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Brasil se deu ao respeito nas relações com os outros

países, diz Lula


VICTOR SAAVEDRA
SEX, 19/07/2013 - 12:07
ATUALIZADO EM 19/07/2013 - 14:36
Da Redação GGN
Victor Saavedra

http://jornalggn.com.br/blog/brasil-se-deu-ao-respeito-nas-relacoes-com-os-outros-paises-diz-lula

Jornal GGN – “A ONU que criou Israel é a mesma que deveria ter força para criar o Estado Palestino”. A afirmação é
do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em palestra na quinta-feira (18), na Universidade Federal do ABC. Segundo
Lula, os países desenvolvidos não agem seriamente na questão da paz, e a “ONU não representa” uma governança
mundial. “Isso vai continuar por algum tempo”, afirmou o ex-presidente, que cobrou uma mudança no Conselho de
Segurança da organização. “Quanto mais gente na mesa de negociação, mais fácil construir a paz”.

Ao longo de cerca de dua horas, Lula comentou diversos momentos de seus oito anos de governo. Como quando diz
não ter abaixado a cabeça para os Estados Unidos, logo que assumiu a Presidência da República. “Nenhum de nós
quer romper relação com os EUA (Estados Unidos), pela importância, mas você não pode ser dependente de um país
ou de um bloco. Quanto mais diversificada a relação, mais chance tem de fazer a coisa funcionar”, afirmou. Lula
também comentou a importância de ter inserido a fome como pauta central de discussões em todos os fóruns
mundiais, além da aproximação com os países da América Latina e da África e dos esforços para mudar as instituições
multilaterais e a governança global.

Ao citar uma reuniãodo G8, Lula disse que, em política exterior, o mais importante é se fazer respeitar. “Em política
internacional, ninguém respeita quem não se respeita. Ninguém respeita lambe-botas. Em uma reunião do G8,
cumprimentei cada companheiro e sentei numa mesa. Eis que chega o Bush, e todo mundo levantou. Eu disse ao
Celso (Amorim) para não levantar. Isso parece bobagem, mas política é feita de gestos. Eu apenas quis dizer que
ninguém levantou quando cheguei e eu não levantei pra ninguém”, disse.
Pilares da política externa

Lula abriu sua conferência, “Brasil no mundo: mudanças e transformações”, falando que a política externa adotada no
seu governo se baseou em três pilares: fome, aproximação com América Latina e países africanos e governança
global. O ex-presidente comentou sua história de vida, para justificar por que elegeu a fome como tema crucial em
todos os fóruns internacionais dos quais participou durante seu governo. “Uma das coisas de que me orgulho na nossa
política externa é ter conseguido colocar a questão da fome como central”, contou.“Nunca o mundo discutiu tanto
esse tema (...). Eles queriam falar de comércio internacional, e eu querendo debater a questão da fome”. O ex-
presidente também lembrou que essa luta ainda continua e que, recentemente o Instituto Lula, junto com a FAO
(Organização da ONU para Alimentação e Agricultura) e a União Africana, realizou um encontro na Etiópia para
discutir a questão.

O ex-presidente destacou a aproximação do Brasil com a América Latina e com os países africanos. “Queremos ter
relação com os Estados Unidos, o que não podemos é nos tornar dependentes. Por isso, nos voltamos para a América
Latina”, disse Lula, ao destacar que o período recente vivido na região foi o mais progressista e de esquerda da
história. Lula lembrou que foi justamente nessa época que aconteceu a primeira reunião dos países latinos sem a
presença dos EUA e do Canadá e que o número de empresas brasileiras em países latino-americanos aumentou
"enormemente" a partir de seu governo.

Em relação à África, o ex-presidente contou a dificuldade que enfrentou, inclusive dentro da diplomacia, para
convencer as pessoas de que era importante ampliar as relações com os países africanos. Lula contou que era difícil
convencer os diplomatas a deixarem Paris para morar na África. Ao comentar a dívida histórica do Brasil com os
países africanos, o ex-presidente explicou qual foi a estratégia de seu governo em relação ao assunto. “Nós não
podemos pagar nossa dívida com a África em dinheiro, mas podemos pagar com solidariedade”, destacou. Como
resultado da integração, foram criadas 19 novas embaixadas brasileiras na África e o comércio do Brasil com os países
africanos saltou de US$ 5 bilhões para US$ 26 bilhões. 

Depois de dizer que o Brasil possui tecnologia para transformar a savana africana em um território de grande
produção agrícola, Lula reclamou das dificuldades e da burocracia para aprovar investimentos e auxílio a países mais
necessitados. “Nossas instituições financeiras são tão sérias que não emprestam dinheiro para quem precisa, só para
quem não precisa”, afirmou o ex-presidente, criticando as exigências e garantias financeiras para a liberação dos
empréstimos pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Lula creditou à aproximação do
Brasil aos países africanos a eleição de Roberto Azevêdo ao cargo de diretor-geral da OMC (Organização Mundial do
Comércio), José Graziano ao cargo de diretor-geral da FAO e a eleição do ex-ministro Paulo Vannuchi para uma das
vagas da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, da (OEA) Organização dos Estados Americanos.

O terceiro pilar da política externa do governo Lula foi a constante luta por uma mudança nos organismos
multilaterais e pela construção de uma governança global. O ex-presidente contou como foi a atuação do Brasil em
relação ao programa nuclear do Irã. Segundo Lula, o Brasil havia conseguido um acordo com o presidente iraniano
Mahmoud Ahmadinejad, durante a crise sobre o enriquecimento de urânio no país, mas foi traído pelos países
desenvolvidos, que mudaram as exigências após a divulgação do tratado. Para Lula, esse episódio provou que os
países desenvolvidos não aceitariam um novo ator na cena global. Ao falar sobre as missões de paz que o Brasil
lidera, Lula destacou a atuação brasileira no Haiti: “Graças a Deus, estamos lá, porque não se sabe quais as intenções
de quem estaria no [nosso] lugar”.

Conserto do telhado

Em relação às manifestações no país, Lula disse que “as pessoas se incomodam com o pobre tendo carro ou andando
de avião”, lembrando que, em 2007, 48 milhões de brasileiros usavam o transporte aéreo e que, cinco anos depois,
esse número subiu para 101 milhões. “Em 10 anos, fizemos com que 53 milhões começassem a andar de avião. Claro
que tem problema em aeroporto. O pobre compra um carro e não consegue andar. É claro que tem protesto. Aí ele
fala, 'p*** que pariu, vamos protestar contra esse prefeito'. E viva o protesto, porque de protesto em protesto vamos
consertando o telhado”, afirmou.

Ao comentar o vazamento de informações pelo ex-técnico da NSA (agência de segurança dos EUA), Lula disse que
Snowden, hoje considerado foragido pelos Estados Unidos, presta um serviço à democracia, e que espera não ter tido
suas conversas monitoradas. "Eu não sei qual foi o critério da negativa [do pedido de asilo ao Brasil]. Eu acho que
esse rapaz está prestando um serviço à democratização, denunciando um comportamento não recomendável para um
país presidido pelo Barack Obama. Não é aceitável, e eu acho que os países têm de pedir uma explicação. Eu espero
que ele não tenha ouvido as minhas conversas. É uma irresponsabilidade, um desatino", arrematou.

Lula encerrou a palestra destacando o aniversário de 95 anos de Nelson Mandela, completados na quinta-feira. Ao
final, o ex-presidente respondeu algumas perguntas da plateia e brincou com os participantes, dizendo que continua
viajando. "É um jeito de não encher o saco da Dilma", afirmou.

A palestra fez parte da Conferência Nacional “2003-2013: uma nova política externa”. O encontro contou também
com a participação dos ministros Antonio Patriota (Relações Exteriores), Celso Amorim (Defesa), Gilberto Carvalho
(Secretaria-Geral da Presidência) e Maria do Rosário (Direitos Humanos), além de intelectuais e líderes sindicais.

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