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INSURREIÇÕES TRANSNACIONAIS E NOVOS ATIVISMOS POR JUSTIÇA

SOCIAL

PROBLEMA

A problemática a ser estabelecida é a seguinte: De que forma as insurreições políticas


contemporâneas afetam à compreensão, efetivação e eficácia de justiça social e dos direitos
humanos?

JUSTIFICATIVA

As insurreições políticas contemporâneas estão assumindo uma narrativa central nos


processos de disputa pelo espaço público de aparição, nos quais os corpos precários marcados
por gênero, raça, etnia, sexualidade e territorialidade têm protagonizado papel de destaque
nesses acontecimentos. Isto significa dizer, que movimentos políticos plurais têm produzido
novas estratégias, em que sujeitos não hegemônicos passam a ocupar a posição privilegiada
ao questionar as práticas estatais, os modos de vida e a própria concepção de justiça social.
Dessa forma, ao alinhar-se a essas interrogações, o presente projeto tem por objetivo
investigar os levantes políticos transnacionais contemporâneos – a partir de epistemologias
plurais, como os estudos feministas, teorias queer, da teoria crítica da raça e do pensamento
decolonial – e compreender em que termos as demandas por justiça social estão sendo
reivindicadas pelas atuais expressões de ativismo político. Para tanto, busca-se examinar,
através da análise dos levantes políticos contemporâneos latino-americanos – a exemplo dos
levantes mais recentes ocorridos a partir de 2015 no Chile, Equador, Bolívia, Colômbia, Costa
Rica, Nicarágua, Guatemala – de que maneira as insurreições políticas recentes, promovidas
pelos feminismos e pelas lutas étnicas e antirracistas, podem servir de impulso para uma
mudança radical nas interpretações de “Justiça” em termos de garantia e efetividade dos
direitos humanos transnacionais.Compreende-se a relevância da presente investigação,
considerando que os movimentos feministas, as lutas antirracistas e as experiências dos
chamados novos movimentos sociais têm produzido práticas de resistências e novas
semânticas para compreender as relações de poder que organizam a distribuição desigual dos
corpos ao redor do mundo.
Essas experiências passaram a apontar, em especial, os limites dos governos
representativos e da capacidade estatal em responder a anseios sociais. Nesse tom, as
insurreições políticas g-locais têm assumido uma posição singular em construir alianças sem
fronteiras, questionar o status normativo das democracias e desenvolver novo arsenal teórico-
analítico para a chamada “justiça social”.
As “políticas de insurreição” nos anos recentes, conectado à pluralidade de corpos
que reivindicam enunciação no espaço público durante esses levantes, têm demonstrado como
a linguagem sobre “política”, “democracia”, “direitos”, “justiça” hegemônica é incapaz de ser
assimilada pela gramática dos Estados e de que a própria percepção dos contornos políticos
das democracias contemporâneas atravessa posições de autoridade e violência. Tais
evidências passaram a tensionar os termos do que é justiça.
É desde esse contexto que o presente projeto se justifica. A justificativa para propor
uma investigação sobre como os movimentos contemporâneos estão se organizando, baixo a
qual semântica e através de quais formas de aliança, nos serve como ponto de partida para
cartografar essas experiências e identificar as reivindicações mais substanciais hoje em termos
de justiça social e direitos humanos.
Ao considerarmos a Teoria Crítica dos Direitos Humanos e a urgência de pluralizar
as vozes, move-nos aqui o interesse em ampliar os mecanismos para pensar os problemas da
Justiça para além do modelo jurídico-estatal. Essas formas “tradicionais” de enfrentar os
conflitos e os problemas sociais se apresentam hoje não só como insuficientes e ineficazes,
mas também como forjadas pelos contornos hierárquicos contra os quais se combate. Dessa
forma, se a tensão atravessa o próprio conjunto normativo que produz o Direito, manter
imóvel a interpretação sobre os conflitos e sobre os direitos humanos gera a incapacidade de
construir novas respostas àquilo que os contextos atuais nos têm exigido.
Esse panorama parece interpelar a urgência de compreender que os limites
evidenciados pelas complexas provocações produzidas pelas insurreições recentes não podem
ser reduzidos aos termos de baixa intensidade da justiça institucional e das “reformas
políticas” tradicionais. Assim, propor investigação sobre práticas e saberes que emergem em
diversos locais do mundo exige compreender como esses movimentos se articulam, quais
saberes dão suporte a essas experiências e quais são as reivindicações compartilhadas entre
eles, para que, dessa forma, se possa formular novos critérios de compreensão, efetivação e
eficácia de justiça social e dos direitos humanos.
OBJETIVOS

Objetivos Gerais: O objetivo geral do presente projeto é investigar os levantes


políticos transnacionais contemporâneos – a partir de epistemologias plurais, como os estudos
feministas, teorias queer, da teoria crítica da raça e do pensamento decolonial – e
compreender em que termos as demandas por justiça social estão sendo reivindicadas pelas
atuais expressões de ativismo político.

Objetivos Específicos:
a) Mapear os levantes transnacionais ocorridos na América Latina a partir do ano de
2015, como expressões de novas formas de reivindicação política;
b) Desenvolver uma cartografia de experiências de insurreição na América Latina – a
exemplo de Chile, Equador, Bolívia, Colômbia, Costa Rica, Nicarágua, Guatemala – e sua
relação com a criação de novos parâmetros para justiça social;
c)Rastrear as semânticas envolvidas na categoria “insurreição” e “justiça social”
através de revisão bibliográfica e narrativas dos movimentos sociais e grupos vulneráveis
relacionados aos levantes;
d) Definir campo teórico da “insurreição” em termos de Direitos Humanos e Justiça
Social;
e) Percorrer as epistemologias plurais e os saberes localizados como fonte de
interpretação teórico-analítica das insurreições como epifenômenos de diversas lutas
capilarizadas e territorializadas;
f) Promover ações colaborativas com grupos que desenvolvem práticas de autonomia
e auto-organização a fim de desenvolver material em termos de Direitos Humanos e justiça
social que se aproxime da linguagem produzida pelas experiências atuais de ativismo.

METODOLOGIA

Tendo em vista o projeto exploratório proposto, é necessário desdobrar um


conjunto de atividades, por um lado, para coletar informações, visualizar cenários e temas e,
por outro lado, analisar qualitativamente os dados coletados e produzir conhecimento
científico a ser produzido como relatório de investigação. Para tanto, propomos investigar
casos emblemáticos de insurreição popular a partir do ano de 2015.
A análise de caso não será utilizada apenas dentro de uma lógica comparativa,
mas como uma ferramenta para melhor compreender o fenômeno, ou seja, cada caso é único,
mas pertence a um conjunto de casos que possuem características em comum. Nessa
perspectiva, serão selecionados alguns casos levando em consideração as distinções coletivas
entre as pessoas envolvidas e os marcadores de diferenças ligadas aos movimentos, a
importância que o caso teve na mídia e no debate político internacional, a atenção e o
ativismo dado ao caso e as reações promovidas institucional e popularmente aos levantes, por
fim, o andamento das medidas institucionais (deposição de cargos políticos, novas regulações
legislativas, medidas repressivas agudas) produzidas para corresponder aos levantes
populares.
Ao mesmo tempo, os casos serão selecionados para mapear as insurreições e
produzir uma cartografia das experiências, buscando identificar a transnacionalidade dos
eventos, assim como suas particularidades em termos de política auto-organizada e
reatividade institucional. Ainda, a necessidade de revisão bibliográfica coloca-se a qualquer
pesquisa com a função de conhecer e explorar as principais contribuições teóricas sobre o
tema relacionado aos problemas propostos. Tal necessidade prevê a urgência permanente de
um conhecimento prévio do estágio em que se encontra a pesquisa sobre determinado assunto
e as ramificações possíveis de diálogo entre aquilo que já se tem desenvolvido e o que se
propõe a formular como novos olhares. Porém, a pesquisa bibliográfica não esgota as
possibilidades analíticas, mas as amplia.
Por tais razões, é fundamental incluir entre as etapas deste trabalho o
levantamento bibliográfico relacionado às teorias feministas, ao pensamento pós e decolonial,
aos estudos de gênero e teoria queer e à teoria crítica da raça e conhecimentos de matrizes
africanas e afro-brasileira. Ainda, será realizada revisão bibliográfica específica sobre a ideia
de “insurreição”, buscando-se as referências citadas nos principais trabalhos, obras e artigos
produzidos a partir dos levantes recentes.
Assim como, utilizar-se-á como recorte para seleção do material bibliográfico a
ser revisado, as obras e referências utilizadas, diretamente mencionadas ou através de
mapeamento conceitual, pelos personagens envolvidos nas ações políticas investigadas.
Trabalharemos também com técnicas de coleta de dados qualitativos e nossas principais
fontes serão a análise dos manifestos e convocatórias (redigidas por escrito ou produzidas em
vídeo) para realização dos levantes populares.
Buscar-se-á identificar quais termos e semânticas, que envolvem a noção de
“justiça social”, estão sendo produzidas e utilizadas para estimular a participação popular
multitudinária nas ruas e novas formas de ativismo social.
RESULTADOS E CONCLUSÕES

Até o envio deste resumo expandido, realizou-se pesquisa de perfis através da


plataforma Instagram. Foram analisados perfis, primeiro, de mulheres que auxiliaram na
construção do livro “Chile em Chamas”. Após, a análise concentrou-se em perfis relacionados
ao movimento feminista 8M.
Dos perfis analisados até então, conclui-se que eles alternam suas publicações,
que vão desde fotos em levantes relacionados às revoltas políticas e sociais ocorridas no Chile
a partir do ano de 2019, a artigos adicionados na nova Constituição, além de pedidos e críticas
sobre igualdade, violência obstétrica e imagem do corpo feminino como “padrão”
(gordofobia).
Nos perfis encontrados, foram constatados alguns pontos em comum entre todas
as mulheres analisadas: (1) favoráveis ao “apruebo”, isto é, o pedido de uma nova
Constituição; e (2) a luta por leis que incluam mulheres na sociedade e que sejam protegidas.
Percebe-se, desta forma, o quão patriarcal é Constituição chilena até então
vigente, resultando em uma política desigual, regida pelo heteropatriarcado.
Outrossim, oportuno ressaltar que se trata de hipótese preliminar, visto que o
caminho da pesquisa deste trabalho ainda não foi concluído.

PALAVRAS-CHAVE: América Latina. Insurreições. Justiça Social. Levantes


Transnacionais.

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