V JORNADA D E ETNOMUSICOLOGIA

III COLÓQUIO AMAZÔNICO DE ETNOMUSICOLOGIA

Fernando Lacerda Simões Duarte

PPG-Artes/UFPA, Bolsista de pós-doutorado, PNPD-CAPES

O hino Akathistos do padre António Cartageno: uma

abordagem a partir dos modelos para a música religiosa
católica em Portugal e no Brasil após o Concílio Vaticano II

Belém-PA
2018
 Objetivos
Considerando o contexto da produção das obras musicais
para sua compreensão (DAHLHAUS, 2003), os modelos
existentes no panorama católico pós-conciliar (1963) no
espaço luso-brasileiro, e a liberdade individual nas opções
composicionais, compreender como os modelos se
articulam com uma composição específica: Akathistos:
Hino em Honra da Virgem, Mãe de Deus (CARTAGENO,
MELRO, 2017).
Não se trata da “musicologia comparada” evolucionista de
outrora, mas um estudo de condições diversas e como
estas podem ou não resultar em produtos composicionais
semelhantes ou diversos
 Projeto – Núcleo Caravelas (UNL)
O trabalho é parte do projeto História Temática da
Música Luso-Brasileira (Universidade Nova de
Lisboa)
Volume 2: Música e cultos (para muito além do
catolicismo) – com João Pedro D’Alvarenga;
Outros materiais: capítulo de livro decorrente da
fala na mesa redonda do Simpósio de
Musicologia da UFG de 2018, realizado em
Pirenópolis
 Problemas e metodologia
Quais as memórias observadas em relação à produção pré-
conciliar?
Quais as principais diferenças entre os modelos que
condicionaram ou balizaram a produção musical no Brasil após
o Concílio Vaticano II (1962-1965)?

PROCEDIMENTOS: pesquisa bibliográfica, documental e análise de

elementos musicais capazes de sinalizar elementos identitários
Documentos romanos e da CNBB com os paradigmas das práticas
musicais antes e após o Concílio Vaticano II

REFERENCIAIS: Candau e Nora  Memória, identidade, trabalhos

e normas sobre o patrimônio cultural imaterial
 Música religiosa católica pré-conciliar
Disciplina ao longo de séculos (desde Clemente de
Alexandria, séc. II até o presente)
Controle normativo das práticas musicais - motu proprio “Tra
le Sollecitudini” de Pio X (1903) - Restauração musical
católica – repertório restaurista – referências: “polifonia
clássica” e canto gregoriano + aspectos contemporâneos
(harmonia romântica)
Uso da língua latina no Ordinário (vernáculo nos cânticos
espirituais)
Vozes iguais
Afastamento da ópera
Negociações no Brasil: bandas, coros mistos e seleção do
repertório (Lambillotte, Bordèse, Battmann e outros)
Aproximação com a Romanização
 Aggiornamento e Concílio Vaticano II
Reconhecimento do valor de outras culturas;
aumento do uso do canto religioso popular
(cânticos espirituais), sobretudo nos países “em
missão” – Pio XII, déc. 1940
Culmina com o Concílio Vaticano II – igualdade
entre as culturas, assimilação da “índole de cada
povo particular na liturgia” (inculturação),
ampliação do uso do vernáculo, orientação do
padre no altar
 Paradigmas musicais no Brasil
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) – tais como
Pastoral da Música Litúrgica no Brasil (1976 ) e A música
litúrgica no Brasil (1998)

“Os principais renovadores da música litúrgica brasileira, que

abriram as portas da Igreja Católica no Brasil para o
elemento étnico o fizeram se baseando completamente
nas diretrizes marioandradianas. Duas obras são
testemunho desta filiação, a primeira delas do Pe. José
Geraldo de Souza, publicada na coleção Musica Sacra da
Editora Vozes, que tem como título Folcmúsica e Liturgia
[...] (CARVALHO, 2009: 103-104)”.
Aproximação também da música popular (MPB) e da Nova
Canção latino-americana
 Memórias e identidades
Não é uma relação fatalista, mas de legitimação ou
enquadramento do mais adequado (CANDAU, 2011).
AUTOCOMPREENSÕES do Catolicismo Romano:
Romanização; Aggiornamento; Concílio Vaticano II
(AL: Teologia da Libertação); Fechamento (?)
MÚSICA: Restauração musical católica (repertório
restaurista, motu proprio de Pio X); Esteticistas x
Pastoralistas; Música autóctone (“engajada”); Pop
urbano (RCC), atual busca por memórias (pontual)
Padre António Julio da Silva Cartageno (1946-)
Padre da Diocese de Beja, desde 1972, atuante
Comissão Diocesana de Música Sacra e regente
1978-82: juntamente com o Padre António
Mendes Aparício, realizou recolha exaustiva de
cânticos da tradição popular religiosa do Baixo
Alentejo ligados às festas de Nossa Senhora, Natal,
Quaresma/Paixão, Santos Populares, que,
praticamente, tinham deixado de ser cantados
A Comissão de Liturgia e Música Sacra de Beja, de
acordo com o desejo da Instrução Musicam
Sacram (e da Constituição Conciliar sobre a
Sagrada Liturgia, recuperou muito desses cânticos,
adaptando alguns textos à liturgia. Diferente da
AL: não parece ser uma aproximação da música
popular ou da Nova Canção.
Coro do Carmo procedeu à gravação e divulgação
de quase trinta espécimes (MÚSICOS
ECLESIÁSTICOS, [20--]).
 O hino Akathistos
“Cantado de pé”  liturgia bizantina (ÁUDIO)
Origens da oração cantada remontam ao século V, pouco após o Concílio da
Calcedônia (451): dogmas e o magistério eclesiástico sobre Maria
No rito latino: Advento ou nas grandes solenidades marianas.
Texto sobre o “mistério da encarnação salvífica do Verbo de Deus, desde a
anunciação até à parusia, contemplando a Virgem Mãe
indissoluvelmente unida a Cristo e à Igreja” (SECRETARIADO NACIONAL
DE LITURGIA, [20--]).
Traduções para português: servita Francisco M. Carnimeo, e musicada pelo
salesiano Dom Luis Lasagna, iniciador da obra salesiana no Brasil
Manutenção ou retomada da memória de um hino com quase mil e
quinhentos anos
Busca por outros amálgamas de memórias na composição de Cartageno
 O hino Akathistos do padre Cartageno
Apesar de a oração remeter à “Igreja do Oriente”, as
memórias evocadas na composição do padre
Cartageno se referem ao rito latino: não é canto
monódico microtonal com bordões vocais
Memórias da música restaurista
Gregoriano: ritmo livre escrito (3+2) e recitação
Falsobordão (séc. XV); presente no Vespro de
Monteverdi, em estilo moderno: harmonização da
recitação gregoriana
Harmonização que sustenta o canto
Ambiguidade entre tonalidade e modalismo (Solesmes)
Ritmo livre

Áudio
Recitação em ritmo livre
Falsobordão
Modalismo
“Sustentação do canto” / Ambiguidade modal-tonal
 Considerações finais
Os resultados apontam para:
1. Uma obra cujo contexto de produção não se relaciona
à noção de inculturação litúrgica baseada em
referências musicais da música popular, de bases
marioandradianas;
2. Escrita para coro, o uso de falsobordão e recitativos, o
acompanhamento de órgão, o ritmo livre e a
ambiguidade entre modalismo e tonalidade reforçam
tal continuidade: continuidades em relação à estética
pré-conciliar;
3. Identidade musical / paradigmas musicais 
diferença do modelo pós-conciliar hegemônico no
Brasil.
 Referências
AKATHISTOS: Hino Litúrgico Bizantino à Mãe de Deus – Música do M° Luigi
Lasagna, s.d.b. Tradução e adaptação musical de Francisco M. Carnimeo,
o.s.m. Roma: Centro di Cultura mariana «Madre della Chiesa», [20--].
CANDAU, Joël. Memória e identidade. São Paulo: Contexto, 2011.
CARTAGENO, A.; MELRO, F. Akathistos: Hino em Honra da Virgem, Mãe de
Deus. 3.ed. Fátima (Portugal): Secretariado Nacional de Liturgia, 2017.
Partitura.
CARVALHO, Aspectos da música na liturgia católica na América Latina do
Vaticano II aos dias atuais Do "canto do povo de Deus" ao "som da massa".
Diálogos Latinoamericanos, Aarhus (Dinamarca), n.16, p. 90-114, 2009.
DAHLHAUS, Carl. Fundamentos de la historia de la musica. Barcelona: Gedisa,
2003.
DUARTE, Fernando Lacerda Simões. Resgates e abandonos do passado na
prática musical litúrgica católica no Brasil entre os pontificados de Pio X
.
 Referências (2)

e Bento XVI (1903-2013). São Paulo, 2016. 495 f. Tese (Doutorado em Música) –
Instituto de Artes, UNESP, São Paulo, 2016.
_____. Música e Ultramontanismo: possíveis significados para as opções
composicionais nas missas de Furio Franceschini. São Paulo: Cultura
Acadêmica, 2012.
MONTERO, Paula. Tradição e modernidade: João Paulo II e o problema da
cultura. Revista Brasileira de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, a.7, n.20, p.90-
112, 1992.
MÚSICOS ECLESIÁSTICOS. Músicos eclesiásticos contemporâneos. [20--].
Disponível em: <https://www.meloteca.com/musicos-eclesiasticos.htm>.
Acesso em 9 out. 2018.
SECRETARIADO NACIONAL DE LITURGIA. Akathistos. [20--]. Disponível em:
<http://www.liturgia.pt/multimedia/Musica/001Akathistos.php>. Acesso em
9 out. 2018.