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CADERNOS IPP UR

IPPUR
Ano X XXX, N o 1
Jan
Jan-- Jul 2006
Indexado na Library of Congress (E.U.A.)
e no Índice de Ciências Sociais do IUPERJ.

Cadernos IPPUR/UFRJ/Instituto de Pesquisa e Planeja-


mento Urbano e Regional da Universidade Federal
do Rio de Janeiro. – ano 1, n.1 (jan./abr. 1986) –
Rio de Janeiro : UFRJ/IPPUR, 1986 –

Irregular.
Continuação de: Cadernos PUR/UFRJ
ISSN 0103-1988

1. Planejamento urbano – Periódicos. 2. Planejamen-


to regional – Periódicos. I. Universidade Federal do Rio
de Janeiro. Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano
e Regional.
As cidades e as apropriações
sociais das mudanças climáticas

Henri Acselrad

Segundo conhecimento corrente, os ecológicos que interligam ecossistemas


processos de urbanização afetariam as e permitem fluxos genéticos, e no clima,
dinâmicas ecológicas em função dos através da emissão de gases-estufa e de
padrões de distribuição das cidades no mudanças que podem provocar na ra-
espaço, dos padrões de distribuição das diação solar, na temperatura, na velocida-
atividades no interior das próprias cidades de e direção dos ventos, nos índices de
e da dimensão atingida pelas manchas precipitação e umidade (Mota, 1999).
urbanas. A expansão dessas manchas Os impactos da urbanização podem,
provoca alterações de cobertura vegetal, assim, ser caracterizados a partir da con-
aterramento de mangues, impermeabi- figuração material das cidades em sua
lização de solos, movimentos de terras relação com os processos ecológicos que
em margens de cursos de água e, even- lhes são imediatos como os supracitados.
tualmente, ocupação de fundos de vale. Mas a natureza desses impactos pode
Em sua relação com os processos am- ser também discutida de forma bem mais
bientais ditos globais 1, a urbanização ampla e relacional, se considerarmos o
pode ser fator de alteração na biodiver- processo de urbanização como crescen-
sidade, pela interrupção de corredores temente constitutivo de uma rede-arqui-

1
Segundo Vitousek, mudanças ambientais globais “são aquelas que alteram os envoltórios
do sistema terrestre e, desta forma, são experimentadas globalmente, e aquelas que ocorrem
em áreas mais restritas, mas por serem muito difundidas, adquirem caráter mais global”
(Vitousek, apud Confalonieri et al., 2000, p. 35). A possibilidade de uma caracterização
objetiva dos processos ambientais considerados globais é questionada, por sua vez, em
Shiva (1993) e Lohman (s.d.).

Cadernos IPPUR , Rio de Janeiro, Ano XX, No 1, 2006, p. 77-106


78 As cidades e as apropriações sociais das mudanças climáticas

pélago de grandes metrópoles, de nós primeiras fundadas na exploração de


de encadeamento de múltiplos fluxos de recursos locais e as segundas promovidas
produção e de trocas. Pois estas são as por agentes econômicos cujo poder lhes
tendências da urbanização em contexto permite drenar recursos provenientes de
de reestruturação produtiva e financei- longas distâncias ou impor impactos in-
rização do capital como o configurado desejáveis também à distância (Gadgil e
nas últimas décadas do século XX: as Guha, 1995). As cidades, em particular,
redes de cidades apontam cada vez mais abrigam parte significativa das práticas
para arquiteturas logísticas mais centrali- sociais de apropriação “biosférica” do
zadas, em que todos os fluxos de moeda meio ambiente. Assim, o debate sobre o
e informação mas também de matéria impacto ambiental das cidades põe ne-
e energia transitam para plataformas cessariamente em questão os fluxos em
centrais menos numerosas, embora do- proveniência do hinterland rural res-
tadas de maior alcance econômico e ter- ponsáveis pelo fornecimento de merca-
ritorial em suas dinâmicas (Veltz, 2001, dorias para a satisfação da demanda
p. 149). Nessa perspectiva, fica difícil urbana. Como o fluxo desses recursos
estabelecer de forma clara a separação tende a ser contínuo para manter a cida-
entre o que seriam os impactos ambien- de em funcionamento, eles podem acar-
tais associados ao fato propriamente retar, com significativa freqüência, a
urbano e o que seriam os originados na ruptura dos fluxos materiais e das cultu-
dinâmica mais geral dos próprios mo- ras extra-urbanas cuja existência liga-se
delos de desenvolvimento que têm nas à reprodução dos ecossistemas em que
metrópoles os pólos irradiadores de pro- se encontram situados tais recursos 2. A
cessos econômicos e impactos ambien- extração de insumos de localidades cada
tais. Isso porque nos principais nós da vez mais remotas pode provocar inclu-
rede-arquipélago de metrópoles desen- sive o deslocamento espacial de grupos
cadeiam-se processos que produzem sociais ditos “ecossistêmicos” para as
alterações ecológicas evidenciáveis muito periferias pobres de grandes cidades, tor-
além do perímetro imediato das cida- nando-os conseqüentemente também
des, incluindo as alterações consideradas dependentes, ainda que em escala quan-
pertinentes aos assim chamados “impac- titativamente pouco expressiva, dos sis-
tos biosféricos”. Pois, em analogia com temas econômicos ditos “biosféricos”.
os denominados “povos ecossistêmicos”
e “povos biosféricos” na definição de M. Processos similares podem surgir da
Gadgil e R. Guha, podemos considerar imposição de valores e práticas simbóli-
que as formas sociais de apropriação da cas citadinas a espaços sociais extra-
base material do desenvolvimento po- urbanos que se pretenda, inclusive por
dem também ser divididas em “ecossis- razões ambientais, preservar. Levy et al.
têmicas” e “biosféricas” – ou seja, as e Adams, por exemplo, assinalam que

2
John Vidal cita o episódio do suicídio em massa do povo U’Wa, ante o desenvolvimento dos
campos de petróleo da Shell na Colômbia, como conseqüência do crescimento da “pegada
urbana” associada à civilização do automóvel. Cf. Vidal (1997), apud Dalby (1998, p. 310).
Henri Acselrad 79

concepções estetizantes de origem ur- É certo que antes do século XVII a


bana, quando aplicadas a paisagens que urbanização esteve limitada por uma
se quer, por razões ambientais, trans- relação metabólica bem específica esta-
formar em parques e reservas, podem belecida entre as cidades e seus hinter-
ter efeitos dramáticos e diruptivos sobre lands produtivos, assim como pelas
os povos afetados por sua implantação 3. possibilidades de extração dos exceden-
“Os perigos da permanência de uma tes que sustentavam as aglomerações
compreensão colonial continuada dos urbanas. Segundo Harvey, as cidades
‘recursos’, do ‘meio ambiente’ e da ‘Na- medievais assemelhavam-se ao que os
tureza’” – acrescenta Willems-Braun – ambientalistas contemporâneos julgariam
“ligam-se diretamente à consideração ser “formas virtuosas biorregionalistas”
imprópria de um ambiente separado da (Harvey, 1996, p. 411). A estabilidade
cultura, de um rural separado do urba- das economias das cidades dependia
no e de assentamentos urbanos ‘civiliza- então crucialmente de sistemas metabó-
dos’ tidos como separados da Natureza” licos localizados, com suas qualidades
(Willems-Braun, 1997, apud Dalby, ambientais de sustentação e seus pro-
1998, p. 308). dutores potenciais de excedentes, aptos
a serem transferidos para as cidades. Até
Assim, as cidades, por suas práticas o início do século XIX, a hoje chamada
tanto materiais quanto simbólicas, têm “pegada ecológica” da urbanização na
participado do que MacNeill, Winsemius superfície da Terra teria sido relativa-
e Yakushiji chamam de uma “ecologia mente reduzida. O que ampliou essa
sombra” 4, da qual os principais centros “pegada” foi a onda de novas tecnolo-
urbanos dos países economicamente gias que permitiu a superação conside-
mais poderosos constituem pontos cen- rável de barreiras espaciais e temporais
trais que que até então opunham limites à acu-
mulação capitalista nas cidades (ibid.).
habilitam as nações ocidentais a es-
tribarem-se no capital ecológico de Foi assim que o desenvolvimento de
todas as outras nações para fornecer uma rede global de cidades ligadas a
alimento às suas populações, energia uma variedade de hinterlands permitiu,
e materiais para as suas economias a partir de meados do século XX, um
e, inclusive, terra, água e ar para ab- processo de crescimento urbano agrega-
sorver seus subprodutos e detritos. do radicalmente maior do que aquele
(MacNeill et al., 1991, p. 71) possível para cada cidade isoladamente

3
Cf. Levy, Scott-Clark e Harrison (1997), apud Dalby (1998, p. 308), e Adams e McShane
(1996), apud Dalby (1998, p. 308).
4
“Em essência, a sombra ecológica de um país é constituída pelos recursos ambientais que ele
extrai de outros países e dos bens comuns globais” (cf. MacNeill et al., 1991, p. 71).
Analogamente, M. Wackernagel e W. Rees chamam de capacidade de “pegada ecológica” “a
área de terreno requerida para proporcionar os recursos e assimilar os rejeitos de um grupo
determinado de pessoas – habitação, cidade ou país” (cf. Wackernagel, s.d.).
80 As cidades e as apropriações sociais das mudanças climáticas

(ibid., p. 413). É por essa razão, suge- ecológicas danosas de suas próprias
rem os estudiosos da Ecologia Global, ações (Dalby, 1998, p. 306). Como sa-
que é importante tentar entender os bemos, a exportação de impactos am-
processos ambientais contemporâneos, bientais indesejáveis não os elimina da
inclusive os urbanos, em termos biosféri- superfície terrestre. Ao contrário, lem-
cos, não limitando as análises aos ecossis- bra Harvey, a crescente e ruinosa com-
temas individuais ou Estados Nacionais, petição interterritorial – entre nações,
mas procurando apreender as interco- regiões e cidades – associada à necessi-
nexões dos diferentes tipos de proces- dade suposta de as mesmas (em nosso
sos, independentemente de convenções caso, as cidades) “venderem a si próprias”
geográficas ou de meras distâncias físicas. ao mais barato custo, para o bem da
No contexto dessas dinâmicas ecogeo- máxima mobilidade do capital na Terra,
gráficas geradoras de conseqüências em só têm feito aumentar o grau de descoor-
distâncias múltiplas, as práticas ambien- denação entre os processos decisórios
tais dos agentes poderão ser entendidas dos capitais individuais e, por conse-
na perspectiva não só da extração de guinte, os riscos da eclosão de impactos
recursos situados à distância mas tam- ambientais incontrolados (Harvey, 1996,
bém de decisões de localização de rejeitos p. 413). O presente texto revê o debate
tóxicos e perigosos em contexto de rela- que liga processos de urbanização ao de
ções de mobilidade globalizada, abran- mudanças climáticas, procurando, no
gendo práticas de tipo Nimby (“Not in caso brasileiro, identificar relações pos-
my Backyard” – “não no meu quintal”), síveis entre as distintas configurações dos
por meio das quais as elites urbanas pro- aglomerados urbanos e os níveis respec-
curam se distanciar das conseqüências tivos de emissão de CO2.

As cidades e as mudanças climátícas


O debate sobre mudanças ambientais os oceanos e a superfície terrestre, tendo
globais apresenta dificuldades relativas por base princípios físicos validados por
à pretensão de se separar dimensões na- uma vasta e ainda imperfeita gama de
turais e sociais da mudança ambiental. observações (Boehmer-Christiansen,
A agenda da pesquisa sobre mudanças 1994, p. 141). Calbo et al., por exemplo,
globais tem sido dominada pelos esfor- procuram estabelecer as interações dos
ços de elaboração de modelos de tipo aspectos globais e urbanos das emissões
preditivo. Para a modelagem global que antropogênicas na química troposférica.
usa as teorias das Ciências Naturais, o Tal pesquisa tenta enfrentar as dificul-
clima, por exemplo, precisa assim ser tra- dades de articulação parametrizada
duzido em um grande número de equa- entre diferentes escalas espaciais e tem-
ções matemáticas destinadas a prever as porais, pois, enquanto para o estudo do
interações complexas entre a atmosfera, efeito estufa usam-se como escala o diâ-
Henri Acselrad 81

metro terrestre e um horizonte de 30 direção do planejamento das cidades


anos, para o da poluição atmosférica nas (Brand, 1999, p. 646). Assim, a pesquisa
cidades usam-se escalas muito menores 5. e o debate sobre mudança ambiental
M. L. Bell, por sua vez, tenta explorar global podem ser vistos como capazes de
as relações em sentido inverso, através fornecer um certo número de justificati-
da hipótese de que a mudança climática vas para as opções relativas a alterações
pode alterar as concentrações de poluen- no modelo de desenvolvimento urbano,
tes atmosféricos, acarretando significa- no que diz respeito tanto à sua matriz
tivos impactos sobre a saúde humana. energética, de transportes, ao padrão lo-
Para tanto, procurou integrar dados de cacional de atividades, quanto às forma-
sensoriamento remoto, modelagem me- ções sociais subjacentes à configuração
soescalar e dados epidemiológicos (Bell, do modelo urbano. Sonja Boehmer-
2006). Christiansen mostrou, por exemplo,
como na Inglaterra a Sra. Thatcher con-
Na perspectiva dialética de autores verteu-se à causa ambiental e, em parti-
como Harvey, porém, a mudança am- cular, à do aquecimento global, em 1984,
biental é permanente, e a questão, por- por suspeitar que os ambientalistas esti-
tanto, não seria propriamente a da vessem usando o problema ambiental
caracterização de um evento urbano para atacar o capitalismo: “acreditando
concorrente para uma mudança enten- que um debate científico livre, por si só
dida como abandono da estabilidade, ofereceria meios de superar as ameaças
mas a da busca de correlação entre o ambientais”, afirma Boehmer-Christian-
sentido do processo de urbanização e o sen, “a Sra. Thatcher via no investimento
sentido do que se entende por “mudan- em Ciência uma parte da batalha contra
ça ambiental”. Assim é que, pela consi- a política ambiental socialista, que en-
deração do risco, inclusive do risco do tendia ser repressiva” (Boehmer-Chris-
consumo energético para as mudanças tiansen, 1994, p. 177). Ademais, como
ambientais globais, a questão ambiental partidária da energia nuclear e inimiga
veio se tornando um meio de expressão implacável das organizações sindicais
de um mal-estar social geral, constituin- dos mineiros do carvão, Mrs. Thatcher
do uma dimensão central de novas prá- só pôde ver-se atraída por prescrições
ticas espaciais institucionalizadas. Como que propugnavam o fim da queima do
as preocupações com o meio ambiente carvão (ibid.).
surgem das múltiplas facetas da expe-
riência social e se interconectam na cons- Algumas indicações de efeitos de
tituição das agendas ambientais urbanas, mudanças climáticas globais sobre as ci-
um novo conjunto de fundamentos vem dades podem ser inferidas dos estudos
surgindo como esboço de mudanças na efetuados sobre as repercussões dos

5
Cf. Calbo, Pan, Webster, Prinn e McRae (1997). O sismólogo Thomas Heaton se interroga,
por exemplo, sobre “como podemos pretender prever eventos passíveis de acontecer nos
próximos mil anos, quando nossas idéias normalmente não se sustentam nem por 20 anos”
(cf. Davis, 1998, p. 35).
82 As cidades e as apropriações sociais das mudanças climáticas

eventos climáticos El Niño e La Niña no de El Niño e La Niña apresentam condi-


Brasil 6. No período 1982-1983, o El cionantes novos e inescapáveis às polí-
Niño ocasionou precipitações superiores ticas públicas relativas às infra-estruturas
às consideradas normais, com transbor- urbanas de fornecimento de água, sa-
damentos de rios e inundações de bai- neamento e energia 7. Brandão, por
xadas nas regiões Sul e Sudeste do país. exemplo, para o caso do Rio de Janeiro,
Entre os anos 1997 e 1998, foram re- sustenta que
gistradas temperaturas mais elevadas no
início do verão nas regiões Sul, Sudeste a expansão desordenada da cida-
e Centro-Oeste e no sul do Nordeste. de, que resultou na ocupação de
No que se refere às suas repercussões áreas que deveriam ser preservadas,
no meio urbano, o El Niño foi responsa- tais como as encostas dos maciços e
bilizado por chuvas abaixo das médias os diversos morros e as áreas ribei-
e a conseqüente crise de abastecimento rinhas, faz com que a cidade fique
de energia elétrica no norte e leste da cada vez mais vulnerável aos eventos
Amazônia; por escassez de água e po- climáticos anômalos, passando a
luição de mananciais, com a migração aumentar os riscos de episódios de
de população para as grandes cidades enchentes e inundações. (Brandão,
na faixa litorânea do Nordeste e a so- 1992, p. 183)
brecarga de demanda sobre os serviços
urbanos locais; por enxurradas e en- Com base em dados da Secretaria
chentes em cidades do Sul. O fenômeno Municipal de Habitação de São Paulo
La Niña, por sua parte, foi responsabili- (Sehab) e da Fundação Instituto de Pes-
zado pela ocorrência de chuvas anor- quisas Econômicas (Fipe/USP), Marcon-
malmente abundantes no norte e leste des menciona que em 1991 existiam
da Amazônia e anormalmente escassas 24.551 domicílios integrantes de 298
no Rio Grande do Sul entre os meses favelas instaladas em áreas de manan-
de setembro e fevereiro (Freitas, Santos ciais na cidade de São Paulo (Marcon-
e Hamada, 2000, p. 4-5). Ao alterar sig- des, 1999, p. 165). Segundo Figueiredo
nificativamente os padrões climáticos e (1994), em 1994, na cidade de São
meteorológicos de grandes áreas urba- Paulo, 808 favelas localizavam-se às
nas, provocando, alternadamente, secas, margens de cursos de água, das quais
chuvas abundantes e aumento de tem- quase um terço estava sujeito a enchen-
peratura, fenômenos climáticos do porte tes. Em terrenos com declividade acen-
6
O fenômeno El Niño é caracterizado pelo aquecimento anômalo e o subseqüente resfriamento
das águas superficiais do Oceano Pacífico Equatorial Oriental, durante um período de 12 a
18 meses, provocando mudanças na circulação atmosférica e na precipitação em escalas
regionais e global. Cf. Freitas, Santos e Hamada (2000).
7
Pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) estão começando a estudar
também a hipótese de o aumento da poluição atmosférica em cidades como Rio de Janeiro,
São Paulo e Belo Horizonte estar favorecendo o aumento da freqüência e da intensidade de
raios, com a conseqüente derrubada de árvores, interrupção de trânsito e outros acidentes
(cf. Azevedo, 2000).
Henri Acselrad 83

tuada e com elevada incidência de ero- quase 20% a população favelada do


são, contavam-se então 466 favelas. município de São Paulo. Dados do IBGE
Entre 1987 e 2000, a capital de São apontavam para Recife a cifra de 40%
Paulo perdeu 30% da cobertura vegetal de moradores em favelas (Maricato,
em virtude da expansão urbana, nota- 2000, p. 153-154).
damente dos loteamentos clandestinos
de população pobre deslocada de áreas Na medida em que as vítimas das
centrais por impossibilidade de pagar os catástrofes climáticas são, via de regra,
elevados aluguéis (Atlas Ambiental de os grupos sociais que habitam as perife-
São Paulo, apud Pesquisa Fapesp, rias, encostas e beiras de rios, como re-
2000). Segundo Ermínia Maricato, “en- sultado da urbanização excludente, há
quanto os imóveis não têm valor como pouca propensão a que se forme um
mercadorias, ou têm valor irrisório, a consenso social favorável à reformula-
ocupação ilegal se desenvolve sem in- ção do padrão urbanístico. Conforme
terferências do Estado” (Maricato, 1995, assinalou Mike Davis, para o caso de Los
p. 269). As ocupações tendem assim a Angeles, o fato de todas as maiores en-
ocorrer em áreas desprovidas de inte- chentes e terremotos do século XX terem
resse e possibilidade de exploração eco- coincidido com conjunturas recessivas
nômica pelo capital imobiliário, como, contribuiu para que as dimensões socio-
de modo geral, as encostas, os manan- políticas dos desastres urbanos fossem
ciais e as áreas de proteção ambiental. obscurecidas: além de nenhum ciclo ex-
Como resultado de uma urbanização pansivo de negócios ter sido interrompi-
que segrega, continua Maricato, estima- do, as providências keynesianas de corte
va-se que em 1999 viviam em áreas de anticíclico, convenientes em período
ocupação irregular 20% das populações marcado por recessão, foram ampla-
do Rio de Janeiro, de Belo Horizonte e mente justificadas com base na necessi-
de Porto Alegre, assim como 28% da dade de recuperação dos danos (Davis,
população de Fortaleza. No início dos 1998, p. 38).
anos 1990, a Fipe/USP estimava em

Implicações ambientais da forma urbana


A expansão urbana e os sucessivos ater- rios são eliminadas por obras de retifi-
ros que costumam acompanhá-la redu- cação e canalização que diminuem a
zem os leitos dos rios e, juntamente com infiltração da água e contribuem para
a erosão das encostas desprotegidas pela aumentar a velocidade da vazão (Bran-
retirada da cobertura vegetal, transfor- dão, 1992, p. 188). A concentração de
mam pequenas vazões em grandes tor- elementos poluentes na atmosfera, por
rentes nos períodos de chuvas intensas sua vez, associada à densidade constru-
e concentradas. Muitas das curvas dos tiva das cidades, forma as chamadas ilhas
84 As cidades e as apropriações sociais das mudanças climáticas

de calor, responsáveis pelo desconforto Ademais, a despeito do senso comum


térmico urbano 8; a ilha de calor associa- que sugere que a melhoria da eficiência
da à impermeabilização da superfície do tráfego, pela criação de vias expressas
pelo asfalto e o concreto favorece o fe- e pelo aperfeiçoamento técnico dos veí-
nômeno das inundações; o desconforto culos, é um caminho eficaz para a redu-
térmico provocado pela ilha de calor ção dos níveis de poluição urbana,
intensifica o uso de aparelhos de ar con- pesquisas realizadas em Nova York e em
dicionado, contrastando o microclima Perth, na Austrália, revelam que há uma
interno aos prédios com as altas tempe- correlação inversa entre tráfego eficiente
raturas externas a eles. A poluição am- em combustível (o que flui a altas velocida-
biental e o desconforto térmico tendem des) e cidades eficientes em combustível
a atingir com maior intensidade os espa- (as que requerem menos deslocamen-
ços residenciais de baixa renda, onde tos) (Lowe, 1991, p. 16). Apesar de os
ocorrem simultaneamente carência de veículos que circulam em áreas centrais
arborização, proximidade com fontes de mais densas gastarem mais combustível
poluição e emprego de materiais de cons- por quilometragem do que a média ur-
trução que emitem mais calor (Souza, bana, ainda assim, por circularem pouco,
1999, p. 126). usariam relativamente menos combustí-
vel. Inversamente, veículos que circulam
As cidades são, além disso, reconhe- em áreas de baixa densidade, embora
cidamente grandes consumidoras de percorram menos quilômetros por litro
energia. Nos países da Organização para de combustível do que a média urbana,
a Cooperação e Desenvolvimento Eco- circulam muito mais, utilizando, pois,
nômico (OCDE), elas consomem de muito mais combustível.
60% a 80% do balanço energético. Se-
gundo pesquisas correntes, o consumo Segundo outras abordagens, porém,
de gasolina seria inversamente propor- mesmo implicando uma diminuição glo-
cional à densidade urbana 9. No Canadá, bal do consumo, a concentração espa-
nos EUA e na Inglaterra, estudos mos- cial dos residentes e das atividades não
traram que uma duplicação da densi- deixa de acarretar uma concentração
dade da população ou das habitações espacial do uso de combustível, logo
resultaria numa redução de 20% a 30% uma concentração das poluições por
da quilometragem anual do desloca- fontes móveis. Em espaços densamente
mento de automóvel por pessoa (Bindé, utilizados, isso tenderia a ocasionar um
1998, p. 98). Disso decorreria a pro- aumento da exposição das populações
pensão predominante à diminuição do aos riscos da poluição atmosférica, na
consumo de energia em função da con- medida em que o consumo de energia
figuração de cidades mais compactas. ligado às migrações alternantes diminui

8
“Quanto maior é a cidade, mais acentuado será o efeito contraste térmico entre a cidade e o
campo” (cf. Lombardo, 1985, p. 39, apud Cabral, 1995, p. 1).
9
Cf. International Union of Public Transport (UITP, na sigla em francês), Des Villes à Vivre,
Bruxelles, 1996, apud Bindé (1998, p. 98).
Henri Acselrad 85

pouco com a concentração urbana, transporte coletivo, que gera grande


dadas as condições invariáveis da estru- parte das emissões totais e incentiva o
tura de transporte. A fonte mais pode- transporte individual, favorecendo per-
rosa de economia de combustível seria, das ambientais e ineficiência energética
assim, a mudança do modo de trans- (Motta, 1996, p. 46). Em grandes cida-
porte em zona densa, ou seja, o favore- des de países industrializados, é forte a
cimento real de uma transferência correlação positiva entre a densidade po-
modal em favor do transporte coletivo pulacional e a proporção de viagens fei-
pouco poluente (Mathis, 1996, p. 106). tas por transporte público (Vasconcellos
e Lima, 1998, p. 13). Tal correlação só
As emissões de CO2 no Brasil, cujo pode ser observada, porém, em cidades
volume é sete vezes superior às emissões onde o sistema de transportes coletivos
de origem energética, são basicamente é objeto de políticas e investimentos
devidas ao desflorestamento. As emis- apropriados.
sões energéticas brasileiras de CO2 são
bastante inferiores às observadas em Os indicadores de emissão de CO2
outros países, em virtude do nível de por habitante e por unidade de consu-
produção industrial do país ser relativa- mo de energia no Brasil são significati-
mente baixo e de a matriz energética estar vamente baixos se comparados aos dos
centrada na hidroeletricidade (Motta, países mais desenvolvidos, os primeiros
1993, p. 65). O papel da urbanização exprimindo o baixo nível de renda per
no desmatamento das florestas tropicais capita no país e os segundos evidencian-
em geral é considerado muito pouco do eficiência no uso de recursos reno-
relevante pela literatura científica. Em váveis endógenos (Rosa e Tolmasquim,
um levantamento realizado por pesqui- 1996). Pesquisa da Coppe/UFRJ mostra
sadores do Departamento de Ecologia que entre 1990 e 1998 o município do
Humana da Universidade de Rutgers, Rio de Janeiro aumentou em 57,7%
em 825 artigos em que se discutem as suas emissões de gás metano (CH4),
causas do desmatamento, a urbanização provavelmente em razão da melhoria
situou-se em 19º lugar entre as 20 prin- da coleta de lixo e do maior acúmulo
cipais causas (Rude et al., 2000, apud de resíduos em aterros sanitários. Mos-
Teixeira, 2001, p. 39). tra também um pequeno aumento das
emissões de CO2, em função do aumen-
Os veículos automotores são as prin- to do número de veículos em circulação
cipais fontes de poluentes atmosféricos e da queda no uso do álcool como com-
no Brasil. Segundo pesquisa realizada bustível. Apesar das tendências ao au-
na Região Metropolitana de São Paulo mento das emissões de gases-estufa
em 1990, contribuíram com mais de verificadas no Rio de Janeiro, a cidade
90% nos casos de CO, HC e NOX, 64% de Berlim emitiu em 1990 quase quatro
no de SOX e 40% nos de particulados. vezes mais desses gases do que a cidade
A qualidade do ar nos centros urbanos do Rio de Janeiro em 1998 (Nogueira,
está fortemente associada ao sistema de 2000).
86 As cidades e as apropriações sociais das mudanças climáticas

Se observarmos os dados sobre existe uma capacidade ociosa bastante


emissão de gases-estufa por setores de grande nessa indústria 11. Além de redu-
uso final de energia, o setor de trans- zido, o mercado brasileiro de automó-
porte responde por parte considerável veis oscila fortemente de acordo com
(em estimativas que variam entre 32,5% as crises internacionais e as conjunturas
e 42%) do total das emissões de CO2 econômicas. Em 1998, por exemplo,
do Brasil 10. No entanto, a despeito de em função da crise russa, foram licencia-
um modelo urbano que favorece o uso dos menos 400 mil veículos em relação
do automóvel, a relação habitante/au- ao ano anterior.
tomóveis é, no Brasil, extremamente alta
se comparada à de outros países pro- Dados da indústria automotiva mos-
dutores. Apesar de a indústria automo- tram uma elevada concentração espa-
bilística estar implantada no Brasil há cial na demanda por automóveis, fato
mais de 40 anos e de o país ser o déci- que indica a possibilidade de permanen-
mo primeiro produtor mundial de veí- tes impactos sobre as cidades brasileiras.
culos, sua relação habitantes/veículos A cidade de São Paulo, por exemplo,
(10,3 em 1996) o situa na décima oitava conta, hoje, com a maior frota nacional,
posição entre os países produtores, atrás que tem crescido a uma média de 6%
do México, da Coréia do Sul e da Ar- a.a. Todos os dias, 1,5 mil veículos são
gentina. a ela incorporados. A velocidade média
nos principais corredores viários tem de-
Os altos investimentos realizados na crescido sistematicamente, tendo alcan-
indústria automobilística brasileira nos çado 20 km/h em 1994. Por outro lado,
últimos anos elevaram sobremaneira entidades ambientalistas estimam que
sua capacidade instalada, que é estimada morrem cerca de 300 crianças por ano
aproximativamente entre 2,5 milhões em virtude da poluição advinda dos
de unidades/ano e 3,5 milhões de uni- escapamentos dos carros 12. Esses indi-
dades/ano (Limoncic, 2001, p. 31). cadores exprimem as implicações am-
Dados para a década de 1990 mostram bientais da opção automobilística nas
que os índices de crescimento do licen- cidades brasileiras.
ciamento de carros novos são no Brasil
bastante elevados se comparados aos A entrada massiva de automóveis
dos países mais desenvolvidos (Meiners, no centro urbano das cidades não foi
1999, p. 199). No entanto, em 1998, acompanhada de alterações no padrão
foram emplacadas apenas 1,535 milhão histórico de ocupação do solo urbano da
de unidades no Brasil, revelando que cidade. Os investimentos urbanos, tanto

10
Cf. La Rovere (1995, p. 17) e Klabin (2000, p. 47). Ver também Uria (1996) e Monteiro
(1998).
11
Como afirmou Jack Smith, chairman da General Motors: “Temos muitas fábricas; precisamos
agora vender carros” (Smith, apud Limoncic, 2001, p. 31).
12
Cf. Greenpeace, Automóveis: saúde agredida e alterações no clima do planeta, apud Limoncic
(2001, p. 35).
Henri Acselrad 87

em infra-estrutura quanto em embele- Os anos 1960 caracterizaram-se


zamento, no período de expansão da pelo esforço de adequar o espaço ur-
oferta de automóveis no país, concen- bano das principais cidades brasileiras
traram-se nos núcleos urbanos. Assim, às necessidades do automóvel, privile-
a concepção urbana que nos Estados giando, portanto, as camadas de maior
Unidos permitiu a absorção de um nú- poder aquisitivo.
mero crescente de carros nas cidades,
propiciando subúrbios com baixas den- Se, por um lado, a emergência de
sidades populacionais e amplos espaços uma febre rodoviária nessas cidades sig-
para a circulação de veículos, não se nificou a destruição ou degradação de
verificou nas cidades brasileiras. Pelo espaços públicos ou residenciais, princi-
contrário, os núcleos urbanos tiveram palmente nos bairros que estavam no
sua população adensada, principalmente caminho das autovias que então se
por meio da acelerada verticalização. Em abriam, por outro, redundou na quase
alguns pontos do Rio de Janeiro, como exclusividade do transporte coletivo por
Copacabana, casas com menos de 30 meio de ônibus no perímetro urbano,
anos foram derrubadas para a construção com a supressão dos bondes e a oferta
de prédios de vários andares. Com uma limitada do metrô (Limoncic, 2001).
área equivalente a 0,4% do território do
município, Copacabana abriga, nos dias Em 1994, os ônibus transportaram,
de hoje, 2,9% de sua população 13. no Rio de Janeiro, 1,3 bilhão de passa-
geiros 14, ou seja, um número próximo
No início dos anos 1950, a constru- ao de passageiros que circularam, por
ção de prédios sem garagem para a classe metrô, em Paris. Em que pese o fato de
média era um indicativo de que o auto- as grandes cidades brasileiras não terem
móvel ainda não constituíra um bem no seguido os traços das cidades america-
horizonte de consumo dessa classe que nas para a absorção dos automóveis, a
só viria a integrar o seu estilo de vida e propriedade e o uso desses meios de
projeto de ascensão social como meio de transporte passaram a fazer parte dos
distinção social após a instalação da in- mecanismos de distinção social da classe
dústria automobilística no país. A ade- média brasileira. Na década de 1970,
quação do espaço da moradia da classe um estudo da Fiat demonstrou que um
média ao automóvel só ocorreria no Rio motorista brasileiro rodava por ano, em
de Janeiro, para citar um exemplo, no média, quase duas vezes mais do que
final dos anos 1950, quando foi aprovada um italiano. Configurou-se assim no
a lei que obrigava as novas construções Brasil um padrão de consumo de auto-
a reservar espaço ao estacionamento de móveis análogo ao da modernidade
automóveis (Malin e Junqueira, 1984, fordista norte-americana, sem a corres-
apud Limoncic, 2001, p. 35). pondente alteração dos modos de uso

13
Cf. Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, IplanRio, Anuário Estatístico da cidade do Rio de
Janeiro 1993/1994, apud Limoncic (2001, p. 35).
14
Ibid.
88 As cidades e as apropriações sociais das mudanças climáticas

do solo que poderiam contribuir para anos 1950 estiveram, como veremos a
evitar os congestionamentos e os altos seguir, fortemente associados ao padrão
níveis de emissão de poluentes. mais geral de distribuição espacial das
atividades condicionado pela dinâmica
O modo de uso do solo urbano e o específica da modalidade brasileira do
padrão de mobilidade que caracteriza- chamado “fordismo periférico”.
ram as cidades brasileiras a partir dos

Implicações climáticas da urbanização brasileira


O padrão de distribuição espacial das senvolvendo complementaridades inter-
atividades econômicas e das cidades re- regionais. Uma relativa especialização
laciona-se historicamente com os distin- das regiões acompanhou a crescente
tos modos de inserção da economia integração nacional da economia. Até
brasileira nos fluxos internacionais de o final dos anos 1940, o comércio inter-
comércio e investimento. Até as primei- nacional ainda superava por larga mar-
ras décadas do século XX, as diferentes gem o comércio inter-regional, realizado
regiões do país não se ligavam significa- majoritariamente por meio da cabota-
tivamente umas às outras: articulavam- gem. Investimentos em infra-estrutura
se predominantemente com o mercado construíram as pontes no interior do
externo. Ferrovias e portos asseguravam antigo “arquipélago”, intensificando a
a integração das regiões produtoras aos acessibilidade entre as partes no interior
fluxos mundiais de comércio. Apesar dos de um verdadeiro sistema de transpor-
indícios do que alguns autores conside- tes configurado efetivamente nos anos
ram um movimento de acumulação 1950. Com a enorme expansão do
endógena, protagonizado por uma elite comércio inter-regional na década de
mercantil atuante no mercado interno, 1950, a cabotagem passou a ter caráter
a demanda internacional manteve-se no marginal, e o caminhão tornou-se o veí-
comando da dinâmica produtiva do culo de transporte dominante na circu-
país, definindo os principais contornos lação interna de mercadorias (Galvão,
da trama espacial das vias de escoamen- 1993, p. 278).
to da produção.
A partir dos anos 1960, no entanto,
Com as crises que atingiram as regiões a integração do mercado nacional pas-
exportadoras e o surgimento de condi- sara a contar com políticas de desen-
ções de sustentação de uma expansão volvimento regional, mediante as quais
industrial nos anos 1930, desenvolveu- o Estado estimulava a industrialização
se, porém, uma crescente articulação periférica, através de incentivos fiscais e
comercial entre as regiões. Com o pro- do apoio à implantação de plantas in-
cesso de industrialização, foram-se de- dustriais estatais e privadas. O cresci-
Henri Acselrad 89

mento da infra-estrutura econômica pro- O que se observou, a partir de 1970,


movido pelo Estado contribuiu igualmen- foi o incremento da influência do co-
te para o processo de desconcentração mércio internacional no dinamismo das
industrial: a malha rodoviária pavimen- regiões produtoras. No início dos anos
tada federal e estadual multiplicou-se 1970, o desempenho exportador esteve
por quatro entre 1960 e 1970. A partir associado aos estímulos fiscais e finan-
dos anos 1970, verificou-se, portanto, ceiros governamentais, enquanto nos
uma tendência à desconcentração indus- anos 1980, à retração do mercado
trial no espaço territorial, com um au- interno e à instabilidade econômica.
mento simultâneo da heterogeneidade Transformou-se paralelamente a intensi-
intra-regional, dados os diferentes tipos dade relativa das relações da economia
estabelecidos de integração ao mercado paulista com o conjunto da economia
nacional. A articulação, até então apenas nacional, tendo a primeira, entre 1975
de natureza comercial, foi complemen- e 1985, se “extrovertido” progressiva-
tada por uma articulação propriamente mente em direção ao mercado interna-
produtiva entre os espaços subnacionais. cional e se “fechado” relativamente às
Capitais transferiram-se para as regiões demais regiões brasileiras (Diniz e San-
menos industrializadas na busca de novas tos, 1993, apud Guimarães Neto, 1995,
frentes de investimento e de ocupação p. 24-26). Mas, mesmo sem significar
de espaços econômicos. A disponibilida- ainda uma desarticulação da economia
de de recursos naturais e a configuração nacional e de seu mercado interno, a
da ação indutora do Estado foram os redução da articulação comercial de
elementos determinantes da mobilida- São Paulo com o mercado nacional in-
de dos capitais (Guimarães Neto, 1995, dicou que, a partir dos anos 1980, novas
p. 14). A circulação de mercadorias fez- formas de articulação espacial da eco-
se então acompanhar por uma crescente nomia começavam a se instaurar.
articulação dos capitais no espaço inter-
regional, configurando uma lógica de Nos anos 1990, a política de aber-
acumulação cada vez mais integrada, tura comercial e a priorização dada à
que tornou as economias regionais mais chamada “inserção competitiva” do país
complexas e internamente mais hetero- romperam com o processo de consti-
gêneas. Entre 1970 e 1980, o número tuição de uma base econômica nacio-
de áreas industriais com mais de 10 mil nalmente integrada que desconcentrava
pessoas ocupadas subiu de 33 para 76 atividades ao longo dos espaços perifé-
em todo o país. Verificou-se também um ricos. A globalização parece ter vindo,
processo de reversão do movimento de assim, reforçar as tendências à especia-
polarização na Área Metropolitana de lização regional: as empresas passaram
São Paulo, cujas participações no em- a adotar estratégias de localização nor-
prego e na produção industrial caíram teadas pela oferta de recursos humanos
de 34% e 44%, respectivamente, para qualificados, pela proximidade com os
28% e 29% entre 1970 e 1985 (Cam- centros produtores de tecnologia, pela
polina Diniz, 1996, p. 84). maior e mais eficiente dotação de infra-
90 As cidades e as apropriações sociais das mudanças climáticas

estrutura econômica e pela proximidade Durante o período 1940-1970, houve


com mercados consumidores de mais um crescimento contínuo e expressivo
alta renda. Foram-se, ao longo dos anos da participação das cidades de maior
1990, evidenciando focos dinâmicos em tamanho na população urbana e total.
diferentes pontos situados no interior Na década de 1970, verificou-se uma
das macrorregiões brasileiras, refletindo interrupção dessa tendência e na déca-
o caráter espacialmente seletivo dos in- da de 1980, uma inversão da mesma
vestimentos que delinearam a divisão do (Martine, 1995, p. 78). Também nessa
trabalho entre as regiões e definindo década ocorreu uma mudança no pa-
uma tendência à reconcentração geo- drão de urbanização brasileiro, dado o
gráfica da produção na região que vai arrefecimento da migração rural-urbana
do centro de Minas Gerais ao nordeste e inter-regional, especialmente na região
do Rio Grande do Sul. É nesse subes- Sudeste. Foi notável o crescimento das
paço que começam a surgir novas áreas áreas rurais, das localidades pequenas
industriais localizadas em cidades mé- e da rede urbana nordestina. Foi impor-
dias, caracterizadas por uma forte inte- tante no período, também, a redução
gração produtiva e comercial numa rede do processo de “metropolização” demo-
intra e inter-regional (Campolina Diniz, gráfica, ou seja, caiu a participação do
1996, p. 100). crescimento das regiões metropolitanas
no crescimento demográfico total do
Ao longo do século XX, a distribuição país. Paralelamente ao declínio do pro-
espacial das atividades esteve associada cesso de concentração em grandes cida-
ao extremamente marcante processo de des, observou-se uma “periferização” do
urbanização da sociedade brasileira. A crescimento demográfico – a taxa de
proporção da população residente nas crescimento dos municípios periféricos
cidades quase dobrou entre 1960 e foi significativamente superior à de seus
2000: representando 44,67% da popu- respectivos municípios núcleos. Tais pro-
lação brasileira total em 1960, a popu- cessos eram explicados pela desconcen-
lação urbana passou a representar 82% tração industrial, a chamada “contra-
no ano 2000. Do ponto de vista de suas urbanização” (tendência de procurar
implicações espaciais, o processo de ur- residência e trabalho fora das grandes
banização ocorreu a partir de dois mo- cidades), pela queda da fecundidade e
vimentos simultâneos: a criação de novas pelo efeito cumulativo da ocupação das
cidades e o crescimento contínuo das fronteiras com a constituição de cida-
existentes (Brasil, 1995, p. 30). Expres- des distribuídas no interior do território
são desses movimentos foi o aumento nacional (ibid., p. 83).
do número de cidades com mais de 500
mil habitantes, que de três em 1940, É igualmente a partir dos anos 1980
apenas no Sudeste e no Nordeste, pas- que se configura no Brasil uma rede
sou para 17 em 1996, em todas as gran- urbana bem estruturada, na qual o fe-
des regiões do país (Unicamp/Ipea/IBGE, nômeno da primazia, ou seja, da grande
1999, v. 1, p. 323). dominância de uma só cidade sobre
Henri Acselrad 91

outras no âmbito intra-estadual, quase mento público, a busca de efeitos de


desaparece. proximidade e de economias externas
pelas empresas envolvidas na produção
Nas três últimas décadas do século flexível, são fatores que parecem ter
XX, as cidades médias brasileiras – cidades contribuído para fortalecer novamente,
com população entre 100 mil e 500 mil nos anos 1990, o papel dos grandes
habitantes – absorveram os fluxos migra- centros (Andrade e Serra, 2000).
tórios que anteriormente dirigiam-se para
as grandes metrópoles. Dessa forma, Durante os anos 1980 e 1990, o
contribuíram fortemente para a configu- maior grau de abertura da economia
ração de uma rede urbana menos polari- concorreu para um aumento na hetero-
zada. Contribuiu também para essa nova geneidade econômica e social do país e
configuração a criação de pequenos nú- para uma mudança no padrão de mobi-
cleos urbanos em áreas de fronteira de lidade da população, que alteraram con-
ocupação e de fronteira de moderniza- seqüentemente a configuração do sistema
ção, a partir de dinâmicas desencadea- brasileiro de cidades. Entre as principais
das por empresas dedicadas à valorização transformações observadas na rede urba-
fundiária através de loteamentos urba- na brasileira na passagem do século XXI,
nos em áreas de expansão agrícola, aponta-se a criação de novos centros
como é o caso de vários núcleos ligados urbanos em associação com a industria-
à valorização do cerrado baiano. Outras lização do campo, tais como centros de
cidades pequenas se reinseriram de modo comercialização e beneficiamento da
singular na rede urbana globalizada por produção agrícola, de distribuição varejis-
meio da especialização em atividades ta, de prestação de serviços ou de reserva
voltadas para a moderna agricultura pra- de força de trabalho temporário. Am-
ticada em seu hinterland, procedimento pliou-se assim o número de cidades que
que lhes conferiu um caráter de “cidades funcionam como centros de drenagem
no campo” (Correa, 1999, p. 47). de renda fundiária vinculada às atividades
associadas à modernização do campo.
O papel “amortecedor” das cidades Tornaram-se, em contrapartida, mais
médias atenuou-se, porém, ao longo dos complexas as funções urbanas e as intera-
anos 1990. Diferentemente da década ções entre centros de tamanhos distintos
de 1980, as regiões metropolitanas cres- localizados em regiões diferentes. A essas
ceram nos anos 1990 em ritmo superior interações múltiplas entre diferentes cir-
ao do conjunto do país. Apesar de as cuitos urbanos soma-se o aparecimento
cidades médias terem crescido em ritmo crescente de espaços vazios ou subocupa-
mais acelerado que o de crescimento das dos que expressam a relativa desvincula-
regiões metropolitanas, esse diferencial ção entre as dinâmicas urbanas e o campo
caiu em relação ao período 1980-1991. circundante (Correa, 2001, p. 10-12).
A preferência governamental pelo apoio
ao escoamento de produtos exportá- As novas atividades industriais ten-
veis, a perda de capacidade de investi- deram a se localizar fora das áreas metro-
92 As cidades e as apropriações sociais das mudanças climáticas

politanas, em função da crescente dis- merações urbanas como Campinas e


posição empresarial de evitar as deseco- Vitória, bem como para um certo nú-
nomias de aglomeração. Muitas cidades mero de centros urbanos com mais de
pequenas e médias cresceram no perío- 100 mil habitantes (ibid., p. 23). Verifi-
do em razão do desenvolvimento da cou-se, assim, um crescimento popula-
agroindústria, da agricultura irrigada e cional mais significativo nas antigas
da urbanização de fronteira, o que, jun- periferias econômicas e nos centros ur-
tamente com a desestabilização da agri- banos médios, e a urbanização esten-
cultura familiar, estimulou a migração de deu-se em direção ao oeste. Novas
curta distância como alternativa ao des- aglomerações urbanas foram também
locamento até então corrente para as incorporadas à rede urbana nacional,
grandes metrópoles, onde a partir do que foi adquirindo complexidade cres-
final dos anos 1980 concentraram-se os cente (ibid., p. 292). Tal complexidade
efeitos danosos da reestruturação pro- reside não só na constituição estrutural
dutiva sobre o mercado de trabalho. As da trama da rede como na própria con-
tendências à desconcentração da eco- figuração socioespacial interna às cida-
nomia – verificada nos anos 1980 so- des. De um lado, um certo número de
bretudo pela interiorização da indústria núcleos urbanos relativamente peque-
paulista – a par com o menor ritmo de nos caracterizam-se por abrigar grupos
crescimento das aglomerações urbanas populacionais plenamente integrados ao
metropolitanas contribuíram para a con- mercado nacional, seja por seu padrão
figuração de uma rede de cidades mais de consumo, seja por suas articulações
dispersa e relativamente desconcentrada com os circuitos produtivos e culturais.
(Unicamp/Ipea/IBGE, 1999, v. 1, p. 11). De outro lado, os grandes e médios cen-
Com exceção da região Nordeste, onde tros urbanos são progressivamente atra-
o crescimento de algumas áreas metropo- vessados por processos de diferenciação
litanas revelou-se ainda elevado nos anos social e segmentação socioespacial, abri-
1980 e 1990, as cidades de porte médio gando significativos contingentes sociais
apresentaram taxas médias de crescimen- de excluídos dos processos de moder-
to superiores às das metrópoles. As ten- nização. Essas dicotomias internas às
dências à terceirização e à precarização cidades rebatem-se, por certo, sobre a
do trabalho nas grandes cidades não só própria rede urbana, que passa a ex-
bloquearam a mobilidade para os gran- primir a articulação predominante das
des centros como incentivaram migrações partes modernas e monetariamente in-
de retorno, contribuindo para a consoli- tegradas das cidades e de seus segmen-
dação de um subsistema de aglomera- tos sociais de mais alta qualificação e
ções urbanas não-metropolitanas. renda, mais suscetíveis de se vincularem
aos circuitos extrovertidos e globalizados
Apesar de as metrópoles continua- da acumulação. Parcelas significativas das
rem concentrando volumes expressivos populações das metrópoles e das gran-
de população, elas perderam peso nas des cidades se ligarão, por sua vez, aos
últimas duas décadas para algumas aglo- circuitos do trabalho informal, da mo-
Henri Acselrad 93

radia de risco e do acesso precário às tribuição espacial de densidades popu-


infra-estruturas urbanas. lacionais urbanas bastante diferenciada
no interior do território nacional. Pode-
A dinâmica espacial dos sistemas mos identificar a distribuição dessas den-
urbanos, de acordo com os resultados sidades a partir da configuração das
da pesquisa Caracterização e Tendências aglomerações urbanas metropolitanas e
da Rede Urbana do Brasil, compreende não-metropolitanas delineadas pela pes-
os seguintes processos articulados (ibid., quisa referida. No interior dessas aglome-
p. 380): rações, encontraremos distintos padrões
de distribuição das densidades, a saber:
a) o adensamento no entorno dos nú-
cleos metropolitanos ou centros a) núcleos de alta densidade popula-
urbanos de grande porte que enca- cional com municípios do entorno
beçam os sistemas; cujas densidades populacionais lhes
são ainda superiores. É o caso de
b) a expansão de suas áreas de in- São Paulo, que tem em seu entorno
fluência para além dos limites políti- municípios de densidade populacio-
co-administrativos das unidades nal ainda maiores, como Diadema,
federativas originais; Osasco, São Caetano do Sul e Ta-
boão da Serra, e o do Rio de Janeiro,
c) a conformação de novos sistemas a que tem em seu entorno municípios
partir da consolidação de centros de mais densos, como os de São João
polarização emergentes, principal- de Meriti, Nilópolis e Belford Roxo.
mente nas áreas de povoamento Essa configuração aplica-se também
recente, como é o caso de Cuiabá; aos casos de Santos e de Campinas
(com densidades menores e apenas
d) um processo de metropolização di- dois municípios de entorno compa-
ferenciado, abrangendo desde sis- rativamente mais densos), de Belém,
temas macrocefálicos como o do Rio de João Pessoa e de Maringá (com
de Janeiro até um sistema articulado densidades mais baixas e apenas um
de centros regionais como o nuclea- município do entorno com densida-
do por São Paulo; de comparativamente maior que o
núcleo da aglomeração);
e) a dispersão espacial de pequenos
centros urbanos, responsável pela b) aglomerações formadas por um
organização do espaço nas áreas conjunto de municípios de densida-
abertas recentemente na fronteira de moderada e de níveis similares
de recursos, notadamente na região entre si, tal como a aglomeração nu-
Centro-Norte. cleada por Porto Alegre, que tem em
seu entorno os municípios de Alvo-
A dinâmica espacial supracitada con- rada, de Esteio, de Canoas e de
corre para a configuração de uma dis- Cachoeirinha. Esse seria também o
94 As cidades e as apropriações sociais das mudanças climáticas

caso das aglomerações de Londrina, ir ao trabalho despendem o tempo


de Caxias do Sul e de São José dos médio de 63 minutos; na região metro-
Campos; politana do Rio de Janeiro, esse tempo
é de 54 minutos, e na de Belo Horizon-
c) aglomerações formadas por um nú- te, de 47 minutos. Nas cidades do Nor-
cleo denso e por um subcentro de deste, onde as densidades populacionais
menor densidade demográfica. São são menores, o tempo médio é de 52
os casos das aglomerações urbanas minutos em Fortaleza, de 42 minutos
de Salvador, de Belo Horizonte, de em Recife e de 39 minutos em Salvador
Fortaleza, de Curitiba, de Goiânia, (IBGE, 1999, p. 140-141). Em São
de Vitória e de Jundiaí; Paulo, Rio de Janeiro, mas também em
Santos e Campinas, a existência de um
d) aglomerações em que o núcleo não certo número de subcentros mais den-
tem nenhum subcentro significativo sos do que o próprio núcleo da aglo-
em seu entorno, como São Luís, meração urbana sugere, mais do que a
Maceió, Natal, Aracaju e Ribeirão justaposição de várias cidades compac-
Preto. tas com predominância da mobilidade
intra-urbana de curta duração, a preva-
Se considerarmos os dois primeiros lência de estruturas estabilizadas, em que
padrões de distribuição de densidades as dinâmicas imobiliárias no núcleo da
demográficas em aglomerações urbanas, aglomeração repelem as populações de
veremos que eles pressupõem dinâmi- menor renda para subcentros de seu
cas de deslocamento intra-aglomeração entorno, pressupondo a incidência de
distintos. Se a existência de uma aglome- deslocamentos constantes de trabalha-
ração densa pode sugerir menores dis- dores entre esses subcentros e o núcleo
tâncias/tempos de deslocamento entre da aglomeração. Tal não seria o caso,
residência e trabalho, os níveis muito por certo, do segundo padrão de distri-
elevados de densidade podem, ao con- buição de densidades populacionais
trário, sugerir maiores possibilidades de supramencionado, configurado pelas
congestão de tráfego, tempos maiores aglomerações urbanas de Porto Alegre,
de deslocamento e maiores dispêndios de Londrina, de Caxias do Sul e de São
em energia com o transporte. A Pesquisa José dos Campos, onde a maior mode-
sobre Padrões de Vida, para 1996- ração e a homogeneidade espacial das
1997, realizada pelo IBGE em seis re- densidades populacionais urbanas entre
giões metropolitanas, três do Sudeste e os diferentes municípios sugeririam a
três do Nordeste, mostrou que 36,4% prevalência de maior grau de compacta-
dos indivíduos vão a pé ao trabalho, ção na dinâmica residência-trabalho,
enquanto 24,8% utilizam transporte basicamente intramunicipal, e, conse-
coletivo e 14,3%, carro ou moto. A pes- qüentemente, a possibilidade de que
quisa mostrou também que na região sejam menores os dispêndios em ener-
metropolitana de São Paulo os indiví- gia no sistema de transportes.
duos que usam transporte coletivo para
Henri Acselrad 95

A configuração das sub-redes urba- concorrendo para aumentar o número


nas mais adensadas, que concentram e o tempo dos deslocamentos entre os
parte considerável das populações e ativi- locais de residência da população traba-
dades econômicas nas cidades brasileiras, lhadora e seus locais de trabalho, e ali-
parece, portanto, combinar os processos mentando permanentemente, pode-se
de periferização do crescimento demo- supor, a importante participação dos
gráfico e de metropolização da pobreza, transportes nas emissões de CO2.

Considerações finais
É preciso reconhecer a dificuldade de timam-se tendo por base os relatórios do
fazer uma sociologia da disputa energé- IPCC – o Painel Internacional da Mudan-
tica planetária, que subjaz ao debate ça Climática. A análise deveria conside-
sobre mudanças climáticas e sobre suas rar, pois, o modo social como “se fecha
implicações para os padrões de urbani- o problema” da mudança climática – ou
zação hoje vigentes. O campo de forças seja, o modo como os discursos a consti-
pertinente é multiescalar, o jogo de esca- tuem como objeto de política para poder
las é pouco estável, “glocal” como dizem supô-la solúvel, legitimando as soluções
alguns num esforço de captar essa dinâ- propostas (Hajer, 1995).
mica e essa complexidade interescalares
ou de considerar a “política de escalas”, Cabe considerar, para tanto, a dis-
como o geógrafo Swyngedouw (2004). cussão em curso entre os autores da
Os climatologistas não conseguem en- Sociologia da Ciência Ambiental, que
xergar, por exemplo, os gradientes de sublinham, por um lado, a historicidade
variação da vegetação sob a ação de de seu objeto e, por outro, os problemas
desmatamento, que os biólogos obser- associados aos usos sociais da incerteza
vam em escala micro. O mesmo pode- (Winnie, 1994; Fabián, 1997). Quanto
mos dizer das alianças e estratégias de ao primeiro aspecto, na imbricação da
atores sociais que se configuram nesse socionatureza em movimento, cabe re-
campo, como construir um quadro sis- conhecer as múltiplas escalas de obser-
temático de análise capaz de explicar a vação e considerar os enunciados em
circunstancial aliança entre os interesses vinculação a seus contextos: admitem-
petrolíferos dos EUA e a agroindústria se respostas múltiplas a uma mesma
canavieira brasileira em torno ao etanol, questão. Só recentemente, por exemplo,
sem fazer intervir também o fator con- o conceito de sistema terrestre, na clima-
juntural da linha de ação do governo tologia, incorporou os sistemas sociais, as-
Chávez na Venezuela? E tudo isso apre- sumindo comportamentos não-lineares
sentado em nome do equilíbrio climático na interação dinâmica entre todos os
e do bem comum: ou seja, interesses diferentes elementos do sistema. Há, é
econômicos e geopolíticos em jogo legi- claro, aspectos éticos e políticos envol-
96 As cidades e as apropriações sociais das mudanças climáticas

vidos na discussão, mas também ques- lativos às mudanças climáticas? No que


tões propriamente epistemológicas: a diz respeito às relações Norte-Sul, estão
evidenciação da incerteza, sustenta Fa- em jogo as formas de integração das
biani, não exprime o reconhecimento economias periféricas no mercado mun-
de uma impotência do saber racional, dial: vemos culpar-se ora “o Sul” ora “o
mas sim uma redefinição de seus crité- Norte” – ou seja, manifesta-se, por um
rios de produtividade – reconsidera-se, lado, um neomalthusianismo animado
assim, o que se pode esperar socialmen- por conservadores e mesmo por um certo
te da produção científica. É preciso re- ambientalismo dos países industrializados
conhecer que a controvérsia científica (a culpa seria “do bebê indiano”) versus,
(demanda por conhecimento) tem tem- por outro, um desenvolvimentismo pró-
poralidade distinta da controvérsia po- prio aos países menos industrializados:
lítica (demanda por ação) e que o saber alegando-se um déficit de “pegada eco-
especializado não é mais capaz, por si lógica” com relação à dos países mais
só, de fechar o debate no interior da industrializados, reivindica-se o direito de
própria ciência, mas sim de abrir o de- poluir. No seio dos países menos desen-
bate sobre valores. As condições de va- volvidos, os atores sociais hegemônicos
lidade e os compromissos sociais e culpam os pobres (“atrasados”, impedem
morais da ciência expõem-se, pois, à as barragens de energia dita “limpa” e
discussão pública (ibid.). desmatam, emitindo gases-estufa; além,
é claro, de “travar o desenvolvimento”);
Há, por outro lado, também interes- ambientalistas e críticos do modelo de
ses envolvidos na própria controvérsia desenvolvimento acusam os ricos (usam
científica – uma indústria do conheci- energia para consumo de luxo) ou o
mento e grupos de peritos pressionam bloco de poder, que faz da idéia de de-
os governos para abrir mercados para senvolvimento no Sul uma forma de ex-
seus serviços. Com base na incerteza, a portar energia barata para as economias
pesquisa científica dita “dura” tende a do Norte. No seio dos países mais indus-
sugerir políticas “intensivas em pesquisa” trializados, por sua vez, críticos do mo-
e soluções meramente tecnológicas, via delo industrialista energético-intensivo
de regra sob hegemonia do complexo culpam os capitais que detêm o controle
técnico-industrial das economias centrais da indústria de combustíveis fósseis e
(Boehmer-Christiansen, 1995). Como afirmam que, quando ocorrem catástro-
sabemos, as inovações ligam problemas fes climáticas, os pobres pagam o preço
a soluções, mas os processos políticos é do consumismo dos ricos, como, por
que as fazem necessárias. exemplo, no caso do furacão Katrina pa-
garam os custos da concentração dos re-
Isso posto, quais os contextos dos cursos públicos na invasão do Iraque 15.
enunciados e diagnósticos correntes re- Eric Klinenberg mostrou como na seca

15
No caso do furacão Katrina, é sabido que os planos de evacuação não deram atenção à
população “com baixa mobilidade” – fatores como raça e classe foram considerados dimen-
sões fundamentais da catástrofe.
Henri Acselrad 97

de 1995 em Chicago os negros pobres questionadas, como a da energia nuclear


mais idosos, socialmente isolados e des- no caso francês).
providos de recursos foram as vítimas
fatais (Dreier, 2005). Pesquisas recentes No ano de 2007, governantes
no Brasil revelam como as populações como George W. Bush e Lula passaram
de mais baixa renda são as mais ambien- a apresentar-se como ambientalmente
talmente desprotegidas, sujeitas às mais preocupados quando o argumento eco-
vulneráveis condições de habitação e a lógico pôde justificar lucros para os capi-
inundações e doenças (Fonseca Alves, tais, divisas para o equilíbrio monetário,
2007). Assim como no caso do tsunami promessa de empregos para os eleitores
de dezembro de 2004, em que não ou força suplementar na trama geopo-
houve qualquer plano de emergência lítica. Há indícios mesmo de que o ar-
para os países asiáticos menos desen- gumento ecológico só tenderia a ser
volvidos. Katrina, tsunami e outras não abraçado por forças hegemônicas quan-
são manifestações comprovadas do do pudesse servir como reforço aos mo-
aquecimento global, mas servem para delos de dominação vigentes – fundados
exemplificar a socionatureza da chama- no agronegócio canavieiro, na energia
da “injustiça climática”, expressão nuclear e na hidroeletricidade, por
atmosférica da injustiça ambiental. Pode- exemplo. No Brasil, pouco se avançou
se supor, de forma plausível, que os no campo das energias alternativas, da
agentes hegemônicos tenham, com re- eficiência energética e da repotenciação
lação aos males das mudanças climáticas de usinas instaladas, entre outros. É sin-
previstas pelos modelos matemáticos tomática a enunciação recente, por uma
climatológicos, padrões de comporta- autoridade do setor elétrico, da vigência
mento análogos aos que têm demons- de um chamado “paradoxo ambiental”
trado ante as catástrofes climáticas já segundo o qual o “burocratismo” dos
ocorridas. órgãos de licenciamento ambiental “tem
feito com que seja mais simples produzir
Seja no âmbito das relações Norte- energia elétrica queimando carvão e
Sul, seja nas lutas socioterritoriais em petróleo, que contribuem para o efeito
curso no seio dos países industrializados estufa, do que utilizando água” (Inves-
ou no dos menos industrializados, vemos timento em poluição, 2007). Percebe-
um processo diversificado de apropria- se aqui o recurso a uma sutil chantagem
ção social do fato científico. Nas esferas do efeito estufa, via ameaça de multi-
políticas, ainda parecem contar pouco plicação de usinas termoelétricas, tanto
as evidências do Painel Intergoverna- para favorecer a desmontagem do siste-
mental em Mudança do Clima (IPCC, ma de licenciamento ambiental brasileiro
na sigla em inglês), assumidas basica- como para responsabilizar quilombolas e
mente por certos países europeus como índios pelo aquecimento global, em razão,
legítimas e merecedoras de orientar al- no caso, de estes contestarem a constru-
gumas mudanças nas políticas (ou então ção de hidrelétricas no rio Madeira.
de justificar práticas, por outras lógicas
98 As cidades e as apropriações sociais das mudanças climáticas

Há, pois, por um lado, por parte das para abastecer a suburbanização des-
forças hegemônicas, uma “irresponsa- controlada que promove (ibid.). Ou
bilidade organizada”, diria Ulrich Beck seja, o ônus do ajuste do novo ciclo cli-
(1992), mas “classista”, acrescentaria mático e hidrológico, sustenta Mike Davis,
Mike Davis: poucos recursos são destina- cairia, nessa região, sobre os ombros dos
dos para proteger ou remediar o risco grupos subalternos, notadamente dos
sofrido por grupos sociais “menos mó- trabalhadores rurais imigrantes cujo fluxo
veis” – pobres, negros e minorias étni- para os EUA tenderia a aumentar, justi-
cas –, acusados como são “de saber que ficando acusações de estarem indo “rou-
moram em áreas arriscadas e de querer bar a água dos americanos” (ibid.). Esse
que os contribuintes paguem por sua tipo de processo em que os custos da
escolha residencial” (tal como expresso degradação ambiental são concentrados
no jornalismo televisivo dos EUA em sistematicamente sobre os mais despos-
matérias posteriores ao furacão Katrina) suídos, ainda mais quando parte dos
(Davis, 2007). Parece vigorar uma es- interesses dominantes consegue auferir
pécie de percepção confiante de que os lucros com essa degradação, é compa-
males atingirão apenas os mais despos- tível com o entendimento dos movimen-
suídos. Uma espécie de Nimby (“não no tos sociais ditos de “justiça ambiental”:
meu quintal”) exclusivo das elites, ou segundo eles, pode-se pressupor que
seja, mecanismos pelos quais os toma- não haverá nenhuma iniciativa dos po-
dores de decisão detêm os meios de se derosos para enfrentar os problemas
distanciar das conseqüências ecológicas ambientais, enquanto for possível con-
de suas próprias ações. Mais que isso, centrar os males deles decorrentes nos
em tempos de liberação das forças de mais pobres. Seu corolário é que todos
mercado, observa-se uma apropriação os esforços deveriam ser concentrados
da denúncia ambientalista do capitalis- na proteção ambiental dos mais pobres,
mo e do modelo vigente de negócios de modo que, interrompendo-se a trans-
para fins de dinamizar o capitalismo e ferência sistemática dos males, as elites
os negócios – após o furacão Katrina, venham a considerar seriamente a neces-
por exemplo, as ações das empresas que sidade de mudar modelos de produção
ganharam contratos para a limpeza e a e consumo. Nessa ótica, por exemplo,
reestruturação das áreas afetadas – as quilombolas e indígenas do Madeira, ao
mesmas que atuam no Iraque – eleva- contrário do que propugnam represen-
ram-se em 10%. tantes de empreiteiras e desenvolvimen-
tistas pouco reflexivos, estariam na linha
Steve Erie da Universidade da Cali- de frente do combate contra o aqueci-
fórnia assinala como a expansão imobi- mento global, favorecendo, por sua resis-
liária no sudoeste dos EUA e na Baixa tência, energias alternativas e eficiência
Califórnia está comercializando milhares energética.
de km2 na frágil ecologia dos desertos,
apostando no aumento tendencial dos A pesquisa relacionada às mudanças
custos da água e em sua dessalinização climáticas desenvolvida na Comunidade
Henri Acselrad 99

Européia só começou a tratar dos aspec- ção das dificuldades políticas resul-
tos tecnológicos, sociais e econômicos tantes da diversidade de interesses
relevantes, para apoiar a formulação de sociais e de nações envolvidos neste
políticas, inclusive com a definição do enfrentamento. (Buttel e Taylor, 1992,
foco na eficiência energética, como re- p. 406)
sultado da politização do efeito estufa
em 1986. Para a formulação de políticas Já em 1988, o relatório Swedish
de combate às mudanças climáticas, esse Perspective on Human Dimensions of
efeito ambiental teve de ser traduzido Global Change chamava a atenção para
nos termos de um problema “tratável” os processos de construção social do
e politicamente “administrável” (Libera- conhecimento científico sobre mudança
tore, 1994, p. 192). Dessa forma confi- global, destacando o papel da história e
gurou-se o procedimento chamado por da cultura na definição dos temas cien-
Hajer de “fechamento do problema”, tíficos e políticos. É nesse contexto de
segundo o qual os discursos constituem construção social do problema que, em
a mudança ambiental como objeto de 1992, o relatório da U.S. National Re-
políticas, de modo a poder apresentá- search Council sobre mudanças am-
la como passível de solução (Hajer, bientais globais destacava “a importância
1995). A transformação de evidências da Geografia, das distâncias entre os as-
climatológicas nos termos de uma trama sentamentos humanos – e da Demogra-
política passou assim pela seleção de fia –, por exemplo, da dispersão das
ações relativas à busca de eficiência populações em subúrbios, na determi-
energética, o que permitiu que fossem nação do padrão de consumo energé-
associados os esperados benefícios am- tico” (U.S. National Research Council,
bientais à obtenção simultânea de bene- 1992).
fícios econômicos.
Em analogia com o que se verificou
Buttel e Taylor sustentam que, após na experiência européia, caberia per-
um período inicial de “lua de mel” du- guntar de que dependeria a construção
rante o final dos anos 1980, a modela- dessa “administrabilidade” das mudan-
gem do clima global, as estimativas de ças ambientais num país como o Brasil.
perda de biodiversidade e outros estu- Parece relativamente pequena a presen-
dos das implicações das mudanças am- ça de justificativas relacionadas a mu-
bientais tornaram-se objeto das disputas danças climáticas no debate brasileiro
científicas e, conseqüentemente, políti- sobre políticas urbanas. Essas políticas
cas. Segundo eles, prevaleceu por muito não parecem estar integrando de forma
tempo uma substantiva os temas políticos nos quais
têm sido traduzidas as questões das
construção moral dos problemas mudanças climáticas globais no país.
ambientais globais que enfatiza o
interesse comum nos esforços de seu Segundo pesquisa citada pelo The
enfrentamento, desviando a aten- Economist, a qualidade do ar começa
100 As cidades e as apropriações sociais das mudanças climáticas

a tornar-se preocupação de política pú- seringueiros na Amazônia sugere não ser


blica a partir do momento em que o PIB impossível que o mesmo venha a acon-
por habitante alcança 5 mil dólares. Po- tecer com movimentos sociais urbanos.
deríamos disto inferir que os baixos ín-
dices de desenvolvimento inibem a luta Em sua parábola da Ética do Bote
contra a poluição? (Bindé, 1998, p. 105). Salva-Vidas, o ecólogo Garret Hardin
Se considerarmos, hipoteticamente, que simulava uma situação futura, segundo
tal correlação possa ser estendida aos ele previsível, em que, dado o crescimen-
problemas menos imediatamente visí- to incontrolável de população, a nave-
veis como o das mudanças ambientais terra deveria escolher a quem reservar
globais, seria esperável que a mobiliza- os poucos lugares disponíveis nos botes
ção sociopolítica em torno a tal tema salva-vidas (Hardin, 1974). Hardin, numa
venha a crescer paralelamente ao cres- perspectiva claramente social-darwinista,
cimento da renda per capita. Tal mobi- sustenta que seria lógico reservá-los aos
lização pode associar-se, como vimos, que, na humanidade, mais tenham acu-
ao eventual envolvimento de elites urba- mulado tecnologia e civilização – ou seja,
nas que venham a distinguir nos impac- a seu ver, as populações dos países mais
tos das mudanças globais um problema industrializados. As populações “menos
que lhes diga respeito, que pareça afetar produtivas” deveriam, supõe-se, ser
substancialmente seus projetos, que con- deixadas ao largo. A relutância das elites
figure motivo suficiente para engajar a em assumir medidas compatíveis com
sua capacidade de se fazer ouvir na es- o princípio de precaução em matéria
fera pública. Nada impede, porém, que climática parece sugerir que a Ética do
representações de setores populares Bote Salva-Vidas encontra-se hoje em
também distingam e ponham em evi- operação. Seja nos bairros negros de
dência as articulações globais de lutas Nova Orleans, nas zonas em vias de de-
locais – notadamente por moradia se- sertificação da África, nas moradias de
gura, saneamento urbano e transporte risco no Brasil ou, ainda que sob pre-
coletivo apropriado – por eles desenvol- tensas razões ecológicas, nos processos
vidas no meio urbano. A experiência extenuantes de trabalho observados nos
pregressa de Chico Mendes e das arti- canaviais brasileiros.
culações ambientais globais das lutas dos

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Resumo Abstract
O texto procura discutir a natureza dos The article discusses the nature of envi-
impactos ambientais da urbanização de ronmental impacts of urbanization in a
forma ampla e relacional. Considerando large and relational scope, considering
as distintas apropriações sociais dos fatos urbanization process as constitutive of a
científicos e os modos sociais de cons- network-archipel of big metropolis,
trução do problema da mudança climá- nodes of multiple production and ex-
tica, são revistas as relações gerais que a change flows, trends observed at global
pesquisa estabelece entre a forma urbana level since the last decades of the XXth
e o clima. A configuração espacial dos century. The spatial configuration of
sistemas urbanos do Brasil é tratada, em Brazilian urban systems is treated, par-
particular, do ponto de vista dos efeitos ticularly, from the point of view of the
da densificação ou do espraiamento, as- effects of densification or sprawl associ-
sociados aos padrões de distribuição das ated to the patterns of distribution of
populações urbanas, sobre as dinâmi- urban population on climatic dynamics.
cas climáticas.

Palavras-chave: mudança climática, ur- Keywords: climate change, urbanization,


banização, meio ambiente urbano, forma urban environment, urban form.
urbana.

Recebido em outubro de 2006. Aprovado para publicação em novembro de 2006

Henri Acselrad é professor do IPPUR/UFRJ, pesquisador do CNPq, editor da


Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, co-editor (com Bruce Stiftel e
Vanessa Watson) do Dialogues in Urban and Regional Planning e organizador de
Conflitos Ambientais no Brasil.

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