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A ERA

Ossip Mandelstam
Traduo Haroldo de Campos


Minha era, minha fera, quem ousa,
Olhando nos teus olhos, com sangue,
Colar a coluna de tuas vrtebras?
Com cimento de sangue dois sculos
Que jorra da garganta das coisas?
Treme o parasita, espinha langue,
Filipenso ao umbral de horas novas.

Todo ser enquanto a vida avana
Deve suportar esta cadeia
Oculta de vrtebras. Em torno
Jubila uma onda. E a vida como
Frgil cartilagem de criana
Parte seu pex: morte da ovelha,
A idade da terra em sua infncia.

Junta as partes nodosas dos dias:
Soa a flauta, e o mundo est liberto,
Soa a flauta e a vida se recria.
Angstia! A onda do tempo oscila
Batida pelo vento do sculo.
E a vbora na relva respira
O ouro da idade, urea medida.

Vergnteas de nova primavera!
Mas a espinha partiu-se da fera,
Bela era lastimvel. Era,
Ex-pantera flexvel, que volve
Para trs, riso absurdo, e descobre
Dura e dcil, na meada dos rastros,
A pegada dos seus prprios passos.

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