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Oração do Sacerdote

-numa tarde de domingo-


(in Poemas para rezar, de Michel Quoist)

Esta tarde, Senhor, estou sozinho. forte.


Na Igreja, pouco a pouco, os ruídos É duro estar sozinho.
calaram-se. Sozinho diante de todos,
Foi-se embora toda a gente, Sozinho diante do mundo,
E eu voltei para casa, Sozinho diante do sofrimento, do pecado,
Passo a passo, da morte.
Sozinho.
Não estás sozinho, meu Filho,
Cruzei-me com gente que voltava de um Estou contigo,
passeio, Eu sou teu,
Passei pelo cinema: vomitava uma Eu precisava, na verdade,
pequena multidão, de uma humanidade a mais para
Vagueei ao longo de esplanadas de cafés continuar a minha
onde, cansados, Encarnação e a minha Redenção.
Os domingueiros tudo faziam para esticar Desde toda a eternidade, Eu te
um pouco mais a escolhi.
Alegria de viver um Domingo de festa. Eu preciso de ti:
Esbarrei nos miúdos que jogavam à bola Preciso das tuas mãos para
na rua. continuara abençoar,
Os garotos, Senhor! Preciso dos teus lábios para continuar
Os filhos dos outros, que não serão nunca a falar,
os meus. Preciso do teu corpo para continuar a
E aqui estou, Senhor, sofrer,
Sozinho! Preciso do teu coração para continuar
No silêncio que me dói a amar,
Na solidão que me oprime. Preciso de ti para continuar a salvar.
Fica comigo, meu Filho.
Tenho 33 anos, Senhor,
Um corpo feito como os outros corpos, Senhor, eis-me aqui:
Braços moços para o trabalho, Eis o meu corpo,
Um coração reservado para o amor, Eis o meu coração,
Mas tudo isto Te dei. Eis a minha alma.
É verdade que de tudo precisavas, Fazei-me bastante grande para atingir o
Tudo Te dei, Senhor, mas é duro Senhor. mundo,
É duro dar o próprio corpo: ele queria dar- Bastante forte para carregar com ele,
se a outro. Bastante puro para o abraçar, sem querer
É duro amar toda a gente e não possuir guardá-lo.
ninguém. Fazei que eu seja um ponto de encontro,
É duro apertar a mão sem poder retê-la. sim, mas ponto de passagem.
É duro fazer que brote uma afeição, mas Caminho que não pende para si próprio,
para a dar a Ti. porque nele não há nada de humano a
É duro nada ser para mim mesmo, encontrar, nada que não conduza a Ti.
a fim de ser tudo para eles.
É duro ser como os outros, entre os outros Esta tarde, Senhor, enquanto tudo em
e ser um outro! volta está em silêncio,
É duro dar sem cessar, sem procurar dentro do meu coração sinto morder
receber. duramente a solidão.
É duro alguém ir ao encontro dos outros, Enquanto o meu coração uiva longamente
sem que jamais a fome de prazer,
alguém venha ao meu encontro. enquanto os homens me devoram a alma
É duro sofrer os pecados dos outros, sem e eu me sinto impotente para a saciar,
poder recusar Enquanto sobre os meus ombros pesa o
acolhê-los e carregá-los. Mundo inteiro,
É duro receber os segredos, sem poder com todo o seu peso de miséria e pecado,
compartilhá-los. eu repito o meu Sim.
É duro arrastar os outros sem cessar e Não às gargalhadas, mas lentamente,
nunca poder, um lucidamente,
instante sequer, deixar-me arrastar pelos humildemente.
outros. Sozinho, Senhor, sob o Teu olhar,
É duro sustentar os fracos sem poder Na paz da tarde...
apoiar-me sobre um

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