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O caso Aranha, ou

perdão, uma ova

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fichacorrida.wordpress.com/2014/09/

Postado por Juremir em 22 de setembro de 2014 –

Por Marcelo Rocha

O escritor Ricardo Lísias acerta em cheio ao dizer que o goleiro Aranha não age como um brasileiro
típico. Para Lísias, as etapas para a resolução de conflitos no Brasil seguem um percurso habitual: o
incidente, a tensão, os famigerados “panos quentes” e a resolução pelo afeto. Nesse sentido, não é
raro, também, que aquele que cometa um crime – ou mesmo uma agressão considerada menor –
arrependa-se depois, chore e, compungido, prometa nunca mais reiterar o erro. Ocorre, assim, uma
inversão de papeis, o agressor transforma-se em vítima e a vítima, quando não aceita abraçar
aquele que a ofendeu, é configurada como vilã da história.

No caso do goleiro Aranha, o roteiro foi mais ou menos esse. Além disso, boa parte da mídia torcia
pelo encontro da torcedora arrependida com o arqueiro do Santos para encerrar, de maneira
folhetinesca, mais um episódio da propalada e harmônica democracia racial brasileira. Gilberto
Freyre estaria, mais uma vez, certo e tudo voltaria ao seu lugar. Mas a bola bateu na trave. Aranha
não aceitou as desculpas, não levou gol e saiu de cabeça erguida sob os apupos da torcida tricolor.

Certa vez, fiz uma pesquisa, com uma aluna do Serviço Social, sobre a violência, no âmbito
familiar, e os resultados aproximam-se das etapas aduzidas no “caso Aranha”. Os estágios pelos
quais passam os que praticam e sofrem atos violentos, em uma relação conjugal, podem ser
resumidos em três fases: a acumulação das tensões, o episódio das agressões e a conduta
arrependida. Depois do arrependimento, por parte do agressor, a vítima nutre a esperança de uma
mudança de comportamento o que, com frequência, não ocorre. Dessa forma, o ciclo se repete até
a vítima resolver, finalmente, rompê-lo.

Infelizmente, estamos habituados a um hábito cotidiano conciliatório em que a ação crítica é


confundida com casmurrice, radicalidade ou intransigência. O goleiro do Santos saiu da meta e nos
fez pensar. Sou gaúcho, sou gremista e te aplaudo, Aranha. Aos racistas: perdão uma ova.

* Pós-Doutor em Educação (Cnpq/PUCRS)


Prof. Adjunto III da Universidade Federal do Pampa – Campus São Borja

Integrante do Grupo de Pesquisa em História da Mídia (GPHM) Unipampa/Cnpq

Integrante do Projeto de Extensão em Cinema: Sessão Pipoquinha (Unipampa)

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