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Texto traduzido para uso acadêmico do Grupo de Pesquisa Actividade (coord.

por
Milton Athayde), vedado seu uso comercial

O texto é uma composição. Baseou-se em última instância no texto original (neste caso trata-se dos
verbetes Ergonomia e Ergonomias) presente no Vocabulaire de l’Ergonomie, org. por M. de
MONTMOLLIN, publicado em 1995 pela ed. Octarès de Toulouse (consideramos aqui a 2ª edição revista
e ampliada, de 1997, pp. 135-142). Em 1998 o mesmo texto (relativo apenas ao verbete Ergonomias) foi
publicado em espanhol como capítulo do livro Ergonomía: conceptos y métodos, org. por J. J. Castilho &
J. Vilhena, pela ed. Complutense de Madri (pp. 69-77). Optamos por iniciar a tradução pela edição
espanhola (mais recente), trabalho realizado pelos psicólogos Ilana Teixeira Zenaide e Vladimir Athayde.
Em seguida o texto foi cotejado com o francês para dirimir dúvidas, trabalho realizado por Vladimir
Athayde/ENSP-Fiocruz. Concluímos com revisão técnica e notas de Milton Athayde/UERJ.
__________________________________________________________________
Ergonomia
Maurice de Montmollin

O termo Ergonomia, em francês, foi inicialmente uma tradução do vocábulo


inglês ergonomics (fundação da Ergonomic Research Society, Oxford, 1949). O
vocábulo foi forjado a partir do grego ergon (trabalho) e nomos (lei).
Não é possível dar em algumas palavras a definição de um termo que remete a
diferentes abordagens, às vezes opostas. Daí a preferência pelo vocábulo Ergonomias
(no plural).
É neste sentido que o conjunto deste Vocabulário constitui-se em uma tentativa
de definição da ergonomia, cujos problemas de fronteira são discutidos no Prefácio.

Ergonomias
Maurice de Montmollin

O plural aqui caracteriza a abordagem prática: parece impossível definir


Ergonomia no singular, como se pode – ao que parece – fazer com disciplinas cuja
história se estabilizou dentro de fronteiras reconhecidas, de forma majoritária, como a
Física, a Psicologia ou a Sociologia. Ainda que seja cômodo e necessário, por
necessidades editoriais, dar como título A Ergonomia no caso das obras “comuns” e
Ergonomia no caso das enciclopédias, aqui o termo as Ergonomias se impõe, no sentido
descritivo e não normativo.
O plural, aqui, contudo, é modesto: propomos distinguir – tanto na história como
nos conceitos e práticas – dois principais conjuntos de Ergonomias, referindo-se a dois
grandes modelos ou quadros teóricos gerais. O primeiro corresponde à Ergonomia
clássica – mundialmente majoritária, sob domínio americano e britânico – que
qualificaremos como centrada no componente humano dos sistemas Homem-
Máquina*1 (SHM). O segundo, hoje presente sobretudo nos países francófonos (França,
Bélgica, Quebec) –, ainda que afortunadamente tenda a se universalizar – qualificamos
como centrado na atividade humana, e mais precisamente, na atividade situada. Estas
duas grandes correntes não estão em oposição (ainda que às vezes os ergonomistas que
as represente estejam...), mas se complementam.
Esta dicotomia entre as duas principais famílias de Ergonomias reside em
modelos, marcos teóricos e métodos diferentes. Ela é transversal com relação às
Ergonomias, quando identificadas em função dos diferentes âmbitos de intervenção*.
Pode se distinguir entre Ergonomias de aviação, de hospitais, de salas de controle em
processos contínuos, de escritórios, de mineração, de computação, de deficientes... Estas
distinções são necessárias quando os especialistas destes diferentes domínios querem
confrontar seus resultados e seus métodos, como se faz em colóquios e publicações
especializadas.
Mas, no seio de cada um destes âmbitos, encontramos uma linha de separação entre
a Ergonomia do componente humano2 e a Ergonomia da atividade humana. Para citar
um exemplo, podemos dizer que o clássico estudo acerca das dores de coluna das
enfermeiras está mais próximo ao estudo acerca das dores de coluna dos agricultores
que da análise da atividade da equipe de enfermeiras, a qual recorre a modelos análogos
à análise da atividade da equipe de turno de trabalhadores embarcados em um navio.

1. A Ergonomia do “componente humano”


“Componente humano” é aqui a tradução proposta para Human Factors*, como a
Associação americana e a revista de mesmo nome. Sim, pois “fator humano” seria uma
denominação ambígua, pois se refere sobretudo, em francês, às correntes de orientação
humanista da Psicossociologia das Organizações, concernindo às relações humanas. Nas
empresas esta abordagem é o oposto da corrente denominada Fatores Humanos, bem
mais mecanicista, incorporando nos anos cinqüenta e sessenta a Engineering
Psychology, denominação que caiu um pouco em desuso atualmente, mas que é
representativa de uma orientação tecnicista “dura”, sempre muito apreciada.

1
O asterisco aponta para a presença destes conceitos como verbetes no Vocabulário. [Nota dos tradutores
– NTs].
2
Vamos aqui alterar na forma o texto original, colocando em itálico algumas palavras, como o objetivo
didático. [Nota de revisão técnica de M. Athayde - NRT].
Os componentes humanos dos sistemas industriais, militares e, mais recentemente,
administrativos, não são tanto os homens, mas certas funções destes homens. Funções
isoladas por uma démarche3 analítica voluntária, permitindo assim respeitar as duas
maiores exigências de toda démarche científica (segundo as normas sempre em vigor
nos centros de investigação e universidades): a generalização* e a medida quantitativa.
O trabalhador (ou operador*, como hoje se diz) é então descrito em suas relações
com seu ambiente de trabalho (sua “máquina” no vocabulário de origem dos Sistemas
Homem-Máquina), segundo as funções elementares que compartilha com a grande
família humana à qual pertence: às vezes todo o gênero humano (certas funções
implicadas nas sensações visuais, por exemplo), mas freqüentemente limitada aos
adultos jovens e com boa saúde; uma distinção se operando, todavia, entre os dois
sexos. A generalização dos resultados é assim obtida desde o início pela eliminação de
todas as variáveis estranhas às funções consideradas. Este mesmo método de análise
autoriza a medida quantitativa, permitindo a interpretação dos resultados por
comparação das variações obtidas.
Os ergonomistas do componente humano acumularam, desta maneira, uma
impressionante quantidade de dados, valorada por sua grande generalidade, pertinentes
às principais funções elementares utilizadas no trabalho. Durante muito tempo deu-se
prioridade às funções que se referiam ao “motor humano” (temos que assinalar aqui a
importância histórica da Fisiologia do Trabalho francesa), estudado, por exemplo,
quando se pede a alguém que levante cargas pesadas (lifting), ou quando se o submete a
horários altamente exigentes4 (trabalho por turnos*). No entanto, muito rapidamente os
estudos das funções elementares, relacionados sobretudo à sensação e à percepção
visuais (particularmente nas tarefas ditas de vigilância) ocuparam um lugar importante,
seguindo nisto a à evolução das próprias tarefas, mesmo as que exigiam a detecção e a
discriminação de sinais*, mesmo no caso dos trabalhadores considerados “manuais”. Só
muito recentemente as funções ditas cognitivas* (ou de interpretação de sinal) foram
levadas em conta, para responder às exigências de tratamento da informação
(information processing). Entretanto, no essencial, a Ergonomia do Componente
Humano não mais evolui, como o demonstra, por exemplo, a 7ª edição da obra

3
Mantivemos o vocábulo em francês, conforme frequentemente se faz. Em espanhol foi traduzido por
processo. Preferiríamos traduzir por perspectiva. (NRT).
4
Horaires contraignants, em francês. O vocábulo transformou-se em um conceito da Ergonomia e vem
sendo traduzido por pressão, exigência, etc. Há quem tenha preferido criar um neologismo (contrante) ou
manter o vocábulo em francês (como se fez com input/output), como muitas vezes venho fazendo. [NRT].
fundadora de McCormick, cuja primeira edição remonta a 1957 (Sanders &
McCormick, 1993), ou ainda a 3ª edição (1995) do manual do britânico Oborne.
Uma lista significativa dos componentes humanos tradicionalmente estudados está
dada no sumário da obra de vulgarização de Dul e Weerdmeester (9ª edição revisada de
1993):
 Posturas e movimentos
- Bases biomecânicas, fisiológicas e antropométricas
- Posturas: deitado, sentado, de pé, mãos e braços, mudanças de postura
- Movimentos: levantar, transportar, empurrar, estirar

 Informações e operações
- Informações visuais: caracteres, diagramas, percepção de informações visuais
- Informações oriundas de outros sentidos: audição...
- Comandos: teclados, distinções entre teclas, teclas que dão informações, diálogo
homem-máquina, diferentes formas de diálogo

 Fatores do meio ambiente


- Ruídos
- Vibrações
- Luminosidade
- Clima
- Substâncias químicas

As exigências de generalização e de medida quantitativa quanto aos componentes


humanos elementares (fala-se também de “mecanismos de base”*, ou até “primitivos”)
têm conseqüências metodológicas imediatas: só a experimentação em laboratório
permite um controle suficiente das variáveis independentes e dependentes selecionadas
pelo plano experimental. Além disto, dado que as funções estudadas não são específicas
de situações* naturais de trabalho, não há outras exigências para a escolha dos sujeitos
experimentais senão ser representativo da espécie humana, eventualmente restrito aos
jovens adultos de boa saúde. É por isso que a grande maioria dos sujeitos das
experiências publicadas são estudantes, mais disponíveis e menos custosos que os
próprios trabalhadores.
A Ergonomia do Componente Humano não necessita, em absoluto, de uma análise
do trabalho. Ela é substituída pela construção de uma lista de exigências da tarefa, em
geral estabelecida através de perguntas realizadas aos chefes, a partir de questionários
pré-elaborados, com bases de dados sobre as características humanas supostamente
presentes nas tarefas em foco. Experimentações mais específicas são conduzidas quando
os dados padrões são insuficientemente precisos; mas se trata sempre de funções
isoladas. Ciência em primeiro lugar (mas uma ciência a-teórica), aplicações em seguida.

O contraste com a abordagem anterior é claro. Atividade, nesta Ergonomia, significa


que não são mais funções gerais que são levadas em conta, de forma isolada, mas
comportamentos* (gestos, olhares, palavras) e raciocínios*..., tais como se apresentam
nas situações naturais de trabalho, atuais ou por conceber. Situações e não somente
postos de trabalho*, ou dispositivos técnicos (como máquinas, ferramentas, software).
Não é só o usuário* destes dispositivos que é levado em conta, como antes, mas sua
utilização pelo operador. A dimensão temporal (ver o verbete Tempo*) é fundamental
nesta abordagem (enquanto ela está ausente nas taxonomias clássicas). Daí a
importância dada à análise da atividade – e análise de campo, sempre que possível. Uma
análise do trabalho que não se contente apenas com o estatuto dos métodos, mas que
busque a construção de modelos específicos, resultantes de marcos teóricos específicos;
não se confundindo – ao menos não sempre – com os modelos das ciências-mães (como
a Psicologia, por exemplo). Tal orientação permite chegar a resultados de grande
riqueza e de grande pertinência para a ação, mas, freqüentemente, têm um débil poder
de generalização.

Temos que destacar, no entanto, que esta importância dada à análise da atividade
não significa que a Ergonomia aí se identifique inteiramente. A Ergonomia é uma
tecnologia, cujo objetivo final é a melhoria do trabalho. Ela pode, em certos casos,
alcançar este objetivo sem passar por uma minuciosa análise da atividade. E certas
generalizações são possíveis, portanto, a partir dos resultados anteriores. Além do mais,
a análise da atividade pode ser utilizada em outros domínios que não o trabalho – por
exemplo, a psicoterapia – e levar em conta outras variáveis – por exemplo, do âmbito do
afetivo, da “vivência”, etc. –, variáveis até aqui descartadas pela Ergonomia.

3. Ergonomias complementares, embora com ambigüidades


As duas abordagens acima descritas podem ser consideradas complementares ou,
mais exatamente, hierarquizadas. A Ergonomia dos componentes humanos permite
conceber dispositivos tecnológicos (da escova de dentes à cabine espacial, para citar
dois exemplos reais) adaptados às “características e limites” dos seres humanos (uma
das definições da Ergonomia clássica). Isto considerando função por função, dentro da
grande tradição da Psicologia Geral (ou da Fisiologia Geral), antes mesmo que se saiba
exatamente quais operadores e em quais contextos integrarão estas funções para atuar. É
possível assim estabelecer normas*. Poderíamos dizer que se trata de uma “Ergonomia
de primeiros socorros” que evita as dificuldades e erros devidos, por exemplo, a
assentos muito baixos, calor excessivo, ruídos insuportáveis, legendas ilegíveis, telas
deslumbrantes e, mais recentemente, “interfaces” insuficientemente amigáveis. Todos
eles elementos de um posto de trabalho individual, abstraído de seu contexto.Pode-se
dizer que a Ergonomia centrada sobre a atividade vai adiante, uma vez asseguradas estas
bases indispensáveis. Ela considera um operador bem sentado, bem iluminado, que
dispõe de informações acessíveis e legíveis, podendo então se interessar por sua
atividade real, temporal, complexa, inesperada, bizarra, aparentemente inventiva e às
vezes imperfeita...Tal como ela aparece na análise de campo, ou tal como pode ser
antecipada quando da concepção* de situações futuras.
Hoje são, sobretudo – ainda que não exclusivamente – as atividades ditas cognitivas
que são estudadas (a Ergonomia Cognitiva constituindo assim uma certa autonomia).
Ou seja, para ser breve, as atividades em que o essencial é constituído pela
compreensão*, por parte do operador, de situações às quais ele dá uma significação.
Situações que comportam quase sempre uma dimensão coletiva*.
É aqui onde a complementaridade entre as duas Ergonomias pode, às vezes, levar a
um conflito. Pois os ergonomistas que analisam as atividades cognitivas complexas (por
exemplo, os diagnósticos* de incidentes por parte da equipe de turno em uma sala de
controle de processo contínuo, para dar um exemplo conhecido) aceitam, claro, a
necessidade preliminar de que as informações sejam apresentadas de maneira legível.
Em compensação, não aceitam – pois contraria a evidência de campo – que a solução de
problema* que constitui o diagnóstico de disfuncionamento da instalação possa se
reduzir a alguns “mecanismos de base”, tal como certos psicólogos cognitivistas o
descreveram, a partir de experiências simplificadas de “solução de problemas”, como a
Torre de Hanói. Este reducionismo ilusório foi batizado por alguns como “metáfora de
Lego”, por analogia com o jogo de montagem que permite – a partir de um número
finito de peças tiradas de um “pote” – construir qualquer objeto, mas com a condição de
renunciar ao realismo que a vida industrial exige. É preciso entretanto reconhecer que,
com muita freqüência, os ergonomistas do componente humano renunciam
prudentemente a aventurar-se sobre áreas de grande complexidade.
A complementaridade das duas Ergonomias está assim assegurada pelas duas partes,
mas de uma maneira assimétrica. A Ergonomia clássica ignora amplamente a
Ergonomia da atividade, e atribui os domínios que esta reivindica – a atividade em sua
verdadeira grandeza – a outras disciplinas, como as ciências da organização, ou certas
abordagens das ciências da comunicação. O que é contestado, é claro, pelos
ergonomistas centrados na atividade. Com ainda mais energia do que alguns dissidentes
dos Human Factors eles tentaram – primeiro com referência na abordagem sistêmica, e
mais recentemente sob o rótulo de Macroergonomia* – elevar a Ergonomia clássica,
mas economizando tanto nos rigores de laboratório quanto nas riquezas da análise da
atividade em situação natural.
Na realidade, é claro, as partes não estão assim tão separadas, e o oportunismo a-
teórico é não somente praticado, como também às vezes reivindicado.

2. Objetivos diferentes
Para complicar um pouco a descrição das Ergonomias, pode ser útil introduzir a
diversidade de objetivos perseguidos. A Ergonomia clássica, desde suas origens, se
define como A adaptação da máquina ao homem (retomando o título de uma das
primeiras obras publicadas em francês5). Falou-se, em seguida, de “melhoramento das
condições de trabalho*”. As ideologias tecnicistas americanas aí conduzem, tanto
quanto as ideologias humanistas francesas, mais preocupadas com a proteção da saúde
do que com a produção. A Ergonomia centrada na atividade nasceu, também ela, deste
projeto geral, mas pretende chegar a uma maior eficácia graças a um maior realismo.
Recentemente, no entanto, a análise da atividade levou alguns ergonomistas a
introduzirem em seus objetivos não somente a adaptação da máquina ao homem, mas –
o que seria até então considerado como sacrilégio – a adaptação do homem à máquina,
não somente concebendo assistências ao trabalho* (em particular assistências em linha),
como também remontando à formação6. São, sobretudo, as exigências cognitivas das
tarefas, induzidas pelas ”novas tecnologias de informação”, que levaram a esta
ampliação (devido também, talvez, às debilidades teóricas dos profissionais de
formação). A simplificação do trabalho (postura tomada de empréstimo pelos
ergonomistas ao taylorismo primitivo) é cada vez menos possível (e desejável, por outro

5
O autor se refere a Faverge, J. M. ; Leplat, J. & Guiguet, B. L’ addaptation de la machine a l’Homme.
Paris: PUF. 1958. (Nota dos editores do livro em espanhol).
6
Em português, conforme uma influência norte-americana utiliza-se geralmente a expressão treinamento
e desenvolvimento – T&D. [NRT].
lado), e uma competência rica, que permita adaptações múltiplas a situações
complicadas exige que as ferramentas postas à disposição dos operadores compreendam
também suas próprias “ferramentas cognitivas”.

5. Âmbitos de intervenção que se diversificam


Durante muito tempo os domínios de intervenção dos ergonomistas situaram-se nas
indústrias e nas forças armadas, principalmente nas manufaturas, nas indústrias de
processo contínuo e nos transportes (sobretudo aviação). Hoje, particularmente devido
aos desenvolvimentos da informática, as atividades terciárias (os escritórios, os guichês
de atendimento ao público, o setor de serviços em geral, principalmente os hospitais, as
escolas...) vieram somar-se. Enfim, alguns ergonomistas começam a interessar-se, ainda
que timidamente, pelas atividades não-assalariadas, principalmente as dos usuários de
atividades de utilizadores de produtos* de grande consumo.
Seria errôneo, no entanto, dar muita importância à diversidade destes âmbitos de
evolução da Ergonomia. Ela certamente afeta as práticas de intervenção, que exigem
uma certa especialização, mas não diretamente os modelos* e métodos de análise do
trabalho.

6. A Ergonomia nos campos disciplinares


É necessário, ainda, distinguir a Ergonomia do componente humano da Ergonomia
centrada na atividade.
A primeira se quer completamente tributária das disciplinas-mãe, das quais ela faz a
gestão de seus domínios de aplicação. Ela não tem qualquer escrúpulo dessa ordem que
afete a sua identidade acadêmica. As tentativas recentes de abrir para as aplicações os
níveis sistêmicos e “macro” não colocam problemas de princípio, nesta perspectiva.
Basta ampliar a biblioteca de base, nas sessões de “ciências humanas” e “ciências da
organização”. Os problemas de identidade, portanto, são somente de ordem profissional:
como, em particular, tornar reconhecida a especificidade da Ergonomia para os
engenheiros, sempre e em qualquer parte persuadidos em poder assumir sozinhos a
integração dos fatores humanos.
A Ergonomia centrada na atividade, ao contrário, tem problemas de identidade
frente a diferentes disciplinas, pois não se trata simplesmente de aplicar seus métodos e
seus modelos, mas de integrar alguns de seus modelos e de seus métodos aos seus
próprios. Vai-se falar de transdisciplinaridade mais que de multidisciplinaridade. É
preciso citar aqui as Ciências Cognitivas (e em primeiro lugar a Psicologia Cognitiva),
as diversas Ciências da Linguagem, as diversas Sociologias, assim como correntes em
fronteiras menos precisas, como a Psicologia do Trabalho, quanto aos domínios de
intervenção, o behaviorismo e a antropologia* quanto aos modelos e os métodos7.
Problemas de identidade que não são somente científicos, mas também profissionais (os
problemas atuais de fronteiras são lembrados no Prefácio do presente Vocabulário).

7. Clientes diferentes
Para compreender as evoluções das Ergonomias e, sobretudo, dos ergonomistas, é
também proveitoso falar de suas relações com seus clientes. As exigências de ordem
industrial – produção, qualidade, segurança – são moduladas aqui pelo fato de que o
essencial da credibilidade, e do crédito, que possuem os que ensinam e pesquisam em
Ergonomia, lhes é dado primeiramente pelo meio acadêmico, defensor da Ciência, e
sempre um pouco desconfiado no que concerne às aplicações, salvo quando há
referência ao menos quanto aos métodos, ou aos critérios operados pelos avaliadores8
das revistas científicas. Sem dúvida, é isto que explica a persistência, nos estudos
publicados, de experimentações muito bem concebidas, mas sem relação com as
demandas da indústria ou do setor de serviços. Ao contrário, os ergonomistas
preocupados com modelos e métodos realmente eficazes, se têm êxito como
consultores, graças ao sucesso de suas intervenções, são pouco reconhecidos como
cientistas no sentido forte pelas instituições acadêmicas e científicas. Estas posições,
nos dois casos, são felizmente suscetíveis de evoluções, que começam a atenuara a
oposição entre a Ergonomia como disciplina e a Ergonomia como profissão.

Bibliografia9
1. Relacionada à Ergonomia do “componente humano”
DUL, J & WEERDMEESTER, B. 1993. Ergonomics for beginners: A quick reference
guide. Londres, Taylor & Francis.
OBORBE, D. J. 1995. Ergonomics at work: human factors in Design and Development.
Chichester, Jonhn Wiley & Sons.

7
No texto do Vocabulário, em francês, após a referência à Psicologia do Trabalho o autor agrega a
Antropologia e encerra. No texto em espanhol o autor se estende, na forma como está no texto traduzido
para o português, exceto a referência ao Prefácio. [NTs].
8
Experts, em francês. [NTs].
9
O texto do Vocabulário só faz referência à bibliografia concernente à Ergonomia do “componente
humano”. A bibliografia seguinte só está presente no texto contido no livro em espanhol. [NTs].
SANDERS. M. & MCCORMICK. E. J., 1993. Human Factors in Engineering and
Design (7ª edição). Nova York, McGraw Hill.

2. Relacionada à Ergonomia “centrada na atividade” (Análise do Trabalho)


AMALBERTI, R.; DE MONTMOLLIN. M.; THEUREAU, J. (Eds.), 1991. Modèles en
analyse du travail. Bruxelas, Mardaga.
LEPLAT, J. (Ed.), 1992. L’ analyse du travail en psychologie ergonomique. 2 vols.
Toulouse: Octares.
MONTMOLLIN, M. de, 1967. Les systèmes Hommes-Machines. Paris: PUF.
OMBREDANE, A & FAVERGE, J. M., 1955. L’ analyse du travail. Paris: PUF.
VATIN. F. (Ed.), 1990. Organisation du Travail et Economie des Entreprises. Paris, Les
Editions d’ Organisation.

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