Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
O vídeo de November Rain marcou uma geração. Fique por dentro de sua produção
incomum.
Para o baterista Dave Grohl, “November Rain” foi um desastre, como ele conta
em “I Want My MTV: The Uncensored Story of the Music Video Revolution,” (trad: “Eu
quero minha MTV - as histórias sem censura da revolução dos vídeos musicais”),
produzido por Craig Marks (agora editor de música pop do jornal inglês The Times) e
Rob Tannenbaum. “Quando um músico começa a usar o termo ‘mini-filme’ para
descrever um vídeo, é hora de parar”.
No Video Music Awards em setembro daquele ano, quando Axl Rose e Kurt
Cobain protagonizaram a famosa briga nos bastidores, o Guns N’ Roses recebeu o
Prêmio Michael Jackson De Vídeos Contemporâneos, uma espécie de Oscar da MTV.
Porém o vídeo ganhou apenas em uma das categorias, cinematografia. Uma mudança
importante estava acontecendo: o hard rock, decadente, dava lugar para o ascendente
grunge. Uma outra mudança significativa: alguns meses antes do lançamento de
“November Rain”, o seriado The Real World passou a ser exibido na MTV americana.
Ao longo da década, os vídeos musicais superproduzidos foram desaparecendo e
surgiram programas simples, gravados praticamente sem roteiro ou planejamento. Deste
modo, “November Rain soava um pouco como o último dos dinossauros antes do meteoro
que foi o grunge e tudo o mais que aconteceu à indústria da música, graças ao
compartilhamento de arquivos na internet”, explicou Mike Southon, um dos dois
cineastas que captaram o vídeo.
O fato é que passados trinta anos, “November Rain” segue reinando. Em 2018, se
tornou o primeiro vídeo produzido antes do surgimento do YouTube a alcançar um bilhão
de visualizações. Em junho de 2022 já tinha sido visto 1.9 bilhões de vezes, mais do que
qualquer outro vídeo dos anos 80 e 90. De acordo com o ranking da MTV, é o terceiro
melhor clipe de todos os tempos.
Os vídeos musicais se tornaram mais acessíveis – basta dar uns cliques em um
smartphone – e menos influentes. Por isso, “November Rain” representa um exemplo
duradouro da época em que este tipo de mídia dominava.
Este vídeo ganhou diversas paródias, inspirou casamentos temáticos, um podcast
sobre o tema e ao menos uma fragrância de vela. Entre os fãs dele estão Sofia Coppola,
que tentou adquirir os storyboards originais de Morahan “porque o clipe é épico e
glamouroso”, contou recentemente à revista Vice (publicada nos EUA e Canadá). Outro
fã é Donald Trump, que quando presidente, fez os funcionários da Casa Branca assistirem
ao vídeo por acreditar ser este o melhor de todos os tempos.
“November Rain” se tornou para os vídeos de música o que Titanic é para os
filmes – um título no topo, talvez até bobo, mas inegavelmente eficiente, um campeão
romântico que continua a ser exibido e a provocar grande especulação mesmo décadas
depois de ter sido lançado.
Quando a banda entrou em contato com Morahan, ele já era um diretor famoso,
responsável por vídeos de George Michael e Elton John.
pareiaki
O vídeo enigmático da música “Father Figure”, do George Michael, que retrata
um affair entre uma modelo e um motorista de táxi, interpretado pelo próprio, chamou a
atenção de Axl Rose. O cantor procurava por alguém com sensibilidade cinematográfica
para produzir uma trilogia de vídeos para canções ambiciosas que ele compôs,
pertencentes aos álbuns “Use Your Illusion” I e II.
A história que Del James escreveu bem antes de “November Rain” ser lançada é
sobre um rock star extravagante chamado Mayne Mann (evidentemente baseado em Axl)
que fica desnorteado após o suicídio da ex-namorada. “Eu basicamente era aquela
pessoa”, Axl escreveu na introdução do conto para o livro “The Language of Fear” (A
Linguagem do Medo). A história termina com Mayne tocando ao piano “Without you”,
sucesso musical inspirado no fim da relação, enquanto seu apartamento é tomado por
chamas.
Na era análoga de 1992, esta explicação não estava disponível ao telespectador
casual da MTV. Eu, como fã hávido de Guns N’ Roses, não sabia que James era um
escritor ainda não publicado ao tentar encontrar o livro dele na biblioteca da minha
cidade. Além disso, as semelhanças do conto com o vídeo são poucas.
Para os que por algum motivo esqueceram os pontos chave do clipe, aqui vai um
resumo para refrescar a memória: o início se dá num quarto com pouca luz, onde Rose
toma uns comprimidos. A cena seguinte é a de um teatro lotado e a banda tocando ao
vivo, acompanhada por uma orquestra. Numa igreja pitoresca, Stephanie, usando um
vestido curto, se casa com Axl. Eles dão um beijo escancarado e, sob chuva de pétalas,
embarcam em um conversível branco vintage. Um olhar preocupado no rosto da noiva
sugere que nem tudo vai bem no relacionamento.
A banda estava em crise quando o vídeo para “November Rain” foi gravado,
explica Morahan. “Eles só queriam trabalhar à noite. Então mesmo que houvesse no
cronograma gravações para serem feitas durante o dia, havia boa chance deles não
aparecerem antes do sol se pôr”. Por meio de tentativas e erros, o diretor descobriu que a
melhor forma de filmar durante o dia era manter os membros da banda trabalhando a
noite toda e produzir uma certa falta de continuidade – como, por exemplo, o fato de Axl
Rose estar ao lado do caixão, no cemitério, à noite, apesar do funeral ter acontecido
durante o dia.
Southon, que filmou a apresentação da banda ao vivo para o vídeo, contou que
ficava o dia inteiro no teatro equipado com oito câmeras e lotado de figurantes esperando
a banda chegar. “Quando dava umas três da manhã, o assistente de direção vinha e
informava: ‘não vai dar’, e não filmávamos nada”. Eles tiveram que organizar tudo de
novo, em um outro local, e quando colocaram as câmeras para funcionar, deu tudo certo.
“O êxtase que você sente compensa tudo”, explica. Ele também foi o câmera no vídeo de
“Freedom 90” do George Michael.
Meredith Blake