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O JOVEM EINSTEIN

17-02-2008

+ Marcelo Gleiser

MARCELO GLEISER,
é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover
(EUA) e autor do livro "A Harmonia do Mundo"

O jovem Einstein

O físico de vinte e poucos anos vestia-se bem e era boa pinta

Talvez uma das fotos mais conhecidas do século 20 seja aquela de


Albert Einstein (1879-1955) com a língua de fora. No seu
aniversário de 72 anos, dia 14 de março de 1951, Einstein estava
cansado dos jornalistas que não o deixavam em paz. Quando
deparou-se com o exército de fotógrafos que o esperava, Einstein
pôs a língua de fora, na esperança que os fotógrafos desistissem
dele e fossem realmente embora.

Grande engano! A imagem tornou-se um ícone do gênio, excêntrico


e brincalhão. Incontáveis filmes, desenhos animados e peças
teatrais exploram o mito do cientista meio louco meio gênio, cabelos
despenteados, sotaque carregado, roupas amarrotadas e sapatos
desamarrados. Poucos sabem que esse Einstein tem muito pouco a
ver com o outro Einstein, o jovem que criou teorias mirabolantes
sobre o espaço, o tempo e a matéria, teorias que revolucionaram
toda a visão que se tinha sobre o cosmo na época.

O jovem Einstein era um rapaz problemático, ao menos segundo os


olhos de seus professores. Não que fosse um mau aluno: em 1896,
graduou-se no então científico com as melhores notas da turma,
mesmo que um ano mais novo. Seu problema maior era o
autoritarismo do sistema educacional europeu. Os professores
achavam-se literalmente intocáveis, incapazes de errar e muito
menos de serem criticados por estudantes metidos.

Pois Einstein era justamente um desses estudantes que vivia


questionando seus professores, tentando encontrar erros em seus
argumentos, sem medo de se expor ou de criar controvérsia. Em
1898, quando cursava o Instituto Politécnico de Zurique, Weber, um
dos maiores físicos da Europa e seu professor, afirmou: "Você é
muito inteligente, mas jamais aceita a opinião dos outros". Einstein
estava irritado com Weber, que limitava-se a ensinar a física pré
1850. Matava aulas e usava as notas de seu amigo Marcel
Grossmann. Weber acabou opondo-se à sua carreira e Einstein não
conseguiu emprego como seu assistente e também ficou de fora de
uma universidade.

Acabou encontrando um emprego no escritório de patentes em


Berna, na Suíça, graças à influência do pai de Grossmann. Nessa
altura, Einstein tinha um círculo de amigos que se reunia sempre
nos cafés da cidade para discutir filosofia e física, a chamada
Academia Olímpia.

Enquanto lia os textos dos grandes filósofos e físicos, Einstein


escrevia também seus próprios artigos. Era clara a sua liberdade e
coragem intelectual. Esse Einstein, de vinte e poucos anos, vestia-
se bem, era boa pinta e engraçado. Em 1904, seu melhor amigo,
Michele Besso, juntou-se a ele no escritório de patentes.

Einstein diria dele: "Não poderia ter encontrado pessoa melhor para
discutir minhas idéias em toda a Europa". Em 1905, Einstein
publicou quatro artigos que mudaram a ciência. A teoria da
relatividade especial foi apenas um deles. Qualquer dos outros
trariam fama imortal ao seu autor. Tinha apenas 26 anos.

Na relatividade, Einstein vai contra 300 anos de física,


demonstrando contra tudo e todos que o problema do éter, o meio
que supostamente dava suporte à propagação da luz, não era um
problema: o éter simplesmente não existia.

Anos de reflexão levaram a uma conclusão fantástica: "O tempo


não pode ser absolutamente definido". O jovem rebelde traz a
noção de perspectiva à ciência, ressaltando o papel do observador
nas medidas de tempo e de espaço.

Se a elegância foi-se com a idade, ficou ao menos a rebeldia, se


não tanto nas idéias ao menos na língua.
MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth
College, em Hanover (EUA) e autor do livro "A Harmonia do Mundo"

Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1702200802.htm

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