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Atividade I de HIS 430

Tauan Rodrigues Guimarães - 106633

O Brasil no final do século XIX passou por uma das suas transformações mais
importantes de sua história. Em sentido de continuidade ou ruptura, a proclamação da
República Federativa Brasileira vai, ao longo do tempo de maneira processual, também
modificando todo o escopo dinâmico do país e com isso, alguns setores vão ser de extrema
importância basilar quando se pensa em debater o período ligado, principalmente, a Primeira
República. Desse modo, entre os assuntos mais discutidos em relação a esse momento de
mudança, tem-se no “coronelismo” um dos principais pontos levantados para entender o
funcionamento desse novo sistema e a sua implementação. Porém, sendo a Primeira
República um evento muito estudado, não seria diferente quando se trata da temática do
“coronelismo”, na tentativa de compreender esse contexto, muitas interpretações
historiográficas foram produzidas ao longo dos anos, o que também denota como o próprio
conceito de “coronelismo” é bastante complexo e que demanda muita atenção ao ser
analisado. Nesse sentido, é de suma importância contextualizar o novo regime e de como ele
opera e onde a figura do coronel entra na lógica, para então analisarmos o fenômeno do
“coronelismo” e de seu notável impacto na história do Brasil.
Em primeiro lugar é necessário denotar as características presentes nessa nova
República, talvez em termos de prioridades dadas por ela. Essa Nova República tinha como
base, principalmente, as revoluções realizadas no Estados Unidos e na França, mais
especificamente a dos Estados Unidos, mas que se tem a ideia de construir uma divergência
em relação ao Antigo Regime Imperial, para além disso, o sistema de república está
enraizado na ideia de liberdade do Liberalismo, o que também está ligado a concepção de
representatividade. Entretanto, na prática, quase tudo isso cai por terra, sobretudo quando
pensamos em casos mais radicais de mudança, o que inclui a ampliação da questão cidadã por
exemplo. Apesar de uma certa mudança nos status políticos que regulamentam o país, uma
estrutura de privilégios já presente no Império vai ainda ganhar mais força com a questão
federalista sendo trazida à tona em que vai haver em alguns casos potencializações de certos
grupos em detrimento de outros, mais precisamente no campo. Assim, em relação a esse
contexto, Maria Efigênia Lage de Resende em seu texto O processo político na Primeira
República e o liberalismo oligárquico, vai expor como essa nova Constituição vai por fim
acabar deixando de lado a questão mais coletiva e pública durante o seu processo de
implementação, e de como todo esse sistema vai gerar muitas revoltas no território brasileiro.
Assim, ela coloca que:

A denominação de República oligárquica, frequentemente atribuída aos


primeiros 40 anos da República, denuncia um sistema baseado na dominação
da minoria e na exclusão de uma maioria do processo de participação
política. Coronelismo, oligarquia e política dos governadores fazem parte do
vocabulário político necessário ao entendimento do período republicano em
análise.1

Esse processo de exclusão para Maria Efigênia vai ser muito provindo por exemplo da
questão federalista assumida como base da Constituição de 1891, em que vai haver um
movimento de fortalecimento dos Estados em detrimento de um poder central mais forte,
onde os governadores ou presidentes são eleitos e detém uma enorme soma de poder que lhes
advém do próprio texto constitucional (Efigênia, 2003, p. 95). Assim, ela vai dizer que os
coronéis vão ser peças-chave, principalmente pensando a nível municipal. De uma maneira
parecida, Victor Nunes Leal em Coronelismo, Enxada e Voto, vai colocar a ideia de
reciprocidade provinda dos coronéis em relação ao Estado e em alguns casos em relação aos
subordinados e eleitores, em que a “A rarefação do poder público em nosso país contribui
muito para preservar a ascendência dos “coronéis”, já que, por esse motivo, estão em
condições de exercer, extraoĕcialmente, grande número de funções do Estado em relação aos
seus dependentes.”2 Assim, vai haver trocas entre esses coronéis e a concessão de serviços
provindas do poder público, em que o coronel às vezes assume a função de “cumpridor” de
promessas. Ou seja, uma grande rede funciona através da figura desses coronéis, o que
impacta diretamente a questão política e social no país.

A própria Maria Efigênia vai citar a obra clássica de Victor Nunes Leal para definir o
coronelismo, em que o:

1
Resende, Maria Efigênia Lage. “O processo político na Primeira República e o liberalismo
oligárquico”. Ferreira, Jorge e Delgado, Lucilia de Almeida. O Brasil Republicano: O tempo do
liberalismo excludente - da Proclamação da República à Revolução de 1930. Volume 1. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p. 91
2
Leal, Vitor Nunes. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. 7
ed.São Paulo: Companhia das Letras, 2012. “Capítulo I: Indicações sobre a estrutura e o processo do
‘coronelismo’", p. 62
[...] coronelismo é um fenômeno que só pode ser entendido a partir da marca
histórica e exorbitante poder privado; da estrutura agrária latifundiária que
fornece base de sustentação para as diferentes formas de manifestação do
poder privado; da superposição de formas de sistema representativo a uma
estrutura econômica e social, basicamente rural, que permite o controle de
uma vasta população em posição de dependência direta do latifúndio [...]3

A partir disso se tem também uma relação forte entre o campo e o urbano, em uma
questão de ascensão sobre o espaço oligárquico, que vai criar um clima de tensão tanto entre
os coronéis, quanto entre as oligarquias - talvez uma visão mais voltada para a teoria
feudalista para esse momento traga mais essa característica do coronelismo. A própria
cabanagem e o cangaço são importantes nessas disputas municipais.
Outro ponto importante nessa discussão é a relação dos coronéis com o voto e logo o
exercício da cidadania política. Tanto Maria Efigênia quanto Victor Nunes Leal vão entrar
nessa discussão muito pelo lado de que há de fato uma ligação direta entre os votos e o que é
decidido há nível federal, ou pelo menos, vão denotar a pouca participação populacional dos
votos o que daria ênfase para a ideia de uma República contraditória, sendo muito pouco
relevante no que diz respeito ao público e a democracia. Porém, Liliane Faria Corrêa Pinto
em seu texto Coronelismo uma análise historiográfica vai traçar através das divergências e
convergências sobre o tema na historiografia, onde ela cita as críticas de José Murilo de
Carvalho e de Cammack aos argumentos de Victor Nunes Leal a respeito da dimensão
potencial do voto, de cabresto principalmente, a nível federal, onde ele vai dizer que por
motivos diferentes ambos rejeitam a ideia de que o voto teria de fato um impacto, pois o que
mais interessava em ambos os casos era que:

[...] os coronéis continuavam no poder porque era necessária a


reunião de coronéis para a manutenção do poder no Congresso, assim os
parlamentares só chegavam a um resultado final das eleições com o consenso
entre vários grupos. Isso garantia a política de compromissos entre coronéis e
o governo estadual.[...] 4

3
Resende, Maria Efigênia Lage. “O processo político na Primeira República e o liberalismo
oligárquico”. Ferreira, Jorge e Delgado, Lucilia de Almeida. O Brasil Republicano: O tempo do
liberalismo excludente - da Proclamação da República à Revolução de 1930. Volume 1. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p. 96
4
Pinto, Liliane Faria Corrêa. Coronelismo: uma análise historiográfica. Locus: revista de história, Juiz
de Fora, v. 23, 2017. p. 371
Todo o rumo era decidido em outra instância, o que deixaria ainda mais frágil a
participação política através dos votos, seja a favor ou contra o próprio coronel, como diz
Murillo de Carvalho, vai haver um certo consenso que beneficia mais os coronéis, que decidir
junto com as fraudes das eleições - o clientelismo. Ou seja, o voto era importante por outros
motivos, até mais relacionados ao mandonismo - outro ponto que Leal e Cammack vão
discordar, onde o primeiro coloca a ação do coronel como forma de dominação e outro atribui
até uma liberdade ao eleitor, conseguindo escapar do “cabresto”- , mas nem mesmo o pouco
percentual votante, ainda que direcionado pelos coronéis, era de fato efetivo enquanto
cidadania política. Então que nesse momento voltamos a ideia de Maria Efigênia, em que se
vive nesse contexto, ainda que não a nível geral, um liberalismo, porém, oligárquico, um
golpe que em seu cerne e base teriam questões públicas e democráticas, mas que por sua
concentração de poder vai tornar a participação política dos cidadãos quase nulas.

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