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POLÍCIA MILITAR DA PARAÍBA

DIRETORIA DE ENSINO
CENTRO DE ENSINO
CURSO DE GERENCIAMENTO DE CRISES

Disciplina: Rebelião em Estabelecimentos Prisionais

LEONARDO PAREJA, O SEQUESTRADOR QUE RIDICULARIZOU A POLÍCIA, É


ASSASSINADO NA CADEIA POR SEUS COMANDADOS

A vida do bandido que quis transformar sua biografia num autêntico filme policial
chegou ao fim às 7h20 da segunda-feira 9. Leonardo Rodrigues Pareja, 22 anos, foi
assassinado no final de um corredor do Centro Agroindustrial de Goiás (Cepaigo) por um
grupo de presidiários que desferiu uma facada e disparou sete tiros à queima-roupa com
uma pistola automática calibre 45. O final infeliz de Pareja era desejado pelos
personagens principais da trama que ele mesmo armou. Nos últimos 15 meses, o
assaltante goiano ridicularizou a polícia em fugas espetaculares e, dentro do Cepaigo,
passou a incomodar os companheiros de prisão com seu comportamento de estrela. Nos
depoimentos que prestaram após a execução, os assassinos afirmaram que praticaram o
crime porque Pareja fez papel de dedo-duro e delatou à direção do presídio um plano de
fuga dos detentos. "Estávamos cansados de ser humilhados por ele", desabafou
Eurípedes Dutra, autor dos tiros. "Aqui dentro estou seguro, tenho o controle completo de
minha vida", disse Pareja em entrevista concedida ao SBT dez dias antes de morrer.

A intuição de Leonardo Pareja falhou. A facada no pescoço que antecedeu os sete


tiros à queima-roupa foi um golpe certeiro lançado por Eduardo Rodrigues de Siqueira, o
"Eduardinho", considerado por Pareja seu último braço direito dentro da prisão.
Curiosamente, o destino do assaltante acabou selado com a ajuda de uma arma que lhe
pertencia. Segundo a versão dos assassinos, um mês antes de sua morte, o seqüestrador
havia comprado uma pistola automática ao preço de R$ 2 mil das mãos do agente
penitenciário Sérgio Luciano de Almeida e a guardava dentro de uma cela onde só
entravam ele e seus comparsas. Na manhã da segunda-feira, Eduardinho levantou
disposto a executar o companheiro de vida bandida, fumou três cigarros de merla,
derivado de coca, e roubou a pistola de Pareja.

A confissão dos presidiários não descarta, entretanto, o envolvimento de policiais


na morte do assaltante que fazia tudo para atrair os holofotes. A polícia tinha motivos de
sobra para ficar irritada. As peripécias de Pareja começaram em setembro de 1995. Após
assaltar um apartamento em Salvador, ele manteve como refém por três dias uma menina
de 16 anos e, durante mais de um mês, desafiou a polícia telefonando para rádios e
brincando de esconde-esconde numa fazenda em Goiás. Nesse episódio, chegou a ficar
a poucos passos dos policiais mergulhado dentro de um rio camuflado com o rosto sujo
de barro. Na seqüência, foi reconhecido numa igreja evangélica em Aparecida de Goiânia
(GO), trocou tiros com policiais e, mais uma vez, escapou. Em outubro do ano passado,
entregou-se à Justiça dizendo que tinha medo de ser morto durante a prisão. No início de
abril, assumiu o comando de uma rebelião de seis dias em que ele e outros 43 presos
fugiram com seis reféns, todos integrantes da alta cúpula do Poder Judiciário de Goiás.
Poucas horas depois da fuga, Pareja entregou-se novamente à Justiça dando proteção a
um dos reféns, Aldo Guilherme de Freitas, filho do presidente do Tribunal de Justiça de
Goiás, desembargador Homero Sabino. Pareja aproveitou a fama nacional conquistada
durante a rebelião para assumir o papel de líder dos presos, passando a controlar o
comércio ilegal dentro do presídio, que conta com a conivência dos agentes
penitenciários, segundo os presos. "Não quero citar nomes, mas quase todos os
funcionários do presídio abastecem o comando dos detentos com armas e drogas", disse
Eduardinho a ISTOÉ na quarta-feira 11. O poder de Pareja passou a ser um problema
maior para a polícia quando ele começou a usar o prestígio de comandante dos detentos
para acumular dinheiro. "Um bandido com poder e dinheiro dentro de um presídio torna-
se uma ameaça ao sistema penitenciário", explica o desembargador Homero Sabino.
Além do dinheiro que entrava através do comércio ilegal, o assaltante conseguia
aumentar seu capital com a venda do livro Vida bandida, sobre sua trajetória, e
entrevistas concedidas à imprensa estrangeira. Nos últimos dias de sua vida, Pareja
realmente levou uma vida de galã. No domingo 8, véspera de sua morte, teve um dia
especial. Recebeu em sua cela a visita da namorada, Vanessa Ferreira Fagundes,
acompanhada de duas fãs, e passou o dia tocando violão e cantando. Enquanto posava
para fotografia ao lado das três e do namorado de uma delas, fez bravatas a respeito de
um futuro plano de fuga e apresentou aos visitantes como seu braço direito o detento
Eduardinho, que no dia seguinte ajudaria a matá-lo. Definitivamente, não era um preso
comum. Desfrutava de mordomias como televisão e aparelhagem de som e distribuía
tarefas para os demais presidiários, inclusive a limpeza de sua cela. Também tinha sob
seu comando um grupo de 28 "robôs", presos que se submetiam às suas ordens e
atuavam como seguranças de juízes que fiscalizavam as condições do Cepaigo. Outro
costume de Pareja era ofertar suas amantes para os amigos mais chegados.

O destino colaborou para o marketing de Pareja até no dia do seu sepultamento. O


corpo do bandido foi enterrado no cemitério "Parque Memorial" na terça-feira 10 de
dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos. A coincidência motivou o
representante do movimento "Tortura Nunca Mais" de Goiânia, Valdomiro Batista, a
colocar sobre o caixão uma bandeira do Brasil. A iniciativa foi considerada um abuso pelo
comandante do batalhão de choque da Polícia Militar de Goiás, tenente Nilton Neri de
Castilho. "Isso é um desrespeito", afirmou o policial depois de ordenar a retirada da
bandeira. "Não podiam fazer isso com um homem que se tornou um símbolo de Goiás.
Todo detento tem o direito à vida", disse Batista. Duas horas antes do sepultamento,
havia acontecido outra cena de pastelão mexicano. Uma tia do morto não gostou de ver
Vanessa Ferreira Fagundes dar entrevistas durante o velório se dizendo "viúva" de Pareja
e partiu para cima com tapas e empurrões. Vanessa perdeu a batalha e terminou
assistindo ao enterro enrolada numa bandeira a mais de 30 metros de distância.

Com tantos lances cinematográficos na vida real e até no próprio enterro, Pareja
vai ressuscitar nas telas em um longa-metragem dirigido pelo ator Reginaldo Farias, que
encarnou o bandido Lúcio Flávio Villar Lírio numa produção do final da década de 70. Tão
espetacular quanto à história de Lúcio Flávio, o passageiro da agonia, o roteiro do filme
policial de Pareja contou com a colaboração do personagem principal ao longo do últimos
meses. Admirador de Al Pacino, Pareja inspirou- se no filme Scarface para levar sua vida
bandida. "Ele era um bandido cruel e humano ao mesmo tempo", dizia Pareja, o menino
classe média, que falava inglês e teve aulas de piano, mas escolheu como cenário o
mundo do crime.

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