmente
verdade, não foi por decisão consciente. Não foi como se ele
tivesse deixado que algum lado sombrio dele tomasse conta, o
que acredito ter sido sua atitude sobre ele até o dia em que ela
morreu. Foi a doença que o reivindicou e o medo da doença
herdada que me atormentou por tanto tempo.

Mas, neste estágio do jogo, as probabilidades e minha


idade estão a meu favor de que nunca sofrerei seu destino.
Recuperando a pedra desbotada pelo sol de onde a
escondi há uma vida inteira, vou em direção à escada sinuosa
ao lado do penhasco que leva à minha meta. Está mais
evidente do que nunca de que jamais foi a casa pela qual eu
esperava. Era hoje, este momento de lucidez – um dia em que
minha cabeça e meu coração não estão mais em conflito.

Se eu tivesse que resumir minha vida, minha jornada em


uma palavra, seria hoje. Fiz tudo isso por este momento. A
ironia é que nunca soube, através de minha conspiração e
esquemas, que um dia como este poderia existir para mim. O
destino me lançou as cartas enquanto o Karma tinha seu jeito
malvado comigo. A sorte nunca foi levada em consideração,
mas ela brotou para este oportunista o suficiente para saber
que às vezes, estava presente, e outras vezes havia me
abandonado completamente.

Entendido, sorte. E que se foda por isso.

Mas se eu tiver que medir minha vida contra as forças


incontroláveis do que poderia acontecer, a qualquer momento,
a favor ou contra mim, terei que acabar com todos eles. Terei
que escolher outra coisa para medir minha vida por uma
entidade diferente no conjunto, uma força cósmica para vencer
todas as outras, ela.

Sem ela, meu propósito pareceria sem sentido, como seria


neste dia.

Porque ela não estava errada. Nós, o que temos e o que


encontramos um no outro, é tudo o que importa. O caminho
que percorri para chegar aqui não seria nada sem alguém com
quem refletir sobre ele. E não há melhor contador de histórias,
não há melhor reflexo do meu valor do que aos olhos da mulher
que compartilhou da minha jornada e me ajudou a navegar
pelo pior dela.

Ela é meu espelho, minha juíza, e se revelou como meu


único propósito. Ela me trouxe de volta à minha alma mortal
quando me perdi, e continua me guiando até aqui, uma estrela
muito brilhante para ignorar, não importa o quanto eu me
desvie.

Não há mais força na vida do que o propósito de um


homem. Por tantos anos, eu pensei que a minha era algo mais
– até que ela me mostrou a verdade. Sempre me considerei um
passageiro solitário até que ela abriu caminho em meu rumo
como minha adversária, minha amante, professora, confidente
e melhor amiga.

Qualquer quantia significativa de todos os dias que passei


na Terra sempre será por ela.

Se eu tivesse conseguido jogar fora meu propósito, se


tivesse sucesso na autossabotagem, não saberia que existia
um sentimento tão pleno. Jamais teria encontrado tal paz
dentro de mim. O pânico já teria tomado conta de mim há
muito tempo e me deixaria doente ao ponto de não ter retorno.

No minuto em que eu atravessar a porta desta casa,


nunca mais olharei para trás para a crueldade do caminho ou
para quantos passos dei sozinho. Ao invés disso, vou apreciar
cada curva da viagem, exceto um único golpe impiedoso, que
nunca conseguirei me livrar dele. Nunca. Uma perda tão
dolorosa, que nunca haverá um dia em que não doerá.

Meu irmão.

Seu salvador.

Uma cicatriz irreversível que nunca cicatrizará


completamente e prova das minhas exaustivas jornadas. Estou
na metade do caminho em direção ao topo do penhasco quando
meu telefone estremece no meu bolso.

Lady Bird está no ninho.

Entretanto, eu já a senti por perto. Do alto, ouço-a gritar


meu nome enquanto ela corre pela casa; o pânico claro e a
emoção em sua voz quando começo a subir as escadas dois
degraus de cada vez, com o coração disparado.

— Ouvi você, Mon Tesor, — respondo, apressando meus


passos, batendo no peito, a delicada oferenda em segurança
em minha mão. Eu a ouvirei sempre.

Já engasgado de emoção, aceno com a cabeça aos dois


Corvos de guarda na parte de trás da propriedade enquanto
passo e entro pela porta dos fundos. Beau me cumprimenta
com seu típico aceno antes de permitir que eu esfregue meus
dedos em seus ouvidos. Aprendi a tolerá-lo com o tempo,
apesar do fato de que ele ainda é ridiculamente territorial em
relação à nossa mulher.
— Bonjour, seu filho da puta ganancioso.

De todo o planejamento que fiz em minha vida, esta é a


ideia que mais tenho obcecado em realizar. Mas se Beau está
aqui, isso significa que ela não só recebeu minha mensagem,
mas entendeu claramente o duplo sentido.

Encontre-me no fim do caminho.

Embora eu nunca tenha colocado os pés nesta casa e me


tenha recusado a vir sem ela, presto pouca atenção enquanto
passo pelo corrimão das escadas de ferro forjado, sabendo
exatamente onde vou encontrá-la. Sonhei este sonho mil vezes
ao longo dos anos, e tanto meu coração quanto minha cabeça
conhecem o caminho.

Uma brisa leve me guia pelo longo percurso, com estilo


espanhol, passando pelas paredes de caramelo com textura de
areia. A casa tem apenas alguns cômodos comparada a uma
mansão, mas adequada o suficiente para uma rainha.

Os detalhes que absorvo ao passar são poucos porque


meu único foco é muito mais atraente. Não há nada além de
fogo e necessidade em meu peito turbulento, que está batendo
tão forte como da última vez que vim até ela com um pedido.
Então, fiquei apavorado. Aterrorizado que ela se recusasse me
aceitar novamente. Aterrorizado, pois ela acreditava nas
minhas mentiras. Aterrorizado que eu acreditasse nelas por
tanto tempo, que me convenci de que elas eram verdadeiras.
Há doze anos, eu a forcei a sair de minha vida. Ao fazer
isso, perdi a mim mesmo, meu propósito, meu sentido e minha
mente.

Mais da metade daqueles anos que passei sem ela foram


devido ao medo, à culpa e à autocondenação.

Hoje, venho a ela um homem mudado por causa dos anos


que perdemos e por causa dos anos que nos trouxeram até
aqui. Ela pode não ter acreditado em minhas mentiras, mas eu
sempre acreditei em suas verdades, em seu amor, na certeza
de seu coração.

Porque ela me salvou.

Ganhar a ela e seu coração tem sido minha maior


conquista, fazendo dela meu bem mais precioso.

Um tesouro que qualquer ladrão digno tentará roubar.

Um tesouro que muitos tentaram roubar e falharam.


Porque eu me certifiquei disso. Antes, eu nunca teria me
vangloriado de tal façanha de conquistá-la por causa do custo.
Antes, a culpa tornava impossível fazer tais declarações.

Antes...era muito doloroso.

Eu era egoísta na época, como sou agora com ela, sem


muitas desculpas, porque a necessidade supera a culpa –
principalmente.

Depois de quarenta e três anos de vida, tenho certeza de


que ela é a única coisa sem a qual não posso viver.
E nos próximos quarenta e três, eu nunca mais amarei
outra.

Ela já amou muitos. Essa é a natureza de quem ela é. Foi


o que a criou, mas eu tenho sido ganancioso com meu coração,
e ela tem um só dono. Nada se compara, ou poderia se
comparar, com o que provoca dentro de mim.

Meu egoísmo, minhas ambições, meu ciúme e minha


ganância quase me custaram meu futuro, me custaram ela.

Desde que ela me aceitou de volta, passei cada minuto do


nosso tempo juntos pagando penitência enquanto apostava
meu tempo para este dia.

A sentença foi cumprida.

Meu tempo acabou, e eu sou oficialmente um homem


livre.

É exatamente por isso que tenho que encontrá-la. Porra.


Agora.

Esse desejo ardente, juntamente com a dor no meu peito,


levou-me a apressar em direção a ela como o Beau se pavoneia
ao meu lado, determinado a ser o primeiro a buscar seu afeto.

— Foda-se, vira-lata, ela é minha pelo resto da noite.

Beau continua avançando ao meu lado, ignorando minha


ordem. Demorou mais de um mês para trazê-lo aqui e outras
seis semanas em quarentena para levá-lo para casa. Agora
parece que ele já reivindicou sua posição como líder.
— Vá. Agora. Ou nunca vou cozinhar outro bife para você.

Seus ouvidos se animam como se estivesse ciente das


implicações da minha ameaça, e ele para quando eu faço isso,
circulando aos meus pés. Estalando meus dedos, ele me
devolve o olhar, sem nenhuma dificuldade, antes de se
pavonear.

Idiota.

Quando chego ao meu destino, encontro-a exatamente


onde pensei que ela estaria, empoleirada na varanda, seus
longos cabelos soprados pela brisa emaranhados em torno de
seu rosto. Suas mãos estavam espalmadas na saliência de
argila grossa enquanto ela olhava para o mar cintilante. Ela
está vestida de branco, o material sedoso mergulhando baixo
em um V em suas costas, expondo cada centímetro de sua
coluna. Sua pele dourada por causa do sol, mas é a visão das
asas delicadas ao longo de seus ombros que me deixa duro.
Meus olhos sedentos a absorvem com uma mistura de desejo
e alívio.

Trazê-la aqui foi o passo final de muitos.

Espero que ela reconheça que estou perto e, a um


segundo de mim, de pé à porta, vejo-a inquieta em
reconhecimento. Olhos furiosos, lacrimejantes e azuis escuros
encontram os meus à medida que eu a acolho, a emoção
entupindo minha garganta.
Chegamos tão longe desde aquele dia no estacionamento
na Virgínia, onde tudo que eu tinha, literalmente, era a camisa
nas costas, um pedido de desculpas que nunca seria
suficiente, e a luta que ela provocou em mim para conquistá-
la, para mantê-la, para recuperar o que eu roubei todos
aqueles anos atrás.

E nós chegamos até aqui.

Por isso. Porra. Chegamos tão longe.

De lá para cá parece que foi há uma vida inteira.

Em certo sentido, tenho estado esperando... mas a partir


deste momento, acabou.

Em questão de segundos, eu terei feito tudo o que me


propus a fazer. Mas é o primeiro dia da minha sentença que
me vem à mente quando eu arrombo a porta e clamo para ela.
No piscar dos segundos que leva para chegar até ela, eu revivo
tudo isso.
“Nunca fui realmente louco, exceto nas ocasiões em que meu
coração foi tocado”.

– Edgar Allan Poe


Trinta e sete anos

Inferno, primeiro dia.

O peso repentino em meu peito agita minha consciência


um segundo antes de uma respiração quente e pútrida atingir
meu rosto. Abrindo meus olhos, sou recebido pela sombra
inconfundível de um maldito demônio de quatro patas.

O cão raivoso fica orgulhosamente em meu peito


enquanto a saliva induzida pelo rosnado me bate no queixo e
seu latido que soa em meus ouvidos.

— Psychopathe. — Psicopata.

Resmungo, afastando o buldogue francês enlouquecido,


cujo uivo só aumenta à medida que eu o desperto e luto com
ele. Ele não pesa muito, mas seu latido indica que tem uma
autoimagem incrível.

O filho da puta não parou de rosnar para mim desde que


entrei pela porta da frente ontem, o que Cecelia achou muito
divertido.
Eu não.

Levantando-me para sentar no quarto escuro, coloco a


palma da mão no espaço vazio ao meu lado na cama. Beau,
um homônimo que eu realmente queria que ela não tivesse
desperdiçado com um cachorro, estala sua mandíbula onde ela
dormia ao meu lado apenas algumas horas antes, sentado
sobre suas patas, latindo, para ter certeza de que eu o odeio.

E poucas horas depois de nossa apresentação, decido que


sim.

Tenso devido ao seu desaparecimento, olho pela janela


para ver que ainda está escuro, escuro da meia-noite.

Corro a mão por meu rosto, a apreensão se esgueirando.

Apareci depois de oito meses, prometi a ela o mundo,


explicações, café da manhã e jurei merecê-la. Em vez disso, fiz
um breve tour pela casa antes de tomar um banho e desmaiar.
Não me lembro de muito depois do alívio de passar pela porta,
misturado com o vapor quente me relaxando a um ponto que
não conseguia alcançar há anos.

E depois de todas as promessas que fiz, deixei de cumprir


cada uma delas apenas uma hora depois de tê-las proferido –
devido à exaustão. Com a adrenalina acabada, caí com força.

Que porra é essa, Tobias?

Tirando as cobertas, visto as roupas com que cheguei e


calço as botas.
Procurando no quarto por um relógio, localizo um
pequeno que parece antigo – ouro maciço com sinos no topo –
em cima de uma das suas estantes de livros e consigo ver a
hora.

Quatro da manhã

O registro da hora marca meu primeiro dia de inferno.

Não só isso, tenho quase certeza de que ela está


enlouquecendo.

Merde. Merda.

Esperava dormir a noite toda, mas eu sabia melhor. O jet


lag de uma viagem de 36 horas, desmaiei antes de termos uma
conversa de verdade, fiquei praticamente em coma até
conseguir dar a ela uma única explicação do que me manteve
afastado. Em resumo, lembro-me que ela vestiu um pijama de
flanela enquanto eu me desfazia de uma toalha. Lembro-me
deste detalhe porque achei divertido que ela se esforçasse tanto
para garantir que eu soubesse que ela não me recompensaria
por voltar – com seu corpo. Isso não a impediu de foder-me
com os olhos quando pensou que eu não estava olhando.

Tenho certeza de que ela geralmente acorda cedo para


abrir seu café, mas ainda é muito cedo para que ela tenha
dormido o suficiente. Mas eu dormi como uma pedra naquelas
horas, melhor do que dormi em anos porque estava na sua
cama. Sei que ela não descansou pelo mesmo motivo.
Por minha causa e por conta do meu grande retorno à sua
vida.

Posso ter enfiado o pé na porta, mas ela ainda está com a


mão na maçaneta, pronta para bater na minha cara se eu
estragar tudo. E estou tendo um começo incrível.

Gemo de frustração enquanto Beau continua a latir para


mim no que parece ser uma declaração canina de guerra
territorial até que finalmente grito de volta.

— Putain, tais-toi! — Cale a boca! Imediatamente, Beau


fica em silêncio, cabeça inclinada, olhos negros como contas
questionando a autoridade em meu tom.

— Couché. — Abaixe-se. Beau obedece sem problemas.


Ele tem os comandos simples bem definidos. Comandos que
ele entende claramente, em francês.

O cachorro de orelhas pontudas salta em volta dos meus


calcanhares enquanto meus olhos se adaptam à escuridão.
Embora esteja ansioso para chegar até ela – onde quer que
esteja – não posso deixar de olhar ao redor de seu quarto por
curiosidade. Este quarto muito diferente daquele em que nos
conhecemos. O quarto na casa de seu pai onde a manipulei,
fodi, danifiquei antes de começar a adorá-la, amá-la.

Ela disse que sua casa não era grande, mas cada parte
do espaço foi tocada de alguma forma pela cor, inspiração, ou
por algum tipo de conforto.
É como se tivesse projetado cuidadosamente todos os
cômodos desta casa, tanto como um santuário quanto como
uma prova de sua evolução. Posso ver, todas as peças sutis
dela nesta casa, na arte, em suas escolhas.

Ligando uma lâmpada de leitura colorida de mosaico em


sua mesa adaptada, folheio alguns livros de capa dura que ela
ainda não guardou e olho alguns de seus recados a mão ao
lado de uma pilha de contas, uma delas uma lista de tarefas
pendentes.

Organize uma campanha de alimentos para o Dia de


Ação de Graças. (Dê uma passada na casa de Meggie)

Junte-se à Câmara de Comércio.

Faça uma aula de culinária?

Yoga?

Noite das meninas com a Marissa?

Clube do Livro?

Entreter o Sr. Bonito?

Controlo uma onda de fogo que ameaça e decido não


começar nossa conversa matinal com 'Quem diabos é o Sr.
Bonito?'

Tudo na minha situação delicada tem me feito afastar


meus instintos naturais para dominar, para que eu possa fazer
as pazes com ela antes de declarar qualquer tipo de guerra
territorial. E por guerra, quero dizer a verdadeira batalha para
garantir que faremos tudo o que for possível para recuperar o
que estávamos sob as ruínas da nossa anterior.

Perturbado com o que descobri, eu me dirijo para a


cozinha em busca dela. Quando a encontro vazia, meu mal-
estar começa, mas não posso deixar de sorrir ao ver a imprensa
francesa sentada no balcão. E é aí que meu peito começa a
doer devido à faca de dois gumes que é a minha situação.

Posso estar aqui, com ela, mas não da maneira que eu


quero estar.

A paciência é crucial para ganhá-la de volta, mas também


o meu calcanhar de Aquiles.

Já faz muito tempo que não estamos verdadeiramente


juntos. Anos impiedosos desde o último dia em que estivemos
envolvidos um no outro enquanto confessávamos nosso amor
no quintal de Roman antes de sermos dilacerados pelas piores
circunstâncias. Algumas das quais eu mesmo criei.

Daquele ponto, anos atrás, até este, junto com todos os


obstáculos que enfrentei nos últimos oito meses, todos os
obstáculos que lutei para chegar aqui, até este ponto, através
de sua porta, sinto justificado.

Porém mesmo com ela por perto, ela não está comigo.
Ainda não.

A dúvida surge quando olho em volta da cozinha em


busca de algum lugar óbvio para um recado e não encontro
nada. Só por instinto, sei que ela não está dentro de casa.
Abrindo a porta dos fundos para Beau, uma rajada de vento
frio bate em meu rosto quando o pânico começa a se instalar.

Ela foi embora?

O suor se acumula na minha testa enquanto encaro seu


vira-lata com complexo de Napoleão enquanto ele deixa cair
seu xixi matinal, o tempo todo rosnando para mim. É claro que
teremos problemas, mas o maior faz latejar minhas têmporas.

Eu poderia culpá-la se ela fosse embora?

Ontem foi um grande passo, mas quando a sensação do


meu aparecimento repentino foi passando e a realidade se
instalou, podia sentir que ela se distanciava para se proteger.

Monitorando Beau da varanda, assopro em minhas mãos.


Com a passagem do verão, uma onda de frio parece ter chegado
durante a noite, assim como eu, sem aviso prévio. O frio do
outono se infiltra em meus ossos quando saio da varanda e
vou para o quintal, aliviado quando a vejo. Ela está curvada
sobre seu jardim, uma luz iluminando onde ela trabalha com
nada além de seu pijama de flanela e botas pretas.

O desejo de tocá-la, saboreá-la, fodê-la, reivindicá-la,


vibra no meu peito – uma demanda baixa que me recuso a
receber, embora esteja doendo por toda parte, e sei que ela
sente a mesma necessidade.

É quem nós somos.


Conosco, olhar é amor, lutar é amor, foder é amor e,
mesmo agora, enquanto nos confundimos com nossos medos
coletivos, mas distintamente diferentes, é amor.

Um fato que ela se recusou a me deixar negar. Um fato


que passei a abraçar. O combustível de que preciso para a luta
que estou prestes a enfrentar.

Não importa como viemos a ser, éramos e ainda somos.


Você roubou meu coração e me deixou amá-lo e garantiu que eu
soubesse onde ficava seu lar.

Preciso acreditar. Tenho que acreditar. Suas palavras são


minha força motriz. Podem ter se passado oito meses, mas a
jornada para voltar para ela pareceu uma eternidade.

Tudo entre nós sempre se resumiu ao amor, como ela


apontou com tanta ousadia, até que não tive escolha a não ser
encarar isso totalmente e me entregar à verdade.

A verdade é que a amo tanto, que não suporto a ideia de


deixar isso se arrastar mais um dia – porra, mais uma hora.
Mas vou. Para ela, vou encontrar paciência.

E minhas demandas serão poucas.

No caminho para casa, ela olhou para mim como um


estranho que ela estava tentando entender, com a postura
cautelosa. É a mesma postura rígida que está exibindo agora,
enquanto apunhala a terra com uma pequena pá. Ela está na
defensiva.
Quando me aproximo, sei que é apenas uma questão de
tempo antes que sinta que estou perto. Ela sempre fez isso,
assim como eu.

Beau, o fodido ganancioso, chega a ela primeiro.

— Oi, bebê, — ela murmura para o cachorro, com a voz


rouca, enquanto tira uma luva de jardinagem suja para passar
os dedos nas costas dele. Não se preocupando em olhar na
minha direção quando fala. — Ele te acordou?

— Não importa. Está congelando aqui fora. Vou pegar um


casaco para você.

— Estou bem. — Ela desliza a luva de volta e continua


seu trabalho, jogando um pedaço de terra para o lado antes de
pegar um recipiente.

— Teve um sonho? — Pergunto, sabendo que é o que está


incomodando-a.

— Não é sempre assim? — Responde em um tom mordaz.

Ajoelho-me ao seu lado enquanto continua a apunhalar a


terra.

— Precisa de ajuda?

— Não. Está tudo tranquilo.

— Converse comigo, — insisto, estudando seu perfil na


luz amarela.
Ela cava e esfaqueia – assim como seu silêncio – e não
faço nada para impedi-la. Está nervosa, magoada ou ambos, e
isso é a última coisa que eu quero.

Dia um, Tobias.

— Converse comigo, Cecelia.

— Talvez eu não queira. — Sua resposta é baixa, tão baixa


que não tenho certeza se ela queria que eu ouvisse. Mas não
me preocupo em me proteger. Ela já ganhou. Hoje não é dia de
briga. É um dia para se render. Senti muito sua falta. Com o
passar dos anos e com o passar dos meses, às vezes me
perguntava se imaginava parte da minha necessidade, meu
afeto por ela. Essa teoria foi destruída no minuto em que entrei
na sala de reuniões para enfrentá-la após anos de separação.
Foi apenas mais uma mentira que disse a mim mesmo nos dias
e meses depois de mandá-la embora. Tentar raciocinar com
amor é inútil. Não se preocupa com suas razões, certas ou
erradas. O amor não tem consideração pelas circunstâncias,
nem dá a mínima para o estado em que você se encontra. É
uma emoção implacável e que nunca vai deixar você mentir
para si mesmo.

Fixado em seu perfil, na necessidade desesperada de um


olhar seu, sento-me nos saltos de minhas botas, preparando-
me para a primeira batalha de muitas.

— Por que agora? — Ela pergunta, pegando uma planta


do recipiente e colocando-a no solo que a espera. — Esperou
até que eu estivesse estabelecida em minha nova vida. Uma
nova vida que não inclui você. Isso não condiz com sua
personalidade. Por quê?

— Tive que... — exalo um suspiro cansado quando ela me


olha de soslaio. — Não importa o que eu diga agora, vai soar
como uma desculpa, mas tenho motivos, muitos deles. E vou
dar todos eles a você.

Ela imobiliza brevemente os dedos que pressionam a terra


ao redor da planta.

— Estou ouvindo.

— Lamento ter adormecido. Essa é a última coisa que eu


queria fazer. Estou com jet lag.

Ela não se incomoda em perguntar onde eu estava. Está


muito acostumada a não saber. Ou pior, não liga.

— Eu estava em Dubai a negócios da Exodus. Acabamos


de adquirir uma empresa. Foi minha última tarefa como CEO
interino antes de Shelly assumir. Não durmo há dias. Quando
terminei as coisas, vim direto para você e...

— Direto para mim? — Ela zomba. — Sabe, você está


certo, Tobias, qualquer coisa que disser agora soará como uma
desculpa. Você provavelmente deveria voltar a dormir.

— Deixe-me explicar.

— Não sei se quero suas explicações agora.


— Bem, você as merece, e está muito frio aqui. Vamos
entrar e conversar.

Ela ignora meu pedido e continua sua tarefa como se não


tivesse me ouvido.

— Não vou embora, — sussurro baixinho, sabendo que


não estou chegando a lugar nenhum. Ela não quer me ouvir,
não agora. Levanto-me e faço o oposto dessa declaração,
entrando na casa e voltando para o quarto dela. Pego um
moletom de sua cômoda e volto para fora enquanto ela esvazia
outro recipiente. Olhando para mim enquanto empurro o
moletom grosso para ela.

— Estou bem.

— Cecelia, está congelando.

Ela se levanta, tira as luvas e puxa o moletom das minhas


mãos antes de puxá-lo para baixo sobre sua cabeça, o logotipo
da universidade um lembrete gritante de que senti sua falta
durante quatro anos de faculdade e nos verões que ela passou
na França entre eles nos anos seguintes. Um lembrete doloroso
que ela experimentou muito viver sem mim. Mesmo com um
relatório diário sobre seu bem-estar e o que eu poderia engolir
em sua vida pessoal, não conheço a maioria dos detalhes
íntimos. Não poderia lidar com conhecê-los, embora tenha
ficado muito curioso mais de uma vez e bebido até ficar
estúpido, atrasando meu progresso. Ela está na minha frente
agora, olhos cautelosos e, mesmo assim, é um raio em minhas
veias estar tão perto. Nossa atração tangível, uma pulsação
constante vibrando entre nós desde o dia em que nos
conhecemos. Mesmo na luz amarela turva, posso ver as sardas
leves em seu nariz. Ela é a perfeição simétrica, desde o formato
de seu rosto até a pequena saliência em seu queixo. Me movo
para alcançá-la e ela se afasta.

Ela já está oscilando com força, e eu sinto cada golpe.


Empurrando minhas mãos em meu jeans, pego uma pedra
solta que beira seu jardim de volta ao lugar com minha bota.

— Qual foi o sonho?

Ela morde o lábio, levantando seu olhar distante quando


fala.

— Acho que se fosse em Freud, a interpretação seria que


eu realmente não sei quem você é. — Ela reassume seu lugar
de joelhos. — Não sei qual é a sua marca de pasta de dente.

— Essa é uma solução fácil. O que mais aconteceu?

— Não me lembro.

— Você está mentindo. Estou disposto a apostar que você


está aqui fora por causa desse sonho. Porque eu te conheço.

Ela solta uma respiração ofegante.

— Preciso terminar isso.

— Chama-se multitarefa, — novamente me ajoelho e a


empurro para o lado para compartilhar a área de trabalho.
Pego outra pá da caixa de ferramentas de madeira antiquada
que está no chão atrás de nós.

— É cedo, você está cansado e não preciso da sua ajuda.

— Nós vamos ficar juntos. Hoje, amanhã e depois de


amanhã, Cecelia.

— Apenas...afaste-se, Tobias. — O tremor em sua voz me


diz tudo o que preciso saber enquanto ela se levanta e caminha
até um grande saco de terra para vasos antes de arrastá-lo em
minha direção. Não ajudo porque tenho quase certeza de que
ela vai me apunhalar com sua pá se eu tentar me aproximar.

Ela está zangada. Já esperava por isso, mas dói do


mesmo jeito. Ontem mesmo, havia forçado minha entrada em
seu espaço, como fiz quando estivemos juntos, e não quero
mais que isso aconteça, mas o impulso é forte.

Ela abaixa a cabeça como se sentisse o conflito em mim,


embora eu não tenha vacilado.

— Não quero brigar, Tobias.

— Desde quando você tem tanto medo do confronto?

— Não estou com medo. — Ela rasga o plástico grosso


facilmente, uma jardineira muito, muito zangada. — Só não
tenho nada a dizer para você agora.

— Com quantas mentiras vamos começar?

Seus olhos azuis escuros congelaram.


— Eu fiz uma vida aqui. Por mais temporário que seja,
não vou deixar isso por você. De novo não.

— Bem, posso ver por quê. Você está no caminho certo


para uma vida emocionante. Yoga? Câmara de Comércio? —
Coloco minhas mãos na minha lateral. Este é um argumento
para uma época diferente.

— Claro, você foi bisbilhotar. Não é típico de você entrar


e invadir minha privacidade depois de anos separados?

— Você sabia por quem estava se apaixonando.

— Não significa que eu queria.

— Tempo e separação não importam quando se trata de


nós. Isso está claro agora.

— Mas importa. Importa, sim. Para mim é importante. Eu


sei que concordei em tentar, mas o que exatamente você está
pensando que vai acontecer? Que vou simplesmente ceder,
sem fazer perguntas, pernas abertas, coração aberto? Não sou
mais aquela garota, Tobias, e também não sou mais aquela
mulher.

— É de você que estamos falando, então eu conheço,


caralho. Se você não fosse mais capaz de ser essa mulher,
aquela que perdoa e ama como só você pode, eu não teria
dormido em sua cama ontem à noite. Quanto aos planos, não
sei porque ainda não conversamos da maneira que
precisamos, ou fizemos um único plano, juntos. Agora estamos
conversando. Qual. Foi. A. Porra. Do sonho?
— O que mais poderia ser?

— Não vou deixar você. Nem hoje, nem amanhã, nem


depois de amanhã. O inferno vai congelar. Antes disso, comerei
um McRib2.

Coisa errada a dizer.

— Você acha isso engraçado? — Ela olha para mim,


coberta de terra, seus olhos cintilando de raiva reluzente.

— Acho que o senso de humor pode tornar isso muito


menos sangrento, mas fica claro pela expressão em seu rosto
que você não compartilha dessa opinião.

— Você morou com ela. — A admissão é quase um


sussurro.

— Você sonhou com Alicia?

— Ela conhecia você. Você a deixou conhecê-lo. Ela


conhecia a sua marca de pasta de dente. Ela provavelmente
escolhia a porra das suas gravatas pela manhã. Coisas que
você deixou que ela conhecesse.

— Não, — balanço minha cabeça, odiando a direção que


isso está tomando, — não faça isso.

— Você me jogou fora, mas morou com ela. Nem cheguei


a ver onde você morava.

2McRib é um sanduíche de carne de porco com sabor de churrasco vendido periodicamente pela
rede internacional de restaurantes de fast food McDonald's.
— Sim, você viu. Você viu o único lugar que considerei
um lar. A merda que minha tia possuía na periferia da cidade.
Essa foi a única casa que conheci em Triple Falls. O resto eram
apenas lugares para descansar minha cabeça entre as viagens
de negócios. Não tive uma casa de verdade desde que meus
pais morreram e não morava com ela.

— Ela fez parecer que vocês moravam.

— E deixei você pensar isso.

— Claro, você fez, — ela deixa escapar uma risada


exasperada.

Não consigo evitar a amargura em meu tom. — Telhado


de vidro, Cecelia. Preciso lembrá-la que você estava usando a
porra de uma aliança de noivado de dois quilates quando
voltou para à Triple depois de deixar seu noivo que morava com
você? Ou ele foi um complemento?

Calma, Tobias. Porra, calma.

Fecho meus olhos, temendo ver a evidência desse


comentário incisivo.

— Como você se atreve, — ela resmunga, sua voz quase


inaudível. — Então, é minha culpa? Eu tive que seguir em
frente. Não é como se você tivesse me dado uma escolha.

— Eu sei, — engulo. — Sinto muito. Isso era o ciúme


falando. Pergunte-me qualquer coisa.

Ela desvia o olhar, e seu silêncio só faz a dor aumentar.


— Temos que conversar sobre isso. Já perdemos muito
tempo.

— Nós?

— Tudo bem, eu. Merde! — Cerro meus punhos. — Se


você quer jogar o jogo da culpa, eu levo tudo, tudo, ok? Quanto
aos locais de moradia, eu...nós, temos um apartamento em
Charlotte, uma casa em Paris, um apartamento na Espanha,
e uma cabana na Alemanha.

— Você e Alicia?

— Você está falando sério? Nós, você e eu. Ela nunca foi
meu futuro, Cecelia.

Ela parece refletir sobre isso.

— E a meta?

Eu concordo. — Ainda lá. Não coloquei os pés nela. E você


e eu praticamente morávamos na casa de Roman juntos.

— Não é o mesmo. E isso tudo era uma ilusão de qualquer


maneira, não era?

— Não, não foi. Mas o que você teve foi apenas um sonho.
Eu sei que eles parecem reais para você, mas foi apenas um
sonho.

— Ou um aviso que eu deveria levar a sério.

Uma facada. Eu a sinto em todos os lugares. Mas vou


deixá-la lutar desta vez e mais mil outras.
— Não ficamos juntos por muito tempo, — ofereço e me
encolho quando vejo que isso contribui para ajudar.

— Tampouco estivemos, se estamos contando pontos e se


namoro é como você quer chamar isso.

— O que fizemos não foi namorar, não subestime o que


nos trouxe de volta a este ponto. Nós nos apaixonamos, e isso
nos devastou e a todos ao nosso redor a ponto de destruirmos
vidas, incluindo a nossa. A culpa é minha. Mas aqui estamos
nós, e ainda apaixonados, ainda mais agora porque somos
sábios o suficiente para saber o que perdemos. Não vai
demorar um dia para superar as coisas que eu disse e fiz, as
mentiras que contei ou a merda que teremos que superar. Mas
estou assumindo minha parte, do jeito que você me pediu, do
jeito que você precisa que eu faça, do jeito que eu preciso. E
tudo que espero é que me pergunte o que você precisa, para
que eu possa confessar e não percamos mais tempo.

Ela se senta sobre os calcanhares e abaixa o olhar. —


Bem. Então comece com o que você prometeu. A verdade. Por
que você voltou agora?

— Muito disso tem a ver com a execução dos planos que


coloquei em ação há mais de vinte anos, especialmente a
posição de Tyler na Casa Branca. Nunca esperei que
demorasse tanto, e quanto mais demorou, mais eu tinha
certeza de que precisava tirar tudo o que tinha para fazer isso
direito. Tive que vetar muito os poucos em quem confiava para
assumir o controle com Sean, para que você e eu
pudéssemos... — gemo de frustração. — A última coisa que eu
queria fazer era vir atrás de você, virar-me e ir embora
enquanto estávamos nos organizando... — a raiva surge no
inferno que passei depois que ela saiu. — E você desapareceu
por sete semanas antes de eu te encontrar.

— Eu tinha todos os motivos para isso.

— Por sete semanas, saí dos trilhos porque você não


deixou rastros, — cerro meus punhos em minhas coxas em
uma tentativa de moderar minha raiva. — Você se certificou
disso.

— Dinheiro, — ela fornece. — É um longo caminho, como


você bem sabe. É por isso que esta casa e a lanchonete
pertencem legalmente à minha mãe. — Ela interrompe sua
busca. — Talvez eu não queria ser encontrada.

— Eu estava perdendo a porra da minha cabeça de


preocupação.

— Eu não era mais sua para se preocupar. Você se


certificou disso.

— Você sempre foi minha. Estou de olho em você desde


os onze anos de idade, Cecelia, não importa o que eu sentia
por você. Talvez eu merecesse essas semanas infernais, mas
nunca haverá um momento em sua vida em que não esteve sob
minha proteção. Eu falhei com você uma vez e farei tudo ao
meu alcance para não falhar novamente. Acredite em mim,
quando cheguei ontem, fiz todos os esforços para que você não
tivesse ninguém além de mim voltando para você.
Seu rosto empalidece. — O que isso deveria significar?

— Exatamente o que você acha que significa. Outra razão


pela qual levei tanto tempo para chegar até você. Além de
colocar cem coisas em andamento para que eu pudesse estar
aqui, eu tinha corpos para encontrar e enterrar. — Meu único
foco sendo o velho sócio de Roman, o filho da puta que enviou
a Miami, transformando o confronto em um banho de sangue.

Sua boca se abre enquanto seus olhos se arregalam,


incrédulos. — Jerry? Você foi atrás dele?

Aceno e não perco seu estremecimento.

— Tobias, o que você fez?

— Me certifiquei de que ele nunca seria uma ameaça para


você novamente.

— Você disse que confiava em mim.

— Confio. Eu não confiava nele. Ele é tão corrupto quanto


parece. A retaliação estava em andamento. Eu vi por mim
mesmo. Estava rastreando seus e-mails e ligações. Ele sempre
foi uma ameaça para você. Se eu tivesse conseguido controlar
as coisas quando deveria... — limpo minha garganta para me
impedir, — teria cuidado dele muito mais cedo.

Ela vira olhos implorantes para mim.

— O que você quer dizer?

Ainda não. Ainda não chegamos, Tobias. Uma coisa de


cada vez.

— Conseguir uma confissão antes de enterrá-lo. Foi ele


quem me mandou a Miami. Você quer os detalhes?

Ela engole e desvia os olhos. — Não.

— Você nunca mais vai desaparecer por mim. — Seu


olhar está a um milhão de quilômetros de distância antes de
finalmente voar de volta para mim, o preço da primeira de
minhas confissões pesando em seus olhos.

Nivelo minha voz, com a intenção de que através de sua


raiva, ela me ouça. Ela sabe no que se meteu, caso a situação
se apresentasse.

— Vou matar qualquer um que te ameaçar. Qualquer um.


Vou acabar com eles, Cecelia. Não vou pensar duas vezes e não
vou perder o sono por causa disso.

Ela morde o lábio, arrastando seu olhar sobre o meu


corpo antes de voltar sua atenção para seu canteiro de flores.
Agacho-me ao seu lado enquanto o vento levanta alguns fios
de cabelo soltos de seu ombro e afasto o resto de seu rosto.
— Isso te assusta?

— Não.

— Isso é porque você sabe quem sou. Não somos


estranhos, Cecelia. Longe disso.

Ela não discute isso. — Mesmo assim, você já deveria


saber. Não me dou bem com ordens.

— Sobre isso, eu não dou a mínima. Puna-me, mas nunca


assim. Não fuja da minha proteção. Vou fazer você me
prometer isso um dia e guardá-lo para uma luta diferente que
acontecerá mais cedo ou mais tarde. Não posso arriscar... —
resisto à vontade de arrancá-la do chão, colocar algum sentido
em sua cabeça e exigir que ela faça a promessa agora, mas eu
a conheço. É minha necessidade egoísta, minhas próprias
emoções que exigem isso. Além disso, ela nunca será
domesticada. É parte da minha atração por ela, mesmo que me
assuste muito.

Um segundo de silêncio passa. — Como você me


encontrou?

— Sean. Ele sabia onde você estava o tempo todo. Depois


de esgotar todos os recursos, finalmente fui até ele para pedir
ajuda. Ele estava me esperando.

Vejo no segundo que ela junta tudo. — Há um dispositivo


de rastreamento no Camaro.
— Ele instalou antes de dar de presente a você. E a seguiu
e colocou dois Corvos permanentes em você no minuto que
pousou aqui. Ele sabia que eu estava perdendo a cabeça, mas
queria ter certeza de que eu tinha conseguido acordar. Cansei
de suas besteiras quando solicitei ajuda, e o bastardo
presunçoso finalmente me livrou do meu sofrimento quando
lhe contei o meu plano.

— Que era?

— Você.

Ela estremece em seu moletom.

— Vamos entrar e conversar. Seus lábios estão ficando


azuis.

— Estou bem. — Grunhe, limpando a sujeira solta de


suas luvas. — Bastardos, mesmo quando eu cumpri suas
ordens e guardei seus segredos, vocês nunca acreditaram que
eu poderia cuidar de mim mesma.

— Ele foi sincero sobre o presente, Cecelia. Dom gostaria


que você o tivesse, mas não importa como isso funcione entre
nós, sempre iremos protegê-la. Sempre. Isso não é contestável.

— Sim? Bem, quem vai me proteger de você?

Gancho direito.

— Você não precisa disso. Estou à sua mercê.

— Até quando?
Ainda agachado ao seu lado, coloco o polegar sob seu
queixo e viro sua cabeça na minha direção. — Estou nisso,
Cecelia. Eu daria tudo para voltar, e mudar as coisas que fiz.
Ser o homem que você precisava que eu fosse, mas nunca foi
tão simples quanto ceder ao que sinto por você. E não é mais
fácil agora. Depois do que aconteceu, depois de tudo que você
passou, tive que permitir a você a chance de uma vida normal,
de escapar desta. — Sua carranca é profunda quando ergo seu
queixo. — E depois de anos longe, você começou uma vida
diferente. Propositalmente, mesmo com a desculpa da morte
de seu pai para voltar, não voltou para Triple Falls. Foi para a
faculdade, se formou e estava noiva de outro homem. Tinha
uma aliança em seu dedo. Quando você voltou, estava
vendendo a empresa. Estava se livrando de todos os laços, de
Triple Falls e de mim. Tive que respeitar sua decisão. Você
estava prosperando. Pelo menos foi o que pensei, no início.

— E depois?

— Expliquei isso para você. Foi uma culminação de


razões, uma em particular, e vou te contar tudo, mas, —
balancei minha cabeça, — preciso de tempo para isso. Não
muito, mas juro que vou te contar.

— Você não acha que posso lidar com isso?

— Acho que você pode lidar com qualquer coisa, — digo


honestamente. — É muito para resolver agora. Você não
dormiu. Duvido que tenha comido.
Ela se levanta e limpa o pijama dos detritos, e dou um
passo à frente, mas ela dá um passo para trás, sacudindo a
cabeça.

— Não faça isso.

— Por quê? Porque você sabe exatamente como vai acabar


quando me deixar tocá-la?

— Amor e sexo não resolvem nada, lembra?

Corro minha mão pelo meu cabelo, e ela cruza os braços,


a satisfação clara em seus olhos. Está totalmente esperando
que eu desista em algum momento. É o oposto de progresso, e
ela dá voz a isso.

— Desistindo já?

— Pare com isso, — rebato. — Foi apenas um sonho.


Nada do que eu confessei para você ontem fez diferença?

— Sim e não, você apenas... — ela esfrega a mão sobre o


nariz vermelho, — você não pertence a este lugar.

— Onde você me imagina?

— Nem trouxe uma maldita mala! — Ela coloca as mãos


nos quadris. — Onde você mora agora? Onde estão seus
pertences, Tobias?

— Embalados em um caminhão com um motorista


esperando minha decisão. Mais da metade do meu guarda-
roupa são ternos que não pretendo usar tão cedo. Eu moro
aqui. Onde você estiver é minha casa. Deixei isso claro ontem.
Sei que não podemos continuar de onde paramos... — dou um
passo para frente, ela dá um passo para trás, e então o tango
começa – o olhar em seu rosto era de um animal ferido.

— Você está sozinha aqui, Cecelia. Eu fiz isso. Te deixei


solitária de novo. Acha que eu não sei disso? Você desistiu da
porra da sua vida por mim, então eu fiz o mesmo. Fiz a única
coisa que pude porque queria que me levasse a sério quando
eu aparecesse com nada além das roupas do corpo.

Ela morde o lábio inferior, seus olhos vagando para cima


e para baixo no meu corpo.

— Desisti da única vida que conheci por mais de vinte


anos e quase tudo que tinha a ver com ela, para vir aqui apenas
por uma chance de estar com você novamente.

— Você desistiu das roupas.

— Desisti do controle, — rebato. — O que é a coisa mais


difícil para um homem como eu fazer. — Dou um passo à frente
e, desta vez, ela não dá um passo para trás. Seguro seu rosto,
suas bochechas geladas. — Porque eu quero isso, mais do que
qualquer outra coisa. Quero isso, você, nós.

— Só, — ela levanta as mãos para meus pulsos e os


agarra, com a intenção de puxá-los para longe. — Volte para a
cama. Preciso pensar.

— Não.
— Tobias

— Porra, não. Não vou dar a você a chance de pensar em


mais razões para guardar rancor de mim. — Me inclino. — O
que machuca você me machuca. Há mais a dizer.

— Hoje não. — Ela abaixa os olhos e balança a cabeça


antes de passar por mim em direção à casa. É quando eu
estalo, me apresso e a pego em meus braços.

— Ponha-me no chão.

— Não, — murmuro, acariciando seu pescoço, inalando


seu perfume, um perfume tão relaxante que parece estar
voltando para casa. Mas é de curta duração porque a sinto
ficar tensa em meus braços.

Curvo-me para beijá-la e ela vira a cabeça. — Olhe para


mim, por favor, — imploro.

— Eu te odeio tanto, — ela sussurra.

— Eu sei.

Seus olhos levantam para os meus antes de caírem para


os meus lábios.

— Plus rien ne nous séparera. Jamais. — Nada jamais


ficará entre nós. Nunca.

Exausta, sem dúvida por mim, ela abaixa a cabeça para


descansar no meu ombro enquanto a carrego para dentro,
Beau quente em meus pés até que eu chute a porta do quarto
fechando em seu rosto.

— Não jogue sua frustração no meu cachorrinho, — ela


repreende enquanto entro no banheiro e a coloco suavemente
em frente ao chuveiro.

— Você dormiu? — Pergunto, abrindo a torneira.

Ela fica inerte e não responde.

— Sinto muito por ter demorado tanto, — lentamente


levanto o moletom acima de sua cabeça junto com a blusa do
pijama antes de puxar suavemente o laço de seu cabelo. Ele
cai pesado sobre seus ombros e, ao vê-lo, fico duro.

Ela está com sono, em estado de choque e parece


derrotada, e eu odeio isso. Quero que ela lute, mas o jogo dela
acabou. E isso é por minha conta.

— Tive que vir até você pronto, Cecelia. Eu precisei.


Muitas pessoas dependem de mim. Eu tinha muitos pratos
girando. Tive que planejar minha estratégia de saída e colocar
minha cabeça no lugar. Prometo a você, de alguma forma vou
fazer você entender.

— Duvido.

— Aquelas mentiras que eu disse a você quando estava


lutando tanto, elas foram as minhas últimas, — murmuro,
pressionando um beijo em sua têmpora enquanto abro o sutiã.
Incapaz de me ajudar, curvo-me e puxo um mamilo em minha
boca, e instantaneamente seus dedos se enredam no meu
cabelo, suspirando deixando-a enquanto ela me arranha, cheia
de resistência.

Lutando com ela, puxo seu outro mamilo em minha boca


e o chupo, passando minha língua sobre sua carne sedosa
antes de levantar meus olhos para os dela. Seu peito bombeia
com respirações rápidas enquanto ela me observa, extasiada,
mas furiosa.

— Preciso de você, — sussurro antes de puxar novamente


metade de seu seio em minha boca, puxando um grito suave
dela. Seu peito brilha quando a liberto, seu corpo se tornando
frouxo enquanto a seguro firmemente no lugar. — Preciso de
você, Cecelia. Eu preciso fazer você gozar. Eu preciso sentir
você se esticar em volta do meu pau. Eu preciso ouvir meu
nome saindo de seus lábios. Mas eu preciso muito de você.

Ajoelhando-me, puxo para baixo a calça do pijama dela


antes de arrastar lentamente sua calcinha para se juntar a ela
no chão. Olho no nível de sua boceta, pressiono meus lábios
no topo dela e inalo seu cheiro, meu pau latejando, implorando
para ser libertado.

Incapaz de lidar com a necessidade de provar, corro


minha língua ao longo de sua fenda enquanto ela cava as
unhas em meu couro cabeludo, um gemido agitado a deixando.
Deleito-me com a queimação da dor que ela está causando,
porque ela está lutando, mas não com força suficiente. Afasto-
me e olho para ela. Seu olhar de retorno cheio de fogo azul.
Nenhum de nós pode lutar por nosso empate, e nunca
fomos capazes, não importa o quão adversos estivéssemos.
Mas preciso mais do que a submissão de seu corpo para agir.

De pé, corro meus polegares ao longo de sua mandíbula


antes de beijá-la brevemente. Ela treme de desejo. Seus olhos
implorando, enquanto seus lábios se recusam a se mover, a
pedir o que ela deseja, e é uma maldita agonia me afastar.

— Chuveiro. Vou fazer o café da manhã. Vamos conversar


mais.

Ela balança a cabeça, seu olhar perdendo o foco, para


outra época – uma época em que, sem dúvida, a machuquei
porque isso é tudo que fiz.

— Ninguém me odeia mais pelo que fiz a você do que eu,


— admito antes de liberá-la totalmente e deixá-la em um
ambiente cheio de vapor.

Ela está no piloto automático desde que saiu do chuveiro,


tomando um gole de café sem pensar enquanto alimentava
Beau com seu bacon. Não é o café da manhã que imaginei que
teríamos. Mas tenho grandes esperanças.
— Pergunte-me qualquer coisa, — insisto de onde estou
sentado em sua cozinha de quatro lugares. Ela morde sua
torrada francesa e bebe seu café antes que eu enfie a primeira
mordida na minha boca.

Nossos olhos se encontram enquanto tusso e um leve


sorriso torce seus lábios.

— Putain, — Foda-se. Pego o prato dela e o meu e os levo


até a pia enquanto continuamente tento limpar minha
garganta.

Ela fala atrás de mim com um pouco de contentamento


em seu tom. — Foi um bom esforço.

— Nunca cozinhei com canela, — coloco o pão torrado no


lixo. O deslizamento de sua cadeira me alerta para o que eu
sabia que estava por vir. Fechando a pia, viro-me e agarro o
balcão atrás de mim. — Você não pode tirar um dia de folga?

Ela balança a cabeça lentamente e aceito a mentira. —


Tudo bem, me dê cinco minutos.

— O quê? — Ela franze a testa, seus lábios carnudos


torcendo em desagrado, e pode muito bem ser uma faca no
meu peito.

— Irei com você.

— Para o meu café?

— Preciso do Camaro emprestado.


— Aonde você vai?

— Preciso de algumas coisas.

Ela acena com a cabeça para as chaves no balcão e


recolhe a bolsa. — Estarei lá fora. Tranque tudo.

Ela se abaixa para acariciar Beau e lhe dá um beijo


exagerado, e fico com ciúmes instantaneamente.
11 anos

Olho para o relógio quando a porta da frente bate e, um


segundo depois, Delphine desliga a música. O tilintar de uma
garrafa na cozinha me diz que ela não nos levará para a escola
em algumas horas, o que significa que cabe a mim garantir que
iremos. Faltar às aulas exigirá que sejamos inspecionados, e
não precisamos de serviços sociais à nossa porta, não com o
estado em que a casa está. E mais uma vez, terei que ser eu a
limpá-la. Faz apenas alguns meses que nossos pais morreram,
os piores meses da minha vida. Dom não está ficando melhor.
O menino feliz que ele era quase desapareceu por causa da
indiferença e da crueldade de nossa tia. Ela não tem o gene
materno, e ela tem deixado claro, diariamente, que nós somos
uma obrigação que ela nunca quis. Mas se for considerada
inapta para ser nossa mãe – o que ela é – seremos levados
embora, e eu não quero isso. Não me separarei do meu irmão.

Decidindo dormir um pouco mais, coloco meu alarme


barato esperando que as baterias não acabem, e me recosto no
colchão quando ouço o som inconfundível dos soluços
abafados de meu irmão no corredor. Jogando meu lençol fino,
entro no quarto de Dominic e o vejo deitado de bruços. Sua
cabeça está pressionada no travesseiro para abafar seus gritos,
seus ombros tremendo. Ligando seu abajur de plástico, sento-
me na beira de sua cama de solteiro e ele congela, com medo
em seus olhos até que ele vê que sou eu.

— Está tudo bem, Dom. Eles foram embora. A festa


acabou. Volte a dormir. — Coloco minha mão em seu ombro e
sinto sua pele brilhando através da blusa do pijama fino. Eu o
viro, levanto sua camisa e percebo que ele está coberto de
catapora.

Ele olha para seu peito e estômago com medo. — Não fiz
nada.

— Não é sua culpa. Você está com catapora.

— Vou morrer como mamãe e papai?

Cerro os dentes com a dor em meu peito.

— Não. Eles coçarão por um tempo, mas você só pega


uma vez.

— Você também teve?

— Sim, e isso me tornou mais forte. Vou pegar um


remédio para você aliviar a coceira pela manhã.

A porta se abre de repente e Delphine olha para nós dois.


— O que vocês dois estão fazendo acordados?
Reviro meus olhos. — Como poderíamos dormir com
tanto barulho?

— Isso é negócio para adultos. Volte para a cama.

— Ele está com febre e catapora. — Ela olha para Dominic


com cautela enquanto levanto sua camiseta para ela ver. —
Não pode ir à escola. Eles vão mandá-lo para casa.

— Bem, não posso sair do trabalho, — ela bufa, — não


podemos pagar por isso.

— Então vou ficar em casa, — argumento de volta. — Ele


não vai ficar doente e sozinho.

— Você não pode faltar à escola.

— Não vou deixá-lo aqui. Fim. — Era o que papai


costumava dizer quando falava sério, e espero que seja
igualmente eficaz.

Ela nos encara antes de se virar e bater à porta.

— Eu a odeio, — Dominic sussurra, com medo de que ela


possa ouvi-lo.

— Não vamos viver aqui para sempre.

— Ela jogou meus carros fora porque pisou em um.

— Eu disse para você pegá-los. Vou comprar mais.

— Você não tem dinheiro.


— Deixe que eu me preocupe com isso. — Vou roubar
mais vinte da bolsa dela. Metade do tempo ela não tem ideia
do que está em sua carteira e está bêbada demais para
perceber quando desaparece. Pressiono novamente minha
palma em seu pescoço e me levanto. Ele está queimando.

— Aonde você vai?

— Comprar um remédio para baixar sua temperatura.

— Você vai voltar?

— Sim.

Vou em direção ao corredor no quarto de Delphine, sou


parado na porta por uma fungada familiar. Espreito para ver
seus olhos ficando vermelhos enquanto ela estuda as fotos
dispostas em sua cama, fotos dela e do marido que a deixou
alguns meses antes de mamãe e papai morrerem. Ela passa os
dedos sobre elas antes de me sentir parado ali e levanta os
olhos hostis para os meus.

— Eu não quero ser mãe.

— Então não seja. Irei alimentá-lo. Darei banho. Vou


acompanhá-lo até a escola. Não toque nele, não grite com ele.
Eu farei tudo.

Ela bufa. — Você é apenas uma criança.

— Mais adulte que toi. — De qualquer forma, mais adulto


do que você.
— Surveille ton langage, petit con. — Cuidado com sua
linguagem, idiota.

Optando por outro argumento inútil, mudo de assunto.


— Preciso de Tylenol para sua febre.

Ela abre a gaveta de cabeceira e arranca um dos pacotes


em pó que põe na língua todas as manhãs para a ressaca, e
olho para ele, inquieto.

— O que há nele?

— O mesmo que Tylenol. Funciona mais rápido. Coloque


um pouco no suco.

— Não temos suco. — Ela suspira e reúne as fotos de seu


colchão antes de colocá-las amorosamente em uma velha caixa
de charutos em sua mesa de cabeceira. Caminhando até sua
cômoda, pego sua carteira da bolsa e tiro uma nota de vinte.

— O que diabos você pensa que está fazendo?

— Vou pegar os remédios de que ele precisa e um carro


novo para ele brincar enquanto estiver doente. — O tom da
minha voz a desafia a contestar. Esta é a luta pela qual estou
pronto.

Ela abre a boca para discutir e, em vez disso, afunda de


volta no colchão.

— Tudo bem, tanto faz.


— Não queremos você como mãe também. — Amasso o
dinheiro na mão e jogo a carteira de volta em sua bolsa. —
Apenas fique longe dele. Vou cuidar dele.

— Tanto faz, garoto, feche a porta. — Ela revira os olhos


e apaga a lâmpada, deixando nós dois na escuridão total. Vai
desmaiar em alguns segundos. Saindo para fora de seu quarto,
uso a luz fraca da lâmpada de Dominic para andar pelo
corredor em direção à cozinha para pegar um pouco de água.
Coloco metade do pacote que ela me deu na xícara e mexo
enquanto fico olhando para a lua cheia do lado de fora da
janela, assim como uma barata desliza pelo vidro. Remédio na
mão, eu o trago de volta para Dominic, que está sem roupa,
coçando furiosamente os braços.

— Coloque suas roupas de volta, para que você não possa


arranhar.

— Eu tenho que.

— Você não pode. Vai piorar e deixar marcas.

Ele acalma os dedos e geme enquanto coloca o pijama de


volta. Pijamas pequenos demais para ele agora. Ainda me
lembro do dia em que mamãe e eu os trouxemos para
casa depois de fazer algumas coisas juntos. Eu os escolhi. Não
faz muito tempo que eles estavam aqui, vivos.

Dominic franze a testa para o vidro.

— Isso vai me tornar mais forte?


— Sim. Cada vez que você fica doente, seu corpo vai
descobrir como torná-lo mais forte para que você não fique tão
doente da próxima vez. Ele terá como alvo o culpado e criará
anticorpos para combatê-lo.

— O que é um culpado?

— A razão pela qual você está doente.

— O que são corpos de formigas3?

— Anticorpos. Eles vivem dentro de você. Eles constroem


um exército para ajudar a combater a doença.

— Como você sabe disso? — Ele pergunta, inclinando a


cabeça como papai costumava fazer.

— Leio livros. Os livros tornam você inteligente.

— Então vou ler livros, — diz ele, — muitos livros. E vou


ficar mais forte. E inteligente, e ninguém mais poderá ser mau
comigo.

— Bom. Beba.

Ele dá um longo gole e faz uma careta.

— Nãoo quero isso.

— Há remédio nisso. Você precisa disso.

— Bleh.

3 Ant, em inglês significa “formiga”.


— Beba, Dom. Vou comprar um remédio de sabor melhor
na loja amanhã.

Não muito tempo depois que ele termina sua bebida, ele
adormece, e caio ao lado dele depois de verificar se há queda
de temperatura em sua pele.

Quando a porta da frente bate algumas horas depois,


levanto-me entre a parede e seu colchão e sacudo suavemente
Dom para acordá-lo.

— Estou indo para a loja. Não saia desta cama até eu


voltar.

— Estou dormindo, — ele lamenta.

— Se você acordar, você faz xixi e vai direto para a cama.


Caso contrário, não saia deste quarto até eu voltar e não
atenda a porta para ninguém.

— Estou dormindo.

— Prometa-me.

— Eu prometo, gah, — ele bufa, puxando o lençol sobre a


cabeça.

Com o estômago agitado, tranco a porta atrás de mim.


Começo em direção à rua antes de me virar e me dirigir à
varanda, girando a fechadura com minha chave. Um, dois, três.

Satisfeito com a minha contagem, começo em uma


corrida mortal da garagem em direção à farmácia. Não estou
longe de casa quando noto o sedan que estava estacionado do
outro lado da rua da nossa casa se arrastando ao meu lado.
Paro no meio do caminho e viro enquanto o carro desacelera
até parar. Pronto para enfrentar quem quer que seja, fico
surpreso ao ver uma mulher no banco do motorista. Ela me
olha antes de baixar a janela, os olhos inchados e vermelhos.

— Oi. Sinto muito se te assustei. Estava me perguntando


se eu poderia te dar uma carona?

— Não preciso. — é tudo que digo antes de me virar e


continuar minha corrida.

Ela segue por alguns segundos sem palavras antes de


falar.

— Não vou te machucar.

— Não preciso de uma carona, mas obrigado, —


mantenho meus olhos para frente, o suor nublando minha
visão. Acumulei resistência devido às minhas corridas
noturnas desde que comecei a ir ao lugar que descobri na noite
em que meus pais morreram, mas está quente como o inferno
hoje e minha camisa já está ensopada.

— Vou para a cidade, se é para lá que você está indo, e


posso ter a companhia.

Irritado, paro minha corrida e olho na direção dela. Ela é


bonita e não parece muito mais velha do que eu. É quando
finalmente me aproximo do carro que vejo sua grande barriga
ao volante. Ela está grávida, realmente grávida, e algo em meu
intestino me diz que ela é inofensiva.

— Você é um pouco jovem para andar sozinho, não acha?

— Faço 12 anos em alguns meses, e o que você está


fazendo seguindo crianças oferecendo caronas?

Ela abre um sorriso fraco.

— Tenho certeza de que te assustei, mas não era minha


intenção. Estava de passagem quando te vi e pensei em
oferecer uma carona. Está quente aqui.

— Você conhece os Perkins?

— Os Perkins?

— A casa em que você estava estacionada, — cruzo os


braços sobre o peito.

— Oh? Não. Me mudei para vizinhança. O você está indo?

— Meu irmão está doente. Ele precisa de remédio.

Seu queixo balança enquanto ela fala.

— Isto é sério?

— Não. Só catapora.

— Entre. Vou levar você. Prometo que não sou uma


ameaça para você.
Agarrando a maçaneta de seu carro, hesito e olho para a
longa estrada à frente e de volta para a casa. Tranquei três
vezes. Ele está dormindo, mas por quanto tempo? Algumas
noites atrás, no meio da minha corrida para o meu lugar
secreto, não conseguia me lembrar se fechei a porta com chave.
Corri todo o caminho para casa, meu coração batendo mais
forte por medo do que pela corrida, porque eu não tinha
certeza. Três fechaduras clicando, três torções da maçaneta.
Três verificações sobre ele antes de eu sair. É a única maneira
de ter certeza.

— Eu tenho que voltar para ele.

— Faremos isso rápido, — ela promete.

Novamente olho para trás, para a casa, o suor escorrendo


pela minha têmpora. Não consigo imaginar essa mulher
tentando me machucar.

Foda-se.

Entro e coloco meu cinto de segurança. O carro dela é


mais velho, um pouco gasto, mas o ar-condicionado funciona,
e estou grato por isso. Ela vira a ventilação na minha direção
e o suor começa a esfriar na minha pele.

— Você pode me deixar na farmácia, por favor?

— Certo.
Quanto mais ela dirige, mais me sinto confortável no
assento. Ela é grande e mal há um centímetro de espaço entre
sua barriga e o volante.

— Então, essa é a sua casa aí?

— É a casa da minha tia. Vamos ficar com ela por um


tempo.

— Você gosta de morar lá?

Dou de ombros para fazê-la pensar, 'está tudo bem', mas


a verdade é que odeio isso, e estou quase a ponto de odiar
Delphine.

— Ela é, você está... — a voz da mulher treme quando ela


fala, o que me deixa inquieto. Olho pelo retrovisor do lado do
passageiro.

Três vezes. Você trancou três vezes.

— Então, seu irmão...

— Dominic.

— Dominic, — ela engole. — Ele está com muita d-dor?

Olho em sua direção, e ela olha para trás como se tivesse


medo de mim, medo do que eu vou dizer.

— Ele vai ficar bem. Eu tive quando tinha a idade dele.


Todo mundo tem, não é?
— Não, na verdade eu não tive. Tenho certeza de que vou
pegar quando meu bebê tiver. É melhor pegar quando jovens,
no entanto. Eu li em um dos meus livros infantis.

— O que você está esperando? — Esta é a conversa mais


estranha que já tive. Não tenho ideia de quem é essa mulher
ou por que ela está me dando uma carona, mas seu ar-
condicionado está tornando difícil me preocupar.

— Uma garota. Estava pensando em chamá-la de Leann.

Torço meu nariz, e ela não perde. Ela solta uma risada
leve.

— Não gosta desse, hein? Bem, é o nome da minha mãe.

— Desculpa. — Olho para trás na direção da casa,


rezando para que Dominic continue dormindo.

— Está bem. Não tenho meu coração fixado nisso. Talvez


use como nome do meio.

Quando ela para na farmácia alguns minutos depois, com


a mão na maçaneta da porta, viro-me para ela.

— Obrigado pela carona.

— Você se importa se eu for? Posso ajudá-lo a encontrar


o que você precisa.

Arqueio minhas sobrancelhas.

— Estou meio que entre as coisas a fazer, — diz ela


suavemente.
— Quero dizer... eu acho, se você quiser.

Ela balança a cabeça e sai do carro quando eu faço,


gingando pela porta quando abro para ela.

— Obrigada, — ela diz distraidamente. Seu rosto está


manchado, muito parecido com o de Delphine depois que ela
chora todas as noites. Juntos, caminhamos por alguns
corredores até encontrarmos o que procuramos. Ela pega um
frasco de loção anti-coceira que custa oito dólares, e é então
que sei que estou ferrado.

— Obrigado, — digo enquanto ela arranca uma garrafa de


Tylenol infantil em seguida, e vejo o preço na prateleira de onde
ela puxou.

Onze dólares.

Não terei o suficiente depois de impostos.

— O que mais você precisa?

— Nada. — Mordo meu lábio, olhando para a marca de


drogaria de Tylenol, e arranco-o da prateleira. — Este, em vez
disso.

Com o rosto em chamas de vergonha, ela pega outra


garrafa de Tylenol e a joga no carrinho de compras que pegou
quando entramos. — Deixe-me pegar isso para você.

— O quê? — Estamos quase da mesma altura. Eu posso


tê-la batido por um centímetro. — Por que isso?
— Eu realmente gostaria se estiver tudo bem.

— Quer dizer... eu não...

— Será nosso segredo. — Ela me dá um pequeno sorriso.

Aceno porque realmente não tenho escolha. Se ela não


tivesse oferecido, eu poderia não ter o suficiente e teria que
roubá-lo. Tenho me safado muito ultimamente, e nunca me dá
uma boa sensação. Mas só comecei a fazer isso por motivos
como esse, dias como hoje em que estou de costas para a
parede. Já que tenho que esperar até os dezesseis anos para
receber o dinheiro do acordo de morte dos meus pais, estou
preso tomando até poder merecê-lo. E até que chegue esse
momento, terei que descobrir uma maneira, e tenho a
sensação de que o desconto de cinco dedos será uma grande
parte do caminho. Mas é uma linha tênue. Se eu for pego
roubando, vou chamar a atenção para Delphine e Dom. Tenho
que fazer tudo certo, ser duas vezes mais rápido, duas vezes
mais inteligente do que qualquer simples ladrão. Minha vida,
a vida de Dom, depende disso. A vergonha familiar me sufoca
e juro que algum dia ganharia dinheiro suficiente, para nunca
mais ter que me sentir assim.

Como se estivesse lendo minha mente, ela fala.

— Você consegue pensar em mais alguma coisa que ele


precise?

— Vou apenas encontrar um carrinho Matchbox e um


livro para ele.
— Oh? — Ela se anima. — Eu ajudo.

— Você realmente não tem...

— Por favor, deixe-me, — ela pede, sua voz urgente e


trêmula novamente. — Estou tendo um dia r-ruim, — diz ela,
— você já teve esses?

— O tempo todo.

Isso parece irritá-la, e ela se afasta de mim e enxuga o


rosto com a mão.

— Eu sinto muito. Não fique chateada. Sim, você pode


ajudar. — Tudo o que quero fazer é deixar esta senhora
estranha e voltar para o meu irmão, mas é quando ela olha
para mim do jeito que está, que meu peito dói.

— Não se desculpe comigo, nunca. Eu sinto muito. A


gravidez me deixou muito emocionada ultimamente. Não estou
tentando deixá-lo desconfortável.

— É uma abundância de hormônios, — repito as palavras


do Sr. Belin durante uma de nossas aulas de ciências. — Você
está criando uma outra pessoa inteira no momento. É
esperado.

Ela sorri para mim.

— Você é inteligente, hein? — Ela empurra o carrinho


para frente e a sigo.

— Tenho uma memória muito boa.


— Isso é bom. Eu gostaria de não ter, — diz ela com uma
risada leve.

Seguimos para a seção de brinquedos e pego o preço de


alguns carros com o dinheiro no bolso quando ela levanta um
conjunto da prateleira.

— Este é um conjunto. Ele pode ter tudo isso.

— Eu não posso... — Rosto queimando novamente. Eu


desviei o olhar. — Eu não tenho dinheiro para um combo.

— Por minha conta. Por favor, isso vai me deixar feliz.

Baixando meus olhos para sua barriga saliente, parece


errado deixá-la. Ela também não pode ter muito dinheiro. Não
com o carro que ela dirige e as roupas que está vestindo. Puxo
a gola da minha camiseta, minha pele ficando quente.

— Você não precisa.

— Eu quero, realmente. Por favor deixe-me.

— OK. — Desisto porque é tudo que posso fazer. Tenho


que voltar para meu irmão. A mesma agitação no meu intestino
me faz bater os dedos na minha coxa.

Você trancou três vezes. Três.

Ela passa os dedos pelo pacote como se fosse uma espécie


de resposta e adiciona um pequeno cobertor coberto de carros
à mistura do carrinho que se enche rapidamente.

— Ele vai adorar. Ele gosta muito de carros.


Isso parece animá-la.

— O que mais ele precisa?

Tudo. Roupas e sapatos novos. Seus pais. Garganta


queimando, olho para longe.

— Só um livro. Ele está melhorando com sua leitura. —


Não sei por que senti a necessidade de relatar isso a ela, mas
sinto que ela quer saber, e quero que alguém, qualquer um,
além de mim, queira saber. Quase ninguém das reuniões
aparece mais. Pelo que descobri, poucos meses após a morte é
o máximo para as pessoas perguntarem sobre nosso bem-
estar.

— Um livro, ok, — ela sorri, embora seus olhos estejam


lacrimejando novamente, e limpo minha garganta,
desconfortável com o quão emocional ela é. Esta senhora está
sofrendo de muitos hormônios. Brinco com ela, sem saber seus
motivos para me ajudar, e me pergunto se ela, ela mesma, será
capaz de pagar tudo o que está jogando no carrinho.
Examinamos a seção de livros e escolho dois. Ela os pega das
minhas mãos antes de adicionar mais sete. E então estamos
na seção de mercearia enquanto ela limpa uma prateleira de
sopa, jogando-a no carrinho junto com um pouco de Gatorade,
balas e chocolates.

— Ele não come chocolate, — digo a ela.

— Você?

— Sim, eu amo isso.


— Então eles são para você.

— Você realmente não tem que fazer isso, — digo a ela,


examinando o carrinho transbordando com apreensão.

— Eu realmente quero.

— Você mora em Triple Falls? — Preciso tirar minha


mente do tempo. Ele está acordado. Posso sentir isso.

Três vezes. Está trancado, está trancado.

Incapaz de evitar, olho para o relógio de plástico


pendurado logo acima da farmácia. Sete e meia. Sean já deve
estar caminhando para a escola. Se ele está dormindo, não
demorará muito para que ele o acorde. Tenho minutos de
sobra.

— Não, eu morava aqui, mas me mudei não faz muito


tempo. Voltei hoje para ver alguém... mas eu... — ela balança
a cabeça. — Não importa.

Olho para o relógio novamente, apenas ouvindo pela


metade enquanto meu coração começa a disparar. Se ele está
com fome, ele pode tentar algo estúpido, como cozinhar um
ovo.

Exceto que não temos ovos de merda. Minhas palmas


começam a coçar quando me viro para ela.

— Preciso voltar para o meu irmão. Preciso ir. Agora


mesmo.
Seus olhos saltam.

— Ele está sozinho?

Concordo.

Isso parece irritá-la novamente.

— Ele estava dormindo quando saí. Não queria trazê-lo


comigo neste calor. Minha tia não podia faltar ao trabalho. Vou
ficar em casa com ele. Sou velho o suficiente. — Há raiva em
meu tom e já falei demais.

— Não vou contar a ninguém se é isso que você está


pensando. Isso não é sua culpa, — ela me garante. — Você é
um bom irmão.

Ela nos apressa para fazer o check-out, e fico olhando


para o mar de sacolas me perguntando como vou levar tudo
para casa, mas animado com a ideia de Dom se acender
quando vir o que está dentro delas.

— Venha, vamos carregar o carro e levá-lo para casa.

Aliviado, eu a examino.

— Tem certeza?

— Claro. Você não achou que eu deixaria você carregar


essas sacolas por cinco quilômetros, não é?

O caixa dá a ela o total, e fico olhando para a tela com os


olhos arregalados. Duzentos e doze dólares. Ela nem pisca
enquanto entrega a ele trezentos dólares e coloca o troco em
uma das minhas sacolas. Olho para ela com os olhos
arregalados.

— Caso ele precise de mais remédios, — ela diz, mas eu


sei que é pena. E odeio isso.

Engolindo em seco, aceno porque estou achando difícil


falar. Pego as sacolas e as levo para o carro enquanto ela liga
a ignição e liga o ar-condicionado. A viagem para casa é
silenciosa enquanto olho para o banco de trás cheio de sacolas
e depois de volta para a mulher segurando o volante, seus
dedos ficando brancos. Tenho pena dela, esta grávida triste,
que está tão sozinha que precisava fazer compras comigo para
se sentir melhor.

Quando ela para na garagem, eu a impeço de me ajudar.


Por mais legal que ela tenha sido, não a convido a entrar.
Raramente deixo qualquer adulto chegar perto de Dominic.
Não confio neles. Não confio em ninguém aqui. Assim que levo
as sacolas para a varanda, volto para o carro e fecho a porta
dos fundos, e ela abaixa a janela do lado do passageiro.

— Obrigado.

— Sério, por favor, não me agradeça, foi um prazer. — Ela


balança a cabeça e novamente parece que está prestes a
chorar.

— Sou Tobias, — digo a ela como se isso importasse.

— Obrigada por me fazer companhia, Tobias.


— Espero que você tenha um dia melhor.

Ela morde o lábio inferior como se fosse explodir antes de


falar.

— Você fez isso muito melhor. Obrigada por me agradar.


— Ela balança a cabeça. — Você deve pensar que sou louca.

— É como você disse, você está tendo um dia ruim. Eu


também. Você fez o meu muito melhor.

— Você é um bom garoto. Você merece, — seus olhos


vagam para a casa, — você merece muito mais do que dias
ruins.

Encolho os ombros.

— Todos nós os temos.

— Obrigada, Tobias.

Incomodado com a última meia hora e o adeus, viro-me


para subir as escadas correndo e arrasto as sacolas para
dentro, fechando a porta e trancando. Corro para espiar nas
persianas e vê-la ainda estacionada na garagem, a cabeça
inclinada no volante, seu corpo tremendo.

Ela está chorando. Uma parte de mim quer ir até ela.


Mamãe sempre dizia para nunca deixar uma mulher enxugar
as lágrimas sozinha e nunca ser o motivo delas, mas não
saberia o que dizer a ela. Tudo que faço é observá-la por alguns
minutos antes que ela enxugue o rosto e se afaste. A sensação
de dor em meu peito permanece comigo enquanto desempacoto
as sacolas. Dom ainda estava dormindo quando coloquei
minha cabeça em seu quarto. Alinhando as latas na despensa
estreita e vazia, sinto-me aliviado quando olho para a
quantidade de comida. Chega de morrer de fome antes de
Delphine decidir que é hora do jantar. Ela raramente come,
então o estoque vai nos alimentar por algumas semanas. É
quando ouço Dominic balbuciar atrás de mim que minha
empolgação aumenta.

— Tudo isso é meu?!

Poucos minutos depois, pacotes estavam espalhados no


chão de seu quarto enquanto tento aplicá-lo com loção rosa e
ele esmaga seus carros novos na minha coxa. Barriga cheia,
penso na mulher que me ajudou e gostaria de ter agradecido
mais do que antes. Uma vez que lutei com Dominic o suficiente
para cobri-lo com a loção, coloco-o de volta na cama e puxo a
pequena TV do meu quarto para o dele. Ele está no meio do
caminho de volta para dormir quando sua janela se abre, e um
ninho de rato de cabelos loiros aparece. Sean levanta a cabeça
e sorri quando nos vê acampados na cama de Dom. Ele sobe
pela janela vestido com sua camiseta favorita do Batman e
jeans, já coberto de sujeira de sua caminhada pelas árvores no
bairro.

— Você não vai para a escola? — Ele pergunta a nós dois.

— Não. Dominic está doente.

— Ele não parece doente. — Sean olha para nós dois,


passando as unhas pelos braços, e é quando eu vejo os pontos
com bolhas em seus braços, rosto e pescoço. Abro a boca para
falar quando Dom pula da cama e aponta para ele.

— Sean! Você é o culpado!

— Senhor? — A voz desconhecida me puxa de volta para


onde estou. — Você tem sete sacolas. — O som de mercadoria
tocando me leva lentamente de volta ao presente enquanto
pego o troco e o recibo da mão estendida da mulher. Com o
peito doendo com a memória, pego as sacolas pela alça e faço
meu caminho para fora da loja em direção ao Camaro de Dom.

— Nós dois sabemos que eu não chegaria aos trinta, irmão.


Cuide dela.
Olhando fixamente para fora de uma das grandes janelas
para o estacionamento, refuto a ideia de que estou procurando
por qualquer sinal do Camaro – por ele. Mais uma olhada no
relógio me irrita com as mentiras que estou dizendo a mim
mesma. Ele me deixou três horas atrás. Sei que ele não mudou
de ideia. Sei que ele está voltando.

Ele voltou, por mim.

Ele deixou sua vida, por mim.

Ele matou, novamente, por mim.

— Onde está sua cabeça hoje, mulher? — Marissa


pergunta, esgueirando-se ao meu lado no balcão.

— Apenas... distraída. — Sei que provavelmente deveria


avisá-la sobre o que, ou melhor, quem está vindo, mas não
tenho ideia se ele tem planos de invadir meu espaço de
trabalho, já que tem minha casa e minha nova vida. Não tenho
ideia se ele pretende permanecer incógnito aqui como no
passado. É uma incógnita por agora, especialmente o meu.
Marissa é a coisa mais próxima que tenho de uma amiga
aqui, e já contei a ela o suficiente sobre Tobias para ela saber
porque não estou entretendo homens por enquanto. Contenho-
me em revelar mais no momento, porque acreditar em
qualquer coisa neste momento é muito prematuro. Ele poderia
muito bem desaparecer tão rápido quanto veio.

Mas não acredito nisso, apesar de minha necessidade de


manter meu ceticismo.

Odeio acreditar principalmente nele e na sinceridade que


ele mostrou até agora com suas palavras e ações.

Mas se eu acreditar nele, levar suas palavras a sério, serei


uma tola para sempre?

Por enquanto, poderia ser. Não posso deixá-lo fazer isso.


Ele tem que ganhar minha confiança de novo, não importa seu
lugar em meu coração.

— Distraída? Vou dizer, você está lustrando aquele


dispensador de guardanapos por dez minutos.

— O quê? Oh, — olho ao redor do café, que está morto


após o último movimento da manhã. — Você precisava de mim
para alguma coisa?

— Não, apenas preocupada. Você tem agido mal desde o


discurso presidencial de ontem. Gostaria de falar sobre isso?

— Não, estou bem, juro. — Viro-me para ela e forço um


sorriso, e ela levanta uma sobrancelha.
— Nós somos grudadas desde que você me contratou.
Você acha que não posso dizer quando você está fingindo?

— Desculpe, você está certa. Algo está acontecendo e,


para ser honesta, ainda estou tentando entender isso. Vou
explicar mais tarde.

— Sim, você vai, e vai ter que esperar porque ele está de
volta. — Ela me dá uma piscadela conspiratória.

— O quê? — Pálida, olho para trás, seguindo seu olhar


para ver o Sr. Bonito entrar. No segundo em que vejo que ele é
o homem a quem ela se referia, sou dotada de um pouco de
alívio, rapidamente substituído por um pico de ansiedade.

— Todo seu, menina. E caso você esteja se perguntando,


nossas omeletes não são tão boas.

Ele pega um banquinho, vestido para impressionar, seus


olhos focados em mim enquanto pego a cafeteira, pego uma
caneca pronta embaixo do balcão, viro e despejo, recusando-
me a encontrar seu olhar curioso.

— Manhã. Omelete ocidental, sem pimentão ou queijo,


certo?

— A maioria das pessoas me chama de Greg, — ele


brinca, — mas sim, por favor. — Dou a ele um sorriso de
resposta enquanto escrevo seu pedido e me arrasto de volta
para a cozinha, cortando qualquer chance de puxar conversa.
Até agora, enchi alguns saleiros com açúcar, derrubei três
pratos e, na minha pressa, esbarrei na porta do meu escritório.
Desgraçado.

A fadiga finalmente apareceu pela falta de sono, e


principalmente porque eu encarei a porra do Adônis francês
que ocupou mais da metade do meu colchão queen na noite
passada vestindo nada além de boxers pretas. Ele é uma
tentação perigosa, seu perfil e constituição – todas as linhas
duras e curvas densamente musculosas – hipnotizantes à
meia-luz. Sua construção era tão incrível quanto era quando
estávamos juntos, talvez mais agora. Sua aparência surreal é
tão perturbadora quanto antes, ameaçando substituir meu
ressentimento por desejo. E no minuto em que acordei de um
sonho que me deixou em carne viva e dolorida, meu primeiro
instinto foi puxá-lo para mim, me envolver dentro dele e nunca
mais me soltar. Oh, quanto eu queria tocar. Tanto que tive que
deixar minha própria cama para me afastar dele. Pelo cheiro
de frutas cítricas e especiarias. De qualquer familiaridade que
possa me trazer conforto.

Porque, foda-se, recuso-me a tornar mais fácil para ele.

Ele quer outra chance, mas ele teve anos de chances de


voltar para mim. Ele me recusou a cada passo em Triple Falls,
forçou-me a deixá-lo ir. De propósito, ele me deixou sair de seu
escritório e de sua vida.

E ele está certo. Não importa seus motivos, não importa


o quão justificados, todos eles serão desculpas para mim no
momento.

Eu mereço mais.
Vou aguentar por muito mais, não importa o quão
gloriosamente ele é bonito. Não importa quantas vezes ao longo
dos anos sonhei com ele voltando para mim e dizendo as coisas
que dizia. Suas palavras de ontem passam pela minha mente.

— Eu não conseguia desviar o olhar.

Não importa o quanto as palavras signifiquem, não sou


mais uma adolescente ou mulher de vinte e poucos anos que
teve seu primeiro orgasmo alucinante, oferecido por um
homem bonito e de fala mansa. Já estive lá, tenho as fronhas
encharcadas de lágrimas e as roupas manchadas de sangue
para provar isso.

— Cecelia. — Travis, meu cozinheiro de pratos rápidos,


berra atrás da janela recortada de aço da cozinha, fazendo-me
pular onde estou.

Olho para ele, e ele estremece.

— Desculpe, você não estava me ouvindo. Seu pedido.

— Relaxa, — Marissa pega o prato da barra quente e leva


até Greg. Ela me lança um olhar curioso assim que é entregue,
assim como Greg. Irritada com o escrutínio e me recusando a
olhar novamente para o estacionamento, recuo pelas portas
duplas da cozinha em direção ao meu escritório por um tempo
limite, desejando pela primeira vez em meses ter um baseado
para fumar.

Minutos depois, quando estou a salvo atrás da minha


mesa, Marissa irrompe pela porta do escritório, uma expressão
de choque absoluto em seu rosto que me permite saber que
não estou gozando tão facilmente. Marissa lança os olhos ao
redor do escritório em pânico, o peito arfando antes de pular
para a bolsa.

— Jesus, perto do rio, — ela diz, passando um gloss de


uma semana nos lábios, parada na soleira da porta do meu
escritório. — Por favor, diga-me que o homem que acabou de
sair do seu Camaro é seu irmão adotivo. — Detestando o alívio
que sinto, deslizo minha cadeira para trás, a segunda
determinação percorrendo meu corpo enquanto ela olha para
mim com os olhos arregalados de esperança, enquanto Travis
grunhe algo ininteligível atrás dela.

— É complicado.

— Isso não me diz nada, — ela está atrás de mim


enquanto jogo os ombros para trás e empurro as portas
duplas.
Reúno as poucas sacolas que preciso para abrir a loja
antes de entrar. Ao entrar, não é nada como eu esperava.
Embora o Meggie's fique em um prédio de aparência velha em
um shopping center desatualizado, o interior, incluindo a
pintura e os móveis, é novo e, de alguma forma, distinto de
Cecelia. Por dentro, é uma sensação completa de 180 graus
vindo do estacionamento cheio de buracos e da pintura
lascada e desbotada do prédio. É aconchegante. As cores das
paredes são uma mistura de Siena queimada e azul-celeste.
Fotografias em preto e branco estão penduradas com placas de
preços flutuando ao lado delas; sem dúvida, a tentativa de
Cecelia de ajudar a apoiar artistas locais. Grandes estantes de
livros alinham-se nas paredes distantes, e cadeiras grandes
são colocadas para criar um recanto de leitura. Há um bar de
Internet e bancos ao longo das fileiras de janelas do chão ao
teto. Cabines e mesas aconchegantes ocupam o meio do café,
designando a área de jantar.

Dominic teria adorado aqui.

É o mesmo pensamento que tive quando entrei em sua


casa ontem. A culpa me cega brevemente enquanto tento
mudar de marcha quando a vejo no centro do bar servindo
café, assim que seus olhos se erguem para os meus.

É uma flecha que atravessa a queimadura e o buraco não


é pequeno.

Porra, senti falta dela.

Interrompendo nosso olhar fixo, ela anda de um lado para


o outro no balcão, reabastecendo as bebidas antes de parar
bem na frente do homem que estou sentado ao lado. Pegando
meu novo laptop da caixa, ela coloca uma xícara de café na
minha frente e um menu enquanto ligo.

— Pensei que você estava de férias, — ela murmura antes


de colocar um cheque no balcão na frente do terno ao meu
lado.

— Este é o meu laptop de férias, — asseguro-lhe e abro o


menu, lendo as seleções.

— Certo, — diz ela secamente antes de sair. Concentrado


nela, sinto que não estou sozinho ao fazê-lo e fico rígido
quando olho para o terno antes de seguir sua linha de visão. O
plástico do menu range em torno dos meus dedos enquanto
um fogo branco percorre meu corpo. Ele tem a minha atenção.
Aparência decente, perto da minha idade, e ele não está aqui
para a merda do café.

Sr. Fodido. Bonito.


Nunca matei um homem a sangue frio ou por ciúme. Algo
me diz que hoje não deve ser o dia em que vou retirá-lo da
minha lista.

— Ela é linda, não é? — Pergunto, conectando meu laptop


em uma das tomadas prontas abaixo do balcão.

— Sou tão óbvio? Estive aqui todos os dias esta semana.

— É mesmo?

Ele acena com a cabeça antes de levantar sua xícara em


saudação.

— Greg.

— Tobias.

— Isso é um sotaque francês? Você com certeza está


muito longe de casa.

Cecelia olha em nossa direção, olha nossa troca antes que


sua atenção volte para mim, detém-se e se afasta.

— Na verdade, estou bem onde preciso estar. Acabei de


me mudar para cá. — Viro para ele com o moletom e jeans que
comprei na loja de descontos. Estou vestido como a porra de
um adolescente devido às opções estreitas. Casanova está de
terno.

— Há algo sobre ela, — seu sorriso se aprofunda, — Me


sinto como um perseguidor voltando assim, mas ela é... —
Posso ouvir a curiosidade em sua voz. Cada palavra falada
pode muito bem ser um fluido de isqueiro com o qual ele está
me ensopando. — Estou indo para isso. — Cecelia usa aquele
momento para se aproximar de nós e genuinamente sorri para
o filho da puta, antes de se virar para mim.

— Está com fome?

— Morrendo de fome, — dirijo com os dentes cerrados. —


O café da manhã foi uma merda.

Dia um, Tobias. Dia um. Nenhum cadáver no primeiro dia.

Ela está completamente sem noção da atenção que está


recebendo. Ou ela está? Sua lista de afazeres transforma essa
teoria em merda, mas ela não vai realizar a porra do Greg.
Nunca, porra.

— Apenas me avise quando estiver pronto.

— Cecelia, — fala o idiota do terno, um sorriso


superconfiante no rosto enquanto ele se levanta e puxa uma
nota de vinte para cobrir sua conta. Porra barata. Sabendo o
que está por vir, vejo o pânico em seus olhos um milésimo de
segundo antes de ela mudar suas feições. Ela ficou muito
melhor em blefar, mas sou o mestre em detecção de besteiras.
Ela não quer participar de Greg ou da oferta que está
chegando, mas isso não diminui o desejo de imprimir o logotipo
da Apple do meu Mac recém-adquirido em seu crânio.

— Eu estava me perguntando se poderia te levar para


jantar?
Logado em uma nova conta de e-mail, clico para escrever,
mantendo meu tom calmo.

— A primeira vez que a vi, ela tinha onze anos. — Os dois


se voltam para mim, mas continuo digitando, sem desperdiçar
um olhar para nenhum deles. — Ela não era nada além de uma
garotinha, mas ela era minha para protegê-la deste mundo
fodido. Minha para cuidar.

— Tobias, — Cecelia sibila em advertência.

— Ela veio mais tarde como uma bola de demolição do


caralho e apagou a imagem da menina que me lembrava. Eu a
reivindiquei então como minha para ter, minha para tocar,
minha para possuir, foda-se, minha.

Cecelia fecha os olhos, fechando os punhos no balcão.

Levanto meus olhos para Greg, que parece que está


prestes a cagar em sua boxer de seda.

— E então, eu apreciaria muito se você parasse de olhar


para o meu futuro como se ela pudesse ser o seu. A resposta é
não, Greg, ela não vai jantar com você.

Greg concorda.

— Peço desculpas, realmente não tinha ideia. Ela não


está usando um anel.

Toco no mousepad para abrir um novo e-mail.


— Deixe seu endereço, e nós lhe enviaremos uma
notificação.

— Tobias, chega, — Cecelia repreende. — Greg, sinto


muito.

— Está bem. — Ele levanta seu paletó de tweed, boceta,


do banquinho ao lado dele e joga sua voz na minha direção. —
Você é um homem de sorte, Tobias. Vejo você por aí, Cecelia.

— Volte, Greg, — ela pede, seu olhar demorando nele por


dez segundos, porra, enquanto ele sai pela porta, assobiando
como um maluco.

Meu laptop bate em minhas mãos antes de ficar cara a


cara com águas violentas de um azul escuro.

Isso mesmo, baby, lute comigo.

— Se você vai se tornar todo homem das cavernas, pode


ir embora. Isso não vai dar certo aqui.

— Duas coisas, — murmuro, levantando a tela para


digitar o último do meu e-mail. — Gostaria de um sanduíche,
batatas fritas e seu número de telefone.

— Você é um bastardo.

— Seu bastardo, — eu a lembro, desbloqueando meu


telefone e empurrando-o sobre o balcão. — E ele pode pedir
todos os ovos e café que quiser aqui, mas ele não pode olhar
para você assim.
Ela sai pelas portas duplas da cozinha. Segundos depois,
uma pequena loira com a cabeça cheia de cachos bagunçados
caminha em minha direção. É então que sei que Cecelia está
lá se escondendo.

— Cecelia pegou você? — Ela pergunta com uma voz doce


e enjoativa.

— Pelas bolas, — murmuro, disparando o e-mail.

— Perdão?

— Já fiz o pedido, obrigado. Mas, — me inclino e a


envolvo. — Por favor, certifique-se de que ela não esteja lá com
uma caixa de veneno de rato. — Ela ri como se fosse histérica
e se inclina, dando-me uma visão cheia de decote que eu opto
por sair.

— Agora, por que ela faria uma coisa dessas?

— Ex-namorado. — Torço meu nariz. — Ela não é minha


maior fã.

Sua mandíbula afrouxa.

— Você é o bastardo?

— Em carne. Então, você sabe sobre mim?

Boa.

Ela estreita os olhos. Ela sabe o suficiente.

Não é bom.
— Oh, vou me certificar de que cuidaremos muito bem de
você.

E não vou mais comer aqui.

— Você é de fora da cidade?

Empoleirado no banquinho, clico no teclado do meu Mac


ao lado do meu pedido intocado. A questão foi levantada por
um veterano que passou a maior parte do tempo desde sua
chegada me examinando. Cecelia tem me evitado
principalmente desde nossa conversa anterior. Quando ela
percebeu que eu não iria embora, ela não teve escolha a não
ser retomar seu turno. Ela pausa sua décima quinta limpeza
do balcão, seus círculos em três, sem dúvida apenas para foder
comigo, à espera de minha resposta.

— Acabei de me mudar para cá, — respondo por cima da


tela. Embora muito mais velho do que eu, ele tem uma postura
quase perfeita, uma espessa juba prateada e parece
meticulosamente preparado. Ex-militar.

— Veio de onde?

— Não longe.
— Pelo quê?

— Acho que você poderia dizer que acabei de mudar de


carreira.

— O que você fazia? — O homem pergunta, seu tom um


pouco mais alto do que o socialmente apropriado, sem dúvida
devido a alguma perda auditiva.

— Muito disso e daquilo. Principalmente, estava em


serviço.

Cecelia bufa.

— Militares? — Ele grita do outro lado do bar. — Ah,


peguei você. Servi no Nam. Então, esta é sua primeira semana
de volta como civil?

Cecelia me observa e sorrio.

— Exatamente.

— Difícil no começo, mas você vai se acostumar. Existem


benefícios em ser um veterano.

Olhos rolando para baixo em seu corpo, ela não perde


isso.

— Espero que seja esse o caso. — Meu pau ganha vida


quando seus lábios se abrem ligeiramente, o pequeno sabor
dela desta manhã persistente na minha língua. — Será um
ajuste ser um cidadão de verdade, — acrescento para
completar. Fazê-la ouvir e acreditar em minhas verdades será
um novo esporte. Com os dedos coçando para tocá-la, resisto
e clico fora de algumas telas.

— O que o traz a esta parte da Virgínia?

— Algo que não posso viver sem, — admito facilmente e


sinto Cecelia ficar tensa pouco antes de a cozinheira pedir para
pegar.

— Você não parece o tipo de cidade pequena.

— Na verdade, fui criado em uma cidade como esta, a


cerca de dez horas daqui.

— Bem, DC não está longe se você precisar sentir a vida


na cidade.

— Obrigado pelo aviso.

— Meu nome é Billy.

— Prazer em conhecê-lo, Billy. Sou Tobias, namorado da


Cecelia.

Cecelia tosse e Billy sorri, os dentes imaculados pela


idade. A grande maioria dos clientes de Cecelia usa
dentaduras. Este não é o tipo de cidade hipster com micro
cervejarias surgindo com o aumento da população. Na
verdade, é provavelmente uma das últimas pequenas cidades
americanas que o resto dos Estados Unidos se esqueceu. E um
ótimo lugar para se esconder.
— Você nunca mencionou um namorado, — Billy diz à
Cecelia.

— Sou um segredo mais bem guardado, — interrompo,


dando-lhe uma piscadela.

Billy passa um palito de dente nos lábios.

— Não se iluda, filho, todo homem que frequenta o lugar


pensa que é o namorado dela. — Seu sorriso aumenta. — Se
eu fosse trinta anos mais jovem...

— Tente quarenta e, Billy, não termine essa frase, —


alerto, enquanto Cecelia finalmente sorri e se aproxima de
mim. Ela levanta meu sanduíche e dá uma grande mordida. É
um ato de gentileza, uma raridade desde que apareci, e meus
ombros relaxam um pouco.

Ela mastiga lentamente e nossos olhos se encontram e se


fixam. Ela está lá, escondendo-se, tanto a garota que conheci
quanto a mulher que amo, como ela estava ontem. Talvez sua
raiva nebulosa de sonho tenha passado. — Terminou com
isso? — Ela pergunta, pegando o prato assim que pego a outra
metade do sanduíche.

Talvez não.

— É verdade, Billy. Ele é minha antiga paixão, — Cecelia


rosna de uma forma indicativa que significa que problemas
estão chegando. — Ele está aqui para tentar me reconquistar.
Mas estou pensando em passar.
Billy levanta as sobrancelhas.

— Bem, o que há de errado com ele, além da maneira


como ele se veste?

Billy-1, Tobias-0

Ela cruza os braços, erguendo os lábios.

— Muita coisa.

— Ele sempre se veste assim? Ele poderia estar em um


daqueles vídeos de rap com esse traje.

Billy-2, Tobias-0

— É apenas uma parte do seu disfarce. Ele é um


mentiroso profissional.

Merda, aqui vamos nós. E sem dúvida ela tornará isso


publicamente doloroso.

Traga isso, baby.

— Isso nunca é bom, — diz Billy, avaliando-me enquanto


Cecelia começa a marcar meus crimes em seus dedos.

— Ele é um ladrão, um mentiroso, e a primeira vez que


ele me beijou, não pediu permissão, então definitivamente não
é um cavalheiro.

— Vergonha, — Billy me analisa com uma ruga entre as


sobrancelhas. — Você deve sempre pedir permissão a uma
mulher.
— E ele me traiu, — acrescenta Cecelia, e não há nada de
engraçado sobrancelhas. Sinto tanto aquele golpe que grunhi.

Você machuca, eu machuquei. Olhe para mim.

Mas ela não faz isso, e tudo que posso fazer para não
pular sobre o balcão.

— Você fez tudo isso? — Billy pergunta, sua carranca


profunda.

Concordo.

— Fiz.

— Você nem vai se defender?

— Não, — respondo enquanto ela levanta os olhos para


os meus. — É tudo verdade.

— Bem, então, você tem um motivo para ela aceitar você


de volta? — Marissa está parada a um pé atrás de mim, e posso
sentir o resto do café escassamente cheio se inclinando sobre
a respiração suspensa.

Pequenas cidades.

Cecelia recolhe uma vasilha de pratos sujos quando


finalmente falo em uma defesa de merda.

— Parei de mentir ontem. — Mal consigo soltar antes que


ela passe pelas portas duplas.
Não muito tempo depois de Billy ir embora, ela mergulha
de volta na limpeza e bate papo com os clientes. Fiquei quieto,
esperando que o resto do turno passasse sem incidentes ou
outra inquisição pública. Quanto mais tento me concentrar na
tarefa de amarrar algumas pontas soltas para o Exodus, mais
me distraio com sua presença a poucos metros de distância.

É a dor de desejá-la. É a necessidade de apagar a


distância, não apenas física, mas emocionalmente. Mas do
lado físico, estou controlando uma sede que tem sido constante
desde a primeira vez que empurrei dentro dela.

Cecelia sempre foi linda. Seu rosto é uma mistura de


inocência e beleza natural incomparável. Ela está acima da
média das mulheres nesse aspecto. Ainda assim, está também
na maneira como ela se comporta com confiança, a maneira
como ela sorri quando sorri, as palavras cuidadosamente
transmitidas que saem de sua boca que expressam seu calor,
empatia e inteligência. Na aparência, ainda vejo um pouco de
sua juventude persistente, sua curiosidade pelo mundo ao seu
redor. Ela é sempre uma estudante, e acho isso atraente.
Enquanto algumas mulheres parecem estar convencidas de
que são especialistas em tudo depois de certa idade, ela está
sempre procurando maneiras de entender o mundo ao seu
redor, aprender e crescer.

Algumas horas depois de chegar aqui, fica claro que ela


tem o respeito e a admiração de seus funcionários e clientes
frequentes.

Ela é impossível não amar.

E quanto mais ela amadurece, mais ela se torna aquela


mulher, a mulher inevitável e irresistível que merece cada
pedaço de admiração que ela recebe.

Os homens têm se apaixonado por ela muito antes de eu


conhecê-la.

Ela nunca usou seu apelo sexual como uma arma ou


exerceu totalmente seu poder. Se algum dia ela controlasse
isso, ela seria uma viúva negra meio letal.

E eu seria um homem morto.

Mal consegui tirar meus olhos dela hoje, depois de negar


a mim mesmo por tanto tempo. Nunca conheci o corpo de outra
pessoa tão intimamente, nem o mapeei tão intrincadamente
como fiz com o dela.

Instintivamente, ainda sei disso.

Mas ela não se vê como os homens a veem – como os


predadores a veem. Especialmente porque durante a maior
parte de sua vida, ela sentiu que não merecia o amor.
Alimentei-me dessa ideia ridícula quando estava no meu
momento mais fraco para nos impedir de comer uns aos outros
vivos, mas estraguei tudo ao fazê-lo.

Recusei seu coração quando ela me implorou para


recuperá-lo, reavivá-lo.

O ciúme não é algo com que estou acostumado. As


mulheres vêm e vão comigo; minha missão sempre tendo
precedência. No entanto, essa mulher tornou impossível
ignorar que dentro de mim se esconde um coração que precisa
do que só ela pode dar.

Foi só no dia em que testemunhei como eles a amavam,


do jeito que Sean e Dom a amavam, que conheci esse tipo de
ciúme profundo. E ao sentir isso, perdi o controle.

Resumidamente, fecho meus olhos e meu laptop.

Me inscrevi no difícil.

Vim pronto para o difícil, para enfrentar e lidar com o


impossível, mas é a culpa que torna tudo mais difícil.

É a tensão que está me matando agora. Sua hesitação em


até mesmo olhar para mim.

Lembro-me de uma conversa de ontem no


estacionamento. Foda-se estar bem com qualquer final que
tenhamos. Isso não é bom o suficiente. Eu a quero feliz. Quero
nosso final feliz. Isso é o que eu decido enquanto a vejo
interagir com as pessoas em seu café. Quero que ela sorria
sobre os pensamentos sobre nós, antes que ela cumprimente
um estranho.

Farei tudo, qualquer coisa, para tornar nosso final feliz.

Simplesmente estar juntos não é suficiente. Não estamos


nos conformando.

Enquanto ela estiver cansada, serei ambicioso por nós


dois.

Em nosso tempo na casa de seu pai, éramos bem-


aventurados, contentes, apesar de nossas circunstâncias e das
ameaças subjacentes a esse estado de paz. Apesar de saber
que éramos uma bomba-relógio. Apesar de mim.

Nossos prazeres eram fáceis. Ela poderia olhar para mim


então. Agora ela o evita.

Levantando-me abruptamente do balcão para esticar as


pernas, cheio de energia inquieta e lanches divertidos em um
guardanapo, mando uma mensagem no meu novo telefone.

Sou eu.

Sean: Eu quem?

Engraçado.

Sean: Vou atirar o número para a tripulação.

Os pontinhos começam e param. Paro quando leio sua


mensagem.
Sean: Como vai?

Você se importa?

Sean: Claro, que me importo. Relatório.

Ela está bem. Ela é boa. Muito boa. Comprou um café.


É legal. A casa dela também. Ela está fazendo a rotina
diária.

Sean: Já sabia disso. E você?

Li o texto novamente. Uma pergunta que eu não esperava.


Quando ele, correção, quando Tessa me convidou para o
casamento deles, pensei que talvez então pudéssemos começar
a consertar o que estava quebrado entre nós, mas mesmo
assim, as coisas estavam erradas. No dia em que enterramos
Dom, ele olhou para mim como se me odiasse. E sei que ele
odiou. Este ramo de oliveira que ele está estendendo parece tão
estranho quanto minha posição em minha nova vida. Estou à
mercê das pessoas que magoei.

E eu quero estar aqui.

Mas foda-se se não é uma merda.

Quando procurei Sean para me ajudar a encontrá-la,


senti que ele estava cedendo um pouco. Ao longo dos anos,
senti sua ausência significativamente. Me convenci de que
nossa causa mútua é a única razão pela qual ainda fazemos
parte da vida um do outro, apesar de nossa história. Mas uma
esperança ilumina-se dentro. Talvez não seja mais o caso.
Você realmente quer saber?

Sean: Eu não perguntaria, cara. Tão ruim assim?

Prioridades de Cecelia

Cachorro

Cafeteria

Eu. E foda-se por rir porque eu sei que você está.

Pontinhos. Decido que odeio pontinhos tanto quanto


odeio ervilhas.

Sean: Você não achou que seria fácil, não é?

De jeito nenhum.

Sean: Ela já te pegou pelas bolas, não é?

Mais que isso.


Sean: Se não doesse, não valeria a pena. Você está muito
acostumado a conseguir o que quer. Deixe queimar. Vai valer a
pena.

Enoja que preciso de consolo tão cedo, e com ele, mudo


de assunto.

Coisas boas?

Sean: Não dura nem um dia, não é, cara?

Jogue-me a porra de um osso. Eu sou um inútil aqui.

Sean: Você não tem nem vinte e quatro horas. Dê um


tempo.

Eu vou. Eu sou. Eu não estou reclamando.

Posso sentir a hesitação nas duas pontas do telefone. Um


minuto se passa antes de receber outra mensagem.

Sean: É estranho, hein?

Você não tem ideia.

Sean: Tenho uma ideia. Espere até você ir de Maverick


para casado com três filhos.

Duas crianças.

Sean: Três. Descobri esta manhã.

Parabéns, cara.

Sean: Você vai querer algum?


Passei metade do dia morrendo de fome para ter
certeza de que ela não envenenou meu sanduíche. Acho
que vou adiar essa conversa para mais tarde.

Os pontinhos começam e param.

Pare de rir. Idiota.

Sean: Você realmente não tem ideia do que está fazendo,


não é?

Eu quero estar aqui. Eu sei disso.

Sean: Vá com seu instinto.

Conselhos familiares.

Sean: Isso vai funcionar. Dia um.

Dia um.

Medito sobre minha escolha de palavras e decido apenas


digitar a verdade.

Obrigado, cara.

Sean: A qualquer hora.

Você quer dizer que?

Os pontinhos aparecem e desaparecem, e um minuto


depois, ele responde.

Sean: Sim.
Emoção inesperada obstrui minha garganta enquanto
mais tensão deixa meus ombros. Olhando para cima, vejo
Cecelia me observando com cuidado antes de empurrar as
portas com as mãos cheias de pratos sujos.

Recupero meu lugar quando ela volta, e a campainha toca


para pegar. Um segundo depois, um novo prato é colocado na
minha frente.

— Coma antes que esfrie, — ela diz baixinho. Agarro sua


mão antes que ela tenha a chance de se afastar e trago as
costas dela para minha boca. Seus olhos caem para onde
pressiono meus lábios em sua pele antes de liberá-la.

— Obrigado.
Tobias insistiu em dirigir para casa, e estou grata por isso
– minha visão turva pela privação de sono, meu corpo doendo
por um dia de emoções dignas de uma montanha-russa. Tenho
tantas perguntas, mas não consigo fazê-las ainda, porque
qualquer pergunta que faço agora me torna vulnerável e
suscetível.

Claramente, eu o ouvi dizer que parou de mentir, e esse


comentário caiu onde pretendia. Depende de mim acreditar
nele. Alguns meses atrás, eu estava pronta para qualquer
verdade, qualquer explicação que ele estivesse disposto a dar,
e quando saí, fiquei em paz com a ideia de que nunca obteria
algumas de minhas respostas. Até agora, tudo o que ele
professou faz sentido de uma forma com a qual não me sinto
confortável, o que só torna difícil manter a minha animosidade.
Ainda estou me recuperando da invasão dele em minha vida e
quero que fique claro que ele não vai se safar com outra
aquisição hostil.

— Pare de pensar nisso, — diz ele suavemente, com a mão


no volante enquanto navega sem esforço de volta para minha
casa, seu perfil iluminado pelo sol poente. Ele está vestido de
maneira tão diferente do jeito que estou acostumada a vê-lo.
Moletom com capuz, jeans, tênis barato, cabelo desgrenhado,
sem produto e com um topete natural na testa. Ele é o mesmo
homem... mas diferente de uma forma que não consigo definir.
Talvez seja sua franqueza, sua ânsia de revelar segredos e as
partes de sua vida que ele escondeu. Ao mesmo tempo, ainda
sinto que ele está guardando algo, algo que estou perdendo.
Ainda estou chocada que ele esteja na Virgínia, dirigindo o
Camaro de Dom, com planos de dormir novamente na minha
cama – mais do que isso – fundindo nossas vidas.

Todas as coisas que eu considerava impossíveis há


poucos dias. Quero muito apenas ser feliz, aceitá-lo aqui e me
lançar na noção de que isso é permanente, mas flashes do
passado me assombram. Pela minha experiência, no minuto
que aceito o amor, aceito a felicidade, ele é arrancado de mim
de maneiras que mudam minha vida. Acusei-o de ser um
covarde, mas sou eu agora cujos medos estão ofuscando todo
o resto.

— Pergunte-me qualquer coisa, — diz ele, olhando na


minha direção brevemente.

Em vez disso, descanso contra o assento, meus olhos


secos, meus ossos doendo. A suspeita atormenta minha
consciência. Algo não estava certo hoje e não consigo definir o
que é, mas decido compartimentar isso por enquanto.

Nunca estive tão cansada, mas não consigo parar de olhar


para ele. Sua presença aqui é surreal. Nenhuma vez me
concedi qualquer versão de uma vida aqui que o incluísse,
porque estava tão decidida a deixá-lo ir. Suas revelações esta
manhã mudaram algumas de minhas percepções, e talvez seja
aí que esteja minha hesitação. Quanto mais tudo fizer sentido,
menos zangada ficarei. Quando ele para na casa, preciso me
esforçar para abrir a pesada porta do Camaro enquanto ele
recolhe alguns sacos plásticos do banco de trás, junto com um
saco de papel cheio de sopa de legumes caseira que ele pediu
antes de nós quando saia do café.

Ele me encontra no capô, impulsionando-me para frente


com a mão livre na parte inferior das minhas costas enquanto
nos aproximamos da porta da frente. Ele vasculha minhas
chaves, encontrando a certa e a enfia na fechadura. De pé à
sua direita, noto quando seus ombros caem para frente antes
que ele solte um suspiro pesado. A confusão se instala quando
ele coloca as sacolas no chão e se vira para mim. Colocando a
palma da mão aberta na minha barriga, um olhar familiar e
predatório em seus olhos, ele me leva de volta para a parede
ao lado da varanda, prendendo-me na casa.

Olho para ele enquanto ele me encara atentamente por


uma fração de segundo antes de enfiar os dedos no meu
cabelo, agarrando-o e colando sua boca na minha. Ofegante,
ele se aproveita da minha surpresa, incitando meus lábios a se
abrirem antes de varrer minha boca com fervor com sua
língua, colando nossos corpos juntos e eliminando todo o
espaço entre nós. Sua ereção roça meu estômago enquanto ele
me seduz completamente com seu beijo, e nesses momentos,
esqueço, esqueço minhas mágoas contra ele e o beijo de volta.
Agarrando seus ombros, começo a derreter em seu corpo
gigantesco, envolvendo-me em torno dele. Em algum lugar no
fundo da minha mente, há uma voz de protesto me lembrando
que estou participando livremente. Mas isso não é uma troca
de poder. Este é um beijo de amante, um lembrete.

Com o coração batendo forte, a calcinha umedecendo,


agarro o material do seu moletom para trazê-lo para mais
perto. Ele me permite, levantando minha perna e se esfregando
em mim enquanto nós dois nos perdemos, fazendo uma nova
memória, um beijo ardente que não esquecerei tão cedo. Um
grunhido de dor o deixa quando ele se afasta e olha para mim.
Nele, vejo – necessidade, desejo, luxúria, esperança.

— Queria fazer isso o dia todo, e se fizesse assim que


entrássemos nesta casa, não sei se conseguiria me conter.
Estou bem em não ser um cavalheiro porque esse não é quem
eu sou e nem quem você ama. Pedindo permissão para beijar
você? Nunca vai acontecer, porra.

Li suas ações, sua intenção enquanto ele se afastava e


recolhia suas sacolas antes de abrir a porta. Ele está tentando.
Tentando respeitar os limites claros que estabeleci, tentando
levar as coisas no meu ritmo, apesar do homem impaciente
que ele é.

Uma vez lá dentro, ele mantém seu olhar desviado como


se doesse olhar para mim.
— Vá tomar um banho. Vou levar Beau para passear e
esquentar esta sopa para você.

— Você não tem que fazer isso.

Ele para no limiar da sala de estar, com os ombros tensos,


de costas para mim.

— Só me deixe cuidar de você esta noite. Amanhã você


pode me encarar, gritar comigo, me colocar no meu lugar, ou
qualquer outra coisa que você achar que precisa fazer para se
sentir melhor sobre me deixar entrar. No entanto, você não
comeu e não dormiu desde que cheguei aqui, e não quero que
comece assim. — Sem esperar pela minha resposta, ele faz seu
caminho em direção à cozinha, e o vejo recuar, ombros pesados
enquanto traço meus lábios inchados com o dedo. Cada parte
de mim quer ir atrás dele, buscar seu beijo novamente, sentir
seu peso em cima de mim, desistir, mas minha mente vence e
caminho em direção ao chuveiro.

Quando estou recém vestida com meu pijama de flanela,


entro na cozinha para ver a tigela de sopa fumegante e um
bilhete ao lado dela.
Fui correr.

Sua ausência não me traz nenhum alívio. Nunca pensei


que seria tão difícil me comunicar com Tobias depois de todo
esse tempo. Neste ponto, não importa o quão bem nos
entrosemos, sentimo-nos como estranhos íntimos. Tudo sobre
nossa dinâmica mudou. Pela primeira vez, ele não está
entrando sorrateiramente em meu quarto sob o radar de
Roman, e temos a capacidade de ser abertos um com o outro,
publicamente sobre nosso relacionamento sem as
repercussões que nos ameaçavam antes. Sento-me à mesa
sentindo-me estranhamente culpada pelo espaço que estou
colocando entre nós, porque não consigo imaginar como isso
vai ser, ou pior, a sensação de que vai acabar de novo... é
apenas uma questão de quando e quão.

Ele vai se levantar e sair na primeira vez que a irmandade


enfrentar uma ameaça séria? Será que esta pequena cidade –
uma vida mais simples – aborrece-o a ponto de ele sentir que
vir aqui foi um erro? Odeio que meu medo decorra de investir
nele novamente, apenas para vê-lo partir. Odeio estar com
tanto medo de abraçar a ideia de nós permanentemente. Mas
ele me forçou a deixar isso de lado. Ele me forçou a imaginar a
vida sem essa possibilidade. Mas, principalmente, odeio que
tudo esteja, mais uma vez, em sua linha do
tempo. Entorpecida, é o que decido que sou no momento.
Dormente. E é para minha própria proteção.

Depois de comer metade da tigela de sopa, decido me


deitar cedo, irritada pelo fato de estar um pouco desconfortável
em minha própria casa por considerá-lo e o que ele pode estar
esperando de mim. Só consigo ler um capítulo de um novo livro
antes que meus pensamentos errantes comecem a se dissipar
e o sono exausto me domine.
Dezesseis anos

— Saia! — Victoria grita enquanto me enxugo e olho para


fora do banheiro para ver Dominic parado na soleira do meu
quarto, com os olhos cheios de minha namorada nua. Ele finge
que está surdo aos protestos dela, um sorriso malicioso
erguendo seus lábios. — Saia, seu pequeno pervertido, — ela
grita, alisando o lençol que puxou até o pescoço.

— Fora, Dominic, — grito. Enquanto ele permanece na


porta, cabelos loiros espetados aparecem sobre seu ombro.
Sean está festejando com ela também.

— Dá o fora. — Prendendo a toalha em volta da minha


cintura, atravesso o quarto e os forço de volta em um empurrão
firme antes de bater a porta na cara deles. Volto para Victoria.
— Desculpe, eles são jovens, idiotas curiosos.

— Tranque a maldita porta, — ela ataca antes de deixar


cair o lençol e puxar o sutiã do chão.

— Não há necessidade. Estou saindo em uma semana.


— O quê? — Ela olha para mim com os olhos arregalados.
— Indo aonde?

Encostado na porta, preparo-me para uma conversa que


temo.

— França. Escola Preparatória. Disse-lhe que me


inscrevi.

— Você vai embora em uma semana e acabou de me


contar? — Me preparo, sabendo que estou dentro disso. Eu
sabia que não devia ter uma namorada no verão.

— Eu pensei que a França era um tiro no escuro. —


Definitivamente foi, mas minhas raízes francesas ajudaram
muito em minha aceitação, a ironia que não passou
despercebida de que minhas raízes francesas são exatamente
o motivo de eu ter pensado nisso em primeiro lugar.

Mas não é por isso que ela estava apostando que eu não
tinha chance.

— Sim, acho que foi, para um cara como eu, vivendo


assim, — meu tom amargo.

— Isso não foi o que quis dizer.

— Sim, foi.

— Sinto muito, — ela sussurra.


Deixei a raiva rolar para fora de mim, sabendo que a
escavação foi feita para doer porque ela mesma se sentiu
picada.

— Não tive a intenção de machucar você.

— Nenhum cara bom nunca faz.

— Não me acuse disso.

— Não vou agora. Fui avisada.

— Deixe-me cuidar deles. — Puxo um moletom da minha


cômoda meio desabada. — Eu voltarei.

— Está tudo bem, — ela puxa o vestido de verão. — Tenho


que chegar em casa mais cedo desde que rompi o toque de
recolher com você na noite passada. — O tremor em sua voz
não caiu bem.

— Victoria. — Ela olha para mim quando a primeira de


suas lágrimas cai. — Eu disse que isso não poderia ficar
profundo quando estivéssemos juntos porque havia uma
chance de eu ir embora.

— Eu sei. — Sua decepção vem da esperança de que ela


seria algum tipo de exceção. Mas nosso relacionamento era
superficial porque eu não podia compartilhar nada com ela.
Ela era a garota perfeita para passar um verão. Embora
altamente privilegiada e um pouco exigente às vezes, ela tem
um bom coração. Ela pigarreia, fechando as sandálias. — Me
considero sortuda por estar com você. Agora eu gostaria de não
saber como era.

— Eu te ligo mais tarde.

Ela não responde.

— Vou chamá-la.

— E dizer o quê? Não vejo o ponto. — Ela balança a


cabeça. — Boa sorte na França.

Ela se levanta na ponta dos pés para me beijar e a beijo


de volta, liberando-a enquanto ela se afasta, hesitando antes
de abrir minha porta.

— Eu amo o fato de que você está saindo daqui. Você é


muito melhor do que este lugar.

Observo-a recuar no corredor. Pouco depois, ouço a porta


da frente se fechar. A culpa me atormenta e a reprimo
enquanto me visto. Deste ponto em diante, qualquer coisa que
se assemelhe a um relacionamento só vai atrapalhar meu
progresso – outra coisa de que tenho que desistir se pretendo
ver meus planos até o fim. Entreguei-me a Victoria porque ela
era minha última em um futuro previsível. Depois de me vestir,
dou passos raivosos pelo corredor e abro a porta do quarto de
Dom com a palma da mão. Sean se senta em sua cama de
solteiro, colocando um pouco da vodca de Delphine em um
frasco antes de substituir a bebida pela garrafa de água. Pego
em flagrante, ele me dá um sorriso malicioso e levanta um
ombro.
— O quê? Venho fazendo isso há meses. Isso a mantém
menos bêbada e mais hidratada.

— Eu disse para você ficar fora do meu quarto quando ela


estiver.

— Ela está sempre, — diz Dom, batendo em seu controle


remoto de onde está sentado em um pufe ultrapassado,
absorto no jogo. — Mas posso ver o apelo, belos peitos.

Tiro o controle remoto de sua mão e ele levanta o queixo,


pronto para minha ira.

— Que diabos está errado com você? Você sabe mais que
isso, — rosno.

— Também tenho um pau, irmão. Percebo as coisas, —


ele retruca sarcasticamente, tudo para mostrar e
principalmente para Sean, que pega seu controle remoto.

— Você vai passar o resto da sua semana com ela


trancada no seu quarto? Preciso marcar uma hora para bater
na sua porta? — Ele está atacando, e não é nenhum mistério
o porquê.

— Eu estava planejando levar vocês dois para acampar


esta noite, mas vocês podem dar um beijo de adeus nessa
merda.

Dom mal recua, mas sei que o machucou. Sean ganha


vida, jogando o controle remoto e abandonando o jogo.

— Estou aqui.
— Não, agindo dessa maneira, você não está. — Enfrento
meu irmão. — E não seja desrespeitoso com ela.

— Você a ama ou algo assim? — Dom pergunta, mais por


curiosidade do que qualquer coisa, mas não há necessidade de
termos essa discussão. Ele está muito à frente da curva nessa
frente, como está na maioria das coisas. Embora eu tenha
certeza de que ele ainda é inocente e decidido a mudar esse
status. Pela atenção que está recebendo, não vai demorar
muito.

— O que eu disse que papai disse?

— Quando você ama alguém, nunca é uma pergunta que


você tem que fazer a si mesmo.

Concordo.

— Mas mesmo se você não fizer isso, você os trata bem.


Não há necessidade de agir como um idiota, mesmo se você
estiver pensando com isso.

— Sábio conselho, obrigado, irmão. Ficarei feliz em


terminar suas palestras em uma semana. — Ele olha de volta
para Sean. — Nós dois vamos.

— Você quer um excelente exemplo do que o homem


errado pode fazer a uma mulher? — Empurro meu queixo em
direção ao quarto de Delphine. — Dê uma boa olhada na sua
tia.
Isso os acalma consideravelmente quando olho de um
para o outro.

Dominic revira os olhos.

— Você quer que eu sinta pena dela?

— Não, quero que você entenda por que ela é do jeito que
é.

— Por escolha.

— Assim como você está escolhendo ser um idiota


ignorante agora.

Aos onze anos, ele é duas vezes mais inteligente do que


eu e três vezes mais difícil de lidar. Sou parcialmente culpado.
Compartilhei com ele quase tudo que sei.

— Não desrespeite as mulheres, ponto final. Elas são


duas vezes mais evoluídas do que a maioria dos homens jamais
será. Não jogue fora sobre elas também. É um sinal de
fraqueza, e elas não são sacos de pancadas. Elas são um
santuário, e você precisa descobrir isso rápido.

— Por quantas você passou ultimamente? — Sean salta.

— Ouça o que estou dizendo.

— Nós temos uma escolha? — Dom berra, e eu o empurro


para sentar no colchão que ele cresceu. Ele tem sido
especialmente agressivo nas últimas semanas e está claro por
quê.
— Estou indo embora, irmão, e sinto muito por deixá-lo
com ela, mas é o que é melhor para nós. Você tem que confiar
em mim.

— A milhares de quilômetros de distância, sim, é o melhor


para nós, — ele retruca secamente.

Seguro minha nuca, a dor crescendo em meu peito.

— Você entenderá o porquê em breve.

— Não tenho que entender merda nenhuma. — Eu o puxo


para ficar de frente para mim, e instantaneamente Sean fica
de pé. Raramente bato em meu irmão, mas é a reação de Sean
que me permite saber onde estamos nessa frente. E é um alívio
que sinto quando Sean se curva, pronto para defendê-lo sem
pensar duas vezes. Nada além de orgulho me preenche, mas
mantenho meu tom agressivo enquanto olho para Dominic.

— Você acha que não te levaria comigo se pudesse?

— Não, você só vai partir pelos próximos seis a sete anos


porque é o que é melhor para nós.

— E não vou ficar seis malditas semanas sem ver você.


Expliquei isso.

— Veremos, — Dom murmura, clara dor brilhando em


seus olhos. Ele está tão apavorado quanto eu sobre nossa
separação iminente. Sean tem estado tão impaciente quanto,
brincando de piadista e agindo um pouco mais para esconder
sua apreensão sobre a minha partida. Meu único conforto é
que eles terão um ao outro.

— Por que Paris? Por que tão longe? — Sean pergunta


enquanto divido meu olhar entre eles. Está claro que o tique-
taque dos meus últimos dias está cobrando seu preço, o que
me deixa no centro de tudo.

— Coloque as garrafas de volta e faça as malas agora – é


hora, você sabe.

— Sabe o quê? — Dom pergunta.

— Que tudo o que estou fazendo é por você.

— Não consigo ver a lógica, irmão.

— E quando você fizer isso, vou fazer você comer essas


merdas de palavras. — Me viro para Sean. — Pegue Tyler e seu
equipamento e esteja de volta aqui em meia hora.

Sean abre a janela.

— Pronto.

— Sean, — chamo-o, e ele faz uma pausa com uma perna


para fora da janela, — por que você não tenta usar a porta da
frente?

Ele me dá seu sorriso característico.

— Onde está a diversão nisso?


Balançando a cabeça, volto meu foco para meu irmão,
que me estuda com curiosidade.

— Onde estamos indo?

— Meu lugar.

Isso o cala. Ele está me implorando há anos para levá-lo


comigo, mas nunca fiz, até esta noite. Ele me seguiu uma vez,
e eu o peguei no meio do caminho e caminhei com sua bunda
direto de volta para casa. Meu lugar sempre foi aquele em que
encontro um pouco de consolo, onde meus pensamentos
caóticos e pânico se transformam em algo mais definível. Onde
posso entender mais do que questiono. E nunca quis
compartilhar isso, até agora.

O pavor me enche quando penso em deixá-lo neste


buraco de merda, e à mercê de Delphine, mas ele tem a pele
dura o suficiente para aguentar, e sua confiança mais do que
compensa qualquer uma de suas outras deficiências – tenho
certeza disso. Posso ter ultrapassado alguns nessa frente pela
quantidade de atitude que ele tem dado.

Do outro lado do corredor, coloco algumas roupas de


alguns dias em minha mochila, assim que Delphine chega do
seu turno, olhando para nós dois do corredor antes de optar
pelo meu quarto.

— Onde vocês dois estão indo?

— Acampamento. Estaremos de volta em alguns dias. O


que você precisa?
— Nada, — ela cruza os braços na minha porta, me
observando embalar. — Obrigada por pagar a conta de luz. —
Com o acordo de morte de meus pais, combinei de pagar
algumas de suas contas no primeiro ano que estou na França,
mas me recuso a dizer isso a ela. Para alguém como Delphine,
isso é permissão para se dobrar, e ela tem tentado secar
recentemente, pelo menos em um nível mais funcional e menos
destrutivo.

— Você está bem para o resto do mês? — Dobro minha


camisa pela terceira vez.

Ele vai ficar bem. Ele vai ficar bem.

Frustrado, desdobro novamente e reinicio o processo,


sentindo os olhos dela em mim.

— O quê?

— Mesmo se eu não estivesse bem, não quero um centavo


desse dinheiro de merda. Vou morrer de fome primeiro.

— Sim, bem, é necessário para mim. Não deixe meu irmão


sofrer por causa do seu preconceito, — advirto-a. — Ele já
sofreu o suficiente.

— Por que acampar?

— Temos muito que discutir.

Ela morde o lábio, entra e fecha a porta.

— Tem certeza de que é isso que deseja fazer?


— Já falamos sobre isso.

— E você está contando a eles agora? Você acha que eles


vão mesmo entender?

— Eles ouviram algumas das reuniões. É um risco que


tenho que correr. Eles precisam começar a prestar atenção.
Em algum momento, eles continuarão em jogo ou se
apresentarão, mas estou disposto a apostar que é o último. Ele
é brilhante, mas ainda é apenas uma criança.

Ela ri.

— Então é você.

Ela permanece imóvel onde está, e isso me irrita quando


enrolo novamente a mesma camisa, incapaz de manter a
contagem adequada com o público. O suor goteja na minha
têmpora, e me ressinto pra caralho por ela estar lá, observando
cada movimento meu enquanto o pulso familiar e o mal-estar
se instalam.

— O quê?

— Seus pais ficariam orgulhosos. — Olho para cima para


vê-la com os olhos vidrados. Ela ficou mais branda com o
passar dos anos, mais uma bêbada sentimental do que
mesquinha. — Eu os envergonhei com a maneira como lidei
com isso. — Uma rara confissão vindo dela. Algo está
acontecendo.
Caminho até onde ela está. Minha tia é uma das mulheres
mais bonitas que já vi, mas foi manchada por uma vida que
roubou a maior parte do que havia de bom nela. Ela nunca vai
andar em linha reta emocionalmente, e nunca vou ser capaz
de confiar totalmente nela com meu irmão por causa da
maneira como ela se trata. É por isso que estarei em casa a
cada seis semanas e passarei todas as férias de festas e verão
em Triple Falls. Recuso-me a deixá-la ser a única a moldar o
resto dele.

— Você quer consertar?

— Estou muito além do ponto de redenção, sobrinho, —


ela admite, não encontrando bem o meu olhar.

— Talvez, — concordo, — mas se você for sincera. —


Baixo minha voz. — Traite-le bien. — Trate-o bem.

— Tenho tentado falar com ele. — Há esperança em sua


voz, e isso ajuda a diminuir um pouco do pânico que sinto.

— Ele não precisa de outro amigo. Ele precisa de


autoridade agora, mais do que nunca. Mas você tem que ter o
respeito dele para ouvir. Conte a ele suas histórias. Diga a ele
o que você me disse. Conte a ele seu passado. Essa é uma boa
maneira de ganhar. Sois ferme. Mais traite-le bien. Il te résiste
maintenant. Les choses ne changeront pas du jour au
lendemain, mais si tu restes ferme, il s'y fera. Fais cela et tu
auras gagné ma confiance. — Seja firme. Mas trate-o bem. Ele
está imune a você agora. As coisas não mudarão da noite para
o dia, mas se você permanecer o mesmo, ele entrará na linha.
Faça isso e você terá conquistado minha confiança.

— Seu francês está muito melhor, — ela comenta.

— Eu sei. — Fiquei enferrujado por um tempo e falhei


com Dominic em manter sua língua nativa.

— Pequeno bastardo presunçoso, — ela murmura antes


de olhar para mim com preocupação. Ultrapassei sua altura
anos atrás. — Você tem certeza disso? Você sabe com quem
entrar em contato quando chegar lá?

— Tenho. Eu tenho isso há muito tempo.

— Ok, — ela puxa a camisa da minha mão e a enrola em


vez de dobrá-la antes de colocá-la confortavelmente na minha
bolsa. — Não vai enrugar dessa maneira. Não que isso importe,
mas... — ela dá de ombros.

Eu olho para a camisa e depois de volta para ela antes de


tirá-las todas e enrolá-las da mesma forma.

— Senhor Sabe Tudo ainda não sabe tudo, — ela ri. —


Isso vai homenagear seu papai. Ele falou muito sobre...

— Falar. — Eu balanço minha cabeça, irritado. — Não há


mais conversa. Estou cansado de falar, e se eles se tornarem
parte disso, — aceno na direção do quarto de Dominic, — eles
têm que saber o que está acontecendo. Ele acha que estou
saindo para sair daqui, dele. — As palavras me machucam.
— Achei que você estava saindo para ficar longe de mim,
— sua risada autodepreciativa diz tudo. Isso é o mais perto que
chegarei de um pedido de desculpas.

— Nós sobrevivemos por tanto tempo. — É a melhor coisa


que posso dizer sobre isso. Ela se estabilizou o suficiente
depois de uma briga explosiva entre nós e começou a hospedar
as reuniões. Por mais que eu esteja enojado com alguns de
seus comportamentos, tenho alguma admiração pela maneira
como ela se comporta, inabalável em suas crenças,
fundamental em sua entrega.

— Você não vai deixar os outros saberem disso? — Ela


está se referindo aos membros principais que comparecem às
reuniões.

— Ainda não.

— Você acha que isso é sábio?

— Acho que se eu estragar essa tentativa, não vai me


ajudar se eles souberem que fiz.

— Apenas tenha cuidado. Essas pessoas que você está


procurando não são para se mexer, Ezequiel. Do tipo que seu
pai...

— Se você não tomar cuidado, Delphine, vai soar


maternal.

— Deus me livre, — ela brinca, mas há preocupação


genuína em sua voz e expressão.
Sem se demorar, especialmente nos sentimentos, ela se
despede, mas coloca a cabeça para dentro antes de fechar
minha porta.

— Você realmente vai fazer isso, Tobias. Eu sei isso.

—Sim, realmente vou. E eles também, — aceno em


direção ao quarto de Dominic. — Marque minhas palavras.
Eles nasceram para isso.

Sentado na cadeira de encosto alto em frente a uma


lareira, os dedos pairando sobre o teclado do meu laptop,
perco-me na memória daquela noite em torno da fogueira, a
noite em que desenterrei meus planos. Menos de uma semana
depois, estava abraçando meu irmãozinho com força, lutando
contra as lágrimas enquanto ele lutava para se libertar de
minhas garras. Eu o envergonhei publicamente com minhas
emoções. A memória disso me faz apertar com força os braços
de veludo da cadeira. Volto a pensar quando Beau ganha vida
aos meus pés, orelhas em pé antes que ele coloque seu queixo
para trás para descansar em suas patas. É quando ele se
levanta novamente que ouço um gemido fraco e dolorido vindo
do quarto. Com o peito balançando, fecho meus olhos e
amaldiçoo, seu gemido agonizante ficando mais alto enquanto
fecho meu laptop e pulo de pé. Beau espreita ao meu lado
enquanto corremos em direção ao quarto. Uma vez lá dentro,
clico em sua lâmpada e olho para baixo para ver seu rosto
torcido, a testa coberta de suor e seu braço sacudindo ao seu
lado. Um sonho ou pesadelo? De qualquer forma, não suporto
o estado em que ela está. Quando estávamos juntos antes, ela
me acordava com seus movimentos sutis ou risadas leves, e eu
a observava, curioso para saber o que ela estava sonhando e
antecipando ouvir sobre isso de manhã. Era uma situação
muito diferente da atual, e esses sonhos também são muito
diferentes.

É quando um soluço explode dela que cerro meus


punhos, determinado a tirar o fardo.

Eu fiz isso. Eu vou desfazer isso.

Sentando-me na beira da cama, inclino-me e beijo sua


têmpora, e ela mal se levanta antes de voltar ao estado de
sonho.

— Dis-moi contre qui me battre, et je me battrai jusqu'à


ce qu'ils disparaissent. — Diga-me com quem lutar. Vou lutar
até que todos eles vão embora. É quando as lágrimas começam
a cobrir suas bochechas que gentilmente a levanto contra o
meu peito, seus braços moles ao lado do corpo.

— Dis-moi comment réparer cela. Dis-moi, mon amour.


Je ferai n'importe quoi. — Diga-me como consertar isso. Diga,
meu amor. Farei qualquer coisa. Outro soluço escapa quando
ela acorda, e eu a seguro com força para tentar mantê-la com
os pés no chão.

— Ce n'est qu'un rêve, Tesor. Je suis là. Je suis là. —


Apenas um sonho, tesouro. Estou aqui. Estou aqui.

Meu nome se derrama em um grito gutural de seus lábios


enquanto meu peito desaba, e os soluços começam a sair dela,
seu corpo tremendo enquanto as lágrimas escorrem pelo seu
rosto. Eu as beijo uma por uma enquanto ela tenta falar, mas
em vez disso chora, agarrando-se a mim.

— Está tudo bem, Cecelia. Está bem. — Gritos silenciosos


destroem seu corpo enquanto ela agarra minhas costas, e beijo
seu rosto, seus lábios, seu nariz, sua têmpora antes de abaixar
minha boca até sua orelha.

— Estou aqui. — Não posso prometer a ela que nada de


ruim vai acontecer ou que nenhum monstro está à espreita nas
sombras porque há. Só posso tentar protegê-la deles e do dano
que o monstro adormecido dentro de mim pode causar a ela.
Finalmente acordando, ela fica tensa e funga, recompondo-se,
e a solto, seus olhos inchados erguendo-se para os meus.

— Conte-me.

— Agora não, — ela murmura, o olhar caindo. — Acho


que acordei você?

— Não, eu estava na sala de estar, no meu laptop.

— Você não consegue dormir?


— Ainda estou um pouco com o jet lag. Tem certeza de
que não quer me dizer?

— Foi apenas um sonho. — Essa declaração e sua


postura tiram toda a intimidade do momento. Sua guarda está
de volta e firmemente no lugar. Tento pressioná-la um pouco
para mantê-la perto de mim, na esperança de uma confissão,
mas a solto quando ela se afasta, vira ao meu redor e se
levanta. — Estou bem.

Pego sua mão antes que ela possa recuar totalmente.

— Não minta para mim.

Ela fica tensa antes de olhar por cima do ombro para onde
me sento na beira da cama. Ressentimento. É tão claro, sua
voz fria quando ela fala.

— Esse é um pedido ousado.

— Estou ciente.

— Você quer honestidade? — Ela afasta a mão. — Passei


anos com esses sonhos sem você.

Essa declaração, junto com o eco firme da porta do


banheiro se fechando atrás dela, permite-me saber exatamente
onde estou.

Ela não precisa de mim, mas disso eu sabia. Ela se tornou


sua própria mulher, independente, ferozmente e muito mais
forte. Ela não precisa de mim, e é um fato que terei de conviver
e respeitar.
Só preciso fazer ela me querer novamente.

Seu rosto está claro quando ela sai minutos depois, com
uma postura estoica quando seus olhos se erguem para os
meus.

Desafio.

Minha lutadora.

Ela está me desafiando a pressioná-la, mas esta noite não


irei. Pego minha camiseta, puxo sobre minha cabeça e a jogo
no chão. Seu olhar cai quando tiro minha calça de moletom e
saio dela. Não temos relações íntimas há meses, na verdade,
anos, por causa da maneira como a tomei da última vez em
minha raiva infundida com gim, algo pelo qual nunca me
perdoarei. Não há nada que eu queira mais do que apagar isso
como da última vez que a tive, substituir aquela memória,
substituir o som persistente de seus gritos angustiados por
gemidos de prazer. Mas, mesmo se ela estivesse livre daquela
porra de pijama de flanela da cabeça aos pés, não a levaria.
Não com a hesitação cautelosa em seus olhos, o medo. Isso
não me impede de precisar dela ou de ficar duro com a visão
da bela e estruturada igual em que ela cresceu. Ela se irrita
quando caminho até onde ela está, com raiva, emocionalmente
confuso, atormentado por um passado que não posso mudar e
erros que não posso apagar.

— Também não sei como isso vai, — respiro. — Não sei


quanto tempo vai demorar, ou que palavras dizer, ou o que
fazer. Não tenho planos, Cecelia, nenhum. — Aperto sua mão
e a levo de volta para a cama. Ela deita de costas para mim,
sem palavras, e a puxo para o meu peito, meus braços em volta
dela.

Seu cheiro, o conforto de saber que ela está segura, alivia


um pouco o sopro de seus gritos. Espero, espero sua
explicação, espero que eu não tenha sido a causa de suas
lágrimas, mas nada acontece.

Tempo. Meu maldito inimigo, uma força invisível que


nunca fui capaz de derrotar. Segundos para salvar meu irmão,
agora anos entre mim e a mulher que amo, tudo devido aos
meus julgamentos, meus erros. E é a hora que levanta sua
cabeça feia para mim agora, zombando de mim, o principal
motivo da barreira entre nós.

Ela viveu muita vida sem mim.

A ironia? Tenho que fazer as pazes com meu nêmesis


porque é a única coisa que pode nos curar.

— Ce rêve dans lequel nous sommes tous les deux.


Emmène-moi avec toi. — Esse sonho que vivemos juntos. Me
leve com você.

Ela agarra minha mão, a que apalpa sua barriga, e não


muito tempo depois, ela se afasta e me leva com ela.

Acordo sozinho.
Idade Dezoito

A batida forte na minha porta seguida por:

— Vamos, King, sei que você está aí, — fez-me fechar meu
livro com um gemido. Só há uma pessoa que sabe o endereço
do meu quarto no albergue.

Abrindo a porta um centímetro, encontro um sorriso de


megawatt. Como de costume, ele está impecavelmente vestido,
como se tivesse acabado de sair de uma revista masculina para
o mundo real. No entanto, não há nada de mundo real sobre
ele, e isso o invejo.

— Sim, assim como eu pensei, é nossa última noite, e


você está decidido a desperdiçá-la, deixe-me adivinhar, lendo?
Você seria inútil para mim se todas as garotas da escola não
quisessem um pedaço de você. Acontece que estou precisando
do meu ala esta noite. — É mentira. Ele é famoso por sua
reputação entre os alunos e pela atenção que chama com sua
personalidade e travessuras. Até eu gostei dele imediatamente,
apesar de meus melhores esforços para ficar longe. Ele é o
oposto de mim em busca de atenção. Debaixo de sua trincheira
de aparência cara, ele pega uma pequena garrafa de gim e a
levanta até minha linha de visão. — Só uma vez, eu adoraria
tirar essa carranca do seu rosto. Vista-se e farei o meu melhor.

— Estou ocupado.

— Besteira, você está tão entediado quanto eu. Você tem


um minuto antes de começar a cantar canções de Natal em
soprano, e se isso não funcionar, farei muito, muito pior.

Irritado, mas sabendo que ele vai apoiar sua ameaça,


afasto-me da porta, ignorando seu sorriso presunçoso de
vitória quando ele a fecha atrás de si. Movendo-me em direção
à prateleira no meio da sala, pego minhas roupas e tiro minha
melhor camisa. Devido ao orçamento absurdamente apertado
em que optei por um quarto individual, estou praticamente
vivendo no ar neste momento. Roupas novas são um luxo que
não posso pagar no futuro previsível e, da última vez que
troquei a etiqueta de venda do suéter de preço integral que
queria, quase fui pego. Paris é uma cidade cheia de ladrões
experientes e, desde aquele dia, tenho sido um observador
atento daqueles que encontrei. Meu aprendizado superior
estendeu-se além dos meus estudos para um truque mais
habilidoso.

Preston olha ao redor da sala e depois de volta para mim,


e fico grato quando não vejo um pingo de pena em seus olhos.
Eu o desprezaria por isso.

— É triste. — Honestidade. É uma das coisas que mais


aprecio nele e concordo com ele. Não há nada além de uma
cama de solteiro em meu quarto, o cabideiro fornecido e uma
pequena escrivaninha com uma luminária embutida que
comprei e arrastei dez quarteirões de uma liquidação de rua.

— Um homem de poucos meios. Eu gosto disso.

Abotoando a camisa, movo-me para pegar meus sapatos


de couro desgastados debaixo da cama enquanto Preston
coloca o gim na minha mesa antes de caminhar e folhear
minhas roupas, procurando por algo mais adequado. Quando
ele inevitavelmente não encontra, ele se vira para mim, seus
olhos me observando enquanto amarro meus sapatos. — Está
congelando, cara. Pegue sua jaqueta. Melhor ainda, tenho um
sobressalente no carro. Pegue o meu. — Ele desliza para fora e
caminha até mim. Em vez de discutir com ele, o que é foda na
maioria das vezes, empurro meus braços enquanto ele o
estende para mim. O ajuste é perfeito.

— Admita. Você vai sentir minha falta, King.

— O que há para perder? Você é uma pessoa barulhenta,


detestável, autoritária e ridícula.

— Ah, amigo, sinto o mesmo por você.

Sorrindo, ele pega o gim da minha mesa, abre a garrafa e


toma um gole antes de empurrá-lo para mim. Aceito a garrafa
oferecida, engolindo um gole da bebida gelada antes de fazer a
temida pergunta.

— Aonde estamos indo?


— Para pintar a cidade.

— Não estou sentindo essa ideia.

— Você não está sentindo nada ainda. Tome outra


bebida.

Engolindo outro gole, devolvo para ele antes de levá-lo


para fora do meu quarto.

— Sua fechadura quebrada ou algo assim? — Ele mantém


seu olhar em meus dedos que trabalham rapidamente. É então
que percebo que estou na minha terceira curva, uma
necessidade avassaladora surgindo para reiniciar minha
contagem. Em vez disso, tiro minhas chaves e coloco-as em
sua jaqueta. Não posso deixar de correr meus dedos ao longo
do forro caro.

— Velho hábito, — encolho os ombros. — Foi meu


bloqueio em casa que teve problemas.

Aceitando minha desculpa, começamos a descer o


corredor para sair do albergue. Uma vez do lado de fora, ele me
leva logo após a entrada de uma limusine apagada em ponto
morto no momento em que seu motorista salta para abrir a
porta para nós.

— Por que gim? — Pergunto a ele, deslizando para o


assento de couro.
— A bebida marrom traz à tona o que há de pior nos
homens, — ele se senta à minha frente. — Isso é o que meu
pai diz, bem, o que ele costumava dizer.

Como eu, Preston é órfão. Seu pai era um congressista


que morreu de ataque cardíaco relativamente jovem. Sua mãe
o seguiu logo após uma mastectomia dupla não poder salvá-
la. A diferença entre nós é que ele foi alimentado com uma
colher de platina e é o benfeitor não apenas da fortuna de seus
falecidos pais, mas também das gerações anteriores. Dinheiro
antigo em abundância. Ele nunca terá que trabalhar um dia
em sua vida, o que o torna sem objetivo e, pelo que descobri,
um pouco imprudente. Recém-dezenove anos, ele incorpora a
realização do sonho americano. No entanto, porque ele é do
jeito que é, não posso odiá-lo por isso. Ele não me trata como
um caso de caridade, mas por meio de pequenos gestos e
histórias compartilhadas, posso sentir sua empatia, e isso às
vezes me irrita. Mesmo quando você faz o melhor para
mascarar a pobreza, isso pode ser dolorosamente óbvio.

— Fui enviado para a França por conselho de meu tutor


e planejador educacional para ampliar meus horizontes e obter
alguma experiência mundial. Meu semestre acabou, cara. Vou
para casa amanhã completamente insatisfeito com o tamanho
dos meus horizontes. — Seu sorriso indica sua intenção antes
de colocar em palavras. — Vamos mudar isso esta noite.

— O que poderia dar errado?


Ele bate o dedo ao longo do assento de couro ao lado dele,
e eu ainda meus próprios dedos enquanto ele me agracia com
outro sorriso presunçoso.

— Foda-se, — resmungo.

— Vamos deixá-lo relaxado. — Ele agarra a vala


sobressalente no assento ao lado dele, sem deixar dúvidas de
que trouxe a que estou usando para mim. Ele puxa uma caixa
de prata de um dos bolsos internos, abre e tira um baseado
antes de acendê-lo.

— Vamos começar com o jantar, — diz ele em uma


expiração enquanto nos afastamos do meio-fio, — um mínimo
de cinco pratos. Vamos ter uma noite de cavalheiros. — Ele
tira uma gravata de outro bolso e a joga no meu colo. — Há um
código de vestimenta.

Manuseando a seda, aceno e olho para ela enquanto o


calor sobe pelo meu pescoço.

— Eu...

— Não diga mais nada, meu amigo. — Em segundos,


Preston manipula a gravata com mãos seguras em um laço
ajustável antes de jogá-la de volta para mim.

Enganchando em volta do meu pescoço, puxo com força


na base da minha garganta e olho para ele. Ele me dá um
aceno afiado de aprovação. É ao mesmo tempo humilhante o
quanto presumo saber e o quanto sou lembrado diariamente
do quanto tenho que aprender. Passar um tempo com caras
como Preston reitera isso para mim, o que às vezes pode ser
irritante. Conhecimento é poder e chave, mas também é
experiência.

Preston tem essa vantagem. Ele teve um mentor em seu


pai até os dezesseis anos. Não tive tanta sorte. A ideia de que
Roman Horner anda livremente, tão privilegiado quanto,
enquanto eu agonizo por causa de uma gravata faz meu
sangue ferver. Quando chegar a hora, não quero que ele tenha
nenhuma vantagem. Por enquanto, enquanto meu
ressentimento aumenta, sou um observador, mas um dia, não
serei. Esse dia é o que me mantém alerta, ansioso para
aprender o máximo que puder. Roman tem a vantagem de
conhecimento, idade e experiência, e não há muito que posso
ganhar com um livro. Mas mais do que isso, como Roman,
Preston parece já saber quem ele é.

— Pela primeira vez, King, quero que você me deixe ficar


no comando. Não vou deixar você perder mais um segundo de
nossa juventude.

Ele está cheio de merda com essa declaração, e nós dois


sabemos disso. Preston veio em uma onda, com sua
personalidade inevitável, agarrou minha mão e me levou com
ele durante a maior parte de sua viagem neste semestre na
preparação. Temos sido uma força a ser reconhecida nos
últimos meses, principalmente devido à atenção dos nossos
colegas de saia, o que só nos tornou mais perceptíveis e nos
colocou em algumas lutas, principalmente dele, porque ele
adora desafios.
Por alguma razão, confio nele e confio em mim mesmo com
ele. Ele não tem aquele olhar nervoso, ele está nisso puramente
por esporte, não por autodestruição, e isso me atrai. Nada me
agrada mais do que forçar os limites do que posso fazer.

As poucas vezes que recusei seus convites foram para


estudar para manter minha média ou porque tive que voar de
volta para casa. Mas mais do que compensamos o tempo
perdido com ressacas correspondentes. O relacionamento dele
é o mais fácil e de menor manutenção que já tive. Com ele, eu
me permiti uma liberdade que nunca terei em casa. E sei com
certeza que, uma vez que ele se for, voltarei aos meus modos
reclusos.

— Ontem à noite, King, — diz ele, pegando dois copos de


gelo do bar abastecido e dividindo o resto do gim entre eles. —
Vamos fazer valer a pena.

Ele estende um para mim e brinco com ele.

Nas últimas semanas, estive... desligado. Embora minhas


notas sejam excelentes, meu GPA alto não é garantia, e terei
que me esforçar para estar pronto para o exame de admissão
ao HEC no próximo outono. Está tudo no ar neste momento,
pois meus esforços para encontrar antigos contatos de meus
pais para ajuda e orientação se mostraram infrutíferos. Meu
pai biológico parece ter arruinado minhas chances com seu
comportamento anterior. Ninguém quer lidar com o filho de
Abijah Baran. Minha lista está quase esgotada neste momento.
A cada porta que bate na minha cara, mais começo a achar
que minha presença aqui é um erro. Um erro caro. Não estou
chegando a lugar nenhum, e entre o estresse de me preocupar
com meu irmão, sua segurança e nossas finanças em declínio,
enquanto não faço nenhum progresso aqui, preciso de toda a
fuga que puder conseguir.

— Estou dentro.

Luniz canta “I Got 5 On It”, enquanto um baixo pesado


troveja aos meus pés. Cabelo loiro angelical bloqueia minha
visão, fazendo cócegas no meu nariz antes que uma bunda em
forma de coração ocupe o resto da minha linha de visão.

— Tu me aborrece. — Você está ferindo meus sentimentos.

Atenção totalmente atraída para onde pretendia, sou


recompensado com o arrepio de seus lábios carnudos pintados
de rosa brilhante. — Te voilà. — Aí está você.

— Pardonne-moi. — Me perdoe. Rastreando seus


movimentos com apreciação, coloco uma das notas no cordão
de sua calcinha.

— On ne touche pas. — Não toque.


— Perdão. — Levanto minhas mãos enquanto o
segurança que monta guarda ao lado de nossa cabine avança
com um olhar de advertência. Em minha defesa, o mastro e o
palco elevado ficam a apenas trinta centímetros de nossa
mesa, o que o torna um lugar privilegiado e, para mim, uma
boa desculpa para olhar mais de perto.

— Est-ce ta première fois dans un endroit comme celui-


ci? — É a primeira vez em um lugar como este?

O pescoço aquecido por causa da transparência, decido


que não adianta mentir.

— Oui.

— Ah, mais un homme comme toi ne devrait pas avoir


besoin d'être ici. — Ah, mas um homem que se parece com você
não deveria estar em um lugar como este.

Sua voz é puro sexo, seu corpo uma oferenda, mas faço o
meu melhor para manter o meu juízo sobre mim, apesar da
mistura de vinho e gim correndo em minhas veias. Mas ela está
certa em sua avaliação. Nunca estive em um lugar como este,
e até eu sei que este clube é tão sofisticado e exclusivo quanto
parece. E desde que passeamos pouco depois da meia-noite,
barrigas cheias da melhor cozinha francesa e vinhos caros –
pelos quais imediatamente adquiri o gosto – ganhamos a
atenção da maioria das dançarinas, especialmente porque
Preston não tem falta de dinheiro e tem sido tão generoso com
isso. A mulher com a intenção de quebrar minha concentração
balança suavemente seus quadris em uma provocação
deliberada enquanto desvio meu olhar de volta para o homem
sentado no VIP. É claro que ele não é um patrono de primeira
viagem. A seção onde ele fixou residência fica bem em frente
ao nosso estande, elevada apenas alguns passos curtos acima
do andar principal para ter certeza de que sabemos nosso lugar
na cadeia alimentar.

O que nos separa é uma corda de veludo e uma


quantidade insana de influência e dinheiro. Embora eu tenha
certeza de que se Preston flexionasse sua conta bancária, ele
seria um candidato ao prêmio mais alto aqui.

Não sou obcecado por dinheiro, conheço os males dele,


mas mais de uma vez esta noite, fui esbofeteado pela realidade
da minha posição devido à falta dele. Penso em Dom, ainda
dormindo na porra do mesmo colchão duplo que ele tem desde
os cinco anos, o telhado vazando no canto de seu quarto e o
mofo crescendo em seu armário por causa disso. Meu quarto
sem brilho no albergue é um palácio em comparação.

— Je pourrais te permettre de me toucher. Mais pas si tu


continua à m'insulter en détournant ton. — Eu posso permitir
que você me toque. Mas não se você continuar me insultando
olhando para longe.

Olhos castanhos claros me repreendem enquanto ela


arqueia as costas contra o poste em outra tentativa de ganhar
meu interesse. É uma oferta tentadora, mas estou muito
distraído, minhas razões para ficar em Paris diminuindo a
cada segundo. Eu poderia desligar agora, deixar algumas de
minhas aspirações irem. Eu poderia frequentar uma
universidade da Ivy League em casa e encontrar uma maneira
de pagar por isso. Daqui a quatro ou cinco anos, garanta um
emprego com um salário de seis dígitos, o suficiente para tirar
Dom da merda de Delphine e garantir seu futuro.

Mas é um pressentimento, combinado com os cabelos da


minha nuca se arrepiando, que faz meus pensamentos
mudarem novamente. Uma tensão tangível vem crescendo
desde que os três homens de terno entraram, meia hora atrás.
O cajado se espalhou como ratos. E pelo que tenho
testemunhado, é devido a uma mistura de medo e respeito, o
que me leva a acreditar que eles são alguém importante ou
trabalham para alguém importante, e estou determinado a
descobrir isso.

— Dis-moi sur quelle chanson danser. Tu vas voir, ça en


vaudra la peine. — Diga-me qual música devo dançar. Você
verá, valerá a pena.

É o homem sentado na mesa do canto que estou mais


curioso. Ele não prestou nem um pouco de atenção as
dançarinas. Tudo sobre seu comportamento grita homem
organizacional. Ele já passou, no máximo, uma década do seu
auge e é muito, muito bem pago, o que deduzo de sua
vestimenta, das garrafas de dinheiro altas que são entregues
em sua mesa a cada poucos minutos e do charuto que está
mascando. É clichê gangster 101, tão óbvio e desagradável.
Provavelmente, eles estão mais bêbados com o efeito, com a
atenção que conseguiram do que com a bebida que estão
jogando goela abaixo.

— Arrête de respecter, si tu ne veux pas qu'il te remarque.


— Pare de olhar se não quiser que ele perceba você.

— Qui est-il? — Quem é ele?

— Un homme qui n'aime pas qu'on pose des questions à


son sujet. — Um homem que não gosta que façam perguntas
sobre ele.

Colocando uma das notas mais altas na minha mão em


seus calcanhares, ela olha para baixo e depois para mim antes
de sacudir sutilmente a cabeça.

— Je ne sais rien. Personne ne sait rien ici. Et personne


ne te dira quoi que ce soit. Mais tout ce que je sais, c'est que
si tu coloca questões trop de, si tu suscites le moindre
soupçon, tu disparaitras, ou tu le souhaiteras fortement. — Eu
não sei de nada. Ninguém aqui sabe. E ninguém vai lhe dizer
nada também. Mas o que eu sei é que se você perguntar, se
sequer levantar suspeitas, você desaparecerá ou desejará ter.

Olho para o maço de dinheiro que Preston pressionou em


minha mão no carro antes de chegarmos e sei que se eu
embolsar um pouco, isso tornará a vida um pouco mais fácil
para mim. Irritado e envergonhado com o pensamento, coloco
tudo aos pés dela.
— Quelqu'un sait quelque escolheu. Et si ce quelqu'un
c'est toi, je serai très reconnaissant. — Alguém sabe de alguma
coisa. E se esse alguém for você, eu ficaria grato.

Assim que os olhos do homem se fixam nos meus, ela


bloqueia sua visão de mim, roçando seus mamilos ao longo dos
meus lábios. Tanto seu fascínio quanto o gim assumem o
controle, e faço o possível para não ficar duro. Este não é o
lugar e, embora linda, ela não é a garota para se dar ao luxo.

Ela agarra meus ombros e me vira para encarar Preston,


que está sentado em nossa cabine, duas garrafas abertas e
suando em baldes. Uma bela morena salta em seu colo. Neste
ponto, ele parece apenas meio consciente, o único sinal de vida
é um sorriso estúpido em seu rosto enquanto ela se esfrega
contra ele. Minha dançarina corre as palmas das mãos dos
meus ombros ao meu peito, envolvendo-me por trás. Sua
respiração atinge meu ouvido um segundo antes de cravar as
unhas no tecido. É então que meu pau não aceita não como
resposta. Sibilando entre os dentes, sou grato pela capa da
jaqueta.

— Si tu ne croyais pas aux fantômes avant de venir ici ce


soir, il en est la preuve. Il a un intérêt dans ce club. Une
danseuse. Elle ne parle à personne ici. Jamais. Elle est
escortée partout où elle va. Un des videurs les a suivis une fois
et a disparu. Ce ne sont pas les hommes avec qui plaisanter.
— Se você não acreditava em fantasmas antes de vir aqui esta
noite, ele é a prova. Ele tem um interesse neste clube. Uma
dançarina. Ela não fala com ninguém aqui. Nunca. Ela é
acompanhada por onde quer que vá. Um dos seguranças os
seguiu uma vez e desapareceu. Estes não são homens para se
mexer.

— Merci. — Obrigado.

Logo após a nossa troca, paro de beber, e depois de


recusar educadamente várias sugestões atraentes da minha
dançarina, arranco Preston da morena. Envolvendo seu braço
em volta do meu pescoço, começo a tarefa de puxá-lo para fora
do clube enquanto ele luta contra mim, sussurrando
declarações para sua dançarina abandonada a poucos metros
de distância.

— Je te retrouverai, mon amour. — Eu vou te encontrar


de novo, meu amor. Com a palma da mão no peito, ele sorri
para ela. — Finalmente, encontrei o verdadeiro amor na cidade
feita para os amantes. E agora tenho que sair. Au revoir, ma
chérie.

— Estou disposto a apostar que ela vai seguir em frente


rapidamente, — bufo enquanto ele luta contra mim,
arrastando seu adeus sentimental.

Ele se vira para mim, nada satisfeito por eu ter encurtado


esta parte da nossa noite.

— O que você sabe sobre amor, cara?

— Isso está distraindo seus pés, faça-me um favor e tente


lembrar para que eles servem.
— Aquela loira estava na sua. Por que você não atacou
isso?

— Não é o meu tipo.

— Qual é o seu tipo? Você gosta de um cracker de chicote


e corda, não é? São sempre os mais calados. Diga-me, King,
estou certo?

— Use seus pés, — resmungo enquanto praticamente o


arrasto pela sala.

— Aposto que você gosta deles, — diz ele, parando nós


dois no meio do clube. — Preciso mijar.

Depois de esperar uma eternidade fora do banheiro,


chegamos à entrada, que agora está deserta, graças ao
adiantado da hora e à rápida queda da temperatura.

— Onde está o carro?

— Liguei para ele enquanto estava mijando. Ele não está


longe.

Ele se recosta na lateral do prédio, os olhos fechados.

— Eu não deveria ter bebido aquela última bebida. O ar


está ajudando. Estarei bem em um minuto. Só preciso do meu
segundo fôlego. A noite ainda é uma criança, King.

— Você terminou.

— Sim, você não? — Ele abre lentamente os olhos, sem


um traço de humor em seu tom. — Em mais de uma maneira.
— O que você quer dizer?

— Quer dizer, mesmo com meus pais quase dois metros


abaixo, tenho expectativas a cumprir. Uma família cheia de
superdotados para impressionar em casa. No minuto em que
sair do avião, eles ficarão olhando por cima do meu ombro pelo
resto da minha vida. — Ele exala, sua respiração visível e
brilhando do néon das luzes do clube. — Para você, esta foi
uma noite de sexta-feira, mas para mim... bem, é a minha
última saudação.

— Você tem faculdade.

— Não, eu não. — Ele acena com a cabeça por cima do


ombro em direção ao clube. — Sem querer ofender as mulheres
que trabalham, mas não estou interessado em strippers, cara.
Foi apenas algo para verificar minha lista. Outra experiência
que posso dizer que não perdi. Não há clubes de strip no meu
futuro. Inferno, não há porra de diversão no meu futuro.

— O que está em seu futuro?

— Tédio. Uma tonelada de merda, seguida de mais tédio.


Problemas de meninos ricos, eu sei. — Ele segura a nuca. Seus
penteados castanhos lisos foram cuidadosamente arrancados
pelos dedos da dançarina. — O dinheiro é meu, mas com ele
vem a pressão. Tenho que realizar mais do que ser um bebê de
fundo fiduciário mimado. Quer saber a pior parte? A estrada à
frente não é tão desagradável para mim. Sou um cara sem
frescuras.
— Vou ter que chamar besteira.

— Não, isto é diferente. Vou ser honesto, cara, nunca


participei da merda que fizemos neste semestre.

Eu rio.

— Mesmo.

Ele abre um sorriso.

— Eu suspeitava disso. E admito que gostei. Acho que


meu problema é que só quero liberdade para decidir, entende
o que quero dizer?

Minha resposta é cortada, assim como minha visão dele


enquanto ele está preso à parede, seus olhos se arregalando
com a aparição repentina do homem entre nós.

— Vide tes poches. Mantido. — Esvazie seus bolsos.


Agora.

Eu não o vi. De modo nenhum. Ele era o ruído de fundo,


um pedestre caminhando por uma rua parisiense tipicamente
movimentada. Não pensei nada sobre o homem se
aproximando de nós porque estava totalmente imerso em
nossa conversa. Preston parece tão surpreso quanto o homem
olha entre nós, produzindo uma faca do nada antes de
empurrá-la em minha direção. Eu mal consigo escapar da
ponta, pulando de volta para o meio-fio.

Satisfeito com o espaço que o movimento proporcionou a


ele, ele agarra Preston pelo colarinho, pressionando a ponta da
lâmina na base de sua garganta. Estou a um metro de
distância, no máximo, e sei que com apenas um pouco mais
de pressão ou um movimento rápido de seu pulso, Preston vai
morrer.

Algo dentro de mim quebra com a expressão de Preston,


e salto para frente, puxando a cabeça do homem pelos cabelos
antes de bater seu rosto no tijolo próximo ao ombro de Preston.
A adrenalina toma conta enquanto aperto o lado de sua cabeça
repetidamente até que ele fica mole e a faca faz barulho no
chão aos meus pés. Uma vez que ele está no chão, chuto-o com
o salto duro do meu sapato até que seus braços não estejam
mais levantados em defesa.

Com uma rápida olhada ao redor, vejo que ainda estamos


sozinhos e o levanto por baixo dos braços antes de olhar para
Preston. Ele ainda está grudado no tijolo, os olhos arregalados.
Olho para a câmera na entrada, grato por estarmos fora de
vista.

— Agarre as pernas dele, — deixo escapar, o pânico


crescendo enquanto o rosto de Dom passa pela minha mente.
Não pode ser isso. Este não pode ser o erro que me tira. —
Preston, não posso ir para a cadeia. — Não expresso meu medo
maior, de não ter certeza se o homem está morto ou não.
Nunca bati em alguém com tanta força em minha vida.

Preston entra em ação e levamos o homem inconsciente


para um beco próximo e o deixamos atrás de uma lixeira.
Curvando-me, pressiono meus dedos em seu pescoço para
verificar se há pulso.

— Ele está vivo?

Aceno e fico de pé.

— Vamos.

Preston me para, segurando-me pelo ombro.

— Pegue o dinheiro dele.

— O quê?

Ele projeta o queixo para o ladrão inconsciente e lança


seu olhar endurecido de volta para o meu.

— É justo pra caralho. Pegue o dinheiro dele.

Voltando-me, inclino-me sobre o homem e estudo o dano


que causei. Seu rosto está mutilado e há sangue escorrendo de
sua orelha.

— Faça isso, King.

Rasgando sua jaqueta, verifico seus bolsos e pego um


maço de notas, algumas puídas, outras parecendo mais novas,
e sei que não é dele. Ele não ganhou um centavo disso.

— Jackpot. Ele esteve nisso a noite toda.

Pondo o dinheiro no bolso, junto-me a Preston, onde ele


está antes de deixarmos o beco sem palavras, apressando-nos
quando vemos a limusine esperando na entrada do clube.
Assim que o motorista nos conduziu para dentro, ele se sentou
ao volante.

— Para onde, Sr. Monroe?

Nós olhamos para longe antes que ele fale.

— Estou com fome. Você?

Concordo.

— Leve-nos a algum lugar para o café da manhã. Você


escolhe.

O motorista acelera para longe do meio-fio.

— Sim senhor.

Preston levanta o queixo em minha direção.

— Você vai ter que perder a jaqueta.

Inspecionando através das luzes da rua que passam, vejo


uma mancha de sangue no casaco. É muito perceptível.
Enquanto o derramo, inclino-me em um sussurro.

— Nunca fiz nada assim.

— Como se sentiu?

Levanto um ombro.

— Não vou chorar por isso.

— Nem eu. — Ele se inclina para frente, as mãos


entrelaçadas entre as pernas, a voz baixa. — E nunca tente
adivinhar o que você acabou de fazer. Esse homem ia acabar
comigo, não importa o que eu tivesse em meus bolsos. Vi em
seus olhos. Ele estava chapado. — Ele se recosta em sua
cadeira, sua expressão contemplativa. — Junto com a
aparência de meu pai, fui abençoado com seu julgamento. Sei
quando confiar nas pessoas e quando não. Normalmente no
primeiro minuto após conhecê-los. — Tirando o estojo do
bolso, ele acende o meio baseado que colocou horas antes,
arrancando um pouco de erva da língua antes de falar. — A
meu ver, existem homens maus capazes de fazer coisas ruins,
e existem homens bons capazes de fazer coisas ruins por boas
razões. — Ele me olha incisivamente. — Você é um desses.

— Qual é você?

— Incapaz de ser qualquer um. Eventualmente, serei um


homem que precisa de caras como você.

Preston me deixou assim que o amanhecer começou a


iluminar as ruas. Depois de algumas horas de sono, mochila
na mão para o meu voo para casa, abri minha porta e vi que
estava bloqueada por seis grandes caixas. No topo da primeira
havia uma nota.

Obrigado por me poupar do fardo de empacotar, Wingman.

P
Houve uma mudança entre nós naquela noite. Nós dois
estávamos cientes disso. Só não sabíamos exatamente o que
era. Nunca soube o quão instrumental aquela noite seria no
meu futuro, mas olhando para trás agora, sei que foi o
verdadeiro começo.

Com a memória passando pela minha mente, estou no


closet de Cecelia, o suor escorrendo pelas minhas costas
depois de outra longa corrida com Beau. Pego suas roupas,
curioso. Ela é uma garota sem rótulo. Não há um designer em
seu armário. Somos muito parecidos em alguns aspectos e
opostos polares em outros. Ela é simples com seu gosto,
mesmo sendo milionária. Ela nunca deu a mínima para
dinheiro, o que ela deixou muito claro quando me entregou sua
empresa herdada da Fortune 500, junto com o lucro que ela
teve com nosso negócio, de volta ao Exodus na íntegra.

Ela nunca quis o dinheiro do pai. Ela só queria seu amor.

Isso é tudo que ela pediu a qualquer um dos homens em


sua vida.

Corro meus dedos pelo tecido de um de seus vestidos.

— Vou compensar você, Mon Trésor.

Nunca morei com uma mulher, ou realmente com


ninguém adulto, para falar a verdade, e acho estranhamente
satisfatório que o meu primeiro seja o meu último. Isso só se a
vida e o tempo permitirem. O tempo em si é tão impiedoso
quanto o amor – sem limites ou cessar-fogo. É um inimigo. E
desde que voltei, não recomeçamos essa merda.

Mas tempo é o que ela precisa – tempo e limites – e é isso


que terei que dar a ela. Mas permitir o espaço é o movimento
certo? A trato com fragilidade?

Não é isso que ela está acostumada comigo. Não somos


assim.

Pego algumas roupas minhas, jogo-as na cama e caminho


até sua estante, vasculhando até ver um livro familiar. Uma
nova cópia da biblioteca de The Thorn Birds, semelhante àquela
destruída no restaurante meses atrás.

— Acho que sempre serei a garota chorando pela lua.

Abrindo o livrinho, folheio algumas páginas e coloco a


palma da mão na cabeça quando vejo o nome do personagem
principal.

— Por que você chamou de Meggie?

— É uma longa história.

— Eu sei disso?

— Intimamente e de longe.

— King, seu idiota de merda, — murmuro. Folheei o livro


uma ou duas vezes por curiosidade, mas os nomes dos
personagens nunca pegaram. Eu estava muito absorto em
Cecelia para ver o quadro geral do que o livro significava, e
todos esses anos depois, ainda estou tão sem noção.

Ela deu ao café o nome do personagem principal de The


Thorn Birds, a história mais próxima de seu coração. O fato de
ela ter roubado este livro da Biblioteca de Triple Falls é uma
das razões pelas quais existimos. É óbvio que ela se compara
a Meggie e nossa própria história àquela que está dentro das
páginas. Vou memorizar a merda se isso significa tanto para
ela. Mas, por enquanto, não consigo saber como proceder.

Esta é a minha primeira vez no tabuleiro sem uma


estratégia e, agora, ela está retomando sua vida como se eu
fosse um obstáculo que ela tivesse que contornar. Ela me
deixou aqui esta manhã, propositalmente, então eu não
poderia ser mais uma distração.

Frustrado, vou para o banheiro e abro o armário de


remédios, satisfeito quando vejo seu controle de natalidade.

Essa é uma discussão para um dia diferente. Pego o


frasco de loção ao lado, destampo e inalo.

Imediatamente sou atingido pela familiaridade e um dos


gatilhos do meu vício por ela, seu cheiro. Lendo o rótulo,
percebo o porquê.

Juniper Berry.

Não admira que eu seja viciado em seu cheiro. Bebo o


conteúdo de seu perfume todas as noites em. Minha. Porra. De
Gin.
— Muito bem, rainha, — pondero, tampando sua loção e
fechando o gabinete.

Remexendo em suas gavetas, percebo que estou no modo


de perseguidor de pleno direito, sem nenhuma ideia do que
estou procurando. Discernimento? Algum tipo de ajuda para
me ajudar a reconquistá-la? Frustrado, eu os fecho, sabendo
que não vou encontrar o que preciso contando sua porra de
cotonete. Meu telefone ressoa no bolso com uma mensagem, e
estou grato pela distração.

Tyler: Recebendo.

O telefone toca na minha mão um minuto depois, e


atendo no segundo.

— Tobias.

— Tive que me certificar de que conhecia minha casa


pegando depois de dois toques, hein?

— Boa tarde, senhor presidente. Como a grande Casa


Branca está tratando você?

— A cama é muito confortável, Sr. King, — ele dispara de


volta no mesmo tom jovial. — Gostaria de lhe agradecer por
toda a sua ajuda e por suas contribuições para a campanha.

— Considero o dinheiro bem gasto. Parece que


concordamos com muitas políticas e mudanças .
— Esse é outro motivo da minha ligação. Queria
assegurar-lhe que vou trabalhar incansavelmente e ter em
mente os melhores interesses do país.

— Sem dúvida, sim, senhor.

Ele corta a merda.

— Faz muito tempo desde a preparação, não é, King?

— Demasiado longo. Estou surpreso que você se lembre


de mim. Você só esteve lá um semestre.

É mentira. Não o seu tempo na preparação, mas o aspecto


conhecido apenas de nossa conversa. Alguém está sempre
ouvindo e não queremos correr nenhum risco. Desde o
segundo em que entramos naquele café da manhã vinte anos
atrás, ambos com um pouco de ressaca e ávidos por gordura
em nossas barrigas, tornamo-nos pessoais devido a uma
confiança e respeito recém-formados.

Pela primeira vez, confiei em um estranho com meus


planos para Roman, e ele também compartilhou suas
aspirações. E juntos criamos uma estratégia de nossa própria
agenda e, juntos, cumprimos ao pé da letra.

Mal sabia eu que nos tornaríamos o maior dos aliados. Ao


ouvir suas aspirações, soube que ele era o candidato perfeito
para um presidente oprimido. Órfão, mas de boa educação,
insanamente rico, bonito, mas podia controlar seu pau e tratar
as garotas com respeito, mesmo a portas fechadas. Ele foi um
dos meus primeiros recrutas principais e uma decisão muito
boa da minha parte. Meu apoio financeiro a sua campanha foi
irônico e nos trouxe um círculo completo.

Sua tinta está lá – embora seja invisível – e ele é um dos


pais fundadores da irmandade, agora sentado na cadeira mais
poderosa do mundo.

— Molly queria que eu estendesse um convite para jantar.

— Algum dia em breve, vou aceitar isso. — Concordamos


desde o início que a associação entre nós precisa permanecer
formal até que tenhamos a maior parte do nosso trabalho fora
do caminho – ou a menos que haja uma emergência. Minhas
contribuições para sua campanha e nossos meses na mesma
escola preparatória por um semestre nosso único vínculo
visível. Ele é um dos únicos homens decentes no poder, e
temos muito a realizar nos próximos sete anos para que nossa
associação o manche – caso eu seja processado por meus
crimes.

Preston Monroe não precisa de micro gerenciamento, e


Tyler está se preparando para isso desde que entrou para a
Marinha.

— O que você está fazendo atualmente, Tobias?

— Mais recentemente, senhor, me interessei pela


Virgínia.

— Ah. Fico feliz em saber que você está na vizinhança.


Alguém que conheço?
— Você vai conhecê-la, eventualmente.

— Estou intrigado. Então, estou assumindo que você está


se aposentando da política?

— É temporário, — asseguro a ele. — Eu não jogo golfe.

— Bem, boa sorte com isso. Entrarei em contato.

— Agradeço sua ligação, Sr. Presidente.

— Estou ansioso para vê-lo na casa.

— Você merece isso, — digo honestamente.

— Não poderia ter feito isso sem você, cara.

Terminando a ligação, olho pela janela do quarto de


Cecelia antes de enviar uma mensagem de texto.

ETA?

Russell: Um passarinho acabou de estacionar o Audi na


garagem, com as chaves no visor. Tenho dois pássaros recém-
nascidos chegando. Devo enviar mais?

Envie mais quatro. Não conheço o bairro. E mude o


antigo. Eles estão cansados e entediados, o que os torna
inúteis para mim. Quero uma porra de visão 20/20.
Entendido?

Russell: Entendi. Eles estarão lá amanhã. Como está Cee?

Bem.
Russell: Essa foi uma resposta abrupta. Ela pode guardar
rancor, não pode? Emoji rindo.

Quando não respondo, o telefone toca novamente.

Russell: Ela está te infernizando, não é? Deus, eu amo


aquela garota. Cuide dela.

Volte para a porra do trabalho.

Russell: Você não está aposentado?

Eu estou de férias. Grande diferença.

Russell: 10/44 Bom amigo. Tenho certeza de que você está


com as mãos ocupadas. Emoji de rosto beijando.

4 Significa “OK”.
Puxo para cima para ver meu Audi estacionado na
garagem, e a visão dele me abala. É parte do que deixei para
trás. Parece que não importa quanto espaço coloquei entre
mim e a vida que estava vivendo um ano atrás. Nunca vou
escapar disso.

Hoje, servi demais e falei com todos os clientes do café,


com a intenção de retomar minha rotina. Quando as coisas
ficaram lentas, ocupei-me esfregando cada centímetro do meu
restaurante para evitar Marissa e suas perguntas. Esta
manhã, quase fugi, deixando-o sozinho, sem carro e com seus
próprios recursos, para que pudesse tentar ordenar meus
pensamentos. Saindo do Camaro, inspeciono meu Audi antes
de olhar para a casa sem vida, curiosa para saber o que ele
está fazendo lá dentro.

— Você não parece feliz com isso. — Quase pulo para fora
da minha pele e me viro para ver Tobias a metros de mim, sua
camiseta preta colada em sua estrutura monstruosa, o suor
escorrendo por suas têmporas.
— Ou talvez você não quisesse entrar naquela casa
porque pensou que eu estava lá. — Ele inclina a cabeça, seu
fascínio me atraindo, seu olhar cético. — Qual é, Cecelia? — A
crueza em sua voz ameaça abrir as cicatrizes reforçadas em
meu peito. — Pare de me foder com os olhos e me diga qual é?
Você não está feliz com o carro ou com o fato de que teria que
me enfrentar naquela casa?

— O quê?

— Você me ouviu. — Em duas passadas, ele está na


minha frente, sua presença invadindo. Nunca fui imune a ele,
e bancar a indiferente à minha atração neste momento é
ridículo – não só isso, ele sabe melhor.

— Essa foi a minha segunda corrida hoje. Você não está


sozinha no que está sentindo. — Ele olha para o carro. —
Podemos nos livrar dele, mas fui eu que o tirei de você, então
pensei que deveria ser o único a devolvê-lo.

— Isso me surpreendeu, só isso. Achei que nunca mais


veria isso.

— Certo, — ele murmura em um tom abatido. Agarro seu


antebraço quando ele passa por mim, e ele para, os ombros
tensos enquanto ele levanta os olhos cor de âmbar para os
meus.

— Eu amo o carro, — digo honestamente, mas nós dois


sabemos que não é do carro que estou falando. — Só estou...
— A raiva surge dentro de mim, e ele lê a agitação tomando
conta.

— Pronta para conversar? — Ele se vira e se move,


fazendo-me dar um passo para trás. — Lutar? — Outro passo.
Nada em seu comportamento sugerindo exaustão, embora ele
apenas corresse por quilômetros. Ele é um lobo puro quando
ele se inclina, leves sugestões de frutas cítricas e especiarias
invadindo meus sentidos. — Foder?

Quando permaneço muda, seus ombros caem. Ele


pressiona um beijo na minha têmpora antes de se inclinar para
sussurrar.

— Mais tempo, então. É tudo o que temos, Cecelia, — ele


me lembra antes de entrar na casa.
— Isso parece incrível, — Marissa fala atrás de mim
enquanto puxo mais da teia falsa e colo na lateral da janela.
Dando um passo para trás, admiro meu trabalho e olho ao
redor do café, satisfeita com o progresso. Depois da correria da
manhã, Marissa e eu conseguimos transformar o restaurante
com motivos de monstros. É um pouco prematuro com as
semanas do feriado longe, mas eu precisava de distração.

— Parece bom, — concordo. Nunca sonhei em ser dona


de uma loja, mas admito que ter um lugar como este é
satisfatório de muitas maneiras – um lugar que eu mesma
frequentaria como cliente. Há alguns reunidos em torno da
lareira aconchegante no recanto de leitura. Há uma
consistência firme no ar agora, enquanto as folhas dos antigos
carvalhos em frente ao estacionamento mudam rapidamente
para tons brilhantes de abóbora, vermelho e amarelo,
oficializando a chegada do outono. Uma temporada que eu
costumava detestar devido a alguns verões que mudaram
minha vida e que nunca quis terminar.
— Agora, — Marissa diz bruscamente. — Vou preparar
um café com leite para nós, e você vai me dizer o que diabos
está acontecendo. Tenho sido paciente o suficiente.

No momento em que ela fala, um ônibus escolar para e


algumas dezenas de crianças começam a sair antes de seguir
em direção ao café.

— Oh, merda, — diz Marissa. — Você sabia que eles


estavam vindo?

— Não sabia, —respondo, igualmente surpresa no


momento em que Tobias para no estacionamento, sua atenção
mudando de mim para o ônibus escolar de crianças entrando
no restaurante. Quando chega à porta, já está arregaçando as
mangas. Ele pisca para Marissa em saudação antes de se
inclinar e pressionar um breve beijo em meus lábios.

— Apenas me diga onde você precisa de mim.

Caos, caos absoluto e completo seria como eu descrevo a


próxima hora. Filas e mais filas de crianças em idade escolar
ocupam todas as mesas e cabines monitoradas por apenas um
punhado de professores que pareciam estar no limite. Embora
eu tenha dispensado nossa terceira garçonete após a correria
matinal, Marissa e eu, junto com a ajuda inesperada de Tobias,
conseguimos fazer um trabalho decente ao acelerar os pedidos
de comida e bebida – mas o barulho é ensurdecedor. Tobias
voa ao redor com uma lixeira, recolhendo pratos como se o
trabalho viesse primeiro da natureza, varrendo respingos e
anotando pedidos para os poucos retardatários que chegam
para jantar.

— Os malditos caipiras nos fazem parecer mal! — Billy


grita no balcão em reação a algo na TV, fazendo-me pular
quando comecei a somar as contas para deixar o ônibus cheio
de alunos do ensino médio para fora do meu café.

— Billy, — repreendo. — Orelhas pequenas em todos os


lugares. Por favor, tente observar sua língua.

— Desculpe, — ele olha para a mulher mortificada em


uma mesa adjacente. — Desculpe, senhora.

Ela zomba de seu pedido de desculpas, e ele se ofende


imediatamente. — Senhora, você vive setenta anos e pode dizer
o que quiser.

O 'bem, eu nunca', em sua expressão quando ela lança


um olhar na minha direção, mostra-me que o comportamento
de Billy está comigo.

— Vou levar minha conta.

Ela recolhe a bolsa e começa a tirar o filho da cabine.

— Sinto muito, senhora, — interrompo, entregando a ela.


— Você não comeu muito. Eu ficaria feliz em preparar sua
refeição.

— Não vamos voltar, — a mulher rebate, devolvendo-me


a conta com expectativa.
Quando Tobias aparece em sua mesa, vejo a mudança
imediata em sua postura enquanto ela o absorve.

— Quer que eu empacote isso para você?

Ela descaradamente o fode com os olhos antes de falar.

— Isso... seria bom, obrigada...?

— Tobias. Avec plaisir, salope. — Com prazer, vadia.

É tudo que posso fazer para abafar minha risada.

— Oh, isso é lindo. Francês?

— Sim. Desculpe, às vezes esqueço meu inglês, — ele diz,


fazendo o papel de um estrangeiro inocente. Por alguns
segundos, perco-me ao vê-lo em roupas casuais, parado no
meio do meu café. Projetando o queixo, ele gesticula por cima
do meu ombro com o gesto conhecedor de seus lábios
enquanto Travis toca a campainha atrás de mim. — Pedido
está pronto, chefe.

Estreito meus olhos.

— Estou ciente, francês. Quando terminar aqui, as mesas


três e seis também precisam de atenção.

— Como quiser, — ele admite.

Virando-me para pegar o pedido, sou interrompida pelo


calor em sua voz.

— Oh, Cecelia?
Olho por cima do ombro para ver a chama ardente em
seus olhos enquanto risos desagradáveis e ruído do nível do
refeitório soam ao nosso redor.

— Sim?

— Je n'aime pas me réveiller sans toi. Je préférerais de


loin me réveiller en toi. — Eu não gosto de acordar sem você.
Eu preferia acordar dentro de você.

— Lá se vai aquela língua francesa de novo, — a mulher


repreende. — Você sabe que é rude dizer coisas que os outros
não conseguem entender.

Ignorando a vadia presunçosa, ele mantém seu foco em


mim.

— Tu as l'air un peu stressée. Je peux t'aider à te


détendre. Avec ma langue, et ta chatte. — Você está parecendo
um pouco estressada. Eu posso te ajudar a relaxar. Com minha
língua e sua boceta.

Com os lábios abertos, faço o possível para esconder meu


choque.

— As-tu perdu la tête? — Você perdeu a cabeça?

— Pas ce que tu avais en tête? Après tu décideras où ira


ma langue. — Não é o que você tem em mente? Então você
decidirá para onde minha língua irá.

— Podemos discutir isso em ca...


— Então, se você apenas embalar isso, — a mulher
interrompe, odiando que tenha roubado sua atenção.

Seu filho, que parece ter cerca de sete ou oito anos, sai
da cabine e observa nossa conversa com interesse. Tobias se
inclina e sussurra para ele, e ele ri antes de falar, imitando
Tobias perfeitamente.

— Le pleck, le spit.

Jogo minha cabeça para trás e rio. Foi há muito tempo


que eu o estava imitando da mesma maneira ao lado da piscina
na casa do meu pai? Então ficamos em desacordo, lutando
contra nossa atração, negando nossa química, a tensão tão
espessa. Quando estávamos separados, parecia uma
eternidade atrás, mas quando ele está tão perto, não parece
assim.

— Tu m'as manqué, mon trésor. — Senti sua falta, meu


tesouro. A sinceridade em seu tom combinada com o olhar em
seus olhos fez meu coração galopar e as visões girando dos dias
em que ele mal conseguiu sair de seu Jaguar na garagem do
meu pai antes de eu estar em seus braços e nossos lábios
colidirem. Uma coleção de dias e semanas em que nosso tempo
foi roubado, um tempo em que nos libertamos para nos
amarmos abertamente, sem dizer as palavras. Um prato se
estilhaça atrás de mim, quebrando nosso feitiço.

— Você acabou de ensinar ao meu filho algum tipo de


maldição francesa?
Sem responder, a paciência diminuindo, Tobias agarra o
prato carregado de sua mesa.

— Vou cuidar disso.

Ela me olha com desconfiança enquanto ele passa.

— Esse inglês parece ir e vir de forma tão conveniente.

— Engraçado como isso funciona, — concordo, saindo e


seguindo Tobias pelas portas duplas, focando em sua bunda
quando noto a etiqueta em seu jeans. — Wranglers? — Não
posso evitar minha risada. — Planejando montar em touros em
breve?

— Isso é tudo que eles tinham no meu tamanho, — ele


explica em defesa enquanto se dirige para a cozinha. — Não há
muito o que escolher por aqui.

— Você não pode fazer isso. — mudo de assunto.

— Por que deveríamos deixar todo aquele francês que


você aprendeu ir para o lixo?

— Não é engraçado.

— Discordo, — ele diz friamente, jogando o conteúdo do


prato da mulher em uma caixa.

— Você não precisava ajudar, sabia.

Ele inclina a cabeça.


— Você sabe muito bem que não estou irritado porque
estou ajudando. Eu queria.

— Bem, você não precisa jogar sujo para falar comigo.

— Você tem certeza disso? Porque não tivemos uma


conversa de verdade desde que cheguei aqui.

— E agora não é a hora.

— Quando seria uma boa hora?

Meu silêncio só o irrita ainda mais quando ele pega um


saco plástico e empurra a caixa dentro.

— Estou me ajustando, Tobias, e agradeço a ajuda, mas


preciso lembrá-lo, você é um bilionário, não um ajudante de
garçom.

— E você é uma milionária, não uma garçonete. Que


diabos isso importa? Sou tudo o que você precisa que eu seja.
— Ele me estuda por um segundo antes de fechar os olhos e
colocar as mãos na bancada de metal, parecendo reunir um
pouco de paciência. Quando ele finalmente fala, sua voz é
baixa, cheia de decepção. — Estarei fora do seu caminho
quando terminar com as mesas. — Ele pega a bolsa e, sem
outra palavra, passa pelas portas duplas.
— Preservativo ou faca? — Marissa me cutuca,
esgueirando-se até mim no balcão, meu foco em Tobias, que
está desenhando com uma menina no recanto de leitura
enquanto conversa com sua avó. Depois que as crianças foram
embora, tivemos uma corrida secundária, uma raridade.
Apesar da nossa conversa, Tobias ficou para nos ajudar,
ocupando as mesas sem dizer uma palavra enquanto corria em
círculos ao redor de Marissa e eu.

— O quê?

— Preservativo ou faca. O ex-dilema. Quando eles voltam


pela primeira vez, você não sabe se deve transar com eles ou
matá-los, estou certa?

— Acertou em cheio, — rio, limpando o balcão de alguns


pratos. — Se ao menos você soubesse. — O que ela não faz e
definitivamente nunca vai. Esse é o ponto crucial de estar em
um relacionamento com um homem como Tobias.

Inquieta, passei a noite passada em meu jardim


plantando bulbos de primavera enquanto ele digitava em seu
teclado em uma das cadeiras do pátio. De vez em quando,
pegava-o olhando para mim e devolvia. Depois que tomei
banho e me vesti para dormir, encontrei-o esperando por mim.
Quando apaguei a luz, ele silenciosamente me puxou para seu
peito. Eu sabia que ele estava lá para me ajudar a combater
qualquer sonho que minha imaginação pudesse reunir. Eu não
tinha dormido sem sonhos desde que ele chegou.
— Nunca vi um homem tão bonito na vida real. É como
se ele nem fosse humano.

— Confie em mim, ele sangra. — Sou um dos raros que


sabe onde estão suas cicatrizes.

— Então, você está feliz por ele estar de volta?

— Quero estar, mas estamos além de complicados.

— Com medo de se machucar de novo?

Tobias não machuca. Ele mata machucando, ele faz a dor


parecer uma viagem de carrossel, e saí de sua carona há oito
meses.

Fecho um dispensador de guardanapos recém-carregado


e vejo ele mantendo uma conversa rápida com a mulher mais
velha.

— Dei a ele um ultimato há quase um ano, e ele só agora


está voltando.

— É sempre assim, certo? — Abrindo a caixa registradora,


ela troca algumas de suas gorjetas por notas maiores e enfia o
dinheiro no avental. Esse ato simples me traz de volta a uma
época e lugar diferentes. Triple Falls, sorrindo Selma e suas
tortilhas. Há muito tempo.

— É sempre assim?

— Você finalmente consegue se recompor o suficiente


para superá-los – viver sem eles – e bam, eles aparecem na sua
porta esperando que você se sinta da mesma forma. Minha
mãe sempre dizia: 'Nunca conte com um homem para perceber
seus erros em sua linha do tempo emocional, porque os
homens sempre demoram mais para chegar e lidar com seus
sentimentos. Eles são emocionalmente atrofiados.

— Nunca palavras mais verdadeiras foram ditas. — Meu


francês atrofiado levou muitos anos imperdoáveis para se
recuperar. É com isso que estou tendo mais dificuldade. Mais
do que isso, não tenho certeza se meu coração aguenta outro
giro em seu carrossel.

— Bem, antes tarde do que nunca, certo? Juro que nunca


vi olhos assim em minha vida. Não sei como você está lidando
com isso.

— Pare de olhar, ou ele saberá que estamos falando sobre


ele.

Nem mesmo um segundo depois, seus olhos levantam e


ele sorri.

Desgraçado.

Nós duas voltamos ao movimento, o que nos faz parecer


ainda mais ridículas.

— Então, você está brincando de rato com aquele leão?


Sem ofensa, mas parece que ele poderia engoli-la inteira.

Faço uma carranca.


— Desculpe, mas é a verdade. Sinto a tensão entre vocês
dois, e você parece um gêiser prestes a explodir, e ele... bem,
se um homem olhasse para mim assim, provavelmente ficaria
nua sem ter consciência disso.

Ela me cutuca, e a cutuco de volta – com força.

— Oh, irritada. Sim, definitivamente escondendo dele.


Você não parece recém-fodida. Você apenas parece... fodida. —
Ela ri, e olho feio antes de terminar e acerto-a com meu pano.

— Ai!

— Diga-me por que contratei você?

— Pela minha personalidade brilhante e sem besteira?

— Sim, bem, já que estamos no negócio da honestidade,


quando você vai tirar nosso cozinheiro do sofrimento?

Ela olha de volta para Travis e franze o nariz.

— Não posso entrar nessa. Namorei o irmão dele na


escola.

Quando estremeço, ela interpreta mal.

— Exatamente. Quero dizer, como você pode namorar o


irmão de um homem e então...

— Marissa, pedido pronto, — chama Travis, e sou grata


pela interferência.
Olho para Tobias, e ele lê minha expressão. Quando me
retiro para o meu escritório, ele está bem atrás de mim antes
que eu tenha a chance de fechar a porta.

— O que há de errado?

— Nada. Olha, nosso... drama está distraindo a equipe.

— Nosso drama está distraindo você, — ele corrige e me


pressiona contra a porta do meu escritório, então sou forçada
a olhar para ele.

— Tobias, você está dificultando meu trabalho. — E


dormir. E pensar.

Ele concorda.

— Nós estabelecemos isso. Eu estava prestes a sair. Só


queria que você soubesse.

— Sinto muito. Eu só... não sei o que sou agora.

— Você se sente emboscada. Temos muito o que resolver,


mas até lá, estou aqui se precisar que eu esteja. E, — ele se
inclina, envolvendo-me em seus braços, suas mãos
acariciando as asas nas minhas costas, — nós temos muito o
que esperar. — Ele roça meus lábios com os dele. — Vejo você
em casa.

Casa.

— OK. Obrigada novamente por ajudar hoje.


Sua resposta é um breve beijo em meus lábios.
Liberando-me, ele enfia a mão na calça jeans e puxa um maço
de dinheiro do bolso, dobrando minha mão em torno dele.

— Para Marissa.

Naquela tarde, volto para casa para ver uma nota de


Tobias dizendo que ele saiu para correr. Depois de um banho
escaldante, fico na frente do meu espelho e limpo a umidade,
pulando quando Tobias aparece atrás de mim, seus olhos
rolando pela minha imagem nua antes de voltarem para os
meus. Seu cabelo está completamente úmido e despenteado,
sua camisa encharcada, ele se inclina e pressiona um beijo no
meu ombro antes de envolver um braço em volta da minha
cintura e puxar minhas costas para ele. Apoiando o queixo no
meu ombro, ele passa as pontas dos dedos ao longo da minha
barriga.

— Conversa fiada é estúpida, você não acha?


Especialmente quando você precisa ter grandes conversas.

Ele empurra a maior parte do meu cabelo encharcado


para o ombro oposto antes de pressionar os lábios no meu
pescoço exposto, lavando as gotas de água com a língua. A
visão do ato me atrai de volta, tão familiar, tão íntimo, que me
deixa com os joelhos fracos.

Revivo a primeira vez que ele fez isso, me beijou assim.


Foi a primeira noite em que ficamos íntimos. Mordo meu lábio,
lembrando-me da visão de seu pau quando ele empurrou para
dentro de mim, o estiramento, o ajuste, a intensidade daquele
momento e o reconhecimento em seus olhos.

Mas não era apenas a sensação. Era a emoção ligada a


ele, emoções que nenhum de nós queria reconhecer.

— Mas sei por que não estamos conversando, Cecelia.


Posso esperar, — ele murmura enquanto nossos olhos pegam
o reflexo. — Porque não vou andar por aqui conversando sobre
a porra do tempo, ou o café – um negócio que você pode
administrar de olhos fechados, ou sobre o que você está
plantando no seu jardim, porque realmente não dou a mínima
contanto que te faça feliz. Posso esperar muito, — ele afasta a
boca de mim, — mas não vou deixar você negar que estou aqui
por muito mais tempo. — Ereção pressionando em minhas
costas, ele se inclina novamente, mordendo minha nuca antes
de acalmá-la com seus lábios e língua. Completamente
encharcada e necessitada, luto para não esfregar minhas
coxas. — Vou falar com você sobre o que você quiser, desde
que tenhamos uma conversa. Mas também ouço tudo o que
você não está dizendo. Sempre ouvirei você. — Ele me estuda,
observando minha expressão e reação a ele, meu corpo
florescendo totalmente sob seu toque antes de seus olhos se
fecharem e uma maldição o deixar. Sua expressão doía como
se ele tivesse acabado de ver algo que não pode controlar antes
de me soltar e fechar a porta atrás de si.

Meu coração dispara atrás dele, mas minha mente se


recusa a permitir que eu me mova. Pela primeira vez desde que
ele chegou, um pensamento me ocorre...

E se eu for incapaz de perdoá-lo?


20 anos

Um baixo pesado vem do clube à minha direita enquanto


caminho por uma nuvem de fumaça de cigarro. Cruzo
enquanto observo a língua de um cara fodendo uma morena
que ele grudou na lateral do prédio, sua mão desaparecendo
sob a saia dela. A inveja me devora enquanto ela joga a cabeça
para trás antes de morder o ombro de seu captor. Quando ela
abre os olhos, seus lábios se separam enquanto se concentra
em mim. A visão do desafio dentro deles, pura tentação.

Venha e me pegue.

Ignorando a provocação descarada, passo pelo clube,


irritado por não poder me permitir. Não me lembro da última
vez que me saciei com uma garota ou fiz algo considerado
normal. Doeria, apenas uma vez, passar uma noite de sábado
em um clube? Para me recompensar com uma longa e
completa foda para me acalmar?

É então que reconheço um colega aluno de uma de


minhas aulas. Mantenho meus olhos baixos para que ele não
me pare, não que ele o faria. Desde que comecei a HEC, deixei
claro com minha conduta que ninguém deveria tentar. Além
do meu novo colega de quarto desleixado, Claude, um colega
de quarto que fui forçado a aceitar por causa das finanças, não
me socializei na minha nova escola. Certifico-me de que Claude
desconfie de mim por meio da comunicação silenciosa e da
linguagem corporal. Ele mantém o horário de um aluno,
muitas vezes fora nos fins de semana, dando-me privacidade
enquanto eu continuamente acendo a vela nas duas pontas.

Com os anos da formatura pela frente, não tenho planos


de mudar nenhuma parte da minha postura. Ninguém pode
me conhecer pessoalmente. Mas uma pequena parte de mim
deseja que – como a maioria dos alunos – as únicas pressões
que tive foram passar nas notas e decisões simples sobre a que
festa ir e que boceta devorar. Desde a preparação, fiz como
minha missão permanecer incógnito e, até agora, houve
apenas alguns alunos corajosos o suficiente para me desafiar
nesse departamento. A recompensa deles foi um rude chamado
de despertar, o que é necessário para garantir que eu continue
sendo apenas mais um aluno sem rosto do qual ninguém
consegue se lembrar de detalhes. Mas depois de anos no
exterior, mesmo em uma cidade tão grande como Paris, o
mundo está se tornando menor.

Atrapalhado com o novo telefone celular Dominic me


surpreendeu durante a noite, a linha treme enquanto passo ao
redor de outra multidão alinhada na calçada. Ele atende no
segundo toque.

— Você deveria estar em um avião.


— Tenho exames, — minto.

— Você está mentindo, — argumenta Dominic. — Como


você espera que te ajude quando você não me diz o que está
acontecendo?

A diferença de idade de quase seis anos entre nós


costumava parecer uma eternidade na maturidade não muito
tempo atrás. Embora, depois da minha última visita a Triple
Falls, esteja claro que eu os subestimei severamente – Dom
especialmente – e por causa disso, é quase impossível passar
qualquer coisa por ele. Cercado pela luz do fogo seis semanas
atrás, descobri o quão pronto ele estava.

— O que está acontecendo na França? — Sean pergunta


de sua cadeira de camping.

— Escola, — respondo secamente.

— Isso não é exatamente verdade, é, irmão? — Dom fala,


olhando entre Tyler e Sean. — Ele saiu para encontrar ajuda.
Todos nas reuniões ficaram com medo quando meus pais foram
mortos, e tudo o que eles fazem agora é vadiar. — Ele chuta
para trás em seu assento. — Meus pais eram revolucionários em
um ponto, extremistas em outro, e meu irmão aqui quer alistar
pessoas que sabem o que diabos estão fazendo. — Ele olha para
mim. — Não é verdade, irmão?

Ele sabe muito mais do que estou confortável. A ideia de


que ele está jogando alheio por tanto tempo me abala
profundamente. Ele é bom em enganar, muito bom.
— Por que você se fingiu de ignorante todo esse tempo?

Seu rosto iluminado pelo fogo permanece impassível.

— Acho que ajuda estar por dentro, sem que ninguém


mais saiba.

Uma espécie de engano genial. Uma manipulação com a


qual ele até me enganou, jogando desinteressado na maior
parte, e sem noção em outras ocasiões.

— Estou perdido, — diz Tyler, olhando entre nós.

Sean fala, seus olhos disparando entre Dom e eu.

— Acredito que a versão curta é, Dominic parou de se fazer


de bobo.

Examino meu irmão e então Sean.

— Isso não funcionará se estivermos mantendo segredos.

— Diz a maconha mais preta, — Dom acrescenta


amargamente.

Enquanto estive fora, Dom esteve juntando as peças. Meu


sigilo aumentou sua curiosidade, e ele apenas deixou claro que
não vai me deixar escapar sem me avisar que está atrás de mim.

— No momento, não há nada para contar. E isso não vai


acontecer da noite para o dia.
— Mas isso não é mais apenas uma conversa, — Dominic
diz definitivamente, — E você sabe disso. Não podemos ajudá-
lo se você não nos contar o que está acontecendo lá.

— O que você acha que pode fazer?

Silêncio é minha resposta.

— Exatamente, você fique fora disso até a hora.

— Você está morando na porra da França, sozinho. Você


acha isso inteligente?

— O que você quer que eu faça?

Ele não hesita.

— Me leve com você.

— Sem chance do caralho. Você sabe por que estou lá,


então não há por que discutir sobre isso. Precisamos nos
concentrar no que é importante e, agora, isso é dinheiro.

Dom quebra nosso olhar, seus olhos voltando para o fogo.

—Eu tenho uma ideia, mas você não vai gostar.

Não gostei e continuo não gostando, e é por isso que me


recusei a deixá-lo se comprometer de alguma forma antes do
tempo. Quero-o o mais longe possível do que estou tentando
realizar aqui na França.

— Estou preso a algo que não quero discutir agora. —


Agarrando minha mochila com força, estico meu pescoço,
mantendo meu telefone aninhado no meu ouvido enquanto a
música explode de uma porta aberta. — Podemos discutir
sobre isso mais tarde? Tenho um lugar para estar. Só queria
checar você.

— Tanto faz. — Há um desânimo em seu tom, e sei que


não é apenas sobre perder meu voo. Mantive minha promessa
de voar de volta a cada seis semanas até agora, mas as coisas
estão começando a se mover na direção que preciso, e não
posso perder mais tempo, literalmente. As viagens estão
ficando cada vez mais caras. — O que está acontecendo?

— Esqueça. Acho que te vejo quando quiser.

— Dom, não tenho paciência para persuadi-lo


gentilmente a falar.

— Estamos falidos, porra.

Parando minha caminhada, passo a mão pelo rosto. A


última vez que estive em Triple Falls, ensinei-lhes como 'pegar
emprestado' o que precisavam daqueles que ganharam sua
posição jogando e tirando de outros menos afortunados. Foi
um código que inventei logo após meu encontro com o ladrão
armado de faca no ano passado. Eles correram com isso, e
Dom sendo Dom, tinha pensado em algumas ideias próprias
sobre como aumentar nossa participação.

— É hora de fazer algumas mudanças.

Por mudanças, ele quer dizer que é hora de se incriminar


de uma forma que não pode ser revertida se ele for pego. Minha
lição sobre pequenos furtos me transformou em ser ensinado
por meu irmão mais novo sobre maneiras mais eficientes de
conseguir dinheiro rápido. Foi incrível e assustador descobrir
o quanto ele sabe quase aos quinze anos de idade.

— Vou descobrir algo, — ofereço.

— Não há tempo para isso também. — Seu tom é grave,


mas ele ainda é jovem e está se tornando mais arrogante a cada
dia, principalmente com seu conhecimento inato de todos os
avanços tecnológicos.

— Se você estragar...

— Tenha um pouco de fé, irmão. — A emoção em sua voz


é mais alarmante do que qualquer coisa. Mas o fato de que ele
está esperando meu sinal verde deve ser o suficiente. Tenho
que confiar nele. Tenho que confiar em todos eles para carregar
o peso até eu cumprir o que me propus a fazer aqui.

— Faça. E Dom, não pense que não vou arrancar o


brinquedo das suas mãos se você for estúpido com ele.

— Como se você pudesse. Estou superando você.

— Talvez sim, — digo com orgulho, — mas não vamos


esquecer as regras.

— Vou te pegar quando estiver pronto.

— Faça isso e mantenha a porra do seu nariz limpo, caso


contrário.
— Confie em mim, irmão.

— Eu faço.

Terminamos a ligação e viro a esquina, deixando espaço


para um cara parado na beira do beco.

— Auriez-vous une cigarro?

— Non, — respondo sem me preocupar em olhar em sua


direção.

— Certeza?

— Desculpa.

— Americano?

— Não.

— Isso não é verdade, é, Ezequiel?

Já estou correndo, mas é tarde demais. Em segundos,


estou encapuzado e andando na parte de trás de uma van.
Permaneço completamente em silêncio enquanto uma
enxurrada de perguntas em inglês e francês espalhado vem de
todos os lados enquanto minha mochila é arrancada do meu
braço e aberta, mas sei que estou seguro lá. Livrei-me de tudo
que indica que não sou um estudante universitário, mas esses
caras sabem disso. Enfiei o nariz onde não devia e morrerei por
isso esta noite ou serei avisado de uma forma que
provavelmente não vou gostar.
— Deveria ter ficado na América, — um deles grunhe
enquanto mantenho minha contagem, batendo minha coxa
com o dedo.

— Como vai a boceta americana? — Um deles dispara da


minha esquerda. Meu silêncio me dá um lábio quebrado, mas
mantenho, limpando minha cabeça de sua distração e
continuo contando.

Pelo que posso dizer, são dois, além do motorista.


Ignorando o barulho, bato meus dedos no couro atrás de mim.

Toque. Toque. Toque.

Algum tempo depois, diminuímos a velocidade e noto o


barulho de construção à nossa esquerda, apesar da hora da
noite. Ouço o barulho distinto de um portão quando um deles
sai da van antes de passarmos. No minuto seguinte, sou levado
para fora e arrastado por um estacionamento de cascalho, uma
porta, e desço alguns degraus íngremes. Quando uma porta se
fecha atrás de mim, o cheiro insuportável de urina atinge
enquanto o capuz é arrancado da minha cabeça. Piscando para
me ajustar à luz, um homem entra em foco a trinta centímetros
de distância, mais velho, cinquenta e poucos anos, seu cabelo
mais branco do que grisalho bem aparado, rosto impassível,
olhos opacos. Logo atrás dele está Palo, o homem sobre quem
perguntei no clube de strip no inverno passado, e não vejo
nenhum reconhecimento em seus olhos por mim. Minha
atenção voa de volta para o homem na minha frente enquanto
ele me inspeciona cuidadosamente.
— Você é mais bonito do que seu pai.

Só posso presumir que ele está falando de Abias. Beau


era muito menos radical e não consigo imaginá-lo amarrado ao
homem parado na minha frente.

— Fale.

— Não me lembro de Abias.

— Ele era um bom soldado. É uma pena que sua mente


o traiu.

— Minha mãe o odiava. Sou leal a ela.

— Fiquei muito triste ao saber do falecimento de Celine.


Trágico. Ela era bonita.

— Ela foi assassinada.

Seu rosto permanece impassível, mas em seus olhos, vejo


uma mudança.

Ele está bem vestido, seu gosto é caro. Nunca tive um


terno, mas se tudo correr bem – e esta não é minha última
noite vivo – estou determinado a ter um meu. Meus
pensamentos derivam brevemente para Dominic e a ideia de
que essa ligação pode ser nossa última conversa. Toco meu
dedo indicador e polegar juntos.

Toque. Toque. Toque.

— Pourquoi es-tu en France?


— Aqui para a escola. Apenas um estudante.

— Diga-me qual a necessidade de um aluno em recrutar


meus homens?

Toque. Toque. Toque.

— Não sabia que eles eram seus homens.

— Ignorância não é desculpa.

— Je ne fais pas la même erreur deux fois. — Não cometo


o mesmo erro duas vezes.

Ele pondera como se estivesse decidindo como quer seu


bife cozido, mas é a minha vida que está em jogo. Mas são
características como essas, sua linguagem corporal, sua
capacidade de exalar força apenas com a presença, a
consideração de suas palavras antes de falar e o tom uniforme
com que ele as fala que me mantêm totalmente engajado. Isso
e sua porra de terno – trespassado, perfeitamente cortado.

Ele me deu quase nada, além do fato de ser um conhecido


dos meus pais, e estou disposto a apostar que ele é controlado
em todas as situações – ameaça ou nenhuma.

— Não. Não apenas um estudante. E pelo que me


disseram, esses planos que você tem...

— Não inclua você. — A queimadura em minha têmpora


com a força bruta da arma me deixa saber que interrompê-lo
não é um erro que deveria cometer duas vezes. Sangue jorra
livremente da minha têmpora enquanto olho para frente em
meu captor, guardando minha ira para o filho da puta atrás de
mim para um encontro posterior.

— Então, você acredita que há espaço para todos nós, não


é?

— Não sou tão ambicioso.

— Acho que nós dois sabemos que é mentira.

— La France n'est pas le pays où mes projets se


réaliseront. — A França não é o país onde meus planos serão
realizados. Considero minha próxima declaração e decido que
não tenho nada a perder com a verdade. — O homem que os
assassinou é o dono da cidade, a polícia. Ele é a razão de eu
estar na França, para pedir ajuda à minha família.

— Você não tem mais família aqui.

— Sei disso agora.

Ele puxa um maço de cigarros do bolso forrado de seda


do paletó, acende um e sopra a fumaça na minha direção. O
sangue desliza pelo meu pescoço enquanto mantenho o
contato visual.

— Você ainda não perguntou quem sou. — Ele inclina a


cabeça. — Sinto que você é mais Abijah do que filho de Celine.

Não me incomodo em responder, mas brevemente me


pergunto se isso é verdade.
— Você vai precisar me contar seus planos se quiser
minha ajuda.

— Não quero sua ajuda. Este é um assunto de família.

— Todo mundo quer minha ajuda, — ele reflete e olha


para o homem às minhas costas como se ele tivesse tomado
uma decisão sobre mim, mas não consigo ler.

Toque. Toque. Toque.

Meus pensamentos vão para Dom e como ele será


agressivo ao vir atrás de mim, à Paris, para buscar a verdade
sobre por que desapareci, inserindo-se nessa mesma situação.
Todos nós morreremos assim? Nas mãos de homens poderosos
que decidem nossos destinos – ou podemos nos tornar o
mesmo tipo de homem, mudar nosso destino, inverter o
roteiro?

— Como disse, não estou interessado na sua ajuda, mas


adoraria o nome do seu alfaiate.

— Calma, — Claude implora enquanto eu corto a mão


para silenciá-lo. Após nossa conversa e amplo aviso, fui
libertado apenas porque sou filho de Celine. Quando o homem
se cansou de mim, fui novamente encapuzado e libertado a
duas quadras da Torre Eiffel. Ao amanhecer, corri os seis
quilômetros de volta ao meu apartamento para acordar meu
colega de quarto Claude e exigir seu carro. Ele insistiu em vir
comigo e, em vez de perder tempo, permiti que ele sentasse no
banco do passageiro enquanto puxava a bunda de volta para o
beco do qual fui sequestrado poucas horas antes. Uma vez lá,
fiz com que ele pegasse o volante e fechei os olhos, exigindo
seu silêncio, iniciando o bater lento dos meus dedos assim que
ele pisou no acelerador.

— Droite. Deux lampadaires. Gauche. — Direita. Duas


luzes. Esquerda.

— Où allons-nous? Que s'est-il passé? — Para onde


estamos indo? O que aconteceu?

Ignorando o ataque de perguntas, concentro-me em


minha tarefa.

Toque. Toque. Toque.

— Droite.

Toque. Toque. Toque.

— Tourne à droite ici! — Vire à direita aqui!

Ele acelera pela estrada estreita enquanto abro os olhos


e procuro qualquer sinal, rezando para não perder uma curva.
Os comentários de Claude parecem distantes enquanto
procuro o caminho que nos trouxe até aqui, passo a passo.

— Tu es complètement taré. Tu le sais? — Você é louco,


sabia disso?

— Tais-toi! Arrête-toi ici. — Cale-se! Pare aqui.


A visão de uma área de construção a metros de distância
e o portão ao lado me anima, e saio do carro de Claude e aceno
com a cabeça em direção à estrada.

— Vá.

Ele olha ao redor da rua abandonada.

— Nous sommes au milieu de nulle part! — Não estamos


em lugar nenhum!

Se você não acreditava em fantasmas antes de vir aqui


esta noite, ele é a prova.

E por um segundo, visualizo o que Claude vê. Uma rua


abandonada, o tempo se esqueceu, nenhum prédio à vista.

— Vá agora. — Seus olhos mudam de medo enquanto ele


estuda minha camisa ensanguentada e o nó em minha
têmpora. — Moins tu poseras de questions et plus tôt tu
partiras, plus tu seras en sécurité. — Quanto menos perguntas
você fizer e quanto antes sair, mais seguro estará. Caras como
Claude precisam de pouca persuasão quando se trata de
autopreservação, e ele é tão egoísta quanto possível.

— Je déménage. — Estou me mudando!

Bato a porta enquanto ele sai correndo e ligo para


Dominic, que atende no primeiro toque.

— E aí?

Desfio um endereço.
— Preciso de detalhes sobre o quê e quem, e preciso deles
agora. Dom, cave fundo.

— Ok. Te mando uma mensagem.

— Você o quê?

— Jesus, — Dominic desliga enquanto começo uma


caminhada lenta em direção ao portão, desejando que meu
telefone toque. Se eles me virem antes que ele me responda,
pode não ser o suficiente.

Quanto mais o tempo passa sem uma palavra, mais os


cabelos da minha nuca se arrepiam. Olhando freneticamente
para o telefone celular que ele enviou horas antes, começo a
voltar atrás, sabendo que sou um alvo fácil sem as informações
de que preciso. Em vez de tocar, o telefone vibra na minha mão.
Pressiono para obter a mensagem que aparece na tela.

O alívio me preenche quando olho para o portão à frente,


armado com as informações de que preciso. Quando chego à
entrada, levanto meu queixo para a câmera posicionada logo
abaixo do topo do portão e levanto minhas mãos. Minha
primeira mensagem de texto pode ter acabado de salvar minha
vida... ou acabado com ela. O tempo dirá, e não tenho muito
porque, segundos depois, os rostos vermelhos em chamas de
dois homens que me atacaram aparecem atrás do portão, suas
vozes crescendo conforme eles se aproximam.

— C'est quoi ce bordel?! — Que porra é essa!?


— Tu viens de signer ton arrêt de mort, imbécile! — Você
acabou de se matar, imbecil!

Depois de ser escoltado para dentro do portão, reconheço


que as aparências enganam e vejo que é mais um complexo –
um aglomerado de prédios de barro vermelho de um andar que
antes prosperou em uma época diferente. Acho a ideia
inteligente, assim como o jogo do vendedor ambulante de
embaralhar copos para encontrar a bola vermelha. A tática dá
a ele tempo suficiente para escapar, se necessário, mas posso
ver as falhas. Cenários passam pela minha cabeça enquanto
sou levado a um dos três edifícios a cinquenta metros do portão
e, desta vez, sou levado para cima antes de ser empurrado para
um escritório e ficar de joelhos.

Atrás de uma mesa de carvalho está sentado o homem


elegantemente vestido. Ele me examina como eu o faço. Está
claro que ele está cansado de uma longa noite, e faço o possível
para não comemorar a leve surpresa em seus olhos. Ele está
começando a perceber neste momento que eu pretendia
totalmente ser capturado na noite passada. Levei quase um
ano para chamar a atenção desse homem, e isso foi fácil em
comparação com descobrir quem ele era, porque nunca
consegui até alguns momentos atrás – conhecido por ser
desconhecido, mas tão notório na reputação que ninguém
ousa procurar ele fora. Preciso de habilidades como essa para
levar a cabo meus planos de me tornar um oponente digno.
Sussurros e murmúrios são tudo o que existe sobre ele e sua
organização, mas ninguém realmente sabe quem a dirige, e se
eles virem seu rosto, é a última coisa que veem.

A pressão de uma arma sendo apontada para minha


têmpora traz esse conhecimento para casa.

Mãe, me cumprimente. Pai, fique comigo.

Depois de um minuto me avaliando, ele acende um


cigarro e respira fundo, sua expiração nublando meu rosto
antes de falar.

— Tudo bem, Ezequiel. Você me encontrou. Como?

— Primeiro erro, eles me encararam no banco. Daí em


diante, era uma questão de desligá-los e acompanhar as
curvas, contagens de luz, o tempo entre eles e a velocidade.

— Como você, não cometo o mesmo erro duas vezes. —


Ele levanta um olhar feroz para os dois homens em ambos os
lados de mim, e sei que poderia ter custado a eles. Ele endireita
os ombros, mas posso ver a dor em seus olhos e um pouco do
desprezo que ganhei com minha façanha. — O ego pode ser
perigoso. Talvez devesse ter perguntado quem você é.

Levantando o queixo, os homens ao meu lado me colocam


de pé antes de fechar a porta atrás deles.

Uma vez a sós, encaramo-nos por vários segundos e sei


que meu tempo é limitado.

— Foi a sua reputação que me fez procurar você. Não


vendo pessoas, drogas ou armas, e nunca irei. Quem sou eu?
No momento, sou um órfão e um ladrão sem dinheiro, e
minhas ambições não combinam com as suas. No entanto,
estou pensando que talvez possamos nos ajudar, Antoine.

Pisando fundo, corro pelas estradas desertas próximas à


casa de Cecelia, examinando os detalhes daquele dia e as
decisões dos anos seguintes. Distorci todos os nossos futuros
naquela noite? Esse movimento foi meu primeiro em um novo
tabuleiro e me deu meu primeiro gosto real pelo jogo.

Foi o começo ou o fim?

Eu estava desesperado o suficiente para me associar a


aliados perigosos naquela época, mas não tinha ideia do
verdadeiro custo. A troca.

Aqueles que confiaram em mim no passado – que


compartilharam minha visão – acabaram perdendo a lealdade
por mim, e não é nenhum mistério o porquê. Não posso culpá-
los, nenhum deles, por sua fidelidade vacilante, ou Cecelia
agora, por sua desconfiança. Tudo o que posso fazer é tentar
acreditar na mulher que voltou para mim, que uma vez
acreditou em mim. Uma mulher que, não faz muito tempo,
lutou comigo, desafiou-me a ser o homem que eu era. Mas
aquele homem era enganoso, destrutivo e perigoso para as
pessoas que amava. E quando ele os perdeu, ele se deu
permissão para correr desenfreado. Agora que fui descarrilado
novamente pela possibilidade de uma vida diferente, estou
sendo forçado a enfrentar seus demônios.

Reduzo a marcha, o ponteiro do Camaro passando da


marca de cem enquanto tento escapar da dor, da queimação
de meus erros. A imagem dos rostos iluminados de Sean, Dom
e Tyler na noite em que contei a eles sobre Roman – sobre a
verdade do que aconteceu com nossos pais – e sobre meus
planos de derrubá-lo. À medida que seus rostos confiantes
ficam mais em foco, sei que nenhuma velocidade jamais
apagará essa memória.
Depois de outro turno, paro para ver Tobias lavando o
Camaro de Dom na minha garagem. Atordoada com a visão
dele sem camisa, tenso, rasgado, ele levanta a cabeça quando
me ouve aproximar e me dá uma leve elevação de seus lábios
grossos de onde ele se agacha, esfregando a lama da lateral do
carro. Ao que parece, ele colocou todos os cavalos sob o capô
para trabalhar. Mas a ideia de sua viagem fica em segundo
plano quando ele fica coberto pelo sol da tarde. Sua pele está
brilhando, acenando, seu jeans caindo perigosamente baixo
em seus quadris, exibindo seu corte em V, pouco antes de
desaparecer em seu jeans escuro. Saindo do carro, vou até
onde ele trabalha, concentrado em sua tarefa.

— Ei, — ele me cumprimenta, sua voz como se estivesse


gritando durante a maior parte do dia.

— Ei de volta, — respondo, olhando para o carro. — Vejo


que você deu uma volta.

— Sim, já faz um tempo desde que me soltei.

Algo está errado. É tão claro ver nas rugas claras ao lado
de seus olhos, o peso em seus ombros.
— Tudo certo?

— Sim, — ele joga sua esponja em um balde antes de dar


um beijo na minha têmpora. Recuperando a mangueira do
chão, ele pausa seu spray e balança a cabeça em reflexão
posterior. — Quero dizer, não, realmente não está bem, não
hoje. Mas podemos deixar essa conversa em particular para
mais tarde?

— Claro, — ofereço facilmente, deixando-o assim antes


que ele me agarre pelo pulso e me puxar para ele. Seus olhos
perfuram os meus enquanto ele me empurra ao lado do carro.
Ele mergulha e me beija, e permito, meu coração trovejando no
momento. Meu corpo implora para aliviá-lo da dor, mas minha
mente ainda me proíbe de entrar na queda livre que já me
permiti muitas vezes antes. Não é uma questão de cair, mas de
ter certeza de que sei como pousar neste ponto. Negar que o
amo, ainda estou apaixonada por ele, é inútil. Negar que ele
está aqui e sinceramente querer que isso funcione é um esforço
da minha parte. Mas, perdoando-o, é isso que impede nosso
progresso. Ainda é muito cedo para abraçá-lo – abraçá-lo
totalmente. No entanto, nesses poucos segundos, ele separa
meus lábios com a língua, provando-me completamente, e não
posso deixar de alimentar minha ganância. Ele me beija por
longos minutos e deixo cair minha bolsa, meu apetite me
implorando por mais um minuto antes que ele se afaste e
pressione sua testa na minha.

— Disse que não esconderia nada de você e não irei.


Tenho esses dias ruins, às vezes.
— O que há de ruim neles?

Ele puxa minha mão de seu pescoço e a beija antes de


pressionar meus dedos em sua têmpora.

— Aqui.

— Tem a ver com Dominic?

— Muitas vezes, sim. Dirigindo o carro dele... não sei, me


perdi um pouco na cabeça.

— Sinto muito. Só pensei que você gostaria de dirigir em


vez do meu Audi.

Ele balança a cabeça.

— Não sinta. Talvez tenha sido bom para mim.

— Não pelo que parece.

Tudo o que posso sentir é a dor emanando dele e minha


necessidade instintiva de confortá-lo.

— Às vezes eu desejo, — ele exala. — Às vezes gostaria de


ter sonhado do jeito que você sonha, para poder exorcizar
meus pensamentos dessa maneira, e talvez não tivesse feito
hoje em dia.

— Não, você não vai, Tobias. Prometo que você não vai.
— Afasto meus olhos. — Eu deveria deixar Beau sair. Preciso
de um banho.
Ele acena com a cabeça e me solta. Fechando a porta da
frente atrás de mim, solto um longo suspiro. Estar no mesmo
espaço com ele novamente, não há como negar a força absoluta
do que sua presença faz comigo. Ainda estou sem fôlego por
causa de seu beijo, o núcleo latejando com a necessidade
vibrando entre nós, mas sua dor ofusca tudo isso. Muito de
mim quer ceder, ouvir suas palavras, levá-las a sério e
realmente deixar todos os rancores para que possamos
começar a nos curar juntos – de uma forma que nos aproxime.

Tenho que tentar. Eu tenho que ceder, encontrá-lo no


meio do caminho em algum momento.

É claro que estamos vivendo o oposto do que imaginamos


coletivamente após nosso reencontro no estacionamento, e
posso sentir fisicamente a decepção em nós dois cada vez que
nos olhamos.

Mal o deixei me tocar ou lhe dei uma chance de se


explicar. Mas não posso me perder nele de novo, pelo menos
não completamente. Ficar física com Tobias não é
simplesmente sexo. É perto de uma experiência religiosa. Não
estou negando tanto a ponto de não perceber que sou eu quem
está impedindo nosso progresso.

Vou até a geladeira para pegar uma garrafa de água e


decido por algo mais forte. Talvez uma bebida me ajude a
relaxar a ponto de iniciar uma conversa. Pegando meu copo de
uísque, abro o freezer para pegar um pouco de gelo e vejo que
ele fez compras na mercearia, e não só isso, ele trouxe uvas
vermelhas fechadas com zíper para mim e as congelou. Visões
dos dias em que eu relaxava à beira da piscina na mansão do
meu pai chupando-as enquanto ele nadava passam pela
minha mente. Embora nossa história fosse curta, ficamos
juntos 24 horas por dia, sete dias por semana, estudando os
hábitos um do outro, aprendendo o corpo um do outro, ficando
loucos de amor. Então, ele usou minha marca de pasta de
dente. E apesar do meu comentário cheio de ressentimento, eu
o conheço, seus hábitos, seu humor, e foi o ciúme do meu
sonho que me disse o contrário.

O diabo está nos detalhes, e me lembro bem do meu


diabo. São gestos como esse que me trazem de volta àquela
época em que ele sempre me amava. Os jantares que ele
preparava para mim, os banhos que preparava que tomávamos
juntos e as nossas longas conversas durante. As longas horas
jogando xadrez, nosso tempo na clareira bebendo Louis Latour
enquanto observamos as estrelas. Fazendo amor por horas e
horas, coberto de suor, olhos travados, corpos zumbindo,
antes de cairmos em um sono exausto apenas para acordar e
fazer tudo de novo.

Fechando os olhos, luto contra o desejo de ir até ele, para


preencher a lacuna. Todas as noites parecemos estabelecer
uma trégua, e ele me envolve, arrastando-me para seu corpo,
esperando que eu faça perguntas, inicie uma conversa, mas
não o fiz. Ainda estou tentando me dar permissão para ser feliz
com isso, para baixar a guarda, para abraçá-lo aqui,
permanentemente.
— Apenas um, ok?

Pulo.

— Você vai parar de se esgueirar atrás de mim?!

— Não espreitei você. Você está olhando para o


congelador desde que entrei na sala.

Fecho a porta. Seus olhos caem para as uvas congeladas


que eu não tinha percebido que tirei da bolsa.

— Você costumava me deixar louco de chupar isso


enquanto estava lendo.

Jogo algumas no meu copo junto com um pouco de gelo


e volto para o balcão para despejar minha bebida.

— Por que apenas um?

— Temos planos para esta noite e preciso que você fique


alerta. — Ele abre a porta dos fundos para deixar Beau sair. —
Tenho um lugar que preciso levar você.

— Aonde estamos indo?

— Um encontro, — ele responde simplesmente.

Cambaleio sobre ele.

— Você está brincando comigo?

— É apenas para apresentá-la àqueles que cuidam de nós


aqui na Virgínia.
Fervendo, engulo o uísque.

— Pensei que você disse que ninguém estava procurando


por mim.

— Eles não estão procurando por você, — ele responde,


seus olhos transmitindo o resto. O fato de ele precisar de
proteção deveria me assustar, mas não assusta. — Ia tomar
um banho rápido.

— Então vou tomar um banho rápido. — Quando termino


minha bebida, ele já está no banho, sem dúvida para me
conceder espaço. Tirando a roupa, vejo-o me olhando no
espelho de onde está, ensaboando o corpo. Com os olhos
travados, tiro minha camiseta e sutiã, minha pele ficando
rosada com o rubor subindo pelo meu pescoço. Ele sorri, e
levanto meu queixo, levando meu tempo meticuloso para me
curvar, abaixando meu jeans e minha calcinha. Não me
preocupo em olhar para trás porque sei como o ato foi cruel.
Não posso deixar de morder os lábios com sua maldição
diluída. Entrando na minha banheira com pés, admiro-o
através da porta transparente do chuveiro enquanto ele passa
uma esponja pelo seu corpo. O banheiro é o único cômodo que
remodelei totalmente quando comprei a casa porque era do
tamanho de um armário e, embora agora tenha o dobro de
tamanho, ainda parece pequeno com a proximidade.

Ezekiel Tobias King é a perfeição diabolicamente sombria,


especialmente quando molhado.

E ele afirma que é meu. Para sempre meu.


Afundando na banheira, observo-o descaradamente
enquanto ele descarta sua esponja e passa um punhado de
xampu em seu cabelo escuro antes de levantar os olhos de fogo
para os meus.

Cílios molhados acentuam a cor surreal de seus olhos.


Através do fluxo de água, vejo isso claramente. Eu tenho vinte
anos de novo e estendo a mão para ele assim que ele me
encontra no meio do caminho para o chuveiro antes de me
beijar sem sentido enquanto me empala em seu pau. Um pau
que ganhou vida agora conforme os segundos passam e nós
olhamos para fora, ambos engolfados por memórias e
desgrudados de necessidade. Ele está ingurgitado agora,
grosso, com veias, a visão de sua ponta, dá água na boca. Em
um ato de crueldade, ele vira as costas, deixando o spray lavar
as asas fortemente pintadas ao longo de seus ombros. É então
que vejo a distorção, a clara interrupção do padrão que tantas
vezes tracei com meus lábios. Ferimentos de saída.

Um logo abaixo do ombro direito e outro acima do quadril


direito.

Lágrimas instantâneas surgem ao vê-los e ao que isso


significa. Ele ficou gravemente ferido enquanto estávamos
separados. Imagens nebulosas da noite em que ele me levou
tão implacavelmente na mansão de meu pai emergem, e eu não
consigo me lembrar de senti-las, mas elas poderiam estar lá.

— Tobias, — eu sussurro com voz rouca, o sangue


drenando do meu rosto, mas ele não me ouve. É tudo que
posso fazer para evitar ir até ele, para exigir respostas, mas há
uma divisória muito mais grossa do que o vidro e a porcelana
entre nós. Ele não quer me empurrar e eu não quero ser
empurrada. Ele parece tão relutante neste ponto em ser físico
comigo por um motivo que não consigo identificar, e não tenho
certeza de como me sinto sobre isso. Como se estivesse lendo
meus pensamentos, ele se vira para mim, avaliando minha
expressão antes de desviar seu olhar, outra maldição o
deixando quando ele desliga o chuveiro, pega uma toalha e
deixa o banheiro encharcado.
Medo.

Foi tudo o que vi pela porta de vidro do chuveiro.

Isso, combinado com o fato de que ela não confia em mim,


porra, é o suficiente para que eu questione minha presença
renovada em sua vida. Esse é o segundo gume da espada que
mais irrita. E é a sensação doentia dessa verdade, um
derramamento lento e contínuo do ácido constantemente se
agitando em meu peito, em minhas entranhas. O medo em
seus olhos não é porque ela tem medo de mim. Ela tem medo
do que fazer parte de nós pode e fez por ela. Ainda assim, ela
mantém a cabeça majestosamente alta em seu pescoço esguio
enquanto anda ao meu lado em direção ao nosso encontro
arranjado. Com o cabelo ainda molhado, passa brilho nos
lábios antes de alisá-lo e prendê-lo em um rabo de cavalo.
Olhando pela janela, ela permanece muda enquanto eu agarro
sua mão e a levo à minha boca, pressionando meus lábios
contra as costas dela.

— Temos que fazer isso, Cecelia. Mas espero que isso não
atrapalhe muito a nossa vida aqui.
— Eu sei.

— Não podemos negociar isso.

— Eu sei.

— Prometi que você saberia cada passo do caminho.

— Eu quero aquilo.

Olho em sua direção, brevemente tirando meus olhos da


estrada.

— Você tem certeza?

— Sim, — diz ela friamente. — Saber disso é um luxo pelo


qual paguei há muito tempo.

— Você vai ter, mas não vai pagar da maneira que você
quer, pelo menos não no começo.

Ela olha para trás pela janela e desacelero até parar no


acostamento porque quero que ela me ouça. Ela está presa no
carro dessa forma, sem escapar da conversa, que é onde eu
preciso dela para esta confissão. Quero estar pronto para
qualquer reação que ela tiver. Ela franze a testa quando pego
meu telefone e escrevo uma mensagem, segurando nossa
reunião. Ela me observa com expectativa quando disparo a
mensagem e a encaro.

— Vamos ter que ter uma dessas conversas agora.

— Tobias... — Ela balança a cabeça. — Entendo porque


precisamos de segurança.
— Há mais do que isso.

Ela se eriça.

— Maldição, não é sempre alguma coisa?

— Sim. Esse é meu argumento. Sempre haverá algo.


Sempre. Não importa o que aconteça, sempre haverá algo, e
você tem que decidir se ficar comigo vale a pena esse incômodo
sem fim e, mais importante, perder sua vida. Sua vida, Cecelia,
porque uma vez que você toma essa decisão, não há como
voltar atrás.

— Tomei essa decisão anos atrás, até você decidir por


mim, lembra?

— Pare de ser tão petulante sobre isso, — grito. — E talvez


eu esteja pensando que ainda é uma decisão para você, porque
talvez você não sinta mais o mesmo.

— Não estou sendo petulante. Estou me ajustando. O que


você não me contou?

— Tudo que preciso porque você não me deu a porra da


chance! — Cerro meus punhos, tentando o meu melhor para
nivelar meu temperamento. — E entendo, ok? Eu quero, mas
isso é realmente sério.

Ela lambe o lábio inferior, seus olhos cheios de remorso.

— Estou tentando.
— Eu sei. O corpo de Dom nem estava no chão antes de
Miami retaliar.

Seus olhos se arregalam.

— O quê?

— Eles vieram da Flórida com armas em punho e


declararam guerra total, assim que terminamos de limpar a
bagunça na casa de Roman. Estávamos completamente
despreparados.

— Jesus.

Viro em meu assento e a encaro totalmente.

— Dentro de uma semana, eles atingiram todos os


capítulos sudeste da irmandade e mataram com sucesso um
corvo em cada um deles, incluindo o irmão de Alicia. Foi assim
que nos conhecemos, em seu funeral. Eu estava lá no dia em
que o enterraram.

Ela acena com a cabeça solenemente.

— Mas isso não foi quando nós ficamos juntos. Esse


funeral foi apenas um de uma dúzia de que compareci no mês
depois que você partiu, incluindo o de Dominic.

Seus olhos se enchem de nada além de empatia, a reação


de uma verdadeira rainha, não de uma ex ciumenta, enquanto
ela tenta compreender o que estou dizendo a ela.
— Eles vieram em massa, Cecelia, e tudo para. Minha.
Cabeça. Você deve se lembrar que apenas alguns membros
fundadores sabiam de minha associação. Assim que fui
descoberto por Miami, tornei-me o inimigo número um. Sean
e eu dividimos os capítulos, aumentando a segurança, embora
não estivéssemos realmente nos falando. Não tínhamos
nenhum tipo de relacionamento naquele momento, mas nossa
dedicação era inabalável, trabalhamos juntos e ambos
avançamos. Essa guerra durou sólidos seis meses antes de
finalmente começar a morrer. E isso só reforçou minha decisão
de mantê-la longe, muito longe.

— Mas... pensei que todos aqueles que desertaram em


Miami foram mortos naquela noite?

— Alguns fugiram e, quando o fizeram, armaram-se e


voltaram com uma vingança. Miami era uma de nossas
melhores equipes por um motivo. Eles eram os maiores e
tinham mais conexões. Alguns deles tinham laços da máfia, e
eles não estavam de brincadeira. Eles foram direto para a
cabeça, eu, e ficou ruim. Quando a notícia se espalhou depois
daquele show de merda na casa do seu pai, minha autoridade
e controle foram questionados pela irmandade. Alguns
pensaram que virei as costas por motivos pessoais. As notícias
ficaram confusas e a notícia se espalhou rapidamente. E não
ajudou o fato de estarmos perdendo irmãos a torto e a direito.
Famílias ficaram chateadas e todos eles me culparam. Foi a
porra do meu pior pesadelo. Tinha certeza de que estávamos
prestes a ficar expostos, e cada vez que eu sobrevivia a uma
nova ameaça, presumia que ela estava prestes a acabar.
Quanto mais isso durava, mais funerais eu comparecia, mais
eu tentava consertar o mundo das famílias que foram
destruídas antes de o governo intervir e me sequestrar. No
primeiro ano, eu tinha certeza de que tudo estava acabado.

— Mas não deu em nada? Nenhuma autoridade pegou


vento?

— A guerra se espalhou por vários estados. Felizmente,


tínhamos federais suficientes com asas em nossa folha de
pagamento para destruir o empate das marcações na mídia,
mas quanto a deixar um rastro, por mais cuidadosos que
fôssemos, não tinha certeza sobre isso porque foi um golpe
total guerra de rua naquele ponto.

Ela engole.

— Quantos morreram?

— Muitos, — acaricio sua bochecha com meu polegar. —


Muitos, porra, de ambos os lados.

— Essas cicatrizes nas suas costas. Elas são de tiros?

Concordo.

— Quando?

— Um ano depois do dia em que te mandei embora, do


dia em que Dom morreu. Não é coincidência. Estava
terminando uma corrida a um quarteirão do meu escritório em
Charlotte quando fui baleado na porra de uma rua da cidade.
Apenas mais uma prova de que não havia acabado, o que só
me convenceu de que fui um idiota por pensar em vir atrás de
você.

— Você, — sua voz fica obstruída, — você...

— Quase morri? Sim. Fiquei tocado por cerca de uma


semana com o que Tyler disse. E honestamente, naquele
ponto, não me importava se o fizesse. Teria sido um alívio para
mim.

Seus olhos lacrimejam. Timidamente, ela estende a mão


e segura meu queixo. Cubro sua mão com a minha.

— O resultado daquela noite acabou sendo muito mais do


que poderíamos suportar. Não estava em posição de arrastá-la
para essa confusão, não importa o quanto quisesse você de
volta. Estava de olho em você em todos os lugares. O mesmo
fez seu pai até o dia em que morreu. Foi uma parceria
silenciosa com meus pássaros e sua segurança adicional.

Ela estremece.

— Não estou dizendo isso para te culpar, Cecelia. Só


quero que saiba que podem parecer desculpas, mas são bons
motivos para mim, motivos pelos quais não pude contatá-la,
não pude ir até você. Era muito perigoso nos primeiros anos.
Aqueles que ainda usam asas, ainda dedicados à causa, foram
fortemente examinados durante esse tempo. Para alguns
outros, aqueles sobre os quais não tínhamos certeza, os
fizemos acreditar que a irmandade estava se dissolvendo,
tornando-se coisa do passado. Depois que o inferno começou,
diminuímos de tamanho e, no final, Sean e eu decidimos que
era o melhor. Nós sabíamos o que estávamos fazendo no que
dizia respeito a você. Era mais seguro para nós machucá-la
emocionalmente e para você nos odiar por isso. Quanto mais
você se ressentia de nós e ficava longe, melhor para você.

Ela passa a língua pelo lábio inferior, seus olhos


procurando os meus antes que ela afaste a mão.

— Depois de todo esse tempo, você e Sean nunca...


conversaram?

— Eu tentei, — admito, — É claro que tentei. Tentei


colocá-lo no lado dos negócios quando seu filho nasceu para
mantê-lo seguro, para manter Tessa segura. Mas não, Sean e
eu não somos os mesmos desde o dia em que voltaram da
França e nos viram juntos.

Sua voz está distante quando ela fala.

— Todo esse tempo, pensei que pelo menos vocês tinham


um ao outro.

Balancei minha cabeça.

— Eu tinha a porra do meu precioso clube, e isso era tudo


que me restava, e estava desmoronando dia após dia. Tudo
pelo que trabalhei pegou fogo na noite em que Dominic morreu.
E eu não me importava naquele momento, mas eram as
pessoas que dependiam de mim, de nós, que me faziam
continuar. Quando a névoa da guerra finalmente se dissipou,
eu me perdi. Me perdi na minha cabeça. E acho que de certa
forma você poderia dizer: fiquei um pouco louco.

— Eu…

— Sente muito? Nunca sinta. Foi apenas o primeiro gosto


real de colher o que semeei. Te disse há muito tempo que sabia
que em algum momento isso me alcançaria. Só não esperava
que isso acontecesse tão cedo. Tem mais e está chegando, mas
eles estão esperando por nós.

Ela balança a cabeça enquanto ligo a ignição e olho pelo


retrovisor para o colar pendurado nele. Estendo a mão e aperto
as asas de metal entre meus dedos.

— Quando cheguei aqui, Sean me mandou uma


mensagem, perguntando sobre você, e pela primeira vez desde
que Dom morreu, ele perguntou sobre mim. Acho que ele está
finalmente tentando me perdoar.

Largando o colar, ele balança para frente e para trás


quando coloco o carro em marcha.

— Nós nunca seremos os mesmos, mas sabia disso


quando escolhi você em vez dele, e isso foi antes, — exalo, e o
medo me envolve enquanto a conto sobre o resto. — Cecelia,
eles sempre estarão atrás de mim, e uso o termo vagamente
porque eles são intercambiáveis. Na noite em que te procurei
com aquele ferimento na cabeça? Esse foi o resultado de outra
tentativa em mim que eu não estava esperando, porra.
Coloquei mais buracos nele do que o necessário para ter
certeza de que era o fim da ameaça, mas em vez de fazer o que
deveria e apagar quaisquer outras ameaças, me abaixei e fui
direto para você naquela noite.

— Quem era?

— Uma visita de um inimigo que fiz na França nos meus


primeiros dias para um sócio. E há uma chance muito boa de
que não seja a última retaliação. Existem longas memórias
neste jogo. — Ela medita sobre minhas palavras. — Com você,
sempre quebrei minha regra número um. Com você, eu não
estava pensando como deveria. Nunca gostei muito depois que
ficamos juntos, mas não queria ficar sem você.

Fico olhando para a estrada aberta diante de nós.

— Se fizermos isso, realmente fizermos isso, você precisa


saber, se eles chegarem até você, a coisa mais valiosa da porra
da minha vida, o jogo acabou para mim, Cecelia. Fim. Mal
consigo lidar com a possibilidade de perder você. Só sobrevivi
por muito tempo sem Dominic e perdendo você, e Sean, meu
respeito, meu propósito, simplesmente parei de me preocupar
com tudo que importava para mim pessoalmente. Me tornei
alguém que não reconheci, e não havia ninguém lá para me
impedir de... — Os lampejos das noites que deixei a depravação
me consumir brilhar brevemente, sombreando o resto da luz
do dia na escuridão. Alcanço essas memórias na tentativa de
descrever meu estado de espírito. — Me senti melhor sem me
importar, porra, liberado de uma forma que nunca estive
porque não tinha nada a perder. Não tinha mais ninguém perto
de mim com quem me preocupar e fiquei aliviado. Minha
cabeça não estava correndo tanto, e eu não estava... —
balancei minha cabeça. — Se eles pegarem você agora, — solto,
— eles levam tudo. Então, esse encontro é mais do que
necessário. Mas tudo isso pode parar bem aqui, agora. Não
posso me afastar de você de novo, não posso afastá-la de novo
e nunca irei, mas você pode me mandar embora. Se essa for
sua decisão, vou respeitá-la, porque Cecelia, há uma chance
muito real de você morrer por me amar, e só posso prometer
que tentarei mantê-la segura.

Ela só leva um segundo para assentir antes de se


endireitar no banco.

— Como disse, tomei essa decisão há muito tempo,


Tobias. Vamos lá.
Vinte e um anos

Caminhando sob a cobertura da copa das árvores na


entrada do parque, coloco minhas mãos em meu jeans
mantendo um ritmo vagaroso. Um pássaro solitário voa de
cima, chamando minha atenção enquanto plana antes de
pousar em um dos galhos baixos. Com os olhos fixos no
pássaro, sinto seu olhar vigilante de volta, seguindo meu
progresso enquanto passo por ele. Minha mente luta com o
significado de sua aparência enquanto meu intestino tenta
decifrar se é um aviso ou um sinal para continuar. Decido pela
segunda opção, caminhando mais adiante ao longo dos
arredores do parque. Não demorou muito para localizar o
grupo de homens reunidos em pares em um aglomerado de
mesas, a maioria deles mais velhos, de meados aos anos
sessenta. Todos eles estão situados frente a frente, tabuleiros
de xadrez no meio. Apenas um homem está sentado sozinho,
as peças do tabuleiro espalhadas como se estivessem no meio
do jogo, a cadeira à sua frente vazia. Com o pulso acelerado,
dou os últimos passos me posicionando entre eles antes de
deslizar para a cadeira vazia. Os homens que nos cercam nem
ao menos me dão uma olhada, muito imersos em seus próprios
jogos.

O homem com quem estou sentado não reconhece a


minha presença nem um pouco quando o observo, seu rosto
marcado por anos de uso, linhas profundas na testa e ao redor
dos lábios. Seus cabelos grossos e grisalhos estão do lado mais
comprido e suas roupas gastas estão ligeiramente amassadas
– como se ele não tivesse se importado com sua aparência e
simplesmente rolado para fora da cama. Ele posiciona as peças
do tabuleiro delicadamente, acariciando cada uma com as
pontas dos dedos antes de soltá-las enquanto as coloca de
volta em sua posição inicial no tabuleiro gasto.

Parecendo satisfeito com seu ritual, ele finalmente


levanta os olhos – a cor dos meus – para me varrer com a
mesma inspeção cuidadosa. Seus lábios se contraem em
diversão com o deslize da minha expressão devido à nossa
semelhança, uma clara relação familiar.

Desde que estive na França e devido aos boatos sobre


meu pai biológico, fiquei mais curioso sobre o homem que ele
era antes de sua doença o levar. Descobri alguns detalhes
esparsos de Antoine, que foi, pelo que descobri, em certo
momento seu sócio quando meus pais estavam juntos. Meu
pai era, em essência, um executor de ordens do lance mais
alto. Muitos temiam Abias. Alguns o respeitaram. Como mil
perguntas brotam em minha língua, não me atrevo a fazer.
Estou aqui a convite, e não vou estragar tudo com minha
curiosidade antes de descobrir por que o convite foi estendido.
Ele não estava na lista exaustiva de contatos que
Delphine construiu com tanto cuidado para mim – que
consistia principalmente de parentes de minha mãe – todos
eles ex-ativistas, e muito poucos do lado do meu pai biológico.
Na verdade, ele é um aliado improvável. O ceticismo toma
conta de suas motivações, mas sei que sem dúvida estou
olhando para o pai de Abijah, meu avô. Alguém que eu nunca
teria considerado pedir ajuda de qualquer forma, o medo
enraizado dentro de mim quando era jovem. A noção
profundamente arraigada por minha mãe de que Abias era um
homem por quem eu nunca deveria ter curiosidade ou
procurar em qualquer função. Por causa disso, raramente, ou
nunca, pensei muito em sua grande família.

À medida que estudamos um ao outro, uma parte de mim


reconhece a possibilidade de que, porque minha mãe fugiu da
França – levando o único filho de Abijah enquanto o
abandonou completamente por outro homem – isso pode ter
causado um ressentimento indireto para todos os envolvidos,
incluindo eu.

Peso sua expressão com atenção para qualquer traço de


rancor ou ressentimento. Em vez disso, encontro algo
semelhante a alegria em seus olhos, como se ele estivesse
sedento por me ver todos esses anos.

Mas talvez não seja a mim que ele vê enquanto me encara,


mas o fantasma do meu pai biológico, um filho que ele perdeu
para uma doença mental há muito tempo. Posso sentir uma
vaga ideia desse vínculo agora, enquanto olho para ele. Um
vínculo que tive em certo ponto com o homem que me criou e
que agora tenho com meu irmão.

O sol da primavera começa a bater em nossas cabeças


enquanto as nuvens da manhã se abrem, iluminando o
tabuleiro.

— Se voir acordei, o premier déplacement est perçu par


sure comme un avantage. Je considère que c'est mon
avantage. Avec ce seul coup, je peux souvent dire si mon
adversaire est agressif ou non. Fais le premier pas, Ezekiel, je
suis assez curieux de voir. — Receber o primeiro movimento é
visto por alguns como uma vantagem. Considero minha
vantagem. Com aquele movimento, muitas vezes posso dizer se
meu oponente é agressivo ou não. Dê o primeiro passo, Ezequiel.
Estou bastante curioso para ver.

— Je n'ai jamais joué. — Nunca joguei.

Outra contração de lábios e um lampejo do que percebo


como orgulho brilham claramente em seus olhos.

— La plupart répondraient, 'Je ne peux pas jouer.' Je


préfère ta réponse. — A maioria responderia: 'Não consigo
jogar'. Gosto muito mais do seu.

Ele pega um peão e o move dois espaços na diagonal antes


de puxá-lo de volta ao seu lugar inicial no tabuleiro.

— Tu ne peux avancer ton pion de deux cases que la


première fois, une fois qu'il est en jeu, le pion ne peut se
déplacer qu'une fois par tour. Lorsque tu retires tes doigts du
pion, c'est joué, tu ne peux plus revenir en arrière. — Apenas
na primeira vez, você pode avançar um peão duas casas; uma
vez em jogo, o peão só pode se mover uma vez por turno. Depois
de remover os dedos do peão, está feito, para nunca mais ser
puxado para trás.

Ele desenha as sobrancelhas em questão e dou uma


lenta inclinação do meu queixo em compreensão. Ele fala um
inglês claro com suas próximas palavras.

— Fiquei muito triste ao saber de seu primeiro


movimento.

Antoine.

É a única conclusão que posso tirar.

Mal tenho tempo para registrar as implicações do que ele


está dizendo enquanto aponta de volta para o tabuleiro.

— Preste muita atenção, Ezequiel.

Ele se move ao longo da linha, demonstrando as regras


de movimento horizontal e vertical de cada peça, até que eu as
compreenda suavemente. Ele faz isso em silêncio por vários
minutos enquanto observo, extasiado, prestando muita
atenção à maneira como ele encara cada peça.

— Vous considérez le pion comme le plus important? —


Você considera o peão mais importante?

— Cela dépend de la connaissance du pion et de sa


position. Et puis, l'union fait la force, n'est-ce pas? — Depende
do conhecimento do peão e de sua posição. E há um conforto nos
números, não é?

A pergunta está diretamente relacionada ao meu motivo


para procurar ajuda na França, o que me permite saber há
quanto tempo ele está ciente de mim e de minha busca aqui, e
quão profundas são suas conexões. Empurrando meu orgulho
de lado, admito a verdade que reuni durante anos de
isolamento aqui e aceno. O momento em que mais me sinto em
paz é em casa, cercado pelos meus irmãos.

— Mais tu vois, s'il est correctement positionné, le pion


seul peut devenir l'une des pièces les plus puissantes du
plateau, et a la capacité de mettre le Roi en échec. — Mas você
vê, se posicionado corretamente, o peão sozinho pode se tornar
uma das peças mais poderosas do tabuleiro e tem a capacidade
de dar xeque no rei.

Ele levanta a peça e a gira nas mãos com muito cuidado,


e o observo, absorto em seu movimento antes de colocá-la de
volta no tabuleiro.

Uma aula de xadrez não é nada do que eu esperava esta


manhã. A ironia me ocorre que, por mais que compare minhas
jogadas na França com este jogo, só sei o básico, a essência
dele, o gol central.

A consciência do tipo mais forte me oprime, e acolho isso,


grato por ter confiado em meus instintos no início de minha
caminhada aqui. Houve algumas vezes na minha vida em que
tinha certeza do meu caminho, por meio da eletricidade geral
que me consumia e me dizia que eu estava exatamente onde
deveria estar em um determinado momento. A primeira vez foi
na clareira, na noite em que meus pais morreram. A segunda
vez que bateu foi na última noite que passei naquele
restaurante com Preston. E sinto o mesmo zing agora quando
levanto meus olhos para o homem sentado à minha frente.

— Tu m'as dévoilé ton handicap avec tes premiers mots,


ce qui n'est pas une sage décision dans un jeu de tactique. Je
sais déjà que je peux et que je vais te battre, mais ton avantage
est maintenant le premier coup. — Você entregou sua
deficiência com as primeiras palavras para mim, o que não é
uma decisão sábia em um jogo de tática. Já sei que posso e vou
vencê-lo, mas sua vantagem agora é o primeiro movimento.

Ele gesticula em minha direção para começar, e invoco o


instinto, movendo a primeira peça para o jogo. Suas
sobrancelhas levantam em leve surpresa, e ele me dá um aceno
lento.

— Você joga com frequência?

Ele chuta para trás em seu assento, as pernas de metal


esfregando levemente contra o pavimento. Ambos sabemos que
minha pergunta não tem nada a ver com o jogo.

— Me aposentei há muito tempo, mas me envolvo de vez


em quando, se tiver um bom motivo. — Uma comunicação
silenciosa passa entre nós até que ele abaixa os olhos e faz seu
primeiro movimento.
Pego um saco de mantimentos e o coloco na mesa da
cozinha, curiosa para saber por que Beau não me bateu com
sua saudação desleixada de costume. Examinando o quintal
pela janela, não vejo meus dois franceses e começo a vasculhar
a casa. É no escritório que descubro que os dois estão
ocupados. Beau está apoiado com as patas dianteiras nas
coxas de Tobias, cutucando sua mão para se alimentar de
batatas fritas, enquanto Tobias dorme praticamente em coma
na minha cadeira redonda enorme. Ele está com nada além de
calça de moletom preta e meias de lã, um ronco suave saindo
de sua boca aberta. Sacos de salgadinhos e doces o cercam, e
vejo um tubo meio comido de Ben and Jerry's na mesa lateral.
A TV está tocando ao meu lado, abafando minha risada
enquanto Beau procura em Tobias por restos de mais lanches
encharcados de óleo.

É engraçado e triste, e está claro que minha ausência


constante, junto com o espaço que estou colocando entre nós,
está ajudando na criação de uma batata de sofá francesa.
Devido ao estado de sono, está claro que ele comeu grandes
quantidades de carboidratos que costumava me proibir de
comer.

Uma mão espalmada repousa sobre seu peito, e suas


pernas estão penduradas na lateral da cadeira. Beau se ocupa
lambendo a outra mão para limpar.

É evidente que ele não estava me esperando em casa tão


cedo. Ansiosa para ir até ele, para limpar as migalhas restantes
de seu rosto e lamber o chocolate que sobrou debaixo de sua
boca, observo-o enquanto dorme. Quando comprei esta casa,
nunca o imaginei aqui e, para ser sincera, nunca o imaginei
em qualquer condição doméstica. Claro, eu morava com ele na
casa do meu pai, mas então tudo era bom jantar, degustação
de vinhos, noites passadas jogando xadrez perto do fogo e
sessões sexy que nos deixavam encharcados de suor e
ofegantes.

Essa dinâmica é completamente estranha.

O desconforto se insinua por ele já estar tão entediado,


enchendo seus dias comendo merda e assistindo TV em
excesso.

Aquela sensação de culpa e o fato de que é assim que ele


passa seu tempo aqui só reitera ainda mais minha ideia de que
ele não se encaixa, de que viver em uma cidade pequena o
aborrece a ponto de ficar inquieto.

Mesmo em seu estado desleixado, ele é o homem mais


bonito que já vi. E se quisesse, poderia ir até ele agora, limpar
a casca e me perder nele. Odeio estar sendo tão resoluta, mas
minha consciência exige isso, e ele me forçou a ser assim por
causa de seu comportamento anterior. Já se passou um pouco
mais de uma semana desde que ele apareceu, e estou
determinada a aguentar os meus próprios interesses. Ele
precisa saber que a qualquer momento que passa frustrado
comigo pelo espaço que estou mantendo entre nós, sinto-me
mil vezes – foda-se, um milhão de vezes quando ele me
empurrou, exilou-me e menosprezou nosso relacionamento.
Todo o tempo implorei para ele nos reconhecer. Por mais
imaturo que seja guardar rancor, sofri demais em suas mãos
para simplesmente ceder. E não vou. Não até que tenha certeza
de que ele entende que nunca vou tolerar isso novamente.

Não são apenas os pecados que ele cometeu e as mentiras


que ele contou em nosso tempo juntos que nunca teve que
responder, mas sua negação cruel meses atrás, quando fiz
papel de boba. No entanto, esses combinados são motivos
suficientes.

Mas quanto mais o observo, mais atraída fico, um pouco


mais indefesa à atração, um zumbido constante de
necessidade por ele, e apenas ele.

Imagens do nosso passado me provocam enquanto olho.


Um flash de mim de joelhos em nada além de calcinha
enquanto ele agarrou meu cabelo e empurrou seu pau grosso
na minha boca, ordenando-me que chupasse. E eu fiz, minha
recompensa... o fogo estimulante e a satisfação do controle que
eu desisti evidente em seus olhos, nos grunhidos e murmúrios
de sua boca antes que ele me fodesse crua. Posso entrar no
fogo do inferno e obter a mesma satisfação a qualquer
momento, mas a frustração sexual não será o que me
quebrará. Não será o que me fez desistir.

Sinceramente, não sei o que será necessário, mas confio


em mim mesma para saber quando sentir.

Sempre vou querer ele. Isso é certo. Meu corpo, coração,


alma, tudo o que me faz ser quem sou, vai doer para sempre
por ele, esteja ele perto ou longe. Essa é uma conclusão
precipitada que meu coração fez há muito tempo. Mas é ao
coração desse mesmo viciado que me recuso a ceder. Por
enquanto, foda-se meu coração, preciso de paz de espírito.

Beau finalmente termina sua refeição, fazendo um


trabalho decente de limpar Tobias antes que ele pule da
cadeira para me cumprimentar. Curvo-me e corro meus dedos
em suas orelhas enquanto ele balança na minha frente com
entusiasmo, contando-me sobre seu dia.

Quando a TV mostra a introdução de um novo episódio


de Storage Wars, Tobias acorda, seus olhos selvagens e em
alerta enquanto ele se levanta para se sentar. Ele procura o
espaço, os olhos se arregalando de surpresa quando me vê
parada na porta. Um sorriso sonolento e sexy do caralho
aparece em sua mandíbula mal barbeada antes que ele
perceba que foi pego pastando nos alimentos que ele uma vez
me proibiu de comer. Ele rapidamente agarra algumas das
sacolas em seu punho antes de baixar a cabeça, um sorriso
tímido enfeitando seus lábios.

— Você está me julgando.

— Absolutamente, sim, estou. — Balanço minha cabeça


para dar ênfase.

— Você chegou em casa mais cedo.

— Só por meia hora. — Beau choraminga aos meus pés.


— Acho que devo agradecer por alimentar o cachorro.

Um lado de sua boca levanta na minha sobrancelha


levantada.

— Estou profundamente envergonhado.

— Uh huh. — Interrompo a hilaridade da situação e me


aproximo na tentativa de lê-lo. — Você teve outro dia ruim?

— Não, na verdade não. — Ele parece buscar seus


pensamentos antes de seu rosto se iluminar. — Você sabia que
há um programa sobre caçadores de tesouros que licitam em
depósitos de estranhos? Incrível o que eles encontram! — Ele
dá um tapa na coxa e arregala os olhos de puro deleite. —
Podemos assistir a isso juntos. — Ele está realmente animado
com essa perspectiva, e tudo o que posso fazer para não cair
na gargalhada.

— Você realmente tem vivido em um planeta alternativo,


Sr. King.
Olhos flamejantes passam por mim, e ele estende a mão,
e a pego antes que ele me puxe para ele, então estou montada
em seu colo.

— Muito longe de você, — ele murmura baixinho, tirando


meu gorro antes de esticar os dedos pelo meu cabelo. — Você
está fria. — Ele segura meu rosto com as mãos antes de
deslizá-las para cima e para baixo em meus braços, criando
atrito para me aquecer. Inclinando-se, ele pressiona seus
lábios nos meus brevemente antes de acariciar meu pescoço.

Afundando nele, perco-me na sensação de sua pele


morena, os músculos tensos e profundamente definidos ao
longo de seus ombros.

— Você vai ter um instinto de relacionamento e colocar a


culpa em mim.

— Eu não daria a mínima, — diz ele, apertando minha


mão quando a passo sobre sua barriga inchada de
carboidratos.

— Você também vai ter alguns tons de cinza em breve. —


Me inclino com um sorriso e pressiono meu nariz frio no dele.
— Você está ficando velho.

— Tenho muitos anos nobres restantes, — ele zomba,


levantando-me em seu colo para que eu possa sentir sua
ereção crescente, — e quando o cinza chegar, vou me deixar ir.
Comer frango frito e beber leite integral.
— Ah, bem, não tenho nada a dizer sobre isso? Vou ficar
com um francês de frango frito robusto?

— Você vai me amar de qualquer maneira, — diz ele em


seu sotaque grosso, novamente aninhado em meu pescoço. —
Mesmo que eu seja gordo e grisalho.

Puxo seu cabelo de ônix despenteado para outra dose de


âmbar, incapaz de parar o leve movimento dos meus quadris
sobre seu pau grosso, minhas palavras em conflito com a
minha necessidade de mais.

— Prefiro esperar um pouco mais para que os pelos da


orelha sejam um problema.

Ele me empurra em seu colo.

— Oh, vamos comer frango frito no jantar.

Estreitando meus olhos, olho para a mesa final e levanto


uma sobrancelha quando vejo a pequena caixa antiga.

— Você entrou no meu estoque de ervas daninhas de


emergência.

— Talvez, — ele levanta os olhos culpados para os meus,


e embora ele esteja sendo brincalhão, o puxão seguro da
verdade de sua nova realidade está começando a pesar,
eletrocutando um pouco da energia sexual sempre presente.

— Você está entediado aqui.


Sua breve hesitação apenas confirma isso. Ele me agarra
com mais força quando meus dedos relaxam.

— Não estou.

— Tobias, você não precisa desistir. Te disse quando você


chegou aqui. Não vou deixar você. O trabalho que você está
fazendo é muito importante para as pessoas que dependem de
você e é importante para você.

— Você é mais importante e estou de férias, — ele insiste,


passando as mãos nas minhas costas, onde estão minhas
asas. Quando seus olhos brilham e suas mãos começam a
explorar, empurro seus ombros.

— Tenho mantimentos para guardar. — É uma desculpa


de merda para quebrar a intimidade, mas uso mesmo assim e
sinto a hesitação em seus braços antes que ele me solte.
Levanto e pego um pouco do lixo, e ele agarra meu pulso,
minha mão em torno de um litro de Cherry Garcia.

— Vou limpar a minha própria bagunça, Tesor, e não foi


um dia ruim, — ele insiste, antes de me soltar e se levantar
para recolher seu lixo.

— Mas também não foi bom. O que vem a seguir, um Xbox


e um fone de ouvido? Você vai se transformar em um desses
caras?

— Por que diabos não? Eu mereci. — Ele me segue até a


cozinha com o lixo na mão e joga na lixeira.
— Não estou dizendo que você não merece.

Ele cruza os braços sobre o peito tenso, o cabelo escuro,


caído e ligeiramente enrolado em torno das orelhas. — Por que
você simplesmente não diz o que quer dizer?

— Não é você.

— Não? Tudo bem, o que agradaria você?

— Não se trata de me agradar.

— Não? Você parecia ter alguma noção preconcebida


sobre mim e esta vida com você. Acho que não estou
cumprindo isso.

— Não tenho noção. Essa é a questão.

— E estou dizendo a você, estou exatamente onde quero


estar.

— Bem, me perdoe se não acredito em você porque


conheço melhor.

— Sim, bem, desculpe-me se penso o mesmo sobre você.

Paro com uma caixa de granola na metade do saco.

— O que isso deveria significar?

Ele me empurra onde estou na mesa da cozinha. Seus


olhos brilharam com animosidade.

— Isso também não é você. Esta é a vida de Cecelia


Horner – quem você poderia ter sido – antes de saber o que a
vida verdadeira significava para você. Você não está
exatamente vivendo o padrão da mulher que dirigiu uma
reunião de diretoria com a porra de saltos altos oito meses
atrás e passou seu tempo livre derrubando adversários de sua
escolha.

— Você está me chamando de hipócrita?

Ele pressiona.

— Sim. Eu vi você. Vi a vitória em seus olhos quando


você encurralou sua presa. Não estou culpando você pela vida
que escolheu viver, mas não é exatamente adequada para
quem você realmente é, não é?

— Sei quem sou.

— Você? Porque a mulher que me deixou há oito meses


era muito mais ousada do que a que seguro à noite.

Coloco uma caixa de macarrão de cabelo de anjo na mesa,


e ele solta um suspiro exasperado. Ele começa a se afastar e
pensar melhor, se vira e corre em minha direção.

— Não vou agir como se não estivesse tendo um momento


difícil do caralho não estar no controle – ou saber – mas o
mínimo que você pode fazer é admitir para mim que isso não é
o que você vê para si mesma permanentemente. Você está se
escondendo porque te machuquei. Sua confiança sofreu um
golpe porque parti seu coração de novo.
— Você não consegue se creditar pela vida que escolhi
viver no minuto em que saí do seu escritório. Você não tem
tanto controle sobre mim, não mais. Você perdeu esse direito,
— estalo.

Com a mandíbula travada, vejo a dor que infligi com


minhas palavras em seus olhos um segundo antes de desviar
meu olhar e começar a descarregar o resto das compras. Ele
mantém seu olhar em mim enquanto termino minha tarefa
sem palavras, recusando-lhe a luta que ele quer. Sinto sua
decepção quando não aceito seu desafio enquanto o silêncio
persiste entre nós antes que ele se vire e saia
tempestuosamente da cozinha. A porta da frente bate minutos
depois, e sei que ele saiu para outra corrida.

Mais tarde naquela noite, sinto a queda da cama antes


que ele me puxe com força para ele, então estou aconchegada
contra seu peito. Envolvida em seus braços, sinto seu pedido
de desculpas, sua necessidade de consertar tudo com cada
batida de seu coração firme contra minhas costas, mas
permaneço muda com a queimadura da verdade que ele falou.
Se as conclusões que tirei também fossem verdadeiras – que
eram devido à sua mordida – então estaremos ambos à deriva
no momento.
Vinte e um anos

— O que há com você hoje, cara? — Tyler pergunta,


sentando-se em uma cadeira enquanto jogo outra lenha no
fogo. Sean e Dominic terminam de armar acampamento no
momento em que o sol começa a passar pela linha das árvores.

Ainda estou com o jet lag do meu voo, no horário de Paris,


as realidades que estou vivendo entre mundos se confundindo
enquanto examino a clareira. O fardo de manter meus papéis
em cada um está começando a me pesar, mas me recuso a
permitir que isso me detenha. Especialmente depois de hoje.
Há dez anos, neste mesmo lugar, iniciei uma jornada para
vingar os assassinatos de meus pais, e estar aqui me serve de
base, lembra-me o quão longe tenho que ir para buscar essa
justiça. Mas a minha presença aqui, neste lugar que considero
sagrado, também me permite saber o quão longe já cheguei e
o quão perto estou.

— Vou cuidar disso, — digo a ele enquanto olho para


Dominic, que pega sua cadeira e encontra meu olhar
pensativo. Bato no mosquito que chupa meu antebraço
enquanto Sean abre uma cerveja. Recém-saído de sua primeira
manifestação na escola, o zagueiro estrela de Triple Falls ainda
está vestido com sua camisa.

— Disse que não vamos beber esta noite. — Pego a garrafa


de sua mão assim que ele a leva à boca.

Sean me encara.

— Você consegue fazer um treino de futebol de dois por


dia e me diz que não merece uma cerveja. E últimas notícias,
tenho um par de pais. Eles moram a algumas ruas de distância
da sua e me ensinaram o certo do errado.

— Por mais que isso tenha feito você, — Tyler diz.

— Isso é importante, — estalo. Os olhos de Sean voam


para a cerveja confiscada em minha mão antes de jogá-la nas
chamas. O verão passado deveria ser a minha vez de me
reconectar com meus irmãos, mas estava ausente, muitas
vezes voando de volta para a França, principalmente por causa
das exigências de Antoine. Mas ainda preciso dele no
momento, então estou preso sendo seu garoto de recados até
encontrar uma maneira de ser menos dependente. Ele tem sido
o recurso que pensei que seria, fornecendo-me quase tudo que
precisava enquanto permanecia ganancioso com sua riqueza,
então ele é a única perna que tenho para me sustentar. É o
movimento certo da parte dele para me manter contido,
manter-me dependente dele, mas está sufocando meu
progresso a ponto de eu precisar fazer movimentos para
garantir que posso varrer suas pernas se necessário.
— Podemos continuar com isso? — Tyler diz, tirando
minha atenção do fogo.

— Você tem um lugar que precisa estar?

— Sim, quero, na verdade, — ele desvia os olhos.

— Ele tem desaparecido muito, — Sean fornece. — E não


vai nos dizer quem ela é.

— Porque ela não existe, — Tyler se encaixa.

Sean sorri.

— Parece-me que a senhora protesta demais.

— Acho que você vai perder alguns dentes de leite se não


calar a porra da boca.

Ignoro sua troca, os olhos treinados em Tyler.

— Algo que preciso saber? — Ele sacode o queixo em


resposta. Ele está claramente escondendo algo, e é pessoal de
sua mordida. Definitivamente existe uma ela, e esse é um dos
motivos pelos quais convoquei a reunião.

Sean chuta para trás em sua cadeira de camping e, em


um movimento repentino, Dom salta da sua e empurra o peito
de Sean, derrubando-o. Dom e Tyler riem quando Sean
pragueja e fica parado limpando a sujeira de suas calças antes
de pegar um maço de cigarros em seu jeans.

— Você quebrou a porra dos meus cigarros, idiota.


— Não deveria fumar de qualquer maneira, — Dom diz,
puxando um baseado de sua mochila.

Levanto uma sobrancelha.

— Você está falando sério agora?

— Sério o suficiente, irmão, — ele murmura, os lábios


envolvendo o baseado enquanto Sean bate em seu Zippo.

— Apenas espere um minuto, — ordeno.

Dom me lê e acena com a cabeça, colocando o baseado


atrás da orelha.

— Qual é a atualização sobre a garagem? — Pergunto,


entre os três. — Quão perto estamos?

— Está feito. Assim que eu receber o dinheiro do acordo,


— Dom diz. — Nenhuma outra oferta na mesa porque ninguém
mais por aqui tem dinheiro para comprá-la.

Tyler entra na conversa, com as sobrancelhas franzidas.

— Qual é o ponto da garagem com tudo o mais que temos?


É apenas uma fachada?

— Não, — digo, olhando de volta para o fogo. — Será um


negócio legítimo. Consertaremos carros e receberemos
dinheiro por isso. A idade legal para mecânicos neste estado é
dezesseis. Mas vamos precisar de mais alguns para ter um
lucro decente e lidar com os custos indiretos.
— Conheço alguém, — Tyler acrescenta, — Chama-se
Russell, ele tem nos ensinado como trabalhar nos clássicos
que o tio de Sean nos deixou. Ele tem idade suficiente. E ele é
bom pra caralho.

— Confia nele?

— Sim, — Tyler concorda. — Ele é gente boa e também


nunca foi fichado. — Temos uma regra estrita de proibição de
impressão ao examinar novas aves por motivos óbvios. Não
queremos ninguém associado a nós com impressões digitais
em qualquer banco de dados – mesmo como um jovem – o que
torna mais difícil encontrar o tipo de recrutas de que
precisamos. Precisamos de ladrões espertos e bons homens,
mas no nosso pescoço do bosque e com o pico de
metanfetamina, eles são difíceis de encontrar.

— Traga-o. Quero conhecê-lo.

Tyler concorda.

— Vou ver se ele conhece mais alguém.

Meus olhos voltam para as chamas, e é então que fico


impressionado com o pensamento dos meus pais, trancados
em uma sala enquanto chamas semelhantes os cercam
enquanto eles gritam por ajuda. Não é nenhum mistério por
que essa imagem deles está pesando em minha mente.

Pego alguns gravetos e jogo no fogo.

— Vi Roman de perto pela primeira vez hoje.


— Onde? — Sean pergunta.

— A biblioteca, — Dominic fornece, — quando ele veio me


buscar.

Olho para meu irmão, levemente surpreso. Ele estava no


canto mais afastado da biblioteca, absorto em seu livro quando
Roman entrou, parecendo leve como se não fosse o responsável
por arruinar vidas. Mas acho que ele não se sentiria culpado.
Homens como ele consideram meus pais 'a ajuda', nada mais
do que responsabilidades cujo assassinato provavelmente o
incomodou mais do que qualquer outra coisa. Ele nunca
saberá que minha mãe foi a única mulher capaz de me tirar do
meu estado de ânimo, de me acalmar com poucas palavras, de
me fazer sorrir não só com a expressão, mas com todo o meu
ser. Ele nunca vai entender a ideia do sonho americano do meu
padrasto. Ou que meus pais escolheram a cidade que ele
monopolizou para criar uma vida melhor para nós – e para a
mulher que ele resgatou de seu marido louco e de seu filho
bastardo. Mesmo se ele fosse informado, duvido que ele se
importasse. Porque era evidente pela maneira como ele trata
sua própria filha hoje, ele não tem fraquezas próprias.

Dom me encara de volta, irritado.

— Você achou que não notaria o homem que assassinou


meus pais? — Ele zomba. — Você acha que ainda estou muito
ocupado jogando videogame e me masturbando? — A
expressão em seus olhos é de uma velha alma, não de uma
criança aos dezesseis anos.
— Não temos certeza de que foi premeditado. E antes de
darmos um passo, quero uma prova sólida.

— As duas merdas de lápides no cemitério não são


suficientes? — Dom estala, raiva subjacente em seu tom. Ele
está com raiva – de maneira silenciosa – o que significa que ele
está fervendo sobre isso sozinho. Olhando além da clareira, é
então que noto que parte do campo foi desenterrado. — O que
está acontecendo aqui?

— Fale do diabo e ele aparecerá. — Dom acena em direção


à terra recém-desocupada. — Roman decidiu se mudar para o
nosso bairro. Ele está construindo uma porra de uma mansão
onde aqueles caminhões estão parados.

Fervendo com a ideia de que ele está tão perto da minha


casa – da nossa casa – fecho minhas mãos em punhos.

— Inacreditável, porra.

— Acredite. Vi as plantas.

Olho para meu irmão.

— Quero saber como você encontrou essa informação?

— Licenças de construção. Ele foi aprovado para eles na


semana passada. Ele é o dono de tudo agora até aquele posto
da bandeira.

A fúria se instala porque estou com a cabeça tão enfiada


na bunda – na verdade, na bunda de Antoine. Tenho estado
tão distraído cumprindo suas ordens que deixei cair a porra da
bola na minha própria agenda. Meu tempo em Paris agora só
prejudica meu progresso em casa. Posso sentir algum
ressentimento vindo de Dom enquanto mergulho nessa
compreensão. Minhas prioridades são em Triple Falls, e é aqui
que preciso estar – não brincar de menino de recados para um
gangster francês. Mas mesmo com a necessidade de apagar
Roman do quadro, a imagem de sua garotinha se arrastando
atrás dele em direção ao estacionamento hoje permanece na
frente e no centro. O olhar de desafio em seus olhos com sua
maldita troca me faz sorrir. Isso se combinou com a clara
rebelião em suas palavras e postura antes que ela se
arrastasse atrás dele e eu a seguisse. Sabia sobre sua filha há
anos, mas ela nunca tinha feito parte do quadro até hoje.

Em todos os meus planos para derrubá-lo, nunca


considerei espectadores. Vi a carnificina que vem em guerras
como essas, principalmente territoriais, e me recuso a deixar
aquela criança inocente sofrer pelos erros de seu pai. Em um
jogo feito de criminosos que fazem fronteira com psicopatas,
muitos não têm consideração pelos inocentes, principalmente
quando estão em guerra, mas sendo eu mesmo um espectador,
aquele homem nunca será eu.

Não tinha certeza se Dominic notou Roman ou o


pesquisou exaustivamente até onde eu fui, mas está claro que
ele sabe muito mais do que deixa transparecer.

Mesmo na sua idade, sem falta de piadas sobre pau e


comportamento imaturo, eles parecem compreender a
importância de trabalhar os detalhes. Depois de um silêncio
prolongado, finalmente falo.

— Estamos indo para o básico com nossa estratégia.

— Significa? — Tyler pergunta.

— Nós temos que jogar isso da maneira certa. A única


maneira de derrotar um homem como Roman é bancar o
gigante adormecido.

— Pense em Helena de Tróia, — vozes de Dom, lendo


minha linha de pensamento antes de olhar para Sean e Tyler.
— Mas parece que há muitos problemas para enfrentar quando
podemos simplesmente eliminar o problema.

O alarme dispara na minha espinha enquanto pondero


suas palavras:

— Eu sei que você não está sugerindo que matemos o


homem no frio...

— Olho por olho. — Dom dá de ombros. — Nossos pais


morreram queimados. Você não acha que isso exige uma ação
agressiva? Você mesmo disse a Delphine que estava farto de
toda aquela conversa. As reuniões são uma piada, cheias de
nada além de idiotas que gostam de reclamar enquanto ela
recarrega o café. Pode muito bem ser um clube do livro por
todo o bem que está fazendo. — Dom olha direto para mim
quando fala. — Sabe, se fervermos tabaco o suficiente e
aplicarmos a quantidade certa de concentrado na porra da
maçaneta da porta do carro, em minutos depois de entrar em
sua pele, o jogo acaba. Ataque cardíaco no relatório da
autópsia. Apresentada com a oportunidade certa, é cem por
cento indetectável.

Todo o sangue é drenado do meu rosto.

— Ele não é fumante, então esse é o primeiro buraco


nessa ideia estúpida, e não somos assim, — digo, com medo
de que esses sejam os pensamentos passando por sua mente.
— E não quem nós seremos, Dom. Não era isso que mamãe e
papai queriam. Há uma maneira melhor e mais diplomática de
lidar com isso, menos misericordiosa do que a morte. —
Balanço minha cabeça com firmeza, — Não, o que vamos fazer
é mudar as coisas para melhor. — Penso em Antoine e em
como ele representa tudo que odeio. Ele – como Roman – se
considera indestrutível. Mas aprendi muito no ano passado.
Mais do que isso, aprendi o que não fazer. — Assim que
derrotarmos Roman, haverá cem como ele para tomar seu
lugar. Eles exploram pessoas como nossos pais e as descartam
assim que se tornam um risco. — Olho entre os três. — O que
vamos fazer sobre eles?

Sean encolhe os ombros.

— Não é problema nosso.

— Vamos fazer disso nosso problema. Esse é o ponto


principal de tudo isso. Não se trata apenas de nossa família,
ou desta cidade, não mais. — Enfio as mãos nos bolsos. —
Vamos fazer isso de uma forma que os honre.
Sean produz e abre a tampa de outra cerveja.

— Isso parece ambicioso. Quer dizer, vamos, cara. Olhe


onde estamos – merda em lugar nenhum.

— Esse é exatamente o ponto, — Dominic se encaixa. —


Você quer acabar apenas mais um cozinheiro de linha no
restaurante do papai? O que vai acontecer quando eles
solicitarem o empréstimo bancário? — Ele olha para Tyler. —
Você vai ser um soldado de carreira?

— É exatamente por isso que estamos aqui, —


interrompo, — para esclarecer nossas prioridades.

— Minhas prioridades são perfeitas, — Sean levanta as


mãos e começa a marcar os dedos. — Boceta, boceta, boceta,
boceta e... — Ele segura um dedo no polegar, — sim, vou ter
que ir com boceta.

Tyler e Dom riem e giro sobre os três.

— Este é outro motivo pelo qual convoquei esta reunião.


Você quer uma namorada? Tenha uma, mas a conversa de
travesseiro e esta porra de clube nunca vão andar de mãos
dadas. O que os outros pássaros fazem não é da minha conta,
mas para nós, as mulheres não têm lugar nesta fogueira, ainda
não. E não até que sejam examinados por mim pessoalmente.
Fim.

— Pensei que você disse que as mulheres são um


santuário. — Isso vem de Sean, que me testa levantando outra
cerveja, com um sorriso malicioso.
— Elas são. Fora dos negócios. Os anexos pessoais são a
maior responsabilidade. E o primeiro que foder nessa frente vai
pagar terríveis consequências, — dou a cada um deles um
olhar penetrante, — sem exceções. — Novamente pego a
cerveja de Sean, assim que ele a levanta. — Não estou lidando
com outro maldito alcoólatra.

O sorriso de Sean desaparece.

— Desde quando senso de humor é crime? Considero isso


uma necessidade. E quem diabos você acha que tem limpado
o vômito da porra do rosto da sua tia nos últimos cinco anos?

Tyler atende, olhando para o lado da cabeça de Sean.

— Você não é o único que está cuidando dela.

— Não, tudo o que somos, — ele acena com a cabeça em


minha direção — mas ele com certeza não é.

Com essa admissão, lanço meu olhar entre os três e


vasculho meu cérebro pelas palavras certas, mas todas
soariam como desculpas. Neste momento, não tenho nada bom
o suficiente. Não posso compensar o que perdi e continuarei a
perder. Em um piscar de olhos, eles passaram de crianças a
adolescentes próximos aos homens. Mas se eu puder ajudar
todos eles, pode haver uma chance de redenção. Uma chance
de que vejam meu sacrifício valer a pena. É tudo pelo que estou
trabalhando. Nesse ínterim, tudo o que sentem é minha
ausência e uma amargura crescente que vem com minha
chegada e as exigências que faço.
Eles precisam de risadas, precisam desses momentos
roubados, precisam vivenciar sua juventude de uma maneira
que não pude.

— Você está certo, — admito, entregando a Sean sua


cerveja. — Apenas, vá com calma, ok?

Sean balança a cabeça, pegando cautelosamente a


cerveja da minha mão, leve surpresa em seu rosto.

Tyler se levanta e agarra algumas das toras do chão, sua


postura hostil enquanto as joga no fogo. Algo está... errado com
ele, e farei questão de chamá-lo de lado e tentar descobrir o
que é.

— Então, se estou entendendo direito, — Tyler fala


lentamente, — precisamos de um cavalo de madeira para
recrutar um exército que se esconda dentro dele e a
oportunidade de entrar na cidade.

Todos nós olhamos para as chamas enquanto ele


continua.

— Vou ser um fuzileiro naval de terceira geração, é um


dado adquirido, e se há uma coisa que sei fazer – é construir
um exército.

Sean fala a seguir.

— Eu e Dom cobriremos a garagem e, quando ela estiver


funcionando, vou descobrir uma maneira de nos fazer passar
pelo portão. — Ele bagunça o cabelo de Dom. — E todos nós
sabemos que esse idiota está indo para Harvard ou Yale ou
alguma merda assim.

— Acho que isso faz de você o cavalo, — Dominic


acrescenta com força, seus olhos em mim. Mas sua verdadeira
irritação esta noite é devido à nossa briga anterior e minha
recusa em deixá-lo voltar para a França comigo. Ele está
implorando há meses, insistindo que pode seguir meus passos
na preparação e, finalmente, juntar-se a mim lá. Eu o levaria
comigo em um piscar de olhos se não fosse por Antoine. Não
quero meu irmão em nenhum lugar ao meu alcance.

— Não, irmãozinho, — digo, enquanto flashes de meus


próprios projetos passam pela minha mente, e revelo o
verdadeiro motivo pelo qual ele é necessário aqui. — Você é o
cavalo. E, — dou a todos eles um olhar aguçado, — a partir
deste momento, não existo mais.

Os três olham para mim com surpresa desprotegida. Mas,


por trás das camadas de ressentimento e confusão moderada,
tudo que vejo é uma confiança cega.

— Deste ponto em diante, nenhum novo recruta saberá


quem são os jogadores principais. Você pode dar uma
impressão a eles, mas nosso objetivo é confundi-los.

— Nós estamos indo para confundir os homens a


trabalhar com a gente? — Sean pergunta, incapaz de ver a
lógica.
— É a única maneira, — insisto e olho para trás para a
construção enquanto o céu escurece. — Deixe Roman comigo.
Com ele, vamos ter que esperar nosso tempo e você vai ter que
confiar em mim.

— E quanto a Helen? — Dom pergunta, juntando-se a


mim onde eu estou. Nós olhamos fixamente por alguns
segundos.

— Estamos deixando Helen fora disso.

Mas nós não a deixamos fora disso, e tudo aconteceu


como eu esperava que fosse assim que ela fosse trazida.
Completo e absoluto desastre. Apesar do meu papel de protegê-
la, Helen não parou de me punir por isso.

Onze dias.

Onze malditos dias de pijama de flanela.

E só para derramar sal em meu pau choroso, ela deixa a


porta aberta quando toma banho, quando se troca, e quando
ela espalha seu corpo insanamente tonificado com um cheiro
tão atraente para mim, fico duro quando ela passa por ela.
Bem jogado, rainha.

Na maioria dos dias, acordo sozinho e, na maioria deles,


fico balançando ao vento, sem direção – sem qualquer
indicação de como isso vai se desenrolar entre nós. Desde que
estou aqui, estou preso em um lugar de reflexão, reflexão que
uma vez consegui suprimir com as constantes consequências
ao longo dos anos.

Agora, neste lugar silencioso, sem planos para fazer e


ordens para distribuir, estou impotente para o constante
aflorar de tudo que compartimentei. Especialmente nos anos
mais recentes, os anos agonizantes que me forcei a existir sem
ela.

Ela não estava errada, mas tédio não é uma palavra que
usaria para descrever meu estado atual. É mais uma
combinação de inquietação à beira da paranoia a cada dia que
voluntariamente deixo de estar por dentro para resolver meu
relacionamento com ela. Ela tentou me dizer que está tudo bem
comigo voltando, mas sei que não posso fazer isso pela metade.

Sou um homem do tudo ou nada e não sei ser de outra


maneira.

Continuo esperando que suas emoções entrem em ação e


assumam o controle para ajudar a preencher a lacuna, mas
sua sensibilidade parece estar conquistando seus
sentimentos. Uma habilidade que ensinei a ela – que as
emoções não têm lugar para um jogador objetivo – uma lição
que ela claramente levou a sério e se voltou contra mim. Há
uma ponta dura nela que não estava lá antes, em seu
escrutínio, em sua voz, apenas através dela que a torna ainda
mais atraente – mas muito mais difícil de alcançar.

Quando consigo pegá-la antes que ela fuja para o café e


prendo-a com meus lábios, ela é receptiva, às vezes
brincalhona, mas o olhar de medo que desprezo ainda está lá.
O olhar que me permite saber que ela está esperando o outro
sapato cair. Aparentemente, garantir a ela que cuidaremos de
nossos ombros pelo resto de nossas vidas não é suficiente.

E a admiro e a respeito muito por isso, considerando a


carnificina que ela testemunhou depois de viver uma vida
protegida.

Ao longo dos anos, conforme ressuscitava a mim mesmo


e ao que restava do meu exército, ela se reinventou como um
exército de um só – armada até os dentes. Mas não quero sua
arma fumegante perto de mim. O que preciso é um longo gole
de sua força, de seu amor e um pouco de submissão.

Grande chance do caralho.

Sem se esforçar muito, ela está balançando sua doce


boceta na minha frente desde que cheguei. Já se passaram oito
meses terríveis desde que a tive, e antes disso – anos, e nunca
na minha vida estive com tanta fome.

A última vez que estivemos juntos não é do jeito que quero


lembrar de tê-la.

Eu a ridicularizei por me amar.


Envergonhei-a naquela noite por ser o soldado que não
era mais.

Fiz o meu melhor para tirar o orgulho dela, para salvá-la


desse tipo de vida, para egoisticamente me poupar das
preocupações, mas ela não estava tendo nada disso.

Eu a deixei pasmo, admirado por quem ela se tornou sem


mim.

Mais ainda, culpado pelo modo como não pude avançar.

Ela me disse então que o amor faz o perigo valer a pena.

Simplesmente vou continuar acreditando nela. Mesmo


que a porra do meu maior medo seja ver tudo acontecer de
novo, desta vez com ela como o sacrifício.

É apenas uma questão de tempo até que estejamos cara


a cara novamente, mas tem que ser o momento certo. Não
quero medo em seus olhos quando reivindicar minha rainha
para sempre. Quero que ela revide, e mais ainda, quero que ela
tenha certeza sobre mim do jeito que ela estava – do meu lugar
em seu coração, ao seu lado.

Ela escolheu sua armadura pessoal na forma de pijama


de flanela.

Agarrando meus halteres recém-entregues, faço outra


série de repetições para tentar me livrar da energia inquieta.
Olhando para fora da janela de seu quarto, noto os esforços
que ela fez para reproduzir o jardim de seu pai. Entre cercas
vivas e fileiras de vinhas vazias há um recanto de leitura.
Acima do dossel de madeira pendem galhos de glicínias
mortificantes.

Vê-lo me traz de volta à manhã no jardim de Roman, onde


quase deixei escapar meu amor por ela. Soltando meus
halteres, vou até a janela e reflito sobre nosso passado
compartilhado. Não foi a primeira vez que a tomei de uma
forma que transmitisse fisicamente o que estava sentindo, mas
foi naquela manhã em particular que mais senti, que soube
que estava irrevogavelmente apaixonado pela filha do meu
inimigo. Com um olhar compartilhado e com uma confissão
que senti do fundo da minha alma, quebrei meu próprio credo
e me entreguei à parte mais profunda de mim e à minha dor
profunda de alma por uma conexão com ela. Segundos depois
de relembrar aqueles minutos, rendo-me ao calor que percorre
meu corpo. Meu braço se apoia na janela enquanto agarro meu
pau em meu short de malha.

AVC.

Sua garganta exposta.

AVC.

Seus gemidos ofegantes.

AVC.

O amor desprotegido em seus olhos.

AVC.
Suas coxas bronzeadas perfeitas se espalharam diante de
mim, sua boceta rosa apertada brilhando.

AVC.

A sensação de seu calor úmido na ponta dos meus dedos.

AVC.

Seus mamilos cor de pêssego.

AVC.

Meu primeiro impulso desesperado dentro dela.

Mandíbula tensa, espinha formigando, calor emanando


de todos os meus poros, estou prestes a grunhir o nome dela
quando a porta do quarto se abre, e Beau vem correndo com
Cecelia atrás dele, seus olhos se arregalando quando ela me
vê.

— Oh, — ela sussurra, lançando os olhos para longe


antes de espalmar a maçaneta para fechar a porta.

— Não se atreva, porra, — assobio, o que congela seu


movimento. Libero meu aperto raivoso em meu pau e caminho
em direção a ela, deixando-o para fora da minha bermuda
esportiva barata enquanto seus olhos se arregalam um pouco
mais a cada passo que dou. Quando a alcanço, empurro-a na
porta, segurando sua mão da maçaneta e cubro meu pau
furioso com ela.
— Você. — Envolvo seus dedos em volta de mim,
segurando sua mão e a conduzo ao longo do meu comprimento
para acariciar, — é nisso que estou pensando. Você. — Dobro
o nível dos olhos enquanto sua respiração aumenta e seus
olhos azuis escuros se fecham. — Vi as glicínias em seu jardim,
e me lembrou daquele dia. Lembra daquele dia, Cecelia? —
Meu pau estremece em sua mão. Corro seus dedos enrolados
ao longo do comprimento do meu eixo, e nos movemos juntos
enquanto seus lábios carnudos se abrem. Lambo seu lábio
inferior. — Você.

— Tobias... — Ela tenta soltar a palma da mão e empurro


meu queixo, apertando-o em torno de mim.

— Não vim aqui para brincar de colega de quarto de


merda.

Inalando seu perfume, continuo a guiar sua mão pelo


meu comprimento, colocando a palma da mão sobre a cabeça
antes de puxá-la de volta para baixo, uma maldição cheia de
prazer me deixando exalando enquanto mostro a ela minha
necessidade.

— Eu sei, — ela murmura.

— Você se lembra daquele dia?

— É claro que me lembro.

— Você goza pensando naquele dia?

— Sim, — ela responde com voz rouca.


— Então você se lembra como foi bom no segundo em que
empurrei dentro de você.

— Tobias, — ela choraminga enquanto lambo seus lábios,


atraindo-os para um beijo responsivo. Ela me agarra ainda
mais forte, provocando um gemido de dentro de mim enquanto
nos perdemos no passado, convocando aquela manhã para seu
quarto. As veias latejavam com a necessidade de reivindicar,
possuir e destruir sua hesitação. Afasto-me para assistir a
ascensão e queda de seu peito antes que meu olhar role pelo
resto dela.

— Essa é uma roupa legal, — digo enquanto ela me


acaricia sem aviso, sua bolsa ainda pendurada em seu ombro.
Dedilhando, alivio-a enquanto faço o meu melhor para conter
a besta rugindo dentro de mim. — Você está bonita.

— O-obrigada.

Estou tentado a rir de sua resposta, mas estou muito


duro, muito carente e prestes a fazer papel de bobo. Anos de
anseio reprimido, de necessidade, de luxúria, de devoção, de
amor, ameaçam me dominar. Eu a quero muito, sempre quis,
e neste momento, quero puni-la tanto quanto ela me quer, mas
não seria justo. Mas quando ela esfrega o pré-semen na cabeça
do meu pau com o polegar, estalo. — Desculpe, estou prestes
a estragar tudo.

Antes que ela possa reagir à minha ameaça, ela está fora
de si e está sob meu domínio. Lisa com o suor do meu treino,
ela desliza as mãos ao longo dos meus ombros, pressionando
a testa no meu bíceps enquanto a levo em direção à cama.

— É pedir demais levar as coisas devagar?

Colocando meus lábios em seu pescoço, mordo.

— No momento, sim.

É quando a deito na cama, e seu cabelo se espalha atrás


dela que meu pau estremece em advertência. Ela olha para
mim, esperando, sem mais protestos em seus lábios.

Empurrando sua saia para descansar em seus quadris,


gemo quando vejo que ela está usando legging. Mais camadas.
Irritado, puxo seu suéter para ver os seios cobertos de renda e
arrasto o material cor de carne sob seus seios perfeitos, para
que eles se juntem para oferecer. Reagrupando meu pau,
retomo meus golpes, e ela continua olhando, extasiada.

Ao ver seus mamilos desenhando, aumento meu ritmo, e


com mais alguns puxões frustrados, gemo meu orgasmo,
revestindo seus seios, estômago exposto e leggings.

A decepção passa por suas feições enquanto seus olhos


azul-marinho caem.

Boa.

— Você está jogando com uma fraqueza que ambos


temos, Tesor. — Levantando seu pé, puxo seus Uggs um por
um e os jogo por cima do meu ombro. Com a besta
parcialmente saciada no momento, ajoelho-me no final de sua
cama, puxando sua calcinha e leggings para baixo. Ela
observa, em transe, enquanto corro minhas mãos para cima e
para baixo em sua pele recém-nua enquanto ela afunda ainda
mais no colchão. É a minha voz que traz seu olhar de volta
para mim.

— Você quer devagar? — Corro um dedo por seus lábios


encharcados e sou recompensada com a saliência de seus
quadris. — Tudo bem, vamos devagar, embora não veja a porra
do ponto porque não sou o único que você está punindo. Mas
já que estamos estabelecendo a lei, — pressiono o polegar em
seu clitóris, massageando-o brevemente antes de retirá-lo. Ela
sibila por entre os dentes, os olhos brilhando de impaciência.

— Amante, namorado.

Vagarosamente, contorno sua abertura com a ponta do


meu dedo antes de lentamente empurrá-lo para dentro – até os
nós dos dedos. A visão dela, sua região depilada deixando só
uma faixa, ameaça arruinar minhas restrições. Meu pau
endurece, com inveja da visão, enquanto ela aperta, úmida e
quente. Seus olhos se fecham quando giro para o seu ponto G.

— Tobias.

— Isso vai servir também, — digo, soprando ao longo de


seu centro, aumentando minha velocidade enquanto uso a
saliência do meu dedo para prepará-la totalmente. — Não é a
porra de seu companheiro de quarto, — lambo-a
profundamente do centro ao topo, chupando seu clitóris
brevemente para ganhar meu primeiro apelo. — O homem em
sua vida, seu parceiro, sua alma gêmea, sua outra metade, —
mergulho novamente e bato minha língua onde ela mais
precisa de mim. Ela geme em protesto quando me afasto.

— Tobias. — Sua voz está cheia de anos de dor, e sinto


cada dia de nossa separação.

Com o coração martelando seu próprio apelo e totalmente


ereto novamente apenas com o gosto dela, reprimo minha
própria necessidade porque há algo que quero mais.

— Achei que nunca mais ouviria isso, dis mon nom. —


Chame meu nome. Mergulhando, cutuco seu clitóris com meu
nariz e ela se curva para fora da cama. Ela precisa disso tanto
quanto eu. Achatando minha língua, lambo-a suavemente
novamente e me afasto.

Jogando a cabeça para trás em agitação, ela fecha os


olhos enquanto pressiono um segundo dedo, enchendo-a antes
de beliscar seu clitóris.

— Quem sou eu?

Ela levanta os quadris, em busca de atrito. Em resposta,


engancho suas pernas sobre meus ombros, ignorando meu
pau ganancioso enquanto exige seu lugar de direito. Mas é a
ganância que afasto, precisando festejar.

— Quem te ama, Cecelia? — Enunciei cada palavra com


cuidado, sabendo que elas a trariam de volta à primeira noite
em que a beijei brutalmente naquela clareira, um lugar que
desde então se tornou sagrado para nós dois. Quero que ela
saiba que, mesmo então, eu a queria para mim. Do jeito que
ainda a quero. Tenho morrido de fome por ela. Mas é uma
penitência que estou pagando, para então, antes que possa
haver um agora.

Minhas necessidades não importam.

Ainda não.

— Por favor, — ela grita enquanto continuo a correr meu


dedo ao longo de seu G, sentindo o inchaço revelador. Ela puxa
meu cabelo, coxas tremendo e apertando em volta da minha
cabeça. Eu a recompenso com outra longa puxada em seu
clitóris. Afastando-me, olho para ela, enquanto ela afunda as
unhas no meu couro cabeludo em retribuição.

— Devagar, — a lembro. — Sou capaz de devagar. Isso


requer paciência. Você acha que não sofri com a lição de
paciência enquanto esperava o momento certo para voltar para
você? Esperando todos esses meses pelo dia em que pudesse
finalmente e totalmente ceder ao que sinto por você? Tudo o
que tenho agora é tempo. — Saboreio a raiva nadando em seus
olhos, seus mamilos duros, o rubor de sua pele, o inchaço de
seu corpo.

Levantando da minha posição, levanto sua blusa de seu


corpo enquanto ela bate contra meu peito em protesto, em uma
tentativa de me levar de volta para a tarefa em mãos, todos os
traços de sua própria paciência se foram, sua necessidade
assumindo o controle. Fico acima dela enquanto ela olha para
mim, ainda coberta pela minha libertação.
— Você quer ir devagar, Tesor? É isso que você quer?
Todos esses anos separados não foram suficientes? Se eu
parecer ansioso, — deixo-a ouvir o ciúme em meu tom
enquanto levanto minha mão, espalhando meu esperma em
seu peito antes de deslizar minha palma para baixo em seu
estômago. — Se pareço ansioso, é porque quero apagar cada
toque que não foi meu. — Trilho minha mão por seu corpo e
pressiono minha essência entre suas coxas. No momento,
estou à mercê dela em todos os aspectos de nossa situação,
até mesmo no quarto. Mas é hora de lembrá-la de que ainda
sou o cara mau e para sempre serei o tirano pelo qual ela fodeu
e se apaixonou – e neste campo de jogo, somos iguais. Mas sua
cedência em me deixar dominar é um presente que me recuso
a deixá-la levar. A vulnerabilidade que brilha em seus olhos,
as emoções que ela está sentindo, a sugestão de desamparo é
o que preciso apenas com o propósito de deixá-la saber – desta
forma física – que ela ainda pode confiar em mim como fez
inúmeras vezes antes. O prazer dela é meu e, sem ele, não sou
o mesmo homem.

Dedos ainda empurrando dentro dela, coloco-me em cima


dela e pressiono nossos corpos juntos enquanto olho para ela
com o culminar do desejo que senti, esperando que ela possa
ver.

— Eu te amo, — murmuro e imediatamente vejo seus


olhos suavizarem. — Senti tanto sua falta, tanto, tanto. — A
emoção me ameaça quando penso nos segundos, horas,
minutos, dias e anos coletivos que me forcei a acreditar que ela
nunca poderia pertencer a mim novamente. De como, em um
ponto, sabia que a possuía, que ela era minha, e perdê-la me
custou mais do que um coração partido. Isso me custou minha
sanidade e minha alma. — Posso ir devagar, mas não me negue
meu lugar de direito.

Ela agarra a parte de trás da minha cabeça e me leva até


ela, beijando-me com uma confissão silenciosa. Colocando
suas pernas atrás das minhas costas, ela se abre para mim
totalmente. Bocas se moldando, línguas duelando, nós nos
beijamos por longos minutos, e esfrego meu pau contra sua
boceta e a paro assim que ela levanta seus quadris para me
permitir entrar. Afastando-me, balanço minha cabeça.

— Vou esperar por você, Tesor, o tempo que for preciso.

Abaixando-me para se ajoelhar diante dela, enfio meus


dedos e chupo seu clitóris com fervor. Não muito depois, ela
chama meu nome, segurando os lençóis em seus punhos. Ela
fica completamente em silêncio enquanto seu corpo entra em
erupção, curvando-se para trás da cama, seu clitóris pulsando
contra a minha língua com cada onda de liberação, o deslizar
dos meus dedos ficando cada vez mais escorregadio enquanto
ela inunda minha boca. Quando outra onda atinge, meu nome
explode dela, e a força absoluta disso faz minha garganta
queimar.

Respirações rápidas bombeiam para fora dela enquanto


ordeno o orgasmo, saboreando o gosto junto com a queda de
emoção correndo pelo meu peito. Meu ato se torna egoísta à
medida que busco mais, alimentando a pressa. Só ela pode me
deixar tão alto. Só ela pode me fazer sentir assim. Só ela pode
aliviar a queimadura que ela mesma cria.

Eu a amo além dos limites porque ela me amou através


do que a forcei a suportar. Ela me amava, embora eu nos
tornasse impossíveis.

Fui eu quem forçou nossas estrelas a brilharem uma


atrás da outra. Fui aquele cuja ira tornou nosso caminho
prejudicial para nós dois.

E ela amou, e ainda me ama, apesar de tudo.

Mas mesmo com a solidariedade desse amor, é a


confiança e o perdão que procuro.

É quando ela fica mole que procuro outro, e ela aperta


suas coxas contra minhas orelhas em uma tentativa de me
afastar. Separando-os, seus olhos azuis escuros brilham com
rendição momentânea enquanto me curvo e retomo minha
adoração.

Com mais algumas lambidas direcionadas, ela está se


contorcendo de novo, e é então que cedi, puxando meus dedos
encharcados dela, lambendo o doce e picante rescaldo de meus
lábios. Pau latejando, a vejo descer, seus olhos vidrados.
Corada e ofegante, ela olha para mim quando me curvo e beijo
o topo de sua boceta, a pele sensível de suas coxas, lançando
minha língua para fora uma última vez em seu centro,
espetando-a com minha língua apenas para satisfazer minha
própria ganância com uma última prova. Quando me levanto
para pairar sobre ela, vê-la me deixa sem fôlego. Ela é um
prisma de beleza, brilhando como resíduo enquanto a viro,
acariciando as asas em suas costas com meus dedos. Pela
primeira vez desde que a marquei, posso apreciá-los
totalmente pelo que representam. Agarrando seu pescoço com
minha mão, corro meu pau latejante ao longo de sua fenda
antes de abaixar minha boca para traçar a tinta com meus
lábios e língua.

— Faite pour moi. — Feita para mim.

Aperto seu pescoço, beijando cada centímetro de pele


marcada antes de desabar ao seu lado, recusando-me a chance
de fazer minhas palavras uma mentira.

Lento.

As estrelas conseguiram pavimentar o caminho para nós


novamente, e não vou estragar outra chance de colidir com ela.

Levei anos para admitir que aquilo que mais lutei me traz
mais paz – tanta paz quanto um homem como eu pode ter.

Virando a cabeça, ela olha para mim com olhos que


contêm uma afeição fortemente protegida, e sei que fiz a
escolha certa ao me interromper.

— Não vou fingir que sei como te machuquei ou como me


senti quando o fiz, Cecelia. Mas sei o quanto isso me
machucou, e isso é o suficiente para saber que mereço sua
raiva e cautela. Mas agora, preciso muito de você para ficar
longe quando você está fodendo aqui na minha frente. Quando
você é quem você é, que é, caso esteja se perguntando, a porra
da outra metade de mim. Sinto muito pelas coisas que fiz, mas
é hora de você me deixar mostrar o quanto.

Ela acena lentamente com a cabeça, uma lágrima


solitária deslizando pelo seu rosto. Ela está com raiva de si
mesma por ceder, e tomo a firme decisão de não a pressionar
mais fisicamente, não importa o quanto o espaço doa.

É lento.

Ficamos ali por longos momentos antes de eu falar


novamente.

— Pergunte-me qualquer coisa, — sussurro enquanto ela


me olha com atenção, refletindo sobre seus pensamentos antes
de finalmente falar.

— A caminhonete... com suas coisas, ainda está parada?

Mergulho meu queixo.

— Então, traga-os aqui.

Levantando-me para pairar acima dela, seguro seu rosto


em minha mão, em busca da sinceridade em suas palavras.

— Você tem certeza?

— Tenho certeza.

— Você sabe o que está dizendo?


— Estou devidamente assustada, Tobias, e não estou
bancando a imune, mas gosto de pensar que minha
ingenuidade morreu há muito tempo. Eu sei quem sou agora.
Da próxima vez, acredite em mim, — seus olhos brilham com
raiva residual da noite em que sua inocência foi realmente
roubada, seu tom se aguça com uma mordida retrospectiva, —
Não hesitarei.

Ela finalmente está em guarda do jeito que preciso que


ela esteja, e isso me traz um alívio parcial. Inclinando-me, puxo
seus lábios para um beijo. Ela o quebra, sua voz um aviso
gelado.

— Estou esperando enormes dividendos do meu


investimento, Sr. King, uma grande recompensa. Você quebra
minha confiança, meu maldito coração de novo, e eu mesma
colocarei uma bala em você. Ainda estou com raiva. Ainda
estou tentando me acostumar com a ideia de você estar aqui.
Nem tudo está bem conosco, ainda, mas fatos são fatos, e fatos
são, estamos juntos nisso, aconteça o que acontecer. Há muita
coisa que não mudou e nunca mudará. E, infelizmente, eu
também te amo.

Não posso evitar minha risada, e a beijo de novo, desta


vez mais agressivamente, e ela se agarra, beijando-me de volta
porque nós dois sabemos que o tempo não está do nosso lado,
nunca esteve. Esses segundos são preciosos e ela me permite
desenhar nela o quanto quiser, porque ela também sente.
Estamos sempre perdendo tempo, nossos oponentes sem
rosto, um tabuleiro totalmente novo, mas desta vez estamos
fazendo todos os movimentos juntos. Quando ela finalmente se
afasta, mantendo-se mais perto da borda da queda livre que
ela costumava se permitir quando éramos arrebatados por
nossas emoções pelo outro, permito que ela recue. É quando
ela para na porta do banheiro, olhando para mim por longos
segundos com o mesmo desejo, que sinto uma mudança entre
nós. É pequeno, mas está lá.

E é o suficiente.

Finalmente.

Progresso.
Vinte e quatro anos

Aposta.

Li em algum lugar que são necessárias três linhas de


renda sólida para tornar um homem rico, seis para tornar um
homem sustentavelmente rico. Entre os últimos anos,
mantendo abas anonimamente online – devido à ajuda de Dom
– como agenciador de apostas no campus da HEC, as migalhas
de lucro que recebo dos negócios legítimos de Antoine. Minha
parcela de crimes de colarinho branco, a ponta de lança do
meu irmão, e a receita flutuante da garagem – isso dá quatro.

Um homem rico, não sou. E sustentavelmente rico é onde


preciso estar.

Ultimamente, damos quase tanto quanto recebemos para


manter nossas consciências limpas e nossas mãos pesadas de
lealdade. Estamos ganhando força em números, mas não é o
suficiente. Dinheiro e status são os últimos obstáculos que
preciso superar para me colocar em posição de derrubar
Roman.
Com meu mestrado obtido em uma das melhores escolas
de negócios do mundo – assim que tiver capital para abrir
minha empresa – posso declarar guerra ao meu inimigo
desavisado.

Então, aposte, é.

Hoje é o dia, e estou neste conselho há muito tempo.

Tudo se resume a uma aposta extremamente cara. Uma


aposta capaz de me libertar de ser escravo ou vítima dos
caprichos de outro homem.

Nesse ponto, posso perder tanto quanto ganho, tendo


pago tanto pela informação quanto preciso para apostar, mas
essa é a natureza da besta. O dinheiro sempre foi um obstáculo
para mim, um meio necessário de ir do ponto A ao ponto B. E
embora alguns homens o deixem conduzi-los, deixem que a
abundância ou a falta dele os corrompa ou destrua, recuso-me
a me tornar um escravo dele. Em vez disso, vou obter o
suficiente para exercer seu poder, seu domínio, para abrir
avenidas e ajudar a nivelar o campo de jogo para homens como
eu e meus irmãos, nossos pais e qualquer outra pessoa. O
destino está nas mãos de homens como Roman Horner.

Com o clipe da etiqueta de preço, sou conduzido para a


jaqueta, a última pincelada no quadro que pretendo pintar.
Dando-me uma olhada no espelho de corpo inteiro, educo
minhas feições para esconder minha empolgação enquanto o
alfaiate olha, roçando os ombros de minha jaqueta.
— Nada mal para um pobre mestiço que cresceu em um
buraco de merda dilapidado em lugar nenhum, na Carolina do
Norte.

Com o franzir das sobrancelhas, fica claro que minhas


palavras se perdem no alfaiate que fala pouco inglês, mas ele
balança a cabeça concordando para me agradar.

— Cela vous va très bien. — Combina com você.

Selecionando as notas do bolso, dou uma gorjeta para ele


e saio do pedestal. Ele me acalma, ajoelhando-se e passando
um pano levemente sujo na parte de cima dos meus sapatos.
Quando pego outra nota em agradecimento, ele acena e aceno
em agradecimento.

— Merci.

Fazendo meu caminho para o meu carro que me


esperava, acendo um cigarro e respiro fundo, exalando um
pouco do estresse ameaçador da manhã. Observando o céu ao
amanhecer, vejo um bando de pássaros voando baixo nas
nuvens leitosas, as asas estendidas em perfeita formação,
imitando o padrão de voo uns dos outros, uma comunicação
silenciosa entre eles ao longo do vento. A visão disso me deixa
com inveja.

Isso. Isso é o que faltava no pedido de volta para casa.

Frères du Corbeau (Irmãos do Raven) era a quimera do


meu padrasto. Um sonho de liderar a revolta contra os
gananciosos líderes da América corporativa – nomeadamente
Roman Horner – para lutar pelo bem do homem comum.

A ideia era boa, mas havia muita falta de comunicação


entre eles – junto com muitas crenças e ideias opostas sobre
como proceder para derrubá-lo. E nenhum deles, meu papai
incluído, tinha postura suficiente para se mover em qualquer
direção. Eles nunca conseguiram se reunir o suficiente para
evocar qualquer mudança real ou tomar medidas contra
aqueles que continuamente os fodiam, especialmente Roman.
A única pessoa naquele grupo que tinha coragem de fazer
qualquer coisa era Delphine, mas com o tempo ela embotou o
fio da navalha com a bebida.

Tudo se resume a meus irmãos e eu.

Recuso-me a ceder a qualquer tipo de veneno que me


entorpece.

Seja uma bebida ou uma mulher, ou qualquer outro vício


ameaçador, estou decidido a me abster. Recuso-me a permitir
que qualquer necessidade pessoal ou frívola me enfraqueça.
Quando penso no panorama geral, é muito mais fácil de
manter.

Posso tornar o sonho de papai uma realidade enquanto


procuro justiça e acabo com Roman, ou posso retroceder como
o resto dos originais, tornando-me inútil, outra voz no vazio.

Ao longo dos anos em que estive na França, pensei que


era uma possibilidade em mais de uma ocasião que eu iria
falhar. Que essa coisa toda era inútil. Mas a dúvida gera
insegurança, e a insegurança diminui a confiança, e não tenho
espaço para isso. É hora de movimentos ousados. É hora de
execução.

Com a clareza mental necessária, deslizo para o banco de


trás depois que meu motorista emprestado abre a porta,
levemente surpreso ao ver seu chefe esperando por mim. O
motorista, Luis, lança-me um olhar de desculpas antes de me
deixar com Antoine, que não faz nada para mascarar o prazer
presunçoso em seu rosto.

Deveria ter visto isso chegando.

— Allais-tu m'informer de tes projets aujourd'hui,


Ezequiel? — Você ia me informar sobre seus planos hoje,
Ezequiel?

Puxo o punho da minha camisa.

— Meus planos hoje não incluem você.

— Eu poderia ter ajudado.

— Como já disse, várias vezes, não preciso da sua ajuda.

— Mas você pegou meu carro emprestado, meu


motorista?

— Você me ofereceu quando precisei. E, por favor, não me


insulte agindo como se não tivesse ganhado algumas cortesias
nos anos que passei trabalhando com você.
Praticamente reconstruí seu exército de bandidos do zero
usando o bom senso que eles desesperadamente careciam e
implementando táticas que estudei por anos. Sem o
conhecimento de Antoine, tenho usado sua organização como
uma cobaia para resolver quaisquer problemas futuros para
mim.

— Un tel manque de respect. Tu pensais qu'un costume


cher ferait de toi un homme digne? — Tanto desrespeito. Você
acha que um terno caro torna você um homem digno?

Avalio seu terno.

— Definitivamente não.

Antes que meu insulto flagrante possa ser absorvido,


levanto meu queixo para Luis, que está esperando no banco do
motorista.

— Longchamp. Merci.

Antoine para o cigarro a meio caminho da boca enquanto


corremos para longe do meio-fio.

— Que negócio você tem na corrida de cavalos?

Encolho os ombros, amando a sensação do linho caro da


camisa na minha pele.

— Talvez eu esteja interessado no esporte. — Seus olhos


negros sem alma se estreitam. — Negócios que não dizem
respeito a você e não têm nada a ver com nosso acordo.
Ele aponta o dedo indicador para mim, o cigarro
queimando baixo entre seus dedos.

— Você está testando minha paciência, Ezequiel.

—Não respondo a você.

— Tu le feras si cela afetam os negócios. — Você vai se


isso afetar meus negócios.

— Diga-me onde não retive minha parte do nosso acordo,


e terei prazer em me explicar.

Durante anos, fiz o papel de pastor para ele, usando sua


reputação underground para aumentar e educar seu exército,
pastoreando para reunir minhas próprias informações
enquanto sugava menos de um quarto de seus recrutas.

O que Antoine não sabe não o machuca nem um pouco,


mas me ajudou muito a me elevar à posição que quero estar.
Mas, quanto mais faço por ele, menos satisfeito ele parece
estar. Com a minha passagem pela França chegando ao fim,
ele está procurando por qualquer ângulo possível para colocar
seus ganchos em mim. Ele me quer como seu segundo, e isso
nunca vai acontecer, porra.

— Cuidei de você, Ezequiel, não é?

— Nós cuidamos um do outro.

— Por que você sente a necessidade de me excluir de algo


que é benéfico?
— Quem disse que é?

— Você me considera um idiota do caralho?

— Considero você um parceiro.

Alcançando seu pequeno bar, sirvo-me um pouco de gim.


Já estou suando e preciso acalmar minha mente. Este é um
revés que não precisava, porra, tão cedo no dia.

Antoine me examina cuidadosamente. Ele tem uma


amante em Pigalle, perto de onde está seu alfaiate, e sei que é
de onde ele acabou de sair. Ele cheira a perfume barato de
rosas. Por outro lado, sua esposa é uma das mulheres mais
bonitas que já vi. É dolorosamente aparente que ela está
profundamente infeliz com ele. Apesar de seus esforços para
chamar minha atenção, não coloquei a mão sobre ela, nem
pretendo.

Frequentemente, especialmente quando visito a casa


deles em Montmartre, pego-a olhando para mim. A atração é
mútua, mas não há nenhum benefício em agir sobre ela. Ela
está com quase 30 anos e está desesperada para que qualquer
um a tire do homem sentado à minha frente. Infelizmente, não
serei esse homem, mas pego Palo, o tenente de maior confiança
de Antoine, olhando para ela da mesma forma. Um dia, talvez
seja capaz de usar isso em uma jogada contra ele.

As emoções, nomeadamente o amor, podem enfraquecer


até o homem mais forte, dando vantagem aos adversários.
Alavanca que nunca pretendo deixar que outra pessoa tenha
sobre mim.

— Parceiros compartilham informações.

— Bem. Estou pensando em alugar meu próprio carro em


breve, para evitar qualquer imposição futura.

— Ah, você pretende ser ganancioso?

— É a ganância que tem me atormentado.

— Compartilhei com você.

— Você me deu sobras, pequenas pontas.

— Só porque você se recusa a participar de qualquer


negócio real. — Ele mantém a voz mesmo apesar de seu
temperamento, uma característica que eu mesmo adaptei.

— Porque o seu verdadeiro negócio é destrutivo. Também


expliquei isso várias vezes. Não estarei na França em tempo
integral por muito mais tempo.

Ele zomba.

— E você vai voltar para casa para o quê, trabalhar na


fábrica de Roman? — Fazendo o meu melhor para não mostrar
meu ódio crescente por ele e o fato de ter revelado muito cedo
sobre minha situação, afasto a emoção ameaçadora e engulo o
resto da minha bebida antes de falar.

— Não se preocupe com isso. Vou encontrar meu próprio


caminho.
Quando o carro para, me movo no assento para sair.
Quando a porta se abre, ele agarra meu pulso. Olhando para
ele, deixo o desafio em meus olhos falar por si.

Em uma hora, vou me tornar financeiramente


independente, o que vai negar a maior parte do meu uso para
ele. Nãoo vou deixá-lo tirar isso de mim. Inclinando minha
cabeça, deixo meu olhar cair para a arma em seu coldre.

Tornei-me inestimável para ele. Provei meu valor uma e


outra vez ao longo dos anos. Ele quer ser meu dono, e ele não
está conseguindo, mas a ameaça de me perder pode ser o
suficiente para acabar com minha vida. Por enquanto, ele
ainda tem a vantagem. Brincando comigo, ele medita sobre a
decisão, pesando os prós e os contras de me descartar como
ele fez com tantos outros de seus homens antes de soltar os
dedos.

— Você está começando a me aborrecer com sua nobreza


ridícula, — ele murmura, desviando o olhar antes de deslizar
para trás em sua cadeira e endireitar sua jaqueta. — Você não
é melhor homem do que eu.

— É sempre um prazer, Antoine.


Toque, toque, toque.

Toque, toque, toque.

Do outro lado do balcão enjaulado, o homem para seu


progresso olhando incisivamente para meus dedos ocupados.
Desviando meus olhos, os arranco de vista enquanto ele pega
o pedaço de papel que muda minha vida. Eu o pego de onde
ele está e me afasto, aquecendo o pescoço.

Caminhando até o bar, faço meu pedido. Quando meu


gim é entregue, fico olhando para minha bebida enquanto um
cobertor familiar de desconforto começa a se infiltrar. Estou
completa e totalmente sozinho nesta aposta.

Um. Dois. Três.

Um. Dois. Três.

Tomando um gole saudável, vislumbro o espelho atrás do


bar, brevemente admirando meu terno antes de erguer meu
olhar para o relógio acima dele. Cinco minutos. Uma mulher
sentada sozinha atrai meu olhar pela última vez, e olho para a
minha direita para encontrar seu sorriso. Cabelo escuro, olhos
castanhos astutos e, por baixo do vestido justo, um corpo
construído para o castigo. Seus lábios pintados levantam
ainda mais enquanto a bebo, e ela retribui, seus olhos se
arrastando dos meus lábios para os meus couros italianos.
Resumidamente, imagino distribuir essa punição, mas pego
minha bebida no bar em vez disso, vendo seus olhos opacos
quando ela lê minha intenção.
— Vous allez laisser une femme boire seule? — Você vai
deixar uma senhora beber sozinha?

— Veuillez acceptter mes excuses, je vous assure que si


c'était un autre jour…— Por favor, aceite minhas desculpas.
Garanto que se fosse qualquer outro dia...

Seus olhos me examinam com determinação.

— Je garderai la dernière gorgée pour la fin de cette


course. Peut-être qu'alors vous vous joindrez à moi. — Vou
guardar o último gole para depois da corrida. Talvez então você
se junte a mim.

Puxo uma nota do meu bolso e aceno para o barman para


pegar outra para ela.

Com a elevação de seus lábios exuberantes, leio a


promessa em seus olhos que diz que ela esperará.

Um passo longe da distração, mudo meu foco para o papel


guardado com segurança no bolso interno da minha jaqueta e
ando para fora. Desviando da massa da multidão, pego um
lugar vago examinando a pista assim que meu pulso aumenta
e minha mente começa a correr incontrolavelmente.

Fique calmo, Tobias.

Um sentimento avassalador e familiar me envolve


enquanto faço o meu melhor para manter minha merda sob
controle.

Dois minutos.
Olhando ao redor da horda de pessoas, estou muito ciente
da vantagem que ganhei ao saber qual puro-sangue cruzará a
linha de chegada. Mantendo meus olhos à frente, tento não
pensar nos outros que podem ter feito apostas semelhantes no
cavalo errado – sua própria situação tão terrível quanto a
minha, e afasto a culpa.

Um. Dois. Três.

O suor goteja em minha têmpora enquanto examino a


pista, procurando desesperadamente por algo, qualquer coisa
para roubar meu foco e roubar meus pensamentos errantes.
Inevitavelmente, fico vazio sabendo exatamente o que preciso.
Incapaz de lutar contra o desejo por mais tempo, pego meu
celular e pressiono enviar, à beira da explosão. Ele atende no
segundo toque.

— Ei, irmão.

— Dom. — Sai em um sussurro cheio de emoção. Limpo


minha garganta e ainda não consigo falar.

Estou apavorado pra caralho.

— O que há de errado?

—Só precisava... — Você. Preciso de você. Preciso me


lembrar por que estou fazendo isso. Para mamãe e papai, para
nós, para nosso futuro.

— Fale comigo, irmão. — Todas as besteiras à parte, ele


tem estado comigo, para o bem ou para o mal, a cada passo do
caminho, confiando em mim, acreditando em mim. Ao correr
esse risco, poderia estragar tudo. Mesmo com a garantia que
paguei, existem muitas variáveis. Há muitas, porra.

O pânico se apodera de mim enquanto seguro meus


dedos e engulo o conteúdo da minha bebida em dois goles.

Talvez eu devesse ter compartilhado esse segredo com ele.


Talvez devesse confessar meu envolvimento com Antoine e
meus temores de que nossos laços nunca sejam rompidos sem
consequências terríveis.

Talvez eu tenha feito tudo errado e feito movimentos


muito arriscados tão cedo no jogo. Mas esse medo, não quero
por ele. Este fardo e as consequências que podem advir – vou
assumir sozinho.

— Só quero conversar. — A comoção irrompe na minha


frente quando o locutor começa a alertar a todos para o início
da corrida.

— Besteira. Me diga o que se passa. — O barulho das


ferramentas me permite saber que ele está trabalhando no
King's. Ser mecânico é uma profissão de que ele gosta muito e,
por isso, fico feliz, mesmo que seja apenas mais uma forma de
sobreviver no momento. Com sua aptidão intelectual, ele tem
um futuro brilhante com ou sem mim. Ele irá longe, mesmo
sem minha orientação. Eu o respeito imensamente pelo
homem que ele está se tornando, e ele está apenas estalando
os nós dos dedos, mal arranhando a superfície de seu
potencial.
— Dom, apenas... — Fecho meus olhos, — fique ao
telefone comigo.

— O que você fez?

Quando os portões se abrem, o ataque é imediato,


milhares de agulhas picantes em meu peito. É doloroso, mas o
gim em circulação o torna menos suportável. Mantendo meus
olhos treinados no número ao lado do meu cavalo, Dom
permanece em silêncio, e sei que é porque ele está ouvindo
atentamente a enxurrada de barulho ao meu redor, em busca
de pistas. Depois de alguns segundos, ele fala.

— Qual é o nosso número? — Ele pergunta suavemente.

— Sete, — respondo. O número de anos que estive longe


do que é mais importante para mim. Há muitos anos que vivo
vidas duplas. Anos de fome e humildade, anos de metamorfose
que me transformaram de um órfão em busca de vingança para
um ladrão comum, para escambo, irmão, mentor, aluno,
professor e agora...?

— O que você apostou?

— Nosso futuro.

Encolhendo-me, não recebo nada. Nenhuma palavra


cruzada, nem mesmo uma respiração exalada com força. É
confiança absoluta e me impregna um sentimento
inimaginável e um inferno de muita culpa. Estou na ponta da
língua para sussurrar um pedido de desculpas por abusar dele
quando vejo nosso cavalo ficar um pouco para trás. Mal posso
respirar com a intensidade das emoções correndo por mim.

— Para B...

— Só desta vez, por favor. Preciso do meu maldito irmão,


— sussurro, aumentando meu aperto no telefone.

— Estou aqui, — ele responde com voz rouca, um medo


raro em sua voz. Mas não é o medo pelo seu próprio bem-estar,
e isso me deixa ainda mais forte.

Engolindo, amaldiçoo minhas emoções enquanto mais


remorso vem à superfície sobre como eu o injusticei. De como
o deixei naquela porra de casa infestada de baratas com um
pai indigno, para se defender sozinho, para o homem antes de
seu tempo. Só uma vez, quero que o sacrifício valha a pena.
Quero que ele sinta que o sacrifício vale a pena.

Nosso cavalo assume a liderança no último quarto de


milha, e posso sentir os pelos dos meus braços começarem a
se arrepiar.

— Irmãos primeiro, — sussurro.

— Sempre irmãos, — ele responde suavemente, um


segundo antes de nosso cavalo cruzar a linha de chegada.

Choque e adrenalina disparam por todo o meu corpo


enquanto exalo uma respiração estável e Dom fala.

— O que nós ganhamos?


O pânico leva alguns segundos para se transformar em
euforia. A liberação dá um salto a cada passo que dou
enquanto faço meu caminho de volta para dentro, desistindo
de meu encontro de espera no bar para receber meus ganhos.

— Exodus.

— E olhe para você agora, King, apenas um Joe normal


fazendo a merda diária, — murmuro, despejando dois cabos de
extensão em meu carrinho antes de empurrá-lo ao longo do
corredor. — Nenhum bandido para caçar, nenhum terno à
vista para negociar acordos de bilhões de dólares.

Embora possa ter planejado meu caminho para me tornar


um milionário e ter falado suavemente para escapar da morte
em mais de uma ocasião, ganhar a confiança nua da filha de
meu ex-inimigo pode ser o melhor caminho para superar todos
os outros.

Nossa progressão é lenta porque, dia após dia, ela está


me matando gradualmente.

Vinte e um dias ela resistiu a mim, ao me deixar entrar.


Vinte e um dias ela me negou a entrada totalmente de
volta em seu coração.

Vinte e um dias fodi meu punho.

Vinte e um dias de dor quando a seguro enquanto ela


dorme de pijama de flanela do pescoço ao tornozelo.

Vinte e um malditos dias.

Sendo o homem tático que sou, decidi que é hora de bolar


um plano.

O plano de um Joe médio. Inocente o suficiente.

Vinho, jantar, sedução, conexão.

Diariamente, ela conseguiu me conter em cada curva.


Mas de alguma forma, vou conseguir lutar com ela de volta a
algum tipo de submissão.

Resistindo ao impulso de socar o filho da puta


despreocupado que passa por mim, bato uma pilha dupla de
papel higiênico no meu carrinho.

Tudo o que precisamos é do ambiente certo para


compartilhar uma noite perfeita e, para isso, estou retirando
todo o meu arsenal.

Está tudo errado, esse espaço que ela tão facilmente


coloca entre nós... precisamos de algo, algo que não consigo
identificar para nos levar de volta para onde estávamos.
Quando meu telefone toca no bolso, luto para atender,
esperando que seja algum tipo de sinal, qualquer coisa para
me ajudar a passar por esta encruzilhada.

— Fale comigo, — resmungo, encarando outro marido


feliz que olha para o meu rosto e se vira para andar na direção
oposta.

Sean ri em saudação.

— Só estou checando, cara. Como está indo?

— Como vai? — Posso ouvir o desprezo em minha


resposta. — Como. Está. Indo? — Cerro. — Bem, no momento,
estou apenas riscando as tarefas que a Sra. deixou para mim
e pegando o papel higiênico. E esta noite, depois de ter
recolhido merda de cachorro suficiente, ela pode simplesmente
me recompensar com um beijo de boa noite após mais um dia
de vida inútil.

Uma risada coletiva ecoa do outro lado da linha, e


pressiono o telefone no ouvido, falando com os dentes
cerrados.

— Você me colocou no viva-voz?

— Desculpe, cara, não pude resistir.

— Fodam-se todos vocês, — estalo, enquanto gargalhadas


ecoam às minhas custas.

— Não desligue. Estamos aqui por você, cara, — Russell


canta em meio a uma risada agonizante. — E não entenda as
merdas baratas, garotas odeiam isso.
Olho para o rótulo e adivinho minha escolha.

— É Charmin.

— Você é bom, — Sean fala antes de eu ouvir a porta da


garagem fechar.

— Tudo bem, fale comigo.

— Ela está me deixando sangrando, Sean. Minha


tolerância, minha paciência, tudo isso.

— Faz apenas algumas semanas. Mantenha-se firme.

— Não tenho ideia do que fazer comigo mesmo aqui. Não


tenho ideia de como ser… normal.

— Não existe tal coisa, e você sabe disso.

— Oh, mas há, — rapidamente examino a loja e baixo


minha voz, — e estou vivendo entre eles. Mas não se preocupe,
— pego uma caixa e a examino antes de jogar seis iguais no
meu carrinho, — Pretendo martelar e pregar meu caminho de
volta por volta da meia-noite.

Outra risada prolongada em sua extremidade.

— Estou tão feliz por te divertir.

— Neste momento, temo por vocês dois. Faça um favor a


si mesmo e saia de um lugar público. Não é seguro para outros.
Só vai levar algum tempo para se ajustar.
— Ajuste, — a palavra é ácida na minha língua. — Essa
é uma palavra que ela usou várias vezes. — A caixa me olha
enquanto me chama, e jogo duas barras de chocolate no balcão
antes de enfiar metade de uma na minha boca e mastigar
lentamente, desafiando-a a julgar.

— Você foi honesto com ela sobre tudo?

Afastando minha cabeça do caixa, baixo minha voz.

— Nem mesmo fui capaz de superar a repetição desde que


ela deixou Triple. Ela é... impossível.

— Apenas dê a ela mais tempo e tente não pensar no que


está acontecendo aqui. Faça um favor a si mesmo e mantenha
seu cérebro de negócios fora disso. Nós temos tudo sob
controle. Apenas se concentre nela.

Soltei um gemido de dor.

— Se me concentrar mais...

— Eu sei, cara, eu sei. Tessa é tão difícil de quebrar


quando fica puta comigo. Faça o que puder. Te ligo de volta em
breve.

— Quando?

— Quando o quê?

— Quando você vai me ligar de volta? — Estalo, engolindo


outra boca cheia de chocolate.

Não perco o riso em seu tom.


— Você precisa de um quando?

Mais uma vez, afasto-me da caixa, que está fazendo um


trabalho de merda em esconder seu sorriso.

— Sim, Sean, preciso de uma porra de quando.

— Vou te pegar amanhã.

Termino a ligação e me viro para pagar o caixa.

— Flores? — Ela oferece uma sugestão, apontando para


os baldes de caules próximos. Embora seja um gesto típico,
não é uma má ideia. A mulher adora um jardim e passa horas
sem fim cuidando de si mesma. Agarrando cada flor do balde,
ela balança a cabeça em aprovação enquanto entrego a ela meu
cartão.

— Obrigado.

— Se quatro dúzias de rosas não ajudarem, querido, você


pode querer pensar em algo mais brilhante.

— Anotado.

As rodas do meu carrinho de compras rangem na calçada


irregular abaixo de mim enquanto puxo minha carga de
suprimentos para o Camaro. Depois de descarregado, fecho o
porta-malas e faço uma pausa quando vejo um carro familiar
estacionado algumas fileiras abaixo. O mesmo carro alugado
que avistei no posto de gasolina.

Não é coincidência.
Olhando para trás em direção à loja, vejo um homem
parado, esperando ao lado da entrada, seus olhos desviados.

Meu telefone ressoa no bolso de trás e o levanto para ver


um aviso tardio.

Estamos atrás dele.

Digito de volta uma resposta rápida.

Deixe-me cuidar disso.

Empurrando meu carrinho de volta para o receptáculo da


loja, ligo para Cecelia.

— Ei.

— Como está o seu dia?

— Bem, considerando que só cheguei aqui há uma hora,


tudo bem até agora. E aí?

— Liguei por um bom motivo. — A irritação de seu


comentário combinada com a chegada de um novo perseguidor
está chegando através da minha ligação, e puxo meu cabelo
em aborrecimento antes de suavizar meu tom. — Uma razão
muito boa.

— Oh?

O homem casualmente avança para o lado da loja,


aproximando-se da esquina enquanto tomo meu tempo, meu
andar lento e despretensioso. Estar ao telefone ajuda a ilusão.
É quando empurro meu carrinho para longe de mim, batendo
nos outros, e mudo a direção indo direto em sua direção, que
eu sei que ele é tão verde quanto eles vêm. É um insulto do
caralho com seu conjunto de habilidades que ele foi enviado
para mim.

— Encontro à noite, — digo, pegando meu ritmo.

— Encontro à noite?

— Sim. Noite de namoro, — digo, — um ritual semanal


para casais para manter a intimidade. É uma coisa.

Posso ouvir o sorriso em sua voz.

— Estou ciente.

— Irei em um encontro com ele, — Marissa ressoa no


fundo.

— Então, podemos ter um?

— O que você tinha em mente?

— Cuidarei dos detalhes.

O idiota vira a esquina, seu corpo tenso como se ele


estivesse pronto para decolar. Seria ridículo – se eu não
estivesse tão chateado.

— Ne me fais pas te courir après. Tu ne vas pas aimer


quand je te rattraperai. — Não me faça perseguir você, você não
vai gostar quando eu te alcançar.
Ele faz uma pausa em sua caminhada. Ele está ouvindo.
E ele está ouvindo porque ele entende.

Francês.

Merda.

— Tobias, quem você está perseguindo?

— Um imbecil que pegou meu carrinho de compras.

— Cidade pequena, francês, as primeiras impressões são


importantes. Você acabou de chegar aqui, não se torne uma
ameaça.

— Vou manter isso em mente.

Logo atrás dele, o homem dá um salto e começo a correr.

— A noite do encontro será em casa. Até então, Tesor.

Depois de desligar, alcanço-o rapidamente, minhas


longas corridas pagando quando agarro o capuz da jaqueta do
idiota e o arranco de seus pés na lateral do prédio. No ar, ele
grita antes de cair de costas com um baque no concreto.
Depois de desarmá-lo, arrasto-o atrás de mim, o material de
sua capa impermeável ajuda no esforço enquanto mantenho
meus olhos abertos para os carros que passam.

Para minha alegria, em uma cidade com uma população


tímida de 2 mil, não há um único carro vindo em qualquer
direção – uma vantagem de viver em uma cidade pequena.
Meus pássaros já estão esperando atrás da loja em um sedan
em marcha lenta quando apareço, puxando o idiota atrás de
mim que grunhe quando bato em um pedaço de calçada
irregular.

— Je t'ai dit de ne pas courir. — Eu disse para você não


correr.

Uma vez que estamos em segurança fora de vista, ajoelho-


me e procuro a identidade dele e dou crédito a ele por ter o bom
senso de deixá-la de volta em qualquer buraco que esteja
ocupando. Acerto quando pego um celular de sua calça jeans.

— Agora falamos em inglês.

Silêncio.

— Eu sei quem te enviou. Já tenho tudo que preciso de


você. Diga-me por que não deveria matá-lo agora?

Sem resposta.

Pego sua própria arma antes de pressioná-la em sua


têmpora.

— Você tem mais uma chance de me responder.

— Tenho uma mensagem de Palo.

— Não, você não tem. — É então que sei como ele me


encontrou.

E esse Palo provavelmente está morto.

Porra.
O medo se filtra do centro do meu peito, circulando por
minhas veias enquanto mantenho minha máscara no lugar
enquanto as implicações do que está por vir me golpeiam por
dentro.

Puxando o homem para se levantar, inclino-me sobre ele,


pressionando todo o meu peso contra ele. Um gemido de dor
sai de seus lábios.

— É plena luz do dia, e você tem a audácia de tentar me


seguir? Você não sabia de quem estava vindo? — Estalo minha
língua.

— Você não deveria saber que eu estava aqui.

— Passons au français parce que tu ne peux pas être


aussi stupide. — Vamos mudar para o francês porque você não
pode ser tão estúpido. — Tu devrais travailler ton anglais. —
Você deve trabalhar em seu inglês.

— Je déteste l'Amérique. Je ne reviendrai pas. — Eu odeio


a América. Eu não vou voltar.

— Tu seras enterré ici si tu ne coopères pas. — Você será


enterrado aqui, se não cooperar.

— Je devais signaler où tu étais et avec qui. — Eu deveria


relatar onde você estava e com quem estava.

— Et tu l'as fait? — E você tem?

O medo pisca nos olhos do meu agressor incompetente.


É tarde demais.
E esse é o ponto crucial da situação. Como sempre foi. Se
eu tivesse ficado sozinho, não haveria nada a relatar. Este teria
sido mais um dia no escritório na minha antiga vida, mas
minhas circunstâncias são diferentes agora, e as apostas são
muito maiores. Esta manhã, tive tempo em abundância. É
hora de tentar ajudá-la a entender meu raciocínio para minhas
decisões que me levaram ao lugar em que estou. E nas últimas
três semanas, achei que a liberdade de ser um João ninguém
era garantida.

— Você mandou fotos?

Outro aceno de cabeça, e faço o meu melhor para não


quebrar seu pescoço enquanto o mantenho preso e levanto seu
telefone.

— Quel est le mot de passe? — Qual é a senha?

Ele recita um código de quatro dígitos e verifico suas


mensagens para ver um tópico ativo com um código de área
familiar. Ele está relatando há dois dias, sua mensagem mais
recente enviada minutos atrás, para a qual ele não obteve
resposta. Anoto a frequência de suas mensagens e coloco seu
telefone no bolso. A imagem de Cecelia na entrada de seu café
leva a raiva tomando conta.

Usando meu cotovelo, apago-o para não deixar marcas de


ruptura em meus dedos para Cecelia inspecionar. Uma vez que
ele está inconsciente, os dois pássaros em quem confiei no
serviço, Oz e David, rapidamente o arrastam para o banco de
trás. Eu os examino de perto enquanto eles nervosamente
carregam o carro, cada um deles olhando por cima do ombro
para mim. Ambos estão vestidos à paisana, com constituição
muscular, mas Oz tem um moicano, que é atraente e distinto
nesta cidade ou em qualquer outra merda.

Esses são os recrutas mais valiosos de Russell?

Ele deveria saber melhor.

Assim que eles fecham a porta para o passageiro


inconsciente, aproximo-me de ambos, fervendo de raiva.

— Por que sua mensagem chegou tarde demais?

Oz é o primeiro a falar.

— Não tínhamos certeza

— Vocês não tinham certeza? — Cerro meus punhos para


não atacar. — O Capitão Óbvio está aqui há dois malditos dias,
— olho entre eles. — Não dou uma segunda chance. Não neste
posto. Identifique-o e sangre-o de informações até ter certeza
de que ele está trabalhando aqui sozinho. Ligue para Russell,
traga mais seis pássaros aqui, dois para substituir vocês dois.
Eu os quero aqui hoje. Não dou a mínima como. Ele está sob
sua custódia agora e sua responsabilidade até que eu diga.
Deixe-me cair nisso, — rosno, — e vocês estão fora, porra.

Cortar asas não é algo que ameace frequentemente,


especialmente quando eles merecem sua marca, mas isso é
uma grande merda, e um homem com tinta nunca deveria
fazer.
Eles acenam com a cabeça, oferecendo nenhuma
desculpa, sem dúvida devido à ameaça assassina em meus
olhos. Uma vez que eles estão de volta no sedan, procuro por
alguém que possa ter visto o espetáculo antes de decolar de
volta para o Camaro. Ao volante, sinto as agulhas começarem
em meu peito e passo a mão no queixo.

O sol brilha através de uma nuvem de chuva enquanto


um recém-chegado agarra um carrinho na entrada da loja. Ele
provavelmente está aqui para pegar uma ferramenta elétrica,
nada mais, e continuar com o resto do dia – um João ninguém.

A inveja dispara por mim enquanto ele entra com os


ombros leves.

Pela primeira vez na vida, tive um senso de normalidade


e o desperdicei sentindo pena de mim mesmo. Tive a liberdade
de viver como um homem comum, não importa o quão
temporário seja, e não percebi o quão precioso isso era para
mim até que foi tirado de mim há apenas alguns minutos. Seria
tão fácil ignorar a distração, a ameaça iminente, ignorar o
perigo um pouco mais, em um esforço para reconquistá-la
totalmente. Mas, neste momento, estou ficando sem tempo.

Fazendo o possível para desacelerar meus pensamentos


acelerados, tento me concentrar na tarefa em questão.

Encontro à noite.

Ela merece o esforço, é o que prometi a ela e, mais do que


isso, é o que preciso para prosseguir com ela. Temos que voltar
a alguma semelhança conosco antes de podermos assumir
mais. Não vou deixar nada atrapalhar o progresso. Um último
segredo, e por nenhuma outra razão a não ser para ganhar
tempo para conquistá-la antes que enfrentemos outra
tempestade. Entre fúria e preocupação, eu levanto meu
telefone quando ele toca com uma mensagem recebida.

Russell: Eu sei que sinto muito não é o suficiente, cara.


Estou enviando dois direto do Tyler.

Não respondo porque desculpa não é suficiente. Esses


são erros que não podemos mais cometer. Não tão tarde no
jogo.

Mais uma vez, uma decisão foi tomada por mim devido a
circunstâncias incontroláveis. Girando a ignição, pressiono
minha cabeça no volante e respiro fundo.

Vou classificar as ameaças à medida que vierem. Tenho


um ou dois dias no máximo para esclarecer as coisas e vou
usar cada segundo para consertar as coisas.

— Putain de fils de pute! — Filho da puta, filho da puta!

Bato meu punho no painel e imediatamente me


arrependo, alisando minha mão onde bati, grato por não haver
nenhuma evidência.

Aperto no peito, expiro lentamente.

Tenho um livro para ler e um jantar para preparar. Posso


fazer isso, por ela. O aperto em meu peito ameaça tomar conta
quando coloco o carro em marcha e pego o acelerador, saindo
do estacionamento.

Só preciso de um pouco de gim primeiro.


Adicionando os recibos do dia na minha mesa, puxo meu
telefone do meu avental descartado e vejo várias mensagens
perdidas de Tobias.

Tobias: Eu odeio esse maldito livro e minha panturrilha


está grávida. Beau precisa ser castrado.

Tobias: Não há Deus na minha vida para escolher você,


não entende?

Ele nunca se emocionou tão abertamente em um texto e,


definitivamente, não é assim que ele revelou seus sentimentos
no passado. Algo está errado, e ficou claro na última semana
com suas corridas excessivas e o aumento do consumo de
álcool que o isolamento está começando a afetá-lo. Armado, ele
anda pelo perímetro da casa à noite antes de trancar, muitas
vezes espiando pelas janelas quando pensa que não estou
olhando, seu rosto visivelmente relaxando apenas quando
recebe mensagens dos corvos em nosso posto. Há um medo
claro instalado nele neste momento. Não sei se é proteção ou
paranoia que o faz agir como um leão enjaulado, mas só posso
assumir que é uma mistura de ambos. É evidente que ele se
preocupa mais do que dorme. Duas noites atrás, ele me
envolveu em seus braços e sussurrou, — volte para mim, —
em respiração com infusão de gim. Não reconheci que o ouvi e
ainda estou com remorso por isso. E agora, ele está sozinho
em casa lendo uma história que uma vez considerei uma
profecia que atinge um personagem com quem o identifico,
sem dúvida magoado e insultado. A culpa corrói minha
consciência enquanto leio mais de seus textos.

Tobias: Essa não é nossa história, Cecelia. Esta não é a


nossa história de merda!

Tiro meu próprio texto na esperança de iniciar algum


controle de danos.

Estarei em casa em breve. Estou tirando dinheiro


agora. É apenas um livro, Tobias.

Tobias?

Tobias?

Quando não obtenho resposta, ligo para o número dele e


sou enviada diretamente para o correio de voz. Em pânico,
retiro o dinheiro e corro para o meu Audi, temendo o que estou
por vir. Dei muita importância ao livro – que claramente o pinta
como o vilão egoísta e egoísta – que é como eu o via por tanto
tempo. Na maior parte do tempo que ele voltou, ele lutou com
algo, algo subjacente que ele ainda não expressou devido a
conversas que recusei. Seus dias 'ruins' parecem acontecer
com mais frequência do que não, e tenho certeza de que é por
causa de seu isolamento. Isso combinado com o fato de que ele
quase abandonou a irmandade, seu propósito, a coisa que o
definiu e quem ele é por mais de duas décadas para brincar de
casinha comigo. Tudo pelo que ele está vivendo agora sou eu,
e não dei a ele quase nada por isso. Não importa o quão forte
ele seja, esta transição está levando o melhor dele. Disse a ele
que queria um rei, não um covarde, mas e se essa exigência
prejudicou sua capacidade de ser aberto comigo?

Nada me afeta mais do que vê-lo tão vulnerável, esse


homem outrora impenetrável de quem tive que lutar por
sentenças completas, por qualquer coisa além de indiferença
cruel. Não é sua aparência ou nossa atração sexual – embora
sua potência não tenha diminuído nem um pouco – é o que ele
me deixou vislumbrar no passado, o romântico que ele revelou
na clareira, nosso relacionamento resultante depois por causa
disso. É seu amor pelos irmãos, sua dedicação à causa que
esgota minha vontade de ferro, dia após dia.

É sua humanidade, sua empatia, seus defeitos e o fato de


que sou a mulher que ele escolheu, aquela em que ele confia
para revelar esse lado de si mesmo que faz minha culpa se
multiplicar.

Mas exigi o homem que conheci e, de várias maneiras,


não sou a mesma mulher. É hipócrita da minha parte pensar
que os últimos anos não o mudaram? Porque neste ponto, com
certeza não posso dizer o mesmo. Ele quase me disse que se
fechou completamente depois que Dominic morreu e se tornou
uma espécie de máquina. Mas essa abertura, agora, me dando
isso em tão pouco tempo, me permite saber que algo está
acontecendo dentro dele muito mais assustador do que o que
ele me revelou.

Correndo em direção à casa, meu coração ansioso


batendo forte, faço a última curva na minha estrada quando o
avisto, correndo em jeans e... Oh. Meu. Deus.

— Que diabos? — Diminuindo o ritmo, abro minha janela


enquanto Tobias corre como se sua bunda estivesse pegando
fogo no meu avental da cozinha, uma fita rosa choque presa
em sua cintura. Ele está coberto de suor e o que parece...
farinha cobrindo metade de seu rosto e espanando seu cabelo.

— O que diabos você está fazendo?

Ele para a corrida quando chamo seu nome novamente,


como se ele estivesse em algum tipo de estupor, muito focado
em algo que não está aqui e agora. Paro e saio do carro, uma
rajada de vento me batendo no rosto. Quando me aproximo
dele, fica claro que ele está congelando, sua pele cor de oliva
tingida de vermelho do frio intenso e ele cheira a gim.

— Você está bêbado? Achei que fosse uma noite de


encontro?

— Eu sou... Tesor... — ele abaixa a cabeça e me puxa para


ele antes de enterrar a cabeça no meu pescoço. — Eu não
poderia estar lá.

— Na minha casa? Por que você está bêbado?


— Não estou bêbado... estou... um pouco. Não importa.

— Entre no carro, francês, sua pele é como gelo.

Ele ignora minhas ordens e me liberta.

— Você me compara com este… Ralph, — ele range com


nojo.

— Tobias, é apenas um livro.

— Não somos nós.

— Eu sei que não.

— J'ai été égoïste, mais j'avais mes raisons. Il ya une


raison à tout ce que je fais. Et si c'est notre histoire, sache que
je suis ici pour te donner, pour nous donner, une meilleure fin.
— Eu fui egoísta, mas tive meus motivos. Sempre há uma razão
para tudo que faço. E se essa é a nossa história, saiba que estou
aqui para dar a você, a nós, um final melhor.

Amuado, ele caminha até o lado do passageiro do Audi e


se joga no banco antes de bater a porta. Apertando meus lábios
para esconder minha diversão com sua birra, pego o assento
do motorista e ligo o aquecedor, abrindo as aberturas em seu
caminho. Cheio de desprezo, ele se senta lá como uma criança
repreendida, sua mandíbula cerrada, seus olhos desviados.
Apertando meus lábios, coloco o carro em marcha enquanto
ele fala.

— Nunca trouxe uma mulher para isso por uma razão de


merda. Em primeiro lugar, era pedir muito a qualquer mulher
a longo prazo. Período. E isso, o que está acontecendo entre
nós, o ressentimento que você sente por mim agora é o porquê.
Essa é uma das razões pelas quais eu os puni tão duramente
por arrastar você para isso.

— Você está exagerando e levando isso para o lado


pessoal.

— Não tenho escolha. — Ele permanece em silêncio


enquanto dirijo os poucos quilômetros de volta para casa, mas
posso sentir a guerra feroz dentro dele, a energia na cabana
densa e vinda de todos os poros cheios de gim. Quando
chegamos em casa, ele me impede de sair do carro com uma
mão na minha coxa, trazendo olhos torturados aos meus. — A
única razão pela qual acredito que Deus existe é porque você
existe. Tantas vezes, eu queria ir até você...

— Não quero ouvir isso! — Eu explodo, surpreendendo-


me com meu veneno.

— Eu disse por que não poderia!

— Isso não torna nada melhor!

Ele muda de marcha como se tivesse pensamentos


demais.

— Collin era seu Luke? No livro, Meggie se casa com um


homem que ela não ama. Alicia era meu Luke. Eu não a amo.
Não poderia.
— Ele era de certa forma, mas você não pode generalizar
relacionamentos como esse.

— O que sei sobre relacionamentos? — Ele pronuncia a


palavra com desgosto. — Que tentei a maior parte da porra da
minha vida evitá-los? Eu sei como tratar uma mulher, isso é...
bom senso, como foder com elas, mas nunca me permiti ter
nada real para nenhuma mulher... até você. — Ele engole e
balança a cabeça ironicamente. — Instintivamente, sempre
soube... que se me deixasse perder em uma mulher, como isso
seria prejudicial para todos os envolvidos, e estava certo. Eu
estava completamente certo. — Seu aperto na minha coxa
aumenta, — e então perdi você.

A picada e a suavidade de sua admissão têm minhas


próprias emoções confusas sobre nós virmos à tona. A picada
começa a vencer enquanto luto contra o desejo de atacar, mas
ele está falando a verdade. Essa é a nossa natureza, como
começamos e toda a resistência que se seguiu enquanto
lutávamos contra nosso desejo e nossa necessidade crescente.
Mas meu ressentimento vence.

— Você não me perdeu. Você me descartou, cruelmente,


propositalmente, — lembro-o. — Você me forçou a sair.

— Eu precisei! Não conseguia nem me proteger! — Ele


amaldiçoa em inglês e francês, procurando meu rosto. —
Cheguei tarde demais? — Ele me olha por segundos antes de
bater o punho no painel, os olhos vermelhos e perdendo o foco.

— Quanto você bebeu?


— Não o suficiente! — Recuo e ele balança a cabeça.

— Porra, e sinto muito. Não tenha medo de mim. Jesus


Cristo, pare de ter medo de mim! — Ele pula para fora do carro
e dá a volta, puxando-me do banco do motorista no momento
em que pego minha bolsa, sua expressão esperançosa
enquanto ele passa as mãos sobre mim. — Tenho uma
surpresa.

E eu tenho a porra da chicotada.

Fisicamente, posso sentir a dor dentro dele, seu


desespero para mudar tudo e não mais tarde, agora. Ele está
bêbado pra caralho, mas tudo o que ele está sentindo é
visceral. Posso sentir sua dor, sua culpa, sua agitação com a
nossa situação e minha recusa em deixá-lo entrar totalmente.

E por causa disso, meu King recém-retornado está se


desfazendo.

Ele me guia para dentro de casa e, uma vez dentro,


pressiona-me contra a porta e abre a fechadura atrás de mim.

Um, dois, três.

Ele abaixa os olhos com vergonha quando me vê tomar


nota de suas ações.

— Tudo começou quando meus pais morreram e eu tive


que trancar Dominic em casa. Eu tinha que ter certeza de que
ele estava seguro. É uma falsa sensação de segurança, e meu
lado lógico sabe disso, sabe, mas não importa. De alguma
forma, contar ajuda. Quando contar não é suficiente, correr
ajuda a exaurir meus pensamentos acelerados. E fumar me
ajuda às vezes entre a corrida e o primeiro gole de gim.

Meu coração está no meio de uma explosão quando ele


levanta os olhos voláteis para mim.

— Você entende isso?

Aceno, sem vacilar.

— É uma condição nervosa e nada do que se


envergonhar. Lamento se alguma vez fiz você se sentir
desconfortável ao falar sobre isso.

— É... — ele solta um suspiro resignado, — às vezes


assume o controle.

Seguro sua mandíbula e ele molda sua mão sobre a


minha, parecendo desesperado pelo contato, e meu peito incha
ainda mais de dor.

— É uma ansiedade que surgiu de um momento muito


difícil e muito traumatizante de sua vida. Quando estou mais
estressada, é quando o pior dos meus sonhos se manifesta.

— Ficou... muito pior quando te mandei embora, — ele


admite e fecha os olhos. — Correr, fumar, gin, nada ajuda hoje.
Venha, — ele agarra a mão que está segurando e me arrasta
para a minha cozinha destruída. Costeletas de vitela
queimadas estão no balcão, junto com uma garrafa vazia de
gim e duas garrafas Louis Latour. Tigelas e utensílios em pó se
alinham nas bancadas, e parece que ele lutou contra um saco
de farinha e perdeu em determinado momento. Torço meu
nariz enquanto examino os danos.

— Você fumou na minha cozinha?

— Tive um. — Ele levanta dois dedos.

— Não fume em minha casa.

— Sua casa, — ele repete, e sinto a dor que esse


comentário causa nele. Ele olha para o fogão. — Fiz o jantar
para você. — Ele franze as sobrancelhas. — Bem, queimei o
jantar, mas consegui isso! — Ele pega uma garrafa vazia de
Louis Latour no balcão e derrama três gotas em uma taça
antes de empurrá-la para mim. — Salvei um pouco para você.

Olho e mordo meus lábios para abafar minha risada


enquanto ele abaixa a cabeça em derrota.

— Não é assim que deveria ser. Nada disso. Me perdoe.

O para o livro recém-picado, que está logo abaixo de um


arranhão recente na minha parede. Ele segue minha linha de
visão.

— Outra morte — digo com um suspiro.

— Isso não é, — ele balança a cabeça para frente e para


trás. — Não somos nós. Isso nunca seremos nós. Não gosto da
sua percepção.
— Tudo o que vejo agora é um francês muito bêbado,
muito cansado e muito estressado que teve um dia ruim e
precisa dormir um pouco. — É então que percebo a ausência
do outro francês em minha vida. — Você deixou Beau dentro
de casa quando fugiu?

Seus olhos se arregalam de medo antes que ele saia


correndo da sala. Um minuto depois, ouço um protesto audível
de Beau por ter sido abordado. No próximo segundo, Tobias
carrega meu cachorro para a cozinha antes de apresentá-lo a
mim em suas mãos como um troféu.

— Ele está aqui.

Pego Beau nos braços e o cachorro confuso lambe meus


lábios. Murmuro meu olá enquanto Tobias ataca nós dois.

— Estou com ciúmes. Do. Cachorro.

Balanço minha cabeça, incapaz de segurar meu sorriso,


e olho ao redor da cozinha.

— Parece que você teve um dia mais do que produtivo.


Agradeço a ideia.

— Não estou entediado, — ele diz suavemente. — Estou...


me ajustando.

Ele dá um passo à minha frente e passa os nós dos dedos


ao longo do meu queixo.

— Não achei que fosse possível sentir mais sua falta do


que antes de chegar aqui, mas sinto. E quero te foder tanto, —
a dor nessa declaração e seu tom é cômico, mas o sentimento
bate forte.

— Uau. Ok. Você ganha pontos pela honestidade.

Ele agarra minha mão, e Beau rosna aos nossos pés.


Tobias rosna de volta.

— Ela foi minha primeiro, filho da puta.

Levanto seu queixo com meu dedo enquanto ele se


levanta em uma luta de galo com meu cachorro. — Acha que
gostaria de dormir e talvez possamos conversar de manhã?

Ele enreda nossos dedos.

— Não quero ser seu espinho, Cecelia.

— Eu sei.

— Eu sou seu.

— Sim, — pondero enquanto estamos em minha cozinha


destruída, — em toda a sua glória.

Ele franze a testa.

— Estraguei tudo isso. Eu estava indo para vinho, jantar,


fazer você gozar, — ele murmura, seus lábios grossos
tentadores mesmo em seu estado. — Ia fazer você se lembrar
de como somos bons. Quero fazer as coisas por você como
costumava fazer. Você costumava me deixar.

— Eu diria que você fez o suficiente por um dia.


— Isso tem que parar. Você tem que me enfrentar.

— Estou olhando bem para você.

Ele coloca a palma da mão sobre onde está seu coração,


seus olhos atentos, sua voz urgente.

— Eu sinto muito.

— Eu sei. — Olhos mergulhando para onde sua mão


repousa em seu peito musculoso coberto parcialmente pelo
meu avental rosa-choque com desenhos de beijos, levanto para
inspecionar uma queimadura de gordura de aparência
dolorosa. — Isso dói?

— Pare, olhe para mim.

Sim, e em seu olhar, não vejo nada além de desejo.

— Quero viver aqui.

— Você está morando aqui.

— Estou existindo aqui, mas podemos construir uma vida


aqui se é isso que você quer. Eu vou te dar o que você quiser.
Sonhe comigo de novo, Cecelia. Sonhe mais mil sonhos comigo,
e farei todos eles se tornarem realidade. Posso te dar
promessas. Promessas que não pude antes.

— Tobias...

— Não quero ser o seu espinho maldito ou a lua pela qual


você chora!
Quando pulo devido à sua explosão, ele fecha os olhos,
passando as unhas com crosta de farinha pelo cabelo,
colorindo mais de branco seus fios de ônix.

Meus olhos se estreitam enquanto peso suas palavras,


suas ações, seu desespero.

— Isso é mais do que o livro. O que você não está me


dizendo?

Assombrado. É exatamente assim que ele se parece.


Mesmo com as luzes brilhantes da cozinha, posso ver as
sombras tortuosas do passado se aproximando dele.

— Diga-me que ainda somos possíveis, Cecelia. Diga que


não estou atrasado.

— Durma. Conversaremos quando você estiver sóbrio.

— É difícil para mim dar sentido à minha vida para que


você entenda.

— Você está fazendo todo o sentido.

Ele balança a cabeça como se não estivesse me afetando.


Ele puxa a mão do meu aperto, deslizando contra o armário no
chão.

— Quero te dizer... muito.

— Estou ouvindo.

— Seu coração não está aberto para mim, e até que esteja,
você não vai realmente me ouvir. — Ele faz uma pausa por
vários segundos e fecha os olhos. Por um minuto, acho que ele
pode ter desmaiado até que fala e seus olhos se arregalam. —
De manhã, na casa de Roman, no dia que confessei para você,
você disse... que Dom disse algo sobre nós, sobre você e eu, —
Ele traz olhos brilhantes para mim.

Aceno, as lágrimas enchendo meus próprios olhos.

— Te conto amanhã, quando você se lembrar.

— Não consigo esquecer de nada. Você não entende? —


Ele agarra seu cabelo, agonia torcendo suas feições. — Minha
mente faz isso comigo. — Ele engasga com a emoção. — Não
posso te perguntar amanhã, — ele sussurra com voz rouca. —
Por favor, entenda que não posso perguntar de novo.

— Ok, — ajoelho-me na frente dele e examino seu rosto.


O rosto de um homem atormentado, não o homem confiante
com quem colidi. — Então vou te dizer sem ser perguntado.
Mas você deve saber que ele queria que você fosse feliz.

— Você acha que é possível?

— Acho que você está chateado agora, e não é uma boa


hora para conversarmos, — respondo. Aperto sua mão
novamente e pressiono um beijo ao lado de sua pele com
bolhas e raiva.

— Você ainda me ama, — ele sussurra, observando meu


rosto atentamente. — Mas você não quer mais me amar, — ele
diz tristemente antes de passar o polegar nos meus lábios. —
Tu es si belle. — Você é tão linda. — Nunca pensei que fosse
encontrar você e, quando o fiz, você não era minha.

Balanço minha cabeça.

— Odeio a sensação de admitir, e gostaria que você


parasse de me obrigar, mas sempre fui sua.

— Mas você realmente os amava.

Concordo.

— Diga-me o que você precisa me dizer, Tobias.

— Essas coisas que penso? Acredite em mim, você não


quer saber.

— Você prometeu. — Há um aviso em minha voz.

— Qual admissão você quer? — Suas sobrancelhas se


franzem em um v profundo. — Que tenho medo de que todos
os dias eu acorde com você, toda vez que eu te foder ou fizer
amor com você, eu vou me sentir culpado. Que a cada dia que
eu viver essa vida com você, vou me odiar um pouco mais.

— Você não pode...

— Quanto mais tento me soltar, mais minha cabeça se


recusa a me deixar. Há tanto que você não sabe. Passei a maior
parte da minha vida sem você. Vivi trinta e um anos sem você,
e meu irmão estava lá, meu irmão, — ele engole, — ele esteve
comigo a maior parte do tempo... não posso seguir em frente.
Dom... — ele engasga com seu nome, e isso parte meu coração.
Ele ainda está sofrendo como se tivesse acabado de perdê-lo.
— Não há como escapar.

— O que você está dizendo?

— Quão diferente tudo isso teria acabado se eu apenas os


tivesse ouvido, porra? — Sua voz está esfarrapada quando ele
fala. — Você tem que pensar sobre isso. Eu sei que você faz.
Sobre o futuro que você teria com um ou os dois se eu não
estivesse no caminho. Me mata que você ainda pense nisso.
Sonhe com isso. Não posso... esse sentimento, Jesus Cristo,
esse ciúme que ainda sinto às vezes. Isso me devora. Vi como
você os amava, e ainda fiz isso, eu fiz isso. Abri meu caminho,
propositalmente, como o homem em sua vida porque é o
quanto eu queria você. Irmãos que se danem, todos que se
danem. E você sabe o que isso fez? Amaldiçoou a todos,
incluindo nós.

Ele levanta o queixo desafiadoramente, e está claro que


seu nêmesis está olhando para ele no reflexo do meu olhar.

— Talvez eu não devesse querer seu perdão. Talvez


precise que você continue a me punir. Porque não mereço o
perdão, Cecelia. É muito errado eu pegar você, enquanto meu
irmão apodrece no chão. — Ele reúne algumas das páginas
espalhadas do chão com a mão livre e as levanta entre nós. —
Talvez eu odeie isso, — ele esmaga as páginas na mão, —
porque é a verdade.

— Você terminou?
— Sim. — Ele balança a cabeça. — Quero te dar uma
história melhor. Só queria poder te dar um homem melhor.
Meu irmão era o melhor homem.

— Tobias...

— Apenas me diga se eu cheguei tarde demais, diga-me a


verdade.

— A verdade? Tudo o bem, admitindo a verdade me pegou


com você antes, — estalo.

— Isso me trouxe aqui! — Ele ruge. — Isso me trouxe


aqui. Mas quero o feio, Cecelia. Preciso disso. Porra, me diga,
então pelo menos eu sei onde estou com você.

— Você nunca lidou bem com a honestidade, Tobias.

— Preciso disso!

— Você está bêbado.

— Estou miserável! Você me chamou por ser um covarde.


Olha quem fala, Cecelia. Pare de se afastar disso.

— Você é imperdoavelmente egoísta! É isso que você quer


ouvir? E talvez eu não queira te perdoar pelos anos que passei
chorando por você, sonhando com você, ou pelo inferno que
suportei oito meses atrás, implorando para você ver o que era
tão claro para nós dois. Você me mandou embora para aliviar
sua própria culpa, dor e medos, nunca levando em
consideração o quanto sofri sozinha – ou se você sofreu – não
foi o suficiente para evitar que você me machucasse
novamente. Se você é imperdoável, é por isso. E o que você está
fazendo agora é igualmente egoísta.

— Eu sei disso, Cecelia, mas não existem palavras


mágicas. Não há gestos grandiosos ou ações boas o suficiente
para compensar o que fiz a ele, a você, a Sean. Não consegui
descobrir como contornar isso então para voltar para você, e
não consigo descobrir agora. Então, talvez precise que você
continue me punindo, — ele engasga. — Talvez seja a única
maneira de ser capaz de viver comigo mesmo. Vou suportar
isso todos os dias pelo resto da porra da minha vida só para
estar com você. Eu farei qualquer coisa, — ele engasga
novamente, — e podemos brincar sobre essa situação, mas
isso é realmente um inferno para mim. Eu te amo, Cecelia, mas
dói pra caralho. — Seus olhos caem e ele solta um suspiro
derrotado. Procurar as palavras que acabou de confessar não
faz diferença. Inevitavelmente não consigo enquanto ele abaixa
os olhos e estuda as costas da minha mão, acariciando o
polegar ao longo da minha pele antes de pressionar os lábios
nele. — Você vai trancar a porta três vezes se eu for dormir?

— Sim.

O alívio cai em seus ombros quando ele afunda de volta


no armário e solta as páginas, que se espalham pelo chão.

— Obrigado. — Ele começa a desmaiar, a cabeça


balançando, enquanto ele desliza ainda mais para baixo na
porta.
— Tobias, — cutuco-o, e seus olhos se abrem brevemente
antes de perderem o foco. — Oh não, você não. Meu Deus, seu
francês desgraçado louco, pelo menos me ajude a levá-lo para
a cama.

Depois de muito esforço, entre passos em coma, alguns


vômitos assustadores e um francês ininteligível, consigo
colocá-lo de bruços na minha cama antes de começar a
consertar minha cozinha.

No caminho de volta do quarto, vejo o novo tabuleiro de


xadrez na sala de estar ao lado da lareira. Dezenas de rosas
em diferentes tons estão dispostas em vasos e potes. Suas
intenções para nossa noite são claras. Ele nos quer de volta. E
a verdade dolorosa na minha garganta me diz que o sentimento
é mútuo, mas depois de tantos anos separados – de certa
forma, uma vida inteira – ainda não consigo me abrir
completamente depois da maneira como ele me deixou sair tão
facilmente da última vez que nós partimos. Pairando sobre o
tabuleiro, inspeciono as novas peças, o conjunto quase
idêntico ao de meu pai. Colocando o rei de volta no lugar, com
o coração pesado, faço meu caminho para a cozinha.

Estou na metade da limpeza quando Beau reclama para


ser libertado. É quando abro a porta dos fundos que minha
respiração para e meu coração pula fora. Penduradas no alto
do meu jardim estão luzes intrincadamente tecidas no jardim
e protegidas por postes de madeira. E elas não são quaisquer
luzes. Elas brilham e escurecem, um brilho inconfundível em
um verde-amarelado claro.
Vagalumes.

Sua tentativa de recriar nosso lugar sagrado.

Em algum lugar entre seus pensamentos acelerados, o


último gole de seu gim, muitos copos de Louis Latour e sua
leitura de The Thorn Birds, seus planos para um encontro
noturno foram por água abaixo. Um livro que entretive por
muito tempo e que pensei que se assemelhava à minha vida e
ao nosso relacionamento. Mas ele está certo, não é nossa
história, e pela primeira vez desde que ele voltou, abro meu
coração necessitado para a possibilidade de podermos escrever
uma melhor.

A visão das luzes cintilantes sob um céu estrelado me


enche de esperança. Embora tenhamos apenas arranhado a
superfície de nossos problemas, a verdade é que fomos
cortados, nossas páginas não escritas arrancadas de nós antes
mesmo de termos a chance de vivê-las.

Apesar de nossas perdas, ele ainda acredita nisso, em


nós, na magia, porque implorei a ele.

O resto de seu sentimento soa claro enquanto as lágrimas


enchem meus olhos. Saio ainda mais na noite gelada e imagino
meu primeiro sonho. Um sonho que há muito tempo proíbe
meu coração de imaginar, o bater das ondas do mar em nossos
pés enquanto caminhamos pela costa, seguros, em um lugar
distante que posso imaginar com tanta clareza porque já o vi.
É então que finalmente respondo sua pergunta em voz alta.
— É possível, Tobias. É possível.

Depois de conduzir Beau para dentro, e com uma última


olhada nas luzes, fecho a porta e viro a fechadura três vezes.
Vinte e quatro anos

O eco de um motor detestável seguido pelo revelador


'foda-se' de buzinas soam enquanto Dom passa zunindo pelo
terminal. Consigo sufocar meu sorriso inicial com uma
carranca assim que o carro muscular elegante aparece. Ele
passou quase dois anos restaurando-o da moldura. Ele
derrapou até parar a um pé de distância, suas janelas escuras
abertas, um sorriso ameaçador firmemente no lugar. A
agitação foge apenas de colocar os olhos nele, pego minha
mochila na calçada e ele levanta a mão antes de levantar um
cartaz que diz Giorgio Armani.

— Hilário, — estalo, — e você está vinte minutos atrasado.


— Saio do meio-fio e abro a porta do passageiro, jogando minha
mochila entre nós antes de deslizar e inspecionar o interior,
incapaz de esconder o quão impressionado estou.

— Isso parece... incrível.

O orgulho brilha em seus olhos com a minha reação.


— Acabei de pegar na oficina de pintura. É por isso que
estou atrasado. Você é o primeiro passageiro. Me certifiquei
disso.

Segurando sua nuca, o puxo para mim e pressiono minha


testa na dele.

— MIT. Estou muito orgulhoso de você, irmãozinho. —


Um sorriso raro, mas amplo, surge em seu rosto enquanto ele
se afunda no contato brevemente antes de se afastar.

— Leio muitos livros. Eles me tornaram inteligente.

Retribuo seu sorriso.

— Você se lembra daquela conversa?

— Me lembro de tudo.

— Ainda estou chateado por saber que você foi aceito por
Sean. — Como eu, Dom mantém suas cartas perto de seu
peito, mostrando-as apenas quando sua mão é forçada, um
problema que discutimos mais de uma vez, mas ele é feito do
mesmo tecido.

— Não é um grande negócio.

— Concordo em discordar.

Ele se endireita no assento antes de se afastar do meio-


fio, interrompendo um táxi no processo. Balanço minha cabeça
em sua risada profunda.

— Você terá essa merda apreendida em uma semana.


— Sean prevê dias.

— Meu dinheiro está com ele.

Ele olha na minha direção, seu cabelo escuro se


espalhando com o vento de verão.

— Quem diabos você está tentando impressionar com


esses ternos caros, afinal?

— Isso se chama ser adulto. Você deveria tentar algum


dia.

— Não temos permissão para usar ternos, suas regras.

E essa é a verdade porque vestir bandidos com ternos é


uma tradição ultrapassada que pode inspirar respeito – mas
também chama a atenção. É um uniforme para homens de
uma raça diferente com uma agenda completamente separada.
Não somos bandidos de merda ou algo parecido com essa raça,
apesar do fato de que temos que fazer movimentos de bandidos
regularmente. Nossos motivos são totalmente diferentes. Meus
negócios corporativos me dão uma desculpa para me vestir da
maneira que quiser, e isso é parte da minha ilusão.

— Você estaria perdido sem suas botinhas pretas, — digo,


— e tenho algo melhor em mente.

Ele levanta uma sobrancelha, desligando outro carro


enquanto muda de marcha e pisa no acelerador.

— O que você está pensando?


— Você saberá em breve.

— Você vai passar o resto do verão aqui? — A elevação


esperançosa de sua voz rasga meu peito.

— Aposte nisso.

— Bom, porque em três meses, estarei no meu próprio


país estrangeiro, — murmura.

— Boston não é um país estrangeiro.

— É para mim, — ele diz contemplativamente. — Nunca


saí de Triple Falls.

A verdade disso me corrói – mas ele era necessário aqui –


e acho que seu ressentimento está desaparecendo porque ele
sabe que é a verdade. Sem ele, não teríamos chegado tão longe
tão rápido. Ele parece ler meus pensamentos.

— Posso pular, — ele oferece facilmente, muito


facilmente. — Você sabe que posso. A mensalidade é cara e...

— Não. Quanto mais tempo você ficar em Triple Falls,


mais permanecerá um pensador de cidade pequena. A escola
é um ponto de salto para você, vai ser desconfortável no
começo, mas vai te fazer bem e, no fundo, você quer ir. Sean
sobreviverá sem você por alguns anos. E não se preocupe com
a mensalidade, deixe isso comigo.

Ele dá uma pequena inclinação de seu queixo.

— Olhe para mim, Dom.


Seus olhos cortaram da estrada para mim.

— É a sua vez.

Um breve lampejo de antecipação ilumina seus olhos


antes que ele os leve de volta para a estrada.

— Enquanto você está lá, você relaxa em seu trabalho de


meio período, e isso é uma merda de ordem.

— Estou sendo inteligente sobre isso. E tenho que


admitir, — um lado de sua boca se levanta, — o que estamos
fazendo é bom. É uma correria.

— O melhor tipo, — concordo, meus próprios lábios


levantando. — Basta puxar um pouco, para que você possa se
concentrar.

— Aye Aye capitão. — Ele me dá uma saudação simulada.


— Como foi Paris?

— Nada de novo.

Dom pisa no Camaro assim que estivamos na rodovia,


colocando cada bit de potência sob o capô para funcionar.
Mantenho a reprimenda paternal dançando na ponta da minha
língua e o condeno, curtindo o passeio como seu irmão. No ano
passado, como morei em Triple Falls com mais frequência,
aproximamo-nos, fortalecendo o clube enquanto colocamos
nossa estratégia em movimento.

Como Sean e Tyler, Dom se tornou dono de si, talvez mais


do que os outros dois, um homem que respeito e admiro. O
fato de ainda ter de voltar à França a cada seis semanas para
saciar Antoine e mantê-lo sob controle me irrita, mas tenho
meus próprios motivos para estar lá. Nosso primeiro capítulo
internacional continua a crescer com a adição de alguns
parentes que consegui encontrar e que provaram seu valor.

E os negócios da Exodus estão crescendo.

Estudando o perfil do meu irmão, fico impressionado com


a mudança em sua constituição, nenhum vestígio do menino
que estava com medo de catapora. Ele se tornou ainda mais
ousado, destemido, astuto e arrogante a um ponto que agora é
um traço arraigado. Ele sabe exatamente quem é, e isso me
enche de orgulho, porque quando eu tinha a idade dele, lutava
com um pequeno dilema de identidade. Ele sente meu olhar
vigilante sobre ele e olha na minha direção, sua próxima
pergunta mais como uma exigência.

— Fale-me sobre a França.

— Nada para contar. Não fique curioso. E não perca seu


tempo.

— O que ele tem sobre você? — É um assunto que ele


abordou mais de uma vez e que me recusei a abordar. Mas
tenho que dar algo a ele, ou ele não vai me esquecer.

— Minha juventude. Ele não é nada além de um recurso,


um do qual podemos precisar no futuro. Eu o tenho sob
controle, mas deixe-me deixar claro, meu negócio com ele não
tem nada a ver conosco. Nem porra nenhuma. É minha merda
para lidar, não sua. Se você entrar em ação, vamos ter um
problema sério de merda. Deixe isso pra lá.

As narinas de Dom dilatam conforme os segundos


passam, e odeio que já estejamos em desacordo. Mas entendo
por que ele não desiste, e eu seria tão inflexível se achasse que
há alguma ameaça para ele. Ele quer ficar comigo, mas me
recuso a deixar que ele cuide disso. Relaxo na minha cadeira,
mudando de assunto, porque não quero que ele saiba o quanto
essa aposta particular pesa sobre mim. Antoine está se
tornando mais previsível a esta altura, o que torna sua
presença em minha vida menos preocupante.

— Qual é o plano para esta noite?

Ele faz uma careta e olha para mim.

— O que?

— Sean e eu temos planos.

— Com quem?

— Essa garota que estamos vendo...

— Uma porra de garota?

— Nós a tratamos bem.

— Você realmente gostou dessa merda?

Sua mandíbula aperta e sei que nunca vamos concordar


com isso. Ele é um animal diferente quando se trata de
mulheres. Para mim, elas são uma fuga, um refúgio de curto
prazo. Para ele, não tenho certeza do que são. Mas tenho a
impressão de que são brinquedos, e não foi assim que o criei
para pensar.

— Faça seu trabalho, irmão, mas guarde minhas


palavras, você provavelmente vai se arrepender um dia. O que
está acontecendo com Tyler?

— Jarhead está dirigindo hoje à noite para enforcar.


Temos sorte que ele está estacionado tão perto.

— Sim, nós vamos, mas não preciso de uma babá


enquanto você vai buscar uma boceta.

Ele sorri.

— O que você vai fazer?

— Vou me encontrar com Eddie em um bar no centro.


Vamos verificar a etiqueta de preço.

— Novo clube?

— Algo parecido.

Ele balança a cabeça.

— Só trabalho, sem diversão. Você é muito chato. Talvez


seja a hora de você encontrar uma Helen para você.

Trocamos um longo olhar.

— Nenhuma Helen existe para mim.

Ele encolhe os ombros.


— Se você diz. Então o que vem depois?

— Compramos Boardwalk e Park Place e qualquer outra


propriedade que Roman ainda não tenha reivindicado. É hora
de investir em alguns imóveis.

— Estamos realmente fazendo isso, — Dom fala com


entusiasmo incontido, deixando sua máscara escorregar
brevemente. Nos últimos anos, ele adaptou um ar sobre ele que
é ao mesmo tempo intimidador e reservado, embora necessário
para nosso propósito.

— Estamos fazendo isso, — concordo, satisfação


crescendo em meu peito. — Apenas certifique-se de que você,
Tyler e Sean estejam livres à meia-noite.

— O que faremos à meia-noite?

O zumbido da pistola de tatuagem começa novamente


quando Tyler tira a camisa e se senta na cadeira ao lado de
Sean. Dom vai até onde estou sentado, com o braço coberto de
uma pomada leve, as penas com tinta escura alinhadas com
manchas de sangue através do invólucro transparente. Ele,
junto com Sean e Tyler, pediram uma tinta extra pesada. Uma
contração de sorriso aparece em seus lábios enquanto ele olha
para o braço com orgulho evidente. — Você pode ficar com as
gravatas de seda, irmão, com isso eu posso trabalhar. — Ele
sorri, seus olhos rolando sobre meu novo terno. — É uma pena
que você não possa participar...
— Tobias, você está acordado, cara, — Jimmy, o dono da
loja diz, acenando para a mesa de espera que ele acabou de
limpar. Dom me segue enquanto tiro meu paletó e afrouxo
minha gravata.

— A tinta não é desaprovada no clube de campo? — Dom


pergunta enquanto desabotoo minha camisa e começo a abri-
la. Jimmy pendura o esboço na frente de nós dois sob uma
lâmpada de mesa, e o examino cuidadosamente antes de
assentir em aprovação e responder a Dom.

— Só se eles puderem ver. E odeio golfe.

Ele estuda cuidadosamente o corvo, as asas estendidas,


sua expressão iluminada escurecendo visivelmente enquanto
ele examina a tatuagem distintamente diferente. Para qualquer
outro Raven, seria mal interpretado como hierarquia – uma
indicação da minha posição na hierarquia – mas Dom é muito
esperto e sabe que o ego não tem nada a ver com isso. Eu
esperava que pudesse passar essa parte dele até que todos nós
terminássemos de ser marcados.

Temendo o inevitável, xinguei baixinho quando Sean e


Tyler sentiram a mudança no ar e pararam de conversar,
voltando sua atenção para nós dois quando Dom começou a se
arrepiar de raiva.

— Não comece, — estalo para Dom em advertência


quando ele começa a andar na minha frente.
— Isso vai ser sua tinta, cara? — Tyler pergunta, olhando
o contorno. — É foda doce.

— É incriminador pra caralho, é o que é, — Dom diz,


recusando-se a recuar. Tyler e Sean olham para mim com as
sobrancelhas levantadas enquanto me dirijo ao meu irmão.

— Isso não é motivo de debate.

Dom balança a cabeça com firmeza.

— De jeito nenhum, irmão, estamos nisso juntos.

Suspirando, levanto meu queixo para os dois caras


passando tinta em Sean e Tyler, e o zumbido para pouco antes
de eles limparem a sala para sair da frente. Quando os dois
acenderam os cigarros nas mãos e estão em segurança do
outro lado da porta, Sean se move de sua cadeira e acende um,
preparando-se para ficar entre nós se necessário.

— Tudo bem, o que diabos está acontecendo?

O olhar escuro de Dom se estreita em mim enquanto ele


levanta o queixo.

— Acredito que nosso irmão está tentando nos enganar


com este grande gesto.

— Não é engano, — pego a garrafa de Tyler que abrimos


uma hora atrás, quando anunciei nossos planos. — Esta é
uma celebração, irmãozinho, — inclino a boca na direção dele,
— e você está estragando tudo.
— Besteira, — ele responde, a raiva escoando para fora
dele. — Esta é a sua forma de garantir que é você quem paga
a conta.

— Está feito. — Cortei minha mão no ar. — Fim.

— Não é o fim da merda, — Dom balança a cabeça


enquanto Tyler olha de volta para o rascunho da minha
tatuagem em uma tentativa de descobrir. Não demora muito.

— Não, cara, isso é besteira. Se um cair, todos nós


cairemos.

A postura de Sean se curva quando ele também recolhe a


verdade do que está acontecendo e me olha com os mesmos
olhos acusadores.

— Que porra é essa, cara?

— Você projetou desta forma, — Dom rosna. — Tudo isso


foi intencional.

Sem palavras, tomo outro gole da garrafa.

— De quem é o nome que você colocou no bar hoje? —


Ele avisa, recusando-se a deixá-lo ir.

— Meu, — Sean fala, seu tom igualmente acusador, — ele


me chamou para assinar a papelada, e agora Tyler é dono do
terreno para o nosso lugar.

— Recebi a escritura pelo correio na semana passada, —


acrescenta Tyler.
Dom junta tudo em questão de segundos.

— Você está usando o Exodus como fachada e está


colocando todas as empresas legítimas em nosso nome, caso
seja algemado.

— Todas as boas decisões de negócios, — argumento, —


Se alguma coisa acontecer comigo...

— Porra, não, — ele puxa o contorno da minha tatuagem


de onde está. — Isso pode muito bem ser um alvo em suas
costas. Se houver uma investigação, todas as setas apontarão
para você.

— O que faz de você um pato sentado, porra, se


mergulharmos na bolsa errada e extrairmos calor, —
acrescenta Tyler.

— O que também significa que você vai gastar mais tempo


por extorsão, — Sean reúne, fúria clara em seu tom. — É por
isso que você não nos deixou entrar no Exodus.

Tyler fala a seguir.

— De jeito nenhum, irmão, de jeito nenhum, Tobias.


Tomamos essas decisões juntos.

— Exceto esse que ele nos manteve fora porque sabia que
nunca concordaríamos, — acrescenta Sean, sua fúria
aparente.

— Está feito, — estalo. — Então, não há por que discutir.


— Foda-se isso. Você não pode se martirizar. — Dom
refuta, seu tom letal. Ele odeia não estar por dentro, mas
principalmente, ele odeia não ter descoberto isso antes. — Se
estragarmos tudo, cairemos juntos, — declara ele com firmeza.

— Não foi assim que projetamos isso, e você sabe disso,


— o lembro. — E você precisa se lembrar que temos o sustento
de outras pessoas dependendo de nós. — Olho para o meu
irmão. — Não esqueci como é a sensação de fome, e você? —
Meu argumento o atordoa em silêncio, e eu cubro, com a
intenção de fazer meu ponto. — Temos que ser espertos sobre
isso, as coisas estão prestes a começar e precisamos estar
preparados para tudo.

— Filho da puta! — Dom explode, virando uma bandeja


de tinta enquanto não posso evitar meu sorriso.

— Você vai ter que trabalhar mais duro para ficar um


passo à minha frente, irmão. Você ainda não chegou lá. — Olho
entre eles, meu olhar demorando por alguns segundos em cada
um deles. — E tudo isso é especulação. Apenas façam seu
trabalho, mantenham suas cabeças no jogo e não estraguem
tudo.

O gim começa a me aquecer, o leve zumbido levantando


meus lábios enquanto eles se olham.

— Beba uma droga e pare de ficar de mau humor como


se eu tivesse acabado de dizer que Papai Noel não é real.
— Ele não é? — Sean brinca, mas o discurso é sem brilho
e ninguém ri.

Decido não os mimar. Esses dias acabaram há muito.

— Eu confio em vocês, — digo enfaticamente, e todos os


três voltam seus olhos baixos para mim. Sei que essa
declaração é tão importante para eles quanto para mim. —
Então, não me decepcionem. — Levanto meu queixo em
direção às duas tintas à espera, e elas apagam seus cigarros
antes de voltarem para dentro. Não olho para os três enquanto
tomo meu lugar na mesa. Esta noite é para comemorar, e não
vou permitir que o medo deles destrua a fé que tenho neles.
Nada além de alegria corre através de mim quando a arma
zumbe para a vida, e sinto a primeira picada das agulhas na
minha pele.

Minutos depois, a música aumentou, o clima melhorou


quando eles passaram a garrafa e retomamos nossa
celebração.

Nós terminamos o último deles amontoados ao redor do


fogo, bêbados, com o futuro zumbindo pesadamente entre nós.
Olho para cada um deles enquanto a noção familiar vem sobre
mim. Atinge com força, os cabelos da minha nuca que se
arrepiam, apesar do meu estado de embriaguez, e com sua
chegada vem o conhecimento de que estamos exatamente onde
deveríamos estar. É hora de dar o primeiro passo.

Já está a muito tempo vindo.


Mas, pela primeira vez em anos, cercado por meus
irmãos, abraço o presente. Quando a conversa começa a
morrer e eles começam a desmaiar um por um, mudo meu
olhar para o céu noturno, a imagem do rebanho que me
inspirou vem à mente. Embora esteja escuro como breu, posso
vê-los claramente, assim que as peças começam a se mover
por conta própria. Voltando-me para a mansão recém-
construída, vejo uma única luz acesa na casa e brevemente me
pergunto que tipo de pensamentos mantêm um homem como
Roman Horner acordado à noite. Em breve, não terei que
imaginar. Peça por peça, vou roubar pedaços de seu reino
debaixo dele até que comece a desmoronar ao seu redor. E
então, e somente então, me revelarei como o ladrão
responsável.

— Estou indo atrás de você, filho da puta, — sussurro


com veemência, jogando outra lenha no fogo assim que a luz
solitária se apaga.

Minha cabeça estilhaça quando a lembrança daquela


noite se desvanece e a pulsação pesada do inferno fresco se
instala. Abrindo um olho, vejo Cecelia dormindo
profundamente ao meu lado e estremecendo com a invasão da
luz da manhã. As unhas de Beau clicam na madeira
anunciando sua entrada no quarto, e ele cutuca a mão que
está pendurada sobre a borda do colchão, chamando sua nova
cadela para acompanhá-lo para seu vazamento matinal.
Movendo-se muito rápido, meu corpo reage, minha cabeça
gritando obscenidades enquanto o conduzo para fora da sala e
pela porta dos fundos para se aliviar. Tremendo com o ataque
de frio, sou acordado por um tapa por um pensamento.

Um passo à frente, Tobias.

O alarme dispara na minha espinha enquanto corro para


dentro e pego os dois telefones antes de ir para o banheiro para
verificar se há mensagens perdidas.

Russell: Novos pássaros no ninho.

A mensagem foi enviada às oito horas da noite passada.


Sinto um leve alívio sabendo que estamos cobertos com os
pássaros treinados de Tyler, especialmente porque eu não
estava de bom juízo. Para mim, confiança cega é muito difícil
de conseguir, mas ao longo dos anos, tenho tentado o meu
melhor para retribuí-la. Ainda assim, com tanto a perder e
voando às cegas, estou na pior posição imaginável. Não estou
mais no controle ou comandando, nem estou ciente de cada
movimento que está sendo feito diariamente, e é quase
impossível para mim lidar com isso dia após dia. Confiança
cega é o que tenho que continuar a dar para poder navegar no
meu caminho com Cecelia. Mas agora? Não tenho certeza se
sou capaz. Especialmente se Antoine está planejando fazer um
movimento. Só não tenho certeza de qual seria seu motivo ou
quais são suas intenções, a não ser para ficar de olho em mim.
Mas se ele se deu ao trabalho de enviar alguém – em vez de
uma porra de um telefonema – as chances estão se formando.

Batendo em um feed de texto separado no meu pré-pago,


vejo uma mensagem de um dos dois pássaros que chutei para
o meio-fio depois da minha corrida ontem.

Oz: Ele está trabalhando sozinho. Ele veio relatar e nada


mais.

Você tem certeza?

Oz: Positivo. Ele nos mostrou seu itinerário e nós o


comparamos com todos os passageiros do voo e todos os outros
dias após sua chegada. Até agora, está tudo certo. Estamos
vasculhando as calçadas agora.

Espere por notícias minhas.

Oz: Ok

Furioso comigo mesmo por ter deixado minhas emoções


e nervos tomarem conta de mim ontem a ponto de me
embriagar até desmaiar; troco de telefone para ver a demanda
por um relatório sobre o celular do idiota. Estou aliviado
quando vejo que a mensagem foi enviada há apenas alguns
minutos. O pedido curto e direto ao ponto.

Quelle est la situação?

Imito o texto anterior.


Pas de changement. Sem mudanças.

A ansiedade me atravessa enquanto faço a porra do


telefone disparar com uma resposta. Uma resposta que me
garantirá mais tempo para controle de danos com Cecelia.

A adrenalina aumenta, espero com a porra da respiração


suspensa e vejo que o tempo de resposta de Antoine variou de
uma hora a cinco. É muito cedo para dizer se Antoine está
atrás de mim, então mando uma mensagem para Tyler.

Quero dois pássaros no ar. Agora.

Sua resposta é imediata.

Tyler: Já está. Precisa conversar?

Eu aviso você.

Amaldiçoando a situação e a porra do desastre que fiz na


noite do encontro, convoco Beau de volta para a casa antes de
rastejar pelo quarto e fechar suavemente a porta do banheiro.
Depois de uma breve inspeção com os olhos injetados de
sangue, lavo o rosto, escovo os dentes e enxáguo a boca antes
de engolir um par de Tylenol do armário de remédios. A
realidade da noite passada bate em mim quando dou uma
última olhada no espelho.

— Corra por sua vida, Tesor.

Telefones em minhas mãos, silenciosamente abro a porta


e coloco os dois em minha mochila antes de voltar para a cama.
Cecelia se mexe levemente com a queda do meu peso, e exalo
lentamente um suspiro de alívio quando consigo voltar sem
acordá-la.

Ela dormiu hoje de propósito. Estou meio aliviado, meio


apavorado porque não consigo me lembrar de muita coisa além
de terminar o livro e esvaziar a garrafa mais próxima.

Breves imagens passam pela minha mente do que


aconteceu depois daquele gole fatal e um pouco do vômito
verbal que vomitei. Tenho certeza de que, no mínimo, um
pedido de desculpas é necessário.

Ela viu as luzes? As chances estão com Senhor Mijão, ela


fez ontem à noite.

Felizmente, foi algum consolo para o idiota completo que


fiz de mim mesmo. Mas a conheço e conheço seu coração. O
que não sei é se esse coração tem mais perdão para mim neste
momento, especialmente agora. Convidei-a para sair e ela
voltou para casa para um show de merda. Coberto com ele,
olho para ela antes de afastar suavemente o cabelo de seu rosto
para uma melhor visão. Sem marcas de lágrimas evidentes,
sem olhos inchados e, por isso, sou grato. Tenho certeza de
que ainda cheiro a gim e desespero, mas não quero perder sua
reação a mim quando ela finalmente acordar. Isso vai me dizer
tudo que preciso saber. Não tenho que esperar muito porque
um minuto depois de acariciá-la, ela sorri para mim antes de
seus olhos se abrirem.

Obrigado, Cristo.
— Como você está se sentindo?

Desenho minhas sobrancelhas.

— Como se corresse uma maratona enquanto tomava gim


e vinho intravenoso.

Seu sorriso cada vez mais profundo apaga ainda mais


minha ansiedade.

— Praticamente o que aconteceu.

— Sinto muito. Eu quero dizer...

Ela cobre minha boca com a mão.

— Você se desculpou muito. Gritou muito. Revelou muito.


E descarregou muita dessa bagagem. Infelizmente, — ela
franze os lábios inchados de sono, — você não sabe como
destrancar suas malas. — Franzindo a testa com preocupação,
ela levanta a mão para a minha cabeça latejante antes de
passar suavemente os dedos pelo meu cabelo. — Você se
lembra de alguma coisa?

— Algumas.

— Bem, para começar, você deu uma crítica negativa ao


livro, — diz ela, sua risada suave ecoando no quarto.

Estremeço, principalmente pela dor na minha cabeça, e


pela humilhação.

— Eu tinha um plano e parece que não sou muito bom


em executá-lo atualmente.
— Bem, você está de férias, — ela encosta o queixo no
travesseiro, aproximando-se de mim, e estou grato por ter
escovado os dentes. Gin fazia gotas de suor na minha têmpora
enquanto tento o meu melhor para lembrar os detalhes do meu
blecaute.

— Perdoe-me, Tesor. Eu não re...

Seu sorriso completo rouba meu discurso.

— Lembra que sua perna fez sexo com Beau e você está
grávida de quatro a seis semanas?

Coloco o rosto no travesseiro, viro para ela e sorrio,


abrindo um olho. Ela passa os dedos pelo meu cabelo
emaranhado e coberto de farinha, e descanso ao toque, uma
esperança acendendo em mim que estava morrendo de fome.

Seus olhos fazem uma varredura lenta no meu rosto


antes de seu tom se transformar em um de preocupação.

— Você foi brutalmente honesto.

— Não sei como consertar as coisas.

—Vi o esforço que você fez enquanto eu limpava minha


cozinha destruída. — Ela arregala os olhos. — Chega de
cozinhar bêbado, ok?

— Você deveria ter me deixado limpar. Me perdoe?


— Para a noite passada, vou considerar isso, — ela passa
a mão pelo meu bíceps e braço antes de apertar minha mão e
enredar nossos dedos. — As luzes, Tobias, são lindas.

— Não queria que você as visse sozinha.

— Eu acho que eu precisava.

— Significa?

— Significa, eu precisava ver por mim mesma o que você


não me disse em todos os anos que estivemos separados. Você
é... muito para lidar em uma sala às vezes. Não quero dizer
isso de uma maneira ruim, mas você está me distraindo. E sua
culpa... está comendo você vivo. Já se passaram anos, Tobias.
Você não fez as pazes com nada disso?

— Com Roman, tudo isso, sim, mas com... todo o resto,


não, — fecho meus olhos. — Não sei como impedir.

— Nós vamos superar isso, — ela move sua metade


superior para me cobrir, e se não fosse pela minha cabeça
latejante, estaria muito ansioso para tentar fazer amor com ela
até que ela se esquecesse da bunda que eu era noite passada
e se lembra do homem controlado que ela conheceu. O homem
capaz de se conduzir.

— Je suis un putain d'idiot, — murmuro, mordendo o


lábio.

— Meu idiota, — ela agarra meu queixo e usa o polegar


para puxá-lo dos meus dentes. Pela primeira vez desde que
voltei para ela, ela inicia um beijo. Com o coração disparado,
seguro a parte de trás de sua cabeça e agarro, mantendo-a
perto, e a beijo de volta em meio ao protesto em minha cabeça
gritando.

— Tobias, — ela geme contra meus lábios, e tenho uma


visão de flanela rasgando, de mais gemidos, de enterrar meu
pau dentro dela.

Mudando para pairar acima dela, vejo a única coisa que


preciso desesperadamente em seus olhos, permissão.

Foda-se a dor de cabeça.

Com o peito estalando, reclamo seus lábios e agarro seu


cabelo, inclinando sua cabeça e mergulhando minha língua
profundamente em sua boca. Nosso beijo chamusca a nós dois
e começamos a andar. De repente, entrego-me a cada parte de
mim, com a liberdade que não tenho há anos quando começo
a tocá-la, saborear seu pescoço, inalar seu perfume, entregar-
me e me perder nela enquanto arrasto gemidos e respirações
rápidas dos lábios dela.

— Porra, senti sua falta, — murmuro, levantando a


bainha de seu top de flanela com uma mão ansiosa, assim
como Beau late, seu alerta nos separando quando o som de
um motor se aproximando para todos os nossos movimentos.
Cecelia olha para mim e franze a testa.

— Esperando alguém? — Pergunto, pronto para matar


quem está nos interrompendo enquanto meu pau chora na
minha boxer. Não há nenhuma fodida maneira de alguém
chegar tão perto da nossa porta sem os meus pássaros
perceberem. Quem quer que seja, eles já foram examinados e
identificados se conseguiram entrar na garagem. Tenho certeza
de que há um texto esperando com um anúncio de chegada.

Pairando sobre ela, com o pulso martelando, os quadris


ainda moendo, faço uma pergunta esperançosa enquanto ela
engasga com o atrito.

— Carteiro? — Pergunto, e ela balança a cabeça.

— Funciona à tarde.

Gemendo de frustração, pulo dela e pego minha Glock.


No momento em que estou armado, ela já tem sua Beretta,
perdendo o golpe da minha mão para bloqueá-la enquanto a
persigo, puxando minha calça de moletom, tropeçando atrás
dela.

— Maldição, Cecelia!

— Calma, francês, — ela grita enquanto se dirige para a


sala de estar.

Estou a meio caminho de onde ela está na entrada


quando ela se afasta da janela e corre em minha direção,
empalidecendo a cada passo. Alarmado, eu a alcanço para
colocá-la atrás de mim, e ela para a um pé de distância antes
de apontar sua arma para mim. Agarrando-a, e sabendo que
ela está ciente de quem está em sua garagem, procuro seu
rosto enquanto o alarme é drenado e a preocupação entra em
ação.

— O que há de errado?

— Vá tomar banho, ok? Vou me livrar deles e depois


vamos tomar café.

— Livrar-se de quem?

— Tobias, por favor, deixe-me cuidar disso.

Movo-me para andar em torno dela quando uma porta


abre e fecha, e o pânico floresce totalmente em seu rosto.

— Por favor! — Ela implora, pulando na minha frente e


colocando a mão no meu peito. — Tobias, deixe-me cuidar
disso. Por favor.

O ciúme se insinua e estreito meus olhos.

— Que. Porra. É. Isto. Cecelia?

Ela torce as mãos na frente dela como uma adolescente.

— Tobias, quando você chegou aqui, esqueci


completamente disso. Fizemos planos há muito tempo.
Escapou da minha mente.

—Tenho uma mensagem esperando que vai me dizer


exatamente quem é, e não vou me mover até que eu saiba,
então fale.

Ela levanta os olhos aterrorizados para os meus.


— É minha mãe.
Atordoado brevemente com sua admissão, Cecelia salta
para a ação antes que me recomponha a tempo de impedi-la
de surtar. Em segundos, ela desliza para fora da porta da
frente enquanto me esforço para largar as armas e me vestir.
Correndo para o quarto, coloco-as na mochila, sem me
preocupar em verificar meu celular, um descuido que não vou
repetir. Era imprudente e descuidado ignorar qualquer aviso
em potencial. Depois de puxar um moletom, enfio em meus
tênis antes de voltar na direção em que Cecelia fugiu. No
momento em que limpo a varanda da frente com Beau
choramingando, sou capaz de ouvir palavras trocadas
duramente de uma conversa abafada na parte de trás de um
enorme trailer.

— Mãe, por favor, vá, ok. Te ligo e explico mais tarde.

— Você está sendo ridícula. Acabamos de chegar aqui, e


você sabe que viríamos há meses. O que mudou?

— Tudo, mãe. Por favor, vá e ligo para você. — Seu apelo


é para mim, para me proteger, o que só faz crescer o meu amor
por ela.
— Isso não é necessário, — falo, aparecendo, colocando
os olhos em ambas as mulheres enquanto elas se voltam para
mim com a boca aberta.

— Tobias, — Cecelia diz tristemente, seus olhos fechando


como a protuberância de sua mãe.

Só por reação, é fácil ver que Cecelia nunca contou a ela


sobre nós, pois sua mãe empalidece rapidamente, seus olhos
se lançando freneticamente entre nós.

Sempre presumi que Cecelia guardava nossos segredos –


mesmo daqueles mais próximos a ela – e a prova está parada
na minha frente, parecendo prestes a desmaiar. Cecelia
manteve seu envolvimento comigo de sua mãe, mesmo depois
de seu confronto com ela, oito meses atrás. Nunca perguntei a
ela os detalhes porque estava muito ocupado tentando aceitar
seu adeus.

Cecelia olha para mim, puro pânico em seus olhos ao me


ver indo cumprimentar sua mãe.

— Olá, Diane, — digo, avançando lentamente enquanto


ela dá uma longa olhada em sua filha antes de levantar os
olhos mortificados para mim.

— Isso é o que você tem escondido por tanto tempo?

Não é tanto uma questão neste momento, mas a verdade


disso a deixou de lado. Cecelia tenta me impedir de alcançá-la,
mas pego as mãos que pretendia me subjugar e aperto-as para
me tranquilizar.
— Tobias, pedi a ela para sair.

Timothy, um namorado sobre o qual só li em e-mails


informativos, sai do trailer olhando entre nós três, seus olhos
voltando para mim. É estranho como acompanhei todas essas
pessoas ao longo dos anos, sentindo como se as conhecesse, e
até certo ponto, as conheço.

Diane se vira para Timothy, sua voz tremendo de medo.

— Timothy, querido, você pode pegar um pacote de


cigarros da mala? Estou fora.

— Não antes de dar um abraço nesta pequena senhora.


— Ele caminha até onde estamos e puxa Cecelia em seus
braços antes de virar os olhos curiosos para mim. — Olá, sou
o Tim.

— Tobias King, —rebato, estendendo minha mão.


Liberando Cecelia, ele a pega e sacode ansiosamente.

— Então, estou assumindo que o Sr. King é o que a


impediu de responder às nossas ligações na noite passada? —
Timothy pergunta a Cecelia, exibindo um sorriso sem noção.

— Tim, por favor, meus cigarros, — Diane grunhe, seus


olhos grudados em mim.

— Tudo bem, querida, — ele me dá um olhar de 'mulher'


antes de sair para cumprir suas ordens.
— Eu esqueci, — Cecelia diz, puxando minha atenção de
volta para ela. — Eu juro, Tobias, isso me escapou totalmente.
Sinto muito.

— Está tudo bem, Tesor, — sussurro sinceramente, antes


de dar um beijo em sua têmpora. Eu a evito para alcançar
Diane, que agora está visivelmente tremendo.

— Já faz muito tempo, — digo baixinho enquanto Diane


raspa o lábio com os dentes, os olhos brilhando de medo.

— Quis entrar em contato tantas vezes desde aquele dia.

Aceno enquanto Cecelia intercepta.

— Você a conheceu? Você conheceu minha mãe?


Quando?

— Eu tinha onze anos. Dom teve catapora e ela me deu


uma carona até a farmácia. — Me viro para Cecelia. — Ela
estava grávida de você. Ela quase chamou você de Leann. —
Levanto meus olhos para Diane. — Acho que tive alguma
influência nisso?

Diane acena com a cabeça, uma lágrima solitária e


culpada deslizando por seu rosto.

— Você nunca me contou, — Cecelia grasna. A mágoa em


seu tom me faz tentar controlar os danos de ambos.

— Não tive a chance, quando... aquele dia no meu


escritório antes de você sair, — ofereço, para indicar a que dia
estou me referindo. — Nunca chegamos tão longe na
discussão. — E esses detalhes e revelações não importavam,
porra, porque ela estava se livrando de mim para sempre. Havia
muita coisa não dita entre nós então, como agora. E devido à
nossa própria merda, não pude explicar muito mais.

Cecelia pondera sobre a última bomba lançada e se volta


para a mãe em questão.

— E você não me disse que você o conheceu, tampouco.

Diane olha para mim da maneira mais enervante, e sinto


os sentimentos ruins passando por ela. Ela é transparente com
seus olhos, suas expressões, muito parecida com sua filha.

— Foi apenas uma vez, e não pensei em mencionar isso,


bem, porque não tinha ideia de que vocês dois eram... Oh,
Deus, — ela passa a mão pelo cabelo castanho curto. — Eu
irei. Nós iremos. Iremos agora mesmo. — Ela me olha por cima
do ombro de Cecelia. — Sinto muito.

— Venha para dentro, — digo, e as cabeças de ambas as


mulheres aparecem em minha direção. A semelhança irreal,
mortificação em ambos os rostos. — Por favor, Diane, entre.

— Peguei — diz Timothy, saindo do trailer com um maço


de cigarros nas mãos. — Quase não consegui encontrá-los
naquela armadilha mortal que você chama de mala, — ele
brinca, lendo as expressões das duas mulheres antes de olhar
para mim para retransmitir.

— Eu poderia comer algumas panquecas e bacon, Tim. E


quanto a você?
Ele tira a minha calma, seus olhos correndo entre mãe e
filha antes de dar um sorriso inquieto.

— Meu tipo de homem.

Olho para Diane enquanto ela estica o pescoço para me


estudar enquanto a levo para dentro de casa.

— Café da manhã?

Ela balança a cabeça, perplexa, enquanto esvaziamos a


porta antes de olhar por cima do ombro para Cecelia.

— Bem, caramba, esta é a melhor xícara de café que já


tomei na minha vida, — comenta Timothy enquanto olha a
imprensa francesa em minhas mãos.

— Tobias é um esnobe por café e ele influenciou isso em


mim, — responde Cecelia, no piloto automático, onde está
diante do fogão. Ela insistiu em cozinhar, mas está entorpecida
desde que começou, lançando olhares cautelosos na minha
direção. Faço o meu melhor para transmitir no meu olhar de
retorno que estou bem com a situação e não vejo nada além de
desculpas em seus olhos. Seu telefone bate no avental no
balcão, chamando sua atenção. Ela o puxa para ler um texto,
olhando para ele por vários segundos antes de começar a
digitar uma resposta.

Tudo o que quero fazer agora é puxá-la para mim e


garantir que estou bem, o que, surpreendentemente, estou.
Muitas vezes me perguntei como me sentiria se algum dia
ficasse cara a cara com a mulher responsável por tornar a mim
e a meu irmão órfãos neste momento de minha vida. É uma
surpresa para mim o pouco ressentimento que sinto por ela,
mas fiz as pazes com isso há muito tempo. Quando olho para
Diane agora, tudo que vejo é a adolescente torturada e grávida
que conheci. Ainda posso me lembrar claramente da
devastação em seu rosto naquele dia e das constantes lágrimas
com que ela lutou durante todo o tempo que estivemos juntos.
Isso, combinado com meu amor por sua filha, impede-me de
abrigar qualquer coisa perigosa. É desconfortável, mas apenas
por causa das duas mulheres vibrando com emoções,
alimentando-se uma da outra.

Diane praticamente se transformou em pedra onde está


sentada, e faço o meu melhor para não deixar meu olhar se
demorar nela, sabendo que ela está tão dividida agora quanto
estava antes. Alguma parte de mim sente necessidade de
confortá-la, mas não tenho ideia de como fazer isso com a
maneira como ela está reagindo a mim. Timothy está
claramente alheio ou fingindo que não vê o elefante vermelho
de dez toneladas na sala enquanto tagarela sobre o tempo e
seu novo trailer.

Acenando com a cabeça de vez em quando, observo


Cecelia de perto, seus ombros tensos enquanto ela envia uma
mensagem. Ela deve chegar ao trabalho a qualquer minuto e
não perdeu um dia desde que cheguei aqui.

— Está tudo bem na Meggie? — Pergunto, e ela acena


com a cabeça sutilmente antes de Tim tentar atrai-la de volta
para a conversa.
— O que você fez neste lugar desde a última vez que
estivemos aqui é incrível, Cecelia.

— Obrigada, — ela responde sem vida, abandonando as


panquecas para digitar uma milha por minuto. A próxima
mensagem que chega mostra ela batendo o telefone contra o
balcão. De pé devido à sua mudança repentina de
comportamento, ando até onde ela está, e ela olha para mim,
me olhando por longos segundos antes de dirigir sua carranca
para sua mãe.

— O que está acontecendo? É a Marissa?

— Está tudo bem, — ela responde com uma mordida


gelada. — Uma das minhas garçonetes não apareceu.

— Você quer que eu vá e ajude?

Ela morde os lábios e balança a cabeça.

— Claro que não. Eles conseguiram. Vá se sentar, — ela


levanta o queixo em direção à mesa. — Eu cuido disso.

— Certo?

— Tobias, — ela suspira enquanto circulo sua cintura por


trás, descansando meu queixo em seu ombro.

— Está certo. Estou bem, — sussurro.

— Bem, não estou bem, — ela sibila, ficando tensa em


meus braços.
Ela pega sua espátula do balcão, virando um bolo
perfeitamente redondo enquanto corro meus dedos ao longo de
seu estômago.

— Olhe para mim, Tesor.

Olhos hostis encontram os meus, e a confusão se instala.


Não consigo fazer uma leitura clara dela. Pressiono minha
testa na dela.

— Isso iria acontecer mais cedo ou mais tarde. — Ela


morde o lábio pensativamente, parecendo finalmente se
concentrar em mim antes de seus olhos suavizarem.

— É pedir muito de você.

— Não, não é. Se você pode me perdoar, tudo é possível,


certo?

Ela me dispensa, puxando-me para fora do meu aperto


com a inclinação acentuada de seu queixo. Seguindo ordens
silenciosas, recupero meu lugar à mesa, confuso sobre o que
está acontecendo dentro dela. Está claro que seu
relacionamento com a mãe está tenso, e nossa presença
combinada aqui não está ajudando.

Timothy engole em seco, seus olhos correndo ao redor


quando ele começa a sentir e se inquietar, mas sendo o homem
que é, ele optou por mentir sobre isso. Depois de outra
tentativa triste dele para quebrar o gelo de trinta centímetros
de espessura, Diane fala.
— Então, quanto tempo? — Ela pergunta em um tom
fraco, chamando minha atenção de Cecelia. — Há quanto
tempo vocês dois estão se vendo?

— Essa é uma pergunta complicada, mas a versão


resumida é que estivemos juntos por um breve período antes
de ela ir para a faculdade e acabamos de ficar juntos três
semanas atrás.

— Complicado, — Cecelia pigarreou, — Eu direi. — Ela


vira uma panqueca, uma cozinheira muito, muito zangada, e
franzo a testa para ela antes que ela se vire para se dirigir a
mim. — Ela não precisa saber. — Ela bate com a espátula e
cruza os braços sobre o peito. Parece que ela está em um
maldito caminho de guerra agora, e nenhum de nós parece
estar seguro. Timothy engole audivelmente, o café a meio
caminho da boca.

— Bem, eu adoraria saber. — Diane retruca, seus olhos


indo de Cecelia para mim.

— Tenho certeza de que sim, — Cecelia rosna, jogando o


leite de volta na geladeira antes de fechá-la.

— O que é importante agora, — aponto, — é que estamos


juntos, para sempre. — Cecelia desliga o fogo, colocando a
última das panquecas em uma travessa antes de colocá-las ao
lado do bacon que espera na mesa.
— Suco de laranja? — Ela late no que parece uma
acusação para nós três, e nós balançamos a cabeça
coletivamente em resposta.

Timothy se intromete, procurando qualquer desculpa


para manter os olhos baixos e a boca cheia. Diane ignora a
comida, olhando entre a filha e eu enquanto me ocupo,
empilhando bolos no meu prato e cavando, na esperança de
aliviar um pouco a agitação no meu estômago. O foco de
Cecelia permanece fixo em mim enquanto ela dá bacon para
Beau.

— Esse bacon é seu, — a repreendo. — Coma.

— Não estou com fome. — Não posso evitar meu sorriso


quando um vislumbre da teimosa de dezenove anos que me
arruinou para todos os outros espia.

— Tesouro…

— Você come, — ela diz antes de seus olhos novamente


amolecerem e dispararem entre mim e sua mãe.

— Por favor, — pergunto, cutucando-a, usando sua


preocupação maternal para mim a meu favor. Ela estreita os
olhos, deixando-me saber que ela está em cima de mim, mas
enfia um pedaço na boca de qualquer maneira.

— Então, presumo que você não venha conosco agora,


por causa da companhia? — Timothy pergunta, agora
antenado com a química à mesa.
— Para onde vocês iriam? — Pergunto enquanto mãe e
filha retomam o olhar fixo.

— Cecelia ia acampar conosco por algumas noites antes


de partirmos para o oeste. Estamos indo para Colorado,
Arizona, Utah e Novo México.

— Vai acertar os quatro cantos?

Tim aponta o garfo para mim.

— Exatamente. Estando em quatro estados ao mesmo


tempo. É o sonho deste campista.

Cecelia já está balançando a cabeça quando olho em sua


direção. Embora dois dias possam me dar tempo suficiente
para controlar minha situação, apenas o pensamento de me
separar dela por qualquer período de tempo me atormenta.
Mas se houver uma chance, essa interrupção pode ser uma
dádiva de Deus se eu conseguir que ela vá.

— Se quiser ir...

Batendo a mão na mesa, ela aponta os talheres na minha


direção.

— Termine essa frase, King, e irei apunhalá-lo com esta


faca de manteiga.

Não posso evitar minha risada.

— Bem, então. — Olho entre eles, — Vocês vão ficar aqui.


Pelo menos esta noite? Não há necessidade de encurtar sua
visita. — Viro-me para Diane, que está focada em Cecelia, seus
olhos brilhando enquanto ela continua lutando com tudo.

— Tobias… — Cecelia começa.

— Estes são seus pais, — digo definitivamente, fazendo o


meu melhor para tornar as coisas mais fáceis para ela, o que
não me ganha nada além de outro olhar mordaz. Franzo a testa
para ela enquanto ela lança seus olhos no meu corpo antes de
levantar seus pulsos um por um e endireitar os punhos de seu
pijama – em ameaça.

Ela sorri quando me vê concluir que sabe exatamente o


que está fazendo comigo com aquela porra de pijama.

O quê. Porra?

Timothy limpa a garganta antes de finalmente comentar


sobre a tensão crescente.

— Se estamos impondo, não há problema. Podemos


cruzar um pouco mais cedo.

— Não é nenhuma imposição, — rebato, deixando minha


postura clara enquanto Cecelia afunda em sua cadeira.

— Tem certeza de que é melhor agora? — Cecelia diz,


insinuação saindo de sua língua. Ela parece estar se
preparando para a guerra quando tudo que estou tentando é
fazer as pazes. Estou tentado a puxar sua bunda de lado e
avermelhar antes de lambê-la ou simultaneamente fazer as
duas coisas.
— Sim, — aceno para dar ênfase, cortando minha mão no
ar. — Fim.

Ela estreita os olhos.

— Não se atreva.

— Cecelia, — interrompe Diane com a voz de uma mãe


paciente, — por que você...

— Eu terminei, — ela se encaixa e se levanta, puxando


seu prato para a pia e jogando-o antes de olhar para Diane. —
E parei de fingir também. Você nem contou a ele, não é, mãe?
Seu novo marido.

— Marido? — Pergunto, surpreso com a notícia e


percebendo os anéis em seus dedos. Deve ter sido em um de
meus relatórios recentes. Em minha defesa, estive ocupado
nos últimos oito meses.

— Sim, marido, — Cecelia esclarece, seu olhar focados em


sua mãe. Estou esperando que olhos cor de sangue e uma
coroa de cobras em movimento apareçam a qualquer segundo
com a forma como ela está se comportando. Faço uma nota
mental para ver o quão longe ela está de seus dias de pílula de
açúcar em seu controle de natalidade.

— Você não aprendeu nada? Como você espera passar a


vida com ele com segredos como este?

Timothy calmamente pousa os talheres e me olha.

— Alguém pode me dizer o que estou perdendo?


— Infelizmente, sua esposa e eu compartilhamos uma
história trágica.

Uma lágrima escapa dos olhos de Diane, e Cecelia se joga


imune, mas sei que a tensão no relacionamento a está
prejudicando, tanto que se transformou em uma metástase de
raiva incontrolável.

— Ele sabe, — Diane levanta os olhos doentios de culpa


para sua filha. — Disse a ele no caminho de volta para casa da
última vez que estivemos aqui, depois que assinei os papéis do
restaurante e da casa, embora você se recusasse a me dizer
por que eu estava fazendo isso. — Seu olhar voa para o meu.
— E também depois que você se recusou a me dizer por que
perdeu quinze quilos, você não podia se dar ao luxo de perder.

Insinuação clara, essa revelação me atinge onde deveria,


e Cecelia atira de volta.

— Não brinque de mãe preocupada. É um pouco tarde


para isso, não acha?

— Nunca, você sempre será minha filha. E não tinha ideia


do que você estava passando, porque você não compartilhou
comigo.

— Todos nós temos nossos segredos, não temos? — Ela


diz, nenhum de nós está a salvo daquele soco.

— Olhe para mim, baby. — Cecelia ergue seus olhos


ardentes até os meus, com tanta dor brilhando neles que quero
protegê-la com meu corpo. — O que machuca você, me
machuca.

Ela fecha uma lágrima debaixo dos olhos.

— Tobias, isso é demais.

— Não é. Prometo a você, Tesor, não é.

O deslizamento da cadeira de Diane nos faz virar em sua


direção enquanto ela oferece um quase inaudível 'com licença'
antes de sair correndo da cozinha, pegando seus cigarros no
balcão antes de correr pela porta dos fundos.

Timothy se levanta para ir atrás dela e o detenho com a


mão em seu ombro. Ele olha para mim com clara apreensão.

— Então você é...

— Sim. Mas o mais importante, sou o homem apaixonado


pela filha dela. Por favor deixe-me. — Timothy me estuda por
vários segundos antes de me dar um aceno lento. Não dou à
Cecelia a chance de protestar antes de sair para o quintal.

Encontro Diane lutando com seu isqueiro no centro do


quintal antes que ela consiga acender uma chama, inalando
seu primeiro golpe profundamente, olhos fechados, lágrimas
manchando suas bochechas. Sentindo-me, ela abre os olhos e
me encara enquanto me aproximo com as mãos enfiadas na
calça de moletom.

— Se importa se eu tiver um desses? — Ela acena com a


cabeça, abrindo a caixa e a estende para mim. Pego um, e ela
o acende, seus olhos pesados no meu perfil antes de eu recuar.
— Obrigado.

— Não consigo nem começar a imaginar como isso


aconteceu.

Pego o cigarro e exalo uma baforada de fumaça, grato pelo


leve alívio que isso traz.

— É uma história muito complicada.

— Você se envolveu com ela para machucá-la, por nossa


causa, por causa do que eu fiz?

— Não. Na verdade, fiz um grande esforço para garantir


que ela fosse mantida fora disso, mas falhei.

Seu tom fica mais nítido.

— Posso não ter o direito de perguntar, mas quando se


trata dela, não dou a mínima. O que exatamente você quer
dizer com isso, Tobias? Você tinha planos para Roman por
causa do que eu fiz?
— Inicialmente, sim. Roman era meu alvo até descobrir a
verdade sobre o que aconteceu. Mas eu não tinha intenção de
machucá-la. Protegê-la sempre foi uma prioridade para mim.

— Desde quando?

— Desde a primeira vez que coloquei os olhos nela.

— Que foi?

— Quando ela tinha onze anos.

— Jesus. — Ela está visivelmente tremendo enquanto dá


uma tragada no cigarro e me estuda com atenção. — Você a
ama, isso está claro.

— Eu faço.

— Roman nunca me disse que você estava envolvido...


Deus, aquele homem.

— Ele era bom em guardar segredos. Mas ele estava muito


ciente quando Cecelia e eu nos separamos, anos antes de ele
morrer, que nosso relacionamento havia acabado.
Trabalhamos juntos para proteger Cecelia.

— Acho que não tenho escolha a não ser tentar e acreditar


em você.

— Espero que você faça. Nunca a machucaria.

— Mas você tem.

Aceno porque é a triste verdade.


— Mas principalmente para protegê-la.

Seu olhar perde o foco quando seu peito se contrai e seus


ombros caem para frente antes de falar. — Tantas, muitas
vezes ao longo dos anos quis estender a mão, confessar a
verdade para você, para Dominic, e implorar seu perdão, mas
você desapareceu. E, eventualmente, ele fez também.

É então que sei que minha suposição estava certa.

— Deve ter sido difícil sustentar três crianças todos os


meses.

Seus olhos caem.

— Não queria que você ficasse sem. Tirei muito de você e


vi como você estava miserável naquela casa com Delphine.

Expiro, batendo a cinza do meu cigarro.

— Durante anos, pensei que as caixas sem endereço de


retorno enviadas à nossa porta eram de amigos e parentes de
meus pais. Caixas com roupas no valor de centenas e centenas
de dólares, cartões-presente, brinquedos e sapatos. Mas
ninguém é tão generoso, não é, Diane?

Ela funga, enxugando o nariz.

— Delphine me odiava, e sabia que ela iria me rejeitar,


mas eu simplesmente não podia deixar você ir sem. Sei que
não compensa o que fiz.
— Você cometeu um erro, — digo incisivamente,
enquanto seus olhos se nublam com lágrimas. — Essas caixas
nos salvaram, às vezes por meses a fio. Posso dizer com
segurança que aquele ato de gentileza me inspirou a pagá-lo
de uma maneira importante.

Um soluço explode dela enquanto dou outra tragada no


meu cigarro, mantendo distância suficiente para que ela esteja
confortável, mas perto o suficiente para pegá-la se ela quebrar,
o que parece possível. Desde o minuto em que conheci essa
mulher, tudo que vi foi uma culpa agonizante, e saber que ela
viveu com isso todos esses anos só me faz querer convencê-la
ainda mais a se libertar.

— Sabe, você e eu temos muito em comum, — confesso,


— ambos sofremos com a terrível praga da culpa do
sobrevivente.

— N-nunca poderei dizer o quanto lamento o que


aconteceu.

Jogando meu cigarro, agarro seus ombros, vendo tanto


da mulher que amo na mulher antes de mim – certa de que
Cecelia herdou seu coração.

— É tragicamente irônico o quão bem conheço a sua dor


porque talvez se eu não conhecesse, não seria capaz de olhar
para você agora e dizer que te perdoei há muito tempo. Foi um
acidente. Eu senti o quão profundamente você se arrependeu
o dia em que nos conhecemos. Seu erro mudou minha vida de
uma forma irreparável, mas também me transformou no
homem que sou hoje – para melhor ou para pior – um homem
que ama sua filha. É uma loucura que de alguma forma,
apesar do que você levou embora, você e Roman tenham me
dado de presente a única pessoa no mundo capaz de me amar
de uma forma que me enche de tanta paz. Cecelia é minha casa
e minha razão para tentar me perdoar, e ela precisa ser sua
razão também. Pelo que descobri, você se puniu por tempo
suficiente e isso afetou você e seu relacionamento com sua
filha. Não é tarde demais para nenhum de nós, Diane. Cecelia
está me fazendo acreditar.

Uma fungada reveladora logo atrás da grade me faz sorrir.

— Venha, Mon Trésor, sei que você está ouvindo.

Os olhos avermelhados de Cecelia encontram os meus e


vão até sua mãe quando ela dá um passo à sua frente.

— Isso é porque você teve tantos postos de trabalho, e


ainda lutou?

Diane concorda.

— Não poderia deixá-los ir sem, e sei que você sofreu por


isso.

— Roman não sabia?

Diane balança a cabeça.

— Deus, não, ele teria ficado furioso porque pareceria


uma admissão de culpa. Ele estava tão paranoico. Mas não
sinto muito por ter feito isso. Só lamento que você tenha
sofrido.

— Mãe, — a voz de Cecelia se eleva enquanto ela puxa a


mãe em seus braços. — Nós estamos bem. Deus, eu só queria
que você tivesse me contado.

Elas começam a falar em sussurros abafados enquanto


me viro e volto para a casa para dar-lhes privacidade.

Realmente não acredito que as palavras podem curar


tanto quanto doem. Mas quero muito acreditar que não é tarde
demais para nós – que viver de verdade sem aquela dor aguda
é possível. Mais esperança acende quando olho para trás para
as duas e vejo um leve alívio na expressão de Diane um
segundo antes de fechar a porta dos fundos.
Tim preparou seu trailer para a noite, insistindo que eles
dormissem nele, sem dúvida devido ao drama que se
desenrolou hoje. Ajudei-o a montar acampamento e, com
Cecelia ocupada com a mãe, saio correndo para verificar os
dois telefones.

Oz identificou o idiota nos observando e está investigando


mais profundamente sua história por ordem minha.

Tyler conseguiu executar meu pedido de cobertura aérea


e o ETA demorou meia hora.

E o superior do idiota ordenou que continuasse minha


vigilância e relato. Depois de um banho para aliviar a tensão,
passei o resto do dia satisfeito com o tempo que ganhei, com a
intenção de descobrir os motivos e intenções de Antoine.

Terei de utilizar meu tempo com sabedoria para fazer


mais progressos com Cecelia, e pretendo fazer exatamente isso
assim que nossos convidados inesperados partirem.
Depois do jantar, reunimo-nos em torno de uma fogueira
improvisada que Tim e eu conseguimos encontrar fora de seu
trailer.

Cecelia, Diane e eu tomamos um gole de vinho enquanto


Tim bebe a cerveja que estocou em sua geladeira. Estamos
todos alguns drinques quando Diane fala, encerrando
inevitavelmente um dia de progresso.

— Você não mencionou Dominic, — ela pergunta,


olhando entre Cecelia e eu, — onde ele está agora?

Paro o copo a meio caminho da minha boca quando a


expressão de Cecelia cai, e ela volta os olhos questionadores
para os meus. Nunca enfrentamos essa questão juntos e, por
mais que eu tente, está claro em nossos rostos.

Diane olha entre nós, seus olhos brilhando de medo.

— Por favor, diga que ele está bem, — ela implora


enquanto Tim agarra a mão dela.

— Ele morreu há seis anos, — Cecelia fala ao mesmo


tempo que eu.

— Acho que é hora de você saber a verdade. — O olhar de


Cecelia se fixa no meu quando termino. — Toda a verdade.

— Tobias

— Está na hora, — enfatizo suavemente antes de olhar


para a fogueira.
— Tobias, — Cecelia incita meus olhos em sua direção, e
olho de volta para ela, o fogo levantando um pouco da
tonalidade vermelha em seu cabelo castanho enquanto ela
silenciosamente me avalia.

— Está na hora.

Depois de alguns momentos tensos, Cecelia acena


sombriamente. Nas próximas horas, revezamo-nos
conversando e revelo muito da minha história, dos momentos
que tenho revivido desde que estou na Virgínia, aproveitando
para vir um pouco mais limpo com Cecelia.

Deixo de lado minha história com Antoine, segredo que


guardo há vinte anos. Enquanto Cecelia e eu nos lembramos
dos detalhes de nosso passado sórdido juntos, os olhos de
Diane disparam loucamente entre nós enquanto Timothy fala
de vez em quando com uma pergunta ou 'puta merda.'

Em um ponto, muita verdade deixa Diane em uma


pirueta, suas emoções levando o melhor dela, especialmente
quando relatamos os eventos da noite em que Dom morreu e
as consequências. Felizmente, ela mantém a compostura o
suficiente para passar pela lembrança do retorno de Cecelia a
Triple Falls antes de eu vir buscá-la três semanas atrás.

— E agora... — Diane me olha, sua voz rouca. — O que


você vai fazer?

— Estou deixando isso para sua filha, — digo


honestamente. — Ela vai decidir.
O medo estremece fisicamente quando Cecelia engole,
recusando-se a responder à pergunta da mãe. É claro que ela
está em carne viva e exausta por causa de um dia revirando
nosso passado e, pela primeira vez, contando sua história
inteira. A parte triste é que ainda tenho muito para contar.

Não estou nem um pouco preocupado com os segredos do


Hood ou qualquer um dos nossos segredos sendo revelados,
aliás. Na maior parte do tempo, Diane cuida de nós dois desde
que éramos crianças. Sinto-me seguro com esse conhecimento
e melhor por ela conhecer a verdade de nossa realidade.

— É esta a vida que você quer? — Ela pergunta à Cecelia.


— Mesmo depois de tudo o que aconteceu, por mais perigoso
que seja?

Ele, é o que ela queria dizer, mas não posso culpá-la por
isso.

— A decisão é minha e eu tomei.

Diane morde o lábio por vários segundos antes de


levantar os olhos para mim. Timothy limpa a garganta.

— Estou maravilhado, cara. Verdadeiramente. Esta é...


que história incrível. — Ele balança a cabeça e olha para mim.
— Ainda estou surpreso por você ter estudado na escola
preparatória com o presidente e ter planejado isso, — ele bebe
sua cerveja, — muito legal.

— Encontramos alguns obstáculos na estrada.


— Também nunca conheci essa parte, — diz Cecelia, sua
voz cheia de mágoa e raiva subjacente.

— Você não conhece muitos detalhes, — admito


suavemente, sabendo que estou pronto para isso.

— Não, eu não conheço, — ela redireciona, raiva fervendo


em sua voz.

— Pergunte-me qualquer coisa, — eu a lembro das vezes


que tentei me revelar a ela em graus nas últimas semanas.
Seus olhos brilham antes que ela os afaste.

— Exceto que não é... — Diane diz suavemente. — Não é


uma história, é, Tobias?

— Não, — viro o resto do meu vinho, esvaziando meu


copo, — não é.

Diane se vira para Cecelia, sua expressão em branco


enquanto ela olha para as chamas.

— O que...

— Mãe, não, ok? Apenas, — ela suspira, — Não.

— Não posso evitar!

— Bem, você vai ter que confiar em mim. Não sou mais
sua para proteger.

— Isso é... besteira, garota. Sempre serei sua mãe.


— Isso não é isso, e você sabe disso. — Cecelia se levanta
e olha na minha direção. — Estou cansada. Está tarde. — Ela
anda ao redor do fogo para beijar a bochecha de sua mãe antes
de dar uma palmada no ombro de Tim. — Podemos conversar
mais amanhã de manhã.

Diane balança a cabeça, mal registrando seu adeus


enquanto falo em uma tentativa de acalmar sua mente.

— Nove pessoas estão nos guardando, vigiando esta casa,


duas delas protegendo Cecelia o tempo todo, algumas estão
vasculhando as ruas desta cidade em busca de qualquer
possível ameaça. Há dois drones no ar agora examinando cada
metro quadrado desta terra e a terra ao seu redor.

— Jesus Cristo, — suspira Diane.

— Você está segura aqui. Mas se você se sentir mais


confortável saindo, entenderei. — Raspo meu lábio superior
com os dentes, temendo minha próxima confissão. — E
quando você chegar em casa, farei com que os pássaros que
estão observando vocês dois por anos finalmente se
apresentem.

Ambos apontam suas cabeças em minha direção e dou de


ombros.

— Sinto muito, era necessário.

Os olhos de Diane brilham com uma mistura de choque


e admiração.
— Todo esse tempo, você esteve me protegendo.

— Prometi a Roman que protegeria sua filha, e isso inclui


proteger você. E tenho bons motivos para investir igualmente
em seu bem-estar.

Ela olha para mim.

— Eu sabia quando te conheci que você era especial, mas


isso é uma grande superação, não acha? — É a primeira piada
do dia e sou grato por isso.

— Vou protegê-la com tudo o que tenho.

— Aparentemente, ela fará o mesmo por você. A


propósito, ela tirou seu gene durão de mim. — Outro sorriso,
outra piada, e tenho quase certeza de que o vinho é o
responsável.

— Claro, ela quer.

— Tobias. -— ela começa novamente, seus olhos


suavizando substancialmente.

— Sem mais lágrimas, Diane, e sem desculpas. OK?

Ela concorda.

— Vou tentar.

— Boa noite.

Eles me dão uma boa noite em uníssono enquanto entro


na casa escura, a única luz acesa vindo do quarto. Não tenho
ideia de no que estou metido, mas retardo meu passo um
pouco enquanto atravesso a sala de estar.

Que porra é essa, King? Cresça um conjunto.

Acelerando minha caminhada, a encontro no quarto,


olhando para seu edredom como se fosse fascinante. Circulo
sua cintura e a acaricio por trás.

— Eu sei que era muito.

Ela sai do meu aperto, cambaleando sobre mim, seus


olhos atirando adagas azuis.

— O que?

— Você conheceu minha mãe, uma das mil omissões que


você casualmente deixou de fora. Ou que tal este, 'ei, você sabe
que sou o cérebro por trás de uma sociedade secreta de
vigilantes, mas o presidente é uma porra de parte dela.'

— Eu não...

— Você teve meses para me contar esses detalhes quando


nós. Estávamos. Juntos!

— Bem, naqueles meses, a porra do clube era a última


coisa que queria falar nas poucas horas que tive para roubar e
escapar com você. Até te conhecer, minha vida inteira era um
trabalho. Com você, fui egoísta. Te falei isso. Eu admiti, pedi
desculpas por isso. Mas naquela época, com você, eu era
apenas... eu, Tobias. Apenas um homem apaixonado por uma
mulher e amando a liberdade que senti por causa disso. —
Expiro. — Eu não podia arriscar contar a você esses detalhes
sobre Preston, Cecelia. Já entreguei a você minha própria
morte. E ainda éramos indefiníveis naquele ponto, até o dia em
que implodimos.

— Preston, — ela zomba, — mesmo assim, você ainda não


aprendeu, não é? Segredos e omissões nos separaram antes e
farão novamente. — A fúria irradia através de seu corpo
enquanto tento parar a hemorragia antes que comece.

— Não vou deixar isso acontecer.

— Não vai?

— Estou tentando, Cecelia, tão porra difícil. — Tirando


meu moletom, corro a mão pelo meu cabelo antes de agarrar a
parte de trás da minha camisa, jogando-a fora. Seus olhos
caem imediatamente, para o chão, desintegrando qualquer
esperança que tinha de retomar a intimidade que
compartilhamos esta manhã.

Tentado a enfiar meu punho através da parede de gesso,


aperto ao meu lado em vez disso, enquanto minha frustração
ameaça transbordar.

— O que você fez hoje, — ela diz suavemente, — para


minha mãe, foi... indescritível, tão... altruísta e um dos atos
humanos mais incríveis que já testemunhei, o que só me fez
amá-lo mais.

Dou um passo à frente e ela levanta a cabeça, os olhos


cheios de acusação.
— E você estragou tudo! Você estragou tudo por ser o
mesmo idiota que sempre foi!

— Sendo honesto?!

Dou um passo à frente e invado seu espaço, ansioso por


essa luta. Porque ela está lutando contra suas emoções agora,
e elas estão vencendo, e para mim, isso é mais importante do
que o porquê.

— Você estragou tudo, me mantendo no escuro sobre os


detalhes. Todas essas coisas, se soubesse pelo menos a metade
delas, teria um melhor entendimento de você, seu idiota de
merda!

— Você me entende! Você vê dentro de mim, você já esteve


em lugares que ninguém mais esteve.

— Talvez sim, mas essas coisas que você considera


detalhes são de vital importância para mim, Tobias.

— Você está tomando seus comprimidos de açúcar?

— O quê?!

— Nada. Fale baixo. Seus pais estão lá fora. — Minha


cabeça começa a latejar.

Bem-vindo à felicidade da vida doméstica, Tobias.

Mas não é minha própria voz que ouço. É do Sean.

— Eu não tive tempo...


— Mais desculpas, não motivos. — Ela balança a cabeça
e zomba. — Você nunca em sua vida deixou escapar nada? Já?

— Uma ou duas vezes, mas só quando estiver lutando


com você. E você sabe melhor, me treinei para nunca fazer
isso, você deveria saber...

— Oh eu sei! Acredite em mim, eu sei, seu macaco francês


estúpido!

Mordendo meu lábio inferior, desvio meus olhos.

— Não ria de mim! Isso não é engraçado, porra! Este é o


porquê, Tobias. É por isso que a maioria dos nossos problemas
existe, por causa da porra do seu sigilo! — Ela dá um tapa no
peito onde seu coração estava. — Você quer entrar aqui?

— Sim, — grito, meu sangue fervendo.

— Você quer voltar aqui? — Ela diz de novo.

— Sim, droga, isso é tudo que quero!

Ela dá a volta na cama e se aproxima de mim, batendo na


lateral da minha cabeça com o dedo.

— Então, deixe-me entrar! — Fico boquiaberto com ela


em estado de choque quando ela se afasta, lançando o próximo
míssil por cima do ombro, — até então, você está perdendo a
porra do seu tempo aqui.

— Fui honesto com você esta noite!


Ela recua para mim como se eu a tivesse esbofeteado
antes de virar as costas para mim.

— Apenas uma vez, — ela marchou para o banheiro,


clicando na luz, — apenas uma vez, eu gostaria de poder fazer
você sentir como é isso.

— Acho que descobrir que você foi trazida para o meu


clube e ter um relacionamento não com um, mas com dois dos
homens mais próximos de mim é uma merda de surpresa para
durar a vida toda. — Paro perto da porta do banheiro, e ela
para com a escova de dentes na boca antes de arrancá-la, o
resíduo borbulhando no canto.

— Isso não é a mesma coisa, e você jurou que nunca


tocaria nisso.

— Não para usar isso contra você, era para fazer um


ponto!

— Um ponto de escolha!

— Bem. Sinto muito, — resmungo, meu corpo todo


iluminado de raiva e frustração. — Só quis dizer que era
surpreendente o suficiente. E só para me deixar claro, sou bom
até vinte anos após a morte com fodidas surpresas quando se
trata de você.

— Isso não foi uma surpresa do meu design!

— Não importa. Você atingiu sua cota.


— Isso foi então, — ela argumenta de volta. — Estou
falando agora. Agora, neste exato momento.

A ideia de confessar tudo sobre Antoine é jogada pela


janela quando entro na merda, até o pescoço.

Estou fodido agora, de qualquer maneira. Se confessar


nossa possível ameaça, ela apenas aumentará suas defesas.

Uma luta de cada vez, Tobias.

— Estou falando sobre ser pego de surpresa sem um bom


motivo, quando você teve tempo de me dizer a verdade!

Você está tão fodido. Faça uma mala para sua bunda e dê
um beijo de despedida.

O homem dentro de mim se recusa a recuar, o homem


que deseja desesperadamente consertar esta ponte. Ele quer
esmagar sua boca, silenciá-la com sua língua e puni-la
severamente com seu pênis. Isso é tudo menos progresso, e
temo que todos os meus esforços nas últimas três semanas
tenham sido infrutíferos pelo modo como ela está me olhando
– o que só me enfurece ainda mais.

— Eu tive tempo? Eu tive tempo? Putain. — Foda-se. Ela


passa por mim, recusando-se a encontrar meus olhos, e sigo
em seus calcanhares. — Entre cuidar das mesas e seguir você
como um segundo cachorrinho e conseguir a porta batendo na
minha cara, eu tive tempo, certo?

— Não se atreva! Não bati a porta na sua cara!


Ela briga comigo na cama enquanto abro meu relógio e
bato em sua mesa de cabeceira, esvaziando meus bolsos.

— Poderia muito bem ter. E acredite ou não, Tesor, você


não é a mulher mais fácil de se conversar. Se o assunto tivesse
surgido...

Ela arranca o suéter e meus olhos caem para o volume de


seus seios perfeitos em cima de seu peito arfante.

— Olhe aqui para cima, Pierre, e me perdoe se eu não fizer


as perguntas certas pertinentes aos segredos que você está
guardando no momento. — Ela levanta as mãos. — Quem
diabos sabe com você!

— O que você realmente espera de mim, Cecelia? Você


esperava que eu voltasse para você como um homem
completamente reformado com todas as respostas, que faz
todos os movimentos certos? Ainda sou o mesmo homem – o
vilão. E sempre jogarei sujo para protegê-la e mantê-la segura.
Vou considerar fazer qualquer concessão que você precise para
tentar fazer isso funcionar, mas você está realmente enganada
se acha que vou fugir das partes implacáveis, implacáveis e
cruéis que ainda existem em mim quando necessário. Você
perguntou pelo homem por quem se apaixonou, bem, há dois
lados nele, e nenhum deles vai a lugar nenhum. — Corto com
minha mão no ar. — Fim.

Juro que vejo fumaça saindo de suas narinas, esperando


que o fogo siga enquanto seus olhos se estreitam. Em um flash,
ela empurra para baixo a calça jeans e abre o sutiã antes de
abrir a cômoda.

— Não se atreva, porra! — digo. —Prefiro que você tire a


porra da Beretta da sua bolsa e atire no meu pau!

— Não me tente, King! — Ela se vira, jogando o novo


pijama de flanela na cama – a mesma porra do mesmo padrão,
este par em azul claro, e nunca na minha vida odiei tanto a
visão de um objeto inanimado. Ela joga as meias felpudas – a
cereja em cima – na pilha, e seguro minha nuca e olho para o
teto.

— Você só quer guardar rancor, — bufo. — Estávamos


chegando mais perto esta manhã, e esta é à sua maneira de
foder com tudo. Você está se encolhendo de novo.

O silêncio passa junto com o pequeno relógio ao lado de


sua cabeça, pouco antes de ela jogá-lo em mim e errar a minha
cabeça por um centímetro.

Dou um passo à frente enquanto ela puxa o pijama pela


cabeça, e pode muito bem ser uma faca no peito. É claro que
não sou o único que joga sujo. — Nós apenas revivemos cada
coisa ruim que aconteceu entre nós, Tobias. Acho melhor
apenas pararmos de conversar.

— Sim, porque isso tem funcionado para nós até agora. E


isso torna todo o seu argumento discutível. Mais silêncio – isso
deve ajudar.

Quando ela alcança a calça do pijama, atinjo meu limite.


— Se você ao menos colocar um dedo do pé nessas
malditas calças, você está declarando guerra e todas as
apostas estão canceladas!

Ela enfia uma perna enquanto minha paciência se esgota.

— Merde. Bon cantou, femme. Tu me testes au-delà de


mes limites! — Porra. Maldição, mulher. Você está me testando
além dos meus limites.

Ela empurra a segunda perna, puxando o cordão


apertado em volta da cintura para esfregar o sal no meu peito
aberto.

— Bem, bem-vindo à porra do clube, francês! É bom ver


que finalmente estamos na mesma página!

— Qualquer coisa menos. Não estamos mais na mesma


porra de lugar.

— Tudo bem por mim. — Ela aponta para a porta. — Você


sabe a saída.

Ela respira fundo e posso ver seu arrependimento


imediato. O fragmento em meu peito mal é administrável
enquanto abaixo meu olhar e pego um travesseiro do meu lado
da cama.

— Bem, então, meu tesouro, vou poupá-la do trabalho de


me mostrar a porta duas vezes.
Passei a maior parte da noite me revirando, sabendo que
poderia aliviar a familiar dor de sentir sua falta simplesmente
pegando sua mão e o guiando de volta para a cama. E uma vez
que seus braços estivessem em volta de mim, poderia retirar
as palavras que não quis dizer. Mas muitas dessas palavras eu
quis dizer.

O fato de ele relembrar nossa história para minha mãe


me surpreendeu e lançou uma luz muito necessária sobre
tantas coisas. Isso é tudo que quero, mas ele estava certo.
Recusei-o em quase todas as oportunidades para explicar seu
raciocínio para as coisas que ele fez. Quase tornei impossível
para ele confessar qualquer coisa, evitando-o e evitando suas
explicações.

Colocar nossa própria história em palavras me lembrou


de quanto passamos, mas também me lembrou da razão pela
qual não podemos consertar totalmente – todo o maldito
segredo.
Ele não pode mudar suas manchas durante a noite.
Todas as coisas enraizadas – incluindo os maus hábitos –
cimentaram sua personalidade ao longo do tempo.

Os segredos são quem e o que ele é, porque ele mesmo


viveu como um segredo por incontáveis anos.

Se eu quiser que isso funcione, vou ter que me lembrar


disso e tentar não ficar ressentida com ele pelos segredos que
ainda guarda.

Esteja ciente ou não, ele ainda os mantém –


seletivamente.

Depois de deixar Beau entrar de volta, caminho levemente


pela sala antes de usar uma das almofadas descartadas para
me ajoelhar na frente de onde ele dorme. Ele está
completamente desprotegido enquanto respira pesadamente,
seus cílios grossos e pretos se espalhando sobre suas maçãs
do rosto afiadas. Ele está embrulhado em uma das colchas
remendadas que comprei em uma loja de antiguidades quando
me mudei para cá. Ele parece totalmente deslocado no meu
sofá curto que ele diminui com sua forma adormecida. Com os
dedos coçando para tocar, Beau me vence lambendo o lado de
seu rosto. Ele grunhe de desgosto, puxando as cobertas sobre
sua cabeça enquanto abafo minha risada. Espero que ele
retome a soneca, mas sua voz soa sob o cobertor grosso.

— Va te faire voir, connard. Je sais que tu as dormi avec


elle. — Cai fora, idiota. Eu sei que você tem que dormir com ela.
Sufocando outra risada, corro meus dedos por seu
cabelo, e ele abaixa as cobertas para encarar meu pijama antes
que olhos âmbar cheios de remorso encontrem os meus.

— Oi.

— Oi, — ele sussurra, esticando suas longas pernas além


dos limites do braço do sofá antes de virar seu corpo
totalmente para mim. — Você está finalmente lutando de volta.
Isso significa que você está começando a me perdoar?

Correndo meus dedos por seu cabelo preto espesso,


inclino-me, inalando frutas cítricas e especiarias, o cheiro me
inundando com memórias. — Por que não podemos
simplesmente nos odiar?

— Simples, — ele murmura, — Nós nos amamos demais.

— Nós sobrevivemos à nossa primeira luta pesada. —


Aceno passando meu ombro em direção à porta. — Completo
com meus pais em um trailer do lado de fora.

Ele desenha as sobrancelhas.

— Isso é bom?

— Acho que sim.

Ele abaixa a colcha remendada e segura meu queixo,


apertando meus lábios do jeito que ele fez todos aqueles anos
atrás na cozinha de Roman.
— Tudo que quero, Mon Trésor... é fazer uma fogueira do
tamanho do Texas e queimar todos esses malditos pijamas. É
tudo para o que estou vivendo.

Minha risada quebra seu aperto enquanto ele facilmente


me levanta de onde me ajoelho para montá-lo. Ele afasta o
cabelo dos meus ombros enquanto olha para mim, sondando
os olhos.

— Tenho muito para te contar, e algumas coisas podem


te deixar com raiva, mas eu vivi muitas realidades diferentes e
me escondi tanto por tanto tempo que é difícil distinguir quais
segredos eu guardava e quais mentiras contei e em quais vida.

— Então, me diga tudo. — Cubro-o, deitando minha


cabeça em seu peito, e ele envolve seus braços em volta de
mim, apoiando o queixo no topo da minha cabeça.

— Pretendo, Cecelia, mas é...

— Sei que é difícil. E serei o mais paciente possível, dentro


do razoável. — Pressiono um beijo em seu peito. — Quero você
aqui, Tobias. Eu quero, — sussurro, espalmando seu peito
onde meu beijo dura para sentir seu batimento cardíaco
constante. — Se te faz sentir melhor, Beau só chegou à
primeira base. — Enterro-me mais profundamente nele
enquanto ele esfrega as palmas das mãos para cima e para
baixo nas minhas costas, afastando o frio da manhã.

— Não é justo. Ele tem a vantagem de jogar em casa.

— Verdade, mas esta é a sua casa também.


Seu corpo relaxa com minhas palavras enquanto ele me
levanta, ajustando-me para que fiquemos cara a cara, seu pau
engrossando na minha coxa, enviando uma onda de
necessidade por todo o meu corpo. Curvo-me para beijá-lo
assim que ele se levanta para encontrá-lo. O beijo é sensual,
sem pressa, enquanto ele desliza sua língua ao longo da
minha, o braço me envolvendo enquanto ele me aperta contra
seu peito. Ele me alimenta com seu pedido de desculpas com
cada golpe lento de sua língua, e retribuo, gemendo em sua
boca, a dor da noite passada lentamente escapando enquanto
nos separamos, olhos conectados.

— Lembra-se de quando...

— Tudo, — diz ele suavemente, flexionando os dedos pelo


meu cabelo. — Me lembro de tudo, Cecelia. Cada palavra que
você disse, cada olhar que você me deu. Seus três tipos de
risos, os detalhes de seus sonhos, a maneira como suas
narinas se dilatam quando você começa a ficar chateada. A
picada de seus tapas, o sal em suas lágrimas, o ajuste de seus
seios em minha mão. A sensação da sua boca, o gosto da sua
boceta, — ele murmura, deslizando o polegar ao longo da
minha mandíbula, — então de que parte você precisa que eu
te lembre?

Correndo as palmas das mãos para baixo em seus braços,


começo a me perder na sensação dele enquanto ele me puxa
de volta para seus lábios. Mãos quentes exploram timidamente
enquanto seu beijo vai do meu queixo para o meu pescoço.
Encharcada e necessitada, meu pulso acelera enquanto deslizo
minha mão em seu peito e sobre seu estômago para cobrir seu
pau. Seu comprimento enorme empurra na minha mão
enquanto eu o agarro através do material de sua boxer. Um
gemido de dor vibra em meus lábios antes de murmurar seu
nome, um pedido na ponta da minha língua assim que uma
batida soa na porta.

Tobias se levanta, mantendo-me em seus braços


enquanto solta uma série de palavrões em francês. Eu me
afasto igualmente perturbada, mas não posso evitar rir de sua
reação. — Acho que eles são madrugadores?

Eu me levanto e puxo o travesseiro e o cobertor do sofá e


entrego a ele enquanto ele se levanta, uma ereção de tamanho
real armada em sua boxer, uma carranca profunda em seu
rosto enquanto eu aceno em direção ao seu pau ingurgitado.
— Faça algo com isso, sim?

— Oh, eu pretendo, — ele ameaça, sua voz uma mistura


de luxúria e fúria.

Soltando uma respiração áspera, seus olhos rolam pelo


meu corpo antes que ele saia com os braços cheios, pisando
no quarto antes de fechar a porta com o pé.
Tobias e eu acenamos para meus pais depois de ter
garantido à minha mãe mensagens de texto e telefonemas
todos os dias pelo resto da minha vida. Sua preocupação é
justificada, mas é meu trabalho agora protegê-la de quaisquer
verdades que possam surgir. Faz parte de saber o segredo.

Tobias fica olhando muito depois que o trailer desaparece


de vista, e estudo seu perfil enquanto o sol começa a tingir o
céu da manhã.

— O que você pensa sobre?

— Roman. — Afastando-se de mim vestido com roupas de


corrida – moletom, uma térmica e uma camiseta, e Nikes
usados – ele agarra o pé atrás dele em um alongamento do
tendão. Seu corpo maciço está se tornando mais magro e mais
definido devido às suas corridas vigorosas, e não posso evitar
minha avaliação completa de seus esforços.

— E quanto a Roman?

— Que idiota ele era, do que ele perdeu. — Satisfeito com


seu aquecimento, ele dá um passo à frente e segura minhas
asas, meus olhos caindo para seus lábios carnudos enquanto
ele fala. — De como gostaria que você tivesse conhecido meus
pais. Mas se eles não tivessem morrido, eu provavelmente não
teria você. — Ele se inclina e solta um suspiro cauteloso. — De
como odeio algumas das maneiras como você me vê, e vou
mudar isso.
— Isso é muito para se pensar às sete da manhã. —
Quando seus olhos caem, imediatamente me sinto culpada,
mas estou drenada do furacão das últimas vinte e quatro
horas. Com a postura derrotada, ele se afasta, recuperando
seus fones de ouvido dos bolsos e os coloca antes de folhear
seu telefone, batendo para iniciar uma lista de reprodução
enquanto fala.

— Exatamente como minha mente funciona, — ele


levanta os olhos para os meus, — pensei que você queria isso.

— Eu fiz, eu quero. Me desculpe.

Ele agarra minha nuca e me puxa rapidamente para ele,


roçando minha boca com um beijo que me deixa doendo. É
então que reconheço as notas de abertura de Archives “Again”,
uma música que sei de cor, fluindo por seus fones de ouvido.

— Vejo você depois do trabalho.

Em segundos, ele está correndo pela estrada na direção


que minha mãe deixou, meu coração disparando atrás dele.
Idade Vinte e Oito

Vegas.

O playground do diabo.

No que diz respeito aos demônios, trouxe todos os meus


favoritos comigo. E esta noite, pretendo deixá-los reinar.

Nossa marca?

Elijah Rosenbaum, um vice-presidente de 36 anos que


pertence a uma pequena, mas teia rede de ladrões ambiciosos.
Ele rouba sua própria empresa por esporte enquanto passa
seu tempo livre aterrorizando mulheres. Sua mais nova vítima,
Amelia, está sentada ao seu lado, uma ex-garçonete de vinte e
três anos que deixou seu posto em um bar de Boston pensando
que ele seria seu Príncipe Encantado. Agora, ela
definitivamente percebe que precisa de um cavaleiro branco,
mas ela vai ter que se contentar com alguns pássaros rebeldes.

Está se tornando mais evidente para ela a cada segundo


que abandonar sua vida foi um erro catastrófico. Seus olhos
disparam de medo enquanto ela se senta, um novo prisioneiro
na nossa frente em assentos ao lado do ringue que Elijah não
poderá mais pagar depois de pagar nossa conta.

Desde a primeira rodada, Dom e eu temos olhos de águia


em ambos, procurando por qualquer segurança que ele possa
ter e que possamos ter perdido. Mas ficou aparente que Elijah
se safou com suas maldades por muito tempo para tomar
medidas cautelosas. Nesse ponto, ele se considera intocável. E
está claro que isso não é apenas uma suposição de seu
comportamento, enquanto ele se deleita com o medo intenso
no coração de sua companheira. Cada vez que os olhos dela
vagam pelos aparentes quinze centímetros que ele permitirá,
ele a verifica com uma abordagem prática. Nas duas vezes em
que ele a machucou, ela começou a chorar de dor, apenas para
ser ameaçada de ficar quieta ao reagir à tortura metódica dele.

— Filho da puta, — Dom rosna ao meu lado. — Se ele


bater nela mais uma vez, vou matá-lo, porra.

— Fácil, — aperto, olhando para Dom para ver seus


ombros tensos, seus dedos flexionando com a necessidade de
atacar.

Temos batido cabeças recentemente devido ao seu


temperamento e ao uso de medidas mais extremas. Ele é um
renegado implacável e letal nisso. Nos últimos anos, ele
endureceu suas arestas, sua paciência diminuindo, seu pavio
ficando mais curto. Aos vinte e dois anos, ele quase me
alcançou em altura – seu corpo ligeiramente menor – mas
quando ele ataca, ele garante que a dor seja inesquecível. Vejo
muito de mim nele, mas diferimos muito nas opiniões táticas,
o que tornou nossos últimos trabalhos mais difíceis.

— Farei um acordo com você, irmão.

— Estou ouvindo. — Seus olhos estão focados em Amelia,


que está procurando freneticamente por uma maneira de
escapar de sua má companhia.

- Você se mantém firme até que possamos pegá-lo a sós,


e vou deixar que lhe dê uma lição completa de boas maneiras
sobre como tratar uma dama. Será o seu show hoje à noite.

Tecnicamente, este trabalho é achado de Dom de


qualquer maneira, uma dica de uma das vítimas de Elijah que
estava confidenciando em lágrimas a um amigo na biblioteca
do MIT. Ela não apenas falou sobre seus maus-tratos, mas
passou minutos contando como Elijah se gabava de suas
conquistas corporativas e riqueza – o que chamou a atenção
de Dom. E por causa dessa troca, essa marca caiu em nosso
colo. Depois de uma pesquisa completa, sabíamos que Lady
Luck estava do nosso lado, e é por isso que Sean e eu
encontramos Dom em Boston para passar alguns dias com ele
antes de seguirmos Elijah até Vegas para a luta. É o local
perfeito, uma cidade remota no meio do deserto, sem vínculos
com a vida de Dom em Boston. Elijah não terá ideia de quem
se vingar, não que ele seja capaz.

Apenas quinze minutos em um quarto de hotel e


estaremos meio milhão mais ricos. O kicker? Se for pego, Elias
sofrerá a queda, não importa onde o dinheiro vá parar ou como
seja gasto. Essa é a vantagem de roubar ladrões.

Elijah é precisamente o tipo de idiota que visamos. Sua


ganância e seus delitos lhe rendem dinheiro fácil e um emprego
pelo qual nenhum de nós perderá o sono. Junto com o meio
milhão, ganharemos uma lista de contatos e co-conspiradores
que nos garantirá uma nova lista de alvos a fumar no futuro.

Dom se senta ao meu lado, postura agitada, os olhos fixos


em nossa marca enquanto gritos esporádicos soam ao nosso
redor para os dois homens no ringue. O campeão atual é um
pouco maior em comparação com seu adversário, Lance
Prescott, um novato sobre o qual li com um recorde
impressionante – um curinga com um evidente chip no ombro,
que parece estar dançando com o diabo em seus olhos. E meu
dinheiro literal está com ele. Examinando a arena, vejo Sean
enquanto ele se aproxima com uma cerveja fresca e se senta à
minha direita.

— Tudo pronto, — diz ele, antes de bebericar sua cerveja,


o cartão-chave do hotel de Elijah enfiado em seu bolso
enquanto ele os olha através do anel. — Ele ainda está fodendo
com ela?

Nossa visão é obstruída por duas mulheres de salto alto


enquanto passam por nós, seus olhos percorrendo nós três
com evidente interesse. Mudo minha atenção além deles para
a luta enquanto Lance acerta sua oposição com uma
combinação doentia, atordoando-o.
— Droga, cara, — Sean diz, me dando uma cotovelada, —
você é assexuado agora, ou o quê? Não vi você com uma garota
desde, — ele estala os dedos, — qual era o nome daquela
garota?

— Chesty-toria, — Dom fornece com um sorriso.

Sean fecha os olhos.

— Sim, cara. Lembro-me bem desses peitos.

Reviro meus olhos enquanto Sean me cutuca, a espuma


de sua cerveja perigosamente perto de derramar no meu terno.

— Você tinha o quê, dezesseis? — Sean incita. — Sério,


cara, é hora de dar uma coça nas costas, pelo menos.

— Ele tem um par de garotas na França que ele cuida


para coçar, — Dom fornece, ganhando meu olhar enquanto ele
inclina a cabeça para ter uma visão de Sean além de mim. —
Você esquece que Christian Louboutin aqui é um agente duplo.
Talvez ele prefira mulheres francesas.

— Talvez eu prefira privacidade, — estalo. — Fim, — me


viro para Sean, — e você está me irritando.

— Isso é o que irmãos mais novos fazem, — Sean rosna.


Ignorando-o, olho para Elijah, que está focado na luta, aliviada
por não ter que tirar meu irmão de cima dele no momento.
Mark ou não, Dom não vai durar muito mais tempo.

Sean deixa escapar um suspiro exagerado, remexendo-se


ao meu lado até que cortei meu olhar em sua direção.
— O que?

— Estivemos em Las Vegas nove horas, e você ainda não


provou aquela garoa patética que você chama de bebida.

— Não bebo no trabalho, — olho sua cerveja. — Você


deveria tentar algum dia.

— Viva um pouco, cara. Você não acha que nós


merecemos?

— Tenho planos para mais tarde.

— Oh sim? Você programou seu primeiro sorriso?

Meu olhar atinge o lado de sua cabeça, seu sorriso


desaparecendo em sua garrafa antes que ele
desagradavelmente engula sua cerveja.

— Ahhhhh, delicioso. — Ele espirra o líquido ao redor. —


Eu lhe ofereceria um pouco, mas provavelmente você é alérgico
porque tem um gosto muito bom.

Dom ri ao meu lado e balança a cabeça.

Passar um tempo com Sean e Dom é completamente


diferente de lidar com Antoine em seu fosso cheio de víboras.
Por mais relaxado que esteja com os dois na maior parte do
tempo, às vezes é difícil para mim me aclimatar de um papel
para o outro.
Aqui nos Estados Unidos, não estou constantemente em
guarda como estou na França, mas as apostas são igualmente
altas.

Sean coloca o cotovelo no joelho, segurando o lado do


rosto enquanto olha para mim, batendo os cílios.

— Simplesmente não consigo entender como você não


deslumbra as mulheres com sua personalidade brilhante.
Espere, Dom, — ele apalpa meu peito, roçando meu mamilo
com o polegar, e dou um tapa em sua mão. — Acho que vi a
contração de seus lábios. — Ele solta um suspiro exagerado.

Pego sua cerveja e a derramo, sorrindo para o copo


enquanto o sorriso de Sean desaparece.

— Alguém mais notando um padrão aqui? — Ele olha


entre nós dois enquanto bebo sua bebida, e ele estreita os
olhos. — Toda vez que tenho uma porra de uma garrafa, você
a leva embora, — ele rosna quando lhe devolvo seu copo vazio.
— Você sabe quanto tempo tive que esperar na fila para isso,
idiota?

— Agradeço.

Dom ri ao meu lado, e olho para ele, notando o raro


sorriso em seu rosto. Aos vinte e dois anos, seu futuro é muito
mais brilhante do que o meu, suas preocupações menos nos
dias de hoje, fazendo todos os meus esforços valerem a pena.

Tudo valeu a pena, só para vê-lo prosperar. Dom olha


para mim e desenha as sobrancelhas.
— O que?

Balanço minha cabeça enquanto Sean segura meu peito


novamente.

— Três horas, T. Morena construída como uma cagada


de tijolos. Caramba, ela está fumando e só tem olhos para você.
— Ele se vira para mim. — Ela está ansiosa por um pouco
daquela carne de homem malvado. — Ele ri e franze as
sobrancelhas. — Você não vai nem olhar para ela?

— Roberts, — Dom fala.

— Sim?

— Cale a boca.

Sean recua na cadeira, inquieto como sempre, a imagem


espelhada de Tarzan, que foi forçado a pentear o cabelo e disse
para ficar quieto.

— Aqui está uma ideia, — digo, — por que você não vê a


luta dos pesos pesados acontecendo alguns pés na sua frente.

— Fiz cortes de cabelo mais divertidos do que este, — ele


lamenta. — Esses são chatos até que param de valsar no
terceiro ou quarto assalto e realmente começam a jogar. Nem
sei por que estamos aqui de qualquer maneira. Temos tudo no
lugar, porra. Não precisamos desperdiçar dinheiro com essa
merda.
— Porque temos um trabalho a fazer, — Dom rosna,
ficando tão irritado quanto eu, — mas se você for um bom
menino, vou deixar você comer um pirulito depois.

— Pode ser preso naquela bunda? — Sean gesticula em


direção a uma mulher que passa por nós, deslumbrante com
pernas de quilômetros de comprimento. — Já repassamos isso
mil vezes. Sério, com que frequência fazemos isso? Nunca.
Estamos em Vegas, juntos, e estamos assistindo a uma luta de
boxe chata.

Ele caminha ao meu lado enquanto pressiono meu ombro


contra o de Dom.

— O que diabos está acontecendo com ele?

Ele olha para Sean além de mim e olha para mim.

— Ele teve seus sentimentos feridos.

— Eu disse a você que o tiro ia sair pela culatra.

— Você sabe, supor que o torna um idiota, certo? — Ele


retruca.

— Nós compartilhamos apenas alguns, e eu moro em


Boston no momento, lembra?

— Ele não me disse.

— Por que ele iria? — Os olhos de Dom rolam sobre mim.


— Você não sangrar como que.
Suas palavras afundam enquanto volto minha atenção
para a luta com mais paciência do que tinha um minuto atrás.
Apesar de ser o homem das mulheres por excelência, e apesar
de brincar muito, Sean é muito profundo e leva a vida muito
mais a sério do que deixa transparecer. Com Dom em Boston
para a faculdade e Tyler servindo no exército, quando não
estou em Charlotte ou França, passo meu tempo com Sean e o
resto do capítulo em Triple Falls. Nesse tempo, nos tornamos
mais próximos, falando principalmente sobre tudo, muito
sobre a vida e filosofia compartilhada. E o fato de Sean estar
agindo mal porque está sofrendo, e ele não sentiu que pudesse
me dizer, o corta profundamente. Não que possa culpá-lo, não
converso sobre relacionamentos. A triste verdade é que não
consigo me identificar com a realidade deles na maioria das
vezes. Olho para Sean e o inspeciono com mais cuidado, e
agora que sei, posso ver claramente a picada em seus olhos,
junto com a dor que vem dele.

O sorriso de Sean diminui consideravelmente quando ele


olha para mim.

— O que?

— Você está bem?

Seus olhos endurecem além do meu ombro para Dom por


dedurar antes que seu olhar lentamente viaje de volta para
mim.

— Não se pode colocar um leão em um nenúfar e esperar


que ele ruja da mesma maneira, certo?
Nós nos encaramos por vários segundos antes que ele
desvie o olhar. É então que entendo, é o clube, minhas regras
que causam isso, junto com a expectativa de que eles
continuem focados e desapegados.

A culpa se instala, e depois de alguns segundos


assistindo Lance jogar, bato meu joelho com o dele.

— Podemos conversar sobre as regras. Talvez faça


algumas mudanças.

Sean balança a cabeça.

— Não é uma má ideia para os outros, mas é tarde demais


para mim. — Inconscientemente, ele passa a mão ao longo do
ombro, onde a tinta fica embaixo. — É melhor assim. Não estou
pronto para aninhar ainda. Mas ela estava... — ele balança a
cabeça. — Estou bem, cara. É o que é.

Como Sean previu, a luta começa a ganhar força


conforme Lance começa a dominar o round. Volto minha
atenção para Elijah, que está no rosto de Amelia,
repreendendo-a enquanto ela olha ao redor, humilhada e
aterrorizada, pouco antes de suas feições se contorcerem de
dor.

— Foda-se, — Sean se levanta de repente, — Estou


pegando outra cerveja. — Bato meu pulso para lembrá-lo da
hora.

— Sim, sim, — ele sorri, — só trabalho e nenhuma


diversão torna T. um menino muito chato. — Ele bate no meu
queixo de brincadeira, o copo vazio na mão, enquanto passa
por nós dois na direção oposta da concessão.

— Onde diabos ele está indo? — Dom pergunta, enquanto


nós dois acompanhamos sua marcha, que se torna mais
desleixada a cada passo que ele dá.

— Ele está chapado? — Pergunto.

Ele encolhe os ombros, seus olhos fixos em Sean com


preocupação.

— Não mais do que o normal.

Confuso, o vejo quando ele começa a tropeçar nas fileiras


de pessoas ao redor do ringue, cambaleando enquanto ele
empurra alguns, levantando as mãos em um pedido de
desculpas, antes de dobrar a esquina. É quando o vejo se
aproximando de Elijah que percebo sua intenção.

Dom pragueja, percebendo quando o faço, puxando o


celular do bolso e mandando uma mensagem de texto
furiosamente para Sean. Sean tropeça ao redor do ringue, seu
andar bêbado é impressionante, especialmente quando ele
sutilmente bate no bolso no meio de sua performance, nos
deixando saber que ele está ignorando as mensagens de Dom
antes de sutilmente mostrar o logotipo da empresa.

— Diga-me que isso não está acontecendo. — Cerro meus


punhos enquanto Sean tropeça em seu caminho em direção a
nossa marca.
— Temo que sim, irmão.

— Vou matá-lo, — rosno enquanto Sean se posiciona e


coloca a isca, a metros de distância de Amelia, seus olhos
treinados nela, esperando, um sorriso característico no lugar.

— Filho da puta, — rosno. — Envie uma mensagem de


texto para ele novamente.

— É tarde demais. — Assim como Dom disse, Amelia


avista Sean e, por instinto, retribui o sinal, assim que Elijah
percebe a troca. Xingo quando o rosto de Amelia empalidece e
ela começa a chorar.

Dom vai se levantar, e agarro seu braço e o puxo de volta


em seu assento. Ele se vira para mim, sua postura ficando
tensa, seus olhos escurecendo, lívidos.

— Ele acabou de dar uma cotovelada no estômago dela.


Por que ninguém está ajudando ou dizendo nada?

Sean anda para o lado como se o chão estivesse se


movendo embaixo dele. Ele já está começando a chamar a
atenção, olhares estranhos de alguns da primeira fila, e é só
uma questão de tempo antes que ele chame a atenção dos
seguranças da casa.

— Infelizmente, é a natureza humana, irmão, e você tem


que controlar seu temperamento e esperar o momento certo
para atacar, ou então você é apenas mais um bandido idiota
tentando ser pego, — digo a ele enquanto Amelia seu rosto e
soluços em suas mãos.
Sean permanece ocioso enquanto luto para não o ajudar,
da mesma maneira que sua aposta vale a pena e toda a arena
pula de pé. No ringue, Lance conseguiu colocar seu oponente
nas cordas e está aplicando punições com uma série de golpes,
fazendo chover o inferno com seus punhos borrados. Com
todos os olhos no ringue, Sean salta para a ação, tropeçando
direto na direção deles antes que ele finja uma viagem, sua
cabeça pousando na virilha de Elijah. Elijah agarra Sean pelos
braços na tentativa de afastá-lo; quando Sean se levanta e dá
uma cabeçada nele com tanta força, a boca de Elijah fica
frouxa quando ele afunda na cadeira. Com Elijah
semiconsciente, Sean gerencia sua recuperação atrapalhando-
se astutamente nos pés e plantando o rosto no decote de
Amelia. Seus olhos se arregalam com o choque quando ele fuça
nela uma fração de segundo antes de se levantar, se desculpar
e se afastar. Amelia sorri na direção em que Sean fugiu assim
que Elijah lentamente se recupera antes de procurar o trem de
carga que acabou de atingi-lo.

Dom treme em uma risada histérica ao meu lado, e perco


Sean de vista, que desliza para a multidão em pé. É a
gargalhada que sai dos lábios de Dom, um som raro, que me
faz virar o rosto para o meu irmão, e com a reação dele, minha
raiva desaparece e não consigo evitar o sorriso.

— Porra, isso não tem preço. — A risada de Dom começa


a diminuir quando ele coloca a mão no meu ombro. — Esse é
o nosso menino, — ele proclama com orgulho, seu sorriso
estalando em seu rosto. — Essa merda por si só valeu o
dinheiro que pagamos por esses assentos. — Nossos bolsos
ressoam com uma mensagem que chega e nós os verificamos
ao mesmo tempo para ver uma mensagem de Sean. É uma foto
em tempo real de nós, Dom rindo, eu sorrindo para ele.

— Habilidoso filho da puta, — Dom reflete, enviando uma


resposta enquanto olho para a imagem para ter uma ideia de
onde ela foi tirada. Olhando na direção, examino a multidão,
localizando Sean sentado algumas fileiras atrás de Elijah e
Amelia, um sorriso cheio de orgulho no rosto. Sorrindo, levanto
meu queixo para Sean enquanto Elijah e Amelia passam por
ele em direção à saída, e ele levanta as costas antes de se
levantar para segui-lo.

— Vamos fazer isso, — digo a Dom quando ele se levanta.

Dom me para com uma mão no meu braço.

— Este é dele.

Meia hora depois, depois de travessuras ou gostosuras e


descartar nossas máscaras Michael e luvas de plástico,
estávamos meio milhão mais ricos e tínhamos uma nova lista
de alvos para atingir. Graças a Sean e Dom, Elijah se tornou
um otário e Amelia foi liberada para fazer melhores escolhas
na vida. Quando o sol nasceu na manhã seguinte, Sean havia
conseguido esquecer o coração partido. Mas eu não fiz. E
quando Dom voltou da faculdade, tínhamos novas regras em
vigor para pássaros que procuram fazer ninhos. Uma marca
específica destinada a protegê-los. Uma marca que Cecelia
agora carrega.

Cortando a cebola em cubos, olho para trás para a pilha


de merda que comprei para a noite e estremeço com o fato de
que pode ser um exagero. Tive certeza de que Cecelia adoraria.
Com vontade de tomar outro gole de gim, desisto quando a luz
do sol começa a diminuir e olho para a hora no meu celular. O
café fechou há uma hora. Ela deveria estar em casa. Mando
uma mensagem para os novos pássaros de guarda.

Onde ela está?

Cafeteria.

Engulo de volta a picada que ela pode estar me evitando


e retomo meu corte.
Esticando meu pescoço para aliviar um pouco da tensão,
sento-me em um dos sofás do meu café olhando para o fogo
enquanto meu telefone carrega.

Assim que liga, vejo uma mensagem perdida de Christy.


Uma foto de seus filhos com os trajes de Halloween costurados
à mão em que ela trabalhou por meses. Amo a imagem e tiro
um texto de retorno.

Impressionante. Te amo.

As bolhas começam e param, e eu sei por quê. Não liguei


ou fiz um FaceTime para ela desde que Tobias apareceu, e sei
que ela está com raiva de mim. Quando cheguei à Virgínia,
liguei para ela todos os dias e, sendo a amiga que é, ela me
ensinou a começar uma nova vida, com o coração partido de
novo.

A merda de sempre.

Seus textos tornaram-se mais curtos, mais abruptos


ultimamente porque os meus se tornaram inexistentes. Ela
aguenta anos com essa merda minha e não merece. Ela merece
uma amiga melhor, e abusei de nossa amizade a ponto de ela
ficar seriamente chateada comigo. A verdade é que estou
cansada de mentir.

Tenho feito isso há muito tempo e prejudicou nosso


relacionamento.

Ela é minha constante, minha família, e ela merece coisa


melhor, mas é tudo parte do custo de amar Tobias. Se eu disser
que estou com ele de novo, sei que não terei o apoio dela. E
pior, se ele partir meu coração de novo, não sei se posso lidar
com o 'eu te avisei'. Então, por enquanto, estou me escondendo
em vez de mentir.

Esta manhã, eu estava pronta para ceder ao que sinto por


ele, mas logo depois de sermos interrompidos, fui atingida por
um medo corrosivo de que fazer isso poderia me levar de volta
ao ponto de partida. Fui empurrada de volta para um muitas
vezes antes.

Mas eu o amo. E o quero, muito. O desejo está ficando


mais difícil de ignorar. Estamos dormindo na mesma cama há
quase um mês, e nem uma vez me permiti me perder nele.

— Terra para Cecelia.

Olho para Marissa para vê-la balançando a cabeça. É


então que percebo que ela está parada na minha frente com o
depósito na mão, e a desliguei o tempo todo em que ela estava
tentando chamar minha atenção.

— Desculpa, o que?
— Disse que aceitaria o depósito se você quiser ir para
casa. — Ela coloca sua bolsa nos ombros e sorri para mim. —
Chefe, por favor, saiba que penso no seu melhor interesse
quando digo isso.

— Ok?

— Saia da sua miséria e foda o homem, já. — Ela levanta


uma sobrancelha quando meus lábios se abrem. — Em
primeiro lugar, eu o vi, e nem mesmo o próprio Messias vai
culpar você por fornicar pecaminosamente e muitas vezes com
ele. Você pode pensar o quanto quiser, mas combine tensão
sexual, velhas mágoas, sentimentos conflitantes e se, e vocês
dois serão hamsters de patins por algum tempo.

— Não é um hamster em uma roda?

— O que você acha que é mais difícil para o hamster?

Rio e balanço minha cabeça para ela.

— Você está louca.

— Você ainda está punindo-o.

— Confie em mim. Tenho razão para isso. Mas eu... quero


deixar isso para lá.

— Então, — ela me cutuca e sorri. — Vá para casa e


monte aquele leão de merda, rato.

— Não sou um rato, e é isso que preciso fazê-lo entender.

Ela concorda.
— Então seja persuasiva. Lute com ele se for preciso,
mas faça isso com sua calcinha mais fina. — Ela pega nossas
xícaras. — Vou enxaguar e tirar.

— Vou esperar por você.

Defino o alarme e ele começa a tocar enquanto nos


dirigimos para a porta.

— Você poderia tirar um dia de folga, sabe, — acrescenta


ela, — podemos cobrir as coisas aqui.

— Acabei de fazer ontem e vejo você amanhã.

Marissa tagarela sobre seus planos para o Halloween


enquanto tranco, avistando os dois corvos no sedan
estacionado algumas lojas abaixo. Levanto meu queixo em
saudação e agradecimento enquanto Marissa e eu saímos do
meio-fio e ela deu a volta em seu SUV.

— Não pensei que o veria novamente depois daquele dia,


mas ele tem potencial. Não sei, veremos.

Ela abre a porta do carro e sua conversa cessa.

— Meu Deus, mulher, é como falar com uma parede.

Estremeço e olho para ela.

— Desculpa. Estou apenas…

— Distraída. Está tudo bem, garota, — ela oferece


pacientemente, adicionando uma piscadela de apoio. — Vejo
você amanhã, chefe. — Ela liga seu jipe e se afasta, assim como
uma mãe de dois filhos sai do minimercado algumas portas
abaixo, distribuindo dois recipientes de abóbora laranja
recém-comprados de um saco plástico para dois ansiosos
Minions fantasiados. Ela me pega na calçada, notando-os, e
sorri, e aceno antes que ela comece a trabalhar prendendo-os
na parte de trás de seu SUV. Imagino que a vida dela seja
semelhante à de Christy na dinâmica familiar, e posso ver
claramente sua noite acontecendo. Um jantar apressado,
seguido por doces ou travessuras, antes de colocar seus filhos
com alto teor de açúcar em pijamas e depois desmaiar na cama
compartilhando um high five.

Uma vida normal.

Eu poderia ter tido isso. Tive todas as chances de ser


normal. Mas com Tobias, o normal provavelmente nunca fará
parte da equação. E a verdade essa é que me ressentia do
normal quando o tinha, todo o meu ser o rejeitava. Eu o queria,
uma vida com ele. E ele está aqui. Ele está aqui porque ele me
quer também, e o resto simplesmente não importa, porra.

O remorso percorre meu corpo enquanto imagino a ferida


de saída nas costas de Tobias enquanto ele tomava banho.

— O que você está fazendo, Cecelia? — Repreendo


enquanto as lágrimas ameaçam.

Meu coração quebra em compreensão no tempo que já


perdi, invejando-o por erros que ele já pagou dez vezes. E ele
ainda está se punindo diariamente, seu coração
continuamente quebrando. E ao invés de perdoá-lo e tentar
juntar suas peças, estou rasgando a possibilidade de uma
segunda chance para longe de nós. Enquanto ele está lutando
pelo que nós temos, eu o estou sobrecarregando com
expectativas.

Cada minuto conta, cada segundo que estou com ele é


um presente e estou desperdiçando.

— Eu me lembro de tudo, Cecelia. Cada palavra que você


disse, cada olhar que você me deu. Seus três tipos de risos, os
detalhes de seus sonhos, a maneira como suas narinas se
dilatam quando você começa a ficar chateado. A picada de seus
tapas, o sal em suas lágrimas, o ajuste de seus seios em minha
mão. A sensação da sua boca, o gosto da sua boceta, então de
que parte você precisa que eu te lembre?

— Merda. — Olhos queimando, garganta apertada,


destranco meu carro, fico atrás do volante, giro a ignição e
coloco a marcha antes de correr para fora do estacionamento
em direção ao meu rei quebrado.

Entrando em casa quinze minutos depois, meu mundo se


transforma quando vejo dezenas de mini-velas piscando por
toda a casa. Meus ouvidos se animam enquanto tento
identificar a música que está filtrando – velha, melódica e
lenta.

Beau me cumprimenta com uma lambida na minha mão,


e me curvo para coçar suas orelhas antes de correr pela sala
de estar, seguindo o som do estrépito da luz na cozinha.
Entrando, sou recebida pela visão de Tobias cozinhando, seus
antebraços musculosos em exibição enquanto ele despeja
azeite em uma panela antes de virar seus olhos de pôr do sol
para mim, seus lábios levantando em saudação. — A essa
hora?

Meus olhos lacrimejam quando o imagino na cozinha de


Roman anos atrás.

— Sim, desculpe, m-meu telefone morreu, e não gosto de


dirigir para casa no escuro sem ele carregado, apenas no caso.
Quer dizer, há um carregador no meu Audi, mas estou
acostumada a dirigir n-no Camaro.

Ele franze a testa enquanto tropeço na minha desculpa,


meu coração batendo forte quando a alegria que senti semanas
atrás ao vê-lo naquele estacionamento vem à tona. Ele me
estuda, parecendo completamente relaxado, uma bebida
intocada no balcão ao lado dele. Ele caminha até onde estou e
pega a bolsa do meu ombro, jogando-a sobre o balcão antes de
se aproximar e me virar em seus braços para desamarrar meu
avental.
— Espere, — digo, puxando um saco cheio de doces de
abóbora do meu avental, minhas bochechas corando quando
me viro e o empurro para ele. — Feliz Dia das Bruxas.

Ele olha para baixo e seus lábios se erguem.

— Obrigado.

— É bobo, eu sei.

— Não é bobo. — Ele acena com a cabeça por cima do


ombro, um sorriso tímido brincando em seus próprios lábios
enquanto olho para a mesa da cozinha cheia de... tudo que se
possa imaginar, mais notavelmente duas abóboras maduras
para entalhar.

— Você quer fazer o Halloween comigo?

Ele acena enfaticamente, voltando-se para mim, uma


carranca no lugar quando ele vê as lágrimas nos meus olhos.

— O que há de errado?

— Eu te amo, — deixo escapar. — Lamento ter tornado


isso tão difícil para você.

Ele procura meus olhos.

— Não, Tesor, eu mereço...

— Ser feliz. Nós dois merecemos.

Ele segura meu rosto com as mãos, alívio em seus olhos


enquanto jogo meus braços em volta dele e o beijo. Ele geme
de surpresa quando amplifico o beijo, mostrando a ele o quanto
estou com fome, e ele inclina minha cabeça, mergulhando
profundamente enquanto estamos no meio da minha cozinha
e exploramos, um gemido baixo deixando minha garganta
enquanto ele cede e agarra a parte de trás da minha camisa
enquanto me puxa com força contra seu peito. Ele fecha nosso
beijo antes que eu esteja pronta e me vira na direção do meu
quarto.

— Tome um banho. Temos muito que fazer e um jogo de


xadrez para começar. Se apresse.

Aproveitando a deixa com um leve tapa na bunda e um


pequeno salto em meus calcanhares, ando pela sala para ver
que ele limpou a casa imaculada e passou o aspirador. Não há
nada fora do lugar. O fogo me aquece enquanto caminho, o
ambiente me relaxando ainda mais quando paro na porta do
quarto para ver se minha mesa foi limpa de desordem, os livros
colocados nas prateleiras e organizados. Em cima da minha
mesa está um diário encadernado em couro com uma escrita
recém-escrita e uma caneta ao lado dele.

Cher Journal,

Conheci meu avô, o pai de Abijah, quando tinha 21 anos


em um parque em Paris. Ele me enviou um convite para me
juntar a ele em sua mesa por meio de um mensageiro. Ele estava
cuidando de mim durante os anos que estive em Paris, algo que
me confortou muito depois do fato. Antes de nos conhecermos,
passei anos procurando parentes de minha mãe para me ajudar
e tive a porta fechada na minha cara por ser filho de Abias. Este
não foi o caso de Abel.

Meu avô nunca me tratou como outra coisa senão seu


amado neto. E ele nunca me ressentiu pelo abandono de Abias
por minha mãe. Depois de nosso primeiro encontro, ele passou
todos os sábados comigo durante meses, ensinando-me o jogo
que ele mais amava, enquanto me transmitia tudo o que sabia
sobre a vida e a estratégia do xadrez. Sempre acreditei no
ditado 'escute os mais velhos' e, embora ele se encaixasse nos
critérios, era muito mais sábio do que qualquer outro homem que
encontrei antes e depois de conhecê-lo, com uma exceção – meu
irmão.

Com o Abel senti uma afinidade próxima da minha ligação


com o Beau, e talvez um pouco mais, pela relação consanguínea.

Sempre me senti culpado por isso.

Mas depois de anos vivendo principalmente na solidão na


cidade, eu tinha alguém, um amigo por meio de família.

Ele era um homem estranho e ria de coisas que muitas


vezes eu não entendia sem que ele as explicasse. Ele vivia de
uma dieta de pão francês, queijo, maçãs e o café mais forte que
se possa imaginar e muitas vezes exigia que eu trouxesse tudo
antes de jogar nosso jogo.
Foi no outono daquele ano que apareci no parque com uma
sacola com suas coisas favoritas em mãos para descobrir
nossas peças ainda em jogo da semana anterior.

E eu sabia que ele havia partido.

Mas o que ele me deixou foi um sentimento de família que


não sentia em ninguém além de Dom desde que meus pais
morreram. Aprecio o tempo que passamos juntos. Na maioria
das vezes, sentia que ele tinha sido um jogador importante em
um ponto de sua vida, e ele fazia alusão a isso muitas vezes
sem muitos detalhes, embora nunca realmente confessasse. No
entanto, estava claro que havia muitos aspectos de sua vida dos
quais ele se envergonhava profundamente. O mais assustador
é que ele era um pai militante. Talvez eu fosse sua maneira de
lidar com sua dor ao perder seu único filho, minha empresa um
alívio para parte de sua dor. Mas por alguma razão ele estendeu
a mão – valeu a pena para mim apenas conhecê-lo.

Não consigo lembrar suas últimas palavras para mim. E


como um homem com uma memória extensa, esse fato irônico e
cruel me deixa perplexo até hoje. Tenho certeza de que sua
despedida naquele dia foi repleta de calorosos e conselhos
sutis. Porque apesar do homem que poderia ter sido, ele morreu
um homem bom, um homem que eu admirava e honestamente,
um homem que comecei a amar como uma família.

Quando fui ao funeral como seu único parente vivo, senti a


força daquela mentira e decidi que um dia, procuraria meu pai
biológico para tentar obter-lhe os cuidados de que precisava
para honrar Abel. Não sei se acredito na vida após a morte, mas
quero porque não tenho mais um parente vivo próximo, e é
reconfortante pensar que todos podem estar reunidos em algum
lugar e esperando.

Gosto de pensar que, se existe uma vida após a morte, Abel


descansou mais facilmente quando finalmente encontrei Abijah
sabendo que ele foi cuidado e não estava sozinho quando
morreu. E talvez agora, os dois tenham paz.

É uma questão que me atormenta com frequência, a


existência de vida após a morte, e tem feito isso desde que meus
pais morreram. Uma pergunta com a qual luto diariamente,
principalmente devido à culpa.

Porque se formos verdadeiramente olhados, e aqueles que


faleceram puderem nos ouvir, minha confissão é esta –

Não falei uma palavra com meu irmão desde que ele
morreu.

Todos os dias me pergunto se ele espera notícias minhas.

E mesmo com a culpa de que ele possa estar esperando,


não consigo encontrar as palavras. Eu não sei se irei.

Com um inchaço na garganta, fungo e vejo uma mudança


na minha visão periférica e olho por cima do ombro para ver
Tobias me observando, com os braços cruzados, encostado na
porta.
— É isso que você quer?

Em sua cabeça, é o que pedi.

Concordo.

— Sim.

— Isso posso fazer.

— Sinto muito.

— Foi há muito tempo.

— Não parecia muito tempo atrás quando li. Você já


perguntou sobre Abias?

— Não, nunca consegui reunir coragem porque acho que


era muito doloroso para ele falar sobre isso.

Volto minha atenção para o diário e passo a mão pela


página.

— Obrigada.

— Esta é a única vez que vou assistir você lê-lo. Se você


lê ou não minhas confissões, depende de você. E Sensodyne.

— O que?

— A pasta de dentes que gosto. — Ele encolhe os ombros.


— Tenho gengivas sensíveis.

Não posso evitar minha risada enquanto fungo o resto das


minhas lágrimas.
— Eu te amo.

— Eu sei, — ele enfia as mãos nos bolsos. — Lamento que


seja uma tarefa tão difícil.

— Não é tão difícil. — Ando até onde ele está e ele segura
meu rosto, seus olhos brilhando com afeto.

— Você quer outra confissão?

Aceno, presa em suas mãos.

— Nunca tive uma namorada de verdade até você. Você


foi minha primeira e única. — Seus olhos são sérios, suas
palavras rasgam meu coração quando ele fala. — Um flerte,
jantares, sexo, mas nada mais, e Alicia era... uma distração.
Ela foi gentil e tentou cuidar de mim, não importa o quanto eu
resistisse, mas não era real, não compartilhamos uma vida , —
ele passa os polegares ao longo do meu queixo, — não cortando
abóboras ou um peru, ou escolhendo uma árvore de Natal,
conhecendo os pais. E nunca pensei que iria querer essas
coisas, mas quero. E quero fazer essas coisas com você.

— Você quer ser normal comigo? — Pergunto enquanto as


lágrimas não consigo evitar brotar e derramar.

— Eu quero, — ele murmura, enxugando-as. — Por que


você está chorando de novo, Tesor?

— Porque estou bem em ser um rato… às vezes.

Suas sobrancelhas se contraem em um V profundo.


— O quê?

— Você não tem que entender.

— Também te amo, rato. — Ele se inclina e me beija


novamente, e sinto a força disso nos meus dedos dos pés
quando ele se afasta, e a incerteza atravessa suas belas feições.
— Não sei se serei um bom namorado.

— Você era quando estávamos juntos, além de, você sabe,


mentir e manipular, e ainda é, muito bom nisso.

— Tesouro, quero o Halloweenie com você, o Dia de Ação


de Graças com você, e o Natal com você, mas...

Não posso evitar minha risada.

— Halloweenie?

— Sim, com você.

— Hallow-weenie. É isso que você está dizendo, certo?

— Sim. — A linha se enruga em sua testa. — Foi o que


disse.

— Tobias, não há Hallo weenie.

— Sim, existe, — ele insiste. — Minha mãe dizia isso o


tempo todo.

Bufo.

— Tobias, é apenas Halloween.


Ele me olha como se eu fosse uma ignorante.

— É o evento, uma ocorrência, você sabe, o que você faz


no dia de… — Ele solta meu rosto, jogando a mão em sua
explicação. — Há canções de Natal e canções de natal.
Halloween e Halloweenie... — Ele franze a testa como se
estivesse começando a soar estranho para ele.

A risada irrompe de mim enquanto seguro seu rosto

— Ah, pobre homem, acho que sua mãe perdeu aquele


na tradução. Você tinha acabado de se mudar da França,
certo?

Ele acena lentamente.

— Você tem trinta e sete anos. Como é possível que você


ainda acredite que esse é o palavreado certo?

— Não comemoro feriados, então é uma conversa rara, —


ele diz secamente. — A mulher da loja não me corrigiu hoje.

— Talvez seja porque você é um estrangeiro assustador e


malvado, e eles estão apavorados com isso.

Juro que vejo sua pele morena.

— Tobias, meu amor, sinto muito, mas não existe


nenhum ato de Halloweenie.

— Tanto faz, — ele bufa. — Você vai me deixar falar?

Lábios tremendo com uma risada ameaçadora, aceno.


— Quero uma trégua temporária.

— Tipo?

— Nenhuma conversa de clube de qualquer tipo, só você


e eu. Só nós, Cecelia. É por isso que vim aqui, por nós. Não se
trata da porra do clube ou do papel que ele desempenha
conosco. E é isso que parece que não conseguimos superar.

— Por quanto tempo?

— Podemos aguentar dia após dia?

— Halloweenie por Halloweenie? — Ele rosna e rio.

— Desculpe, mas é hilário.

— Mantenha isso. Posso estrangular você esta noite.

— Ooooo, uma reconstituição de Halloweenie. — Balanço


minhas sobrancelhas. — Nós vamos brincar de se vestir?

— Sim, — ele fala em tom monótono. — Você brincará de


lenhador.

— O quê?

Ele dirige os olhos para o pijama esperando na minha


cama.

— Har, har.

— Então? Podemos concordar com um cessar-fogo? —


Sua expressão muda, o olhar em seus olhos implorando.
— Uma trégua temporária parece perfeita para mim.

— Bom. Tome um banho. Temos muito que fazer. Uma


lista de rituais de Halloween, e estou fazendo chili de peru.
Deanna disse, é um bom Hello... — ele se interrompe, e eu
pressiono meus lábios, — ween comer uma noite fria.

— Quem é Deanna?

— Ela é minha caixa.

— Você tem uma caixa?

— Não, bem, vou para sua fila. — Ele morde o lábio. —


Toda vez.

Levanto uma sobrancelha. — É assim mesmo?

Ele concorda. — Eu confio nela.

— Deveria estar preocupada?

Ele revira os olhos. — Ela é jovem.

— Agora estou realmente preocupada.

— O namorado dela, Ricky, trabalha em uma loja de


bebidas e eles têm dois filhos.

— Você com certeza sabe muito sobre ela.

— Ela me ajuda, — ele explica vagamente.

— Ajuda com o quê?


— Com você, — ele diz suavemente, e meu coração dá um
aperto no fato de que ele está recebendo conselhos sobre
relacionamento de uma garota do caixa.

— Bem, você deve confiar nela. Você fez bem. — Fico na


ponta dos pés e escovo meus lábios contra os dele. — Você já
venceu todos os primeiros encontros que já tive.

Meu sentimento o comove, e ele me beija, realmente me


beija antes de me soltar muito cedo. Seus olhos passam por
mim antes que ele se vire e volte para a cozinha e mordo meu
lábio, olhando para ele até que ele desapareça com Beau em
seus calcanhares.
Água jorra do rosto de Tobias enquanto ele
triunfantemente levanta a maçã com os dentes. Seus olhos
estão dançando com a vitória enquanto bato palmas para ele
quando ele sacode a água do cabelo como um cachorro
encharcado.

— Bom trabalho, King. Pesca para maçãs, check, — digo


entre uma risada, — mas você não precisava que colocar toda
a sua cabeça dentro.

Ele enxuga o rosto com um pano de prato.

— Não vejo o sentido disso.

— Nem eu, realmente. É apenas uma coisa.

— Acho que vamos pular no ano que vem, — ele diz


enquanto passa a toalha no pescoço, e meu coração se aquece
com a ideia de mais um ano. Ele joga a maçã no jornal que
estendemos no chão, quando meu curioso vira-lata se interpõe
entre nós, mergulhando o focinho na grande lata de maçãs.
— Não, — Tobias rebate, e Beau dá um pulo para trás
antes de juntar uma pilha de entranhas de espaguete de
abóbora em suas patas e arrastá-la com ele.

— Ah, vamos! — Choro enquanto Beau tenta escapar.


Tobias consegue pegá-lo, enxugando seus pés antes de deixá-
lo sair pela porta dos fundos. Destruo o jornal enquanto Tobias
acende as velas em nossas abóboras prontas. Aproximo-me e
apago a luz da cozinha enquanto ele coloca a tampa de volta
na minha e me junto a ele onde está enquanto examinamos os
dois sobre a mesa.

— Bem, acredito que você ganhou, — digo, admirando


sua abóbora cheia de corvo. — É incrível.

— O seu é terrível, — ele retruca, olhando para a minha


lanterna de abóbora.

A risada explode de mim enquanto considero sua


expressão séria.

— Tudo bem, namorado 101, mesmo que seja horrível, ou


pareça gorda em meus jeans, minta para mim.

— Agora você quer que eu minta?

— Você é um idiota.

— Vamos, — ele ordena, pegando sua abóbora. — Temos


que colocá-los na varanda para espantar os maus espíritos.

Sorrindo, pego minha abóbora terrível e o sigo até a


varanda. Nós as sentamos lado a lado na noite congelante e
estrelada. Envolvendo seus braços em volta de mim, ele me
puxa de volta em seu peito enquanto examinamos meu jardim.
As árvores ao longo da calçada estão quase vazias, mas a vista
é pitoresca devido ao tamanho do quintal e à lua distante
brilhando acima do campo do outro lado da rua.

— É tranquilo aqui, Cecelia.

— Mas?

— Não, mas eu ajustei. Vamos. Está frio.

Assim que nos viramos para entrar, vejo um objeto escuro


correndo em nossa direção e grito quando fica à vista, no nível
dos olhos, e paira a poucos metros de distância.

— Não tenha medo, — ele ri. — É apenas Tyler dizendo


oi, — ele levanta a mão e mostra o dedo médio.

— Isso é um drone.

— Sim.

Sim, apenas o seu Halloween normal, normal, todos os


dias, Cecelia. Mas nenhuma parte de mim se ressente disso.

— Desde quando temos drones?

— Eu te disse.

— Não, você não disse. Tenho certeza de que me


lembraria de você me dizendo que temos drones.

— Oh, — lembra ele, — disse a seus pais.


— Bem, com certeza ajudou que eles soubessem. — Olho
de volta para ele, e ele me mostra remorso.

— Desculpa.

— Este é um excelente exemplo de por que você estará


para sempre na casa do cachorro, King. — Volto para onde o
drone está e aceno com entusiasmo para Tyler antes de
começar a mandar beijos.

Atrás de mim, Tobias rosna, antes de me empurrar de


volta para dentro de casa e me prender na parte de trás da
porta. Ele vira a fechadura três vezes, colocando as mãos perto
da minha cabeça, estreitando os olhos.

— Você não dá isso.

— Não?

Ele empurra o queixo.

— Não. Não negociável.

— Um homem tão ciumento. É uma coisa boa eu não


querer beijar mais ninguém.

— Não?

— Não, — sussurro e mordo meu lábio, antecipação


vibrando por mim quando ele levanta o dedo, puxando-o dos
meus dentes antes de correr o polegar ao longo dele, seus olhos
se fechando. Ele se inclina e dá um breve beijo em meus lábios,
seu olhar descendo para o meu pijama antes de se afastar.
E agora estou começando a odiar minhas próprias
flanelas.

— Qual é o próximo? — Pergunto, seguindo-o de volta


para a cozinha.

Vinte minutos depois, depois de dividir um baseado com


maçãs caramelo, damos o sinal do Halloween e nos revezamos
enfiando pipoca na boca um do outro. Espantada com o rumo
que este dia tomou, eu o estudo através da luz bruxuleante das
velas e dos flashes de luz do filme. Vejo Tobias assistir ao filme
de terror pela primeira vez.

Sou sua primeira namorada e seu único amor. A verdade


sobre isso afunda enquanto acaricio seu peito através de sua
térmica.

Fazer parte dos primeiros nunca envelhecerá, não


importa o quão grande ou pequeno seja. É dolorosamente óbvio
que ele perdeu muita vida e, por causa disso, há uma espécie
de inocência sobre ele que ainda está lá, apesar de sua idade e
do tipo de vida que levou até este ponto. Não foi proposital. É
assim que aconteceu. E a verdade disso é tão atraente que não
posso deixar de me enterrar mais profundamente nele,
puxando-o para mais perto de mim.

Ele merece essas férias só para poder viver um pouco sem


as expectativas do clube. Da mesma forma que fez naqueles
curtos meses em que estivemos juntos, mas mesmo assim, ele
estava trabalhando. Ele é um homem livre agora, e estou
determinada a tornar isso bom para ele. O que ele precisa de
mim é tão simples. Ele precisa que eu lhe assegure que está
tudo bem viver para si mesmo, para sua própria felicidade,
porque ele não sabe o que é viver se não o está fazendo por
outra pessoa. É um hábito que terei dificuldade em quebrar,
embora seja uma das coisas mais incríveis sobre ele, mas ele
já sofreu o suficiente por isso. E, na verdade, parece um hábito
inquebrável, visto como ele fez isso a maior parte de sua vida.

Mas qualquer pequena vitória para mim será uma doce


perda para ele. No entanto, com o tempo, vou forçá-lo a tomar
decisões com base no que ele deseja – ser um pouco mais
egoísta com suas próprias necessidades. Ele passa a mão ao
longo das asas nas minhas costas enquanto pressiono um
beijo em sua garganta. Seus olhos se voltam para os meus
quando a faixa familiar do serial killer começa a tocar, seus
braços musculosos apertando em torno de mim enquanto ele
volta sua atenção para a tela e distraidamente me acaricia com
os dedos.

Melhor Halloweenie de todos.


Um pouco depois da meia-noite, espreito para fora do
banheiro e localizo Tobias em sua boxer preta, empoleirado
contra a cabeceira da cama onde ele trabalhou em seu laptop
desde que entramos de andar com Beau. Fechando a porta,
abro a torneira e puxo a caixa de debaixo do armário do
banheiro, onde a coloquei antes. Puxando o laço que o amarra,
reúno o que preciso e coloco de volta embaixo da pia antes de
tirar e aplicar a loção de zimbro na minha pele. Meus mamilos
ficam tensos em antecipação enquanto me arrumo, carregando
minha escova de dentes antes de esfregar meus dentes.

Mil borboletas rodopiam em meu estômago enquanto


enxáguo minha boca e corro meus dedos pelo meu cabelo.
Verificando minha aparência uma última vez, apago a luz e
abro a porta. Examinando-o onde ele está sentado, bebo cada
centímetro de seu corpo musculoso, o pulso acelerando
enquanto meus olhos sedentos o devoram. Seu cabelo ônix
está despenteado. Seus traços elegantes são delineados pela
concentração enquanto ele digita, concentrado em sua tarefa.
Seus musculosos antebraços flexionam, levantando o
travesseiro para ter um vislumbre do V profundamente
gravado que começa em seu quadril. A umidade se acumula
entre minhas pernas enquanto permaneço na porta, ficando
com mais sede a cada segundo. É apenas quando me movo
para ficar no final da cama que ele pausa os dedos sobre as
teclas, lentamente levantando os olhos da tela para onde estou.
Uma centena de emoções passou por seus olhos ardentes
antes de brilharem sobre a lingerie que ele comprou para mim
anos atrás.

Minha barriga afunda quando ele fecha lentamente seu


laptop enquanto fico esperando, a pele zumbindo, o coração
trovejando, enquanto ele se ajusta no colchão com os punhos,
aproximando-se do final da cama. Em segundos, estou entre
suas pernas abertas enquanto ele pressiona sua testa contra
meu estômago, correndo para frente e para trás ao longo do
material sedoso.

— Cecelia, — meu nome sai estrangulado enquanto ele


levanta os olhos para os meus, deixando minha pele em
chamas. Erguendo o queixo para descansar no meu estômago,
ele apalpa minhas panturrilhas na mais suave das carícias
antes de lentamente começar a trabalhar seu caminho para
cima.

— Muitas vezes fui tentada a jogá-la fora, — confesso em


um sussurro. — Fiz uma ou duas vezes – o arco tem uma
mancha de ketchup, — grito, seu toque eletrizante, enviando
arrepios na minha carne, — mas nunca consegui me separar
dela. — Arranco seu cabelo enquanto ele olha para mim, suas
mãos lentamente subindo enquanto seus dedos passam ao
longo da parte de trás das minhas coxas. — Costumava dormir
com ela nas noites difíceis e dizer a mim mesma que talvez se
a usasse..., — luto com a memória, — talvez seja na noite em
que você voltasse para mim. É... estúpido, eu sei, mas é o
quanto senti sua falta.

— Não é estúpido, — ele sussurra com a voz rouca,


deslizando as mãos sobre a curva da minha bunda para me
encontrar nua. Uma maldição suave o deixa enquanto ele
acaricia minha pele, espalhando fogo por todo o meu corpo
zumbindo.

— Macia, — ele murmura, as palmas das mãos


levantando o material para me mostrar a ele. — Sensual, — ele
se curva, passando a língua ao longo da minha fenda. —
Delicada, — ele continua, repetindo as palavras com que me
seduziu na primeira vez que deslizou a camisola pelo meu
corpo. — Linda, tão linda, — ele me puxa para frente com mãos
acenando, inclinando meus quadris enquanto chupa todo o
topo da minha boceta com fervor. Seus cílios escuros vibram
fechados enquanto ele me espalha com uma língua
exploradora, sussurrando sobre meu clitóris latejante.

— Tobias, — meu gemido necessário o alimenta, e ele se


levanta, segurando meu rosto antes de esmagar nossas bocas.
Ele lambe minha boca enquanto deslizo minha palma em seu
estômago musculoso. Combino suas lambidas sedentas,
alcançando sua boxer e agarro seu pau grosso na minha mão,
esfregando o pré-semen fora da coroa gorda com meu polegar.
Seu gemido vibra na minha boca enquanto eu o aperto da
raiz às pontas. A fome tomando conta, quebro o nosso beijo e
caio de joelhos, puxando sua boxer para baixo enquanto vou.
Agarrando sua bunda, agarro-o com firmeza, movendo meus
olhos para os dele antes de lamber meus lábios e levá-lo para
o fundo da minha garganta.

— Putain. — Porra. Ele agarra meu cabelo em um esforço


para me controlar enquanto, fico selvagem, levando-o mais
fundo, sufocando em sua circunferência enquanto a saliva
balança de meus lábios.

— Cecelia, — ele sibila enquanto chupo seu comprimento


venoso na cabeça grossa antes de mergulhar novamente, meus
olhos nunca se desviando dos dele. É quando começo a
explorar vagarosamente, lambendo ao longo da lateral de seu
eixo enorme que ele me puxa de joelhos. Em um flash, estou
presa na cama apenas por seu beijo enquanto ele mergulha
seus dedos grossos entre minhas coxas, esticando-os para me
preparar. E na próxima respiração, ele está de costas, me
levantando facilmente antes de me posicionar para sentar em
seu rosto, sua língua mergulhando em mim com lambidas
meticulosas enquanto agarra meus pulsos, prendendo-os no
topo das minhas coxas.

A luxúria assume enquanto ele me devora, sua língua me


atacando enquanto me mantém à sua mercê. Sinto cada
impulso enquanto ele me come, seu gemido vibrando na minha
metade inferior antes que ele finalmente libere minhas mãos.
— Levante, — ele ordena, e o faço, inclinando-me para a
frente para apoiar as palmas das mãos no colchão. Ele me
ajusta para pairar onde ele quer antes de usar seus dedos e
língua até que eu esteja tremendo com o ataque. Ele martela
sua língua contra o meu clitóris, nunca parando enquanto
seus dedos sondam, esticam, foda-se. A construção se
intensifica até que estou gaguejando entre implorar e
respirações rápidas. Ele levanta a cabeça para mergulhar mais
fundo, seu cabelo preto fazendo cócegas em minhas coxas
antes de ele chupar tudo de mim entre seus lábios, beijando
minha boceta tão completamente quanto ele faz em minha
boca antes de me condenar entre lambidas e relaxadas.

— Dois-je te laisser aller? — Devo libertar você?

Sua respiração atinge meu clitóris antes que ele aplique


sua língua ao longo dele, me roubando assim que eu começo a
subir.

— Tobias, — imploro, esfregando contra sua boca por


mais fricção, tão perto que posso sentir os primeiros tremores
do meu orgasmo. Ele olha para mim, a bainha da minha
camisola dançando ao longo de seu rosto e pescoço, e eu a
levanto para ter uma visão melhor dele embaixo de mim. Seus
olhos se fecham enquanto ele circula seu dedo, beliscando meu
clitóris antes de se afastar.

— Dois-je être indulgente? — Devo ter misericórdia de


você?
Outra lambida tortuosa enquanto ele passa um dedo
habilidoso ao longo do meu clitóris. E grito de frustração
quando ele me atinge.

— Tu n'en as pas fait preuve envers moi. — Você não


mostrou nada para mim.

— Deixe-me gozar, — assobio, puxando seu cabelo


enquanto ele enfia a língua dentro para substituir o dedo,
segurando minha bunda para ir mais fundo.

— Por favor, — imploro enquanto ele passa a palma da


mão sobre meus seios cobertos de seda, moldando e
apertando, sua boca trabalhando em um frenesi até que estou
tão apertada com a necessidade que mal posso respirar.

Seu rosnado soa um segundo antes de ele fechar os lábios


em volta do meu clitóris e chupar, e com o aceno de seu dedo,
desabo. Ele agarra meus quadris enquanto o monto, correndo-
me para frente e para trás ao longo de sua boca celestial
enquanto estalo, quase gritando quando chamo seu nome.
Encharcado e tremendo no rescaldo, ele continua a me lamber
até que meu barato tenha diminuído parcialmente.

E então estou de costas, enquanto ele geme contra minha


boca, seus olhos exigentes. Pairando, ele separa minhas coxas
com as palmas das mãos, levantando minhas pernas antes de
correr sua cabeça grossa pelas minhas dobras em uma
provocação perversa.

— Por favor.
Meu núcleo dói com extrema necessidade enquanto ele
me provoca, massageando meu clitóris com sua coroa até que
estou me contorcendo embaixo dele.

— Olhe para mim, — ele comanda. Levanto meus olhos


para suas profundezas derretidas enquanto ele penetra em
mim com um impulso de quebrar a terra. Minhas costas se
curvam enquanto olho para ele, a boca entreaberta, a
respiração saindo de mim assim que seus olhos fecham.

— Putain. Mon Dieu. — Porra. Meu Deus.

Sufocando com a invasão, minha boceta pulsa


dolorosamente, esticando-se ao redor de cada centímetro dele
enquanto seus olhos se abrem.

— Me perdoe. — Ele agarra minha garganta, recua e


impiedosamente penetra novamente. Grito enquanto ele rasga
através de mim com abandono, minhas coxas tremendo
enquanto ele empurra seus quadris e me fode como se eu
estivesse prestes a desaparecer.

Com traços implacáveis, cavo minhas unhas em seu peito


enquanto ele fica de joelhos, afastando minhas coxas ainda
mais, seu olhar mergulhando para onde nos conectamos
enquanto ele dirige novamente. Sigo, ficando igualmente
paralisada com a visão de nós nos conectando.

— Ma chatte. Mon corps. Ma femme. Meu coração. Ma


vie. — Minha boceta. Meu corpo. Minha mulher. Meu coração.
Minha vida.
Suas palavras me levam a uma queda livre, outro
orgasmo me paralisando, me dominando até que estourei em
respirações rápidas com a pressa. Ondulando com tremores
secundários, ele abaixa a cabeça, beijando-me freneticamente,
lábios grossos escovando cada centímetro de pele exposta
antes de chupar meu seio coberto de seda em sua boca,
puxando o material para chupar o outro. Ele começa a tremer
acima de mim, seus beijos se tornando frenéticos, sua foda tão
apressada como se estivéssemos correndo sem tempo.

Seu peito brilha com uma fina camada de suor enquanto


ele me assola, implacável, até que sinto a mudança, sinto ele
vacilar. Beijo seu pomo de adão enquanto ele engole um
grunhido e me segura por baixo dos braços para segurar meus
ombros, as mãos espalmadas sobre minhas asas enquanto
nossos peitos roçam.

— Sinto muito, — ele resmunga baixinho, desacelerando,


rolando suavemente para dentro de mim, capturando minha
boca e empurrando sua língua para acompanhar seu ritmo. É
então que sinto o gosto do sal em seu beijo, enquanto sons
desesperados começam a sair dele. Meus olhos ardem
enquanto tento o meu melhor para acalmá-lo.

— Tobias, — murmuro enquanto ele abaixa a boca


salpicando beijos de desculpas ao longo do meu pescoço.

— Je t'ai perdue, — eu perdi você, ele range enquanto


levanta a cabeça, a crueza em seu olhar me agarra, apertando
meu coração com tanta força que choramingo ao perder a
última proteção que tinha. Isso não é transar ou fazer amor. É
a reunificação de duas almas dilaceradas no pico da
descoberta. E eu sei que é o que ele sente agora enquanto a
consciência flui entre nós e nós novamente nos tornamos um,
não deixando nenhum vestígio de qualquer espaço existente.

Nós nos movemos juntos sem esforço enquanto ele treme


acima de mim, agarrando a borda do colchão e balançando em
mim com estocadas profundas – me enchendo de novo e de
novo enquanto ele murmura seu amor, sua devoção, suas
desculpas. Mapeio seu peito antes de correr meus dedos ao
longo de seus bíceps. Seus olhos não procuram mais, mas
sondam mais profundamente em mim, navegando facilmente
para o lugar dentro que só ele é capaz de alcançar.

A conexão renovada entre nós parece molecular e dói


enquanto cura. Tenho certeza de que se Deus me desse apenas
um minuto de vida nesta terra, gostaria que fosse este minuto,
este momento com ele, onde sei exatamente porque estou viva
e para quem.

Olhando para o amor da minha vida, o aceito totalmente


de volta em seu lugar no meu coração, cedendo à única coisa
que nunca tive controle, e nunca terei enquanto seu próprio
coração bater.

Porque é meu.

— Eu te amo, — murmuro.
E com um último impulso e minhas palavras
sussurradas, ele goza.
Tobias me embala na minha banheira com pés depois de
horas do sexo mais intenso da minha vida. Ele já está duro,
apesar de nossa última sessão exaustiva onde nossas únicas
palavras foram pronunciadas suavemente 'eu te amo' entre
gemidos cheios de prazer, grunhidos e respirações
desesperadas. Nós nos desperdiçamos com nossa ganância ao
tentar curar um ao outro com nossos corpos, lábios e mãos
necessitadas. Quando ele levanta um pano quente e
encharcado e o passa pelos meus ombros, me inclino para
frente, dando acesso a ele, minhas mãos apoiadas em suas
coxas musculosas.

— Você acha que somos amaldiçoados? — Pergunto, e ele


acalma o pano, meditando sobre a minha pergunta antes de
passar pelo centro das minhas costas.

— Acho que às vezes somos nossos piores inimigos e


permitimos que muitas forças externas nos separassem. Eu
especialmente.

— Cruzado, — sussurro.

— Não discordo.
— E as outras forças externas? Onde diabos estavam
nossas fadas madrinhas quando precisamos delas?

Ele grunhe em concordância.

— Eles fizeram um trabalho péssimo.

— Cupido? — Pergunto.

— Ele atirou muitas flechas em você.

— Bem, ele também está demitido. Ninguém apareceu


para nós?

— Não.

— Os Santos?

— Nenhum, — ele sussurra, correndo os dedos ao longo


do meu estômago enquanto eu deito para descansar em seu
peito. — Nem Lady Luck, nem Pai Tempo, nenhum deles.

— Idiotas, — pigarreio. — Quem mais deveria estar


cuidando de nós?

— Bem, aí está Deus. Mas acho que o irritei antes de


nascer.

Sua declaração puxa meu coração.

— Não, você não fez, Tobias. Apenas lembre-se, Jó era


um dos favoritos, e Ele tirou tudo dele, suas riquezas, sua
família, tudo o que ele tinha antes de atormentá-lo com
doenças para provar um ponto para o diabo. Ele o colocou no
inferno, então talvez não seja tão bom ser o favorito de Deus.

— Bem, nesse caso, talvez eu seja um dos favoritos

Corro minhas unhas ao longo de suas pernas.

— Você é meu favorito e o melhor homem que já conheci.

Seus dedos ainda.

— Depois de tudo que fiz você passar, você acredita que


sou um bom homem?

Me viro em seus braços e monto nele, e ele entrelaça seus


dedos na parte inferior das minhas costas, suas sobrancelhas
franzidas.

— Você é um homem incrível. Você revelou suas


verdadeiras cores quando estávamos juntos antes. Nos últimos
anos, suas ações foram principalmente devido à dor, e você
ainda está com dor, meu amor. Não vou começar a apontar
todas as suas falhas porque foda-se, tenho as minhas, mas o
seu âmago é feito de ouro puro, e nada do que você diga ou
faça vai me convencer do contrário.

Sem palavras, ele segura minha nuca, passando a palma


da mão pelo meu cabelo encharcado.

— Você diz que não gosta da minha percepção de você,


francês, mas minha percepção não é distorcida. Eu amo todas
as partes, todos os lados de você, bons e maus. Essa coisa
entre nós ainda é nova. Não vamos sair perfeitos direto do
portão. Mas todos vocês têm tudo de mim, meu Rei teimoso,
sempre.

Seus olhos rolam pelo meu corpo, me aquecendo por


dentro.

— Podemos não ser perfeitos, mas você é.

— Não, não sou, mas superei o fato de que às vezes não


vou conseguir o que quero com você. As birras precisam cair
no esquecimento em algum ponto do que é importante.

Ele morde o lábio brevemente.

— É estranho dizer que você soa como o Sean?

Encolho os ombros.

— É estranho dizer que Sean se parece com você?

Ele olha para baixo.

— É estranho que as pessoas se sentem em banheiras


cheias de sujeira, pensando que isso as torna limpas? Posso
ver a escória flutuando no topo desta água.

— Não, seu puritano francês, mas banhos são bons para


uma mulher que foi dobrada como um pretzel e martelada até
quase desmaiar. E não destrua minhas habilidades de limpeza.

— Não sou, Tesor. — Ele esfrega o polegar e o dedo


indicador juntos em inspeção. — Você não tem absolutamente
nenhum.
— Ou talvez você só precise de muita manutenção.

Ele levanta os quadris, correndo sua ereção ao longo do


meu centro, batendo no meu clitóris apenas... então.

— A manutenção me atrai muito. — Seus olhos brilham


e balanço minha cabeça com um sorriso enquanto ele traça
meu mamilo com o dedo, levando-o a um pico rígido.

— Diga-me algo que não sei, francês.

— O que você quer saber?

— Qualquer coisa que eu não sei, o que aparentemente é


muito.

Ele junta o cabelo do lado do meu pescoço e morde a pele


do meu ombro antes de acalmá-lo com seus lábios
exuberantes.

— Fale, King. Vou parecer abatida no trabalho amanhã.

— Você não vai trabalhar amanhã.

— Veremos.

— Um dia. Você não reservou um único dia para mim


desde que cheguei aqui.

— O que faremos neste dia?

Ele puxa meus quadris novamente e gemo.

— Tobias, não posso.


— Então me deixe. — Mesmo na água, sinto-me pegajosa
enquanto ele esfrega um dedo ao longo do meu clitóris antes
de enrolá-lo dentro de mim.

— Não usamos camisinha, — indico. — Todas as quatro


vezes. — Seu dedo se imobiliza antes que ele o afaste, apoiando
as duas mãos na lateral da banheira.

— Você está no controle de natalidade. Vi no armário.


Você leva isso religiosamente.

Concordo.

— Então, essa conversa é necessária?

— Não é?

Sua mandíbula lateja, mas sua pergunta sai dolorida.

— Você esteve com alguém desde mim?

Balanço minha cabeça.

— Não, Tobias, não, claro que não.

Faço a mesma pergunta sem palavras.

— Cecelia, — ele suspira. — Não, porra, não. Naquela


noite, peguei você tão rudemente... e nas semanas após você ir
embora, não conseguia nem olhar para mim.

— Pensei tanto, mas...

Ele balança a cabeça, me interrompendo.


— Mesmo quando era solteiro, nunca me dediquei muito
às mulheres, — confessa. — E eu tive muitas chances.

— Com modelos de lingerie, — acrescento secamente.

— E uma estrela de cinema francesa, — ele diz com uma


piscadela.

— Foda-se, King, — me movo para sair de seu colo, e ele


me imobiliza facilmente, uma risada satisfeita saindo de seus
lábios.

— Aí está minha bebê ciumenta.

Torço meu nariz.

— Não é saudável para nenhum de nós.

— É quem somos e como nos sentimos quando se trata


um do outro. E então nós realmente não damos a mínima, não
é?

Penduro minha cabeça.

— Vamos acabar em uma terapia de casal e, com nossos


temperamentos, provavelmente precisamos disso.

Ele aperta meu queixo e o levanta.

— Estou viciado em você desde o minuto em que toquei


em você. No passado... às vezes eu iria... muito tempo sem
nenhum contato humano. Estive tão focado por tanto tempo
que não era uma prioridade para mim – até você. Um golpe de
você e eu era como um demônio de merda. Agora tenho certeza
de que estava esperando a mulher certa, para você. E é uma
coisa boa eu ter guardado a pouca paciência que tenho para
você, ou seria um homem morto.

— Har, har. E você acha que é tão fácil de lidar?

— Não. Sou o diabo que você escolheu.

— E quem sou eu?

— Você é o anjo que constantemente me apunhala na


bunda com meu próprio forcado.

— Ok, você evitou minha pergunta por tempo suficiente.


Diga-me, — insisto, passando minhas mãos por seus braços
musculosos. Porque eu posso. Porque ele é meu.

— Algo que você não sabe? — O brilho em seus olhos


escurece. — Shelly quase me internou, e não há piada. Fiquei
louco quando você saiu, quando deixei você sair.

— Eu queria odiar você.

— Tentei o meu melhor para ter certeza de que você fez,


mas você chamou meu blefe, mulher teimosa.

Nenhum de nós sorri porque a dor dessa verdade dói


muito.

— Você estava muito mais segura naquela vida, Cecelia.

— Mas não estava feliz. Eu nunca teria sido realizada.


— Nem eu. Totalizei meu Jaguar no dia em que você saiu
do meu escritório, me deixou, saiu de Triple Falls.

— O quê? — Empurro para trás em seus braços enquanto


ele levanta um pouco de água e coloca sobre meus ombros.

— Quando eles perderam você, — ele balança a cabeça,


— idiotas de merda, eu sabia que você tinha feito isso de
propósito e não tinha intenção de ser encontrada. Eu não tinha
nada para continuar. Você largou seu celular, tudo. Você até
deixou seu Audi apreendido. Eu sabia que estava fodido no
segundo que eles ligaram, e acho que desmaiei porque não me
lembro dos minutos que levaram ao naufrágio. Simplesmente
fiquei... louco pra caralho.

— E você o totalizou?

Ele concorda.

— Sinto muito.

— Você me deu todas as chances de impedi-la. — Ele


encosta a cabeça na borda da banheira. Seus olhos fixos no
teto. — Deus, Cecelia, nunca na minha vida estive tão fodido.
Só estou pensando naquele telefonema. — Ele levanta a
cabeça, seus olhos exigentes mesmo com seu apelo. — Prometa
que nunca mais fará isso.

— Tobias...

— Estou te implorando, Cecelia. Se lutarmos, se


estivermos em nosso pior momento, não importa o quanto você
fique zangada, isso é tudo que vou pedir de você. Nossas
maiores lutas serão sobre segurança, eu sei disso. Mas, por
favor, deixe-me protegê-la para minha própria sanidade,
minha própria paz de espírito, mesmo se você sentir que não
precisa disso. Não aguento. Não aguento, porra. — Ele parece
tão lindamente torturado, suas feições retorcidas de dor, seus
cílios mais escuros por causa da água pingando. Se esta vida
for realmente minha, se com o tempo Tobias provar que suas
intenções são sinceras, não consigo imaginar uma maneira
melhor de viver.

Pressiono minha testa na dele.

— Prometo.

Ele agarra meu queixo e se afasta alguns centímetros,


ainda com a intenção de conseguir o que quer.

— Sempre?

— Sim, seu filho da puta teimoso.

— Esta promessa acima de todas as outras, — ele insiste,


— acima de tudo.

— Prometo a você, Tobias.

— Merci. — Não há nada além de alívio em seu tom.

— E que tal eu protegendo você?

Ele desenha as sobrancelhas e zombo.


— Talvez não goste da sua percepção de mim. Às vezes
vejo o reflexo em seus olhos e sei que você ainda vê a ingênua
de dezenove anos que conheceu. Você obviamente esqueceu
por quem você voltou. — Ele passa os dentes sobre o lábio
enquanto o agarro firmemente em minha mão, cavando um
pouco minhas unhas na pele sedosa que cobre seu pau. — Já
passou da hora de lembrá-lo. — Seus olhos brilham e me
seguem enquanto levanto meus quadris e lentamente afundo
nele.
Trinta e um anos

Incompetência. Se há uma coisa que não suporto, é o fato


de que tenho dinheiro e recursos à minha disposição, e fodo os
dois por todo o bem que estão me fazendo agora.

Minha busca por Abias provou ser infrutífera. Seu último


paradeiro relatado na mesma rua em que estou caminhando.
Mas o homem não frequenta os mesmos lugares, nunca. Ele é
tão esquivo quanto parece, e o fato de que ele nos evitou por
tanto tempo está me desgastando.

Meu telefone bate no meu bolso enquanto mudo de


direção e sigo para o bar no final da rua, com a intenção de
tomar uma bebida antes de tomar banho para limpar o
fracasso de outro dia.

— Oui? — Lati, atendendo meu celular, e fui recebido por


hesitação do outro lado da linha.

— Tobias, é Matt, Virgínia.

— Estou ouvindo.
— Lamento ser o único a te dizer isso, cara, mas você
estava certo.

— Como assim?

— Eles trouxeram uma garota para o encontro não muito


tempo atrás, e eu realmente não pensei nada sobre isso.

Filho da puta.

Nos últimos meses, Dom e Sean tornaram-se


estranhamente ausentes, relatando apenas o mínimo, e
tornaram-se cada vez mais difíceis de alcançar nas últimas
semanas. Presumi que eles haviam assumido um novo projeto
de estima fodida entre eles, até velhos truques, e estava certo.

— Minha irmã a conheceu naquela noite. Disse que


parecia uma boa garota, mas não exatamente o tipo para o
clube.

Corro a mão pelo meu cabelo escorregadio de suor,


examinando a rua uma última vez, minha irritação crescendo.
Deixar que meus irmãos arrastem um inocente para a
confusão, e para quê? No máximo, ela é um brinquedo para
mastigar. Jurei que seria paciente com isso quando chegasse
a hora. Obviamente eles não estão levando o ninho a sério, o
que só me irrita, porque pelo menos isso seria um bom motivo
para sua distração.

— Ela disse que seu nome é Cecelia.


Paro no meio do caminho, carmesim serpenteando pela
minha visão enquanto Matt continua.

— Mas ela não conseguiu muito mais do que isso.

É preciso todo o controle que tenho para não jogar meu


telefone no prédio ao meu lado.

— Você pode repetir isso?

— Ela disse que parecia uma boa...

— Não, o nome. Tem certeza de que é Cecelia?

— Sim. Cecelia, certo? — Posso dizer que ele está falando


com a irmã. — Sim, cara, esse era o nome dela. Disse que
relutava em beber ou até mesmo em um baseado. Esse não é
exatamente o tipo de clube.

Ignorando a vontade de corrigi-lo de que não é preciso ser


um fumante de cigarro, alcoólatra de baixo padrão moral para
estar no meu clube, opto por uma pergunta urgente.

— Quando foi esse encontro?

— Quero dizer um mês e meio, talvez dois.

— Qual é?

Ele segura o telefone contra o peito, sem dúvida


consultando sua irmã informativa.
— Alicia, essa é minha irmã, diz dois. Não fomos a um
encontro desde então, mas posso tentar descobrir se ela já
esteve em outros.

— Você não deveria ser capaz de descobrir isso, não é,


Matt?

Todo o clube é baseado no anonimato, já que você tinha


que estar lá para saber o que estava acontecendo. Lábios soltos
não são tolerados, e sua hesitação me diz que ele sabe melhor.

— Tanto este favor quanto meu interesse por essas


informações são restritos apenas a mim, estou claro?

— Cristal.

Dois meses.

Dois que conheço. Dois meses de um verão em que pedi


demissão para ficar em Paris, confiando em Dom e Sean para
dirigir o clube enquanto dedicava meu tempo perseguindo meu
pai biológico. Meses de corretagem de negócios para que nunca
tenham que se preocupar com seu futuro financeiro. Meses em
que corri riscos, coloquei meu nome na papelada, minha vida
em risco. Meses em que tive que negociar para evitar atos
indescritíveis para impedir que Antoine arrancasse de mim o
resto da humanidade.

O kicker? Dom saiu do radar em mais de uma ocasião,


quando eu precisava desesperadamente de sua ajuda, me
deixando aberto e vulnerável. Meu irmão nunca me deixou
aberto e vulnerável, e por causa disso, fiquei desconfiado e pedi
a ajuda de um de nossos originais.

— Você precisa que eu vá lá?

— Não. Eu cuido disso. Obrigado, Matt.

Encerrando a ligação, chamo meu motorista e, em


segundos, estou na parte de trás do meu carro, meu laptop
aberto enquanto procuro os relatórios do Raven encarregado
de manter os olhos em Cecelia Leann Horner.

— Où allons-nous, monsieur? — Para onde vamos,


senhor?

Batendo em meu e-mail, balanço minha cabeça.

— Je ne sais pas encore. — Ainda não sei

Seus relatórios têm chegado semanalmente, como um


relógio, sem mudança na frequência e, negligentemente, não
verifiquei nenhum há meses. Na verdade, não tive motivo para
isso. O relacionamento de Cecelia e Roman não existia desde
que a vi pela última vez, há dez malditos anos atrás.

É quando abro um e-mail de um mês atrás que sinto o


peso da decepção de Sean e Dom. Há um mês, Cecelia ainda
estava morando em Peachtree City.

Dom.

Ele seria facilmente capaz de manipular isso, como já fez


inúmeras vezes antes. É brincadeira de criança para ele.
— E quanto a Helen?

— Estamos deixando Helen fora disso.

A. Porra. Da. Filha. De. Roman.

Qualquer um menos ela. Qualquer um, menos a filha de


Roman Horner.

Literalmente, qualquer mulher menos ela.

E pior, eles a escolheram em vez de mim.

Se fosse um movimento para ganhar terreno na


derrubada de Roman, eles teriam me contado. Mas Dom... se
eu tivesse sua lealdade e confiança, por que eles esconderiam
isso de mim?

A traição passa por mim enquanto agulhas com pontas


começam a rasgar meu peito. Destampando uma garrafa, sirvo
uma bebida com as mãos trêmulas enquanto meu motorista
me olha enquanto tiro minha jaqueta e afrouxo minha gravata,
sentindo meu mundo se fechando.

Por quê? Por que eles fariam isso? Estou tão perto de
derrubar Roman. Anos de espera, anos fazendo jogadas. Eles
sabem disso. Eles sabem o quão perto estamos. Sean saiu da
garagem para voltar à fábrica e tentar cavar um pouco mais
fundo para ver se perdemos alguma coisa antes de fazermos
nossa mudança.

Estamos a meses de distância, no máximo, após malditos


anos de espera.
Não faz sentido.

Resistindo ao impulso de chamar qualquer um deles


apenas para ser alimentado com mais mentiras, coloco a
palma da mão na queimadura em meu peito, minhas costas
escorrendo de suor.

— Tout va bien, chefe? Avez-vous besoin d'aller à


l'hôpital? — Você está bem, chefe? Você precisa de um hospital?

Balanço minha cabeça em resposta antes de beber mais


gim, minha cabeça girando com apenas uma pergunta – por
quê?

Só há uma maneira de descobrir. E estou com medo


porque, de alguma forma, eu sei, já acabou. Mando uma
mensagem para Palo para avisar Antoine que estou indo
embora.

Eu estou indo para os Estados Unidos.

Sua resposta é quase imediata.

Diga você mesmo.

Embora nossa dinâmica de relacionamento tenha


mudado para melhor ao longo dos anos, Palo é um filho da
puta temperamental, mas um pouco imprevisível. Mas ele está
me defendendo mais vezes neste momento do que não. E não
posso culpá-lo por ser o bastardo odioso que é, com a
companhia que mantém. Seu ódio e ressentimento crescentes
por Antoine – já estou usando a meu favor. Ele está se
aproximando depois de anos sofrendo por sua esposa, o que
eu sei que será a etapa final para garantir uma aliança. Só
tenho que esperar meu tempo.

Com meu pai fora de alcance e meus irmãos escapando


de minhas mãos, a raiva que nunca senti cresce dentro de
mim. Eles viraram minhas próprias táticas contra mim,
fazendo de mim o maldito homem de fora, me empurrando
para fora do círculo – um em que eu havia cimentado todos
nós. Deste momento em diante, não sei se algum dia vou
confiar em meus irmãos da mesma forma, não importa seu
raciocínio. A dor que esse pensamento causa me faz esfregar o
peito.

Toque. Toque. Toque.

Depois de todos os sacrifícios que fiz para levar Roman à


justiça. Depois de todas as oportunidades que lhes dei, tudo
que pedi foi lealdade e confiança, e eles não podiam nem me
dar isso?

Meu próprio maldito irmão se virou contra mim, por uma


mulher – a filha de nosso inimigo.

E nunca vi isso chegando.

— Você sabe, supor que o torna um idiota. — As palavras


de Dom passam pela minha cabeça, mas em que mais posso
acreditar? Eles estão mentindo para mim, pior do que isso, me
enganando de propósito, há pelo menos dois meses.
Dom quer o controle? Ele está disposto a me machucar
por isso? É algum tipo de movimento lateral para me derrubar
do tabuleiro na tentativa de ganhar poder?

Nesse caso, não vou lutar com ele. Ele pode ficar com isso.
Vivo unicamente pelo que construímos juntos, pelas
possibilidades de compartilhar o que podemos fazer no futuro.
É suficiente para mim. Por mais ambicioso que eu seja, é o
suficiente.

Não fui generoso o suficiente? Apoiei o suficiente? Fui


mais chefe do que irmão? É por isso que é tão fácil para ele me
trair assim? Trair nossos pais?

— Jesus Cristo. — Arrancando minha gravata, desabotoo


meu colarinho antes de atacar meu motorista. — À la maison.
— Casa.

Olho para fora da janela escura para um novo mundo,


um onde me sinto mais sozinho do que nunca, com
absolutamente ninguém do meu lado. Procuro na rua
desesperadamente por um rosto gentil, uma placa, um maldito
pássaro que me deixe saber que estou pensando
irracionalmente. E é quando eu o avisto – um rosto familiar,
um dos nossos primeiros recrutas de Triple Falls, virando a
esquina, o queixo abaixado enquanto ele levanta o celular
enquanto passo.

Dom está me seguindo?

Ele é o único que sabe do meu paradeiro o tempo todo.


Meu irmão. Meu sangue.

Todos os anos de luta, de autoprivação, anos de sacrifício,


afastando minhas necessidades, ignorando meus desejos,
todos os anos que passei à margem vendo meus irmãos
viverem plenamente enquanto trabalhava incansavelmente
para construir este sonho ao lado deles.

E para quê?

Para quê?

Meu celular toca, e xinguei enquanto o levanto, sua voz


saindo em um silvo no segundo que atendo.

— Você não vai a lugar nenhum, Ezequiel.

— Não gosto do seu tom, Antoine.

— Não dou a mínima, — ele se encaixa. — Nós temos


negócios.

— Vou informar Palo. Ele pode lidar com isso.

— Não teste minha paciência, Ezequiel. Seus planos vão


ter que esperar.

Levei três semanas para chegar em casa. Três semanas


eu precisava tirar Antoine da minha merda de volta o suficiente
para escapar de suas garras e lidar com minha própria merda.
Passei três semanas cavando mais fundo nas mentiras e
enganos em que fui alimentado em pedaços e pedaços pelas
mãos dos homens em quem mais confiava.

E agora já reuni o suficiente para saber que foi tudo


intencional. Eles tinham ido tão longe a ponto de humilhá-la
publicamente na frente de alguns capítulos para tentar
devolver a palavra para mim e me afastar de seu cheiro. Uma
tentativa fraca, na melhor das hipóteses, que cheira a
desespero, e eu sei disso. O que também me diz que eles sabem
que eu sei. Desde então, cortei todas as comunicações com eles
na esperança de lhes causar medo. E, pelos incontáveis textos
que enviaram desde então, está funcionando.

É sempre uma questão de coração que atrai homens


como eu – como Roman, como o porra do Antoine – para baixo,
e só por essa razão, eu evitei.

É sempre uma questão de coração que transforma as


estátuas sólidas de volta em peões para serem facilmente
retiradas do tabuleiro. Amor e emoções sempre se igualaram a
fraqueza. E eles sabiam disso quando decidiram por ela, a
escolheram. Me certifiquei de que eles soubessem disso.
Aconselhei contra isso a cada passo, mas sabia que,
eventualmente – quando eles crescessem em sua pele mais
confortável – chegaria um momento de fazer concessões para
qualquer parceiro que escolhessem.

Eu estava preparado para isso. Era inevitável.

Mas isso?
Não há preparação para isso.

A raiva tomou conta agora, e é a raiva que não consigo


controlar enquanto saio do aeroporto em direção à minha
clareira. Pela primeira vez como adulto, quero bater em meu
irmão, mas sei que não vou me perdoar se o fizer.

Ainda bem que deixei meu coração espalhado por toda


Paris, porque com ele aqui, posso me fazer de idiota. Mas essa
raiva, nunca senti nada parecido. É uma mistura de ira que é
ilimitada e libertadora pela onda de poder que ela traz e que
me livra de toda responsabilidade pelo dano que poderia
infligir, e é terrível pra caralho como é bom.

Antes de poder enfrentá-los, preciso de algo, qualquer


coisa, uma memória afetuosa para refletir, para não reagir com
tanta vingança. Mesmo semanas depois dessa ligação, ainda
estou em carne viva, doendo de uma maneira que sei que
nunca serei capaz de reparar.

Meu único irmão.

Meus amigos.

O filho da puta do Tyler, entre todas as pessoas,


participou desse engano.

Todos eles. Meu clube, meus pássaros, meus irmãos.

Cada um dos originais de Triple Falls. Homens em quem


confiei meus segredos, minha vida, minha porra de destino.

Todos eles me traíram.


Todos eles.

Estou completa e totalmente sozinho neste mundo.

Batendo a porta do meu carro, vou em direção à clareira


enquanto a raiva surge em minhas veias. Todas as mentiras
que contei ou omissões que cometi apenas os mantiveram
seguros, impediram que vissem o sangue em minhas mãos.

Assim que passo pela primeira fileira de árvores, o som


da música da guitarra me para. Fazendo uma pausa, examino
a floresta, ouvidos atentos em busca da fonte antes de
novamente seguir em direção à clareira – a melodia flutuando
para a floresta se tornando mais clara quando alcanço a
abertura nas árvores. É quando chego ao campo vazio que noto
a ausência de vida, as mesas se foram. Fico em total confusão
enquanto a música começa novamente, a repetição me
corroendo enquanto começo a absorver a letra. A fonte da
música está vindo da casa de Roman, isso é certo. Começo a
caminhar em direção a sua mansão sob a cobertura das
árvores antes de enviar uma mensagem para os Ravens em seu
posto para seus vinte.

Charlotte.

O que só pode significar uma coisa.

Cecelia é a fonte e ela está em casa.

Caminhando até a grama – sabendo que meus pássaros


controlam as câmeras, chego a um grande conjunto de alto-
falantes apontado na direção da clareira.
Ou eles contaram a ela, ou ela descobriu e minha casa foi
comprometida. Minha casa, minha porra de lugar.

É então que sei o motivo da música. É uma convocação


de Cecelia.

Uma convocação para Sean e Dom.

E está claro que eles a transformaram em fantasma.

Tarde demais, tarde demais.

— Puta merda!

Furioso além da compreensão, corro com minhas roupas


de couro italiano ao longo da grama escorregadia, caminhando
os últimos cinquenta metros pelo gramado perfeitamente
cuidado de Roman. Nunca estive tão perto de seu palácio, e
juro que nunca estarei tão perto novamente.

O calor do verão queima meu couro cabeludo, apenas


ajudando na minha irritação enquanto dou longos passos pelo
jardim, a letra que me rodeia é ensurdecedora, mas clara na
entrega.

Esta garota está perdendo a cabeça.

Semicerrando os olhos por causa do sol enquanto


queimava meu terno, consigo chegar ao deck e congelo quando
a vejo, de topless, em uma espreguiçadeira.

Enfurecido, vou até ela e não reconheço mais a garotinha


que vi na biblioteca dez anos atrás. No lugar da garota
desajeitada está o corpo de uma mulher em nada além de um
biquíni, sua pele bronzeada brilhando, rosto impecável, feições
serenas. Sentindo-me, seus lábios exuberantes se erguem em
um sorriso de sereia antes que ela deslize a mão sobre os seios
perfeitos, achatando a palma da mão na barriga e avançando
para a parte inferior do biquíni. Meus olhos seguem como
pretendido antes que ela levante a mão para proteger os olhos.
O cabelo em meus braços arrepia, apesar do calor, e
imediatamente começo a entrar em pânico quando a sensação
familiar me consome.

Não, não, não, não, não.

Um choque elétrico de consciência me atinge, um choque


tão poderoso que me deixa desamparado, sem palavras e
totalmente incapaz enquanto luto com tudo em mim quando
ela fala.

— Nada a dizer?

Quando permaneço mudo, seus olhos lentamente abrem


e se arregalam, e é então que estou amaldiçoado pelo segundo
choque.

Anos de relatórios sobre seu progresso – progresso que


mapeei tão de perto quanto qualquer outra marca até
recentemente. Anos conhecendo sua história, vendo seu
crescimento em preto e branco. Anos se recusando a olhar
fotos e aparentemente por um bom motivo. Ela era apenas uma
criança quando a vi, e ela é tudo, menos agora, deitada
embaixo de mim, perfeitamente madura e ao alcance. Por anos
neguei cavar muito fundo, mas os detalhes que evitei mostram
sua cara feia para mim agora enquanto olho para minha
própria morte, o único nome em minha mente se repetindo
enquanto cerro meus punhos e tento vai embora.

Helen.

Assim como me permito o pensamento, ela me identifica


com o mesmo choque.

— Você é o francês.

Garrafa de gim vazia, eu a solto, e ela quebra em algum


lugar na calçada. É todo o conteúdo necessário para me
manter subjugado a ponto de a adrenalina ser a única coisa
que me mantém de pé. Me inclino contra o capô do meu Jaguar
quando os faróis de Dom aparecem antes de entrarem no
estacionamento. Baixando o olhar, inalando uma tragada no
cigarro, espero até que as portas do carro se fechem e suas
botas apareçam na minha linha de visão.

— Antes de você dizer uma porra de palavra, deixe-me


dizer como quero ouvir isso. — Não consigo olhar para nenhum
deles ainda, e posso sentir o medo e a tensão saindo deles, o
que me traz um leve alívio.

Este nunca foi um movimento intencional para derrubar


minha posição ou tomar meu lugar. Depois do meu encontro
com Cecelia e do desejo irresistível que o acompanhou, tive que
beber até negar, especialmente depois de ouvir seus apelos por
eles.

Mas a verdade é que não há alívio.

Porque não foi apenas sua devoção por eles que me


abalou, foi o fato de que existia. Eles têm o amor de uma bela
mulher, uma mulher que arriscaria tudo por eles. A mesma
devoção que pensei que eles tinham por mim. E eles a
injustiçaram da mesma forma. Machucaram passando-a para
frente e para trás como a garrafa que acabei de esvaziar
enquanto a colocava em perigo. E ao fazer isso, eles
arruinaram algo sagrado para mim. Enquanto abria a tampa
da garrafa apenas uma hora antes, tive que admitir para mim
mesmo que ela era o rosto da inocência que venho protegendo.

— Quero que vocês dois me digam exatamente quando


decidiram me trair e destruir minha confiança – vocês dois.
Então, quero que você me conte os detalhes de como fez isso,
um por um. Mas, primeiro, quero saber há quanto tempo vocês
fazem isso.

Olho para o meu irmão primeiro, seus olhos brilhando


com medo raro.
— Três meses.

Aceno e quase tropeço quando dou um passo à frente,


mas consigo me manter de pé.

Três meses.

Três.

O número de vezes que tranquei a porta para ter certeza


de que você estava seguro.

Não posso evitar meu sorriso com a ironia.

— Sempre foi meu número.

— Para...

— Três irmãos em quem confiei aqui, o que dei três


chances para um deles confessar. Três meses. — Engulo e tiro
meus olhos de Dom para olhar para Sean. Ele parece tão
mortificado quanto Dom, e isso não me traz nenhum conforto.

— Bem, deixe-me informar a vocês dois agora, sua frase


é três vezes maior. Nove meses. Vamos adicionar outro para
uma boa medida.

— Para...

Olho para os dois, e isso me compra silêncio.

— Diga outra maldita palavra, mais uma maldita palavra.


Acabo com tudo! Tudo isso. Ainda tenho o poder de fazer isso,
embora vocês dois obviamente me considerem um inútil. Vou
dissolver toda a porra do clube em questão de dias. Vou me
mudar para a França permanentemente e viver minha vida de
merda. Porque ao que parece, tudo o que tenho vivido aqui é
uma mentira.

— Nós nunca quisemos...

— Foram três palavras? — Pergunto, olhando entre eles.


— Ou estou ouvindo coisas? — Corro a mão pelo meu cabelo,
engolindo várias vezes, minha voz rouca quando falo. — Sem
exceções. Estas são as regras. Esta é a hora. Aceite e sirva, ou
vocês dois estão fora, e sou eu sendo generoso. É pegar ou
largar.

— Onde? — A pergunta vem de Dominic, e posso ouvir o


remorso em sua voz. Não é o suficiente. Não é o suficiente.

— Onde, você pergunta, querido irmão? Onde mais? O


lugar que me fez. Você sempre quis ir para a França. Aqui está
sua chance.

Ele chuta para trás contra o capô do carro, com o rosto


abatido.

— Onde você estará?

— Onde diabos quero estar.

— Você está falando sério? — Sean pergunta, e olho para


ele.
— Você coloca tudo que trabalhei, que temos trabalhado
para por quinze anos em risco para obter o seu pau molhado.
Então, me diga, Sean, estou falando sério?

— Isso não é...

— Você vai me dar um sermão sobre o amor, Sean? — Em


um flash, estamos nariz com nariz, e cerro meus punhos com
força, minhas unhas cravando na minha pele para não bater
em meu irmão. — Porque se é para onde você está indo com
sua linha de pensamento, você não sabe porra nenhuma sobre
isso.

— Nós a amamos, — Dominic fala, e é como um chute no


peito.

— Não dou a mínima, — estou oco. — Nada importa para


mim agora, e você vai ter que me convencer a me importar
novamente se quiser manter o que construímos porque, neste
ponto, realmente não quero. Eu realmente, — minha voz falha,
— realmente não me importo.

— Sei que você está ferido, cara, — Sean diz enquanto eu


me afasto, seu perfil iluminado pelos faróis se aproximando
enquanto Tyler para e pula para fora de sua caminhonete,
examinando nós três antes que seu olhar permaneça em mim.

— Você também? Você também, Tyler? — Grito, meu


coração despedaçando enquanto olho entre os três. — Depois
de tudo que passamos? — Engulo de novo e de novo e afasto a
fraqueza nublando minha visão enquanto olho para Dom,
cujos olhos se enchem antes que ele os enxote. — Porra, olhe
para mim! — Ele fixa seu olhar no meu. — Isso era para mamãe
e papai, Dom. Éramos tão próximos, irmão. Por quê? —
Resmungo quando Dom expele um suspiro de dor, seus olhos
transbordando.

Tyler dá um passo em minha direção e balanço minha


cabeça, parando-o.

— Digam-me, irmãos, palavra por palavra, como vocês me


enganaram por três meses. Digam-me cada coisa que vocês
fizeram, cada mentira proposital que vocês contaram, cada
movimento que vocês fizeram para me trair desta forma, para
me manter no escuro, e então, — grito, — digam-me como
vocês amam, — minha voz falha novamente como meus olhos
derivam para Dom, — diga-me que você ama.

Vacilando, seguro meu rosto e Tyler agarra meu braço,


abaixando a cabeça para me manter de pé. Jogando meu
cigarro no chão, levanto meus olhos para meus irmãos.

— Sugiro que você feche qualquer negócio de clube que


você tenha e faça isso rapidamente porque o tempo não começa
até que você toque em Paris. E não se preocupe, disse a ela
gentilmente que você não vai ligar em nenhum momento no
futuro, e se você entrar em contato com ela, estamos prontos.

— Para...

— Não consigo nem olhar para você! — Dom engasga


quando o empurro e tropeço para frente. Tyler me pega quando
minha máscara desliza completamente enquanto sangro na
frente deles. Com as agulhas trovejando em meu peito, Tyler
consegue me levar até a porta do passageiro de sua
caminhonete e me iça para dentro, decolando pouco antes de
eu desmaiar.

Por oito meses depois, senti-me como um forasteiro em


meu próprio clube, o único lugar onde sempre me senti em
casa. Por oito meses, os homens restantes em quem confiava,
a quem amava como irmãos, olhavam para o outro lado
quando passava – decepcionados comigo, em minhas ações por
mandar Dom e Sean embora, como se eu fosse o errado.

E durante esses oito meses, entre verificar seu bem-estar


e progresso na França e manter o controle de perto enquanto
protegia a mulher com quem eles me enganaram, resisti à
tentação de tentar descobrir o mistério por mim mesmo no que
viam nela. Uma verdadeira Helena de Tróia, capaz de destruir
o reino que construí com minhas próprias mãos.

Por oito meses, aproximei-me de seu pai, fazendo meus


últimos movimentos para garantir que, no minuto em que
meus irmãos saíssem do avião, seu ato final para recuperar
minha confiança fosse ajudar a derrubar Roman.

Eu não tinha absolutamente nenhuma intenção de


colocar os olhos nela novamente. Mas quando não aguentava
mais ser um proscrito no clube que construí, voltei ao lugar
onde tudo começou – para lembrar por que começamos, para
tentar perdoá-los, fazer as pazes com seu erro e recuperar o
lugar como meu.

Enquanto rompia as árvores, com a intenção de ganhar


perspectiva, apenas para ouvi-la chamar por eles, sabia sem
dúvida se Deus existia, o irritei de alguma forma, arranjando
minha vida da maneira que tinha feito sem consultá-lo com
meus planos. E o chute mais brutal nos dentes foi vê-la
encharcada pelo luar, chamando por eles desesperadamente.
Foi então que soube que estava muito além do ponto de Sua
redenção.

A prova brilhou sobre mim – por meio dela – no minuto


em que coloquei novamente meus olhos na tentação. Sua
inocência me provocando, prejudicando qualquer decência que
eu tinha deixado em mim a ponto de querer apagá-la e colocar
fogo em seu amor por eles. Porque ela não era inocente, ela
sozinha destruiu tudo por existir, e as evidências estavam
brilhando em volta de seu pescoço.

No minuto em que ela empurrou de volta contra minha


raiva, tão furiosa, lábios entreabertos, olhos arregalados, sabia
que estava sendo provocado pelo que neguei a mim mesmo
uma centena de vezes ou mais. Depois de anos de resistência,
de empurrar a compulsão de lado, para eles, para nós, de
manter todas as fraquezas a que era suscetível à distância, não
ia negar a mim mesmo mais um minuto de merda.

E com uma prova dela, descobri a liberdade.


A mesma liberdade que sinto agora quando abro os olhos
para ver sua boca me envolvendo, seus olhos profundos do
oceano cheios de demandas silenciosas.

Minha mais forte tentação e destruição. A única mulher


capaz de me saciar. Meu nêmesis e igual, meu tormento e
amor.

Desvendar com ela nunca foi tão bom pra caralho.

Envolvendo meu punho em seu cabelo, me deleito com o


estiramento de seus lábios ao redor do meu pau e o gemido
vibrando em sua garganta.

Meu tesouro nunca foi saciado facilmente, não importa


quantas vezes faça meu trabalho. Ela engasga na minha
cintura sem se abalar e balança a cabeça, a mandíbula cerrada
de determinação, ganhando um gemido de mim. Afundo na
sensação, a pressão perfeita de sua boca molhada, apoiando
minha mão atrás de mim para uma visão melhor. Ela me libera
assim que empurro para cima, seus lábios se erguendo em um
sorriso sensual enquanto ela me segura em sua mão.

— Bom dia, Sr. King,

Não posso evitar o retorno de meus lábios.


— Isto é.

Ela agarra minhas coxas, levando-me para o fundo de sua


garganta, e caio de volta no meu travesseiro, negando-me a
saliência dos meus quadris, fazendo o meu melhor para me
conter.

— Putain. — Porra.

Ela mergulha novamente, e seguro sua cabeça e olho para


ela. Só a visão me deixa perto. Ela está completamente nua,
montada em uma das minhas coxas, seus seios perfeitos à
vista, mamilos pontiagudos enquanto corro a mão sobre eles
antes de traçar o estiramento de seus lábios.

— Tellement sexy. — Tão sexy pra caralho.

Estamos de volta sexualmente, e não vou durar muito


assim. Ela me chupa até a ponta antes de me soltar e
novamente me bombeia em sua mão, seus olhos cheios de
expectativa.

— Tem algo em mente, Mon Trésor?

— Foda-me, — ela diz, sua voz rouca de desejo. Corro


meus dedos por seu cabelo sedoso, incapaz de esconder meu
sorriso.

— Coletando mais dividendos?

— Precisamente, e não estou com humor para conversa,


King. — Rindo, levanto-a em meu peito e reivindico sua boca
faminta. Um grunhido escapa da minha garganta enquanto me
perco em nosso beijo, na sensação de sua língua roçando a
minha.

Qualquer beijo que trocamos nunca foi menos perfeito,


não importa a emoção por trás dele. Ela me alimenta
exatamente como preciso, sem instrução ou aviso. Mapeamos
os corpos um do outro em um nível de especialista, e
reaproximar-se deles completamente nos últimos dois dias foi
nada menos que a porra do paraíso. O olhar em seus olhos me
permite saber que a deixei com fome por muito tempo, uma
necessidade que estou muito feliz em remediar. Erguendo-a em
cima de mim, acaricio suas asas enquanto ela corre sua fenda
ao longo da crista do meu pau antes de me guiar para dentro,
afundando lentamente até travarmos.

A necessidade dominante pulsa em minhas veias, mas é


o controle que entrego enquanto ela se empurra em cima de
mim com a quantidade perfeita de atrito, apenas o suficiente
para que, se eu empurrar para cima, seja recompensado da
melhor maneira.

— Tobias, — ela lambe os lábios, colocando as mãos no


meu peito enquanto aumenta o ritmo, o cabelo comprido
fazendo cócegas nas minhas coxas quando ela joga a cabeça
para trás, o arco me dando a melhor visão imaginável.
Agarrando seus quadris, sucumbi ao seu calor úmido e
apertado enquanto trabalhamos juntos até que eu não pudesse
demorar mais um segundo.
Virando-a, vejo o brilho de satisfação em seus olhos por
tirar o melhor de mim enquanto prendo sua coxa em volta da
minha cintura.

Mas ela sempre fez.

A vida, como eu sabia, acabou no segundo em que


coloquei os olhos nela. Todas as versões anteriores de mim
foram apagadas quando troquei o ódio pelo amor. Teria sido
muito mais fácil odiá-la. Em um ponto eu fiz, e às vezes ainda
faço por causa do que ela é capaz de fazer comigo. Mas foi a
rendição que mudou minha vida, me mudou como homem,
acalmou minha mente e encheu minha alma.

Amá-la me arruinou, me feriu além da compreensão.

Amá-la também mudou minha percepção do que importa,


da gravidade, da minha própria verdade pessoal e, para melhor
ou pior, ajudou a criar o homem que me tornei.

Fim.

Lentamente começo a queimar através dela, seus gemidos


me alimentando, seus lábios adorando, seus olhos vazios de
medo enquanto seu coração bate sob a carne que cubro com
meu beijo.

Não há mais um sopro de separação entre nós. Não sinto


nenhum espaço, apenas inteiro e grato pra caralho. Grato pela
minha destruição, pelo coração que bate embaixo de mim, que
torna a respiração mais fácil, alivia a tensão e me liberta da
armadilha da minha mente. Peitos juntos, penetro nela
enquanto ela engasga meu nome, puxando meu cabelo com os
dedos enquanto seus olhos permanecem fixos nos meus. Meu
coração bate de volta contra o dela com a mesma firmeza, mas
não está mais implorando por readmissão. A porta já está
aberta. Com outra chamada do meu nome resmungo minha
liberação dentro dela, pressionando minha mandíbula em seu
peito arfante, enquanto desço, e sinto isso, o reconhecimento
de um destino que nunca pensei que seria novamente, o lar.
Beau geme de onde está deitado aos meus pés, quando
uma rajada de ar gelado bate em meu rosto. Apalpando o
colchão ao meu lado, vazio, enquanto o vento frio sussurra por
todo o quarto, despertando-me totalmente. É quando abro
meus olhos e vejo a fonte – a janela do quarto totalmente aberta
– que me viro para sentar na beira da cama, meus pés batendo
na madeira congelada enquanto pego minha Glock. No
próximo segundo sou atingido, a picada persistente em minha
mandíbula quando percebo o quê.

Neve.

O alívio me cobre quando largo minha arma de volta na


gaveta e estreito meus olhos quando uma luva enluvada
aparece brevemente na borda. Um segundo depois, outra bola
passa pela janela, me acertando no peito – o ato malicioso
seguido pela risada maníaca de meu Tesor.

— Você me assustou pra caralho, obrigado por isso. Sua


bunda é minha.

— Desculpe, — ela chama do lado de fora da janela.


— Não é o suficiente.

Olho para Beau, que começa a lamber o gelo do chão.

— Você é inútil, — repreendo, — vá pegá-la!

Sua risada ecoa pelo quarto enquanto ando até a janela,


assim como os olhos azuis escuros brilhantes passam pela
parte inferior da moldura. Ela sorri para mim de onde está logo
abaixo da janela e faço o mesmo antes de bater a janela em seu
rosto e trancá-la, interrompendo-a,

— Eiiiii— protesto antes de voltar para a cama.

E espero.

Não muito depois, ouço o rangido revelador da porta dos


fundos antes que passos suaves de botas percorram a casa.
Beau a entrega totalmente quando se junta a ela, onde ela
permanece na porta do quarto, sem dúvida trancada e
carregada.

— Sinto muito, — diz ela com sinceridade. — Não estava


pensando assim.

— Você tem que pensar assim, — repreendo, — em todos


os momentos, e você sabe disso, e só hoje vou te perdoar, mas
aviso justo, Tesor, você joga um desses em mim, vou
considerar é uma declaração de...

Mal sou capaz de me proteger das três bolas em alta


velocidade sendo arremessadas contra mim em rápida
sucessão. Estou instantaneamente de pé quando ela grita,
deixando cair o resto de seu arsenal antes de se virar e se
lançar para fora da porta, uma risada histérica saindo de seus
lábios. Não posso evitar minha própria risada enquanto a
persigo pela casa, alcançando-a na sala de estar e jogando-a
no sofá. Ela grita enquanto cai para trás e luta contra mim,
seus olhos brilhando com malícia.

— Você vai pagar por isso, muito caro, — digo, incapaz de


evitar o meu sorriso enquanto olho para ela.

— Deixei você dormir por tempo suficiente.

— Você não vai trabalhar?

— Você deve saber, como um homem criado no sul, que


um quarto de polegada dessa coisa branca, — diz ela,
acenando com a cabeça em direção à janela, — dá às cidades
do sul a chance de fingir que não sabem do que é feito e fechar.

— É mesmo?

— É assim, — ela balança a cabeça, sua pele de porcelana


rosada de frio. Sua beleza me rouba momentaneamente
enquanto me pressiono contra ela, e ela me apalpa com luvas
congelantes. Quando empurro contra o desconforto, ela ri.

— Nós vamos ter um dia de neve adequado, francês. Há


o suficiente para uma boa luta, um boneco de neve de tamanho
decente, e se você for um menino muito bom, farei um creme
de neve para você.

Torço meu nariz.


— O que é um creme para neve?

— É um prazer para bons meninos, você verá.

— O que significa ser um bom menino? — Mergulho e


pressiono meus lábios na pele que posso alcançar por baixo
das camadas que ela está usando. — Você vai se contentar com
uma língua habilidosa? Você sabe que isso é muito para pedir
de mim.

— Só vai ter que dar tudo de si, francês.

— Meu tudo está pronto, — murmuro em seu pescoço,


esfregando o máximo que posso nas roupas grossas que ela
abotoou ao redor dela.

— Acalme-se, cowboy, — ela diz, deslizando suas luvas


com crosta de neve pelas minhas laterais, me fazendo
estremecer.

— Você quer lutar comigo? Você deveria saber melhor.

Seus olhos se estreitam com o meu desafio.

— Posso levar você, — ela provoca.

— Você acha?

— Sei que sim.

Abandonando a busca por mais pele, afasto-me dela e do


sofá e levanto meu queixo em aceitação de sua batalha.
— Cinco minutos, Tesor. E é melhor você se esconder
bem.

Meu capanga de quatro patas a fareja no jardim no


primeiro minuto, e ela grita como uma maluca, jogando um
arsenal de bolas de neve malfeitas em mim antes de correr pela
casa para o jardim da frente. Aproximando-se dela, ela dá dois
passos no cobertor de 30 centímetros de altura em seu jardim
antes de perder o equilíbrio e as plantas faciais.

Não posso evitar minha risada enquanto ela está deitada


lá, seu corpo tremendo de tanto rir e derrotar quando a alcanço
e a rolo para ver cada centímetro dela delineado na neve.

— A guerra mais curta da história dos Estados Unidos


durou trinta e oito minutos, Tesor. Estou tão decepcionado
com você.

Tiro a neve dela enquanto ela ri embaixo de mim.

— Oh sim, que guerra foi essa?

— Anglo-Zanzibar, 1896.
— Você é um nerd, King, — ela murmura embaixo de
mim. — Achei que você ficaria feliz com o fim da guerra.

— Se você está se referindo à nossa guerra, estou mais do


que feliz. Na verdade, estou disposto a acomodar todas as
demandas de sua rendição. Mas vamos ter que trabalhar em
suas táticas. Você não poderia nem mesmo fugir do meu
capanga. — Aceno com a cabeça para onde Beau levanta a
perna, pontilhando o pó branco com uma linha amarela
brilhante.

— Beau, — ela repreende enquanto ele olha para nós dois


como se dissesse, 'o quê?' Ela balança a cabeça, olhando para
mim. — Não acho que ele goste.

— Nenhum homem gosta de ter bolas no gelo. Mas essas


bolas, precisamos cortar, e logo, — digo, puxando-a do chão.
— Ele está ficando muito confortável com minha panturrilha.

— Shhhh, ele vai ouvir você, — juro que Beau lamenta


em concordância antes de trotar para longe de nós, sua
curiosidade levando o melhor dele. Ela gira quando se levanta
e enreda sua perna na minha na tentativa de me derrubar.
Recuso-me a seu esforço de merda para me colocar de costas
antes que eu desista e sofra sua queda pretendida.

— Você me deixou vencer, — ela faz beicinho, pousando


em cima de mim, tirando um pouco do ar de mim enquanto
cruza as mãos sobre o meu peito, seu sorriso radiante. Arranco
um pouco de seu cabelo recém-molhado e emaranhado de seu
pescoço e jogo por cima do ombro.
— Acho que é melhor deixar você ganhar às vezes. Torna
a vida muito mais fácil para mim. E você precisa de uma lição
de autodefesa, — acrescento.

Ela levanta uma sobrancelha antes de fingir que está


puxando uma luva.

— Eu?

— Sim.

Na próxima respiração, estou amaldiçoando enquanto ela


estrangula meu pau em um aperto como um torno através do
meu jeans.

— Você estava dizendo?

— Não é para ser mexido, — digo enquanto ela


brevemente aperta seu aperto antes de me soltar.

— É uma pena que os homens sejam tão vulneráveis lá.


— Ela pisca os cílios. — E luto sujo.

— Eu também, — lembro-a, puxando-a para ficar de pé e


examinando o cobertor branco.

— Lindo, não é?

Concordo.

— Achei que seria apenas uma limpeza.

— Uma frente fria surgiu e, portanto, recebemos muito


mais do que o previsto.
Concordo.

— Nós merecemos um bom dia de neve depois da última


que tivemos, — ela diz suavemente, trazendo-me de volta ao
dia em que confessei tudo no quintal de seu pai quando a neve
caiu ao nosso redor. A culpa ressurge quando a imagino,
congelando, as lágrimas caindo enquanto ela me implorava
para nos reconhecer, para admitir o que nós dois sabíamos ser
verdade. E recusei, me separando o tempo todo, sabendo que
não sobreviveria à verdade ou àquela memória.

— Sinto muito, — ela diz, lendo minha reação. — Não


queria jogar sujo.

— Pensei naquele dia o tempo todo em que estivemos


separados. — Lentamente levanto a bainha de seu boné de
malha, pressionando um longo beijo em sua testa antes de
puxá-lo de volta para baixo. — Vamos tornar este dia muito
mais memorável, então você nunca mais vai pensar nele.

Ela acena com a cabeça, as nuvens em seus olhos


lentamente se dispersando enquanto ela se esgueira para o
chão, uma curva em seus lábios exuberantes enquanto ela
junta a neve em sua mão.

— A vingança é um prato que se serve frio, certo?

— Nem pense em...

Ela dá um tapa no gelo ao lado do meu rosto antes de se


virar e fazer uma boa demonstração de tentar fugir. Desta vez,
ela dá cinco passos.
Tobias vira o nariz enquanto abro a tampa do leite
condensado com a ponta triangular do abridor de latas. Ele
examina o rótulo enquanto separo a neve em duas tigelas e
despejo o leite em cima antes de pegar duas colheres da gaveta
próxima.

— Te disse, Tesor, não vou comer neve. — Ele torce o


nariz em claro desgosto. — Isso não pode ser... higiênico.

— As poucas polegadas superiores estão limpas.

— Não, obrigado. — Ele se move para ir embora, e o paro


e nos viro, prendendo-o entre mim e o balcão.

— Você vai tentar isso, — exijo, mas ele já está


balançando a cabeça.

— Não, merci, mas não.

— Isso não é opcional, King, — digo, levantando uma


colher cheia em direção a sua boca.

Ele vira a cabeça.

— Não vou comer isso.


Balanço minha cabeça.

— Juro que acabei de ter um vislumbre do futuro,


tentando alimentar um pirralho francês, uma pequena réplica
sua.

Seus olhos caem imediatamente para o meu estômago e


ele lentamente levanta meu suéter, cobrindo a pele com a
palma da mão antes de levantar um olhar questionador para o
meu. Há uma profunda tristeza gravada ali, e coloquei minha
colher ameaçadora de volta na tigela, preocupada com sua
reação.

— O quê?

— Você quer filhos?

Alarme brota em meu peito com sua expressão cautelosa.

— Não pensei muito nisso. Admito que a ideia de carregar


seu bebê... há algo sexy, muito atraente nisso, e ser mãe... quer
dizer, não me oponho a eventualmente me tornar mãe. Ainda
assim, não sinto que isso vá me fazer ou quebrar. Por que você
pergunta?

Ele abaixa os olhos para observar o deslizar de seus dedos


ao longo da minha carne em vez de uma resposta.

— Você quer ter filhos?

— Nunca pensei que faria... mas a ideia de você, grávida


do meu bebê, porra, — ele lambe os lábios, seus olhos
brilhando de desejo. — Talvez, com você. Só com você.
Sua resposta me aquece assim que meu lado cauteloso
fala.

— Ok, então o que há de errado?

— Nada.

— Não minta na minha cara, Tobias. É o perigo?

— Um pouco, sim.

— Ok, então podemos conversar sobre isso no futuro. Não


temos pressa, certo?

— Certo.

Muito rápido. Pressiono.

— O que você não está me dizendo? Há... algo de errado


com... — abaixo meus olhos.

Ele empurra o queixo.

— Não. Posso dar-lhe filhos, Tesor.

— Ok, — suspiro. — Dê-me algo aqui.

Ele acena em direção às nossas tigelas.

— Seu creme de neve está derretendo.

Gemo, frustrada, mas decido que esse argumento pode


esperar. Não estou com pressa e é muito difícil recuperar o que
ele claramente não quer que eu veja.
Recarregando a colher, levo-a à boca e gemo quando o
creme doce atinge minha língua. Seus olhos brilham com um
pouco de curiosidade enquanto ele me observa.

— Uma mordida, para mim?

Ele acena com a cabeça, os nós dos dedos ainda


acariciando levemente meu estômago antes que ele abaixe meu
suéter. Quando levo a colher aos lábios carnudos, ele abre,
tomando um gole, seus olhos se arregalando um pouco de
surpresa.

Não posso evitar meu sorriso vitorioso.

— Eu disse a você.

Sem hesitar, ele pega sua própria tigela, e vamos para o


sofá, nossos casacos e luvas descartados pendurados em um
suporte próximo a uma lareira.

Ele enfia seu creme de neve, enquanto tento não me


vangloriar, e então fala alto. Suas palavras são imperceptíveis.

— O que foi isso, King? Você disse nom nom bom?

Seus olhos se estreitam.

— Preciso ir ver Mark, — ele murmura, inalando sua


guloseima e gesticulando com urgência para eu comer a minha
como se eu não tivesse apenas que forçar a colher em sua boca.

— Você precisa ver o Mark?

Ele concorda.
— Quem é Mark?

Ele engole, dando outra grande mordida.

— Na loja de ferragens. Para suprimentos para dias de


neve. Ele é meu caixa.

Fecho meus lábios enquanto ele limpa sua tigela.

— Você está se locomovendo bastante ultimamente, não


é?

Ele concorda.

— Ele concordou em me dar cinco por cento de desconto


na minha compra.

A risada explode de mim.

— Deanna não vai ficar com ciúmes?

Ele encolhe os ombros.

— Loja diferente.

— Seu puto, — digo enquanto ele engole o resto de sua


tigela e gesticula para eu compartilhar a minha. Quando ele
abre a boca com expectativa, certifico-me de cobrir seus lábios
com os restos do leite pegajoso da minha colher. Ele franze a
testa quando coloco minha tigela na mesa, ainda olhando o
que resta até que agarro seus ombros e o empurro de volta no
sofá antes de limpar completamente seus lábios. Em segundos,
ele esqueceu meu creme de neve abandonado e optou por me
lamber. Lábios inchados, umidade se acumulando, eu me
afasto e olho para ele.

— Eu amo Tobias domesticado.

— Você?

— Não me interprete mal, também adoro o francês


salgado, mandão e vestido de terno, mas amo essa versão sua.
— Pressiono meus lábios em sua mandíbula e o sinto se
acomodar embaixo de mim, seus braços me envolvendo. —
Talvez mais.

Horas depois, olhamos para o fogo enquanto deitamos em


coma no sofá, meio tontos de vinho depois de um longo jogo de
xadrez enquanto a previsão zumbia no fundo durante o
noticiário da noite. Tobias se senta em uma extremidade
enquanto me deito em frente a ele e ele massageia meus pés
cobertos de lã. De acordo com o boletim meteorológico, nossa
neve vai embora amanhã, o que me deixa um pouco
melancólica. É o próximo segmento da notícia que atrai a
atenção do meu sonolento francês, impedindo minha
massagem nos pés completamente. Ele aumenta o volume
rapidamente, mas uma filmagem grotesca é reproduzida e
recapitulada pelo âncora, tirando nós dois de nosso estupor.
Os responsáveis por isso orgulhosamente se proclamam os
culpados, uma nova organização terrorista, e pode muito bem
ser a porra do sinal do morcego pela forma como Tobias está
reagindo – sua postura ficando rígida e sua mandíbula
latejando. Os cabelos do meu pescoço começam a se arrepiar
enquanto Tobias se eriça ao meu lado, sua reação é a mesma.
Ele é um empático armário até o âmago.

Por instinto, ele alcança seu celular, algo que eu teria


achado estranho anos atrás. Seu objetivo sempre foi a guerra
corporativa, mas desde que nos separamos há meses, sua
aposta, seu lugar, sua palavra e qualquer movimento futuro
que fizer será o próximo nível. Uma vantagem propositalmente
calculada que não tenho certeza se ele ainda foi capaz de
utilizar.

A realidade disso afunda um pouco mais enquanto ele


pega seu celular e pensa melhor, olhando para mim antes de
colocá-lo de volta no lugar.

— Eles já estão trabalhando nisso. Tyler e Preston, — ele


esclarece.

Concordo.

— Tenho certeza que sim. Mas ligue se quiser, Tobias.


Não estou te impedindo. E não pedi para você parar.

Ele desliga a TV, seus olhos de volta no fogo enquanto ele


distraidamente retoma minha massagem nos pés. Por mais
que eu tenha tentado dizer a ele que estou bem com ele se
mantendo informado, ele se recusou, garantindo que eu
soubesse que nosso relacionamento é sua prioridade. E sei que
com ele é tudo ou nada. Ele não é o tipo de homem que fica à
margem. Me resignei que a decisão é dele. Olho pela janela
vendo nosso boneco de neve perfeitamente construído, mas
sem rosto, e sorrio. Nós nos distraímos quando chegamos
nessa parte. Nosso novo dia de neve definitivamente superou
qualquer outro que eu gostaria de lembrar, e isso me deixa
esperançoso.

— Não entendo esse tipo de homem, — ele fala ao meu


lado, chamando minha atenção de volta para ele. — O tipo de
homem que pode matar inocentes por qualquer motivo para
provar do mal de que são capazes. — Ele afunda de volta no
sofá. — Não é nada novo, mas quanto mais isso sai, mais
desesperados eles ficam para superar aqueles que os
precederam.

— Não é seu trabalho entendê-los. Você faz o suficiente


tentando detê-los.

Ele balança a cabeça.

— Tenho que tentar entendê-los para impedi-los, para


que eu possa pegá-los.

Estendo a mão e corro meus dedos por seu cabelo


emaranhado.

— Fique feliz por você não os entender, Tobias.

— Já fiz coisas horríveis, — admite. — Mas sempre para


proteger aqueles que amo, proteger nossa causa, mas
realmente não perco o sono por isso.

— Você não deveria.


— Talvez deva. Talvez eu tenha muito mais de Abias em
mim do que... — ele balança a cabeça, — Ouvi histórias sobre
o homem cruel que me criou. Elas não são boas, Cecelia.

— Como ele estava quando você o encontrou?

— Quase ausente. — Seu olhar perde o foco enquanto ele


fala. — Em minhas raras visitas com ele, ele estava lúcido
apenas algumas vezes. Estranhamente, ele foi gentil nas duas
vezes, mas quando não era coerente, a maior parte de sua
conversa era um disparate enfadonho. E seu temperamento
era... malicioso.

— Tobias, você decide quem você é, você sabe disso. Você


me ensinou isso.

Seus olhos se voltam para mim.

— Vi você uma vez em Paris. Seu segundo ano de


faculdade. Acabei de matar um homem.

Choque. O choque total e completo me mantém em


silêncio atordoado enquanto ele fala.

— Ele era um filho da puta imundo, habilidoso com


crianças, cruel com sua família, um ser humano horrível. Um
de Ant..., — ele se interrompe, apenas alimentando a dor e a
raiva à tona. — Não hesitei um segundo em puxar o gatilho.
Nem um segundo, — ele sussurra. — Depois de vê-lo morrer,
fui a um bar que frequentava. Tinha acabado de esvaziar meu
primeiro gim quando recebi a mensagem de que você estava
indo na minha direção e sabia que estava vindo direto para
mim. Só consegui me afastar um quarteirão quando vi você
virar a esquina, seu cabelo esvoaçando em volta do rosto,
obstruindo minha visão antes de você entrar. — Seus olhos se
erguem para os meus. — Sabia que você estava em Paris.
Sempre soube onde você estava, mas parecia muito mais
íntimo quando você estava lá. Sabia que você estava com
saudades de mim porque frequentava todos os lugares de que
conversamos quando estávamos juntos. Todos os lugares que
eu esperava levar para você um dia. Sabia, de certa forma, que
você estava procurando por mim. — Ele me dá um sorriso triste
quando a primeira lágrima desliza pela minha bochecha. — E
você quase me pegou, — ele sussurra, sua mão parando no
meu pé. — Era como se você estivesse me assombrando, e
então você estava lá.

Quando ele avalia minha reação, fecho os olhos.

— Por favor, não fique chateada.

— Como não posso? Você me viu, e você não, porra... —


balanço minha cabeça, minha dor assumindo. — Quão...

— Não consegui, Cecelia, não consegui. Mal me curei do


tiro, e o estiramento doloroso em minha pele enquanto me
afastava de você era um lembrete suficiente de como seria
perigoso arrastá-la de volta. Se você soubesse o quão ruim isso
dói. Eu poderia matar um homem sem hesitar, mas deixá-la lá
parecia muito pior. Jesus, se você soubesse o quanto queria
andar de volta para aquele bar, apenas para dar uma olhada
em você através daquela porra de janela. Mas me senti um
monstro. E naquela época, era muito mais monstro do que
homem. — Ele balança a cabeça. — Saber que você estava lá,
tão perto e me perguntando se você me sentiu lá. Queria tanto
ir até você, tocá-la, mesmo com sangue fresco em minhas
mãos. E me senti... punido. Completamente punido e confuso
por como poderia me sentir tão pouco sobre tirar uma vida,
mas tão dilacerado por precisar de você. Foi um caos completo
para mim, ambos os lados lutando pelo domínio e ambos
querendo a mesma coisa – você. E então eu corri, corri de você,
perseguindo o monstro muito, muito longe, para que ele não
pudesse tocar em você com as mãos ensanguentadas. — Suas
feições se retorcem de dor. — Comecei a odiar Paris depois
disso, odiar tudo nela. Estar lá parecia uma traição a um
futuro que nunca poderíamos ter. — Ele fecha os olhos. —
Levei tudo que tinha para sair daquele bar. Tudo que tinha
sobrado, e isso não era muito naquele ponto. Fui mais
vingança do que ser humano, mas você me lembrou que eu
ainda era de carne e osso naquele dia... você me lembrou. Foi
uma das piores noites da minha vida porque nunca me senti
tão sozinho.

Lágrimas quentes escorrem pelo meu rosto com sua


admissão. Raiva pelo tempo que perdemos, pelo alívio que
poderíamos ter encontrado um no outro e nunca ter devido à
sua necessidade irresistível de me proteger.

— Foi sempre o trabalho que me custou você. Sempre foi


o trabalho. Tenho que ser um monstro para pegar os outros
monstros, e o trabalho, em essência, é lutar por uma causa
perdida. Principalmente porque homens assim nunca vão
parar de vir. — Ele levanta os olhos sérios para os meus, —
Mas há apenas um você... e, — seus olhos brilham com
emoção, — Estive sozinho minha maldita vida inteira. Não
quero mais ficar sozinho.

Lanço-me para ele, envolvendo-me com tanta força em


torno dele, que recuso-lhe qualquer espaço. Respiro em sua
pele picante, envolvendo-o, cobrindo-o, enquanto ele me
agarra com a mesma força.

— Você não está sozinho, Tobias, — digo suavemente. —


Não vou a lugar nenhum, não se puder evitar.

Ele agarra minha cabeça e olha para mim, a tristeza que


vi segundos antes substituída por uma espécie de paz. Ele
cimenta nossos lábios e os separa com a língua em uma
exploração suave. Atraída, o beijo de volta, sentindo cada gota
de amor em seu beijo enquanto o alimento com o meu.

Não muito depois, nos perdemos. Ele se levanta do sofá


comigo enrolada em torno dele, me levando sem palavras para
o quarto. E a cada passo, sinto sua decisão.

Eles podem esperar. Por mais um pouco, todos eles


podem esperar, porra.
Saindo de outro dia exaustivo, encontro Tobias no jardim
da frente com Beau, seu sorriso me aquecendo enquanto o
cachorro pula a seus pés, ansioso por algo em sua mão. Pego
o fim da conversa deles quando saio do meu Audi.

— Devrions-nous montrer à maman sur quoi nous


travaillons? — Vamos mostrar a mamãe em que estamos
trabalhando?

— Oui, — respondo enquanto Tobias se estica sobre um


Beau dançarino para me agarrar em seus braços e me beijar
sem fôlego.

— Salut Maman. — Olá mamãe.

— Bonjour francês. — Olá, francês. — O que vocês dois


estão fazendo?

O olhar de Tobias brilha sobre mim, seu sorriso


alcançando seus olhos.

— Tenho uma surpresa. — Ele lança um olhar severo


para Beau antes de gritar seu primeiro pedido.
— Assis. — Senta. Beau imediatamente se senta sobre as
patas traseiras.

— Você não pode levar o crédito. Ensinei isso a ele, —


provoco.

— Roule. — Role. Beau rola imediatamente e bato palmas


de alegria enquanto Tobias o recompensa com uma guloseima.

Beau arfa, esperando seu próximo pedido enquanto


Tobias levanta o nível dos olhos dele.

— Pattes en l'air. — Mãos ao ar.

Rio enquanto Beau se levanta sobre as patas traseiras


colocando as patas para cima em sinal de rendição.

— Ah, ah, — Tobias o mantém no ar, antes que ele


converta sua mão em uma arma imaginária. — Bang, bang.

Beau cai em uma pilha ensaiada.

— Oh meu Deus! — Exclamo enquanto beijo ambos os


homens furiosamente enquanto lhes dou elogios.

— Há quanto tempo você está trabalhando nisso? —


Pergunto enquanto Tobias nos conduz para dentro.

— Algumas semanas.

— Você poderia ser um treinador de cães.

— Mal posso tolerá-lo, — ele zomba, dando-me um olhar


esnobe.
— Você o ama.

— Ele me deu uma foda misericordiosa quando você não


o faria, — ele dá de ombros, e bato em seu peito. Ele sorri,
tirando rapidamente os ingredientes da geladeira.

— Como foi seu dia, Tesor?

— Só um dia, — digo, lançando meus olhos em direção


ao quarto, ansiosa por outra entrada diária. Nas últimas
semanas, ele me deu grandes vislumbres de sua vida,
relembrando pedaços dos anos que perdi. Às vezes, ele se
expande durante o jantar sobre o que escreveu, e outras vezes
se recusa a discutir qualquer coisa mais aprofundada. Mas sua
história é de longe uma das mais fascinantes que já li. O dia
na pista, onde apostou tudo o que tinha para fazer do Exodus
um dos meus favoritos. Cada parágrafo fornece pedaços de seu
passado, de Sean e de Dom, eliminando um pouco do mistério
por trás deles, enquanto apenas os torna mais intrigantes.
Cada detalhe saboreio, o que só faz crescer o meu amor e
apreço.

— Vou tomar banho, — digo enquanto Tobias fecha a


geladeira e me agarra pela mão, me puxando de volta para ele.

— Por que está tão ansiosa?

— Você sabe por quê, não seja um merda.

Seus lábios se contraem.

— Você gosta das minhas histórias, Tesor?


— Adoro elas. — Coloco a palma em seu rosto. — E você.

Ele lê a ansiedade em meu rosto e franze a testa.

— Tenho medo de desapontá-la hoje.

— Não me importo.

Ele pressiona seus lábios nos meus.

— Tesouro, esta vai te chatear.

As últimas semanas foram um sonho, mais do que isso,


uma espécie de lua de mel. Nós não discutimos... muito. É
como se tivéssemos retomado nossa vida em Triple Falls. Os
breves olhares tristes que compartilhamos sobre nosso
passado são facilmente superados pela vitória da nova
realidade que estamos criando.

Nós transamos como animais sedentos de sangue todas


as manhãs e fazemos amor todas as noites. Meus pesadelos
estão ficando escassos e, quando acordo, ele está comigo, me
beijando, dentro de mim, perseguindo o que quer que
permaneça. Infelizmente, sua ansiedade não diminuiu e sei
que é por causa dos segredos que ele mantém por perto. Dia
após dia ele continua a revelar mais pedaços de sua história,
deixando-me temporariamente satisfeita.

Uma vez, cheguei perto de vencê-lo no xadrez e me


regozijei por muito tempo porque ele me puniu naquela noite
por uma boa meia hora antes de me deixar gozar. E, à medida
que nossos velhos hábitos de observar as estrelas e beber Louis
se fundem com os novos hábitos que adquirimos aqui na
Virgínia, atingimos um passo que não pensei que fosse possível
tão cedo em nossa nova união. Com uma semana até o Dia de
Ação de Graças, parece que o pior de nossa luta ficou para
trás.

— Seja o que for, vamos lidar com isso, — digo, totalmente


confiante de que é o caso.

Ele me dá um aceno de cabeça e volta para sua tarefa de


cozinhar, algo pelo qual anseia e faz um árduo esforço diário
para fazer – no qual colho as recompensas.

Com um último beijo reconfortante, corro para o quarto,


jogando minha bolsa sobre a cama e me sento na mesa.

Cher Journal,

Nas últimas semanas, nos tornamos mais próximos, mais


próximos do que éramos antes, mas ainda há um espaço entre
nós e ambos sabemos por quê.

Estou escondendo algo dela, e ela sabe disso. Mas mantive


essa confissão fechada por anos e, quando finalmente contar o
que é, tenho medo de que ela não entenda do jeito que preciso.
Eu quero muito contar a ela, mas quanto mais o tempo passa,
mais fortes nos tornamos. Compartilhar isso com ela pode
mudar tudo entre nós novamente. Nenhum de nós quer isso,
mas preciso que ela saiba que estou esperando para dizer isso
a ela por um motivo. Um motivo egoísta porque, pela primeira
vez em anos de guerra sem fim na cabeça e no coração, estou
quase contente. Não quero que meus medos se tornem os dela.
Então, preciso que ela espere um pouco mais. Só espero que ela
entenda.

Sei há muito mais tempo que ele está escondendo algo de


mim, e não precisava de confirmação por meio de sua confissão
diária.

A raiva vem à superfície enquanto leio suas palavras


novamente e fecho o diário. Se ainda tenho rancor ou
ressentimento, é por causa disso.

Sabendo que estou em uma briga e completamente


incapaz de deixá-la ir, me levanto e desisto do meu banho,
caminhando de volta para a cozinha para encontrá-lo
desaparecido, vegetais picados abandonados no balcão.
Abrindo a porta dos fundos, paro quando ouço uma conversa
abafada enquanto Beau late em algum lugar no jardim.

— Isso não vai apenas passar. Você perdeu duas ligações


comigo.

A voz de uma mulher.


Ele está no FaceTime e me aproximo para dar uma olhada
nela. O ciúme me queima quando ela aparece e, claro, ela está
linda pra caralho. Ela parece ter trinta e poucos anos, cabelos
e olhos escuros, uma cadência melódica francesa em sua voz.

— Estou ciente, Sonia. Estive preocupado.

— Não posso continuar me esforçando com você se você


não falar comigo ou retornar minhas ligações.

— Compreendo. Entrarei em contato em breve.

— Exorto você a me tornar uma prioridade, assim como


com você.

Ele concorda.

— Você tem minha palavra.

Seus olhos encontram os meus atrás dele, e ela gesticula


para Tobias, que olha para mim, já ciente ou sendo informado
de que estou parada atrás dele. Não sei dizer qual. Eles
encerram a ligação e espero por uma explicação, parada logo
atrás dele, meu sangue quente.

— Exodus business, — ele diz simplesmente e fica diante


de mim. A mentira muito fácil de detectar.

— Certo, — digo, virando-me e batendo a porta dos


fundos.
— Cecelia, — ele range para fora, seguindo-me para
dentro, uma maldição suave o deixando enquanto giro sobre
ele.

— Você pensou que eu estava no banho, — estalo.

— Não estou escondendo nada.

Zombo.

— Você mentiu na minha cara.

— Cecelia, — ele me agarra pelo braço. — É uma


confissão para mais tarde.

— Você está transando com ela? Você transou com ela?

— Jesus, não. — Ele libera meu braço. — Confie em mim,


você saberá mais cedo ou mais tarde. Chamamos uma trégua,
lembra?

— Foda-se sua trégua, — estalo, meu ciúme vencendo a


lógica. Ele não se esquivou quando foi pego, mas não é bom o
suficiente.

— Ela é parte do que você está escondendo?

— Sim, mas não, Tesor, não tire conclusões precipitadas.


— O timbre de sua voz mais triste do que temeroso. — Não é
nada parecido com o que você está pensando. Essa explicação
você obterá em detalhes. Ela quer falar com você.

— Bem, então, coloque-a de volta no telefone, King. Sou


toda ouvidos.
— Ainda não.

— Só quando for conveniente para você, certo? Como se


você não me contasse por que está andando de um lado para
o outro à noite, em vez de dormir e checar os pássaros de
guarda com mais frequência do que o necessário. Ou por que
você fica tão perdido em sua cabeça às vezes, você me encara.
Talvez você me diga, talvez, ou talvez você fuja de dar as
explicações que mereço, como você fez em Paris. Confie em
você, certo? Confie em você. Como você pode me pedir o que
não vai dar?

Afasto-me e bato a porta do meu quarto. Naquela noite,


ele me envolveu sem palavras. Seu silêncio inflama, mantendo-
me acordada.

Cher Journal,

Esta manhã tivemos uma briga e foi desagradável. Ela


acha que sou um 'autoritário, arrogante, homem das cavernas
com um complexo de Deus, que precisa afrouxar um pouco as
rédeas'. Gritei com ela em inglês e xinguei internamente em
francês por duas horas antes de sair de casa como um furacão
e correr até minhas pernas fraquejarem. Mas não tenho certeza
se ela entende o medo que me leva a agir da maneira que faço.
Não tenho certeza se ela me entendeu com clareza o suficiente
quando disse que não sobreviveria a perdê-la. Talvez seja
egoísta, mas quero mais desta vida que começamos juntos.
Tenho muito medo de que um maldito movimento errado acabe
com tudo. Preciso que ela me escute porque meu medo é real. E
não consigo controlar, não importa o quanto tente.

Gostaria muito que ela pudesse sentir esse medo por


apenas alguns segundos, apenas para ajudá-la a entender. Que
pudesse deixá-la testemunhar a catástrofe que continuamente
assola minha cabeça que leva às agulhas que se transformam
em facas apunhalando meu peito a ponto de me sufocar. Se ela
soubesse como é a sensação, talvez eu não fosse um 'idiota de
bater no peito'. Ou talvez eu devesse apenas dar o fora e dizer
a ela que sinto muito. Mas mesmo fazendo isso, sei que só agirei
dessa forma novamente. Não importa o quanto eu queira confiar
em seus instintos, e não importa o quanto eu esteja começando
a temer a Beretta em sua bolsa, porque eu juro, vi assassinato
em seus olhos no meio da luta.

Então, minha confissão é esta – eu sempre agirei assim,


me sentirei assim, insistirei no meu próprio caminho quando se
trata de proteção dela, para evitar que esses sentimentos tomem
conta. Para mantê-la comigo.

Li sua entrada novamente e mandei uma mensagem.

Eu também sinto muito. Venha para casa. Eu te amo.

A caminho.

Fui correr.

Ele aumentou suas corridas para três por dia. Na última


semana, ele tem estado cada vez mais em guarda. Nos dias
bons, quando chego em casa do trabalho, encontro-o
esperando com uma garrafa respirando, geralmente na
cozinha antes de dar um beijo de tirar o fôlego. Depois do
jantar, jogamos xadrez, muitas vezes até altas horas,
conversando, rindo e explorando o corpo um do outro até
ficarmos exaustos. No Dia de Ação de Graças, jantamos juntos
sozinhos, empanturrando os rostos e dividindo o osso da sorte,
sua vitória, antes que o tiro ao alvo desse um novo significado
a um tiro ao alvo.

Embora o sigilo não seja novidade, ele tem me


atormentado constantemente desde sua confissão, e tenho
esperado pacientemente que ele finalmente revele quais cartas
estão coladas em seu peito. Frequentemente, o pego atordoado,
feições distorcidas, olhos assombrados, completamente imerso
em seus pensamentos, e dei a ele tempo suficiente para
confessar.

E ele continua a falhar comigo.

Mais de uma vez, testemunhei-o beber até desmaiar, um


pedido de desculpas em seus lábios quando consigo levá-lo
para a cama. E é enfurecedor que mesmo a bebida que soltou
seus lábios no passado não o ajudou em nada a fazer sua
confissão.

A bebida dele me preocuparia mais se ele não tomasse


cuidado tão imaculado de seu corpo. Por enquanto, permito
por causa de sua admissão. Isso ajuda a parar seus
pensamentos errantes e o acalma a ponto de ele conseguir
dormir, o que ele tem feito cada vez menos.
Se ele confessasse tudo agora, eu poderia aliviar seus
fardos. Ele manteria suas promessas para mim, mas não o fez,
e provavelmente não.

A partir de agora, nossos pássaros vigilantes estão se


tornando implacáveis, muitas vezes jantando no café, e alguns
dias atrás, eles começaram a me flanquear quando fazia
recados, me levando e voltando do meu carro. Eles estão em
alerta máximo e sei por quê. Eles estão ficando tão agitados
quanto seu chefe.

É irritante para mim saber que essa é a verdade, e ele


ainda está se escondendo atrás de nossa trégua para não me
contar.

Não é difícil me manter vigiada quando o engano neste


momento é tão flagrante.

Os segredos nos separaram e não tenho dúvidas de que


eles farão isso de novo – se eu permitir.

Mas enquanto ele está afiando seu rebanho, preparando-


o, tomei algumas decisões por conta própria.

Tenho que forçar sua rendição para que tenhamos total


transparência.

É a única coisa que nos curará totalmente.

Até conseguir isso, não vou parar de buscar a verdade


dele.
Com isso, não vou quebrar. Não vou vacilar, não importa
o quanto seu beijo implore e seus olhos implorem.

Então, por enquanto, mesmo com nossa trégua em vigor,


mesmo enquanto nos aproximamos mais do que nunca,
permanecemos em um impasse não dito.

Vou mantê-lo a apenas um sopro de distância de onde ele


deseja desesperadamente recuperar totalmente a minha
confiança.

Isso é guerra. Não estou mais lutando apenas pela


verdade – estou estabelecendo limites para o futuro.

Desta vez, estou determinada a quebrar meu rei antes


que ele me destrua.
Trinta e três anos

Olhos azuis do oceano olham para mim enquanto ela


paira acima de mim, vaga-lumes dançando ao redor da grama
alta que nos rodeia, a lua translúcida entre as árvores. Calor
serpenteia em meus braços, tornando-os pesados, quase
impossíveis de levantar, a onda calmante circulando por eles
ameaçando me puxar de volta para a escuridão. Ainda assim,
luto porque ela está aqui comigo, sussurrando para mim, me
beijando, sua presença calmante, como nenhum outro
conforto que já senti. Esforçando-me, não consigo ouvir seus
sussurros enquanto luto para ficar com ela, a lua atrás dela
brilhando mais forte agora, elevando-se acima das árvores.
Seus lábios se movem novamente quando ela me alcança, mas
não consigo entender as palavras que ela está falando. O orbe
ameaçador paira um pouco acima agora, seu brilho mais forte
que o sol, ameaçando levá-la com ele.

Bip. Bip. Bip.

— Não vá, — imploro enquanto luto contra o calor e


alcanço para acariciar seu rosto. Ela inclina a cabeça em
confusão, desaparecendo brevemente enquanto a luz
avassaladora novamente obstrui minha visão.

Bip. Bip. Bip.

Uma voz distante soa além das árvores, mas não é a dela.

— Lute, cara. Vamos, T.

Estou seguro aqui, deitado embaixo dela, seus olhos


azuis escuros me chamando para ficar, só mais um pouco. Mas
a lua ameaça, e agora ela está sumindo, ainda sorrindo
enquanto sussurra para mim. Ela muda novamente quando a
chamo, pedindo um pouco mais de tempo, e o homem dentro
de mim zomba de mim com seu sorriso, me traindo por roubar
totalmente a visão dela. Grito com a perda, e ela brilha cada
vez mais forte até que fico cego por ela – até que seja tudo o
que posso ver.

De repente, sou empurrado para dentro enquanto queima


meus olhos e a dor toma conta. Dor pela perda dela, por toda
parte, é tudo que posso sentir.

Ela se foi.

— Aí está você. — Um rosto aparece, o rosto de uma


jovem, bloqueando a luz acima, mas não é dela.

— Ce..., — resmungo, mas não consigo falar, minha


garganta está em carne viva.

— Ela está bem, cara. — Reconheço a voz quando uma


mão masculina agarra a minha. — Juro para você. Nós a
protegemos. Ela está bem. — Tyler. Seu rosto sombreado fica
mais claro quando ele fica acima de mim, a preocupação
gravada em seus olhos. — Não lute. Não lute, cara. Deixe-os
fazer o que querem. — Seus olhos se voltam para a mulher,
que não é ela. Não é Cecelia.

Furioso, luto contra ele. Preciso voltar para ela.

— Três... — minha língua está revestida de cobre, minhas


palavras bloqueadas enquanto Tyler pragueja e uma imagem
passa pela minha mente – uma memória, meus pés batendo
na calçada, enquanto Eddie Vedder canta sobre um sol no céu
de outra pessoa. Acabei de perder tudo o que importava em
mim. Meu sol, minha lua, cada fodida estrela ardente entre
eles. Quero a lua de volta, mesmo que zombe de mim, e não
importa para mim, porque pelo menos estarei com ela. Mas eu
não estava...

Eu estava correndo. Eu estava correndo quando...

A consciência me atinge como um trem de carga enquanto


volto para a realidade enquanto Tyler fica acima de mim, sua
mão me prendendo enquanto a garota fala comigo em uma
tentativa de me acalmar. Mas ela não é Cecelia.

Cecelia não estava aqui.

Ela nunca esteve aqui.

Meus olhos empolam com a verdade quando os fecho,


sentindo todo o peso disso enquanto a raiva quente vaza de
mim, e solto um grito silencioso.
Essas balas me falharam.

— Jesus Cristo, cara, — Tyler resmunga. — Por favor,


irmão. Por favor, não. — Tyler paira acima de mim, seus olhos
vermelhos se enchendo de lágrimas enquanto ele lê a verdade
nos meus.

Não quero estar aqui.

Em qualquer lugar, menos aqui. Não mais. Não sem Dom.


Não sem ela.

Cecelia.

Eu estava na rua enquanto um grupo de estranhos se


reunia ao meu redor, seus rostos um borrão enquanto olhava
aliviado para o céu azul cheio de nuvens atrás deles. Porque
não precisava mais forçar a mentira de viver enquanto
sangrava naquela calçada. O alívio estava chegando. Talvez
Dom me encontre. Talvez meus pais.

Mas essas fodidas balas me falharam. Eles falharam


comigo. E estou de volta aqui, sem ela. Estou respirando de
novo sem razão para isso. Não quero essa vida. Não quero vida.
Lágrimas de raiva ardem em meus olhos, e paro de lutar,
totalmente derrotado enquanto ele me pressiona contra a
cama.

— Foda-se, — Tyler diz com a voz rouca, seus olhos


disparando para o lado da sala onde sei que Sean está sentado,
olhando para mim com a mesma pena. Desvio meu olhar
porque sei que eles veem a verdade. Não sou mais o mesmo
homem. Não sei quem eu sou. E não me importo.

Essas malditas balas me falharam.

Black do Pearl Jam desaparece quando puxo meus fones


de ouvido e caminho pela garagem, a memória do dia em que
acordei no hospital fresco em minha mente. Expiro para tentar
limpar minha cabeça, apoiando minhas mãos nos joelhos
enquanto o suor desce pela minha têmpora. Minha frequência
cardíaca começa a se equilibrar depois de outra tentativa de
enfrentar o que me assombra. Estava ouvindo essa música
quando levei um tiro. Às vezes me forço a revivê-lo, esperando
que eventualmente seu domínio diminua. E na maior parte,
tem. A ironia é que isso não diminui a memória da dor no
coração que evocou quando voltei ao hospital.

Mas agora a lua nasce a meu favor. Agora posso estender


a mão e tocá-la, e não preciso de morfina ou desilusão. Ela está
comigo, em meus braços, todas as noites de merda. Não é mais
um sonho. É nossa realidade.

Esse reconhecimento é interrompido quando o telefone de


Julien toca no meu bolso. A trepidação se infiltra quando o
puxo para ver o mesmo texto que recebi nas últimas três
semanas e meia.

Quelle est la situação?

Espero o tempo apropriado antes de dar uma resposta.

Pas de changement.

Acrescento duas fotos que tirei, semelhantes às enviadas


no passado. Uma de Cecelia trabalhando pela janela de seu
café, e uma em que tive um tiro de pássaro em mim saindo da
loja de ferragens, esperando que eles o satisfizessem, e odeio
isso.

A resposta leva apenas alguns minutos. Medo imediato


circula pelo resto de mim enquanto leio a resposta – um
horário e número de voo. Antoine o quer em casa.

Qualquer controle que tinha agora está escapando dos


meus dedos. Controle é o que preciso para funcionar, para
protegê-la, para manter minha sanidade.

No minuto em que o colocar naquele avião, voarei às


cegas, sem ideia de quais são seus planos ou como proceder.

O que quer que ele tenha decidido, está claro que ele não
vai me deixar terminar minha vida na felicidade doméstica com
Cecelia. E já me senti assim antes, na noite anterior à morte
de Dom, horas depois que Cecelia e eu fomos descobertos por
Dom e Sean. Na noite em que meus irmãos me evitaram,
viraram as costas para mim.
“Father Figure” de George Michael se filtra pelas árvores,
uma mensagem clara para mim enquanto ando pela clareira,
totalmente indeciso sobre o que fazer. Ela repetiu a música,
berrando através de seus alto-falantes de tamanho comercial
em sua varanda desde que eu apareci aqui uma hora atrás,
tentando encontrar as palavras certas para explicar meu
engano. Ela sabe que os mandei embora e menti várias vezes
para ela, mas ela não entende a extensão completa de por que
fui a tais extremos. Suas emoções devido às minhas ações
tornarão impossível para ela entender completamente o porquê
de tudo isso ou entender os anos de sacrifícios que fiz, alguns
deles para mantê-la segura.

E do jeito que ela olhou para mim antes, não tenho certeza
se posso chegar até ela. Perdi qualquer chance que tive de
ganhar sua confiança e tudo que quero fazer é agarrá-la e fugir.
Afasta-la de tudo que está ameaçando se colocar entre nós. Ela
já está fazendo as malas, para fugir de mim, da situação,
minuto a minuto, convencendo-se de que o que tínhamos era
apenas mais uma mentira. Cada minuto que hesito em me
explicar é um minuto perdido.

Já a perdi?

Qual será a reação dela quando ela acordar e descobrir


que está marcada?
Talvez esta manhã, ela teria recebido a marca se eu
pedisse. Mas ela ainda é tão jovem, e a verdade é que ainda
pode sair dessa.

Ela pode seguir em frente como planejado e viver como se


este tempo comigo fosse apenas um pontinho em seu caminho
para outra coisa, uma vida mais segura, nada mais.

Poderia empurrá-la para fora, forçá-la a fugir, e talvez com


sua ausência, possa salvar meu relacionamento com meus
irmãos, e o clube pode se recuperar.

Do ponto de vista dos negócios, seria muito mais fácil


deixá-la ir. No entanto, nem por um segundo posso imaginar
viver o próximo sem ela. Levei muito tempo para encontrá-la.

Tirando a tampa da garrafa, estou grato pela queimadura


do gim na minha garganta, rezando para acalmar meus
pensamentos acelerados para a solução certa.

Poderíamos partir, fugir juntos até que a fumaça se


dissipasse, até que eu pudesse dar-lhes tempo para lidar com
sua raiva e voltar e testar as águas. Descarto a ideia assim que
me ocorre. Nunca os abandonei e não vou aumentar minha
própria traição fazendo isso agora, não importa o quão atraente
seja simplesmente levá-la para longe e mantê-la.

É egoísmo, e foi isso que me colocou nessa situação.

Dom verá a lógica em marcá-la com um único propósito,


para proteção. Sean não verá nada além de um jogo possessivo
de minha parte.
Ambos estarão certos.

Mas ela é realmente minha?

O olhar dela esta manhã me disse que essa é a verdade, e


ainda sinto isso. Ela é minha, feita para mim, a única alma
nesta terra com a qual já me senti compatível, segura, em casa.
A sensação dela quando a tomei apenas algumas horas atrás,
a calúnia do meu nome bêbado de luxúria deixando seus lábios
e o olhar cheio de amor em seus olhos enquanto ela se apertava
em torno de mim me convenceu de que nada mais foi tão
verdadeiro.

Ela é minha. Ainda sinto isso com cada fibra do meu ser,
apesar da maneira como seu coração se partiu ao vê-los
novamente e da traição que ela sentiu por me amar de volta, por
saber que ela pertence a mim.

Isso já foi longe demais.

Acendendo um cigarro, puxo o fumo profundamente e


expiro antes de tomar mais gim.

Tiquetaque.

Cada segundo é como uma chicotada no peito. Já dei


ordem para marcá-la. No minuto em que ela dormir, ela será
marcada como minha.

Fiz jogadas ousadas e calculadas desde que era jovem,


mas as apostas nunca foram tão altas. Meu coração pode ter
decidido, mas minha mente está em frangalhos. Estou
totalmente dividido e não tenho ideia de para onde me mover.

O olhar no rosto de Dom, a raiva em sua postura, a dor em


seus olhos e Sean... Fecho meus olhos e imagino claramente sua
expressão devastada e as lágrimas que ele derramou
livremente, algo que nunca poderia ter previsto.

Neguei completamente a profundidade de seus


sentimentos devido à natureza de seu relacionamento. E a
verdade era tão evidente hoje. Ela os ama. O olhar em seus
olhos quando nos descobriram e as emoções zumbindo entre os
três está me destruindo.

Cada uma das minhas apostas no passado valeu a pena.


Mas como os outros, uma vez em movimento, isso é algo que não
pode ser desfeito.

Não posso. Não consigo fazer isso.

Puxando meu celular, rapidamente toco um texto para


executar o pedido, meu dedo pairando sobre o envio.

Ela precisa dessa marca. Qualquer pessoa que a viu no


encontro sabe da importância dela. Ela se tornou uma alavanca
para qualquer inimigo do clube no minuto em que se envolveu
com eles. E pelo que descobri, Sean a exibia em Triple Falls
quando eles estavam juntos. Ainda não consigo compreender o
que qualquer um deles estava pensando, e em vez de dar a eles
uma chance de explicar, agi como juiz e júri e passei a sentença.
Eles serviram, de boa vontade e sem muita luta, para me
apaziguar.

E em troca... nos destruí.

Por mais que queira me arrepender, não posso. Apesar de


como aconteceu, seu amor é a coisa mais pura que já conheci.

E estou prestes a puni-la por isso.

Penduro minha cabeça enquanto a letra da música envolve


meu coração, me alimentando com uma espécie de esperança
desesperada. Figura paterna. É assim que ela me vê? A letra
corta irregularmente no centro do meu peito já esfarrapado
enquanto tento o meu melhor para pensar em uma maneira de
chegar até ela.

Se for até ela agora e der minhas razões e a verdade


absoluta, ela vai acreditar em mim? Ou estarei totalmente à
mercê dela a ponto de ela não ouvir o que é importante?

— Puta merda! — Arrancando minha jaqueta, a jogo no


chão e olho para o céu noturno. Este lugar é para onde venho
desde criança para encontrar minhas respostas, de onde elas
vêm a mim através dos raios dançantes do luar. Mas não há lua
à vista. Esses raios são inexistentes quando mais preciso deles.
É como se qualquer presente que recebi soubesse que traí meu
caminho ao me apaixonar.

A inflamação no meu peito aumenta dez vezes enquanto


tento imaginar a vida sem ela. Sempre lidei em preto e branco
com as decisões, as emoções nunca foram levadas em
consideração.

Sem emoções, sem erros.

Quando a música começa novamente, olho para o meu


telefone, meu dedo ainda pairando acima de enviar enquanto
toca na minha mão.

— Não tenho tempo para falar, — estalo.

— Qual foi o nosso acordo, Ezequiel? — Antoine sibila em


resposta.

— Cumpri a porra do seu lance. Acabei de sair de Paris.


Providenciei para que o negócio estivesse em andamento...

— Você quer ser aquele a dizer à minha irmã que seu único
filho morreu esta noite?

— Disse para você não morar sem mim, — a raiva surge,


desesperada por uma saída. — Eu disse para você não mandá-
lo. Que ele não estava pronto.

— Não recebo ordens suas, — ele responde. — E agora


tenho um sobrinho morto, e você me custou. Este era o seu
negócio.

— Disse que voltaria em alguns...

— Você quebrou nosso acordo.


— Disse para você esperar por mim! — Rujo ao telefone,
minhas palmas suando enquanto as agulhas começam a picar
a pele do meu peito.

— E você desperdiçou muito do meu tempo com sua


pequena casa de férias, — ele mantém seu tom calmo, e é então
que sei que ele tem uma agenda. — Temo que esse descuido vá
custar muito mais para você desta vez, Ezequiel. — Faço uma
pausa quando a música que sai da casa é cortada
abruptamente, e sei que tenho minutos para enviar a mensagem
para cancelar o pedido, para libertá-la da minha marca, para
livrá-la desta vida, especialmente porque eu sei disso por estar
aqui, sendo indulgente com ela, acabei de me agradecer a
Antoine.

— Precisamos ter uma longa discussão sobre nosso futuro.

Ele não dá a mínima para o sobrinho. E não deixaria de


sabotar seu próprio acordo para conseguir o que quer de mim –
minha lealdade. Me consolo em saber que ele não dá a mínima
para o meu clube. É o controle que ele busca – que posso dar a
ele para afastá-lo.

— Irei ao meu escritório em Charlotte e mandarei o dinheiro


para você. Irei pessoalmente certificar-me de que sua irmã tenha
minhas mais sinceras condolências.

— Receio que isso não seja suficiente.

Penduro minha cabeça, sabendo que ele me pegou. Nem


uma vez deixei de entregar, mas por estar ausente, dei a ele a
oportunidade de me prender. E suas próximas palavras apenas
confirmam minhas suspeitas.

— Espero você em casa dentro de uma semana.

— A França não é a porra da minha casa!

— Talvez um acordo, então. Não sou um homem irracional


e sempre tive curiosidade sobre o lugar que você considera seu
lar, Tobias.

Tobias.

Ele nunca me chamou por esse nome.

Isso em si é uma ameaça suficiente. Ele encontrou alguma


vantagem na minha chamada foda, e ele não vai desistir disso.

Ao longo dos anos, dei a ele pedaços e pedaços sobre o


clube por meio de Palo, colher por colher, para lhe dar a ilusão
de que ele sabe, mas parece que a tática está começando a sair
pela culatra. Não posso permitir que ele se envolva de alguma
forma na minha vida aqui, especialmente agora.

— Você está cruzando a porra da linha, — sinto a pulsação


em minha têmpora.

— Também estou ofendido por sua indiferença. Ele era


meu único sobrinho.

Começo na direção da casa de Roman apenas para colocar


os olhos nela, para reunir algum conforto apenas com sua
presença, apesar da recepção hostil que tenho certeza de que
vou receber, e dou apenas alguns passos em direção a ela
quando a luz do quarto dela se apaga. Parado no meio do
caminho entre a clareira e a mansão de Roman, fico em um
estado de indecisão absoluta quando a derrota começa a se
infiltrar. Não há como evitar Antoine, e minhas prioridades
precisam mudar agora se quiser chegar à frente dele e mantê-lo
longe, longe do que é mais importante para mim.

— Ligarei para você em algumas horas quando estiver de


volta ao meu escritório, e podemos discutir nosso futuro.

Tenho que falar com meus irmãos para tentar estancar a


hemorragia antes que se rompa mais. Preciso deles atentos e
focados se a ameaça de Antoine se tornar uma realidade. Essa
percepção me fez parar a apenas cem metros de distância dela
e mudar de direção para chegar ao meu Jaguar.

Cada segundo que deixo minhas emoções tomarem


decisões é um segundo que não podemos perder.

Posso ouvir a satisfação na voz do filho da puta com suas


palavras de despedida.

— Não me deixe esperando, Ezequiel.

A linha fica muda enquanto sua ameaça paira


pesadamente no ar, e começo em uma corrida mortal além da
linha das árvores, o tempo todo paralisado por dentro. Examino
cuidadosamente cada movimento possível, sabendo que estou
fodido em todas as direções.
Uma vez atrás do volante, puxo o texto e meu dedo paira
por segundos antes de voltar lentamente até excluí-lo.

A decisão foi feita por mim.

Ela vai precisar de proteção do clube daqui para frente. Ela


vai acordar marcada e vai me odiar por isso. Mais um engano
imperdoável com o qual terei de conviver.

Horas depois, bato meu telefone na mesa e afundo na


cadeira em meu escritório em Charlotte, onde estou desde que
deixei King's Garage, em uma tentativa de fazer o controle de
danos com Dom e Sean. Passei quase o dia inteiro negociando
com a porra de um louco na cama que fiz anos atrás. Transferi
uma quantia significativa de dinheiro para o almoço para
manter o valentão à distância, para mantê-lo o mais longe
possível dos meus irmãos, meu clube e da mulher que amo.

E, ao fazer isso, concordei com um novo arranjo, um que


me manterá sob seu comando por algum tempo. Mas não é
minha fidelidade recém-forçada a ele que está me comendo vivo.
Se eu conseguir colocar meu clube e relacionamentos sob
controle, então poderei descobrir uma maneira melhor de lidar
com Antoine, mesmo que isso signifique declarar guerra e
derrubá-lo. É a confusão com meus irmãos em nossa garagem,
poucas horas atrás, que me faz sentir derrotado de uma forma
que nunca imaginei ser possível.

Não importa o que eu faça a partir deste ponto, já sinto que


perdi tudo.
Ela acordou horas atrás, sem dúvida se sentindo violada
de uma forma que é incompreensível para ela. E eu não estava
lá. Não estava lá para tentar me explicar ou meu motivo para
fazer o que fiz. E neste ponto, sei que eles não importam.

Engolindo a culpa, examino o horizonte de Charlotte,


minhas mãos amarradas de uma forma que nunca estive. O
desamparo que sinto é inevitável, meu destino e futuro selados
quando Shelly chega com outra xícara de café.

— Querido, você está horrível. Beba isso. — Ela coloca a


oferta na minha mesa enquanto as palavras de condenação de
Sean e Dom circulam minha mente, minha mandíbula dolorida
do soco que Sean deu quando suas palavras de despedida me
rasgaram por dentro. Shelly permanece em minha mesa, e
posso sentir sua preocupação, sua hesitação antes de
finalmente falar. — Sei que não é a hora, mas você tem uma
ligação...

— Anote uma mensagem.

— Ele disse que é urgente, em relação a uma pessoa


chamada Cecelia.

Todos os cabelos da minha nuca se arrepiam enquanto vou


direto para a luz piscando na minha mesa e pego o fone.

— Eles deram um nome?

Ela concorda.

— Roman Horner.
Aquele telefonema e as horas depois de ter repetido tantas
vezes neste ponto, o revivo vividamente. Do encontro com
Roman que mudou tudo que eu pensava sobre ele, às duas
horas terríveis que passei correndo de volta para Triple Falls
para tentar chegar até ela. Ao minuto que Dom estava
morrendo em seus braços e até o segundo que nossos olhos
seguraram logo após ordenar que ela nunca mais voltasse. Em
vinte e quatro horas, minha vida explodiu e uma guerra
começou.

Naquela noite, realmente perdi tudo. Cada pedaço do meu


controle, junto com meu irmão, Cecelia, meu clube, tudo o que
importava para mim, porque hesitei ao tomar decisões devido
às minhas emoções. Não posso cometer esse erro novamente.
Não posso hesitar. Não posso perdê-la por causa disso. Tenho
que deixar o soldado sem emoção – o monstro que mora dentro
de mim – assumir se eu quiser ganhar o controle de Antoine.

Não posso deixar o amor tomar uma única decisão de


merda por mim.

Há uma tempestade se formando, e não consigo ver, mas


posso sentir, assim como senti há tantos anos. Tenho que
descobrir suas intenções – suas jogadas. E mais do que isso,
tenho que estar vários movimentos à frente dele.
Sem Palo, sou um alvo fácil. Um telefonema com Antoine
não vai me convencer de uma forma ou de outra. E sem uma
palavra dele no último mês, eu sei que é apenas uma questão
de tempo antes que ele ligue. Desta vez, estarei pronto. Passei
os últimos seis anos saciando suas demandas enquanto tento
limpar minha própria merda de bagunça. Meus planos para
me livrar dele estão ficando em segundo plano na recuperação
do clube. Tinha a intenção de mantê-lo afastado enquanto
reconstruímos, e com a chegada repentina de Cecelia e meus
esforços para voltar para ela, esperei muito tempo para ir atrás
dele.

Nunca cometo o mesmo erro duas vezes.

Por causa do amor, fiz essa declaração uma mentira.

E sou um homem. Porra. Amor.

Se é uma guerra que esse filho da puta está atrás, meus


dias de manutenção da paz acabaram há muito.

Decisão tomada, sigo em direção à casa e, vinte minutos


depois, saio em alta velocidade da garagem do Camaro.
— Peça tudo, Cecelia, — Travis chama, assim que mando
uma mensagem para Tobias. Ele ficou quieto a manhã toda, o
que me deixou um pouco nervosa. Deixei-o dormindo esta
manhã e escapei com um breve beijo em seus lábios, que ele
devolveu enquanto tentava me puxar para ele, ainda submerso
no sono.

— Entendi, chefe, — minha nova contratada, Alena,


anuncia quando o som distinto de um motor familiar soa no
estacionamento atraindo todos os olhos para a fonte do ruído.
Um segundo depois, Tobias para em frente às portas enquanto
os pelos dos meus braços se eriçam e o pânico se instala. Muito
longe da minha Beretta, procuro alguém que possa parecer
uma ameaça. No próximo segundo, ele está fora do Camaro
parecendo torturado e devastador em jeans escuros, uma
camiseta preta e um cardigã combinando que mostra cada
centímetro de músculo em seus ombros cheios de tensão. Mas
é o propósito com que ele anda e a expressão em seu rosto que
me mantém em alerta máximo. Quando ele passa pela porta,
toda a tagarelice cessa. Quase salto para fora da minha pele
quando Marissa soa atrás de mim.
— Oh merda, garota. O que você fez?

Ele é pura intimidação. Seus olhos cheios de fogo


encontram os meus através do balcão enquanto ele ronda em
minha direção, a mandíbula cerrada e o fogo do inferno
correndo desenfreado em seus olhos. Ele vem em minha
direção e dá a volta no balcão, sem se preocupar com o
espetáculo que está fazendo. Engolindo, preparo-me para uma
luta quando ele me alcança, seus olhos brilhando com
emoções que não consigo identificar. Com o peito arfando, ele
parece que está prestes a explodir enquanto olha para mim,
exigindo explicação, mas não pedindo nenhuma. Quase recuo
quando ele estende a mão.

— Venha comigo. — Sua voz está rouca, como se ele


tivesse gritado durante todo o trajeto até aqui.

— Tobias, estou trabalhando.

Ele acena por cima do meu ombro para Marissa, e sigo


sua linha de visão para vê-la sorrindo como uma lunática.

Traidora.

— Ela ficará fora pelo resto do dia.

— Tobias, — começo a protestar quando ele agarra a


parte de trás da minha cabeça e se inclina para que estejamos
cara a cara, seu olhar tumultuado rasgando um buraco direto
na minha resolução. Este não é o mesmo homem com quem
dei um beijo de despedida esta manhã. Este é o mesmo homem
que rasgou minha alma com um beijo na segunda vez que nos
encontramos.

— Não é discutível. — Ele me levanta carregando-me no


ombro enquanto mais objeções voam da minha boca e uma
risada leve ecoa ao nosso redor. Mal consigo pronunciar
pedidos rápidos enquanto Marissa me garante que ela está
cuidando disso enquanto ele me carrega para fora do
restaurante. Abrindo a porta do carro com facilidade, apesar
do meu peso, ele me deposita no Camaro e, um segundo
depois, estamos saindo do estacionamento. Presa no banco
apenas pela velocidade, não posso deixar de admirar a beleza
de seu perfil e a força que ele exala enquanto faz a transição
do carro facilmente de uma marcha para a próxima.

— O que diabos está acontecendo? — Minhas palavras


saem uma mistura confusa de medo e demanda.

Ele sacode a cabeça em minha direção, cortando meu


protesto, sua mandíbula cerrada, seus olhos nadando em
resolução. Embora seja a imagem de controle, posso senti-lo
se desfazendo ao meu lado.

Ele faz uma curva em velocidade de quebrar o pescoço e,


em seguida, uma rápida direita na estrada que leva à minha
casa. Ele permanece mudo como mil ou mais cenários para
sua corrida perturbada em minha mente pouco antes de
derrapar e parar na garagem. Antes que eu possa piscar, ele
está me puxando do carro e me levando para dentro de casa
com a mão no meu pulso. Atrapalho-me com minhas palavras
enquanto ele destranca a porta.

— Tobias

Uma vez lá dentro, ele me pressiona contra ele e olha para


mim.

— Explique-se, agora, King. O que aconteceu?

— O que aconteceu? — Seu tom é doloroso. — Eu te perdi.


Eu perdi você, porra. E não vou fazer de novo.

Procuro em seu rosto por qualquer pista do que causou


isso quando minha atenção cai sobre a mochila embalada que
está a poucos metros de distância. Ele segue minha linha de
visão e se volta para mim, sua intenção clara.

Ele está pronto para essa luta.

— NÃO SE ATREVA A ME DEIXAR! — A voz é minha, o


apelo é meu, mas não é o meu coração falando. É minha alma
que está gritando agora.

— Tenho que.... São apenas alguns dias. Eu voltarei...

— Não! — Balanço minha cabeça furiosamente. — Não!

— Tesouro, — sua voz vacila ligeiramente, — por favor,


olhe para mim. — Ele está totalmente decidido a me deixar.
Viro minha cabeça quando o golpe penetra tão fundo que não
consigo respirar. Mas algo dentro de mim se quebra enquanto
consigo encontrar minha luta, meu corpo fervendo de
indignação.

— Você prometeu que tomaríamos nossas decisões


juntos. Você prometeu nunca me deixar!

— E você prometeu me deixar protegê-la. Uma promessa


acima de todas as outras.

— Não! Uma promessa a você acima de todas as outras


que fiz, não as promessas que você fez a mim. Você não vai
escapar dessa. Se você sair por esta porta, terminamos. Você
sai por esta porta. Eu nunca vou deixar você voltar. Nunca.

— Tenho que... tenho que ir. E você tem que confiar em


mim.

Balanço minha cabeça, incrédula.

— Você nunca vai parar de partir meu coração, não é?


Você nunca vai parar de mentir para mim! — Sinto então, as
paredes ameaçam subir, e ele também pode sentir porque ouço
o grunhido de dor escapar dele enquanto ele pressiona para
tentar obter a resposta que deseja.

— Não tenho escolha, me escute, — é uma ordem. Uma


ordem do homem que se forçou a entrar em meu coração anos
atrás. É o meu Rei ressuscitado falando. É ele quem está
procurando uma audiência agora – o homem que planejou e
traçou seu caminho durante toda a sua vida. O mesmo homem
que contratei anos atrás, e é o mesmo homem para quem olho
agora enquanto ele olha para mim, com uma decisão tomada.
— Cansei de ouvir, contanto que aquela mala embalada
existisse. Foda-se, Tobias.

— Pare com isso, Cecelia, — ele repreende, mas não vou


aceitar. Não desta vez, e não em qualquer outra.

— Você sai, e nós terminamos. É simples assim.

A intensidade e as emoções que emanam dele são


potentes demais para desviar o olhar. É apenas o tapa da
minha mão contra sua pele que traz alívio, a dor que estou
infligindo que libera a raiva. Quero separá-lo pelo que ele está
fazendo. Lágrimas amargas brotam dos meus olhos enquanto
ele agarra meu cabelo em seu punho, curvando-se para
ficarmos cara a cara.

— Você tem que confiar em mim. Estou fazendo isso para


que possamos ter mais dessa vida juntos.

— Não confio em você. Você ainda não ganhou minha


confiança de volta. Nem mesmo perto. E se você sair por esta
porta, você nunca a terá, e você nunca me terá. Nunca, porra!

Ele força meus olhos nos dele com seu aperto, e os fecho,
uma lágrima rolando pela minha bochecha quando começo a
desligar, pouco a pouco.

— Não faça isso, — advirto. — Se você fizer isso, você


colocará uma bala em nós. Não estou blefando, Tobias. Vou te
dar qualquer coisa, menos isso.
O reconhecimento penetra em seu olhar, e ele sabe o que
quero dizer.

— Você é quem tem que confiar, Tobias. Você tem que


confiar em mim e não pode, não é? Depois de tudo que
passamos, você não pode confiar em nós. Você se recusa a
acreditar que não importa o que aconteça, o que quer que
apareça em nosso caminho, qualquer perigo que enfrentemos,
podemos enfrentá-lo juntos. Mas você se programou para não
fazer isso. Mas me escute, não vou me curvar sobre isso. Não
vou perdoar isso. Nunca vou olhar para trás se você nos
quebrar desse jeito.

— Olhe para mim, Cecelia.

— Você não quer que eu olhe para você agora, Tobias,


porque tudo que vou ver quando fizer é uma porra de um
mentiroso que continuamente quebra meu coração – e suas
promessas. E até dez minutos atrás, vi um homem por quem
caminharia pelo inferno eterno. Esta é a única coisa que você
pode fazer para nos acabar para sempre.

Bato minhas palmas contra seu peito.

— Tão perto. Estava tão perto. Acho que a terceira vez é


o charme para você, não é?

— Cecelia...

Ele realmente vai fazer isso. Ele está me deixando.


— É isso, Tobias, de todas as decisões que você fez, esta
será a que nos fará ou nos destruirá. E é sua para fazer. Fiz a
minha. Tudo que você precisa fazer é confiar em mim. Não há
outra maneira de contornar isso. Não estou esperando que
você chegue à conclusão certa e seu tempo já está se
esgotando. Você fez uma porra de uma promessa para mim. E
você já quebrou as duas primeiras ao se recusar a me dizer o
que está acontecendo. Você acha que sou ignorante para o fato
de que você está escondendo algo? Você acha que sou um
ignorante para você? Você não pode se esconder de mim!

— Não sei o que está acontecendo, — ele explode, — e


essa é a verdade! Não posso te dar uma verdade que não tenho!
Não sei o que está acontecendo e não posso nos proteger se
estiver na porra da escuridão.

— Mas você sabe de uma coisa, certo? Chega de saber


onde procurar, certo? — Me oponho, seus olhos baixam, e mais
lágrimas deslizam livres.

— Você está estragando isso. Acabamos de nos recuperar,


e você está estragando isso porque se recusa a confiar em mim,
porra!

Seus olhos piscam enquanto ele me mantém presa à


porta. Não tenho certeza de quem está bloqueando quem mais,
mas enquanto minha esperança murcha, meu maldito coração
ainda está lutando, e eu sei, sem dúvida, que quero dizer cada
palavra que estou dizendo. Isso não posso perdoar. Recuso-me
a perdoar.
Um grunhido de dor o deixa enquanto ele reclama minha
boca em um beijo ardente, e me afasto, mordendo seus lábios,
o que só me dá um gemido de prazer. Empurro seu peito.

— Você não vai receber um beijo de despedida de mim,


seu bastardo doente. Você sempre amou o gosto das lágrimas
que causa.

— Oh, estou doente pra caralho, certo. Doente de ter


medo do que não posso ver! Não posso fazer nada se não
souber o que está acontecendo! Não posso protegê-la se não
souber o que está por vir! — Ele balança a cabeça como se eu
fosse uma ignorante e me gira, usando seu peso para me
pressionar contra a porta. Grito de frustração, furiosa por não
conseguir me mover, furiosa por ele estar usando sua força
para me conter. Ele é muito forte e sou impotente contra ele.

— Eu te odeio, — vem de dentro enquanto ele pressiona


todo o seu peso em mim, a raiva saindo de seu corpo.

— Je t'aime, — eu te amo, ele diz, pressionando seu peito


nas minhas costas, colocando sua testa em meu ombro. — Não
me exclua, Cecelia. Espere por mim.

— Não!

— Não me exclua. Não faça isso. Eu voltarei. Eu preciso


de dois dias. Dois dias. Você não pode me dar isso?

— Você não tem nem dois minutos. Se demorar mais do


que isso, terminamos, independentemente de você ficar.
— Cecelia...

— Não!

Ele me esmaga com o peito, tentando exercer sua vontade


em mim, seu coração batendo erraticamente sob minha
omoplata enquanto seu braço serpenteia em volta do meu
estômago, e ele desabotoa meu jeans antes de rasgá-lo pelas
minhas pernas.

— Pare! — Grito enquanto ele puxa meu tênis e as meias.


Empurro-me contra ele enquanto ele facilmente me empurra
de volta para a porta com uma mão.

Ele agarra minha camisa e cruzo os braços.

— Pare! Você não vai me deixar nua agora!

Ele bate com o punho na porta, a moldura chacoalhando.

— Você me prometeu, Cecelia!

— E você me prometeu!

— Você não entende? Posso roubar seu tempo, sua


atenção e até mesmo seu corpo, mas não posso aguentar o que
voltei!

— Isso mesmo, e você não está entendendo. Não se você


fizer isso comigo de novo! Você sai por esta porta – não há como
voltar.
Ele solta um rugido gutural e me vira em seus braços,
rasgando minha camisa enquanto agarro seus ombros em uma
tentativa de afastá-lo.

— Pare com isso, King! Que porra você está fazendo?

Implacável, sua paciência evaporou, ele me despiu,


puxando para baixo meu sutiã e calcinha até que eu estivesse
completamente nua.

— Você não pode fazer isso e obter qualquer parte de mim.


— Vou me mover ao redor dele, e ele me levanta facilmente
enquanto o bato e agarro até que ele me deposita ao lado do
sofá. Ele me puxa pelo braço para ficar de frente para ele antes
de enganchar meus braços atrás de mim com um dos dele.
Lutando embaixo dele, recuo enquanto ele me mantém refém
e completamente à sua mercê.

— Seu monstro de merda!

Sua voz é uniforme quando ele fala.

— Só quando tiver que ser, e para você, eu serei.

Empurro-me contra ele, minha luta é inútil enquanto ele


me mantém imobilizada por sua força. Raiva como se eu nunca
tivesse conhecido passa por mim por sua traição.

— Você vai fazer essa merda, então me enfrente, seu


covarde!

— Por que se importar? Você me odeia por quem eu sou.


— Eu te odeio pelo que você esconde!

— Não estou me escondendo agora. — Ele se inclina,


dobrando seu corpo sobre o meu, e sussurra em meu ouvido
enquanto lágrimas furiosas nublam minha visão. Sua voz está
cheia de veneno quando ele fala.

— Essa raiva que você está sentindo, o desamparo que


você sente agora, o medo de não saber o que está por vir,
sentir-se exposta de uma forma que te humilha e enfurece, te
deixando impotente, — ele grunhe, cada palavra mais dolorida
ao ser pronunciada, — É exatamente o que sinto cada vez que
você é ameaçada, e não sei por que ou por quem, e ainda assim
você recusa a porra da minha proteção.

Suas palavras se estabelecem assim que ele me libera, e


giro e bato em seu peito, rosto, pescoço, desencadeando o
inferno. Ele leva cada golpe sem nem piscar, seus olhos
brilhando de raiva enquanto me esgoto. Suas palavras mal são
registradas enquanto minha luta enfraquece, o desespero
infiltrando-se em seus olhos elimina um pouco da minha raiva
enquanto bato minhas mãos contra seu peito arfante. Ele
parece que está à beira de uma explosão.

— Só queria que você soubesse como é sua vitória para


mim, — ele engole, a raiva controlando sua voz enquanto seus
olhos brilham em derrota. — Você venceu, Cecelia, estou
deixando você vencer, porra, e não sei o que isso significa.

— Eu te odeio, — resmungo, toda força me deixando,


meus olhos transbordando de raiva.
— Para cada coisa que fiz ou farei com você, tenho um
motivo. E sinto muito se eles não são bons o suficiente, mas
não dou a mínima, contanto que seu coração continue
batendo, e há uma chance de você me perdoar por garantir que
isso aconteça. — Sua voz falha a cada palavra. — Mas se você
tirar isso de mim, não tenho nada. Você me deixa sem nada.

O resto da minha raiva me deixa quando a gravidade de


seu sacrifício se infiltra, e seguro seu rosto em minhas mãos.
Furioso, ele se afasta do meu toque.

— Você me tem, — asseguro-o enquanto o agarro com


mais firmeza e seus olhos se desviam. Pressiono um beijo em
sua mandíbula, sua garganta enquanto ele engole
repetidamente, vibrando de raiva. Agarrando sua camisa,
empurro na ponta dos pés e lambo ao longo de sua garganta.
— Você terá minha confiança. Você terá minha devoção. Você
terá tudo de mim.

— O amor não vai nos salvar, — ele retruca.

— Talvez não. Mas amor e confiança são as únicas coisas


capazes de salvar você e eu. Você tem que confiar em mim,
Tobias.

Ele amaldiçoa, um touro enjaulado, enquanto faço o meu


melhor para acalmar sua raiva, pressionando meu corpo
contra o dele enquanto deslizo minha mão entre nós para cima
e para baixo em seu peito antes de agarrar sua ereção. Ele
agarra meu pulso para me parar, fazendo-me estremecer, seus
olhos cheios de fogo são mordazes enquanto ele me ataca com
um olhar.

— Tobias, você me tem, — murmuro enquanto pressiono.


Ele empurra o queixo em recusa e se afasta, colocando espaço
entre nós.

Atenta, dou um passo à frente, mãos vagando enquanto


ele olha para mim com nada além de desdém, e sinto a linha
tênue entre o amor e o ódio enquanto avançamos ao longo dela.
Mas conheço essa vantagem, já corremos nela antes e sei o que
vence com a gente, o que sempre vencerá.

Seus olhos percorrem minha pele, sua respiração ficando


mais rápida enquanto sua raiva inflama e familiar, potente
necessidade picos entre nós.

— Maldita seja, — ele range para fora, sua voz crescendo


com fúria enquanto ele afasta minhas mãos, seus olhos
ardendo com a promessa de entregar um tipo diferente de
inferno.

Dando um passo para trás, ele tira o casaco de lã, seus


olhos lambendo o calor do meu corpo antes que o suéter caia
no chão. Ele segura sua camiseta, a bainha deslizando por seu
torso esculpido antes de jogá-la na pilha. Com os olhos âmbar
brilhando, ele tira as botas e abre o zíper do jeans, e assisto,
hipnotizada pela visão dele enquanto ele os descarta junto com
sua boxer e meias. Seu pau balança pesadamente entre nós
enquanto minha boca enche de água ao vê-lo. Nus e ofegantes,
tomamos o outro, almas descobertas, corações em carne viva.
Na minha próxima respiração, ele me imobiliza, negando meu
beijo e novamente me encarando em direção ao sofá antes de
levantar meus joelhos para descansar na borda grossa.

Lentamente e dolorosamente agarrando meu cabelo, ele


desliza a palma da mão livre no meu estômago colocando dois
dedos entre minhas pernas enquanto um gemido baixo me
escapa. Um gemido escapa de seu peito nas minhas costas
quando ele sente o quão escorregadia estou antes de começar
a me foder implacavelmente com os dedos. Ofegando com a
picada de uma mordida, abro minhas pernas mais
amplamente enquanto mais umidade se reúne em meu núcleo.

— Você me odeia? Talvez eu te odeie também, — seu


sussurro é venenoso, e estremeço com a chegada de um
orgasmo ameaçador enquanto ele afasta seus dedos de mim.
Este é um castigo pela minha vitória e estou muito pronta para
isso.

— Então me odeie.

Ele agarra minha bunda com sua mão errante,


espalhando-me enquanto sua ereção escova entre minhas
bochechas e a tensão enrola em minha barriga. Por trás, seus
dedos mergulham novamente no calor úmido reunido no meu
centro, um gemido de dor deixando sua garganta enquanto ele
me estica ainda mais, minha frequência cardíaca disparando
enquanto meu clitóris lateja em antecipação. Ele desliza a
palma da mão nas minhas costas antes de serpentear em volta
da minha garganta e apertar, minhas costas arqueando com o
movimento enquanto ele empurra a ponta de seu pênis em
mim, puxando a parte de trás da minha cabeça em seu peito
até que nossos olhos se conectem e ele esteja olhando para
mim de cima. No segundo que travamos no lugar, ele penetra
em mim completamente, e meu corpo fica tenso com a invasão
quando seus olhos se fecham.

— Putain. — Foda-se.

Dentro das primeiras estocadas, aperto em torno dele e


começo a desmoronar, minhas coxas tremendo
incontrolavelmente quando sua mão novamente aperta minha
garganta e seus olhos se abrem, seu olhar firme enquanto ele
olha para mim.

Invadindo.

Reivindicando.

Furioso.

Agarrando sua nuca, apoio-me contra ele enquanto ele


me fode com punhaladas punitivas. Seus olhos brilham
quando endureci em boas-vindas, um orgasmo se
desenrolando em meus membros enquanto ele mantém nossos
olhos presos e dirige, me rasgando.

Com o próximo impulso, detono, meu corpo


convulsionando incontrolavelmente enquanto ele continua em
um ritmo enlouquecedor e proposital. Nunca fui fodida de
forma tão selvagem em minha vida, e não consigo o suficiente.
A cada poucas estocadas, acelero, minhas costas
arqueando ainda mais, conforme me desfaço novamente, e
novamente, e novamente enquanto ele olha para mim, um
homem possuído, o desejo em seus olhos é sua única indicação
enquanto o resto de suas características se retorce cruelmente,
sua intenção era clara.

Punição.

Quando novamente afundo em uma onda de êxtase em


cinzas familiares, relaxo em seus braços apenas para ser
recebida com um tapa violento na minha bunda.

Meu corpo inteiro se agarra a essa dor enquanto o prazer


escoa por todos os meus poros. Seus lábios se separam
enquanto ele se perde brevemente, e arqueio minhas costas
ainda mais, levantando minha bunda para tomar mais dele
enquanto o fogo líquido goteja de seu olhar. Em segundos,
estou gozando de novo, os orgasmos batendo em mim, onda
após onda na esteira da última, enquanto ele me fode
violentamente, canalizando toda a sua raiva em seu
movimento.

— Eu tenho tudo? — Ele provoca, seu dedo invadindo o


proibido, a ameaça pairando no ar enquanto ele pressiona o
dedo.

— Simmmm, — assobio antes de explodir em torno dele,


minhas coxas ameaçando ceder enquanto ele pega seu ritmo,
seus dedos apertando em volta da minha garganta como se
estivesse indeciso. Vejo um lampejo de satisfação quando ele
me nega o fôlego por vários segundos, o que leva a outro
orgasmo explosivo, este muito mais intenso.

Ele amaldiçoa quando relaxo com o peso disso e me puxa


do sofá. No próximo segundo, a madeira machuca meus
joelhos quando ele agarra meu cabelo em seu punho e empurra
seu pau inchado entre meus dentes até que estou sufocando
com ele. Com algumas investidas de seus quadris, ele grunhe,
enchendo minha boca, sua liberação atingindo o fundo da
minha garganta. Pego tudo, saboreando cada segundo, meu
corpo se enchendo de desejo renovado enquanto o lambo da
raiz às pontas, sugando cada centímetro dele para limpar. Ele
observa, extasiado, seus olhos brilhando com leve surpresa.
Quando finalmente o liberto da minha boca, lambo meus
lábios com apenas um pedido.

— Mais.

Ele me levanta do chão com o mesmo aperto de punição


antes de me levar para a cama e me dar exatamente isso.
Trinta e um anos

Estaciono na garagem a tempo de ver Sean acelerar em


seu Nova, sem me lançar um olhar enquanto ele passa zunindo
– mas posso sentir sua raiva do mesmo jeito. Estacionando ao
lado de seu Camaro, a luz da garagem se acende, e estou
aliviado por Dom estar sozinho. Mas sei que não fará diferença
na maneira como isso vai acontecer. Quer seja um ou ambos,
o resultado será o mesmo. Nunca tive a intenção de eles
descobrirem dessa forma. Os pensamentos ainda corriam, o
peito doendo por causa de suas expressões quando nos viram
no quintal de Roman, as confissões de amor saindo de nossos
lábios me fizeram andar pelo saguão e direto para o fogo. Dom
está no meio da garagem, olhando para o nada. Segundos
longos e tensos se passam e me preparo para tudo. Quando o
alcanço, ele se vira para olhar para mim com os olhos de um
homem que mal reconheço, nossa conexão longe de ser
encontrada.

— Se você está esperando que eu bata em você, lute com


você, você é patético. — Ele balança a cabeça, seus olhos
negros de raiva. — Você não me via como seu irmão. A única
vez em que precisei que você me visse, me ouvisse como seu
irmão, você não conseguia parar de brincar de pai. Você não
poderia me levar a sério. Você presumiu que eu estava
brincando. Nada de novo. Dominic sendo Dominic. Mas vi no
minuto em que você acreditou em mim, e não foi há dez meses
quando pedi. Estava lá quando você percebeu que era tarde
demais. Isso foi melhor do que qualquer soco que pudesse dar.
Foda-se você. Saia.

Permaneço mudo porque não tenho nenhuma defesa em


que posso pensar, e com suas palavras, não quero nenhuma.
Quero sua ira porque, por enquanto, é melhor do que
indiferença. Enquanto ele estiver lutando comigo, há uma
chance para nós.

— Dê o fora daqui, — ele repete, cerrando os punhos.

— Não posso.

— Você é totalmente inútil para mim agora, — diz ele,


movendo-se para sua caixa de ferramentas e abrindo-a.

— Já faz algum tempo. Você é seu próprio homem agora.

— Nah, não foi isso que você viu em mim. Você precisava
de mim como desculpa para bancar o diretor, para manter o
controle.

— Testemunhei tudo, Dominic, desde o primeiro dia,


estive lá...
— Você não é a porra do meu pai! — Ele se aproxima de
mim em toda a sua altura, seus olhos brilhando, seus dentes
à mostra. — Você mal compartilha meu sangue. Saia. Não
estou perguntando.

— Não posso.

— Você não obterá absolvição de mim.

— Eu sei.

— Então o que diabos há para dizer? Vá até ela. Ela pode


ouvir suas malditas mentiras esta noite, mas não serei eu.

— Dom, estou apaixonado por ela.

— Soa familiar. — Ele ataca então, ambas as mãos no


meu peito, e me empurra contra um caminhão empoleirado na
baía atrás de mim. Não luto com ele enquanto a guerra grassa
em sua cabeça. A mesma guerra que lutei meses atrás antes
de mandá-lo embora, recusando-me a ouvir, recusando-me a
acreditar que seus sentimentos por ela eram reais. É então que
ouço o barulho dos freios e o barulho do cascalho do lado de
fora das portas.

Porra.

Dominic me encara, os olhos cheios de desprezo e


condenação. É então que me pergunto se meu irmão algum dia
vai me olhar como antes, com respeito e admiração. Senti a
pressão nele no minuto em que percebeu o que estava feito.
— Não posso nem perguntar se ela vale a pena. Porque
sei que ela vale. Você conseguiu o que queria. Ela é sua. Você
sabia exatamente quais seriam as consequências, o dano que
isso causaria a nós, a Sean, a ela, então o que diabos você quer
de mim?

— Estou marcando-a esta noite. Queria que você fosse o


primeiro a saber. — É então que vejo Dominic olhando Sean
por cima do meu ombro.

— Você o quê? — Sean ferve de onde está, e olho para ver


seus punhos cerrando e abrindo na soleira da garagem. Ele
quer acabar comigo. É tão transparente. Ele não vai me
perdoar tão cedo e nunca vai me perdoar, uma vez que tenha
deixado claro o que estou prestes a fazer.

— Estou marcando-a por razões óbvias e para sua


proteção. O pedido já foi feito. Está feito.

— Foda-se você! — Sean me ataca e Dominic se coloca


entre nós, com a cabeça inclinada como se ele não tivesse me
ouvido direito.

— Você vai chegar tão longe? — Seu tom é letal, e sinto o


segundo golpe de traição emanando de seu corpo.

— Não tenho escolha.

— Você tem uma merda de escolha, — explode Sean, — e


ela também deveria.
Dominic lê minha postura, minha intenção e acena com
a cabeça.

— Sim, você faz isso. Você a marca, porra. É melhor você


ousar essa merda, e então você pode viver com isso.

— Dom! — Sean late, incrédulo. Dom balança a cabeça,


voltando-se para ele. Ele conhece meu raciocínio, mas Sean
está muito quebrado para perceber.

Sean se aproxima de nós dois, a imagem da agressão.

— Você está indo longe demais para provar um ponto.


Não é o suficiente que você fodeu todos nós?

— Não para mim, — rebato quando Dominic se vira para


me encarar com um sorriso tão maldito com a intenção que sei
que ganhei um pouco de seu ódio. Meu irmão me odeia, e isso
é merecido.

Irei odiar, mutilar ou matar qualquer um que tentar tirá-


la de mim. Qualquer um, menos meus irmãos que a amam com
a mesma intensidade, mas o que está matando os dois é que
ela não é mais um jogo justo.

— Não coloquei a mão sobre ela até alguns meses antes


de você voltar, — digo a eles porque vale a pena ser repetido –
embora ainda não seja uma defesa.

Sean ataca por mim, mas para a trinta centímetros de


distância, seus olhos sedentos de sangue, a devastação mais
difícil de ver agora que está mascarada pela fúria, mas sei que
está lá.

— Sim, bem, você também roubou nossa habilidade de


lutar nos mantendo amordaçados na porra do seu zoológico! E
estou disposto a apostar que tivemos a chance de trazê-la de
volta até você intervir!

— Minhas ordens não te impediram de deixar um colar,


— olho entre os dois, e nenhum deles fala, mas nenhum parece
surpreso que eu saiba também. — Vou me desculpar por amá-
la no minuto que você fizer. Mas o que fiz, — balancei minha
cabeça, — não espero o seu perdão.

— Você não vai conseguir. E você não a merece, —


comenta Sean.

— E você faz? Vocês dois idiotas desfilando como homens,


como soldados, quando não sabem absolutamente nada sobre
sacrifício. E com ela, você não sacrificou nada! Porra nenhuma!
Até saber o que é isso, você não é capaz de ser o homem de que
ela precisa. — O ciúme transborda enquanto condeno os dois.
— E você sabe muito bem que a perdeu no minuto em que a
compartilhou, — olho para Dominic, — e escolheu esta vida
em vez dela.

— E você não manipulou para entrar? — Sean balança a


cabeça com desgosto. — A única coisa que lamento foi por ter
acreditado em suas besteiras. — Ele cospe no chão, a
centímetros do meu sapato.
— Eu a trouxe totalmente e disse a ela a porra da verdade
porque era mais seguro para ela, o tempo todo sabendo que ela
poderia me derrubar, derrubar todos nós! Isso não é sobre
mim, ou você, ou nossa porra de agenda agora. Isso é sobre
ela. — Me aproximo dele e posso sentir a tensão crescendo, a
violência crua irradiando de seu corpo. Ele está dividido entre
bater em seu irmão enquanto me determina como seu inimigo.
— Você está saindo, Sean? Em caso afirmativo, deixe suas asas
na porta. Esta noite, estou aqui a negócios.

Sean fica boquiaberto.

— Você ousa dizer essa merda para mim?

— Sim faço. Preciso saber o quão longe você irá com isso.

— Quem diabos é você? — Sua voz está rouca de dor.

— Sou o homem que pisaria na frente de uma bala por


qualquer um de vocês, sem fazer perguntas, mas também sou
o homem que segurou a porra das suas mãos antes de
transformá-las em punhos. Sou o mesmo homem – até
conhecê-la – que colocou vocês dois acima de todo mundo. Mas
agora, quem sou eu agora? Sou o homem que a ama o
suficiente para não deixar ninguém ou nada na frente dela.

A voz de Sean treme de ódio enquanto ele olha para mim.

— Você está brincando de eu a vi primeiro?

— Sim, estou. E acho que você sabia que linha estava


cruzando, ou então você não a teria escondido de mim.
Sean recua, sua direita me acertando na mandíbula uma
fração de segundo antes de Dominic me empurrar para trás,
aliviando-me do impacto do golpe. Dominic me endireita e olha
de volta para Sean antes de se virar para mim.

— Você não acreditou em mim, irmão, mas acredito em


você, agora. Cecelia pode ser sua, mas o capítulo de The Triple
Falls é meu, e enquanto ela estiver aqui, ela estará sob a porra
da minha proteção. Venho administrando as coisas aqui desde
que você está viajando pelo mundo, e se seguirmos as regras,
e negócios são negócios, é melhor você marcá-la por nenhum
outro motivo. Se precisar de alguma coisa nossa de agora em
diante, terá que pedir com educação. Até então, nós dois
terminamos com você. Você está ouvindo, irmão mais velho?
Terminamos com você na frente não comercial. Dê. A. Porra. Do.
Fora.

A lividez e a finalidade de seu tom rasga um lugar dentro


de mim que não pode ser reparado. Meu relacionamento com
meu irmão nunca foi questionado há um ano. É o único lugar
onde tive paz, solidariedade, consistência, e o estraguei com
minhas ações. Mas entre os destroços, encontrei um lugar
diferente, um que nunca acreditei que pudesse existir para um
homem como eu.

Exalando, seguro minha nuca e me encontro nivelando


com ele de uma forma, um apelo para me ouvir – lutando por
sua atenção sobre sua raiva e ódio, uma troca que nunca
imaginei que teria que fazer com o meu sangue. Com o menino
que criei e o homem que moldei. Mas posso sentir a mudança,
e é paralisante. Demoro vários segundos para falar antes de
olhar entre eles.

— Nunca pedi nada a vocês e não estou pedindo que me


perdoem, não agora, mas sinto que dei o suficiente para pedir
isso a vocês dois. Para ela, não para mim, para Cecelia. Vocês
dois a trouxeram para isso, e estou mantendo-a nisso para sua
segurança e para minha ganância. Eu a amo. E não importa o
que aconteça daqui em diante, preciso da sua palavra de que,
quando chegar a hora, ela virá primeiro. E não se engane, eu
sei que papel desempenhei, mas a verdade é que todos nós
fizemos isso mais do que negócios. — Viro para Dominic,
sabendo a verdade sobre aquele dia na biblioteca, sabendo
muito bem que ele a viu e sempre esteve ciente dela. — Você a
trouxe quando disse para mantê-la fora disso. Eu disse a você
o que iria acontecer. Só não sabia como seria. Todos somos
culpados. Todos nós.

Dom corre em direção à porta dos fundos e abre caminho


através dela. Fico olhando para ele, o buraco que ele deixou
em mim queimando enquanto corro a palma da mão no meu
queixo. Posso sentir o mundo que criamos escorregando pelas
minhas mãos enquanto minha necessidade de voltar para
Cecelia aumenta dez vezes.

Estou perdendo-a agora pelos mesmos motivos? Minha


ganância, minha necessidade por ela, por algo para mim. Pela
primeira vez na porra da minha vida – e com ela, naquelas
semanas preciosas que tivemos onde nossas paredes
desapareceram completamente – eu me senti liberado, como a
versão de mim mesma que teria sido se não tivesse seguido
esse caminho. Tudo o que quero agora é descartar tudo isso
por mais tempo com ela. Com esse conhecimento, tenho uma
compreensão clara de por que mereço sua ira. Talvez ela tenha
criado o mesmo santuário para eles.

Talvez Dom e Sean tenham se tornado as versões mais


desejadas de si mesmos com ela. Todos nós nos sacrificamos
de alguma forma por esta vida. Talvez ela fosse seu santuário.
E odeio se for verdade. Se eles encontraram o mesmo prazer, o
mesmo pertencimento que tenho. Rejeitei seus sentimentos
porque não conseguia entender o fato de que eles
compartilhavam a mulher com quem movi céus e terra apenas
para roubar semanas de felicidade. E juntos, eles passaram
por ela e pegaram pedaços do meu tesouro, pedaços que nunca
poderei recuperar.

Este é o meu preço, minha penitência por ser o ladrão que


me tornei. Por me apaixonar, por roubá-la. Por viver minha
vida, pelo menos uma vez, para mim.

Mas tenho de enfrentar consequências que complicarão


as coisas muito mais do que o que está acontecendo aqui.

Resignado, isso é apenas o começo, enfrento o homem


que amei como um irmão desde o momento em que ele caiu
em nossas vidas. Em segundos, minha mágoa muda e estou
de luto pelo menino que ele era e pelo homem que ele se tornou
e significou para mim. Nunca mais seremos os mesmos.
Nenhum de nós vai. Leva toda a minha energia para não deixar
a raiva entrar em cena, embora cada fibra do meu ser grite por
carne e sangue. Mas não posso ter esse sangue e minha
ganância por ela nunca será saciada.

A agonia dessa verdade me deixa fervendo enquanto Sean


se aproxima de mim, seus olhos são uma mistura de raiva e o
mesmo tipo de ruína.

— Por quê?

— Você sabe por quê. Você está bem aí comigo! Mas não
vou compartilhá-la, porra, nem com você, nem com meu irmão,
nem com uma maldita alma! Foi aí que você estragou tudo,
Sean, e sabe disso. Seu lugar é comigo. Fim.

— Você acha? — Seu sorriso condescendente fez meu


sangue ferver. — Não teria tanta certeza. Sei o que vi hoje, e
talvez não possa lutar por uma causa perdida, e esta é a minha
cruz para carregar. Mas também sei o que você testemunhou
naquele quintal. Vi o medo em seus olhos. Medo pelas partes
dela que você nunca terá. A parte que pertence a mim, a outra
ao seu irmão. Reivindique-a o quanto quiser, marque-a, mije
em volta dela, mas você nunca a terá totalmente. Não. Porra.
Nunca. Você sempre a compartilhará conosco, não importa o
que você faça. Você nunca a possuirá como a alma de seu
ladrão precisa para possuí-la. E você consegue viver com isso.
Nós todos começamos a viver com isso. — Ele passa por mim
e bato com o punho no capô da caminhonete.

— Sean! — Engulo em seco, a queimação tornando minha


voz crua e irreconhecível para mim. É uma agonia saber que é
verdade, mas eu empurro para o que é importante. — Para ela.
Para ela. Não para mim. Estou pedindo por isso. Ela vem
primeiro.

— Jesus, cara, — ele zomba, — o fato de você ainda


precisar de garantias é patético. Usando-a foi com a desculpa
eu vim com para você poucos dias depois que a conheci. Isso
sempre foi sobre ela.

Segundos se passam, o uivo do vento lá fora sacode as


portas da baía.

— Por que você não a reivindicou?

Seus olhos cortam.

— Porque nenhum de nós era digno de fazê-lo com as


mentiras flutuando entre nós. E essas mentiras existiram
porque nós protegemos você. Porque acreditamos em você e na
nossa causa. E até que ela soubesse toda a verdade... — Ele
balança a cabeça. — Porra, não importa agora, não é?

— Nenhum de nós a merece, — declaro honestamente. —


Nenhum de nós.

— Você, menos ainda, seu idiota egoísta. Sinto a porta


bater atrás dele até a medula em meus ossos.
Pegando uma garrafa do porta-malas de Dom, suor
escorrendo da minha testa depois da minha corrida da meia-
noite, abandono a casa, caminhando até a varanda de trás
para desabar na espreguiçadeira, meu coração quebrando com
a memória que revivo diariamente.

Olhando para a garrafa, sei que a abrir não apagará uma


única palavra que trocamos naquela noite ou tornará a dor no
coração menos intensa.

É a definição de insanidade.

Mesmo depois de um dia exaustivo de brigas e fodendo


com Cecelia, mesmo com o conhecimento de que recuperei seu
coração, mesmo com a proximidade entre nós que ansiava
desde que retornei selou um pouco do buraco que estava lá há
mais de metade uma década – não consigo me livrar disso.

E eu sabia que isso aconteceria.

Sabia que não importava o quão feliz ficasse aqui com ela,
que este lugar não estava me deixando. O contentamento saiu
de mim por causa da minha memória longa e cruel.
Pensamentos sobre nossas consequências na noite anterior à
morte de Dom me atormentaram sem parar esta noite,
tornando o sono impossível. Fiquei olhando para o teto por
horas depois que Cecelia adormeceu, esparramada nua sobre
meu peito, sua coxa enganchada em volta do meu torso
enquanto ela sonhava. Deixei-a dormir, não importa o quanto
precisasse da distração de seu corpo para tentar afastar a dor.
Mas não cabe a ela lutar contra meus demônios.
Essa batalha luto diariamente, e nunca ganhei uma vez.

Mas ainda estou fraco com a necessidade de ir até ela


agora. Para acordá-la, fodê-la e me perder nela, desfrutando
da segurança de seu amor, de seus braços, de meu santuário.
Fico olhando para a garrafa azul de Bombaim, sabendo que é
uma alternativa de merda.

Esta noite, tudo o que sinto é inquieto.

Talvez seja pela batalha que perdi hoje, mas mesmo


perdendo isso, estou um pouco aliviado. Nunca quis deixá-la,
mas não tinha outro plano de jogo.

Nem mesmo a nova planta que consegui conjurar depois


de me deitar na cama com ela horas depois, antes de enviar
uma mensagem para Tyler, me traz paz.

O ar da noite começa a esfriar o suor em minha pele e


minha respiração, mesmo quando a porta dos fundos se abre
e Beau sai correndo, lambendo meu joelho e disparando um
segundo antes que os olhos vermelhos de Cecelia encontrem
os meus. É então que percebo o quanto estraguei tudo.

— Não deixei um bilhete.

Uma lágrima escorre por seu rosto enquanto um soluço


explode de seus lábios, e a visão disso me mata. Estendendo a
mão, agarro sua mão e a puxo para o meu colo, o alívio nela é
tão aparente que só parte meu coração ainda mais.
Pressiono meu rosto em seu pescoço, inalando seu
perfume.

— Sinto muito, querida. Sinto muito, porra. Eu não


estava pensando. — Pela primeira vez desde que cheguei aqui,
ela precisa de consolo devido ao medo – medo que instalei nela
e está em mim.

Seguro seu rosto enquanto ela treme em meu aperto,


mais lágrimas deslizando pelo seu rosto. Acalmando seus
lábios trêmulos com a longa pressão dos meus, uso meu
polegar para enxugar suas lágrimas. Por mais forte que ela
tenha se tornado, consegui assustá-la de uma forma
imperdoável por estar muito imerso na minha própria merda.

Traço o pequeno ponto em seu queixo com meu polegar.

— Menti e quebrei promessas para você muitas vezes,


porra, para você acreditar em mim. Mas gostaria que você
acreditasse que nunca poderia fazer isso com você novamente.
É por isso que você venceu, Tesor eu me rendo. Minha
bandeira branca é sua.

—Estou tão brava... com você, King, — ela diz através de


outra respiração engatada.

— Você deve. Sinto muito, Tesor. Não vou embora. Isso


prometo a você acima de tudo.

Ela solta um suspiro exasperado e espero até que seu


corpo relaxe contra o meu. Nenhuma palavra que eu possa
dizer agora é boa o suficiente. Com o tempo, vou me provar.
Pressiono meu rosto na lateral de seu pescoço e inalo.

— Me desculpe, não posso parar isso. Essa é minha


merda. Eu vou ficar melhor para você.

Bebendo seu perfume de zimbro, olho a garrafa que


descartei na mesa. Talvez ela seja tudo de que preciso. Ela
parece ler meus pensamentos.

— Não faça isso. — Olhos azuis profundos imploram aos


meus: — Em vez disso, fale comigo.

— Isso não é um problema. Não vou deixar ser. Não vou


desperdiçar minha vida assim. Isso eu sei sobre mim.

Ela me olha com os olhos encharcados de lágrimas.

— Bem, você pode não precisar de um, mas graças à sua


corrida noturna, eu preciso. — Ela levanta a garrafa da mesa
e desatarraxa, tomando um longo gole antes de mergulhar
para me beijar. Saboreio o gosto do álcool, chupando sua
língua e ganhando um gemido até que ela interrompa o beijo.
— Por favor fale comigo. Diga-me o que dói tanto você.

Aceno, raspando meus lábios com os dentes.

— Depois que deixei você naquele quintal – o dia em que


Dom e Sean nos descobriram – dei a eles algumas horas para
esfriar um pouco antes de ir até eles. Muitas horas, na verdade.
Voltei e caminhei em seu quintal. Eu ouvi você tocando “Father
Figure”, para mim. Doeu pra caralho. Sabia o quanto você
estava magoada. Acabei voltando para eles antes de vir para
você, e você sabe que nunca consegui.

— Por quê?

— Pela mesma razão, estou me rendendo. Já tomei


muitas decisões ruins que colocam em risco as pessoas que
amo. Isso me deixou paranoico, e às vezes não sei quando
meus instintos estão certos, ou é a paranoia. Está ficando mais
difícil distinguir qual. Eu realmente precisava dessa porra de
férias.

Ela balança a cabeça e passa os dedos pelo meu cabelo,


esperando pacientemente que eu fale. Quero dar isso a ela e,
mais de uma vez, arranquei páginas do meu diário
relembrando aquela noite, mas nunca consegui ler. Tomo
outro longo gole de gim e coloco a garrafa na mesa, dando a ela
toda a minha atenção enquanto relato cada detalhe que
consigo lembrar sobre aquela noite, exceto a ligação de
Antoine. Ela escuta com atenção, se aproximando de mim a
cada palavra, seu aperto em mim cada vez mais forte, seus
olhos brilhando com empatia quando eu termino.

Depois de um período de silêncio, ela se posiciona no meu


colo para que ela fique totalmente de frente para mim antes de
falar.

— Você sabe que um juiz dá uma sentença para crimes


cometidos em ordem de gravidade e grau do crime. Quanto
tempo você planeja servir, Tobias?
— Não é tão simples assim.

— Não, não é, mas você acha que ele gostaria que você
vivesse o resto de sua vida como escravo de sua culpa? Culpa
por ações das quais você se arrepende com todo o seu coração
e ser? Você sabe a resposta. Por mais duro que estivesse, esse
não era o coração de Dominic. Isso não era quem ele era. Ele
era o mesmo homem impenetrável operando no amor, uma
imagem espelhada de você. — Mordo meu lábio enquanto ela
segura meu queixo, forçando meus olhos nos dela.

— Nunca senti como se tivesse acabado de perder meu


irmão, e sei que pode parecer estranho. Mas eu sinto que...

— Você perdeu um filho, — ela sussurra. — Não é


estranho. Você assumiu esse papel. Vocês eram os dois.

Concordo.

— Eu conheço esse amor, Cecelia, — confesso, — o amor


de um pai. Na maior parte, eu era o pai de Dominic, apesar do
meu título. — Balanço minha cabeça, incapaz de vê-la agora
em meio à minha dor. — E um dia antes de ele morrer, tirei
dele a única coisa que ele mais queria no mundo. Ele morreu
apaixonado por você. Roubei dele e quebrei seu coração, sua
confiança. Que razão ele teve para não se colocar na frente
dessas balas?

Seus olhos se arregalam e ela balança a cabeça


furiosamente.
— Você não pode pensar isso. Eu sei que você não pode
pensar isso.

— Talvez eu faça.

— Você está mentindo para si mesmo, Tobias. — Seus


olhos marinhos exigem os meus. — Frères pour toujours. —
Sempre irmãos.

Ela repete as últimas palavras de Dom para mim, e ela


poderia muito bem ter levado uma marreta no meu peito.

— Você foi a razão pela qual ele levou aquelas balas. Ele
nos salvou ao salvar você primeiro.

— Não, — começo a me desfazer, a ferida em meu peito


queimando minha garganta. Quando levanto a garrafa, ela a
pega de mim.

— Não faça isso comigo, — balancei minha cabeça, — por


favor.

— 'Eu nunca o vi se iluminar assim com qualquer


mulher.' Foi o que ele me disse naquela noite. Isso é o que você
queria saber quando estava sóbrio.

Desvio meu olhar, mas ela me pressiona.

— Ele sorriu quando disse isso, Tobias. Gostaria que você


pudesse ter visto aquele sorriso, porque se você estivesse lá –
se você tivesse visto – você saberia sem dúvida que ele queria
que você fosse feliz, mesmo que isso significasse me perder. O
que tivemos foi lindo, mas você está dando muita importância
ao relacionamento errado, e posso ver em seus olhos, você sabe
que é verdade, mas admitir significa admitir que ele morreu
por você. E ele salvou você, Tobias.

— Cecelia, — imploro a queimadura na minha garganta


me fazendo engasgar.

— Ele te amava tão ferozmente e incondicionalmente


quanto você o amava. Ele estava com raiva, mas tão protetor
com você e sua felicidade, e é por isso que ele o salvou.

— Puta merda! — Estalo, e ela me fixa onde estou


sentado, firme e pressionando ainda mais.

— A verdade é que ele empurrou você para fora do


caminho naquela noite antes de pegar qualquer bala para me
proteger. Ele deu a vida pela sua. Você se recusa a aceitar isso,
e isso é o que mais está machucando você. — Ela me puxa para
seu peito enquanto começo a tremer enquanto grunhidos saem
de mim. Ela se envolve em mim, recusando-se a me deixar livre
enquanto sussurra a verdade, uma verdade que eu faria
qualquer coisa para esquecer. — Já passou da hora de você
encarar e aceitar isso. Não sou a única que ele salvou naquela
noite, Tobias. Você tem que aceitar seu sacrifício. Mesmo que
esteja com raiva por isso, você tem que aceitar que o amor dele
por você era tão forte quanto, e tem que aceitar que ele te
perdoou e te amou o suficiente para querer que você seja feliz.
Você tem que se libertar dessa culpa, ou você nunca será capaz
de aceitar o resto do presente que ele lhe deu.
Pressiono meu rosto em seu peito e estremeço com o
ataque da verdade que tenho evitado desde que a vida deixou
seus olhos. Desde o momento em que o segurei como um bebê
em meus braços, sabendo que ele pertencia a mim, até o dia
em que ele olhou para mim e sumiu, ele era meu.

— Je suis désolé, Je suis désolé, je suis vraiment désolé,


Je suis vraiment désolé. — Eu sinto muito. Eu sinto muito. Eu
sinto muito. Eu sinto muito, porra.

— Você tem que agradecê-lo vivendo, — ela murmura


enquanto me canso, enquanto o remorso profundo rola por
mim. Não parece punição. É mais cru do que isso. É
derramamento de sangue, implosão e, ao mesmo tempo, uma
estranha espécie de liberação. Não quero tanto isso, porque se
acontecer, se eu esquecer um único detalhe de alguma
memória, não o terei de volta.

Desmoronando em seus braços, ela murmura para mim,


passando os dedos por toda a minha pele, pelo meu cabelo,
alisando a mão nas minhas costas. Não tenho certeza de
quanto tempo ficaremos naquela cadeira quando eu finalmente
recuperei, seus murmúrios constantes, suas lágrimas caindo
em minha pele enquanto eu volto para mim, para o meu
presente, exausto, mas longe de estar vazio. Não é uma onda
de alívio, mas é a iminência de uma pequena liberação.

Abalado com o que acabou de acontecer, enterro meu


rosto em seu pescoço e inalo, seu cheiro me acalma a ponto de
eu poder respirar fundo. Erguendo meus olhos para os dela,
ela balança a cabeça enquanto abro a boca para falar, tão cru
de emoções que mal consigo controlar.

— Não se atreva a se desculpar comigo, — diz ela


suavemente.

— Não sei se sou o homem por quem você se apaixonou,


— confesso. — Não sei se algum dia serei de novo.

— Eu sei.

— Nunca fui um rei, Cecelia.

— É aí que nós discordamos. Você não vê o que vejo.


Talvez você nunca tenha. Tudo o que você parece ver são seus
erros, e estou determinada a mudar isso. Mas para mim, você
é tudo.

A sensação desconfortável me ameaça, mas eu a ignoro,


sabendo que estou completamente exposto. Mas com ela,
sempre estive, seja pelo desejo desenfreado que ela tira de
mim, meus pensamentos mais sombrios, minhas verdades
mais verdadeiras ou minha necessidade implacável por ela. Ela
sempre conseguiu me separar, camada por camada,
quebrando minha base para ficar mais profunda do que
qualquer outra.

Da garotinha com olhos travessos a uma mulher com


nada além de fogo no coração – ela me roubou primeiro, e essa
é a verdade mais verdadeira do coração deste ladrão.
Ficamos sentados por vários momentos apenas ouvindo
os ruídos da noite, o suor secando na minha pele enquanto
respiro seu cheiro novamente e levanto meus olhos para ela.

— Juniper, — sorrio, meus olhos meio fechados de


exaustão. — Você sabe, Tesor, que o gim é feito de bagas de
zimbro, certo?

— Não se iluda, francês, é pura coincidência. Uso desde


os dezesseis anos.

— Não é uma coincidência, — corro minha mão por suas


asas, seus olhos se fechando um pouco mais com cada carícia.
— Nada sobre nós é uma coincidência. Você já deveria saber
disso. A vida pode ter um senso de humor fodido para nos unir,
e todas as forças externas podem ter nos abandonado, mas se
alguma vez houve evidências de duas pessoas fadadas a
ficarem juntas, perdidas ou não, somos nós.

Ficamos em silêncio por vários minutos à beira do sono


até que o barulho de cascalho soe na calçada. Cecelia ganha
vida e aperto meus braços em volta dela para impedi-la de
pular do meu colo.

— Está bem. Estamos esperando companhia.

— São quase três da manhã. Quem é?

Belisco seus lábios enquanto ela empurra meu peito,


impaciente por uma resposta.

— Nossa carona.
Tobias desliza em um Tom Ford recém-costurado que
chegou algum tempo depois de eu dormir por meio de um
mensageiro de pássaros, sem dúvida por esse motivo. Ele puxa
o punho da camisa para abotoá-la, seus olhos pegando os
meus no espelho antes de um sorriso enfeitar seu rosto. Estou
excitada além da compreensão enquanto ele me examina com
nada além de meu sutiã e calcinha rendada preta enquanto
passo um ferro quente no meu cabelo. Estou indecisa no
momento sobre transar com ele ou matá-lo, mas tenho certeza
de que essa será a norma, desde que estejamos juntos.

Mas a razão para meus nervos à flor da pele neste


momento é porque estou me preparando para viajar para DC
para me encontrar. Com. O. Presidente.

Ele brincou comigo, mais uma vez com sua conspiração


e maquinação, fazendo mais planos que eu não sabia, e
disfarçou como uma 'surpresa'.

— Isso não é engano, — ele me assegura, com voz firme.


— Este é o meu plano B, minha Ave Maria.
— Parece muito com manipulação. E você ainda não me
disse o que está acontecendo.

— Você trancou a porta na minha cara, — diz ele,


juntando as abotoaduras, — então estou abrindo uma janela.

— Significa?

— Você saberá em breve. — Meus olhos descem para seus


dedos enquanto ele segura suas abotoaduras e levanta uma
sobrancelha. — Seu cabelo deveria estar soltando fumaça?

Pego minha chapinha e fico aliviada ao ver que meu


cabelo não veio junto.

— Pare de me distrair, — eu estalo.

Seus lábios se contraem.

— Tesor fica mal-humorada quando não consegue


completar as oito horas.

— Não culpe a privação de sono, francês, não tenho uma


noite inteira há semanas.

— Aqueles eram gemidos que mantinham você acordada,


não objeções.

— Seu bastardo presunçoso.

— Ton salaud. — Seu bastardo. Ele se move em minha


direção, o ajuste do terno o suficiente para me fazer salivar.
Embora ele negue, ele ainda é o rei arrogante por quem me
apaixonei. O zumbido em minhas veias não existe mais devido
ao gim ou aos orgasmos intermináveis de horas antes.

É ele.

Esse zumbido é tudo dele, nós.

Ele me alcança em dois passos confiantes e lentamente


levanta o vestido justo que escolhi do cabide, abrindo o zíper
para eu entrar. Eu o faço antes que ele o puxe para cima e
levante meu cabelo para dar um beijo na minha nuca.

— Esta é apenas uma visita domiciliar. Não pense muito.


Vou explicar no passeio. — Ele me vira em seus braços e me
empurra para a cômoda, seus olhos mergulhando.

— Nem pense nisso, — advirto.

— Contra esta cômoda ou na parte de trás daquela


limusine, sua escolha.

— Sonhe, amigo, de volta à casa do cachorro você vai.

— É uma surpresa, — ele me lembra enquanto pego


minha bolsa. Ele me segue para fora do meu quarto,
apontando com o queixo para o corvo encarregado de assentar
Beau. Há uma elasticidade em seus passos e, para ser honesto,
nos meus também, mas me recuso a deixá-lo ver minha alegria
porque, mais uma vez, não tenho ideia de quais são seus
planos.
Depois de trancar a porta da frente, me viro com Tobias
nas minhas costas para ir em direção à limusine, e ele me para,
me bloqueando, seus olhos intensos.

— Você o trancou.

— Sim? — Olho para cima em confusão.

— Você trancou três vezes, — ele grunhiu, as emoções


girando em seus olhos. — Você trancou três vezes, Tesor. Você
nem percebeu, não é? — Ele me empurra para a porta e
pressiona sua testa na minha antes de expirar e olhar para
mim, engolindo repetidamente.

— Tobias

Ele balança a cabeça suavemente, passando o nariz pelo


meu.

— Eu sou... porra, Cecelia. Perguntei se você achava que


ser feliz era possível para mim, mas isso não era justo e você
não poderia responder a isso, — ele diz suavemente. — Mas eu
posso. Eu sou. Você me faz feliz.

A emoção em sua voz me leva às lágrimas.

— Ficaria de joelhos agora e pediria que você se casasse


comigo, se pudesse.

Olhando para ele, ele agarra minhas mãos nas suas.

— Às vezes, gostaria de ser tão egoísta com você agora


como era antes.
— O que você quer dizer?

— Nada, — ele diz suavemente. — Mas quero dizer isso,


e nunca pensei que diria isso. — Ele exala uma respiração
lenta e olha para mim. — Estou feliz que você o amou e estou
feliz que ele sabia o que era ser amado por você antes de
morrer, e é por causa do jeito que você ama, Cecelia.

— Tobias...— ele captura meus lábios e me beija até que


estou ofegante, então ele se afasta. — Nada acima de você, —
ele garante com um breve contato visual antes de agarrar
minha mão e me levar em direção à limusine enquanto minha
cabeça nada com suas confissões. Quando o motorista abre a
porta, Tyler sai com um sorriso ofuscante no rosto enquanto
examina nós dois.

— Oh meu Deus, você esteve aqui o tempo todo?

— Ei, linda garota, — ele diz enquanto pulo em seus


braços abertos. — Por que diabos vocês dois demoraram tanto?
— Ele pergunta, seu queixo cavando no meu ombro antes de
me soltar. — Eu estava ficando muito irritado para
surpreendê-la adequadamente.

Aceno por cima do ombro.

— Culpe ele. Foi ele quem demorou meia hora para se


vestir.

Tobias corta os olhos para mim.


— Passamos quinze desses minutos soletrando meu
nome com minha língua, primeiro, meio e último, — ele
anuncia descaradamente enquanto minhas bochechas
esquentam.

Tyler balança a cabeça com uma risada enquanto olho


para Tobias.

— O que você é, um garoto de quinze anos?

— Vocês duas aberrações entrariam na limusine, por


favor? Vamos nos atrasar.

Tobias me introduz, e ouço sua troca silenciosa, suas


pernas ainda à vista.

— Acha que as coisas estão melhores? — Tyler diz.

— Graças a Deus. Estava perto de começar em um corpo


de pai e pesquisar cortadores de grama.

— Eu ouvi isso, — estalo, e ambos colocam suas cabeças


na limusine para ver meus olhos estreitos. Não posso evitar a
minha risada de suas expressões coletivas 'quebradas' antes
de eles deslizarem. Estou grata por estar no assento oposto a
Tobias, então posso admirá-lo de terno. Não só isso, sou
agraciada com a visão de Tyler, que só fica melhor com a idade.
Seus olhos castanhos calorosos estão ligeiramente cansados
de tanto viver, as pequenas rugas ao redor deles não fazem
nada para diminuir seu apelo. Toda a sua beleza juvenil se foi,
características esculpidas tomando seu lugar, mas sua
covinha ainda aparece quando ele sorri, e por isso, sou grata.
Há mais desgaste em sua postura muscular desde a última vez
que o vi.

Vê-los juntos assim é chocante. Adicionado com o


conhecimento de quem eles são, onde estiveram e o que
realizaram juntos torna tudo ainda mais fascinante.

Se o mundo conhecesse sua história, eles não


acreditariam. Ainda tenho dificuldade em acreditar.

— Não fique nervosa, — Tyler fala enquanto fico inquieta.


— Preston vai te amar. Molly também. Ela é boa pessoa. Você
está linda, Cee.

— Bem, eu ia dizer o mesmo para você. Você está incrível.


Você está vendo alguém?

Ignorando o brilho de ciúme flamejante do meu elogio e


minha pergunta, mantenho meus olhos em Tyler. Ele balança
a cabeça ligeiramente, seus olhos se entorpecendo com um
flash de dor.

— Não há tempo agora.

Ele não está pronto. Mesmo depois de todo esse tempo.


Já se passaram anos desde que Delphine morreu, e ele ainda
não quer tentar seguir em frente. Infelizmente, entendo porque
senti o mesmo. Ele perdeu a única mulher que considerava seu
verdadeiro amor e não por escolha, não por egoísmo, medo ou
qualquer outro motivo idiota que mantém as pessoas
separadas. Um longo silêncio se segue. Compartilho um olhar
com Tobias e sei que estamos pensando a mesma coisa.
— Vocês dois finalmente perceberam os idiotas que
foram? — Tyler entra na conversa. — Porque eu realmente
invejo vocês dois por isso.

— Percebemos, — diz Tobias, mantendo os olhos em mim.

— Contanto que saibamos quem é o maior idiota, —


aponto.

— Fico feliz em ver vocês dois tão felizes, — Tyler


interrompe. — Você merece isso. — Ele me lança um olhar
penetrante. — Fui encarregado de verificar você de vez em
quando. Fiquei chateado por você não ter voltado criando o
inferno muito antes.

— Deveria ter me dito que tinha um bom motivo para


voltar.

— Não poderia. Tinha um psicopata como chefe.

— E? O que você vai fazer? — Dou de ombros e


compartilhamos um sorriso triste: — Mas não somos os únicos
que merecem ser felizes.

Ele pisca em resposta, mas posso sentir o apelo em seus


olhos para não pressionar mais a conversa. Não quero uma
vida sem amor para o futuro dele, disso eu sei. Odeio pensar
nisso.

Depois de alguns minutos de bate-papo, Tyler enrola a


partição e verifica o relógio.

— Temos cerca de oitenta minutos até chegarmos.


— Fale livremente, — diz Tobias, e Tyler concorda.

— Posso te contar quase tudo, mas prefiro que Preston


explique, então você não precisa ouvir duas vezes.

— Por favor, não me faça esperar, — pergunto entre eles,


observando o fato de que Tyler chama o presidente pelo
primeiro nome. A realidade é que estou indo encontrar o líder
do mundo livre. O presidente que minha linda alma gêmea e
amante ajudou a colocar no cargo com um esquema que
arquitetaram quando eram adolescentes. E temo não estar
prestando atenção suficiente aos detalhes quando chegar lá.
Não deixo meus nervos levarem o melhor de mim com
frequência, mas isso é uma grande merda. Olhos vagando de
Tobias para Tyler e vice-versa, posso ver a hesitação.

— Vou nos legitimar, — Tobias diz simplesmente.

— O quê? — É a última coisa que esperava que ele


dissesse.

— Até certo ponto, — Tyler acrescenta.

— Significado?

— Isso significa que não devemos mais nos esconder do


'Big Brother' e não correremos mais o risco de cometer crimes
ou qualquer outro tipo de pena.

Lanço meus olhos entre eles.

— Você está falando sério?


Ambos concordam.

Tobias se inclina para frente e pega minha mão enquanto


falo.

— Este é o seu plano B, sua janela?

— Tem que acontecer, Tesor.

— Mas... isso vai contra tudo que você defende. Por que
você... — balanço minha cabeça, — Oh, não, inferno, não, você
não pode me usar como uma desculpa para fazer isso.

— Farei o que for preciso para mantê-la segura.

— Mas este é... Tobias. Isso é conformidade! — Grito. —


Não. — Atiro Tobias antes de virar para Tyler com outro
enfático, — Não.

— Eu disse que ela iria odiar, — Tobias diz, um sorriso


quase imperceptível nos lábios.

— Monroe só vai ficar no cargo por mais sete anos, no


máximo, — o lembro, — e depois?

Tobias encolhe os ombros.

— Então teremos muito a realizar durante esse tempo.


Isso não pode durar para sempre.

— E quanto aos outros, que tal...

— Eles vão mudar de ideia ou podem chutar pedras,


porra, — Tyler fala. — Isso não está se vendendo, Cecelia. Este
é o próximo nível. Não seria uma nova CIA nem nada. Não tire
conclusões precipitadas. Mas se houver uma maneira de
evoluirmos sem maiores riscos, vale a pena explorar. Nós
queremos a mudança e trabalhar com um governo que
podemos confiar. Esse é o ponto principal de tudo isso. E se
for temporário, que a história garante que será, faremos o que
pudermos, enquanto podemos. Se não achasse que era uma
boa ideia, não a teria colocado na mesa. No momento, estamos
em posição de escrever nossas próprias regras.

— Não entendo. Por que agora? — Mas sei a resposta.


Olho para Tyler, arregalando meus olhos para ele e minha
boca, 'que porra é essa?' Suas feições permanecem impassíveis
enquanto ele me encara.

— Vai funcionar. Confie em mim.

Balanço minha cabeça e volto minha atenção para


Tobias.

— Não faça isso. Você não precisa.

— Nós temos que fazer, Tesor.

— Não sou um tesouro de merda, ou uma rosa delicada,


ou uma violeta encolhida, ou uma donzela em perigo, ou um
maldito rato! Sou tão capaz quanto qualquer um de vocês e
assim que puder, vou chutar seus traseiros!

Eles caíram na gargalhada quando cruzei os braços, a


fúria passando por mim.
— Falou como uma verdadeira rainha, — Tobias reflete.

— Por favor, não faça isso por mim, — imploro. Lágrimas


de raiva ameaçam. — Nenhum de vocês será meu herói porra
por isso.

— Mais uma vez, — Tobias aponta para o peito, — Vilão.

— Sim, um homem tão horrível. Quanto você vai perder


para mim?

— Tudo, — ele diz sem hesitação. — Mas não se trata de


perder.

— Por favor, não coloque isso em mim.

— Ok, não vou.

A esperança brota dentro de mim.

— Farei isso por Sean. Ele tem outro bebê a caminho. —


Todas as minhas objeções cessam. Ele não deu a notícia com
a intenção de me machucar, mas o longo olhar que trocamos
me diz que ele tem medo de que possa.

— Cecelia, — Tyler diz, tirando minha atenção. —


Prometo. Isto é uma coisa boa.

Engulo e olho para os dois, sabendo que está


acontecendo com ou sem meu apoio.

— Você trabalhou toda a sua vida.


— Para mudar as regras, — afirma Tobias. — E nós
vamos.

Mastigo suas palavras enquanto cavalgamos em um


silêncio amigável antes que Tyler fale.

— Você está crescida, Cee.

Olho para ele e o vejo me encarando com olhos calorosos.

— Você só... — Ele balança a cabeça. — Quando te


conheci, bem, você era... é simplesmente selvagem, as
mudanças.

— Poderia dizer o mesmo sobre você.

Ele se vira para Tobias.

— Você vai colocar um anel nesta mulher ou o quê?

Tobias me encara, completamente silencioso, sem


intenção de responder. Ele me perguntou se eu queria filhos, e
nem uma hora atrás disse que se casaria comigo se fosse
egoísta, o que só me confundiu ainda mais. Quebrando nosso
olhar, olho pela janela.

— Ele mal conseguiu passar seis semanas de


domesticidade, Tyler, — sorrio. — Vamos dar um tempo para
ele.
Abotoando a jaqueta com o fone de ouvido no lugar, Tyler
sai da limusine e nos leva a uma entrada subterrânea.
Caminhamos por um longo corredor sem vida e entramos no
elevador. Minutos depois, entramos no Salão Oval enquanto o
presidente paira sobre sua esposa, que parece estar dando
uma bronca nele de onde está sentada no sofá.

—... seu burro teimoso.

— Baby, não seja rude, — ele olha para cima, com seu
sorriso de político firme, — nós temos companhia.

A primeira-dama dirige sua atenção para nós, sua


carranca dando lugar a um sorriso brincalhão enquanto ela se
levanta. Os olhos do presidente pousam em Tobias um
segundo antes de correrem em direção ao outro, fazendo o
homem bater palmas e segurando seu abraço por alguns
segundos.

— Já faz muito tempo, — diz o presidente enquanto eles


param e se olham por alguns segundos antes de seus olhos
rolarem sobre Tobias em avaliação. — Belo terno. Você parece
bem, irmão.
— E você está uma merda, — brinca Tobias.

— Vai com o trabalho. Tenho a projeção de ter quarenta


e poucos anos no final do meu primeiro mandato.

Sua esposa fala.

— Já disse mil vezes para você não prestar atenção a


essa besteira.

Os olhos cintilantes do presidente me encontram, e fico


tão nervosa ao vê-lo que coro.

— Posso ver por que você se interessou pela Virgínia.

Tobias se vira, com orgulho em seus olhos enquanto


estende a mão para mim e me apresenta a ambos.

— Senhor. Presidente...

— Corta essa merda, King, — diz a primeira-dama.

— Esta é Cecelia Horner.

— Prazer em conhecê-lo, senhor, — digo, erguendo a mão,


minha voz tremendo com a realidade em que estou atualmente.
Meras horas atrás, estava na Virgínia, lutando com Tobias em
um armário enquanto ele rasgava minha calcinha, me
lambendo sem sentido enquanto exigia que eu escolhesse um
vestido. Agora estou no Salão Oval.

— Me chame de Preston.
— E eu sou Molly, — acrescenta sua esposa, seus olhos
me varrendo. — Então, foi você quem fugiu.

— Não corri longe o suficiente, aparentemente.

Seus olhos brilham com sua risada.

— Espero que você esteja dando o inferno para ele.

— Ela está, — Tobias entra na conversa.

— É realmente uma honra conhecer vocês dois, — digo,


me permitindo o momento. Molly Monroe tem sido uma espécie
de ídolo para mim desde a campanha. Sem besteira em sua
fala, tanto dentro quanto fora da câmera, e ela constantemente
controla o inferno na mídia. Ela é muito 'o que você vê é o que
você consegue' de uma forma 'na sua cara'. Ela parece
realmente se importar com o trabalho que está fazendo, tem
um senso de moda incrível e não parece dar a mínima para as
opiniões dos forasteiros.

— Você vai ter que desculpar minha explosão quando


chegar aqui. Meu marido idiota parece achar uma boa ideia
apostar no meu blefe na hora de parar. Ele tem a noção de que
é o chefe.

Preston olha em nossa direção, seus olhos desconfiados.

— Tinha minha escolha de debutantes de todos os


estados para escolher, e aconteceu de escolher a mulher mais
atrevida e teimosa viva para me atormentar até que a morte
nos separe.
— O que será uma morte prematura se você continuar
batendo em suas mandíbulas, — Molly diz a ele sem lhe lançar
um olhar, e não posso evitar minha risada. Tyler sinaliza para
todos nós que ele estará de volta e me dá uma piscadela antes
de fechar a porta.

— Tenho um passeio de helicóptero, um pequeno tour


aéreo em DC organizado para nós, meninas, enquanto os
meninos falam de negócios.

Hesito porque não quero estar fora da sala quando isso


acontecer, mas esta não é uma reunião do clube, é o governo
dos Estados Unidos, e só tenho que tentar e confiar que meus
meninos me manterão no ciclo.

— Isso parece incrível, — digo honestamente.

— Não a roube ainda, — Preston fala antes de se sentar


no sofá.

— Você quer uma mimosa? — Molly pergunta, levantando


duas taças de uma bandeja pronta. — Sei que Preston te
acordou cedo, mas tenho um dia chato como o inferno pela
frente, e poderia usar um pouco de entorpecimento.

— Claro, — digo, olhando para Tobias, que me encara


como se eu fosse a pessoa mais importante na sala. Posso ver
o claro 'eu te amo' em seus olhos e tenho que atirar nos meus
para longe quando nossa conexão se torna demais para a
situação.
— Uau, isso é revigorante de ver, não é, Pres? — Molly
pergunta, uma pitada de seu sotaque de Boston escapando
enquanto pego a bebida oferecida.

— Claro que é, faça anotações, — ele rosna, agarrando


seu pulso assim que ela leva a flauta aos lábios. — Só um para
você. — Ele instrui antes de olhar entre Tobias e eu. —
Estamos fazendo fertilização in vitro. É por isso que ela perdeu
a cabeça ultimamente. Tenho certeza de que ela vai começar a
desafiar nossos caras para a queda de braço.

Eles foram abertos sobre sua jornada para começar uma


família na mídia, mas vê-los falando sobre isso tão
abertamente me deixa um pouco pasma. É dolorosamente
aparente que eles desejam tanto ser pais para se assemelhar à
verdadeira definição de Primeira Família, e espero de todo o
coração que isso se torne realidade.

— Se perdi a cabeça, — ela brinca, — é porque me casei


com um homem capaz de governar um país, mas não tem
tempo de espera.

— Dá, baby, vamos ter cuidado com o palavreado, dá a


você zero tempo de espera, ultimamente, — ele corrige
incisivamente. — Não vamos abrir buracos na minha
masculinidade hoje, tigre. E fique tranquila, vou colocar um
bebê em você esta noite. — Preston atira de volta, sua voz
esquentando. — E mais cinco depois, então você tem seis
réplicas minhas para lidar no dia a dia.
Eles compartilham um olhar esperançoso, e posso ver um
pouco da mágoa nos olhos de Molly quando ela se vira para
mim.

— É a nossa quarta tentativa. Mas isso vai acontecer


desta vez, — ela sussurra, — posso sentir isso. — Ela pega
outra mimosa da bandeja e desafia Preston a se opor. Ele
aperta o joelho dela para encorajá-la enquanto chuta para trás
e cruza a perna sobre a outra. Não posso deixar de perceber o
quão bonito ele é pessoalmente. A câmera realmente não lhe
faz justiça o suficiente.

— Não acredito que vocês dois estudaram juntos.

— Bons tempos, — Preston diz. — Aposto que ele nunca


lhe contou sobre a noite em que salvou minha vida.

— Isso é um exagero, — diz Tobias.

— O inferno que é, — retruca Preston.

— Acho que devo a você, Tobias, — Molly dá de ombros.


— Ou eu?

— Continue assim, mulher, — Preston sorri para sua


esposa, seus olhos sedentos enquanto ele os revira sobre ela,
dando a Tobias e eu mais uma espiada dentro de sua vida
privada. Tobias agarra minha mão na sua, e Preston pigarreia
quando Tyler entra.

— Pronto para fazer isso? — Preston pergunta, de pé.


— Para o inferno com isso, você vai comer o seu café da
manhã primeiro, depois os negócios.

— Molly...

Ela se vira para ele, seu olhar assassino, e ele morde o


punho antes de sacudi-lo para ela. E é então que me apaixono
pelos dois.

Tobias começa a rir do outro lado da mesa de Preston, e


o som disso me faz parar no meio da conversa com Molly. Não
o ouvi rir assim em anos, se é que nunca, e lanço meu olhar
entre os dois, um pouco pasma.

— Temos sorte, não temos? — Molly pergunta, bebendo o


suco de laranja que ela trocou depois de seu segundo copo. Ela
olha entre os dois enquanto conversam. — Estamos sentadas
com os dois homens mais poderosos do mundo, mas não é isso
que o torna tão especial. Na verdade, torna-se mais difícil amá-
los, não os respeitar, mas amá-los, não é.

Concordo.

— Mas é isso que nos torna especiais, — ela continua. —


Este não é apenas um namoro de menino com menina. Eles se
apaixonam, blá, blá. Este é um compromisso vitalício com os
homens que não estão satisfeitos com uma vida normal. Às
vezes, parece mais uma obsessão do que uma missão. Um que
pode testar uma mulher até seus limites absolutos. — Ela sorri
para mim, — Mas por ele, por aquele homem, farei isso. Estarei
lá quando ele se foder tanto que não conseguirá comemorar o
quanto é bom ou o que fez. Estarei lá sempre que ele duvidar
de si mesmo e nosso relacionamento sofrer por causa dessas
dúvidas. Estarei lá com o cabelo arrumado e batom, nos meus
melhores saltos, com a cabeça erguida nos dias mais sombrios,
porque é disso que ele precisa. E não quero que ele mude. Não
quero que ele pare de ser quem é, nunca, nem por mim, nem
por qualquer bebê que fizermos. — Ela vira seu olhar para
mim. — Mas vou usar as pontas desses saltos para perfurar e
prender suas bolas de latão se ele parar de me dar o que
preciso. — Ela pisca e toma outro gole de seu suco de laranja,
e pelo brilho em seus olhos, posso ver que nem tudo pode ser
suco. O calor lambe meu perfil, e sei que ele está me
observando, curioso sobre nossa conversa silenciosa.

Ela olha para Tobias, um sorriso suave em seus lábios


antes de se virar e se concentrar em mim.

— Você tem um bom par de saltos, Cecelia?

— Já estou usando, — asseguro-lhe, tomando um gole da


minha bebida depois de brindarmos.

De pé na Sala de Jantar de Estado da Casa Branca, duas


horas depois, olho para o retrato de Lincoln Healy que está
pendurado sobre a lareira e fico maravilhada com o fato de
estar aqui. Estou exausta, mas com adrenalina devido a tudo
o que aconteceu e ao fato de que tenho o número do celular
pessoal da primeira-dama. Olho para o Honesto Abe, me
perguntando o quão honesto ele realmente era e curioso se ele
alguma vez sujou as mãos – ou se tinha um monstro
semelhante, um remotamente perto daquele com que a minha
lida. Fico olhando em transe até senti-lo, um tipo diferente de
homem, muito mais agressivo em sua abordagem para buscar
justiça enquanto ele circula minha cintura e me acaricia.

— Como foi?

— Muito bem.

— Você quer dizer que?

— Estou surpreso com o quão feliz estou.

— Boa. — Engulo. — Vou arrancar os detalhes de você


em breve.

— Vou te dar tudo isso depois de dormir um pouco. Você


estará presente na próxima reunião. Me certifiquei disso.

Aceno e viro para ele.

— Você sabe que não é justo, — digo baixinho.

— O que não é justo?

— Você merece reconhecimento pelo que fez igual a


qualquer um desses outros. Sei que todos eles sujaram as
mãos em um ponto. Talvez eles tivessem seus próprios
monstros. Nenhum deles é inocente. Você merece... muito
mais. Você merece ser reconhecido pelo que fez, Tobias.

— Não fiz isso de maneira honesta, — ele diz


facilmente. — E mesmo que suas mãos não estivessem limpas,
davam a impressão de que estavam. Muitos deles eram bons
homens oprimidos por outros. E não dou a mínima para a
notoriedade.

— Sabia que você diria isso.

— Porque é verdade. A única opinião, o único reflexo que


me interessa, é olhar de volta para mim. E enquanto ela estiver
me olhando do jeito que está, me considero validado e
reconhecido.

— Eu te vejo. Até o que você esconde.

Ele faz uma pausa antes de me beijar brevemente,


olhando Abe atrás de mim.

— Por mais sexy que possa parecer batizar a Casa


Branca, e por um momento, Tesor, pensei nisso brevemente,
há muitos homens mortos com olhos vigilantes aqui.

Rio e o abraço enquanto ele sussurra docemente em meu


ouvido.

— Vamos para casa.

— Mostre o caminho, meu rei.


Estacionando do lado de fora do motel, olho ao redor para
ver alguns carros passando antes de me aproximar da porta.
Antes que possa levantar minha mão, ela se abre. Oz me
cumprimenta com um aceno de cabeça enquanto me concentro
no idiota sentado à mesa. Há uma variedade de lanches de
máquina de venda automática intocados na frente dele. Ele
levanta os olhos para os meus, e neles não consigo ver um
lampejo de medo, mas fica claro em sua postura que ele não
tem certeza de seu destino pela forma como seus braços estão
apoiados na mesa. Pegando a cadeira estofada manchada em
frente a ele, coloco minha Glock na mesa e aceno para Oz e
Dave antes que eles saiam da sala.

— Quels sont ses projets? — Quais são seus planos?

Ele encolhe os ombros. Sua postura ainda é rígida, mas


há claro desprezo em seus olhos pelo fato de estar trancado
aqui há semanas e provavelmente preferiria morrer a ser
prisioneiro em um hotel decadente.

— Tudo bem, Julien, vamos parar com essa merda. Você


sabe que sei quem você é. Um francês nascido que cresceu em
uma família abastada na Côte d'Azur e se formou como o
primeiro da classe antes de fazer uma breve passagem pelo
exército. Pouco depois, você foi recrutado para as fileiras de
Antoine, o que, para ser totalmente honesto, pode ser minha
culpa, porque disse a ele o que procurar. Você também é
fluente em inglês, italiano e espanhol. Você tinha uma chance
de um futuro decente, até se juntar a ele, até este exato
momento. Mas estou curioso para saber por que você jogou
ignorante comigo.

Outro encolher de ombros.

— Então, você odeia a América? — Digo, colocando


minhas mãos sobre a mesa.

Ele concorda.

— O que exatamente você odeia? E, por favor, não diga


nossa arrogância, porque essa também é uma característica
francesa. Eu deveria saber. Sou ambos.

Silêncio.

— Vou te dizer o que não gosto na América – ganância.


Este país foi roubado e estabelecido por homens materialistas.
É uma doença que nos atormenta há centenas de anos, dando
a ilusão de oportunidade e liberdade. E é, mas apenas para
aqueles que têm coragem de tirar o que não lhes pertence. Para
esses homens, é grátis para todos. Você já ouviu falar de Al
Capone?

Ele abaixa o queixo.


— Um dos gangsters mais notórios de todos os tempos. A
simples menção de seu nome poderia causar terror nos
corações de inúmeras pessoas enquanto ele reinava. A maioria
sabe como ele viveu, mas você sabe como ele morreu?

Um rápido aceno de cabeça.

— Em uma fralda cheia de merda devido à neurossífilis.


Tenho certeza de que você concordará que é um fim indigno.

Seus olhos se arregalam ligeiramente.

— Também me surpreendeu. Eu poderia dar mais cem


exemplos de idiotas como ele, mas nenhum deles tem um final
bom. Muito poucos como ele morrem confortavelmente
dormindo com paz em seus corações. — Zombo dele.

— Você pode imaginar como seria estar perdido na mente


por esse tipo de mal? Eu não quero. Eu não sou ele. Acabei de
aprender com seus erros e dezenas de outros como ele, porque
no final, ninguém quer ser aquele filho da puta, não é? — Tiro
a passagem de volta do bolso. Ele nem mesmo olha para ela.

— Mas a América não é o único lugar onde existe


ganância. Nosso planeta está infestado disso. A França não é
exceção. Acredito que houve uma guerra de cem anos forçando
os jovens a ficarem desfigurados porque eles praticavam com
arco e flecha dia e noite para se preparar para uma guerra que
eram muito jovens para lutar – cento e dezesseis anos de luta.
Algumas centenas de anos depois, outra guerra foi declarada
por um bastardo francês excessivamente ambicioso. Você pode
me dizer o nome dele?

— Napoléon, — diz ele, como se tivesse um gosto ruim na


boca.

— Outro homem ganancioso, e assim por diante. Acho


que você entendeu meu ponto. Todos nós fazemos o que temos
que fazer no final do dia, não é? Porque mesmo que eu esteja
disposto a dividir o que ganho, não será o suficiente. A
ganância não entende o conceito de suficiente. Mas esses atos
indizíveis dos quais participamos são todos necessários porque
decidimos até onde iríamos no minuto em que decidíssemos
jogar este jogo. Posso ser um homem virtuoso o dia todo, mas
não poderia chegar onde estou se me recusasse a lutar contra
o resíduo sob a superfície. E isso é negócio.

Curvo-me para ficarmos no mesmo nível.

— Mas esta é a minha vida pessoal com a qual você foi


condenado, e ao fazer o que tinha que fazer, você acabou de
perder seu futuro. Fique tranquilo, não importa para qual
buraco você salte de volta na França – a porra do eu de
fabricação americana está vindo atrás de você. Pelo menos
então, você terá um bom motivo para odiá-lo. Mas vou
conceder-lhe isso, quando te encontrar, você vai morrer nas
mãos de um compatriota francês.

Tudo dentro de mim quer acabar com ele agora, mas se


fizer isso, minha mensagem não será entregue.
Neste ponto, estou preparado para enfrentar o exército de
Antoine, e serei amaldiçoado se deixasse aquele maldito
bandido roubar mais minha paz de espírito. Esta charada já
dura o suficiente. Se é a guerra que ele quer, farei o que for
preciso para vencê-la. Mesmo que tema a ideia, há um lado de
mim que anseia por voltar à ação.

— Tu veux mourir? Et laisse-moi être clair, si tu hausses


les épaules encore une fois, tu le seras. — Você quer morrer? E
deixe-me ser claro, se você encolher os ombros mais uma vez,
você vai.

— Je t'ai dit tout ce que je sais. — Eu disse a você tudo o


que sei.

Sei que isso é verdade. Os textos são muito vagos para


este idiota ser o mais confiável de Antoine.

— Tu n'es rien de plus qu'un putain de chien de garde, et


tu n'es même pas bon à ça. — Você não passa de um cão de
guarda e nem mesmo é bom nisso.

Seus olhos brilham de raiva, mas ele permanece mudo,


engolindo seu temperamento. E porque sou o bastardo que
sou, quero mais.

— É um desperdício de suas habilidades se você me


perguntar. Você deveria ter exigido mais para si mesmo. —
Revirando meus olhos para baixo em seu corpo com desgosto
claro, o isco para qualquer desculpa para atacar.
— Tu n'es même pas digne d'être français. — Você não é
digno de ser francês.

Seu sorriso de escárnio é quase imperceptível, mas é toda


a munição de que preciso. Agarrando minha Glock, jogo a
mesa de lado e fico acima dele, pressionando-a contra sua
testa. Para seu crédito, ele não vacila. Agarrando-o pela
garganta, cavo meus dedos em seu pomo de adão e me curvo
para ficarmos cara a cara.

— Dis-lui que le temps ici est parfait. — Diga a ele que o


tempo aqui está perfeito. Me inclino enquanto ele luta para
respirar, os olhos disparando em direção à porta do motel, —
Et que l'eau est prête. — E a água está pronta.

Resistindo ao impulso de esmagar seu crânio com minha


Glock, saio correndo, levantando meu queixo para Oz, que está
esperando do lado de fora,

— Coloque-o no avião.

Vinte e quatro horas. Vinte e quatro horas até que Tyler


envie seus melhores – até que tenhamos a proteção do Serviço
Secreto ao lado de meus pássaros. É tempo suficiente. E, nesse
tempo, preciso esclarecer todos os detalhes, começando pela
minha história com Antoine. Tenho dez dessas horas até Julien
chegar à França e, depois disso, o relógio de verdade começará
a funcionar. Não tenho dúvidas de que vai ser mais uma luta
com a Cecelia, mas também sei que não vai nos quebrar a
ponto de não conseguirmos nos recuperar. Mesmo com essa
proteção a caminho, não tenho certeza do que está por vir. Só
isso me faz correr em direção a ela, com a intenção de nos
manter o mais perto possível. Não apenas minha confissão
poderia abrir uma nova cunha entre nós, mas o fato de que
vou recusar a ela qualquer espaço pessoal de agora em diante,
vai ser terrível pra caramba. Ela quer minha confiança, mas
quando se trata do imprevisível, não posso dar e, sobre isso,
não vou ceder. Parando no café, não vejo seu Audi e franzo a
testa antes de enviar uma mensagem.

Onde você está?

Quando não recebo uma resposta, raciocino comigo


mesmo o melhor que posso enquanto tento acalmar meu
coração acelerado.

Calma, Tobias, provavelmente ela foi fazer um depósito.

Ela geralmente o faz antes de chegar em casa,


normalmente carregando uma bolsa de banco com um recibo
no avental. Entro no café para ver Marissa no balcão, decote
em exibição enquanto ela adora um cliente. Ela levanta o
queixo em minha direção, seus olhos brilhando em boas-
vindas, enquanto o homem sentado atrás do bar faz o mesmo,
um sorriso distraído em seu rosto antes que seus olhos se
conectem aos meus.

Sr. Fodido. Bonito.

— Ei, Tobias, — Marissa interrompe nervosamente,


chamando minha atenção dele. — Ela apenas saiu para fazer
o depósito.

— Ela vai voltar?

— Ela não disse.

— Vou esperar.

— Quer um pouco de café?

— Estou bem.

Olhando para o meu telefone, não vejo nenhuma


mensagem dela e tento não entrar em pânico. Mando uma
mensagem para meus pássaros, demorando na porta
enquanto Greg se levanta e pega algumas notas.

— Vou pegar seu troco, — Marissa fala em um tom mais


adequado para o quarto.

— Não há necessidade.

— Vou embora em algumas horas, — ela diz, e ele


concorda. É óbvio que algo está acontecendo. Cecelia
mencionou ter visto Greg algumas vezes no café e me garantiu
que ele não tinha mais olhos para ela. Sua nova presa se
inclina sobre o balcão novamente enquanto levanto meu olhar
de volta para o meu telefone antes de enviar outra mensagem
para Cecelia.

Ela provavelmente está dirigindo, Tobias.

O Sr. Bonitão se inclina na minha periferia, sem foder e


sussurra sugestivamente para Marissa, e só consigo pegar o
traseiro dele, — sobre a companhia que você mantém.

Franzindo a testa, levanto meus olhos enquanto ele


pendura o casaco sobre o braço antes de caminhar em direção
à porta, assobiando. Ele para quando me alcança, dando-me
uma piscadela de 'Eu fodi com ela' e inclinando seu queixo.

— Tobias.

Ignorando-o descaradamente, olho de volta para a minha


tela.

— Ela provavelmente foi para casa, — diz Marissa, —


normalmente vai depois de fazer o depósito.

Concordo.

— Tudo bem, te vejo mais tarde.

— Vejo você em breve, — ela sorri, seus olhos voltando


para Greg, que está indo em direção a sua BMW. Marissa
começa a limpar o balcão e, como o mais novo membro de seu
fã-clube de merda, começa a assobiar sua música de
despedida.
Irritado, com a mão na porta, congelo quando a imagem
de um quarto de hotel em Paris se fecha antes de explodir
totalmente em minha mente. Imagino isso tão claramente,
derrubando uma garrafa meio vazia de Bombay na mesa de
cabeceira enquanto tento pegar o controle remoto. Fui
arrancado do sono cantando, só parando quando reconheço a
mulher cantando como Ann-Margret, a mesma mulher que
estrelou um filme de Elvis que Beau costumava assistir
quando éramos crianças. Mas a razão pela qual essa memória
ficou em mim é por causa da música que Ann estava cantando.

— Tchau, tchau, Birdie.


Estourando pela porta de vidro, eu consigo ver Greg
assim que ele puxa para fora, sua janela abaixada, seus olhos
fixos em mim, e desta vez, há um desafio neles, junto com a
porra do toque presunçoso dos lábios.

— Vejo você em casa, passarinho.

Em um segundo plano, tenho minha arma apontada para


ele, mas ele abaixa seu Beamer, e amaldiçoo enquanto sou
forçado a persegui-lo. Discando freneticamente, enquanto ligo
a ignição, não recebo resposta em pânico como se nunca
tivesse experimentado corridas através de mim.

Livrando-me do telefone para me concentrar, consigo


avistar a cauda de Greg e reduzi a marcha, acelerando para
dar-lhe tudo sob o capô. É quando fico preso atrás de um velho
Civic e Greg sai de vista que perco o controle, desviando da
estrada e buzinando em advertência antes de rasgar o piso
para alcançá-lo. Examinando mentalmente as rotas que fiz nos
últimos meses, sei que não há nenhum atalho que me leve até
lá mais rápido. É quando ele dá algumas voltas em direção à
casa de Cecelia que o pavor me envolve totalmente, e fico com
raiva da estrada. O Sr. Belo morrerá esta noite, disso eu sei.
Não importa meu destino, ele morrerá.

E eu vi isso.

Ele tem agido sozinho? E qual é a conexão dele, se houver,


com a porra francesa que acabei de colocar em um avião?

Repasso a conversa que tivemos no dia em que nos


conhecemos.

— Ela é linda, não é?

— Sou tão óbvio? Estive aqui todos os dias esta semana.

— É mesmo?

Ele acena com a cabeça, antes de levantar sua xícara em


saudação.

— Greg.

— Tobias.

— Isso é um sotaque francês? Você com certeza está muito


longe de casa.

— Porra! — Com o coração batendo forte, a esperança


despencando, faço o meu melhor para alcançar Greg, mas ele
está muito à frente – em todos os sentidos que contam. Desligo
o motor de Dom fazendo um bom tempo, mas não é o
suficiente. No momento em que ele está na entrada de Cecelia,
ele me alcançou em seis distâncias de carro.
— Por favor, fique bem, Tesor, droga! — Levanto meu
telefone para ver nada, nem uma única mensagem de qualquer
pássaro ou dela, enquanto mais medo bate em mim. O que sei
é que estou indo direto para uma armadilha e não tenho
escolha, porra. Se eles a levaram para algum lugar remoto para
lidar comigo, não tenho a porra da chance de salvá-la. Mas
pude ver nos olhos de Greg, ele é um monstro de uma raça
diferente, ele está com fome e quer que isso doa. E ele sabe que
ela é o caminho.

— Esteja aqui, baby, por favor, esteja aqui, Deus, por


favor, de novo, não de novo!

O sol se pôs totalmente quando Greg acelera em sua


longa entrada de automóveis, e meu estômago afunda quando
vejo que a casa está completamente escura. A luz da rua no
final de seu quintal não é suficiente para ver o que está à frente
ou quem, mas um leve alívio me cobre quando vejo seu Audi.

Provavelmente, ela está respirando.

Por favor, Deus, vou pedir uma coisa a você. Uma Coisa.
Nada mais.

Renunciando à entrada de automóveis, que o pedaço de


merda decide usar, rasgo suas árvores para ganhar tempo,
destruindo seu quintal. Paro a poucos metros de sua porta,
efetivamente prendendo-o logo após a entrada quando seu
primeiro tiro atinge o lado do passageiro do para-brisa. A
confusão estraga suas feições enquanto um buraco raso
aparece, mas não perfura, e sorrio de volta para ele porque
meu irmão não era um idiota.

— Vidro à prova de balas, filho da puta.

Já sei pela escuridão da casa e pelo silêncio do rádio, Greg


não está trabalhando sozinho. De alguma forma, ele conseguiu
afastar meus pássaros ou pelo menos distraí-los. Minha única
esperança é que Tyler esteja assistindo e possa ver a porra do
espetáculo que estou fazendo com o carro de Dom. E pelo jeito
que Greg acabou de me provocar, parece que ele me quer para
si. Ele ainda não entrou em casa para se proteger, o que me
diz muito. E ele é um atirador horrível ou está apenas
brincando comigo.

Pode falar, vadia.

Camaro em ponto morto, abro ambas as portas e olho


para o painel para ver seus olhos disparando entre eles para
ver por qual rota vou sair. Em vez disso, pressiono a
embreagem, coloco o carro em marcha à ré e pego o acelerador.
O carro começa a se mover, efetivamente fechando a porta do
passageiro enquanto giro totalmente de frente para ele para ter
uma visão clara. Ele salta sobre o capô enquanto descarrego
um pente para afastá-lo da porta da frente. Não posso me dar
ao luxo de matá-lo ainda. Acelero, corrigindo o volante
enquanto ele corre para o lado da casa e acelero em direção ao
portão, novamente prendendo-o. Ele se vira e atira por
instinto, o que me faz rir até que ele pula no capô como uma
espécie de porra de comando e começa a chover balas no para-
brisa, os buracos que ele está fazendo embaçam minha visão.

Nossos olhos se encontram logo acima de sua última foto


enquanto ele pega um novo clipe de sua calça enquanto abro
minha janela.

— Você tem uma porra de um alfaiate horrível.

Antes que possa posicionar minha mão o suficiente para


disparar e imobilizá-lo, ele está em cima do carro, seus passos
acima de mim. Sem escolha, e o tempo está se esgotando, pulo
para fora, Glock se virou assim que seu mocassim com borla
acerta meu queixo.

E à medida que os pontos negros desaparecem, percebo


rapidamente que alguém enviou um JCPenney vestido-Jackie-
fodido-Chan-rejeitado para mim em uma pequena cidade,
Virginia.

Minha mente misericordiosamente desacelera então, e a


visão de túnel entra em ação enquanto ele praticamente dança
para fora do tronco enquanto eu o peso visualmente, e ele faz
o mesmo, seu sorriso ainda está no lugar.

Este filho da puta acha que pode me levar.

Descarto uma das minhas Glocks a alguns metros de


distância, e ele faz o mesmo, então jogo a outra. Sei que fiz a
escolha certa quando ele balança as mãos em preparação.
Assim como estou tentado a jogar junto e dar a ele a porra
da onda de Bruce Lee venha aqui, ele se lança para mim, e
bato o cotovelo em seu estômago, roubando-lhe o fôlego. O
golpe levanta seu corpo, jogando-o para trás o suficiente para
que eu acerte outro em seu estômago e um abaixo da cintura
que o tem ofegante por Deus.

Ele esperava uma luta valente, uma abertura por meio de


um punho para se esquivar.

Ele agarra suas bolas, seu rosto contorcido de dor


enquanto me movo.

— Você foi lá primeiro, filho da puta. Onde ela está?

Conheço o tipo dele, com direito desde tenra idade, assim


como os malditos pirralhos que zombaram do meu sotaque
quando fui parar no parquinho da escola em Triple Falls –
mimado, ameaçado pelo que eles não sabem. O tipo que prefere
dar uma surra verbal ou física do que estender a mão para
ajudar alguém novo. Conheci muito poucos do tipo de homem
que conheceria. Greg é o tipo de homem que Preston se
tornaria se não tivesse um bom coração e uma alma decente.
Mas acho que deveria ser grato por filhos da puta como esses.
Por causa deles e frequentemente estando em menor número,
aprendi rapidamente como lutar nas ruas – sem regras,
implacável e sujo pra caralho.

Ele se reagrupa muito rápido e levanta o queixo.


— É só você e eu aqui, homem-pássaro. — Ele flexiona os
dedos e o apresso. Ele consegue dar outro soco antes que eu o
agarre pelo colarinho e dê uma cabeçada tão brutal que ele
quase desmaia em mim, sangue jorrando de seu nariz
enquanto suas pernas cedem.

Com um grunhido de frustração, ele se recupera,


lançando os olhos para o chão em busca de uma arma que não
vai receber de volta.

— Essa era sua única chance, vadia, e você a perdeu. —


Sabendo que ele está prestes a aproveitar suas reservas, choro
meus punhos em seu rosto. Quanto mais tempo lido com essa
merda de merda, mais tempo perco para chegar até ela. Seu
chute por pouco acerta a minha perna, e é quando fico
selvagem, deixando minha raiva assumir temporariamente até
que ele suspira e gorgoleja embaixo de mim. Tenho que me
forçar a parar, ainda sem saber o que ou quem espera lá
dentro.

O pedaço de merda estalando embaixo de mim é minha


única chance de saber o que estou enfrentando. Procurando
no quintal os pássaros que já deveriam estar aqui, um medo
genuíno se instala.

Onde diabos eles estão? O apoio deveria estar aqui agora.

Não há um único sinal de ninguém, nem mesmo dos


drones. Destruindo meu cérebro, sei que estou fodido porque
deixei meu celular no carro. Não tenho como espalhar a
palavra ou saber quem está vindo e quando.
Greg choraminga embaixo de mim enquanto coloco sua
arma na parte de trás da minha calça jeans sob o capuz e pego
minhas Glocks.

Ele começa a desaparecer enquanto olho para ele.

— Não, não, — bato em seu rosto, e quando ele não


acorda, pressiono meu dedo em seu nariz destruído. Um grito
de dor o deixa quando ele acorda, gemendo de agonia enquanto
o arrasto em direção ao ralo de chuva, onde tenho outra arma
e alguns pentes extras. Os escondo onde possa encaixá-los em
meus jeans e moletom.

— Quem está dentro, Greg?

Greg tosse e cospe embaixo de mim enquanto pressiono


seu nariz novamente, cavando ao redor da cartilagem
quebrada através do corte enorme com meu polegar. Ele grita
e cubro sua boca, sabendo que aqueles dentro da casa
ouviriam.

— Só vou perguntar mais uma vez, idiota.

Um ruído indignado sai de sua garganta, algo que soa


perto de uma risada, pouco antes de eu sentir o metal na parte
de trás da minha cabeça.

Foda-se.

Em segundos, sou tomado por duas sombras depois que


minhas Glocks são arrancadas de minhas mãos, e nós dois
somos levantados do chão e conduzidos para dentro. O
silêncio, uma vez que passamos pela porta da frente, faz meu
coração latejar contra minhas costelas. Se ela já se foi, não
consigo sentir. Ela tem que estar aqui.

Não saber está me matando, e resisto ao impulso de gritar


por ela para mostrar a extensão do que ela significa para mim,
para esconder o medo em minha voz. É quando os cabelos da
minha nuca começam a se arrepiar que sei, eu simplesmente
sei, fui superado.

É confirmado um segundo depois, quando a voz de


Antoine soa na sala de estar.

— Quanto tempo você vai me fazer esperar, Ezequiel?


Olhando as duas sombras dentro da porta de entrada
enquanto sou puxado para dentro, vejo mais algumas na
cozinha antes de ser liberado na porta da sala de estar. Meus
olhos pousam imediatamente em Cecelia, que está parada do
lado oposto do lado de fora de seu quarto. Ela está de pijama,
o cabelo ainda molhado do banho recente, a Beretta na mão.
Um homem morto está a poucos metros dela – e ao que parece
– morreu por sua mão.

— Ela insistiu bastante em ficar com a arma, — diz


Antoine de onde está sentado em frente a ela na cadeira de
encosto alto ao lado da lareira – a única luz na sala. Antoine
está sentado relaxado na cadeira, como se Cecelia não
representasse uma ameaça com sua arma e, pelo que parece,
ela não é, porque, de pé em cada lado dele, estão dois homens
armados familiares.

Palo e Julien.

David e Oz estão mortos? Eles ao menos conseguiram


chegar ao aeroporto?
Me movo para ficar ao lado de Cecelia para ter uma visão
clara dos três e encontrar o olhar fixo de Palo, ele me dá
absolutamente nada. Só posso concluir que ele mudou de
aliança novamente. Se eu tinha alguma esperança, era que
ainda tinha a dele. Então, novamente, não ouvi a porra de uma
palavra dele nas últimas semanas, o que é indicativo o
suficiente de onde estamos.

O problema de comprar homens é que eles podem ser


comprados.

Eles permitiram que Cecelia ficasse com a porra de sua


arma porque eles achavam isso ridículo. Estudo Cecelia, e sua
expressão permanece estoica enquanto seus olhos me
percorrem com alívio e os meus fazem o mesmo.

Ela está respirando. Ela está ilesa e armada. É mais do


que poderia ter pedido, mas ainda estamos fodidos.

Cedo demais. É muito cedo para terminarmos. Não


tivemos tempo suficiente. Nós fomos roubados desde o início.
A realidade disso toma conta do meu peito quando começo a
lamentar a nossa perda e dizer — sinto muito.

Ela balança a cabeça sutilmente quando me viro para


enfrentar Antoine.

Onde diabos estão meus pássaros?

Isso não pode acontecer novamente. Isso não pode


acontecer de novo.
Olho para Antoine, que está impecavelmente vestido, seu
corpo mais frágil do que a última vez que o vi devido à sua
idade. Greg se junta ao seu lado, uma toalha cheia de sangue
em uma mão enquanto ele pega um frasco do bolso com a
outra e retira a tampa.

Coca.

O que explica muita coisa. O homem não pode lutar por


merda nenhuma, mas a droga o tornou um crente. Sorrio com
o fato de que estraguei sua ferramenta para consumo, e ele me
encara enquanto a joga no fundo da garganta.

— Disse a você, — diz Antoine, olhando de soslaio para


Greg, — que você estava executando uma missão tola.

— Ele está aqui, não é? — Greg estala, seus olhos


vagando entre mim e Cecelia, cujo olhar está focado nele.

— O enteado afastado de Jerry, — Cecelia esclarece para


mim, alto o suficiente para a sala ouvir. — Ele está aqui para
mim porque eu lhe custei sua herança. Oops.

Olho para ela, a fúria enrolando através de mim, ela


pegou, e eu perdi devido ao ciúme. Mas, ao colocar uma bala
no antigo parceiro de negócios de Roman antes de chegar aqui,
iniciei essa cadeia de eventos e ajudei a colocá-la em
movimento. Na minha pressa de voltar para ela, deixei uma
ponta solta.

Uma a mais, ao que parece.


Greg entra na conversa.

— Acho que devo agradecê-lo por colocar uma bala na


porra da cabeça do porco gordo, — ele me diz antes de virar os
olhos para Cecelia. — Ou deveria agradecer a você agora que
minha mãe vive em um hospital psiquiátrico? E a cereja no
topo? Agora sou uma procuração sobre um império falido. —
Ele morde o lábio, seus olhos em Cecelia, sua intenção clara.
— Nós poderíamos ter nos divertido um pouco, você e eu, e
estávamos indo até o seu namorado bandido aparecer e me
contar sua pequena história de amor. Felizmente para mim,
meu querido padrasto não estava nem um pouco preocupado
com o rastro dele. Depois que encontrei seus contatos, Antoine
e eu conversamos um pouco... ficou muito mais fácil juntar as
peças. — Ele dá um passo ameaçador para frente, e Cecelia
também, com a mão firme enquanto mantém a arma apontada
para ele.

Greg zomba.

— Você vai atirar em mim, querida?

— Sim, — responde Cecelia sem hesitação.

— E depois? — Greg olha ao redor da sala, sabendo que


ele nos pegou.

Cecelia dá de ombros, sua intenção clara enquanto ela se


aproxima, sua mão firme.
Há armas apontadas para nós em todos os cômodos
adjacentes, exceto o quarto dela, que é de onde parece que ela
saiu, com a arma em punho.

Um maldito dia, precisávamos de um maldito dia para


nossa proteção entrar em ação.

Pense, Tobias.

— Cecelia, — advirto, e ela nem sequer olha na minha


direção.

Com o levantar da mão de Antoine, Greg dá um passo


para trás, mas Cecelia permanece onde está, e me junto a ela.

— Inimigos comuns, Tobias, você me aconselhou sobre


isso, — zomba Antoine. — Entre vocês dois, diria que você está
reunindo uma lista completa, bem, isso é até que você começou
a marcá-los antes de chegar aqui

Cecelia o interrompe.

— Algum idiota aleatório com um rosto bonito aparece


no meu café do nada quatro dias seguidos e se interessa
especificamente por mim? Foi amador. — Ela estala a língua e
se vira para Greg — sabia de você no segundo dia, e com
certeza no quarto dia, — ela diz, projetando sua voz para mim,
— tenho que amar Ryan.

— Você ligou para a porra do Ryan e não me contou? —


Cerro.
— Ele é meu parceiro no crime, bom em descobrir quem
são as sanguessugas, e você e eu não conseguimos nos
comunicar nessa frente, não é? Mas não se preocupe, seu
antigo parceiro de negócios se apresentou.

— Você a escondeu bem, Tobias. — Os olhos de Antoine


percorrem Cecelia, que está estoica ao meu lado, alerta e
pronta, antes de voltar o olhar para Greg, uma elevação
desafiadora ao queixo. Os olhos de Antoine voltam para mim.

— Vamos economizar um ao outro algum tempo,


afirmando o óbvio. Você estava me esperando.

— Em algum momento, mas esperava que você me


poupasse da dor de cabeça. No entanto, sabia que você viria
quando encontrasse a alavanca certa.

— Minha vantagem é linda, — ele avalia Cecelia


nauseante, e tudo o que posso fazer para não me lançar contra
ele.

— Ela nunca fez parte do nosso acordo.

— Ahh, é aí que você está errado. Meu corpo pode estar


se voltando contra mim, mas minha mente não, Tobias.
Lembro-me bem de nossa conversa. Você quebrou nosso
acordo há muito tempo, e minha confiança.

— Nosso negócio está encerrado há algum tempo. Você


não está aqui por causa de uma quebra de confiança.

— Não? Então me ilumine. Por que estou aqui?


— Porque você está perto de sua data de validade. Porque
você não tem mais nada para viver agora, a não ser seus
rancores amargos, e você os está inventando neste momento.

Seus olhos brilham com fúria quando Cecelia se eriça ao


meu lado, seus olhos hostis em Greg, que apenas sorri.

— Estou decepcionado com você, Antoine... depois de


tudo que fiz, — olho para os homens que estão atrás dele, —
isso é o melhor que você tem?

— Você não deveria ser tão presunçoso. Foi muito fácil


passar pela porta da frente e Cecelia foi uma anfitriã tão boa –
bem, além daqueles primeiros minutos, — ele olha para o
homem morto aos pés dela. — Para você ir tão longe para
mantê-la longe de mim todo esse tempo, me diz tudo que
preciso saber. — Ele estala a língua. — A filha de seu inimigo
jurado. Você foi contra tudo em que acreditava.

— Vale a pena, — engulo. — E você pode acabar comigo


agora. Você pode acabar comigo agora mesmo, levando-a
embora. Não estou negando.

— Um castigo que parece adequado ao crime.

— Que crime? Você sempre foi tão delirante, e é por isso


que nunca teve minha lealdade. Não quebrei nenhum acordo.
Não tenho nenhuma dívida com você. Por que ela é um insulto
a você?
— Porque meu sobrinho e meus homens morreram
enquanto você se entregava a ela anos atrás. Eu tinha me
perguntado o que prendeu você. Agora faz sentido.

— Um sobrinho e homens com os quais você não se


importava. Nunca te ferrei. Você viveu uma vida longa e sua
segurança nunca foi minha prioridade. Mas aqui está você,
vivo e respirando por minha causa. Isso deve dizer o suficiente.

— Você é tão rápido em apontar como educou a mim e


aos meus homens, mas deixou seu pau tomar suas decisões,
o que é patético pra caralho, de acordo com você.

— E para que eu teria que viver se tivesse seguido meu


próprio conselho? Percebi o erro dos meus caminhos. E meu
objetivo número um nunca foi me tornar um clone de você.
Ninguém para se lembrar de mim. Ninguém para assumir o
meu legado. Nenhuma razão para viver, porra, a não ser para
o jogo e, mais tarde, para existir sozinho apenas para refletir
sobre minhas maldades. Escolhi um caminho diferente. Você
tira isso de mim e depois? Quem você irá atrás? É isso que
você realmente quer?

— Não me insulte com seu coração sangrando, Tobias.


Você sabe que não posso ser persuadido.

— Você quer que eu implore por ela? Porque eu não estou


acima disso.

— Tobias, não — sussurra Cecelia suavemente, enquanto


os lábios de Greg se curvam em um sorriso felino de merda.
Puxo a arma de Greg da parte de trás da minha calça
jeans – uma arma que eles não se preocuparam em verificar
depois de segurar minhas Glocks – e sei que há pelo menos
seis outras pessoas apontadas para nós. Quatro na cozinha, e
os dois pelos quais passei na entrada. Mesmo se dermos
alguns tiros, vamos perder essa luta. A raiva lateja em mim
com a ideia de que é assim que tudo termina. Fui derrotado
por um homem que detesto, um homem indigno, e ele está
prestes a levar a única coisa sem a qual não posso viver.

— Por ela, vou te dar cada centavo que ganhei. Vou


entregar tudo. Pegue meu dinheiro, tire minha vida, mas deixe-
a ir.

Ele zomba:

— Existe essa nobreza. Temo que vá custar muito mais


para você desta vez.

Mantenho meu insulto pronto para mim, esperando pelo


menos poder de alguma forma negociá-la com segurança. Se
conseguir tirá-la desta casa, há uma chance de que ela consiga
pegar meus pássaros, mas não vejo opção, nenhuma chance
disso.

Antoine sempre foi impiedoso ao distribuir suas


punições, e isso é algo que ele sempre terá sobre mim.

A esperança desaparece enquanto a resolução me cobre.


Não tenho nada, absolutamente nada. Não há cenário aqui em
que um ou ambos não morram.
— Se você a levar, minha ira será bem-vinda, não é? Uma
última emoção, velho, antes de ir? — Levanto a Glock até a
têmpora e Cecelia engasga meu nome. — Não vou deixar você
ter a porra da satisfação, e se você sequer olhar para ela de
novo, morro, e você não vai conseguir o que veio buscar. Quer
me testar, porra?

Seus olhos brilham de surpresa. Isso sempre iria


acontecer. Sempre. Não importa quanto espaço coloquei entre
meu passado e presente, Antoine sempre foi o fio entre eles.

Tornei-me inútil para ele – para o jogo – quando cedi às


minhas próprias necessidades pela primeira vez na vida –
quando roubei aqueles meses com ela. Soube então que tinha
perdido a vantagem sobre qualquer inimigo do passado,
presente ou futuro.

Sempre achei que os envolvimentos emocionais são uma


ruína. Só desta vez, gostaria de estar errado.

Para Antoine, foi o ciúme e a ganância que o trouxeram


aqui, juntamente com o estado de mau gosto de sua vida agora.

Certa vez, vi seu presente como meu próprio futuro. O


futuro com que concordei quando comecei tudo isso, um
futuro que aceitei para mim mais de uma vez, até que ela
voltou à minha vida e me lembrou que eu tinha uma escolha.
Sacrifiquei nossa felicidade repetidamente para garantir que
esse confronto nunca acontecesse. Mas ela e eu sempre fomos
azarados, infelizes de todas as maneiras imagináveis. No final,
eu a escolhi, ao invés de sofrer a espera sem ela. A emoção
ameaça e engulo de volta, minha raiva fervendo enquanto
pressiono a arma em minha têmpora enquanto Antoine
mantém seu olhar no meu.

— Basta deixá-la ir.

Antoine zomba.

— Tão roteirizado. Quem é patético, Ezequiel?

Vi o futuro de Cecelia também, enquanto ela implorava


para eu amá-la de volta há muitos meses, enquanto ela me
implorava para ver o que ainda podíamos ser, o tempo todo
imaginando como seria sua vida pelos olhos injetados de
sangue de Delphine. Sacrificando nosso coração, nenhuma de
nossas vidas valeria a pena ser vivida. O meu como um homem
vazio e sem emoção, e o dela como uma mulher sem amor. E
mesmo com tudo isso, sei que senti isso e ela diria agora se
tivesse a chance, valeu a pena.

Com a arma na cabeça, olho fixamente para Antoine em


um desafio. É a mim que ele quer e sei que, apesar de sua
ameaça, sou a verdadeira moeda de troca. Tenho que acreditar
que ele vai tentar me convencer a não tirar seu prêmio e poupá-
la. É meu único movimento.

— Valeu a pena, Tesor. Então, vale a pena, — digo,


apertando o gatilho apenas o suficiente para ter Antoine
segurando as laterais de sua asa, seus olhos fixos em mim. Ele
está começando a acreditar em mim.
— Vagalumes, — Cecelia diz suavemente, e viro minha
atenção para ela.

— Essa é nossa força externa, Tobias. Foram eles que


cuidaram de nós. — Seus olhos lacrimejam enquanto ela
estuda a arma pressionada na minha cabeça. — Você não
concorda?

Aceno, meus próprios olhos ardendo enquanto peso suas


palavras.

— Nós nunca estivemos sozinhos, Tobias, — ela murmura


baixinho, seu tom enrolando em torno do meu coração. Posso
ver a resolução em seus próprios olhos enquanto caminhamos
para a beira do penhasco em que nos lançamos. Mesmo agora,
enquanto estou no precipício, posso sentir a convicção dessa
verdade entre nós. Vale a pena.

— Pesada é a cabeça, meu amor, — ela murmura como


se estivéssemos sozinhos, — só desta vez, deixe-me poupar o
fardo.

Ela vira o olhar de volta para o Sr. Bonito e o faço, para


ver os lasers vermelhos brilhando por todas as janelas da casa,
assim que percebo sua intenção.

— Cecelia, não! — Avanço para ela assim que ela puxa o


gatilho.
Tobias me prendeu no chão atrás do sofá enquanto
incontáveis pings quebram o vidro e ambas as portas se abrem.
Em segundos, a casa está cheia de movimentos borrados
enquanto Tobias pragueja em uma mistura de inglês e francês,
seus olhos e mãos me procurando freneticamente em busca de
ferimentos.

— Tesouro, — ele grasna, suas mãos ficando vazias


enquanto ele apalpa cada centímetro de mim. Olhando por
cima, vejo Antoine mortalmente imóvel – na poltrona que
pretendo queimar – vários lasers cobrindo-o da cabeça ao
peito. As luzes se acendem na cozinha e nos quartos ao redor
enquanto os homens de Antoine – os que ficaram de pé – são
presos e colocados de pé, seus olhos temerosos olhando ao
redor. O Sr. Bonitão está morto a poucos metros de distância,
com os olhos arregalados e sem vida. Mudando, olho para
Tobias e seguro seu rosto enquanto ele continua a murmurar
para mim, seu rosto em pânico enquanto suas palmas
percorrem meu corpo para cima e para baixo.

O medo e a confusão em sua expressão fazem meu


coração doer e meu amor se multiplicando além do ponto de
amor – ou qualquer palavra que represente o que sinto por ele
– algo que o transcende, algo indescritível, algo para o qual
nunca haverá palavras suficientes. Quando ele vê que estou
ilesa, sua postura fica rígida enquanto seu olhar voa para Palo
e Julien.

— Que porra esses dois não estão fazendo algemados? —


Ele grita com os homens que prendem os poucos que sobraram
na cozinha. Agarro seu rosto de onde eu estava deitada no chão
abaixo dele.

— Já acabou, meu amor, — informo-o, enquanto ele


brevemente baixa seu olhar para mim e reajusta sua Glock.
Com a intenção de chegar até ele, seguro seu rosto com as
duas mãos enquanto ele luta contra meu aperto.

— Tobias, olhe para mim, — ordeno em um tom que faz


seus olhos se moverem lentamente de volta ao foco, — acabou.

Com os lábios abertos, ele olha para mim, a verdade disso


não chega bem.

— Eu te amo, Ezekiel Tobias King, pra caralho, —


murmuro, — mesmo que você me obrigue a provar meu valor
para você uma e outra vez. Eu disse que não hesitaria, porra,
e falei sério. — Suas sobrancelhas se franzem em um profundo
V. — Você me fez um Raven. Você me deu minhas asas, então
me encarreguei de usá-las.

— O quê?

Chamo o homem ao lado de Palo.


— Julien, s'il te plait, — Julien, por favor.

Julien se adianta, ajoelhando-se para ficar ao nível dos


olhos de Tobias antes de jogar sua Glock no tapete. Tobias
eriça-se em cima de mim até Julien desabotoar a camisa e
lentamente enrolá-la para revelar tinta fresca.

A mandíbula de Tobias fica completamente frouxa


quando ele enfrenta um dos seus e percebe as implicações do
inferno que o fez passar.

— Ele atendeu ontem à noite, — digo com um sorriso. —


É o mínimo que eu poderia fazer depois do dano cerebral que
você quase custou a ele. Julien é um corvo há quase seis anos.

Antoine pragueja e lança um olhar mortal para Julien,


cujos lábios se contraem em um sorriso. Palo permanece em
silêncio, mas posso ver a diversão dançando em seus olhos.
Tobias estuda os dois por longos segundos e então muda seu
olhar de volta para mim.

— Obrigada, Julien, — dispenso-o, e com um aceno de


cabeça, ele recupera sua arma e se move de volta para o lugar.
Tobias vai falar, mas pressiono meus dedos em seus lábios. —
Mas o fato de você me desafiar é provavelmente uma das razões
pelas quais mais te amo. Conhecer você, amá-lo e compreender
você ajudou a me transformar na mulher que sou.

Ele engole, meus sentimentos o atingindo enquanto ele


examina cada palavra com cuidado.
— Algumas semanas depois, — explico. — Eu sabia que
algo com você não estava certo. E eu não conseguia descobrir
o que era. Eu já tinha Greg no meu radar e graças ao meu
antigo parceiro Ryan, ele o examinou e concluímos que seu
jogo era fraco. Vamos enfrentá-lo, Greg nunca teve a porra de
uma chance. — Abaixo minha voz para um sussurro. — Mas
eu tinha que descobrir o que ou quem tinha assim por diante.
Tinha que saber que ameaça silenciosa estava incomodando
você, uma ameaça que você repetidamente se recusou a me
contar, mesmo depois de prometer que faria. Estava tão furiosa
com você em um ponto porque eu sabia que você havia caído
nos velhos hábitos novamente, me mantendo no escuro, então
liguei para Sean.

— Sean está envolvido nisso?

— Ele tinha suas suspeitas, mas enviamos Julien para


nos certificar de que ele estava certo.

Seus olhos se arregalam.

— Você... me enganou?

Mantenho minha voz baixa enquanto a comoção soa ao


nosso redor.

— Sim. Antoine nunca percebeu minha presença. Nunca.


Você cobriu seus rastros, nossos rastros perfeitamente. Ele
nunca teria nos descoberto. Mas não me importava se Antoine
era uma ameaça naquele momento. Queria que ele fosse
embora, independentemente do estado em que você se
encontrava. Então, quando descobri sobre Greg, alimentei-o
com pedaços para levá-lo a Antoine. Mas Antoine veio a meu
convite. Trouxe a luta aqui.

Ele olha boquiaberto para mim.

— Você, foda-se, fez o quê?

— Para matar dois pássaros, sem trocadilhos. —Inclino


minha cabeça quando ela afunda. — Isso era inevitável.
Apenas acelerei o processo, do meu jeito.

— Você o atraiu aqui? — Ele grasna, suas feições se


torcendo em fúria.

— Eu fiz. E você quase atrapalhou meus planos ao nos


legitimar com a condição de proteção do Serviço Secreto.
Queria muito que fosse um trabalho interno para mostrar a
força do seu próprio clube, mas, felizmente, conheci um cara.
Nós trabalhamos para contornar isso.

— Você sabia toda essa merda de tempo? — A realização


assume quando seus olhos flamejantes estreitam em mim. —
Isso é porque você quase me deu no dia em que sua mãe veio
castrada... você descobriu que eu estava guardando segredos.
Foi no dia seguinte... — ele se vira para Julien e depois de volta
para mim.

Concordo.

— Fiquei tão zangada quando você não me contou sobre


seu encontro com Julien, que estava me reportando o tempo
todo – aliás, belas fotos – e quando você não confessou, fiquei
furiosa. Então, usei seus segredos do passado e nossos
problemas como desculpa para gritar com você por isso. Essa
raiva não era falsa. E quanto mais você não me contava, mais
zangada eu ficava. Porque...

— Prometi sem mais segredos, — ele termina, baixando a


cabeça brevemente, seus olhos cheios de desculpas quando ele
os levanta. — Cecelia...

— Cale a boca, King. E tente acompanhar, — repreendo


enquanto corro minha mão ao longo de sua mandíbula. — Meu
próximo passo foi escolher o tamanho da colher.

— A colher? — Acaricio seu rosto com a palma da minha


mão e levanto para dar um breve beijo em seus lábios antes de
olhá-lo bem nos olhos. — Para baixar aquele remédio. Xeque-
mate, meu amor.

Descrença total e absoluta. A expressão em seu rosto não


tem preço, fazendo com que este momento valha a pena o
esforço cem por cento.

— Então, Palo?

— Não está morto, — ele responde de onde está a poucos


metros de distância, e não posso evitar minha risada.

— Claramente, — Tobias responde, virando a cabeça para


olhar para ele, pegando seu sorriso.
— Sean pode ser convincente, — ele encolhe os ombros,
erguendo os lábios brevemente.

Tobias estreita os olhos para Palo.

— O que tem para você?

— Uma esposa. Esposa de Antoine, para ser exato, —


respondo por ele. O rosto de Antoine fica vermelho como uma
beterraba devido à evidente contenção das armas apontadas
para ele.

A casa começa a ficar quieta enquanto o resto dos


homens de Antoine são levados embora, lacres prendendo seus
pulsos enquanto eles lutam, xingando em francês e
prometendo vingança. Tobias olha para mim, seu velho mundo
inclinado em seu eixo enquanto seu novo mundo entra em
foco.

— Você é exaustivo. Você sabe disso? Entre as reuniões


secretas que mantive com David, Oz e Julien, trabalhando com
Sean e Tyler para fazer Greg atrair Antoine aqui e persuadindo
o resto dos meninos a embarcar para que não enfrentassem
sua ira, mal tive um momento de descanso para ter certeza de
que você tirou suas férias.

— Tyler, Russell, todos eles sabiam?

— Todos concordamos que essa era a única maneira de


você confiar totalmente em mim.

— Tudo isso foi uma armação?


— Além de Greg, tudo. Até previmos que você dispensaria
os dois pássaros naquele dia, Julien propositalmente atraiu
você e bancou o incompetente. Tyler tinha pássaros reserva
prontos. Ele sabia que você não deixaria uma merda como
aquela deslizar.

— Como você sabia sobre Antoine?

— Pergunte ao Sean.

Ele balança a cabeça em retrospecto.

— Isso é porque você passou a trabalhar todos os dias,


porra?

— Eu tinha um grande trabalho a fazer. Minha parte era


distrair você bancando a ex-namorada ferida, irritada e
cansada, o que honestamente não era grande coisa. Achei que
você pudesse me dar conta algumas vezes, especialmente
naquele dia em que você invadiu o café depois de decidir jogar
Rambo. O café era o único lugar onde podia manter contato
regular com os meninos sem que você percebesse. Pela
primeira vez, eu estava nisso, e você não. Meu projeto, meu
plano. —Não posso evitar meu sorriso cheio de orgulho. —
Agora engula aquele remédio, King, e deixe-o assentar.

Depois de alguns momentos prolongados, ele descansa os


antebraços no chão e levanta minha cabeça, segurando-a com
as duas mãos.

— Meu Deus, mulher, — ele balança a cabeça, nada além


de admiração em sua expressão. — Isso foi brilhante.
— Aprendi com os melhores. Mas, como disse, você
esqueceu para quem você voltou. Sei quem eu sou, Tobias, e é
hora de você se lembrar de quem você é – um homem que
construiu um exército digno, mas lutou muitas batalhas
sozinho. Nós temos você. Tive você, — digo suavemente. — É
hora de você confiar em mim, confiar em nós.

Minhas palavras atingem o lugar pretendido quando a


realização se estabelece.

— Você é um protetor, meu rei. É quem você é, para que


você nasceu, e não consigo ficar com raiva de você por isso.
Mas também sou uma protetora, meu amor, e é hora de você
ver isso.

Ele enterra o rosto no meu pescoço, a tensão deixando


seus ombros enquanto seu peito começa a bombear, e percebo
que é uma risada.

— Você não está com raiva? — Pergunto.

Ele levanta a cabeça, um sorriso radiante no rosto.

— Estou furioso pra caralho.

— Ezequiel? — Antoine grasna de onde está sentado do


outro lado da sala, seu tom cheio de desespero.

Tobias nem mesmo lhe dá um olhar enquanto escova os


polegares preguiçosos ao longo de minhas bochechas antes de
outro sorriso tomar conta dele.
— Essa foi uma sessão rápida e infernal de terapia de
casal que você acabou de me fazer passar.

— E totalmente necessária, — murmuro, — sem


arrependimentos.

Olhos âmbar perfuraram os meus, e posso ver a


sinceridade em sua expressão encharcada de amor.

— Eu nunca, nunca vou mantê-la no escuro sobre


qualquer coisa, nunca novamente.

Bufo e reviro meus olhos.

— Já ouvi isso antes.

Ele estremece.

— Eu só queria.

— Sei por que você fez isso. E você ainda está errado em
fazer isso. Vai demorar muito para treinar você na frente do
namorado.

— Nunca mais, nunca mais, — ele me garante.

— Uh huh, — franzo os lábios, — até a próxima vez.

Seus lábios se curvam.

— O que vou ter que fazer para te convencer?

— Muito. É uma coisa boa eu ter a paciência que você


claramente carece. — A adrenalina corre em minhas veias
enquanto acaricio as curvas de seus bíceps e, estranhamente...
Estou excitada de uma maneira que não posso descrever. Ele
lê minha expressão, os lábios se erguendo ainda mais
enquanto ele continua a acariciar meu queixo com uma
promessa ardente em seus olhos.

— Nós vamos chegar a isso o mais rápido possível.

Assim que ele fala, nossos nomes são chamados da porta


da frente.

Botas amarelas manchadas de óleo e jeans desbotados


aparecem em nossa periferia antes de Sean se agachar ao
nosso lado.

— Vocês dois estão falando sério agora?

— Muito, — Tobias brinca antes de nós dois mudarmos


nossa atenção para Sean, cuja pele está vermelha como bolhas
enquanto ele coça sua crina dourada com a mão segurando
sua Glock. — Alguém se importa de me dizer o que diabos está
acontecendo aqui com o Serviço Secreto?

— Tyler não atualizou você? — Pergunto, olhos


arregalados.

— Não, e quase tive uma porra de um ataque cardíaco


quando eles me pararam antes de se identificarem. Achei que
não conseguiria chegar a tempo. Desde quando estamos na
cama com o governo?

— Desde cerca de dez minutos atrás, — Tyler entra na


conversa enquanto entra na sala, aparecendo do nada.
— Há quanto tempo você esteve aqui? — Tobias grunhe,
levantando-se e me puxando do chão para o seu lado.

— Muito antes dos vagalumes, e bem a tempo de ver você


tomar seu remédio. — Ele pisca para mim e não consigo evitar
meu sorriso vitorioso. Tyler leva nós quatro para o meu quarto
e fecha a porta antes de se virar para Sean. — Desculpe, mano,
mas essa era a minha parte a desempenhar. E como essa tem
sido minha missão por malditos anos, pensei que deveria ser
eu a abrir o champanhe.

Sean parece pronto para esmurrá-lo.

— Talvez um pouco de alerta para não atirar na porra do


Serviço Secreto da próxima vez?

— O teste não vai acontecer de novo, — garante. — Que


bom que você é um péssimo atirador.

— Foda-se, e eu poderia passar sem o tempo de prisão


com esposa e três filhos.

— Você nunca verá o interior de uma cela, — garante


Tyler, batendo a mão em seu ombro. Os olhos de Sean
imediatamente se arregalam e depois mudam para Tobias, que
balança a cabeça lentamente.

— O que você fez? — Ele olha entre eles e lê suas


expressões. — Tobias.

— Anistia, para todos nós, para você e para seu filho, —


Tyler anuncia com orgulho. — Se Dom decidir alguma coisa.
— Os olhos de Sean caem, e eu sei que ele está tentando
controlar suas emoções, mas elas levam o melhor dele quando
ele levanta os olhos para Tobias, e eles compartilham um olhar
persistente.

— Viu, vale a pena esperar, — sussurra Tyler para Tobias


com a elevação sutil de seus lábios, — só para ver a expressão
em seu rosto.

— Foda-se, — Sean exala asperamente, passando a


palma da mão pelo queixo. Fisicamente, posso ver a tensão o
deixando. Obviamente, é algo que o atormenta há anos como
um homem de família, algo para o qual ele se preparou caso
isso acontecesse, e agora algo com que nunca mais terá que se
preocupar. Seus olhos castanhos voltam para Tobias, e Tyler
fala. — Falaremos sobre os detalhes mais tarde.

Sean acena com a cabeça, seus olhos nunca deixando


Tobias enquanto ele balança a cabeça várias vezes.

— E agora? — Pergunto, voltando-me para Tobias.

Tobias encolhe os ombros, levemente erguido em seus


lábios.

— Não me pergunte. Não estou no comando.

Tyler sorri.

— Como é?

Tobias sorri de volta.


— Totalmente aterrorizante, — ele me puxa com mais
força para ele e entrelaça nossos dedos, — mas vou… ajustar.

Sean olha para mim, seus olhos castanhos brilhando de


orgulho.

— Você foi bem, filhote.

Quase estremeço com o deslize de seu apelido para mim


e olho para Tobias, que aperta meus dedos com força entre os
seus. Durante tudo isso, Sean e eu mantivemos um contato
próximo porque era necessário, mas durante esse tempo,
conseguimos estabelecer um tipo diferente de relacionamento,
uma amizade próxima daquela que tínhamos anos atrás. A
facilidade com que aconteceu surpreendeu a nós dois. Foi
assim que surgiu a amizade que me deixou desconfortável. Não
por causa de qualquer sentimento persistente que eu tenha
por Sean, mas por causa de como isso pode afetar Tobias.
Tobias permanece mudo, sua expressão imperceptível quando
olho para Sean.

— Não poderia ter feito isso sem você.

— Sim, bem, não foi fácil, — ele sorri e acena com a


cabeça em direção a Tobias. — Tive que mantê-lo distraído de
coração para coração algumas vezes por semana. Ele é um
chorão, a propósito, você pode querer ver sobre isso.

Tobias faz uma careta, um rosnado baixo soando de sua


garganta enquanto todos nós compartilhamos uma risada.
Coloco a palma em seu peito.
— Vou ver o que posso fazer.

Sean olha para Tobias e posso sentir a mudança no ar


entre eles, como se estivessem realmente se vendo pela
primeira vez em anos. Os olhos de Sean passam por nós dois
juntos e ele balança a cabeça, seus olhos castanhos brilhando
com aceitação.

— Mas parece que as coisas estão bem agora.

Sem esperar por uma resposta, ele muda sua atenção


para Tyler.

— É bom ver você, cara, — ele o puxa para um meio


abraço. Eles batem palmas nas costas um do outro e se
afastam.

— Precisamos nos atualizar, — Tyler concorda, e Sean


concorda.

— Não há tempo como o presente. Eu poderia usar a


merda de uma cerveja.

Limpo minha garganta quando todos começam a falar ao


mesmo tempo, ignorando completamente o fato de que há um
gangster francês na minha sala de estar.

— Gente, — digo enquanto eles tagarelam. — Gente, —


repito, colocando-me entre os três antes de acenar em direção
à porta.

Nós três saímos enquanto Sean se aproxima de Antoine,


olhando para ele pela ponta do nariz.
— O que vem a seguir é, — ele dá a Antoine um sorriso
maníaco. — Levo o lixo para fora.

Tyler se move para ficar na frente da janela e, com um


movimento de seu pulso, os lasers desaparecem do rosto e do
peito de Antoine.

Sean se curva e fica quase nariz com nariz com Antoine,


evidente violência em sua postura.

— Espero que você tenha comido bem esta noite, filho da


puta, porque essa foi sua última ceia.

Antoine se vira de Sean e se dirige a Tobias.

— Tenho vários associados que não ficarão nada


satisfeitos com você se eu desaparecer.

— Eu não estaria tão confiante, — diz Sean, chamando


sua atenção de volta, — eles venderam você e você veio barato
pra caralho.

Antoine empalidece visivelmente quando Sean revela o ás


na manga.

— O dinheiro fala, idiota, e usamos o seu para pagá-los.


Lute com essa merda um minuto e estaremos de volta com
você. — Sean bate na têmpora de Antoine com sua Glock para
dar ênfase.

Antoine muda os olhos negros para Tobias, que o encara


de volta, o fogo do inferno transbordando de seus olhos, mas
ele permanece mudo. Sean acena com a cabeça para a cozinha
enquanto Tyler é informado por um dos homens no comando,
e Sean se dirige a nós dois.

— Já eliminamos o plano B dele e, se houver um C, vamos


descobrir e cuidar disso, mas Palo não sai de seu lado há
semanas e duvido que haja um. — Sean olha para Tobias. —
Estamos dando a Palo um molho de chaves, mas ele concordou
em conseguir asas e pilotar seus homens, então é nosso para
compartilharmos.

Tobias apenas balança a cabeça, parecendo introspectivo


enquanto Sean fala novamente.

— Teremos muito que resolver no futuro e iremos, mas


já que agora estamos cobertos pelo governo, por que vocês dois
não fazem uma pequena viagem enquanto limpo essa
bagunça?

Tobias se vira para mim com nenhuma objeção, e ainda


posso ver que ele está tentando resolver tudo.

— Alguma ideia? — Ele estreita os olhos quando levanto


meus lábios.

— Tenho exatamente o lugar em mente.


Jogando a última de nossas malas no Audi parado, olho
para Cecelia, que está falando com Ryan em um telefone
portátil enquanto leva Beau para um passeio antes de
seguirmos para a estrada.

Porra do Ryan. Sua fonte sobre todas as coisas Greg. Ela


o pegou antes mesmo de eu pousar na Virgínia.

Ainda estou tão impressionado com o que acabou de


acontecer – chocado principalmente com milhares de outras
emoções que estou tendo que lutar constantemente para
manter minha merda sob controle. O que ela fez, o que ela
conseguiu fazer sob minha cuidadosa vigilância é
incompreensível para mim. E mesmo que eu esteja cheio de
orgulho, ainda estou lutando contra o desejo de espancá-la ou
fodê-la, ou ambos. Definitivamente ao mesmo tempo. O
problema é que ela gosta muito da punição.

Mas, principalmente, estou pasmo por ela, por sua força,


sua habilidade e pela mulher que ela se tornou – feroz,
corajosa, brilhante, poderosa e destemida.
Não posso evitar o sorriso estúpido no meu rosto
enquanto a vejo repreender seu cachorro brevemente como se
fosse uma caminhada diária enquanto ela conversa ao telefone
como se ela não apenas salvasse nossas porras de vidas,
garantisse nosso futuro enquanto levantava mil... Libere o
fardo de meus ombros e evite uma guerra.

Acabei de ser educado pela minha rainha.

Inacreditável, porra.

E ela me jogou no nível de especialista.

Sean se junta a mim onde estou no baú, meus olhos fixos


na mulher que recuperou meu coração, curou minha alma e
salvou minha vida mil vezes.

Posso sentir o olhar vigilante de Sean em mim antes que


ele fale.

— Tudo pronto.

Concordo.

— Deixe-me colocá-la no carro.

Um silêncio desconfortável passa entre nós enquanto


tento trabalhar meu cérebro em torno do fato de que Sean está
aqui e o porquê disso. Que ele mesmo fez um grande esforço
para provar um ponto semelhante para mim.

— Vai levar semanas para juntar as peças, — diz ele,


lendo meus pensamentos.
Cruzo meus braços.

— Acho que ela vai se gabar demais para me dar a chance


de resolver tudo por mim mesmo.

— Digo que ela mereceu o direito. — Ele se vira na direção


dela, e ela olha para nós dois, seus olhos correndo
nervosamente entre nós enquanto Sean fala novamente.

— Acha que algum dia chegará o momento em que as


coisas não serão tão estranhas entre nós três?

— Não sei, — digo honestamente.

— Ou que você não se sinta mal quando olho para ela?

Fico olhando para seu perfil enquanto ele cruza os braços


e se inclina contra o tronco, seu olhar ainda em Cecelia.

— Estou apaixonado por minha esposa, Tobias. — Ele se


vira para mim, sua expressão é genuína. — Estou convencido
por experiência própria que é possível amar mais de uma vez
na vida. E, honestamente, nunca pensei que a veria novamente
depois que ela deixou a Triple.

— Nem eu.

— O que fez você ir atrás dela, finalmente?

— Porque talvez você seja capaz, mas eu não sou. Não há


mais ninguém para mim além dela. Nunca antes, nunca
depois.
— Entendi. — Outra crise de silêncio. — Ela está mais do
que pronta.

— Ela está, mas estou deixando o quando para ela. Não


sei quanto tempo vai demorar até então, e realmente não dou
a mínima. É a decisão dela, indefinidamente.

Ele acena com a cabeça, e olho para ela, ainda no limite


de quão perto as coisas ficaram poucos minutos atrás. Não
importa o quão bem tenha funcionado, nunca estarei
verdadeiramente confortável com ela em perigo.

— Dom lhe contou sobre Antoine, — digo, virando-me


para encará-lo.

— Há muito, muito tempo atrás. Ainda cuidando de você,


mesmo desde o túmulo. — Ele balança a cabeça. — Apenas
Dom.

A verdade disso se estabelece.

— É a única coisa boa que veio da nossa época na França.

Não me preocupo em esconder minha surpresa.

— Sim, cara, é claro que investigamos ele enquanto


estávamos lá. Nós protegemos você o tempo todo. Sempre. E
teria tido bem antes disso, se você não tivesse sido tão calado
sobre ele. Quando você nos mandou embora, nós o rastreamos
pelas informações que Dom reuniu ao longo dos anos. Juntos,
aprendemos toda a operação dele, entrando e saindo, e não foi
difícil descobrir que você ensinou a eles tudo o que sabia.
— Quase tudo.

Ele concorda.

— Mantê-los confusos, certo? Nós trabalhamos logo no


início através de uma trilha de texto tênue que você já tinha
Palo em seu bolso, mas queríamos reforços, então enviamos
alguns de nossos caras não marcados para suas fileiras ao
longo do tempo. Temos muito mais pássaros em seu exército
do que você pode imaginar. A questão é: por que você não fez
isso?

— Não queria homens capazes de fazer o trabalho sujo de


Antoine, trabalhando para mim. Eles são uma raça diferente.
Mas agora vejo que foi um erro e um mal necessário. E cometi
erros, Sean. Muitos deles.

— Gostaria que você tivesse pedido ajuda.

— Não queria que você soubesse. Ele é...

— Ele só era um adversário digno porque você o tornou


um.

— Lamento todos os dias.

— Você não precisa mais. Ele é nosso, — diz ele, tirando


um cigarro da calça jeans antes de bater no Zippo. Ele fecha
com um movimento de seu pulso antes de exalar um fluxo
constante de fumaça. Outro longo silêncio se segue, e viro em
sua direção para vê-lo me olhando fixamente. — O pior dia de
nossas vidas foi aquele em que partimos seu coração.
As palavras atingem profundamente e tiram minha
habilidade de falar enquanto nos enfrentamos, cara a cara,
pela primeira vez desde a noite que nos separou.

— Se você pensou que nós partimos voluntariamente, que


nós a deixaríamos voluntariamente pela causa, você estava
muito errado. Claro, nós nos importamos e não queríamos
perdê-lo, mas nós saímos, — ele exala outra tragada enquanto
meu peito se aperta insuportavelmente, — saímos de boa
vontade e desistimos dela temporariamente por causa dos
sacrifícios que você fez por nós, Tobias. Pelos anos que você
passou fazendo tudo por nós, arriscando sua vida, por nós,
porque esse é o tipo de homem que você nos ensinou a ser. —
Sua voz treme enquanto ele fala, seus olhos disparando para o
cascalho entre nós. — E começamos a sentir falta do seu amor
e lealdade no minuto em que o perdemos. — Ele exala uma
nuvem de fumaça e levanta os olhos lacrimejantes de volta aos
meus. — O segundo pior dia de nossas vidas foi o dia em que
você partiu nossos corações, — ele limpa a garganta e segura
a nuca enquanto a queimação em minha própria garganta se
intensifica.

— Filho da puta, — ele balança a cabeça enquanto meu


coração bate no centro, e sinto os anos de separação entre nós,
o desejo que senti de nos levar de volta sem ideia de como.

— Mas naquele mesmo dia você partiu nossos corações,


você nos mostrou como é o amor verdadeiro, e você o ganhou
sacrificando tudo, incluindo nós, e nossa causa, por ela. — Ele
olha para Cecelia e depois de volta para mim. — Algo que nós
dois falhamos em fazer. E, por sua vez, você a conquistou e a
merece por isso. — Ele engole audivelmente. — Quando você
tentou se defender, nós sabíamos que você estava certo, mas
fomos tão profundamente feridos que não queríamos ouvir
porra nenhuma. Porque perdê-la completamente era um
motivo bom o suficiente para ficar ressentido com você, e
nossas mãos não estavam tão sujas se você fosse igualmente
culpado.

Ele solta uma respiração áspera.

— Mas nós sabíamos que você estava certo, e acho que,


no fundo, nós dois sabíamos que tínhamos um tempo
emprestado com ela. E porra, como eu odiava você por isso. —
Ele exala novamente, seus ombros rolando para frente. — Dom
percebeu naquela noite porque ele pegou muito mais rápido
como sempre fazia. Ele entendeu. Eu não queria, porra. Mas
ele sempre via as coisas com clareza como eram, mesmo que
doesse. Levei muito mais tempo para resolver isso. E Tessa,
aquela mulher, ela passou pelo inferno me mostrando onde
errei, mas você merece saber que teve meu perdão por muito
mais tempo do que você pensa.

Estou à beira da erupção, a queimação na minha


garganta é muito forte quando meus olhos começam a arder.

— Mas a verdade é agora... — Sean admite com voz rouca,


seus olhos marejados levantando-se para os meus, — Só quero
meu irmão de volta.
Em um flash, seguro sua nuca e pressiono nossas testas
juntas.

Um suspiro de dor nos deixa quando ele agarra meus


ombros, a pressão insuportável até que eu o liberto, minhas
emoções assumindo enquanto engulo continuamente e tento
falar. Sean agarra meus ombros enquanto ficamos ali por
intermináveis segundos.

— Sempre irmãos, — sussurro através de uma respiração


instável enquanto nos abraçamos com força, consertando a
ponte que nos separou por anos. Vários segundos se passam
enquanto nós coletivamente engasgamos com nossas emoções.

— Todos nós ficamos muito bons em guardar segredos,


até mesmo uns dos outros, — admito firmemente. — Sinto
muito, irmão.

Ele balança a cabeça e nos separamos, enxugando anos


de dor.

— Todos nós cometemos erros horríveis, Tobias, mas olhe


onde estamos agora, e isso é em grande parte por sua causa.
Aceite a porra do crédito e deixe esses erros caírem no
esquecimento. É hora de se perdoar. — Ele suspira, passando
a mão pelo rosto, seus olhos brilhando de novo, sua voz um
apelo: — Mas você tem que deixá-lo ir. Ele não gostaria que
você se condenasse assim. Todos nós merecemos ver como o
resto disso vai se desenrolar, especialmente você. Você tem que
deixá-lo ir, cara.
Mal consigo controlar minha resposta.

— Estou tentando.

— Tente mais. — Ele agarra meu ombro e aperta


enquanto aceno várias vezes. — Nós precisamos de você.

Quando ele me solta, olho para ver Cecelia congelada no


meio do quintal, olhando para nós dois. Levanto meu queixo
para que ela saiba que estamos bem, e ela começa a se mover
em nossa direção.

Um minuto se passa, talvez mais, e Sean acende outro


cigarro e passa para mim. Respiro fundo, me sentindo mais
leve do que em quase uma década.

— Ele nunca me deu motivos para suspeitar dele, mas


agora tudo faz sentido. Era tão óbvio, Sean. Óbvio pra caralho.
Recebi uma confissão de Jerry de que ele mandou Miami antes
que eu colocasse uma bala nele, mas nunca perguntei sua
fonte. Estava tão ansioso para voltar para Cecelia que não
pressionei mais. Nunca pensei que Antoine estivesse equipado
o suficiente. Ele me jogou bem, distraindo-me com seu próprio
drama, mas a verdade é, quem mais poderia saber sobre uma
disputa de lealdade em nosso clube? Quem iria cavar tão longe
para descobrir? — Fúria brota em minhas veias com a ideia de
que o homem que lançou a granada – que colocou em
movimento os eventos de anos de inferno que passei – quase
escapou impune.
— Não há coincidências, não neste jogo, todos nós
sabemos disso, mas é por isso que você nos tem.

— Obrigado porra por isso.

— E o que você fez por mim, pela minha família...

— Não, Sean, é o mínimo que eu poderia fazer. Você se


juntou a uma cruzada para ajudar a vingar minha família sem
nada...

— Ganhei tudo, irmão, tudo. E faria tudo de novo em um


piscar de olhos. A estrada infernal menos percorrida tem valido
a pena, cara. Só queria que ele ainda estivesse conosco.

Concordo com um aceno lento enquanto Cecelia vem


vagarosamente em nossa direção com Beau a reboque, a
expressão serena em seu rosto iluminado pelo único poste de
luz no final de sua longa estrada.

— Ela realmente melhorou seu jogo, — diz Sean em


observação contemplativa. — Fiquei pasmo quando ela juntou
tudo isso.

— Confio nela com tudo, Sean. Tudo. Espero que você


esteja bem com ela tomando decisões para o clube no futuro.

— Sou ouro com isso. Acho que todos vimos isso nela. —
Ele se vira para mim. — E quando vocês dois estiverem
prontos, é hora de voltar ao trabalho. — Ele larga o cigarro e o
esmaga com a bota antes de acenar com a cabeça em direção
à casa. — Vejo você lá dentro.
Sean se afasta interceptando Cecelia a poucos metros de
onde estou. Forço-me a assistir a interação deles enquanto eles
trocam sussurros. Ela envolve os braços em volta dele
brevemente, e ele retribui o abraço antes de soltá-la. A
intimidade compartilhada não me atormenta do jeito que
pensei que faria, nem o sorriso dela ou o olhar deles quando
eles se separam. É quando seus olhos se voltam para os meus,
e ela me lança um olhar pensativo antes de colocar Beau no
banco de trás que a tensão de nossa própria troca se instala.

Agarro seus quadris e a giro assim que ela fecha a porta.

— Não se sinta culpado.

— Não posso evitar.

— Entreter o Sr. Bonito? Você gosta de me deixar com


ciúmes.

Ela sorri porque sabe que ainda estou juntando as peças.

— Você deixou que a lista do que fazer em um lugar


bastante conveniente, Trésor. Mas era o último da lista.

Ela torce os lábios.

— Era para tirar você do cheiro dele. Ele era meu para
derrubar. Só não sabia que ele ia te atrair esta noite. Antoine
permitiu no último minuto, mas sabia que você poderia pegá-
lo.

— Jesus, eu criei um monstro.


— Sim, você criou, meu rei.

Balanço minha cabeça.

— Ainda não sou um rei.

— Concordo em discordar.

— Estou bem com você..., — olho na direção de Sean, —


tendo qualquer amizade que você acabar tendo com ele.

— Considerando que tenho falado com ele diariamente


nas suas costas, isso significa muito, mas estou mais
preocupada com o seu relacionamento com ele. Por um
segundo, pensei que você estava lutando até que descobri que
aquele abraço era uma maneira de evitar que seus peitos
masculinos se esfregassem.

Reviro meus olhos enquanto seus lábios aparecem antes


que a preocupação tome conta.

— Vocês dois... estão... bem?

— Sim, — aceno, — nós estamos.

— Isso é verdade?

— Eu mentiria para você?

Ela estreita os olhos, e não posso evitar minha risada


quando agarro seu rosto antes de separar seus lábios franzidos
com a minha língua. Meu pau se agita, e quebro o beijo em
uma tentativa de manter o foco na minha tarefa.
— Não vamos chegar muito longe na estrada esta noite,
— digo rispidamente. — Vou ter que te foder, e logo.

— Você não ouvirá nenhuma reclamação minha.

— Dividendos?

— Estou ganhando dinheiro, King, — ela garante, —


prepare-se para esvaziar seus bolsos.

— Tudo o que tenho é seu, — asseguro-lhe. — Tem


certeza de que é aqui que você quer ir?

— Positivo.

Procuro sombras em seu rosto, à luz do que acabou de


acontecer, e não encontro nenhuma.

— Estou bem, — ela me assegura, lendo meus


pensamentos. Ela acabou de matar dois homens. Um para
manter a arma, o outro para tirar a única ameaça real na sala,
mas não vejo nenhum traço de arrependimento, nenhum
remorso. Mas conheço o coração dela, e o ato que ela cometeu
é algo que pode muito bem começar a corroê-la. Mas agora,
tudo que vejo é uma mulher que fez o que tinha que fazer para
me proteger.

— Esqueci algo lá dentro. — Aceno em direção à casa.

— Não, você não fez, — diz ela uniformemente.


Procurando qualquer sinal de condenação em seu rosto, não
encontro nenhum. — Termine isso, — ela sussurra
suavemente antes de pressionar um beijo em meus lábios.
— Volto já.

Ela acena com a cabeça e afivela-se no banco do


passageiro enquanto fecho a porta no batente, e Beau late para
mim do banco de trás.

O pensamento me ocorre então que toda a minha vida


existe dentro de seu Audi, uma família pequena, mas em
crescimento. E se isso é tudo que sempre terei, é mais do que
suficiente.

Reprimindo minhas emoções, endireito minha coluna


para a tarefa em mãos e aceno com a cabeça em direção aos
homens de guarda a poucos metros de distância antes de fazer
meu caminho de volta para dentro.
A mudança é instantânea quando Sean me encontra na
porta da frente, uma oferta carregada em sua mão. Pego o que
preciso da sala antes de entrar na cozinha e ir para o plástico.

— Tobias

— É patético, de verdade, Antoine, — interrompi, — ver


você assim depois de tudo que lhe ensinei ao longo dos anos.
Claramente, você não estava prestando atenção.

— Você se esquece tão facilmente que fui eu quem você


procurou por ajuda.

— Nunca precisei de ajuda. Te falei isso. Precisava de


recursos, força de trabalho, dinheiro, coisas que não fui capaz
de adquirir em um tempo que me convinha. Minha impaciência
sempre foi uma falha. E te procurar foi meu maior erro de
merda. Eu disse que era um ladrão. E você era muito ignorante
nisso, muito ansioso para bancar a porra de um mentor para
mim. Havia uma maneira melhor do que através de você, mas
valeu a pena porque comecei a roubar de você na primeira
semana. Obrigado pelo dinheiro da mensalidade.
Os olhos de Antoine brilham.

— Primeiro, quero que você admita sua melhor jogada


contra mim.

Ele não hesita, muito ansioso para se gabar.

— Eu poderia ter ligado para Jerry e avisado sobre Miami


para cuidar de seu problema. Estava te fazendo um favor,
Ezequiel. Você estava demorando muito para se mudar para
Roman.

Ele nunca soube que me apaixonei pela filha de Roman e


descobri a verdade sobre a natureza da morte de meu pai, o
que acabou com minha vingança contra ele. Ele presumiu que
minha fixação por Roman era a única coisa que me impedia de
estar ao seu lado na França.

— Então, se você tirou Roman de cena, você pensou que


eu voltaria correndo para a França e continuaria sendo seu
mensageiro?

Ele encolhe os ombros.

— Não puxei o gatilho para o seu irmão.

Sean se lança sobre ele, e me viro e o seguro enquanto ele


luta para chegar até ele, quase me jogando para trás, e agarro
seus braços.

— Olhe para mim, irmão, — insisto enquanto ele agarra


meus pulsos para lutar contra o meu aperto. — Sean, olhe para
mim.
O olhar nuclear de Sean voa para o meu.

— Vamos terminar isso, por nós, por Dom.

Sean me dá um aceno solene, sua confiança, e dá um


passo para trás, seu olhar letal voltando para Antoine.

A fúria rola através de mim enquanto o suor se acumula


em minha têmpora com minha contenção. É necessária toda a
minha força para colocar minha máscara de volta no lugar e
manter minha voz, mesmo enquanto olho para o homem
responsável pelos piores anos da minha vida.

Em vez de levar Roman para me levar de volta para a


França, ele manipulou a porra do meu próprio clube para
tentar me ensinar uma lição, o tempo todo mantendo as mãos
limpas para que ele pudesse continuar a me usar. Ciente de
que essa é a totalidade da verdade, faço as pazes com isso.
Termina aqui. Esta noite.

— Você está familiarizado com o jogo de xadrez?

— Salve-me o teatro, Tobias. Estou aberto para


negociações.

— Vou manter isso em mente, mas acho que você achará


isso interessante.

Sean sorri quando Antoine olha entre nós dois.

Tiro a primeira peça de xadrez do bolso e passo ao longo


de sua linha de visão.
— A primeira lição do meu avô para mim foi sobre o peão.
— Quando ele baixa os olhos para segui-lo, o revelo. Cabeça
sacudindo para trás, ele fica boquiaberto enquanto o sangue
começa a escorrer de seus lábios. A satisfação zumbe em
minhas veias enquanto aceno novamente o peão em seu rosto
e deixo o monstro sair para brincar.

— Você vê o peão... — No segundo que seus olhos focam,


bato meu punho em seu nariz novamente e sou recompensado
com o rompimento da cartilagem enquanto seus olhos
lacrimejam e uma maldição o deixa antes que ele cuspa um
bocado de sangue no plástico.

— Você está prestando atenção, Antoine? Não quero que


você perca isso. — No segundo que ele está focado, bato meu
punho em seu rosto novamente, e ele solta um grito de dor
quando o sangue jorra em uma queda livre e ele murmura algo
ininteligível sob sua respiração.

— O que é isso? — Provoco.

— Estou ouvindo, — ele resmunga.

Olho para Sean.

— Onde eu estava?

— O peão.

— Está certo. Como disse, o peão pode ser um dos


jogadores mais poderosos quando em movimento. Se for jogado
corretamente, ele ainda tem a capacidade de dar xeque no rei.
— Aperto o pedaço entre meus dedos. — O peão é tudo o que
se apresenta como sendo. Revelei minha própria fraqueza logo
dizendo a você exatamente quem eu era em nosso primeiro
encontro. Foi um erro de novato da minha parte, não deve ser
confundido com o novato. — Enterro meu punho em seu rosto
e desta vez ele grita, antes de engasgar com o sangue
obstruindo sua garganta.

Dando a ele alguns segundos para se recompor, agarro


seu cabelo e o puxo para me encarar.

— Ainda está ouvindo?

— Sim, — ele sibila, seus olhos se enchendo de um medo


raro.

— Mas você fez a mesma coisa na noite em que nos


conhecemos. Você me mostrou sua fraqueza porque não me
via como uma ameaça, naquela época ou no futuro, e me deu
tudo de que eu precisava em poucas palavras. E estava claro
para mim então – não estávamos jogando o mesmo jogo.

Ele franze as sobrancelhas.

— A ilusão é uma coisa poderosa, Antoine. Pode esconder


muito. Mas você nunca verificou realmente o que estava em
minha mão, nem uma vez, porque se tivesse, teria se poupado
dessa humilhação.

Balanço minha cabeça e suspiro.


— Acho que deveria dar a você algum crédito por me
lembrar de quem sou, do meu propósito, mas minha fraqueza
não é algo que você nunca deveria ter tentado foder. Você
sempre foi uma reflexão tardia para mim e nunca fez parte do
quadro. Se qualquer coisa, você foi minha primeira marca, não
um mentor digno de merda. Você nunca teve meu respeito,
meu ouvido ou toda minha atenção. Você quer ser eu, porra,
mas aprendi que os verdadeiros líderes precisam se humilhar
para evoluir. Eles têm que reconhecer suas fraquezas e usá-
las para se fortalecer. — Desvio meus olhos para Sean
enquanto o gosto residual do meu remédio cobre minha língua.
— E eles precisam saber quando pedir ajuda.

Com o olhar demorado em Sean, concordo com essa


verdade. Talvez já tenhamos sido todos fênix, batizados por
nossos fogos individuais antes de ressurgir das cinzas de
nossos erros. Mas, após a transformação, nos declaramos um
tipo diferente de pássaro e conseguimos encontrar o caminho
de volta um para o outro. A verdade disso é mais reconfortante
do que qualquer coisa que já senti. Nunca estive sozinho, nem
uma vez, e isso é tão evidente agora. Quando um de nós vacila,
quando nossas asas falham e perdemos a direção, sempre há
outro para nos acertar.

Embora eu tenha passado anos à deriva, tentando


navegar sozinho para salvar aqueles ao meu redor da
destruição de meu caminho oculto, eles se recusaram a me
deixar voar sozinho.
A sinergia está de volta e é poderosa. Posso sentir isso
entre nós agora, enquanto atingimos o topo na mesma brisa,
asas bem abertas, cicatrizes de nossa separação da mesma
profundidade, forma e cor. Sean abaixa o queixo, confirmando
minha linha de pensamento, pois sentimos a ausência de um,
para nunca ser esquecido. E é então que deixo a raiva me
consumir totalmente.

— Esta é a ilusão, Antoine. Pronto? Observe de perto. —


Seguro o rei na palma da minha mão, certificando-me que ele
o vê antes de deslocar as peças sem esforço com um truque de
prestidigitação. — Mas isso é quem eu sou. — Aperto o peão
entre meus dedos e o levanto alguns centímetros de seu nariz
aberto. — É quem eu sempre fui, e aceitei isso desde o início.

Segurando sua nuca, pressiono a peça de xadrez contra


seu nariz escancarado enquanto ele grita de dor, seu corpo
tremendo violentamente em sua cadeira enquanto me inclino
e sussurro cada palavra.

— Mas como disse no começo, eu nunca cometo o mesmo


erro, duas vezes. E por causa disso, você morrerá um covarde
porque me mostrou sua fraqueza em nosso primeiro encontro
– ego.

Olho para Sean, entregando-lhe o rei.

— Devemos alimentar sua ganância?

Sean acena com a cabeça, tirando o rei da minha mão


enquanto Antoine se sacode violentamente em seu aperto
enquanto empurra a peça de xadrez, quebrando alguns de
seus dentes enquanto a força para o fundo de sua garganta.
Antoine começa a sufocar, seu rosto vermelho como uma
beterraba enquanto ele engasga.

Sean permite a ele um pouco de ar enquanto ele tenta o


seu melhor para cuspir o pedaço, sangue escorrendo de sua
boca entre suspiros.

— Então, vamos descer a lista de verificação, certo, Sean?

— Vamos, — diz ele, enquanto segura um Antoine


lutando em seu punho de ferro.

— Nós roubamos o dinheiro dele?

— Sim.

— Palo levou sua esposa?

Um aceno de cabeça.

— Nós destruímos sua reputação?

— Ele é motivo de piada, mas na verdade, ele mesmo fez


isso.

— Nós roubamos seu reino e demos um molho de chaves


para o tenente fodendo sua esposa, e o posicionamos a nosso
favor?

O sorriso ameaçador de Sean aparece e ele assente.

— Palo vai ter um ano muito bom.


— Deixei alguma coisa de fora?

— Sua amante acabou de fugir da França. — Ele encolhe


os ombros. — Algo deve tê-la assustado.

Antoine lança seu olhar entre nós dois, suas feições


torcidas em total derrota enquanto dou um passo em direção
a ele e pressiono o cano da minha Glock no centro de sua testa.

— E não tive que levantar um dedo porque sou apenas


um peão, que conseguiu encontrar uma rainha e fazê-la se
apaixonar por mim. Mas de que serve um peão, quem pode
verificar, sem um companheiro?

Pressiono a arma em seu crânio, inclinando sua cabeça


para cima, forçando seus olhos nos meus e puxo a porra do
gatilho.
— Não, não, não. Vamos, cara, não! — Eddie quase grita
quando entramos em seu bar. Não posso evitar a risada que
explode de mim enquanto Tobias faz uma carranca para ele. A
última vez que estivemos aqui, Tobias quase destruiu este
lugar devido ao nosso impasse. Ao que parece, Eddie colocou
o dinheiro da consolação que deixei para usar. Olhando ao
redor, dou um assobio baixo.

— Parece ótimo aqui. Nova iluminação.

Eddie tirou uma toalha de um copo.

— Gostaria de saber por quanto tempo vou mantê-lo.

Uma voz soa atrás de nós.

— Calma, Eddie, só podemos balançar nos lustres uma


vez esta noite. — Viro-me para ver Jeremy na porta, um sorriso
dividindo seu rosto enquanto avanço e ele me pega no meio do
voo.

— Droga, garota, você só fica mais bonita, — ele sussurra


enquanto me levanta em um abraço de urso antes de agarrar
meus braços. — Como você está?
Gesticulo por cima do ombro e levanto minhas
sobrancelhas.

— Sim, eu entendo. Ele é uma pequena pílula irregular,


não é?

— Cuidado, — Tobias se encaixa, e nós dois olhamos para


ele. Ele está completamente relaxado, um gin na mão, vestido
da cabeça aos pés com um Armani recém-cortado. Por um
segundo, me perco em minha atração, e Jeremy passa o braço
pelos meus ombros.

— Está pronta para um jogo de sinuca?

— Vou limpar o chão com a sua bunda, — prometo.

— Ou isso ou ela vai bater nas suas bolas com o taco. É


um truque sujo. — O som da voz de Russell me faz sair das
garras de Jeremy, um segundo antes de Russell me envolver
em um abraço.

— Seu idiota, só fiz isso uma vez.

— Duas vezes, minhas bolas estavam contando.

— Não que você precise delas. Você nunca vai se acalmar,


— digo enquanto ele olha para Tobias.

— Bem, se ele não está disposto a proteger você por mais


tempo...

— Termine essa frase, — Tobias diz uniformemente. —


Por favor, termine essa frase.
Russell revira os olhos.

— Não gostaria que você amarrotasse esse terno, Hugo.

Tobias coloca seu gim no bar e descarta sua jaqueta,


arregaçando as mangas, dando-me uma chance de
pornografia. Memórias vêm à superfície do meu tempo aqui,
dos dias passados quando a queimação começa na minha
garganta e Eddie traz uma jarra de cerveja enquanto Jeremy
joga as bolas de sinuca. Com o taco na mão, Tobias olha para
mim e levanta o queixo em questão enquanto eu aceno em
resposta enquanto minhas emoções ameaçam assumir o
controle assim que “Wish You Were Here” começa a tocar na
jukebox.

Não é perfeito e não é totalmente a reunião que eu


esperava. Alguns de nós não estão aqui. Mas não é então. É
nos olhos do meu amor que vejo a mesma ponta de tristeza, e
mantemos nosso olhar até que estejamos ambos fortes o
suficiente para quebrá-lo. Durante a próxima hora, observo os
três beberem e falarem besteiras, concordando aqui e ali. Na
maior parte, meu prazer vem de assistir a camaradagem de
quase uma vida inteira de nos conhecermos, crescendo juntos,
uma base construída há muito tempo antes de mim. E embora
algumas coisas mudem, o amor permanece o mesmo. Então
bebemos para isso. Celebramos agora, o novo normal mesmo
enquanto andamos na ponta dos pés em torno da ausência de
alguns Ravens insubstituíveis – aqueles que já passaram e
aqueles que se mudaram para um presente diferente, como
todos faremos quando chegar a nossa hora. E nossa hora está
chegando mais cedo ou mais tarde.

Mas temos esta noite e é o suficiente.

Tonta de algumas horas de cervejas com os meninos,


acendo meu diamante vermelho enquanto a banda marcha
tocando canções de Natal e pego Tobias examinando a
multidão pela enésima vez de onde estou na beira da rua.
Quando as faíscas acabam, vou até onde ele está sentado.

— Se isso te deixa nervoso, podemos ir.

— Estamos cobertos, — ele me garante, com a postura


rígida ao se recostar, enrolado em um cobertor de boneco de
neve em uma cadeira de jardim que pegamos no trajeto.

— É por isso que você parece constipado?

— Sim, — ele diz distraidamente, e começo a rir e me


junto a ele na cadeira, beijando-o na esperança de apagar a
confusão de sua expressão. Em vez disso, ele inclina a cabeça,
retribuindo meu beijo, então ele fica de olho na multidão.
Rindo em sua boca, ele se afasta e levanta os lábios
timidamente.
— Não podemos viver assim, Tobias.

— É só me dar um tempo para me ajustar, — garante.

— Quão mais?

— Por volta dos setenta anos, — ele diz com naturalidade,


e balanço minha cabeça e sorrio. Ele bate no braço de plástico
da cadeira e levanto seus dedos e os beijo em uma tentativa de
acalmar um pouco de sua ansiedade.

— Temos olhos em todos os lugares, então o que é que


está te incomodando tanto?

— Cecelia, eu quero me casar com você.

Viro-me em seu colo e o olho para ver que sua expressão


é grave.

— Pode me deixar confusa, francês, mas você não parece


muito animado com isso.

— Isso acaba agora. Não vou empurrar merdas


importantes para segundo plano mais, e guardei essa
confissão para mim mesmo por tempo suficiente. Esta é uma
conversa que precisamos ter.

— Tudo pode esperar, Tobias. Não estou... quero dizer...


colocando desta forma, meu relógio biológico está
completamente silencioso no momento.
— Eu meio que espero que você espere em um relógio
diferente. — Ele engole. — Antes de fazermos qualquer coisa
permanente.

Franzo a testa.

— O quê?

— Eu estou... — ele balança a cabeça, a emoção passando


por suas feições. — Eu me casaria com você agora, Cecelia.
Porra, agora, daria a você um anel, um casamento, grande ou
pequeno, prometo meu amor, mas não posso te dar essas
promessas porque posso não ser capaz de cumpri-las, cumprir
isso.

— Se estamos falando sobre fidelidade, posso


simplesmente atirar em você.

— Posso estar doente.

Meu corpo estremece quando volts de choque cortam


minhas veias. Mal consigo pronunciar as palavras.

— O que você quer dizer com doente?

— Você sabe. Você sempre soube.

Dois segundos é tudo o que leva para ele me transmitir a


verdade em seus olhos.

— Para tudo o que faço, há uma razão por trás disso.


Seu raciocínio para muitas de suas ações todos aqueles
meses atrás é a vergonha sombreando suas feições – sua
verdadeira fraqueza, o medo que mais o atormenta.

Meu amor.

Meu amor de merda.

Como fui cega. Como estava errada em presumir que


conhecia a totalidade de seus medos, especialmente naquele
dia em seu escritório quando ele me deixou sair de sua vida.
Sempre acreditei que era o perigo que o mantinha me
afastando, nada além do perigo que ele poderia representar
para mim. Ao longo dos anos, fui forçada a assumir muitos de
seus raciocínios por causa de sua evasão, e isso é culpa dele –
mas cansei de jogar o jogo da culpa de onde ambos erramos.

A partir deste momento, estou farta de suposições


porque, com este homem, nada nunca foi o que parece. E ao
fazer isso, posso ver as razões de algumas de suas ações
anteriores.

— Você tem medo da esquizofrenia? Você tem medo de


ficar doente como seu pai? — Meus olhos transbordam.

— A mulher com quem tenho falado, Sônia, — ele afirma


como se estivesse com medo das próprias palavras, — era
psicoterapeuta do meu pai no hospício. Enquanto ele estava
sendo tratado lá, ela começou a conversar comigo. Ela
percebeu que eu estava lutando contra o medo, com meus
próprios problemas. Ela tem me ajudado a encontrar meu foco
quando minha mente às vezes me trai. Não há teste genético
para isso... mas parte do meu comportamento é indicativo de
que há uma possibilidade de eu ficar doente.

— É ansiedade e TOC. Existe uma grande diferença. Ele


tinha vinte e oito anos quando foi diagnosticado, Tobias. Você
já viveu quase dez anos depois disso.

— Ainda pode acontecer. — Ele engole. — Eu tenho sete


anos até que o relógio 'e se' termine, e mesmo depois que
houver uma chance. Existe uma possibilidade real de que isso
possa acontecer, Cecelia. E às vezes me perco. Especialmente
na paranoia.

— É de se esperar com a linha de trabalho em que você


está.

— Isso é o que ela diz. — Seus olhos estão baixos, e isso


me arrasta – ele está profundamente envergonhado. — Mas ela
é mais realista do que você. Existe uma chance, Cecelia. Eu
preciso que você reconheça isso.

— Ok, — fecho meus olhos e odeio o fato de tê-lo chamado


de covarde alguns meses antes, porque a batalha que ele
enfrenta diariamente o torna mais heroico para mim do que
qualquer coisa poderia.

Ele me coloca em seu colo, os nós dos dedos correndo ao


longo do meu queixo.

— Você conhece meus... hábitos. Você me viu ficar


perdido na minha cabeça na Virgínia. Já estive em vários
estados questionáveis como esse... — Seus olhos brilham de
medo enquanto ele olha para mim, completamente perdido. —
Não tenho controle sobre se isso acontecer comigo. Não vou
colocá-la na posição em que minha mãe foi colocada, uma
criança pequena para criar enquanto o marido enlouqueceu.

— Este é o motivo pelo qual você me recusou quando


apareci?

— Um deles. Você é jovem, Cecelia. Já te roubei


cegamente. Quanto mais poderia aguentar? Eu não sou tão
ganancioso. — Com essa declaração, meu coração se quebra
em um milhão de pedaços.

— Você pega tudo, Tobias, porque não sou boa para


ninguém. Nunca serei. É só você. E eu sei o que você está
pensando, e você está certo, não vou. Nunca vou sair do seu
lado maldito. Nunca por esse motivo. Nunca. Portanto, não me
pergunte. — Ele permanece em silêncio, seus olhos caindo
enquanto o forço novamente a me encarar.

— Droga, francês, você não consegue mais se esconder de


mim. Você entende? Diga-me que você acredita em mim,
Tobias. Eu nunca vou deixar você propositalmente por isso. O
que machuca você, me machuca. O que te assusta, me
assusta, — murmuro para ele enquanto ele corre o nariz ao
longo do meu queixo. — Se falharmos, — asseguro-lhe, —
vamos falhar juntos. Você nunca estará sozinho novamente.
Nunca.

Olhos vermelhos se erguem para os meus.


— Se chegar um momento em que eu não possa...

— Pare. Não vamos fazer isso.

— É aqui que você me deixa ser realista.

Admito devido à determinação absoluta em seus olhos.

— Fazemos isso juntos, a menos que eu fique incapaz, o


que me leva ao próximo ponto. Você decide.

— Decidir o quê?

— Quando voltar, se formos.

— E o que você quer? E quanto ao meu rei?

Ele me aninha.

— Ainda em formação. Por enquanto, a rainha é quem


está no controle do tabuleiro.
Abrindo a porta do hotel, faço uma pausa quando ouço a
melodia familiar de “K” de Cigarettes After Sex. Minha mulher
está de mau humor. Sorrindo, fecho a porta e vou até a sala de
estar da suíte em busca dela. Uma bebida feita na hora espera
no carrinho do bar antigo, e a pego tomando um gole saudável.

— Tesouro?

Como esperado, não recebo resposta. Entrando no


quarto, vejo que também está vazio, além da sacola de roupas
na cama com um bilhete anexado.

Feito sob medida para um rei.

Feliz Natal.

Colocando minha bebida na cômoda, vou até ela e abro o


zíper, revelando um clássico Armani com uma gravata fina e
lenço de bolso branco recém-engomado.
— Tesouro, — suspiro, correndo meus dedos sobre o
material em apreciação, não posso evitar meu sorriso.

É perfeito pra caralho.

Esta mulher me conhece, minha história, meu começo e


meu meio, minhas falhas, a história de minhas cicatrizes –
meus pontos fortes e fracos. Ela vê claramente além da minha
armadura e é a única capaz de ir mais longe, penetrando em
carne e sangue para chegar ao coração batendo abaixo. Eu dei
esse poder a ela, para segurá-lo em sua mão e fazer o que ela
quiser com ele. E mesmo com isso – sabendo o que ela é capaz
de fazer comigo – ela continua a amar, aceitando totalmente o
fardo enquanto permanece leal e fiel.

A liberação que vem com sua aceitação é uma que eu,


sem saber, procurei e encontrei nela. Nesses segundos
preciosos, me deleito com a compreensão de que tenho alguém
com quem me compartilhar, um parceiro, um amante,
confidente e amigo. Seu amor é toda a validade de que vou
precisar.

Logo abaixo da gola há uma pequena caixa de couro. Pego


e abro para ver duas abotoaduras feitas sob medida,
meticulosamente moldadas em grandes detalhes. Um corvo,
asas totalmente estendidas. Qualquer dúvida que tivesse sobre
sua mensagem desaparece quando começo a tirar minhas
roupas.
A antecipação vibra através de mim enquanto corro meu
cartão-chave na tela e abro a porta. A melodia ainda toca como
quando o deixei horas antes. Eu abusei de meus poderes hoje
– como Tobias fez tantas vezes no passado – para executar
meus planos pessoais. Nas últimas horas, usei meus pássaros
para rastrear seus movimentos, sabendo quando ele chegaria.

Claro no meu passo, entro na sala para encontrá-la vazia,


mas é o cheiro persistente de especiarias que me faz mudar de
direção – os pelos dos meus braços ganham vida conforme o
calor se acumula em meu núcleo. Entrando no quarto,
encontro-o vazio, mas vejo a porta do pátio aberta. É quando
entro, o vejo do outro lado da varanda, e é o suficiente para me
fazer parar. A visão dele de costas, uma mão descansando na
varanda, a outra segurando sua bebida, rouba-me o fôlego –
deixando-me em um estado imediato de excitação. Seu cabelo
está penteado para trás apenas o suficiente, agora mais
comprido, com as pontas ligeiramente enroladas em volta das
orelhas. É quando ele se vira para me encarar totalmente que
sou totalmente recompensada.
Jesus Cristo.

Atemporal, intimidante, formidável e uma ameaça


brilhante. A imagem mais incrível de agitação. As chamas
valsando em seus olhos me atingem. Ele é o mais atraente dos
homens e o mais letal. O calor que irradia entre nós já é
demais. O fato de que ele é mais do que capaz de queimar
quando ele toca me faz gravitar em direção a ele, pronta demais
para me lançar em seu inferno. Passei um dia inteiro sendo
encerada, polida, tingida e cortada, especificamente para a
recompensa do olhar em seus olhos. Com uma sutil elevação
do queixo, ele me ordena que avance, e obedeço, dando passos
largos em sua direção e descartando minha jaqueta pelo
caminho sem interromper meu andar. Seus olhos vagam pelo
meu corpo parando nas botas de couro com pontas e
arrastando para cima o vestido que envolve cada curva minha.
Fervendo com as possibilidades, recebo a recompensa por
meus esforços quando ele enfia a mão pelo meu cabelo,
segurando-o apenas o suficiente para que eu sinta a picada.

Ele está de volta, meu rei quebrado. Embora com


cicatrizes para sempre, ele está inteiro de novo, e é
completamente meu.

— Isso é o que você quer?

— Sim. Está na hora.

— Você tem certeza?


Ele afrouxa o aperto no meu cabelo, seu hálito quente
atinge meus lábios enquanto ele se inclina. Olhos derretidos
penetram nos meus, o único sinal de emoção em sua expressão
estoica. Só esse homem poderia fazer a possibilidade de
morrermos juntos parecer romântica. Mas ele está procurando
agora qualquer vestígio de medo. Medo de que não existe mais
e não existirá enquanto estivermos juntos.

— Positivo.

Sua resposta é um aceno lento antes de seus olhos


mergulharem, e sua mão livre vagar para a fenda do meu
vestido, seu dedo deslizando pela minha coxa. Suas narinas
dilatam quando ele me encontra nua, reunindo evidências de
minha necessidade por ele nas pontas de seus dedos.

— Espero que você não esteja planejando deixar este


quarto esta noite, Tesor.

Ele me separa antes de pressionar seus dedos, seu aperto


em mim aumentando quando ele sente meu desejo. Minha
boca se abre quando ele se inclina e passa a língua ao longo
do meu lábio inferior. Com o corpo zumbindo, deslizo minha
mão pelo material sedoso de sua gravata e para baixo para
cobrir seu pau, que estremece em reação ao meu toque
carente. Com os dedos enredados no meu cabelo, ele inclina
minha cabeça aproveitando o acesso antes de pressionar seus
lábios carnudos na minha garganta. Meu gemido alimenta o
movimento de seu dedo, e em segundos estou gemendo seu
nome.
Tomando seu tempo, ele cobre completamente cada
centímetro de carne exposta na minha nuca antes de olhar
para mim com satisfação – um homem em chamas, tão
completo quanto um homem pode ser depois de tudo que ele
suportou, enquanto sussurro as palavras que ele está
esperando.

— Vamos voltar ao trabalho.


O tique-taque de um relógio de pêndulo e o olhar intenso
da mulher sentada à minha frente me deixam nervoso. Foi um
minuto sólido de silêncio desconfortável desde que nos
sentamos. Ela levanta sua xícara de chá, nunca tirando seu
olhar estreito de mim enquanto limpo minha garganta. Foi
uma curta viagem de Triple Falls de volta ao inferno, e isso é
parte da minha penitência e uma das poucas condições de
Cecelia para voltar a entrar. Disseram-me detalhadamente
como era “da minha conta” consertar os erros do meu passado
e explicar meu comportamento às pessoas que mais significam
para ela fora de nosso mundo exclusivo. Um deles agora está
olhando para mim como se tramasse minha morte lenta e
dolorosa.

Cecelia se ergue ao meu lado antes de cair na gargalhada.

— Christy, acalme-se com ele. Acho que nunca vi o


homem suar tanto.

Eu mantenho meu olhar em Christy, outro descuido e a


“melhor amiga” do meu futuro. Uma amiga que teve que se
recompor ao longo dos anos devido à natureza de nosso
relacionamento. Está claro agora, mesmo com o amplo aviso
de Cecelia, eu não estava preparado o suficiente quando ela
abriu a porta da frente de sua casa em estilo colonial no
subúrbio de Atlanta. Quando chegamos, Christy levou seu
marido para longe, junto com seus dois filhos, para Home
Depot – que era, estou supondo – a uma distância segura de
onde a inevitável nuvem em forma de cogumelo não podia ser
vista.

Para mim, isso é penitência e o preço de Cecelia – para


Christy, este é um dia de ajuste de contas.

Ela parece pronta para explodir agora, enquanto bebe de


sua xícara novamente e desvia os olhos de Cecelia para mim
em acusação.

— Estou ouvindo.

Cecelia olha para mim.

— O chão é seu.

Abro a boca para falar e fecho, sem saber por que


concordei em explicar meus motivos para a dona de casa do
inferno em Atlanta. Bem, quero, mas não estou feliz com isso.

— Estamos juntos agora, — corto a mão no ar, — fim.

— Tobias, — Cecelia sibila em um aviso claro.

Posso praticamente ver o vapor saindo dos ouvidos de


Christy e cedi e respirei paciente.
— Por que você não me pergunta o que você quer saber?

Ela entra com as armas em punho.

— Você parou de puni-la por dormir com seu irmão?

Cecelia respira fundo e olho em sua direção antes de me


virar para me dirigir a Christy.

— Nada a perdoar.

— Besteira, você a torturou por anos.

— Christy, há muita coisa que você não sabe, — Cecelia


interrompe. — Muito.

— Sim, como o quê? Esse idiota não disse que te amava


e depois te jogou de lado? Ele não arrancou seu coração pela
segunda vez há um ano e pisou nele para garantir? — Ela se
levanta abruptamente, descartando o chá e o pires na mesa,
antes de colocar as duas mãos nos quadris. — Entendo que
você estava sofrendo com seu irmão, e realmente sinto muito
por isso, mas isso não é desculpa para tratar uma mulher
como você a tratou. É imperdoável, e você está aqui agora, para
quê, minha bênção? Grande chance. Será um dia frio no
inferno. Ela o amou fielmente por anos, mas você? Alguma vez
você perguntou sobre a vida dela ou sobre as pessoas que
vivem nela? Você ao menos se preocupou em conhecer a mãe
dela? — A repreensão de Christy muda para Cecelia. — E você
o trouxe aqui pensando que ficaria bem com isso? Eu não
estou bem com isso!
Ela mentiu para ela, repetidamente, para me manter
seguro, prejudicando seus próprios relacionamentos com as
pessoas mais próximas a ela para minha proteção, enquanto
se alienava no processo. E por tudo isso, ela tem estado
sozinha – sozinha com seu conhecimento, sozinha com a
verdade e isolada por causa disso, seu padrão imitando o meu.

— Christy, — me dirijo a ela, e sua atenção lentamente


muda para mim. — Por favor, por ela, não por mim, por ela,
ouça o que tenho a dizer.

— Agora você tem algo a dizer?

— Muito. E você está certa, sou o cara mau e a tratei


horrivelmente. Eu não a mereço.

— Não me diga! E talvez eu não queira ouvir suas


desculpas. — Ela se levanta e começa a arrancar brinquedos
de seu tapete, e com o olhar mortal que ela me concede durante
sua limpeza hostil, tenho certeza de que é preciso muito
esforço para não os jogar em mim. Depois de alguns segundos
inquietos observando-a, me levanto e me junto a ela, pegando
um anel de dentição. Ela o arranca das minhas mãos, e posso
ver o medo em seus olhos enquanto tento nivelar com ela.

— Eu a amo.

— Você é terrível nisso.

— Eu farei melhor.
— Não é bom o suficiente. Você realmente pode culpá-la
por seguir em frente depois de você...

— Seu irmão não morreu em um acidente de carro, — diz


Cecelia suavemente, e Christy recua com a revelação, — ele
morreu de vários ferimentos a bala em um tiroteio na mansão
de meu pai, salvando nós dois. — Com a boca aberta, chaves
de plástico em sua mão, guio Christy de volta ao seu assento
com as pernas trêmulas.

Ela olha boquiaberta para Cecelia antes de olhar para


mim, e tento fazer uma piada para tirar um pouco da tensão.

— E sabemos quem atirou em JFK.


— Puta merda, — Christy profere pela enésima vez
enquanto Tobias persegue seu filho de dois anos em seu
parquinho enquanto Josh cuida da churrasqueira.

No meio de nossa confissão, ela trocou o chá por vinho.


Pouco depois de ela terminar a primeira garrafa, Josh voltou
para casa e decidiu fazer um churrasco no auge do inverno, o
que nos fez amontoar-nos em sua varanda de trás enquanto os
dois homens faziam malabarismos com a churrasqueira e um
de seus filhos.

— É uma loucura, eu sei. E realmente não acho que você


deveria contar a Josh. Pelo menos não tudo.

Ela olha para mim com o estresse de mil segredos


derramados gravados em seu rosto e praticamente grita.

— Como não posso!?

— Quer dizer, você pode, mas duvido que ele nos deixará
voltar para casa se você fizer isso. Eu não quero isso.

— Você não me colocaria em perigo, — ela diz com


segurança. — Nunca.
— Temos o Serviço Secreto nos protegendo agora, e você
está certa, eu não faria.

— Isso é absolutamente louco. Não sei se devo ficar


chateada, surpresa, ou animada ou – meu Deus, aquele
homem me quer querendo ter outro bebê.

Tobias fica com a criança nos braços enquanto ela aponta


para o slide.

— Não me interprete mal, eu amo Josh, — ela olha para


o marido, que está usando um avental – coma minha carne–
por cima do moletom, — mas a porta número dois com certeza
é atraente.

— A porta número dois é um burro ego maníaco


reformado e gigantesco, com quem terei que lutar todos os dias
pelo resto da minha vida.

— Sexy, — ela diz, olhando para Tobias e completamente


imperturbável por minhas palavras enquanto ela olha para
mim. — Sabe, mesmo se eu contasse a Josh, ele não
acreditaria.

— Você acredita nisso?

Um aceno enfático.

— Toda palavra. Havia muitas lacunas em suas outras


histórias e muitas inconsistências, agora tudo faz sentido. Eu
pensei que você estava enlouquecendo por um tempo, então
você pareceu se acertar com Collin, então achei que era apenas
um feitiço.

Não ouvi o nome de Collin desde que nos separamos,


aliviando um pouco da culpa associada a ele. Uma pontada
repentina de remorso me corrói agora com a simples menção
dele. Em meu estado de luto, e minha vontade de começar uma
nova vida, eu mudei de luto para outro, mas todo o peso do
meu caminho destrutivo mostra sua cara feia agora.

Christy lê minha expressão.

— Ele está bem, você sabe. Ele conheceu alguém.

— Como você sabe?

— Eu os vi juntos em um restaurante chique na cidade


em nosso último encontro à noite.

— Mesmo? Ele parecia feliz?

— Sim, ele parecia.

— Por que você não me mandou uma mensagem?

— Porque desde que você se mudou para lugar nenhum,


Virgínia, você também não tem mandado muitas mensagens
de texto.

— Entrei na minha cabeça de novo e estava cansada de


sobrecarregar você com isso.
— Não é disso que se trata, — ela retruca. — Não há
limites em ser um amigo, em estar lá para um amigo. Não há
limite.

— Sinto muito se a minha distância doeu em você.

— Bem, sim.

— Eu sinto muito. E não vai acontecer de novo. Juro para


você. Nunca vou mentir para você novamente. Não quero que
nos distanciemos.

— Também não, e sei porque você fez isso. Eu entendo


agora. E cuido de você. Mas meu Deus, Cecelia... Ainda estou
louca e entorpecida. Tipo, essa merda é real?

— Cem por cento, e principalmente por causa dele. —


Tobias olha para nós duas depois de abrir uma cerveja fresca
que Josh oferece a ele. Tucker corre até nós, embrulhado em
seu casaco de inverno.

— Mamãe, colo, por favor, mamãe!

Em um flash, ele é puxado do chão e colocado sobre os


ombros de Josh. Seus olhos de amor brilhando sobre nós com
um pedido de desculpas. Ele é um marido atencioso e sabe que
nosso tempo juntos é limitado.

— Papai está cuidando disso. — Josh se inclina e beija


Christy, e posso vê-la desmaiar por dentro. Ela está feliz,
verdadeiramente feliz, e eu brevemente me pergunto se minha
vida algum dia se parecerá com a dela de alguma forma. Mas
a verdade é que não me importo, contanto que eu tenha os dois
nela. Enquanto tiver o homem que olha para mim agora com
olhos flamejantes de observância, sem dúvida se perguntando
a mesma coisa que ele olha para Josh discutindo com seu filho
e depois para mim.

Tento nos imaginar no cenário dela, no subúrbio e não dá


para entender. E sei com certeza que não seremos nós, não tão
cedo.

— Então o que você fará agora?

— Estamos voltando. — Bebo meu vinho.

— Sério?

— Com a proteção e ajuda do governo, vamos atrás deles


– todos eles. Qualquer um que pudermos pegar enquanto
Monroe ainda estiver no cargo. Não vamos cutucar o urso. Nós
vamos dar um tapa de vadia nele.

— Isso é... tão louco.

— Eu sei, vim em algum lugar no meio disso, e levei anos


para envolver minha cabeça em tudo isso.

— Eu realmente deveria ter ignorado você e vindo te de


qualquer maneira.

— Christy, tinha que proteger você.

— Eu sei. Vou tentar não guardar rancor, mas vai levar


algum tempo. Mas ficaremos bem. Você e eu, sempre
estaremos bem. E estou cem por cento atrás de você. Mas, —
ela muda seu olhar para mim, seu tom ficando sério, — não
deveria haver algumas vantagens neste arranjo?

— Quais?

— Acha que pode nos tirar do pagamento de impostos?

Nós duas caímos na gargalhada e duas cabeças


masculinas curiosas se viraram em nossa direção. Tobias lê
minha expressão e me dá um sussurro de um sorriso antes de
voltar para sua conversa com Josh.

— Do que diabos aqueles dois poderiam estar falando? —


Christy contempla observá-los interagir. — O que eles
poderiam ter em comum?

Estudo Tobias, que neste momento está completamente


à vontade no subúrbio com um estranho na prática. Ele está
aqui para mim porque esta família, essas pessoas, são
importantes para mim – porque ele me ama. E
esperançosamente, nosso futuro consiste em mais reuniões
como esta, embora nosso futuro não se pareça com os
Baldwins.

— Você vê um homem refinado, quase impenetrável em


um terno caro. E ele é isso, mas não vejo mais isso. Vejo um
menino que começou órfão determinado a proteger seu irmão.
Apenas um garoto pobre morando em uma rua ruim,
intimidado por um mundo que não entendia e determinado a
mudá-lo para si, para seu irmão e para nós. Eu vejo o homem
que ele cresceu, que nunca se esqueceu de onde ele veio e como
isso o moldou, não importa o quanto ele tenha evoluído.

— É admirável... ele é realmente... ele é algum tipo de


homem.

O olhar de Tobias vagueia para mim enquanto a


eletricidade sobe no ar entre nós.

— Ele é, — concordo.

Um verdadeiro rei.

Eu me viro para Christy.

— Sei que pedi muito a você hoje, mas preciso de um


favor.

Corro meus dedos ao longo das orelhas de Beau, lutando


contra as lágrimas. Tobias se inclina, repetindo meu
movimento, seu paletó roçando a grama congelada.

— Não precisamos deixá-lo aqui. Podemos...

— Não há lugar mais seguro do que aqui. Está bem. Estou


bem.
Ele levanta meu queixo e afasta a evidência da minha
mentira.

— O que machuca você, me machuca.

Eu consigo rir.

— Você não vai sentir falta dele.

Posso dizer por sua expressão que pode não ser mais a
verdade. Meu cão cresceu com ele. E talvez um dia possamos
dar-lhe um lar, mas ele não pertence ao nosso mundo no
momento. Ele passa a mão pelas costas de Beau.

— Você tem certeza?

— Não sabemos onde vamos parar. Ele precisa de uma


boa casa até descobrirmos. — Christy está a poucos metros de
distância, seus olhos vagando entre nós antes de eu caminhar
com ele em sua coleira até ela.

— Ele é um bom menino. Ele não deve lhe dar muitos


problemas. — O tremor em minha voz me denuncia, e Tobias
pragueja atrás de mim, sem dúvida por culpa. Mas foi minha
decisão, e fiz isso. Reunindo minha força, faço isso apenas
alguns segundos antes de Christy me puxar para seus braços.

— Quando te verei de novo? — Ela pergunta enquanto a


seguro com força contra mim.

— Não tenho certeza, mas ligo para você assim que


chegarmos a algum lugar.
— Eu te amo.

— Amo você também.

Nós nos abraçamos até que a Mercedes apagada pare no


meio-fio, sinalizando o fim da vida que conheço. Christy me
libera, seu olhar suplicante em Tobias.

— Não me dê um motivo para ir atrás de você.

Ele acena com a cabeça antes de me conduzir para dentro


do SUV em marcha lenta.

E com a batida da porta, nós nos afastamos do meio-fio.


Posso sentir o olhar de Tobias em mim um segundo antes de
ele gritar para o motorista.

— Arrêtez! — Pare.

O motorista franze a testa enquanto Tobias balança a


cabeça, dando a ordem em inglês.

— Pare!

Confusa com sua explosão, me viro para ele um segundo


antes de pular do SUV. O motorista olha para mim igualmente
confuso enquanto examino as ruas por qualquer ameaça que
possa ter perdido enquanto pego minha Glock da minha bolsa.
Um minuto depois, Tobias abre a porta com meu outro francês
na mão, ambos ofegantes enquanto ele sobe de volta no carro,
o cachorro agarrado firmemente em seu abraço enquanto Beau
lambe seu queixo. Tobias lança seu olhar para mim,
desafiando-me a discutir com ele antes que seus lábios se
inclinem e ele fale.

— Eu posso ensiná-lo a atirar.

Uma risada de alívio explode de mim quando Beau se


acomoda em nosso colo, descansando a cabeça na coxa de
Tobias enquanto ele acaricia suas orelhas com amor.

— Você está ficando mole, King.

— Não dou a mínima.

— Eu sabia que você o amava, — insisto enquanto beijo


seus lábios virados para cima.

Nós entrelaçamos nossos dedos em antecipação


enquanto somos levados para longe do meio-fio e nos
arremessamos para o desconhecido, os corações batendo forte,
a excitação crescendo entre nós enquanto aceleramos em
direção ao nosso futuro.
“Amamos com um amor que era mais do que amor”.

– Edgar Allen Poe


Quarenta e três anos

Saint-Jean-de-Luz, França

Encontre-me na linha de chegada.

Nós colidimos no meio da varanda e eu a levanto.

— Maldito seja, seu bastardo! — Ela chora no meu


pescoço. — Por favor, diga-me que estar aqui significa o que
acho que significa.

Com os olhos vidrados, inalo seu perfume enquanto ela


treme em meus braços. Estava perto, muito perto, e nós dois
sabemos disso. Nos últimos sete anos, partimos em uma
aventura de mil sonhos – principalmente a minha – e ela nunca
reclamou. Nós brigamos tanto quanto fodemos. Nós nos
movemos doze vezes, nos esquivamos de balas, perdemos
amigos, lutamos o bom combate, juntos, e principalmente lado
a lado – que foi a maior luta de todas. Lutamos, nos sentimos
derrotados, nos recuperamos e voltamos balançando.
Utilizamos nossa posição de todas as maneiras imagináveis,
enfrentando as maiores ameaças, principalmente corporações
corruptas e conglomerados de mídia controlados por um
Estado profundo. Com a ajuda de Cecelia, Molly implementou
vários programas e aprovou vários projetos de lei para ajudar
os menos afortunados.

Nós lutamos muito e foi sangrento pra caralho, mas


conseguimos realizar muito – e principalmente sair ilesos.
Preston reinou com mão de ferro em seus dois mandatos e,
com o apoio do governo e do povo, conseguimos retirar uma
boa quantidade de lixo. Meu único foco nos últimos sete anos
foi expulsar os terroristas que se tornaram famosos durante o
segundo ano de Preston no cargo. Adversários que se deram a
conhecer quando me sentei no sofá na Virgínia anos atrás,
durante nosso dia de neve. Quando os cabelos do meu pescoço
se arrepiaram, e aquele zing familiar me atingiu como um raio,
eu sabia, sabia que faria da minha missão livrar o mundo deles
mesmo se eu tivesse que caçá-los e erradicá-los. Eu mesmo.

E há dois dias, com a ajuda dos militares dos Estados


Unidos, assassinamos as cinco cabeças responsáveis pelo
movimento antes de imobilizar e prender o restante dos
principais atores. E com aquela guerra oficialmente acabada e
as balas chegando perto demais para serem consoladas, e uma
longa troca de olhares com meus irmãos enquanto todos nós
soltávamos um suspiro de alívio quando chegamos ao ar,
concluímos que a guerra que travamos anos atrás foi acabou
para nós também.

Tínhamos feito nossa parte, arriscado nossas vidas e as


vidas daqueles que amamos por muito tempo, retomando o
controle de um governo corrompido. Vencemos muitas
batalhas para considerar nossos esforços um fracasso. E
lutamos pelas pessoas que fomos e voltaremos a ser, cidadãos
do mundo – Cecelia, a filha de uma mãe solteira que lutava, e
eu, um órfão deixado na esteira de um imperador de colarinho
branco ganancioso que acabou seja um homem com um
coração muito parecido com o meu. Nossos mundos colidiram
como essas pessoas e, desde então, manifestamos uma
realidade diferente. Um pelo qual trabalhamos a vida inteira.

Temos pássaros suficientes para continuar nosso legado


ou deixá-lo morrer – a escolha é deles.

A triste verdade é que já existe uma ameaça nova e


invisível chegando, porque sempre haverá mais. Ninguém pode
governar o mundo. No bem contra o mal, sempre haverá dois
lados, uma oposição.

— Tobias, isso significa o que acho que significa? — Seus


olhos azuis procuram os meus em busca de respostas sobre
por que estamos aqui, e ela sabe, mas sei que ela precisa das
palavras.

— Significa que estamos em negociações, — sussurro


com a voz rouca. — Sinto muito, Tesor. Me desculpe, eu te
assustei.

Ela se afasta e posso ver claramente a preocupação que


causei – pequenos anéis pretos sob seus olhos.
— Sean? — Ela pergunta, com a voz trêmula, com muito
medo da resposta enquanto passa as mãos para cima e para
baixo no meu peito.

— Ele está bem. Ele vai pousar em Charlotte em algumas


horas. Ele vai se recuperar totalmente. Todo mundo está bem.

Ela acena com a cabeça, sua postura relaxando


substancialmente enquanto suas mãos continuam a vagar.

— OK. — Ela balança a cabeça. — OK.

— Eu disse que isso ia ser...

— Não torna as coisas mais fáceis! Depois de sete


malditos anos disso, estou perdendo a cabeça! Tobias, nossa
sorte vai acabar em breve – você conseguiu sair dessa aqui por
pouco. Quantas vezes você tem que arriscar seu próprio
pescoço para ver seus planos malucos? — Ela grita tudo isso,
examinando-me como se eu tivesse caído do trepa-trepa no
pátio de uma escola. Ela roça o corte abaixo do meu olho, e
aperto sua mão antes de beijá-la por trás.

— Nós os pegamos, Cecelia. Nós os pegamos.


Conseguimos, baby.

Ela olha para mim, seus lábios se separando com a minha


revelação.

— Está realmente acabado?

— Sim, acabou.
Ela solta um longo suspiro de alívio.

— Perdemos o sinal no caminho para a pista de pouso.


Estávamos correndo para o avião quando te enviei a
mensagem. Fomos detidos na fronteira por um maldito dia
inteiro antes de Tyler resolver isso. E quando pude alcançá-lo,
você já estava no ar.

— Se você quer me alcançar, francês, então talvez você


não se coloque nessas posições como um comando estúpido do
Rambo. Você está muito velho para correr esses riscos!

Incapaz de evitar, jogo minha cabeça para trás e rio, forte,


o que me ganha dois punhos furiosos contra o peito. Agarro
seus braços para impedir seu ataque, e ela sorri para mim a
contragosto.

— Deus, eu te odeio.

— Também te amo. E quantas vezes tenho que


demonstrar que. Não. Sou. Velho. Porra?

Ela aperta as mãos em volta do meu pescoço, subindo na


ponta dos pés e pressionando seus seios perfeitos no meu
peito.

— Talvez mais uma vez.

— Apenas uma?

— Ou duas. — Seu rosto cai de toda pretensão quando


ela deita a cabeça no meu peito e me agarra com mais força.
— Deus, estava tão preocupada.
Inclino sua cabeça para cima.

— Eu sei, me desculpe. Sinto muito. Nunca mais, Tesor.


Eu juro para você.

— Sim, ouvi dizer que...

Beijo-a profundamente para cortar sua resposta


sarcástica e ela me atrai ainda mais, um gemido escapando de
sua garganta. Resumidamente, satisfaço meu desejo e varro
sua doce boca com minha língua antes de acalmá-la,
concentrada em meu propósito.

— Nós vamos chegar a isso.

— Ok. — Ela olha por cima do meu ombro. — Tobias, esta


casa é um sonho.

— É mesmo?

— Você não viu?

— Não. Vim direto da praia para você. Estava esperando


por você.

Seus olhos suavizam.

— Venha ver. Você esperou por este dia por tanto tempo.
— Ela agarra minha mão e consigo puxá-la bem a tempo.

— Isso também pode esperar. Como disse, estamos em


negociações.

Ela olha para mim, as sobrancelhas levantadas.


— Para?

Minhas entranhas estremecem quando a aperto em mim.


Em seus olhos, vejo tudo, incluindo minha redenção.

— Vida.

— Estamos negociando a vida? — Ela segura meu rosto


enquanto as emoções crescem dentro de mim, além do ponto
de segurá-lo. Engasgo várias vezes antes de conseguir falar.

— Tobias, o que é?

— Eu te amo.

— Eu sei. Por favor, me diga o que está acontecendo. Você


está me assustando.

— Não tenha medo. Tenho um favor para pedir.

Ela fica bastante séria quando vê a mudança visível em


mim.

— Ok, estou ouvindo.

— Cansei de assustar você. Definitivamente terminei,


porra. Cansei de fazer você se preocupar. Cansei de planejar.
Eu terminei com isso.

— Você está falando sério?

— Nunca terminaremos totalmente. Você sabe disso. Mas


terminei com todas as partes do trabalho pesado.

Ela engole.
— Ok.

Levanto sua mão e beijo as costas dela. Seus olhos se


fixaram em onde meus lábios acariciavam sua pele antes de eu
abrir a palma da mão e colocar o dólar de areia dentro dela.

— Eu tenho guardado isso para você. Por hoje.

— É lindo. — Ela passa o dedo sobre a concha.

— Meu pai me fez lembrar de uma memória da última vez


que o vi. Foi o dia na praia, a única lembrança que tenho dele.
Divida ao meio. Bem no meio. — Coloco minhas mãos embaixo
dele para pegar os despojos.

Ela quebra o dólar ao meio e o conteúdo cai na minha


palma. Concordo com a sorte quando cinco pombas em
formato de osso perfeitas aparecem na minha palma. Ela
estuda a evidência em minha mão e levanta uma para
inspecioná-la.

— Parecem passarinhos.

— Meio irônico, não é? Mesmo antes de saber qual era o


meu destino, ele foi entregue a mim por um homem que nunca
conheci de verdade. O que é ainda mais irônico é que esses
pássaros representam nós cinco. — Levanto os pássaros um
por um. — Eu, Sean, Tyler, Dom e você. O começo e o fim –
embora tecnicamente sejam pombas – no sentido religioso, eles
representam o sacrifício e a paz.
— Não sabia disso, — ela diz suavemente, estudando as
peças, — isso é... muito bonito. — Ela levanta seus olhos do
oceano profundo para mim.

— É hora de mudar nossas asas, Cecelia.

Seus lábios começam a tremer e sei que ela está se


alimentando de minhas emoções. Chegamos a um ponto em
nossa união em que não há um grama de separação. Nós
somos um há muito tempo.

Pego os pássaros do dólar e os coloco na varanda.

— Você, — consigo estrangular através da bola na minha


garganta, — você fez isso por mim. Exigi o sacrifício, mas você,
Cecelia, trouxe a paz.

Seus olhos brilham enquanto um sorriso sugestivo


aparece em seus lábios.

— Você andou bebendo?

— Nem uma gota.

— Desculpe, é que você raramente fica assim tão


sentimental, a menos que...

— Não desta vez, — fecho meus olhos e penduro minha


cabeça enquanto mais emoções vazam de mim. Tudo o que
sinto por ela está furioso na minha cabeça e no peito e me
recuso a ser contido por mais um segundo. — Eu não preciso
de álcool e não preciso esconder nada de você.
— Tobias, o que você está dizendo?

— Para onde eu for, você irá?

— Vou segui-lo em qualquer lugar, — ela garante sem


hesitar, — você sabe disso.

— Como irei te seguir. E a partir deste dia, nunca quero


dar um único passo, porra, sem você ao meu lado. Eu te amo,
Cecelia, muito. — Ela segura meu queixo, a evidência da
minha destruição, umedecendo sua mão.

— Também te amo. Tobias, mas você ainda está me


assustando.

— Não sinta. Não tenho mais medo de nada. E você deu


isso para mim. Não há adversário forte o suficiente para nós,
Cecelia. Você tem que acreditar nisso agora.

— Eu faço.

— Deus, estou, — mergulho meu queixo no meu peito. —


Tenho muito a dizer, mas acho que não vou conseguir superar
tudo... você me perdoa?

Ajoelho-me e ela reconhece minha intenção. É a visão


mais bonita. Queimo sua expressão e o amor em seus olhos na
memória.

— Eu..., — penduro minha cabeça. — Porra... — Corro


meu rosto ao longo da manga da minha camisa e a vejo
visivelmente começando a chorar tão desfeita quanto eu.
— Nenhum homem na terra amou uma mulher mais do
que eu te amo. Vou provar isso todos os dias pelo resto de
nossas vidas. Amo você mais do que qualquer causa, qualquer
ambição. A visão do seu rosto sobre qualquer outro na terra.
— engasgo com cada palavra, frustrado com a minha
incapacidade de realizar meu plano, mas muito emocional para
dar a mínima. Me humilharia um milhão de vezes porque ela
me mostrou, repetidamente, a beleza de um coração nu e
despojado. — Você me possui. Você me faz muito feliz. Você é
meu propósito agora e para sempre.

Seus olhos brilham e transbordam quando puxo o anel


do meu dedo mindinho, levantando o diamante em sua linha
de visão. Sua respiração fica presa brevemente, seus olhos
vagando do anel e de volta para mim enquanto olho para ela e
pisco, limpando minha visão.

Estou tão longe.

— Eu não roubei isso, — consigo dizer, levantando


levemente os lábios.

Seu lábio treme com sua resposta.

— Não?

— Não. Ganhei-o.

Ela lentamente abaixa o queixo.

— E ganhei sua confiança?

— Sim.
— Sua lealdade?

— Sim.

— Eu ganhei sua fé?

— Sim.

— Seu coração?

— Integralmente.

— Seu corpo é meu? '

— Seu. Só seu, — ela jura.

Empurro o anel em seu dedo.

— Faça-me rei?

Um mês depois

Penduro minha foto favorita do dia do nosso casamento e


polimento a moldura branca e fosca com meu pano de pó. Ele
fica ao lado de uma janela do chão ao teto, dando ampla vista
para o mar. É um cândido preto e branco de Tobias beijando
meu dedo anelar enquanto olhava para ele, uma mulher
totalmente apaixonada.

Estávamos do lado de fora da porta em arco da pequena


igreja onde recitamos nossos votos. Éramos apenas nós dois,
o padre e suas testemunhas designadas, e foi perfeito. Nós
passamos a lua de mel em casa e depois informamos nossa
família e amigos, a maioria dos quais virá amanhã para uma
recepção atrasada. Pegando a última das caixas que
finalmente chegaram do exterior, comecei a terminar minha
tarefa. Durante o último mês ou mais, estive aninhada em um
estado de sonho, beliscando-me mentalmente, não só por
causa do palácio em que agora residimos permanentemente,
mas também por causa do brilho do diamante em forma de
lágrima de três quilates em meu dedo e o que significa – uma
cura para a doença que guardei por tanto tempo, um fim
duradouro.

Nas últimas semanas, estabelecemos uma rotina, dando


longas caminhadas na praia, visitando nossa nova cidade,
comendo à beira-mar, nos apresentando à nossa nova vida. O
que eu pensei que seria a parte mais difícil de todo o ajuste foi
realmente desligar da vida que vivemos desde que deixamos a
Virgínia. Uma vida onde estivemos totalmente imersos na
irmandade, fazendo movimentos calculados e colocando em
ação dezenas de esquemas de Tobias. Nunca vou entender
completamente a maneira como ele construiu tudo, mas isso é
um pouco do mistério de seu gênio.

E depois de fazer anos de trabalho árduo e recuar, posso


ver claramente o quadro geral, cada nota que ele escolheu para
compor a sinfonia mais alucinante. Casei-me com um rei e
uma lenda e tudo o que ele vê em seu reflexo é um homem
imperfeito.

Ele dormiu por dias quando chegou em casa. Foi como se


ele finalmente sentisse alívio o suficiente para conceder a seu
corpo e mente o alívio. Há uma paz dentro dele agora, em seus
olhos ferozes e, honestamente, nunca pensei que isso
aconteceria, pelo menos não tão cedo. Sinto o mesmo
contentamento, sabendo que na maior parte do tempo, ele está
vencendo sua batalha contra a culpa que o atormentou por
anos. Esta manhã foi outro ponto de virada. Acordei com a
visão dele nu, enrolado em algodão branco, seus olhos
percorrendo meu rosto, meu corpo com necessidade urgente
enquanto eu acordava, de frente para ele em meu travesseiro.

— Puis-je demander une faveur de plus? — Posso pedir


mais um favor?

— O que você quer agora, meu francês necessitado?

— Un autre trésor. — Outro tesouro.

Pega de surpresa, eu soltei uma risada incrédula. — Nós


nos casamos há cinco minutos e você já quer um bebê? Quer
experimentar um pequeno casamento primeiro?
— Non, — ele diz suavemente, prendendo meus pulsos e
se acomodando entre as minhas pernas, seus olhos caindo
para meus seios e além, antes de trazê-los de volta aos meus.

— Eu ainda estou fazendo controle de natalidade.

Ele se inclina e me beija.

— Pare de tomar.

— Você está falando sério?

Ele me inclina o queixo, os olhos cheios de esperança.

— Tu apprendras à notre bébé à aimer comme toi. — Você


vai ensinar nosso bebê a amar como você.

— Você ama com a mesma intensidade, Tobias.

Quando levantei e beijei a ruga de preocupação entre sua


sobrancelha, nossa discussão terminou com um pouco de
prática de fazer bebês. Minutos depois que ele se derramou
dentro de mim, juntei-me a ele no banheiro enquanto ele
tomava banho, seus olhos procurando os meus quando abri a
gaveta da penteadeira, tirei meu controle de natalidade e joguei
no lixo. A luz em seus olhos, a expressão alegre de seus lábios
e o olhar que compartilhamos naqueles segundos é algo que
nunca, jamais esquecerei. Nenhuma parte de mim pensa que
estamos nos precipitando. Colocamos nossa vida em espera
por tempo suficiente, mas o tique-taque do relógio não é uma
ameaça para nós, não mais. Realizamos tanto, chegamos tão
longe – agora é um momento de celebração e é exatamente o
que faremos.

E agora, ao desempacotar nossas coisas em um palácio


que nunca imaginei que moraria, um lugar tão distante do
apartamento de um quarto que dividia com minha mãe na
Geórgia, não posso deixar de ser grata pela estrada que nos
levou aqui, até este ponto. Um ponto de agradecimento que só
se tornou mais doce devido à natureza da estrada que
percorremos. Quando Delphine morreu, Tobias empacotou sua
casa sozinha, preservando cuidadosamente os pertences de
três vidas, duas das quais terminaram muito cedo. Não
consigo imaginar isso, e o fato de que ele passou por tantas
dificuldades sozinho, tentando ser forte para aqueles ao seu
redor, mas nunca tendo realmente uma constante própria.
Pela aparência e peso das caixas, parece que ele não teve
coragem de jogar uma única coisa fora.

Abrindo uma caixa de charutos, classifico as fotos e me


fixo na imagem de uma jovem Delphine e um homem que
presumo ser seu marido. Elas estão no banco de trás de um
carro, Delphine sentada em seu colo enquanto eles se olham
com sorrisos, inegavelmente apaixonados.

É uma imagem do amor que a quebrou, e só posso ser


grata por não ter sofrido o mesmo destino.

Eu cheguei tão perto.

Conheço a maior parte de sua história, mas não os


detalhes, e me entristece ela cortar sua vida e a si mesma das
possibilidades quando ele a deixou. Sempre terei sentimentos
confusos sobre ela, sobre o papel que ela desempenhou em
minha vida e a ameaça que ela era para mim. Mas também me
identifico com ela de certa forma por causa da lealdade de seu
coração. Se não tivesse me recomposto, poderia ter me tornado
igual a ela, deixando o amor perdido me arruinar a um ponto
sem volta. Ela viveu como uma vítima de amor, e seu caminho
é a prova de que mesmo a mais forte das mulheres pode ser
vítima de sua destruição. Grata pelo tempo que ela teve com
Tyler, pela cura que isso trouxe para os dois, coloco as fotos de
volta na caixa para mantê-las longe de olhos curiosos.
Levantando a tampa de uma caixa de sapatos da Nike, hesito
ao ver o carro com caixa de fósforos em cima de uma pilha de
desenhos dobrados. Levando o carro até minha linha de visão,
meu coração começa a sangrar.

— Eu sei o que estou segurando. Eu sei que ela vale.

É um eco, essa parte do meu batimento cardíaco que


lateja no meu peito, um eco de uma vida que vivi há muito
tempo e de um homem que amei com quem passei meus dias
chuvosos. Meu amor por ele ainda é tão distinto, e sou grato
por isso. Tobias me disse, anos atrás, na Virgínia, que estava
feliz por eu ser a mulher que o amava, e não posso deixar de
me sentir privilegiada por isso, por mais egoísta que seja.
Correndo o dedo sobre o capô, relembro as noites cheias de
estrelas que passamos trocando sussurros e nos recusando a
reconhecer a culpa que essas memórias evocavam. Não posso
esquecer meu segundo amor, e nunca quero. Ainda o carrego
comigo – através do tempo.

— Seu favorito, — Tobias diz baixinho, falando atrás de


mim. Virando, vejo-o parado no batente da porta, seus olhos
fixos no carro em minha mão. — Mesmo quando era pequeno,
ele sabia o que queria. Era como se ele visse seu futuro.
Olhando para trás agora, pelo que me lembro, por mais louco
que possa parecer, acredito que sim.

— Também acredito, — digo, olhando para o carro. —


Havia algo nele que era tão... indescritível.

Ele se junta a mim, olhando para a caixa de sapatos, e


posso sentir que vê-la é dolorosa para ele, mas ele não recua.

— Estava tentando resolver as coisas antes que todos


chegassem aqui. Vou colocar isso em uma sala diferente. —
Movo-me para fechar a caixa e ele me para.

— Não, Tesor. Passei muito tempo lembrando... das


coisas erradas. — Ele gentilmente tira o carro da minha mão
antes de beijar meu dedo anelar. A dor que posso sentir ao sair
dele pica, a saudade, o pedaço de si mesmo que ele nunca vai
ter de volta. Ele nunca vai parar de sofrer com o irmão, e nunca
vou pedir a ele porque, na verdade, acho que nenhum de nós
vai parar.

— Você pode me dizer, — digo baixinho. — O que quer


que você esteja pensando.

Ele agarra o carro em sua mão e acena com a cabeça.


— Eu sei, — ele diz suavemente. — Estou pensando nele
de pijama como um garotinho com uma boca inteligente. — Ele
me dá um sorriso triste. — Vou dar um passeio.

— Há uma tempestade chegando. — Aceno em direção à


janela.

— Vou ser rápido, esposa. — Sorrio com o título enquanto


ele pressiona um beijo em meus lábios antes de sair da sala, a
tristeza persistente em seu rastro. Com o coração pesado, vejo-
o descer as escadas antes de olhar de volta para a caixa, minha
curiosidade vencendo minha necessidade de recapturar a paz
que senti há poucos momentos.

Abro o pedaço de papel de construção dobrado mais


próximo para ver que é um desenho. No final da página, há
uma etiqueta com a caligrafia de um professor, Título “Minha
Família”, Dominic King, Idade seis. Um sol amarelo-limão
aparece no canto superior direito da página finalizando um céu
azul escuro. Dentro de uma das nuvens fofas no centro estão
duas figuras de palito marcadas como Mamãe, Papai. Abaixo
estão Tobias e Dominic no meio de montanhas de cor marrom
claro. Tobias é muito, muito maior em tamanho. Ele poderia
muito bem ser um gigante em comparação com a forma como
Dominic se desenhava.

Eles estão de mãos dadas, e posso ver claramente a


dinâmica do relacionamento – muita confiança, amor e
adoração. Dominic gastou mais tempo nos detalhes de Tobias
do que em qualquer outro aspecto do desenho. E é porque ele
o amava, idolatrava, porque Tobias era seu mundo, seu irmão,
seu professor, seu mentor e, em essência, seu pai. Olhos
ardendo, eu olho para a imagem clara da devoção de um irmão
pelo outro.

Por mais que eu achasse que sabia sobre esses homens,


por mais profundamente que os amei e os entendesse como
eles eram quando entrei em suas vidas, Tobias estava certo –
houve uma evolução que ocorreu muito antes de mim, que não
me inclui, e não tem absolutamente nada a ver comigo. E estes
são os momentos pelos quais Tobias mais sofre, por um
relacionamento que só tive um raro vislumbre antes da
tragédia acontecer. O fim de uma história da qual nunca tive
conhecimento. Embora Tobias tenha me contado histórias,
não entendia muito bem até este momento, o significado por
trás de cada ação, cada detalhe, porque estou segurando o
projeto original em minhas mãos.

Esta não é apenas minha história de amor. Nunca foi.

Dobro o desenho com cuidado, coloco-o de volta na caixa


e caminho até a janela, avistando Tobias assim que ele chega
à praia.

Sob sua armadura propositalmente construída está o


coração sangrando de um menino órfão que foi forçado a
crescer muito cedo. Um coração que sofreu anos de abandono,
de rejeição – incluindo o seu próprio. Ele o manteve assim para
proteger a si mesmo e aqueles ao seu redor até que eu o
recuperasse. E ele me deixou descobri-lo, sabendo que ele se
tornaria o mais vulnerável.

Ele me disse uma vez que sua admiração por mim vem do
fato de que eu sempre falei sobre meu coração – enquanto ele
cuidadosamente esconde o dele para proteger aqueles que
ama. E é aqui, comigo, que ele finalmente se libertou da
obrigação de ser tão altruísta. É aqui comigo que ele se libertou
para amar do jeito que deveria. Levanto minha palma para a
janela.

— Você nunca estará sozinho novamente. Você nunca


estará sozinho. Eu prometo. Nunca foi meu coração, Tobias.
Era seu.

11 anos

— Vamos, Dominic, pegue sua mochila. Temos de ir. —


Dominic não se move. Em vez disso, ele se ajoelha no tapete
empurrando o carro ao longo de uma trilha que fez com fita
isolante em seu tapete puído.
— Você me ouviu? Venha, ou vamos nos atrasar.

— E daí.

— E daí que será a sua bunda vermelha se você continuar


respondendo para mim, é isso.

— Por que temos que ir para a escola por cinco dias?

— Porque essas são as regras, — estalo, pegando o carro


em sua mão.

— Quem faz as regras?

— Pessoas.

— Quais pessoas?

— Dom, — suspiro enquanto ele o puxa para fora de seu


alcance. — Não temos tempo para essa merda.

— Então me diga quem faz as regras.

— Eu disse a você, pessoas.

— Por que temos que ouvir as pessoas?

— Porque eles fizeram as regras.

— Podemos fazer nossas próprias regras. Papa disse isso.

Faço uma pausa. Ele não tem falado muito sobre nossos
pais ultimamente, nem se lembra de suas memórias deles, mas
sempre tento me envolver quando ele faz para mantê-los
atualizados.
— Papai disse que temos que fazer nossas próprias
regras, ou os bandidos vão vencer.

— Ele disse isso?

— Sim. Escola por dois dias.

— Não funciona assim, Dominic.

— Por quê?

— Dom, — solto e arranco o carro de sua mão. Seu lábio


treme de raiva quando ele olha para mim. — Nós somos
pessoas. Podemos fazer regras, para que os bandidos não
ganhem.

Ele me olha com tanta convicção que, por alguns


segundos, acredito nele. Vou acreditar em qualquer coisa que
ele me diga.

— Então talvez um dia nós os mudemos.

— Promessa?

— Promessa.
Os cabelos da minha nuca se arrepiam enquanto as
nuvens de tempestade cobrem o sol no horizonte. O mar se
enfurece lá embaixo enquanto as ondas violentas rolam sobre
a areia sedosa à minha frente, um paralelo forte e adequado ao
modo como as coisas aconteciam. Durante a maior parte
daquela noite, fiquei destacado em minha clareira enquanto as
palavras de Dominic circulavam minha cabeça, a simplicidade
e o brilho delas – uma implicação pesada para a solução de
todos os problemas.

Mude as regras.

Suas palavras desencadearam um efeito borboleta e me


forneceram algumas de minhas primeiras notas, as primeiras
imagens para a composição de meu projeto, a ignição que
acionou as engrenagens em movimento.

Não falei uma palavra com ele desde o dia em que ele
faleceu – mesmo quando visitei seu túmulo porque as palavras
sempre me faltaram – porque senti que falhei com ele.

Mas são palavras diferentes que me mantiveram calado


ao longo dos anos. Palavras que Dominic disse na noite em que
morreu que mais me assombra. Indicativo para a maneira
como ele pensava, do que sei que ele acreditava sobre si
mesmo, sobre seu destino. Mesmo aqueles que não o
entendiam pessoalmente – que eram apenas alguns
selecionados – podiam reconhecer que havia algo mais nele.

Ainda não sei o que acredito sobre a vida após a morte.


Espero, e principalmente para aqueles que amo, que haja um
lugar onde nada fica sem dizer. Que tudo o que sofremos para
dizer àqueles que perdemos, há um lugar para confessar –
porque tenho muito a dizer.

Corro minhas mãos pelo meu cabelo enquanto trabalho


ao redor da queimadura no meu peito.

— Desculpe relatar a escola ainda tem cinco dias de


duração. — Balanço minha cabeça e sorrio, limpando minha
garganta. — Você me forçou a assumir todo o crédito por ser o
homem por trás da cortina, mas não foi assim que tudo
começou, não é, Dom? E acho que ninguém acreditaria que foi
a sugestão de um menino de cinco anos que viu o mundo como
ele é, que colocou tudo em movimento.

Sufocando com as fotos sem fim dele passando pela


minha mente, fecho meus olhos e seguro o carro na palma da
minha mão.

— Eu te fiz uma promessa, Dom, mas te perdi para


mantê-la. E olhando para trás, não acho que valeu a pena. Por
mais egoísta que seja, trocaria tudo o que fizemos, apenas para
ter você de volta.

Sempre irmãos.

Ouço-o falar as palavras tão claramente que meus joelhos


batem na areia. É como se ele as tivesse sussurrado em meu
ouvido. Fechando meus olhos, rezo para mantê-lo comigo
apenas um pouco mais enquanto cada cabelo do meu corpo
fica em pé.
— Você era tão intuitivo, mas você... você realmente
sabia? — Engolindo, deixei a dor quente escorrer pelo meu
rosto. — Eu sinto sua falta. Todo dia. Todo maldito dia. E se
estou destinado a viver uma vida longa sem você, acho que o
mínimo que posso fazer é agradecer. Obrigado, Dominic.
Obrigado. Porra, — abrindo meus olhos, eu olho para o céu
que escurece rapidamente. — Acho que... acho que se você
pode me ouvir, reserve um lugar para mim no banco do
passageiro. — Penso em meus pais e em como parecia que eles
existiam há muito tempo – uma vida diferente. — Espero que
você esteja com eles. Eu espero que você esteja... — deixo a
tristeza assumir enquanto o vento aumenta. Abro minha mão
para ver o carro rolar para frente e para trás na minha palma
enquanto as ondas de espuma branca se elevam e arrebatam
a costa. Uma brisa mais forte segue como se me pusesse de pé,
e tiro a poeira das calças e caminho até o paredão e coloco sua
pomba em cima dele.

— Estou cansado, Dom, então me ajude a cuidar de nós,


ok?

Começando minha caminhada até a encosta do


penhasco, a chuva começa a atingir meu rosto, assim como o
trovão soa nas minhas costas. Outra rajada de vento me fez
acelerar meus passos em direção ao meu futuro, mas ainda
posso senti-lo, então falo mais uma vez.

— Conseguimos, irmão.

Fim

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