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Brazilian Journal of Development 80395

ISSN: 2525-8761

Atividade clássica de inteligência – ramos, ciclos e momentos

Classic intelligence activity - branches, cycles and moments


DOI:10.34117/bjdv8n12-238

Recebimento dos originais: 14/11/2022


Aceitação para publicação: 23/12/2022

Rinaldo Paz da Rocha


Oficial da Polícia Militar do Paraná, Mestre em Políticas Públicas pela Universidade
Estadual de Maringá (UEM)
Instituição: Polícia Militar do Paraná - 3 º CRPM
Endereço: Av. Guedner, 1218, Zona 08, Maringá, Paraná, CEP:87050-390
E-mail: rinaldopr10@gmail.com

RESUMO
O presente artigo visa contextualizar conceitos da atividade de inteligência, com o intuito
de evidenciar alguns entendimentos consolidados pela inteligência clássica e auxiliar na
compreensão da importância da atividade e do sistema de inteligência como instrumento
de proteção do cidadão, qual o seu papel constitucional e, especialmente, qual a sua
finalidade, como ferramenta estratégica de governança. O escrito tem por base
concepções e argumentos da inteligência clássica, os ramos da inteligência e da
contrainteligência, os respetivos ciclos de produção do conhecimento de inteligência, o
processo em si e seus momentos.

Palavras-chave: inteligência, contrainteligência, governança.

ABSTRACT
This article aims to contextualize concepts of intelligence activity, in order to highlight
some understandings consolidated by classical intelligence and help in understanding the
importance of the activity and the intelligence system as an instrument for the protection
of the citizen, what is its constitutional role and, especially, what is its purpose, as a
strategic governance tool. The writing is based on concepts and arguments of classical
intelligence, the branches of intelligence and counterintelligence, the respective cycles of
production of intelligence knowledge, the process itself and its moments.

Keywords: intelligence, counter-intelligence, governance.

1 INTRODUÇÃO
Para se fazer uma abordagem sobre esse assunto, em solo brasileiro, é necessário
reconhecer que a atividade de inteligência evoluiu efetivamente a partir da Constituição
de 1988, visto a latente necessidade de mudanças nas estruturas dos órgãos de inteligência
do país. De verdade, foi realizado um ajustamento normativo da atividade de inteligência
aos novos tempos. No entanto, esse processo só foi iniciado em 1999 através da Lei nº

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9.883/99, que instituiu o Sistema Brasileiro de Inteligência - Sisbin, criou a Agência


Brasileira de Inteligência - Abin e possibilitou a edição do Decreto nº 4.376/2002, que
regulamentou e organizou o funcionamento do Sistema de Inteligência no país (BRASIL,
1999; BRASIL, 2002).
Neste sentido, por mais que o Sistema Brasileiro de Inteligência, tradicionalmente,
tenha como base a preservação da soberania nacional, em âmbitos gerais, a atual
legislação de inteligência estabeleceu noções importantes para o desenvolvimento da
atividade de inteligência, como a obediência aos princípios da legalidade; da defesa do
Estado democrático de direito; do respeito aos direitos humanos fundamentais; dos
direitos e garantias individuais e coletivas, além de acordos, convenções e tratados
internacionais firmados pelo Brasil, dentre outros dispositivos constitucionais.
No campo da atividade de inteligência, a estética e metodologia do processo de
produção do conhecimento e a adequada, oportuna e conveniente gestão da informação,
possuem papeis fundamentais no desdobramento e implementação das políticas públicas
e dos interesses de governo, posto que, possibilitam o desenvolvimento, aprimoramento
e expansão de ideias (estratégias organizacionais), discussões e soluções dos negócios de
governo em um ambiente protegido, com o objetivo de diminuir as incertezas dos
tomadores de decisão. Pela sua própria essência, a atividade de inteligência está
diretamente ligada aos princípios constitucionais, éticos e morais, que orientam a
administração pública, e não é por acaso, pois, em geral lida com assuntos sensíveis de
natureza social, política, econômica, de segurança e de soberania nacional.
Nesse sentido, o artigo explica a finalidade da atividade de inteligência, seus
ramos, apresenta conceitos e aspectos de constituição do sistema, expõe sobre a
sistemática e particularidades do processo de produção do conhecimento de inteligência,
de contrainteligência, os ciclos e suas fases – retratadas em momentos/ações bastante
particulares da administração pública.

1.1 O SISTEMA DE INTELIGÊNCIA E SUA FINALIDADE


A necessidade de proteção institucional contra as instabilidades cotidianas de
governo fazem com que o Estado permaneça indefinidamente dependente das ações dos
serviços de inteligência, como a exploração, domínio, proteção dos ativos nacionais e a
sistêmica vigilância à reais ou potenciais ameaças à democracia. Na atualidade, a
atividade de inteligência constituiu-se numa ferramenta de cooperação para o
planejamento, execução e acompanhamento das ações governamentais, pois facilitam as

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decisões que possibilitam estabelecimento e o implemento das políticas públicas. De


verdade as ações realizadas pelos órgãos de inteligência representam a força da
democracia em um país.
Essencialmente, a atividade de inteligência tem o escopo de assistir as autoridades
governamentais, nos seus diversos níveis, através da detecção de oportunidades e de
ameaças. A exemplo, pode-se citar o assessoramento para a realização do planejamento
público e execução das ações governamentais; a definição de diretrizes para estruturação
da segurança dos ativos institucionais - dados, pessoas, instalações, meios de transmissão
de informação (segurança orgânica); e o desenvolvimento proativo de ações de
prevenção, identificação, bloqueio e neutralização de antagonismos. Então, a atividade
de inteligência, resume-se na arte de conhecer e entender as realidades nacionais e
estrangeiras com a finalidade de orientar as decisões do poder executivo, no sentido de
promover a proteção e o bem coletivo de uma nação (BRASIL, 2016).
Hoje, a atividade pura de inteligência centra as suas ocupações essencialmente na
área das tecnologias da informação e se debruça em tarefas preditivas de produção de
conhecimentos, visando a antecipação de acontecimentos futuros, com o objetivo de
orientar o desenvolvimento das ações do Estado em benefício/defesa da sociedade. De
fato, a moderna atividade de inteligência é social e protetiva, suas ações se fundamentam
na promoção do bem-estar da sociedade, na defesa dos interesses econômicos nacionais,
socioambientais, na democracia e na manutenção do Estado de Direito.
A atividade de inteligência compreende o desenvolvimento contínuo de ações
especializadas de naturezas exploratórias ou sistemáticas, cujo propósito é a produção de
conhecimentos de natureza restrita, com a finalidade de assessorar as autoridades
constituídas no processo de tomada de decisão, salvaguardar os interesses do Estado e
instituições, mas, sobretudo, proteger o cidadão dos diversos males sociais que afligem a
sociedade moderna.
Em razão das necessidades tecnológicas e do alinhamento aos novos
mandamentos constitucionais, a atividade de inteligência vem recorrendo, cada vez mais,
aos métodos científicos aplicados pelas ciências sociais (BRASIL, 2016) e ao
aprimoramento da legislação pátria, mesmo que ainda não tenha sido aprovado,
definitivamente, um “Marco da Atividade de Inteligência Brasileira1”, que disponha

1
Disciplina o exercício permanente e sistemático da produção, difusão e salvaguarda de conhecimentos
sensíveis destinados à proteção da sociedade e do Estado, com vistas ao assessoramento de autoridades.
Prevê a cooperação técnica, estrutura, garantias, forma de atuação e controle dos órgãos de inteligência

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claramente sobre conceitos; órgãos e seus integrantes; atribuições, forma de atuação,


proteção e produção do conhecimento; amparo legal e vedações; controle e forma de
compartilhamento dos produtos de inteligência. A esse respeito, cabe ressaltar a
existência do Projeto de Lei n° 2719, de 2019, em andamento no Senado (BRASIL, 2019).
Da mesma forma, para ilustrar o processo de abertura e evolução das leis e da
atividade de inteligência no mundo, Cepik (2003) assinala que na Inglaterra, a legislação
passou a empenhar diretamente o serviço de inteligência no processo de preparação das
avaliações técnicas (assessments) para orientar as decisões de governo. Em analogia, nos
EUA, via de regra, as decisões de governo se movem por dentro dos ambientes da
inteligência, no entanto, não se confundem com a política, ou seja, não sofrem inclinações
provenientes das interferências políticas - uma medida inteligente para afastar o risco de
enviesamento nas decisões e ações do Estado. A partir dessa ideia, nota-se a preocupação
desses dois países em estruturar um sistema de inteligência transparente para que o
cidadão tenha a possibilidade de entender o que o governo e suas agências fazem
(JOHNSON, 2010).
Além dessas observações, é primordial ressaltar que as ações de inteligência no
Brasil, hoje, são desenvolvidas totalmente afastadas e desvinculadas dos antigos conflitos
políticos e ideológicos do século passado (Guerra Fria)2. Na atualidade, a atividade de
inteligência vive o pós-momento da abertura política, experimenta o pluralismo de ideias
e de ideais de democracia, consequência de uma nova visão de Estado e sociedade, e
desenvolve os seus deveres sempre focados nos princípios da eficiência, eficácia e
efetividade da prestação do serviço público, conforme também preceitua e orienta o
Planejamento Estratégico da PMPR para os anos de 2022-2035 (PARANÁ, 2022).

2 RAMOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA


Essencialmente, a atividade de inteligência se ramifica em dois eixos distintos: a
inteligência e a contrainteligência, seguimentos interligados por uma união que não se
desfaz e que se beneficiam entre si. Ressalta-se que, frequentemente, essas duas

das polícias, departamentos penitenciários, Forças Armadas, Gabinete de Segurança Institucional,


Agência Brasileira de Inteligência, Ministérios das Relações Exteriores, da Integração Nacional e da
Ciência e Tecnologia, ministérios públicos estaduais e Conselho de Controle de Atividades Financeiras
(BRASIL, 2019).
2
Conflito político-ideológico, entre Estados Unidos e União Soviética (1947-1991), que dividiu o mundo
em dois grandes blocos - capitalista e comunista. Perídodo marcado por tensões políticas, econômicas e
sociais (MEYER, 2009).

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especialidades mesclam ações sistêmicas e/ou exploratórias (pontuais) com a finalidade


de prospectar oportunidades e/ou ameaças aos ativos de um sistema ou de uma agência,
a partir de ciclos próprios de produção do conhecimento de inteligência.

2.1 INTELIGÊNCIA
Além de acompanhar as “Expressões do Poder” – contexto nacional político,
econômico, psicossociológico, militar e tecnocientífico (PILAR, 2017) e suas
transformações, a inteligência se incumbe de entender a realidade pátria e os organismos
nacionais e internacionais, com fundamento nas relações do homem com a terra e
instituições, perfazendo-se no aparato perfeito de assessoria aos tomadores de decisão nos
mais variados níveis, a partir da produção de conhecimentos significativos.
Sob a concepção de Kent (1965), a inteligência pode ser compreendida a partir de
três perspectivas: produto (conhecimento), organização (órgão) e atividade (processos).
Como Produto: refere-se a produção de conhecimento (relatório/documento) para uso
de um tomador de decisão em diferentes níveis. Como Organização: refere-se à estrutura
funcional dos órgãos que atuam na busca de dados/informações, que possibilitam a
produção e salvaguarda do sistema, agências e informações. Como Atividade: refere-se
à metodologia utilizada para obtenção, análise e difusão de dados/informações, em
especial do material de acesso negado.
Com fundamento em Platt (1974), a palavra inteligência, aplicada a produção do
conhecimento estratégico de governo, refere-se a algo especial, significativo, de
concepção elaborada, ou mesmo à informes sem tratamento, atinentes a fato ou dado
específico que tenha potencial de avaliação e de interpretação. Fundamentalmente,
compreende um produto com relevância para a resolução de determinado problema de
política nacional em curso.
Observa-se então que, sob o enfoque de Kent (1965) e Platt (1974), o sistema de
inteligência brasileiro tomou forma a partir da Lei nº 9.883/1999, somada ao Decreto
4.376/2002 e a Doutrina Nacional de Inteligência. A partir disso, a atividade de
inteligência foi estruturada para se ocupar da obtenção, análise, produção e difusão,
interna e externa, de conhecimentos relacionados a fatos/eventos com potencial poder de
desdobramento social, político e econômico no âmbito das atribuições do Estado
brasileiro (BRASIL, 1999; BRASIL, 2002; BRASIL, 2016).
De forma genérica, uma inteligência, entendida como bem abstrato, refere-se a
toda informação coletada, buscada, organizada, analisada e produzida com a finalidade

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de atender às demandas de um tomador de decisão. Um produto estratégico de interesse


público (governos) ou privado (grandes corporações), que afeta e impacta diretamente a
política, a economia e o bem-estar social (CEPIK, 2003), sempre associado ao estudo de
assuntos sensíveis de Estado e de grandes corporações de importância multinacional.

2.2 MOMENTOS DO CICLO DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA


O Ciclo da atividade de “inteligência” é constituído de cinco estágios distintos,
que são desencadeados progressivamente em consonância com o método de produção do
conhecimento, ou seja, estão segmentados em momentos específicos, quais sejam:
primeiro - a política; segundo - o planejamento; terceiro - a reunião; quarto - o
processamento e o quinto - a difusão. A saber: o Momento da Política: compreende o
elemento central, ou seja, representa o núcleo originário do processo de produção do
conhecimento de inteligência, sendo caracterizado pelo instante do aparecimento da
demanda governamental, que chancela o início do ciclo da atividade de inteligência.
Importante ressaltar que a “política” é uma fase que mistura poder e influência, sendo
capaz de interligar e interferir diretamente no desenvolvimento das outras etapas do ciclo.
A partir do momento político as ações de inteligência são precipitadas para o atendimento
de necessidades especiais de governança. Em geral, após o desenvolvimento de todo o
ciclo e do recebimento do conhecimento de inteligência, como resposta da demanda
inicial, os atos de governo se operacionalizam através da formulação das políticas
públicas – Planos: Plurianuais; de Desenvolvimento; de Defesa e Soberania; de
Segurança; de Inteligência, entre outras representações setoriais nas esferas federal,
estadual e municipal, que não se limitam apenas ao Poder Executivo; o Momento do
Planejamento: representa o instante de compreensão da necessidade de organização para
o desenvolvimento de uma demanda especial ou sistêmica, com a finalidade de entender
e categorizar uma realidade e possibilitar a formação de conhecimentos específicos; o
Momento da Reunião: compreende o instante da obtenção e juntada de dados e
informações (documentos), que se processa através da coleta e/ou busca sistêmica ou
específica de materiais úteis para a produção do conhecimento de inteligência. Para o
recolhimento desse material são utilizadas as mais diversas competências humanas e
meios tecnológicos; o Momento do Processamento: representa o instante da aplicação
de método, procedimentos analíticos de seleção para identificação de partes
significativas, verificação de conexão com outros materiais, integração de partes a
elementos relevantes e a formulação de considerações e conclusões. Esse trabalho

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possibilita a construção/reconstituição do delineamento e trajetória de acontecimentos no


passado, presente e a projeção de cenários no futuro; o Momento da Difusão:
disseminação do conhecimento se dá no instante da transmissão do produto final de
inteligência. Essa fase do processo se materializa por meio da remessa de relatórios ao
usuário (tomador de decisão), para avaliação de conveniência, oportunidade e viabilidade
de utilização das informações, como subsídio às intervenções governamentais (BRASIL,
2014).
A atividade de inteligência se desenvolve por meio de um ciclo constituído de
fases bem distintas, no qual o mesmo ponto, identificado como “política”, representa o
marco inicial e o desfecho das ações de inteligência. A figura abaixo apresenta
objetivamente essa metodologia:

Figura 1 - CICLO DE INTELIGÊNCIA

Fonte: elaborado pelo autor.

Em razão da dinâmica do ciclo de inteligência não guardar barreiras ou estabelecer


dependências metodológicas das fases entre si, o processo de produção do conhecimento
mantém-se suscetível à permanentes reavaliações e aprimoramentos, como um artifício
de atualização, ajuste e sintonia do processo. Em síntese, a produção do conhecimento de
inteligência visa identificar oportunidades e detectar ameaças a sociedade e aos negócios
de governo.

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2.3 CONTRAINTELIGÊNCIA
A Contrainteligência, também estabelecida pela Lei nº 9.883/1999 e
regulamentada pelo Decreto nº 4.376/2002, é definida como uma atividade de função
protetora, frente à atividade de inteligência antagônica. Esta especialidade se manifesta
nas ações de prevenção, detecção, obstrução e neutralização da inteligência hostil e/ou
atividades que constituam ameaça à sociedade e/ou aos ativos do Estado, como dados,
informações, conhecimentos, instalações, tecnologias, comunicação, transporte, entre
outros (BRASIL, 1999; BRASIL, 2002).
Efetivamente, as ações de contrainteligência lidam com a proteção do sistema de
inteligência, contra o risco da subtração de conhecimentos e informações estratégicas de
governo. Sugere a ideia da formação de barreiras (defesas ativas) contra ações adversas
(espionagem, sabotagem, propaganda hostil, terrorismo ou desinformação).
Neste sentido, observa-se que a contrainteligência se ocupa da proteção global do
Estado, a partir da detecção de potenciais ou reais hostilidades, pelo próprio sistema de
inteligência, objetivando a proteção de recursos humanos, instalações, documentos e
operações, com a finalidade primordial de defesa do cidadão e dos interesses da nação
contra a ação criminosa nacional ou estrangeira (JOHNSON, 2010).
Via de regra, as ações de contrainteligência são desenvolvidas por meio da ação
de três setores distintos de Segurança, a saber: a Segurança Orgânica – SEGOR; a
Segurança de Assuntos Internos – SAI; e a Segurança Ativa – SEGAT, conforme explica
a tabela abaixo:

Quadro 1 – Atribuições setoriais - SEGOR, SAI e SEGAT.


SIGLA ATIVIDADE ESPECIALIZADA
Setor responsável por estabelecer medidas de defesa para a garantia de funcionamento do
órgão de inteligência. Atua na prevenção e obstrução das ações adversas contra os ativos
SEGOR
do sistema de inteligência - pessoal, documentos, instalações, materiais, operações,
comunicações e tecnologia da informação (BRASIL, 2011; BRASIL, 2014).
Setor responsável pelo tratamento de Assuntos Internos. A SAI atua por meio do
estabelecimento de medidas específicas, produzindo conhecimento para assessorar as
SAI
ações institucionais de correição (BRASIL, 2011; BRASIL, 2014) e acompanhamento do
público interno.
Setor responsável pelo estabelecimento de dinâmicas para a detecção, identificação,
SEGAT avaliação, analise e neutralização de reais ou potenciais ações hostis ao sistema de
inteligência e seus ativos (BRASIL, 2011; BRASIL, 2014).
Fonte: elaborado pelo autor.

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2.3.1 Momentos do ciclo da atividade de contrainteligência


Caracterizado pelo desencadeamento sistemático e/ou exploratório de ações
especiais de salvaguarda do sistema de inteligência, por ocasião do surgimento de reais
ou potenciais ameaças à segurança da sociedade, instituições e à governança do Estado e
seus ativos, o Ciclo de Contrainteligência é composto de cinco momentos/ações
distintos – observar, orientar, detectar, decidir e agir. A saber: o Momento de
Observar: compreende a fase mais relevante da atividade de contrainteligência, que se
manifesta no acompanhamento sistemático do objeto de interesse, com a finalidade de
identificar inclinações, capacidades e técnicas utilizadas, para prevenir-se de uma
potencial ação adversa; o Momento de Orientar: é a ocasião para assessorar
estrategicamente, por meio de metodologia, os tomadores de decisão com o objetivo de
proteger reais ou potenciais alvos sensíveis para evitar ou minimizar prejuízos à sociedade
e ao Estado; o Momento de Detectar: é a fase de identificação da ação nociva, gerada
durante a fase de observação ou fornecida por colaboradores, contra a sociedade e/ou os
ativos do Estado; o Momento de Decidir: é a fase de definição do procedimento a ser
seguido para prevenir, obstruir ou neutralizar a ação nociva. Essa etapa leva em
consideração a natureza, responsabilidade, circunstâncias e prováveis efeitos colaterais
que o ato possa provocar; o Momento de Agir: é a execução de medidas e procedimentos
definidos na fase de decisão para conter e certificar que a ação danosa seja contida
definitivamente (BRASIL, 2016).
Na prática, a atividade da Contrainteligência atua de forma cíclica, ou seja, inicia
e finaliza suas ações no mesmo ponto-ação (observar), conforme a figura abaixo:

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Figura 2 - CICLO DE CONTRAINTELIGÊNCIA

Fonte: elaborado pelo autor.

Por fim, importa salientar que o ciclo de contrainteligência, por desenvolver


atividades sistêmicas, conserva-se em um estado perene de reavaliação, atualização e
aprimoramento do conhecimento de inteligência, em consequência do dinamismo e do
infindável fluxo de dados/informações, natural da atividade de inteligência. Em síntese,
a Contrainteligência planeja e executa ações preventivas de defesa e de contraposição à
reais e/ou potenciais forças antagônicas contra o aparelho estatal e seus ativos.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Face a complexidade notória dos negócios de governo, seus planejamentos e
realizações, nota-se que a atividade de inteligência, hoje, é uma necessidade para o
exercício pleno da governança, visto a sua capacidade de prospectar cenários sociais, com
reflexos políticos, que facilitam o processo de tomada de decisão das autoridades
constituídas.
Pensando a atividade de inteligência como instrumento de gestão e de importância
estratégica para o Estado, é primordial que se tenha um entendimento suficientemente
abrangente dos conceitos estabelecidos pela Inteligência Clássica, seus ramos e
funcionalidades, para a correta aplicação das teorias de inteligência na área da segurança
pública, visando o alcance dos objetivos estratégicos traçados pela PMPR, para a
promoção da melhoria dos “programas e processos” de combate aos fenômenos da

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violência e da criminalidade no âmbito do Estado do Paraná, em conformidade com o


Planejamento Estratégico da PMPR 2022-2035.
A partir do exposto, pode-se conceituar a atividade de inteligência como a arte
de produzir conhecimentos estratégicos de natureza política, social ou econômica, a partir
de dados brutos e informações, com ou sem tratamento, com o objetivo de orientar as
decisões governamentais, frente às demandas de interesses do Estado e dos formuladores
de políticas públicas, por meio de documentos técnicos - informes, informações,
apreciações e estimativas. A finalidade cerne da atividade de inteligência é manter as
autoridades atualizadas e acauteladas quanto a potenciais ou reais oportunidades e/ou
ameaças à governança, de modo a possibilitar a projeção de cenários de risco para mitigar
conjunturas e hostilidades aos ativos do Estado e a segurança da sociedade.
Já a atividade de contrainteligência, esta pode ser entendida como uma atividade
especializada de planejamento e execução de ações preventivas de defesa e contraposição
(detecção, obstrução e neutralização) a reais e/ou potenciais antagonismos à sociedade e
governança do Estado e seus ativos. Ressalta-se que tanto a inteligência quanto a
contrainteligência possuem ciclos e processos próprios para a produção de
conhecimentos.
Por fim, cabe destacar que, quanto melhor a compreensão da Inteligência Clássica,
melhor a aplicação dos conceitos de inteligência na estruturação dos diversos sistemas de
inteligência de segurança pública. Também, melhor será o conteúdo produzido e mais
eficaz, eficiente e efetivo será o governo em seus planejamentos e realizações em
benefício do Estado, da sociedade e do cidadão.

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REFERÊNCIAS

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funcionamento do Sistema Brasileiro de Inteligência, instituído pela Lei nº 9.883, de 7 de
dezembro de 1999, e dá outras providências. Diário Oficial, Brasília, DF, 16 set. 2002. Seção 1,
p. 4.

BRASIL. Gabinete de Segurança Institucional. Agência Brasileira de Inteligência. Doutrina


Nacional da Atividade de Inteligência: fundamentos doutrinários. Brasília, 2016.

BRASIL. Lei nº 9.883, de 7 de dezembro de 1999. Institui o Sistema Brasileiro de Inteligência,


cria a Agência Brasileira de Inteligência - ABIN, e dá outras providências. Diário Oficial, Brasília,
DF, 8 dez. 1999. Seção 1, p. 1.

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março de 8 de março de 2022. Alteradas pelas Portarias CG: nº 791, de 26 de agosto de 2022 e
nº 805, de 6 de setembro de 2022. Aprova o Planejamento Estratégico da PMPR 2022/2035,
composto do Plano Estratégico, do Mapa Estratégico e da Carteira de Projetos e dá outras
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