LISPECTORIANO Profa. Dra. Rosângela Neres Prof. Dr. João Paulo Fernandes “Se uma pessoa perfeita do planeta Marte descesse e soubesse que as pessoas da Terra se cansavam e envelheciam, teria pena e espanto. Sem entender jamais o que havia de bom em ser gente, em sentir- se cansada, em diariamente falir; só os iniciados compreenderiam essa nuance de vício e esse refinamento de vida.”
In: A Imitação da Rosa, Laços de família, 1960.
APRESENTAÇÃO
Clarice Lispector (Chaya Pinkhasovna Lispector)
nasceu em 1920, na Ucrânia.
Sua família mudou-se para o Brasil, no ano
seguinte, e viveu em Maceió, Recife e Rio de Janeiro.
É uma das escritoras mais importantes do século
XX, situada no Modernismo brasileiro, na literatura de estilo intimista da Geração de 1945. DA LITERATURA INTISMISTA No esteio da obra considerada “intimista”, encontra- se, sobretudo, a narrativa psicológica.
A essa narrativa se adensam símbolos, metáforas,
o nível do dizer inconsciente, numa estrutura composicional diferente dos moldes romanescos tradicionais e a presença de novas temáticas.
O jogo entre a memória e o sentimento ativa a
subjetividade e proporciona o surgimento da escrita de si, da autoficção, da metanarrativa. Na obra lispectoriana, a introspecção (re)visita a memória e procura um estado de alma recorrente no indivíduo, sua metáfora insólita, suas abstrações e subjetividades.
Assim, vemos uma narrativa de ficção permeada
por elementos da poesia, em que o lirismo e as vozes subjetivas que ecoam de seu interior são a proposta de construção do enredo. O FEMININO E A VOZ FEMININA Em boa parte dos contos e romances lispectorianos, o narrador ou é um sujeito feminino ou uma voz feminina.
Vejamos o que isso significa, em termos de pensar esse
sujeito.
A essência do feminismo é a crença de que as mulheres são
subordinadas aos homens na cultura ocidental. O feminismo procura libertar as mulheres dessa subordinação e reconstruir a sociedade de forma que o patriarcado seja eliminado e se construa uma cultura completamente inclusiva em relação aos desejos e propósitos das mulheres. (EDGAR & SEDGWICK, 2003, p. 125). • Lygia Fagundes Telles, em sua obra As meninas: “Sempre fomos o que os homens disseram que nós éramos. Agora somos nós que vamos dizer o que somos.” (2012).
• Era estranho pensar que todas as grandes
mulheres da ficção, até a época de Jane Austen, eram não apenas vistas pelo outro sexo, como também vistas apenas em relação ao outro sexo. (WOOLF, 2004, p. 91).
• É no nosso século, por volta dos anos 30, que a
reação feminista vai-se fazer notar. (COELHO, 1989, p. 6). • A liberdade intelectual depende de coisas materiais. A poesia depende da liberdade intelectual. E as mulheres sempre foram pobres, não apenas nos últimos duzentos anos, mas desde o começo dos tempos. As mulheres têm tido menos liberdade intelectual do que os filhos dos escravos atenienses. As mulheres, portanto, não têm tido a mínima chance de escrever poesia. Foi por isso que coloquei tanta ênfase no dinheiro e num teto todo seu. (WOOLF, 2004, p. 118). O CONTO LISPECTORIANO As coletâneas:
• Primeiras histórias (1940)
• Laços de família (1960) • A legião estrangeira (1964) • Felicidade clandestina (1971) • Onde estivestes de noite (1974) • A via crucis do corpo (1974) • Visão do esplendor (1975) • Últimas histórias (1979) A narrativa:
• Utiliza a arte da brevidade
• Possui enredo fractual • Adensa à introspecção • Tempo psicológico e subjetivo • Alterna a voz feminina • Evidencia a memória e a escrita de si A voz feminina em: