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Neoenergia

A arte de ignorar a natureza Págs. 4, 5 e 6

Circulação Nacional Uma visão popular do Brasil e do mundo R$ 3,00

Ano 13 • Número 649 São Paulo, de 6 a 12 de agosto de 2015 www.brasildefato.com.br

A violência nossa de cada dia


O Brasil vive uma onda de violência generalizada. Nos últimos dias foram registrados vários
casos de linchamentos, e segundo especialistas, a intolerância é a principal causa. Por outro
lado, segundo estudo divulgado dia 3 pela Anistia Internacional, mais de 8 mil pessoas foram
mortas por policiais militares no estado do Rio de Janeiro entre 2005 e 2014. Já no meio rural,
segundo dados parciais da Comissão Pastoral da Terra (CPT), de janeiro a julho de 2015, foram
registrados 23 assassinatos em conflitos no campo no país. Págs. 9, 10 e 11

Amazônia apodrece
com hidrelétricas Pág. 7

“A mídia paraguaia
quer a sentença” Pág. 13

Entrevista com
Roberto Requião Págs. 14 e 15

ISSN 1978-5134

Ademar Bogo Alipio Freire Silvio Mieli

Aliados e delatores Ajustes em nossa linguagem Público-alvo


Traidor é o delatado que se alia ao delator Uma grande confusão e uma série de mal- Sempre que alguém alude às influências dos
e renega os princípios de sua classe. A entendidos em nosso meio têm se originado discursos odiosos e dos programas mundo-
história é sábia em dar lições, aprende com da utilização dos conceitos “classe média” e cão nos altos índices de violência, é convidado
elas quem escapa à sedução da negociação “pequena burguesia”, muitas vezes tratados a citar pesquisas ou dados quantitativos que
do caráter e da emancipação. Pág. 2 como sinônimos. Pág. 3 justifiquem a relação. Pág. 3
2 de 6 a 12 de agosto de 2015

editorial

A ofensiva imperialista
ENFRENTAMOS um difícil momen- onda de privatizações, reestrutura- Nosso maior desafio é 2000 e 2008. Neste sentido, os EUA tégia do imperialismo estaduni-
to, em que o imperialismo intensifica ção produtiva e reprimarização das imprimiram uma forte política de dense, que busca de todas as ma-
sua ofensiva contra os governos pro- economias, dentre outras medidas. construir a unidade das cerco e isolamento sobre a China e a neiras retomar suas posições no
gressistas em nosso continente. Des- Um período marcado por derrotas da forças democráticas Rússia através de diversas bases mi- continente, atuando na contrao-
de o final da Guerra Fria, os Estados classe trabalhadora e por regimes po- litares no leste europeu e na eurásia. fensiva aos governos progressis-
Unidos ocuparam papel de potência líticos pautados por uma concepção e populares, não só Desestabilizar os governos progres- tas, que nos últimos 15 anos bus-
imperialista hegemônica, sustentado de democracia restrita no sentido do para barrar a ofensiva sistas da América Latina também é caram responder às aspirações de
pela defesa do neoliberalismo, em es- acesso à cidadania política e social. parte integrante da ofensiva, assim construção de Estados-Nações com
pecial, pela hegemonia do capital fi- O neoliberalismo empobreceu os da direita, mas para como derrubar em qualquer parte do maior grau de soberania política a
nanceiro. Ao lado dos seus aliados, países latino-americanos, concen- mundo regimes políticos indepen- partir de projetos antineoliberais.
como Europa e Japão, instalaram ba- trou renda e secundarizou o capi-
exigir a retomada do dentes e com peso geopolítico e não É cada vez mais nítido que, por
ses militares no leste europeu e no tal produtivo. A convergência de de- desenvolvimento e alinhados com Washington. No pla- trás da Operação Lava Jato, o obje-
nordeste asiático. semprego, descontentamento de fra- no econômico, os EUA buscaram re- tivo é desmoralizar a Petrobras e as
Além disso, intervieram na Guerra ções burguesas com as políticas neo- avançar num projeto tomar o espaço perdido para a China empresas estatais, de modo a criar
do Golfo, entre Kuwait e Iraque, in- liberais e crises econômicas criaram popular na América Latina e na Ásia através as condições para privatizá-las. Em
tensificaram as guerras civis e os se- as condições para revoltas popula- de acordos comerciais. nosso hemisfério, os objetivos es-
paratismos nos Estados da antiga res e derrotas das forças neoliberais O imperialismo busca violenta- tadunidenses, além da apropriação
URSS, e contribuíram para estabe- no processo eleitoral, possibilitan- mente retomar suas posições no das riquezas do Pré-sal, se voltam
lecer regimes e governos aliados no do a emergência de governos de es- continente, derrubar o governo bo- para esvaziar as articulações dos
Oriente Médio, África, Ásia e Amé- querda e centro-esquerda a partir de livariano da Venezuela, afastar os BRICS e a incorporação do Brasil e
rica Latina. O poder inconteste des- 1998 com a vitória de Chávez na Ve- BRICS, acabar com os governos a Argentina, que são as duas princi-
se Estado imperialista busca contro- nezuela, seguida de diversos triunfos aprofundamento das conquistas po- progressistas, neutralizar a influên- pais economias industriais da Amé-
lar os recursos naturais, em especial progressistas nos anos 2000. Diver- pulares e numa certa incapacidade cia de Cuba e atender aos interes- rica do Sul, ao conjunto de áreas de
o petróleo e os serviços e empresas sas conquistas democráticas e popu- de alguns governos em pautar pro- ses das corporações estaduniden- livre comércio bilaterais.
estatais. lares ocorreram nesse período. A in- jetos políticos de ruptura. Some-se a ses. Desestabilizar o governo brasi- Nosso maior desafio é construir a
Em nosso continente, apostaram tegração regional avançou na Améri- isto a constante articulação das clas- leiro é uma peça fundamental deste unidade das forças democráticas e
em governos neoliberais durante os ca Latina através de múltiplas inicia- ses dominantes antinacionais e anti- xadrez geopolítico. populares, não só para barrar a ofen-
anos de 1980 e 1990 que abriram su- tivas. Ao mesmo tempo começaram a populares com o imperialismo. Fica cada vez mais evidente que siva da direita, mas para exigir a re-
as economias para a hegemonia do surgir os limites de tais governos que A ofensiva imperialista atual bus- o atual cerco político contra o go- tomada do desenvolvimento e avan-
capital financeiro, promovendo uma se expressaram nas dificuldades de ca retomar o terreno perdido entre verno Dilma é parte de uma estra- çar num projeto popular.

opinião Ademar Bogo crônica Luiz Ricardo Leitão


Bob May/CC

Padrão universal
DEVEMOS RECONHECER que o preconceito (ou ódio) de clas-
se no país da “casa-grande & senzala” se reveste de traços singu-
larmente perversos até hoje. É claro que, desde o antigo regime
colonial, o alvo maior da chibata tem sido o povo negro oriundo
de Guiné, Angola, Benim, Daomé e outros pontos da costa afri-
cana. Por sua vez, a tardia abolição da escravatura concorreu em
muito para a absurda longevidade do modelo tupiniquim de de-
sigualdade e exclusão social. Contudo, cevada no caldo de cultu-
ra da modernização conservadora, a elite de Bruzundanga não
se limita a segregar apenas os filhos e netos da Mãe África; ao
contrário: ciosa de seus “privilégios”, ela oprime com igual rigor
outros segmentos populares, estigmatizando-os sob as mais di-
versas máscaras sociais.
No campo ou na cidade, a burguesia tropical sempre cultivou
o velho mote liberal do Facundo, de D. F. Sarmiento, autopro-
clamando-se a classe civilizada em sua cruzada histórica con-
tra a barbárie da senzala. Fiel à sua origem agrária, o coronela-
to brasileiro tem exibido um sarcasmo ímpar contra os lavrado-
res: os peões das fazendas, os meeiros dos sertões, os boias-frias
e os sem-terra são descritos como toscos capiaus, filhotes de Je-
ca Tatu e de Macunaíma. Mas os trabalhadores urbanos tam-
bém não escapam ao desdém dos patrões: desde o proletariado
fabril até os garis da limpeza urbana, incluindo-se aí os bancá-
rios, os comerciários, os profissionais da Educação e da Saúde,
as domésticas e faxineiras, todos eles são apenas “vagabundos e
imprestáveis”...

Aliados e delatores Deve-se lastimar o atraso de


Bruzundanga, não há dúvida,
HOUVE UMA ÉPOCA em que al-
gumas forças de esquerda no Bra-
Traidor é o dem institucional; basta inserir indi-
víduos de posições progressistas nos
porém não esqueça, caro leitor:
sil acreditavam que a burguesia in- delatado que se alia cargos governamentais, fazer pelos seu padrão é universal
dustrial era aliada dos trabalhado- trabalhadores e pelas massas popu-
res. Veio o golpe militar de 1964 e os
militantes que lutaram, detiveram
ao delator e renega lares aquilo que teria que ser feito
com uma revolução.
embaixadores, fizeram recuperações os princípios de sua Fica evidente, pelo passado e pelo Iaiá e ioiô, de fato, detestam os peões. Não escrevo isso por
em Bancos, etc., foram mortos, ou- presente, que “o homem da merca- conta do recente ataque à bomba ao Instituto Lula, em São Pau-
tros presos e torturados, mas resisti- classe. A história doria” não é de confiança na política, lo, mas sim inspirado por duas “pérolas” da gente chique da ter-
ram bravamente à delação. O tempo nem serve para se somar à luta pelas rinha. A primeira é de Isabela Odebrecht, mulher do emprei-
passou, mas o mito da conciliação é sábia em dar transformações sociais. A elucidação teiro preso na operação Lava Jato. Em mensagem eletrônica de
entre as classes continuou vivo e não nos é dada pela história, que se pode 2012, ao saber que um sindicalista jantaria em sua casa, a Si-
apenas a burguesia industrial passou lições, aprende juntar dinheiro e prática revolucio- nhazinha disparou: “Se sujar minha toalha de linho ou pedir
a ser vista como aliada, como tam- nária, mas jamais política e propina, Marmitex, vou pirar. Saudações sindicais? Não mereço...”. A
bém a burguesia agrária, comercial, com elas quem porque esta última pode resultar em outra coube ao nobre deputado Laerte Bessa (PR-DF), relator e
bancária e, a mais ladina e delatora: delação. Os processos ensinam que feroz defensor da redução da maioridade penal. Em entrevista
a burguesia das construtoras. escapa à sedução o primeiro dever de um revolucioná- ao jornal inglês The Guardian, ele não hesitou em pregar novas
Chama a atenção, porque a presi- rio é fazer a revolução; perdido esse reduções do limite, sugerindo que este chegue à “barriga da mu-
denta da república, de ora em quan- da negociação princípio, delatados e delatores so- lher”: afinal, no futuro “os cientistas já terão inventado a forma
do, obriga-se, para afirmar a sua ho- mente se diferenciam no alívio das de descobrir, antes de o moleque nascer, se ele já é criminoso”.
nestidade, a ter de declarar que no do caráter e da condenações. Como fomos o último país das Américas a decretar o fim da
passado resistiu à tortura e, para sal- Por que os homens de negócios escravidão, sem promover nenhuma ruptura radical do status
var a vida de dezenas de lutadores emancipação políticos tornaram-se delatores? quo desde então, poderíamos supor que esta mazela fosse uma
revolucionários, não entregou nin- Porque eles não são quadros revolu- exclusividade nacional. No entanto, em tempos de globaliza-
guém, por isso “não confia em dela- cionários e, embora mudem os go- ção e crise aguda do capital, não é difícil perceber que, na pró-
tores”. Delator não é para se confiar, vernos, não saem do lugar que ocu- pria terra do Tio Sam, o acirramento dos problemas econômicos
mas para temer. No entanto, vemos pam nos esquemas escusos da lava- se associa a violentos incidentes raciais, além de surtos de in-
uma colheita de delações premia- gem do dinheiro público. Não são continência verbal nos setores mais raivosos da classe dominan-
das, não por causa de ações revolu- membros de um partido revolucio- te. Veja-se o caso do empresário Donald Trump: pré-candidato
cionárias, nem pelas recuperações fi- nário e não possuem valores para republicano à Presidência dos EUA, o bilionário lidera as inten-
nanceiras feitas para financiar a lu- lítica”, que precisa, para vender-se respeitá-los. ções de voto no partido dizendo exatamente aquilo que muitos
ta de classes, mas pela participação como mercadoria, corromper, armar O delator então não é um trai- não ousam falar – basta lembrar a bombástica acusação de que
em esquemas criminosos para finan- esquemas e, se for preciso, quando dor; é um colaborador da ordem que os mexicanos levam drogas e crimes à América...
ciar disputas eleitorais, enriquecen- se sentir em apuros, delatar os seus sempre permitiu a ele atuar legal- Enfim, é tempo de globalização: em meio ao tiroteio retóri-
do empresas e indivíduos, de dentro aliados para salvar a pele. mente como mercador para superva- co e ideológico dos ventríloquos do capital, Scarlett O’Hara e Si-
e de fora dos partidos. A ilusória visão de que o modo de lorizar os contratos e desviar a par- nhá Isabela trocam mensagens por WhatsApp nos salões do po-
Não sai da cabeça a definição que produção capitalista funciona com te da propina com quem está aliado. der. Sua linguagem virtual é única; o que varia é apenas o sota-
o filósofo Henri Lefebvre fez do co- duas ordens, uma para a economia Traidor é o delatado que se alia ao que de cada estupidez. Deve-se lastimar o atraso de Bruzundan-
merciante, como “o homem da mer- comandada pelos empresários e a delator e renega os princípios de sua ga, não há dúvida, porém não esqueça, caro leitor: seu padrão é
cadoria”, que se torna mestre na lin- outra para a política, comandada pe- classe. A história é sábia em dar li- universal.
guagem e, para se fazer aceitar, pre- lo governo, leva a crer que pode ha- ções, aprende com elas quem escapa
cisa mentir, enganar e contar his- ver no capitalismo uma fissura entre à sedução da negociação do caráter e Luiz Ricardo Leitão é professor associado da UERJ.
tórias. No grande mercado das tro- o poder econômico e o poder políti- da emancipação. Doutor em Estudos Literários (Universidade de La Habana),
cas institucionais podemos acreditar co e que, este último, pode controlar é autor de Noel Rosa: Poeta da Vila, Cronista do Brasil e
que existe também “o homem da po- todos os interesses manejando a or- Ademar Bogo é filósofo e escritor. Aluísio Machado: Sambista de Fato, Rebelde por Direito.

Editor-chefe: Nilton Viana • Editores: Aldo Gama, Marcelo Netto • Repórter: Marcio Zonta• Correspondentes nacionais: Maíra Gomes (Belo Horizonte – MG),
Pedro Carrano (Curitiba – PR), Pedro Rafael Ferreira (Brasília – DF), Vivian Virissimo (Rio de Janeiro – RJ) • Correspondentes internacionais: Achille Lollo (Roma – Itália),
Baby Siqueira Abrão (Oriente Médio), Claudia Jardim (Caracas – Venezuela) • Fotógrafos: Carlos Ruggi (Curitiba – PR), Douglas Mansur (São Paulo – SP),Flávio Cannalonga (in memoriam), João R. Ripper
(Rio de Janeiro – RJ), João Zinclar (in memoriam), Joka Madruga (Curitiba – PR), Le onardo Melgarejo (Porto Alegre – RS), Maurício Scerni (Rio de Janeiro – RJ), Pilar Oliva (São Paulo – SP) • Ilustradores: Latuff,
Márcio Baraldi, Maringoni • Editora de Arte – Pré-Impressão: Helena Sant’Ana • Revisão: Maria Aparecida Terra • Jornalista responsável: Nilton Viana – Mtb 28.466 • Administração: Valdinei Arthur Siqueira •
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de 6 a 12 de agosto de 2015 3

instantâneo Paulo Kliass

Copom
aumenta a Selic
PELA SÉTIMA VEZ CONSECUTIVA, o Comitê de Polí-
tica Monetária (Copom) decidiu pelo aumento da taxa
oficial de juros do governo. A reunião realizada entre os
dias 28 e 29 de julho confirmou a Selic no patamar de
14,25% ao ano para os próximos 45 dias. Na verdade,
trata-se de um colegiado que congrega os próprios di-
retores do Banco Central (BC) e que termina por ceder
às pressões dos principais representantes do sistema fi-
nanceiro privado. Assim, via de regra, as deliberações
estão de acordo com as pesquisas que o próprio BC re-
aliza junto aos operadores dos bancos.
O que chama a atenção, ainda mais nesse caso, é a in-
sistência em manter e aprofundar a opção por um ca-
minho de política monetária restritiva. Desde 29 de ou-
tubro de 2014, a trajetória adotada tem sido pela eleva-
ção sistemática da Selic. Naquele momento, ela foi ele-
vada de 11% para 11,25%. E desde então, a cada nova
reunião, a taxa sofre nova progressão. Ora, está mais
do que evidente as inúmeras consequências negativas
que tal tipo de decisão provoca para a maioria de nos-
sa população.
A taxa de juros oficial serve como referência de base
mínima para o conjunto das demais taxas cobradas pe-
lo sistema financeiro. Isso significa que haverá maio-
res taxas voltadas às empresas se financiarem para seu
próprio custeio e para a realização de novos investi-
mentos. Isso significa também que haverá maiores ta-
xas para os indivíduos e as famílias em suas operações
de empréstimo e crédito junto ao sistema financeiro.
Isso significa também que haverá maiores despesas or-
çamentárias do governo federal, pois o próprio sistema
Alipio Freire de remuneração dos títulos da dívida pública está atre-
lado à Selic.
Ora, se a política de juros elevados deve sempre ser

Ajustes em nossa linguagem 2 evitada como prioridade na política econômica, sua


utilização em uma conjuntura já marcada pela recessão
nas atividades se revela ainda mais inadequada. Maio-
res custos financeiros inibem a dinâmica das decisões
UMA GRANDE CONFUSÃO e uma série de mal-enten- ta ou aquela profissão, mas de qualquer profissional que empresariais, provocando redução do número de ho-
didos em nosso meio (esquerda em geral) têm se origi- tenha seu próprio escritório, do qual tira sua renda, sem ras trabalhadas e mesmo demissão de trabalhadores.
nado da utilização dos conceitos “classe média” e “peque- no entanto explorar o trabalho de outras pessoas. Assim, Maiores custos financeiros também provocam o au-
na burguesia” (ou, a variante deste último, “pequeno bur- um advogado, um médico, um engenheiro, um massagis- mento da inadimplência de famílias e indivíduos, uma
guês”), muitas vezes tratados como sinônimos. ta, um corretor, um soldador, um professor, dependendo vez que há mais dificuldades em cumprir com os com-
Antes de tudo, é necessário atentarmos para o fato de do lugar que ocupe na produção de sua renda, pode ser promissos derivados dos empréstimos assumidos an-
que são conceitos oriundos de distintas correntes de pen- um profissional liberal, um trabalhador assalariado, um teriormente. Esse é o espiral da recessão.
samento. pequeno burguês, ou mesmo um grande burguês – nes-
A expressão “classe média”, oriunda de certa sociologia te último caso, basta que nos lembremos dos grandes es-
estadunidense, diz de um olhar sobre o conjunto de uma
sociedade a partir de cortes (arbitrários) das suas diver-
critórios de advocacia, engenharia, arquitetura, medicina,
das escolas privadas, das grandes mecânicas especializa-
O governo tem adotado um
sas faixas de renda, próprios para as análises de mercado
e elaboração de marketings.
das, etc. etc.
Fazer essas diferenças é de grande importância, e se não
conjunto de medidas de política
O termo “pequena burguesia” – com matriz no mar-
xismo – diz de uma classe social composta por pequenos
estivermos atentos a isto, podemos cometer graves erros
de análise e de proposições.
econômica marcado pelo viés do
proprietários, de reduzido capital, e que explora a força de Neste momento em que, mais que nunca, para a elabo- conservadorismo e da ortodoxia
trabalho de pouquíssimos assalariados – seja na área de ração séria e profunda de uma análise de classes que nor-
produção, comércio ou serviços. teie e fundamente um programa de mudanças estruturais
Não bastassem as confusões daí oriundas, elas vão mais da sociedade/realidade brasileira, é indispensável a pre-
além, quando incluem os “profissionais liberais” necessa- cisão na aplicação correta desses conceitos. Do contrário, Assim, o único setor que se beneficia de tal decisão é
riamente como pequenos burgueses ou classe média. todas as estratégias e táticas – bem como as diversas polí- o financeiro, uma vez que os demais grupos da socieda-
Diferentemente do que se possa pensar, quando fala- ticas de alianças – não passarão de quimeras e/ou mani- de acabam por transferir renda para ele. O argumento
mos de “profissionais liberais”, não nos referimos a es- pulações da pior qualidade. de que o aumento de juros é o único instrumento para
combate a inflação tampouco se sustenta. Os aumen-
tos de preços têm sido motivados por fatores ligados ao
Silvio Mieli ramo dos alimentos e dos preços administrados, como
tarifas de transporte, energia elétrica, derivados de pe-

Público-alvo
tróleo e outros. Por isso, esse aumento fenomenal na
Selic não se justifica, inclusive por ser inoperante pa-
ra esse fim de impedir esse tipo de elevação dos preços
na economia.
O governo tem adotado um conjunto de medidas
SEMPRE QUE ALGUÉM alude às influências dos discur- mente, de outros dois candidatos-apresentadores de TV de política econômica marcado pelo viés do conserva-
sos odiosos e dos programas mundo-cão nos altos índices (Celso Russomanno, e João Dória Jr.), além de Marta dorismo e da ortodoxia. A obstinação com a geração
de violência, é convidado a citar pesquisas ou dados quan- Suplicy — cuja carreira foi alavancada no programa TV do superávit primário é a outra face da mesma moe-
titativos que justifiquem a relação. Mas, por mais que o Mulher (Rede Globo), nos anos de 1980. Que a política da, qual seja, a de atender sempre aos interesses do fi-
discurso raivoso esteja reverberando e os crimes de cada virou um espetáculo não chega a ser nenhuma novida- nancismo em primeiro lugar. Ao promover cortes nos
dia sejam repetidos no estilo das “vídeo-cassetadas”, se- de. O que parece digno de nota, principalmente no caso gastos públicos de natureza social e de investimento, a
rá sempre complicado estabelecer quantitativamente um de Datena, é que o mestre-sala desses shows macabros equipe econômica sinaliza que apenas as verbas aloca-
nexo causal entre o impacto da imagem violenta a que es- se apresente como bombeiro dos incêndios que ele mes- das para o pagamento de juros e serviços da dívida não
tamos submetidos e os índices de criminalidade. mo ajuda a fustigar. Sim, estou acusando os apresenta- serão tocadas.
Entretanto existem outras formas de estabelecer este dores dos programas policiais de incentivarem a violên- Por outro lado, ao evitar lançar mão de novas fon-
vínculo. E na última semana tivemos dois exemplos a par- cia. Sem contar que a segurança pública é prerrogativa tes de receita que tenham por base um sistema tribu-
tir dos quais é possível fazer relações qualitativas. O pri- dos estados, e não dos municípios. tário menos injusto, o governo deixa evidente que não
meiro é o ataque ao Instituto Lula (terceira bomba con- Igor Carvalho (do site da CUT) nos lembra que em vai conseguir os recursos necessários para promo-
tra alvos do PT). Não é preciso citar nenhum estudo aca- 2012 o presidente do Uruguai José Mujica anunciou um ver o ajuste fiscal, tal como desejado. E assim, come-
dêmico para compreender que o discurso de ódio contra pacote de medidas (“Estratégia pela vida e convivên- çam a surgir as suspeitas de que estaria sendo prepa-
Lula se materializou (direta ou indiretamente) na bomba cia”) para conter a criminalidade. Além da importante rado o lançamento de um programa de privatização de
caseira arremessada no portão do Instituto, no bairro do medida que transformou o Uruguai no gerente, produ- empresas públicas, com o objetivo de obter as receitas
Ipiranga, em São Paulo. Um dos fomentadores desse dis- tor e distribuidor de maconha no país, também proibiu que deveriam vir, na verdade, de tributos sobre gran-
curso agressivo (Danilo Gentili) chegou inclusive a insi- a exibição de programas policiais entre 6h e 22h. Segun- des fortunas, sobre heranças e sobre as transações fi-
nuar que o atentado (minimizado pela imprensa) teria si- do a medida, “atrações televisivas” promovem atitudes nanceiras.
do forjado e, na mesma toada, lamentou que o ex-presi- ou condutas violentas e discriminatórias. E, para quem
dente não estivesse no prédio. Muito coerente. gosta de números, em junho de 2014, as mortes ligadas Paulo Kliass é doutor em economia pela Universidade de
O segundo é o lançamento da pré-candidatura à pre- ao tráfico de drogas estavam zeradas no Uruguai. Sauda- Paris 10 e integrante da carreira de Especialista em Políticas
feitura de São Paulo de José Luiz Datena e, provavel- des de Mujica! Públicas e Gestão Governamental, do governo federal.

fatos em foco
da Redação
MP quer ouvir população Brasil registra 5 milhões de Salário-mínimo aumenta a reforma agrária, os sem-terra se posicionam
sobre a falta de água em SP acidentes de trabalho em um ano 18,5% na Argentina contra o ajuste fiscal e a política econômica
Nos próximos dias 20 e 21, a população Dados de pesquisa do Instituto Brasi- Em acordo com sindicatos, o governo da do Governo Dilma. “O ajuste fiscal do governo
paulista poderá levar ao Ministério Público do leiro de Geografia e Estatística (IBGE) em presidente Cristina Kirchner anunciou aumen- federal ameaça estagnar ainda mais o processo
Estado (MP-SP) relatos, documentos, infor- parceria com o Ministério da Saúde, apon- to de 28,5% no salário-mínimo. O reajuste da reforma agrária no país, pois sem orçamen-
mações ou qualquer outro subsídio que possa tam que 4.948 milhões de trabalhadores será escalonado até janeiro de 2016, os pri- to não há como o governo cumprir o compro-
auxiliar na instrução de dez inquéritos que in- sofreram acidentes de trabalho entre 2012 meiros 18,5% serão aplicados em 1º de agosto. misso político, assumido no início deste ano,
vestigam as causas, consequências e responsa- e 2013. O número de casos computados é O salário-mínimo argentino passará de 4.716 de assentar 120 mil famílias sem-terra acam-
bilidades sobre a falta de água que atinge São bem maior que o registro da Previdência pesos para 6.060 pesos (de R$ 1.642 para R$ padas no Brasil”, afirma Alexandre Conceição,
Paulo desde o ano passado. Dentre os temas Social do mesmo período. “O Brasil sem- 2.097, pelo câmbio oficial). A decisão é toma- da coordenação nacional do MST.
investigados estão a prática de racionamento pre liderou a lista dos países com maior da por meio do Conselho do Salário, que reú-
não declarado, qualidade da água e risco à número de acidentes de trabalho”, destaca ne, há 12 anos, Centrais Sindicais, entidades Trabalhador mineiro morre
saúde, irregularidades nas obras emergenciais, Marcelino Rocha, presidente da Federação patronais e governo. (Agência Sindical) no Chile após participar de greve
a previsibilidade da crise e suficiência das Interestadual de Metalúrgicos (Fitmetal), Um disparo por arma de fogo da polícia chi-
medidas adotadas pelo governo de Geraldo que representa uma das categorias com MST ocupa Ministério da Fazenda lena provocou a morte do trabalhador Nelson
Alckmin (PSDB). Segundo o promotor Ricardo mais incidência de acidentes. “Temos de em jornada por reforma agrária Quichillao López, de 47 anos. Operário de uma
Manuel Castro, do Grupo de Atuação Especial nos lembrar que, em geral, esses acidentes O Movimento dos Trabalhadores Rurais mina, ele participava de um protesto durante
de Defesa do Meio Ambiente (Gaema), da acontecem devido à precarização do traba- Sem Terra (MST) realiza desde o dia 3 de greve de sua categoria, na segunda-feira, dia
capital paulista, o objetivo é produzir provas lho.” A pesquisa foi divulgada na ocasião agosto uma jornada de lutas por reforma agrá- 27 de julho, que reivindicava melhores condi-
para os inquéritos a partir da participação de do Dia Nacional de Prevenção de Aciden- ria popular. Ocupações de latifúndios, órgãos ções de trabalho e salários. Após a morte de
quem é afetado cotidianamente pela crise, mas tes de Trabalho, celebrado em 27 de julho. do governo, fechamento de rodovias e debates López, centenas se somaram às manifestações.
que nunca havia contatado o MP. (Agência Sindical) ocorrem por todo o país. Além de reivindicar (Agência Sindical
4 de 6 a 12 de agosto de 2015 brasil 5

A arte de ignorar a natureza


IMPACTOS
Iberdrola
A CNEC – WorleyParson
de Salto da Divisa (MG)

A CNEC foi criada em 1959 por um


Arquivo Câmara Municipal de Salto da Divisa
do momento, as alterações verificadas
nos textos entregues”, afirmou. O bió-
logo contou que, em reunião com repre-
sentantes da CNEC em São Paulo, ouviu
grupo de professores da Escola Politéc- que os trabalhos apresentados não aten-
Engevix, Leme e CNEC- nica da Universidade de São Paulo. Em diam ao padrão CNEC e que o texto ou
WorleyParsons: conheça 1969, foi adquirida pelo Grupo Camar- a avaliação de impactos feita pela equi-
go Corrêa e passou a projetar boa par- pe não interessavam ao empreendedor.
as três empresas que se te das hidrelétricas construídas pela Dos 17 impactos relacionados pelos es-
empreiteira. Ao lado da Engevix, ela foi tudiosos dos peixes, apenas três foram
revezam na elaboração uma das principais empresas projetistas mantidos no documento final ou EIA/
de engenharia do país durante a ditadu- Rima, de acordo com ele.
de estudos de impacto ra militar. O mesmo ocorreu com os dados apre-
ambiental das maiores “O amordaçamento de mecanismos sentados pelo biólogo especialista em
fiscalizadores, como a imprensa, o Par- biologia vegetal Alexandre Uhlmann,
usinas hidrelétricas do lamento e parte da sociedade civil, per- que também constatou que parte do seu
mitia aos empreiteiros maximizar seus relatório foi omitida no EIA. Ele descre-
país. Para acelerar o início lucros com práticas ilícitas e tocar obras veu 14 impactos positivos e negativos,
das obras, vale tudo com rapidez, agilidade e sem preocupa- mas alguns foram omitidos e outros, mi-
ção com os impactos do empreendimen- O rio antes da construção da usina dava vida à cidade de Salto da Divisa nimizados. Ao MPF, o biólogo ornitólo-
to”, afirma Pedro Henrique Pedreira go Marcos Ricardo Borsnschein decla-
Campos, na tese de doutorado apresen- No decorrer do texto do EIA, a empre- Com o prazo reduzido, a CNEC pas- rou que o trabalho apresentado pelo IAP
Alice Maciel tada na Universidade Federal Fluminen- sa, de acordo com o instituto, informou sou a acompanhar os trabalhos dia e é “completamente diferente” do desen-
de Salto da Divisa (MG) se: A ditadura dos empreiteiros: as em- dados diferentes da área preventiva de noite e colocou uma funcionária para volvido por ele. Segundo Marcos, o tra-
da Agência Pública presas nacionais de construção pesada, desmatamento e limpeza do reservató- revisar os textos e alterar o conteúdo balho do EIA entregue ao órgão ambien-
suas formas associativas e o Estado di- rio. O órgão solicitou à Eletrobrás a re- dos trabalhos técnicos, “muitas vezes tal “é paupérrimo, dado que as consul-
“A LUTA NOSSA, menina, tem sido pesa- tatorial brasileiro, 1964-1985. formulação do estudo e apontou mais de em desacordo com seus atores”, diz a tas bibliográficas foram restritas a me-
da demais”, descreve o pescador Ademar No mesmo estudo, realizado em 2012, 180 pontos que precisavam ser aprofun- ação. Em depoimento ao procurador- nos de 10 fontes”, e ele havia levantado
Leôncio, que em seguida passa a palavra ele ainda observa: “Nos últimos dez anos, dados. Um detalhamento maior sobre o -geral do estado do Paraná, João Aki- mais de 90 fontes de informações sobre
para a lavadeira Jovecília de Jesus con- fomos surpreendidos com a retomada de modo de vida, infraestrutura, educação, ra Omoto, a antropóloga contratada aves na bacia do rio Tibagi. O relatório
tinuar a história. Sentados em uma me- vários projetos encetados no período di- segurança e pesca nas áreas diretamente pela Igplan para fazer o levantamen- diz que ele esteve em campo três dias,
sa da casa do extrator de pedra e areia, tatorial, além de empreendimentos no- afetadas pelo projeto, estão entre os ci- to de impactos sobre populações indí- mas Marcos afirmou ter ficado na região
Reinaldo Oliveira, o Reinaldão, os três vos que reproduzem certas característi- tados. A CNEC Engenharia WorleyPar- genas, Maria Fernanda Campelo Mara- atingida por 24 dias. Ainda segundo o
contam como foi a chegada da hidrelétri- cas daquele modelo de desenvolvimen- sons preferiu não comentar o caso. nhão, alegou que aguardava o texto fi- biólogo, o EIA apontou apenas uma es-
ca de Itapebi, em Salto da Divisa, Vale do to. Assim, vimos a retomada da constru- As falhas nos estudos ambientais da nal do EIA/Rima quando foi informa- pécie ameaçada de extinção, enquanto
Jequitinhonha, em Minas Gerais. ção das grandes centrais hidrelétricas – usina de São Luiz do Tapajós não são um da de que seu trabalho não seria incluí- ele elencou cinco.
O município com 7 mil habitantes, es- como Belo Monte, projetada na ditadu- caso isolado no histórico da CNEC. Ain- do, a pedido da CNEC. Ela foi procura-
tá localizado às margens do rio que dá ra, e as usinas do rio Madeira, de projeto da integrante do Grupo Camargo Cor- da por um funcionário do Departamen- Multa
nome à região. Mas o que sobrou dele final mais recente –, com seu grande im- rêa, em 2006, a empresa foi denunciada to de Meio Ambiente da empresa para Devido a isso, a CNEC Engenharia
depois da construção da barragem, em pacto socioambiental”. em um esquema de fraude e manipula- assinar um resumo do seu trabalho, de foi multada em R$ 40 milhões por da-
2003, foi um grande lago sujo, infesta- Em 1980, a CNEC começou a pres- ção nos estudos de impacto ambiental da aproximadamente três páginas. “[…] a nos coletivos. Além dela, o deputado es-
do de aguapé, planta que se espalha em tar serviços na área ambiental. Na mes- usina hidrelétrica de Mauá, no rio Tiba- declarante se negou ao proposto pela tadual Rasca Rodrigues (PV) chegou
águas poluídas. Até mesmo a cachoeira ma década, fez o mapeamento de proje- gi (PR) – a empresa, vencedora da con- empresa CNEC, tendo dito que um re- a ser condenado, em primeira instân-
Tombo da Fumaça, um dia tombada co- tos de construção de usinas em diversos corrência em 2008, fez também a revi- sumo não atenderia a complexidade da cia, à perda de mandato por ter ocupa-
mo patrimônio histórico estadual e mu- afluentes do rio Amazonas, incluindo os são dos estudos de inventário da bacia questão antropológica; que apenas en- do, simultaneamente, dois cargos públi-
nicipal, foi alagada e sumiu. Das promes- rios Xingu e Tapajós. hidrográfica do rio Tibagi. Com investi- tregaria o texto integral do seu traba- cos durante a liberação do licenciamen-
sas feitas pela empreiteira, poucas foram Em 2010, a CNEC foi adquirida pelo mentos do Programa de Aceleração do lho”, registra o procurador. to da usina, em 2005: presidente do IAP
cumpridas. Menos da metade dos extra- grupo australiano WorleyParsons, con- Crescimento (PAC), do governo federal, O biólogo Euclides Selvino Grando (e membro do conselho fiscal da Copel,
tores e dos pescadores recebeu indeniza- sultoria de energia que atua em 45 paí- e financiada pelo BNDES, a obra da usi- Jr., responsável pela consolidação dos empresa majoritária no consórcio cons-
ção. A cidade não viu o prometido desen- ses nos cinco continentes. Mesmo pas- na de Mauá custou R$ 1,4 bilhão. dados levantados pela equipe técnica da trutor da hidrelétrica). Em 2013, o polí-
volvimento. Pelo contrário, a sensação é Vista aérea da hidrelétrica de Itapebi, em Salto da Divisa, Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais sando para as mãos de outro grupo eco- Igplan, declarou ao MPF que houve al- tico conseguiu reverter a decisão. A re-
que Salto da Divisa parou no tempo. nômico, a CNEC permaneceu com pro- Adulteração terações nos dados do EIA/Rima na sua portagem entrou em contato com a Ca-
A empresa que elaborou o Estudo de e do EIA da hidrelétrica de Belo Mon- Hoje, a empresa é alvo da Operação Hoje, a empresa é alvo da Operação jetos no Xingu e Tapajós. Ela foi con- Em depoimento ao MPF-PR, técnicos parte. No depoimento, ressaltou que um margo Corrêa, que ficou responsável pe-
Impacto Ambiental (EIA) da hidrelétri- te, no rio Xingu (PA). Foi a responsável Lava Jato, que investiga denúncias de tratada pela Norte Energia para a im- responsáveis pelo levantamento do EIA/ dos resultados do levantamento deter- lo passivo, mas não obteve retorno.
ca – que omitiu o alagamento de cacho- pelo pré-cadastro socioeconômico, pes- Lava Jato, que investiga denúncias de corrupção na Petrobras. Ela é acusada plantação e gerenciamento de progra- Rima constaram que a CNEC adulterou minou que “com a construção da barra- A CNEC elaborou também os estu-
eiras, subestimou o número de traba- quisa censitária e amostral do patrimô- de participar do cartel de contratos que mas socioambientais da usina hidrelé- as informações do texto final do relatório gem deveriam ser localmente extintas dos ambientais das hidrelétricas Ba-
lhadores atingidos pela barragem e não nio arqueológico, cultural e paleonto-
corrupção na Petrobras. Ela é acusada de teria desviado mais de R$ 6 bilhões da trica de Belo Monte, no Xingu. Também entregue ao IAP, órgão responsável pe- espécies como o dourado e o pintado, guari (MG), Estreito (TO/MA), Itá (RS/
previu a interrupção da pesca – é co- lógico na região afetada pela usina. Ao participar do cartel de contratos que teria maior estatal brasileira. De acordo com foi a CNEC WorleyParsons Engenharia lo licenciamento. Os especialistas traba- que constam na lista paranaense de es- SC), Tijuco Alto (SP/PR) e Segredo (PR).
nhecida do público. Foi a Engevix En- mesmo tempo, a Engevix Engenharia e a denúncia do Ministério Público Fede- a responsável por elaborar o EIA/Rima lhavam para a Igplan – Inteligência Geo- pécies ameaçadas de extinção”. De acor- Ainda na área de meio ambiente, a em-
genharia S.A. Engevix Construções – do mesmo grupo desviado mais de R$ 6 bilhões da maior ral (MPF), a Engevix teria pago propi- da usina São Luiz do Tapajós, finalizados gráfica Ltda., contratada pela CNEC pa- do com Grando Jr., o texto foi substituí- presa fez o EIA/Rima do metrô de São
A Engevix tem como foco a construção – participam junto com a Toyo Setal do na ao ex-diretor de abastecimento da ano passado. ra fazer o levantamento. do por outro que desvaloriza essas espé- Paulo, da rodovia Castelo Branco, no es-
civil, mas também atua na área de meio consórcio de montagem eletromecânica estatal brasileira Petrobras, Paulo Roberto Costa, por Os trabalhos dos técnicos, após in- cies no contexto nacional, mencionando tado de São Paulo, e da ferrovia Norte-
ambiente. Ela participou, por exemplo, da hidrelétrica a um custo de R$ 1,038 intermédio de empresas vinculadas ao Falhas no estudo terrupção de dois anos, foram levados tratar-se de espécies de grande distri- -Sul, nos estados de Minas Gerais e Es-
da realização dos estudos das comuni- bilhão. Ou seja, além de fazer o EIA/Ri- doleiro Alberto Youssef. A propina te- O documento feito pela empresa no a cabo em julho de 2004. De acordo buição geográfica e omitindo a ameaça pírito Santo.
dades, terras e áreas indígenas do Re- ma, a Engevix se beneficia da construção ria vindo do lucro obtido com licitações Tapajós, no entanto, não convenceu o com a ação civil pública impetrada pe- da extinção local. A CNEC já projetou mais de 60 usinas.
latório de Impacto Ambiental (Rima) do empreendimento. fraudulentas. Ibama. O órgão apontou diversas falhas lo MPF, a empresa tinha três meses pa- Segundo ele, em dois momentos ocor- Ela atua também nos setores de óleo e
no estudo, em avaliações divulgadas en- ra concluir os trabalhos. Isso porque se reram alterações ou interferências nos gás, mineração e transporte. Presta ser-
tre novembro de 2014 e o início de mar- pretendia incluir o empreendimento no resultados do trabalho: “No primeiro viços de consultoria e gerenciamento de
ço. Para ter uma ideia, durante a análise leilão previsto inicialmente para janei- momento, as interferências dessa apon- projetos que vão desde estudos de via-

Engevix: um
realizada, o Ibama detectou até mesmo ro de 2005 (mas que acabou ocorrendo tada funcionária da CNEC na fase de bilidade até o início da operação do em-

O mercado de dissimular
informações controversas. em dezembro). consolidação dos textos e, em um segun- preendimento. (AM) (Agência Pública)

histórico de omissões impactos ambientais Doações eleitorais


1997 comprou-a com outros dois dire- rez, Camargo Corrêa e Odebrecht, que
de Salto da Divisa (MG) tores, José Antunes Sobrinho e Gerson de Salto da Divisa (MG) também são parceiras da Engevix, da Le- de Salto da Divisa (MG)
de Mello Almada. Fundada em 1965, a me e da CNEC na construção de grandes
No final da década de 1990, a Engevix Engevix nasceu com a missão de fazer Não é à toa que a Engevix esteve pro- obras país afora. Como exemplo, a Enge- O confronto de interesses, que coloca em xeque o atual sistema de licenciamento ambiental
Engenharia protagonizou um dos casos projetos para a Servix Engenharia, em- fundamente envolvida em diversas vix participou com a Odebrecht do con- no Brasil, não para por aí. Nas campanhas eleitorais, as mesmas empresas que deveriam exe-
mais emblemáticos de fraude em EIA no preiteira especializada em obras de hi- grandes licitações e na construção de Be- sórcio construtor da usina hidrelétrica de cutar estudos de impacto ambiental imparciais fizeram doações para parlamentares ruralistas.
país. Omitiu a existência de uma flores- drelétricas. Isso porque a legislação de lo Monte, segunda maior hidrelétrica do Baguari (rio Doce-MG); a CNEC é par- Entre as eleições de 2004 e 2014, juntas, as três investiram quase 26 milhões em diversos co-
ta de quase 6 mil hectares de araucárias 1964 impedia as empresas de atuar tan- país. Ela faz parte de um seleto clube de ceira da Camargo Corrêa na implantação mitês partidários e candidaturas pelo Brasil afora. Os principais partidos beneficiados foram:
alagada com a construção da hidrelétri- to na elaboração do projeto quanto na três empresas que há duas décadas se re- da refinaria de Abreu e Lima; enquanto a PT, PSDB e PMDB. Nas duas últimas eleições nacionais (2014 e 2010), pelo menos quatro de-
ca Barra Grande, no rio Pelotas, divisa construção. vezam na elaboração dos estudos de im- Leme Engenharia participou do consór- putados da bancada ruralista foram agraciados: Espiridião Amin (PP-SC), Nelson Marche-
de Santa Catarina com o Rio Grande do pacto desse tipo de obra. cio construtor da usina hidrelétrica Ca- zan Júnior (PSDB-RS), Arnaldo Jardim (PPS-SP), que se licenciou do mandato para assumir
Sul. Hoje, no Brasil, restam apenas 3% Das 71 hidrelétricas que entraram em pim Branco I e II (rio Araguari-MG) com o cargo de secretário de Estado de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, e Luiz Fernando
de remanescentes de floresta de arau- Em 2007, a empresa foi operação desde o primeiro ano do gover- Andrade Gutierrez, Odebrecht e Engevix. Farias (PP-MG). Em 2014, a candidatura de Dilma Rousseff recebeu R$ 1,5 milhão da Enge-
cária, ecossistema que pertence à Mata no Fernando Henrique Cardoso, em ja- Além dos contratos com o setor priva- vix. A empresa investigada pela Lava Jato investiu mais de R$ 7,6 milhões em doações para 13
Atlântica. Junto com a floresta, também alvo da Operação Navalha, neiro de 1999, pelo menos 42 contaram do, elas têm negócios com a Empresa de partidos no ano passado. Já a Leme investiu 380 mil em candidatos ao governo e ao Congres-
foi extinta a bromélia Dyckia distachya. com a participação das empresas En- Pesquisa Energética (EPE), autarquia do so nas últimas eleições. (AM) (Agência Pública)
“A maior parte a ser encoberta é cons-
cujo objetivo era desmontar gevix Engenharia, Leme Engenharia e Ministério de Minas e Energia responsá- Infografia: Marcelo Grava
tituída de pequenas culturas, capoei- uma quadrilha que fraudava CNEC WorleyParsons Engenharia, sen- vel por “desenvolver estudos de impacto
ras marginais baixas e campos com ar- do que elas foram responsáveis pelos es- social, viabilidade técnico-econômica e
voredos esparsos”, alegou a Engevix em licitações de obras públicas tudos de impacto social e ambiental de socioambiental para os empreendimen-
relatório que serviu de base para o Iba- 22 delas. Esses estudos são pré-requisi- tos de energia elétrica e de fontes reno-
ma dar a licença de instalação da usina, tos para o licenciamento da construção váveis”, de acordo com a Lei n° 10.847,
em 2001. A licença de operação saiu em das usinas desde 1986, seguindo a reso- de 15 de março de 2004. A EPE contra-
2005, mesmo ano em que o órgão fede- Nos primeiros anos de vida, a Enge- lução do Conama. tou, por exemplo, a Leme Engenharia
ral autuou a empresa em R$ 10 milhões vix fez projetos de engenharia das hi- (em consórcio com a Concremat) para
e a proibiu de elaborar estudos ambien- drelétricas do Paranapanema e Jurumi- fazer os estudos das usinas de São Mano-
tais para novos empreendimentos no rim (SP), além de subestações, linhas de Para acelerar o início das obras el (PA) no rio Teles Pires e da hidrelétri-
Brasil por omitir a existência da floresta transmissão e obras de irrigação. A En- ca Teles Pires (PA/MT), no rio de mesmo
de araucárias. Uma decisão do Tribunal gevix Engenharia faz parte do Grupo En- das usinas hidrelétricas vale tudo nome. Só de recursos da EPE, a Engevix
Regional Federal (TRF) da 4ª Região, gevix, formado por mais cinco empresas recebeu, de 2008 a 2015, R$ 6,2 milhões,
em 2012, suspendeu as penalidades, de que atuam em diferentes áreas de ne- nas rubricas Estudos de Inventário para
acordo com informações da assessoria gócios: a Engevix Engenharia S.A. ope- As mesmas empresas fizeram os estu- Expansão de Energia Elétrica e Plane-
de imprensa do Ibama. ra nas áreas de energia, indústria e infra- dos ambientais das demais grandes hi- jamento do Setor Energético, de acordo
Em 2007, a empresa foi alvo da Opera- estrutura; a Desenvix Energias Renová- drelétricas que estão em construção atu- com levantamento no Portal da Trans-
ção Navalha, cujo objetivo era desmon- veis S.A. desenvolve empreendimentos e almente: Teles Pires (PA-MT), Baixo parência do Governo Federal. Já a CNEC
tar uma quadrilha que fraudava licita- investe no setor de energia renovável; a Iguaçu (PR) e São Manoel (MT), além de Engenharia recebeu, no mesmo período,
ções de obras públicas. Na época, o lo- Ecovix – Engevix Construções Oceânicas São Luiz do Tapajós (PA) que está em fa- R$ 7,8 milhões, enquanto a Leme Enge-
bista Sérgio Sá, contratado da emprei- S.A. atua em construção naval e instala- se de planejamento. nharia, R$ 5 milhões.
teira, foi preso na operação. Isso, no en- ções off shore para a indústria de óleo e Porém, contratadas e pagas pelo em- Para acelerar o início das obras das
tanto, não impediu que a empresa man- gás; a Infravix Empreendimentos S.A. preendedor, as três têm como ativida- usinas hidrelétricas vale tudo: esconder
tivesse contratos com o poder público. dedica-se à infraestrutura em obras de de principal a construção civil. Ou seja, a existência de florestas, de espécies de
Em novembro do ano passado, um dos transporte, saneamento básico e desen- além de ter de agradar ao freguês com animais em risco de extinção e até mes-
sócios da Engevix, Gerson Almada, foi volvimento imobiliário; a Engevix Siste- relatórios que sejam aprovados pelos ór- mo de impactos sobre tribos indígenas.
preso na Operação Lava Jato. Em entre- mas de Defesa Ltda. trabalha com a de- gãos ambientais, elas estão entre as in- Denúncias por falhas e omissões em EIA
vista à Folha de S.Paulo em março des- manda dos grandes projetos na área de teressadas na liberação da obra. Muitas e Rima fazem parte do histórico da En-
te ano, o presidente da Engevix, Cristia- defesa do Brasil; a Engevix Construções vezes essas empresas fazem os estudos e, gevix, da Leme e da CNEC. A consequên-
no Kok, admitiu ter pago cerca de R$ 10 Ltda. atende às demandas de construção posteriormente, participam do processo cia: biomas destruídos e direitos huma-
milhões para o doleiro Alberto Youssef. do Grupo Engevix, trabalha em paralelo de construção das hidrelétricas. nos desrespeitados, estragos irreversí-
Kok está na presidência da Engevix com a Engevix Engenharia e possui con- Na lista de clientes que as contratam veis. Apesar disso, nada impediu, até ho-
desde 1989. Engenheiro mecânico, ele tratos próprios, prestando serviços a ou- pelo know-how na área de meio ambien- je, que elas continuem atuando na área.
começou a trabalhar ali em 1972. Em tras empresas. (AM) (Agência Pública) te, estão as construtoras Andrade Gutier- (AM) (Agência Pública)
6 de 6 a 12 de agosto de 2015 brasil

A Leme Engenharia Luiz Paulo Mairink


IMPACTOS formações, a empresa encaminhou al-
gumas proposições de ações que bus-
A empresa esteve à frente cam evitar ou amenizar impactos nestas
áreas, caso uma nova cheia semelhante à
também do EIA/Rima da de 2014 venha a ocorrer”, acrescentou a
maior hidrelétrica do país, empresa. Já a Leme Engenharia não re-
tornou aos pedidos de informação, as-
a de Belo Monte sim como o Ibama.
A Leme Engenharia esteve à frente
também do EIA/Rima da maior hidrelé-
trica do país, a de Belo Monte. Os estu-
Alice Maciel dos ambientais da usina contam ainda
de Salto da Divisa (MG) com a participação da Themag Engenha-
da Agência Pública ria, da Engevix Engenharia e da Interte-
chne, responsáveis pelos estudos de co-
“O GOVERNO constrói barragens com munidades em terras e áreas indígenas.
estudos apressados e incompletos, sem
buscar entender as consequências da
destruição da natureza para nossas vi- “Os estudos do
das, autorizando o funcionamento das
barragens, sem dar uma resposta aos licenciamento restaram
indígenas de como seguirão suas vidas
sem peixe, sem água, sem caça. Ten-
prejudicados e,
ta esconder seus impactos negativos so- consequentemente, não se
bre nossas vidas, nossos rios e nossos
territórios. O governo não traz infor- tem a real dimensão dos
mações que entendemos, nas nossas al-
deias e nas nossas línguas, não oferece impactos sociais, étnicos,
alternativas para a nossa sobrevivência
física e cultural. O governo federal não ambientais e econômicos
tem respeitado o nosso direito à consul- que serão causados na região
ta e consentimento livre, prévio e infor-
mado, garantido pela Constituição Fe- pelo empreendimento”
deral e pela Convenção 169 da OIT, an-
tes de tomar suas decisões políticas so-
bre a construção de barragens no rio Te-
les Pires. Jamais fomos consultados ou
demos nosso consentimento para a des- O MPF do Pará já ajuizou 23 ações con-
truição de nossos rios, nossas florestas e tra Belo Monte. De acordo com informa-
nossos lugares sagrados, como a cacho- ções da Procuradoria, há problemas com
eira de Sete Quedas e o Morro do Maca- o estudo de viabilidade da hidrelétrica,
co.” Essas palavras fazem parte de uma com o procedimento de licenciamento
carta dos povos indígenas Apiaká, Kaya- ambiental e com o EIA da obra. Segundo
bi e Munduruku, do baixo Teles Pires, e o MPF do Pará, o próprio Ibama identifi-
Rikbaktsa, do baixo Juruena, publica- cou que o EIA/Rima entregue pela Norte
da em abril. No documento, eles exigem Energia deixou de apresentar documen-
que se cumpra a consulta sobre os proje- tos importantes, como estudos de qua-
tos hidrelétricos em curso. lidade da água e informações sobre po-
Segundo o Ministério Público do Pará, pulações indígenas, mas aceitou os rela-
os impactos sobre esses povos nem se- tórios técnicos. “Os estudos do licencia-
quer foram citados no EIA/Rima, de au- mento restaram prejudicados e, conse-
toria da Leme Engenharia em consórcio quentemente, não se tem a real dimen-
com a Concremat, que serviu para o Iba- são dos impactos sociais, étnicos, am-
ma emitir a licença prévia e de instala- bientais e econômicos que serão causa-
ção da usina hidrelétrica de Teles Pires, dos na região pelo empreendimento”,
no Mato Grosso. “É fato que a UHE Te- alertou o órgão ao Judiciário. A Leme fez
les Pires vai impactar os povos indíge- também estudos ambientais das hidrelé-
nas Kayabi, Apiaká e Munduruku. Ocor- “Até hoje, não tem onde por uma pá de areia” tricas de Capim Branco I e II, Dardane-
re que o Ibama aceitou o EIA/Rima e los, Salto Caxias e São Manoel.
emitiu Licença Prévia (LP) e Licença de bilhões financiados pelo BNDES), que A hidrelétrica contou Além de elaborar estudos de impacto
Instalação (LI) da usina, respectivamen- entraram em operação em 2012 e 2013, ambiental, a empresa atua nos setores
te, sem o Estudo de Componente Indíge- respectivamente, também acumulam com financiamento do de hidroenergia, geração térmica, ener-
na (ECI), parte integrante do EIA/Rima. processos contestando os estudos de im- gias renováveis (biomassa, eólica e so-
Vale dizer, os impactos sobre os povos pactos ambientais e sociais assinados
BNDES de R$ 2,8 bilhões. lar), sistemas eletrônicos (subestações,
indígenas não foram mensurados. O Es- pela Leme. A construção da usina linhas de transmissão e telecomunica-
tudo de Componente Indígena está pre- Em fevereiro de 2014, a Justiça Fede- ções associadas aos sistemas de trans-
visto no Termo de Referência, emitido ral determinou que os consórcios Santo começou em agosto de missão), gás, edificações complexas,
pelo próprio Ibama. Há evidências con- Antônio Energia e Energia Sustentável transporte (ferrovias, hidrovias), portos
cretas de danos iminentes e irreversíveis do Brasil, responsáveis pela construção 2011 e 98% das obras já e drenagem urbana. Ela desenvolve e ge-
para a qualidade de vida e patrimônio das duas usinas, refizessem o EIA/Rima rencia as obras, atuando desde as fases
cultural dos povos indígenas”, aponta a depois de uma enchente histórica no rio foram concluídas preliminares de estudos e projetos até a
denúncia feita pelo MPF. Madeira. A decisão atendeu a uma ação implantação final do empreendimento.
A hidrelétrica contou com financia- civil pública movida pelo Ministério Pú- A Leme Engenharia foi fundada no
mento do BNDES de R$ 2,8 bilhões. A blico Federal e Estadual de Rondônia, mesmo ano da Engevix, durante o regi-
construção da usina começou em agos- pelas Defensorias Públicas da União e A empresa Energia Sustentável afir- me militar, em 1965. Ela nasceu com a
to de 2011 e 98% das obras já foram con- do Estado e da Ordem dos Advogados do mou que não comenta as ações ajuiza- função de desenvolver os projetos bási-
cluídas. De acordo com os índios, na car- Brasil – Seccional de Rondônia. das. A Santo Antônio Energia respondeu co e executivo das usinas hidrelétricas
ta-manifesto, “as barragens de Teles Pi- “Neste momento de crise, é fato notó- que atendeu a determinação do Ibama e de Mascarenhas, no Espírito Santo, e de
res já mataram toneladas de peixes e mi- rio que a área de influência direta dos la- do Judiciário e incorporou novos dados Volta Grande, em Minas Gerais, para a
lhares de animais”. Eles contam ainda gos dos AHE ultrapassou e muito as pre- aos estudos do EIA/Rima. “Prontamen- Cemig, empresa de energia de Minas Ge-
que não conseguem mais pescar com ar- visões dos estudos realizados pelos con- te, e respeitando os prazos determinados rais. Em 2000, a Leme foi adquirida pela
co e flecha, por causa da água suja, e que sórcios. Dizem os empreendimentos que judicialmente, a Santo Antônio Energia Tractebel Engineering, que tem sede em
os problemas de saúde estão aumentan- se trata de enchente que, segundo seus encaminhou os dados complementares Bruxelas, na Bélgica, e atua na América
do devido à contaminação da água. cálculos, remete a um tempo de recor- ao juiz da 5ª Vara Federal de Porto Ve- Latina, Europa, África e Ásia.
rência de 100 anos, daí os impactos vi- lho, que englobam novos levantamentos A Tractebel integra o grupo francês
Processos venciados na infraestrutura regional, na topobatimétricos, detalhamento da área GDF Suez – que no início de maio pas-
No rio Madeira, em Rondônia, as usi- floresta que margeia os reservatórios, afetada na BR 364 e da Área de Preser- sou a se chamar Engie –, um dos maio-
nas de Santo Antônio (R$ 6,13 bilhões fi- nas comunidades ribeirinhas, nos reas- vação Permanente (APP) do distrito de res grupos de energia e infraestrutura
nanciados pelo BNDES) e Jirau (R$ 9,5 sentamentos, etc.”, diz o MPF na ação. Jacy-Paraná. Juntamente com estas in- do mundo.

Para MPF, interesse econômico prevalece


dos. “Sem uma coerência interna, o Es- ção de informações inexatas, impreci- so de elaboração do EIA/Rima é inicia-
de Salto da Divisa (MG) tudo de Impacto Ambiental deixa de si- sas ou contraditórias. “Há casos em que do, já “é sinal de que a obra será apro-
tuar-se na esfera da prevenção de da- os Estudos citam espécies reconhecida- vada”. “O EIA/Rima tornou-se um ins-
O MPF comprovou, em levantamento nos ambientais para se tornar apenas mente inexistentes na região”, conclui. trumento de viabilização da obra. É tu-
feito em 2004, que nos estudos de im- um documento formal no processo de No EIA da UHE Estreito, no rio Tocan- do um faz de conta”, diz Schaffer, que
pacto ambiental prevalecem os aspectos licenciamento ambiental. Ao não iden- tins (TO/MA), realizado pela CNEC En- acompanhou o alagamento da floresta
econômicos sobre os ambientais. O diag- tificarem e analisarem suficientemen- genharia, foi mencionada a possibilida- de araucária pela usina de Barra Gran-
nóstico, intitulado Deficiências em Estu- te os potenciais impactos dos empreen- de de ocorrência da ararinha-azul em de com “uma sensação de tristeza e de
dos de Impacto Ambiental, apontou fa- dimentos, os Estudos deixam de reve- savanas nos estados do Maranhão e To- muita indignação”.
lhas em 12 EIAs de usinas hidrelétricas lar a equação completa de benefícios e cantins, apesar de a espécie ser conside- Ele reitera que o licenciamento deve-
que resultaram em impactos ambientais ônus”, diz o documento. rada extinta pelo Ibama. ria ser um instrumento de análise sé-
não previstos, insuficiência na mitigação Ao longo de todo o período de análise, ria dos impactos ambientais, apontando
de impactos e conflitos entre o empreen- não foi encontrado nenhum estudo em possibilidades de diminuir ou precaver
dedor e a população. que os autores concluíram pela inviabi- “Sem uma coerência interna, o os impactos. “Quando não há como fazer
Segundo o MPF, o levantamento mos- lidade ambiental do empreendimento. a mitigação, o EIA/Rima deveria negar a
tra que os estudos tendem a privilegiar Foi verificado que, desde a fase de ela- Estudo de Impacto Ambiental deixa obra, o que não acontece.”
os aspectos positivos dos empreendi- boração do EIA até a fase de execução Segundo ele, um dos pontos mais gra-
mentos. de medidas mitigadoras e de programas
de situar-se na esfera da prevenção ves do licenciamento ambiental está na
“Esta é uma falha grave em um docu- de monitoramento, prevalece a preocu- de danos ambientais para se tornar lei que permite que o empreendedor
mento que deve tratar a matéria com o pação com os investimentos, “o que po- contrate o EIA/Rima. “Os estudos de-
máximo de imparcialidade, visto que o de levar à adoção de soluções que repre- apenas um documento formal no veriam ser contratados de forma inde-
seu objetivo não poderia ser a viabiliza- sentem menor aplicação de recursos”. pendente, pelo poder público.” De acor-
ção, a qualquer preço, de um empreen- O relatório do MPF mostrou também processo de licenciamento ambiental” do com o ambientalista, os órgãos am-
dimento, mas, sobretudo, informar com que os prazos para a realização de pesqui- bientais fecham os olhos para os impac-
clareza à sociedade os benefícios e os sas de campo são insuficientes. “Em al- tos. “O Ibama tinha a obrigação de fa-
ônus previsíveis.” guns casos, os próprios autores dos diag- zer a vistoria adequada, verificando se
De acordo com o diagnóstico, os be- nósticos reconhecem nos textos as limi- Para o ambientalista e conselhei- as informações apontadas são verdadei-
nefícios do empreendimento são mui- tações de tempo para pesquisa primária.” ro da Associação de Preservação do ras. Como não viram, por exemplo, que a
tas vezes afirmados sem clara funda- O órgão apontou ainda como deficiên- Meio Ambiente e da Vida (Aprema- empresa estava escondendo 6 mil hecta-
mentação, quando não superestima- cia dos estudos ambientais a apresenta- vi), Wigold Schaffer, quando o proces- res de floresta?” (AM) (Agência Pública)
brasil de 6 a 12 de agosto de 2015 7

Amazônia apodrece em
lagos de novas hidrelétricas Fotos: Ibama

IMPACTOS
Usina de Teles Pires
descumpriu plano Madeira
ambiental e alagou o
reservatório com árvores jogada fora
dentro. Decomposição
deve emitir grande de São Paulo (SP)
quantidade de metano, Os erros cometidos pelo consórcio não
gás do efeito estufa afetarão só a vida no rio e o aquecimento
global, mas também a floresta Amazôni-
ca e a economia da região. Isso porque a
madeira que boia sobre o lago deveria ter
Piero Locatelli sido explorada por serrarias certificadas
de São Paulo (SP) e vendida legalmente, diminuindo a de-
manda pela derrubada de mais árvores.
A HIDRELÉTRICA de Teles Pires de- Com o desperdício, a madeira necessária
ve começar a gerar energia com árvores na região, inclusive nas obras da usina,
apodrecendo dentro do seu reservatório, terá que sair de outro lugar.
construído na divisa entre o Mato Grosso Madeira desmatada não foi removida e ficou dentro do lago da usina. Floresta em pé também foi alagada Região de expansão da soja, o norte
e o Pará, na floresta Amazônica. Boian- do Mato Grosso está entre os locais com
do sobre o lago criado pela usina, o en- e na beira do rio Teles Pires. O respon- O Ibama só constatou que o plano mais desmatamento no país. O municí-
tulho pode ser visto de longe. São galhos, sável direto pela barbeiragem ambien- pio onde fica a maior parte do lago, Pa-
lenhas e toras de madeira, entre elas cas- tal é a Companhia Hidrelétrica Teles Pi- não tinha sido cumprido em ranaíta (MT), está na chamada “lista ne-
tanheiras e árvores de mogno. res, consórcio formado pelas empresas fevereiro de 2015, quase três meses gra” do Ministério do Meio Ambiente, o
O apodrecimento dessa vegetação deve Neoenergia (50,1%), Eletrobras Furnas ranking das cidades que mais desma-
levar à morte de peixes e ao aumento da (24,5%), Eletrobras Eletrosul (24,5%) e após autorizar o funcionamento da tam. Por isso, a população da cidade so-
emissão do gás metano, pelo menos vinte Odebrecht (0,9%). A usina faz parte do fre restrições de acesso a algumas políti-
vezes mais nocivo ao efeito estufa do que Programa de Aceleração do Crescimen- hidrelétrica em novembro de 2014 cas públicas, como o crédito a produto-
o gás carbônico. Impacto desastroso pa- to (PAC), do governo federal. Como ór- res rurais.
ra um empreendimento que se apresenta gão fiscalizador, o Ibama deveria ter de-
como “fonte [de energia] limpa, renová- tectado o problema, mas os técnicos che-
vel e ambientalmente correta.” garam tarde. do, há menos de um mês dela receber a Região de expansão da soja,
As fotos publicadas nesta reportagem O Ibama só constatou que o plano não autorização para encher o reservatório.
revelam que a usina não cumpriu uma tinha sido cumprido em fevereiro de Desta forma, 6,2 mil hectares devem ter o norte do Mato Grosso está
regra obrigatória para o seu funciona- 2015, quase três meses após autorizar o sido alagados com vegetação – mais de
mento: a retirada das árvores da área a funcionamento da hidrelétrica em no- mil hectares acima do que deveria ter si-
entre os locais com mais
ser alagada, conforme previsto no seu vembro de 2014. Segundo relatório assi- do retirado pela empresa, segundo o seu desmatamento no país
Plano de Desmatamento. Além da gera- nado por técnicos do órgão, “as ativida- Plano de Desmatamento.
ção de metano, outra consequência é o des de limpeza da bacia de acumulação Questionada pela Repórter Brasil, a
desperdício de madeira. Oito pátios com foram realizadas de forma pouco crite- assessoria de imprensa da Companhia
toras foram alagados pelo reservatório riosa e até mesmo negligente”. Hidrelétrica Teles Pires respondeu que Desmatamento é alto na região
da usina, e a madeira que deveria ter si- Antes da fiscalização do Ibama, os er- está tomando as “providências adicio- Em e-mail à reportagem, o consórcio
do vendida ou utilizada na obra acabou ros da usina já haviam sido diagnostica- nais necessárias ou requisitadas pelos ór- de Teles Pires alega ainda que “realocou e
apodrecendo no rio. A companhia tam- dos pelo Instituto Centro de Vida, orga- gãos ambientais, incluindo a limpeza do removeu” as toras de valor comercial que
bém manteve árvores onde deveria ter nização que monitora os impactos de Te- reservatório”. estavam nos pátios alagados. Questiona-
desmatado totalmente, como as margens les Pires. O instituto revelou que a usina Questionado sobre a demora na fisca- da, a empresa não respondeu às pergun-
do rio Paranaíta. Além disso, a usina não não havia retirado nem metade da vege- lização, o Ibama afirmou que elas foram tas sobre como esta madeira foi comer-
retirou a vegetação necessária nas ilhas tação do local em outubro do ano passa- feitas dentro do tempo “usual”. cializada. (PL) (Repórter Brasil)

Projeto tinha Usina de metano


problemas de São Paulo (SP)

A principal consequência da série de


de São Paulo (SP) erros cometidos pela usina será o au-
mento da emissão de metano. O gás é ge-
Mesmo que seguido à risca, o Pla- rado quando uma substância orgânica se
no de Desmatamento da usina não decompõe sem oxigênio, como no fun-
teria sido suficiente para conter os do do reservatório da hidrelétrica. Des-
impactos ao meio ambiente. Este ta forma, as folhas, galhos e árvores dei-
plano, que é elaborado pelo consór- xados na área alagada vão se decompor
cio e aprovado pelo Ibama, estabele- e emitirão o gás metano em abundância.
ceu que apenas 58% da vegetação de- Este fenômeno é estudado de perto
veria ser retirada dos 10,7 mil hecta- no Brasil pelo biólogo Philip Fearnside, Sob o lago, entulho apodrece e leva à morte de peixes e ao aumento da emissão do gás metano
res alagados. pesquisador do Instituto Nacional de
Segundo especialistas ouvidos pe- Pesquisas da Amazônia (Inpa). Ele cha- que cresce em locais abandonados, co- xo da água em parte do ano. Assim, ela
la Repórter Brasil, o percentual con- ma as hidrelétricas em países tropicais nhecido como juquira. Como a maior vai apodrecer e gerar o gás tóxico anual-
trasta com o plano de outras hidrelé- de “fábricas de metano”, já que emitem parte da vegetação do reservatório foi re- mente. “Toda vez que rebaixar o nível da
tricas licenciadas recentemente que o gás de forma constante ao longo dos tirada seis meses antes do seu enchimen- água, vai se expor um lamaçal em volta
fixam como meta a retirada total da anos. O problema é comum a todas as to, a juquira cresceu nos locais de onde do lago. Ali crescem ervas e gramíneas,
vegetação. hidrelétricas no Brasil, mas foi agra- saíram as árvores. Inundada, a vegetação e tudo aquilo morre quando a água vem.
vado em Teles Pires devido à grande baixa se transformará toda em metano. A vegetação fica no fundo, onde não tem
quantidade de árvores e entulhos dei- O mesmo problema vai se repetir de- oxigênio, e isso vira metano”, explica
“Não há um processo aberto xados no reservatório. vido ao ciclo natural de seca e cheia dos Fearnside. A hidrelétrica não respondeu
Fearnside chama a atenção para outra rios. A vegetação das margens do reser- à reportagem sobre a emissão do gás tó-
de debate com a comunidade fonte de metano em Teles Pires: o mato vatório não está adaptada a ficar abai- xico. (PL) (Repórter Brasil)
científica, é um processo
entre o Ibama e a empresa.
E o Ibama não está imune a
pressões políticas”
Histórico repetido
de São Paulo (SP)
“Não há rigor científico nos 58%.
O Ibama discutiu diferentes cenários Teles Pires não será a primeira hidrelé-
com o empreendedor, e chegaram ao trica a virar uma “fábrica de metano”. O
que era mais econômico para a em- mesmo problema foi flagrado na cons-
presa,” diz Brent Millikan, diretor do trução da usina de Santo Antônio, em
programa para a Amazônia da Inter- Rondônia. A imagem ao lado foi registra-
national Rivers, ONG que acompa- da em fevereiro de 2012, quando o reser-
nha o impacto de hidrelétricas em vatório começava a ser alagado.
todo mundo. “Não há um processo “Todo mundo sabia que isso estava
aberto de debate com a comunidade acontecendo, bastava andar de barco pe-
científica, é um processo entre o Iba- los lagos. O problema é que o Ibama não
ma e a empresa. E o Ibama não está fiscaliza”, diz Artur Moret, físico da Uni-
imune a pressões políticas.” versidade Federal de Rondônia. “A em-
Não foram só os cientistas que presa só retira a madeira que tem valor Em 2012, a usina de Santo Antônio cometeu o mesmo erro; a vegetação do rio Madeira não foi retirada
não foram ouvidos sobre os detalhes de mercado. Se não tem valor, eles dei-
do plano ambiental da hidrelétrica, xam lá mesmo.” Segundo Moret, esse é raria uma termoelétrica movida a car- cinco turbinas funcionarem. A geração
mas também a população local afe- um problema geral na construção de hi- vão com o mesmo potencial energético, de energia está atrasada em mais de seis
tada pela obra. “A discussão chegou drelétricas no Brasil. segundo estudo do Inpa. O desastre de meses porque a linha de transmissão que
ao local na hora em que já estava Construída há 25 anos, a usina de Balbina não deve acontecer na mesma vai liga-la ao Sistema Interligado Nacio-
pronto, ninguém sabia de nada [so- Balbina é o maior exemplo do proble- escala por que a área do reservatório de nal ainda não está pronta. O Ministério
bre como seria o desmatamento],” ma. Ao norte de Manaus, foi alaga- Teles Pires é menor e suas turbinas são de Minas e Energia e a usina não soube-
diz João Andrade, coordenador do da com a maior parte das árvores em mais eficientes, e desta forma a água fi- ram informar quando o problema estará
Programa Governança Florestal do pé dentro do lago. Quinze anos após ca menos retida no local. solucionado. Hoje, Teles Pires é uma hi-
Instituto Centro de Vida. (PL) (Re- ser construída, em 2005, a usina emi- A nova usina, porém, já gera proble- drelétrica que não gera energia, apenas
pórter Brasil) tia dez vezes mais metano do que ge- mas ambientais antes mesmo de suas gás metano. (PL) (Repórter Brasil)
8 de 6 a 12 de agosto de 2015 brasil

“No Brasil, os dados da exclusão à


educação ainda são gritantes” Deputada Estadual Marcia Lia

ENTREVISTA Para Rosimeire


Pan’Darco, dirigente estadual
do Setor de Educação do MST
em São Paulo, a escola é um
dos espaços de formação
humana e, portanto um espaço
de educação importante para
a classe trabalhadora

Maria Aparecida Terra


da Redação

FRUTO DE PARCERIA entre o Movi-


mento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST), o Movimento dos Atingi-
dos por Barragens (MAB), a Federação
da Agricultura Familiar (FAF) e as Co-
munidades Tradicionais do Estado de
São Paulo, aconteceu no Espaço Anhan-
guera, em Perus, entre os dias 1º e 3 de
agosto, o I Encontro Estadual de Educa-
ção do Campo.
Uma das principais propostas do en-
contro foi a articulação entre movimen-
tos sociais e comunidades, com o obje-
tivo de pensar uma política estadual es-
pecífica para a população do meio ru-
ral, além do fortalecimento de políticas I Encontro Estadual de Educação do Campo, realizado em Perus (SP)
conquistadas, como é o caso do Progra-
ma Nacional de Educação na Reforma voltada ao desenvolvimento dos terri- A educação é considerada um direi- pessoas competitivas, individualistas,
Agrária (Pronera). tórios camponeses, constitui um dos to fundamental. E a educação do campo mas capazes de se adequarem às incer-
Segundo os organizadores do encon- grandes desafios de uma política – con- pressupõe desde o lugar onde as pessoas tezas do futuro produzidas por esse sis-
tro, está cada vez mais certo de que é pre- siderada, claro, toda a diversidade des- vivem, respeitando o conjunto das neces- tema destrutivo, são indivíduos aptos à
ciso pensar políticas públicas de educa- ses territórios e respeitando o protago- sidades humanas e sociais, que aconte- lógica do capitalismo e isentos de qual-
ção do campo e para o campo, que res- nismo dos movimentos e das organi- cem em espaços escolares, e não somen- quer pensamento crítico, o que eu acho
peitem as especificidades dos trabalha- zações sociais, inclusive na proposição te. Na perspectiva da educação do cam- que traz enormes prejuízos à formação
dores e trabalhadoras rurais e que não e implementação dessas políticas. É o po, a construção do conhecimento, a par- enquanto pessoa humana.
estejam voltadas aos interesses de mer- que a gente reafirma na nossa palavra ticipação política, o jeito de produzir, o
cado, como acontece atualmente. de ordem: “Educação do Campo: Direi- jeito de organizar, o jeito de socializar os O que significa a intervenção de
Para Rosimeire Pan’Darco, dirigente to Nosso, Dever do Estado”, também bens culturais, a forma de se alimentar, a grupos econômicos no sistema
estadual do Setor de Educação do MST sobre o protagonismo das populações, relação com a natureza, a prática de va- educacional brasileiro?
em São Paulo, a luta por escola, por uma dos movimentos do campo. lores, tudo isso são elementos que con- No encontro, a professora Lisete [Are-
educação do campo, nada mais é do que tribui como condição básica para a cons- laro, da Universidade de São Paulo]
a luta por um direito e por isso deve ser trução de um projeto popular de refor- trouxe um exemplo concreto do gru-
entendida dentro do conjunto dos direi- “Quando a gente pensa ma agrária, ou seja, as formas de educa- po Anhanguera utilizando-se dos recur-
tos constantemente negados à classe tra- ção, de vivência, de cultura, de produção sos públicos. Ao mesmo tempo em que a
balhadora. “A educação é considerada essa luta no estado de da vida, a partir de outro olhar – consi- população alcança – no patamar da re-
um direito fundamental. E a educação do SP, é comum da parte do derada a realidade dos sujeitos do cam- lação governamental – financiamento,
campo pressupõe desde o lugar onde as po – estão numa perspectiva de transfor- apoio para o estudo, quem abocanha tu-
pessoas vivem, respeitando o conjunto governo estabelecer que mação social. do isso é a iniciativa privada através das
das necessidades humanas e sociais, que Novamente poderíamos falar aqui so- grandes corporações que atuam no mer-
acontecem em espaços escolares, e não não exista populações bre a dívida histórica do Estado brasilei- cado internacional, na bolsa de valores.
somente. Na perspectiva da educação do do campo ou tentar ro com a educação do campo. Nos foi ne- É aí que ela traz o exemplo da Anhangue-
campo, a construção do conhecimento, a gado, historicamente, acesso à educação. ra, uma das maiores corporações que do-
participação política, o jeito de produzir, esconder, invisibilizar a Então a luta por escola, por uma educa- minam o mercado – isso mesmo, o “mer-
o jeito de organizar, o jeito de socializar ção do campo, nada mais é do que a lu- cado”, assim dito – de educação em nível
os bens culturais, a forma de se alimen- situação dessa população” ta por um direito. Do ponto de vista da superior. Acho que outros exemplos tam-
tar, a relação com a natureza, a prática de relação com a reforma agrária popular, bém podem ser dados, como o que a gen-
valores, tudo isso são elementos que con- ela contribui para trazer certa visibilida- te está vendo acontecer nas escolas atra-
tribui como condição básica para a cons- de. Quando a gente pensa essa luta no es- vés dos sistemas de avaliação, através de
trução de um projeto popular de reforma Qual a relação da reforma tado de SP, é comum da parte do gover- empresas que estão direcionando a ges-
agrária”, afirma. agrária popular defendida pelos no estabelecer que não exista populações tão escolar, através das reformas curri-
movimentos sociais do campo do campo ou tentar esconder, invisibili- culares, da formação de professores. Eu
com a construção do conceito de zar a situação dessa população. Por isso acho que tudo isso são exemplos de como
“A educação é considerada um Educação do Campo? eu acho que essa luta traz uma marca de o capital tem se apropriado desses espa-
A escola é um dos espaços de formação dar visibilidade, de expressar os conflitos ços, dos recursos públicos, da formação
direito fundamental. E a educação humana e, portanto um espaço de edu- colocados ao meio rural. docente e do controle efetivo dos rumos
do campo pressupõe desde o lugar cação importante para a classe trabalha- da educação no nosso país.
dora – para nós do campo principalmen- Fora o Movimento Todos
onde as pessoas vivem, respeitando o te, pela ausência histórica dos trabalha- pela Educação, empresas do
dores à esse espaço. Portanto, lutar por agronegócio como a ABAG “A educação já não é mais
conjunto das necessidades humanas escola do campo, pressupõe pensar o lu- (Associação Brasileira do
e sociais, que acontecem em espaços gar de vida dos trabalhadores do cam- Agronegócio), por exemplo, tem construída desde os sujeitos
po, pressupõe um vínculo a um projeto criado projetos de formação para
escolares, e não somente” de campo, inclusive em contraposição à crianças e jovens no campo ou nas
que ali estão envolvidos, mas
subordinação aos interesses do capital e cidades próximas de onde estão sob os preceitos da empresa
aos interesses historicamente construí- situadas. Para você, o que isso pode
dos sobre a escola no meio rural. Por isso significar na formação geral deste que vai determinar”
De acordo com Rosimeire, tendo em educação do campo e não educação ru- futuro adulto?
vista a interferência de diversos grupos ral. A proposta de educação do campo, o Isso que a gente vê ocorrendo no Brasil
econômicos na política de educação, atu- próprio nome, surge exatamente em con- hoje – da educação subordinada à lógica
almente existe no Brasil a inversão da traposição à lógica do capital e, na atua- de mercado e com os interesses do em- Na prática, como se dá essa
prioridade na educação e hoje o princi- lidade, em contraposição à subordinação presariado – coloca a educação num pa- interferência?
pal interesse é o lucro, independente do aos interesses do agronegócio, o capital tamar em que o lucro é o principal inte- Um dos exemplos está relacionado à
ônus que acredita provocar na formação no campo. resse e a formação dos indivíduos fica re- autonomia dos professores hoje nas es-
dos indivíduos que frequentam as unida- legado também a essa lógica de mercado. colas, que é praticamente zero. Isso des-
des escolares que estão “subordinadas à Como a Educação do Campo Os prejuízos na formação dos indivídu- de os municípios. A gente pode pegar na
lógica de mercado”. contribuiria na construção da os estão no aspecto de que essas empre- relação dos municípios a compra de sis-
Para ela, a proposta de educação do reforma agrária popular? sas, através de suas propostas, formam temas de ensino – a compra de sistemas
campo, o próprio nome, surge exatamen- de ensino significa pacotes em que se in-
te em contraposição à lógica do capital e, clui apostila, material didático, forma-
Elza Fiúza/ABr

na atualidade, em contraposição à subor- ção de professores – em que o professor


dinação aos interesses do agronegócio, o já não é mais sujeito do processo educa-
capital no campo. tivo. Ele é o seguidor de cartilhas e a ges-
Nesta entrevista ao Brasil de Fa- tão segue a mesma lógica. A educação já
to, Rosimeire afirma ainda que existem não é mais construída desde os sujeitos
muitos desafios no acesso e implementa- que ali estão envolvidos, mas sob os pre-
ção de uma política de educação do cam- ceitos da empresa que vai determinar. Eu
po que leve em consideração o ser huma- acho, por exemplo, que uma coisa mui-
no como prioridade ao invés do lucro. to forte que a gente vê se reproduzindo
é que – em função dos testes de avalia-
Brasil de Fato –Qual o maior ção da qualidade de ensino – tudo o que
desafio na implementação de uma se ensina nas escolas hoje, e esse talvez
política de educação no meio rural? seja o mais gritante, tá condicionado ao
Rosimeire Pan’Darco – Acho que que vai cair nas ditas provas, como a Pro-
o maior desafio na implementação de va Brasil e as tantas outras. O estado de
uma política de educação do campo tal- São Paulo adota esse sistema e é o que
vez tenha relação com o acesso, porque vai determinar o conteúdo a ser ensina-
embora com a constituição da LDB (Lei do em sala de aula, esse vai ser o recurso
de Diretrizes e Bases da Educação) a para atribuir o mérito se a educação es-
gente tenha tido avanços, do ponto de tá sendo de qualidade ou não. Então, isso
vista da história da educação no Brasil, engessa, ignora as realidades, ignora es-
os dados da exclusão à educação ainda pecificidades. É algo que vem pronto e de
são gritantes. Então, a garantia pelo Es- novo subordinada à lógica do mercado.
tado do acesso universal a uma educa- (Colaborou Camila Bonassa, do Setor de
ção de qualidade, em todos os níveis, Movimento Todos pela Educação: subordinação à lógica de mercado Comunicação do MST - São Paulo)
brasil de 6 a 12 de agosto de 2015 9

Amazônia concentra os
assassinatos no campo em 2015 Fotos: Joka Madruga
VIOLÊNCIA Segundo
dados parciais do Centro
de Documentação Dom
Tomás Balduino, da
Comissão Pastoral da Terra
(CPT), de janeiro a julho de
2015, dos 23 assassinatos
registrados em conflitos
no campo no país, 22
foram em estados da
Amazônia

Cristiane Passos
de Goiânia (GO)
especial para o Brasil de Fato

ACAMPADOS, assentados, sem-terra,


protagonistas da luta por reforma agrá-
ria em geral, voltam a ser os principais
alvos dos assassinatos em conflitos no
campo no Brasil. Ao todo, foram 23 as-
sassinatos. Pará (11), Rondônia (10), Ma-
ranhão (1) e Bahia (1), entre janeiro e ju-
lho desse ano. 15 foram no contexto da Manifestação contra violência no campo: demora na regularização fundiária é uma das principais causas dos conflitos
luta por reforma agrária, 3 em conse-
quência de projetos de mineração, 2 em tá sob análise do Programa Terra Legal “O grileiro, não raras vezes, é tratado tenção da pecuária, como fonte primária
consequência de projetos de barragem, 2 para suspensão de títulos provisórios. As de produção de matéria-prima (carne e
em conflitos indígenas e 1 por uso de mão famílias sem-terra denunciavam que a como proprietário, o especulador leite), esta região tende a uma reconcen-
de obra escrava. área está sendo usada para extração ile- tração de terras e, sob as lacunas e equí-
Pará e Rondônia, estados nos quais es- gal de madeira. Antes de desaparecer, Al- imobiliário como legítimo destinatário vocos de um Programa feito para ‘não
tão sendo desenvolvidos grandes proje- tamiro relatou a agentes da CPT Rondô- de terras públicas e os movimentos funcionar’, a grilagem mantém-se como
tos como a usina de Belo Monte, as de nia que havia sido ameaçado de morte. estratégia do latifúndio. E este latifúndio
Tapajós, Jirau e Santo Antônio, foram José Osvaldo de Sousa, assassinado em sociais como vilões, invariavelmente” tem na violência sua alma-gêmea. A jus-
onde mais se matou no campo. Além dis- 14 de junho, aguardava há 13 anos, jun- tiça estadual e federal, de forma genera-
so, pelo histórico dos crimes é possível to a 120 famílias sem-terra, a regulariza- lizada, não compreende nem a questão
perceber a efetiva participação de pisto- ção da área em que viviam, em disputa agrária como uma questão social, nem a
leiros e, também, de agentes do estado, com um suposto proprietário, que nunca O professor analisa como essa inope- histórica questão dos bens públicos, no
policiais ou ex-policiais que comandam apresentou o documento da terra. José rância reflete diretamente no aumento caso a terra pública, sua retomada e des-
grupos de segurança privada. foi morto após dois dias de terror, quan- da violência no meio rural. “Em Rondô- tinação, como uma questão a ser discu-
A falta de regularização dos territórios do 25 pistoleiros atacaram as famílias, nia, pela análise preliminar dos dados da tida e resolvida por esta instância. O gri-
e a falta de uma plena reforma agrária em Tucuruí, no Pará. violência, compreende-se claramente, leiro, não raras vezes, é tratado como
são fatores que impulsionam e acirram que ela é bem localizada na região onde a proprietário, o especulador imobiliário
os conflitos agrários. Invasores de lotes Pequeno contra pequeno questão das terras públicas não foi resol- como legítimo destinatário de terras pú-
em assentamentos, madeireiros que en- Na investida para expulsar o povo do vida (Região de Ariquemes, Machadinho blicas e os movimentos sociais como vi-
tram nos territórios para a retirada ilegal campo, o capital coloca pequeno con- d’Oeste e Buritis). Trata-se, ou de áreas lões, invariavelmente.”
da madeira, bem como a presença cons- tra pequeno. Sem perspectivas, alguns irregularmente ocupadas por grandes es-
tante de pistoleiros constituem uma rea- grupos, inviabilizados tanto no cam- peculadores imobiliários ou áreas de an- Cristiane Passos é assessora de Comunica-
lidade com a qual o povo do campo tem po quanto na cidade, acabam invadin- tigas concessões de terras. Com a manu- ção da Secretaria Nacional da CPT.
convivido. A morosidade do Incra e a do áreas de assentamentos ou reservas
falta de ação dos órgão competentes na extrativistas, gerando tensões que, mui-
proteção das áreas, têm causado mortes, tas vezes, acabam em mortes. No dia 17
agressões e ameaças. de fevereiro desse ano, seis pessoas da

Lideranças
mesma família foram assassinadas nu-
ma chacina em Conceição do Araguaia,
A falta de regularização dos Pará. Um casal, três filhos e um sobri-

indígenas na mira
nho foram mortos a tiros e golpes de fa-
territórios e a falta de uma cão. O crime foi motivado por disputa
por lote de terra entre ocupantes. Os ir-
plena reforma agrária são mãos “Oziel” e “Oliveira”, após aban-
fatores que impulsionam e donarem a área, queriam o terreno de
volta. Os investigadores da Polícia Ci-
acirram os conflitos agrários vil também apuram a denúncia de que No caso dos conflitos pelo crime são madeireiros de Centro do
o Incra orientou as vítimas a ocupar o Guilherme, revoltados com as ações de
lote, mesmo sem ainda estar legalizado. indígenas, as lideranças autofiscalização e vigilância territorial
Mais uma vez a demora na regulari- iniciadas pelos Ka’apor no local, des-
Para Ruben Siqueira, da coordenação zação fundiária provocou violências co- permanecem na mira dos de 2013. Eusébio seria um dos nomes
nacional da CPT, “isso é reflexo de que o mo essa. Nesse caso, desde 2010 existe pistoleiros. Duas mortes da “lista de execução” dos madeireiros.
povo, mais uma vez, está pagando o pre- um decreto presidencial determinan- Adenilson da Silva Nascimento, conhe-
ço da crise, com ainda menor desempe- do a desapropriação da área para refor- foram registradas até o cido como Pinduca, liderança tupinam-
nho do estado, menos gastos do governo ma agrária. Só que o processo foi pa- bá, foi morto por pistoleiros, no dia 1º
com a reforma agrária, com a regulariza- rar na Justiça e até hoje, cinco anos de- momento em 2015 de maio, na região de Serra das Trem-
ção fundiária, entre outras demandas ur- pois, os colonos ainda não foram assen- pes, em Ilhéus (BA). Essa área é disputa-
gentes do povo pobre do campo, que não tados. Para Afonso das Chagas, profes- da há anos pelos indígenas e por fazen-
desiste do campo, como gostariam auto- sor de Direito da Universidade Federal deiros. Na hora do crime, Adenilson es-
ridades e empresários”. de Rondônia (UNIR) e colaborador da de Goiânia (GO) tava acompanhado pela esposa, duas fi-
Em janeiro, Elizeu Bergançola, geógra- CPT no estado, programas criados pe- especial para o Brasil de Fato lhas, de 10 e 11 anos, e um filho de 1 ano
fo, sofreu um atentado a tiros, em Ma- lo governo com a promessa de resol- e 11 meses. A esposa da vítima foi bale-
chadinho do Oeste, Rondônia, e sobrevi- ver o problema da terra da Amazônia Eusébio Ka’apor foi morto a tiros por ada nas pernas e nas costas. As crianças
veu. Segundo informações da CPT Ron- e da histórica grilagem tem, na verda- dois pistoleiros, no dia 26 de abril, quan- não foram atingidas pelos disparos. A
dônia, ele continua ameaçado por de- de, servido a outros fins. “Recentemen- do voltava para casa, a Aldeia Xiboren- quantidade de tiros foi tanta que a equi-
nunciar, juntamente com os seringuei- te criado, em 2009, o Programa Terra dá, Terra Indígena Alto Turiaçu, em pe do Departamento de Polícia Técnica
ros, a extração clandestina de madeira Legal objetivava, ainda que retorica- Centro do Guilherme, no Maranhão. De (DPT) não teve condições de levantar,
nos seringais. Já Altamiro Lopes Ferrei- mente, resolver a questão da Terra Pú- acordo com indígenas, que pediram para no local, o número de tiros disparados
ra não teve a mesma sorte. Foi encontra- blica e do secular problema da grilagem não serem identificados, os responsáveis contra os indígenas. (CP)
do morto no dia 13 de março, após qua- em terras amazônicas. Em outro rumo,
se 10 dias desaparecido. Ele fazia par- tem servido muito mais à ‘legalização’
te das famílias sem-terra despejadas no de grandes áreas de terras públicas ir-
mês de fevereiro, do Acampamento No- regularmente ocupadas (grilagem), do
va Esperança, em Costa Marques, tam-
bém em Rondônia. A área é pública e es-
que promover uma justa distribuição
fundiária na região.” Agentes da CPT convivem com
ameaças constantes na região
nhecer e que daquele dia em diante ele
de Goiânia (GO) e seus homens iriam agir à sua manei-
especial para o Brasil de Fato ra. No dia 22 de julho houve uma nova
ameaça quando o senhor Valdomiro, co-
Cosme Capistano da Silva, agente da nhecido por ‘Baixinho’, foi até o mesmo
CPT de Boca do Acre (AM), vem sendo local e disse em voz alta pra mim e pa-
ameaçado de morte desde 2009. Des- ra outras pessoas que estavam presentes
sa vez a ameaça foi direta. De acordo que eu tinha que morrer, e que já deve-
com depoimento de Cosme, “em 2015 as ria estar morto”. Algumas pessoas teste-
ameaças voltaram com mais frequência. munharam as ameaças.
No dia 8 de julho o Senhor JOSÉ HO- A CPT conclama que a sociedade se
NÓRIO CARDOSO, conhecido por ‘Zé mobilize em favor da justiça e do direi-
Baiano’, acompanhado de dois funcio- to, contra a impunidade que alimen-
nários seus, foi até a sede do Sindicato ta a escalada da violência interminável
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Ru- no campo. Dos órgãos competentes exi-
rais de Boca do Acre (STTR-BA) onde eu ge-se que, superadas a omissão e a co-
estava trabalhando. Ao entrar no recin- nivência, tomem as devidas providên-
to o mesmo senhor disse em tom inti- cias para que mais mortes não aconte-
Cartazes mostram números que resultam em 23 assassinatos entre janeiro e julho de 2015 midatório que só estava ali para me co- çam. (CP)
10 de 6 a 12 de agosto de 2015 brasil

Estado fraco e desrespeito aos direitos


humanos favorecem linchamentos Bob May/CC
INTOLERÂNCIA do tipo de crime e a consequência de-
le. O professor da Escola de Direito da
Para especialista, os Fundação Getulio Vargas, Thiago Botti-
no, informou que se a vítima morrer, o
espancamentos são agressor será enquadrado em crime de
fruto da combinação da homicídio doloso intencional. E a puni-
ção se agrava se a vítima for aprisionada
percepção de Estado ou amarrada a um poste, por exemplo,
porque haverá ainda a qualificação por
ineficiente, por parte da impedimento de defesa da pessoa. Caso
não haja morte, o crime é de tentativa
população, com uma de homicídio. Os acusados podem ainda
tradição de desrespeito responder por lesão corporal com penas
até 12 anos. Mesmo se o crime for prati-
aos direitos humanos cado por um grupo de pessoas, a polícia
deverá prender e identificar todas para
que sejam processadas.
“O que a polícia tem que fazer é pren-
Cristina Índio do Brasil der a pessoa na hora em que estiver pra-
do Rio de Janeiro (RJ) ticando o fato, para que vá a julgamen-
to”, esclareceu.
A INTOLERÂNCIA é a principal causa
dos linchamentos que ocorrem em vá- Legislação
rios estados do Brasil, dizem especialis- O professor informou que não exis-
tas em comportamento humano, segu- te um crime específico de linchamen-
rança pública e direito. Para a pesqui- to, mas qualquer caso pode ser enqua-
sadora do Núcleo de Estudos da Violên- lômetros de Porto Velho. Ele tentou es- “Ninguém lincha sem querer, então, drado na legislação existente e nunca
cia (NEV) da Universidade de São Pau- tuprar uma jovem, matou o irmão dela é sem intenção. “Ninguém lincha sem
lo, Ariadne Natal, os espancamentos são que tentava protegê-la e foi linchado até é sempre doloso e qualificado. A ideia querer, então, é sempre doloso e quali-
fruto da combinação da percepção de Es- a morte. Na comunidade da Rocinha, na de qualificação é porque há algumas ficado. A ideia de qualificação é porque
tado ineficiente, por parte da população, zona sul do Rio, um homem foi espan- há algumas características que qualifi-
com uma tradição de desrespeito aos di- cado até a morte por 30 pessoas. Ele foi características que qualificam o crime” cam o crime.” Se alguém é morto sem
reitos humanos. acusado de agressão com uma barra de que possa se defender, o crime é qualifi-
“De um lado, a percepção de que o Es- ferro a três pessoas de uma família, entre cado, quando várias pessoas se reúnem
tado não é capaz de prover segurança e elas duas crianças. para matar, é qualificado, se usa fogo é
justiça. Há uma percepção difusa de uma Na avaliação do presidente da ABP, a qualificado, explicou.
parte da população de que a impunidade Comportamento sensação de ineficiência do Estado, que Na avaliação do advogado, a legisla-
dá a sensação de medo, aumento da cri- Para o presidente da Associação Brasi- leva à intolerância, acaba por criar na ção atual é suficiente. “O problema não
minalidade e a população se vê vulnerá- leira de Psiquiatria (ABP), Antônio Ge- população a necessidade de ter figuras é a legislação. O problema é que, mui-
vel. Então, há a percepção de que o Es- raldo da Silva, o alto grau de intolerância de destaque que se tornam celebrida- tas vezes, a polícia não interfere, aceita
tado é ausente e ineficiente. Além disso, leva algumas pessoas a querer fazer jus- des, como o juiz Sérgio Moro, respon- e tolera. Na verdade, esse é um compor-
há uma cultura de desrespeito aos direi- tiça com as próprias mãos. “Como as pes- sável pela Operação Lava Jato, e o ex- tamento completamente intolerável. É
tos humanos. A gente vive em um país soas estão com o estopim extremamente -presidente do STF, Joaquim Barbosa, uma barbárie. O Estado não pode dei-
em que há uma cultura de resolução de curto e a tolerância está realmente mui- que são festejados e aplaudidos, até em xar que as pessoas resolvam fazer justi-
conflito por meio do emprego da violên- to baixa, elas não estão conseguindo li- atos comuns do dia a dia, como a ida ça com as próprias mãos”, contou.
cia”, disse. dar com mais perdas e com tanta situa- a um restaurante ou a entrada em um O professor destacou que os suspeitos
Conforme a pesquisadora, as motiva- ção de incapacidade do Estado de atuar. avião. “São vistos como superstar. E o podem ser processados e só quem po-
ções variam, mas partem da ideia de que E as pessoas estão atuando de maneira que eles fizeram? Nada, apenas atua- de punir é o Estado. “Imagine se a partir
algumas regras foram quebradas e, com errada e agressiva”, disse. ram, como deveria fazer um magistra- de hoje todo mundo que se sentir vítima
isso, os suspeitos são alvo de ameaças ou O médico destacou que essas reações do”, acrescentou. de um crime puder sair fazendo justiça
de agressões físicas, que podem ter um representam um retrocesso no compor- pelas próprias mãos? Vai virar um ca-
desfecho fatal. “O linchamento é uma es- tamento humano. “As pessoas estão vol- Crimes os. Não é a legislação que tem que mu-
pécie de controle social, é uma espécie tando a que época? Estamos voltando Quem participa de um ato de lincha- dar, o problema é a cultura das pessoas
de punição ou pena dada à pessoa acusa- à Idade Média? Que violência é essa? ”, mento pode ser julgado e receber penas e o funcionamento da polícia”, avaliou.
da de cometer um crime, não necessaria- questionou. que chegam a até 30 anos, dependendo (Agência Brasil)
mente culpada, porque ali não tem uma
investigação real, é com base em indícios
momentâneos”, disse.
Ariadne Natal destacou que, em ge-
ral, quando ocorre um linchamento não
há qualquer base de investigação e a im-
putação da responsabilidade se dá no ca- Intolerância aumenta ocorrência
de linchamentos, diz secretária
lor dos acontecimentos. “Geralmente, as
falas são até desconexas. As pessoas que
participam podem apontar razões dife-
rentes para o linchamento. É meio a his-
tória de telefone sem fio”, comparou. Wilson Dias/ABr
Na sua avaliação, independentemen-
te de a vítima ser inocente ou culpada, do Rio de Janeiro (RJ)
o espancamento é que é injusto, ainda
que a pessoa tenha culpa. “Porque se A secretária nacional de Segurança Pú-
trata de uma ação que não é para fazer blica, Regina Miki, disse que os casos de
justiça, mas para vingança. A forma co- linchamento que ocorrem em vários es-
mo o linchamento se dá, usando a vio- tados são resultado de uma intolerân-
lência física e, muitas vezes, aplicando cia generalizada que existe atualmente
uma espécie de pena que é mais dura do no país. “Eu tenho raiva, eu tenho ódio
que seria a prevista por nossa legisla- do outro porque ele é diferente, porque
ção” completou. ele teve uma atitude que não acato ou até
mesmo porque ele teve uma atitude não
condizente com a lei do Brasil. Então, eu
“O linchamento é uma espécie de me acho no direito de tirar a vida de ou-
tra pessoa.” Para Regina, este momento
controle social, é uma espécie de de intolerância facilita essas ações. “Não
punição ou pena dada à pessoa justifica de forma nenhuma, mas explica
o momento”, afirmou.
acusada de cometer um crime, não Segundo a secretária o problema é cres-
cente. “Intolerância é muito ruim e tem
necessariamente culpada, porque ali se agravado realmente. Preocupa porque
não tem uma investigação real, é com é mexer com o sentimento das pessoas.” Prisão não é única solução: “cultura de encarceramento precisa mudar”, diz especialista
Regina destacou que o Estado de Direi-
base em indícios momentâneos” to pressupõe uma Justiça que julgue as gislação sobre esse aspecto, mas ponde- Mudança na Constituição
pessoas, que pretensamente cometeram rou que é preciso agilizar os procedimen- A secretária explicou que, conforme a
algum desvio de conduta ou ilícito e, para tos operacionais para cumprir a legisla- Constituição, seria uma interferência o
isso, existe o Poder Judiciário. “Nós va- ção, como ocorreu em Alagoas. “Uma câ- governo federal determinar aos estados
Uma pesquisa do NEV, da qual Ariad- mos sempre estar em defesa da vida. O mara de monitoramento do Judiciário, qualquer conduta sobre segurança pú-
ne participou, mostrou que as motiva- maior bem tutelado pela Constituição é com a segurança pública, com o sistema blica, mas daqui a 15 dias deve ser proto-
ções que levam à intolerância e aos lin- a vida. Não se julga a pessoa, mas se pre- prisional, verificar a entrada dos inqué- colada uma proposta de emenda à Cons-
chamentos variam, mas a principal é um serva a vida”, completou. ritos, agilizá-los o quanto antes, robuste- tituição para melhorar os procedimen-
crime contra a vida, como casos de homi- cer de provas para que possamos punir tos operacionais. “Primeiramente, que-
cídio ou latrocínio. A segunda motivação Perícia as pessoas”, explicou. remos alterar a Constituição para que a
pode ser um crime contra o patrimônio e Uma das ações desenvolvidas pela Se- União possa ter procedimento operacio-
a terceira, crime contra os costumes, que cretaria Nacional de Segurança Pública nal padrão, normatizar condutas de in-
são os casos de estupro. para garantir melhor apuração dos ca- “Nós vamos sempre estar em vestigação e de percepção criminal.
Na quinta-feira, 30 de julho, no Grajaú, sos e garantir provas contra os crimes é Os estados que quiserem cooperar
zona norte do Rio, um homem suspei- o aprimoramento da perícia. “Para que defesa da vida. O maior bem com o governo federal são bem-vindos,
to de assalto teve as mãos e os pés amar- aqueles que julgam os atos ilícitos te- disse a secretária. Ela voltou a citar o
rados por um grupo de pessoas e preci- nham condição de fazê-lo com total tran-
tutelado pela Constituição é caso de Alagoas, que era o primeiro lu-
sou ser encaminhado a um hospital. Lá, quilidade e confiança”, disse a secretária. a vida. Não se julga a pessoa, gar em homicídios e hoje está em quar-
ele negou ter praticado o crime. Ainda no De acordo com Regina Miki, a impuni- to. “Caiu 33% depois de trabalharmos
Rio, na segunda-feira (27/07) outro ho- dade não está presente só nos atos de po- mas se preserva a vida” em conjunto, mas pouco holofote se dá
mem foi acusado de estupro e teve o ros- lícia, mas se verifica em um ciclo que não à Alagoas, se dá onde está aumentando
to ferido. Também foi levado para rece- se completa por meio dos sistemas de se- o crime”, ressaltou.
ber socorro médico. No mesmo dia, em gurança, de Justiça Criminal e do pri- De acordo com Regina, há 40 mil
Belo Horizonte, acusado de roubar um sional. “A falta de integração entre esses Encarceramento presos no Brasil que estão provisoria-
celular, um homem foi detido, agredido e sistemas é que traz a impunidade. Não Regina Miki não concorda com o en- mente nas penitenciárias. Em 80% dos
amarrado. No domingo (26/07), por ser adianta o inquérito sair da delegacia com caminhamento dos acusados às prisões casos, ao serem julgados, ou a sentença
suspeito de tentativa de roubo, outro foi autoria conhecida se, chegando ao Judi- como única forma de punição. Ela dis- é menor do que o tempo em que aguar-
espancado e as consequências foram trá- ciário, leva de oito a dez anos para ser jul- se que existe uma cultura de encarce- daram o julgamento ou são absolvidos.
gicas. Ele morreu em Viamão, na região gado”, acrescentou. ramento no país e que isso precisa mu- “Temos muito mais presos por crimes
metropolitana de Porto Alegre. A saída, nesse caso, segundo a secretá- dar. “Nunca se prendeu tanto no país e contra o patrimônio no sistema do que
Na semana passada, também se trans- ria, é buscar a relação entre os sistemas com tão pouca qualidade, já que essas pela vida. Então, alguma coisa não es-
formou em tragédia o espancamento de para que a impunidade seja combatida. prisões não se traduzem em queda da tá funcionando certo”. (CIB) (Agência
um homem na Vila de Samuel, a 50 qui- Regina Miki descartou a mudança na le- criminalidade.” Brasil)
brasil de 6 a 12 de agosto de 2015 11

Anistia Internacional aponta


violência policial no Rio de Janeiro ABr
VIOLÊNCIA De acordo morte. Não acredito que a Justiça vai ser
cruel a esse ponto”, acrescentou.
com o estudo, a imagem Outra questão indicada no relatório é
negativa associada à o medo das testemunhas em dar infor-
mações. Para Átila Roque, isso é conse-
juventude, em especial quência da falta de segurança para quem
vai testemunhar. “Existe muito medo
entre os jovens negros nessas comunidades de se mostrar e tes-
temunhar, contar à policia e depois ser
que vivem em favelas, leva uma outra vítima. É uma cultura que es-
para “a banalização e a tá presente não apenas no Rio de Janei-
ro, em que o Estado não garante condi-
naturalização da violência” ções para que as pessoas que testemu-
nham violência e violação de direitos co-
metidos por agentes do Estado se apre-
sentem para testemunhar.”
Cristina Indio do Brasil O diretor, no entanto, reconheceu que
do Rio de Janeiro (RJ) o Rio de Janeiro deu passos importantes
na última década para a redução no nú-
O BRASIL TEM vivido “uma crise agu- mero de homicídios e nos autos de resis-
da na segurança pública” nos últimos 30 tência. De acordo com dados do Instituto
anos, com o registro, em 2012, de 56 mil de Segurança Pública do Rio de Janeiro,
assassinatos, que correspondem a 29 ho- em 2005, eram 1.098 autos de resistên-
micídios por 100 mil habitantes. Do total cia. Em 2007, tiveram a maior alta e che-
de vítimas, 30 mil eram jovens de 15 a 29 garam a 1.330. Até 2013, caíram, alcan-
anos, sendo 90% homens e 77% negros. çando o total de 416, mas no ano seguin-
A atuação da polícia, de grupos de exter- te subiram para 580. “É preciso reconhe-
mínios e de milícias contribuem para es- Críticas da Anistia Internacional não se resumem à Polícia Militar, também se estendem à Justiça Criminal cer o avanço, mas se observa que a cultu-
se cenário, como aponta o relatório Você ra da guerra continua muito arraigada.”
Matou Meu Filho! – Homicídios Cometi- munhas, famílias de vítimas e servido- também o caso do bailarino Douglas Ra- Nas conclusões, o relatório faz reco-
dos pela Polícia Militar no Rio de Janei- res públicos, incluindo policiais civis e fael Pereira da Silva, o DG, de 26 anos, mendações aos governos federal e esta-
ro, divulgado dia 3 de agosto, pela Anis- militares. O trabalho avaliou ainda re- morto em abril do ano passado, na co- dual, ao Ministério Público e ao Congres-
tia Internacional. gistros de ocorrência, atestados de óbi- munidade do Pavão-Pavãozinho, na zo- so Nacional para o enfrentamento da vio-
De acordo com o estudo, a imagem to, laudos periciais, inquéritos policiais, na sul do Rio. O dançarino foi encontra- lência policial e a impunidade. “Não de-
negativa associada à juventude, em es- fotos e vídeos. do morto com um tiro e vários ferimen- vemos reduzir essa questão apenas à po-
pecial entre os jovens negros que vi- tos no dia seguinte a um tiroteio entre lícia. Temos todas as demais instâncias
vem em favelas, leva para “a banaliza- Chacina de Acari policiais da Unidade de Polícia Pacifica- do Estado, que de uma forma ou de ou-
ção e a naturalização da violência”. O Para a Anistia, na comunidade de Aca- dora e criminosos. tra, ou estão sendo incompetentes ou
documento aponta que as políticas de ri, na zona norte do Rio, os homicídios “[Tenho] sentimento de perda total. ineficientes, ou pior, estão sendo omis-
segurança pública no Brasil são marca- decorrentes de intervenção policial, em Qual outro sentimento uma mãe pode sas ao não exercerem o seu papel. Que a
das por operações policiais repressivas 2014, têm “fortes evidências de execu- ter com a perda de um filho? Sentimento questão seja tratada com a gravidade que
em áreas pobres e, com frequência, com ções extrajudiciais praticadas por poli- de indignação e de muita raiva também tem, porque é ela que distingue o estado
o uso de força letal, como em casos de ciais militares do Rio de Janeiro”. Segun- pela morosidade e muita mentira em de direito da barbárie”, avalia o diretor.
pessoas suspeitas de envolvimento com do a entidade, há casos em que a vítima torno do processo”, disse Maria de Fá- “Uma mensagem importante que está
grupos criminosos. foi morta quando já estava ferida ou ren- tima, mãe de DG, à Agência Brasil. “Eu presente neste relatório é que o comba-
“É uma prática recorrente, nestes ca- dida. Em outras situações, não houve or- vou acreditar que a justiça vai ser feita. te ao crime não é e não pode ser incom-
sos, o desmonte da cena. Raramente tem dem de prisão, a pessoa detida não ofere- Uma pessoa não pode tomar um tiro pe- patível com a garantia do direito funda-
perícia feita no momento em que as mor- cia perigo para o policial ou os policiais las costas e sair como culpado da própria mental à vida”, afirmou. (Agência Brasil)
tes ocorrem. O que temos com mais fre- ficam escondidos aguardando a vítima
quência é que rapidamente a polícia iso- passar para acertá-la.
la a área, retira o corpo e pronto”, disse o “O auto de resistência, em particular,
diretor-executivo da Anistia Internacio- segue como uma espécie de cortina de
nal Brasil, Átila Roque, em entrevista à
Agência Brasil.
Foram analisados dados do Datasus
fumaça para que o policial acabe exer-
cendo a execução extrajudicial. Os dados
coletados mostram que, em Acari, pra-
Mais de 8 mil pessoas foram
do Ministério da Saúde e do Mapa da
Violência. A Anistia Internacional fez a
pesquisa entre agosto de 2014 e junho
ticamente todas as mortes classificadas
como auto de resistência têm fortes ele-
mentos que apontam para execução”, diz
mortas por PMs no Rio
de 2015. A organização apurou o anda- o relatório.
mento de 220 investigações de homicí- O diretor disse que é preciso chamar a Negros
dios ocorridos durante intervenção po- atenção para impunidade e ausência de Vinícius Lisboa A pesquisa informa que, entre 2010 e
licial em 2011 na cidade do Rio e cons- investigação. “Isso é quase uma autori- do Rio de Janeiro (RJ) 2013, 99,54% das vítimas eram homens,
tatou que foi apresentada apenas uma zação, uma carta branca para matar. Es- 79% eram negros e 75% tinham entre
denúncia e, até abril deste ano, 183 in- sa situação é grave, e uma das demandas Mais de 8 mil pessoas foram mortas 15 e 29 anos. Para Átila Roque, diretor-
vestigações continuavam em aberto. principais que a gente faz é que o Minis- por policiais militares no estado do Rio -executivo da entidade no Brasil, o pata-
Conforme o levantamento da entida- tério Público estabeleça, imediatamente, de Janeiro entre 2005 e 2014. Na cida- mar de homicídios cometidos pela Polí-
de, o Rio de Janeiro apareceu por mui- uma força-tarefa para esclarecer essas si- de do Rio, foram mais de 5 mil vítimas. cia Militar é muito alto.
to tempo como o estado com a maior tuações”, disse o diretor. Em 2014, o número de mortes em decor- “A anistia não pode se furtar de pontu-
taxa de homicídios. Entre 2002 e 2012, O relatório destaca a Chacina de Acari, rência da intervenção policial correspon- ar e sublinhar um problema que persiste
o indicador diminuiu de 56,5 homicí- ocorrida em julho de 1990, quando 11 jo- deu a 15,55% do total de mortes violentas em um patamar muito alto, mesmo re-
dios por 100 mil habitantes para 28,3, vens, sendo 7 menores de 18 anos, foram intencionais registradas no estado, se- conhecendo os avanços. Ainda estamos
enquanto, na capital, a taxa passou de retirados de um sítio localizado em Su- gundo o estudo Você matou meu filho! – falando de 580 autos de resistência no
62,8 para 21,5. ruí, bairro do município de Magé. A sus- Homicídios cometidos pela Polícia Mili- estado do Rio de Janeiro por ano. Esse é
A análise incluiu também dados esta- peita é de envolvimento de policiais nos tar no Rio de Janeiro, divulgado dia 3 de um patamar muito alto”, destacou Átila
tísticos oficiais, entrevistas com teste- desaparecimentos. O documento lembra agosto pela Anistia Internacional. Roque. (Agência Brasil)

Beltrame e MP do Rio criticam relatório da Anistia Internacional


rando as acusações como “vazias e gené- bém de desprestígio à imprescindível e em um número elevado de vítimas fa-
Vinícius Lisboa ricas”. O MPRJ afirmou realizar um “tra- função pública dos policiais.” tais, que são em sua maioria homens jo-
do Rio de Janeiro (RJ) balho hercúleo e, muitas vezes, solitário Segundo o MPRJ, foram denunciados vens e negros.”
para responsabilizar agentes públicos”. 813 policiais militares em 444 ações pe- As críticas da organização não se resu-
O secretário estadual de Segurança Pú- “O Ministério Público não teve aces- nais propostas à Justiça entre junho de mem à Polícia Militar, também se esten-
blica do Rio de Janeiro, José Mariano so ao estudo que vem sendo menciona- 2013 e junho de 2015. Ainda de acordo dem à Justiça Criminal. “Essas práticas
Beltrame, classificou de “temerária e in- do pela imprensa. Contudo, a instituição com o órgão, só o Grupamento de Atu- parecem estar amparadas nas diversas
justa” a divulgação do relatório da Anis- acredita que as acusações, vazias e gené- ação Especial de Combate ao Crime Or- instituições do sistema de Justiça Crimi-
tia Internacional Você matou meu filho! ricas, em nada colaboram para a solução ganizado (Gaeco) do MPRJ deu início nal – especialmente no Ministério Públi-
– Homicídios cometidos pela polícia mi- do problema”, diz nota da instituição. a 247 ações criminais envolvendo poli- co –, que têm sido omissas na investiga-
litar no Rio de Janeiro. Para o secretário, “O MPRJ, ao oferecer denúncia ao Ju- ciais, sendo 129 da Polícia Civil e 458 da ção efetiva dos casos de homicídio decor-
a capa do estudo já cria “um estigma an- diciário e colocar quem quer que seja na Polícia Militar. rente de intervenção policial”.
tecipado do policial”. posição de réu, só deve fazê-lo de forma Em entrevista à Agência Brasil, o di-
“Sabemos que no Rio ainda há áreas responsável, sob pena não só de desres- Investigação defeituosa retor-executivo da Anistia Internacio-
com guerra, como mostra esse estudo de peito às garantias individuais, mas tam- “Todo esse trabalho é realizado a des- nal Brasil, Átila Roque, também ressal-
casos. Mas é inegável a melhora nos ín- peito da fragilidade do trabalho policial”, tou a necessidade de responsabilização
dices de criminalidade de 2007 para cá”, diz a nota do MPRJ, acrescentando que de culpados pelas mortes. “É quase uma
Reprodução

disse Beltrame, acrescentando que “além o trabalho policial é, muitas vezes, ruim. autorização, uma carta branca para ma-
de reduzirmos o uso de fuzis e de muni- “Assim, a investigação defeituosa resul- tar. Essa situação é grave, e uma das de-
ção, criamos o Centro de Formação do ta, por vezes, em impunidade, seja pelo mandas principais que a gente faz é que
Uso Progressivo da Força e a Divisão de arquivamento do inquérito por falta de o Ministério Público estabeleça imedia-
Homicídios”. indícios ou no oferecimento de uma de- tamente uma força-tarefa para esclare-
“A maioria das recomendações fei- núncia frágil, que pode ser rejeitada pelo cer estas situações”, disse.
tas nesse estudo de casos já é adotada Judiciário ou mesmo resultar, ao final de O diretor pondera que a questão não se
em nosso estado. Infelizmente, todo es- longo e custoso processo penal, em uma resume à polícia. “Temos todas as demais
se avanço não é reconhecido nesse estu- sentença absolutória.” instâncias do Estado, que de uma forma
do”, destacou. De acordo com MPRJ, “a situação é ou de outra, ou estão sendo incompeten-
Beltrame afirmou ainda que a diminui- ainda mais grave quando se trata de tes ou ineficientes, ou pior, estão sendo
ção da letalidade é o principal fator para criminosos que ostentam a qualidade omissas ao não exercerem o seu papel”,
que um policial seja premiado pelo Sis- de policiais, agentes públicos que co- disse. E acrescentou: “Que a questão se-
tema Integrado de Metas, e que as uni- metem os mesmos crimes que juraram ja tratada com a gravidade que tem, por-
dades de Polícia Pacificadora reduziram combater”. que é ela que distingue o estado de direi-
em 85% o número de mortes decorrentes O relatório divulgado hoje pela Anis- to da barbárie”.
de intervenção policial nas comunidades tia Internacional afirma que a Polícia No relatório, a entidade recomenda ao
em que foram instaladas. Militar tem usado a força de forma des- Ministério Público que forme uma força-
necessária, excessiva e arbitrária, des- -tarefa que dê prioridade aos homicídios
MPRJ respeitando normas e protocolos inter- decorrentes de intervenção policial e co-
O Ministério Público do Estado do Rio nacionais sobre o uso da força e armas bra que seja cumprida a missão consti-
de Janeiro (MPRJ) também criticou o re- de fogo. “Isso resulta – acrescenta – em tucional de exercer o controle externo da
latório da Anistia Internacional, conside- Reprodução da capa do relatório diversas violações dos direitos humanos atividade policial. (Agência Brasil)
12 de 6 a 12 de agosto de 2015 cultura

Submissão cultural
CRÔNICA Sem dúvida, há muita coisa
boa advinda dos Estados Unidos e de
outros países, mas respirar só essa arte
por meio da internet pode ser um risco
Bob May/CC

Fabius

O ACESSO a informações e a produtos importados hoje é um fato que


faz parte da realidade dos jovens brasileiros e da maioria dos países. O
discurso da sociedade quando houve uma certa “democratização” dos
meios digitais foi o de que haveria interação cultural entre os povos, e
isso tornaria o ser humano menos ignorante por entender diferenças
culturais por ter acesso ao modus vivendi de países distantes. Aconte-
ce que não se buscam referências culturais da Venezuela ou da Guiana
na internet. Não se procuram conhecimentos acerca do cotidiano ango-
lano ou esloveno.
A internet é um instrumento de comunicação muito empregado no
mundo todo, sobretudo para estabelecer contato entre internautas, e is-
so é uma qualidade insuperável sobre outros meios, mas há um cuidado
que se deve tomar quando se trata de uma fonte de pesquisa cultural.
Certa vez, eu voltava de Ribeirão Preto e parei num restaurante próxi-
mo a uma colônia de japoneses e descentes radicados ali há muitas dé-
cadas. Havia um jovem cabeludo dessa comunidade, com uma camise-
ta preta estampando o nome de uma banda de rock. Não hesitei e, sem
timidez, perguntei ao rapaz que instrumento ele tocava. Ele disse com
decidida dicção: “Guitarra”.
Perguntei que guitarra ele tinha, e ele respondeu possuir uma Ibanez.
Então perguntei se ele gostava de Steve Vai, um endorser dessa marca,
e ele emendou que também ouvia e tocava coisas de Joe Satriani, mes- Essa identidade cega com a cultura estadunidense,
tre de Vai e também anunciante dessa guitarra. Daí completamos esse
assunto falando de amplificadores, equipamentos e timbres extraídos somada à negação da identidade cultural brasileira,
desse instrumento e do fácil acesso a informações sobre artistas e mú-
sicas que havia na internet. pode comprometer toda uma geração de jovens,
levando-os à total submissão cultural
A internet é um instrumento de comunicação
muito empregado no mundo todo, sobretudo para
estabelecer contato entre internautas

Virei o rumo da conversa perguntando sobre as atividades culturais


da colônia que se vinculavam às raízes nipônicas e sobre a relação que
os jovens dali tinham com tais atividades. Ele estranhou minha pergun-
ta e disse que não havia uma grande adesão espontânea dos jovens pa-
ra participarem do Bon Odori e outros ritos. Falou que há uma boa par-
cela dos netos de japoneses que consideram “mico” aquilo tudo. Eu dis-
se: “Que pena!”. Antes de me despedir, perguntei seu nome e ele dis-
se também com boa entoação: “Isaque”, um bonito nome hebraico que
chamou o filho de Abraão com Sara no Velho Testamento.
Saí dali pensando que aquele garoto tinha o perfil de uma boa parte
da juventude brasileira. Descendente de imigrante, reconhece essa con-
dição, mas não se sente mais vinculado às antigas tradições, negando-
-as, assim como também se negam as raízes brasileiras quando se pen-
sa em cultura.
Essa identidade cega com a cultura estadunidense, somada à negação
da identidade cultural brasileira, pode comprometer toda uma geração
de jovens, levando-os à total submissão cultural. É preciso reconhecer
que não são mais japoneses, italianos, espanhóis ou árabes ortodoxos,
mas que são jovens brasileiros e que precisam fortalecer suas bases cul-
turais e mudar a cara do país com seus recursos. Sem dúvida, há muita
coisa boa advinda dos Estados Unidos e de outros países, mas respirar
só essa arte por meio da internet pode ser um risco.

Fabius é pesquisador musical, doutorando no programa Humanidades,


Direitos e Outras Legitimidades (FFLCH – USP) e violeiro do trio Tamoyo.

www.malvados.com. br dahmer

PALAVRAS CRUZADAS
Horizontais: 1.Igreja pequena – O original do Tratado de Tordesilhas está guardado em museu desta cida-
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18
de espanhola – Monarca. 2.Padrão de escala que determina o grau de sensibilidade de um filme fotográfico
1
– Em tupi, diz-se “ira”. 3.“Catedral”, em alemão - “é ou está”, em inglês. 4.De acordo com o fotográfico Sebas-
tião Salgado, Geórgia do Sul é a ilha com a maior (?) que ele já observou após ter fotografado praticamente 2
todos os cantos do mundo – Forma popular de chamar a “cocaína”. 5.Diferentemente da TED, transferência
bancária instantânea que só pode ser realizada a partir de R$ 3 mil, “neste” tipo de transferência para valores 3
abaixo disso o dinheiro só é liberado no dia útil seguinte pois tem que passar pelo sistema de compensação
– burla o pagamento de impostos. 6.“Sufixo” característico do Futuro do Pretérito – Ferramenta para cavar 4
– Iniciais do mais conhecido jogador de futebol nascido na Ilha da Madeira - “Onda”, em espanhol. 7.Prover
do que é preciso, de modo que nada falte. 8.Valor máximo do salário de uma categoria. 9.Dadá (?), folclórico 5

jogador de futebol que dizia que além dele, que “parava no ar” para cabecear a bola, somente “beija-flor e
6
helicóptero” faziam o mesmo – A totalidade do que existe – Instituição responsável por fiscalizar gastos da
União. 10.Frequência do rádio – É usado para arar a terra. 11.Medo repentino – Confusão dos elementos
7
antes da criação do universo – Diz-se “blackberry”, em inglês.

Verticais: 1.Apetite sexual dos animais, especialmente das fêmeas, em determinadas épocas do ano - Argu- 8
mento formado por duas proposições que se contradizem mutuamente. 2.Carta do baralho – Documento
feito na delegacia para registrar uma ocorrência. 3.Em alemão, diz-se “Polizei” - Raso, rente. 4.Organização 9

fundada em 1967 que se dedica desde então à causa da reforma agrária no Brasil. 5.Mais que bonito – Em
10
inglês, diz-se “gap”. 6.Deste modo. 7.Desloca – Catedral – Lampião nasceu neste estado (sigla). 9.“Ele”, em
espanhol – Antes de Cristo – Divisão principal das peças de teatro. 10.Alienígena – Leonel Brizola nasceu
11
neste estado (sigla). 11.“Janela (?)”, um dos filmes de Alfred Hitchcock. 12.Cheiro – Comida típica mineira
à base de feijão preto, farinha de mandioca e torresmo. 13.“Humano”, em inglês - Lama das nascentes das
águas minerais. 14.“Deus”, em latim – Reza. 15.Sociólogo suíço, ex-relator das Nações Unidas para o direito à
alimentação, durante o período de 2000 a 2008. 16.Grupo que sugere a abstinência total de bebidas alcoó- 14.Deo – Ora. 15.Ziegler. 16.AA – Tio. 18.Fome – Cuba.
licas – Em inglês, diz-se “uncle”. 18. Pela primeira vez na história “ela” existe e aumenta sem estar relacionada
ve. 8.Sé – PE. 9.Él – AC – Ato. 10.ET – RS. 11.Indiscreta. 12.Odor – Tutu. 13.Human – Lodo.
Verticais: 1.Cio – Dilemas. 2.Ás – BO. 3.Polícia – Rés. 4.ABRA. 5.Lindo – Vão. 6.Assim. 7.Mo-
a problemas de natureza, baixa produtividade agrícola ou por circunstâncias de guerras – Melhor lugar da 11.Susto – Caos – Amora.
América Latina e o 33º do mundo para ser mãe, de acordo com um estudo britânico que mostra os Estados – Sonega. 6.Ia – Pá – CR – Ola. 7.Abastecer. 8.Teto. 9.Maravilha – Tudo – TCU. 10.AM – Trator.
Horizontais: 1.Capela – Sevilha – Rei. 2.ISO – Mel. 3.Dom – Is. 4.Biodiversidade – Pó. 5.DOC
Unidos em 30º lugar e o Brasil em 78º.
américa latina de 6 a 12 de agosto de 2015 13

“A mídia paraguaia quer a sentença”


30 ANOS DE PRISÃO Juiz do caso Curuguaty confessa julgamento-farsa contra camponeses
Eduardo Arce
Fensuagro (Federação Nacional Sin-
Leonardo Wexell Severo dical Unitária Agropecuária de Co-
de Assunção e lômbia), é preciso garantir um jul-
Curuguaty (Paraguai) gamento justo a estes homens e mu-
lheres que estão lutando pela terra e
“A MÍDIA QUER a sentença.” O foram vítimas de uma armação cria-
anúncio do juiz Ramón Zelaya, res- da pelos poderosos do Paraguai para
ponsável pelo julgamento dos cam- dar o golpe de Estado em Lugo. “Es-
poneses de Marina Cue, no municí- tão utilizando métodos abusivos pa-
pio de Curuguaty, evidenciou o jo- ra aterrorizar os camponeses. Preci-
go de cartas marcadas do mais que samos estar vigilantes”, ressaltou.
viciado processo. Para o governo
paraguaio, os latifundiários e sua
mídia, que utilizaram o confronto “No Paraguai, 90%
ocorrido no dia 15 de junho de 2012
para justificar o impeachment do da propriedade está
presidente Fernando Lugo, a meta é
penalizar os trabalhadores sem-ter-
concentrada nas mãos de
ra com até 30 anos de prisão. apenas 2% da população,
Ao negar aos advogados, que re-
cém assumiram o caso, o direito a grande quantidade
um estudo pormenorizado de mais
de 7.200 páginas dos autos do pro- delas, terras do Estado
cesso, Ramón Zelaya expôs as vísce-
ras do judiciário paraguaio, intima- que passaram a mãos
mente ligado aos poderes político e privadas de forma
econômico. Afinal, disse, “é preciso
atender aos meios de comunicação. fraudulenta”
E eles têm pressa”.
“Esta é uma confissão expressa da Manifestação em Assunção por justiça aos mortos de Curuguaty
total ausência de independência do
judiciário paraguaio”, declarou o juiz cas. O cenário lembra Ponte Lagu- e sua luta é criminalizada”, afirmou ros condenou a postura do juiz pa- Os promotores José Sarza e Ja-
brasileiro Jonatas Andrade, mem- no, na Venezuela, onde atiradores a paraguaia Marielle Palau, do Cen- raguaio de se submeter ao ritmo da lid Rachid - filho de Blader Rachid,
bro da Associação dos Juízes pela de elite da CIA assassinaram tan- tro de Investigações Sociais (BASE). mídia. “Um dos espaços que violam ex-presidente do Partido Colorado,
Democracia e um dos observadores to apoiadores do presidente Hugo Na avaliação de Marielle, “o que ou legitimam a violação se dá no sis- controlado por Stroessner - mantém
internacionais do caso Curuguaty, Chávez como oposicionistas, pro- ocorreu em Curuguaty evidencia a tema de justiça. Por isso a importân- a versão de que os camponeses “pre-
presente em Assunção para acom- vocando uma sangrenta confronta- impunidade e a perversão do poder cia de se observar as garantias dos pararam uma emboscada”, sendo os
panhar o processo. Em geral, ressal- ção. A atuação dos profissionais da judiciário, ao mesmo tempo em que acusados para sua defesa em socie- responsáveis pelas mortes. Sarza,
tou Jonatas, “o judiciário é contra as morte em Caracas e em Curugua- reforça a necessidade da solidarie- dades tão desiguais, em que os pode- que ordenou a brutal ação policial
maiorias de ocasião, pois precisa es- ty teve por objetivo fomentar o cal- dade e de fortalecer a pressão sobre res econômico e político influenciam em Curuguaty, foi processado recen-
tar apegado ao Estado de direito, à do de cultura para a derrubada dos o governo”. negativamente na realização da jus- temente por corrupção ativa, ao exi-
Constituição, à legislação. Nunca vi dois presidentes e sua substituição Membro da Rede Nacional de Ad- tiça”, sublinhou. gir mais de 15 mil dólares de um pro-
um juiz assumir desta forma que sua por nomes mais palatáveis a Wa- vogados e Advogadas Populares (Re- Para Alirio Garia, secretário de So- prietário rural para ordenar a expul-
decisão é para atender a imprensa, shington. Com a mobilização popu- nap), o brasileiro Rodrigo de Medei- lidariedade e Direitos Humanos da são de assentados.
isso é estupendo. No Brasil até ocor- lar, Chávez resistiu e venceu. Lugo
re, mas não se diz”. foi derrubado menos de uma sema-
na após a matança. O plano neoli-
beral de concessões e privatizações
“Nunca vi um juiz chegou logo em seguida.
À frente da ação em Curuguaty
assumir desta forma encontrava-se Erven Lovera, che-
que sua decisão é para fe do Grupo Especial de Operações
(GEO), irmão do tenente-coronel Al-
atender a imprensa, isso é cides Lovera, chefe da segurança do
estupendo. No Brasil até presidente Lugo. Reconhecido pela
capacidade de diálogo, Erven Love-
ocorre, mas não se diz” ra foi um dos primeiros a cair morto
enquanto conversava com a lideran-
ça do movimento, dando início ao ti-
roteio.
Os jornais ABC Color, Última Ho- Considerado uma “testemunha
ra e Extra, assim como todas as prin- chave” por ter denunciado a presen-
cipais emissoras de rádio e televisão ça de franco-atiradores que teriam
do Paraguai voltaram à carga com “o começado a conflagração, o campo-
julgamento sobre a matança que ti- nês Vidal Vega foi assassinado em
rou Lugo”. Imagens editadas de sol- dezembro de 2012 na porta de sua
dados da polícia chegando ao assen- casa. “O fato é que os camponeses
tamento de Marina Kue e sendo te- não tinham armas de grosso calibre
oricamente “emboscados” por “cam- e os policiais foram mortos com ar-
poneses covardes” são repetidas à mas de guerra. Os tiros vieram de
exaustão, para que a população em- franco-atiradores desde a mata, no
barque na campanha desinformati- alto, e do helicóptero”, relata Maria-
va, julgue e condene. Como se fosse no Castro, pai de Nestor e Alberto,
crível que 60 camponeses, 25 deles presos, e de Adolfo, assassinado.
crianças e mulheres, pudessem fazer Havia um pedido de desapropria-
frente a mais de 320 militares forte- ção para fins de reforma agrária dos
mente armados e contando, inclusi- dois mil hectares de Marina Kue,
ve, com cavalos e helicópteros. mas, ao contrário disso, a Justiça,
Rubens Villalba, Felipe Martínez, atendendo aos interesses da famí-
Luis Olmedo, Adalberto Castro, Ar- lia Riquelme – vinculada à ditadura
naldo Quintana, Néstor Castro, Lu- de Alfredo Stroessner (1954-1989) -,
cía Aguero, Fani Oledo e Dolores Ló- solicitou uma prospecção do local,
pez Peralta são acusados por tenta- para saber se havia intrusos. Algo to-
tiva de assassinato, invasão de imó- talmente anormal, já que em 2004 o
vel alheio e associação criminosa. Al- presidente Nicanor Duarte havia as-
cides Ramón Ramírez e Juan Carlos sinado um decreto determinando a
Tílleria de associação criminosa e in- destinação das terras a trabalhado-
vasão de móvel, e Felipe Nery Urbi- res rurais.
na responde por fugir da persegui- Representante da Organização
ção penal. A jovem Raquel, que tinha de Luta pela Terra, Lidia Ruiz res-
então 17 anos, é acusada de invasão salta que no Paraguai, 90% da pro-
de imóvel alheio, associação crimi- priedade está concentrada nas mãos
nosa e cumplicidade de assassinato. de apenas 2% da população, gran-
O caso de Felipe é uma boa demons- de quantidade delas, terras do Esta-
tração da violação dos direitos hu- do que passaram a mãos privadas de
manos: ao tentar ajudar a um dos fe- forma fraudulenta.
ridos, foi preso e torturado durante
três dias. Outros camponeses não ti- Mães da Praça de Maio
veram tanta sorte e foram assassina- Aos 85 anos, com o tradicional
dos pelas costas, a sangue frio. “pañuelo” na cabeça e ostentan-
do orgulhosa a foto do filho desa-
parecido na Argentina, Nora Mo-
“O fato é que os rales Cortinias, das mães da Praça
de Maio, hipotecou solidariedade
camponeses não tinham aos lutadores pela terra, manifes-
armas de grosso calibre e tando-se em defesa de um proces-
so “limpo e transparente, para que
os policiais foram mortos se faça justiça”.
com armas de guerra. Os Conforme o advogado Roque Or-
rego, “um aspecto fundamental do
tiros vieram de franco- que ocorreu foi a tortura e a execu-
ção em Marina Kue”, questionando
atiradores desde a mata, o fato de que nenhum policial tenha
no alto, e do helicóptero” sido responsabilizado nem se encon-
tre no banco dos réus.
“Em primeiro lugar, a terra era pú-
blica, Marina Kue significa Terras da
“Enfrentamento” pré-fabricado Marinha, em guarani, portanto não
Há três anos, 17 pessoas morre- devia ter havido nenhuma ação poli-
ram depois do “enfrentamento” ini- cial. O dito proprietário pediu o des-
ciado por franco-atiradores, com pejo ilegalmente e até hoje, três anos
projéteis de armas privativas das depois, esta questão ainda não está
Forças Armadas. Após tiros disper- resolvida. A justiça está completa-
sos, ouvem-se nove segundos de mente dominada, há um caráter de
disparos de armas semiautomáti- classe, os pobres são discriminados
14 de 6 a 12 de agosto de 2015 brasil 15

“Projeto de Serra para pré-sal é perda total. Querem acabar com a Petrobras” ABr
ENTREVISTA território nacional. Não tem limite is- de São Paulo], e outros que apareceram Qual a perspectiva que o senhor
so, não é quantificável. O endividamen- na integralidade dos seus nomes. tem para este segundo semestre
Senador Roberto Requião to da Petrobras hoje é muito menos de- Ele põe tarja preta no JS, que hoje já nos trabalhos do Senado?
vido ao roubo diante dos investimentos se sabe que é o bezerro da vaca, e não co- O Senado está trabalhando sob co-
(PMDB) ataca projeto de que foram feitos e do retorno desses in- loca tarja preta nos outros, e não coloca mando. Tem relatores únicos. O relator
tucano, que pretende vestimentos. tarja preta no escritório da secretária do exclusivo do Senado agora é o Rome-
bezerro e nem nos números de telefone. ro Jucá (PMDB-RR). A gente, eu, por
retirar da Petrobras a O senhor acredita que há um exemplo, me considero completamen-
ataque orquestrado à Petrobras? Como o senhor está vendo a te marginalizado das decisões do Sena-
participação exclusiva no Sim, por parte do Levy, por parte das gestão do Beto Richa, a questão do. Eles indicam o Vital [do Rêgo, PM-
pré-sal, e critica governo medidas tomadas pelo nosso governo
e por parte do Serra e de alguns par-
inclui principalmente...
Você está falando no que não existe,
DB-PB] ministro do Tribunal de Contas
e você só sabe disso no dia da votação.
Dilma por ceder a lamentares. É evidente que estão ten- não é?! Não existe gestão no Paraná. Então, os senadores como eu não parti-
tando acabar com a Petrobras, ou você cipam de nada no Senado.
pressões do mercado acha que o Serra, de uma hora para ou- Principalmente na questão dos Agora, vai ser uma chapa quente no
tra, tentaria facilitar o governo da Dil- professores... Congresso inteiro. Temos um projeto que
ma, viabilizando que ela venda alguns Não, na questão da administração dos estabelece que as relatorias sejam distri-
poços de Libra e do pré-sal para fechar recursos públicos. Pelo que a gente vê buídas conforme o Judiciário distribui
Helder Lima seu superávit primário?! Isso é total- hoje, tem uma quadrilha comandando processos. Por um computador que fun-
de São Paulo (SP) mente descartado por qualquer raciocí- o estado do Paraná. ciona com algoritmo. Eu apresentei esse
da Rede Brasil Atual nio moderadamente inteligente. projeto com 60 assinaturas ou mais dos
Voltando à Lava Jato... 81 senadores. Está engavetado.
CRÍTICO ÁCIDO do governo da presi- Você veja, 13 ou 14 anos atrás houve
denta Dilma Rousseff e, ao mesmo tem- “A legalização do direito de resposta a primeira delação premiada do Yous- O que se pode esperar do Senado
po, da oposição, o senador Roberto Re- sef [Alberto Youssef, doleiro]. Se qui- na questão da redução da
quião (PMDB-PR) tem se destacado é mais importante que qualquer ser, procure “delação premiada”, entra maioridade penal?
como um dos parlamentares que mais ali na pesquisa. Você vai ver que ele de- Eu espero que ele rejeite isso. Vo-
tem contribuído para combater o Pro-
controle da mídia. Se o Jornal nunciou o governo do PSDB e do DEM cê não pode admitir mais a impunida-
jeto de Lei do Senado (PLS) 131/2015, Nacional chamar o Zé das Couves inteirinho. Mas, como os fatos eram es- de de um menino de 17 anos e 9 me-
de José Serra (PSDB-SP). O tucano pre- taduais, não foi ele que levou à frente. ses que matou quatro pessoas. Mas vo-
tende mudar a Lei de Partilha do Pré- de ladrão, e tiver de desmentir no Até hoje, as pessoas não foram nem se- cê não pode admitir esses tipos de con-
-sal, aprovada em 2010, para acabar quer citadas, passados 14 anos. Jai- denações. Crimes de tipo aberto, o que
com o papel da Petrobras como opera- dia seguinte, no mesmo espaço, me Lerner, o presidente do Tribunal existe na França. Na França, quem de-
dora exclusiva do pré-sal, e sua partici- de Contas, aquele pessoal todinho, com cide a periculosidade do crime é o juiz
pação mínima, de 30%, nos leilões de perde credibilidade. O direito ao pacotes e pacotes de dinheiro, e nada e o promotor. Então, se eles brigaram
exploração de petróleo, o que em últi- contraditório é fundamental e não aconteceu em relação a isso. Então, isso com a mulher de manhã cedo, ou estão
ma instância tem sido percebido pelas deu esta complacência, teve continui- irritados por alguma coisa, eles pegam
centrais sindicais como um ataque des- existe na mídia brasileira” dade no governo... Deu continuidade na teu filho que roubou uma maçã no bar
truidor à soberania do país. administração do Beto Richa. da esquina, e condenam.
“Estão fazendo com a Petrobras o que Aqui inventaram, para atenuar, essa
fizeram com a Sabesp em São Paulo e a Agora, no histórico jurídico, do crime hediondo, que é uma estupi-
Sanepar em Curitiba. Isso significa que E como o senhor vê a atuação digamos assim, da delação dez, ninguém sabe exatamente o que é
estão diminuindo os investimentos em da Operação Lava Jato nesse premiada, a lei mais recente é da isso. Eu acho que tem de haver uma so-
extração e em projetos de médio e longo contexto? presidenta Dilma... lução. Tentaram essa solução do José
prazos, mudando o cronograma de in- Eu vejo, do ponto de vista do garan- Veja bem, a delação premiada é cor- Serra, que não tem muita ligação com a
vestimentos da empresa, e aumentan- tismo jurídico do qual eu sou um adep- riqueira, ela tem de ser confirmada por realidade, que é aumentar o período de
do os preços para aumentar o lucro dos to, grandes furos. Mas do ponto de vis- fatos processuais. segregação nestas escolas disciplinares,
acionistas. A Petrobras está engasga- ta nacional, muito bom. Estão expon- estes reformatórios.
da pelo tipo de administração que tem do o que não seria exposto. É claro que Mas o senhor vê nesse aparato Então, está muito mal conduzido is-
e pela orientação da Fazenda”, afirma existem verdadeiras esdruxularias, por jurídico que garante a delação so. Pode ser que tenham de estabele-
Requião. exemplo, hoje descobri que o procura- premiada, inclusive nesta lei cer alguns tipos que levariam à conde-
Irônico em sua abordagem da reali- dor da República Deltan Dallagnol vai mais recente, algum problema, nação do menor. A reincidência e o tipo
dade, o que reflete sua indignação com a uma igreja e diz (não com todas as le- algum buraco que deixou espaço de crime. Mas isso muito bem definido
os ditames neoliberalistas na política e tras, mas se pode inferir) que a Lava Ja- para os vazamentos seletivos? por lei, para não ficar ao visto de juízes
economia, o senador é do tipo de políti- to é a maior operação policial. É um cul- Existem críticas à condução policial e promotores.
co que não tem papas na língua e gosta to, é uma obra de Deus. É uma estupi- do Ministério Público e do próprio juiz A redução pura e simples é um retro-
de uma polêmica. dez isso. Ele é uma espécie de novo jiha- nas ações. Mas esta crítica garantista cesso bobo. Você vê, Nova York discute
Nesta entrevista, ao comentar os epi- dista, um cruzadista, está sendo dirigi- não pode se transformar na garantia da hoje a volta da responsabilidade crimi-
sódios recentes da Operação Lava Ja- Para Requião, projeto de Serra é ataque destruidor à soberania do país do pelo Senhor. É uma bobagem monu- impunidade desse bando de ladrões. nal para 18 anos.
to, que investiga a tomada da Petrobras mental. Por outro lado, tem outras bo-
por meio de propinas a empresas pres- tadamente a Chevron. O Serra negou is- comparando o Brasil com a Grécia, os sa política de arrocho e recessão havia prejuízo que viria com o projeto bagens, você descobre que a vaca cita- Em relação à reforma política,
tadoras de serviço, ele ironiza as tarjas so durante meu discurso no plenário, gregos produzem azeite e turismo, mas diminuído a receita fiscal e que era im- do Serra sobre o pré-sal? da não é o Vaccari, é uma vaca (um ani- “Olha, reforma política é proibir seria importante mudar o
pretas que protegeram nomes da opo- mas não é o que demonstra o projeto é o mesmo projeto que levou a Grécia possível cumprir a meta. Eles simples- Perda total. Perderíamos o controle mal) premiada. Mas uma vaca premia- financiamento de campanha?
sição nos vazamentos seletivos e a ila- que ele fez. O projeto mantém a legisla- à falência de hoje. Quando isso come- mente disseram oficialmente que não do preço, o controle da vazão, que in- da adquirida por R$ 2,2 milhões segu- coligação e proibir doação de pessoa Olha, reforma política é proibir coli-
ção que tenta associar a palavra “vaca” ção de partilha, mas entrega o comando çou na Grécia, em 2010, a dívida era de vão cumprir a meta. fluencia no preço, e eles teriam o con- ramente é uma lavagem de dinheiro, jurídica. O resto é tapeação. Hoje o gação e proibir doação de pessoa jurí-
a João Vaccari Neto, o tesoureiro do PT do processo todo, que é o controle dos 104% do PIB, e hoje, cinco anos depois, trole dos custos, comprando insumos muito comum nos leilões de gado, onde dica. O resto é tapeação. O dinheiro de
preso pela operação. “Agora, se um da- custos, o fornecimento de máquinas e com desnacionalizações, arrocho sala- No dia 28 de julho tivemos fora do Brasil, faturando como quises- as empresas e os bancos compram por dinheiro da pessoa jurídica manda empresas manda no Congresso. Nós
queles nomes traduzidos por letra era insumos fora do Brasil, o controle da va- rial, diminuição de direitos trabalhistas em São Paulo e Brasília sem, como faz toda multinacional. preços altíssimos, pagam com o dinhei- não temos mais partidos, praticamente,
uma vaca, seguramente o JS era o be- zão. Ou seja, eles tiram o que quiserem e privatizações, o déficit da Grécia é de manifestações contra a reunião ro comunitário, o dinheiro empresarial, no Congresso. Nós não temos mais temos bancadas financiadas.
zerro. Não é José Serra, é o filho da va- e quando quiserem, e vão tentar tirar a 180% do PIB. Ela está sendo submeti- do Copom... O projeto educacional com e recebem de volta na pessoa física, co- partidos, praticamente, temos
ca”, afirma provocando risos. quantidade máxima de petróleo de cus- da, de uma forma vil, aos interesses da Tem um artigo do Serra na Folha que verbas do pré-sal estaria mo caixa dois. É evidente isso e conhe- E chegamos a isso também por
Requião considera que reforma polí- to baixo, e entregam isso às concessio- banca do mercado que comanda a polí- é um “encanto”. Ele considera o Copom acabado? cido no Brasil inteiro. bancadas financiadas” conta da jurisprudência sobre
tica que não elimina financiamento em- nárias com o pretexto que a Petrobras tica europeia. uma reunião de vestares, que provavel- Dança! Porque aumentam os custos. as eleições, que também veio
presarial e coligações é “tapeação”, por- não tem condição de explorar o pré-sal. mente estão em um templo de adoração Eles vão aumentar o custo de produ- A lavagem de dinheiro em países evoluindo nesse sentido?
que o dinheiro de empresas “manda no Isso é uma falácia. Mas, na verdade, à deusa Vesta, completamente isolados ção, vai diminuir isso tudo, será reduzir em desenvolvimento como Não. É evidente que os tribunais es-
Congresso”, transforma partidos em o Serra não deixa de ter razão, porque “Você acha que o Serra facilitaria do mundo e agindo tecnicamente. Ele a uma expressão muito simples, ditada o Brasil não está minando a Esses vazamentos seletivos tão tão legislando. Mas o fundamental é o
bancadas financiadas. Sobre o compor- o ministro Joaquim Levy [da Fazenda] faz um protesto porque um membro do pelo interesse do capital investidor. democracia? falados deveriam estar previstos financiamento privado. Se forma a ban-
tamento da imprensa, defende a legali- proibiu o BNDES de fazer empréstimo para o governo da Dilma, para que Copom adiantou à Folha a sua opinião, Veja os leilões de obras de arte. De re- na lei? cada, aí entra na questão do liberalismo
zação do direito de resposta. “Se o Jor- à Petrobras, e a presidenta Dilma no- que deveria aumentar os juros, o que é Por que o governo Dilma, que pente, o banco compra um quadro por Não, o Serra não acredita nisso, ele mesmo. O povo não tem mais influên-
nal Nacional chamar o José das Cou- meou uma diretoria de mercado no co- ela venda alguns poços de Libra e uma estupidez. O Serra diz que não foi é um governo popular, estaria R$ 15 milhões. Na verdade, ele paga R$ acha que no Banco Central nunca hou- cia. É precarização do trabalho, precari-
ves de ladrão, estelionatário, desones- mando da empresa, um conselho de ad- do pré-sal para fechar seu superávit para isso que ele e o FHC criaram o Co- cedendo à pressão? 500 mil para o dono e fica com R$ 14,5 ve. Só não haveria vazamento seletivo zação do Congresso por meio do finan-
to, improbo e tiver de desmentir no dia ministração de mercado. Então, estão pom, porque o comitê não pode discutir Cedeu porque cedeu, cedeu à pressão milhões. Mas o banco saiu, os acionis- se a Polícia Federal e o Ministério pú- ciamento de pessoa jurídica e precariza-
seguinte, no mesmo espaço, ele perde fazendo com a Petrobras o que fizeram primário? Isso é descartado por nada por antecipação. O comitê se reú- do capital e dos bancos. tas perderam e alguém da direção que blico fossem compostos por querubins ção do Executivo através do domínio ab-
a credibilidade e importância. O direi- com a Sabesp em São Paulo e a Sane- ne diante das explicações colocadas pe- decidiu a compra ficou no caixa dois. e versais. Claro que o vazamento seleti- soluto da economia pelo Banco Central.
to ao contraditório é fundamental e ele par em Curitiba. Isso significa que estão qualquer raciocínio inteligente” lo Banco Central, ele toma uma posição O resultado das eleições no ano Agora, se um daqueles nomes traduzi- vo acaba sendo uma derivação da natu- Isso é cada vez mais comum no mun-
não existe na mídia brasileira.” diminuindo os investimentos em extra- que é imediatamente anunciada pela passado, que mostrou o país dos por letra era uma vaca, seguramen- reza humana das pessoas múltiplas que do hoje. Se você quer uma crítica, tem
ção e em projetos de médio e longo pra- Secom (Secretaria de Comunicação do divido, não contribui? te o JS era o bezerro. Não é José Serra, conduzem um processo desses. Veja, um livro de um alemão, que chama-se
zos, mudando o cronograma de inves- governo), ou seja, ele estabelece o pre- O que diferencia a política da Dil- é o filho da vaca (risos). estão protestando hoje contra o vaza- Wolfgang Streeck. Como não leio ale-
Há um debate acalorado, timentos da empresa, e aumentando os Por que acontece isso? domínio celestial dos técnicos em finan- ma da política do Aécio é que ela ainda mento do depoimento do Júlio Camar- mão, li em uma edição em português
polêmico, por conta do projeto de preços para aumentar o lucro dos acio- A Dilma cedeu à pressão do mercado, ças sobre os interesses da democracia e mantém a política social. Por conta desse contexto da go em relação ao Eduardo Cunha. Não do livro. Muito interessante, chama-se
lei do Senador José Serra. O que nistas. A Petrobras está engasgada pe- cedeu às exigências do capital. Colocou da população. É a política que vige no Operação Lava Jato, e dos existe vazamento. Porque o Eduardo Tempo Comprado.
é importante para a população lo tipo de administração que tem e pela o Levy para fazer esse tipo de política mundo hoje, de reação ao estado social, Qual seria o caminho para incansáveis vazamentos seletivos, Cunha não era réu. Ele era testemunha
entender sobre o projeto, para orientação da Fazenda. que ela diz concordar, mas só uma res- do trabalho e dos executivos e da pre- recuperar a Petrobras? o senhor acredita que é preciso em uma ação, e seu depoimento foi pú- O que esperar do futuro?
que se possa fazer a defesa da salva, ela, ainda por não ser uma libe- valência da suposta capacidade técnica O primeiro caminho é demitir essa di- discutir a regulação da mídia? blico. Ele já tinha sido ouvido pelo Su- Só tenho um desejo. Que essa crise
Petrobras? O senhor considera isso um ral puro sangue, está mantendo as po- dos gestores do mercado. É a submis- reção e colocar uma direção que tenha A minha proposta é a legalização do premo [Tribunal Federal] e dito a mes- seja curta. Para o Brasil voltar a ser re-
Roberto Requião – O WikiLeaks di- choque de neoliberalismo? líticas compensatórias, as bolsas (pro- são do país aos interesses do capital fi- uma visão nacional, e não uma visão direito de resposta. Isso é muito mais ma coisa. Neste caso, não era nem de- construído do ponto de vista nacional,
zia que o Serra [senador José Serra] ti- Não é só um choque. É o neolibera- gramas sociais, como o Bolsa Família). nanceiro. imediatista do mercado financeiro, a importante do que qualquer espécie de lação premiada, ele era testemunha dos democrático e popular. Agora, o ris-
nha um compromisso de acabar com lismo funcionando sem limites na con- Mas eu vejo que essa política fracas- mesma que quebrou os Estados Unidos suposto controle da mídia. Se o Jornal processos. Então, a rigor, o Supremo co é que a crise leve a uma solução, por
o pré-sal e entregá-lo, sob o regime de dução da economia brasileira, e de uma sou de forma completa. O governo não Existe alguma projeção, algum em 2008. Essa visão é a que esquece o Nacional chamar o José das Couves de Tribunal Federal deve considerar abso- exemplo, como a eleição do Berlusconi
concessão, à empresas estrangeiras, no- forma absolutamente errada. Não estou reduziu o déficit, ele reconheceu que es- numero que dá uma dimensão do planejamento de médio e longo prazos, ladrão, estelionatário, desonesto, im- lutamente correto o depoimento. na Itália.
Divulgação Marcelo Camargo/ABr o investimento na inovação e tecnolo- probo e tiver de desmentir no dia se- Waldemir Barreto/Agência Senado
gia, e se dedica apenas a obter o lucro guinte, no mesmo espaço, ele perde a
dos acionistas no momento. credibilidade e importância. O direi-
to ao contraditório é fundamental e ele
Como se viabiliza a Petrobras não existe na mídia brasileira.
hoje?
A ideia que desenvolvemos no Sena- Mas com essa finalidade teve um
do, com alguns companheiros, é a emis- projeto que o senhor aprovou
são de letras do Tesouro, que seriam re- recentemente?
passadas ao BNDES e a Petrobras to- Aprovei por unanimidade no Senado
maria esse volume de recursos através e está engavetado por Eduardo Cunha
de debêntures, e imediatamente ela pu- [presidente da Câmara, do PMDB-RJ]
nha para funcionar o seu planejamento na Câmara. Nem em regime de urgência
anterior, eliminando os ladrões, os des- é votado. Provavelmente, o Cunha es-
vios, o superfaturamento, com uma di- tá esperando um parecer do círculo re-
reção limpa e nacionalista. ligioso para saber se pode ou não pode
pôr em votação. Um culto estranho...
Mas para isso a Petrobras
precisa de uma capacidade de Como vê a questão da tarja preta?
endividamento... Tarja preta foi uma estupidez, uma
A Petrobras tem a maior capacidade burrice monumental de um agente ou
de endividamento do planeta, ela não de um delegado. Provavelmente aecista
pode ser analisada pelo seu valor de mesmo, ou foi para colocar o Serra em
mercado hoje, não tem nada a ver com evidência, o que seria imaginar muita
seu valor patrimonial. O valor patrimo- inteligência por parte dele, porque não
nial da Petrobras é um valor estratégi- tem justificativa. Lá estavam também
co para o Brasil, é o valor do nosso futu- detentores de foro privilegiado, como
O senador José Serra (PSDB-SP) O coordenador da força-tarefa Lava Lato, procurador da República Deltan Dallagnol ro e das nossas reservas de petróleo no Alckmin [Geraldo Alckmin, governador O senador Roberto Requião (PMDB-PR)
16 de 6 a 12 de agosto de 2015 internacional

A Turquia combate o Estado


Islâmico ou os opositores curdos? OTAN

OPINIÃO
Depois de denunciado
internacionalmente por
apoiar fundamentalistas
do Estado Islâmico (EI), o
presidente turco, Recep
Erdogan, preocupado
com o êxito das últimas
eleições, voltou a dialogar
com Obama. Com a
desculpa de que atacaria
as forças fundamentalistas,
Erdogan e seus
generais, aproveitaram
a oportunidade para
bombardear todas as
posições do PKK e dos
curdos que derrotaram o
EI em Kobane
Reunião em que membros aprovaram apoio da OTAN à ofensiva turca contra o EI e os curdos

louvada pelas chancelarias europeias e do Iraque – chamada também de Curdis- as comunidades curdas. E isso aconteceu
Achille Lollo pelo próprio Obama por realizar ataques tão – telefonou ao primeiro-ministro tur- primeiro no Iraque, após o ataque à cida-
de Roma (Itália) aéreos contra as posições do EI na Síria. co, Ahmet Davutoglu para informar que de petrolífera de Mossul, e depois na Sí-
Esses ataques favorecem a permanência, os curdos do Iraque condenam os bom- ria, com as batalhas pela conquista da ci-
O PETRÓLEO roubado no Iraque e o gás ao longo das regiões fronteiriças com a bardeios que provocaram morte e sofri- dade de Kobane.
da Síria ainda continuam sendo desvia- Síria, do chamado ELS (Exército de Li- mento aos civis curdos. Provocar uma guerra no norte da Síria
dos para os terminais dos portos turcos bertação da Síria) que os EUA estão trei- e no norte do Iraque, ao mesmo tempo,
sem que esse crime seja denunciado pe- nando com inúmeras dificuldades. Um cenário confuso entre curdos e o EI, é a grande cartada de
la grande mídia. Aliás, nem os inspeto- A segunda vertente, que a grande mí- Nos últimos meses, a cidade síria de Erdogan para pedir, novamente, ao Con-
res da OPEP e nem os da ONU, se pro- dia e o próprio Obama tentam deslegi- Kobane foi, pela segunda vez, heroica- selho de Segurança da ONU, a criação de
nunciaram contra o governo da Turquia timar, se aproveita do confuso cenário mente defendida e depois libertada pelos uma Fly Zone ao longo da fronteira com
que, juridicamente, é o principal respon- geopolítico no Oriente Médio para aca- combatentes curdos, únicos a consegui- a Síria e com o Iraque, onde a aviação de
sável pelo financiamento do Estado Islâ- bar com a questão curda movimentan- rem derrotar no terreno os contingentes guerra da Turquia e as unidades espe-
mico (EI) – já que permite às empresas, do 70% do potencial bélico do exército do EI. Aliás, a derrota em Kobane facili- ciais poderiam atuar com mais liberdade
públicas e privadas, que administram os turco. De fato, com a ruptura do cessar- tou bastante o trabalho dos caças-bom- para “proteger” os refugiados. Na reali-
terminais de estocagem e de embarque, -fogo entre a Turquia e o PKK, a ques- bardeiros da coalizão, já que toda a estru- dade, a referida Fly Zone seria o primei-
de negociarem a compra de petróleo e de tão curda permanece sem solução des- tura logística dos fundamentalistas ficou ro passo da ONU para permitir à Turquia
gás roubados naqueles países. de a Conferência de Paris, em 1918, logo descoberta, transformando-se em um fá- anexar essas regiões e, depois, com a as-
Considerando que as empresas turcas após o fim da Primeira Guerra Mundial, cil alvo dos jatos. Mas é necessário dizer sistência e colaboração dos EUA, atacar o
estão pagando ao EI entre 10 e 15 dólares quando as potências ocidentais, mes- que a segunda vitória dos curdos contra o exército da Síria, derrubando governo de
o barril de petróleo e que o roubo energé- mo tendo prometido a independência EI, além do sacrifício em vidas humanas, Bashar al-Assad.
tico, em 2014, garantiu cerca de 10% dos do Curdistão e da Armênia, preferiram determinou a permanência nessa estra- É claro que Obama, a CIA, os generais
consumos da Turquia, é compreensível o apoiar, em 1923, a nova república de nha guerra de todos os curdos, incluin- do Pentágono e até o último deputado
silêncio do presidente, Recep Erdogan, e Mustafa Kemal “Ataturk”. Assim, enga- do curdos moderados da Assembleia da democrata da Casa Branca sabem muito
a posição do primeiro-ministro, Ahmet vetaram para sempre a questão curda e, Região Autônoma do Curdistão Iraquia- bem como Erdogan pretende finalizar a
Davutoglu. Por outro lado, se o compor- principalmente, a armênia, mesmo com no, dos revolucionários do PKK, dos de- questão curda. Porém, a necessidade de
tamento da Turquia é bem parecido ao de o exército turco tendo trucidado mais de fensores de Kobane e dos combatentes derrubar Bashar al-Assad para criar no
“Aladim e os quarenta ladrões”, é neces- um milhão de armênios e cerca de 400 do YPG (braço armado do partido curdo Oriente Médio uma definitiva paz ame-
sário descobrir se essa roubalheira insti- mil curdos. que governa Rojava, a região no norte da ricana, faz com que os direitos do povo
tucionalizada é o objetivo final do gover- No dia 24 de julho, o Wall Street Jour- Síria onde se concentram a maior parte curdo sejam completamente esquecidos
no turco ou se Davutoglu busca construir nal dedicou a primeira página aos ca- dos curdos sírios). e sacrificados no altar do mercado e da
um cenário geopolítico que modificaria a ças-bombardeiros turcos (F-35) que, da É evidente que o presidente Erdogan e geoestratégia do Império.
estrutura do Oriente Médio. grande base aérea de Incirlik, partiam seu primeiro-ministro permitiram o for-
em missão ao lado dos jatos da “Coali- talecimento militar do EI no Iraque e na Achille Lollo é jornalista italiano,
A questão curda são Anti-IS” liderada pelos EUA. Porém, Síria. Não por fanatismo religioso, mas correspondente do Brasil de Fato na
Turquia e Grécia representam as duas o articulista do WSJ não mencionou que por um cálculo político bem coordena- Itália, editor do programa TV “Quadrante
principais defesas da OTAN no mar Me- somente uma décima parte dos F-35 tur- do com a Inteligência Militar, uma vez Informativo”, colunista do Correio da
diterrâneo Oriental, mais popularmen- cos atingiam as posições que os comba- que os batalhões de Al-Bagdadhi, cedo Cidadania e colaborador de
te conhecido por Mar Egeu. Em função tentes do EI ainda mantém na Síria. O ou tarde, teriam entrado em choque com ALBA Informazione e de L’Antidiplomatico.
disso, Israel e Estados Unidos assinaram restante dos F-35 ou sobrevoa o norte do
importantes acordos militares, primei- Iraque para bombardear as cidades e as
ro com a Grécia e depois com a Turquia,
que sempre recebeu importante ajuda
aldeias que, segundo a inteligência mili-
tar turca, seriam os centros de apoio lo- PKK – Partido dos Trabalhadores Curdos
militar e constante assessoramento no gístico para os guerrilheiros do PKK, ou Movimento revolucionário de esquerda que, de 1948 até 2013, combateu uma guer-
chamado “combate aos terroristas cur- desviam sua rota para as montanhas do ra de longa duração contra os governos turcos de Ankara. Para sobrepujar o proces-
dos do PKK”. Curdistão turco para atacar as bases do so insurrecional, o exército turco repetiu todas as artimanhas do exército estaduni-
Entretanto, a consolidação de uma PKK, onde as unidades especiais do exér- dense, expulsando milhares de camponeses curdos de suas aldeias, prendendo os
frente parlamentar curda com 80 depu- cito turco estão levando a cabo uma gi- chefes tribais e fuzilando simpatizantes, além de bombardear e destruir as colheitas
tados e as pressões de muitos países da gantesca operação antiterrorista. nos territórios suspeitos de dar abrigo aos guerrilheiros.
União Europeia, obrigaram o governo Diante desse cenário, a agência de no- Por sua parte, o PKK adotou todas as táticas de guerrilha urbana e de guerrilha ru-
turco a estabelecer negociações com os tícias Firat desmentiu o primeiro-minis-
curdos, estendidas ao partido guerrilhei- tro turco divulgando as fotos das casas
ral. Até 2013, quando o governo e o PKK definiram uma trégua oficiosa e o início de
ro do PKK, gerando uma trégua que du- das aldeias destruídas pelos F-35 turcos negociações, o PKK tinha uma sólida estrutura política e militar nas montanhas do
rou de novembro de 2013 até a semana e dos 260 civis mortos e 445 feridos, en- Curdistão, onde o exército turco entrava somente quando realizava ofensiva com mi-
passada. tre os quais muitas crianças. Em respos- lhares de soldados. Em 2012, o PKK começou a utilizar atentados suicidas cm ho-
No dia 20 de julho, os generais de ta, a agência oficial turca Anadolou limi- mens-bomba. Com a ruptura da trégua, os combates recomeçaram em todo o Curdis-
Ankara, apresentaram a Davutoglu um tou-se a publicar o comunicado do Esta- tão turco.
plano detalhado para dizimar com bom- do Major, segundo o qual os F-35 bom-
bardeios as bases do PKK e, ao mesmo bardearam somente bases de terroristas
tempo, romper a perfeita organização so- do PKK. Para consolidar a imagem do HDP – Partido Democrático do Povo
cioeconômica das comunidades curdas governo e do partido islâmico no poder, É o partido político curdo de esquerda que nas eleições de junho obteve um resul-
que vivem nas montanhas do Curdistão o presidente turco incentivou o exército tado histórico, alcançando 13% dos votos, elegendo 80 deputados. O HDP, mesmo
da Turquia, da Síria e do Iraque, e que e a polícia a perseguir os terroristas do criticando o governo turco, admite não estar associado ao PKK, de quem condena os
nesse momento estão derrotando o EI. PKK, ação que confirma todas as acusa- atentados com bombas. Seu líder, Selhattin Demirtas, foi o principal engenheiro do
Na realidade, o plano estratégico da ções movidas pelos representantes cur- processo de paz entre o governo e o PKK em 2012, oficializado com o cessar-fogo de
Turquia apresenta duas vertentes. A pri- dos da Síria e do Iraque. Massud Barza- 2013.
meira, oficial, é celebrada pela mídia e ni, presidente da região autônoma curda

YPG – Unidades de Defesa do Povo


Acnur

É o braço armado do partido curdo PYD (Partido da União Democrática) que go-
verna a região de Rojava, no norte da Síria, onde vive a maioria dos curdos sírios. O
YPG mantém estreitas relações com o PKK. Atualmente, os combatentes do YPG con-
trolam quase todo o Norte da Síria e, por isso, os batalhões do EI e de outros grupos
jihadistas atacaram Kobane. O comando do YPG denunciou, em 2013, as ligações e o
monitoramento da inteligência militar turca com o EI.

KRG – Governo da Região Autônoma do Curdistão Iraquiano


O líder do KRG, Massud Barzani, sempre foi considerado filo-ocidental. Aliás, mui-
tos dizem que ele manteve estreitos contatos com a CIA durante o governo de Sa-
ddam Hussein. Hoje, o KRG tem um exército de quase 100.000 peshmerga (aque-
les que enfrentam a morte) que não mantém relações com o YPG ou com o PKK. De-
pois do encontro com o Secretário de Estado, John Kerry, o próprio Barzani prefere
se relacionar com os EUA com cautela, uma vez que os posicionamentos da Turquia,
(aliado estratégico dos EUA) em favor do EI multiplicaram as dúvidas no seio do Go-
verno da Região Autônoma do Curdistão Iraquiano.
Refugiados curdos da Síria atravessam a fronteira com a Turquia, perto da cidade de Kobane

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