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ESCOLA SECUNDÁRIA ARTÍSTICA ANTÓNIO ARROIO

ANO LECTIVO 2008/2009

DISCIPLINA DE PORTUGUÊS

CARTAS DE AMOR

Profª. Elisabete Miguel


Ana Francisca Silva
10ºF Nº5

1
Escolhi fazer este trabalho - “Cartas de Amor” - por várias as razões, entre as quais,
talvez a mais importante, porque penso que as cartas de amor têm tendência a
desaparecer, sendo substituídas pelas tecnologias e quis colher dados mais concretos.
Hoje, já são muito poucas as pessoas que ocupam minutos do seu tempo a pegar numa
caneta, a tirar um papel e escrever simplesmente “Amo-te”. Preferem fazê-lo
pessoalmente, ou escondendo-se através do tão conhecido Messenger.
Para conseguir atingir os meus objectivos, abordei algumas pessoas para responderem a
um pequeno questionário e para participarem numa actividade inserida no mesmo.
Pretendi assim, não só ficar a saber a opinião das outras pessoas mas também abordar o
tema cartas de amor, tendo feito pesquisa em autores portugueses, acabei por
seleccionar textos de António Lobo Antunes e de Fernando Pessoa.

Cartas de Amor

Duas Cartas de Amor de António Lobo Antunes

“7.1.71

Meu Amor

Escrevo-te durante uma breve paragem na Madeira, já cheio de saudades. Tenho


dormido um pouco e não tenho enjoado. A comida é óptima, há orquestra a tocar, e o
tabaco americano custa o mesmo que o Sagres. (…)

Devemos chegar a Luanda a 15 (…)

Quando chegar a Luanda espero escrever de novo. Coragem e paciência, como tens tido
até agora. Mil beijos para ti e para o nosso filho. Não te esqueças de estudar e de ter
coragem e paciência. Lembra-te de mim.

António

PS. Segundo os rumores que aqui correm, devo ficar na CCS o que seria menos mau.
(…) Vamos ver…

Beijos, beijos e beijos. (…)”

2
II

“Minha namorada querida

Aqui cheguei, finalmente, a Gago Coutinho, depois de uma viagem apocalíptica, como
nunca pensei ter de fazer em qualquer época da minha vida: partimos às 3 horas da
manhã dia 22, em autocarros tipo Claras, de Luanda para Nova Lisboa, através de um
cenário maravilhoso, mas que à 23ª hora começou a cansar-me.

Chegámos de madrugada a Nova Lisboa, dormimos nas camionetas, e às 3 da tarde do


dia 29 (ou 23?), depois dos 600 km de autocarro, meteram-nos no comboio para o Luso:
2 dias de viagem em vagões de 4ª classe – essa famosa invenção dos ingleses para os
habitantes do 3º mundo, e que a companhia dos caminhos-de-ferro de Benguela
inglesmente adoptou - em grandes molhos de pernas e de braços, de armas e de cabeças.

Essas carruagens possuem apenas 3 únicos bancos longitudinais: dois ao correr das
janelas e o último, duplo, ao centro, como uma risca ao meio. Como faltavam vagões ,
assistiu-se então a um espectáculo indescritível: de todo o lado surgiram membros que
pareciam não pertencer a nenhum corpo. Cheguei a coçar a minha cabeça com uma mão
alheia. Aí dormia, ou fingia dormir, e comia as conservas que inundavam o chão de
latas e de molhos, e que me estragaram completamente as vísceras. Deportados judeus
para um campo de concentração nazi.

E depois veio o inferno, ou inferno maior, o sétimo inferno inversamente comparável ao


7º céu de Maomé: agarraram em nós e meteram-nos em camionetas de carga para os
500 km minados que separam Luso de Gago Coutinho: dois bate-minas à frente (duas
berliets carregadas de sacos de areia) e depois uma extensa fila de carros, onde
seguíamos de arma apontada numa tensão de ataque iminente.

Felizmente não houve minas nem emboscadas, mas aconteceu uma coisa horrível: a
camioneta em que eu seguia, a última (por sorteio) partiu a direcção, a uma velocidade
considerável, e esmagou-se numa vala. Eram 21: três braços partidos, e pernas, várias
outras lesões sortidas, e eu com seis pontos no lábio e 3 na língua: ainda não a sinto.
Caímos todos uns por cima dos outros, e pensei que tivesse sofrido mais do que isso
porque o corpo dava-me a sensação de se encontrar multiplamente rachado.

Mas tudo passou, continuo a resistir, e amo-te.

Isto é o fim do mundo: pântanos e areia. A pior zona de guerra de Angola: 126 baixas
no batalhão que rendemos, embora apenas com dois mortos, mas com amputações
varias. Minas por todo o lado.”

27 de Janeiro de 1971

Lobo Antunes

3
Cartas de Amor de Fernando Pessoa

Começo por transcrever o conhecidíssimo Poema do seu heterónimo Álvaro de Campos

Todas as cartas de amor são


Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,


Como as outras,
Ridículas.

As cartas de amor, se há amor,


Têm de ser
Ridículas.

Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia


Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.

A verdade é que hoje


As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas,


Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)

4
e prossigo, com uma carta de Fernando Pessoa para a sua amada, Ophélia

Ophéliazinha:

Para me mostrar o seu desprezo, ou pelo menos, a sua indeferença real, não era preciso
o disfarce transparente de um discurso tão comprido, nem da serie de «razões» tão
pouco sinceras como convincentes, que me escreveu. Bastava dizer-mo. Assim, entendo
da mesma maneira, mas doe-me mais.
Se prefere a mim o rapaz que namora, e de quem naturalmente gosta muito, como lhe
posso eu levar isso a mal? A Opheliazinha pode preferir quem quizer: não tem
obrigação - creio eu - de amar-me, nem, realmente necessidade (a não ser que queira
divertir-se) de fingir que me ama.
Quem ama verdadeiramente não escreve cartas que parecem requerimentos de
advogado. O amor não estuda tanto as cousas, nem trata os outros como réus que é
preciso «entalar».
Porque não é franca comigo? Que empenho tem em fazer sofrer quem não lhe fez mal -
nem a si, nem a ninguém-, e quem tem por peso e dor bastante a própria vida isolada e
triste, e não precisa de que lha venham acrescentar creando-lhe esperanças falsas,
mostrando-lhe afeições fingidas e isto sem que se perceba com que interesse, mesmo de
divertimento, ou com que proveito, mesmo de troça.
Reconheço que tudo isto é cómico, e que a parte mais cómica de isto tudo sou eu. Eu-
proprio acharia graça, se não a amasse tanto, e se tivesse tempo para pensar em outra
cousa que não fosse no sofrimento que tem prazer em causar-me sem que eu, a não ser
por amá-la, o tenha merecido, e creio bem que amá-la não é razão bastante para o
merecer. Enfim...

Aqui fica o «documento escripto» que me pede. Reconhece a minha assinatura o


tabelião Eugenio Silva.

1.3.1920

[Primeira carta de Fernando Pessoa à Exma Senhora Dona Ophélia Queiroz]

As próximas cartas de amor foram expressamente


escritas para este trabalho

5
Almada, 17 de Novembro de 2008

Meu amor,
Há quanto tempo! Há quanto tempo não nos vemos, não nos sentimos, não nos rimos ou
apenas nos amamos.
Sinto falta da tua presença, por mais breve que esta seja.
Estou aqui a lembrar-me de como me sinto quando te aproximas.
Sinto-me quente com as orelhas a ferver, borboletas na barriga e as pernas a tremer.
Sinto-me como o nada, em que tenho medo de dar um passo ou não sei se devo levar as
mãos aos bolsos. Mas depois quando me piscas o olho ou, como é agora, perguntas
como estou, fico sem saber o que dizer e faço apenas um sorriso tímido e escondo-me
de forma a que me vejas bem.
E quando já não estás, penso há quanto tempo isto dura. Esta paixão apenas consentida,
sabida e criada por mim.
Amo-te platonicamente

Silvson

6
Lisboa, 25 de Novembro de 2008

Querido amado,
Estás a ler-me com atenção?
Provavelmente enlouqueci de novo ou de vez.
Lembro-me que já faz um ano.
Há um ano atrás eu era, provavelmente, mais sossegada e menos sociável, intimidada
pelos gozos dos meus colegas de turma.
A mãe e o Carlos casavam-se e eu perdia-me pelos sonhos de rapariga que sou e que
está a entrar na vida adulta.
Há um ano, não sonhava eu com a minha esperança em entrar na Escola de Música do
Conservatório Nacional e não sonhava eu que este objectivo não seria alcançado.
Passado um ano, escola nova, Lisboa pela mão e amigos novos, vivo cada momento
como se fosse o último e considero-me louca por escrever neste papel, uma carta,
sabendo que não vai ser enviada e que será apenas para queimar a saudade, saudade essa
que não existe e que é fruto da minha cabeça.
Amo-te, como sempre, muito e platonicamente

Silvson

7
Cartas na Música

Green Day – Dearly Beloved

8
Querido Amado

Querido amado, estás a ouvir?


Não me consigo lembrar de nenhuma palavra que estavas a dizer
Estamos loucos?
Ou estou perturbado?
O espaço que existe entre a loucura e a insegurança
Ó terapia, podes, por favor, preencher o vazio?
Estou doido?
Ou estou simplesmente a divertir-me?
Ninguém é perfeito e eu continuo acusado
Pela necessidade de uma palavra melhor e esta é a minha melhor desculpa

Tony de Matos - Cartas de Amor

Como jurei,
Com verdade o amor que senti
Quantas noites em claro passei
A escrever para ti
Cartas banais
Que eram toda a razão do meu ser
Cartas grandes, extensas, iguais
Ao meu grande sofrer

Cartas de amor
Quem as não tem
Cartas de amor
Pedaços de dor
Sentidas de alguém
Cartas de amor, andorinhas
Que num vai e vem, levam bem
Saudades minhas
Cartas de amor, quem as não tem

Porém de ti
Nem sequer uma carta de amor
Uma carta vulgar recebi
Pra acalmar minha dor
Mas mesmo assim
Eu para ti não deixei de escrever
Pois bem sabes que tu para mim
És todo o meu viver

Cartas de amor
Quem as não tem
Cartas de amor
9
Pedaços de dor
Sentidas de alguém
Cartas de amor, andorinhas
Que num vai e vem, levam bem
Saudades minhas
Cartas de amor, quem as não tem.

*** lamento, mas, apesar de ter tentado muito, não consegui colocar aqui a música.

Carta de amor da Princesa Diana para Dodi Fayed

As cartas de amor da princesa Diana para o seu


namorado Dodi Al Fayed foram reveladas pela
primeira vez durante o interrogatório de uma
das suas amigas íntimas, Rosa Monckton, no
novo inquérito sobre a morte dos dois.

Numa das cartas, Diana agradece a Al-Fayed


pelos seis dias passados juntos no iate dele.

«Esta (carta) vai com todo o amor deste mundo


e, como sempre, um milhão de agradecimentos por trazer tanta alegria para a vida desta
rapariga em particular», escreveu Diana.

Questionário acerca das Cartas de Amor


Foi proposto às pessoas que respondessem, a um pequeno questionário sobre cartas de
amor. Idades compreendidas entre os 15 e os 50 anos, não diferenciando o sexo, num
total de 19 pessoas.

As questões eram:

10
 Já recebeu alguma carta de amor?
12 pessoas responderam que já receberam pelo menos uma carta de amor.

 Já escreveu alguma carta de amor?


11 pessoas responderam que já escreveram uma carta de amor.

 Qual é para si, a importância das cartas de amor?


A maioria das pessoas abordadas acham que as cartas de amor transmitem mais
sentimento e que são mais importantes do que sms‟s ou e-mails e que a
caligrafia revela como a pessoa se sentiu ao escrever uma declaração de amor.

 Confrontando as novas tecnologias, acha que é necessário manter a tradição


das cartas de amor?
16 pessoas partilham a opinião de que é vital manter a tradição.

 Acredita que pode existir uma relação, onde o único meio de comunicação
sejam as cartas de amor?
8 pessoas acham que não é possível, 8 pessoas acham que sim, apesar de ser
muito dificíl com as novas tecnologias e 3 pessoas acham que depende de vários
factores como o sentimento.

Seguidamente, foi proposto às mesmas pessoas que fizessem uma carta de amor.
Cada uma escrevia uma frase numa folha A4, dobrava de forma a que o que acabou de
escrever não fosse visível e passava a outro. Isto repetiu-se até que a carta estivesse
acabada.

Transcrevo, agora, o resultado desta „especial‟ carta.

“Meu amor... Tudo o que eu quero é ficar contigo para

sempre... O amor é fogo que arde sem se ver... És me essencial, não me

farto de dizer AMO-TE... Amo-te 25 horas por dia, 8 dias por semana,

5 semanas por mês, 13 meses por ano... És a minha perdição, és a razão do meu

viver... O amor é um doce venenoso... Tenho saudade da tua

pele, dos teus traços, apenas algo que

relembro nos teus lábios... Os teus olhos são como

rúbis que brilham olhando para o meu coração... O teu olhar escuro e
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sombrio faz-me amar-te ainda mais... Amor eterno, és tu meu amor... Quero dizer que

te amo, não sei como começar, pois tenho medo que o meu coração se vá

despedaçar, bate forte o meu desejo, bate forte o coração, quero dizer-te que te

amo... Sinto falta dos teus lábios, do teu olhar, do teu toque, da tua fala

meiga, do teu amor, simplesmente sinto a tua falta...Amo-te!!”

Conclusão
Com este trabalho conclui que, mesmo com as novas tecnologias, as pessoas têm a
preocupação em manter a tradição das cartas de amor, vendo estas como um bem fulcral
à tradição romântica.
Conclui também que algumas pessoas sentem alguma vergonha quando este assunto é
abordado, mas outras sentem-se à vontade. E que as cartas de amor podem ser tomadas
como um bom tema de estudo de relações entre as pessoas.
Gostei de ter feito o trabalho, de contactar diferentes pessoas, a quem agradeço por me
possibilitaram, ao colaborarem na escrita da carta „colectiva‟, ter experimentado, fora da
aula o que aí já tínhamos feito com bons resultados, quando abordámos a construção do
imaginário surrealista através do jogo cadavre exquis – e a CARTA fez-nos rir e
pensar. Oxalá convosco se passe o mesmo.

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