Você está na página 1de 25

Revista Portuguesa de Filosofia

Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea e Reposicionamento da Metafísica face à


Ciência, num Compromisso Ôntico com a Verdade
Author(s): RICARDO BARROSO BATISTA
Source: Revista Portuguesa de Filosofia, T. 68, Fasc. 1/2 (2012), pp. 147-170
Published by: Revista Portuguesa de Filosofia
Stable URL: http://www.jstor.org/stable/41955628
Accessed: 04-11-2017 04:31 UTC

REFERENCES
Linked references are available on JSTOR for this article:
http://www.jstor.org/stable/41955628?seq=1&cid=pdf-reference#references_tab_contents
You may need to log in to JSTOR to access the linked references.

JSTOR is a not-for-profit service that helps scholars, researchers, and students discover, use, and build upon a wide
range of content in a trusted digital archive. We use information technology and tools to increase productivity and
facilitate new forms of scholarship. For more information about JSTOR, please contact support@jstor.org.

Your use of the JSTOR archive indicates your acceptance of the Terms & Conditions of Use, available at
http://about.jstor.org/terms

Revista Portuguesa de Filosofia is collaborating with JSTOR to digitize, preserve and extend
access to Revista Portuguesa de Filosofia

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea
e Reposicionamento da Metafísica face à Ciência,
num Compromisso Ôntico com a Verdade
RICARDO BARROSO BATISTA

Resumo

O presente artigo brota da verificação de que a metafísica mantém uma relação co


com a ciência. Para compreender a natureza deste problemática o autor percorre a
da relação entre estas duas áreas de estudo, focando-se no ponto decisivo dessa hist
foi o surgimento do neopositivismo. O autor argumenta que durante o processo de
tação e ascensão da metafísica, logo após a queda do neopositivismo, os metafísicos
de procurarem diminuir o hiato com a ciência, acabaram por adoptar uma abordag
mais autónoma desta. 0 autor procura mostrar que esta viragem tem origem no
própria metafísica analítica, pelo que neste artigo se revisita o processo de reabi
metafísica com Quine, passando para a ascensão da modalidade a posteňoň com
Evidencia-se que é nesta última fase que reside subtilmente a parte da mesma filos
causou a queda da metafísica. O autor argumenta que os principais factores que mo
um afastamento das comunidades metafísica e científica, e a consequente posição d
nomia daquela, resultaram do facto da metafísica analítica contemporânea manter
tamente uma forma de teoria deflacionista da verdade e de não-factualismo, que c
a uma posição anti-realista com todas as suas consequências. Por último, o auto
um reposicionamento da metafísica, a partir do conceito de união em compleme
suportado por um realismo e compromisso ôntico com a Verdade.

Palavras-chave : Filosofia da Ciência, Metafísica, Metafísica Analítica Contem


Modalidade, Papel da Metafísica na Ciência, Teoria da Verdade

Abstract

This article stems from the fact that metaphysics maintains a complicated relationship with
science. To understand the nature of this problem the author will go through the history of the
relationship between these two areas of study, focusing on the crucial point of this story with
the emergence of neo-positivism. The author argues that during the process of rehabilitation
and ascension of metaphysics, shortly after the fall of neo-positivism, metaphysicians rather
than seeking to solve the gap with science, they adopted a more autonomous position.
The author will show that this shift comes from the very core of Analytic Metaphysics,
therefore this article will revisit the process of rehabilitation of metaphysics with Quine,
moving to the rise of the posteriori modality with Kripke. About this latter part it will be
showed these subtly contains part of the same philosophy that brought the downfall of
metaphysics. The author argues that the main factors that motivated a departure from the
metaphysical community over science, and the resulting position of autonomy, come from the
fact that contemporary analytic metaphysics maintain an implicit form of deflationary theory

* Universidade Católica Portuguesa - Braga (Portugal), rbarrososj@gmail.com

Vol. 68

Fase .1-2 Q RPF 2012 | 147-170

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
148 Ricardo Barroso Batista

of truth and non-factualism, which led to an ant


Finally, the author will propose a repositioning of
of complementarity union supported by a realism

Keywords : Contemporary Analytic Metaphysi


Science, Role of Metaphysics in Scientific Theorizin

1. Introdução

mosidade entre as duas ganhou maior contorno no princípio do


A metafísica mosidade
séculoséculo
passado
passado
e, especialmente,
entre mantémcome, aso especialmente,
surgimento da duas
filosofia
uma darelação ganhou complicada com maior o surgimento contorno com a no ciência. da princípio filosofia A ani- do da
ciência por oposição à metafísica.1 Os neopositivistas sentiam-se unidos
numa desconfiança perante a metafísica e essa suspeita profunda foi
a motivação que os levou a procurar uma demarcação entre ciência e
não-ciência e, nomeadamente, entre ciência e «especulação» metafísica.
Durante a sua reabilitação, logo após a queda do neopositivismo,
a metafísica gozou de um período de tréguas, mas recentemente tem
vindo a estar sob grande pressão. Tanto é que tem sido visível o clima de
hostilidade nas recentes publicações de filosofia da ciência.2 Van Fraasen
revela, a este propósito, o seguinte: "[...] metaphysicians interpret what we
initially understand into something hardly anyone understands, and then
insist that we cannot do without that. To any incredulous listener they 11
say: Construct a better alternative! But that just signals their invincible
presumption that metaphysics is the sine qua non of understanding."3
Contudo, é interessante observar que os críticos actuais da meta-
física não são positivistas lógicos, nem abraçam uma ideologia empírica
comum da qual seria expectável uma desconfiança para com a metafísica.
Em vez disso, estes críticos ocupam toda a gama de posições na filosofia da
ciência. E mesmo que se vá reconhecendo, em alguma filosofia da ciência,
a importância do uso da reflexão metafísica, muito ainda fica por fazer.
Ao contrário de algumas posições críticas na filosofia da ciência, é
possível estendermos a nossa compreensão da natureza através de uma
crítica metafísica da concepção da realidade. Isto porque os conceitos

1 . Vd. Gale, G. & Pinnick, C. - "Philosophy of Science and History of Science: a Troubling
Interaction". Journal for General Philosophy of Science 31 (2000): 109-125.
2. Vd. Van Fraasen, B. - The Empirical Stance. New Haven: Yale University Press, 2002;
Vd. Maddy, P. - Second Philosophy: A Naturalistic Method. Oxford: Oxford University Press,
2007; Vd. Ladyman, J. & Ross, D. - Everything Must Go: Metaphysics Naturalized. Oxford:
Oxford University Press, 2007.
3. Van Fraasen, B. - The Empirical Stance, p. 3.

Vol. 68 -

Fase 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea e Reposicionamento da Metafísica face à Ciência 149

descritivos que incorporam as nossas pressuposições ontológicas acerca


da realidade (e que nos ajudam a compreender o significado de descrições
teóricas abstractas) devem ser sujeitos a uma constante reavaliação.
Por exemplo, o formalismo quântico, sendo adequadamente interpretado,
pode ser fonte de novas explicações e metáforas acerca da realidade, de
forma similar ao que aconteceu com o advento da mecânica newtoniana.
A questão é realmente sobre a ontologia adequada à teoria quântica e é
difícil de imaginar uma questão de importância comparável, em épocas
anteriores, não receber a devida atenção, como é frequente nos tempos
actuais. Por conseguinte, nesta base, não só há muito espaço para se fazer
metafísica, como esta é importante para auxiliar o processo de obter uma
melhor compreensão dos fundamentos da realidade.
Contudo, se assim o é, porque está a ressurgir a hostilidade para com
a metafísica? Nós iremos sugerir, ao longo deste artigo, que o elemento
crucial para se compreender tal fenómeno reside na própria relação entre
metafísica e ciência. Onde no passado a metafísica e a ciência eram uma
só (Filosofia da Natureza), hoje em dia prevalece uma preocupante divisão
entre as duas. No entanto, porque nos propomos a ser sintéticos, concen-
trar-nos-emos no lado filosófico deste hiato.
Começaremos por descrever quatro tipos de relacionamento que
foram ocorrendo ao longo da história entre estas duas disciplinas.
Isto porque iremos argumentar que os problemas que hoje assolam a
metafísica analítica contemporânea, dos quais chovem actualmente tantos
ataques, têm a sua origem na crise da metafísica com o advento do neopo-
sitivismo.

Durante o processo de reabilitação e ascensão da metafísica, os meta-


físicos, em vez de procurarem cobrir o hiato com a ciência, acabaram por
adoptar uma abordagem que os tornou ainda mais autónomos da ciência
e, consequentemente, mais vulneráveis ao risco de permanecerem estéreis
e descredibilizados. Quem sabe se não terá sido este isolamento face à
ciência um síndrome pós-traumático, resultante do neopositivismo, ou de
alguma fobia a perder a sua área de estudo para a ciência. Todavia, não
nos parece que o problema resida aí.
Nós iremos argumentar que este isolamento e consequente autonomi-
zação face à ciência tem origem no cerne da própria metafísica analítica.
Por conseguinte, iremos revisitar o processo de reabilitação da metafísica
com Quine, passando para a ascensão da modalidade a posteriori com
Kripke que, não só marca o início em que os metafísicos se reencontraram
com o seu objecto de estudo, e a partir do qual mantêm até aos dias de
hoje a sua obsessão pela modalidade metafísica (que permeia muitos dos
trabalhos da metafísica analítica), mas também porque daqui resultou

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
150 Ricardo Barroso Batista

uma viragem na área de estudo da meta


fazer metafísica, em comparação com a m
Contudo, a importância de rever a re
física passa também por mostrar que n
física analítica, pelo fato de ser herdeir
nela residir subtilmente parte da mesma
metafísica e parte da mesma suspeita para
Consequentemente, melhor se poderá re
contemporânea mantém implicitamente
não-factualismo para com a verdade , e que
ser uma metafísica anti-realista. Sendo
motivaram, e que continuam a motivar,
metafísica para com a ciência e a consequ
Contudo, antes de podermos sugerir u
física, tendo por pano de fundo o conceito
suportado por um realismo e comprom
teremos de criticar o baluarte da modal
metafísica ancorada na autonomia.
Este posicionamento acreditamos nós, permitirá contribuir para que
a metafísica seja profundamente infundida na ciência, ao mesmo tempo
que a investigação metafísica seja aconselhada pela ciência e não ignore
os seus resultados. Por conseguinte, nós acreditamos que não só este repo-
sicionamento permitirá diminuir o hiato entre metafísica e ciência, como
subsequentemente permitirá aproximar a ciência e a filosofia da ciência
da reflexão metafísica, pois as primeiras sem a última ficam mais pobres.

2. As Diferentes Relações entre Metafísica e Ciência

Até ao começo da modernidade, metafísica e ciência eram uma só


disciplina (filosofia da natureza). As questões científicas eram dirigidas
como uma parte da metafísica. O próprio termo ciência significava «conhe-
cimento de». A esta primeira posição designaremos por união.*
Contudo, no início da modernidade começou a assistir-se ao desdo-
bramento das duas. Foi a partir desse desdobramento que começou a
tomar lugar uma segunda posição que designaremos por supremacia.
Nesta posição tanto a ciência como a metafísica, ou procuram oferecer

4. Por uma questão de espaço abreviámos esta posição. Vd. Gaukroger, S. - The
Emergence of a Scientific Culture: Science and the Shaping of Modernity, 1210-1685. Oxford:
Oxford University Press, 2006, pp. 47-1 16.

Vol. 68

Fase 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea e Reposicionamento da Metafísica face à Ciência 151

uma descrição da realidade na qual surgem afirmações que entram em


conflito (tanto em questões simples como gerais), ou tentam derivar os
princípios de uma disciplina a partir dos princípios da outra. Um exemplo
histórico pode ser o de Descartes, quando este tentou afirmar que a meta-
física está mais próxima da verdade do que a física. Recordemos que
Descartes atacou Galileu por este prescindir de um método sistemático
na sua abordagem à filosofia natural e por ter estado demasiado absorvido
em questões empíricas dispersas e isoladas. Por outro lado, as hipóteses
físicas de Newton foram atacadas por Leibniz sob a base de princípios
metafísicos e teológicos (a identidade dos indiscerníveis, e o principio da
razão suficiente aplicado às escolhas divinas). Outro exemplo de supre-
macia pode ser observado em Kant e Euler, quando para estes a metafísica
tinha a tarefa de explicar os princípios básicos da física, por derivá-los de
verdades metafísicas apriorísticas. Curiosamente, o Kant tardio entendeu
que após o trabalho de Newton a metafísica tradicional não teria mais
futuro.5
Ao longo da modernidade, não só emergiu esta segunda posição,
como também uma terceira a que designaremos por autonomia. Nesta
posição, foram frequentes as afirmações e reivindicações, tanto da meta-
física como da ciência, que defendiam uma posição de independência
entre metafísica e ciência de tal forma que não deveria haver conflito entre
as duas, nem em termos de princípios. Na autonomia existe uma atitude de
reciprocidade, em que a matéria de estudo das disciplinas deve ser consi-
derada pelos seus agentes como não sobreposta uma à outra. Por exemplo,
esta posição encontra-se generalizada entre muitos filósofos contempo-
râneos, que seguem o seu trabalho sem prestar qualquer tipo de atenção
ao que vai acontecendo no campo científico, como no caso particular da
física. Contudo, também deve ser dito que, ainda de forma mais signifi-
cativa, esta atitude também é defendida pela grande maioria dos cientistas
- inconscientemente parecidos com os discípulos do neopositivismo - que
acreditam numa independência total entre a ciência e a metafísica.
Todavia, no início do século passado, com os grandes desenvolvi-
mentos ocorridos na ciência e com uma metafísica incapaz de os acom-
panhar, assistiu-se à emergência de uma quarta posição que designaremos
por anexação. Esta também derivada, em parte, dos anteriores relaciona-
mentos de supremacia e autonomia. Nesta posição observa-se a reivindi-
cação de que uma disciplina é ela menos a outra, pelo que a outra se torna

5. Cf. Francks, R. - Modern Philosophy: The Seventeenth and Eighteenth Centuries. Nova
Iorque: Routledge, 2004.

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
152 Ricardo Barroso Batista

desnecessária. Observemos que a física r


teoría metafísica da natureza e, portant
de qualquer análise «metafísica» ou interv
pela qual a física procurou anexar a met
daquela ser a única capaz de descrever a r
"[...] a verdadeira dificuldade reside no f
metafísica. A física «descreve» a realidad
a realidade a não ser que a descrevamos c
esta posição foi difundida pelos neoposit
carem a metafísica por ser demasiado super
um critério que separasse a «boa» (legítim
física. A saber, a «boa» seria a própria física
tituir a «má» (a metafísica «tradicional»).
Curiosamente esta quarta posição emer
o da rápida ascensão da física e do sucess
facto dos cientistas da altura nutrirem inte
(F3) do alicnamento da metafísica (maior
ciência; (F4) da origem da filosofia da ci
(F5), intrinsecamente ligado a (F3) e (F
metafísica ter tido o seu maior contribu
Estes motivos contribuíram para a tent
pela física, e da sua subsequente queda.
Contudo, como veremos, mesmo após
e da tentativa de anexação, a metafísic
Acreditamos que isto é sintoma de uma d
sentir antes da anexação e que resulta prim
nomia que hoje se volta a sentir. Tudo ist
conduziram à queda da metafísica, não s
também estão novamente a ressurgir, n
(F3), e (F5). Salientamos que apesar de (F
novo contexto, este continua a marcar p
causas de (F3). Por sua vez, observa-se o
publicações por parte de filósofos da ciên
metafísica, para voltar a atacá-la. Porém,

6. Einstein, A. - Como vejo o Mundo. Rio de Janeiro


7. Com isto queremos realçar o relacionamento
para com a filosofia, e especialmente para com os f
D. - "The Society for Empirical/Scientific Philos
(Eds.) - The Cambridge Companion to Logical Empir
Press, 2007, pp. 42-57.

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea e Reposicionamento da Metafísica face à Ciência 153

(F5) deriva de (F3) e sugerimos que (FI) se faz sentir por causa de (F3).
Consequentemente, teremos de nos focar em (F3) se queremos perceber
o mal-estar face à metafísica, e para o fazer é necessário observar a sua
génese no princípio do século passado.

3. Da Queda à Ascensão da Metafísica na Contemporaneidade

A queda da metafísica tem como pano de fundo a crítica neoposi-


tivista. Carnap pensou que muita da metafísica e ontologia tradicionais
assentavam num erro. Para explicar isto, ele confiou na noção de enqua-
dramento linguístico. De forma simples, um enquadramento linguístico é
o conjunto de regras (supostamente) que regulam o uso de um grupo de
termos e predicados (por exemplo, os termos que usamos quando falamos
acerca de objectos de tamanho médio, ou quando falamos sobre números).
Carnap pensou que ao adoptar um enquadramento, ou forma de falar,
trazia consigo questões ou métodos ontológicos. E que isto seriam questões
«internas», questões que se levantavam dentro do enquadramento, e que
a sua natureza dependia do enquadramento em questão. Sendo que estas
podiam ser empíricas como na ciência, ou lógicas como na matemática.
Contudo, Carnap considerou que estas questões internas não incluiriam
as questões metafísicas tipicamente usadas pelos filósofos, tais como:
"Existem objectos materiais?" ou "Existem os números?" Segundo Carnap,
estas questões «externas» são erros, pelo que não devem ser colocadas,
pois estão enquadradas de maneira desacertada. Desse modo, as únicas
questões externas legítimas são pragmáticas por natureza, como tal, seria
nosso dever questionar se deveríamos aceitar este enquadramento e se o
enquadramento aceite seria útil. Por conseguinte, Carnap defendeu um
pluralismo de enquadramentos.8 À questão: "existem átomos?" Carnap
responderia que alguém lida sempre com entidades pressupostas pelo
enquadramento. Então, se o enquadramento pressupõe atomos, a questão
nem se levanta. Logo, se alguém o questionasse sobre o porquê de usar
tal enquadramento em detrimento de outro, defenderia que a resposta é
uma decisão puramente prática. Pelo que a ontologia foi empurrada para
a pragmática.
Contudo, foi com Quine que se deu início ao resgate da metafísica.
Putnam sugere que começou antes da publicação de «Dois Dogmas do

8. Cf. Eklund, M. - "Carnap and Ontological Pluralism". In: D. Chalmers, D. Manley &
R. Wasserman (Eds.) - Metametaphysics: New Essays on the Foundations of Ontology. Oxford:
Oxford University Press, 2009, pp. 130-153.

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
154 Ricardo Barroso Batista

Empirismo»: "If we ask when Ontolog


an analytic philosophy to pursue, the
respectable in 1948, when Quine publi
What There Is». It was Quine who sing
respectable subject."9
A importância de Quine deveu-se a
distinção entre verdades analíticas e ve
entre verdades em virtude do facto e v
Se Quine está certo, então não existe um
conceptuais/linguísticas e verdades fact
uma má notícia para a análise conceptua
tempo (visto que assim não haveria ve
Foi uma boa notícia para a possibilidade
do-se à visão de Carnap, de que as quest
de tipos de objectos e que são questões p
Quine interrogou porquê de isso ser e
questões filosóficas e não para as questõ
a noção de enquadramento de Carnap p
co-sintética. Deste modo, Quine argum
da distinção analítico-sintética, mesmo
mamente pragmáticas. Ou seja, a afirm
de Carnap não poderia haver questões
nenhuma questão mantém-se inteira
pragmáticas, pois questões deste tipo e
menos implicitamente. Portanto, em ú
pragmáticos por natureza.10
Consequentemente, sem enquadram
enquadramentos, os neopositivistas fic
para banir a metafísica. Por conseguin
que dizem respeito à metafísica não são m
Diz o autor a este respeito que,

A questão sobre o que há é uma preocup


com a maior parte das outras áreas que
A resposta descritiva só foi dada em pa
Uma combinação representativa de massa
e estrelas tem sido descrita individualme

9. Putnam, H. - Ethics without Ontology. Cam


pp. 78-79.
10. Cf. Hylton, P. - Quine. Nova Iorque: Routledge, 2007, pp. 51-56.

Vol. 68 -Jfc,
Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea e Reposicionamento da Metafísica face à Ciência 155

astronomia, e um bípede ocasional ou outro objecto de dimensão média


nos livros de biografia e de arte. A produção em massa em zoologia,
botânica e mineralogia, nas quais as coisas são agrupadas por simila-
ridades e descritas colectivamente, intensificou a descrição. A física,
por se abstrair mais implacavelmente das diferenças de pormenor,
leva ainda mais longe a descrição em massa. E até a matemática pura
pertence à resposta descritiva à pergunta sobre o que há; pois as coisas
acerca das quais a pergunta se põe não excluem os números, classes,
funções, etc., se houver tais coisas, de que a matemática trata. O que
distingue a preocupação ontológica do filósofo de tudo isto é apenas a
abrangência de categorias.11

Prosseguindo, Quine diz-nos que as questões ontológicas do tipo: "Há x?"


têm sentido, mas somente quando os enunciados envolvidos são apre-
sentados de forma lógica e adequada. Assim sendo, alguém aprende que
uma teoria está comprometida com X se e somente se X está dentro do
domínio das variáveis da teoria. Mas se acrescentarmos a isto a reivindi-
cação de que a teoria é «verdadeira», então assim estamos a fazer onto-
logia. Portanto, o ataque positivista é repelido.
Contudo, mesmo depois de repelido o ataque positivista, a metafísica
permaneceu suspensa. Isto porque apesar de Quine ter removido a razão
dada pelos neopositivistas para não se fazer metafísica, ele não provi-
denciou uma forma clara de a fazer. Tanto que Quine veio atacar um dos
tópicos centrais da metafísica, a modalidade de re. 12
Porém, seguiu-se que a modalidade voltou a adquirir nova força,
sobretudo quando a lógica modal foi reforçada nas suas próprias fundações
e quando os contra-factuais receberam uma semântica mais rigorosa.
Mas melhor do que isso, do ponto de vista da metafísica analítica, acon-
teceu quando Kripke realizou as suas «experiências de pensamento»,
através das quais mostrou que podemos ter intuições fortes acerca do
que é possível e que essas intuições edificam um domínio da modalidade
que não é de forma óbvia reduzível às possibilidades científicas, a saber,
a modalidade metafísica. Consequentemente, foi reabilitado um certo tipo
de essencialismo . Ou seja, se a água é actualmente H20, então esta não
pode ser outra coisa qualquer. Aqui o não pode ser representa a necessidade
metafísica e Kripke é tido como o autor da necessidade a posteriori}3.

11. Quine, W. - Palavra e Objeto. Petrópolis: Editora Vozes, 2010, p. 347.


12. Cf. Hylton, P. - Quine, pp. 349-352.
13. Cf. Hughes, C. - Kripke: Names , Necessity, and Identity. Oxford: Oxford University
Press, 2006, pp. 84-87.

Vol. 68

Fasc. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
156 Ricardo Barroso Batista

Encorajados por este acontecimento, o


com o seu objecto de estudo. Mas como
sicos foram muito além da possibilidad
até aos dias de hoje, uma nova forma
a modalidade e que nas suas raízes assen
analítica que esteve subjacente ao ataqu
de prosseguir, observando como a part
alcançou o presente estado de autonom

4. A Origem da Autonomia da

Uma vez restaurada a intuição filosóf


física, regressaram os trabalhos académ
desse trabalho foi para além das nec
A comunidade metafísica voltou a afas
posição de cada vez maior autonomia e
mentos científicos que iam ocorrendo.
Por isso, vale a pena observar em m
teorização metafísica autónoma que p
incorrido no grave risco de esterilidad
mento. Esse exemplo é o do simples ,
analítica, e que por vezes é alcunhado c
físicos.
O simples é um objecto que não se en
por partes. Uma questão que tem receb
se este é possível tendo extensão espacial.1
argumentado que o simples com extens
possível.15 Por exemplo, suponhamos que
rogéneas e que numa região é vermelho e
terá duas partes, a parte vermelha e a p
ideia de que é um simples . Certamente
princípio para o efeito da necessidade de
se e somente se tiver simplesmente a
Agora, o argumento do simples sem ex
uma alegação sobre o mundo actual, no

14. Cf. McDaniel, K. - "Brutal Simples". In: D.


Metaphysics, vol. 3. Oxford: Oxford University Pre
15. Cf. Spencer, J. - "A Tale of Two Simples". Ph
16. Ibid., pp. 172-174.

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea e Reposicionamento da Metafísica face à Ciência 157

extensa com propriedades heterogéneas não é simples. Subsequentemente,


vejamos como esta alegação se relaciona com a ciência.
À primeira vista, esta alegação parece contradizer qualquer afir-
mação científica que postule um tipo de entidades fundamentais simples
com extensão. Por exemplo, na interpretação mais natural,17 a teoria das
cordas (uma das mais promissoras tentativas de uma teoria quântica da
gravidade) postula o simples com extensão.18
Se as cordas existem e, pelo que está actualmente postulado, elas
terão algumas das suas propriedades heterogeneamente distribuídas, por
exemplo, densidades de energia não triviais ao longo da corda, então, apli-
cando o argumento do simples não extenso às cordas, podemos deduzir
que as cordas não são os blocos básicos do mundo porque estas têm
partes. Isto, porque a reflexão sobre a natureza das partes e dos simples
dizem-nos que as cordas são compostos. E na medida em que a teoria
das cordas deixa de fora as partes, esta é incompleta e não é ultimamente
fundamental. Observemos que este argumento é apresentado estando inti-
mamente impresso nas discussões da apresentação/organização (lógica,
semântica, linguística, etc.) dos nossos conceitos;19 mas se o argumento
estiver certo, então as cordas são mesmo compostos. Logo, não seria
necessário um acelerador de partículas para testar isso.
Contudo, como é que podemos saber se os blocos mais elementares
do mundo têm extensão ou não, senão através da ciência? E se porventura
imaginarmos que no futuro se descobre que têm extensão, não serão apenas
os simples não extensos uma construção linguística? Estarão mesmo dois
metafísicos a argumentar, ou a contra-argumentar, sobre a possibilidade
dos simples extensos serem metafisicamente possíveis e a discordar acerca
de duas diferentes formas de mundos possíveis? Ou será este debate
meramente verbal? A comunidade dos metafísicos encontra-se dividida
nesta questão. Alguns pensam que debates como estes são genuínos,20

17. Nós dizemos "mais natural" porque a teoria inicialmente foi motivada pelo facto de
que a topologia de contínuas interacções de entidades extensas unidimensionais evitava as
divergências ultravioletas que assolava a dispersão gravitão-gravitão. A unidimensionalidade
das cordas foi uma parte significativa da atracção original que a teoria causou. Todavia,
apesar das críticas, a teoria das cordas é uma possibilidade para descrever as entidades do
nosso mundo.

18. Cf. Hudson, H. - The Metaphysics of Hyperspace. Oxford University Press, 2005, p. 107.
Cf. McDaniel, K. - "Brutal Simples", p. 235.
19. Cf. Hawthorne, J. - Metaphysical Essays. Oxford: Oxford University Press, 2006, p. 55.
20. Cf. Sider, T. - "Ontological Realism". In: D. Chalmers, D. Manley & R. Wasserman
(Eds.) - Metametaphysics: New Essays on the Foundations of Ontology. Oxford: Oxford
University Press, 2009, pp. 284-423.

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
158 I Ricardo Barroso Batista
outros defendem que não o são,21 outros acham que são genuínos mas
irresolúveis,22 e ainda há outros que crêem que são genuínos mas apenas
na medida em que debates acerca de ficção são genuínos.23
Agora, como é encarado por parte dos metafísicos o facto de os físicos
reivindicarem que aquilo que é designado (na metafísica) por simples tem
extensão? Alguns metafísicos alegam que os físicos estão confusos e que
as suas cordas não são simples extensos }4 Por conseguinte, para alguns
metafísicos, a teoria deveria ser reinterpretada de uma maneira tal que
fosse compatível com os termos usados pela metafísica.25
Para outros, a metafísica deve manter os seus simples não extensos ,
independentemente do que afirma a ciência, por estes serem os blocos
últimos da realidade, isto alicerçado na possibilidade da metafísica modal.
Afirma Holton:

It may be the physicists job, for example, to tell us whether the


fundamental entities that physics appeals to are physically indivisible
one-dimensional strings, but it is the job of the metaphysician to tell us
whether those uncuttable things are composite.26

Contudo, será desta forma autonoma que as investigações metafísicas


serão relevantes para uma compreensão mais profunda do mundo físico?
A nossa resposta é negativa, porque os metafísicos procedem as suas inves-
tigações sem sentirem a necessidade de as confrontar com a física. Pois foi
desde a ascensão da metafísica que se voltou a assistir ao facto de que, se
não é clara a maneira em que os tópicos e as investigações da metafísica
podem afectar e desempenhar um papel na física, então acontece que
uma confrontação com a física parece aos metafísicos como algo dúbio

21 .Cf. Hirsch, E. - "Ontology and Alternative Languages". In: D. Chalmers, D. Manley &
R. Wasserman (Eds.) - Metametaphysics : New Essays on the Foundations of Ontology. Oxford:
Oxford University Press, 2009, pp. 231-259.
22. Cf. Bennett, K. - "Composition, colocation, and metaontology". In: D. Chalmers,
D. Manley & R. Wasserman (Eds.) - Metametaphysics: New Essays, pp. 38-76.
23. Cf. Yablo, M. - "Must existence-questions have answers?". In: D. Chalmers, D. Manley
& R. Wasserman (Eds.) - Metametaphysics: New Essays, pp. 507-526.
24. Cf. Hudson, H. - The Metaphysics of Hyperspace, p. 107.
25. "What are strings made of? There are two possible answers to this question. First,
strings are truly fundamental - they are "atoms", uncuttable constituents, in the truest sense
of the ancient Greeks. As the absolute smallest constituents of everything, they represent the
end of the line... From this perspective, even though strings have spatial extent, the question
of their composition is without any content. Were strings to be made of something smaller,
they would not be fundamental." McDaniel, K. - "Brutal Simples", pp. 235-236.
26. Hudson, H. - The Metaphysics of Hyperspace, p. 107.

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea e Reposicionamento da Metafísica face à Ciência 159

ou suspeito, e isto é uma das razões principais pelo que tantas investi-
gações metafísicas dentro da tradição analítica permanecem, e possivel-
mente devem de permanecer, seguras dentro da posição de autonomia ,
com todos os perigos que tal posição representa.

5. Diagnóstico dos Problemas da Metafísica Analítica


Contemporânea

Contudo, nós não encontramos nada a objectar face ao uso da intuição


por parte dos metafísicos, nem da sugestão que a metafísica pode ajudar
a uma nova interpretação da física. Os metafísicos podem ter boas razões
para reinterpretar, desafiar e acrescentar algo à física. A nossa objecção
está principalmente centrada na relação de autonomia entre metafísica e
ciência.

Mas, como é que a metafísica chegou a este actual posicionamento


de autonomia ? Aqui chegados, já podemos apontar quatro razões prin-
cipais que se relacionam entre si, a saber: (Al) a metafísica, tendo sido
reabilitada dentro do seio da própria filosofia analítica, acabou por herdar
uma teoria da verdade deflacionista, que de tal forma a impregnou, que na
actual metafísica modal permanece implícito um certo não-factualismo
que a torna anti-realista e, consequentemente, a afasta de um compromisso
ôntico para com a verdade ; (A2), derivado de (Al) e da herança analítica,
foi a ocorrência de uma viragem subtil na área de estudo da metafísica;
(A3) resultado de (Al) e de (A2), deve-se ao facto de a metafísica se ter
restringido num «logicismo» modal, como seu objecto de estudo, e sobre
o qual quer/tem uma reivindicação exclusiva; (A4) como consequência dos
anteriores, e de um certo espírito do tempo, observa-se a respectiva ideia
de que o filósofo e o cientista realizam trabalhos separados, e fundamen-
talmente diferentes.
Contudo, existe uma viragem mais subtil, por detrás da viragem
do objecto de estudo da metafísica e do exacerbamento da modalidade.
Esta viragem emerge da permanência de boa parte da mesma filosofia
neopositivista no seio da metafísica e, nomeadamente, na desconfiança
perante uma metafísica da verdade , o que se reflectiu na adopção por parte
da metafísica de uma teoria da verdade de forma deflacionista. Horsten
refere, neste sentido, o seguinte:

Deflationism is the most popular philosophical view of truth these days.


Many philosophers believe that the view is essentially correct. But there
is surprisingly little agreement on what the view is committed to. This

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
160 Ricardo Barroso Batista

is to some extent due to the fact that just a


physical theory, deflationism is not a theor
rather a view on the nature and role of the c

A metafísica, de uma forma ou de outra,


nhada por uma teoria da verdade. E a teo
a metafísica, com tradição em Aristótel
teoria da correspondência. Segundo esta
ciado ou de uma crença consiste numa f
um enunciado ou uma crença e o mundo
Contudo, os neopositivistas, a certa
sobre a verdade era inaceitavelmente me
excluído. Eles tinham esta visão elimina
eram verdadeiramente verdadeiros ou falso
que foi emergindo uma concepção defla
em Frege, Ayer e Carnap, e que se foi in
palmente com Quine. O que aconteceu e
ciente atenção deve-se a esta subtil distinçã
e a linguística do «termo verdade». Nest
na afirmação de Devitt: "Realism entails no
of truth, not even one of correspondence,
have a role even in stating a metaphysical
Ora, uma das consequências deste defla
metafísica, é estar oculto no seu fundo
Por estar oculto, não é visível à primeira v
forma deflacionista na metafísica contem
revelar, será necessário contrastá-lo com
deste contraste que se levantarão, no nos
centrais (que se relacionam entre si) que
metafísica contemporânea. A saber:
(PI) As duas teorias focam-se em pontos opostos. Onde a teoria
da correspondência se foca sobretudo na natureza e no papel
da verdade, o deflacionismo foca-se na natureza e no papel do
«termo verdade». O foco do primeiro é metafísico, o foco do
segundo é linguístico. Então, muito do que os deflacionistas
dizem não incide directamente no que dizem os defensores da
teoria da correspondência e vice-versa. Uma explicação simples

27. Horsten, L. - The Tarskian Turn: Deflationism and Axiomatic Truth. Cambridge: The
MIT Press, 201 l,p. 59.
28. Devitt, M. - Realism and Truth. Princeton: Princeton University Press, 1997, p. 304

Vol. 68 -Jļj
Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea e Reposicionamento da Metafísica face à Ciência 161

para esta diferença assenta no facto do deflacionismo ser real-


mente um tipo de eliminativismo, ou de anti-realismo acerca
da verdade, pois este esvazia a verdade ôntica. Nós também
podemos dizer isto, afirmando que para o deflacionismo não
existe realidade para a verdade. E visto não haver realidade para
a verdade, então nada haverá de positivo a dizer sobre a natureza
da verdade. Contudo, o que torna a questão subtil estabelece-se
no facto dos deflacionistas não terem qualquer objecção para
o uso do termo «verdade». Pode-se mesmo dizer que eles estão
empenhados sobre o termo e têm muito a dizer acerca do seu
uso linguístico e semântico.29

Já por contraste, os defensores da correspondência são realistas


acerca da verdade e portanto empenham-se em explicar a sua natureza.
Para eles o termo verdade assenta no pressuposto de que o termo denota a
propriedade de verdade, ou aplica-se a todas as coisas verdadeiras.
(P2) Assenta no facto de que nem sempre (PI) é facilmente distin-
guivi nas afirmações da modalidade metafísica. Muitos dos
debates sobre o deflacionismo, e muitas das afirmações meta-
físicas, tendem a diluir a distinção entre o linguístico e o meta-
físico. Em particular, afirmações que deveriam ser somente
acerca do «termo verdade» são frequentemente apresentados
como sendo acerca da «verdade».30 Isto resulta da viragem
linguística na filosofia, onde tem sido comum pender entre um
lado e outro, a saber, quando se fala de palavras (conceitos ou
noções) e quando se fala do mundo. Por exemplo, uma questão
é falar-se do realismo acerca do mundo externo, outra questão é
falar-se do realismo da verdade. No nosso ponto de vista, é mais
fácil evitar a confusão no caso do realismo do mundo externo
do que no da verdade.
(P3) Subtilmente implícito em (PI) e (P2), e causa destes dois, tem
por base o facto de no deflacionismo e na metafísica modal o
«termo verdade» não desempenhar qualquer papel para além
do lógico.31 Em particular, não ter o papel «descritivo» de um
predicado normal. Por outro lado, para a teoria da correspon-
dência, o termo verdade tem um papel descritivo substancial em
alguma teoria sobre o mundo.

29. Cf. Horsten, L. - The Tarskian Turn: Deflationism and Axiomatic Truth, pp. 60-61.
30. Ibid., pp. 62-64.
31. Ibid., pp. 65-66.

Vol. 68

Fase. 1-2 0 "RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
162 Ricardo Barroso Batista

Relacionando os vários problemas (P


que o deflacionismo é um tipo de elim
podemos de forma simples constatar q
rizada pela negação da existência de qu
Afirma Devitt: "[...] is its insistence t
realism involves no theory of truth nor
Porém, a resultante inadequação deste
observamos que os metafísicos tal como
falar acerca de enunciados «verdadeiros»,
da correspondência estão. A questão é
metafísica é análogo ao não-factualismo

Nonfactualism in an area is obviously a sort of antirealism or


eliminati vism about that area. Nonfactualism about some area of
language - for example, moral language, causal language, or the
theoretical language of science - is the view that the predicates in that
area do not denote, correspond to, etc., properties. Or it is the view that
the indicative sentences in that area are not assertions or statements,
are not factual or descriptive, are not truth-conditional, and do not
correspond to facts.33

Se observarmos, a metafísica tem apresentado duas características deste


tipo de não-factualismo implícito:

(NF1) A primeira é ao nível linguístico e está muito explícita nas


recentes publicações. O não-factualismo quando está presente
numa determinada área tem uma visão revisionista sobre a
linguagem dessa área: a linguagem não é «descritiva» como
naturalmente é tida ser. Esta visão é manifestada de várias
formas (algumas insatisfatórias), mas a ideia chave é clara:
os termos que aparecem como predicados numa determinada
área não possuem o padrão semântico34 de um predicado
normal. A visão metafísica analítica do termo «verdade» é uma
forma similar de revisionismo. O «termo verdade» não possui

32. Devitt, M. - Realism and Truth, p. 304.


33. Devitt, M. - "The Metaphysics of Nonfactualism". Philosophical Perspectives 30(10)
(1996): 159.
34. Tipicamente o padrão semântico de um filósofo será o de referencial da verdade,
mas não tem necessariamente de ser assim. Pois também pode ser verificacionista. E o
padrão semântico de um deflacionista não pode ser referencial da verdade, porque para ele a
verdade não é explicatória. Então o significado do não-referencial de verdade que o deflacio-
nista atribui a um predicado normal não o pode atribuir ao "termo verdade".

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea e Reposicionamento da Metafísica face à Ciência 163

o padrão semântico de um predicado normal. E o seu papel


não é o de descrever enunciados, o seu único papel é lógico ou
expressivo (P3), vejamos o que diz Williams: "Merely stating
such truths as 'Cats exist' does not ontologically commit you
to cats. That commitment depends on accepting the statement
at face value so that it has a certain truth condition. The onto-
logical question becomes clear only when we move into the
metalanguage and consider this semantic question." 35
(NF2) A segunda é uma implicação a nível metafísico resultante de
(NF1) e é frequentemente mais implícito do que explicito nas
publicações de metafísica modal. Um não-f actualista não usa
uma linguagem diferente de um factualista. Em vez disso,
ele tem uma teoria diferente sobre a linguagem que ambos
usam. Por isso é que o não-factualismo numa determinada
área traz o anti-realismo para essa área.36 Analogamente,
os metafísicos influenciados por uma teoria deflacionista
(que não reivindica a existência de enunciados verdadeiros )
falam como realistas (P2) mas, sujeitos ao revisionismo não-
-factualista (NF1), acabam por estabelecer igualmente um
anti-realismo para com a verdade sem o explicitar. A maneira
mais directa de caracterizar o anti-realismo em geral, usando
uma linguagem comum, é a negação de um compromisso
ôntico. A única coisa que torna isto explícito é a marcada
ausência na metafísica contemporânea de um compromisso
ôntico para com a verdade. Consequentemente, os metafísicos
analíticos têm sido anti-realistas acerca da verdade. Pelo que
é aqui que se joga o actual problema da viragem metafísica.
Por detrás da fachada linguística destas metafísicas contem-
porâneas esconde-se uma metafísica anti-realista.
Agora, podemos compreender que a metafísica abandonou um
compromisso ôntico para com a verdade. Este anti-realismo implicou a
negação do papel da verdade no mundo. Contudo, antes de prosseguirmos
será importante observar o principal argumento presente no deflacio-
nismo da metafísica contemporânea, diz Horwich:

The respect in which metaphysical realism is commited to autonomous


facts is radical. It concerns the adequacy of the canons of justification

35. Williams, M. - "Realism and Scepticism". In: J. Haldane & C. Wright (Eds.) -Reality,
Representation and Projection . Oxford: Oxford University Press, 2003, p. 212.
36. Devitt, M. - "The Metaphysics of Nonfactualism", p. 159.

Vol. 68

Fase 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
164 Ricardo Barroso Batista

implicit in scientific and ordinary linguist


there to suppose that they guide us towar
given metaphysical realism, is substantia
answer; and it is this gulf between truth an
recognize it which constitutes the respect
autonomous. Assuming a grasp of proposit
it is for them to have the property of met
clear how we could derive the ability to re
applies. Indeed, it is our total inability to
be solved which should lead us to rejec
Thus metaphysical realism involves to an
degree of autonomy of facts: there is from
suppose that scientific practice provides ev
is true."37

Horwich poderá ser livre para definir o


lhe aprouver. Contudo, não será correcto
tipo de correspondência com um facto,
sentação, na qual não temos forma de d
são. Também a metafísica contemporân
supor que o realismo metafísico se enc
com a verdade como algo que é simple
de uma pura construção linguística. Ist
mente os metafísicos estão imbuídos d
qual, em última instância, a realidade
única alternativa é apoiarmo-nos num
tirando assim qualquer possibilidade
verdade, na qual os factos que fazem co
verdadeiras são-nos frequentemente ace
Os cientistas ao fazerem ciência acre
com o mundo externo, e que as suas m
literais do mundo, sendo que aquilo qu
verdade sobre o mundo. A partir do m
para a ciência é esquecido pela metafís
grande aproximação das duas, nem sequ
a metafísica. O resultado é um maior is
Por agora e de forma sucinta, afirma
que as melhores teorias cientificas ao
literalmente verdadeiras. Podemos con

37. Horwich, P. - "Three forms of realism". Syn

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 20

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea e Reposicionamento da Metafísica face à Ciência 165

existe se vai desvelando ao longo da nossa história e que gradualmente nos


vamos aproximando da verdade. E que a ciência desempenha nisso um
papel importante. Contudo, aceitar isto implica considerarmos que aquilo
que faz com que um enunciado seja verdadeiro é algo de objectivo que se
encontra frente a frente no enunciado. O valor de verdade do enunciado
depende principalmente sobre como é o mundo e a existência, e não tanto
sobre alguma característica do próprio enunciado. No entanto, com isto
não queremos regressar a uma visão do Tractatus, nem regressar a uma
concepção moderna de progresso. Até porque isto não implica necessaria-
mente um certo tipo de materialismo ou de fisicalismo.
Por conseguinte, derivado da herança analítica que impregnou
a metafísica e consequente a viragem anti-realista, nós encontramos
também outra razão para a autonomia , nomeadamente, sobre aquilo que
é a área de estudo da metafísica (A2).
No passado as investigações metafísicas eram dirigidas primeira-
mente no sentido de fornecerem razões para se acreditar que o mundo
tinha entidades particulares ou propriedades nele, como por exemplo:
Deus, verdade, estrutura do ser, teleologia, criaturas com livre-arbítrio,
etc. Contudo, e infelizmente, boa parte dos metafísicos de hoje considera
estas preocupações limitadas e como que já ultrapassadas (devido à sua
herança analítica). Para eles, a metafísica ambiciona ser algo maior e mais
abstracto, a saber, a ideia contemporânea analítica da estrutura da moda-
lidade metafísica.
Nós acreditamos que esta viragem é também ela uma das razões para
o afastamento da metafísica da ciência e para o presente confronto entre
a metafísica e a filosofia da ciência. Este estilo alternativo de teorização
metafísica traz consigo muitas mudanças (não declaradas) que ofendem
aqueles que estão mais ligados à ciência. Se a metafísica for somente
acerca da lógica e da semântica dos nossos enunciados científicos,
então vê-se forçada pela mudança de alvo a estudar princípios abstractos
mais gerais.

6. Contra o Exclusivismo da Modalidade Metafísica

Agora, aqui chegados, podemos melhor perceber (A3) como resultado


de (Al) e (A2). Contudo, será legitimo que a metafísica exacerba a moda-
lidade e sobre ela pense estar imune à ciência e, assim, ter completa a
exclusividade? A nossa resposta é negativa e, antes de passarmos à nossa
proposta de reposicionamento metafísico, será necessário argumentar
contra (A3).

Vol. 68

Fase 1-2 0 RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
166 Ricardo Barroso Batista

As nossas intuições modais são historicamente condicionadas e


possivelmente falíveis ou inconsistentes. Para isso observemos dois argu-
mentos:

(Ml) A modalidade metafísica enquanto metafísica é algo de po


claro. Actualmente esta encontra-se num cruzamento entre
muitas disputas tanto na filosofia da linguagem, como na
lógica. Basta observarem-se os chamados debates entre racio-
nalistas modais e empíricos modais que, por sua vez, debatem
contra os convencionalistas e outros. Em muitas destas visões
a modalidade metafísica não serve para se separar da moda-
lidade linguística;
(M2) Apesar de Kripke nos dar boas razões para acreditarmos numa
categoria a que podemos chamar de modalidade metafísica,
nada existe que possa ser encontrado nos exemplos de Kripke
que nos garanta pensar a possibilidade metafísica como algo
imune à ciência. O próprio Kripke comenta que as intuições
poderão vir a perceber-se (como ele está a tentar abarcar) utili-
zando apenas a possibilidade física.38 A característica interes-
sante das necessidades de Kripke, apesar de tudo, é que elas
são a posteriori. E a reivindicação de que a água é H20 vem a
partir da ciência, se não apenas da física. Nós até poderíamos
seguir Edgington e postularmos apenas o seu conceito de
«necessidade natural», uma vez que esta modalidade natural
seria sensível à ciência.39

Por sua vez, na ausência de razões para pensar que a modalidade


metafísica é independente da ciência, nós pensamos que se deve consi-
derar esta espécie de modalidade à luz da proposta de Edgington, assim
como consideramos a modalidade nomológica.40 Vejamos que facto do
mundo faz com que a luz não possa ser mais célere do que a velocidade
da luz? Independentemente da resposta certa, a resposta não se encontra
nos nossos conceitos de luz. Nós já tínhamos esse conceito muito antes
de sabermos qual era a velocidade da luz. Em vez disso, nós pensamos
que a velocidade é uma característica da luz e, melhor ainda, da estrutura
do espaço-tempo que faz com que essa limitação seja uma possibilidade
verdadeira. Todavia, iniciaremos com a resposta mais natural: as leis da

38. Cf. Hughes, C.- Kripke: Names, Necessity, and Identity, pp. 88-90
39. Cf. Edgington, D. - "Two Kinds of Possibility". Aristotelian Society 78 (2004): 1-3.
40. Ibid., pp. 17-19.

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea e Reposicionamento da Metafísica face à Ciência ļ 67

relatividade fazem com que esta restrição seja verdadeira. Mas o que é que
são as leis? Como é óbvio isso é controverso. Porém, constatamos que inde-
pendentemente do modo como forem interpretadas, as leis representam o
núcleo central das teorias, e estas são teorias que procuram sistematizar/
explicar o mundo. Nós somente tratamos os eventos como possíveis se
eles fizerem parte de boas sistematizações do mundo. Logo, pensamos
que seja impossível que os fotões viagem mais rápido do que reivindica
a relatividade. E isto porque é nas «melhores» teorias que nos baseamos
para as nossas explicações e previsões. Se considerarmos como alguns
filósofos da ciência que as leis são os princípios nucleares das melhores
sistematizações da natureza, então a modalidade pode fluir a partir da
sistematização. Nós podemos conceber isto como uma versão específica
da alegação de Putnam, de que possibilidades e necessidades são sempre
relativas a uma teoria de fundo, nunca existindo afirmações simplesmente
a partir do necessário ou do possível.41 Diz também Jubien: "I think this
should immediately raise the suspicion that the necessity doesn't arise
from how the worlds are, but rather that the worlds are taken to be as they
are in order to capture the intuitive necessity."42
Subsequentemente, nós podemos ter todo o tipo de intuições acerca
da essência da luz, mas a nossa proposta é que devemos de tomar tais
intuições tão seriamente consoante a teoria da qual elas fazem parte.
A história da ciência e da filosofia já nos vêem mostrando que aquilo
que outrora pensámos ser possível ou impossível paira sobre a ciência.
Ou, enveredando noutra direcção, o erro está em pensar que as intuições
modais são fiáveis se estas não estiverem relacionadas com uma teoria
sistemática de um domínio mais amplo.

7. Conclusão: União em Complementaridade

A nossa proposta agora é sugerir que a metafísica deverá manter


uma relação de união em complementaridade 43 com a ciência. E já não de
união como no passado, pois tal tornou-se hoje impossível. A nossa visão

41 . Cf. Putnam, H. - Realism with a Human Face. Cambridge: Harvard University Press,
1992, pp. 54-57
42. Jubien, M. - "Analyzing Modality". In: D. Zimmerman (Ed.) - Oxford Studies in
Metaphysics, vol. 3. Oxford: Oxford University Press, 2007, p. 105.
43. Nós tomámos este termo de empréstimo, de uma carta do Papa João Paulo II a
Coyne, sobre a relação entre religião e ciência. Cf. http://www.vatican.va/holy_father/john_
paul_ii/letters/l 988/documents/hf Jp-ii_let_l 988060 l_padre-coyne_en.html

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
168 Ricardo Barroso Batista

é portanto inteiramente simétrica entre


quando realiza «devidamente» o seu trab
mente susceptível e profundamente ligad
Então sugerimos dizer que a tarefa es
trazer uma ontologia precisa e exacta, n
com a verdade , para se associar à linguagem
(representação); (T2) relacionar tal ont
experiência e vida; (T3) consequentement
tarefa metafísica, nomeadamente, a de de
nossas teorias físicas forem verdadeiras
tação não requer necessariamente que as n
visto que toda a tarefa interpretativa ass
(se as teorias forem aproximadamente
obstáculo a um realismo e, portanto, ao c
verdade.
Por exemplo, podem as correlações da n
estados entrelaçados ser interpretadas com
correlações causais? E se a resposta for po
elas permitem? Quando nós fazemos este
importância ressaltar que nunca podemos
de uma visão de todo do mundo sugerid
assentava no facto de que nenhuma ex
adequada para as explicar/interpretar, po
consideradas como fundamentais, ou natu
como tal, elas não precisariam de qualquer t
Por outras palavras, a tarefa interpreta
à possibilidade de que nenhuma categoria
cional, possa realmente ser apropriada pa
Um outro exemplo seria considerarm
a separação de eventos nas teorias clássic
pretada como dando origem a uma forma
defendeu esta interpretação minimalista
questão permanecerá, se tal leitura meta
de se ligar (ou explicar) com o sentido da
da nossa experiência.45 Se esta segunda

44. Cf. Fine, A. - "Do Correlations Need to be Exp


(Eds. ) -Philosophical Consequences of Quantum Theo
Press, 1989, pp. 175-178.
45. Cf. Savitt, S. - "On Absolute Becoming and the
- Time, Reality and Experience. Cambridge: Cambri

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
Crítica à Metafísica Analítica Contemporânea e Reposicionamento da Metafísica face à Ciência 169

cumprida, postulando um devir de eventos definidos, como a sua sucessão


temporal na ordem parcial definida pela relatividade especial, a primeira
interpretação ontológica deverá ser abandonada ou corrigida. É por isso
que a questão ontológica colocada por (Tl) [é a teoria da relatividade
(especial ou geral) interpretável como uma teoria que metafisicamente
admite o devir?] não pode ser separada das questões levantadas por (T2),
nomeadamente a ligação com a nossa experiência.
Por conseguinte, gostaríamos de sublinhar que é a ligação da inter-
pretação metafísica de uma teoria física com a nossa experiência e intuição
metafísicas, o que nos proporciona o teste final para a plausibilidade de
uma interpretação metafísica proposta. Isto é particularmente evidente
para o desafio que representam algumas das interpretações da mecânica
quântica.
Contudo, à primeira vista, a nossa sugestão de união em complemen-
taridade pode parecer muito pouco em termos de complementaridade para
a metafísica e pode ser interpretada como um certo tipo de viragem meta-
física, de uma antiga ancilla theologiae para uma nova ancilla scientiae.
Porém, devemos clarificar um pouco mais a nossa proposta. Na nossa
proposta existe muito espaço para a metafísica. Utilizando uma espécie de
cliché: a boa ciência é informada por boa metafísica, e uma boa meta-
física deve ser informada por boa ciência. Com isto queremos salientar
que não pretendemos reduzir a metafísica à ciência, mas antes manter
uma produtiva colaboração e, se é verdade que a metafísica (como vimos)
precisa da ciência, o mesmo deve ser dito na outra direção. Até porque
a ciência já beneficiou de contributos da metafísica e, portanto, como
argumentou Friedman, reflectir sobre isso pode conduzir a revoluções na
ciência.46 Em verdade, nós pensamos que a ciência é indissoluvelmente
infundida pela metafísica nos seus aspectos ordinários, desde o topo
(teoria) até às bases (experiências). Por conseguinte, é crucial pôr a desco-
berto as suposições metafísicas das nossas melhores teorias do mundo,
não só porque é parte importante para a compreensão do mundo, como
da verdade.
Alguém poderia objectar que a ciência procede perfeitamente bem
em deixar muitas questões metafísicas por responder. Em certo sentido
isto até pode ser correcto, especialmente se alguém considerar «perfeita-
mente bem» apenas como fazendo boas previsões. Contudo, se nós abar-
carmos a explicação e a compreensão como elementos cruciais para uma

46. Cf. Friedman, M. - The Dynamics of Reason. Chicago: Chicago University Press, 2001,
p. 105-116.

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms
170 Ricardo Barroso Batista

boa teoria (como deveria ser), então já


afirmação anterior. A mecânica quântic
teoria para se fazer previsões, porém
em aberto (ou confusas), trazendo consi
cativo e de compreensão.
A questão da interpretação não é de
menos, na medida em que no passado t
se existiam átomos ou o éter, de qualq
complementar a imagem física da reali
riência, e respectiva significação meta
parece-nos ser uma tarefa essencial d
Por último, terá que ficar para uma ou
mais consistente desta nossa proposta. Convém, contudo, sublinhar
que com ela pretendemos evitar o problema da autonomia , reabilitar a
relação da metafísica com a ciência e, subsequentemente, com a filosofia
da ciência. Mas principalmente, sugerir uma proposta que possa redi-
reccionar nestas balizas a metafísica para um realismo em que está
presente um compromisso ôntico para com a verdade.

Vol. 68

Fase. 1-2 Q RPF 2012

This content downloaded from 200.20.0.159 on Sat, 04 Nov 2017 04:31:37 UTC
All use subject to http://about.jstor.org/terms

Você também pode gostar