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A Questão Sinótica

Nesta parte é levantada a questão dos evangelhos sinóticos, com a apresentação das fontes que
possibilitam seu estudo, a apresentação da história do problema e as tentativas de solução da
questão sinótica.

 Sinopses
Kümmel aqui reapresenta as sinopses que já indicou, dividindo-as agora em:
- sinopses com uso lingüístico: além da sinopse, há no arranjo em colunas
paralelas uma análise abrangente do uso lingüístico de cada perícope.
- sinopses com visões de conjunto: são sinopses diagramadas.
- sinopses com concordância vocabular: apresenta, além do texto com os três
sinóticos, sucessivamente, com sinais a core, identificadores da
concordância vocabular.
- sinopses com subsídios lingüísticos-estatísticos: estatísticas dos vocábulos
dos três sinóticos e a seqüência das frases e das perícopes.

 Estudos
- estudos sobre a questão sinótica: são mencionados os autores que
apresentam a história desta questão, bem como dão seu parecer, que tem
importância considerável na pesquisa. Entre estes estão: Holtzmann,
Fascher, Grobel, Vaganay, Farmer, Schniewind, Schmid, Léon-Dufour,
Heuschen e Evans.
- estudos sobre as fontes e crítica literária: aqui são apresentados autores e
obras que analisam a questão sinótica por estes dois aspectos.
- estudos sobre o problema da tradição oral e crítica formal.

 Definição
“A questão sinótica consiste a questão a respeito da relação literária dos três primeiros evangelhos
entre si Como explicar a notável e complexa teia de concordâncias e discordâncias entre Mateus,
Marcos e Lucas? A questão é tanto mais premente quanto se sabe que João nada absolutamente tem
a ver com ela.”

1. A questão
Trata-se aqui do conteúdo, da disposição, das características, das semelhanças entre os sinóticos e
das distinções entre esses.

1. Conteúdo e disposição: o conteúdo e a disposição dos sinóticos são intimamente


relacionados. Os três sinóticos apresentam a seguinte disposição:

 Descrição da disposição comum dos sinóticos

1. Aparecimento do Batista 2. Ministério de Jesus na Galiléia  3. Ida de Jesus a Jerusalém,


chegada, aparecimento e processo  4. crucifixão e ressurreição

 Características:
as características dos evangelhos sinóticos são as seguintes:
i) Mateus e Lucas têm material mais rico que Marcos
ii) Os três evangelhos sinóticos coincidem na descrição da atividade de Jesus
iii) Os três evangelhos sinóticos não são biografias de Jesus
iv) Os três evangelhos sinóticos não procuram retratar a personalidade de Jesus
v) Os três evangelhos sinóticos apresentam em linguagem popular as ações e
palavras de Jesus, bem como as impressões decorrentes dessas naqueles que as
presenciavam.

 Características literárias:
A exposição sinótica consiste:
i) em unidades de narrativas e discursos completas em si mesmas e postas uma
após a outra, independente de ligações espaciais ou temporais
ii) em seções homogêneas, onde um material de conteúdo semelhante é reunido.
 Ex. 1:os três discursos polêmicos (perdão de pecados, ligação com os
pecadores e sobre o jejum): Mc 2.1-22 e paralelos
 Ex. 2: as questões a respeito da observância do sábado: Mc 2.23-3.6
 Ex. 3: o capítulo das parábolas: Mc 4 e paralelos.
iii) estilo com a linguagem de Jesus sendo a mesma através dos sinóticos:
 sem longas discussões
 com ditos separados, rápidos e característicos
 discursos e fragmentos de discursos, todos muito curtos
 nítida predileção por parábolas

2. Semelhanças de estilo e linguagem


As semelhanças estendem-se até os pormenores de estilo e linguagem entre os sinóticos. Estas
semelhanças estão presentes entre os três evangelhos; entre dois (Marcos e Lucas, ou Marcos e
Mateus); entre Mateus e Lucas; ou entre dois deles em longos trechos, sendo o terceiro
divergente (Marcos e Lucas, com Mateus divergindo; ou Marcos e Mateus, com Lucas
divergindo).

 Paralelos entre os três evangelhos sinóticos


Há paralelos entre os três evangelhos nas seguintes passagens:
- perícope sobre a autoridade de Jesus (Mc 11.27ss e paralelos)
- narrativa da cura do leproso (Mc 1.40ss e paralelos)
- Discurso escatológico (Mc 13.5-8.14-17, 28-32 e paralelos)
- Outros exemplos: Mc 8.34-36 e paralelos; Mc 9.1 e paralelos; Mc 10.13-15 e
paralelos.

 Paralelos entre dois evangelhos


Alguns testemunhos atestam paralelos entre dois dos três evangelhos sinóticos:
- Mt 4.18-22a, paralelo a Mc 1.16-20a
- Mc 1.21-25, paralelo a Lc 4.31-35

 Seções de discursos que só estão em Mateus e Lucas


Dentro da questão dos paralelos entre dois evangelhos, destaca-se aqueles testemunhos em que
Mateus concorda com Lucas, mas as passagens citadas em ambos não estão presentes em Marcos:
- Mt 3.7b-10.12, paralelo a Lc 3.7b-9.17.
- Mt 23.37-39, paralelo a Lc 13.34-35
- Mt 11.4ss, paralelo a Lc 7.22ss.

 Seções onde dois evangelhos concordam em longos trechos, e o terceiro diverge


Não obstante haver menção à passagem concordante, o terceiro a cita de forma difusa das outras
duas testemunhas:
- Mt 20.24-28, paralelo a Mc 10.41-45, divergindo de Lc 22.24-27
- Mc 12.38-40, paralelo a Lc 20.46s, divergindo de Mt 23.6-13
Mais exemplos estão em: FARMER, W. R., Synoptic Problem, p. 204ss. – e na obra: FARMER, W.
R., Synopticon.
Estes exemplos parecem supor a dependência literária entre os evangelhos sinóticos.

3. Diferenças entre os sinóticos


Não obstante as semelhanças apresentadas, os evangelhos sinóticos diferem entre si no conteúdo e
na forma. Para aferir isto, é necessário analisar as narrativas da infância, os relatos de ressurreição, a
atividade pública de Jesus, as parábolas, os textos e contextos e o material especial.

 narrativas da infância
As narrativas da infância contradizem-se uma à outra em pontos essenciais:
- em Mateus, a narrativa do nascimento é contada do ponto de vista de José  em
Lucas, a narrativa do nascimento é contada do ponto de vista de Maria
- em Mateus, Belém é o local da residência da família de Jesus  em Lucas, o local
da residência é Nazaré
- Em Mateus estão presentes as narrativas da fuga para o Egito (Mt 2.13ss) e da visita
dos magos (Mt 2.1ss)  não há menção da viagem para o Egito ou da visita de
magos em Lucas
- A genealogia de Mateus apresenta 3 ciclos de 14 gerações, sendo progressiva (Mt
1.1ss)  a genealogia de Lucas é diferente da de Mateus, e é retroativa (Lc 3.23ss)
- Marcos não apresenta nenhum relato da infância de Jesus

 relatos da ressurreição
Os relatos da ressurreição não apresentam uma tradição uniforme:
- Lucas só conhece aparições de Jesus em Jerusalém (Lc 24)
- Mateus coloca aparições de Jesus na Galiléia (Mt 28)
- Marcos simplesmente ignora qualquer aparição

 atividade pública de Jesus


A extensões da atividade pública de Jesus são variáveis nos evangelhos:
- Mateus apresenta a atividade pública de Jesus em vinte e cinco capítulos
- Lucas apresenta a atividade de Jesus em vinte e um capítulos
- Marcos apresenta a atividade de Jesus em quinze capítulos, faltando quanse por
inteiro as seções dos grandes discursos (sermão da montanha, missão dos doze,
discussão com os fariseus Mt 5-7; 10; 23), e apresenta menos parábolas

 discursos
A localização dos discursos são o principal diferencial entre Mateus e Lucas:
- Mateus apresenta os grandes discursos em forma de discursos elaborados e
distribuídos no evangelho: Mt 5-7, serão da montanha; Mt 10, discurso da missão
dos doze; Mt 12, primeira discussão com os fariseus; Mt 13, parábolas relativas ao
reino de Deus; Mt 18, discurso sobre a comunidade; Mt 23, segunda discussão com
os fariseus; Mt 24-25, discurso escatológico
- Lucas concentra a grande maioria do material dos discursos em seções, misturando
este material com o material narrativo: Lc 6.20-8.3; 9.51-18.14. Além disto, o
discurso da planície de Lucas (Lc 6.20ss), comparado com Mt 5-7, é breve.
- Cada um dos três sinóticos contém material especial que lhe é peculiar, sendo este
material muito mais abundante em Mateus e Lucas que em João. Marcos não contém
a infância de Jesus ou as aparições do ressuscitado.
 textos e contextos
Parte do sermão da montanha de Mateus está em Lucas em lugares e contextos totalmente
diferentes, muito embora com sentidos semelhantes.

 material especial
O material especial em Mateus e Lucas geralmente está ligado aos materiais que ambos têm em
comum (ex.: comparação entre o sermão da montanha em Mateus e o sermão da planície de Lucas).

Em suma, nos textos contidos pelos três evangelhos, ora os três estão de acordo; ora Mateus e
Marcos coincidem e diferem de Lucas; ora Lucas e Marcos coincidem e diferem de Mateus; ora
Mateus e Lucas concordam e diferem de Marcos; ora os três diferem.

2. História do problema sinótico

A história do problema sinótico surgiu na segunda metade do século XVIII, quando se tomou
consciência da questão, não obstante antes algumas discrepâncias e contradições já chamassem a
atenção da igreja primitiva e seus opositores.

 Introdução
Agostinho de Hipona foi o primeiro a se dedicar a esta questão: na obra De consunsu
evangelistarum, I, 2, ele traz informações históricas sobre a origem dos evangelhos. Afirma nesta
obra que Marcos é resumo de Mateus, e antecipa a c´ritica do século XVIII.

1. A hipótese de um evangelho primitivo


Exata hipótese versa que existiu um evangelho primitivo, do qual os evangelistas fizeram suas
versões.

 J.B. Michaelis: afirmou, em sua introdução publicada em 1750 (Einleitung in die göttlichen
Schriften des Neuen Bundes, 1788 4a ed.), que os sinóticos concordavam em muito por usarem
vários evangelhos apócrifos em comum como fontes.

 G.E. Lessing: em sua obra Theses aus der Kirchengeschichte, publicada em 1776; e na sua obra
Hypotesen über die Evangelisten als bloss menschliche Geschichtschreiber betrachtet, de 1778;
Lessing afirma que os Evangelhos são traduções de um texto aramaico antigüíssimo de origem
apostólica, o evangelho dos nazarenos – nazarenos estes conhecidos por Jerônimo no século IV.

 J. E. Eichhorn: tem duas teorias:


1. na obra Über die drei ersten Evangelien, de 1794, Eichhorn dá forma
científica à teoria de Lessing, afirmando que cada evangelista usou o
evangelho primitivo de maneira própria.
2. na obra Einleitung in das Neuen Testament I, de 1804, admitiu a
existência de um evangelho aramaico primitivo, do qual faz derivar
nove evangelhos escritos diferentes, que estariam na base dos
evangelhos agora conhecidos.

 Crítica de Kümmel: hipótese artificial.

 Elogio de Kümmel: preparou o caminho para a compreensão de que os evangelhos são a


culminância de um processo literário.

2. A hipótese do fragmento ou hipótese “Diegesis”


A hipótese apresentada pelos defensores desta teoria é que havia resumos das atividades de Jesus,
que foram consultados pelos evangelistas, o que fez com que entre eles tivessem elementos
semelhantes e distintos.

 H.E.G. Paulus: ele admitiu a hipótese de que Marcos e Lucas se desenvolveram a partir de
resumos (memorabilia) de cada dia da atividade de Jesus.

 F. Schleiermacher: na obra Über die Schriften das Lukas ein kritischer Versuch, de 1917,
conjecturou que os autores originais (apóstolos) anotavam as pregações de Jesus. Estes resumos
(diegeseis) passaram a ser procurados quando a primeira geração começou a desaparecer, sendo os
colecionadores aqui compiladores, que reuniram, cada um, aquilo que mais o interessava. Os
resumos sobre a vida de Jesus, seus atos, narrativas da paixão entre outras foram conservadas no
material evangélico, que têm em sua base estas testemunhas.

 Crítica de Kümmel: não explica a semelhança de vocabulário e na seqüeência, o que


impossibilita serem os evangelhos traduções a ermo.

 Elogio de Kümmel: Num estudo chamado Über die Zeugnisse des Papias von unsern beiden
ersten, de 1832, Schleiermacher afirma que uma coleção de logia de Jesus estava em Mateus, sendo
anterior a este.

3. A hipótese da tradição
Esta hipótese afirma que, ao invés de evagelhos escritos, o que circulavam eram tradições orais
uniformes, que se desenvolveram espontaneamente em Jerusalém a partir dos apóstolos para uso na
pregação.

 Herder: avançando na hipótese de Lessing de que exitiria um evangelho primitivo, afirmou que
este seria um evangelho oral primitivo, surgido a partir de fragmentos isolados (1796-1797).

 J. C. L. Gieseler: apresentou a tese de Herder com argumentação teórica mais consistente,


afirmando que cedo um evangelho oral uniforme se desenvolveu espontaneamente entre os
apóstolos de Jerusalém, para a pregação. Este tipo de tradição de evangelho oral era transmitido em
aramaico, mas assumiu duas outras formas gregas, das quais dependiam os evangelhos sinóticos
(Historich-kritischer Versuch über die Entstehung und die frühesten Schicksale der scriftlichen
Evv., 1818).

 J. W. Doeve: Estaria por detrás do evangelho uma única narrativa, que foi tomando forma em
conexão com a exegese dos textos do AT (Recherches Bibliques, 1957).

 Stather Hunt: o início do relato de Jesus, em conexão com as profecias do AT, estão no início do
proceso de formação do Evangelho

 P. Gaechter: cosidera os três evagelhos sinóticos como independentes um do outro, mas


dependentes todos da tradição oral grega (Das Matthaüs, 1962).

 Elogio de Kümmel: a hipótese de Gieseler está correta ao ver a tradição oral como tradição que
precedeu os evangelhos, durante o qual se transicionou o idioma do querigma do aramaico para o
grego.

 Crítica de Kümmel: não resolve o complexo problema do paralelismo e contradições dos


sinóticos.
4. A hipótese da utilização
As hipóteses da existência de um evangelho primitivo; hipótese do fragmento ou hipótese
“Diegesis”; e a hipótese da tradição afirmam que os sinóticos surgiram sem ligação literária direta
entre si. Mas os pontos de contato entre os evangelhos apontam para uma dependência literária
entre si. São três teorias: a seqüência Mateus-Marcos-Lucas; a seqüência Mateus-Lucas-Marcos; e a
seqüência Marcos-Mateus e Marcos-Lucas.

 Agostinho: foi o precursor desta teoria, ao afirmar que Marcos resumiu Mateus. A extensão ou
variação desta teoria foi feita por:
 Lindsey: Lucas dependeria de uma narrativa primitiva e de Q; e Marcos dependeria de
Lucas, de maneira primitiva, e de Q.
 West: Marcos e uma versão primitiva de Lucas seriam fonte de Mateus; e Lucas é uma
extensão de versão primitiva.
Ambas carecem de fundamentação.

a. A seqüência aceita por Agostinho, Mateus-Marcos-Lucas (p. 394): Marcos depende


de uma forma preliminar de Mateus.
 Schlatter
 Zahn
 Butler
 N. Walker

b. A hipótese de Griesbach, Mateus-Lucas-Marcos: Marcos é resumidor de Mateus,


mas Lucas é “Vorlage” de Marcos.
 J. J. Griesbach: na obra “Commentatio qua Marci evangelium totum e Matthaei et Lucas
commentariis decertum esse mostratur, 1789)., afirma que Marcos depende das obras de
Mateus e Lucas – resumiu Mateus, e tem Lucas como Vorlage.
 F. Bleek: na obra “Einleitung in das Neuen Testament, 1822), cita Mc 1.32 e paralelos como
evidência desta ligação entre os sinóticos:

Mc 1.32 Mt 8.16 Lc 4.40


VOyi,aj de. genome,nhj( o[te e;du VOyi,aj de. genome,nhj Du,nontoj de. tou/ h`li,ou
o` h[lioj prosh,negkan

 F. Strauss e a Escola de Baur: assumiram a tese de Griesbach


 Farmer: restaurou esta tese, com a doção da mesma por Dungan:
 De Wette e Bleek: Consideram que Marcos depende de Lucas e Mateus, e negam qualquer
dependência de Lucas com Mateus.

 Crítica de Kümmel: a hipótese se vê obrigada a assumir os inúmeros dados improváveis e


seu ponto mais vulnerável está em aceitar a independência literária.

c. A seqüência Marcos-Mateus e Marcos-Lucas: a prioridade de Marcos sobre Mateus


e Lucas já foi defendida no século XVIII.
 G. C. Storr: em 1776, defendeu a prioridade de Marcos sobre Mateus.
 J. B. Koppe: em 1782, defendeu a prioridade de Marcos sobre Mateus.
 C. Lachmann: filólogo, percebeu que Marcos e Lucas estão de acordo entre si na seqüência
de Marcos, e que este reproduz a tradição mais próxima do original; e que Mateus
acrescentou matrial marciano a uma coleção de logia (De ordine narratiorum in evangeliis
synopticis, 1835).
 G.G. Wilke e H. Weisse: independentes um do outro, ambos afirmaram que Marcos
representa a fonte comum do material narrativo de Mateus e Lucas. Weisse reforçou esta
afirmação com a hipótese de que Mateus e Lucas coicidem com Marcos na explicação de
uma fonte de logia de Jesus que lhes era comum.
 Holtzmann: admitiu a existência de um Marcos primitivo (Urmarkus), que é fonte para
Mateus e Lucas – e distinto do atual Marcos.

Progresso na teoria das duas fontes: nos últimos cem anos, a teoria obteve ampla aceitação
(Albertz, Feine-Behm, Fuller, Heard, Henshaw, Jülicher, Klijn, McNeile-Williams, Marxens,
Michaelis, Vögtle, Filson, Geldenhuys, Grundmann, Haenchen, Johnson, Schniewind,
Schweitzer, De Solages, Schmid, Perry, Vielhauer, Bradby, Bornkamm, Beare, Dalmau,
McLoughlin, Honoré, Fitzmyer, Carlston e Norlin, Morgenthaler.

 Crise da teoria das duas fontes


a) Lucas:
- tem material especial abundante
- diverge de Marcos, sobretudo na narrativa da paixão
Teorias para explicar:
- Lucas usou outra fonte narrativa
- tem um relato especial da paixão
- incorporou ao material de Marcos um “proto-Lucas”

b) Mateus:
- Pápias fala de Mateus como fonte comum aos sinóticos

 Benoit e Vaganay:
* 3 sinóticos usaram um Mateus traduzido ao grego de diferentes maneiras:
* Mateus canônico é testemunha de um Mateus aramaico
* Marcos resume o Mateus aramaico e acrescenta promenores da pregação de Pedro em Roma

 Parker:
* Marcos depende de um evangelho aramaico, do qual Mateus é o maior representante
* Lucas depende de Marcos
* Não há um Mateus aramaico primitivo

Outros:
 Harrington, Léon-Dufour, Cerfaux, Levie: evangelho aramaico escrito ou oral, ou múltiplas
fontes de tais escritos, que subjazem nos sinóticos.

 Grant: teoria das várias fontes.

 Gaboury: pelo método da “Strukturgeschichte”, hipótese de que todos os três sinóticos


dependeriam de uma fonte especial comum, que teriam ampliado de diversas formas, que seria
preservada somente em Mc 1.1-13 e 6.14-16.8, consegue se impor com convicção.

5. A pré-história do material evangélico


A pesquisa, desde o século XIX, tem se ocupado com a história da tradição oral do material
evangélico (C. Weizäcker e F. Overbeck tratam desta questão).

 Wrede e Welhausen: o primeiro, na obra Das Messiasgeheimnis in den Evv (1901), e o segundo
em seus comentários aos evangelhos sinóticos (1903 e 1904) chamaram a atenção à influência da fé
a comunidade na formação e transformação da tradição sinótica e na teologia de cada evangelista.
Isto passou a ser estudado pela chamada abordagem cítico-formal (Formgeschichtlich) doe
evangelhos. Esta é uma investigação histórico-literária (literaturgeschichtlich).

Os critérios desta linha de pesquisa são os seguintes:


 tradição oral popular obedece a leis rigorosas
 estas leis variam de acordo com o gênero literário (Gattung)
 é necessário descobrir as leis e analisar as unidades de maneira crítico-formal
 depois disto, é necesário classificá-las corretamente
 é necessário distingüir sua origem histórica

 K. L. Schmidt: afirmou que a estrutura básica de Marcos é trabalho do autor, sendo o evangelho
uma coleção de histórias e logia separados, reunidos de maneira livre e que teriam circulado na
tradição oral de uma maneira independente.

 M. Dibelius, R. Bultmann: procuraram fazer uma abordagem crítico-formal:


* Dibelius: classificou os textos em parábolas, logias, paradigmas, novelas, lendas cultuais, lendas
pessoais etc. Evangelistas são colecionadores, transmissores e redatores.

* Bultmann: afirmou serem estas tradições apoftegmas (unidades com logia de Jesus estratificado
numa forma breve). Somente a paixão seria um relato coerente.

P RE G AÇÃ O CR IS T Ã P RIM I TI V A

material mais antigo foi modificado por motivos


dogmáticos; apologéticos ; parenéticos ; disciplinares
dentro da comunidade
palestinense; helenística
* pela assimilação de material estranho da cultura
circunstante e pela incorporação de dados geográficos e cronológicos.

GRUPOS PRÉ-LITERÁRIOS

A REUNIÃO DESTE MATERIAL E SEU POSTERIOR ARRANJO, COM:


- MOTIVOS TEOLÓGICOS PARTICULARES
- NA FORMA LITERÁRIA “EVANGELHO”
POR CADA EVANGELISTA.
A reunião deste material em grupos pré-literários e seu posterior arranjo por cada evangelista é uma
segunda etapa.

 O ponto de vista crítico-formal foi largamente aceito em sua essência, mas encontrou
oposição e repulsa nos juízos históricos nele implicados:

Críticas à Crítica das Formas

A.
 Riesenfeld e Gerhardsson: é falso o pressuposto do criticismo formal de que a formação da
tradição foi dentro da comunidade: Jesus, na realidade, entregou seu ensino aos discípulos em
fórmulas fixas.

Objeções a esta tese:


1) técnicas da tradição do rabinato dificilmente estavam fixadas (Sanders, Tendencies,
demonstra que não há evidências para provar a existência de práticas rabínicas no
cristianismo helenístico.
2) Jesus não era rabinoi fariseu.
3) Igreja primitiva não era guardiã da “palavra divina” – claro que as testemunhas oculares
guardaram a tradição.

B.
Redaktionsgeschichte:
Pela apresentação dos resultados dos antigos estudiosos, foi focalizada a atenção sobre as
pressuposições literárias, sociológicas e teológicas, e sobre os métodos e tendências individuais dos
evangelistas, para demonstrar um terceiro Sitz im Leben, o da crítica da redação
(Redaktionsgeschichte).

Sitzes im Leben

1º Sitz im Leben: história de Jesus

2º Sitz im Leben: formação da tradição na comunidade

3º Sitz im Leben: a redação dos evangelhos

O método da crítica da redação foi aplicado por:


 G. Bornkamm, em 1948, ao evangelho de Mateus
 H. Conzelmann, em 1954, ao evangelho de Lucas
 R.H. Stein: que discute os critérios desta técnica na Zeitschrift für die Neuen Testament
Wissenchaft und die Kunde der älteren Kirche.
 J. M. Robinson: que prefere chamá-la de Gattungsgeschichte
Porém a metodologia ainda (1971) não é segura.
ORDEM DA PESQUISA PARA O PONTO DE VISTA CRÍTICO-FORMAL:

Questão crítico-literária sobre a


relação dos sinóticos entre si

Questão literária das fontes


por detrás dos sinóticos

Elucidação do método redacional


de cada evangelista

Conteúdo e natureza do
material empregado nas fontes

3. Tentativas de Solução da Questão Sinótica

Opção: a partir de resultados já garantidos, fazer 3 restrições:


1. a redação original dos evangelhos não foi preservada.
Mudanças:
- transformações expontâneas
- ampliações
- cortes
- assimilação
- retificações dogmáticas feitas já a partir do século II:
Mt 1.16: E Jacó gerou a José, marido de Maria, da qual nasceu Jesus, que se chama o Cristo.
Mt 11.27: Tudo me foi entregue por meu Pai. Ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém
conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar.
* Conseqüências: não dá para saber quando concordâncias ou variantes são originais ou frutos de
uma revisão.

2. Papias não é uma fonte segura:


- Papias é citado por Euséio de Cesaréia (HE 3,39,16)
- não se sabe se ele tinha conhecimento do assunto
- termos usados por Papias são controversos
Informações de Papias:
- introdução: investigou a tradição oral do Senhor e descobriu aquilo que os presbíteros e discípulos
disseram
- João, o presbítero é sua fonte
- Marcos é hermenéutes de Pedro, e escreveu de memória os ensinamentos deste
- sua redação não corresponde à tácsis dos ensinamentos e ações de Jesus.
Questões abertas:
- qual a relação entre Marcos e Pedro
- porque o presbítero falou que Marcos não tem tácsis.
- É improvável Pedro ter que se utilizar de um intérprete.
Tese:
- É provável que Marcos esteja sendo comparado a outro evangelho, provavelmente Mateus.
Críticas:
- Defesa de Papias não ajuda a entender melhor as relações literárias entre os evangelhos
- Papias deve estar falando de Q, ou dos acréscimos de Marcos a um relato escrito por Pedro
- Mateus não é tradução do aramaico.
- Se Papias está falando do Mateus canônico, ele está errado.
- Uma interpretação adequada das informações de Papias é praticamente impossível.

3. Predecessores aramaicos dos escritos do evangelho grego


- tradição oral das palavras e ditos de Jesus está em aramaico.
- os evangelhos gregos deixam transparecer claramente que a tradição sobre Jesus é aramaica
- devem ser investigadas as traduções e variantes destas traduções

 Eichhorn: lança a hipótese de que os sinóticos são traduções de escritos aramaicos primitivos.

 Torrey: evangelhos são traduções do aramaico.

Objeções:
1) erros de tradução alegados não são convincentes
2) ninguém provou que os evangelhos foram traduzidos
3) relação literária entre os sinóticos é grega
4) Marcos não tem indício de ser uma tradução do aramaico
5) Papias não é uma fonte segura
Conclusão: tradição oral era aramaica: esta é a única certeza.

4. Uma comparação dos três sinóticos demonstra a ampla semelhança em relação a material
entre Marcos e Mateus e Marcos e Lucas.

Exceções:
Só não estão em Mateus ou em Lucas

* três relatos de Marcos:

A parábola da semente que germina por si só:


Marcos 4:26-29
26
Disse ainda: O reino de Deus é assim como se um homem lançasse a semente à terra; 27 depois,
dormisse e se levantasse, de noite e de dia, e a semente germinasse e crescesse, não sabendo ele
como. 28 A terra por si mesma frutifica: primeiro a erva, depois, a espiga, e, por fim, o grão cheio
na espiga. 29 E, quando o fruto já está maduro, logo se lhe mete a foice, porque é chegada a ceifa.

A cura do surdo-mudo:
Marcos 7:31-37 31 De novo, se retirou das terras de Tiro e foi por Sidom até ao mar da Galiléia,
através do território de Decápolis. 32 Então, lhe trouxeram um surdo e gago e lhe suplicaram que
impusesse as mãos sobre ele. 33 Jesus, tirando-o da multidão, à parte, pôs-lhe os dedos nos ouvidos
e lhe tocou a língua com saliva; 34 depois, erguendo os olhos ao céu, suspirou e disse: Efatá!, que
quer dizer: Abre-te! 35 Abriram-se-lhe os ouvidos, e logo se lhe soltou o empecilho da língua, e
falava desembaraçadamente. 36 Mas lhes ordenou que a ninguém o dissessem; contudo, quanto
mais recomendava, tanto mais eles o divulgavam. 37 Maravilhavam-se sobremaneira, dizendo:
Tudo ele tem feito esplendidamente bem; não somente faz ouvir os surdos, como falar os mudos.

O cego de Betsaida:
Marcos 8:22-26 22 Então, chegaram a Betsaida; e lhe trouxeram um cego, rogando-lhe que o
tocasse. 23 Jesus, tomando o cego pela mão, levou-o para fora da aldeia e, aplicando-lhe saliva aos
olhos e impondo-lhe as mãos, perguntou-lhe: Vês alguma coisa? 24 Este, recobrando a vista,
respondeu: Vejo os homens, porque como árvores os vejo, andando. 25 Então, novamente lhe pôs as
mãos nos olhos, e ele, passando a ver claramente, ficou restabelecido; e tudo distinguia de modo
perfeito. 26 E mandou-o Jesus embora para casa, recomendando-lhe: Não entres na aldeia.

* três textos curtos

Reação dos familiares de Jesus


Marcos 3:20-21 20 Então, ele foi para casa. Não obstante, a multidão afluiu de novo, de tal modo
que nem podiam comer. 21 E, quando os parentes de Jesus ouviram isto, saíram para o prender;
porque diziam: Está fora de si.

O fogo que salga


Marcos 9:49 49 Porque cada um será salgado com fogo.

O homem fugitivo
Marcos 14:51-52 51 Seguia-o um jovem, coberto unicamente com um lençol, e lançaram-lhe a
mão. 52 Mas ele, largando o lençol, fugiu desnudo.

Em Marcos:
571 versículos estão em Mateus e/ou Lucas
Marcos tem 8.189 palavras, das 10.650, em Mateus ou em Lucas.
Das 10.650 palavras de Marcos, 7.040 estão em Lucas e 7.760 estão em Mateus.

Se Marcos é a fonte de Mateus e Lucas, é compreensível a omissão, em Mateus e Lucas, de


fragmentos do material marciano:

Explicações das omissões:


* as duas curas (Marcos 7:31-37) são feitas com manipulações mágicas: “... pôs-lhe os dedos nos
ouvidos e lhe tocou a língua com saliva; depois, erguendo os olhos ao céu, suspirou e disse: Efatá!,
que quer dizer: Abre-te!”

* a atitude de parentes (Marcos 3:20-21) de Jesus é ofensiva: “...os parentes de Jesus ouviram isto,
saíram para o prender; porque diziam: Está fora de si.”

* Mc 9.49 é imcompreensível: “salgado com fogo.”???

* A informação de Mc 14.51 é de pouca importância à história: “Seguia-o um jovem, coberto


unicamente com um lençol, e lançaram-lhe a mão. 52 Mas ele, largando o lençol, fugiu desnudo.”

* Apenas a omissão da parábola da semente é inexplicável, não obstante Mateus apresentar, em


13.24ss, a parábola do joio e do trigo: “24 Outra parábola lhes propôs, dizendo: O reino dos céus é
semelhante a um homem que semeou boa semente no seu campo; 25 mas, enquanto os homens
dormiam, veio o inimigo dele, semeou o joio no meio do trigo e retirou-se. 26 E, quando a erva
cresceu e produziu fruto, apareceu também o joio. 27 Então, vindo os servos do dono da casa, lhe
disseram: Senhor, não semeaste boa semente no teu campo? Donde vem, pois, o joio?”

Razão da relação Mt-Mc e Lc-Mc: qualquer outro arranjo traz omissões inexplicáveis.

5. A comparação da seqüência das narrações nos evangelhos é decisiva.


- Mt e Lc concordam na seqüência das narrações nos evangelhos
1) Mt e Lc concordam em seqüência quando concordam com Marcos.
2) Quando Mt e Lc divergem de Mc, cada um segue seu caminho
 Lachmann: primeiro a perceber que Marcos é base para Mateus e Lucas, e teorizou que haveria
um evangelho primitivo melhor preservado por Marcos. A partir disto, foi afirmado que se deveria
rejeitar de Lachmann a defesa de um evangelho primitivo e deveria ser adotada a concepção de que
o próprio Marcos seria a fonte dos evangelhos. Isto só foi possível pela conversão da idéia de
Lachmann de que Mt e Lc não dependem diretamente de Marcos, para a idéia de que dependem
diretamente. A rejeição de Farmer de que a ordem de seqüência (argumento de Lachmann) é uma
falácia sucumbe ao fato de que Mateus e Lucas, quando concordam com a ordem de Marcos,
cncordam também com seu texto.

 Demonstração da Relação entre Lucas e Mateus com Marcos

Evangelho de Marcos Evangelho de Lucas Comentário


1.1-15 3.1-4.15 A rejeição de Jesus em
------------------------- 4.16-30 Nazareé (Mc 6.1-6) é
colocada dentro de uma
1.16-20 ------------------------- cena programática no
1.21-39 4.31-44 começo da atividade de
------------------------- 5.1-11 Jesus (Lc 4.16-30).
1.40-3.6 5.12-6.11
3.7-12 6.12-16
3.13-19 6.17-19
3.31-35 -------------------------
4.1-25 8.4-18
------------------------- 8.19-21
4.35-5.43 8.22-56
6.1-6 -------------------------

Comparação – seções em grego e na tradução em língua portuguesa


Seção 1: Mc 1.15 x Lc 3.1-4.15

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