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RAFAEL M.

SALDANHA

Conteúdo publicado pela Iniciativa T20


Não oficial e não canônico
CAPÍTULO 1

Carrego um pouco de medo e orgulho


Atrás da orelha deles eu sou a pulga
Se eles chegar, tô pronto pra dar a fuga
(“Crime Bárbaro”, Rincon Sapiência)

Eu tenho uma missão e não vou parar


Meu estilo é pesado e faz tremer o chão
Minha palavra vale um tiro... eu tenho muita munição
(“Capítulo 4, Versículo 3”, Racionais MC´s)

F avela dos Goblins, Valkaria. Início de uma noite de haya no


final de Caravana. Um pequeno grupo de jovens goblinóides
se reúne, formando uma roda em uma esquina. Bebidas são
compartilhadas e um goblin toca um pequeno tambor em um ritmo
repetitivo, mas agradável. No centro do círculo, rapazes e moças se
alternam rimando de improviso poemas que falam de suas vidas. O
público reage efusivamente quando eles são bons (e de forma cruel
quando não são). Um hobgoblin franzino aguarda ansiosamente sua

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vez de falar. Quando chegou lá, ao contrário do que imaginava, foi
invadido por uma imensa sensação de calma. As palavras vinham
naturalmente à sua boca:

Da Favela dos Goblins, eu sou o Matraka


Criando versos afiados, com a mente em chamas, caraca.
Na periferia do centro, onde a vida é sinistra
Mas eu vim pra brilhar, ser o orgulho da pista

Trabalhando duro, roubando no mercado


Pelas esquinas da vida, eu fui forjado
Mas agora estou aqui, representando meus manos
Vou espalhar a palavra, nesses versos insanos

O mundo como deve ser, eu vou dizer com vontade


Caos, vida, mudança e liberdade
Não importa de onde venha, vou fazer a diferença
Matraka na cena, com toda a resistência

Caos, vida, mudança e liberdade é o meu refrão,


Na batalha de rimas, eu sou a revolução.
Da Favela dos Goblins, levanto minha bandeira,
Com rimas afiadas, minha mensagem ecoa verdadeira.

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(recorte da Gazeta do Reinado)

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CAPÍTULO 2

Tudo, tudo tudo que nós tem é nós.


(“Principia”, Emicida)

Por fim, permita que eu fale


Não as minhas cicatrizes
Achar que essas mazelas me definem
É o pior dos crimes
É dar o troféu pro nosso algoz e fazer nóis sumir, aí
(“AmarElo, Emicida)

A
o nascer, não se criou muita expectativa. “O menino é
pequeno, magro... ninguém sabe se vai vingar. Não se
apegue demais”, alguém falou com a mãe. Tal brutalidade
era comum na Favela dos Goblins, mas Kroxa desejava que
aqui as coisas fossem um pouco diferentes. Ela havia saído das terras
próximas às Montanhas Sanguinárias quando soube estar grávida. Um
boato de que no sul havia um general bugbear que unificava os
goblinóides e colocava medo nos inimigos. Um lugar onde seu povo
seria respeitado. Um lar para seu filhote. Um choro estridente tirou a

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mãe de seu devaneio. “Mas tem pulmões fortes”, lhe disse a parteira
goblin. “Um grito desses é capaz de mudar o mundo”, riu a velha. E
assim Kroxa batizou o menino de Oybedeshhzahukat.

“Você fala demais para alguém tão pequeno. Essa boca parece
uma matraca”, disse um mercador, e foi assim que
Oybdedeshhazahukat foi batizado pela segunda vez, aos sete anos.
Daquele dia em diante poucos se lembrariam de seu nome pomposo.
Agora ele era só mais um na Favela dos Goblins. Volta e meia se metia
em brigas, dormia na rua e só voltava dias depois, para o desespero de
sua mãe, que parecia querer protegê-lo do mundo. Uma vez ela disse a
ele que ele a lembrava o pai, mas foi tudo que ele ficou sabendo de seu
genitor. Não que fizesse falta. A comunidade ajudava Kroxa a criar o
menino. O velho Tuppaak o deixava brincar nos fundos de sua oficina
e ensinava os rudimentos da forja de armas. As letras e números foram
cortesia de Margot, uma devota humana de Tanna-Toh. Ou quase
humana. Ou quase goblin de tão pobre. Ainda era pequeno para um
hobgoblin, mas esse fato raramente era lembrado por viver
principalmente entre goblins. Se o físico não impressionava, a rapidez
de raciocínio e a forma de se expressar fascinava quem convivia com o
menino.

Jamais se acostumou com os olhares de suspeição da Milícia de


Valkaria. Matraka tinha 8 anos quando o sítio purista à Valkaria
escancarou o que ele sabia desde sempre: os goblinóides podem até vir
a serem aceitos, mas ninguém realmente gosta de seu povo. Por isso
era tão importante se unirem. Desconfiou logo de cara quando os
lordes urbanos decidiram instalar a UMP. Após tomar alguns safanões
por pegar um pão no mercado a desconfiança foi se tornando ódio. A
situação era ideal para levar mais um jovem pobre para o caminho da
criminalidade, mas algo mudou sua rota. Com os primeiros refugiados
de Tyrondir chegando à capital também veio a palavra de Thwor e O

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Mundo Como Deve Ser. Descobriu que não bastava ser goblin,
hobgoblin, ou mesmo gnoll ou orc. Era preciso ser um só povo.
Duyshidakk. O ódio e a revolta agora tinham direção, e a arma do
Matraka era sua língua afiada.

Os aplausos e apupos o deram certeza: tinha nascido para


aquilo. Mais tarde, ao invés de voltar direto pra casa, decidiu tomar um
último gole em cima dos Arcos do Poente, esperando baixar sua
adrenalina. Olhou a cidade e pensou que Valkaria era grande, enorme,
mas não era o mundo todo. Ele se sentia pronto. Arton era dele e era
hora de tomar posse. Havia sobrevivido a uma guerra e não ia esperar
acontecer outra pra perceber que o tempo estava passando. Ia juntar
suas poucas coisas e buscar aventura. Mas antes ia deixar mais um
recado...

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