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: a da rebelião
da pobreza ou a do extermínio dos pobres?
Resumo
Desenvolve uma reflexão a respeito do desenvolvimento e da distri-
buição de riquezas, relacionando as formas de repressão à pobreza, no
sentido de mostrar que há uma tendência mundial de extermínio dos
pobres, legitimada através de discursos, ações de governo e multinacio-
nais.
Abstract
Marcola
1 Introdução
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tiva do Estado não acompanha as inovações propostas no significado de cada
conceito. Aqui no Brasil, mesmo com reestruturações impostas pelos: Banco
Interamericano de Desenvolvimento, Banco Mundial e vigiadas pelo Fundo
Monetário Internacional, os resultados concretos em termos de bem-estar e
desenvolvimento socioeconômicos foram simplesmente pífios.
No Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial, de 1987, as recomenda-
ções quanto aos direcionamentos que os países deveriam tomar estavam bem
claras:
Nos últimos anos, o Banco concedeu aos países em desenvolvimento
vários empréstimos para ajustes estruturais e ajuste setorial, apoiando
mudanças em suas políticas macroeconômica, comercial e industrial
[...]. A longo prazo, as economias industriais de mercado precisavam
aumentar sua flexibilidade econômica, diminuindo suas barreiras ao
comércio e lutando contra a rigidez em seus mercados de trabalho e
de produtos [...]. Os países deveriam passar a ter uma estratégia comer-
cial voltada para fora [...] reduzir os déficits orçamentários [...] inflação
baixa [...] e reforma das regulamentações do mercado de trabalho [...].
Os países que tentaram estas reformas estarão em melhor posição que
os que não tentaram [...]. Diferentes formas de intervenção terão efei-
tos diferentes na economia. Mas, na verdade, o que mais importa, com
frequência, não é se vai ou não haver intervenção, e sim como ela será.
(BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO 1987,
p. 2, 4, 5, 8).
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produtores de alimentos do mundo possui um dos maiores índices de pobre-
za do mundo e o segundo pior Índice de Acesso à Alimentação da América
Latina e Caribe. Por que reformas e “ajustes” nunca acontecem no sentido
de beneficiar a maioria da população? Por que tanta necessidade de expor-
tar, principalmente alimentos, em meio a um mercado consumidor interno
muito grande, mesmo se só levarmos em conta a parcela da população que
tem alguma capacidade de consumo? Sendo assim, questionaremos alguns
mitos acadêmicos, difundidos também pela mídia, que tentam justificar a
manutenção do atraso brasileiro.
Nesse sentido, torna-se cada vez mais importante a análise da relação
entre a economia formal/lícita e a economia informal/ilícita. Aí, neste inter-
stício, encontraremos razões e respostas para explicar o enigma do subdesen-
volvimento e do atraso.
Na transição entre os séculos XX e XXI a “questão social” volta à cena
com características muito próprias de um momento no qual a palavra crise
está na ordem do dia.
Nesse contexto, podemos afirmar que o mundo apresenta dois níveis de
realidade, em parte antagônicas, ao mesmo tempo em que são decorrestes
uma da outra. Apesar das insistentes previsões em contrário, o antagonismo
entre riqueza e pobreza só fez aumentar nas últimas décadas do século XX,
entre países, regiões e no interior destes mesmos territórios. A concentra-
ção de riqueza foi um fenômeno antes de tudo mundial, mesmo levando em
conta os vários projetos de redução da pobreza exaltados por agências tais
como: FAO, ONU - PNUD, UNICEF, Banco Mundial, BID, etc.
Mesmo que muitos estudos venham mostrando que a principal causa da
concentração de renda seja o desemprego, isto parece não ser uma afirmação
inteiramente real. Ninguém pode negar a importância do emprego na distri-
buição de renda. Entretanto, o que vem sendo pouco enfatizado é a aplica-
bilidade complexa de fatores que envolvem a construção dos fundamentos e
reprodução que vem sendo chamado de qualidade de vida.
Na Declaração de Roma sobre a Segurança Alimentar que ocorreu entre
13 a 17 de novembro de 1996, em Roma – Itália, realizada por governantes
e representantes da comunidade européia, afirmou-se que:
Nós, chefes de Estado e de Governo, ou nossos representantes, reunidos
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na Cúpula Mundial da Alimentação reunidos a convite das Organiza-
ções das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), reaf-
irmamos o direito de todos terem acesso a alimentos seguros e nutritivos,
em consonância com o direito a uma alimentação adequada e com o
direito fundamental de todos a não sofrer a fome. [...] Comprometemo-
nos a consagrar a nossa vontade política e o nosso compromisso comum
e nacional a fim de atingir uma segurança alimentar para todos e á re-
alização de um esforço permanente para erradicar a fome em todos os
países [...]. A produção alimentar aumentou substancialmente, contudo,
dificuldades no acesso aos alimentos, a insuficiência do rendimento a
nível familiar e nacional, para a compra de alimentos, a instabilidade da
oferta e da procura, assim como as catástrofes naturais ou as causadas
pelo homem, têm impedido a satisfação das necessidades alimentares
básicas. (DECLARAÇÃO...,1996, p. 1).
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satisfatório. Segundo análises mais detalhadas, o ritmo é muito lento
e o progresso é muito disperso [...]. Na realidade, em muitas partes
do mundo o número de pessoas afetadas pela fome vem aumentando.
(RELATÓRIO..., 1999, p. 4, 5, 6).
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no Brasil em especial. Os outros 12 países são Índia, Bangladesh, Paqui-
stão, Nigéria, México, Indonésia, Filipinas, Tailândia, Egito, Turquia,
Etiópia e Colômbia. [...] O NSSM-200, oriundo do Conselho de Se-
gurança Nacional é datado de 1974 [...]. Tal política se daria através
de abundante financiamento de organismos oficiais norte-americanos,
como a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento (USAID),
e entidades privadas, como o International Planned Parendhood Fed-
eration (IPPF), que tem sede em Londres mas foi fundada pelo pai de
George Bush. Prescott Bush, cuja subsidiária, no Brasil, é a Bemfam [...].
O documento justifica a política de controle de natalidade, no Terceiro
Mundo, como interesse estratégico dos Estados Unidos. ‘A localização
de reservas conhecidas de minérios de mais alto teor, da maioria dos
elementos, favorece uma demanda crescente de todas as regiões indus-
trializadas, em relação às importações dos países menos industrializados
[...].’ O documento ameaça ainda com ‘uma séria de desastres agrícolas,
que poderiam transformar alguns países menos desenvolvidos em casos
malthusianos clássicos, com a fome de milhões de pessoas [...].’ O docu-
mento orienta as agências multilaterais, no sentido de ‘evitar a expressão
controle de natalidade e utilizar planejamento familiar’ [...]. (ESTERIL-
IZAÇÃO, 1991, p. 10, 11).
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de distribuição, que fora suspenso logo depois que os bombardeios
começaram, está prejudicado. A Ajuda internacional foi restabelecida,
mas num ritmo bem mais lento, enquanto agências humanitárias de-
nunciavam com veemência que os pacotes de alimentos lançados por
aviões norte-americanos eram meros instrumentos de propaganda que
provavelmente estavam fazendo mais mal do que bem [...] segundo cál-
culos das Nações Unidas, haveria em breve 7,5 milhões de afegãos so-
frendo necessidades desesperadoras, sem terem sequer pão para comer.
(CHOMSKY, 2002, p. 5, 6).
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só pode se cumprir se uma expressiva parcela da população for mantida entre
os níveis de pobreza e de miséria, que juntamente com outros mecanismos
regulatórios mais explícitos entre eles, uma estrutura tributária escorchante
que possibilita ao problema da dívida pública, tanto na sua versão interna
como externa, possa ser mantida sob algum controle.
Tudo isso está atrelado ao novo mito do equilíbrio dos gastos de governo.
Não há nada mais natural que num país de cultura perdulária como o nosso
que, também os governos, gastem muito e mal. O problema, então, volta-se
para a difusão da retórica de que a salvação de todos os males econômi-
cos e sociais que nos afligem particularmente os países periféricos está no
equilíbrio dos gastos de governo. Isso tem justificado a redução de despesas
para setores historicamente desassistidos o que só tem agravado as condições
de bem-estar de parcelas significativas de populações periféricas e subdesen-
volvidas.
No debate atual sobre os conceitos de liberdade, igualdade e justiça,
tornou-se quase que esvaziado, sem sentido objetivo, restringindo-se a um
grupo seleto de acadêmicos, restrito até mesmo neste ambiente. Ao mesmo
tempo, a vulgarização de tal debate, em meio ao qual o “politicamente cor-
reto” torna-se uma das faces perigosas do discurso alienante, tem reflexo e
origem muitas vezes no próprio meio acadêmico. Com isso, o emparelha-
mento de conteúdos cada vez mais semelhantes entre o discurso acadêmico
e o que se acostumou chamar de mídia e os próprios governos, demonstra a
pouca criatividade e disposição em refletir sobre possibilidades reais no rumo
à superação do subdesenvolvimento.
Os limites da propriedade privada, e quais os meios justos de adquiri-la
transitam a pelo menos quatrocentos anos entre uma tantas teorias que con-
tribuíram para dar corpo ao que chamamos de pensamento ocidental.
Na situação atual, burocracias que não funcionam e talvez, não seja ex-
agero afirmar que, em muitos casos, são criadas para não funcionar de acordo
com um organograma ou função social definida, podem ser apenas uma das
causas do problema. Dogmas e definições estatutárias ainda são privilegia-
dos, mesmo quando, o equilíbrio e méritos burocráticos disputam espaço ou
equilibram-se entre incompetência e corrupção.
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3 A ética e a moral na teoria política e econômica
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se mais vinculada à disciplina do trabalho e do consumo. E não por acaso,
a secularização das relações econômicas, sociais e políticas acarretou o que
podemos chamar de uma institucionalização das desigualdades.
Podemos afirmar então: “[...] as desigualdades que, manifestam-se nas
instituições sociais, perpetuadas através delas, têm primordialmente causas
históricas e sociais em vez de biológicas.” (MOORE JUNIOR, 1999, p.
194). Por isso,
Podemos perguntar que obstáculos os membros de uma sociedade civili-
zada deveriam transpor a fim de se estabelecer uma ordem social iguali-
tária e que problemas esta ordem teria de resolver para se manter [...].
Para estabelecer e manter uma sociedade igualitária seria necessário fazer
três coisas. Primeiro, superar ou pelo menos neutralizar os resultados
históricos da força e da fraude que criam privilégios especiais para os
elementos dominantes da sociedade... A segunda missão seria encontrar
métodos de coordenação social que não dependessem da autoridade ou
das relações comando-obediência [...]. O terceiro obstáculo a uma so-
ciedade igualitária deriva da divisão do trabalho [...]. A sociedade iguali-
tária séria tem que encontrar uma forma de recrutar, treinar alocar e
motivar cada uma destas diferentes espécies de trabalho sem recorrer a
diferenças de remuneração, ou, na melhor das hipóteses, utilizando dife-
renças muito pequenas. (MOORE JUNIOR, 1999, p. 193, 194, 195).
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liberdade moderna, a formação do capitalismo foi visivelmente acompan-
hada por uma apropriação do Estado por parte das classes dominantes e da
pequena burguesia em ascensão.
É nessa dominação e controle socioeconômico, a partir do Estado, que
está o problema moral da origem e manutenção das desigualdades sociais
e da pobreza em Adam Smith (1996). A partir desta problemática, Smith
analisa a questão da seguinte forma:
Três são as maneiras pelas quais a política européia provoca essas
desigualdades. Primeiro, limitando a concorrência, em que se tratando
de alguns empregos, a um número menor de pessoas do que o número
daquelas que de outra forma estariam dispostas a concorrer; segundo,
aumentando em outros empregos a concorrência, além da que ocorreria
naturalmente; terceiro, criando obstáculos à livre circulação de mão-
de-obra e de capital, tanto de uma profissão para outra como de um
lugar para outro. [...] Primeiramente, a política vigente na Europa gera
uma desigualdade muito ponderável no conjunto global das vantagens
e desvantagens dos diversos empregos de mão-de-obra e de capital, ao
restringir a concorrência, em algumas profissões, a um número menor
de pessoas do que aquelas que de outra forma poderiam estar dispos-
tas a participar dela. [...] Os privilégios exclusivos das corporações con-
stituem o meio principal de que se lança mão para atingir esse objetivo
[...]. O governo das câmaras municipais estava totalmente nas mãos de
comerciantes e artesãos, tendo evidentemente cada categoria deles in-
teresse em evitar que o mercado de cada tipo de mão-de-obra específica
ficasse saturado, o que na realidade significava sempre mantê-lo carente
de mão-de-obra. (SMITH, 1996, p. 164, 169).
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75), “[...] no hábito do costume [...]”, “[...] na educação ou formação [...].”
Smith (1999) reconhecia que há uma propensão à geração dessa diferença
de talentos entre as pessoas e ao mesmo tempo, salienta que, a divisão do
trabalho é algo fundamental à dinâmica do mercado e, até mesmo, que esta
divisão de funções, complementaria em certa medida as deficiências entre os
homens. Diante da tendência ao intercâmbio, as pessoas poderiam adquirir
bens que não podiam produzir e que suprem as suas necessidades.
No século XVII, anterior ao tempo de Smith, J. Locke já havia elaborado
no seu Dois Tratado de Governo uma teoria sobre a liberdade e a propriedade
privada. Este Tratado iria tornar-se obra inspiradora para todo liberalismo,
até pelo menos, o século XIX. De fato, A. Smith foi muito influenciado
por Locke. O seu liberalismo econômico está orientado pelas concepções de
liberdade e propriedade desenvolvidas no Tratado.
Como reflexo das preocupações de sua época, Locke, ao argumentar so-
bre o conceito de liberdade moderna, estava tentando antes de tudo, uma
saída para o problema trazido pelo Estado moderno, que vinha a ser, o limite
da autoridade. O conceito moderno de liberdade tornou-se atrelado ao de
propriedade, exatamente, porque o primeiro estava imbuído do significado
de independência. Daí, a necessidade de haver condições para o desenvolvi-
mento da propriedade e sua manutenção. Este seria não só testemunho do
desenvolvimento humano, como também instrumento importante para a
independência perante os ditames da autoridade e do Estado.
Esta problemática moderna envolvia também uma resignificação do con-
ceito de soberania. Como estaria resguardada a liberdade e a propriedade se a
soberania ainda estava associada à autoridade do governante? Torna-se típica
deste momento, marcadamente nas teorias de Locke, a argumentação em
favor da soberania da lei tal é o sentido que temos hoje.
Segundo J. Locke (1998, p. 403, 409)
A liberdade dos homens sob um governo consiste em viver segundo
uma regra permanente, comum a todos nessa sociedade e elaborada pelo
poder legítimo nela erigido [...]. Embora a terra e todas as criaturas infe-
riores sejam comuns a todos os homens, cada homem tem uma proprie-
dade em sua própria pessoa. A esta ninguém tem o direito algum além
dele mesmo. O trabalho de seu corpo e a obra de suas mãos, pode-se
dizer, são propriedade dele.
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como questão decisiva a propriedade privada. A bondade humana estava
desta forma, corrompida pela sociedade civil e a propriedade. Daí, Rous-
seau mostra que existe uma relação entre desigualdade e modelo de relações
sociais. Sendo assim, modelo social e a desigualdade natural entre os homens
se complementam na composição de um modelo que só pode se reproduzir
aumentando as diferenças entre as classes sociais. Por isso ele afirma:
[...] a desigualdade natural insensivelmente se desenvolve junto com a
desigualdade de relações, e as diferenças entre os homens, desenvolvidas
pelas diferenças das circunstâncias, se tornam mais sensíveis, mais per-
manentes em seus efeitos e, em idêntica proporção, começam a influir
na sorte dos particulares. (ROUSSEAU, 1958, p. 197).
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a população com menor poder aquisitivo é a menos atenta a estes questões
sobre a manutenção do lar, ao mesmo tempo em que, é neste estrato da
população que ocorrem os mais altos níveis de mortalidade infantil por falta
de alimentação adequada ligada, por sua vez, diretamente à incapacidade
destas famílias de autossustentar-se.
Ao prosseguir sua análise das causas da pobreza e da fome, Malthus se de-
para com problemas, para nós, inteiramente atuais, principalmente quando
falamos em pobreza e fome na América Latina e no Brasil. Leis existem, es-
trutura institucional também, mas não funcionam a contento. Por não ser
um problema novo, já na sua época, Malthus observa que:
[...] as leis dos pobres que foram instituídas na Inglaterra para reme-
diar a frequente miséria do povo a intensidade da miséria individual,
provocam um dano geral numa escala muito maior [...] não obstante
a enorme quantia que é anualmente arrecadada para os pobres na In-
glaterra, ainda exista tanta miséria no meio deles. Alguns pesam que o
dinheiro deva ter sido desviado, outros que os mordomos de igreja e os
provedores dos indigentes da paróquia gastam a maior parte deles em
jantares. Todos concordam que, de uma outra forma, o dinheiro deve ser
muito mal administrado. (MALTHUS, 1996, p. 268).
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desorganizam a economia da região. Nada mais longe da verdade [...].
São causas mais ligadas ao arcabouço social do que aos acidentes nat-
urais [...]. A luta no Nordeste não deve, pois, ser encarada em termos
simplistas de luta contra a seca, muito menos de luta os efeitos da seca
[...]. Ao arcaísmo da estrutura agrária está intimamente ligado o prob-
lema do desemprego que é sem dúvida um dos fatores condicionantes
da alta prevalência de fome no Nordeste. (CASTRO, 1980, p. 259, 260,
261, 262).
O século XX passou longe de ser palco das realizações cujos planos e ob-
jetivos já haviam sido traçados desde ao menos o século XVII. Foi mais um
tempo de frustrações quanto aos resultados da ideia de progresso. Regiões
de fome endêmica, já demarcadas no século XIX como: Nordeste brasileiro,
a maior parte do continente africano e a Índia, não mostraram, no século
XX, resultados significativos, quando levamos em consideração os avanços
tecnológicos que envolvem a produção de alimentos.
As experiências espalhadas pelo mundo durante o século XX, possibili-
taram a convicção de que o problema está nas estruturas e dinâmicas de
produção e distribuição de alimentos. Já não podemos falar apenas em uma
Arquitetura Institucional, uma vez que a estrutura e dinâmica do comércio
exterior de alimentos foi, principalmente no pós-guerra, constituída para
beneficiar meia dúzia de multinacionais de alimento. O brasileiro Josué de
Castro (1980) mostrou que muitos dos paradigmas usuais, estabelecidos
pelas agências internacionais, muito pouco explicavam o fenômeno da fome
e do subdesenvolvimento.
Quando o IBGE traçou o perfil sobre a Segurança Alimentar, no Brasil,
referente ao ano de 2006, o próprio termo técnico também logo se inver-
teu para Insegurança Alimentar. Tal relatório levou em consideração estudos
específicos de anos anteriores, conceitos pouco difundidos tais como: Es-
cala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA), Segurança Alimentar, In-
segurança Alimentar Leve, Moderada e Grave. Respectivamente: (IA Leve),
(IA moderada), (IA grave) (IBGE, 2006). Este mesmo relatório aborda a
evolução temporal da indigência e da pobreza no Brasil. Em 1977, o Brasil
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tinha 16,8 milhões de indigentes e 40,7 milhões de pobres. Dezenove anos
depois, em 1998, o número de indigentes havia aumentado para 21,4 mil-
hões e o de pobres para 50,1 milhões de pessoas. Segundo a Organização
Panamericana de Saúde (OPS), no início dos anos 90, o Brasil apresentou
algo em torno de 18 mil casos de contaminação de cólera espalhados pelo
país e em toda a América Latina, algo como 572.300 casos de cólera espal-
hados pelo continente no mesmo período (INSTITUTO BRASILEIRO DE
GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2006). Um termômetro da miséria que
sempre assolou o continente.
Em matéria publicada em Cartacapital, n. 452 de julho de 2007, Pla-
nos Frustrados: ONU mostra que o mundo continua distante das metas de
redução significativa da miséria proposta, em 2000, o repórter Antonio Luiz
M. Costa, afirma que:
A porcentagem de pessoas passando fome do mundo deveria ser redu-
zida pela metade em relação a 1990. Houve algum progresso entre 1990
e 2000: principalmente em razão do crescimento econômico da China,
da Índia e dos Tigres Asiáticos, a porcentagem de crianças abaixo do
peso com menos de 5 anos – indicador destacado pelo relatório anual
de acompanhamento da ONU de 1º de julho – caiu de 33% para
27%. [...]. O número de pessoas subnutridas nos países periféricos, se-
gundo a FAO, caiu em 26 milhões de 1990 para 1996, mas voltou a
aumentar em 23 milhões até o início do milênio. No mundo inteiro,
o número de famintos era de 800 milhões em 1996, 852 milhões em
2005 e 854 milhões em 2006 [...]. O relatório da ONU comemora uma
aparente redução numérica da miséria absoluta: em 1990 afirma, havia
1,25 bilhões de pessoas recebendo menos de 1 dólar por dia, enquanto
em 2004, esse número teria caído para 980 milhões, o que significaria
uma redução de 31,6% em 1990 para 23% em 1999 e 19,2 em 2004,
o que faz a meta global de reduzir o percentual de 1990 à metade [...].
Mas há razões para pensar que o que está encolhendo não é a pobreza e
sim a régua para defini-la [...]. Resultado: o poder aquisitivo dos pobres
é superestimado, e cada vez mais. A renda de Bangladesh ou Ruanda
aumenta aos olhos do Banco Mundial e da ONU [...]. Parece provável
que a pobreza real tenha estagnado ou crescido [...]. Na Ásia Ociden-
tal ou no Oriente Médio, a miséria cresceu (1,6% em 1990, 2,5% em
1999, 3,8% em 2004), o que não é de surpreender, dada a demolição
sistemática da economia e infra- estrutura de comunidades inteiras no
Afeganistão, Iraque, Líbano e Palestina, entre outros [...]. Nas regiões
onde a redução da pobreza pareceu mais notável e há razões para crer
que nem tudo é ilusão estatística, isso foi acompanhado por um notável
aumento da desigualdade [...]. Mesmo assim, a promessa de dobrar a
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ajuda da África até 2010, anunciada pelo G-8 em 2005, já se mostra
vazia [...]. Mas a ênfase na insuficiência dessa ajuda também obscurece
que muitos dos piores casos de estagnação ou agravamento do quadro
social e econômico dos países mais pobres ocorreram durante a im-
posição, pelo Banco Mundial e pelo FMI, de políticas de privatização e
de abertura comercial e financeira a países frágeis demais para resistir ou
se adaptar. (COSTA, 2007, p. 34, 35).
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questão: mais de meio milhão de crianças morreram, no último ano no Terceiro
Mundo, 350 mil delas no continente africano, em conseqüência direta da guerra,
da dívida externa, da instabilidade econômica e da recessão. Segundo o repórter
Antônio Carlos Cunha, (1989, p. 10, 11):
Em 50 países, a morte infantil decorre não apenas da subnutrição, de
doenças imunopreveníveis ou de desidratação diarréica, mas também,
de conflitos armados [...] são crianças que sofrem atualmente as mais
graves consequências tanto das crises militares como econômicas, prin-
cipalmente dívida externa e recessão, que se abateram sobre os países em
desenvolvimento [...]. Em muitas nações, os pobres pouco se beneficia-
ram dos bilhões de dólares, que foram, em geral, irresponsavelmente
emprestados. Agora, ao final da festa e com a chegada das cobranças é
aos pobres que se apresenta a conta [...]. [...] O Terceiro Mundo se viu,
em grande parte, obrigado a adotar políticas de ajustes, numa tentativa
de corrigir os desequilíbrios da balança de pagamentos e, ao mesmo
tempo honrar os compromissos da dívida, manter importações e reto-
mar o crescimento. [...] A África, atormentada por guerras, secas deteri-
oração ambiental e ainda pela dívida externa e a recessão, é o continente
que, de maneira mais dura, tem sido atingido pelos programas de ajustes
econômicos.
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aplicado pelo governo em políticas sociais, apenas 20% chega aos mais
pobres. O resto vai para a classe média. [...] Há uma tradição no País
de não medir o impacto dos programas sociais. O que se costuma fazer
é apenas uma contabilidade do fluxo financeiro para mostrar, por ex-
emplo, que em X anos foram construídas X creches com um volume X
de dinheiro. [...] Mas não se avalia de que maneira a construção dessas
creches contribuiu para a melhoria de vida das crianças daquela locali-
dade.
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Ainda, sobre as contas públicas, retratando uma apenas um universo
muito mais amplo e complexo, matéria de Cartacapital, nov. de 2003, n. 266,
Irregularidades a Varejo: uma força tarefa da Controladoria-Geral da União
mapeia a utilização de verbas federais em pequenos e médios municípios. Por
Luiz Alberto Weber (2003, p. 42-43).
Como cartógrafos, eles mapeiam os desvios de dinheiro público em
regiões remotas do Brasil. Desde abril, cerca de 680 analistas de finan-
ças da Controladoria-Geral da União (CGU) esmiúçam a aplicação de
dinheiro federal transferido para municípios com até 300 mil habitantes.
[...] No total, 131 localidades selecionadas por sorteio foram fiscalizadas
[...]. Eles estão no rastro de uma montanha de 60 bilhões de reais, que
é a quantia média repassada pela União para Estados e Municípios. [...]
Ao vasculhar os hábitos e costumes da administração [...] os analistas
localizam indícios de fraudes que parecem gravadas no DNA dos 5.656
municípios brasileiros [...] A tradição brasileira mostra que grupos fa-
miliares que dominam economicamente a região acabam por se tornar
espécies de sócios do poder constituído local [...] O mundo das licita-
ções parece ignorar o que lhe dá essência – o público.
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tados desse sistema revoltar-se contra a sociedade. Os executivos das
nossas mais respeitadas empresas contratam pessoas com base em remu-
nerações que beiram o trabalho escravo para jornadas escorchantes em
condições de trabalho desumano em fábricas com as piores condições
trabalho nos países asiáticos. As companhias petrolíferas não fazem out-
ra coisa a não ser bombear toxinas nos rios das florestas tropicais matan-
do conscientemente pessoas, animais e plantas e cometendo genocídio
entre culturas seculares. A indústria farmacêutica nega medicamentos
para salvar as vidas de milhões de africanos infectados com o vírus HIV.
[...] Se falharmos no nosso trabalho, uma forma de matador ainda mais
maligna, o chacal, entra em cena. E se o chacal falha, então a tarefa recai
sobre os militares. (PERKINS, 2004, p. 9, 12, 14).
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desenvolvimento: os recursos destinados ao supérfluo crescem entre nós
com rapidez, enquanto aqueles destinados a atender às necessidades
básicas da população apenas se movem... Tudo se passa como se a com-
posição da oferta comandasse a distribuição de renda e a alocação final
de recursos... A nova classe média em rápida expansão foi vista como
simples fator de ampliação do mercado, sem vinculação maior com a
esfera política [...]. Como os interesses dos que procuram impor deter-
minados padrões de oferta se confundem com os da minoria de con-
sumidores beneficiados pela concentração de renda disponível para o
consumo, configura-se uma estrutura de dominação social voltada para
o ‘desenvolvimento econômico’, mas destituída de toda sensibilidade
para os problemas sociais. Esse sistema não tem possibilidade de sobre-
vivência sem o amparo de um regime autoritário. Basta que os excluídos
possam organizar-se politicamente para que as fundações da construção
comecem a ceder.
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Para ele, fome e subdesenvolvimento são a mesma coisa. Josué apontou para
uma questão sempre atual, porém como raízes antigas. Ele mostrou o quanto
a questão da terra e sua exploração determinam o subdesenvolvimento. O
modelo do latifúndio e da monocultura voltada, por sua vez, para a exporta-
ção, perpetrou-se e chega ao nosso tempo deixando um rastro de pobreza e
atraso. A fome é então muito mais um fenômeno socioeconômico e também
influenciado por fatores culturais do que um problema meramente climáti-
co e geográfico. Nesse sentido, o autor esteve preocupado com a extensão
do problema e não somente se ela é permanente ou transitória, endêmica
ou epidêmica respectivamente. Além disso, o povoamento predatório, sem
planejamento, contribuiu bastante para que populações inteiras tenham
dificuldade em criar uma estrutura que suporte nos períodos de crise, assim
como, a concentração de terra e os seus resultados, seja na agricultura ou na
pecuária, resultando num regime alimentar insuficiente mesmo diante da
abundância de certos alimentos.
Podemos afirmar então, que o latifúndio e outras formas de concentração
de terra, no Brasil, impediram a passagem para outras formas de produção
agrícola que, por sua vez, vão se refletir no desemprego e na pobreza tanto do
campo quanto nas grandes cidades.
Temos como resultado, realidades expostas denunciando que, por exem-
plo, a necessidade de controlar as populações pobres e miseráveis através da
força e violação de direitos é uma questão Latina, não é nada pontual de um
país ou região específica. O controle dos “morros” e favelas é um problema
latino. As violações sistemáticas das Garantias Individuais destas populações
fazem parte também da dinâmica à qual nos referimos no decorrer deste
estudo.
Além dos problemas estruturais legados à economia, pobreza e atraso, o
tráfico de armas, drogas e prostituição encontram caminho aberto diante
destas condições contextuais.
Não por acaso não é de causar espanto, quando Yuri Orlov personagem
central do filme Senhores das Armas afirma:
Existe mais de 550 milhões de armas de fogo em circulação no mundo,
isso equivale a uma arma para cada doze pessoas no planeta. A única
pergunta é como podemos armar as outras onde? [...] Não há nada mel-
hor para um negociante de armas do que soldados descontentes e um
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almoxarifado cheio de armas [...]. Aqueles 45 anos de ódio recíproco
entre o Leste e o Oeste tinham gerado o maior acúmulo de armas da
história [...]. O fim da Guerra Fria foi o começo da era mais quente de
venda de armas, o bazar das armas estava aberto [...] eu tinha rivais [...]
32 bilhões em armas foram roubados e revendidos só da Ucrânia. [...]
O mercado principal foi a África. Um dos grandes conflitos envolvendo
32 países em menos e uma década. O sonho dos mercadores de armas.
Na época o Ocidente não dava a mínima. Eles tinham uma guerra de
brancos do que sobrava da Iugoslávia. [...] Eu fechei muitos negócios
na Libéria [...] “Terra dos Livres” [...] A pátria dos ex- escravos livres
americanos acabou escravizada por um ditador ou outro desde então
[...]. Cada facção da África chama a se mesma por estes nomes ignó-
beis [...] República Democrática de alguma coisa [...]. Muitas vezes, as
atrocidades mais bárbaras ocorrem quando nos dois lados combatentes
ocorrem chamarem a se mesmos como lutadores da liberdade [...].
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estragado. Precisamente, em 1986, verificou-se a publicação na imprensa es-
crita, jornais e periódicos, problemas como: “A política de venda de medica-
mentos” veiculada na época aqui no Brasil por Cadernos do Terceiro Mundo,
agosto de 1985, p. 15, n. 92.
O Senado norte-americano aprovou recentemente uma decisão que
proíbe a venda de numerosos medicamentos no país e, ao mesmo tem-
po, autorizou sua exportação. Cerca de 61% dos remédios na América
Central são perigosos para a vida humana. [...] A denúncia foi feita pelo
médico e químico farmacêutico hondurenho Pedro Portillo, catedrático
da Faculdade de Medicina de seu país [...]. Para Portillo, a decisão do Se-
nado norte- americano representa uma ‘violação dos direitos humanos’.
Lembrou que desde 1967 a OMS vem denunciando a introdução de
medicamentos não- examinados, ineficazes e perigosos nas nações sub-
desenvolvidas. Como exemplo citou o caso de uma vacina contra saram-
po que foi aplicada maciçamente em seu país entre 1969 e 1970, antes
de o seu uso ser aprovado nos Estados Unidos. [...] Um caso parecido
aconteceu em países africanos, onde a ‘cimetidina’, um citostático que
provocou vítimas fatais, foi experimentado em hospitais. Atualmente
em Honduras se vende o ‘Falutal’, um anti-conceptivo de ação pro-
longada proibido nos Estados Unidos. (A POLÍTICA..., 1985, p. 15).
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vê, são catástrofes humanas como fato cotidiano, ainda que, exacerbada pela
mídia como algo necessário. Muitas vezes reduzidas a uma relação de causa
e efeito dentro do universo da Nova Geopolítica mundial e local. Desde que
apontadas como fracasso de políticas públicas até resquícios históricos, talvez
o mais verdadeiro seja, aceitar não só uma convergência de variáveis, mas ao
mesmo tempo uma conivência criminosa.
Entre as reflexões sobre o tema, Negri (2006, p. 80) se destaca quando
afirma que:
[...] o grande problema de hoje em dia é requalificar a guerra num contexto
imperial. Como é possível fazer a guerra hoje? Contra quem se entra na guerra hoje?
Que defendemos hoje? E qual a diferença entre uma operação policial mundial [...]
e aquilo que os jornais chamam de “guerra”? Tudo isso está diante dos nossos olhos.
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O que estes eventos denunciaram foi o fato de que o Estado tem também
os seus grupos de extermínio. Já que se faz lugar comum, no mundo inteiro,
apontar a pobreza e as variáveis sobre pobreza vinculadas estritamente a ela
mesma. Em outras palavras, a pobreza e suas consequências é culpa dos po-
bres. Mas a questão que continua buscar respostar e também incomodar é:
por que a pobreza se reproduz em meio à abundância?
De fato, elites corruptas sempre caracterizaram o Terceiro Mundo. Atu-
almente parece novidade vincular pobreza, subdesenvolvimento e corrupção.
Mas não há nada tão novo assim, quando se trata de estabelecer tais relações.
As populações muitas vezes pedem, mas dificilmente toleram o Terror-
ismo de Estado à luz do dia. O homem-massa clama pela execução daqueles
que são colocados como iminente ameaça, mas não pode ter diante de si,
fatos que comprovem a sua responsabilidade nesta tragédia. O sistema precisa
exercer, vez por outra, o assassinato seletivo daqueles que por suas idéias e/ou
ações lhes fogem ao controle. O problema é quando erra o alvo. Aí, tudo que
sempre ficou nas sombras das informações e relatórios confidenciais, vem à
luz, só restando à mídia a possibilidade de distorção e omissão dos fatos.
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tão aí, todos absolvidos. Os políticos nunca são responsabilizados pelos
seus erros, pelas suas falhas, enquanto no meu caso sou responsabilizado
(CAMACHO, apud, BARROS, 2006, p. 27). [...] Não é porque eu
cometi um erro que tenho que ser tratado como um monstro, porque o
(juiz) Lalau cometeu um erro e não é tratado como eu sou tratado. E o
erro dele leva ao meu erro, porque ele rouba do povo e deixa todo mun-
do na miséria. Eu sou um pé- rapado, pé-de-chinelo. (CAMACHO,
apud BARROS, 2006, p. 26).
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as oportunidades de participação e contestação são cobradas, mas quase sem-
pre frustradas. Logo, as porções de interesses a serem levados em consid-
eração nas decisões da dimensão política, aumentaram proporcionalmente,
perante uma crescente incompetência do Estado em ampliar, para além das
questões de renda e classe, a judicialização dos conflitos.
Em outras palavras, quanto mais sofisticada for a “arquitetura institucio-
nal” do Estado, no sentido de proteger os interesses individuais e coletivos
legítimos, maior a possibilidade de um modelo competitivo que resulte no
aprimoramento das partes e do todo. Por outro lado, se eliminar o conflito
pela via da informalidade-ilegal é menos oneroso do que conquistar objeti-
vos através, da tramitação formal-legal, a democracia e o Estado de Direito
acabam por ser reduzidos a ritos e formalidades. Não obstante, a exemplo do
Brasil e da América Latina, a função do voto, no bojo do processo democráti-
co é completamente distorcida. O voto, que é um dos pontos de partida do
processo democrático, torna-se o fim, o objetivo a ser alcançado.
A pobreza no Brasil e na América Latina é tão funcional quanto qual-
quer outro setor da economia. A parcela empregável serve ao mercado formal
de trabalho, os demais, o novo lupemproletariado, presta serviços ao setor
informal-criminoso, pois, contribui para os mercados criminosos das armas,
da prostituição infantil, das drogas e das mortes por encomenda, etc. Essa
criminalidade investe dinheiro no capitalismo formal, exercendo a lavagem
de dinheiro, que sustenta e enriquece setores inteiros da economia formal,
tanto nos países centrais quanto nas economias periféricas.
Tanto matar o pobre quanto manter o pobre, tornou-se um lucrativo
negócio. Tanto a indústria de armamentos quando a indústria da pobreza
administradas principalmente pelas OGNs, estão muito bem, graças a toda
essa tragédia humana. Daí, então, é possível sugerir o questionamento do
conceito de excluído.
Bem ilustrativa de, o quanto é lucrativo no Brasil manter pobres e ig-
norantes, é a matéria de A Tarde, publicada em 17/08/2007 cujo título, já
resume o problema: “MEC afirma haver ‘indícios claros de fraude’ em con-
vênios realizados com sete organizações não- governamentais da Bahia, local-
izadas nas cidades de Camaçari, Salvador e Santa Inês.” Em seguida, “ONGs
investigadas por desviar 3,7 milhões de reais.” (A TARDE, 2007, p. 1). Já no
corpo da matéria temos as seguintes informações:
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Foram nove convênios com casos graves de irregularidades (sete na
Bahia e dois em São Paulo) [...]. Os contratos integram o programa
Brasil Alfabetizado, que tem como objetivo alfabetizar jovens e adultos.
Na Bahia as instituições deveriam ensinar a ler e escrever a 49.573 ci-
dadãos [...]. A suspeita de que algo não ia bem, na parceria com ONGs,
começou há dois meses em são Paulo, quando a imprensa denunciou o
Centro de Educação, Cultura e Integração de São Paulo (Ciesp) [...]. A
relação de ONGs vinculadas ao MEC sob suspeita e indícios de fraude
traz os seguintes nomes: Associação de Inclusão Social da Bahia/BA. As-
sociação de Desenvolvimento dos Jovens da Bahia/BA. Força Jovem da
Bahia/BA. Educar.com/BA. Fundação Humanidade Amiga/BA. Funda-
ção Movimento Cultural Camaçari/BA. Fundação Cultural Ca e Ba/BA.
Centro de Educação, Cultura e Integração de São Paulo/SP. Núcleo
Direito do Saber/SP. (A TARDE, 2007, p. 2).
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necessidade de, principalmente nos momentos de crises e escândalos recorrer
ao jogo das culpabilidades. É reflexo da nossa crise de consciência e institu-
cional. Ninguém viu nada, ninguém sabe de nada, a culpa foi do assessor ou,
melhor ainda: o problema sempre está na outra instituição... Num país de
tantos bem-feitores é estranho que somente através de propagandas seja pos-
sível renovar e sustentar o mito do paraíso tropical e da esperança.
Um exemplo do que significa a expressão: O terrorismo de Estado no Brasil
é sofisticado, está bem ilustrado no depoimento de Hélio Bicudo (2006) sobre
a chacina da polícia paulista travestida pela imprensa nacional como política
de Segurança Pública.
Em resumo:
Nos primeiros dias de maio de 2007, a polícia de São Paulo executou
no pedágio da rodovia que liga Castelo Branco a Sorocaba 12 pessoas
que, supostamente, iriam assaltar um avião que aterrissaria no aero-
porto daquela cidade, com avultada soma de dinheiro. Posteriormente,
apurou-se que há anos não aportavam naquele aeroporto aviões com
grandes somas [...]. Contudo, um exame mais acurado dos fatos veio a
demonstrar que a chamada ‘Operação Castelinho’ fora uma das maiores
farsas da polícia paulista. [...] É que a polícia estava desprestigiada aos ol-
hos da opinião pública... Esta situação reclamava que se fizesse algo para
[...] restabelecer o prestígio da polícia e a sua confiança por parte da pop-
ulação. [...] Um órgão que funcionava junto ao gabinete do secretário da
Segurança, que responde pela sigla de GRADI (Grupo de Repressão e
Análise dos Delitos de Intolerância), tendo recrutado, com autorização
[ilegal] dos juízes da Corregedoria dos Presídios, alguns detentos conde-
nados por delitos graves, passou a armar, com a ajuda destes delinqüen-
tes, um evento que denotasse a eficiência da polícia. Recrutaram 12 pes-
soas com o objetivo de realizar o aludido assalto. [...] Proporcionaram
armas e a munição, estas sem efeitos letais, e, por fim, um ônibus que os
conduzisse para o local do assalto. [...] Esses homens foram surpreendi-
dos na praça daquele pedágio e sumariamente executados. Ato contínuo,
tratou-se de limpar o local do crime, enviando as vítimas, já mortas,
para a Santa Casa de Sorocaba, e alterando o conjunto do cenário em
que os fatos se deram [...]. O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de
São Paulo determinou o arquivamento do inquérito por insuficiência de
provas [...]. O relator, dentre outras jóias que podem ser lidas no voto
vencedor, observou [...] que o fato de os juizes terem violado a lei se
constitui numa atitude compreensível na luta contra o crime organizado.
Quer dizer: pode-se cometer crime para combater crime! [...] Em con-
clusão: o lamentável episódio não terminou, pois devemos esperar
que os fatos que não sensibilizaram o corporativismo da Justiça paulista,
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encontrem seu reconhecimento, primeiro pela comissão e depois pela
Corte Interamericana, cujas decisões são de cumprimento obrigatório
em nosso país. (BICUDO, 2006, p. 1, 2).
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treinamento ou supervisão. A única contestação à operação veio dos
promotores públicos federais, que afirmaram que ela era inconstitucio-
nal. (RELATÓRIO ..., 2007, p. 22).
• a polícia mal treinada, sem recursos e com pouca capacidade para ativ-
idades de inteligência, o que a torna ineficaz e também vulnerável a
ataques;
• a negligência do Estado com relação aos bairros mais pobres, que se tor-
nam zonas sem lei, onde os moradores sofrem de forma desproporcional
com a violência, tanto do crime quanto da polícia;
• a falta de uma política coerente de segurança pública para longo prazo,
focalizada nas causas básicas da violência e da exclusão social;
• sistema penitenciário à beira do colapso, em que a superlotação, os
maus- tratos dos detentos, a corrupção e o crime organizado estão ar-
raigados.
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O autor tenta estabelecer uma relação que caracteriza o atual modelo
de guerra civil que se espalha pelo mundo de maneira indistinta no que diz
respeito a região, classe, renda ou desenvolvimento econômico.
Como consequência, particularmente nos países periféricos, a algo que
nos articula. As guerras moleculares adaptadas a cada lugar. Uma guerra sem
ideologia que torna seus participantes incapazes de distinguir que, muitas
vezes, tudo pode ser reduzido a uma luta de perdedores contra perdedores. A
estes participantes, Enzensberger, chama de autistas, aqueles que, envolvidos
diretamente nesta trama, são incapazes de discernir o que estão fazendo.
Segundo este autor:
O que nos chama atenção em todas elas é o caráter autista dos crim-
inosos, assim como sua incapacidade de distinguir entre destruição e
autodestruição.Nas guerras civis do presente esvaiu-se a legitimidade. A
violência libertou- se completamente de fundamentações ideológicas
[...]. Os guerrilheiros latino-americanos não se incomodam em chacinar
os mesmos camponeses em cuja luta por libertação eles estariam supos-
tamente engajados; conluios com os barões da droga ou com agentes
secretos não lhes parecem problemáticos, mas naturais. O terrorista ir-
landês utiliza-se aposentados como bombas vivas e manda para os ares
carrinhos de bebês... Quem não possui uma pistola é considerado um
verme. (ENZENSBERGER, 2002, p. 16, 17).
No mesmo sentido, Luiz Mir (2004) efetiva uma análise que traduz a
crueza da democracia brasileira, tentando vasculhar os meandros dos discur-
sos que correlacionam Estado e Sociedade de tal forma que o resultado é o
fenômeno das “[...] cidades balcanizadas em guetos irreconciliáveis.” Exata-
mente porque a nossa “República não consegue se dissociar de sua genealogia
[...] o fenômeno ocorre em todo o Brasil, mas agrava-se nas Regiões Metro-
politanas de Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e Curitiba.” (MIR, 2004, p.
35, 60, 82).
Mas é através de John Pilger (2004) que nós voltamos ao cenário mun-
dial e buscamos encontrar uma relação de extermínio dos pobres sobreposta
por valores econômicos, encabeçados pelas multinacionais e governos dos
países desenvolvidos e as espalhafatosas elites periféricas.
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O autor concorda com a tese de que a democracia está sendo reduzida a
um ritual eleitoral e que os interesses econômico-financeiros das multinacio-
nais estão acima de qualquer valor em defesa da dignidade humana. Admite
também, a prostituição intelectual do meio acadêmico quando afirma:
Aqueles que dispõem de recursos sem precedentes para compreender esta prob-
lemática, entre eles tantos professores e pesquisadores das grandes universidades,
omitem publicamente este conhecimento; é provável que nunca antes tenha feito
tamanho silêncio. (PILGER, 2004, p. 13).
Agora, o conceito de guerra ao terrorismo criado pelo subsecretário de
Estado americano, Paul Wolfowitz, conduz metade do mundo a um clima
de terror e insegurança, que só beneficia aos donos do poder. A atual guerra
ao terrorismo substitui o anterior conceito do perigo vermelho nos tempos da
União Soviética e, em seguida, o conceito de guerra contra as drogas, lá pelos
idos dos anos 80.
O extermínio dos pobres, nos países periféricos, pode adotar estratégias
sofisticadas. De acordo com o Comitê de Sanções das Nações Unidas o for-
necimento de óxido nitroso pode ser proibido sob a suspeita de uso bélico,
quando, de fato, é comumente usado em partos cesarianos para deter as
hemorragias das mães e salvar-lhes a vida. Temos então um infanticídio mas-
carado de políticas de sanções da ONU, que têm como suposto objetivo, des-
tituir ditadores. Se os números pudessem vir à tona revelariam que este tipo
de política, das grandes potências, baseadas em retaliações a governos dita-
toriais, jamais tiveram o resultado oficial esperado. É de se suspeitar sobre a
insistência em políticas fracassadas que mais parecem, ações de extermínio
aos pobres e insatisfeitos do Terceiro Mundo.
É neste mesmo contexto, que devemos comparar os índices de crimi-
nalidade e violência infanto-juvenil na América Latina e Caribe. Qualquer
rápida comparação irá demonstrar vários índices com semelhanças de país
para país, principalmente o de vítimas de homicídio por arma de fogo entre
a população jovem e pobre.
Com isso, podemos falar de um modelo estrutural de desenvolvimen-
to socioeconômico e político próprio da região. As tão debatidas teorias a
respeito sucessos e fracassos do desenvolvimento e subdesenvolvimento da
região são apenas parte do problema.
A idéia de um modelo concentrador e excludente, tão exploradas nos estu-
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dos de Celso Furtado, parece ainda conceitualmente inteiramente plausível.
Segundo o Relatório da Anistia Internacional (2007):
Governos poderosos e grupos armados estão deliberadamente instigan-
do o medo para corromper os direitos humanos e criar um mundo cada
vez mais polarizado e perigoso, afirmou a Anistia Internacional no lan-
çamento de seu Informe 2007, a avaliação anual que a Organização faz
dos direitos humanos em todo o mundo. [...] No Brasil, os problemas
nos sistemas judicial, prisional e de segurança pública, entre os quais,
violações sistemáticas dos direitos humanos, contribuem para os níveis
elevados e persistentes de violência criminal. Além disso, o Relatório
aponta a tortura, o acesso à terra e o trabalho escravo como questões que
ainda assolam a população brasileira.
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Para efeito do desenvolvimento da presente abordagem sobre o tema ado-
taremos a expressão “garantias individuais” como referência a tantas tendên-
cias e conceitos que formam o universo dos “direitos humanos”.
A manutenção de um terço da pobreza da América Latina e Caribe está
no Brasil, relativamente pacificada e ordeira, mostra a eficiência das elites em
manter via, principalmente propaganda, a imagem coletiva o “bom-pobre”,
“pobre-honesto” e do “pobre- feliz”. A falência no modelo produtor de mer-
cadorias neste continente nunca teve a capacidade de estar voltado para a
distribuição, porque não foi para isso constituído. O “bom- pobre” torna-se
uma espécie em extinção, as políticas de extermínio dos pobres tornam-se,
cada vez mais sofisticadas, porque à proporção que a pobreza bélica ameaça
a propriedade privada, mesmo que, muitas das quais, de origem ilícita, as
ações de paz, lei e extermínio tornam-se sofisticadas porque ganham apoio
Jurídico-Estatal.
A questão do Estado de Exceção como paradigma de governo, é antes
de tudo, uma maneira de Interpretar o Estado Policial que se instalou na
América Latina cada vez mais eficiente.
É bem pouso usual a compreensão do que J. Rawls (2000, p. 32) fez sig-
nificar e afirmar: “Portanto, numa sociedade justa as liberdades da cidadania
igual são consideradas invioláveis; os direitos assegurados pela justiça não
estão sujeitos à negociação política ou ao cálculo dos interesses sociais.”
Já não é em todo o aparelho repressor do Estado, até mesmo nas insti-
tuições armadas, que vigora a idéia de autoritarismo e repressão, tal como
foi doutrinado e ficou de herança, aos nossos dias, através da Doutrina de
Segurança Nacional.
Temos o desafio da distribuição para um modelo político-jurídico e
econômico concentrador perante o qual, as sempre liberdades ameaçadas,
vão ganhando roupagens novas, assim como, ações de governo ou mercado,
ações placebo, vendidas como remédios prodigiosos.
A necessidade de tornar o Estado mais vigilante, o seu poder de polícia au-
mentado, esbarra diretamente na redução dos limites do que é culturalmente
chamado de intimidade.
Começa aí, a nova reflexão sobre a liberdade. Não é mais sobre como
ter propriedade. E ainda cabe uma reflexão do significado político-jurídico
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de liberdade, a partir da reflexão ética e moral. Quando os modernos desen-
volveram a diferença entre ética e moral, estava clara a preocupação entre o
que é e o que poderia ser o comportamento humano na sociedade ocidental.
Princípio inclusive fundamental de todo movimento Iluminista.
Mas o Estado precisa desenvolver o seu poder de polícia e adaptá-los aos
novos tempos. Como estabelecer novos limites, redistribuindo os deveres e
direitos por toda hierarquia social? Este grande dilema moderno está muito
atual e se faz presente em nosso país. O próprio discurso Rousseauniano que
envolve o conceito de vontade geral não anula necessariamente a perspectiva
de povo como massa a ser conformada. Para aquela época é notório o seu
conteúdo revolucionário. Mas atualmente em que medida, podemos ouvir o
grito de uma vontade geral numa sociedade bastante fragmentada e dinam-
izada por um universo virtual de informações, que torna difícil pensar em
maioria, ou sociedade civil organizada com senso crítico apurado.
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