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BACIAS HIDROGRÁFICAS: PLANEJAMENTO E GERENCIAMENTO

1
Waldenize Manoelina do Nascimento
2
Maria Garcia Villaça

RESUMO: Nas últimas décadas o homem vem se conscientizando que a água é um


bem finito. Sua preocupação se dá a partir do momento em que a escassez da água
provoca danos tanto ao meio ambiente quanto a ele próprio. Estudiosos sobre
Recursos Hídricos definiram a Bacia Hidrográfica como unidade de análise,
planejamento e gerenciamento mais eficaz para caracterizar e combater os impactos
ambientais. Este artigo procura estabelecer de forma sistematizada uma referência
sobre Planejamento e Gerenciamento de Bacias Hidrográficas bem como métodos e
técnicas para recuperação das mesmas.
Palavras-chave: Bacias Hidrográficas, Planejamento, Gerenciamento.

ABSTRACT: In the last few decades the man comes if acquiring knowledge that the
water is a well finite one. Its concern if gives from the moment where the scarcity of
the water provokes damages to the environment in such a way how much proper it.
Studious on Hydrics Resources they had defined the drainage basin as unit of
analysis, planning and more efficient management to characterize and to fight the
ambient impacts. This article looks for to establish of form systemize a reference on
Planning and Management of drainage basins as well as methods and techniques for
recovery of the same ones
Key words: Drainage basins, Planning, Management.

Introdução

1
Mestranda do Programa de Pós-Graduação do Departamento de Geografia da Universidade Federal de Mato
Grosso, PPGGEO/UFMT. Membro do Grupo de Estudos Estratégico e de Planejamento Integrado GEEPI/UFMT.
E-mail: waldnascimento@gmail.com
2
Mestranda do Programa de Pós-Graduação do Departamento de Geografia da Universidade Federal de Mato
Grosso, PPGGEO/UFMT. E-mail: maria.villaca@hotmail.com

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Revista Eletrônica da Associação dos Geógrafos Brasileiros – Seção Três Lagoas
Três Lagoas – MS – Nº 7 – ano 5, Maio de 2008
Ao longo do tempo o homem vem se utilizando dos recursos hídricos

sem a preocupação de ver nestes um bem finito. A crescente demanda pelo uso dos

recursos naturais foi acompanhada nas últimas décadas pela preocupação com a

quantidade e qualidade desses recursos. Dessa forma, cresceu enormemente o

valor da Bacia Hidrográfica como unidade de análise e planejamento ambiental.

Este estudo procura estabelecer de forma sistematizada uma

referência sobre Planejamento e Gerenciamento de Bacia Hidrográfica, cuja

degradação ambiental está tipicamente caracterizada por: solos empobrecidos e

erodidos, instabilidade hidrográfica, produtividade primária reduzida e diversidade

biológica ameaçada, sendo possível avaliar de forma integrada as ações humanas

sobre o ambiente e seus desdobramentos no equilíbrio hidrológico, presente no

sistema representado pela Bacia Hidrográfica.

Este artigo tem por objetivo apresentar de maneira sistematizada os

conceitos aplicados ao Planejamento e Gerenciamento, bem como os Métodos e as

Técnicas para recuperação das Bacias Hidrográficas, vistos na opinião de alguns

autores que estudaram o tema. A princípio foram realizados estudos bibliográficos

que tratam do assunto, e, posteriormente, discussões e reflexões que resultaram na

elaboração deste trabalho.

Definição de Bacia Hidrográfica

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Três Lagoas – MS – Nº 7 – ano 5, Maio de 2008
A bacia hidrográfica foi definida segundo Guerra (1978, p. 48), como

um conjunto de terras drenadas por um rio principal e seus afluentes. Inúmeros

esquemas ou representações gráficas deixam também de apresentar, por exemplo,

os limites internos do sistema de uma bacia hidrográfica, por onde circula e atua

grande parte da água envolvida. Para não ocorrer em tais equívocos, é possível

definir bacia hidrográfica como:

... um sistema que compreende um volume de materiais,


predominantemente sólidos e líquidos, próximos à superfície
terrestre, delimitado interno e externamente por todos os processos
que, a partir do fornecimento de água pela atmosfera, interferem no
fluxo de matéria e de energia de um rio ou de uma rede de canais
fluviais. Inclui, portanto, todos os espaços de circulação,
armazenamento, e de saídas de água e do material por ela
transportado, que mantêm relações com esses canais. (Rodrigues &
Adami, in: Venturi, 2005, p. 147-148).

A rede fluvial também chamada de rede de drenagem ou de rede

hidrográfica é constituída por todos os rios de uma bacia hidrográfica,

hierarquicamente interligados. É um dos principais mecanismos de saída (output) da

água, principal matéria em circulação na bacia hidrográfica. Tanto a bacia

hidrográfica quanto a rede hidrográfica não possuem dimensões fixas. Pode-se

subdividir uma bacia hidrográfica considerando-se as ordens hierárquicas de seus

canais. Rodrigues & Adami in: Venturi (2005, p.163) afirma que:

...o primeiro modo de hierarquização amplamente aplicado foi


proposto por Horton em 1945. Nesse esquema, os canais sem
afluentes são considerados de 1ª ordem, e, apenas na confluência
de dois rios de igual ordem, acrescenta-se mais um à ordenação, ou
seja, dois canais de mesma ordem hierárquica, formam um canal de
ordem hierárquica superior. (Fig. 01)

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Fig. 01: Hierarquia da rede segundo Horton.
Fonte: Rodrigues & Adami. In: Venturi (2005)

Numa bacia hidrográfica os processos de circulação de matéria e de

energia que nela se operam, não envolvem apenas os canais fluviais e planícies de

inundação, mas incluem as vertentes, nas quais os processos internos são de suma

importância. Para reconhecer os limites espaciais de bacias hidrográficas é

necessário, considerar em primeiro lugar a distribuição espacial do conjunto dos

processos envolvidos em todos os subsistemas.

Nas regiões tropicais úmidas, segundo Rodrigues & Adami in: Venturi

(2005, p.148),

...essas definições conceituais e espaciais são ainda mais


necessárias, pois grande parte da água que precipita em bacias
hidrográficas pode ficar reservada ou circular em vários níveis e
subsistemas: copas, folhas, caules, tronco e raízes da cobertura
vegetal e da serrapilheira, diversos horizontes pedológicos; rochas;
superfície das vertentes e suas depressões; e,finalmente, canais
fluviais e planícies de inundação.Assim é que aos estudos de bacias
hidrográficas aplica-se a noção de sistemas aberto, composto por
outros subsistemas, os principais sendo os sistemas de vertentes e
os dos canais fluviais e das planícies de inundação.

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A Fig. 02, demonstra os diversos níveis por onde a água poderá entrar,

permanecer ou circular numa bacia hidrográfica, destacando os subsistemas

mencionados na citação anterior.

Fig. 02: Bacia Hidrográfica: limites e processos. Org.:Rodrigues, C. e Fiori, S.


Fonte: Rodrigues & Adami. In: Venturi (2005)

Bacia Hidrográfica como Unidade de Planejamento e Gerenciamento

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A bacia hidrográfica como unidade de planejamento já é de aceitação

mundial, uma vez que esta se constitui num sistema natural bem delimitado

geograficamente, onde os fenômenos e interações podem ser integrados a priori

pelo input e output, assim bacias hidrográficas podem ser tratadas como unidades

geográficas, onde os recursos naturais se integram. Além disso, constitui-se uma

unidade espacial de fácil reconhecimento e caracterização, considerando que não

há qualquer área de terra, por menor que seja, que não se integre a uma bacia

hidrográfica e, quando o problema central é água, a solução deve estar

estreitamente ligada ao seu manejo e manutenção. (Santos, 2004, p. 40-41)

A bacia hidrográfica como unidade de planejamento deve considerar

seus usos múltiplos em dois momentos, sejam eles: primeiro, de implementação e

viabilização de políticas públicas e, segundo interpretação. Roberts & Robert, 1984

citado por Tundisi (2003, p. 105) aponta no primeiro plano, os objetivos, as opções e

a zonação em larga escala das prioridades no uso integrado do solo, agricultura,

pesca, conservação, recreação e usos domésticos e industriais da água. Já no

segundo momento, o da interpretação, destaca-se, a capacidade de gerenciar

conflitos resultantes dos usos múltiplos e a interpretação de informações existentes

de forma a possibilitar a montagem de cenários de longo prazo incorporando uma

perspectiva de desenvolvimento sustentável.

A partir da Agenda 21 os conceitos de desenvolvimento sustentável

teve grande repercussão mundial. Em várias regiões e países consolidou-se a

concepção de que a bacia hidrográfica é a unidade mais apropriada para o

gerenciamento, a otimização de usos múltiplos e o desenvolvimento sustentável.

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Por ter características bem definidas, a bacia hidrográfica é uma

unidade que permite a integração multidisciplinar entre diferentes sistemas de

planejamento e gerenciamento, estudo e atividade ambiental. A abordagem por

bacia hidrográfica tem várias vantagens apontadas por Tundisi (2003, p. 108), das

quais podemos citar:

• A bacia hidrográfica é uma unidade física com fronteiras


delimitadas podendo estender-se por várias escalas espaciais
(Tundisi & Matsumura,1995).
• É um ecossistema hidrologicamente integrado, com
componentes e subsistemas interativos.
• Oferece oportunidade para o desenvolvimento de parcerias e a
resolução de conflitos (Tundisi & Straskraba, 1995).
• Estimula a participação da população e a educação ambiental e
sanitária (Tundisi et al., 1997).
• Garante visão sistêmica adequada para o treinamento em
gerenciamento de recursos hídricos e para o controle da
eutrofização (gerentes, tomadores de decisão e técnicos) (Tundisi,
1994a)

Para o planejamento e gerenciamento de uma bacia hidrográfica é

fundamental considerar a mudança de paradigma de um sistema setorial, local e de

respostas à crise para um sistema integrado, preditivo, e em nível de ecossistema.

Isso deverá resultar em um diagnóstico mais abrangente dos problemas e deverá

incorporar os aspectos sócio-econômicos para que se possa desenvolver um bom

planejamento e gerenciamento.

Na abordagem tradicional a gestão dos recursos hídricos sempre foi

compartilhada e não integrada. Um longo tempo foi necessário para que os

limnólogos e engenheiros iniciassem sua interação na gestão das águas. O

tratamento da água, na abordagem tradicional da engenharia advém da concepção

de que com a tecnologia qualquer água é possível ser transformada em água

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potável. Mesmo sendo verdade, os altos custos do tratamento tornam inviável a

produção de água potável.

No planejamento e no gerenciamento é necessário dar condições para

cuidar dos mananciais e das fontes de abastecimento de água potável, desde a

fonte à torneira, tratar assim todo o sistema de produção de água. Segundo Tundisi,

(2003, p.107) deve-se considerar os seguintes processos:

• Processos conceituais – adoção da bacia hidrográfica como


unidade de planejamento e gerenciamento e a integração
econômica e social.
• Processos tecnológicos – o uso adequado de tecnologia de
proteção, conservação, recuperação e tratamento.
• Processos institucionais – a integração institucional em uma
unidade fisiográfica, a bacia hidrográfica é fundamental.

A bacia hidrográfica constitui um processo descentralizado de

conservação e proteção ambiental, tornando-se um estímulo para a integração da

comunidade e a integração institucional. As condições da bacia hidrográfica também

são importantes na consolidação do gerenciamento. De acordo com Tundisi, (2003,

p. 109), o índice da qualidade pode ser representado pelos seguintes indicadores:

• Qualidade da água de rios e riachos.


• Espécies de peixes e vida selvagem (fauna terrestre)
presentes.
• Taxa de preservação ou de perda de áreas alagadas.
• Taxa de preservação ou de perda das florestas nativas.
• Taxa de preservação de contaminação de sedimentos de rios,
lagos e represas.
• Taxa de preservação ou contaminação das fontes de
abastecimento de água.
• Taxa de urbanização ( % de área da bacia hidrográfica ).
• Relação população urbana / população rural. (Revenga et
al.,1998; Tundisi et al., 2002)

Em conjunto com o índice de qualidade também deve-se considerar


os indicadores de vulnerabilidade da bacia hidrográfica:

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• Poluentes tóxicos (Pimentel & Edwards, 1982).
• Carga de poluentes.
• Descarga urbana.
• Descarga agrícola.
• Alterações na população: taxa de crescimento e ou migração /
imigração.
• Efeitos gerais das atividades humanas (Tundisi, 1978).
• Potencial de eutrofização. (Tundisi, 1986 a)

Conceito aplicado ao Gerenciamento de Bacia Hidrográfica

O conceito que se aplica ao gerenciamento de bacia hidrográfica

estende às barreiras políticas tradicionais (sejam municipal, estadual e federal, em

alguns casos entre países) para uma unidade física de gerenciamento e

desenvolvimento econômico e social. Para tanto há de se ter integração entre setor

público, setor privado, universidade, e população da área considerada.

Conforme Jorgensen (1980) e Jorgensen et al.(2000) citado por

Tundisi (2003, p. 111-112), para estabelecer algumas opções de gerenciamento

deve-se analisar e consolidar os seguintes conhecimentos:

• Tecnologias de controle de processos de emissão de poluentes


e caracterização quali e quantitativa de efluentes industriais.
• Conhecimento de fontes não pontuais de poluentes. Incluindo
metodologias de irrigação e alternativas que afetam descargas
química (Minotti,1995).
• Conhecimento especializado em processos aquáticos (Matsui
et al., 2002).
• Física e química dos rios, reservatórios e lagos, incluindo
mecanismos de dispersão de poluentes, eutrofização e interações
sedimento – água (Overbeck, 1989 ).
• Modelagem ecológica e matemática que deverá integrar os
diferentes componentes e planejar e estabelecer cenários
adequados prevendo interações para soluções adequada
(Henderson-Sellers, 1984; Jorgensen & Muller,2000).

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Quando se trata de gerenciamento de bacia hidrográfica as medidas

de prevenção são as melhores aliadas, sobretudo porque esse gerenciamento deve

ser planejado com objetivo duradouro, isto é, de longo prazo, pois medidas

preventivas são menos dispendiosas do que as corretivas. A Fig. 3, apresenta as

duas abordagens no gerenciamento de recursos hídricos e os objetivos a longo

prazo.

Fig. 03: Abordagens no gerenciamento de recursos hídricos e objetivos de longo prazo


(Straskraba & Tundisi, 2000).
Fonte: Tundisi, 2003.

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Como afirma Tundisi (2003, p. 112-113), as abordagens mais recentes

que envolvem a base de conhecimento existente apontam para os seguintes

aspectos fundamentais:

• Reconhecimento das incertezas (Cooke et al.,1986).


• Reconhecimento de que as decisões sobre a política de
gerenciamento e planejamento a ser adotada não proverão soluções
‘exatas’, mas ‘adaptativas’ e em etapas, incorporando novas idéias e
metodologias ao longo do processo (Cooke & Kennedy,1988).
• Desenvolvimento da capacidade preditiva por meio de
interações entre clientes, usuários e planejadores e gerentes
• Definição de objetivos precisos: gerenciamento de integrado,
preditivo, adaptativo, avanço por etapas, introdução de
ecotecnologias adequadas e implantação de sistemas de suporte à
decisão com a participação. Fundamental é a construção de uma
capacidade local de gerenciamento com base no conhecimento de
capacidade local (PNUMA/IETC, 2000, 2001).

Gerenciamento Integrado de Bacias Hidrográficas

No final da década de 1980 o gerenciamento integrado de recursos

hídricos foi proposto como uma das soluções frente à incapacidade de construir um

processo dinâmico e interativo somente com uma visão parcial e exclusivamente

tecnológica.

O planejamento e o gerenciamento integrado devem proporcionar uma

visão abrangente de planejamento incluindo políticas públicas, tecnológicas e de

educação, com o intuito de promover um processo de longo prazo com participação

de usuários, autoridades cientistas e do público em geral além das organizações e

instituições públicas e privadas.

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Essa integração propõe a resolução de conflitos, a otimização de usos

múltiplos de rios, lagos, represas e áreas alagadas e a promoção de bases

científicas sólidas.

Dentro da visão de planejamento e gerenciamento integrado Tundisi

(2003, p. 117) considera os seguintes tópicos:

• Bacias hidrográficas como unidade de gerenciamento,


planejamento e ação.
• Água como fator econômico.
• Plano articulado com projetos sociais e econômicos.
• Participação da comunidade, usuários e organizações.
• Educação sanitária e ambiental da comunidade.
• Treinamento técnico.
• Monitoramento permanente, com a participação da
comunidade.
• Integração entre engenharia, operação e gerenciamento de
ecossistemas aquáticos.
• Permanente prospecção e avaliação de impactos e tendências.
• Implantação de sistemas de suporte à decisão.

Numa visão municipal, o gerenciamento de bacia hidrográfica encontra

vários desafios como o grau de urbanização, considerando se o município é de

médio ou pequeno porte, em virtude dos usos múltiplos que podem provocar

impactos ambientais na área municipal.

Os municípios de pequeno e médio porte têm características muito

diferentes das áreas metropolitanas que apresentam problemas especiais de

abastecimento de água e de tratamento de esgoto. Nesses municípios, um dos

principais desafios é a conservação dos mananciais e a preservação das fontes de

abastecimento superficiais e/ou subterrâneas. Deve-se dar ênfase aos usos do solo,

proteção da vegetação e reflorestamento. O reflorestamento ciliar pode gerar

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oportunidades de desenvolvimento econômico e social, através de cooperativas

populares para construção de viveiros que produzam sementes e mudas. Também

pode ser um mecanismo efetivo de mobilização da população da periferia e da zona

rural.

O tratamento de esgoto é uma ação muito importante para a

recuperação das águas municipais. Outra ação importante é a deposição de

resíduos sólidos de maneira que não afete os mananciais e não aumente os riscos à

saúde pública.

Os municípios também devem criar legislação específica para a

proteção de mananciais e implantação de programas de monitoramento e controle

ambiental.

Para áreas municipais segundo Tundisi (2003, p. 114) pode-se

sintetizar as soluções para os principais problemas relacionados com recursos

hídricos, em:

• Proteção dos mananciais e das bacias hidrográficas.


• Tratamento de esgotos e de águas residuárias industriais.
• Tratamento e disposição dos resíduos sólidos (lixo doméstico,
industrial e de construção civil).
• Controle da poluição difusa.
• Treinamento de gerentes, técnicos ambientais e de recursos
hídricos.
• Educação sanitária da população.
• Programas de mobilização comunitária e institucional.
• Campanhas e introdução de tecnologia para diminuir o
desperdício da água tratada.
• Estímulo e apoio às práticas coletivas de organização dos usos
da água por associações ou grupos de pessoas.

Métodos para Gerenciamento Integrado e Recuperação de Bacia Hidrográfica

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Dentre as várias técnicas citadas por Tundisi (2003, p.118) para

promover a recuperação de bacias hidrográficas e a capacidade de auto-

sustentação do sistema pode-se considerar as seguintes:

• Introdução de corredores de florestas de espécies nativas na


bacia hidrográfica.
• Gerenciamento e adequação da aplicação de fertilizantes,
pesticidas e herbicidas na bacia hidrográfica, a fim de diminuir fontes
não pontuais e controlar eutrofização e toxicidade (Matsui et al.,
2002).
• Controle da erosão para diminuir assoreamento (Tundisi et al.,
2003).
• Tratamento de esgotos domésticos, várias técnicas
ecotecnológicas.
• Tratamento dos efluentes industriais e reuso da água.
• Monitoramento permanente para avaliação de potenciais
impactos (Matsumura Tundisi & Tundisi, 1997).
• Gerenciamento integrado dos usos do solo da bacia
hidrográfica (Tundisi et al., 2003).

A gestão das águas e o papel dos gerentes

Os gerentes de qualidade da água atuam como responsáveis ou como

parceiros, nos cuidados referentes à qualidade e à quantidade da água nos sistemas

aquáticos continentais.

Mudanças de atitudes, tanto de gerentes como do público, são

necessárias, para obter sustentabilidade para as gerações futuras. De acordo com

Tundisi (2003, p. 120), os gerentes devem considerar as atividades seguintes como

aplicáveis à interação bacias hidrográficas/rios/lagos/represas.

• Introduzir tecnologias com métodos não agressores ao meio


ambiente, como tecnologia e engenharia ecológica.
• Empregar abordagens de gerenciamento integrado. Integrar
gerentes com engenheiros, cientistas e a comunidade local.

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• Implementar programas para reciclagem de materiais, visando
à redução da poluição das águas.
• Apoiar redução no uso e medidas conservacionistas de água.
• Avaliar diversas possibilidades de gerenciamento, inclusive
abordagens inovadoras, no sentido de determinar a escolha com
maiores perspectivas. Os objetivos devem contemplar horizontes de
longo prazo e recursos hídricos qualitativamente sustentáveis.
• Dar maior atenção aos métodos de mitigação da poluição
difusa.
• Fomentar a educação ambiental na região.
• Demonstrar aos gerentes industriais e membros da
comunidade quais as conseqüências de suas decisões e/ou
atividades sobre a disponibilidade quanti e qualitativa de água
(Hashimoto, 1995).

Essas atividades visam garantir:

a) desenvolvimento controlado capaz de garantir a manutenção, a


longo prazo, dos recursos hídricos e minimizar os efeitos sobre esse
ou outros recursos;
b) que não se esgotem opções para um desenvolvimento futuro;
c) que a eficiência no uso da água ou de outros recursos seja o
elemento-chave da estratégia de seleção.

Para que a gestão dos recursos hídricos tenha um resultado efetivo é

necessário que tenha um monitoramento adequado, com capacidade de identificar e

apontar possíveis locais sujeitos ou não a contaminação, poluição, erosão ou outros

danos ambientais. Além disso, o monitoramento deve dar indicações seguras sobre

o que conservar e qual o custo dessa conservação.

O monitoramento envolve dois tópicos fundamentais: o monitoramento

para orientação (freqüência limitada e poucos parâmetros) e monitoramento

sistemático (alta freqüência, constante e periódico e muitos parâmetros). O

monitoramento é o primeiro passo importante para a elaboração de um banco de

dados confiável, que vai resultar em conjunto de informações capazes de verificar

tendências, avaliar impactos, prevenir catástrofes e orientar futuras ações.

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Os aspectos legais do planejamento e gerenciamento de bacias hidrográficas.

O Código das Águas de 1934 foi muito importante quando da sua

implantação, mas em função da abundância de águas existente no país, a atenção

era voltada para a energia elétrica e saneamento básico. Outros usos como o

industrial, a irrigação, etc., foram passados “despercebidos”, mas a partir dos anos

80 a água não é vista mais como um bem infinito, passando a ser elemento de

discussão, e por essa, providências gerais e legais vêm sendo tomadas desde

então.

Pode-se considerar como marco zero dessas mudanças a implantação

da Lei Federal nº 6.938/81, que estabeleceu a Política Nacional do Meio Ambiente,

seus instrumentos e principais mecanismos de formulação e implementação. Esta lei

exerce um papel transformador no que diz respeito às ações do Estado e à

organização do Poder Executivo para sua aplicação como mecanismo de gestão

colegiada e participativa através da criação do Conselho Nacional do Meio Ambiente

– CONAMA, que assegura a participação da sociedade civil.

Simultaneamente a criação do CONAMA, a Lei nº 6.938/81 dá uma

dimensão nacional para a institucionalização da gestão ambiental como já havia sido

feito em Minas Gerais e Rio de Janeiro.

Atualmente o Ministério do Meio Ambiente – MMA - atua como órgão

gestor do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNEMA, sendo o Instituto

Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis – IBAMA, a entidade

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executiva das atividades de competência da União, das Secretarias de Estados de

Meio Ambiente e demais órgão estaduais e municipais ligados ao SISNEMA.

A Lei Federal 9.433 de 08 de janeiro de 1997, fundamenta-se

juridicamente em novos princípios, e institui o Sistema Nacional de Gerenciamento

dos Recursos Hídricos – SNGRH. A água é vista como bem econômico passível de

ter sua utilização cobrada, bacia hidrográfica como unidade de planejamento e

gestão, a gestão das águas delegadas a comitês e conselhos de recursos hídricos

com a participação da União, Estados, Municípios e sociedade civil.

A criação da Agência Nacional das Águas – ANA, em 2000, “veio

consolidar o esforço governamental do Estado brasileiro e a organização do Poder

Executivo Federal para a implantação da Lei das Águas e para efetivar seus

princípios.” (CARVALHO in TRIGUEIRO, 2003).

Por mais recente que seja a Lei das Águas, ela inclui conceitos de

gestão já estabelecidos na Lei Ambiental nº 6.938/81, mas que não estavam

suficientemente claros para serem tratados como instrumentos de políticas públicas,

como a criação do Conselho Nacional dos Recursos Hídricos e dos Conselhos

Estaduais como instância máxima de liberação sobre as políticas, normas e padrões

de gestão e gerenciamento das águas em suas respectivas esferas.

O gerenciamento dos recursos hídricos, centralizado em Comitês de

Bacias Hidrográficas, possibilita um novo mecanismo de cooperação multilateral

entre a esfera federal e as demais, na solução de problemas regionais, sobretudo

nas regiões conurbadas.

Segundo relata Carvalho in Trigueiro (2003):

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“Há aqui uma medida absolutamente inovadora, à medida que as
competência e decisões que seriam tradicionalmente atribuídas ao
Poder Executivo migram para o Comitê, transformando em locus de
decisão sobre as principais iniciativas de gestão das águas de uma
determinada bacia, a saber: aprovação do plano diretor de recursos
hídricos para a bacia, definição das normas e procedimentos sobre
concessão da outorga de direito de uso das águas, decisão sobre o
uso das águas, definição da agenda de prioridades da bacia,
aprovação do plano de investimentos, incluindo a aplicação dos
recursos eventualmente arrecadados pelo uso dos recursos
hídricos. Cada Comitê conta com uma agência executiva de
natureza paraestatal que lhe dá suporte operacional, executando
atividades que no modelo tradicional exigiriam a criação de órgão ou
participação pública.”

Um fato de relevância fundamental na Lei das Águas é que a outorga

de água passou a ser obrigatória para o lançamento de efluentes (esgoto, águas

servidas e resíduos líqüidos industriais) a qualquer corpo receptor que é utilizado

para despoluição que podem afetar negativamente a qualidade da água.

Anteriormente, a outorga era exigida para a captação e derivação de recursos

hídricos de um corpo d’água.

Considerações Finais

O gerenciamento de recursos hídricos envolve um conjunto de ações

estratégicas de planejamento, participação de usuários e organização institucional e

a implantação de tecnologias diferenciadas, avançadas (ecotecnologias) e de baixo

custo.

A gestão dos recursos hídricos efetua-se a partir da bacia hidrográfica,

com promoção de políticas públicas, participação de usuários e treinamento de

gerentes com visão sistêmica tecnológica de problemas sociais e econômicas.

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É imprescindível uma visão integrada de economia regional, global e

das relações do desenvolvimento sustentável com a política pública de

desenvolvimento.

Efetuam processos cooperativos institucionais com enfoque sistêmico,

preditivo e adaptativo, dando igual importância as medidas estruturais e não

estruturais.

No tocante às questões legais e às questões da política ambiental

nacional, vive-se um novo ciclo que abrange uma abordagem integrada,

considerando que a política ambiental não é para a natureza uma política setorial,

mas uma política global onde o planejamento e a gestão ambiental fundamentam-se

na decisão do governo em todos os níveis.

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Referências Bibliográficas

BRASIL. Lei nº 6.938/81. Política Nacional do Meio Ambiente.

BRASIL. Lei nº 9.433/97. Política Nacional de Recursos Hídricos.

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Três Lagoas – MS – Nº 7 – ano 5, Maio de 2008

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