Você está na página 1de 71

Geraldo De Mori

Virgínia Buarque
(orgs.)

Em obras
de língua portuguesa

Apoio :

é
CAPES
~ Faculdade Jesuíta
\.5 de Filosofia e Teologia Edições Loyola
li --
Dado s Inte rn acionais d e Catalogação na Publicação (CIP)
(Câm ara Brn silcira do Livro, SP. Brasil)

Escritas do crer no corpo em obras de lingua portuguesa / G eraldo De M oo.


Sumário
Virgonoa Buarque, (o rg) - São Paulo Edições Loyola,
Belo Horizonte, MG FAJE, 2018
Vários autores
· Apoio CAPES"
ISBN 978 85 15 04520 4
1 Corporeidade 2 Ep1stemolo91a 3 Literatura 4 Teologia Apresentação ................................................................................................................................................7
1 M on, G ernldo De li Buarque, V1rg1n1a
ANT ON I O M ANZATl"O
1815163 coo 233 5
-
lndiccs p ara catálogo sist emâtico:
Introdução ................................................................................................................................................... 11
1 Corporeidade e teologia: Cristianismo 233 5 Ü ~ ORG1\ N I ZADO RES

1 1 Corpo-alteridade-hospitalidade
Os fJadres têm corfJo? O padre como fJerso11agem no romance
fJ Ort11guês co11te111fJorâneo ....................................................................................................................23
j ost T O L ENTI NO M E DONÇA
Capa: Ronaldo Hideo lnoue
Chantelle dos Santos Narrativas da hosfJitalidade em Mia Couto: fJrovocações teológicas.........................45
Fotógrafo: Carl W illoughby
Modelo: Jone van Vuuren ANTON I O G rn A L DO CANTA RELA
Diagramação: Adriana Vegas
li 1 Corpo-sensações-silêncios
Conselho Editorial
Diálogo entre o corpo e o sagrado em Rubem Alves ........................................................... 65
Danilo Mo ndoni (PUG, Roma, Edições Loyo la) A IU .OS 1\ LD1\ S
Antõnio Abreu (Innsbruck, Áust ria, Edições Loyola)
Gabriel Frade (FAU-USP, Brasil) A anatomia da escuta e a acústica do corp o entre C artas a um Jovem Poeta
Élio Gasda (FAJE, Brasil)
Johan Konings (FAJE. Brasil)
(Rainer Maria Rilke) e Para o Instrumento Difícil do Si lêncio (Daniel Faria) .......... 85
Lúcia Pádua Pedrosa (PUC-R10, Brasil) j O\Í:. P El) RO ANGÉ LI CO

lil 1 Corpo-sagrado-feminino
Via C rucis e gozo fJascal (o corfJo em três romances de Clarice LisfJector) ............. 105
M 11tllA C LA RA l.UCCll ETn BI NGEM ER

Uma ascese aos a vessos ..................................................................................................................... 123


CAPES (PROEX) - Coordenação de Aperfeiçoamento
C L EI D E M A ll1 1\ DE Ü LI VElllA
de Pessoal d e Nível Superior

FAJE - Faculdade Jesuít a de Filosof ia e Teologia Paixão e santidade: corfJo, cartas e fJoesia de urna carmelita descalça ...................... 143
Av. Dr. Cristiano Guimarães, 2127 - Planalto
V 1RG Í N I A BUARQUE
31720-300 Belo Horizonte - MG

Edições Loyola Jesuítas IV 1 Corpo-eros-pathos


Rua 1822, 341 - lpiranga
04216-000 São Paulo, SP
É no co rpo que escrever me dó i: o divino (homo)erótico em
T 55 11 3385 8500/8501 · 2063 4275 Caio Ferna11do Abreu.......................................................................................................................... 16 1
ed itorial@loyola.com.br
LEA D RO GA llC I A ROD IU GUE~
vendas@loyola.com.br
www.loyola.com.br
A (des)huma11idade selvagem e a erótica em Lya Luft: inter(fJe/}ações
Todos os d11ertos tescrvados Nenhuma pane desra obr.J pode ser
rcproduz1dd ou transmitid a por qua lquer fo rma e/ou qud1squcr teológicas na fJ oética da sensação em Lévinas..................................................................... 177
meios (cfcrrôrnco ou mccJnico, mdwndo fo1ocop1a e gr11v.1çJo) ou
lltquiv.Jd il em qualq uer sis tema ou b anco d e dados sem pcrmiss.io 1LO Rlll EIRO .f úN I O R
cscnt.:i d.:i Editora

ISBN 978-85-15-04520-4

iC> EDIÇÕES LOYO LA, São Paulo. Brasil, 2018


V 1 Corpo-carne-memória Apresentação
Pecado e graça entre Carlos Drwnmond de Andrade e A délia Prado .................... l 97
AI.EX V 11. t AS BOAS Antonio Manzatto 1
O impossível real: encarnação e utopia em Hélio Pellegrino ...................................... 217
LUC I ANO COSTA SANTOS

VI 1 Corpo-sincretismos-hibridismos "E o Verbo se fez carne, e ha bitou entre nós; e nós vimos sua gló ria'',
Corpo e transcendência em Primeiras Histó rias .................................................................. 241 ensina o eva ngelho segundo j oão (1 ,14). É a firm ação básica da teologia
SAND lt 1\ C w 1\ l.CANT E que quer pensa r a enca rnação d o Filho de Deus, po nto centra l d a teologia
Provocações "eucarísticas" nos hibridismos do corpo em Viva o po vo cristã. Em cri stianismo não se pensa a penas Deus no a lto d e sua tra nscen-
brasileiro de j oão Ubaldo Ribeiro ............................................................................................... 259 d ênc ia, mas sua presença na história huma na e, d e ma neira especia l, na pes-
GERALDO DE Mo1u soa de Jesus d e Nazaré, o Filho enca rnado. Enca rn a r-se significa assumir
a ca rne, ma neira d e se di zer corpo reidade; sig nifica form ar-se um corpo,
Conclusão................................................................................................................................................ 285
Os 0 1<GAN I Z ADOREs
aq uele mesm o que cresceu no ve ntre de Maria e veio à luz na gruta de
Be lém . Depois, este mesm o co rpo fo i to rturado e crucificado, também aq ui
Apresentação dos autores ........................................................................................................... 289 um evento central no cristianismo. Pa ra se dizer tudo, sem o corpo d e Jesus
Apresentação do grupo de pesquisa "As Interfaces da Antropologia nã o have ri a cristianismo po rque não haveri a ma neira d e se referir a ele
na Teologia Contemporânea" ................................................................................................ 295 co mo Filho enca rn ado presente na história humana . Ainda mais qua nd o o
cristi a ni smo compreendesse a Igreja co mo "corpo d e C risto" e a euca ristia
Índice remissivo ................................................................................................................................... 297
co mo sacramento no qua l se a firm a seu corpo e sa ngue. D e ma neira bem
concreta, bem real, bem carna l poderíamos dize r. Sem corpo o cristi an ism o
seria sem vida, sem h istó ria .
Afirma r corpo é a firm a r história, fazer-se corpo é fazer-se história. Na
rea lida de, corpo é p rocesso, não esta d o. É em se u corpo que cad a pessoa
vive suas emoções, seus desejos, se u compo rta mento. Fundamenta lmente, é
em seu corpo qu e cada um vive sua história. A história da pessoa é ta mbém
a histó ria de seu corpo, não a penas porque cuida dele, mas porque ele car-
rega as marcas de s ua vida. É nele que se c resce, é ne le que se envelhece, é
ele que traz a cicatriz da s feridas e as rugas do tempo . O tempo qu e passa
faz história e a faz como histó ria d o corpo e no corpo . O processo da vida
é o processo do co rpo, a históri a d a pessoa confunde-se co m a história d e
se u co rpo . Sim, po de-se lembrar em a lgum mo mento que a pessoa não é
a penas se u corpo, mas que se lembre ta mbém que ninguém é pessoa sem
corpo. É nele que se vivem as experi ências de cad a um, é nele que se vivem

1. Doutor em teologia pela Universidade Católica de Lovaina, Bélgica; professor de teologia


sistemática da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

71
J ESCRITAS DO CRER NO CORPO J J APRESENTAÇÃO 1

as hisró ri as, ra m as, que fazem um a vida. Fundamenralmenre é disso qu e no pensa menro c ristão de forma que ta mbém a li se passou a negar o praze r
vive a lirera rura : de hisró ri as narradas co mo memória, como uropia, como e a ma teria lidade, afi rmando a penas o va lor de tud o o que era "espiritua l" .
ficção, mas sempre hisrórias. Afirmar, po r isso, a corporeidade huma na não iceia já faz gra nde esfo rço para afi rma r o Deus que é criador de "rodas as
é simples menre afirm a r sua bio logia física, mas sua caracrerísrica mais es- coisas, as visíveis e as in visíveis', e a históri a do c ristianismo conhece u não
se ncia l: er huma no é ser hisró ri a . po ucos mo menros em que a ma teri a lidade, e especifica mente aquilo q ue se
Ma is não fosse, já tería mos aqui um po m o exrrema menre inreressa n- relac io na va com o co rpo, fo i negado o u desva lo ri zado , visro como pecado.
re pa ra a afirmação das relações entre reologia e literarura. Ambas lidam Tal fa to gero u não a penas graves consequ ências a ntro po lógicas e cultura is,
com histó rias, embora cada um a à sua ma neira . Se não houvesse histó ri as mas também pol íticas. O qu e não va lo riza o ma teri al o u o corpora l não
pa ra narrar, nã o haveria lirera tura, simples assim . Mas se não ex istissem va loriza o histó rico e o que com ele se relacio na.
histórias da ação de De us na histó ria humana, também não haveri a como Mu iros foram os mo menros da histó ri a da huma nidade em que os
se fa la r de Revelação, não haveria como fazer teologia. Ao menos não da gra nd es do mund o se ampararam na a firm ação do poder de Deus, na de-
maneira cristã. Ricoeur lembra que a na rração ta lvez seja a forma mais rerminação do desrino o u no desva lor das coisas ma teriais, incl uind o o
a propriada pa ra se falar de um Deus que age na histó ria, e ta l narrativa se corpo, para conrinua rem guard a nd o seu poder e pri vilégios. Uma das for-
tra nsfo rma em histórias que nos falam da vida d e quem nele crê. Não é re- mas enconrradas por vá rios a rtistas para manifestarem s ua críti ca socia l
leva nre se tais histórias são relaros de ficção o u registro de aconrecimenros e política foi, exata mente, a a firm ação do corpo . Em sua beleza, em sua
"verídicos", o que impo rta é a percepção e a a tribui ção de sentido qu e se sex ua lidade inclusive, em seus sentimentos e situações, se exaltava o va lor
to rn a possível a partir daquela narra ti va . da ma teria lidade da vida e se contestava o poder estabelecido . Muiro do
Dizemos a lgo semelha nre qu a ndo nos referimos à co rpo reidade. Não qu e se fez em literatura, por exemplo, a firm a ndo o erotismo, foi uma for-
impo rta se o que o corpo percebe são senrimenros ou reações químicas, ma de se posicio na r contra o sistema, se us govern a ntes, sua cultura e se us
impo rta aq uil o que é pe rce bido como ex peri ênc ia vivencia da que va i va lores que, de um a ma neira muito cla ra, oprimiam e do minava m pessoas
forma ndo não apenas o senrido do que sig nifica ser pessoa, mas do que e povos para g uarda rem seu poder e pri vilégios. Conhecemos isso ta mbém
significa ser aq uela pessoa concreta. Corpo e hisró ri a estão inrima mente entre nós, a a firm ação do corpo, inclusive sua eroti zação, como forma de
relacio nados na litera tura e na teologia . Na verdade, o corpo é história, co nrestação política já que não hav ia o urra maneira de fazê- lo .
a mbos concreros. Ta mbém é histó ri a do que será, do que se busca, d o que A recente teologia que aprendeu a va lo ri za r a hisró ria e o po lítico va-
se quer. Nenhum d e nós é apenas aqu ilo que está sendo, mas ra mbém aqui - lo ri zou ta mbém a corpo reidade huma na em todos os seus aspectos e sig-
lo que que r ser, que pode ser, que é cha mado o u destinado a ser. O corpo nificados. O po bre sofredor é atingido em seu corpo que padece fo me,
qu e nos co ncreti za não nos to rn a incapazes de ir a lém dele; a histó ri a que sede, persegui ção, fa lta de mo ra di a, de a tendimenro de saúde, pro blemas
nos configura não nos to rn a incapazes de ir pa ra a lém dela, para atin- no tra nspo rte público, violência e o utras dores mais. O sofrim enro é co n-
gir ma is que o factual. Corpo reidade e hisró ri a não nos to rna m inca pazes creto, rea l e histó rico, ta nto qu e é físico. Sua libertação, então, deve ta m-
de tra nscendência. bém se r física para poder ser histó rica . E no coração desre deba te ético
Por o urro lado, e é bo m que se perceba, não haveria possibilidade de sobre compo rta mento social, não estamos distantes do que a teologia de-
tra nscendência sem o corpo, sem a história. Afi na l, se tra nscenderia o quê? riva da afirm ação da encarnação do Filho de Deus. A histó ri a diz qu e Je-
Dura nte muiro te mpo, ta lvez por conta de razões fil osóficas o u políticas, sus, em sua pregação, tam bém a nunciava a chegada de um Reino com
o cristia nism o viveu certa desvalorização do corpo huma no. Com o gnos- características muito concretas, já que os critérios para dele participa r
tic ismo qu e não reconhecia va lo r no materia l, o u o esroicismo qu e negava era m comida, bebida, bens e solidariedade partilhados (M t 25,34-40).
va lo r ao praze r, certas correntes de fi losofia g rega ri vera m gra nde influência A indicação de co mporta menros exemplares mostra a centra lidade da cor-

la 91
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1

poreidade. Assim, preocupa r-se com o corpo não é fa lta de espiritua lidade, lntrodução1
mas sua efetivação.
Os organizadores
O co rpo é centra l na a firma ção d a pessoa humana e em sua dig nid ade·
não poderi a d eixa r de ser centra l na ela boração d e obras literá rias mai~
não fosse pelo fato destas sempre se referirem ao humano . Mas ele ra;iibém
é centra l em teologia, por mais qu e e la fa le de espiritualidade o u de trans- Meu pobre corpo é feito corpo de Deus.
cendência . A marca histórica lhe é inde lével. E é muito bom quando a teo- (PRADO, 2010, p. 28).
logia pode recuperar sua identidade, em especial quando o faz a partir do
enco ntro com a litera tura. O di á logo entre ambas continua surpreendente. Entre 3 1 de agosto e 1 de setembro de 2017, rea lizou-se na Faculdade
j esuíta de Filosofia e Teologia (FAJE) o li Colóquio Interfaces: literatura,
teologia e corporeidade em obras de língua portuguesa. Este evento fo i pro-
movido pelo Grupo de Pesquisa "As Interfaces Antropológicas na Teologia
Contemporâ nea", liderado pelo prof. Dr. Gera ldo de M ori, em parceria co m
a ALALITE (Asociació n Latinoamericana de Literatura y Teología) .
No tri êni o 2014-2016, o Grupo Interfa ces dedicou-se a refleti r so bre
algumas vertentes epistemológicas e se us respectivos fundam entos teóri-
co-co nceituais qu e abarcam a tem;hica da corporeidade-Encarnação, em
perspectiva interdisciplinar. Assim, em 2015 , o Grupo promove u a reali-
zação do 1 Colóqui o Interfaces, a pa rtir do qual foi possível formu lar um a
concepção específica so bre o enl ace corporeidade-Encarnação, postul ado
então como enigma, pathos e dádiva: 2

Com o enigma, a corporeidade foi indagada a partir da contribuição das


neurociências, parricularmente da ncuroreo logia, discurindo-se q uais ele-
menros em nossa condição bio físicomolecular nos rornam hum anos.
Na esfe ra do pathos, com d ecidido a po rre da fenomeno logia, a corporei -
dade foi in vesrigada em sua vulnerabilidade co nsriruri va, desdobrad a em
mem óri as da dor. Ma s, simultaneamente, por apresentar-se entremea d a à
afe ti v idade, a co rpo reid ade sobrepuj a tal padecimenro em ressignificações
criati vas.

1. Texto redigido entre o final de outubro e o inicio de novembro de 2017 e debatido na reunião
do Grupo de Pesquisa "As Interfaces Antropológicas da Teologia Contemporânea" realizado
em 24 de novembro de 2017. As menções aos integrantes das mesas redondas (referidas
neste livro como partes) do li Colóquio Interfaces. nele promovidas, limitaram-se aos textos
enviados pelos autores até o dia 31 out. 2017.
2. As palestras realizadas neste Colóquio podem ser consultadas no livro DE MOR!; BUAR-
QUE (orgs.). Corpo-Encarnação. São Paulo: Loyola, 2016.

1 1o 11 1
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1 1 INTRODUÇÃO 1

Na condição de dádiva, a corporeidade exprime-se por um "excesso " o u trans- (ou instrumenta lização) de um sa ber pelo o urro, pode propicia r um mú-
bo rda mento de sentido na relação com o o utro/o O utro. Dessa fo rma, o corpo tuo questi o nar, na incitação/remissão ao Mistéri o de um existir no Amor,
como dádiva espelha o a mor trinitário, entrelaçando Mistério, fragi lidade-en-
a mparado não pelo conhecer ou poss uir, mas pelo desejar e pelo acred ita r.
carnação e g raça-comunhão. (DE MOR I; DE TZ; BUARQUE, 201 7, p. 5).
Trata-se, porranto, de uma o usada, mas enriquecedora proposição às prá-
Para o rri ênio 201 7-2019, o Grupo oprou por aprofundar a dimensão ticas acadêmicas de interpretação da fé crisrã. 3
de pathos da corporeidade-Encarnação em arric ul ação com a perspecriva Daí a promoção, já em 201 7, do II Colóq ui o Interfaces, que compor-
esrérico-lirerária. Considerou-se que, desra fo rm a, seria possível inrerpretar ta ndo seis mesas-redondas, quatro simpósios temáticos e va ri adas perfor-
com ma ior acuidade experi ências socioculru rais pautadas no crer em um a mances cênico-musicais, fo i concebido como uma pec uliar oportunidade
Alteridade amorosa: " O diá logo com a litera tura estabelece uma forma di- para interpelação do corpo conjugada à ling uagem, dimensões crucia lmen-
reta de enfrentamento da nossa rea lidade por meio da leitura dos mitos que te constituti vas do mistério c ristão. Conclu ída a programação, as comu-
nos aviva m e nos subjuga m, das formas como as narra tivas cristãs esrão nicações a presentadas nos simpósios foram ediradas on-line nos Annales
incorporadas na cultura. A teol ogia não deixa de ser crítica, assim como FA} E. 4 De forma paralela, as expla nações nas mesas redondas encontram-
a lireratu ra não é a-crítica" (MAGALHÃES, 2001, p. 17). Nesse processo, se editadas neste li vro, qu e dedica-se, por sua vez, à sisrematização de algu-
muito contribui, como mas questões tra nsversais qu e emergiram nos pronuncia mentos e de bates
do Colóquio.
Uma das marcas da literatura 1... 1, a sua ca pacida de plurívoca . Ela evoca
múltiplas interpretações. 1... j Uma vez, Rubem IAlves l ia se a usentar do Bra -
1 1 Paradoxos de uma corporeidade aprisionada e
sil po r um lo ngo período. Co m apenas 4 anos de idade, e muito ligada ao
reconfigurada pela palavra
pa i, Raq ue l [ ua filha! estava desolada. Por isso, pa ra explicar a sua a usência
tempo rária, Rubem escreveu A menina e o pássaro encantado. [... J o utros No tempo presente, como os sujeitos ocidenta is, mediados pela cul-
sentidos passara m a ser atribuídos à história. Esse livro, lre lara 0 próprio tura globalizada e pelas novas tecnologias de informação, vivencia m seu
Rubem Alves] 'Começou a se r usado por terapeutas para lidar com casa is em próprio corpo? Uma afirm ação previamente la nçada pelo Colóq uio a esta
que cada um tentava engaiola r o o utro. Depois, os ed ucadores a rgumenta-
interrogação foi: de mane iras muito distintas, em fun ção d as trajet ó ri as
vam que as escolas são como ga io las que prendem os a lun os. E ta mbém por
e contextos cotidianos. Uma pessoa que reside em uma das periferias de
religiosos q ue me felicitavam por e u ter escrito uma linda estória sobre Deus.
uma grande metrópole, configurada por variados enlaces identitários (de
Sobre Deus? Você se perg unta . Ele disse que o pássaro encantado era De us
e as religiões que o apris io nam eram as ga io las. É.. . pode ser. Não podemos geração, cor, religiosidade, gênero erc.), irá lida r com sua corporeidade, em
enga io la r o sentido'. (SILVA, 2017, p . 2730). te rm os inrers ubj etivos e imag iná ri os, de forma bem diferente de indivíduos
que experiencia m o utras ta ntas vivências. Po r isso, um dos critérios epis-
Este esforço por conferir sentidos ao pathos do viver, indissociável do têmicos do Colóq ui o foi constitui r mesas redondas que explicitassem e te-
lida r com a corporeidade, desafio compartilhado pela literatura e teologia,
ta mbém favorece um a reconfiguração episremo lógica, permitindo a in-
3. Cf. DIAS, 2011 . p. 13-14: "Até os albores da Modernidade a teologia, ou seja, a articulação
clusão de sing ul ares regimes de verdade no discurso teológico, os quais, do discurso sobre as relações dos seres humanos com a Transcendência e suas consequên-
acionados por memórias e biogra fias, relatos fundadores, discursos tes- cias, foi estabelecida por meio do aparato conceituai da filosofia, basicamente aristotélica. [... ]
vamos chegar à Modernidade com a teologia assumindo os novos paradigmas do conheci-
temunhais, epistolários, produção ficcional e poética etc., ma ntêm espe- mento(...] a literatura e as artes em geral serão desqualificadas, por parte da teologia, que se .
cíficas afi nidades à trad ição feno menológico-hermenêutica. De forma envereda pela trilha do conhecimento científico-racional visto como interlocutor mais idôneo".
concomita nte, ta l intercâ mbio, ao in vés de favorecer uma s ubordinação 4. Disponível em: <http://faje.edu.br/ periodicos/index.php/annales/issue/view/537/ showToc>.
Acesso em 3 1 out. 2017.

l 12
13 1
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO J J INTRODUÇÃO J

matizassem essa diversidade socioculrura l: da í o a tenta r ao estranhamento - o u de mil mundos! - dife rente(s), o ho mem tece teias de sím bolos e de
e à prox imidade (M esa C orpo-Alterid ade-H ospitalida de ), à sig nificação (e sig nificados que dão sentid o à ex istência. Este(s) mundo(s) é/são recria-
seus impasses) por diferentes linguage ns, inclusive semió t icas (M esa Co r- do( s ) a pa rtir do corpo" (Ca rl os Ca ldas). Efeti vamente, a a rte " provoca
po-sensações-silêncios), à especificidade de gêne ro (M esa Corpo-sagrado- um dista ncia mento do Eu po rqu e quem traz a a rte di a nte dos o lhos e no
feminin o), à a fetaçã o de si no gozo e na do r, entremea ndo corpo e discurso se ntido esq uece de si. Daí que a poesia, ta l como a a rte, se dirij a, co m um
(M esa Co rpo-eros-pathos), à reconfig uração do vivido na lembra nça, in- Eu esqu ecido de si, pa ra aquelas coisas inquieta ntes e estranhas, pa ra de
clusive co rpó rea (Mesa Corpo-ca rne-memó ri a ), à dimensão perfo rrnati va novo se liberta r. De modo que um poema é um ca minh o pa ra ir ao o utro,
desse entremeio corpo-lingua ge m nas culturas e nos po de res (M esa Co rpo- o estra nh o" (Nilo Ribeiro Juni o r).
sincretis mos-hibridism os). Ta l ressignificação da co rpo reidade torna-se, po r sua vez, pa rticul a rmen-
Não o bsta nte, no decorrer do Colóqui o, foi possível considera r que, te via bilizada pela mediação dos textos literários, nos qua is, a liás, a remissão
sem desc urar de rodas essas sing ula ridades, algumas prá ticas de relação/ ao sagrado se a presenta nas ma is diferentes configurações e intensidades.
significação com o co rpo mostrava m-se recorrentes na contempo ra neidade. Nessa perspecti va, o corpo ga nha o utra fo rma e potência a través da escrita :
Uma delas, mescla ndo, de fo rma a pa rentemente contraditó ria, gra nde sofri - "1...1a obra literá ria não se retira a penas da posse do a utor pelo movimento
mento físico e p síquico e a pa rente esca pismo, é o a prisio namento do corpo de apropriação do leitor, mas provoca dupla e radical (ex) propri ação do ser
em rígidos e a lta mente seletivos padrões de a pa rência pública . Ta l as pec- selvagem em sua identidade na rra ti va" (Nilo Ribeiro Júnio r).
to, inclusive, vem sendo basta nte a bo rdado pelas publicações aca dêmicas, Foi justamente esta dimensão recri ado ra da co ndição huma na em
as quais indica m co mo o corpo to rnou-se campo de bio po líticas: "Assim, o sua co rpo reidade através da leitu ra e d a esc rita, ta ntas vezes em profun-
corpo poderá ser co ntid o de di versas ma neiras: pelo silêncio a medro nta do da a na logia com a conce pção teológica da ressurreição co mo culmin â ncia
(bullying, perseguição), pelo silêncio imposto (coerção, imposição, am eaças), da enca rnação, o aspecto mais rea lçado pelos pesquisado res no Colóq ui o .
pelo silêncio voluntá rio (autodefesa, medo pró prio de cada um ), pelo discur- Pode-se então posrular que o ac io na mento do literá ri o, inclusive em sua
so efusivo (enga ja mento po lítico, militâ ncia ), pelo discurso literá ri o (poética di mensão re ligiosa, constitui-se e m uma ação potencia lmente ema ncipa-
da do r, litera ruras do eu) e pelo a pa ra ra camp (afetação, indumentária gay, tó ria dos pad rões de a prisio na mento estético comumente veic ulad os pela
tra nsformação física etc.)" (Lea nd ro Ga rcia Ro dr igues)5 . g ra nde m ídia, permiti ndo qu e os suj eitos se reinventem a pa rti r de desejos,
Todav ia, embo ra a tento a ta l d ema rcação político-cultu ra l da subj eti- expectati vas de fururo , lu tos sofridos (i nclusive de decepções qua nto a si e
vidade, que desqualifica ta ntas o utras ma neiras de lidar com a perce pção ao mund o ) etc.: " Pa ra Rubem Alves, a teologia se rá constru ída a pa rtir do
e a proposição de si aos o utros, o aspecto que o Colóqui o ma is ressa ltou corpo, qu e ex perimenta o desejo, q ue surge em co nsequência e deco rrência
foi o emprego da corpo reidade como ma nifestação da singula ridade da da fa lta" (Carl os Ca ldas). E em um di á logo da teologia co m a litera tu ra a
existência, justa mente pelo acio na mento, po r pa rte dos suje itos, das múl- pa rt ir do co rpo, o desejo hum a no se fund e com o desejo de Deus. É im po r-
tiplas possibilidades de ressignificação do co rpo nas culturas - os suje itos ta nte precisar, po rém, qu e ta l estéti ca o u poética libertad o ras não se produz
reemprega m condi cio na mentos c ulturais e midiáticos ace rca do co rpo em de for ma teleológica, indica ndo uma condi ção idea lizada a ser a tingida; em
miríades de ex pressões dife renciadas:6 " Desta imaginação de um mund o cada na rra ti va o suj eito se rein venta em seu co rpo po r critéri os m uito pró-

5. A transcrição de extratos dos capítulos redigidos pelos integrantes das mesas redondas do
li Colóquio e entregues para edição até 3 1 de outubro, quando efetuadas neste texto, estão complementares: graças a elas. os seres vivos são 'postos num texto', transformados em
indicadas somente pela remissão ao nome dos autores entre parênteses. significantes das regras (é uma contextualização) e, por outro lado, a razão ou o Logos de uma
6. Pode-se remeter tal reflexão à análise promovida por CERTEAU, 1994, p. 23 1: "[... ! sempre sociedade 'se faz carne' (trata-se de uma encarnação)''.
é verdade que a lei se escreve sobre os corpo s. [.. .) Essas escrituras efetuam duas operações

[ 14 15 [
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1 1 INTRODUÇÃO 1

prios, qu e se a uto legitima m, sem necessariamente reportarem-se a padrões dade. [...J Enca rn a r a alma do povo em uma personagem feminina é um a
ético , políticos e ideológicos va lidados a priori. contribuição revisio nista e atua lizadora de João Ubaldo Ribeiro à tradição
Ressa lte-se, po rém, que em uma sociedade atingida por ta ma nhas ex- lite rá ri a brasilei ra, no caminho a be rro por J osé de Alencar em lracema."
plo rações e desigua ldades como a nossa, ta l processo de ressignificação do (Gera ldo De Mori ).
corpo pelo texto, aí podendo ta mbém inserir-se uma evocação ao sagrado,
2 1 A corporeidade na constituição poética de uma
nem sempre é promovida de ma neira gratificante. Pelo contrário, pa ra um
sem número de pessoas, a vida é ge ra lmente percebida em angústia, e a transcendência inter-humana
mo rte é um risco eminente. Mas mesmo nesta instância, a leitura e a escri- A menção a essa potência recriadora, pessoal e social, da existência, na
ta constituem a lternativas de ressignificação/recriação de si, a inda que o imbricação do corpo e da escrita evidencio u, por sua vez, uma segunda pro-
tra nspasse pelo sofrimento não possa ser evitado: blemá tica a perpassar todas as mesas do Colóquio : em que aspectos litera-
tura e teologia convergem no a to performa rivo do existir, e em que diferem ?
A nordestina que podemos a prox imar do Severino de João Cabra l, do Fa-
Entretanto, não há uma resposta única a ta l indagação. Muitos traba lhos
bia no de Vidas Secas e de ta ntos outros personagen semelha ntes presentes
na literatura brasil eira ex perimentava a morte prematura que é o destino
importantes têm se debruçado sobre esta inquirição, apresentando aborda-
inelu tável de todos os pobres e vítimas da injustiça que reina neste mundo. gens basta nte insrigado ras.7 Mesmo no tocante às discussões lançadas pelo
Po rém, pelo o lhar de C larice, sua morte não é ó fracasso, mas triun fo de Colóquio, não seria possível reduzir tais interpretações a um ponto comum.
haver ma tado em seu c riador - o e critor - a indiferença cruel e assassina , Não obstante, talvez seja cabível realçar alg uns elementos mencionados
isenta de compa ixão, que não o rigina sentimentos nem emoção e sobretudo por mais de um pesquisador. Pode-se indica r, como o primeiro deles, a com-
a titudes vita is diante da desgraça e do corpo "cariado " de ta ntos o primidos preensão do sagrado como uma dimensão de t ra nscendência inter-humana,
que dia a d ia ca minha m no cotidian o como sombras pelas ruas d as c idades
o u seja, enca rnada no huma no. N ão se esboçou, assim, uma apreensão do
onde se ha bita.
teológico como um discurso acerca de um " a lém " do huma no, remetido em
O corpo caria do era agora corpo lumin oso, transfigurado, soma pne11111ati-
kó11 como o d ' Aquele q ue foi o bediente até a mo rte e que então Deus elevou
pa ra lelo em esferas celestes o u infern ais; não se cogitou uma compreensão
acima de todo nome. A via crucis cio corpo de Macabéa - figura crística - era do mistério como a lgo completa mente ina preensível pelo pensa mento ou
agora li bertação, vida ressuscitada e não mais submetida ao poder da mo rte. pela sensibilidade. Em sutil sintonia com a perspecti va cristã da Encarna-
Gozo pasca l! Soara a hora da estrela e Maca béa brilhava sobre as trevas ção, literatura e sagrado não fora m dissociados, nas interpretações tecidas
que não conseguiram engoli-la não po r compa ixão huma na, mas po r a mo r no decorrer do Colóq ui o, das "alegrias e espera nças, das tristezas e a ng ús-
divino (Cleide Oliveira). tias do ho mem de hoje" :8
Outro aspecto de grande relevâ ncia indicado pelo Colóquio é que tal Os relatos eva ngélicos faze m questão de a firm ar a im po rtância da corporei-
procedim ento de reinstauração da existência processa-se não somente em dade em todas as suas na rrati vas, mas particula rmente nos relatos pós-pas-
âmbito individual, mas ta mbém comunitá rio e socia l, pois a leitura e a es- cais, nos qua is se a presenta o ressuscita do, não como um fa ntasma, mas
crita viabi liza m rei nte rpretações do "corpo" da nacionalidade: "A vontade como corpo, tangível (Lc 24. 13-43; Jo 20.24-28). 1... 1 Po r isso o Credo Apos-
de construir o pa ís e a identidade naciona l é um traço de lo nga duração na
história do pensa mento e da produção textua l no Brasil. [... ] Maria da Fé é
7. Neste sentido, sugere-se a leitura do artigo indicado a seguir, que oferece uma recapitula-
um a personagem criada por João Uba ldo Ribeiro, embora pa ra inventá-la ção histórico-conceituai bastante consistente dessa discussão: BARCELLOS. 201 O, p. 9-30.
renha visivelmente dialogado com o acervo do imaginá rio da nacionali- 8. Paráfrase da Constituição pastoral Gaudium et Spes, n. 1. Ver: Compêndio do Vaticano li.
Constituições. decretos, declarações. 19ª Edição. Petrópolis: Vozes, 1987.

l 16 17 1
J ESCRITAS DO C RER NO CORPO 1 1 INTRODUÇÃO 1

tó lico decla ra, de maneira ao mesmo tempo singela e o usada : "Creio ... na pírito'', e ta mbém uma a lternativa à for ma teo lógicas de modelo esco-
ressurreição do corpo " . Em uma: Jesus tem um corpo. Da í, a im portância lástico e ilumi nista (dois modelos separados tempora lmente por sécu lo ,
do corpo como mo rada do sagrado na tra dição cristã. É ne ta perspectiva mas que com pa rtilha m o lugar p rivilegiado dado à razão como critério de
q ue se questio na a classificação do c ristian ismo como religião do livro, e su- aferição da rea lidade), e a inda uma a lternativa a uma forma teológica de
gere-se q ue este deve er entendido com o religião do corpo (Ca rlos Ca ldas). modelo funda menta lista, q ue gera uma espiritua lidade legalista e mora lista
(Ca rl os Ca ldas) .9
Este sag ra d o te r-hum a no evid enc ia qu e a co rpo re id a de não se redu z
ao empírico, ao bio lógico; muito pe lo contrá rio , e la evad e/ultra passa o Nessa esc rita imbricado ra do corpo e d o sagra do, a dimensão c ri stã
analítico, o sociológico etc. e m instâ ncias não ca pita li záveis, não co ntro- e c rística é ma is evidente em a lguns textos, po is " j ... J a tra di ção cri stã va i
láve is: " H á, nesta fili ação poé tica, j .••] uma intuição d a divina saudade afi rma r a lgo qu e pa ra juda ísmo e is la mismo é inace itáve l e inconce bíve l,
co mo luga r fronteiriço d e m isté ri o e revelação, s ilênc io e pa lav ra, a u- ve rda deira mente a ná tema: Deus se revela d e m aneira definiti va, não em um
sênc ia e prese nça, escuta e co rpo re ida de, a mor e d o r j ... J" (José Ped ro tex to, mas em um a pessoa. No caso, na pessoa do ho mem Jesus de Naza ré.
Angélico. G ri fos d o a utor ). Ass im , face à indagaçã o " Que no me terá esse E este ho m em não é mera a pa rição, nem um fa ntas ma, um espírito o u um
mistério ?'', nos é sugerid o qu e " tra ta-se d e um misté ri o ma io r, um mis- a nj o . Logo, na concepção cri stã, o corpo passa a ter lugar de destaq ue"
téri o q ue está acima: "Este li vro se pediu uma libe rd ad e m a io r qu e ti ve (Ca rl os Ca ldas). Em contra pa rtid a, em várias o utras esc ritas a refe rênc ia a
med o d e da r. Ele es tá ac ima d e mim. Humildeme nte tente i esc revê- lo. E u C risto é bem ma is nu a nçad a o u híbrida, e em a inda em o utros inexistente:
so u ma is forte do qu e eu " (tra nscrição d e C la rice Lispec to r). Ao m es m o "Na hermenêutica do sagrad o, tudo leva rá a c rer qu e, nestes dias, urgirá
te mpo o mistéri o m a io r e m a is a lto qu e pediu um a liberdade qu e provo- ta mbém o uvir ace rca d a essência d a Rea lida de última, co m os teólogos
ca m ed o s uscitou o se ntime nto d a humilda d e e a a titude d a o bedi ê nc ia e místicos, ta mbém os poetas e m C1sicos. Tod os nos comuni ca rão uma só
qu e co nse nte e m toma r d a pena e esc reve r [.. .J. Ali es tá o misté ri o d o verd a de a tingida, através de ca minh os d ive rsos" . 10
Senh o r da vida que sempre fasc ino u a judi a C la ri ce Li specto r." (M a ri a
C la ra Binge me r).
Simulta nea mente, não se recorre u, nessa fo rmul ação d e um sagra d o
inter-hum a no, a um embasa m ento d e c unh o m eta fís ico o u o nto lógico. A 1 Referências
fund a mentação desse " tra nsce nd enta l" pro mov ida nas mesas red o nd as
d o Colóq ui o m ost rou-se c la ra me nte d e c unh o poético: " Va le lembra r: no BARCELLOS, J osé Ca rlos. Lite ra tura e teologia: pers pecti vas teórico-me-
texto lite rá ri o, as sacra lida des faze m pa rte d e um a es tra tégia d e c ri ação. tod o lógicas no pensa mento ca tó lico contemporâ neo. Nu111en: revista
Bea tas, miss io ná ri os e fe iticeiros não identifi ca m pessoas co nsagra d as. d e estudos e pesquisa da re lig ião, Jui z de Fo ra, v. 3, n. 2, p. 9-30,
São personagens. Templos, e mbo nd eiros e ce mité ri os não d em a rca m lu- 20 10.
ga res sa ntos. São co nfig urações d e es paços nar ra ti vos " (A nto ni o Ge ra ldo C ERTEAU, M ichel d e. A Invenção do Cotidiano. Petró po lis: Vozes, 1994.
Ca nta rela ). Proced e-se, s im, à co ns titui ção d e teopoéticas, entendidas
co mo di sc ursos entre laça ntes d a sacra lida d e (da vidaNida) e co r po,

1... 1 q ue se expressa[m J não por m eio de pro posições lógicas, racio na is, 9. Em seu capítulo, Carlos Caldas refere-se especificamente à produção teológica de Rubem
Alves, mas nesta introdução a teopoética por ele mencionada é alçada à condição de instân-
ca rtesia nas e positivistas, mas por meio da ling uagem intuiti va, im pres io-
cia discursiva alternativa à significação dos sujeitos e da sociedade na relação simultaneamen-
nista e subjet iva da poes ia . 1... 1 1prod ução! a lternativa à forma teológica te mantida por eles com o sagrado e com a corporeidade.
trad icio na l de inspiração pla tô n ica, q ue se preocupa a penas com o "es- 1O. COSTA, 1999, p. 78-80. Transcrição de José Pedro Angélico, em seu capítulo.

l 18 19 1
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1

CONSTITUI ÇÃO PASTORAL GAUD IUM ET SPES SOB RE A IG R E-


JA NO MUNDO ACTUAL. Em Compêndio do Concílio Vatica-
no li. Constituições, decretos, declarações. 19ª Edição. Perrópoli :
Vozes, 1987.

DE MOR!, Ge ra ldo; BUARQUE, Virgínia (orgs.). Corpo-Encarnação . São


Pa ul o: Loyola, 2016.

DE MOR !, Geraldo; DENTZ, René; BUARQU E, Virgínia. Apresentação.


Annales FAJE, v. 1, n. 2, 2017. p. 5. Disponível em: dutp://faje.edu.
br/period icos/i ndex.ph p/a n na les/a rricle/view/377713 834>. Acesso em
2 nov. 2017.

DIAS, Zwingl io M. Desvelando Deus nos enrremeios da vida ... (Alg umas no- 1 1 1
tas so bre o diá logo da teologia com a literatura a pa rtir da proscrição).
CORPO-ALTERIDADE-
Refl.exus: Revista semestra l de Teologia e C iê ncias das Religiões, v. 5 , n. 6,
p. 11-29, 2011. HOSPITALI DADE
MAGALHÃES, Antônio Ca rlos. Deus no esfJe/ho das palavras: Teologia e
Literatura em di á logo. São Paulo: Pa ulinas, 2001.

PRADO, Adélia. A duração do dia. Rio de Janeiro: Record, 2010.

SILVA, Anaxsuell Fernando da. As cores do crepúscul o: fabu lação, teologia


e litera tura em Rubem Alves. Estudos de Religião, v. 3 1, n. 2, 261-
284, ma io-ago. 2017.

1 20
Os padres têm corpo?
O padre como personagem no
romance português contemporâneo
josé Tolentino M endonça

Na cena e ucarísti ca está rese rva da ao padre - a tor litúrgico pri ncipa l -
a repeti ção das pa lav ras de Jes us: " Hoc est enim corpus meum" - " Is to é
o meu co rpo" (Mt 26,2 6). Como esc reve J ea n-Luc Na ncy, essa exp ressão
nuclear do qu eri grn a mostra qu a nto a tradi ção c ristã nos to rn a "obceca-
dos pela vo nta de d e mostra r um isto, e de (nos) convencerm os q ue este
isto, aq u i, é ... o seu corpo. l ... j Que isto seja um corpo (e deste modo qu e
isto seja o co rpo, a bsolutamente), eis a nossa o bsessão" (NAN CY, 2000,
p. 5) . O ministé ri o o rdenad o coloca, ass im, o padre no e picentro de um a
radi ca l reivin d icação do co rpo. E, contudo, podemo-nos perg unta r: os
padres tê m co rpo? Não ra ro, o co rpo d o pa dre fi ca co mo qu e seques tra do
po r um a es pécie de inv isibilidade funcio na l, e o discurso eclesia l co rre nte
co nvive com um dé-ficit de pensa mento e de pa lav ra so bre o corpo do pa-
dre e d o qu e a ele se prende. Dessa ma neira, acentua-se o pa radoxo: o ser-
viço e uca rístico centra a confissão da fé na din â mica enca rn ac io na l, mas
o pad re é inte rpreta do - e mu itas vezes a uto inte rpretado -, de um a fo rm a
desejave lme nte desenca rn ada, des ma teria li zad a, incorpó rea . Como se o
co rpo pudesse ser o mitido e não fosse, ele pró prio, ma is do qu e o presente
da prese nça. Como se o corpo não co nstituísse o enun cia do primeiro, a
intersecção fund a nte, a possibi lidade de qua lqu e r fa la, a o ntologia loca li-
zada . O teólogo Ro berto Repo le reco rd a, e bem, qu e "a rea lidade teológi-
ca do pad re só pode inscreve r-se no conc reto d os padres em ca rne e osso"
(REPO LE, 20 L6, p. 111 ). Contudo, aquil o qu e se o bserva é qu e ta l co rn o
o pad re surge po r o fício estreita mente ligado à pro dução disc ursiva - o
dec reto concilia r, Presbyterorum Ordinis, so bre o ministéri o e a vida dos
pres bíteros, di z mesmo que o a núncio da Pa lavra é o se u " primeiro deve r"
(P. 0., 11 ,4) -, e ra ra mente o o uvimos, e m primeira pessoa, num disc urso
de si, ta mbém o co rpo do pa d re é um corpo diluíd o, a fás ico, sublim ad o,
a bscnte: um corpo não identificado.

23 I
J OS PADRES TÊM CORPO? 1
1 CORPO-ALTERIDADE-HOSPITALIDADE 1

eterna o u religiosa do ro ma nce record a-nos ta mbém que a vida é circuns-


1 1 O romance, "esse pequeno sacramento da
cri ta pela mo rte, que a vida é expectativa da mo rte e nisso pa rtilha a visão
modernidade" sagrada da vida como vida já escri ta, determ inada pa ra ser, ainda q ue no
Em nosso a uxílio pode vir o roma nce, "esse pequ eno sac ra mento da aberro, um a passagem. Este é o fato da existência. E, nesse sentido, como
modernidade" (SALMANN, 2000, p. 16), como, numa ex pressão pa rtic u- recorda Wood, "o roma nce ma ntém a promessa feita po r Deus no Sa lmo
la rmente instiga nte, o teólogo Elma r Sa lma nn lhe cha mo u. É já célebre o 12 l : 'O Senhor te p rotegerá, qu and o sa is e qu a nd o entras"' (WOO D, 2015,
modo co mo, em "A arte do roma nce", Mila n Kundera explica o nascimen- p. 1 8). Penso, po r isso, qu e tem razão O reste Aime qua ndo esc reve que
to desta form a sing ul a r de hermenêuti ca huma na que é o ro ma nce. Diz ele: " não só é o po rtun o, mas é ta mbém indispensável que a teologia ... institua
um a relação com o ro ma nce" (A IM E, 2012, p. 16).
Q uando Deus a ba ndo nava lenra menre o luga r de o nde tinha dirigido o uni -
verso e a sua o rdem de va lo res, sepa rado o bem cio ma l e da do um senti do
Nessa linha, Elmar Sa lma nn a presenta três traços constitutivos ' d o ro-
a rodas as coisas, Dom Q uixote sa iu de casa e já não estava em condições ma nce que o ca pacita m como ferra menta pa rticularmente adequ ada pa ra
de reconhecer o mundo. Este, na ausênc ia cio J uiz sup re mo , a pa receu su bita- q ue nos veja mos refletidos e nos compreenda mos, mesmo do po nto de vista
menre com uma te rrível a mbig uidade; a única verdade divina decompôs-se do religioso, convocados para um a exercitação do pró prio ser. Antes de
em centenas de verdades rela tivas q ue os ho mens partilh ara m entre si. As- rudo, o roma nce consegue gera r-se como metáfora integra l da vida, porque
sim, o mundo cios te mpos modernos nasceu e o roma nce, na sua imagem e ele aposta na construção de um a unidad e narrati va entre o mundo e uma
modelo, nasceu com ele (KUN D ERA, 19 88, p. 1 8-19).
multi p licidade sobreposta de visões do mundo . Qua ndo o lha mos para o
A emergência do rom a nce como gêne ro coincide, em gra nde medida, mundo a través do roma nce ele nunca é pla no, nem unívoco: junta rea l e
com o des po nta r da secula rização, e esse é ma is um a rgum ento que nos imaginá ri o, histó rico e ficcio na l, empírico e fantasmático, passado e futu ro.
o briga a reconhecer esse vasto processo como um fenó meno civilizacio na l Isto é, oferece-nos sempre uma plura lidade de acessos, ilumina ndo os pos-
de a ltíssima complex idade, ce rta mente a mbíguo e limitado e m a lguns dos síveis que não ve mos. Depo is, o ro ma nce dá-nos um conhecimento concre-
pressupostos - so bretudo qua ndo extremados - , mas rela nça nd o a ta refa to, concentrado, não conceitua i. Nós nem nos da mos bem conta qua nto o

de compreensão d o huma no, que é a um tempo sagrado e secul a r. Não pensamento a bstrato se torno u o código prioritário - e a té exclusivo - das
podemos simplistica mente a rrum a r qu er a secul a rização, qu er o roma nce nossas relações. Cada um de nós é um a máq uina de ídolos e de opiniões. A
na gaveta do profa no e tra tá-los em c have dia léti ca o u a ntago nística na re- ó tica d o roma nce é co rreti va. Ela não se limita a expressar po ntos de vista :
lação que não deixa ra m nunca de ma nter co m o relig ioso. A decomposição exibe, sim, o modo como estes se gera m, ex põe os press upostos existen-
d a " ve rdd
a e " em " ver dd
a es ,, po d e ser vista
. como um a perda, mas ta mbém cia is, cri a a cena, expõe o corpo . A ótica do roma nce (a petecia escreve r, a
como uma o po rtunidade. ética d o roma nce) não demonstra : ela mostra, num esforço de desa p ropria-
ção ideológica por fid elidade à existência em si. Po r exemplo, não são as
Ja mes Wood, um dos ma is origina is c ríticos literá ri os contempo râ neos,
ideias de To lsto i qu e conta m, mas sim Ann a Ka renina vivendo. Não é agre-
ex plica, po r exemplo, que "ao lermos um roma nce podemos verificar um a
lha menta l de G uima rães Rosa qu e devemos o uvir, mas Ri o baldo a dize r:
a lternâ ncia consta nte entre a moda lidade sec ul ar e a religiosa, naquil o que
" Viver é um descuido p rossegui do" (GU IMARÃES ROSA, 1988, p. 5 7).
se poderi a designa r po r fa to e fo rma " (WO OD, 201 5, p. 16) . O impulso se-
Por fi m, o roma nce é um instrumento de precisão, como ex istem poucos. Só
cul a r do roma nce p rocura expa ndir a vida, a mplia as suas cenas e deta lhes,
o roma nce está à altura da si ngula rid ade, liberda de e tragicid ade d a vida;
esforça-se po r a tribuir aos acontecimentos rela tad os o ritmo, a minúcia e
só ele consegue relatar o maiúsc ul o e o min úscul o , o sublime e o in fa me, o
o turbilhão do tempo real. Qua ndo o roma nce se rege pela moda lidade
secula r, deseja que as suas pe rsonagens viva m pa ra sempre, não a dmite qu e
possam mo rrer. Essa é a fo rma da existência ro ma nesca . M as a moda lidade 1. Aparecem aqui resumidos. Cf. SALMANN, 2000, p. 20-24.

25 I
l 24
/ CORPO-ALTERIDADE-HOSPITALIDADE 1
/ OS PADRES TÊM CORPO? 1

enlace e a solidão d os fenó menos da vida. O nosso pensamento tem dificul- não prosseguiu, escreve: "Já me disseram que não podia faze r conto, dra-
dade em ser tão preciso: porque vemos apenas pa rte e de ma neira limitada, ma, roma nce sem lhe meter o meu frad inho ... Po is senhores, não sei que
sem conseguir remover a incerteza . O roma nce - essa "arte da precisão", lhes faça; a culpa não é minha. [... ] Não sei que se passasse o u pudesse
como Sa lmann a denomina - oferece-nos uma lente. E uma lente também passa r nesta terra coisa alguma, pública o u particular, em que o frade não
pa ra o lhar o padre, coisa porventura em que pensamos pouco, pois não é entrasse" (GARRETT, 2010, p. 77-78).
frequente ele ser buscado a í. Talvez a ex plicação principa l para esta proliferação da presença do
clero no ro ma nce de uma determinad a época seja, de fa to, de natureza
2 1 O padre no romance português socio lógica: o padre só está no roma nce po rque a sua presença encontra-se
M as um dado curioso - e que po rventura não fo i ainda a bo rdado histo ricamente disseminada pelos di versos â mbitos da vida pessoa l e socia l,
como merecia - é que não se pode escrever a história do romance em Po r- cumprindo ass im o rom ance uma espécie de fun ção documenta l em relação
tuga l - dura nte um período hist órico e literário muito significati vo, entre os à rea lidade. N o fund o, o romance reconhece que não é possível encena r a
sécul os XIX e meados do século XX - sem referir a presença a bundante do d ra maturgia da existência, entre nascimento e morte, nem perceciona r a
padre como personagem. Em to rno à figura do clérigo, o roma nce constró i construção/desconstrução mo ral e o quad ro de um tempo, nem se aventu-
uma ga leria huma na impressionante: há padres heró icos e d evotos, mas rar pela compreensão da pa isagem não só religiosa, mas também po lítica,
ta mbém munda nos; padres idea listas e pragmáticos, intra nsigentes e bo- cultura l, etnográ fica e onírica, sem o recurso ao signo que o padre repre-
nacheirões, ascéticos, devassos, truculentos, desencontrados o u felizes. H á senta . M as o padre pa rece ma is um signo socia l do que um corpo. M a is um
padres de sacristia e de sa lão, carreiristas e abnegados; e padres místicos, fragmento do corpus do que um corpo . O enfoque centra-se no pap el qu e
mergulhados no assombro da fé e da dú vida . H á padres vivendo às ex- o padre representa . Até não faltam informes acerca d o co rpo do clérigo:
pensas dos ricos, figuras de poder e do mínio o u busca ndo uma eva ngélica pode-se efeti va mente traça r um elenco eno rme de peri pécias no campo d a
e desprendida frugalidade que fez deles a póstolos dos desgraçados e dos sexua lidade, das patologias, vícios e prazeres. M as, como indica N ancy,
simples. H á padres jovens, aca bados de o rdenar, e padres nas encru zilhad as não se trata d isso. Tra ta r-se-ia sim de "escrever não acerca do corpo, mas
pro blemati za ntes da maturida de: ho mens urba nos e ru ra is, ignora ntes e o próprio corpo. N ão a corporeidade, mas o corpo. Não os signos, as ima-
do utos, bem-sucedid os e fracassados, em ciclo e em contraciclo na relação gens, as cifras do co rpo, mas a inda o corpo" (N AN CY, 2000, p. 10).
com o seu tempo e lugar. E há so bretudo muitos, muitos pad res, num pe-
río do relativa mente dil atado da história do romance po rtuguês. Seja como 3 1A fraqueza e a força: modalidades de representação
protago nistas da intriga roma nesca - pense-se na p rodução de Alexa ndre Num estudo que podería mos considera r emb rio ná ri o da teoliterá ria
H erculano, Júlio Dinis, Eça de Queiroz ou Camilo Castelo Branco - , seja escrita em língua portuguesa, mesmo se no se u interior é muito d esigual
so bretudo como atores secundári os o u figurantes, recortados, em pa no de - refiro -me ao texto de Zacari as de Oliveira, " O padre no romance po r-
fund o, ao serviço da verossimilhança gera l do discurso. Como diz Almeida tuguês", editado em 1960 - o a uto r adota um tom desiludido no ba la nço
Ga rrett, "eles ca racteri zava m a paisagem ... E tão necessári as, tão o brigadas que faz, considerando que apesa r dos indiscutíveis méritos que reconhece
figuras eram em muitos desses qu ad ros, qu e sem elas o pa inel já não é o em a lgumas o bras, "ainda não surgi u um verdadeiro ro ma nce português a
mesmo" (GA RRETT, 201 0, p. 73 ). estudar o padre tal qual ele é" (O LIVEIRA, 1960, p. 202). Oliveira ava nça
Almeida Garrett ironi zo u com a sit uação, deixa ndo dela registo na- a seguinte hipótese:
qu ela que é a s ua o bra ma is emblemática, Viagens na minha terra (1 84 6).
O lha ndo fora de si, em busca de temas ou pe rsonagens, entre o utros ti pos
Ga rrett q ue era so brinho de bispo e de cônego, e chegou inclusive a rece ber capazes de ocupa rem as páginas dos se us livros, descobrira m o pad re. Este
as ordens meno res na perspecti va de uma ca rreira eclesiás tica que depo is entra, então, na sua a rte enqua nto faz pa rte da pa isagem huma na. Nesta pai-

/ 26 27 1
1 CORPO-ALTERIDADE-HOSPITALIDADE 1 1 OS PADRES TÊM CORPO? 1

sagem, prende as a tenções à maneira do médico, do professor, do advogado, " rem um ar pobre e sem força ", mas que essa experiência - que é a dos
do capita lista o u do indu t ri ai. Aparecerá destacado na ficção romane ca despro tegidos, dos pobres e excl uídos - carrega consigo uma signi ficati-
q ua ndo outras personagens lá anda m apenas com a fu nção ele preparar o va energia eva ngélica. A força do padre contemporâ neo, escreve Suhard -
a mbiente e o cenário o nde esses sen ho res de vida ma is notável irão desen-
"está em se apresenta r desarmado" (SU H A RD Apud: O LIVEIRA, 1960
rola r o seu caso. Não e d isting ue, a sim, de qua lq uer o utra personage m
p. 1 O). Zacarias de O li veira oscila, mas não va i por a li . Contudo essa seria
cons iderada digna ele estud o. Entra na história despido de roda a caracterís-
tica sobrenatura l. É um homem, um ele mento profa no, com mais ou menos
uma via fec unda de perscrutação do roma nce português. O desarmar pro-
destaque o u influência. Ana lisa-se o seu papel socia l. C ritica-se o u lo uva-se gressivo da fig ura do padre, a fragilização da sua posição social, o seu vive r
a tendendo, apenas, ao ho mem que o rea liza: um ho mem des ligado do céu e rorn ado condição a rdente de pergunta, a sua exposição menos acomodada
ela graça, um ho mem absoluta mente ca l. É cerco que lhe concederão a lgumas ao contexto, menos institucio na li zada, mas suscetível de fazer irromper po r
prerrogativas sacerd ota is o u clerica is. Nem de o utra fo rma se distinguiria: novas vias a imprevisibilidade do tracejado de Deus. Pois, como refere uma
vestirá uma sota ina , pronu nciará uns votos que ning uém co m preende, vive- personagem de um roma nce recente: "só ho mens incertos podem manter um
rá entre a sacristia e a igreja, terá pa lavras latina , o u de a rremedos latinos. mundo que se esq uiva de qualquer sentido" (CAMARNEIRO, 2013, p. 113).
Mas tudo isso é exterio r e em na da caracteriza essa ou tra personagem ou a
distingue in timamente. Foi este o método das duas escolas li terárias conhe- 4 1 "Debaixo de algum céu"
cid as po r romantismo e rea lismo (OLI VEIRA , 1960, p. 12-13 ).
Inscreve-se, po rventura, mais nessa linha o exercício que aqu i propo-
Zacarias de O li veira te m e não tem razão. Tem razão qua nd o se abo r- nh o: a leitura c rítica da o bra de Nuno Cama rneiro, D ebaixo de algum
rece que a fig ura do padre seja reduzida a meia dúzi a de estereótipos em céu (2012). O livro foi disting uid o com um dos mais impo rtantes prêmio
ro ma nces ba na is o u então utili zada como a rma ideológica . N ão é po r aca- li terá rios portugueses, o Prêmio Leya, e associa do a isso, s urge um por-
so qu e um d os capítu los da s ua o bra se intitula "O anticlericalismo ", in- meno r c uri oso do nosso ponto de vista . A decla ração do júri, a justifica r a
te rpreta ndo a í a mo de rnid ade como uma ba ta lha c ultura l o u um diá logo atribuição, destaca na o bra "a fo rça no desenho das personagens e a hu -
de s urd os, qu e em parte também tem s ido. Mas não tem razão quando manidade subj acente ao que poderá ser lido como uma a legoria do mundo
revisita a literatura po rtug uesa, con idera ndo que ela, no seu conjunto, não contem porâ neo" (ALEGRE Apud: CAMARN EIRO, 2012). É um a decla ra-
faz justiça à personagem do pad re e que, pelo co ntrá ri o, "a deformação é ção interessa nte se pensarmos que a personagem principal é um padre. Mas
gra nd e" (O LIVEIRA, 1960, p. 259). O estud o de O li veira padece de um a ta mbém inesperada é a consideração de que o percurso espiritua l de uma
idea li zação da figura do padre, enqua nto que a lite ra tura representa o que personagem assim possa ser o motor de " uma a legoria do mundo contem-
tem di a nte dos o lhos (ou no interio r deles). Ele considera qu e o padre se rá po râ neo". São elementos que devem faze r-nos refletir.
se mpre um incompreendido na modernidade, um isolado. E co m a sua O seu a uto r, N uno Cama rn eiro, acaba de completa r quarenta a nos, e
" missão ex traordiná ri a, o padre é fraco. Anda sozinho, não possui a uxílios, é uma das vozes emergentes da nova literatura portuguesa. A sua for ma-
nem verdadeiros a migos. Se, no passado, ele se ergui a como um a força, ção uni versi tá ri a ocorre no domínio da fís ica, chega ndo ele a traba lhar
escoltado por um saber reconhecido e procurado, defendido por um a so- na O rga ni zação Europeia para a Investigação nuclea r (CERN ), embora a
c iedade o nde a religião era o va lo r primeiro, hoje traba lha sem a ux ílios" posterior pesq uisa doutora l - rea lizada na Uni vers idade de Florença - o
(O LIV EIR A, 1960, p . 9). Aspira-se no fundo a um fo rta lecimento da insc ri - des loque já para um diá logo explícito com as humanidades, pois faz o
ção socia l, ao regresso ao protecio nismo ultrapassado, em vez de perceber doutoramento em C iência Aplicada ao Património cultural. É a tua lmente
a oportunida de para um protago nismo do corpo, evangelicamente ferido e docente e in vestigador uni vers itá rio no campo das Ciências d a Ed ucação e
para o se u potencial profético. É verdade que no seu argum entário ele c ita do Patrimó ni o. Mas clara mente procurando co njugar o percurso acadêmi-
um pensamento do ca rd ea l Emman ue l Suh ard que di z que ho je o padre co com um a ca rreira literária.

l 28 29 I
1 CORPO-ALTERIDADE-HOSPITALIDADE 1 1 OS PADRES TÊM CORPO? 1

O roma nce que a bo rda remos, intitulado Debaixo de algum céu (20 13) A esta concentração tem pora l da na rrat iva corresponde ta m bém uma
é o seu segundo roma nce. Em 2011 , hav ia-se estreado na ficção com No concentração espacia l. A ação ro ma nesca cruza progressiva mente a vida
meu Peito não Ca bem Pássaros. Posterio r a Debaixo de algum céu é o vo- do inq uilinos de um prédio; um ba ndo de de co nhecidos, com idades,
lume de contos Se Eu Fosse Chão (20 15), gênero que tem regul a rmente fre- percursos e rotinas diferentes, protegidos pela solidão e o a no nima to das
quentado, como o a resta a re prese ntação espa rsa em revistas e a nto logias paredes. No preâ mbulo q ue ab re o li vro, o na rrado r enqu ad ra desta ma-
nacio na is e estra ngeiras. Um dado qu e pode ser interessa nte referir nesta neira o espaço: "No prédio, pessoas em cima um as das o utras, di vididas
sede é que rodos os três li vros, que perfazem o núcleo fund a mental da sua po r tij o los e cimento, a pen ad as em a pa rta mentos, pa ra que não ca ia m
produção literá ria, co nhecera m ta mbém circulação no Bras il. e se bara lhem as vidas de cima com as vidas de baixo. Pessoas a rrum a-
das como histó ri as em esta ntes ... O prédi o conta-se com quem lá está"
5 1O purgatório que é a vida dos homens (CAMARNEIRO, 2012, p. 14).
O ro ma nce de Cama rneiro cha ma-se Debaixo de algum céu, mas a E q uem lá está? Esta é a d ist ri buição que o leito r encontra: No rés-do-
pa lav ra mais recorrente para classificá-lo fo i "purgató rio" (RATO, 2012). chão di reito vive Marco Moço, um a personagem à ma neira de a lg umas
É isso inclusive q ue se pode le r no fin a l da sinopse da contraca pa, o nde de Hemingway - um marinheiro em terra q ue pertence ao ma r como uma
se a nuncia que o livro retrata "o pu rga tó rio que é a vida dos ho mens e a gaivota, mesmo qua nd o po usa lo nge. Todas as ma nh ãs, Moço a travessa
busca q ue cada um empreende pela redenção". Teremos ocasião de apro- a pra ia de ponta a po nta a resga tar objetos perdidos que aos o lhos dos
fund a r o tema. O bserve-se desde já, no enta nto, como a pró pria narra ti va o utros pa recem a penas li xo, mas qu e pa ra ele são fragmentos de m ús ica. É
se a prox ima de um léxico de natureza teológica: "Céu " (mesmo se a través ta mbém o po rteiro do p rédi o . O ro ma nce d escreve-o assim:
de uma fó rmul a que de certa fo rma o rela ti viza : não é o "céu", mas "a lg um
Por vezes o préd io começa em Marco Moço, o utra s vezes é nele q ue ter-
cé u"), " redenção" e "pu rga tó ri o". O purga tó ri o, isto é, a vida enca rn ada, é
mina. Ass im é neste iníc io de noite. Moço tem um ba lde e uma esfregona
o traço de uni ão entre as personagens. E entre elas e os leitores. e lim pa a entrada do prédi o como todas as sema nas. Ele conhece os in-
A intriga decorre num período de o iro dias, entre o di a de na ta l e o de quilinos pe lo som dos passos e pelas o la dos sapatos. As vozes também,
a no novo - "os últimos sete de um a no e o primeiro de o utro". O iro di as o horá rios, a hora em que e deita m e acordam, os dias em q ue fazem
podem parecer p o uco se ti vermos a pretensão de na rra r e compreender a compras, o correio que recebem, as visitas, a luz, a água e o gás qu e gasta m,
existência de uma pessoa, mas como a rg umenta o na rra d or, o tempo de o li xo que prod uzem. Se o mundo encolhe se a ré ao volume fechado do
uma vida é descontínuo e assimétrico. Po r exemplo, nascer é só um di a e préd io, Moço pod ia bem ser deus. Um deus discreto e respeitador de inti mi-
da des, q ue lavasse o chão e a inda tratasse dos canos e dos q uad ros elétricos.
mo rrer ta mbém ... Estes o iro dias - gara nte ele - são "o tempo cerro pa ra
(CAMA RNEIRO , 2012, p. 53).
que os ho mens t rema m e mudem " (CAMARNEIRO, 20 12, p. 13). Esta
expressão "o tempo certo" o briga-nos, desde logo, a transcende r um a visão No rés-do-c hão esq uerdo vive David, um in fo rm á tico esqui vo que tra-
exclusiva mente cro no lógica da tempo ra lidade e a brirmo-nos à dimensão ba lha em casa, sob retudo no ite dentro, a construi r um a distopia tão devas-
ka irológica . O tempo em qu e se treme e muda - e qu e constitui no fundo tado ra q ue ele próprio não ac redi ta nela: uma base de da d os com pessoas
o tempo do roma nce - é o mo mento o po rtun o, a ho ra da crise e da g raça, virtuais q ue possam ser vend idas o u al ugadas num porvir já m uito pró-
d o tudo ou nada, o nde a experiência de da nação e salvação encontra m ximo. " Traba lhado res virtua is, públicos, cl ientes, com pa nheiros, a rtistas,
a possibilidade de consuma r-se. O fac to de os cap ítul os correspo nderem apresentado res, pessoas d ispostas a q ualq ue r coisa, em tud o igua is às rea i
sucessiva mente à fração de um dia, co nfere ao tempo uma fo rça semâ ntica e sem a desva ntagem de um corpo" (CAMA R NEIRO, 2012, p. 27). No pri-
que conta mina estrutura lmente o rela to. É claro, múltiplas seri a m as a pro- meiro d ireito vive Ma rga rida, uma velha viú va solitá ria, q ue tem um ga to,
ximações inte rtex tu a is possíveis com a narra ti va bíblica . recordações qu e q uer deixa r pa ra trás e po uco mais. No primeiro esqu erd o

l 30 31 1
1 CORPO-ALTERIDADE-HOSPITALIDADE 1 1 OS PADRES TEM CORPO? 1

vivem Adria no e Constança, um casa l com um bebé numa relação conjugal aferiva e espiritual à vocação de um presbítero - , e que se pode resumir em
a desfazer-se aos bocados. Todo o segundo a nda r é ocupado po r uma única dua questões pa ra as quais a narrati va procura rá iluminação: o que pode
fa mília: Berna rdino, o pai que trabalha como bancá rio· Ma nuela a ma-e ser para um padre "viver como um homem ?"; e o que pode ser pa ra um
' ' '
professora de Inglês; a filh a j oa na, uma adolescente-tipo; e Frederico, 0 ir- homem "v iver como um padre ?" .
mão mais novo, a criança-pro blema, sempre à beira de uma crise nervosa . Prossigamos com a primeira das questões, procura ndo, po r econo mia
O tercei ro direito está desocupado, mas cheio de um vazio ferido que ainda de análise, agrupar o material narra ti vo:
palpita. "O apa rta mento está mo bilado, a cozinha equipada e os a rmários
I. Pa ra um padre, viver como um homem pode ser assumi r uma " desloca-
guarda m ainda as roupas de um ho mem e de uma mulher ... Há quase um
lização simbólica" em relação ao que seria o seu territó rio previsível -
a no que ninguém entra no a pa rta mento e ninguém no prédio tem a cha ve.
aquele tutelado direta mente pela sua missão. O es paço, como nos re-
As pla ntas estão secas, são fósseis que contam uma histó ria de a ba ndono"
corda Michel Fo uca ult (1994, p. 752-762 ), não é neutro, tem uma
(CAM ARN EIRO, 2012, p. 21 ). M as ao mesmo tempo este a ba ndono fun-
história. Pense-se no significado do espaço no mundo medieva l: ele é
cio na como uma espécie de ecrã dispo nível para cada inquilino projeta r os
fu nda mentalmente um conjunto hiera rquizado de lugares distintos e
s~ u s medos e desejos. De ma neira pa rticular o último inquilino, aquele que
inconfund íveis, caracterizados em termos de o postos - lugares cosmo-
vive em frente, no terceiro esquerdo : um jovem padre - o padre Daniel - a
lógicos e terrestres, lugares sagrados e profa nos, lugares protegidos e
atravessa r uma crise de gestação da pró pria identidade e que, ao contrário
abertos. Tudo aí era explicado - o homem, o mundo, as sociedades -
dos ho mens virtuais que David cria no rés-do-chão, se debate com o " in-
a pa rtir de uma loca lização estável, institucio nalmente gara ntida. O
conveniente de ter um corpo".
gra nde escâ ndalo de Galileu, po r exemplo, não foi ta nto descobrir que
Uma referência final à mo rfo logia do edifício: " Com a exceção do rés-
a terra girava em torno do sol, mas ter substituído o paradigma da
do-chão, todos os apa rta mentos têm pelo menos uma di visão com vara nda
localização pelo novo paradigma moderno do movimento e com ele a
e vista para o ma r. O a rquiteto respo nsável pelo projeto cha mo u-lhe Edifí-
no rmalidade da desloca lização. O luga r de inscrição de todas as fo r-
cio Atlântico, mas nenhum mo rado r o conhece po r esse no me. As pa redes
mas de existência passa assim a ser o movimento. O novo espaço, o da
do prédio são razoavelmente isoladas, o uvem-se os gritos, mas não as vo-
modernidade, é um espaço dinâ mico, mutante, em revisão crítica, um
zes" (CAMARNEIRO, 2012, p. 39). Podia ser um prédio de qua lquer uma
espaço continua mente reconfigurado, pois ele pró prio é movimento.
das nossas cidades.
O ra, partindo desta visão de Foucaul t, o espaço t radicional do padre -
6 1 Viver como um homem pela sua estabilidade, hiera rqui zação, di fe renciação - dá a ver um mo-
delo pré-moderno. A sugestão q ue Da niel segue é viver à ma neira de
Que faz um padre como inquilino num prédio daqueles? É um traço um ho mem, acompa nhando o regime da modernidade, com rodos os
disru pti vo impo rta nte que o ro ma nce introduz. Tanto mais que somos in- seus riscos.
fo rmados de q ue a paróquia dispõe de uma pequena casa de fun ção nas
2. Viver como um homem é confro ntar-se com as práticas do quotidia no,
traseiras da igreja (CAMARNEJRO, 2012, p. 42), a que Da niel teria direi-
com a vida minúscula na sua materia lidade despida de a ura, a existên-
to. Po rém, como nos ex plica o narrado r, o pa i de Daniel insistiu em com-
cia comum sem q ualificação, nem gra ndeza. Ir ao mercado, toca r as ce-
prar-lhe este apa rta mento: " Prefe ria q ue me desses netos, ma se essa é a
bolas, o peixe, as lara njas. Vi ver com pouco dinheiro. Volta r pa ra casa
tua escolha que ao menos vivas como um homem" (CAMA RNEIRO 2012
' . ' com meio frango assado num Tupperware, comer sozinho, levantar-se
p. 42). Nesta fa la, temos a defi nição, em face e em contra face, em positivo
e limpar a mesa. Viver como um padre é, pa ra Daniel, oficia r a cena
e em nega ti vo, do programa ro ma nesco que a personagem do pad re viverá
li tú rgica, o nde "com o modo seguro que aprendeu'', "o corpo di reito ",
- num itinerário que, ava nço já, me pa rece ser esta: a iniciação psicológica,

l 32 33 I
1 CORPO-ALTERIDADE-HOSPITALIDADE f 1 OS PADRES TÊM CORPO? 1

"os gestos largos'', "a voz sabedora" (CA MARNEIRO, 2012, p. 20) rudo rão contrá rio, e o peito não aguema, o coração não aguenta ... Fazemos
dirige-se ao seu rebanho. É o es paço da igreja - um mundo regulado ma l as contas a Deus, não é à nossa medida, o u nós à sua, e foi Ele que se en-
ganou. Um engano divino, imenso, como são sempre os Seus. Esrá rudo ma l
que ele administra com solenidade e a exatidão de normas, enqua nto
pensado desde o início e agora é rarde ... (CA MAR EIRO, 2012, p. 11 8).
qu e viver como um ho mem tem o utra estética : é a fund a r-se num apar-
ta mento anônimo, ig ua l ao dos outros inquilinos, o nde ele tem de lutar Viver como homem é vive r a exposição da fratura original, a ins ufi-
com o frio e a solidão; onde a Bíblia se mistura com Schopenhauer ciência, o erro, a escassez, a interrogação, a desordem, a ferida, o desejo .
e Nietzsche e Santo Agostinho está caído ao lado de Grande Sertão: Daniel é um ser adâmico. O seu monólogo po deri a ser murmurado por
Veredas e Pedro Páramo; o nde há uma di visão vazia onde ele se senta Adão qu a ndo escondi a o seu corpo de Deus, na pa rá bola do ja rdim.
de cócoras o u se deita no chão com a luz apaga da , a escuta r, no som
4. H á, a lém disso, do is movimentos na vida de Daniel como um ho mem:
depois do som, os silêncios difíceis da s ua a lma.
um primeiro de enclausura mento e solidão em que ele se sente a enl o u-
Convoca ndo o que a fenomenologia nos ensi no u sobre o espaço, no- quecer. Parece aí um a nima l acossado: " não se pa rece com um padre e
mead a mente Gaston Bachelard (1957), percebe mos que este espaço o nde o pouco como um ho mem são. Daniel está embrulhad o num cobertor, os
homem vive não é homogêneo, nem vazio, mas está ca rregad o de perceções, o lhos vermelhos e inchados ... os cabelos desarranjados, um ligeiro tre-
seja m elas remoras como as da infância ou as a tuais de uma vida ad ulta, mo r que é ma is nítido nos dedos e nos joelhos ... A boca semiaberra, o
ligad as aos devaneios o níricos o u aos co mba tes que se objetiva m no tempo, olhar...qu ase vio lento" (CAMARNEIRO, 2012, p. 117). E o utro movi-
tenham a transparência da lu z o u a ru gosidade da sombra. Vivendo como mento em que ele se deixa tocar pelo o utro. Aí ocorrem do is enco ntros
um homem esse encontro torna-se mais inexcusável - naq uela casa vive ma rcantes, o nde ele é tocado por um a mão ma tern al e o utra paternal.
apenas ele - e Da niel ex põe-se desa rmado como um fi lho de ho mem ao Primeiro a vizinha que o perce bendo doente lhe leva de comer e de-
radical confro nto consigo pró prio e com Deus. mora-se: " põe-lhe a mão na ca beça e afaga-lhe os cabelos ...escorrem
duas lágrimas que ela enx uga com os polegares. Diz-lhe que está tudo
3. O primeiro espaço do homem é o se u próprio corpo, ema ra nhado de
bem, que tudo se vai acertar com o tempo" (CAMARNEIRO, 2012,
linguagens so brepostas, lugar do s ublime e do trágico, d o sagrado e cio
p. 118-] 19). Depois a conversa com Marco Moço, selada com " um
profano, " tecido na rra tivo" (ALMEIDA Apud: REICHLER, 1983, p.
a perto de mão e o lhos que se entendem ", o nde Moço o desafia a tenta r
17) que ele é chamado a compreender e a o rga ni za r. Há um a ap ren-
ver para lá daquilo que a Da niel, no momento opaco da crise, parecem
dizagem do corpo feita em solidão e o utra qu e supõe a mediação dos
as únicas evidências: "Os ho mens só veem o qu e para eles está virado,
o utros (na am izade, no a mo r ) e na abe rtura ao mundo. Daniel vive
não é ass im, padre Da niel?... É a nossa maio r fraqueza, porque a cabe-
a te rrorizado a escura de si, no a mbiente claustro fóbico do pequeno
ça é redo nda, mas os olhos só vee m o qu e têm à frente. Que nos fosse
apa rta mento, representa ndo o seu corpo como um a a rena de forças
dada a cegueira como dád iva, para que o mundo nos chegasse como a
contra postas, num eq ui líbrio que ele julga impossível, sem med iado-
música que vem de todo o lado ..." (CAMA RNEIRO, 2012, p. 96).
res com quem estabelecer um di á logo. Da niel considera-se um e rro de
Deus. Diz ele nos seus mo nó logos: 5. O ponto de viragem e resolução dra mática na narrativa do prédio,
Passei a vida a falar da imensidão da fé, da imensidão de De us, infinito, aq uele " tempo certo pa ra que os ho mens trema m e mudem '', a nuncia-
infinito, mas quanto maior nos cresce De us, ma is peq uenos nos tornamos. do ao início pelo na rrador, sucede no dia 28 de dezembro, quando se
Vamos a pertando os conrrários, c ria ndo p ressões cada vez maiores, o que a ba te uma tempestade que deixa o prédio sem luz. A verdade, é que
quere mos e o que q ueremos querer, o que remos e o que não queremos rer. É paradoxa lmente a tempestade fo i o momento de graça : tateando no es-

f 34 35 I
1 CORPO -ALTERIDADE-HOSPITALIDADE 1 1 OS PADRES TÊM CORPO? 1

c uro é co mo se rea lmente os inq uilin os se o lhasse m pela primeira vez; O gesro co rta a pla teia de cima pa ra ba ixo e da esq uerd a pa ra a di -
preoc upa m-se agora un s pelos o utros, dispo nibili za m-se pa ra a juda r... reita se pa ra ndo os fi éis do qu e lhes pe rtence. Desenga nem-se do qu e
Estão tra nsform ados. Da nie l é um deles. A c rise na vida dos ho mens são, com esta mão de Deus vos co rro e vos ba ra lh o, aqui ma nda Ele"
é um te mp o de huma ni zação. N um tempo em que escasseia m o mes- (CA MARN EIRO, 2012, p. 88-89). Da ni el p recisa ta mbém " treme r
tres, e pa recemos entreg ues a um a a utoges tão distra ída (qua nd o não a e mud a r " .
um isola mento devora nte} , ex pe ri ências ass im são realmente g ra nd es
2. O estre mecimento chega em duas frentes. Primeiro há um lo uco - o
mestres qu e têm a lguma co isa a ensinar-nos. Permitem-nos um o lhar
lo uco da a lde ia que rod os rejeita m e ma ntê m à distâ ncia, e que Da ni el
a qu e a inda não ha víamos chegado; leva m-nos a escuta r não a penas
vê a li pela primeira vez - que interrompe a missa g rita ndo um a série
a vida a pa rente, mas a insa tisfa ção, a sede de ve rd ad e, e passa r a as-
de o bscenidad es contra aque les " beatos de fim-d e-sema na", q ue fa ri a m
sumir um a condição peregrin a nte. N ão nos escuta rm os, a té ao fim , é
melho r em deixa r " Deus pa ra quem precisa". O lo uco (que po r sina 1 se
des perdi çar um a preci osa ocasião pa ra acede r àque la profundida de
cha ma M enin o Bento, no me que é difícil não associa r imed iata mente
que pode d evolver se ntid o à existênci a. Ta lvez precisemos desco bri r
ao o utro M enino Bento que se cele bra naquela sema na de N ata l e m
que, no decurso do nosso caminho, os gra nd es cic los de inte rrogação,
que a ação decorre) é retirado da Igreja . Da ni el co meça por interpreta r
a intensificação da proc ura , os tempos de impasse, as ex pe ri ênc ias
o incidente como uma " profa nação" que o deixa muito pe rturbado .
de crise se insta la m pa ra que seja evitado o pio r. E o que é o pior?
O pio r é te r o lhado sem ver, ter o uvido sem esc uta r, te r ca ptado de 3. O segund o estremecimento é interno. E ele pró prio descreve-o ass im:
a lg uma ma neira, mas não ter efeti va mente entendido. O pi o r é nos "Os votos que fi z protege m-me do juízo, mas não do pensa mento, não
reco nh ece rmos na " opo rtunid ade pe rdida" que o Eva ngelho la menta : do horro r. Uma mulher co nta um segredo a um ho mem à espera de qu e
" Toca mos fl a uta para vós, e não da nçastes! Entoam os la mentações, e Deus a o uça e lhe perdoe, é uma coisa q ue se decide entre o pecador e
não cho ras tes !" (Lc 7,32 ). o in ventor do pecado. A mim ca be-me o uvir, ca la r e viver com o ho rror
dentro de mim, sem casti go nem perd ão. M as eu sou ho mem ta mbém,
7 1Viver como um padre
de pecados po r tod as as pa rtes que se fund em com os a lheios e, qu a nd o
A o utra pergunta que o roma nce de Camarneiro persegue é "o qu e so nh o, qu a nd o dispo os pa ra mentos, qua nd o vivo co mo os o utros vi-
pode se r pa ra um ho mem viver co m o um padre?". De facto, todo o roma n- ve m, acho-me inca paz de disting uir o ma l que fi z do ma l qu e esc utei o u
ce pode ser visto afinal não como um processo ap enas de desconstrução, imaginei o u compreendi . O li xo sa i de casa e repo usa no a terro o nde é
mas ta mbém de co nstrução da fi gura do padre, po is a conclusão do liv ro tra tado e tra nsform ado, ninguém se preoc upa co m os contento res o u
é a co nsolidação da identidade sace rd ota l: Da ni el não só percebe po rque é os ca rros da recolha o u os ho mens qu e o tra nspo rta m. M as é esse li xo
padre e colhe a razão pro fund a da sua vocação , mas sente-se confirma do, residua l, esse qu e se aga rra às pa redes e às mãos, a d iferença entre o
"sente-se ma is padre do qu e nun ca" (CAMA R N EIRO, 2012, p. 180). que produzimos e o que tra ta mos, é esse li xo que corrói os meta is e a
1. M esmo vivend o " desloca li zado" em relação ao espaço ha bitua l, Da nie l ca rne. Deus é bom, mas liga po uco a po rmeno res" (CAMAR NE IRO,
surge inicia lmente esta bilizado num a image m de ritu a lismo, impessoa l 2012, p. 6 1). Ele ideali za ra a imagem de um padre b lind ado, colocado
e qu ase mecâ nico. A esse nível, é muito impressiva a descrição do seu dentro de um a bo lha de pro teção. Descobre q ue o padre é c ha mado
mo do de presidir à e ucari sti a: "entra na sacristia o nde do is acó li tos e a viver o estremecimento não a penas a pa rtir de fo ra, mas so bretudo
o sacristão o esp era m, c umprimenta m-se e vestem os pa ra mentos em vindo de dentro. Ele terá de a prend er a vive r sem fugir do corpo e da
silênc io ... O s ino a nuncia a ho ra e ... seguem em fil a a té ao presbitéri o ... interrogação radica l qu e a vida qu o tidi a na mente avizinha, e a faze r
Erg ue a mão em lâ mina, em no me do Pa i, do Filho e do Es pírito Sa nto . di sso ca minho espiritua l.

l 36 37 I
1 CORPO-ALTERIDADE-HOSPITALIDADE 1 OS PADRES TÊM CORPO?

4. Um momento ma rcante e prepara tó ri o da transformação do desfecho As do res do corpo são parre peq uena da que t razemos, po rque ma iores e
é quando ele lê o capítu lo 38 do livro de Jó e fin almente o percebe. de maior dano são outras, ma is fundas e secretas, feiras à medida de cada
Nesse passo bíblico, Deus aceita o repto de Jó e acol he as suas pergun- um . A cada dia escolhemos dores que nos chamam pe lo no me, a dor de
estar perdido, a dor da solidão, a dor de não acreditar. Somos crianças sem
tas e protestos. Mas a resposta de Deus é na linha do a la rga mento do
a a legria das crianças, animais sem a inocência dos animais, pagão sem
olhar de J ó . A tradição mística fa la de três caminhos: a via purga tiva,
a descul pa da ignorâ ncia ... H o je é dia de a no novo, ma nhã de acordar e
essa espécie de caminho da purificação de qu e precisamos pa ra nos
acredi ta r com ma io res e renovada fo rças. De deitar fora o que pesa, de
a proxima rmos de Deus em rea l abertura; a via iluminati va, que pode agarra r os que nos estão próximos e ca nta r um cântico novo ... disposros
ser o enco ntro com uma palavra ou uma experi ência que nos dá uma à a legria po rq ue a mo rre não é mais, nem o luto, nem a do r, nem o gri to.
o utra visão (e vemos a vida a um a o utra luz); e a via unitiva , um a ex pe- (CAMA R NEIRO, 20 12, p. 188).
riência íntima de quietude e de comun hão como se fôssemos um qu a-
drado bra nco dentro de o utro quadrado branco. Cada um a destas vias
8 1À maneira de epílogo
nos ensina alguma coisa acerca do que significa a braçar a nossa vida
em regime crente. Contudo, o verdadeiro viajante místico é aq uele que, À maneira de epílogo para este percurso - um epílogo necessariamente
po r fim , perce be que não está dependente do caminho. Ele próprio se aberto-, queria a inda propor uma deslocação do campo literário, numa
tornou o cam inho. Isto é, adq uiriu um o lhar novo. Daniel o uve ass im passagem do romance para a etnografia, e assina lar correlações possí-
a sucessão de pe rg untas que Deus faz a Jó como o la boratório de um veis entre a mbas as percepções. A teoliterária pergunta-se continua mente,
o lhar novo: " Onde estavas quando eu fund ei a terra? Diz-me, se tens " Qua l é a relação entre a literatura e o co nh ecimento da realidade?", va-
entendimento" (Jó 38, 4 ). Compreender a vida é aceita r e integra r co m lo ri za nd o a resposta positi va que dessa interrogação ad vé m, não como um
sa bedo ria aquilo que ignora mos. Na fé, nesta fé que o co rpo s upo rta, substituto da teologia, mas como uma possibi lidade de interl ocução para
não é a posse que conta, mas a confiança. o traba lho teológico específico. Ora, também as ciências sociais admitem
cada vez ma is o papel de complementa ridade entre o tra balho literário e o
5. O resgate dá-se qu a ndo Daniel se decide a proc ura r o Menino Bento, sociológico. Escreve Lewis Coser, de fo rm a di rimente:
esse ser imundo que todos afastava m. A ideia qu e o remoinhava e ra
esta: "só sa lva ndo poderia salva r-se". Num ritua l huma níssimo, que As intuições (insighrs) li terária não podem su bstituir o conhecimento so-
não dei xa de ser sacramenta l, ele aproxima-se, fa la-l he com a mor do c io lógico e a nalít ico, mas podem ser-lhe de eno rme proveito. Do mesmo
modo que nenhum psicólogo pode aceitar que o conhecimento de N ietzsche
a mor d~ Deus, escuta-o a perguntar "Deus é como dormir a brigado do
ou Dostoiévsk i substituía o contributo de Sigmund Freud, nenhum soció-
- ter f n.o.'" , comove-se com ele, convida-o para s ua
ven t o .'E como nao
logo acredita que a espantosa d iscussão de Ba lzac so bre o impacto do di-
casa e promove um ja ntar - a que se junta Marco M oço, que no fin a l
nheiro nas relações interpessoa is nos pode d ispensa r da leitu ra de Marx
tem este comentá rio: "O padre Daniel que desculpe, mas se a última ceia sobre o fetiche da mercadoria o u Georg Simmel sobre a socio logia do
fosse desta categoria nem Jud as se punha com ideias" (CAMARNEIRO, dinheiro ... Mas precisamos de ler Marx e Ba lzac, Max Weber e Proust.
2012, p. 164 ). Será para a última ceia, no primeiro dia do a no, que A compreensão de uns será ilumina da pela compreensão dos o utros.
Daniel leva rá aquelas duas ovelhas perdidas, fazendo -os ocupa r o (COSER, 1963, 4 ).
primeiro banco da Igreja (pois os últimos serão os primeiros). A sua
Conta tei recentemente com o estudo de um sociólogo italiano, Giuseppe
ho milia reflete então um cristi a nismo comprometido, um eva ngelho
Bonazzi, que se intitula La fede dei preti. Um'indagine etnografica. Ele en-
que progressivamente se to rn o u consciente da sua dim ensão huma na e
profética. Diz o padre Da niel: trevista um conjunto de padres da diocese de Turim, auscultando-os não

l 38 39 I
1 CORPO-ALTERIDADE-HOSPITALIDADE 1 1 OS PADRES TÊM CORPO? 1

so bre as form as extern as da sua existência, mas sobre as suas convicções 3. A terceira conclusão prende-se com um a dinâmica de subj eti vação da
teológicas e eclesiais, tra çando co m essas conversas doze perc ursos crentes ex periência religiosa o bservável ta m bém no contexto do ministério o r-
que tendo certa mente muito em comum, revela m ta mbém impo rta ntes tra- denado . Ano ta o nosso sociólogo: "q ua ndo um crente dia loga com as
ços distinti vos, mostrando co m isso que " um a vocação, qu alquer que ela ve rda des da fé e as faz suas, não pode não as vivifica r com a lin fa da
seja, não surge resolvida de uma vez po r tod as" (BONAZZI, 2 016, p. 8). emoção pessoal. Entra ass im em jogo a sensibilidade que leva a desta-
O soció logo rerira da sua abo rdagem à figura do padre cinco conclusões ca r um aspeto em relação a o utro, e o imaginá ri o que acrescenta, enri-
principais, que penso podem di a logar de forma pertinente co m a pesquisa quece e co necta, a juda nd o as verdades de fé a to rna rem-se ma is pla u-
teoliterá ri a qu e efetu á mos: síveis e fa milia res" (BONAZZI, 201 6, p. 16) . Ta mbém na litera tura a
modernidade tem pro movido as margens de subjeti vação da fé como
1. A primeira conclusão é formul ada através da experiência pessoal de
co ntributo para a sua relevâ ncia e legibilidade. A fé não é ta nto valo-
Bo nazzi. Testemunha ele: " Nunca encontrei uma categori a socio pro-
rizada como verdade conceprua l, declinada num a ling uagem a bstra ta
fi ssio na l tão dispo nível pa ra o encontro ... Dei-me conta que a sua dis-
e com carácter uni versa lizante. Ela gan ha leirura na micro-histó ria, na
po nibilidade imediata, qu ase festiva, para fal a r com um desconhecido
dicção pa rti cul a r, no reco rte existencia l que é sempre uma de uma ex-
não é a penas um traço psico lógico; tem ta mbém um a valência socio ló-
peri ência o perada em primeira pessoa. E a í entra ta mbém o padre.
gica que obriga a refletir". (BON AZZI, 201 6 ).
É verdade qu e a co nte mpo ra neidade, nas múltiplas fo rmulações da se- 4. A qua rta conclusão prende-se ai nda com a dificuldade de a rruma r as
c ularização, confirma um a espécie de mo vimento de " invisibilização" persona lidades dos padres nas tradicio nais co rrentes teológicas e ideo-
da fig ura do padre. Decrescem não só em número as vocações sacer- lógicas. Essas espécies de gavetas qu e categori zava m di a letica mente a
do tais e religiosas, mas ta mbém no poder simbó lico e no espaço socia l realidade esbatera m-se significati va mente. Escreve G iuseppe Bo nazzi:
qu e ocupava m . Essa ra refa ção de presença do padre está a mpla men- " Podem existi r temas face aos qu a is uma pessoa se sente mais próxima
te patenteada na litera tu ra. O padre está ma is in visível na lite ra tura . do ca mpo o posto do que àq uele q ue tra dicio na lmente é o seu " (BO-
Surge menos vezes. Contudo, sempre que ele surge testemunha um a NAZZI, 201 6, p. 17) . As fro nteiras to rnara m-se ma is fluid as. E ass iste-
acess ibilida de - um mergulh o na huma nidade -que contrasta inclusive se a uma heterogeneidade ma io r dos com ponentes q ue caracteriza m
com a indife rença do contexto circund a nte. Os padres serão menos e cada personagem, conferindo- lhe um gra u ma io r de imp revisibilidade,
ma is a nó nimos, mas continua m a sustenta r na pa isagem d o mundo a mas ta mbém de huma nidade.
possibilidade de um in vulga r enco ntro. 5. A quinta e última conclusão tem a ver com as possibilidades de sobre-
2. A segunda conclusão refere a dificuldade de traça r hoje um perfil -ti- vivência do ministério presbitera l num mund o em acelerada reconfigu-
po do padre. Escreve G iuse ppe Bo nazzi: " qu ase todos os padres qu e ração, e o nde o modelo tridentino de o rga nização do cato licismo numa
encontrei me pa recera m pessoas pro fund a mente dive rsas po r tem- base territorial tem dificuldade em acompanha r a nova realidade do
pera mento, interesses, a rgumentos e pa ixões" (BO N AZZI, 20 16). É mundo . Bo nnazzi faz alusão a um texto de Arna ud Join-la mbert, Verso
ta mbém um indicado r que a litera tura hodierna confirma. Ma is do parrochie liquide? (2015 ), o nde se to ma a metáfora de Zygmunt Ba uma n
que uma re presentação ho mogênea po r g ru po, o padre passo u a ser pa ra defender que, no contexto atual, só haverá futu ro para uma presen-
rep resenta do d e um modo dis rupti vo po r pe rsona lidades fo rtemente ça do cristianis mo se existir uma ca pac idade criativa e com pro metida de
indi vidua lizadas, o nde a sing ul ari dade tem um acento do mina nte. O edificar modalidades inovadoras de comunhão e com unidades que seja m
padre é ho je perspeti vado ma is de um po nto de vista pessoa l do q ue polos agregado res de pluralidade. M as, como recorda o etnó logo, para
integra nd o um determin ado g rupo o u classe. esta tra nsição é necessário encontra r um novo modelo de padre.

l 40 41 1
1 CORPO-ALTERIDADE-HOSPITALIDADE 1 1 OS PADRES TÊM CORPO? 1

E é a partir desta premissa que deixo ficar a pergunta: será que a refle- REI CHLER, Charles. Le corps et ses fictions. Paris: Minuit, 1983.
xão aguda que o romance permite não nos pode ajudar?
REPOLE, Roberto. E se la teologia fosse necessária alia pastora/e? ln:
BONAZZI, Giuseppe. La fede dei preti. Un 'indagine etnográfica. To-
rino: Rosenberg & Sellier, 2016.

1Referências SALMANN , Elma. La teologia e un romanzo. Un approccio dialettico a


questioni cruciali. Milano: Paoline, 2000.
AIME, Oreste. li curato do D on Chisciotte. Teologia e romanzo. Assisi: SUHARD, E. Deus, Igreja, sacerdócio. Lisboa: Aster, 1956.
Citadella Ed irrice, 2012.
WOOD, James. Th e Nearest Thing to Life. Waltham, Ms: Brandeis
ALMEIDA, 1. Un corps devem1 récit. ln: REICHLER, Claude (dir.). Le University Press, 2015.
corps et ses fictions. Paris: Minuit, 1983.
BACHELARD, Gaston. La poétique de /'espace. Paris: Presses Universita i-
res de France, 1957.
BONAZZI, Giuseppe. La fede dei preti. Un'indagine etnográfica.Torino:
Rosenberg & Sellier, 2016.
CAMARNEIRO, Nuno. D ebaixo de algum céu. Lisboa: Leya, 2013.
COSER, Lewis. Sociology through Literature. An lntrodutory Reader.
Englewood Cliffs, N.J.: Prenrice Hall, 1963.
FOUCAULT, Michel. Dits et écrits. 1954-1988, IV. Paris: Gallimard, 1994.
GARRETI, Almeida. Viagens na minha terra. Porto: Porra Editora, 2010.
GUIMARÃES ROSA, João. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1988 .
.JOIN-LAMBERT, Arnaud. Verso parrochie " liquide"? Nuovi senrieri di un
cristianesimo "per tutti " . La Rivista dei Clero Italiano, v. 96, p. 209-
223, 2015.
KUNDERA, Milan. A arte do romance. Lisboa: Dom Qui xote, 1988.
NANCY, Jean-Luc. Corpus. Lisboa: Vega, 2000.
OLIVEIRA, Zacarias de. O padre no romance português. Lisboa: União
G ráfica, 1960.
RATO, Vanessa. Os nossos purgatórios deram o Prémio Leya a Nuno
Camarneiro. ln: Público, 18 dez. 2012.

l 42 43 I
A anatomia da escuta e a acústica
do corpo entre Cartas a um
Jovem Poeta (Rainer Maria Rilke}
e Para o Instrumento Difícil
do Silêncio (Daniel Faria}
José Pedro Angélico

Arte Poética
A palavra despe-se
O silêncio despe-se
Nus
Os sexos ardem
Os seios da palavra
Os músculos do silêncio
O silêncio
E a palavra
O poeta
E o poem a
(FA RI A, 2003, p. 386).

N unca ta lvez corno ho je a atenção prestada pelos teólogos à litera tura, e


à poesia em particul a r, fo i tão interessada. São já significa ti vos os momentos
em q ue, de fo rma pluridisciplina r, acadêmi cos se encontra m a urna mesa co-
mum para pensa r a tão fec unda q ua nto tensa a rticul ação teoliterá ria 1 •
Como ta m bém fora m send o importa ntíssimas, na passada centúria,
as a prox imações - das mais intuitivas às mais sistemá ticas - de C ha rl es
Moeller (1953-1964 , 5 Vo ls.), Ro m a no G ua rdini (2000)2, Ka rl Ra hner
(2002, v. IV, 411-422), Ka rl -J osef Kuschel (1999), Ado lphe Gesché (1995,

1. Lembro. a propósito, os trabalhos publicados a partir do Heythrop College (University


of London), no âmbito do projeto Power of lhe Word: cf. KNOX; LONSDALE, 2015; KNOX;
TOOK, 2015; BURROWS; WARD, 2017.
2. Além dos seus ensaios sobre Hõlderlin e Rainer Maria Rilke.

85 I
1 CORPO-SENSAÇÕES-SILÊNCIOS 1 1 A ANATOMIA DA ESCUTA E A ACÚSTICA DO CORPO 1

p. ] 0 9-142), Jea n-Pierre j ossua (Cf. 1985--1998, 4 Vo ls.; 20 11 ), David Jas- to pela poe ia a ntecederá imed iata mente o da mística, e e te o da música;
per (2016) o u To m Wrig ht (1989) . estes últimos, como extremos possíveis noéticos; e eles por si mesmos, como

A re fl exão que se segue o pera-se, a pa rentemente, numa espécie de jus- fo rmas di versas de teologia, em aprox imações unânimes da Fons Vitae. Em
si, no seu c la ro mistério, como o de rodo inapreensível, incogno cível. J ... J
ta posição forçad a. Ao con voca r do is poetas à mesa co mum d a pa lavra
a hermenê utica do sagrado, ru do levará a crer q ue, nestes dias, urgirá tam -
poéti ca, a pesa r d e di sta ntes no tempo e no espaço, faço-o po rqu e a mbos se
bém o uvir acerca da essência da Rea lida de últim a, com os teólogos e m ísti-
sa bem instrum entos de escuta 3•
cos, tam bém os poetas e músico . Todo nos comunica rão uma só ve rdade
a tingida, at ravés de caminhos d iversos (COSTA, 1999, p. 78-80) .
ina lcançável pelo seu pró pri o entendimento, e ag ua rd a r com pro fund a hu-
mildade e paciência a hora do pa rto de uma nova c la ridade: só a isso se c ha-
um o utro contexto5 , em que me era pedido re fletir so bre as Cartas
ma viver a rtistica mente: no entender como no cria r. (RILK E, 20 16, p. 29).
a um Jovem Poeta, d e Ra iner M a ri a Rilke, a rtic ulei imedi a ta mente esta
Ou na resposta que Da ni el Fa ri a d á a Fra ncisco M a ngas na entrevista intui ção de Da lila Pereira d a Costa com a pro fund a reflexão de M a ría
de 23 de junho d e 1998 ao Diário d e N otícias: Za mbra no, qu a ndo, em Filosofía y Poesía, a firm a:

Não me recordo q uem disse q ue o poem a se escuta . 1••• J Duma coi a estou Apesa r de em a lg uns mo rta is afortunados poesia e pensamento terem acon-
certo: a poesia é-m e dada . Eu contru o-a. O poema escapa-se-nos tota lmente. tecido ao mesmo tem po, para lela mente; apesar de no utros ai nda ma is afor-
E como nos é a lheio, aca ba po r se nos impô r. J ... J os poe mas dão-se-nos. tunados poesia e pensamento se terem unido numa única fo rma expressiva, a
Constru í-l os é um exercício de o bediência. (FARI A, 20 14, p. 9 ). verdade é q ue pensamento e poesia se enfrentam gravemente ao lo ngo da nos-
sa cultura . Cada uma delas quer eterna mente pa ra si a a lma onde ha bita. E a
sua du pla tensão pode ser a causa de a lg umas vocações malogradas e de muita
1 1 Variação rilkiana sobre o ofício do poeta a ng ústia interminável desfeita em esterilidade (ZA M BRANO, 20 13, p. L3).
Não é a primeira vez qu e, com o propósito de um a a rti culação teoló -
As Cartas a um Jovem Poeta fun cio na m - c reio - como um a espéc ie de
gico-literá ri a, recorro às pa lav ras ca rregadas de emoção de Da lila Pe reira
eco das inquietações profundas d e Fra nz Xave r Ka ppus. Pa rece-me rela ti-
da Costa 4 :
va mente claro que a muita angústia interminável desfeita em esterilidade,
Se fo r possível ver um processo ascensio na l no con hecimenro o nto lógico, de que fal ava M a ría Za mb ra no, é o q ue situa o Jovem Poeta entre o desejo
como in vestigação des a Rea lidade o u Ser, e que, a pa rtir d um certo ponto de o se r e a fru stração de o não ser a inda .
desse processo, ultra passe o poder huma no de ca pração, fo rmulação e t ra ns-
Essa a ngústi a é, em p ri meiro luga r, d enunc iad a pelas pró prias pa lavras
missão a t ravés das pa lavras c ri ad as po r esse huma no poder - o conhecimen-
de Ri lke, que supõem um a inquieta p rocura ex terio r d e reco nh ecimento:
"Pergunta se os se us ve rsos são bo ns. Pe rgunta -me a mim . Antes perg un -
3. Seguindo a intuição rahneriana, assim escreve Antonio Spadaro: "Como se dá o encontro to u a o utros. Envia -os pa ra peri ód icos. Compa ra -os com o utros poemas,
do homem com a vontade de Deus, sobre a sua pessoa em concreto? Para lá de qualquer e inqui eta-se qu a ndo ce rtas red ações rejeita m as s uas tentati vas" (R ILK E,
outra consideração, este encontro tem sempre necessidade de "abrirmos o ouvido a um
silêncio". O discurso teológico sobre a poesia pode ganhar sentido a partir desta atitude, 20 16, p .9).
que consiste em "estender o ouvido". É esta a convicção de um grande teólogo como Karl Mas há um a o ut ra a ng ústi a, o u tristeza, que pa rece emergir d o ma is
Rahner. O primeiro pressuposto para que o homem possa ouvir a voz do Evangelho consiste
em ter os ouvidos abertos. O cristianismo tem, pois, necessidade de palavras que exercitem pro fund o d a vida e da qu a l suposta mente con fessa o jovem Kappus q ue-
a capacidade da escuta. Para podermos ser cristãos importa exercitarmo-nos para que as rer liberta r-se. O " poeta do nosso sécul o" (GO M ES, 2002, p. 2 1 ) - co mo
palavras não deslizem sobre a superfície, não sufoquem na indiferença e se percam no meio
das banalidades" , cf. SPADARO, 2016, p. 52-52. Cf. LUSSI, 2011, p. 68-86.
4. Até mesmo no contexto de um ensaio sobre a poesia de Daniel Faria, cf. ANGÉLICO, 2014, 5. Nomeadamente nas VII Jornadas de Teologia Prática: A Literatura como Aventura Espiritual,
p. 155- 165. realizadas na Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa, em dia 4 nov. 2016 .

l 86 87 I
1 CORPO-SENSAÇÕES-SILÊNCIOS 1 1 A ANATOMIA DA ESCUTA E A ACÚSTICA DO CORPO 1

D. Antó nio Fe rreira Gomes entusiastica mente a Rilke se refere - faz uma São como fo ntes, e caem
es pécie de maiêurica, num registo que po r vezes se confunde com o de um ma is claros e em pa usas de ca nções
de novo no regaço das taças.
compa nheiro ou mestre espiritual:
E agora sei: sê como as cri a nças.
Assim , caro senho r Ka ppus, não lhe é legítimo assustar-se quando pera nte si Toda a a ngústia é só começo;
se e rgue uma t risteza tão gra nde como nunca nenhuma viu; q uando um de- Mas a terra não tem fim ,
sassossego, co mo luz o u sombra de nu vens, passa r por cima das suas mãos e E o medo é só o gesto,
por sobre rodo o seu faze r. Tem de pensa r que acontece a lgo em si, que a vida E sa udade o seu sentido (RILKE - Poem as, p. 4 1 ).
não o esqueceu, q ue ela o segura pela mão; não o deixa rá ca ir. Po r q ue moti-
ão será, po r isso, demasiado a rrojado di zer que Rilke é ta mbém o
vo q uer excluir da sua vida tudo o que é inq uietude, do r, desconsolo, q ua ndo
todavia não sa be o que estes estados executam dentro de si? (RI LKE, 2016, poera da Sehnsucht; o u ta lvez seja . Não me refi ro tanto, po rém, a essa
p. 103; 105). Sehnsucht que fo rçada mente tenta mos a funil a r pa ra a compreensão da
nossa sa udade. Mas ta mbém : red imida a sa udade ga laico-lusita na dos psi-
Não estou certo de que a qui se possa c ha ma r à refl exão o conceito cologismos e regio na lismos fil osóficos a qu e, dura nte lo ngo tem po, esteve
de angústia, tal como o desenvo lveu Kierkegaard (19 82 ), principalmente sujeita, e situada no seu justo luga r o nto lógico e estéti co, talvez haja a inda
qua nd o o fil óso fo din a ma rquês a firm a que se trata de " uma aventura que a possibilida de de pensá-la em diá logo co m a poesia de Ril ke e, em concre-
todos têm que correr, esta d e a prender a a ng usti a r-se; o que não a prende, to, com a elabo ração ética, estética e poética q ue nestas Cartas se insinua .
s ucumbe, po r não sentir a ngústi a nunca" (KI ERK EG AARD, p . 181), mas Enq uanto sentimento d o ser contingente (PINEIRO LÓ PEZ, 1953, p. 11-
creio que não a nd a dista nte da pró pria compreensão que Rilke ex pressa na 39) o u da sing ularidade o nto lógica (M AGA LHÃES, 1955, p. 282-2 89), a
Carta de 12 de agosto de 1904: saudade situa-se num nível a nterio r à a ng ústia o u à espe rança (TORRES
Po r que motivo quer perseguir-se a si mesmo com a q uestão de sa ber de QUEIRUGA, 2003, p. 57-67) - possibilidade radica l de a mbas - pelo qu e é
o nde pode t udo isso vir e para o nde q uererá ir? Q ua ndo a fi na l sabe q ue está tam bém a nteri o r à sua ex pressão poética.
em meio de transições e q ue nada deseja ria tanto como meramorfosea r-se. Não sei sé é por aí q ue vai a voz poética d as Lições de Trevas de
Se a lguma parte dos eus proce sos é doentia, pense contudo que a doença Ferna nd o G uima rães, e ta lvez não seja mes mo, mas agrad a-me pensar
é o meio pelo q ua l um o rga nismo se liberta daq uil o q ue lhe é estranho; a í é q ue sim :
p reciso apenas a judá -l o a esta r doente, a ter a sua doença integra lmente, e a
expeli-la, porque esse é o eu progresso. (RI LKE, 20 16, p. 105). O q ue cabe no interio r de uma ferida? O soro, o movimento
do a r, uma carícia esquecida. Nada ma is se recebe
Aqui , o po tencial da a na logia te ra pêuti ca a larga -se à compreensão de qua ndo o sofri mento muda de no me e agora se pa rece
um processo ma iuêti co a q ue perm a nentemente Ra iner Ma ria Ril ke convi- com uma voz q ue se ti nha afasrado. Saberemos apenas
da o j ovem Poeta, a solidão, como única via de aceso ao útero pa rturiente o q ue vem ao encontro da mãos q ue há m ui to sustentavam
de um di zer poético: "ca ro senh o r, a me a s ua solidão e supo rte com um o fios desiguais o nde podi a este penso estar ocu Iro
la mento melodi oso a do r q ue ela lhe p rovoca" (RI LKE, 2016, p . 4 7 e 49). pa ra q ue a noi te c hegue e nos traga o segredo
É com efeito em Alba Poética q ue o poeta não repud ia, e ta lvez a me a té, a de tudo o que se esquece, mesmo que seja a dor. (GU IMA RÃES, 2002, p. 42).

solidão, de que angústia é só começo, em qu e " tud o é ainda a ng ústia", "e a O que cabe no interior da sa udade? Po r que razão insiste ta nto Rilke
noite é nova demais/e a beleza é pudo r " (RILK E, 2001, p. 42): na ideia de que há qu e faze r esse movimento, q uase místico, de me rgulh a r
Sonhos q ue cachoa m no te u fundo, denrro, qua ndo dentro tudo é ainda angústia e qu a nd o toda ela é só come-
libe rta-os da escuridão. ço? O que cabe no interior da solidão?

l 88 89 I
1 CORPO-SENSAÇÕES-SILÊNCIOS 1 1 A ANATOMIA DA ESCUTA E A ACÚSTICA DO CORPO 1

Enqua nto sentimento de sing ul a ridade o nto lógica o u de radi ca l con- Enrrar denrro de si mesmo e não estar com ninguém du rante horas - é isso
tingênc ia , a solidão pode entender-se ass im como sa ud ade, co m a a nterio- q ue é preciso ser capaz ele a lcançar. Fica r solitário como se fi cava solitário
rid ade estética que principia - não em termos c rono lógicos, mas fund acio- c m criança, enqua nto os ad ultos anelavam para cá e para lá, enredados em
coisas q ue pareciam imporra nre e g ra ndes, porq ue as pessoas g randes pare-
na is - todo o di zer poético.
c ia m tão ocupadas e porque nada se com p reend ia dos seus afazeres (RI LKE,
" Minha solidão sagrad a", "sagrada solidão minha" (RI LKE, 2003,
2016, p. 6 1j 63).
p. 29) ...
Po r qu e ins iste ta nto Rilke so bre esse ideia qu ase agos tini a na do Essa solidão, que se perce be enraizada no ma is fund o da vida, qu e é a
Noli foras ire, in te ipse redi (AGOSTI N HO, D e vera religione [39,721, infâ ncia, s urge assim, poetica mente disposta, em Advento (1898):
2006, r. 34 )? É que pa ra o poeta d as Elegias de D uíno não há o utra fo r- Se, cria nça, foste a legre entre cria nças
ma de acede r à poesia. H á um a es pécie de enqu a dra mento é ti co a nteri o r então não poderás compreender
à dispos ição estéti ca qu e c ri a as co nd ições de possibilid ade de rod o o como foi q ue eu cheguei a od iar o dia
di zer poético: como eterno perigo hosti l.
Eu era riio estranho e aba ndonado
Pergun ta se os se us versos são bons. Pergunta-me a mim. Antes perguntou a
q ue só no fundo elas pá lidas e fl o ridas
o urros. Envia-os pa ra periód icos. o mpa ra-os com o urros poemas, e inquie-
noites de ma io era secreta mente fe liz.
ta-se qua ndo cerras redações re jei ra m as suas rentari vas. Ora (uma vez que
De dia rrazia o a nel apenado
me permiriu da r-lhe conselh o), peço-lhe que desista de rudo isso. O senh or
do dever cova rde de ma neira pia.
o lha pa ra fora, e é sobretud o isso que agora não deveria faze r. inguém
Mas à no ite furtava- me a este círculo,
o pode aconselha r e a juda r, ninguém . Só há um meio. Entre em si mesmo.
a minha ja nelinh a abria-se - cling! -
In vestigue o funda mento q ue o cha ma a escreve r; ponha à prova se ele la nça
sem eles sabe rem. Borboleta ,
raízes a té ao luga r ma is pro fun do d o seu coração, adm ita se reria de mo rrer
a minha sa udade partia em viagem,
caso lhe fosse vedado escrever. Sobretudo isto: na mais silenciosa hora da
para ir, baixin ho, pergunta r
sua no ire, pergunte a si mesmo: tenho de escrever ? Escave dent ro de si à
longe às esrrelas o nde era a sua pátria. (RI LKE, 2003, p. 29-30).
procura de uma respo ra profunda . E se esta houver de soar afirmariva, se
lhe fo r perm ir ido encara r essa pergunta séria com um fo rre e sim p les "Te- E se a sua solidão é sagrada, é porq ue é a s ua pátri a:
nho '', então consrrua a sua vida segund o essa necessidade; a sua vida, a té ao
â mago da ho ra ma is ind iferente e li mitada, terá de se tornar um sinal e um A minh a pátria é entre o Dia e o Sonho .
testemunho para esse ímpeto. (R ILKE, 2016, p. 9; 11 ). Ali, o nde as cri anças dormita m, quentes ele brincar,
a li , o nde os velhos à no ite se senta m
Po r isso, pa ra Rilke, a solidão é sagrada. É dessa necessá ri a "virage m e lare iras a rdem e lh es ilumin a m o qua rto.
pa ra d entro", ma is da ordem da vontade do qu e dos a fetos, desse " penetra r A minh a pátria é entre o Dia e o Sonho .
em si pró pri o e pô r à prova as pro fund ezas o nde brota a j ... j vida; !em cuj a] Ali, o nde os sinos ela ta rd inha mo rrem claros
1 . .. J nascente [ ... ] encontra rá a res posta à q ues tão de sa ber se tem de cri a r" e do nzelas, possuídas cio som q ue morre,
(RILKE, 2016, p. 13), que poderá nasce r o poeta. Se por um lado ins iste, na se apoia m cansadas à beira do poço
E uma tília é a minha á rvore escolhida;
Carta que de Ro ma envia a 23 de dezembro de 1903, na "so lidão, lna l g ra n-
e rodos os verões, que nela calam,
de solidão interior" (RILK E, 2016, p. 6-1), é p recisamente po rq ue fo i essa
agiram-se de novo nos mil ra mos
a terra fé rtil de um di zer que se dá num trâ nsito perma nente entre o Dia e e desperta m de novo entre o Dia e o Son ho. (RI LKE, 2003,
o Sonho: p. 38-39) .

l 90 91 1
1 CORPO -SENSAÇÕES-SILÊNCIOS 1 1 A ANATOMIA DA ESCUTA E A ACÚSTICA DO CORPO 1

Creio que, se Rilk e in iste tanto na solidão quanto na infância, "essa O u então, como José Augusto Mourão - tão ao seu modo - liga a
preciosa riqu eza régia, essa câ ma ra de teso u ro das recordações" {RILK E, palav ra ao gesto, a linguagem à ex periência sensível o u a comu nicação às
2016, p. 6 1 ), com o escreve de Pa ris a 17 d e fevereiro de 1903 - a primeira frontei ras do corpo:
da Cartas a um Jovem Poeta, é porque a mbas se a rti culam em to rn o d a
Fa lar é tocar a fronteira do ourro que passa, ante de mais, pelo corpo. Com-
interi o ridade. Na perspectiva de um a a rti c ul ação teologa l, cre io qu e o si- preendo um corpo (seja dum o utro o u dum objeto) na medida em que eu
lênc io, subentendid o nessa " profundeza das coisas" (RILK E, 20 16, p. 21) sou e renho um corpo. O meu corpo é a condição de possibi lidade da minh a
o u na grande solidão interior, é a na loga mente a única via d e acesso à " ra iz experiência sensível. Ma o movimento do corpo é empre provocado pela
da nossa li berd ade/poeta d a nova criação" (MOURÃO, 2009, p. J 89), emoção. A rea lidade da linguagem está em relação direta com o mundo via
co m o com simplicidade j osé Aug usto Mourão inicia veni Sancte Spiritus! 0 co rpo próprio, a percepção, a emoção. O discurso é uma prega som:i rica
do dizer, como tão bem o enrendem os mísricos. O corpo é Co rpus Ego. !... \
"Se tudo ao menos uma vez se ca lasse ..." . Ass im, começa uma das com-
Que Deus é esse nas fronteiras da estética? (MOU RÃO, 201 7, p. 675).
posições poéticas d'O Livro da Vida Monástica (1899). Não sei se era a
este s ilêncio qu e se referia Ka rl Ra hner, quando escrevia A Palavra Poética
e o Cristão. 2 1O ofício de poeta e a obra de Daniel Faria
Se toda a angústia é só começo e a solidão sagrada é a ca ixa d e resso- Da nie l Faria nasceu em Balrar, num a pequena a ldeia a 20 quilômetros
nâ ncia de um si/ente mistério, que dá à luz roda a pa lavra poética, não será da cidade do Porto, em 1971. Frequen to u os sem iná rios d iocesa no da
ta mbém essa mesma inte ri o ridade, para a qua l Rilk e perm a nentemente Igre ja portuca lense e concluiu , em 1996, a sua Licencia tu ra em Teologia,
con vida o .Jovem Poeta, luga r poético de rea li zação teologa l? na Uni vers idade Cató lica Portug uesa, aprese nta ndo uma dissertação sobre
a Vida e Obra de frei Agostinho da Cruz (FARI A, 1999), o conhecido m ís-
ão espere até que Deus venha a ti
tico do Convento da Arráb ida que ca ntou a sa ud ade, " unindo, franci sca-
e d iga: Sou.
Um deus que confessa a ua força namente, num abraço amo roso, a multiplic idade das criaturas, na lem b ran-
não tem sentido. ça da unidade primeira e na esperança da reunião final no seio de Deu "
H ás de aber que o sopro de Deus re invade (TEIXEIR A, 2006, p. 13 ). H á, nesta fi liação poética em q ue Daniel também
desde o pr incípio, e reco nhece, um a intuição da divina saudade como lugar fronteiriço de
e quando o coração rearde e nada rrai, mistéri o e revelação, s ilêncio e palavra, a usê ncia e presença, esc ura e co rpo-
é ele então que em ri cria (RILKE, 2003, p. 55). reidade, a m o r e dor, como penelopia na menre se desfia em Ítaca:
Não o bsta nte a rra nscendenra lidade que sa bemos constituti va da na- O q ue dói
tureza huma na, não é a co nvocação es piritua l prima ria menre co rpó rea? É não poder apagar a rua ausência
Re lembro, a propósito, a im portância que dá Inácio de Loyola ao sentid os E repetir dia após dia os mesmos gestos
para a contempl ação 6 . O que dói
É o reu nome que fi cou como mendigo
Descoberro em cada esq uina dos meu versos
6. "I ... ] entrar en la contemplación quándo de rodillas, quándo prostrado en tierra, quándo
supino rostro arriba, quándo asentado, quándo en pie, andando siempre a buscar lo que O que dói
quiero. En dos cosas advertiremos: la primera es que si hallo lo que quiero de rodillas, no pa- É rudo e mais aquilo que de reço
saré adelante, y si prostrado, asimismo, etc: la segunda, en el puncto en el qual hallare lo que Ao recer para ri novos regres os (FA RIA , 2003, p. 369).
quiero, ahí me reposaré. sin tener ansia de pasar adelante hasta que me satisfaga". IG NAC IO
DE LOYOLA, Ejercicios Espirituales, 76.

l 92 93 I
1 CORPO-SENSAÇÕES-SILÊNCIOS 1 1 A ANATOMIA DA ESCUTA E A ACÚSTICA DO CORPO 1

A Arte Poética é, em Da ni el Faria, um difícil exercício d e escura e espe- con rrói, aprox ima-se e afasta- se, numa lúcida transparência ele quem abe
ra corpóreas, em que a palavra é cô ncava, e o silêncio muscul ado. Por isso, que está a escrever poesia e que tem consciência sóbria do se u va lo r. O su-
jeito ela escrita é um contempl ativo que e move nos lugare onde se movem
o cansaço da esc ura se abate so bre o corpo qu e cava a pa lavra no silêncio.
o outro , que faz as suas opções de modo li vre e decisivo, que ergue o seu
Eis a Explicação do Poeta:
canto até ao infini to, mesclado com o canto das aves e dos Anjos, solidá rio,
Pousa devaga r a enxa da sobre o o mbro no seu grito, com o grito de rodo o ser humano . É a sua atitude contempla-
Já cavou muito silêncio tiva que dá à sua Obra a marca mnis fo rte, uma vez que ela se in screve num
Como punhal brilha em suas costas uni verso reocêntrico, sem deixar, por esse moti vo, de prestar uma a rguta
atenção ao mundo que o rode ia 1... 1. (FURTADO, 2007, p.122-123).
A lâ mina contra o ca nsaço. (FARIA, 2003, p. 1O1).

A ju ventude do poeta - um (rimbaudiano) rapaz raro, como lhe cha- Não estranha, ta mbém por isso, qu e o se u percurso vira i se ren ha dei-
mou Alexa ndra Lucas Coelho (200 1, p. 4 -10) - não é bastante para iludir xado interpela r pelo silênc io da vida mo nástica. Abandonando o Seminário
o cansaço d a lavo ura poética, em que a escura da pa lav ra e cava num Maior do Po rto, ao fin a l do percurso teológico, e rendo termin ado a s ua
silê nc io muscul a do . Da í qu e não seja possível , como creio com qualquer Licenc iatura em Litera tura Portuguesa na Faculdade de Letras da Universi-
poeta ma io r, a d estrinça a nalítica (e fácil) do poeta e do seu dizer poético. dade do Po rto, em ·1998, ingressa como noviço no Mosteiro Beneditino de
Singcve rga, onde perm anecerá a té à dara da sua inesperad a morre, em 1999.
Reco nhece mos, com rel a ti va o usadi a, que de faro a reopoérica de Da-
niel é, na verdade, uma bioteopoérica. Sem levianos o u apressados ba tismos Durante a d écada de 90 publica roda a sua o bra poética-. Mas são as
de tona lidade reolirerá ria concordisra, a reopoérica de Danie l é evidência sua três obras maiores que revelam o ca rácter abso lu tamente ímpa r da
de que vida e obra se não podem se para r. Mapeando parte da inrerrexrua- sua reopoérica, publica das entre 1998 e 2000 pela Fundação Manuel Leão
lidade que tece a intrincada teia d a poesia d e Da nie l, assim o a firma arina- (Vila Nova de Gaia) (FA RI A, 1998; FAR IA, J 998 b; FARIA, 2000 [posru-
damente Maria Teresa Furtado: mamentcl), e traduzidas em edição bilíng ue nas Ediciones Sígueme (Sa la-
manca) entre 2014 e 2016 (FA RIA, 2014; FARIA, 2015; FARIA, 2016).
O poeta qu e aqu i focamos é um poeta ma ior, único e extremamente o ri gi- No â mbito d e uma mesa pa rtilh ada que se propõe à articu lação reo-
nal. O seu olhar sobre o mais imediato e sobre o que o transcende é fresco
lirerária entre corpo, sensações e silêncios, repousarei o m eu o lhar sob re
e cheio de vigor, utiliza ndo uma linguagem apa rentemente simples numa
o último conjunto de composições poéticas (Para o instrumento difícil do
o rga nização do discurso poético muito bem elaborada, não deixando ne-
silêncio) que integra uma d as suas obras ma io res: Homens que são como
nhum verso o u imagem ao acaso. A sua poesia roca o fundo do ser humano,
os seus di lema s e a sua liberdade, a sua busca de identidade e o seu modo de lugares mal situados (FARIA, 2008 b ).
identificação, a sua parti lha e a sua necessidade de soli dão, a sua ho ri zontali- Entre a anatomia da escuta e acústica do corpo. A introdução do pa-
dade e a sua vertica lidade. Daniel Faria é também um leito r atento e versá til radoxo como chave hermenêutica d a poesia de Daniel Faria é intenc iona l.
'
construtor de uma intertextu a lidade oportuna e fecunda, projetando o texto Sem qualquer pretensão de im posição herm enê utica, parece- me, porém,
" he rdado" numa multiplicidad e de direções e sentidos. Assim acontece co m qu e bastaria ao leitor a tento de bruça r-se so bre a o bra de Daniel para rapi -
a Bíblia - vários textos do Antigo e do Novo Testamento-, com a urores de
literatura esp iritual corno S. João da C ruz, Sa nta Teresa do Menino Jesus e
a utores da literatura portuguesa como Rica rdo Reis e Luiza Nero Jorge. Os
7. Entre 1991 e 1993: FARIA, 1991, p. 57-77; LAGE, 1993; AUGUSTO, 1993. Em 2003, a
poemas de Daniel Faria são, sobretudo, um espaço de diálogo com o mundo, professora Vera Vouga (Faculdade de Letras da Universidade do Porto) organiza a sua poe-
com o utros e com o Outro que é Deus. Não esta mos, porém, perante um a sia incluindo estes três primeiros livros de poesia, juntamente com alguns inéditos e com as
poesia "religiosa " o u "espiri tual", mas sim face a uma poesia cuja unidade três consideradas obras maiores: cf. FARIA, 2003, p. 339-360, 361-386, 387-424. 19-23,
427-432, e 26-334, respectivamente. Em 201 2, será publicada Poesia em Assírio & Alvim, e
é a unidade do próprio autor enquanto pessoa que pensa e sente, acredita e
reeditada em 201 5.

l 94 95 I
1 CORPO-SENSAÇÕES-SILÊNCIOS 1 1 A ANATOMIA DA ESCUTA E A ACÚSTICA DO CORPO 1

damente perce ber que a escuta é corporeamente o centro de gravidade de Ponho -os no coração
roda sua reopoérica. Contud o, não há redução possível dessa escuta corpó- Trago os instrumentos da re piração
rea à linguagem ana lírica e fri a da anaromia . A escuta de que aq ui se fala - Uma monta nha, uma á rvore q ue lhe dá abrigo -
é escuta de faro. E o corpo é o corpo real, como se poderá consrarar pela E suspend o-os nos ra mos como pinhas que dão so mbra
refe rência quase obsessiva que o poera faz às suas parres. Mas é ra mbém Um luga r fresco para os deportados de Sião nas ma rgens [... [.
essa capacidade d e escuta rranscendental que o Geist in Welt não pode (FARIA, 2015, p. '11 2 ).
fazer senão corpórea e existenci a lmente. O s motivos corpóreos e as suas fun ções são recorrentes neste conjunto
Rel embro, a esre respeito, a arinada observação d e Ka rl Rahner: de poemas: a boca (FAR IA, 2015, p. 112; 120; 130), o coração (p. 112; 130),
a respiração (p. 112; 122), a ca beça (p. 112; 118 ), os o lhos (p. 112; 122;
[... [ o cristão, para sa ber o uvir a palavra cristã da mensagem de Deus, tem
que esta r capacitado, exercita do e agraciado para o uvir uma pa lavra. Que
128), o sangue (p. 112; 124; 132), as mãos (p. 112; 120; 122; 124), a esc ura
palavra? Tem que sa ber o uvir a pa lavra mediante a qual o mistério silente (p. 114; 126; 132), os pés (p. 120; 124), o peito (p. 120), o ombro (p. 120),
se " presencia" . Tem que saber perceber a pa lavra que roca certeira mente o os rins (p. 122), os calcanhares (p. 124), os to rn ozelos (p. 124), os joelhos
coração na sua entra nha mais funda . Tem que estar iniciado na graça huma- (p. 128), os braços (p. 128), o la d o (p. 128), o corpo (p. 122; 132) e a carne
na de o uvir a palavra que une recolhendo, e a palavra que é, no meio da sua (p. 132). Não fosse a freq uênc ia com que o poeta visira lugares teo lógi-
própria e clara finitude, a corpo reidade do misté rio infinito. Esse saber-ouvir cos vetem e neotestamentários, ora implícita ora expl icitamente, basta ria
é o ter-ouvido da palavra poética, à qua l o homem se entregou com humilde o bserva r a intensida de do recurso a um a ling uagem corpórea para, nesta
prontidão a té que se abriram a ela os o uvidos do espírito e lhe entrou no
reo poética, se perceber uma semítica - diri a mes mo, hebraica - forma d e
coração. (RAHNER, 2002, v. 4, p. 417).
o lhar e sentir a realidade (FERNÁNDEZ CASTELAO, 2010, p. 395-408 ).
A corporeidade do mistério corresponde à capacidade teo logal de uma Nesta teopoética, o sujeito é o suj eito poético. A reduçã o do ca mpo
materia lidade cujas potencialida des acústicas legiti mam, aqui, a enunc ia- semâ ntico religioso - quase a usente no que respeita à nomeação d o divino
ção paradoxa l de uma a natomi a da esc ura. Ou não é o Horer des Wortes (FINO, 2008, p. 403 ) - não co rrespo nde so mente a uma estética minima-
um Geist in Welt? lisra, que rende apofaricamente para o silêncio ante o mistério, mas diz
també m respeito a uma intuição do m esmo a partir de uma autonomia
3 1Uma breve leitura de Para o instrumento difícil do silêncio filia l (CUN HA, 1989, p. 169-190).
Falo de para d oxo, po rta nto, e d a sua enunciação poéti ca, porque me Dizer Deus é di zer-se na aceitação agracia d a da sua a usência, o que
parece que a poes ia de D a ni el Faria - e em particular este bloco d e co mpo- implica rá escavar, no silêncio muscul ado, a palavra de um silenre mistéri o:
sições poéticas - sobre ele se tece frequ entemente. Mas tu ex istes.
"O silênc io é o luga r/ o nde baterão as mãos" (FARIA, 2003, p. 55). Os dia o mam ruín a à ruína
É por essa razão qu e o sujeito poético traz "todos os instrumentos na cir- E o a vir multiplicará
culação d o sangue e na ocupação permanente/ das mãos" (FARIA, 20·15, A miséria.
Apodreço não aduba ndo a terra
p. 1 L2). São "os instrum entos d a res piração" e d o fogo, nessa imagem ora
E cada dia somado a cada hora
de utero nô mica (Dr 6, 4-6) o ra isaíatica (ls 6, 1-13), que purificam a pa lav ra
Não completa o tem po.
a proferir e o ouvido do coração a escuta r: Sei que existes e multipli ca rás
A rua fa lta.
Trago os instrumentos do fogo
Somarei a tua a usênc ia à minha escura
Po nho-os na boca
E tu redobrarás a minh a vida (FA RI A, 20 15, p. 11 4).

l 96
97 I
1 CORPO -SENSAÇÕES-SILÊNCIOS 1 1 A ANATOMIA DA ESCUTA E A ACÚSTICA DO CORPO 1

Esta escuta é a do coração, único lugar onde a pa la vra humana po d e ins- E nela posso existir.
crever o misté rio. Não é por acaso que o a utor d o Livro do Deuteronô mio Só posso viver ca bendo nela .
o defin e com o o luga r ma is visceral d a pa lav ra: Habito-a
Como J o nas o g ra nde pe ixe. (FARIA , 2015, p. 126).
Escuta, Israel!
O Senho r é o nosso Deus; o Senhor é Cm ico ! E ta l esc ura só é possível quando afi nada à palavra feita ca rn e:
Ama rás o Senho r, teu Deus, co m todo o teu co ração, com tod a a rua a lm a e
C ruz, rosa
com todas as tuas fo rças.
Dos venros sem direção que não seja o centro . Coluna
Estes m a nda mentos que ho je te instruo estarão no teu coração (Dt 6, 4 -6) .
Sustentada pelos braços como um a migo que chega. Rosa
Ta mbém a R egra dos Monges o considera como o luga r da esc uta: "Es- De o rva lho e sa ngue pa ra o corpo trespassado de sede. Á rvore

cuta, filh o , os preceitos de um mestre e inclina o o uvi do d o te u coração ..." Que bebe do ho mem. Árvore
Em silênc io o nde escuta mos a palavra
(BENITO DE N URSIA, 2006, p. 12-13).
Em ca rne viva . Ve rbo
É verda d e que a percepção é o m eio pelo qu a l um o lha r se torna a mbí-
T ão inreiro que se fez espelho. (FARI A, 20 15, p. 133).
g uo. Percepção não é visão perfeita nem a udição a bsoluta . É tão so mente
a forma como a incidênc ia da lu z mo lda a forma como as coisas aparecem
ou como as o ndas sonoras es barram com o ouvido intern o. O que se vê e o
qu e se o uve só se to rn a a bsoluto - e nunca em sentido a bsoluto - qu a ndo
a rela ti vida d e d as percepções se senta a uma m esa circular e co ncêntrica . 1 Referências
O luga r da pa la vra é um coração co ncêntri co. Co ncentricidad e não
significa c iclicida de a utorreferente. Pelo contrário, a qua lidade do que é AGOSTINHO DE HIPONA . De vera religione. ln : Patrologiel:! cursus com-
concêntri co é precisamente a partilha de um ce ntro co mum . Como uma pletus, Series Latina [PL]. Turn ho ut, Brepols, 1982-1993; 2006. t. 34.
mesa. Ou como um a palavra : E estas palavras que hoje te instruo estarão ANGÉLICO, j osé Pedro. Escuta, silêncio, palavra. Uma aprox imação à
no teu coração [Dt 6, 6]. poesia de Daniel Faria. In: C UNHA, Jorge; NATÁRIO, Maria Celes-
O coração é o lugar da me mó ri a, a tá bua o nde se há de grava r a pa la- te; EPIFÂNIO, Rena to (coords.) . Palavra, escuta e silêncio. Filosofia ,
vra, o verdadeiro centro da tenda lcf. Ex 36, 8-39, 43], do templ o [cf. 2 Sm Teologia e Literatura. Porto: Unive rsida de Cató lica Editora, 2014.
6-8] e do encontro lcf. Lc 24, 13-35]8. Mas, di zia, a percepção é meio pelo _ _ . Para um a teopoética d o coração e d a mulher à m esa da pa lavra.
qual o o lha r e a escuta se tornam ambíguos. Po r essa razão, o poeta não Fátima XXI. R evista Cultural d o Santuário de Fátima. n. 7, 60-67,
pode dizer este coração-ouvinte sem a a rti cul ação co m a d ensidade de to da 2017.
a sua massa corpórea. A a nato mia da esc uta é, nesta teop oética, a ac ústica
AUGUSTO, Daniel. A asa dos ceifeiros. Po rto : Associação de Estuda ntes da
de um corpo qu e reverbe ra no silêncio a pal av ra d o silêncio, ha bita nd o-a
Facu ld a de de Teologia - UCP, 1993.
por de ntro:
BENITO D E NURSIA . Regia d e los nionjes. Sa lama nca : Ed icio nes
Há uma pa lav ra pessoa
Sígueme, 2006.
Uma pa lavra pregada ao silênc io de dizer-se como nunca fora o uvida
BURROWS, M a rk S.; WARD, Jea n; GRZEGORZWSKA, Malzgor-
zata (eds.). Th e fJ ower o f the word: p oetic revelations. Londo n:
8. De "Não é por acaso" até "encontro [cf. Lc 24, 13-35]", cf.: ANGÉLICO, 2017, p. 60-67 . Ro utledge, 2017.

l 98 99 I
1 CORPO-SENSAÇÕES-SILÊNCIOS 1 J A ANATOMIA DA ESCUTA E A ACÚSTICA DO CORPO 1

COELHO, Alexandra Lucas. Dan iel Faria: o rapaz raro. Mil Folhas - Su- g evista da Faculdade de Letras - Línguas e Literaturas . II" Série,
plemento Literário do j ornal Público. p. 4-1O, 14 j ui. 200 1. n. 23, p. 403, 2000.
COSTA, Da lila P. Os instan tes nas estações da vida . Porto: Lello Edi to res, FURT DO, Maria Teresa . Da niel Faria: Se fores pelo centro de ti mesmo.
1999. Didaskalia, n. 37, v. 2, p. 122-123, 2007.
CUN HA, j orge Teixeira da. O Evento do Filho, Advento do Homem.. A GESCH É, Adolphe. La théologie dans le temps de l'hom me. Littérature et
relação do homem a Cristo. Pascal, Fonte da ética, na Obra de F.-X. révélation. ln : Cultures et théologies en EurofJe. j alons pour un dia-
Durrwell. Porto: Uni versidade Ca tólica Editora , 1989. logue. Ed. por J. Vermeylen. Paris : Éditions du Cerf, 1995.
FA RfA, Daniel. Poesia . Vila Nova de Famalicão: Edições Q ua i, 2003. GOMES, António Ferreira. Pórtico. ln: ANDRESEN, Soph ia de Mell o
_ _ . Poesia. 2012 (2". ed. 20 '15). Breyner. Contos ex emplares. 34·' ed . Porto: Figueirinhas, 2002.
_ _ . ExfJ/icação das árvores e de ou tros animais. Vila Nova de Gaia: GUA RDIN I, Romano. Linguaggio, poesia, interfJretazione. Brescia: Ed itri-
Fundação Manuel Leão, 1998. ce Morcelliana, 2000.
_ _. Homens que são como lugares mal situados. Vila Nova de Gaia:
GUIMA RÃES, Fernando. Lições de trevas. Vila Nova de Fama licão: Edi-
Fundação Manuel Leão, 1998b.
ções Q uasi, 2002.
_ _ . A vida e conversão de Frei Agostinho: entre a aprendizagem e o
ensino da Cruz . Lisboa: Faculdade de Teologia da Uni ve rsidade Ca- IG AC IO DE LOYOLA. Eiercicios Esp irit11ales. Bilbao: Sa l Terrae, 1987.
tólica Portuguesa, 1999. JASPER, Dav id. Literature and Theology as a grammar o( ascent. Farn ham:
_ _ . Uma Cidade com M ura lha. Bibliotheca Portucalensis. [!" Série, v. 6 Ashgate, 2016.
p. 57-77, 199 1.
JOSSUA, Jean-Pierre. Pour une histoire religieuse de l'expérience littéraire:
_ _ . Dos líquidos. Vila Nova de Ga ia: Fundação Ma nuel Leão, 2000 Dieu aux X/ X" et XX" siecles. Paris: Édi tions Bea uchesne, 1985-
1postumamente!.
1998, 4 Vol .
___ . ExfJ/icación de los árboles de otros animales. Ed iciónbilingüc. Tra- _ _ . La fJa ssion de l'infini. Littérature et théologie: nouvelles recherches.
d ucción y estudio de Luis Antonio Marina. Sa lama nca: Ediciones Sí-
Paris: Le Éd itions d u Cerf, 20 ·1 1.
gueme, 2014.
_ _ . Hombres que son como lugares mal situados. Edición bilingüe. Tra- l< IERKEGAA RD, Soren. EI concefJto de la angustia. 2" ed. Mad rid:
ducción de Luis Antoni o Ma rina . Salamanca: Edicioncs Sígueme, Espasa-Ca lpe, 1982.
20'1 5. KNOX, Francesca Bugliani; LONSDA LE, Da vid (ed .). Th e fJower of the
_ _ .De los líquidos. Edición bilingüe. Trad ucción de Lui An tonio Ma ri- word: fJ Oetry and religious imagination . London: Rourledge, 20 15 .
na y revisión de Miriam Reye . Sa lama nca: Ediciones Sígueme, 20 16. l<NOX, Franccsca Bugliani; TOOK, .J ohn (eds.). Th e fJower of the wo rd:
FERNÁ DEZ CASTELAO, Pedro. EI ser humano como " unidad mu lridi- poetry and !Jrayer. London : Rourledge, 2015.
men ional" . Más aliá de la o posición "cuerpo y a lma". Sal Terrae. v. KUSCHEL, Ka rl-Josef. The Poetas mirrar: h uman nature, G od and j esus
98, n. 5 p. 395-408, 20 10. in the twentieth-century literat11re. London: SCM Press, 1999.
FINO, Fra ncisco Sara iva. Para o instrumento difícil do silêncio. Fulgu- LACE, Cérj io. Oxálida. Porro: Associação de Estudan tes da Faculdade de
rações da pa lavra poética na obra de Dan iel Fa ria: um percurso.
Teologia - UCP, 1993.

1100 101 1
1 CORPO-SENSAÇÕES-SILENCIOS 1

LUSSI, Ca rmem_ A linguagem do fazer teológico. Elementos do legado de


Ra hner sobre literatura e poesia. Teoliterária . n. 1, v. 2 p. 68-86, 2011.
MAGALHÃES, António de. Metafísica e saudade. Revista Portuguesa de
Filosofia. n. 11, v. 2, p. 282-289,1955.
MOELLER, Cha rl es. Littérature du XX'' siecle et christianisme. Tournai:
Casterman, 1953-1 964, 5 Va is.
MOURÃO, José Augusto. O nome a forma . Poesia reunida. Lisboa : Pedra
Angular, 2009.
_ _ . A Estética na fronte ira da experiência de Deus 1. ln : Obra Sele-
ta de josé Augusto M ourão. Lisboa: Im prensa Naciona l-Casa da
Moeda . 2017.
1 III 1

PINEIRO LÓ PEZ, Ramón . Para uma filosofia da saudade. ln: PINEI- CORPO-SAGRADO-FEMININO
RO LÓPEZ, Ramón et a i. La Saudade. Ensayos. Vigo: Editorial
Ga lax ia, 1953 .
RAHNER, Karl. La pa labra poética y el cristiano . ln : Escritos de Teología.
4." ed. Mad rid: C ristiandad, 2002. v. IV.

RILK E, Rain er Maria. Cartas a um jovem poeta. Edição Bilingue. Tradu-


ção e posfácio de José M ira nda justo. Lisboa: Antígona, 2016.
_ _ . Poemas. As elegias de Duíno. Sonetos a Orfeu. Prefácios, selecção e
tradução de Paulo Q uintela. 4ª ed. Porto: Edições Asa, 2001.
SPADARO, Antonio. O batismo da imaginação. A experiência da palavra
criativa. Prior Velho: Paulus, 2016.
TEIXEIRA, An tónio Braz. A filosofia da saudade. Matosinhos: Q uidn ovi,
2006 .
TORRES QUEIRUGA, Andrés. Para uma filosofía da saudade. O urense:
Publicació n da Fundación Otero Pedrayo, 2003.
WR IGHT, Tom. Theology and Literature. Oxford: Basi l Blackwe ll, 1989.
ZAMBRANO, Ma ría. Filosofía y poesía. México: Fondo de C ultu ra Eco-
nómica, 2013.

1102
A (des)humanidade selvagem e a erótica
em Lya Luft: inter(pel)ações teológicas
na poética da sensação em Lévinas
Nilo Ribeiro júnior

Carolina sentira então que tocava num lado remoto de Camilo, um


lado mórbido, e selvagem, e que ao mesmo tempo o perdia para sempre,
no corpo únúdo cheirando a musgo que se esfregava no seu
(LUIT, 1991a, p.125 ).

Ao aventura r-nos nas sendas da Filosofia e da Literatura à procura de


uma intersecção em torno da produção da significância de Eros para além
do Ser, que propicie um paradoxa l acesso à (teo)lógica como passagem do
infinito pela experiência huma na, seri a qu ase impossível não traze r à bai la
a ex pressão, humanidade selvagem, cunhada no contexto do epílogo da
obra Autrem ent qu 'être, de Emma nuel Lévinas 1• Ela é evocada pelo fil óso-
fo franco-lituano tendo em vista contrapor sua ótica (sur)real - o u (sobre )
natural - do humanismo do outro homem àq uela do rea l naturalismo da
o nto logia, cuja visão se tornou patente no pensamento ocidenta l contem-
po râ neo pela " eloquência de suas belas-letras" (LÉVlNAS, 1987, p. 208 ).
E se assi m o faz, não visa apenas ra tificar aqui lo que, do ponto de vista a n-
tropo lógico, havia dito Pasca l a respeito " do Eu detestável preocupado em
asseg urar seu lugar ao sol" (LÉVINAS, 201 1, epígrafe) contrastado pelo
(des)astre que a irrupção de o utrem provoca no s uj eito, mas sobretud o, em
desenfeitiça r-nos da linguagem à qua l fomos ha bituados pela o nto logia em
função da " ressonâ ncia verbal, sono ridade ina udita e memorável do Ser"
(LÉVINAS, 2014, p. 9) . Da subjacente retóri ca, não escapa seq uer a ex is-
tência humana ávida em cuidar desse (se) di ze r do ser (LÉVlNAS, 1987,
p. 207 ), a lheia a inter(pe/)ação de o utrem a partir da qua l a palavra Deus

1. O filósofo franco-lituano Emmanuel Lévinas nasceu na Lituânia em 1906 e migrou para a


França onde viveu e morreu em 1995. Considerado grande expoente da filosofia da alteridade,
foi muito influenciado pela leitura talmúdica (ética) do Livro Sagrado e pela literatura univer-
sal a ponto de ser considerado por Jean-Luc-Nancy um filósofo poeta e um poeta filósofo
(Cf. LÉVINAS, 2013, p. 23).

177 I
1 CORPO-EROS-PATHOS 1 1 A (DES)HUMANIDADE SELVAGEM E A ERÓTICA EM LYA LUFT 1

poderia significa r-se em ua própria significâ ncia. Eis que a palavra do ou- de si, só se di z na metáfora o u na hi pérbole do "contato tangencial com o
tro soa como " insignificante aos o uvidos da essência" (LÉVI AS, 2014 Rosto de o utrem" (LÉVl AS, 20 1·1, p. 194), pois " a prox imidade é o ime-
p. 68) de modo a interdita r a escuta de Deus que fa la pela boca do homem' diato de rra ma mento para o o utro r... 1 materialização da matéria - a lterada
cuidado r do Rosto. pelo imediato do contato " (LÉVIN AS, 20 11, p. 93). E essa proximidade,
rne mo quando referida ao contato da volúpia de Eros (LÉVI AS, 20 13,
1 1 A poemática do outro e a incondição surreal do humano p. 185 ), remete à pa sagem do Rosto q ue, já tendo passado, a paga os ras-
O ineditismo daqui lo q ue o pensa mento levinasia no, inspirado pelo tros deixados po r o nde esti vera em sua a nda nça amo rosa . E nessa vinda,
poeta Pa ul Cela n ('1 996)2, no meia como " poema da sensação" (LÉVINAS, daquele que já pa rtiu , anuncia-se ta lvez, a significância da significação da
2014, p. 62), em fun ção do contato com o sopro (jJneuma ) o u com " a voz pala vra Deus inena rrável fo ra da di vina comédia huma na.
tênue do o utro e da ca rícia do a mo r do Rosto" (LÉVINAS, 2011 , p. 195), O co ntato com o utrem, po rtanto, é da ordem da ancestra lidade que
há de ser exa ltado nesse percur o, a fim de afasta r-nos do risco eminente ó o p oem a da sensação dá conta de seu "D izer-sem-Dito" po rque graças
de assistir ao a prisio na mento da Erótica na emboscada da (com )-preensão ao (inter}peles aquele se "situa precisa mente no nível pré-sintá xico e pré-
da ontologia e nos artifícios de sua linguagem a utóctone, sem o devido lógico " (LÉVI AS, 2014, p. 62), aquém, isto é, anárquico com relação ao
cuidado à diferença que o diferentemente o utro introdu z na (in )condição caráter o riginá rio do Ser. Por isso, o " poema do Rosto " (LÉVINAS, 20 14,
huma na pela qual passa e se pa sa o infinito. Entende-se, aq ui , o poema p. 66) se revela como " mais a ntigo do que a linguage m da verdade do ser" ,
em seu ca ráter eminentemente pneumático - p oemática - porque inspirado pois aquele não se di z senão no di zer da prox imidade mais próxima que
no a rrancamento do sujeito de sua identidade, graças à prox imidade de roda contiguidade. Esse poe1na surreal à fl.or da pele com ou trem, aquém
o utrem q ue inspira, instiga e escava seu corpo pa ra o utrem. Isso, porém o e além de toda poesia, é consentâneo do " tempo interro mpido" que bro ta
contrapõe à a mbiência do Ser que, segundo o fil ósofo, impinge à existência da "sa bedo ria do amo r" insepa rável da " ma ravilha de dar-se a o utrem"
huma na, seja a ilusão do êx- tase e as fa lsas segura nças de um enraiza- (LÉVTNAS, 2014, p. 62).
mento no "ser-pa ra-a-mo rte" (LÉV lNAS, 2011, p. 124), seja a sedução A p oem ática da a pro ximação do o utro, po r ua vez, ina ugu ra u m aataxia,
dessa selvage m poética, in pirada " nas pa isagens, no fl o rescimento da isto é, "o sem-do micilio, o não-mundo, a não-ha bi tação" (LÉVI AS, 2011,
Natureza " (LÉVlNAS, 20 11 , p. 194 ) e na "cla reira da Floresta negra de p. 191) associada a (a )ssindética condição do huma no (LÉVINAS,
Holderl in " (LÉVl AS, 2014, p. 63), cuj os " pâ nta nos, pla nícies fecundas 20 1 I , p. 196), que se tradu z e se enca rn a no desejo insaciável pa ra além
tocam mais os olho s d o q ue os olhares" (LÉVIN AS, 20·11, p. 93) . do gozo, um a vez inspirada pela a lteridade de o utrem, o Fem inino . Assim ,
Na contravenção o u à revelia da o ntologia, pensa r ou tram ente lque o o Feminin o põe em xeque, seja a (co)naturalidade do ser à vio lência, seja
Serl como o usadia de dizer a (im )possível condição humana (LÉVINAS, a cultura da exclusão que deita ra ízes na histó ria e na poética das Huma-
2011 , n. 29, p. 140), supõe (des)sencia lizá-la do ser e de sua linguagem nidades gesrada pela O ntologia, cujos efeitos se faze m sentir até mesmo
(LÉVlNAS, 2011 , p. 188), sem a qua l não ter-se-ia tocado no â mago do no seio de Eros (LÉVINAS, 2011 , p. 144). E " a ruptura do ero tismo na
desnuda mento mais nu que a própria nudez huma na supo rta ria nessa (in) tempora lidade de Eros " (LÉVIN AS, 20 11 , p. ·188) encontra seu destino no
condição. Esse pa radoxo da cond ição (pré)o riginá ria da huma nidade fora faro de q ue "a própria diferença entre mim e o o utro que se adensa em
pele, é não-indi ferença, é o um-pa ra-o-o utro" (LÉVINAS, 20 1 J, p. 190 ),
isto é, um " poema do p uro toca r" (LÉVINAS, 2014, p. 62 ) q ue, a liás,
2. Em sua obra O Meridiano. Paul Celan (1996) revela a novidade de sua percepção do poe-
ma. Segundo o autor, a arte provoca um distanciam ento do Eu porque quem traz a arte diante nenhum discurso sobre a sexua lidade poden:1 sintetiza r e retó rica a lguma
dos olhos e dos sentidos, esquece de si. Dai que a poesia, tal como a arte, se dirija, com um poderá conter (LÉVI N AS, 201 1, p.1 90) . Ressa ira Lévinas que "o sexo
Eu esquecido de si. para aquelas coisas inquietantes e estranhas. para de novo se libertar. De
modo que um poema é um caminho para ir ao outro, o estranho. não é um conteúdo, é uma classificação e, entreta nto, não é uma simples

l 178 179 1
1 CORPO-EROS-PATHOS 1 1 A (DES)HUMANIDADE SELVAGEM E A ERÓTICA EM LYA LUFT 1

diferença específica. Ele é como a diferen ça da realidade humana - corno ror, mas provoca dupl a e radica l (ex) propriaçào do ser selvagem em sua
uma dupla face dessa rea lidade " (LÉVI AS, 2013, p. 194). identidade na rrativa.
Ei , pois, que esse a rurdimenro do surrealismo da pró pria (in )condição
huma na que se dá na enca rnação do corpo dado a o utrem, à qual se refere
2 1Expropriação do ser selvagem na (ex)critura luftiana
a escritura levinasia na, reverbera na (Po)érica de O Q uarto Fechado, da es e senrido, parece fund amental evoca r a novidade da " teoria se-
literata bras ileira Lya Luft 3• Não é à roa que o poema do Rosto se di z no miótica" (LÉVINAS, 2011 , n. 7, p.158) propugnada por Lévinas, a fim de
contato, em cerro senrido surreal do a mor de Ca milo por seu a migo de perce ber seus ecos na escritura de Lya Luft. Ora, o a uto r enfa ti za que na
in fâ ncia, personagem cenrral do romance lufria no. " linguagem primeva da sensibilidade e do puro contato com o Rosto de
urn eu-corpo que se fa z signo" (LÉV INAS, 2014, p. 62), processa-se um
Um l o utro] infante como Ca milo, talvez nove, dez anos. A única pessoa de
movimento centrífugo que (des)orbita a subjeti vidade da lsua 1 essência de
q uem Cami lo conseg uira se aprox imar além de Ca ro lina. A primeira aber-
ser. essa ótica, o conta to (de)situa o eu des e inter-esse, desinstala ndo-o
tura, possibilidade de o ut ro contato, fora daquele círculo o nde gira va com
sua o utra metade desde anre do nascimento 1... 1 o seu isolado coração, de si e condu zindo-o à uma condição (u)rópica, do " lugar sem-lugar gra-
Cam ilo estava apa i xonado. Não compreend ia isso, nem med ia a d imensão ças ao signo da ca rne à qual se vincu la pa ra além da Humanitas de ser "
da própria singularidade, mas naq uela criança pre sentia: existem coisas (LÉV INAS, 2011 , p.1 93).
fora de mim e de Carolina (LUFT, 1991a, p. 23). Na perspecti va da sensação, o poema de Lya Luft 4 ressa lta a (des)
ontologização das relações fa miliares na q ual sobressai o d ra ma de Rena-
Há , porém, de se sa lientar, que o ca ngencia menro entre a fil osofia
ra, dessa mãe (inter)pelada na carne pelo interpele com a pele do olha r do
levinasia na da sensação [ética ] e a Eró tica lufria na ocorre bem ao reverso
Rosto dos filh os Camilo e Carolina, suspeitos de existirem numa " ma neira
das interprerações de corte hermenêutico-ontológico da o bra da literata.
de interesses incestuosos".
Outrossim , ta nto em Lévinas como em Lya Luft, a o bra literária não se
retira a penas da posse do a utor pelo movimento de apropri ação do lei- Não tinham nascid o iguais. De sexos diferentes, seriam como do is irmãos
quaisquer. Parecidos, sim , pequenos, débeis. M as com o tempo haviam-se
3. Lya Lutt é considerada pela crítica um dos expoentes da literatura brasileira contempo- to rnado mais e mais semelhantes. Renata [a màe l sabia , rodos sa biam sem
rânea. Escritora, ensaísta, romancista e poetisa, nasceu no dia 15 de setembro de 1938, em coragem ele dizer : eles treinavam par a ser iguais. O s gêmeos não pareciam
Santa Cruz do Sul e se radicou em Porto Alegre. Ao longo de mais de 50 anos de carreira, es-
creveu nâo menos que 20 livros, nos mais diferentes gêneros. Sua obra literária, via de regra,
habituou o leitor a voltar aos truísmos como forma de lidar. poeticamente, com as questões
existenciais ou com os conflitos humanos indissociáveis do drama da morte, da paixão, do 4. Nossa reflexão se fixa em torno de uma de suas primeiras obras: O quarto fechado , pu-
sexo, enfim, dos medos fundamentais e dos tormentos essenciais narrados em suas histórias. blicado em 1980. O enredo mescla realidade e ficção em torno dos dilemas l1umanos que se
Em sua escritura, sobressai o fato de o acesso à alma humana ocorrer por meio da descrição desfilam diante dos sentidos do leitor, ambientado numa noite do velório de um rapaz que se
quase plástica do encontro com o outro como e-vento, isto é, discriminando os tempos e lu- suicidara por conta da paixão incestuosa por sua irmã. A narrativa, por sua vez, tem como
gares nos quais se travam as relações l1umanas de modo a associá- las à materialidade bruta pano de fundo o oll1ar da mãe. Ele alterna entre a visão do rosto do filho defunto, que jaz num
dos corpos. Pois, neles se instalam os paradoxos dos quais o humano não pode se desven- caixão bem ao centro da sala da casa, e sua atenção despertada pela pintura de um "Pe-
cilhar. Sendo que por meio deles, emerge a situação humana em sua nudez mais nua diante queno cais deserto", colocada no patamar da escada da mansão (LUFT, 1991a, p. 18). Bem
da alteridade da morte. Em função da primazia atribuída à carnalidade palpável da existência no desfecho, depois de apresentar a tragédia da morte como o drama mais indominável da
humana, o problema de Deus ganha outro estatuto epistemológico porque o conhecimento condição humana, a questão de Deus irrompe como pergunta crucial de todo adeus, isto é,
de Deus só é possível na sua própria significância nas entrelinhas de sua escritura, e jamais o a situação da divina comédia humana que brota do próprio encontro com a alteridade de um
contrário: Deus passa e se passa na relação com outrem. Segundo a escritora. pronunciar a rosto humano a partir do qual a palavra Deus talvez lpossa] ser dita com sentido. Daí nosso
palavra Deus com sentido, é tão enigmático quanto dizer da Morte, do sofrimento, do amor e interesse em aproximar a escritura luftiana do pensamento do Rosto de Emmanuel Lévinas,
do Rosto humano. A saber, tanto o inefável de Deus como o indizível do outro homem depen- tendo em vista a procurar uma nova via para a intriga entre a Teologia e o Poema. A essa pre-
dem da diferença ou da separação absoluta do Mistério, embora não se possa distanciar-se ferimos denominar de (feo)poemática, a saber, um discurso teológico inspirado pelo contato
dessa comunicação e expressão primevas. Esse paradoxo se deve à significação que Deus e com o Rosto cujo "pneuma do psiquismo" de outrem arranca o sujeito de sua permanência
o Rosto se dão de si mesmos aquando do eu como signo dado a outrem. no ser "apesar de si", isto é, que sem sua carne não haveria inspiração.

l 180 181 1
1 CORPO -EROS-PATHOS 1 1 A (DES)HUMANIDADE SELVAGEM E A ERÓTICA EM LYA LUFT 1

a ma r n ing uém 1.•• 1 Camilo e Carolina, fr utos inesperados, a lheio ao mundo como a lteridade e a mo rte de o utrem, porta nto, não se deixam ap reender
o nde deveria m crescer. M a rrim 1o pa i 1 irritava-se: - Garoto que só a nda com nem pelo tempo nem pelo indeterminado do Nada Ido Ser] porqu e esca-
a irmã vira ma ricas! E procurava sepa rá- los. Eles ti nham um dom , pensou
pa das ma lhas de sua verba lidade circ unscrita à a nfi bologia do Dizer/D ito
Renata, luta ndo para não chora r ma is. E o desenvolvera m m uito melhor
onto lógico. A propósito disso, sa ira aos olhos, que a existência huma na
do qu e eu desenvolvi o meu. O q11e fiz com o 111e11 dom? A mãe indaga va,
incon fo rmada, dia nte da reação cio m a rido, M a rtim (LU FT, 199 1a, p. 35-36.
na ó ti ca da o nco logia passe ao la rgo da (u )topia d a sensibilidade pura, do
G ri fo nosso). co rpo, da pele, da ca rna lidade bruta e exposta à do lência, enfim, da Eró tica
co nce bida segundo "a sensação e a inspiração da relação com o Rosto"
Não há, po is, adonação (do m em ação ) senão nesse extravaga nte per- (LÉVINAS, 2 011 , p. 193) . Em co ntra pa rtid a, como sa lienta o fil ósofo fra n-
do m, isto é, no poema do corpo que se tece no esquecimento de si, indo co-litua no, "Eros é a comunicação e expressão primeira" (LÉVI NAS, 2013,
em direção à estra nheza do o utro, desse o utro cuj a sex ua lidade fo ra dos p. 162), e send o da gesta da sensação " provoca a (des)indi vidu a lização na
padrões punha em questão o ethos a mbiente e o status quo c ultura l pelo essência do huma no do huma nismo o nto lógico a po nto de fazê-lo ingressar
contraste de d iferença de o utrem. Dessa feita, no roma nce O quarto fecha- em uma nova indi viduação p a ra a lém do Ser" (LÉVINAS, 2013, p. 162) .
do, a escritora brasileira põe-nos em co ntato com essa (des)do mesricação Eis, po is, a (des) razão de se poder associa r, paradoxalmente, o espaço
da subjetividade for a-de-si, nesse "sem-luga r, exilado e sem-tem po" (LÉVI- ao sem-luga r, e o tempo ao sem-continuidade, g ra ças ao Rosto que, po r
NAS, 2011 , p. 153), se compa rado à tra nscendência e à tempo ralida de do ser do reino do a b-soluto se asse melha à mo rte em sua a lteridade, embo ra
a í do Dasein da o nto logia. É, precisa mente, po r esse Dize r LH Ópico que o extravase qua lq uer a nalogia que se qu eira esta belecer entre elas, isto é, en-
Dito do rom a nce luftia no ga nh a a densidade de um poema d o Rosto. tre a mo rte e o Rosto. Afinal, a mbas passa m e se retira m no aquém e pa ra
a lém do ser.
A vicia de Camilo é como ilhotas da magia o u como águas do terror: misté-
rios qu e não nos a brem luga r, os objetos cotidianos que ela nos oferece, tudo Entreta nto, sendo a intriga com o Rosto da (des)ordem de uma iló-
serve para atormenta r a fa ntasia do mesticada daquele q ue imaginava tudo gica do huma no, a relação permite enlaça r a subjeti vidade pa ra a lém da
saber de um rosto incógnito (LUFT, J 996, p. 28). concreção do a niquila mento que se s upõe na mo rte. É por esse moti vo que
ao tra nsgredir a poesia de Cântico dos Cânticos, do "a mor fo rte como ,ª
Urge ressa lta r que a (in )condi ção da huma nidade associad a à (u )to pia mo rte", Lévinas chega a dizer q ue "o a mo r é ma is fo rte q ue a mo rte" (LE-
suscitad a pela prox imidade do Rosto huma no expulsa o e u de sua " terra VINAS, 2011 , p. 47), to ma ndo-o agora em fun ção da relação erótica com
na ta l" e deflagra um êxodo a um Si sem reto rn o a si, " nesse Si, fo ra da es- o utra huma nidade no fenúnino. Po is, o fi lósofo asseve ra que "o feminino
sência, como um a passibilidade de morte" (LÉVIN AS, 2011 , p. 140 ). Esse - o etern o feminino-, cujo ser consiste no mistério é indispensável pa ra
exílio sem ter p a ra o nde ir g raças a esse "n ão-luga r da intriga com o utrem " have r um tempo" (LÉVINAS, 2013, p. 186). E, para fr asea nd o, o fil óso fo,
(LÉVINAS, 2014, p. 64 ), qu e somente a enca rn ação assegura o êx ito, dá poder-se-ia acresce ntar: o feminino é indispensável pa ra have r " ress urrei-
azo pa ra que se possa traze r à tona a questão avassa ladora da M o rre, que ção dos corpos" (LÉVIN AS, 2014, p. 'J 7 ). Po rque se "a líng ua viva, líng ua
ocupa luga r central no poema de Lya Luft. ressuscita da, é inter(pel)ada a significa r, entre os viventes, as coisas do pre-
Contrá ri o à ó tica o nco lógica, a mo rte inscreve-se, na escritura da ro- sente e as esperanças" (LÉVIN AS, 2014, p.l 7 ), essa significação depende
ma ncista, como uma alrerid ade a bsoluta que a tudo desa rvo ra, desa rruma, do conta to com a pele de o utrem e da ca rne fe ita signo (língua viva) dada
" des-o rdena" (LÉVINAS, 2011 , p. 195). G raças a isso, a su bjetividade é para o utrem nesse lapso de tempo .
s ubmetida a uma " in ve rsão em essência de des regra mento" (LÉVINAS, O ra, o a mo r como e-vento na intriga com o Rosto do o utro é pass ível
2011 , p. 196). Ela expõe a s ubjeti vidade a o utrem que vem de a lhures, e
de ser vivido como se estivesse di ante da mo rte co mo alteri dade. Suce-
que, no caso do ro ma nce, a remete à M o rte e ao Rosto de Ca milo . A mo rte de que di a nte da ra dicalidade da "Exteri orid ade do próximo" (LÉVIN AS,

1182 183 1
1 A (DES)HUMANIDADE SELVAGEM E A ERÓTICA EM LYA LUFT 1
1 CORPO-EROS-PATHOS 1

2011 , p. l 95 ), é co mo se a subj eri vidade perdesse sua rerra firme , seu solo, 0 rempo, (LÉVINAS, 2 011 , p.87), no " la pso de tempo" (LÉVlNAS, 2011 ,
sendo exrradirad a de si e posra na co ndição de pad ecência a bsolura, na p. 107) da "sensação suscitada pela a prox imação do Rosto" (LÉVIN AS,
pura exposição a o utrem. Entreta nto, o "a mo r é da o rde m da enca rnação 20 11 , p. 156) de Ca milo que, po r sua vez, retira seus familia res (p róx imos
erótica com o femin ino" (LÉVINAS, 2013, p. 186) enquanto a mo rte, em mais próximos) daquela "atmosfera pesada da essência" (LÉVI NAS, 2011,
seu realismo, é passível do fim co mo término da existência em função de p. l 5 1) à qu al remete a Morte.
" um apocalipse sem escatologia" na ética, diz o fil ósofo. Esse contato da o rdem do exo rbita nte " ma is forte do qu e a mo rte";
esse pathos da a proximaçã o não aca ba de ferir, como na mo rte, embora
3 1A (des)ontologização da Morte e a exterioridade do Rosto na " paixão, o utrem me exalte e me eleve e, no sentido liter al do te rmo, me
Considerando o poema de Lya Luft nessa esteira da esca tologia do inspire" (LÉVINAS, 2011 , p. 141). Enca rnação do suj eito, pois, cuj a signifi-
feminino, aquele não poderá ja ma is ser dissociado da Eró tica mesmo qua n- câ ncia se a ra na carne e se desata no devota mento do corpo/signo o ferecido
do, especia lmente, na o bra O quarto fechado, a escritora se dedica a dizer ao Rosto fd e Camilo ], no "entrerempo" do o utro (LÉVINAS, 2014 , p. 64)
das interjeições que a morte de Camilo provoca em sua irmã Carolina e do cuj a hipérbo le de seu co rpo o situa entre "o céu e a terra'', entre "a vida e
dra ma da relação incesru osa ta l como reiteradas vezes insinua o romance. a morte", entre "a majestade e a vassa lagem " (LÉVIN AS, 2011 , p.195). Ele
E o poema do Rosto se enca rna de ma neira la pidar nas pa la vras de Lya in te rpela, sem pedido a lgum, po r meio do silêncio de sua voz e da ca rícia da
Luft: " O mo rto jazia entre eles como um anjo exterminado r: impo ndo si- pele de seu o lha r, em ser gesrad o nas entra nhas de uma subjeti vidade pater-
lêncio, impla ntando sepa ração, corta ndo derradeiros elos; urdindo outros, na lmente matern a, fo ra do suj eito (LÉVINAS, 2 011 , p. 1 89) . E o poema do
numa ação dolo rosa e pungente" (LUFT, 1991a, p. 4 7). Rosto se di z de ma neira contundente na escritura luftia na .
G raças ao Rosto de Camilo, "ma is forte que a mo rte", que deixa ras- O menino fraco, o adolescenrc que flh ej pa recia efeminado, provocava l -lhel
tros de sua passagem uma vez que ve io e, inesperada mente, já pa rtiu, essa impaciência, ra iva, medo. Agora, era quase transpa rente: inerme, exposto.
exterioridade que se faz prox imidade (LÉVlNAS, 2 011 , p. 195), preside a No entanto, fora de qu alq uer alcance. O tempo perdera-se numa vida con-
busca de um a mor (u)rópico sem conc upiscência. Esse a mo r se cumpre na tu rbada, não havia como o recupera r, pois o Rosto havia pa rtido ao meio
tempo ra lidade " d a prox imidade como linguage m da pura proximidade" roda e qualquer explicação sobre pa rtida (LUFf, 1991a, p. 50 ).
(LÉVINAS, 2014, p . 62),.isto é, se realiza na sensibilidade como responsa-
Na perspecti va da a lmejad a "distensão da selvagem huma nidade"
bilidade, substituição 5 e maternagem de o utrem que se di z em trapos ético;
( LÉVINAS, 2011 , p. 342) à qua l se refere o fil ósofo, e pa ra a qu a l, a té mes-
desse poema que brota da pró pria sensação aquém do ser, enqua nto tempo
mo Eros deve ser (des)dito naquil o qu e lhe resta de profa nação do co rpo do
da relação sem relação com o o utro em se u no madismo.
o utro (LÉVINAS, 201 l, p. ·188 ), "o qua rto fechado" de Lya Luft, não dei-
N ão resta dú vida de que nessa esteira do ficcion a l, o poema O quarto
xa de ser metáfo ra da "transcendência do co rpo fe ito carne pa ra-o utrem "
fechado, põe-nos em contato com o dra ma da subj eti vidade despida de si,
(LÉVINAS, 20 11 , p.1 93).
seja pelo conta to com a precariedad e do Rosto, seja pela a prox imação des-
sa elevação do outro que se eng ra ndece em sua humildade. Po r isso essa re- 4 1A diferenciação primeva da humanidade na diferença sexual
lação da o rdem do surreal se encarn a como " passa tempo", isto é, padecer
Esse " movimento excêntrico da su bjeti vida de" (LÉVINAS, 1984, p. 66)
se c um pre, de fato, na urdidu ra da a legri a e d o sofrimento involuntá ri os
5. Na paixão de si que é este acontecimento incessante de sujeição a tudo, de substituição,
o fato, para o ser, de se des-prender, de se esvaziar do seu ser, de por "do avesso", e, se nessa diferenciação sexual da relação en tre os irmãos Caroli na e Camilo
assim o podemos dizer, o fato de "de outro modo que ser", sujeição que não é nem nada, nem (LÉVINAS, 2011, p. 189) que perpassa a na rra ti va .
produto de uma imaginação transcendental (AE, p. 132 -133).

l 184 185 1
1 CORPO- EROS-PATHOS 1 1 A (DES}HUMANIDADE SELVAGEM E A ERÓTICA EM LYA LUFT 1

o quarto fechado, deitava m-se na s duas ca mas, esticavam-se, cruzavam as essa ó ti ca, compree nde-se que "a carícia não é simplesmente um conta-
mãos no peito, fechava m os ol hos. o começo, Ca ro lina faz ia força para " porque "aqu ele que é acariciado não é propriamente fa lando, tocado"
não rir. Mas aos poucos ia sendo levada. Alg umas vezes acontecia que se to , d d .
(LÉVINAS, 2013, p.178). Em sintonia co m essa percepção o ese10 em
transfigurassem, concentrado na grav idade do brinquedo: um nevoeiro os
Eros, dirá Lya Luft em seu poema do Rosto:
recobria, uma o nda pa liclecia m, a resp iração tornava-se lenta e s uperficial,
o gra nde so no não os trag·uia pa ra sem pre? Era Caro lin a quem rompia 0 Com o dedo ela escreveu seu no m e no vidro embaciado. Depois, vira ndo-se
jogo, leva nta va-se, to nta, corria até o irmão. Precisava cha mar por ele, tocar para o interio r cio quarto, a briu os braços, ergueu o rosto, e começou a dan -
nele, para que voltasse, tão absorvido estava em joga r (LUFT, 199 1 a, p. 33 ). ça r: passos lentos, meneios lascivos, os seios frouxos. Estava inre ira m e nt~
nua . O cabelo cor de prata, caindo a ré os o mbros, cintil ava na luz 1... 1 E
A sensação, po rtanto, qu e se produz no " instante do conta to e na du- Ca milo arado àq uele corpo não tinha certeza se o rosto de Caro lina reria
ração do tempo" (LÉVINAS, 2013, p. 184 ) da intriga a mo rosa pela qual se pe rd ido no infinito de sua sombra o u se, como o perfume que exa lava de
o eu-corpo dá-se como sig no a outrem, a nunc ia o fim da " tira ni a sexual" sua pele, ela teria partido para um lugar do qua l jama is se a usentou (LUFT,
sem, co ntudo, nega r a ambiguidade que se s upõe em tod o jogo eró tico. 199 1a, p. 9 1).
É mister enfatiza r qu e na escritura d e Lya Luft, a metáfo ra do "q uarto
H a ja vista, que na o bra de Lya Luft, o quarto assume, pa radoxalmen-
fechado" não se restringe a uma fig ura de linguagem. O ra, se por um lado,
te o caráter de um tempo/luga r "sobrenatural para além do discurso dos
na se nsação corno prox imidade, a transcendência se di z nesse fora de si do
tc~logos" (LÉVTNAS, 2014, p. 74 ), isto é, de um topos (im)penetrável e
suj eito, por o utro, esse (des)interesse não se mostra a lheio à ma teria lidade
de um tempo (in )ena rrável, se compa rados ao natural e realista acesso ao
ma is material de um a posento, de um leito revestido com lençóis de linho
" qua rto fechado", inspirado na a rquitetura translúcida o u na linguage m
cru, de uma lâ mpada so bre o criado mudo, do cheiro suave d o sa bão do
da "cla reira do Ser" às quais o sentido de Eros acaba associado a essa "es-
lavabo etc., aos qu a is se atam os co rpos que se entrega m à vo lú pia em Eros.
tra nh a sacra lização do e r " como fosforescência o u tra nsfig uração na qu a l
Esse contato protagoni zado no (e ntre)peles dos pa rceiros permite cotejar
0 corpos podem se tornar di áfa nos e etéreos (LÉVINAS, 1976, p. 273 ).
a transcendência à carn a lidade de mod o a exorciza r a significânc ia da pri-
Em contra pa rtida, se é que "o qu a rto fechado" se erige como terra (so-
meira d e um espiritua lism o esté ril. Sem a gravidade da g raça qu a l tatuagem
brenatura l) de a prox imação de o utrem, só haveria luga r pa ra a sig nificação
que se cola à pele dos corpos que se roça m, se aca ricia m e se desejam, cujos
ela palav ra "deus" diferente do sentido da o ntol ogia, desde que a quele pu-
movimentos e diferenças permitem adensa r a transce ndência associa ndo-a
desse se dizer na diacroni a da intriga hum a na com a pele do Rosto. E essa
às relações hum a nas eró ticas, correr-se-ia o risco de se recair no du a lismo
dependeria desse à-deus (ir em direção ao infinito do Rosto esquecendo-se
co rpo/a lma qu e teima em perseguir a tradi ção fil osófica ocidenta l. Po is, o
de si) como desejo qu e brota da inte r(pel)ação de Ca rolin a a Camilo o u
que há de mais es piritual na (in)condição hum a na o é sine qua non g raças
desse passatemp o (padecer) d a ca rnalidade de Camilo na qual aco ntece
à (des)ordem (sur)rea l da de ns idade da ca rne.
a (in)ha bitação de Carolina, como "outro-n o-mesmo" [dentro, instalado
Acrescente-se a isso, o fato de a transcendência desa ta r a natureza in-
no corpo sem lugarj antes mesmo que ho uvesse mo tivo para associa r o
cestu osa de Camilo e Caro lina dessa hum a nidade selvage m, que tende a
Feminino à hospita lidade. Ora, sem desejo e sem (in)spiração de o utrem
"confundir fra ternidade com pa rentesco" (LÉVINAS, 2011, p. 189); Eros
radicada numa a ntrop o logia do (a)pátrida o u dessa huma nidade (des) na-
com Amor, proteção co m fusão etc. Sim , a extrema confusão se instaura na
tura li zada pelo Rosto, para a lém da o nto logia, a significação da pa lavra
ca rne e a enl o uquece qua ndo se torna (a uto)eró tica. Em fun ção do Desejo
" deus" continua rá sendo da ordem do non-sens. Pois, não haverá corpo
d o (in )desejável qu e somente a diferença no conta to pode assegura r, a ca rí-
que a proclame com sentido . Melhor dizend o, sem a huma nidade enca r-
cia dos corpos prenuncia a impossibilidade de fusão co m o utrem, um a vez
nad a no de-vota mento a outrem, a palav ra "deus" nã o encontra um corpo
que "o próx imo não preenche a a proximação" (LÉVINAS, 2011, p. L08) .
qu e, ao se fazer carne-para-o utrem, possa testemunh á- la no instante mes-

l 186 187 1
1 CORPO-EROS-PATHOS 1 1 A (DES)HUMANIDADE SELVAGEM E A ERÓTICA EM LYA LUFT 1

mo (duração) da sign ificação da sensação e no dizer-sem-dito do contato de cam uma circularidade de um movimento sem retorno, de uma trajetória
um dar-se-para-o utrem, lá onde deus, e quem sa be, unicamente, lá , diga-se perfeita em sua fin a lidade sem fim " (LÉYINAS, 2014, p. 67).
de passagem, na carne hum a na exposta, "possa" como Ele, como Pró-no- E esse " mapa" tracejad o na paixão, com suor e sa ngue na vulnerabi-
me, como Nome acima de todo nome, H ápax do vocabulá rio (LÉYlNAS lidade da ca rn e hum a na, e não com tintas de um bico de pena (anima l),
2011 , p. 244), passar e se passar na Erótica como ling uagem primeva da
' é in epa ráve l da "vid a (d ia)spó rica na qua l a a ltero-grafia do femin ino
diferença huma na. se a bsorve em histó ri a, porque a terra prometida [da pele de ou trem 1 se
Sem esse "en igma " da carne (oscila entre a ex terioridade e a interiori- estrem ece nas palavras que a designam" (LÉVINAS, 2014, p. 20). E, no
dade) avesso à devassa do Ser, confi ado à morada , o feminino como "m isté- caso d o contato à fl or da pele co m o utre m, a esc ritu ra de Eros se ins-
ri o" não se revelaria em sua nudez como ternura e a branda mento para um creve na hi stó ri a ca rn a l desse corp o-ú ni co-para-o utre m. Pois, na esfera
corpo retesado do eu, sem q ue o primeiro pudesse ser ac usado de obsceno da (u }topi a (LÉYINAS, 2014, p. 64) e do "tempo perdido " de Eros que
(LÉYINAS, 2011, p. 108). Pois, nesse tempo/lugar do segredo, o feminino 0 o utro feminino traz com sua aprox imação e d iferença, qua l "passado

toca o corpo de um eu encaps ul ado no gozo de si, imerso na vida, satisfeito ime moria l" (LÉYIN AS, 2011, p.191), sequer a "consciência íntima do
e sem necessidade de nada e de ninguém. Entretanto, mesmo pressupon- tempo vivido" dos corpos que se atam e desatam no prazer, poderia m
do-se essa condição prazerosa do eu-co rpo, o feminino lhe advém a ponto rememorar e nomear o se ntid o do sexo a té então vivido na intimidade
de perfurá-lo, fiss urá- lo e (im}po r-se ne sa carne como (anti)natural em de um quarto fechado.
Eros (LÉVINAS, 201 l, p.194). Afina l, o feminino não se desvincul a desse E mai , segund o, essa "outra ma neira que Ser", ina ugurada pela (in )
" para a lém do ser e do m undo" (LÉVINAS, 201 l , p. 195). Ao aproximar ab itação do feminino, de O quarto fechado de Lya Luft, a sig nificâ ncia de
do eu-corpo, embo ra tendo vindo de a lhu res, inaug ura pa ra a própria hu- Eros destitu ída de q ua lquer imaginário mítico da fecundidade dos deuses
manidade, a condição surrea l o u (so bre)natural da sex ua lidade graças ao ido o limpo ! a ser mimeti zada em sacrifício pelos seres huma nos, já não se
desejo e à (in)abitação (inspiração e a sa ntidade po rque retirado) do o utro. fixa em torno da relação dua l dos amantes. A fec undidade eró tica se encar-
E, portanto, essa (in)a bitação do Femi nin o anuncia o fim da sacra lização na em seu ca ráter público, me mo sob quatro paredes, graças à proximida-
de Eros ao mes mo tempo em que o fe m inino põe em xeq ue a destinação de da a lteridade do " terceiro excluído " humano (LÉVINAS, 2011 , p . 195).
última de Eros à morre. A não ser que se descarte a trama o u a intriga de Es e se instala bem no seio da relação dos parceiros a ponto de aba la r a
Eros (i n )sepa rável do feminino em s ua fe minidade, isto é, em sua a lteridade idílica cu mplicidade de dois seres comparados à duas metades prede tina-
a quem o sujeito que fru i no ato mesmo de fruir oferece eu co rpo para das "a prolonga r a fruição do sexo na unid ade e na comunhão de corpos"
o utrem: "O rapaz pensava divertir-se co m Carolina . Desprezava um pouco (LÉYINAS, 201 1, p. 188) . Essa lleidade de o utrem irrenunciável à Eros,
o irmão dela, irritantemente doce, grudand o nele o lhos seq ui oso . Mas o q ue vi ri a "sa lva r " os parceiros da "atmosfera de pesada sensua lidade"
rosto feminino, repetindo o da irmã tão estranhamente, era perturbador". (LUFT, 199 1.a, p . .11 6), está grafada magistralmente na in triga da escritura
(LUFT, 199a, p. 116). de Lya Luft. Ne la, Ca milo brada no silêncio do D izer do Rosto:
O " quarto fechado", que em princípio evocaria a alcova, isto é, o lu-
Pela primeira vez mentíamos um ao o utro: cada um de nós queria estar sozi-
ga r privativo, em ce rto sentid o, p udico e no qua l os amantes se entrega m
nho com ele, o Intruso. Por quê? Para quê? Não sabíamos. Pela primeira vez
perdidame nte aos praze res da carne sem se rem vistos, incomodados ou não pude mais do rmir no quarto dela, porque sabia, o tempo rodo sabia: ela
censurados, se oferece agora como " terra prometida" (LÉVINAS, 2014, está aí, o u me vem dele es a inquietação? 1... J Pelos ca minhos cio Outro, da
p.67) em que os parceiros se orientam em direção ao infini to do Rosto, sua lo ucura e prazer, poderiam fina lmente integrar-se em definitivo, ou viria,
pe la "ca rtografia" do Desejo, insp irada nos "meridia nos, cuj os arcos evo- afi nal, a lg uma libertação? (LU FT, 199 1a, p. 11 5).

l 188 189 I
1 CORPO-EROS-PATHOS 1 1 A (DES)HUMANIDADE SELVAGEM E A ERÓTICA EM LYA LUFT 1

Nesse entretempo ela sensação, a a proximação cio terceiro provoca no Alguém joga xad rez com minha vida,
corpo ele Ca milo, " uma a berrura ne sa a bertura, sem desculpa, sem evasão a lguém me borda do avesso,

nem á libi , e ntrega ndo-se sem nada di zer ele Dito" a Caroli na (LÉYlNAS a lg uém ma nc ja os cordéi .

2011, p. 158). Ele, Camilo, c uj o corpo, a té então só se a bria ao mundo da'


Mordo d evagar
o fruro desta inquietaçã o.
frui ção. Ora, a a proximação cio feminino em Eros, (in )sta la-se e (in)ha bita
(a lg uém me inventa e dcsin vcnta
co mo terceiro sem se r convidado, bem no interior do quarto no qu a l (des) como quer:
a loja, solitá rio, esse eu "sem portas e ja ne las" para o Ser. Desse modo, 0 ta lvez seja esta a minha condição).
terceiro em Eros, "a bre a a bertura" do humano para o Femin ino e o torna (LUFT, J 992, p. 2 1).
fecundo (LÉYlNAS, 20"1 l , p. 158), isto é, cava-o às múltiplas relações com
o o utro, e m Eros. 6 1A ambivalência entre Eros e Thanatos
Há, porém, de salienta r que mesmo co nsiderando que Eros aguce a
5 1A homoafetiva significância de Eros
(in )condição humana segundo a (des)ordem ela dife rença na sensibilidade/
A propósito cio ad vento cio Te rceiro e m Eros, não deixa ele surpree nder signo introduzida pela se nsação, ele ja ma is se afastará ele sua am.biguidade
que Lya Lufe insinue que, ta nto o a mo r inconfesso ele Ca milo ao a migo de pois "a carne é o e lemen to mesmo ela vida. É a brutalidade e a solidez de
infâ ncia, co m o a a tração fa ta l por aque le o utro intruso, sem no me, que um objeto físico que se a nuncia, entreta nto, co mo a lgo de frági l, trêmulo,
fez com que a relação se tri a ng ul asse pa ra a lém cio conta to com Ca ro lina, como exposta ao fe rimento" (LÉVINAS, 2013, p. 178). E, nesse caso, se
a mbos, introdu zissem uma inespe rada novidade (homo)afetiva à signifi- o Feminino ina ug ura a ca rícia de co rpo hum a nos, essa mesma afecção,
cância de Eros. Ca milo pode vislumbrar po r meio dessa " d iferença sex ual" portadora da fru ição e distensão pode deflagra r uma tal " irrita bilidade"
ela ho mossex ua lidade, em função do (inter) pe les daquele o utro, próximo na ca rn e (LÉVINAS, 2011, p. 108) a ponto de Eros a fl orar com ímpeto
de Ca mi la, a " libertação" daquil o que o d ividia e o perturbava a ponto de nesse eriça mento da epiderme. E, num movimento ensa ndecido, a procura
incliná- lo co mpulsiva mente a querer da r cabo de sua vida e desfazer-se do de ex purgar o (in )cômodo da " resistência absoluta que os ol hos sem defe-
a feto incestuoso pela irmã: " ICarolinaJ E soube ta mbém q ue Ca milo se sa' (LÉVINAS, 1976, p.410) e a pele de o utro lhe provocam, (LÉVINAS,
oferecia ao Outro nela, buscando a través dela, no prazer que era agonia e J976, p.41 0), Thanatos não tardasse em mostrar a o utra face de Eros, ta l
dor, a lgo que o la nçasse para a lém de tudo: da procura, do limite" (LUFT, co mo está fi xado no Dito do poema de Lya Lufe: "Ca milo, a ntes co ntro-
199 l a, p. 11 7) . lado, de emoções débeis, sentia-se agora como um dos to uros enfureci-
Sem sombra ele dúvida, o feminino aca lenta e propicia ao eu-co rpo o dos que cobri a m as vacas na faze nd a: impulso de ataca r, mo rde r e mata r "
prazer eminentemente huma no sem o qu a l não existi ria senão frui ção da (LUFT, 1991a, p. ·1 16) .
vida para si. E é ta mbém ao fem in ino que se deve a to mada, a (per )segui- Seja como for, a mo rte e a a lteridade de Ca milo (e não a própria morte)
ção e a oc upação d o "outro-no- mesmo", sem que nada o u ning uém (ser, a fe re as entra nh as de Rena ta, sua mãe, pia n ista solitária, sempre (in )pacien-
morte) possa substitui-lo na intriga com meu co rpo . E que, po rta nto, não tc, em-tempo, que reagia a qua lqu er tenta ti va de se a prox imar do (in )
reste ao eu-co rpo senão a (i n)conclição ele único, obcecado a respo nde r na com preensível drama da pele ho mo-afetiva e incestuosa vivida pelo filh o.
ca rne-pa ra-outrem. Eis q ue so mente a sensação qua l evento ela inabitação, E que, no enta nto, nessa ho ra derradeira (ta lvez a primeira de sua vida)
(in )spiração, respiração em pausa, na ap roximação cio Feminino, permite o u nesse " lapso de tempo" aberto pe la a usência do Filho, cla ma ri a po r se r
referir-se à condição (in) uma na ela carne ta l como é retra tada pela sensibi- adotada por Ca milo. Somente nesse seu adeus, a mãe poderia se r a rra ncad a
lidade da escri tura lufria na. da perseveran ça em ser desse pa pel cômodo (ind ife rente) que ass umi ra no

l 190 191 1
/ CORPO-EROS-PATHOS / / A (DES)HUMANIDADE SELVAGEM E A ERÓTICA EM LYA LUFT /

contexto familiar. E assim, quem sabe, nesse (i nter)peles da diferença abso- gem que fa la nesse discurso, isto é, ao afã de persisti r e justificar-se a todo
luta, introduzida " por o utro parentesco com o filh o" (AE, p. 189) poderia custo, em ser a sua essência quando da relação erótica.
ir à Deus, não como se ele fosse um a Ilha, mas como " ma r aberto" seguin- A tra ma e o tra uma da ap roximação do Rosto dos filh os, precipitado
do o utra via pela qu a l se embrenha ri a a procura do infinito, do filho, que pela a lterid ade no sofrim ento a troz de Carolina, radicalizado pela a usência
já veio e pa rtiu. Afinal, como recorda a escritura de Lya Luft, "Enquanto abrupta provocada pelo suicídio de seu irmão Ca milo 6 , defl agra em seus
Martim virava o rosto para a luz opaca de fora, pensando na mulher, esta co rpos uma ex posição, isto é, uma ex pulsão de si a ponto de restarem in-
se ergueu, inclino u-se: o filho g irava longe, cada vez ma is longe. Deus era a ter(pel)ados o u inspirados a tra nsubsta ncia rem-se em subjeti vida des 1.eró-
Ilha o u era o ma r eterno?" (LU FT, 1991a, p. 131). ri casl para-os-filhos. E esses, que de filh os se tra nsformam em pa is de seus
pais. De ma neira mais radical, tratava-se de serem a lterados por essa dife-
7 1 O inter(pel)ação de um Rosto a todos os outros rostos
rença não-indife rente (LÉVINAS, 1987, p. 210), em substituição daqueles
O ro ma nce não po upa de evidenciar o fato de a pa rtida de Ca milo ter que, ma is do que filhos p róxi mos, se lhes aproxi mavam como estra ngeiros
golpeado a indiferença de Martim, seu pai . Esse se envergonh ara do filho no feminino e no terceiro. E a a lte ridade dos filh os que os inquietava e os
em vida por considerá-lo um afeminado, e em morte, pela sina do fracasso, imp ulsio nava m a não se pertencerem a si mesmos enqua nto pa is, agora, de
de um s uicida, não o bsta nte, nutrisse a espera nça de ser um dia encontra- fato, os arra ncava (pa i e mãe) dessa essência de um a mo r fa mil ia r modelar,
do pelo afeto do filh o. O pa i que, po rta nto, não conseguira ex pressar-lhe pa radisíaco e (hetero)normativo. Eis que esse a mor que nutrira m em vida,
a força de Eros em vida, ago ra, o ex perimentara e o toca ra sensivelmente q ue sonh ara m para si e que o projetavam sobre se us filh os, di zia-lhes ade us.
diante desse leito de morte de Camilo. N esse adeus, o filh o qu e sempre
A no ite subi a, a maré ava nça ndo. O clamor: é a Morte, onde está, aonde
estivera a usente tornou-se próximo de seu pai. De outro modo que Ser, na
levou seu novo escolhi do? O nde, como? Martim se perguntava: o que ar-
diferença da (in)abitação e d a (in)spiração da carnalida de huma na exposta,
rancou meu fi lho de mim e fez dele essa coisa esvaziada, cuja substância não
o Filho, quem sabe, conseguira arra ncar o pa i de s ua a utocomiseração para
a tinjo mais? (LUFT, J 99 l a, p. 85).
incumbi-lo da bondade de cuid ar do Rosto da filh a, Ca mila e do Rosto da
mulher, Renata : "Martim volta ra ao fund o da sa la para espreitar Renata. À g uisa de conclusão, resta assinalar q ue na escritura de Lya Luft, a
Ainda estava preso a ela, recon hecia . Fia pos, farrapos, a taduras soltas de dra ma ti cidade da divina comédia humana se c ump re na diferença sexua l
um a mo r não resolvido enro lava m-se nele. Seu coração esfolado de a mor, congê nita da (des) huma ni da de ina ugurada por Eros (LÉVINAS, 2013, p.
e ele pensara que era ó di o" (LUFT, 1991a, p. 88). 194), c uj a materi a lidade dos corpos e da sensação, não permite passa r ao
Nas pegadas dessa literatura ficcio na l, os pa is de Camil o e de Carolina la rgo do tempo da proximidade do " drama de muitos personagens" (das
foram inscritos no roma nce de Lya Lufr como corpos viscera lmente a feta- ingul a ridades fa milia res) do qual ning uém está protegido e, q ue, por isso,
dos por Eros. Isso não os exime da pa ixão e da morre, uma vez que Eros é os inspirava a (des) naturalizar as relações huma nas arra ncando-as da es-
vivido no embate da cotidia na proximidade e exterio ridade que os enlaça, sência. Daí que a significação da tempo ra lidade em Eros se significa na
tal como o suscita igua lmente a a lteridade e a morte de um filh o. E isso se própria sign ificância de uma travessia que se materiali za na d ife renciação
deve, seja porq ue Martin e Renata carrega m em sua própria ca rne, situa- q ue vai da (in )substituição do sujeito selvagem à substituição do o utro na
ções muito semelha ntes à dos filh os, especialmente ao dra ma dos a mores
frustrados o u das relações incestuosas nada fácil de se enfrentar, seja por- 6. Cf. LÉVINAS,2011 , p.189. Segundo Lévinas, a substituição se justificaria porque, mesmo
no caso de uma covardia, de uma queda no quotidiano e da coragem do suicídio, o sujeito
que, como os fi lhos Camilo e Carolina, ta mbém eles fo ram "acostum ados" encontra-se nas malhas do Ser. Nele, o sujeito, por medo de morrer ou por horror ao há, esta-
ao connatus essendi e à mo rada do Ser (LÉVINAS, 1976, p. 412), à língua- ria certamente ainda mais sob o domínio deles. Tratar-se-ia de alguém substituir-se ao suicida
enquanto ele está mergulhado no inter-essamento da Essência.

l 192 193 1
1 CORPO-EROS-PATHOS 1

encarnação do human ismo do o utro homem (LÉVINAS, 2011, p.1 92). Em


C1ltima instâ ncia, a fissão do núcleo do sujeito (LÉVlNAS, 201 1, p.192) à
qual se submete o eu-corpo diante do rastro do Rosto, se deve ao fato de que,
se em Eros insta ura-se a possibilidade da morte apesa r da sorte, na intriga
com a fe minidade do feminino e no adeus prenunciado pelo te rceiro, o dizer
erótico signi fica-se como um "amo r ma is fo rte do que a morte" no qual a
palavra deus !pode] se significar a si mesma aquando do exílio da própria
exposição do Si feito ca rna lidade dada a o utrem (LÉVlNAS, 20 .ll , p.157).

1 Referências
1V1
CORPO-CARNE-MEMÓRIA
CELAN, Pa ul. A arte poética. O meridiano e outros textos. Lisboa: Co-
tov ia, 1996. LÉVINAS, Emma nuel. No111s propres. Pa ris: Fata
Morga na, 201 4.
_ _ . Hors sujet. Paris: Fata M o rga na, 1987.
_ _ . De outro modo que ser ou para lá da essência. Lis boa : Centro de
Filosofia da Uni ve rsidade de Lis boa, 201 1.
_ _. Eros, Littératu re et philosophie. l nédites, O euvres 111. Paris:
Berna rd G rasset/lMEC, 20 13.
_ _ . Dificile liberté. Essais sur le ju dai'sme. Pa ris: Alb in Mic hel, 1 973 .
LUFT, Lya. O quarto fechado. São Pa ulo: Siciliano, 199 l a .
_ _ .O lado fatal. São Pa ulo: Sicilia no, 1991 b.
_ _ . Reunião de família. São Pa ulo: Sicili ano, 1991c.
_ _ . O exílio . 8ª. ed. Ri o de Ja neiro: Record, 2005 .
_ _ .Para não dizer adeus. 2a Ed . Ri o de J aneiro: Record, 2005 .
_ _. Em outras palavras. Ri o de Ja neiro: Record, 2006.

l 194
Corpo e transcendência
em Primeiras Histórias
Sandra Cava/cante

Não se esqueça, é de fenômenos sutis


que estamos tratando.
J. G. Rosa
A análise da na rra tiva ficcio nal produzida por Guimarães Rosa exige
da quele qu e se propõe a esse desa fio um exercíci o, revol ucionário para os
dias atu ais: lentidão. Essa a ti tude vale para o crítico literá rio, para o pes-
q uisador, para especia listas de á reas di versas, para aq ueles que se propõem
a la nçar sobre o texto alguma lente interpretati va específica (construída em
campos como a Filologia, a Psicanálise, a Filosofia, a M edicin a, a Teologia ).
Essa atitude: a lentidão (o vaga r) é exigida também do leito r "comum" que
- in iciante ou ex periente - se debruça sobre o texto rosiano em busca de
construir sentidos a pa rtir dele.
Este a rtigo deve ser compreendido em termos de reflexões pessoa is de
uma leitora curiosa, inquieta, que não rea liza pesq uisa stricto sensu no cam-
po da literatura, mas se alimenta da experiência de leitura do texto literário
para o enfrentamento dos desafi os existenciais cotidianos e para o próprio
faze r científico (na busca de compreensão de fe nô menos de na tureza disc ur-
ivo-cognitiva como a metáfora, a metonímia e a intertextualidade).
A a ná lise d a ob ra literária, como be m sa bemos, pode cum p rir-se com
base em le ntes inter preta tivas e procedimentos estilísticos e metodo lógi-
cos m uito di ve rsos. Frente ao te ma so b re o qua l me propo nho a re fleti r
neste mo mento - corpo e transcendência em primeiras estórias - optei
por um cam inho particular, à c usta, é claro, de o utros muitos caminhos e
veredas possíveis.

1 1 "Esta é a estória"
Se eu fosse uma pesquisadora do ca mpo dos Estudos Li terá rios e pu-
desse optar por um procedimento estilístico e metodológico preciso, certa-
mente iria ao encontro das lições do mestre Antônio Câ ndido . Como esti lo

241 1
1 CORPO-SINCRETISMOS-HIBRIDISMOS 1
/ CORPO E TRANSCENDtNCIA EM PRIMEIRAS HISTÓRIAS /

ou método para a aná li e d a na rrati va ficcional, opta ri a pela " digressão". Entre essa diferentes concepções, no entan to, parece não haver muira di-
Opta ri a pe lo desvela me nto, em essê ncia, da natureza e da o rga nicidade da vergência no p ress uposto d e qu e a transce ndênc ia, como ex periência hu-
ob ra . ão so u, definiti va mente, uma especialista na esc ritura a na líti ca do ma na, é vivenciada no e pelo corpo .
texto literário, mas, nestas notas de leitura, tomo a liberda de de me inspirar Assim compree ndida, como pa rte constitutiva do hum ano que há em
no velho mestre em busca d e refletir sob re o tema . nó , a tra nscend ência é um a ex peri ência d e natu reza fenomenológica, on-
E tento fazê- lo, como fa z o narra dor construíd o por Rosa em " O espe- ro lógica, a tra vés da qual integra mos, d e fo rma indelével e indissociá ve l,
lho ", conto que nos assombra no meio do ca minh o, no m eio do percurso d iferentes dimensões da vida, na integral idade, nas po tencia lidades e nas
de leitura de Primeiras Estórias: limirações d o nosso corpo. Isso inc lu i a dim ensão sensóri o-perceptual da
realida de física, ran gível e, a um só tempo, a dimensão do indizíve l, do in-
- SE QUER seguir-me, narro-lhe; não um a ave nru ra, mas experiência, a que
me induziram , a lternadamenre, séries de raciocínios e inru içõe .
tangível, do inapreensível pela raciona lidade.
(ROSA, ]. G ., 1962, p. 7 1). Sendo assim, não é di fícil considerar que a transcendência - um a ex-
peri ênci a concreta e natura lmente vive ncia da pelo corpo - pode se r (e é)
O que comparti lho, neste artigo, a partir do exercício d a lentidão, do efeti va mente vivenciada - pelo p rincípio da a lteridade - nos ma is diferen-
vagar, são a lgu ns "raciocín ios e intuições" que decorrem da leitura da obra te ni chos, do míni os, contextos e situ ações d a vida, o q ue inclu i as nos as
Primeiras Estórias, em s ua integra lidade e, em particular, cios contos que vi vênci as no domínio estético, no ca mpo da artes. Isso inclui , é claro, as
"emolduram " a obra: "As Margens da Alegria " e " O s C imos" . experiências que vivenciamos no processo d e leitura d o texto li terá ri o . E
O convite qu e faço ao leitor destas no ras é refletir, por um lado, sobre i so, incl ui mu ito especia lmente, as ex periências qu e vivencia mos no pro-
a experiênci a de transcendênci a qu e a leitura do tex to literá ri o nos permite cesso de le itura da obra d e Guimarães Rosa .
vivenc iar, por o utro, so bre como essa experiência, a lém de rema ti za da, de Qua ndo compreendemo a transcendência, pa rtindo da dimensão se-
referenciada, - de mane ira ma is o u menos explícita, em Prim.eiras Estórias mâ ntica d e sua raiz latina, como a experiência de ' ascender', de ' ir Jlém', d e
- está ram bém mostrada revelada, concretamente d esenha da o u matizada, ' ultrapassa r', de 'a travessa r' o u, ainda, de transgredir, de infringir o u de vio-
no processo de estruturação enunci a ti va da fabu lação rosiana. la r, nos deparamos com uma perg unta implicad a na dimensão morfo-semâ n-
Todos sabemos qu e a busca de compreensão da ex peri ência d a trans- rica ele ses verbos. Tra nscendemos à medida q ue ultrapassamos "o quê" ?
cendência tem raízes profundas, pla ntadas em ca mpos os mais a ntigos e a perspecti va que o pro por adora r, neste momento, a trevo-me a respo n-
férteis da Filosofia e d a Teologia. Como experiência constituti va m ente hu- der esta pergunta, a firm a ndo que transcend emos à medida que a travessa mos
ma na, essa é um a questão que ta mbém ve m sendo, cada vez mais, enfrenta- o que é da ordem do aparentemente previsível e possível à vi d a humana, ao
da (estudada, debatida) por pensadores e pesquisa dores de á reas basta n te co rpo hum ano . Um co rpo qu e é constituído em, pelo menos, cinco d imen-
diversa s do conhecimento, na contemporaneida de. sões: na dimensão bio lógica, ecológica, feno meno lógica, social e c ultura l.
Uma breve busca em redes dig ira is de pesqu isa como Scielo, Research Ao compreender o co rpo hum a no nessas múlti plas e indis ociá-
Cate, A cademia.edu e ou tras, não são po ucos o trabalhos qu e encontra mos veis dimensões, vamos ao encontro da concepção de corpo proposta por
sobre o rema da Tra nscendência, inscritos em áreas como a Antropo logia, a M a rk Johnson (2007), na obra Th e Meaning of the Body: Aesthetics of
Psicologia, a M edicina, a eurociência e, inclusive, a Linguí rica Cognitiva e Human Understan.ding.
a Semi ó tica Cognitiva, á reas às quais me a fili o como pesquisadora.
O corpo huma no possui rodas as cinco dimensões destacadas aci ma, e e le
Frente a esses diferente ca mpos do saber, é fácil s upor qu e nos d epa ra-
não pode ser reduzido a nenhuma de la (ou a dua ou três) . Eu não estou
mos co m muitas, convergentes e diferentes co ncepçõe d e rra n cendência .

/ 242 243 I
1 CORPO-SINCRETISMOS-HIBRIDISMOS 1 J CORPO E TRANSCENDÊNCIA EM PRIMEIRAS HISTÓRIAS 1

conrestando os usos coloquia is de " meu corpo '', " o corpo" e "seu corpo" tido, da mente e da identidade pessoa l. A pa rrir dessa perspectiva humana, a
pa ra nos referir a uma cria rura de carne indi vidual q uando esra mos fa la ndo transcendência consi te na nossa capacidade de, às vezes, " ir a lém " da nossa
de nó mesm o e de o ucro . Cla ramenre, nosso senrido ma i centra l do cermo ituação p resente em aros trans fo rmadores que modi fica m o nosso mundo e
co rpo hu ma no é o co rpo vivo, bi o lógico, ripica menre correlacio nado com a nós mesmos. Isso está ligado a uma percepção de nós mesmos como parre
nosso sentimento de nosso corpo fe no meno lógico. O q ue eu esrou contes- ele um processo contínuo de desenvolvimento huma no, ma is a m plo e mais
ta ndo, e o nde o pe rigo a parece, é q uando romamos nossa noção de senso humano , em que a mudança, a criatividade e o apro fund amenro do se ntido
co mum o u de cearia -po pula r de corpo como base pa ra a nossa visão inteira, são possíveis. A fé, entã o, se carna fé na possibilidade da transformação
fil osófi co, psicológico e religioso, de corpo . O problema, ins isro , é q ue nossa genu ína e positiva que a umenta a riqueza de se ntidos, a harmo ni a entre as
visão si mplisca, de senso comum rende a nos coloca r n um dua lismo, fil osofi- espécies e o fl orescimento, não apenas no nível huma no, mas no mun do,
ca menre e ciencificamence, in usrenrável enrre corpo e menre. O que ta mbém como um processo contínuo ele desenvolvimento criativo. A Esperança é o
rende a red uzir o corpo a um mero objero (.J O H NSO N, 2007, p. 278). compromisso com a possibilida de de rea liza r algum des e cre cimento - não
em a lguma cransform ação escarológica final do mu ndo, mas sim localmente,
Os a rg um entos propostos po r j o hnson visa m fund a menta r as bases na nossa luta e vitória d iá rias. A Graça é a ex periência não merecida do
co rpó reas da produção de sentido, da imaginação e da razão o u, em ou- crescimento tra nsform ado r, apesar das fal has indi viduais o u comun itárias
tros te rm os, as bases do qu e o pesquisador deno mina "estética da com- em fazer com que a coisas melho ra sem. O Amor é um compro misso com
pree nsão huma na " . o bem-estar dos o utros de um modo que tire fo ser humano!, ao menos par-
É com esse co rpo, o nto logicamente múltiplo, que co-constru ímos sen- cialmenre, de s uas necessida des e desejos egocêntricos e a bra o seu potencia l
de respeita r e de cuidar dos o utros e do se u m undo. Nada disso está fun -
tid o na e pa ra a vida, no aqui-e-ago ra, das nossas experiências fenomeno-
da mentado no infini to, mas sim nas possibilidades criat ivas da ex periência
lógicas. É com esse co rpo multidimensio na l qu e tra nscend emos, evolutiva-
huma na finita. Isso nos dá , a cada um de nós, mais trabal hos bons a erem
mente, os limites impostos pelas restrições da nossa própria biofisiologia e
feitos d o que temos condição de real izar em nosso cempo de vida (JOHN-
das regras de na tureza sócio-histórica e cultu ra is em que esta mos necessa- SON, 2007, p. 28 1-282 ).
riamente imersos. É co m esse co rpo que vivemos a experiência 'espiritual'
de t ra nscender ta nto em um a perspecti va vertical quanto na que o filósofo Na perspectiva que adota mos neste momento, tra nscendemos (ultra-
deno mina perspectiva horizonta l da tra nscendência . Sobre essa dupla pers- passa mos, a travessa mos limites) vivendo, em nossos corpos, a tensão da
pecti va, ao discutir a tese de que a espiritua lidade huma na é corporificada, busca de respostas para os para doxos da nossa existência. Entres esses, o
j o hnson a firm a qu e pa radoxo ma io r da ex istência hum a na: a indissociáve l relação entre a vida
e a morte. Atravessamos (tra nsgredimos, infringimos, vio la mos) limites, vi-
A espirirua lidade sempre esreve conecrada à ideia de que somos parte de, ou
vend o - em todas as dimensões do nosso corpo - a tensão de enfrenta r as
podem os estar em relação com, a lgo que rranscende a nossa siruação limi-
in úmeras eme rgênci as desse parad oxo maior. Fazemos isso, no cotidiano
rada , perspectiva ou corpo rificada (enca rnada) . Mas há, pelo menos, duas
co ncepções pla usíveis de tra nscendência . Uma é o que eu c hamo de transcen-
da nossa finitu de, pelo o lhar e pelo ve r, pelo ou vir e pelo escutar, pelo sa-
dência vertical, a suposta capacidade de lo ser huma no ! eleva r-se e derramar bo rear e pelo toca r. Fazemos isso vivencia ndo, em nossos corpos, o flu xo
a sua forma humana finita e " pluga r-se" no infiniro. Ao lo ngo de pratica- contínu o da expe riência de estados emocionais como amo r e ódi o, con -
mente roda a histó ria huma na, o fl agelo da huma n idade tem sido ligado à fi a nça e desconfia nça, empa ti a e desprezo, compaixão e repulsa. E faze mos
nossa finirud e, aquela que cada um de nós ex perienc ia como limitação, fra- isso na busca inesca pável da produção de sentid o, da com preensão das ex-
queza , dependência, a lienação, perda el e sentid o, fa lta de a mo r e a nsiedade peri ências que vivemos, imersos em uma rea lidade física (visíve l, ta ngível,
po r doença e morte. 1... 1 Mas ex iste uma noção d iference de t ranscendência, apreensível) e em sua contraparte metafísica (sensível, inta ngível, indizível).
que podemos chama r de tra11scendê11cia ho rizontal, que reconhece a inesca-
Frente a esses argumentos, podemos nos pergunta r: qual seria a for ma
pabilida de da finirude hum ana e é compat ível com a corporificação do sen-
ma is natural, simples, bio lógica e sócio-culturalmente constitutiva, de o

1 244 245 I
1 CORPO-SINCRETISMOS-HIBRIDISMOS 1 1 CORPO E TRANSCEND~NCIA EM PRIMEIRAS HISTÓRIAS

ser hum a no enfrenta r, no seu cotidi a no, os mistéri os qu e ence rra m a sua das n ossas e moções, no a qu i-agora , a experiênc ia estética, por natureza,
busca d e sentido pa ra as d ive rsas fo rm a de emergência d o pa ra doxo " vida press upõe o ato d e t ra nscender.
e m o rte"? Pelo lento e a tento exercício d e leit ura d o texto ros ia no, no aq u i-e-a -
Ampa ra d o po r re flexões qu e data m da Antig uid a de C lá sica a proce- gora d o p rocesso de leitura, somos cond uzi d os a u ma experiência sensó ri o-
dimentos emp íricos, implementa dos po r estud os qu e se p retend em "obje- perceptua l qu e nos permite vivencia r a um só tem po:
ti vos", no ca mpo das C iências Cognitivas, não é difícil concl uir que uma • um estra nha mento natura l q uanto ao ' modo de narrar' do escri tor,
das fo rm as m a is primiti vas de o ho mem tra nscender os limites do possível que decorre de um tra ba lho estético singul a r co m a fo rma ling uística,
e d o previsíve l, do ta ng ível e cio inta ngíve l, na vida, es tá no a to de narrar. em seu p rocesso de estruturação semâ ntico-lexical e morfossintática;
de fa bu la r a pró pria vida. '
• um empen ho n o sen tid o d e ultra passa r a lógica do ó bvio, do espe ra-
A tra nsce ndência, ass im compreendida, é uma ex periência que pode d o, d o previsível pa ra o desenvo lvime nto da trama encenada;
ser (e é) e feti va mente vivida pelo se r hum a no no ato d e co nta r estórias. E • um movimen to de construção intuiti va, cria ti va, de m ú ltiplos senti-
esse a to tem um a dicção pró p ria. Essa di cção es tá flagrad a nos mitos que dos possíveis pa ra o mergu lho existencia l em q ue, através do pon to
co nstituem as m a is di ve rsas culturas, nas peri pécias e a venturas fantásticas de vista d o na rrad o r, as perso nagens estão imersas e nos mergulham.
cio nosso povo, nos ditad os po pu lares, nos ca usos fa milia res. E essa dicção
está - intencio n a l e di sciplina da mente - p la ntad a, prese rvad a, ma tizada na E como esse " narrar", esse fa bula r, esse ato d e conta r estórias - com-
esc rita literá ri a rosia na. pree nd ido como conc reta e, po rtan to co rpórea expe riência de t ranscendên -
cia - se faz representa r, a presenta r, experie nc ia r na o bra Primeiras Estórias?
O pró prio G . R osa, no contexto de uma lo nga e impo rta nte entrevista,
c hega a fo rmul a r essa tese. Ao assumir-se identita ria m ente " um ho mem do
2 1" Outra era a vez"
se rtão'', n as diferente fa ses e fa ces d e s ua vida socia l (estuda nte, médico,
diplo ma ta, esc rito r), Rosa a firm a: Se nos inspi ra rmos no m odo de ler do mest re Antônio Câ ndido, é pos-
sível pe rcebe r qu e, em Primeiras Estórias, a exp eriência d a tra nscendência
1... 1 nó , os ho mens do sertão, somos fa bul istas po r na tu reza. Está no nosso pode se r flagrada, por se r encenada e, porta n to, revelada, em d uas pers-
sa ngue na rrar estó rias; já no berço recebemos esse dom para toda a vida. pectivas fund a mentais: na n atureza d a obra, em sua temática geral e na
Desde peq ueno , esta mos constante mente escuta ndo as na rrativas multico-
d icção' estilística const ruída pelo escri tor, e na o rganicidacle da obra, ou
lo ridas dos velhos, os contos e lendas, e ta mbém nos cria mos em um mundo
seja, nas relações perceptua is q ue, co mo leito res, pod emos constru ir n o
q ue às vezes pode se asse melh a r a uma lenda cruel. Deste modo, a geme se
ha bitu a, e na rra estó rias q ue correm por nossas veias e penet ra m em nosso
proce so de leitura de cada conto, em particul a r, e a partir d a re lação que
corpo, cm nos a a lma, porq ue o errão é a a lma de eus homens. Assim, não co n eg uimos esta belecer dos contos entre si.
é de estranhar que a gente comece desde muito jovem. Deus meu! No sertão, o q ue tange ao contexto sócio -histórico e político-cu lt ural no qua l se
o q ue pode uma pessoa faze r do seu tempo li vre a não ser contar estórias? inscreve, Primeiras Estórias é um livro qu e foi publicado em l 962. A o bra
A única di ferença é, im plesmcnre, que e u, em vez de contá-las, escrevia se organiza a pa rtir da pu blicação o rigina l dos contos, no deco rrer do a n o
(LO RENZ, J99 l , p. 7 1). de 1960, no jorn a l O Globo. Não po dem os nos esq uecer de q ue 1960, no
Brasil, fo i u m ano ma rcado pela inauguração de Brasíl ia. Este fo i um ano
Se tra nscend em os à m edida qu e, em nossa fin iru de, assumimos o de-
em q ue, na gra nd e mídi a brasileira, os leitores se deparava m com o d iscur-
safi o d e " ir a lém " do aqui-ago ra em busca d e ex peri encia r a tos transfor-
o hegemônico do progresso, da co nstrução de uma cida de q ue, metafórica
ma do res qu e mo difica m o n osso mund o e a nós m es m os e se o ato de
e rnero nimi ca mente, sign ifi cava o futu ro de um Brasil ind iscutivelmente
co nta r estó ri as nos pe rmite ' ultra passa r' os limites im postos pela finitude
feliz, prós pe ro.
d o nossos co rpos, d as nossas ex peri ências sensó ri o- perceptua is concretas,

l 246 247 I
1 CORPO-SINCRETISMOS-HIBRIDISMOS 1 1 CORPO E TRANSCEND~NCIA EM PRIMEIRAS HIS TÓRIAS 1

Em Primeiras Estórias, Guimarães Rosa, o home m do sertão, contador Ao c hega r ao luga r d esejado, o menino encontra um a casa de madei-
de estó ri as, convida o leitor a um a ex peri ência que poderíamos d enominar ra , pequena, próxima da pista de voo; e uma mata, da qual imagina que
como uma "viagem caleidoscópica" . Essa é, certa mente, uma viagem de po deriam sa ir "índios, onça, leão, lobos, caçadores". Nesse luga r místico,
natureza sensório-perceptu a l, sinestésica, que nos permite sempre a cons- misterioso, encenado a partir do ponto de vista do narrador, o men ino vive
trução de novos sentidos possíveis. a experiência do o lhar, do ver, do espiar, do a tentar, do ouvir, do e c urar,
Na experiência de leitura da obra, esta mos di a nte d e um conjunto de sa borear o que a na tureza e as demais personagens lhe apresenta m , lhe
vinte e um contos em que, por dicção, por opção estilística, o escritor cons- revela m e esco nd em.
trói um narrado r (um perfil de na rrado r) que, a d espeito de em perspectiva
O 111e11i110 e as coisas vinham docemente, de repenre, seguindo harmo nia
d e 1 ª o u 3·' pessoa, em essência, pode ser caracterizado como um exímio
prév ia, ben fazeja, em movimenros concordanres: as sa ri sfações a nres da
contador de estórias. E Rosa o faz a través de pa lavras, d e uma linguagem,
consciênc ia das necess idades.
que, a um só tempo: é precisa e contraditó ria; é a rcaica e nova; é legível,
O 111e11i110 deixava-as, fartamente, sobre os joelhos, e espiava: as nuvens de
compreensível e tra nsgressora. a mo nroada a mabilidade, o azul de só ar, aquela claridade à larga, o chão
No conjunto dos contos, a percepção do narrador 'sobre o que se nar- plano cm visão carrognífica, reparrido de roças e ca mpo , o verde que se
ra', sempre em uma perspectiva digressiva, é um convite ao le itor à experi- ia a a marelos e vermelhos e a pa rdo e a verde; e, a lém, baixa, a monranha
ência d a transce ndência. Nos contos, a partir da percepção e do enquadra- (ROSA, 1962, p. 3).
mento de um bo m contador de estórias (maduro, reflexivo), as personagens O 111e11i110 via, vislumbrava. Res pirava muiro. Ele queria poder ver ainda
encenam a busca de se ntid o, a busca de compreensão para profundos pa- mais vívido - as novas ranra s coisas - o que para os seus o lhos se pronun-
ra d oxos existenciais. No conjunto d os contos, nos deparamos com intrigas ciava (ROSA, 1962, p. 4).
que colocam em cena, por parte do narra dor e das personagens, a busca de Mal comeu dos doces, a marmelada , da terra, que se cortava boni ta, o per-
compreender o cotidia no e o insóli to, o tri via l e o fantástico, o particular e fum e em açlÍcar e carne de flor. Saiu sôfrego de o rever (ROSA , 1962, p. 5).
o universa l, o físico e o meta físico. Sem 11e111 poder apanhar com os olhos o acerramcnro - o inaudito choq11e -
Esta experiência - corpó rea, integradora de sentid os, sines tésica - está o pulso da pancada. O 111e11i110 fez ascas. O lhou o céu-atônito de azul. Ele
encenada em um dito e um dizer que se revelam em co nstruções sígnicas tremia (ROSA, 1962, p. 7).
- lexicais, morfológicas, semânticas - que reservam ao leitor o direito à
polissemia, a uma co nstitutiva incerteza de sentidos possíveis. a estória que nos é contada por esse narrador experiente, o niscien-
re, o límpico, imerso em uma profunda experiência sensório-perceptua l e
Quando nos abrim os à experiência de leitura de Primeiras Estórias
emoc iona l, o menino vê um a nima l que ga nha toda s ua a tenção e profunda
pelo conto inic ial , o escritor coloca em cena, como protagonista, através
em patia: um inusitado peru .
do ponto de vista de um na rrador o límpico, on isciente, um Menino que
vive a experiência de uma viagem, de se deslocar no espaço físico, pelo ar e Pelo processo de produção de sentido implicado no ato de ler, em nossa
pela terra. Em "As Margens da Alegria'', a viagem do menino, o seu deslo- pró pria experiênc ia sen ó rio-perceprual, é esse na rrador, qu e tudo sa be,
camento pelo ar, se dá em busca de encontra r os ti os, que moram no lugar q ue tud o vê, qu e tudo sente, qu em nos conduz, pelo ato d e contar a estó ria,
onde máquinas erguem uma cidade moderna. a vivenciar as a legri as e a profunda tri reza do menino: diante de á rvores
que tombam pelo po der de escavadeiras, da desco be rta da s adve rsidade
ESTA É A ESTÓR IA. la um menino, com os rios, passa r dia no lugar onde cio " mundo ma quinal " e da morte aparente do peru no a lmoço d a famíl ia.
se consrruía a grande cidade. Era uma viagem invenrada no fe liz; para ele,
produ zia-se em ca o de onho. Saiam a inda com o escuro, o a r fino de chei- Todas n coisa , urgidas do opaco. uste11tava-se dela sua i11cessw1te alegria,
ros desconhecidos (ROSA, 1962, p. 3). sob e pécie sonho n, bebida em novos a11111e11tos de amor (RO A, 1962, p. 5 ).

l 248 249 I
CORPO E TRANSCENDÊNCIA EM PRIMEIRAS HISTÓRIAS
1 CORPO-SINCRETISMOS-HIBRIDISMOS 1

Talvez não deve se, não fosse por causa dele aquele doer, que põe e punge, Reveladoras de um trabalho isremático, intencional e di sciplinado
de dó, desgosto e dese11ga110. Mas matarem-no, também, parecia-lhe obscu- por parte do Esc ri ro r, essas construções sígnicas (sinestésicas ) m ati za m, em
ramenre algum erro. Senria-se sempre ma is cansa do. Mal podia com 0 que cores e so mbras, pela percepção relata da da pe rsonagem, o ol har (a per-
agora lhe mostravam, 11a circuntristeza: 1---1 cepção) do leiror. Ao sere m confi guradas no dizer e no diro, no processo
Sua fadiga, de im pedida emoção, formava u111 medo secreto: descobria 0 enunciativo do na rra do r e d as pe rsonagens (o menino, o rio, a ria ), essas
pos ível de o utra adversidades no mund o maquin a l, no hosti l espaço, em construções sines résicas, se mantica men te híbridas, entram em cena co mo
que, entre o co11te11tame11to e a desilusão, na balança infidelíssima, quase
fo rm a de revela r ao leitor o mund o físico e metafísico em que narrador e
nada mede ia (ROSA, 1962, p. 6).
personage ns estão imersos. Nas pa lav ras do na rra d o r, a inda:
O 111e11ino, timorato, aquietava-se com o próprio q11ebra11to.
Seu luga r era o da janelinha, para o móvel mundo. Enrregavam-se revista ,
O me11i110 se doía e se entusiasmava. (ROSA, 1962, p. 7).
de fo lhear, quantas quisesse, até um mapa, nele mostravam os ponros em
o processo d e leitura do conto, a dora ndo o po nto de vista do narra- q ue ora e ora e e rava por cima de onde. O Menino deixava-as, fartamente,
do r, pela imaginação, va m os construind o, a um só tempo, o cená rio e as ce- sobre joelhos, e espiava: as nuvens de amontoada amabilidade, o awl de só
ar, aquela claridade à larga, o chão plano e111 visão cartográfica, re/Jartido de
nas e m que o menin o va i expe rimenta nd o, em si, uma tensão corporificada
roças e campos, o verde que se ia a amarelos e vermelhos e a pardo e a ver-
entre a sua alegria sonhosa e o doer, que põe e punge; entre novos aumen-
de; a além , baixa, a mo11tanha. Se homens, meninos, cavalos e bois - assim
tos de amor e a s ua circunstristeza, entre o contentamento e a desilusão.
i1rsetos? Voavam supre111a111e11te (ROSA, 1962, p. 3).
Com a trama de "As Margens d a Alegria" em mente, voltemos à per-
O peru pra sempre. Belo, belo ! Tinha qualquer coisa de calor; 1wder e flor;
g unta que conduz a nossa reflexão neste artigo: como a ex periência da
um tra11sborda111e11to. Sua ríspida grandeza tronituarrte. Sua colorida empá-
tra nscendênc ia - compreend ida em term os de um a co nc reta e co rpó rea ex-
fia (ROSA, 1962, p. 4).
peri ênc ia huma na, implicada na busca de ultrapassar os limites d o possível,
do previsível, po de se r flagra da em Primeiras Estórias? Com base nos a rgu m entos e excertos apresentados até aqu i, e em diá-
o conto, nos deparamos com uma intriga que coloca em cena, por logo com traba lho desenvo lvido por And ra d e (20 12), é possível a firm a r
pa rte do na rrador, a bu ca de compreensão - pela personagem - do próprio que no ato d e ler o conto, a a legria da personagem va i sendo construíd a
cotidia no, mergulh ado entre o trivial e o fantástico, o físico e o metafísico. arravés do uso intencio na l e consta nte, po r parte do esc rito r, d e termos e
Co mo fo rm a d e o menin o co mpreender essa busca, nas palavras expre ões que nos permi tem evocar imagens mulrissensoriais da experi ên-
d o narra dor: cia hum a na de cla rida d e (ra iar; espaço em branco; nuvens; o azul de só
ar; claridade à larga; raios; luz); de felicida de (viagem inventada no feliz;
O menino frem ia 110 acorçoo, a legre de e rir pa ra si, confortavelzinho, com sorria-se; fremia no acorçoo; alegre de se rir para si; um crescer e desconter-
um jeito de fo lha a ca ir. A vida pod ia às veze raia r numa verdade extraor- se); d e sentimento de p roteção (a Tia e o Tio tomavam conta dele, justinha-
diná ria. Mesmo o afivelarem-lhe o cinro de segurança virava forte afago, de
mente; confortavelzinho; afovelarem -lhe o cinto de segurança; fugir vara o
proteção, e logo novo senso de esperança: ao não sabido, ao mais (ROSA,
espaço em branco).
1962, p. 3).
O mesmo ocorre no ato de ler "Os Ci mos", conto que encerra a obra.
Como é pos ível percebe r pela imagens construída a través da poética Nesse, a percepção do na rrad or sobre o que se na rra, em um a perspecti va
narrativa d o escritor, a expe ri ência d o Menino - co rpó rea, integradora de digressiva, também é um con vi te ao leitor para uma concreta e particular
sentid os, si nesté ica - está revelada em um d iro e um di zer q ue se estruturam expe ri ência m u 1tissensoria1.
co m base em co nstru ções sígn icas - lexica is, mo rfológ ica , semâ nticas - Em " O s C imos", a pa rtir da percepção e do enqu a d ra mento de na rra-
que reserva m ao leitor o d ireito à po li ssemia, à incerteza dos sentidos. do r qu e o pta mos por caracte ri za r com o ' um maduro contador d e estórias',

251 1
l 250
1 CORPO-SINCRETISMOS-HIBRIDISMOS 1 1 CORPO E TRANSCENDÊNCIA EM PRIMEIRAS HISTÓRIAS )

da m es ma form a com o ocorre em "As ma rgens da Alegri a", o M enino en- E o menino estava muito dentro dele mesmo, em a lgum ca minho de i. Es-
cena a busca d e sentid o pa ra o pa ra d oxo ma ior d a vida huma na: a rela- ta va m uito pa ra trás. Ele, o pobrezinho sentado. O q uanro q11eria dor111ir.
A gente devia poder parar de estar tão acordado, quando precisasse, e ador-
ção entre vida e mo rre. E o fa z, encena nd o, na perspecti va d o narrador, a
mecer seg11ro, salvo. Ma não d ava conta. Tinha de tom ar a abrir de111ais os
a ng ústia d a qu ela alguma coisa, maior que todas, que podia acontecer: a
olhos, à nuvens que ensa iam esculturas efêmeras.
mo rre d a m ãe.
Sou besse q ue um dia a mãe tin ha ele adoecer, então teria ficado sem pre ju11to
N o processo de leitu ra d e "Os C imos'', pe lo exe rcício da imaginação, dela, espiando pa ra ela, com fo rça, sabendo muiro que e rava e q ue espiava
emba rca mos com a personagem n a ex peri ênc ia de via ja r nas alturas, de com ta nta fo rça, a h. (ROSA, 1962, p . 169).
av ião, nova mente pa ra o luga r em que muitas muitas m il pessoas faziam a
grande cidade. Pa rtind o d esse in verso a fa sta mento d o sentido d a al egri a, em ce nas
construídas a pa rti r d a perspectiva d o na rrad o r, co mo le itores, so mos leva-
N a tra ma encena d a, co mo leitores, co m a a tenção o ri enta da pelo pon-
dos a o lha r e ve r, a o uvir e escuta r O aparecim ento do pássaro, O trabalho
to d e vista d e um na rrad o r que tudo vê, que tudo sa be, vivemos com 0
do pássaro, O desm edido m om ento.
M enino não ma is a ex pe riência de uma vi agem inventada no feliz, mas de
uma viagem com o co rpo aturdido, tropeçante, cansado, pela d oença e pela E o tuca no, o voo, rero, lento como e voou embora, xô, xô! - mirável,
mo rte iminente da m ãe. cores pairantes, 110 garridir; fez so nho. Mas a gente nem pode ndo esfria r de
ver. Já para o o urro imenso lad o a po nrava m .
Dessa vez, à lu z do po nro de vista d o na rrad o r, va m os construindo
co m e como o menino, uma viagem m a rcad a pelo med o, pelo susto, pelo'
De lá , o sol q ueria sa ir, na região da esrre la-d 'a lva. A beira cio campo, e c ura,
com o um mu ro ba ixo, q uebrava-se, nu m po nto, do urad o rombo, de bordas
possíve l cho ro, pe lo sofrim ento que lhe formavam avesso - do horrível
estilhaçadas (ROSA, 1962, p. 172 ).
do impossível.
A to rna da d o pá sa ro era emoção enviada, impressão ensívcl, um tra ns-
OUTR A ERA A VEZ. De sorre q ue de novo o men ino viajava para o lugar borda mento do coração. O menino o g uardava, no fug id ir, de memória, cm
o nde as m ui tas mil pessoas fazia m a gra nde cidade. Vinh a, po rém, só com fe liz voo, no ar so11oro, a ré a ta rde. O ele q ue pod ia se servir para consola r-se
o rio, e era 11111a íngreme partida. E11trara at11rdido 110 avião, a esmo trope- com , e desdo lo rir-se, po r escapa r do ape rto de rigor - daqueles dias quadri-
ça nte, en rolava-o de po r denrro um estufo co mo ca n aço; fi ngia a penas que culados (ROSA, 1962, p. 174).
so rria, q uando lhe falavam. Sabia q ue a mãe csrava d ocnrc. Po r isso o man-
O meni no so rriu cio que orriu, con fo rme ele repente se sentia: para fora cio
d ava m para fo ra, decerto por demorad os d ias, decerto porque era preciso.
caos pré- inicia l, fe iro o dcscng loba r-sc de uma nc bulo a.
O 111e11i110 cobrava l/laior 111edo, à medida q ue os o urros ma is bo ndosos para
E era o inesq uecível dc-repcnre, de q ue pod ia rraspassa r-sc, e a ca lma , inclu-
com ele se mostrava m . Se o rio, g race ja ndo, an imava-o a espi a r na janelinha
sa. D urou um nem-nada, co1110 a palha se desfaz, e, no comum, na gente não
ou escolhcr as revi ras, sabia q ue o rio não e ra va de todo incero. Outros
s11stos levava. Se encaras e pensamcnro na lem bra nça da mãe, iria chorar. ca be: paisagem , e t11du, fora das molduras (ROSA, 1962, p. 175).
A 111ãe e o sofri111e11to 11ão cabia111 de 11111a ve:::. 110 es1Jaço de instante, for-
Em " O C imos'', um a e pécie d e co ntra pa rte de "As Ma rgens da Ale-
mavam ave so - do horrível do impo ível. Nem ele i so e ntendia, tudo se
gria " , o Me nino vive a ex pe ri ênc ia d a tra nscendênc ia, em um a a ltern â nc ia
rra nsrornanclo cnrão cm sua ca hecin ha. Era assim: alg11ma coisa, maior que
todas, podia, ia acontecer? (ROSA, 1962, p. 168) . paradoxa l de sen açõe , pe rcepções e emoções, enrre o fega ntes noi tes e um
dourado a ma nhece r; enrre o a pego e o d esa pego ao q ue lhe é belo, ra ro;
O co nto, di vido em q ua tro pa rtes, se inicia po r um inverso afastamento enrre o de ejo d a vida e a recu a d a mo rre.
d o M enin o de "As Ma rgens da Aleg ri a", em s ua a titud e de a bertura para o o do m íni o fi ccio na l, no a qui-e-agora d o aro de ler "Os C imos " ,
novo qu e cad a desco berta lhe reservava. assumindo com o nos o o o lha r d o n a r rador, (re)con rru ímo , em um

l 252 253 I
1 CORPO-SINCRETISMOS-HIBRIDISMOS 1 1 CORPO E TRANSCENDÊNCIA EM PRIMEIRAS HISTÓRIAS 1

entrelaça me nto mu ltissensorial, a expen encia de ve r, ouvir, tocar, perce- cm uma incxtricável e paradoxa relação entre a experi ência natural e a
ber e sentir do M e nino, a través da (re)construção d e sensíveis imagens ex pe riência maq uinal. Essa ex periência pode ser flagrada através da ma-
meta fó rico-si nestésicas 1• neira como, por exemplo, a imagem metafóri ca do jeep é construída nos
do is contos.
O a lpendre era um passadiço, entre o terreirinho mais a mara e o extenso
o utrolad o - aquele escuro campo, sob ra sgos, neblinas, feiro um gelo, e os Ia m de jeep, ia m aonde ia ser um sítio do lpê. O menino repetia e m íntimo
perolíns do o rval ho: a ir até a fim de vista, à linh a do céu de este, na extrema o no me de cada coisa . A poeira a lvissa reira. (... ) A cobra-verde atravessando
do horizonte. O so l a inda não viera. a estrada. A arn ica: em candelabros pá li dos. A aparição angélica dos papa-
Ma s a cl a ridade. Os cimos das árvore e douravam . As a lras á rvores depois gaios. As pirangas e seu pinga r. (... ) A tropa de seriemas, além, fingi ndo, em
do terreiro a inda mai verdes, do que o orval ho lavara. fila , índio-a-índi o. O par de ga rças. Es a pai agem ele muita largura, que o
Entreman hã - e de tudo um perfume, e passarinhos piando. g rande sol alargava (ROSA, 1962, p. 5 ).
Da cozinha, trazia m café (ROA, 1962 p. 17 1).
Tam bém não dava vontade sa ir de jeep, com o rio, se para a poeira, gente e
Por a li, se bala nçou para cima , suave, aos lige iros vaga rinhos, o meio-sol, o terra (ROSA, 1962, p. 170).
d isco, o liso, o sol, a luz por tudo. Agora , era a bola de ouro a se equilibrar
O dos outros, não da gente. As acudidelas do jeep form ava m o aco ntecer
11 0 azul de 11111 fio . O tio o lhava no relógio.
ma1 egu ido (ROSA, J 962 , p. 173).
Ta nto tempo q ue isso, o menino nem exclamava . Apanhava com o olhar
cada sílaba do horizonte (ROSA, 1962, p. 172). O jeep corria po r e tradas de não pa rar, sempre novas. Mas o menino, em
cu ma i forre coração, decla rava, só: que a mãe tinha de ficar boa , tinha de
Havia o tucano - sern jaça - em voo e pouso e voo. De novo, de manhã,
ficar salva! (ROSA, 1962, p. 173 ).
se endereçando só àquela <Írvore de copa a lra, de espécie chamada mesmo
tucaneira. E dand o-se o ra ia r do dia, seu fôlego dourado. Cada madruga- Entrercmpo, se arrasava numa a udadc, fiel às coisas de lá. Do tuca no e do
da, à horínha , o tucano, gentil, ru111oroso: ... chégochéghégo ... - em voo a man hecer, ma rambém de tudo, naqueles dias tão piores: a casa, a gente, a
direto, jazido, rente, traçado m acio 110 m; q ue nem um na viozinho verme- mata, o jeep, a poeira, a ofega ntes no ites - o que se afinava, agora, no qua-
lho sac udindo devagar as velas, puxado; tão ce rro na plana como se fosse e-azul de seu imaginar. A vicia mesmo, nunca parava (ROSA, 1962, p. 175).
um ma rreq uinho desliza ndo para a frente, po r sobre a lu z de dourada água Como e ele estive se com a mãe, sã, sa lva, sorridente, e rodos, e o macaqui-
(ROSA, 1962, p. 173). nho com uma bo ni ta gravara verde - no a lpendre do terreirinho das alta
á rvo res .. e no jeep aos bo ns sola vancos . .. e em toda-a-parte .. , no mesmo
Elemento estilístico fundamental da escrita rosiana, no co njunto dos instante ó .. . o primeiro ponto do dia .. , do nde assistiam, em tempo- o b re-
contos que constituem Primeiras Estórias, as personagens corpori fica m, a rernpo, a o sol no rena cer e ao voo , a inda muito mais vivo, entoa nte e exis-
um só tempo, rotinas, valores e tensões comuns a uma cultura predomi- tente - parado que não se acabava - do tucano, q ue vem comer fr utinhas
na ntemente rura l, serta neja . Essa cultura pode ser flag rada em um cená- na dourada copa, nos altos va les da aurora, a li junro de ca a (ROSA, 1962,
ri o desenhado em dife rentes espaços e ma ti zes. No â mbito da ex periência p . 175- 176).
natural : a mata, a casa, o quinta l, o rio, a estrada, o terremoto, o mar. No
Nos excertos anteriores, é possível notar que o movimento da per ona-
â mbito de uma "experiência maquin al": o av ião, a escavad eira, o trem, o
gem no jeep (ca rro, máq uina), em um cenário natural (poeira , cobra-verde,
barco, o carro.
arnica, pitanga) reflete, como em um espelho, o seu movimento interio r.
Em "As ma rgens da Aleg ri a" e "Os Cimos", em partic ul ar, as sensações, O jeep levava o menino onde ia ser um sítio; o nde haveria poeira, gente
percepções e emoções da personagem protagonista, o menin o, se constroem
e terra; o nde haveria estradas sempre novas. E nesse de loca mento entre
um lugar e o utro, o jeep levava o menin o, e m sua percepção e emoções, à
1. Sobre o assunto, conferir MARI (2014). desco berta do novo do desconhecido, cio o utro .

/ 254 255 /
1 CORPO-SINCRETISMOS-HIBRIDISMOS 1 1 CORPO E TRANSCENDÊNCIA EM PRIMEIRAS HISTÓRIAS 1

Em cada conto, em um cenári o de fundo em que entrelaçam-se a expe- 3 1 Chegamos, afinal!


ri ência natural e a experiência ma quinal - sob um enquadramento sensório-
Através das reflexões sistematizadas neste a rtigo, gostaria de me fazer
percepcual, mecafórico-sinescésico - as personagens de Primeiras Estórias
compreender na defesa de uma tese: a a rre, a litera tura em pa rticular, é
são construídas de forma a encenar, na busca de sentido pa ra a vida, um
um luga r privilegiado pa ra vivermos - corporea mente, concretamente - a
encontro com um "outro" que lhes é, sempre, ma is ou menos, fami liar: o
travessia e a tra nsgressão dos limites esta belecidos pelo possível e pelo pre-
cio, a mãe, a filh a, os vizinhos, o pai, os irmãos, o a migo, o padre, o médico,
visível em nós mesmos, em nossos atos, em nossas ações cotidia nas.
o representante do governo, o navega nte, os a nima is.
As refl exões compa rti lhadas neste a rtigo, em grande medid a, fa zem
Nos contos "As Margens da Alegria" e " Os Cimos" , remos represen-
eco a uma tese defendida po r Morais (2012), uma d as ma is reconhecidas
tada, entre o utras, uma estreita e especial relação de a lte ridade e, nessa
leitoras da prosa ficcion a l rosiana:
medida, de transcendência horizontal (JOHNSON, 2007), entre o Menino
e o tio, entre o M enin o e um peru, entre o Menin o e um tucano. Em todas as formas de fi cção a querere m dar conta do desejo e da imagi na-
ção, a literatura é, indubitavelmente, a expressão mais rica. Assi m, para além
Mas: não. Não por simpatia companheira e sentida o peru até a li vie-
de ter uma função catártica ou projetiva no âm bito da experiência humana,
ra, certo, a traído. Movia-o um ódio. Pega va de bicar, feroz, aq uela outra
lega ndo a cada um de nós, fa ntasias compensatórias de nos percebermos
ca beça. O menino não entendi a . A maca, as mais negras á rvo res, era m um
criativos, criado res e possibi lidades imaginárias de adiar a dor e privilegia r
montão dema is; o mundo. o prazer, a literatura , é, ela me ma, o mais que nos ha bi lita a tratarmos as
o utras formas de ficção, incluindo-se aí toda e qua lquer ma ni festação de
Trevava. Voava, po rém, a luzinha verde, vindo mesmo da mata, o primeiro
vaga lume. Sim , o vaga lume, sim, era lindo ! - tão peq uenino, no a r, um ins- linguagem. (MORAI S, 2012, p. 7).
ta nte só, a lto, distante, indo-se. Era, outra vez em q11ando, a alegria (ROSA,
N o aro de ler uma o bra ficcio nal como Primeiras Estórias, po demos
1962, p. 7).
ver representada e, nessa med ida, expe rimenta r a energia c ri ativa da pró-
::·
pria vida. Aquela que nos permite vivencia r, em nosso co rpo, sinestesica-
(... ) d onde assistia m, cm tempo- o bre- rempo, ao sol no rena cer e ao voo, mente, concreta mente, o direito à incerteza, à mescla e à multiplicida de de
a inda muito mai vivo, entoa nte e ex istente - parado que não se aca ba va sentidos, que a litera tura nos reserva.
- d o t11cano, que vem comer frurinh as na do ura da copa, nos a ltos va les da O processo de leitura de um a obra li terária, da ob ra de G. Rosa e de
aurora , a li junto de ca a .
Primeiras Estórias, em pa rtic ul a r, desencadeia e m nós um a espécie de luta
Só aq uilo . Só tudo.
interna, pessoal, s ubj eti va . Essa é uma luta pela qua l o leitor precisa passa r
- "Chega mos, afina l! " - o rio fa lo u.
pa ra viver, à sua maneira, as po sibilidades de se ntido que cada co nto gua r-
"Ah, não. Ainda não .. . " - respo ndeu o menino.
da em si - em seu mo do de ser contado, em suas cenas e cená rios, em suas
Sorria fechado: sorrisos e enigmas, seu . E vinha a vida (ROSA, 1962, p. 176).
personagens e nos dra mas que essas encena m.
No aro de ler, com a devida lentidão, o conjunto dos contos e, par- A leitura dos contos de Primeiras Estórias, indi vid ualmente o u pelo
ti cul a rmente, os contos que emoldura m a o bra Primeiras Estórias, aqui diálogo que podemos estabelecer entre eles, na integra lidade da obra é uma
(re) to mados de forma breve, à luz da encenação construída pelo na rra dor experiência que, ac redito, po de contribuir para a tiça r, para assoprar, aqui lo
ro ia no, por empa tia, vivemos, conc rera e corpo rea mente, as ex pe riências que To lentino (2014), em se u Mística d o Instante, a po nta como profund o
sensório-perceprua is de um a pe rsonage m, que, em eu cotidia no, visível e desafio para o ho mem contempo râ neo: "voltar aos sentidos, redescobrir
in vi ível, fís ico e imaginá ri o, busca ultra passa r o limites do possível e do o caco, regressa r ao pa ladar, revisitar o o lfa to, retorna r à a udição, a brir a
previsível pa ra si mesmo. visão" . E isso, sem temer.

1 256 257 1

>
1 CORPO-SINCRETISMOS-HIBRIDISMOS \

1 Referências
Provocações "eucarísticas" nos hibridismos
do corpo em Viva o povo brasileiro
ANDRADE, Dênia Moreira. A H ora e Vez do(a) Menino(a), em contos de de João Ubaldo Ribeiro
Primeiras Estórias, de Gu imarães Rosa. Dissertação ap resentada ao
Programa de Pós-Grad uação em Letras da Pontifícia Universidade
Geraldo De Mori
Católica de Minas Gera is. Belo Horizonte, 20J 2.
CANDIDO, Antonio. A Educação pela noite e outros ensaios. São Paulo:
Ática, 1987. João Ubaldo Ribeiro é, sem dú vida, um dos auto res que melhor enca r-
JOHNSON, Mark. Th e Meaning o( the Body: Aesthetics o( Human Un- na o "sincretismo-hibridismo" na literatura brasilei ra do fin al do século
derstanding. Chicago: University o f Chicago Press, 2007. XX . Sua obra, Viva o Povo Brasileiro, retoma boa parte do itinerário da
literatura nacional que se debruçou sobre esta questão, tornando-se, po r
LORENZ, Glinter W. Diálogo com Guimarães Rosa. ln: COUTINHO, isso, passagem obrigatória pa ra quem se pergunta sobre "o que faz o bra-
Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. 2" ed., Rio de Janeiro: Civiliza- sil, Brasil ?", como o faz Roberto DaMa rra em obra de 1984. O texto aqui
ção Brasileira, 199 l . proposto retoma a questão dos sincretismos-hibridismos do corpo nesta
MARI, Hugo. Sinestesia e Metáforas. Scripta . Dossiê temático: Linguagem, obra de João Ubaldo Ribeiro. Seu viés é mais teológico. Por isso, iniciará
Cognição e Discurso. CAVALCANTE, Sandra; ABRANTES, Ana M.; com uma reflexão sobre o que são a " provocações eucarísticas" presentes
SOUZA, A. L. (Org). V. 18, n. 34, p. 257-282, 2014. na existência humana, as quais se inscrevem de muitas maneiras na imagi-
nação poética e literária, tornando possível o diálogo entre a teologia e a
MORAIS, Márcia Marques de. Ensino de/com literatura. Abertura de En-
potência criadora da arre poético-literá ri a, que será objeto da segunda par-
foque Letras. Belo Horizonte: PUC Minas, 20·12.
te do texto, consagrada à lei tura e aná lise da obra de João Ubaldo Ribeiro.
PACHECO, Ana Paula . Lugar do mito: narrativa e processo social nas Pri-
meiras Estórias de Guima rães Rosa. São Paulo: Nankin, 2006. 11 O "eucarístico" da existência
ROSA, João Guimarães. Primeiras estórias. Rio de Janeiro: Nova Frontei- A euca ristia recorda de imediato o ritual litúrgico pelo qual os cristãos
ra, 2008 . fazem memória da última ceia de Jesus, na qual "ele tomou o pão, aben-
çoou-o, deu graças, o partiu e o deu aos seus discípulos dizendo: to mai e
TOLENTINO, José. A Mística do instante: o tempo e a promessa. Portu-
comei, isto é meu corpo, dado por vós. Fazei isto em memóri a de mim "
ga l: Paulinas. 20J 4.
(Me 14,22; Mr 26,26; Lc 22, 19; l Cor 1 J ,23-24 ); em seguida, "ele tomou o
cálice, deu graças, passo u-o aos discípulos e disse-lhes: toma i e bebei, este é
o cálice da nova aliança no meu sa ngue, que será derramado por vós e pela
multidão para o perdão dos pecados. Fazei isto em memória de mim" (Me
14,23; Mr 26,27-28; Lc 22,20; l Cor 11 ,25) 1• Esse gesto ritual , que lembra
o sentido que Jesus reria dado à sua morte de cruz, que aco nteceu no dia

1. As referências bíblicas do texto foram tiradas da Bíblia de Jerusalém.

259 I
\ 258
Conclusão
Os organizadores

Após as ex pla nações e de ba tes das mesas redondas no li Colóq ui o


lnte rfaces, uma conclusão e me rgiu com basta nte vigor: a co nstituição de
s i através de uma teopoética inclusiva do corpo desborda no desejo de
uma relação a morosa. Tra ta-se de um a escrita/le itura que potencia li za
uma reela boração das identidades do sujeito, individuai s o u socia is, "gra-
ças à prox imidade de o utre m que inspira, instiga e escava se u corpo para
outrem " (N ilo Ribe iro Junior ). Desta fo rma, " f...] será a travess ia pela
a lreridade qu e d esembocará no amor vivido e partil hado. Essa travessia
qu e te rmin a no gozo da reciprocidade cor res po ndid a e ple na, passa rá, no
entanto, por mo mentos adversos, de silê ncios, de dura s esperas f...J va i
di ze ndo ao longo do roma nce qu e o corpo do ou tro é um mis té ri o a se r
decifrado, com pac iê ncia, carin ho e ge nerosidade" (Maria C lara Binge-
me r) . Po r isso, "a críti ca [literá ri a ! ge ra lmente ressa lta o caráter de liber-
tação do a to de a mar [ ...J: no fin a l, há um sa ldo sempre positi vo, a inda
qu e a expe riê ncia a morosa seja efê me ra, ma oco rreu, fez-se p resente e
marca nte durante o te mpo (ainda qu e pouco) da ação e do envo lvimento "
(Lea ndro R odrigues Garcia).
Tal a bo rdagem, reiterada em todas as mesas redo nd as, viu-se, po rém,
aco mpa nhada de uma dupl a ponderação. Po r um lado, é c rucial nã o di s-
socia r a releitura d o pathos da corporeidade, promovida no di á logo en-
tre lite ra tura e teologia, de um a contextu a li zação histó rico-cu ltura l. Afi-
na l, roda e crita e leitura ão pro movidas em contexto específicos, que
por vezes a tingem a condição de situações-limite. justa mente po r isso, o
11 Colóq ui o Interfaces pe rspecri vo u o deba te a partir de "obras de língua
po rtuguesa", denotando um a plural relação identitária, en vo lve ndo inter-
c ultural idade e podere . Mostra-se impo rta nte de tacar que ta l co ntex tua-
lização não implica em um reducionismo histó ri co, qu e esvaziaria o po ten-
cia l mu lriper fo rm a ti vo de um texto (lite rá ri o, relig ioso o u teológico), muito
pelo co ntrá rio : nas prá ti cas de leitura e escrita, a experiência encetada no
tempo presente entremeia- e a memó ri as passadas (re sig nifica nd o-as) e a

285 I
b
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1 1 CONCLUSÃO 1

expectari vas de fururo (despertando-as, redirecionando-as, refurando-as). resposta possível, face ao desmantelamenro de quaisquer outros projetos
Nos texros lirerá rios e reológicos, as instâncias "passado", " presente" e alrernati vos dianre de poderes demasiada menre opressivos, a escrira acerca
"furu ro" o peram de maneira intercambiável, suscira ndo bem ma is a simul- do pathos corpóreo pode conferir uma voz a distintos agences, reconhe-
ta neidade do que a sucessão. cendo neles uma dignidade a ntropológica (inerente ao pertencimento ao
De fo rma concomita nce, mosrra-se fundamental arricu lar ta l inteligibi- humano), histórica, sociopolírica (SELIGMANN-SJLVA, 2008, p. 66) e,
lidade com a atribuição de uma conoração polírica à prática auroral aos su- acrescenre-se, sacra!. E esta operação mosrra-se ainda mais releva nte quan-
jeiros (q uer por sua escrira, quer por sua leirura ressignificance dos texros), do se rrata de indivíd uos e grupos não letrados, que foram submeridos aos
através da qual eles arribuem novos sencidos à sua rrajerória biográfica, mais diferences tipos de e poliação (GINZBURG ln : SALGUEIRO, 2011).
indissociável de sua corporeidade. Observe-se que, no rempo presente, as Em suma, é crucial não dissociar o a inreligibilidade do pathos corpó-
vivências coridianas "t... l aponram para uma desconsrrução da caregoria reo, na inrerlocução reologia-literatura, da questão dos sujeitos que so frem,
de pessoa, o que leva à exploração das mais diferences fo rmas do impessoal amam e creem:
e/ou do anonimato, vivenciando e inrerrogando a intensidade de uma vida
O diá logo, e diria ma is, uma certa cumplic idade entre a vivência teológica
que é irred urível a um eu e ao indivíd uo. Nes as práticas, as noções de su- e as rea lizações da litera tura (nas suas d iferentes fo rmas de expressão: o
jeiro, de indi víduo e de subjeri vidade - ranro como a própria noção de uma romance, a poes ia, o teatro, o c inema, a música,) se torna cada vez mais im-
experiência que apa receria arrelada a essas noções - parecem rer sido subs- portante e urgente para a teologia (e os q ue dela dependem como as Igrejas
riruídas por fig uras diferences, obrusas às vezes, barrocas, que se revelam e suas múlti p la man ifestações pastorais), po is a mbas se a limenta m da me-
com certa dificuldade, erranres em alguns aspecros, apa ixo nadas" (Leandro mó ria mítica e dos sonhos utópicos q ue, hoje, tornam a vida minimamente
Garcia Rodrigues) . Daí a importância de que o sujeiro possa reinventar-se supo rtável para milhões de homens e mu lheres, povos inteiros, colocados na
através de sua escrita e de suas leiruras, alçando com isso seu corpo a pa- condição ele proscrito (excluídos) ela rea lizações socioeconô micas e políti-

tama res inusitados (e, porranto, " rranscendentais" - de silenciamenro, de cas da modern idade ocidenta l (DIAS, 201 1, p. 13-14; p. 27-28).

glorificação, de aniquilamenro ... ): "Nesra reopoérica, o sujeito é o sujeito Quem abe, ral inrerlocução entre reologia e lirerarura, mediada pelo
poético. A redução do campo semânrico religioso - quase a usenre no que pathos da corporeidade, não venha a conrribui r para o delinea r de um
respeita à nomeação do divino - não corresponde somenre a uma estética singula r humanismo crisrão, disrinro da ótica uni ve rsa lisra que perpassou
minimalista, que tende apofarica mente para o silêncio anre o mistério, mas ral abordagem desde a emergência dos tempos modernos? Ta l humanismo
di z também respeito a uma inruição do mesmo a partir de uma autonomia acionaria, como critérios de senrido, a prática de urna enunciação amorosa
-filial" (José Pedro Angélico) . com a alteridades, em li nguagens perpassadas pela corporeidade. Com
Trata-se, assim, de produzir um " pensamenro poético teológico" que isso, a antropologia reológica teri a melhores condições para dialoga r com
promova " um modo peculiar de desvelamenco de sencido do dado reve- as cu lruras e a reflexão acadêmica conremporâ neas:
lacional, naquilo que se propõe como teoparodiceia, ou seja, como a her-
menêutica da experiência de Deus (Theós ) corrobora para um processo de Po rque o sagrado não é, ou não é apenas, o religioso oposro ao profano.
É ta mbém e antes de tudo - como, a li á , se cnrendc cm francês - aquilo
subjetivação (pa thos) responsável (diké), pessoal e socia l" (VlLLAS BOAS,
pelo qual nó poderíamos sacrifica r, a rriscar o u me mo dar a vida. Resposta
2016, p. 62). Esre aspecro érico-político susrenta-se ainda na faceta ilucio-
para a imensa maiori a de nós: foi o se r humano que se rornou sagrado pa ra
nária compartilhada pelos textos teológicos e literá rios, segundo a qual
nós, a começa r, certamen te, por aquele que é sacrali zado pelo a mor o u pela
o dizer já consiste em um fazer e em ser. Isto ocorre porque mesmo nos amizade; o parente, mas também eu contrá rio, o próx imo. 1... 1 vivemos o
casos em que tais relatos consistam em expressões de denúncia como única nasci mento de uma nova fase do humanismo, que não é ma is o el e Voltaire e

l 286 287 I
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1

o de Kant, dos dire itos do ho mem e d a razão, daquelas Luzes que certamente Apresentação dos autores
foram portadoras de um vasto projeto de ema nc ipação, m as qu e co nduzi-
ra m ta mbém à colo nização e ao imperia li mo.
Trata-se de um huma nismo pós-co lonial e pós-metafísico, um humanismo
da transcendência do o utro e do a mo r (FERRY, 2015, p. 106). j osÉ T OLE TINO CALAÇA M ENDONÇA é sacerdo te cató lico e poeta. Nasceu em 15 de de-
zembro de l 965, em Madeira, Po rtuga l. Ordenado presbítero em 1990.
Deixa-se ta l sugestão como um convite para que, em 2019, venhamos
Titulou-se em mestre em C iênc ias Bíblicas, em Ro ma. Ing ressou na Uni-
a promover o III Colóq uio Interfaces pensando as cond ições inter-humanas
ver ida de Católica Po rtug uesa, o nde lecio nou He bra ico e C rist ianismo
da sacralidade, num diálogo entre a corporeidade, a teologia e os demais
e C ultura. Aí ta mbém concluiu o doutorado em Teologia Bíblica. Dirige
sa beres que evocam a experi ência de amar.
o Secretariado Nacio na l da Pasto ra l da C ultura e a revista Didaskalia.
Em dezembro de 201 1, foi no meado consul tor do Conselh o Po ntifício
da C ultura. É ta mbém poeta , ensa ísta e tradutor. Foi la ureado com o
prémio Cidade de Lisboa de Poesia, em l 998, e com o prémio PEN C lu-
1 Referências be de Ensa io, em 2004. Últimas o bras publicadas: O tesouro escondido
(Pa uli nas, 20J 1 ); Pai-nosso que estais na terra (Pa ulinas 20 11 ); N enhum
DIAS, Zwinglio M . D esvela ndo Deus nos entremeies da vida ... (Algumas caminho será longo (Pa ulin as, 20 12); O hi/JO{JÓtamo de Deus (Pa ulinas,
notas sobre o diá logo da teo logia com a literatura a pa rtir da pros- 20 13); A papoila e o mo nge (Assírio & Alvim, 2013); A mística do ins-
crição). Reflexus: Revista semestral de Teologia e Ciências das Reli- tante (Pa ulinas, 2014 ); A leitura infinita, (Paulinas, 2014 ); A construção
giões, v. 5, n. 6, p. 11-29, 2011. de j esus (Paulinas, 2015).

FERRY, Luc. A inovação destruidora: Ensa io sobre a lógica das sociedades ANTONIO GERALDO CANTARELA é graduado em Filosofi a pela Faculda de Dom Bosco
modern as. Ri o de j aneiro: Ob jeti va, 2015. ( 1975), em Teologia pela PUC-Minas ( 1979) e em Comunicação (Re-
lações Públicas) pe la PUC-M inas (1986). Mestre em Letras (Litera tura )
GINZBURG, Jaime. Li nguagem e trauma na escrita do testemunho. ln:
pela PUC-M inas (2003) e doutor em Letras (Litera tura) por esta mesma
SALGUEIRO, Wilberth Clayton. (Org.) . O testemunho na literatura. Uni versida de (2010). Atua lmente é professor adjunto da PUC Minas e
Representações de genocídios, ditaduras e outras violências. Vitória: professor titula r do Instituto Santo Tomás de Aquino (ISTA), a tua ndo
Edi tora da UFES, 201 1. principa lmente nos seguintes temas: na rra tivas sagradas, literatu ra, teo-

SELIGMANN-S ILVA, M. Na rra r o tra uma - A qu estão dos testemunhos poética e filosofia da ling uagem. Professor do Progra ma de Pós-gradua-
ção em Ciências da Religião da PUC-M inas. Membro de corpo edito ria l
de catástrofes históri cas. Psicologia Clínica, Ri o de j a neiro, v. 20, n.
da revista Horizonte, do programa de pós-graduação em C iências da
1, p. 65-82, 2008.
Religião da PUC-Minas. Membro da SOTER. Pesq uisa: Interfaces entre
VILLAS BOAS, Alex. Recuperar a lógica poética da Revelação: uma con- literatura e religião (teopoética). Prod uções bibliográficas ma is recentes:
tribuição do di á logo entre Teologia e Literatura. Interações: Cultura em co-a uto ria com Roberlei Pa nasiewicz, o a rtigo " Identidades religiosas
e Comunidade, vol. 11, n. 19, p. 61-86, ja n-jun . 201 6 . no mundo plura l: na voz de personagens de O outro /Jé da sereia, de Mia
Couto'', na revista f-lorizo11te, em 20 17; o a rtigo "O câno n bíblico: po r
que certas narrativas se tornaram sagradas?", na revista f-lorizonte, em
20 16; o a rtigo "A questão dos gêneros literá rios e o utros aspectos rela tivos
à ling uagem na Dei Verbum " , na revista Perspectiva Teológica, em 20 15;

1 288 289 I
J ESCRITAS DO C RER NO CORPO J J APRESENTAÇÃO DOS AUTORES J

o artigo "Deus e deuses nos meandros do Livro do Desassossego: uma York , 2016); The Mystery and the \Y/orld. Passion for God in Times of
função de estilo", na Revista Brasileira de Literaturas e Teologias, 2015. Unbelief. (Cascade: Oregon, 2016).

CARLOS RIBEIRO CALDAS FILHO é professor da PUC-Minas, em seu Programa de Pós-Gra- CLEIDE MARIA DE OuvEIRA LovoN CHANCHUMANI possui grad uação em Letras Portu-
duação em Ciências da Religião e em cursos de gradu ação desra Univer- guês e Literaturas em Língua Portuguesa pela UERJ (2001 ), mestrado
sidade. Concluiu estágios de pós-doutorado na Faculdade Jesuíta de Fi lo- em Estudos de Literatura pela PUC-Rio (2005) e doutorado Estudos
sofia e Teologia. Possui gradu ação em Teologia - Seminário Presbiteriano de Litera tura pela mesma instituição (2010). Desenvolveu pesquisa de
do Sul (1985), gradu ação em Letras pela Faculdade de Fi losofi a, Ciên- pós-do utoramento na PUC-Rio e na FAJ E- BH sobre as representações
cias e Letras de Caratinga (1988), mest rado em Missio logia pelo Centro do divino nas líricas de Adél ia Prado e H ilda Hilst. Tem experiência na
Evangélico de Missões (1997) e doutorado em Ciências da Religião pela área de Letras, com ênfase em Litera tura Brasileira, atua ndo principal-
Universidade Metodista de São Paulo (2000), com período de pesquisas mente nos segu intes temas: Lírica contemporânea, linguagem poética e
(sanduíche) na Uni versidad Bíblica Latinoa mericana em San José, Costa disc ursividades místico-eróticas na 1itera tu ra contem porâ nea, pa rticu-
Rica. Tem experiência na área de Teologia, atu ando principalmente nos la rmente em Georges Batai lle.
seguintes temas: protestantismo brasileiro, teologia latino-a mericana,
VIRGÍNIA AuJUQUERQUE DE CASTRO BUARQUE cursou Bacharelado e Licenciatura em His-
teologia reformada, teologia pública, teologia da missão, diá logo entre
tória (1989), Mestrado em História (1994) e Doutora do em História
teologia e literatura, imaginári o religioso e/ou teológico no cinema e em
(2005) pela UFRJ. Pós-doutora em Ciências Religiosas pela Université
HQ's (quadrinhos), e o pensamento de O rlando Cosras, C. S. Lewis, J. R.
La vai (2012 ) e pós-doutora em Teologia pela FAJE (2015). Lecionou no
R. Tolkien, Rubem Alves e Dietrich Bon hoeffer.
ensin o básico no Colégio Pedro 11, Rio de Janeiro (1994-2006). Integra o
j osÉ PEDRO ANGÉLICO rea lizou estudos superiores na Un iversidade Católica Portuguesa Departamento de História e o PPGH IS da Universidade Federal de Ouro
(Porto), na Pontifical University o f Maynooth (Republic of Ireland) e Preto desde 2006, atuando no Setor de Prática do Ensino de Históri a e
na Universidad Pontificia de Salamanca (Espaiia). Licenciado em Teo- em História Religiosa. Participa do Grupo de Pesq uisa "As interfaces da
logia e em Teologia Dogmática, é doutor em Teologia Fundamental antropologia na teologia contemporâ nea" (FA.JE). Últimas obras publica-
pela Universidad Pontificia de Salamanca. Investigador integrado do das: Memoriais da Fé (Dom Viçoso, 2013 ); em co-auroria com Julio Cesar
Centro de Estudos do Pensa mento Português. Membro da Cátedra de Santos e Cleverson Pinhei ro, Diocese de ltabira-Coronel Fabriciano (Dio-
Sophia - Poesia e Transcendência. Membro da Europea n Society for cese de lrabira, 2015); Dom Luciano Mendes de Almeida: humanismo em
Ca tholic Theology. trans(des)cendência (Loyola, 201 6); Corpo-Encarnação (Loyola, 201 6).

MARIACLARA LucCHElTI B1NGEMER desde 1982 é professora da PUC-Rio no departamento LEANDRO GARCIA RODRIGUES possui graduação em Letras (Português-Inglês) pela Univer-
de Teologia. Foi coord enadora do Centro Loyola de fé e cu ltura da mesma sidade Castelo Branco (2000), mestrado em Letras (Estudos Literá rios)
universidade de 1994 a 2004 e decana do Centro de Teologia e Ciências pela PUC-Rio (2003), doutorado em Letras (Estudos Literá rios) pela PUC-
Humanas de 2004 a 2010. Ensina Teologia Fundamenta l e o tratado do Rio (2009) e Pós-Doutorado em Letras (Estudos Literários), na PUC-Rio
Deus da Revelação - a Trindade. Formada em Comunicação Social antes (2010). Pós-doutorando em teologia pela FAJE. É Professor Adjunto de
de sê- lo em teologia, escreve desde 2002 se manalmente no j ornal do Bra- Teoria da Litera tura e Literatura Compa rada na UFMG. Tem experiência
sil, colaborando igua lmente de forma esporádica com outros jo rnais. É na área de Letras, com ênfase em Teoria Literária e Literatura Brasilei ra,
diretora de conteúdo e colunista do site Amai-vos. Publicou recentemen- atuando principal mente nos seguintes temas: epistolografia , crítica epis-
te: Teologia Latino-A m ericana: raízes e ramos. (PUC- Rio, Vozes, 2017); tolográfica , interdisciplinaridade, modernismo, cultura e compararismo.
em co-o rga nização com Marcus Reis Pinheiro, Narrativas místicas - Pertence aos seguintes grupos de pesquisa: Acervo dos Escritores Mineiros
Antolog ia de textos místi cos da históri a do cristianismo (Pa ulus, (AEM-UFMG), Núcleo de Estudos de Epistolografia Brasileira (IEB-USP),
20 ·16); Latin American Theology: Roors and Branches. (Orbis: New Novas Textualidades (UNB-UFJF-UFMG-PUC Rio) e Rede de Pesquisa

J 290 291 1

b
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1 1 APRESENTAÇÃO DOS AUTORES 1

História e Cato licismo no Mundo Contemporâneo (UFMT-UPF-UFRN- Luc1A o COSTA SANTOS possui graduação em Filosofia pela UFBA (1990), mestrado
PUC Minas). em Filosofia pela UFRJ (1997) e doutorado em Filosofia pela PUC do
Rio Grande do Sul (2007), com estágio doutoral no lnstitut Ca tho lique
N1LO RmEmo JúNIOH possui graduação em Engenha ria Operacional pela Universidade de Paris-Univer ité de Poitier (2005). Atualmente é Professor Adjunto
Presbiteriana Mackenzie (198 .1), graduação em Filosofia pela Universi- na UNEB, credenciado no Programa de Pós-Graduação em Educação e
dade Federal de Minas Gerais (1990), graduação em Teologia pela Facul- Contempo raneidade (PPG EDUC); e Professor Visitante na Pós-Gradua-
dade .Jesuíta ele Filosofia e Teologia (1991 ), mestrado em Teologia Moral ção em Fi losofia Contemporâ nea da Uni versidade Cató lica de Salvauor
pela Pontificia Università Gregoriana (1993), doutorado em Teologia (UCSAL). Integra o Grupo ele Pesq uisa Filosofi a Moderna e Contem-
pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (1999), clourorado em Filo- porânea ela UFBA. É membro do Centro Brasileiro de Estudos sobre o
sofia pela Universidade Católica Portuguesa, Braga, Portuga l. Pro fessor Pensa mento de Emmanuel Lévinas (CE BEL); sócio fundad or da Asso-
do Quadro cio Departamento ele Filosofi a ela FAJE. Professor do Quadro ciação Sul-A mericana de Filosofia e Teologia Interculturais (ASAfTI );
cio PPG ele Fil osofi a e Pro fessor Cola borador do PPG de Teologia da sócio fundad or da Associação Latin o-America na ele Filosofia ela Liber-
FAJE. Últimas obras publicadas: A Gênese da Ética e da Teologia na tação; membro da Associação Latino-Americana ele Literatura e Teolo-
Filoso fia de Emm a1111el Lévinas (O Lutador, 1999); Sabedoria de Amar gia (ALALITE). Tem experiência na á rea el e Filosofia, com ênfase em
(Loyola, 2005); Sabedoria da Paz. Ética e Teológica em Emma1111el Lé- Filosofia Contempo rânea, atuando principalmen te nas seguintes áreas:
vinas (Loyo la, 2008); em co-autoria com João Luiz Correia Jr., O Amor Fenomenologia; Ética ela Alteridade; Filosofi a da Religião; Filo ofi a La-
em suas múltiplas fo rmas (Pa ulinas, 20-U ). tino-A mericana; Fil osofia e Literatura Brasileira.

ALEX VII.LAS BOAS ÜUVEIHA MAHIANO é Coordenador do Progra ma ele Pós-Grad uação SANDRA MARIA SILVA CAVALCANTI é doutora em Linguística pela UFMG (2009), mestre
em Teologia ela PUC cio Paraná. Livre Docente em Ética Teológica pela em Língua Portuguesa pela UFMG (2003), especialista em Literatura In-
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP, 201 7). Pós- fantil e Juvenil (1992) e Literatura Brasileira ( 1995 ) pela PUC-Minas.
cloutoraclo em Teologia pela Pontifícia Università Gregoria na ele Roma É professora do Programa de Pós-graduação em Letras da PU C-M inas,
(2016). Doutor cm Teologia pela PUC- Rio, 201 3. Mestre em Teologia onde atua na linha ele pesquisa Enunciação e Processo Oi cursivos.
pela PUC-SP (2008). Líder cio Grupo ele Pesquisa Teopatocliceia: Espiri- Como pesq uisa dora, in vestiga fenômen os de ca ráter semântico-pragmá-
tua lidade, Cultu ra e Práx is (C Pq ). Editor ela Teoliterária: Revista Bra- tico com base em arcabouços teóricos cio campo da Linguística Cogniti-
si leira de Literaturas e Teologias. Membro da Diretoria ela Sociedade va e da Semiótica Cognitiva. Integra o grupo de pesquisa ELin C (E tudos
Brasileira de Teologia e Ciências ela Religião (SOTER). Coordenador cio em Linguagem e Cognição) e o grupo de pe quisa interdisciplinar Coin-
G rupo de Trabalho de Religião, Arte e Literatura da Sociedade Brasileira plex Cognitio. omo professora cio Instituto de Ciências Humanas, na
de Teologia e Ciências ela Religião (SOTER). Vice-presidente ela Associa- gradu ação, atua no Curso de Letras, em disciplinas que foca lizam prá-
ção Latino America na ele Literatura e Teologia (A LALITE). Membro ela ticas de lctramento acadêmico, prática de leitura e produção ele textos
Sociedade Brasileira ele Teologia M ora l (S BTM ). Membro fundador do em am bientes midiá ticos e a relação entre linguagem e cognição hu mana.
Centro ele Estud os Literários, Fenô meno Religioso e Artes da Universi- Atua em projeto de formação ele pro fessores discutind o questões relati-
dade Estad ual ele Campin as (CELTA - U ICAMP). Áreas de Interesse: vas ao uso das tecno logias digitais na sala ele aula; sa bcre e competên-
Antropologia Teológica, Sentido el a Vida, Teologia e Litera tu ra, Ética cias da área ele Linguagen , Códigos e suas Tecnologias.
Teológica, Mística e Práx i , Altericlacle, Teologia ela Cultura, Exercícios
E pirituais de Santo Inácio de Loyola.

l 292 293 I
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1

GERALDO Luiz OE M ORI é bacha rel em Filosofia ( 1986) e Teologia ( 1992 ) pelo Centro Apresentação do grupo de pesquisa
de Estudos Superio res da Companhia de Jes us - C ES, atua l Faculda- "As Interfaces da Antropologia
de Jesuíta de Filosofi a e Teologia - FAJ E; licenciado em Fi losofia pela
PUC- M G (1990); mestre (1996) e do utor (2002) em Teologia pelo Cen-
na Teologia Contemporânea"
tre Sevres - Facultés Jésuites de Pa ris (França); pós-doutorado pelo Ins-
titut Catho lique de Pa ris. Atua lmente é professor e d ireror do Departa-
mento de Teologia e Coordenador da Pós-Graduação na FAJ E. É líder
Estuda a qu estão do ser huma no à luz das distintas disci plinas sistemá-
do G rupo de Pesq uisa " As inte rfaces da cristologia e da a ntro po logia na
teologia co ntemporânea". Últimas o bras publicadas: Le temps, énigme ticas da teologia cristã, a brindo-se às q uestões antropo lógicas leva ntadas
des hommes, mystere de Dieu (Ou Cerf, 2006); o rga nizad or do livro na a tu a lidade pelas ciências (exa tas e hum a nas), pela fi losofia e pelas a n-
Teologia e Ciências da Religião: a ca minho da maioridade acadêmica no tro po logias de o utras religiões.
Bras il (Pa ulinas, 201 J ); Religião e Educação /Ja ra a Cidadania (Pa ulinas, Temá ticas de interesse: (1) relação corpo e a lma, vista nas seguintes
201 ·1); Mobilidade Religiosa. Lillguagens, ;uvelltude, política (Pa ulinas, perspecti vas: a) co rpo e alma na cultu ra ocidental; b) a q uestão d o corpo
20 L2); Aragem do Sagrado. Deus na literatu ra brasileira contempo rânea nas a ná lises socio lógicas e psica nalíticas da co ntempora neidade; c) co rpo e
(Loyola, 2012); Deus 1w sociedade plural: Fé, símbo los, narrativas (Pau- sexualidade; d ) a relação corpo e men te nas neurociências; e) a com pree n-
linas, 201 3 ); Corpo-Encam ação (L.oyola , 201 6). são feno men o lógica do co rpo e s ua relação co m a carne; (2 ) o tema da
enca rn ação, a bo rd ado na perspecti va fil osófica e teológica; (3) o conceito
de pessoa, lido do po nto de vista histórico, fil osófico e teológico; (4 ) o pro-
blema da liberdade, estuda do em chave histórica, fil osófica e teológica; (5)
a questão do mal e sua relação com o tema do pecad o.
Para o triêni o 2017-2019, o G rupo optou a apro fund a r a d imensão
de pathos da corpo reidade-Enca rnação em articulação co m a perspectiva
estético-literária . Dessa ma neira, o G ru po promoveu em 2017, em parceria
com a Ala lite (Asociació n La tinoa meri cana de Li tera tura y Teología), o II
Coló qui o Interfaces.

LÍDERES: 1 - Pro f. Dr. Gera ldo Lui z De Mori (FAJE); 2 - Profa. Ora . Vi r-
gíni a Bua rq ue (UFOP)

Integrantes:
Davi Chang Ribeiro Lin. - Do utora ndo em Teologia (FAJ E); mestre em
Teo logia (Regent College, Canadá); g rad uado em Psicologia (UFMG), com
e pecia li zação em Psicologia C línica.
Edson. M atias Dias - D o utora nd o em Teologia (FAJ E); mestre em Ciências
da Religião (PUC-Goiás ); g rad uado em Psicologia (Centro Un iversitário de
Brasília) e em Teo logia (Centro Uni ve rsitá rio C la retiano ).

295 I
l 294
\ ESCRITAS DO CRER NO CORPO \

José Sebastião Gonçalves - Doutora ndo em Teologia (FAJE ); mestre em Índice remissivo
Teologia (FAJE); especialista em Psicologia d a Formação pa ra a Vida Reli-
giosa; gradu ado em Filosofia (ISTA ) e Teologia (FAJE).
]ulio Cesar da Costa Santa Bá rba ra - M estre em Teologia (PUC-Ri o de
j a neiro); graduado em Teologia (Faculdade Católica de Fortaleza) Autores de textos literários ou científicos':
Leandro Garcia Rodrigues - Pós-doutor em Letras-Estudos Literá rios ABREU, Caio Fernando -161, 162, 164-1 67, 170, 173, 174
(PUC-Rio de janeiro); douto r em Letras (PUC-Rio de j a neiro); mestre em ABREU, Capistrano de - 143
Letras (PUC-Rio de Janeiro); gradu ado em Letras (Português-Inglês) (Uni- ABREU, Honorin a de -143
AGOSTINH O (santo) - 34, 68, 90
versidade Castelo Branco ).
AGOSTI NHO DA CRUZ (frei ) - 93
Lucio Álva ro Marques - Pós-do uto r em Filosofia Brasileira (Universidade
AGUESSY, Honorat - 58
do Porto); do uto r em Filosofia (PUC-Rio Gra nde do Sul); mestre em Teo-
AIM E, O reste - 25
logia (FAJ E); graduado em Filosofia (UF MG). ALENCAR, José de -17, 266, 270
Luiz Antônio Pinheiro - Douto rando em Teologia (FAJ E); mestre em Teo- ALVES, Rubem-12, 15, 19, 65, 67
logia e Ciências Patrísticas (Institutum Patristicum Augustianianum); gra- AMARAL, Maria Adelaide - 163, 169, 172, 173
duado em Filosofia (UFMG) e Teologia (FAJ E) AN DRADE, Carlos Drummond de - 197, 201, 202, 207, 208
ANDRADE, Mário de - 173, 221 , 226
Mariano Torres Vargas - Gradu ado em Teologia (FAJE) e em Engenh a ria
ANGÉLICO, José Pedro - 18, 19, 286
Bioquímica (Instituto Po litécnico N aciona l)
APOLLINAIRE, Guillaume - 109
Natalino Guilhenne de Souza - M estre em Teologia (FAJ E); graduad o em APPIAH, Kwa me - 58
Teologia (FAJE) e em Filosofia (ISTA) ARISTÓT ELES - 65
Paulo Antonio Couto Faria - Do utor em Teologia (FAJE); mestre em Teo- ASSMANN, Hugo - 70
logia (FAJE); graduad o em Filosofi a (FAJE) e em Teologia (FAJ E) BÂ, Amadou Hampaté - 58
BACH ELARD, Gaston - 34
René Annand Dentz ]únior- Pós-Do uto r em Educação (Wa rsaw Universi-
BALZAC, Honoré de - 39
ty); Do uto r em Teologia (FAJE) e do utor em Filosofi a (PUC-SP); mestre em
BARTH, Karl - 69
Filosofia (PUC-Ca mpinas) e graduado em Filosofi a (UFJ F).
BAUMAN, Zygrnunr - 41
Ricardo da Silva - G raduado em Teologia (FAJE). BEAUCH AMP, Paul - 263
Rosana Araujo Viveiros - Mestre em Teologia (FAJ E); e pecia lista em BEAUVO IR, Simone de - 163
Filosofia C línica (Instituto Packter de Po rto Alegre) e em Ad ministração BELO, Ruy - 167
Escolar (UNIPAC de Ba rbacena); grad uada em Pedagogia (UEMG) e em BERGER, Peter - 78
BINGEMER, Ma ria Clara Lucchetti - 18, 105, 123, 205, 285, 290
Teologia (FAJ E).
BOAS, Alex Villas - 197, 200, 286, 292
Thiago Santos Pinheiro Souza - Do utor em Teologia (FAJ E); mestre em BOFF, Clodovis - 67
C iência da Religião (UFJF); gradua do em Teologia (Faculdade Eva ngélica
de Teologia de Belo H o ri zonte) e em Letras Po rtuguês/Inglês (Faculdade
Alfa América) . 1 . Sem incluir as referências bibliográficas, mas abrangendo as menções em notas de rodapé.

l 296 297 I
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO \ 1 ÍNDICE REMISSIVO 1

BONAZZI, Giuseppe - 39-41 H ILST, H ilda - 162, 29 1


BRANCO, Camilo Castelo - 26 HOBSBAWM, Eric - 55
BUA RQU E, Virgín ia - 143, 295 H OHFELDT, Antoni o - 123, 128
CA M ARNEIRO, N uno - 29 H OLANDA, Sérgio Buarq ue de - 266
CÂNDIDO, Antô nio - 225, 241, 247 H ÓLDERLIN - 85, 178
CANTARELA, Antoni o Gera ldo - 18, 45, 289 H USSERL, Edmund - 199
CALDAS, Ca rl os - 15, 18, 19, 65, 67, 290 JASPER, David - 86
CELA N, Pa ul - 178 J ESUS, Maria J osé de (monja) - J 43, 144, 152
COELHO, Alexandra Lucas - 94 JOÃO (Evangelista) - 7, 66
COM BLI N, Joseph - 70 JOÃO CABRAL (de Melo Nero) - 16, 120
COSER, Lewis - 39 JOÃO DA CRUZ (santo) - 94, 146, 148
COUTO , Mia - 45-4 7, 52, 53, 55, 289 JO IN- LAM BERT, Arnaud - 41
C URY, Z ilda - 46 JO RGE, Luiza Nero - 94
DAMATTA, Roberto - 259, 266 JOSSUA, Jean-Pierre - 86
DE MOR!, Gera ldo - 11 , 12, 17, 259 KA FKA, Fra nz - 167
DESCA RTES, René - 78, 199 KAPPUS, Franz Xavier - 87, 88
DI N IS, Júlio - 26 Kl-ZERBO, J ose ph - 58
DOSTO IÉVSKl, Fiódo r - 39, 167 KIERK EGAA RD, Soren - 88
FA RIA, Da niel - 85, 86, 93-96, 197 KUNDERA, M ila n - 24
FESSA RD, Gasron - 263 KUSCHEL, Karl-Josef - 85
FONSECA, Naza rerh - 46 LACAN, Jacq ues - 201, 227
FOUCAULT, M ichel - 33 LÉVINAS, Emma nue l - 177, 181, 199, 292, 293
FREUD, Sigmund - 39, 23 l, 237 LI MA, Alceu Amoroso - 174, 224
FREYRE, Gi lberto - 266 LISPECTOR, C larice (Chaya Lispecror)- 18, 105-107, 109-115, 117, 11 8-120, 122,
FUKELMAN, C la rice - 11 4 167, 169
LOPES, Ma rcos - l 97
GA LILEU- 33
LOYO LA, Inácio de - 92, 292
GA RR ETT, Almeida - 26
LUC-NANCY, Jean - 177
GESCH É, Ado lphe - 85
LUCKMANN, Tho mas - 78
GUA RDI N I, Ro ma no - 85
LUFT, Lya - 177, ·180-182, 184-187, 189- 193
GUI MA RÃES, Ferna ndo - 89
GUT IERREZ, Gustavo - 70, 77 MA LU LA, Joseph - 58

H A R N AC K , Ado lf von - 198 MA RX, Ka rl - 39, 68, 2 17, 218, 230, 23 1, 23 7, 26 1

H EGEL, Georg Wilhel m Friedrich - 261 M' BOKOLO, Eli kia - 58

H EID EGGER, Martin - 199, 225 MCCULLERS, Ca rson - 166


MEN DONÇA, José Tolenrino - 23, 197, 289
H EINE, Heinrich - 109
MOELLER, Cha rles - 85
H EMINGWAY, Ernesr - 31
H ERC ULANO, Alexand re - 26 MON DI N, Barisrra - 70
MO RI CON I, fta lo - 123, 170
H ESSE, Herm an - 77

\ 298 299 \
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1 1 fNOICE REMISSIVO 1

MOSER, Benjamin -1 06- 108, 121 WRIGHT, Tom - 86


N IET ZSCH E, Fried rich - 34, 39, 68, l 99 YU ES, Eliana - 123
O LI VEIRA, Cleide Maria de - 16, 123, 29 1 Textos literários, científicos ou religiosos2 :
O LI VEIRA, Zacarias de - 27-29
A descoberta do mundo - 108
PANNENBERG, Wo lfh art - 66
A hora da estrela - l06, 114, 121, 122
PASCA L, Blaise - 177, 226
A paixão segundo GH - 105, 112, 12 1, 122
PAU LO (deTarso,a pósrolo)- 131, 133
A palavra poética e o cristão - 92
PELLEG RINO, Hélio - 217-219, 222, 224-227, 230, 231, 236
A varanda do (rangipani - 46, 52
PESSOA, Fernando - 167
Alba Poética - 88
PLATÃO - 67, 131, 198
Alcorão - 65
PRADO, Adélia - 123- 127, 134, 197, 201, 207, 209, 214, 291
Antigo Testamento (Bíblia) - 65, 261
PROUST, Marcel - 39, 167
Autrement qu'être - 177
QUEIROZ, Eça de - 26
Bhagavad Cita - 65
RAHNER, Karl - 85, 86, 92, 96
Bíblia - 34, 49, 50, 65, 67, 94, 109, 134, 259
RIBEIRO, Darcy - 266
Cacos para um vitral - 129, 130, 135
RIBEIRO, João Ubaldo - 16, 259, 264, 266, 269, 275
Cântico dos Cânticos (Bíblia) - 183
RIBEIRO J ÚNIO R, N ilo - 15, 177, 285, 292
Carta aos E(ésios (Bíblia) - 69
REIS, Ricardo - 94
Carta aos Hebreus (Bíblia) - 51
REPOLE, Roberto - 23
Carta aos Romanos (Bíblia) - 79
RILKE, Rainer Maria - 85, 87, 88
Carta de Tiago (Bíblia) - 51
RODRIGUES, Leandro Garcia - 14, 161, 286, 296
Cartas a um jovem poeta - 85, 87, 92
ROSA, Guimarães - 25, 241, 243, 248
Constituição Apostólica Sponsa Christi - 147, 153
SALMANN, Elmar - 24, 25
Constituições teresianas - 14 7
SANTOS, Lucia no Costa - 217
Creio na ressurreição do corpo - 17, 66, 68-72, 74 , 77, 79-81
SA RT RE, Jean-Paul - 167, 225
Cristiane F. - drogada e prostituída - 161
SCHO PENHAUER, Arthur - 34
Da poesia como exercício espiritual - '197
SHAULL, Richard - 70
Debaixo de algum céu - 29, 30
SIMMEL, Georg - 39
Elegias (de Duíno) - 90
SUHARD, Em manuel - 28
Fala amendoeira - 202, 207
TEMPELS, Frans - 56-59
Filandras - 127, 137
T ERESA D'ÁVI LA (ou de Jesus, santa)- 94, 143, 148
Génesis (Bíb lia) - 8 1, 260
TERESA DO MENINO J ESUS (e da Sagrada Face, santa) - 94
Grande Sertão: Veredas - 34
TOLSTOI, Leon - 25
Inventário do irrem ediável - 164
VOLTA IR E - 198, 287
lracema - 17, 266, 270
WEBER, Max - 39
La fede dei preti. Um'indagine etnografica - 39
WITTGENSTECN, Ludwig - 77
WOOD, James - 24
WOOLF, Virgínia - 167 2. Sem incluir as referências bibliográficas, mas abrangendo as menções em notas de rodapé.

l 300 301 1
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1
1 ÍNDICE REMISSIVO 1

Segu11do Livro de Reis (Bíblia ) - 51


La philosophie ba11toue - 56, 58
Solte os cachorros - 127, 128
Levítico (Bíblia) - 51
Ta/11111d - l 77
Lições de trevas - 89
Ta11ach (Bíblia Hebraica ou Antigo Testamento cristão) - 65
Livro de Josué (Bíblia ) - 51
Tao Te Ching - 65
Livro do Deuteronômio (Bíblia) - 98
Terra sonâmbula - 45, 46
Macunaíma - 173
Torá - 5 1, 108
Manuscritos de Felipa - 136
Variações sobre a vida e a m orte - 68, 7 1, 76, 78, 80
Morangos mofados - 170
Variações sobre o prazer - 68, T I , 76, 8 1
No meio da noite - 207
Vatica110 li (Documentos do Concílio) - 17, 153, 154, 224
No meu peito não cabem pássaros - 30
Verso parrochie liquide? - 41
Notre rencontre - 58
Viagens 11a minha terra - 26
Novo Testamento (Bíblia) - 65, 69, 94, 261
Vida e Obra de frei Agostinho da Cmz - 93
O fio das missa11gas - 46
Vidas Secas - 120
O ;ogo das contas de vidro - 77
Viva o Povo Brasileiro - 259, 263-266, 270, 27 1, 282
O homem da mão seca - 134
O livro da vida monástica - 92 Termos recorrentes:
O livro dos prazeres - 105, 109 A
O marinheiro - 168
Abraça r, abraço - 54, 77, 93, ]] 8, n 9, 133, 174
O outro pé da sereia - 45, 47, 48, 52, 55, 59, 289
Afeto - 90, 106, 124-1 26, 132, 13 7, J 90, 192, 229
O ovo apunhalado - 174
Agonia - 52, 11 9, ·126, 129, 145, 146, 190
O quarto fechado - 180-182, 184, 185, 187, 189
Alegria -1 7, 39, 68, 69, 76, 81, 82, 109, 11 3, 121, 129, 133-135, 137, 185, 207, 210,
O último voo do flamingo - 46 2 12,214, 220,225,231 233,236, 242,248-254,256, 261,263
Os componentes da banda - l 31- 133, 135, 137
Alma - 16, 34, 49, 54, 67, 76, 87, 98, LI 1, 11 7, 118, 124-126, 128, 131, 135, 137, 138,
Os dragões não conhecem o paraíso - l 72 140, 144, 148, 171, 174, 180, 186, 202, 207, 211, 219, 221, 224, 246, 264-266,
Ovelhas negras - 164 268-270,276,277,279,280,282,295
Para o instrumento difícil do silê11cio - 85, 95, 96 Alteridade- 12, 14,45,49, 109, 11L,J14, '120, 128, 135, 151, 164, ·177, '179- -183, 188,
Pedro Páramo - 34 189, 19 1-193, 201, 213, 214, 223, 228, 229, 23 1, 243, 256, 285, 287
Pequenas epifanias - 166, 168, l 73 Amante - 77, l 10, 138, 188, 189, 267, 270, 277
Presbyterorum O rdinis - 23 Amizade - 34, 78, 220, 221, 224, 287
Primeira Carta de j oão (1 João) - 7, 66 Amigo(a) - 28, 72, 79,99, 1 11 , 162, 168, 180, 190,2 18,221,224,256,276
Primeiras Estórias - 242, 247, 248, 250, 254, 256, 257 Amor - 12, 16, 18, 34, 38, 49, 52, 53, 69, 70, 72-74, 77-80, 93, 110, 111, 113, 118,
Primeiro Livro de Reis (Bíblia) - 5 1 120, 12 1, 127, 129, 13 1, 133-135, 140, 150, 15 1, 155, 166, 167, 170-172, 174,
Quero minha mãe - 127, 138 178- 180, 183, 184, 186, '190, 192- 194, 204, 224, 227-229, 236, 244, 245, 249,
Regra dos monges - 98 250,26 1-263,270,280,285,287,288
Regras e Constituições das Religiosas Descalças - 14 7 Ana l, ana lidade -1 29, 132, 135
Se eu fosse chão - 30 Ana logia - 15, 88, 122, 161, 183
Segunda Carta a Timóteo (Bíblia) - 70 Anato mia - 85, 95, 96, 98
Primeira Carta aos Coríntios (Bíblia) - 133 Angústia - 16, 69, 78, 87-89, 92, 145, 252

l 302
303 I
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1
1 ÍNDICE REMISSIVO 1

Animal, animismo - 35, 78, 87-89, 92, 145, 252 Carne - 7, 14, 15, 23, 37, 66, 73, 97, 99, 11 5, 124, 127, 13 1, 132, 138-140, 149, 166,
174, 181, 183, 185-192, 195,218-221,228,230-236, 244,249,264,280, 295
Anjo - 19, 51, 59, 66, 78, 95, 155, 168, 184
Carta - 51, 85, 87-90, 92, 118, 133, 143, 144, 146-153, 161, 166, 167, 168, 172, l 73,
Antropo logia - 45, 187, 223, 226, 231, 242, 287, 295
22 1,274
Antropologia teológica - 45, 287
Casar, casa mento - 133, 139, 211 , 261
Apetite - 68, 122, 220, 228
Ca tó lico(a), catolicismo -1 9, 41, 50, 56, 58, 67, 144, 152, 153, 162, 224, 260, 276
Arte, artista -13, 15, 24, 27, 77, 82, 85, 94, l 06, 161, 178, 224, 243, 257, 259, 282
Cego(a) cegueira - 79, 281
Ascese, ascetismo - 81, 123, 124, 125, 130, 139
Cemitério - 18, 45, 54, 78, 107, 173, 222
Audição - 98, 257
Céu - 28-30, 58, 66, 67, 69, 74, 78, 133, 139, 150, 155, 163, 185, 213, 232, 233, 249,
Ausência - 12, 18, 24, 46, 70, 79, 93, 97, 122, 125, 191, 193, 202, 204, 271, 274, 275
254,302
Autor{ a) - 11, 14, 15, 18, 27, 29, 45, 56, 57, 80, 94, 98, 105, 106, 107, 110, 114, 116,
Cheiro - 47, 126, 186, 272
124, 129, 132, 134, 163, 166, 173, 174, 178, 180, 181,2 19,259
Cho ro, chorar - 72, 74, 80, 111, 136, 138, 182, 220, 252
Avó(ô)-106, 107, 136, 138, 155, 269, 276
Ciência(s) - 11, 29, 39, 45, 80, 13 1, 144, 198, 199, 218, 220, 223, 225, 246, 278, 295
B Civilização, civilizatório - 55, 226, 272-275
Banto - 56, 57, 58 Colônia, colonial - 46, 52, 47, 266, 267, 288
Batismo, batiza do(a) - 94, 128, 266 Colonização - 52, 58, 60, 269, 288
Beijar, beijo - 80, 118, 132 Companheiro(a)- 31, 75, 88, 220, 126, 256
Beleza - 9, 52, 67-69, 74, 88, 110, 121 , 124, 130, 132, 134, 140, 198, 204, 206, 207, Compaixão - 16, 71, 105, 109, 115, 120, 134, 138, 245
210-212,214,263,268,279 Comunhão - 12, 38, 41 , 105, 109, 1 ]] -114, 121, 122, 134, 189, 230, 232, 235
Bicho - 53, 70, 72, 117, 167, 265, 272 Comunicação - 93, 124, 180, 183, 200, 202, 207
Biografia -12, 106, 129, 150, 224 Comunidade - 41 , 50, 56, 57, 75, 76, 148, 198
Biológico(a) -1 8, 244 Confissão - 23, 72, 79, 173
Boca - 35, 72, 96, 97, 111 , 11 3-115, 11 8, 128, 129, 133, 178, 209, 211, 275, 279 Conhecimento - 25, 39, 47, 78, 85, 87, 105, 108, 198, 200, 223, 230, 232, 233, 242,
Bondade, bo m - 74, 81, 192, 214, 230, 237, 260, 263 263,266,278,279
Bonito(a)-107, 120, 133, 139, l 72, 210, 249, 255 Con ciência - 59, 68, 95, 109, 11 9, 124, 125, 128, 138, 152, 166, 189, 201, 206, 209,
Braço(s) - 97, 99, 11 8, 170, 187 210, 249, 278
Branco - 26, 38, 49, 52, 107, 1l7, 134, 169, 173, 251, 266, 267, 271, 272 Contemplação - 81, 92, 162, 198, 202
Contemplativo(a) - 95, 148-1 52, 154
c Conto - 27, 30, 45, 127, 137, 162, 164, 170- 172, 174, 202, 203, 242, 246-248, 250-
Cabeça - 35, 68, 97, 112, 11 7, 118, 128, 138, 165, 168, 256, 276, 278, 280
252, 254-257
Ca belo - 35, 116, 117, 122, 164, 187,210,266, 281 Convento - 60, 93, 143, 145, 147, 152
Cadáver- 75, 129, 170,213 Converter(-se), conversão - 53, 211, 217, 223
Ca ntiga, canto, cantar - 39, 51, 93, 95, 11 9 Coração - 9, 35, 54, 69, 77, 90, 92, 96-98, 105, 110, 118, 145, 151, 154, 155, 169,
Ca rdeal - 28, 58, 143, 146-148 ·172, 180, 192,203,204,206,209, 235,236,253,255,278
Carícia - 75, 89, 178, 185, 187, 191 Corpo - 7-11, 13-19, 23, 25, 27, 28, 31, 32, 34, 35, 37-39, 45, 46, 65, 66, 67-82, 93-
Carinho, carinhoso - 52, 121 , 133, 149, 285 99, 105-140, 143, 145, 146,148, 149, 161,164, 166-171,173, 177,178, 180-183,
Ca rnalidade - 183, 186, 187, ·192, 194, 211 , 212 185-194, 201, 210-212, 22 1, 224, 232, 234, 235, 241, 243-246, 252, 257, 259,
Cansaço - 57, 94, 138, 234, 252 260,262,263,270,277,279,285,295

l 304 305 I
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1
-- 1 ÍNDICE REMISSIVO 1

Corpo de Cristo - 7, 69, 7 J , 75-77, 131 Doença - 57, 88, 107, 108, 138, 149, L69, 244, 252, 265
orporalidade - 123, 125, 129, 138, 140, 2 1 l, 232 Dor - 9, 1 1, 14, 18, 39, 78-80, 88, 89, 93, 108, 109, 110, 115, 116, 126, 134, 135,
138, 146, 164, 165, 167, 170, '171, 173, 174, 190, 205, 206, 208 209 211 231
orporeidade - 7-9, 11 -15, 17, 18, 27, 45, 46, 66, 96, 105, 108-110, 114- 11 6, 125, 235,257 , , , ,
129, 161,285-288,295
Drama, dramático(a) - 27, 115, 12 1, 131, 17 1, 174, L81 , 184, 191-1 93, 257, 263, 268
o rrespondência-144, 145, 149, 166, 172
Cósmico(a) - 76, 124, 139, ·165, 166, 235 E
Cosmovisão - 70, 124, 126, 130, 135 Emoção - 16, 41, 78, 86, 93, 120, 169, 250, 253
Costume - 47, 56, 59, 143, 145, Encarnação - 7, 9, 1'1, 12, 15, 66, 7 1-7 3, 123, 132, 133, 138, 180, 182, 184, 185, 194,
Credo (Apostólico) - 17, 66, 70, 221 211-213,217,219,224
rença - 48, 57, 58, 65, 108, 162, 197, 198, 206, 210, 269, 277 Encarnado(a) - 7, 76, 136, 138, 282
riador (divino) - 9, 65, 66, 122, 172, 260, 263 Encontro, (des)enconrro - 10, 34, 35, 38, 40, 47, 54 , 55 ' 70' 73 ' 74 , 76 , 89 ' 98 ' 10'..,,
riança - 32, 39, 70, 72, 74, 75, 81, 82, 89, 9 1, 130, 136, 138, 180, 233, 234, 267 11o, 11 1, 135, 138, 161, 165, 168, 2 18, 223, 228, 230, 24 1, 243, 256, 266
C riatura - 75, 93, 112, l 18, 12 1, 124, 206, 244, 271 Enigma, enigmático(a) - 11, 188, 204, 206, 210, 2 19, 256
C ristianismo, cristão - 7-9, ·13, 18, 38, 4 1, 47, 49, 55, 59, 60, 65, 66, 67, 69, 70, 92, Ensaio, ensaísta- 173, 126, 161, 169, 172, 214
96, 123, 125, 130, 132, L33, 1 40,2 1 ~22 1 ,222,224,228,234,236,259,262,287 Entranhas - 73, 79, 80, 185, 191, 22 ·1
C rônica - 67, 68, J 62, 166, 168, 169, 172-174, 218, 230 Epifania -125, 166, 168, 173, 208, 210
rucificado(a) - 7, 75, 80, 150, 236 Eros- 14, 170, '177, 179, 183, 185- 194,218,222,230,231,233
uidado, cu idadoso - 48, 52, 107, 163, 178, 2 12 Erótico( a) - 76, l 24, 132, 161, 186, 194, 2 14, 236
ul pa, culpabilização - 27, 108, 120, 129, 131, 134, 139, 140, 206 Erotismo - 9, 124, 128, 131, 132, 179
ultura, cu ltural - 9, 12-14, 27-29, 46, 56-60, 79, 87, 146, 152, 169, 179, 182, 199, Escravidão, e cravo - 48, 49, 59, 222, 261, 263-265, 267, 270-273, 276, 280
200,2 11 ,224,225,233,243-247,254,260,266,271-274,285,287,295 Escrever - 18, 25-27, 90, 95, 110, 115, 121, 134, 144, 161, 165-169, 17 1, 173, 265,
ura, curar - 76, 79, ·108, 109, 134, 169, 173 267,282
Escrita - 15, 17, 19, 25, 27, 47, 48, 65, 78, 95, 105, 106, 108, 120, 137, 144, 148, 149,
D
154, 163, 165, 168, 169, 219, 246, 254, 285-287
Dádiva - 11 , 12, 35, 72-75, 2 12 Escriror(a)- 16,45,46,58, ·106, 114, 11 5, 11 7, 120, 12 1, 123, 128, 161, 162, 167,
Dança(r)- 36, 56, 69, 124, 139, 233, 236, 277 169, 1TI, 173, 174, 182, 184, 217, 224, 225, 232, 236, 246-248, 250, 25 1
Desejo - 7, 15, 32, 35, 67, 69-72, 77-79, 87, 105, 11 0, l 12, 1 19, 124, 126-128, 133,
Escri tura - 180-182, l 85, 186, 189-193, 2 18, 2 19, 242, 261
136, 140, 145, 150, 16 1, 168- 170, 172, 179, 186-'188, 204, 206, 214, 217, 218,
Escuta, escutar - ·18, 34, 36, 38, 46, 57, 58, 86, 93, 94, 96-99 , 167 ' 178 ' 208-21 O' 223 '
220,226-229,23 1,245,253,257,285
232,234,245,246,249,253
Desnudo(a), nu(a) - 72, 85, 131, 138, 178, 180, 187, 188, 228
Espelho - 79, 99, 11 6, 124, 21O, 242, 255
Destino-9, 16, 73, 110, 11 6, 11 8, 120, 179, 197,206,227,223,268,271,275
E perança - 17, 53, 67, 7:1, 72, 75, 77, 79, 80, 89, 93, 108, 109, 118, 1 19, 129, 133,
D iálogo - 10, 12, 15, 28, 29, 34, 52, 55, 58, 60, 65, 67, 68, 70-72, 76, 80-82, 89, 94,
152,183, 192,205,209,220,221,23 1,245,250,281,282
1 1 l, 125, 127, 134, 161, 222, 257, 259, 269, 285, 287, 288
Espírito - 18, 19, 36, 52, 57, 59, 66, 72-74, 80, 82, 96, 105, 107, 1ll,112, 116, 121 , 124,
D iário-48,50,86, 127, 163- 165, 174 133, 135, 139,140, 149,203,2 10,223,228,236,269,271,272,277,278,281,282
Disciplina, disciplinarização - 56, 81, 130, 246, 251, 295 Espiritual idade - 10, 19, 81, 82, 219, 230, 231, 236, 244
D iscurso- 12, 14, 17, 18, 23, 26, 52, 93, 94, 123, 129, 144, 168, 171, 179, 187, 193,
Esq uec imento - 46, 67, 149, 182, 199
198,200,229,266,27 1,273,275-277,279
Esteri lidade, estéril - 87, 186, 208
O ivino(a) -16, 35, 57, 97, ·109, 11 1, 120, 123, 125, 128, 149, 151, 161, 210, 231, 235,
Estória - 12, 70, 80, 241 , 242, 246-25 ·1, 254, 256, 257
236,261,286

307 I
1 306
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1
1 ÍNDICE REMISSIVO 1

Estrangeiro(a) - 51, 193, 263, 2 75 Fraqueza - 27, 35, 80, 164, 169, 170, 244
Ete rno - 66, 91, 152, 161, 183, 192, 200, 204, 2 18, 222, 235 Fronrei ra-41 , 46,47,54,93, 124, 166, 171, 173
Ético(a) - 9, 15, 25, 5 1, 57, 65, 89, 90, 125, L77, 180, 184, 199, 200, 228, 231, 263, 286 Fru ição - 81, 189-19 1
Eucaristia, euca rístico(a) - 7, 23, 36, 7 1, 259, 260, 262-264, 275, 282 Futuro - L5, 25, 42, 66, 69, 75, 80, 11 8, 11 9, 231, 247, 272, 273, 278, 286
Eulogia - 260-264, 275, 282 G
1
Eva nge lho - 7, 36, 38, 58, 66, 86, 126, 134 Gemido - 74, 75, 79, 80
Excluído(a) - 29, 51, 189, 229, 230, 269, 287 Generosidade - 70, 121, 151, 225, 285
Exercício espiritual - 197, 198, 200, 20 1, 213 Gesto - 34, 37, 51, 52, 57, 72, 73, 89, 93, 12 L, 134, 218, 259, 262
Exilado(a) , exílio - 75, 106, 107, L82, 164, 182, 194, 220 Gozo - 14, 16, 8 1, 105, 106, 120, 126, 134, 136-138, L78, 188, 285
Existencial - 41, 68, 96, 127, L46, 167, 198, 200, 202, 208, 214, 217, 218, 223, 225, 247 Graça (divina) - 12, 28, 30, 35, 51, 96, 117, 133-135, 140, 155, 197, 200-202, 204,
205,207,212,226-228,245,259,260-262
F
Grávido(a) - 72, 73, 75, 231 , 277
Fábula, fabu lação - 242, 246, 247, 269
Fala - 8, 23, 32, 34, 38, 40, 46, 47, 5 1, 55, 59, 65, 66, 69-71, 76-79, 81, 87, 93, 96, Gritar, grito - 32, 39, 95, 11 6, 212, 220, 276
110, 111, 11 6, 123, 1.27, 131, 136, 146, 153, 161, 163, 166, 170, 173, 178, 187, Guerra - 46, 50, 52, 75, 106, 107, 234, 268, 276-278, 280, 281
L93,202,205,207,209,220,224, 228,232,244,252,261,262,269,271,275,
H
276,28 1,282 Hermenêutica - 12, 19, 24, 68, 76, 81, 87, 95, 201, 218, 219, 225, 23 1, 232, 286
Família - 32, 41 , 106, 107, 249, 268, 275, 276
História, Histórico(a) - 7-9, 12, 16, 26, 28, 31-33, 41, 48, 50-52, 55, 59, 66, 108, 115-
Familiar - 41, 181, 185, 192, 193, 234, 236, 246, 256, 265, 276 117, 11 9, 137, 143, 145, 149, 152, 161, 164, 170, 172, 179, 180, 189, 200, 213,
Fa ntasma - 17, 19, 25, 66, 202, 203, 237 223,235,241 ,244,261,262,264,266,267,269,270,275,276,281,282
Fanrástico(a) - 55, 133, 163, 246, 248, 250 História/estória (ficção) - 12, 70, 80, 241, 242, 246-251, 254, 256, 257
Fé -13, 16, 23, 26, 34, 38, 41 , 51, 60, 66, 105, 128, 165, 166, 172, 173, 210, 213, 214, Holocausto - 79, 108, 168, 234
217-219,221,224,230,233,236,245,282 Homem - 15, 17, 19, 28, 32-37, 57, 65, 66, 70-75, 79, 86, 96, 99, 107, 109, 110, 118,
Feiticeiro(a) - 18, 45, 49, 50, 53, 56, 277 128, 130-134, :138-140, 161, 177, 178, .180, 194, 197, 202, 203, 213, 224-228,
Feminino(a) -14, 123, 125, '126, 13 1, 133, 136, 138, 139, 143, 145, 146, 179, 183, 234-236,246,248,257,263,265,271,275,279-282,288
184,187-191,1 93, 194 Hospita lidade -14, 45, 47, 50-52, 55, 187
Fenomenologia -11 , 34, ·199, 200, 231 Huma nidade-9,29,40,41,55, 125, 137, 177- L79, 182, 183, 185-188, 193,244,261
Fenomeno lógico(a) - 12, 225, 243, 244, 295 Humano(s) - 8, 1O,11 , 13, 15, J 7, 18, 24, 66, 67, 75, 77, 81, 86, 94, 95, 110- 11 4, 11 7,
Ferida - 7, 35, 81, 89, 166, 170 121, 123, L27, 128, 130, 131, 133, 137, 149, 150, 151, 164, 170, 178-183, 189-
Festa - 56, 68, 69, 130, 2 11, 221, 230, 260-262, 267, 276, 277 19 1, 199, 200, 203, 204, 206, 211, 213, 21 7, 218, 225-227, 230, 232, 233, 235,
Ficção, ficc ional - 8, 28, 30, 164, 165, 168, 173, 181, 257, 263 236, 243-246, 260-264, 271, 272, 282, 287, 295
Fiel -136, 148, 151, 152, 172, 255
Fi lho(a) - 7, 9, 34, 36, 49, 51, 60, 71, 75, 79, 98, 108, 126-129, 132, 135, 147, 163,
Identidade - 1O, 15, 16, 32, 36, 49, 50, 94, 105, 112, 145, 146, 178, 181, 197, 202-204,
181, 191-193,234,264-266,268,270,278,279,281
245,263,264,268,269,285
Filosofi a - 8, 11, 13, 56, 67, 77, 81, 87, 109, l 77, 180, 199, 219, 241, 242
Igreja, templo - 28, 32, 34, 53, 54, 59, 60, 69, 224
Físico(a) - 9, l4, 110, 133, 145, 146, 150, 191, 248, 250, 251, 256
Igreja Católica - 7, 37, 38, 53, 75, 76, 93, 144, 151, ·152, 154, 211, 224, 272
Fome - 9, 72, 74, 106, 124, 136, 138, 139, 208, 209, 212, 226, 229, 233-235, 264, 265
Ilusão - 52, 133, 136, 139, '172, 178, 205, 21O,222
Fragilidade -12, 116, 11 7, 132, 138, 140,209

309 I
l 308
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1 1 ÍNDICE REMISSIVO i

Imagem - 24, 36, 37, 48-50, 52-54, 69, 72, 73, 94, 201, 204, 205, 207, 208, 218, L
230,255 Lágrima - 35, 70, 78, 208, 220
Imagética( o) - 124, 201 , 204, 205, 21 l, 2 13 Leiror - 15, 30, 3 1, 50, 94, 96, 107, 112, 11 5, 11 6, '164, 167, 174, 180, 191, 198, 201,
Imaginação - 14, 79, 80, 184, 20 1, 244, 250, 252, 257, 259 219,241,242,247,248,250-252,256,257
Imaginário - 13, l 6, 25, 41 , 52, 59, 130, 133, 140, 173, 189, l 99, 200, 256 Ler, leitu ra - 12, 15-17, 29, 39, 42, 45, 47, 50, 55, 59, 72, 78, 96, 122-124, 139, 177,
Impureza, impuro(a)-1 13, 205, 131, 270 207,209, 2 l 9,241 -243,247,248,250,252,257,259,261, 264,266,269,273,
Imundície, imundo - 38, 11 3, 114, 121, 137 276,285,286
lncesro, incesruoso(a)- '181, 184, 186, 190-192 Liberdade, livre -1 8, 25, 45, 78, 72, 75, 92, 94, '1'1 0, 135, 169, 202, 203, 2'18, 224,
Independência - 52, 154, 264, 265, 267, 268 226,227, 229,230,232,233,242,278-281,295
Indiferença - 16, 40, 86, 120, 179, 192 Liberração-9, 16,67, 70, 77, ·109, 119, l20, 171, 189, 190,218,224,230-232,235,
Índios - 75, 249, 266, 274, 280 236,285
Língua (idio ma} - l l, 27, 46, 56, 183, 265, 270, 272, 276, 277, 285
Indi víduo - 13, 163, 199, 202-204, 208, 286, 287
Linguagem - 13, 14, l 8, 41, 52, 57, 58, 67, 72, 77, 93, 94, 96, 97, 121, 126, 169, 177-
Indizível - 180, 235, 243, 245
179, l 81, 184, l 86-188, 198,200,20 1, 205,206,2 11,213,224,248,257,281
Infância - 34, 91, 92, 105, 106, 108, J l l, 120, 180, 190, 236
Linhagem - 57, 225, 230, 265, 268, 275, 276
Infiniro - 34, 66, 95, 96, 11 2, 140, 152, 155, 177, 178, 187, '188, J 92, 219, 244, 245
Literatu ra, literário - 8-10, 12-17, 28, 29, 39, 40, 41 , 45, 51, 56, 67, 85, 87, 94, 106, 120,
Injustiça - 16, 57, 120, 218, 230, 235, 26 L, 280, 281
123, 161- 166, ITl, 174, 177, 180, 192, 197,200,20 1,221, 241 ,257,259,285,287
Inocência, inocente - 39, 74, 123, 126, 127, 130-132, 138, 151, 2 11 , 2 19, 235
Literatu ra brasileira - 16, 120, 161, 163, 166, 17 1, 180, 259
Interioridade - 92, 188, 198, 203
Liturgia, li túrgico(a) - 23, 65, 71, 149, 259, 262
lnrerrexrual, inrerrexrualidade - 94, 134, 167, 169, 241
Livro - 11-1 3, 18, 27, 29-31, 36, 38, 51, 65, 66, 68, 76, 92, 95, 98, 105, 106, 109, 11 O,
Intimidade - 31, 129, 189, 230, 235
112, 11 5, 11 6, 126-131, 134, 137, 138, 140, 148, 16 1, 166, 168-1 70, 174, 179,
Intriga - 26, 30, 67, 108, l 6'1, 181 -183, 186-190, 194, 248, 250 180,202,2 18,230, 247,260,261,265,279
Intuição - 18, 78, 86, 87, 93, 97, 229, 286 Lura - 34, 59, 71, 78, 106, 1 16, 138, l 62, 172, 182, 203, 204, 223, 224, 229-231, 235,
Invisível - 40, 71, 172, 227, 228, 23 1, 256, 280 245,257,260-264,267,269,271,275,277,279,280,282
lrm ão(s} - 32, 71, 72, 155, 173, 18·1, 185, 186, 188, 193, 219, 221 , 256
M
lpseidade - 197, 198, 201, 228
Mãe - 32, 105-109, 120, 126, 127, 129, 136, 138-140, l55, 170, 181, 182, 19 L, 193,
J 252,253,255-257,270,276,277,279-28 1
Jardim - 35, 70, 72-74, 260 Mal - 24, 35, 37, 74, 78, 95, 110, Ll 6, 120, 124, ·171, '173, 204, 213, 218, 225, 234,
Jes uíta - ·11 , 47, 48, 264, 267, 276 235,249,250,272,274,277,295
j oelh o(s} - 35, 54, 97, 249, 251 Mão(s ) - 35-37, 53, 66, 70-74, 77, 88, 89, 96, 97, 11 O, 111 , 121 , 123, 128, 134-136,
j ogo - 4 1, 48, 59, 77, 78, 80, 124, 186, 198, 204, 226, 229 138, 165, 166, l68, 169, 186, 206, 209, 2 11 , 220, 227, 228, 232, 261, 272, 273,
j ornal - 117, l 61, 174, 247 280
Jovem- 32, 46, 48,85,87,88,92, 107, 11 5, 11 6,1 74,21 9,246 Maravi lh a( r), maravilhamenro - 127, 132, 135, 179, ] 98
Judeu - 75, 'I06, 107, 12 l , 2 18, 223, 226, 231, 263 Marido - 53, 124, 126, 135-137, 182
Ju venrude - 94, 106, 138, 221, 222, 224, 268 Marar - 60, 135, 19 1, 250, 279, 281
Justiça - 28, 57, 128, l 65, 166, 217, 2 18, 224, 225, 229, 231, 235, 26 l , 279, 280, 281 Matéria - 58, 70, 72, L13, 114, 124, 129, 132, l40, 179, 209, 230, 235, 236
Materna(I) - 35, 53, 108, 184, 185
K
Med icina - 2 19, 220, 24·1, 242
Kenosis - ll 2, 121 , 150

l 310 311 1
J INDICE REMISSIVO 1
J ESCRITAS DO CRER NO CORPO J

Natural - 114, 177, 179, 187, 188, 245, 247, 254-256


Medo -14, 18, 32, 69, 70, 73, 75, 77, 82, 89, 110, 129, 134-136, 138, 140, 147, 161,
Na tureza - 27, 30, 74, 79, 92, 11 8, 155, 166, 167, 178, 186, 197, 202-205, 209, 227,
162, 165, 168, 171, 172,180,185,193,202,203,232,250,252, 262
228,241-244,246-249,271,273,282
Menino(a) - 69, 72, 107, 136, 138, 168, 185, 234, 248-256, 267
Negro - 49, 59, 11 9, 266-268, 270-278, 280, 281
Mentira - 11 6, 168, 281, 282
Nome -14, 16, 18, 24, 26, 32, 36, 37, 39, 46, 49, 51, 52, 54, 56, 77, 79, 89, 93, 106,
Memória - 8, 11, 12, 14, 46, 52, 71, 98, 107, 126, 220, 253, 259, 262, 269, 270, 282,
109, 110, 114, 120, 121, 123, 126-128, 136, 143, 170, 187, 188, 190, 204-206,
285,287 211,224,225, 228,235,255,265,268, 277
Mestiço(a) - 266, 268-275 Nostalgia - 7 1, 72, 79, 80, 270
Mestre - 36, 88, 98, 174, 218, 219, 221, 224, 237, 241, 242, 247, 267
Nu, nudez - 53, 85, 138, 148, 167, 178, 180, 187, 188, 228
Metafísica - 82, 124, 125, 134, 198, 199, 211, 219, 226, 228, 236, 245
N ulidade - 46, 164
Metáfora, metaforiza - 25, 41 , 49, 52, 54, 68, 79, 11 5, 134, 137, 140, 164, 167, 168,
179, 185, 186,204, 241,261,264,269 o
Milagre - 108, 11 2, 114, 132, 204, 261, 280 Obra(s) - 10, 11, 15,26-29, 45-47,51, 52,55,56,58,66,67, 78,93-95, 106, 109, 111,
Missão - 28, 33, 46, 53, 108, 144, 152, 207, 208, 226, 275 113, 123-126, 128, 132, 137, 144, 147, 151, 161 , 162, 164, 169-171, 173, 177,
Missionário(a) - 18, 45, 47, 49, 50, 52, 55-59 178, 180, 181, 184, 187, 199, 207, 211, 218, 219, 225, 229-231 , 241-243, 247,
248,251,256,25~259,260,26 1,2 64,266,27 1 , 2 73, 280,285
Mistério -12, 13, 17, 18, 58, 66, 79, 87, 92, 93, 96-98, 105, 110, 113, 114, 117, 121-
123, 125, 127, 130-132, 138, 140, 180, 182, 183, 188, 197-205, 210-212, 214, Ofício - 23, 86, 93, 11 5, 149, 202, 226
217,219,226-228,230-232,236,246,249,262,263,285,286 Olfato - ·11 4, 257
Mística(o)-19, 26, 38, 87, 89, 93, 105, 106, 109, 113, 121 , 123, 125, 127, 129, 131, Olhar, olho(s) - 15, 16, 26, 28, 31, 35, 36, 38, 52, 56, 57, 66, 72-74, 94, 95, 97, 98,
132, 135, 137, 162, 173, 199,224,227, 231,235,249,257 105, 106, 109, 11 0, 11 2-115, 11 7-122, 129, 130, 138, 139, 150, 155, 164, 165,
178, 181, 183, 185, 186, 188, 191, 204, 2l3, 234, 245, 249, 251, 253, 254, 260,
Mito, mítico(a) - 12, 51, 189, 246
262,263,27 1
Modernidade - 13, 24, 28, 33, 41, 152, 154, 163, 206, 287
Ontologia - 23, 57, 177-179, 182, 183, 187, 199
Moral - 19, 27, 58, 81, 82, 230, 272
Oprimido(a)-16, 74, 80, 115, 11 8, 120,
Moralismo - 209, 214
M ulher- 32,37,46,49,51,53,54, 70, 72, 73, 75, 105-11 2, 114, 115, 11 7, 118, 120, Oraçào- 105, 110, 11 8, 144,151, 153, 161, 166,206,224
121, 123, 124, 126, 128-130, 135-137, 139, 144, 192, 208, 211 , 213, 233, 263- Oral, ora li dade - 51, 56
265, 268, 269, 287 Organismo - 88, ] 18, 219
Música - 13, 31, 35, 56, 76, 87, 287 Orgasmo - 136, 167
Ouvido, o uvir - 19, 25, 36, 37, 56, 86, 87, 96, 98, 109, 1 14, 167, 172, 178, 204, 206,
N 245,249,234,253,254,264,279
Nação - 52, 265, 267, 268, 273, 275, 281
p
Nádegas -125, 130, 131, 211
Narrado r(a) - 30-32, 35, 48, 49, 52-54, 115, 11 6, 11 8, 119, 121, 126, 128, 134, 138, Padre - 23, 26-29, 32, 33, 35-41, 48, 49, 56, 59, 256, 260, 264, 265, 268
164, 166, 167, 171, 172,242,247-253,256,264, 266, 269,276,277,282 Paganismo, pagão - 39, 49, 51, 263, 264
Narrativa - 8, 12, 15, 17, 25, 30, 3·1, 33, 35, 45-48, 50, 51, 56, 65, 66, 106, 110, 115, Pai - 12, 32, 36, 66, 75, 106, 108, 114, 129, 135, 139, 140, 155, 182, 192, 193, 219,
126, 127, 129, 132, 134-136, 138, 139, 149, 181, 185,241 , 242,246,250,263, 226,234,256,266,267,268,276,280
264,266,267,269,271,275,276, 282 Paixão - 126, 130, 143, 180, 18 1, 184, '185, 189, 192, 211 , 22 1, 225, 227, 230, 233,
Nascimento - 24, 27, 79, 108, 165, 180, 205, 232, 233, 235, 269, 287 237,264
Natal - 30, 37, 53, 56, 71, 106, 182 Paladar- 1. 14,257

313 I
1 312
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1 1 ÍNDICE REMISSIVO 1

Palavra (divina ) - 23, 65, 67, 69, 96, 98, 99, 105, 210, 262 Poesia - 15, 18, 72, 76, 79, 85-87, 89, 90, 94-96 , 123 , 127' 130' 136' 143 ' 144, 154'
Palavra(s) - 13, 18, 23, 28, 30, 38, 57, 58, 7 1-73, 76, 78, 80, 85, 86, 87, 92, 93, 96-98, 178, 179, 183, 197-20 1,204, 207-2 11 , 2 13,214,2 19,287
113, 11 8, 11 9, 124-126, l34, 138, 164, 167, 178-1 81, 184, 187, 189, 194, 198, Potência,potencialidade-15, 17,28,55,88,96, 129, 131, 137, 138, 150, 151, 154,
20 1,207,211,225,227,229,232, 248,250,251,276 199,218,219,224,225,232,236,243,245,259,285
Pão - 71-74, 133, 224, 231, 235, 259-264, 271, 275, 277, 282 Povo-9, 16,50,52,56,59, 107, 217,221,222,224,233,246,259,260, 261,263,
Paradoxo - 13, 23, 66, 95, 96, 178, 180, 197, 198, 227, 245, 246, 248, 252 265-267,269-274,276,27~279-282,287

Paraíso - 81, 82, 172 Prazer - 8, 9, 27, 78, 81, 82, 109- 111 , 11 7, 16 1, 167, 170, 188-190, 207, 223, 227,
Partilha - 9, 24, 25, 52, 56, 94, 95, 98, 120, 1.33, 173, 26 1, 285 229, 231-233, 257
Presença - 7, 18, 23, 26, 27, 40, 4 l, 46, 48, 49, 56, 58, 79, 93, 111 , 123, 127, 164, 171,
Parto - 79,80,86, 108
172, 197, 212, 213
Pasca l -1 6, 105, 106, 11 4, 120, 122, 177, 210-212, 226
Presente (tempo), atualidade- 7, 13, 16, 23, 73, 75, 82, 106, 120, 121, ·128, 132, 149,
Passado (tempo) - 25, 28, 47, 50, 52, 59, 146, 153, 179, 189, 222, 286
165, 166, 171, 183, 201, 245, 259, 262, 263, 267, 285, 286
Pathos - 11 , 12, 14, 185, 201, 209, 285-287, 295
Prisão, prisioneiro(a) - 74, 75, 78, 222, 223, 276, 279
Paz - 78, 106, 149, 235
Prosa - 123, 126-129, 131 , 134, 135, 138, 139, 202, 209, 257
Pecado, pecar - 9, 37, 58, 1 13, 130, 131, 145, 197, 20 1, 202, 204-207, 209-212, 259,
Protagonista - 26, 126, 127, 131, 133, 134, 136- 138, 248, 254
26 1,262,295
Proxi midade - 14, 113, 178, 179, 182, 184, 186, 189, 192, 193, 285
Peito - 30, 35, 54, 97, 138, 186, 203
Psicanálise, psica nalítico(a) - 67, 69, 123, 2 17, 218, 222-224, 226, 229-23 1, 241
Pele - 47, 53, 72, 139, 179, 18 l, 183, 185-187, 189-192, 232
Psicológico(a) - 33, 40, 70, 146, 200, 244
Pensa mento - 9, 16, 17, 23, 25, 26, 28, 37, 56, 57, 67, 68, 80, 8 1, 87, 149, 152, 177,
178, 181, 198, 209, 2 13, 218, 2 19, 225-228, 230, 23 1, 236, 252, 286 R
Percepção - 8, 14, 93, 98, ·126, 178, 187, 198, 201, 203-205, 2 11 , 245, 248, 251, 255 Rea lismo (literário) - 28, 48, 75, ·1g4
Perda - 24, 71, 146, 244, 259, 262 Reconhecimento -47, 87, 105, 150, 214, 26 1-263, 266
Personagem - 16, 23, 26, 28, 29, 3·1, 32, 41, 48, 52, 54, 109, l 10, 112, 11 5, 116, 118, Redenção - 30, 80, 1 14, 135
11 9, 121, 125, 126, 128, 129, 13 1, 135, 136, 140, 16 1, 164, 165, 166, 180,202, Religião, religioso, religiosidade - 18, 28, 45, 46, 5 1, 53, 55, 56, 65, 66, 81, 108,
2 11 , 250-252, 254-256 198,230
Pé(s) - 45, 47-49, 52, 53, 55, 59 77, 8 1, 97, 107, 1 12, 1 18, 138, 145, 167, 232 Religião do corpo - 18, 65-67
Perdoar, perdão - 37, 108, 135, 155, 259, 262 Religiosidade - 13, 125, 126, 13 1, 132, L45, 162, 173, 198, 217
Perfume - 151, 187, 249, 254 Representação - 27, 30, 40, 56, 128
Pessoa - 7-10, 13, 16- 19, 23, 27, 30, 3 1, 36, 40, 4 l, 45, 49, 56, 66, 70, 74, 86, 91, 94, Resistir, resistência - 77, 139, 140, 168, 191
98, 105-107, 112, n 6, 120, 126, ·128, 134-136, 143, 150, 163, 166, 167, 171, 173,
Respiração - 96, 97, 186, 190, 235
H4, 180, 202, 2 17, 219, 220, 222-23 1, 233-235, 237, 24 1, 246, 248, 252, 257,
Ressurreição - 15, 17, 66, 70, 74, 79, 126, 129, 132, 133, 183, 207, 208, 22 1, 235, 236
267,279,280,286,295
Revelação (divina) - 8, 18, 93, 111 , 125, 126, 130, 131, 200, 208, 211
Platônico(a)- 18, 67, 70, 82, 124, 126, 15 1, 211
Rev ista - 30, 162, 2·18, 25 1, 252
Plenirude-57, 111 , 113, 12 1, 13 1, 15 1,232,235,26 1, 282
Reza, reza r - 48, 54, 117, 206
Pobre, pobreza - 9, 11 , 16, 29, 5 1, 75, 80, 106, 1.1 5- 121, 147, 15 1, 155, 2 12, 21 4, 217,
Romance-23-32,36,39,42,45-50,52,54,55,59, 105, 109, 114, 120, 12 1, 126, 129,
224,228,230,234,253,268,270, 274,278,28 1
132, 134, 151, 162, 166, 172, 180, 182, 184, 192, 264, 266-270, 285, 287
Poema - 15, 65, 77, 85-87, 89, 90, 94, 97, 124, 130, 13 l , 154, 178- 182, 184, 185, 187,
Rosto-46, 74, 110, 115, 11 9, 139, 155, P8- 185, 187-1 89, 192-194,204,21 7,228,
19 1, 20 1, 207-209, 2 18
229,260
Poera - 19, 76, 8 1, 82, 85-90, 92-94, 96-98, 134, 177, 178, 199, 202, 205-209, 226, 233
Roupa - 32, 67, 128, 139, 220

l 314 315 I
...,
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1 1 ÍNDICE REMISSIVO 1

Sine ré ico(a), inesresia - 248, 250, 25 1, 254, 256, 257


s
Sobrena tu ra l - 28, l 14, 144, l 87
Sa bedoria - 38, 57, 80, 179, 233, 275
Sa ber(es) - 13, 28, 46, 5 1, 57, 66, 67, 70, 78, 80, 81, 88, 90, 92, 107, 13 1, 199, 200, Social- 9, 16, 17,27-29, 40,50,57, 127, 128, 148, 198,217,2 18,224,225,229,230,
243,246,268,286
224,230, 232, 234, 242, 282,288
Sacralidade -1 8, 45, 11 0, 130, 137, 138, 2 14,288 Sofrer, sofrim enro - 9, L4, 16, 57, 74, 75, 80, 89, 108, 11 5, 128, 139, 144, 145, 149,
17 l , 180, 185, 193, 205, 208-2 1o,252, 260, 276
Sacramento - 7, 24, 7 1, 72, 74-76
Solidão - 26, 31, 34, 35, 39, 78, 88-92, 94, 1 1 1, 1 16, 148, 169, 172, 23 1
Sacrifício, sacrificado(a) - 77, 189, 235, 270, 272
Sonho - 37, 67, 72, 88, 90, 9 1, 127, 134, '136, 137, 139, 228, 248-250, 253, 287
Sagrado (a ) - 14-19, 24, 33, 34, 50, 52-54, 57, 65-68, 70-74, 76, 77, 80-82, 87, 124,
125, 132, 134, 145, 147, 153, 162, 167, 177,233,287 Sopro - 92, 11 6, 1 19, 178, 202-205, 278
Sa lvação - 30, 75, l20, 152, 2 12, 2 l4, 22 1, 235, 260 Sorriso, riso - 70, 74, 233, 256
Sangra r, sa ngue - 7, 71, 73, 74, 96, 97, 99, 1 'll , 11 6, 11 9, 13 l, 138, 189, 231, 232, Subjetividade - 14, 123, 163, 164, 18 1- 185, 193, 20 1, 228, 286
235,246, 259,260-263, 265,270,271,275, 282 Sujeira - 13- 15, 19, 95-97, 123, 132, 148, 150, 163, 169, 177, J 78, 181, 185, 186, 188,
Santidade-5 1, 114, 11 6, 118, 132, 143, 152, 188, 197 193, 194, 199, 200, 222, 227, 236, 269, 285-287
Sanro(a) - 34, 132, 26 1, 272, 276, 277, 28 1, 28 2 Surrea l, surrealismo - 178-180, 184, 188
Sa udade - 18, 67, 71, 89-91, 93, 11 l , 11 9, 255 T
Saúde-9, 57, 145, 146, 234 Ta ngíve l - 17, 66, 243, 245, 246
Sede - 9, 30, 36, 47, 72, 74, 99, 138, 152, 168 Taro, ra rea r - 257
Sedução, seduzido(a) - 1 12, 178, 2 14, 22 1 Temer, temor - 53, 1.33, 217, 257, 265
Seio - 80, 85, 93, 128, 136, 148, 179, 187, 189 Te mpo - 7, 8, 13, 17, 18, 24, 26, 27, 30, 32, 34-36, 46, 47, 50-54, 56, 59, 66, 69, 82,
Semântico(a) - 30, 59, 97, 16 1, 168, 197, 198, 202, 243, 247, 248, 250, 25 1, 286 86, 87, 89, 97, 107, 11 0, 1'13, 114, 126, 128, 129, 133, 148, 149, 152, 164, 168,
Sensação- 139, 140, 177- 18 1, 183- 186, 188, 190, 19 1, 193,202,2 12 170, 17 1, 177, l 79- L89, 19 1, 193, 197, 198, 20 1, 202, 205, 2 17, 2 19, 224-226,
Sensibilidade - 17, 4 1, 68, 74, 105, 1 12, l23, 152, 162, 18 1, 183, 184, 190, 191, 199, 234-236,243,245-248,250,254-256,26 1,263,265,267,269,28 1,285-287
20 1, 205, 220, 274 Tempora lidade - 30, 125, 129, 140, 179, 182, 184, 193
Se nsual, sensualidade - J 17, 1 19, 189, 274 Teo lirerária - 27, 39 40, 85, 94, 95
Sentido (corpóreos) - 8 J, 1 14, 178, 18 1, 232, 257 Teo logia, reológico(a) - 7-13, 15, 17, 25, 39, 45, 5 1, 65-72, 74, 76-82, 87, 93, 120,
Senrimenro-8, 9, 16, 18, 80, 89, 90, 108, 11 0, 11 3, 11 5, l l 8, 120, 128, 129, 137, 139, 122, 132, 144, 16 1, 165, 181, 198, 200, 21 1, 2 14, 224, 23 1 24 1, 242, 259, 263,
164, 172,202,204,208,209,244,25 1 285,287,288
Ser (Ex istente) - 8- 1O, 15, 38, 46, 49, 57, 60, 67, 78, 82, 86, 87, 94, 95, L09-11l , 114, Teologia cristã - 7, 66, 69, 122, 295
11 6, 11 7, 11 9, 125, 127, 132, 137, 149, 152, 155, 170, 177- 179, 18 l, 183, 184, Teologia da li berração - 67, 70, 77, 224, 23 1
187- 193, 199-203, 2 17 2 18,225-228,230,232-235,244-246,260,261,263, 286 Teologia do corpo - 67, 68, 70
Sereia - 45, 47-49, 52, 54, 55, 59, 109 Teopoérica - 18, 19, 69, 72, 76, 80, 82, 94-98, 285, 286
Serviço - 23, 26, 172, 2 12, 2 14, 222, 224 Terra - 27 3 1, 33, 38, 46, 49, 5 1-53, 56, 66, 73-75, 89, 90, 97, LOS, LOS, 11O, 11 1,
exo- 78,85, 109, I J 1, 130, 138, 147, 179- 18 1, 189,233,263 128, l 18, 148, 182, 184, 185, 187- 189, 203, 230, 232, 233, 236, 248, 249, 255,
Sex ual, sexualidade - 9, 27, 11 O, 179, 182, 185, 186, 188 190, 193, 229, 233, 295 260, 265, 271-273, 275, 277-279
Signo-27, 124, 15 1, 180, 18 1, 183, 185, 186, L9 1,260 Texro- 11 , 14- 16, 18, 19,27,29,4 1,45,47,51,53,56 65,66,68-70, 72,8 1, 94, 105,
Silêncio - 14, 18, 34, 36, 69, 73-75, 78, 85, 86, 90, 92-99, 105, 111 , 120, 134, 148, 123, 127, 128, 148, 149, 154, 166, 167, 169, 172, 174, 197, 2 18, 2 19, 225, 226,
·15 1, 155, 16 1, 172, 173, 184, 185, 189,204, 205,22 1,232,235,285,286 230,24 1-243, 247,259,269,285,286
Sím bolo - 15, 7 1, 74, 79, 80, 136, 152, 202, 2 1J , 269 Texro literário - 18, 45, 24 1-243

l 316 317 I
1 ESCRITAS DO CRER NO CORPO 1 J ÍNDICE REMISSIVO 1

Tocar, toq ue - 33, 35, 69, 73, 79, 93, 11 3, 11 7, 132, 134, 179, 186, 245, 254, 277 Vítima - l 6, 55, 75, 80, 8 1, 1 17, 120, 161 , 170, 230
Trabalho - 17, 39, 45, 56-58, 67, 68, 8 1, 82, 85, J 10, 144, 147, 150, 155, 162, 166, Vocação - 33, 36, 40, 53, 227, 229, 272
170, 173, 20 1, 202, 218, 228, 231, 242, 245, 247, 25 1, 253, 260, 267-270, 272, Vonrade- 16, 23, 7 1, 86, 90, 106, 11 6, 119, 121, 135, 149, 150, 164, 170, 198, ·199
274,279,280 201,203,204,209,2 10,255,28 1 ,
Tra ma - L88, 193, 247, 250, 252, 264, 266 Voz, vozes - 29, 3 1, 32, 46, 280
Transgredir, transgressão - 11 3, 183, 243, 257 Vulnerabilidade - 11, 109, 11 6, 189
Trauma - 107, 168, 193, 2 19, 267
Travessia - 46, 48, 49, Ll 1, 113, 120, 169, 193, 2 17, 236, 257, 285
Tristeza - J 7, 78, 87, 88, 108, l 15, 248

u
Un iverso - 24, 7 1, 73-79, 95, 11 3, 123, 173, 198, 260, 274
Útero - 88, 1 1O, 138
Utopia, utópico(a) - 8, 76, 77, 2 17, 222, 22 1, 235-237, 287

V
Valo r(cs) - 9, 24, 53, 57, 59, 148, 233, 254, 270
Vazio - 32, 34, 70, 163, 165, 172
Velh ice, velho - 46, 52, 53, 70, 75, 77, 78, 9 1, 202, 203, 2 19, 220, 242, 246, 277, 281
Venrre - 7, 73 11 0
Ver- 33, 36, 4 L, 7 1, 73, 74, 86, 108, 130, 146, 165, 2"12, 220, 245, 249, 253, 254, 257,
260,263,266,276,278, 279
Verbo (divino) - 7, 66, 99, 228
Vcrdade-8, 12, 14, 19,24,27 28,35,36,38,40 41,53,55,66, 78, 79,87,94,98,
105, 106, 109, 111 , 11 3, 11 5, 12 1, 124, 135, 139, 149, 162- 165, 168, 172, 173,
179, L99,208,2 10,22 1,227,228,250,262,268,273,275,276,278,280,282
Verso (poesia) - 87, 90, 93, 94, ·124
Via Crucis- 16, 105, 106, 109, 120, 122
Viagem - 47-50, 54, 9 1, 108, 109, 120, 136, 248, 25 1, 252
Vida, vira i - 57, 58, 95, 105, 108, 11 7, 133, 168, 170, 224, 225, 233
Vi nho - 69, 71-74, 23 1, 235, 260-264, 27 1, 275, 277, 282
Violência - 9, 74, 81, 107, 109, 145, 150, 154, 179, 199, 222, 234, 266, 269, 270, 279
Virgem, virgindade- 11 6- 11 8, 147, 163
Virtude - 8 1, ] 51, 198, 230
Visão - 25, 30, 33, 38, 58, 74, 76, 80, 98, 105, 106, 109, 1 1 l, 11 2, 145, 177, 181, 244,
249, 251,257,27 1
Vísceras - 138, 231, 232, 274

1 318 319 I

Você também pode gostar