Você está na página 1de 117

A UA UL L AA

21
21
Quantos Brasis
existem?

E sta aula inicia nosso estudo sobre o Brasil,


como um país de industrialização recente no conjunto regional da América
Latina. Vamos aprender que nosso país apresenta feições múltiplas e contradi-
tórias
tórias. De um lado, revela aspectos dinâmicos que o destacam na economia
mundial; de outro, caracteriza-se pelas profundas desigualdades sociais que o
colocam entre os países de maior concentração de renda no planeta.

Hoje, qual o papel do Brasil no cenário internacional? Como conciliar o


dinamismo de sua economia com as grandes desigualdades internas na distri-
buição social e territorial da renda?
O cientista francês Jacques Lambert escreveu um famoso livro, intitulado
Os dois Brasis , em que mostra o contraste entre o arcaico e o moderno em nosso
país. Hoje, na verdade, sabe-se que são muitos os Brasis que pertencem a uma
economia emergente no contexto latino-americano, com a pobreza de mais da
metade de sua população agravada pelos efeitos da profunda crise econômica
dos anos 80. O ritmo das transformações em que vivemos, num país de
dimensões continentais, gera tempos e espaços muito diferenciados, dificul-
tando o conhecimento preciso sobre a realidade brasileira e sobre a posição
do Brasil no mundo atual.

O Brasil é pouco conhecido, mesmo por aqueles que nele vivem e traba-
lham. A rapidez das transformações que se processaram nos últimos quarenta
anos dificulta a compreensão de suas reais dimensões. Ele não é um gigante
adormecido, como pregam alguns, nem tampouco apenas mais um dos mem-
bros do chamado Terceiro Mundo
Mundo, como acreditam outros. É um exemplo de
uma potência emergente de âmbito regional, marcada por muitos aspectos
contraditórios.
O Brasil é um país de múltiplos tempos e múltiplos espaços
espaços. A veloci-
Wall Street:
dade de incorporação de inovações tecnológicas é extremamente rápida, em
rua da cidade
parcelas localizadas de seu território, ao mesmo tempo em que se vive em
de Nova York,
Estados Unidos,
condições primitivas, com ritmos determinados pela natureza, em imensas
considerada extensões. Grandes redes nacionais de televisão estabelecem diariamente a
importante ponte entre passado e futuro, entre garimpeiros isolados na selva em busca do
centro mundial Eldorado e gerentes de grandes corporações multinacionais instalados na
de negócios. Avenida Paulista, a “Wall Street” brasileira, na cidade de São Paulo.
A U L A

21

Contraste entre habitações sobre palafitas, na Amazônia, e os arranha-céus da Avenida Paulista, em São Paulo.

O Brasil, como parcela da economia mundial, constitui um dos segmentos


mais dinâmicos, do ponto de vista dos indicadores econômicos. Suas taxas
históricas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) são comparáveis às de
economias avançadas desde o final do século passado. A partir de 1940,
o crescimento do PIB manteve-se em uma média de 7% ao ano, chegando a 11%
entre 1967 e 1973, os anos do chamado “milagre econômico”, quando o restante
do mundo dava sinais evidentes de arrefecimento no seu ritmo de crescimento.

CRESCIMENTO MÉDIO DO PIB A PREÇOS CONSTANTES


Países 1870/1913 1913/50 1950/73 1973/83
Estados Unidos 4,2 2,8 3,7 1,9
Alemanha 2,8 1,3 5,9 1,6
Japão 2,5 2,2 9,4 3,7
México 2,0 2,7 6,6 4,6
Brasil 2,3 4,9 7,5 4,5
Fonte: Adaptado de Maddison, 1982, 1985.

Por outro lado, o Brasil é um rico país de pobres. A brutal discriminação


social na apropriação dos benefícios do dinamismo econômico é um traço
dominante na sociedade brasileira, mesmo quando comparada com os outros
países da América Latina. É uma das poucas economias no mundo cuja parcela
dos 10% mais ricos controla mais de 50% da renda nacional e qualquer indicador
de bem-estar social demonstra tal situação.

BRASIL- SITUAÇÃO ÉTNICA - 1990


Renda média
Grupos étnicos População (%) Analfabetismo (%)
(US$/mês)
Brancos 56,6 12,3 214,00
Mulatos 37,2 29,0 100,00
Negros 05,6 29,5 087,00
Asiáticos e
00,6 07,4 377,00
sem declaração
Fonte: IBGE, PNAD, 1990.
A U L A A discriminação percorre de cima a baixo a estrutura social brasileira.
O sexismo, isto é, a discriminação por sexo, expressa-se no fato de que 67,1%

21 das mulheres com mais de 10 anos de idade não têm qualquer rendimento,
enquanto esse número atinge 24,7% dos homens. Negros e pardos, que em 1987
representavam 45% da população brasileira, são social e economicamente
discriminados quanto às oportunidades de mobilidade social, constituindo
o grosso do contingente de mão-de-obra com menor qualificação profissional,
em oposição ao que ocorre com os imigrantes asiáticos e descendentes, princi-
palmente os japoneses. A discriminação étnica também está presente no que
diz respeito aos 200 mil indígenas que sobreviveram aos massacres do coloni-
zador - seus direitos são restritos e sua capacidade de auto-determinação é
submetida à tutela burocrática do Estado.
A recente industrialização levou o Brasil a se destacar na América Latina.
O país suplantou largamente a Argentina e foi acompanhado com menor
intensidade pelo México.
PIB EM BILHÕES DE DÓLARES
Países 1970 1980 1985 1990 1994
Argentina 088,2 115,0 104,5 105,9 142,7
México 092,1 173,9 193,6 207,4 230,1
Brasil 106,4 243,5 259,3 284,4 311,8
Fonte: Comissão Econômica para a América Latina e Caribe / ONU.

A associação com o capital internacional foi um traço comum ao desenvol-


vimento da região; mas, no Brasil, o Estado teve papel decisivo na aceleração do
ritmo de crescimento, avançando à frente do setor privado e mantendo elevadas
taxas de investimento. Em contrapartida, o Brasil é também um dos maiores
devedores, em termos absolutos, do sistema financeiro mundial.
O modelo de industrialização latino-americano, baseado na substituição de
importações, procurou administrar o mercado interno como principal atrativo
para as grandes corporações multinacionais, sem se preocupar com os objetivos
básicos de justiça social. O Brasil atingiu etapas mais avançadas nesse processo,
chegando a consolidar um parque industrial diversificado - em grande parte
devido ao potencial de sua economia - cuja capacidade de atração de capitais
foi viabilizada e ampliada pela atuação do Estado. Isso, no entanto, não reduziu
as condições de miséria de amplos contigentes da população que permaneceram
à margem do desenvolvimento.

Nesta aula você aprendeu que:

l o Brasil, ao mesmo tempo em que apresenta um grande dinamismo econô-


mico no cenário econômico mundial, caracteriza-se pelas grandes desigual-
dades internas na distribuição social e territorial da renda;
l a rapidez das mudanças ocorridas em algumas áreas contrasta com
a manutenção de ritmos comandados pela natureza, em outras regiões;
l sua economia é, hoje, a mais importante da América Latina e o país tem uma
indústria diversificada, graças à forte atuação do Estado, que criou condi-
ções para os investimentos produtivos;
l os grandes contrastes sociais e territoriais expressam as contradições do
processo de desenvolvimento brasileiro.
Exercício 1 A U L A
Explique a contradição básica presente na realidade social e econômica
brasileira nos dias atuais.
21
Exercício 2
O período de 1969-1973 caracterizou-se pelo crescimento acelerado da
economia brasileira, ou seja, as taxas de crescimento do Produto Interno
Bruto (PIB) alcançaram cifras superiores a 10% ao ano. Esse processo foi
gerado por medidas político-econômicas implantadas pelos governos mili-
tares pós-64. Nesse período ocorreu o que se denominou:
a) “milagre brasileiro”.
b) “crescer 50 anos em 5”.
c) “Brasil ano 2000”.
d) “Plano de Metas”.
e) “Diretas-já”.

Exercício 3
Com base no quadro a seguir conclui-se que:
DISTRIBUIÇÃO DA RENDA NO BRASIL (ENTRE A POPULAÇÃO ECONOMICAMENTE ATIVA)

PARTICIPAÇÃO NOS RENDIMENTOS (%)


População 1960 1970 1980
Os 50% mais pobres 17,4 14,9 12,6
Os 40% intermediários 43,0 38,4 36,5
Os 10% mais ricos 39,6 46,7 50,9
Fonte: IBGE

a) a distribuição da renda no Brasil, nos últimos anos, tem sido feita de forma
mais justa, o que, de certo modo, comprova o crescimento econômico do país
e sua caracterização como nação em desenvolvimento.
b) apesar do processo de crescimento da economia nacional, observa-se que há
uma progressiva concentração da renda, principalmente entre os 10% mais
ricos.
c) os 50% mais pobres da população economicamente ativa do Brasil, nos
últimos anos, vêm melhorando sua participação nos rendimentos, a exem-
plo do que vem ocorrendo com os 10% mais ricos.
d) a concentração da renda não pode ser justificada por esse quadro, uma vez
que o mesmo se resume à população economicamente ativa, que não chega
a ser significativa no conjunto da população brasileira.

Exercício 4
Quais das características enumeradas abaixo aplicam-se à atividade
industrial do Brasil na década de 1970?
I. Hegemonia do capital privado nacional.
II. Crescente participação do Estado na economia industrial.
III. Inauguração do processo de substituicão de importações de manufaturados.
IV. Acentuada internacionalização da economia.
a) I e II
b) I e III
c) I e IV
d) II e III
e) II e IV
A UA UL L AA

22
22
Cultura ibérica
e natureza tropical

N esta aula, vamos verificar como a forma-


ção territorial do Brasil foi profundamente marcada pelo processo de coloniza-
ção e como as fronteiras nacionais resultaram da luta pelo poder entre as
potências coloniais. Veremos também como o escravismo e a orientação de sua
economia para a exportação de produtos tropicais deixou marcas igualmente
profundas na organização social e econômica brasileira.

Quais as resultantes do processo de colonização sobre a formação social e


territorial do Brasil? Como superar o legado colonial do uso indiscriminado
e predatório das fontes originais de toda a riqueza - a terra e o trabalho?
Para que o Brasil rompa com seu passado colonial e escravista é necessário
que conheçamos nossas raízes históricas e culturais e avaliemos quais seus
efeitos nos dias atuais. É preciso tomar consciência de que somente uma
sociedade mais justa terá maiores preocupações com a qualidade ambiental
e com a preservação de nosso patrimônio natural.

A América Latina é a mais antiga periferia da economia mundial. Foi


orientada, desde o início da colonização, para a produção de mercadorias de alto
valor para a Europa. Partilhada entre Portugal e Espanha, teve sua formação
econômica marcada pelo mercantilismo - um sistema econômico voltado para
a acumulação de riquezas pelo comércio -, e sua sociedade foi moldada a partir
da cultura ibérica.
A partir do século XIX, seu desenvolvimento esteve intimamente asso-
ciado à dinâmica dos centros de acumulação da economia mundial - primei-
ro a Grã-Bretanha e depois os Estados Unidos. Participou da divisão interna-
cional do trabalho como economia exportadora de matérias-primas e consu-
midora de produtos manufaturados.
A ocupação e o povoamento do território que constituiria o Brasil não
passam de episódios do amplo processo de expansão marítima resultante do
desenvolvimento das empresas comerciais européias.
Como decorrência da busca de novas rotas para o Oriente pelos países A U L A
ibéricos (a Espanha pelo Ocidente e Portugal contornando a África), o território
que constitui hoje o Brasil precedeu a criação da própria Colônia. O Tratado
de Tordesilhas
Tordesilhas, firmado entre os dois países em 1494, dividia, entre as coroas 22
de Portugal e Espanha, todo o mundo a ser descoberto e estabelecia que todas
as terras a leste do meridiano de 50 graus oeste pertenceriam a Portugal.
Desse modo, definia-se, a priori , a Colônia por um território correspon-
dente a apenas 40% de sua área atual e, ainda assim, imenso. A defesa do
território e sua expansão não decorreram de conquista militar. Foi um processo
de posse lento e complexo, em que pesou a estratégia portuguesa, favorecida
pela luta pelo poder e o controle das rotas comerciais entre holandeses,
franceses e ingleses, e pela união de Portugal com a Espanha entre 1580 e 1640.

O mapa mostra a divisão das capitanias hereditárias,


limitadas a oeste pelo meridiano criado no Tratado de Tordesilhas.

A colonização do Brasil foi um desafio para os monarcas portugueses


devido à pressão da Holanda, Grã-Bretanha e França sobre o território, o que
ocorreu logo depois da perda, para os holandeses, da maioria dos postos
comerciais que Portugal tinha na Ásia e na África.
Ao contrário do que acontecia nos territórios espanhóis, a população
nativa era relativamente escassa e os portugueses não podiam, portanto, se
basear no trabalho nativo. Foi preciso, então, organizar a produção de cana-de- Monocultura:
açúcar no sistema de plantations
plantations, isto, é grandes propriedades monocultoras plantação de um
voltadas para o abastecimento dos mercados europeus, que se tornaram a base único produto
da economia e da defesa coloniais. agrícola.
A U L A Esse empreendimento deveu-se a dois fatores: a experiência de Portugal
nas ilhas de São Tomé e Madeira, que estimulou uma indústria de equipamen-

22 tos para engenhos açucareiros, e a organização comercial dos flamengos, que


controlavam um mercado expressivo na Europa Continental, e financiaram
diretamente as plantações e engenhos no território da Colônia portuguesa.
Assim, o Brasil colonial foi organizado como uma empresa comercial
resultante da aliança entre a burguesia mercantil (inclusive holandesa) e a
nobreza. No início da colonização, a legislação relativa à propriedade da terra
estava baseada na política rural de Portugal.
A terra era vista como parte do patrimônio pessoal do rei, como domínio
da Coroa, e sua aquisição decorria de uma doação pessoal, segundo os méritos
dos pretendentes e os serviços por eles prestados à Coroa, em um sistema
conhecido como patrimonialismo
patrimonialismo.
Dentro da ótica mercantil, procuravam-se informações sobre as riquezas
disponíveis na costa brasileira, em particular a existência de produtos exóticos,
de alto valor unitário nos mercados europeus, e sobre metais e pedras precio-
sas. Subordinado a esse interesse principal, buscavam-se o descobrimento de
passagens para a Ásia e a localização de pontos na costa que servissem de apoio
aos navios que faziam o percurso para a Índia.
Desde cedo, as facilidades naturais de comunicação privilegiaram o litoral
oriental, como objeto de exploração econômica. Esse fato foi acentuado pela
presença, nessa porção da costa brasileira, de uma imensa massa de floresta úmida,
a Mata Atlântica
Atlântica, formada pela precipitação resultante da umidade trazida pelos
ventos alíseos. A floresta era o hábitat natural de diversas tribos indígenas do
grupo Tupi-Guarani, que haviam ultrapassado a fase cultural da caça e coleta e se
situavam no início da revolução agrícola, tendo dominado para o cultivo diversas
plantas da floresta tropical - como a mandioca, o milho e o tabaco, entre outras -
que eram cultivadas em pequenas roças abertas no meio da floresta.
A floresta e o trabalho das comunidades indígenas foram objeto da primei-
ra atividade econômica da Colônia: a extração de madeiras corantes, em
especial o pau-brasil
pau-brasil. Retirado da floresta pelos índios e armazenado em
feitorias - pontos defendidos por fortificações, no litoral -, o “pau-brasil”
inaugurou o instituto do estanco
estanco, ou seja, o monopólio da Coroa portuguesa
sobre o comércio com a Colônia. Mas toda essa proteção não impediu as visitas
constantes de corsários franceses e ingleses.
As primeiras tentativas de implantação da economia açucareira no Brasil
procuraram utilizar a base material desenvolvida com a extração de madeiras
corantes. Em primeiro lugar, a floresta tropical, cujo desmate fornecia madeira para
construções e lenha para os engenhos. Em segundo, as várzeas úmidas litorâneas,
que além de propiciarem solos de renovada fertilidade, com as cheias periódicas,
garantiam o escoamento fluvial da produção açucareira. Por fim, a tentativa,
frustrada rapidamente, de utilizar as comunidades indígenas como fonte de traba-
lho compulsório para o cultivo das terras e a manutenção das plantações.
As plantations litorâneas foram as células fundamentais da estrutura econô-
mica e social da Colônia. Delas partiu a expansão gradativa das fazendas de gado
pelo sertão, para abastecer de couro e animais de trabalho as zonas canavieiras.
No litoral norte, o rio Amazonas foi estratégico por sua extensão e ampla
navegabilidade: até 2.000 km no interior, em meio à floresta equatorial. Durante
a união das Coroas de Portugal e Espanha (1580-1640), holandeses, franceses e
ingleses trataram de ocupar militarmente essa área. Para defender a Bacia
Amazônica, as formas iniciais de ocupação, adotadas por Portugal, foram
pequenos fortes, sendo o primeiro deles na foz do Amazonas, em Belém (1616).
A ocupação da terra como base do direito A U L A
sobre sua posse, isto é, o direito “de facto”, foi
a prática estratégica de apropriação do terri-
tório para além dos limites jurídicos do Trata- 22
do de Tordesilhas, o que foi posteriormente
reconhecido como um princípio legal.
O maior impulso para a expansão
territorial decorreu sobretudo da descoberta
do ouro (1690) no planalto do Brasil Central.
O ouro tornou-se a base econômica da Colô-
nia até o final do século XVIII, à medida que a
economia açucareira decaía, face à concorrên-
cia do açúcar produzido nas Antilhas.
A descoberta do ouro provocou um afluxo
de imigrantes da Metrópole, grande mobili-
dade interna e uma corrida gigantesca em
alguns decênios, que cobriu uma área imensa
no centro e oeste do atual território brasileiro
(Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso). Cami-
nhos de gado e tropas de mulas estabelece-
ram-se para abastecer os primeiros centros
mineradores, constituindo-se nos primeiros Atividades econômicas do período colonial.
eixos da integração interna da Colônia.
Em conseqüência da mineração, deslocou-se o eixo econômico para o centro-
sul e com ele transferiu-se a capital da Bahia para o Rio de Janeiro (1763).
Entretanto, o ciclo do ouro e diamantes, embora intenso, foi breve. Esgotou-se
nos últimos 25 anos do século XVIII, inclusive pela pressão dos impostos
cobrados pela Coroa. Essa pressão resultou no primeiro, mas fracassado,
movimento pela independência: a Inconfidência de Minas Gerais, em 1792.
A principal característica da sociedade colonial era a escravidão de índios
e, principalmente, de negros. Essa foi uma escravidão original, que reviveu
uma forma de trabalho historicamente extinta, e proporcionou um recurso
para a exploração comercial da Colônia. Embora não se tenham dados comple-
tos e seguros, em 1798 o número de escravos correspondia à metade da
população da Colônia.
A escravidão afetou o conceito de trabalho, que se tornou uma atividade
humilhante e deixou um pequeno número de ocupações para os homens livres
que não eram proprietários de terra.
Distinguiam-se assim, dois setores na sociedade colonial, segundo a utiliza-
ção de trabalho escravo ou livre. Um setor era estruturado pela escravidão e o clã
patriarcal coeso, formado pelo conjunto de indivíduos que participavam da
grande propriedade rural, cujos donos constituíam a classe privilegiada, aristo-
crática. O outro setor era integrado por comerciantes, os únicos que faziam frente
aos proprietários de terra como financiadores da grande lavoura.
A propriedade monoprodutora escravista de grande escala foi a célula de
toda a estrutura colonial, determinando o conjunto das relações sociais e a
exploração extensiva e especuladora dos recursos naturais.
Reproduzindo-se no tempo e no espaço, a grande propriedade teve seus
traços mais acentuados na plantation açucareira, mas esses traços estavam
presentes também na fazenda de gado, na mineração e mesmo no setor
extrativo do Vale Amazônico, embora este último não tivesse por base a
propriedade da terra.
A U L A Foi a manutenção do princípio monárquico, no processo de independência,
que determinou a preservação da unidade política do território. O princípio

22 monárquico centralista foi a solução que os grandes proprietários e traficantes de


escravos encontraram para defender seus privilégios e manter seu poder local:
no plano externo, garantir o tráfico de escravos contra a pressão inglesa; no plano
interno, assegurar o comércio de escravos entre as províncias e o monopólio
da propriedade da terra.
Essa relação entre centralismo do Estado e interesses escravistas revela
o caráter do bloco do poder. Ele era composto por todas as classes de pro-
prietários, mas sob a hegemonia política de um sub-bloco, formado pela elite
escravista de plantadores de café, grupos de proprietários urbanos e comerci-
antes. Estes últimos agiam como vanguarda e conquistavam postos-chave
no aparelho de Estado.
Tal situação revela, também, o início de interesses regionais diferencia-
dos, que vão estar presentes em boa parte da história brasileira, inclusive nos
dias atuais.

Nesta aula, você aprendeu que:

l o Brasil foi marcado, social e territorialmente, pelo processo de colonização


ibérico, e até hoje perduram os desafios para construir uma sociedade mais
ibérico
justa, capaz de respeitar seu imenso patrimônio natural
natural;
l seus contornos territoriais foram traçados, no período colonial, segundo as
estratégias formuladas pela Coroa portuguesa, no confronto com as demais
potências do mercantilismo
mercantilismo;
l a ocupação e o povoamento, ao longo do período colonial, se fazem segundo
a lógica da empresa mercantil
mercantil, primário-exportadora, baseada no trabalho
escravo
escravo;
l a estrutura social da Colônia foi preservada após a independência, que
manteve, por intermédio da monarquia, um Estado unificado territo-
rialmente, fundado no trabalho escravo;
l a grande propriedade rural manteve-se durante a industrialização e consti-
tuiu-se em um fator de concentração de riqueza, renda e poder que perdura
até os dias atuais.

Exercício 1
Enuncie qual a principal forma de inserção da economia da América Latina
e do Brasil na economia mundial. Explique por que formaram a mais antiga
periferia da economia européia.
Exercício 2
Qual o sistema agrícola em que podemos classificar a monocultura de
produtos tropicais para a exportação que se tornou a base da estrutura
econômica e social colonial:
a) agricultura intensiva de jardinagem;
b) agricultura de produtos temperados;
c) sistema de plantation;
d) sitema de rotação de culturas.
Exercício 3
Quais os efeitos da concentração da propriedade da terra, desde o período
colonial, sobre a distribuição de renda no Brasil?
AUU
A L AL A

23
23
Uma fronteira
em movimento

N esta aula, veremos como o Brasil se des-


taca pelas dimensões continentais de seu território, cuja ocupação se deu por
meio da constante incorporação de novas terras terras, ao mesmo tempo em que
preservava relações de trabalho arcaicas. Veremos como o deslocamento da
frente pioneira foi uma das expressões da grande mobilidade do trabalho
no Brasil - um processo contraditório, pois de um lado contribuiu para reduzir
os níveis de salário e de garantias trabalhistas, e de outro criou uma alternativa
para a sobrevivência do trabalhador e de sua família.

Quais os efeitos da grande disponibilidade de terras sobre o processo


de industrialização e urbanização no Brasil? Qual o significado da fronteira para
o desenvolvimento brasileiro?
Os papéis da fronteira agrícola e do acesso à terra são fundamentais para
diferenciar o Brasil de seus parceiros latino-americanos. Isso também deu uma
forma peculiar à questão agrária, em que a grande propriedade foi sempre
dominante.
No Brasil, a oferta de produtos agrícolas foi garantida pela incorporação de
novas terras, sem tocar na estrutura fundiária pré-estabelecida, que constitui
a base do poder dos grupos dominantes até os dias atuais.
Entretanto, essa disponibilidade de terras favoreceu a mobilidade no traba-
lho, que costuma ocorrer tanto nos deslocamentos entre um lugar e outro, como
na mudança de um tipo de emprego para outro.

O Brasil tem dimensões continentais, e essa é uma diferença fundamental em


relação aos seus vizinhos latino-americanos. Sua extensão territorial coloca-o na
quinta posição entre os maiores países do globo, com uma área de 8,5 milhões de
km2 e uma população estimada em 162 milhões de habitantes, em 1995.
A potencialidade de recursos amplia-se pela disponibilidade de espaço
útil decorrente de sua posição geográfica. O Brasil corresponde a dois terços da
América Latina, e é seguramente o maior país situado na faixa intertropical.
A grande reserva de terras do Brasil é a maior floresta pluvial do planeta - a
Amazônia - com uma imensa variedade de espécies. Apesar disso, seu delica-
do equilíbrio ecológico constitui ainda um desafio à sociedade brasileira e à
ciência mundial, na busca de formas apropriadas de ocupação.

17
A U L A As condições naturais são importantes, mas não determinantes. Antes,
nosso país era um grande fornecedor de café, mas hoje passou a segundo maior

23 exportador de soja e derivados, com a vantagem de colocar sua produção no


mercado durante o período da entressafra norte-americana. A soja, pouco
conhecida no Brasil há quinze anos, venceu a barreira ecológica dos cerrados e
espalhou-se no Planalto Brasileiro, graças aos investimentos em melhorias
genéticas e no desenvolvimento de tratos em sua cultura. Em 1975, os cerrados
eram responsáveis pela produção de cerca de 6% da soja brasileira; em 1982, esse
número atingia 22% e, com a grande safra de 1987/88, responderam por 8
milhões de toneladas de soja, isto é, 44,5% do total nacional.
A economia brasileira cresceu, e continua crescendo, pela impressionante
capacidade de incorporar rapidamente novas terras. A área total dos estabeleci-
mentos agrícolas era de 198 milhões de hectares em 1940; saltou para 365 milhões
em 1980, e atingiu 375 milhões de hectares em 1985, já sob os efeitos da crise
econômica do início da década de 1980. E isso representa apenas cerca da metade
da área disponível para a agropecuária.

EXPANSÃO DA ÁREA DOS ESTABELECIMENTOS AGROPECUÁRIOS – 1970/85

( EM MILHÕES DE HECTARES)
ÁREA DOS ÁREA DOS ÁREA DOS INCREMENTO INCREMENTO

REGIÕES ESTABELECIMENTOS ESTABELECIMENTOS ESTABELECIMENTOS ANUAL (1) ANUAL (1)

1970 1980 1985 1970/80 1980/85


Brasil 294, l5 364, 85 374, 92 2,18 0,27
Norte (2) 23, l8 41, 56 45, 21 6,01 0,85
Nordeste 74, 30 88, 44 92, 05 1,76 0,40
Sudeste 69, 50 73, 50 73, 24 0,56 - 0,04
Sul 45, 46 47, 91 47, 94 0,53 0,01
Centro-Oeste (3) 81, 71 113, 44 116, 48 3,34 0,26
(1) Taxa de incremento geométrico anual.
(2) Dados excluem o Estado de Tocantins.
(3) Dados incluem o Estado de Tocantins.
Fontes: IBGE, Censos Agropecuários de 1970, 1980 e 1985.

A grande propriedade rural brasileira, herdada do latifúndio escravista, foi


um instrumento básico para conservar os trabalhadores e suas famílias em
condições próximas à subsistência, rebaixando o nível geral de salários da
economia. O consumo de calorias por habitante no Brasil é de 2.657 por dia,
inferior aos valores encontrados no Iraque (2.891), no Irã (3.115) ou na Turquia
(3.218). O custo por hora da mão-de-obra no Brasil é um dos mais baixos
do mundo - cerca de US$ 1.00 -, enquanto em países como a Grã-Bretanha
ou a França, a hora de um trabalhador médio está em torno de US$ 17.00.
A concentração do capital e o crescimento econômico não repousaram
apenas nos baixos salários, mas também na extraordinária intensificação da
mobilidade dos trabalhadores no decorrer da História. O processo migratório
interno foi responsável pelo povoamento do território nacional, que se inten-
sificou com o processo de industrialização, avançando progressivamente para
o oeste e o norte.
O deslocamento da população para essas áreas novas, com a conquista
de terras de floresta para a agricultura, é chamado de frente pioneira, porque
se faz de modo mais ou menos contínuo, como uma frente, e ocupa terras novas
- por isso seu caráter pioneiro.

18
As frentes pioneiras iniciaram-se com a expansão do café no Estado de São A U L A
Paulo e avançaram em direção ao sul e ao oeste do Brasil, povoando o interior dos
Estados do Paraná, Goiás, e Mato Grosso do Sul, dentre outros.

BRASIL - DENSIDADES DEMOGRÁFICAS POR ESTADOS - 1940/ 1991


23

1940 1950 1960 até 2 hab./km2


de 2 a 20 hab./km2
de 20 a 50 hab./km2
mais de 50 hab./km2

1970 1980 1991

A mobilidade da população ampliou a margem de pobreza em todo o


território nacional e fez emergir novos grupos sociais, que compõem o universo
da sociedade brasileira. Intensificaram-se a rotatividade do emprego, que é uma
das maiores do mundo, e a polivalência do trabalhador, isto é, o exercício de
múltiplas tarefas ou múltiplos empregos por um mesmo indivíduo.
Essa mobilidade deve-se, de um lado, à atração exercida pelas áreas dinâmi-
cas, com novas oportunidades de emprego e/ou de acesso à terra, sobretudo
no Sudeste, nas metrópoles e, com menos intensidade, no Centro-Oeste e Norte;
de outro lado, a modernização da agricultura, que liberou a mão-de-obra rural
em todo o país, retirou do Nordeste seu papel de fornecedor, quase exclusivo,
de migrantes.
A mecanização subsidiada pelo governo, cujo melhor exemplo é o cultivo Ao fornecer
da soja, transformou o Estado do Paraná de uma frente pioneira do café, subsídio, o governo
que atraía a população de outros estados, no maior exportador de mão-de-obra pode pagar parte
do Brasil, em apenas duas décadas - de 1970 a 1991. do bem, ou cobrar
A concentração da propriedade da terra, decorrente de sua valorização impostos mais
baixos, ou até
e do acesso diferenciado ao crédito, resultou na expropriação violenta de pequenos
deixar de cobrá-los.
produtores (posseiros, parceiros, pequenos proprietários etc.). Em conseqüência,
a mobilidade passou a se dar em escala nacional e está associada à formação de um
novo mercado de trabalho com características próprias.
Nas áreas em que o mercado de trabalho é melhor organizado, como em
São Paulo, assalariados rurais permanentes foram transformados em traba-
lhadores temporários, que vivem nas cidades e vão trabalhar diariamente no
campo, os bóias-frias
bóias-frias. Em áreas menos desenvolvidas, os pequenos produ-
tores rurais passaram a vender seu trabalho, tanto para o mercado urbano
como para o rural (dependendo da estação), e a morar em áreas urbanas. Esse
processo significa maior instabilidade no emprego e maior exploração do
trabalho, pois permite manter os salários baixos, induz à ampliação da
jornada de trabalho e “libera” os patrões das obrigações trabalhistas.

19
A U L A Na área urbana os trabalhadores podem estar empregados no setor formal
da economia, isto é, o que apresenta uma relação estável de trabalho e está

23 regulamentado pelas normas do Estado, ou no setor informal


informal, que é formado
pelos trabalhadores por conta própria e pelos que não possuem relações de
trabalho formais, isto é, não têm seus direitos trabalhistas garantidos.
O chamado setor informal abrange uma fantástica massa de empregadores
e empregados, constituindo uma economia paralela que foge da regulação
oficial. Ainda pouco conhecida, essa imensa massa de trabalhadores sem
carteira assinada exerce as mais diversas atividades. A economia paralela
inclui desde o pequeno vendedor ambulante até as pequenas indústrias que
proliferam nas grandes cidades brasileiras.

Nesta aula você aprendeu que:

l o Brasil tem a maior extensão territorial entre os países da América Latina


e uma das maiores entre os países do mundo;
l essas dimensões territoriais possibilitaram ao Brasil, historicamente, inte-
grar-se ao comércio mundial, pela ocupação de grandes extensões de
terras com cultivos como o açúcar, o café e atualmente a soja, destinados,
de preferência, à exportação;
l mas essa possibilidade de incorporar novas áreas produtivas - as chamadas
fronteiras agrícolas - permitiu, também, a preservação de uma estrutura
fundiária altamente concentrada
concentrada, pois os “sem-terra” deslocam-se para
as áreas de fronteira;
l no Brasil, a mobilidade do trabalho
trabalho, quer nas fronteiras agrícolas, quer nas
áreas urbanas, é um dos fatores para explicar as baixas remunerações que
conservam os trabalhadores apenas em níveis próximos da pobreza.

Exercício 1
A intensificação do processo de ocupação da região Centro-Oeste é recente.
Destaca-se como fator dessa ocupação:
a) a pecuária, iniciada nas últimas décadas, especialmente em trechos do
Planalto Central e no Pantanal Matogrossense;
b) a industrialização, estimulada pelo governo, que se tornou a atividade
econômica mais expresiva de Estados como Goiás e Mato Grosso do Sul;
c) a construção de Brasilia em uma das áreas mais valorizadas da região,
que possibilitou dinamismo econômico, tornou complexa a estrutura
do espaço regional e viabilizou a estratégia de “integração regional”;
d) a constução de ferrovias, que se constituem atualmente no mais expres-
sivo fluxo de circulação regional.

Exercício 2
A população rural da região Sul do Brasil foi a que conheceu o maior
decréscimo percentual entre 1970 e 1980 (-2,47% ao ano). Para que outras
regiões essa população tem se dirigido?

Exercício 3
Considerando o aspecto da dinâmica populacional, descreva:
a) um fator de atração;
b) um fator de repulsão da população.

20
AUU
A L AL A

24
24
Condomínios e favelas:
a urbanização desigual

N esta aula, vamos estudar a urbanização


brasileira, que se caracteriza pela rapidez e intensidade de seu ritmo. Vamos
comprender como o crescimento das cidades esteve ligado à atividade industri-
al, gerando aglomerações urbanas com diferentes níveis na hierarquia regional.
Veremos também que a pobreza urbana reflete as desigualdades sociais presen-
tes na economia brasileira.

Qual o papel das grandes cidades no processo de desenvolvimento brasi-


leiro? Como as metrópoles podem ser, ao mesmo tempo, centros de inovações
e aglomerados de pobreza?
No Brasil, o mercado unificou a economia urbana em escala nacional.
Quanto maior a cidade, maior a possibilidade de multiplicação das atividades
informais e das alternativas de sobrevivência para os pobres. Favelas se
multiplicam, enquanto as pessoas mais abastadas procuram construir condo-
mínios que lhes ofereçam mais segurança. Explica-se, assim, a expansão do
emprego - ainda que rotativo e mal remunerado - na indústria metropolitana,
ao contrário do que ocorre nas economias centrais. No caso brasileiro, a
periferia cresce com a indústria e com a migração da população de baixa renda.
O lugar da riqueza torna-se literalmente o lugar da pobreza.

O Brasil transfor-
mou-se em um país
urbano em poucas dé-
cadas, comprimindo
no tempo um proces-
so que, em outros paí-
ses, se fez muito mais
lentamente. As áreas
urbanas passaram a
concentrar, em 1995,
mais de 120 milhões
de indivíduos, num
total de aproximada-
mente l60 milhões.

21
A U L A Ao contrário dos países latino-americanos, como os do Cone Sul, que têm
urbanização mais estabilizada, o Brasil manifesta um processo extremamen-

24 te dinâmico, devido, em grande parte, ao próprio crescimento urbano - que


não se reduz à mera “inchação” das cidades - mas também à mobilidade de
sua população e a uma fronteira móvel.
A partir de 1930, começou a se acelerar o crescimento industrial do eixo entre
Rio de Janeiro e São Paulo. Essa área passou a ter um desenvolvimento maior do
que as demais, tornando-se o centro econômico do Brasil e produzindo bens
industrializados de todos os tipos. Os demais Estados tornaram-se mercados
consumidores desses bens, fornecendo matérias-primas e alimentos a preços
baixos e, principalmente, mão-de-obra barata em grande quantidade. Estabele-
ceu-se, assim, a relação centro-periferia
centro-periferia, isto é, áreas que tiveram crescimento
econômico diferente mantêm uma relação de dependência entre si.
A indústria foi a grande responsável pela aceleração do processo de urbani-
zação. Como mostra o gráfico, hoje o Brasil é um país predominantemente
urbano, com cerca de 75% de sua população vivendo e trabalhando em cidades,
em especial nas metrópoles
metrópoles.
As metrópoles são cidades que exercem um grande poder de atração sobre
as áreas vizinhas. Esse é o caso de Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo
Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre e Brasília.

Entre 1950-1990, o crescimento mais significativo ocorreu nas cidades mé-


dias e grandes. O total de cidades com mais de 100 mil habitantes passou de 11
para 95, representando 48,7% da população urbana do país.

22
Dois movimentos complementares caracterizam a urbanização: a acentua- A U L A
ção da concentração populacional e a tendência à dispersão espacial.

BRASIL: ÍNDICE DE URBANIZAÇÃO – 1950/91


24
População População População Índice de urbanização
Ano Total Urbana %
1950 51 .944.397 18 .782.891 36,2
1960 70 .197.370 31 .533.681 44,9
1970 93 .139.037 52 .084.984 55,9
1980 119.002.706 80 .436.409 67,6
1991 146.825.475 110.990.990 75,6
FONTE: IBGE, Censos Demográficos: 1905, 1960, 1970, 1980 e 1991.

Em termos de concentração, nos anos 70 as regiões metropolitanas aumen-


taram sua participação relativa (isto é, em relação ao total da população das
áreas urbanas) de 25,5% para 29,0%. A indústria teve papel central no cresci-
mento das metrópoles e das aglomerações urbanas imediatamente abaixo
desse nível.
Somente as regiões metropolitanas de São Paulo e do Rio de Janeiro - com
12 milhões e 9 milhões de habitantes, respectivamente - juntas respondiam,
em 1980, por 75,4% do pessoal ocupado e por aproximadamente 65% do valor
da produção industrial em todo o país.

Essas metrópoles recebem apoio de dois tipos de cidade, tanto em relação


ao crescimento demográfico quanto à situação de renda:
1. as cidades que correspondem à desconcentração industrial de São Paulo ou
à implantação da fronteira científico-tecnológica, isto é, cidades onde se
instalam importantes centros de pesquisa e se desenvolvem atividades que
utilizam tecnologia de ponta, como é o caso de Campinas e São José dos
Campos;
2. regiões metropolitanas com indústrias ou pólos industriais avançados,
como Belo Horizonte (metalurgia e material de transporte), Salvador
(petroquímica), Curitiba e Porto Alegre (indústrias diversas).

A tendência à dispersão urbana, tanto em termos populacionais como de


renda, se faz por três modalidades, movidas por fatores que não se ligam
diretamente à indústria, e em geral correspondem a posições de contato entre
áreas de economias diversas.
A primeira modalidade é a extensão contínua de centros urbanos a partir da
cidade mundial, isto é, uma cidade rica que fornece as tendências de atuação para
regiões de agricultura diversificada e regiões basicamente pecuaristas, por onde
avança a agricultura moderna da soja e da cana-de-açúcar.
A segunda é a formação de uma ampla frente urbana de interiorização,
correspondente às grandes capitais dos Estados do Centro-Norte, que fornecem
as tendências de atuação para a urbanização no interior, e funcionam como
pontos de contato e intermediação entre as bordas da cidade mundial e as áreas
de avanço da fronteira. Papel central na presença de grandes populações e de
rendas relativamente elevadas deve-se ao Estado. O maior exemplo dessa
situação é Brasília, a capital da geopolítica, que registrou a maior proporção no
país da população economicamente ativa urbana nas mais altas classes de renda.

23
A U L A A terceira modalidade da dispersão é característica da fronteira. Inclui
centros regionais e locais que servem de suporte para as frentes de expansão

24 agropecuárias e minerais, e inclui também o crescimento explosivo de pequenos


núcleos dispersos, vinculados à abertura da floresta ou aos garimpos, que se
constituem em locais de reprodução da força de trabalho móvel, razão pela qual
muitos desses são também efêmeros, mudando de localização com o desloca-
mento das frentes.
A urbanização foi sustentada em grande parte por uma maioria de mão-de-
obra barata e pobre. E, ainda assim, o trabalho urbano significa ascensão, pois a
proporção de trabalhadores na faixa inferior a um salário mínimo foi de cerca de
25%, no Brasil urbano, bem menor do que a percentagem de 38% do país como
um todo. Na Região Metropolitana de São Paulo, a proporção de trabalhadores
ganhando até um salário mínimo é de 9,2%, na do Rio de Janeiro é superior a
14,0% e na de Belo Horizonte alcança quase 21%.
Crescimento econômico com pobreza crescente, movimentos espontâneos
na economia informal e estruturas econômicas formais se complementam para
sustentar o crescimento metropolitano. A pobreza, por um lado, constitui um
entrave à maior expansão das grandes empresas, pois restringe o crescimento de
um mercado interno, consumidor; mas, por outro, permite a proliferação de
pequenas fábricas menos capitalizadas e criadoras de emprego.
O mercado unifica a economia urbana e, quanto maior a cidade, maior a
possibilidade de multiplicação de atividades informais. Explica-se, assim, a
expansão do emprego - ainda que rotativo e mal remunerado - na indústria
metropolitana, ao contrário do que ocorre nas economias centrais. No caso
brasileiro, a periferia cresce com a indústria e a migração da população de baixa
renda. O lugar da riqueza torna-se literalmente o lugar da pobreza.
Os dados relativos ao sistema urbano das regiões brasileiras revelam alguns
aspectos importantes:

PARTICIPAÇÃO DAS REGIÕES METROPOLITANAS E DO DISTRITO FEDERAL

NO VALOR BRUTO DA PRODUÇÃO INDUSTRIAL (VBPI),

NA RECEITA DA VENDA DE MERCADORIAS (RVM) E NA RECEITA TOTAL DOS SERVIÇOS (RTS)


VBPI RVM RTS
Brasil 47,0 46,5 65,4
Norte 11,0 25,6 22,3
Nordeste 58,9 40,4 50,1
Sudeste 52,4 58,9 75,4
Sul 34,1 27,7 43,3
Centro-Oeste (1) 10,8 21,5 55,4
(1) Dados relativos ao Distrito Federal
Fonte: IBGE, Censo Econômico de 1985 e Municípios: Indústria, Comércio e Serviços.

O Sudeste, que é o núcleo original da industrialização, revela a formidável


concentração da indústria (52,4%), do comércio (58,9%) e dos serviços (75,4%)
nas regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte.
É particularmente acentuado o fato de que três quartos das receitas de serviços
estão centralizados nas metrópoles, o que é um indicador indireto da elevada
concentração urbana da região.
O Sul, dadas as características históricas e geográficas de seu desenvolvi-
mento, apresenta uma estrutura mais dispersa, com maior concentração metro-
politana na oferta de serviços.

24
No Nordeste são nítidos os efeitos territoriais da nova indústria nordestina, A U L A
cuja produção está fortemente centralizada nas áreas metropolitanas de Salva-
dor, Recife e Fortaleza (58,9%), com uma concentração superior à receita dos
serviços (50,1%). Isso constitui um efeito peculiar das políticas regionais centradas 24
na indústria como motor dinâmico do desenvolvimento, cujo melhor exemplo
está na região metropolitana de Salvador, que detém cerca de 80% do total do
valor da produção industrial do Estado da Bahia e aproximadamente 35% do
valor total da Região Nordeste.
O Norte e o Centro-Oeste revelam estruturas semelhantes, no que diz
respeito ao peso metropolitano da indústria e do comércio, em grande parte por
causa do papel de cidades médias, como é o caso de Goiânia e Manaus, que
dividem as funções urbanas com os aglomerados metropolitanos de Brasília
e Belém, respectivamente.
Dois aspectos devem ser ressaltados: a considerável presença de Belém no
comércio regional, atividade tradicional nessa cidade da foz do Amazonas, e o
papel de destaque de Brasília, na receita dos serviços da região Centro-Oeste,
reforçando sua centralidade na rede urbana regional, em grande parte devido
à função de capital federal.

Uma das questões centrais, nesse contexto, é o abastecimento dessas aglo-


merações metropolitanas, que exige redes de circulação eficientes para manter
a oferta de bens agrícolas a esse grande contingente populacional, garantindo,
pelo aumento da oferta de alimentos, ganhos relativos nos salários reais.
Esse é um dos problemas centrais de uma política territorial de distribuição
de renda, com profundas implicações sociais, conforme se observou nos anos 80:
a convivência de grandes safras com elevações constantes nos preços da cesta
básica, nos mercados metropolitanos.
As metrópoles tornaram-se também o lugar da pobreza urbanaurbana, das carên-
cias sociais de vários tipos, que se manifestam em movimentos de posseiros
(sem-terra), em invasões dos sem-teto e em loteamentos clandestinos
clandestinos. Elas têm
os complexos problemas de gestão, comuns às grandes aglomerações urbanas,
bem como os problemas específicos das cidades de economias periféricas, o que
resulta em elevado potencial de conflitos reivindicatórios de direito à cidadania.

Nesta aula você aprendeu que:

l o Brasil se transformou em um país urbano


urbano, em poucas décadas, comprimin-
do no tempo um processo que em outros países se fez muito mais lentamente;
l a partir de 1930, começou a se acelerar o crescimento industrial do eixo entre
Rio de Janeiro e São Paulo. Essa área passou a ter um desenvolvimento maior
do que as demais, tornando-se o centro econômico do Brasil;
l a industrialização foi a grande responsável pela aceleração do processo
de urbanização
urbanização;
l cerca de 75% de sua população vive e trabalha em cidades, principalmente
nas metrópoles
metrópoles, que têm um grande poder de atração sobre as áreas
vizinhas, como é o caso de Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizon-
te, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre e Brasília;
l as metrópoles tornaram-se também o lugar da pobreza urbanaurbana, das carên-
cias sociais de vários tipos que se manifestam em movimentos de possei-
ros
ros, em invasões dos sem-teto e em loteamentos clandestinos
clandestinos.

25
A U L A Exercício 1
Por que podemos afirmar que hoje o Brasil é um país urbano?

24 Exercício 2
Por que as metrópoles brasileiras podem ser consideradas lugares da rique-
za e da pobreza?

Exercício 3
Assinale a alternativa errada sobre a urbanização brasileira:
a) A aceleração do processo de urbanização ocorreu principalmente após a
Segunda Guerra Mundial, quando também se intensificou a industriali-
zação.
b) Uma das tendências da urbanização na década de 1970 diz respeito ao
aparecimento, no interior, de centros de contato e de intermediação entre
as regiões de desenvolvimento urbano-industrial e as áreas de avanço da
frente pioneira.
c) A tendência mais marcante da configuração espacial da urbanização,
no período de 1970 a 1980, refere-se ao aumento da concentração urbana
nos espaços metropolitanos.
d) O processo de urbanização no período de 1980 a 1990 estabiliza-se,
evidenciando um padrão definido na distribuição espacial da população
no território nacional.

26
AUU
A L AL A

25
25
Cidade mundial,
domínios e fronteiras

N esta aula, vamos verificar que a industri-


alização recente foi consolidada por uma forte participação do Estado em um
processo que ficou conhecido como modernização conservadora
conservadora. Veremos
como esse processo marcou profundamente a organização espacial do território
nacional, hierarquizando-o a partir de uma cidade mundial
mundial, em domínios e
fronteiras
fronteiras. Tal processo contribui pouco para reduzir as disparidades de renda
entre as regiões brasileiras, resultantes do ritmo de desenvolvimento desigual
na acumulação de riqueza e na geração de renda na economia nacional.

Qual o papel do Estado na industrialização recente no Brasil? O que significa


a modernização conservadora e quais seus reflexos na organização espacial da
economia brasileira?
Durante o período autoritário - de l964 a l985, quando o Brasil esteve sob
regime militar - as implicações políticas da estrutura espacial foram levadas ao
extremo, num momento em que o espaço tornou-se instrumento e condição da
modernização conservadora.
A gestão estatal do território foi principalmente estratégica, envolvendo
não apenas sua administração em termos econômicos, mas também as rela-
ções de poder. Entre 1955 e 1970, a política regional procurou identificar-se
com a construção da nação. A macro-região foi a escala considerada ótima,
tanto para promover a unificação do mercado nacional como para a centra-
lização do poder governamental. Na década de 1970, os grandes projetos
administrados pelas empresas estatais substituíram a política regional por
novos ajustes com os grupos que detinham o poder nas regiões.

No Brasil, o status de país de industrialização recente - conhecido também


pela sigla em inglês NIC (New Industrialized Country) - foi alcançado a partir
de 1970 pela modernização conservadora conduzida pelo Estado, que
produziu transformações significativas na economia sem romper com a ordem
social hierarquicamente organizada.
A U L A A gestão autoritária do território foi um instrumento essencial para criar
fronteiras
fronteiras, isto é, áreas onde se conquistavam novas terras e se produziam

25
Oligarquia:
governo de poucas
mudanças aceleradas; garantir os domínios
domínios, ou seja, territórios controlados por
oligarquias solidamente estabelecidas, e consolidar uma cidade mundial -
São Paulo - como lugar que estabelece ligações com a economia mundial.
pessoas que A fronteira não se resume a uma vasta extensão de terras sem dono a ser
pertencem ao explorada por homens também - pretensamente - livres, tampouco represen-
mesmo partido, ta um determinado tipo de periferia dependente de um centro. Ela é um espaço
classe ou família, e
econômico, social e político que não está plenamente organizado e tem a
que compartilham
capacidade de gerar novas realidades.
os mesmos
interesses.
Os domínios são áreas consolidadas, com estruturas políticas relativamente
estáveis, mantidas por alianças com interesses locais e regionais que participam
diretamente do núcleo de poder político, e que deram sustentação ao projeto
de modernização conservadora.
Assim, perpetuaram-se formas tradicionais de propriedade da terra e de
controle do comércio, graças a toda sorte de instrumentos políticos que garantem
privilégios adquiridos e criam barreiras à entrada de novos concorrentes.
Fronteiras e domínios são articulados, ou seja, criados e postos em prática
pela cidade mundial, que, em países de industrialização recente, é, ao mesmo
tempo e no mesmo lugar, centro de gestão, de acumulação de capital em escala
mundial e núcleo de comando de uma vasta rede urbana que conecta a
multiplicidade de lugares existente no Brasil.
A política territorial do Estado manteve domínios, expandiu fronteiras A U L A
e fortaleceu a cidade mundial. Como exemplo de manutenção de domínio
domínio,
a persistência da questão regional no Nordeste; da expansão de fronteira
fronteira,
a configuração de uma imensa fronteira de recursos no Norte e Centro-Oeste 25
e de fortalecimento da cidade mundial
mundial, a conformação de um vasto complexo
urbano-industrial comandado por São Paulo.

Um balanço desse período recente


mostra que, apesar da intervenção direta
do Estado, persistem na economia nacio-
nal os mecanismos geográficos que leva-
ram ao desenvolvimento desigual das re-
giões brasileiras. E as desigualdades re-
sultam do ritmo diferenciado de acumula-
ção da riqueza e de geração da renda, nas
diferentes parcelas do território nacional.

A análise das grandes regiões brasilei-


ras, que utiliza a classificação definida
pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) em Norte
Norte, Nordeste
Nordeste,
Sudeste
Sudeste, Sul e Centro-Oeste
Centro-Oeste, é útil para
um primeiro contato com as mudanças
recentes ocorridas no Brasil, que revelam a
situação atual na distribuição territorial
da riqueza e as desigualdades regionais na
divisão social da renda.

DADOS BÁSICOS SOBRE AS MACRO- REGIÕES BRASILEIRAS

Região Área Área População População Renda - Renda -


(1.000 km2) (%) -1991 (1) - l991 (1) 1985 (2) l985 (2)
Milhões de hab. (%) (milhões de US$) (%)
Norte 3.864 45,4 110.146 6 ,9 8 .828 4 ,3
Nordeste 1.546 18,2 142.387 29 ,0 27 .511 l3 ,5
Sudeste 1.925 l0 ,9 162.121 42 ,6 118 .139 58 ,3
Sul 1.578 6,8 122.080 15 ,1 35 .914 17 ,7
Centro-Oeste 1.593 18,7 149.420 6 ,4 l2 .667 6 ,2
Brasil 8.506 100,0 146.154 100,0 203 .059 100,0
(1) Dados preliminares do Censo Demográfico de 1991 (FIBGE, 1992).
(2) Dados básicos das Contas Nacionais - Renda Interna por Unidade da Federação (FIBGE, 1991).

A industrialização foi responsável pela maior concentração de população e


de renda no Sudeste. Sua integração com o Sul já era importante desde o início
do desenvolvimento industrial, por causa do fornecimento, pelo Sul, de alimen-
tos e matérias-primas agrícolas.

O Nordeste, a segunda região mais populosa, ainda é a área mais pobre do


país, com uma participação na renda nacional inferior à metade de seu peso
demográfico, isto é, de sua grandeza populacional. A integração do Nordeste ao
Sudeste é um processo que se completa na década de 1970 pela intervenção
planejada do Estado.
A U L A O Centro-Oeste iniciou, de fato, seu processo de integração com a fundação de
Brasília, em 1960. Sua rede de infra-estrutura viária facilitou a expansão da soja,

25 cultura agrícola que “abriu” os cerrados e integrou definitivamente o Centro-


Oeste ao mercado nacional, na década de 1980.
O Norte, que abrange a grande Planície Amazônica, é ainda uma imensa
superfície florestada e um imenso vazio demográfico. Os esforços de ocupação
dessa área, realizados a partir da década de 1970 com a abertura de rodovias que
partiam de Brasília, permitiram o crescimento populacional em manchas na
borda sul da grande massa florestal. Entretanto, a atividade econômica ainda é
em grande parte dispersa ou, então, concentra-se ao longo de poucos eixos que
partem de cidades encravadas aqui e ali, e ao longo dos rios e rodovias.
Os grandes projetos agropecuários e mineradores instalados a partir da
década de 1970 na Amazônia seguem basicamente esse padrão, mesmo em
Carajás, a grande província mineral da região, onde a Companhia Vale do Rio
Doce (CVRD) é o elemento de integração do território sob seu controle com o
mercado mundial.
Dessa maneira verificamos que, apesar da forte intervenção do Estado, o
ritmo de desenvolvimento desigual é o responsável pelas disparidades entre
as regiões brasileiras, o que resulta em uma grande concentração de pessoas,
investimentos e informações na área geoeconômica comandada pela cidade
mundial, São Paulo, conhecida também como o Centro-Sul
Centro-Sul, que veremos na
aula a seguir.

Nesta aula você aprendeu que:

l no Brasil, o status de país de industrialização recente foi alcançado pela


modernização conservadora conduzida pelo Estado;
l a gestão autoritária do território produziu fronteiras
fronteiras, garantiu domínios
e consolidou a cidade mundial
mundial, lugar que estabelece ligações com a econo-
mia global;
l a industrialização foi responsável pelo desenvolvimento desigual da econo-
mia nacional, pois estimulou uma maior concentração de população e de
renda no Sudeste
Sudeste. A região está integrada com o Sul
Sul, especialmente porque
este lhe fornece alimentos e matérias-primas agrícolas;
l o Nordeste ainda é a área mais pobre, com uma participação na renda
nacional inferior à metade de seu peso demográfico;
l o Centro-Oeste iniciou, de fato, seu processo de integração com a fundação
de Brasília, em 1960;
l o Norte
Norte, que abrange a grande Planície Amazônica, é ainda uma imensa
superfície florestada e um imenso vazio demográfico.

Exercício 1

ÁREA TERRITORIAL E POPULAÇÃO NAS REGIÕES BRASILEIRAS

Regiões Porcentagem Porcentagem


do território da população
1 45,4 16,9
2 10,9 42,6
3 16,8 15,1
Considerando os dados apresentados, identifique qual das alternativas A U L A
abaixo contém, corretamente indicadas, as regiões brasileiras que substi-
tuem os números 1, 2 e 3 na ordem da tabela.
a) Centro-Oeste, Nordeste e Sul; 25
b) Centro-Oeste, Sudeste e Sul;
c) Norte, Nordeste e Sudeste;
d) Sudeste, Sul e Nordeste;
e) Norte, Sudeste e Sul.

Exercício 2
Na região Centro-Oeste, do ponto de vista das características geoeconômicas,
quais são os fatores que permitem definir essa unidade espacial? Assinale
as respostas falsas e as verdadeiras.
a) alta concentração de população e de renda;
b) intensa aplicação de capital na agricultura;
c) comunicação precária por rodovias com o resto do país;
d) economia principalmente voltada para a exportação.

Exercício 3
A região Sudeste é a mais desenvolvida do país, concentra mais da metade da
população absoluta do Brasil, mais de 60% da renda nacional e tem o maior
complexo industrial da América Latina. Assinale a alternativa incorreta:
a) Esse progresso é explicado pelo grande fluxo de capital acumulado
na fase áurea da mineração no interior de Minas Gerais.
b) Isso ocorre devido ao seu potencial energético e à disponibilidade
de mão-de-obra vinda de outras regiões do país.
c) Embora tenha áreas pobres e grande número de favelados nos mais
importantes centros urbanos, apresenta o menor índice de desemprego
rural e urbano do país.
d) Apresenta os mais bem-equipados portos do país, como o de Santos,
no Estado de São Paulo, e o de Tubarão, no Espírito Santo.
e) O crescimento econômico do espaço regional foi favorecido pela boa
infra-estrutura dos transportes, com destaque para as rodovias que ligam
diferentes áreas de produção da região.
A UA UL L AA

26
26
Centro-Sul: o cinturão
urbano-industrial

N esta aula, veremos como a cidade mundial


- São Paulo - foi responsável pela consolidação de um cinturão urbano-
industrial na região Sudeste
Sudeste, que incorporou a região Sul e se estendeu
pelo Centro-Oeste
Centro-Oeste. Esse desenvolvimento se deu principalmente depois da
construção da nova capital federal em Brasília, inaugurada em 1960, o que
acelerou o avanço da ocupação agrícola e a diversificação do papel das cidades
da região.
Essa área forma um conjunto regional denominado Centro-Sul
Centro-Sul, que se
destaca no cenário nacional pelo dinamismo de sua agroindústria, embora ainda
apresente níveis elevados de pobreza, em especial nas grandes aglomerações
metropolitanas.

Qual o papel de São Paulo na estruturação do espaço brasileiro? Qual


a importância da metrópole paulistana na rede mundial de cidades?
No Brasil, a metropolização expressa a rapidez com que se urbaniza o espaço
nacional. É contraditório verificar como uma economia subdesenvolvida supor-
ta esse papel que, sem dúvida, lhe é atribuído pela divisão internacional do
trabalho, em termos da própria realização do capital internacional.
Apesar da importância desse papel, a metrópole é essencialmente o lugar da
pobreza. Essa posição típica de São Paulo - parecida com a da Cidade do México,
quanto à evolução da população urbana das grandes metrópoles mundiais - já
pode ser considerada como um elemento de identidade. São Paulo, metrópole
nova que vem se consolidando como tal apenas neste século, apresenta um ritmo
surpreendente de urbanização, que foi se afirmando a partir dos anos 70.

O Centro-Sul é o cinturão agroindustrial do país. Ele é formado basicamen-


te pelos Estados da Região Sudeste (São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais
e Espírito Santo) e Sul (Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul), pelos
Estados de Goiás e de Mato Grosso do Sul e pelo Distrito Federal, que compõem
a Região Centro-Oeste, segundo a classificação oficial. De um modo geral,
o Centro-Sul corresponde à parcela do território brasileiro diretamente ligada
à cidade mundial - São Paulo.
Nele encontramos áreas onde houve, nas chamadas empresas rurais, A U L A
uma verdadeira industrialização da agricultura
agricultura, com o uso de máquinas,
adubos e fertilizantes e a especialização da produção.
Além disso, a grande capacidade produtiva permite que o Centro-Sul 26
abasteça tanto o mercado nacional quanto o mercado externo. Essa área
geoeconômica, caracterizada por suas atividades produtivas, ocupa o primeiro
lugar em volume e em valor de produção do setor agropecuário.
O Centro-Sul possui a melhor infra-estrutura viária do país. A intensa
circulação de produtos e de pessoas, feita por uma densa rede de rodovias e
ferrovias, revela a forte integração e o dinamismo de sua área interna, bem como
sua ligação com as demais regiões do país.

FERROVIAS RODOVIAS

ENERGIA TELECOMUNICAÇÕES
ELÉTRICA

É importante destacar que essa é a área mais bem servida pelos novos
meios de comunicação desenvolvidos com a microeletrônica e a informática,
por onde circulam as idéias e as informações no país. Os principais corredores
de exportação, assim como os portos e aeroportos de tráfego mais intenso,
também estão no Centro-Sul.
Os fluxos de informação estão amplamente concentrados em São Paulo.
A cidade é sede da maioria dos bancos privados, que correspondem a 60% do
sistema bancário nacional, incluindo 18 dos 23 bancos estrangeiros que
operam no Brasil.
Os bancos são os principais clientes dos serviços de telecomunicações que
ligam o centro financeiro de São Paulo ao de outras cidades mundiais. São Paulo
também recebe metade das chamadas da rede de telex que chegam ao país.
A nova maneira como o Brasil participa da economia mundial deve-se à
formação da cidade mundial - São Paulo - e a uma estrutura urbano-
industrial intimamente ligada, que teve início no Sudeste com a concentração
e ampliação do núcleo econômico, durante os anos 60 e 70.
Essa área é a parte do país mais integrada à economia mundial e também
a mais dinâmica, tanto em termos de relações com o restante do país quanto
com o exterior. Aí se localiza o eixo de expansão metropolitano que liga São
Paulo ao Rio de Janeiro. E uma grande área industrial quase contínua, que parte
da cidade mundial, ultrapassa os limites do estado de São Paulo e inclui porções
dos estados vizinhos de Minas Gerais e Rio de Janeiro.
A U L A

26

A atividade industrial está se expandindo para novas áreas, a exemplo do sul


de Minas Gerais e o norte do Espírito Santo, onde a produção de celulose para a
fabricação de papel está modificando radicalmente a paisagem das cidades como
Aracruz (ES), que hoje depende diretamente dessa atividade econômica.
A agricultura da região também se destaca das demais do país. Por ser uma
agricultura moderna, com nível técnico avançado, está bastante integrada à
indústria. A Região Sudeste concentra a maior parte da producão agrícola
comercial voltada para a exportação.
O café, que no passado era produzido em São Paulo, hoje é o principal
produto de exportação do estado de Minas Gerais. A soja e a laranja também são
itens importantes no comércio exterior brasileiro. O Brasil é responsável pelo
fornecimento de cerca de 70% do consumo mundial de suco de laranja, cujo
maior produtor é o Estado de São Paulo.
O cinturão agro-industrial se expande em todas as direções, desde os
campos do Sul até os cerrados centrais. Ele avança em fronteiras ao longo dos
principais eixos rodoviários, estimulando o desenvolvimento de centros regio-
nais, capitais estaduais e da própria capital federal.
A agroindústria da Região Sul responde por uma boa parte da produção de
alimentos e matérias-primas do Brasil. O traço característico dessa agricultura
ainda é a média propriedade familiar, na qual o trabalho é realizado pela própria
família. Existem algumas áreas agrícolas muito especiais, nas quais predomina a
média propriedade familiar: a “serra” gaúcha com seus vinhedos, o noroeste do
Rio Grande do Sul com grandes áreas cultivadas com trigo e soja, e o oeste de Santa
Catarina, onde a produção de milho está associada à criação de aves ou de suínos.
A modernização, que se processou a partir de 1960, promoveu grandes
transformações nas condições dessa agricultura. Os médios proprietários se
viram obrigados a consumir cada vez mais os produtos industrializados: máqui-
nas, fertilizantes, sementes. Nem sempre os resultados foram compensadores e
muitos desses médios proprietários não têm conseguido pagar os empréstimos
bancários que fizeram.
Já as grandes empresas têm condições mais estáveis, por isso recebem maior A U L A
apoio do governo. A produção dessas grandes empresas está ficando cada vez mais
especializada. Mas, curiosamente, nesse processo que envolve modernização, espe-
cialização e industrialização, o Brasil, mesmo sendo um grande exportador de 26
produtos agrícolas, pode algumas vezes ter necessidade de importar alimentos.
No oeste de Santa Catarina, grandes indústrias, como a Sadia e a Perdigão,
estão entrosadas com as médias propriedades produtoras da matéria-prima que
essas indústrias vão processar. O mesmo acontece em Santa Cruz do Sul, onde
os médios proprietários, que produzem fumo, estão ligados às grandes indús-
trias produtoras de cigarros.
A Campanha Gaúcha, no Rio Grande do Sul, além das grandes propriedades
que se dedicam à pecuária de corte, desenvolveu, no vale do rio Jacuí, uma
importante área agrícola. Grandes propriedades mecanizadas, com modernas
técnicas de irrigação, dedicam-se à produção de arroz.
A valorização econômica do Centro-Oeste é recente. A transferência da
capital federal para Brasília, em 1960, exigia que a região estivesse integrada de
modo mais eficiente às demais regiões do país.
A grande metrópole regional do Centro-Oeste é Brasília. Com cerca de
2 milhões de habitantes distribuídos pelo plano-piloto e pelas cidades satélites,
Brasília é um centro de prestação de serviços. As atividades ligadas às funções
políticas, administrativas e comerciais dominam a vida da cidade.
O Centro-Oeste foi a região brasileira de maior dinamismo no período
recente. Suas condições naturais favoráveis, associadas à expansão econômica
do país nessa direção, fizeram da região uma importante área agrícola.
Seu ritmo de crescimento acelerou-se a partir de 1975, quando se iniciou o
avanço da agricultura tecnificada sobre os cerrados.
Mas não apenas as transformações no campo justificam esse desempenho,
pois o papel das cidades também foi muito importante. Elas ampliaram
e diversificaram suas atividades e passaram a dar suporte material e financeiro
à agricultura e a atuar como centros de processamento industrial, de comer-
cialização e administração do complexo agroindustrial.
As condições de clima e de solo, além do relevo muito plano, permitiram o
uso de técnicas de cultivo modernas e de tratores e equipamentos agrícolas no
aproveitamento da terra.
As grandes propriedades que se instalaram na região cultivam cereais (milho,
arroz e, mais recentemente, trigo) e oleaginosas (amendoim e, em especial, soja).
Essas modernas propriedades agrícolas investem capital na seleção de sementes, nas
técnicas de irrigação e na aplicação de fertilizantes para aumentar sua produção.
No entanto, a aparente estabilidade dessa agricultura é enganosa. Ela
depende dos preços do mercado internacional, uma vez que sua produção
destina-se, cada vez mais, à exportação, e seu endividamento com os bancos,
causado pelas altas taxas de juros, dificulta novos investimentos.
Apesar disso, o crescimento da produção agrícola no Centro-Oeste tem sido
significativo. Ele acontece por dois motivos: aumento do rendimento por hectare
das áreas já em utilização e implantação de novas áreas de colonização ao longo
dos eixos rodoviários, principalmente no Mato Grosso.
A modernização que transformou a agricultura também se deu na pecuária
de corte. As grandes fazendas de criação de gado adotam técnicas modernas,
como a inseminação artificial que melhora a qualidade do rebanho, as vacinas
para evitar a febre aftosa e a brucelose, e a melhoria das pastagens com o plantio
de espécies mais resistentes e que forneçam mais alimento para o gado. Além dos
cerrados do planalto, outra área de pecuária importante é o Pantanal.
A U L A É importante deixar claro que o padrão de expansão agrícola do Centro-
Oeste é radicalmente distinto daquele que prevaleceu no Nordeste ou no Sul.

26 A pequena propriedade praticamente não existe como unidade produtiva nos


cerrados por uma razão muito simples: os custos dos insumos (matérias-
primas, horas trabalhadas, energia consumida e outros fatores que entram no
processo de produção) e dos equipamentos, para atingir economias de escala
que compensem os investimentos realizados, transformaram esta área no
território econômico da agro-indústria que é diferente do domínio agro-
mercantil nordestino, como veremos na aula seguinte.

Nesta aula você aprendeu que:

l o Centro-Sul é o cinturão agroindustrial do país. Ele é formado basica-


mente pelos Estados da Região Sudeste (SP, RJ, MG e ES) e Sul (PR, SC e RS)
pelos Estados de Goiás, Mato Grosso do Sul e o Distrito Federal, que
formalmente compõem a Região Centro-Oeste;
l nele encontramos áreas onde ocorreu uma verdadeira industrialização da
agricultura
agricultura, com uso o de máquinas, adubos e fertilizantes, e a especializa-
ção da produção, nas chamadas empresas rurais;
l o Centro-Sul possui a melhor infra-estrutura viária do país. A intensa
circulação de produtos e de pessoas, feita por uma densa rede de rodovias
e ferrovias, revela a forte integração e o dinamismo de sua área interna;
l também é a área mais urbanizada do Brasil, não só devido à industrialização,
mas destacadamente pela migração campo-cidade
campo-cidade, resultante de uma mo-
dernização da agropecuária.

Exercício 1
A industrialização e a urbanização do Sudeste, que contribuíram para a
formação de um importante núcleo econômico no Brasil, podem ser
responsáveis:
a) pelo agravamento dos desequilíbrios regionais de desenvolvimento no país;
b) pela ampliação e fortalecimento do mercado consumidor interno do país;
c) pela grande diferença de ocupação espacial existente no interior do país.

Exercício 2
A concentração econômica determinou e elevou a aglomeração de população
e as atividades em grandes cidades. Qual a denominação desse processo?
Cite algumas dessas grandes cidades.

Exercício 3
O desenvolvimento da economia urbano-industrial refletiu-se na concen-
tração da produção e da força de trabalho e no crescimento do mercado
consumidor, em determinados pontos selecionados do território.
a) Cite dois exemplos importantes desse processo.
b) Diga quais são as suas origens.

Exercício 4
Apresente três fatores que aceleraram o crescimento econômico da Região
Centro-Oeste.
AUU
A L AL A

27
27
Nordeste: o domínio
agrário-mercantil

N esta aula, veremos por que o Nordeste é a


região que apresenta maiores desigualdades sociais, com um marcante nível de
pobreza e um alto nível de destruição ambiental. A estrutura agrária, marcada
pelo binômio latifúndio/minifúndio, e a dominação do capital mercantil sobre
a circulação das mercadorias são fatores históricos e geográficos que ajudam a
explicar o atraso dessa região.
Veremos também como os projetos industriais e agropecuários, incentiva-
dos pela Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), apesar
de terem integrado o Nordeste ao restante da economia nacional, não foram
capazes de romper o círculo vicioso da pobreza urbana e rural da região.

Qual o papel da estrutura agrária, fundada no binômio latifúndio/


minifúndio, para a permanência da pobreza rural e para o atraso no processo de
desenvolvimento do Nordeste? Por que a política de incentivos fiscais posta em
prática pelo Estado, por meio da Sudene, foi incapaz de reverter essa situação?
Historicamente, criou-se na região Nordeste uma estrutura agrária extrema-
mente concentrada e persistente, que monopoliza as melhores terras da Zona da
Mata e transfere o custo (e o prejuízo) das periódicas estiagens no Sertão semi-
árido, as secas, para os pequenos proprietários e parceiros (meeiros).
A política de incentivos fiscais da Sudene contribuiu para atrair indústrias
para a região, mas não foi capaz de gerar empregos na quantidade necessária, e
muito menos conseguiu alterar as condições de pobreza da maioria da popula-
ção nordestina.

O Nordeste é a área geoeconômica de povoamento mais antigo no Brasil.


Sua estrutura sócio-econômica está solidamente enraizada no passado agrário-
exportador.
Desde seu surgimento até hoje, essa tem sido a região de maior concentração
de renda no país.
A região se estende desde o Maranhão até a Bahia e está integrada ao
mercado nacional, participando com uma produção diversificada na industria-
lização regional. Apesar disso, o Nordeste ainda apresenta a maior concentração
nacional de pobreza, e tirá-lo dessa condição é um desafio para a conquista da
justiça social e para o resgate da cidadania.
A U L A

27

Quando observamos a evolução da participação da renda per capita das


regiões brasileiras, vemos que o Centro-Sul ultrapassa a média nacional e que
a Região Norte vem aumentando significativamente sua renda.
Entretanto, o Nordeste permanece quase nos mesmos níveis que apre-
sentava em 1940, apesar das políticas de desenvolvimento regional postas em
prática após 1959 - com a criação da Sudene, que tinha como principal
objetivo reduzir as disparidades regionais de renda entre o Nordeste e o
Centro-Sul.
Boa parte do atraso do Nordeste pode ser explicado pelo pacto regional que
domina a economia e a política da região. Esse pacto, ou seja, um grande acordo
político, coloca, de um lado, os grandes proprietários rurais que dominam o
acesso às melhores terras; de outro, o capital mercantil, isto é, os grandes
comerciantes que controlam os circuitos comerciais da região e procuram
valorizar suas atividades, valendo-se dos mais diversos recursos. Querem
manter o monopólio (controle exclusivo, sem concorrentes) sobre a venda de
mercadorias que vão desde alimentos até automóveis.
Essa associação entre grandes proprietários e comerciantes, que caracteriza
o domínio agrário-mercantil, tem revelado uma capacidade extraordinária para
se manter sólida, apesar da industrialização, da metropolização de capitais -
como Salvador, Recife e Fortaleza - e da modernização da agricultura.
Utilizando os mais variados meios para negociar favores com o Estado, o
chamado regionalismo nordestino resiste a mudanças substanciais na sua base
de sustentação social e política, conservando uma estrutura particularmente
perversa - e destoante das demais regiões - de distribuição de renda, apesar dos
expressivos avanços econômicos ocorridos no período recente.

A Região Nordeste pode ser dividida em quatro sub-regiões, diferenciadas


entre si: a Zona da Mata, o Agreste, o Sertão e o Meio-Norte.

A Zona da Mata é a mais úmida e tem solos férteis. Estende-se ao longo do


litoral, desde o Rio Grande do Norte até o sul da Bahia. Nessa área está
concentrada a maior parte da população da região, principalmente em grandes
cidades, como Recife e Salvador.
Três núcleos econômicos im- A U L A
portantes podem ser identifica-
dos na Zona da Mata. O litoral
açucareiro, que se estende desde 27
Alagoas até o Rio Grande do Nor-
te, onde predomina a grande pro-
priedade produtora de cana-de-
açúcar. Recife é a principal me-
trópole do litoral açucareiro, e lá
estão instaladas várias indústri-
as têxteis e alimentares.
A segunda área é o Recôn-
cavo Baiano, que se situa ao redor
da Baía de Todos os Santos, onde
está Salvador. Tem como princi-
pais atividades econômicas a ex-
tração de petróleo e as indústrias
petroquímicas no Pólo Petroquí-
mico de Camaçari, principal cen-
tro industrial da Região Nordeste.
A terceira área é o sul da Bahia, onde predomina o cultivo do cacau em
grandes propriedades monocultoras; os centros regionais mais importantes são
Ilhéus e Itabuna.

O Agreste se caracteriza por ser uma área de transição entre a Zona da Mata
e o Sertão. A região é marcada pelo Planalto da Borborema. Do lado leste do
planalto estão as terras mais úmidas; do outro lado, em direção ao interior, o
clima vai ficando cada vez mais seco.
A estrutura fundiária do Agreste é bem diferente da estrutura das demais
sub-regiões. Ela é basicamente formada de pequenas e médias propriedades.
Outra característica que marca o Agreste é a policultura (cultivo de vários
produtos agrícolas), muitas vezes associada à pecuária.
Grandes feiras de alimentos e de gado deram origem a cidades importantes
do Agreste, como Caruaru (PE), Campina Grande (PB) e Feira de Santana (BA).

O Sertão é uma área de clima semi-árido, com escassez e irregularidade de


chuvas. É nessa área que ocorrem períodos de seca que podem durar meses ou
até anos. O Sertão abrange parte de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte,
Alagoas e quase todo o Ceará, isto é, a maior parte do Nordeste.
A vegetação característica do Sertão é a caatinga, formada por pequenas
árvores, em geral espinhosas, que perdem as folhas durante a seca; ali também
nascem plantas de folhas grossas, chamadas de plantas suculentas.
A atividade econômica predominante é a pecuária extensiva em grandes
latifúndios. Em algumas áreas nas quais ocorrem chuvas de relevo, próximas às
serras e chapadas, desenvolve-se uma agricultura de subsistência, com o cultivo
de feijão, milho e cana-de-açúcar. A região do Cariri, por exemplo, localizada na
encosta da Chapada do Araripe no Ceará, é uma importante área agrícola.

O coronelismo, isto é, a concessão de favores políticos e econômicos aos


grandes proprietários em troca de voto, principalmente no Sertão semi-árido, é
um dos motivos que explicam a persistência do que ficou conhecido como
“indústria da seca”.
A U L A A construção de açudes no Polígono das Secas - que
é a área definida pelo Departamento Nacional de Obras

27 Contra as Secas (DNOCS) como sujeita à ocorrência de


estiagens periódicas - é feita muitas vezes dentro de
grandes fazendas, sem o menor critério social. Assim, o
controle sobre a terra permite o controle sobre a água do
Sertão, o que é fundamental para a manutenção dos privi-
légios que atrasam o desenvolvimento da região.
Percebemos, dessa maneira, que a seca influencia de
forma diferente a vida dos vários grupos de população. De
um lado existe o grande proprietário, que tem acesso ao
maquinário, à tecnologia e à irrigação para manter sua
produção; de outro, existem os pequenos produtores ru-
rais, que baseiam seu trabalho na agricultura de subsistên-
cia, e também os que trabalham como meeiros nas grandes
fazendas. Estes últimos sofrem tanto nos períodos de seca,
que muitas vezes são obrigados a deixar a região.
Hoje existem diferentes técnicas para manter a produ-
ção na zona semi-árida. Na região do vale do Rio São Francisco estão sendo
cultivados produtos como a uva, a cebola, o melão e outros. Essas culturas são
possíveis por causa dos grandes investimentos em irrigação, técnica que utiliza a
água acumulada para manter a produção durante os longos períodos de estiagem.
Iniciativas como essas mostram que é possível produzir no Sertão nordesti-
no e que o grande potencial da região não pode e não deve ser descartado. Uma
melhor distribuição de terras, e conseqüemente, da renda, pode dar ao Nordeste
um novo impulso econômico, fundamental para completar a integração da
região e seu desenvolvimento.
O Meio-Norte é também uma zona de transição, situando-se entre o Sertão e
a Amazônia. Apresenta um clima seco na sua porção próxima ao Sertão e um clima
mais úmido em sua porção próxima à Amazônia. Nos vales dos rios maranhenses
destaca-se a extração do babaçu, matéria-prima para a produção de óleo vegetal.
Essa área está cada vez mais integrada à Região Norte, especialmente pelo porto
de Itaqui, próximo a São Luís (MA), que funciona como grande terminal de
exportação de minérios provenientes da Serra de Carajás, situada no estado do Pará.
A proposta de industrialização da Região Nordeste, promovida pela
Sudene, facilitou a integração produtiva do domínio agrário-mercantil nordes-
tino à economia nacional. Mas foram os grandes projetos da década de 1970 que
criaram condições para o crescimento econômico da região, seja no Pólo
Petroquímico de Camaçari, nos arredores de Salvador, seja nos grandes proje-
tos de irrigação, ao longo do vale do São Francisco.
O Programa Nacional do Álcool (Proálcool) levou à modernização da
agroindústria canavieira nordestina, embora de forma diferente da que ocorreu
em São Paulo, porque o Nordeste dependia muito de fornecedores externos para
adquirir equipamentos industriais e insumos agrícolas.
Com o Proálcool, a luta pela terra e pela regulamentação dos direitos
trabalhistas assumiu novas formas. A herança das Ligas Camponesas, movi-
mento social de camponeses que explodiu na zona canavieira no final da década
de 1950, foi ampliada e unificada pelos conflitos resultantes da expansão
das plantações. Isso transformou os sindicatos de canavieiros em instrumentos
de luta pelos direitos sociais e trabalhistas e contra a expropriação das terras,
provocada pela modernização da agricultura.
A exploração de gás natural e petróleo realizada pela Petrobrás levou A U L A
à implantação de bases de apoio, terminais e instalações de beneficiamento
em vários pontos do litoral, como em Sergipe e no Rio Grande do Norte.
Mas os impactos dos grandes projetos sobre o Nordeste ainda são restritos. 27
É importante dizer que tais projetos forçam um melhor relacionamento entre
os grupos dominantes locais, o que nem sempre ocorreu porque alguns grupos
se beneficiam (ou julgam se beneficiar) de modo desigual do recebimento
de recursos oficiais.
Um ponto desvantajoso é que os efeitos sobre a estrutura produtiva são
limitados, pois em geral esses grandes projetos operam com máquinas e equipa-
mentos modernos que não requerem muita mão-de-obra. Desse modo, geram
poucos empregos, o que quase não contribui para o desenvolvimento regional.
Há, no entanto, efeitos externos que não são controlados pelos grandes
projetos. O mais importante deles é o surgimento de movimentos reivindicatórios
sociais e ecológicos, que passaram a ter importância nacional a partir do final
dos anos 70, exercendo pressões cada vez maiores sobre as autoridades locais,
em busca de melhorias nas condições sociais e ambientais.

Nesta aula você aprendeu que:

l o Nordeste é a área geoeconômica de povoamento mais antigo e de estrutura


sócio-econômica solidamente enraizada no passado agrário-exportador,
e permaneceu como a região de maior concentração de renda no Brasil;
l boa parte do atraso do Nordeste pode se explicado pelo pacto regional que
domina a economia e a política da região;
l a associação entre grandes proprietários rurais e comerciantes, que define o
domínio agrário-mercantil, tem revelado uma capacidade extraordinária
para se manter, apesar da industrialização regional;
l a proposta de industrialização regional promovida pela Sudene facilitou a
integração produtiva do domínio agrário-mercantil nordestino à economia
nacional;
l os impactos dos grandes projetos sobre o Nordeste ainda são restritos. Há,
no entanto, efeitos externos que não são controlados pelos grandes projetos.
O mais importante deles é o surgimento de movimentos reivindicatórios
sociais e ecológicos.

Exercício 1
Quais são as origens estruturais do atraso da Região Nordeste? Qual a
importância das secas para a pobreza da população nordestina?

Exercício 2
Quais os principais efeitos dos programas de desenvolvimento regional
conduzidos pela Sudene?

Exercício 3
Por que se multiplicaram os movimentos sociais e ecológicos na Região
Nordeste?
A UA UL L AA

28
28
Amazônia:
a grande fronteira

N esta aula vamos estudar a Amazônia


Amazônia,
a grande fronteira de recursos da economia brasileira no final do século XX.
Veremos como a ação do Estado estendeu as redes técnicas
técnicas, como a rede
rodoviária e a de telecomunicações, e promoveu o avanço do povoamento
e a ocupação de seu território. Vamos observar como os incentivos e subsídios
a projetos de mineração e agropecuários constituíram vetores de expansão
de empresas nacionais e multinacionais, gerando profundos conflitos pelo uso
do território na grande floresta amazônica.

Qual a importância da Amazônia como fronteira de recursos neste final de


século? Qual a origem dos interesses internacionais sobre a grande floresta?
A Amazônia é um dos últimos grandes e ricos espaços pouco povoados
do planeta e representa imensa disponibilidade de recursos que estão se
tornando escassos: terras, águas, minérios e florestas. Essa imensa e conflitiva
região é, ao mesmo tempo, um potencial e um desafio para o desenvolvimen-
to brasileiro. Concentra um grande estoque de riqueza. No entanto, pode ser
rapidamente destruída se não for corretamente utilizada.
A Amazônia é o lugar onde devemos avaliar nossas experiências passa-
das de uso dos recursos naturais e o palco para que busquemos novas
alternativas de desenvolvimento, com maior justiça social e qualidade
ambiental.

A construção de Brasília e da rodovia Belém-Brasília marcou a abertura da


fronteira de recursos no Norte rumo ao dinâmico centro nacional do Sudeste.
A criação de gado difundiu-se pelo norte de Goiás, acelerando a expansão da
frente pioneira. Essa frente, além da descoberta e extração comercial de recursos
minerais, como a exploração de manganês no Amapá e de cassiterita
em Rondônia, criou núcleos urbanos e enclaves econômicos na vasta floresta,
que permaneceu muito pouco ocupada.
A Amazônia assume hoje a expressão básica das fronteiras. Como não A U L A
havia organizações sociais já instaladas, que poderiam oferecer resistência,
o governo federal assumiu diretamente a iniciativa da ocupação e da integração
da Amazônia à economia nacional. Instalou redes técnicas
técnicas, como estradas 28
de rodagem e redes de distribuição de energia e redes de telecomunicações
telecomunicações,
em tempo acelerado e numa escala gigantesca, que transformaram parte
das antigas regiões Centro-Oeste e Nordeste e toda a região Norte numa
grande fronteira nacional, aberta para a ocupação.
Essas iniciativas abriram verdadeiros vetores de expansão na área da
floresta, que estimularam a colonização dirigida, como ocorreu em Rondônia,
e a colonização espontânea, como no caso do norte de Mato Grosso. Esses
vetores de expansão também favoreceram a implantação de grandes projetos
agropecuários e mineradores.

O Programa de Integração Nacional (PIN), proposto pelo Governo Federal


no início da década de 1970, previa a construção do primeiro trecho da rodovia
Transamazônica. Em 1973 foi inaugurada a rodovia Cuibá-Santarém, ligando
as regiões Centro-Oeste e Norte. Ao longo das rodovias pretendia-se implantar
assentamentos de trabalhadores para a produção agrícola, chamados de
agrovilas
agrovilas, cujo objetivo era atrair população do Nordeste e das grandes
cidades.
Programas e projetos promovidos pelo Estado, por meio da Superinten-
dência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e pelo Polonoroeste,
ainda que nem sempre tenham sido implantados, provocaram um imediato
aumento do valor da terra e a intensificação dos conflitos sociais, fatos
incompatíveis com as relativamente baixas taxas de investimento, ocupação
e produção. Em 1980, apenas 24% da área total da região estava ocupada por
unidades produtivas, representando 7% das terras cultivadas no país. Mais
de seiscentos projetos agro-pastoris de grandes empresas, nacionais e estran-
geiras, foram subsidiados mas só 20% deles foram de fato instalados.
Os núcleos urbanos estão restritos às áreas ao longo das principais
rodovias. Zonas de criação de gado e de agricultura comercial, situadas nas
margens da floresta, foram criadas ao longo da Belém-Brasília, favorecendo
o crescimento da grande metrópole regional, Belém, e das capitais estaduais
que ligam a Amazônia ao Centro-Sul.
Na década de 1970 foi criada a Eletronorte, com o objetivo de aproveitar
o potencial da região para a produção de energia hidrelétrica. A maior das
usinas hidrelétricas da Região Norte (e a segunda maior do Brasil) é a de
Tucuruí, situada na região do Projeto Grande Carajás, com capacidade para
a geração de 8 milhões de quilowatts. As hidrelétricas amazônicas são
responsáveis pela inundação de grandes áreas florestais, já que o relevo
é pouco acidentado.

A produção de energia elétrica favoreceu a implantação de grandes


projetos de exploração mineral, montados em verdadeiras “company-towns”
(cidades-empresas) construídas no interior da floresta.
Criados por meio de “joint-ventures” (associações de empresas diferen-
tes para explorar determinado produto ou mercado) com capitais estatais e
privados, nacionais e multinacionais, os grandes projetos contribuíram para
internacionalizar grandes territórios no interior da floresta. Exemplos disso
são o Projeto Jari, no Amapá; a Mineração Rio Norte e o Projeto Grande
Carajás, estes últimos no Pará.
A U L A Por causa da recessão mundial do início dos anos 80, o investimento estran-
geiro foi muito menor do que o esperado. Dos seis grandes projetos implantados

28 na Amazônia somente um é totalmente estrangeiro: o da Alcoa-Billington . Essa


empresa montou a Alumar, junto ao Porto de Itaqui, próximo a São Luís no
Maranhão, e é o maior investimento estrangeiro já feito no Brasil.
Na Região Norte, a empresa mais importante é a estatal Companhia Vale do
Rio Doce (CVRD). O minério de ferro permanece como o mais importante ramo
de atividade da Companhia Vale do Rio Doce. As reservas conhecidas somam
cerca de 38 bilhões de toneladas. Cerca de 90% das jazidas são mineradas a céu
aberto, e o minério não exige complexas operações de beneficiamento. As
recentes descobertas de ouro e cobre confirmam as previsões de que a região de
Carajás é uma das maiores províncias minerais do mundo.

A CVRD opera um sistema integrado mina-ferrovia-porto, o Sistema Norte,


com capacidade de produção de até 35 milhões de toneladas de minério. Esse
sistema é formado pelas minas de Carajás, localizadas no sul do Estado do Pará,
com reservas de 18 bilhões de toneladas de minério de ferro de alto teor, pela
Estrada de Ferro Carajás e pelo terminal marítimo de Ponta da Madeira, em São
Luís, no estado do Maranhão. A privatização da CVRD deve abrir novas
possibilidades de investimento no Sistema Norte.

A porção da Região Norte do Brasil que está diretamente relacionada aos


Estados do Pará, Amapá, e Tocantins forma a Amazônia Oriental
Oriental. A ocupação
dessa área se deu a partir da abertura da rodovia Belém-Brasíla e foi consolidada
com os grandes projetos agrícolas e mineradores.
Os conflitos pela posse de terra entre posseiros e grandes proprietários são
marcantes, fazendo dessa área a porção do país onde é maior a ocorrência de
conflitos fundiários. Em meio a esses conflitos estão as populações indígenas,
que também sofrem com a ocupação de suas terras pelos grandes projetos,
como a passagem de rodovias e ferrovias ou a atividade dos garimpeiros em
suas terras.
A Amazônia Ocidental engloba os estados do Amazonas, Rondônia, Roraima A U L A
e Acre. A abertura da rodovia Cuiabá-Porto Velho, em 1973, e a instalação do
Polonoroeste, em 1981, levaram para a região muitos agricultores, que seguiram
a rodovia aberta no noroeste de Mato Grosso. 28
Em 1967, foi criada a Zona Franca de Manaus
Manaus, uma área livre de impostos
alfandegários para os produtos importados. Ali se estabeleceram diversas
fábricas montadoras de produtos eletroeletrônicos, cujos componentes são,
em geral, importados. E essas montadoras criaram um mercado de trabalho
e são responsáveis por uma parte importante do emprego industrial da
Região Norte.
A Zona Franca de Manaus estimulou o crescimento da capital do Estado do
Amazonas, concentrando a produção nacional de produtos eletroeletrônicos
em seu Distrito Industrial. Isso atraiu boa parte da população do Estado,
que passou a se aglomerar na periferia de Manaus. Mas o desenvolvimento
da infra-estrutura urbana não acompanhou a velocidade do crescimento
da cidade.
Outra importante área da Amazônia Ocidental é a região seringueira do
Acre, cuja principal atividade econômica é o extrativismo vegetal. Os proble-
mas sociais nessa região são imensos. Existem inúmeros conflitos entre os
grandes latifundiários e os seringueiros. Para defender a terra e os recursos
florestais de uma prática econômica predatória e pouco produtiva, que é a
pecuária extensiva, os seringueiros usam estratégias de combate ao avanço da
especulação de terras e aos desmatamentos que reduzem sua área de trabalho.
O em
empp ate é a principal estratégia: envolve toda a comunidade, que se reúne na
frente das áreas a serem desmatadas, enfrentando os grandes proprietários,
interessados em aumentar suas áreas de pastagens.
Durante a década de 1980, um grande número de agricultores chegou a
Rondônia disposto a se fixar na Amazônia, aproveitando os incentivos para a
colonização oferecidos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (Incra).

Da estratégia de ocupação regional resultaram também intensos conflitos


sociais e ecológicos. Com a expansão da pecuária, da exploração florestal e da
mineração, verificou-se um desmatamento a uma taxa muito elevada. Estima-
tivas do total desmatado na década de 1980 são conflitivas e vão de 12%
(equivalentes a 598.921 km2), 8,2% (equivalentes a 399.765 km2) até 5,1%
(equivalentes a 251.429 km2).

As tentativas de integração da Região Norte à economia nacional, embora


tenham revelado inúmeros erros, acabaram por colocar a questão amazônica
na ordem do dia. Hoje se sabe que precisamos aprender muito mais sobre a
Amazônia. Assim, devem ser encontradas novas alternativas para a utilização
de seus recursos florestais, de modo que evitem danos irreversíveis sobre o
ambiente.

A efetiva participação da Região Amazônica no cenário econômico nacio-


nal deve se basear na pesquisa científica, para que sejam criadas técnicas
compatíveis com as peculiaridades do ambiente e definidas as áreas de preser-
vação e conservação, buscando-se formas de desenvolvimento sustentável
sustentável,
em que sejam mantidas as condições naturais da floresta amazônica, conforme
veremos na próxima aula.
A U L A Nesta aula você aprendeu que:

28 l

l
a construção de Brasília e da rodovia Belém-Brasília marcou a abertura da
fronteira de recursos do Norte ao dinâmico centro nacional do Sudeste;
a Amazônia assume hoje a expressão básica das fronteiras, em que o
governo federal assumiu diretamente a iniciativa de sua efetiva ocupação
e integração à economia nacional, implantando redes técnicas em tempo
acelerado;
l essas iniciativas abriram verdadeiros vetores de expansão na área da floresta,
que estimularam tanto a colonização dirigida como a espontânea;
l os núcleos urbanos estão restritos às áreas ao longo das principais rodovias.
Zonas de criação de gado e agricultura comercial situados nas margens da
floresta foram criados ao longo da Belém-Brasília, favorecendo o crescimen-
to de Belém;
l em 1967, criou-se a Zona Franca de Manaus e estabeleceram-se diversas
fábricas montadoras de produtos eletroeletrônicos;
l da estratégia de ocupação regional resultaram também intensos conflitos
sociais e ecológicos
ecológicos, entre índios, garimpeiros, colonos, grandes empresas
e outros;
l a efetiva inserção da Região Amazônica no cenário econômico nacional deve
estar baseada nas propostas de desenvolvimento sustentável
sustentável.

Exercício 1
Durante muito tempo, a economia da Amazônia esteve pouco articulada
com a economia nacional. Apresente duas ações do Estado que facilitaram
a integração da produção regional ao restante do país.

Exercício 2
Qual a importância da Zona Franca de Manaus para a economia da Amazô-
nia, e quais os seus resultados sobre a distribuição da população no Estado
do Amazonas?

Exercício 3
Em que estados se localiza a ferrovia que liga Carajás ao porto de Itaqui?
Qual a finalidade da sua construção?
AUU
A L AL A

29
A sustentabilidade 29
do desenvolvimento
brasileiro

N esta aula, veremos como as alternativas de


retomada do desenvolvimento no Brasil estão ligadas a uma maior eqüidade
(igualdade) na distribuição da renda nacional. Veremos que a reforma agrária
é uma necessidade para se obter a redução da pobreza e que estratégias
econômicas devem buscar a valorização da sustentabilidade no uso dos recur-
sos naturais, levando em conta a importância de se utilizar de maneira racional
o imenso estoque de biodiversidade de que dispomos, como elementos decisi-
vos para a construção de um futuro melhor para os brasileiros.

Qual o significado de desenvolvimento sustentável? Qual a sua importância


para superar os impasses atuais para a retomada do desenvolvimento no Brasil?
O desenvolvimento sustentável está vinculado, em sua forma e em seu
conteúdo, a uma base ambiental e ao processo eficiente de aproveitamento dos
recursos ecológicos. Ambiente e economia podem, e devem, ser mutuamente
reforçados para o verdadeiro desenvolvimento social.
Os conflitos pela posse da terra no Brasil atual podem ser vistos como um
problema de desenvolvimento sustentável, pois o acesso à terra representa, na
realidade, o acesso ao abrigo e ao sustento. Por isso, deve-se compreender que
a questão da reforma agrária e dos sem-terra não é apenas um ajuste de contas
em relação ao passado, mas também a busca de alternativas para a construção
do futuro.

O Brasil pertence ao grupo de países que completou sua industrialização


recentemente, isso quer dizer depois da Segunda Guerra Mundial. Esse processo
teve custos elevados.
Primeiro, o custo ambiental
ambiental, já que o país utilizou de forma predatória os
recursos naturais, sem qualquer consideração sobre se tais recursos poderiam
ser renovados ou não. As florestas, os solos e as jazidas minerais foram exauri-
dos, enquanto os rios e mares foram poluídos ou contaminados em nome do
progresso.
Segundo, o custo social
social, pois o Brasil não teve a menor preocupação com os
efeitos do crescimento econômico sobre as condições de vida das famílias que
viviam no campo e na cidade, bem como sobre a condições em que se dava
a distribuição social dos frutos do processo de industrialização.
A U L A O crescimento econômico não foi compartilhado por todos os brasileiros,
isto é, não houve eqüidade na distribuição de seus resultados. Podemos

29 verificar isso de forma muito simples, utilizando a divisão do PIB por habitante
enda per capita
do Brasil, para obter a sua renda capita. Hoje, o valor da renda per capita
anual no Brasil é de cerca de 3 mil dólares por habitante, o que é menos da
metade do valor encontrado na Argentina (6.015 dólares) e muito inferior à dos
Estados Unidos (23.240 dólares).
Atualmente, esse quadro está ainda mais grave, pois, na década de 1980,
a economia brasileira cresceu muito lentamente. Em primeiro lugar, por causa
da crise da dívida externa
externa, isto é, a dificuldade do país em pagar os emprésti-
mos tomados no exterior, cujo valor aumentou vertiginosamente com a eleva-
ção das taxas de juros pelos bancos estrangeiros. Em segundo lugar, porque a
economia brasileira viveu dificuldades internas que se manifestaram em altas
taxas de inflação. A combinação desses dois fatores praticamente paralisou a
economia brasileira durante os anos 80.
O gráfico ao lado
mostra que, embora o
PIB do Brasil tenha
crescido durante a dé-
cada de 1980 (o que
pode ser notado pelas
colunas do gráfico,
cujos valores, lidos no
eixo da esquerda, mos-
tram que passou dos
400 bilhões de dólares),
a renda per capita per-
maneceu praticamen-
te estagnada em torno
de 3 mil dólares (lidos
quando se acompanha
a linha cujos valores se
encontram no eixo da
direita).
Para que o desenvolvimento seja durável é necessária uma proposta que
tenha a sustentabilidade como meta principal, integrando as tensões ambiental,
econômica, social e institucional, em todas as etapas do planejamento, desde o
diagnóstico até a implementação, o monitoramento e a avaliação dos planos e
programas.
A questão agrária no Brasil permaneceu intocável desde o estabelecimento
da Lei de Terras, em 1850, que dividiu o território nacional em duas grandes
zonas: domínios e fronteiras, seguindo o padrão patrimonialista do colonizador
português, onde cabia ao aparelho de Estado regular as relações sociais, com o
controle do acesso à terra.
Enquanto principal divisão social e territorial do trabalho, a relação entre
domínios e fronteiras foi resultante direta da intervenção do Estado. Garantir os
domínios e abrir as fronteiras foi uma das principais atribuições do aparelho de
Estado no Brasil. Isso ocorreu com a Marcha para o Oeste no governo Getúlio
Vargas e atingiu o auge no modelo nacional-desenvolvimentista nos anos 50,
com a construção de Brasília por Juscelino Kubitschek, e foi levado ao extremo
com a conquista amazônica do período autoritário pós-1964.
Esse padrão de desenvolvimento esgotou-se na década de 1970, em grande A U L A
parte por causa da incapacidade financeira do Estado para administrar domí-
nios e fronteiras, e também porque ocorreram crescentes pressões da imensa
população urbana, mobilizada por diferentes movimentos sociais, que passa- 29
ram a cobrar sua representação no núcleo do poder. Hoje, a principal resultante
desse processo é a formação de uma economia industrial, construída num
ambiente em que coexistem uma sociedade de massas pobres, cristalizada no
interior dos domínios, junto com a maior floresta pluvial do planeta, expressão
máxima das fronteiras.
Cerca de 1/20 da superfície ter-
restre, 1/5 da água doce, 1/3 das
florestas pluviais do globo e apenas
3,5 milésimos da população mundi-
al estão contidos na Amazônia, 63,4%
dos quais sob a soberania brasileira.
Apesar de sua imensa riqueza mine-
ral e madereira, o que lhe confere
hoje maior valor é a diversidade bi-
ológica, isto é, sua biodiversidade
biodiversidade,
que se expressa na grande varieda-
de de espécies vegetais e animais
existentes na floresta. Tamanha con-
centração de vida significa, por um
lado, um símbolo ecológico único e,
por outro, uma fonte primordial para
o desenvolvimento científico-
tecnológico, particularmente da
biotecnologia.
É preciso separar o que é mito e o que é História. Para a ciência mundial,
a Amazônia é ainda uma incógnita. Teorias sobre os efeitos da destruição da
floresta na circulação atmosférica terrestre - tais como o efeito estufa - são, até
o momento, hipóteses apenas, não comprovadas e baseadas no pressuposto da
destruição total da floresta. Na realidade, apesar do desflorestamento rápido
e extenso das últimas décadas, 85% da floresta ainda permanecem intactos, o
que coloca o desafio de seu manejo sustentado.
Mas a incógnita amazônica não se restringe à ciência e à tecnologia. Além do
problema ecológico, seu significado como instrumento de pressão para adesão
ao “Norte” reflete as próprias lutas e os conflitos de interesses entre os países
industrializados na redefinição de suas áreas de influência, depois da queda do
Muro de Berlim e da derrocada da União Soviética.
A disputa por hegemonia entre as potências fica exposta na polêmica sobre
a construção e pavimentação da Rodovia BR-364 que, ao fazer a ligação do
Estado do Acre ao Peru, completa a articulação com a Rodovia Transamazônica
e acelera a conexão com o Pacífico Sul, onde interesses japoneses são cada vez
mais intensos. Neste cenário, os Estados Unidos exercem pressão sobre o Japão
para não liberar recursos destinados ao término da rodovia, a fim de manter a
tradicional porta amazônica aberta para o oceano Atlântico e o mar do Caribe.
Entretanto, é inerente à questão nacional a dificuldade em definir e negociar
um novo padrão de desenvolvimento regional para a Amazônia, que leve em
consideração não apenas a dimensão ambiental, mas também o problema social.
Confrontados hoje com uma profunda crise econômica, diversos grupos sociais
procuram consolidar posições e territórios na arena amazônica.
A U L A Neste quadro, a questão da sustentabilidade do desenvolvimento
é inseparável do desafio da eqüidade na distribuição de seus frutos, o que

29 pressupõe a negociação de um novo pacto de poder. Nesse sentido, o acesso


à terra, como expressão básica do direito humano ao abrigo e ao sustento, é a peça
central de qualquer proposta conseqüente de resgate da cidadania e o ponto
de partida para a construção de um novo padrão de desenvolvimento no Brasil.
O acesso à terra e à possibilidade de administrar o território de forma
democrática constitui o principal desafio para a consolidação de um novo
padrão de desenvolvimento no Brasil. Isso está presente tanto nos conflitos
abertos das “invasões” nas cidades e campos ou nas lutas pela delimitação das
terras indígenas e reservas extrativistas da grande fronteira amazônica. Diferen-
temente de uma concepção clássica de reforma agrária, em que a proposta central
está em aumentar a produção agrícola, o processo de assentamento dos trabalha-
dores sem-terra deve ser visto como uma necessidade da distribuição da riqueza
acumulada e de garantia de uma via democrática de transição para o desenvol-
vimento sustentável.
O Brasil é uma parte integrante e inseparável da construção da economia
mundial em sua dimensão planetária. Sua posição como país de industrialização
recente revela a profunda instabilidade deste final de século. Suas dimensões
como uma potência regional sintetizam as contradições da crise que atravessa a
economia mundial no final do século XX. A busca de soluções por meio da
cooperação com os parceiros da América Latina é inevitável, como é o exemplo
do Mercosul, que veremos na aula a seguir.

Nesta aula você aprendeu que:

l o processo de industrialização no Brasil teve custos ambientais e sociais


elevados;
l o crescimento econômico não foi compartilhado por todos os brasileiros, isto
é, não houve eqüidade na distribuição de seus resultados;
l para que o desenvolvimento seja durável é necessária uma proposta que
tenha a sustentabilidade como meta principal, integrando no planejamento
as tensões ambiental, econômica, social e institucional;
l a Amazônia possui riqueza mineral e madereira, mas o que lhe confere hoje
maior valor é a diversidade biológica, isto é, sua biodiversidade
biodiversidade;
l o acesso à terra e à possibilidade de administrar o território de forma
democrática constitui o principal desafio para a consolidação de um novo
padrão de desenvolvimento no Brasil.

Exercício 1
Como você diferencia desenvolvimento social de crescimento econômico?
Em sua opinião, qual predominou no Brasil nas últimas décadas?
Exercício 2
Por que o desenvolvimento sustentável permite conciliar o combate
à pobreza com uma melhor utilização dos recursos ecológicos?
Exercício 3
Por que o desenvolvimento sustentável da floresta amazônica é tão impor-
tante para o desenvolvimento brasileiro?
AUU
A L AL A

30
30
O Brasil e a integração
latino-americana

N esta aula, veremos o papel do Brasil no


contexto latino-americano. Verificaremos como o Mercado Comum do Sul
(Mercosul) e o Tratado de Cooperação Amazônica (TCA) representam iniciativas
de integração regional
regional, que enfrentam dificuldades por causa dos diferentes
problemas internos dos países sul-americanos, mas que se apresentam como uma
das alternativas de cooperação inter-Estados diante do processo de globalização
globalização.

Qual o papel do Brasil na integração latino-americana? O que podemos


esperar do Mercosul e do Pacto Amazônico?
O princípio da união alfandegária pressupõe a adoção de um mesmo regime
tarifário para as nações que a integram, abolindo as barreiras entre elas e
apresentando-se como uma entidade única perante o comércio internacional.
No caso do Mercosul, o Brasil é a principal economia nacional a integrar a
união, seguido pela Argentina. E as possibilidades de sucesso dependem muito
das políticas internas de seus membros, que possuem inúmeras diferenças entre
si. Já o Tratado de Cooperação Amazônica (TCA), proposto em 1977, tinha por
objetivo o incremento do desenvolvimento regional e a defesa da ecologia, sob
a premissa de rejeitar qualquer tentativa de interferência externa na região.

Diante do processo de globalização da economia mundial e da formação dos


blocos econômicos supranacionais, e pela necessidade de melhorar e facilitar as
relações comerciais com os países do Cone Sul, o Brasil, o Paraguai, o Uruguai e a
Argentina firmaram o Tratado de Assunção (1991), destinado a aumentar a coope-
ração econômica e criar uma união alfandegária denominada Mercosul - Mercado
Comum do Sul Sul. O Chile (1995) e a Bolívia (1996) firmaram acordos tarifários
especiais com o Mercosul e podem ser considerados membros associados.
O Mercosul passou a vigorar em 1995, mas antes disso os países envolvidos
nesse tratado começaram a se estruturar em função das novas normas alfande-
gárias. Quando as tarifas alfandegárias são reduzidas ou eliminadas, os produ-
tos importados terão um preço bem próximo do produto nacional e, assim,
aumenta-se a competição. Numerosas empresas tiveram dificuldades em se
adaptar a essa nova situação e fecharam suas portas. Outras, modernizaram-se
e ganharam condições para competir no mercado externo, aumentando suas
exportações. Isso explica o crescimento significativo das relações comerciais
entre os países do Mercosul no período de 1990 a 1995.

51
A U L A COMÉRCIO EXTERIOR BRASIL / PAÍSES DO MERCOSUL - 1994

30

Fonte: Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo. Intercâmbio Comercial - Brasil X Mercosul.


Rio de Janeiro: MICT, 1995. Ministério da Fazenda. Secretaria da Receita Federal, 1994.

O Mercosul procura aumentar ainda mais as atividades econômicas dos


países membros, tanto na indústria como em serviços de transportes, comu-
nicação e energia, estimulando a formação de empresas binacionais. Muitos
problemas ainda precisam ser discutidos ou negociados. As dificuldades são
muitas, mas o interesse de superá-las torna possível o projeto de integração.
Os quatro países integrantes e os membros associados pretendem, por meio
do Mercosul, ingressar na economia mundial com o peso de um mercado de
cerca de 250 milhões de consumidores.
Um mercado com essas dimensões, que apresenta um PIB de mais de
800 bilhões de dólares, constitui uma realidade internacional de apreciável peso,
porque proporcionará um significatvo incremento à capacidade de negociação
internacional dos países membros. Esse peso se revela uma contrapartida indispen-
sável para os integrantes do Mercosul, num mundo em que os megamercados,
centrados na Europa Ocidental, no sistema Estados Unidos-Canadá-México e na
articulação do Japão com os “tigres” asiáticos, dominarão a economia internacional.
Antes do Mercosul, existiram tratados que não prosperaram, como a Asso-
ciação Latino-Americana de Livre Comercio (Alalc), criada em 1960, cuja meta
era a constituição de uma zona de livre comércio até 1980. Porém, as fortes
disparidades entre os países signatários e a instabilidade política e econômica
levaram ao fracasso da iniciativa. Posteriormente, um segundo acordo criou a
Aladi (Associação Latino-Americana de Integração). O intercâmbio comercial
do Brasil com a área da Aladi manteve-se estagnado, revelando os limites dessa
perspectiva de integração.
O Mercosul agrupa quatro parceiros extremamente díspares, do ponto de
vista do seu potencial demográfico e econômico. O Brasil e a Argentina são as
principais economias sub-regionais; o Uruguai e o Paraguai são economias
marginais e inteiramente dependentes dos vizinhos. Posteriormente, o Chile e
a Bolívia foram incorporados como membros associados do Mercosul. E esses
países também possuem muitas diferenças entre si.
Dadas as características próprias das duas principais economias que buscam
a integração - o Brasil e a Argentina -, os efeitos dos mercados unificados serão
particularmente intensos nos respectivos complexos agroindustriais. Desde a
metade dos anos 80, o Brasil vem aumentando significativamente suas importa-
ções de produtos agrícolas dos demais membros do Mercosul. Em 1985, a
Argentina, o Uruguai e o Paraguai eram responsáveis por cerca de um terço do
fornecimento de bens agrícolas importados pela economia brasileira. Com um
crescimento regular durante o último qüinqüênio, esse valor atingiu 60% em
1990, principalmente em trigo, milho, soja e derivados da pecuária.

52
Entretanto, os níveis de produtividade na agropecuária entre os países A U L A
signatários do tratado são muito diferenciados, o que obriga a medidas de ajuste
a médio e longo prazo para evitar o sucateamento generalizado de parcelas
ponderáveis do complexo agroindustrial. No caso brasileiro, isso afetaria prin- 30
cipalmente a estrutura produtiva da Região Sul, área consolidada de produção
de grãos, couros e frutos de áreas temperadas, sendo que a produtividade da
economia agrária argentina é superior à dos produtos brasileiros. A produtivi-
dade superior na agropecuária argentina repousa, em grande parte, em fatores
naturais de distribuição regular de chuvas e fertilidade dos solos. Assim, os
custos de produção de cereais e oleaginosas batem até mesmo os do Paraná,
estado brasileiro de mais elevada produtividade.

ARGENTINA E PARANÁ: CUSTOS DE PRODUÇÃO AGRÍCOLA E PRODUTIVIDADE

Produtividade(kg/ha) Custo unitário (dólar/t)


Produto
Argentina Paraná Argentina Paraná
Milho 4.000 3.240 185,36 192,75
Soja 2.500 2.040 141,00 306,07
Trigo 2.000 1.980 102,59 306,97
Fonte: P.R, Schilling, Mercosul - Integração ou Dominação.

No caso das indústrias, o parque industrial brasileiro, especialmente os


ramos mais modernos, opera com níveis de produtividade muito superiores aos
da Argentina. O atraso tecnológico argentino é maior que o brasileiro e a força
de trabalho brasileira é mais barata que a argentina. Além disso, as empresas
instaladas no Brasil têm economias de escala superiores, em função da maior
amplitude do mercado interno. A produção brasileira de aço é competitiva nos
mercados internacionais e opera em larga escala, enquanto a siderurgia argen-
tina não se modernizou na mesma velocidade.
É importante observar que as grandes empresas automobilísticas já estão
definindo estratégias de operação para atuar no mercado supranacional.
A Scania, cuja fábrica na Argentina já foi concebida dentro dessa visão, exporta
motores, eixos e outros componentes para a Scania do Brasil. Na mesma direção,
embora em menor escala, a Volkswagen possui um esquema de complementação
transfronteira, e desenvolveu um projeto de investimento, com valores supe-
riores a 200 milhões de dólares para a produção na Argentina, com previsão de
90% das vendas serem destinadas à montadora no Brasil. E mais: indústrias de
bens de consumo não-duráveis, como é o caso da produção de bebidas (basica-
mente cerveja) e de fumo, já penetraram largamente no mercado supranacional,
beneficiando-se de isenções de impostos e vantagens de escala adquiridas no
mercado nacional.
A condição indispensável para o funcionamento do Mercosul é uma
harmonização mínima das legislações financeiras e fiscais, que inclui também os
dois pequenos parceiros, Paraguai e Uruguai. O Paraguai, valendo-se de isen-
ções tributárias e alfandegárias, tornou-se um entreposto de contrabando
direcionado essencialmente para a classe média brasileira e um reexportador de
produtos agrícolas e madeira originários ilegalmente do Brasil. O Uruguai
liberalizou sua legislação financeira, atuando como um semiparaíso fiscal,
utilizado em negócios brasileiros e argentinos para a “lavagem de dinheiro”.
Práticas comerciais e financeiras deste tipo constituem obstáculos para a
concretização do mercado comum.

53
A U L A Para os trabalhadores, o Mercosul é uma realidade que deve ser tratada
com cuidado. De um lado, permite que as grandes empresas operem em escala

30 ampliada, sem se preocupar com a manutenção dos postos de trabalho, neste


ou naquele lugar. De outro, leva os sindicatos a conhecer novas realidades
sociais e a ampliar os limites das lutas pelas conquistas sociais. De qualquer
modo, o Mercosul já é uma realidade que precisa ser conhecida e pensada pelos
trabalhadores.
Outra tentativa brasileira de integração latino-americana é o Tratado de
Cooperação Amazônica (TCA (TCA), integrado pelos países cujos territórios fazem
parte da Bacia Amazônica. Firmado em 1977, o TCA ainda é um mecanismo de
cooperação destinado a ampliar o controle dos Estados integrantes sobre o
espaço amazônico, onde proliferam formas paralelas de poder, como o tráfico
internacional de drogas. Entretanto, dadas as dimensões do desafio que repre-
senta o desenvolvimento sustentável da floresta amazônica, é de se esperar que
se amplie a cooperação dos países no campo da ecologia e do desenvolvimento
científico-tecnológico.
A integração econômica na América Latina é um velho sonho da Comissão
Econômica para a América Latina (Cepal), que inspirou a criação da Alalc em
1960, cujo insucesso não pode ser atribuído unicamente aos seus formuladores,
que tentavam trazer, para o sul do Equador, um processo que tomava corpo na
Europa. Hoje, talvez, a experiência acumulada mostre que a integração
supranacional é uma necessidade diante do processo de globalização da econo-
mia mundial, tema que trabalharemos no módulo seguinte.

Nesta aula você aprendeu que:

l diante do processo de globalização da economia mundial e de formação


dos blocos econômicos supra-nacionais, o Brasil, o Paraguai, o Uruguai
e a Argentina formaram um tratado de cooperação econômica denomina-
do Mercosul - Mercado Comum do Sul Sul;
l o Mercosul agrupa quatro parceiros extremamente díspares
díspares, do ponto de
vista do seu potencial demográfico e econômico;
l tratados anteriores, como a Associação Latino-Americana de Livre Comér-
cio (Alalc), não prosperaram por causa das grandes disparidades entre os
países signatários e a instabilidade política e econômica;
l a condição indispensável para o funcionamento do Mercosul é uma
harmonização mínima das legislações financeiras e fiscais entre os países
membros;
l algumas empresas industriais estão definindo novas estratégias para
operar nesse mercado supranacional e os trabalhadores devem refletir
sobre as novas realidades trabalhistas criadas com o Mercosul;
l outra tentativa de integração latino-americana é o Tratado de Cooperação
Amazônica (TCA), integrado pelos países cujos territórios fazem parte da
Bacia Amazônica.

Exercício 1
A partir da observação dos meios de comunicação e transportes nos dois
mapas a seguir, avalie o que está expressando cada um, no que diz respeito
à integração do Cone Sul.

54
A U L A

30

Exercício 2
Os sucessivos fracassos de integração representados pela Alalc e pela Aladi
levaram ao lançamento do Mercosul.
a) Em que o projeto do Mercosul se distingue dos anteriores?
b) O sucesso do Mercosul poderá produzir importantes transformações nas
estruturas produtivas do Brasil e da Argentina. Comente essas possíveis
transformações.

Exercício 3
Justifique a convergência de interesses dos países membros e associados em
torno de um Mercado Comum.

55
A UA UL L AA

31
31 O meio
técnico-científico e
o papel da informação

N esta aula, abordaremos um dos aspectos


mais importantes das fronteiras da globalização: a aceleração do processo de
integração mundial, possível de ser realizado por intermédio das novas
tecnologias da informação.

Qual o papel da informação e de seu controle para os habitantes do planeta


Terra neste final de século? As telecomunicações fizeram a integração dos
diferentes lugares e reduziram o tempo necessário para produzir e circular
informações. Seja quando você entra na cabine de um banco eletrônico e, com
um cartão magnético, é capaz de retirar instantaneamente uma certa quantida-
de de dinheiro. Seja quando o caixa de uma cadeia de supermercados faz a
leitura do código de barras de um determinado produto ou mercadoria, e esse
código entra numa rede de informações que permite o surgimento instantâneo,
na caixa eletrônica, do preço do produto, assim como informa, simultaneamen-
te, para o setor de estoque, a redução de uma unidade daquele produto para
posterior reposição.
Essas mudanças só foram possíveis pela aplicação maciça da microeletrônica
na vida cotidiana, criando novas maneiras de organizar a produção e a
administração dos negócios. A informática e a telemática são exemplos
marcantes das formas atuais de organização do espaço geográfico no período
técnico-científico.

Uma das realidades mais extraordinárias do mundo atual é a velocidade


com que são transmitidas informações entre diferentes lugares, quer estejam
próximos quer distantes, fazendo deles lugares mundiais
mundiais. A comunicação e a
circulação de informações - dados, idéias ou decisões - ocorrem instan-
taneamente, no chamado tempo zero. Isso sem falar que essas informações
podem chegar, ao mesmo tempo, em vários lugares. Velocidade, instantanei-
dade e simultaneidade são características do que chamamos de meio técnico-
científico informacional
informacional.
Em 1982, o geógrafo Milton Santos, em seu trabalho intitulado Pensando A U L A
o Espaço do Homem, já alertava para o fato de que, das múltiplas denomina-
ções aplicadas ao nosso tempo, nenhuma é mais expressiva que a de período
tecnológico
tecnológico. Dizia ele que a técnica é um intermediário entre a natureza e o 31
homem desde os tempos mais remotos e inocentes da História. Mas, ao
converter-se num objeto de elaboração científica sofisticada, acabou por
subverter as relações do homem com o meio, do homem com o homem, as
relações entre as classes sociais e até mesmo as relações entre as nações.
Para Milton Santos, a ciência, a tecnologia e a informação, hoje, são a base
técnica da vida social, ou, em outras palavras, o meio técnico-científico
informacional é um meio geográfico no qual o território inclui obrigatoriamente
ciência
ciência, tecnologia e informação
informação.

Sem os equipamentos
computadorizados
não seria possível a
instalação de satélites
na órbita da Terra.

Nas últimas décadas, a revolução tecno-científica em curso se deu destaca-


damente no campo da microeletrônica e das telecomunicações, e ocorreu junta-
mente com a reestruturação da produção e do trabalho no sistema capitalista, da
economia internacional e dos territórios. A alta tecnologia permitiu a crescente
internacionalização da economia e a interpenetração das economias nacionais,
ou seja, a interpenetração do capital, do trabalho, dos mercados e dos processos
de produção baseados na informação. E, com isso, países e nações deixam de ser
unidades econômicas de nossa realidade histórica.
A economia capitalista, dominante no mundo, estimula a competição econô-
mica e força as empresas - principalmente as de grande porte - a buscarem a
eficácia, gerando com isso uma sucessiva revolução do trabalho, da técnica e dos
produtos. Sistemas cada vez mais aperfeiçoados de comunicação e de fluxos de
informações, junto com técnicas mais racionais de distribuição, tais como
empacotamento, controle de estoques e conteinerização, permitem a aceleração
das atividades e da circulação de mercadorias. Bancos eletrônicos e dinheiro “de
plástico” são inovações que agilizam os fluxos de dinheiro e permitem a
aceleração dos negócios nos mercados financeiros e de serviços, tanto nacionais
como internacionais.
A economia de mercado sempre buscou a redução das distâncias porque
isso significaria redução do tempo de produção, de circulação e de consumo de
mercadorias e, conseqüentemente, redução dos custos, pois, no sistema capi-
talista de produção, tempo é dinheiro. Grandes avanços foram feitos nesse
sentido, ao longo do século XIX e na primeira metade do século XX. Eram
inovações voltadas para a remoção das barreiras espaciais - uma questão
“deveras geográfica” na história das sociedades capitalistas.
A U L A Foi isso que aconteceu quando surgiram as estradas de ferro, o cabo
submarino, o telégrafo sem fio, o automóvel, o telefone, o rádio, o avião a jato

31 e a televisão que, ao formarem redes técnicas de circulação e comunicação,


permitiram (cada um a seu tempo e interligando-se aos demais) realizar
integrações territoriais, quebrando as barreiras físicas para o transporte
e para a circulação de matérias-primas, de bens produzidos, de pessoas,
de idéias, de decisões e de capital. Mas nenhuma dessas inovações compri-
miu tanto o espaço, acelerando o processo de integração, como as novas
tecnologias da informação
informação.

Antena parabólica, ligada aos satélites de comunicação, no Alasca.

Hoje ocorre um aumento significativo na densidade das redes de circulação


e de comunicação. E essas redes podem se superpor umas às outras, permitindo
simultaneamente a aceleração nos processos de integração produtiva, integração
de mercados, integração financeira, integração de informações. Mas, ao mesmo
tempo e perversamente, geram um processo de desintegração, pelo qual países
e nações são excluídos das vantagens propiciadas pela alta tecnologia da
informática, como ocorre, notadamente, com nações africanas.
No entanto, a exclusão não se dá apenas em relação às nações mais
pobres. Tal exclusão atinge também milhões de trabalhadores nas economias
de tecnologia mais avançada. Em países desenvolvidos, máquinas inteligen-
tes estão substituindo trabalhadores de escritórios e operários que, a cada
dia, engrossam as filas dos desempregados.
Como afirma Milton Santos, a tecnologia é um fator importante, mas ela,
por si só, não explica a História dos homens.

Nesta aula você aprendeu que:

l nossa vida cotidiana é hoje marcada pelas novas tecnologias da informação


informação;
l o meio geográfico é dominado pela ciência, pela tecnologia e pela
informação que chega veloz, instantânea e simultaneamente nos lugares
mundiais;
l embora os avanços técnico-científicos permitam a maior integração do
espaço mundial, homens, países e lugares são excluídos dessa integração.
Exercício 1 A U L A
A Terra encolheu?! A partir da figura, explique as inovações técnicas
responsáveis por esse processo, entre 1850 e 1930 e a partir de 1970.
31

As inovações técnicas têm


permitido uma progressiva
compressão da distância.

Exercício 2
A produção e a circulação mundial de mercadorias se expandem, sendo a via
marítima a opção para as trocas intercontinentais, cada vez mais valiosas e
volumosas. Em função disso, os portos sofreram profundas mudanças.
Antes localizavam-se preferencialmente junto aos aglomerados urbanos e
estimulavam sua expansão. Multidões de trabalhadores candidatavam-se
para carregar e descarregar os navios. Hoje, os maiores portos afastam-se das
grandes cidades e, em algumas zonas portuárias antigas, os armazéns vazios
foram transformados em áreas de lazer.

Quais os fatores responsáveis por essas mudanças?

Exercício 3
Relate uma experiência de seu cotidiano que esteja relacionada com a
tecnologia da informação.
A UA UL L AA

32
32 Robôs e engenheiros:
para onde vão
os operários?

N esta aula, vamos estudar como as mu-


danças nas tecnologias e formas de produção e na organização do trabalho -
que vêm ocorrendo nas últimas décadas, nos países desenvolvidos e naqueles
emergentes - alteraram as condições econômicas e espaciais do mercado de
trabalho e ameaçam um número significativo de trabalhadores com o desem-
prego ou com trabalhos apenas temporários.

Quais os efeitos das transformações que estão ocorrendo no processo


produtivo sobre o emprego e o salário dos trabalhadores? Como essas novas
formas de produzir mercadorias estão alterando a configuração do espaço
geográfico no mundo atual?
A aplicação da microeletrônica e da informática na produção industrial está
fazendo com que robôs e máquinas automatizados substituam milhares de
trabalhadores, exigindo uma qualificação cada vez maior daqueles que perma-
necem nas fábricas. Por sua vez, a reestruturação produtiva (nome que se dá a
esse processo de mudanças) está alterando a posição relativa das regiões,
fazendo com que aquelas que têm um parque industrial consolidado percam
posição para novas áreas, onde as novas formas de produzir estão sendo
implantadas.

Hoje, um fantasma ronda a vida dos trabalhadores: o desemprego. Para


muitos estudiosos, trata-se de um desemprego estrutural, isto é, causado pelas
transformações que vêm ocorrendo no padrão ou modelo de desenvolvimento
produtivo e tecnológico que predomina nos países capitalistas avançados. Essas
transformações apresentam diferenças nos países onde ocorrem mas, de qual-
quer forma, estão alterando a organização do processo produtivo e do trabalho
em todos eles e no resto do mundo também. E tais mudanças afetam o conjunto
do mundo do trabalho.
À primeira vista, os robôs ou as novas tecnologias de produção parecem ser
os únicos e mais cruéis causadores desse desemprego. No entanto, existem
outras razões de ordem econômica, social, institucional e geopolítica que,
associadas à tecnologia, formam um conjunto que explica melhor aquilo que,
para alguns analistas, significaria até mesmo o fim de uma sociedade organizada
com base no trabalho.
O sistema capitalista, como todo sistema econômico, sofreu transformações A U L A
ao longo de sua história. As mudanças podem ser profundas, acumular tensões
sociais e graves problemas econômicos, gerar crises, guerras e revoluções
políticas, mas o sistema permanece basicamente o mesmo, isto é, trata-se de um 32
sistema produtor de mercadorias cuja venda tem por objetivo o lucro. Por isso
o chamamos, indistintamente, de economia de mercado ou economia capitalista.
No entanto, para que as empresas capitalistas produzam mais e mais
mercadorias - com maior eficiência e melhores níveis de produtividade, ga-
nhando em competitividade em relação a outras empresas, e sempre que
possível obtendo lucros crescentes - elas precisam criar e aplicar novas técnicas
e novas formas de organização da produção e do trabalho, dividir funções com
outras empresas, negociar salários, estipular taxas de lucros etc.
Mas o capitalismo não se restringe apenas às unidades empresariais e suas
dinâmicas internas. Na sociedade como um todo, existem outros componentes
extremamente importantes que precisam ser levados em consideração, pois
interferem na vida das próprias empresas. Tais componentes podem ser as
formas institucionalizadas, como as regras do mercado, a legislação social,
a moeda, as redes financeiras, em grande parte estabelecidas pelo Estado,
ou ainda, as disputas pelo poder das nações, o comércio internacional, a renda
e o consumo de cada família, a qualidade dos recursos humanos, as convenções
coletivas, as idéias produzidas etc.
Quando esse conjunto de elementos, e muitos outros, é razoavelmente Interior de uma
ajustado e aceito pela sociedade (não se trata de um consenso pleno, pois sempre fábrica com linha
haverá oposições e tensões), estamos diante de um modelo de desenvolvimento de montagem
tradicional,
capitalista dominante, com uma organização territorial correspondente. E esse notando-se a
modelo permanece até que uma nova crise ocorra e novos rearranjos sejam feitos presença de
na sociedade e no espaço. muitos operários.
Após a crise de 1929, o modelo de desenvolvi-
mento que aos poucos passou a dominar nos paí-
ses de tecnologia avançada - Estados Unidos, Ja-
pão e em boa parte da Europa -, mantidas suas
especificidades, levou o nome de fordismo
fordismo, pois
nesse modelo foram incluídas formas de produção
e de trabalho postas em prática pioneiramente nos
Estados Unidos, nas décadas de 1910 e 1920, nas
fábricas de automóveis do empresário norte-ame-
ricano Henry Ford.
O fordismo teve seu ápice no período posterior
à Segunda Guerra Mundial, nas décadas de 1950 e
1960, que ficou conhecido na história do capitalis-
mo como Os Anos Dourados
Dourados.

A crise sofrida pelos Estados Unidos na década de 1970 foi considerada


uma crise do próprio modelo, que apresentava queda da produtividade e das
margens de lucros. A partir da década de 1980, esboçou-se nos países industri-
alizados um novo padrão de desenvolvimento denominado pós-fordismo ou
modelo flexível
flexível.

Para compreender as tendências do novo modelo - flexível - baseado na


tecnologia da informação, que vem ameaçando os empregos, é necessário
levantar, ainda que de forma simplificada, algumas características do fordismo
e algumas razões que levaram ao seu esgotamento:
A U L A l Período
Nos países de industrialização avançada, o fordismo surgiu a partir da crise

32 l
de 1929, atingindo o auge de dominação nos anos 50 e 60.
Avanços tecnológicos
O fordismo contou inicialmente com os avanços tecnológicos alcançados no
final do século XIX, como a eletricidade e o motor à explosão. Mais tarde
incorporou os avanços da alta tecnologia desenvolvida durante a Segunda
Guerra Mundial e que posteriormente passou para o uso da sociedade civil,
a exemplo dos materiais sintéticos e do motor a jato. E, finalmente, no pós-
guerra, começou a usufruir dos avanços científicos alcançados nas áreas
da eletrônica e da tecnologia da informação.
l Organização da produção
Nas grandes indústrias, longas esteiras rolantes levavam o produto semi-
acabado até os operários, formando uma cadeia de montagem. A produção
dos diversos componentes era feita em série. O resultado foi uma produção
em massa que utilizava maquinaria cara; por isso, o tempo ocioso deveria ser
evitado a todo custo. Acumularam-se grandes estoques extras de insumos e
mantinha-se alto número de trabalhadores para que o fluxo de produção não
fosse desacelerado. Os milhares de produtos padronizados eram feitos para
mercados de massa.
Os setores industriais mais destacados eram os de bens de consumo
duráveis (automóveis e eletroeletrônicos) e os de bens de produção
(destacadamente a petroquímica). Entre as décadas de 1940 e 1960 surgiu
uma interminável seqüência de novos produtos, a exemplo de rádios
portáteis transistorizados, relógios digitais, calculadoras de bolso, equipa-
mentos de foto e vídeo.
l Organização do trabalho
O trabalho passou a se organizar com base num método racional, conhecido
como taylorismo
taylorismo, que apresentava as seguintes características:
- separava as funções de concepção (administração, pesquisa e desenvol-
vimento, desenho etc.) das funções de execução;
- subdividia ao máximo as atividades dos operários, que podiam ser
realizadas por trabalhadores com baixos níveis de qualificação, mas
especializados em tarefas simples, de gestos repetitivos;
- retinha as decisões nas mãos da gerência.
Esse “método americano” de trabalho seguia linhas hierárquicas rígidas,
com uma estrutura de comando partindo da alta direção e descendo
até a fábrica. Os operários perderam o controle do processo produtivo
como um todo, e passaram a ser controlados rigidamente por técnicos
e administradores.
l Organização dos trabalhadores
Houve crescimento e fortalecimento dos sindicatos. Os contratos de traba-
lho começaram a ser assinados coletivamente. Os salários eram ascenden-
tes. E foram realizadas importantes conquistas de cunho social, tais como
garantias de emprego, salário-desemprego e aposentadoria.
l Mercado
Os mercados de massa ficavam garantidos por causa do aumento da
capacidade de compra dos próprios trabalhadores. Embora ocorresse uma
expansão dos mercados internacionais, eram os mercados internos que
garantiam o consumo da maior parte da produção. Surgia a sociedade de A U L A
consumo. Geladeiras, lavadoras de roupa automáticas, telefone e até
automóveis passaram a ser produtos de uso comum. Serviços antes
acessíveis a minorias, como no caso do setor de turismo, tranformaram-se 32
em serviços de massa.
l Papel do Estado
Ocorreu a ampliação e a diversificação da intervenção social e econômica
do Estado, inspirada nos princípios da teoria keynesiana e do Estado do
bem-estar social. O Estado nacional de caráter keyneisiano passou a
interferir mais diretamente na economia, por meio, por exemplo, dos
gastos públicos, dos planos de desenvolvimento regional, da criação de
um número significativo de empregos no setor público e do atendimento
às garantias reivindicadas pelos trabalhadores, a exemplo da garantia de
emprego. E o Estado do bem-estar social desenvolveu políticas destinadas
a reduzir as desigualdades sociais, como as de transportes urbanos, habi-
tação, saneamento, urbanização, educação e saúde.
l Organização do território
A organização da produção e do trabalho reorganizou o espaço geográ-
fico. O processo de urbanização acelerou-se. As unidades produtivas
atraíam umas às outras. Cresceram ainda mais as regiões industriais. As
cidades se tranformaram em grandes manchas urbanas. Surgiram novos
bairros residenciais e distritos industriais com o apoio e incentivo esta-
tais. Cresceram a construção civil e a massa construída de casas e prédios,
em grande parte incentivadas por programas governamentais de hipote-
cas e empréstimos.
As metrópoles, com seus centros de negócios e de decisões constituídos
pelas sedes sociais das grandes empresas, incorporaram os municípios
vizinhos. Grandes regiões urbanizadas - as megalópoles - se formaram
entre duas ou mais metrópoles devido à polarização que tais centros
exerciam sobre as pequenas e médias cidades que se encontravam ao seu
redor. Intensos fluxos de pessoas e mercadorias integraram o conjunto
formado por essas cidades.
Em todas as cidades intensificaram-se o comércio, os tranportes, as
comunicações e os serviços em geral. As redes urbanas tornaram-se mais
densas. Diversificaram-se as atividades culturais e de lazer. Cresceram as
universidades e centros de pesquisa e tecnologia. Mais capitais e traba-
lhadores foram atraídos pelas cidades. A geografia do fordismo foi a das
grandes concentrações urbano-industriais.

O modelo fordista, que floresceu no pós-guerra, dependia da subida cons-


tante dos salários para manter o mercado ativo, ou seja, manter os níveis de
produção e de consumo crescentes. Porém, os salários não podiam crescer a
ponto de ameaçar os lucros empresariais; mantiveram-se os níveis salariais e os
lucros aumentando os preços dos produtos, o que gerou uma crise inflacionária.
Nos Estados Unidos, os gastos públicos se agigantaram, tanto interna como
externamente - a guerra do Vietnã foi um exemplo. A moeda americana ficou
debilitada. Esse país, que durante todo o período de domínio do fordismo
assegurava a estabilidade da economia mundial com base em sua moeda - o
dólar -, viu esse sistema monetário declinar. A competitividade da Europa e do
Japão superavam a dos Estados Unidos. Assistia-se a uma verdadeira guerra
comercial, que nunca deixou de crescer.
A U L A A partir da década de 1970, a saída foi investir num novo modelo que
rompesse com aquilo que era considerado a rigidez do modelo fordista. A ordem

32 era flexibilizar, ou seja, golpear a rigidez nos processos de produção, nas formas
de ocupação da força de trabalho, nas garantias trabalhistas e nos mercados de
massa, então saturados.
As empresas multinacionais, para restabelecer sua rentabilidade, expandi-
ram espacialmente sua produção por continentes inteiros. Surgiram novos
países industrializados. Os mercados externos cresceram mais que os mercados
internos. O capitalismo internacional reestruturou-se.
Os países de economia avançada precisaram criar internamente condições
de competitividade. A saturação dos mercados acabou gerando uma produção
diversificada para atender a consumidores diferenciados. Os contratos de trabalho
passaram a ser mais flexíveis. Diminuiu o número de trabalhadores permanentes
e cresceu o número de trabalhadores temporários. Flexibilizaram-se os salários -
cresceram as desigualdades salariais, segundo a qualificação dos empregados e as
especificidades da empresa. Em muitas empresas, juntou-se o que o taylorismo
separou: o trabalhador pensa e executa. Os sindicatos viram reduzidos seu poder
de representação e de reivindicação. Ampliou-se o desemprego.
Os compromissos do Estado do bem-estar social foram sendo rompidos
pouco a pouco. Eliminaram-se, gradativamente, as regulamentações do Estado.
As políticas keynesianas - que se revelaram inflacionárias, à medida que as
despesas públicas aumentavam e a capacidade fiscal estagnava - forçaram
o enxugamento do Estado.
A transformação do modelo produtivo começou a se apoiar nas tecnologias
que já vinham surgindo nas décadas do pós-guerra (automação e robotização)
e nos avanços das novas tecnologias da informação. O método de produção
americano foi substituído pelo método japonês de produção enxuta, que com-
bina máquinas cada vez mais sofisticadas com uma nova engenharia gerencial
e administrativa de produção - a reengenharia, que elimina a organização
hierarquizada. Agora, engenheiros de projetos, programadores de computado-
res e operários interagem face a face, compartilhando idéias e tomando decisões
conjuntas.
O novo método, rotulado
por muitos como toyotismo
toyotismo,
numa referência à empresa ja-
ponesa Toyota, utiliza menos
esforço humano, menos espaço
físico, menos investimentos em
ferramentas e menos tempo de
engenharia para desenvolver
um novo produto. A empresa
que possui um inventário
computadorizado, juntamente
com melhores comunicações e
transportes mais rápidos, não
precisa mais manter enormes
estoques. É o just in time.
O novo método permite variar a
produção de uma hora para
outra, atendendo às constantes
exigências de mudança do mer-
Fábrica com robôs. cado consumidor e das mudan-
ças aceleradas nas formas e técnicas de produção e de trabalho. A ordem A U L A
é manter estoques mínimos, produzindo apenas quando os clientes efetivam
uma encomenda.
As grandes empresas começaram a repassar para as pequenas e médias 32
empresas subcontratadas um certo número de atividades, tais como concepção
de produtos, pesquisa e desenvolvimento, produção de componentes, seguran-
ça, alimentação e limpeza. Isso passou a ser conhecido como terceirização
terceirização. Com
ela, as grandes empresas reduziram suas pesadas e onerosas rotinas burocráticas
e suas despesas com encargos sociais, concentrando-se naquilo que é estratégico
para seu funcionamento.
A produção flexível vem transformando espaços e criando novas geogra-
fias, à medida que ocorrem redistribuições dos investimentos de capital
produtivo e especulativo e, conseqüentemente, redistribuição espacial do
trabalho. Numerosas empresas se transferiram das tradicionais concentrações
urbanas e regiões industriais congestionadas, poluídas e sindicalizadas, para
novas áreas nas quais a organização e o poder de luta dos trabalhadores é
pouco significativa. Surgiram novos complexos de produção - os complexos
científicos-produtivos -, ligados a universidades e centros de pesquisa onde
as inovações são constantes.
Um caso exemplar desses complexos é o do Vale do Silício (Silicon Valley),
na Califórnia, cujo modelo se difundiu por vários países. Nesse complexo, a
Universidade de Stanford, juntamente com empresas do ramo da microele-
trônica, criou um parque tecnológico cuja fama cresceu com a produção de
semicondutores e o uso do silício como matéria-prima para sua fabricação. O
Vale do Silício faz parte de uma área maior em torno da baía de São Francisco
onde se estabeleceram numerosas indústrias de alta tecnologia.
Esses tecnopólos também são encontrados no interior das tradicionais
regiões industriais que vêm se modernizando, a exemplo da região industrial
de Frankfurt, na Alemanha, ou ainda daquelas que procuram sair de uma
situação de estagnação, como no caso da região de Turim, na Itália, ou de Lyon,
na França.

MAPA DOS ESTADOS UNIDOS - REGIÃO EM RECONVERSÃO . TECNOPÓLOS .


A U L A O sistema just in time exige também uma reorganização do território. As
firmas subcontratadas pelas grandes empresas se aglomeram em torno da

32 planta terminal de produção, criando um novo tipo de aglomeração produtiva.


Esse é o caso da fábrica da Volkswagen, instalada em Resende, no Estado do Rio
de Janeiro, que vem atraindo outras empresas que produzirão, no próprio
terreno da fábrica da Volkswagen, componentes utilizados na montagem de
ônibus e caminhões.
Sem nenhuma dúvida, vivemos hoje mudanças profundas que se refletem
no mundo do trabalho. Para os mais otimistas, a questão do desemprego
tecnológico será resolvida pela própria tecnologia avançada que estimulará o
surgimento de novos setores produtivos e de atividades humanas a ela ligados,
exigindo, assim, novos trabalhadores. Para outros, o sonho dos empresários de
fábricas sem operários está prestes a ser realizado.
Também nos setores agrícolas e de serviços, as máquinas substituem o
trabalho humano. Corporações multinacionais fazem notar que estão cada vez
mais competitivas, e ao mesmo tempo anunciam demissões em massa. A
questão que se coloca neste final de século é a seguinte: para onde vão os
trabalhadores? A resposta dependerá da posição assumida pelas sociedades
como um todo.

Nesta aula você aprendeu que:

l os dois modelos de desenvolvimento capitalista – o fordista e o flexível –


apresentam diferenças nas técnicas utilizadas, nas formas de produzir, na
organização do trabalho e dos trabalhadores, na organização do território,
no papel do mercado e do Estado;
l o modelo flexível
flexível, que tende a dominar nos países avançados e nos países
emergentes, ameaça um número significativo de trabalhadores com o
desemprego.
l as máquinas automáticas e os computadores assumem o lugar dos
trabalhadores. Estes já não têm tanta força política e reivindicatória como
antes; as indústrias se afastam das áreas onde eles se mantêm ainda
relativamente fortes; os mais qualificados ganham mais, porém os menos
qualificados são muito explorados; o mercado seletivo não lhes dá acesso a
qualquer tipo de produtos; o Estado já não os apóia como os apoiava e não
lhes garante os empregos permanentes.

Exercício 1
“Depois de lutar contra a exploração capitalista, os trabalhadores têm agora
que lutar contra a falta dela. Do sistema de exploração passa-se para uma
situação de exclusão porque os grandes centros capitalistas prescindem
cada vez mais do trabalho...”
Adaptado de Kurz, Robert. O Colapso da Modernização . Paz e Terra, 1992.

Com o auxílio do texto acima, explique por que os trabalhadores vivem, hoje,
uma situação de exclusão
exclusão.
Exercício 2 A U L A
Elaborar um quadro comparativo do fordismo e do pós-fordismo, contendo
os seguintes aspectos:
a) a remuneração dos trabalhadores; 32
b) a organização dos trabalhadores;
c) o papel do Estado;
d) a organização do espaço.

Exercício 3
A rápida ascenção da Toyota no mercado mundial de automóveis revela
a sua estratégia transnacional de operação, com unidades de montagem
de carros espalhadas por todo o mundo.

Com base no mapa responda:


a) Por que a maioria das unidades de montagem da Toyota está situada na
zona costeira dos diversos continentes.
b) Qual a importância da bacia do Pacífico na expansão transnacional das
firmas japonesas.
A UA UL L AA

33
33 O sistema financeiro
global e os limites
do Estado-nação

N esta aula, vamos estudar o que é o sistema


financeiro global, o que determinou seu surgimento e os problemas dele decor-
rentes. Vamos discutir até que ponto o Estado-nação vem perdendo poder
ou sentindo a necessidade de mudar seus regulamentos internos para sobreviver
e conviver nesse novo contexto internacional da globalização.

Qual o papel do sistema financeiro global, cujo campo de operações vai além
dos limites dos estados-nacionais? Quais os instrumentos de controle de que
dispõem os governos sobre as operações bancárias com títulos e moedas em
escala planetária? São elas operações lícitas ou simplesmente especulações
fraudulentas ou lavagem de dinheiro ganho ilegalmente?
Hoje, mais do que nunca, o poder dos grandes bancos e das grandes
empresas desafia os governos nacionais, propondo uma novo desenho político
e econômico para o espaço geográfico mundial, onde não exista limites, nem
controle, sobre a circulação dos capitais. No entanto, quais serão os efeitos desta
“nova ordem mundial” sobre a vida dos trabalhadores?

Nossa representação geográfica do mundo é a de um conjunto de Estados-


nações, cada um deles constituído por uma unidade territorial delimitada por
nações
fronteiras políticas, sobre a qual é soberano, e por uma unidade econômica
organizadora de seus assuntos internos e externos.
Os Estados-nações estariam sendo ameaçados pelo sistema financeiro glo-
bal - veloz, eletrônico, computadorizado, de tempo integral, indiferente às
fronteiras, ávido de lucros rápidos -, pelo qual enorme somas de capital entram
e saem dos países de acordo com o que de melhor possam lhe oferecer num dado
momento? Mas o que é esse sistema financeiro global?
Segundo nos explica a geógrafa Lia Osório Machado, em seu trabalho
O Comércio Ilícito de Drogas e a Geografia da Integração Financeira: uma
simbiose?, a economia de mercado funciona atualmente com a ajuda dos bancos
de investimento internacionais e dos mercados de capitais, isto é, de um sistema
de geração, compra e venda de crédito. Assim, quem controla o acesso ao
dinheiro, ao crédito - como no caso de governos, bancos, companhias de seguro
e operadores dos mercados financeiros - exerce um poder notável na conjuntura
internacional. Nas palavras de Lia Osório Machado, trata-se de um sistema
financeiro global
global, pois sua tendência recente é expandir-se cada vez mais
“liberado dos regulamentos de base territorial como aqueles do Estado-nação”.
O sistema financeiro global é um estágio mais avançado da internaciona- A U L A
lização da economia capitalista que remonta ao século XIX. Até 1970, o sistema
ainda se baseava na intermediação bancária que transformava os capitais
disponíveis e as poupanças privadas em créditos internacionais. Mas, a partir 33
da crise dos anos 80, esse sistema foi fortemente golpeado.

Hoje, o caráter globalizado do sistema financeiro se deve:

a) à acelerada e sempre crescente expansão dos fluxos financeiros internacio-


nais, o que resulta em forte impacto sobre as políticas monetária (quantidade
de moedas em circulação) e cambial (relação de valor entre a moeda nacional
e a moeda estrangeira) das economias nacionais;
b) à violenta disputa entre bancos e instituições financeiras (fundos de pensão,
companhias de seguros, administradoras de carteiras de títulos e de fundos
de investimento) para negociar serviços financeiros, o que leva à prolifera-
ção de mecanismos especulativos de ganhos de capital em detrimento do
uso de capital em investimentos produtivos;
c) aos investimentos virtualmente desimpedidos entre os mercados financei-
ros nacionais, ou seja, a uma maior integração financeira internacional, o que
significa oportunidades - mas também riscos - para os Estados nacionais,
principalmente aqueles de países emergentes.

Nos últimos dez anos, a globalização financeira movimenta um volume de


créditos nunca visto anteriormente na história do capitalismo. Somente no
período 1991-1996 o valor total do financiamento, na forma de empréstimos
bancários, emissão de bônus e ações, mais que duplicou, já tendo ultrapassado
1 trilhão de dólares. Hoje, a circulação média diária (24 horas) no mercado
internacional de câmbio (troca de moedas) chega a 2 trilhões de dólares. Isso sem
falar de outros mecanismos financeiros, atualmente utilizados, nos quais o valor
nominal negociado (o dinheiro não aparece, e sim a ordem de pagamento) já
ultrapassa a cifra de 20 trilhões de dólares. Grande parte desse volume de
dinheiro, de crédito, “cresce” descolado do volume de bens e serviços
comercializados no mundo. Cresce, então, por especulação
especulação, pois o que cresce é
o valor dos “papéis” negociados.
Os investimentos financeiros não têm correspondência com os investi-
mentos produtivos. Para alguns estudiosos, isso pode significar, se mantidos
os ritmos atuais dos fluxos financeiros, uma crise do sistema capitalista de
conseqüências inimagináveis. Trata-se de uma situação de “risco sistêmico”,
que pode criar desequilíbrios em cadeia, do tipo efeito dominó, e levar a uma
crise global.

Para o economista Reinaldo Gonçalves, em seu trabalho Ô Abre-alas -


A nova inserção do Brasil na Economia Mundial , as principais determinantes
para o atual estágio da internacionalização do sistema financeiro foram:
o desequilíbrio no balanço de pagamentos e o déficit público dos Estados
Unidos; a desregulamentação do movimento de capitais; a criação de novos
instrumentos financeiros, como resposta à instabilidade do sistema monetá-
rio internacional, ou seja, a variabilidade das taxas de câmbio e de juros;
e os avanços das telecomunicações e da informática que permitiram uma
maior integração dos diversos sistemas financeiros nacionais, com um custo
cada vez mais baixo.
A U L A

33

Na foto acima, o sistema


computadorizado que serve à
Bolsa de Valores de Hong Kong.
Ao lado, operadores da Bolsa de
Nova York, também dependem
de computadores para a
realização de seu pregão.

Durante as décadas de 1940 e 1950, o sistema financeiro internacional


apoiava-se na forte economia norte-americana e em sua moeda (o dólar) que,
ligada a uma determinada quantidade de ouro, criava uma situação de
estabilidade no sistema monetário internacional. Havia controle sobre o
montante de dólares existente no mundo e cada país sabia exatamente a
relação, em valor, entre a moeda nacional e a moeda de referência, o dólar.

Em 1950, somente os Estados Unidos produziam cerca de 60% de toda


a produção dos países capitalistas avançados e possuíam em torno de 40%
de todo o estoque de capital entre esses países. Nessa época, as transações
em divisas estrangeiras eram controladas em cada país e os fluxos de
capital mantinham-se relativamente pequenos no mercado financeiro
internacional.
No entanto, a partir da década de 1960, essas condições mudaram. Antes
de mais nada, é importante lembrar que a partir dessa década começou a
surgir uma economia cada vez mais transnacional, ou seja, um sistema de
atividades que tende a romper com os limites territoriais, com as fronteiras
dos Estados nacionais. E uma das primeiras e mais fortes manifestações de
que a economia capitalista escapava ao controle do Estado-nação se dá,
justamente, no sistema financeiro.

Geograficamente, muitas empresas passaram a transferir sua sede social


para “territórios fiscais generosos” como forma de fugir ao controle dos
impostos e das restrições existentes em seus Estados de origem. Essa prática,
que passou a ser conhecida como offshore (externo), escolhe justamente
pequenos ou mini-Estados - tais como Curaçao, Ilhas Virgens e Liechtenstein
-, hoje em torno de setenta, que se caracterizam pela ausência ou grandes
buracos nas leis empresariais e trabalhistas, o que permite às empresas que
para lá se dirigem, realizar grandes transações financeiras.
Na década de 1970, o sistema monetário internacional
internacional, baseado no dólar, A U L A
desestabilizou-se porque a economia central que lhe dava sustentação estava
perdendo força relativa e competitividade, e porque o dólar, por decisão do
governo americano foi desvalorizado, rompendo com o padrão ouro, o que 33
significou uma liberalização geral dos controles cambiais num número cres-
cente de países. Além disso, os contínuos déficits públicos e os déficits no
balanço de pagamentos dos Estados Unidos, constantemente cobertos por
empréstimos externos, em pouco tempo transformaram esse país, de maior
credor mundial, em devedor internacional.
Ao mesmo tempo, externamente, os investimentos e os gastos militares eram
relativamente altos. Os dólares americanos depositados em bancos não-ameri-
canos e que não voltavam para os Estados Unidos - para fugir também das
restrições da legislação bancária americana - eram estocados fora do território
norte-americano e tornaram-se um instrumento financeiro negociável. O velho
centro financeiro internacional – a City de Londres – negociava os eurodólares
“inventados”, em livre flutuação, ou seja, em movimentos oscilatórios, de
cotação (valor-preço) instável.
O capital norte-americano se multiplicava e corria solto e rapidamente pelo
mundo, e era aplicado, principalmente, em empréstimos de curto prazo (de
poucos meses até um ano) altamente lucrativos. Com essa expansão de fluxos de
dólares, todos os governos perderam o controle das taxas de câmbio e do volume,
agora bem maior, de dinheiro em circulação no mundo.
A liberalização financeira ajudava a expandir o comércio mundial, mas os
fluxos financeiros se separavam cada vez mais do comércio de manufaturas e de
serviços. As políticas dos governos, coordenadas nacional ou internacional-
mente, já não funcionavam como antes. Os Estados nacionais perderam parte de
seus poderes econômicos.

A crise inflacionária da década de 1970 abriu espaço para as explicações


dos ideólogos do neoliberalismo
neoliberalismo, que colocam o Estado como o maior
culpado pelos males dessa crise. Para esses ideólogos, qualquer regulação
do mercado por parte do Estado é nefasta. O mercado deve ser “livre”.

Em 1979, na Inglaterra governada pela primeira-ministra Margareth


Tatcher, apelidada de “dama de ferro”, foi aplicado o mais abrangente
programa neoliberal no mundo capitalista. Dele constavam, entre outras
realizações: a contração da emissão monetária; a elevação das taxas de juros;
a redução dos impostos sobre rendimentos altos; a abolição dos controles dos
fluxos financeiros; o corte nos gastos sociais; uma nova legislação anti-
sindical e um amplo programa de privatizações. Essas realizações tinham
como objetivos, em seu conjunto, reduzir a inflação, estimular investimentos
produtivos e especulativos, reduzir o tamanho e o papel do Estado, garantir
ao capital privado maiores margens de lucros e reduzir o peso político e
econômico dos trabalhadores.
Os Estados Unidos de Ronald Reagan, a Alemanha de Helmut Khol,
e outros países, foram seguindo um a um, com maior ou menor rigor, o modelo
neoliberal. Esses países derrubaram pouco a pouco o estado keynesiano,
embora não conseguissem acabar com o Estado do bem-estar social, que em
muitos países continuava crescendo. Os neoliberais afirmavam que, em opo-
sição ao Estado, que ameaça a liberdade econômica e política, o livre mercado
produziria “o maior crescimento da Riqueza das Nações e a melhor distribui-
ção sustentável de riqueza e renda dentro dele”.
O poder financeiro mundial

33
A U L A
O programa neoliberal reanimou as taxas de lucros, mas não as taxas de A U L A
acumulação, isto é, de investimentos para o crescimento do parque de equipa-
mentos produtivos. Isso porque a desregulamentação financeira, elemento
importante do programa neoliberal, gerou condições muito mais favoráveis para 33
investimentos especulativos do que produtivos. O boom das transações financei-
ras, nos anos 80, levou à redução do comércio mundial de mercadorias, penali-
zando os países mais pobres, principalmente os de economia basicamente
primário-exportadora.
Após atingir os países ricos da Europa Ocidental e da América, o neolibera-
lismo afetou os países do Leste europeu e, finalmente, os países da América
Latina. No entanto, a região que alcançou o maior êxito, nos últimos vinte anos,
é justamente a menos liberal. Trata-se do Extremo-Oriente, onde estão incluídos
o Japão e a Coréia do Sul. Esses países têm sofrido fortes pressões das potências
ocidentais para liberar, desproteger e desregulamentar suas economias.

A globalização não tem apenas um caráter financeiro. Ela é também produ-


tiva. No passado, todas as fases da produção de uma mercadoria eram realizadas
no próprio país, onde era consumida ou exportada. Hoje, vem diminuindo o
conteúdo nacional da maioria das mercadorias. E as fases intermediárias da
produção de um determinado bem ocorrem em diferentes países. As empresas
saem em busca de regiões, países ou áreas que ofereçam vantagens em termos de
recursos humanos e de padrões técnico-científicos de produção.
O importante a destacar é que são justamente os países em desenvolvi-
mento aqueles que mais necessitam atrair investimentos produtivos e finan-
ceiros globais para seus territórios, como forma de resolver suas questões de
dívida externa, para alcançar maiores índices e níveis de crescimento econô-
mico, reestruturar espacial e tecnologicamente o país, gerar emprego e
redistribuí-lo geograficamente para reduzir as desigualdades existentes.
E, para que isso ocorra, devem atender às exigências hoje ditadas pelo
mercado internacional cujos poderosos centros encontram-se nas áreas mais
avançadas economicamente.

A integridade política e econômica de cada Estado nacional estaria corren-


do perigo por causa da atuação de especuladores, cujos capitais de curto prazo
valem-se de momentos circunstanciais, de informações “quentes”, para inves-
tir? E esses especuladores são atraídos pelos mais recentes dados do comércio
ou pelo aumento das taxas de juros que lhes garantam vantagens financeiras?
Ou fogem quando essas mesmas taxas descem, ou quando há a mais leve
suspeita de instabilidade política ou de comoção social que possam ameaçar
suas taxas futuras de lucros sobre o capital de risco investido?

Nas palavras de Lia Osório Machado, “de um lado, o sistema de Estados-


nações mantém, do ponto de vista jurídico, as prerrogativas de soberania; de
outro, o poder fixado pelas fronteiras do Estado nacional é cada vez mais
limitado pela política de poder das grandes corporações e das altas finanças”.
Parece que a pressão exercida pelo sistema global é de tal ordem que reduz
o papel e o poder - de escolhas e de decisões - dos Estados nacionais. Perdem
autonomia e capacidade de dinamizar os investimentos, a renda e o emprego.
A globalização, não só financeira mas também produtiva, subordina cada
governo nacional aos interesses dos principais centros financeiros internacio-
nais, além de os expor a preconceitos político-econômicos daqueles que mane-
jam o capital global.
A U L A O “mundo sem fronteiras” representa uma certa perda, pelo país, do
controle sobre sua moeda e sobre suas políticas fiscais. Se para os mercados

33 internacionais, bastante conservadores em matéria econômica, o equilíbrio


fiscal de um determinado país está correndo algum risco, tais mercados tomam
decisões que têm um impacto real no país em questão. Essa situação já foi
vivida pelo México, quando a fuga de capitais internacionalizados jogou esse
país numa recessão, manifestada pela queda da produção, do consumo,
do emprego, com um conseqüente empobrecimento.

Segundo alguns estudiosos, não se trata de escolher entre participar a


qualquer preço dessa globalização e da ideologia do “mercado livre” ou ficar
de fora dela. Acreditam eles que sempre será possível preservar (ou
reinstaurar) uma regulamentação no âmbito do Estado-nação, bastando para
isso que haja “vontade política” de privilegiar as questões sociais dos homens
sem capital. Ou pode haver ainda algum controle do movimento internacio-
nal do capital financeiro e produtivo, pela ação de agrupamentos como o do
Grupo dos Sete - o G-7 (os sete países de economias mais desenvolvidas) -
ou de organismos multilaterais como o Banco Mundial e o Fundo Monetário
Internacional, para que os custos sociais da globalização no mundo não sejam
tão altos como vêm sendo.
Nos últimos anos está ocorrendo uma desaceleração nos fluxos de capitais
financeiros. Acredita-se que o movimento de desregulamentação e liberalização
dos fluxos internacionais de capitais tenha sido concluído, pelo menos nos
países desenvolvidos. E parece ainda que surge uma nova tendência de
controle das atividades financeiras internacionais.

A “natureza racional” (ou irracional?) do mercado de capitais não está


preocupada com o bem-estar ou com a justiça social dos cidadãos de uma
determinada sociedade, mas sim com os lucros. Não cabe ao mercado de capitais
as questões sobre saúde, educação, habitação ou serviços públicos.
Entretanto, a um Estado democrático cabe o papel de não permitir que
os territórios nacionais transformem-se apenas em “filhas legítimas da lógica
do capitalismo”, agora globalizado. Cabe impedir que os espaços nacionais
sejam simplesmente espaços de manobra e de possibilidades para a economia
internacionalizada.

Nesta aula você aprendeu que:

l o sistema financeiro global está buscando expandir-se, livre de regulamen-


tos de base territorial como os do Estado-nação
Estado-nação. O sistema é globalizado
devido à aceleração e à expansão cada vez maior dos fluxos de dinheiro e de
títulos entre os diferentes mercados financeiros nacionais;
l a crise dos Estados Unidos e do sistema monetário internacional baseado
na moeda norte-americana - o dólar - resulta na expansão dos fluxos de
dólares fora dos Estados Unidos.
l a onda neoliberal que varreu o mundo, a partir da década de 1970,
acelerou a globalização financeira na medida em que diversos países
passaram a liberar as regras do mercado financeiro para permitir e
estimular a entrada de maiores volumes de capitais, mesmo que
especulativos, em suas economias.
Exercício 1 A U L A

33

A charge “brinca” com uma realidade do mundo de hoje. Responda:


a) Qual é essa realidade?
b) Explique a razão da euforia dos homens que jogam os dardos.

Exercício 2
Com base no texto desta aula, explique qual é a relação existente entre
sistema monetário internacional e sistema financeiro internacional.

Exercício 3
Procure, em jornais ou revistas, notícias que contenham alguns aspectos do
sistema financeiro global, estudados nesta aula.
A UA UL L AA

34
34
Ritmos e movimentos
da população mundial

N essa aula, vamos estudar o crescimento da


população mundial relacionando-o com as mudanças ocorridas na sociedade.
Vamos conhecer o modelo explicativo da desaceleração do crescimento
populacional - a transição demográfica
demográfica. Veremos ainda os principais fluxos
migratórios contemporâneos e as questões sociais e econômicas que decorrem
desses fluxos.

Qual a importância dos movimentos de população no mundo atual? Diante


de um período histórico em que o dinheiro praticamente não encontra limites a
sua mobilidade, qual a situação do trabalho diante da globalização?
Aparentemente, as restrições à livre circulação de pessoas estão aumentan-
do nos países industrializados, apesar da formação dos blocos econômicos.
Os trabalhadores árabes, turcos e africanos, que nos últimos trinta anos acorre-
ram à Europa para trabalhar na construção civil e nos empregos de menor
qualificação, estão sendo cada vez mais discriminados pela legislação dos países
europeus. Da mesma maneira, os Estados Unidos têm aumentado as dificulda-
des impostas à imigração de trabalhadores, principalmente latino-americanos,
que buscam emprego em seu território.
Assim, a globalização é um processo de duas vias: de um lado aumenta a
mobilidade do dinheiro, de outro restringe os deslocamentos da população
que busca trabalho.

A grande expansão demográfica do mundo contemporâneo começou com a


Revolução Industrial. A partir do século XVIII assistimos a um extraordinário
crescimento demográfico, e a população mundial, em 1830, atingiu pela primeira
vez um bilhão de habitantes. Apenas oitenta anos depois atingiu 2 bilhões.
Entre 1930 e 1975 - em 45 anos -, dobrou de novo. Em 1987 foi anunciado o
nascimento do habitante de número 5 bilhões. Em 150 anos a população do nosso
planeta quintuplicou.
No mundo, hoje, nascem 150 crianças por minuto, 220 mil por dia
e 80 milhões por ano. Nesse ritmo a Terra deverá ultrapassar 6 bilhões de
habitantes por volta do ano 2000.
O crescimento da população mundial não se processou de modo uniforme, ao A U L A
mesmo tempo e em todos os lugares. Ele foi inicialmente um crescimento
populacional europeu. A eficácia na luta contra a morte e as melhorias das
condições de vida fizeram a população da Europa passar de 187 milhões, em 1800, 34
para 400 milhões, em 1900. A partir da metade do século XX, o crescimento da
população mundial ocorreu nos outros continentes. Os países subdesenvolvidos
conheceram então uma forte baixa da mortalidade, como resultado da difusão das
vacinas, da eliminação dos vetores de numerosas doenças e das medidas de
saneamento básico. A taxa de mortalidade no conjunto dos países pobres passou
de 25 óbitos por mil habitantes, em 1950, para 9 óbitos por mil, em 1990. O conjunto
dos países subdesenvolvidos tinha uma taxa de crescimento anual de 2,4% no
período 1970/75, enquanto os desenvolvidos tinham uma taxa de apenas 0,8%.
As incertezas quanto ao futuro são explicadas pelas atuais interrogações
sobre as tendências das taxas de natalidade. Desde a década de 1970 constata-se
uma diminuição da taxa de fecundidade (número de nascimentos anuais em um
conjunto de mil mulheres entre 14 e 49 anos) em quase todos os países -
a fecundidade mundial teria passado de 6,1 filhos em 1970 para 3,7 em 1990.
Novos comportamentos sociais, como o uso de métodos anticonceptivos e a
emancipação da mulher na sociedade contribuíram para diminuir a natalidade.
As políticas de planejamento familiar aceleraram a queda da fecundidade. Os
únicos países que ficaram fora da política anti-natalista foram os países da África
tropical e alguns países árabes. Como resultado dessas ações o crescimento
demográfico anual, que era de mais de 2% na década de 1970, caiu para 1,6 nos
anos 80, e para aproximadamente 1% nos anos 90.
GRÁFICO DA TRANSIÇÃO DEMOGRÁFICA
O crescimento extraordinário da po-
pulação mundial nos últimos duzentos
anos e a desaceleração atual permitiram
elaborar um modelo explicativo para a
evolução da população mundial: a transi-
ção demográfica
demográfica.
A transição demográfica consiste em
uma sucessão de fases pelas quais uma
população passa à medida que penetra no
que chamamos de modernidade, isto é,
uma sociedade agrária tradicional trans-
forma-se numa sociedade moderna, indus-
trial e urbana.

Ao longo do processo de transição, é possível identificar uma primeira fase


na qual se registra um pequeno crescimento da população porque a alta taxa
de natalidade é anulada pela alta taxa de mortalidade. A segunda fase carac-
teriza-se por um rápido crescimento demográfico por causa do desencontro
entre as duas taxas. Essa aceleração é explicada pelo recuo da mortalidade,
graças à revolução sanitária, isto é, ao desenvolvimento de uma infra-estrutura
de serviços coletivos de higiene e à adoção de medidas de profilaxia. O terceiro
momento tem um pequeno crescimento, um novo equilíbrio entre as duas
taxas que, agora, se apresentam muito baixas.
Os países mais avançados já terminaram o processo de transição
demográfica. Muitos deles vem apresentando uma população estabilizada na
qual o número de nascimentos equivale ao número de óbitos. O crescimento
vegetativo é muito pequeno e, em alguns períodos, negativo.
A U L A MAPA DOS DIFERENTES RITMOS DE CRESCIMENTO DEMOGRÁFICO MUNDIAL

34

Para muitos países subdesenvolvidos, a transição demográfica iniciou-se


após a Segunda Guerra Mundial. A difusão de medidas sanitárias e o uso de
vacinas e antibióticos derrubaram a taxa de mortalidade, provocando uma
aceleração das taxas de crescimento demográfico. Mas a mudança de compor-
tamentos sociais, a adoção de métodos contraceptivos e o acesso à informação
fizeram as taxas de fecundidade declinar rapidamente.
O período de crescimento mais rápido ocorreu na década de 1960.
Mas as taxas médias de crescimento estão declinando e as previsões
demográficas admitem uma estabilização da população mundial em torno de
10 bilhões de habitantes, no ano de 2050.
A evolução demográfica é um indicador de mudanças econômicas.
As transformações impostas pela industrialização na Europa Norte-Ocidental, no
período 1850-1914, provocaram o primeiro boom (explosão) da economia moderna
e o grande crescimento demográfico europeu na segunda metade do século XIX.
No mundo subdesenvolvido, a renda real por habitante dobrou no período de
1945 a 1973, graças a um crescimento econômico de mais de 3% ao ano. Se o
crescimento econômico e o crescimento demográfico têm origens estruturais co-
muns, é possível admitir que eles tenham uma interação dinâmica. A velocidade das
mudanças - urbanização, elevação do nível de instrução, aumento do poder de
compra - acarreta a baixa da mortalidade que é apenas o seu aspecto mais visível.
A dinâmica de uma população envolve, além das taxas de natalidade e
mortalidade, as diferentes modalidades de migração. Os homens sempre se
deslocaram em grupos ou individualmente. Esses deslocamentos influem na
organização do espaço e na estrutura da população, tanto na região de saída
quanto na região de chegada.
As migrações internacionais, sem o caráter maciço que tiveram no século
XIX e no início do século XX, são ainda expressivas em termos numéricos.
Aproximadamente 2% da população mundial vive fora do país de nascimento,
e a proporção de estrangeiros na composição da população varia de 7% na
Alemanha e na França a 20% na Austrália. As estatísticas sobre as migrações
internacionais não apresentam muita precisão por causa do grande número de
imigrantes clandestinos.
Após a Segunda Guerra Mundial podemos identificar quatro grandes A U L A
fluxos migratórios internacionais:

l O primeiro refere-se aos deslocamentos de população para fazer coincidir a 34


“nova” fronteira política com os grupos étnicos. O exemplo mais significa-
tivo ocorreu após a divisão política da União Indiana, em 1947, quando
aproximadamente 15 milhões de pessoas foram deslocadas entre a Índia e o
Paquistão. Outro exemplo, mais recente, deu-se na região balcânica, quando
houve a fragmentação política da Iugoslávia.
l O segundo diz respeito aos refugiados políticos, que chegam hoje a mais de
25 milhões de pessoas. Eles procedem dos “pontos quentes”, ou seja, das
áreas de conflitos internos, nas quais uma facção temporariamente derrota-
da se refugia em outro país. A situação trágica desses grupos é marcada pela
indefinição e pela precariedade das condições de vida que anulam, em
grande parte, a ação do Alto Comissariado das Nações Unidas para os
Refugiados (ACNUR). O Sudeste Asiático, o Oriente Médio, a América
Central e a África Oriental são as principais regiões desses refugiados.
O Leste Europeu, enquanto esteve isolado pela chamada Cortina de Ferro,
dava origem a numerosos contingentes de refugiados políticos. A crise de
1989 facilitou o deslocamento de mais de um milhão e trezentos mil emigran-
tes que deixaram seus países em direção à Europa Ocidental, por razões
basicamente econômicas, e que solicitavam, no país de acolhimento,
o estatuto de refugiados políticos.
l O terceiro é marcado pelo deslocamento de “cérebros”. A migração de
pessoas com alta qualificação profissional e/ou de estudos significa uma
vantagem enorme para os países que as recebem porque as despesas para
sua formação foram desembolsadas pelos países de origem. Os Estados
Unidos são beneficiados por esses movimentos porque entre 1970 e 1990
receberam perto de um milhão de imigrantes altamente qualificados, proce-
dentes de todo o mundo, embora no mesmo período tenham sido adotadas
leis cada vez mais restritivas à imigração de mão-de-obra não qualificada.

PRINCIPAIS FLUXOS DE MIGRAÇÃO DE TRABALHADORES


A U L A l Finalmente, o quarto fluxo agrupa as migrações de trabalhadores. Após a
Segunda Guerra Mundial, a Europa Norte-Ocidental se abastecia de mão-

34 de-obra nas regiões de economia deprimida da bacia mediterrânea. Já os


Estados Unidos recorriam a seus vizinhos mais próximos, o México e o
Caribe. No entanto, a partir da crise dos anos 70 e da adoção das novas
técnicas de produção do modelo de industrialização pós-fordista, agra-
vou-se a situação de desemprego nesses países. Nas antigas áreas de
acolhimento de imigrantes cresceram os sentimentos xenófobos (do grego:
xeno = estrangeiro + fobia = aversão) e os movimentos de pressão para a
adoção de leis restritivas à imigração. Os problemas surgidos com os
árabes na França são análogos aos dos turcos na Alemanha e aos dos
jamaicanos na Inglaterra. Hoje, na Europa e nos Estados Unidos, a imigra-
ção é uma questão social e política preocupante.
Os problemas ligados aos fluxos migratórios de trabalho reabrem o velho
debate sobre integrar os recém-chegados à comunidade nacional ou mantê-los
num estatuto particular. Os muçulmanos, por exemplo, instigados pelos
movimentos fundamentalistas, alegam o direito à diferença, recusando-se a
aceitar a integração. As sociedades ocidentais adotam comportamentos de
rejeição, o que é facilmente explorado no campo político. Esse desconhecimen-
to recíproco pode esgarçar o tecido social dando origem a tensões e conflitos.
As novas tendências da economia mundial admitem a livre circulação de
capitais, de mercadorias e de tecnologia, mas adotam medidas cada vez mais
restritivas para os fluxos de mão-de-obra. As migrações de trabalhadores são
submetidas a controles cada vez mais rigorosos.
O desenvolvimento dos meios de transportes e o acesso à informação
abriram a era do turismo de massa, deslocando milhões de pessoas anualmente.
O turismo tornou-se assim um fato econômico e social do mundo contemporâ-
neo por causa dos recursos que movimenta.

PRINCIPAIS FLUXOS TURÍSTICOS


No mapa, observa-se uma estreita relação entre a qualidade de vida e a A U L A
intensidade dos fluxos turísticos. A Europa Ocidental é a principal emissora e
receptora do turismo internacional. Esses deslocamentos têm implicações econô-
micas, pois os lucros que geram têm grande importância no balanço de pagamen- 34
tos dos países receptores. Na Europa Ocidental, por exemplo, o turismo mantém
6 milhões de empregos diretos e perto de 10 milhões indiretos.
Os Estados Unidos atraem por ano 50 milhões de turistas do mundo inteiro,
mas os fluxos internos são quase dez vezes maiores. Nova York é o principal pólo
de atração, enquanto a Califórnia e a Flórida atraem fluxos turísticos internos e
externos, em virtude das atrações aí instaladas.
Fluxos menores dirigem-se para os países subdesenvolvidos. Nesses locais, de
natureza privilegiada, são instalados equipamentos turísticos eficientes, quase
sempre pelo capital internacional. Esses locais “vendem” a paisagem.

Nesta aula você aprendeu que:

l o crescimento da população mundial é desigual no tempo e no espaço.


Os países desenvolvidos têm, hoje, pequeno crescimento vegetativo pois
já completaram sua transição demográfica
demográfica. Alguns países subdesenvolvi-
dos iniciaram essa transição enquanto outros ainda dependem do desenvol-
vimento sócio-econômico para realizá-la;
l os mais importantes fluxos migratórios internacionais contemporâneos
são realizados por grupos étnicos à procura da nova fronteira política,
pelos refugiados políticos, por técnicos altamente qualificados e, com mais
destaque, por homens em busca de trabalho;
l o turismo de massa
massa, pelos recursos que movimenta, é uma das mais
importantes atividades da economia moderna.

Exercício 1
Relacione as pirâmides etárias dos países A, B e C com o gráfico esquemático
da transição demográfica e responda às perguntas abaixo.
a) Por que a pirâmide etária do país A representa a população de um país
que se encontra na primeira fase da transição demográfica?
b) Apresente duas mudanças que devem ocorrer na dinâmica demográfica
do país A para que a estrutura etária da sua população passe a ser igual
à da pirâmide do país C.

PIRÂMIDES ETÁRIAS

A pirâmide etária representa a distribuição, por idade, da população de determinado país.


Ao mesmo tempo, expressa a fase da transição demográfica em que se encontra a sua população.
A U L A Exercício 2
Observe o mapa e apresente duas razões para os fluxos migratórios

34 representados.

FLUXOS MIGRATÓRIOS PARA A EUROPA

Durante o
século XIX, a
explosão
demográfica e
as mudanças
na economia
européia
originaram
fluxos
migratórios
importantes
para o
povoamento
da América,
Austrália e
Nova
Zelândia.
Hoje, a
Europa vive
um problema
inverso:
milhares de
migrantes
tentam
instalar-se
nos seus
países mais
ricos.

Exercício 3
Numa área de atração turística que você conheça, responda:
a) Quais os efeitos dos fluxos turísticos na preservação das condições
ambientais locais?
b) De que modo os fluxos turísticos atuam na melhoria das condições
do espaço?
AUU
A L AL A

35
A energia vital: 35
os recursos naturais
são inesgotáveis?

N esta aula, vamos identificar a Revolução


Industrial como responsável pela grande mudança na utilização dos recursos
naturais. Vamos avaliar o papel dos principais recursos naturais, os problemas
decorrentes do seu uso abusivo e mostrar que mesmo os recursos considerados
renováveis correm o risco de esgotamento.

Os recursos naturais são inesgotáveis? A humanidade pode retirar o que


deseja da natureza e despejar toda a sorte de resíduos na biosfera?
Existem fortes evidências de que não! Os combustíveis fósseis, cuja exploração
continua aumentando rapidamente, são finitos, e sua queima contribui para o
aumento do efeito estufa que vem elevando a temperatura na superfície da Terra.
A energia que consumimos em nosso dia-a-dia, que movimenta os processos
vitais no mundo atual, não pode se originar de um conjunto tão pequeno de
fontes não renováveis que estão muito irregularmente distribuídas no planeta.
Guerras, contaminação dos mares e oceanos, poluição nas cidades são apenas
algumas das conseqüências de um padrão energético que já mostrou seus sinais
de esgotamento.

Os fluxos naturais de energia, que são utilizados há milênios, são conhecidos


como fontes renováveis
renováveis. Antes da Revolução Industrial, o Sol era uma das fontes
de energia mais utilizadas. Ele fornecia energia para os músculos (do ser humano
e dos animais empregados na tração de cargas e para mover moinhos e máqui-
nas). Além disso, aproveitava-se a força do vento e da água - movidos também
pela energia solar. A madeira, sob a forma de carvão, era igualmente utilizada
desde a pré-história.
Com a Revolução Industrial, os combustíveis fósseis - como o carvão e o
petróleo - começaram a ser utilizados como fontes de energia. A energia gerada
pelos combustíveis fósseis é, em última instância, limitada pela geologia, pois se
trata de uma fonte de energia não renovável
renovável.
A exploração dos combustíveis fósseis deu a base para o desenvolvimento
da sociedade industrial, diferente de todas as sociedades anteriores, tanto na sua
natureza quanto na sua escala.
No ano 2000, as fontes de produção/consumo de energia devem se distribuir
aproximadamente do modo como está no esquema da página seguinte.
A U L A Esquema da

35
distribuição
mundial das
fontes de energia
em dois
momentos:
1980 e 2000

GÁS NATURAL

PETRÓLEO - PRINCIPAL DEVE REPRESENTAR

FONTE DE ENERGIA MUNDIAL . CARVÃO - COMBUSTÍVEL


20% DO CONSUMO MUNDIAL

AS JAZIDAS CONHECIDAS, DE ENERGIA À MEDIDA QUE


FÓSSIL MAIS ABUNDANTE .
MANTIDO O CONSUMO ATUAL , FOR SUBSTITUINDO O
SEU USO AGRAVA A
ESGOTAM - SE NOS PRÓXIMOS PETRÓLEO EM CERTOS
QUESTÃO AMBIENTAL
CINQÜENTA ANOS . USOS .
(CHUVAS ÁCIDAS , AUMENTO
DO DIÓXIDO DE CARBONO NA
ATMOSFERA ).

ENERGIA NUCLEAR - DEVE


TER SEU USO RESTRINGIDO
POR CAUSA DO AUMENTO
DOS CUSTOS E DA QUESTÃO
DA SEGURANÇA NAS CERCA
BIOMASSA - MATÉRIA VEGETAL 2000 1980 DE QUATROCENTAS USINAS
OU ANIMAL QUE PODE SER EM FUNCIONAMENTO ATÉ
TRANSFORMADA EM ENERGIA . O FINAL DESTE SÉCULO .
A BIOMASSA , SOB A FORMA DE
MADEIRA , É O PRINCIPAL
COMBUSTÍVEL DOS PAÍSES
EM DESENVOLVIMENTO .

ENERGIA EÓLICA - OS VENTOS SÃO


PRODUZIDOS PELO AQUECIMENTO
DESIGUAL DA SUPERFÍCIE DA TERRA .
OS MOINHOS DE VENTO PODEM
GERAR ELETRICIDADE E EXECUTAR
ÁGUA - 25% DA
GERA QUASE TRABALHOS MECÂNICOS .
ELETRICIDADE MUNDIAL. ENERGIA
LIMPA E RENOVÁVEL . AINDA
NÃO SE UTILIZA TODA A SUA
CAPACIDADE GERADORA .

ENERGIA SOLAR - DEVE AUMENTAR ENERGIA DOS OCEANOS ENERGIA GEOTÉRMICA - USADA
SUA PARTICIPAÇÃO NA TEM POTENCIALIDADE GIGANTESCA DIRETAMENTE OU PARA
PRODUÇÃO DE ENERGIA , DEVIDO AOS (ONDAS, MARÉS, CORRENTES MARI- PRODUZIR
GRANDES INVESTIMENTOS FEITOS EM NHAS ), MAS AINDA É POUCO USADA . ELETRICIDADE .
NOVAS TECNOLOGIAS DE USO .
A principal fonte de energia da sociedade industrial é o petróleo, que A U L A
representa aproximadamente 40% da energia comercial do mundo.
Por causa da ameaça de esgotamento das jazidas é possível que, no início do
século XXI, seu uso se modifique, passando a ser empregado mais como 35
matéria-prima para a indústria química do que como combustível.
As reservas mundiais de carvão, ao contrário, são suficientes para atender
à demanda nos próximos 250 anos, se forem mantidos os níveis de consumo
atuais. Os problemas ambientais devem, no entanto, inviabilizar uma volta
maciça ao seu uso.

Em 1973, os países produtores de petróleo, organizados na Organização


dos Países Produtores de Petróleo (OPEP), promoveram uma grave crise
energética mundial ao dobrar o preço do barril de petróleo. Até então, os
países consumidores de petróleo usavam de forma abusiva esse capital
energético que a natureza havia acumulado há milhões de anos, esquecen-
do-se de que estavam usando uma “oferta” que a natureza não conseguiria
manter indefinidamente. A crise obrigou os países consumidores a buscar
novas regiões produtoras de petróleo e, ao mesmo tempo, promover cam-
panhas de racionalização do seu uso. Normalmente as taxas de consumo de
energia acompanhavam as de crescimento econômico. Mas, a partir da
crise, o exemplo da Alemanha Ocidental é sugestivo: entre 1974-1985,
enquanto o seu consumo de energia aumentou apenas 3%, o PIB alemão
cresceu 17,5%, o que mostra a eficiência das suas políticas de uso mais
racional de energia.
Para os países em desenvolvimento, a crise energética revelou-se mais
grave porque foi acompanhada por uma desvalorização das matérias-primas:
em 1975 o preço de uma tonelada de cobre equivalia ao de 115 barris de
petróleo; em 1982 a equivalência baixou para 57 barris.
Embora os preços do petróleo tenham diminuído na década de 1980,
não voltaram mais aos níveis anteriores a 1974, o que mudou profundamente
a situação energética mundial.

A crise dos preços estimulou o desenvolvimento de novas tecnologias que


possibilitaram obter mais petróleo nos poços que estavam em produção e
recuperar áreas já consideradas esgotadas. Porém, se continuarmos a consumir
petróleo no ritmo atual, as reservas mundiais deverão esgotar-se nos próximos
cinqüenta anos.
Antes que a OPEP deflagrasse a crise do petróleo, o terço mais pobre da
população mundial já enfrentava outra crise energética. Aproximadamente
2 bilhões de habitantes dos países em desenvolvimento dependem da lenha
como combustível para cozinhar ou para aquecimento. Como há um
descompasso entre a velocidade do consumo da floresta e o tempo necessá-
rio para as árvores crescerem, a obtenção de lenha torna-se cada vez mais
difícil. O aumento da população nessas regiões torna o problema ainda
mais grave. Não se trata de um problema de ignorância: é um trágico
problema de sobrevivência. As populações mais pobres, dos países subde-
senvolvidos, são obrigadas a destruir os meios de vida do futuro para
dispor do necessário no presente. O quadro se torna ainda mais grave
porque o desmatamento traz uma série de problemas ambientais: desapa-
rece o “efeito esponja” da floresta, o que significa que os solos ficam
expostos diretamente à ação das chuvas; aumenta o escoamento superficial;
modifica-se definitivamente a biodiversidade.
A U L A Outras razões significativas para a diminuição das florestas - especial-
mente das florestas tropicais - são a demanda de terras para o cultivo e o

35 desmatamento para a obtenção de madeiras nobres. Os deslocamentos da


população em direção às fronteiras agrícolas em busca de terras e a atuação
das empresas madeireiras, em busca do lucro imediato, têm provocado a
rápida redução das florestas tropicais úmidas. Estima-se em 12 milhões de
hectares a área desmatada a cada ano. Se o desmatamento mantiver esse
ritmo é possível que, no ano 2050, essa formação florestal esteja praticamente
desaparecida.
Como as demais riquezas, a energia produzida no mundo não se distribui
equilibradamente: um norte-americano consome trezentas vezes mais ener-
gia do que um africano. Certamente, num futuro próximo, os combustíveis
fósseis e a energia nuclear - fontes não renováveis - continuarão sendo as
nossas principais fontes de energia. Mas nos últimos anos tem crescido o
interesse pelo uso das energias solar, hidráulica e da biomassa, até aqui
subutilizadas. Elas representam, certamente, as alternativas mais
encorajadoras para a questão energética mundial.
Além dos combustíveis fósseis, a indústria moderna utiliza cerca de
oitenta minerais como matérias-primas. As jazidas desses minerais são
relativamente abundantes e, em termos gerais, as reservas dos minerais
fundamentais mostram-se suficientes para atender às necessidades.
O uso cada vez mais freqüente da reciclagem permite poupar tanto as
jazidas quanto as fontes de energia. Por exemplo: para produzir uma
tonelada de alumínio, a partir de sucata, gasta-se apenas 5% da energia
necessária para extrair a bauxita e transformá-la em alumínio. Outra alter-
nativa que vem se tornando cada vez mais freqüente é a da substituição de
materiais, a exemplo do estanho, que tinha largo emprego industrial nas
embalagens de alimentos perecíveis e está sendo substituído pelo plástico
e pelo alumínio.
A água em estado líquido é uma das originalidades do nosso planeta.
Componente essencial de todos os seres vivos, a água está presente em cada
animal, em cada planta e em cada ser humano, na forma de fluxos microscópi-
cos. A degradação da água tem efeitos dramáticos sobre a fauna, a flora e a
saúde do homem. O desinteresse sobre a poluição da água favorece a contami-
nação alarmante dos lençóis subterrâneos, dos rios e das águas costeiras.
O desconhecimento do modo pelo qual a água circula nos solos, nos rios, nos
oceanos e na atmosfera - o ciclo da água - é em parte responsável por esse
desinteresse.
Outro dado fundamental: os recursos hídricos são limitados. À medida
que vem aumentando o consumo de água, ficam claras as limitações do seu
uso. A água que abastece os continentes circula entre a terra, o mar e a
atmosfera graças à energia solar. Uma parte é transportada sob a forma de
vapor e envolve todo o planeta. A atmosfera se umidifica graças à evapora-
ção dos oceanos e da superfície terrestre e perde água por causa das
precipitações. A água absorvida pelo solo fica disponível para as plantas
que a absorvem pelas raízes e a liberam, por transpiração, para a atmosfera.
A outra parte do ciclo é totalmente terrestre. A rede hidrográfica recebe a
água da precipitação que escoa superficialmente ou se infiltra pelo solo,
reabastecendo os lençóis d’água, os lagos e os rios. Ao fim do ciclo, a água
é devolvida ao mar ou armazenada nos reservatórios profundos da crosta
terrestre.
O conhecimento do ciclo da água per- A U L A
CICLO DA ÁGUA
mite compreender o impacto da poluição.
Uma vez utilizada, a água fica carregada
de impurezas, contaminando os rios, os 35
lençóis subterrâneos e a atmosfera.
Todos os anos aproximadamente
10% das águas evaporadas dos oceanos e
mares, devido à ação do Sol, retorna aos
continentes sob a forma de chuva. É des-
sa água que dependemos. De toda água
existente na Terra, somente essa peque-
na quantidade está disponível para uso.
E essa água utilizável não está distribuí-
da igualmente.
De modo geral, existe água disponí-
vel para atender às necessidades da po-
pulação mundial embora as diferenças
de consumo sejam diretamente propor-
cionais ao desenvolvimento sócioeconô-
mico. Para manter uma qualidade de vida
razoável são necessários 80 litros de água
por dia para cada habitante. Mas o con-
sumo médio pode variar dos 25 litros
diários de uma família indiana até os 500
litros de uma família norte-americana.
Enquanto a agricultura consome 73% da
água disponível no mundo, conforme as necessidades de irrigação, a indús-
tria consome 22% do total, e o uso doméstico apenas 5%.

Segundo a Organização Mundial


da Saúde (OMS) “o número de tornei-
ras para cada 1.000 habitantes é um
indicador mais confiável para a saúde
do que o número de leitos hospitala-
res”. A água, uma fonte de vida, mata
em torno de 25 milhões de pessoas, a
cada ano, nos países subdesenvolvi-
dos. A obtenção de água em condições
adequadas de uso e a eliminação higi-
ênica dos resíduos humanos são pro-
blemas do cotidiano desses países. Na
ausência dos serviços básicos, é co-
mum o uso da água não-tratada para o
abastecimento. Como conseqüência, ela
se torna o principal agente de trans-
missão de numerosas doenças como a
diarréia, o cólera e o tifo.

As populações ribeirinhas,
em todo o mundo, abastecem-se
sem a preocupação com o fato de as
águas não estarem limpas.
A U L A A água é um recurso renovável mas suas reservas não são ilimitadas. O
problema de escassez é crucial para os países subdesenvolvidos, que têm um

35 rápido crescimento demográfico e que se situam nas regiões tropicais semi-


áridas. No ano 2000, o mundo terá 25 cidades com mais de 10 milhões de
habitantes, e algumas dessas megacidades, tais como Cairo (Egito), Calcutá
(Índia), Cidade do México (México) e mesmo São Paulo (Brasil), sofrerão
problemas de abastecimento de água, seja por causa de uma demanda crescente,
seja por causa da contaminação.
Nos países desenvolvidos, o aumento indiscriminado dos produtos quími-
cos tóxicos tornou-se também um problema de saúde pública. Como a biosfera
é um sistema fechado, as substâncias que são lançadas na atmosfera não
desaparecem. Assim, o uso do DDT, dos inseticidas clorados e outros pesticidas
contamina a água dos rios, dos mares e dos lençóis subterrâneos. O acidente com
a fábrica Sandoz, na Suíça, em 1986, tornou-se um exemplo desse tipo de
poluição, pois provocou a morte de peixes e tornou, temporariamente, a água do
rio Reno imprópria para o consumo. Embora o uso desses produtos esteja
proibido nos países desenvolvidos, as empresas do setor químico os produzem
para vendê-los nos países subdesenvolvidos onde a legislação é menos rigorosa.
Outra forma de poluição é a provocada pelos poluentes transportados pelos
fluxos atmosféricos. Os gases lançados na atmosfera pelas fábricas e pelos carros
(dióxido de enxofre e óxido de nitrogênio) e os pesticidas vaporizados pela
agricultura estão na origem das chuvas ácidas. Os efeitos desse tipo de poluição
são particularmente graves no norte da Europa e no nordeste dos Estados Unidos.

As fotos mostram duas formas de poluição do ar: pelas fábricas e pelos carros.

A gestão dos recursos naturais nos últimos vinte anos ganhou maior
eficiência e, ao que tudo indica, uma nova orientação. Como seria impossível
mudar a matriz energética mundial, a solução encontrada foi obter economias
significativas no consumo de energia, graças a novas tecnologias. Assim, os
“sistemas inteligentes” de iluminação e aquecimento dos edifícios e os sistemas
eletrônicos para controle de consumo de combustível dos carros conseguiram
maior eficiência por unidade de energia consumida. O mesmo tipo de ação está
se realizando em relação à água. Ainda que ela seja um recurso renovável, é
preciso uma gestão cuidadosa dos recursos hídricos. Hoje, aproximadamente
trinta países vivem a ameaça de escassez de água.
A energia, a água, os minerais, entre outros recursos da natureza, não são A U L A
inesgotáveis. Nosso planeta é um sistema fechado e nós estamos alcançando os
seus limites. Por isso existe a necessidade de utilizar esses recursos de forma
racional. As novas tecnologias devem ser difundidas para que sejam adotados 35
novos comportamentos sociais, a partir de políticas ambientais. A sociedade
conservacionista depende, fundamentalmente, do compromisso dos indiví-
duos que a compõem.

Nesta aula, você aprendeu que:

l os combustíveis fósseis - carvão e petróleo - são os principais componentes


da matriz energética do mundo atual. O aumento do preço do petróleo
forçou a busca de fontes alternativas e a uma maior racionalização;
l a lenha continua sendo um combustível essencial nos países pobres, e seu
uso acarreta a destruição da cobertura florestal
florestal;
l as jazidas das matérias-primas minerais são suficientes para garantir
o abastecimento da indústria moderna. A reciclagem permite prolongar
a vida útil dos jazimentos;
l o recurso mais abundante na superfície da Terra é a águaágua. Ela é essencial
para todos os seres vivos, e sua qualidade fica, a cada dia, mais comprome-
tida por causa das ações que têm levado a sua degradação;
l a criação de uma mentalidade conservacionista garantirá o uso dos recursos
naturais, com parcimônia, por todos os homens.

Exercício 1
Quase ¾ do vapor d’água que se condensa e se precipita sob a forma de
chuva na Região Norte do Brasil são devolvidos à atmosfera pela
evapotranspiração da floresta pluvial amazônica.

A partir do texto e do esquema acima:


a) Explique o mecanismo da evapotranspiração.
b) Cite dois efeitos do desmatamento sobre o ciclo da água na região.
A U L A Exercício 2
O mercado mundial do petróleo foi profundamente modificado nos últimos

35 vinte anos. Até 1973/1974, as “Sete Irmãs” (as grandes companhias petrolí-
feras ocidentais - Exxon, Royal Dutch-Shell, Mobil Oil, Texaco, British
Petroleum, Gulf Oil e Socal) controlavam o mercado mundial, mantendo
baixos os preços do petróleo, apesar do aumento do consumo. Os países
exportadores eram penalizados por essa política.
O primeiro choque do petróleo representa a revanche dos países produtores.
O preço do petróleo bruto duplicou em 1974. Em 1978, quando houve o
segundo choque, ele praticamente triplicou.

Com base nos dados dos dois gráficos, indique duas alternativas adotadas
pelos países consumidores de petróleo para enfrentar o aumento do preço
desse produto.

Exercício 3
“Cerca de 80% de todas as doenças do mundo se relacionam com o controle
inadequado dos recursos hídricos, seja devido à transmissão hídrica, como
a febre tifóide e cólera, seja pela deficiência de água para higiene, como em
verminoses e tracoma, seja devido à contaminação ou infestação de animais
aquáticos, como no caso da esquistossomose, seja devido às condições de
água onde se desenvolvem as larvas de insetos transmissores de moléstias,
como a malária, dengue, febre amarela e outros.”
Conferência de Alma Ata - Organização Mundial da Saúde - 1978

SITUAÇÃO DO SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL POR GRANDES REGIÕES - 1988


(Em percentagem da população servida)
Região Abastecimento de água Esgotos sanitários
Norte 69,23 33,46
Nordeste 68,80 11,75
Sudeste 85,96 55,53
Sul 87,49 18,00
Centro-oeste 75,90 30,55
Brasil 80,62 35,55

a) Por que a população brasileira está seriamente ameaçada pela difusão de


doenças relacionadas com o controle inadequado dos recursos hídricos?
b) Por que o risco de contaminação é diferenciado para os habitantes das
diversas regiões do Brasil?
AUU
A L AL A
Alimentos, 36
matérias-primas e 36
biotecnologia:
o papel do campo

N esta aula, analisaremos os avanços nas


técnicas e na estrutura da produção de alimentos. Estudaremos as possibilidades
e os problemas advindos da adoção da biotecnologia na agropecuária e as
possíveis mudanças que ela provocará na economia mundial.

Você já pensou nas mudanças que estão ocorrendo na produção de alimen-


tos, com a aplicação das novas técnicas de engenharia genética? Hoje, os
Estados Unidos estão exportando soja e milho obtidos por transformação de
genes, que aumentam a produtividade e deixam as plantas mais resistentes às
pragas. Mas isso também significa a criação de novos organismos que nunca
existiram antes e que estão sendo introduzidos na biosfera, com efeitos
desconhecidos sobre os demais seres vivos.
A aplicação do conhecimento científico e tecnológico na estrutura básica
da vida - o gene - é um desafio e um risco. De um lado, ajuda a evitar e a curar
muitas doenças; de outro, talvez introduza mudanças irreversíveis nas rela-
ções entre os seres vivos e seu ambiente, podendo trazer novas formas de
contaminação por microrganismos desconhecidos.

Quando o estudioso Malthus admitiu, no início do século XIX, que a


população crescia em progressão geométrica e a produção agrícola crescia em
progressão aritmética, estava denunciando um desequilíbrio entre população
e alimentos e profetizando uma crise alimentar mundial, cuja solução seria o
controle do crescimento da população. Nesses quase duzentos anos da propos-
ta malthusiana, a população mundial continuou crescendo de forma acelerada
mas a produção agrícola, cada vez mais eficiente, tem crescido em ritmo igual
ou superior ao do crescimento da população.
Para atender às necessidades do aumento do consumo de alimentos a
agricultura evoluiu extensivamente, com a incorporação de novas áreas antes
consideradas impróprias para o cultivo, e evoluiu intensivamente, com a
utilização de técnicas de produção cada vez mais avançadas, de insumos
agropecuários cada vez mais eficientes e da aplicação dos conhecimentos
científicos às diferentes práticas e etapas da produção de alimentos.
A U L A No entanto, na economia mundial de alimentos fica muito claro o contraste
entre os países desenvolvidos, que controlam as formas mais avançadas de

36 produção e que consomem a maior parte dos alimentos produzidos, e os países


subdesenvolvidos, incapazes de produzir ou importar os alimentos de que
necessitam.

As soluções previsíveis para reduzir esse desequilíbrio - aumentar a


área cultivada ou a eficiência dos agricultores - não podem ser adotadas
com facilidade. Na Ásia, por exemplo, calcula-se que já estão sendo utiliza-
dos aproximadamente 80% da terra potencialmente própria para a agricul-
tura (terra agricultável). Na América Latina, novas áreas de cultivo só serão
conseguidas com a derrubada de florestas, o que provocaria graves danos
ambientais. Na África, as chuvas insuficientes, em algumas áreas, e o
desgaste dos solos, em outras, diminuem suas possibilidades de produção
agrícola. A questão se torna ainda mais difícil porque as inovações tecno-
científicas são controladas por grandes empresas multinacionais que, ao
objetivarem o lucro, não estão preocupadas com os impactos sociais e
ambientais de suas ações.

A partir de 1950, a produção agrícola cresceu em um ritmo mais acelerado


do que em qualquer outro período da história, realizando uma verdadeira
revolução verde
verde. Nas últimas décadas, a agricultura registrou índices cada
vez mais elevados de produtividade, à medida que foi se integrando ao setor
industrial. A indústria passou a fornecer uma parte crescente das necessida-
des de consumo da agricultura, desde os fertilizantes e defensivos químicos
até as máquinas mais modernas. Os produtos agrícolas não são mais entre-
gues na sua forma natural para o consumo, sendo adquiridos e processados
pela indústria.
O surgimento de uma indústria especializada na produção de equipamen-
tos e insumos agrícolas fez da agricultura uma atividade dependente e subor-
dinada à indústria, criando certas desvantagens para os produtores agrícolas.
À medida que se dá essa integração, ocorre uma transferência de renda da
agricultura para a indústria. Na realidade, agricultura e indústria passam a
formar, por meio de vínculos contratuais, os chamados complexos agro agro-
industriais
industriais.
Nos países desenvolvidos, onde a indústria de bens de produção é mais
avançada, essa integração entre agricultura e indústria ocorreu primeiro e
com maior rapidez, tornando esses países grandes produtores e mesmo
grandes exportadores de produtos agrícolas.
Além disso, a atuação transnacional das grandes empresas industriais,
envolvidas no complexo agro-industrial, converteu-as em agentes da
internacionalização dessa nova estrutura produtiva de alimentos. Sua capa-
cidade de mobilizar recursos e tecnologia e sua capacidade empresarial
forçaram a modernização da produção agrícola em vários países ou regiões,
ao mesmo tempo em que tornaram essas áreas dependentes de sua presença.
Grandes indústrias farmacêuticas e agroquímicas passaram a investir em
pesquisa e produção de alimentos e ligaram-se cada vez mais às grandes
cadeias de distribuição de alimentos e de lojas, formando conglomerados
que, hoje, controlam desde a produção de sementes, adubos, hormônios e
genes in vitro até produtos enlatados e empacotados, oferecidos nos super-
mercados.
A U L A

36

A transnacional Bouge e Born controla aproximadamente 15% da produção mundial de trigo.


Ela atua nos cinco continentes.

Hoje podemos falar de um verdadeiro sistema alimentar mundial, no


qual vem aumentando a participação desses conglomerados, sediados nos
países desenvolvidos, na produção e comercialização dos produtos alimen-
tícios. E, mais do que isso, esse sistema está criando novos hábitos alimenta-
res e de consumo, como no caso das refeições ligeiras, cujo cardápio mundial
pode ser um refrigerante, um hambúrguer ou uma pizza.

Os avanços da produção agropecuária alteraram a tradicional divisão


do trabalho entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos, no setor de
alimentos. Muitos países são, ao mesmo tempo, vendedores e compradores
de alimentos. Alguns países desenvolvidos, a exemplo do Japão, da Itália e
da Alemanha, que possuem pequena área agricultável e uma população
numerosa com elevado nível de vida, importam mais do que exportam.
Alguns países subdesenvolvidos da África e do Oriente Médio também são
importadores de alimentos. O mesmo acontece com alguns países do Leste
europeu. Os Estados Unidos, o Canadá e a Austrália são grandes exporta-
dores de alimentos. Símbolo de um
hábito alimentar
mundializado.
A participação da produção agrícola no comércio mundial diminuiu
nos últimos vinte anos. Hoje, ela representa apenas 15% das trocas comer-
ciais mundiais. No entanto, por causa da difusão dos hábitos alimentares
dos países industrializados ocidentais, ocorreu um aumento da demanda
mundial de trigo - o mais importante produto no comércio mundial de
alimentos -, que alcançou, em 1992, mais de 100 milhões de toneladas
exportadas, o que significa, aproximadamente, metade do volume dos
produtos agrícolas comercializados.
A U L A

36

Produção/consumo de trigo

A mecanização da agricultura começou há mais de cem anos e foi anunciada


como um triunfo da sociedade industrial. Ela começou com o arado de aço
puxado a cavalo, em meados do século passado. A seguir, o motor a gasolina
instalado nos tratores e nas máquinas agrícolas faziam o trabalho pesado nas
fazendas. Hoje, a mecanização está praticamente concluída com a introdução de
equipamentos computadorizados. A mecanização evoluiu junto com as novas
técnicas de cultivo e com a genética agrícola. Por exemplo: as primeiras varieda-
des de milho híbrido triplicaram o rendimento por hectare; os fertilizantes
nitrogenados aumentaram o volume das safras e possibilitaram práticas agríco-
las mais intensivas.
Dos avanços conquistados pela produção de alimentos, os mais extraordiná-
rios deles têm sido, nos últimos anos, os obtidos no campo da biotecnologia
biotecnologia, isto
é, “qualquer técnica que use processos vivos para modificar produtos, melhorar
plantas ou animais, ou desenvolver microrganismos para usos específicos”.
Os cientistas podem, hoje, isolar e estudar a estrutura do genes que, nos
processos de vida, são responsáveis pelas características hereditárias, e alterar o
código genético de uma planta ou de um animal para aumentar sua resistência,
seu tamanho ou seu rendimento.
As novas tecnologias de cruzamento genético estão mudando o modo
como plantas e animais são produzidos. A engenharia genética, ou seja,
a aplicação de padrões de engenharia à manipulação dos genes, consegue
acrescentar, eliminar, reorganizar materiais genéticos, criando novos organis-
mos ou alterando o ritmo de crescimento. Exemplo disso ocorre na Austrália,
onde a transferência de genes no código genético de carneiros faz sua lã crescer
mais rapidamente.
Hoje é possível chegar a um pré-diagnóstico de uma doença vegetal A U L A
e introduzir resistências biológicas contra elas. O complexo agro-industrial deve
passar, no próximo século, da agricultura baseada na petroquímica para
a agricultura baseada na genética. 36
O desenvolvimento da informática aplicada à agricultura ajudará os agricul-
tores a monitorar o meio ambiente, a estabelecer estratégias de ação, e a
identificar áreas problemáticas. Os produtores agrícolas serão, num futuro
próximo, informados das mudanças meteorológicas e das condições de solo.
A seguir, equipamentos automatizados executarão as diferentes tarefas agríco-
las, transformando as fazendas modernas em fábricas automatizadas.
Os novos avanços da informática e da biotecnologia ameaçam acabar com a
agricultura ao ar livre até a metade do próximo século. Esses avanços terão
conseqüências imprevisíveis para os 2,5 bilhões de agricultores que dependem
da terra para sua sobrevivência.
O uso da biotecnologia é uma nova etapa na tentativa de produzir mais
alimentos e, como toda mudança muito profunda, terá vencedores e vencidos.
Tudo indica que o avanço gerado pela biotecnologia vai acentuar ainda mais o
desequilíbrio existente entre alguns países industrializados, como o Canadá, os
Estados Unidos e a Austrália, que têm superprodução de alimentos, e a maioria
dos países pobres que não são capazes de produzir ou importar alimentos
suficientes para atender às suas populações.

Pesquisadores do
Instituto Internacional de
Pesquisa do Arroz
selecionam, nas Filipinas,
espécies resistentes às
pragas e às condições
ambientais inadequadas
ao seu cultivo.

Em termos gerais, a biotecnologia


deverá abrir novos mercados, reduzir cus-
tos, oferecer novos produtos, criar novos
tipos de empregos. No entanto, certa-
mente irá suprimir grande número dos
empregos agrícolas tradicionais. Nos pa-
íses industrializados, a população econo-
micamente ativa do setor agrícola é pe-
quena, mas nos países pobres o número
de agricultores é muito grande e seus
empregos estão ameaçados.

Na Índia, onde a agricultura ocupa grande parte


da população, as novas tecnologias ameaçam o
emprego de milhões de camponeses.
A U L A Recentemente, duas empresas norte-americanas de biotecnologia anuncia-
ram a produção de baunilha em laboratório. Essa descoberta afetará a economia

36 de Madagascar, responsável por mais de 90% da safra mundial de baunilha. Lá,


70 mil agricultores dependem dessa cultura para sua subsistência.
Para os países pobres, a biotecnologia poderá diminuir a distância entre o
aumento populacional e a produção de alimentos. E isso significaria maior
consumo de calorias e melhoria dos padrões de vida. A biotecnologia poderia
afastar a “previsão malthusiana” que ameaça as sociedades mais pobres.
Já para o mundo desenvolvido, as mudanças provocadas pela biotecnologia
irão aumentar as tensões no comércio internacional. Os países que são grandes
exportadores de produtos agrícolas, como os Estados Unidos e o Canadá,
perderão tradicionais compradores, como o Japão e alguns países europeus, que
agora serão capazes de produzir o que consomem.
Mas a engenharia genética é muito cara e está quase totalmente nas mãos
de grandes empresas transnacionais, o que certamente agravará a relação de
dependência do mundo não desenvolvido. E o mais grave ainda: se é perigoso
um país depender da exportação de um único produto agrícola, cujos preços
flutuam muito no mercado internacional, será bem pior para esse país ver seu
produto de exportação se tornar desnecessário porque estaria sendo produzi-
do nos laboratórios de um país que antes o importava.
A revolução da biotecnologia traz, ao mesmo tempo, vantagens e desvan-
tagens. Hoje, não poderíamos produzir o alimento necessário para abastecer a
população mundial se estivéssemos utilizando as técnicas agrícolas de cin-
qüenta anos atrás. E certamente necessitaremos de inovações para atender ao
aumento cada vez maior do número de consumidores. A biotecnologia -
mesmo com as ameaças que ela representa - parece ser ainda a melhor solução.
Caso ocorra, no mundo, o domínio da produção de alimentos por um
novo complexo agro-industrial, resultante da união da informática com a
biotecnologia, poderá surgir uma nova era na produção de alimentos, em
laboratório, sem as limitações dos fatores naturais. Isso significaria a substi-
tuição da agricultura ao ar livre pela manipulação de moléculas no laborató-
rio. O preço desse progresso seria a eliminação de milhões de agricultores do
processo econômico e a mudança do papel do campo.

Nesta aula você aprendeu que:

l a mecanização da agricultura começou há mais de cem anos e a produção de


equipamentos e insumos agrícolas transformou a agricultura numa ativida-
de subordinada à indústria. Atividades agrícolas e industriais estão integra-
das nos complexos agro-industriais
agro-industriais;
l hoje, no final do século XX, a agropecuária passa por uma nova e extraor-
dinária revolução técnico-científica
técnico-científica. O uso de equipamentos computado-
rizados transformou a organização do trabalho rural; a produção de
fertilizantes mais eficientes alterou profundamente as condições naturais
do solo; a genética aplicada à agricultura tornou possível a obtenção de
espécies mais resistentes e melhor adaptadas às condições ambientais;
l a biotecnologia possibilitou melhor combate às pragas e maior proteção às
colheitas, mas existem sérios riscos envolvidos na perda de postos de
trabalho no campo e na difusão de novos organismos criados artificialmente.
Exercício 1 A U L A
Antes a agricultura produzia seus próprios adubos orgânicos. Hoje, esses
adubos são químicos e, em geral, vêm de fora. Antes, o preparo da terra
dependia de animais de tração, criados no próprio local. Hoje, os animais são 36
substituídos por tratores. A agricultura evoluiu para aquilo que atualmente
se chama de "complexos agro-industriais".
A partir do texto, explique o que são os complexos agro-industriais.

Exercício 2
Justifique a frase:
"O agricultor, hoje, não compra terra; compra o clima ."

Exercício 3
Apresente duas conseqüências positivas e duas negativas, dos avanços da
informática e da biotecnologia aplicados à agricultura.
A UA UL L AA

37 Para além
37 da polarização:
os novos
blocos políticos

N esta aula, vamos conhecer a ordem


geopolítica mundial estabelecida entre o final da Segunda Guerra Mundial e o
final da década de 1980 pela potência norte-americana, capitalista, e a soviética,
socialista. Estudaremos, também, a nova ordem que vem sendo estruturada na
década de 1990, em que a bipolaridade vai dando lugar a uma nova polaridade,
agora disputada pelas mais fortes economias de mercado.

Qual será o desenho do novo mapa político do mundo após o fim da Guerra
Fria? Qual a importância dos novos blocos geopolíticos da União Européia, da
Bacia do Pacífico e do Tratado Norte Americano de Livre Comércio (NAFTA)
sobre os demais países do planeta?
Sem dúvida o mundo ficou muito diferente após o desmonte da União
Soviética e o fim das economias centralmente planificadas do Leste Europeu. O
poderio militar norte-americano se estende por toda a superfície da Terra,
embora a economia da grande potência seja obrigada a compartilhar o mercado
mundial com novos e poderosos parceiros, como o Japão, a Alemanha e a
emergente China, o que permite supor que estamos assistindo à construção de
um mundo multipolar
multipolar.

Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo foi dividido em dois blocos


ideológicos: um capitalista, polarizado pelos Estados Unidos, e outro socialista, cujo
pólo era a União Soviética. Pólos antagônicos, tanto no plano econômico quanto no
militar. Era o início da Guerra Fria que predominaria como força motriz da ordem
geoestratégica mundial até 1989, quando o Muro de Berlim, um dos marcos mais
ostensivos da bipolarização, foi derrubado, marcando concreta e simbolicamente a
desestruturação do socialismo real e o fim da ordem mundial bipolar.
De 1945 até 1990, as questões geopolíticas se estruturaram em função da
oposição leste-oeste. Os 45 anos que se seguiram ao fim da Segunda Guerra
Mundial foram dominados, no plano das relações internacionais, pelo confronto
entre americanos e soviéticos. Ao longo desse período ocorreram momentos nos
quais as relações foram mais tensas; e outros, nos quais as relações entre as
superpotências foram mais amenas, chegando-se até, entre 1956 e 1962, a uma
situação de coexistência pacífica e, após 1985, a um período de aproximação entre
os governos dos dois países.
A NOVA ORDEM MUNDIAL A U L A

37

A Guerra Fria significava o confronto de dois regimes políticos e de duas


concepções econômicas, qualificadas como capitalismo e comunismo
comunismo. Mas o
confronto entre os Estados Unidos e a União Soviética não era apenas uma
oposição de diferentes concepções de sociedade ou, ainda, de diferentes
formas de expressar a liberdade e a justiça. Era mais que isso. As duas
superpotências lutavam pela hegemonia mundial procurando atrair, cada uma
para o seu bloco, o maior número de países. Países esses que, segundo seu peso
econômico-político no cenário mundial, passavam a ser aliados ou parte
da periferia das superpotências.
No pós-guerra, a oposição entre os dois blocos era nítida. No plano militar, a
Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) opunha-se ao Pacto de Varsó-
via. No plano econômico, enquanto os países europeus organizavam-se para
usufruir as vantagens da ajuda norte-americana, por meio do Plano Marshall, os
países do Leste Europeu se estruturavam no Conselho de Ajuda Econômica Mútua
(Comecom), sob a hegemonia soviética. Nesse período, restava aos demais países
escolher a liderança e o ingresso num dos campos antagônicos.
O processo de descolonização, que se seguiu ao final da Segunda Guerra
Mundial, deu origem a um grande número de países. E as superpotências,
estimuladoras da descolonização, passaram a exercer, em numerosos casos, o
papel das antigas potências coloniais. O espaço descolonizado transformou-se
em local privilegiado para a competição leste-oeste. Aos países pró-soviéticos
opunham-se os nitidamente pró-americanos. Somente os novos estados com
dimensões continentais, como a China e a Índia, mantiveram esquemas polí-
ticos e econômicos próprios, gozando de significativa autonomia.
A U L A Pouco a pouco, foi se estruturando um terceiro bloco - o chamado Terceiro
Mundo - não alinhado aos blocos já existentes. No entanto, a idéia de Terceiro

37 Mundo foi maior do que o conjunto de países não alinhados que o compunha
inicialmente. O Terceiro Mundo passou a ser pensado como o mundo subde-
senvolvido. Nele, os Estados Unidos e a União Soviética se enfrentaram em
numerosos conflitos, entre países ou no interior de um mesmo país, nos quais
as partes em confronto se ligavam às lideranças da Guerra Fria. Nenhum
desses conflitos fez uso de armas nucleares, mas eles foram responsáveis por
mais de 30 milhões de mortes. No período 1945-1990, os conflitos se sucederam
e a paz esteve sempre ameaçada.
No entanto, alguns fatos da segunda metade da década de 1980 prepararam
caminho para o final da Guerra Fria. Em 1985, o primeiro ministro soviético
Mikail Gorbachev, avaliando a situação política e econômica em que se encon-
trava a União Soviética, afirmou:

“Estamos percebendo um desgaste progressivo dos valores ideológicos e


morais do nosso povo. Ele se manifesta na diminuição das taxas de
crescimento e no mal funcionamento do sistema de controle de qualidade
que não incorpora os avanços da ciência e da tecnologia. Os indicadores
sociais, que atestam a melhoria da qualidade de vida crescem hoje mais
lentamente e as dificuldades de atender às necessidades de abastecimen-
to, de habitação, de bens e serviços são evidentes. A propaganda
que alardeia os sucessos - reais ou imaginários - prevalece sobre todos
os fatos. (...) As necessidades e as opiniões da massa trabalhadora
são ignoradas (...) mas não podemos aceitar a estagnação. Nós não
podemos aceitar a mentalidade de vulgares consumidores. Se nós apren-
dermos a trabalhar melhor, seremos mais honestos e cuidadosos uns com
os outros, estaremos criando, então, um modo de vida verdadeiramente
socialista.”

Gorbachev mostrava suas preocupações ao analisar as dificuldades so-


viéticas. Ele anunciou, em 1987, a necessidade de reestruturação da economia
para fortalecer os princípios do socialismo. Segundo ele, a perestroika
(reestruturação, em russo) elevaria o nível de responsabilidade social e as
esperanças soviéticas. A glasnost (transparência, em russo) revelaria os
privilégios ilegítimos e a sociedade soviética retomaria a estabilidade e o
crescimento econômico.
Porém, no final de 1989, a União Soviética foi forçada a se retirar do Leste
Europeu. A derrubada do Muro de Berlim, em 9 de novembro de 1989, abriu
caminho para a reunificação alemã, até então dividida entre os dois blocos. Em
seguida, os países da Europa Central e Balcânica pediram a saída das tropas
Queda do Muro soviéticas dos seus territórios. Em 1991, o Comecom e o Pacto de Varsóvia foram
de Berlim. dissolvidos.
O império soviético viveu então uma crise econômica e política
sem precedentes: tentativa de golpe militar, sublevações populares,
revolução liberal. A União Soviética deixou de existir em 21 de
dezembro de 1991.
Em seu lugar surgiram novos estados soberanos e independentes.
Contra essas forças de dissolução surgiu a idéia de formar uma
Comunidade de Estados Independentes (CEI), reunindo doze das
quinze ex-repúblicas soviéticas. Contrariando as expectativas, a CEI
parece ter conseguido reunir as “ovelhas desgarradas”.
O esfacelamento da União Soviética significou a “vitória” americana. Após A U L A
a intervenção no Golfo Pérsico, para punir a ação do Iraque na invasão do
Kuwait, em janeiro de 1991, os Estados Unidos reafirmam seu papel de
superpotência hegemônica e impuseram a pax americana, isto é, a paz ameri- 37
cana semelhante à pax romana imposta pelas legiões, no Império Romano. Os
Estados Unidos passaram a dominar a nova ordem mundial, o que, para alguns
geógrafos, significa um mundo unipolar
unipolar. Para outros, no entanto, o mundo
pós-Guerra Fria é multipolar
multipolar.
MEGABLOCOS REGIONAIS

Os Estados Unidos são, sem dúvida, a primeira potência econômica, cientí-


fica e tecnológica no mundo contemporâneo. Sua população dispõe de um alto
nível de vida e sua sociedade aparece, em escala mundial, como um exemplo a
ser seguido. A realidade americana exerce no imaginário coletivo mundial um
efeito de demonstração impressionante: a liberdade, como bem inalienável,
exercida nos limites da ação individual e dentro de um quadro democrático,
é a sua identidade mais característica.
Ao final da Segunda Guerra Mundial o “dólar era tão bom quanto o ouro”.
As decisões de Bretton Woods confirmavam a hegemonia econômico-financeira
dos Estados Unidos. Hoje, essa posição não é tão tranqüila. A importância do
déficit comercial e financeiro norte-americano traduz a “fome” de consumo da
sua população e a internacionalização do seu sistema econômico.
Em 1º de julho de 1994, o vencedor da Guerra Fria aliava-se a uma potência
média, o Canadá, e a um país em via de desenvolvimento, o México, com o
objetivo de estabelecer uma zona de livre comércio entre eles. O Acordo de Livre
Comércio da América do Norte (Nafta) deveria promover a democracia
do mercado e abrir as negociações com outros países latino-americanos, a fim
de criar um grande mercado do Alasca à Terra do Fogo.

A Europa, abrindo mão dos nacionalismos - que a levaram, por duas vezes
no espaço de uma geração, ao limite do caos -, vem procurando uma nova
ordem política e econômica. A situação crítica do pós-guerra levou à assinatura
do Tratado de Roma, em 1957, que criava a Comunidade Econômica Européia
(mais conhecida como Mercado Comum). A população européia, de aproxima-
damente 400 milhões de habitantes, alcançou os mais elevados indicadores de
qualidade de vida do planeta, além de um extraordinário dinamismo indus-
trial e comercial.
A U L A O Tratado de Maastricht, que come-
çou a vigorar em 1º de novembro de 1993,

37 definiu as novas estratégias da União


Européia (UE) - nova denominação para
a Comunidade Européia. Graças a esse
Tratado foram abolidas as últimas barrei-
ras econômicas e definidas as estratégias
para a adoção, em 1999, de uma moeda
única, o euro
euro, o que exigirá, dos países
membros, importantes decisões econô-
micas e financeiras.
Em 1995, vários países candidataram-
se ou manifestaram intenção de integrar a
UE. A Áustria, a Finlândia, a Noruega e a
Suécia tiveram suas candidaturas aceitas;
os países do chamado grupo de Visegrad -
Polônia, República Tcheca, República da
Eslováquia e Hungria - demonstraram
interesse em ingressar na UE, mas as nego-
ciações ainda não estão definidas.
Provavelmente, a União Européia deverá ser a primeira potência mundial,
no século XXI, destacando-se no seu interior a economia alemã, que pode
funcionar como um pólo dentro da UE.
O desaparecimento da Cortina de Ferro (que, durante a Guerra Fria,
separava a Europa Ocidental da Europa do Leste) mostrou com clareza as
diferenças que separavam os dois modelos de sociedade que estavam sendo
estruturados. Enquanto a Europa Ocidental se organizava tendo como base a
idéia de liberdade
liberdade, a Europa do Leste se estruturava de acordo com o princípio
da igualdade
igualdade. O terceiro princípio da Revolução Francesa, a fraternidade
fraternidade,
ainda não foi alcançado concretamente. A integração da Europa num projeto
unitário poderá reunir os três princípios.

O Japão saiu da Segunda Guerra Mundial totalmente destruído. Pelos


acordos de paz foi impedido de reconstituir sua base militar. Mas, em 1949,
graças à mudança da política punitiva imposta pelos Estados Unidos, devido à
comunização da China, o Japão reorganizou rapidamente sua base econômica.
Nos anos 30, o Japão pretendeu desenvolver um grande projeto político-
militar que chamou de “co-prosperidade na Ásia do Pacífico”. Mas o avanço
imperialista japonês terminou na Segunda Guerra Mundial e na sua rendição
incondicional. O que o Japão não conseguiu militarmente, nos anos 30, está
conseguindo realizar economicamente, graças aos investimentos de capital, nos
anos 80. Durante a crise do petróleo
petróleo, as indústrias tradicionais, grandes
utilizadoras de mão-de-obra e consumidoras de matérias-primas, foram
deslocadas para o leste e o sudeste da Ásia. O megabloco do Pacífico começava
a se esboçar. Ao mesmo tempo, o Japão aplicou a reengenharia em suas
empresas, alcançando o máximo de eficiência de seu sistema produtivo.

Em 1989, em Camberra (Austrália), definiu-se um novo bloco econômico -


a Cooperação Econômica da Zona Ásia-Pacífico (Apec). A iniciativa de formação
desse bloco coube à Austrália, que de tradicional cliente da Europa Ocidental
está se transformando numa importante fronteira de recursos para o Japão, à
medida que se integra ao bloco asiático.
As medidas políticas liberalizantes ocorridas na China abriram novas possi- A U L A
bilidades aos capitais japoneses. A partir de 1979, com a abertura das primeiras
zonas econômicas especiais
especiais, foram estimulados investimentos e transferência
de tecnologia japoneses para essas áreas. 37
Durante a Guerra Fria, o Japão mantinha uma aliança político-militar estável
com os Estados Unidos. Agora, entre os dois países estabeleceu-se uma relação
econômica de concorrência. Ao mesmo tempo e em nome da competitividade,
são feitas alianças bilaterais - IBM com Toshiba, Hitachi com Texas, Ford com
Mazda -, mostrando que a cooperação é tão necessária quanto a rivalidade.
Assim se pode explicar o aparecimento de produtos binacionais, trinacionais ou
até quadrinacionais no mercado globalizado, desafiando as mais eficientes
políticas protecionistas.
Em 1993 o governo japonês lançou a idéia de pacifismo militante
militante, compro-
misso entre a renúncia à guerra - prevista na Constituição e com forte apoio na
opinião pública - e a responsabilidade internacional. A retirada do “guarda-
chuva” militar norte-americano pode significar o aparecimento de uma constru-
ção regional, de uma nova realidade política e social que dará sentido ao espaço
Ásia-Pacífico.
O mundo geopolítico da Guerra Fria conviveu com os vinte anos gloriosos
da economia capitalista que foram interrompidos, na década de 1970, com a crise
do petróleo. Na realidade, a crise anunciava a necessidade de mudanças estru-
turais no modelo industrial que havia garantido o extraordinário crescimento
econômico dos anos anteriores. A revolução tecno-científica, baseada na
automação dos processos produtivos, aumentou a produtividade e diminuiu as
necessidades de matérias-primas, de energia e de mão-de-obra. A pesquisa
científica e o conhecimento passaram a ser os insumos mais importantes do
processo produtivo. A incorporação de novas tecnologias exigiu grandes inves-
timentos e os mercados consumidores deveriam ser ampliados na mesma escala.
A integração em mercados regionais, acima dos limites criados pelo Estado-
nação, era, agora, uma exigência das grandes corporações, que passaram a
liderar a economia globalizada. O surgimento dos blocos econômicos (Nafta,
UE, Apec, Mercosul) é o resultado dessa política de ampliação dos mercados.
Os mercados ampliados, consolidados nos megablocos, aumentam a produ-
tividade das empresas graças às economias de escala. Quando uma empresa
ganha em eficiência, no interior do bloco, aumenta suas possibilidades de
competir na economia globalizada, para além da polarização.

Nesta aula você aprendeu que:

l a ordem geopolítica e geoestratégica do período que vai do pós-guerra


(1945) até 1989 era bipolar. Ela era constituída por dois blocos antagônicos
tendo de um lado o Primeiro Mundo capitalista, com os Estados Unidos e
seus aliados, e do outro, o Segundo Mundo socialista, com a União Soviética
e os países do Leste Europeu;
l os países do Terceiro Mundo
Mundo, com exceção da China e da Índia, estavam
atrelados a uma potência ou a outra;
l na década de 1980, a União Soviética revelou ao mundo o descompasso
existente entre a potência militar e econômica e a sociedade. O bloco
socialista se desestruturou e vive, hoje, a experiência da transição de uma
economia centralmente planificada para uma economia de mercado mercado;
A U L A l desde a década de 1970, o bloco capitalista vem sofrendo uma grave crise,
incluindo-se aí uma forte competição entre as potências que lideram os

37 novos blocos econômicos. O mundo bipolar vai dando espaço a uma nova
ordem geopolítica multipolar
multipolar.

Exercício 1
Leia este texto com atenção.

“O mundo bipolar era a nova paisagem estratégica a que não apenas os


povos europeus, de uma Europa dividida, deveriam se ajustar. Mas
também da África, Oriente Médio, América Latina e outros que tiveram
de se adaptar ou resistir durante o período da chamada Guerra Fria.”
Adaptado de KENNEDY, P. Ascensão e Queda das Potências . Rio de Janeiro, Ed.
Campus, 1989.

Desenvolva duas idéias apresentadas no texto.

Exercício 2
Apresente duas tendências da geopolítica mundial após o fim da Guerra Fria.

Exercício 3
Leia este texto com atenção.

“Até muito recentemente, os Estados Unidos davam as cartas como líder


militar e econômico do mundo livre. Agora, o Japão parece ter usurpado
o poder econômico. (...) Muitos dos desgostos dos Estados Unidos são
obras deles mesmos, mas alguns preferem pôr a culpa no Japão, dizendo
(...) que somos um parceiro desleal.”
ISHIHARA, S. O Japão que sabe dizer não . São Paulo. Siciliano, 1991.

Indique duas estratégias adotadas pelo Japão, após a crise do petróleo, para
fazer frente aos Estados Unidos.
AUU
A L AL A

38
A pobreza das nações: 38
onde ficou o
desenvolvimento?

N esta aula, vamos conhecer alguns dos indi-


cadores usados para medir a riqueza das nações. Iremos estudar também teorias
que tentam explicar as desigualdades existentes no mundo atual e as numerosas
tentativas já realizadas para diminuir o fosso que separa o Norte do Sul.

Qual o efeito das mudanças que estão ocorrendo no mercado mundial sobre
os países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos? Qual será o papel da
América Latina e da África na nova ordem mundial que se impõe a partir dos
desígnios do Norte industrializado? Será que o Sul também existe, apesar da
miséria, das guerras fratricidas e do crescimento das doenças infecto-contagio-
sas, como a Aids?
Aparentemente, aquilo que fazia parte da agenda dos países industrializa-
dos logo após o final da Segunda Guerra Mundial, isto é, a busca do desenvol-
vimento de todos os países do planeta, deixou de ser relevante para as principais
economias industrializadas. Hoje, o futuro da África, aparentemente, depende
muito mais da cooperação dos países do Sul, do que da exclusão a que foi
condenada pelo Norte.

Para Adam Smith, um dos mais importante teóricos da economia clássica


liberal, em sua obra A Riqueza das Nações, “(...) nenhuma sociedade pode
crescer e ser feliz se a maioria dos seus membros é pobre e miserável.”
Hoje, para se medir a riqueza ou a pobreza das nações utiliza-se o chamado
Produto Interno Bruto (PIB) que é um indicador da renda e do nível de vida real
da população de determinado país. O PIB corresponde à soma dos valores
agregados pelos agentes econômicos que atuam em um território nacional.
Apesar das décadas de crescimento econômico e social que se seguiram à
Segunda Guerra Mundial, a situação de pobreza tem se agravado. Entre 1965 e
1985, a renda dos países pobres teve um ganho de 100 dólares por habitante,
enquanto os países ricos aumentaram sua renda em 4.000 dólares por habitante.
Acentuou-se a diferença entre os países do norte e do sul (em relação à linha do
Equador). A renda per capita nos países ricos é cinco ou dez vezes maior do que
a de um país de industrialização tardia como o Brasil.
A U L A RICOS E POBRES

38

Mas o PIB não deve ser a única referência para mostrar as desigualdades
existentes entre os países de economia industrializada do hemisfério norte e os
de economia basicamente primário-exportadora do hemisfério sul. Outros indi-
cadores, a exemplo do consumo de energia, mostram com maior nitidez o nível
de desenvolvimento de um país. Os Estados Unidos, o Canadá e os países da
Europa Ocidental, com menos de 15% da população mundial, consomem mais
da metade da energia primária produzida no mundo. Um europeu consome
vinte vezes mais energia do que um africano.
Pode-se também adotar como referência, para diferenciar ricos e pobres, os
indicadores culturais, como o número de livros publicados em um ano, o número
de receptores de televisão por habitante, ou a porcentagem de adultos analfabe-
tos existentes na população. Enquanto, em 1992, o Canadá publicou em torno de
vinte mil títulos de novos livros, o Paquistão publicou menos de dois mil.
No Canadá existem seiscentos aparelhos de televisão por mil habitantes, o que
pode significar o acesso à informação e ao lazer. No Paquistão esse número cai
para quinze aparelhos por mil habitantes.
Também é possível confrontar indicadores sociais, como a quantidade diária
de calorias ingerida por habitante ou o acesso à água tratada e às instalações
sanitárias. Enquanto nos países industrializados a quase totalidade da popula-
ção tem acesso a água de qualidade, nos países subdesenvolvidos menos de 30%
da população recebe água tratada.
Existem ainda critérios de comparação entre riqueza e pobreza que são
difíceis de medir, como a manifestação livre de idéias ou a estabilidade política.
Afinal, o homem não é apenas um produtor/consumidor de mercadorias
e serviços. Seu bem-estar depende, também, desses valores não-materiais
que ainda não foram conquistados por grande parte da população mundial.
Várias teorias foram elaboradas para explicar “a a pobreza das nações
nações” .
Algumas delas, ainda que equivocadas, prevaleceram durante muito tempo.
Outras, embora corretas, explicavam apenas parcialmente a origem da pobreza.
Nenhuma delas foi suficientemente abrangente para atender a todas as sutilezas
da desigualdade sócio-econômica existente hoje entre os Estados-nações.
No século XIX, os europeus afirmavam que a pobreza dos povos do hemis- A U L A
fério sul era o resultado da combinação de fatores naturais hostis e fatores
humanos marcados pela inferioridade dos grupos raciais que habitavam “as
ásias e as áfricas tropicais”. Nesse período Grã-Bretanha, França e Alemanha 38
foram, com uma energia especial, potências coloniais. Era necessário difundir
entre os “povos inferiores” as conquistas materiais da Europa branca, indus-
trializada, “superior”. As metrópoles tinham uma visão positiva da sua “missão
civilizadora”. As lembranças desse período estão vivas no inconsciente coletivo
dos povos dos países dominados, assim como as conseqüências concretas
das formas de dominação a que foram submetidos.
Após a Segunda Guerra Mundial, essa explicação foi sendo substituída por
outra, mais consistente e largamente difundida entre as elites intelectuais dos
então chamados países subdesenvolvidos. Tal explicação afirmava que a pobre-
za da África, da Ásia e da América Latina decorria da exploração colonial a que
esses continentes foram submetidos. As relações impostas pelas potências
imperialistas às suas colônias teriam levado a uma extrema exploração da força
de trabalho, à manutenção de baixos níveis de escolaridade e, durante muito
tempo, teriam impedido a estruturação de Estados nacionais.
Essa explicação, embora coerente, lança toda a responsabilidade da pobreza
sobre os colonizadores, sem revelar que os bloqueios para o desenvolvimento
encontram-se também no interior desses países. Seus sistemas sociais eram
dominados por elites políticas que impediam as reformas modernizadoras e
mantinham a renda concentrada em suas mãos. Recursos eram perdidos com
excessivos gastos militares ou em obras de resultados econômicos duvidosos.
Os investimentos feitos em saúde e educação eram insuficientes, comprometen-
do a qualidade dos recursos humanos.
Na segunda metade do século XX, ocorreu o mais importante movimento
político de nosso século - a descolonização
descolonização. O direito dos povos a se autogover-
narem foi aceito como princípio, e as palavras “colonialismo” e “imperialismo”
passaram a ser condenadas. O colonialismo chegava ao fim. A descolonização passou
a ser vista como um triunfo da modernidade e uma derrota das forças reacionárias.
No entanto, outra circunstância poucas vezes percebida atuou na
descolonização: a perda do fundamento econômico do colonialismo. No século
XIX, o capitalismo industrial contava com as vantagens das relações de explora-
ção colonial, ou seja, a aquisição de matérias-primas e produtos tropicais
em troca do fornecimento de produtos industriais. Na divisão internacional
do trabalho, realizavam-se as denominadas trocas desiguais que permitiam
grandes lucros às economias industriais.
A partir da Segunda Guerra Mundial, os interesses das potências industriais
passaram a ser outros. Seu desenvolvimento econômico estava agora centrado
no desenvolvimento técnico-científico e o papel das colônias começava a perder
importância. O comércio entre as potências industriais passava a ser muito mais
importante do que as relações comerciais com os países do hemisfério sul.
Ao final da Segunda Guerra Mundial, as colônias podiam se tornar independen-
tes porque o custo econômico desse fato político revelava-se muito pequeno.
Mas não estaria sendo estruturada uma nova forma de dominação mais sutil que
a anterior? No lugar da dominação imposta pelo Estado colonialista estava se
esboçando agora uma dominação patrocinada pelo setor privado, tendo como
instrumento visível a empresa transnacional. Essa idéia teve um importante efeito
no desenvolvimento econômico dos novos Estados nacionais, que resistiram ini-
cialmente aos investimentos estrangeiros. Essa nova política colocava os novos
Estados nacionais à mercê dos interesses e dos investimentos das grandes empresas.
A U L A Como conseqüência da Guerra Fria, os países pobres receberam, nos últimos
cinqüenta anos, uma grande atenção dos países ricos. Nos primeiros anos de

38 auxílio acreditava-se que a passagem de uma situação de pobreza para a de uma


situação de desenvolvimento econômico se realizaria com a transferência da
“mobília pesada” da industrialização. Assim foram transferidas siderúrgicas,
hidrelétricas, indústrias químicas e setores da mecânica pesada, que caracteri-
zavam a economia industrial, para alguns países subdesenvolvidos. Essas
industrias representariam o progresso econômico e o fim da pobreza.
Na realidade foi um erro de avaliação. Essa ação não deu os resultados
esperados porque, ao privilegiar o econômico, ignorava os indicadores sociais,
a exemplo da educação e da saúde para as massas como condição essencial para
o enriquecimento humano de um Estado-nação. Nenhum país é pobre se a sua
população tem acesso a uma educação básica de qualidade. Em sentido amplo,
a educação deve ser o ponto de referência para as políticas de desenvolvimento
a serem praticadas.
Nas últimas décadas, os países industrializados forneceram créditos e
financiamentos aos subdesenvolvidos, o que possibilitou taxas de crescimento
econômico altas mas aumentou a relação de dependência entre eles. A crise
econômica a partir dos anos 70 criou novas dificuldades: os preços das matérias-
primas decresceram e as taxas de juros se tornaram insuportáveis.
Os Novos Países Industrializados não conseguiram amortizar as dívidas
contraídas e o endividamento bloqueou o crescimento econômico. Os países
latino-americanos foram os principais atores dessa tragédia. As dificuldades
surgidas com o endividamento - 1 trilhão e 500 bilhões de dólares aproximada-
mente, em 1995 - foram enormes. O serviço da dívida, isto é, os juros e
compromissos financeiros para mantê-la, representava, em média, 25% do valor
das exportações. Para enfrentar o endividamento externo, numerosos países
aplicaram políticas de estabilização com restrição nos investimentos públicos,
agravando ainda mais o quadro econômico e social.
VALOR DA DÍVIDA EXTERNA EM PORCENTAGEM DO PIB

Hoje, a pobreza absoluta atinge em torno de um bilhão de habitantes, quase


20% da população mundial. A maior parte dos países que apresentam os maiores
índices de pobreza absoluta encontram-se em dois cinturões: o africano
africano, atraves-
sando toda a África Equatorial e Tropical, do Saara até a bacia do rio Zambeze,
e o asiático
asiático, que atinge o sul e sudeste desse continente, indo do Paquistão até
a Indonésia.
A U L A

A ordem econômica mundial exige que o diálo- 38


go Norte-Sul se estabeleça em novas bases. A As-
sembléia Geral da ONU tomou essa decisão em 1974!
As Nações Unidas poderiam ser o fórum privilegia-
do para esse diálogo mas os movimentos realizados
pelo bloco de países do hemisfério sul não sensibili-
zaram os países mais ricos. A ação das instituições
especializadas mantidas pela ONU, tais como a
Unesco, a OMS e a FAO, não foram suficientes para
diminuir o fosso que separa o Norte do Sul.

O desenho representa a brutal diferença


entre os países mais ricos e os mais pobres.

Nesta aula você aprendeu que:

l além do Produto Interno Bruto (PIB), os indicadores sociais e culturais


revelam as desigualdades existentes entre o Norte e o SulSul;
l essas desigualdades foram explicadas por numerosas teorias, sendo a mais
difundida a que afirmava que a pobreza da Ásia, da África e da América
Latina decorria da exploração colonial
colonial;
l na segunda metade do século XX, após a independência dos países coloni-
zados, as nações industrializadas forneceram créditos e financiamentos para
o desenvolvimento econômico desses países. Mas o endividamento exter-
no levou-os a uma crise insustentável;
l hoje, quase 20% da população mundial vive numa situação de pobreza
absoluta
absoluta;
l as bases para um novo diálogo e para a cooperação entre o Norte e o Sul e
entre os países do Sul deve ser a grande tarefa das Nações Unidas, no limiar
do século XXI.

Exercícios
Cite três indicadores usados para medir a riqueza ou a pobreza de um
determinado país.

Exercício 2
Apresente duas teorias elaboradas para explicar "a pobreza das nações".

Exercício 3
Como a dívida externa, contraída pela América Latina, bloqueou o seu
desenvolvimento?
A UA UL L AA

39
39
O ovo da serpente:
a cultura da violência

N esta aula, vamos avaliar a violência no


mundo e abordar algumas de suas diferentes manifestações. Destacaremos a
miséria em que vive grande parte dos homens como a origem da violência.
Vamos analisar a violência contra a natureza que, em última análise, é também
uma violência contra os próprios seres humanos.

Qual a origem da escalada de violência que explode em conflitos, guerras e


tiroteios urbanos? De onde provêm tantas armas modernas e por que as drogas
são tão consumidas no mundo atual?
A globalização trouxe novos e angustiantes problemas para a comunidade
das nações e para os habitantes do planeta Terra. De um lado, emerge a
consciência de que fazemos parte de um grande conjunto mundial; de outro,
vemos que a exclusão dos benefícios do progresso é cada vez maior, deixando
milhões de pessoas sob a ameaça da fome e da guerra, que hoje não acontece
apenas nos lugares distantes, pois está presente nas grandes cidades brasileiras.

O problema da violência no mundo contemporâneo é extremamente com-


plexo. Na realidade não existe violência, mas violências, que devem ser enten-
didas em seus contextos e situações particulares. Mas há um conjunto de
variáveis que deve ser pensado, indiscutivelmente, como o patamar básico para
as diferentes formas de violência: a pobreza, a miséria, a desigualdade na
distribuição da renda. Embora esse conjunto não explique por si só a violência,
ele atua como fator básico para a formação de um campo propício ao desenvol-
vimento de violências dos mais diferentes tipos. Partindo desse raciocínio
podemos levantar algumas das diferentes situações atuais de violência no
mundo.
A globalização da economia ampliou a circulação de capitais, tecnologias e
produtos. Ao ampliar as atividades econômicas, ela favoreceu os negócios de
duas mercadorias muito especiais: armas e drogas. Os negócios ilegais operam,
hoje, em escala global, e não existe nenhum organismo internacional em condi-
ções de realizar ações repressoras eficazes contra essas atividades. A economia
mundial passou a se comportar como uma máquina cada vez mais poderosa,
violenta e incontrolável.
A Guerra Fria havia estruturado a idéia de que os conflitos nacionais ou A U L A
internacionais estavam todos relacionados direta ou indiretamente à oposição
Leste-Oeste. Com o fim da ordem bipolar, o clima de confrontação se desfez e as
organizações internacionais passaram a atuar como forças de regulação dos 39
conflitos regionais. Desde o final da Guerra Fria aumentaram as solicitações para
reformular a Carta das Nações Unidas nos itens que determinam em que
condições a organização pode intervir nos assuntos de competência nacional
nacional.
Essas pressões têm aumentado por causa da multiplicação dos pedidos de
socorro feitos pelos pequenos estados agredidos, pelas minorias dizimadas
e pelas vítimas de guerras civis intermináveis.

Nos anos que se seguiram à queda do Muro de Berlim, crises e conflitos


como os ocorridos na Bósnia, em Ruanda, na Argélia, no Afeganistão e no
sempre explosivo Oriente Médio, transformaram tais regiões em novas zonas de
violência. Nesses conflitos nem sempre ficava clara a posição dos diferentes
participantes e eram freqüentes as situações de desintegração dos Estados
nacionais. A dificuldade de se classificar essas situações como “guerra” passava
a exigir formas originais de atuação.
Entre 1989 e 1992, chegou-se a admitir que o intervencionismo seria a
medida-chave. No Kuwait, a intervenção realizada pelos Estados Unidos foi
feita em nome da legítima defesa coletiva
coletiva, mas na Iugoslávia e na Somália era
impossível aplicar o mesmo argumento, pois se tratavam de movimentos de
minorias que lutavam para conquistar seus próprios territórios nacionais.
Alguns países, ao perderem a proteção da União Soviética, correram o
risco de se desfigurar. Por isso, a lógica do mercado, criando esperanças de
vantagens econômicas, tornou-se o parâmetro da nova estratégia interna-
cional, como revelam os projetos de desenvolvimento dos dragões ou tigres
do Sudeste Asiático.

A violência contra a natureza não se


manifesta, aparentemente, de forma tão
explosiva quanto as situações já mencio-
nadas aqui. Mas o efeito estufa
estufa, o desapa-
recimento de espécies
espécies, o buraco na cama-
da de ozônio
ozônio, as chuvas ácidas
ácidas, a deser-
tificação de algumas áreas, a poluição do
ar - resultantes do crescimento econômico
a qualquer preço - trazem conseqüências
irreversíveis para o ambiente natural do
planeta. São fatos que certamente muda-
rão as condições de vida na biosfera e
poderão, até mesmo, torná-las insuportá-
veis para a espécie humana.
Desde a década de 1970, os proble-
mas ecológicos passaram a ser discutidos
mundialmente em termos de caos imi-
nente. Se ocorrer de fato uma crise ecoló-
gica, ela, diferentemente das demais, será
global e atingirá igualmente as áreas ricas
e as pobres, pois na natureza não existem
as fronteiras artificialmente criadas pelos A ação do homem aumentou o fluxo
homens. de substâncias tóxicas na atmosfera.
A U L A As políticas ecológicas que vêm sendo propostas não precisam chegar ao
radicalismo de propor que o crescimento da produção mundial passe a ser zero,

39 como forma de preservação do meio ambiente. Até porque essa decisão serviria
para manter a atual distribuição desigual da riqueza mundial, que favoreceria
os países economicamente mais avançados sem dar chance de desenvolvimento
para os países mais pobres.
A taxa de desenvolvimento mundial deve ser reduzida, sim, mas ao limite
do sustentável, ou seja, com base num equilíbrio entre os homens, os recursos
(renováveis ou não) utilizados e os seus efeitos sobre o meio ambiente.
Mas, entre todas as situações vividas no mundo atual, aquela que provavel-
mente irá se tornar a principal causa de tensão e violência no século XXI é o
aprofundamento do fosso que separa os países ricos dos países pobres. Hoje,
entre os primeiros, alastra-se um sentimento xenófobo responsável por ações
dirigidas contra os imigrantes do Terceiro Mundo.
Se a prática mostrou que ainda não existe um sistema econômico capaz de
competir com o capitalismo, também é necessário reconhecer a incapacidade do
sistema de mercado de eliminar as desigualdades sociais e os bolsões dos
excluídos. No mundo contemporâneo, marcado pela revolução técnico-científi-
ca, a generalização do bem-estar e a redução das desigualdades devem ser as
principais prioridades. Porém, o modo como essas ações vão se realizar é a
grande incógnita.
A política do novo século deve ser dominada pela distribuição social.
A alocação dos recursos sem o objetivo exclusivo do lucro é essencial para essa
nova ordem, mas isso vai depender da restauração da autoridade pública
nacional ou supranacional. A ONU, nesse quadro, deveria exercer um papel
mais explícito e desenvolver ações mais enérgicas.
Não há solução milagrosa para o desmoronamento dos Estados nem receitas
de pacificação para as guerras civis. Rompida a política bipolar, reativaram-se
antigos conflitos que mostram a impotência das instituições internacionais para
resolvê-los. Neste final de século, os homens estão tateando os caminhos para o
século XXI. Enquanto se instala uma (des)ordem global, sem um mecanismo
capaz de acabar com ela ou mantê-la sob controle, falta um sistema internacional
que supervisione o novo desenho do mundo.
No filme O ovo da serpente , do cineasta sueco Ingmar Bergman, é retratada
a difícil situação vivida pela Alemanha nos anos 20 - inflação devastadora,
desemprego, crise. Ao encontrar a solução para a situação de violência apresen-
tada no filme, um dos personagens afirma: “É como o ovo da serpente. Nele você
pode acompanhar o desenvolvimento do monstro que está sendo gerado.”
Essa parece ser uma das poucas certezas deste final de século. Estamos assistin-
do, na nova ordem mundial, a uma escalada da violência.

Nesta aula você aprendeu que:

l a violência no mundo contemporâneo é muito complexa, mas a pobreza e


a desigualdade de renda são as suas origens indiscutíveis. A ruptura do
mundo bipolar estimulou a formação de uma nova ordem global marcada
pelo surgimento de numerosos conflitos e pela dissolução de Estados
nacionais
nacionais;
l a longo prazo, os problemas centrais são a desigualdade entre os países A U L A
ricos e pobres e a questão ambiental
ambiental. O desenvolvimento sustentável
propõe um equilíbrio entre a ação dos homens, o uso dos recursos e os
efeitos das atividades econômicas sobre o meio ambiente; 39
l a partir de 1989, têm aumentado as solicitações para uma ação mais enérgica
das organizações internacionais
internacionais, incapazes, até aqui, de atender às solicita-
ções da nova ordem mundial, mas a violência se institucionalizou e se
transformoua na grande ameaça do novo século.

Exercício 1
Leia com atenção o texto a seguir. Identifique, nele, “o patamar básico das
diferentes formas de violência do mundo contemporâneo”.

“Quando a Guerra Fria amainou e as fronteiras ideológicas começaram


a desaparecer, nos vimos dentro de outra macro-geografia, a das frontei-
ras econômicas. Estas são visíveis demais. Separam bairros, dividem
ruas, - e você as cruza todos os dias. No trajeto entre o seu condomínio
cercado e seu escritório, ar condicionado dentro do seu carro importado,
você as cruza mais de uma vez. Passa por flóridas, suíças, bangladeshes,
algumas bolívias e em cada sinal que pára está na Somália. É impossível
defender essa fronteira. A grande questão do fim do século é como
defender seu perímetro pessoal da miséria impaciente e predadora. Os
americanos não podem ajudar dessa vez. A fronteira maluca zigueza-
gueia dentro dos Estados Unidos também.”
VERÍSSIMO, L. F. Fronteiras. Jornal do Brasil, 7/4/1996.

Exercício 2
A Europa foi, em vários momentos da História, pólo irradiador de migra-
ções, de onde saíram levas de homens e mulheres na direção de várias partes
do mundo. No entanto, a atual situação dos processos migratórios para
a Europa tem apresentado um novo panorama, cuja principal característica
é a hostilidade em receber novos migrantes.
Apresente duas manifestações contrárias à presença de imigrantes nos
países da União Européia.

Exercício 3
Durante uma semana, procure e recorte, em jornais diários, diferentes
situações de violência.
A UA UL L AA

40
40 O embrião de Gaia:
a ecologia
como utopia planetária

N esta aula, vamos estudar a hipótese Gaia -


a Terra como um sistema fechado, vivo, que põe em destaque as alterações
ambientais produzidas pela ação do homem. Vamos ver quais os encaminha-
mentos que a hipótese sugere para a manutenção das condições ambientais
adequadas à vida.

De que maneira a consciência de que habitamos um planeta frágil pode


ajudar a encontrar saídas para a crise que atravessamos? Como é possível
encontrar na ecologia uma nova maneira para pensar a economia mundial e
buscar alternativas de desenvolvimento que não comprometam o futuro das
novas gerações?
A hipótese Gaia - isto é, de que o planeta Terra é um organismo vivo, onde os
fluxos de energia são fundamentais para a manutenção dos ciclos vitais e para
garantir a reprodução das espécies, inclusive a humana - é um bom princípio para
começar a construção de uma nova ordem mundial, em que a justiça social e a
qualidade ambiental sejam as principais metas para o desenvolvimento sustentável.

Na opinião de numerosos cientistas, a Terra pode ser comparada a um


organismo vivo do qual todas as espécies fazem parte. Esse ser vivo, com
identidade própria, mereceu um nome especial, Gaia Gaia, denominação que
os gregos antigos davam à deusa que personificava a Terra, mãe de todas
as criaturas vivas.
O primeiro cientista a defender essa hipótese foi o inglês James F. Lovelock.
Ele propôs, ao formular a hipótese Gaia, que a Terra deve ser estudada como um
sistema fechado, capaz de captar energia para manter-se em funcionamento
e para se auto-regular.
Segundo a hipótese Gaia, a biosfera - a fina camada do planeta que sustenta
a vida - está inseparavelmente integrada à atmosfera, aos oceanos e aos solos.
O conjunto se realimenta, buscando manter um meio ambiente adequado à
manutenção da vida. Um sistema dinâmico, integrado, auto-regulado.
Nesse contexto, a atmosfera não é apenas uma camada de gás que envolve a
Terra, mas a camada gasosa sem a qual a vida seria impossível. Ela é, junto com os
oceanos, responsável pela manutenção das temperaturas adequadas à existência da
vida que se observa na superfície do planeta. A atmosfera, ao refletir para o espaço
parte da energia solar, controla a quantidade de energia que chega à superfície.
Outro exemplo significativo dessa integração é a relação que alguns cientis- A U L A
tas estabeleceram, há pouco mais de dez anos, entre a atividade de algas
planctônicas, que vivem nos oceanos e nas bacias fluviais, e a formação das
nuvens. Essas algas emitem um composto químico sulfuroso que, ao reagir com 40
o oxigênio atmosférico, produz ácido sulfúrico. As partículas de ácido sulfúrico
se elevam na atmosfera e atuam, no ciclo da água, como núcleos de condensação,
pois atraem vapor d’água e dão origem às nuvens. Asssim, as algas estão
relacionadas com os regimes das chuvas e, conseqüentemente, com os climas da
Terra. Além disso, a ação dessas algas permite que o enxofre - abundante no mar A capa da revista
- passe para os ambientes terrestres, onde é escasso. Correio da Unesco,
Pelos exemplos apresentados, estamos percebendo que a atmosfera da Terra de julho de 1980,
mostra a Terra
e os ciclos dos elementos que a compõem atuam nos mecanismos de regulação como um ser vivo.
da biosfera. Os desequilíbrios que temos observado sugerem que a atmosfera é,
provavelmente, uma fabricação biológica, isto é, a extensão de um sistema vivo
estruturado para conservar o meio ambiente.
Existem evidências cada vez mais numerosas de que os elementos desse
sistema atuam de forma a confirmar a hipótese Gaia. A idéia básica é a de que a
Terra oferece condições adequadas à vida porque a própria vida as mantém mantém.
No entanto, nos últimos duzentos anos, a espécie humana alterou de forma
significativa alguns dos principais ciclos químicos da biosfera. A ação do homem
multiplicou o fluxo de substâncias tóxicas na água, no ar e nas cadeias alimen-
tares. Essas substâncias chegam até as camadas superiores da atmosfera e
penetram profundamente nas águas dos oceanos. A redução da cobertura
vegetal é outra conseqüência dessa ação. Nos trópicos úmidos está sendo
destruída a floresta pluvial, num ritmo que alcança 100.000 km2 por ano.

A devastação irá desencadear o


processo de desaparecimento da flo-
resta. Nos pontos em que a floresta é
destruída não se realizará mais a
evapotranspiração que dá origem a
novas chuvas. E a floresta tropical
úmida só pode sobreviver com chu-
vas freqüentes. E, à medida que cres-
ce a população mundial, certamente
as alterações ambientais serão ainda
maiores.

Nas regiões tropicais, a ampliação das áreas


agrícolas acarreta o desmatamento por causa
da prática da queimada. O solo se esgota com
rapidez e dificilmente a floresta se recupera.

Os elementos da natureza estão sempre presentes no espaço geográfico e


os homens relacionam-se com eles o tempo todo. Uma vez que os elementos
estão ligados uns com os outros, as alterações ambientais influenciarão todas
as formas de vida.
O movimento social que procura rever o modo pelo qual os homens utilizam
os elementos naturais, ganhou maior significado neste final de século. A forma
pela qual as sociedades modernas têm se relacionado com a natureza, usando-
a como recurso a ser explorado, produziu verdadeiras catástrofes ambientais.
Essa ação ameaça seriamente o futuro.
A U L A É a partir dessa crise que a ecologia adquire maior prestígio e passam a ser
formuladas novas propostas para a relação homem-natureza
homem-natureza. E à medida que

40 formos conhecendo melhor as relações entre os seres vivos nos daremos conta de
que sobrevive, não o mais forte, mas o melhor adaptado, aquele que melhor se
harmoniza com as condições ambientais. É por isso que sobrevivem seres tão
frágeis e vulneráveis, como a orquídea e o beija-flor.
Se a proposta inicial era a de que a natureza existe para servir aos homens,
como recurso a ser explorado, hoje a idéia mais aceita é a de que essa mesma
natureza é a fonte da vida, que não se pode usá-la de forma irracional.
Os interesses econômicos deixam de ser a única preocupação, pois a nature-
za, como palco das atividades humanas, deve ser preservada. A conservação
ambiental exige estratégias capazes de salvaguardar o nosso futuro comum.
No mundo contemporâneo, o desequilíbrio sócio-ecológico mostra aspectos
muito diferentes. Em países de economia desenvolvida, com uma sólida base
industrial, problemas como as chuvas ácidas, as montanhas de lixo e as doenças
provocadas pelo excesso de álcool e/ou pelo uso de drogas decorrem da criação
da riqueza. Nos países subdesenvolvidos, os problemas decorrem da pobreza -
fome, inexistência de serviços de água e esgoto, condições precárias de habita-
ção, atendimento médico-sanitário deficiente.

A urbanização da população africana deverá


agravar suas condições sócio-econômicas.

Para os cidadãos dos países desenvolvidos, a questão ambiental tornou-se


uma preocupação permanente. Os dejetos, a poluição das águas e do ar, o buraco
na camada de ozônio são assuntos do cotidiano. As pessoas desconfiam das
instalações industriais nas proximidades de um bairro residencial e têm medo
das conseqüências da poluição atmosférica nas condições do clima. Para os
países em desenvolvimento, a questão fundamental é desenvolver a economia
e criar melhores condições sociais.
Como conciliar os imperativos do desenvolvimento e os da questão ambiental?
Na verdade, temos, até aqui, abusado da fantástica capacidade de regenera-
ção do nosso planeta. Devemos tomar consciência de que nos encontramos a
bordo da “nave espacial” Terra, e deve ser nossa preocupação mantê-la viva,
evitar sua morte. Em vez de nos preocuparmos com uma tola campanha de
“retorno à natureza” temos de acreditar nas possibilidades de conseguir manter
essa vida, conservando e mudando a tecnologia, tornando-a mais sensata e
racional. Os recursos elementares de Gaia - a energia da água e o ar - são tão
abundantes e auto-regeneradores que tornam possível a sua utilização inteligen-
te e duradoura.
As propostas são muitas. A hipótese Gaia estimula uma reflexão mais A U L A
abrangente sobre os problemas mundiais, ao encarar o planeta como um orga-
nismo vivo. A humanidade precisa agir conscientemente, uma vez que seus
modelos de desenvolvimento econômico começam a provocar significativas 40
alterações nos ambientes terrestres.

O Oceano Pacífico
visto de uma nave
espacial. O equilíbrio
existente na biosfera
deve ser preservado
porque dele depende
a manutenção da vida.

Em junho de 1992, os países membros da ONU reuniram-se no Rio de Janeiro


para a ECO-92, com a finalidade de discutir acordos internacionais sobre a questão
da preservação ambiental. Procuravam criar “uma associação global entre os
países em desenvolvimento e os países industrializados, estabelecendo necessida-
des e interesses comuns para assegurar o futuro do planeta ”. A questão sempre
presente na reunião do Rio de Janeiro era encontrar um ponto de equilíbrio entre
desenvolvimento e questão ambiental, e estabelecer os princípios básicos do
desenvolvimento sustentável
sustentável.
Como prevê José Lutzemberger: “A continuar o quadro atual, o desastre
será total. Para nós! Talvez nem tanto para Gaia. Gaia tem muitos recursos, tem
muito tempo. Com novas formas de vida, encontrará saídas. Sobram ainda uns
cinco bilhões de anos até que o Sol venha a apagar-se lentamente...”

Nesta aula você aprendeu que:

l a hipótese Gaia procura mostrar que a Terra pode ser comparada a um


organismo vivo e a biosfera está inseparavelmente integrada à atmosfera,
aos oceanos e aos solos. O conjunto se realimenta para manter as condições
ambientais adequadas à vida;
l uma vez que todos os elementos da natureza estão ligados uns aos outros,
qualquer alteração ambiental influenciará todas as formas de vida
vida. A idéia
básica da hipótese Gaia é a de que a Terra oferece condições adequadas à
vida, porque a própria vida mantém essas condições;
A U L A l o desequilíbrio sócio-ecológico
sócio-ecológico, existente hoje tanto no mundo desenvolvi-
do quanto no subdesenvolvido, é o resultado do modo pelo qual a natureza

40 l
tem sido usada;
a crise ambiental
ambiental, que ameaça a sobrevivência da nossa própria espécie,
exige uma nova relação sociedade-natureza;
l o aumento da consciência ecológica e as novas propostas para a questão
ambiental são o resultado dessa busca - o equilíbrio entre desenvolvimento
e preservação da natureza.

Exercício 1
Faça uma pequena redação tendo como tema a capa da revista Correio da
Unesco, que mostra a Terra como um ser vivo.

Exercício 2
Apresente dois problemas ambientais que preocupam o mundo desenvolvido.

Exercício 3
Faça uma pesquisa em jornais e revistas e indique três agressões ambientais
ocorridas na sua cidade, ou região, no último ano.
Gabaritos
das aulas 21 a 40

Aula 21 - Quantos Brasis existem?


1. O Brasil é, ao mesmo tempo, um dos países mais dinâmicos, do ponto de vista
dos indicadores econômicos, e um dos mais desiguais, do ponto de vista da
distribuição social da riqueza.
2. a) O “milagre brasileiro”.
3. b) apesar do processo de crescimento da economia nacional, observa-se
que há uma progressiva concentração da renda, principalmente entre os
10% mais ricos.
4. e) II e IV.
Aula 22 - Cultura ibérica e natureza tropical
1. A América Latina, inclusive o Brasil, inseriu-se na economia mundial por
meio da exportação de produtos minerais e agrícolas para serem comer-
cializados na Europa. Devido ao controle do centro mercantil europeu sobre
o processo de colonização, pode-se dizer que a América Latina foi a mais
antiga periferia da economia mundial.
2. c) Sistema de plantation.
3. A extrema concentração da propriedade fundiária no Brasil, herdada do
período colonial, junto com o trabalho escravo, são alguns dos fatores que
explicam a desigual distribuição de renda.
Aula 23 - Uma fronteira em movimento
1. A alternativa c) está correta.
2. Para as metrópoles do Sudeste e, em menor número, para a fronteira
(Centro-Oeste e Amazônia).
3. a) Novas oportunidades de emprego e/ou acesso à terra nas metrópoles ou
áreas de fronteira;
b) Liberação de mão-de-obra rural a partir da modernização agrícola.

Aula 24 - Condomínios e favelas: a urbanização desigual


1. Porque hoje mais de 75% da população brasileira vive e trabalha em cidades,
como resultado de um processo acelerado de urbanização que mudou a face
do país, nos últimos trinta anos.
2. Porque as metrópoles brasileiras concentram boa parte da produção industri-
al e da oferta de serviços, embora também concentrem grande parte da
população carente, que procura, pelos mais diversos expedientes, sobreviver
nas grandes metrópoles, disputando uma parcela dessa renda concentrada.
3. A alternativa d) está errada, pois o processo de urbanização ainda continua
produzindo mudanças.
Aula 25 - Cidade mundial, domínios e fronteiras
1. e) Norte, Sudeste e Sul.
2. Alternativas a) e c) são falsas; b) e d) são verdadeiras.
3. A alternativa a) está errada.
Aula 26 - Centro Sul: o cinturão urbano-industrial
1. As três alternativas estão corretas.
2. Processo de metropolização, e ele consolidou grandes aglomerados urbanos
como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba,
Salvador, Recife, Fortaleza e Belém.
3. a) As cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro, e o eixo entre elas.
b) Nessas cidades, o processo ocorreu devido aos fluxos intensos de merca-
dorias, pessoas e capitais, com uma crescente integração econômica
devido às relações nacionais e internacionais.
4. a) A criação de Brasília; b) a construção de rodovias de interligação regional
e nacional; c) o avanço da agricultura tecnificada sobre os cerrados centrais.

Aula 27 – Nordeste: o domínio agrário-mercantil


1. Os grandes proprietários rurais e comerciantes ainda dominam a economia
e a política regional, utilizando os favores do Estado para garantir seus
interesses em troca de apoio eleitoral. As secas, que atingem com maior
intensidade as populações pobres, servem para angariar recursos que, na
maioria das vezes, destinam-se unicamente aos poderosos da região. Por
isso eles têm interesse em manter a “indústria das secas”.
2. Os programas e projetos de desenvolvimento regional da Sudene permiti-
ram a integração produtiva da economia nordestina ao mercado nacional.
3. Os grandes projetos, como o Pólo de Camaçari e o Proálcool, unificaram os
movimentos sociais de diferentes estados e trouxeram à tona os problemas
ecológicos do crescimento econômico a todo custo.

Aula 28 - Amazônia: a grande fronteira


1. O aluno deve ser capaz de mostrar as iniciativas governamentais com a
extensão das redes técnicas, a colonização dirigida e os incentivos aos
grandes projetos agrícolas e de mineração, que foram implantados como
elementos para inserir a Amazônia nas economias nacional e internacional.
2. Os incentivos fiscais concedidos na Zona Franca de Manaus foram respon-
sáveis pela concentração da indústria de eletroeletrônicos na Amazônia, o
que explica também a concentração de população do Estado do Amazonas
na cidade de Manaus, na busca de emprego nas atividades relacionadas à
Zona Franca.
3. Pará e Maranhão. A ferrovia possibilita a exportação do minério de ferro
de Carajás.

Aula 29 - A sustentabilidade do desenvolvimento brasileiro


1. O desenvolvimento social pressupõe maior eqüidade na distribuição de renda,
isto é, com menor custo social e maior participação na tomada de decisões.
2. A proposta de desenvolvimento sustentável procura conciliar o uso racional
dos recursos ecológicos com o combate à pobreza porque entende que a
miséria e a falta de abrigo e sustento é o principal problema ambiental do
planeta Terra.
3. Porque a floresta pluvial amazônica representa um imenso estoque de
biodiversidade, que pode contribuir para o conhecimento científico-
tecnológico e o desenvolvimento da biotecnologia.
Aula 30 - O Brasil e o desafio latino-americano
1. O mapa A mostra os corredores de exportação do sul do Brasil, direcionados para
concorrer com o países vizinhos, principalmente com o porto de Buenos Aires.
O mapa B revela a nova integração econômica do Cone Sul.
2. a) O Mercosul é uma iniciativa de integração regional que consolida um
mercado unificado entre os países membros e possibilita a livre circulação
de bens e serviços. A inexistência de um mercado consolidado e integrado
explica o fracasso da Alalc.
b) As mudanças nas estruturas desses países pelos efeitos do mercado
unificado serão particularmente intensas, principalmente nos respecti-
vos complexos agro-industriais.
3. A integração econômica por uma zona de livre comércio pode contribuir,
devido ao grande potencial ao desenvolvimento da região, para aumentar
sua participação no comércio mundial.
Aula 31 - O meio técnico-científico e o papel da informação
1. Entre 1850 e 1930, numerosas inovações técnicas foram desenvolvidas como
meio de transporte e de comunicação para a expansão capitalista, tais como
o barco a vapor, a estrada de ferro, o telégrafo, o telefone e o avião. Vencendo
barreiras espaciais, pareciam encolher o mundo dos homens, permitindo
um extraordinária mobilidade de mercadorias, pessoas e informação. A
partir de 1970, o avanço técnico-informacional, com a invenção do microchip
e de sistemas aperfeiçoados de comunicação por satélite, levou à compres-
são do tempo e do espaço, servindo para a circulação da informação, mas,
principalmente, alterando o sistema produtivo e financeiro.
2. O aumento de volume dos produtos transportados exige navios cada vez
maiores e portos cada vez mais equipados. As mercadorias de pequeno volume
e maior valor são transportadas em contêineres. A mecanização dos portos, a
modernização dos navios e conteinerização contribuem para a maior eficiência
na carga e descarga das mercadorias, com menor utilização de mão-de-obra.
3. Resposta pessoal.

Aula 32 - Robôs e engenheiros: para onde vão os operários?


1. Porque o avanço tecnológico e a competição entre as empresas pela maior
produtividade exigem qualificação cada vez maior da mão-de-obra. Os
grandes investimentos de capital necessários para a utilização de tecnolo-
gias modernas reduzem a participação da mão-de-obra.
2.
Remuneração Fordismo Pós-fordismo
Organização dos trabalhadores salários ascendentes salários flexíveis - altos para
em sindicatos fortes os qualificados, baixos para
menos qualificados
Papel do Estado interfere na economia e garante menor força sindical
o bem-estar social interfere menos na economia
e já não garante tanto o bem-
estar social
Organização do espaço grandes concentrações urbano- tendência à dispersão
industriais
3. a) A estratégia da operação da Toyota para o mercado mundial divide o
processo produtivo em diversas localizações e o integra por meio do
controle da matriz, no Japão.
b) Devido à proximidade geográfica do Japão e por apresentarem disponi-
bilidade de mão-de-obra e um mercado consumidor em expansão.
Aula 33 - O sistema financeiro global e os limites do Estado-nação
1. a) É a realidade da globalização financeira. Hoje, o mundo é um só, em
termos de movimento de capitais financeiros.
b) Os jogadores de dardos, que são os investidores, estão felizes porque
podem investir em qualquer parte do mundo que lhes garanta lucros.
A desregulamentação dos mercados financeiros nacionais ampliou
significativamente as áreas de investimento. Os dardos que chegam
velozmente aos alvos podem ser comparados aos computadores, faxes e
telecomunicações, que permitem que as informações circulem rapida-
mente entre os lugares, acelerando, assim, a atuação dos investidores.
2. Quando o sistema monetário internacional se baseia numa moeda forte, de
uma economia forte, como era o caso do dólar americano nas décadas de 1940
e 1950, ocorre uma estabilidade monetária, pois todos os países têm a mesma
moeda forte e estável como referência para as trocas (câmbio) de suas
moedas. Além disso, sabe-se o montante de dólares, estáveis, existentes no
mundo e controla-se o volume de capitais em circulação no mundo. Os
financiamentos são feitos com base na moeda estável. Quando o sistema
monetário deixa de ser estável, os governos perdem o controle das taxas de
câmbio e do volume de dinheiro em circulação. Especula-se com moedas e
com vários mecanismos especulativos financeiros.
3. Resposta pessoal.
Aula 34 - Ritmos e movimentos da população mundial
1. a) A pirâmide apresenta uma base larga que se estreita rapidamente, indican-
do a ocorrência paralela de altas taxas de natalidade e mortalidade no país.
b) Inicialmente, acentuada redução da mortalidade e o declínio da taxa de
fecundidade, levando ao envelhecimento da população do país.
2. a) As enormes disparidades econômicas entre os países industrializados
e os países desenvolvidos.
b) Os migrantes procuram empregos e melhores níveis de remuneração
e de proteção social.
3. Resposta pessoal.

Aula 35 - A energia vital: os recursos naturais são inesgotáveis?


1. a) A evapotranspiração (E), que corresponde ao total da precipitação (P) menos
o escoamento para o lençol subterrâneo e a rede pluvial (Q), é composta pela
evaporação da água interceptada pela copa das árvores (I) mais o vapor
d’água transferido para a atmosfera pela transpiração das plantas.
b) A redução da evapotranspiração e conseqüentemente da quantidade de
água que retorna da atmosfera, altera a distribuição das chuvas; o
aumento da quantidade de água escoada à superfície reduz a infiltração
no solo e altera a descarga nos rios.
2. Uma alternativa foi a utilização crescente de outras fontes de energia como,
por exemplo, a retomada do consumo do carvão e a expansão do emprego
da energia nuclear. Outra alternativa foi a abertura de novas regiões produ-
toras, como a do Mar do Norte, e a entrada no mercado de novos países
produtores como a União Soviética e a China.
3. a) A população brasileira está seriamente ameaçada pelas moléstias de
transmissão hídrica devido à deficiência dos serviços básicos como o
abastecimento de água e principalmente esgoto sanitário.
b) O atendimento dos serviços de saúde pública é particularmente grave nas
Regiões Norte e Nordeste, onde a rede de esgotos sanitários atende,
respectivamente, apenas a 3,46% e 11,75% da população, transformando
essas regiões em áreas vulneráveis às moléstias de propagação hídrica.

Aula 36 - Alimentos, matérias-primas e biotecnologia: o papel do campo


1. A agricultura e a indústria estabeleceram vínculos contratuais - financia-
mentos, equipamentos, cadeias de distribuição -, formando conglomerados
que controlam desde a produção de sementes até a distribuição dos produ-
tos já empacotados ou enlatados.
2. O agricultor, hoje, tem a possibilidade de corrigir as condições do solo
mediante análises químicas que indicam as deficiências e necessidades do
solo. O uso de fertilizantes permite corrigir ou restabelecer as qualidades do
solo. Já as condições do clima, até agora, não podem ser alteradas. Por isso
o agricultor "compra" o clima, pois são as condições do clima que vão ditar
o ritmo das atividades agrícolas.
3. Positivas - aumentar a produção agrícola; eliminar doenças e pragas
e oferecer novos produtos.
Negativas - suprimir grande número de empregos; acentuar ainda mais
o desnível entre ricos e pobres.

Aula 37 - Para além da polarização: os novos blocos políticos


1. O aluno pode desenvolver, entre outras, as seguintes idéias:
l O conflito ideológico e estratégico entre as duas superpotências que
procuravam manter e expandir suas áreas de influência.
l A crescente corrida armamentista, com a criação de alianças militares de
apoio.
l A formação, por um grupo de países, de um terceiro bloco que resistia ao
alinhamento imediato às superpotências e que deu origem ao chamado
Terceiro Mundo.
2. O aluno deve apresentar, entre outras, as seguintes tendências:
l A multipolaridade do poder econômico.
l A estratégia norte-americana para a América Latina é a de formalizar um
mercado de livre comércio em todo o continente.
l A União Européia é pressionada por um número cada vez maior de países
interessados em ingressar no bloco europeu.
l A formação dos megablocos norte-americano, europeu e asiático consti-
tui uma nova forma de regionalização.
l A Alemanha e o Japão, fortalecidos econômica e financeiramente, são
hoje importantes centros de decisões políticas e econômicas.
3. O aluno pode apresentar, entre outras, as seguintes estratégias:
l A transferência das indústrias tradicionais, grandes consumidoras de
mão-de-obra e de matéria-prima, para o leste e sudeste da Ásia.
l A formação do megabloco do Pacífico, graças aos investimentos de
capital e à transferência de tecnologia japoneses.
l Aplicação da reengenharia nas empresas japonesas atingindo o máximo
de eficiência do seu sistema produtivo.
l Associações entre grandes empresas japonesas e norte-americanas.
Aula 38 - A pobreza das nações: onde ficou o desenvolvimento?
1. O aluno deve indicar, entre outros:
· o PIB, que é um indicador de renda e do nível de vida real da população;
· o consumo de energia;
· os indicadores culturais (número de livros publicados por ano; o acesso
à informação, porcentagem de adultos analfabetos);
· a quantidade de calorias ingerida por dia;
· o acesso à água tratada e a instalações sanitárias adequadas.
2. O aluno deve indicar, entre outras: as condições naturais hostis e a inferio-
ridade dos "povos de cor" diante da "Europa branca"; a exploração colonial
que, por causa das trocas desiguais, teria transferido para as metrópoles
grande parte da riqueza produzida; a ação das elites dos próprios países que
impedem as reformas modernizadoras.
3. O pagamento de juros e compromissos financeiros representava, em média,
25% do valor das exportações, o que restringia os recursos públicos para
investimento em educação, saúde e saneamento básico, agravando ainda
mais o quadro de pobreza da América Latina.

Aula 39 - O ovo da serpente: a cultura da violência


1. O aluno deve ser capaz de identificar no texto diferentes manifestações de
pobreza e desigualdade de renda.
2. Os atos de violência contra imigrantes turcos na Alemanha; africanos na
França e na Inglaterra. As mudanças recentes nas leis de imigração, tornan-
do cada vez mais restritiva a entrada de imigrantes nesses países.
3. Resposta pessoal.

Aula 40 - O embrião de Gaia: a ecologia como utopia planetária


1. Resposta pessoal.
2. O aluno deve indicar, entre outros problemas: chuvas ácidas; buraco na
camada de ozônio; doenças provocadas pelo excesso de álcool ou pelo uso
de drogas; as montanhas de lixo etc.
3. Resposta pessoal.

Você também pode gostar