Você está na página 1de 2

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

E
ncontramo-nos em um contexto
onde a maioria das escolas, princi- Maristela do Nascimento Rocha,
palmente as públicas, possui uma Aline Ribeiro Sabino e
educação de baixa qualidade. Uma das Mikiya Muramatsu
causas dessa situação é a falta de condições Instituto de Física, Universidade de São
financeiras para adquirir materiais neces- Paulo, São Paulo, SP, Brasil.
sários à confecção de experimentos que E-mail: mmuramat@if.usp.br
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
ofereçam aos alunos uma compreensão
mais qualitativa e conceitual de determi-
nado fenômeno, onde o aluno possa vi-
sualizar o conceito ensinado em sala de
aula e não fique apenas na memorização
de fórmulas que para ele são aplicações
matemáticas sem muito sentido. Assim, Figura 1 - Esquema de montagem para a
este artigo propõe a construção de um realização do experimento.
experimento simples de colisão inelástica
com materiais de baixo custo e tem como Procedimento experimental
objetivo calcular o coeficiente de atrito
entre superfícies utilizando as leis de con- Calculando o coeficiente de atrito
servação da quantidade de movimento e dinâmico
de energia, além do conceito de trabalho
Com o auxílio da balança, meça a
de forças dissipativas. O equipamento
massa M do suporte de madeira (incluindo
consiste em um suporte de madeira onde
a massa de modelar) e a massa m da esfera
é acoplado um pêndulo com uma esfera
metálica. Levante a esfera metálica, man-
metálica. O suporte é colocado em uma
tendo-a no mesmo plano definido pelo fio
superfície de madeira, entre os quais se
e a haste metálica (Fig. 2). Meça a variação
deseja medir os coeficientes de atrito está-
h da altura do centro de massa da esfera.
tico e dinâmico. Para que a colisão entre o
Solte-a e meça o deslocamento x do siste-
suporte e a esfera metálica seja inelástica,
ma. Repita os procedimentos pelo menos
coloca-se no primeiro uma porção de
cinco vezes e obtenha valores médios de x
massa de modelar, a fim de absorver toda
e h. Este artigo tem como principal objetivo propiciar
a energia no impacto, como mostra a
Através da altura h e utilizando o teo- aulas interativas através da construção de um
Fig. 1. experimento simples de colisão inelástica, com
rema da conservação da energia mecânica
é fácil verificar que o módulo da velocidade o qual é possível calcular o coeficiente de atrito
Materiais
entre superfícies utilizando as leis da conservação
da esfera no momento da colisão vale
• suporte de madeira em formato de de energia e da quantidade de movimento, além
L . (1) do conceito de trabalho e forças dissipativas. Para
• haste metálica isso construiu-se um aparato experimental com
• massa de modelar Usando o teorema da conservação da materiais de baixo custo, a fim de viabilizar a
quantidade de movimento é possível obter sua aplicação em escolas públicas. Após efetuar
• esfera metálica maciça
a velocidade do conjunto após a colisão. É as medidas e aplicar os conceitos envolvidos,
• fio de náilon compararam-se os valores obtidos com os espe-
• tábua de madeira (o coeficiente de atri- importante ressaltar que após o choque a rados teoricamente para o coeficiente de atrito
to será calculado entre a madeira do esfera passou a fazer parte do conjunto, entre duas superfícies de madeira. O resultado
suporte e a tábua) ocorrendo assim uma colisão inelástica. foi próximo do esperado, o que valida o método
• uma régua milimetrada Temos então experimental e o torna uma boa opção a ser
• uma balança Pi = Pf , desenvolvida e discutida em sala de aula.

Física na Escola, v. 11, n. 1, 2010 Calculando o coeficiente de atrito 9


Figura 4. Esquema de forças para o cálculo
do coeficiente de atrito estático.

Resultados e discussão
Figura 2 - Esquema de procedimento experimental. Utilizando as Eqs. (6) e (7), os valores
médios obtidos para os coeficientes de
mvv e = (m + M)v
v f. de atrito dinâmico entre as superfícies. atrito dinâmico e estático foram, respec-
Como há apenas velocidade na direção tivamente, 0,19 e 0,21. A título de compa-
horizontal Calculando o coeficiente de atrito ração, os valores encontrados em tabelas
mve = (m + M)vf. estático foram 0,20 e de 0,25 a 0.50, respectiva-
E então obtemos a velocidade vf de Para iniciar esta etapa, incline o plano mente. Analisando os resultados, vê-se
partida do conjunto gradativamente até que o sistema fique na que os valores teóricos são próximos dos
iminência de deslizar (Fig. 3), onde qual- tabelados. Essa variação pode ser explicada
. (2) quer mínima influência externa provoca o pelo fato de ter sido utilizada neste expe-
escorregamento no plano. Como veremos rimento uma madeira mais lisa do que a
A partir dessa velocidade é possível no próximo item, o coeficiente de atrito utilizada para o mesmo cálculo nos livros
calcular a quantidade de energia transfe- estático depende apenas da tangente do ân- didáticos, o que ocasiona a diminuição do
rida ao sistema gulo entre a tábua e o solo. Portanto não é coeficiente de atrito entre as superfícies.
necessário repetir os procedimentos de 1 a
. (3) 3 do item anterior, podendo ser utilizado Conclusão
apenas o suporte de madeira ou um bloco Este experimento é uma alternativa
Substituindo as Eqs. (1) e (2) na qualquer do mesmo material. Meça a altu- interessante para professores do Ensino Mé-
Eq. (3) temos ra h’ e a distância d conforme o esquema dio, uma vez que utiliza material de baixo
abaixo, para que seja possível calcular a custo e de fácil acesso. Além da atividade
. (4) tangente do ângulo θ. Repita os procedi- experimental, a parte mais interessante é a
mentos pelo menos cinco vezes e obtenha aplicação das leis de conservação de energia,
Após o deslocamento x, o conjunto um valor médio. da quantidade de movimento e do teorema
para e, portanto, a variação de energia será Para calcular o coeficiente de atrito es- da energia cinética. É uma boa oportuni-
tático é necessário analisar as forças envol- dade para se discutir as principais fontes
vidas. Para esta situação, temos o diagra- de energia mecânica que intervêm neste ex-
. (5) ma de forças mostrado na Fig. 4. perimento e como elas podem ser manipu-
Como não há movimento na direção ladas. Seria interessante também uma justi-
perpendicular ao deslocamento, a força re- ficativa do papel da força de atrito no coti-
O sinal negativo indica que houve dis-
sultante é nula. Na direção do movimento, diano: em algumas situações é desejável
sipação de energia através do atrito entre
pode-se considerar a projeção em x da for- aumentar o coeficiente de atrito entre as
as superfícies. Por outro lado, a variação
ça peso como sendo igual em módulo à for- superfícies e, em outras, minimizá-lo. Dis-
da energia cinética é igual ao trabalho da
ça de atrito, pois o corpo está na iminência cutir a natureza das forças de atrito e ações
força de atrito
de deslizar. Logo, temos a seguinte expres- para aumentar e/ou minimizar sua atua-
. são ção deveria ser o ponto de partida para jus-
-P sen θ = -μeN, tificar a medida dessa grandeza.
Pelo referencial adotado, a força de
-(m + M)g sen θ = -μe(m + M)g cos θ, Saiba mais
atrito é negativa. Temos que μd e N (força
P.G. Hewitt, Física Conceitual (Ed.
normal) são constantes, então Bookman, Porto Alegre, 2002).
. (7) P. Tipler, Física 1 (LTC, Rio de Janeiro,
, 2000).
R.A. Serway e .W. Jewett Jr, Princípios
onde de Física - Mecânica (Ed. Pioneira
N = (m + M)g. Thomson Learning, São Paulo, 2004).
Então D. Halliday, R. Resnick e K.S. Krane,
Física 1 (LTC, Rio de Janeiro, 2003).
,
Sites indicados
www2.fc.unesp.br/
. (6) experimentosdefisica/
www.if.usp.br/profis/sites_fte.html
Dessa forma, utilizando a Eq. (6) e medindo Figura 3 - Sistema na iminência de deslizar
www.sbfisica.org.br/fne/
o deslocamento x, pode-se obter o coeficiente com a inclinação θ do plano.

10 Calculando o coeficiente de atrito Física na Escola, v. 11, n. 1, 2010

Você também pode gostar