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Era uma vez um rei que tinha três filhas, uma das quais era muito formosa e ao
mesmo tempo dotada de boas qualidades. Chamava-se Bela. O rei tinha sido
muito rico, mas, por causa de um naufrágio, ficou completamente pobre.
Um dia foi fazer uma viagem; antes porém perguntou às filhas o que queriam
que ele lhes trouxesse. – Eu, disse a mais velha, quero um vestido e um
chapéu de seda.
E partiu.
Passado algum tempo trouxe as prendas de suas filhas, disse à mais nova:
Bela ficou muito preocupada e perguntou ao pai por que é que lhe tinha dito
aquilo. Ele, a princípio, não lho queria dizer, mas ela tantas instâncias fez, que
ele lhe respondeu que no jardim onde tinha colhido aquela rosa encontrou uma
cobra, que lhe perguntou para quem ela era; que ele lhe respondeu que era
para a sua filha mais nova e ela lhe disse que lha havia de levar, se não que
era morto. Depois disse ela:
Assim foi. logo que ela entrou naquele palácio, ficou admirada de ver tudo tão
asseado, mas ia com muito medo. O pai esteve lá um pouco de tempo e depois
foi-se embora. Bela, quando ficou só, foi a uma sala e viu a cobra. Ia-se a
deitar quando começaram a ajudarem-na a despir. Estava ela na cama quando
sentiu uma coisa fria; deu um grito e disse-lhe uma voz: – Não tenhas medo.
Em seguida foi ver o que era e apareceu-lhe uma cobra. Ela, a princípio,
assustou-se, mas depois começou a afagá-la. Ao outro dia de manhã
apareceu-lhe a mesa posta com o almoço. Ao jantar viu pôr a mesa, mas não
viu ninguém; a noite foi-se deitar e encontrou a mesma cobra. Assim viveu
durante muito tempo, até que um dia foi visitar o pai; mas quando ia a sair
ouviu uma voz que lhe disse:
– Só tu, minha donzela, me podias salvar! Estou aqui há uns poucos de anos e,
se tu não chorasses sobre o meu peito, ainda aqui estaria cem anos mais.
O príncipe gostou tanto dela que casou com ela e lá viveram durante muitos
anos.
Moravam numa aldeia dois compadres. Um era pobre e o outro rico, mas muito
miserável. Naquela terra era uso todos quantos matavam porco dar um lombo
ao abade. O compadre rico, que queria matar porco sem ter de dar o lombo,
lamentou-se ao pobre, dizendo mal de tal uso. Este deu-lhe de conselho que
matasse o porco e o dependurasse no quintal, recolhendo-o de madrugada,
para depois dizer que lho tinham roubado.
Ficou muito contente com aquela ideia e seguiu à risca o que o compadre
pobre lhe tinha dito. Depois deitou-se com tenção de ir de madrugada ao
quintal buscar o porco. Mas o compadre pobre, que era espertalhão, foi lá de
noite e roubou-lho. No dia seguinte, quando o rico deu pela falta do porco,
correu a casa do compadre pobre e muito aflito contou-lhe o acontecido. Este,
fazendo-se desentendido, dizia-lhe: «Assim, compadre! Bravo! Muito bem,
muito bem! Assim é que há-de dizer para se esquivar de dar o lombo ao
abade!»
O rico cada vez teimava mais ser certo terem-lhe roubado o porco; e o pobre
cada vez se ria mais, até que aquele saiu desesperado, porque o não
entendiam.
O que roubou o porco ficou muito contente e disse à mulher: «Olha, mulher,
desta maneira também havemos de arranjar vinho. Tu hás-de ir a correr e a
chorar para casa do compadre, fingindo que eu te quero bater; levas um odre
debaixo do fato, e quando sentires a minha voz, foges para a adega do
compadre e enquanto eu estou falando com ele, enches o odre de vinho e
foges pela outra porta para casa.» A mulher, fingindo-se muito aflita, correu
para casa do compadre, pedindo que lhe acudisse, porque o marido a queria
matar. Nisto ouviu a voz do marido e correu para a adega do compadre, e
enquanto este diligenciava apaziguar-lhe a ira, enchia ela o odre. Tinha-lhe
esquecido, porém, um cordão para o atar, mas tendo uma ideia gritou para o
marido: «Ah! Goela de odre sem nagalho!» O marido, que entendeu,
respondeu-lhe: «Ah, grande atrevida!... Que se lá vou abaixo, com a fita do
cabelo te hei-de afogar!» Ela, apenas isto ouviu, desatou logo o cabelo, atou
com a fita a boca do odre e fugiu com ela para casa. Desta maneira tiveram
porco e vinho sem lhes custar nada, e enganaram o avarento do compadre.
Um rei tinha três filhas; perguntou a cada uma delas por sua vez, qual era a
mais sua amiga. A mais velha respondeu:
Respondeu a do meio:
O rei entendeu por isto que a filha mais nova o não amava tanto como as
outras, e pô-la fora do palácio. Ela foi muito triste por esse mundo, e chegou ao
palácio de um rei, e aí se ofereceu para ser cozinheira. Um dia veio à mesa um
pastel muito bem feito, e o rei ao parti-lo achou dentro um anel muito pequeno,
e de grande preço. Perguntou a todas as damas da corte de quem seria aquele
anel. Todas quiseram ver se o anel lhes servia: foi passando, até que foi
chamada a cozinheira, e só a ela é que o anel servia. O príncipe viu isto e ficou
logo apaixonado por ela, pensando que era de família de nobreza.
O pai do noivo fingiu-se raivoso, e mandou que a cozinheira viesse ali dizer
porque é que não tinha botado sal na comida. Veio então a menina vestida de
princesa, mas assim que o pai a viu, conheceu-a logo, e confessou ali a sua
culpa, por não ter percebido quanto era amado por sua filha, que lhe tinha dito,
que lhe queria tanto como a comida quer o sal, e que depois de sofrer tanto
nunca se queixara da injustiça de seu pai.
Teófilo Braga
Um cavaleiro, casado com uma dama nobre e formosa, teve de ir fazer uma
longa jornada: receando acontecesse algum caso desagradável enquanto
estivesse ausente, fez com que a mulher lhe prometesse que enquanto ele
estivesse fora de casa diria a tudo: – Não. Assim pensava o cavaleiro que
resguardaria o seu castelo do atrevimento dos pajens ou de qualquer
aventureiro que por ali passasse. O cavaleiro já havia muito que se demorava
na corte, e a mulher aborrecida na solidão do castelo não tinha outra distracção
senão passar as tardes a olhar para longe, da torre do miradouro. Um dia
passou um cavaleiro, todo galante, e cumprimentou a dama: ela fez-lhe a sua
mesura. O cavaleiro viu-a tão formosa, que sentiu logo ali uma grande paixão,
e disse:
Ela respondeu:
– Não!
Ela respondeu:
– Não.
– E quereis que vá cair nas mãos dos salteadores ao passar pela floresta?
Ela respondeu:
– Não.
Ela respondeu:
– Não.
– Não.
– Não.
Ela respondeu:
– Não.
– Não.
Teófilo Braga
Contos Tradicionais do Povo Português
COMADRE MORTE
Havia um homem que tinha tantos filhos, tantos que não havia ninguém na
freguesia que não fosse compadre dele e vai a mulher teve mais um filho. Que
havia do homem fazer? Foi por esses caminhos fora a ver se encontrava
alguém que convidasse para compadre.
– Eu sei lá; o que eu quero é alguém para padrinho do meu filho. – Pois, olha,
eu cá sou Deus.
– Não sei.
– Deixa estar que eu te arranjo, e pega no doente e muda-o com a cabeça para
onde estavam os pés e ele escapa.
– Pois reza.
Mas ele rezar; qual rezou! Não rezou nada e a Morte para não faltar à palavra
foi-se sem ele.
Um dia o homem encontra a comadre que estava por morta num caminho; e
ele lembrou-se do bem que ela lhe tinha feito e disse:
– Minha rica comadrinha, que estás aqui morta; deixa-me rezar-te um padre-
nosso por tua alma.
O homem era esperto; mas a Morte ainda era mais; pois não era?