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Caro professor,

É com prazer que apresentamos para você um guia de orientações para a escrita do
relato de seu trabalho para o Prêmio Victor Civita Educador Nota 10. A intenção é
ajudá-lo a colocar sua experiência no papel (ou na tela), descrevendo bem os detalhes
do projeto ou da seqüência de atividades que você realizou com os alunos. Leia a
seguir e, em caso de dúvida, envie seus comentários.

Os relatos pessoais e relatos de trabalho

Os relatos sempre estiveram presentes entre os homens e talvez seja o texto mais
importante para escrever uma história. São escritos pelos mais diferentes autores,
com fins igualmente diversos: servem para organizar as memórias e contar as
aventuras de uma vi-agem como se costuma fazer ao escrever os diários de bordo.
Para tornar claro aos olhos do outro o que se pode ver com seus olhos, como é o caso
dos relatos dos grandes navegadores, dos viajantes descobridores do mundo novo.
Para relatar episódios de uma vida inteira, como fez Anne Frank, Zlata, Amir Klink e
tantos outros adolescentes e adultos que registraram em palavras, diariamente, o
sentido de suas vivências.

O relato é um tipo de escrita que guarda algumas características bem específicas: é


escrito em 1ª pessoa permitindo ao leitor reconhecer aspectos subjetivos do autor do
relato. Geralmente se emprega nesses casos uma linguagem mais coloquial,
destacando a participação direta do autor, aquele que enuncia fatos ocorridos no
passado utilizando, portanto, o verbo em sua conjugação passada.

Na escola também encontramos comumente esse tipo de texto. Os relatos produzidos


no dia-a-dia das escolas também têm funções bem específicas: servem para promover
reflexões sobre a prática educativa e os processos de ensino. Tratam de diversos
assuntos: podem contar sobre a pesquisa ou a investigação que o professor faz em
sala de aula como, por exemplo, sobre a aquisição da escrita pelas crianças, a
aprendizagem de determinados procedimentos matemáticos etc. Descrevem
iniciativas, intervenções e resultados, sentimentos, dúvidas e inquietações que dizem
respeito ao modo como o professor vivencia e interpreta os fatos. Também podem
trazer observações sobre reações e características individuais das crianças, fatos
inéditos daquele dia, o que foi significativo ou o que pode ter repercussão nos dias
seguintes, dificuldades da organização do tempo, relações com as famílias etc.

Os relatos podem ser episódicos ou, como é mais freqüente, podem ser desenvolvidos
ao longo de um certo tempo (dias, semanas etc.) revelando tipos de professores, seus
pensamentos, suas questões, os passos de um percurso vivido com os alunos. A
escrita é uma prática importante para o professor: ao escrever ele se coloca em uma
conversa consigo mesmo, podendo tomar consciência do seu fazer, refletir e avaliar o
que aconteceu e muitas vezes antecipar futuras intervenções, reorganizar materiais,
planejar situações que podem realizar melhor suas intenções com os alunos e aprender
cada vez mais sobre seu próprio trabalho.

Registros dessa natureza, além do benefício imediato no próprio ato de escrever,


também amplia os conhecimentos do professor na medida em que podem ser lidos por
um parceiro mais experiente, em geral o coordenador pedagógico. Segundo Zabalza,
"o próprio fato de escrever, de escrever sobre sua prática, leva o professor a aprender
através da sua narração. Ao narrar a sua experiência recente, o professor não só a
constrói lingüisticamente como também a reconstrói ao nível do discurso prático e da
atividade profissional (a descrição vê-se continuamente excedida por abordagens
reflexivas sobre os porquês e as estruturas de racionalidade e justificação que
fundamentam os fatos narrados). Quer dizer, a narração constitui-se em reflexão".

Sendo uma escrita tão singular e subjetiva, pode-se dizer que existem tantos tipos de
relatos quantos tipos de professores.

Um relato nota 10

Os relatos produzidos para concorrer ao Prêmio Educador Nota 10, embora sejam
muito parecidos com os que normalmente se produz na escola, guardam algumas
diferenças que devem ser consideradas por você, professor, que pretende relatar seu
projeto para concorrer ao prêmio. A primeira diferença é o próprio propósito dessa
escrita: na escola você escreve para registrar sua história, para investigar os processos
de aprendizagem de seus alunos ou mesmo para saber mais sobre seu próprio
trabalho. No caso do relato de prática enviado ao prêmio, sua intenção é outra:
consiste em mostrar as qualidades do trabalho realizado. Sendo um concorrente entre
tantos outros, esse relato precisa justificar-se como merecedor de um reconhecimento
nacional. Um bom relato necessariamente fala de uma boa prática educativa. Não é
possível falar bem de um trabalho que não se sustenta por si. Bons projetos,
normalmente, possuem qualidades tais como:

1. Têm objetivos claros e relevantes em si mesmos.


2. Os objetivos têm relação direta com os conteúdos.
3. Os objetivos são altamente relevantes não só do ponto de vista social mas
principalmente didático.
4. Amplia os conhecimentos dos alunos e isso se verifica nos diferentes instrumentos
de avaliação utilizados pelo professor.
5. Está centrado na vivência cultural e na apresentação de práticas sociais reais.
6. Eleva o grau de desafios propostos e a aprendizagem dos alunos.
7. Considera os conhecimentos prévios dos alunos e suas experiências não escolares.
8. Valoriza a contribuição das crianças e considera a heterogeneidade do grupo.
9. Assegura às crianças o acesso direto aos recursos e materiais utilizados.
10. Promove aprendizagens também dos professores envolvidos.
11. Propicia produções dos próprios alunos e estas são portadoras das marcas de suas
aprendizagens, fruto claro do trabalho desenvolvido pelo professor.
12. Tem potencial de multiplicação, pode servir de inspiração para experiências
semelhantes em outros contextos.

Portanto, em primeiro lugar, se você pretende inscrever um trabalho para o Prêmio


Educador Nota 10, escreva-o de uma maneira pessoal, preserve seu estilo próprio de
escrita, seus pensamentos e idéias. Procure evidenciar todos os motivos que te
levaram a pensar que este é um trabalho merecedor desse reconhecimento. Um bom
exercício preparatório dessa escrita consiste em listar todas as qualidades que seu
projeto tem e os resultados promissores que puderam ser observados. Saber relatar
sua experiência é um dos fatores determinantes para sua defesa perante um grupo de
selecionadores.

Além do propósito, podemos apontar uma segunda diferença entre os relatos que se
faz na escola e os que se apresenta para concorrer a um prêmio que é a interlocução.
Na escola você normalmente escreve para um interlocutor conhecido que é o
coordenador pedagógico, alguém que sabe mais sobre você, seu trabalho, a rotina dos
alunos etc. Dada a intimidade desse leitor, muitos detalhes podem ser omitidos porque
é suposto que ele já saiba. No caso do relato que você envia para o prêmio o oposto
ocorre: o selecionador é um leitor crítico e distante, que não sabe nada sobre você e
sua escola e que, portanto, precisa de algumas informações mais detalhadas e
específicas que talvez não fossem necessárias em outra situação. Veja a seguir, os
principais aspectos que são observados pelos leitores críticos dos relatos de prática
enviados para o Prêmio Educador Nota 10.

1. Intencionalidade didática
Um bom relato de prática deve explicitar suas intenções didáticas. É comum que se
inicie um relato como se estivesse narrando um conto: “tudo começou quando ...”,
“surgiu a idéia ... “. Isso leva o leitor a imaginar que a casualidade é a origem de um
trabalho e não a intenção didática baseada na avaliação do professor que é um
especialista na área. Os re-latos que começam casualmente, também terminam
casualmente: às vezes se relata uma apresentação final para os pais, um teatro, um
evento a título de “culminância” que, na mai-oria das vezes, é apenas um evento de
fechamento, mas não dá visibilidade ao que de melhor as crianças aprenderam com
aquele trabalho.

Os relatos devem apresentar com clareza os objetivos de trabalho com os alunos.


Procure escrevê-los de modo que o leitor entenda a sua coerência ao escolhê-los e
destacá-los como prioridade do ensino. A parte do texto que melhor apresenta essa
clareza e coerência é a justificativa. Veja como exemplo o relato da professora Iara,
uma das vencedoras do prêmio de 2007.

“Este trabalho pretendeu romper com a postura fatalista algumas vezes vivenciada na
minha própria formação, do ensino de História, entendido como uma seqüência de
etapas que cumprem uma trajetória determinada independente da vontade dos
sujeitos.
Pude verificar como o aluno visualiza as questões históricas do ontem e do hoje e
quais habilidades traz da trajetória de vida. Sua relevância está na expressão das
reflexões do aluno, visto como alguém que pensa, que vive e que indaga a relação dos
sujeitos no mundo.
Utilizei a pesquisa para refletir juntamente com os alunos, que a História é feita por
diversos sujeitos dotados de vontade e situados em diferentes presentes, um conjunto
de permanências e transformações realizadas pelas ações humanas.”

Iara Rodrigues Alho Lopes. As viagens do século XVI.


É importante também explicar com propriedade as decisões e encaminhamentos
pedagógicos, sua consciência das orientações didáticas e intervenções necessárias ao
desenvolvimento das propostas. Isso fica mais claro nos relatos em que o professor
traz as perguntas disparadoras do projeto ou seqüência didática e mostra como deu
encaminhamento a elas, como no exemplo da professora Iara que fez a seguinte
atividade inicial:

“Como foi possível essa travessia (grandes navegações do séc. XVI)? O que era
necessário haver na caravela para que os homens chegassem vivos até seu destino,
sem saber ao certo onde era e quanto tempo levariam? Para conhecer o que os alunos
já sabiam ou não sobre o tema, foram divididos em 9 grupos de 4 alunos, munidos de
tintas, lápis de cor, canetas e papel pardo, os grupos desenharam as caravelas,
colocando dentro delas tudo o que fosse necessário para que, em média 40 homens
navegassem por ao menos três meses sem encontrar terra firme. Não se pode
esquecer nada: alimentação, higiene, vestuário, repouso.”

Iara Rodrigues Alho Lopes. As viagens do século XVI.

É importante lembrar que o relato está se propondo a falar sobre o sucesso de um


investimento para a aprendizagem dos alunos. Portanto, é importante explicitar os
problemas que estiveram no horizonte de suas preocupações como professor, como fez
outra vencedora do prêmio de 2007, a professora Renata, envolvida com os problemas
típicos das séries iniciais:

“Ao iniciar o trabalho com alunos de nove a dez anos, percebi a dificuldade que tinham
com relação à língua escrita: apresentavam muitos problemas de ortografia, não
produziam textos coerentes e não distinguiam os gêneros textuais.”

Renata. No Caminho da Autoria.

“O relato da professora Renata situa muito bem o leitor que, diante do problema que
ela colocou, espera encontrar solução na lista de seus objetivos, como de fato ocorre.
Ora, se são esses os problemas que os alunos enfrentam, o que deve ser objetivo de
trabalho? Nada mais coerente do que os que a professora elencou:
a) Trabalhar a análise e a reflexão sobre a língua escrita, dentro de um determinado
gênero textual, para melhorar a capacidade de compreensão e ex-pressão, tanto em
situações de comunicação escrita quanto oral.
b) Valorizar a leitura, não só como uma prática social, mas como fonte de informações
necessárias a nossa vida.
c) Aprender as características dos contos de fadas: tipo de linguagem mais usual,
expressões utilizadas e apresentação da estrutura do texto.
d) Distinguir os contos de fadas de outras narrativas.
e) Relacionar as características do gênero proposto ao texto escrito.
f) Aprender alguns procedimentos de revisão de textos (reler cada parte escrita,
verificando a articulação com o que já foi escrito, planejando o que falta escrever e
fazendo rascunhos).
g) Sociabilizar seus conhecimentos através do trabalho em grupo.
h) Produzir textos de autoria utilizando procedimentos de escritor: planejar o que vai
escrever considerando a intencionalidade, o interlocutor, o portador e as características
do gênero proposto, para compor o livro de Contos de Fadas, que fará parte do acervo
de livros da biblioteca da escola (produto final).”

Renata. No Caminho da Autoria.

2. A organização didática do tempo


Um bom relato traz o passo-a-passo da seqüência de trabalho e apresenta os
diferentes graus de dificuldade para o grupo de alunos. O modo como se relata o uso e
a passagem do tempo também diz muito sobre o próprio trabalho do professor: há
quem relate idéias e conteúdos complexos em poucas semanas, às vezes dias, e
propósitos muito simples e pontuais que se arrastam por meses. Nesses casos, o leitor
crítico tende a notar a falta de critérios de organização de tempo dos projetos ou
mesmo do próprio cotidiano educativo que sustenta tantas outras aprendizagens
necessárias aos alunos e que nem sempre se resumem aos projetos. Procure, então,
pensar uma escrita que permita explicitar mais detalhadamente a seqüência didática, a
ordem lógica da apresentação das propostas feitas aos alunos.

3. A coerência didática
“Vimos até o momento como a intencionalidade aparece no texto da justificativa e na
lista de objetivos eleitos pelo professor. Convencido das reais intenções do professor, o
leitor crítico procura então a sua coerência didática: se ele sabe o que os alunos
precisam aprender e o que ele precisa ensinar, é de se esperar que suas intenções
sejam concretizadas no tipo de desafios que ele propõe aos alunos. Para se atingir
determinados objetivos, alguns conteúdos são imprescindíveis. Muitos relatos trazem
enormes listas do que ensinar, do que esperar dos alunos, muitas vezes itens copiados
ou transcritos de documentos referenciais, currículos etc. Um bom relato deixa claro ao
leitor os objetivos específicos de modo que já se possa quase que inferir daí os
conteúdos necessários à realização dos objetivos propostos. Freqüentemente a
incoerência entre os objetivos e os conteúdos também se revela na própria proposta
didática do trabalho. Vale a pena continuar com o relato da professora Renata para
observar sua coerência em cada passo de seu trabalho. Observe:

Iniciei o projeto com uma roda de conversa para apresentar o gênero trabalhado e
compartilhar o produto final.
Organizamos junto, um plano de ação; listamos os materiais necessários e planejamos
as seqüências didáticas, que chamamos de oficinas, que iríamos trabalhar ao longo do
projeto.

Primeira oficina: Reconhecendo Contos de Fadas - Objetivo: Resgatar a experiência


dos alunos com contos de fadas e ampliar o repertório do grupo.
Li um conto de fadas dos Irmãos Grimm, Cinderela, em seguida, formamos uma lista
de contos de fadas conhecidos pelo grupo; cada aluno foi até a lousa e escreveu o
título de um conto de fadas, em seguida, propus que recontassem o seu conto
preferido.

Segunda oficina: Primeira produção individual - Objetivo: Avaliar o que os alunos já


sabem e os pontos que precisam ser mais trabalhados..
Propus a primeira produção individual; eles teriam que produzir um conto de fadas
diferente dos que eles conheciam, mas deveriam usar as mesmas personagens.

Terceira oficina: Sabendo um pouco mais sobre os Contos de Fadas - Objetivo:


Refletir sobre algumas características de um conto de fadas, definir e diferenciar
conceitos do universo desse tipo de narrativa.
A idéia não foi dar uma aula teórica ou explicativa, mas promover uma conversa que
familiarizasse os alunos com alguns aspectos que são fundamentais para discutir e
trabalhar os novos contos de fadas que conheceram.
Fizemos uma roda de leitura, no pátio da escola, foi feito um rodízio de livros de
contos de fadas de diferentes versões; depois da leitura propus que recontassem o que
tinham lido. Em seguida, fiz perguntas objetivas: ´´Como começam a maioria dos
contos de fadas?``, ´´Como terminam?``, ´´Como são apresentadas as
personagens``, ´´Quais as características dessas personagens?``. Solicitei que se
dividissem em grupos e discutissem essas questões. Depois sugeri que apresentassem
suas conclusões. Fechei a atividade pegando a conclusão de cada grupo que mais se
aproximou das características dos contos de fadas.
Subimos para a sala de aula e pedi que fizessem uma lista de tudo o tinham aprendido
(os alunos falavam e eu escrevia). Fixamos a lista no mural da sala de aula.

Quarta oficina: Conhecendo um Conto de Fadas moderno - Objetivo: Familiarizar o


grupo com contos de fadas modernos através de filme.
Levei os alunos para sala de vídeo e passei o filme: ´´Deu a louca na Chapeuzi-nho``.
Depois conversamos sobre o filme: ´´Que tipo de filme é esse?``; ´´O que vo-cês
notaram de diferente nessa história?``; ´´O que esse filme tem a ver com o nosso
projeto?``.

Quinta oficina: Analisando diferentes olhares sobre o mesmo tema - Objetivo:


Discutir histórias de diferentes autores sobre um mesmo tema.
Para esta oficina escolhi três contos de fadas que contavam de forma diferente a
história da Cinderela.
Dividi a sala em grupos e distribui a cada um deles um dos três contos, como é uma
classe numerosa, um mesmo conto foi distribuído para mais de um grupo. Pedi que
lessem e pensassem em um modo de apresentá-lo para o resto do grupo. Eles podiam
apenas ler, contar a história resumida, contar a história com gestos, em forma de
teatro, enfim, de diferentes maneiras, mas teriam que ter o cuidado de preparar a
apresentação cuidando do ritmo, das pausas e da entonação.
Depois da apresentação lancei um novo desafio: ´´Se esses contos de fadas têm como
personagem principal – Cinderela, por que têm títulos diferentes?``; ´´Que
contribuição o título de cada um deles dá para quem vai lê-los?``.
Terminei a atividade mostrando aos alunos que, assim como esses autores, cada um
deles poderia achar uma forma inovadora e diferente de produzir um conto de fadas.
Sexta oficina: Tornando-se escritores - Objetivo: Escrever um texto coletivo, para
que possam sociabilizar os conhecimentos que adquiriram ao longo das oficinas e
expor suas dúvidas com maior naturalidade instruindo-se ainda mais sobre a escrita.
Propus que construíssem um texto coletivamente, na lousa. Os alunos foram
construindo o texto oralmente e eu, como escriba, fui ajudando-os a transformar o que
foram dizendo num texto escrito. Auxiliei também na substituição de marcas de
oralidades (´´e aí``, ´´e depois``, ´´aí né``) por marcas próprias da escrita, na
organização do texto em parágrafos, no uso da pontuação corretamente, a usar
expressões próprias do gênero ´´contos de fadas`` e a grafar corretamente as
palavras, utilizando o dicionário quando fosse preciso.
O texto coletivo foi reescrito em uma folha de papel pardo e exposto no mural da sala.

Sétima oficina: Revisão coletivo - Objetivo: Analisar e rever um conto de fadas


escrito por um aluno.
Nesta oficina eles desenvolveram uma atividade que os ajudou a rever os próprios
textos. Para tanto, usei um texto que foi escrito na primeira produção individual que
continha inadequações comuns a produção dessa faixa de escolarização.
Dividi a lousa ao meio: em uma das colunas, transcrevi o texto escolhido para esta
atividade. A outra coluna ficou em branco e nela reescrevi o texto, incorporando as
sugestões dos alunos. Lancei perguntas desafiadoras para que pudessem por em jogo
tudo o que tinham aprendido e, assim, aprimorassem o texto que estava sendo
revisado.

Oitava oficina: Primeira produção em dupla - Objetivo: Produzir um texto em dupla


diferente dos conhecidos, mas com as mesmas personagens.
Agrupei-os segundo as suas dificuldades, os alunos que tinham dificuldades em
pontuar textos foram colocados com os que tinham mais facilidade e assim por diante.

Nona oficina: Dando o toque final aos Contos de Fadas - Objetivo: Rever o texto
escrito em dupla, aprender alguns processos de revisão de textos finalizando a escrita
dos contos de fadas.
Para conduzir a auto-correção, preparei um cartaz com o roteiro descrito abaixo:
Usou expressões próprias dessa narrativa?
Estruturou corretamente o texto: Início, Ruptura, Confronto e superação dos obstá-
culos e perigos e Desfecho?
Verificou se a coesão entre as partes?
Lembrou-se de iniciar com letra maiúscula os nomes próprios, o início de parágrafos e
após o ponto final?
Corrigiu os erros de ortografia?
Substituiu palavras repetidas desnecessárias?
Verificou se a pontuação está correta?
Colocou um título coerente com sua história?
Acompanhei as duplas bem de perto, conversei com cada uma e juntos fizemos as
correções necessárias. Além disso, ajudei-os a perceber que podiam substituir as
palavras repetidas por sinônimos ou pronomes e à medida que as dúvidas de
ortografia foram surgindo eles foram usando o dicionário para conferi-las.

Décima oficina: Digitação dos textos na sala de informática da escola.


Com as produções revisadas, fomos para a sala de informática e eles digitaram os
textos. Foi feito um revezamento entre as duplas; levei para sala o acervo de livros
circulantes e os alunos que não estavam digitando ficaram lendo.

Décima primeira oficina: Organização do sumário e das páginas do livro.


Com os textos digitados começamos a organizá-los para preparar o sumário do livro.
Dividi a lousa ao meio e distribui os textos, em um dos lados escrevi os textos sem
obedecer a ordem alfabética dos títulos, depois, sugeri que cada dupla viesse na lousa
e escrevesse, do outro lado o título em ordem alfabética.
Escolhemos um aluno para digitá-lo e voltamos para sala de informática; enquanto o
aluno digitava o sumário o restante do grupo escolhia as gravuras da capa, levei um
CD com gravuras coerentes às produções e deixei que as escolhessem.
Encerramos as oficinas e levei o livro para ser encadernado.
Os alunos sugeriram que alguns cartazes fossem anexados nos corredores da escola
chamando a atenção para o novo livro que iria ter na biblioteca da escola. Concordei
mesmo sem estar no nosso plano de ação, pois o projeto deve ser flexível e aberto a
sugestões desde que estejam coerentes ao mesmo.
Fizemos os convites para o lançamento e a entrega do livro à biblioteca da escola com
a presença dos pais.
O lançamento foi feito na biblioteca com alguns comentários dos alunos e dos pais
sobre o projeto, em seguida o livro foi entregue para a vice diretora. Além dos pais,
que compareceram em grande maioria, e da direção da escola, tivemos a presença de
um representante da Diretoria de Ensino Norte 2, o professor Roberto Arruda que
cuida da parte de projetos de Língua Portuguesa. Foi oferecido um chá da tarde para
todos que estavam presentes e o projeto foi encerrado.”

Renata. No caminho da autoria.

4. Relevância

Além da intencionalidade, da coerência e da organização do trabalho didático, o leitor


crítico também costuma observar o modo como o professor defende a relevância de
seu trabalho, de modo a convencer o leitor de que de fato o que foi feito é importante.
Um bom relato mostra claramente ao leitor o conhecimento que o professor possui
sobre o conteúdo apresentado ao grupo. Veja a seguir como a professor Luzia
defendeu a relevância de seu trabalho:

Neste contexto, o presente trabalho procurou estabelecer uma relação mais estreita
entre a teoria e a vivência, partindo do pressuposto de que é preciso despertar os
alunos para uma aguçada percepção através de um olhar mais cuidadoso da paisagem
e um contato mais íntimo com a história e a vivência de seus moradores. Minha
intenção foi que com esse processo eles pudessem enxergar com mais profundidade e
clareza o lugar onde vivem. A partir daí, tiveram interesse e condições de constatar a
sua real posição e o seu importante significado histórico e social.
Para os alunos, reconhecerem-se como agentes históricos do espaço que eles ocupam,
ajudou-os a se valorizar e a se engajar na luta para a superação das dificuldades,
tornando-os cidadãos mais conscientes, críticos e, conseqüentemente, com muito mais
possibilidades de transformarem o próprio meio.
É preciso ressaltar aqui que este projeto, de imediato, foi desenvolvido para ser
trabalhado apenas com as 5ªs séries, uma vez que “concepção de lugar” faz parte do
conteúdo programático da 5ª série.

Luzia. O lugar onde vivo.

Ela de fato ressalta aspectos da mais alta importância: há uma importância social do
conhecimento e também relevância programática de um conteúdo previsto no currículo
de uma série. Ao relatar dessa maneira a professora se mostra como especialista em
Geografia e grande conhecedora do currículo da 5ª série. Tais preocupações também
estiveram presentes no relato da professora Vânia que se desafia a pensar um
contexto mais relevante para as aprendizagens no campo da Matemática:

“Os alunos sentiam-se sem motivação para aprender Matemática, pois era trabalhada
de forma tradicional sem significado, sem utilização prática dos conteúdos, os alunos
não sabiam o porquê e para que estudavam porcentagem, razão, proporção, gráficos
etc. com o projeto, despertou-se a curiosidade em saber a utilização dos conteúdos na
sua vida, e até mesmo para melhorar sua renda mensal.
O projeto foi um trabalho propositivo às pessoas da comunidade, com propostas de
mudanças e melhoria na produção de leite, comercialização e sua utilização na
alimentação. E o que é melhor: essa proposta foi construída juntamente com os alunos
(filhos (a) dos produtores de leite da comunidade).
Quanto à prática pedagógica, inovei e constatei que é possível mudar e melhorar as
aulas de Matemática, tornando o processo de ensino e de aprendizagem mais
significativo aos alunos, despertando neles o interesse, a confiança, a criatividade e
valorizando os conhecimentos empíricos de cada um, tornando-os capazes de construir
seu próprio conhecimento.”

Vânia Horner de Almeida. A produção de leite e seus derivados, uma fonte de


renda familiar.

5. O olhar do professor, especialista da sua área

É comum que os relatos tragam referências teóricas. Elas são úteis para esclarecer um
trabalho, um ponto de vista, uma intervenção. No entanto, é preciso saber usar as
citações e referências. Elas só devem aparecer se realmente ajudarem na
compreensão das hipóteses de trabalho e na justificativa das decisões didáticas. Veja a
seguir como o professor Rogério fala sobre cinema, sua especialidade, para justificar
os conteúdos que ele elegeu a partir do currículo de Artes da 7ª série:

“Em meados da década de 50, quando a indústria fonográfica assume uma maior
proporção, e também a produção videográfica, foi preciso a criação de um novo veículo
de comunicação que atendesse ao interesse dos músicos e gravadoras, auxiliando-os
no processo de divulgação de seu trabalho. Com o advento do ci-nema de animação e
as experimentações do cinema com a música, surge o videoclipe, que a princípio
mostrava somente o artista cantando sua música, sem maiores preocupações com
cenário, figurino e narrativas. Os videoclipes serviam, assim, como simples artifício
para divulgação da imagem do artista, já que na época as turnês mundiais eram
difíceis de ser realizadas. Portanto, um artista se tornava conhecido por dois fatores
básicos: seus vídeos, que eram exibidos em canais de TV por todo o mundo, e pelas
fotografias estampadas nos discos de vinil.
Não pretendemos aqui mostrar a história do Cinema e do Vídeo, mas apenas criar um
contexto que nos permita entender como a produção audiovisual funciona nos dias de
hoje e, conseqüentemente, como ela interage com outros campos do saber e das
Artes, o que justifica a realização do projeto em sala de aula.”

Rogério Andrade Bettoni. Imagens no Tempo.

6. O olhar dos alunos, aprendizes em um projeto

O trabalho pedagógico não está apenas nas mãos do professor, mas também dos
alunos. Um professor especialista se responsabiliza com a tarefa de tornar seus alunos,
de certa forma, mais especialistas em algum aspecto que foi trabalhado. Para tanto, é
preciso reconhecer o que eles já sabem ao início de um projeto, como relata a
professora Bernadete em uma das páginas de seu diário:

“22.09.06 - Numa conversa informal com os alunos, expusemos sobre o que iria
tratar o projeto e quais os seus objetivos. As informações prévias que eles tinham
eram:

Joaninha, cigarra formiga são insetos.

A aranha é um inseto.

A barata no ouvido deixa a pessoa doida.

O corpo dos insetos é mole.

Os insetos são pintados.

A abelha é um inseto.
Cada perna dos insetos tem duas.

A barata é um inseto e voa.

Borboleta é um inseto.

Borboleta não é um inseto porque vem da lagarta.

Os insetos se alimentam de folha.”

Bernadete. Bichos Esquisitos.

Um bom relato deve permitir ao leitor reconhecer em suas palavras a participação dos
alunos no projeto bem como seus ajustes no planejamento, necessários para melhorar
as futuras etapas de trabalho. É fundamental relatar como você mudou seus planos ou
como pensou intervenções a partir do que observou nos alunos, na tentativa de apoiá-
los na aprendizagem dos conteúdos tematizados, como fez a professora Paula:

“Muitas crianças pegam o pincel de forma que dificulta o trabalho. Dessa forma as
orientações foram fornecidas para facilitar o trabalho e não para que aprendessem
técnicas acadêmicas.”

Paula. Auto-retrato.

7. Avaliação final

Na avaliação final muitos professores tendem a falar sobre si mesmos, sobre suas
qualidades pessoais, seu entusiasmo, coragem etc. Também é muito comum que os
professores apresentem como dado de avaliação o fato de os alunos gostarem da
proposta e o envolvimento e animação geral, não só dos alunos como da escola inteira,
às vezes até da comunidade local. Mas isso, por mais interessante que seja, não é
suficiente para se avaliar se o projeto foi de fato bem sucedido. Um projeto não é um
evento de entretenimento, mas sim um contexto que deve provocar aprendizagens
específicas. O que está em jogo nos relatos nota 10 é justamente a sua avaliação
como professor em um contexto bem específico, seu projeto de trabalho. Ao ler um
bom relato, o leitor deve conseguir compreender porque tal trabalho foi significativo
para os alunos. Para saber disso o leitor precisa ter acesso aos problemas que seus
alunos tiveram que resolver no percurso do projeto. Veja, por exemplo, como a
professora Luzia escreve sobre sua avaliação trazendo ao leitor não só o modo como
os alunos resolveram o problema que lhes havia sido posto como também as suas
próprias falas:

“Os alunos, com este trabalho, passaram a perceber que, apesar dos indicadores de
Guaianases e Lajeado serem os piores, eles aprenderam a valorizar as pessoas e as
coisas do lugar onde vivem e a entender que todos são responsáveis pela construção
de um lugar melhor, sentindo-se participantes desse processo e dando sugestões e
contribuições para sua melhoria. Foi feita uma avaliação coletiva, em forma de
questionário, para que eles apontassem os aspectos positivos e negativos do trabalho
realizado e do que eles teriam aprendido. Assim, nas palavras próprias de alguns
deles, colhemos:

“... foi bom porque conhecemos novas pessoas e a nossa própria escola e foi também
importante, pois aprendemos muito sobre o bairro. Descobrimos os muitos problemas
que Guaianases enfrenta e percebemos que, sabendo disso, no futuro, nós teremos
como agir sobre esses fatos e modificá-los para melhor...”

“... o governo poderia construir casas de custo viável, em lugares seguros, para
abrigar famílias que moram em áreas de risco. Criar parques de áreas verdes em
terrenos abandonados, para aumentar a arborização... ”

“... foi a forma que achamos de mostrar as necessidades do nosso bairro e como
temos que valorizá-lo... deveria ter melhor apoio do governo e aplicações em locais
que mais necessitam...”

“... descobrimos que existem lugares que estão esquecidos... ”

“... aprendemos coisas do bairro que não sabíamos, conhecemos lugares que não
conhecíamos... nós não sabíamos que o rio que tem na frente da escola (Córrego
Itaquera) já foi usado para matar a sede e a fome de muita gente... ”
“... teria que ter mais gente para desenvolver projetos como esse e quem sabe a
população se conscientizaria para melhorar o nosso bairro... ”

“... se eu pudesse ir à televisão, pediria um único favor: esse bairro é de todas as


pessoas. Porque destruí-lo? Tem gente que brinca, come, pas-seia... ”

Como aspectos negativos, colhemos também:

“... teria que ter mais alunos participando do projeto...”

“... faltou tempo e recursos... ”

“... ter que vir à escola nos feriados, ter que andar bastante para chegar em algum
lugar ou repetir uma cena de vídeo várias vezes... ”

Luzia. O lugar onde vivo.

Além do olhar das crianças, o professor também precisa apresentar de maneira


objetiva os dados que ele mesmo utilizou na avaliação do seu trabalho, ou seja, de que
modo que os resultados finais provocaram mudanças e que mudanças eles
provocaram, como ocorre no relato da professora Bernadete:

“Mais uma vez estávamos atentas às suas conversas. O vocabulário que agora utilizam
é riquíssimo! Além disso, o aprendizado da leitura e da escrita avançou bastante com
as atividades realizadas. Comparando os resultados da penúltima (junho/julho 2006) e
da última avaliação de escrita (outubro e novembro 2006) vemos claramente esse
avanço: 21 alunos alfabetizados, 05 com hipótese silábi-ca-alfabética, 02 com hipótese
silábica com valor sonoro, 01 aluno com hipótese silábica sem valor sonoro e 01 pré-
silábica devido a dificuldades na fala.”

Bernadete. Bichos Esquisitos.

Agora é a sua vez: como elaborar um bom relato de prática?


Depois de escrito seu relato em primeira versão, procure ler seu próprio texto e utilize
os comentários desse guia para nortear a sua própria crítica e a revisão do texto final.
Acompanhe ponto a ponto as seguintes questões abaixo enumeradas.

1. Seu relato apresenta com clareza os objetivos de trabalho com os alunos? Estão
escritos de modo que o leitor perceba-os claros, coerentes e perfeitamente
justificados?
2. Os conteúdos específicos estão relatados de modo que se mostrem necessários à
realiza-ção dos objetivos propostos?
3. Ao ler seu relato, o leitor consegue compreender porque seu trabalho foi
significativo para as crianças? O leito tem acesso aos problemas que seus alunos
tiveram que resolver no percurso do projeto que você desenvolveu nessa sala?
4. Seu texto relata passo a passo a seqüência de trabalho investigativa e apresenta os
diferentes graus de dificuldade para o grupo de alunos?
5. Seu texto apresenta as referências culturais que estiveram presentes em seu
trabalho? Você pode defender por escrito a relevância social de seu trabalho de modo
a convencer o leitor de que de fato o que foi feito é importante?
6. Você procurou mostrar claramente ao leitor o conhecimento que você possui sobre o
conteúdo apresentado ao grupo?
7. Seu texto permite explicar com propriedade suas decisões e encaminhamentos
pedagógicos, demonstra sua consciência das orientações didáticas e intervenções
necessárias ao desenvolvimento de suas propostas?
8. É possível reconhecer pelo relato a participação das crianças no projeto bem como
seus ajustes no planejamento, necessários para melhorar as futuras etapas de
trabalho?

A seguir você encontrará dois relatos de estilos bem diferentes. O da professora


Bernadete tem marcas de um diário de campo, traz o olhar de alguém que desenvolve
um trabalho ao mesmo tempo em que investiga as próprias crianças e seus modos de
aprender. O relato do professor Rogério tem características mais acadêmicas, porém
muito contextualizadas nas necessidades de aprendizagem dos alunos e no seu próprio
percurso como alguém que ensina algo novo. O primeiro está devidamente comentado
- para ler as observações, passe o mouse em cima do texto grifado em amarelo. O
segundo, aguarda agora a sua leitura crítica: leia-o com atenção procurando encontrar
ali todas as qualidades enumeradas anteriormente. Isso vai ajudar a desenvolver seu
olhar para o exercício mais complexo que é a crítica de seu próprio relato. É possível
que você note a necessidade de escrever mais alguns parágrafos ou então de enxugar
mais uma parte do texto para se deter mais em outro aspecto talvez mais relevante.
Reescreva-o à vontade! Mostre-se pela escrita. Feito isso, envie seu relato, revisto e
reescrito para a comissão selecionadora do prêmio Educa-dor Nota 10 e acompanhe
pela revista e pelo site as últimas notícias.

Esperamos seu texto. Bom trabalho, até lá!

Anexo A - RELATO

Projeto: Bichos Esquisitos


Professora: Bernadete
Disciplina: Educação Infantil

O projeto “Bichos Esquisitos” foi realizado na turma do Pré-Escolar III “C” (alunos de 6
anos) da Escola Municipal Francisca Aragão Silva, em Rio Branco, AC, no ano letivo de
2006. Essa escola atende 219 crianças de vários bairros das suas imediações, que
possuem estrutura precária em relação a abastecimento de água, rede de esgoto, além
do pouco acesso aos bens culturais e aos serviços básicos de saúde. A escola (que foi
construída por reivindicação e luta da própria comunidade em 15 de março de 1988) é
vista por pais e alunos como um espaço que oportuniza vivências saudáveis e
satisfatórias que auxiliam no desenvolvimento das crianças em diferentes aspectos,
especialmente no cognitivo.

Apesar disso, buscávamos uma alternativa para lidar e vencer a apatia de boa parte de
nossos alunos em relação à aprendizagem dos conteúdos que trabalhávamos. Às
vezes, percebíamos certo desânimo na turma, que se refletia na leitura e na escrita, ao
mesmo tempo em que a curiosidade estava à flor da pele por elementos e espaços da
própria escola, especialmente pela jardineira próxima ao parque infantil. Em que
estávamos falhando? Como validar as nossas teorias? O que fazer? Como dar sentido à
leitura e à escrita, para que de fato os alunos aprendam? Esses eram os nossos
questionamentos.
Paralelamente, passamos a entender claramente que: “é a criança quem evolui ao
resolver os conflitos que enfrenta, mas cabe ao professor atuar no sentido da
colocação desses conflitos. Existe um papel específico da aprendizagem quando o
professor atua num plano adiante da resposta da criança, levando em conta o nível
que ela se encontra” (grifo nosso). As próprias crianças nos davam as respostas a cada
dia, com suas atitudes. E começamos a percebê-las.

Sempre trabalhávamos o conteúdo referente aos animais, entre outros, de forma


estanque, sem considerar os insetos e a função dos mesmos no equilíbrio do meio
ambiente. As idéias iniciais dos alunos quando partilhamos o projeto, expressavam
certa repulsa, medo e preconceitos em relação aos insetos (“bichos esquisitos”),
apesar de toda a curiosidade que despertavam, o que também impulsionou o projeto.
A nossa prática pedagógica precisava ser revista... e as idéias iniciais dos alunos
também.

Em nossas reflexões e leituras, compreendemos que a modificação do nosso fazer


pedagógico se articula ao conhecimento que possuímos e à prática que realizamos. “A
teoria é validada quando possibilita a reflexão sobre a prática e, sobretudo, quando
contribui para que a prática avance para níveis de qualidade”. Aliamos essas
inquietações à vontade de executar um projeto com o tema “insetos” que, em nosso
entendimento, contribuiria para uma aprendizagem significativa não só na área do
conhecimento específica de Ciências, mas também na oralidade, na leitura e na
escrita.

O encaminhamento inicial foi uma conversa com os alunos, na qual apresentamos o


projeto e registramos seus conhecimentos prévios. A seguir, utilizamos diferentes
estratégias, desde as rodas de conversa, exposição dialogada, utilizando
transparências sobre os insetos selecionados para estudo, passa ou repassa
(perguntas e respostas sobre os conteúdos trabalhados), coleta dos insetos
selecionados para estudo, vídeos, leitura de fábulas, leitura informativa, até a
elaboração do livro dos insetos coletados e montagem de um insetário. Pretendíamos
estudar e conhecer o modo de vida dos insetos, as características básicas da abelha,
barata, besouro, cigarra, cupim, formiga, grilo, libélula, mosca e piolho (estrutura,
habitat, alimentação, reprodução e ciclo de vida) – estes selecionados por serem mais
próximos da vivência das crianças e pela possibilidade de abordarmos, além de seus
benefícios, as doenças que podem transmitir - como interagem no ambiente em que
vivem e a importância dos mesmos na natureza.
Nas atividades propostas às crianças, solicitávamos que expressassem suas
aprendizagens e compreensão sobre o assunto estudado, fizessem a correspondência
entre os desenhos e os nomes dos insetos, descrevessem as suas características,
coletassem informações em suas casas, junto aos seus familiares, lessem bastante
(livros e revistas que tínhamos disponíveis) e líamos todos os dias para elas,
elaborassem gradativamente o vocabulário do projeto. Nessas atividades, a leitura e a
escrita foram trabalhadas e enfatizadas - momentos riquíssimos de aprendizagem que,
além de envolver os alunos, mobilizaram a escola.
Contamos com a colaboração valiosa de uma servidora em especial, concludente do
curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Acre – UFAC, desde a
orientação quanto às pesquisas, ao material próprio para coletar os insetos, espetar,
fazer a secagem e organizar o nosso insetário, além da outra professora da turma.
Também contamos com duas estagiárias do curso de Pedagogia dessa mesma
instituição. Elas entenderam o propósito do projeto e se dispuseram a executá-lo
conosco. Essas parcerias foram feitas a partir da apresentação do projeto, no caso da
servidora da própria escola, e da disposição dos parceiros (estagiárias) que
procuraram a escola para estágio e “se apaixonaram”, por assim dizer, pelo projeto. O
que gerou essa “adesão” ao projeto foi o encaminhamento que demos ao mesmo,
possibilitando às crianças desenvolverem a autonomia e a aprendizagem significativa
nas pesquisas e demais atividades que realizaram, num clima de respeito e
colaboração, princípios esses que vão ao encontro do Projeto Político Pedagógico da
escola.

A avaliação se deu na execução de cada etapa do projeto, por meio da observação e


do registro em um diário. E os resultados da aprendizagem dos alunos foram logo
percebidos. Os pais relatavam que os filhos faziam relação do conteúdo estudado às
suas vivências e os próprios alunos expressavam nas atividades o quanto haviam
aprendido; ficaram mais estimulados e atentos para aprender e a escola um espaço
prazeroso de aprendizagem e convivência; e os avanços em relação a expressão oral,
leitura, ampliação de vocabulário e à escrita ocorreram (de 46,6% para 70%
alfabetizados em decorrência das atividades, intervenções e desafios do projeto).Além
disso, hoje os alunos, que estudam em escolas de ensino fundamental próximas à
nossa escola, nos relatam que a matéria de Ciências está entre as que mais gostam,
com uma referência especial ao projeto que executamos na pré-escola.
Pretendemos trocar experiências com essas e outras escolas (divulgar o projeto),
executá-lo em outras turmas na escola onde atuamos, com um enfoque mais voltado à
prevenção de doenças que têm os insetos como transmissores, a exemplo da dengue e
da doença de chagas, entre outras, comuns na região amazônica.

NOSSO DIÁRIO

22.09.06 - Numa conversa informal com os alunos, expusemos sobre o que iria tratar
o projeto e quais os seus objetivos. Fizemos também o levantamento dos
conhecimentos prévios dos alunos. As informações que eles tinham eram:

Joaninha, cigarra formiga são insetos.

A aranha é um inseto.

A barata no ouvido deixa a pessoa doi-da.

O corpo dos insetos é mole.

Os insetos são pintados.

A abelha é um inseto.

Cada perna dos insetos tem duas.

A barata é um inseto e voa.

Borboleta é um inseto.

Borboleta não é um inseto porque vem da lagarta.

Os insetos se alimentam de folha.


Para nós algumas dessas idéias precisavam ser revistas, outras complementadas ou
melhor esclarecidas. Mas decidimos que isso se daria ao longo do projeto,
oportunizando às crianças que tirassem suas próprias conclusões a partir do estudo
das características gerais dos insetos e das espécies que elegemos, popularmente
chamadas de: abelha, formiga, barata, cupim, libélula, piolho, grilo, cigarra, besouro e
mosca. Passamos então a fazer as fichas de cada inseto, com o auxílio da professora
Regiane (concludente do Curso de Ciências Biológi-cas da UFAC), e a estudá-los nos
aspectos: estrutura, habitat, alimentação, reprodução, ciclo de vida e
importância/danos ao meio ambiente. As estratégias utilizadas foram: exposição dia-
logada, utilizando transparências com gravuras dos insetos; passa ou repassa
(perguntas e respostas sobre os insetos estudados); revisão do conteúdo estudado;
atividades de leitura e escrita relacionadas ao tema do projeto; visualização dos
insetos coletados para estudo; vídeos “Insetos”, “A invasão”, “Formiguinhas”; Livros “A
Joaninha” (Mary França e Eliardo França); “Dona Baratinha” (Recontado por João de
Barro); “Bichos Esquisitos”. Os resultados em relação a aprendizagem dos alunos são
maravilhosos. No passa ou repassa insistem em responder as perguntas e respondem
corretamente.

17.10.06 - O aluno Geison falou para a professora da Sala das Artes que a figura de
uma abelha colocada na porta da sala estava errada. A professora perguntou por que e
ele prontamente respondeu que era devido ao fato de só estar com quatro pernas, e os
insetos possuírem 6 pernas.

12.10.06 - Fomos presenteados com o “João Batalha”, nosso primeiro coleóptero,


doado pela professora Maria Antonia Batalha. Ele se finge de morto quando ameaçado,
misturando-se à “paisagem”. As crianças gostaram muito dele e ficaram admiradas
com esse mecanismo de defesa do besouro. Depois dessa doação, vieram um “rola
bosta” (também coleóptero doado pela professora Batalha), uma formiga coletada na
escola e duas baratas doadas pela Professora Sabrina Oliveira, que alimentamos
periodicamente com bolachas. Os depoimentos dos pais também evidenciam a
aprendizagem dos alunos. Os mesmos fazem comentários em casa, mostrando o que
aprenderam, sem contar o que expressam nas atividades feitas em sala de aula.

18.10.06 - A aluna Beatriz estava muito intrigada e perguntou:


- Professora, cupim é um inseto?
Prontamente respondemos:
- Sim Beatriz, cupim é um inseto.
Ela pensou e concluiu:
- Então professora, lá em casa está cheio de insetos!
As professoras estagiárias Ester e Sabrina (da UFAC) estão continuando o projeto nas
duas semanas do estágio (de 16 a 27.10.06). O conteúdo está sendo desenvolvido
com muita competência. Os alunos ficaram inicialmente muito agitados com a
mudança, mas estão melhorando. Cremos que a agitação e a ansiedade são por conta
do que estão aprendendo: todos querem falar e expor suas idéias ao mesmo tempo.

20.10.06 - Ganhamos mais um coleóptero, doado pela funcionária Helena dos


Prazeres. Achamos muito interessante esse envolvimento dos funcionários da escola.
Eles sempre falam: “Achei um bicho esquisito e vou trazer para vocês”. Outra
servidora, no dia seguinte, doou outro coleóptero. Outros servidores relatam que
quando encontram insetos lembram logo do nosso projeto. Alguns trazem aranhas,
entre outros pequenos animais, e então agradecemos e esclarecemos que estes não
são insetos e dizemos o que os caracteriza, especialmente o fato de possuírem 6
pernas.

23.10.06 - Todos os insetos que temos até o momento estão vivos. O procedimento
que adotamos após coletá-los (ou recebê-los, no caso das doações) é colocá-los em
vidros trazidos pelos alunos, perfurar as tampas para entrada de ar e tornar o espaço
nos vidros um pouco parecido com o ambiente natural de cada um, adicionando terra,
água embebida em algodão, folhas, além de alimentos apropriados às espécies.
Chamou a nossa atenção, observando duas espécies de coleópteros que nos foram
doadas, como já relatamos, o mecanismo de defesa que utilizam: ficam paralisados,
como se estivessem mortos, ao serem ameaçados de alguma forma. Surgiu daí um
questionamento: os insetos dormem? Dois insetos (coleópteros) morreram nos últimos
dias, incluindo o “João Batalha”, nosso primeiro besouro.
A aprendizagem continua ocorrendo satisfatoriamente. Dividimos os grupos e os temas
(por sorteio) para a apresentação dos trabalhos na VIII Mostra de Conhecimentos,
ficando cada grupo com um líder:
1. Alex, Tamiris, João Valério (Piolho)
2. Beatriz, Ana Cristina, Paulo Gabriel (Besouro)
3. José Rian, Blenda, Taynara (Barata)
4. Marcus Phelype, Wercules, Janara (Cupim)
5. Geison, Mêmorah, Kelvin (Cigarra)
6. Vitória, Olivan, Pedro Henrique (Formiga)
7. Regina, José Victor, Marcos da Silva (Abelha)
8. Nathália, Paulo Henrique, João Cayro (Mosca)
9. Lorrane, Áquila, Marcos Paulo (Grilo)
10. Thaís, José Henrique, Perla (Libélula)

Os alunos ficaram empolgados com a divisão do trabalho. O Marcus Phelype (líder do


grupo do CUPIM) trouxe textos da Internet para aprofundar o estudo e disse:
- “Ah, eu sou o líder e tenho que saber mais.”
As atividades propostas pelas professoras estagiárias Ester e Sabrina continuam muito
boas e desafiadoras para os alunos, tanto no conteúdo espe-cífico do projeto, quanto
na leitura e na escrita.
Nossa dúvida, aquela relacionada ao sono dos insetos foi esclarecida pela Sabrina com
a leitura de um texto informativo sobre o assunto.

26.10.06 - Hoje foi feita a revisão sobre o CUPIM e os alunos “quebra-ram a cabeça”
para montar (em grupos) os quebra-cabeças dos insetos.
Eles diziam estar muito difícil, especialmente os grupos do CUPIM, BESOURO e
CIGARRA, mas todos conseguiram montar. Foi uma atividade desafiadora e
envolvente.

27.10.06 - Foi emocionante a despedida das estagiárias Ester e Sabrina; alguns


alunos choraram de saudade. Sabemos que todos nós aprendemos muito nesses dez
dias e elas deram uma grande contribuição para o nosso projeto.

30.10.06 - Continuamos com as atividades do projeto, aprendendo um pouco mais


sobre a MOSCA. Os alunos ficaram eufóricos e, no momento do lanche, não permitiam
que as moscas pousassem nas bolachas. Quando isso ocorreu, a Ana Cristina
imediatamente jogou uma das bolachas no lixo dizendo que a mosca tinha pousado e
deixado cocô que estava nas suas pernas.
A novidade de hoje é que os líderes dos grupos levaram os vidros identi-ficados para
coletar os insetos: besouro, cupim, abelha, libélula, mosca, piolho, formiga, grilo,
cigarra.

31.10.06 - Com a ajuda da Professora Regiane organizamos os insetos que tínhamos


e os trazidos pelos alunos Nathália (moscas) e Lorrane (grilos) para a secagem. Os
alunos ficaram empolgadíssimos com mais essa etapa do projeto. Durante a aula e o
processo de secagem surgiu uma conversa entre a Nathália e a Regina sobre como a
primeira tinha conseguido pegar as moscas. Nathália dizia ter tentado pegá-las à noite
por estarem mais sossegadas, mas conseguiu somente de manhã, com a ajuda de seu
irmão. Regina, por sua vez, dizia que à noite era muito perigoso.

01.11.06 - A nossa frustração foi devido ao processo de secagem dos insetos. Muitos
que havíamos coletado, no processo, perderam algumas peças e não servem para o
insetário. Só restou um besouro e uma joaninha doados pela servidora Ana Neves.
Além disso, os alunos estavam muito ansiosos por conta do anúncio da “Festa dos
Bichos” (pernoite na escola) e querem fazer as tarefas apressadamente. Mas, apesar
de tudo isso, vamos fazer nova uma co-leta coletiva com os alunos e novo processo de
secagem.

03.11.06 - Contando com o apoio da Professora Regiane, fizemos hoje uma coleta nas
proximidades da escola e na casa da aluna Beatriz. Os alunos ficaram empolgados a
ponto de espantar as borboletas e libélulas que vimos no caminho. Contudo,
conseguimos coletar formigas (Alex, Taynara, Regina, José Rian), cupins (Beatriz e
Regiane), grilo (Beatriz), percevejos (Geison) e moscas (Nathália). Foi uma
experiência bastante significativa para todos. Víamos isso no empenho das crianças
durante a coleta. Percebemos também que as crian-ças têm demonstrado não ter
medo dos insetos, o que é bastante comum na idade em que estão, apesar da
curiosidade peculiar. E as descobertas não param aí:
- “Eu pensava e ouvia as pessoas dizerem que os insetos não são inteligentes, mas
descobri que são muito inteligentes” (comentário da aluna Vitória, após ouvir a
explicação da professora Regiane que o grilo fêmeo não aceita qualquer canto do grilo
macho como cortejo; tem que ser um canto forte e vi-brante).

06.11.06 - Após as explicações da professora Regiane sobre o grilo e das atividades


que executou com a turma, iniciamos o nosso livro dos insetos. Algumas crianças não
se dedicaram à tarefa como esperávamos. Avaliamos que isso se deu pelo pouco
tempo que tivemos para fazê-la após o recreio. Tentaremos novamente!

07.11.06 - Os insetos que coletamos e os que recebemos (doação dos servidores da


escola) passaram pelo processo de secagem e, desta vez, todos foram aproveitados.
Pedimos que alguns alunos fizessem novamente a página do livro referente ao grilo.
Quando fizeram a página da cigarra, já capricharam mais. A da libélula então, foi mais
caprichada ainda. As crianças se interessaram muito por esse inseto. O aluno Marcus
Phelype descobriu na palavra libélula o nome Lula, dizendo ser o nome do Presidente
da República. Disse então que se tirássemos essa parte (lula) do nome libélula,
teríamos o nome lib (uma marca bastante conhecida de refrigerante da região).
Relatavam já ter visto as libélulas em processo de cópula (transando, na linguagem
utilizada pelo aluno Geison). Quanto ao termo utilizado pelo aluno, esclarecemos que
há um nome específico, que é cópula, para denominar o que ocorre entre o macho e a
fêmea do inseto estudado para que ocorra a reprodução. O Alex dizia já ter visto
também. As perguntas feitas por eles expressam o conhecimento que têm e as suas
dúvidas. Ex: a aluna Thaís Cristina pergunta: “Como o macho da libélula passa o ovo
dele para a libélula fêmea?”

09.11.06 - Numa roda de conversa com os alunos pensamos e avaliamos sobre o que
temos aprendido. A partir das perguntas: Vocês estão gostando do projeto “Bichos
Esquisitos”?; Por que?; O que mudou, o que vocês mais gostaram de estudar?, as falas
foram surgindo:
- “Tem algumas pessoas que não fazem parte desse projeto. Perguntei para uma
menina se ela estava estudando sobre os insetos. Ela disse que estava estudando
sobre outra coisa, que eu não me lembro mais.” (Vitória)
- “Tudo mudou comigo, porque eu não sabia e agora sei, para falar. O projeto tá cada
vez melhor, cada vez mais interessante”. (Alex)
- “O projeto tá muito divertido porque estudar insetos fica cada vez mais inte-ressante,
que estou aprendendo”. (Marcus Phelype)
- “Tá bom o projeto porque nós estamos aprendendo muito. Eu gostei mais de estudar
a libélula”. (Nathália)
- “Eu gostei dos insetos: do serra-pau, da barata, do rola-bosta, da formiga e da
mosca”.
(Wercules)

10.11.06 - Fizemos mais duas páginas do livro dos insetos (mosca e besouro) e
apresentamos para os alunos o PUÇÁ (rede entomológica ótima para se capturar
insetos em vôo, como libélulas, borboletas e mariposas, moscas, abelhas, vespas,
cigarras e outros.), após uma coleta feita pelas professoras Bernadete e Regiane nas
imediações da escola.
Temos bastante trabalho ainda para fazer, principalmente revisar as fichas dos insetos
selecionados e fazer os cartazes dos mesmos com as infor-mações corretas. Nosso
insetário está quase pronto e desperta a curiosidade de crianças e adultos na escola.

13.11.06 - No início da nossa aula houve muitos comentários sobre o filme “Vida de
Inseto”, veiculado pela televisão, no domingo à tarde. Lemos para os alunos o texto
científico “O namoro dos Bichos” (Revista Ciência Hoje das Crianças, Ano 19, Nº 171,
Agosto de 2006) e eles descobriram que lemos esse tipo de texto para termos
informações. Na fala e entendimento da aluna Beatriz: “Lemos para aprender”. O
interesse dos alunos era visível quando manusearam outras revistas (Ciência Hoje das
Crianças) colocadas à disposi-ção; e descobriram informações importantes,
especialmente sobre os insetos (o assunto que mais chamava a atenção dos mesmos).
Logo nos mostravam as revistas dizendo: “Olha aqui professora!” (falando sobre as
reportagens que abordavam sobre a formiga, a barata, entre outros). Estudamos sobre
o piolho e a curiosidade dos alunos estava aguçada para saber mais a respeito deste
inseto. Perguntas surgiam a todo instante. Foi necessário fazer um combinado (que as
perguntas fossem feitas após as explicações da professora) para que conseguíssemos
concluir o assunto.
- “Como o piolho nasce na nossa cabeça?” (Áquila)
- “O piolho tem larva? Tem ninfa?” (Beatriz)
- “De onde vem o piolho?” (Vitória, que perguntou varias vezes, queren-do na verdade
saber como apareceu o piolho, de onde ele veio).
Percebemos nessas perguntas o uso de termos que antes não faziam parte do
vocabulário das crianças, como: ninfa e larva.
Aproveitamos o entusiasmo da turma para realizar o passa ou repassa (perguntas e
respostas sobre o piolho, de forma lúdica), com a anotação dos pontos referentes aos
acertos.

14.11.06 - As coletas de insetos dos servidores da escola, de seus parentes e dos


alunos, em suas casas e na própria escola, continuam. Hoje recebemos um besouro
“rola bosta” (Irlândia), um grilo grande (Raimundo) e uma barata-d’água gigante (Tita,
parente da professora Maria Antonia Batalha), além de grilos menores (Pedro Henrique
e Áquila, que infelizmente perderam partes de suas estruturas).

15.11.06 - Lemos o texto “Insetos no cardápio” (Ciência Hoje das Crian-ças, Ano 19,
Nº 173, Outubro/2006) e fizemos a página do piolho para o livro dos insetos;
concluímos os cartazes para a VIII Mostra de Conhecimentos, com a ajuda de alguns
alunos (desenhos da barata, da cigarra e do grilo). Notamos que neste aspecto
(desenhar) os alunos avançaram bastante. Antes não gos-tavam (preferiam atividades
de leitura e de escrita) ou desenhavam apressadamente, mas agora demonstram ter
prazer ao fazer os desenhos e capricham nos detalhes da estrutura externa dos
insetos. A partir das informações que têm sobre os insetos, os alunos também estão
mais atentos às ilustrações de livros, cujos personagens fazem parte dessa classe de
animais. Quando lemos histórias como “A cigarra Zizi”, “A cigarra e a formiga”, “Dona
Baratinha”, entre outras, observam e questionam, por exemplo, por que os insetos das
ilustrações têm somente quatro pernas; outras vezes, dizem que o texto fala que
comem determinados alimentos, mas que não é verdade. Exemplo: A cigarra tomando
sopa dada pela cigarra ou a folha como alimento da formiga e não dos fungos que
alimenta para depois comê-los, como acontece com uma espécie de formiga estudada.
Estamos felizes com os resultados do projeto, que tem oportunizado desafios e muito
conhecimento. Sabemos que alguns alunos (mais precisamente cinco) estão dispersos
e faltam muito às aulas, e por isso têm apresentado um baixo rendimento em relação
ao que esperávamos deles e do que são capazes. Mesmo assim não deixam de dar
suas contribuições para o projeto.

16 a 18.11.06 - Continuamos construindo o nosso livro passo a passo (hoje foi a vez
da página da abelha). Fizemos também o vocabulário do projeto (novas palavras
aprendidas e seus significados - escrita espontânea das crianças):
1. ABDOME – “É uma parte do corpo do inseto”. (Nathália)
2. CÓPULA – “Namoro dos insetos” (José Rian)
3. INSETOS – “Animais que têm três partes: cabeça, tórax e abdome”. (Áquila)
4. INVERTEBRADOS – “Animais sem coluna” (Regina)
5. LARVA – “A reprodução antes da mosca virar pupa” (Alex)
6. LÊNDEAS – “Os ovos do piolho”. (José Henrique)
7. NINFA – “Antes do adulto”. (Nathália)
8. OOTECA – “É a bolsa da barata, que carrega os ovos da barata”. (Marcus Phelype)
9. OPERÁRIA – “Trabalha para a abelha, formiga, cupim”. (Thaís Cristina)
10. PUPA – “Antes da mosca”. (João Cayro)
11. REPRODUÇÃO SEXUADA – “O macho precisa de uma fêmea e a fêmea precisa de
um macho”. (Paulo Gabriel)
12. SEIVA – “Alimento da cigarra”. (Marcos da Silva)
13. TÓRAX – “Parte do corpo dos insetos antes da cabeça” (Kelvin)
14. ZANGÂO – “O namorado da abelha. Só serve pra namorar e ter filho” (Bea-triz)
15. OLHOS COMPOSTOS – “Olhos grandes, cheios de facetas.” (Mêmorah)
16. OCELOS – “Olhos pequenos.” (José Rian)
17. BACTÉRIA – “É um bichinho que estraga os nossos dentes e os restos de comida.”
(Perla)
18. ANTENA – É uma parte do corpo e fica na cabeça do inseto.” (Beatriz)

As coletas por alunos, servidores e pais de alunos estão cada vez mais freqüentes.
Recebemos três tão esperadas libélulas. Infelizmente a que foi coletada pelo Paulo
Gabriel na escola perdeu parte da sua estrutura. Enquanto preparávamos as duas
restantes para a secagem, com o auxílio dos alunos, eles davam verdadeiras aulas de
como é a estrutura e como se dá a cópula desses insetos tão curiosos, falando uns aos
outros. Estamos concluindo a organização do insetário (Ufa! Que trabalheira!) e
tivemos o nosso tão aguar-dado “pernoite”, com a realização da festa dos bichos.
Acampamos na escola entre os dias 17 e 18/11/06 e, como esperávamos, foi uma
festa: momentos inesquecíveis de comunhão, amizade e muita brincadeira. Essa
atividade, pelo seu significado, não será esquecida pelas crianças.

20.11.06 - Recebemos com muita alegria a carta das Professoras Sabri-na e Ester,
que estagiaram na turma e nos ajudaram muito no projeto. Lemos para os alunos;
eles ficaram emocionados e contentes por saber que as professoras estagiárias
gostaram da experiência de ensinar e de aprender com a turma, de terem participado
do início do projeto “Bichos Esquisitos”, que estão bem, estudando muito e que
poderão vir na nossa VIII Mostra de Conheci-mentos. Continuamos o livro dos insetos,
fazendo as páginas da formiga e do cupim e cada momento dos alunos na escola é
marcado pelo tema “insetos”. A reação que têm ao ver alguma espécie de inseto no
pátio é coletar e examinar para verificar se são mesmo insetos. E nos encanta o
vocabulário que utilizam em suas conversas nesses momentos. Pensamos que o ritmo
intenso de trabalho no projeto cansaria os alunos. Mas, isso tem favorecido muito.
Trabalhamos o tempo todo na sala de aula.
A aprendizagem e a saudade que ficaram... Construímos a última página do nosso livro
(21.11.06) e fizemos a capa, para, posteriormente numerar as páginas e encadernar.
Olhávamos para os alunos e pareciam estar numa grande oficina (todos trabalhavam
em ritmo acelerado). Mais uma vez estávamos atentas às suas conversas. O
vocabulário que agora utilizam é riquíssimo! Além disso, o aprendizado da leitura e da
escrita avançou bastante com as ati-vidades realizadas. Comparando os resultados da
penúltima (junho/julho 2006) e da última avaliação de escrita (outubro e novembro
2006) vemos claramente esse avanço: 21 alunos alfabetizados, 05 com hipótese
silábica-alfabética, 02 com hipótese silábica com valor sonoro, 01 aluno com hipótese
silábica sem valor sonoro e 01 pré-silábica devido a dificuldades na fala.
Fizemos a avaliação do projeto com as crianças e cada aluno desenhou do seu jeito os
insetos para decorar a sala de aula para a mostra de conhecimentos. Cada parte dos
insetos estava destacada. Até parecia uma brincadeira com os “bichos esquisitos” por
meio dos desenhos. Então, chegamos ao final do nosso projeto: insetário pronto e a
participação na VIII Mostra de Conheci-mentos da Escola. Os alunos explicaram aos
visitantes o que tinham aprendido sobre cada inseto estudado. O que mais chamava a
atenção dos visitantes com certeza era o insetário. Eles diziam admirados: “Foram os
alunos que fizeram?!” Durante a Mostra de Conhecimentos, apresentamos a peça “D.
Baratinha”. Foi um sucesso! Havia visitantes de outra escola, pais de alunos e servi-
dores prestigiando.

Anexo B

Projeto: Imagens no Tempo


Professor: Rogério Andrade Bettoni
Disciplina: Artes – Ensino Fundamental II (7ª e 8ª séries) - Colégio Efigênia Vidigal

JUSTIFICATIVA

O Cinema e o Vídeo talvez sejam as modalidades artísticas pelas quais o ser humano
se sinta mais atraído no mundo atual. Logo após o surgimento do Cinema, no final do
século XIX, seu desenvolvimento se deu em grandes proporções e, principalmente nas
últimas décadas, popularizou-se de tal forma que muitos países possuem destaque na
produção cinematográfica mundial.

O Cinema desperta tanto interesse do público quanto da crítica não só por ser
acessível, mas também por ser a única modalidade artística que possui em si mesma
os atributos das outras artes, como a Pintura, a Literatura, a Música. Ao fazer um
apanhado das artes e unificá-las em uma só linguagem, o Cinema atinge um público
de diversas idades e gostos e cria um universo único, em que a Fotografia dá lugar ao
movimento, a Literatura dá lugar aos diversos tipos de roteiro e gêneros
cinematográficos, a Música (ou a ausência dela) dá ritmo à seqüência de imagens. Por
esses e outros motivos, o Cinema tornou-se uma das maiores culturas de massa do
planeta.

Em meados da década de 50, quando a indústria fonográfica assume uma maior


proporção, e também a produção videográfica, foi preciso a criação de um novo veículo
de comunicação que atendesse ao interesse dos músicos e gravadoras, auxiliando-os
no processo de divulgação de seu trabalho. Com o advento do cinema de animação e
as experimentações do cinema com a música, surge o videoclipe, que a princípio
mostrava somente o artista cantando sua música, sem maiores preocupações com
cenário, figurino e narrativas. Os videoclipes serviam, assim, como simples artifício
para divulgação da imagem do artista, já que na época as turnês mundiais eram
difíceis de ser realizadas. Portanto, um artista se tornava conhecido por dois fatores
básicos: seus vídeos, que eram exibidos em canais de TV por todo o mundo, e pelas
fotografias estampadas nos discos de vinil.

Não pretendemos aqui mostrar a história do Cinema e do Vídeo, mas apenas criar um
contexto que nos permita entender como a produção audiovisual funciona nos dias de
hoje e, conseqüentemente, como ela interage com outros campos do saber e das
Artes, o que justifica a realização do projeto em sala de aula. Com o advento de novas
tecnologias, a produção audiovisual se tornou tão massificada e com linguagens tão
diversas que se torna quase impossível separar os traços de cada tipo de produção
audiovisual. No presente projeto, trabalhamos então com três tipos de obra
audiovisual: o videoclipe, o documentário e o vídeoarte, cada qual com seu traço
peculiar, mas abarcando diversos aspectos da linguagem cinematográfica. A partir da
compreensão destes fatores, desenvolvemos um projeto de aulas práticas, com o
intuito de fazer com que os alunos pudessem produzir obras audiovisuais de autoria
própria, com um discurso crítico, um roteiro bem elaborado, mesmo que intuitivo, e
uma seqüência lógica de imagens.

Durante a segunda etapa do ano letivo de 2006 do Colégio Efigênia Vidigal, na


disciplina Artes, Módulo II (Artes Visuais), os alunos da sétima e oita-va séries tiveram
a oportunidade de estudar, teoricamente, um pouco da história do Cinema e do Vídeo,
analisando os principais fatores do desenvolvimento dessas artes com a exibição de
trechos de filmes e alguns dos vídeos mais importantes e inovadores da história.
Desde o início das aulas, pudemos perceber que os alunos encaravam o Cinema e o
Videoclipe como simples entretenimento, e tinham certa dificuldade de fazer
interpretações das imagens que viam, relacionando-as com outros aspectos do roteiro
ou até mesmo com as informações mostradas através das letras das músicas dos
videoclipes exibidos em aula. A partir desse levantamento, pudemos esboçar todo o
panorama teórico e metodológico que iria nortear tanto as aulas teóricas quanto as
aulas práticas, a serem desenvolvidas futuramente, em um módulo separado do
horário normal das aulas. O intuito do curso como um todo (aulas teóricas e práti-cas)
era proporcionar ao aluno um contato maior com diversos tipos de lingua-gem
artística, relacionando-as com os aspectos verbais e não-verbais do nosso cotidiano, e
fazer com que a obra audiovisual, proveniente de qualquer meio, fosse encarada como
um âmbito de informação e crítica, e não somente como entretenimento ou como uma
informação passageira. Assim, o presente projeto visou o desenvolvimento de aulas
teóricas e práticas, separadas em dois momentos distintos: a) aulas teóricas,
ministradas dentro da disciplina Artes, no horário normal das aulas; b) aulas práticas,
visando a uma produção audiovisual de grande porte, ministradas durante um
“workshop” para os alunos interessados em aprimorar seus conhecimentos.

O desenvolvimento artístico e audiovisual dos alunos é importante a partir do


momento em que encaramos o mundo atual como inserido em um contexto de
tecnologia em constante evolução, a partir do qual a linguagem videográfica torna-se
mais acessível através da mídia televisiva e a internet. Tendo isso em mente,
procuramos auxiliar os alunos na descoberta de possibilidades de conhecer o mundo
através das próprias ferramentas que eles utilizavam como fonte de divertimento,
muitas vezes sem perceber que possuíam um grande tesouro em mãos. Nesse
contexto, uma lata de metal pode se tor-nar uma câmera fotográfica experimental;
uma webcam, muito utilizada pelos alunos no MSN (programa usado para conversas
instantâneas na internet), pode se tornar a principal ferramenta para a produção de
vídeos; o site “You Tube”, um dos mais visitados por nossos alunos, pode se tornar
uma valiosa fonte de pesquisa jornalística e de informações; uma câmera fotográfica
digital pode se tornar um instrumento para a captação de imagens criativas do cotidi-
ano; e um simples videoclipe de um artista preferido pode se transformar em um
universo de possibilidades de interpretação literária e artística. Assim, utilizamos as
ferramentas que já despertavam interesse nos alunos, bem como todos os esquemas
de conhecimento que eles já possuíam, para estabelecer uma relação com um novo
horizonte de possibilidades artísticas.

OBJETIVOS, CONTEÚDOS CURRICULARES E METODOLOGIA

Visto que o desenvolvimento do presente projeto se deu de forma dinâmica, desde o


seu início até a sua finalização, e visto que suas etapas foram intercambiadas, muitas
vezes elaboradas durante o processo de ensino e aprendizagem, optamos por fazer o
relato dessa experiência relatando os objetivos, os conteúdos curriculares e a
metodologia dentro de um só tópico.

O início do projeto de Iniciação à Produção em Vídeo ocorreu durante as aulas teóricas


da disciplina Artes, módulo II, com os alunos de 7ª e 8ª séries. Os tópicos estudados
perpassaram diversos temas, desde o surgimento do cinema propriamente dito até os
dias atuais, bem como o videoclipe, estudando linguagem videográfica (ângulos,
planos seqüenciais, roteiro), gêneros e etapas de produção de uma obra audiovisual.
Procuramos uma interpretação semiótica em todos os vídeos exibidos, tentando
estabelecer a relação das idéias presentes nas imagens com outros campos do saber,
tratando a imagem como símbolo que pode nos remeter a diversas interpretações. Por
pura falta de espaço, em vez de elucidarmos cada tópico estudado no curso, vamos
nos concentrar no presente projeto em mostrar todo o âmbito teórico do curso em
linhas gerais.

No início da 2ª etapa, fizemos um levantamento de todo o conhecimento que os alunos


tinham sobre o Cinema e sobre o Vídeo. Percebemos que, na maioria dos casos, o
Cinema era visto somente como um veículo de entretenimento, e o Vídeo era encarado
somente como Videoclipe. Além disso, as ferramentas utilizadas pelos alunos, como a
internet e alguns sites que eles já conheciam, poderiam ser transformadas em grandes
fontes de pesquisa, desde que eles tivessem a orientação necessária de como utilizá-
las seguindo um propósito determinado. Assim, elaboramos uma meta a ser cumprida,
com objetivos básicos, levando em conta todo o conhecimento que pretendíamos
proporcionar aos alunos durante as aulas, a saber:

a) mostrar aos alunos um pouco da História da Fotografia e do Cinema, e seu


concomitante desenvolvimento ao longo do último século;
b) fazer com que os alunos compreendessem que o cinema e a produção videográfica
são modalidades artísticas de extrema importância histórico-cultural, e que exercem
papel fundamental na cultura moderna;
c) mostrar que a percepção cinematográfica depende de nossa sensibilidade e abertura
às obras em questão e que, através da reflexão e da interpretação semiótica, podemos
desenvolver um questionamento crítico do cinema e do vídeo;
d) levar à compreensão dos alunos os processos necessários para a realização de um
filme, desde a elaboração do roteiro à sua finalização e distribuição;
e) proporcionar aos alunos conhecimentos básicos de estética da imagem, bem como
conhecimentos técnicos e teóricos para a elaboração de vídeos lógico-narrativos;
f) mostrar que a intuição e a sensibilização artísticas são fundamentais para qualquer
tipo de filmagem e fotografia, mesmo que amadoras.

A partir do estabelecimento dos objetivos, dividimos o planejamento das aulas teóricas


em três momentos que se intercalavam, sempre aliados às aulas expositivas.
Num primeiro momento, para que os alunos entendessem o funcionamento da
produção audiovisual, foi preciso mostrar a eles como a fotografia surgiu e, como
conseqüência dela, o Cinema e o Vídeo. Três fatores foram de extrema importância
para que o Cinema se tornasse o que é hoje, a saber: a) a descoberta, pelo físico
Plateau (1801-1883), do tempo exato que uma imagem demora para se dissipar da
retina do olho humano ou, em outras palavras, descobrir a “persistência retiniana”
(uma imagem demora, em média, 1/10 de segundo para desaparecer na nossa
retina); b) a descoberta da fotografia propriamente dita, e o seu desenvolvimento até
chegar ao formato tradicional que conhecemos hoje (sensibilização da luz em um
filme, ou negativo), e c) a partir da descoberta de Plateau, desenvolver um
equipamento que retirasse 24 fotografias por segundo e que, colocadas em
movimento, reproduzissem as cenas numa tela como se fossem reais. Percebemos
nesta etapa uma relação interdisciplinar com conhecimentos do campo das Ciências
(a), da História (b) e da Matemática (c).

Na prática, utilizamos uma técnica alternativa de fotografia, chamada “pinhole”


(buraco da agulha) para demonstrar como a fotografia era feita nos seus primórdios.
Os alunos usaram uma lata de “nescau” pintada de preto no seu interior,
transformando-a no que chamamos de “câmara escura”. Na frente da lata foi feito um
furo com a ponta de uma agulha, que serve como a “objetiva” da câmera fotográfica. E
no interior da lata, os alunos colocaram papel fotográfico virgem. Com a câmera
pronta, eles fizeram a pesquisa de diversos tipos de linguagem e efeitos especiais que
pudessem ser utilizados nas fotografias e, a partir de suas próprias idéias, cada aluno
fez uma fotografia. Na semana seguinte, montamos um pequeno “laboratório de
fotografia” na escola, e os alunos puderam revelar suas próprias fotografias de
maneira convencional, experimentando assim um processo que é utilizado há décadas,
e que hoje vem sendo substituído pela fotografia digital. Uma vez reveladas as
fotografias, os alunos dividiram-se em grupos na sala de aula, e trocaram as
fotografias entre si. A idéia desta atividade era fazer com que as imagens falassem por
si mesmas, levando os alunos a refletirem sobre o seu próprio fazer e sobre possíveis
“interpretações semióticas” de cada imagem. A atividade culminou numa pequena
exposição das fotografias no site da Escola, bem como num painel montado no
corredor das salas de aula da Escola.

Num segundo momento, procuramos estabelecer uma relação direta do Cinema com o
Videoclipe, mostrando aos alunos que suas linguagens são, o tempo todo,
interdependentes. Para isso, fizemos uma análise de um filme do cineasta alemão Tom
Tykwer, intitulado “Corra Lola, Corra”. Tom Tykwer é reconhecido por sua inovação no
que diz respeito à mistura de linguagens em seus filmes, apresentando-nos sempre
uma narrativa que instiga nosso raciocínio e senso crítico. O filme em questão nos
mostra diversos tipos de linguagem, como animação, cenas filmadas com câmeras
caseiras, seqüências feitas com fotografias, narrativa de tempo circular, e ainda
diversos tipos de enquadramentos e estilos de filmagem. Tendo em vista o fato de que
o filme trata, além de outros temas, da questão da percepção e do tempo, fizemos
uma discussão interdisciplinar do filme durante uma aula de Filosofia, o que propiciou
aos alunos uma visão mais crítica do Cinema, e fez com que eles estabelecessem
diretamente uma relação de todo o conteúdo técnico com as imagens. A partir disso,
os alunos produziram um relatório minucioso do filme, relacionando todos os conceitos
estudados em sala de aula.

No terceiro e último momento das aulas teóricas, desenvolvemos com os alunos uma
técnica alternativa e bem artística de criação de vídeos: o “stopmotion”. Esta técnica
de produção de vídeo é, em termos, a mesma técnica utilizada nos filmes de
animação. Os alunos foram divididos em grupos de cinco pessoas, e cada grupo tinha a
função de desenvolver uma idéia simples a partir de um tema qualquer. Sem a
utilização de uma filmadora, os alunos tinham que fazer um vídeo de 30 segundos, no
mínimo, a partir de fotografias retiradas com uma câmera digital. Dessa forma, assim
como nos filmes de animação, para cada segundo de vídeo os alunos tinham que tirar
uma média de 10 fotografias, que seriam posteriormente colocadas no computador
para que o movimento do vídeo fosse dado. Para avaliar esse trabalho, levamos em
conta não só o domínio da técnica explicitado durante as aulas, mas também a
criatividade dos alunos, e a lógica na elaboração dos vídeos.

Assim sendo, percebemos que todos os recursos didáticos utilizados durante as aulas
são de fácil acesso para os alunos; a maioria dos alunos já conhecia a técnica da
“câmera escura”, muito utilizada nas aulas de Ciências para estudar a ótica e o olho
humano, bem como já sabiam operar uma câmera fotográfica digital. O que fizemos foi
demonstrar que estes instrumentos, já presentes no cotidiano dos alunos, podem
servir de ferramentas para reproduzir verdadeiras obras de arte.

Dando continuidade ao projeto, elaboramos uma espécie de “workshop” com o objetivo


de colocar em prática tudo o que foi estudado pelos alunos durante a segunda etapa,
dando a oportunidade aos interessados de desenvolver melhor suas habilidades
produzindo uma obra audiovisual. Foram montadas duas turmas de produção em
vídeo, que desenvolveram diferentes tipos de linguagem e de produto. As aulas da
oficina foram ministradas todas as terças e quartas, das 14h30min às 16h30min, com
duas turmas distintas, que chama-remos de turma A e turma B, respectivamente.

Com a Turma A, foi realizado um videoclipe da música “Estudar pra quê?”, da banda
mineira Pato Fu. Nosso intuito com a execução deste videoclipe foi questionar,
diretamente, o mundo tecnológico em que vivemos. Depois de uma discussão do tema
e da letra da música com os alunos, chegamos ao argumento inicial do vídeo, que
consiste em mostrar a desumanização do homem em função da tecnologia: a cada dia
nos isolamos mais num universo tecnológico, abdicando assim das nossas relações
sociais, e vivendo em detrimento de uma informação passageira, absorvida através da
mídia e da internet.
Com a Turma B, foi realizado um videoclipe da música “The Big Jump”, da dupla
Chemical Brothers. Nosso intuito com a realização desse vídeo foi experimentar a
linguagem artística, demonstrando que a semiótica e a interpretação dos símbolos
podem ser extremamente coerentes durante a construção narrativa. A idéia foi
demonstrar o destino de alguém sendo decidido através de uma partida de xadrez, e
sua trajetória na tentativa de impedir que o jogo se finalizasse. Utilizamos, para a
realização do vídeo, uma interpretação semiótica da simbologia das peças do xadrez,
bem como a movimentação de palavras na tela.

Como objetivos gerais das aulas práticas, tivemos os seguintes:


a) Proporcionar ao aluno habilidades extracurriculares, bem como a atuação em um
campo de atividade moderno e tecnológico;
b) Desenvolver a capacidade de planejamento, organização e fortalecer suas
habilidades artísticas;
c) Ensinar ao aluno toda a teoria ministrada durante as aulas com os alunos de 7ª e
8ª, desde a elaboração de um plano de filmagem até a finalização de um vídeo;
d) Fazer com que o aluno compreenda todas as etapas de produção de um vídeo, bem
como a organização lógica das imagens para que uma obra visual possua uma
narrativa;
e) Proporcionar ao aluno a inserção direta em todas as funções necessárias para a
produção de uma obra audiovisual, a saber: iluminação, câmera, roteiro, produção,
edição e direção, agindo como assistente geral de direção de vídeo.

Durante as primeiras aulas da Oficina, elaboramos um planejamento geral das


atividades desenvolvidas em cada turma. A Escola providenciou a compra do material
necessário, como fitas VHS, iluminação, tripé, DVDs graváveis, entre outros, para que
os alunos pudessem experimentar uma inserção direta em uma produção de vídeo
semi-profissional. O planejamento de execução dos vídeos foi feito a partir do seguinte
esquema:
a) Idéia: a idéia ou o tema principal que move a produção de um vídeo;
b) Elaboração do Roteiro: momento em que a idéia toma forma propriamente dita.
Nesta etapa definiram-se os personagens, os estilos de filmagem, e o que se
pretendia, de fato, passar para o público com a obra;
c) Plano de Filmagem: nesta parte aconteceu a elaboração de uma planilha, onde
foram especificados todos os locais de filmagem, bem como suas datas, horários,
diálogos, personagens, figurino, cenário, tempo de cada cena, etc.;
d) Captura das Imagens: filmagem propriamente dita;
e) Decupagem das Imagens: nesta etapa, os alunos assistiram ao material gravado,
selecionando o que seria útil para a finalização da obra;
f) Pré-edição: as imagens foram transferidas para o computador e ordenadas em
pastas e sub-pastas;
g) Edição: montagem das imagens no computador, aplicação de efeitos, inserção de
trilha sonora, de legendas ou frases de texto etc.;
h) Finalização: Gravação em mídia DVD.

É importante ressaltar que as etapas de produção de uma obra são inter-cambiáveis, e


sugerem que os participantes tenham conhecimento de diversas áreas do
conhecimento, como a matemática, a filosofia, o português, as artes etc. Assim,
acreditamos que, com a produção dos vídeos durante as aulas, os alunos tiveram a
oportunidade de vivenciar e unificar conhecimentos de outras áreas, estabelecendo
uma relação de dependência entre eles.

Assim, acreditamos que com esse projeto pudemos proporcionar aos alu-nos uma
experiência nova, na qual eles tiveram a oportunidade de desenvolver atividades
variadas, inseridas em seu próprio contexto histórico-cultural, exercitando diversas
habilidades artísticas e colocando em prática o conhecimento absorvido em outros
campos do saber.

AVALIAÇÃO E AUTO-AVALIAÇÃO

O objetivo geral do presente projeto não era fazer um estudo profundo da História do
Cinema, nem mesmo levar à exaustão a prática cinematográfica. Queríamos, sim,
proporcionar aos alunos um ambiente onde eles pudessem questionar, analisar, criticar
e discutir acerca dos filmes e vídeos exibidos durante a aula, e ainda pudessem trazer
sua própria experiência com obras audiovisuais para serem discutidas e analisadas em
classe, com o grupo. Ao fazer uma autocrítica final com relação aos produtos finais do
projeto, acredito ter cumprido este objetivo no que diz respeito à uma análise geral do
grupo.
O progresso dos alunos foi acompanhado durante todo o decorrer do projeto, com a
observação do desenvolvimento deles em sala de aula e com a mudança dos
paradigmas que eles tiveram no final das aulas. As ferramentas que eles utilizavam
para assistirem a vídeos na internet, como site “You Tube”, por exemplo, já vem sendo
utilizado pelos alunos como fonte de pesquisa de diversas referências do Cinema e do
Vídeo. Pude observar também uma diferença muito grande quando questionei os
alunos sobre os vídeos que assistem, e se existe uma narrativa presente neles. O
processo de avaliação se deu atra-vés de duas provas constituídas por questões
abertas e fechadas, bem como uma avaliação de seu desempenho perante os
trabalhos em grupo, exercícios e vídeos realizados. Com os resultados que eles tiveram
nas provas e em todos os exercícios propostos, pude perceber que o grupo soube
aproveitar com maestria todo o conteúdo lecionado, principalmente através do domínio
de conteúdo que o grupo teve ao fazer seus próprios vídeos, utilizando a técnica de
“stop motion”.

Duas dificuldades que os alunos tiveram, mas que foram superadas no decorrer das
aulas, estavam relacionadas ao respeito pela arte videográfica e à compreensão de
alguns conteúdos teóricos quando levados para a prática. Por se tratar de um tema
que despertou diretamente o interesse dos alunos, durante as aulas realizadas na sala
de multimeios da Unidade III, os alunos ficavam extremamente agitados e ansiosos,
encarando a exibição dos vídeos como pura diversão. Para sanar este problema,
durante as aulas procurei manter o mesmo mapeamento utilizado durante as aulas
regulares, o que fez com que os alunos se concentrassem mais nas imagens exibidas e
se dispersassem menos. Quanto à compreensão do conteúdo, procurei demonstrar
durante a exibição dos vídeos e filmes como determinados efeitos de gravação ou de
edição eram feitos, o que proporcionou aos alunos uma imersão direta no contexto de
produção cinematográfica, bem como uma melhor relação de conteúdos. A utilização
de instrumentos complementares de trabalho também fo-ram fundamentais, e por isso
procurei compartilhar com os alunos conhecimentos de vários campos do saber,
fazendo o uso de livros, revistas, fotografias, sites na internet e vídeos de produção
própria.

Todas as produções realizadas pelos alunos podem ser usadas para demonstrar que os
objetivos gerais do projeto foram atingidos. Recebi como trabalho final vídeos com os
mais variados e criativos temas e feitos com diferentes ferramentas, desde a
manipulação de bonecos de playmobil como uma animação com bonecos feitos de
massa de modelar. Em relação às aulas puramente práticas, os alunos demonstraram
ter compreendido todos os conteúdos das aulas teóricas, mostrando uma grande
facilidade em criticar com argumentos fundamentados as obras que viam, e também
fazer uma interpretação semiótica e simbólica das imagens que criam e que observam.

A análise que faço do meu desempenho pedagógico é positiva. Consegui demonstrar


para os alunos que a produção de uma obra visual não é tão simples quanto
pensamos, e que envolve uma produção muito grande, além de dedicação e
sensibilidade artística. Muitos alunos, no decorrer da execução do projeto, diziam que
não imaginavam poder estudar sobre este tema numa escola, o que demonstra se
tratar de um assunto que, além de despertar a curiosidade e o empenho dos alunos,
fez com que eles se interessassem cada vez mais pelas aulas. O retorno que eles
deram durante as aulas foi muito bom para que eu percebesse a importância do meu
trabalho como professor, e per-cebesse que a arte pode ser desenvolvida onde menos
esperamos. Assim, acredito que meu desempenho, aliado ao retorno e à troca de
conhecimento com os alunos, fizeram aprimorar minhas técnicas, e desenvolver outros
tipos de visão e interpretação com relação a diversos filmes e vídeos que estudamos
durante o projeto.

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