O livro organizado por Bruna Franchetto e Michael Heckenberger vem suprir
e atualizar uma importante lacuna na etnologia brasileira contemporânea: os
povos do Alto Xingu, objetos de estudos realizados desde as expedições de
Karl Von de Steinem, em 1884, até as etnografias acumuladas, particularmente,
nas décadas de 1960 e 1970, logo após a criação, em 1961, do Parque Nacional
do Xingu. Esses povos têm, entretanto, estado ausentes de uma discussão
etnográfica e de políticas indigenistas atuais, principalmente, tendo em vista o
importante processo de transformações que tem ocorrido no Parque durante
a última década, com a retirada progressiva da Funai da prestação de serviços
assistenciais às suas comunidades, que vêm se reorganizando para fazer face
às novas formas de relação com a sociedade nacional que hoje se lhes apresentam.
O livro organizado por Bruna Franchetto e Michael Heckenberger vem suprir
e atualizar uma importante lacuna na etnologia brasileira contemporânea: os
povos do Alto Xingu, objetos de estudos realizados desde as expedições de
Karl Von de Steinem, em 1884, até as etnografias acumuladas, particularmente,
nas décadas de 1960 e 1970, logo após a criação, em 1961, do Parque Nacional
do Xingu. Esses povos têm, entretanto, estado ausentes de uma discussão
etnográfica e de políticas indigenistas atuais, principalmente, tendo em vista o
importante processo de transformações que tem ocorrido no Parque durante
a última década, com a retirada progressiva da Funai da prestação de serviços
assistenciais às suas comunidades, que vêm se reorganizando para fazer face
às novas formas de relação com a sociedade nacional que hoje se lhes apresentam.
O livro organizado por Bruna Franchetto e Michael Heckenberger vem suprir
e atualizar uma importante lacuna na etnologia brasileira contemporânea: os
povos do Alto Xingu, objetos de estudos realizados desde as expedições de
Karl Von de Steinem, em 1884, até as etnografias acumuladas, particularmente,
nas décadas de 1960 e 1970, logo após a criação, em 1961, do Parque Nacional
do Xingu. Esses povos têm, entretanto, estado ausentes de uma discussão
etnográfica e de políticas indigenistas atuais, principalmente, tendo em vista o
importante processo de transformações que tem ocorrido no Parque durante
a última década, com a retirada progressiva da Funai da prestação de serviços
assistenciais às suas comunidades, que vêm se reorganizando para fazer face
às novas formas de relação com a sociedade nacional que hoje se lhes apresentam.
Doutorando do Departamento de Antropologia USP Professora do Departamento de Cincias Sociais UFSCar
O livro organizado por Bruna Franchetto e Michael Heckenberger vem suprir
e atualizar uma importante lacuna na etnologia brasileira contempornea: os povos do Alto Xingu, objetos de estudos realizados desde as expedies de Karl Von de Steinem, em 1884, at as etnografias acumuladas, particularmente, nas dcadas de 1960 e 1970, logo aps a criao, em 1961, do Parque Nacional do Xingu. Esses povos tm, entretanto, estado ausentes de uma discusso etnogrfica e de polticas indigenistas atuais, principalmente, tendo em vista o importante processo de transformaes que tem ocorrido no Parque durante a ltima dcada, com a retirada progressiva da Funai da prestao de servios assistenciais s suas comunidades, que vm se reorganizando para fazer face s novas formas de relao com a sociedade nacional que hoje se lhes apresentam. Trs so os principais aspectos que norteiam a organizao do livro como um todo. O primeiro deles est presente na prpria concepo interdisciplinar da coletnea, enriquecida com a discusso de matrias e argumentos distintos (antropologia, ecologia cultural, arqueologia, etnohistria, lingustica), os quais procuram dar conta dos vrios temas que a diversidade cultural alto-xinguana oferece. Temos, assim, na primeira parte do livro: os estudos arqueolgicos e etnohistricos mais recentes de Heckenberger ou lingusticos de Franchetto; um panorama da bioantropologia local, feito por Ricardo Santos e Carlos Coimbra; a geografia poltica realizada por Maria Lcia Pires Menezes; os dados preliminares para uma iconografia no Xingu por Aristteles Neto; Dole e a difuso de prticas culturais; Gregor fundamentando a paz intertribal tomando o casamento como artifcio de pacificao do inimigo. Na segunda parte, textos etnogrficos, referentes a alguns dos grupos altos xinguanos (Waur, Kuikuro,
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Kalaplo, Bakairi, Kamayur, Aweti, Trumai), tratam da multiplicidade dos
aspectos da histria local, tanto do ponto de vista da sua localidade quanto da sua reconstituio etnogrfica e arqueolgica. Deve-se tambm salientar a presena, nesse livro, de dois precursores da etnografia alto-xinguana, Thomas Gregor e Ellen Basso, cujos livros sobre os Mehinako e os Kalaplo, respectivamente, so referncias obrigatrias para todos os pesquisadores da regio do Alto Xingu. O segundo aspecto, tambm presente na frtil concepo do livro, que nos leva ao seu subttulo, refere-se articulao entre os diversos captulos e as duas partes. Trata-se de uma discusso cara antropologia em torno do tema histria e cultura, procurando-se, por meio das vrias formas de histria (arqueolgica, documental e etnogrfica), estabelecer as possibilidades de suas relaes internas, porque localizadas em diferentes planos de pesquisa e de registro. Neste ponto, o leitor apresentado a duas vertentes distintas para visualizar o Alto Xingu. Primeiramente, iluminado pelos estudos interdisciplinares, e sobretudo arqueolgicos, a sociedade alto-xinguana revela-se organizada por um processo fechado, mesmo que dinmico, cuja linha estrutural de base aruak, formada antes mesmo do perodo do contato ocidental. Sahlins, ao lado de Steinen e Schaden, so as referncias centrais, ao serem apresentadas as teses principais desse livro sobre a formao do sistema altoxinguano. Por um lado, como j observamos, fechado em si mesmo, formado por sucessivas levas migratrias dos povos de lngua Aruak (800900 D.C.), Karib (em torno de 1500) e Tupi (entre 1700-1800), que teriam absorvido ou se amalgamado com outros grupos que ali j se encontravam. Por esse aspecto, a sociedade alto-xinguana teria sido formada em perodo anterior ocupao ocidental e prpria formao do Parque, constatandose uma notvel permanncia desse sistema em face dos processos histricos de mudanas pr e ps-contato. De acordo ainda com essa viso, a sociedade xinguana pauta-se pela adoo de uma origem mtica comum que evidencia a natureza do convvio pacfico, ao mesmo tempo que se perpetuam cosmologias e ideologias distintas. Esta seria a condio moral necessria para a comunidade alto-xinguana, que revela sua essncia no ciclo do ritual da chefia, representado pelo cerimonial Kuarup. Por outro lado, e em segundo, na viso alternativa, temos o conflito situado na essncia da sociedade xinguana, entendido tambm como fator constitutivo
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do sistema. Tanto quanto o Kuarup, o faccionalismo, o xamanismo e a feitiaria
constituem elementos primordiais da ao poltica, revelando concepes distintas quanto natureza da estrutura social local. Por esse aspecto, tal como a leitura alternativa proposta por Marcela Coelho ilustra a segunda, para ficarmos com dois pontos altos da coletnea. De fato, a bibliografia sobre os alto-xinguanos parece ser unnime em considerar que, a despeito das diferenas lingsticas e socioculturais locais, os grupos identificados como pertencentes sociedade alto-xinguana (Yawalapiti, Mehinako, Waur, Kamayur, Aweti, Kalaplo, Kuikuro, Matipu, Nahukw e Truma) fazem parte de um sistema integrado no que diz respeito sua forma de organizao sociopoltica, padres de aldeamento, parentesco e chefia. O partilhamento de rituais, sistemas cosmolgicos, trocas cerimoniais, econmicas, matrimoniais, assim como, comportamentos belicosos entre faces, xams e feiticeiros tm sido tambm fundamentais para a continuidade desse sistema at nossos dias, remetendo a um conjunto de relaes intertribais pelas quais eles se definem e se situam diferencialmente dentro do mesmo. Desse modo, o terceiro aspecto a ser destacado sobre o livro diz respeito ao esforo de alguns de seus autores em desvendar a lgica alto-xinguana de diferenciao interna (lingusitca, etnohistria, especializao tcnica, iconogrfica e musicolgica), pela qual eles preservariam ainda aspectos de sua identidade cultural dentro desse sistema intertribal mais amplo de trocas (pacficas e belicosas), cooperao e conflito. Trata-se, assim, de uma coletnea exemplar para mostrar como as dinmicas societrias articulam-se por meios de processos dspares: semelhana/alteridade, continuidade/descontinuidade, permanncia/mudana, o que recoloca, sem dvida, a relao entre histria e cultura, ou a pesquisa histrica e a etnogrfica, em significativos patamares de discusso e cooperao. O problema maior uma certa indefinio conceitual de histria (ou histrias), assim como de estrutura (ou estruturas). No que diz respeito ao primeiro ponto, faz-se freqentemente, menes a perodos pr-histricos, isto ., referentes ao perodo anterior ao contato ocidental e existncia de documentao sobre os grupos alto-xinguanos, o que parece incompatvel, seno no-resolvido, pela discusso que precede o livro na Introduo, que reafirma o uso de dados arqueolgicos e etnogrficos locais, alm das histrias orais, nos captulos subseqentes, como parte do mesmo registro histrico e cultural, apesar de em diferentes planos.