Proposta Paradigma Colonialista

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Núcleo da Juventude - 3ª série do Ensino Médio

Componente Curricular: Redação - Folha nº 4


Professoras: Aline e Marina
Estudante: __________________________ Data: _________

PROPOSTA DE ESCRITA - REDAÇÃO UFRGS

Considere, abaixo, a entrevista de Ailton Krenak intitulada “A terra cansa”,


mediada pela jornalista Tainá Aragão, publicada no Instituto Socioambiental:

Ailton Krenak pensador e ativista indígena, autor de Ideias Para Adiar o Fim do Mundo
e A Vida Não é Útil, publicados em mais de dez países, comenta os desafios para superação
do paradigma colonialista:

Nos últimos cinco anos, os crimes socioambientais ganharam as principais manchetes


dos jornais brasileiros, como nunca antes. O que mais te chamou atenção nesse
período?

É uma experiência radical. Em cinco anos, a gente viu essa pobreza se expandir e deixar
cerca de 32 milhões de brasileiros nessa condição de passar fome. Só em São Paulo já
foram registrados mais de 6,2 milhões de pessoas que correm risco de ficar sem comer
amanhã. Até em São Paulo, onde as pessoas geralmente não se alimentam do rio ou da
terra, mas consomem produtos processados do mercado, as pessoas estão ficando sem
comida. Nós estamos em meio a um desastre social amplo, onde a questão ambiental
entra só como motor.

O desastre social socioeconômico acontece quando milhões de famílias perdem o


contato com as fontes de produção de alimento e passam a depender de cesta básica,
passam a esmolar. É uma tragédia. A gente piorou de uma maneira inimaginável nesses
cinco anos, em especial com a perda desses recursos que estavam disponíveis para
milhares de pessoas, principalmente para aqueles que vivem na Floresta, para aqueles
que vivem na Mata Atlântica ou no Cerrado e que tinham sua economia baseada no
acesso à terra.

A gente diminuiu muito o atendimento à demanda de terra de assentamento. A gente não


tem mais assentamentos, a gente tem assentamentos estragados e uma política
deliberada de produção de pobreza. A questão ambiental aparece de maneira mais
gritante, porque, talvez, ela consiga articular o campo e a cidade; as pessoas que vivem na
cidade já estão sentindo a perda ambiental como uma coisa que atinge diretamente seu
cotidiano. A fumaça que vem das queimadas na Amazônia e paira sobre São Paulo
aproxima as realidades de pessoas que vivem no ambiente urbano e de pessoas que
vivem na floresta, algo que nenhum de nós imaginava, é como se fosse uma ficção.

Pela primeira vez na história do país, a Constituição de 1988 possibilitou que indígenas e
outros povos tradicionais tivessem seu direito desenhado. Mas, nesses últimos anos,
esses direitos retrocederam. Como você percebe esses retrocessos?

Eu olho essa linha do tempo e percebo que a ideia de tomar uma Constituição como guia
geral para a vida política de um país, elencando questões sociais e ambientais – que foi o
que a gente fez na Constituinte de 1988 –, pode também criar uma espécie de barreira.
Algumas cláusulas podem ficar, como dizem os juristas, pétreas, mas muitas
comunidades podem perder direitos em vez de acessá-los. A Constituição dizia que o
Estado brasileiro deveria, em cinco anos, concluir o reconhecimento de todas as Terras
Indígenas e, nesse ínterim, fizeram manipulações jurídicas e políticas para cravar o marco
temporal no meio do caminho – temos 15 anos de marco temporal. Esse jogo de
empurra-empurra serve para a gente despertar um pouco nossa percepção de que uma
Constituição não é um livro sagrado, não é uma Bíblia. Alguns constitucionalistas querem
dar esse peso à Constituição, de que ela é esse documento fundador, mas isso contraria a
própria dinâmica das sociedades modernas, as quais estamos integrando, querendo ou
não.

O evento da globalização alterou tanto essas ideias do século XX, que a gente deveria
considerar uma negociação objetiva em torno da realidade política que estamos vivendo
no país e os compromissos que são possíveis extrair dessa negociação. Não seria fora do
tempo. Uma Constituição é um compromisso, é um contrato social e, como contrato
social, deve refletir as mudanças que a sociedade experimenta, mesmo que
involuntariamente.

Nós estamos passando por uma situação em que a questão da terra se agravou de uma
maneira semelhante a um genocídio. Então, nós precisamos ter sabedoria, discernimento.
A questão ambiental não vai mudar porque alguns princípios fundamentais estão escritos
na Constituição; ela vai mudar se a gente mudar nossa maneira de ser sociedade.
Enquanto formos uma sociedade racista, que reproduz o colonialismo dentro de casa,
sem dúvida, estaremos incentivando diretamente o tipo de progresso e desenvolvimento
posta em curso no governo federal por essa legenda [bolsonarista].

Antes de projetar desenvolvimento, seria necessário pensar em envolvimento.


Envolvimento maior com a questão ambiental, com a questão territorial, a gestão do
território amplo do país, a questão das bacias hidrográficas que estão sendo privatizadas,
destruídas, depredadas. Enfim, aquilo que os conservadores chamam de “patrimônio
comum”.

Parece que eles não sabem conjugar meio ambiente e sociedade. Eles continuam
achando que são coisas separadas, como sempre acharam: cultura versus natureza,
essas ideias. Tomara que a gente consiga sair desse momento péssimo da vida política
brasileira, e vamos ter que fazer isso com a Constituição que nós já temos. Mas não
custaria nada, depois disso, fazer como estão fazendo no Chile e botar em questão o
molde do Estado colonial.

É preciso perguntar se queremos reproduzir o Estado colonial infinitamente, eternamente.


Será que esse é o único jeito de se organizar em sociedade? Eu já disse que esse Estado
colonial que temos aqui foi deixado aqui por Dom Pedro: um príncipe português deu no pé
e largou a carcaça do Estado português em cima das nossas vidas. A maior parte da
burocracia estatal transferiu-se direto de Lisboa para cá, veio junto com a família real, e
deveria ter ido embora com eles.

Quais debates são necessários para decolonizar a política?

Agora, com o debate sobre o novo constitucionalismo latino-americano, sobre as


possibilidades da Colômbia, do Chile, e mesmo da Bolívia, do Equador, a questão é
estender o debate para além da ideia de direitos humanos: os direitos da natureza. O que
está se discutindo agora é o direito da natureza, não porque já se conseguiu atender toda
a lista de demandas dos direitos humanos, mas porque é impossível atender aos direitos
humanos sem atender ao direito da natureza, da Terra. Não é em outro lugar que vamos
tirar esses recursos para a gente continuar vivendo.

O discurso do progresso e do desenvolvimento é burro, porque se você perguntar de onde


eles vão tirar água e comida para todo mundo, eles vão te responder que é da terra, pois
não tem jeito de tirar de outro lugar. Mas, por outro lado, eles insistem em ignorar uma
política adequada para a questão do acesso à terra.

Vivemos um crescimento escandaloso da propriedade privada, do latifúndio privado,


porque a sociedade deixou de se configurar como uma sociedade agrícola, agora nós
passamos a nos articular em termos corporativos; são corporações que estão comprando
terra no Brasil. São grandes empresas, grandes bancos e grandes conglomerados que
estão se apropriando de grandes extensões de terra, numa escala de milhões de hectares.
Assim, estamos privatizando a infraestrutura natural do país.

A primeira infraestrutura que uma nação deve considerar é seu território; depois você vai
pensar em estrada, hidrelétrica etc. No Brasil, já faz muito tempo que ninguém pensa que
o território é o que institui a possibilidade de identidade cultural desses povos; por isso a
gente corre o risco de ter uma diversidade de povos sem lugar para pousar.

Enquanto o Brasil insiste em querer imitar países ricos, nós vamos continuar sendo essa
pobre imitação de país rico. Temos um território imenso, uma biodiversidade escandalosa,
uma riqueza natural de dar inveja aos estrangeiros. Mas os brasileiros, principalmente
aqueles que têm poder político, que têm capacidade de se articular politicamente, são tão
medíocres que não têm conhecimento sobre esse mundo que eles habitam.

É uma tragédia, é um desencontro entre, de um lado, esse território, essa pachamama,


essa terra rica e, de outro, a mediocridade das autoridades, dos políticos, que insistem em
estragar o melhor que nós temos e produzir pobreza.

Disponível em: https://www.socioambiental.org/noticias-socioambientais/ailton-krenak-terra-cansa

A partir da leitura do texto, considere a seguinte situação: você faz parte


de um grupo universitário que estuda e debate assuntos da
contemporaneidade, atividade muito comum dentro das universidades.
Normalmente, esses grupos são coordenados por um ou dois professores e
contam com a participação de alunos de iniciação científica, alunos de
diferentes semestres da faculdade, outros professores, etc. Ou seja, são, por
natureza, bastante heterogêneos.
O fato é que o professor coordenador do seu grupo leu a entrevista de
Ailton Krenak durante uma reunião e, como era de esperar, o tema suscitou
forte debate. Alguns colegas concordaram completamente com o autor;
outros, dele discordaram veementemente. Enfim, instaurou-se uma forte
polêmica!
Tendo em vista essa situação, o professor coordenador solicitou a
membros do grupo a redação de textos dissertativos que apresentem
claramente um posicionamento acerca das opiniões lançadas pelo autor.
Esses textos representarão as ideias daqueles que concordaram ou
daqueles que discordaram do autor.
Você foi um dos escolhidos pelo professor nesta importante tarefa:
escrever um dos textos!
Observe que você será porta-voz de uma coletividade: seu texto, além
de apresentar um posicionamento qualificado sobre as ideias de Krenak,
deverá representar a opinião de seus colegas de grupo.
Enfim, você deverá escrever uma dissertação que, ao ser lida no grupo
de estudos ao qual você pertence, apresentará seu ponto de vista sobre a
entrevista do autor e representará a opinião daqueles com os quais você se
identificou durante o debate.
Bom trabalho!

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