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Egidio Shizuo Toda PDF
Egidio Shizuo Toda PDF
Cláudio Pastro na
Basílica de Aparecida
e sua contemporaneidade
História, Cultura e Leitura de suas Obras
São Paulo
2013
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São Paulo
2013
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CDD 704.9480981
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Aprovada em: 05 / 08 / 2013
BANCA EXAMINADORA
DEDICATÓRIA
AGRADECIMENTOS
A Deus, fonte de sabedoria, porque dele recebi a energia vital para trilhar este caminho.
À minha família, meu pai, tias, meus irmãos, cunhados, sobrinhos, que ajudam na
formação do homem como indivíduo e sociedade.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Marcos Rizolli, pelo apoio, confiança e orientação
constantes, estimulando-me à pesquisa acadêmica contínua e aprofundada.
Ao amigo Dr. José Alberto B. Borges, que abriu os caminhos com Cláudio Pastro.
Ao Dom Darci Nicioli por sua atenção em receber e falar do projeto estético da Basílica,
e por franquiar meu acesso às obras e ao Centro de documentação.
À banca de qualificação, composta pelo Prof. Dr. João Carlos de Souza e pela Prof.
Dra. Mirian Celeste Martins, pelo rigor acadêmico e pelas preciosas observações, que
sem dúvida contribuíram muito na elaboração desta dissertação.
EPÍGRAFE
RESUMO
ABSTRACT
This paper discusses the importance of the work of art in the environment
sacrum, as relevant instrument of religious education inside the Basilica of Our Lady
of Aparecida, the largest Catholic church in Brazil and the second largest in the world.
It is the study of the process of communication and media by the artist Claudio Pastro,
responsible for the implementation of the Basilica´s sacred art and visual, to reach
the general public nowadays. On how the artist creates this aesthetic communication,
linking all parts of this building with monumental dimension by imposing its unique and
current style. With a language developed in studies abroad and influences in the past,
the artist seeks in the sacred art the teachings of the liturgy, and reaches people of all
ages, social classes and culture.
The analysis of the work - “The Sacrificial Lamb”, is supported by specialists
of art and religious art,. allowing to deduce which proposed the artist and with which
profundity he is involved in the mystery of the sacred.
Key words: Basilica of Aparecida, history, sacred art, Cláudio Pastro, comunication.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 15
Proposta de trabalho 19
Objetivo da pesquisa 20
Referencial teórico 21
Metodologia da pesquisa 22
apreciação 104
perceptiva 120
3.2.3. Aplicação das teorias de leitura semiótica da imagem, nas obras de Cláudio
ANEXOS 142
Fig. 14 – Versão reformulada da planta da Basílica Nova com as divisões, das capelas
e naves, numeradas 48
Cap. 2. O mais importante artista sacro brasileiro da atualidade, sua obra prima
Imolado 108
Cavalo 108
candelabros 113
incenso 113
14
Fig. 43 – Pintura de “São João Batista” do artista Francesco del Cossa 121
Imolado” 131
INTRODUÇÃO
Lembro de meu pai ter-me convidado para visitar a Catedral do Campo Limpo,
situada na cidade e estado de São Paulo, em 1998. Ao entrar neste templo de
arquitetura moderna, baseada na nova linguagem das igrejas alemãs, onde o altar
fica ao centro, e abaixo do nível da entrada, com os assentos ao seu redor, lembrando
o formato de um teatro de arena das clássicas construções gregas, deparei-me com
um grande painel da Sagrada Família.
Esta nova linguagem arquitetônica das igrejas alemãs, com seu formato
quadrado, suas finíssimas chapas de mármore branco que dão transparência para a
iluminação do ambiente e seus granitos revestindo todo o piso, troca a arquitetura das
antigas igrejas góticas, com sua verticalidade e os arcos ogivais, das igrejas romanas
com sua estrutura retangular, solidez e seus arcos redondos, das igrejas bizantinas e
de formato octogonal e suas cúpulas enormes, para uma arquitetura arejada e clara
que, de uma forma aconchegante e minimalista, nos recebe para acalmar e meditar.
Na parte de trás deste altar, um grande painel se eleva verticalmente em tons
de ocre, branco, amarelo, dourado, castanho e contornos escuros. Maria, José e
Jesus Cristo, cercados de anjos, celebram a Sagrada Família.
Ao tentar continuar minha leitura no interior da catedral, algo me levava de volta
a este painel de linhas simplificadas e cores chapadas. Sua pintura, que lembra uma
grande ilustração, completava a linguagem moderna de toda a arquitetura e me fixou
o olhar para a apreciação, na ânsia de desvendar todo o mistério de construção desta
imagem. Ao voltar à casa de meus pais, esta imagem não mais me saiu da memória.
Passaram-se os anos e, após um convite, fui visitar outro centro religioso,
o maior templo católico do Brasil, a Basílica de Nossa Senhora de Aparecida. Ao
circular pelo seu interior, chamou-me à atenção a linguagem artística dos painéis que
circundavam a parte interna, nas naves norte, sul, leste e oeste. De novo, como em um
redescobrimento, aquelas imagens me prenderam a atenção para desvendar quem
foi o artista que as criara e executara. A associação direta com o painel da Catedral
de Campo Limpo me trouxe lembranças que estavam guardadas na memória e, de
novo, a vontade de saber tudo acerca destas obras. Quem foi o artista, sua história,
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por outros países como Itália e França para a imersão em Arte Sacra, pela Turquia para
os estudos do bizantino e à Alemanha para o encontro com a Arte Contemporânea.
Outra viagem ao Egito em 2008, e o mergulho em uma das mais fascinantes
artes desenvolvidas na história da civilização, há 6 mil anos, mostra-nos como a arte
egípcia, com suas rígidas regras de conduta, leis de traçado, de frontalidade e de culto
ao divino, encaixa-se no processo de desenvolvimento desta obra atual. A viagem
para a Turquia leva-nos para o encontro da Arte Bizantina e o começo da arte cristã e
como pontos tão distantes geograficamente se entrelaçam no momento da descoberta
da elaboração desta arte contemporânea.
Observei na sequência deste trabalho, que a obra do artista está intrinsecamente
ligada ao processo de evangelização do período bizantino, dos primórdios do
cristianismo, em Constantinopla. Ele se vale da influência da arte do período de
Bizâncio para levar os fiéis a intuir e estabelecer uma relação de empatia com os
principais fatos dos ensinamentos cristãos.
O projeto tratou de um dos maiores templos católicos do mundo. E, não obstante
as suas dimensões, foi possível vivenciar, ao admirar in loco a sua obra, como o
artista foi capaz de levar o observador à introspecção no espaço sagrado do templo e
integrar a comunicação de todos os espaços unindo em uma só linguagem todos os
cantos desta estrutura monumental.
Todos os pontos cardeais representados pela Nave norte, Nave sul, Nave leste
e Nave oeste desta basílica encontram-se em um ponto que é o Altar Central, no
interior da basílica. É o lugar de início da comunicação, que se expande pelas paredes,
contando histórias do nascimento de Jesus Cristo, sua vida pública, sua paixão e
ressurreição. Pelo chão vemos ondas que saem do altar e como um rio esparramam-
se, em contínuo movimento, para atingir todos os cantos e todas as pessoas que por
aí transitam.
Tanto a entrevista com o então vigário Pe. Darci Nicioli, hoje assumindo as
funções de bispo auxiliar de Aparecida, quanto a entrevista com o artista, transcritas
nos anexos 1 e 2, nos permitiram ter uma visão bastante rica dos bastidores desta
obra de acabamento da Basílica de Aparecida.
Os detalhes abrangeram desde o processo de escolha do artista, até os
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PROPOSTA DE TRABALHO
OBJETIVO DA PESQUISA
REFERENCIAL TEÓRICO
METODOLOGIA DA PESQUISA
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 1
A nova ordem de missionários que surgia, a Companhia de Jesus, foi aquela que
efetivamente instrumentalizou esse pacto entre a Igreja e o Estado Português no
período das conquistas e colonização de novas terras. Como Lustosa (1991), que
enfatiza em sua obra, graças ao sistema do Padroado, construiu-se uma imagem do
rei como chefe da Igreja, chegando ao ponto de legitimar as ações religiosas.
Sob este enfoque, Alves (2005) faz uma extensa e muito rica análise da
relação entre a Igreja e o estado português, da qual o texto abaixo serve para ilustrar
essa condição:
Quanto à função da imagem, ela não visava, de modo geral, a fornecer uma
cópia reconhecível dos traços do rei ou uma descrição sóbria de suas ações.
Ao contrário, a finalidade era celebrar Luís, glorificá-lo, em outras palavras,
persuadir os especatadores, ouvintes e leitores de sua grandeza. Para isso,
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Assim, a Coroa Portuguesa, numa atitude política muito mais que devocional,
atrelou fortemente suas ações de conquista ao poder de Roma auferindo com isso,
além do sustentáculo político, tão estratégico à época, o apoio necessário, em recursos
humanos diferenciados de apoio à colonização, como o dos padres jesuítas.
Como consequência direta dessa ação ingestora do Estado na religião,
Brustoloni (2012), faz menção em sua obra que o culto à Imaculada Conceição de Maria
difundiu-se na colônia do Brasil e definiu características próprias para a religiosidade
do povo. Ele inclusive faz menção de que a Imaculada Conceição era forte motivo
de inspiração para as artes e a literatura na época da colonização e que imagens
de Nossa Senhora “eram feitas pelos melhores artistas portugueses e brasileiros em
madeira e terracota; pintores célebres puseram nome e fama às telas da Imaculada
Conceição que executaram”.
A festa à Nossa Senhora era celebrada no dia 8 de dezembro, correndo toda
a solenidade às expensas do governo. E Brustolini (2012), destaca que também no
culto havia interferência do governo. Por determinação de D. João IV, no ano de 1646,
as imagens deveriam conter tez branca no rosto e nas mãos, com manto azul escuro
e forro vermelho granada que deveriam ornar as imagens do título da Imaculada
Conceição. Vem desta época,a cor azul do manto de Nossa Sra.utilizado até hoje.
Também cabe neste momento uma rápida contextualização das condições
sócio-econômicas da Vila de Guaratinguetá, à época da descoberta da imagem. O
povoado de Santo Antonio de Guaratinguetá foi elevado à categoria de vila em 13 de
junho de 1651. Este povoado, situado no Vale do Paraíba, começou a ser ocupado
pelos colonizadores no século XVII, com caçadores de riqueza nas minas, quando
possuía uma população pequena e pobre, constituída de brancos portugueses, índios
e mestiços, conforme destaca Andréa Alves (2005):
que visavam, umas, a captura dos índios para mão de obra escrava e
outras, a busca de riquezas minerais. Ainda no séc. XVI, foi encontrada a
primeira mina, na Capitania de São Vicente (atual São Paulo). Depois desta,
muitas outras foram descobertas, em diversos pontos do país, sobretudo na
região de Minas Gerais. Isso criou uma agitação na Capitania de São Paulo,
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, do ano de 1939, nº3, ps. 295 a 316.
É neste contexto da estadia do Conde de Assumar e sua comitiva na Vila de
Guaratinguetá, que os pescadores da região foram convocados a recolher em suas
redes a maior quantidade de peixes que pudessem. Nessa tarefa, os pescadores
Domingos Garcia, João Alves e Felipe Pedroso encontraram a imagem de Nossa
Senhora da Conceição em duas partes, cabeça e corpo e achadas em lanços de rede
distintos, seguidos segundo a lenda por fartas quantidades de peixe.
É interessante notar que, apesar dos detalhes dos fatos históricos que cercam
a visita do então governador, o Conde de Assumar, serem razoavelmente profusos de
detalhes, o mesmo não ocorreu com essa pesca. Os registros do achado da imagem
são muito posteriores, o mesmo se dizendo da devoção que se instalou a partir da
descoberta. Há registro a respeito no livro de batizados da paróquia de Santo Antonio
de Guaratinguetá, de 1920, de um neto de Filipe Pedroso. Bem como João Alves está
registrado como testemunha de casamento. Igualmente Domingos Garcia figura em
processo de recenciamento de 1765. Por isso, são bastante fortes as evidências de
que os personagens citados a posteriori eram reais e não compunham apenas o mito
de processo devocional.
Brustoloni (2012) revela todo esforço em sua busca para conseguir registros
que tratassem da data efetiva da pesca da imagem, mas apenas se limita a
circunscrevê-la ao período de 17 a 30 de setembro de 1717, durante a estadia do
Conde de Assumar na Vila de Guaratinguetá. Recorrendo aos livros paroquiais, como
de batismos, casamentos e livros do Tombo, o único relato que encontra, das igrejas
locais, é o do I Livro do Tombo da Paróquia de Santo Antônio de Guaratinguetá,
constante dos arquivos da Cúria Metropolitana de Aparecida e que foi inaugurado em
1757, o curioso é que no relato se menciona o ano de 1719, mas que na realidade se
deu em 1717. Abaixo, os fatos oficiais da visita do Conde Assumar:
Entre muitos foram a pescar Domingos Martins Garcia, João Alves e Filipe
Pedroso com suas canoas. E principiando a lançar suas redes no Porto de
José Corrêa Leite, continuaram até o Porto de Itaguassu, distância bastante,
sem tirar peixe algum. E lançando neste porto, João Alves a sua rede de
rasto, tirou o corpo da Senhora, sem cabeça; lançando mais abaixo outra
vez a rede, tirou a cabeça da mesma Senhora, não se sabendo nunca quem
ali a lançasse. Guardou o inventor esta imagem em um tal ou qual pano,
e continuando a pescaria, não tendo até então tomado peixe algum, dali
por diante foi tão copiosa a pescaria em poucos lanços, que receoso, e os
companheiros de naufragarem pelo muito peixe que tinham nas canoas, se
retiraram a suas vivendas, admirados deste sucesso.
Felipe Pedroso convervou esta Imagem seis anos pouco mais ou menos em
sua casa junto a Lourenço de Sá; e passando a Ponte Alta, ali a conservou
em sua casa nove anos pouco mais ou menos. Daqui se passou a morar em
Itaguassu, onde deu a Imagem a seu filho Atanásio Pedroso, o qual lhe fez
um oratório tal e qual, e, em um altar paus, colocou a Senhora, onde todos os
sábados se ajuntava a vizinhança a cantar o terço e mais devoções. Em uma
dessas ocasiões, se apagaram duas luzes de cera da terra repentinamente,
que alumiavam a Senhora, estando a noite serena, e querendo logo Silvana da
Rocha acender as luzes apagadas também se viram logo de repente acesas
sem intervir diligência alguma: foi este o primeiro prodígio, e depois em outra
semelhante ocasião, viram muitos tremores no nicho e no altar da Senhora,
que parecia cair a Senhora, e as luzes trêmulas, estando a noite serena. Em
outra semelhante ocasião, em uma sexta-feira para o sábado (o que sucedeu
várias vezes), juntando-se algumas pessoas para cantarem o terço, estando
a Senhora em poder da Mãe Silvana da Rocha, guardada em uma caixa
ou baú velho, ouviram dentro da caixa muito estrondo, muitas pessoas, das
quais se foi dilatando a fama até que, patenteando-se muitos prodígios que
a Senhora fazia, foi crescendo a fé e dilatando-se a notícia, e, chagando
ao R. Vigário José Alves Vilella, este e outros devotos lhe edificaram uma
capelinha e depois, demolida esta, edificaram no lugar em que hoje está com
grandeza e fervor dos devotos, com cujas esmolas tem chegado ao estado
em que de presente está. Os prodígios desta Imagem foram autenticados
por testemunhas que se acham no Sumário sem Sentença, e ainda continua
a Senhora com seus prodígios, acudindo à sua Santa Casa romeiros de
partes muitos distantes a gratificar os benefícios recebidos desta Senhora.
(BRUSTOLONI, 2012, ps.32 a 48).
33
1
O Santuário de Nossa Sra. Aparecida passou a ser conhecido como “basílica velha”, a partir do início
da construção do novo templo, em 1955.
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1 2
1. Primeira planta publicada da construção da nova Basílica, projeto de Benedito Calixto Neto, jornal
Ecos Marianos, p.34, 1952. Em torno da plataforma com a imagem teriam mais 8 pequenos altares para
celebrar 9 missas ao mesmo tempo. 2. Placa de responsabilidade civil da terraplanagem, concretagem
e construção da Basílica. Fotos 1 e 2: s/n e 2372. Cortesia do CDM Pe. Antão Jorge.
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3. A área escolhida foi o Morro das Pitas com uma dimensão de 60 alqueires. Ao custo de 300 contos
de réis, fica na direção do Porto de Itaguaçu. Fotografia tirada antes dos trabalhos de terraplenagem.
Foto: 4037. Cortesia do CDM Pe. Antão Jorge.
4. A empresa Mariutti Ltda ficou encarregada pela terraplanagem. Vista aérea do Morro das Pitas onde
seria construída a basílica. Foto: 2706. Cortesia do CDM Pe. Antão Jorge.
42
5. Início das obras de concretagem da Nave Norte. Ao centro, de terno e boina preta, o arquiteto
Benedito Calixto Neto comanda a operação. Foto: 2593. Cortesia do CDM Pe. Antão Jorge.
6. Início das obras da Nave Norte. Da esquerda para a direita: Dom Macedo, bispo auxiliar, padre
redentorista, arquiteto Benedito Calixto Neto e cardeal Dom Carlos Motta. Foto: 2684. Cortesia do CDM
Pe. Antão Jorge.
43
7. Vista de mais uma etapa das obras da Nave Norte. Foto: 2461. Cortesia do CDM Pe. Antão Jorge,
8 9
8. Detalhe das portas de entrada da Nave Norte. Cortesia do CDM Pe. Antão Jorge, foto 2631. 9. Nave
Norte em fase final de concretagem. Foto: 2830. Cortesia do CDM Pe. Antão Jorge.
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10
10. Detalhe das obras da Nave Norte. Estruturas de madeira para sustentação do concreto das arcadas.
Foto: 3056. Cortesia do CDM Pe. Antão Jorge,
11
11. Construção da Torre Brasília onde se vê ao fundo o Rio Paraíba do Sul, junto ao Porto Itaguaçu,
onde foi descoberta a imagem em 1717. Foto: 2973. Cortesia do CDM Pe. Antão Jorge.
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12. Inauguração da Torre Brasília, com a presença do então presidente da República, Juscelino
Kubitschek de Oliveira e do Cardeal Dom Carlos Carmelo de Vasconcellos Motta. Originalmente
denominada de Torre Basílica, foi renomeada para Torre Brasília por conta da doação de sua estrutura
de ferro pelo presidente da República. Foto: cortesia do CDM Pe. Antão Jorge.
Dom José Gonçalves, secretário da CNBB. Por sua vez, os padres redentoristas,
responsáveis pelo Santuário de Aparecida, também tinham constituído uma comissão
de acompanhamento das obras. Referida comissão se reunia mensalmente, para
que nela prestasse contas ao Pe. Noé Sotilo, responsável pela tesouraria e pela
administração dos bens da Basílica.
Terminada a torre, as obras seguiram para a cúpula central. As obras da Nave
Norte e da Torre estiveram sob a responsabilidade da empresa Indústria e Comércio
Mariutti Ltda. Os trabalhos de construção das pilastras da cúpula central também se
iniciaram exclusivamente com essa empresa. Todavia, para o processo de edificação
das 4 abóbodas da cúpula central, a 40 metros de altura, o conselho questionou o
método e os preços apresentados pela empresa, quando se fez uma quotação com
outras empresas, quanto ao estaqueamento para sustentação da cúpula. O processo
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13
13. Versão reformulada da planta da Basílica Nova. Com a morte do arquiteto Benedito Calixto Neto,
o projeto foi refeito novamente pelo Dr. Luís Alves Coelho e a construção ficou a encargo e supervisão
do Pe. Noé Sotilo. Em comparação à planta antiga, a Nave Sul foi alongada por mais dois lances de
colunas, ficando 16 mestros mais longa que as demais, mas preservando a mesma fachada das outras
naves. Foto: cortesia do CDM Pe. Antão Jorge.
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11
14 15
12 8 4 1 5 9 13
10
16 17
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14. 1 Altar central. 2 Nave Norte e os painéis da Vida pública de Jesus. 3 Nave Sul, o nicho de Nossa
Sra. e os painéis da Infância de Jesus. 4 Nave Leste e os painéis da Ressurreição. 5 Nave Oeste e os
painéis da Paixão de Jesus. 6 Painel do Cristo Pantocrator. 7 Trono de Nossa Sra. 8 Painel do Cordeiro
Imolado. 9 Painel da Virgem Imaculada. 10 Acesso norte. 11 Acesso sul. 12 Acesso leste. 13 Acesso
oeste. 14 Capela São José. 15 Capela do Santíssimo. 16 Capela da velas 17 Torre Brasília. Foto:
cortesia do CDM Pe. Antão Jorge. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
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Fato notório durante a construção foi em 1969, foi a muito útil ideia do Pe.
Noé Sotilo de aproveitar o subsolo da Nave Norte como espaço para um salão de
descanso e de convivência social para os romeiros. Além de acomodar, há sanitários
públicos e água potável. O vão entre a laje do piso da nave e o subsolo era de apenas
2 metros e, com a concordância do Cardeal Motta, se iniciou a sua escavação. (Doc.
2 - Construção da Nova Basílica, 1992 – introdução).
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15. Vista atual da Basílica de Aparecida com a Nave Norte ao centro e a Torre Brasília à direita. Foto:
Egidio S. Toda. Registro em novembro de 2011.
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16. Entrada principal da Basílica de Aparecida, Nave Sul, onde o Papa João Paulo II celebrou a missa
de inauguração em 1980. Foto: Egidio S. Toda. Registro em setembro de 2012.
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Além das quatro naves (norte, sul, leste e oeste) e da cúpula central, o espaço
interno da Basílica também está composto de 5 capelas: Capela do Santíssimo,
Capela da Ressurreição, Capela de São José, Capela do Batismo e Capela das Velas.
Concluída a etapa da construção estrutural do templo, que durou 42 anos,
de 1955 a 1997, uma tarefa não menos importante era a de acabamento da nova
52
basílica. Além dos 182.000 m2 de piso a decorar, as 4 naves com 40 metros de altura,
a cúpula de 70 metros e os enormes vitrais de cada uma das naves e das 5 capelas,
eram um grande desafio, principalmente tendo em vista que essa obra em si mesma
deveria ter um conteúdo evangelizador muito forte.
A nova basílica, como vimos, foi projetada no início da década de 50 e,
portanto, foi adequada ao modelo litúrgico então vigente. Daí decorre o comentário que
fizemos no item 1.1. acima: “na nova basílica, o altar da imagem de Nossa Senhora
Aparecida foi projetado para o centro, sob a cúpula. Em torno da plataforma teria mais
oito pequenos altares, o que permitiria a celebração de nove missas simultâneas”.
A basílica pós concílio tinha realmente que ser revista, em função das novas
diretivas do Concílio Vaticano II2, em que o altar da celebração tem que ocupar o
centro da Igreja. Com isso, a Nave Sul foi adaptada para receber a imagem de N. Sra.
Aparecida, de forma que os fiéis em todas as naves convergissem para o centro da
celebração, o altar.
Foi levando em conta esse contexto que, em 1997, a convite do então Cardeal
Arcebispo de Aparecida, D. Aloísio Lorscheider, o artista plástico Cláudio Pastro
assumiu o processo de conclusão da gigantesca basílica, juntamente com outros
artistas e arquitetos especializados em Arte Sacra.
2
Foi uma série de conferências realizadas entre 1962 e 1965, consideradas o grande evento da Igreja
Católica do século XX, com o objetivo de modernizar a Igreja e atrair os cristãos afastados da religião.
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Deus é a beleza, por isso construir o belo ajuda as pessoas no seu encontro com
Deus. Dostoievski disse que a beleza salvaria o mundo e intuiu isso muito bem. Isso
norteou o acabamento interno do Santuário Nacional. Todo o trabalho tem sido feito
com o objetivo de fazer com que haja harmonia e que harmonia seja percebida pelo
visitante, que deve fazer parte dela. Destaca:
Então, a Basílica tem que fazer com quem vem aqui se sinta bem, se
da Mãe Aparecida.
…É tão simples, como são simples as coisas de Deus. Então talvez seja este
o grande encantamento de Aparecida – a simplicidade. As pessoas que aqui
vêm, vêm trazendo as suas mazelas, as suas dificuldades, as suas dores,
os seus contratempos, os seus sofrimentos, e encontram uma esperança.
Voltam para casa com o coração renovado. Tudo o que é construído aqui no
3
Ciência que se ocupa de Deus, seus atributos e perfeições.
4
Ordem da cerimônia e preces de que se compõe o seviço divino, como se encontra determinado no
ritual eclesiástico; as fórmulas consagradas das orações, rito, Ciência que trata das cerimônias e ritos .
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CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 2
Segundo Dom Luciano Mendes de Almeida, em seu prefácio de abertura no
livro “Arte Sacra: O Espaço Sagrado Hoje”(em cujo texto se insere a frase citada
acima), Pastro expressa aquilo que crê e ajuda-nos, com sua imagem, a crescermos
acreditando nestes ensinamentos cristãos. Permite-nos uma visão de conjunto da
iconografia cristã através dos tempos e fundamenta as expressões artísticas na
igreja como valores intrínsecos, ajudando a compreender a imagem como lugar de
manifestação do Espírito.
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17. O artista Cláudio Pastro em seu ateliê no bairro de Perdizes, São Paulo. Foto: Lucas Lima. Publicado
na Veja São Paulo em 05 de junho de 2013.
(…) Eu me conheço sempre com arte, desde os quatro ou cinco anos de idade.
Minha mãe era modista, era costureira. Então eu ficava de olho em como ela
desenhava as roupas. Naquela época não se tinha grandes elementos. Por
exemplo, papel era uma coisa que não existia para a gente praticamente.
Minha mãe juntava papel de padaria, que era um papel escuro, acinzentado,
60
natal. Em abril do ano seguinte, na Páscoa, o marchand voltou ao Brasil e lhe pagou
os direitos autorais. Segundo suas palavras:
interior da igreja da Trapa, que está num mosteiro trapista no sul do Paraná (Campo
do Tenente). Na cidade de São Paulo está uma importante obra sua, o painel da
Sagrada Família na catedral do Campo Limpo, mas o trabalho que muito lhe agrada
é o da capela das irmãs argelinas:
É uma capela que não tem bancos. É uma igreja que eu acredito que daqui a
mil anos vai estar sempre atual. É muito bonita, na forma de tenda, aberta para
todo o jardim e não tem bancos. Porque no cristianismo também nunca houve
bancos. Foi depois da reforma protestante, por influência do protestantismo,
que os bancos entraram na igreja católica romana. A igreja católica oriental
até hoje não tem bancos, à exceção de uma ou outra aqui no Brasil, que já
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Pertencente a congregação de Cister - abadia de Cluny, França.
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Em entrevista com o reitor da Basílica, Pe. Darci Nicioli, pedimos que falasse
sobre o processo seletivo do artista para o desenvolvimento da obra de acabamento
do templo (Anexo 2).
Ele esclareceu que esse processo teve início em 1999, quando se resolveu
entrar na fase de acabamento da nova basílica. Foi então constituída uma comissão
especial, composta por teólogos, litúrgos, arquitetos, os principais responsáveis pela
condução da pastoral do Santuário, além da presença do cardeal arcebispo, Dom
Aluízio Loscheider. Foram convocados diversos artistas sacros, dentre eles Cláudio
Pastro. O que mais chamou à atenção na proposta dele foi a sua consistência com
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as recomendações do Concílio Vaticano II, de que tudo deveria partir do altar central
e não do trono de Nossa Senhora, porque tudo se inicia e finda em Jesus Cristo. Daí
é que derivaria todo o acabamento da nova basílica. O grupo então resolveu, por
unanimidade, optar pelo Cláudio Pastro, pela sua competência, pelas obras realizadas
por ele, não só no Brasil, mas também no exterior, bem como pelos livros editados
por Cláudio Pastro, que mostram um conhecimento bastante profundo da arte sacra.
Mas foram mais de dois anos de análise das propostas de Cláudio Pastro, até que
finalmente seus projetos foram aprovados e se desse início ao processo efetivo de
acabamento. Destacou o Pe. Darci:
apreender de pronto e que poderemos ver logo a seguir no depoimento do artista (item
2.4.5.), porque estão associados com cenas do Livro do Apocalipse de São João.
Em outro momento da entrevista, o reitor descata como se deu este acordo de
expectativas, entre o artista e a comissão de especialistas da Basílica:
Eu digo que nada, para quem tem fé, acontece por acaso. Cláudio Pastro é o
artista sacro brasileiro da atualidade. O único por sua tamanha competência
e experiência… não posso falar por ele, mas posso interpretar o que ele
pensou. Certamente ele viu nisto a possibilidade de imortalizar-se na arte
sacra. Porque Aparecida é o coração católico do Brasil e o Brasil é o maior
país católico do mundo. Então, entendo que houve um casamento, entre a
competência do Cláudio Pastro e aquilo que nós queríamos e a vontade dele.
E Deus agiu nesse meio, porque o artista recebe esses dons, não por seus
méritos, mas por graça, como nós entendemos na fé. Então, entendo que o
que o Cláudio faz aqui é ser o instrumento de Deus. Deus está trabalhando
nele para se perpetuar. A Basílica quer ser a perpetuação da presença de
Deus. Uma extensão, um instrumento, que vai dizer para nós que a arte que
aqui está já diz como Deus nos ama, como Deus nos escolheu para a vida,
que onde Deus está a vida é abundante e que nós não estamos à deriva
neste mundo. Deus é nosso grande parceiro. Nós nos sentimos acolhidos na
Basílica, que na verdade é o grande útero, onde nós renascemos para a vida
sob cuidados médicos. Escreveu todavia uma carta a Dom Aloísio, explicando porque
não poderia participar, mas colaborar de longe.
No final de 1999, Dom Aluízio lhe enviou novamente uma carta, convidando-o
para um encontro. Lá chegando, constatou várias pessoas conhecidas suas: a
arquiteta, irmã Laide Somoda, das (irmãs) Pias Discípulas, e outra grande arquiteta,
Regina Machado, que também está ligada à arte sacra. Além dessas pessoas, havia
outras e que totalizavam umas vinte e poucas pessoas, entre arquitetos e artistas.
Nesse momento lhes foi pedido para dizer o que achavam da Basílica de Aparecida,
e o que pensavam que seria possível fazer lá.
Então, ele detalha em sua entrevista:
A gente deu uma primeira idéia. Cada um deu a sua idéia. Depois de uns dois
meses, eu recebo um segundo convite para ir lá (à Aparecida). E percebo
que não éramos mais 20 e sim 10. No terceiro encontro não éramos mais
10, mas 4 ou 5. Então foi havendo uma seleção e eu fui dizendo tudo o que
pensava, como sempre disse, até hoje. E acredito que foi por isso que eu fui
ficando. Ficamos esses nomes que eu já citei e depois, quando eu já tinha
sido transplantado de fígado, um belo dia Dom Aluísio Loscheider veio me
visitar no hospital e disse: “Cláudio, a partir de agora é só você. Fica nas
suas mãos”. Aí eu ainda brinquei com ele: vocês ainda acreditam num pré-
defunto? Eu achava que realmente iria morrer logo, porque é muito duro o
coma, transplante, de fato até hoje estou metido nisso. Mas eu tento (me)
Na junção das quatro naves, formando uma cruz latina sobreposta à cruz
grega, encontram-se o Altar. A cruz latina, que é a mais comum de todas as cruzes,
representa o supremo sacrifício de Jesus, sua crucificação. Lembra-nos também a
ressurreição e a esperança da vida eterna. Tem 3 braços de igual longitude e o quarto
braço com um comprimento maior em duas vezes. Diferente da cruz latina, a cruz
grega tem todos os braços com o mesmo tamanho. Na junção das duas cruzes, forma-
se uma estrela de 8 pontas. O Altar, que se situa no cruzamento das cruzes latina e
grega, é o centro e coração do templo, bem ao centro e abaixo da cúpula principal da
área interna da nova basílica. Para Pastro, é a razão de ser do espaço sagrado, lugar
do sacrifício cultural, o símbolo tangível do lugar do encontro e da aliança entre Deus
e o homem (figura 18).
A função das obras de convergência das quatro naves é a doutrina cristã. Sua
relação conta a história do cristianismo e a vida, missão, morte e ressureição de Cristo.
Dividida em 34 painéis em azulejos pintados e distribuídos em torno da parte interna
68
18
18. Vista aérea do Altar Central da Basílica de Aparecida na junção das quatro naves, Norte, Sul, Leste
e Oeste. Foto: Arquivo pessoal. Cortesia de Cláudio Pastro.
em formas e cores numa arte que comunica e encanta, para tocar o coração dos
fiéis. Entre um e outro painel do Evangelho, palmeiras circundam as paredes e fazem
referência ao oásis, lugar de repouso e revitalização, que é a função da própria
Basílica. Faz também uma alusão ao nome indígena brasileiro, o Pindorama, que
significa Terra das Palmeiras e, por fim, ao local de aparição da imagem de Nossa
Senhora, o Morro dos Coqueiros.
Estes são os dez painéis dos acontecimentos da infância de Jesus:
1. Anunciação de Maria: “Eis a escrava do Senhor. Faça-se em mim segundo
a tua Palavra” (Lc 1,38).
2. Visita de Isabel: “Você é bendita entre as mulheres e é bendito o fruto do
seu ventre” (Lc 1,42).
3. Nascimento de João Batista: “Ele irá à frente do Senhor para preparar-
lhe os caminhos” (Lc 1,76b).
4. Nascimento de Jesus: “Glória a Deus no mais alto dos céus, e paz na terra
aos homens por ele amados” (Lc 2,14).
5. Anúncio aos Pastores: “Nasceu para vocês um Salvador, que é o Messias,
o Senhor” (Lc 2,11). (figura 19).
6. Apresentação de Jesus no Templo: “Uma espada há de atravessar-lhe a
alma” (Lc 2,35).
7. Visita dos Reis Magos: “Nós vimos sua estrela no Oriente, e viemos para
prestar-lhe homenagem” (Mt 2,2).
8. Fuga para o Egito: “Levante-se, pegue o menino e a mãe dele, e fuja para
o Egito” (Mt 2,13).
9. Perda de Jesus no Templo: “Devo estar na casa de meu Pai” (LC 2,49-b).
10. A Sagrada Família: “E Jesus crescia em sabedoria, em estatura e graça,
diante de Deus e dos homens” (LC 2,52).
No lugar do Painel frontal da Nave Sul, está o nicho com a imagem de Nossa
Sra. de Aparecida (figura 20), incrustrado numa parede de 40 metros, onde estão como
guardiões os três principais arcanjos: Miguel, Gabriel e Rafael. O oratório em forma
de caixa toda confeccionada em ouro e, onde se encontra a imagem de Nossa Sra.,
foi construído de forma blindada para evitar qualquer ataque como o vandalismo que
70
19
19. “Anúncio aos pastores”. Localizado na Nave Sul, este é um dos dez painéis que conta a Infância de
Jesus. Feitos em tons de azul cobalto e branco, são as cores da Imaculada Conceição. Foto: Egidio S.
Toda. Registro em novembro de 2011.
20
20. Oratório com o trono e imagem de Nossa Senhora de Aparecida, localizada na Nave Sul da Basílica
de Aparecida. A coroa foi doação da Princesa Isabel. A imagem durante o dia fica exposta para o
público e a noite gira para um salão restrito. Foto: Egidio S. Toda. Registro em setembro de 2012.
71
o destruiu em 1978. Este oratório quadrado e com a frente de vidro transparente, tem
em seu interior, atrás da imagem, um círculo com desenho do Sol, e estrelas na parte
de dentro deste círculo. Ao redor do oratório, uma enorme placa também de ouro, com
texturas de peixes em alto relevo, cria uma gigante moldura de sustentação. Estes
peixes guardam relação com o primeiro milagre, de quando foi encontrada a imagem
no Rio Paraíba do Sul. Duas vezes por ano, a imagem é retirada para a sua limpeza
e restauração. Esta retirada é feita por Marilena Chafuri, a mesma que restaurou a
imagem depois de sua destruição. Há um mecanismo que gira a imagem. Durante o
dia a imagem fica virada para a área de visitação ao público e à noite para a Capela
dos Apóstolos, na parte de trás do retábulo. A coroa de Nossa Sra. foi uma doação
da Princesa Isabel, filha de Dom Pedro II, o último Imperadodo Brasil. Zenilda, relata
outras curiosidades:
Isabel. (ANEXO 3)
21
21. “As Bem-aventuranças”. Localizado na Nave Norte, é um dos oito painéis que conta a Vida Pública
de Jesus. Feitos em tons de azul anil e branco. Foto: Egidio S. Toda. Registro em novembro de 2011.
73
22
22. “Cristo Pantocrator”. Localizado na Nave Norte, este é o painel frontal desta nave. Está posicionado
sobre a Porta Santa e ladeado de mulheres que se destacaram na vida da igreja. Foto: Arquivo pessoal.
Cortesia de Cláudio Pastro.
74
mulheres, indicam as escolhidas, pela sua vida cristã. Os outros azulejos completam
a composição deste painel. As muralhas da Nova Jerusalém são representadas em
ziguezague, as lâmpadas indicam as virgens prudentes, os peixes e as águas em
movimento mostram a vida na Igreja na corrente que vem de Cristo e as flores do
mandacaru e da bromélia representam a presença da Glória no sofrimento da vida em
terras brasileiras.
23
23. “Encontro com Maria”. Localizado na Nave Oeste, é um dos oito painéis que conta a Paixão de
Jesus. Feitos em tons de lilás e roxo. Foto: Egidio S. Toda. Registro em novembro de 2011.
24
24. “Virgem Imaculada”. Localizado na Nave Oeste, este é o painel frontal desta nave e que representa
a Evangelização do Brasil. Foto: Arquivo pessoal. Cortesia de Cláudio Pastro.
76
Jorge, o Padre José de Anchieta e o índio Tibiriçá, o primeiro índio que se converteu
ao catolicismo e que doou suas terras para a construção do Pátio do Colégio de São
Paulo, são alguns dos homens retratados neste painel. Símbolos de martírio, vitória e
da própria brasilidade permeiam toda a Obra e o material encontrado faz a ponte com
os colonizadores e a nossa terra. Os homens retratados no Painel da Evangelização
do Brasil: Anchieta; Tibiriçá; Cunhau e Uruaçu; Roque Gonzáles; Sepé; Zumbi dos
Palmares; Frei Caneca; Frei Galvão; Padre Ibiapina; Dom Vital; Padre Cícero; Frei
Damião; Dom Hélder Câmara; Alceu Amoroso Lima; Dom Martinho Micchler; Padre
João Burnier; Frei Tito; Vladimir Herzog; Padre Vitor Coelho, Missionário Redentorista;
Santo Dias; Padre Josimo; Padre Ezequiel Ramin; Chico Mendes; Joilson; Crianças
da Candelária; Índio Galdino e Dom Luciano Mendes de Almeida.
25
25. “O Bom Pastor”. Localizado na Nave Leste, é um dos oito painéis que conta a Ressurreição de
Jesus. Feitos em tons de verde claro e esmeralda, representa a esperança e perseverança da glória
eterna. Foto: Egidio S. Toda. Registro em novembro de 2011.
Painel Frontal da Nave Leste: é o painel dos ‘Fundamentos da nossa Fé’. Este
painel faz elo de união com os outros painéis das naves Sul, Norte e Oeste para narrar
os fatos importantes da fé cristã. Cláudio Pastro define esta Obra como:
26
26. “Cordeiro Imolado e ressuscitado com a Cruz”. Localizado na Nave Leste, é o painel frontal que
representa os Fundamentos da nossa Fé com homenagens aos patriarcas, profetas e apóstolos. Foto:
Arquivo pessoal. Cortesia de Cláudio Pastro.
79
coberta da basílica, a Capela das Velas (figura 27). Um dos pontos mais visitados,
depois da Imagem de Nossa Sra. e da sala das promessas. No chão, vemos círculos,
com os quais Pastro quis representar as sete virgens prudentes que guardaram o óleo
para o encontro com seu esposo, que é o Cristo. E, as sete virgens imprudentes, que
não quiseram guardar o óleo para o encontro. A noroeste encontra-se a Torre Brasília
(figura 28), onde fica o CDM Centro de Documentação e Memória Pe. Antão Jorge, o
Museu da basílica, a administração e o observatório no último andar de onde pode-se
avistar o Rio Paraíba do Sul e toda a cidade de Aparecida. Na outra extremidade a
sudeste, ainda na parte interna da basílica, fica a Capela de São José (figura 29), com
o painel de Pastro, “O sonho de São José”. No outro lado a sudoeste, fica a Capela do
Santíssimo (figura 30), com um mural de mosaico doado pelo Papa João Paulo II.
27
27. Capela das Velas. Localizada entre as Naves Norte e Leste, a capela é a terceira maior visitação da
Basílica, perdendo apenas para a Imagem de Nossa Sra. e a Sala das promessas. Foto: Romeu Melo..
28
28. Torre Brasília. Localizado entre as Nave Norte e Oeste, no último andar fica o observatório de onde
se vê o Rio Paraíba do Sul e a cidade. Foto: Egidio S. Toda. Registro em dezembro de 2012.
81
29
29. Capela São José. Localizada entre as Naves Sul e Leste, tem como destaque o painel “O sonho de
São José”, de Cláudio Pastro. Foto: Egidio S. Toda. Registro em dezembro de 2012.
30
30. Capela do Santíssimo. Localizada entre as Naves Sul e Oeste, tem ao fundo como destaque o
painel em mosaico romano doado pelo Papa João Paulo II. Foto: Sanctorum.
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1 2 3
12 Sul 4
11 5
Oeste
Leste
10 6
Norte
9 8 7
1 Capela São José. 2 Trono de Nossa Sra. 3 Painéis da Infância de Jesus. 4 Capela do Santíssimo.
5 Painel da Virgem Imaculada. 6 Painéis da Paixão de Jesus. 7 Torre Brasília. 8 Painel do Cristo
Pantocrator. 9 Painéis da Vida Pública de Jesus. 10 Capela da velas. 11 Painel do Cordeiro Imolado.
12 Painéis da Ressurreição de Jesus.
83
dos deuses. Esta passagem o tornaria no grande protetor do povo egípcio e do seu
império, e iria garantir que o sol voltasse a brilhar todos os dias e o Nilo continuasse
tornar suas margens férteis.
Segundo Maria Carla Prette, nas regras da arte egípcia na pintura, o modo
de retratação da figura humana não seguia o modelo realista, mas esquemático e
convencional. Estas imagens não deveriam retratar os indivíduos como eram na vida
terrena e sim em sua natureza e substância, em sua essência, que acreditavam iria
sobreviver após a morte. Por conta disto, os artistas eram obrigados a pintar seguindo
uma código rígido de conduta, com regras precisas que permaneceram imutáveis
durante séculos. Pastro desenvolve seu trabalho baseado nas características,
principalmente, da arte egípcia, como a estilização das figuras, retratadas em plena
juventude, contornos lineares e preenchido com cores. A falta de profundidade sem o
uso da perspectiva, trás as figuras dispostas em um único plano paralelo ao observador.
31 32
31. Na arte egípcia as formas eram simplificadas, desenhadas em contornos lineares e preenchidos
com cores. Sem perspectiva, as figuras ficavam sobre um plano paralelo ao observador. 32. Na arte
bizantina, a representação do cristianismo como os ícones santos, usavam auréolas e o dourado.
Ainda criança nos ensinaram a andar, falar e brincar, mas nem sempre nos
ensinaram a sentir, como ouvir, cheirar, degustar, tocar ou ver. De uma forma natural, já
6
Luís Lima, professor e doutor com especialização em Cultura Contemporânea e Novas Tecnologias,
atua na área de investigação em filosofia e estética, leciona a disciplina de Teorias da Imagem, ministrada
no curso de Pós graduação do Mestrado de Ilustração e Animação pelo IPCA-Instituto Politécnico do
Cávado e do Ave, na cidade de Barcelos em Portugal.
86
contida na linguagem humana, aprendemos por nós mesmos a olhar. E é na visão que
se forma a imagem de mundo e de pessoa. Completadas pela audição, olfato, tato e
paladar é que percebemos e apreciamos as diferentes formas de construir, ler e sentir
a imagem. Antes da formação da imagem, a mensagem está sendo decodificada, mas
quando conseguimos montar as imagens é que a comunicação estará estabelecida.
Segundo Luís Lima6, doutor em comunicação e filosofia, e professor de Teorias
da Imagem, no curso de Mestrado em Ilustração e Animação em Barcelos, Portugal
– do qual tive o privilégio de participar em 2012, a imagem pode ser lida de duas
maneiras, sobre as quais retomaremos analisando em detalhes no capítulo de Leitura
da Imagem: a imagem sensorial e apreciativa e a imagem sígnica e perceptiva. A
primeira tem como base o pensamento e as sensações e a segunda se dá através do
significado da percepção. Três forças unem-se para formar a imagem: ARTE, com a
apreciação e percepção, CIÊNCIA, com a observação e experiência, e a FILOSOFIA,
com a reflexão crítica. Nesta ótica é que veremos, sentiremos, refletiremos e a
comunicação estará estabelecida.
Para Maria Carla Prette (2009), historiadora da arte e pesquisadora em leitura
da imagem, a arte é um poderoso meio de comunicação. Desde os primórdios, na
pintura rupestre, o homem começou a usar imagens para se comunicar com seus
semelhantes, quando ainda não havia o recurso da escrita. Estas imagens gravadas
em rochas, pintadas com tintas rudimentares como o próprio sangue e o carvão
vegetal nas paredes ou modeladas em argila, tinham um significado e carregavam
uma bagagem de pensamentos, de sentimentos e percepções.
Estas imagens, vindas de um passado remoto ou próximo, nos permitem
conhecer suas técnicas e nos fazem entender qual era o modo de pensar e sentir de
de uma época. Os ensinamentos, sobre a História da Arte, entram para compreender
a comunicação destes artistas, suas mensagens e por meio de suas obras, captar
visualmente conteúdos muito complexos. É por isso que Prette enfatiza que a
linguagem das imagens é direta, rica e poderosa, como todas as linguagens. Porém,
é preciso conhecê-la (PRETTE, 2009, p. 9).
Além de considerar os aspectos da comunicação entre a obra e o espectador,
como uma linguagem individual, temos que levar em conta também o processo de
87
comunicação de massa, onde o conjunto das obras na basílica tem como propósito os
ensinamentos evangélicos para o grande público. Os conjuntos de painéis de Pastro,
de dimensões monumentais, traços simples, esquemáticos e padrões de cores
facilitam, com sua padronização e organização, o entendimento deste público. Assim,
a estrutura montada através de uma necessidade retroativa, traz esta massa para o
processo de evangelização.
Mauro Wolf (2005), professor e pesquisador em comunicações de massa, cita
em sua obra Teorias da Comunicação de Massa, Horkheimer-Adorno:
Além dos materiais utilizados e as relações entre eles, Pe. Darci fala sobre as
cores da obra, seus significados e suas influências.
33
33. Vista das arcadas externas da Basílica de Aparecida, bem como o gradil que faz alusão à Pindorama:
Terra das Palmeiras. E o piso em granito simbolizando as águas do Rio Paraíba do Sul, onde foi
encontrada a imagem de Nossa Sra. Foto: Egidio S. Toda. Registro em dezembro de 2012.
90
capítulo 12 do Livro do Apocalipse. A mulher que está grávida para gerar seu filho, que
é o Cristo, mas por estar permanentemente grávida, é a imagem da Igreja que gera
outros Cristos, nós cristãos.
Segundo o reitor, a humanidade também é elevada à glória de Deus, por Maria,
a senhora da Assunção. É a humanidade que também é acolhida nos tabernáculos
do Céu. Se Maria é o tabernáculo, no sentido de que em seu útero recebeu Jesus
Cristo, que desceu até a humanidade, Maria representa a humanidade que sobe para
Deus. Se Maria era o tabernáculo de Cristo, Deus abriu os tabernáculos do céu para
recebê-la de corpo e alma. É a prefiguração da nossa ressurreição. Nós também um
dia estaremos na glória, junto de Deus.
Sobre o altar
Em sua entrevista, o Pe. Darci fez questão de ressaltar a importância do altar
como o centro do processo litúrgico e de evangelização.
Na Basílica temos uma cruz grega que cruza uma cruz latina. E, o importante,
o altar, está no centro. Ou seja, tudo o que aqui se realiza é cristológico,
é Jesus Cristo e é para Ele que nós caminhamos. Embora nós chamemos
a Basílica como Basílica de Nossa Senhora Aparecida, nós a entendemos
como a Casa da Mãe, mas para onde nós nos dirigimos para o encontro
pascal, com o Cristo Ressuscitado. Portanto, o centro desta Basílica é a
Eucaristía, que é o centro da Igreja, que faz a Igreja, pois sem Eucaristía não
existe Igreja. Por isso, toda arte e toda a arquitetura da Basílica converge
Fiquei pensando, pensando e um dia disse, tem que ser azulejo. Eu conheço
o Carlos Alvano, no Paraná, que trabalha muito bem azulejo, e azulejo é uma
linguagem que aguenta mil, dois mil anos, se ninguém atacar. Quer dizer,
a natureza em si não destrói o azujelo. E depois, pensei mais: é da nossa
tradição Ibérica. Portugal e Espanha nos trouxeram os azulejos. Vêm lá dos
turcos, mas a raiz, o centro do azulejo é a Antiga Babilônia. Porque se você
vai à Alemanha, por exemplo no Bauden Museum, no Pedragon Museum,
você vai encontrar os grandes portais da Babilônia. Aliás, isso me fascinou
há anos atrás e isso ficou em mim. Mas quando fiz o projeto da azulejaria
não pensei nisso. Estava inconsciente. Depois, refletindo é que passei a ter
consciência disso. Então o berço da azulejaria está onde hoje é o Irã e Iraque,
que é, por incrível que pareça, o berço do cristianismo. Porque de lá vem
93
se casar sempre vem montado num cavalo, que tem de ser branco. No Apocalipse, o
Filho de Deus é o esposo e a Igreja é a esposa. Por isso então, Ele vem sempre em
seu cavalo em cada culto, em cada missa.
No próximo capítulo veremos a leitura completa da imagem. Como entender
a mensagem da obra, a imagem pensamento e a semiótica da imagem, seus signos,
códigos, símbolos, índices e por fim o seu significado. Através de autores e teorias
sobre a construção da imagem, como Deleuze, Crary, Berkeley, Focault, Merleau-
Ponty, Rancière, Berguson, Prette e Bouleau, vamos fragmentar a obra do “Cordeiro
Imolado e Ressuscitado com a Cruz” e descobrir como cada parte desta imagem afeta
a nós como indivíduos e onde encontrar suas formas, linhas, contornos, harmonia,
equilíbrio, movimento e sua contemporaneidade.
95
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 3
34
34. Margens da Foz do Côa onde estão localizadas as gravuras ruprestes originais datadas de 36.000
anos Antes de Cristo, no Alto do Rio Douro, Portugal. Foto: Egidio S. Toda. Registro em junho de 2012.
35
35. Réplica de uma das gravura rupestre encontrada nas margens do Rio Côa, exposta no Museu de
Foz do Côa, Portugal. Foto: Egidio S. Toda. Registro em junho de 2012.
cavernas. Fabricava o arpão e o anzol e foi o inventor da agulha de osso que usava
para costurar suas roupas feitas de peles. Este homem, que era capaz de pensar e
de deter o saber, foi o primeiro a produzir signos e, a partir destes sinais é possível,
milhares de anos depois, ver e perceber as manifestações de seu desejo e interpretar
seu pensamento.
Desde este momento, o homem marca a sua entrada para a história. Com o
espetáculo da arte, ele representa a delimitação territorial e define suas necessidades
e domínios. Este domínio imaginário é a capacidade de colocar o espaço e o tempo
em uma época de confusão cronológica.
Mondzian ainda menciona Leroi-Gourhan para justificar a necessidade
do homem de libertar o pensamento do corpo e da manifestação artística como
comunicação, sem se prender ao tempo. A invenção da imagem e da vida, sem a
presença do homem-artista.
99
(MONDZAIN, 2007).
Podemos assim dar voz ao homem ausente e criar uma prosopopéia. Nós
somos capazes de entender a intenção do homem pré-histórico, através dos seus
sinais. Se temos a capacidade de produzir imagem, podemos receber esta imagem,
criando um circuito de comunicação: produzida, codificada e interpretada. Neste
momento, o homem primitivo, que começa a pensar e a saber, transforma-se em
homem moderno. A pré-história entra na história e a imagem ganha perenidade.
Gilles Deleuze fala da intensidade das imagens. Temos como exemplo a obra
de Edward Munch intitulada de O Grito, as pinturas de Lucian Freud ou as telas da
100
artista portuguesa Paula Rego. Estes trabalhos, com forte apelo no expressionismo ,
trazem com suas figuras distorcidas e às vezes desfiguradas, as forças para a partilha
do sensível (termo também utilizado por Rancière) ou a troca da sensibilidade. A
proposta do artista é, por meio destas formas de expressar seus sentimentos, fazer
o espectador sentir esta força e entender a obra. Quando tal troca é alcançada,
do espectador e da obra, constroem-se a força para a formação da imagem. Nós
recebemos, em toda forma de arte, forças para as construções destas imagens.
No livro ‘A busca do tempo perdido’, de Marcel Proust, o autor conta a história
de um rapaz doente, sua relação com o mundo social e uma viagem alucinada. É a
narração do estilo de vida da alta sociedade, e se criam dúvidas entre o limite racional
e irracional dessa sociedade. Só se consegue compreender esta obra quando se
estabelece a epifania7, que é a sensação de realização ou compreensão da essência
ou do significado de algo. A epifania dos sentidos da percepção do presente e que se
transporta para outro tempo.
O desfecho deste livro é feito em laços, na busca de suas respostas e de sua
entrada para este mundo irreal. A partir da presença do protagonista em um baile de
máscaras e seu encontro com a vice-condessa, é construído o rol das pessoas que
morreram. Na verdade todos estão mortos e aí o livro começa.
Deleuze comenta este livro de Proust. A formação de todo um imaginário:
artistas, músicos, trilhas sonora, cenários... um novo mundo! É a vivência de duas
realidades e a intensidade dos acontecimentos. Vários momentos que se ligam
formando vasos comunicantes. Onde todos os personagens produzem epifanias.
Quando entram em contato uns com os outros, um acontecimento único é formado.
Para Deleuze, é como o Rizoma8 é formado, a criação de uma teia que vai atrair os
personagens. Este rapaz é surdo e mudo e reage por vibrações. Deleuze defende a
ligação dos neurônios pela sinapse, onde o sinal não é cármico, mas físico e material.
Deleuze procura esta relação: da sensação do consciente e da criação da teia que
7
Aparição ou manifestação divina.
8
A noção de rizoma, como um modelo epistemológico ou descritivo, foi adotada a da estrutura de
algumas plantas, cujos brotos podem ramificar-se em qualquer ponto, como raiz, talo ou ramo.
101
entra em contato uns com os outros, da origem como multiplicidade e não como
unidade. Deleuze e Proust acreditam que a origem “Deus”, como criador e imagem,
não é única e sim múltipla.
9
Objeto cilíndrico, em cujo fundo há fragmentos móveis de vidro colorido, os quais, ao refletirem-se
sobre um jogo de espelhos dispostos, produzem inúmeras combinações de imagens.
103
fragmentadas é que se cria uma nova imagem. Como no filme de Godard, é necessária
a exposição de múltiplas imagens para se produzir o sentido. É a multiplicidade
para a construção do entendimento e, a partir do caos, vem a interpretação. Toda
esta informação só funciona como um todo, nós como espectadores vamos ter
esta apreciação, a partir da experiência de cada um. Com a junção de todas estas
experiências estéticas é que podemos construir a nova Imagem .
Em seu livro O Espectador Emancipado, Rancière questiona também a
imagem intolerável. Aquela que à primeira vista parece perguntar quais são os motivos
característicos que nos tornam incapazes de olhar para uma imagem sem experimentar
dor ou indignação, ou qual o limite de tolerância proposto pelo artista para a visão dos
outros. O autor defende uma dialética que conduz à política das imagens. De uma
lado, a imagem desempenha o papel de denunciar a realidade como descrição do
acontecimento real, enquanto do outro lado, a outra imagem denuncia a miragem
como o sentimento produzido destes acontecimentos (RANCIÈRE, 2010, p.125).
10
Da antiga Grécia traz o significado de uma introdução aos mistérios do sagrado.
106
36
36. Painel do Cordeiro Imolado e Ressuscitado com a Cruz, localizado na Nave Leste, é o painel frontal
do “Fundamentos da nossa Fé. Foto: Arquivo pessoal. Cortesia de Cláudio Pastro.
37
37. Montagem sobre o painel do “Cordeiro Imolado e Ressuscitado com a Cruz” com destaque
do Cordeiro Imolado. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
38
38. Montagem sobre o painel do “Cordeiro Imolado e Ressuscitado com a Cruz” com destaque
do Grande Cavalo. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
109
De acordo com Pastro, o cavalo representa o cavalo branco do Apocalipse, que no fim
dos tempos vai trazer o Cristo ressuscitado.
Em sua postura ereta e de obediência, se prepara para carregar o pequeno
passageiro agonizante e galopar nesta longa viagem transcendental. O encontro do
tangível e o intangível, do visível e o invisível, do material e imaterial, do corpo e o
espírito do desencarnar para renascer.
Pastro, em seu livro “O Espaço Sagrado Hoje”, reforça seu significado como
sendo o símbolo maior do cristianismo. É o símbolo da Redenção Universal, da
Reconciliação e da Paz. É a vitória da vida quando um homem de nome Jesus esteve
ali de braços abertos, num gesto de reconciliação e confraternização. Este Homem-
Deus uniu em si os dois extremos, como as traves em que esteve pregado. A cruz
lembra, de um extremo, a morte e o mundo presente como trave horizontal e, no outro
extremo, aponta para cima, para a eternidade e para a ressurreição, na trave vertical.
Ali, “tudo está consumado”.
39
39. Montagem sobre o painel do “Cordeiro Imolado e Ressuscitado com a Cruz” com destaque
da Cruz. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
Logo atrás da cruz e abaixo do cordeiro temos o Altar (figura 40). O Altar é
o centro, a razão de ser do espaço sagrado, é o lugar do sacrifício cultual. Esta é a
verdade fundamental própria a toda religião. É neste lugar que se efetua o encontro
de Deus e o homem, é o lugar da oferenda, do rito do sacrífico do cordeiro imolado.
Como uma sólida rocha, esta base de pedra maciça escura tem inscrito o
texto do livro do Apocalipse, capítulo 5 versículo 9, onde diz: “Redimiste para Deus,
por teu sangue homens de toda tribo, língua, povo e nação.” E, em suas pontas sobre
o Altar a primeira e última letras do alfabeto grego, Alpha e Ômega que representam
o princípio e fim, a razão de tudo e para onde tudo conflui.
A simbologia deste altar, diferentemente do altar do templo que induz à
celebração, é a de um local sagrado de imolação, à semelhança dos sacrifícios que
os próprios judeus e outros povos realizavam. A grande distinção neste caso é a de
que o cordeiro, retratado por um animal presente em muitas profecias do judaísmo
no Antigo testamento, representa o próprio Deus redentor. Em suma, o mistério é a
realidade presente.
111
40
40. Montagem sobre o painel do “Cordeiro Imolado e Ressuscitado com a Cruz” com destaque
da Altar. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
41
41. Montagem sobre o painel do “Cordeiro Imolado e Ressuscitado com a Cruz” com destaque
dos Sete Candelabros. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
42
42. Montagem sobre o painel do “Cordeiro Imolado e Ressuscitado com a Cruz” com destaque
dos Vasos de Incenso. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
114
a soma de todas estas características construa uma segunda interpretação, uma nova
imagem. Este painel, que aparentemente parece ser de fácil entendimento, mostra-
nos uma complexa mensagem de elementos codificados, ora separados, ora juntos,
para a construção do significado final do Cordeiro Imolado.
Apesar da violência visual do vermelho, que é o sangrar do animal até a sua
morte, o artista cria uma tolerância para que o espectador continue sua observação e
entendimento. A mensagem verdadeira é que a partir do ato cruel, que é o sacrifício
e a morte, vem o renascer. A denúncia da miragem, que vem da tranquilidade e a
passividade do cordeiro e da cor, como sinônimo do sangue, não constroem uma
imagem intolerável.
Maria Carla Prette (2009), em seu livro Para entender a Arte, mostra-nos
uma das formas de como ler uma obra de arte e compreender como esta arte é um
poderoso meio de comunicação. Para significar é preciso conhecer a bagagem cultural
de cada indivíduo, seu pensamento, seu sentimento e suas percepções. Quando
estamos diante de uma obra de arte, é preciso dispor de algumas informações prévias
que ajudam no significado, como: autor, título, data que foi realizado, dimensões, a
localização, técnica utilizada, materiais e o gênero. Com base nestas informações
estabelecemos códigos e subcódigos para determinar sua categoria, como: pintura,
escultura, arquitetura ou artes aplicadas, e seu gênero: arte sacra, arte profana,
temas mitológicos, realista, histórica, retrato, natureza morta... E, a partir desta base,
podemos proceder à sua leitura.
Prette ainda menciona como a leitura descritiva, mais chamada de denotativa,
nos diz, o que se vê na obra, seus detalhes reais, suas cores, formas, a descrição
pura daquilo que se está percebendo com o olhar, ouvir, degustar, cheirar... sem uma
preocupação com a emoção, ou a sua representação. É a leitura pura e simples e seu
significado imediato. E como a leitura interpretativa, também chamada de conotativa,
constitui a parte mais complexa da leitura. Interpretar a obra significa compreender a
proposta do artista, sua mensagem e o que este artista quer passar como comunicação.
115
aquelas que vão do amarelo ao vermelho e cores frias, as cores que vão do verde
ao azul. As cores quando justapostas se destacam diferentemente, dependendo do
contexto onde se encontram, as cores luminosas dão a impressão de avançar ao
observador e aquelas mais escuras ou frias, de afastar.
As cores que percebemos são produzidas pela luz. A luz do sol, aparentemente
branca, é, na verdade, composta pelas sete cores do arco-íris. Quando a luz do sol
ilumina um objeto, algumas dessas cores são absorvidas pelo objeto, enquanto as
outras são refletidas na direção dos olhos que as percebem. É nesse o fenômeno, na
direção dos olhos que as percebem, que nos permitem dizer qual a cor dos objetos.
Cor pigmento é a substância material que, conforme sua natureza, absorve, refrata
e reflete os raios luminosos componentes da luz que se difunde sobre ela. A cor-
pigmento é a substância usada para imitar os fenômenos da cor da luz. Essas tintas
podem ser extraídas de vários materiais, alguns de origem vegetal, outros de origem
animal ou mineral. As cores primárias de cor-pigmento, das quais conseguimos obter
todas as outras, são: Azul ciano, rosa magenta e amarelo, ou no termo em inglês,
cyan, magenta e yellow.
Podemos dividir as cores em primárias: as cores que não podem ser formadas
pela soma de outras cores (são irredutíveis) Vermelho, Amarelo e Azul. Secundárias:
cores formadas pela mistura de duas cores primárias em iguais quantidades ou iguais
intensidades. Verde, Violeta e Laranja. Terciárias: resultam das diferentes misturas das
cores em intensidade e quantidade diferente. Para a psicodinâmica das cores, a cor
é vista e impressiona a retina. A cor é sentida e provoca emoção. A cor é construtiva,
pois tendo um significado próprio, possui valor de símbolo, podendo assim, construir
uma linguagem que comunique uma idéia.
Charles Bouleau: O significado através da trama e da geometria
A arte monumental: Determina-se monumental a escala maior que a do
homem, de acordo com o volume de sua massa e as dimensões de seu tamanho. A
arte monumental está associada ao espaço que nos rodeia e percebemos de forma
distinta seu objeto. A contemplação acontece não só através da visão, mas, observando
todo o movimento que envolve este objeto. A percepção do movimento do espaço de
118
43 44
43. Pintura sacra de São João Batista, que foi o precursor de Cristo, do artista Francesco del Cossa,
século XV, exposto na Pinacoteca de Brera, Milão. 44. Detalhes carregados de atributos e significados:
bastão com a imagem do Cordeiro que é o símbolo de Cristo, vestimenta de pele de camelo para provar
que viveu no deserto uma existência de privações, o lagarto pintado aos seus pés é o símbolo deste
ambiente árido e selvagem.
122
para Deus, por teu sangue homens de toda tribo, língua povo e nação”. Uma cruz em
tom de dourado, em primeiro plano, brilha como o texto da Escritura, de mesmo tom.
Destaque para a figura do Cordeiro, de cor branca, que se revela no fundo vermelho.
A figura de contorno vazado, do grande cavalo, se confunde com o mesmo fundo
escarlate. Acima e pendurados, encontram-se os sete candelabros dourados, em
formas triangulares e sua luz circular (figura 36).
Suas formas com traços simplificados lembram a arte egípcia e a arte para
o culto, os vasos laterais a queimar o incenso, os candelabros e a própria cruz,
fazem menção a este culto. O animal como simbolismo divino, como o cordeiro e sua
representação de Jesus, o filho de Deus e o grande cavalo que irá carregá-lo para a
ressurreição. A bi dimensionalidade de seu painel de azulejos e suas cores chapadas
como o vermelho, branco e os tons de castanho escuro e dourado, reforçam a relação
com a arte do antigo Egito (figura 45).
Além do quadrado vermelho, o retângulo do altar, os círculos da luz dos
candelabros, a forma triangular aparece com bastante intensidade. Observamos os
triângulos nos vasos laterais, nos candelabros, e nas junções dos vasos com a parte
superior do candelabro central, das extremidades horizontal da cruz e sua ponta
vertical inferior e o retângulo reaparece na forma não definida das fumaças dos vasos
laterais (figura 46).
Ponto: Quando entramos no interior da basílica, ao chegarmos à ala leste,
vemos de longe um ponto vermelho que se destaca dos demais painéis, pela cor
(figura 47). Ao nos aproximarmos, este ponto vermelho torna-se quadrado, e dentro
dele aparece outro ponto, formado pelo contraste do branco com o vermelho, que é
a figura branca do cordeiro imolado bem ao centro deste quadrado rubro (figura 48).
Contornos e linhas: Todas as figuras são construídas com linhas retas e
curvas, mostrando uma delicada construção figurativa. O grande quadrado de linhas
retas, formado pelo contraste do vermelho e do branco, é base deste painel. A figura
da cruz em linhas retas no tom dourado, que clareia ou escurece, dependendo da
posição do olhar, sem contorno definido, aparece através do contraste do castanho
escuro e o fundo vermelho. O altar em castanho escuro também com suas linhas retas
e angulares, como um retângulo, sem contorno definido, revela o texto da Escritura
125
45
45. Pintura antiga egípcia no interior da tumba de Ramsés I. A Lei da frontalidade predomina
nos desenhos e suas representações. Pés e cabeça para o lado e tronco e corpo para frente.
46
46. Esquema das formas sobre a obra do Cordeiro Imolado. Círculos em azul, retângulos em
verde e triângulos em vermelho. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
126
47
47. Vista dos painéis que compõem os Fundamentos de Nossa Fé. No alto de 15 metros do chão, de
longe vê-se o ponto formado pelo quadrado vermelho. Foto: Arquivo pessoal. Cortesia: Cláudio Pastro.
48
48. Esquema do ponto sobre a obra do Cordeiro Imolado. Nota-se a formação do ponto na figura central
do Cordeiro, e única de cor branca, no quadro vermelho. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
contornos definidos, formados apenas pelo contraste do fundo branco com o dourado,
deixam subir em linhas sinuosas sua fumaça. Na sequência dos candelabros iguais,
é formada uma linha horizontal que atravessa o quadrado vermelho e, na junção
dos vasos e suas fumaças são formadas, na direita e na esquerda, linhas verticais a
atravessar a moldura branca (figura 49).
Simetria: Se dividirmos o painel ao meio, através de um eixo vertical, temos
a distribuição das formas regulares e elementos, num equilíbrio visual e harmonioso
que agrada aos olhos atentos. Do lado esquerdo três candelabros e meio dividem o
espaço com metade da cruz e altar e um vaso com sua fumaça. A massa de texto
com a letra alfa também é dividida de forma igual, assim como o quadrado vermelho
e a parte traseira do grande cavalo, que distribui seu peso com a metade frontal do
cordeiro branco. Do outro lado, o lado direito, temos as mesmas figuras e elementos,
apenas modificada com a letra ômega do altar e invertida com a parte da frente do
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49. Esquema dos contornos e linhas sobre a obra do Cordeiro imolado. Os contornos estão em traçados
contínuos e as linhas imaginárias em tracejados. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
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50. Esquema de simetria sobre a obra do Cordeiro Imolado. Os elementos da esquerda são
iguais ao da direita nas formas, quantidade e tamanho. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
51
51. Esquema de simetria sobre a obra do Cordeiro. Os elementos se diferem nos animais e
nas letras alfa e ômega, mas há um equilíbrio. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
130
52
52. Esquema de geometria e tramas sobre a obra do Cordeiro Imolado. A teia é formada a partir do
cordeiro e atinge todos os outros elementos, como uma planta. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
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53
53. Esquema de geometria e tramas sobre a obra do Cordeiro Imolado. Os círculos e o semi-círculos
estão presentes como ornamentos. A partir dos pontos áureos do pentágono saem as retas para
posicionar todos os elementos. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
54
54. Esquema de geometria e tramas sobre a obra do Cordeiro. Nos traçados contínuos, em amarelo,
vemos todos os movimentos, e sua dinâmica, visíveis, como a fumaça e os biomecânicos. E nos
tracejados, os invisíveis como o triângulo e a relação com o fogo. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
133
55
55. Esquema de geometria e tramas sobre a obra do Cordeiro Imolado. As paralelas principais, em
amarelo, foram formadas a partir das linhas dos candelabros. A partir destas paralelas formam-se as
ortogonais para a base da construção dos elementos. Montagem sobre foto: Egidio S. Toda.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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e Arquivo - CDM – Centro de Documentação e Memória da Basílica de Nossa Senhora
Aparecida.
Doc. 2: Autor desconhecido - Construção da Nova Basílica – Documentário e Notícias
– 1955 a 1988. Aparecida, CDM – Centro de Documentação e Memória da Basílica de
Nossa Senhora Aparecida, 1992.
Foto no. 2372: Placa de responsabilidade civil pela obra – Arquivo do CDM - Centro de
Documentação e Memória da Basílica Nacional de N. Sra. Aparecida.
Foto no. 4037: Morro das Pitas – antes dos trabalhos de terraplenagem – Arquivo do
CDM - Centro de Documentação e Memória da basílica Nacional de N. Sra. Aparecida.
Foto no. 2706: Morro das Pitas – trabalhos de terraplenagem - Arquivo do CDM -
Centro de Documentação e Memória da Brasília Nacional de N. Sra. Aparecida.
Foto no. 2593: Início das obras de concretagem da Nave Norte (observa-se o
arquiteto Benedito Calixto ao centro de terno e boina) - Arquivo do CDM - Centro de
Documentação e Memória da Basílica Nacional de N. Sra. Aparecida.
Foto no. 2684: Início das obras da Nave Norte (da direita para a esquerda: cardeal
Dom Carlos Motta, arquiteto Benedito Calixto, um padre redentorista e Dom Macedo
– bispo auxiliar) - Arquivo do CDM - Centro de Documentação e Memória da Basílica
Nacional de N. Sra. Aparecida.
140
Foto no. 2461: Vista das obras da Nave Norte - Arquivo do CDM - Centro de
Documentação e Memória da Basílica Nacional de N. Sra. Aparecida.
Foto no. 2631: Nova vista das obras da Nave Norte – Arquivo do CDM - Centro de
Documentação e Memória da Basílica Nacional de N. Sra. Aparecida.
Foto no. 3056: Vista das obras da Nave Norte – estruturas de madeira para sustentação
da concretagem das arcadas - Arquivo do CDM - Centro de Documentação e Memória
da Basílica Nacional de N. Sra. Aparecida.
Foto no. 2830: Vista Geral das obras da Nave Norte – Arquivo do CDM - Centro de
Documentação e Memória da Basílica Nacional de N. Sra. Aparecida.
Foto da Inauguração da Torre da Basílica (com a presença do então presidente da
República, JuscelinoKubitschek e do Cardeal Motta) - Arquivo do CDM - Centro de
Documentação e Memória da Basílica Nacional de N. Sra. Aparecida.
Foto da Planta do Santuário- Arquivo do CDM - Centro de Documentação e Memória
da Basílica Nacional de N. Sra. Aparecida.
Ecos Marianos, no. VII – 1940.
Ecos Marianos, no. VII – 1949.
Ecos Marianos da Basílica Nacional – A planta da Basílica Nova – 1952.
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Jornal O Lince – Aparecida – Ano 2, nº14, fev 2008).
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Jornal OESP – O Estado de S.Paulo, 05 jul 1980.
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141
Internet
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Conceição Aparecida – http://www.a12.com/santuario/media/arq/ Cronologia_do_
Santuario.pdf - em 29/09/12.
Entrevistas
CUNHA, Zenilda. Orientadora de visitas do Santuário Nacional de Nossa Senhora
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PASTRO, Cláudio. Artista de arte sacra. São Paulo, São Paulo, em 07/09/2012.
NICIOLI, Darci. Reitor do Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida. Aparecida,
São Paulo, em 12/09/2012.
Aulas
LIMA, Luís Filipe Monteiro. Teorias da Imagem. Mestrado de Ilustração e Animação
pelo IPCA-Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, Barcelos, Portugal, em 17, 18, 24
e 25/05/2012.
142
ANEXOS
ANEXO 1
ENTREVISTA COM O SACRO PLÁSTICO CLÁUDIO PASTRO
1º. BLOCO
Eu sou Egidio Shizuo Toda. Hoje é 7 de setembro de 2012, às 18h35. Entrevista
com o artista sacro brasileiro Cláudio Pastro, responsável pela arte interna da basílica
de N. Sra. Aparecida. Esta entrevista faz parte da pesquisa de mestrado em Arte,
História, Comunicação e Cultura, pela Universidade Mackenzie.
líamos (a bíblia) com elas, com as irmãs. E havia alguns movimentos. Por exemplo,
nós crianças, adolescentes e depois jovens fazíamos parte de algumas equipes, que
eram chamadas: “equipe Partis”, “equipe Lumen Christi”, “equipe Gaudium Christi”,
através das quais disputávamos de tudo, desde conhecimento, até jogos, futebol
e outras coisas, fazendo parte então da igreja que era no próprio convento das
Irmãzinhas da Assunção. Depois elas perceberam que eu gostava de arte. Eu me
conheço sempre com arte, desde os quatro ou cinco anos de idade. Minha mãe era
modista, era costureira. Então eu ficava de olho em como ela desenhava as roupas.
Naquela época não se tinha grandes elementos. Por exemplo, papel era uma coisa
que não existia para a gente praticamente. Então minha mãe juntava papel de padaria,
que era um papel escuro, acinzentado, onde se punha o pão, e a gente desenhava ali.
Então, às vezes ela se sentava na escada de casa e pedia que eu desenhasse o que
eu quisesse, enquanto ela fazia os desenhos dela.
2. Egidio – então nessa época eu imagino que você se descobriu como artista
plástico, nesses ensaios, papéis, nesses primeiros contatos com esses materiais? E
a sua mãe pode ser considerada a pessoa que o instigou a desenvolver esse trabalho
artístico?
Pastro – não necessariamente. Um pouco talvez indiretamente. Mas, por
exemplo, na igreja, tudo era muito bonito, muito elegante, tudo era muito cuidado.
Então por exemplo não se falava na igreja em hipótese alguma. O que se fazia eram
pequenos sinais para se falar fora. As mulheres tinham que se vestir muito bem – de
preferência todas as mulheres usavam véu. E se a camisa era como a minha (de
mangas curtas) punha também um véu na mulher, porque isso já era indescente,
naquela época. Os homens tinham que usar paletó. No fundo da igreja havia uma
série de casacos para quem não tinha paletó.
2º. BLOCO
3. Egidio – a outra pergunta é sobre o início da carreira como artista plástico,
como foi e se alguém em particular o instigou?
Pastro – antes de mais nada é preciso dizer que a minha formação vem muito
da contemplação do próprio mistério. Desde adolescente e jovem, como na igreja
144
era tudo em gregoriano e em latim, onde ninguém entendia nada, mas não é preciso
entender, é preciso “entrar na dança”, como se fala, entrar naquele movimento, aquilo
era bom. Educou muito o meu espírito. Me deu um espírito, acredito que muito mais
forte, porque que eu vejo que hoje as pessoas são muito descentralizadas, não estão
centralizadas em si. Aí, respondendo à sua pergunta, eu penso que recebi muito
no convento das Irmãzinhas da Assunção, mas depois eu quis fazer Belas Artes.
Estudei sempre no Estado (em escola estadual). Naquela época os professores eram
excelentes e eles achavam que eu deveria fazer Belas Artes. Naquela época só havia
duas escolas de Belas Artes em São Paulo: o Liceu de Artes e Ofícios, onde hoje é a
Pinacoteca e a FAAP. Aquela época, dos anos 60, correspondia aos anos da Ditadura
e em termos de igreja, porque estamos falando de arte sacra, corresponde ao grande
evento do Concílio Ecumênico Vaticano II.
Nesse período, o papel era caro, o lápis era caro, porque tudo era importado.
Máquina fotográfica era caríssima e era luxo. Então nessa época, eu e minha família
não tínhamos condições. Aí, fui fazer o que era de moda na época, e era o curso
mais barato – foi o de ciências políticas - ciências sociais, pela PUC de São Paulo.
Terminei em 1972 e não aguentava. Eu nunca ouvi tanta bobagem na minha vida.
Em casa o estímulo era o contrário. Em casa eu chegava e desenhava, abusava da
mente. Quando terminei a faculdade, queria comprar um apartamento, como todo
jovem. Mas uns amigos meus, aos quais eu agradeço até hoje, me disseram: não, vai
pra Europa, você é novo. A Europa tem muita arte e assim você fica conhecendo muito
mais. De fato resolvi ir para a Europa. Eu tinha dado aulas em cursos de madureza
e de vestibular que estava começando (isso foi a fonte de algumas economias). Fui
para a Europa e fiquei encantado. Fui por um mês e fiquei três meses. Quando você
é jovem passa fome, vive com sanduíches, qualquer coisa serve.
Aí visitei alguns países da Europa, e quando voltei para o Brasil, durante um
ano não queria trabalhar. Eu achava aqui terrível, porque tudo é muito abrutalhado,
em termos de trabalho. E na Europa, era arte por toda parte. Nessa época meu gosto
pela arte foi se acentuando mais ainda.
4. Egidio – qual o primeiro lugar que você visitou?
Pastro – primeiro foi a Itália. Depois fui à França, fui à Espanha, à Portugal, à
145
Alemanha e à Inglaterra.
5. Egidio – Chegar à Europa pela Itália foi proposital?
Pastro – pela Itália, porque eu tinha amigos de lá no Brasil, que nesse caso
me ajudaram um pouco.
6. Egidio – Essa saída teve relação com a instituição na qual você estudava
à época?
Pastro – não. Fui por conta própria. Naquela época o professor ganhava muito
bem. É preciso saber disso. A tal ponto que ao invés de um mês na Europa eu fiquei
três e mais um ano sem trabalhar,porque eu podia. O ano de 73 foi o ano que eu não
trabalhei. Depois, através de amigos, comecei meus trabalhos. O primeiro trabalho
meu mais consistente, ligado à arte, foi num projeto da Prefeitura de São Paulo, na
região da Zona Leste – em Itaquera. E aí comecei a me dedicar mais à arte, quando
em 1976 ou 77, veio um grupo de italianos, amigos de amigos de amigos meus, entre
os quais um grande marchand, Francesco Ricci, que numa exposição de Itaquera eu
tinha 10 trabalhos e ele comprou os dez. A temática já era a temática sacra. Fiz uma
composição em couro para ser colocada numa porta de capela. Quando ele comprou
os 10 trabalhos era o mês de agosto. Por volta do mês de novembro, eu recebi cópia
dos 10 em postais de natal. Em abril do ano seguinte, na Páscoa, ele veio ao Brasil
e me deu dinheiro de direitos autorais. Então foi um estímulo muito grande. A partir
de então voltei as costas para todos os outros pensamentos e passei a me dedicar
exclusivamente à arte sacra.
Nessa época, também para sobreviver, dava aula de cerâmica para madames.
Por exemplo, dei aula na faculdade dos e das salesianas em Lorena. Em Santo André,
dei aula de estética. Eram coisas pra sobreviver, enquanto se firmava o aprofundamento
meu com a arte sacra e também até começar ser conhecido um pouco. Foi muito difícil.
Dificílimo, porque aqueles anos 70 e final de70 para 80, foi um período de ditadura,
pós concílio, etc, quando surge na Igreja a famosa teologia da libertação. E, creio eu,
que muito por causa da ditadura, a Igreja quis enfrentá-la e, nesse confronto, passa
a se dedicar, através da teologia da libertação, mais ao trabalho social do que a ela
mesma. Nesse momento em que eu estava surgindo, fui abafado, porque chamavam
arte de luxo. E não perceberam, intencionalmente ou não, porque era um misto de
146
fazendo correlação com o que acontece hoje, que o dinheiro não era o centro da
família. Era o bem estar, era outro mundo.
3º. BLOCO
7. Egidio – Pastro, conte-me sobre a sua formação profissional e acadêmica.
Pastro – eu sou formado em ciências sociais. Nunca trabalhei com isso. Para
remuneração trabalhei com cursos, tanto de madureza quanto de preparação para
vestibular e até aulas de estética na faculdade. Mas quando o marchand me deu o
impulso primeiro, aí voltei à Europa e lá fiquei nos anos de 78 e 79, voltando em 81. Foi
quando estudei muito. Estudei na Academia de Belle Arte Lorenzo DaVitergo, na Itália,
onde fiz dois anos de curso direcionado para arte sacra. Mas os cursos eram mais
técnicos. Então, por exemplo, o conhecimento da pedra do arenito. O conhecimento
técnicas de afresco, técnicas a óleo, etc. Mas aí fiz outros cursos também, em paralelo,
por exemplo, na Catalunha, em Barcelona, no Museu Nacional de Artes da Catalunha.
Fiz também um curso muito bom de cerâmica no mosteiro beneditino de Turnay, na
sul da França. Então foram vários cursos que me ajudaram muito. Mas acredito que
o que mais me ajudou foram as viagens e as amizades, porque arte é uma coisa que
você tem que vivenciar. Não adianta ser muito teórico, muito embora eu pesquise
muito. Sou muito conhecedor, acredito eu, tanto em arte sacra quanto em liturgia.
Porque para fazer arte sacra você tem que conhecer profundamente liturgia. Então
não pode ser só arte sacra. Aliás não é só uma questão do tema. Arte sacra é uma
questão muito profunda. Por isso que nos meus cursos e livros faço bem a distinção
entre arte religiosa, que é intimista, subjetiva, devocional, e arte sacra, que é a arte do
culto. É bem diferente. A maior parte das vezes, a arte religiosa, devocional, contradiz
a própria fé. No caso, a fé cristã.
A gente encontra isso em outras religiões, por exemplo, é muito diferente o
budismo na China continental e no Tibet e no Japão, do budismo na China insular de
Formosa, onde já é um budismo decadente. Estabeleço o mesmo paralelo da arte
sacra e da arte religiosa. E assim outras religiões têm o mesmo problema, como o
islamismo, etc.
8. Egidio – Vamos falar um pouco sobre o trabalho. Além do trabalho que está
148
que a Alemanha Oriental ainda era extremamente atrasada, mesmo agora, porque ela
está se desenvolvendo aos poucos. É interessante, porque as mulheres alemãs nos
últimos 10 ou 15 anos conquistaram novamente essas terras onde viveu Gertrudes,
reuniram dinheiro de todas as mulheres das paróquias da Alemanha, compraram essa
propriedade em que tudo estava em ruínas, depois de 800 anos. E aí se levantou tudo
e inclusive fui convidado para levantar a capela da Adoração, onde se diz que santa
Gertrudes teve suas primeiras visões místicas. É uma igreja bonita, toda em pedra,
que foi trabalho meu. Depois também tem algumas igrejas em Roma.
9. Egidio – sobre Roma: gostaria de comentar sobre uma observação de meu
orientador de mestrado, de que Cláudio Pastro é o único artista brasileiro que tem
uma obra exposta no Museu do Vaticano.
Pastro – não sei se sou o único. Em 1995 me foi pedido que eu criasse uma
imagem do Cristo para o terceiro milênio. Então eu preparei, baseado nos Cristos
Pantocrator, senhor do universo, que o Brasil não conhece porque nós não vivíamos
a 1000 anos atrás, 1500 anos atrás.Baseei-me nisso por que? Primeiro porque a Igreja
está voltada para o Concílio Ecumênico Vaticano II, e então se é ecumênico envolve
tanto o tempo cronológico como também todo o espaço e ecumênico, quer dizer, não
a ligação com igrejas não cristãs, abertura sim para todos, mas a idéia era de unidade
com as igrejas cristãs separadas. Então, por exemplo, graças ao Concílio Ecumênico,
de 50 anos atrás, dele participaram os padres e monges da Igreja Oriental. Então
mudou muito a cabeça da Igreja Católica. E nós recebemos uma grande influência
da Igreja Oriental na arte. Porque a Igreja católica romana, desde o século XI ela
chutou os artistas. A partir de então só chama os artistas quando têm grande nome,
para fazer um grande trabalho. Enquanto que na Igreja Oriental os artistas fazem
parte dos chamados grandes ministérios. Então têm bispo, padre, diácono e artista.
Assim o artista está envolvido pela igreja. Ele não é um simples artista, mas faz parte
dos cânones da igreja, em todos os sentidos. E aí, por exemplo, depois do Concílio
Vaticano ll, da década de 60 para cá, os católicos romanos, quer dizer, os católicos
do ocidente, não têm uma arte sacra precisa. Têm só uma arte religiosa e de baixa
qualidade. São esses santinhos que a gente vê por aí.
10. Egidio – sobre a basílica de Aparecida. Que tipo de demanda foi recebida
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eu fui dizendo tudo o que pensava, como sempre disse, até hoje. E acredito que foi
por isso que eu fui ficando. Ficamos esses nomes que eu já citei e depois, quando
eu já tinha sido transplantado de fígado, um belo dia Dom Aluísio Loscheider veio me
visitar no hospital e disse: “ Cláudio, a partir de agora é só você. Fica nas suas mâos”.
Aí eu ainda brinquei com ele: vocês ainda acreditam num pré-defunto? Eu achava que
realmente iria morrer logo, porque é muito duro o coma, transplante, de fato até hoje
estou metido nisso. Mas eu tento (me) desafiar. Trabalho sem parar.
11. Egidio – a próxima pergunta é inevitável. Por que você aceitou esse
trabalho, em função da seriedade da realidade que você vivia?
Pastro – não acredito com a maior sinceridade que foi por orgulho meu, porque
sabia que a tarefa era duríssima. Também, graças a Deus, eu tinha e tenho pessoas
que me assessoram muito bem. Imagine, em Aparecida, os empregados registrados
são 1.800. Mas eu trabalho numa equipe de cinquenta e poucas pesssoas, entre
arquitetos e engenheiros. Depois tem onde fazemos a azulejaria, porque ela (a
Basílica) está sendo revestida na maior parte por azulejos, que é no Paraná, em
Campo Largo. Ali temos umas 30 pessoas e um excelente pintor de azulejos, que é
meu amigo há muitos anos e que me é muito fiel. Se eu fizer um pingo errado, ele
copia o pingo errado. Então isso para mim é muito importante para um bom trabalho.
E a equipe que trabalha em Aparecida é realmente muito boa. Tudo o que é granito
vem de uma outra equipe também grande, de trinta pessoas. Então eu aceitei porque,
como se diz na gíria, eu entendia do riscado. Porque você não pode imaginar o que
tem por detrás.
Quando comecei o trabalho, tinha padres que achavam que eu deveria
transformar as janelas, porque janela para rezar tem que ser gótica. E eu dizia, mas
o edifício que é o que determina o estilo das janelas não é gótico, ele é basilical
românico, como nos séculos IV, V e VI.
Egídio: o próprio arquiteto Benedito Calixto define a basílica como neo-
românica.
Pastro – e de fato é neo-românica, porque ele concebe a arquitetura da basílica
no período dos neos – fim do século XIX e primeira parte do século XX. Então, nós
temos a catedral da Sé de São Paulo que é neo-gótica. Apesar de um certo ecletismo,
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ela é neo-gótica. Então tinha padre que queria revestir todo o interior da basílica com
mármore. Aí eu disse, então vamos entrar num grande túmulo… Depois tinha outros
que queriam que fizesse com gesso o barroco. E eu dizia, meu Deus, o barroco já
morreu fazem três séculos. No Brasil ficou um pouco mais, mas já morreu. Não há
nada de barroco na vida atual. Ainda mais depois do Concílio.
Um outro detalhe. Com que revestir as paredes? Eu sempre pensei no tijolo,
porque o tijolo é a terra brasileira. O tijolo, do ponto de vista físico é termo-acústico.
Ele é ótimo para um lugar aonde vão 30, 50 mil pessoas se agruparem dentro. Ele é
sonoro. Tem tudo isso. O fato de ser térmico é um elemento muito importante, apesar
de que a arquitetura do Calixto Neto é muito boa. Eu sempre digo, brincando, que a
Basílica de São Pedro, em Roma, tem três portas para você entrar e são as mesmas
três para você sair, sendo que uma fica sempre fechada. A basílica de Aparecida tem
24 pórticos, além da belíssima arcada externa que dá a volta nela toda. Então ela é
extremamente arejada, agradável. Você pode estar participando com outras 30 mil
pessoas lá dentro ou pode estar participando lá de fora, andando pelas arcadas que
são muito bonitas. Aliás, o Benedito Calixto Neto recebeu um prêmio lá no Vaticano
por esse projeto. Um grande prêmio na época. Acho que foi em 1952 ou 53.
Então pensei também, se eu for pintar a Basílica, primeiro que o afresco é
muito difícil e muito demorado, penoso, trabalhoso, duro. Depois se for pintar numa
outra técnica de afresco, sempre vai ter restauração. E quem conta um conto, aumenta
um ponto. Quem vai restaurar, já vai modificando. E nós somos um país tropical, onde
a arte sofre muito. Depois é um lugar cheíssimo de gente. Por exemplo, nos painéis
de azulejo, na semana passada, tinha funcionários de rapel limpando os azulejos a 45
metros de altura. O azulejo recebe, da multidão que vai lá rezar, o suor com sal e por
incrível que pareça, recebe também gordura do nosso corpo. É impressionante. Os
painéis são limpos a cada ano, ou no máximo, a cada dois anos, com muito cuidado e
sempre a gente percebe que tem sal e tem gordura.
Essa também é uma razão porque escolhi os azulejos. Fiquei pensando,
pensando e um dia disse, tem que ser azulejo. Eu conheço o Carlos Alvano, no
Paraná, que trabalha muito bem azulejo, e azulejo é uma linguagem que aguenta mil,
dois mil anos, se ninguém atacar. Quer dizer, a natureza em si não destrói o azujelo. E
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depois, pensei mais: é da nossa tradição Ibérica. Portugal e Espanha nos trouxeram
os azulejos. Vêm lá dos turcos, mas a raiz, o centro do azulejo é a antiga Babilônia.
Porque se você vai à Alemanha, por exemplo no Bauden Museum, no Pedragon
Museum, você vai encontrar os grandes portais da Babilônia. Aliás, isso me fascinou
há anos atrás e isso ficou em mim. Mas quando fiz o projeto da azulejaria não pensei
nisso. Estava inconsciente. Depois, refletindo é que passei a ter consciência disso.
Então o berço da azulejaria está onde hoje é o Irã e Iraque, que é, por incrível que
pareça, o berço do cristianismo. Porque de lá vem Abraão. Então é o início de judaísmo
e do cristianismo, consequentemente. Então une-se o princípio da fé e da azulejaria
lá no Irã e Iraque atuais. São até coincidências, mas felizes coincidências, que nos
permitiram fazer um bom trabalho.
Egídio: na verdade, você já começou falar, mas iria lhe pedir uma idéia geral
da obra de Aparecida. O que você acha importante de tudo isso que está sendo
construído. Tem o revestimento, o próprio tijolo, que tem a ver com a terra, os azulejos,
o uso do dourado que é uma referência ao bizantino.
Pastro – o ouro em todas as religiões é o material da divindade. Como o
ouro é o material mais nobre, é o material que reluz de si mesmo, é o material da
presença do sagrado naquele lugar. Por isso que no passado também os reis que
eram determinados, escolhidos pela divindade, também usavam o ouro e estavam
revestidos de deus, do sagrado.
Então, optei pelo azulejo por isso que acabei de falar. Mas o mais importante na
basílica, por exemplo, o tijolo é importante pelo que já falamos, dos aspectos técnicos.
Mas também por que? A imagem de Aparecida, que tem quase 30 centímetros, ela
também é de barro cozido, de terracota. E, nós temos o barro vermelho aqui, a chamada
terra roxa, no Brasil, sobretudo no Brasil Centro-Sul. E depois, uma coisa que é mais
importante, também nós somos de barro. Se você pega a leitura bíblica do gênesis,
somos criados à imagem e semelhança, e quando Deus insufla na narina de Adão, a
partir do boneco de barro, surge o primeiro homem. Então, isso é muito importante.
Agora,na concepção do interior, o primeiro pensamento meu foi, quando eu
digo meu, às vezes sou eu, às vezes é a nossa comissão. Dois ou três anos depois até
chamamos uma comissão de liturgia para ajudar e também os padres, por exemplo o
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Pe. Darci, que é o atual reitor, é um homem que se dedica 24 horas pela Basílica. Ele
tanto se preocupa com o mosaico na cúpula, quanto se preocupa com uma poeirinha
no chão que não varreram. Ele ama a Basílica. Isso é muito importante. Você vê que a
Basílica hoje é considerada pelos estrangeiros como uma das mais bem organizadas
do mundo. Você veja, a Basílica de Aparecida tem dois mil banheiros. Nenhuma
basílica, Lourdes, Fátima, Guadalupe, nenhuma delas tem metade disso. Nós temos,
por exemplo, fraudários, locais para esquentar leite para bebês, tem pronto-socorro.
A parte de alimentação dentro (do território da Basílica) é bem cuidada. Tudo é muito
bem cuidado. Imagine até que o pessoal que ainda vai a cavalo, tem estrebaria paraos
cavalos, com alimentação gratuita. Isso não existe no resto do mundo igual.
Agora, ainda respondendo à sua pergunta, quando a gente concebeu o
interior da Basílica, a primeira coisa que pensei era que a Basílica tinha que ser,
como no passado, nas antigas basílicas e catedrais cristãs, deveria ser uma Bíblia
Pauperam, quer dizer, biblia dos pobres. Quer dizer, a leitura nossa não é o be-a-bá
de Gutemberg, mas é a imagem nossa, que é através da arte. Assim no passado,
nossos antepassados, pré-Gutemberg, aprenderam a bíblia pela imagem. Então é a
palavra em forma e cor. O nosso povo ainda é muito simplista e muito ignorante na
fé, a tal ponto que nós estamos rodeados de mil bobagens, em termos de fé. Então
pensei em educá-los através da arte.
Uma função é a função didática. A primeira função, antes da didática…
imagine, são 36 painéis, de 7 comprimento x por 5 de altura, com cenas do evangelho.
Então nós temos uma educação através do evangelho. Depois tem painéis nos
extremos. Então o trabalho, antes de ser didático, quando as pessoas entram, é para
elas ficarem cheias de estupor, de admiração pelo espaço. Isso se chama mistagogia,
na linguagem religiosa. A função da arte é conduzir as pessoas para o fim que é Deus.
Então, se o espaço é completamente diferente do exterior, e que não copia shopping,
não copia banco, não copia nada da nossa vida externa, esse caos externo, elas
vão entrar numa harmonia. E ali é um cosmos, um universo fechado. Isso que me
interessa. E agora, aos poucos, isso está acontecendo. E é interessante. Pessoas
hiper cultas, especialistas em isso e aquilo, e pessoas simplórias, analfabetas, sentem
o mesmo prazer de estar lá. Isso pra mim é uma conquista . E não é só minha. É tudo
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isso que nós estamos vivendo em conjunto. Está nascendo, está nascendo. Acredito
que daqui há uns 7 a 9 anos a gente conclua o interior.
Egídio: vou abrir um parêntesis. Na sua arte veio para atingir a todos. O que
se vê é que é uma arte mais simplificada e de fácil entendimento.
Pastro – Bem colocado. Ela(a arte) tem que ser universal e atingir inclusive
de outras religiões. Aí é o problema do renascimento,que estragou com tudo. Ele ficou
preocupado com a realidade. Ficou preocupado com proporções, ficou preocupado,
por exemplo em revestir as pessoas de cenas do evangelho com roupas da época
(do renascimento). Às vezes as figuras são figuras da família do mecenas. Mas ele (o
artista) teve que colocar nas cenas o rosto (do mecenas) porque era ele que estava
pagando, o duque tal, o cardeal tal…
O Pe. Darci sempre fala para mim, Cláudio, eu gostaria que a Basílica se
tornasse um centro tão bonito de arte que quem venha ao Brasil sinta que não pode ir
embora sem passar por Aparecida. E já está acontecendo isso. Então há grupos cada
vez maiores de estrangeiros, de turistas que vêm . Então não precisa ser cristão no
ambiente. Não precisa ser de nenhuma religião. Explicitamente ela é cristã (a igreja),
lógico, mas você se sente bem, vale a pena estar lá. A razão última do Evangelho,
no caso do cristão, mas eu digo que de todas as religiões, é a felicidade do homem.
O próprio homem corrompe o universo que é belo. E as religiões criam pequenos
microcosmos, para salvar (resgatar) o homem.
Egídio: a grande reforma que teve na Igreja, o Concílio Vaticano II, que faz
50 anos, facilitou essa mudança da linguagem na arte saca. Isso ajudou de fato,
fortaleceu a sua arte?
Pastro – se não fosse o Concílio, aliás como uma monja, amiga minha, sempre
diz. Agora ela já está mais de idade. Ela sempre diz, Cláudio, vá em frente. Você é
um homem do Concílio. Quer dizer, houve esta grande abertura. Realmente mudou.
Houve abertura. Agora, eu acredito que toda essa abertura, porque não foi a partir
do Concílio. Acho que teve o pré-Concílio, que do final do século XIX e toda primeira
parte do século XX, onde já haviam grandes movimentos litúrgicos, de religiosos,
sobretudo nos mosteiros baneditinos, que estavam pedindo essa reforma.
Você vê, a Basílica de Aparecida, com toda aquela grandiosidade basilical, de
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edifício da realeza, ela foi construída, a meu ver, porque no final do século XIX vieram
para o Brasil, depois daquela besta chamada Marquês de Pombal, que destruiu com
toda a religião na colônia portuguesa. Era tão burro o homem que ele destruiu com
a educação em Portugal e em todas as colônias. Porque a educação estava na
mão dos religiosos. A partir de Marques de Pombal, Portugal definhou, desapareceu,
ficou no que é. Então, o que a gente percebe é que no finalzinho do século XIX, as
pessoas não sabem disso, vieram recuperar o cristianismo do Brasil, levas de monges
beneditinos, que reforçaram os mosteiros, desde Olinda, até São Paulo, que estavam
na decadência final, por causa do Marquês de Pombal, que eram de origem alemã. Os
mosteiros na Europa estavam lotados. Quando não eram alemães eram os franceses.
Em Aparecida, os redentoristas foram alemães, os que chegaram. Então, toda aquela
reforma litúrgica, que ia acontecer 50, 60 anos depois no concílio, na década de 60, já
começou lá, na Alemanha e na França. Na Bélgica, nesses países. Então, a Basílica
em si não é só genialidade do Benedito Calixto Neto. Ele foi influenciado por esses
alemães,que já conheciam o pré-concílio. Já estavam imbuídos dessas idéias. Por
isso que nós temos uma basílica gostosa, arejada. Eu detestava. Hoje eu amo.
Egídio: separei 4 obras, porque minha pesquisa não suporta eu analisar
todas as obras da basílica. A basílica foi escolhida para a pesquisa, por conta da
sua dimensão, da sua importância, por ser a segunda maior do mundo. A primeira
mariana do mundo. Então escolhi quatro, que é o altar central, o Cristo Pantocrator,
o Cordeiro Imolado e o Capítulo XII, que é a mulher vestida de sol. Então a gente vai
focar mais nessas obras. Ao centro, no altar central, temos o encontro das quatro
naves, em forma de cruz latina. O centro é o coração do templo, o lugar do sacrifício.
É a razão de ser do espaço sagrado. E é nele que se dá o testemunho do encontro
e da aliança sagrada selada entre Deus e os homens. O mistério pascal. Está correto
esse entendimento?
Pastro – está. A única coisa é que a cruz é cósmica. No projeto a cruz é
cósmica ou grega. Quer dizer, os quatro lados são iguais. Tem um pouquinho, quatro
metros de diferença na nave sul, onde está Nossa Senhora. Aí dá um ar de latinidade,
mas não é. Continua cósmica. Depois tem também os quatro cantos de cruz de Santo
André,onde estão as capelas – capela do Santíssimo, capela de São José e as duas
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capelas de passagem que nós ainda não determinamos. Então, quem olha passando
de avião, do alto e quem olha a planta também, vê uma estrela. Então é a estrela
polar, para chamar à atenção que é a estrela guia do povo brasileiro, em relação à fé
cristã. Essa é a idéia principal. Então, você me pergunta sobre o altar.
Egídio: sim. Na verdade era uma análise sensorial, apreciativa e depois vou
pedir uma análise sígnica, em cima das formas, das cores, da realidade. Então a
primeira é mais sensorial.
Pastro – É. O que acontece, o Benedito Calixto, juntamente com os redentoristas
alemães, tinham colocado o altar na ponta, onde hoje está Nossa Senhora, porque
era antes do concílio, a missa era de costas para povo, etc. Aí de fato nós pensamos
que o altar tinha que ser debaixo da cúpula central, porque realmente reúne, dos
quatro cantos da terra, norte, sul, leste e oeste, os povos. Então tem esse sentido
central, de centralidade. Depois também, a questão do altar em si, tem todo seu
significado. O centro do cristianismo é o altar, onde é celebrado o Cristo e, onde já
desde o século II, III, se diz que o altar é Cristo. São Cirilo, de Jerusalém, ele vai dizer
que o altar é Cristo, quer dizer, encarna naquele lugar. E o profeta Ezequiel, que vai
dizer antes, muito antes, na época do cativeiro, do segundo cativeiro, que foi o da
Babilônia, ele vai dizer que ele viu no templo, saindo do altar, uma água, que essa
água fertilizava o mundo. Então agora essa água é o espírito de Jesus, a graça, como
a gente chama, que vai em direção aos quatro cantos da terra. E isso também está
ligado ao Livro do Apocalipse, que vai dizer nos capítulos sobretudo XXI e XXII, que
são os capítulos finais, que quando desce a Jerusalém Celeste naquele lugar, porque
desde uma capelinha na roça, até uma catedral, todo espaço sagrado cristão é a
Jerusalém Celeste, que desce do céu naquele lugar. Então, desce naquele lugar, ele
vai dizer o evangelista João, eu não vi templo nenhum. Então, a concepção antiga de
templo morre e agora é uma praça. E no meio dessa praça tem a fonte da vida, e tem
a árvore da vida, que é a árvore que Adão perdeu no paraíso, e que Jesus recupera
na cruz, que é a nova árvore de Davi.
Então, essas questões todas têm que ser levadas em conta, é evidente. Então,
por isso, o altar, que é um bloco de pedra, de quatro toneladas, então a idéa é, quando
a pedra cai na água, ela forma círculos concêntricos. Os que estão mais perto, são
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perfeitos, os que estão mais distantes vão perdendo a perfeição e se dissipando. Essa
ideia é, quanto mais perto do Cristo, mais a gente é um homem novo, um homem
perfeito. Na linguagem antiga, santo. Santidade.Sagrado. Quando mais distante do
Cristo, a gente não sabe pensar, a gente não sabe nada, vai enfraquecendo. Então
isso se vê também no desenho do piso, onde nós fizemos esses círculos, com um
desenho de água. Isso foi a concepção que eu tive, na manhã do dia 09 de agosto de
2001, quando às sete da noite do mesmo dia eu entro em coma. Coincidentemente foi
isso. Historicamente foi isso. Então, a água que eu bolei, depois desses círculos em
volta do altar, altar mesa e altar espaço, que a gente chama de presbitério, nos quatro
grandes corredores essa água continua e vai em direção aos quatro pontos cardeais.
Esta água tem um desenho em zigue-zague, que é o desenho, a concepção indígena
de água. Porque fora da basílica, nas arcadas externas, eu coloquei uma outra
concepção de água, em movimento, como a gente conhece. Curvas. Então, essas
curvas externas não correspondem mais à graça que sai do Cristo, mas corresponde
agora ao rio Paraíba do Sul, onde a imagem foi encontrada. Porque quando comecei a
trabalhar, as pessoas me viam lá com o crachá, passavam e perguntavam: como é que
eu vou visitar a imagem? Porque é tão grande, quem conhece Aparecida. Aí pensei,
ôpa, na arcada, vou bolar essa água em movimento, vou chamar de Rio Paraíba, que
passa na frente de Nossa Senhora, então não sai da água, que você chega lá. Então
esse foi outro pensamento.
A questão é de sutilezas. Na beleza e na cultura. Misturar essa sutileza do
Antigo Testamento e do Novo Testamento bíblico, internamente na basílica, a sutileza
da nossa cultura, que não é só indicar o rio Paraíba, mas as curvas, que são muito
importantes e que a gente vê nos calçadões de Copacabana, vê nos trabalhos de
Niemayer e vê em outros trabalhos. Por exemplo, na basílica, entre uma cena e
outra do evangelho, têm pequenos painéis de palmeiras, não sei se vocês notaram,
separando uma cena da outra. Essas palmeiras não são gratuitas. Essas palmeiras
estão aí porque, primeiro, indica ser esta Jerusalém Celeste, onde as pessoas vão. É
o lugar do repouso. É o lugar de se refazer tomando aquela água. Então, é um oásis.
São pequenos oásis que existem no mundo, os lugares sagrados. E, depois, uma
outra coisa. O nome de Aparecida, quando não era Aparecida, que era só a vilazinha
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dos pescadores, era chamada, onde está a velha cidade, era chamada de Morro dos
Coqueiros, que são palmeiras. E depois, o nome de Brasil, indígena, é Pindorama,
terra das palmeiras.
4º. BLOCO
7. Egidio – ...
Pastro – por exemplo tem esses detalhes. Por exemplo, o gradil, que antes
eram umas separações horrorosas, de muro, em cima de muro, etc, até o gradil. O
gradil são palmeiras que se abrem, fazendo essa referência (a Pindorama).
Então, ali tudo tem um símbolo, um sinal marcante, que quando não é cristão
em si, é misturado com a nossa brasilidade indígena. Sem ser demais explícito, porque
aí é feio. Aí torna-se feio. Porque, por exemplo, explicitar demais o índio, explicitar
demais o branco, explicitar demais o negro, nós não somos isso. Nós somos uma
fusão imensa de raças. São pequenos detaques que a gente vai colocando.
8. Egidio – Os estudos quanto à linha, forma, cor, projetos e desenvolvimento
e execução do altar foram organizados como? De que forma? Através da aprovação
em reuniões, dos materiais…?
Pastro – sempre eu passo pela santa inquisição. Santa inquisição quer dizer
que eu às vezes faço o projeto e apresento para pessoas, entre aspas,” ignorantes”.
E que me julgam. Então isso é um sofrimento terrível para mim. Acho que é por isso
que eu perdi o fígado. Brincadeira. Perdi o fígado já lá no começo… Não mas…
têm pessoas que entendem perfeitamente, mas têm pessoas também que não são
obrigadas a entender de questões estéticas. Mesmo na questão religiosa, também.
Por isso que também eu tive que aliar a questão da mistagogia da educação do nosso
povo, que é uma pedagogia para educar na fé cristã, com a preocupação de que,
predominantemente, a temática dentro da basílica, é a do Apocalipse, que é o último
livro da Bíblia, e é… o Apocalipse não é um fato que vai acontacer, mas é um fato que
acontece hodiernamente, cujo centro é a revelação do Cristo, cada dia na Missa, na
Eucaristía. Se você pegar toda a composição da Missa, ela é Apocalipse. E o centro
do Apocalipse é tanto o Senhor, que aparece e desaparece, aparece e desaparece,
e o Cordeiro Pascal, que é imolado em cima daquele altar, e que é o próprio Senhor,
160
outras figuras, e quais foram os estudos com a linha, forma, cor, projetos, material,
desenvolvimento e execução?
Pastro – A Nave Norte é a porta principal. A Nave Sul, que é o oposto, tem
o retábulo de Nossa Senhora. Então Nossa Senhora, além de estar dentro de um
totem de ouro, porque aquele totem tem 45 metros, como é de ouro, então é o lugar
da teofania. Quer dizer, ali Deus se manifesta realmente no Brasil. E a primeira
manifestação para os brasileiros é através desta imagem boba, simples, porque é um
pedacinho de barro, de terracota, e que ainda foi, há uns vinte anos atrás quebrada
em 140 pedaços. 140 e poucos pedaços… então é uma coisa insignificante, mas que
tem uma significância imensa. Então ali, eu coloquei envolto neste totem de ouro,
onde fica o nicho da virgem, eu coloquei toda uma forma de sol, porque ela é a mulher
do capítulo 12 do Apocalipse, que o dragão quer comer o filho que vai nascer. Então
o filho que vai nascer, agora no cristianismo, o primeiro foi o Cristo, mas agora essa
imagem dessa mulher é a própria Igreja, que é a esposa do Cristo. E o filho que via
nascer é todo cristão, que é batizado, que é outro Cristo. Isso é muito importante.
Depois o nicho em si eu coloquei em bronze, com banho de ouro e dezenas, centenas
de peixinhos, em volta dela. Isso já é um nicho de dois por dois metros, porque, como
ela foi encontrada no meio de uma pesca, que foi o primeiro grande milagre, a grande
pesca “e o encontro delas, então o nicho está desta forma” (sic).
Então, ela é a mulher vestida de sol, que ela é a imagem da Igreja, a esposa
do Cristo, que foi ele que fundou a Igreja, não foi nenhum pastor por aí, e, do outro
lado, como você salientou, temos o Cristo Pantocrator, que vem pela porta. Ele é o
Sol. Enquanto ela está revestida de sol, ele está dentro de uma placa de ouro. Então
ela está revestida dele. Então é o amado, Ele e a amada, Ela, que é a Igreja, a imagem
nossa, do povo. Então os dois vêem ao encontro. Ela está rodeada, desde Eva, pelas
mulheres do Antigo Testamento, até a rainha Ester. Então, todas as mulheres, Eva,
Sara, Débora …. até a rainha Ester, são as mulheres que prefiguraram a Virgem Maria.
Então, a Virgem Maria, hoje, é a nova Eva, de um novo povo, de uma nova humanidade.
Ela é a nova Sara, mulher de Abraão, mãe dos crentes, assim como Abraão é o pai
dos crentes. E termina como a rainha Ester. Pela sua beleza e formosura, no cativeiro
da Babilônia, o rei ficou fascinado por ela e ela então intercedia pelo seu povo e o rei
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concedia a liberdade ao povo judeu. Então agora ela é a intercessora por nós, junto
ao rei, que aí no caso é o Cristo.
Mas é interessante porque este rei que entra, que é o Pantocrator, Onipotente
no presente, que é o próprio Cristo, e aliás no Apocalipse é bonito, porque logo no
primeiro capítulo, quando São João tem a grande visão de que o Céu se abre com
terremotos, relâmpagos e etc, ele desmaia, porque percebe que o Senhor do Universo
é aquele seu amigo de Nazaré. Então esse é o grande sentido. Então esse lugar
não é um lugar qualquer. É o lugar dessas revelações. Dessas aparições. Então aí,
para complementar, assim como a Virgem é a principal num séquito de mulheres
do judaísmo, agora o Cristo é seguido por mulheres da história da Igreja. A primeira
é Madalena, do lado esquerdo termina com Joana D`Arc. No outro lado a primeira
é Tereza D´Ávila, a grande doutora da Igreja, e a última mulher, quando eu estava
pintando, fazendo o projeto, assassinaram a irmã Doroty, lá no Pará, na Amazônia.
Então eu botei a irmã Doroty. Mas aí eu fiquei pensando, será que a santa inquisição
vai me permitir, porque … Mas aí eu falei, está no papel e eu vou deixar. Em última
análise, se não permitem, a gente corta ela. É a última mesmo. E aí foi interessante,
porque no dia em que cheguei lá, com os rolos debaixo do braço, assim…, o padre
Darci veio correndo me dizendo, Cláudio, esqueci de te telefonar. Você tinha que
colocar a irmã Doroty. Aí eu disse, pode deixar que o papa Cláudio “ já canonizou-a”!
É bom. São detalhes que ninguém sabe… Então isso é muito bonito.
As naves Norte e Sul da Basílica, são naves femininas. Porque o espaço
desta Basílica é sobretudo feminino. A virgem, Nossa Senhora, a Igreja, que é a
esposa do Cristo, etc. As naves Leste e Oeste elas são masculinas. Separei para eles
não brigarem. Na nave Leste, o centro é o Cordeiro e atrás do Cordeiro é o cavalo
branco. Isso é muito importante. E, à direita e à esquerda, nós temos uma procissão
de homens, que são os patriarcas do judaísmo e do cristianismo, os profetas, até
o último dos profetas, que é o maior de todos, que é João Batista. Do outro lado,
do Cordeiro e do cavalo branco, temos então os apóstolos. Aí nós temos todos os
fundamentos da nossa fé. Do lado oposto, na nave Oeste, nós temos a evangelização
do Brasil. Os fundamentos da fé cristã no Brasil. Então o centro é a Virgem, também
vestida de Sol, com o menino no peito, que vai ser gerado, porque Nossa Senhora na
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pequena imagem, é a imagem da Conceição, quer dizer como ela foi concebida, então
ela não tem o menino. Aí eu botei ela com o menino, é o centro, do outro lado está
o Cordeiro Pascal e ela está envolta por homens da nossa história do cristianismo,
desde Anchieta, passando por grandes índios cristãos, no Rio Grande do Norte,
no Rio Grande do Sul. Então tem Frei Damião, tem padre Cícero, tem pessoas até
desconhecidas. O primeiro, do lado direito da Virgem, por exemplo, é o Dom Euder
Câmara. O último nessa lateral, quando eu estava trabalhando, faleceu o Dom Luciano
Mendes de Almeida, então colocamos o Dom Luciano Mendes de Almeida, que foi um
grande bispo, sobretudo aqui em São Paulo. Jesuíta e bispo.
Assim dá para perceber que a Basília vai se completando.
Então aí tem a questão das linhas, das cores… Algumas pessoas dizem: às
vezes parece uma arte egípcia. Não é essa a questão. A questão é que na tradição
religiosa cristã, nas raízes da arte cristã, está o mundo helênico, que era Egito, Grécia
e Roma. Então nesse cadinho há também um pouco de judaísmo, para não dizer
muito e não diretamente. Muito embora para eles não seja permitida a forma humana,
mas nós sim, por causa da reencarnação. Então a forma humana é revalorizada,
pelo próprio Cristo e entra na nossa história, assim como entrou no Egito, na Grécia
e Roma. E as formas muito hieráticas, muito nobres, é para dizer que nós somos
dessa descendência nobres também. Isso é para acentuar, quem olha, que todos nós
somos de uma estirpe nobre. Isso é muito importante, sobretudo para as pessoas
mais simples, ou para as pessoas que estão em desespero.
Se eu sou dessa mesma raça, desse mesmo povo, eu não estou, entre aspas,
“corrompido pelo mundo”. Essa é a idéia.
12. Egidio – Do painel do Cordeiro Imolado, nós temos vários símbolos, desde
o vermelho, o próprio cavalo que é só um contorno, tem o cordeiro, que é todo branco.
Por que o cavalo está bem sutil, só em traços?
Pastro – Eu vou começar pelo vermelho. O vermelho é o sangue, que é o
símbolo da redenção. Por isso que o cordeiro tem o grande instrumento da paixão,
da nossa redenção, que é o instrumento do martírio, que é a cruz, junto dele. Ele
está sobre um altar, com o texto do Apocalipse, se não me falha a memória, capítulo
5, “redimistes para Deus povos de todas as raças, tribos, línguas, nações”. Então
164
é Ele que reune todos os povos. É o cordeiro, porque na tradição judaica e cristã
tinha que alguém se imolar por todo o povo. No passado eram cordeiros e agora, o
Novo Cordeiro e único, que é o próprio Cristo. O fundo vermelho então lembra esta
redenção. É por isso.
Depois nós temos, não sei se você está lembrado, têm sete lâmpadas. Sete,
no judaísmo e em geral no Oriente, é o número perfeito. Nós vivemos no Ocidente
o sistema binário, que é o sistema burro, um mais um são dois, dois mais dois são
quatro… é um sistema fechado. O sistema do número sete é porque a natureza tem
sete elementos. Então ela é perfeita. É o símbolo da perfeição. Então aí nós temos as
sete lâmpadas, que indicam também que a perfeição é o próprio espírito de Deus, que
é o espírito do Cristo. Daí então as sete luzes. É a luz plena.
Depois nós temos sutilmente delineado um cavalo branco. Porque, no
Apocalipse, que tem vários cavaleiros, o da morte, o da guerra, o da praga, etc…,
de repente, a um certo momento, o Amado, o Senhor, vem num cavalo branco. Na
tradição dos povos orientais, pelo menos do Oriente próximo, o noivo, para casar-se
sempre vem montado num cavalo, que tem de ser branco. Então ele é o esposo e a
Igreja é a esposa. Por isso então Ele vem sempre em cada culto, em cada missa.
É muito bonito. Você vê que cada figura tem uma simbologia, em cada
patriarca, em cada profeta, cada apóstolo tem uma riqueza de simbologia. E a cor.
Aquela nave, a nave Leste, predomina a cor turqueza. A nave da paixão e morte é a
cor lilás. A nave Norte predomina um azul que eu chamo de azul petróleo e a nave Sul
é um azul bonito, é um azul meio colonial.
13. Egidio – E a última imagem, que é a do Capítulo XII, que também tem esse
predomínio do dourado, que é luz e a Conceição eternamente grávida?
Pastro – Sim.
14. Egidio – Agora vamos entrar no tema da comunicação, que é o último
bloco, ok?
Pastro – Não. Não tem problema. Eu falo com gosto.
5º. BLOCO
15. Egidio – Gostaria que você falasse um pouco da sua formação. No início
165
por melhor que seja bem formado, porque ele é um ser humano. A imagem não. Nos
coloca diante de uma presença. Por exemplo, em frente de uma imagem do Cristo,
é lógico que aquela imagem não é o Cristo. Mas indica a presença do invisível para
mim, ali. Então eu tenho toda uma outra atitude, e também a assembléia toda, a igreja
toda tem uma outra atitude. Por isso que também fazer arte sacra não é para qualquer
um. Não é desenhar bem, não é esculpir bem. Tem que colocar o espírito na obra e o
espírito não meu, de Cláudio Pastro, é não é fácil.
18. Egidio – o seu trabalho tem uma imagem contemporânea, que vai de
encontro a uma história do passado. O que você poderia acrescentar?
Pastro – para mim fica sempre isso,por exemplo, a arte atual ela parte do
indivíduo ou de um grupo fechado de indivíduos, que a gente chama de panelinha.
E aí entram os modismos. Na arte sacra, você tem que ter um pé no passado e um
pé no presente. Então tem que casar o antigo com o novo. E é esse casamento
que continua uma história que não é minha. Independe de mim. O cristianismo, se
eu existir ou não existir ele continua a mesma coisa. Então eu preciso entrar nessa
corrente. A gente diz que o artista de arte sacra ele tem que se despojar de si mesmo.
Por isso eu fico muito triste que aparece muito o meu nome, Cláudio Pastro, mas
isso porque é normal. Mas veja, no passado, até por volta do século XI e XII, você
não vai encontrar nenhuma obra, assinada por nenhum artista. Os artistas, como no
caso dos nossos índios, são aqueles que celebravam algum momento da vida de
esplendor e pouco importa se é Benedito, João, Afonso, tanto faz. Não interessa isso.
É a celebração. Por isso que na Igreja Oriental, também os artistas fazem parte dos
sagrados minitérios, porque ele é continuidade do padre, ele é continuidade do bispo,
porque tanto quem faz música, como quem pinta, como quem constrói a igreja, é tudo
continuidade da mesma celebração. Por isso que não deixam nome. São raros os que
deixaram nome assim no passado. Por exemplo, na Igreja Oriental é muito forte, eu
sou apaixonado por ele, Teófano o grego. Ele foi o mestre de Rublióv, aquele também
famoso monge artista, que pintou a Trindade. Não sei se vocês conhecem ou ouviram
falar. São coisas belissimas da arte sacra mundial.
19. Egidio – também o próprio Gioto…
Pastro – aí já é mais tarde. É um grande homem, mas aí já começa o período
167
leve da decadência.
20. Egidio – eu vou entrar num ponto delicado, porque você já se antecipou
nele, que é: percebo a lei da frontalidade nos traços das figuras em seus painéis.
Uma linguagem que foi percebida desde a arte egípcia e continuou na arte bizantina.
Também percebo a simplicidade na forma dos desenhos, como a arte egípcia, que
era para ser eterna. O uso do dourado, a auréola, é uma referência ao bizantino, e do
próprio azulejo utilizado em seus painéis. Quais são as influências em suas obras?
Pastro – são todas essas que você acabou de dizer.
21. Egidio – Ótimo. Então há uma concordância de que há uma referência, e
a busca de uma influência?
Pastro – sim. A arte sacra não é complicada. Ela é simplesmente a colocação,
não mais e não menos, daquela palavra que é o espírito da coisa. Então é evitar a
interpretação pessoal. Isso é muito importante. E também é uma arte que tem de
ser simples. De uma simplicidade que tanto um adulto, um idoso, um letrado, como
uma criança analfabeta, entendam o mesmo mistério. Esse é o segredo. O mundo de
hoje é bobo. A televisão, as imagens, são imagens passivas, você engole tudo. Você
não corresponde, sab e? A arte está se enfraquecendo porque ela não é celebrativa.
Ela é demais subjetiva. Eunão estou falando contra certas coisas. Mas, por exemplo,
o grafismo que têm nas cidades, particularmente em São Paulo, que tem muito, se
torna em certos momentos sujeiras. Eu sempre digo que é o vômito da pessoa que
ela coloca na parede. Então, será que nós temos o direito de sujar o universo? Para
mim isso é muito forte. Colocar idéias minhas assim, sujando o universo? Não, isso eu
não vou fazer nunca. Até pode ser que a minha arte não seja explêndida. Porque eu
não sou um grande artista, no sentido de desenvolver a arte. Sei o que estou fazendo,
não é? Mas é mais para entrar naquela questão do cosmos, porque no cosmo há uma
harmonia e não o caos. Volta ao princípio de tudo.
Porque também tem uma palavra evangélica muito importante. O Cristo vai
dizer a um certo ponto: “sede perfeitos como o vosso Pai do céu é perfeito”. É muita
pretensão. Mas é esse caminho que tem que ser tomado. O caminho do subjetivo,
o caminho do individualismo, como a gente vive hoje, é o caminho do caos. Cada
um fala uma língua. E quer impor a sua comunicação. E não é uma comunicação do
168
eterno, do cosmo, mas é uma comunicação de hoje. Imagina hoje. Hoje não existe, já
passou. É bobo isso. O amanhã já vai virar passado. É bobagem isso.
22. Egidio – Dentro da percepção em cima do seu trabalho, que é o traço
simples, de fácil entendimento, a comunicação direta, que consegue atingir o grande
público, desde os intelectuais até as pessoas mais simples, então eu percebo que isso
é muito forte. Daí vem a última pergunta: Qual o propósito da obra? E, se está dentro
desse contexto?
Pastro – é isso que acabamos de falar. É não desarmonizar o que é
harmonioso, que é o cosmos. É não fazer, não colocar na obra o meu parecer. É a
objetividade do mistério que vive em nós. Então, por exemplo, hoje cada vez mais
é discontada as religiões do mundo. Por exemplo, no extremo oriente o budismo é
perseguido. No islamismo, querem acabar com o islamismo, que também está sendo
perseguido, para ser ocidentalizado. Então são essas guerras que estamos vivendo.
O no cristianismo, particularmente na igreja católica, ela é perseguida também pelo
governo, não só o atual mas por toda a nossa história dos últimos cem anos, como
também pelas próprias idéias individualistas das pessoas, onde religião não entra.
Então o homem vive apavorantemente só. Ele não se comunica com o invisível. Ele
não vive em presença do invisível.
Este é o fator das religiões. Isso faz com que o homem fique equilibrado,
saudável. Enquanto que o individualismo que é a proposta de tudo, de emprego e
de tudo na sociedade… Imagina o que eu vou fazer tendo um grande emprego, com
30 anos me aposentando e depois morrendo. Eu não fiz nada. Isso não acrescentou
nada para a vida.
23. Egidio – É interessante que, durante o período em que estive em Portugal,
fui visitar Istambul, fui à Haiya Sophia e conheci uma igreja, que se chama São
Salvador de Chora. E o impacto que eu tive, quando entrei na igreja, foi o mesmo
impacto que eu percebi também na Basílica de Aparecida, que é a forma mais fácil de
entendimento e de comunicação.
Pastro – isso para mim é um elogio. Fico muito feliz.
24. Egidio – E o trabalho é belíssimo.
Pastro – porque o princípio é o mesmo, porque o verdadeiro artista e na
169
arte sacra mais ainda, ele persegue a simplicidade. Falar muito com pouco ou com
nada até. Eu sempre digo, em hebraico o número um é Deus. O judeu religioso não
pronuncia o número um. Ele pula. Porque Deus é um nome impronunciável. Então eu
sempre digo, quanto mais perto do nada, mais perto de Deus.
25. Egidio – É interessante você mencionar isso, Pastro, porque eu usei
aqueles audio guides, para entender a história e todo o processo. E quando foram
construídos os painéis nessa igreja, a função era passar a liturgia para as pessoas
que não sabiam ler. Essa comunicação é de fácil entendimento, eu percebo, também
na Basílica de Aparecida. Isso eu acho que é muito importante.
Pastro – o que eu acho interessante, não é uma questão de orgulho, porque
isso é uma bobagem. No passado, quando eu comecei, os padres, porque lá viviam
trinta e poucos padres redentoristas, e não é que a maior parte é muito culta. Isso
não é próprio dos redentoristas. Tem um ou outro culto, mas a maior parte é simplista,
pelo próprio princípio do fundador, Santo Afonso, que foi trabalhar com gente bem
simplória. Então no começo eles diziam, mas o povo entende a sua arte? E eu dizia,
o povo entende, você é que não entende. Primeiro você coloca o preconceito de um
entendimento de cabeça. Isso não existe.
Quando você entre num espaço desses, como você falou lá em Istambul,
Constantinopla, como entrar na Basílica, ou até em outras igrejas bonitas que deve
ter por aí, é essa separação do mundo, essa coisa de sujeira do mundo, que nesses
espaços sagrados, cristãos ou não cristãos, você se sente bem. Esse é o primeiro
ponto. É o esplendor, a admiração, que, como alguns dizem para mim: “mas o mundo
não é assim”. Eu sei que sim, o mundo é caótico, é corrupto, é sujeira de toda a
espécie, etc. Esse espaço dá a verdadeira dimensão de quem nós somos. Nós não
somos para esse sujeira, nós fomos criados para a grandeza de vida. A vida é bela.
Eu vejo em Aparecida pessoas simplórias que falam: eu não quero sair daqui.
Aí eu digo: ôpa, é esse o objetivo. Não é preciso entender mais nada. Resolveu o seu
problema. Aqui você percebe que você volta para o seu centro, que a gente chama de
substância. E substância é o ser da razão de ser. Você se encontra com o seu ponto
central da vida, quando a pessoa chega a esse êxtase, vamos chamar assim. Por isso
que na pintura muitos também me criticam: ah, você faz as pessoas às vezes com os
170
olhos muito arregalados. Isso é um êxtase. Quando você entra em êxtase, quando há
o impacto, os seus olhos arregalam e a pupila se dilata. Esse é o momento de você
verdadeiro. Por isso que é como o bebum. O bebum ele passa a fazer tudo, porque ele
sai da dimensão da terra, e ele toma a dimensão verdadeira dele. Aí ele se revela. Só
que é de um ponto de vista negativo. É também como a droga. A droga é justamente
porque nós não temos essa linguagem do sagrado hoje. Não só não temos, como é
negada também pela sociedade.
26. Egidio – Muito obrigado. Eu queria agradecer.
Pastro – imagine. Eu espero depois ter uma cópia de uma coisa dessas. O que
seria muito bom. Amanhã vou sair às seis da manhã, porque vou fazer essa palestra
sobre a imagem do Cristo. E ainda eu preciso continuar. Estou na metade ainda. Mas
a idéia é também essa, não é. Se as pessoas sentem nessas imagens alguma coisa
diferente. Alguém me disse ainda hoje de manhã: mas o Cristo não vai ter tênis, nem
gravata? Esse é um outro problema. Eu não posso colocar tênis e gravata no Cristo,
quando o Cristo é uma coisa que por dois mil anos, no imaginário coletivo, Ele já se
formou, como sendo filho de Deus, já se formou na forma e era isso.
Quem disse que o homem, daqui há dez anos vai usar tênis ou usar gravata?
Então isso é coisa (transitória…) é como a roupa do renascimento. Hoje ninguém usa
roupa do renascimento. Passou a moda.
171
ANEXO 2
1º BLOCO
Egidio - Pe. Darci, gostaria que o Sr. falasse um pouco sobre sua história na
Basílica. Quando o Sr. assumiu e qual tem sido o seu principal desafio?
Pe. Darci - Eu sou reitor do Santuário Nacional. A basílica é o templo. O
Santuário Nacional é o complexo que gira em torno do templo. Eu assumi como
reitor no ano de 2008, mas antes já tinha sido administrador do Santuário por 9 anos.
Portanto, a minha vivência no Santuário é grande. A minha função aqui é a de ser
como um maestro numa orquestra sinfônica – ser aquele que consegue provocar
a harmonia entre os vários setores e trabalhos que o Santuário realiza. A missão
precípua do Santuário é evangelizar. Tudo aqui é feito neste sentido. Levar a boa nova
de Nosso Senhor Jesus Cristo ao coração das pessoas, pelas mãos carinhosas de
Nossa Senhora Aparecida. Ela é a estrela da evangelização. Então, é através dessa
imagem, do carinho que o povo tem à N. Sra. Aparecida (porque ela é a imagem da
Mãe de Deus), que continua na verdade a missão de Maria na história da salvação,
que é apresentar Jesus.
Então, aqui no Santuário não fazemos outra coisa senão anunciar Jesus
Cristo pelas mãos carinhosas de Nossa Senhora. E quando eu digo que o reitor é
o maestro, imagine você que nós somos quase 1.500 funcionários, nós temos uma
obra social, que adota crianças, que cuida de crianças e de adolescentes. Também
de idosos. Então este é um ramo do santuário que procura evangelizar pelas obras.
Nós temos também uma equipe de construção. Você está escutando aí o reflexo
172
Pelas obras realizadas por ele, não só no Brasil, mas também no exterior. Pelos livros
editados por Cláudio Pastro, que mostram um conhecimento bastante profundo da arte
sacra. Muito particularmente a escolha dele se deveu ao fato de que não optamos por
uma arte figurativa. Porque a arte figurativa tem um fim em si mesma. Se você vê, por
exemplo, um quadro do Renascimento, o quadro em si esgota toda a realidade. Nós
então preferimos a arte do Cláudio Pastro, que não é figurativa, é mais representativa,
porque ela remete ao mistério.
Quando você contempla a obra de Cláudio Pastro, você não fica na obra. A
obra é como um sinal. É como um símbolo, que remete a um significado. No caso da
Basílica, é importante falar do mistério de Deus que se realiza dentro deste espaço.
Então a obra dele é mais adequada para este nosso objetivo. Fazer com que quem
aqui viesse percebesse a presença do mistério. A atuação do mistério de Deus, que
age neste espaço santo, neste espaço sagrado. Então, a opção por Cláudio Pastro é
justamente porque a sua obra não é figurativa, mas vai até o mistério.
Egidio – ainda quanto à escolha do artista, quanto tempo durou esse processo?
Pe. Darci – Nós começamos o processo de conversar sobre o assunto em
1999 e começamos de fato as obras em 2001. Então, tivemos aí um espaço de dois
anos a dois anos e meio entre o estudo do que o Cláudio Pastro apresentou, até a sua
escolha, para depois iniciarmos com ele.
Egidio – a escolha do Cláudio Pastro foi uma unanimidade?
Pe. Darci – Sim, foi, entre aqueles que compunha a comissão litúrgica.
Egidio – o cronograma de desenvolvimento da obra de acabamento foi definida
pelo bispo ou pelos padres da basílica?
Pe. Darci– A própria obra foi ditando seu cronograma. Pedimos a ele que por
primeiro fizesse a concepção do presbitério. O presbitério é o conjunto central, onde
está o altar, e todas as peças que compõe o presbitério, o altar da celebração, o altar da
palavra, o ambão do comentarista e todo aquele conjunto. A partir daí é que definimos
o piso do Santuário. A partir do altar de Cristo, em forma de ondas, representando os
sacramentos, as bençãos e as graças que brotam do Cristo, a água se distribui pela
igreja toda. Neste momento se definiu o piso. Ao definir o piso, definimos também as
paredes do templo. As balaustras nas paredes seguem a mesma temática da água.
176
para a vida. Não só o homem como ser criado, mas toda a criação. Então, temos
o esplendor da criação presente sobre o altar da Eucaristia, porque Deus redime o
homem e redime o cosmos. Queremos terminar a obra em 2016 para o jubileu dos
300 anos em 2017. Nossa Senhora foi achada em 1717 e em 2017 se completam os
300 anos da pesca milagrosa.
Egidio – Pe.Darci, por que o artista Cláudio Pastro aceitou este trabalho?
Houve condições?
Pe. Darci – Eu digo que nada, para quem tem fé, acontece por acaso. Cláudio
Pastro é o artista sacro brasileiro da atualidade. O único. Eu digo por sua tamanha
competência e experiência. Então, Cláudio também certamente, não posso falar por
ele, mas posso interpretar o que ele pensou. Certamente ele viu nisto a possibilidade
de imortalizar-se na arte sacra. Porque Aparecida é o coração católico do Brasil e o
Brasil é o maior país católico do mundo.
Então, entendo que houve um casamento, entre a competência do Cláudio
Pastro e aquilo que nós queríamos, e a nossa vontade e a vontade dele. E Deus
agiu nesse meio, porque o artista recebe esses dons, não por seus méritos, mas por
graça, como nós entendemos na fé. Então, entendo que o Cláudio faz aqui é ser o
instrumento de Deus. Deus está trabalhando nele para se perpetuar.
A Basílica quer ser a perpetuação da presença de Deus. Uma extensão, um
instrumento, que vai dizer para nós que a arte que aqui está já diz como Deus no ama,
como Deus nos escolheu para a vida, como onde Deus está a vida é abundante e
que nós não estamos à deriva neste mundo, Deus é nosso grande parceiro. Nós nos
sentimos acolhido na Basílica, que na verdade é o grande útero, onde nós renascemos
para a vida e para a virtude.
3º. BLOCO
Egidio – o senhor poderia dar uma idéia geral da obra e sua história, embora
ao longo desta entrevista já tenhamos uma visão disso?
Pe. Darci – Aparecida nasce de um fato muito simples. Diferente de outros
santuários, como Fátima, Lourdes e Guadalupe, por exemplo, que nascem de um
evento maravilhoso, o encontro do ser humano, com uma teofania, uma manifestação
178
de Deus na aparição das imagens. Lurdes apareceu àquela devota, Fátima aos
pastorinhos, Guadalupe ao índio Juan Diego. Aparecida não tem isso, por um fato
muito simples: três pescadores foram buscar o seu pão. Trabalharam, tiraram peixe
das redes para o seu sustento e encontraram uma imagem quebrada.
A imagem de Nossa Senhora Aparecida é reciclada. Primeiro encontraram o
corpo e depois a cabeça. Juntado corpo e cabeça deu a imagem que nós conhecemos.
Então o que é que tem de fenomenal nisso? É tão simples, como são simples as
coisas de Deus. Então talvez seja este o grande encantamento de Aparecida – a
simplicidade. Depois, as pessoas que aqui vêem, vêem trazendo as suas mazelas,
as suas dificuldades, as suas dores, os seus contratempos, os seus sofrimentos, e
encontram uma esperança. Voltam para casa com o coração renovado.
Tudo o que é construído aqui no Santuário tem este objetivo – o de fazer
com que as pessoas renovem as suas energias, as suas forças, refaçam as suas
esperanças. Portanto, a arte aqui não é pela arte. A arte aqui é para evangelizar. E é
para falar desta simplicidade – de um Deus que nos ama e que quer se encontrar com
os seus fiéis. Por isso, nós cunhamos uma frase que norteia a nossa ação em tudo
o que acontece aqui no Santuário: “acolher bem também é evangelizar”. É isto. É o
espírito do Santuário Nacional.
Egidio – vou estar fazendo uma análise semiótica do altar, do Cristo Pantocrator,
da Nossa Senhora e do Cordeiro Imolado. No altar central temos o encontro das
quatro naves, em forma de cruz latina. O centro é o coração do templo, lugar do
sacrifício, é a razão de ser do espaço sagrado e é nele que se sá o testemunho do
encontro e da aliança selada entre Deus e os homens, o Mistério Pascal. Está correto
esse entendimento?
Pe. Darci – Sim. Primeiro que é uma cruz latina, com o intercepto de quatro
capelas, como aquela cruz de Santo André. Então nós dizemos que é uma cruz grega.
Uma cruz grega que cruza uma cruz latina. E, o importante, o altar, está no centro.
Dizendo que o centro desta Basílica e tudo o que aqui se realiza é cristológico, é
Jesus Cristo e é para Ele que nós caminhamos. Embora nós chamamos a Basílica
como Basílica de Nossa Senhora Aparecida, nós a entendemos como a Casa da Mãe,
mas para onde nós nos dirigimos para o encontro pascal, como você disse, com o
179
esposa do Cristo.
Egidio – o senhor teria documentos que falam sobre a definição das imagens,
os projetos, os traçados?
Pe. Darci – temos isso digitalizado na Engenharia, com todos os passos que
vão sendo dados, até chegar onde chegamos hoje com a Basílica.
Egidio – poderia ter acesso a essa documentação?
Pe. Darci – temos um setor chamado CDM = Centro de Documentação e
Memória. Você precisa vir falar com a Dorotéia, explicar o que precisa e ela vai lhe
mostrar.
4º. BLOCO
Egidio – vamos passar ao último bloco sobre a COMUNICAÇÃO DA OBRA
Egidio– sobrea mensagem – tem algo a acrescentar?
Pe. Darci – Não. Acho que já comentamos tudo acima.
Egidio – dentro da linguagem e estilo que está sendo desenvolvido, observo
uma linguagem contemporânea, que vai de encontro à história do passado. Tive
oportunidade de discutir isso com o artista Cláudio Pastro, sobre as influências da Arte
Egípcia, com a lei da frontalidade, os traços simplificados, que eram característica
da Arte Egípcia para dar perenidade à obra, indo muito além de seu tempo. Também
influências do Bizantino, que é a prevalência do dourado, os mosaicos, o uso da
auréola. O que o Pe. Darci gostaria de acrescentar sobre o tipo de imagem que está
sendo desenvolvida e revista depois do Concílio Vaticano II?
Pe. Darci – O Vaticano II pede uma liturgia simples, sóbria e prática. Deve-se
tirar tudo o que rebuscado da liturgia, justamente para desvestí-la da pompa e buscar a
simplicidade, porque Deus mora na simplicidade, Deus mora na harmonia, Deus mora
na beleza, que não é rebuscamento, mas que é simples. Então, dentro desta filosofia
do Vaticano II, da simplicidade, sobriedade e praticidade, a obra de Cláudio Pastro se
encaixa muito bem dentro desses critérios. Porque não é interesse do artista, dentro
desta perspectiva, falar da forma, mas falar do mistério. Ser o instrumento revelador
do mistério de Cristo.
A arte de Cláudio Pastro remete para algo superior ao próprio homem. E é
183
justamente isto que nós buscamos dentro do Santuário de Nossa Senhora, que é
a superação do possível, é a busca do impossível. E é aí que Deus mora. Somente
Deus responde pelo impossível. Então, desvestir tudo aquilo que pode atrapalhar.
Tirar o humano da arte, para revelar o que há de divino na arte, como Dom, como
manifestação do Artista Maior, do Criador, que é Deus. Cláudio Pastro, neste sentido,
é o co-criador, ajuda a Deus na sua criação, ajuda Deus a revelar-se, ajuda o humano
a tocar o mistério, a superar o possível para atingir o impossível. Então, o tipo da arte
do Cláudio Pastro é de uma arte mistério, não figurativa.
Egidio – gostaria de agradecer o tempo que o senhor dispendeu com a gente,
a abertura de sua agenda para este encontro. Muito obrigado.
Pe. Darci - Ressalto que esta é uma leitura pessoal. A leitura técnica fica por
conta do artista.
184
ANEXO 3
Egidio - Há outros artistas além de Cláudio Pastro com obras aqui na Basílica?
Zenilda - Sim. As madonas de madeira, da Madona apoiando Jesus numas
das quedas a caminho do Calvário e a outra da Madona recebendo o Cristo morto
nos braços, são de Walter Frasson Os painéis de cimento das capelas é do escultor
Adélio Sarro. E fora da basílica nós temos os painéis com os mistérios do rosário,
que são de Marco Aurélio Funchal. As imagens do apóstolos (sobre os corredores
externos que ligam as capelas do Batismo e da Ressurreição ao prédio da Basílica)
foram feitas por Alexandre Moraes - são feitas de cimento com decopage de bronze.
Ele também é responsável pelas esculturas do Morro do Presépio.
grego Cristos é o ungido de nossas vidas, é a roda de nossas vidas e o círculo tem o
significado do infinito. Aqui dá para explicar muito bem também a questão da planta
do Santuário. O Santuário é uma construção de 1955 e o arquiteto responsável era
Benedito Calixto de Jesus Neto (ele é neto do pintor Benedito Calixto). Aqui dá para
explicar muito bem a intenção da planta do Santuário.
O Santuário tem o formato de uma cruz grega e latina. Latina – que são as
naves principais no formato da cruz que Cristo que simboliza o sacrifício. E a cruz
grega que é formada pela outras alas representadas pelas capelas de passagem
onde temos as madonas e as capelas de São José e do Santíssimo, que formam uma
cruz grega, perfeita em todos os lados. E a cruz grega ela significa “vitória”. Então a
cruz grega sobreposta à cruz latina forma uma estrela guia. Eu diria que o santuário é
uma estrela guia que, através de Maria, nos conduz até Jesus.
E a gente olha aqui, tem essa trama preto e branca, que é uma referência à
forma indígena da água. Uma referência aos indígenas que acolheram a evangelização.
Essa roda representa então um todo, desde a evangelização dos indígenas até a
evangelização presente hoje.
a primeira capela de Nossa Senhora, onde hoje está a Matriz Basílica, que hoje nós
chamamos Basílica Velha.
Os tijolos da Basílica
Por que o tijolo que reveste a Basílica? O tijolinho, dentro da religiosidade, é
uma referência ao fato de que nós viemos do barro moldado por Deus, assim como
uma referência à pequenina imagem (imagem milagrosa de Nossa Senhora), que
é feita de terracota, de barro cozido. Por isso é que a Basílica não é revestida de
mármore. Nós somos o pó de Deus, assim como a pequenina imagem encontrada
no rio. Uma curiosidade que se tem é a de quantos tijolos. A última contagem, feita
há diversos anos atrás, alcançava 25 milhões de tijolos. Mas de fato hoje já estão
beirando os 30 milhões – isso só na construção. E no revestimento (a contagem) é de
1 milhão e 200 mil tijolos e 257 mil telhas azuis.
Porta Santa
E caminhando, porque estamos sob a ação do Espírito Santo que conduz
a nossa vida, nós chegamos à Porta Santa, na Nave Norte. Este é o coração de
entrada do Santuário. As pessoas têm dúvidas, porque como são quatro lados
iguais, mas esta é a entrada principal, com a face voltada para o rio (Paraíba
do Sul), como as antigas igrejas. Esta foi a primeira das quatro naves que foi
construída. Essa imagem de Nossa Senhora da Assunção está aqui desde maio
de 1955. E esta ala, que é a Nave Norte, a partir de novembro de 1955 e há uma
simetria perfeita entre todas as alas.
Neste símbolo da entrada principal nós vemos o círculo, que representa o
infinito e o brasão de entrada, onde consta ‘Basílica Nacional de Nossa Senhora
Aparecida’, onde nós temos: as chaves que simbolizam Pedro; temos esta haste, com
este guarda-chuva branco, que é o GOLFALORO, o símbolo de Basílica Menor e que
representa a proteção de Deus sobre nós. Temos o sino, que é o chamado de Deus
em nossas vidas. A flor-de-liz eráudica, que simboliza a nobreza de Deus, e então
a cruz de Cristo e a estrela guia, justamente nos conduzindo a Maria. Nós também
temos os peixes que somos nós, os novos cristãos e também, como uma referência
187
Arcadas e monogramas
Neste outro ângulo das arcadas externas nós temos o monograma do Sol e da
Lua. Jesus é o Senhor do tempo, do espaço, do cosmo. Ele é o centro de todo o nosso
universo. Daqui nós vamos para a Jerusalém Celeste. As águas nos acompanham
ao longo das arcadas. É como se fossem várias cidadelas, uma entermeando com a
outra, formando a assembléia de Deus.
Caminhando sobre ele, pelas arcadas externas, passamos em frente à
imagem original da Mãe de Deus, encontrada no rio onde está o Porto Itaguaçu.
Entre as arcadas externas, no piso do adro principal, na face norte, temos o brasão
da Basílica. A forma indígena de cestaria simboliza a terra brasileira que recebeu
o Mistério Cristão. No ângulo noroeste, entre a Basílica e a Torre Brasília, temos o
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Nós vamos ver muito ouro, com tons em branco e as várias tonalidade de
azul. Estas são referências às terras da Mesopotâmia, associadas com o pai da
fé judaica e cristã - Abraão. Os azulejos também são uma homenagem à nossa
herança Ibérica (Portugal e Espanha). Pode-se observar muitos detalhes indígenas
como referência aos índios, porque esta região, de Aparecida e de Guaratinguetá,
era uma região de índios, puris e colorados, que existiam aqui na região. Este painel
tem caráter religioso e histórico.
A imagem, depois de encontrada (em meados de outubro de 1717), é
colocada na casa dos próprios pescadores. Depois é feito um pequeno oratório
onde hoje é a igreja de São Geraldo, que é pequenina. Depois vai para a primeira
capela, de 1745, que recebe uma ampliação de 1834 a 1888, que é a Basílica Velha.
Depois a imagem veio para a Nova Basílica. Estamos perto da celebração dos 300
anos de encontro da imagem.
casa dos pescadores, quando num momento de oração o vento apagou as velas e
elas se acenderam sozinhas; o milagre do escravo, que estava acorrentado e pediu
ao capataz que o levava para rezar em frente a Nossa Senhora – quando todas as
correntes dos pés e das mãos se partiram (informado do ocorrido, o seu senhorio o
libertou); o milagre da visão - de uma menina cega que veio em peregrinação por
3 meses desde Jaboticabal; e o do cavaleiro de Cuiabá – era ateu e queria entrar a
cavalo na Igreja – o cavalo resistiu todas as ordens e chicotadas do cavaleiro e não
entrou e no seu trotar muito forte deixou a marca de uma das patas no piso de entrada
da Basílica (na época a Basilica Velha) – fenômeno que converteu o cavaleiro.
O retábulo
A parte principal do Santuário está voltada para a mulher do Apocalipese =
a mulher revestida de Sol. Por isso que o nicho de Nossa Senhora está dentro do
Sol.O retábulo é todo em dourado, com a associação ao sol e com tons de branco, em
referência à Imaculada Conceição.
No retábulo acima do nicho da imagem de Nossa Senhora estão os arcanjos:
Miguel, Gabriel e Rafael. É a simbologia de como os nossos pedidos são levados
aos céus, e como Maria nos devolve os pedidos em graças. E cada anjo representa
um atributo de Deus: Miguel = o poder de Deus (em hebraico, significa: quem como
Deus); Gabriel = Deus anuncia (em hebraico, GABRÍ = anunciar); Rafael = Deus cura
(em hebraico, RAFÁ = curar). Dentro do nicho, que foi refeito recentemente, o oratório
onde está a imagem. Agora o revestimento em ouro do oratório tem muitos peixes,
representando a imagem no meio dos peixes, em associação à abundância de peixes
que veio na rede, quando ela foi encontrada. Também essa imagem dos peixes remete
ao apocalipse: “E o Espírito e a esposa dizem: Vem Senhor” (Apocalipse – capítulo 22,
versículo 17). A coroa de ouro utilizada foi doada pela princesa Isabel.
A imagem de Nossa Senhora é retirada duas vezes ao ano, para manutenção
pela restauradora, Marilena Chafuri e equipe, que foi quem restaurou a imagem no
ano de 1972, quando um indivíduo descontrolado destruiu completamente a imagem,
ainda quando na Basílica Velha.
A imagem à noite fica voltada para a capela dos apóstolos. É por lá que se
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tem acesso à imagem. É uma capela pequena, com cenas do Pentecostes, que é o
início da Igreja. Cabe no máximo 50 pessoas e foi construída em estilo neo-românico.
Flores e frutos usados: bromélia, flor de liz e flor de lotus.