Comentário gerias sobre a primeira república, sua consolidação e sua crise
Marcelo de Jesus da Silva
Primeira República, que é o período histórico que vai de 1889 a 1930, num período marcado pelo regime político republicano, instituído por um golpe de estado com apoio, basicamente, protagonizado pelo exército, mas também com forte apoio na oligarquia, sobretudo paulista ligada ao café. Embora o ato político seja muito mais um ato militar do que a proclamação da república e deposição do império, o apoio civil não pode ser menosprezado, sobretudo da oligarquia paulista. É uma periodização clássica que a historiografia utiliza para pensar o filho do primeiro período da Primeira República, que via de regra divide o período em três grandes conjuntos. O período de consolidação da república de 1889 a 1898 (sim, as datas são sempre aproximativas, nunca exatas), o período de institucionalização de 1898 a 1921 e um período razoavelmente longo de crise, que vai de 1921 a 1930. Quando, em outubro, ocorre uma revolta que veremos daqui a pouco e que derruba, instaurando um novo tipo de regime político no Brasil, coincidindo com a ascensão ao poder de um novo grupo político, capitaneado por Getúlio Vargas. O período de consolidação de 1889 a 1898 é conhecido nos três primeiros governos republicanos: Marechal Deodoro da Fonseca, o Marechal Floriano Peixoto e Prudente de Moraes. Os três primeiros governos são um período de muita instabilidade política e também econômica. Nós vamos ver, daqui a pouco, em detalhes, mas é um período de muita instabilidade, aquela relativa estabilidade do império, obviamente assentada em bases marcadas pelo centralismo político e pela existência de instituições políticas que acabavam regulando o conflito entre os próprios membros, no caso, o poder moderador, Conselho de Estado, senador vitalício. Quando vem a república, essas instituições não existem mais, e há os vários grupos oligárquicos, vários grupos políticos, entram num processo de conflito para ver quem efetivamente hegemoniza a região. Esse período aí, há aproximadamente dez anos, é um período de muita instabilidade. O período de institucionalização do regime coincide com o governo Campos Sales, que assume o poder em 1898, substituindo Prudente de Moraes. Campos Sales, ligado também à oligarquia paulista do café e tendo em vista a crise financeira, crise econômica e a crise política, é um período em que Campos Sales vai desenvolver uma espécie de prática política que vai acabar se tornando quase uma instituição, e que vai tentar exatamente criar um mecanismo de dependência mútua das oligarquias regionais em relação ao governo da união, ao poder executivo nacional. Então, a partir de Campos Sales, é que veremos também como foi efetivamente essa instituição e essa regulação do jogo político brasileiro daqui a pouco. A partir de Campos Sales, então, surgem mecanismos para acomodação desses conflitos entre oligarcas. Temos que tomar muito cuidado para não achar que o fato da existência desses mecanismos de regulação significa o fim dos conflitos. Ao contrário, a Primeira República foi marcada ao longo de seu período por um conjunto de conflitos intraoligárquicos, além de conflitos sociais interpessoais. Vamos ver isso também em detalhe daqui a pouco, mas de qualquer forma, nesse período, há uma relativa acomodação do jogo político entre as elites oligárquicas, o que levou alguns autores, como Fernando Henrique Cardoso, a cunhar o termo 'pax oligárquica', ou seja, uma paz oligárquica que estabilizou o regime político tão tumultuado em seus primeiros anos.
Depois, o período de crise de 1921 a 1930 é um período que, via de regra, a
historiografia destaca a existência de novos atores políticos que entram em cena, além de novos atores políticos, entram em cena as crises dentro das oligarquias, que se pactuavam para se revezarem no poder, começam a se tornar mais agudas, efetivamente apontando para modelos políticos diferenciados em relação ao Estado nacional. E também, conhecido nesse período, surge nesse período, no período de crise, um conjunto de críticas ao chamado liberalismo oligárquico, que é uma marca do liberalismo brasileiro. Ninguém discute que a Primeira República é uma república liberal, mas nem por isso é uma república democrática, e muito menos ligada àquilo que algumas elites delimitam como interesses nacionais mais integrados. Nesse período de crise, essas tensões se agudizam e começam a surgir projetos alternativos, sobretudo projetos políticos, mas também projetos sociais alternativos de uma sociedade diferente, principalmente pelo movimento operário e por uma parcela do movimento tenentista. Características gerais da Primeira República, né? Lembrando que este é um curso monográfico, então temos como perspectiva sempre do geral para o particular, mas articulando essas duas perspectivas. Características gerais da Primeira República: temos um federalismo com predominância do poder executivo nacional, embora esse poder executivo nacional fosse independente das oligarquias estaduais, o que se convencionou chamar de política dos governadores, como veremos daqui a pouco. Vale dizer que foi a partir de Campos Sales, mas de todo modo, é um regime marcadamente federalista, até porque as forças políticas que sustentaram a república, que derrubaram a monarquia, eram basicamente federalistas, ligadas a uma tradição na política que defendia maior poder político-administrativo para os estados da federação. No império, embora fossem importantes, como já demonstra nossa historiografia, eram submetidos a um poder mais centralizado na coroa. Com a república, os estados ganham mais autonomia financeira, fiscal e também política, embora isso não signifique um ultrafederalismo. Tem que tomar cuidado com isso. Em nenhum momento tivemos um federalismo semelhante ao que tivemos, por exemplo, no contexto norte-americano. Temos a manutenção do regime escravocrata, que é uma marca, de uma certa forma, contraditória do liberalismo oligárquico, porque o liberalismo oligárquico defendia as liberdades individuais, liberdade de comércio, liberdade de indústria, liberdade de terras, mas era contraditório quando se tratava da liberdade do trabalho. A liberdade do trabalho, na ótica dos oligarcas, tinha limites, e o trabalho não podia ser totalmente livre, sobretudo quando mexia com os interesses dos grandes proprietários de terras e da elite agrária brasileira. A Primeira República é marcada pela manutenção do regime escravocrata, apesar da abolição da escravatura que ocorreu em 1888, quando a princesa Isabel assina a Lei Áurea. Então, formalmente, a escravidão está abolida no Brasil, mas na prática, nas relações sociais e econômicas, ela vai se manter durante boa parte do período republicano. Temos também, na Primeira República, um sistema eleitoral bastante restritivo, o que limitava a participação política. No geral, os critérios de voto eram restritivos, havia uma série de impedimentos para o voto, como a obrigatoriedade de alistamento militar, critérios de renda, critérios de alfabetização, e isso restrigia bastante o acesso à cidadania política, obviamente excluindo a participação de grande parte da população. O sistema eleitoral era marcado por fraudes e manipulações, e as eleições eram muito tumultuadas, com grande possibilidade de conflitos locais e regionais, o que fazia com que o governo federal, o poder executivo, interviesse muitas vezes para garantir a estabilidade política local. Além disso, temos um sistema político dominado pelas oligarquias agrárias. A elite agrária, principalmente ligada à produção cafeeira, que era a principal riqueza do país na época, dominava a cena política nacional. Os grandes cafeicultores, os grandes fazendeiros, eram também os grandes políticos, e havia uma relação muito estreita entre esses dois campos, o econômico e o político. Isso é uma marca bastante importante da Primeira República. O poder político estava nas mãos dos grandes proprietários de terra, da elite agrária, e isso também influenciava na condução das políticas públicas, na definição das leis, nas questões tributárias, enfim, em toda a estrutura do Estado. Outra característica importante da Primeira República é a presença do coronelismo, que é um fenômeno típico do período, especialmente nas regiões do interior, nas áreas rurais. O coronelismo é uma prática política que envolvia a figura do coronel, que era o grande líder local, o grande chefe político, militar e econômico de uma determinada região. O coronel tinha uma influência muito grande sobre a população local, muitas vezes controlando não só os aspectos políticos, mas também econômicos e sociais da região. Ele tinha, por exemplo, o controle sobre os currais eleitorais, onde as pessoas eram praticamente obrigadas a votar nos candidatos indicados pelo coronel. Então, o coronelismo é uma forma de dominação política que estava muito presente no contexto da Primeira República, especialmente nas regiões mais afastadas dos centros urbanos. Na área econômica, a Primeira República é marcada por uma economia agroexportadora, centrada principalmente na produção e exportação de café. O café era o grande produto de exportação do Brasil nesse período, e isso influenciava diretamente na política econômica do país. As decisões políticas eram muitas vezes voltadas para garantir o desenvolvimento e a expansão da produção cafeeira. Isso também tinha impactos sociais, como a manutenção de uma estrutura agrária concentradora de terras, com pouca distribuição de terra para a população, especialmente para os trabalhadores rurais. Do ponto de vista cultural, a Primeira República é marcada por um positivismo. O positivismo foi uma corrente filosófica e política que influenciou bastante o pensamento da elite brasileira n início do período republicano. Ela pregava a ordem e o progresso como valores fundamentais e defendia a ideia de uma república governada por uma elite intelectual e científica. Essa visão positivista estava presente na constituição de 1891, por exemplo, que trazia a inscrição "Ordem e Progresso" na bandeira nacional. Essa ideia de ordem e progresso também estava relacionada ao desenvolvimento material do país, buscando modernizar a economia e a sociedade. Portanto, essas são algumas das características gerais da Primeira República. Claro que cada período tem suas nuances, suas especificidades, mas isso nos dá um panorama geral do que foi esse momento histórico no Brasil. Como eu disse, esse é um curso monográfico, então vamos entrar em mais detalhes ao longo das aulas, abordando questões específicas, eventos importantes, personagens relevantes, e tentando entender as dinâmicas políticas, econômicas e sociais desse período. Bom, podemos falar numa paz oligárquica na Primeira República. Podemos falar, portanto, numa acomodação do jogo político, ligado em grande parte, mas com muitas reticências. Muito cuidado primeiro porque, efetivamente, a república, sobretudo nos 10 e nos dez primeiros anos, era marcada por conflitos entre oligarcas. Primeiro, isso tem muito a ver com a Constituição do Brasil como corpo político, corpo nacional. Dá para entrarmos em detalhes, clássicos têm muito a ver com a formação do Brasil nação lá no começo do século 19. O Brasil é, como nação, nunca teve uma organicidade muito grande, mas é muito mais um estado nacional herdado da colônia portuguesa, que constituiu o Brasil nação aqui. As partes do império sempre foram muito altos entraves, gerando o que alguns autores clássicos chamam de força centrípeta, seja forças que descentralizam a ameaça, assim a gravidade que jogam para fora. As partes que formam todo, no caso das províncias, é, portanto, repito, fazer essa característica do Brasil de um arquipélago de províncias isoladas, muitas vezes com muitos altos entraves. É uma marca que vem lá do império. Ora, isso gerou um federalismo muito próprio, uma integração nacional que integrava aqui qual força política integrava a nação, o estado, o estado nacional ou a coroa. Particularmente, as instituições monárquicas, elas 5 ela se impunham e garantir uma coesão, facilitada pela língua comum, mas ao mesmo tempo com intenções políticas muito fortes. As províncias, vale lembrar o período regencial e oitocentos e trinta e um mil cento e quarenta, marcado por guerras civis terríveis que têm como marca conflitos dentro das províncias por maior autonomia, o fim à hegemonia de poder. Por fim, é dificuldades de convivência com a coroa, com o poder central. No caso, isso vai quando chega à república, olha, essa coesão dada pelas instituições e pela coroa deixa de existir. Repito, fim do conselho do estado, fim do poder moderador, fim do senador vitalício, portanto, a ausência de instituições tuteladas do corpo político das eleições regionais exigiu novas práticas e arranjos políticos entre oligarcas. Ou seja, as várias oligarquias provinciais tiveram que desenvolver mecanismos de convívio, ainda que tenso, com o poder nacional, entre si, que entre os vários grupos das províncias e entre uma província e o poder hegemônico das províncias em relação ao poder nacional. Dão todos esses termos aqui que vocês verão a seguir: a política dos estados ou política dos governadores, política do café-com-leite, política das salvações. São políticas que vocês verão muito na literatura relacionadas à Primeira República, relacionadas a essa relação à atenção entre o poder nacional e o poder político. São respostas que muitas vezes criam mais problemas do que soluções, mas que conseguem, meio mal, evitar que o país entre numa guerra civil constante entre as suas elites de gás. O constante porque houve muitas guerras civis nesse período e com base social nos coronéis. Mas, bem ou mal, o estado-nação se manteve. Então, começando pela política dos estados ou política dos governadores estabelecida pelo Campos Sales. E aí, eu recomendo muito a leitura do Renato Lessa, A Invenção Republicana, que é um trabalho que esmiúça essa nova política. Eu vou avançar um pouquinho, a gente já volta para o país laico daqui a pouco. A política dos governadores ou política dos estados, como Campos Sales preferia, significava o apoio do governo federal às oligarquias regionais no poder. Por sua vez, as oligarquias regionais no poder deveriam apoiar as políticas do governo federal na Câmara dos Deputados. Eu apoio você que está no poder aí no seu estado, e você, seus deputados, apoiam os projetos que saem do executivo. Ora, como se dava esse apoio? É um jogo de poder, mas só a liberação de verbas não funcionava. Hoje existe, sobretudo, era através da homologação de candidatos apoiados pelo poder situacionista dos estados que chegavam à Câmara, que por sua vez garantia o reforço ao poder situacionista dos estados. Ao mesmo tempo, que apoiavam o governo federal, como é que se dava esse apoio? Basicamente, através da chamada Comissão de Verificação de Poderes e do controle da presidência da Câmara. O governo federal, poder executivo nacional, passou a ter muita influência na escolha dos membros da Comissão de Verificação de Poderes que já existiam, mas que ganhou uma nova função. A composição e o controle dessa comissão mudaram, função da mudança de regimento da Câmara. Logo no início do governo Campos Sales, 1898- 99, o que era basicamente o papel da Comissão de Verificação de Poderes? Era a aplicação de instrumentos jurídicos dentro da própria Câmara para impedir a eleição de deputados, enfim, políticos que eram de oposição aos grupos que controlavam os estados. Como é que isso era feito? Era feito manipulando-se uma série de recursos jurídicos que a comissão tinha e, sobretudo, avaliando se a eleição tinha sido, por exemplo, fraudada. Se tivesse, enfim, se seguido as regras, esses diplomas poderiam ser obtidos através desse controle desses recursos jurídicos e regimentais. A comissão dizia: você não pode tomar posse, você pode, mesmo que um sujeito vencesse, ele, você não pode. Eram escandalosamente, todas essas decisões eram um produto de pura fraude e negociata política, sendo uma via coerência jurídica. Não havia sequer preocupação com a lisura do processo, que havia uma preocupação de impedir que a oposição, oposição, grupos que pudessem criar problemas para o governo federal ou executivos estaduais, tivessem poder na Câmara. Obviamente, no governo Campos Sales, quando lança esse modelo político, ele está lembrando do conflito que marcou a presidência do Deodoro da Fonseca, entre poder executivo e poder legislativo, que ocasionou, em última instância, a renúncia do próprio Deodoro, quando ele tentou fechar o Congresso e se impor como um poder centralizador e, enfim, autoritário. O Congresso reagiu, apoiado em várias oligarquias, e o presidente teve que se retirar. Campos Sales, quando lança essa política, ele praticamente estabelece um convívio à base de fraude, né, para equilibrar o convívio entre elites regionais, o Congresso nacional e poder executivo. Certo nacional presidente da república. Então, o recado é o seguinte: fiquem no poder nos seus estados e garantam apoio aqui na Câmara, que nós também faremos a nossa parte. Algo assim. Ainda bem que essa situação, claro, é tabu no Brasil. Não há fraude, eu tenho que dizer que acabou. Porque também esse modelo carregava em si uma perspectiva de fraude eleitoral sistemática. E como é que essa fraude se dava? À medida que o recado do governo federal era: fiquem no poder de qualquer jeito. Como é que se dava essa fraude? Voto de cabresto, ou seja, o coronel mandava votar num determinado candidato ligado a um determinado grupo político que estava no poder. Aliás, os municípios eram palcos, às vezes, de guerras sangrentas por conta dessas disputas. E como o voto é descoberto, obviamente um eleitor que tivesse juízo não ia votar conforme sua consciência, mas conforme o que mandava. Havia eleitores fantasmas, ou seja, eleitores que tinham morrido mas tinham o título de eleitor. Esses eleitores continuam valendo, então a mesma pessoa votava por 5 ou 6 mortos. E havia adulteração das atas. Aliás, uma prática que vinha já do império, que queria a falsificação das atas eleitorais. Quantos votos tinha essa urna, quem votou, os votos conhecidos, as assinaturas. Adulterar a ata não altera o resultado, são os votos. Até o documento oficial daquela urna, daquela mesa, isso também era adulterado. Eventualmente, se o número real de votos não agradasse o poder hegemônico ali naquele município, naquele estado, até resolver o problema, mudava. Então, vejo ao longo da Primeira República que essa fraude vinha de antes. Está aí uma distorção, eu diria, de Bazzini. O Congresso verifica a lisura do processo que os interessados em verificar a lisura do processo, independente dos deputados serem honestos, já tem um problema de base. O interessado não pode ser responsável por chancelar o processo, tem que ser um olhar externo para verificar a lisura. E da política dos governadores, netheism exatamente começa a dar mais poder ainda ao coronel, que já tinha o poder de fato. Passa a ser um pilar dessa política dos arranjos, porque ela é a base do sistema que passava pela estabilidade dos arranjos regionais, que por sua vez sustentava a dizer-se esse convívio entre as elites. E a manutenção de certas políticas do governo federal, tá voltando aqui para o slide anterior. Vejo então que a gente tem a política dos estados como uma das perspectivas de manejo dessas tensões políticas entre, ligada à outra, a famosa política do café com leite, principalmente a partir da Afonso Pena. É presidente que substitui o Rodrigues Alves, e principalmente mais ainda, é se essa ideia de um arranjo estratégico entre São Paulo e Minas Gerais, o café com leite, fica mais forte ainda com o chamado Pacto de Ouro Fino de 1913, em que essas duas grandes oligarquias resolvem amarrar as pretensões das oligarquias menores e fazer seu candidato, no caso, Wenceslau Braz. Mas a historiografia atualmente também questiona a existência de uma política do café com leite ao longo de todo o período republicano, a Primeira República. E que, vamos dizer assim, isenta de tensões e conflitos. Eu cito o texto que vocês têm hoje como um dos textos-base da aula, que é o texto da Cláudia Viscardi, que está propondo uma releitura desses arranjos políticos entre oligarcas e defende a tese de que não dá para pensar a Primeira República só a partir dessa perspectiva da política do café com leite. Ou seja, São Paulo e Minas Gerais se revezando sem conflitos ou sem maiores conflitos. Ela defende a ideia de que pelo menos seis oligarquias eram fundamentais para se entender a política da República, e do arranjo dessas seis oligarquias dependia a estabilidade ou a instabilidade do sistema político. São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Bahia, e entendo, e Pernambuco, também pensando, incluindo a elite paraibana, que ganha um papel muito importante e um protagonismo nacional muito importante. No máximo, seis ou sete oligarquias regionais devem ser levadas em conta na política nacional, não apenas São Paulo e Minas. A crítica que a Cláudia Viscardi desenvolve no texto que vocês têm aí é prova de hoje. Então ela reconhece um pacto, que em alguns momentos existe entre São Paulo e Minas, mas ela recusa pensar que o café com leite significaria estabilidade do sistema. Que, portanto, quando esse, se essa política do café com leite, de fato, teria sido rompida, seja na sucessão de Washington Luís em 1930, é que a Primeira República teria, sobretudo, teria sobrado, teria, enfim, sido lapidada nessas bases, tenham sido lapidada. A Cláudia arrisca e questiona se essa visão de que só se explica o arranjo oligárquico pela imposição pelo revezamento das duas maiores oligarquias. Então, a outra perspectiva de história política desse período, e outra política que aparece talvez menos conhecida, aos anos nos textos, é, sobretudo, a ideia do ensino médio, é a chamada política das salvações. Que foi uma política imposta pelo presidente Hermes da Fonseca, o presidente que foi eleito em 1910 e ficou no governo até 1914, militar, sobrinho-neto do marechal Deodoro da Fonseca, muito influente no exército e que, quando sob a presidência, promete a volta da República da Espada, como era conhecida a República nos primeiros anos, na época do marechal Floriano Peixoto. É Hermes da Fonseca, então, o seguinte: olha, nada disso está garantindo artificialmente as elites dos estados. Ligado, que os estados em troca de apoio, nós vamos impor um rodízio de poder nos estados, para que, porque ele entende, obviamente, que esse arranjo favorecia principalmente a oligarquia paulista. Ao fim e ao cabo, ele vai dizer: não, nós vamos propiciar um rodízio de poder real nos estados, nem que, para isso, tenhamos que fazer intervenção militar em caso de fraude eleitoral, em caso de conflito entre os grupos estaduais. O que é, obviamente, o que efetivamente ocorreu. E é claro que o recado era para a elite paulista que não o apoiou, apoiou o candidato derrotado Rui Barbosa nas eleições. Mas, ao fim e ao cabo, a política das salvações também ficou muito reduzida aos estados pequenos, os estados menos poderosos. Aí do norte, principalmente, no chamado nordeste, que hoje chamamos de nordeste. Então, causou, é causou as intervenções patrocinadas pelo governo federal acabaram causando uma série de conflitos dentro das oligarquias, no Ceará, na Bahia, sobretudo, e acabou não conseguindo diminuir o poder das grandes oligarquias, principalmente Minas Gerais e São Paulo. São Paulo, o exército tinha condições de fazer uma intervenção militar porque as forças públicas nesses estados eram virtualmente mais poderosas, mais bem equipadas que o exército nacional. E os partidos republicanos desses estados, o PRM, o PRP, eram agremiações políticas muito organizadas, com uma burocracia interna sofisticada e, portanto, que acabavam despersonalizando o poder do coronel de base, criando um mecanismo político mais sofisticado nesses estados de manutenção dos interesses políticos. Então, a política das salvações nos estados que efetivamente dominavam as ligas, que dominavam a multinacional, foram ineficazes. Em compensação, criou uma desorganização política nos estados, sobretudo, no nordeste. Mas vejam, todas essas três políticas, em grande parte, respondem a formas mais ou menos bem-sucedidas de reorganizar o convívio dos estados com o poder nacional. De reorganizar, por exemplo, a sucessão presidencial que tinha um problema porque, no Império, não tinha esse problema. Quem sucede o rei ao filho do rei é quem de direito, cabe ao trono. Agora, numa república, qualquer um pode ser postulante. Se você não tem vida partidária organizada, a população é muito personalista ou passa por arranjos, enfim, regionalistas, arranjos de bairros sociais, que às vezes correm por fora dos partidos. É o caso aqui da República brasileira, ela, ela, na verdade, fez convergir lideranças pessoais, partidos políticos regionalizados que procuraram organizar os interesses das elites, das oligarquias estaduais, em torno de um candidato presidencial, além, é claro, das revoltas sociais e das ameaças, enfim, de um levante de um movimento popular que poderia tentar destruir a ordem estabelecida por meio da introdução do sindicalismo e do socialismo que estavam tentando se organizar na época. Então, até que ponto essas três políticas do governo federal durante a Primeira República, até que ponto elas garantiram a estabilidade política do país e o fim das crises regionais e o equilíbrio entre os estados, é uma questão a se perguntar. Eu diria que garantir o equilíbrio entre os estados nunca houve, ou seja, os interesses dos estados, cada uma dessas políticas é uma resposta às crises, ou seja, quando o governo federal propõe essas políticas é porque está vivendo uma crise com as elites estaduais e precisa resolver para governar.