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Lênin

5ª Edição – Global Editora

I – Em que sentido se pode falar aplicando-a a outros aspectos da nossa


da significação internacional da revolução além de alguns dos fundamen-
Revolução Russa? tais. Também seria errado não ter em
conta que depois da vitória da revolução
Nos primeiros meses que se segui- proletária, mesmo que seja em apenas
ram à conquista do Poder político pelo um dos países adiantados, se produzirá,
proletariado na Rússia (25-X/7-XI de com toda certeza, uma radical transfor-
1917) poder-se-ia acreditar que, em mação: a Rússia, logo depois disso,
virtude das enormes diferenças existen- transformar-se-á não em país modelo, e
tes entre a Rússia atrasada e os países sim, de novo, em pais atrasado (do ponto
adiantados da Europa Ocidental, a revo- de vista "soviético" e socialista).
lução proletária nesses países seria muito
pouco parecida com a nossa. Atualmente No momento histórico atual,
já possuímos uma experiência internaci- porém, trata-se exatamente de que o
onal bastante considerável, experiência exemplo russo ensina algo a todos os
que demonstra, com absoluta clareza, países, algo muito substancial, a respeito
que alguns dos aspectos fundamentais de seu futuro próximo e inevitável. Os
da nossa revolução não têm apenas operários evoluídos de todos os países já
significação local, particularmente nacio- compreenderam isso há muito tempo e,
nal, russa, mas revestem-se, também, de mais que compreender, já perceberam,
significação internacional, e não me sentiram com seu instinto de classe
refiro à significação internacional no revolucionária. Daí a "significação" inter-
sentido amplo da palavra: não são ape- nacional (no sentido estrito da palavra)
nas alguns, mas sim todos os aspectos do Poder Soviético e dos fundamentos da
fundamentais - e muitos secundários - da teoria e da tática bolcheviques. Esse fato
nossa revolução que têm significação não foi compreendido pelos chefes "revo-
internacional quanto à influência que lucionários" da II Internacional, como
exercem sobre todos os países. Refiro- Kautsky na Alemanha e Otto Bauer e
me ao sentido mais estrito da palavra, Friedrich Adler na Áustria, que, por isso,
isto é, entendendo por significação inter- se converteram em reacionários, em
nacional a sua transcendência mundial defensores do pior dos oportunismo e da
ou a inevitabilidade histórica de que se social-traição. Assinalemos, de passa-
repita em escala universal o, que aconte- gem, que o folheto anônimo A Revolução
ceu em nosso país, significação que deve Mundial (Weltre-revolution), publicado
ser reconhecida em alguns dos aspectos em 1919 em Viena (Sozialistische
- fundamentais da nossa revolução. Bücherei, Heft II; Ignaz Brand*), apre-
senta com particular clareza todo o pro-
Naturalmente, seria o maior dos cesso de desenvolvimento do pensamen-
erros exagerar o alcance dessa verdade, to e todo o conjunto de raciocínios, ou

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melhor, todo esse abismo de incompre- lucionária. O crescente movimento revo-
ensões, pedantismo, vilania e traição aos lucionário russo será, talvez, o meio mais
interesses da classe operária, tudo isso poderoso para eliminar esse espírito de
mascarado sob a "defesa" da idéia da filisteísmo flácido e de politicagem de
"revolução mundial". praticismo mesquinho que começa a
difundir-se em nossas fileiras e ressusci-
Mas teremos de deixar para outra tará a chama viva do anseio de luta e a
ocasião o exame mais pormenorizado fidelidade apaixonada aos nossos gran-
desse folheto. Consignemos aqui apenas des ideais.
o seguinte: na época, já bem distante,
em que Kautsky era um marxista e não Há muito tempo que a Rússia
um renegado, previa, ao abordar a ques- deixou de ser para a Europa Ocidental um
tão como historiador, a possibilidade do simples reduto da reação e do absolutis-
surgimento de uma situação em que o mo. O que acontece atualmente é, tal-
revolucionarismo do proletariado russo vez, exatamente o contrário. A Europa
se converteria em modelo para a Europa Ocidental torna-se o reduto da reação e
Ocidental. Isso foi em 1902, quando do absolutismo russos... É possível que
Kautsky publicou na Iskra revolucionária os revolucionários russos já tivessem
o artigo Os eslavos e a revolução, no qual derrubado o czar há muito tempo se não
dizia: fossem obrigados a lutar, ao mesmo
tempo, contra o aliado deste, o capital
"Atualmente" (ao contrário de europeu. Esperamos que dessa vez
1848) "pode-se acreditar que os eslavos consigam derrotar ambos os inimigos e
não só se incorporaram às fileiras dos que a nova "santa aliança" desmorone,
povos revolucionários, como, também, mais rapidamente que suas predecesso-
que o centro de gravidade das idéias e da ras. Contudo, seja qual for o resultado da
obra revolucionárias se desloca, dia a dia, luta atual na Rússia, o sangue e o sofri-
para os eslavos. O centro revolucionário mento dos mártires que essa luta cria,
está se transferindo do Ocidente para o infelizmente em demasia, não serão
Oriente. Na primeira metade do século inúteis e sim, pelo contrário, fecundarão
XIX encontrava-se na França e, em os germes da revolução social em todo o
alguns momentos, na Inglaterra. Em mundo civilizado, fazendo-os crescer
1848, a Alemanha também se incorporou com maior esplendor e rapidez. Em 1848,
às fileiras das nações revolucionárias... O os eslavos eram uma terrível geada que
novo século inicia-se com acontecimen- calcinava as flores da primavera popular.
tos que sugerem a idéia de que caminha- É bem possível que agora venham a
mos para um novo deslocamento do representar o papel da tormenta que
centro revolucionário: concretamente, romperá o gelo da reação e trará consigo
de sua transferência para a Rússia... É irresistivelmente, uma nova e feliz prima-
possível que a Rússia, que assimilou vera para os povos". (Karl Kautsky, Os
tanta iniciativa revolucionária do eslavos e a revolução, artigo publicado
Ocidente, esteja hoje, ela própria, pronta na Iskra, jornal revolucionário da social-
para servir-lhe de fonte de energia revo- democracia, russa, n.º 18, 10 de março

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de 1902). inflexibilidade e uma vontade única.

Como Karl Kautsky escrevia bem, A experiência da ditadura proletá-


há dezoito anos! ria triunfante na Rússia, repito, demons-
trou, de modo palpável, a quem não sabe
II - Uma das condições fundamen- pensar ou a quem não teve oportunidade
tais do êxito dos bolcheviques de refletir sobre esse problema, que a
centralização incondicional e a disciplina
Hoje, sem dúvida, quase todo mais severa do proletariado constituem
mundo já compreende que os bolchevi- uma das condições fundamentais da
ques; não se teriam mantido no poder, vitória sobre a burguesia.
não digo dois anos e meio, mas nem
sequer dois meses e meio, não fosse a Fala-se disso com freqüência. Mas
disciplina rigorosíssima, verdadeiramen- não se medita suficientemente sobre o
te férrea, de nosso Partido, não fosse o que isso significa e sobre as condições
total e incondicional apoio da massa da em que isso se torna possível. Não convi-
classe operária, isto é, tudo que ela tem ria que as saudações entusiásticas ao
de consciente, honrado, abnegado, Poder dos Sovietes e aos bolcheviques
influente e capaz de conduzir ou trazer fossem acompanhadas, mais amiúde,
consigo as camadas atrasadas. pela mais séria análise das causas que
permitiram aos bolcheviques forjar a
A ditadura do proletariado é a disciplina de que necessita o proletariado
guerra. mais severa e implacável da nova revolucionário?
classe contra um inimigo mais poderoso,
a burguesia, cuja resistência está decu- 0 bolchevismo existe como corren-
plicada, em virtude de sua derrota (mes- te do pensamento político e como partido
mo que em apenas um país), e cuja político desde 1903. Somente a história
potência consiste não só na força do do bolchevismo em todo o período de sua
capital internacional, na força e na soli- existência é capaz de explicar satisfatori-
dez das relações internacionais da bur- amente as razões pelas quais ele pôde
guesia, como também na força do costu- forjar e manter, nas mais difíceis condi-
me, na força da pequena produção. ções, a disciplina férrea, necessária à
Porque, infelizmente, continua a haver vitória do proletariado.
no mundo a pequena produção em gran-
de escala, e ela cria capitalismo e burgue- A primeira pergunta que surge é a
sia constantemente, todo dia, a toda seguinte: como se mantém a disciplina
hora, através de um processo espontâ- do partido revolucionário do proletaria-
neo e em massa. Por tudo isso, a ditadura do? Como é ela comprovada? Como é
do proletariado é necessária, e a vitória fortalecida? Em primeiro lugar, pela
sobre a burguesia torna-se impossível consciência da vanguarda proletária e
sem uma guerra prolongada, tenaz, por sua fidelidade à revolução, por sua
desesperada, mortal; uma guerra que firmeza, seu espírito de sacrifício, seu
exige serenidade, disciplina, firmeza, heroísmo. Segundo, por sua capacidade

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de ligar-se, aproximar-se e, até certo dessa teoria revolucionária - e de nenhu-
ponto, se quiserem, de fundir-se com as ma outra - foi demonstrada tanto pela
mais amplas massas trabalhadoras, experiência internacional de todo o
antes de tudo com as massas proletárias, século XIX como, em particular, pela
mas também com as massas trabalhado- experiência dos desvios, vacilações,
ras não proletárias. Finalmente, pela erros e desilusões do pensamento revo-
justeza da linha política seguida por essa lucionário na Rússia. No decurso de
vanguarda, pela justeza de sua estraté- quase meio século, aproximadamente de
gia, e de sua tática políticas, com a condi- 1840 a 1890, o pensamento de vanguar-
ção de que as mais amplas massas se da na Rússia, sob o jugo do terrível des-
convençam disso por experiência pró- potismo do czarismo selvagem e reacio-
pria. Sem essas condições é impossível nário, procurava avidamente uma teoria
haver disciplina num partido revolucioná- revolucionária justa, acompanhando
rio realmente capaz de ser o partido da com zelo e atenção admiráveis cada
classe avançada, fadada a derrubar a "última palavra" da Europa e da América
burguesia e a transformar toda a socie- nesse terreno. A Rússia tornou sua a
dade. Sem essas condições, os propósi- única teoria revolucionária justa, o mar-
tos de implantar uma disciplina conver- xismo, em meio século de torturas e
tem-se, inevitavelmente, em ficção, em sacrifícios extraordinários, de heroísmo
frases sem significado, em gestos grotes- revolucionário nunca visto, de incrível
cos. Mas, por outro lado, essas condições energia e abnegada pesquisa, de estudo,
não podem surgir de repente. Vão se de experimentação na prática, de desilu-
formando somente através de um traba- sões, de comprovação, de comparação
lho prolongado, de uma dura experiên- com a experiência da Europa. Graças à
cia; sua formação é facilitada por uma emigração provocada pelo czarismo, a
acertada teoria revolucionária que, por Rússia revolucionária da segunda meta-
sua vez, não é um dogma e só se forma de do século XIX contava, mais que
de modo definitivo em estreita ligação qualquer outro país, com enorme riqueza
com a experiência prática de um movi- de relações internacionais e excelente
mento verdadeiramente de massas e conhecimento de todas as formas e
verdadeiramente revolucionário. teorias do movimento revolucionário
mundial.
Se o bolchevismo pode elaborar e
levar à prática com êxito, nos anos de Por outro lado, o bolchevismo,
1917/1920, em condições de inaudita surgido sobre essa granítica base teórica,
gravidade, a mais rigorosa centralização teve uma história prática de quinze anos
e uma disciplina férrea, deve-se simples- (1903/1917) sem paralelo no mundo, em
mente a uma série de particularidades virtude de sua riqueza de experiências.
históricas da Rússia. Nenhum país, no decurso desses quinze
anos, passou, nem ao menos aproxima-
De um lado, o bolchevismo surgiu damente, por uma experiência revolucio-
em 1903 fundamentado na mais sólida nária tão rica, uma rapidez e um varieda-
base da teoria do marxismo. E a justeza de semelhantes na sucessão das diversas

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formas do movimento, legal e ilegal, tendências principais existem todas as
pacífico e tumultuoso, clandestino e formações intermediárias, transitórias,
declarado, de propaganda nos círculos e híbridas que se queira. Em termos mais
entre as massas, parlamentar e terroris- exatos: na luta entre os órgãos da
ta. Em nenhum país esteve concentrada, imprensa, os partidos, as frações e os
em tão curto espaço de tempo, seme- grupos vão se cristalizando as tendências
lhante variedade de formas, de matizes, ideológicas e políticas com caráter real-
de métodos de luta, de todas as clames mente de classe; cada uma das classes
da sociedade contemporânea, luta que, forja para si uma arma ideológica e políti-
além disso, em conseqüência do atraso ca para as batalhas futuras.
do país e da opressão do jugo czarista,
amadurecia com singular rapidez e assi- Anos de revolução (1905/1907).
milava com particular: sofreguidão e Todas as classes agem abertamente.
eficiência a "última palavra" da experiên- Todas as concepções, programáticas e
cia política americana e européia. táticas são comprovadas através da ação
das massas. Luta grevista sem preceden-
tes no mundo inteiro por sua amplitude e
III - As principais etapas da histó- dureza. Transformação da greve econô-
ria do bolchevismo mica em greve política e da greve política
em insurreição.
Anos de preparação da revolução
(1903/1905). Prenúncio de grande tem- Comprovação prática das relações
pestade em toda parte, fermentação e existentes entre o proletariado dirigente
preparativos em todas as classes. No e os camponeses dirigidos, vacilantes e
estrangeiro, a imprensa dos emigrados instáveis.
expõe teoricamente todas as questões
essenciais da revolução. Com uma luta Nascimento, no processo espontâ-
encarniçada de concepções programáti- neo da luta, da forma soviética de organi-
cas e táticas, os representantes das três zação. As discussões de então sobre o
classes fundamentais, das três correntes papel dos Soviets são uma antecipação
políticas principais - a liberal-burguesa, a da grande luta de 1917/1920. A sucessão
democrático-pequeno-burguesa (enco- das formas de luta parlamentares e não
berta pelos rótulos de social- parlamentares, da tática de boicote do
democrática" e "social-revolucionária") é parlamento e de participação no mesmo,
a proletária revolucionária - prenunciam e das formas legais e ilegais de luta,assim
e preparam a futura luta aberta de clas- como suas relações recíprocas e as liga-
ses. Todas as questões que motivaram a ções existentes entre elas, distinguem-se
luta armada das massas em 1905/1907 e por uma assombrosa riqueza de conteú-
em 1917/1920 podem (e devem) ser do. Do ponto de vista do aprendizado dos
encontradas, em forma embrionária, na fundamentos da ciência política pelas
imprensa daquela época. massas e os chefes, pelas massas e os
partidos - cada mês desse período eqüi-
Naturalmente, entre essas três vale a um ano de desenvolvimento "paci-

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fico" e "constitucional". Sem o "ensaio aprende a compreendé-la através de sua
geral" de 1905, a vitória da Revolução de própria e amarga experiência - que não
Outubro de 1917 teria sido impossível. se pode triunfar sem saber atacar e
empreender a retirada com ordem. De
Anos de reação (1907/1910). 0 todos os partidos revolucionários e de
czarismo triunfou. Foram esmagados oposição derrotados, foram os bolchevi-
todos os partidos revolucionários e de ques que recuaram com maior ordem,
posição. Desânimo, desmoralização, com menores perdas para seu "exército",
cisões, dispersão, deserções, pornogra- conservando melhor seu núcleo central,
fia em vez de política. com cisões menos profundas e irrepará-
Fortalecimento da tendência para o veis, menos desmoralização e com maior
idealismo filosófico, misticismo como capacidade para reiniciar a ação de modo
disfarce de um estado de espírito contra- mais amplo, justo e vigoroso. E se os
revolucionário. Todavia, ao mesmo tem- bolcheviques conseguiram tal resultado
po, justamente essa grande derrota dá foi exclusivamente porque desmascara-
aos partidos revolucionários e à classe ram impiedosamente e expulsaram os
revolucionária uma verdadeira lição revolucionários de boca, obstinados em
extremamente proveitosa, uma lição de não compreender que é necessário
dialética histórica, de compreensão, de recuar, que é preciso saber recuar, que é
destreza e arte na direção da luta política. obrigatório aprender a atuar legalmente
Os amigos se manifestam na desgraça. nos mais reacionários parlamentos e nas
Os exércitos derrotados passam por uma organizações sindicais, cooperativas, nas
boa escola. organizações de socorros mútuos e
outras semelhantes, por mais reacionári-
0 czarismo vitorioso vê-se obrigado as que sejam.
a destruir apressadamente os remanes-
centes do regime pré-burgues e patriar- Anos de ascenso (1910/1914). A
cal na Rússia. O desenvolvimento bur- principio, o ascenso foi de uma lentidão
guês do país progride com notável rapi- incrível; em seguida, depois dos aconte-
dez. As ilusões à margem e acima das cimentos do Lena2. em 1912, verificou-
classes, as ilusões sobre a possibilidade se com rapidez um pouco maior.
de evitar o capitalismo se dissipam. A luta
de classes manifesta-se de modo absolu- Vencendo dificuldade3 inauditas,
tamente novo e com maior relevo. os bolcheviques eliminaram os menche-
viques, cujo papel como agentes da
Os partidos revolucionários têm de burguesia no movimento operário foi
completar sua instrução. Aprenderam a admiravelmente compreendido depois
desencadear a ofensiva. de 1905 por toda a burguesia e aos quais,
por isso mesmo, ela apoiava de mil mane-
Agora têm que compreender que iras contra os bolcheviques.
essa ciência deve ser completada pela de
saber recuar ordenadamente. É preciso Estes nunca teriam conseguido
compreender - e a classe revolucionária eliminar os mencheviques, caso não

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houvessem aplicado uma tática justa, de 1914, a vileza, a infâmia e a abjeção
combinando o trabalho ilegal com a do social-chovinismo e do "kautskismo"
utilização obrigatória das "possibilidades (ao qual correspondem o longuetismo3
legais". Na mais reacionária das Dumas, na França, as idéias dos chefes do Partido
os bolcheviques conquistaram toda a Trabalhista Independente4 e dos fabia-
bancada operária. nos5 na Inglaterra, de Turati na, Itália,
etc.) e em que as massas foram se con-
Primeira guerra imperialista mun- vencendo cada vez mais, por experiência
dial (1914/1917). 0 parlamentarismo própria, de que as concepções dos bol-
legal, com um "parlamento" ultra- cheviques eram justas.
reacionário, presta os mais úteis serviços
ao partido do proletariado revolucioná- Segunda revolução russa (feverei-
rio, aos bolcheviques. Os deputados ro-outubro de 1917). 0 incrível grau de
bolcheviques são deportados para a decrepitude e caducidade do czarismo
Sibéria. Na imprensa dos emigrados criou contra ele (com ajuda dos reveses e
encontram entre nós sua mais plena sofrimentos de uma guerra infinitamente
expressão todos os matizes das concep- penosa) uma tremenda força destruido-
ções do social-imperialismo, do social- ra. Em poucos dias, a Rússia converteu-
chovinismo, do social--patriotismo, do se numa república burguesa democrática
internacionalismo inconseqüente e do mais livre (nas condições da guerra) que
conseqüente, do pacifismo e, da negação qualquer outro país. Os chefes dos parti-
revolucionária das ilusões pacifistas. Os dos de oposição e revolucionários come-
imbecis sabichões e as velhas comadres çaram a formar o governo, como nas
da II Internacional, que franziam o cenho repúblicas do mais "puro parlamentaris-
com desdém e arrogância ante a abun- mo", pois o título de chefe de partido de
dância de "frações" no socialismo russo e oposição no parlamento, mesmo no mais
ante a luta encarniçada que havia entre reacionário jamais havido, sempre facili-
elas, foram incapazes, quando a guerra tou o papel ulterior desse chefe na revo-
suprimiu em todos os países adiantados a lução
tão alardeada "legalidade" de organizar,
ainda que apenas aproximadamente, um Em poucas semanas, os menchevi-
intercâmbio livre (ilegal) de idéias e uma ques e os "social-revolucionários" assimi-
elaboração livre (ilegal) de concepções laram com perfeição todos os maneiris-
justas, como os revolucionários russos mos, e posições, argumentos o sofismas
organizaram na Suíça e em outros países. dos heróis europeus da II Internacional,
Precisamente por isso, tanto os social- dos ministerialistas e de toda a corja
patriotas declarados como os "kautskis- oportunista Tudo que hoje lemos sobre
tas" de todos os países revelaram-se os os Scheidemann e os Noske, Kautsky e
piores traidores do proletariado. E se o Hilferding, Renner e Austerlitz, Otto
bolchevismo foi capaz de triunfar em Bauer e Fritz Adler, Turati e Longuet,
1917/1920, uma das causas fundamen- sobre os fabianos e os chefes do Partido
tais dessa vitória consiste em que des- Trabalhista Independente da Inglaterra
mascarou impiedosamente, já desde fins nos parece (e é, na realidade) uma repe-

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tição monótona de um assunto antigo e dos Soviets. A experiência demonstrou
conhecido. que, em algumas questões essenciais da
revolução proletária, todos os países
A História os ludibriou, obrigando passarão, inevitavelmente, por onde a
os oportunistas de um país atrasado a se Rússia passou.
manifestarem antes dos oportunistas de
uma série de países adiantados. Contrariamente às opiniões que
não raro se expendem agora na Europa e
Se todos os heróis da II na América, os bolcheviques começaram
Internacional fracassaram e se cobriram com muita prudência e não prepararam
de opróbrio na questão do papel e da de modo algum com facilidade a sua vito-
importância dos Soviets e do Poder riosa luta contra a república burguesa par-
Soviético; se eles se cobriram de ignomi- lamentar (de fato) e contra os menchevi-
nia com singular "brilhantismo" e se os ques. No início do período citado, não con-
chefes dos três grandes partidos que se clamamos à derrubada do governo, e sim
separaram agora da II Internacional explicamos a impossibilidade de fazê-lo
(Partido Social-Democrata Independente sem modificar previamente a composi-
da Alemanha6, Partido Longuetista da ção e o estado de espírito dos Soviets.
França e Partido Trabalhista Indepedente Não declaramos o boicote ao parlamento
da Inglaterra) se confundiram nossa burguês, mas, pelo contrário, dissemos -
questão; se todos eles se tornaram e a partir da Conferência de nosso
escravos dos preconceitos da democracia Partido, celebrada em abril de 1917, pas-
pequeno-burguesa (exatamente da samos a dizê-lo oficialmente em nome do
mesma maneira que os pequeno- Partido - que uma república burguesa
burgueses de 1848, que se chamavam com uma Constituinte era preferível à
"social-democratas"), também é verdade mesma república sem Constituinte, mas
que já vimos tudo isso no exemplo dos que a república "operária-camponesa" so-
mencheviques. A História fez esse grace- viética é melhor que qualquer república
jo: os Soviets surgiram na Rússia em democrático-burguesa, parlamentar.
1905, foram falsificados em fevereiro- Sem essa preparação prudente, minucio-
outubro de 1917 pelos mencheviques - sa, sensata e prolongada não teríamos
que fracassaram por não haver compre- podido alcançar nem manter a vit6ria; de
endido o papel e a importância dos Outubro de 1917.
Soviets --- e hoje surgiu no mundo inteiro
a idéia do Poder Soviético, idéia que se IV - Quais foram os inimigos que o
difunde com inusitada rapidez entre o bolchevismo enfrentou, dentro do
proletariado de todos os países. movimento operário, para poder
crescer, fortalecer-se e temperar-
Enquanto isso, os antigos heróis da se?
II Internacional fracassam em toda
parte, por não terem sabido compreen- Em primeiro lugar, e acima de tudo,
der, do mesmo modo que os nossos na luta contra o oportunismo que, em
mencheviques, o papel e a importância 1914, transformou-se definitivamente

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em social-chovinismo e se bandeou, de nômeno social comum a todos os países
uma vez por todas, para o lado da bur- capitalistas.
guesia, contra o proletariado.
São por demais conhecidas a in-
Esse era, naturalmente, o principal constância e a esterilidade dessas velei-
inimigo do bolchevismo dentro do movi- dades revolucionárias, assim como a faci-
mento operário, e continua sendo, em es- lidade com que se transformam rapida-
cala mundial. O bolchevismo prestou e mente em submissão, apatia, fantasias, e
presta a esse inimigo a maior atenção. mesmo num entusiasmo "furioso" por
Esse aspecto da atividade dos bolchevi- essa ou aquela tendência burguesa "em
ques já é muito bem conhecido no es- moda". Contudo, o reconhecimento teó-
trangeiro. rico, abstrato, de tais verdades não é sufi-
ciente, de modo algum, para proteger
Quanto a outro inimigo do bolche- um partido revolucionário dos antigos er-
vismo no movimento operário, a coisa já ros, que sempre acontecem por motivos
é bem diferente. Pouco se sabe, no es- inesperados, com ligeira variação de for-
trangeiro, que o bolchevismo cresceu, for- ma, com aparência ou contorno nunca
mou-se e temperou-se, durante muitos vistos, anteriormente, numa situação ori-
anos, na luta contra o revolucionarismo ginal (mais ou menos original).
pequeno-burguês, parecido com o anar-
quismo, ou que adquiriu dele alguma coi- 0 anarquismo foi, muitas vezes,
sa, afastando-se, em tudo que é essenci- uma espécie de expiação dos pecados
al, das condições e exigências de uma oportunistas do movimento operário.
conseqüente luta de classes do proletari- Essas duas anomalias completavam-se
ado. Para os marxistas está plenamente reciprocamente. Se o anarquismo exer-
provado do ponto de vista teórico - e a ex- ceu na Rússia uma influência relativa-
periência de todas as revoluções e movi- mente insignificante nas duas revoluções
mentos revolucionários da Europa confir- (1905 e 1917) e durante sua preparação,
mam-no totalmente - que o pequeno pro- não obstante a população pequeno-
prietário, o pequeno patrão (tipo social burguesa ser aqui mais numerosa que
muito difundido em vários países europe- nos países europeus, isso se deve, em
us e que tem caráter de massas), que, parte, sem dúvida, ao bolchevismo, que
muitas vezes sofre sob o capitalismo uma sempre lutou impiedosa e inconciliavel-
pressão contínua e, amiúde, uma agrava- mente contra o oportunismo. Digo "em
ção terrivelmente brusca e rápida de parte" porque o que mais contribuiu para
suas precárias condições de vida, não debilitar o anarquismo na Rússia foi a pos-
sendo difícil arruinar-se, passa-se facil- sibilidade que teve no passado (década
mente para uma posição ultra- de 70 do século XIX) de alcançar um de-
revolucionária, mas é incapaz de mani- senvolvimento extraordinário e revelar
festar serenidade, espírito de organiza- profundamente seu caráter falso e sua in-
ção, disciplina e firmeza. O pequeno- capacidade de servir como teoria dirigen-
burguês "enfurecido" pelos horrores do te da classe revolucionária.
capitalismo é, como o anarquismo, um fe-

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Ao surgir em 1903, o bolchevismo tunistas, relativamente leves, da social-
herdou a tradição de luta implacável con- democracia alemã, ao mesmo tempo que
tra o revolucionarismo pequeno- imitavam os ultra-oportunistas desse
burguês, semi-anarquista (ou capaz de mesmo partido, em questões como a
"namoricar" o anarquismo), tradição que agrária ou a da ditadura do proletariado.
sempre existira na social-democracia re-
volucionária e que se consolidou particu- A História, diga-se de passagem,
larmente em nosso país em 1900/1903, confirmou hoje, em grande escala, em es-
quando foram assentadas as bases do cala histórico-mundial, a opinião que sem-
partido de massas do proletariado revo- pre defendemos, isto é: que a social-
lucionário da Rússia. democracia revolucionária alemã (deve-
mos levar em conta que, já em
O bolchevismo fez sua e continuou 1900/1903, Plekhanov reclamava a ex-
a luta contra o partido que mais fielmente pulsão de Bernstein do partido e que os
representava as tendências do revolucio- bolcheviques, mantendo sempre essa tra-
narismo pequeno-burguês (isto é, o par- dição, desmascaravam em 1913 toda a vi-
tido dos "socialistas revolucionários") em lania, a baixeza e a traição de Legien) es-
três pontos principais. Em primeiro lugar, tava mais próxima que ninguém do parti-
esse partido, que repudiava o marxismo, do de que o proletariado revolucionário
obstinava-se em não querer compreen- necessitava para triunfar. Agora, em
der (talvez fosse mais justo dizer que não 1920, depois de todos os rompimentos e
podia. compreender) a necessidade de le- crises ignominiosos da época da guerra e
var em conta, com estrita objetividade, dos primeiros anos que a sucederam, vê-
as forças de classe e suas relações mútu- se com clareza que, de todos os partidos
as antes de empreender qualquer ação ocidentais, a social-democracia revoluci-
política. Em segundo lugar, esse partido onária alemã é, exatamente, a que deu
via um sinal particular de seu "revolucio- os melhores chefes e que mais rapida-
narismo" ou de seu "esquerdismo" no re- mente se recuperou, corrigiu e fortale-
conhecimento do terror individual, dos ceu. Isso também se verifica no partido
atentados, que nós, marxistas, rejeitáva- dos espartaquistas7 e na ala esquerda,
mos categoricamente. É claro que conde- proletária, do "Partido Social-Democrata
návamos o terror individual exclusiva- Independente da Alemanha", que man-
mente por conveniência; as pessoas capa- tém uma luta firme contra o oportunismo
zes de condenar "por princípio" o terror e a falta de caráter dos Kautsky,
da grande revolução francesa ou, de Hilferding, Ledebour e Crispien. Se der-
modo geral, o terror de um partido revo- mos agora uma olhada num período his-
lucionário vitorioso, assediado pela bur- tórico completamente encerrado, que vai
guesia do mundo inteiro, já foram fusti- da Comuna de Paris à primeira República
gadas e ridicularizadas por Plekhanov em Socialista Soviética, veremos delinear-se
1900/1903, quando este era marxista e com relevo absolutamente definido e in-
revolucionário. Em terceiro lugar, ser "es- discutível a posição do marxismo diante
querdista" consistia, para os social- do anarquismo. Afinal de contas, o mar-
revolucionários, em rir dos pecados opor- xismo demonstrou ter razão. E se os anar-

10
quistas assinalavam com justeza o cará- quais havia muitos excelentes revolucio-
ter oportunista das concepções sobre o nários que depois foram (e continuam
Estado que imperavam na maioria dos sendo) honrosamente membros do
partidos socialistas, é preciso observar, Partido Comunista, apoiavam-se, princi-
em primeiro lugar, que esse caráter opor- palmente, na feliz experiência do boicote
tunista provinha de uma deformação e de 1905. Quando o czar anunciou, em
até mesmo de uma ocultação consciente agosto de 1905, a convocação de um
das idéias de Marx a respeito do Estado "parlamento" consultivo, os bolchevi-
(em meu livro 0 Estado e a Revolução re- ques, contra todos os partidos da oposi-
gistrei que Bebel manteve no fundo de ção e contra os mencheviques, declara-
uma gaveta durante 36 anos, de 1875 a ram o boicote a esse parlamento, que foi
1911, a carta em que Engels denunciava liqüidado, com efeito, pela revolução de
com singular realce, vigor, franqueza e outubro de 1905. Naquela ocasião, o boi-
clareza o oportunismo das concepções so- cote foi justo, não porque seja certo abs-
cial-democratas em voga sobre o ter-se, de modo geral, de participar nos
Estado); e, em segundo lugar, que a reti- parlamentos reacionários, mas porque
ficação dessas idéias oportunistas e o re- foi levada em conta, acertadamente, a si-
conhecimento do Poder Soviético e de tuação objetiva, que levava à rápida
sua superioridade sobre a democracia transformação das greves de massas em
parlamentar burguesa partiram com mai- greve política e, sucessivamente, em gre-
or amplitude e rapidez precisamente das ve revolucionária e em insurreição. Além
tendências mais marxistas existentes no disso, o motivo da luta era, nessa época,
selo dos partidos socialistas da Europa e saber se se devia deixar nas mãos do czar
da América. a convocação da primeira instituição re-
presentativa, ou se se devia tentar arran-
Houve dois momentos em que luta cá-la das mãos das antigas autoridades.
do bolchevismo contra os desvios "es- Como não havia, nem podia haver, a ple-
querdistas" de seu próprio partido adqui- na certeza de que a situação objetiva era
riu dimensões particularmente conside- semelhante e que seu desenvolvimento
ráveis: em 1908, em torno da participa- havia de realizar-se no mesmo sentido e
ção num "parlamento" ultra-reacionário com igual rapidez, o boicote deixava de
e nas associações operárias legais, regi- ser justo.
das pelas leis mais reacionárias, e em
1918 (paz de Brest), em torno da admis- O boicote dos bolcheviques ao "par-
sibilidade desse ou daquele "compromis- lamento" em 1905, enriqueceu o proleta-
so". riado revolucionário com uma experiên-
cia política extraordinariamente preciosa,
Em 1908, os bolcheviques "de es- mostrando que, na combinação das for-
querda" foram expulsos de nosso parti- mas de luta legais e ilegais, parlamenta-
do, em virtude de seu empenho em não res e extraparlamentares, é, às vezes,
querer compreender a necessidade de conveniente e até obrigatório saber re-
participar num "parlamento" ultra- nunciar às formas parlamentares. Mas
reacionário. Os "esquerdistas", entre os transportar cegamente, por simples imi-

11
tação, sem espírito critico, essa experiên- paz de Brest era um compromisso com os
cia a outras condições, a outra situação, é imperialistas, inaceitáveis por princípio e
o maior dos erros. O que já constituíra funesto para o partido do proletariado re-
um erro, embora pequeno e facilmente volucionário. Tratava-se, realmente, de
corrigível *, foi o boicote dos bolchevi- um compromisso com os imperialistas;
ques à "Duma" em 1906. Os boicotes de mas era precisamente um compromisso
1907, 1908 e dos anos seguintes foram er- dessa espécie que era obrigatório naque-
ros muito mais sérios e dificilmente repa- las circunstâncias.
ráveis, pois, de um lado, não era acerta-
do esperar que a onda revolucionária se Hoje, quando ouço, por exemplo,
reerguesse com muita rapidez e se trans- os "social-revolucionários" atacarem nos-
formasse em insurreição e, por outro la- sa tática ao assinar a paz de Brest, ou
do, o conjunto da situação histórica origi- uma observação como a que me foi feita
nada pela renovação da monarquia bur- pelo camarada Landsbury durante uma
guesa impunha a necessidade de combi- conversa: "Os chefes de nossas trade-
nar-se o trabalho legal com o ilegal. Hoje, unions inglesas dizem que também se po-
quando se considera retrospectivamente dem permitir um compromisso, uma vez
esse período histórico já encerrado por que os bolcheviques se permitiram", res-
completo, cuja ligação com os períodos pondo habitualmente, antes de tudo,
posteriores já se manifestou plenamen- com uma comparação simples e "popu-
te, compreende-se com extrema clareza lar":
que os bolcheviques não teriam podido
conservar (já não digo consolidar, desen- Imagine que o automóvel em que
volver e fortalecer) o núcleo sólido do par- você está viajando é detido por bandidos
tido revolucionário do proletariado du- armados. Você lhes dá o dinheiro, a car-
rante os anos 1908/1914, se não houves- teira de identidade, o revólver e o auto-
sem defendido, na mais árdua luta, a móvel; mas, em troca disso, escapa da
combinação obrigatória das formas lega- agradável companhia dos bandidos.
is com as ilegais, a participação obrigató- Trata-se, evidentemente, de um compro-
ria num parlamento ultra-reacionário e misso. Do ut des ("dou" meu dinheiro, mi-
numa série de instituições regidas por nhas armas e meu automóvel, "para que
leis reacionárias (associações de mútuo me dês" a possibilidade de seguir em
socorro, etc.). paz). Dificilmente, porém, se encontraria
um homem sensato capaz de declarar
Em 1918, as coisas não chegaram à que esse compromisso é "inadmissível do
cisão. Os comunistas "de esquerda" só ponto de vista dos princípios", ou de de-
constituíram, na ocasião, um grupo espe- nunciar quem o assumiu como cúmplice
cial, ou "fração", dentro de nosso Partido, dos bandidos (ainda que esses, possuin-
e por pouco tempo. No mesmo ano, os do o automóvel, e as armas, possam utili-
mais destacados representantes do "co- zá-los para novas pilhagens). Nosso com-
munismo de esquerda", Rádek e promisso com os bandidos do imperialis-
Bukharin, por exemplo, reconheceram mo alemão foi semelhante a esse.
abertamente seu erro. Achavam que a

12
Mas quando os mencheviques e os de, nada mais é que oportunismo, defec-
social-revolucionários na Rússia, os parti- ção e traição da pior, espécie.
dários de ScheideMann (e, em grande
parte, os kautskistas) na Alemanha, Otto Há compromissos e compromissos.
Bauer e Friedrich Adler (sem falar dos É preciso saber analisar a situação e as cir-
Srs. Renner e outros) na Áustria, os cunstâncias concretas de cada compro-
Renaudel, Longuet & Cia. na França, os misso, ou de cada variedade de compro-
fabianos, os "independentes" e os "tra- misso. É preciso aprender a distinguir o
balhistas" 8 na Inglaterra assumiram, em homem que entregou aos bandidos sua
1914/1918 e em 1918/1920, com os ban- bolsa e suas armas para diminuir o mal ca-
didos de sua própria burguesia e, às ve- usado, por eles e facilitar sua captura e
zes, da burguesia "aliada", compromis- execução, daquele que dá aos bandidos
sos dirigidos contra o proletariado revolu- sua bolsa e suas armas para participar da
cionário de seu próprio país, esses se- divisão do saque. Em política, isso está
nhores agiram como cúmplices dos ban- muito longe de ser sempre assim tão difí-
didos. cil como nesse pequeno exemplo de sim-
plicidade infantil. Seria, porém, um sim-
A conclusão é clara: rejeitar os com- ples charlatão quem pretendesse inven-
promissos "por principio", negar a legiti- tar para os operários uma fórmula que,
midade de qualquer compromisso, em ge- antecipadamente, apresentasse solu-
ral, constitui uma infantilidade que é in- ções adequadas para todas as circuns-
clusive difícil de se levar a sério. O político tâncias da vida, ou aquele que prometes-
que queira ser útil ao proletariado revolu- se que na política do proletariado nunca
cionário deve saber distinguir os casos surgirão dificuldades nem situações com-
concretos de compromissos que são mes- plicadas.
mo inadmissíveis, que são uma expres-
são de oportunismo e de traição, e dirigir A fim de não deixar margem a in-
contra esses compromissos concretos terpretações falsas, tentarei esboçar, ain-
toda a força da critica, todo esforço de da que em poucas palavras, algumas te-
um desmascaramento implacável e de ses fundamentais para a análise dos ca-
uma guerra sem quartel, não permitindo sos concretos de compromisso.
aos socialistas, com sua grande expe-
riência de "manobristas", e aos jesuítas O partido que acertou com o impe-
parlamentares que se livrem da respon- rialismo alemão o compromisso de firmar
sabilidade através de preleções sobre os a paz de Brest vinha elaborando na práti-
compromissos em geral". Os senhores ca o seu internacionalismo desde fins de
"chefes" das trade-unions inglesas, as- 1914. Esse partido não receou proclamar
sim como os da Sociedade Fabiana e os a derrota da monarquia czarista e estig-
do Partido Trabalhista "Indepedente", matizar a "defesa da pátria", na guerra
pretendem, exatamente desse modo, exi- entre duas aves de rapina imperialistas.
mir-se da responsabilidade da traição Os deputados desse partido no parla-
que cometeram, por haver assumido se- mento foram deportados para a Sibéria,
melhante compromisso que, na realida- em vez de seguir o caminho que leva às

13
pastas ministeriais num governo bur- Seu compromisso com os bandidos do im-
guês. A revolução, ao derrubar o czaris- perialismo consistiu, do principio ao fim,
mo e proclamar a república democrática, em tornar-se cúmplices do banditismo im-
submeteu esse partido a uma nova e im- perialista.
portante prova: não ajustou nenhum
acordo com os imperialistas de "seu" pa- _____________
ís, e sim preparou sua derrubada e os der- * Pode-se dizer, da política e dos
rubou. Esse mesmo partido, uma vez partidos, com as variações correspon-
dono do Poder político, não deixou pedra dentes, o mesmo que dos indivíduos.
sobre pedra nem da propriedade agrária Inteligente não é aquele que não comete
nem da propriedade capitalista. Depois erros. Não há, nem pode haver, homens
de publicar e inutilizar os tratados secre- que não cometam erros. Inteligente é
tos dos imperialistas, esse partido propôs aquele que comete erros não muito gra-
a paz a todos os povos e só cedeu ante a ves e sabe corrigi-los acertada e rapida-
violência dos bandidos de Brest quando mente. (Nota do autor)
os imperialistas anglo-franceses frusta-
ram a paz e depois de os bolcheviques te-
rem feito tudo que, era humanamente V – O comunismo "de esquerda" na
possível para acelerar a revolução na Alemanha. Chefes, partido, classe,
Alemanha e em. outros países. A total jus- massa.
teza de semelhante compromisso, assu-
mido por tal partido nessas circunstânci- Os comunistas alemães, de quem
as, torna-se dia a dia mais clara e eviden- vamos falar agora, não se chamam de "es-
te para todos. querdistas", mas de "oposição de princí-
pio", se não me engano. Mas, pelo que se
Os mencheviques e social- segue, pode-se ver que têm todos os sin-
revolucionários da Rússia (do mesmo tomas da "doença infantil do esquerdis-
modo que todos os chefes da II mo".
Internacional no mundo inteiro, em
1914/1920) começaram pela traição, jus- 0 folheto intitulado Cisão no Partido
tificando direta ou indiretamente a "defe- Comunista da Alemanha (Liga dos
sa da pátria", isto é, a defesa de sua bur- Espartaquistas), que reflete o ponto de
guesia espoliadora, e persistiram na trai- vista dessa oposição e que foi editado
ção coligando-se com a burguesia de seu pelo "Grupo local de Francfort-sobre-o-
país e lutando a seu lado contra o prole- Meno", expõe com. grande evidência,
tariado revolucionário de seu próprio pa- exatidão, clareza e concisão a essência
ís. Sua união na Rússia com Kerenski e os dos pontos de vista dessa oposição.
democratas constitucionalistas9 e, depo- Algumas citações serão suficientes para
is, com KoIchak e Denikin, assim como a mostrar aos leitores essa essência:
aliança de seus correligionários estran- "0 Partido Comunista é o partido da
geiros com a burguesia de seus respecti- luta de classes mais decidida..."
vos países, foi uma deserção para o cam-
po da burguesia, contra o proletariado. "Do ponto de vista político, esse pe-

14
ríodo de transição" (entre o capitalismo e cionária devem ser ressaltados com ener-
o socialismo) "é o período da ditadura do gia. E, para abarcar os mais amplos seto-
proletariado..." res e camadas proletários, que devem in-
corporar-se à luta revolucionária sob a di-
"Surge a seguinte pergunta: quem reção do Partido Comunista, é preciso cri-
deve exercer a ditadura; o Partido ar novas formas de organização, sobre a
Comunista ou a classe proletária? Por mais ampla base e com os mais amplos li-
princípio, devemos tender para a ditadu- mites. Esse lugar de agrupamento de to-
ra do Partido Comunista ou para a ditadu- dos os elementos revolucionários é a
ra da classe proletária?"... União Operária, construída sobre a base
(Os grifos são do original). das organizações de fábrica. Nela devem
unir-se todos os operários fiéis ao lema:
Mais adiante, o autor do folheto Fora dos Sindicatos! É nela que se forma
acusa o "CC" do Partido Comunista da o proletariado militante nas mais amplas
Alemanha de procurar uma coalizão com fileiras combativas. Para ser admitido bas-
o P a r t i d o S o c i a l - d e m o c r a t a ta reconhecer a luta de classes, o sistema
Independente da Alemanha, de ter le- dos Soviets e a ditadura. Toda a educa-
vantado "a questão do reconhecimento, ção política posterior das massas militan-
em princípio, de todos os meios políticos" tes e sua orientação política na luta é mis-
de luta, entre eles o parlamentarismo, so- são do Partido Comunista, que se encon-
mente para ocultar suas verdadeiras e tra fora da União Operária..."
principais intenções de coligar-se com os
independentes. E o folheto continua: " ... Há agora, por conseguinte,
dois partidos comunistas frente à frente:
"A oposição escolheu outro cami-
nho. Defende o critério de que a questão "Um, é o partido dos chefes, que
da hegemonia do Partido Comunista e de trata de organizar e dirigir a luta revoluci-
sua ditadura nada mais é que uma ques- onária de cima, aceitando os compromis-
tão de tática. Em todo caso, a hegemonia sos e o parlamentarismo com a finalidade
do Partido Comunista é a última forma de de criar situações que permitam a esses
toda hegemonia de partido. Por principio, chefes participar de um governo de coali-
deve-se tender para a ditadura da classe zão, em cujas mãos esteja a ditadura.
proletária. E todas as medidas do Partido,
sua organização, suas formas de luta, O outro, é o partido das massas,
sua estratégia e sua tática devem orien- que espera o ascenso da luta revolucio-
tar-se, para esse objetivo. De acordo com nária de baixo, que conhece e aplica nes-
isso é preciso rejeitar do modo mais cate- sa luta um único método que leva firme-
górico todo compromisso com os demais mente ao objetivo traçado, rejeitando to-
partidos, todo retorno aos métodos par- dos os processos parlamentares e opor-
lamentares de luta, que já caducaram his- tunistas; esse método único é a derruba-
tórica e politicamente, toda política de da incondicional da burguesia para depo-
manobra e conciliação". "Os métodos es- is implantar a ditadura de classe do prole-
pecificamente proletários de luta revolu- tariado, com a finalidade de instaurar o

15
socialismo..." menos estáveis, integrados pelas pesso-
as mais prestigiosas, influentes o saga-
"'... De um lado, a ditadura dos che- zes, eleitas para os cargos de maior res-
fes; de outro, a ditadura das massas! ponsabilidade e chamadas de chefes.
Essa é a nossa palavra de ordem". Tudo isso é o ABC, tudo isso é simples e
claro. Que necessidade havia de trocar
Tais são as teses fundamentais que isso por tais confusões, por essa espécie
caracterizam o ponto de vista da oposi- de volapuk*1 ? Essas pessoas se desnor-
ção no Partido Comunista Alemão. tearam, pelo visto, caindo numa situação
difícil, em virtude da rápida sucessão da
Todo bolchevique que tenha parti- vida legal e ilegal do Partido, que altera
cipado conscientemente do desenvolvi- as relações comuns, normais e simples
mento do bolchevismo desde 1903, ou entre os chefes, os partidos e as classes.
que o tenha observado de perto, não po- Na Alemanha, como nos demais países
derá deixar de exclamar imediatamente, europeus, as pessoas estão excessiva-
depois de haver lido tais opiniões: "Que mente habituadas com a legalidade, a ele-
velharias conhecidas! Que infantilidades ição livre e regular dos "chefes" pelos con-
de "esquerda"!". gressos ordinários dos partidos, a com-
provação cômoda da composição de clas-
Examinemos, porém, mais de per- se desses últimos através das eleições
to essas opiniões. parlamentares, dos comícios, imprensa,
estado de espírito dos sindicatos e outras
O simples fato de perguntar "dita- organizações, etc. Quando, em virtude
dura do Partido ou ditadura da classe?" – da marcha impetuosa da revolução e do
"ditadura (partido) dos chefes ou ditadu- desenvolvimento da guerra civil, foi pre-
ra (partido) das massas?" demonstra a ciso passar dessa rotina para a sucessão
mais incrível e irremediável confusão de da legalidade e da ilegalidade e sua com-
idéias. Há pessoas que se esforçam para binação, para métodos "pouco cômo-
inventar alguma coisa inteiramente origi- dos", "não, democráticos', a fim de desig-
nal e que, no seu afã de sabedoria, não nar, formar ou conservar os "grupos de di-
conseguem senão cair no ridículo. Todos rigentes', essas pessoas perderam a cabe-
sabem que as massas se dividem em clas- ça e começaram a inventar um monstru-
ses, que só é possível opor as massas às oso absurdo. Ao que parece, os "tribunis-
classes num sentido; opondo-se uma es- tas" holandeses10, que tiveram o azar de
magadora maioria (sem dividi-la de acor- nascer num país pequeno, com uma tra-
do com as posições ocupadas no regime dição e condições de situação legal parti-
social da produção) a categorias que ocu- cularmente privilegiada e estável, e que
pam uma posição especial nesse regime; nunca assistiram à sucessão das situa-
que as classes são, geralmente e na maio- ções legais e ilegais, desorientaram-se e
ria dos casos (pelo menos nos países civi- perderam a cabeça, favorecendo inven-
lizados modernos), dirigidas por partidos ções absurdas.
políticos; que os partidos políticos são diri-
gidos, via de regra, por grupos mais ou Por outro lado, salta aos olhos o

16
uso impensado e ilógico de algumas pala- traidores; essa política, exatamente, foi a
vras "da moda" em nossa época sobre "a aplicada pela II Internacional.
massa" e "os chefes". Essas pessoas ouvi-
ram muitos ataques contra "os chefes" e Mas, com tal pretexto, chegar a con-
os sabe de cor, ouviram como se os con- trapor, em termos gerais, a ditadura das
trapunha à "massa", mas não souberam massas à ditadura dos chefes é um ab-
raciocinar sobre o significado de tudo isso surdo ridículo, uma tolice. O mais engra-
e ver as coisas com clareza. çado é que, de fato, em lugar dos antigos
chefes que se limitavam a idéias comuns
No fim da guerra imperialista e de- sobre as coisas simples, destacam-se (dis-
pois dela, manifestou-se em todos os paí- simulados pela palavra de ordem "abaixo
ses com singular vigor e evidência o di- os chefes") chefes novos, que dizem su-
vórcio entre "os chefes" e "a massa". A ca- premos disparates e asneiras. Tais são,
usa fundamental desse fenômeno foi ex- na Alemanha, Lauffenberg, Wolfweim,
plicada muitas vezes por Marx e Engels, Horner11, Karl Schroeder, Friedrich
de 1852 a 1892, usando o exemplo da Wendell e Karl Erler*2. As tentativas des-
Inglaterra. A situação monopolista, des- se último para "aprofundar" a questão e
se país originou o nascimento de uma proclamar, de modo geral, a inutilidade e
"aristocracia operária" oportunista, semi- o "caráter burguês" dos partidos políticos
pequeno-burguesa, saída da "massa". Os representam verdadeiras colunas de
chefes dessa aristocracia operaria passa- Hércules da estupidez, deixando qual-
vam-se freqüentemente para o campo da quer um estupefato. Como é certo que
burguesia, que os sustentava direta ou in- de. um pequeno erro se pode fazer sem-
diretamente. Marx foi alvo do ódio, que pre um monstruosamente grande, caso
lhe honra, desses canalhas, por havê-los, se persista nele, caso se o aprofunde
qualificado publicamente de traidores. O para justificá-lo, caso se tente "levá-lo às
imperialismo moderno (do século XX) cri- últimas conseqüências"!
ou uma situação privilegiada, monopolis-
ta, para alguns países avançados, e, nes- Negar a necessidade do Partido e
se terreno, surgiu em toda parte, dentro da disciplina partidária: eis o resultado a
da II Internacional, esse tipo de chefes que chegou a oposição. E isso eqüivale a
t ra i d o r e s , o p o r t u n i s t a s , s o c i a l - desarmar completamente o proletariado,
chovinistas, que defendem os interesses em proveito da burguesia. Eqüivale preci-
de sua corporação, de seu reduzido gru- samente à dispersão, instabilidade, inca-
po de aristocracia operária. Esses parti- pacidade de de dominar-se para unir-se e
dos oportunistas afastaram-se das "mas- atuar de modo organizado, defeitos tipi-
sas", isto é, dos setores mais amplos de camente pequeno-burgueses, que, se for-
trabalhadores, de sua maioria, dos ope- mos indulgentes com eles, causam inevi-
rários pior remunerados. A vitória do pro- tavelmente a ruína. de todo movimento
letariado revolucionário torna-se impos- revolucionário do proletariado. Negar a
sível sem a luta contra esse mal, sem o necessidade do Partido, do ponto-de-
desmascaramento, a desmoralização e a vista do comunismo, é dar um salto das
expulsão dos chefes oportunistas social- vésperas da derrocada do capitalismo

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(na Alemanha) não até a fase inferior ou homens é a força mais terrível. Sem parti-
média do comunismo, mas até a sua fase do férreo e temperado na luta, sem um
superior. Na Rússia (depois de mais de partido que goze da confiança de tudo
dois anos da derrubada da burguesia) ain- que exista de honrado dentro da classe,
da estamos dando os primeiros passos na sem um partido que saiba tomar o pulso
transição do capitalismo para o socialis- do estado de espírito das massas e influir
mo, ou fase inferior do comunismo. As nele é impossível levar a cabo com êxito
classes continuam existindo e existirão essa luta. É mil vezes mais fácil vencer a
durante anos em toda parte, depois da grande burguesia centralizada que "ven-
conquista do Poder pelo proletariado. É cer" milhões e milhões de pequenos pa-
possível que na Inglaterra, onde não há trões, os quais, com seu trabalho, invisí-
camponeses (apesar de haver pequenos vel, de corrupção, trabalho intangível, diá-
patrões) esse prazo seja mais curto. rio, obtêm os mesmos resultados de que
Suprimir as classes significa não só ex- a burguesia necessita, que determinam a
pulsar os latifundiários e os capitalistas - restauração da burguesia. Quem concor-
isso nós fizemos com relativa facilidade - re para enfraquecer, por pouco que seja,
como também suprimir os pequenos pro- a disciplina férrea do Partido do proletari-
dutores de mercadorias; estes, porém, ado (principalmente na época de sua dita-
não se pode expulsar, não se pode esma- dura) ajuda, na realidade, a burguesia
gar; é preciso conviver com eles, e só se contra o proletariado.
pode (e deve) transformá-los, reeducá-
los, mediante um trabalho de organiza- Ao lado da questão sobre os che-
ção muito longo, lento e prudente. Esses fes, o partido, a classe e a massa, é preci-
pequenos produtores cercam o proletari- so exprimir a dos sindicatos "reacionári-
ado por todos os lados de uma atmosfera os". Mas, antes, a fim de facilitar a com-
pequeno-burguesa, embebem-no nela, preensão da conclusão, tomarei a liber-
corrompem-no com ela, provocam cons- dade de fazer algumas observações base-
tantemente no seio do proletariado recaí- adas na experiência de nosso Partido.
das de frouxidão, dispersividade e indivi- Nele, sempre houve ataques contra a "di-
dualismo pequeno-burgueses, de oscila- tadura dos chefes". Que eu lembre, a pri-
ções entre entusiasmo e abatimento. meira vez foi em 1895, quando nosso
Para fazer frente a isso, para permitir que Partido ainda não existia formalmente,
o proletariado exerça acertada, eficaz e vi- mas já começava a se constituir em
toriosamente sua função organizadora Petersburgo o grupo central que iria en-
(que é sua função principal), são neces- carregar-se da direção dos grupos distri-
sárias uma centralização e uma disciplina tais. No IX Congresso de nosso Partido
severíssimas no partido político do prole- (abril de 1920) houve uma pequena opo-
tariado. A ditadura do proletariado é uma sição que também se pronunciou contra
luta tenaz, cruenta e incruenta, violenta e a "ditadura dos chefes", a "oligarquia",
pacífica, militar e econômica, pedagógica etc. Não há, portanto, nada de surpreen-
e administrativa, contra as forças e as tra- dente, nada de novo, nada de alarmante
dições da antiga sociedade. A força do há- na "doença infantil do "comunismo de es-
bito de milhões e dezenas de milhões de querda" entre os alemães. Essa doença

18
manifesta-se sem perigo e, uma vez cura- infiltrando, sem a menor dúvida, provo-
da, chega mesmo a fortalecer o organis- cadores nos Partidos Comunistas. Um
mo. Por outro lado, a rápida sucessão do dos meios de lutar contra esse perigo con-
trabalho legal e ilegal, que implica na ne- siste em saber combinar acertadamente
cessidade de "ocultar", de envolver com o trabalho ilegal com o legal.
singular segredo o Estado-Maior, os che- _______________
fes, originou em nosso país, algumas ve- *1 Volapuk - Idioma internacional
zes, fenômenos profundamente perigo- artificial inventado por SchIeyer, em
so. O pior deles foi a infiltração no Comitê 1879. (Nota de Ediciones en Lenguas
Central bolchevique, em 1912, de um Extranjeras)
agente provocador - Malinovski. Este de-
latou dezenas e dezenas dos mais abne- *2 No Diário Operário Comunista
gados e excelentes camaradas,. causan- 12 (n.º. 32, Hamburgo, 7 de fevereiro de
do a sua condenação a trabalhos força- 1920), Karl Erler, num artigo intitulado A
dos e provocando a morte de muitos de- dissolução do Partido, escreve: "A classe
les. Se não causou maiores danos foi por- operária não pode destruir o Estado bur-
que estabelecêramos adequadamente a guês sem aniquilar a democracia burgue-
correlação entre os trabalhos legal e ile- sa, e não pode aniquilar a democracia bur-
gal. Para ganhar nossa confiança, guesa sem destruir os partidos ".
Malinovski, como membro do Comitê
Central do Partido e deputado à Duma, As mais confusas cabeças dos sin-
teve de ajudar-nos a organizar a publica- dicalistas e anarquistas latinos podem
ção de diários legais que, inclusive sob o sentir-se "satisfeitas": alguns alemães im-
czarismo, souberam lutar contra o opor- portantes que pelo visto, se consideram
tunismo dos mencheviques e difundir, marxistas (em seus artigos no jornal cita-
com os disfarces necessários, os princípi- do, K. Erler e K. Horner demonstram sere-
os fundamentais do bolchevismo. Com namente que se consideram firmes mar-
uma das mãos, Malinovski enviava para a xistas, apesar de dizerem de modo singu-
prisão e para a morte dezenas e dezenas larmente ridículo tolices inacreditáveis,
dos melhores combatentes do bolchevis- manifestando assim não conhecer o ABC
mo; com a outra via-se obrigado a contri- do marxismo) chegam a afirmar coisas
buir para a educação de .dezenas e deze- completamente absurdas. Por si só, o re-
nas de milhares de novos bolcheviques, conhecimento do marxismo não exime
através da imprensa legal. Sobre este ninguém dos erros. . Os. russos bem sa-
fato deveriam refletir cuidadosamente os bem disso, porque o marxismo, com mui-
camaradas alemães (e também os ingle- ta freqüência, esteve "em moda" em nos-
ses, americanos, franceses e italianos) so pais. '(Nota do autor)
que tem diante de si a tarefa de aprender
a realizar um trabalho revolucionário nos *3Malinovski esteve preso na
sindicatos "reacionários"*3. Alemanha. Quando regressou à Rússia,
já no Poder bolchevique, foi imediata-
Em muitos países, até nos mais adi- mente entregue aos tribunais e fuzilado
antados, a burguesia infiltra e continuará por nossos operários. Os mencheviques

19
criticaram-nos acerbamente pelo erro de com o plano geral deste folheto, que tem
ter abrigado um, provocador no Comitê por objetivo aplicar à Europa Ocidental o
Central de nosso Partido, Mas, quando no que a história e a tática atual do bolche-
período de Kerenskí exigimos que fosse vismo tem de aplicável, importante e obri-
detido e julgado o presidente da Duma, gatório em toda parte.
Rodzianko, que desde antes da guerra sa-
bia que Malinovski era um provocador e A correlação entre chefes, partido,
não comunicara o fato aos deputados classe e massa e, ao mesmo tempo, a ati-
"trudoviques" (trabalhistas) e operários tude da ditadura do proletariado o de seu
da Duma, nem os mencheviques nem os partido no que concerne aos sindicatos
social-revolucionários, que formavam no apresentam entre nós, atualmente, da se-
governo de Kerenski, apoiaram nossa exi- guinte forma concreta: a ditadura é exer-
gência, e Rodzianko ficou em liberdade e cida pelo Proletariado organizado nos
pode unir-se a Denikin sem o menor obs- Soviete e dirigido Pelo Partido Comunista
táculo. (Nota do autor) Bolchevique, que, segundo os dados do
último Congresso (abril de 1920), conta
com 611 000 membros. O número de fili-
VI - Os revolucionários devem atu- ados oscilou muito, tanto antes como de-
ar nos sindicatos reacionários ? pois da Revolução de Outubro, e foi mes-
mo consideravelmente menor em
Os "esquerdistas" alemães acham 1918/1919. Receamos ampliar excessi-
que podem responder a essa pergunta vamente o Partido porque os arrivistas e
com uma negativa absoluta. Na sua opi- aventureiros, que nada merecem além
nião, a algazarra e os gritos encoleriza- de ser fuzilados, tendem inevitavelmente
dos contra os sindicatos "reacionários" e a infiltrar-se no partido governante. A últi-
"contra-revolucionários" (K. Horner des- ma vez que abrimos de par em par as por-
taca-se pela "seriedade" e estupidez com tas do Partido - exclusivamente para ope-
que faz isso) bastam para "demonstrar" a rários e camponeses - foi nos dias (inver-
inutilidade e até a inadmissibilidade da no de 1919) em que Yudenich estava a al-
atuação dos revolucionários, os comunis- gumas verstas de Petrogrado e Denikin.
tas, nos sindicatos amarelos, social- estava em Oriol (a umas trezentas e cin-
chovinistas, conciliadores e dos legienís- qüenta verstas de Moscou), isto é, quan-
tas*1. do a República Soviética corria um perigo
terrível, mortal, e os aventureiros, arrivis-
Mas, por muito convencidos que es- tas, aproveitadores e, de modo geral, to-
tejam os "esquerdistas" alemães do cará- dos os elementos instáveis não podiam,
ter revolucionário de semelhante tática, de jeito nenhum, esperar fazer uma car-
ela é, na realidade, profundamente errô- reira vantajosa se aderissem aos comu-
nea e nada contém, a não ser frases vazi- nistas, pois era mais fácil a perspectiva da
as. forca o das torturas. O Partido, que con-
voca congressos anuais (no último, a re-
Para esclarecer o que digo, partirei presentação foi de um delegado para
de nossa própria experiência, de acordo cada mil militantes), é dirigido por um

20
Comitê Central de 19 membros, eleito no na prática, um trabalho de propaganda e
congresso; a gestão dos assuntos cotidi- agitação bastante complexo e variado, re-
anos é exercida em Moscou por dois orga- uniões oportunas e freqüentes, não só
nismos ainda mais restritos, denomina- com os dirigentes, mas geralmente com
dos "Birô de Organização" e "Birô os militantes que têm influência nos sin-
Político", eleitos em sessões plenárias do dicatos, e também uma luta decidida con-
Comitê-Central. Em. cada um desses dois tra os mencheviques, que conservaram
organismos participam cinco membros até hoje um certo número de adeptos –
do CC. Estamos, por conseguinte, diante bem pequeno, é verdade - aos quais ensi-
de uma verdadeira oligarquia". Nenhuma nam todas as artimanhas da contra-
questão importante, política ou de orga- revolução, desde a defesa ideológica da
nização, é resolvida por qualquer institui- democracia (burguesa) e a pregação da
ção estatal de nossa República sem as di- "independência" dos sindicatos (inde-
retrizes do Comitê Central do Partido. pendência... em relação ao Poder estatal
proletário!) até à sabotagem à disciplina
Em seu trabalho, o Partido apoia-se proletária, etc., etc.
diretamente nos sindicatos, que têm ago-
ra, segundo os dados do último Reconhecemos que o contato com
Congresso (abril de 1920), mais de qua- as "massas" através dos sindicatos não é
tro milhões de filiados e que, no aspecto suficiente. No transcurso da revolução cri-
formal, são sem partido. De fato, todas as ou-se em nosso pais, na prática, um orga-
instituições dirigentes da imensa maioria nismo que procuramos manter a todo cus-
dos sindicatos e sobretudo, naturalmen- to, desenvolver e ampliar: as conferênci-
te, a central, ou Birô sindical de toda a as de operários e camponeses sem parti-
Rússia (Conselho Central dos Sindicatos do, que nos possibilitam observar o esta-
da Rússia), compõem-se de comunistas e do de espírito das massas, aproximarmo-
aplicam todas as diretrizes do Partido. nos delas, corresponder a seus desejos,
Obtém-se, no conjunto, um dispositivo promover aos postos do Estado seus me-
proletário, formalmente não comunista, lhores elementos, etc. Um decreto recen-
flexível e relativamente amplo, podero- te sobre a transformação do
síssimo, por meio do qual o Partido está Comissariado do Povo de Controle do
estreitamente ligado à classe e às mas- Estado em "Inspeção Operária e
sas, e através do qual se exerce, sob a di- Camponesa" concede a essas conferênci-
reção do Partido, a ditadura da classe. É as sem partido o direito de eleger mem-
claro que nos teria sido impossível gover- bros para o Controle do Estado, encarre-
nar o país e exercer a ditadura, já não gados das mais diversas funções de revi-
digo dois anos e meio, mas nem sequer são, etc.
dois meses e meio, se não houvesse a ma-
is- estreita ligação com os sindicatos, seu Além disso, como é natural, todo o
apoio entusiasta, seu abnegadíssimo tra- trabalho do Partido realiza-se através dos
balho tanto na organização econômica Soviets, que agrupam as massas traba-
como na militar. Como se pode compre- lhadoras, sem distinção de ofício. Os con-
ender, esta estreitíssima ligação significa, gressos distritais dos Soviets represen-

21
tam uma instituição democrática como ja- pura, inventada por comunistas muito
mais se viu nas melhores repúblicas de- simpáticos (e na maioria dos casos, pro-
mocráticas do mundo burguês. Por meio vavelmente, bem jovens), etc., etc.
desses congressos (cujo trabalho procu-
ra acompanhar o Partido com a maior O capitalismo lega inevitavelmente
atenção possível) assim como através da ao socialismo, de um lado, as antigas dife-
designação constante dos operários mais renciações profissionais e corporativas
conscientes para diversos cargos nas po- entre os operários, formadas mo decor-
voações rurais, o proletariado exerce sua rer dos séculos, e, por outro lado, os sin-
função dirigente com relação ao campe- dicatos, que só muito lentamente, no
sinato, realiza-se a ditadura do proletari- transcurso dos anos, podem transfor-
ado urbano, a luta sistemática contra os mar-se, e se transformarão, em sindica-
camponeses ricos, burgueses, explora- tos de indústria mais amplos, menos cor-
dores e especuladores, etc. porativos (que abarcam indústrias intei-
ras, em vez de englobar somente corpo-
Esse é o mecanismo geral do Poder rações, ofícios e profissões). Depois, por
estatal proletário examinado "de cima", meio desses sindicatos de indústria, será
do ponto de vista da realização prática da iniciada a supressão da divisão do traba-
ditadura. É de esperar que o leitor com- lho entre os homens, a educação, instru-
preenda por que o bolchevique russo, ção e formação de homens universal-
que conhece tal mecanismo e o viu nas- mente desenvolvidos e universalmente
cer dos pequenos círculos ilegais e clan- preparados, homens que saberão fazer
destinos no decurso de 25 anos, só pode tudo. O comunismo marcha e deve mar-
achar ridículas, pueris e absurdas todas char para esse objetivo, que será atingi-
as discussões sobre a ditadura de cima do, embora somente dentro de muitos
ou de baixo, a ditadura dos chefes ou a di- anos. Tentar hoje antecipar-se na prática
tadura das massas, etc., ridículas, pueris a esse resultado futuro de um comunis-
e absurdas como uma discussão acerca mo chegado ao fim de seu completo de-
da maior ou menor utilidade que tem senvolvimento, solidez e formação, de
para o homem a perna esquerda ou o bra- sua realização integral e de seu amadure-
ço direito. cimento, é o mesmo que querer ensinar
matemáticas superiores a uma criança de
Também não podemos deixar de quatro anos.
achar um absurdo ridículo e pueril as ar-
gumentação ultra-sábias, empoladas e Podemos (e devemos) empreender
terrivelmente revolucionárias dos es- a construção do socialismo não com um
querdistas alemães a respeito de idéias material humano fantástico, nem especi-
como: os comunistas não podem nem de- almente criado por nós, mas com o que
vem atuar nos sindicatos reacionários; é nos foi deixado de herança pelo capitalis-
lícito renunciar a semelhante atividade; é mo. Não é necessário dizer que isso é mui-
preciso abandonar os sindicatos e organi- to "difícil"; mas, qualquer outro modo de
zar obrigatoriamente uma "união operá- abordar o problema é tão pouco sério
ria" novinha em folha e completamente que nem vale a pena falar dele.

22
Os sindicatos representaram um compreender absolutamente as condi-
progresso gigantesco da classe operária ções fundamentais da transição do capi-
nos primeiros tempos do desenvolvimen- talismo ao socialismo. Temer esse "espí-
to do capitalismo, visto que significavam rito reacionário", tentar prescindir dele,
a passagem da dispersão e da impotên- ignorá-lo, é uma grande tolice, pois eqüi-
cia dos operários aos rudimentos da vale a temer o papel de vanguarda do pro-
união de classe. Quando começou a de- letariado, que consiste em instruir, ilus-
senvolver-se a forma superior de união trar, educar, atrair para uma vida nova as
de classe dos proletários, o partido revo- camadas e as massas mais atrasadas da
lucionário do proletariado (que não será classe operária e do campesinato. Por ou-
merecedor desse nome enquanto não tro lado, adiar a ditadura do proletariado
souber ligar os líderes à classe e às mas- até que não reste nenhum operário de es-
sas num todo único e indissolúvel), os sin- treito espírito profissional, nenhum ope-
dicatos começaram a manifestar inevita- rário com preconceitos tradeunionistas e
velmente certos aspectos reacionários, corporativistas, seria um erro ainda mais
certa estreiteza grupal, certa tendência grave. A arte do político (e a justa com-
para o apoliticismo, certo espírito de roti- preensão dos seus deveres no comunis-
na, etc. O desenvolvimento do proletaria- ta) consiste, precisamente, em saber
do, porém, não se realizou, nem podia re- aquilatar com exatidão as condições e o
alizar-se, em nenhum país de outra mane- momento em que a vanguarda do prole-
ira senão por intermédio dos sindicatos e tariado pode tornar vitoriosamente o
por sua ação conjunta com o partido da Poder; em que pode, por ocasião da toma-
classe operária. A conquista do Poder polí- da do Poder e depois dela conseguir um
tico pelo proletariado representa um pro- apoio suficiente de setores bastante am-
gresso gigantesco deste, considerado plos da classe operária e das massas tra-
como classe, e o partido deve dedicar-se balhadoras não proletárias; em que po-
mais, de modo novo e não apenas pelos de, uma vez obtido esse apoio, manter,
processos antigos, para educar os sindi- consolidar e ampliar seu domínio, edu-
catos, dirigi-los, sem esquecer, ao mes- cando, instruindo e atraindo para si mas-
mo tempo, que estes são e serão durante sas cada vez maiores de trabalhadores.
muito tempo uma "escola de comunis-
mo" necessária, uma escola preparatória Prossigamos. Em países mais adi-
dos proletários para a realização de sua antados que a Rússia se fez sentir, e devia
ditadura, a associação indispensável dos fazer-se sentir de modo muito mais acen-
operários para a passagem gradual da di- tuado, sem dúvida, que entre nós, certo
reção de toda a economia do país inicial- espírito reacionário dos sindicatos. Aqui,
mente para as mãos da classe operária (e os mencheviques tinham (e em parte ain-
não de profissões isoladas) e, depois, da tem, num reduzidíssimo número de
para as mãos de todos os trabalhadores. sindicatos) apoio entre os sindicatos, gra-
Na ditadura do proletariado é inevitável a ças, exatamente, a essa .estreiteza cor-
existência de certo "espirito reacionário" porativa, a esse egoísmo e ao oportunis-
nos sindicatos, no sentido assinalado. mo. Os mencheviques de Ocidente "en-
Não compreender esse fato significa não trincheiraram-se" muito mais firmemen-

23
te nos sindicatos, e lá surgiu uma camada sas operárias e para colocá-las ao nosso
muito mais forte que em nosso pais de lado; sustentamos a luta contra os chefes
aristocracia operária, profissional, mes- oportunistas e social-chovinistas para ga-
quinha, egoísta, desalmada, ávida, pe- nhar a classe operária. Seria tolice esque-
queno-burguesa, de espírito imperialista, cer esta verdade mais que elementar e
subornada e corrompida pelo imperialis- evidente. E é essa, precisamente, a tolice
mo. Isto é indiscutível. A luta contra os cometida pelos comunistas alemães "de
Gompers, contra os senhores Jouhaux, esquerda", que deduzem do caráter rea-
Henderson, Merrheim, Legien e Cia. na cionário e contra-revolucionário dos che-
Europa Ocidental é muito mais difícil que fetes dos sindicatos que é necessário ...
a luta contra os nossos mencheviques, sair dos sindicatos!!., renunciar ao traba-
que representam um tipo social e político lho neles!!, criar formas de organização
totalmente homogêneo. E' preciso sus- operária novas, inventadas!! Uma estupi-
tentar essa luta implacavelmente e man- dez tão imperdoável, que eqüivale ao me-
tê-la obrigatoriamente, como o fizemos, lhor serviço que os comunistas podem
até desmoralizar e desalojar dos sindica- prestar à burguesia. Isso porque nossos
tos todos os chefes incorrigíveis do opor- mencheviques, como todos os líderes sin-
tunismo e do social-chovinismo. É impos- dicais oportunistas, social-chovinistas e
sível conquistar o Poder político (e não se kautskistas nada mais são que "agentes
deve nem pensar em tomar o Poder polí- da burguesia no movimento operário"
tico) enquanto essa luta não tiver atingi- (Como sempre dissemos ao falar dos
do certo grau; este certo grau não é o mencheviques) ou, em outras palavras,
mesmo em todos os países e sob todas as os "lugar-tenentes operários da classe
condições, e só dirigentes políticos sen- dos capitalistas" (labor lieutenants of the
satos, experimentados e competentes do capitalist class), segundo a magnífica ex-
proletariado podem determiná-lo com pressão, profundamente exata, dos discí-
acerto em cada país. (Na Rússia o termô- pulos de Daniel de León nos Estados
metro do êxito dessa luta, entre outras co- Unidos. Não atuar dentro dos sindicatos
isas, foram .as eleições de novembro de reacionários significa abandonar as mas-
1917 para a Assembléia Constituinte, al- sas operárias insuficientemente desen-
guns dias depois da revolução proletária volvidas ou atrasadas à influência dos lí-
de 25 de outubro de 1917. Nessas elei- deres reacionários, dos agentes da bur-
ções, os mencheviques sofreram frago- guesia, dos operários aristocratas ou ope-
rosa derrota, obtendo 700 000 votos - rários aburguesados" (ver a carta de
1400 000 contando os da Transcaucásia - Engels e Marx em 1858 a respeito dos
contra os 9 000 000 alcançados pelos bol- operários ingleses).
cheviques. Ver. meu artigo As eleições
para a Assembléia Constituinte e a dita- Precisamente a absurda "teoria" da
dura do proletariado, publicado no núme- não participação dos comunistas nos sin-
ro 7/8 de A Internacional Comunista). dicatos é que demonstra do modo mais
evidente a leviandade com que esses co-
Mas sustentamos a luta contra a munistas "de esquerda" encaram a ques-
"aristocracia operária" em nome das mas- tão da influência sobre as "massas" e

24
como abusam de seu alarido em torno "setores inferiores", atrasados. Na
das "massas". Para saber ajudar a "mas- Inglaterra, França e Alemanha, milhões
sa" e conquistar sua simpatia, adesão e de operários passam pela primeira vez da
apoio é preciso não temer as dificulda- completa desorganização. É impossível
des, mesquinharias, armadilhas, insultos conceber maior insensatez, maior dano
e perseguições dos "chefes" (que, sendo causado à revolução pelos revolucionári-
oportunistas e social-chovinistas, estão, os "de esquerda"! Se hoje, na Rússia, de-
na maioria das vezes relacionados direta pois de dois anos e meio de triunfos sem
ou indiretamente com a burguesia e a po- precedentes sobre a burguesia da Rússia
licia). Além disso, deve-se trabalhar obri- e a da Entente estabelecêssemos como
gatoriamente onde estejam ao massas. É condição de ingresso nos sindicatos o "re-
necessário saber fazer todas as espécies conhecimento da ditadura", faríamos
de sacrifícios e transpor os maiores obs- uma tolice, perderíamos nossa influência
táculos para realizar uma propaganda e sobre as massas e ajudaríamos os men-
uma agitação sistemática, pertinaz, per- cheviques, pois a tarefa dos comunistas
severante e paciente exatamente nas ins- consiste em saber convencer os elemen-
tituições, associações e sindicatos, por tos atrasados, saber atuar entre eles, e
mais reacionários que sejam, onde haja não em isolar-se deles através de pala-
massas proletárias ou semi-proletárias. E vras de ordem tiradas subjetivamente de
os sindicatos e cooperativas operários nossa cabeça e infantilmente "esquerdis-
(estas pelo menos em alguns casos) são tas".
precisamente as organizações onde es-
tão as massas. Na Inglaterra, segundo da- Não há dúvida de que os senhores
dos publicados pelo jornal sueco Folkets Gompers, Henderson, Jouhaux e Legien
Dagblad Politiken*2 a 10 de março de ficarão muito agradecidos a esses revolu-
1920, o número e membros das trade- cionários "de esquerda", que, como os da
unions, que em fins de 1917 era de 5 500 oposição "de princípio" alemã (que o céu
000, aumentou nos últimos dias de 1918 nos proteja de semelhantes "princípios"
para 6 600 000, isto é, 19%. Em fins de ou alguns revolucionários da "Operários
1919, seus efetivos elevavam-se, segun- Industriais do Mundo" nos Estados
do os cálculos, a 7 500 000. Não tenho à Unidos, pregam a saída dos sindicatos re-
mão os números correspondentes à acionários a renúncia à atuação neles.
França e à Alemanha; mas alguns fatos, Não duvidamos de que os senhores "che-
absolutamente indiscutíveis e que todos fes" do oportunismo recorrerão a todos
conhecem, atestam o notável incremen- os artifícios da diplomacia burguesa, à
to do número de membros dos sindicatos ajuda dos governos burgueses, dos pa-
também nesses países. dres, da policia e dos tribunais para impe-
dir a entrada dos comunistas nos sindica-
Tais fatos provam com toda clareza tos, para expulsá-los de lá por todos os
o que é confirmado por outros milhares meios e tornar o seu trabalho nos sindica-
de sintomas: o desenvolvimento da cons- tos o mais desagradável possível, ofen-
ciência o do desejo de organização justa- dê-los, molestá-los e persegui-los. E' pre-
mente nas massas proletárias, em seus ciso saber enfrentar tudo isso, estar dis-

25
posto a todos os sacrifícios e, inclusive, parcialmente, tanto faz) sustentaram
empregar - em caso de necessidade - to- essa política falsa. A III Internacional
dos os estratagemas, ardis e processos deve romper com a tática da II e não evi-
ilegais, silenciar e ocultar a verdade, com tar nem ocultar as questões escabrosas,
o objetivo de penetrar nos sindicatos, per- e sim levanta-las sem rebuços. Dissemos
manecer neles e ai realizar, custe o que cara a cara toda a verdade aos "indepen-
custar, um trabalho comunista. Sob o regi- dentes" (Partido Social-Democrata
me tzarista, até 1905, não tivemos ne- Independente da Alemanha); do mesmo
nhuma "possibilidade legal"; mas quan- modo, é preciso dize-la- aos comunistas
do o policial Subatov organizou suas as- "de esquerda.
sembléias e associações operárias ultra-
revolucionárias, com a finalidade de ca- _______________
çar os revolucionários e lutar contra eles, * Subordinados ao social-
infiltramos ali membros de nosso Partido democrata oportunista de direita alemão
(lembro entre eles o camarada Legien. (Nota do tradutor)
Babushkin, destacado operário peters-
burguense, fuzilado em 1906 pelos gene- *2 Diário Popular Político. (Nota da
rais czaristas) que estabeleceram conta- Redação)
to com a massa, conseguiram realizar
sua agitação e tirar os operários da in- *3 Os Gompers, os Henderson, os
fluência dos agentes de Subatov3. Johaux e os Legien nada mais são que os
Naturalmente, é mais difícil, atuar assim Subatov, diferenciando-se dele por seus
nos países da Europa Ocidental, particu- trajes europeus, seu porte elegante e refi-
lar mente impregnados de preconceitos nados processos aparentemente demo-
legalistas, constitucionalistas e democrá- cráticos e civilizados que empregam para
tico-burgueses muito arraigados. Mas se realizar sua abominável política. (Nota do
pode e deve atuar dessa maneira siste- autor)
maticamente.
VII - Deve-se participar nos parla-
O Comitê Executivo da III mentos burgueses
Internacional deve, na minha opinião,
condenar abertamente e propor ao próxi- Os comunistas "de esquerda" ale-
mo Congresso da Internacional mães com o maior desdém e a maior levi-
Comunista que condene, de modo geral, andade, respondem a essa pergunta pela
a política de não participação nos sindica- negativa. Seus argumentos? Na citação
tos reacionários (explicando pormenori- transcrita no parágrafo V pode-se ler:
zadamente a insensatez que essa não
participação significa e o imenso prejuízo "... rejeitar do modo mais categóri-
que causa à revolução proletária) e, em co todo retorno aos métodos parlamen-
particular, a linha de conduta de alguns tares de luta, que já caducaram histórica
membros do Partido Comunista e politicamente..."
Holandês, que (direta ou indiretamente,
às claras ou disfarçadamente, total ou Além do tom ridiculamente presun-

26
çoso em que isso está dito, sua falsidade ro, do Boletim do Birô Provisório de
é evidente. "Retorno" ao parlamentaris- Amsterdam da Internacional Comunista
mo! Já existe, por acaso, uma república (Bulletín of the Provisional Bureau in
soviética na Alemanha? Então, como se Amsterdom of Communist International,,
pode falar de "retorno"? Não é uma frase February - 1920) e que exprime clara-
vazia? mente as tendências esquerdistas dos ho-
landeses, ou as tendências holandesas
O parlamentarismo "caducou his- dos esquerdistas.
toricamente". Isso está certo do ponto de
vista da propaganda. Mas ninguém igno- Em primeiro lugar, os "esquerdis-
ra que daí à sua superação na prática há tas" alemães, como se sabe, já conside-
'uma enorme distância. Há muitas déca- ravam em janeiro de 1919 que o parla-
das já s6 podia dizer, com toda razão, que mentarismo havia "caducado politica-
o capitalismo havia "caducado historica- mente", malgrado a opinião de destaca-
mente"; Mas isso nem mesmo impede dos dirigentes políticos como Rosa de
que sejamos obrigados a sustentar uma Luxemburgo e Karl Leibknecht. É sabido
luta extremamente prolongada e tenaz que os "esquerdistas" se equivocaram.
no terreno do capitalismo. O parlamenta- Tal fato é suficiente para destruir de gol-
rismo "caducou historicamente" do pon- pe e radicalmente a tese de que o parla-
to de vista histórico-universal, isto é, a mentarismo "caducou politicamente". Os
época do parlamentarismo burguês ter- "esquerdistas" tem a obrigação de de-
minou, começou a época da ditadura do monstrar por que seu erro indiscutível de
proletariado. Isso é indiscutível. Na histó-então, deixou hoje de ser um erro.
ria universal, porém, o tempo é contado Contudo, eles não apresentam, nem po-
por décadas. Nesse terreno, dez ou vinte dem apresentar, a menor sombra de pro-
anos a mais ou a menos não tem impor- va. A atitude de um partido político diante
tância; representam um número tão mo- de seus erros é um dos critérios mais im-
desto que, mesmo aproximadamente, é portantes e seguros para a apreciação da
impossível aquilatar seu valor. Por isso, seriedade desse partido e do cumprimen-
utilizar-se do critério da história universal
to efetivo de seus deveres para com a sua
para uma questão de política prática cons- classe e as massas trabalhadoras.
titui o mais gritante erro teórico. Reconhecer francamente os erros, pôr a
nu as suas causas, analisar a situação
"Caducou politicamente o parla- que os originou e discutir cuidadosamen-
mentarismo"? Isto já é outra questão. Se te os meios de corrigi-los é, o que carac-
fosse verdade, a posição dos esquerdis- teriza um partido sério; nisso consiste o
tas" seria firme. Mas isso tem que ser pro- cumprimento de seus deveres; isso signi-
vado através de uma análise muito séria, fica-- educar e instruir a classe e, depois,
análise que os esquerdistas nem sequer as massas. Ao não cumprir esse dever
sabem como abordar. Do mesmo modo, nem estudar com toda a atenção, zelo e
não vale um tostão, como veremos, a aná- prudência necessários seu erro evidente,
lise contida nas Teses. Sobre o os "esquerdistas" da Alemanha (e da
Parlamentarismo, publicado no 19 núme- Holanda) demonstram exatamente que

27
não são o partido da classe, e sim um cír- siasmo, heroísmo e força de vontade as-
culo; que não são o partido das massas e sombrosos, pudemos observar bem de
sim um grupo de intelectuais e de um re- perto, estudar com singular atenção e co-
duzido número de operários que imitam nhecer minuciosamente este erro dos re-
os piores aspectos dos intelectualóides. volucionários, o que nos faz vê-lo com
particular clareza nos outros. Como é na-
Em segundo lugar, no mesmo fo- tural, para os comunistas da Alemanha o
lheto do grupo "de esquerda" de parlamentarismo "caducou politicamen-
Francfort, do qual transcrevemos trechos te"; mas, trata-se exatamente de não jul-
mais detalhados páginas atrás, lemos : gar que o caduco para nós tenha caduca-
do para a classe, para a massa. Mais uma
". . . os milhões de operários que vez, constatamos que os "esquerdistas"
ainda seguem a política do centro" (do não sabem raciocinar, não sabem condu-
partido católico- centrista) "são contra- zir-se como o partido da classe, como o
revolucionário. Os proletários do campo partido das massas. Vosso dever consiste
formam as legiões dos exércitos contra- em não descer ao nível das massas, ao ní-
revolucionários". (página 3 do folheto em vel dos setores atrasados da classe. Isso
questão). não se discute. Tendes a obrigação de di-
zer-lhes a amarga verdade: dizer-lhes
Como se vê, a afirmação é feita que seus preconceitos democrático-
com ênfase e exagero excessivo. Mas o burgueses e parlamentares não passam
fato fundamental exposto aqui é indiscu- disso: preconceitos. Ao mesmo tempo,
tível, e seu reconhecimento pelos "es- porém, deveis observar com serenidade
querdistas" atesta seu erro com acentua- o estado real de consciência e de preparo
da evidência. Com efeito, como se pode de toda a classe (e não apenas de sua
dizer que o "parlamentarismo caducou vanguarda comunista), de toda a massa
politicamente", se "milhões" e "legiões" trabalhadora (e não apenas de seus ele-
de proletários ainda são não apenas par- mentos avançados).
tidários do parlamentarismo em geral, co-
mo, inclusive, francamente "contra- Mesmo que não fossem "milhões" e
revolucionários"!? E evidente que o par- "legiões", e sim uma simples minoria bas-
lamentarismo na Alemanha ainda não ca- tante considerável de operários industri-
ducou politicamente. E evidente que os ais que seguisse os padres católicos e de
"esquerdistas" da Alemanha considera- trabalhadores agrícolas que seguisse os
ram seu desejo, suas concepções políti- latifundiários e camponeses ricos (Gross-
co- ideológicas, uma realidade objetiva. bauern), poderíamos assegurar sem, va-
Este é o mais perigoso dos erros para os cilar que o parlamentarismo na
revolucionários. Na Rússia, onde o jugo Alemanha ainda não caducou politica-
sumamente selvagem e feroz do czaris- mente, que a participação nas eleições
mo criou, durante um período prolonga- parlamentares e na luta através da, tribu-
díssimo e com formas particularmente va- na parlamentar são obrigatórias para o
riadas, revolucionários de todos os mati- partido do proletariado revolucionário,
zes, revolucionários de abnegação, entu- precisamente para educar os setores atra-

28
sados de sua classe, precisamente para te na Rússia? Tínhamos, sem dúvida,
despertar e instruir a massa aldeã incul- pois a questão não se baseia em se os par-
ta, oprimida e ignorante. Enquanto não lamentos burgueses existem há muito ou
tenhais força para dissolver o parlamento há pouco tempo, mas sim em até que pon-
burguês e qualquer outra organização re- to as massas trabalhadoras estão prepa-
acionária, vossa obrigação é atuar no radas (ideológica, politicamente e na prá-
seio dessas instituições, precisamente tica) para adotar o regime soviético o dis-
porque ainda há nelas operários embru- solver (ou permitir a dissolução) do par-
tecidos pelo clero e pela vida nos rincões: lamento democrático-burguês. Que a
mais afastados do campo. Do contrário, classe operária das cidades, os soldados
correi o risco de vos converter em simples e os camponeses da Rússia estavam, em
charlatães. setembro-novembro de 1917, excepcio-
nalmente preparados, em virtude de uma
Em terceiro lugar, os comunistas série de condições particulares, para ado-
"de esquerda" são pródigos de elogios a tar o regime soviético e dissolver o parla-
nós bolcheviques. às vezes dá-nos vonta- mento burguês mais democrático é um
de de dizer-lhes: louvem-nos menos e tra- fato histórico absolutamente indiscutível
tem de compreender melhor a nossa táti- e plenamente demonstrado. Contudo, os
ca, familiarizar-se mais com ela! bolcheviques não boicotaram a
Participamos das eleições ao parlamento Assembléia Constituinte, e sim, pelo con-
burguês da Rússia, à Assembléia trário, participaram das eleições, tanto
Constituinte, em setembro-novembro de antes como depois da conquista do Poder
1917. Era justa ou não a nossa tática? Se político pelo proletariado. Creio haver de-
não era, é preciso dize-lo com clareza o monstrado no artigo citado páginas
demonstrá-lo; isso é indispensável para atrás, no qual analiso minuciosamente os
que o comunismo internacional elabore a resultados das eleições para a
tática justa. Se era, é preciso tirar as con- Assembléia Constituinte da Rússia, que
clusões que se impõem. Naturalmente, essas eleições tiveram conseqüências po-
não se trata absolutamente de equiparar líticas de extraordinário valor (e de suma
as, condições da Rússia às da Europa utilidade para o proletariado).
Ocidental. Mas, quando se trata em parti-
cular do significado que tem a idéia de A conclusão que se tira desse fato é
que "o parlamentarismo caducou politi- absolutamente indiscutível: está provado
camente", é indispensável levar em conta que, mesmo algumas semanas antes da
com exatidão a nossa experiência, pois vitória da República Soviética, mesmo de-
sem considerar uma experiência concre- pois dessa vitória, a participação num par-
ta, tais idéias convertem-se muito facil- lamento democrático-burguês, longe de
mente em frases vazias. Nós, bolchevi- prejudicar o proletariado revolucionário,
ques russos, não tínhamos, porventura, permite-lhe demonstrar com maior facili-
em setembro-novembro de 1917, mais di- dade às massas atrasadas a razão por
reito que todos os comunistas do que semelhantes parlamentos devem ser
Ocidente de considerar que o parlamen- dissolvidos, facilita o êxito de sua dissolu-
tarismo havia sido superado politicamen- ção, facilita a "supressão política" do par-

29
lamentarismo burguês. Não levar em con- sores desprezam completamente a expe-
sideração essa experiência e pretender, riência de toda a Europa (da França nas
ao mesmo tempo, pertencer à vésperas das revoluções de 1848 e 1870,
Internacional Comunista - que deve ela- da Alemanha entre 1878 e 1890, etc.) e
borar internacionalmente a sua tática da Rússia (ver acima) sobre a importân-
(não uma tática estreita ou de caráter es- cia da combinação da luta legal com a ile-
tritamente nacional, mas exatamente gal. Essa questão é da maior importân-
uma tática internacional) - significa incor-cia, tanto no geral como no particular, por-
rer no mais profundo dos erros e precisa- que em todos os países civilizados e adi-
mente afastar-se de fato do internacio- antados aproxima-se a largas passadas a
nalismo, embora este seja proclamado época em que tal combinação será - e,
em palavras. em parte, já o é - cada vez mais obrigató-
ria para o partido do proletariado revolu-
Consideremos agora os argumen- cionário, em conseqüência do amadure-
tos "esquerdistas holandeses" em prol da cimento e da proximidade (1ª guerra civil
não participação nos parlamentos. Eis a do proletariado contra a burguesia, em
tese, a mais importante das teses "holan- conseqüência das ferozes perseguições
desas" citadas anteriormente, traduzida feitas aos comunistas pelos governos re-
do inglês: publicanos e, de modo geral, burgueses,
que violam por todos os meios a legalida-
"Quando o sistema capitalista de de (como exemplo disso basta citar os
produção é destroçado e a sociedade atra- Estados Unidos), etc. Essa questão fun-
vessa um período revolucionário, a ação damental não é absolutamente compre-
parlamentar perde gradualmente seu va- endida pelos holandeses e esquerdistas
lor em comparação com a ação das pró- em geral.
prias massas. Quando, nestas condições,
o parlamento se converte em centro e ór- A segunda frase é, em primeiro lu-
gão da contra-revolução e, por outro la- gar, falsa historicamente. Nós, bolchevi-
do, a classe operária cria os instrumentos ques, atuamos nos parlamentos mais con-
de seu Poder sob a forma dos Soviets, tra-revolucionários e a experiência de-
pode tornar-se inclusive necessário re- monstrou que semelhante participação
nunciar a toda participação na ação par- foi não só útil como necessária para o par-
lamentar" tido do proletariado revolucionário, preci-
samente depois da primeira revolução
A primeira frase é, evidente, falsa, burguesa na Rússia (1905), a fim de pre-
posto que a ação das massas - uma gran- parar a segunda revolução burguesa (fe-
de greve, por exemplo - é sempre mais vereiro de 1917) e, logo em seguida, a, re-
importante que a ação parlamentar, e volução socialista (outubro de 1917), Em
não só durante a revolução ou numa situ- segundo lugar, essa frase é de um ilogis-
ação revolucionária. Esse argumento, de mo surpreendente. Da transformação do
indubitável inconsistência e falso históri- parlamento em órgão e centro (diga-se,
ca e politicamente, só serve para mostrar de passagem, que nunca foi nem pode
com particular evidência que seus defen- ser realmente o "centro") da contra-

30
revolução e da criação pelos operários tituição reacionária por sua efetiva des-
dos instrumentos de seu Poder sob a for- truição mediante o conjunto de forças de
ma de Soviets conclui-se que os trabalha- uma série de fatores objetivos. O meio
dores devem preparar-se ideológica, polí- mais seguro de desacreditar uma nova
tica e tecnicamente para a luta dos idéia política (e não somente uma idéia
Soviets contra o parlamento, para a dis- política) e prejudicá-la consiste em levá-
solução do parlamento pelos Soviets. la ao absurdo, a pretexto de defendê-la,
Daí, porém, não se deduz de modo algum uma vez que toda verdade, se a torna-
que essa dissolução seja dificultada, ou mos "exorbitante" (como dizia Dietzgen,
não seja facilitada, pela presença de uma pai), se a exageramos e a estendemos
oposição soviética dentro de um parla- além dos limites em que ela é realmente
mento contra-revolucionário. Nunca dis- aplicável, pode ser levada ao absurdo e,
semos, durante a nossa luta vitoriosa con- nessas condições, ela própria se transfor-
tra Denikin e Kolchak, que a existência de ma num absurdo. Eis o desserviço que os
uma oposição proletária, soviética, na esquerdistas da Holanda e da Alemanha
zona ocupada por eles tenha sido indife- prestam à nova verdade da superioridade
rente para nossos triunfos. Sabemos mui- do Poder Soviético sobre os parlamentos
to bem que a dissolução da Constituinte, democrático-burgueses. Naturalmente,
por nós efetuada a 5 de janeiro de 1918, estaria errado quem continuasse susten-
longe de ser dificultada, foi facilitada pela tando, de modo geral, a velha afirmação
presença: na Constituinte contra- de que abster-se de participar dos parla-
revolucionária que dissolvíamos tanto de mentos burgueses é inadmissível em to-
uma oposição soviética conseqüente, a das as circunstâncias. Não posso tentar
bolchevique, como de uma oposição so- formular aqui as condições em que é útil
viética inconseqüente, a dos social- o boicote, já que a finalidade desse folhe-
revolucionários de esquerda. Os autores to é bem mais modesta: analisar a expe-
da tese confundiram-se totalmente e es- riência russa em relação a algumas ques-
queceram a experiência de uma série de tões atuais da tática comunista internaci-
revoluções, talvez até de todas, expe- onal. A experiência russa nos apresenta
riência que confirma a singular utilidade uma aplicação feliz e acertada (1905) e
que representa, por ocasião das revolu- outra equivocada (1906) do boicote por
ções, combinar a ação de massas fora do parte dos bolcheviques. Analisando o pri-
parlamento reacionário com uma oposi- meiro caso, concluímos: os bolcheviques
ção simpatizante da revolução (ou, me- conseguiram impedir a convocação do
lhor ainda, que a apoia, abertamente) parlamento reacionário pelo Poder reaci-
dentro desse parlamento. Os holandeses onário, num- momento em que a ação re-
e os "esquerdistas" em geral raciocinam, volucionária extraparlamentar das mas-
nesse problema, como doutrinadores da sas (particularmente as greves) crescia
revolução que nunca participaram de com rapidez excepcional, em que não ha-
uma revolução verdadeira, ou que nunca via nenhuma setor do proletariado e do
meditaram sobre a história das revolu- campesinato que pudesse apoiar de
ções, ou que ingenuamente tomam a ne- modo algum o Poder reacionário, em que
gação subjetiva de uma determinada ins- a influência do proletariado revolucioná-

31
rio sobre as grandes massas atrasadas es- do-se em consideração serenamente,
tava assegurada pela luta grevista e pelo com estrita objetividade, todas as torças
movimento camponês. É totalmente evi- de classe do Estado em questão (e dos
dente que esta experiência é inaplicável Estados que o rodeiam, assim como de to-
às atuais condições. européias. Também dos os Estados em escala mundial) e tam-
salta aos olhos - em virtude dos argu- bém a experiência dos movimentos revo-
mentos acima expostos - que a defesa, lucionários. Manifestar o revolucionaris-
mesmo condicional, da renúncia à parti- mo somente através de invectivas contra
cipação nos parlamentos, feita pelos ho- o oportunismo parlamentar, apenas con-
landeses e pelos "esquerdistas" é radical- denando a participação nos parlamentos,
mente falsa e nociva à causa do proletari- é facílimo; mas, exatamente por ser mui-
ado revolucionário. to fácil, não representa a solução para
um problema difícil, dificílimo. Nos parla-
Na Europa Ocidental e nos Estados mentos europeus é muito mais difícil que
Unidos o parlamento tornou-se extrema- na Rússia criar uma fração parlamentar
mente odioso para a vanguarda revoluci- realmente revolucionária. Sem dúvida.
onária da classe operária Isso é indiscutí- Isso, porém, não é senão uma expressão
vel. E é facilmente compreensível, pois é parcial da verdade geral de que - na situ-
difícil imaginar maior vilania, abjeção e fe- ação concreta de 1917, extraordinaria-
lonia que a conduta da imensa maioria mente original do ponto dê vista histórico
dos deputados socialistas e social- - foi fácil à Rússia começar a revolução so-
democratas no parlamento, durante e de- cialista; todavia, ser-lhe-á mais difícil que
pois da guerra. Contudo, deixar-se levar aos países europeus continuá-la e con-
por esses sentimentos ao resolver a ques- cluí-la. Já no começo de 1918 tive de assi-
tão de conto se deve lutar contra o mal nalar essa circunstância, e a experiência
universalmente reconhecido. Pode-se di- dos dois anos decorridos desde então
zer que, em muitos países da Europa veio confirmar inteiramente a justeza des-
Ocidental, o estado de espírito revolucio- sa consideração. Condições específicas
nário ainda é uma "novidade", uma "rari- como: 1) a possibilidade de conjugar a re-
dade" aguardada durante muito tempo, volução soviética com a cessação, graças
em vão e impacientemente, razão por a ela, da guerra imperialista, que havia es-
que, provavelmente, predomina com tan- gotado indescritivelmente os operários e.
ta facilidade. E' claro que sem um estado camponeses; 2) a possibilidade de tirar
de espírito revolucionário das massas e proveito, durante certo tempo, da luta
sem condições que favoreçam o desen- mortal em que estavam empenhados os
volvimento desse sentimento, a tática re- dois grupos mais poderosos de tubarões
volucionária não se transformará em imperialistas do mundo, grupos que não
ação; na Rússia, porém, uma experiência podiam unir-se contra o inimigo soviéti-
bastante longa, dura e sangrenta con- co; 3) a possibilidade de suportar uma
venceu-nos de que é impossível levar em guerra civil relativamente longa, em par-
conta apenas o estado de espírito revolu- te pela gigantesca extensão do país o
cionário para criar uma tática revolucio- pela deficiência de suas comunicações;
nária. A tática deva ser elaborada levan- 4) a existência entre os camponeses de

32
um movimento revolucionário democrá- gada e tenaz, sem retroceder diante de
tico-burguês tão profundo que o partido nenhuma dificuldade, para denunciar,
do proletariado pôde tornar suas as rei- desvanecer e superar tais preconceitos.
vindicações do partido dos camponeses
(do partido social-revoluc4onário, pro- Os "esquerdistas" alemães quei-
fundamente hostil, em sua maioria, ao xam-se dos. maus "chefes" de seu parti-
bolchevismo) e realizá-las imediatamen- do e caem no desespero, chegando ao ri-
te graças à conquista do Poder político dículo de "negar" os "chefes". Porém, em
pelo proletariado - não existem hoje na circunstâncias que obrigam freqüente-
Europa Ocidental. E a repetição dessas mente a mantê-los na clandestinidade, a
condições ou de outras semelhantes não formação de "chefes" bons, seguros, pro-
é nada fácil. Por isso, entre outras razões, vados é prestigiosos torna-se particular-
é mais difícil para a Europa Ocidental que mente difícil e é impossível vencer seme-
para nós começar a Revolução socialista. lhantes dificuldades sem a combinação
Tratar de "furtar-se" a essa dificuldade do trabalho legal com o ilegal, sem fazer
"saltando" por cima do árduo problema os "chefes" passarem, entre outras pro-
de utilizar os parlamentos reacionários vas, também pela do parlamento. A críti-
para fins revolucionários é pura infantili- ca - a mais implacável, violenta e intransi-
dade. Quereis criar uma sociedade nova gente - deve dirigir-se não contra o parla-
e temeis a dificuldade de criar uma boa mentarismo ou a ação parlamentar, mas
fração parlamentar de comunistas con- sim contra os chefes que não sabem - o
victos, abnegados e heróicos num parla- mais ainda contra os que não querem -
mento revolucionário! Isso não é, por aca- utilizar as eleições e a tribuna parlamen-
so, uma infantilidade? Se Karl Liebknecht tares de modo revolucionário, comunis-
na Alemanha e Z. Höglund na Suécia sou- ta. Somente essa crítica - ligada, natural-
beram, mesmo sem o apoio, vindo da mente, à expulsão dos chefes incapazes
base das massas, dar um exemplo de uti- e sua substituição por outros mais capa-
lização realmente revolucionária dos par- zes - constituirá um trabalho revolucioná-
lamentos revolucionários, como é possí- rio proveitoso e fecundo, que educará si-
vel que um partido revolucionário de mas- multaneamente os "chefes", para que se-
sas que cresce rapidamente não possa, jam dignos da classe operária e das mas-
em meio às desilusões o à ira do após- sas trabalhadoras, e as massas, para que
guerra das massas, forjar uma fração co- aprendam a orientar-se como é necessá-
munista nos piores parlamentos? rio na situação política e a compreender
Exatamente porque as massas atrasadas as tarefas, amiúde bastante complexas e
de operários e mais ainda - de pequenos confusas, que dessa situação decor-
camponeses estão muito mais imbuídas rem.*1
de preconceitos democrático-burgueses
e parlamentaristas na Europa Ocidental _______________
que na Rússia, exatamente por isso, so- * Foram muito poucas as possibili-
mente no seio de instituições como os dades que tive para conhecer o comunis-
parlamentos burgueses os comunistas mo "de esquerda" da Itália. Sem dúvida,
podem (e devem) travar uma luta prolon- o camarada Bordiga e sua fração de "co-

33
munistas boicotadores" (comunistas abs- querdistas" lançam essa palavra de or-
tencionistas) estão errados ao defender a dem. É triste ver como pessoas que, sem
não participação no parlamento. Mas há dúvida, se consideram marxistas e que-
um ponto em que, a meu ver, têm razão, rem sê-lo esqueceram as verdades fun-
pelo que posso julgar atendo-me a dois damentais do marxismo. Engels - que,
números de seu jornal Il Soviet (números como Marx, pertence a essa raríssima ca-
3 e 4 de 18-1 e 1-2 de 1920), a quatro nú- tegoria de escritores, em cujos grandes
meros (1, 2, 3 e 4, de 1-10 a 30-11 de trabalhos, - as frases têm todas, sem ex-
1919) da excelente revista do camarada ceção, uma assombrosa profundidade de
Serrati Comunismo e a números avulsos conteúdo - escrevia contra o Manifesto
de jornais burgueses italianos que pude dos 33 comunardos-blanquistas*1, em
ler. O camarada Bordiga e sua fração tem 1874, o seguinte:
razão precisamente quando atacam
Turati e seus partidários. que estão num " ... Somos comunistas", diziam em
partido que reconhece o Poder dos seu manifesto os comunardos-
Soviets e a ditadura do proletariado, con- blanquistas, "porque queremos atingir
tinuam' sendo membros do parlamento e nosso objetivo sem nos deter-mos em
prosseguem em sua antiga e perniciosa etapas intermediárias e sem compromis-
política oportunista. É natural que, ao to- sos, que nada mais fazem que tornar dis-
lerar isso, o camarada Serrati e todo o tante o dia da vitória e prolongar o perío-
Partido Socialista Italiano incorrem num do de escravidão".
erro tão cheio de prejuízos e perigos
como o havido na Hungria, onde os se- "Os comunistas alemães são comu-
nhores Turati locais sabotaram interna- nistas porque, através de todas as etapas
mente o Partido e o Poder dos Soviets. intermediárias e de todos os compromis-
Essa atitude errada, inconseqüente ou sos criados não por eles, mas pela mar-
sem caráter em relação aos parlamenta- cha da evolução histórica, vêem com cla-
res oportunistas, gera, por um lado, o co- reza e perseguem constantemente seu
munismo "de esquerda" e, por outro, jus- objetivo final: a supressão das classes e a
tifica até certo ponto a sua existência. É criação de um regime social onde não ha-
claro que o camarada Serrati não tem ra- verá lugar para a propriedade privada da
zão ao acusar de inconseqüência o depu- terra e de todos os meios de produção.
tado Turati (Comunismo, n.3) pois incon- Os 33 blanquistas são comunistas por
seqüente é, exatamente, o Partido imaginarem que basta seu desejo de sal-
Socialista Italiano, que tolera em seu seio tar as etapas intermediárias e os compro-
oportunistas parlamentares como Turati missos para que a coisa esteja feita, e por-
e Cia. (Nota do autor) que acreditam firmemente que "a coisa
arrebenta" num dia desses e o Poder cai
em suas mãos o "comunismo será im-
VIII - Nenhum compromisso ? plantado" no dia seguinte. Portanto, se
não podem fazer isto imediatamente,
Na citação do folheto de Francfort não são comunistas.
já vimos o tom decidido com que os "es-

34
"Que pueril ingenuidade a de apre- tando-se com a satisfação parcial de suas
sentar a própria impaciência como argu- reivindicações. Todo proletário, graças
mento teórico!" (F. Engels; Programa dos ao ambiente de luta de massas e do acen-
Comunardos-bIanquistas, no jornal soci- tuado agravamento dos antagonismos
al-democrata alemão Volksstaat*2 de classe em que vive, percebe a diferen-
,1874, pg 73, incluído na recompilação ça existente entre um compromisso im-
Artigos de 1817/1875, tradução russa, posto por condições objetivas (pobreza
Petrogrado, 1919, páginas 52/53). de fundos financeiros dos grevistas, que
não contam com apoio algum, passam
Engels expressa nesse mesmo arti- fome e estão extenuados ao máximo) -
go seu profundo respeito por Vaillant e compromisso que em nada diminui a ab-
fala dos "méritos indiscutíveis" deste negação revolucionária nem a disposição
(que foi, como Guesde, um dos chefes de continuar. A luta dos operários que o
mais destacados do socialismo internaci- assumiram - e um compromisso de trai-
onal antes de sua traição ao socialismo dores que atribuem a causas objetivas
em agosto de 1914). Mas Engels não dei- seu vil egoísmo (os fura-greves também
xa de analisar em todos os detalhes seu assumem "compromissos"!), sua covar-
erro evidente. É claro que os revolucioná- dia, seu desejo de atrair a simpatia dos ca-
rios muito jovens e inexperientes, assim pitalistas, sua falta de firmeza ante as
como os revolucionários pequeno- ameaças e, às vezes, ante as exortações,
burgueses mesmo de idade respeitável e as esmolas ou as adulados capitalistas
grande experiência, consideram extre- (esses compromissos de traidores são
mamente perigoso, incompreensível e er- particularmente numerosos na história
rôneo "autorizar que se firmem compro- do movimento operário inglês por parte
misso". E muitos sofistas (como politi- dos chefes da trade-unions, se bem que,
queiros ultra ou excessivamente "experi- sob uma ou outra forma, quase todos os
mentados") raciocinam do mesmo modo operários de todos os países tenham podi-
que os chefes do oportunismo inglês cita- do observar fenômenos semelhantes).
dos pelo camarada Lansbury: "Se os
Bolcheviques se permitem tal ou qual É claro que acontecem casos isola-
compromisso, por que nós não nos per- dos extraordinariamente difíceis e com-
mitimos qualquer compromisso?". Mas plexos, em que só através dos maiores es-
os proletários, educados por repetidas forços se pode determinar com exatidão
greves, (para só falar dessa manifesta- o verdadeiro caráter desse ou daquele
ção da luta de classes) assimilam habitu- "compromisso", do mesmo modo que há
almente de modo admirável a profundís- a casos de homicídio em que não é nada
sima verdade (filosófica, histórica, políti- fácil julgar se este era absolutamente jus-
ca e psicológica), enunciada por Engels. to e até obrigatório (como, por exemplo,
Todo proletário conhece greves, conhece em caso de legítima defesa) ou se era efei-
"compromissos" com os odiados opres- to de um descuido imperdoável, ou mes-
sores e exploradores, depois dos quais os mo conseqüência de um plano perverso
operários tiveram de voltar ao trabalho executado com habilidade. Não há dúvi-
sem haver conseguido nada ou conten- da de que em política, onde às vezes se

35
trata de relações nacionais o internacio- cie mais inadmissível, os compromissos
nais muito complexas entre as classes e de traição, que representam um oportu-
os partidos, se registrarão inúmeros ca- nismo funesto para a classe revolucioná-
sos muito mais difíceis que a questão de ria, e dedicar todos os esforços para ex-
saber se um compromisso assumido por plicar seu sentido e lutar contra elas.
ocasião de uma greve é legítimo ou se se Durante a guerra imperialista de
trata de uma perfídia de um fura-greve, 1914/1918 entre dois grupos de países
de um chefe traidor, etc. Preparar uma re- igualmente criminosos e vorazes, o prin-
ceita ou uma regra geral ("nenhum com- cipal e fundamental dos oportunismos foi
promisso"!) para todos os casos é um ab- o que adotou a forma de social-
surdo. É preciso ter a cabeça no lugar chovinismo, isto é, o apoio da "defesa da
para saber orientar-se em cada caso par- pátria", o que eqüivalia de fato, naquela
ticular. A importância de possuir uma or- guerra, à defesa dos interesses de rapina
ganização de partido com chefes dignos da "própria" burguesia. Depois da guerra
desse nome consiste precisamente, en- foi a defesa da espoliadora "Sociedade
tre outras coisas, em chegar - mediante das Nações", a defesa das alianças dire-
um trabalho prolongado, tenaz, múltiplo tas ou indiretas com a burguesia do pró-
e variado de todos os representantes de prio país contra o proletariado revolucio-
uma determinada classe capazes de pen- nário e, o movimento "soviético" e a defe-
sar*3 - a elaborar os conhecimentos e a sa da democracia o do parlamentarismo
experiência necessários e, além dos co- burgueses contra o "Poder dos Soviets".
nhecimentos e experiência, a sagacidade Foram essas as principais manifestações
política exata para resolver bem e rapida- desses compromissos inadmissíveis e trai-
mente as questões políticas complexas. dores que, em seu conjunto, culminaram
num oportunismo funesto para o proleta-
As pessoas ingênuas e totalmente riado revolucionário e sua causa.
inexperientes pensam que basta admitir
os compromissos em geral para que desa- " ... Repelir do modo mais categóri-
pareça completamente a linha divisória co todo compromisso com os demais par-
entre o oportunismo, contra o qual sus- tidos... toda política de manobra e conci-
tentamos e devemos sustentar uma luta liação", dizem os esquerdistas da
intransigente, e o marxismo revolucioná- Alemanha no folheto de Francfort.
rio ou comunismo. Mas essas pessoas, se
ainda não sabem que todas as linhas divi- É surpreendente que, com seme-
sórias na natureza o na sociedade são va- lhantes idéias, esses esquerdistas não
riáveis e até certo ponto convencionais, condenem categoricamente o
só podem ser ajudadas mediante o estu- Bolchevismo! Não é possível que os es-
do prolongado, a educação, a ilustração e querdistas alemães ignorem que toda a
a experiência política e prática. Nas ques- história do bolchevismo, antes e depois
tões práticas da política de cada momen- da Revolução de Outubro, está cheia de
to particular ou específico da história é im- casos de manobra, de acordos e compro-
portante saber distinguir aquelas em que missos com outros partidos, inclusive os
se manifestam os compromissos da espé- partidos burgueses!

36
de mercadorias do país em que ela foi der-
Fazer a guerra para derrotar a bur- rubada. Só se pode vencer um inimigo
guesia internacional, uma guerra cem ve- mais forte retesando e utilizando todas as
zes mais difícil, prolongada e complexa forças e aproveitando obrigatoriamente
que a mais encarniçada das guerras co- com o maior cuidado, minúcia, prudência
muns entre Estados, e renunciar de ante- e habilidade a menor "brecha" entre os
mão a qualquer manobra, a explorar os inimigos, toda contradição de interesses
antagonismos de interesses (mesmo que entre a burguesia dos diferentes países,
sejam apenas temporários) que dividem entre os diferentes grupos ou categorias
nossos inimigos, renunciar a acordos e da burguesia dentro de cada país; tam-
compromissos com possíveis aliados (ain- bém é necessário aproveitar as menores
da que provisórios, inconsistentes, vaci- possibilidades de conseguir um aliado de
lantes, condicionais), não é, por acaso, massas, mesmo que temporário, vacilan-
qualquer coisa de extremamente ridícu- te, instável, pouco seguro, condicional.
lo? Isso não será parecido com o caso de Quem não compreende isto, não com-
um homem que na difícil subida de uma preende nenhuma palavra de marxismo
montanha, onde ninguém jamais tivesse nem de socialismo científico, contempo-
posto os pés, renunciasse de antemão a râneo, em geral. Quem não demonstrou
fazer zigue-zagues, retroceder algumas na prática, durante um período bem con-
vezes no caminho já percorrido, abando- siderável e em situações políticas bastan-
nar a direção escolhida no início para ex- te variadas, sua habilidade em aplicar
perimentar outras direções? E pensar esta verdade à vida, ainda não aprendeu
que pessoas tão pouco conscientes, tão a ajudar a classe revolucionária em sua
inexperientes (menos mal se a causa dis- luta para libertar toda a humanidade tra-
so é a juventude de tais pessoas, juven- balhadora dos exploradores. E isso apli-
tude cujas características autorizam que ca-se tanto ao período anterior à con-
se digam semelhantes tolices durante cer- quista do Poder político pelo proletariado
to tempo) puderam ser apoiadas direta como ao posterior.
ou indiretamente, franca ou veladamen-
te, total ou parcialmente, pouco importa, Nossa teoria, diziam Marx e Engels,
por alguns membros do Partido não é um dogma, mas sim um guia para a
Comunista Holandês!! ação, e o grande erro, o imenso crime de
marxista; "registrados", como Karl
Depois da primeira revolução soci- Kautski, Otto Bauer e outros consiste em
alista do proletariado, depois da derruba- não haver compreendido essa afirmação,
da da burguesia num pais, o proletariado em não haver sabido aplicá-la nos mo-
desse país continua sendo durante muito mentos mais importantes da revolução
tempo mais débil que a burguesia, em vir- proletária. "A ação política não se parece
tude, simplesmente,, das imensas rela- em nada com a calçada da avenida
ções internacionais que ela tem e graças Nevsk! (a calçada larga, limpa e lisa da
à restauração, ao renascimento espontâ- rua principal de Petersburgo, rua absolu-
neo e contínuo do capitalismo e da bur- t a m e n t e r e t a ) , j á d i z i a N . G .
guesia através dos pequenos produtores Chernishevski, o grande socialista russo

37
do período pré-marxista. Desde a época vam como socialistas.
de Chernishevski, os revolucionários rus-
sos pagaram com inúmeras vítimas a Em 1917, os bolcheviques constitu-
omissão ou esquecimento dessa verda- íram, por pouco tempo, um bloco político
de. É preciso conseguir a todo custo que formal com os "social-revolucionários"
os comunistas de esquerda e os revoluci- para as eleições da Duma. Com os men-
onários da Europa Ocidental e da cheviques, estivemos formalmente du-
América fiéis à classe operária paguem rante vários anos, de 1903 a 1912, num
menos caro que os atrasados russos a as- partido social-democrata único, sem in-
similação dessa verdade. terromper nunca a luta ideológica e polí-
tica contra eles como portadores da in-
Os social-democratas revolucioná- fluência burguesa no seio do proletariado
rios da Rússia aproveitaram repetidas ve- e como oportunistas. Durante a guerra as-
zes antes da queda do tzarismo os servi- sumimos uma espécie de compromisso
ços dos liberais burgueses, isto é, conclu- com os "kautskistas", os mencheviques
íram com eles inúmeros compromissos de esquerda (Martov) e urna parte do "so-
práticos, e em 1901/1902, mesmo antes c i a l - r e v o l u c i o n á r i o s " ( C h e r n o v,
do nascimento do bolchevismo, a antiga Natanson). Assistimos com eles às confe-
redação da Iskra (na qual participávamos rências de Zimmerwal,d e Kienthal e lan-
Plekhanov, Axelrod, Zasúlich, Martov, çamos manifestos conjuntos, mas nunca
Potresov e eu) concertou - (é verdade interrompemos nem atenuamos a luta po-
que por pouco tempo) uma aliança políti- lítica e ideológica contra os "kautskistas",
ca formal com Struve, chefe político do li- contra Martov e Chernov. (Natanson mor-
beralismo burguês, sem deixar de sus- reu em 1919 sendo já um "comunista re-
tentar, simultaneamente, a luta ideológi- volucionário" -populista, muito chegado
ca e política mais implacável contra o libe- a nós e quase solidário conosco). No mo-
ralismo burguês e contra as menores ma- mento da Revolução de Outubro fizemos
nifestações de sua influência no seio do um bloco político, não formal, mas muito
movimento operário. Os bolcheviques importante (e muito eficaz) com o cam-
sempre praticaram essa mesma política. pesinato pequeno-burguês, aceitando na
Desde 1905 defenderam sistematica- íntegra, sem a mais leve modificação, o
mente a aliança da classe operária com p r o g r a m a a g r á r i o d o s s o c i a l -
os camponeses contra a burguesia liberal revolucionários, isto é, contraímos um
e o tzarismo sem negar-se nunca, ao mes- compromisso indubitável para provar aos
mo tempo, a apoiar a burguesia contra o camponeses que não nos queríamos im-
tzarismo (na segunda fase das eleições por e sim chegar a um acordo com eles.
ou nos empates eleitorais, por exemplo) Ao mesmo tempo, propusemos aos "soci-
e sem interromper a luta ideológica e polí- al-revolucionários de esquerda" (e depo-
tica mais intransigente contra o partido is o realizamos) um bloco político formal
camponês revolucionário-burguês, os com participação no governo, bloco que
"social-revolucionários", que eram de- eles romperam depois da paz de Brest,
nunciados como democratas pequeno- chegando, em julho de 1918, à insurrei-
burgueses que falsamente se apresenta- ção armada e, mais tarde, à luta armada

38
contra nós. Não há dúvida de que uma das cau-
sas foi a tática errada dos comunistas ale-
É fácil, por conseguinte, compre- mães, que devem reconhecer seu erro
ender que o ataque dos esquerdistas ale- honradamente e , sem temor, e aprender
mães ao Comitê Central do Partido a corrigi-lo. O erro consistiu em negar-se
Comunista da Alemanha, em virtude des- a participar no parlamento reacionário,
te admitir a idéia de um bloco com os "in- burguês, e nos sindicatos reacionários; o
d e p e n d e n t e s " ( " Pa r t i d o S o c i a l - erro consistiu em múltiplas manifesta-
democrata, Independente da ções dessa doença infantil do "esquerdis-
Alemanha", os kautskistas) pareçam-nos mo", que agora se manifestou e que, gra-
carecer de seriedade e que vejamos ne- ças a isso, será curada melhor, mais rapi-
les uma demonstração evidente da posi- damente e com maior proveito para o or-
ção errada dos "esquerdistas". Na Rússia ganismo.
também havia mencheviques de direita
(que participaram do governo de O "Partido Social-democrata
Kerenski), equivalentes aos Independente" alemão. carece, visivel-
Scheidemann da Alemanha, e menchevi- mente, de homogeneidade; ao lado dos
ques de esquerda (Martov), que se opu- antigos chefes oportunistas (Kautski,
nham aos mencheviques de direita e eqüi- Hilferding e, pelo que se vê, em grande
valiam aos kautskistas alemães. Em parte Crispien, Ledebour e outros), que
1917, assistimos plenamente à passa- demonstraram sua incapacidade para
gem gradual das massas operárias ,dos compreender a significação do Poder
mencheviques; para os bolcheviques. No Soviético e da ditadura do proletariado e
1º Congresso dos Soviets de toda a para dirigir a luta revolucionária deste,
Rússia, celebrado em junho desse ano, tí- formou--se e cresce com singular rapi-
nhamos uns 137o dos votos. A maioria dez, nesse partido, uma ala esquerda,
pertencia aos social-revolucionários e proletária. Centenas de milhares de mem-
aos mencheviques. No II Congresso dos bros do partido - que tem, ao que parece,
Soviets (25 de outubro de 1917, segundo uns 750 000 membros - são proletários
o antigo calendário) tínhamos 51% dos que se afastam de Scheidemann e cami-
sufrágios. Por que será que na Alemanha nham a largas passadas em direção ao co-
uma tendência igual, absolutamente idên- munismo. Esta ala proletária já no
tica, dos operários passarem da direita Congresso dos independentes, realizado
para a esquerda não levou ao fortaleci- em Leipzig em 1919, propôs a adesão
mento imediato dos comunistas, mas imediata e incondicional à III
sim, no inicio, ao do partido intermediário Internacional. Temer um "compromisso"
dos "independentes", embora esse parti- com essa ala do partido é simplesmente
do nunca tenha tido nenhuma idéia políti- ridículo. Pelo contrário, para os comunis-
ca independente e nenhuma política inde- tas é obrigatório procurar e encontrar
pendente, nem tenha feito outra coisa uma forma adequada de compromisso
que vacilar entre Scheidemann e os comu- com ela, que permita, de um lado, facili-
nistas ? tar a apressar a fusão completa e neces-
sária com ela e que, de outro, não entra-

39
ve de modo algum os comunistas em bém depois dela, a aplicação de uma táti-
suar luta ideológica e política contra a ala ca de manobras, acordos, compromis-
direita, oportunista, dos "independen- sos, ainda que de tal natureza, é claro,
tes". É provável que não seja fácil elabo- que facilitavam e apressavam a vitória
rar uma forma adequada de compromis- dos bolcheviques, além de consolidar e
so, mas só um charlatão poderia prome- fortalecê-los às custas dos menchevi-
ter aos operários e aos comunistas ale- ques. Os democratas pequeno-
mães um caminho "fácil" para alcançar a burgueses (inclusive os mencheviques)
vitória., vacilavam inevitavelmente entre a bur-
guesia e o proletariado, entre a democra-
O capitalismo deixaria de ser capi- cia burguesa e o regime soviético, entre o
talismo se o proletariado "puro" não esti- reformismo e o revolucionarismo, entre o
vesse rodeado de uma massa de elemen- amor aos operários e o medo da ditadura
tos de variadíssimas graduações, ele- do proletariado, etc. A tática acertada
mentos que representam a transição do dos comunistas deve consistir em utilizar
proletário ao semiproletário (o aue ob- essas vacilações e não, de modo algum,
tém grande parte de seus meios de exis- em desprezá-las; para utilizá-las é neces-
tência vendendo sua força de trabalho), sário fazer concessões aos elementos
do semiproletário ao pequeno camponês que se inclinam para o proletariado - no
(e ao pequeno artesão, ao biscateiro, ao caso e na medida exatos em que o fazem
pequeno patrão em geral) do pequeno - e, ao mesmo tempo, lutar contra os ele-
camponês ao camponês médio, etc., e se mentos que se inclinam para a burguesia.
no próprio seio do proletariado não hou- Em virtude de seguirmos uma tática acer-
vesse setores com um maior ao menor de- tada, o menchevismo se foi decompondo
senvolvimento, divisões de caráter terri- e se decompõe cada vez mais em nosso
torial, profissional, às vezes religioso, etc. país; essa tática foi isolando os chefes
De tudo isso se depreende imperiosa- obstinados no oportunismo e trazendo
mente a necessidade uma necessidade para o nosso campo os melhores operári-
absoluta - que tem a vanguarda do prole- os, os melhores elementos da democra-
tariado, sua parte consciente, o Partido cia pequeno-burguesa. Trata-se de um
Comunista, de recorrer à manobra aos processo longo, e as "soluções" fulmi-
acordos, aos compromissos com os di- nantes, tais como "nenhum compromis-
versos grupos proletários, com os diver- so", nenhuma manobra, só podem difi-
sos partidos dos operários e dos peque- cultar o crescimento da influência do pro-
nos patrões. Toda a questão consiste em letariado revolucionário e o aumento de
saber aplicar essa tática para elevar, e suas forças.
não para rebaixar, o nível geral de cons-
ciência, de espírito revolucionário e de ca- Finalmente, um dos erros incontes-
pacidade de luta e de vitória do proletari- tes dos "esquerdistas" da Alemanha con-
ado. É preciso assinalar, entre outras coi- siste em sua insistência inflexível em não
sas, que a vitória dos bolcheviques sobre reconhecer o Tratado de Versailles.
os mencheviques exigiu da Revolução de Quanto maiores são a "firmeza" e a "im-
Outubro de 1917, não só antes como tam- portância" e o tom "categórico" e sem

40
apelação com que formula esse ponto de fracassar) a aliança com a Rússia
vista K. Horner, por exemplo, menos inte- Soviética e com a Hungria Soviética. Nós,
ligente resulta. Não basta renegar as in- comunistas, procuraremos por todos os
dignantes tolices do bolchevismo nacio- meios facilitar e preparar essa aliança;
nal (Lauffenberg e outros), que, nas atua- quanto à paz de Versailles, não estamos
is condições da revolução proletária in- de modo algum obrigados a rechaçá-la a
ternacional, chegou até a falar na forma- todo custo e, além disso, imediatamente.
ção de uma aliança com a burguesia ale- A possibilidade de rechaçá-la eficazmen-
mã para a guerra contra a Entente. É pre- te depende dos êxitos do movimento so-
ciso compreender que é absolutamente viético não só na Alemanha, como tam-
errônea a tática que nega a. obrigação da bém no terreno internacional. Este movi-
Alemanha Soviética (se surgisse rapida- mento foi dificultado pelos Scheidemann
mente uma república soviética alemã) de e os kautskistas; nós o favorecemos.
reconhecer durante certo tempo o Nisso reside a essência da questão, a dife-
Tratado de Versailles e submeter-se a ele. rença radical. E se nossos inimigos de
Daí não se deduz que os "independentes" classe, os exploradores e seus lacaios, os
tiveram, razão ao reclamar a assinatura Scheidemann e os kautskistas, deixaram
do Tratado de Versailles nas condições en- escapar uma série de possibilidades de
tão existentes, quando os Scheidemann fortalecer o movimento soviético alemão
estavam no governo, ainda não havia e internacional e a revolução soviética ale-
sido derrubado o Poder Soviético na mã e internacional, a culpa é deles. A re-
Hungria e ainda não estava excluída a volução soviética na Alemanha robuste-
possibilidade de uma ajuda da revolução cerá o movimento soviético internacio-
soviética em Viena para apoiar a Hungria nal, que é o reduto mais forte (e o único
Soviética. Naquele momento, os "inde- seguro invencível e de potência univer-
pendentes" manobraram muito mal, pois sal) contra o Tratado de Versailles e con-
tomaram para si a responsabilidade, mai- tra o imperialismo mundial em geral.
or ou menor, por traidores tipo Colocar obrigatoriamente, a todo preço e
Scheidemann e se desviaram em maior imediatamente em primeiro plano a de-
ou menor escala da luta de classes impla- núncia do Tratado de Versailles, antes da
cável (e friamente arquitetada) contra os questão de libertar do jugo imperialista
Scheidemann para colocar-se "fora" ou os demais países oprimidos pelo imperia-
"acima" das classes. lismo, é uma manifestação de nacionalis-
mo pequeno-burguês (digno dos
Mas a situação atual é de tal natu- Kautsky, Hilferding, Otto Bauer & Cia.)
reza, que os comunistas alemães não de- mas não de internacionalismo revolucio-
vem amarrar-se as mãos e prometer a re- nário. A derrubada da burguesia em qual-
núncia obrigatória e indispensável ao quer dos grandes países europeus, inclu-
Tratado de Versailles em caso de triunfar sive Alemanha, é um acontecimento tão
o comunismo. Isso seria uma tolice. É pre- favorável para a revolução internacional
ciso que se diga: os Scheidemann e os ka- que, em proveito dessa derrubada, pode-
utskistas cometeram .uma série de trai- mos e devemos aceitar, se for necessário,
ções que dificultaram (e em parte fizeram uma existência mais prolongada do.

41
Tratado de Versailles. Se a Rússia pôde re- mais excepcional florescimento, de todas
sistir sozinha durante vários meses ao as suas forças espirituais gerado pelas cir-
Tratado de Brest, com proveito para a re- cunstâncias do momento, conta - e con-
volução, não é nada impossível que a tará inevitavelmente enquanto subsisti-
Alemanha Soviética, aliada à Rússia rem as classes e a sociedade sem classes
Soviética, possa suportar mais tempo não estiver assentada, consolidada e de-
com proveito para a revolução o Tratado senvolvida por completo sobre seus pró-
de Versailles. prios fundamentos ~ Com representan-
tes que não pensam e que são incapazes
Os imperialistas da França, de pensar. 0 capitalismo não seria o capi-
Inglaterra, etc., provocam os comunistas talismo opressor das massas se isso não
alemães, preparando-lhes essa armadi- acontecesse. (Nota do autor)
lha: "Digam que não assinarão o Tratado
de Versailles". E os comunistas "de es- IX - 0 comunismo "de esquerda",
querda" caem como patinhos na armadi- na Inglaterra
lha, em vez de manobrar com destreza
contra um inimigo traiçoeiro e, no mo- Na Inglaterra ainda não existe o
mento atual, mais forte, em vez de dizer- Partido Comunista, mas entre os operári-
lhe: "Agora assinaremos o Tratado de os observa-se um movimento comunista
Versailles". Amarrarmos as mãos anteci- jovem, amplo, poderoso, que cresce com
padamente, declarar abertamente ao ini- rapidez e permite que se alimentem as
migo, hoje melhor armado que nós, que mais radiosas esperanças. Há alguns par-
vamos lutar contra ele e em que momen- tidos e organizações políticas, ("Partido
to, é uma tolice e nada tem de revolucio- Socialista Britânico"17 , "Partido
nário. Aceitar o combate quando é clara- Socialista Operário", "Sociedade
mente vantajoso para o inimigo e não Socialista do Sul de Gales", "Federação
para nós constitui um crime, e não ser- Socialista Operaría"18 que desejam fun-
vem para nada os políticos da classe revo- dar o Partido Comunista e que, para isso,
lucionária que não sabem "manobrar", já fazem negociações entre si. O Workers
que não sabem concertar "acordos e com- Dreadnought (t. VI, n.º. 48, de
promissos" a fim de evitar um combate 21/11/1920), semanário da última das or-
que todos sabem ser desfavorável. ganizações citadas, dirigido pela camara-
da Sylvia Pankhurst, publicou um artigo
_______________ escrito por ela, intitulado, Rumo ao
* Partidários de Louis Auguste Partido Comunista. Nele está exposta a
Blanqui, participantes da Comuna de marcha das negociações entre as quatro
Paris. (Nota do tradutor) organizações citadas para constituir um
Partido Comunista único, baseado na ade-
*2 O Estado Popular. (Nota da são à II Internacional o no reconheci-
Redação) mento, em vez do parlamentarismo, do
sistema soviético e da ditadura do prole-
*3 Mesmo no país mais culto, toda tariado. Acontece que um dos principais
classe, inclusive a mais avançada e com o obstáculos para a criação imediata de um

42
Partido Comunista único é a falta de una- dústrias (nos diversos setores da produ-
nimidade no que concerne à participação ção) e um Partido Comunista, baseado
no parlamento e à adesão do novo em Comitês sociais, no país inteiro.
Partido Comunista ao velho "Partido Durante muito tempo altercamos com os
Trabalhista" oportunista, social- parlamentares oficiais. Não achamos ne-
chovinista e profissionalista, integrado cessário declarar-lhes guerra abertamen-
predominantemente por trade-unions. A te e eles temem iniciar o ataque contra
"Federação Socialista Operária" e o "Par- nós.
tido Socialista Operário"*1 pronunciam-
se contra a participação nas eleições par- Semelhante estado de coisas, po-
lamentares e no parlamento, e contra a rém, não pode prolongar-se muito. Nós
adesão ao "Partido Trabalhista", discor- triunfamos em toda a linha.
dando quanto a isso de todos ou da maio-
ria dos membros do Partido Socialista Os membros de base do Partido
Britânico, que, é, na sua opinião, "a ala di-
Trabalhista Independente da Escócia tem
reita dos Partidos Comunistas" na uma repugnância cada vez maior pela
Inglaterra (pág. 5, artigo citado de Sylvia
idéia do parlamento, e quase todos os
Pankhurst). grupos locais são partidários dos Soviets
(no texto inglês emprega-se o termo rus-
A divisão fundamental é, portanto, so) ou Conselhos Operários. Sem dúvida,
a mesma que na Alemanha, malgrado as isso tem considerável importância para
enormes diferenças de forma em que se os senhores que consideram a política
manifestam as divergências (na um meio de vida (como se fosse uma pro-
Alemanha essa forma é muito mais pare- fissão) e põem em jogo todos os métodos
cida "com a russa" que na Inglaterra), para persuadir seus membros a voltarem
além de muitas outras circunstâncias. para o parlamentarismo. Os camaradas
Examinemos os argumentos dos "es- revolucionários não devem (todos os gri-
querdistas". fos são do autor) apoiar esse bando.
Nesse terreno, nossa luta será muito difí-
Ao falar da participação no parla- cil. Um dos seus piores aspectos consisti-
mento, a camarada Sylvia Pankhurst alu- rá na traição daqueles cuja ambição pes-
de a uma carta à Redação do camarada soal é um motivo mais forte que seu inte-
W. Gallacher, publicada no mesmo núme- resse pela revolução. Qualquer apoio ao
ro, o qual, em nome do "Conselho parlamentarismo eqüivale a contribuir
Operário da Escócia", de Glasgow, escre- para que o Poder caia nas mãos dos
ve: Scheidemann e Noske britânicos.
Henderson. Clynes, & Cia são reacionári-
"Este Conselho é definidamente an- os irrecuperáveis. O Partido Trabalhista
tiparlamentarista e está apoiado pela ala Independente oficial cai, cada vez mais
esquerda de várias organizações políti- sob o controle dos liberais burgueses,
cas. Representamos o movimento revo- que encontraram um refúgio espiritual no
lucionário na Escócia, que pretende criar campo dos senhores MacDonald,
uma organização revolucionária nas in- Snowden e companhia. O Partido

43
Trabalhista Independente oficial é violen- ses ou outros erros em que podem incor-
tamente hostil à III Internacional, mas a rer ou incorrem os homens mais fiéis à ca-
massa é partidária dela. Apoiar, seja usa revolucionária são capazes de preju-
como for, os parlamentaristas oportunis- dicá-la. A carta dirigida à Redação pelo ca-
tas significa simplesmente fazer o jogo marada Gallacher mostra de modo incon-
desses senhores. O Partido Socialista teste, o germe de todos os erros que co-
Britânico nada significa... Precisa-se é de metem os comunistas "de esquerda" ale-
uma boa organização revolucionária in- mães e em que incorreram os bolchevi-
dustrial e de um Partido Comunista que ques "de esquerda" russos em 1908 e
atue em bases claras, bem definidas, cien- 1918.
tíficas. Se nossos camaradas podem aju-
dar-nos a criar ambas as coisas, aceitare- O autor da carta está imbuído do
mos de bom gosto sua ajuda; se não po- mais nobre ódio proletário aos "políticos
dem, por Deus, não se metam nisso, se de classe " da burguesia (ódio compreen-
não querem trair a Revolução apoiando sível e suscetível de penetrar, por outro la-
os reacionários, que tão cuidadosamente do, não só nos proletários, como em to-
tratam de adquirir o "honroso" (?) (a in- dos os. trabalhadores, todos os "peque-
terrogação é do autor) titulo de parla- nos", para empregar a expressão alemã).
mentar e que ardem de desejos de de- Esse ódio de um representante das mas-
monstrar que são capazes de governar sas oprimidas e exploradas é, na verda-
tão bem quanto os próprios "amos", os de, o "princípio de toda a sabedoria", a
políticos de classe". base de todo movimento socialista e co-
munista e de seus êxitos. Mas o autor não
Esta carta à Redação exprime admi- leva em conta, pelo visto, que a política é
ravelmente, na minha opinião, o estado uma ciência e uma arte que não caem do
de espirito e o ponto de vista dos comu- céu, que não se obtêm gratuitamente, e
nistas jovens e dos operários comuns que que se o proletariado quiser vencer a bur-
apenas começam a chegar ao comunis- guesia deve formar seus "políticos de clas-
mo. Esse estado de espírito é altamente se", proletários, e de tal envergadura que
consolador e valioso: é preciso saber não sejam inferiores aos políticos bur-
apreciá-lo e apoiá-lo, porque sem ele se- gueses.
ria para desanimar da vitória da revolu-
ção proletária na Inglaterra (e em qual- O autor compreendeu de modo ad-
quer outro país). É preciso conservar cui- mirável que não é o parlamento, e sim
dadosamente e ajudar com toda a solici- apenas os Soviets operários que podem
tude os homens que sabem expressar constituir o instrumento necessário do
esse estado de ânimo das massas e sus- proletariado para atingir seus objetivos.
citá-lo (pois muito amiúde ele permanece E, naturalmente, quem até agora não
oculto, inconsciente, adormecido). Mas, compreendeu isso, é o pior dos reacioná-
ao mesmo tempo, é mister dizer-lhes, cla- rios, mesmo que seja o homem mais cul-
ra e sinceramente que, por si só, esse es- to, o político mais experiente, o socialista
pírito é insuficiente para dirigir as massas mais sincero, o marxista mais erudito, o
na grande luta revolucionária, e que es- mais honrado cidadão e chefe de família.

44
Há, porém, uma questão que o autor não nar clara essa idéia usarei dois documen-
apresenta e nem sequer pensa que seja tos políticos ingleses atuais : 1) o discur-
necessário apresentar; se se pode levar so pronunciado pelo Primeiro Ministro
os Soviets à vitória sobre o parlamento Lloyd George a 18 de março de 1920 (se-
sem fazer com que os políticos "soviéti- gundo o texto do The Manchester
cos" entrem no parlamento, sem decom- Guardian de 19 do mesmo mês) e 2) os ar-
por o parlamentarismo estando dentro gumentos de uma comunista "de esquer-
dele, sem preparar no interior do parla- da", camarada Sylvia Pankhurst, no arti-
mento o êxito dos Soviets no cumprimen- go citado.
to de sua tarefa de acabar com o parla-
mento. Contudo, o autor exprime uma Em seu discurso, Lloyd George pole-
idéia absolutamente justa ao dizer que o miza com Asquith (que fora convidado es-
Partido Comunista Inglês deve atuar em pecialmente para a reunião, mas que se
bases científicas. A ciência exige, em pri- negou a assisti-la) e com aqueles liberais
meiro lugar, que se leve em conta a expe- que querem uma aproximação com o
riência dos demais países, sobretudo se Partido Trabalhista e não a coalizão com
esses países, também capitalistas, pas- os conservadores. (Na carta dirigida à
sam ou passaram há pouco por uma expe- Redação pelo camarada Gallacher vimos
riência bastante parecida ; em segundo também uma alusão à passagem de al-
lugar, exige que se levem em conta todas guns liberais ao Partido Trabalhista
as forças, todos os grupos, partidos, clas- Independente). Lloyd George demonstra
ses e massas que atuam dentro do pais que é necessária uma coalizão dos libera-
considerado, em vez de determinar a polí- is com os conservadores, inclusive uma
tica baseando-se exclusivamente nos de- coalizão estreita, pois de outro modo a vi-
sejos e opiniões, no grau de consciência e tória pode ser alcançada pelo Partido
de preparação para a luta de um só grupo Trabalhista,. que Lloyd George "prefere
ou partido. chamar" de socialista e que aspira "à pro-
priedade coletiva" dos meios de produ-
É certo que os Henderson, Clynes, ção. "Na França isso se chamava comu-
MacDonald e Snowden são reacionários nismo" - explica em linguagem popular o
irrecuperáveis. E também é certo que chefe da burguesia inglesa a seus ouvin-
querem tomar o Poder (ainda que prefi- tes, membros do Partido Liberal parla-
ram a coalizão com a burguesia), que que- mentar, que, com certeza, até então igno-
rem "governar", de acordo com as ranço- ravam isso – "na Alemanha chamava-se
sas normas burguesas e que, uma vez de socialismo; na Rússia chama-se bolche-
posse do Poder, procederão inevitavel- vismo". Para os liberais isso é inadmissí-
mente como os Scheidemann e os Noske. vel por princípio, esclarece Lloyd George,
Tudo isso é verdade; mas dai não se de- pois os liberais são, por princípio, defen-
duz, absolutamente, que apoiá-los eqüi- sores da propriedade privada. "A civiliza-
vale a trair a revolução, mas sim que, no ção está em perigo", declara o orador, ra-
interesse dela, os revolucionários da clas- zão por que devem unir-se liberais e con-
se operária devem conceder a esses se- servadores...
nhores certo apoio parlamentar. Para tor-

45
"... Se vocês forem aos distritos Partido Trabalhista por parte desses mes-
agrícolas - diz Lloyd George - verão con- mos operários que hoje nos apoiam tão
servadas, reconheço, as antigas divisões sinceramente?
do partido. Lá, o perigo está longe, não
existe. Mas quando o perigo lá chegar, O Primeiro Ministro: Sou de opinião
será tão grande como o é hoje em alguns completamente diferente. O fato de os li-
distritos industriais. Quatro quintos de berais lutarem entre si leva, sem dúvida,
nosso país dedicam-se à Indústria e ao co- um número bastante considerável deles,
mércio; apenas um quinto vive da agri- movidos pelo desespero, para as fileiras
cultura. Eis uma das circunstâncias que do Partido Trabalhista, onde há muitos li-
sempre tenho em mente quando penso berais bastante capazes que hoje se ocu-
nos perigos com que o futuro nos amea- pam em desacreditar o governo. O resul-
ça. Na França, a população é agrícola e tado dessa luta entre os liberais, eviden-
por isso constitui uma base sólida de de- temente, é um importante movimento da
terminadas opiniões, base que não se mo- opinião pública em favor do Partido
difica tão rapidamente e que não é facil- Trabalhista. A opinião pública inclina-se
mente excitável pelo movimento revolu- não para os liberais que estão fora do
cionário. Em nosso país a coisa é diferen- Partido Trabalhista, mas sim para este,
te. Nosso pais é menos estável que qual- como mostram as eleições parciais".
quer outro, e se se começar a vacilar, a ca-
tástrofe aqui será, em virtude dos moti- Digamos, de passagem, que esses
vos citados, mais forte que nos demais pa- raciocínios provam de modo singular até
íses". que ponto se confundiram e não podem
deixar de cometer desatinos irreparáveis
Através dessas citações, o leitor os mais inteligentes homens da burgue-
pode perceber que o Sr. Lloyd George sia. É isto que a fará perecer. Nossos ca-
não só é muito inteligente, como também maradas podem até fazer tolices (con-
que aprendeu muito com os marxistas. tanto, é claro, que não sejam muito con-
Nós também não faríamos nenhum mal sideráveis e possam ser reparadas a tem-
em aprender com Lloyd George. po) e, não obstante, acabarão por triun-
far.
É igualmente interessante registrar
o seguinte episódio da discussão havida 0 segundo documento político são
depois do discurso de Lloyd George: as seguintes considerações da comunista
"de esquerda" camarada Sylvia
"G. Wallace: Gostaria de perguntar Pankhurst:
como encara o primeiro ministro os resul-
tados de sua política nos, distritos indus- "...0 camarada Inkpin (secretário
triais no que concerne aos operários in- do Partido Socialista Britânico) denomina
dustriais, muitos dos quais são hoje libe- o Partido Trabalhista de "a principal orga-
rais e nos concedem tão grande apoio. nização do movimento da classe operá-
Não se pode prever um resultado que pro- ria". Outro camarada do Partido
voque um aumento enorme da força do Socialista Britânico expressou ainda com

46
mais relevo o ponto de vista desse parti- do. Dentro de pouco tempo o Partido
do na Conferência da III Internacional. Trabalhista estará no governo; a oposi-
"Consideramos o Partido Trabalhista - dis- ção revolucionária deve estar preparada
se - como a classe operária organizada". para empreender o ataque contra ele..."

Não compartilhamos dessa opinião Assim, pois, a burguesia liberal re-


a respeito do Partido Trabalhista. Ele é nuncia ao sistema dos "dois partidos"
muito importante do ponto de vista numé- (dos exploradores), consagrado no
rico, embora seus membros sejam; em transcurso da história por uma experiên-
grande parte, inertes e apáticos; trata-se cia secular e extremamente proveitoso
de operários e operárias que entraram para os exploradores, considerando ne-
para as trade-unions porque seus com- cessária a união de suas forças a fim de lu-
panheiros de oficina são trade-unionistas tar contra o Partido Trabalhista. Uma par-
e porque desejam receber seguros e pen- te dos liberais, como os ratos de um navio
sões. que afunda, corre para o Partido
Trabalhista. Os comunistas de esquerda
Reconhecemos, porém, que a im- consideram inevitável a passagem do
p o r t â n c i a n u m é r i c a d o Pa r t i d o Poder para as mãos do Partido
Trabalhista obedece também ao fato de Trabalhista e reconhecem que a maior
ser esse partido fruto de uma escola de parte dos operários está atualmente a fa-
pensamento, cujos limites ainda não fo- vor desse partido. De tudo isso, chegam
ram ultrapassados pela maioria da classe à estranha conclusão assim formulada
operária britânica, embora se preparem pela camarada Sylvia Pankhurst :
grandes modificações na mentalidade do
povo que transformarão brevemente "0 Partido Comunista não deve as-
esse estado de coisas... " sumir compromissos... Deve conservar
pura a sua doutrina e imaculada a sua in-
"... 0 Partido Trabalhista Britânico, dependência frente ao reformismo; sua
como as organizações social-patriotas missão é marchar na vanguarda, sem de-
dos demais países, chegará inevitavel- ter-se ou desviar-se de seu caminho,
mente ao Poder pelo caminho natural do avançar em linha reta em direção à
desenvolvimento social. O dever dos co- Revolução Comunista".
munistas consiste em organizar as forças
que derrubarão os social-patriotas, e em Pelo contrário, do fato de a maioria
nosso país não devemos vacilar nem re- dos operários da Inglaterra ainda seguir
tardar essa ação. os Kerenski e os Scheidemann ingleses
de não ter passado "ainda pela experiên-
Não devemos dispersar nossas cia de um governo formada por esses ho-
energias aumentando as forças do mens - experiência que foi necessária tan-
Partido Trabalhista; seu advento ao to na Rússia como na Alemanha para que
Poder é inevitável. Devemos concentrar os operários se passassem em massa
nossas forças na criação de um movi- para o comunismo deduz-se de modo in-
mento comunista que derrote esse parti- falível que os comunistas ingleses devem

47
participar do parlamentarismo, devem sas exploradas e oprimidas tenham cons-
ajudar a massa operária de dentro do par- ciência da impossibilidade de continuar vi-
lamento a ver na prática os efeitos do go- vendo como vivem e exijam transforma-
verno dos Henderson e dos Snowden, de- ções; para a revolução é necessário que
vem ajudar os Henderson e Snowden a os exploradores não possam continuar vi-
derrotarem a coalizão de Lloyd George e vendo e governando como vivem e go-
Churchill. Proceder de outro modo signifi- vernam. Só quando os "de baixo" não
ca dificultar a marcha da revolução, pois querem e os "de cima" não podem conti-
se não se produz uma modificação nas nuar vivendo à moda antiga é que a revo-
opiniões da maioria da classe operária, a lução pode triunfar. Em outras palavras,
revolução torna-se impossível; e essa mo- esta verdade exprime-se do seguinte mo-
dificação se consegue através da expe- do: a revolução é impossível sem uma cri-
riência política das massas, e nunca ape- se nacional geral (que afete explorados e
nas com a propaganda. A palavra de or- exploradores). Por conseguinte, para fa-
dem: "Avante sem compromissos, sem zer a revolução é preciso conseguir, em
desviar-se do caminho!" é claramente er- primeiro lugar, que a maioria dos operári-
rada, se quem a propala é uma minoria os (ou, em todo caso, a maioria dos ope-
evidentemente impotente de operários rários conscientes, pensantes, politica-
que sabe (ou, pelo menos, deve saber) mente ativos) compreenda a fundo a ne-
que dentro de pouco tempo, no caso de, cessidade da revolução e esteja disposta
Henderson e Snowden triunfarem sobre a sacrificar a vida por ela ; em segundo lu-
Lloyd George e Churchill, a maioria per- gar, é preciso que as classes dirigentes
derá a fé - em seus chefes e apoiará o co- atravessem uma crise governamental
munismo (ou, em todo caso, adotará que atraia à política inclusive as massas
uma atitude de neutralidade e, em sua mais atrasadas (o sintoma de toda revo-
maioria, de neutralidade simpática em re- lução verdadeira é a decuplicação ou cen-
lação aos comunistas). É a mesma coisa tuplicação do número de homens aptos
que se 10.000 soldados se lançassem ao para a luta política, homens pertencentes
combate contra 50.000 inimigos no mo- à massa trabalhadora e oprimida, antes
mento em que é necessário "deter-se", apática), que reduza o governo à impo-
"afastar-se do caminho", e até concertar tência e. torne possível sua rápida derru-
um "compromisso" para esperar a chega- bada pelos revolucionários.
da de um reforço prometido de 100.000
homens, que não podem entrar em ação Na Inglaterra, e exatamente o dis-
imediatamente. É uma infantilidade pró- curso de Lloyd George o demonstra, en-
pria de intelectuais e não uma tática séria tre outras coisas, desenvolvem-se a
da classe revolucionária. olhos vistos as duas condições de uma re-
volução proletária vitoriosa. E os erros
A lei fundamental da revolução, dos comunistas de esquerda represen-
confirmada por todas as revoluções, e tam atualmente um singular perigo preci-
em particular pelas três revoluções rus- samente porque observamos em alguns
sas do século XX, consiste no seguinte: revolucionários uma atitude pouco pon-
para a revolução não basta que as mas- derada, pouco atenta, pouco consciente,

48
pouco reflexiva com relação a cada um eleitoral: marchemos juntos contra a coa-
desses fatores. Se somos o partido da lizão de Lloyd George e os conservado-
classe revolucionária, e não um grupo re- res, repartamos os postos no parlamento
volucionário, se queremos atrair as mas- proporcionalmente aos votos dados pe-
sas (sem o que corremos o risco de não los operários ao Partido Trabalhista ou
passar de simples charlatães) devemos: aos comunistas (não nas eleições, mas
em primeiro lugar, ajudar Henderson ou numa votação especial) conservemos a
Snowden a vencer Lloyd George e mais completa liberdade, de agitação,
Churchill (mais exatamente: devemos propaganda e ação política. Sem esta últi-
obrigar os primeiros a vencer os segun- ma condição é impossível, naturalmente,
dos, pois os primeiros tem medo de sua fazer a aliança, pois seria uma traição. Os
própria vitória!); em segundo lugar, aju- comunistas ingleses devem reivindicar e
dar a maioria da classe operária a con- alcançar a mais completa liberdade, que
vencer-se por experiência própria de que lhes permita, desmascarar os Henderson
temos razão, isto é, da incapacidade com- e Snowden, de modo tão absoluto como
pleta dos Henderson e Snowden, de sua o fizeram (durante 15 anos, de 1903 a
natureza pequeno-burguesa e traidora, 1917) os bolcheviques russos em relação
da inevitabilidade de sua falência; e, em aos Henderson e Snowden da Rússia, isto
terceiro lugar, antecipar o momento em é, os mencheviques.
que, sobre a base da desilusão produzida
pelos Henderson na maioria dos operári- Se os Henderson e Snowden acei-
os, se possa, com grandes probabilida- tarem a aliança nessas condições, saire-
des de êxito, derrubar de golpe o gover- mos ganhando, pois o que nos interessa
no dos Henderson. Se inclusive Lloyd não é, absolutamente, o número de cade-
George, político inteligentíssimo e resolu- iras no parlamento. Não é esse o nosso
to, que não é pequeno burguês, mas sim objetivo; nesse ponto seremos transi-
grande burguês, debilita-se cada vez gentes (enquanto os Henderson e, so-
mais (com toda a burguesia), ontem por bretudo, seus novos amigos - ou seus no-
suas "rusgas" com Churchill e hoje por vos amos - os liberais que ingressaram no
suas "rusgas" com Asquith, e perde a ca- Partido Trabalhista, correm atrás disso
beça, com muito mais facilidade a perde- mais que de qualquer outra coisa).
rão os Henderson. Teremos ganho porque levaremos nossa
agitação às massas num momento em
Falarei de modo mais concreto. Os que o próprio Lloyd George as terá "irrita-
comunistas ingleses devem, na minha do', e ajudaremos não só o Partido
opinião, unificar seus quatro partidos e Trabalhista a formar mais depressa o seu
grupos (todos muito débeis e alguns ex- governo, como também as massas a com-
traordinariamente débeis) num Partido preenderem melhor toda nossa propa-
Comunista único, baseado nos princípios ganda comunista, que realizaremos con-
da III Internacional e da participação obri- tra os Henderson sem nenhuma limita-
gatória no parlamento. O Partido ção, sem nada silenciar.
Comunista propõe aos Henderson e
Snowden um "compromisso", um acordo Se os Henderson e Snowden repeli-

49
rem a aliança conosco, nessas condições, perfeitamente que os social-
teremos ganho ainda mais, pois teremos revolucionários e os mencheviques al-
mostrado na hora às massas (levem em cançariam a maioria*2 (ambos forma-
conta que inclusive dentro do Partido vam um bloco político muito estreito, re-
Trabalhista Independente, puramente presentavam praticamente uma só demo-
menchevique, completamente oportu- cracia pequeno-burguesa), os social-
nista, as massas são partidárias dos revolucionários e os mencheviques fica-
Soviets) que os Henderson preferem sua ram impotentes para lutar com energia e
intimidade com os capitalistas à união de até o fim contra esses adiamentos.
todos os trabalhadores. Teremos ganho
imediatamente ante a massa, a qual, so- Se os Henderson e Snowden se ne-
bretudo depois das explicações brilhan- gassem a formar uma aliança com os co-
tíssimas, extremamente acertadas e úte- munistas, estes sairiam ganhando de ime-
is (para o comunismo) dadas por Lloyd diato, pois conquistariam a simpatia das
George, simpatizará com a idéia da união massas, enquanto os Henderson e
de todos os .operários contra a coalizão Snowden ficariam desacreditados. Pouco
de Lloyd George com os conservadores. nos importaria então perder algumas ca-
Teremos ganho desde o primeiro mo- deiras no parlamento por causa disso. Só
mento, pois teremos demonstrado às apresentaríamos candidatos num núme-
massas que os Henderson e Snowden re- ro ínfimo de circunscrições absolutamen-
ceiam vencer Lloyd George, receiam to- te seguras, isto é, onde isto não repre-
mar o Poder sozinhos e aspiram a conse- sentasse a vitória de um liberal contra um
guir em segredo o apoio de Lloyd George, trabalhista. Realizaríamos a nossa cam-
que estende a mão abertamente aos con- panha eleitoral distribuindo volantes de
servadores contra o Partido Trabalhista. É propaganda do comunismo e convidando
preciso lembrar que na Rússia, depois da o povo, em todas as circunscrições em
revolução de 27 de fevereiro de 1917 (ca- que não apresentássemos candidato, a
lendário antigo), o êxito da propaganda votar no trabalhista contra o burguês.
dos bolcheviques contra os menchevi- Enganam-se os camaradas Sylvia
ques e social-revolucionários (isto é, os Pankhurst e Gallacher se vêem nisso uma
Henderson e Snowden russos) foi devido traição ao comunismo ou uma renuncia à
precisamente às mesmas circunstâncias. luta contra os social-traidores. Pelo con-
Dizíamos aos mencheviques e aos social- trário, não há dúvida de que a causa da re-
revolucionários: tomem todo o Poder volução sairia ganhando.
sem a burguesia, posto que vocês têm a
maioria nos Soviets (no I Congresso dos Hoje em dia, é muito difícil para os
Soviets de toda a Rússia, celebrado em ju- comunistas ingleses inclusive aproximar-
nho de 1917, os bolcheviques não tinham se das massas, fazer com que elas os ou-
mais que 13% dos votos). Mas os çam. Contudo, se me apresentar como co-
Henderson e Snowden russos tinham munista e, ao mesmo tempo, convidar a
medo de tomar o Poder sem a burguesia, votar em Henderson contra Lloyd
e quando esta adiou as eleições para a George, é certo que serei ouvido. E pode-
Assembléia Constituinte porque sabia rei explicar de modo acessível não só por

50
que os Soviets são melhores que o parla- Trabalhista. Tenho pouquíssimos dados
mento e a ditadura do proletariado me- sobre essa questão extremamente com-
lhor que a ditadura de Churchill (masca- plexa, dada a extraordinária originalida-
rada sob o rótulo de "democracia", bur- de do "Partido Trabalhista" Britânico, mui-
guesa), como também por que eu gosta- to pouco parecido estruturalmente com
ria de sustentar Henderson com meu os habituais partidos políticos do conti-
voto do mesmo modo que a corda sus- nente europeu. Mas não há dúvida de
tenta o enforcado; que a aproximação que, em primeiro lugar, também incorre
dos Henderson a um governo formado inevitavelmente em erro quem deduz a tá-
por eles mesmos demonstrará a minha ra- tica do proletariado revolucionário de
zão, atrairá as massas para o meu lado e princípios como este: "0 Partido
acelerará a morte política dos Henderson Comunista deve conservar pura a sua
e Snowden, exatamente como aconteceu doutrina e imaculada a sua independên-
com seus correligionários na Rússia e na cia frente ao reformismo; sua missão é
Alemanha. marchar na vanguarda, sem deter-se ou
desviar-se de seu caminho, avançar em li-
E se replicarem dizendo que esta tá- nha reta em direção à Revolução
tica é muito "astuta" ou complicada, que Comunista". Princípios como este só fa-
as massas não a compreenderão, que dis- zem repetir o erro dos comunardos-
persará e desagregará nossas forças im- blanquístas franceses, que em 1874 pro-
pedindo-nos de concentrá-las, na revolu- clamavam a "negação" de todo compro-
ção soviética, etc., responderei aos meus misso e de toda etapa intermediária. Em
contestadores "de esquerda": não atri- segundo lugar, não há dúvida de que nes-
buam às massas o seu próprio doutrina- se ponto a tarefa consiste, como sempre,
rismo ! É de supor-se que na Rússia as em saber aplicar os princípios gerais e fun-
massas não são mais cultas, mas, pelo damentais do comunismo às peculiarida-
contrário, que são menos cultas que na des das relações entre as classes e os par-
Inglaterra. Apesar disso, compreende- tidos, às peculiaridades do desenvolvi-
ram os bolcheviques; e, em vez de preju- mento objetivo rumo ao comunismo, pró-
dicá-los, favoreceu-os o fato de, nas vés- prias a cada pais e que é necessário saber
peras da revolução soviética de setembro estudar, descobrir e adivinhar.
de 1917, comporem, listas de candidatos
seus ao parlamento burguês (à Mas é preciso falar a respeito disso
Assembléia Constituinte) e tomarem par- não só em relação ao comunismo inglês,
te, no dia seguinte à revolução soviética mas sim em relação às conclusões gerais
de novembro de 1917, nas eleições para que se referem ao desenvolvimento do
essa mesma Constituinte, dissolvida por comunismo em todos os países capitalis-
eles no dia 5 de janeiro de 1918. tas. Este é o tema que vamos abordar
agora.
Não posso examinar pormenoriza-
damente a segunda divergência entre os ___________
comunistas ingleses, consistente em se *1 Pelo visto, esse partido opõe-se
devem ou não aderir ao Partido à adesão ao "Partido Trabalhista", mas

51
nem todos os seus membros são contra a meira vez a combinação da greve econô-
participação no parlamento. (Nota do au- mica com a greve política, com a trans-
tor) formação desta última em insurreição ar-
mada, o nascimento de uma nova forma
*2 As eleições de novembro de de luta de massas e de organização de
1917 para a Assembléia Constituinte na massas das classes oprimidas pelo capi-
Rússia, segundo dados que abrangem talismo: os Soviets.
mais de 36 milhões de eleitores, deram
25% dos votos aos bolcheviques, 13% As revoluções de fevereiro e outu-
aos diferentes partidos dos latifundiários bro de 1917 levaram ao desenvolvimento
e da burguesia e 62% à democracia pe- multilateral dos Soviets em todo o pais e,
queno-burguesa, isto é, aos social- depois, à sua vitória na revolução prole-
revolucionários e mencheviques junta- tária, socialista. Menos de dois anos mais
mente com os pequenos grupos chega- tarde manifestou-se o caráter internacio-
dos a eles. (Nota do autor) nal dos Soviets, a extensão dessa forma
de luta e de organização ao movimento
operário mundial, o destino histórico dos
X - Algumas conclusões Soviets de serem os coveiros, os herdei-
ros e os sucessores do parlamentarismo
A revolução burguesa de 1905 na burguês, da democracia burguesa em ge-
Rússia evidenciou uma reviravolta extra- ral.
ordinariamente original da história uni-
versal: num dos países capitalistas mais Mais ainda. A história do movimen-
atrasados, o movimento grevista alcan- to operário mostra atualmente que ele
çou, pela primeira vez no mundo, força e está destinado a atravessar em todos os
amplitude inusitadas. Só em janeiro de países (e já começou a atravessar) um pe-
1905, o número de grevistas foi dez ve- ríodo de luta do comunismo nascente,
zes maior que a média anual de grevistas cada dia mais forte, que marcha para a vi-
durante os dez anos anteriores tória, sobretudo e principalmente contra
(1895/1904); de janeiro a outubro de o "menchevismo>> próprio (de cada pa-
1905, as greves aumentaram incessante- ís), isto é, contra o oportunismo e o soci-
mente e em proporções gigantescas. Sob al-chovinismo e, de outro lado, como
a influência de uma série de fatores histó- complemento, por assim dizer, contra o
ricos completamente originais, a Rússia comunismo "de esquerda". A primeira
atrasada deu ao mundo o primeiro exem- dessas lutas desenvolveu-se em todos os
plo não só de um salto brusco, em época países, ao que parece sem exceções, sob
de revolução, da atividade espontânea a forma de luta entre a II Internacional
das massas oprimidas (coisa que ocorreu (hoje praticamente morta) e a III. A se-
em todas as grandes revoluções), como gunda luta manifesta-se na Alemanha,
também de uma projeção do proletariado na Inglaterra, na Itália, nos Estados
que superava infinitamente o que se po- Unidos (onde pelo menos uma parte dos
dia esperar por sua pequena percenta- "Operários Industriais do Mundo" e das
gem entre a população; mostrou pela pri- tendências anarco-sindicalistas apoiam

52
os erros do comunismo de esquerda, ao economia, sua política, sua cultura, sua
mesmo tempo em que reconhecem de composição nacional (Irlanda, etc.), suas
maneira quase geral, quase incondicio- colônias, diversidade de religiões, etc.,
nal, o sistema soviético) e na França (ati-etc. Sente-se expandir e crescer em toda
tude de uma parte dos ex-sindicalistas parte o descontentamento contra a II
em relação ao partido. político e ao parla-Internacional por causa de seu oportu-
mentarismo, também paralelamente ao nismo e sua inépcia, sua incapacidade
reconhecimento do sistema dos Soviets), para criar um órgão realmente centraliza-
isto é, manifesta-se não só em escala in- do e dirigente, apto para orientar a tática
ternacional, como universal. internacional do proletariado revolucio-
nário em sua luta pela república soviética
Contudo, embora a escola prepara- universal. É preciso compreender perfei-
tória que leva o movimento operário à vi- tamente que esse centro dirigente não
tória sobre a burguesia seja em toda par- pode, de modo algum, ser formado se-
te idêntica em sua essência, seu desen- gundo normas táticas estereotipadas de
volvimento efetua-se em cada país de luta, mecanicamente igualadas, idênti-
modo original. Os grandes países capita- cas. Enquanto subsistirem diferenças na-
listas adiantados avançam por esse cami- cionais e estatais entre os povos e os paí-
nho muito mais rapidamente que o bol- ses e essas diferenças subsistirão inclusi-
chevismo, ao qual a história concedeu ve durante muito tempo depois da insta-
um prazo de quinze anos para preparar- uração universal da ditadura do proletari-
se como tendência política organizada a ado - a unidade da tática internacional do
fim de conquistar a vitória. No curto pra- movimento operário comunista de todos
zo de um ano, a III Internacional já al- os países exigirá, não a supressão da vari-
cançou um triunfo decisivo ao desfazer a edade, não a supressão das particulari-
II Internacional, a Internacional amarela, dades nacionais (o que é, atualmente,
social-chovinista, que há poucos meses um sonho absurdo), mas sim uma tal apli-
era incomparavelmente mais forte que a cação dos princípios fundamentais do co-
III, parecia sólida e poderosa, e dispunha munismo (Poder Soviético e ditadura do
do apoio da burguesia mundial sob todas proletariado) que modifique acertada-
as formas, diretas e indiretas, materiais mente esses princípios em seus detalhes,
(postos ministeriais, passaporte, impren- que os adapte, que os aplique acertada-
sa) e morais. mente às particularidades nacionais e na-
cional-estatais. Investigar, estudar, des-
O que importa agora é que os comu- cobrir, adivinhar, captar o que há de parti-
nistas de cada país levem em conta com cular e específico, do ponto de vista naci-
plena consciência tanto as tarefas funda- onal, na maneira pela qual cada país abor-
mentais, de principio, da luta contra o da concretamente a solução do problema
oportunismo e o doutrinarismo "de es- internacional comum, do problema do tri-
querda", como as particularidades con- unfo sobre o oportunismo e o doutrinaris-
cretas que esta luta adquire e deve ad- mo de esquerda no movimento operário,
quirir inevitavelmente em cada país, de a derrubada da burguesia, a instauração
acordo com os aspectos originais de sua da república soviética e da ditadura pro-

53
letária, é a principal tarefa do período his- pela, Rússia como pela Alemanha. Não só
tórico que atualmente atravessam todos as massas incultas, em muitos casos anal-
os países adiantados (e não só os adian- fabetas, da Rússia, como também as mas-
tados). Já se fez o principal - claro que sas da Alemanha, muito cultas, sem ne-
não se fez tudo, absolutamente, mas já nhum analfabeto, precisaram experi-
se fez o principal - para ganhar a van- mentar em sua própria carne toda a impo-
guarda da classe operária para colocá-la tência, toda a veleidade, toda a fraqueza,
ao lado do Poder Soviético contra o parla- todo o servilismo ante a burguesia, toda
mentarismo, ao lado da ditadura do pro- a infâmia do governo dos cavalheiros da
letariado contra a democracia burguesa. II Internacional, toda a inelutabilidade da
Agora é preciso concentrar todas as for- ditadura dos ultra-reacionários (Kornilov
ças e toda a atenção no passo seguinte, na Rússia, Kapp & Cia. na Alemanha), úni-
que parece ser - e, de certo modo, é real- ca alternativa diante da ditadura do pro-
mente - menos fundamental, mas que, letariado, para orientar-se decididamen-
em compensação, está mais perto da so- te rumo ao comunismo.
lução efetiva do problema, isto é: procu-
rar as formas de passar à revolução pro- A tarefa imediata da vanguarda
letária ou de abordá-la. consciente do movimento operário inter-
nacional, isto é, dos partidos, grupos e
A vanguarda proletária está ideolo- tendências comunistas, consiste em sa-
gicamente conquistada. Isto é o princi- ber atrair as amplas massas (hoje, em
pal. Sem isto não é possível dar sequer o sua maior parte, ainda adormecidas, apá-
primeiro passo para a vitória. Mas daí ticas, rotineiras, inertes) para essa sua
para o triunfo ainda falta uma grande dis- nova posição, ou, melhor dizendo, em sa-
tância a percorrer. Apenas com a van- ber dirigir não só seu próprio partido,
guarda é impossível triunfar. Lançar a van- como também essas massas no período
guarda sozinha à batalha decisiva, quan- de sua aproximação, de seu deslocamen-
do toda a classe, quando as grandes mas- to para essa nova posição. Se a primeira
sas ainda não adotaram uma posição de tarefa histórica (ganhar para o Poder
apoio direto a essa vanguarda ou, pelo Soviético e para a ditadura da classe ope-
menos, de neutralidade simpática, e não rária a vanguarda consciente do proleta-
são totalmente incapazes de apoiar o ad- riado) não podia ser cumprida sem uma
versário, seria não só uma estupidez, vitória ideológica e política completa so-
como um crime. E para que realmente bre o oportunismo e o social-chovinismo,
toda a classe, para que realmente as gran- a segunda tarefa, que é agora imediata e
des massas dos trabalhadores e dos opri- que consiste em saber atrair as massas
midos pelo capital cheguem a ocupar para essa nova posição capaz de assegu-
essa posição, a propaganda e a agitação, rar o triunfo da vanguarda na revolução,
por si, são insuficientes. Para isso neces- não pode ser cumprida sem liquidar o
sita-se da própria experiência política das doutrinarismo de esquerda, sem corrigir
massas. Tal é a lei fundamental de todas completamente seus erros, sem desem-
as grandes revoluções, confirmada hoje baraçar-se deles.
com força e realce surpreendentes tanto

54
Enquanto se trata (e na medida em com poderoso impulso o afã de apoiar as
que se trata ainda hoje) de ganhar para o ações revolucionárias mais resolutas,
comunismo a vanguarda do proletariado, mais valentes e abnegadas contra a bur-
a propaganda deve) ocupar o primeiro lu- guesia. É então que está madura a revo-
gar; inclusive os círculos, com todas ás lução, que nossa vitória está assegurada,
suas debilidades, são úteis neste caso e caso tenhamos sabido levar em conta to-
dão resultados fecundos. Mas quando se das as condições levemente esboçadas
trata da ação prática das massas, de mo- acima e tenhamos escolhido acertada-
vimentar – se me é permitido usar essa mente o momento.
expressão – exércitos de milhões de ho-
mens, dispor todas as forças da classe de As divergências entre os Churchill e
uma determinada sociedade para a luta fi- os Lloyd George de um lado - tipos políti-
nal e decisiva., não conseguireis nada cos que existem em todos os países com
através, unicamente dos hábitos de pro- peculiaridades nacionais ínfimas - e, de
pagandista, com a simples repetição das outro, entre os Henderson e os Lloyd
verdades do comunismo "puro". E é por- George, não têm absolutamente nenhu-
que nesse caso a conta não é feita aos mi- ma importância e são insignificantes do
lhares, como faz o propagandista mem- ponto de vista do comunismo puro, isto
bro de um grupo reduzido e que ainda é, abstrato, ainda incapaz de ações políti-
não dirige massas, e sim aos milhões e de- cas práticas, de massas. Mas, do ponto
zenas de milhões. Nesse caso é preciso de vista dessa ação prática das massas,
perguntar a si próprio não só se conven- tais divergências têm extraordinária im-
cemos a vanguarda da classe revolucio- portância. Saber levá-las em conta, saber
nária, como também se estão em movi- determinar o momento em que amadu-
mento as forças historicamente ativas de receram plenamente os conflitos inevitá-
todas as classes da tal sociedade, obriga- veis entre esses "amigos", conflitos que
toriamente de todas, sem exceção, de debilitam e extenuam todos os "amigos"
modo que a batalha decisiva esteja com- tomados em conjunto, é o trabalho, a mis-
pletamente amadurecida, de maneira são do comunista que deseje ser não só
que 1) todas as forças de classe que nos um propagandista consciente, convicto e
são adversas estejam suficientemente teoricamente preparado, como também
perdidas na confusão, suficientemente lu- um dirigente prático das massas na revo-
tando entre si, suficientemente debilita- lução. É necessário unir a mais absoluta fi-
das por uma luta superior a suas forças; delidade às idéias comunistas à arte de
2) que todos os elementos vacilantes, ins- admitir todos os compromissos práticos
táveis, inconsistentes, intermediários, necessários, manobras, acordos, zigue-
isto é, a pequena burguesia, a democra- zagues, retiradas, etc., para precipitar a
cia pequeno-burguesa, que se diferencia ascensão ao Poder político dos
da burguesia, estejam suficientemente Henderson (dos heróis da II
desmascarados diante do povo, suficien- Internacional, para não citar nomes des-
temente cobertos de opróbrio por sua fa- ses representantes da democracia pe-
lência prática; 3) que nas massas prole- queno-burguesa que se chamam de soci-
tárias comece a aparecer e a expandir-se alistas) e seu malogro no mesmo; para

55
acelerar seu fracasso inevitável na práti- não terminou antes dessa conquista); 2)
ca, o que educará as massas precisamen- a classe revolucionária deve estar prepa-
te em nosso espírito e as orientará preci- rada para substituir uma forma por outra
samente para o comunismo; para acele- do modo mais rápido e inesperado.
rar as rusgas, as disputas, os conflitos e a
separação total, inevitáveis entre os Todos hão de convir que seria in-
Henderson, os Lloyd George e os sensata e até mesmo criminosa a condu-
Churchill (entre os mencheviques e os so- ta de um exército que não se dispusesse
cial-revolucionários, os democratas cons- a conhecer e utilizar todos os tipos de ar-
titucionalistas e os monárquicos; entre os mas, todos os meios e processos de luta
Scheidemann, a burguesia, os partidári- que o inimigo possui ou pode possuir.
os de Kapp, etc.) e para escolher acerta- Mas essa verdade é ainda mais aplicável
damente o momento de máxima dissen- à política que à arte militar. Em política é
são entre todos esses "baluartes da sa- ainda menos fácil saber de antemão que
crossanta propriedade privada", a fim de método de luta será aplicável e vantajoso
esmagá-los por completo, mediante uma para nós, nessas ou naquelas circunstân-
resoluta ofensiva do proletariado, e con- cias futuras. Sem dominar todos os meios
quistar o Poder político. de luta podemos correr o risco de sofrer
uma derrota fragorosa - às vezes decisiva
A história em geral, e a das revolu- - se modificações, independentes da nos-
ções em particular, é sempre mais rica de sa vontade na situação das outras classes
conteúdo, mais variada de formas e as- puserem na ordem do dia uma forma de
pectos, mais viva e mais "astuta" do que ação na qual somos particularmente dé-
imaginam os melhores partidos, as van- beis. Se dominamos todos os meios de lu-
guardas mais conscientes das classes ta, nossa vitória estará garantida, pois re-
mais avançadas. E isso é compreensível, presentamos os interesses da classe real-
pois as melhores vanguardas exprimem a mente avançada., realmente revolucio-
consciência, a vontade, a paixão e a ima- nária, inclusive se as circunstâncias nos
ginação de dezenas de milhares de ho- impedirem de utilizar a arma mais perigo-
mens acicatados pela mais aguda luta de sa para o inimigo, a arma mais capaz de
momentos de exaltação e tensão especi- assestar-lhe golpes mortais com a maior
ais de todas as faculdades humanas, pela rapidez. Os revolucionários inexperientes
consciência, a vontade, a paixão e a ima- imaginam freqüentemente que os meios
ginação de dezenas de milhões de ho- legais de luta são oportunistas, uma vez
mens, enquanto que a revolução é feita, que a burguesia enganava e lograva os
em classes. Dai se depreendem duas con- operários com particular freqüência nes-
clusões práticas muito importantes: 1) a se terreno (sobretudo nos períodos cha-
classe revolucionária, para realizar sua mados "pacíficos", nos períodos não revo-
missão, deve saber utilizar todas as for- lucionários), e que os processos ilegais
mas ou aspectos, sem a menor exceção, são revolucionários. Mas isso não é justo.
da atividade social (terminando depois O justo é que os oportunistas e traidores
da conquista do Poder político, às vezes da classe operária são os partidos e che-
com grande risco e imenso perigo, o que fes que não sabem ou não querem (não

56
digam: não posso, mas sim: não quero) Um exemplo: Inglaterra. Não pode-
aplicar os processos ilegais de luta numa mos saber e ninguém pode determinar
situação, por exemplo, como a guerra im- de antemão - quando eclodirá ali a verda-
perialista de 1914,/1918, em que a bur- deira revolução proletária e qual será o
guesia dos países democráticos mais li- motivo principal que despertará, inflama-
vres enganava os operários com insolên- rá e lançará à luta as grandes massas,
cia e crueldade nunca vistas, proibindo hoje ainda adormecidas. Temos o dever,
que se dissesse a verdade sobre o caráter por conseguinte, de realizar todo nosso
de rapina da guerra. Mas os revolucioná- trabalho preparatório tendo as quatro pa-
rios que não sabem combinar as formas tas aferradas ao solo (segundo a expres-
ilegais de luta com todas as formas legais são predileta do falecido Plekhanov quan-
são péssimos revolucionários. Não é difí- do era marxista e revolucionário). Talvez
cil ser revolucionário quando a revolução seja uma crise parlamentar que "abra o
já estourou e está em seu apogeu, quan- caminho", que "rompa o gelo", talvez
do todos aderem à revolução simples- uma crise que derive das contradições co-
mente por entusiasmo, modismo e inclu- loniais e imperialistas irremediavelmente
sive, às vezes, por interesse pessoal de fa- complicadas, cada vez mais graves e exa-
zer carreira. Custa muito ao proletariado, cerbadas, ou talvez outras causas. Não fa-
causa-lhe duras penas, origina-lhe ver- lamos da espécie de luta que decidirá a
dadeiros tormentos "desfazer-se" depois sorte da revolução proletária na
do triunfo desses "revolucionários". É mu- Inglaterra (essa questão não permite ne-
itíssimo mais difícil - e muitíssimo mais nhuma dúvida para nenhum comunista,
meritório - saber ser revolucionário quan- pois para todos nós está firmemente deci-
do ainda não existem as condições para a dida), mais sim do motivo que despertará
luta direta, aberta, autenticamente de as massas proletárias hoje ainda ador-
massas, autenticamente revolucionária, mecidas, que as colocará em movimento
saber defender os interesses da revolu- e as levará à revolução. Não esqueça-
ção (através da propaganda, da agitação mos, por exemplo, que na república bur-
e da organização) em instituições não re- guesa da França, numa situação que era
volucionárias e, muitas vezes, simples- cem vezes menos revolucionária que a
mente reacionárias, numa situação não atual, tanto internacional como interna-
revolucionária, entre massas incapazes mente, bastou uma circunstância tão
de compreender imediatamente a neces- "inesperada" e "fútil" como o caso
sidade de um método revolucionário de Dreyfus - uma das mil façanhas desones-
ação, Saber perceber, encontrar, deter- tas do bando militarista reacionário para
minar com exatidão o rumo concreto ou a levar o povo às bordas da guerra civil.
modificação particular dos acontecimen-
tos suscetíveis de levar as massas à gran- Na Inglaterra, os comunistas de-
de luta revolucionária, verdadeira, final e vem utilizar constantemente, sem des-
decisiva é a principal missão do comunis- canso nem vacilação, as eleições parla-
mo contemporâneo na Europa Ocidental mentares, todas as peripécias da política
e na América. irlandesa, colonial e imperialista do go-
verno britânico no mundo inteiro e todos

57
os demais campos, esferas e aspectos da ciedades e reuniões fortuitas das pessoas
vida social, atuando neles com espírito, pobres; que falem ao povo não de forma
novo, com o espírito do comunismo, com doutoral (e não muito à parlamentar),
o espírito da III e não da II Internacional. não corram, por nada neste mundo, atrás
Não disponho de tempo nem espaço para de um "lugarzinho" no parlamento, mas
descrever aqui os processos "russos", despertem em toda parte o pensamento,
"bolcheviques", de participação nas elei- arrastem a massa, tomem a palavra da
ções e na luta parlamentar; mas posso as- burguesia, utilizem o aparelho por ela cri-
segurar aos comunistas dos demais paí- ado, as eleições por ela convocadas, seus
ses que em nada se pareciam com as ha- apelos a todo o povo e tornem conhecido
bituais campanhas parlamentares na deste último o bolchevismo, como nunca
Europa Ocidental. Desse fato tira-se fre- antes haviam tido oportunidade de fazê-
qüentemente a seguinte conclusão : lo (sob o domínio burguês) fora do perío-
"Isso é assim no vosso país, na Rússia, do eleitoral (sem contar, naturalmente,
mas o nosso parlamentarismo é diferen- os momentos de grandes greves, quando
te". A conclusão é falsa. Os comunistas, esse mesmo aparelho de agitação popu-
os partidários da III Internacional exis- lar funcionava em nosso país com maior
tem em todos os países exatamente para intensidade ainda). Fazer isso na Europa
transformar em toda linha, em todos os Ocidental e na América é muito difícil, difi-
aspectos da vida, o antigo trabalho socia- cílimo; mas pode e deve ser feito, pois é
lista, tradeunionista, sindicalista e parla- totalmente impossível cumprir as tarefas
mentar num trabalho novo, comunista. do comunismo sem trabalhar, e é preciso
Em nossas eleições também vimos, à von- esforçar-se para resolver os problemas
tade, traços puramente burgueses, tra- práticos, cada vez mais variados, cada
ços de oportunismo, praticismo vulgar, vez mais ligados a todos os aspectos da
fraude capitalista. Os comunistas da vida social e que vão arrebatando cada
Europa Ocidental e da América devem vez mais à burguesia, um após outro, um
aprender a criar um parlamentarismo no- setor, uma esfera de atividade.
vo, incomum, não oportunista, sem arri-
vismo. É necessário que o Partido Nessa mesma Inglaterra é neces-
Comunista lance suas palavras de or- sário também organizar de modo novo
dem; que os verdadeiros proletários, (não de modo socialista, mas comunista;
com a ajuda da gente pobre, inorganiza- não de modo reformista, mas revolucio-
da e completamente oprimida, repartam nário) o trabalho de propaganda, de agi-
entre si e distribuam volantes, percorram tação e de organização no exército e en-
as casas dos operários, as palhoças dos tre as nações oprimidas e que não gozam
proletários do campo e dos camponeses de plenos direitos que formam "seu"
que vivem nas aldeias longínquas (que, Estado (Irlanda, as colônias). Pois todos
felizmente, existem em número muito esses setores da vida social, na época do
menor na Europa que na Rússia, e são ra- imperialismo em geral e sobretudo ago-
ras na Inglaterra), entrem nas tabernas ra, depois da guerra, que atormentou os
freqüentadas pelas pessoas mais sim- povos e que lhes abriu rapidamente os
ples, introduzam-se nas associações, so- olhos à verdade (a verdade de dezenas

58
de milhões de homens terem morrido ou cimentos e, de outro, concentra a aten-
terem ficado mutilados exclusivamente ção no esmagamento do bolchevismo
para decidir se seriam os bandidos ingle- pela força, debilitando com isso sua posi-
ses ou os bandidos alemães que saquea- ção em muitos outros terrenos. Os comu-
riam maior número de países), todos es- nistas de todos os países avançados de-
ses setores da vida social saturam-se par- vem levar em conta para a sua tática es-
ticularmente de matérias inflamáveis e sas duas circunstâncias.
dão origem a multas causas de conflitos e
de crises e à exacerbação da luta de clas- Os democratas constitucionalistas
ses. Não sabemos nem podemos saber russos e Kerenski passaram dos limites
qual das centelhas que surgem agora em quando empreenderam uma furiosa per-
grande número por toda parte em todos seguição contra os bolcheviques, sobre-
os países, sob a influência da crise econô- tudo desde abril de 1917 e, mais ainda,
mica e política mundial, poderá causar o em junho e julho desse mesmo ano. Os
incêndio, isto é, despertar de modo espe- milhões de exemplares dos jornais bur-
cial as massas. Por isso, com nossos prin- gueses, que gritavam em todos os tons
cípios novos, comunistas, devemos em- contra os bolcheviques, ajudaram a con-
preender a "preparação", de todos os seguir que as massas valorizassem o bol-
campos, qualquer que seja a sua nature- chevismo, e toda a vida social, mesmo
za, até dos mais velhos, vetustos e, apa- sem o concurso da imprensa, impregnou-
rentemente, mais estéreis, porque em se de discussões sobre o bolchevismo,
caso contrário não estaremos à altura de graças ao "zelo" da burguesia. Os milio-
nossa missão, faltar-nos-á alguma coisa, nários de todos os países conduzem-se
não dominaremos todos os tipos de ar- atualmente de tal modo em escala inter-
mas, não nos prepararemos nem para vi- nacional que lhes devemos ficar agrade-
tória sobre a burguesia (que organizou a cidos de todo o coração. Perseguem o bol-
vida social em todos os seus aspectos à chevismo com o mesmo zelo com que o
moda burguesa e que agora a desorgani- perseguiam anteriormente Kerenski e
zou também à moda burguesa) nem para companhia e, como estes, também pas-
a reorganização comunista de toda a vi- sam dos limites e nos ajudam tanto quan-
da, tarefa que deveremos cumprir uma to Kerenski. Quando a burguesia france-
vez conquistada a vitória. sa converte o bolchevismo no ponto cen-
tral de sua campanha eleitoral, injuriando
Depois da revolução proletária na por seu bolchevismo socialistas relativa-
Rússia e de suas vitórias em escala inter- mente moderados ou vacilantes; quando
nacional, inesperadas para a burguesia e a burguesia norte-americana, perdendo
os filisteus, o mundo inteiro se transfor- completamente a cabeça, prende milha-
mou e a burguesia também é outra em res e milhares de indivíduos suspeitos de
toda parte. A burguesia sente-se assus- bolcheviques e cria um ambiente de pâni-
tada com o "bolchevismo" e está irritada co propagando em toda parte a notícia de
contra ele a ponto de quase perder a ca- conjurações bolcheviques; quando a bur-
beça; precisamente por isso, acelera, de guesia inglesa, a mais "Séria" do mundo,
um lado, o desenvolvimento dos aconte- com todo seu talento e experiência come-

59
te inacreditáveis tolices, funda riquíssi- centenas, milhares, centenas de milha-
mas "sociedades para a luta contra o bol- res de bolcheviques de ontem ou de ama-
chevismo", cria uma literatura especial a nhã; ao fazer isso, procede como proce-
seu respeito e toma a seu serviço, para a deram todas as classes condenadas pela
luta contra ele, um pessoal suplementar história a desaparecer. Os comunistas de-
de sábios, agitadores e padres, devemos vem saber quê, seja como for, o futuro
inclinar-nos e agradecer aos senhores ca- lhes pertence. E, por isso, podemos (e de-
pitalistas. Trabalham para nós, ajudam- vemos) unir, na grande luta revolucioná-
nos a interessar as massas pela natureza ria, o máximo de paixão à análise mais
e a significação do bolchevismo. E não po- fria e serena das furiosas convulsões da
dem fazer de outro modo, porque já fra- burguesia. A revolução russa foi cruel-
cassaram em suas tentativas de "fazer si- mente esmagada em 1905; os bolchevi-
lêncio>> em torno do bolchevismo e su- ques russos foram derrotados em julho
focá-lo. de 1917; mais de 15.000 comunistas ale-
mães foram aniquilados por meio da ardi-
Mas, ao mesmo tempo, a burgue- losa provocação e das hábeis manobras
sia vê no bolchevismo quase que exclusi- de Scheidemann e Noske, aliados à bur-
vamente um dos seus aspectos: a insur- guesia e aos generais monárquicos; na
reição, a violência, o terror; por isso pro- Pínlândia e na Hungria o terror branco faz
cura preparar-se de modo particular para estragos. Em todos os casos e em todos
opor resistência e responder nesse terre- os países, porém, o comunista está se
no. É possível que em casos isolados, em temperando e cresce; suas raízes são tão
alguns países, nesses ou naqueles perío- profundas que as perseguições não o de-
dos breves, o consiga; é preciso contar bilitam, não o extenuam, mas, pelo con-
com essa possibilidade, que nada tem de trário, reforçam-no. Só falta uma coisa
temível para nós. O comunismo "brota" li- para que marchemos rumo à vitória com
teralmente de todos os aspectos da vida mais firmeza e segurança; que os comu-
social, seus gemes existem absoluta- nistas de todos os países compreenda-
mente em toda parte, o "contágio" (para mos em toda parte e até o fim que em nos-
empregar a comparação predileta da bur- sa tática é necessária a máxima noxibili-
guesia e da polícia burguesa e a mais dade. O que falta atualmente ao comu-
"agradável" para elas) penetrou profun- nismo, que cresce magnificamente, so-
damente em todos os poros do organis- bretudo nos países adiantados, é essa
mo e o impregnou completamente. Caso consciência e o acerto para aplicá-la na
se "feche", com particular cuidado uma prática.
das saídas, o "contágio" encontrará ou-
tra, às vezes a mais inesperada. A vida Poderia (e deveria) ser uma lição
triunfa acima de todas as coisas. Que a útil o que ocorreu com os chefes da II
burguesia se sobressalte, irrite-se até per- Internacional, tão eruditos e tão fiéis ao
der a cabeça; que ultrapasse os limites, socialismo como Kautski, Otto Bauer e ou-
faça tolices, vingue-se por antecipação tros. Compreendiam perfeitamente a ne-
dos bolcheviques e se esforce por aniqui- cessidade de uma tática flexível, haviam
lar (na Índia, Hungria, Alemanha, etc.) aprendido e ensinavam aos demais a dia-

60
lética de Marx (e muito do que foi feito com o menor sofrimento para o organis-
por eles nesse terreno será sempre con- mo. Não só o doutrinarismo de direita
siderado como uma valiosa aquisição da constitui um erro; o de esquerda tam-
literatura socialista); mas ao aplicar essa bém. Naturalmente, o erro do doutrina-
dialética incorreram num erro de tal natu- rismo de esquerda no comunismo é hoje
reza ou se mostraram na prática tão afas- em dia muito menos perigoso e grave
tados da dialética, tão incapazes de levar que o de direita (isto é, do social-
em conta as rápidas modificações de for- chovinismo e do kautskismo); mas isso é
ma e o rápido aparecimento de um con- devido apenas a que o comunismo de es-
teúdo novo nas formas antigas, que sua querda é uma tendência novíssima, que
sorte não é mais invejável que a de acaba de nascer. Só por isso, a doença
Hyndman, Guesde e Plekhanov. A causa pode ser, em certas condições, curada fa-
fundamental de seu fracasso consiste em cilmente e é necessário empreender seu
que "fixaram sua atenção" numa deter- tratamento com a máxima energia.
minada forma de crescimento do movi-
mento operário e do socialismo, esque- As formas antigas romperam-se,
cendo o caráter unilateral dessa fixação; pois aconteceu de seu novo conteúdo -
tiveram medo de ver a brusca ruptura, antiproletário, reacionário - adquirir um
inevitável em virtude das circunstâncias desenvolvimento desmedido. Do ponto
objetivas, e continuaram repetindo as ver- de vista do desenvolvimento do comunis-
dades simples memorizadas e à primeira mo internacional possuímos hoje um con-
vista indiscutíveis: três é maior do que do- teúdo tão sólido, tão forte e tão poderoso
is. Mas a política se parece mais com a ál- de nossa atividade (em prol do Poder dos
gebra que com a aritmética e mais ainda Soviets, em prol da ditadura do proletari-
com as matemáticas superiores que com ado) que pode e deve manifestar-se sob
as matemáticas elementares. Na realida- qualquer forma, tanto antiga como nova;
de, todas as formas antigas do movimen- que pode e deve transformar, vencer, sub-
to socialista adquiriram um novo conteú- meter todas as formas, não só novas
do, razão pela qual surgiu diante das ci- como também antigas, não para concili-
fras um sinal novo, o sinal "menos", en- ar-se com estas, mas para saber conver-
quanto nossos sábios continuavam (e tê-las todas, as novas e as velhas, numa
continuam) tratando teimosamente de arma da vitória completa e definitiva, de-
persuadir-se e de persuadir todo mundo cisiva e irremissível do comunismo.
de que "menos três" é maior que "menos
dois". Os comunistas devem consagrar to-
dos os seus esforços para orientar o movi-
É preciso fazer com que os comu- mento operária e o desenvolvimento soci-
nistas não repitam, só que em sentido al em geral no sentido do caminho mais
contrário, esse mesmo erro, ou melhor, reto e rápido para a vitória mundial do
que esse mesmo erro, cometido, só que Poder Soviético e da ditadura do proleta-
em sentido contrário, pelos comunistas riado. Trata-se de uma verdade indiscutí-
"de esquerda>, seja corrigido o mais vel. Mas basta dar um pequeno passo
cedo possível e curado rapidamente e além - ainda que pareça um passo dado

61
na mesma direção - para que essa verda- Apêndice
de se transforme em erro. Basta dizer,
como dizem os comunistas de esquerda Enquanto as editoras de nosso país
alemães e ingleses, que não aceitamos - que foi saqueado pelos imperialistas de
senão um caminho, o caminho reto, que todo o mundo em vingança pela vitória
não admitimos manobras, acordos e com- da revolução proletária e que continua
promissos, para que isso se torne um sendo saqueado e bloqueado, apesar de
erro que pode causar, e em parte já cau- todas as promessas feitas aos operários
sou e continua causando, os mais sérios desses países imperialistas - organiza-
prejuízos ao comunismo. O doutrinaris- vam a publicação do meu folheto, rece-
mo de direita obstinou-se em não admitir bemos do estrangeiro dados comple-
senão as formas antigas e fracassou do mentares. Sem aspirar, absolutamente, a
modo mais completo por não ter percebi- que meu folheto seja algo mais que bre-
do o novo conteúdo. O doutrinarismo de ves notas de um publicista, abordarei lige-
esquerda obstina-se em repelir incondici- iramente alguns pontos.
onalmente certas formas antigas, sem
ver que o novo conteúdo abre seu cami- I - Cisão dos comunistas alemães
nho através de todas as espécies de for-
mas e que nosso dever de comunistas A cisão dos comunistas na
consiste em dominá-las todas, em apren- Alemanha é um fato. Os "esquerdistas"
der a completar umas com as outras e a ou "oposição de princípio" construiriam
substituir umas por outras com a máxima um "Partido Comunista Operário", à par-
rapidez, em adaptar a nossa tática a qual- te, em contraposição ao "Partido
quer modificação dessa natureza, causa- Comunista". Na Itália, pelo visto, as coi-
da por uma classe que não seja a nossa sas também marcham para a cisão. Digo
ou por esforços que não sejam os nossos. "pelo visto" porque disponho apenas de
dois novos números, o 7 e o 8, do jornal
A revolução universal, que recebeu esquerdista II Soviet, onde se discute
um impulso tão poderoso e foi acelerada abertamente a possibilidade e a necessi-
com tanta intensidade pelos horrores, vi- dade da cisão, além de falar-se também
lezas e abominações da guerra imperia- de um congresso da fração dos "absten-
lista mundial e pela situação sem saída cionistas" (ou boicotadores, isto é, dos ini-
que esta originou, essa revolução esten- migos da participação no parlamento)
de-se e aprofunda-se com rapidez tão ex- que até agora pertence ao Partido
traordinária, riqueza tão magnífica de for- Socialista Italiano.
mas sucessivas, com uma refutação prá-
tica tão edificante de todo doutrinarismo, Há receio de que a cisão dos "es-
que existem todos os motivos para acre- querdistas", antiparlamentaristas (e em
ditar que o movimento comunista inter- parte também antipolíticos, inimigos do
nacional se curará rapidamente e por partido político e do trabalho nos sindica-
completo da doença infantil do comunis- tos), converta-se num fenômeno interna-
mo "de esquerda". cional, como a cisão dos "centristas" (ou
27 de abril de 1920. kautskistas, longuetistas, "independen-

62
tes", etc.). Assim seja. Afinal de contas, a sigo mesmo"); mas as massas operárias,
cisão é melhor que a confusão, que impe- quando chegar a hora, unir-se-ão fácil e
de o desenvolvimento ideológico, teórico rapidamente e unirão todos os comunis-
e revolucionário do Partido e seu amadu- tas sinceros num só partido, capaz de ins-
recimento, assim como seu trabalho prá- taurar o regime soviético e a ditadura do
tico unitário, verdadeiramente organiza- proletariado*.
do, que realmente prepare a ditadura do
proletariado., ___________
* No que concerne à futura fusão
Que os "esquerdistas" provem o dos comunistas de "esquerda", dos anti-
acerto de sua linha na prática, em âmbito parlamentaristas, com os comunistas em
nacional e internacional, que tentem pre- geral acrescentarei o seguinte: na medi-
parar (e depois realizar) a ditadura do pro- da em que pude conhecer os jornais dos
letariado sem um partido rigorosamente comunistas "de esquerda" e dos comu-
centralizado, dotado de uma disciplina nistas em geral da Alemanha, os primei-
férrea, sem saber dominar todas as esfe- ros levam a vantagem de saber efetuar
ras, ramos e variedades do trabalho polí- melhor a agitação entre as massas. Algo
tico e cultural. A experiência prática os en- semelhante observei várias vezes - ainda
sinará com rapidez. que em menores proporções e em orga-
nizações locais isoladas, e não em todo o
É preciso fazer todos os esforços ne- pais - na história do Partido Bolchevique.
cessários para que a cisão dos "esquer- Em 1907-1908, por exemplo, os bolche-
distas" não dificulte, ou dificulte o míni- viques "de esquerda" realizavam às ve-
mo possível, a fusão num só partido, ne- zes e em alguns lugares seu trabalho de
cessária e inevitável num futuro próximo, agitação entre as massas com maior êxi-
de todos os participantes do movimento to que nós. Isso se explica, em parte, por
operário que defendem sincera e honra- ser mais fácil aproximar-se das massas
damente o Poder Soviético e a ditadura com a tática da negação "pura e simples"
do proletariado. Para os bolcheviques da numa situação revolucionária, ou quando
Rússia foi uma felicidade singular dispo- ainda estão bem vivas as lembranças da
rem de 15 anos para lutar de modo siste- revolução. Isso, contudo, não chega a ser
mático e até o fim tanto contra os men- um argumento em favor de semelhante
cheviques (isto é, os oportunistas e os tática. Em todo caso, não há a menor dú-
"centristas") como contra os "esquerdis- vida de que um Partido Comunista que
tas" muito antes da luta direta das mas- queira ser realmente a vanguarda, o des-
sas pela ditadura do proletariado. Esse tacamento avançado da classe revolucio-
mesmo trabalho tem que ser feito agora nária, do proletariado, e que deseje,
na Europa e na América em ritmo de "mar- além disso aprender a dirigir a grande
cha forçada". Algumas pessoas, sobretu- massa não só proletária, como também
do as que figuram entre os frustrados can- não proletária, a massa trabalhadora e ex-
didatos a chefe, podem insistir durante plorada, tem obrigação de saber fazer
muito tempo em seus erros (se lhes, fal- propaganda, organizar e agitar da mane-
tam disciplina proletária e "honradez con- ira mais acessível, compreensível, clara e

63
viva tanto na "praça" urbana, abril, como gueses-capitalistas", quando os partidos
nas aldeias. (Nota do autor) dos Scheidemann e dos senhores
Ka u t s k i - C r í s p i e n s ã o p e q u e n o -
II - Os comunistas e os indepen- burgueses-democráticos; que não se
dentes na Alemanha pode escrever coisas como o parágrafo 4
da declaração, que diz:
No folheto expressei a opinião de
que o compromisso entre os comunistas "... Para continuar ganhando as
e a ala esquerda dos independentes é ne- massas proletárias para o comunismo
cessário e útil para o comunismo, mas tem enorme importância, quanto ao de-
que não é fácil realizá-lo. Os exemplares senvolvimento da ditadura do proletaria-
dos jornais que recebi depois confirmam do, uma situação em que a liberdade polí-
ambas as coisas. No n.º. 32 de Bandeira tica possa ser utilizada de modo ilimitado
Vermelha, órgão do C.C. do Partido e a democracia burguesa não possa atuar
Comunista da Alemanha (Die Rote como ditadura do capital..."
Fahne, Zentralorgan der Kommun. Partei
Deutschlands, Spartacusbund - União de Tal situação é impossível. Os chefes
Espartaco - de 26 de março de 1920), foi pequeno-burgueses, os Henderson
publicada uma "declaração" do referido (Scheidemann) o os Snowden (Críspien)
C.C. sobre o "putch" (complô, golpe) de alemães não vão além, nem podem ir,
Kapp-Lüttwitz19 e sobre o "governo soci- dos limites da democracia burguesa, que,
alista". Essa declaração é absolutamente por sua vez, não pode deixar de ser a dita-
justa tanto na premissa fundamental dura do capital. Do ponto de vista dos re-
quanto na conclusão prática. A premissa sultados práticos propostos com absoluta
fundamental consiste em que, atualmen- clareza pelo C.C. do Partido Comunista,
te, não há "base objetiva" para a ditadura essas coisas de modo algum deveriam ter
do proletariado, porquanto a "maioria sido escritas, erradas por principio e pre-
dos operários urbanos" apóia os inde- judiciais politicamente. Teria sido sufici-
pendentes. Conclusão: promessa de ente dizer (caso se quer dar demonstra-
"oposição leal" ao governo "socialista (is- ções de cortesia parlamentar): enquanto
to é, renúncia de preparar sua "derruba- a maioria dos operários urbanos seguir
da através da violência") excluindo-se os os independentes, nós, os comunistas,
partidos burgueses-capitalistas". não podemos impedir que esses operári-
os se libertem de suas últimas ilusões de-
A tática, sem dúvida alguma, é jus- mocrático-pequeno-burguesas (ou seja,
ta no fundamental. Mas, se não é neces- também "burguesas-capitalistas") com a
sário que nos detenhamos em pequenas experiência de "seu" governo. Isso basta
inexatidões de fórmula, é impossível, por para justificar o compromisso, que é real-
outro lado, deixar de assinalar que não se mente necessário e que deve consistir
pode chamar de "socialista" (numa de- em renunciar durante certo tempo às ten-
claração oficial do Partido Comunista) um tativas de derrubada pela força de um go-
governo de social-traidores; que não se verno que conta com a confiança da maio-
pode falar de exclusão "dos partidos bur- ria dos operários urbanos. No que con-

64
cerne à agitação diária entre as massas, te", convencidos de que ajudam o prole-
que dispensa a cortesia oficial, parlamen- tariado! Também os social-democratas
tar, poder-se-ia, naturalmente, acrescen- húngaros, que se batizaram de comunis-
tar: deixemos que miseráveis como os tas, queriam "ajudar" o proletariado
Scheidemann e filisteus como os Kautski- quando, por covardia e baixeza, conside-
Crispien demonstrem com seus atos até raram desesperada a situação do Poder
que ponto enganam os operários e a si Soviético na Hungria e se lamuriaram di-
próprios; seu governo "puro" realizará ante dos agentes dos capitalistas da
com "mais pureza que ninguém" o traba- Entente e seus verdugos.
lho de "limpar" as cavalariças dos Augias
do socialismo, do social-democratismo. e __________________
demais variações da social-traiçào. * Isso foi explicado, diga-se de pas-
sagem, com extraordinária clareza, con-
A verdadeira natureza dos atuais creção e exatidão, à maneira marxista,
chefes do "Partido Social-democrata pelo excelente órgão do Partido
Independente da Alemanha" (desses che- Comunista Austríaco Bandeira Vermelha
fes de quem se diz, fugindo à verdade, em seus n.ºs de 28 e 30 de março de
que já perderam toda a influência e que, 1920 (Die Rote Fahne, Wien 1920, n.ºs
na realidade, ainda são mais perigosos 226 und 267; L. L.: Ein neuer Abschnitt
para o proletariado que os social- der deutschen Revolution). (L.L.: Uma
democratas húngaros, que se denomina- nova etapa da revolução alemã). (Nota
vam comunistas e prometiam "apoiar" a da Redação)
ditadura do proletariado) manifestou-se
mais de uma vez durante a korniloviada III - Turati e companhia na Itália
alemã, isto é durante o "putch" dos se-
nhores Kapp e Lüttwitz*. Exemplo disto, Os números do jornal italiano II
pequeno mas eloqüente, nos é dado pe- Soviet a que me referi confirmam tudo
los artigos de Karl Kautski - Os minutos que eu disse no folheto a respeito do erro
decisivos (Entscheidende Stunden), pu- do Partido Socialista Italiano, que tolera
blicado em Freiheit (A Liberdade, órgão em suas fileiras membros desse tipo e, in-
dos independentes) aos 30 de março de clusive, um grupo de parlamentares des-
1920 - e de Arthur Crispien - Sobre a situ- sa espécie. Mais ainda o confirma uma
ação política, no mesmo jornal, n.º. 14 de testemunha desinteressada, o corres-
abril de 1920. Estes senhores carecem to- pondente em Roma do jornal liberal bur-
talmente da capacidade de pensar e .ra- guês The Manchester Guardian (Ingla-
ciocinar como revolucionários. São uns terra), que no número de 12 de março de
choramingas democratas pequeno- 1920 publicou uma entrevista sua com
burgueses, mil vezes mais, perigosos Turati.
para o proletariado declarando-se parti-
dários do Poder Soviético e da ditadura "0 Sr. Turati - diz o correspondente
do proletariado, pois, de fato, cometerão – é de opinião que o perigo revolucioná-
inevitavelmente uma traição em cada mo- rio não é tão grande que possa suscitar te-
mento difícil e perigoso... "sinceramen- mores na Itália. Os maximalistas jogam

65
com o fogo das teorias soviéticas exclusi- o enriquecimento dos capitalistas ! Como
vamente para manter as massas em esta- são bem conhecidos por nós, russos, to-
do de tensão e excitação. Essas teorias dos esses discursos mencheviques !
são, contudo, noções puramente fanta- Como é valiosa a confissão de que as mas-
sistas, programas imaturos, que não ser- sas estão a favor do Poder Soviético !
vem para ser usados na prática. Servem Como é estúpida e vulgarmente burgue-
apenas para manter as classes trabalha- sa a sua incompreensão do papel revolu-
doras em estado de expectativa. Essa cionário das greves que crescem espon-
gente que as emprega como isca para taneamente ! Sim, sem dúvida, o corres-
deslumbrar os proletários, vê-se obriga- pondente inglês do jornal liberal burguês
da a enfrentar uma luta cotidiana para prestou um mal serviço aos senhores,
conquistar algumas melhorias econômi- Turati & Cia. e confirmou de modo exce-
cas, muitas vezes insignificantes, a fim de lente o quanto são justas as exigências
adiar o momento em que as classes tra- do camarada Bordiga e seus amigos do I1
balhadoras irão perder as ilusões e a fé Soviet, que reclamam do Partido
em seus mitos queridos. Dai esse grande Socialista Italiano, se este quer realmen-
surto de greves de todas as grandezas e a te estar a favor da III Internacional, a ex-
qualquer pretexto, inclusive as últimas pulsão de suas fileiras, cobrindo-os de
nos Correios e nas ferrovias, que tornam opróbrio, dos senhores Turati & Cia. e sua
ainda mais grave a situação, já difícil em transformação num Partido Comunista
si. O país está excitado pelas dificuldades autêntico, tanto por seu nome quanto
provenientes de seu problema adriático, por seus atos.
sente-se esmagado por sua dívida exter-
na e por sua desmedida emissão de pa- IV - Conclusões erradas de premis-
pel-moeda, e, contudo, ainda está muito sas justas
longe de compreender a necessidade de
assimilar a disciplina no trabalho, único fa- De sua justa crítica aos senhores
tor capaz de restabelecer a ordem e a Turati & Cia., porém, o camarada Bordiga
prosperidade.. - " Está claro como a luz e seus amigos "esquerdistas" tiram a con-
do dia que o correspondente inglês deu li- clusão falsa de que é prejudicial em geral
berdade à sua pena e disse uma verdade participar do parlamento. Os "esquerdis-
que, provavelmente, o próprio Turati. E tas", não podem, nem de longe, apresen-
seus defensores, cúmplices e inspirado- tar argumentos sérios em defesa dessa
res burgueses na Itália ocultam e procu- opinião. Simplesmente desconhecem (ou
ram embelezar. Essa verdade consiste tratam de esquecer) os exemplos inter-
em que as idéias e o trabalho político dos nacionais de utilização verdadeiramente
senhores Turatí, Treves, Modigliani, revolucionária e comunista dos parla-
Dugoni e Cia. são exatamente como o cor- mentos burgueses, indiscutivelmente pro-
respondente inglês esboça.. Isso é uma veitosa para preparar a revolução prole-
autêntica social-traição. Como é signifi- tária. Simplesmente não imaginam uma
cativa a simples defesa da ordem e da dis- forma "nova" de utilização do parlamen-
ciplina para os operários que vivem na es- tarismo e esbravejam, repetindo-se até o
cravidão assalariada, que trabalham para infinito, contra a utilização "antiga", não

66
bolchevique. sê-lo, se os que trabalham num e noutro
setor são verdadeiros comunistas, verda-
Nisso, precisamente, reside seu deiros membros do partido proletário, de
erro básico. Não só no terreno do parla- massas. Mas, tanto numa como noutra -
mentarismo, mas em todos os terrenos e em qualquer esfera de trabalho no capi-
da atividade humana,. o comunismo talismo e no período de transição do capi-
deve apresentar (e não, poderá fazê-lo talismo para o socialismo - é impossível
sem um trabalho prolongado, persistente evitar as dificuldades e as tarefas origina-
e tenaz) algum princípio novo, que rompa is que o proletariado deve vencer e resol-
de modo radical com as tradições da II ver para utilizar em seu benefício pessoas
Internacional (conservando e desenvol- que procedem de meios burgueses, para
vendo ao mesmo tempo tudo que esta alcançar a vitória sobre os preconceitos e
apresentou de bom). a influência dos intelectuais burgueses,
para debilitar a resistência do ambiente
Tomemos, por exemplo, o trabalho pequeno-burguês (e, posteriormente,
de imprensa. Os jornais, folhetos e mani- para transformá-lo por completo).
festos. cumprem uma função necessária
de propaganda, agitação e organização. Não vimos, por acaso, em todos os
Não pode haver um movimento de mas- países, até a guerra de 1914-1918, uma
sas em nenhum país, por menos civiliza- extraordinária abundância de exemplos
do. que ele seja, sem um aparelho de im- de anarquistas, sindicalistas e demais ele-
prensa. E nem os gritos contra os "che- mentos muito "esquerdistas" que fulmi-
fes", assim como os juramentos de res- navam o parlamentarismo, que zomba-
guardar a pureza das massas. contra a in- vam dos parlamentares socialistas eiva-
fluência dos chefes, podem eliminar a ne- dos de vulgaridade burguesa, fustigavam
cessidade de utilizar-se nesse trabalho seu arrivismo, etc., etc.,. e faziam a mes-
pessoas procedentes dos meios intelec- ma carreira burguesa através do jornalis-
tuais burgueses, ou podem livrar-nos da mo, através do trabalho nos sindicatos?
atmosfera e do ambiente democrático- Acaso não são típicos os exemplos dos se-
burgueses, "de propriedade privada", em nhores Jouhaux e Merrheim, para só fa-
que se realiza esse trabalho sob o regime larmos na França ?
capitalista. Passados já dois anos e meio
depois da derrubada da burguesia e da A infantilidade de "negar" a partici-
conquista do Poder político pelo proleta- pação no parlamentarismo consiste, exa-
riado ainda sentimos em torno de nós tamente, em que com esse método tão
essa atmosfera, esse ambiente de rela- "simples", "fácil" e pseudo-
ção de propriedade privada, democráti- revolucionário querem "resolver" a difícil
co-burguesas, de massas (camponesas, tarefa de lutar contra as influências demo-
artesãs). crático-burguesas no seio do movimento
operário e, na realidade, a única coisa
0 parlamentarismo é uma forma de que fazem é fugir de sua própria sombra,
trabalho; o jornalismo é outra. O conteú- fechar os olhos diante das dificuldades e
do pode ser comunista em ambas, e deve desembaraçar-se delas apenas com pala-

67
vras. Não há dúvida de que o arrivismo so – partido proletário elementos proce-
mais desavergonhado, a utilização bur- dentes da intelectualidade burguesa.
guesa dos postos no parlamento, a gri- Penetrarão também nos Soviets, nos tri-
tante deformação reformista da ação par- bunais e no aparelho administrativo, pois
lamentar e a vulgar rotina pequeno- é impossível construir o comunismo com
burguesa são traços peculiares, habituais outra coisa que não seja o material huma-
e predominantes, engendrados pelo capi- no prolongada, nas bases da ditadura do
talismo em toda parte, e não só fora proletariado, os próprios proletários, que
como também dentro do movimento ope- não se libertam de seus preconceitos pe-
rário. Mas o capitalismo e o ambiente bur- queno-burgueses de repente, por mila-
guês por ele criado (e que mesmo depois gre, por obra e graça do espírito santo, ou
da derrubada da burguesia só desapare- pelo efeito mágico de uma palavra de or-
ce muito lentamente, porquanto o cam- dem, de uma resolução ou um decreto,
pesinato faz a burguesia renascer inces- mais sim exclusivamente através de uma
santemente) engendram inevitavelmen- luta de massas longa e difícil contra a in-
te em todas as esferas do trabalho e da vi- fluência das idéias pequeno-burguesas
da, no fundo, o mesmo arrivismo bur- entre as massas. Sob o Poder Soviético,
guês, o mesmo chovinismo nacional, a essas mesmas tarefas que o antiparla-
mesma vulgaridade pequeno-burgues, mentarista afasta agora com um gesto
etc., com insignificantes variações de for- cheio de orgulho, altivez, leviandade e in-
ma. fantilidade, essas mesmas tarefas ressur-
girão dentro dos Soviets, dentro da admi-
Imaginais ser, caros boicotadores e nistração soviética, entre os "procurado-
antiparlamentaristas, "terrivelmente re- res" soviéticos (eliminamos na Rússia, e
volucionários", mas, na realidade, vos as- fizemos bem em eliminar, a advocacia
sustastes diante das dificuldades relati- burguesa, e entretanto ela renasce entre
vamente pequenas da luta contra a in- nós sob o disfarce dos "procuradores"20
fluências burguesas no movimento ope- "soviéticos"). Entre os engenheiros so-
rário; no entanto, a vossa vitória, isto é, a viéticos, os advogados soviéticos e os
derrubada da burguesia e a conquista do operários privilegiados (isto é, os de mais
Poder político pelo proletariado criará es- alta qualificação e melhor colocados) nas
sas mesmas dificuldades em proporções fábricas soviéticas vemos renascer de
maiores, incomensuravelmente maiores. modo constante absolutamente todos os
Vós vos assustastes como crianças com a aspectos negativos próprios do parla-
pequena dificuldade que amanhã e depo- mentarismo burguês, e só através de
is de amanhã tereis, de qualquer manei- uma luta renovada, incansável, longa e te-
ra, de aprender, e aprender completa- naz do espírito de organização e discipli-
mente, a vencer as mesmas dificuldades, na proletárias vamos vencendo - a pouco
em proporções imensamente mais consi- e pouco - este mal.
deráveis.
É claro que sob o domínio da bur-
Sob o Poder Soviético, tratarão de guesia é muito "difícil" vencer os costu-
penetrar ainda mais no vosso – e no nos- mes burgueses no próprio partido, isto é,

68
no partido operário: é "difícil" expulsar do
partido os chefes parlamentaristas acos- Se os camaradas "esquerdistas"e
tumados com os preconceitos burgueses antiparlametares não aprenderam agora
e por eles irremediavelmente corrompi- a vencer uma dificuldade que é até pe-
dos; é "difícil" submeter à disciplina pro- quena, pode-se dizer com segurança que
letária o número absolutamente neces- ou não estarão em condições de instau-
sário (mesmo que numa quantidade bem rar a ditadura do proletariado, não pode-
limitada) de pessoas que procedem da rão subordinar e transformar em grande
burguesia; é "difícil" criar no parlamento escala os intelectuais e instituições bur-
burguês uma fração comunista plena- gueses, ou serão obrigados a terminar de
mente digna da classe operária; é "difícil" aprender a toda velocidade, pressa que
conseguir que os parlamentares comu- os fará causar grandes danos à causa pro-
nistas não se deixem levar pelas frivolida- letária, cometer maior número de erros
des parlamentaristas dos burgueses, e que os que comumente cometeriam, dar
que se entreguem ao mais que essencial mostras de debilidade e incapacidade aci-
trabalho de propaganda, agitação e orga- ma do normal, etc., etc.
nização das massas. Não há dúvida de
que tudo isso é "difícil; foi difícil na Rússia Enquanto a burguesia não for der-
e é incomparavelmente mais difícil na rubada - e, depois de sua queda, enquan-
Europa Ocidental e na América, onde a to não desaparecerem totalmente a pe-
burguesia, as tradições democrático- quena economia e a pequena produção
burguesas, etc., são muito mais fortes. mercantil - o ambiente burguês, os hábi-
tos de propriedade privada e as tradições
Mas todas essas "dificuldades"são, pequeno-burguesas prejudicarão o tra-
na verdade, pueris se as compararmos balho do proletariado tanto dentro como
com as tarefas exatamente da mesma es- fora do movimento operário, não só na
pécie que o proletariado terá de resolver atividade parlamentar, como, inevitavel-
inevitavelmente para triunfar, durante a mente, em todas e em cada uma das esfe-
revolução proletária e depois de tomar o ras da atividade social, em todos os seto-
Poder. Em comparação com estes proble- res culturais e políticos, sem exceção. E
mas, verdadeiramente gigantescos, que constitui um erro profundíssimo, pelo
surgirão sob a ditadura do proletariado – qual inapelavelmente se deverá pagar
quando será preciso reeducar milhões de mais tarde, procurar livrar-se ou esqui-
camponeses e pequenos proprietários, var-se de uma das tarefas desagradáveis
centenas de milhares de empregados, ou das dificuldades surgidas numa das es-
funcionários e intelectuais burgueses, feras de trabalho. É preciso aprender, e
para subordiná-los todos ao Estado pro- aprender plenamente, a dominar todos
letário e extirpar-lhes os hábitos e tradi- os aspectos da atividade e do trabalho,
ções burgueses – tornar-se de uma facili- sem nenhuma exceção, a vencer em toda
dade infantil criar sob o domínio da bur- parte todas as dificuldades e todos os cos-
guesia uma fração autenticamente comu- tumes, tradições e hábitos burgueses.
nista do verdadeiro partido proletário no Qualquer outra maneira de encarar a
parlamento burguês. questão é totalmente despida de serieda-

69
de, é infantil. ana do Partido; procuram também, direta
ou indiretamente, aplicar no Partido
12 de maio de 1920 Comunista as palavras de ordem oposici-
onistas, contra as quais o Partido
V Comunista Holandes e todos os seus ór-
gãos empenharam-se e empenham-se
Na edição russa desse livro apre- até hoje na mais enérgica luta.
sentei com certa inexatidão a conduta do Saudações fraternais
Partido Comunista Holandês em seu con- (em nome da delegação holande-
junto, no terreno da política revolucioná- sa)
ria mundial. Por isso, aproveito a oportu- D. I. Wijnkoop
nidade para publicar a carta abaixo trans-
crita, carta de nossos camaradas holan-
deses sobre este problema. Além disso, Notas
aproveito também para corrigir a expres- 1 A Doença Infantil, do "Esquerdis-
são "tribunistas holandeses" que empre- mo" no Comunismo foi escrito por Lênin
guei no texto russo, substituindo-a, pelas em abril de 1920, e o Apêndice em 12 de
palavras "alguns membros do Partido maio do mesmo ano. Foi publicado na im-
Comunista Holandês". prensa, de 8 a 10 de junho em russo, e
I. Lênin em julho em alemão, francês e inglês.
Carta de Wíjnkoop Lênin controlou pessoalmente os prazos
Moscou, 30 de junho de 1920 marcados para a composição e a impres-
Querido camarada Lênin: são do livro, a fim de que ele fosse edita-
Graças à sua amabilidade, os mem- do antes do início dos trabalhos do II
bros da delegação holandesa ao II Congresso da Internacional Comunista.
Congresso da Internacional Comunista ti- O livro foi distribuído entre todos os dele-
vemos a possibilidade de ler seu livro A gados ao II Congresso. De julho a no-
Doença Infantil do "Esquerdismo" no vembro de 1920, foi reeditado em ale-
Comunismo, antes de ser ele publicado mão em Leipzig, em francês em Paris e
nos idiomas da Europa Ocidental. Nesse li- em inglês em Londres.
vro você ressalta várias vezes a sua desa-
provação do papel desempenhado por al- No manuscrito de A Doença Infantil
guns membros do Partido Comunista do "Esquerdismo" no Comunismo há um
Holandês na política internacional, subtítulo: Ensaio de palestra popular so-
bre a estratégia o a tática marxistas. Em
Devemos protestar, contudo, con- todas as edições publicadas em vida de
tra o fato de você atribuir ao Partido Lênin. esse subtítulo foi suprimido. Na 4ª
Comunista a responsabilidade pelos atos edição das obras de V. I. Lênin, A Doença
desses membros, o que é extremamente Infantil do "Esquerdismo" no Comunismo
inexato. Além disso, é injusto, pois esses foi publicada de acordo com a primeira
membros do Partido Comunista Holandês edição do livro, cuja revisão foi feita por
participam muito pouco, ou não partici- Lênin..- pág. 4
pam absolutamente, da atividade cotidi-

70
2 Os acontecimentos do Lena de nos trabalhos de Lênin "Prefácio da ver-
1912: alusão ao metralhamento dos ope- são russa do livro Cartas de J. Becker, J.
rários dos areais auríferos do Lena (Sibé- Dietzgen, F. Engels, K. Marx e outro"
ria). em abril de 1912 pelas tropas czaris- (Obras, 4ª ed. russa, tomo 12, pág.
tas. - pág. 20 330/331); 0 Programa Agrário da Social-
democracia na Revolução Russa (Obras,
3 Longuetismo: corrente centrista 4ª ed. russa, t. 15 , pág, 154); 0
do Partido Socialista Francês, à frente da Pacifismo Inglês e o Desamor Inglês pela
qual figurava Jean Longuet. Teoria (Obras, 4ª ed, russa, t. 21, pág.
234) e outras. - pág. 21
Durante a primeira guerra mundial,
os longuetistas mantiveram uma posição 6 Partido Social-democrata
social-pacifista. Depois do triunfo da Independente da Alemanha: partido cen-
Grande Revolução Socialista de Outubro trista fundado em abril de 1917
na Rússia, declararam-se, em palavras,
partidários da ditadura do proletariado, Dividiu-se em seu Congresso de
mas, na realidade, eram seus inimigos. Halle, em outubro de, 1920. Uma parte
Seguiram a política de reconciliação com ponderável do partido fundiu-se, em de-
os social-chovinistas e apoiaram o rapace zembro do mesmo ano, com o Partido
Tratado de Versafiles. Em dezembro de Comunista da Alemanha. Os elementos
1920, os longuetistas, juntamente com direitistas formaram um partido isolado,
os reformistas desavergonhados, sepa- adotando a antiga, designação de Partido
raram-se do partido aderiram à social-democrata Independente. Em
Internacional chamada, de Segunda e 1922, os "independentes" reingressaram
meia e depois do desmoronamento des- no Partido Social-democrata Alemão.
ta, voltaram à II Internacional. - pág. 21
7 Espartaquistas: membros da Liga
4 0 P a r t i d o Tr a b a l h i s t a "Espartaco", fundada durante a primeira
Independente da Inglaterra (Indepen- guerra mundial, em janeiro de 1916, sob
dent Labour Party) fot fundado em 1893. a direção de K. Liebknecht, R.
À sua frente estavam James keir Hardie, Luxemburgo, F. Mehring, C. Zetkin e ou-
R. MacDonald e outros. Pretendendo ser tros. Os espartaquistas fizeram propa-
independente politicamente dos partidos ganda revolucionária entre as massas
burgueses, o Partido Trabalhista contra a guerra imperialista e desmasca-
Independente era, na realidade, "inde- raram a política de rapina do imperialis-
pendente do socialismo, mas dependen- mo alemão e a traição dos chefes social-
te do liberalismo" (Lênin). - pág. 21 democratas. Mas os espartaquistas, es-
querdistas alemães, não se depuraram
5 Fabianos: membros da "Socieda- dos erros mencheviques, nas questões
de Fabiana", reformista e extremamente mais importantes da teoria e da política.
oportunista, fundada na Inglaterra em A crítica dos erros dos esquerdistas ale-
1884 por um grupo de intelectuais bur- mães pode ser encontrada nas obras de
gueses. Veja-se a definição dos fabianos Lênin A Respeito do Folheto de Junius

71
(Obras, 4ª ed. russa, t. 22, pág. coincidiu, em seus aspectos fundamenta-
291/305), Acerca de uma Caricatura do is, com a dos governos conservadores. -
Marxismo e Sobre o Economismo pág. 31
Imperialista (Obras, 4ª ed. russa, t. 23,
pág. 16/64) e outras, e na carta de I.V. 9 Partido Democrata
Stálin à redação da revista A Revolução Constitucionalista - (k. d. - kadetes) - prin-
Proletária, carta intitulada Sobre cipal partido burguês na Rússia, partido
Algumas Questões da História do da burguesia liberal-monárquica, funda-
Bolchevismo (Questões do Leninismo, do em outubro de 1905. Acobertando-se
11ª ed. russa, pág. 350/361). Em abril de sob um falso caráter democrático e deno-
1917, os espartaquistas ingressaram no minando-se o partido da "liberdade popu-
Partido Social-democrata Independente lar", os democratas constitucionalistas
da Alemanha, partido centrista, conser- trataram de ganhar para suas posições o
vando dentro dele sua independência or- campesinato. Inclinavam-se pela manu-
gânica. Depois da revolução de novem- tenção do czarismo sob forma de monar-
bro de 1918 na Alemanha, os esparta- quia constitucional.
quistas romperam com os "independen-
tes" e em dezembro do mesmo ano fun- Depois da vitória da Revolução
daram o Partido Comunista da Alemanha. Socialista de Outubro, os democratas
-- pág. 27 constitucionalistas organizaram "com-
plots" e insurreições contra-
8 O Partido Trabalhista (Labour revolucionários contra a República
Party) foi fundado em 1900 como um Soviética. - pág. 34
agrupamento de organizações operárias,
com a finalidade de criar uma, represen- 10 "Tribunistas" holandeses: deno-
tação operária no parlamento. Esse agru- minação dada por Lênin aos membros do
pamento denominou-se, inicialmente, Partido Comunista Holandês.
"Comitê de Representação Operária" e, a Inicialmente, os tribunistas formavam o
partir de 1906, Partido Trabalhista. Em grupo esquerdista do Partido Operário
1913, Lênin caracterizou o Partido Social-democrata Holandês, que em
Trabalhista como "a união dos sindicatos 1907 organizou a publicação do jornal A
não socialistas com o Partido Trabalhista Tribuna (De Tribune). Em 1909 foram ex-
Independente, oportunista ao extremo". pulsos do Partido Operário Social-
Durante a guerra imperialista mundial de democrata e constituíram um partido in-
1914/1918, os líderes do Partido dependente: o Partido Social-democrata
Trabalhista mantiveram uma posição soci- da Holanda, Os tribunistas representa-
al-chovinista. vam a ala esquerda do movimento operá-
rio da Holanda, mas não constituíam um
O Partido Trabalhista subiu ao partido revolucionário conseqüente. Em
Poder em 1924, 1929, 1945 "e 1950. A po- 1918 participaram da fundação do
lítica dos -governos trabalhistas dentro Partido Comunista da Holanda. - pág. 38
do país baseou-se na colaboração de clas-
ses com a burguesia; sua política exterior 11 Horner: A. Pannekoek - pág. 40

72
os Industriais do Mundo" lutaram ativa-
12 Diário Operário Comunista mente contra a guerra imperialista, razão
(Kommunistische Arbeiterzeitung: órgão pela qual foram cruelmente perseguidos.
do grupo pequeno-burguês, anarco- A organização chegou a ter naquele pe-
sindicalista, de comunistas "de esquer- ríodo mais de 100.000 filiados. Ao obser-
da" que se separou em 1919 do Partido var que "estamos diante de um movi-
Comunista da Alemanha (espartaquis- mento profundamente proletário e de
tas). O jornal circulou de 1919 até 1927. massas", Lênin criticava a linha política er-
Os comunistas "de esquerda" alemães rada dos dirigentes dos "Operários
não cumpriram o acordo firmado no III Industriais do Mundo", que caíam no sec-
Congresso da Internacional Comunista, tarismo "de esquerda", negando-se a atu-
que deles exigia a renúncia à tática sectá- ar entre as massas que aderiam aos sin-
ria e a adesão ao Partido Comunista da dicatos reacionários e pronunciando-se
A l e m a n h a , s e n d o e xc l u í d o s d a contra a participação nos parlamentos
Internacional Comunista. Os dirigentes burgueses.
dos comunistas "de esquerda" passa-
ram-se para o campo da contra- Posteriormente, a associação "Ope-
revolução. __ pág. 40 rários Industriais do Mundo", da qual se
separaram os elementos autenticamente
13 Depois da revolução de feverei- revolucionários, transformou-se numa or-
ro de 1917 e até 1919, Inclusive, o núme- ganização sectária pouco numerosa, sem
ro de membros do Partido modificou-se nenhuma influencia entre as massas ope-
da seguinte maneira: quando se realizou rárias. - pág. 55
a VII Conferência do P.O.S.D.R. (bolche-
vique) - Conferência de Abril - em 1917, o 15 O Partido Socialista Italiano foi
Partido tinha 80.000 membros; ao reali- fundado em 1892 como "Partido dos
zar-se o VI Congresso, julho/agosto de Operários Italianos"; em 1893 adotou o
1917, cerca de 240 000; ao começar o VII nome de "Partido Socialista Italiano".
Congresso do P. C. R. (bolchevique, em Depois da vitória da Grande Revolução
março de 1918, mais de 270 000; e no Socialista de Outubro na Rússia, a ala es-
VIII Congresso do P.C.R. (bolchevique), querda das fileiras do Partido Socialista
em março de 1919, 313 766. - pág, 46 Italiano viu-se fortalecida Em janeiro de
1921, no Congresso do Partido realizado
14 "Operários Industriais do em Livorno os esquerdistas romperam
Mundo" ("Industrial Workers of the com o Partido Socialista, convocaram seu
World", I W W ): organização dos operá- Congresso e fundaram o Partido
rios dos E.U.A., fundada em 1905. Entre Comunista da Itália.
seus dirigentes e membros de base esta-
vam difundidas as opiniões anarco- Nos anos de ditadura fascista na
sindicalistas, que se traduziam na renún- Itália. tornou a formar-se uma influente
cia à luta política, na negação da necessi- ala esquerda no Partido Socialista
dade de participar dos parlamentos bur- Italiano. Em 1934, o Partido Socialista
gueses, etc. Em 1914/1918, os "Operári- concertou um pacto de unidade de ação

73
com o Partido Comunista da Itália, pacto
que serviu de base para a colaboração en- 18 O "Partido Socialista Operário"
tre os dois partidos durante a segunda foi fundado em 1903 por um grupo de so-
guerra mundial e no período de após- cial-democratas de esquerda dissidente
guerra. Em janeiro de 1947 um grupo de da Federação Social-democrata. A "Soci-
direitistas encabeçado por Saragat aban- edade Socialista de Gales do Sul" era um
donou as fileiras do Partido Socialista e pequeno grupo, integrado inicialmente
formou o chamado "Partido Socialista por mineiros do País de Gales. A "Federa-
dos Trabalhadores Italianos", que desde ção Socialista Operária"' era uma organi-
1952 se denomina Partido Social- zação pouco numerosa, surgida da "Soci-
democrata. - pág. 71 edade de defesa dos direitos eleitorais da
16 Lênin refere-se a um trecho da mulher" e integrada principalmente por
carta de F. Engels a F. Sorge, datada de mulheres.
29 de novembro de 1886, na qual Engels,
criticando os emigrados social- Ao ser fundado o Partido
democratas residentes na América, diz Comunista da Grã-B retanha (o
que, para eles, a teoria "é um dogma e Congresso que o estatuiu realizou-se de
não um guia para a ação". -, pág. 78 31 de julho a 1 de agosto de 1920), que in-
cluiu em seu programa um ponto sobre a
17 O "Partido Socialista Britânico participação do Partido nas eleições par-
(British SociMist Party) foi fundado em lamentares e sobre a filiação ao Partido
1911, em Manchester. Realizou a propa- Trabalhista, todas as organizações "es-
ganda e a agitação dentro do espírito mar- querdistas" negaram-se a ingressar no
xista e era um partido "não oportunista, partido. No Congresso do Partido
verdadeiramente independente dos libe- Comunista realizado em janeiro de 1921,
rais" (Lênin). Seus pequenos efetivos e o a Sociedade Socialista de Gales do Sul e a
isolamento das massas davam-lhe certo Federação Socialista Operária (que havi-
caráter sectário. am adotado nessa ocasião as denomina-
ções de Partido Comunista Operário e
Durante a primeira guerra mundial Partido Comunista) fundiram-se com o
determinaram-se, nele duas tendências: Partido Comunista da Grã-Bretanha, que
uma abertamente social-chovinista, enca- tomou o nome de Partido Comunista
beçada por Hyndman, e outra internacio- Unificado da Grã-Bretanha. A direção do
nalista, chefiada por A. Inkpin e outros. O Partido Socialista Operário negou-se a
partido cindiu-se em abril de 1916. participar da unificação. - pág. 87
Hyndman e seus correligionários ficaram
em minoria e abandonaram suas fileiras. 19 Lênin refere-se ao golpe de
A partir daquele momento, ficaram à fren- Estado monárquico-militar na Alemanha,
te do Partido Socialista Britânico elemen- ao chamado "putch de Kapp", efetuado
tos internacionalistas. A esse partido cou- pela reacionária camarilha militar alemã
be a iniciativa de constituir o Partido sob a direção de Kapp. Os conspiradores
Comunista da Grã-Bretanha, fundado em prepararam o golpe de Estado em evi-
1920. - pág. 87 dente conivência com o Governo social-

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demócrata. A 13 de março de 1920 os gol- democratas, que seguiram uma política.
pistas deslocaram unidades militares de repressão aos operários. - pág. 128
para Berlim e, não encontrando resistên- 20 "Procuradores" "Soviéticos": co-
cia do Governo, declararam-no derruba- légios de procuradores criados em feve-
do e formaram um novo governo. Os ope- reiro de 1918, junto aos Soviets de depu-
rários berlinenses responderam ao golpe tados operários, soldados, camponeses e
de Estado com a greve geral. O Governo cossacos. Em outubro de 1920 esses colé-
Kapp caiu em virtude da pressão operá- gios foram suprimidos. - pág. 134
ria, retornando ao Poder os social-

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