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UNIVERSIDADE FEDERAL DE JATAÍ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS

APLICADAS CURSO DE DIREITO

CRIMINALIZAÇÃO SECUNDÁRIA

TÍTULO DO TRABALHO:

JATAÍ-GO

2023
UNIVERSIDADE FEDERAL DE JATAÍ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS

APLICADAS CURSO DE DIREITO

CRIMINALIZAÇÃO SECUNDÁRIA

TÍTULO DO TRABALHO:

Trabalho realizado como requisito avaliativo parcial


da disciplina de Criminologia no semestre de
2023.1, curso de Direito - Bacharelado, escrito
pelos discentes: Ana Carolina Gomes de Sousa,
Gustavo Franco de Moraes, Jadiel Rodrigues Xavier
da Silva, Maria Elisa Dy Santa Cruz, Sophia Sales
Bessa Santos, Yasmim Flores Cabral, Yasminn
Winslet Alves e Yuri Peixoto.

Docente: professor Dr. Diego Augusto Diehl

JATAÍ-GO

2023
RELATÓRIO:

1. Introdução (1,0 ponto)

- Apresentar o caso que foi escolhido para análise, justificando os motivos para tal definição;

- Delimitar o alcance analítico do trabalho (qual a abrangência do objeto de estudo, quais


teorias foram utilizadas etc), para então esclarecer no tópico seguinte o caminho
metodológico que foi adotado

(Ana)

2. Metodologia (1,0 ponto)

- Esclarecer qual(is) foi(foram) a(s) fonte(s) e o(s) método(s) adotado(s) para a coleta de
dados e informações para a construção do trabalho: pesquisa teórica (livros, artigos etc),
jurisprudencial (se for o caso), análise de dados e/ou documentos, notícias, observação,
estudo de caso etc

- Descrever todos os passos metodológicos para a execução do relatório: levantamento de


fontes de pesquisa, análise do material, construção de roteiro expositivo e analítico

(Gustavo)

3. Resultados (2,0 pontos)

3.1 —--------------------------------------------------------------------------------------------------------

Com a construção da sociedade como se conhece, e o estabelecimento de um Estado


Moderno, as instituições policiais surgem como expressão do poder para o controle
inconsciente dos indivíduos em sociedade. No entanto, sua presença em meio social vem da
premissa de que há a necessidade de ter órgãos que controlassem as ações e práticas dos
grupos existentes, mas são determinadas, como primordiais para a segurança dos indivíduos e
a promoção da ordem pública, na teoria, garantindo os direitos e liberdades de todos os
cidadãos, assim como agindo no combate, prevenção e investigação de crimes pela paz da
comunidade.

No Brasil, inspiradas no modelo ibérico, as instituições policiais, mesmo que nascendo


de formas distintas, possuem uma organização distribuída em setores com órgãos diferentes
envolvidos, possuindo sua autoridade, nisso pode-se citar as
principais: a Polícia Militar (PM), com uma estrutura hierárquica militar, possuindo praças e
oficiais, responsável por monitorar e agir na prevenção de ações criminosas, no
patrulhamento das ruas e estabilidade da ordem pública; a Polícia Civil (PC), com a função
de investigar crimes, dividida em departamentos com delegados e investigadores que agem
em relação a crimes cibernéticos, homicídios e narcóticos; e a Polícia Federal (PF), tem seu
papel na ação criminosa federal como corrupção e o tráfico internacional de drogas.

As instituições policiais brasileiras detêm de um histórico que migra do ditatorial ao


democrático, e são influenciados por uma cultura patriarcal em desconstrução. A partir de
1988 entra em vigência no Brasil uma Constituição Federal puramente democrática,
entretanto, a relação existente entre a polícia e os cidadãos ainda é de pouca confiança, isso
devido ao uso incorreto do poder atribuído aos agentes policiais à comunidade. Por várias
vezes, ocorre a violação dos direitos assegurados constitucionalmente, gerando uma
desconfiança por parte do povo, manifestado por agentes da lei, por meio de abusos de
poder, assédio físico e moral, uso indevido de armamentos, discriminação étnica e racial,
além da corrupção de alguns policiais envolvidos em ações criminosas, burlando a lei em
benefício próprio. Geralmente a abordagem policial é puramente violenta, ainda mais
com a distinção de grupos da elite, influenciados principalmente por fatores étnicos e de
classe social, e sua força é desproporcional quando se direciona a jovens negros, indivíduos
de zonas periféricas e minorias no geral, resultando em uma relação problemática e com
pouco diálogo com esses grupos. Durante os anos o foco nos elementos criminosos suspeitos
são dessas minorias, uma pesquisa feita em 2022 pelo Centro de Estudos de Segurança
Pública mostra que na cidade do Rio de Janeiro 63% das pessoas abordadas pela polícia são
negras, e é relatado na pesquisa que a forma violenta de abordagem teve um aumento nos
últimos anos. No boletim Negro Trauma do Rio revela alguns dados a respeito dessas ações,
além de avaliações dos agentes e experiências dessas abordagens, a partir dessa pesquisa:

● Negros são 68% dos abordados andando a pé na rua ou na praia, 74% em vans ou
Kombis, 72% nos carros de aplicativos, 71% no transporte público, 68% andando de
moto e 67% em um evento ou festa;
● 17% das pessoas abordadas já foi parada mais de 10 vezes;
● 79% dos que tiveram sua casa revistada pela polícia eram negros;
● 74% dos que tiveram um parente ou amigo morto pela polícia são pessoas negras;
● PM tem pior desempenho na avaliação entre os entrevistados e recebe nota 5,4;
● Só 17% acham que não existe racismo na Polícia Militar;
● Negros são 70% dos que presenciaram a polícia agredindo pessoas, 79% dos que
tiveram suas casas invadidas e 74% dos que tiveram um parente ou amigo morto pela
polícia;
● 45% das pessoas pretas reprovaram a Polícia Militar (isto é, deram nota menor que 5);
23% das pessoas brancas e 28% das pessoas pardas também reprovaram a PM.
Apenas 3% consideram a PM nada corrupta e 7%, nada violenta.

Em detrimento dessa pesquisa, a Polícia Militar se pronunciou dizendo que as ações


realizadas nas abordagens são pautadas em um protocolo rígido e que a maioria do corpo da
polícia vêm de classes de base da sociedade. Além da PM destacar que foi uma das primeiras
instituições públicas do Brasil a ter uma pessoa negra como comandante e, atualmente, a
maioria dos seus efetivos de praças e oficiais é constituída por pessoas negras.

A violência é contínua, pois, no Brasil, existe uma grande impunidade dos policiais,
onde os culpados não são encontrados por falta de uma investigação minuciosa, e os
responsáveis são poupados sem justiça pelas vítimas. A abordagem através do diálogo é
pouco vista, já que prezam por uma resposta armada, por uma influência histórica militar,
justificando essa agressividade, além de um treinamento inadequado. Refletindo, claro, os
valores e direitos básicos dos cidadãos, uma reforma da polícia brasileira deve ser um debate
público, político e democrático. Priorizando a transparência, uma educação policial através
de representatividades, diversidade e inclusão dentro das instituições policiais.

O cenário de criminalidade no Brasil é preocupante, tanto para a sociedade quanto para


as instituições policiais, de acordo com Folha de São Paulo, tendo um crescimento absurdo
desde 2000, ultrapassando o número de vagas suportadas
pelo sistema carcerário, demonstrando um déficit de vagas, com cerca de 832 mil presos, em
2022 o país possui a terceira maior população carcerária do mundo, sendo 68,2% pessoas
negras e 43,1% possuindo entre 18 e 29 anos, pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública,
oriundos de locais marginalizados pela sociedade, ilustrando a atenção necessária à segurança
pública.

3.2 —--------------------------------------------------------------------------------------------------------

A polícia é uma instituição criada para manter a segurança não somente da sociedade,
como também das regras jurídicas, usando métodos de prevenção e investigação do que foge
às leis aceitas. Entretanto, a polícia abandona seu papel quando enxerga-se a cotidianidade
dos casos de violência contra aqueles à quem deveria proteger.

As raízes das razões da violência policial encontram no Estado a falha de não afirmar
os direitos democráticos de seu povo, segundo Pinheiro, conforme citado por Oliveira e
Tosta (2001, p.55), no Brasil, bem como em diversos outros países latino-americanos,
verifica-se uma significativa discrepância entre o que está prescrito na legislação e a dura
realidade da aplicação das leis. A promulgação da nova Constituição brasileira em 1988 foi
capaz de incorporar muitos direitos individuais que eram rotineiramente violados durante o
período da ditadura militar.
Direitos essenciais como o direito à vida, à liberdade e à integridade pessoal foram
oficialmente reconhecidos, além de se estabelecer como crime a prática de tortura e a
discriminação racial. Contudo, apesar do reconhecimento formal desses direitos, a violência
perpetrada pelas mãos do Estado persiste.

Conforme Pinheiro (apud OLIVEIRA e TOSTA, 2001), o autoritarismo do Estado


sobre seus cidadãos faz com que a sociedade reproduza o que o Estado lhe faz, entre si. A
violência é, entretanto, igualmente um desdobramento intrinsecamente ligado à persistência
de uma prolongada tradição de atos autoritários perpetrados pelas elites em detrimento das
camadas populares, os quais, por sua vez, são reproduzidos dentro do estrato socioeconômico
mais baixo.

A reintrodução de princípios constitucionais democráticos teve um impacto limitado


na supressão desses comportamentos autoritários dentro da sociedade e a continuidade citada
engloba-se nas relações policiais na sociedade brasileira, haja vista que a polícia sempre foi o
braço armado do Estado em suas medidas repressivas e abusos contra os direitos individuais.
Ao notar tal continuidade, o que atrai mais ainda a atenção de todos é a atuação direta da
polícia em episódios de violência sem sofrer nenhuma represália do Estado.

Nesse contexto, encontra-se outra razão enraizada na violência policial, o despreparo


dos agentes policiais nas formas de abordagem, haja vista que sem nenhum controle estatal,
os agentes acreditam que estão acima das leis e que podem levar a julgamento a vida ou a
morte de um indivíduo. Logo, encontra-se o termo chamado de “abuso de autoridade”, mas
afinal o que é abuso de autoridade?

Aprofundando a concepção do termo autoridade do ponto de vista sociológico, Max


Weber (apud OLIVEIRA e TOSTA, 2001, p. 60) evidencia que o termo dominação é
utilizado para descrever a probabilidade de obter obediência a ordens específicas, ou todas
elas, dentro de um determinado grupo de pessoas. Cabe ressaltar que essa definição não
abrange todas as formas de poder ou influência exercidas sobre outras pessoas. Em cada caso
individual, a dominação, também conhecida como autoridade, pode fundamentar-se em
diversos motivos de submissão que variam desde hábitos inconscientes até considerações
puramente racionais, relacionadas a objetivos específicos.
No entanto, é importante destacar que um mínimo de vontade de obedecer, ou seja,
um interesse externo ou interno na obediência, é necessário para estabelecer uma relação de
dominação autêntica. Weber (apud OLIVEIRA e TOSTA, 2001) afirma ainda que toda
forma de dominação buscará uma forma de legitimação e conforme Oliveira e Tosta “o setor
policial [...] tem legitimidade do monopólio da força” ( 2001, p. 25).

O abuso de autoridade se estabelece em uma sociedade na presença de impunidade,


ou seja, quando o Estado omite a punição daqueles que cometeram tais abusos. “Entre as
instituições existentes, o trabalho da Ouvidoria de Polícia do Estado de São Paulo tem sido
bastante significativo.” (OLIVEIRA; TOSTA, p. 63). A tabela a seguir apresentada por
Oliveira e Tosta (2001) demonstra os dados encaminhados à ouvidoria sobre os casos de
abuso de autoridade por parte da polícia civil e militar, que respondem, respectivamente, por
730 e 1317 denúncias.

TABELA 1

Denúncias encaminhadas à Ouvidoria de Polícia do Estado de São Paulo:


1996-1999

Natureza POLÍCI POLÍCI TOTAL


A CIVIL A
MILITA
R

Abuso de autoridade 730 1317 2047

Concussão 623 252 877

Homicídio cometido por policial 180 683 863

Espancamento/tortura 413 279 692

Prevaricação 444 135 579

Ameaça 232 285 517

Agressão 114 142 257

Corrupção 152 52 204


Peculato 29 34 63

Estelionato 15 14 29

Total 2932 3193 6125

Fonte:Oliveira e Tosta (2001, p. 64)

Ainda conforme Oliveira e Tosta (2001), há falta de entendimento da lei, haja vista
que os delitos presentes na tabela apresentada poderiam configurar atos de abuso de
autoridade, o que resultaria no salto de 2.047 casos para 6.125. Também são apresentados
dados que ressaltam a importância de fortalecer os órgãos responsáveis por investigar a
conduta policial, uma vez que apenas 6.38% dos casos encerrados em 1999 foram
considerados como denúncias improcedentes após a apuração.

Os autores também enfatizam que dados do relatório demonstram a expansão do


âmbito de atuação da Corregedoria da Polícia Civil, que passaria a ter responsabilidade por
todo o Estado. Além da criação de uma carreira específica para os policiais que integram
os órgãos corregedores das duas polícias. Com essa proposta, os órgãos corregedores
adquiriram independência e autonomia para conduzir as investigações com maior
imparcialidade diante das denúncias recebidas.

Outros dados do Relatório da Ouvidoria de São Paulo (Oliveira e Tosta, 2001,


p. 43) revelam que os policiais punidos por denúncias feitas à Ouvidoria foram de 6,92% na
Polícia Civil e 42,23% na Polícia Militar. O Relatório também afirma que a grande maioria
dos policiais militares punidos vem das partes mais subalternas da hierarquia institucional.
Ademais, de acordo com Oliveira e Tosta (2001, p. 65) ”enquanto a Polícia Militar tem
dificuldades de punir membros mais graduados da corporação, a Polícia Civil apresenta um
grau de impunidade geral absurdamente alto.”

Já de acordo com RAMOS et al. (2021, p. 10) nos dados da Rede de observatórios da
Segurança, projeto do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) que reúne
dados produzidos pelas polícias e obtidos via Lei de Acesso à Informação de sete estados,
sendo eles BA, CE, MA, PE, PI, RJ e SP, o
número de violências, abusos e excessos por parte de agentes do estado notificados
registrados durante os eventos monitorados de agosto de 2021 a julho de 2022 foram:

TABELA 2

Eventos monitorados pela Rede de Observatórios da Segurança Agosto de


2021 a julho de 2022
BA CE MA PE PI RJ SP
Violências, abusos e 18 40 7 5 11 53 127
excessos por parte de
agentes do
Estado
Corrupção policial 0 7 8 0 6 12 13

Fonte: Ramos et al (2022, p. 10)

Não obstante, é delegada à polícia e outras instituições a legítima função do exercício


direto do monopólio da violência como instrumento extremo de manutenção da ordem
pública, visto que a resolução de alguns conflitos podem exigir o uso da violência por parte
da polícia (Bandeira e Suárez, 2001).

À vista do exposto, no que tange a administração de conflitos, sua realização pode ser
feita através do diálogo ou do uso da força. Todavia, o diálogo exige uma percepção das
razões de ambas as partes, enquanto na força busca-se transformar o outro em si, estendendo
a própria vontade aos demais (Soares e Carneiro, 1996 apud Bandeira e Suárez, 2001). Nesse
sentido, Bandeira e Suárez (2001) apontam que a utilização da violência em resolução de
conflitos de ordem política modifica-se, em alguns casos, como uma forma de discriminação
de classe, gênero e/ou raça.

Os encadeamentos do uso de noticiários a respeito de casos sobre violência policial


devem ser levados em consideração, uma vez que estes atuam diretamente na elaboração
tanto dos sentidos quanto dos significados acerca do ato violento e dos atores envolvidos,
modificando a construção da opinião e percepção moral social em relação ao universo da
violência. A mídia assinala ainda a evolução dos
comportamentos observados na sociedade e articula as marcas de cor, classe e gênero
das vítimas da violência policial (Bandeira e Suárez, 2001).

Bandeira e Suárez (2001) apresentam dados a respeito das mortes violentas ocorridas
em 1997 e 1998, organizadas em quatro categorias, expostas na tabela a seguir:

TABELA 3

Mortes violentas ocorridas em 1997 e 1998

Ano Homicídios Homicídios Homicídios Homicídios


cometidos cometidos pela cometidos pela cometidos pela
polícia, no polícia no polícia fora do
exercício ou não exercício de exercício de
de suas funções suas funções suas funções

1997 12.124 1.058 867 191

1998 12.795 1.106 (+4,5%) 962 (+10,5%) 144 (-18%)


(+5,5%)

Fonte: Bandeiras e Suárez (2001, p)

De acordo com os dados, cerca de 8,7% e 8,6% das mortes violentas ocorridas entre
1997 e 1998 foram provocadas por policiais, estando eles no exercício de sua função ou não.
Outro dado relevante aponta que policiais matam mais homens do que mulheres, entretanto
ao longo dos dois anos (1997 e 1998) 82,2% das mortes masculinas ocorreram enquanto os
policiais exerciam suas funções e 25,5% das mortes femininas aconteceram sobre a mesma
circunstância, isto é, as mortes de mulheres causadas por policiais possuem maior relação
com contato interpessoal do que profissional (Bandeira e Suárez, 2001).

Em relação à cor das vítimas dos homicídios cometidos, a categoria “não consta” é
expressivamente maior que as demais, totalizando 84% e 86%, em 1997 e
1998 respectivamente. Da mesma forma, das vítimas classificadas, 42,3% e 46,8% eram
brancas e 57,7% e 53,2% eram ‘não-brancas’. No que concerne às vítimas de atuação
policial, em 1997, 19% eram brancas e 81% ‘não-brancas’ e, em 1998, houve um aumento de
16,2% no número de vítimas brancas e 17,6% em vítimas ‘não-brancas’ (Bandeira e Suárez,
2001).

Ainda de acordo com (RAMOS et al., 2021, p. 10), o registro do número de mortos
por agentes pela polícia no estados monitorados em 2019 e 2020 se configuram da seguinte
maneira:

TABELA 4

Número de mortos pela polícia em 2019 e 2020


Estados Ano de 2019 Ano de 2020
BA 650 787
CE 136 145
MA 72 97
PE 74 113
PI 42 35
RJ 1814 1245
SP 815 814

Fonte: Ramos et al (2021, p. 10)

Pode se verificar também a partir do número de mortes decorrentes de ação policial


no ano de 2021 de RAMOS et al (2022, p. 7) que o número de vítimas negras, constituídas
pelo somatório de pretos e pardos conforme critério estabelecido pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), é expressivamente maior do que o número de não informados
e as demais categorias. Segue abaixo a tabela completa:

TABELA 5
Número de mortes decorrentes de intervenção do Estado por raça ou cor
- estados monitorados pela Rede de Observatórios - 2021
Cor BA CE MA PE PI RJ SP
Branca 13 3 0 4 8 154 149
Negra 603 36 0 101 24 1.060 330
NI 397 86 87 0 2 142 90
Outros 0 0 0 0 0 0 1
Parda 528 31 0 95 20 696 293
Preta 75 5 0 6 4 364 37
Total 1.013 125 87 105 34 1.356 570

Fonte: Ramos et al (2022, p. 7)

As vítimas negras configuram 97,9% dos mortos na Bahia, 96,3% em Pernambuco,


92,3% no Ceará, 87,3% no Rio de Janeiro, 75% no Piauí e 68,8% em São Paulo, excluindo-se
os casos em que não há informações sobre a cor dos mártires. Segundo a rede de
observatórios de segurança, a secretaria de segurança do estado do Maranhão evita lidar com
a gravidade deste desvio ao impedir a análise dos dados sobre letalidade policial, não
divulgando a distribuição de cor dos mortos.

A violência racista possui mecanismos que se encontram não somente na negação da


cor, mas também de outras características do corpo e de atributos identitários (Costa, 1986
apud Bandeira e Suárez, 2001), acarretando em associações negativas e, consequentemente,
tornando a identidade do sujeito contestável, produzindo uma relação de perseguição ao
indivíduo ‘não-branco’. De acordo com Bandeira e Suárez (2001, p. 140), “há um imaginário
que é construído em torno da diferença racial” e a conduta policial sustenta e reproduz
preconceitos estruturais e estruturantes da cultura, refletindo diretamente a desvalorização
presente na sociedade quanto às classes oprimidas.

Frente ao supracitado acima, verifica-se que, em casos de manutenção da ordem


pública, o uso da violência (de maneira descomedida), da força e da
opressão pode se apresentar como um meio de discriminação às classes populares e a
população negra, comprometendo assim o monopólio da violência governamental e a
legitimidade do poder policial (Bandeira e Suárez, 2001). Evidencia-se, assim, um
despreparo das forças policiais frente à diversidade.

A percepção popular de que a segurança pública é uma metáfora a guerra, na qual


o cidadão infrator deve ser derrotado ou aniquilado (Silva, 1999; Vasconcelo, 1998 apud
Bandeira e Suárez, 2001) provoca diversos problemas, como por exemplo a valorização da
polícia como atores exclusivos do combate à criminalidade e a predileção por atos violentos a
atos democráticos na resolução de conflitos, contribuindo ainda para o aumento do uso
discriminativo da violência (Bandeira e Suárez, 2001).

Questões de raça, gênero e socioeconômicas afetam diretamente o acesso a bens, a


serviços e aos direitos do indivíduo, ainda que perante a lei todos sejam iguais, sem distinção
de qualquer natureza. Adorno (1996, apud Bandeira e Suárez, 2001) postula que a violência
policial não pode ser separada do fato de que vivemos em uma sociedade na qual
determinadas existências são tidas como perturbadoras da ordem social, isto é, uma sociedade
que não assegura a isonomia legal.

Outrossim, as expectativas da sociedade civil colaboram para o uso descomedido da


violência policial, bem como na formação de um governo violento, em especial das classes
médias e altas, que apresentam uma postura ambígua, cobrando da força policial uma
resposta frente aos abusos cometidos, ao mesmo tempo em que exigem o combate aos
“criminosos das favelas e periferias” (Silva, 1990 apud Bandeira e Suárez, 2001).

3.3 —--------------------------------------------------------------------------------------------------------

A instituição policial é uma instância oficial que está responsável, em primazia, pela
atribuição da criminalização secundária a indivíduos que apresentem, na sociedade, condutas
consideradas digressivas. De forma tendenciosa, entretanto, assim como já citado
anteriormente, a polícia tem uma abordagem questionável, dado que as minorias sociais,
principalmente, às pessoas pretas e periféricas, são constantemente vigiadas e consideradas
suspeitas de contravenções, mesmo que, de fato, não tenham cometido quaisquer atitudes
consideradas ilegais, visto que:
“Como os pobres urbanos encontram-se em situação desvantajosa quanto à sua
capacidade de influenciar significados e decisões institucionais no que diz respeito
ao crime e seu combate, a resultante social lhes é desfavorável: está criminalizada a
pobreza.” (Ratton Jr., 1996, p.83)

Enquanto isso, há casos criminosos sendo perpetrados em bairros nobres e condomínios


de luxo que são de conhecimento policial, no entanto, permanecem velados ou
subnotificados, já que são feitos por indivíduos influentes social e economicamente, logo, os
profissionais da instituição policial tendem a não exercer suas funções pré-estabelecidas por
medo de que a imposição de suas autoridades faça recair sobre eles retaliações, tal qual a
perda de seus cargos, em decorrência disso, eles tendem a ser omissos.
Em síntese, os policiais têm legitimidade para demonstrarem seu poder de
aplicabilidade investigativa e punitiva aos povos mais vulneráveis e, inclusive, tendem a ser
bastante violentos e extremos diante a casos banais. Todavia, o domínio de autoridade
policial não se difunde aos indivíduos mais vangloriados socialmente, já que, assim como
assinala Ratton Jr., “certos tipos de crimes cometidos por indivíduos dos extratos médios ou
superiores são amplamente subnotificados.” (Ratton Jr., 1996, p.83), demonstrando, assim,
que:

“a observação, o controle, a suspeita exercida pelas instituições de controle social


atingem, seletivamente, as camadas mais pobres da população. Nem todo mundo é
visto como suspeito; aí também atua uma construção social fundamentada no senso
comum e em seus estereótipos, os quais, tendendo a identificar os pobres às classes
perigosas, atribuem aos crimes de colarinho branco uma outra conotação: aqueles
que os praticam, mesmo no caso de serem vistos como marginais, são percebidos
como participantes de uma marginalidade quase simbólica, no sentido de que é do
tipo que não atenta contra a integridade física.” (PORTO, Maria S. G., 1999, p. 45)

Para exemplificar melhor a desigual abordagem policial, o artigo em questão traçará um


comparativo entre a aplicabilidade punitiva da instituição quando se trata de um indivíduo
preto e pobre, que foi a ocorrência de Genivaldo, versus um cenário que envolve uma pessoa
da elite que desacatou a polícia.
De acordo com as informações expostas pelo g1, portal de notícias da Globo, Genivaldo
foi abordado por três policiais rodoviários federais por estar sem capacete, na rodovia,
enquanto pilotava uma moto. Durante o processo de revista, por ter transtornos mentais
(esquizofrenia), a vítima, por não conseguir se manter imóvel, foi contida de maneira violenta
e foi colocado no porta-malas da viatura enquanto os agentes borrifavam gás lacrimogêneo e
sprays de pimenta. Em decorrência a isto, Genivaldo foi morto por asfixia.
Indo de encontro à abordagem policial deferida a Genivaldo, tem-se uma ação policial
mais tolerante no caso de Ivan Storel. Este é um empresário, residente de um condomínio de
luxo que, conforme noticiado pelo site jornalístico “Pragmatismo Político”, foi denunciado
pela própria mulher por violência doméstica. Os agentes policiais, ao chegarem na casa do
criminoso, foram desacatados por um longo período, até que os mesmos imobilizaram e
algemaram Ivan, mas tudo ocorreu de forma menos brutal se comparado com o caso de
Genivaldo. O acontecimento em questão teve repercussão na internet e diversos internautas
opinaram que se o delinquente estivesse na periferia, possivelmente, já estaria desacordado
pelos PM's, enquanto isso, no bairro luxuoso, os policiais falam manso e aceitam a
humilhação.

Demonstração das notificações e indiciamentos criminosos: crimes do


colarinho branco vs. crimes da “ralé”.
No intuito de respaldar ainda mais o que foi afirmado, especificamente na questão da
seletividade de indiciamentos da instituição policial, o gráfico abaixo demonstra os
números irrisórios de crimes de colarinho branco notificados.
Enquanto isto, a tabela evidencia que os crimes que, geralmente, são cometidos por
indivíduos vulneráveis social e economicamente, apresentam, quantitativamente, um
elevado número de notificações, evidenciando, portanto, que a polícia tende a vigiar e punir
mais os desafortunados, haja vista que, perante a eles, a instituição policial tem
“legitimidade” para manifestar seu poder.

3.4 —--------------------------------------------------------------------------------------------------------

Os estereótipos estão presentes em todas as organizações, na qual se destaca


principalmente o racismo institucional, que é o fracasso das organizações em prover um
serviço profissional e adequado às pessoas em virtude de sua cor,
cultura, origem racial ou étnica. O racismo institucional pode gerar práticas racistas voltadas
para membros da própria organização, mas seu resultado principal é a perpetuação de uma
desigualdade que é estruturante. Há indicadores relacionados há dados de segurança pública:

“No Rio de Janeiro, por exemplo, no ano de 2014, os homicídios praticados pela
polícia corresponderam a 15,4% do total de homicídios. Quando se analisa o perfil
das vítimas, evidenciase que a maioria é do sexo masculino (99,5%), jovem (75%
entre 15 e 29 anos de idade) e negra (79%). A maioria deles também vivia nas áreas
mais pobres da cidade, principalmente nas
favelas (Anistia Internacional, 2015).”

Ao analisar essas práticas, é possível observar alguns aspectos do racismo institucional


presente em ao menos algumas Polícias Militares brasileiras (PMs), na qual, segundo
analistas do comportamento:

“Uma organização é composta por subsistemas denominados de"setores


","departamentos ","diretorias ", etc. Cada um deles pode ser analisado do mesmo
modo que uma organização completa, envolvendo metacontingências específicas
(Glenn & Malott, 2004). Os produtos agregados de cada setor são essenciais para o
funcionamento de outro(s) setor(es) da organização e geram consequências
culturais específicas (muitas vezes produzidas internamente à organização; (Glenn
& Malott, 2004).”

A Polícia Militar é dividida em diversos grupos internos, no qual estão inseridos os


comandos de policiamento (de trânsito, áreas metropolitanas, do interior, da capital etc.),
diretorias (de pessoal, da saúde, de logística, de ensino, etc) e de outros departamentos
( corregedoria, comando geral). Esses comportamentos são divididos em diversos
funcionários e, são extremamente importantes para que a PM possa realizar suas atividades.
Ao aplicar essas atividades nos estudos dos analistas citados, são definidos como produtos
agregados as rondas de áreas escolares, as abordagens policiais, a detenção, etc. Assim,
outros órgãos da Secretaria de Segurança Pública estadual (chefia de gabinete, ouvidoria) são
os responsáveis por alterar e estabelecer as diretrizes do funcionamento da PM.
Na figura acima, estão presentes algumas metacontingências relacionadas ao
funcionamento da Polícia Militar, no contexto da Secretaria de Segurança Pública estadual.

Para abordar o racismo institucional na PM, é preciso analisar as atividades


específicas que indicam responsabilidade no racismo institucional. A abordagem policial é
um exemplo, já que, é uma função essencial realizada pela PM e, envolve diretamente a
população na sua realização. Segundo diversas pesquisas, as pessoas negras, especialmente
homens negros e pobres, são os principais alvos da abordagem policial.
Assim como é mostrado no gráfico acima, a população negra é a principal vítima dos
agentes de Estado. Alguns fatores comportamentais presentes nessa problemática é a
aprendizagem social do preconceito racial, no qual o racismo institucional se dá devido ao
preconceito policial da população como um todo, o direcionamento das abordagens policiais
pela ‘guerra às drogas” que incentiva a abordagem mais frequentes de negros desfavorecidos
socialmente. E por fim,a seleção de macro comportamento, que pressupõe que os policiais
acabam realizando as abordagens de acordo com um padrão e favorece a seleção
comportamental errônea.
A mídia reforça cada vez mais esse estereótipo, ao apresentar posicionamentos pró-
militar e reafirmar que os infratores são monstros na sociedade. Porém, em nenhum momento
a segurança pública é discutida como problema social mas, é realizado um reforço do
estereótipo que a polícia é o herói, protegendo os “cidadãos de bem” dos bandidos ao
colocarem os mesmos na prisão, que é colocado como a vitória na batalha contra o “bem e o
mal”, mesmo a polícia matando mais que a bandidagem no Brasil.

3.5 —---------------------------------------------------------------------------------------------------------

O intuito desse tópico é entender possíveis causas que contribuem para a conduta
violenta dos policiais militares. Nesse sentido, é preciso abordar como ocorre o processo de
socialização e de militarização dos policiais militares nas instituições.

Ao ingressar na Academia de Polícia, o novo policial estará sujeito a um diferente código


de conduta que passará a mudar a sua visão de mundo, em que o quartel será visto como sua
residência e os demais internos como sua família. Segundo o sociólogo Peter Berger, “parte
socializada da individualidade costuma ser designada como identidade.”, com isso, é possível
compreender a metodologia aplicada aos alunos soldados, pois o principal objetivo no
processo de socialização é a absorção dos princípios e valores cultivados no seio militar, é a
construção de uma identidade que externe a instituição. Não é sem fundamento que, durante
esse período, o contato com o mundo externo é limitado, para que ocorra a “Mortificação do
Eu", ou seja, a anulação do indivíduo, segundo posto pelo sociólogo Erving Goffman.

Não somente a iniciação do treinamento reflete na conduta, como também a


hierarquização da instituição, como apresentado na obra “Praça Velho” a visão hierárquica
predominante no militarismo não permite com que o superior veja o subordinado como
semelhante, consequentemente esse indivíduo é socializado num ambiente de relação hostil.
Dessa forma, as práticas policiais pautadas no autoritarismo e na violência física seja um
reflexo mecânico da vida em quartel.

“[...]O aluno era submetido a tratamentos humilhantes.Os oficiais, nessas ocasiões,


alcançavam uma total submissão dos alunos que, sob qualquer pressão, precisavam
suportar as humilhaçoes, caso quisessem permanecer
ligados ao curso, e qualquer desobediência poderia resultar no
desligamento ou em punições.[...]“ (SILVA, p.29)

Diante do exposto, os alunos que não conseguem se ajustar conforme o regime da


instituição acabam sendo perseguidos pelos seus tutores, sendo preferível adequar às normas
militares, independente das circunstâncias, para garantir respeito entre os demais.

Conforme a obra, a denominação de “Praça Velho” é o policial que atingiu um alto grau
de conhecimento prático, tanto no trato com os superiores hierárquicos como no seu
relacionamento com a sociedade mais ampla. Ele não deixa vestígios de suas ações na
sociedade e nem práticas que descumpram a lei. Segundo o autor Agnaldo Silva, esse
policial é visto como “modelo” para os novatos, os praças velhos instruem os internos com
valores e comportamentos que ressaltam o policial militar como superior ao civil.

A partir dessa instrução, o novato será influenciado a reavaliar o ambiente que ele possa
frequentar e o grupo de pessoas com quem ele pode se relacionar, pois ele passa a ser a
imagem da corporação. Diante disso, o novo policial assume uma postura mais “séria” e,
assim, evitando contato com civis. Os demais indivíduos, rotulados de maneira pejorativa
como “paisanos”, assumirão uma posição de inferioridade simbólica em relação aos
militares. Sob essa lógica, é possível expor o tratamento danoso para com a sociedade e,
principalmente, para as camadas populares, tendo em vista que já são marginalizadas por
outros entraves sociais.

No que cerne a militarização da polícia militar, entende-se como o processo pelo qual a
polícia incorpora cada vez mais os padrões do militarismo e do modelo das forças armadas.
Desta forma, a militarização diz respeito ao grau de identificação das polícias com o campo
militar, absorvendo suas crenças, valores e saberes.

“O militarismo deixa de ser um meio para se tornar um fim em si mesmo” (SILVA, p.30)

Diante desse cenário, os policiais estariam sendo treinados para usar o máximo de sua
força combativa, contrariando seu dever de proteção a comunidade e de que usariam apenas
o necessário o que, consequentemente, provoca um desvio de
funções entres as instituições no trato da segurança pública elevando o aumento da violência
contra os cidadãos.

“Treinamentos, os exercícios e o próprio cotidiano dos policiais são marcados


muito mais pela hierarquia e pela disciplina do que por qualquer outro valor ou
preceito. O policial militar recebe um treinamento muito mais para ser militar do
que propriamente para ser policial, isto é, a ênfase dada
no curso de formação dos policiais militares volta-se mais para a
internalização dos valores do militarismo do que para as relações do trabalho que
policial desempenha junto à comunidade.” (SILVA, p. 81)

“[...] A gestão feita pelo Exército tira a possibilidade da polícia de se organizar


como categoria, entender e aprimorar seus direitos e deveres e impede que a PM
possa agir como uma instituição multidisciplinar garantindo respeito e formação
para tropa como a comunidade.” (MELO, raissa, 2019)

Dito isso, fomentar a desmilitarização da polícia é compreendê-la como uma instituição


civil para assim permitir que seus membros possuam os mesmos direitos e deveres inerentes
ao restante da população. Esta ideia pretende retirar da polícia o seu modo de operação
bélico que vem do sistema militar das Forças Armadas e de sua ação hierarquizada. Fazendo
isso, os novos agentes policiais, possivelmente, vão diminuir as abordagens desiguais entre
os cidadãos, haja vista que o treinamento será voltado mais para a função da instituição de
proteção dos cidadãos e não mais a militarização e necessidade de demonstração de qual
cargo detém maior ou menor poderio.

4. Análise teórica (3,0 pontos)

4. resultados
4.1 Criminalização secundária: atuação arbitraria das policias sobre a população preta
e periférica.
Para uma melhor análise sobre a definição de crime, é necessário antes de tudo,
entender como certas condutas são tidas como ilícitas, pois essa tipificação demostra
um determinado conhecimento social daquilo que é importante coibir. Dentro dessa
ótica, é importante entender os processos formais de criminalização, em outras
palavras, entender o “[...] meio de seleção, pelos mecanismos de controle social, de
pessoas e condutas a serem punidas” (ARAÚJO, 2010, p. 114).
Nota-se que, independentemente do processo de criminalização, o Estado é o
principal responsável pelo o desenvolvimento, pois fica sob sua responsabilidade a
criação e a aplicação da lei (SELL, 2007).
O desenvolvimento da criminalização se divide em três momentos: criminalização
primária, criminalização secundária e criminalização terciária. A criminalização primária
é o momento de criação da lei, ou seja, é nessa primeira etapa que se define o que
são condutas ilícitas, por meio de um ordenamento jurídico. Já a criminalização
secundária corresponde a atuação das instituições de controle social na punição e
coerção do agir criminoso. Por último, a criminalização terciaria que decorre do
estigma que recai sobre o indivíduo após o cárcere.
Como o presente trabalho tem o foco a criminalização secundária, é de importância
uma análise mais profunda sobre seu recorte para um entendimento dos resultados
apresentados acima.
Como já dito, a criminalização secundária aborda os papeis das agências e serviços
de controle formais, como a polícia, órgãos de acusações e as cortes de julgamentos,
não apenas de modo a realizarem seus fins, mas também de coibir comportamentos
que prejudicam a ordem, além de moldarem o novo comportamento social surgido
com o tipo penal.
Essa seletividade da ação estatal, é vista para Araújo (2010, p. 123), como um
processo de “funil, no qual, do montante total dos comportamentos ilícitos praticados,
apenas alguns são capturados e processados pelo sistema”. E complementa:
Os policiais perseguem precipuamente os sujeitos cujas características
identificam-se com a dos seus principais clientes, têm tendência a atuar
de modos distintos tendo em vista aspectos pessoais e de
comportamento da vítima, agem mais rigorosamente na persecução de
alguns crimes quando há delegacia especializada no combate de
determinado gênero de ilícitos, entre outros fatores (ARAÚJO, 2010, p.
123-124).
Em consoante com o pensamento do autor, nota-se como as polícias agem de acordo
com certa seletividade, principalmente contra pessoas pretas e de classes mais
baixas, na sua grande maioria, moradores da periferia, como mostra os resultados
presente na página xx do artigo.
Dentro dos órgãos formais, responsáveis pela aplicação do direito, encontra-se a
polícia, cuja sua função mais simples é a preservação da ordem pública e a apuração
de infrações penais. É necessário ressaltar que a mesma, é determinante na seleção
daqueles sobre quem ocorrerá a subsunção das normas penais, uma vez que é a
primeira instituição de controle social formal a ter contato com o suspeito. Ademais,
“na realidade, tem maior poder seletivo dentro do sistema penal a polícia do que o
legislador, pois aquela opera diretamente sobre o processo de “filtração” do sistema”
(ZAFFARONI E PIERANGELI, 2004, p. 70-71).
É exatamente dessa conduta violenta, seletiva e diferenciada da polícia, condicionada
ao grupo sobre o qual recai a sua atuação que se faz o presente artigo. Por outro lado,
“a forma que a polícia atua em membro das classes privilegiadas, não é nem de longe,
comparada com a atuação em face, como é de fácil percepção, das classes
subalternas” (FERREIRA, 2012, p. 10-11). Juntamente com a ideia do autor e o
resultado dessa pesquisa, os casos do Genivaldo e Ivan Storel ressalvam como as
condutas se divergem quanto a etnia e posição social. Fica evidente, a violência, a
imparcialidade e a ausência de empatia, frente a pessoas pretas e de baixa renda. Em
contrapartida, tal posicionamento é muito diferente quando os indivíduos são homens
brancos e de classe alta, quando se mora em bairros nobre e não em favelas.
Sobre o tratamento condicionado a classe a qual se pertença, Foucault (2003, p. 35)
destaca que,
É segundo a classe social à qual se pertença, segundo as
possibilidades de fortuna, segundo as posições sociais que se obtêm a
justiça. A justiça não lhe é atribuída do mesmo modo. Essa
desigualdade diante da justiça que, no século XVII, já era muito
vivamente experimentada e contra a qual reagiram Beccaria e Bertin e
os grandes códigos napoleônicos, essa desigualdade restaurou-se, se
é que ela em algum momento foi suspensa. Ela se restaurou e,
atualmente, as pessoas sofrem dela de modo violento. Tem-se o
sentimento quase cotidiano dessa desigualdade diante da justiça e
diante da polícia.
Corroborando o que é defendido nesse trabalho, se percebe que a atuação hostil da
policia recai, em regra, sobre aqueles que trazem consigo o perfil criminoso em outras
palavras, perfis que as classes dominantes caracterizam como indivíduos
delinquentes, pois não sustentam os padrões que são impostos pelos os mesmo. É
dentro dessa ótica de conduta desfavorável e do entendimento do “perfil criminoso”,
juntamente com as escolas criminológicas, que se buscará os contornos para tais
ações arbitrarias, além de entender como a mídia e a sociedade contribuem para tal
cenário.
4.2 Criminologia critica:
O nascimento da criminologia como ciência foi marcado pelo o paradigma etiológico.
Na década de 1870, com a Escola Positivista Italiana, havia teorias que defendiam
teses absurdas da inferioridade de negros e indígenas e ideias de criminalidade que
se ocupavam a definir suas causas a partir da análise dos indivíduos. Em suma, os
positivistas acreditavam que existia uma criminalidade diferencial dos negros e
indígenas explicada/justificada com o argumento da inferioridade racial, ou seja, os
afrodescendentes e os indígenas seriam mais criminosos porque eram mais inferiores
que outros grupos raciais. Entretanto, o modelo da reação social (abordagem do
etiquetamento) provoca uma transformação no campo da criminologia, levando a uma
reconsideração do problema do crime e deslocando o foco de investigação dos fatores
que causam a criminalidade para a maneira como a sociedade reage à conduta
desviante, em outras palavras,
na perspectiva da criminologia crítica a criminalidade não é mais uma
qualidade ontológica de determinados comportamentos e de
determinados indivíduos, mas se revela, principalmente, como um
status atribuídos a determinados indivíduos, mediante uma dupla
seleção: em primeiro lugar, a seleção dos bens protegidos penalmente,
a dos comportamentos ofensivos destes bens, descritos nos tipos
penais; em segundo lugar, a seleção dos indivíduos estigmatizados
entre todos os indivíduos que realizam infrações a normas penalmente
sancionadas. A criminalidade é... um bem negativo, distribuído
desigualmente conforme a hierarquia dos interesses fixada no sistema
socioeconômico e conforme a desigualdade social entre os indivíduos.
(BARATTA. 1999. p.161)
No que tange a criminologia crítica, o fato que determinava que certos grupos
cometessem tal desvio, não estava relacionado a características biológicas aos
“homens de cor”, pelo o contrário, tal comportamento advinha do desamparo no qual
se encontraram os mesmos após a abolição da escravidão e das condições precárias
que se viviam. Dessa forma, surge a necessidade de uma teoria para reverter tal
situação. Portanto, “o parcial desajustamento” dos “negros e mulatos” estaria “[...]
ligado, não a fatores raciais, hereditários ou orgânicos, mas exclusivamente culturais,
ambientais ou sociais.” (HUNGRIA, 1956, p. 283).
Nesse contexto, que a questão racial se transmutou em questão social. Desse modo
sem propor uma crítica dos efeitos do racismo institucional nas
trajetórias de negros e negras, a Criminologia Positivista, reatualizada
em conjunto com as novas teorias sociais culturalistas, marxistas e
weberianas no Brasil, seguiu validando a violência do Estado brasileiro,
por meio de abordagens infundadas, prisões sem provas, métodos
ilícitos de produção de prova, testemunhos tendenciosos, ausência de
defesa eficiente, preconceitos na investigação, acusação, julgamento e
validação das provas, entre outros”. (CALAZANS, 2016. p.3)
Em consoante com o pensamento da autora e a “revolução de paradigmas científicos”
na criminologia, com a passagem etiológica para a reação social, além de deslocar o
foco dos “controlados” para os “controladores”, as denúncias sobre violência
institucional e desigualdade no tratamento dentro do sistema crimina, contribuíram
para que questões como seletividade e vulnerabilidade ganhassem centralidade
dentro da justiça criminal (ANDRADE, 2003; BARATTA, 1999). Ao atuar dentro dos
sistemas de justiça criminal, a seletividade desempenharia um papel tanto em termos
de quantidade quanto de qualidade, influenciando quais comportamentos seriam alvo
de criminalização (priorizando aqueles mais comuns entre os grupos mais
marginalizados) e quais indivíduos seriam rotulados como criminosos (favorecendo
aqueles pertencentes a grupos vulneráveis) (ZAFFARONI, 1991).
Portanto, “a criminologia crítica trata o conflito como luta de classes, desenhado diante
dos modos de produção e da infraestrutura socioeconômica da sociedade capitalista”
(procurar como pôr a referência, p. 150). Nesse sentindo, o crime é um produto
histórico desse confronto de classes antagônicas, em que uma se sobrepõem e
explora as outras.
Na síntese, entende que o direito penal está a serviço da parcela da população
detentora de poder, reduzindo o trabalho da justiça penal a mera selecionadora de sua
clientela, pois, o crime nada mais é do que o subproduto final do processo de criação e
aplicação das leis, orientadas pela messa classe possuidora de poder. Assim sendo, o
status de criminoso é distribuído de modo desigual entre as pessoas, com maior
frequência nos grupos marginalizados. Toda via, a partir dos dados como se pode
comprovar, as policias não cumprem com o papel de uma ordem social para todos,
pelo o contrário, busca por uma organização que seja de interesses da classe
dominante, condenando e atuando de maneira arbitraria de acordo com as
características de pessoas que não fazem parte desses grupos dominantes.
Ademais, como os dois casos apresentados Genivaldo e Ivan Storel, Becker (2018.
p.24) resume o desvio da seguinte maneira:
Se um ato é ou não desviante depende de como as pessoas reagem a
ele. [...] O simples fato de uma pessoa ter cometido uma infração a
uma regra não significa que outros reagirão como se isso tivesse
acontecido. (Inversamente, o simples fato de ela não ter violado uma
regra não significa que não possa ser tratada, em algumas
circunstâncias, como se o tivesse feito).
Dessa forma, “à luz desse panorama, dessume-se que o mesmo comportamento que
autoriza mandar alguém à prisão, também autoriza a qualificar outro como honesto”
(Tanferri e Giacoia. 2019. p.10). Com isso, conclui-se que o processo de
estigmatização é praticado pelos próprios agentes de controle social ostensivo,
quando se seleciona o suspeito de acordo com as suas características pessoais. Além
disso,
Esta vulnerabilidade faz com que a clientela do sistema penal seja
constituída de pobres não porque tenham maior tendência para
delinquir, mas porque tem mais chances de serem criminalizados e
etiquetados como criminosos. (ANDRADE, 1996, p.283).
Para complementar, os resultados obtidos nesse trabalho ilustram como o rotulo de
criminoso é inserido em certos grupos e como está enraizado na sociedade. De fato,
pode-se afirmar que existe sim um perfil que induz os policias a sua abordagem, essas
características são confirmadas nos dados (pagina dos dados), dos quais, são em
grande parte pretos, homens, moradores da periferia e jovens. Além do etiquemento
de tais características correspondente a delinquentes, ainda há o tratamento
desumano perante esses grupos, o caso do Genivaldo, o qual um homem preto,
morador da periferia, teve sua vida ceifada por uma ação totalmente imoral da polícia,
em contrapartida, o caso do Ivan Storel onde o mesmo foi acusado de violência
doméstica, além de ter cometido desacato aos policiais, os mesmos não reagiram com
tamanha brutalidade, pelo o contrário, foram muito passivos. Isso só demonstra como
esse racismo institucional se encontra de maneira tão “natural”, que leva a tomada de
atitudes tão contrarias, se divergindo apenas nas características dos envolvidos.
Diante do exposto, é evidente que a seletividade penal, trata de um mecanismo de
controle social do direito penal fundamentado nas mazelas do estigma social. Além de
ressaltar como determinadas estratificações sociais são comumente mais
selecionadas do que outras. Em suma, o criminoso e a atuação hostil das policias são
produtos de interações desarmônicas de poder, por meio, da rotulação e estigmas nos
grupos minoritários. Portanto, para a criminologia crítica, a definição de um “criminoso”
não é simplesmente alguém que comete um ato ilegal, mas uma construção social que
deve ser analisada criticamente à luz das estruturas de poder, desigualdades sociais e
contextos políticos que influenciam quem é rotulado como criminoso e por quê, além
de ser alvo das desigualdades e preconceitos parente as instituições detentoras legais
do poder.

4.3 Criminologia latino-americana


Por outro lado, os dados apresentados nos resultados (discorrer sobre alguns), são
suficientes para notar como as políticas criminais atuam de maneira contraria as
políticas sociais, já que a mesma persegue os efeitos, deixando intactas as causas
que geram e agravam os conflitos sociais. A redução da criminalidade só pode ser
alcançada se houver modificações nos fatores que ajudam a sua proliferação. É
exatamente dentro desse recorte que a criminologia da América-Latina concentra seu
ponto de estudo, como a fase contemporânea de internacionalização do capitalismo
promove desigualdades econômicas e sociais devido à má gestão na distribuição de
rendimentos, além da propensão para a marginalidade, à exclusão social e à
corrupção generalizada, entre outros, agentes que aceleram o crime.
O processo de adesão da América Latina enquanto região marginal ao ideário do
positivismo criminológico e suas aplicações socias, são resultados de uma tradução
restrita nos termos de Sozzo (DEL OLMO. 2004). Essa tradução restrita significa que,
ao invés de buscar a fidelidade literal às palavras originais, buscam capturar o
significado mais amplo, contexto e nuances do texto original, permitindo transmitir não
apenas as palavras, mas também a mensagem e a intenção por trás delas (SOZZO.
2006). Além disso, defende que a adoção/recepção da ideologia positivista como
dinâmica é incorporada ao poder da burguesia local (DEL OLMO. 2004). Como aponta
a própria autora
Era imposta uma criminologia na Europa como a solução científica do
problema do delito. A América Latina devia acolhê-la porque as classes
dominantes necessitavam dela. A adoção de determinadas ideologias
estrangeiras pelas classes dominantes dos países subdesenvolvidos
cumpre basicamente duas principais funções: (a) em primeiro lugar,
levantar toda uma superestrutura que legitime sua relação de classe
dominante local com o centro dominante internacional; (b) na ordem
interna, legitimar sua própria posição dominante ao operar como
instrumento de dominação e meio de distinção relativamente às
classes e grupos subordinados. (DEL OLMO, 2004, p. 162).
Portanto, a criminologia na América Latina não é aderida aos países como forma de se
analisar seus problemas e buscar soluções para a sociedade. Pelo ao contrário, ela é
inserida apenas para legitimar o poder das nações dominantes e intensificarem suas
forças sobre os países subdesenvolvidos, sem estudar as características da
criminalidade dos Estados marginalizados. A adesão a esse pensamento criminológico
no Brasil, marcou de forma resistente a relação entre racismo e criminologia,
justificando o poder punitivo autoritário. Essa racionalização ainda se faz presente na
contemporaneidade (discorrer dos dados). Nesse sentido
moldada pelo o racismo, a criminologia ortodoxa no Brasil
historicamente foi colaboracionista, ou seja, produziu conhecimento
para fornecer elementos de identificação e de classificação dos
sujeitos-alvo do sistema penal oficial e por isso, é até hoje, uma
engrenagem altamente funcional às violências das agências penais
(CARVALHO. 2022. p. 186-187)
Como os discursos criminológicos na América Latina carrega complexos em seu
processo de criação teórica, trazendo consigo ideais europeus sem considerar as reais
condições latino-americanas, se faz necessário uma análise crítica aprofundada desse
cenário. O autor Zaffaroni “inaugura uma perspectiva realista a partir da margem
latino-americana e inova ao associar, com rara habilidade, a Criminologia Crítica à
Dogmática Penal” (FERREIRA E MACHADO. 2020. p.3). Ademais para Zaffaroni
(2003), a criminologia é uma ferramenta capaz de perceber que é o Estado quem mais
mata na América Latina (falar sobre os dados). Assim,
o horizonte epistemológico da criminologia” é ter consciência de que
“qualquer melhora no sistema penal não seria outra coisa que a
reafirmação do controle e, por conseguinte, uma tentativa reacionária,
legitimante, que em definitivo, demoraria o encaminhamento à única
alternativa possível (Ferreira e Machado. 2020. p.5).
É notório que as traduções e incorporações dos pensamentos da criminologia
positivista, causaram divergências no campo criminológico brasileiro, pois apesar de
terem sido transpassadas em seu sentido mais estrito, ainda há lacunas, devido ao
fato de que todo termo se encontra enraizado em um contexto que lhes confere
sentido (MELOSSI. 1997). Dentro dessa perspectiva, se faz necessário “reconstruir
dogmaticamente a teoria penal desde esta realidade latino-americana” (ZAFFARONI.
2001. p.245). Portanto, caberia aos juristas levar em conta os
processos de operação do sistema de justiça na América Latina
referentes às penas deslegitimadas, as mortes praticadas por
agentes do Estado, a legitimação do controle fundada na teoria
de raças inferiores [...] e a utilização da criminologia a serviço do
poder (FERREIRA E MACHADO. 2020. p. 8).

A dogmática da criminologia na América-Latina, sem dúvidas, é decorrente da


racionalização de poder, e estando ciente sobre isso, é de extrema importância buscar
“construir um saber que permita ajudar as pessoas criminalizadas a reduzir seus níveis
de vulnerabilidade ao sistema penal” (ZAFFARONI. 2003. p. 23). Portanto, o preceito
da dogmática crítica, é que ela seja capaz de lidar com as pessoas alvos do sistema
penal, que são em sua maioria, pretos e moradores das comunidades, é preciso
questionar, principalmente, os agentes da criminalização secundária. Assim, deve
considerar a função do direito penal de reduzir e limitar a violência, mas também de
lidar com as suas contradições, pois os mesmos que são responsáveis por garantir a
segurança social, são os mesmos perpetuadores da violência, como nos dados
citados na pagina xx (discorrer sobre os dados).
Uma das tarefas da criminologia critica latino-americana, portanto, era de romper com
as bases criminológicas vigentes na região. O período da ditadura militar, marca o
inicio da construção da crítica criminológica, devido ao contexto regional autoritário,
frente a resistência civil, nesse sentido, a estrutura desigual e a realidade repressiva,
vindicavam por uma criminologia critica (FUNCIA. 2023). A conduta, era mais voltada
para atender aos problemas
de uma região com uma estrutura social muito desigual, uma economia
dependente de um Estado coercitivo, que recorria inclusive a práticas
delinquenciais tão graves como matar, roubar, torturar e demais ações
que não eram sancionadas como delitivas (ANITUA. 2008. p.678).

Os processos de busca pela latinidade na criminologia foram muitos,


consequentemente, tal processo impediu uma unificação. Por esse motivo é correto
pensar em criminologias latino-americanas, e de que apesar dos esforços para
denúncias ao poder punitivo e desenvolvimento teórico de especificidades locais,
houve por outro lado, omissões sobre raça e gênero no bojo dessas discussões
(FREITAS. 2016). Em suma
a criminologia produzida no saber central é caracterizada por
“ocultações”, na medida que é centralizada no poder punitivo formal e
não incorporou em seus processos de construção crítica os genocídios
e violências perpetradas contra os povos colonizados, sub-
humanizados, característica de nosso poder punitivo. A letalidade
ampla, normalizada e chancelada pela política, Poder Judiciário,
Ministério Público, Executivo, constitui uma ausência presente na
produção crítica criminológica latino-americana, notada pelas
discussões críticas a partir de 1970, comprometidas, cada qual com a
sua vertente, para a transformação da realidade concreta operada com
particular violência na América Latina (FUNCIA. 2023. p.132).
Posto isso, evidencia-se que, apesar do esforço para uma criminologia que buscasse
soluções para a os reais cenários dos países marginalizados, ff que atendessem as
necessidades das minorias frente ao cenário de dominação de classes, a criminologia
da América-Latina, ainda se encontra pautada na legitimação da violência contra
grupos específicos. Para ilustrar (falar dos dados). Consequentemente, a ação dos
policiais ainda está pautada nos ideais racistas disseminados pela cultura dominante.
4.4 a mídia e a criminalização:
A função da mídia desempenha um papel essencial na sociedade contemporânea,
atuando como um veículo de informação, educação e entretenimento. No entanto,
para essa veiculação exige-se altos gastos e que por varias vezes são custeados
pelos cofres públicos, o que acarreta
o desejo de buscar agradar a quem contribuí, sendo a mídia um instrumento
de poder, usado para favorecer o interesse privado, cumprindo o papel que
não é apenas de informar, mas de usar meios estratégicos para formar a
opinião de seu leitor, telespectador ou ouvinte (LIMA. 2022. p. 39).
Em paralelo, a criminologia e a seletividade, são influenciadas fortemente pela a mídia,
pois como formadora de opinião, reforçar os estereótipos de pessoas “descentes” e de
pessoas “inimigas” do estado, dessa forma, atua de maneira tendenciosa em
convergência com preconceitos e crenças, com noticiários imediatistas (ZAFFARONI.
2013). Além disso,
A criminologia midiática cria a realidade de um mundo de pessoas
decentes frente a uma massa de criminosos, identificada através de
estereótipos que configuram um eles separado do resto da sociedade,
por ser um conjunto de diferentes e maus. O eles da criminologia
midiática incomodam, impedem de dormir com as portas e janelas
abertas, perturbam as férias, ameaçam as crianças, sujam por todos os
lados e por isso devem ser separados da sociedade, para deixar-nos
viver tranquilos, sem medos, para resolver todos os nossos problemas.
Para tanto, é necessário que a polícia nos proteja de suas ciladas
perversas, sem qualquer obstáculo nem limite, porque nós somos
limpos, puros e imaculados (ZAFFARONI, 2013, p.308).
Diante da estigmatização persistente dos corpos negros, que enfatiza a rotulagem
social desses grupos, ocorre a criação de uma imagem que associa injustamente a
criminalidade a eles, enquanto negligencia outros tipos de criminosos, como aqueles
que vestem "colarinho branco" ou possuem privilégios econômicos notáveis. Isso
evidencia a seletividade da mídia em conluio com o sistema de justiça, resultando na
marcação dessas pessoas como criminosas, baseada exclusivamente na cor de sua
pele e nas condições sociais em que vivem, perpetuando um estigma preconceituoso
já preconcebido (ZAFFARONI. 1991).
Entretanto, para existir certa seletividade da policias entre as pessoas pretas, é
necessário a aprovação do senso comum, ou seja, diante das práticas impostas, é
preciso que a sociedade seja complacente. Nesse viés, a mídia contribui para a
construção da criminalidade negra, além de atuar como “normalizadora” das
arbitrariedades nas ações policias, diante, de reportagens, publicações que
repercutem as atuações da polícia de forma a negativar os atos da minoria. Portanto
“as ações deferidas em desfavor dos grupos estereotipados não causam reação de
espanto pois já é algo esperado de quem vem da periferia sendo preto e pobre” (LIMA.
2022. p. 40).
Ademais, o racismo institucional neutraliza a prática de atos discriminatórios por parte
das instituições de poder e que são repercutidos na mídia. Parente essa concepção e
dos dados óbitos nos resultados, temos que a polícia introduz em sua abordagem os
fatores cotidianos vistos, onde o número de ocorrências acaba por ser maior em
periferias e suas abordagens direcionadas aos indivíduos que possuem os
estereótipos reforçados pela a mídia. Consequentemente, o sistema penitenciário vem
se tornando cada vez mais homogêneo diante dos perfis dos encarcerados, como
ilustra os dados (falar dos dados), a qual a discriminação contribui para esse fator e a
prisão não atua de forma eficaz para mudar a realidade, ne verdade, funciona como
uma escola do crime. Para somar, Hofmeister evidencia que o cárcere não prepara a
pessoa para o convívio social, “na verdade, existe uma socialização que a prisão
produz: ela condiciona o indivíduo para viver no meio social prisional. Não para a
sociedade livre. Opera-se uma socialização às avessas” (2002, p. 43).
Em suma, conclui-se que a mídia desempenha um papel significativo na formação e
perpetuação dos estereótipos em relação às minorias. Muitas vezes, na busca por
narrativas simplificadas e cativantes, a mídia pode retratar grupos minoritários de
maneira categorizada, exagerando características superficiais ou associando-os a
estigmas negativos. Isso não apenas perpetua preconceitos, mas também influencia a
percepção pública, reforçando visões distorcidas sobre essas comunidades. Esses
estereótipos podem ter um impacto profundo na vida dessas pessoas, afetando sua
representação, oportunidades e interações sociais. Portanto, é crucial que a mídia
assuma a responsabilidade de retratar a realidade de maneira mais precisa e
equitativa, não buscando ressalvar os ideias das classes dominantes sobre os
subordinados.

5. Conclusão (2,0 pontos)

- A partir da análise teórica dos resultados apresentados, deve-se sintetizar as principais


conclusões às quais é possível chegar no caso analisado. (Ana)

6. Referências (1,0 ponto)


BANDEIRA, L e SUÁREZ, M. Ordem pública, discriminação e repressão. In: OLIVEIRA,
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OLIVEIRA, D. e TOSTA, T. Abuso de autoridade: fronteiras entre a segurança e a agressão.


In:In: OLIVEIRA, D. D., SANTOS, S. A. e SILVA, V. G. B. (Orgs.).
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https://cesecseguranca.com.br/wp-content/uploads/2022/10/RELATORIO_REDE-DE
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Racismo institucional: Aspectos comportamentais e culturais da


[PDF]

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TM Mizael, AAS Sampaio - Acta Comportamentalia: Revista Latina de …, 2019 - redalyc.org

VIOLÊNCIA E MÍDIA: A VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS


E PROPAGAÇÃO DE ESTEREÓTIPOS
APB Zeifert, MK Lucas - Meritum, Revista de Direito da …, 2021 - revista.fumec.br

Caso Genivaldo: entenda ordem dos fatos que levaram homem à morte em
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Policiais são humilhados por empresário em condomínio de luxo: "Aqui é


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erence_5

Livros: “Violência Povo e Polícia” de Maria Victoria Benevides| “Praça Velho: socialização,
representações e práticas policiais militares” de Agnaldo Silva.

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