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CRIMINALIZAÇÃO SECUNDÁRIA
TÍTULO DO TRABALHO:
JATAÍ-GO
2023
UNIVERSIDADE FEDERAL DE JATAÍ
CRIMINALIZAÇÃO SECUNDÁRIA
TÍTULO DO TRABALHO:
JATAÍ-GO
2023
RELATÓRIO:
- Apresentar o caso que foi escolhido para análise, justificando os motivos para tal definição;
(Ana)
- Esclarecer qual(is) foi(foram) a(s) fonte(s) e o(s) método(s) adotado(s) para a coleta de
dados e informações para a construção do trabalho: pesquisa teórica (livros, artigos etc),
jurisprudencial (se for o caso), análise de dados e/ou documentos, notícias, observação,
estudo de caso etc
(Gustavo)
3.1 —--------------------------------------------------------------------------------------------------------
● Negros são 68% dos abordados andando a pé na rua ou na praia, 74% em vans ou
Kombis, 72% nos carros de aplicativos, 71% no transporte público, 68% andando de
moto e 67% em um evento ou festa;
● 17% das pessoas abordadas já foi parada mais de 10 vezes;
● 79% dos que tiveram sua casa revistada pela polícia eram negros;
● 74% dos que tiveram um parente ou amigo morto pela polícia são pessoas negras;
● PM tem pior desempenho na avaliação entre os entrevistados e recebe nota 5,4;
● Só 17% acham que não existe racismo na Polícia Militar;
● Negros são 70% dos que presenciaram a polícia agredindo pessoas, 79% dos que
tiveram suas casas invadidas e 74% dos que tiveram um parente ou amigo morto pela
polícia;
● 45% das pessoas pretas reprovaram a Polícia Militar (isto é, deram nota menor que 5);
23% das pessoas brancas e 28% das pessoas pardas também reprovaram a PM.
Apenas 3% consideram a PM nada corrupta e 7%, nada violenta.
A violência é contínua, pois, no Brasil, existe uma grande impunidade dos policiais,
onde os culpados não são encontrados por falta de uma investigação minuciosa, e os
responsáveis são poupados sem justiça pelas vítimas. A abordagem através do diálogo é
pouco vista, já que prezam por uma resposta armada, por uma influência histórica militar,
justificando essa agressividade, além de um treinamento inadequado. Refletindo, claro, os
valores e direitos básicos dos cidadãos, uma reforma da polícia brasileira deve ser um debate
público, político e democrático. Priorizando a transparência, uma educação policial através
de representatividades, diversidade e inclusão dentro das instituições policiais.
3.2 —--------------------------------------------------------------------------------------------------------
A polícia é uma instituição criada para manter a segurança não somente da sociedade,
como também das regras jurídicas, usando métodos de prevenção e investigação do que foge
às leis aceitas. Entretanto, a polícia abandona seu papel quando enxerga-se a cotidianidade
dos casos de violência contra aqueles à quem deveria proteger.
As raízes das razões da violência policial encontram no Estado a falha de não afirmar
os direitos democráticos de seu povo, segundo Pinheiro, conforme citado por Oliveira e
Tosta (2001, p.55), no Brasil, bem como em diversos outros países latino-americanos,
verifica-se uma significativa discrepância entre o que está prescrito na legislação e a dura
realidade da aplicação das leis. A promulgação da nova Constituição brasileira em 1988 foi
capaz de incorporar muitos direitos individuais que eram rotineiramente violados durante o
período da ditadura militar.
Direitos essenciais como o direito à vida, à liberdade e à integridade pessoal foram
oficialmente reconhecidos, além de se estabelecer como crime a prática de tortura e a
discriminação racial. Contudo, apesar do reconhecimento formal desses direitos, a violência
perpetrada pelas mãos do Estado persiste.
TABELA 1
Estelionato 15 14 29
Ainda conforme Oliveira e Tosta (2001), há falta de entendimento da lei, haja vista
que os delitos presentes na tabela apresentada poderiam configurar atos de abuso de
autoridade, o que resultaria no salto de 2.047 casos para 6.125. Também são apresentados
dados que ressaltam a importância de fortalecer os órgãos responsáveis por investigar a
conduta policial, uma vez que apenas 6.38% dos casos encerrados em 1999 foram
considerados como denúncias improcedentes após a apuração.
Já de acordo com RAMOS et al. (2021, p. 10) nos dados da Rede de observatórios da
Segurança, projeto do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) que reúne
dados produzidos pelas polícias e obtidos via Lei de Acesso à Informação de sete estados,
sendo eles BA, CE, MA, PE, PI, RJ e SP, o
número de violências, abusos e excessos por parte de agentes do estado notificados
registrados durante os eventos monitorados de agosto de 2021 a julho de 2022 foram:
TABELA 2
À vista do exposto, no que tange a administração de conflitos, sua realização pode ser
feita através do diálogo ou do uso da força. Todavia, o diálogo exige uma percepção das
razões de ambas as partes, enquanto na força busca-se transformar o outro em si, estendendo
a própria vontade aos demais (Soares e Carneiro, 1996 apud Bandeira e Suárez, 2001). Nesse
sentido, Bandeira e Suárez (2001) apontam que a utilização da violência em resolução de
conflitos de ordem política modifica-se, em alguns casos, como uma forma de discriminação
de classe, gênero e/ou raça.
Bandeira e Suárez (2001) apresentam dados a respeito das mortes violentas ocorridas
em 1997 e 1998, organizadas em quatro categorias, expostas na tabela a seguir:
TABELA 3
De acordo com os dados, cerca de 8,7% e 8,6% das mortes violentas ocorridas entre
1997 e 1998 foram provocadas por policiais, estando eles no exercício de sua função ou não.
Outro dado relevante aponta que policiais matam mais homens do que mulheres, entretanto
ao longo dos dois anos (1997 e 1998) 82,2% das mortes masculinas ocorreram enquanto os
policiais exerciam suas funções e 25,5% das mortes femininas aconteceram sobre a mesma
circunstância, isto é, as mortes de mulheres causadas por policiais possuem maior relação
com contato interpessoal do que profissional (Bandeira e Suárez, 2001).
Em relação à cor das vítimas dos homicídios cometidos, a categoria “não consta” é
expressivamente maior que as demais, totalizando 84% e 86%, em 1997 e
1998 respectivamente. Da mesma forma, das vítimas classificadas, 42,3% e 46,8% eram
brancas e 57,7% e 53,2% eram ‘não-brancas’. No que concerne às vítimas de atuação
policial, em 1997, 19% eram brancas e 81% ‘não-brancas’ e, em 1998, houve um aumento de
16,2% no número de vítimas brancas e 17,6% em vítimas ‘não-brancas’ (Bandeira e Suárez,
2001).
Ainda de acordo com (RAMOS et al., 2021, p. 10), o registro do número de mortos
por agentes pela polícia no estados monitorados em 2019 e 2020 se configuram da seguinte
maneira:
TABELA 4
TABELA 5
Número de mortes decorrentes de intervenção do Estado por raça ou cor
- estados monitorados pela Rede de Observatórios - 2021
Cor BA CE MA PE PI RJ SP
Branca 13 3 0 4 8 154 149
Negra 603 36 0 101 24 1.060 330
NI 397 86 87 0 2 142 90
Outros 0 0 0 0 0 0 1
Parda 528 31 0 95 20 696 293
Preta 75 5 0 6 4 364 37
Total 1.013 125 87 105 34 1.356 570
3.3 —--------------------------------------------------------------------------------------------------------
A instituição policial é uma instância oficial que está responsável, em primazia, pela
atribuição da criminalização secundária a indivíduos que apresentem, na sociedade, condutas
consideradas digressivas. De forma tendenciosa, entretanto, assim como já citado
anteriormente, a polícia tem uma abordagem questionável, dado que as minorias sociais,
principalmente, às pessoas pretas e periféricas, são constantemente vigiadas e consideradas
suspeitas de contravenções, mesmo que, de fato, não tenham cometido quaisquer atitudes
consideradas ilegais, visto que:
“Como os pobres urbanos encontram-se em situação desvantajosa quanto à sua
capacidade de influenciar significados e decisões institucionais no que diz respeito
ao crime e seu combate, a resultante social lhes é desfavorável: está criminalizada a
pobreza.” (Ratton Jr., 1996, p.83)
3.4 —--------------------------------------------------------------------------------------------------------
“No Rio de Janeiro, por exemplo, no ano de 2014, os homicídios praticados pela
polícia corresponderam a 15,4% do total de homicídios. Quando se analisa o perfil
das vítimas, evidenciase que a maioria é do sexo masculino (99,5%), jovem (75%
entre 15 e 29 anos de idade) e negra (79%). A maioria deles também vivia nas áreas
mais pobres da cidade, principalmente nas
favelas (Anistia Internacional, 2015).”
3.5 —---------------------------------------------------------------------------------------------------------
O intuito desse tópico é entender possíveis causas que contribuem para a conduta
violenta dos policiais militares. Nesse sentido, é preciso abordar como ocorre o processo de
socialização e de militarização dos policiais militares nas instituições.
Conforme a obra, a denominação de “Praça Velho” é o policial que atingiu um alto grau
de conhecimento prático, tanto no trato com os superiores hierárquicos como no seu
relacionamento com a sociedade mais ampla. Ele não deixa vestígios de suas ações na
sociedade e nem práticas que descumpram a lei. Segundo o autor Agnaldo Silva, esse
policial é visto como “modelo” para os novatos, os praças velhos instruem os internos com
valores e comportamentos que ressaltam o policial militar como superior ao civil.
A partir dessa instrução, o novato será influenciado a reavaliar o ambiente que ele possa
frequentar e o grupo de pessoas com quem ele pode se relacionar, pois ele passa a ser a
imagem da corporação. Diante disso, o novo policial assume uma postura mais “séria” e,
assim, evitando contato com civis. Os demais indivíduos, rotulados de maneira pejorativa
como “paisanos”, assumirão uma posição de inferioridade simbólica em relação aos
militares. Sob essa lógica, é possível expor o tratamento danoso para com a sociedade e,
principalmente, para as camadas populares, tendo em vista que já são marginalizadas por
outros entraves sociais.
No que cerne a militarização da polícia militar, entende-se como o processo pelo qual a
polícia incorpora cada vez mais os padrões do militarismo e do modelo das forças armadas.
Desta forma, a militarização diz respeito ao grau de identificação das polícias com o campo
militar, absorvendo suas crenças, valores e saberes.
“O militarismo deixa de ser um meio para se tornar um fim em si mesmo” (SILVA, p.30)
Diante desse cenário, os policiais estariam sendo treinados para usar o máximo de sua
força combativa, contrariando seu dever de proteção a comunidade e de que usariam apenas
o necessário o que, consequentemente, provoca um desvio de
funções entres as instituições no trato da segurança pública elevando o aumento da violência
contra os cidadãos.
4. resultados
4.1 Criminalização secundária: atuação arbitraria das policias sobre a população preta
e periférica.
Para uma melhor análise sobre a definição de crime, é necessário antes de tudo,
entender como certas condutas são tidas como ilícitas, pois essa tipificação demostra
um determinado conhecimento social daquilo que é importante coibir. Dentro dessa
ótica, é importante entender os processos formais de criminalização, em outras
palavras, entender o “[...] meio de seleção, pelos mecanismos de controle social, de
pessoas e condutas a serem punidas” (ARAÚJO, 2010, p. 114).
Nota-se que, independentemente do processo de criminalização, o Estado é o
principal responsável pelo o desenvolvimento, pois fica sob sua responsabilidade a
criação e a aplicação da lei (SELL, 2007).
O desenvolvimento da criminalização se divide em três momentos: criminalização
primária, criminalização secundária e criminalização terciária. A criminalização primária
é o momento de criação da lei, ou seja, é nessa primeira etapa que se define o que
são condutas ilícitas, por meio de um ordenamento jurídico. Já a criminalização
secundária corresponde a atuação das instituições de controle social na punição e
coerção do agir criminoso. Por último, a criminalização terciaria que decorre do
estigma que recai sobre o indivíduo após o cárcere.
Como o presente trabalho tem o foco a criminalização secundária, é de importância
uma análise mais profunda sobre seu recorte para um entendimento dos resultados
apresentados acima.
Como já dito, a criminalização secundária aborda os papeis das agências e serviços
de controle formais, como a polícia, órgãos de acusações e as cortes de julgamentos,
não apenas de modo a realizarem seus fins, mas também de coibir comportamentos
que prejudicam a ordem, além de moldarem o novo comportamento social surgido
com o tipo penal.
Essa seletividade da ação estatal, é vista para Araújo (2010, p. 123), como um
processo de “funil, no qual, do montante total dos comportamentos ilícitos praticados,
apenas alguns são capturados e processados pelo sistema”. E complementa:
Os policiais perseguem precipuamente os sujeitos cujas características
identificam-se com a dos seus principais clientes, têm tendência a atuar
de modos distintos tendo em vista aspectos pessoais e de
comportamento da vítima, agem mais rigorosamente na persecução de
alguns crimes quando há delegacia especializada no combate de
determinado gênero de ilícitos, entre outros fatores (ARAÚJO, 2010, p.
123-124).
Em consoante com o pensamento do autor, nota-se como as polícias agem de acordo
com certa seletividade, principalmente contra pessoas pretas e de classes mais
baixas, na sua grande maioria, moradores da periferia, como mostra os resultados
presente na página xx do artigo.
Dentro dos órgãos formais, responsáveis pela aplicação do direito, encontra-se a
polícia, cuja sua função mais simples é a preservação da ordem pública e a apuração
de infrações penais. É necessário ressaltar que a mesma, é determinante na seleção
daqueles sobre quem ocorrerá a subsunção das normas penais, uma vez que é a
primeira instituição de controle social formal a ter contato com o suspeito. Ademais,
“na realidade, tem maior poder seletivo dentro do sistema penal a polícia do que o
legislador, pois aquela opera diretamente sobre o processo de “filtração” do sistema”
(ZAFFARONI E PIERANGELI, 2004, p. 70-71).
É exatamente dessa conduta violenta, seletiva e diferenciada da polícia, condicionada
ao grupo sobre o qual recai a sua atuação que se faz o presente artigo. Por outro lado,
“a forma que a polícia atua em membro das classes privilegiadas, não é nem de longe,
comparada com a atuação em face, como é de fácil percepção, das classes
subalternas” (FERREIRA, 2012, p. 10-11). Juntamente com a ideia do autor e o
resultado dessa pesquisa, os casos do Genivaldo e Ivan Storel ressalvam como as
condutas se divergem quanto a etnia e posição social. Fica evidente, a violência, a
imparcialidade e a ausência de empatia, frente a pessoas pretas e de baixa renda. Em
contrapartida, tal posicionamento é muito diferente quando os indivíduos são homens
brancos e de classe alta, quando se mora em bairros nobre e não em favelas.
Sobre o tratamento condicionado a classe a qual se pertença, Foucault (2003, p. 35)
destaca que,
É segundo a classe social à qual se pertença, segundo as
possibilidades de fortuna, segundo as posições sociais que se obtêm a
justiça. A justiça não lhe é atribuída do mesmo modo. Essa
desigualdade diante da justiça que, no século XVII, já era muito
vivamente experimentada e contra a qual reagiram Beccaria e Bertin e
os grandes códigos napoleônicos, essa desigualdade restaurou-se, se
é que ela em algum momento foi suspensa. Ela se restaurou e,
atualmente, as pessoas sofrem dela de modo violento. Tem-se o
sentimento quase cotidiano dessa desigualdade diante da justiça e
diante da polícia.
Corroborando o que é defendido nesse trabalho, se percebe que a atuação hostil da
policia recai, em regra, sobre aqueles que trazem consigo o perfil criminoso em outras
palavras, perfis que as classes dominantes caracterizam como indivíduos
delinquentes, pois não sustentam os padrões que são impostos pelos os mesmo. É
dentro dessa ótica de conduta desfavorável e do entendimento do “perfil criminoso”,
juntamente com as escolas criminológicas, que se buscará os contornos para tais
ações arbitrarias, além de entender como a mídia e a sociedade contribuem para tal
cenário.
4.2 Criminologia critica:
O nascimento da criminologia como ciência foi marcado pelo o paradigma etiológico.
Na década de 1870, com a Escola Positivista Italiana, havia teorias que defendiam
teses absurdas da inferioridade de negros e indígenas e ideias de criminalidade que
se ocupavam a definir suas causas a partir da análise dos indivíduos. Em suma, os
positivistas acreditavam que existia uma criminalidade diferencial dos negros e
indígenas explicada/justificada com o argumento da inferioridade racial, ou seja, os
afrodescendentes e os indígenas seriam mais criminosos porque eram mais inferiores
que outros grupos raciais. Entretanto, o modelo da reação social (abordagem do
etiquetamento) provoca uma transformação no campo da criminologia, levando a uma
reconsideração do problema do crime e deslocando o foco de investigação dos fatores
que causam a criminalidade para a maneira como a sociedade reage à conduta
desviante, em outras palavras,
na perspectiva da criminologia crítica a criminalidade não é mais uma
qualidade ontológica de determinados comportamentos e de
determinados indivíduos, mas se revela, principalmente, como um
status atribuídos a determinados indivíduos, mediante uma dupla
seleção: em primeiro lugar, a seleção dos bens protegidos penalmente,
a dos comportamentos ofensivos destes bens, descritos nos tipos
penais; em segundo lugar, a seleção dos indivíduos estigmatizados
entre todos os indivíduos que realizam infrações a normas penalmente
sancionadas. A criminalidade é... um bem negativo, distribuído
desigualmente conforme a hierarquia dos interesses fixada no sistema
socioeconômico e conforme a desigualdade social entre os indivíduos.
(BARATTA. 1999. p.161)
No que tange a criminologia crítica, o fato que determinava que certos grupos
cometessem tal desvio, não estava relacionado a características biológicas aos
“homens de cor”, pelo o contrário, tal comportamento advinha do desamparo no qual
se encontraram os mesmos após a abolição da escravidão e das condições precárias
que se viviam. Dessa forma, surge a necessidade de uma teoria para reverter tal
situação. Portanto, “o parcial desajustamento” dos “negros e mulatos” estaria “[...]
ligado, não a fatores raciais, hereditários ou orgânicos, mas exclusivamente culturais,
ambientais ou sociais.” (HUNGRIA, 1956, p. 283).
Nesse contexto, que a questão racial se transmutou em questão social. Desse modo
sem propor uma crítica dos efeitos do racismo institucional nas
trajetórias de negros e negras, a Criminologia Positivista, reatualizada
em conjunto com as novas teorias sociais culturalistas, marxistas e
weberianas no Brasil, seguiu validando a violência do Estado brasileiro,
por meio de abordagens infundadas, prisões sem provas, métodos
ilícitos de produção de prova, testemunhos tendenciosos, ausência de
defesa eficiente, preconceitos na investigação, acusação, julgamento e
validação das provas, entre outros”. (CALAZANS, 2016. p.3)
Em consoante com o pensamento da autora e a “revolução de paradigmas científicos”
na criminologia, com a passagem etiológica para a reação social, além de deslocar o
foco dos “controlados” para os “controladores”, as denúncias sobre violência
institucional e desigualdade no tratamento dentro do sistema crimina, contribuíram
para que questões como seletividade e vulnerabilidade ganhassem centralidade
dentro da justiça criminal (ANDRADE, 2003; BARATTA, 1999). Ao atuar dentro dos
sistemas de justiça criminal, a seletividade desempenharia um papel tanto em termos
de quantidade quanto de qualidade, influenciando quais comportamentos seriam alvo
de criminalização (priorizando aqueles mais comuns entre os grupos mais
marginalizados) e quais indivíduos seriam rotulados como criminosos (favorecendo
aqueles pertencentes a grupos vulneráveis) (ZAFFARONI, 1991).
Portanto, “a criminologia crítica trata o conflito como luta de classes, desenhado diante
dos modos de produção e da infraestrutura socioeconômica da sociedade capitalista”
(procurar como pôr a referência, p. 150). Nesse sentindo, o crime é um produto
histórico desse confronto de classes antagônicas, em que uma se sobrepõem e
explora as outras.
Na síntese, entende que o direito penal está a serviço da parcela da população
detentora de poder, reduzindo o trabalho da justiça penal a mera selecionadora de sua
clientela, pois, o crime nada mais é do que o subproduto final do processo de criação e
aplicação das leis, orientadas pela messa classe possuidora de poder. Assim sendo, o
status de criminoso é distribuído de modo desigual entre as pessoas, com maior
frequência nos grupos marginalizados. Toda via, a partir dos dados como se pode
comprovar, as policias não cumprem com o papel de uma ordem social para todos,
pelo o contrário, busca por uma organização que seja de interesses da classe
dominante, condenando e atuando de maneira arbitraria de acordo com as
características de pessoas que não fazem parte desses grupos dominantes.
Ademais, como os dois casos apresentados Genivaldo e Ivan Storel, Becker (2018.
p.24) resume o desvio da seguinte maneira:
Se um ato é ou não desviante depende de como as pessoas reagem a
ele. [...] O simples fato de uma pessoa ter cometido uma infração a
uma regra não significa que outros reagirão como se isso tivesse
acontecido. (Inversamente, o simples fato de ela não ter violado uma
regra não significa que não possa ser tratada, em algumas
circunstâncias, como se o tivesse feito).
Dessa forma, “à luz desse panorama, dessume-se que o mesmo comportamento que
autoriza mandar alguém à prisão, também autoriza a qualificar outro como honesto”
(Tanferri e Giacoia. 2019. p.10). Com isso, conclui-se que o processo de
estigmatização é praticado pelos próprios agentes de controle social ostensivo,
quando se seleciona o suspeito de acordo com as suas características pessoais. Além
disso,
Esta vulnerabilidade faz com que a clientela do sistema penal seja
constituída de pobres não porque tenham maior tendência para
delinquir, mas porque tem mais chances de serem criminalizados e
etiquetados como criminosos. (ANDRADE, 1996, p.283).
Para complementar, os resultados obtidos nesse trabalho ilustram como o rotulo de
criminoso é inserido em certos grupos e como está enraizado na sociedade. De fato,
pode-se afirmar que existe sim um perfil que induz os policias a sua abordagem, essas
características são confirmadas nos dados (pagina dos dados), dos quais, são em
grande parte pretos, homens, moradores da periferia e jovens. Além do etiquemento
de tais características correspondente a delinquentes, ainda há o tratamento
desumano perante esses grupos, o caso do Genivaldo, o qual um homem preto,
morador da periferia, teve sua vida ceifada por uma ação totalmente imoral da polícia,
em contrapartida, o caso do Ivan Storel onde o mesmo foi acusado de violência
doméstica, além de ter cometido desacato aos policiais, os mesmos não reagiram com
tamanha brutalidade, pelo o contrário, foram muito passivos. Isso só demonstra como
esse racismo institucional se encontra de maneira tão “natural”, que leva a tomada de
atitudes tão contrarias, se divergindo apenas nas características dos envolvidos.
Diante do exposto, é evidente que a seletividade penal, trata de um mecanismo de
controle social do direito penal fundamentado nas mazelas do estigma social. Além de
ressaltar como determinadas estratificações sociais são comumente mais
selecionadas do que outras. Em suma, o criminoso e a atuação hostil das policias são
produtos de interações desarmônicas de poder, por meio, da rotulação e estigmas nos
grupos minoritários. Portanto, para a criminologia crítica, a definição de um “criminoso”
não é simplesmente alguém que comete um ato ilegal, mas uma construção social que
deve ser analisada criticamente à luz das estruturas de poder, desigualdades sociais e
contextos políticos que influenciam quem é rotulado como criminoso e por quê, além
de ser alvo das desigualdades e preconceitos parente as instituições detentoras legais
do poder.
RAMOS, S. et al. Pele alvo: a cor que a polícia apaga. Rio de Janeiro: Rede de
Observatórios da Segurança/CESeC, 2022. Disponível
em:https://cesecseguranca.com.br/wp-content/uploads/2022/11/Pele-alvo-2.pdf
Acesso em: 25 de set 2023.
RAMOS, Silvia et al. Pele-alvo: a cor da violência policial. Rio de Janeiro: CESeC,
dezembro de 2021. Disponível: em
https://cesecseguranca.com.br/wp-content/uploads/2021/12/RELATORIO_REDE-DE
-OBS_cor-da-violencia_dez21_final.pdf Acesso em: 25 de set 2023.
abordagem policial
TM Mizael, AAS Sampaio - Acta Comportamentalia: Revista Latina de …, 2019 - redalyc.org
Caso Genivaldo: entenda ordem dos fatos que levaram homem à morte em
abordagem da PRF | Sergipe | G1 (globo.com)
que-a-policia-e-militar/
https://fontesegura.forumseguranca.org.br/ainda-sobre-a-desmilitarizacao-das-polici as/
(PEREIRA, VILLELA, 2019)
https://bibanpocs.emnuvens.com.br/revista/article/view/482/571#content/citation_ref
erence_5
Livros: “Violência Povo e Polícia” de Maria Victoria Benevides| “Praça Velho: socialização,
representações e práticas policiais militares” de Agnaldo Silva.