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DE ESTRUTURAS SUBTERRÂNEAS
As questões geotécnicos assumem natural relevância, sendo ainda dado destaque às questões
relacionadas com o desenvolvimento das novas tecnologias para furação e escavação em maciços
rochosos e terrosos. Em concomitância, procuram-se ilustrar alguns exemplos concretos da
experiência portuguesa em grandes empreendimentos subterrâneos, com destaque para a Estação
Baixa-Chiado do Metropolitano de Lisboa e para as obras de reforço do empreendimento
hidroeléctrico de Miranda.
ABSTRACT: In this work important aspects related to the use of the underground space in
several domains are analysed with special emphasis to the innovator aspects related to the
design and construction, namely in the domain of transport systems, energy production, and
storage or repository of products.
The geotechnical issues have a natural importance, being also given special reference to the
issues related to the new technologies of excavation in rock and soil masses. In addition some
instances of the Portuguese experience in important underground undertakings are presented,
with special emphasis to the Baixa Chiado station of the Lisbon Metro and to the Miranda
hydroelectric repowering works.
1. INTRODUÇÃO
À medida que a população aumenta e mais países melhoram o seu nível de vida, o mundo
precisa de mais alimentação e de mais matéria prima para se desenvolver de forma sustentada.
Para que tal seja possível, é necessário a conversão de terrenos agrícolas, o aumento de zonas
urbanizadas e a manutenção e (ou) melhoria do meio ambiente.
Uma maior consciencialização dos problemas emergentes da situação decorrente do actual modelo
de desenvolvimento da humanidade conduz necessariamente à procura de soluções alternativas,
envolvendo uma utilização mais racional dos recursos existentes. Nesse sentido, a consideração do
uso do espaço subterrâneo, também designado de geospaço, nos mais diversos domínios - das vias
de comunicação, ligações rodoviárias e ferroviárias, do urbanismo subterrâneo, metropolitanos,
construção de complexos comerciais, industriais e parques de estacionamento, das infra-estruturas
urbanas, para abastecimento de águas, saneamento básico e outros serviços, da produção de
energia, centrais hidroeléctricas, centrais nucleares e sistemas de armazenagem e produção de
energia, da armazenagem de produtos, quer de consumo, como hidrocarbonetos líquidos e gasosos,
produtos alimentares e água, quer de resíduos, como resíduos de indústrias químicas e nucleares,
das explorações mineiras, da defesa, abrigos e instalações militares - pode constituir uma dessas
soluções alternativas.
O geospaço apresenta propriedades específicas que tornam aliciante o seu uso. Assim, do ponto de
vista estrutural, as obras subterrâneas quando adequadamente projectadas e construídas, não
necessitam de estruturas de suporte muito dispendiosas, face às solicitações provenientes do maciço
envolvente ou das próprias obras. O espaço subterrâneo está envolvido por um meio isolante
excelente, mormente em relação a acções térmicas, de alta e baixa temperatura, a vibrações, sismos
incluídos, e a ruídos. Por outro lado, nestas obras existe plena liberdade para o desenvolvimento de
variadas formas a três dimensões, sem as limitações existentes à superfície, e o impacto ambiental
pode ser consideravelmente reduzido.
Na Figura 1, procura-se ilustrar o espectro possível dos domínios de aplicação no uso do espaço
subterrâneo.
Urbanismo Armazenagem
de Hidrocarbonetos
Energia Depósito
de Residuos
Hídrica Radioactivos
Nuclear Químicos
Térmica Biológicos
Vias de Armazenagem
Comunicação de Energia
Rodoviárias CAES
Ferroviárias Calor
Metropolitanos Hídrica
Canais de navegação
Explorações
Mineiras
Assim, para além da presente Introdução, apresentam-se, no Capítulo 2, aspectos relativos aos
sistemas de transportes subterrâneos com destaque, no caso das ligações rodo-ferroviárias, para
os túneis subaquáticos, imersos e submersos, bem como para os transportes em metropolitano,
sendo dado destaque especial ao caso da Estação Baixa-Chiado do Metropolitano de Lisboa.
2.1. Introdução
Nos últimos anos têm sido construídas obras de grande porte ligadas a travessias subaquáticas e
à execução de comboios de alta velocidade do tipo TGV. Merecem especial relevo o túnel de
Seikan no Japão que liga as duas maiores ilhas setentrionais do Japão, com 54km de
comprimento, sendo 23km sob o mar e com profundidade máxima de cerca de 240m. Na Figura
2, apresenta-se uma planta e um perfil longitudinal deste túnel. Mais recentemente foi
construído o túnel da Mancha, entre a França e a Inglaterra, com uma extensão de 50,5km e
compreendendo dois túneis ferroviários gémeos, a cerca de 40m de profundidade do fundo do
mar, com 7m de diâmetro e um túnel de serviço com 4,5m de diâmetro. Nos últimos anos, os
transportes ferroviários têm aumentado consideravelmente com o desafio da alta velocidade, em
particular na Europa e Japão. Têm sido construídos ou estão em construção obras espectaculares
de grande porte, de que se salienta o túnel de Saint Gothard com uma extensão de 57km, entre a
Suíça e a França e actualmente em construção (Kovari et al., 1999).
Nas ligações rodoviárias, destaca-se, entre os primeiros, o túnel de Monte Branco, com 11,6km
de extensão, cujo recobrimento atinge cerca de 2500m. As principais dificuldades relacionaram-
se com os problemas de afluxo de água, com as elevadas pressões e temperaturas do maciço
rochoso, e naturalmente com os elevados estados de tensão instalados nos maciços. Menciona-
se, ainda, o túnel de Fréjus, ligando a Itália a França, com um desenvolvimento de 12,87km,
recobrimento máximo de 1800m e com a existência de túneis de ventilação dos lados francês e
italiano, perfazendo um total de 2125m. Recentemente, foi construído o túnel Aurland- Laerdal,
na Noruega, que tem a maior extensão mundial, cerca de 24,5km, que entrou em exploração em
1999.
Neste Capítulo, dá-se especial destaque na secção 2.2, para o caso dos túneis rodo-ferroviários,
aos túneis imersos, sub-aquáticos e os túneis flutuantes, que se espera vir a concretizar num
futuro próximo.
Nos grandes meios urbanos, os metropolitanos constituem um dos meios de transporte mais
importantes hoje em dia, pelo que se apresentam na secção seguinte (2.3), sendo dado especial
destaque às obras realizadas na Estação Baixa-Chiado.
2.2.1. Generalidades
Perfil longitudinal
No Quadro 1, procura-se ilustrar túneis rodo-ferroviários de grande extensão que têm sido
executados a nível mundial. Inclui-se, também, o túnel do Rossio por se tratar da obra em
Portugal de maior extensão.
Para além destas soluções, podem ser executados túneis imersos preferencialmente para
estuários, mas, também, para atravessamentos marítimos, que consistem na construção de
elementos pré-fabricados que são instalados no local, em regra, por flutuação e conectados um a
um no solo debaixo de água (Saveur e Grantz, 1997; Tribune, 1999).
ponte suspensa ponte flutuante túnel flutuante submerso túnel sub-aquático
Podem ser utilizadas secções com revestimento interior metálico, exemplificando-se na Figura 5
secções transversais de túneis imersos metálicos, envolvendo secções circulares (unidades em
mm). Para túneis em betão, também têm sido utilizadas secções circulares para tubos simples.
No entanto para túneis imersos habituais as secções são do tipo rectangular e múltiplas, como se
exemplifica na Figura 6.
Figura 5. Secções transversais de túneis imersos metálicos (adaptado de Saveur e Grantz, 1997)
O túnel de maior extensão é o de Drogden, com 3,75km de comprimento, que faz parte da
ligação por via marítima entre a Suécia e a Dinamarca inaugurada em 2000, envolvendo ainda a
realização de uma ilha artificial com 3,85km de extensão e uma travessia em ponte através do
canal de Flinterenden com 7,3km.
Uma discussão aprofundada sobre o projecto destas estruturas subterrâneas encontra-se num
número especial elaborado pela Revista Tunnelling and Underground Space Technology, Vol.
12, nº 2, de Abril de 1997.
As vantagens na escolha de um túnel imerso são expressas de uma forma sintética no Quadro 2.
O estudo das questões ambientais, do risco associado a estas obras, do transporte dos elementos
estruturais e do estudo sísmico pode ser analisado, respectivamente, nas publicações de
Marshall (1997), Saveur (1997), Hakkaart (1997) e Ingerslev e Kiyomiya (1997).
Alinhamento Os túneis imersos (TI) podem ser construídos à superfície, permitindo túneis mais
pequenos e alinhamentos menos inclinados.
Secção Os TI são altamente versáteis sendo particularmente adequados para vias
transversal rodoviárias e ferroviárias, com combinação ou não de ambas as vias.
Profundidade Os TI estão contidos entre 5-30m de água, tendo já sido projectados para 100m.
da água
Condições Os TI podem lidar com a maior parte de tipos de terrenos, incluindo materiais
geotécnicas aluvionares. As situações não adequadas para túneis escavados não põem
usualmente problemas. Em zonas de risco sísmico mostram-se particularmente
adequados.
Disponibilidade Os TI são habitualmente pré-fabricados longe do sítio de imersão, permitindo a
de terreno instalação em zonas urbanas congestionadas.
Reconquista As operações de dragagem constituem uma boa ocasião para redesenhar os perfis
de terrenos dos rios. Por exemplo, os TI são frequentemente associados a projectos de
reconquista de terrenos.
O primeiro túnel a ser construído na Noruega foi o de Vardø em 1982, com secção de 46m2,
inclinação máxima de 8% e cobertura mínima de 35m, sendo a sua extensão de 2620m. Na
Figura 9, apresenta-se um perfil longitudinal do túnel de Flekkerøy, com cerca de 2320m de
extensão, concluído em 1989 (Juncà, 1991). Nestas obras, a realização de instalações de
bombagem em cavidades executadas para o efeito constitui um dos elementos importantes a
considerar no projecto (Figura 10).
A inclinação máxima destes túneis pode ser de cerca de 10% para um tráfego de 1500 veículos
por dia ou de 8% para um tráfego superior, entre 1500 a 5000 veículos dia, sendo, por
consequência, o perfil longitudinal quantificado pelo gradiente máximo e pela cobertura,
normalmente de 50m e com um mínimo de cerca de 30m.
Os túneis submersos podem ser utilizados para atravessar estreitos, fiordes e lagos. Envolvem
uma estrutura flutuante em forma de tubo que se situa a alguma profundidade dentro de água e
suportada por cabos, colunas ou flutuadores. Devem ser suficientemente largos de forma a
permitir o tráfego rodo-ferroviário e sem interferência na navegação (Figura 11).
Embora o conceito de túnel submerso tenha já quase um quarto de século, ainda nenhum país
efectuou uma construção deste tipo. Podem, porém, permitir uma solução mais económica para
uma travessia em alternativa às soluções em ponte ou em túneis subaquáticos (Ahrens, 1997;
Marshall, 1999).
Têm sido conduzidos vários estudos para a realização deste tipo de túneis de que se salientam as
indicadas na Figura 12. Assim, a primeira solução apontada é a do túnel de Høgsfjord, na
Noruega, com uma extensão de 1400m e máxima profundidade de água de 150m, com altura de
água de 20m. Este projecto foi considerado em detalhe e considerado possível (Skorpa, 1999).
Outro túnel, ferroviário, está planeado para atravessar o lago Lugano, na Suiça com 1260m de
comprimento e profundidade máxima da água de 74m, sendo a altura de água no túnel de 6m.
Outra solução foi prevista para atravessamento do estreito de Messina, em Itália, sendo a
extensão de 3000m e altura de água acima do túnel de 55m. Finalmente, a última solução
pontada na Figura diz respeita à travessia da baía de Funka, na ilha setentrional do Japão,
Hokkaido. A largura é de cerca de 30km, sendo a altura de água cima do túnel de 30m.
Na construção, devem ser usadas técnicas similares à dos túneis imersos. Beneficiam, também,
da experiência obtida com a construção de grandes estruturas marinhas para a indústria do
petróleo e do gás. Em princípio, o tubo é instalado numa doca sendo transportado
posteriormente para o local. Podem, também, ser acoplados alguns elementos na doca antes da
sua colocação no local.
2.3. Metropolitanos
Existem metropolitanos em quase todas as grandes metrópoles, como é por exemplo o caso dos
metropolitanos de Londres e de Nova York já centenários. Assim, em Nova York cerca de 4,3
milhões de pessoas utilizam diariamente este meio de transporte. Em Moscovo, regista-se o
maior volume de pessoas anualmente, cerca de 1,3 bilhões de passageiros, a que se segue
Tóquio, Seul,
Túnel de Høgsfjord, Noruega
Cidade do México e Nova York. Existem outros metropolitanos de grande extensão recorrendo
naturalmente ao uso do espaço subterrâneo, como Paris, Londres, Osaka e Hong Kong.
Nalgumas cidades dos USA e da Europa ocorrem metropolitanos que servem populações
inferiores a um milhão de habitantes. Porém, em países da Ásia, da América do Sul e da antiga
URSS, os metropolitanos existem apenas em metrópoles com mais de um milhão de pessoas
(Hanamura, 2001). É, pois, possível concluir que o recurso a metropolitanos utilizando o
geospaço é inevitável em grandes metrópoles.
Está actualmente em construção o Metro Ligeiro do Porto, com 4 linhas e cerca de 70km de
extensão, sendo 7km em túnel, com 66 estações, sendo 10 subterrâneas. Vai, ainda, proceder-se
à reabilitação do túnel ferroviário da Trindade. Serão construídos de raiz 20km, resultando os
restantes da conversão de 50km de linhas já existentes (Figura 14). O sistema do Metro do Porto
desenvolve-se na sua quase totalidade na área metropolitana do Porto, envolvendo os concelhos
do Porto, Vila Nova de Gaia, Maia, Matosinhos, Vila do Conde, Póvoa do Varzim e Santo
Tirso.
Figura 14. Rede do Metro do Porto
A selecção do processo construtivo foi determinada pela experiência de outras obras e com base
em simulações numéricas efectuadas. Várias soluções alternativas foram analisadas de forma a
permitir uma escolha apropriada tendo em vista analisar a estabilidade das sucessivas estruturas
subterrâneas. A Figura 17 ilustra a sequência escolhida para a construção das sucessivas etapas
das duas cavidades.
Figura 15. Estação Baixa-Chiado
A escavação da cavidade do lado ocidental ocorreu em torno do túnel efectuado pela tuneladora,
com a escavação de galerias laterais no topo da caverna e progredindo para as zonas inferiores,
conforme ilustrado na Figura. A região crítica do pilar entre as duas cavidades foi tratada por
intermédio de colunas de jet-grouting (Postiglione et al., 1997).
As convergências foram efectuadas com bases em leituras de cordas em três marcas segundo
triângulos, variando a posição das marcas inferiores de acordo com a sequência construtiva. A
frequência de leituras variou naturalmente em função da distância da frente de escavação em
relação à secção instrumentada. As medições dos níveis freáticos por intermédio de piezómetros
foi também efectuada. No que respeita à superfície, realizaram-se medições de assentamentos
em marcas topográficas situadas em cada uma das secções principais de observação, bem como
em outras marcas topográficas localizadas à superfície do terreno. Foram, ainda, instaladas
marcas e outros dispositivos nas paredes dos edifícios. Para controlo do movimento de fissuras,
nomeadamente da abertura, foram colocados fissurómetros nos edifícios de modo a poder
controlar as aberturas destas descontinuidades, bem como foram instalados selos de modo a
facilitar a leitura das aberturas nas fissuras quando elas ocorriam nos edifícios e deste modo
controlar a sua abertura com as diferentes fases construtivas.
Na zona superficial da estação existem cerca de 30 edifícios antigos entre o Largo da Academia
das Belas Artes e a Calçada do Livramento. Antes da execução das obras, efectuaram-se visitas
de inspecção de modo a avaliar o estado de conservação dos edifícios. Verificou-se que a grande
maioria das construções tinha adoptado um tipo de construção designado de Pombalina,
implementado após o terramoto de 1755. A construção adoptada consistia na adopção de
elementos de alvenaria em pedra com uma estrutura em gaiola com elementos estruturais em
madeira. Os elementos de alvenaria formavam as paredes resistentes na periferia, bem como
paredes dos pisos inferiores, sendo a fundação contínua. A estrutura em madeira era contínua
em cada plano e compreendia elementos resistentes dos pavimentos e paredes internas.
Verificou-se, porém, que inúmeras alterações tinham sido introduzidas nos edifícios durante os
anos, especialmente nos pisos inferiores, devido à criação de espaços comerciais e execução de
caves.
poente (esq.) poente (eixo) poente (dir.) oriente (esq.) oriente (eixo) oriente (dir.)
0
-20
-40
settlements (mm)
calculado (95/8/28)
observado (95/8/28)
shield (calculado - 95/8/28)
-60
shield (observado - 95/8/28)
calculado (97/4/30)
observado (97/4/30)
-80
-100
-120
section
-20
-40
assentamentos (mm)
-60
-80
observado (95/8/28)
shield (calculado - 95/8/28)
-100
shield (observado - 95/8/28)
calculado (97/4/30)
observado (97/4/30)
-120
Ocorriam também outras construções, como palácios e igrejas sem este efeito de gaiola, bem
como alguns edifícios em betão armado recentemente reabilitados na sequência do grande
incêndio ocorrido no Chiado. Sendo assim, algumas construções tornaram-se vulneráveis em
relação a solicitações horizontais e verticais e nomeadamente a assentamentos diferenciais na
fundação. Foram, então, estabelecidos níveis de danos para vários edifícios envolvidos.
Consideraram-se em especial 6 edifícios, que foram objecto de observação cuidadosa e alguns
deles submetidos a trabalhos de consolidação.
Foram utilizadas leis empíricas para estimar os assentamentos com base nos resultados da
observação, considerando funções Gaussianas caracterizadas pelo assentamento máximo Smax e
pela distância horizontal do eixo da cavidade e o ponto de inflexão dos assentamentos i
(AFTES, 1995). Analisaram-se, também, os seguintes parâmetros: volume relativo de
assentamentos à superfície ∆V/V, que depende das condições geotécnicas e do método
construtivo, e K=i/z que depende das características geotécnicas do terreno, sendo z a
profundidade do eixo do túnel. Com base nos parâmetros calculados, foram avaliados os danos
potenciais no final da construção para alguns edifícios seleccionados. A Figura 22 ilustra os
edifícios que foram afectados pelas obras da Estação Baixa-Chiado.
3.1. Introdução
3.2.1. Generalidades
A utilização de centrais subterrâneas oferece, por vezes, consideráveis vantagens do ponto de vista
económico, para além dos benefícios adicionais que este tipo de centrais proporciona, como seja
uma maior segurança, nomeadamente do ponto de vista estrutural, contra sabotagens e um menor
impacto ambiental.
A utilização de centrais hidroeléctricas subterrâneas, que constitui uma parte importante e, por
vezes, determinante no projecto de empreendimentos hidroeléctricos, tem, pois, vindo a ser
incrementado desde que as condições geotécnicas e topográficas sejam adequadas ao projecto deste
tipo de obras (Sousa, 1983; Martins, 1985).
A primeira central subterrânea em poço foi a central Edward Dean Adam, cujo primeiro grupo
iniciou a sua operação em 1895. No entanto, a central mais próxima da concepção das actuais foi a
central de Snoqualmie Falls, concluída em 1899, com uma caverna de 9m de altura, 12m de largura
e 60m de comprimento, localizada a uma profundidade de 80m (Lang, 1971). Na Europa, o
primeiro empreendimento foi o de Verayaz, na Suiça, concluído em 1897. Outros projectos se
seguiram no início deste século, mormente na Alemanha, Suécia, França, Noruega e Itália
(Mosonyi, 1965). Foi somente a partir da década de 50, que surgiram as principais obras realizadas
neste domínio, por considerações já anteriormente referidas.
Em Portugal, o primeiro empreendimento importante com obras subterrâneas foi o de Venda Nova,
concluído em 1927, mas o primeiro empreendimento com central em subterrâneo foi o de
Salamonde, em funcionamento em 1953. Posteriormente, foi inaugurado o escalão de Caniçada,
entrando, no final da década de 50 e início de 60, em funcionamento os aproveitamentos do Douro
Internacional, Picote, Miranda e Bemposta. O empreendimento hidroeléctrico mais importante
construído em Portugal é o do Alto Lindoso, de que se ilustra, na Figura 26, uma perspectiva do
conjunto deste empreendimento (Sousa et al., 1994).
ii) Túneis a baixa pressão e de acesso - Caracterizam-se por um grande desenvolvimento linear e
pequena abertura, não sendo necessário uma prospecção muito completa do maciço, cuja
caracterização é em geral obtida à custa de informação colhida entre sondagens, por vezes bastante
afastadas. Os estudos a empreender devem ser essencialmente conduzidos por forma a estabelecer
critérios de classificação do maciço, que permitam definir classes de comportamento para os
maciços interessados pelas obras. A identificação dessas classes visará, para cada caso, definir
métodos construtivos e suportes mais apropriados.
iii) Poços e túneis a alta pressão - Caracterizam-se, também, por um grande desenvolvimento e
pequena abertura, sendo igualmente pertinentes as considerações referidas para os túneis a baixa
pressão. No entanto, dado o facto de ocorrerem altas pressões, neste caso é da maior importância o
conhecimento rigoroso das propriedades do maciço, visando analisar o comportamento global da
estrutura composta pelo maciço e pelo suporte, no caso de obras revestidas. Ensaios
hidromecânicos devem ser realizados em certos casos.
iv) Chaminés de equilíbrio – Em regra são obras concentradas, em que se desenvolvem equilíbrios
tridimensionais. Poderão, eventualmente, estar inseridas no complexo subterrâneo da central.
Especial atenção deve ser dada às obras com ar comprimido, tendo presente os requisitos já
enunciados anteriormente.
v) Tomadas de água e bocas de montante e jusante – São obras que interessam numa zona do
maciço afectada pelas usuais perturbações de superfície, pelo que se torna necessário efectuar uma
prospecção geotécnica completa e ter cuidados especiais em relação aos métodos construtivos a
adoptar e aos métodos de dimensionamento.
Procura-se ilustrar, na Figura 30, diferentes formas utilizadas para uma central hidroeléctrica em
subterrâneo. Salienta-se a forma tradicional em cogumelo a), a forma ovoide em centrais de grande
dimensão b), as centrais em forma de círculo c) e, ainda, as localizadas em poço, quando a
cobertura da rocha é pequena d) (Sousa et al., 1994).
1 – Albufeira de Venda Nova 1 – Reservatório de Venda Nova 7 – Túnel de descarga
2 – Albufeira de Paradela 2 – Tomada de água superior 8 – Caverna da central
3 – Albufeira de Salamonde 3 – Tomada de água inferior 9 – Sala dos transformadores
4 – Central de Vila Nova 4 – Chaminé de equilíbrio a montante 10 – Galerias de ventilação
5 – Circuito hidr. de Venda Nova 5 – Chaminé de equilíbrio a jusante 11 – Túnel de acesso
6 – Central de Venda Nova II 6 – Túnel de carga 12 – Túneis auxiliares
7 – Circuito hidráulico de VN II
8 – Túnel de acesso de VN II
A caverna da central constitui o elemento primordial de todo o complexo subterrâneo, pelo que se
pode afirmar que, no essencial, o acerto do seu projecto está ligado a uma localização adequada,
sem deixar evidentemente de parte os problemas relacionados com o correcto dimensionamento
dos suportes necessários para assegurar a estabilidade das estruturas subterrâneas (Martins, 1985;
Geoguide 4, 1992; Sousa et al., 1994). Daí que um projecto completo implique um bom
reconhecimento geológico, geotécnico e hidrogeológico do maciço rochoso, onde se irão construir
as obras, compreendendo a disposição das diferentes formações, zonas alteradas ou
descomprimidas, a fracturação do maciço, incluindo sobretudo falhas e diaclases mais relevantes.
As acções determinantes no cálculo destas obras estão, essencialmente, relacionadas com a
libertação do estado de tensão instalados nas fronteiras das zonas a escavar, pelo que se torna
necessário estabelecer previsões sobre o estado de tensão existente nos maciços, baseadas
fundamentalmente em medições efectuadas in situ, e com as acções devidas ao escoamento da
água, sendo muito importante as de natureza hidráulica e mecânica, cujos efeitos podem ser
minimizados na fase de exploração se forem tomadas medidas adequadas, utilizando meios de
intervenção, como seja obras de impermeabilização e de drenagem.
O dimensionamento das obras implica a definição dos suportes a aplicar nas diversas fases
construtivas, sendo baseado em regras de experiências obtidas em numerosas obras, em cálculos de
estabilidade efectuados com base em modelos de cálculo, e na observação do comportamento das
obras durante o processo construtivo.
Fig. 30. Diferentes formas de uma central subterrânea
O aproveitamento hidroeléctrico do rio Douro está dividido nos sistemas nacional e internacional.
Na parte internacional, o problema de descargas de caudais máximos previstos e a forma do vale
levaram à decisão de construir esquemas similares nos escalões de Miranda, Picote e Bemposta.
Foram construídas barragens de betão e circuitos hidráulicos de pequena extensão, cada um
incluindo uma central subterrânea equipada com 3 unidades (Aguiar, 1993; Sousa et al., 1999). O
reforço de potência do aproveitamento hidroeléctrico da parte internacional do rio foi justificado
com base em considerações de natureza económica de forma a evitar o desperdício anual de
energia devido à pequena capacidade de encaixe dos reservatórios face ao caudal da barragem
espanhola instalada a montante e de forma a possibilitar uma melhor distribuição do caudal no
tempo. O empreendimento hidroeléctrico de Miranda foi o primeiro a ser reforçado (Figura 31).
A central II tem uma forma aproximadamente circular devido ao grupo gerador e à necessidade
de comunicações verticais para acesso das pessoas e instalação de cablagens, barras e tubagens.
Para determinados níveis a secção estende-se rectangularmente para jusante de forma a
acomodar os equipamentos. O poço tem uma profundidade de 66m e foi executado por recurso
ao uso de explosivos, tendo a sua secção um raio aproximado de 25m (Figura 33).
O novo circuito hidráulico tem uma tomada de água com uma extensão de 50m, a que se segue
um trecho inclinado com cerca de 60m e, em seguida, uma galeria sub-horizontal com cerca de
155m de comprimento (Figura 33). O túnel sob pressão contém um suporte ao longo de todo o
seu desenvolvimento, com uma secção cujo vão e altura máximas são de 10,8m. O diâmetro
interno da conduta é de 9,7m. Tem um suporte de betão até uma secção intermédia do trecho
inclinado e uma blindagem na restante parte do túnel. O circuito de restituição é de cerca de
49m em planta, com um tecto em forma de arco. O grupo gerador consiste uma unidade Francis
com potência instalada de 190MW.
Figura 33. Circuito hidráulico da central II
A estratégia e o planeamento dos trabalhos foram fortemente condicionados pela presença das
estruturas associadas à central I, cujo funcionamento se manteve ao longo da fase construtiva,
pelo que se revestiu de cuidados especiais e implicou a realização de observações rigorosas do
comportamento das estruturas de modo a garantir a funcionalidade e a segurança das obras
existentes e em construção. Em relação às ensecadeiras, foram cuidadosamente planeadas de
forma a minimizar os custos devidos à paragem das centrais portuguesas de Miranda e de Picote
e da central espanhola de Castro.
No local das obras de reforço, existem formações rochosas formadas por migmatitos e granitos
(Neiva, 1989; Sousa et al., 1999). Os migmatitos são constituídos por um misto de micaxistos e
de granito. Estão muito dobrados, tendo a xistosidade a direcção NW-SE e o seu pendor
dominante é mais frequentemente sub-vertical. As famílias de diaclases são sub-verticais,
existindo uma sub-horizontal, cuja frequência diminui com a profundidade. Os granitos têm
uma textura planar tendo as micas orientadas na direcção dominante NW-SE. Existe um
conjunto apreciável de falhas, sendo as caixas de falha, em regra, de pequena possança, mais
frequentemente entre 0,05 e 0,20m, verificando-se, porém, algumas com espessura de 0,50m.
Estão na maioria dos casos preenchidas com milonite argilosa. A Figura 35 mostra uma secção
longitudinal intersectando a tomada de água, o novo circuito hidráulico e a central II.
Para quantificação do estado de tensão in situ instalado no maciço rochoso, foram utilizados
ensaios SFJ (Small Flat Jack) e STT (Stress Tensor Tube), ambos os métodos de ensaio
baseados em libertação de tensões. Os ensaios foram conduzidos na zona do circuito hidráulico
indicada na Figura 33. Foram efectuados cinco ensaios SFJ nas paredes do circuito hidráulico, a
cerca de meia altura, utilizando rasgos horizontais, verticais e inclinados. Nos rasgos horizontais
as tensões obtidas foram de 0,5MPa no hasteal direito, de 1,0MPa no hasteal esquerdo e uma
pequena tracção no hasteal esquerdo, enquanto que o rasgo vertical apresentava uma pequena
tracção. No rasgo inclinado, obteve-se 2,1MPa. Foi obtido um valor médio de 13GPa para o
módulo de deformabilidade do maciço rochoso, com um mínimo de 9GPa e um máximo de
16GPa. Os ensaios STT foram efectuados num furo sub-horizontal, respectivamente para as
profundidades de 6,4 e 10,5m. O primeiro ensaio foi efectuado numa rocha xistosa para a qual
se obteve um módulo de elasticidade de 14,1GPa. Foram quantificados as seguintes tensões in
situ: 3,6MPa para a tensão vertical; tensões horizontais de 5,7 e de 4,2MPa, respectivamente em
direcções normal e paralela à direcção da galeria. O outro ensaio efectuado numa formação
granítica foi excluído devido à dispersão dos resultados. O módulo de elasticidade determinado
para o granito foi de 20,1GPa. Para avaliação das propriedades mecânicas do maciço rochoso
foi utilizada uma câmara triaxial desenvolvida no LNEC o que tornou possível uma avaliação
mais rigorosa das propriedades do mecânicas do maciço rochoso. Considerando a hipótese de
um estado de tensão axissimétrico, o estado de tensão inicial mais provável adoptado foi
representado por uma tensão vertical de 2,7MPa e por uma tensão horizontal de 7,3MPa. A
relação das tensões horizontal e vertical foi de 2,7, sendo a tensão vertical cerca de 0,9 do valor
do peso do maciço. O estado de tensão obtido está em relativa concordância as tensões obtidas
pelos ensaios SFJ.
Figura 35. Condições geológicas do novo circuito hidráulico e central II
Para as obras de reforço de potencia, foram elaborados dois Planos de Observação, que
implicaram, também, a reactivação de observações na central antiga em forma de caverna. O
primeiro Plano incidiu, essencialmente, na etapa construtiva, enquanto que o segundo teve em
conta os requisitos específicos da entrada em serviço. Ambos os planos foram elaborados
seguindo as recomendações do Regulamento de Segurança de Barragens (Sousa et al., 1999).
Este problema foi também estudado mediante um modelo 3D usando o programa FLAC-3D
(Itasca, 1996). O sistema de coordenadas foi localizado com o eixo z coincidente com o centro
da central II e orientado para a superfície. A parte superior do modelo representava a superfície
livre, a base do modelo, a 139m da superfície da escavação, e os lados estavam fixos. De acordo
com o estado de tensão medido, o modelo foi submetido a um estado de tensão inicial de
σh=2σv. O maciço rochoso foi representado mediante três camadas de materiais com
comportamento do tipo Mohr-Coulomb, com as seguintes características mecânicas: primeira
camada (M1): E=3GPa, ν=0,1, C=0,1MPa e φ=25º; segunda camada (G): E=8GPa, ν=0,15,
C=0,2MPa e φ=40º; terceira camada (M2): E=5GPa, ν=0,1, C=0,1MPa e φ=30º. Para o betão foi
adoptado um material com comportamento elástico de módulo de elasticidade E=15 ou 30GPa,
segundo o tempo decorrido desde a betonagem. A sua resolução considerou as mesmas fases
definidas para o modelo 2D.
-2
-4
-6
Deslocamento (mm)
EB1
-8
-10
Ph=Pv (EB2)
EB2 - 15
-12
-14
Ph=1,5Pv(EB2)
-16
EB2 - 40
-18
Ph=2Pv(EB2
-20 )
dic-91 jun-92 dic-92 jun-93 dic-93 jun-94 dic-94 jun-95 dic-95 jun-96 dic-96
-22
Data
As principais acções induzidas pela entrada em serviço do novo circuito hidráulico tiveram que
ver com as pressões hidrostáticas, interior e exterior, e com as variações da temperatura
causadas pela circulação da água no interior do circuito. Neste período consideraram-se as
seguintes etapas: i) ensaio de carga com enchimento lento do circuito hidráulico – foi realizado
um ensaio de carga no novo circuito hidráulico (a entrada de água foi controlada mediante as
comportas da tomada de água e as observações foram controladas usando soluções analíticas);
ii) etapa intermédia entre o reenchimento e a entrada em serviço do novo grupo (as observações
foram mais espaçadas no tempo); iii) entrada em serviço das obras de reforço de potência (os
efeitos estruturais induzidos pelo funcionamento do novo grupo foram analisados em detalhe e
alguns ensaios específicos foram realizados).
O Quadro 5 apresenta as velocidades máximas medidas nos quatro pontos mais próximos ao
grupo. Para os pontos 5, 6 e 7 as velocidades máximas variaram entre 0,1 e 0,8 µm/s. As
velocidades medidas foram sempre muito baixas, sendo o máximo valor obtido de 1,5 mm/s
para o ensaio IV. De acordo com as normas DIN 4025, estas vibrações podem resultar
incómodas para as pessoas se a sua duração ultrapassar uma hora, mas não afectam as estruturas
(Gomes, 1996).
Tomando como referência as normas suíças SN 640312 e as normas alemãs DIN 4150, que
estabelecem como limite velocidades de 3 mm/s, foi possível concluir que o funcionamento do
novo grupo não afectava a estabilidade estrutural da central II.
4. ARMAZENAGEM DE PRODUTOS
4.1. Generalidades
Na secção 4.2, será dado especial destaque a outras soluções inovadoras para armazenagem de
gás natural em cavernas revestidas (sistema LRC – Lined Rock Cavern). Em 4.3, abordam
alguns aspectos e realizações no âmbito do depósito de resíduos nucleares, pelos desafios
complexos e multidisciplinares que se levantam nestes empreendimentos.
500 444 m Top halite Pure halite
600 Anhydrite
Breccia
700 1425 m
Clays
1475 m
1225 m
800 1300 m Intrusions
1325 m
1000
1100
1200
1300
1400
1500
Figura 41. Esquema típico de cavernas revestidas para armazenagem de gás natural
Recentemente iniciou-se a construção de uma instalação piloto em Halmstad, Suécia, por um
consórcio denominado LRC Demo AB, constituído pelas empresas Gaz de France e Sydkraft. A
instalação em fase de construção tem capacidade para armazenar cerca de 10 milhões de m3 a
uma pressão de cerca de 25MPa. É parcialmente financiada pelo programa Europeu Thermie.
Existe ainda uma instalação a superfície conectada à caverna de armazenagem por um poço
contendo tubos de transporte do gás. Prevê-se que a instalação possa estar em serviço em 2002.
A caverna tem a forma de um cilindro vertical com 35m de diâmetro e 50m de altura, tendo um
domo esférico no topo e uma forma arredondada na base, sendo o recobrimento de maciço
rochoso de cerca de 115m (Figura 42). Toda a caverna vai ter um sistema de drenagem para as
águas afluídas e o gás que eventualmente possa escapar do sistema de contenção. O maciço
rochoso é, essencialmente, constituído por gnaisse de boa qualidade, com resistência à
compressão simples estimada em 189MPa. Apresenta, também, estratos de anfibolite de menor
qualidade geomecânica. O túnel de acesso à caverna tem uma secção transversal de 28m2 e uma
inclinação de 1/7, tendo uma extensão total de cerca de 1040m, tendo a sua construção sido
levada a cabo entre Novembro de 1998 e Novembro de 1999. O poço de acesso tem 1m de
diâmetro e 90m de altura, tendo sido efectuado por uma máquina de escavação contínua. A
escavação da caverna exige grande precisão, sendo a parte mais complicada a construção do
domo esférico. Uma vez concluída a escavação da caverna, procede-se à execução de um
suporte de betão com 1m de espessura, revestido por uma blindagem de aço com 10-12mm de
espessura.
O objectivo desta instalação consiste em demonstrar que é comercialmente viável esta nova
opção de armazenagem do gás natural. As instalações LRC para armazenagem de gás natural
permitem soluções económicas e trabalhar com volumes de armazenagem relativamente
modestos. São complementares das soluções em formações salíferas e podem ser construídas na
grande maioria de países europeus que necessitam de capacidades de armazenagem moderadas.
Possibilitam, ainda, a sua construção a pequenas profundidades sendo a estanqueidade da
armazenagem do gás conseguida à custa do revestimento metálico. O revestimento permite
eliminar situações de risco tais como fugas de gás e impede a sua mistura. O revestimento é
suportado por um suporte espesso de betão armado que transmite as forças provenientes da
pressão do gás para o maciço rochoso. A função do maciço rochoso consiste em resistir à
pressão do gás armazenado (GDF-SKF, 1996; Lemos et al., 2001).
O projecto das cavidades LRC é um desafio importante do ponto de vista mecânico. Devem ser
localizadas a profundidades relativamente reduzidas, entre cerca de 100-200m e com uma
pressão do gás armazenado entre cerca de 10 a 25MPa. A caracterização do estado de tensão in
situ e das propriedades geomecânicas do maciço é fundamental do ponto de vista da estabilidade
das obras. No entanto, a caracterização das propriedades do maciço rochoso deve ser conduzida
com cuidados especiais, posto que o conhecimento da deformabilidade do maciço rochoso é
muito importante para a integridade do revestimento (Tenborg, 1989).
Neste tipo de estrutura, a ocorrência de eventuais sismos pode colocar problemas relacionados
com a propagação de fissuras no maciço rochoso. Apresenta-se, de seguida, um estudo
preliminar de avaliação do comportamento de uma instalação LRC sob acção de um sismo
realizado no LNEC (Lemos et al., 2001). A instalação considerada consistiu na existência de 4
cavernas com diâmetro de 35m e altura de 80m, conforme indicado na Figura 41. Foi
considerado uma rampa de acesso com 6m de diâmetro conectando as cavernas à superfície.
Cada caverna tem um suporte de betão com 1m de espessura, tendo o revestimento blindado
1cm de espessura. Foram considerados 3 sismos artificiais com duas componentes horizontal e
vertical, representando cenários representativos de regiões do continente europeu,
representativos de sismos Moderate Low, Moderate High e High (Costa e Pinto, 1997).
As análises numéricas foram conduzidas com o software FLAC-3D (Itasca, 1996), discretizando
o domínio com elementos do tipo cúbico de 8 pontos nodais. Utiliza um algoritmo de relaxação
dinâmica baseado na integração no tempo das equações nodais de movimento seguindo um
método explícito. São adoptadas fronteiras absorventes, bem como fronteiras simétricas, anti-
simétricas e livres. O modelo estende-se desde a superfície até a uma profundidade de 400m,
situando-se as cavidades entre as profundidades de 150 e 240m, sendo o raio das cavidades
igual a 35m, e representando apenas um quarto do domínio. A Figura 43 evidencia a malha
numérica utilizada com 6882 elementos de 8 pontos nodais e 23445 graus de liberdade,
considerando condições de simetria e anti-simetria. Os sistemas computacionais explícitos
necessitam de pequenos intervalos de tempo, tendo sido considerado um intervalo de tempo de
8,1x10-5 s.
Foram efectuadas inicialmente análises estáticas segundo duas fases, correspondendo a primeira
à escavação da caverna e a segunda à colocação do suporte de betão e aplicação de uma pressão
interna de 20MPa. O estado de tensão in situ foi considerado gravitacional, sendo as tensões
verticais devidas ao peso e assumindo duas hipóteses para a tensão horizontal, igual e três vezes
superior à vertical. A pressurização da caverna induziu tracções generalizadas no suporte de
betão nas direcções radial e axial, com tensões no maciço dependendo a sua extensão das
hipóteses de cálculo admitidas. As análises dinâmicas foram efectuadas assumindo um
comportamento elástico linear para os materiais envolvidos. No entanto, a avaliação de
potenciais danos devido à acção sísmica foram baseadas em cálculos estáticos não lineares
equivalentes. Na Figura 44, apresenta-se a extensão das regiões em tracção em torno da caverna
para uma secção vertical paralela ao plano OYZ (vide Figura anterior), para E=70GPa, ondas do
tipo S e a situação de sismo mais intenso. Resultados relativos à região em tracção em torno da
caverna são sintetizados no Quadro 6. As situações mais desfavoráveis derivam dos cálculos
estáticos equivalentes com sismo do tipo High, particularmente quando o módulo de
deformabilidade do maciço rochoso é igual a 70GPa. Nessa situação (ondas S), o volume da
região em tracção aumenta de cerca de 25%. Os resultados numéricos mostram, porém, o
aumento da zona de maciço em extensão não é acompanhado por uma aumento equivalente nas
deformações em torno da caverna, dado que as tensões induzidas pelas cargas estáticas
equivalentes ao sismo são muito diferentes das devidas à pressurização da caverna. Os
resultados mostram, ainda, que não existe uma interacção significativa entre as cavernas. No
entanto, o efeito das cargas cíclicas no maciço rochoso deve ser investigado, requerendo uma
análise dinâmica não-linear.
Um dos aspectos mais relevantes associados à utilização da energia nuclear, relaciona-se com o
estudo de soluções adequadas para o depósito final de resíduos, nomeadamente de alta
radioactividade, não só pelos delicados problemas tecnológicos que levantam, mas também pelas
fortes reacções emocionais e sociológicas da opinião pública. Uma central nuclear origina vários
tipos de efluentes. Para os efluentes líquidos e gasosos existe legislação e regulamentação
internacional para o seu despejo, não levantando normalmente problemas complexos. Os resíduos
sólidos podem classificar-se em resíduos de baixa, média e alta radioactividade. O primeiro tipo é
armazenado à superfície em bidões tornados estanques; o segundo em profundidade, por exemplo
em minas ou zonas profundas dos oceanos, depois de acondicionados em bidões estanques; os
resíduos de alta actividade são inicialmente armazenados em cubas ou piscinas de paredes duplas
durante alguns anos, para redução da radioactividade e absorção do calor libertado nas
desintegrações, e, posteriormente, após vitrificação ou calcinação, encerrados em cápsulas
(Bubbers e Allison, 1983).
Em relação a resíduos de alta radioactividade, que constituem os produtos do ciclo nuclear de maior
risco e de longo período de radioactividade, dada a quantidade de plutónio que contêm, não existem
regras estabelecidas para o seu depósito. Daí ser necessário assegurar uma protecção das condições
ambientais, pelo que devem permanecer isolados da biosfera por milhares de anos, da ordem de
250000, antes que a radioactividade se reduza a concentrações de níveis inofensivos.
O crescente aumento da capacidade de produção de energia eléctrica pelas centrais nucleares tem
vindo a aumentar a existência destes resíduos. Nos últimos anos, tem sido desenvolvido um grande
esforço na investigação de métodos para o seu acondicionamento. Vários têm sido os conceitos
propostos, desde a utilização de espaços extraterrestres, ao depósito em profundidade nas regiões
polares, para a transformação dos resíduos para formas com menor radioactividade. No entanto, a
sua deposição definitiva em sistemas geológicos terrestres, a grande profundidade, tem merecido
grande atenção como o método mais promissor. Estas soluções são preferidas por envolverem
meios geológicos com períodos de estabilidade que excedem o período do ciclo radioactivo nos
próprios resíduos.
O depósito de resíduos radioactivos implica, pelo seu carácter complexo e multidisciplinar, uma
problemática especial, que se pretende abordar essencialmente nos seus aspectos geológicos e nos
relacionados com a engenharia civil.
A garantia de isolamento dos resíduos radioactivos, isto é, a impossibilidade de que os fluidos
possam transportar os radionuclídeos para a biosfera assenta fundamentalmente no conceito que se
designa de barreiras. Exemplos dessas barreiras são os contentores duráveis à base de ligas
metálicas onde se alojam os resíduos (barreiras técnicas) e o próprio maciço rochoso onde se
armazenam os contentores (barreiras naturais). As barreiras técnicas procuram minimizar a
capacidade de difusão dos produtos compostos armazenados e evitar possíveis reacções entre o
resíduo e o maciço rochoso, que poderiam levar à alteração do maciço circundante. Destacam-se os
processos de fixação dos resíduos por vitrificação e as capas metálicas que formam os contentores.
A formação geológica envolvente funciona como a última barreira que previne e atenua a chegada
de material radioactivo até à hidrosfera e à biosfera. O conceito de barreira natural está, pois,
relacionado com as propriedades do maciço rochoso, de que se destacam as relativas à
permeabilidade, deformabilidade, resistência, condutibilidade e difusibilidade térmica e com
aspectos ligados à estrutura geotécnica do maciço.
O conceito de depósito em cavidades no interior dos maciços foi introduzido pela Dupont
Corporation em 1966 e 1969 (Fairhurst, 1998). A principal preocupação dizia respeito ao facto dos
resíduos poderem fluir das cavidades e vir a contaminar o aquífero no sítio estudado para o efeito.
Os estudos então conduzidos partiram de duas situações extremas, assumindo uma primeira
hipótese conservativa de que o resíduo radioactivo depositado estava directamente conectado ao
aquífero por uma só fractura, considerada condutora. Nesta situação ou numa situação similar de
várias fracturas idênticas ligando o depósito subterrâneo ao aquífero, o fluxo de água contaminada
poderia ser considerável. A outra situação extrema partia de uma hipótese oposta, isto é, que o
maciço rochoso entre o depósito subterrâneo e o aquífero era homogéneo, permeável e obedecendo
o escoamento à lei de Darcy. Estas análises permitiam dar uma ideia do nível de incerteza
associado a estes estudos na década de 60.
Muitos países têm conduzido investigações no âmbito da Mecânica das Rochas para suportar os
seus programas nacionais, envolvendo por vezes custos consideráveis, como é o caso sítio de
Yucca Mountain, USA (Hudson, 1999). O Quadro 7 dá-nos uma ideia sobre as actividades em
curso.
Um dos principais empreendimentos tem sido conduzio pela Suécia (Winqvist e Mellgren,
1988; Stephansson, 1999). A empresa SKB – Swedish Nuclear Fuel and Waste Management
Company é responsável pelo depósito de forma segura de resíduos de centrais nucleares e de
outras indústrias. Tem presentemente um sistema de transporte, um depósito central final para
resíduos de baixa e média radioactividade, designado SFR, e um sistema intermédio para
resíduos de maior radioactividade, designado CLAB, estando prevista a construção de um
sistema final para depósito de grande radioactividade. Este sistema integrado indica-se
esquematicamente na Figura 46.
O depósito SFR está localizado na proximidade da central nuclear de Forsmark, na costa do mar
Báltico a cerca de 300km a norte de Estocolmo, e tem uma cobertura de rocha granítica de cerca
de 50m abaixo do fundo do mar, sendo a altura de água de cerca de 5m (Figura 47). Iniciou a
sua operação em 1988 e tem capacidade para armazenar 60 000m3 de resíduos. Consiste em
actualmente 5 câmaras escavadas na rocha, um silo em forma de poço e 4 cavidades extensas,
que permitem depositar diferentes tipos de resíduos. O silo tem 30m de diâmetro e 5m de altura,
sendo provido de diversas barreiras. Existem 2 túneis de entrada, cada um com 1000 de
comprimento (Stephansson, 1999).
Figura 46. O sistema sueco para depósito de resíduos nucleares (Winqvist e Mellgren, 1988)
Figura 47. Silos para depósito de resíduos de baixa e média radioactividade numa instalação
SFR (Winqvist e Mellgren, 1988)
Figura 48. Sistema intermédio CLAB para depósito de resíduos nucleares na Suécia
(Stephansson, 1999)
Para o sistema de depósito final, diferentes tipos de barreiras têm sido consideradas de forma a
conseguirem a melhor protecção possível a longo prazo. Foram seleccionados inicialmente 6
sítios, dos quais serão ou foram seleccionados dois locais em 2001, devendo os ensaios serem
iniciados em 2002 (Stephansson, 1999). A insvestigação geotécnica deverá ter lugar durante 4 a
8 anos e um estudo detalhado mais 6 a 10 anos. Apresenta-se, na Figura 49, uma perspectiva do
sistema planeado de depósito final, cobrindo uma área de 1x1km2, sendo efectuado um conjunto
de furos de diâmetro igual a 1,5m, furados a partir de galerias a uma distância de cerca de 6m do
depósito dos resíduos.
Detalhes sobre as características deste primeiro sistema de depósito de resíduos nos USA podem
ser obtidos na publicação de Rempe et al. (1998).
Hoje em dia em meios urbanos, as soluções em cut-and-cover têm vindo a ser menos frequentes
em meios densamente populosos por razões ambientais e danos envolvidos e, ainda, devido às
interferências com as infra-estruturas existentes. Surgem, assim, como alternativas as soluções
em túnel por escavação sequencial, também designados NATM, ou utilizando uma escavação
mecanizada por tuneladoras, designadas de TBM (Tunnel Boring Machine). No caso dos
maciços rochosos em meios não urbanos, as escavações processam-se, via de regra, utilizando
explosivos, tendo havido nos últimos anos avanços espectaculares no avanço das escavações e
na melhoria na precisão do alinhamento das perfurações (Assis, 2001).
A comparação de túneis abertos com TBM ou com túneis abertos pelo método sequencial, quer
em rocha, quer em solos, a principal vantagem reside no facto de permitir uma escavação em
secção plena e permitir taxas de progressão, em regra, mais elevadas. No entanto, são
competitivos em termos de custos principalmente em túneis muito extensos e envolvendo
formações relativamente homogéneas. Os métodos sequenciais seguindo os princípio do método
NATM são a solução habitual para túneis de pequena a extensão média, com secções não
necessariamente circulares, para estações subterrâneas, rampas de acesso, apresentando
naturalmente uma maior flexibilidade.
Os túneis com TBM abertos em rocha conseguem ser executados com resultados satisfatórios
até diâmetros de cerca de 12,5m. As tuneladoras têm sido mais aplicadas em túneis superficiais
em solos, mormente me meio urbano, sendo vários os tipos de equipamentos desde tuneladoras
com pressão de face balanceada, com bentonite na face ou com ar comprimido (Almeida e
Sousa, 1998; Assis, 2001).
As máquinas de escavação de túneis podem ser classificadas em função do tipo de método de
escavação (secção total ou secção parcial), do tipo cortantes (rotação ou não rotação) e pelos
métodos de obtenção da força de reacção (ITA, 2000). Recomendações sobre o uso de máquinas
de escavação estão indicadas em publicação do ITA (2000) e da AFTES (2000).
No Japão, têm sido desenvolvidos equipamentos especiais, que resultam da acoplagem de mais
que uma tuneladora de forma a ser possível a execução de escavações com uma geometria
diferente da circular.
Destaca-se a linha Nanboku do metropolitano de Tóquio, com 21,4km. Para a escavação de uma
estação (Shiroganedai) foram utilizadas três TBMs circulares, sendo a máquina central
responsável pela execução do túnel central, com diâmetro de 9,8m e as duas laterais
aumentavam a largura de escavação para 15,6m. Este esquema acoplado escavavou a estação ao
longo de um comprimento de 120m (Assis, 2000; Koyama, 2001). Ilustra-se, na Figura 52, o
esquema de TBM múltiplo.
No projecto de túneis com uso destas máquinas, têm sido utilizadas metodologias de cálculo
baseadas no uso de modelos planos com apoios de mola do tipo Winkler e acções devidas ao
impulso do terreno conforme indicado na Figura 53 (Koyama, 2001).
Outras soluções têm sido desenvolvidas no Japão para outras forma de TBMs múltiplas ou para
outro tipo de secções (Page, 1998; Assis, 2001; Koyama, 2001). A máquina TBM que se
apresenta na Figura 54 permite a execução de uma secção rectangular. Na cidade de Quioto,
encontra-se em montagem uma máquina deste tipo na extensão da linha Tozai com
aproximadamente 2,4km, para uma secção com vão de 9,9m e altura de 6,5m. No entanto, a
parte que irá ser efectuado por esta TBM envolve apenas uma extensão de cerca de 760m.
Envolve um mecanismo com dois cortantes, conforme indicado na parte superior da Figura 54.
Na mesma Figura apresentam-se duas fotografias de montagem do equipamento, que revelam
bem a complexidade de montagem uma máquina TBM deste tipo.
6. CONCLUSÃO
AGRADECIMENTOS
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