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Origens do turismo religioso no Brasil

O Brasil foi descoberto pelos portugueses em 1500, ano em que foi celebrada a primeira missa no
país. Desde esse primeiro momento, a Igreja esteve presente na fundação das novas cidades,
catequizando a população e lançando os alicerces de fé e devoção sobre os quais o turismo
religioso iria de desenvolver nos séculos seguintes.

De Norte a Sul do Brasil se desenvolveram núcleos populacionais que depois se tornaram


grandes destinos de turismo religioso, seja pelo formidável acervo de patrimônios sacros, como
em Salvador, Olinda e as cidades barrocas de Minas Gerais ou pelo surgimento de devoções
como em Aparecida, Belém e Trindade.

No interior do Sul do país, os padres jesuítas implantavam as suas Missões Jesuíticas para
catequizar a população indígena, criando um rico patrimônio sacro que se estendeu por toda a
região Sul do continente.

A chegada da mão de obra escrava, prontamente catequizada, deu origem a versões próprias das
festas e procissões católicas, que resistem até hoje e serviu de base para o nascimento do
sincretismo religioso, com religiões e práticas que misturam santos católicos às práticas africanas.

O turismo religioso no Brasil

Podemos dizer que o turismo religioso começou no Brasil ainda no período colonial. Por mais que
as igrejas estivessem entre as primeiras edificações de cada povoado, vila, usina de açúcar,
fazenda ou cidade, não havia padres suficientes para celebrar as missas e ministrar os
sacramentos em todas elas. Por isso era comum que as pessoas fossem para as cidades maiores
para participar das procissões e festas religiosas, que costumavam durar mais de um dia.

Poucas décadas depois do descobrimento do Brasil têm início duas festas religiosas que
continuam sendo realizadas até hoje: a de Nossa Senhora da Conceição da Praia, em Salvador,
na Bahia, celebrada desde 1549, e a de Nossa Senhora da Penha, em Vila Velha, no Espírito
Santo, celebrada desde 1570.

A primeira é atualmente uma festa de dimensão local, mas a Festa da Penha, que comemorou em
2022 a sua 452ª edição, costuma atrair mais de dois milhões de fiéis de todo o estado e é uma
das três maiores festas religiosas do país.

A devoção a Nossa Senhora da Penha no estado do Espírito Santo teve início em 1558, quando
frei Pedro Palácios levou de Portugal para a cidade de Vila Velha um quadro de Nossa Senhora
das Alegrias e passou a reunir os moradores para rezar numa gruta ao pé de um morro de 154
metros de altura, na região da Prainha.
Segundo a tradição, por diversas vezes o quadro sumiu e depois era sempre encontrado no alto
do morro. O frade entendeu que devia construir uma capela no topo do morro e mandou vir de
Portugal uma imagem de Nossa Senhora.

Como a capela ficava no alto de uma "penha", termo que na época era usado para descrever uma
grande rocha isolada e saliente, ou um rochedo, logo a imagem passou a ser conhecida como
Nossa Senhora da Penha.

Quase dois séculos mais tarde começaram a ocorrer fatos que geraram devoções que evoluíram
para se tornarem motores de desenvolvimento do turismo religioso no Brasil.

Círio de Nazaré

A primeira delas teve origem em 1700, na então cidade de Vigia de Nazaré, hoje Belém, onde o
caboclo Plácido encontrou junto a um riacho (igarapé) uma pequena imagem de Nossa Senhora
de Nazaré entalhada em madeira.

Ele a levou para a sua casa, a limpou e improvisou um altar. Segundo a tradição, diversas vezes a
imagem sumiu desse altar e foi encontrada junto ao riacho, no mesmo local onde tinha sido
achada. Plácido acabou entendendo que isso era um sinal divino e construiu nesse lugar uma
capelinha para abrigar a imagem.

A divulgação do milagre da imagem atraiu a atenção dos habitantes da região, que passaram a
visitar a capelinha até atrair a atenção do governador da Capitania do Grão-Pará, que transferiu a
imagem para a capela do Palácio da Cidade. Mesmo vigiada pela guarda do Palácio, a imagem
voltou a sumir e reapareceu na pequena capela construída por Plácido junto ao riacho.

Anos mais tarde, o governador da época ficou muito doente, e como não melhorava, foi
aconselhado a pedir a Nossa Senhora de Nazaré que o curasse. Ele fez isso e prometeu que se
fosse curado iria fazer uma procissão em homenagem à santa, transportando a imagem da capela
do Palácio à Catedral. Foi curado e cumpriu a sua promessa.

O Círio de Nazaré, festa em honra de Nossa Senhora de Nazaré, foi instituído em oficialmente em
1793. Desde então, a devoção só aumentou e hoje a festa, coroada com uma procissão no
segundo domingo de outubro de cada ano, atrai mais de dois milhões de romeiros a Belém, no
Norte do Brasil, e é considerada a maior procissão católica do mundo. Desde 2013, é Patrimônio
Cultural da Humanidade pela UNESCO.

Embora a festa em si dure pouco menos de uma semana, incluindo diversas procissões, inclusive
uma naval, a preparação espiritual da população começa seis meses antes e a artística se
estende por semanas depois da última procissão, no segundo domingo de outubro. Entre outras
curiosidades do Círio de Nazaré, podemos citar a quantidade de cartazes impressos – mais de um
milhão-, o início da última procissão às 7h00 para driblar o calor de até 40 graus durante o dia e o
costume de decorar casas, empresas e até bancos com a imagem de Nossa Senhora de Nazaré

Nossa Senhora Aparecida

Em 1717 um fato reputado como milagroso deu início à maior devoção do Brasil. Um governador
português iria passar pela cidade de Guaratinguetá, no Sudeste do Brasil, e, conforme o costume,
a cidade devia lhe oferecer um banquete. Três pescadores da mesma família foram encarregados
de pescar peixes para alimentar os participantes. Passaram um dia suas redes no rio, sem
conseguir pescar nada.
Quando já estavam cansados de tantas tentativas resolveram lançar a rede uma última vez e
desta vez, em vez de peixe, ela trouxe uma imagem em barro de Nossa Senhora do Carmo, mas
sem a cabeça. Voltaram a lançar a rede logo depois e desta vez o que veio foi a cabeça da
imagem. Com a imagem completa dentro do barco, lançaram a rede mais uma vez e agora quase
não conseguiram puxá-la de volta para dentro do barco, de tantos peixes que tinham sido
capturados.

A imagem que tinha aparecido em suas redes (daí o Nossa Senhora Aparecida) foi colada e
colocada num pequeno altar na casa da família, em agradecimento pelo milagre dos peixes. A
partir de então, todos os sábados os moradores da região iam lá para rezar o terço e cantar uma
ladainha. Com o aumento do número de devotos, em 1732, foi construído um oratório aberto ao
público.

Como a devoção continuava a crescer, em 1740 foi construída uma pequena capela, onde as
velas queimavam noite e dia. Em 1743 foi autorizada pela Igreja a construção de uma igreja
dedicada à imagem, que era chamada de Mãe Aparecida. Ela foi inaugurada em 1745 e se
mantém no mesmo local até hoje, depois de diversas reformas e restaurações, sendo conhecida
como Basílica Velha.

Graças ao grande volume de turistas que recebeu, o povoado onde moravam os pescadores foi
crescendo e hoje é a cidade de Aparecida, visitada anualmente por mais de onze milhões de
devotos, o que a torna o segundo destino de turismo religioso mais visitado do mundo, só atrás da
Cidade do México, onde fica o Santuário da Virgem de Guadalupe.

Para acomodar tantos visitantes, foi construído um novo Santuário dedicado Padroeira do Brasil,
um projeto com números impressionantes: ocupando uma área total de 1,352 milhões de metros
quadrados. A Basílica pode receber até 43 mil pessoas de uma só vez e tem 23.300 m² de área
construída. O estacionamento de 272.000 m² comporta 2 mil ônibus e 3 mil automóveis e tem
áreas específicas para acomodar motor homes e cavalos.

O Santuário foi consagrado oficialmente em 1980 pelo Papa São João Paulo II e depois recebeu a
visita de outros dois papas: Bento XI e Francisco. A Basílica Velha é ligada ao Santuário por uma
passarela para pedestres, a Passarela da Fé, que tem 392,2 metros de comprimento.

Atualmente o Santuário está recebendo em suas quatro fachadas (Norte, Sul, Leste e Oeste)
painéis em mosaico criados e executados pelo padre Marko Ivan Rupnik, considerado o principal
artista sacro da atualidade. A primeira fachada, a Norte, já foi inaugurada e tem 3.840 m2 de
mosaicos. A segunda, na face sul, os mosaicos estão sendo instalados e devem ser apresentados
em 2023. As obras devem continuar até 2025, com a conclusão das quatro fachadas. Quando
concluído, o exterior do Santuário deverá ter 12.970 m2 de mosaicos criados pelo padre Rupnik, o
maior conjunto de obras desse artista em um mesmo local no mundo todo.

Outros destinos e celebrações

O Brasil ainda reúne outras importantes celebrações e destinos de turismo religioso, como o
patrimônio colonial das igrejas de Salvador, na Bahia, primeira capital do Brasil, as igrejas
coloniais das cidades históricas do estado de Minas Gerais, procissões como a do Fogaréu, no
estado de Goiás, e festas como a do Divino Pai Eterno, em Trindade, também em Goiás, que atrai
mais de quatro milhões de pessoas no primeiro final de semana do mês de julho de cada ano.
O turismo religioso no Brasil não vive só de tradições. Iniciativas recentes também merecem
destaque, como os eventos da Canção Nova, que atraem mais de 1,2 milhão de fiéis e a Rota da
Fé, que percorre as estradas do estado do Paraná, reunindo centenas de pessoas e famílias
inteiras em cada edição. A Rota da Fé já teve mais de sessenta edições realizadas!

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