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Fernand Braudel

Civilização Material, Economia e Capitalismo - Séculos XV a XVIII

Título original CIVILISA TION AM TÉRIELLE, ÉCONOMIE ET (AP1TALLWE - Tome


11 LesJeicv de lEchange

Copyright (e) Libraire Armand Colin. Paris, 1979 Copyrzght


Livraria Martin, Fontes Editora Lida.,
São Paulo, 19-96, para apresente edição l edição janeiro de 1996 Tradução
Teima Costa
Revisão da tradução
Maria Ermantina Galvão G. Pereira Revisão gráfica
Maria de Fátima Cavallaro Agnaldo Alves de Oliveira Produção gráfica
Geraldo Alves
Dados Internacionais de Catalogação na Publicaçáo (CIP) (Câniara
Brasileira do
Livro, SP, Brasil)
Braudel, Fernand, 1902-1985.
Civilização material, economia e capitalismo: séculos XV-XVIII / Fernand
Braudel ; tradução Teima Costa. - São Paulo : Martins Fontes, 1996,
Título original: Civiliwtion matérielle, économie er capitalisme.
Obra em 3 v.
Conteúdo: V 1. As estruturas do cotidiano : o possível e o impossível -
v. 2. Os jogos das trocas.
lSBN 85-336-0428-9 (v. 1) - ISBN 85-336-0462-9 (, 2)

1. Capitalismo - História 2. Civilização - História 3. História econômica


1.
Título.

95-5208 CDD-909

índices para catálogo sistemático:


1.Civilização :História 909

Todo, os direitos para o Brasil reservados à Livrarur Martins FontesUtora


Li, & Rua Conselheiro kintalho,

330134O 01325-00O São Paulo SP Brasil Telefone 2, 39-3677

A Pierre Gourou, em testemunho de uma dupla afeição.

PREFACIO
Se tudo pudesse ser simples, eu diria que o presente volume explora,
acima do andar térreo da vida material - assunto do primeiro volume desta
obra -, os andares imediatamente superiores da vida econômica e, acima
desta, da ação capitalista. Essa imagem de uma casa com vários andares
traduz bem a realidade das coisas, embora as force em seu significado
concreto.
Entre "vida material" (no sentido de economia muito elementar) e vida
econômica, a superfície de contato, que não é contínua, materializa-se em
milhares de pontos modestos: feiras, bancas, lojas... Esses pontos são
todos eles rupturas:
de um lado, a vida econômica com suas trocas, suas moedas, seus pontos
nodais e seus meios superiores, praças comerciais, bolsas ou grandes
feiras; do outro, a "vida material", a não-economia, sob o signo
obcecante da auto-suficiência. A economia começa no limiar do valor de
troca.
Procurei, neste segundo volume, analisar o conjunto dos jogos da troca,
desde o escambo elementar até, e inclusive, o mais sofisticado
capitalismo. Partindo de uma descrição tão atenta e neutra quanto
possível, tentei apreender regularidades e mecanismos, uma espécie de
história econômica geral (tal como há uma geografia geral), ou, para quem
preferir outras linguagens, uma tipologia, ou um modelo, ou ainda uma
gramdtica capaz de fixar pelo menos o sentido de algumas palavraschave,
de algumas realidades evidentes, sem que, todavia, esta história geral
seja de

)erfeito, sem que a tipologia proposta seja peremptória, sobretudo comque


o modelo possa ser de alguma forma matematizado e verificado, gramática
nos tenha dado a chave de uma linguagem ou de um discurso ), e isto
supondo que tal discurso exista e seja suficientemente igual atrapo e do
espaço. De um modo geral, tratou-se de um esforço de inteligibia
reconhecer articulações, evoluções e, também, as forças imensas que ordem
tradicional e as "violências inertes" de que fala Jean-Paul Sartre. um
estudo situado na junção do social, do político e do econômico. al rumo,
o único método era a observação, repetida até cansar os olhos, diversas
ciências do homem, mais ainda a comparação sistemática, a Úo das
experiências da mesma natureza sem temer demasiado, por meio s que não
mudam muito, que o anacronismo nos pregasse peças quando árias
confrontações. É o método comparativo que Marc Bloch mais rea e que
pratiquei segundo uma perspectiva da longa duração. Na fase iossos
conhecimentos, muitos dados comparáveis nos são oferecidos atrapo e
através do espaço, a ponto de termos a impressão de proceder não
xperiências comparadas, nascidas ao sabor do acaso, mas quase a expe.s.
Construí, portanto, um livro a meio caminho entre a história,
inspimordial, e outras ciências do homem.
confronto entre modelo e observação, o que encontrei constantemente
isistente oposição entre uma economia de troca normal e muitas vezes
iatural, dir-se-ia no século XVIII) e uma economia superior, sofisticada,
dir-se-ia no século XVIII).
Estou certo de que esta divisão é tangível, ntes e os homens, os atos, as
mentalidades não são os mesmos nos difeires da construção. Que as regras
da economia de mercado que se enconrtos níveis, tais como as descreve a
economia clássica, atuam muito mais sob o seu aspecto de livre
concorrência na zona superior, que é a dos Ja especulação. Aí começa uma
zona de sombra, de contraluz, de ativiaiciados que creio estar na raiz do
que nos é dado compreender sob a pitalismo, sendo este uma acumulação de
poder (que baseia a troca nude força, tanto e mais do que na
reciprocidade das necessidades), um :> social, inevitável ou não, como
tantos outros. Em suma, há uma hiemundo mercantil mesmo que, aliás como
em qualquer outra hierarquia, superiores não possam existir sem os
andares inferiores em que se apóiam. ~os, enfim, que, mesmo abaixo das
trocas, aquilo a que chamei vida a falta de melhor expressão, constitui,
durante os séculos do Ancien Réna mais espessa de todas.
ão achará o leitor discutível - mais discutível ainda do que esta
oposição s andares da economia - que eu tenha utilizado a palavra
capitalismo iar o andar mais elevado? A palavra capitalismo só aparece
tardiamente turidade e em sua força explosiva, com o princípio do século
XX. Não.dúvida de que ela ficou marcada em seu sentido profundo pela data
de ?iro nascimento, e lançá-la de supetão entre 140O e 180O não será
cometer, e pecado que pode cometer um historiador - o pecado do
anacronismo? le, isso não me perturba muito. Os historiadores inventam
palavras, ródesignar retrospectivamente seus problemas e seus períodos: a
guerra

dos Cem Anos, o Renascimento, o Humanismo, a Reforma... Para essa zona


que não é a verdadeira economia de mercado, mas tantas vezes a sua franca
contradição, eu precisava de uma palavra especial. E aquela que se
apresentava de modo irresistível era mesmo capitalismo. Por que não se
servir desta palavra evocadora de imagens, esquecendo todas as discussões
acaloradas que ela levantou e ainda levanta?
Segundo as regras que presidem à construção de qualquer modelo, fui
prudentemente, neste livro, do simples para o complexo. O que as
sociedades econômicas de outrora oferecem sem dificuldades a uma primeira
observação é o que em geral se chama circulação ou economia de mercado.
Empenhei-me, portanto, nos dois primeiros capítulos - "Os instrumentos da
troca" e "A economia em face do mercado" -, em descrever os mercados, a
mascateagem, as lojas, as feiras, as bolsas... Decerto com pormenores a
mais. E tentei discernir algumas regras da troca, se é que há regras. Os
dois capítulos seguintes - "O capitalismo em casa alheia" e "O
capitalismo em casa" - abordam, à margem da circulação, os problemas
difusos da produção; definem também, o que era indispensável, o sentido
dessas palavras decisivas no debate que aceitamos: capital, capitalista,
capitalismo; finalmente, tentam situar setorialmente o capitalismo,
devendo essa "tipologia" revelarlhe os limites e, logicamente, desvelar-
lhe a natureza. Então teremos chegado ao cerne de nossas dificuldades,
não ao termo de nossa labuta.
Um último capítulo, na realidade talvez o mais necessário, "A sociedade
ou o conjunto dos conjuntos", tenta recolocar a economia e o capitalismo
no contexto geral da realidade social, fora do qual nada pode assumir
pleno significado.
Mas descrever, analisar, comparar, explicar é colocar-se quase sempre
fora da narrativa histórica, é ignorar ou quebrar, como que por capricho,
os tempos contínuos da história. Ora, esses tempos existem; voltaremos a
encontrá-los no terceiro e último livro desta obra: O tempo do mundo.
Ficaremos portanto, nas páginas do presente volume, numa fase prévia em
que o tempo não é respeitado em sua continuidade cronológica, mas
utilizado como meio de observação.
Nem por isso a minha tarefa ficou simplificada. Recomecei quatro, cinco
vezes os capítulos que compõem este livro. Apresentei-os oralmente no
Collège de tio a paFrance e na École des Hautes Études. Escrevi-os e
tornei a escrevê-los de f* vio. Henri Matisse, contou-me um dos seus
amigos que posou para ele, tinha o hábito de recomeçar dez vezes cada um
dos seus desenhos, lançando-os no cesto de papéis, dia após dia, para
apenas conservar o último, em que pensava ter encontrado enfim a pureza e
a simplicidade do seu traço. Não sou Henri Matisse, infelizmente. E nem
sequer tenho certeza de que a minha última redação seja a mais clara, a
mais conforme ao que penso ou tento pensar. Para me consolar, repeti para
mim mesmo a frase de um historiador inglês, Frederic W. Maitland (1887):
"A simplicidade não é o ponto de partida, mas o objetivo", às vezes, com
alguma sorte, o ponto de chegada.

Capítulo -1

OS INSTRUMIENTOS DA TROCA
A economia, à primeira vista, consiste em duas enormes zonas: a produção,
o consumo. Aqui tudo acaba e se destrói, ali tudo começa e recomeça. "Uma
sociedade", escreveu Marx, não pode parar de produzir, tal como não pode
pa rar de consumir." Verdade banal. Proudhon diz quase a mesma coisa
quando afirma que trabalhar e comer são a única finalidade aparente do
homem. Mas entre esses dois universos se insinua um terceiro, estreito
mas vivaz como um rio, também reconhecível à primeira vista: a troca ou,
se se preferir, a economia de mercado
- imperfeita, descontínua, mas já coerciva durante os séculos que este
livro estuda, e seguramente revolucionária. Num conjunto que tende
obstinadamente para um equilíbrio rotineiro e só sai dele para a ele
voltar, é a zona da mudança e das inovações. Marx a denomina esfera da
circulaçã02, expressão que me obstino em achar feliz. Por certo, a
palavra circulação, vinda da fisiologia para a economia3 abarca muitas
coisas ao mesmo tempo. Segundo G. Schelle4 o editor das obras completas
de Turgot, este teria pensado em elaborar um Tratado da circulação em que
falaria dos bancos, do sistema de Law, do crédito, do câmbio e do
comércio, enfim, do luxo, isto é, de quase toda a economia tal como era
então entendida. Mas não terá a expressão economia de mercado hoje
assumido também um sentido mais amplo que ultrapassa infinitamente a
simples noção de circulação e de troca?'

)s aa iroca s universos, portanto. No primeiro tomo desta obra,


destacamos o consu;
capítulos que se seguem, abordaremos a circulação. Os difíceis problemas
Lição virão em último lugaró. Não que se possa contestar Marx e Proudlion
que não são essenciais. Mas, para o observador retrospectivo que é o his,
é difícil começar pela produção, domínio confuso, de árdua delimitação
risuficienternente inventariado. A circulação, pelo contrário, tem a
vanta;er de fácil observação.
Tudo nela é agitação e lhe assinala os movimentos. das feiras chega
distintamente a nossos ouvidos. Não é exagero dizer que, istar os
negociantes, mercadores e vendedores, na praça do Rialto, em Ver volta de
1530, da própria janela da casa de Aretino, que com prazer consse
espetáculo cotidian07; posso entrar, por volta de 1688 e até antes, na
Amsterdam sem me perder, diria mesmo que posso jogar lá sem cometer
eorges Gurvitch obj etar-me-ia imediatamente que o facilmente observável
risco de ser o que não conta ou o secundário. Não estou tão certo disso
- e não creio que Turgot, às voltas com toda a economia do seu tempo, -se
enganado de todo ao privilegiar a circulação. E, se a gênese do capita'à
estritamente ligada à troca, pode-se desprezá-la? Enfim, a produção é )
do trabalho e, portanto, obrigatoriamente, a condenação dos homens à s,
quem pensaria realmente em minimizar o papel do mercado? Mesmo Lr, é o
lugar predileto da oferta e da procura, do recurso a outrem, sem o
haveria economia no sentido comum da palavra, mas apenas uma vida da" (o
inglês diz embedded) na auto-suficiência ou na não-economia. O é uma
libertação, uma abertura, o acesso a outro mundo. É vir à tona. tde dos
homens, os excedentes que eles trocam passam aos poucos por essa streita
com tanta dificuldade, no princípio, como o camelo da Escritura ico da
agulha. Depois os buracos se alargaram, se multiplicaram, tornando-dade,
no fim do caminho, uma "sociedade de mercado generalizado' 98. Lo
caminho, portanto tardiamente, e nunca, conforme as diversas regiões, a
data nem da mesma maneira. Não há, portanto, história simples e linear
volvimento dos mercados. Nesse ponto o tradicional, o arcaico, o
moder)derníssimo estão lado a lado. Ainda hoje. É certo que é fácil
conseguir iagens significativas, mas não é fácil, mesmo no que se refere
à Europa, , ilegiado, situá-las com exatidão relativamente umas às
outras.
esta dificuldade, de certo modo insinuante, também do fato de o nosso o
observação, do século XV ao XVIII, ser ainda um tempo insuficiente? de
observação ideal deveria estender-se a todos os mercados do mundo,
origens até os nossos dias. Foi o imenso domínio já debatido pela paixão
ta de Karl
Polanyi9. Mas englobar numa mesma explicação os pseudomerBabilônia
antiga, os circuitos de troca dos primitivos das ilhas Trobriand os
mercados da Europa medieval e pré-industrial, será isso possível? Não
namente convencido disso.
como for, não vamos, de início, encerrar-nos em explicações gerais. Coos
por descrever. Primeiro a Europa, testemunho essencial que conheceior do
que os outros. Depois a não-Europa, pois nenhuma descrição nos um
princípio de explicação válido se não desse efetivamente a volta ao

Veneza, ponte de Rialto. Quadro de Carpaccio, 1494. (Veneza, Academia,


cliché
Giraudon.)

: AS ENGRENAGENS NO, ERIOR DAS TROCAS , em primeiro lugar, a Europa.


Mesmo antes do século XV, ela eliminais mais arcaicas da troca. Os preços
que conhecemos ou de cuja existênLmos são, já no século XII, preços que
flutuam10, prova da instalação )s já "modernos- capazes de,
ocasionalmente, ligados uns com os ou__ trigo feijão aveia

......, cevada,

1 -
- 11 ,
J, , kl" -1

- -------117O 1175 118O 1185 119O 1195 1200

PRECOCIDADE DAS FLUTUAÇõES DE PREÇOS NA INGLATERRA armer, "Some Prices


Fluctuations in Angevin England" in The Economic History
Review, 1956-1957, subida concomitante dos preços dos diversos cereais
por causa das más colheitas do ano de 1201.
ir sistemas, ligações de cidade com cidade. com efeito, praticamente is e
as cidades têm feiras locais. Raríssimas, algumas feiras de aldeia" !m no
século
XV, mas em quantidade insignificante. A cidade do Ociu tudo, submeteu
tudo à sua lei, às suas exigências, aos seus controles. iou-se uma das
suas engrenagens

12.
i forma elementar, as feiras ainda hoje existem. Pelo menos vão sobrem
dias fixos, ante nossos olhos, reconstituem-se nos locais habituais
idades, com suas desordens, sua afluência, seus pregões, seus odores )
frescor de seus gêneros.
Antigamente eram quase iguais: algumas bando contra a chuva, um lugar
numerado para cada vendedor13, fixado, devidamente registrado e que é
necessário pagar conforme as exigên, oridades ou dos proprietários; uma
multidão de compradores e uma ! biscateiros, proletariado difuso e ativo:
debulhadoras de ervilhas que
têm fama de mexeriqueiras inveteradas, esfoladores de rãs (que chegam a
Genebra14 e a Paris" em carretos inteiros, de mula), carregadores,
varredores, carroceiros, vendedores e vendedoras ambulantes, fiscais
severos que transmitem de pais para filhos seu mísero ofício, mercadores
varejistas e, reconhecíveis pelas roupas, camponeses e camponesas,
burguesas em busca de algo para comprar, criadas que são hábeis em passar
a perna (dizem os ricos) nos patrões quanto ao preço ("ferrar a mula-,
dizia-se então) 16 padeiros que vão à feira vender grandes pães,
açougueiros com suas várias bancas atravancando ruas e praças,
atacadistas (mercadores de peixe, de queijo ou de manteiga por atacado)
17

coletores de taxas... E depois, expostas por toda a parte, as


mercadorias, barras de manteiga, montes de legumes, pilhas de queijos, de
frutas, de peixes ainda pingando, de caça, carnes que o açougueiro corta
na hora, livros que não foram vendidos e cujas folhas impressas servem
para embrulhar as mercadorias18.
Dos campos chegam ainda a palha, a lenha, o feno, a lã, até o cânhamo, o
linho e mesmo tecidos dos teares de aldeia.
Se este mercado elementar, igual a si próprio, se mantém através dos
séculos é certamente porque, em sua simplicidade robusta, é imbatível,
dado o frescor dos gêneros perecíveis que fornece, trazidos diretamente
das hortas e dos campos das cercanias. Dados também seus preços baixos,
pois esse mercado elementar, onde se vende sobretudo "sem intermediários"
19, é a forma mais direta, mais transparente de troca, a mais bem
vigiada, protegida contra embustes. A mais justa? O Livre des métiers de
Boileau (redigido por volta de 1270)2O o diz insistentemente: --Pois há
razões para que os gêneros cheguem à feira e aí se veja se são bons e
leais ou não [... 1 porque nas coisas [... 1 vendidas em plenafeira todos
podem tomar parte, o pobre e o rico."* Segundo uma expressão alemã, é o
comércio de mão na mão, olhos nos olhos (Hand-in-Hand, A uge-in-A uge
Hande021 , a troca imediata: o que se vende, vende-se sem demora, o que
se compra, leva-se logo e paga-se no mesmo instante; o crédito é pouco
utilizado, e só de uma feira para outra 22. Este antiqüíssimo tipo de
troca já era praticado em Pompéia, em óstia ou em Tirrigad, a Romana, e
séculos, milênios antes: a Grécia antiga teve suas feiras; havia feiras
na China clássica, bem como no Egito faraônico, na Babilônia, onde a
troca foi tão precoce". Os europeus descreveram o esplendor colorido e a
organização da feira --de
Tlalteco que fica perto de Tenochtitlan- (MéXiCO)24 e as feiras
"regulamentadas e policiadas" da África Negra, cuja ordem os impressionou
favoravelmente, a despeito da exigüidade das trocaS25 . Na Etiópia, a
origem das feiras perdese na noite dos tempoS26.
As feiras urbanas são realizadas geralmente uma ou duas vezes por semana.
Para abastecê-las, é necessário que o campo tenha tempo de produzir e de
reunir os gêneros e possa dispensar uma parte da sua mão-de-obra para a
venda (confiada * É saboroso o arcaico do original: "Quar il est resons
que les denrées viegnent en plein marchié et illuee soient vues si elles
sont bonnes et loyaux ou non car aux choses vendues en plein marchie,
tous pueent avoir part, et poure et riche."
(N.T.)

icia às mulheres). É verdade que nas grandes cidades as feiras tendem is,
como em Paris, onde, em princípio (e muitas vezes de fato), só devear-se
às quartas e aos sábadOS27. Seja como for, intermitentes ou contí;
mercados elementares entre campo e cidade, pelo seu número e incanição,
representam a mais volumosa de todas as trocas conhecidas, como dam
Smith. Por isso as autoridades urbanas empenharam-se em sua ore
vigilância: para elas, é uma questão vital. Ora, são autoridades próxias
para punir, para regulamentar, que vigiam rigorosamente os preços. se um
vendedor exigir um preço superior em um só "grano" à tarifa Je até ser
condenado às galés! O caso aconteceu, em 2 de julho de 1611, o28. Em
Châteaudun 29 os padeiros surpreendidos em delito pela tercei"jogados
brutalmente de cima de uma carroça basculante, atados como Tal prática
remontava a 1417, quando Carlos de Orléans deu aos escalo de inspeção
sobre os padeiros. A comunidade conseguirá a supressão só em 1602.
igilâncias e repreensões não impedem a feira de se expandir, de engros)r
da procura, de colocar-se no centro da vida citadina. Freqüentada em a
feira é um centro natural da vida social. É nela que as pessoas se
enonversam, se insultam, passam das ameaças às vias de fato, é nela que
uns incidentes, depois processos reveladores de cumplicidades, é nela que
pouco freqüentes intervenções da ronda, espetaculares, é certo, mas
tamntes10. é nela que circulam as novidades políticas e as outras. No
con)rfolk, em 1534, na praça pública da feira de
Fakenham, criticam-se em atos e os projetos do rei Henrique V11131. E em
qual mercado inglês amos ouvir, ao longo dos anos, as palavras veementes
dos pregadores? Jão sensível interessase por todas as causas, até pelas
boas. A feira é lugar predileto dos acordos de negócios ou de família.
"Em Giffoni, a de Salerno, no século XV, vemos pelos registros dos
notários que no i, além da venda dos gêneros alimentícios e dos produtos
do artesanato -se uma percentagem mais elevada [do que habitualmente]
de contratos e venda de terrenos, de enfiteuses, de doações, de contratos
de casamen;tituições de dotes.--32 Tudo se acelera com a feira. Até, e
com toda a ovimento das lojas. Assim, em Lancaster, na Inglaterra, no
final do séWilliam
Stout, que ali tem loja, arranja ajudantes suplementares "on andfair
days' '33.
Trata-se decerto de uma regra geral. Contanto, evi, que as lojas não
sejam fechadas por lei, como acontece em muitas cidias de feiras locais
ou regionaiS34.
a sabedoria dos provérbios para provar que a feira e o mercado se siritro
de uma vida de relações. Eis alguns exemploS35: "Tudo se vende ienos a
virtude e a honra." "Quem compra o peixe no mar [antes de >J arrisca-se a
ficar só com o cheiro." Se não conheces bem a arte de i de vender, ah, "a
feira será tua mestra". Como na feira ninguém está em ti e pensa na
feira", isto é, nos outros.
Ao homem avisado, diz um Laliano, "valpiú avere amici in piazza che
denari nella cassa", vale mais ia praça que dinheiro no cofre. Resistir
às tentações da feira é a imagem para o folclore do Daomé atual. "A quem
te diz 'Vem e compra!' farás ponder: 'Não gasto mais do que tenho.--36

Em Paris, afeira do pão e afeira de aves, quaides A ugustins, cerca de


1670.
(Paris, Carnavalet, clichê Giraudon.)
Os mercados e feiras se multiplicam e se especializam
AcIstritos às cidades, os mercados e feiras crescem com elas.
Multiplicam-se, explodem em espaços urbanos demasiado pequenos para os
conterem. E, como são a modernidade em marcha, sua aceleração não aceita
muito entraves: impõem impunemente seus estorvos, seus detritos, seus
tenazes ajuntamentos. A solução seria removê-los para as portas das
cidades, mais além das muralhas, para os arrabaldes, o que muitas vezes
acontece com a criação de uma nova feira, como em
Paris na praça Saint-Bernard, no faubourg Saint-Antoine (2 de março de
1643);
como (outubro de 1660) "entre a porta Saint-Michel e o fosso da nossa
cidade de
Paris, a rua Enfer e a porta Saint-Jacques`1. Mas os pontos de encontro
antigos, no coração das cidades, mantêm-se; é até já bem complicado
deslocá-los ligeiramente, como em 1667, da ponte Saint-Michel para a sua
extremidade38 oU meio século mais tarde, da rua Mouffetard para o vizinho
Pátio do palacete dos
Patriarcas (maio de 1718)39. O novo não expulsa o velho. E, como as
muralhas se deslocam à medida que crescem as aglomerações, as feiras
sensatamente instaladas no perímetro externo acabam ficando, um belo dia,
no interior dos muros e ali permanecem.
Em Paris, Parlamento, escabinos, chefe de polícia (a partir de 1667)
procuram desesperadamente contê-los dentro de justos limites. Em vão. A
rua Saint-Honoré torna-se impraticável, em 1678, por causa de uma "feira
que se estabeleceu abusi

f ZIRI--_ o mercado do Fãouêt (fim do século XVI). (Clichê Giraudon.)


alçado, de peles (nas cidades alemãs Kornhaüser, Pelzhaüser, Schuliesmo
em
Gõrlitz, numa região produtora da preciosa planta tintorial, i do pastel-
dostiritureiroS55. No século XVI, os burgos e cidades da em construir-se
numerosos mercados com diversos nomes, muitas ves por um rico mercador do
lugar, num rasgo de generosidade56. Em século XVII, o mercado de fios
realiza-se no centro da cidade, atrás Saint-Firmin-en-Castillon, a dois
passos do grande mercado, o mercaos artesãos ali se abastecem todos os
dias de fio de lã chamado de engordurado depois da cardadura e geralmente
fiado em roca"; trata-se ito fornecido à cidade pelos fiandeiros dos
campos vizinhoS57. Tamas dos açougueiros, próximas umas das outras num
espaço coberto, lizer, mercados. É assim em ÉvreUX58; é assim em Troyes,
dentro de scuro59 ; é assim em Veneza, onde os Beccarie, os grandes
açougues stão reunidos, a partir de 1339, a poucos passos da praça do
Rialto, l' Querini, com a rua e o canal que têm o mesmo nome de Beccarie
San Matteo, igreja dos açougueiros, que só será destruída no princío
XIX60.
ra halle pode, portanto, ter mais de um significado, do simples mercaté o
edifício e a organização complexa dos Halles que muito cedo cons)rimeiro
"ventre de Paris". A enorme instalação remonta a Filipe, então que se
constrói o vasto conjunto nos Champeaux, nas imediatitério dos lnnocents,
que só será desativado muito mais tarde, em

Os instrumentos da troca

1786 62. Mas, quando da vasta recessão que ocorreu, de um modo geral,
entre 1350

e 1450, houve uma evidente deterioração dos Halles. Em virtude dessa


recessão, evidentemente; mas também por causa da concorrência das lojas
vizinhas. Seja como for, a crise dos Halles não é tipicamente parisiense.
É patente em outras cidades do reino. Edifícios desativados caem em
ruínas. Alguns recebem as imundícies da vizinhança. Em Paris, o mercado
dos tecelões, --segundo as contas de 1484 a

1487, serviu pelo menos em parte de abrigo para as carretas da artilharia


do
Rei"63. São conhecidas as considerações de Roberto S. LopeZ64 sobre o
papel de "indicadores" desempenhado pelos edifícios religiosos: se sua
construção se interrompe, como aconteceu com a catedral de Bolonha em
1233, com a catedral de
Siena em 1265 ou com a de Santa Maria del Fiore em Florença em 1301-1302,
é sinal de crise. Poderíamos promover os mercados, cuja história global
nunca se tentou fazer, a essa mesma dignidade de "indicadores"? Se sim, a
recuperação, em
Paris, corresponderia aos anos de 1543-1572, mais os últimos do que os
primeiros deste período. O edito de Francisco 1 (2O de setembro de 1543),
registrado no
Parlamento em 11 de outubro seguinte, não passa, efetivamente, de um
primeiro gesto. Outros se seguiram. Finalidade aparente: mais embelezar
Paris do que dotáIa de um organismo poderoso. E, no entanto, o retorno a
uma vida mais ativa, o progresso da capital, a redução, após a
restauração dos Halles, do número de lojas e de pontos de venda nas
imediações fazem dessa uma operação mercantil excepcional. Seja como for,
a partir do fim do século XVI, os Halles, que vestiram roupa nova,
recuperam a antiga atividade do tempo de S. Luís. Também aí houve
"Renascimento"65.
Nenhuma planta dos Halles pode dar-nos uma imagem exata desse vasto
conjunto:
espaços cobertos, espaços descobertos, pilares que sustentam as arcadas
das casas vizinhas, vida mercantil transbordante que, ao mesmo tempo, se
aproveita da desordem e do atravancamento e cria ambos em proveito
próprio. Diz Savary (176 1)66 que esse mercado compósito não mais se
modificou desde o século XVI.
Não é de crer: houve contínuos movimentos e deslocamentos internos. Mais
duas inovações no século XVIII: em 1767, o mercado de trigo é removido e
reconstruido no local do antigo palacete de Soissons; no fim do século,
há reconstrução do mercado de peixe de mar, do mercado de couros, e
transferência do mercado de vinhos para além da porta de Saint-Bernard. E
não param de surgir projetos para organizar e, já, mudar os Halles de
local. Mas o enorme conjunto (50.00O ml de terreno) ali permaneceu, com
muita lógica.
Em edifício coberto ficam apenas os mercados de tecidos rústicos, de
tecidos finos, de peixe salgado e de peixe fresco. Mas ao redor destas
construções, colados a elas, erguem-se ao ar livre os mercados de trigo,
de farinha, de manteiga a granel, de velas, de filaças e cordas para
poços. Junto aos "pilares", dispostos ao redor, alojam-se como podem
adeleiros, padeiros, sapateiros e "outros pobres mestres dos comerciantes
de Paris que têm direito de se instalar no mercado--. Contam dois
viajantes holandeseSÓ7: --Em l' de março [1657], vimos o Adelo que fica
ao lado dos Halles. É uma grande galeria, sustentada por pilares de pedra
de cantaria, debaixo da qual se alojam todos os vendedores de roupas
velhas. [... ] Duas vezes por semana há feira pública: é quando todos os
adeleiros, entre os quais há aparentemente grande número de judeus,
expõem suas mercadorias. A qualquer hora que por ali se passe, é-se
incomodado pelos contínuos pregões, born capote militar! be21

pelos pormenores que contam de suas mercadorias, puxando as pessoas itrem


nas lojas. [... 1 É difícil acreditar na prodigiosa quantidade de traveis
que eles têm: há alguns muito bonitos, mas é perigoso comprá-los
=hecedor, pois têm uma maravilhosa habilidade para retocar e remenvelho
de maneira que pareça novo.-Como as lojas são mal iluminai-se ter
comprado um traje preto e, quando se chega à luz, é verde ou nanchado
como a pele do leopardo".
Je mercados colados uns aos outros, onde se amontoam detritos, águas Àxe
podre, os belos Halles são também --o pior e o mais sujo dos bairros
confessa Piganiol de Ia Force (1742)68. São também a capital das disJosas
e da gíria. As vendedoras, muito mais numerosas do que os venío o tom;
têm fama de serem --as bocas mais grosseiras de toda a Pa5
desavergonhada! Fala aí! Ei, grande puta! És marafona dos estudanVai para
o colégio de Montaigu! Não tens vergonha na cara? Carcaça is poucas!
Desavergonhada! Safardana, estás bêbada até o gargalo." e falam as
peixeiras do
Século XV1169. E, com certeza, até mais tarde.
ais complicado, por mais peculiar que seja o mercado central de Paris,
raduzir a complexidade e as necessidades de abastecimento de uma grande
muito cedo extravasou as proporções correntes. Como as mesmas cau-m os
mesmos efeitos, logo que Londres se desenvolve da maneira que capital
inglesa é invadida por mercados múltiplos e desordenados. Incaber nos
antigos espaços que lhes eram reservados, transbordam para nhas, que se
tornam cada uma delas uma espécie de mercado especiali, legumes, criação,
etc. No tempo de Elizabeth, atulham a cada dia mais is movimentadas da
capital. Só o grande incêndio de 1666, The Great tirá um ordenamento
geral. As autoridades constroem então, para deruas, grandes edifícios ao
redor de amplos pátios. São, portanto, mer[nados, mas a céu aberto,
alguns especializados, principalmente de ata)s mais diversificados.
.ihall, o mais extenso de todos - dizia-se que era o maior da Europa
oferece um espetáculo comparável aos Halles de Paris. Mas com mais i
dúvida. Leadenhall absorveu em quatro edifícios todos os mercados aiaram,
antes de 1666, ao redor da sua antiga localização, os de Grace!et,
CornhiII, The Poultry, New Fish
Street, Eastcheap. Num pátio, 10O çougueiros fornecem carne bovina; em
outro,

14O são reservadas às ou; em outro lugar vende-se peixe, queijo,


manteiga, pregos, quinquilha)tal, "um mercado monstro, objeto de orgulho
citadino e um dos granulos da cidade". Claro, a ordem de que Leadenhall
era símbolo durou itinuando a crescer, a cidade ultrapassa as soluções
sensatas, volta a en, elhas dificuldades; já em 1699, por certo mais
cedo, as bancas invadem ruas, alojam-se sob os portais das casas,
vendedores espalham-se pela, speito das proibições que atingem os
mercadores ambulantes. Entre es

Em Paris, a vendedora de arenque e outras peixeiras em plena ação nos


Halles; em primeiro plano, um mercador de bolinhos. Estampa anônima da
época da Fronda.
(Cabinet des Estampes, clichê B.N.)

- os da rua, os mais pitorescos são as peixeiras, com a mercadoria num


vam à cabeça. Têm má reputação, são alvo de troça e também exploraia foi
bom, é certo encontrá-las à noite no botequim. Decerto são tão e
agressivas como as peixeiras dos Halles. Mas voltemos a Paris. arantir
seu abastecimento, Paris tem de organizar uma enorme região capital: o
peixe e as ostras vêm de Dieppe, do
Crotoy, de Saint-Valéry., iajante (1728) que passa perto das duas
cidades: "Só se vê caça de mar é impossível pôr a mão, acrescenta,
--nesse peixe que nos segue por tos [... 1 Levam-no todo a Paris"". Os
queijos vêm de Meaux; a manteirnay, perto de Dieppe, ou de lsigny; os
animais de abate, das feiras de ceaux e de mais longe, de Neubourg; o
born pão, de Gonesse; os legude Caudebec, na Normandia, onde há feira
todos os sábadOS72... Daí e medidas que devem ser continuamente tomadas e
modificadas. Trataicial, de salvaguardar a zona de abastecimento direto
da cidade, de per-cício da atividade dos produtores, revendedores e
transportadores, tomodestos, que não param de abastecer os mercados da
grande cidade. o afastada para além desta zona das proximidades a ação
livre dos mer)fissionais. Um regularnento da polícia do Châtelet (1622)
ampliou para ) raio do círculo além do qual os mercadores podem ocupar-se
do abas[e trigo; para sete léguas a compra de gado vivo (163 5); para
vinte léguas is chamadas "de leite" e dos porcos (1665); para quatro
léguas a dos gua doce, no princípio do Século XV1173; para vinte léguas
as compras or atacado74.
átos outros problemas: um dos mais graves é o abastecimento de cavagado.
Efetuase em mercados tumultuosos que, na medida do possível, ridos para a
periferia ou para fora dos muros da cidade. O que virá a de Vosges,
espaço abandonado junto de Tournelles, terá sido durante )o um mercado de
cavaloS75. Paris está, pois, permanentemente rodcai coroa de feiras,
quase feiras gordas. Fecha-se uma, abrese outra no
- com os mesmos ajuntamentos de pessoas e de animais. Numa dessas
;avelmente
Saint-Victor, temos em 1667, segundo testemunhas oculas de três mil
cavalos [ao mesmo tempo] e é um prodígio haver tantos, , ira duas vezes
por semana". Na realidade, o comercio dos cavalos pelade inteira: há
cavalos "novos" que vêm das províncias ou do estranm mais ainda cavalos
"velhos", isto é [ ... 1 que já serviram", ou seja, mão, de que --os
burgueses querem [por vezes] desfazer-se sem enviaado", donde um enxame
de corretores e ferreiros que servem de interi serviço dos mercadores de
cavalos e daqueles proprietários de cavalaridisso, cada bairro tem os
seus alugadores de cavaloS77.
m as grandes feiras de gado são enormes ajuntamentos, em Sceaux (às Áras)
e em
Poissy (às quintas), nas quatro portas da pequena cidade (pornas, da
Ponte, de
Conflans, de PariS)78. Um ativíssimo comércio de carmizado por uma cadeia
de "financiadores" que adiantam nas feiras o is compras (e depois se
fazem reembolsar), de intermediários, de bate, iblins ou os bâtonniers)
que percorrem toda a França para comprar ganente, de açougueiros, nem
todos míseros varejistas: alguns chegam a stias burguesaS79. Segundo um
levantamento, todas as semanas se ven

Os instrumentos da troca dem nos mercados de Paris, arredondando os


números, em 1707, 1.30O bois, 8.20O carneiros e quase 2 mil vitelas (10O
mil nesse ano). Em 1707, os financiadores - que se apoderaram tanto do
mercado de Poissy como do mercado de Sceaux queixamse de que negócios são
fechados [fora do seu controle] nas cercanias de Paris, como no
Petit-Montreuil`0.
Registre-se que o mercado de carne que abastece Paris se estende por
grande parte da França, tal como as zonas de onde a capital tira, regular
ou irregularmente, seu trigos'. Essa extensão levanta o problema das
estradas e das ligações - problema considerável de que é quase
impossível, em poucas palavras, sequer assinalar as grandes linhas. O
essencial é, sem dúvida, pôr a serviço do abastecimento de Paris as vias
fluviais - o Yorme, o Aube, o Marne, o Oise, que deságuam no Sena, e o
próprio Sena. Em sua travessia da cidade, este apresenta seus "portos"
- 26 ao todo, em 1754 -, que são também espantosos e grandes mercados
onde tudo é mais em conta. Os dois mais importantes são o porto de Grève,
para onde confluem os tráficos de montante: trigo, vinho, lenha, feno
(embora neste abastecimento o porto das Tulherias pareça superá-lo); o
porto Saint-NicolaS82, que recebe as mercadorias vindas do jusante. Pela
água do rio, inúmeros barcos, carruagens fluviais e, já na época de Luís
XIV, "bachoteurs", pequenos barcos postos à disposição dos clientes,
espécie de fiacres fluviais83, análogos às milhares de "gôndolas" que, no
Tâmisa, a montante da ponte de Londres, tanta gente prefere aos
solavancos das carruagens da cidade84.
Por mais complexo que pareça, o caso de Paris compara-se a dez ou vinte
outros casos análogos. Qualquer cidade importante exige uma zona de
abastecimento de acordo com suas dimensões. Assim, a serviço de Madrid,
organiza-se no século
XVIII a mobilização abusiva da maior parte dos meios de transporte de
Castela, a ponto de quebrar toda a economia do país". Em Lisboa, segundo
Tirso de Molina (1625), tudo era maravilhosamente simples, as frutas, a
neve trazida da Serra da
Estrela, os alimentos que chegavam pelo mar bonançoso: --Os habitantes
que estão comendo, sentados à mesa, vêem as redes dos pescadores
encherem-se de peixes [... 1 capturados a suas portas.,, 86 É um prazer
para os olhos, diz um relato de julho-agosto de 1633, avistar no Tejo as
centenas, os milhares de barcos de pescas'. Glutona, preguiçosa,
indiferente aos tempos, a cidade comeria o mar. Mas a imagem é bonita
demais. Na realidade, Lisboa vive numa lida sem fim para conseguir o
trigo para o pão de cada dia. Aliás, quanto mais povoada é uma cidade,
mais aleatório se torna seu abastecimento. Veneza, já no século XV, tem
de comprar na Hungria os bois que consorne". Istambul, que no século XVI
atinge talvez os

70O mil habitantes, devora os rebanhos de carneiros dos Bálcãs, o trigo


do mar
Negro e do Egito. Contudo, se o governo violento do Sultão não tivesse
mão firme, a enorme cidade passaria por penúrias, carestias, fomes
trágicas que aliás, ao longo dos anos, não lhe foram poupadas89.
A seu modo, o caso de Londres é exemplar. Encerra, mutatis mutandis, tudo
o que podemos evocar a propósito de metrópoles precocemente tentaculares.
Mais

25

, a feira de Eastcheap, em 1598, descrita por Stow (Survey of London)


como ie.
Os açougueiros moram nas casas de ambos os lados da rua, bem como aquelem
pratos prontos. (Fototeca A. Colin.)
do que outros pela investigação histórica`, permite discernir
conclultrapassam o pitoresco ou o anedótico. N. S. B. Gras91 teve razão
em a exemplo típico das regras de Von Thünen sobre a organização zonal
econômico. Uma organização que teria mesmo sido feita ao redor de n
século mais cedo do que ao redor de Paris.
A zona posta a serviço ; em breve tende a abarcar quase todo o espaço da
produção e do coês. No século XVI, de todo modo, chega à Escócia ao
norte, à
Mancha mar do Norte a leste, cuja navegação de cabotagem é essencial ao
seu i oeste ao País de Gales e à Cornualha. Mas nesse espaço há regiões
ial exploradas
- até insubmissas -, como Bristol e a região circundanm Paris (e como no
esquema de Thünen), as regiões mais afastadas es.iadas com o comércio de
gado: o País de
Gales já participava nesse jolo XVI e muito mais tarde a Escócia, depois
da união, em 1707, com a.
ição do mercado londrino são evidentemente as regiões do Tâmisa, teras,
de acesso fácil, com suas vias fluviais e sua coroa de cidades-escala
Brentford,
Kingston, Hampstead, Watford, St. Albans, Hertford, Croyord) que
trabalham com afã a serviço da capital, se ocupam em moer portar a
farinha, em preparar o malte, em expedir víveres ou produtos tdos à
enorme cidade. Se dispuséssemos de sucessivas imagens desse
mer'opolitano", vê-lo-íamos estender-se, engordar de ano para ano, no
próde crescimento da cidade (em 1600, 25O mil habitantes no máximo; 50O
nais, em 1700). A população global da Inglaterra não pára, por sua vez,

de aumentar, porém mais devagar. Como exprimi-lo melhor do que fez uma
historiadora: Londres vai comer a Inglaterra, --is going to eat up
England"9

Não era o próprio Jaime 1 quem dizia: " With time England will only be
London949 Evidentemente, estas frases são a um só tempo exatas e
inexatas. Há sub e sobreavaliação. O que Londres devora não é apenas o
interior da Inglaterra, mas também, se assim podemos dizer, o exterior,
uns 2/3 ao menos, uns 3/4 ou até uns

415 do seu comércio externo 95. Mas, mesmo com o reforço do tríplice
apetite da
Corte, do Exército e da Marinha, Londres não devora tudo, não submete
tudo à atração irresistível dos seus capitais e dos seus preços altos. E
até, sob sua influência, a produção nacional cresce, tanto nos campos
ingleses como nas pequenas cidades, "mais distribuidoras do que
consurnidoras- 96. Há certa reciprocidade nos serviços prestados.
O que se constrói em virtude do progresso de Londres é realmente a
modernidade da vida inglesa. O enriquecimento dos campos próximos torna-
se evidente, aos olhos dos viajantes, com as criadas de estalagem "que
tomaríamos por damas, tão bem vestidas andavam", com camponeses bem
vestidos, que comem pão branco e não usam tamancos, como o camponês
francês, e andam até a cavalo". Mas, em toda a sua extensão, a Inglaterra
e ao longe a Escócia, o País de Gales, são atingidos e transformados
pelos tentáculos do polvo urbano91. Qualquer região que Londres atinge
tende a especializar-se, a transformar-se, a comercializar-se, em setores
ainda limitados, é verdade, pois entre as regiões modernizadas mantém-se
mui~ tas vezes o regime rural, com seus sítios e suas culturas
tradicionais. Assim, o
Kent, ao sul do Tâmisa, muito perto de Londres, vê crescer nas suas
terras os pomares e as plantações de lúpulo que abastecem a capital, mas
o próprio Kent continua o mesmo, com seus camponeses, seus trigais, seus
rebanhos, seus bosques compactos (covis de salteadores) e, o que não
engana, a abundância de sua caça:
faisões, perdizes, tetrazes, codornizes, cercetas, patos selvagens... e
essa espécie de hortulana inglesa, o cartaxo - --só dá para uma dentada,
mas não há nada mais suculento" 99.
Outro efeito da organização do mercado londrino é a ruptura (inevitável,
dada a amplitude das tarefas) do mercado tradicional, do open market,
mercado público, transparente, que punha frente a frente o produtor-
vendedor e o compradorconsumidor da cidade. A distância entre ambos
torna-se grande demais para ser transposta totalmente por gente modesta.
O mercador, o terceiro homem, surgiu há muito tempo, pelo menos desde o
século XIII, na Inglaterra, entre o campo e a cidade, particularmente
para o comércio do trigo. Pouco a pouco, formam-se cadeias de
intermediários, de um lado, entre o produtor e o grande mercador, do
outro, entre este e os revendedores, sendo que por essas cadeias passará
a maior parte do comércio de manteiga, de queijo, de produtos avícolas,
de frutas, de legumes, de leite... Nesse jogo, perdem-se as prescrições,
hábitos e tradições, que voam em estilhaços. Quem diria que o ventre de
Londres ou o ventre de Paris iam ser revolucionários! Bastou-lhes
crescer.

- voluções ficariam muito mais claras para nós se dispuséssemos de


nualanços, de documentos "seriais". Ora, seria possível reuni-los em
grande mo demonstra o mapa que extraímos do excelente trabalho de Alan
Everelativo aos mercados ingleses e galeses de 150O a 1640100; ou o mapa
borado dos mercados da généralité* de Caen em 1722; ou o levantamenao
século XVIII, fornecido por Eckart Schremmer101, dos mercados Mas estes
estudos, e outros, apenas abrem um caminho de pesquisa.
)E DAS CIDADES-MERCADOS NA INGLATERRA E NO PAIS DE GALES, 1500-1680

condado a zona média servida por cada cidade-mercado, A. Everitt obtém


números que vão de mais

5 (isto é, 40.00O ha, sendo o acre cerca de 4O ares) no extremo Norte e


no
Oeste, a menos de 30.00O. 00O ha. Quanto mais povoada é uma região, mais
restrita é a drea de mercado. Segundo A. Everitt, 'own", in The Agrarian
History of England and Wales, p.p. J. Thirsk, 1967, p. 497.
nscrição financeira antiga a cargo de um general conseiller de finances.
(N.T.)

3. AS 80O CIDADES-MERCADOS DA INGLATERRA E DO PAIS DE GALES, 1550-1640

Cada cidade tem pelo menos um mercado, habitualmente vários. Aos mercados
e feiras locais, há que acrescentar as feiras regionais. Mesma referência
do mapa anterior, pp. 468-4 73.

us instrumentos aa troca
Pondo de lado cinco ou seis aldeias que, excepcionalmente, conservaram
seus mercados, contam-se, na Inglaterra dos séculos XVI e XVII, 76O
cidades ou burgos com uma ou várias feiras, e 5O no País de Gales, com
por volta de 80O localidades providas de feiras regulares. Se a população
total dos dois paises se situa em cerca de 5, 5 milhões de habitantes,
cada uma dessas localidades abrange nas suas trocas, em média, 6 mil a 7
mil pessoas, ao passo que reúne dentro de seus limites, também em média,
mil habitantes. De modo que uma aglomeração mercantil implicaria sua vida
de trocas, por alto, entre seis e sete vezes o volume da sua própria
população. Encontramos proporções análogas na
Baviera, no fim do século XV111: conta-se aí uma feira para cada 7.30O
habitantes 102. Tal coincidência não deve fazer-nos pensar numa
regularidade qualquer. As proporções variam seguramente de uma época para
outra, de uma região para outra. E ainda é preciso estar atento para a
forma como cada cálculo é feito.

Sabemos, de todo modo, que havia provavelmente mais feiras na Inglaterra


do século XIII do que na Inglaterra elisabetana, embora esta tivesse
praticamente a mesma população que a outra. Isso se explica quer por uma
maior atividade, portanto uma irradiação maior de cada elemento na época
de Elisabeth, quer por um sobrequipamento de mercados da Inglaterra
medieval, aferrando-se os senhores, por uma questão de honra ou por
espírito do lucro, a criar mercados. Seja como for, houve, nesse
intervalo, "mercados desaparecidos" 103, decerto tão interessantes como
as "aldeias desaparecidas" em torno das quais, não sem razão, a
historiografia recente fez tanto barulho.
com o surto do século XVI, sobretudo depois de 1570, criam-se novos
mercados, ou renascem das suas cinzas, quiçá das suas sonolências.
Quantas discussões a seu respeito! Vão-se buscar velhos forais para ver
quem tem, ou terá, o direito de cobrar as taxas do mercado, quem assumirá
as despesas de seu equipamento: a lanterna, o sino, a cruz, a báscula, as
lojas, as adegas ou os galpões para alugar. E assim por diante.
Ao mesmo tempo, em escala nacional, desenha-se uma divisão das trocas
entre mercados, conforme a natureza das mercadorias oferecidas, conforme
as distâncias, a facilidade ou dificuldade dos acessos e dos transportes,
conforme a geografia da produção assim como do consumo. Os cerca de 80O
mercados urbanos enumerados por Everitt se irradiam, em média, por um
espaço de sete milhas de diâmetro (11 km). Nas imediações dos anos de
1600, o trigo por via terrestre não viaja mais de 1O milhas, quase sempre
não vai além das 5; os bovinos deslocam-se por distâncias que chegam a 11
milhas; os carneiros, 4O a 70; as lãs e tecidos de lã, de 2O a 40. Em
Doncaster, no Yorkshire, um dos maiores mercados lanígeros, os
compradores do tempo de Carlos 1 vêm de Gainsborough (21 milhas),
Lincolit (4O milhas), Warsop (25 milhas), Pleasley (26 milhas), Blankney
(5O milhas). No
Legenda referente à p. 30

4. MERCADOS E FEIRAS DA GÉNÉRALITÉ DE CAEN EM 1725

mapa elaboradopor G. Arbellot, segundo os arquivos departamentais do


Calvados (C maço 1358). J.-C. Perrot apontoume mais seis feiras regionais
(Saint-Jean-daVal 1, Berry 2, Mortam 1, Vassy 2) que não constam neste
mapa. No total,

197feiras, a maior parte das quais dura um dia, algumas 2 ou 3 dias, a


grande feira de Caen, 15 dias. No total,

223 dias defeira por ano. Quanto àsfeiras locais, são 85 por semana,
havendo, por ano, 4.42O dias defeira. A população da généralité está
então compreendida entre 600.00O e 620.00O pessoas. A sua superfície é de
cerca de 11.524 kn2.
Levantamentos análogos permitiram úteis comparações através do território
francês.

31

rdora de legumes e seu burro. --A celga fresquinha, o espinafre


fresquinho. Madeirda do século XVI. (Coleção Viollet.)
na nota do Traité de Delamare assinala, em abril de 1693, em Paris, as
frau.eirantes "que, em vez de venderem suas mercadorias nos mercados ou
nas úblicas, as venderam em hospedarias [ ... 1 e fora""'. Elabora além
disso ntário minucioso de todos os meios usados pelos moleiros, padeiros,
açou, mercadores e armazenadores abusivos ou improvisados para se
abastece-ienor preço e em detrimento das entregas normais às feiras108.
Já por volta ;, em Évreux, na
Normandia, os defensores da ordem pública denunciam lutores e
revendedores que chegam a um acordo "sussurrando ao ouvido, baixo por
sinais, por palavras estranhas ou meias palavras". Outra infraregra:
os revendedores vão ao encontro dos camponeses e compram-lhes lutos
"antes que cheguem aos Halles"109. Também em Carpentras, no sél, as
"répétières"
(vendedoras de legumes) percorrem as estradas para com)reço baixo as
mercadorias que estão sendo levadas às feiras110. É uma prá4üente em
todas as cidades"'. O que não impede que em Londres, em plelo XVIII, em
abril de 1764, seja ainda denunciada como fraudulenta. 0

diz uma correspondência diplomática, "deveria pelo menos tomar algum com
os murmúrios que suscita no povo a excessiva carestia das provisões e
tanto mais que os murmúrios se baseiam num abuso que pode ser
justamputado aos que governam [ ... 1 porque a principal causa dessa
carestia [...]
'z dos monopolizadores de que esta capital fervilha. Recentemente,
puseram3ndições de se antecipar às feiras, correndo pelas avenidas ao
encontro do

6 e arrebatando-lhe os carregamentos dos diferentes víveres que trazem


para pelo preço que acham melhor... 1'112. "Perniciosa corja", diz ainda
nossa nha. Mas é uma corja existente por toda a parte.
or toda a parte também, múltiplo, abundante, perseguido em vão, o
verda)ntrabando zomba dos regulamentos, tanto das alfândegas quanto dos
fisiunais. Os tecidos pintados das índias, o sal, o tabaco, os vinhos, o
álcool lhe serve. Em Dole, no Franco-Condado (I? de julho de 1728), "o
comércio

", N au troca das mercadorias contrabandeadas fazia-se publicamente...


pois um mercador teve a ousadia de intentar uma ação para cobrar o
pagamento desse tipo de mercadoria"
` 3. "Vossa Excelência-, escreve a Desmarets um de seus agentes (o último
dos inspetores gerais do longo reinado de Luís XIV), --poderia pôr um
exército em toda a costa da Bretanha e da Normandia que nem assim
conseguiria evitar as fraudes. - ' `
Mercados e mercados.- o mercado de trabalho
O mercado direto ou indireto, a troca multiforme não cessam de abalar as
economias, mesmo as mais tranqüilas. Agitam-nas; outros dirão: vivificam-
nas. De qualquer maneira, um belo dia, logicamente, tudo passará pelo
mercado, não apenas os produtos da terra ou da indústria, mas também as
propriedades fundiárias, dinheiro, que se movimenta mais depressa do que
qualquer outra mercadoria, trabalho, o esforço dos homens, para não falar
do próprio homem.
Claro que nas cidades, vilas e aldeias sempre houve transações com casas,
terrenos para construção, habitações, lojas ou moradias de aluguel. O
interessante não é estabelecer, com documentos na mão, que se vendem
casas em
Gênova no século X111115 ou que, na mesma época, em Florença, alugam-se
os terrenos nos quais depois se constroem as casas"'. O importante é ver
multiplicarem-se essas trocas e essas transações, ver delinearem-se
mercados imobiliários que um belo dia revelam surtos especulativos. É
então necessário que as transações tenham atingido certo volume. É isso
que demonstram, a partir do século XVI, as variações dos aluguéis de
Paris (inclusive os das lojas): seus preços são puxados infalivelmente
pelas vagas sucessivas da conjuntura e da inflação"'. É também o que
prova, por si só, um simples pormenor: em Cesena, pequena cidade no meio
das riquezas agricolas da Emilia, um contrato de locação de loja (17 de
outubro de 1622), conservado por acaso na Biblioteca Municipal, está
estipulado num impresso prévio: basta preencher os espaços em branco e
depois assinar' 18. As especulações têm um aspecto ainda mais moderno:
"promotores" e clientes não datam de hoje. Em Paris, no século XVI,
podemos seguir parcialmente especulações com a área muito tempo baldia do
Pré-auxCleres119, nas proximidades do Seria, ou com a área não menos
baldia de
Tournelles, onde o consórcio dirigido pelo presidente Harlay, a partir de
1594, empreende a frutuosa construção das magníficas casas da atual praça
de Vosges:
elas serão a seguir alugadas às grandes famílias da nobreza120. No século
XVII, prosperam especulações ao redor do faubourg Saint-Germain e por
certo em outros lugares121. com Luís XV e Luís XVI, estando a capital
coberta de canteiros de obras, o mercado imobiliário conhece dias ainda
melhores. Em agosto de 1781, um veneziano informa um de seus
correspondentes de que a bela alameda do
PalaisRoyal, em Paris, foi destruída, suas árvores abatidas "nonnostante
le mormorazioni di tutta Ia città"; com efeito, o duque de Chartres tem o
projeto de "erguer casas ali para depois alugá-las... " 122.
Quanto às terras rurais, a evolução é a mesma: a "terra" acaba por ser
engolida pelo mercado. Na Bretanha, já no fim do Século Xl11123 decerto
em outras re35

lecerto mais cedo, as senhorias são vendidas e revendidas. Dispomos, na


no tocante às vendas de terras, de séries reveladoras de preços' 24 e de
nureferências sobre o aumento regular delas. Por exemplo, na Espanha, em
gundo um embaixador veneziano 125 11... i beni che si solevano lasciare a
eci per cento si vendono a quatro e cinque", os bens (as terras) que
habite eram cedidos por 8 ou 1007o, isto é, 12, 5 ou 1O vezes o seu
rendimento, lidos a 4 e 507o, isto é, 25 ou 2O vezes o seu rendimento,
dobraram "com ância de dinheiro". No século XVIII, os arrendamentos de
senhorias breratados em Saint-Malo e através de seus grandes mercadores,
graças a caintermediários que vão a Paris e à Ferme générale 126. As
gazetas recebem os anúncios de propriedades à venda 127. A publicidade
aqui não está atran todo o caso, com ou sem publicidade, por toda a
Europa a terra não diante compras, vendas e revendas, de mudar de mãos. É
óbvio que este rito está em toda a parte ligado à transformação econômica
e social que os antigos proprietários, senhores ou camponeses, em
benefício dos novos;
cidades. Já no século XIII, na ile-de-France, multiplicam-se os "senhores
a" (a expressão é de Marc Bloch) ou os "senhorios-cotós", como diz Guy
n128.
mercado do dinheiro, a curto e a longo prazo, voltaremos a tratar com ;tá
no cerne do crescimento europeu, sendo significativo que não se tenha
vido em toda a parte com o mesmo ritmo e com a mesma eficácia.
Univercontrário, é o aparecimento de financiadores e de redes de
usurários, tanleus ou os lombardos como os cadurcos; ou, na Baviera, os
conventos que alizam nos empréstimos a camponeses`9. Sempre que dispomos
de inforestá presente a usura, com boa saúde.
E é assim em todas as civilizações Jo.
contrapartida, o mercado do dinheiro a prazo só pode existir em zonas )
mia já muito ativa. Esse mercado apresenta-se desde o século X111 na Itá,
lemanha, nos
Países Baixos. Nesses países, tudo concorre para criá-lo: a ção de
capitais, o comércio de longa distância, os artifícios da letra de
câm'títulos" de uma dívida pública que cedo foram criados, os
investimentos dades artesanais e industriais ou na construção naval, ou
em viagens de ae, aumentando desmedidamente já antes do século XV, deixam
de ser pros individuais. A seguir, o grande mercado do dinheiro se
deslocará para da. Mais tarde, para Londres.
;, de todos esses mercados difusos, o mais importante, segundo a ótica
desé o do trabalho. Deixo de lado, como Marx, o caso clássico da
escravatu130

aada todavia a prolongar-se e a renascer. O problema, para nós, é ver [ue


o homem, ou pelo menos seu trabalho, se torna mercadoria. Um espíricomo
Thomas
Hobbes (1588-1679), já pode dizer que "a energia (diríarça de trabalho)
de cada indivíduo é uma mercadoria", uma coisa que se iormalmente à troca
no seio da concorrência do mercado131 - contudo é uma noção muito
familiar na época. Gosto desta reflexão ocasional de iro cônsul da França
em Gênova, decerto um espírito atrasado em relação MPO: "É a primeira
vez, Monsenhor, que ouço afirmar que um homem considerado moeda." Ricardo
escreverá muito simplesmente: "O traba1 como todas as coisas que se podem
comprar e vender... , 132

us instrumentos tia troca


Mas não há dúvida: o mercado de trabalho - como realidade, se não como
conceito - não é uma criação da era industrial. O mercado de trabalho é
aquele em que um homem, venha de onde vier, se apresenta despojado de
seus tradicionais - meios de produção-, supondo que alguma vez os teve:
uma terra, um tear, um cavalo, uma carroça... Ele só tem a oferecer as
mãos, os braços, sua "força de trabalho". E, claro, sua habilidade. O
homem que se aluga ou se vende desse modo passa pelo buraco estreito do
mercado e sai da economia tradicional. O fenômeno apresenta-se com
invulgar clareza no que diz respeito aos mineiros da Europa central. Por
muito tempo, artesãos independentes, trabalhando em grupos pequenos, são
forçados, nos séculos XV e XVI, a passar para o controle dos mercadores,
os únicos capazes de fornecer o dinheiro necessário aos investimentos
consideráveis que o equipamento das minas profundas exige. Ei-los
assalariados. A palavra decisiva é dita, em 1549, pelos escabinos de
Joachimsthal, pequena cidade mineira da Boémia: "Um dá o dinheiro, o
outro faz o trabalho" (Der eine gibt das Geld, der andere tut die
Arbeit). Que fórmula melhor poderíamos apresentar do confronto precoce do
Capital e do TrabalhoVM É verdade que o salariado, depois de instituído,
pode desaparecer, como aconteceu nos vinhedos da Hungria: em Tokai com os
anos de 1570, em Nagybanyn em 1575, em
Szentgyõrgy Bazin em 1601, em toda a parte se restabelece a servidão
camponesa13'. Mas isso é peculiar da Europa de Leste. No Ocidente, as
passagens ao salariado, fenômeno irreversível, foram muitas vezes
precoces e sobretudo mais numerosas do que se costuma dizer.
Já no século XIII, a praça de Grève, em Paris, e as vizinhas praça
"Jurée", perto de Saint-Paul-des-Chartips, e a praça ao lado da igreja de
Saint-Gervais, "perto da casa da Conserve", são os lugares habituais de
contratação1 35.
Datados de 1288 e 1290, conservaram-se curiosos contratos de trabalho
para uma olaria dos arredores de Piacenza, na Lombardia136. Entre 1253 e
1379, comprovam alguns documentos, a zona rural portuguesa já tem
assalariados 137. Em 1393, em
Auxerre138, na Borgonha, os operários viticultores entram em greve
(recorde-se que uma cidade está então meio imersa na vida agrícola e que
a vinha é objeto de uma espécie de indústria). O incidente revela-nos que
todos os dias no fim da primavera, na praça da cidade, diaristas e
empregadores encontram-se ao nascer do sol, sendo os empregadores muitas
vezes representados por uma espécie de contramestres, os closiers. É um
dos primeiros mercados de trabalho que nos é dado entrever, com provas na
mão. Em Hamburgo, em 1480, os TagelõImer, trabalhadores diaristas,
dirigiam-se à Trostbrücke à procura de patrão, Já se trata de um
"transparente mercado de trabalho"139. No tempo de Tallemant des
Réaux, "em Avignon, os criados de aluguel ficavam na ponte" 140. Havia
outros mercados, quanto mais não fosse nas grandes feiras, as "de
aluguel" (-a partir de São João, de São Miguel, de São Martinho, do Dia
de Todos-os-Santos, do
Natal, da Páscoa..., ' 141), em que trabalhadores agrícolas, homens e
mulheres, se apresentavam para o exame dos contratadores (camponeses
abastados ou nobres, como o senhor de Gouberville142), como gado cujas
qualidades é lícito avaliar e verificar. "Cada povoado ou aldeia grande
da baixa Normandia, por volta de 1560, possui assim seu local de
contrataÇão que faz lembrar tanto o mercado de escravos como a feira."
143 Em Évreux, a feira dos burros, no dia de São João (24 de junho), é
também o dia da contratação de criados144. Nas colheitas, nas vindimas,
aflui de toda a parte uma mão-deobra supletiva contratada conforme o
costume, em troca de dinheiro ou de uma remuneração em espécies. Estamos
certos de que se trata de um enorme movimen37

to: de vez em quando uma estatística 145 afirma-c, vigorosamente. Ou


critão e un, microobservação precisa - como junto de uma pequena cidade
de Anjou,
Châtea., Gontier, n-3s séculos XVII e XVIIIIII -, que mostra o pulular de
"diaristas" p., ra "abater, serrar e rachar madeira; podar a vinha,
vindimar;
capinar, cavar, fazCr a horta [... 1, semear legumes; ceifar e guardar o
feno;
cortar o trigo, enfeixar a palha, bater o grão, limpá-lo..... Um relato
referente a Paris 147 menciona, só pa, ra os ofícios do porto do feno,
"atracadores de barcos, carregadores, atadores, as, sentadores,
enfeixadores, tarefeiros..... Essas listas e outras análogas fazem-nos
sonhar, porque, atrás de cada palavra, é preciso imaginar, numa sociedade
urbana ou rural, um trabalho assalariado mais ou menos duradouro. Decerto
é nas zona, rurais, onde vive a maioria da população, que devemos
imaginar o essencial, em termos numéricos, do mercado de trabalho. Outro
enorme recrutamento criado pelo desenvolvimento do
Estado moderno é o dos soldados mercenários. Sabe-se onde comprá-los,
eles sabem onde vender-se: e a propria regra do mercado. Da mesnia forma,
para os criados, os de copa, os de libré, com sua hierarquia precisa,
cede começou a haver umas espécies de agências de colocação, em Paris
desde o século XIV, em Nuremberg seguramente desde 1421148.
com o passar dos anos, os mercados de trabalho oficializam-se, suas
regras tornam-se mais claras. Le livre commode des adresses de Parispour
1692, de
Abraham du Pradel (pseudônimo de um certo Nicolas de Blégny), dá aos
parisienses informações deste gênero 149: deseja criada? Dirija-se à rua
da Vannerie, à "agência de recomendadoras"; encontrará um criado no
Mercado Novo, um cozinheiro
- na Grève". Quer um "moço de recados"? Se é comerciante, vá à rua
Quincampoix;
cirurgião, rua dos Cordeliers; boticário, rua da Huchette; os pedreiros e
serventes "do Limousin" oferecem seus serviços na Grève; mas os
--sapateiros, serralheiros, marceneiros, tanoeiros, arcabuzeiros,
assadores e outros empregamse por si sós, apresentando-se nas lojas".
No seu conjunto, é verdade que a história do salariado continua pouco
conhecida.
Todavia, as sondagens mostram a amplitude crescente da mão-de-obra
assalariada.
Na Inglaterra, sob os Tudor, --está provado que [... 1 bem mais da
metade, até dois terços dos lares recebiam pelo menos uma parte de seus
rendimentos em forma de salários" 150. No princípio do século XVII, nas
cidades hanseáticas, especialmente em Stralsund, o número dos
assalariados não para de aumentar e acaba por representar cerca de 5007o,
pelo menos, da população151. Quanto a Paris, às vésperas da Revolução, o
número ultrapassaria 50%152.
Falta muito, claro, para que a evolução há tanto tempo iniciada chegue a
seu termo; falta mesmo muito. Turgot deplora-o numa observação casual:
"Não há uma circulação do trabalho, como há uma circulação do
dinheiro.11153 Contudo, o movimento está lançado e encaminha-se a tudo o
que o futuro possa comporta', neste campo, de mudanças, de adaptações, de
sofrimentos também.
com efeito, ninguém duvida que a passagem ao salariado, sejam quais forem
suas motivações e benefícios econômicos, é acompanhada por certa
decadência social.
Temos a prova disso, no século XVIII, com as inúmeras greves'54 e a
eviderte impaciência operária. Jean-Jacques Rousseau falou desses homens:
"se os quserem humilhar, logo as malas estão feitas; levam seus braços e
vão-se embora"1-. Essa suscetibilidade, essa consciência social, terão
elas verdadeiramente nascido co
W as premissas da grande indústria? Não, sem dúvida. Na Itália,
tradicionalmente, os pintores são artesãos que trabalham em sua oficina
com empregados que, muitas
Na Hungria, no século XVIII, levam um porco para o Colégio de Debrecen.
(Documento do autor.)
vezes, são os próprios filhos. Como os mercadores, mantêm livros
contábeis:
temos os de Lorenzo Lotto, de Bassano, de Farinati, do Guerchino' 56. Só
o dono da loja é mercador, em contato com os clientes, de quem aceita as
encomendas. Os ajudantes, inclusive os filhos, já prontos para rebelar-
se, são, quando muito, assalariados. Isto posto, facilmente se
compreendem as confidências de um pintor, Bernardino India, ao
correspondente Scipione Cibo:
artistas bem colocados, Alessandro Acciaioli e Baldovini, quiseram tomá-
lo a seu serviço. Recusou, pois queria conservar a liberdade e não queria
abandonar os negócios próprios "per un vil salario"157. Isso em 1590!
?rcado é um limite e desloca
O mercado, na verdade, é um limite, como que uma divisão entre águas
fluviais.
Não se viverá da mesma maneira conforme se estiver de um lado ou do outro
da barreira. Estar condenado a abastecer-se unicamente na feira local é o
caso, entre milhares de outros, dos operários de seda de Messina158
imigrados na cidade e prisioneiros do seu abastecimento (muito mais até
do que os nobres ou os burgueses, que em geral possuem terras nos
arredores, uma horta, um pomar, e portanto
Legenda das Páginas 40-41

Feira local em Antuérpia. Mestre anônimo dofim do século XVI. Museu Real
de
Belas-Artes de Antuérpia. (Copyright A. C.L., Bruxelas.)
I 4,

s pessoais). E, se os artesãos se cansarem de comer o ruim --trigo do


mar-, )dre, de que é feito o pão que lhes vendem a alto preço, poderão,
quando e eles se decidem a isso em 1704), ir a Catânia ou a Milazzo para
mudar rego e de mercado alimentar.
ra os que não estão habituados, para aqueles que habitualmente estão exou
afastados da feira, esta se apresenta como uma espécie de festa excepde
viagem, quase de aventura. É uma ocasião para "presumir", como
diespanhóis, para se mostrar, para se pavonear. O marinheiro, explica um
mercantil de meados do
Século XV159 é geralmente muito rude; e "tão igque, quando bebe na
taberna ou compra pão na feira, se julga importanmesmo modo, o soldado
espanhol"' que, entre duas campanhas, dá com idos na feira de Saragoça
(1654) e se maravilha diante dos montes de atuns de trutas salmonadas, de
cem peixes diferentes tirados do mar ou do rio o. Mas o que ele comprará
com as moedas que leva na bolsa? Umas sardi)esadas, prensadas no sal, que
a dona da taberna da esquina grelhará para m que fará seu festim, regado
a vinho branco.
iro, é a vida rural que permanece, por excelência, a zona fora (ou pelo
me-ade fora) do mercado, a zona do autoconsumo, da auto-suficiência,
isolaiundo. Ao longo da existência, os camponeses contentam-se com o que
procom as próprias mãos ou com o que os vizinhos lhes fornecem em troca
ns gêneros alimentícios ou serviços. É certo que há muitos que vão à
feira de ou do burgo. Mas aqueles que se contentam em nela adquirir a
indispenlha de ferro de sua charrua ou em arranjar o dinheiro para as
taxas e imposdendo ovos, uma porção de manteiga, algumas aves ou legumes
não estão iramente associados às trocas do mercado.
Limitam-se a chegar perto dele. )s camponeses normandos "que levam uns 15
ou 2O soldos de gêneros à fei) podem entrar num botequim porque isso lhes
custa o mesmo tanto...""'. vezes a aldeia só se comunica com a cidade por
intermédio de um mercador de em questão ou por intermédio do rendeiro da
senhoria local162.
m~se salientado muitas vezes esta vida retirada cuja existência ninguém
por. Mas há graus e, mais ainda, exceções. Muitos camponeses abastados
utilenamente a feira: os --lavradores- ingleses em condições de
comercializar ieita, que já não precisam fiar e tecer todos os invernos a
lã, ou o cânhamo, iho, que são clientes regulares da feira, assim como
seus fornecedores; os teses das grandes cidades coladas umas às outras ou
dispersas das Províriidas (que contam por vezes 3 mil a 4 mil
habitantes), produtores de leite, e, de toucinho, de queijos, de plantas
industriais, compradores de trigo e a para aquecimento; os produtores de
gado da Hungria que exportam seus )s para a Alemanha e para a
Itália e compram, também eles, o trigo que 'a; todos os hortelãos dos
arrabaldes suburbanos a que os economistas tanim de se referir, atraídos
pela vida da grande cidade, enriquecidos por ela;.ia de Montreuil, perto
de Paris, por causa dos seus pomares de pêssegos, har Louis-Sébastien
Mercier163 (1783); e quem não conhece o desenvolvide tantos centros
abastecedores ao redor de Londres, de
Bordeaux ou de êrne1641 Trata-se, sem dúvida, de exceções num mundo rural
que represen)0% da População da terra. Mas não esqueçamos que até os
campos pobres

Os instrumentos da troca são contaminados por uma economia insidiosa. As


moedas chegam-lhes por diversas vias que extravasam o mercado
propriamente dito. A isso se aplicam os mercadores itinerantes, os
usurários do burgo ou da aldeia (pensemos nos usurários judeus dos campos
do Norte da Itália) 165 os empresários das indústrias rurais, os
burgueses e os rendeiros enriquecidos à procura de mão-deobra para a
exploração de suas terras, até os lojistas de aldeia...
Isso não impede que, em resumo, o mercado em sentido restrito continue a
ser, para o historiador da economia antiga, um teste, um "indicador- cujo
valor nunca subestimará. Bistra A. Cvetkova tem razão em, baseado nele,
elaborar uma espécie de escala graduada, em w, aliar o peso econômico das
cidades búlgaras à margem do Danúbio conforme a importância das taxas
cobradas sobre as vendas no mercado, levando em conta que as taxas são
cobradas em aspres de prata e que já existem feiras especializadas1 66.
Duas ou três notas a respeito de Jassy, na Moldávia, indicam que a
cidade, no século XVII, possui "sete locais onde são vendidas as
mercadorias, alguns com o nome dos principais produtos ali vendidos, como
a feira das botas, a feira das farinhas... 1, 167 isso revela certa
divisão da vida mercantil. Arthur Young vai mais longe. Ao sair de Arras,
em agosto de

1788, encontra "pelo menos uns cem burros, carregados [ ... 1


aparentemente com fardos muito leves e enxames de homens e mulheres", o
bastante para fornecer abundantemente o mercado. Mas --grande parte da
mão-de-obra camponesa deixa assim de trabalhar no meio da colheita para
abastecer uma cidade que, na
Inglaterra, seria aprovisionada por quarenta vezes menos pessoas". E
conclui:
"Quando tal enxame de vadios passeia por um mercado, tenho certeza de que
a propriedade fundiária está excessivamente fragmentada." 168 Então os
mercados pouco povoados, onde as pessoas não se divertissem nem
passeassem, seriam a marca da economia moderna?
Por baixo do mercado À medida que a economia mercantil se alastra e
atinge a zona das atividades vizinhas e inferiores, há crescimento dos
mercados, deslocamento de uma fronteira, modificação das atividades
elementares. É certo que o dinheiro, nos campos, é raramente um
verdadeiro capital; é empregado nas compras de terras e, através dessas
compras, visa à promoção social - mais ainda, é entesourado:
pensemos nas moedas dos colares femininos da Europa central, nos cálices
e pátenas dos ourives de aldeia da Hungria 169 nas cruzes de ouro das
camponesas da França nas vésperas da Revolução francesa110. O dinheiro,
porém, desempenha seu papel de destruidor dos valores e equilíbrios
antigos. O camponês assalariado, cujas contas são registradas no livro do
empregador, ainda que os adiantamentos em espécies do seu patrão sejam
tais

171

que nunca lhe sobra, por assim dizer, dinheiro vivo nas mãos no fim do
ano, ad quiriu o hábito de contar em termos monetários. com o tempo,
trata-se de uma mudança de mentalidade. Uma mudança das relações de
trabalho que facilita as adaptações à sociedade moderna, mas que nunca
reverte em favor dos mais pobres.

Ninguém melhor do que um jovem historiador economista do país basco,


Emiliano
Fernández de Pinedol", mostrou quanto a propriedade e a população rurais
são afetadas pela progressão inexorável da economia de mercado. No século
XVIII, o país basco tende francamente a tornar-se um --mercado nacional",
donde uma

43

'os da troca te comercialização da propriedade rural; finalmente passam


pelo mercado is da
Igreja e a terra igualmente intocável, em principio, dos morgados. A dade
fundiária se concentra assim em algumas mãos e há pauperização cresos
camponeses já miseráveis, obrigados desde então a passar, em maior núo
que nunca, pela estreita brecha do mercado de trabalho, quer na cidade, )
s campos. Foi o mercado que, ao crescer, provocou esse movimento de res
irreversíveis. Essa evolução reproduz, mutatis mutandis, o processo que
intes conduzira às grandes propriedades agrícolas dos "lavradores"
ingleses. ;sim o mercado colabora com grande história. Mesmo o mais
modesto é um da hierarquia econômica, o mais baixo sem dúvida. Então,
sempre que o [o está ausente ou é insignificante, sempre que o dinheiro
vivo, demasiado -m um valor como que explosivo, a observação se encontra
seguramente no ero da vida dos homens, onde cada qual é obrigado a
produzir praticamente duitas sociedades camponesas da Europa pré-
industrial viviam ainda nesse t margem da economia de mercado. Um
viajante que por lá se aventure pori algumas moedas, adquirir todos os
produtos da terra a preços irrisórios. é necessário, para ter surpresas
desse tipo, ir, como Maestre
Manrique173 -gião de Arakan, por volta de 1630, para poder escolher
trinta galinhas por reais ou cem ovos por dois reais. Basta afastar-se
das grandes estradas, ihar-se nas trilhas das montanhas, ir à Sardenha ou
parar numa escala pouitual da costa de ístria. Em suma, a vida do
mercado, tão fácil de apreender, e muitas vezes do historiador uma vida
subjacente, modesta porém autônoLfitas vezes auto-suficiente ou propensa
a sê-lo. Outro universo, outra econoutra sociedade, outra cultura. Daí o
interesse de tentativas como as de Miorineau114

ou de Marco Cattini175, que, tanto um como outro, mostram o passa por


baixo do mercado, o que lhe escapa e mede, em suma, o lugar Jo pelo
autoconsumo rural. Em ambos os casos, a orientação do historiador iesma:
um mercado de grãos é, de um lado, o espaço povoado que dele dedo outro,
a demanda de uma população cujo consumo pode ser calculado [o normas
conhecidas de antemão. Se, além disso, conheço a produção lopreços, as
quantidades vendidas no mercado, as que se consomem locale as que se
exportam ou importam, posso imaginar o que se passa, ou deve -se, por
baixo do mercado. Michel Morincau partiu, para tal, de uma cidade ensão
média, Charleville; Marco Cattini, de um burgo do Modenese, muito róximo
da vida rural, numa região um pouco afastada.
lergulho análogo, mas por meios diferentes, conseguiu Yves-Marie Bercél76

recente tese sobre as revoltas dos croquants na Aquitânia, no século


XVII.
lessas revoltas, ele reconstitui as mentalidades e as motivações de uma
popujue o mais das vezes escapa ao conhecimento histórico. Agrada-me
particuite o que ele diz sobre o povo violento das tabernas de aldeia,
lugares de ão.
m suma, o caminho está aberto. Métodos, meios, abordagens poderão variar
abemos), mas fica estabelecido que não haverá história completa,
sobretudo a rural digna desse nome, se não for possível prospectar
sistematicamente dos homens que estão abaixo do nível do mercado.
5. MADRI E SUAS LOJAS DE LUXO
Capital da Espanha desde 1560, Madri tornou-se, no século XVII, uma
cidade brilhante. Multiplicam-se as lojas. Ã volta da Plaza Mayor, as
lojas de luxo agrupam-se conforme as suas especialidades, umas ao lado
das outras. Segundo M.
Copella, A. Matilla Tascón, Los Cino Gremios mayores de Madrid, 1957.
A primeira concorrência às feiras (mas a troca tira proveito disso) foi a
das lojas. Células restritas, inumeráveis, são outro instrumento
elementar da troca.
Análogo e diferente, pois a feira é descontínua ao passo que a loja
funciona quase constantemente. Pelo menos em princípio, pois a regra, se
é que existe regra, é bem sortida de exceções.
Assim, traduz-se muitas vezes por mercado a palavra sukh, típica das
cidades muçulmanas. Ora, o sukh muitas vezes não passa de uma rua ladeada
de lojas, todas especializadas num mesmo comércio, como aliás houve
tantas em todas as cidades do Ocidente. Em Paris, os açougues vizinhos de
Saint-Étierine-du-Mont, já no século XII, fizeram com que a rua da
Montagne-Saint-Geneviève fosse chamada rua dos Açougues177. Em 1656,
sempre em Paris, "ao lado dos ossários do cemitério Saint-1rinocent
(sic)... todos os mercadores de ferro, de latão, de cobre e de folha-de-
flandres têm lojas`78. Em Lyon, em 1643, "encontram-se aves em lojas
especiais, na Poulaillerie, rua de Saint-Jean"179. Há também ruas com
lojas de luxo (veja-se o mapa de Madri, p. 45), como a Merceria, da praça
de São
Marcos à ponte de Rialto, que é capaz, diz um viajante (1680), de dar uma
grande idéia de

'os da troca

180, ou as lojas da margem norte do Vicux-Port, em Marselha, onde se


vencreadorias do Levante e "tão concorridas-, observa o presidente de
Brosue um espaço de vinte pés quadrados é alugado por quinhentas libras-
181. uas são uma espécie de mercados especializados.
itra exceção à regra: fora da Europa, apresentam-se dois fenômenos inédi)
dizer de viajantes, o Se-tchuan, isto é, a bacia alta do lang-tsé-Kiang
que Àzação chinesa reocupa à força no século XVII, é uma constelação de
habidispersas, isoladas, ao contrário da China propriamente dita, onde a
regra, oamento concentrado; ora, no meio dessa dispersão, erguem-se, no
descam, rupos de pequenas lojas, yao-tien, que desempenham então o papel
de merermanentel 82.
Sempre segundo viajantes, esse também é o caso da ilha de, no século
XVII: não há mercados, mas lojas"'. Por outro lado, retornanaropa, que
nome dar a essas barracas, a essas tendas montadas de qualquer is
próprias ruas de Paris, proibidas em vão por decreto, em 1776? São
ban;montáveis como na feira, mas a venda faz-se todos os dias, como numa
E teremos chegado ao fim das nossas dúvidas? Não, uma vez que na Ina
certas localidades mercantes, como Westerham, tiveram seu renque (row),
arinheiros e merceeiros muito tempo antes de terem mercado185. Ainda não,
, z que muitas lojas ficam no próprio local da feira; esta se abre, elas
contii vender. E ter no mercado de Lille, por exemplo, um local para
vender peixe D embaixo dos mercadores de peixe fresco não será acumular
mercado e sasJncertezas não impedem, evidentemente, que a loja se
distinga do merca1

om uma nitidez cada vez maior com o passar dos anos.


uando, no século XI, as cidades nascem ou renascem em todo o Ocidente
ercados voltam a animar-se, o desenvolvimento urbano estabelece uma
nítiÂnção entre campos e cidades. Estas concentram em si a indústria
nascente seqüentemente, a população ativa dos artesãos. As primeiras
lojas que suro, com efeito, as oficinas (se assim se pode dizer) dos
padeiros, açougueiros, iros, tamanqueiros, ferreiros, alfaiates e outros
artesãos varejistas. Esse arno início, é forçado a sair de casa, a não
ficar na sua loja, à qual entretanto ibalho o liga --conto o caracol à
concha' 1187, a ir vender seus produtos na * no mercado. As autoridades
urbanas, ciosas de defenderem os consumido* impõem, pois é mais fácil
vigiar a feira do que a loja onde qualquer um ia quase o patrão de si
próprio 188. Mas, bem cedo, o artesão venderá em sua a loja, dizia-se "em
sua janela", no intervalo dos dias de feira. Assim essa ide alternada faz
da primeira loja um lugar de venda descontínuo, um pouco a feira.
Em Évora, Portugal, por volta de 1380, o açougueiro desossa a carne loja
e a vende numa das três feiras sentartais181. Para um estrasburguês, é
urpresa ver em Grenoble, em 1643, os açougueiros cortarem e venderem a em
casa e não no mercado, e vendê-la --numa loja como os outros comers -
190. Em Paris, os padeiros são vendedores de pão comum e de luxo na sua,
em geral, de pão grosseiro na feira, às quartas e sábados191. Em maio de
um edito vem, uma vez mais (instala-se o sistema de Law), abalar a moeda;

1 os padeiros, por medo ou por malícia, não levaram ao mercado a


quantidapão habitual; ao meio-dia, já não havia pão nas praças públicas;
e o pior nesse mesmo dia, o preço do pão subiu dois ou quatro soldos por
cada liE acrescenta o embaixador toscano que tomamos por testemunha'9':
-Tan

Lado a lado, lojas de padeiro e mercador de tecidos em Amsterdam. Quadro


de
Jacobus Vrel, escola holandesa, século XVII. (Amsterdam, coleÇão H. A.
WetzIar, clichê Giraudon.)

Jade que não há aqui, nessas coisas, a boa ordem que se encontra em
outros

1 1

rtanto, os primeiros a abrir lojas foram os artesãos. Os "verdadeiros"


lojism depois: são os intermediários da troca; insinuam-se entre
produtores e coms, limitando-se a comprar e a vender sem nunca fabricar
com suas mãos (pc)s não inteiramente) as mercadorias que oferecem. Desde
o início, são como dor capitalista definido por Marx, que parte do
dinheiro D, adquire a merca1 para retornar regularmente ao dinheiro,
segundo o esquema DMD: "Só se Jo dinheiro com a segunda intenção de o
recuperar." O camponês, pelo conai o mais das vezes vender seus gêneros
na feira para imediatamente comprar Je que necessita; parte da mercadoria
e a ela retorna, segundo o itinerário Também o artesão, que tem de
procurar o alimento na feira, não permanece cão de detentor de dinheiro.
Mas são possíveis exceções.
) intermediário, personagem à parte, em breve abundante, está reservado
D. E é este futuro que nos preocupa, mais do que origens difíceis de
destrinbem que o processo deva ter sido simples: os mercadores
itinerantes, que veram ao declínio do Império romano, são surpreendidos a
partir do século ;ez mais cedo, pelo desenvolvimento das cidades; alguns
sedentarizam-se e )ram-se aos ofícios urbanos. O fenômeno não se situa
nesta ou naquela data, numa dada região. Não no século XIII, por exemplo,
no que concerne à iha e à França, mas a partir do
Século XIII 193. Um " andarilho", ainda na le Luís XIII, abandona a vida
errante e instala-se ao lado dos artesãos, nuraca semelhante às deles,
porém diferente, diferença que se acentua com o Uma padaria do século
XVIII é quase igual a uma padaria do século XV mo de um século anterior,
ao passo que, entre o século XV e o século XVIII, s de comércio e os
métodos mercantis se transformariam a olhos vistos. )davia, o mercador
lojista não se separa logo de saída dos corpos profissioxa os quais
entrou ao incorporar-se no universo urbano. Sua origem e as

5es que ela acarreta continuam a impor-lhe uma espécie de mácula. Ainda

2 um relatório francês argumenta: "É verdade que os mercadores são consis


os primeiros entre os artesãos, algo a mais, mas não muito mais."194 To-
rata-se da
França, onde, mesmo ao tornar-se "negociante", o mercador não ipso facto
o problema de sua categoria social. Ainda em 1788 os deputados iércio se
afligem e verificam que até essa data se considera que os negocianupam
uma das classes inferiores da sociedade"'95. Não se falaria assim em
-dam, em Londres ou mesmo na Itália196.
- início, e muitas vezes depois do século XIX, os lojistas vendem
indiferentemercadorias obtidas em primeira, segunda ou terceira mão. É
revelador o o nome deles, o habitual: merceeiro, que vem do latim merx,
mercis, meri em geral. Diz o provérbio: "merceeiro que tudo vende e nada
faz". E, sempre nos informações sobre os fundos das lojas dos merceeiros,
ali encontramos s heterogêneas mercadorias, quer se trate da Paris do
Século XV197, de s111, da
Cracóvia199 ou de Frankfürt-am-Main'00, ou ainda, no século XVIII, de
Abraham
Dent, shopkeeper em Kirkby Stephen, pequena cidade do Westid, no norte da
Inglaterra201.

3 loja desse merceeiro, cujos negócios podemos seguir, graças a seus


próapéis, de 1756 a 1776, vende-se de tudo. Em primeiro lugar, chá (preto
ou

Fornecedores de mercadorias para a loja 1756 - 1777

Os algansmos indicam o nópnero de fornecedores em cada localidade


I t n(D nard I- !uLught-06-w-S Cing-t Penrith BE (ii
Oro (DBiSh0P up land0h
S P I (v 5 @Stockton hit n_ KIRKSY STEPHEN ljo (Dyarm ndal 34

i0a, li'llion
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- .=Accringtonj I Halif?x-(DLeeds aslingd an-ury t OWakefield igan
Cluarmby (D (D
Li___ I Y(D Saddleworth

7 Manchester (D Bolton, Sheff jeld

6. FORNECEDORES DO ARMARINHEIRO ABRAHAM DENT DE KIRKBY STEPHEN


Segundo T. S. Willan, Abraham Dent of Kirkbv Stephen, 7970.

mercadora - escocesa atrds do seu balcão, por volta de 1790.- vende,


entre outras coi9des doces, chá verde, chamado hyson, tecidos, limões,
velas. Os brincos de ouro e o dejade que usa atestam sua abastança.
(PeOPIe's Palace, Glasgow, negativo do museu.)
de diversas qualidades - a alto preço, sem dúvida, porque Kirkby Stephen,
ica no interior, não se beneficia do contrabando; vêm depois açúcar,
melaço, ha, vinho e brandy, cerveja, cidra, aveia, lúpulo, sabão, o
branco da Espao negro de fumo, cinzas, cera, sebo, velas, tabaco, limões,
amêndoas e uvas s, vinagre, ervilhas, pimenta, os condimentos do costume,
macis, cravos-da... Há também na loja de
Abraham Dent tecidos de seda, de lã, de algodão is as miudezas, agulhas,
alfinetes, etc. E até livros, revistas, almanaques, paEm suma, seria
melhor indicar o que a loja não vende: a saber, sal (o que il explicar),
ovos, manteiga, queijo, talvez por serem abundantes no mercado. )s
principais clientes são logicamente os habitantes da pequena cidade e das
s vizinhas. Os fornecedores (ver mapa na página anterior)I01 se dispersam
por paço bem vasto, embora nenhuma via fluvial sirva Kirkby Stephen. Mas
os )ortes por terra, sem dúvida dispendiosos, são regulares, e os
transportadores m, ao mesmo tempo que as mercadorias, as letras de câmbio
e as promissóje Abraham Dent utiliza em seus pagamentos. O crédito, com
efeito, interirgamente, quer em proveito dos clientes da loja, quer em
proveito do pró)jista perante seus fornecedores.

us instrumentos att troca


Abraham Dent não se contenta com suas atividades de lojista. com efeito,
compra meias de tricô e manda-as fazer em KirIçby Stephen e nas
imediações. Ei-lo empresário industrial e comerciante dos próprios
produtos, habitualmente destinados à marinha inglesa por intermédio de
atacadistas de Londres. E, como estes lhe pagam permitindo-lhe sacar
letras sobre si próprios, Abraham Dent fezse, ao que parece, dealer em
letras de câmbio: as letras que manipula ultrapassam em muito, com
efeito, o volume de seus próprios negócios. Ora, manipular letras é
emprestar dinheiro.
Ao ler o livro de T. S. Willan tem-se a impressão de que Abraham Dent é
um lojista fora de série, quase um grande empresário. Talvez seja
verdade. Mas em

1958, numa pequena cidade da Galícia, Espanha, conheci um simples lojista


que se lhe assemelhava estranhamente: encontrava-se de tudo em sua loja,
podia-se encomendar tudo e mesmo descontar cheques bancários. Não
corresponderia a loja em geral simplesmente a um conjunto de necessidades
locais? O lojista tem de se virar para ser bem-sucedido. Um merceeiro de
Munique de meados do século XV, de quem nos chegaram os livros de
contabilidade'03, parece, também ele, fora de série. Freqüenta feiras
locais e regionais, compra em Nuremberg, em Nordlingen, chega a ir a
Veneza. No entanto, não passa de um simples mercador comum, a julgar pela
sua pobre habitação: um único quarto, parcamente mobiliado.
Especialização e hierarquização em marcha
Paralelamente a essas lojas imutáveis, a evolução econÔmica fabrica
outras formas de lojas especializadas. Pouco a pouco, vão-se distinguindo
os lojistas que vendem por peso: os merceeiros; os que vendem por metro:
os comerciantes de tecidos ou os alfaiates; os que vendem por peça: os
ferrageiros; os que vendem objetos usados, roupas ou móveis: os
adeleiros. Estes ocupam um lugar enorme:
são mais de mil em Lille, em 1716204.
São lojas à parte, favorecidas pelo desenvolvimento dos --serviços-, as
do boticário, as casas de penhor, do cambista, do banqueiro, do
estalajadeiro, este muitas vezes também intermediário dos transportes
rodoviários, do taberneiro e, finalmente, as dos "rnercadores de vinho
que têm toalhas e guardanapos e dão de comer em sua casa', 205 e que se
multiplicam por toda a parte, no século XVIII, para escândalo das pessoas
de bem. É verdade que alguns são sinistros, como a taberna "da rua dos
Ursos", em Paris, "que mais parece um covil de bandidos e malandros do
que um lugar de gente honesta' 206, apesar do cheiro gostoso da cozinha
das churrascarias vizinhas. A esta lista acrescentemos os escreventes e
até os tabeliões, pelo menos os que se vêem em Lyon, da rua, "sentados em
suas lojas como sapateiros à espera de serviço" - palavras de um viajante
que atravessa a cidade em

1643207. Mas há também, já no século XVII, tabeliões abastados. Em


contrapartida, há também escreventes públicos demasiado miscraveis para
manterem loja, como os que operam ao ar livre nos Saints-Innocents, em
Paris, ao longo dos pilares, e que mesmo assim enchem os bolsos com um
pouco de dinheiro, tão grande é o número de criados, criadas e pobres que
não sabem escrever208. Há também as lojas das meretrizes, as casas de
carne da Espanha. Em Sevilha, "na calle de Ia Serpiente", diz o Burlador
de Tirso de Molina20% "[... 1 pode-se ver Adão cair a gan51

gram a bolsa - -11 O Português 1... 1 até por um ducado, Petiscos que
logo sanEnfim, há lojas e lojas. Também impõe depressa distinções; há
Comerciantes e comerciantes. O dinheiro ro":
no topo, alguns merc 109O de início, abre o leque do velho ofício de
merceeiadores 11

distância; na base, Os Pobres reven muito ricos especializados no


comércio de longa les de quem fala O Provérbio, dedores de agulhas Ou de
tecido encerado, aqueceeiro, pequeno o cesto-, com com exatidão e Sem
comp.
quem nem m aixão: "Pequeno o meralgumas economias, se casaria esmo uma
criada, sobretudo se tem dores tenta elevar-se acima do. Regra geral: Por
toda a parte, um grupo de mercase das A rti Mino s Outros. Em Florença,
as
Arti
Maggiori distinguem ri. Em Paris, do decreto de 1625 ao edito de 1O de
agosto de

1776, pos:
a honra mercante são os Seis Cor na ordem, fanqueiros, merceeiros,
cambis- tas, ourives, armarinheiros, peloiros. Em Madri, no primeiro
plano, Os Cinco
GremiOs Mayores, cujo Papel financeiro será considerável no século XVIII.
Em
Londres, os Doze Corpos. Na Itália, nas cidades livres da Alemanha, a
distinção foi ainda mais nítida: os grandes mercadores to naram-se, de
fato, uma nobreza, o patriciado; detêm O governo das grandes cidades
mercantes.
As lojas conquistam o mundo
Mas o essencial, do nosso ponto de vista, é que as lojas de comércio de
todas as categorias conquistam, devoram as cidades todas as cidades C
logo as próprias aldeias, onde se instalam, já no século XVII e'
sobretudo no século XVIII, armarinheiros inexperientes, estalajadeiros de
quinta categoria e taberneiros. Estes, usurários modestos mas também
"Organizadores dos festejos coletivOs", encontramse ainda instalados nas
zonas rurais francesas dos séculos XIX e XX. Era à taberna da aldeia que
se ia "jogar, conversar, beber e distrair-se... tratar entre credor e
devedor, entre mercador e cliente, negociar mercados, fechar
aluguéis..... um Pouco o albergue dos pobres! Em frente à igreja, a
taberna é o outro Pólo da aldeia210.
Milhares de testemunhos confirmam esse surto lojista. No século XVI, há
um dilúvio, uma inundação de lojas Em 1606, LoPe de Vega Pode dizer de
Madri, que se tornara capital: -Todo * loja821 se ha vuelto tiendas,,,
tudo se transformou em

1.A lienda torna-se, aliás, um dos cenários favoritos da aÇão dos


romances
Picarescos. Na Baviera, os mercadores tornam-se "tao rOS11212 numerosos
como os padei, Em Londres, em 1673, o embaixador da França, expulso da
sua casa que querem derrubar "para ali construir novos edificios",
procura em vão onde morar, "o que custa a crer-, escreve, "de uma cidade
tão grande como esta... [Mas] como a maior parte das grandes casas foram
derrubadas desde que estou aqui e transformadas em lojas e pequenas
residências de mercadores, há [muito poucas para alugar- e a preços
exorbitanteS213. 1

lojista tornou-se "monstruosiy19214 Segundo Daniel Defoe, essa


proliferação ;
em 1663, os mercers ainda não eram mais do que uns 5O ou 60, no total, na
enorme cidade; no fim do século, são 30O ou 400; as lojas de luxo
transformam-se então com grandes despesas e, cada uma mais do que a
outra, cobrem-se de espelhos, enchem-se de colunas douradas, de
girândolas e de aPliques de bronze que o born
Defoe considera extravagantes. Mas um viajan

Um estabelecimento de luxo em Madri na segunda metade do século XVIII.. a


loja de antiguidades. Cendrio compardvel ao descrito por Defõe para os
novos estabelecimentos londrinos, no início do século. Quadro de Luís
Paret y Alcazar,
Madrid, Museu Lazaro. (Foto Scata.)
te francês (1728) extasia-se diante das primeiras vitrines e observa: --O
que não temos habitualmente [na França] é o vidro, que, em geral, é muito
bonito e muito claro. As lojas daqui são rodeadas de vidro e costumam
dispor a mercadoria por trás, o que protege da poeira exibindo-a aos
olhos dos passantes e lhes dá belo aspecto de todos os lados.--215 Ao
mesmo tempo, as lojas dirigem-se ao oeste, para seguir a expansão da
cidade e as migrações da gente rica. Pater
Noster Row fora durante muito tempo a sua rua; depois, um belo dia, Pater
Noster esvazia-se em proveito de Covent Garden, que terá destaque por dez
anos apenas.
A seguir, a moda vai para Ludgate HiII, mais tarde as lojas enxameiam
perto de
Round Court, Fenchurch Street ou Houndsditch. Mas todas as cidades lêem
pela mesma cartilha. Suas lojas multiplicam-se, invadem as ruas com suas
vitrinas, emigram de um bairro para outro216. Veja-se como se difundem os
cafés em
PariS217 como as margens do Sena, com o Petit Dunkerque que fascina
Voltaire218
suplantam a galeria do Palácio cujo alarido comercial fora o grande
espetáculo da cidade no tempo de Corneille219. Até as pequenas
aglomerações urbanas sofrem mutações análogas. É o caso de Malta, logo no
início do século XVIII, com a acanhada cidade nova de

os da troca a, onde --as lojas de armarinhos e dos pequenos varejistas",


diz um relato inciado 22O --se multiplicaram a tal ponto que nenhum
consegue assegurar tinente seus meios de subsistência. E ei-los forçados
a roubar ou a abrir rapidamente. Nunca têm lojas bem sortidas e é
lamentável ver tantos josiparem ali ou o dote quase intacto da mulher, ou
a herança dos pais, e :) por uma ocupação sedentária de verdadeiro
vadio", "una occupatione -ia et cosi poltrona". O mesmo virtuoso narrador
indigna-se por se multii então, nas casas maltesas, os objetos de ouro e
prata, um capital "inútil

1 9

, por homens, mulheres, crianças de condição medíocre se ataviarem de


'irios, de mantilhas de renda e por, escândalo pior ainda, as putane
passeawruagem, cobertas de seda. Pelo menos, acrescenta ele sem o menor
huia vez que há uma proibição a esse respeito, que lhes imponham uma
taxa, (o al mese per dritto d'abiti"! Como tudo é relativo, não é isso
uma espécie dade de consumo que já desponta?
s há graduações: quando, em 1815, J-B. Say revê Londres passados quase
c)s (sua primeira visita data de 1796), fica estupefato: estranhas lojas
oferes mercadorias com desconto, por toda a parte há charlatães e
cartazes, uns s", outros "ambulantes", "que os pedestres podem ler sem
perder um miAcabam de inventar os homens-sanduíche em Londres221.
linguagem de hoje, concluiríamos que houve por toda a parte um aumento
ini distribuição, aceleração das trocas (outras provas disso são os
mercados e as riunfo (com o comércio fixo das lojas e a extensão dos
serviços) de um sector que não deixa de estar relacionado com o
desenvolvimento geral da economia. e surto poderia ser acompanhado por
muitos números se calculássemos a entre o volume da população e o número
de lojas 222; ou a respectiva perri de lojas de artesãos e de lojas de
comércio; ou o tamanho médio, a renda a loja. Werner
Sombart221 deu realce ao testemunho de Justus Mõser, his- de qualidade,
observador um tanto desgostoso que, a propósito de sua cisnabrück,
verifica, em 1774, que --os armarinheiros de um século para cá am
redondamente, ao passo que os artesãos caíram para a metade". Um i página
55:
ciro parisiense vai à falência - 28 de junho de 1770

esnée, mestre padeiro em Paris, pede concordata à jurisdição consular


parisiense, ndo-se, como é de regra, as dívidas ativas das dívidas
passivas do concordatdrio, , seu ativo e seu passivo. A página
reproduzida, a primeira de um processo com olhas, mostra claramente uma
série de vendas a crédito. Entre os grandes devedo..elheiros do
Parlamento. As dívidas passivas são constitudas por compras de fariImente
a crédito. O nosso padeiro possui uma loja, -instrumentos, um carro, um
ara as entregas, tudo avaliado em 6.60O libras, o mobiliário em

7.400. Esteja o leitor rdo, o mestrepadeiro chegou a um acordo com os


credores.
Esperamos que os clien2m pago as faturas a tempo. (Arquivos do Sena, D4
BI, 11, processo 526.)

5oticário: ajresco do castelo de Issogne, no vale de Aosta, fim do século


XV.
(Foto dor, Hans Mauersberg 224, acaba de nos fornecer constatações
análogas, esiúmeros, referentes a sua série de grandes cidades alemãs. Ao
acaso de al;ondagens (segundo inventários por óbito) feitas, uma na Madri
de Filipe s duas outras em lojas de varejistas catalães e genoveses na
Sicília do sécu226 vislumbramos lojas modestas, acanhadas, periclitantes,
que deixam sodívidas ao serem liquidadas. Neste pequeno mundo, as
falências são mocmte. Tem-se até a impressão - não passa de uma impressão
- de que tudo )ronto, no século XVIII, para um "poujadismo" ativo, se os
pequenos cotes tivessem tido então liberdade de expressão. Em Londres,
quando o mide Fox tenta taxá-los, em 1788, rapidamente volta atrás diante
do "dcsamento generalizado [que a medida suscitou] entre o povo" 227.
Ainda que, as não sejam o povo - verdade evidente -, eventualmente o
agitam. Na A793 e 1794, boa parte da sans-culotterie é recrutada nesse
semiproletariapequenos lojistaS228. Isso incentivaria a acreditar num
relatório, à primeira ri tanto parcial, que pretende, em 1790, que em
Paris 2O mil comerciantes as se encontram à beira da falência229.
:) posto, e no estado atual dos nossos conhecimentos, podemos afirmar:
que o aumento da população e o desenvolvimento da vida econômica a lono,
o desejo do "comerciante varejista" de ter estabelecimento próprio, de,
ram o grande aumento dos intermediários da distribuição. O número, ao
ece, excessivo desses agentes prova, quando muito, que esse surto precede
mento da economia e confia demais nele;
que a fixidez dos pontos de venda, a abertura prolongada, a publicidade,
Leios, as conversas devem ter revertido em favor da loja. Entra-se na
loja

Os instrumentos da troca tanto para discutir como para comprar. É um


teatro em miniatura. Vejam-se os diálogos divertidos e verossímeis
imaginados, em 1631, pelo autor do Bourgeois poli230, de Chartres. E foi
Adam Smith, num dos seus raros momentos de humor, quem comparou o homem
que fala com os animais que não têm o mesmo privilégio: "A propensão para
trocar objetos é provavelmente conseqüência da possibilidade de trocar
palavras..., 1231 Para os povos, tagarelas por natureza, a troca de
palavras é indispensável, ainda que nem sempre se lhe siga a troca de
objetos;
- mas que a razão principal do surto lojista foi o crédito. Acima das
lojas, o atacadista concede crédito: o varejista terá de pagar o que hoje
chamaríamos duplicatas. Os Guicciardini CorSi232 grandes mercadores
florentinos, na época importadores de trigo siciliano (emprestaram
dinheiro a Galileu, o que hoje é um título de glória para essa grande
família), vendem a prazo de dezoito meses a pimentado-reino dos seus
armazéns aos merceeiros, como atestam seus livros de contabilidade. E o
fato é que não inovam neste domínio. Mas o próprio lojista concede
crédito aos clientes, mais ainda aos ricos do que aos outros. O alfaiate
concede crédito; o padeiro concede crédito (utilizando duas tabuinhas de
madeira233 nas quais todos os dias se faz uma incisão, ficando uma com o
padeiro, a outra com o freguês); o taberneiro concede crédito234: o
bebedor inscreve com um traço de giz a sua dívida na parede; o açougueiro
concede crédito. Conheci uma família, diz Defoe, cujos rendimentos eram
de vários milhares de libras por ano e que pagava ao açougueiro, ao
padeiro, ao merceeiro e ao queijeiro 10O libras de cada vez, deixando
constantemente 10O libras de dívidaS235. Apostamos que mestre Fournerat,
que consta do Livre commode des adresses (1692)236, adeleiro junto dos
pilares dos Halles e que, ao que pretende, mantém --um homem com trajes
decentes por quatro pistolas por ano", apostamos que este fornecedor de
um "prêt-à-porter" muito especial nem sempre recebe adiantado. E tampouco
os três mercadores de adelo sócios que, na rua Nova da paróquia de
Sainte-Marie, em Paris, oferecem seus serviços "para todos os artigos de
luto, casacos, crepes e peitilhos, mesmo para casacas pretas usadas nas
cerimônias', 237.
O comerciante, numa situação de pequeno capitalista, vive entre os que
lhe devem dinheiro e aqueles a quem ele deve. É um equilíbrio precário,
sempre à beira da derrocada. Se um --fornecedor" (entenda-se um
intermediário relacionado com um atacadista ou o próprio atacadista) lhe
mete a faca ao peito, é a catástrofe. Se um cliente rico abre falência,
logo uma peixeira fica na rua da amargura (1623):
"Eu começava a arrumar a minha vida e de repente fiquei só com uma
branca', 238

- visto que uma branca é uma moeda de dez dinheiros, entenda-se que ficou
reduzida ao último tostão. Qualquer lojista está sujeito a tal
infortúnio:
pagaram-lhe tarde, ou não lhe pagaram nada. Um armeiro, François
Pommerol, poeta nas horas vagas, queixa-se, em 1632239, da sua condição
em que --Há que labutar para ser pago/Ter paciência quando se está
aprazado" (ou seja, vítima de um prazo).
É a queixa mais comum quando o acaso nos põe ante os olhos cartas de
pequenos comerciantes, de intermediários, de fornecedores. "Escrevemo-vos
estas linhas para saber quando estareis dispostos a nos pagar", 28 de
maio de 1669. "Senhor, muito me espanta que minhas cartas tantas vezes
reiteradas obtenham tão pouco efeito, pois sempre se deve responder a um
homem honesto ..... 3O de junho de

1669. "Jamais pensaríamos que depois de nos terdes garantido que viríeis
até nós para liquidar a vossa conta, vós fôsseis embora sem nada dizer",
1 O de dezembro

57

os da troca . -Não sei mais como hei de vos escrever, vejo que não fazeis
caso das carvos mando ..... 28 de julho de 1669. "Faz seis meses que vos
peço que me provisão..... 18 de agosto de 1669. "Bem vejo que vossas
cartas só servem divertir..... 11 de abril de 1676. Todas estas cartas
foram escritas por di240

, omerciantes de Lyon. Não encontrei a daquele credor exasperado que o


delinqüente de que iria a Grenoble e faria justiça com as próprias mãos.
rcador de Reims, contemporâneo de Luís XIV, reticente nos empréstimos, )
rovérbio: "Para emprestar primo-irmão, para pagar filho da puta. 1,
241 ;es pagamentos claudicantes criam dependências e dificuldades em
cadeia. ubro de 1728, na feira da Sagrada Hóstia, em Dijon, os tecidos de
linho i saída, mas não os tecidos de lã e de seda. "... Atribui-se a
causa disso ao os mercadores varejistas se queixarem das poucas vendas
que fazem e de, do pagos por aqueles a quem vendem, ficarem sem condições
para fazer :)mpras. Por outro lado, os mercadores atacadistas que vêm às
feiras recusamnceder crédito sobre crédito à maior parte dos varejistas
que não lhes
9 9242

is confrontemos essa imagem com as de Defoc, que explica longamente que i


do crédito está na base do comércio, que as dívidas se compensam entre
por isso há multiplicação das atividades e dos rendimentos comerciais. O
niente dos documentos de arquivo não será coletarem para o historiador
is, processos, catástrofes, em vez do andamento regular dos negócios? Os
s felizes, tal como as pessoas felizes, não têm história.
'ante atividade mascates são mercadores, quase sempre miseráveis, que
"levam no pescoi muito simplesmente nas costas, parcas mercadorias. Nem
por isso deixam ;tituir uma massa de manobra apreciável nas trocas.
Preenchem, nas pródades, mais ainda nos burgos e aldeias, os vazios das
redes comuns de diso. Como esses vazios são muitos, pululam os mascates,
é um sinal dos tem)r toda a parte, recebem uma litania de nomes: na
França, colporteur, con?ur, porte-balle, mercelot, camelotier,
brocanteur; na Inglaterra, hawker, ?r, petty chapman, pedIar, packman; na
Alemanha, cada região o batiza a do: Hõcke, Hueker, Grempler,
Hausierer, Ausrufer - diz-se ainda Pfusscateiro), Bõnhasen; na Itália é o
merciaju, olo; na Espanha o buhonero. Tem special até no Leste da Europa:
seyyar satici em turco (que quer dizer ao tempo mascate e pequeno
lojista), sergidzyja (do turco sergi) em língua búl)rbar (do turco torba
= bolsa) ou torbar i srebar, ou ainda Kramar ou KraÈavra de origem
evidentemente alemã que designa tanto o mascate como utor de caravanas ou
o pequeno burguês) em servo-croata243, etc.
ta pletora de nomes deve-se ao fato de, longe de ser um tipo social bem
defimascate representar uma coleção de ofícios que escapam às
classificações is:
um amolador saboiano, em Estrasburgo, 1703 244 é um operário que teia"
seus serviços e perambula como muitos limpa-chaminés e empalhae cadeiras;
um maragato245 camponês das montanhas cantábricas, é um ar

Os instrumentos da troca rieiro que transporta trigo, lenha, aduelas de


pipas, barris de peixe salgado, tecidos de lã grosseira, conforme vai dos
planaltos cerealíferos e vinícolas de Castela
Velha para o mar ou vice-versa; é, além disso, segundo a expressão
figurada, vendedor en ambulancia 246 pois ele próprio comprou para
revender tudo ou parte das mercadorias que transporta. São inegavelmente
mascates os camponeses tecelões da aldeia manufatureira de Andrychow,
perto de Cracóvia, ou, entre eles, pelo menos os que vão vender a
produção de tecidos da aldeia em Varsóvia, em Gdansk, em Lwow, em
Tarnopolo, nas feiras de Lublin e de Dubno, que vão mesmo a Istambul,
Esmirna, Veneza e Marselha. Esses camponeses prontos para desenraizar-se
tornam-se eventualmente "pioneiros da navegação no I)niestr e no mar
Negro..." (1782) 247. Em contrapartida, que nome dar a esses mercadores
abastados de Manchester ou a esses fabricantes de Yorkshire e de
Coventry que, cavalgando através da Inglaterra, vão pessoalmente entregar
as mercadoriais aos lojistas? Diz Defoc: "Riqueza à parte, são mascates-
248. E a palavra podia também aplicar-se aos mercadores chamados
JorasteiroS249 (isto é vindos de uma cidade estrangeira) que, na França e
em outros países, andam de feira em feira mas são por vezes relativamente
abonados.
Seja ele quem for, rico ou pobre, o mascate estimula, mantém a troca,
propaga-a.
Mas está provado que onde ele tem prioridade há, comumente, certo atraso
econômico. A PolÔnia está atrasada em relação à economia da Europa
ocidental:
logicamente, lá o mascate é rei. Não será a mascateagem uma sobrevivência
do que outrora foi, durante séculos, o comércio normal? Os SyriIII do
Baixo Império romano são mascates. A imagem do mercador do Ocidente, na
Idade Média, é a de um itinerante enlameado, coberto de pó, como o
mascate de qualquer época. Um libelo de 1622 25 1 descreve ainda esse
mercador de outras eras, com uma "sacola pendente nas costas, sapatos que
só têm couro na ponta-, a mulher segue-o, protegida por "um grande chapéu
que atrás lhe cai até a cintura". Sim, mas esse casal errante instala-se
um belo dia numa loja, muda de aspecto e revela-se menos miserável do que
parecia. Não haverá entre os mascates, pelo menos entre os carreteiros,
ricos mercadores em potencial? Um acaso, e ei-los promovidos.
Foram os mascates que quase sempre criaram, no século XVIII, as modestas
lojas de aldeia de que falamos. Partem mesmo ao assalto das praças
mercantes: em
Munique, 5O firmas italianas ou saboianas do século XVIII são oriundas de
mascates bem-sucedidos 252. Implantações análogas devem ter ocorrido, nos
séculos X1 e XII, nas cidades da Europa, então pouco maiores do que
aldeias.
Seja como for, as atividades dos mascates, somadas umas às outras, têm
efeitos de massa. A difusão da literatura popular e dos almanaques nos
campos é praticamente obra sua 253. Todos os cristais da Boêrnia254 , no
século XVIII, são distribuídos por mascates, tanto nos países
escandinavos como na Inglaterra, na Rússia como no Império otomano. Mais
da metade do território sueco, nos séculos XVII e XVIII, é ermo de
homens: raros pontos de povoamento perdidos numa imensidão. Mas a
insistência de pequenos mercadores ambulantes, originários da
Vestrogótia ou do Smaland, consegue distribuir ali, ao mesmo tempo,
"ferraduras, pregos, ferragens, alfinetes... almanaques, livros de
orações' 9255. Na
Polônia, os judeus itinerantes assumem 4O a 50% do tráfico 256 e triunfam
também em terras aleMãs, já dominando em parte as feiras gloriosas de
LeipZig257.
A mascateagem, portanto, nem sempre está na rabeira. Mais de uma vez foi
expansão pioneira, conquista de mercados. Em setembro de 1710`1, o
conselho do

59

)r de redondo nas ruas de Moscou. Gravura de 1794. (Foto Alexandra


SkaryÚska.)
io de Paris rejeita o pedido de dois judeus de Avignon, Moyse de
Vallabrege. de
Jasiar, que queriam "vender tecidos de seda, lã e outras mercadorias as
as cidades do reino, pelo tempo de seis semanas nas quatro estações do m
ter loja aberta". Essa iniciativa de mercadores que não são,
evidentemenaenos mascates pareceu "muito prejudicial ao comércio e aos
interesses dos do rei", uma ameaça não disfarçada para os lojistas e
mercadores instalaabitualmente, as posições são inversas: os mercadores
atacadistas e os lojis)ortantes, ou mesmo os pequenos, controlam a
mascateagem, reservando a ifusores obstinados os "encalhes" que lhes
atulham os depósitos. Porque lo mascate é vender em pequenas quantidades,
forçar as zonas mal servidas, icer os hesitantes, para o que não poupa
esforços nem discursos, à imagem lelô dos boulevards franceses, um de
seus herdeiros. Esperto, engraçado, esso: é assim que aparece no teatro e
se, numa peça de 1637259, a jovem viú) casar afinal com o bem-falante,
não é por não ter ficado tentada:
Meu Deus, como é simpático! Se eu tivesse bens E o quisesse, bem que ele
me quereria,
Mas o que ele tira a apregoar gazetas
Não poderia, num ano, dar-nos sequer os óculos.
icitamente ou não, os mascates se insinuam em toda a parte, até sob as
arcaSan
Marco em Veneza ou na Pont-Neuf em Paris. A ponte de Abo (na Fin) é
ocupada por lojas; não seja por isso, os mascates reúnem-se nas duas
exlades da ponte260. Em
Bolonha, é necessária uma regulamentação explícita

Os instrumentos da troca para que a praça principal, em frente à


catedral, onde às quartas e sábados se realiza a feira, não se
transforme, por causa deles, numa espécie de mercado261. Em
Colônia, distinguem-se trinta e seis categorias de Ausrufer, de
pregoeiros de rua262. Em Lyon, em 1643, há um pregão contínuo:
-mascateia-se tudo o que há para vender: bolinhos, frutas, lenha, carvão
[de madeira], caixas de uvas, aipo, ervilhas cozidas, laranjas, etc.
Verduras e legumes são exibidos numa carroça e apregoados. As maçãs e as
pêras são vendidas cozidas. Vendem-se cerejas por peso, a tanto a

263

libra" . Os pregões de Paris, os pregões de Londres, os pregões de Roma


estão presentes nas gravuras da época e na literatura. Conhecemos os
vendedores das ruas romanas desenhados por Carracci, ou por Giuseppe
Barberi, oferecendo figos e melões, ervas, laranjas, biscoitos doces e
salgados, cebolas, pães, roupas usadas, rolos de pano e sacos de carvão,
caça, rãs... Será possível imaginar a
Veneza do século XVIII invadida por mercadores de broas de milho? No
entanto, em julho de 1767 são realmente vendidas, em grandes quantidades,
"ao reles preço de um soldo". É porque, diz um observador, "a plebe
famélica [da cidade] empobrece continuamente"264. Então, como livrar-se
desse enxame de camelôs? Nenhuma cidade o consegue. Guy Patin escreve de
Paris, em 19 de outubro de 1666265: "Começa-se aqui a executar um
policiamento premeditado sobre as vendedoras, receptadores e remendões
que estorvam a passagem pública, as pessoas querem ver as ruas de
Paris bem limpas; o rei disse que quer fazer de Paris o que Augusto fez
de
Roma..." Em vão, claro: é o mesmo que enxotar nuvens de moscas. Todas as
ruas citadinas, todas as estradas rurais são percorridas por essas pernas
infatigáveis. Até a Holanda, numa data tão tardia quanto 1778, é inundada
por "porte-balles, coureurs e mercelots, brocanteurs que vendem uma
infinidade de mercadorias estrangeiras às pessoas ricas e abastadas que
passam grande parte do ano em suas propriedades do campo"266. A loucura
tardia das casas de campo está então no auge, nas Províncias Unidas, e
essa moda talvez não seja alheia a tal afluência.
Muitas vezes, a mascateagem está associada a migrações sazonais: e o caso
dos saboianoS267, dos delfineses que vão para a França e também para a
Alemanha, dos montanheses de Auvergne268 especialmente do planalto de
Saim-Flour, que percorrem as estradas da Espanha. Italianos vão à França
fazer a "temporada", alguns contentam-se em dar uma volta pelo reino de
Nápoles; franceses vão à
Alemanha. Uma correspondência de mascates de Magland269 (hoje Alta-
Sabóia)
permite seguir, de 1788 a 1834, as idas e vindas de "joalheiros"
ambulantes, na realidade mercadores de relógios que colocam suas
mercadorias em feiras da Suíça (Lucerna e Zurzach)27O e nas lojas da
Alemanha do sul em longos itinerários, quase sempre os mesmos, de pai
para filho e para neto. com mais ou menos sorte:
na feira de Lucerna, em 13 de maio de 1819, "mal dá para beber uma caneca
à noite'9271.
Por vezes, ocorrem invasões bruscas, possivelmente ligadas às
vagabundagens das épocas de crise. Na Espanha, em 1783 272 têm de ser
tomadas medidas gerais, em bloco, contra carregadores, mascates e
merceeiros ambulantes, contra os "que exibem animais amestrados", contra
os estranhos curandeiros "a que chamam salutadores que trazem uma grande
cruz no pescoço e pretendem curar as doenças dos homens e dos animais com
orações". Sob o nome genérico de carregadores são visados malteses,
genoveses, naturais da região. Franceses, não, mas deve ser por pura
omissão. É natural que esses vagabundos com profissão tenham ligações com
vagabundos sem profissão com quem se cruzam nas estradas e que participem

61

os aa troca almente das malfeitorias desse pessoal sem eira nem beira
273. Natural tame andem associados ao contrabando. A Inglaterra, por
volta de 1641, está
- mascates franceses que, segundo sir Thomas Roc, do Privy Council do
tribuiriam para o déficit monetário da balança do reino 2741 Não seriam
acós marinheiros que carregam fraudulentamente nas costas inglesas lã e
terra eiro e descarregam aguardente?
stuma-se afirmar que a vida exuberante da mascateagem se extingue por si
m que uma região atinge certa fase de desenvolvimento. Na Inglaterra,
teria -ecido no século XVIII, na França, no XIX. Todavia, houve um
recrudesciIa mascateagem inglesa no século XIX, pelo menos nos subúrbios
das cidaustriais mal servidas pelos circuitos normais de distribuição
275. Na França, -r estudo folclórico encontra vestígios seus no Século
XX276. Pensava~se ata-se de lógica a priori)
que os meios de transporte modernos lhe haviam o um golpe mortal. Ora,
nossos relojoeiros ambulantes de Magland utili-ros, diligências e até, em
1834, satisfatoriamente, um navio a vapor no lago M. É de pensar que a
mascateagem é um sistema eminentemente adaptá.alquer problema de
distribuição pode fazê-la surgir ou ressurgir; ou qualmento das
atividades clandestinas, contrabando, roubo, receptação; ou qualasião
inesperada que abrande as concorrências, as vigilâncias, as
formaliiormais do comércio.
sim, a França revolucionária e imperial foi teatro de uma enorme
proliferamascates. Acredite-se nesse juiz rabugento do tribunal de
comércio de
Metz resenta (6 de fevereiro de 1813) um longo relatório a Suas
Excelências os os do conselho geral do comércio em Paris 278 : --O
mascate de hoje não é de antigamente, com fardo às costas. É um comércio
considerável cuja seem toda a parte - conquanto não tenha sede.-- Em
suma, vigaristas, Iaim flagelo para os compradores ingénuos, uma
catástrofe para os mercadoimiciliados " que têm estabelecimento próprio.
Seria urgente detê-los, quannão fosse para a segurança da sociedade.
Pobre sociedade em que o coméro pouco considerado, em que, depois das
licenças revolucionárias e da épo7ssignats, qualquer pessoa, pelo preço
módico de uma patente, pode tornarador de qualquer coisa. A única
solução, segundo nosso juiz: "restabelecer orações"!
Acrescenta, apenas: "evitando os abusos de sua primeira insti'! Não vamos
continuar a segui-lo. Mas é verdade que, no seu tempo, se m por toda a
parte enxurradas, exércitos de mascates. Em Paris, nesse mesde 1813, o
chefe da polícia é advertido de que "tcndeiros" montam barratoda a parte
em plena rua, "desde o boulevard da Madeleine até o do Temem vergonha,
instalam-se na frente da porta das lojas, vendem as mesmas orias para a
fúria dos lojistas, principalmente os vidraceiros, os louceiros,
altadores, até os joalheiros. Os responsáveis pela ordem já não têm o que
'Vivernos expulsando os tendeiros de um lado para outro e eles vivem
vol... 1 servindo-lhes o seu grande número de salvação. Como prender
tamanha

Os instrumentos da troca quantidade de indivíduos?" Ainda por cima, todos


indigentes. E o chefe da polícia acrescenta: --Talvez esse comércio
irregular não seja tão desfavorável aos comerciantes estabelecidos como
se supõe, pois quase todas as mercadorias assim expostas são vendidas por
eles aos tendeiros que, quase sempre, não passam mesmo de seus
comissionários... 1, 279

Muito recentemente, a esfaimada França, de 194O a 1945, conheceu, com o

44mercado negro", um novo surto de mascateagem anormal. Na Rússia, o


período de

1917-1922, um período tão difícil, com seus transtornos, sua circulação


imperfeita, viu, em dado momento, reaparecer os intermediários ambulantes
como em tempos passados, revendedores, coletores abusivos, comerciantes
desonestos, mas280

cates - os "homens da sacola" , como se dizia com desprezo. Mas hoje os


produtores bretões que vêm de caminhão a Paris vender diretamente
alcachofras ou couves-flores que não interessaram aos atacadistas dos
Halles são por momentos mascates. São também modernos mascates os
pitorescos camponeses da Georgia e da
Armênia, com suas sacolas de legumes e de frutas, suas redes cheias de
aves vivas que as baixas tarifas dos aviões nas linhas internas
soviéticas atraem hoje em dia a Moscou. Se um dia a tirania ameaçadora
das lojas Uniprix, dos grandes espaços comerciais, se tornar intolerável,
não é de afastar a idéia de vermos desencadearse contra eles - mantendo-
se o resto igual - uma nova mascateagem, porque a mascateagem é sempre
uma maneira de contornar a ordem estabelecida do sacrossanto mercado, de
desafiar as autoridades estabelecidas.

63

)PA: AS ENGRENAGENS NO SUPERIOR DAS TROCAS


N, cima das feiras locais, das lojas, da mascateagem, situa-se, nas mãos
de atores intes, uma poderosa superestrutura de trocas. É o andar das
principais engreis, da grande economia, forçosamente do capitalismo, que
não existiria sem ela., 4o mundo de outrora, as ferramentas essenciais do
comércio de grande enver.-a são as grandes feiras e as Bolsas. Não que
elas reuniram todos os grandes -ios. os cartórios, na França e em todo o
continente - não na
Inglaterra, ona função é apenas identificar as pessoas -, permitem
concluir à porta fechaumeráveis e bem importantes transações, tão
numerosas que seriam, no dizer a historiador, Jean-Paul Poisson 281, uma
forma de medir o nível geral dos nes. Assim também os bancos, esses
reservatórios onde lentamente se vai pondo heiro de reserva e de onde ele
nem sempre escapa com prudência e eficácia, irem uma importância cada vez
maior 282. E as jurisdições consulares franceis quais também serão mais
tarde confiadas as questões e litígios relativos às cias)
constituem, para a mercadoria, uma justiça privilegiada "per legem
meriam-, uma justiça expedita e que salvaguarda interesses de classe. Por
isso (17 de janeiro de l757)283 o Périgueux (11 de junho de 1783)281
exigem tanijurisdições consulares que lhes facilitariam a vida comercial.
uanto às câmaras de comércio francesas do século XVIII (a primeira em
Dunjue em

1700)285, e que são imitadas na Itália (Veneza, 1763286, Florença,

87), elas tendem a reforçar a autoridade dos grandes negociantes em


detrimens outros. É o que diz abertamente um mercador de Dunquerque (6 de
janeiro

110): "Todas essas câmaras de comércio [ ... 1 só servem para arruinar o


coio geral [o comércio de todos] tornando 5 ou 6 particulares senhores
absolutos ivegação e do comércio em que estão estabelecidos.""' Por isso,
conforme gares, a instituição consegue ou não ter êxito. Em Marselha, a
câmara de coio é o coração da vida mercantil; em Lyon, é o corpo de
escabinos, de modo i câmara de comércio, que não é muito necessária,
acaba esquecendo de se r. Escreve o inspetor geral em 27 de junho de
1775289: "Fui informado [ ... 1 ie a câmara de comércio de Lyon não
realiza ou realiza muito poucas assems, que as disposições do acórdão do
Conselho de 1702 não são executadas e udo o que diz respeito ao comércio
dessa cidade é examinado e decidido pelos os" - isto é, os escabinos da
cidade. Mas bastará levantar a voz para desperma instituição para a vida
normal? Saim-Malo, em 1728, em vão pedira ao ma câmara de comércio290.
Fica claro, portanto, que no século XVIII os instrumentos do grande
negócio iltiplicam e diversificam. As grandes feiras e as Bolsas nem por
isso deixam tar no centro da grande vida mercantil.
feiras, velhas ferramentas ?nte remodeladas
As grandes feiras são velhas instituições, menos antigas do que os
mercados ras locais (talvez), ainda assim mergulhando no passado de
intermináveis

Ç__3 1111N1fUtr1<r1[U3 "" tIULU raízeS291. Na França, correta ou


incorretamente, a investigação histórica recualhes as origens para além
de Roma, para a época remota das grandes peregrinações celtas. O
renascimento do século XI, no Ocidente, não seria a partida do zero (como
se costuma dizer), uma vez que subsistiam ainda vestígios de cidades, de
mercados, de feiras, de peregrinações - em suma, hábitos que bastava
retomar.
Dizia-se que a feira de Lendit, em Saim-Denis, remontava pelo menos ao
século IX (ao reinado de Carlos, o Calvo)292; que as feiras de TroyeS293
haviam sido romanas; que as feiras de Lyon haviam sido instituídas por
volta do ano 172 da nossa era291. Pretensões, falatórios? Sim e não, uma
vez que as grandes feiras são, ao que tudo indica, ainda mais antigas do
que apontam essas pretensões.
Seja como for, a idade não as impede de serem instituições vivas que se
adaptam às circunstâncias. Seu papel é romper o círculo demasiado
estreito das trocas normais. Em l800295 uma aldeia do Mosa pede a criação
de uma feira para que lhe chegue as ferragens que lhe faltam. Mesmo as
feiras de muitos burgos modestos, que parecem não ser mais do que o
casamento entre o campo circundante e o artesão urbano, rompem de fato o
círculo habitual das trocas. Quanto às grandes feiras, elas mobilizam a
economia de vastas regiões; por vezes todo o Ocidente ali se encontra,
aproveitando liberdades e franquias oferecidas que temporariamente
eliminam o obstáculo das várias taxas e pedágios. Assim, tudo concorre
para que a feira seja uma reunião fora de série. O príncipe, que muito
cedo se assenhoreou dessas confluências decisivas (o rei da França296 o
rei da
Inglaterra, o imperador), multiplica as benesses, as franquias, as
garantias, os privilégios. Todavia, note-se de passagem, as feiras não
são ipso facto francas, e nenhuma, nem mesmo a feira de Beaucaire, vive
sob o regime de uma perfeita troca livre. Por exemplo, as três feiras
"régias" de Saumur, cada qual de três dias, são, segundo um texto, "de
pouca

9297

utilidade porque não são francas'


Todas as feiras se apresentam como cidades efêmeras, sem dúvida, mas
cidades, quanto mais não seja pelo número de seus participantes.
Periodicamente, montam seus cenários, depois, terminada a festa, levantam
acampamento. Após um, dois ou três meses de ausência, reinstalam-se. Cada
uma delas tem seu ritmo, seu calendário, seu sinal indicativo, que não
são os das suas vizinhas. Aliás, não são as mais importantes que têm a
taxa de freqüência mais elevada, mas sim as simples feiras de gado ou,
como então se dizia, as feiras gordas. SuIly-surLoire 298 perto de
Orléans, Pontigny, na Bretanha, Saim-Clair e Beaumont de
Laumagne, têm cada qual oito feiras por ano299; Lectoure, na généralité
de
Montauban, noVe30O ; Auch onze301; as "feiras gordas que se realizam em
Chenerailles, grande burgo da Alta-Marca do Auvergne, são célebres pela
quantidade de animais de engorda que ali se vendem, a maior parte para
serem conduzidos a Paris". Essas feiras realizam-se nas primeiras terças-
feiras de cada mês. Doze, portanto, no total302. Também na cidade do Puy,
"há doze feiras anuais onde se vende toda espécie de gado, sobretudo
muitas mulas e mulos, muitos couros com o pêlo, tecidos por atacado de
fabricação do Languedoc, tecidos do Auvergne branqueados e crus,
cânhamos, fios, lãs, peles de todo o tipo, 9303. Mortain, na Normandia,
deterá o recorde, com suas catorze feiraS304?
Não nos precipitemos em apostar nesse ótimo cavalo.
Claro que há feiras e feiras. Há as feiras rurais, como, perto de Siena,
a minúscula feira da Toscanella que não passa de um grande mercado de lã;
se um inverno um tanto prolongado impede os camponeses de tosquiar os
carneiros (como eni maio de 1652), suprime-se a feira305.

7. UMA FRANÇA AINDA REPLETA DE FEIRAS EM 1841 do o Dictionnaire de


commerce et des marchandises, 1841, 1, pp. 96O e ss.
As verdadeiras feiras são aquelas para as quais a cidade inteira abre
suas porEntão, ou a feira submerge tudo e se torna a cidade e até mais do
que a cidade quistada, ou esta é suficientemente forte para manter aquela
a boa distância: stão de pesos respectivos. Lyon é meio vítima das suas
quatro feiras monumen306. Paris domina as suas, as reduz às dimensões de
grandes mercados. Por mplo, a antiga feira ainda ativa do Lendit se
realiza em Saint-Denis, fora dos ros.
Naricy111 tem a sensatez de relegar as suas para fora da cidade, embora
para lugar bem próximo, Sairu-Nicolas-du-Port. Falaise, na Normandia,
exilou-as a a grande aldeia de Guibray. Durante os intervalos dessas
reuniões tumultuoe célebres, Guibray torna-se o palácio da Bela
Adormecida. Beaucaire teve a

precaução, como muitas outras cidades, de colocar a feira da Madeleine,


que lhe faz a reputação e o sucesso, entre a cidade e o Ródano. Trabalho
perdido: os visitantes, habitualmente uns cinqüenta mil, invadem a cidade
e, para manter um sirnulacro de ordem, todas as brigadas de cavalarianos
da província são necessárias
- e insuficientes. Tanto mais que a multidão chega geralmente uns quinze
dias antes da abertura da feira, em 22 de julho, portanto antes que as
forças da ordem estejam instaladas. Em 1757, foi proposto antecipar o
envio da guarda montada para o dia 12, para que visitantes e habitantes
ficassem "em segurança- .
Uma cidade totalmente dominada por suas feiras deixa de ser ela própria.
Lcipzig, que fará fortuna no século XVI, destrói e reconstrói suas praças
e seus prédios para que a feira fique à vontade308. Mas Mediria del
Campo, em
Castela309, é um exemplo ainda melhor. Confunde-se com a feira que, três
vezes por ano, ocupa a comprida Rua, com casas sobre pilares de madeira,
e a enorme
Plaza Mayor, em frente à catedral onde, em dias de feira, a missa é
celebrada na sacada: mercadores e compradores seguem a missa sem ter de
interromper os negocios. São João da Cruz, criança, extasia-se diante das
multicoloridas barracas da praça 310. Hoje Mediria continua a ser o
cenário, a concha vazia da antiga feira. Em Frankfürt-am-Main31 1, a
feira, no século XVI, ainda é mantida a distância. Mas no século
seguinte, demasiado próspera, submerge tudo.
Mercadores estrangeiros mudam-se de vez para a cidade, onde representam
firmas da Itália, dos Cantões suíços, da Holanda. Segue-se uma
colonização progressiva.
Esses estrangeiros, habitualmente os caçulas das famílias, instalam-se na
cidade com simples direito de residência (o Beisesserschutz); e o
primeiro passo; a seguir, conseguem o Burgerrecht; em breve se comportam
co312 mo senhores. Em Leipzig, onde o processo é o mesmo, a revolta que,
em 1593

, se desencadeia contra os calvinistas não será uma espécie de reação


"nacional"
contra os mercadores holandeses? Deveremos então pensar que foi por
sensatez que
Nuremberg313 uma verdadeira grande cidade mercantil, tendo obtido do
imperador, em 1423-1424 e em 143 1, as concessões necessárias ao
estabelecimento de feiras, renunciou a instalá-las efetivamente? Sensatez
ou inadvertência? Permanecerá sempre a mesma.
Cidades em festa
A feira é o ruído, o alarido, a música, a alegria popular, o mundo de
pernas para o ar, a desordem, por vezes o tumulto. Perto de Florença, em
Prato314 cujas feiras remontariam ao século XIV, todos os anos vêm em
setembro os trombetti de todas as cidades da Toscana a suonare cada um
mais do que o outro pelas ruas e praças da cidade. Em Carpentras, na
véspera da feira de São Mateus ou de São
Zeferino, eleva-se o som penetrante das trompetas nas quatro portas da
cidade, dePois nas praças, enfim diante dos palácios. "Custa, cada vez,
sete soldos à comuna Por instrumentista", e os sinos tocam sem parar a
partir das quatro horas da manhã; fogos de artifício, fogueiras, rufar de
tambores, a cidade gasta bem o seu dinheiro. E ei-la tomada de assalto
por todos os pândegos, vendedores de remédios miraculosos, de drogas, de
"licores purgativos- ou de banha de cobra, ledoras da sorte, menestréis,
malabaristas, dançarinos da corda bamba, arrancadores de dentes, músicos
e cantores ambulantes. As hospedarias regurgitam de gente 315. Em Pa

Feira anual perto de Arnhem. Gravura de P. de Hooghe (1645-1708). (Clichê


da
Fundação Atlas van Stolk, Rotterdam.)

a feira de Saint-Germain, que começa depois da Quaresma, reúne também a i


leviana da capital: para as raparigas, --é tempo das vindimas", como
disse i zornheteira. E o jogo atrai tanto amadores como mulheres fáceis.
A loteria.nada de Ia blanca (=branca) faz furor: distribui muitos
bilhetes brancos, os ledores, e alguns pretos, os ganhadores. Quantas
camareiras não perderam as iomias e a esperança de casamento na
branca'161 ') Mas este jogo ainda não é a comparado com os discretos
antros de jogatina instalados em algumas lojas

1eira, a despeito da vigilância ranheta das autoridades. Tão atraentes


como as s de jogo de Leipzig, muito freqüentadas pelos poloneseS317.
Por fim, a feira é, sem exceção, o ponto de encontro de trupes de atores.
Desde ripo em que se realizava nos Halles de Paris, a feira de Saint-
Germain ensejava esentações teatrais. O Prncipe dos tolos e a Tia tola,
que figuravam no program

1511, representam a tradição medieval das farsas e soties de que Sainte-


Beríve i: "É já o nosso vaudeville., 318 Em breve se lhes irá juntar a
comédia italiana passada sua grande voga, encontrará nas feiras um
derradeiro refúgio. Em 1764, ira de Carpentras, "Gaetano Merlani e a sua
trupe florentina" propunham "coias",
Melchior Mathieu de Piolent "um carrossel" e Giovanni Greei "peças de
-o", em cujos entreatos ele aproveitava para vender suas drogas"'.
O espetáculo está também na rua: procissão de abertura dos "cônsules [de
Carras], de capelo, precedidos pelos batedores de traje comprido,
portando maças rata', 320; cortejos oficiais, o stathouder em Haia321 o
rei e a rainha da
Sardenas feiras de Alexandria da Palha322 o duque de Módena "com as suas
pare, na feira de Reggio Emília, e assim por diante. Gicivarmi Baldi323
corretor ino que fora à Polônia para recuperar dívidas comerciais não
pagas, chega à de
Leipzig em outubro de 1685. Que nos revelam suas cartas sobre as feiras o
em plena expansão? Pois bem, nada mais nada menos do que a chegada de
Alteza o duque da Saxônia "com numeroso séquito de damas, de senhores e
ríncipes alemães que vieram ver as coisas mais notáveis da feira. As
damas, :)mo os senhores, apareceram em trajes tão soberbos que era uma
maravilha". m parte do espetáculo.
Divertimento, evasão, mundanidades, será esse o fim lógico daquelas
grandes, sentações? Sim, às vezes. Em Haia, que mal começa a ser o centro
político olanda, ás feiras são sobretudo a ocasião, para o stathouder, de
convidar para nesa "distintos cavalheiros e damas". Em Veneza, a feira da
Sensa324, da As!o, que dura quinze dias, é uma manifestação ritual e
teatral: na praça de São :os instalam-se barracas de mercadores
estrangeiros; homens e mulheres saem arados, e o Doge, diante de San
Nicolo, desposa o mar como outrora. Mas se que na feira de Sensa se
espremem todos os anos, para se divertir e desfruespetáculo da espantosa
cidade, mais de 10O mil estrangeiroS325. Assim tamem Bolonha, a feira da
Porchetta326 dá ensejo a uma enorme festa a um só o popular e
aristocrática, e no século XVII é erguido para a ocasião, na Piazaggiore,
um cenário de teatro provisório, diferente todos os anos, cujas
extraricias nos são mostradas pelas pinturas das Insignia conservadas nos
arquivos. ido do teatro, as "lojas da feira", pouco numerosas, foram
montadas com a evidência para satisfazer os pequenos prazeres do público,
não para grandes zios. A Bartholornew Fair327, em
Londres, é também o ponto de encontro de les festejos populares "sem
trocas sérias". Uma dessas verdadeiras feiras resifeitas para recordar,
se necessário fosse, o ar de quermesse, de permissivida

Quermesse na Holanda, no princi)gio do século XVIII. Pormenor de um


quadro de
David Vinckboons. (Lisboa, Museu de Arte Antiga, clichê Giraudon.)

, de vida às avessas que são todas as feiras, as animadas e as menos


animadas. m razão o provérbio em dizer: -Não se volta da feira como do
mercado.11328

Em contrapartida, a feira parisiense de Saint-Germain`9, a única que, na


capise manteve sempre animada, sob o signo do prazer - pensemos nos seus
célebres oturnos" com suas mil tochas que são espetáculo muito concorrido
-, conserva i lado mercantil: dá azo à venda de grandes quantidades de
tecidos, de lã ou de io, procurados por uma rica freguesia cuj as
carruagens ficam guardadas num "esionamento" reservado. E essa imagem
corresponde melhor do que as precedentes, alidade normal das feiras,
acima de tudo encontros de mercadores. Dois visitanholandeses, fascinados
(fevereiro de 1657), observam: --Cumpre confessar, esdo aqui e
considerando a grande diversidade de mercadorias de alto preço, que -is é
o centro onde se encontra tudo o que há de mais raro no mundo.

1330

Tem-se dito muitas vezes que as feiras são mercados atacadistas, entre
mercaes apenas 331. Isso é apontar-lhes a atividade essencial, mas
ignorar, na base, a rme participação popular. Todos têm acesso à feira.
Em Lyon, segundo os taiciros, bons juizes para o caso, "para cada
mercador que vem às feiras a cavalo m dinheiro para gastar e se hospedar
em bons aposentos, há vinte outros a pé ficam muito satisfeitos de
encontrar uma taberna qualquer" onde ficar 332. Em rno ou em outra feira
napolitana, multidões de camponeses aproveitam a ocapara vender um porco,
ou um fardo de seda crua, ou um barril de vinho. Na iitânia, boiadeiros e
trabalhadores rurais vão à feira simplesmente à procura.ivertimentos
coletivos: "Partiam para a feira antes do nascer do sol e regressanoite
fechada, depois de se terem demorado nas tabernas pelo caminho. , 333

com efeito, num mundo ainda essencialmente agrícola, todas as feiras


(mesas enormes) estão abertas à imensa presença camponesa. Em Leipzig, as
feiras acompanhadas por consideráveis feiras de cavalos e de gado334 . Em
Antuérque tem, por volta de 1567, com Berg-op-Zoom, quatro feiras
principais (duas a cidade e duas na outra, cada qual de três semanas),
realizam-se também duas s de cavalos de três dias, uma no Pentecostes, a
outra em Nossa Senhora de mbro.
Trata-se de animais de qualidade, "lindos de se ver e lucrativos",
vinwbretudo da Dinamarca - em suma, salões do automóvel335 . Em Antuérpia
a há classificação, separação dos gêneros, Mas em Verona336 cidade
insigne erra Firme veneziana, mistura-se tudo e, em abril de 1634, o
sucesso da feira, izer de um especialista, deve-se menos às mercadorias
vindas de fora do que uantidade de animais de todos os tipos que lá
levaram".
Isso posto, é verdade que o essencial das feiras, economicamente falando,
está ionado com a atividade dos grandes mercadores. Foram eles que, ao
aperfei'm o instrumento, fizeram delas o ponto de encontro dos grandes
negócios. :) as feiras inventado ou reinventado o crédito? Oliver C.
COX337 pretende que ia, nesse caso, exclusivamente uma invenção das
verdadeiras praças mercanão das feiras, essas cidades artificiais. Como o
crédito é, sem dúvida, tão veuanto o mundo, a discussão é um tanto vã. Em
todo o caso, um fato é certo:, ras desenvolveram o crédito. Não há feira
que não termine com uma sessão

de "pagamentos". É o que se passa em Linz, enorme feira da Áustria"'. É o


que se passa em Leipzig, desde que começa a prosperar, durante a última
semana, chaniada Zah1woche 339. Mesmo em Lanciano 34O pequena cidade do
Estado pontifício que é submersa regularmente por uma feira de dimensões
contudo modestas, encontram-se antigas letras de câmbio a mancheias. Da
mesma forma, em
Pézenas ou em Montagnac, cujas feiras, escalas das de Beaucaire, são de
qualidade análoga, uma quantidade de letras de câmbio é encaminhada a
Paris, ou a Lyon 341. As feiras são, com efeito, uma confrontação de
dívidas que, ao liquidar-se umas às outras, derretem como neve ao sol:
são as maravilhas do scontro, da compensação. Uns cem mil --escudos de
ouro em ouro", isto é, moedas efetivas, podem, em Lyon, pagar por
clearing, trocas relativas a vários milhões.
Ainda mais que boa parte das dívidas que subsistem são saldadas quer por
promessa de pagamento sobre uma praça (letra de câmbio), quer por
transferência do pagamento para a feira seguinte: é o deposito que, em
geral, se paga a 1007o ao ano (2, 507o a três meses). A feira é, assim,
criadora de crédito.
Comparando uma feira a uma pirâmide, ela é disposta em degraus desde as
atividades múltiplas e miúdas, na base, referentes às produções locais,
em geral perecíveis e baratas, até as mercadorias de luxo, vindas de
longe e caras, sendo o vértice constituído pelo ativo comércio do
dinheiro sem o qual nada se mexeria, ou pelo menos não se mexeria com a
mesma velocidade. Ora, a evolução das grandes feiras bem parece ter sido,
grosso modo, dar vantagem ao crédito em relação à mercadoria, ao vértice
em relação à base da pirâmide.
Seja como for, é a curva desenhada muito cedo pelo destino exemplar das
antigas feiras de Champagne342. Na época do seu apogeu, por volta de
1260, mercadorias e dinheiro alimentam um tráfico muito intenso. Quando o
refluxo se faz sentir, as mercadorias são as primeiras a ser atingidas. O
mercado de capitais sobrevive mais tempo e mantém pagamentos
internacionais ativos até cerca de 1320343. No século XVI, um exemplo
mais convincente ainda é o das feiras de Piaceriza, chamadas de Besançon.
Sucedem - daí o nome que lhes ficou - às feiras fundadas em 1535 pelos
genoveses em Besançon344 então cidade imperial, para fazer concorrência
às feiras de Lyon, cujo acesso lhes fora vedado por Francisco 1. De
Besançon, essas feiras genovesas foram transferidas, ao acaso dos anos,
para
Lonsle-Saunier, para Monfluel, para Chambéry, finalmente para Piacenza
(1579)345
onde foram prósperas até 1622346. Não julguemos as coisas pelas
aparências.
Piacenza é uma feira reduzida ao seu vértice. Quatro vezes por ano, é
lugar de encontros decisivos mas discretos, um pouco como, em nossos
dias, as reuniões do
Banco Internacional em Basiléia. Nenhuma mercadoria está presente, leva-
se para lá muito Pouco dinheiro vivo, mas grandes quantidades de letras
de câmbio, na verdade os sinais de toda a riqueza da Europa, cuja
corrente mais viva são os pagamentos do Império espanhol. Estão presentes
uns sessenta homens de negócios, banchieri di conto genoveses na maior
parte, alguns milaneses, outros florentinos. São os membros de um clube
onde não se pode entrar sem pagar uma elevada caução (3 mil escudos).
Estes privilegiados fixam o conto, isto é, a cotação dos câmbios de
liquidaÇão no fim de cada feira. É o grande momento dessas reuniões a que
assistem, secretamente, mercadores cambistas, cambiatori, e
representantes de grandes firmaS347. No total, 20O iniciados de
comportamento discreto, que tratam enormes negócios, talvez de 3O a 4O
milhões de escudos em cada feira, até mais, a crer no livro bem
documentado do genovês Domenico Peri (1638)348.

Mas tudo tem fim, até o engenhoso e lucrativo clearing genovês. Só


funciona-ia medida em que a prata da América chegava a Gênova em
quantidade sufine. Quando decresceram os desembarques de metal branco,
por volta de 1610, lifício foi ameaçado. Para escolhermos uma data que
não seja completamente

349

itrária, fixemos a transferência das feiras para Novi, em 1622, que


milane e toscanos não aceitaram e é um born ponto de referência dessa
deterioração.
voltaremos a estes problemas.
Ligadas entre si, as feiras se correspondem. Quer se trate das feiras
simples[te mercantis ou das feiras de crédito, todas são organizadas para
facilitar os, iitos. Se passarmos para um mapa as feiras de uma dada
região (a LombarO ou o reino de NápoICS35 ] no século XV, por exemplo, ou
os circuitos de feijue se cruzam em Linz no Danúbio: Krems, Freistadt,
Graz, Viena, Salzburgo, , ano352) o calendário dessas reuniões sucessivas
mostrará que elas aceitam delências recíprocas, que os mercadores passam
de uma feira para outra com seus os, seus animais de carga ou suas
mercadorias às costas até o círculo dessas ens se fechar e recomeçar. Ou
seja, um movimento de certo modo perpétuo. luatro cidades, Troyes, Bar-
sur-Aube, Provins e Lagny, que na Idade Média ilharam entre si as grandes
feiras de Champagne e de Brie, não param de trocar Ia durante o ano
inteiro. Henri Laurent353 pretende que o primeiro circuito foi s feiras
de
Flandres; as de Champagne as teriam imitado. É possível. A menos o
movimento circular se tenha criado quase em toda a parte, e como que por,
por uma espécie de necessidade lógica análoga à das feiras comuns. Tal
como ira local, é necessário que a região, esvaziada pela feira de suas
capacidades rerta e de procura, tenha tempo de reconstituí-las. Daí
pausas necessárias. Cumambém que o calendário das diversas feiras
facilite os itinerários dos mercadoeirantes que as visitam uma após
outra.
Mercadorias, dinheiro e crédito são apanhados nesses movimentos
giratórios.
nheiro, evidentemente, anima ao mesmo tempo circuitos de maior abertura e
a, normalmente, a um ponto central de onde torna a partir para recomeçar
orrida. No
Ocidente, em nítida recuperação a partir do século XI, um centro ará por
dominar todo o sistema dos pagamentos europeus. No século XIII, is feiras
de Champagne;
estas declinam depois de 1320, registrando-se reper5es por toda a parte -
até no longínquo reino de NápoleS354; a seguir, o sisteeconstitui-se com
dificuldade ao redor de Genebra, no Século XV355, depois
Yort356; finalmente, com o fim do século XVI, ao redor das feiras de
Piacento é, de Gênova. Nada é mais revelador das funções destes
sucessivos sistemas Lie as rupturas que assinalam a passagem de um para
outro.

1)epois de 1622, porém, mais nenhuma feira se situará no centro


obrigatório da econômica da Europa, para dominar-lhe o conjunto. É que
Amsterdam, ião é uma verdadeira cidade de feiras, começou a firmar seu
papel, tomando si a superioridade anterior de Antuérpia: organiza-se como
praça permanente mércio e de dinheiro. O seu triunfo assinala o declínio,
quando não das feiras rciais da
Europa, pelo menos das grandes feiras dominantes do crédito. A era eiras
passou seu apogeu.

Us 1nS1rUrf1kf1~ o declíniO das feiras


No século XVIII, forçoso é reconhecer que as medidas governamentais que
concedem "desde há alguns anos [a liberdade] de enviar para países
estrangeiros a maior parte das mercadorias manufaturadas sem pagar
direitos e de deixar entrar matérias-primas com isenção [só podem]
diminuir de ano para ano o comércio das feiras, cuja vantagem era
proporcionar tais isenções; e de ano para ano acostumam-se cada vez mais
a fazer o comércio direto destas mercadorias sem as fazer passar pelas
feiras"357. Esta observação figura numa carta do inspetor geral das
Finanças a propósito da feira de Beaucaire, em setembro de 1756.
É por volta dessa época que Turgot358 redige o artigo referente às
feiras, publicado na Encyclopédie em 1757. Para ele, as feiras não são
mercados "naturais9 9 nascidos das "comodidades", do "interesse recíproco
que têm compradores e vendedores em procurar-se [... 1 Não é portanto ao
andamento natural de um comércio animado pela liberdade que se devem
atribuir essas feiras brilhantes onde as produções de uma parte da Europa
se reúnem com grandes despesas e que parecem ser o ponto de encontro das
nações. O lucro que deve compensar essas despesas exorbitantes não vem da
natureza das coisas, mas resulta de privilégios e franquias concedidos ao
comércio em certos lugares e em certas épocas, ao passo que ele é onerado
em toda a parte por taxas e direitos".
Então, abaixo os privilégios, ou que haja privilégios para todas as
instituições c práticas comerciais. "Será preciso jej uar o ano inteiro
para comer à farta em certos dias?", perguntava Gournay, e Turgot adota a
frase.
Mas, para comer à farta todos os dias, bastará desembaraçar-se destas
velhas instituições? É verdade que na Holanda (o exemplo aberrante de
Haia pouco conta)
as feiras desaparecem; que na Inglaterra até a grande feira de
Stourbridge, outrora "beyond all comparison", perde seu comércio
atacadista, o primeiro a declinar depois de 1750359. Turgot tem portanto
razão, como tantas vezes: a feira é uma forma arcaica das trocas; na sua
época, ainda pode criar ilusões e até prestar serviços, mas, onde não tem
rivais, a economia marca passo. Assim se explica a prosperidade, nos
séculos XVII e XVIII, das feiras um pouco decadentes mas sempre animadas
de Frankfürt e das feiras novas de LeipZig360; das grandes feiras
polonesaS361 : Lublin, Sandomir, Thortin, Poznan, Gniezno, Gdansk
(Dantzig), Leopol (Lwow), Brzeg362 , na Galícia (onde no século XVII se
podiam ver mais de 2O mil cabeças de gado simultaneamente); e das
fantásticas feiras da
Rússia onde em breve surgirá, no século XIX, a mais que fantástica feira
de
Nijni Novgorod363. Verdade afortiori no Novo Mundo, onde a Europa
recomeça do outro lado do Atlântico. Para escolher apenas um exemplo que
amplia o caso, haverá feira mais simples e mais colossal ao mesmo tempo
do que a de Nombre de
Dios, no istmo de Darien, que a partir de 1584 se muda, sem alteração,
sempre colossal, para o pequeno porto vizinho e também insalubre de Porto
Belo? As mercadorias da Europa ali são trocadas pela prata proveniente do
Peru 364. "Num só contrato fechamse negócios de oito a dez mil ducados...
1, 365 O monge irlandês Thomas Gage, que visitou Porto Belo em 1637,
conta que viu no mercado público montes de prata Como se fossem de
pedraS366.
com essas defasagens e esses atrasos, ser-me-ia fácil explicar o brilho
persistente da feira de Bolzano, nas passagens alpinas que conduzem ao
sul da
Alema

ianto às feiras tão animadas do Mezzogiorno italian0367 que mau sinal


para, úde econômica com efeito, se a vida econômica se acelera, a feira,
relógio ião acompanha a nova aceleração; mas, se essa vida se desacelera,
a feira a sua razão de ser. É assim que interpreto o comportamento de
Beaucaire, -etensamente "excepcional" porque --fica estagnada durante o
período de )Ivimento (17241765)" e "cresce quando tudo declina ao
redor`68, de 1775, Durante este período parado, que, no Languedoc e
talvez em outras reá não era o "verdadeiro" século
XVIII, a produção lança na feira da Madeus excedentes inúteis e abre uma
crise de "saturação", como diria Sismons onde iria essa saturação
encontrar outra porta de saída? Quanto a mim, ósito deste impulso em
direção contrária de
Beaucaire, não poria em causa

1 do negócio estrangeiro, mas sim, no primeiro plano, a própria


economia..iguedoc e da Provença.
decerto nessa perspectiva que devemos entender o projeto um tanto
simplisLiti.
francês de boa vontade, um tal Trémouillet, em 1802369. Os negócios vão
Ailhares de pequenos mercadores parisienses estão à beira da falência. No
o, há uma solução (e tão simples!): criar em Paris feiras grandiosas,
dentro pria cidade, na praça da Revolução. O autor imagina, nesse vasto
terreno, alamedas quadriculadas ladeadas de lojas, e enormes cercados
reservados to e aos indispensáveis cavalos. Infelizmente, o projeto é mal
defendido quando a de expor as vantagens econômicas da operação. Talvez
fossem tão óbvias :) autor que este não julgava necessário explicá-las?
N, lenta, em geral imperceptível (e por vezes discutível), decadência das
feiras ta ainda muitos problemas. Richard Ehrenberg pensava que elas
teriam su)ido ante a concorrência das Bolsas. Tese insustentável,
respondia André E. tis com mau humor 370. No entanto, se as feiras de
Piacenza foram o centro da mercantil do fim do século XVI e do princípio
do século XVII, o novo ceno mundo será em breve a Bolsa de Amsterdam: uma
forma, uma engrenagem uitou a outra. Pouco importa que
Bolsas e feiras coexistam, o que não deixa r verdade há séculos: tal
substituição não se completa num dia. E depois, se Isa de Amsterdam se
apoderou incontestavelmente do vasto mercado dos capi(r)rganiza também de
cima o movimento das mercadorias (pimenta-do-reino speciarias da Ásia,
cereais e produtos do Báltico). Para Werner Sombart371, plano das
mercadorias transportadas, armazenadas, reexpedidas que se deve urar a
explicação certa. As feiras sempre existiram, no século XVIII continuam
- concentrações de mercadorias. Estas ficam aí de reserva. Mas com o
aumento opulação, o crescimento já catastrófico das cidades, a lenta
melhoria do cono, o comércio atacadista tinha de desenvolver-se, de
extravasar do canal das is, (r)rganizar-se de maneira independente. Essa
organização autônoma, por iniédio dos armazéns, celeiros, depósitos ou
entrepostos, tende a substituir, com regularidade que lembra a loja, as
atividades intermitentes das feiras.
A explicação é plausível. Mas Sombart leva-a decerto longe demais. Para
ele, ip(r)rtante é saber se o armazém atacadista onde se acumula a
mercadoria, a dois

O entreposto onde um mercador florentino armazenou suas mercadorias


desembarcadas em Palermo. Miniatura de um artista flamengo que ilustra
uma tradução francesa do Decameron (1413), por Laurent de Premierfait,
Biblioteca do
Arsenal, ms 5070, f 216 r'. (Clichê B. N.)
passos da clientela e de modo permanente, vai funcionar naturaliter - e
então não passa de um depósito - ou mercantaliter, isto.é, de maneira
mercantil371.
Neste caso, o armazém é uma loja de categoria superior, mas ainda assim
uma loja, cujo dono é o mercador por atacado, o mercador "atacadista" ou,
como em breve se dirá com mais elegância, o --negociante" 372. À porta do
armazém, as mercadorias são entregues aos revendedores em grandes
quantidades, "amarradas'

1373, diz-se, sem que os fardos cheguem a ser abertos. Quando se inicia
este comércio por atacado? Talvez em Antuérpia, no tempo de Ludovico
Guicciardini (1567)374'? Mas qualquer cronologia estrita a esse respeito
é inevitavelmente discutível.
É inegável, porém, que com o século XVIII, sobretudo nas ativas regiões
do Norte ligadas aos tráficos do Atlântico, o comércio por atacado
adquire um desenvolvimento até então nunca visto. Em Londres, os
atacadistas impõem-se em todas as áreas da troca. Em Amsterdam, no
princípio do século XVIII, "como chega diariamente um grande número de
embarcações [ ... 1 é fácil compreender que haja grande número de
armazéns e de porões para colocar todas as mercadorias que es

, ntos da troca trcos trazem: por isso a cidade é bem provida deles,
havendo bairros inteiros que

5 armazéns ou celeiros com cinco a oito andares, e, além disso, a maior


parte isas que dão para os canais têm dois ou três armazéns e um porão".
Este equipa:)
nem sempre é suficiente e acontece de os carregamentos ficarem nos barcos
"mais o do que se desejaria". De forma que começaram a construir-se no
lugar de ve, asas uma porção de novos armazéns, que "dão muito bons
rendimentos', 37. ', Ja realidade, a concentração mercantil em benefício
dos entrepostos e armazéns )use um fenômeno generalizado na Europa do
século XVIII. Assim, o algodão ), o "algodão em lã", concentra-se em
Cádiz, se vem da América Central; em )a (em ordem decrescente dos preços,
algodões de Pernambuco, do Maranhão, rá)376 se é de origem brasileira; em
Liverpool, se vem das índiaS377; em Marsee chega do
Levante 378. Mogúncia, no Reno37% é, para a Alemanha, a grande doca inhos
provenientes da França. Lille 38O mesmo antes de 1715, possui enormes
arris onde se reúnem aguardentes destinadas aos Países Baixos. Marselha,
Nantes, eaux são os principais entrepostos, na França, de um comércio das
ilhas (açúcar, que acarreta a prosperidade mercantil do reino, no tempo
de Luís XV. Mesmo lades médias, Moulhouse 381, NanCy382 multiplicam os
entrepostos de todos os nhos.
Exemplos que valem por centenas de outros. Delineia-se então uma Euro:)s
entrepostos que substitui a Europa das feiras.
Portanto, no século XVII, tudo dá razão a Sombart. Mas antes? Será
plausídistinção entre os dois modos, mercantaliter, naturaliter? Sempre
houve arns e entrepostos (storehouses, warehouses, Niederlager, magazzini
di trafico, is do Oriente Próximo, ambary da Moscóvia 383). E mesmo
"cidades de entre:)"
(sendo Amsterdam o modelo do gênero) cuja função e privilégio é servirem,
gar de reserva às mercadorias que a seguir são reexpedidas: como, na
França, CUJO
XV11384, Rouen, Paris, Orléans, Lyon; como o --entreposto da cidade

385

i, em Dunquerque. Todas as cidades têm seus armazéns privados ou pú s. No


século
XVI, os mercados em geral (como, por exemplo, em Dijon ou leaune)
"parecem ter sido ao mesmo tempo armazéns atacadistas, entrepostos ntos
de escalas`86.
Recuando no tempo, quantos armazéns públicos reserva3o trigo e ao sal!
Muito cedo, por certo antes do século XV, a Sicília possui,

3 de seus portos, caricatori, enormes armazéns onde se acumula o trigo,


obtenproprietário um recibo (cedola) - as cedole são negociadas387. Em
Barcelolesde o século XIV, nas belas casas comerciais de pedra de
Montjuich, "arranse armazéns no térreo, situando~se a residência [do
mercador] no andar de ci388. Por volta de 1450, em Veneza, ao redor da
praça do Rialto, no coração da mercantil da cidade, as lojas sucedem-se
por ruas especializadas; "em cima Wa uma delas, há uma sala parecida com
um dormitório de mosteiro, de mai que cada mercador veneziano tem seu
próprio armazém cheio de mercadode especiarias, de tecidos preciosos, de
sedas" 389.
Nenhum destes pormenores é por si só peremptório. Nenhum distingue, o que
iama distinguir, a armazenagem pura e simples do comércio por atacado,
que -erto se misturaram muito cedo. O entreposto, instrumento melhorado,
forçomte existia havia muito, sob formas diferentes, modestas, mistas,
pois correslia a necessidades desde sempre evidentes, na realidade, a
fraquezas da econoO que obriga a armazenar é o ciclo demasiado longo da
produção e da vida -antil, a lentidão das viagens e das informações, os
imprevistos dos mercados intes, a irregularidade da produção, o jogo
ingrato das estações... Aliás, isso

está provado, uma vez que, a partir do momento em que se acelerar a


velocidade e aumentar o volume dos transportes, no século XIX, a partir
do momento em que a produção se concentrar em fábricas poderosas, o velho
comércio de entreposto deverá modificar-se consideravelmente, por vezes
totalmente, e desaparecer

390.
As Bolsas
O Nouveau négociant de Samuel Ricard, em 1686, define a Bolsa como "lugar
de encontro de banqueiros, mercadores e negociantes, agentes de câmbios e
de banco, corretores e outras pessoas". O termo viria da cidade de
Bruges, onde tais assembléias se realizavam "perto do Hôtel des Bourses,
assim chamado em virtude de um senhor da antiga e nobre família Van der
Bourse que o mandara construir e lhe ornara o frontispício com seu escudo
de armas dotado de três bolsas... que ainda hoje se vê nesse edifício".
Pouco importam as raras dúvidas que a explicação suscita. Seja como for,
a palavra fez sucesso, sem contudo eliminar outras designações. Em Lyon,
a Bolsa chamava-se praça dos Câmbios; nas cidades hanseáticas, Colégio
dos mercadores; em Marselha, a Loje; em Barcelona, tal como em Valência,
a Lonja. Nem sempre tinha edifício próprio, donde uma freqüente confusão
de nomes entre o local de reunião e a própria Bolsa. Em Sevilha, a
assembléia dos mercadores realizava-se todos os dias nas gradaS391, as
grades da catedral; em Lisboa, na Rua Nova392, a mais larga e comprida da
cidade, já citada em 1294; em Cádiz, na Calle Nueva, decerto aberta após
o saque de

1596191; em Veneza, nos pórticos do Rialto394 e na Loggia dei Mercanti,


construída na praça, em estilo gótico, em 1459, e reconstruída em 1558;
em
Florença, no Mercato NuoV0395, na atual Piazza Mentana396 ; em Gênova397,
a

40O metros da Strada Nuova, na Piazza dei BanChi398 ; em Lille39% no


Beauregard; em Liège400, na casa do Peso Público, construída no fim do
século
XVI, ou no cais da Beach, ou sob as espaçosas galerias do Palácio
episcopal, ou mesmo numa taberna vizinha; em La Rochelle, ao ar livre,
"entre a rua PetitsBacs e a rua Admyrauld", no lugar chamado --Caritão
dos Flamengos", até a construção de um edifício especial em 1761401. Em
Frankfürt-am-Main402, as reuniões também se realizavam ao ar livre,
unterfreiem Himniel, no Fischmarkt, o mercado do peixe. Em LeipZig403, a
belíssima Bolsa foi construída de 1678 a 1682

- -auf dem Naschmarkt"; anteriormente os negociantes reuniam-se sob uma


arcada, numa loja da feira ou ao ar livre, perto da balança. Em
Dunquerque, "todos os negociantes à hora do meio-dia [reuniam-se todos os
dias] na praça defronte a casa desta cidade [leiase o passo municipal]. E
é aí, à vista de todos, [ ... 1

que rebentam as altercações entre figurões [... 1 em conseqüência de


palavras insultuosas' 404. Em Palermo, a loggia da atual praça do
Garafello é o lugar de reunião dos mercadores e, em 1610, é-lhes proibido
ir para lá uma vez "sonata
Vavemaria ai Santo Antonio`05. Em Paris, alojada durante muito tempo na
velha praça aux Changes, no Palácio de Justiça, a Bolsa instala-se no
palácio de
Nevers, rua Vivienne, segundo decisão do Conselho de 24 de setembro de
1724. Em
Londres, a Bolsa, fundada por Thomas Gresham, passou depois a chamar-se
Royal
Exchange, Está situada no centro da cidade, de forma que, segundo uma
correspondência cstrangeira406 por ocasião das medidas tomadas contra os
quakers, em maio de 1670, a tropa reuniu-se nesse local "dove si radunano
li mercanti", para ficar ao alcance dos diversos pontos que deveria
atingir em caso de necessidade.

com efeito, é normal cada praça ter a sua Bolsa. Um marselhês que traça
um panorama (1685) observa que, se os termos variam - "em vários lugares
o mercado, e nas Escalas do Levante o Bazar- -, a realidade é a mesma em
toda a parte 407.
Compreendemos então a surpresa de um inglês, Leeds Booth, então cônsul
russo em
Gibraltar408, que escreve em seu grande relatório ao conde de Osterrnann
(14 de fevereiro de 1782): "[Em Gibraltarl não temos câmbio onde os
mercaJores se reúnam para negociar como nas grandes cidades de comércio;
e, para falar ;inceramente, temos apenas muito poucos [mercadores] nesta
praça, e, apesar de ;er muito pequena e não produzir nada, faz-se aqui
muito comércio em tempo de )az.-- Gibraltar é, como Livorno, a terra
florescente do entrelopo e do contrabanJo. Para que lhe serviria uma
Bolsa?
De quando datam as primeiras Bolsas? Quanto a este ponto, as
cronologias )odem ser enganosas: a data de construção dos edifícios não
se confunde com a Ia criação mercantil. Em Amsterdam, o edifício data de
163 1, ao passo que a Nova olsa foi criada em 1608 e a antiga remonta a
1530. Temos, pois, de nos contentar imitas vezes com datas tradicionais
que valem quanto valem. Mas não com a abuiva lista cronológica que situa
a origem da Bolsa nas terras do Norte: Bruges 1409, ntuérpia 146O (imóvel
construído em 1518), Lyon 1462, Toulouse 1469, Amsteram

1530, Londres 1554, Rouen 1556, Hamburgo 1558, Paris 1563, Bordcaux 1564,
, olônia 1566, Dantzig 1593, Leipzig 1635, Berlim 1716, La Rochelle 1761
(cons.ução), Viena 1771, Nova York 1772.
Apesar das aparências, essa lista não estabelece nenhuma prioridade
nórdica. a sua realidade, com efeito, a Bolsa expandiu-se no Mediterrâneo
Pelo menos a artir do século XIV, em Pisa, em Veneza, em Florença, em
Gênova, em Valência, m
Barcelona, onde a Lonja solicitada a Pedro, o Cerimonioso, foi concluída
em

409

93 . Sua vasta sala de estilo gótico, ainda de pé, fala da antiguidade de


sua cria !o. Por volta de 1400, "uma porção de corretores circulam juntos
entre as coluas e os pequenos grupos são os corredors d'orella, os
corretores de ouvido", cuja Ássão é escutar, fazer relatórios, apresentar
os interessados uns aos outros. Todos dias, montado numa mula, o mercador
de Barcelona dirige-c à Lonja, acerta seus negócios, depois vai com um
amigo ao pomar da Lonja onde é agradável, scansar`0.
E por certo essa atividade bolsista, ou de aspecto bolsista, é mais an, a
do que assinalam as nossas referências habituais. Assim, em 1111, em
Luca, rto da igreja de São Martinho, já se reúnem os cambistas; à volta
deles, merca)res, notários: não será isto uma Bolsa em potencial? Basta
que intervenha o coércio de longa distância, e muito cedo ele intervém,
quanto mais não seja a prosito das especiarias, da pimenta-do-reino e,
depois, dos barris de arenque do Nor-411 Esta primeira atividade bolsista
da Europa mediterrânea não é, aliás, uma lação ex nihilo. A realidade,
pelo menos a palavra, é muito antiga; data das reu3es de mercadores
conhecidas muito cedo por todos os grandes centros do Oriene do
Mediterrâneo e, ao que parece, atestadas em Roma nas imediações do sendo
século depois de CriSto411. É fácil imaginar encontros análogos nessa
curiosa aça de óstia onde alguns mosaicos marcam os lugares reservados
aos mercadores los patrões de navios estrangeiros.
As Bolsas assemelham-se. O espetáculo nas breves horas de atividade é
quase npre, pelo menos a partir do século XVII, o das multidões ruidosas,
comprimis, apertadas. Em 1653, os negociantes de Marselha reclamam "um
local que lhes va de sede e os livre dos incômodos que sofrem
permanecendo ao longo da rua

Os instrumentos da troca que há já tanto tempo adotaram para local da sua


praça de negócios'1413. Em 1662, ei-los no andar térreo do pavilhão
Puget, numa "grande sala que se comunica por quatro portas com o cais e
onde [... 1 de ambos os lados das portas são afixados os avisos de
partida dos navios". Mas em breve se tornará pequena. "É preciso ser da
raça das serpentes para ali entrar", escrevia o cavaleiro de Gueidan ao
amigo Suard: "Que tumulto! Que barulho! Haveis de convir que o templo de
Pluto é algo singular., 414 É que todo o born negociante deve dar todos
os dias uma volta pela Bolsa no final da manhã. Não estar lá, não buscar
as notícias, tantas vezes falaciosas, é arriscarse a perder uma boa
oportunidade e talvez deixar correr boatos desagradáveis sobre o estado
dos negócios. Daniel Def0e411 adverte solenemente o warehousekeeper: "To
be absentfrom Change, which is his market [ ... 1, at the time when the
merchants generalty go about to buy", é pura e simplesmente buscar a
catástrofe.
Em Amsterdam, o grande edifício da Bolsa foi concluído em 1631, na praça
do Dam, em frente ao Banco e à sede da Oost Indische Compagnie. No tempo
de Jean-Pierre
Ricard (1722), calcula-se em 4.50O o número de pessoas que ali se
espremem todos os dias, do meio-dia às duas horas. No sábado, a afluência
é menor, pois os judeus não a freqüentam nesse dia416. A ordem é
rigorosa, são atribuídos lugares numerados a cada ramo comercial; dispõe-
se de uns mil corretores, juramentados ou não. E, contudo, nunca é fácil
encontrar-se em meio ao tumulto, ao concerto terrível dos números
gritados a plenos pulmões, ao ruído das conversas ininterruptas.
A Bolsa é, guardadas as devidas proporções, o último andar de uma feira,
mas de uma feira que não se interrompe. Graças aos encontros entre
negociantes importantes e a uma multidão de intermediários, trata-se de
tudo ao mesmo tempo, operações sobre mercadorias, câmbios, participações,
seguros marítimos cujos riscos são partilhados entre inúmeros fiadores; é
também um mercado monetário, um mercado financeiro, um mercado de
valores. É natural que todas essas atividades tendam a organizar-se cada
qual autonomamente. Assim, em Amsterdam, já no início do século XVII,
constituiu-se à parte uma bolsa de cereais 417 que se reúne três vezes
por semana, das dez ao meio-dia, num imenso galpão de madeira onde cada
mercador tem seu corretor "que tem o cuidado de levar as amostras dos
cereais que quer vender [... 1 em sacos que podem conter uma ou duas
libras. Como o preço dos cereais é fixado tanto pelo peso [específico]
quanto pela boa ou má qualidade, há nos fundos da Bolsa diversas balanças
pequenas nas quais, pesando três ou quatro punhados de cereal [... 1
fica-se sabendo o peso do saco". Esses cereais são importados para
Amsterdam para consumo da região, bem como para revenda ou reexportação.
As compras por amostras bem cedo se tornaram regra na Inglaterra e ao
redor de Paris, particularmente para compras maciças de cereais
destinados às tropas.
Em Amsterdam, o Inercado dos valores
No princípio do século XVII, a novidade é a instalação em Amsterdam de um
rnercado de valores. Os fundos públicos, as prestigiosas ações da
Companhia das índias Orientais, tornaram-se objeto de animadas
especulações, absolutamente modernas. Não é porém completamente exato que
se trate, como se costuma dizer, da primeira Bolsa de valores. Os títulos
da dívida pública do Estado começaram

81

!terior da Bolsa de Amsterdam em 1668. Quadro de Job Berckheyde. (Foto


Stedelijk eum de Amsterdam.)
to cedo a ser negociados em Veneza418, em Florença mesmo antes de l328419

Gênova, onde há um mercado ativo de luoghi e paghe da Casa di San rgio42O


para não falar das Kuxen, as ações das minas alemãs cotadas desde o ilo
XV nas feiras de LeipZig421, dos juros espanhóiS422, das obrigações
franceemitidas pelo Paço
Municipal de Paris (1522)423 ou do mercado das obrigações cidades
hanseáticas, já no Século XV424. Os estatutos de Verona, em 1318, raam o
mercado a prazo (mercato a termine)425. Em 1428, o jurista Bartolorneo
osco protesta contra as vendas de loca a prazo, em Gênova426. Provas de
uma -rioridade mediterrânea.
Mas o que é novo em Amsterdam é o volume, a fluidez, a publicidade, a
libere especulativa das transações. O jogo corre freneticamente, jogo
pelo jogo: não

esqueçamos que por volta de 1634 a tulipomania que fez furor na Holanda
chegou a trocar, por um bulbo "sem valor intrínseco-, --uma carruagem
nova, dois cavalos cinzentos e seus arreios' 4271 Mas o jogo com as
ações, em mãos experientes, podia assegurar rendimentos satisfatórios. Em
1688, um mercador curioso, José de
Ia Vega (1650-1692), judeu de origem espanhola, publicava em Amsterdam,
com o ambíguo título Confusión de confusiones 428 um livro estranho, de
difícil compreensão por causa do estilo propositadamente rebuscado (o
stilo culto da literatura espanhola da época), mas pormenorizado, vivo,
único no seu gênero.
Não o tomentos ao pé da letra, porém, quando ele nos leva a pensar que,
nesse jogo infernal, se arruinou cinco vezes seguidas. Ou quando se
deleita com coisas já antigas: rímito antes de 1688 "vendeu-se a prazo
arenque antes de ter sido pescado, trigo e outras mercadorias antes de
terem nascido ou sido colhidas"; as especulações escandalosas de Isaac le
Maire com as ações das índias, que se situam logo no início do século
XVII, implicam já mil espertezas e até trapaça

429 ; há muito também que os corretores se metem em negócios na Bolsa,


enriquecem enquanto os mercadores dizem empobrecer. Em todas as praças,
Marselha ou Londres, Paris ou Lisboa, Nantes ou Amsterdam, os corretores,
mal controlados pelos regulamentos, brincam à vontade com eles.
Mas também é bem verdade que os jogos bolsistas de Amsterdam atingiram um
grau de sofisticação, de irrealidade que durante muito tempo fará dela
uma praça à parte na Europa, um lugar onde não se contentam em comprar e
vender ações apostando na alta ou na baixa, onde jogos complicados
permitem que se especule sem sequer ter dinheiro ou ações nas mãos. É
disso que os corretores tiram o maior proveito. Estão divididos em grupos
- dizia-se rotteries. Se um joga na alta, o outro, o dos
"contramineiros", jogará na baixa. É o que arrastará a massa mole e
indecisa dos especuladores num ou noutro sentido. Mudar de campo, para um
corretor - o que acontece --, é ato desleal430.
Todavia, as ações são nominais e a Companhia das índias guarda os
títulos, o comprador só entra na posse de uma ação mediante uma inscrição
em seu nome num registro existente para isso. A princípio, a Companhia
julgava poder desse modo opor-se à especulação (a ação ao portador só
será aceita mais tarde), mas a especulação não implica a posse. O jogador
vende, de fato, aquilo que não possui, compra o que não possuirá: é, como
se costuma dizer, comprar ou vender "em branco". A prazo, a operação é
saldada com perda ou lucro. Acerta-se essa pequena diferença, e o jogo
continua. O prêmio, outro jogo, e apenas um pouco mais complicado431.
com efeito, como as ações são arrastadas por uma alta a longo prazo, a
especulação se instalará forçosamente no curto prazo. Ficará à espreita
das flutuações momentâneas, aquelas que uma notícia, verdadeira ou falsa,
facilmente provoca.
O representante de Luís XIV junto das Províncias Unidas, em 1687, de
início se espanta com que, depois de todo o barulho feito em torno da
tomada de Bantam, na ilha de Java, tudo cesse, como se a notícia fosse
falsa. Mas "não estou muito espantado com essa atitude", escreve ele em
11 de agosto; "serviu para fazer baixar as ações em Amsterdam e houve
quem lucrasse com iSSO-432. Uns dez anos mais tarde, outro embaixador
contará que "o barão Jouasso, judeu muito rico de
Raia", se gabava a ele de poder ganhar "cem mil escudos num dia [ ... 1
se soubesse da morte do Rei de Espanha [o pobre Carlos Il que se esperava
que entregasse

, na de um momento para o outro] 5 ou 6 horas antes de se tornar público


em ;terdam'1433. E acrescenta o embaixador: --Estou convencido disso,
porque ele is outros judeus, Teixeira e Pinto, são dos mais poderosos no
comércio das ações. " Nessa época, contudo, tais práticas ainda não
atingiram a amplitude que conheo no século seguinte, com a ampliação, a
partir da guerra dos Sete Anos, do jogo as ações da Companhia Inglesa das
índias Orientais, do Banco da Inglaterra, do do Sul, e sobretudo com os
empréstimos do governo inglês, o --oceano das anuis", como diz Isaac de
Pinto (177 1)434. As cotações das ações, no entanto, só se)ublicadas
oficialmente a partir de 1747, ao Passo que a Bolsa de Amsterdam afias
das mercadorias desde 1585 435 (339 artigos nesta data, 55O em 1686)436.
O que explica o volume e o furor da especulação em Amsterdam,
relativamen[orme, desde o início, é o fato de gente modesta lhe ter
estado sempre associanão apenas os grandes capitalistas. Alguns
espetáculos faziam pensar nos nossos de hipódromo! Conta José de Ia Vega,
em 1688: "Os nossos especuladores üentam certas casas onde se vende uma
bebida que os holandeses denominam v e os levantinos caffé." Essas coffy
huisen "são de grande comodidade no mo, com seus aquecedores acolhedores,
seus sedutores passatempos: umas ofen livros para ler, outras mesas de
jogo, e todas elas interlocutores com quem, ersar; um toma chocolate,
outro café, outro leite, outro chá, e todos, por aslizer, fumam tabaco. [
... 1 Assim se aquecem, se regalam, se divertem gastanouco, ouvindo as
novidades [ ... 1 Entra então, numa destas casas, nas horas olsa, um ou
outro altista. Perguntam-lhe quanto valem as ações, ele acrescenn ou dois
por cento ao preço do momento, tira um caderninho de notas e coi a anotar
nele o que só fez mentalmente para fazer crer a todos que o fez real-e e
para avivar [... ] o desejo de comprar alguma ação por receio de que suba

437

Que mostra esta cena? Se não me engano, o modo como a Bolsa mete a mão
olso dos pequenos poupadores e pequenos jogadores. O êxito da operação é
Ivel: l? porque não há ainda, repita-se, cotação oficial que permita
seguir fa, nte as variações da cota; 2? porque o corretor - intermediário
obrigatório dirige no caso a gente modesta que não tem o direito,
reservado aos mercadoaos corretores, de entrar no santuário da Bolsa, se
bem que esta fique a dois )s dos cafés em questão, Café
Francês, Café Rochelês, Café Inglês, Café de e438. De que se trata,
então? Do que hoje chamaríamos uma especulação miúima procura de clientes
para arrumar fundos.
A especulação em Amsterdam abrange uma multidão de pessoas sem impora,
mas os grandes especuladores lá estão também, e são dos mais ativos. Seo
o testemunho de um italiano, Michele Torcia (1782), em princípio
imparAmsterdam tem ainda, nessa data tardia, a Bolsa mais ativa da Europa
439; passa Londres. E decerto o enorme volume (aos olhos dos
contemporâneos, ida-se) do jogo com as ações contribui para isso,
porquanto coincide então a febre constante dos empréstimos concedidos ao
estrangeiro, outra especulaessa também sem igual na
Europa, e a qual voltaremos.
:)s papéis de Louis Greffulhe 44O, estabelecido, desde 1778, como dono de
uma rtante feitoria de Amsterdarn441, dão-nos uma idéia bastante viva
deste durescimento. Voltaremos muitas vezes aos ditos e feitos deste
novo-rico, arroe prudente, aos seus testemunhos lúcidos. Em 1778, nas
vésperas da entrada -ança na guerra ao lado das colônias inglesas da
América, têm livre curso em

Os instrumentos da troca
Anisterdam especulações loucas. O momento parece propício, graças à
neutralidade, para tirar proveito das circunstâncias. Mas devia-se
arriscar com mercadorias coloniais, cuja escassez era prevista, deixar-se
tentar pelos empréstimos aos ingleses, depois aos franceses, ou financiar
os Insurretos?
Escreve Greffulhe a A. Gaillard (em Paris): "O vosso antigo empregado
Bringley está aqui metido com os americanos até o pescoço. "442 Quanto ao
próprio
Greffulhe, metido em todos os negócios ao seu alcance que lhe parecem
bons, lança-se com tudo nas especulações da Bolsa, com comissão. Joga por
si próprio e por outros, por Rodolphe Errimanuel Haller (sobretudo por
este, que tomou conta do antigo banco ThelussonNecker), Jean-Henri
Gaillard, os Perrégaux, o universal
Panchaud, banqueiros em Paris, e, em Genebra, por Alexandre Pictet,
Philibert
Cramer, Turrettini, todos eles nomes que figuram em letras douradas no
grande livro do banco protestante estudado por H. Lüthy443. O jogo é
difícil e arriscado, incide sobre grandes somas de dinheiro. Mas, enfim,
se Louis
Greffulhe o conduz com tanta calma é porque se trata sobretudo de
dinheiro alheio. Aborrece-o, mas não o desespera que eles percam: "Se se
pudesse adivinhar, em negócios de fundos [entenda-se os fundos ingleses],
como em muitos outros, meu born amigo, só se fariam bons negócios",
escreve ele a Haller.
Noutra carta explica: "A sorte pode mudar, ainda haverá muitos altos e
baixos."
Contudo, nunca faz compras nem reportes sem ter refletido. Não é um
temerário, um arrisca-tudo como Panchaud: executa as ordens dos clientes.
A Philibert
Cramer, que lhe dá ordem de comprar " 1O mil libras de índias", isto é,
ações da
Companhia Inglesa das índias Orientais, "na conta de 3/3 com os Senhores
Marcet e Pictet, podendo obtê-las entre 144 e 145": "Impossível",
responde Greffulhe (4

de maio de 1779), "pois, apesar da baixa que este fundo sofreu, vale 154
para agosto e 152 para maio. Até agora, não vemos possibilidades de
efetuar essa compra, mas não esquecemos de anotá-la.' 444

O jogo, para qualquer especulador de Amsterdam, é adivinhar a cotação


futura na praça holandesa uma vez conhecidos a cotação e os
acontecimentos na praça de
Londres. Por isso Greffulhe faz sacrifícios para ter informações diretas
de
Londres, que não lhe chegam apenas pelas "malas" do correio. Mantém
ligação, na capital inglesa - onde joga por conta própria -, com o
cunhado Sartoris, modesto e simples executante, e com a grande firma
judaica de J. e Abraham Garcia, a qual utiliza com desconfiança.
A intensa correspondência tão expressiva de Greffulhe apenas nos abre uma
estreita janela para a alta especulação em Amsterdam. Permite ver, porém,
até que Ponto o jogo holandês se abre para o exterior, até que ponto está
instalado ali um capitalismo internacional. Dois livros de rescontre441
da contabilidade de Louis Greffulhe poderiam possibilitar mais ainda: um
cálculo dos lucros destas operações complexas. O rescontre (em Genebra
diz-se "encontro") é a reunião trimestral dos corretores de ações que
operam as compensações e avaliam as perdas e ganhos do mercado a prazo e
do mercado de prêmios. Os dois livros de
Greffulhe são o levantamento das operações que ele realiza, na
circunstância, por conta dos seus correspondentes. Um agenle de câmbios
atual entenderia tudo, mas um historiador perde-se mais de uma vez. com
efeito, de reporte em reporte, em geral é preciso seguir uma operação
através de vários rescontres para ter a possibilidade de calcular os
lucros que nem sempre surgem no fim. Confesso não ter tido paciência de
prosseguir os cálculos até o fim.

85

os instrumentos da troca ftn Londres, tudo recomeça


Em Londres, que por tanto tempo invejou e copiou Amsterdam, bem depressa
os jogos são os mesmos. Já em 1695, o Royal Exchange assistiu às
primeiras transações com fundos públicos, com ações das índias e do Banco
da Inglaterra.
Tornouse quase imediatamente "ponto de encontro daqueles que, já tendo
dinheiro, querem ter mais e também a classe mais numerosa de homens que,
nada tendo, têm esperança de atrair para si o dinheiro dos que o
possuem". Entre 1698 e 1700, a
Bolsa de valores, que se encontrava apertada no Royal Exchange, instala-
se em frente, na célebre Exchange Alley.
Até a fundação do Stock Exchange, em 1773, os cafés de Exchange Alley
foram o centro da especulação com os "rnercados a prazo ou, como se
dizia, as corridas de cavalos da Alameda do Câmbio', 446. Garaway's e
Jonathan's eram os pontos de encontro dos corretores de ações e de fundos
do Estado, enquanto os especialistas de seguro marítimo freqüentavam o
café de Edward Lloyd, os do ramo de incêndio o Torn's ou o Carsey's.
Exchange Alley podia pois --ser percorrida em um minuto e meio", escreve
um panfletário por volta de 1700. "Pare à porta do
Jonathan, fique de frente para o Sul, avance uns passos, a seguir vire
para o
Leste, você está diante da porta do Garaway. Daí, passe à porta seguinte
e chegará [ ... 1 à rua Birchin. [ ... 1 Depois de ter guardado de novo a
bússola no estojo e dado a volta ao mundo da agiotagem, chegará de novo à
porta do Jonathan." Mas este minúsculo universo, lotado nas horas de
pico, com seus freqüentadores assíduos, seus pequenos grupos agitados, é
um nó de intrigas, um centro de poder447. Onde é que os protestantes
franceses, irritados com o tratado que acaba de restabelecer, em Utrecht
(1713), a paz entre a
Inglaterra e o rei da França, irão protestar, na esperança de levantar
contra ele os negociantes e de assim ajudar os whigs? Na Bolsa e nos
"cafés que ressoam com seus gritos" (29 de maio de 1713)448.
Esses pequenos mundos sensíveis perturbam os outros, mas o exterior, por
sua vez, perturba-os constantemente. As notícias que confundem as
cotações, aqui como em Amsterdam, nem sempre são urdidas de dentro. A
guerra da Sucessão da
Espanha foi fértil em incidentes dramáticos de que tudo, no momento,
parecia depender. Um rico mercador judeu, Medina, imaginara mandar alguém
acompanhar
Marlborough em todas as campanhas, pagando ao avaro e ilustre capitão uma
dotação anual de 6 mil libras esterlinas, das quais seria largamente
reembolsado sendo o primeiro a saber, através de um mensageiro, o
resultado das famosas batalhas: Ramillies, Oudenarde, Blenheim449. Já o
choque do anúncio de Waterloo beneficiou, dizia-se, os Rotschild! Anedota
por anedota, terá Bonaparte retido intencionalmente a notícia de Marengo
(14 de junho de 1800) para permitir um golpe sensacional de Bolsa em
PariS4509

Legenda da página 86:

8. O DESENVOLVIMENTO DOS BANCOS FRANCESES


Mapa elaborado por Guy, Antonietti, Une Maison de Banque à Paris au XVIF,
Greffulhe Montz et Compagnie (1789-1793), 1963, Para do texto notar que o
banco
Greffulhe é então o banco mais importante de Paris, que a capital
francesa se tornou uma praça financeira que irradia largamente para a
Europa, que os círculos quadriculados corresPondem, segundo a divertida
nomenclatura de
Antonietti, ao -hexágono dos grandes negócios --, isto é, as seis maiores
Praças de Londres, Amsterdam, Genebra, Lyon, Bordeaux, Nomes. Não dá a
impressão de equilíbrio entre os seis vértices do hexágono?

87

olsa de Londres, reconstruída depois do incêndio de 1666. (Foto Michel


Cabaud.)
Tal como a de Amsterdam, a Bolsa de Londres tem hábitos e jargão
próprios, ?uts e refusals concernentes às transações a prazo; os bulls e
os bears, que são =pradores e vendedores a termo que não têm, na
realidade, o menor desejo =prar nem de vender, apenas de especular; o
riding on horse back, que é uma -culação com bilhetes da loteria
governamental, etc.451. Mas no geral tornamos icontrar em Londres, com
algum atraso, as mesmas práticas da Holanda, incluos Rescounters days -
palavra decalcada diretamente dos Rescontre-Dagen kmsterdam. Assim,
quando as proibições governamentais dão o basta nos puts fusals, em 1734,
impedindo, pelo menos por uns tempos, que se compre e venvento, como em
Amsterdam, vêem-se florescer os Rescotinters que favorecem riesmas
práticas, sob outra forma. E', em Londres como em Amsterdam, os cor)res
interpõem-se e oferecem-se, corretores de mercadorias (trigo, corantes,
esiarias, cânhamo, seda), stock brokers, ou especialistas de câmbio. Em
1761, Tho; Mortimer protestava energicamente contra essa corja. Every man
his broker, ida qual cabe ser seu corretor, tal é o título de seu livro,
e um processo, em

9. LONDRES: O CENTRO DE NEGóCIOS EM 1748

Este esboço, executado a partir de um desenho de 1748, indica os lugares


e os edifícios célebres: Lombard Street, o Royal Exchange em Cornhill e,
o mais célebre de todos, Exchange Alley. Aspartes sombreadas correspondem
às casas destruídas pelo incêndio de 1666.

1767, dará ensejo a medidas libertadoras neste sentido: passar pelo


corretor não é obrigatório, será explicitado oficialmente452. Tudo isso,
porém, só serviu para sublinhar a importância, na vida bolsista, dessa
profissão cujas comissões são, aliás, relativamente baixas: 1/8 por cento
a partir de 1697. Acima dos corretores, adivinhase a ação dos grandes
mercadores e dos banqueiros ourives e, abaixo, aquela, de modo algum
desprezível, dos importunos que no jargão se chamam jobbers, ou seja,
intermediários não autorizados. Já em 1689, George
White acusava --essa estranha espécie de insetos chamados stock-jobbers"
de fazer baixar e subir as ações à vontade para enriquecer à custa alheia
e "devorar os homens, no nosso Exchange, como outrora os gafanhotos
devoraram as pastagens do Egito". E não foi Defoe que escreveu em 1701 um
livrinho anônimo, intitulado The Villany of Stockiobbers detected""?
Alguns anos mais tarde (1718), uma peça de teatro, A Bold Stroke for a
Wife, leva o espectador ao café de Jonathan, entre os dealers, sworn
brokers [corretores juramentados] e sobretudo jobbers. Eis uma amostra do
diálogo:

tentos ota iroca


MEIRO JOBBER - Mar do Sul a 7/8. Quem compra?

3UNDO JOBBER - Cautelas do Mar do Sul, vencimento no São Miguel de

3. Categoria dos bilhetes de loteria.


CEIRO JOBBER - Aç6es da East India?
, XRTO JOBBER - Então! Só vendedores, nada de compradores! Meus senhosou
comprador para um milhar de libras, terça-feira próxima, a 3/4. CRIADO -
Café fresco, senhores, café fresco?
CAMBISTA, MR. TRADELOVE - Atenção, Gabriel, você me pagará a dinça sobre
o capital de que falamos outro dia.

3RIEL - Pois claro, senhor Tradelove, aqui está um título emitido pela
Sword fe
Company.
RIADO - Chá, cavalheirOS4549

Talvez seja born recordar que a especulação incide também sobre os


Exchequers (títulos do Tesouro) e os Navy bills, mais as ações de umas
sessenta compas (entre as quais o Banco da Inglaterra e a Companhia das
índias, restituída

3 unidade em 1709, que são as preferidas). " The East India Company was
the i point", escreve Defoc. Na época em que essa peça é representada, a
Mar do -ião provocou ainda o grande escândalo do South Sea Bubble. A
Sword Blade ipany é uma manufatura de armamento455.
Em 25 de março de 1748, o fogo destruiu o bairro e os cafés célebres de
Exige
Alley. Foi preciso mudar de casa. Mas havia pouco espaço para os
corretoAo cabo de muitos projetos, uma subscrição reuniu os fundos
necessários para truir um novo edifício, em 1773, atrás do Royal
Exchange. Devia ser chamado Jonathan's, mas acabou sendo batizado Stock
Excliange456. O cenário muoficializava-se, mas, nem é preciso dizer, o
jogo continuava, sempre o mesmo.
Se, após reflexão, insistirmos em fazer a viagem a Paris, deveremos ir
pela rua, nne, onde a Bolsa foi instalada em 1724, ao palacete de Nevers,
antiga sede ompanhia das índias, no local da atual Biblioteca Nacional.
Nada de compaa
Londres ou a Amsterdam. No tempo de Law, a rua QuincampoiX457, essa pôde
por um momento rivalizar com a Exchange Alley, mas não depois dessa a que
se seguiram dias tristes e inibidores. Aliás, por um acaso pouco
explicá:)s documentos referentes à rua Vivienne desapareceram quase
todos.
Só uns cinqüenta anos após sua fundação é que a Bolsa de Paris se anima
inmente, na Paris de Luís XVI. Grassa então por toda a parte a febre do
jogo. Jta sociedade entrega-se ao faraó, ao dominó, às damas, ao xadrez",
e nunca mternente458. "Desde 1776, acompanham-se as corridas de cavalos;
o povo se ia nas cento e doze casas da Loteria oficial abertas em Paris."
E há casas de por toda a parte. A polícia, que nada ignora, empenha-se em
não intervir :), mesmo ao redor da Bolsa, no Palais-Royal, onde tantos
especuladores em :)s, cavaleiros de indústria e escroques sonham com
especulações miraculosas. clima, o exemplo das especulações de Londres e
Amsterdam torna-se irresis

"3 MIII1UrfIUrIt"IN "U LtULU tível, tanto mais que a política de


empréstimos de Necker e de Calonne cria uma enorme dívida pública,
repartida entre 50O mil ou 60O mil portadores, na maioria parisienses.
Ora, a Bolsa é o mercado ideal para a dívida pública. No apertado
edifício da rua Vivienne458 os corretores, os agentes de câmbio foram
reorganizados: onipotentes, têm assento numa espécie de estrado, o
parquet;
entre eles e os clientes, o estreito caminho por onde mal passa uma
pessoa, é a coulisse. Vê-se então a formação de um vocabulário, prova de
evidente atividade.
Nas cotações, figuram os títulos da dívida pública, sobretudo eles, mas
também as ações da Caixa de Desconto, antepassado do Banco da França.
Confessemos que, mesmo com um guia

459
inteligente como Marie-Joseph Desiré Martin, não entendemos, logo de
saída, a lista das cotações que ocupa "todos os dias uma página do
Journal de Paris e dos
Affiches' 9460.
Assim se instala a especulação bolsista. Em 1779, a Caixa de Desconto foi
reorganizada e as ações oferecidas ao público. Depois, diz o Conselho de
Estado, "fezse um tráfico tão desordenado dos títulos da Caixa de
Desconto, que foram vendidos quatro vezes mais do que os existentes" 461.
Portanto, vendido e revendido. imagino que a curiosa especulação
conseguida pelo jovem conde de
Tilly462 mal contada por ele (tinha-lhe sido aconselhada pela amante, uma
atriz que também concedia seus favores a um rico intendente dos
Correios), se situe nessa época. Resultado, diz ele, "pagaram-me 22
títulos da Caixa de Desconto", isto é, 22 mil libras. Não há dúvidas, no
entanto, de que a especulação a termo, cheia de vento, tenha dado então
mais do que seus primeiros passos na conquista de Paris. O decreto de 7
de agosto de 1785, cujo texto o embaixador de Catarina

11 em Paris, Simolin463 transmite à sua soberana, é, a esse respeito,


característico. Há algum tempo, explica o decreto, "introduziu-se na
capital um gênero de mercados ou de compromissos [o grifo é nosso] tão
perigosos para os vendedores como para os compradores, pelos quais alguém
se compromete a fornecer a prazos dilatados obrigações que não tem e o
outro se submete a pagá-los sem para isso ter os fundos, com a reserva de
poder exigir a entrega antes do vencimento, mediante o desconto. [... ]
Tais compromissos ocasionam uma série de manobras insidiosas tendentes a
desnaturar momentaneamente a cotação das obrigações públicas, a dar a
umas um valor exagerado e a empregar as outras de um modo capaz de
depreciá-las. [ ... ] Daí resulta uma agiotagem desordenada que qualquer
negociante sensato reprova, que põe em risco as fortunas de quem tem a
imprudência de entrar nela, desvia os capitais de investimentos mais
sólidos e favoráveis à indústria nacional, estimula a cupidez a buscar
ganhos imoderados e suspeitos [... 1 e poderia comprometer o crédito usu~
fruído com tão justa razão pela praça de Paris no resto da Europa".
Depois desse decreto foram renovadas as leis antigas de janeiro de 1723 e
o decreto (criador da Bolsa) de 24 de setembro de 1724. Foram previstas
multas de 3 mil a 24 mil libras, conforme os casos.
Claro que ficou tudo, ou quase tudo, letra morta, e em 1787 Mirabeau pôde
escrever sua Denúncia da agiotagem ao rei. Suprimir essa agiotagem seria
salvar a monarquia, no caso pouco culpada?
Dito isto, os franceses continuam inexperientes no ofício. A propósito do
emPréstimo lançado por Necker em 1781, Louis Grel`fulhe464, nosso
banqueirocOrnissionista de Amsterdam, que o subscreveu largamente - ou
melhor, mandou subscrever -, escreve ao amigo e comparsa lsaac Panchaud
(11 de fevereiro de

1782): "É desagradável, muito desagradável que o empréstimo não tenha


sido fe

do [isto é, concluído] imediatamente. Teria ganhado 5 a 6 por cento.


Ainda não, ndem nada, no vosso país, dessas formas e tramóias que, em
matéria de finantêm sobre a agiotagem e a circulação dos fundos
precisamente o mesmo efeito o óleo tem num relógio, facilitando-lhe o
movimento." A "circulação" dos dos, isto é, a revenda dos títulos.
Concluído o empréstimo, com efeito, é frente que, em
Amsterdam ou em Londres, os subscritores recomprem, pagando s, alguns
títulos subscritos por outras pessoas, e a cotação sobe, pois os respon-
is pela operação forçam ousadamente a alta até se tornar muito
lucrativo !mbaraçar-se da grande carteira de títulos que guardaram com
essa intenção. Paris, como praça de especulação, tem ainda muito que
aprender.
A especulação com as ações, novidade certa, deu muito o que falar a
partir éculo
XVIL Mas reduzir as Bolsas de Amsterdam, de Londres e, atrás delas, )
osição modesta, de Paris ao que os próprios holandeses chamam Windhandel,
ércio de vento, seria absurdo. Os moralistas muitas vezes deram esse
passo, 'undindo crédito, banco, papel-moeda e especulação. Na França,
Roland de latière465, de quem a Assembléia Legislativa fará em 1791
ministro do Interior, faz rodeios e diz, com admirável simplicidade:
"Paris só tem vendedores ou ipuladores de dinheiro, banqueiros, gente que
especula com papéis, com emtimos do Estado, com a miséria pública."
Mirabeau e Clavière também criticaa especulação, e, segundo
Couédie466, em 1791, "a agiotagem, para tirar do i alguns seres obscuros,
causava a ruína de vários milhares de cidadãos". Sem da. Mas o mérito das
grandes Bolsas de Amsterdam e de Londres é ter asseguo triunfo, de
afirmação lenta, da moeda de papel, de todas as moedas de papel. Sabemos
bem que não há economia de mercado um tanto animada sem moe:", sta corre,
"cascateia", circula.
Toda a vida econômica se esforça por captálultiplicadora das trocas, está
sempre em quantidade insuficiente: as minas não ecem metais preciosos que
cheguem, as más moedas expulsam as boas ao lonos anos e o sorvedouro do
entesouramento está sempre aberto. Solução: criar melhor do que uma
mercadoria-moeda, espelho em que as outras mercadorias efletidas e
aferidas; criar uma moeda-signo. Foi o que fez a China, a primeira ê-lo,
logo no início do Século 1X467. Mas criar moedas de papel não é o mes[ue
ambientá-las. O papel-moeda não desempenhou na China o papel de aceler do
capitalismo que lhe coube no Ocidente.
A Europa, com efeito, bem cedo encontrou a solução, até várias soluções.
Asem
Gênova, em Florença, em Veneza, já no século XIII, a grande inovação !tra
de câmbio que penetra lentamente nas trocas, mas penetra. Em Beauvais,
imeiros inventários que assinalam letras de câmbio não são anteriores a
1685, Ja revogação do edito de NanteS468. Mas Beauvais não passa de uma
praça Inciana.
Outra moeda criada cedo, em Veneza, são os títulos da dívida públi'imos
em
Amsterdam, em Londres, em Paris as ações das Companhias serem idas nas
cotações das Bolsas. E, além disso, os títulos de "banco" de diversas
ris. Todo esse papel representa uma massa enorme. Os sensatos diziam, na
épo

1.11, 5 1f13UUfrlefILU3 "" tlul.


ca, que não deveria ultrapassar 3 a 4 vezes a massa do numerário469. Mas
proporções de 1 para 15 e mais são inteiramente prováveis, em certas
épocas, na
Holanda e na Inglaterra 470. Mesmo num país como a França, onde há pouca
familiaridade com o papel (é mesmo odiado depois da experiência de Law),
onde mais tarde a nota do Banco da França circulará por muito tempo com
dificuldade, e só em Paris, --os títulos de comércio que medem o volume
dos créditos representavam cinco a seis vezes a circulação metálica antes
de 1789...-471.
As Bolsas (os bancos também) têm uma ação considerável nessa intrusão de
papel necessária às trocas. Introduzindo todo esse papel no mercado,
criam a possibilidade de se passar num instante de um título da dívida
pública ou de uma ação a um reembolso líquido. Creio que, neste ponto em
que o passado se confunde com a atualidade econômica, não são necessárias
explicações suplementares. Mas, corno contraste, um texto francês do
princípio do século XVIII - um memorando não datado472 mas que deve ter
sido escrito por volta de 1706, uns vinte anos, portanto, antes da
renovação da Bolsa - parece-me merecer atenção. As obrigações emitidas
pelo Paço Municipal, que datam de 1522, poderiam ter desempenhado na
França o mesmo papel que as anuidades inglesas. Ora, elas continuaram a
ser um investimento de pai de família, um valor seguro em geral
imobilizado nos patrimônios, aliás difícil de negociar. Vendê-las implica
o pagamento de um direito e todo um "aparato de processos" perante o
notário. Por conseguinte, explica o memorando francês, "as obrigações da
cidade são um fundo morto para o comércio, cuja serventia para quem faz
negócios equivale à de suas casas e de suas terras. O interesse dos
particulares mal entendido prejudicou muito nesse aspecto o interesse
público". O caso fica claro, prossegue ele, se comparamos essa situação
com a da Itália, da Inglaterra e da Holanda, onde "as ações do
Estado [são vendidas e transportadas] como todos os imóveis, sem despesas
e sem cera".
Passar depressa do papel ao dinheiro e reciprocamente é por certo uma das
vantagens essenciais das Bolsas de valores. As anuidades inglesas não são
apenas uma ocasião para Windhandel. São também uma moeda secundária e
suficientemente garantida, que tem a vantagem de também render juros.
Caso o portador necessite de liquidez, obtém-na na Bolsa no mesmo
momento, em troca de seu papel. Liquidez fácil, circulação, não estará aí
um segredo dos bons negócios holandeses ou ingleses - um de seus
segredos? Acreditando-se num entusiasta italiano, em 1782, os ingleses
possuíam então na "Change Alley" "una mina piá doviziosa di quella che la
Spagna possiede nel Potosi e nel Messico' 1473. Uns quinze anos antes, em

1766, no livro Les intérêts des nations dEurope474 J. Accarias de


Serionne também escrevia: "A agiotagem dos fundos públicos é um dos
grandes meios que [... 1 sustenta o crédito na Inglaterra; a cotação que
o ágio lhes dá na praça de Londres fixa-lhes o preço nas praças
estrangeiras."

INDO FORA WPA?

3erguntar se a Europa está ou não na mesma fase de trocas das outras


regiões s do mundo - populações privilegiadas como ela - é formular uma
questão il. Mas produção, troca, consumo, no nível em que os descrevemos
até agora, brigações elementares para todos os homens; não dependem de
escolhas antii recentes das civilizações, nem de relações que elas
mantenham com seu meio, Ia natureza de suas sociedades, nem de suas
estruturas políticas, nem de um do que pesa continuamente sobre a sua
vida de cada dia. Essas regras elemennão têm fronteiras. Em princípio,
portanto, nesse nível, as semelhanças de;er mais numerosas do que as
diferenças.
) ecúmeno inteiro das civilizações está esburacado por mercados, semeado
de Até as regiões semipovoadas, como a África Negra ou a América dos
primeiiropeus.
ão inúmeras as imagens para a América hispânica. Em São Paulo, no Brasil,
is já se encontram nos cruzamentos das primeiras ruas no fim do século
XVI. s de 1580, aproveitando a união das duas coroas, Espanha e Portugal,
os indiários portugueses invadem literalmente a América espanhola,
esmagando-a s seus serviços. Lojistas, mascates, eles chegam aos centros
mais ricos e às -s mais desenvolvidas, a Lima ou à Cidade do México. Suas
lojas, tal como primeiros merceeiros da Europa, oferecem todas as
mercadorias ao mesmo as mais modestas e comuns, farinha, carne seca,
feijão, tecidos importaias também as mercadorias de preço elevado, como
escravos negros ou fabu)edras preciosas. Até na selvagem Argentina do
século XVIII se ergue, para dos gauchos, a pulpería, uma loja com grades,
onde se vende tudo, sobretuílcool, e que abastece os comboios de
tropeiros e de carreteiros".
Islã é, por excelência, a terra dos mercados superpovoados e das pequenas
irbanas, agrupadas por ruas e por especialidades, ainda hoje visíveis nos
céle, iks das grandes cidades. Ali se encontram todos os mercados
imagináveis: )ra dos muros, amplamente expostos, que impedem a passagem
nas portas nentais das cidades "numa espécie de território neutro que já
não é exatacidade, onde os camponeses se aventuram a ir sem grande
hesitação, porém uito longe da cidade para que o citadino não deixe de
sentir-se em seguranos outros, dentro da cidade, que se insinuam conforme
podem nas ruas ese nas praças públicas, quando não ocupam amplos
edifícios, como o BezesIstambul.
Dentro dos muros, os mercados são especializados. De formação e,
assinalam-se os mercados de mão-de-obra de Sevilha, de Granada, no tempo
ninação muçulmana, e de
Bagdá. Inúmeros são os mercados prosaicos de de cevada, de ovos, de seda
crua, de algodão, de lã, de peixe, de lenha, de edo... No Cairo, nada
menos do que trinta e cinco mercados interiores, se

Pequenafeira em Istambul. Miniatura do Museo Civico Correr, em Veneza.


(Clichê do museu.)

ndo MaqriZi477. Desempenhará um deles o papel de Bolsa, pelo menos para


os mbistas? É o que afirma um livro recente (1965)478.
Em suma, todas as características do mercado europeu estão aí: o camponês
e vem à cidade com a preocupação de obter o dinheiro necessário ao
imposto lue mal atravessa o mercado; o revendedor ativo, esperto e que,
apesar das proi, -ões, se adianta ao vendedor rural; a animação e o
atrativo social do mercado, de se pode comer à vontade os pratos cozidos
que o mercador oferece constante, nte, "almôndegas de carne, pratos de
grão-de-bico ou frituras' 479.
Na índia, muito cedo às voltas com uma economia monetária, não há aldeia
coisa curiosa, mas normal, depois de se refletir - que não tenha seu
mercado. lue a contribuição devida pela comunidade aos senhores
absenteístas e ao Grão)gol, este tão voraz como aqueles, tem de ser
transformada em dinheiro para, seguida, ser paga a quem de direito. Para
isso, é preciso vender trigo, ou arroz, plantas tintoriais, e o mercado
baniano, sempre de serviço, ali está para facilitar peração e, de
passagem, tirar os seus lucros. Nas cidades, pululam os mercados s lojas.
E por toda a parte um artesanato móvel, à chinesa, oferece seus serviços.
ida hoje ferreiros ambulantes se deslocam de carroça com as famílias e
ofereri seus serviços por um pouco de arroz ou outros alimentoS480.
Inúmeros tamn são os mercadores ambulantes indianos ou estrangeiros.
Mascates infatigáveis, sherpas do Himalaia vão até a península de Malaca
481.
No conjunto, porém, estamos mal informados sobre os mercados normais da
ia. Em contrapartida, a hierarquia dos mercados chineses está bem
esclarecida. 'hina, na sua enorme massa viva, melhor que muitas outras
sociedades, conseri milhares de características da sua vida antiga, pelo
menos até 1914 - até des da Segunda
Guerra Mundial. Hoje, evidentemente, já é tarde demais para entrar esses
arcaísmos. Mas G. William Skinner 482, no Se-tchuan, em 1949, ob7ou um
passado ainda vivo, e as suas notas abundantes e rigorosas são uma exnte
informação sobre a China tradicional.
Na China, como na Europa, a feira de aldeia é rara, na prática
inexistente. [as as vilas, em contrapartida, têm sua feira e a frase de
Cantillon 483 - uma caracteriza-se por uma feira - vale tanto para a
China como para a França éculo
XVIII. A feira da vila realiza-se duas ou três vezes por semana, três
vezes ndo a "semana", como na China meridional, tem dez dias. É um ritmo
que pode ser ultrapassado, nem pelos camponeses das cinco ou dez aldeias
satélites ila, nem pela freguesia do mercado, de recursos limitados.
Habitualmente, apeum camponês em cada cinco, por família ou por casa,
freqüenta a feira. Algulojas rudimentares fornecem as mercadorias miúdas
de que o homem do camiceessita:
alfinetes, fósforos, azeite para as lamparinas, velas, papel, incenso,
ouras, sabão, tabaco... Completemos o quadro com a casa de chá, as
tabernas se serve vinho de arroz, os saltimbancos, os acrobatas, os
contadores de hisis, o escrevente público, sem esquecer as casas de
empréstimo e usura, quando é um senhor que desempenha esse papel.
Esses mercados elementares estão ligados uns aos outros, como prova um
caário tradicional muito coordenado, que faz com que as feiras das vilas
se soonham o menos possível e que nenhuma delas se realize no dia em que
a cidade ue dependem faz suas próprias feiras. Esse escalonamento permite
que os váagentes de um comércio e de um artesanato ambulantes organizem
seu próprio

", s; trtsírurricritus au iroca calendário. Mascates, transportadores,


varejistas, artesãos, todos em constante deslocamento, passam de uma
feira para outra, da cidade para uma vila e daí para outra, etc., para
regressarem à cidade, num movimento perpétuo. Miseráveis cules carregam
nas costas mercadorias, que vendem para comprar outras com
discerniniento, jogando com diferenças de preços mínimas, por vezes
irrisórias.
O mercado de trabalho está em permanente circulação; a loja artesanal é
de certo modo itinerante. O ferreiro, o carpinteiro, o serralheiro, o
marceneiro, o barbeiro e muitos outros arranjam serviço na própria feira
e voltam depois a seu local de trabalho durante os dias "frios" que
separam os dias "quentes" da feira. com estes encontros, a feira ritma a
vida aldeã, introduz-lhe seus tempos de pausa e de atividade. A
itinerância de certos "agentes" econômicos atende necessidades
elementares: é na medida em que um artesão não encontra na vila, ou até
na aldeia onde mora, a clientela que lhe permitiria trabalhar em tempo
integral que ele se desloca "para sobreviver". Muitas vezes, sendo
vendedor daquilo que fabrica, tem necessidade de pausas para reconstituir
o estoque e sabe de antemão, pelo calendário das feiras que freqüenta, em
que altura deve estar pronto.
Na cidade, no mercado central, as trocas têm outra dimensão. Para ele
chegam mercadorias e víveres das vilas. Mas a cidade, por sua vez, está
ligada a outras cidades de seu tamanho ou maiores. A cidade é o elemento
que começa a ser francamente alheio à economia local, que sai do seu
âmbito restrito e se vincula ao grande movimento do mundo, recebe dele as
mercadorias raras, preciosas, localmente desconhecidas e as difunde por
sua vez nos mercados e lojas inferiores. As vilas estão dentro da
sociedade, da cultura, da economia camponesas; as cidades saem dela. Esta
hierarquia dos mercados delineia na verdade uma hierarquia da sociedade.
G. W. Skinner pode, portanto, afirmar que a civilização chinesa não se
formou nas aldeias, mas em agrupamentos de aldeias, incluindo neles a
vila que é o seu coroamento e, até certo ponto, o seu regulador. Não se
deveria levar longe demais essa geometria matricial, no entanto ela tem
seu valor.
A superfície varidvel das dreas elementares de mercado
Mas a mais importante observação de G. W. Skinner refere-se à
variabilidade da superfície média do elemento básico, isto é, do espaço
por onde se espraia a feira da vila. E forneceu-lhe demonstração geral a
propósito da China por volta de 1930. com efeito, se aplicamos o modelo
básico a todo o território chinês, fica claro que a superfície dos
"hexágonos" ou pseudo-hexágonos varia em função da densidade
populacional. Se as densidades por quilômetro quadrado se estabelecem
abaixo de 10, sua superfície, pelo menos na China, situa-se nas
imediações dos 185 kM2 ; à densidade 2O corresponde um hexágono de cerca
de 30O kM2, e assim por diante. Esta correlação esclarece muitas coisas,
assinala diversas fases de desenvolvimento. Conforme a densidade do
povoamento, conforme o tônus da economia (penso sobretudo nos
transportes), os centros vitais dos mercados ficam mais ou menos próximos
uns dos outros. E talvez esta seja uma maneira melhor de formular o
problema que atormentou os geógrafos franceses, no tempo de Vidal de Ia
Blache e de Lucien Gallois. A França divide-se num certo número de
"regiões",

97

idades elementares, na realidade grupos de vários hexágonos. Ora, essas


regiões ) tão notáveis pelo seu enraizamento duradouro como pela
mobilidade e incertede suas fronteiras. Mas não é lógico que sua
superfície tenha variado na medida que, com o tempo, variava a densidade
de seu povoamento?
lo de pedlars ociantes?
É a um universo bem diferente que nos conduzem os mercadores que J. C. n
Leur484

grande historiador que a guerra nos arrebatou em plena juventude, ;creve


como pedIars, vulgares mascates do oceano índico e da Insulíndia, nos us
veria, por meu lado, agentes de um nível seguramente mais elevado, às
vezes negociantes. A diferença de critério é tão grande que pode
surpreender: é um

10. OS MERCADOS EXEMPLARES DA CHINA , lapa de uma região do Se-tc/man com


19 vilas (das quais 6 têm categoria de cidades), situadas entre 35 e 9O
N. -E, da cidade de Cheng Tu. Este mapa e os dois esquemas que se seguem
foram extraídos de G. William Skin'Marketing and
Social Structure in rural China", in Journal of Asian Studies, nov. 1964,
pp.

22-23. 'rimeiro esquema (p. 99, em cima): imagine-se em cada vértice dos
dois poligonos representados em linha cheia dileia, cliente da vila ou da
cidade que se encontra no centro. Acima desta primeira geometria, os seis
mercados os ocupam o centro dospolígonos mais extensos, cujos lados são
marcados à tracejada, constituindo cada vertiia vila.
egundo esquema (p. 99, embaixo): o mesmo esquema, mas simplificado, uma
boa ilustração do modelo teórico
9grafia matematizante, segundo Walter Christaller e August Lõsh. Ver
explicaçóes no texto, p. 97.

, os javaneses. Note-se a âncora de madeira, as velas de bambu e os dois


remos do leme -al. (Fototeca A. Colin.)
- o como se, no Ocidente, hesitássemos na distinção entre a feira de um
burgo

1 e uma Bolsa ao ar livre. Mas há mascates e mascates. Aqueles que os


veleiros m, quando a monção ajuda, de um lado para outro do imenso oceano
índico s mares laterais do Pacífico para trazê-los de volta, em
princípio, seis meses ; tarde, enriquecidos ou arruinados, a seu ponto de
partida, serão verdadeirate pedlars vulgares, como afirma J. C. Van Leur,
para logo chegar à conclusão -lodicidade e até do imobilismo dos tráficos
a toda a Insulíndia e à Ásia? Às s ficaríamos tentados a concordar. A
imagem destes mercadores, tão inusual Dlhos do Ocidente, por certo incita
com demasiada facilidade à comparação o pequeno volume da mascateagem.
Assim, em 22 de junho de l596485 OS ro barcos do holandês Houtman que
dobraram o cabo da Boa Esperança acade entrar, depois de uma longa
viagem, no porto de Bantam, em Java. Um me de mercadores sobe a bordo e
se acocora ao redor das mercadorias expos;como se estivessem numa feira".
Javaneses trouxeram os produtos frescos da i, aves, ovos, frutas;
chineses, suntuosas sedas e porcelanas; mercadores turbengalis, árabes,
persas, gujarates, todos os produtos do Oriente. Um deles, urco,
embarcará na frota holandesa para regressar a sua casa, em Istambul. Van
Leur, esta é uma imagem do comércio da Ásia, comércio de mercadores
-antes, cada qual transportando para longe de casa seu pequeno fardo de
merrias, exatamente como no tempo do Império romano. Nada se teria
alterado.
i deveria se alterar por muito tempo ainda.
Frata-se, provavelmente, de uma imagem enganadora. Em primeiro lugar, não
ne todos os tráficos do comércio da "índia com a índia". A partir do
século

XVI, houve um aumento espetacular dessas trocas pretensamente imutáveis.


Os navios do oceano índico transportam cada vez mais mercadorias pesadas
e de preço baixo, trigo, arroz, madeira, têxteis ordinários de algodão
destinados aos camponeses das zonas de monocultura. Não se trata,
portanto, unicamente de mercadorias preciosas, confiadas a um único
homem. Aliás, os portugueses, depois os holandeses, mais tarde os
ingleses e os franceses, que lá viviam, descobriram delíciados as
possibilidades de enriquecer com o comércio da -íridia com a índia", e é
muito instrutivo seguir, por exemplo, no relatório de D. BraemS'86, de
regresso das índias em 1687 depois de lá ter passado trinta e cinco anos
a serviço da Companhia holandesa, o pormenor de todas estas linhas
comerciais entrecruzadas e interdependentes, num sistema de trocas tão
vasto quanto variado, em que os holandeses souberam introduzir-se, mas
que não inventaram.
Não esqueçamos também que as perambulações dos mercadores do
ExtremoOriente têm um motivo exato e simples: a enorme energia gratuita
fornecida pelas monções, que organizam por si sós as viagens dos veleiros
e os encontros dos mercadores, com uma exatidão que nenhum outro
transporte marítimo da época conhecia.
Estejamos atentos, enfim, às formas já capitalistas, quer se queira quer
não, deste comércio de longa distância. Os mercadores de todas as nações
que
Cornelius Houtraan viu acocorados no convés de seus navios, em Bantam,
não pertencem a uma única e igual categoria mercantil. Uns -
provavelmente os menos numerosos - viajam por conta própria e poderiam, a
rigor, pertencer ao mundo simples imaginado por Van Leur, o do andarilho
da Alta Idade Média (se bem que mesmo esses - voltaremos a este ponto -,
a julgar por alguns casos precisos, evocam mais outro tipo mercantil). Os
outros, quase sempre, têm uma particularidade que o próprio Van Leur
assinala: por trás deles, há grandes comanditários aos quais estão
ligados por contrato; mas, uma vez mais, os tipos de contrato diferem.
Na índia, na Insulíndia, no início de seu interminável itinerário, os
pedlars de
Van Leur pediram emprestadas, quer a um rico mercador ou armador, baniano
ou muçulmano, quer a um senhor, ou a um alto funcionário, as somas
necessárias ao seu negócio. Em geral, comprometeram-se a reembolsar o
dobro ao emprestador, salvo em caso de naufrágio. Suas pessoas e as de
sua família são a fiança:
triunfar ou ficar escravo do credor até o reembolso da dívida, tais são
os termos do contrato. Estamos, como na Itália ou em outros lugares,
perante um contrato de commenda, mas os termos são mais rigorosos; a
extensão da viagem e o juro do empréstimo são enormes. Todavia, se essas
condições draconianas são aceitas é, evidentemente, porque os desníveis
de preços são fabulosos, os lucros habitualmente muito elevados.
Encontramo-nos em circuitos de enorme comércio de longa distância.
Os mercadores armênios, que, também eles, povoam os barcos das monções e
São numerosos a transitar entre a Pérsia e a índia, são muitas vezes
mercadorescomissários de grandes negociantes de Ispahan, contratados
tanto na Turquia como na Rússia, na Europa e no oceano índico. Os
contratos, neste caso, são diferentes: o mercador-comissário, em todas as
transações que operar com o capital (dinheiro e mercadorias) que lhe
confiaram à partida, receberá um quarto dos lucros, cabendo o resto ao
patrão, o khoja. Mas essa aparência simples encobre uma realidade
Complexa, que é maravilhosamente esclarecida pelo livro contábil e pelo
caderno
- ) 4, ()

viagem de um destes comissários, conservado na Biblioteca Nacional de


Lisboa o que foi publicada uma tradução resumida em 1967487. O texto,
infelizmente, incompleto. Falta o balanço final da operação, que nos
daria uma idéia exata lucros. Mas, tal como está, é um documento
extraordinário.
Para dizer a verdade, tudo nos parece extraordinário na viagem do
comissário lênio Hovharmes, filho de David:
- sua extensão: seguimo-lo por milhares de quilômetros, de Djulfa, o
arraJe armênio de lspahan, até Surate, depois até Lassa, no Tibete, com
toda uma e de pausas e de meandros, antes de regressar a Surate;
- sua duração, de 1682 a 1693, isto é, mais de onze anos, cinco dos quais
pasos em Lassa sem interrupção;
- o caráter afinal normal, banal, da viagem: o contrato que o une a seus
khoé um contrato-padrão formulado, ainda em 1765, quase um século mais
tarde, Código dos
Artriênios de Astrakhan;
- o fato de, onde quer que o viajante pare, em Chiraz, em Surate, em
Agra, o, mas também em Patria, no centro do Nepal, em Katmandu, em Lassa,
en, ser recebido, ajudado por outros mercadores armênios, comerciar com
eles, )ciar-se a seus negócios;
- extraordinária também a enumeração das mercadorias com que negocia: a,
ouro, pedras preciosas, almíscar, índigo e outros produtos de tinturaria,
tes de lã e de algodão, velas, chá, etc. - e a amplitude do negócio: uma
vez, s toneladas de índigo trazidas do Norte para Surate e expedidas para
Chiraz; -a vez, uns cem quilos de prata; outra ainda, cinco quilos de
ouro obtidos em ;a de mercadores armênios que foram até Sining, na
longínqua fronteira da Chipara trocarem prata por ouro - operação das
mais lucrativas pois na China ata é muito bem paga em comparação à
Europa: a proporção de 1 para 7 indit no caderno de Hovhannes significa
um belo lucro.
Mais curioso ainda é que ele não realiza esses negócios apenas com o
capital lhe confiou seu khoja, se bem que continue ligado a ele e anote
todas as opera, sejam elas quais forem, no seu livro contábil. Associa-se
por contrato pessoal tros armênios, utiliza seu capital pessoal (talvez
sua parte dos lucros?), mais a, contrai empréstimos, chega mesmo a
emprestar. Passa continuamente do eiro líquido às mercadorias e às letras
de câmbio, que transportam seus haveorno que por via aérea, ora a tarifas
reduzidas, 0, 75% por mês por uma distânurta e quando se trata de
mercadores mais ou menos associados aos seus negóora a tarifas muito
elevadas, quando se trata de longas distâncias, de repatriao de fundos,
uns 2O a 25% para um retorno de Surate a lspahan.
A clareza do exemplo, seu valor de amostra salientado pela precisão dos
por)res dão uma idéia inesperada das facilidades de comércio e de crédito
na índas redes de trocas locais muito diversificadas em que Hovharmes,
devotado ssário, devotado servidor e hábil mercador, se integra com
facilidade, negolo com mercadorias preciosas ou comuns, leves ou pesadas.
Viaja, é certo, mas e tem ele do mascate? Se quiserem a todo o custo uma
comparação, ele me raria mais o novo mercador inglês do private market,
em movimento constanido de uma hospedaria para outra, fechando aqui um
negócio, acolá outro, )rme os preços e a oportunidade, associando-se a
este ou àquele compadre e ndo imperturbavelmente seu caminho. Esse
mercador, que sempre é apresen

us instrumenios ua iruca tado como o inovador que sacudiu as velhas


regras do mercado medieval inglês, é para mim a imagem mais próxima
desses homens de negócios que entrevemos através do livro de viagem de
Hovharmes. com a diferença de a Inglaterra não ter as dimensões somadas
da Pérsia, da índia do Norte, do Nepal e do Tibete.
Através deste exemplo, compreende-se melhor também o papel dos mercadores
da índia - esses, por certo, não são pedlars - que vamos encontrar, do
século XVI ao XVIII, instalados na Pérsia, em Istambul488 em Astrakhan489
ou em MOSCOU490.
Ou então esse impulso que, já no final do século XVI, leva os mercadores
orientais até Veneza491, Ancona492 ou mesmo Pesar0493 e, no século
seguinte, até
Leipzig e Amsterdam. Não se trata apenas de armênios: em abril de l589494
a bordo da nau Ferrera que parte de Malamocco, o porto avançado de
Veneza, encontram-se, ao lado dos mercadores italianos (venezianos,
lombardos e florentinos), "armênios, levantinos, ciprianos [cipriotas],
candiotas, maronitas, sírios, georgianos, gregos, mouros, persas e
turcos". Todos estes mercadores certamente comerciam segundo o mesmo
modelo dos ocidentais. Vamos encontrá-los tanto nos gabinetes dos
notários venezianos ou de Ancona, como embaixo dos pórticos da Bolsa de
Amsterdam. Nem um pouco deslocados.
Banqueiros hindus
Na índia, todas as aglomerações têm banqueiros cambistas - os sarafs,
pertencentes sobretudo à poderosa casta mercante dos banianos. Um grande
historiador, Irfan Habib (l960)495 comparou o sistema dos cambistas
hindus ao do
Ocidente. As formas talvez sejam diferentes: tem-se a impressão de uma
rede inteiramente privada, de praça a praça, ou melhor, de cambista a
cambista, pelo que sabemos, sem ajuda de organismos públicos, tais como
as feiras ou as Bolsas.
Mas os mesmos problemas são resolvidos por meios análogos: letras de
câmbio (hundi), câmbio de moedas, pagamentos em dinheiro vivo, seguros
marítimos (bima).
A índia possui, desde o século XIV, uma economia monetária bastante ativa
que não pára de progredir na via de um certo capitalismo - o qual, no
entanto, não abarcará todo o volume da sociedade.
Estas cadeias de cambistas são tão eficazes, que os feitores da Companhia
inglesa - que têm o direito do comércio interno da índia tanto por conta
própria como por conta da Companhia - recorrem constantemente ao crédito
dos sarafs, tal como os holandeses (antes deles os portugueseS)496
contraem empréstimos dos japoneses de Kioto497 ou os mercadores cristãos
em dificuldades dos prestamistas muçulmanos e judeus de Alepo ou do
Cairo498. Como o "banqueiro" da Europa, o cambista hindu é muitas vezes
também um mercador que faz empréstimos para empreendimentos arriscados ou
se ocupa dos transportes. Alguns são fabulosamente ricos: por exemplo, em
Surate, por volta de 166349% Virii Vora possuiria uns 8

milhões de rupias; Abd ul Ghafur, mercador muçulmano50% com o mesmo


capital, dispõe, um século mais tarde, de 2O navios de 30O a 80O
toneladas cada e, sozinho, faria, ao que se diz, tantos negócios como a
poderosa India Company. E são os banianos que servem de corretores e se
apresentam como os intermediários indefectíveis dos europeus em todos os
negócios que estes tratam nas índias, são eles

103

ista de moedas nas Inalas. Desenho colorido da coleção Lally-Tollendal,


c. 1760.
(For.)
ansportam e, por vezes, mandam fabricar (em Ahmedabad, por exemplo) os ;
que nos séculos XVII e XVIII a índia exporta em enormes quantidades.
c)bre a organizaÇão e o sucesso indianos, o testemunho de Tavernier,
negofrancês de pedras preciosas que percorreu longamente a evelador como
o de Hovhannes, também ele utilizador d índia e a Insulíndia, o sistema
de sarafs. cês explica com que facilidade se pode viajar pela índia, e
até fora da índia, im dizer sem dinheiro vivo: basta pedir empréstimos.
Nada mais simples, M mercador em viagem, seja ele quem for, do que
Contrair um empréstimo, Iconda, por exemplo, sobre Surate, onde
transportará sua dívida para outra ontraindo novo empréstimo, e assim por
diante. O pagamento desloca-se )róprio devedor, e o credor (ou melhor, a
cadeia de credores que respondem os outros) só será reembolsado na última
etapa. É o que Tavernier chama

ÇiS 1f15t1utritMtUIN UU [["LU "pagar o velho com o novo". É óbvio que


esta liquidação provisória é paga todas as vezes. Esses desembolsos,
afinal, assemelham-se aos juros pagos --sobre os câmbios" na Europa: vão-
se somando uns aos outros e seu preço fica cada vez mais elevado, à
medida que o devedor se afasta do ponto de partida e dos circuitos
habituais. A rede baniana estende-se, com efeito, ao conjunto das praças
do oceano índico e a mais longe, mas, especifica Tavernier, "sempre fiz
os cálculos nas viagens que, tomar dinheiro em Golconda para ir a Livorno
ou a Veneza, câmbio por câmbio, o dinheiro custa, na melhor transação,
95%, mas quase sempre chega a

100, 1501. Cem por cento: é a taxa correntemente paga pelo mercador
viajante ao seu comanditário, tanto em Java como na índia ou na China
meridional. Fantástica taxa de juro, mas que só vale para as linhas de
mais alta tensão da vida econômica, para o sistema de trocas a longa
distância. Em Cantão, no fim do século XVIII, a taxa de juro corrente
entre mercadores é de 18 ou 20070502. Os ingleses de Bengala contraíam
empréstimos localmente a taxas quase tão baixas como Hovharmes.
Mais uma razão para não considerarmos os mercadores itinerantes do oceano
índico atores secundários: tal como na Europa, o comércio a longa
distância está no cerne do mais alto capitalismo do Extremo-Oriente.
Poucas Bolsas, mas grandes feiras
No Oriente e no Extremo-Oriente não se encontram Bolsas
institucionalizadas como as de Amsterdam, de Londres ou de qualquer
grande praça ativa do Ocidente. Há, porém, reuniões bastante regulares de
grandes negociantes. Nem sempre são facilmente identificáveis, mas não
são também discretas as reuniões dos grandes mercadores venezianos
embaixo dos pórticos do Rialto, onde parecem calmos transeuntes no meio
do tumulto do mercado próximo?
As grandes feiras, em compensação, são reconhecíveis sem risco de erro.
Pululam na índia, desempenham um papel importante no Islã e na
Insulíndia; curiosamente, são muito raras na China, se bem que existam.
É verdade que um livro recente (1968) afirma sem rodeios que
"praticamente não há feiras nos países do ISlã3503. E, contudo, lá está a
palavra: em toda a extensão dos países muçulmanos, mausim significa ao
mesmo tempo feira e festa sazonal, designando também, como sabemos, os
ventos periódicos do oceano índiCO504. Pois não é a monção que regula
infalivelmente, no Extremo-Oriente dos mares quentes, as datas das
viagens marítimas num ou noutro sentido, desencadeando ou interrompendo
os encontros internacionais de mercadores?
Um relatório pormenorizado, datado de 1621505, descreve um desses
encontros em
Moka, ponto de encontro de um comércio restrito mas riquíssimo. Todos os
anos, a monção leva a esse porto do mar Vermelho (que se tornará o grande
mercado do café) certo número de navios das índias, da Insulíndia e da
costa vizinha da África, sobrecarregados de homens e de fardos de
mercadorias (até hoje esses barcos fazem as mesmas viagens). Nesse ano,
chegam dois navios de Dabul (índia), um com 200, o outro com 15O
passageiros, todos mercadores viajantes que vão vender na escala pequenas
quantidades de bens preciosos: pimenta-do-reino, goma, laca, benjoim,
algodões tecidos com ouro ou pintados à mão, tabaco, noz

)scada, cravo-da-índia, cânfora, madeira de sândalo, porcelana, aimíscar,


índi, drogas, perfumes, diamantes, goma arábica... A contrapartida é,
vindo do Suez ra comparecer ao encontro em Moka, um único navio, por
muito tempo carre]o unicamente com moedas de oito espanholas; depois
serão acrescentadas algus mercadorias, tecidos de lã, coral, mantas (de
pêlo de cabra). Se o navio do z não chega a tempo, por uma ou outra
razão, fica comprometida a feira que )itualmente marca o encontro. Os
mercadores da índia e da Insulíndia, privados ;
clientes, têm de vender a qualquer preço, pois a monção mexorável põe fim
ira, mesmo que esta não tenha realmente ocorrido. Encontros análogos
com.nercadores vindos de Surate ou de Mazulipatam são organizados em
Basra ou Ormuz, onde os barcos, no regresso, quase só carregam vinho
persa de Chiraz prata.
No Marrocos, como em todo o Magrebe, são abundantes os locais santos ou )
eregrinações. É sob sua proteção que se instalam as feiras. Uma das mais
frentadas do Norte da África situa-se entre os Guzzula106, ao sul do
Anti-Atlas, ite do ermo e do ouro do deserto. Leão, o Africano, que a
visitou, assinala a importância, no princípio do século XV1; durou,
praticamente, até os nossos Mas em terras do Islã as feiras mais ativas
ocorrem no Egito, na Arábia, na t, nessa encruzilhada onde seriam de
esperar. É para o mar Vermelho que, a ir do século
XII, separando-se do eixo dominador por tanto tempo agarrado olfo Pérsico
e a
Bagdá, se inclinou todo o conjunto mercante do Islã, ao enro dessa linha
principal de seus tráficos e de seus sucessos. A isso acrescenta-se -to
dos tráficos caravaneiros que abrilhantou a feira de Mzebib, na Síria,
vasto o de encontro de caravanas. Em 1503, um viajante italiano, Ludovico
de hema'O', parte de "Mezaribe" para Meca com uma caravana que contaria
35 amelos! Aliás, a peregrinação a Meca é a maior feira do Islã. Como diz
a mes-stemunha, vai-se lá "parte [ ... 1 per mercanzie e parte per
peregrinazione".
ri 1184508 um viajante descrevia sua excepcional riqueza: "Não há uma
merria no mundo inteiro que não esteja neste encontro." Aliás, as feiras
da granregrinação bem cedo fixam o calendário dos pagamentos mercantis e
organizamis compensações109.
o Egito, numa ou noutra cidade do delta, há pequenas e animadas feiras
loinculadas às tradições coptas. Remontariam mesmo a antes do Egito
cristão, ito pagão. De uma religião para outra, os santos protetores
somente mudam me: suas festas (o mülid) continuam muitas vezes a
assinalar a realização de ercado excepcional. Por exemplo, em Tantah, no
delta, a feira anual que coride ao mülid de "santo" Ahmad al Badawi ainda
hoje reúne multidõeS51O . s grandes reuniões mercantis se realizam no
Cairo e em Alexandria51 1 onde, as dependem das estações da navegação no
Mediterrâneo e no mar Verme)rrespondendo ainda ao calendário emaranhado
das peregrinações e das cais. Em Alexandria, é em setembro e outubro que
os ventos são favoráveis, ) mar está aberto". Durante esses meses,
venezianos, genoveses, florentinos, s, ragusanos, marselheses fazem suas
compras de pimenta-do-reino e espe. Os tratados assinados pelo sultão do
Egito com
Veneza ou Florença defiorno observa S. Y. Labib, uma espécie de direito
dos feirantes que não deixa brar, mulatis mutandis, os regulamentos das
feiras do
Ocidente.

UMA --CIDADE DE FEIRA" ASIÁTICA, AO RITMO DOS BARCOS


EmBandarAbassy, o melhorporto da costa emfrenteda ilhade OrmuZ, os barcos
das indias descarregam suas mercadorias destinadas a Pérsia e ao Levante.
No tempo de Tavernier, depois da tomada de Ormitz pelos persas (1622), a
cidade abriga grande quantidade de belos entrepostos e de alojamentos de
mercadores, orientais e europeus. Mas só vive três ou quatro meses por
ano, --o tempo do negócio --, diz Tavernier, o tempo dafeira, dizemos
nós. Passado o que, já no mês de março, a cidade, terrivelmente quente e
malsã, se esvazia ao mesmo tempo do seu tráfico e dos seus habitantes.
Até o regresso dos barcos, em dezembro. (Negativo A.
Colin.)
Tudo isso não impede que, relativamente, a feira não tenha tido, no Islã,
a importância estrondorosa que teve no Ocidente. Atribuir o fato a uma
inferioridade econÔmica seria provavelmente um erro, pois, no tempo das
feiras européias de Champagne, o Egito e o Islã não estão por certo
atrasados em relação ao Ocidente. Talvez seja preciso evocar aqui a
própria enormidade da cidade muçulmana e a sua estrutura? Não tem ela
mais mercados e supermercados, se é que podemos empregar esta palavra, do
que qualquer cidade do Ocidente? E, sobretudo, seus bairros reservados a
estrangeiros são pontos de encontros internacionais permanentes. O fonduk
dos "francos" em Alexandria, os dos sírios no Cairo serviram de modelo ao
Fondaco dei Tedeschi em Veneza: os venezianos aprisionam os mercadores
alemães tal como eles próprios são aprisionados em seus bairros no
Egito512. Prisões ou não, estes fonduks organizam nas cidades muçulmanas
uma espécie de "feira permanente" que a Holanda, terra do grande comércio
livre, viria a ter e que lhe mataria precocemente as feiras, tornadas
inúteis. Deveremos concluir que as feiras de Champagne, no centro de um
Ocidente ainda tosco, foram talvez uma espécie de remédio em dose cavalar
para forçar as trocas em países ainda subdesenvolvidos?
Na índia, metade muçulmana, o espetáculo é diferente. Suas feiras são a
tal
Ponto um traço forte, onipresente, que se incorpora na vida de todos os
dias e o espetáculo nem sequer impressiona os viajantes, de tal forma é
natural. Essas fei

lianas têm, com efeito, o inconveniente, se assim se pode dizer, de se


confuncom as peregrinações que levam às margens das águas purificadoras
dos rios ináveis cortejos de itinerantes e de crentes, numa barafunda de
carros de bois lhantes.
Terra de raças, de línguas, de religiões estranhas umas às outras, a foi
decerto forçada a conservar por muito tempo, no limite das suas regiões
essas feiras primitivas, postas sob a proteção de divindades tutelares e
de inações religiosas, desse modo subtraídas às incessantes brigas de
vizinhan, erto, em todo o caso, que muitas feiras, às vezes entre
aldeias, permanece[ais ainda sob o antigo signo do escambo do que da
moeda.
ão é o que se passa, obviamente, com as grandes feiras às margens do
Gan.i
Hardwar, Allahabad, Sonpar; ou em Mthura e em Batesar, no Jama. Cada tem
as suas: os hinduístas em Hardwar, em Benares; os sikhs em Arnritsar;

513

- , uImanos em Pakpattan, no Punjab. Um inglês (o general Sleeman) por


xagerando, dizia que, desde o princípio da estação fria e seca, quando
comeoca dos banhos rituais, a maior parte dos habitantes da índia, das
encostas nalaia até o cabo
Comorim, está reunida em feiras onde se vende de tudo ive cavalos e
elefantes).
A vida em ruptura com o cotidiano normal torna-se nesses dias de oração e
de festança em que se associam as danças, a música, piedosos. De doze em
doze anos, quando o planeta Júpiter entra no signo iário, esse sinal
celeste acarreta uma enxurrada absurda de peregrinações e as
concomitantes. E surgem fulminantes epidemias.
i Insulíndia, as longas reuniões de mercadores, juntados, aqui e ali, nas
cinarítimas ou nos seus confins imediatos, pela navegação internacional,
asaspectos de feiras prolongadas.
"Grande" Java, até que os holandeses se instalem realmente por ocasião
;trução de Batávia (1619), e até mais tarde, a principal cidade é
Bantam"', a norte, no extremo ocidental da ilha, no meio de pântanos,
apertada em iros de tijolos vermelhos, tendo, nas muralhas, ameaçadores
canhões de que ri, na realidade, saberia servir-se. No interior, uma
cidade baixa, feia, "grande, msterdam". As três ruas divergentes, que
saem do palácio real, e as praças rminam ficam repletas de mercadores e
mercadoras improvisados, vendee aves, de papagaios, de peixes, de carnes,
de pastéis quentes, de araque do Oriente), de sedas, de veludos, de
arroz, de pedras preciosas, de fio de Mais alguns passos, chega-se ao
bairro chines, com suas lojas, suas casas ) e seu mercado próprio. A
oriente da cidade, na grande praça apinhada raiar do dia de pequenos
mercadores, reúnemse mais tarde os grandes ne, s, seguradores de navios,
armazenadores de pimentado-reino, prestamisTipresas arriscadas,
familiarizados com as mais diversas línguas e moedas: serve-lhes de
Bolsa, escreve um viajante. Entretanto, imobilizados todos na cidade à
espera da monção, os mercadores estrangeiros participam aí feira
interminável que dura meses. Os chineses, já de há muito presentes i,
destinados a ali ficar durante muito tempo ainda, desempenham neste um
papel importante. "São pessoas interesseiras", observa um viajante

4que emprestam com usura e adquiriram reputação igual a dos judeus na


Percorrem a região, de balança na mão, compram toda a pimenta-do-reino )
ntram e depois de terem pesado uma parte [note-se o pormenor da venda
stral, de maneira que possam calcular aproximadamente a quantidade [por

us instrumentos ou 11~ certo deve-se ler o peso], otere.., iii vo, cia
prata em barra conforme a necessidade daqueles que a vendem e por este
meio amealham uma quantidade tão grande que têm com que carregar os
navios da China logo que chegam, vendendo por cinqüenta mil caixas [as
sapecas] o que não lhes custa doze mil. Esses navios chegam a Bantam no
mês de janeiro, em número de oito ou dez, e são de quarenta e cinco ou
cinqüenta toneladas.-- Assim, os chineses também têm seu --comércio do
Levante", e por muito tempo a China do comércio de longa distância nada
teve a invejar à Europa. No tempo de Marco Polo, a China consome, diz
ele, cem vezes mais especiarias do que a longínqua Europa515.
Já se sabe que é antes da monção, antes da chegada dos barcos, que os
chineses, na realidade comissionistas residentes, fazem compras pelos
campos afora. A chegada dos barcos é o princípio da feira. De fato, é
isso que caracteriza toda a área da Insulíndia: feiras de longa duração,
no ritmo da monção. Em Atjeh (Achem), na ilha de Sumatra, Davis (1598)516
Vê "três grandes praças onde todos os dias havia feira de todas as
espécies de mercadorias". É apenas um comentário, dirão. Mas François-
Martin, de Saint-Malo (1603), perante os mesmos espetáculos, distingue
uma grande feira das feiras comuns, atulhadas de frutas curiosas, e
descreve, nas lojas, os mercadores vindos de todas as direções do oceano
índico "todos vestidos à turca" e que ficam "uns seis meses no referido
lugar para venderem suas mercadorias' '517. Seis meses "ao cabo dos quais
vêm outras". Ou seja, uma feira contínua e renovada, preguiçosamente
espalhada no tempo sem nunca ter o aspecto de crise rápida das feiras do
Ocidente. Dampier, que chega a Atjeh em 1688, é ainda mais preciS0518:
"Os chineses são os mais consideráveis de todos os mercadores que aqui
negociam; alguns deles ficam o ano inteiro; mas os outros vêm só uma vez
por ano. Estes vêm às vezes no mês de junho, com 1O ou 12 veleiros que
trazem grande quantidade de arroz e muitos outros gêneros alimentícios...
Todos ficam em casas próximas umas das outras, numa das extremidades da
cidade, perto do mar, e chamam a esse bairro o campo dos chineses... Há
vários artesãos que vêm nessa frota, como carpinteiros, marceneiros,
pintores, e logo que chegam põem-se a trabalhar e a fazer arcas, caixas,
cofres e toda a espécie de pequenos trabalhos da China." Realiza-se
assim, durante dois meses, a "feira dos chineses", onde todos vão para
comprar ou para jogar jogos de azar. "À medida que as suas mercadorias
são vendidas, passam a ocupar menos espaço e a alugar menos casas...
Quanto mais diminui a venda, mais aumenta o jogo."
Na própria China519 é diferente. Como tudo é dirigido por um governo
burocrático, onipresente e eficaz, em princípio inimigo dos privilégios
econômicos, as grandes feiras são rigorosamente vigiadas, em comparação
com mercados relativamente livres. Surgem cedo, 'porém, num momento de
grande desenvolvimento dos tráficos e das trocas, por volta do fim dos
T'ang (século
IX). Aí também são geralmente associadas a um templo budista ou taoísta e
realizam-se por ocasião da festa de aniversário da divindade, donde o
nome genérico que têm: assembléias de templos - miao-hui. Têm um
acentuado caráter de festejos populares. Mas outras denominações são
comuns. Assim, a feira da seda nova que, no tempo dos Tsing (1644-1911),
se realiza em Nan-hsün-chen, na fronteira das províncias do Tchõ-Kiang e
do Kiang-su, é chamada hui-ch'ang ou lang-hui. Também a expressão nien-
shih equivale, literalmente, aos Jahrmãrkte alemães, mercados anuais, e
talvez designe efetivamente grandes mercados sazonais (de sal, de chá, de
cavalos, etc.) e não feiras no sentido pleno da expressão.

109

ão holandesa de um relato de viagem às Indias Orientais (1598). No


centro, um dos Ves chineses que se instalam regularmente na cidade de
Bantam durante osperíodos lade comercial- à esquerda, a javanesa que lhe
serve de esposa durante sua permaà direita, um dos chineses
comissionistas residentes que, de balança na mão, compra rdamente a
pimenta-do-reino, no interior da ilha, durante a estação morta. (Foto
ci.)
enne Balazs pensava11O que estes grandes mercados ou feiras excepcionais
im sobretudo nos momentos de divisão da China entre dinastias estranhas
outras:
como os segmentos tivessem então de se abrir obrigatoriamente outros,
brotavam feiras e grandes mercados como na Europa medieval, por razões
análogas. Mas, assim que a China forma de novo uma unidade ela recupera
sua estrutura burocrática, suas eficazes hierarquias de mercagrandes
feiras desaparecem no interior do território. Mantêm-se apenas [eiras
exteriores. Assim, no tempo dos
Song (960-1279), senhores apenas da
Sul, abriam-se --mercados mútuos" voltados para a China do Norte conpelos
bárbaros. Refeita a unidade sob os Ming (1368-1644), continuada )b os
Tsing (1644-1911), as janelas ou postigos passam a dar unicamente
-rímetro, do lado do mundo exterior. Haverá, assim, feiras de cavalos na
com a Manchúria, a partir de

1405, que se abrem ou se fecham conforme, s que afrOnteira mantém com os


"bárbaros" que a ameaçam. Por vezes, -ias portas de Pequim, organiza-se
uma feira quando ali chega uma cara[a da Moscóvia. Acontecimento
excepcional, pois as caravanas vindas do êm-se, de preferência, nas
feiras de Hancheu e de Tchengtun. Veremos wganizar-se em 1728521, ao sul
de lrkutsk, a curiosíssima e importante feika onde o mercador chinês vai
buscar as preciosas peles siberianas. Final

mente, no século XVIII, Cantão é dotada, em face do comércio dos


europeus, de duas feiras 522. Tal como os outros grandes portos marítimos
mais ou menos abertos ao comércio internacional (Ningpo, Amoy), ela passa
a ter todos os anos uma ou várias "estações" comerciais. Mas aqui não se
trata dos grandes encontros livres do Islã ou da índia. A feira continua
a ser, na China, um fenÔmeno restrito, limitado a certos comércios
especiais, sobretudo estrangeiros. Ou porque a China teme as feiras e se
protege delas ou, mais provavelmente, por não precisar delas; dadas sua
unidade administrativa e governamental, suas ativas cadeias de mercados,
vive muito bem sem elas.
Quanto ao Japão, onde a partir do século XIII se organizam regularmente
feiras locais e lojas que a seguir aumentam e se multiplicam, o sistema
de grande feira parece não ter se instalado. Todavia, depois de 1638,
quando o Japão se fecha a todo o comércio externo, com a exceção de
alguns navios holandeses e chineses, são realmente umas espécies de
feiras as que se realizam em Nagasaki toda vez que chegam navios
holandeses "autorizados" da Companhia das índias Orientais ou juncos
chineses, também eles "autorizados". Tais "feiras" são raras. Mas, a
exemplo das que se abrem em Arcangel, na Moscóvia, à chegada de navios
ingleses e holandeses, criam reequilíbrio, são de vital importância para
o Japão: é a única maneira que lhe resta, após seu "fechamento"
voluntário, de respirar o ar do mundo. E também de desempenhar seu papel,
pois sua contribuição para o exterior, suas exportações, particularmente
de prata e de cobre, feitas unicamente por esses barcos, têm incidência
nos ciclos da economia mundial:
ciclo da prata até 1665, breve ciclo do ouro de 1665 a 1668 ou 1672;
finalmente, ciclo do cobre.
A Europa em igualdade com o mundo?
Imagens são imagens. Mas numerosas, repetidas, idênticas, não poderiam
mentir todas ao mesmo tempo. Revelam, num universo diferenciado, formas e
desempenhos análogos: cidades, estradas, Estados, trocas que, apesar de
tudo, se assemelham.
Podem dizer-nos que há tantos "meios de troca quanto meios de produção".
Mas, de qualquer maneira, esses meios são em número limitado, pois
resolvem problemas elementares, os mesmos em toda a parte.
Uma primeira impressão fica, portanto, ao nosso dispor: ainda no século
XVI, as regiões povoadas do mundo, às voltas com as exigências da grande
população, parecem-nos próximas umas das outras, como que em igualdade,
ou quase. Sem dúvida, uma ligeira diferença pode ser suficiente para
emergirem e se confirmarem vantagens e, a seguir, superioridades e,
portanto, do outro lado, inferioridades, depois sujeições. Terá sido isso
que se passou entre a Europa e o resto do mundo? É difícil dizer
categoricamente sim ou não e explicar tudo em poucas palavras. Há, com
efeito, uma desigualdade "historiográfica" entre a
Europa e o resto do mundo. Tendo inventado o ofício de historiador, a
Europa valeu-se dele em seu proveito. Ei-la toda esclarecida, pronta a
testemunhar, a reivindicar. A história da nãoEuropa mal começou a ser
feita. Enquanto não for restabelecido o equilíbrio dos conhecimentos e
das interpretações, o historiador hesitará em desatar o nó górdio da
história do mundo, entenda-se, a gênese da superioridade da Europa. É
esse o

Uo de Joseph Needharn523 , historiador da China, que labuta, até no plano


amente claro da técnica e da ciência, para recolocar com exatidão sua
enor-sonagem no palco do mundo. Uma coisa me parece certa: a distância
entre ente e os outros continentes cavou-se tardiamente, e atribuí-Ia
apenas à "razação" da economia de mercado, como muitos contemporâneos
nossos aini tendência a fazer, é evidentemente simplista.
ja como for, explicar essa distância, que vai afirmar-se com os anos, é
abor)roblema essencial da história do mundo moderno. Problema que
forçosaabordaremos ao longo de toda esta obra, sem ter a pretensão de o
resolver
Jo peremptório. Pelo menos, teremos tentado apresentá-lo sob todos seus )
s, aproximar dele as nossas explicações como outrora se aproximavam as
rdas dos muros da cidade onde se queria entrar à força.
Em Roma, um vendedor ambulante de caça. (Foto Oscar Salvio.)

HIPOTESES PARA CONCLUIR


As diversas engrenagens da troca por nós apresentadas, do mercado
elementar à
Bolsa, são fáceis de reconhecer e de descrever. Mas não é tão simples
definirlhes o lugar relativo na vida econômica, considerar o conjunto de
seus testemunhos. Terão a mesma idade? Estarão, ou não, ligadas entre si?
E como?
Foram ou não instrumentos de crescimento? Claro que não há uma resposta
categórica, pois, conforme os fluxos econômicos que as animam, giram umas
mais depressa, outras mais devagar. Primeiro estas, depois aquelas,
parecem alternarse no comando, e cada século tem assim sua fisionornia
peculiar. Se não somos vítimas de uma ilusão simplificadora, essa
história diferencial elucida o sentido da evolução econômica da Europa e
talvez se apresente como um meio de interpretação comparativa do resto do
mundo.
O século XV prolonga os desastres e deficiências da segunda metade do
século
XIV. Depois, após 1450, inicia-se uma recuperação. Todavia, o Ocidente
levará anos e anos para recuperar o nível de suas proezas anteriores. A
França de S.
Luís, se não me engano, é muito diferente da França viva, embora ainda
dolorida, de Luís XI. Fora das zonas privilegiadas (uma certa Itália, o
conjunto motor dos
Países Baixos), todos os vínculos econômicos se afrouxaram; os agentes
econômicos
- indivíduos ou grupos - ficaram um pouco abandonados a si próprios e
disso se aproveitaram mais ou menos conscientemente. Nestas condições,
feiras e mercados
- mais ainda as feiras locais do que as grandes feiras - bastam para
reanimar e movimentar as trocas. A maneira pela qual as cidades, no
Ocidente, se impõem às zonas rurais deixa adivinhar a retomada de
movimento dos mercados urbanos, instrumentos que permitem, por si sós, a
sujeição regular do campo. Os preços "industriais" sobem, os preços
agrícolas baixam. Assim as cidades prevalecem.
Quanto ao século XVI, Raymond de Roover524 que todavia sempre desconfia
das explicações fáceis, pensa que ele assistiu ao apogeu das grandes
feiras. As feiras explicariam tudo. Elas se multiplicam, esbanjam saúde,
estão por toda a parte, são contadas às centenas, até aos milhares. Se
assim foi, o que também creio, o movimento progressista, no século XVI,
ter-se-ia organizado de cima, sob o impacto de uma circulação
privilegiada das espécies monetárias e do crédito, de feira em feira.
Tudo teria dependido das circulações internacionais em um nível bastante
alto - de certo modo "aéreas"525. Depois, elas desacelerariam ou se
complicariam, e a máquina começaria a falhar. Em 1575, o circuito
Antuérpia-Lyon-Medina del Campo emperra. Os genoveses, com as feiras
chamadas de Besançon, recolhem os pedaços, mas apenas por uns tempos.
No século XVII, é pela mercadoria que tudo volta a funcionar. Não atribuo
esse arranque apenas ao ativo de Amsterdam e de sua Bolsa que, no
entanto, desempenham seus papéis; atribuo-o de preferência à
multiplicação das trocas, na base, no círculo modesto das economias de
curto e muito curto alcance: a característica forte, o motor decisivo,
não seria a loja? Nessas condições, a subida dos preços (o século XVI)
teria correspondido ao reinado das superestruturas; as descidas e
estagnações do século XVII veriam a primazia das infra-estruturas.
Explicação não garantida, mas plausível.

Jas então como partiu, e a galope, o século das Luzes? O movimento,


depois W, invade todos os andares. Mas o essencial é que há ruptura, cada
vez mais L, do sistema instalado. Mais do que nunca, em face do mercado,
atua o conrcado (prefiro esta palavra ao private market que usei até
aqui); em face das es feiras, crescem os armazéns e o comércio de
entreposto: a feira tende a ao plano das trocas elementares; do mesmo
modo, em face das Bolsas, lá os bancos que, por toda a parte, irrompem
como uma floração de plantas, novas, pelo menos cada vez mais numerosas e
autônomas. Precisaríamos a palavra clara para designar o conjunto destas
rupturas, destas inovações, s crescimentos. Mas falta a palavra para
designar todas estas forças exterioe envolvem, quebram um núcleo antigo,
esses feixes de atividades paralelas,
Lcelerações visíveis no vértice com os grandes eixos da vida bancária e
bolsisatravessam a Europa e a sujeitam eficazmente, visíveis também na
base com ;ão revolucionária do mercador ambulante, para não dizer do
mascate...-nbora estas explicações tenham, como penso, certa
verossimilhança, elas nos m ao jogo obscuro, mas incessante, entre
superestruturas e infra-estruturas i econômica. O que se joga em cima
poderá ter repercussões no nível infequais? E, inversamente, o que se
passa na altura dos mercados e das trocas tares repercute em cima? E
como? Para abreviar, tomemos um exemplo. o o século XVIII atinge seu
vigésimo ano, acontecem simultaneamente o Sea,, o escândalo inglês do mar
do Sul, e o episódio contemporâneo, seguramaluco, na França, do sistema
de Law, que não durará ao todo mais que meses... Aceitemos que a
experiência da rua Quincampoix se assemelha à iange Alley; de ambos os
lados, está provado que a economia, na sua globaembora possa ser abalada
por esses fortes temporais, não é ainda controla!o alto, de uma vez por
todas, no decorrer dos anos. O capitalismo não imda a sua lei. Todavia,
segundo creio, com Jacob Van Klaveren526 se o fra.Law se explica, com
toda a evidência, pela hostilidade interesseira de uma i alta nobreza, se
explica igualmente pela própria economia francesa, incaicertar o passo,
de acompanhar um ritmo infernal. A Inglaterra, economi- falando, sai-se
melhor do que a França de seu escândalo. Lá, o escândalo Kará essa
repulsa pelo papel-moeda e pelo banco que a França conhecerá, a fio. Não
será essa a prova de certa maturidade sócio-política e econômiiglaterra,
já demasiado envolvida com as formas modernas da finança e ão para poder
voltar atrás?
iodelo, esboçado nas linhas precedentes, vale apenas para o Ocidente.
Mas, delineado, não permitirá ele uma melhor leitura na escala do mundo?
As acterísticas essenciais do desenvolvimento ocidental são a instauração
de gens superiores e, depois, no século XVIII, uma multiplicação das vias
e )s. O que acontece, deste ponto de vista, fora da Europa? O caso mais
aber) da China, onde a administração imperial bloqueou toda as
hierarquiza, conomia. Só funcionam eficazmente, no andar térreo, as lojas
e as feiras e das cidades. Os casos mais próximos da Europa são os do
Islã e do Jalaro que teremos de voltar a esta história comparada do
mundo, a única ria resolver ou, pelo menos, formular corretamente nossos
problemas.

Capítulo 2
A ECONOMIA
EM FACE DOS MERCADOS
Permanecendo no âmbito da troca, este segundo capítulo tenta apresentar
alguns modelos e algumas regras tendenciais1. Passamos assim adiante das
imagens pontuais do primeiro capítulo, em que a feira do burgo, a loja, a
grande feira, a Bolsa foram apresentadas como uma série de pontos. O
problema consiste em mostrar como se unem estes pontos, como se
constituem as linhas de troca, como o mercador organiza essas ligações e
como essas ligações, embora deixem de lado muitos vazios à margem dos
tráficos, criam superfícies mercantis coerentes. O nosso vocabulário
imperfeito designa essas superfícies pelo nome de mercado, forçosamente
ambíguo por natureza. Mas o uso dita as regras.
Colocar-nos-emos sucessivamente em duas perspectivas diferentes:
primeiro, ao lado do mercador, imaginaremos o que possa ser sua ação, sua
tática costumeira;
depois, afastando-nos dele, amplamente independentes das vontades
individuais, consideraremos os espaços mercantis em si mesmos, os
mercados em sentido lato.
Sejam eles urbanos, regionais, nacionais ou até internacionais, sua
realidade impõe-se ao mercador, envolve-lhe a ação, favorece-a ou
constrange-a. Além disso, eles se transformam ao longo dos séculos. E
essa geografia, essa economia variáveis dos mercados (que examinaremos
mais atentamente no terceiro volume)
remodelam e reorientam incessantemente a ação particular do mercador.

, cador Georg Gisze. Pormenor de um quadro de Hans Holbein. iatliche


Museen
Preussischer Kulturbesitz, Berlim.)

MERCADORES E CIRCUITOS MERCANTIS


A perspectiva, a ação do mercador nos são familiares: seus papéis estão à
nossa disposição 2. Nada mais simples do que nos colocarmos no seu lugar,
ler as cartas que escreve ou recebe, examinar-lhe as contas, seguir o fio
de seus negócios. Mas, aqui, procuraremos antes compreender as regras a
que seu ofício o cerceia, as quais conhece por experiência, mas com as
quais, conhecendo-as, não se preocupa muito no dia-a-dia. Temos de
sistematizar.
Idas e voltas
Sendo a troca reciprocidade, a cada trajeto de A a B corresponde uma
certa volta, tão complicada e sinuosa quanto se queira, de B a A. A troca
se fecha então sobre si própria. Há circuito. Os circuitos mercantis são
iguais aos circuitos elétricos: só funcionam fechados. Um mercador de
Reims, contemporâneo de Luís XIV, observou numa frase muito boa: "A venda
paga a compra., 13

Evidentemente pensava que, já que a pagava, devia pagá-la com lucro.


Se A for Veneza, B Alexandria no Egito (já que temos de exemplificar,
tomemos exemplos brilhantes), a um tráfico de A para B tem de seguir-se
uma volta de B para A. Se nosso exemplo imagindrio incluir um mercador
residente em Veneza, por volta de 1500, pensaremos que ele pode ter em
mãos, inicialmente, groppi de moedas de prata, espelhos, contas de vidro,
tecidos de lã... Essas mercadorias, compradas em Veneza, serão expedidas
a Alexandria onde serão vendidas; em troca, serão provavelmente comprados
no Egito colli de pimenta-do-reino, de especiarias ou de drogas,
destinados a vir a Veneza e aí serem vendidos, quase sempre no
Fontego dei Todeschi (para empregarmos uma expressão veneziana e não a
italiana
- Fondaco dei Tedeschi).
Se tudo corre conforme os desejos de nosso mercador, as quatro operações
de compra e de venda se sucedem sem muita demora. Sem muita demora: todos
sabiam, muito antes de a reflexão se tornar proverbial na Inglaterra, que
tempo é dinheiro. Não deixar "li danari mortti"4 o dinheiro morto; vender
depressa, mesmo mais barato, para "venierpresto sul danaro per un altro
viaggio"5 tais são as ordens que dá a seus agentes um grande mercador de
Veneza, Michiel da Lezze, nos primeiros anos do século XVI. Portanto, sem
contratempos no prazo, as mercadorias, mal foram compradas em Veneza,
foram logo embarcadas; o barco partiu no dia previsto, o que, na prática,
é raro; em Alexandria, a mercadoria encontrou logo comprador, os artigos
desejados para a volta estavam disponíveis;
estes, desembarcados em Veneza, são vendidos sem dificuldades.
Evidentemente, estas condições ótimas de fechamento do circuito por nós
imaginadas não são a regra. Ora os tecidos ficam meses em Alexandria, no
armazém de um parente ou de um comissionista: a cor não agradou, ou a
qualidade foi considerada detestável;
ora as caravanas de especiarias não chegaram a tempo; ou então, na volta,
o mercado veneziano estava saturado de produtos do Levante e os preços,
por esse motivo, anormalmente baixos.

ito isto, o que nos interessa agora é:


que, nesse circuito fechado, se sucedem quatro momentos entre os quais
de, aliás, todo processo mercantil quando há ida e volta;
que houve forçosamente, conforme nos colocarmos em A ou em B, fases ites
do processo; no total, duas ofertas e duas procuras, em A e em B: uma a
de mercadorias em Veneza, na partida; uma oferta em Alexandria, para a
mais uma procura para a compra seguinte e uma oferta em Veneza para u- a
operação;
que a operação é concluída e avaliada pelo circuito completo. A sorte do
lor fica condicionada a essa conclusão. É sua preocupação de cada dia: a
ão de verdade está no fim da viagem. Lucros, custos, despesas, perdas
que, o e ao longo da operação, foram registrados todos os dias, nesta ou
naquela serão convertidos numa mesma unidade monetária - libras, soldos e
dide Veneza, por exemplo. Então o mercador poderá fazer o balanço do
deve, ver, saber quanto lhe rendeu a ida e volta que acaba de se
concluir. E pode, er que tenha havido, como sói acontecer, lucro apenas
com a volta. É o ássico do comércio com a China no Século XV1116.
, do simples, muito simples. Mas nada nos impede de complicar o
esquema. )cesso mercantil não tem forçosamente duas ramificações, ida e
volta. O cochamado triangular é clássico em todo o Atlântico, nos séculos
XVII e XVIII: mplo,
Liverpool, a costa da Guiné, a Jamaica e volta a Liverpool; por
exemrdeaux, costa do Senegal, Martinica, Bordeaux; por exemplo, a viagem
aberrescrita ao capitão La Roche Courvet pelos proprietários do navio
Saintm 1743: ir à Acádia carregar bacalhau, vendê-lo em Guadalupe e aí
embar.-ar, regressar ao Havre7. Os venezianos faziam o mesmo já antes do
sécucom as comodidades das galere da mercato que a Signoria equipava
regue. Assim, em 1505, o patrício Michiel da
Lezze8 dá a Sebastiano Dolfin (que ará nas galeras da "viagem da
Barbária")
instruções pormenorizadas: para ira etapa, Veneza-Túnis, levará dinheiro,
mocenighi de prata; em Túnis, será trocada por ouro em pó; em Valência,
este será fundido e cunhado da moeda da cidade ou trocado por lã ou
trazido para
Veneza, conforme itura. Outra combinação do mesmo mercador: revender em
Londres o cravoi comprado em Alexandria, revender no Levante as fazendas
de lã trazidas
Ires. É também um comércio tripartido o efetuado, no século XVII, por o
inglês que saiu do Tâmisa com um carregamento de chumbo, de cobre,
salgado que leva a
Livorno; embarca na escala o dinheiro que lhe permitievante, em Zante,
Chipre ou
Trípoli na Síria, carregar uva passa, algodão, especiarias (se ainda as
houver)
ou' fardos de seda, ou até vinho de a'. Podemos mesmo imaginar uma viagem
de quatro etapas ou mais. Os -iarselheses, de regresso do Levante, faziam
às vezes as escalas da Itália uma )utra10.
século XVII, o "cornércio de entreposto" praticado pelos holandeses tem,
'íPio, vários ramos, e seu comércio interno na índia foi com toda a
evidêntruído segundo o mesmo modelo. Por isso a Companhia holandesa" só
trabalho de conservar
Timor, na Insulíndia, por causa da madeira de sânlá extrai para
transformá-la em moeda de troca na China, onde é muito a; traz muitas
mercadorias para a índia, para Surate, que troca por sedas,

A economia em face dos mercados tecidos de algodão e sobretudo moedas de


prata, indispensáveis a seu comércio em
Bengala; no Coromandel, onde compra muitos tecidos, sua moeda de troca
são as especiarias das Molucas e o cobre do Japão, de que tem a
exclusividade; no Sião, muito povoado, vende grandes quantidades de
tecidos de Coromandel, quase sem lucro, mas é porque lá encontra peles de
veado procuradas pelo Japão e o estanho de Ligor de que é, por
privilégio, o único comprador e que revende na índia e na
Europa "com bastante lucro--. E assim por diante. No século XVIII, para
arranjarem na Itália "as piastras e cequins [necessários ao] seu comércio
do
Levante", os holandeses12 levam a Gênova ou a Livorno mercadorias da
índia, da
China, da Rússia, da Silésia, indiferentemente, ou café da Martinica e
tecidos do Languedoc que carregam em Marselha. Estes exemplos dão uma
idéia do que pode abarcar o esquema simplificador das "idas e voltas".
Circuitos e letras de câmbio
O circuito fechado, que raramente é simples, nem sempre pode ser feito
com mercadoria contra mercadoria, nem sequer mercadoria contra espécies
metálicas.
Donde o emprego obrigatório e regular das letras de câmbio. Instrumento
de compensação, elas se tornaram, além disso, na Cristandade, onde o juro
do dinheiro é proibido pela Igreja, a forma mais freqüente do crédito.
Assim, crédito e compensação estão estreitamente ligados. Para
compreender bem, bastam pequenos exemplos, muitas vezes aberrantes, pois
os nossos documentos assinalam mais freqüentemente ainda o anormal do que
o comum, o fracasso do que o êxito.
No primeiro volume desta obra13 contei com alguns pormenores, a propósito
do crédito, como Simón Ruiz, mercador em Medina del Campo, se arranjou,
no fim da vida, após 1590, para ganhar dinheiro sem risco e sem grande
custo, praticando uma "usura mercantil", aliás inteiramente lícita. A
velha raposa compra, na praça de sua cidade, letras de câmbio sacadas por
produtores de lã espanhola que despacham para a Itália seus tosões e não
querem esperar, para receber o dinheiro, os prazos do transporte e dos
pagamentos normais. Têm pressa de receber o que lhes é devido. Simón Ruiz
adianta-lhes o dinheiro, contra uma letra de câmbio, em geral sacada
sobre o comprador da lã, pagável três meses mais tarde. Comprou, se
possível, o papel abaixo do valor nominal e enviou-o ao amigo, comissário
e compatriota, Baltasar Suárez, que mora em Florença. Este recebe o
dinheiro do sacado, utiliza-o para comprar nova letra de câmbio, esta
sobre Medina del Campo, que Simón Ruiz receberá três meses mais tarde.
Essa operação, que durou seis meses, representa o fecho, nas mãos de
Simón Ruiz, da transação entre os produtores de lã e seus clientes
florentinos. Porque os interessados não quiseram, ou não puderam,
recorrer à ida e volta mercantil normal, é que Simóri Ruiz pôde executar
a operação para eles, contra um juro líquido de 5% por um crédito de seis
meses.
Todavia, há sempre a possibilidade de fracasso. Numa praça, papel e
numerário jogam um com o outro para fixar a cotação da letra de câmbio a
um preço mais ou menos elevado em dinheiro vivo. Se o numerário é
abundante, o papel se valoriza, e vice-versa. A operação da volta direta
com lucro regular da segunda letra é por vezes difícil, até impossível,
quando a letra de câmbio, em Florença, está com preço muito alto. Então
Baltasar Suárez é obrigado a sacar sobre si próprio (isto

119

4-f4- Z'1 -, . ' 2 go pp f a lf > y Cnt (. Wf zn - , ;op


- 074 7 -, 1 f_ 9 e-'nIf;a"r 1

Y herdeiros de Lodovico Benedito Bonsbisi et Cie., Lyon, 23 de março de


1575, a de Ia Pressa e herdeiros de Victor Ruys, de Medina del Campo
(recebida em 13

Refere-se à liquidação de letras de câmbio (cujos valores figuram nas


adições emOágina). No fim da carta, antes da assinatura, as cotações dos
câmbios nas diferen5. (Arquivo Simón Ruiz, Valladolid.)

A economia em jace aos mercuaus é, sobre a conta que Simón Ruiz tem
aberta em seu nome) ou a --reformá-lasobre Antuérpia ou Besançon: o papel
fará assim uma viagem triangular, três meses mais longa. Ainda vá! Mas
Simón Ruiz fica possesso quando, terminada a operação, percebe que não
ganhou os juros com que contara. Quer jogar, mas com segurança. Como
escreve em 1584, prefere "guardar el dinero en caxa que arisgar en
cambios y perder del principal, o no ganar nada"", ficar com o dinheiro
em caixa em vez de arriscar-se nos câmbios a perder capital ou a não
ganhar nada.
Mas, se Simón Ruiz se considera lesado, para os outros parceiros o
circuito fechou-se naturalmente.
Fechamento impossível, negócio impossivel
Se, em determinadas circunstâncias, um circuito mercantil não consegue
fecharse, seja pelo que for, está evidentemente condenado a desaparecer.
Geralmente, não bastam para isso as guerras freqüentes, embora por vezes
o consigam. Tomemos um exemplo.
A esmaltina, produto tintorial de origem mineral à base de cobalto
(sempre misturado, sobretudo se for de má qualidade, com uma areia com
pontos brilhantes), serve, nas fábricas de porcelana e de faiança, para
fazer as decorações azuis; serve também para o branqueamento de tecidos.
Um mercador de
Caen (12 de maio de

1784) queixa-se ao atacadista da última encomenda: "Acho esta esmaltina


menos escura do que de costume e muito mais cheia de areia reluzente." 15
A correspondência de um fornecedor de esmaltina, a casa Irmãos Bensa de
Frankfürtam-Main, com um revendedor de Rouen, que trabalha por comissão,
Dugard Filho, apresenta, em trinta anos, transações a tal ponto monótonas
que as cartas conservadas se repetem, palavra por palavra, ano após ano.
Só diferem, além da data, os nomes dos capitães dos navios que,
normalmente em Amsterdam, por vezes em Rotterdam, excepcionalmente em
Bremen, carregam os barris de esmaltina que a própria firma Bensa produz
e expede a Dugard Filho. São raros os contratempos:
um navio que se atrasa, outro (mas é uma exceção) que encalha no "rio",
perto de
Rouen16 um concorrente que surge. Regularmente, os barris vão-se
amontoando nos armazéns de Dugard Filho que, de um modo regular, os
revende em Dieppe, em
Elbeuf, em Bernay, em Louviers, em Bolbec, em Fontainebleau, em Caen.
Vende sempre a crédito e recupera através de letras, de remessas ou
envios de dinheiro o montante das suas faturas.
Entre Irmãos Bensa e nosso atacadista, o retorno poderia ser feito em
mercadorias, uma vez que Dugard negocia com tudo - tecidos, goma do
Senegal, garança, livros, vinhos de Borgonha (em pipas ou em garrafas),
foices, barbatanas de baleia, índigo, algodão de Esmirna... Ora, o
retorno é feito em dinheiro, mediante letras e duplicatas, segundo um
processo imposto pelo fornecedor alemão. Um exemplo valerá por cem
outros. Em 31 de outubro de 177517, de Frankfürt, Rémy Bensa faz a conta
das mercadorias que expediu para Rouen:
"Avaliei-as com a dedução habitual de 1507o de custos finais18 em L.
[libras]

4.470, 1O s [soldos], dos quais tomo a liberdade de sacar, sobre vós, 2/3
na data de hoje, L. 2.98O a 3 usanças, pagável em Paris à minha ordem."
As usanças são os prazos de pagamento, sendo cada uma provavelmente de
duas semanas. Dugard
Filho pagará portanto, na data do vencimento, 2.98O libras a um banqueiro
de
Paris, sempre o mesmo, que remeterá o dinheiro para Frankfürt. O circuito
iniciado com esse primeiro pa121

to completa-se no fim do ano; as contas são então encerradas e o saldo


aceritre comerciantes honestos: um, Dugard, que se adivinha cortês, de
born huenevolente, e os correspondentes de Frankfürt, com propensão para
serem mos e darem conselhos. Esse acerto final depende, em suma, da
ligação por [e câmbio entre
Paris e Frankfürt-am-Main. Se rompesse essa ligação, adeus ilidade das
operações! Ora, foi justamente o que aconteceu com o princípio, olução
francesa.
n março de 1793, já não restam ilusões a Bensa: é proibido todo o
comércio anda para a França, e os mercadores de Frankfürt já nem sequer
sabem ao ual é sua posição nesse estado de beligerância que pouco a pouco
invade pa. Escreve a
Dugard Filho: "Ignoro, caro senhor, se consideram os habilaqui inimigos,
embora não o sejamos, mas, se assim fosse, ficaria muito :ido, pois os
negócios entre nós terminariam de repente." 19 com efeito, eles irão, e
bem depressa, porque "o papel sobre Paris baixa continuamente ene é de
presumir que baixará ainda notavelmente", diz uma das últimas carquer
dizer que a linha dos retornos está irremediavelmente comprometida.
olidez do circuito financeiro é evidentemente primordial para as letras,
que i solução cotidiana dos retornos. Esta solidez depende tanto do
crédito pescorrespondentes quanto da possibilidade de ligações eficazes.
Nenhum mer3tá ao abrigo de surpresas, mas, no caso, viver em Amsterdam é
melhor viver em
Saint-Malo, por exemplo.

1747, Picot de Saint-Bucq, grande mercador desta última praça, que


inInheiro no carregamento do navio Le Lis, enviado ao Peru, deseja
recupee lhe cabe dos retornos do navio que regressou à Espanha. Escreve
portanint-Malo, em 3 de julho, à firma Jolif & Cia., de Cádiz: "...
quando estim condições de me fazer a remessa, que seja, por favor, em
letras de toda a e sobretudo recomendo-vos não aceitar nenhuma da
Companhia das ínFrança nem de agentes seus, sejam eles quem forem, e por
nenhuma ra!ja ela qual for.112' Não nos surpreende encontrar em
Cádiz agentes da hia francesa das índias: como as outras companhias, ela
vai carregar ali Iras" de prata (as antigas moedas de oito)
indispensáveis ao seu comércio xtremo-Oriente. Se um comerciante francês
lhe oferecer piastras, ela não em entregar-lhe imediatamente em troca uma
letra de câmbio compensável. Por que Picot de Saint-13ucq se recusa a
isso? Talvez por ter contas com inhia e não desejar misturar vários
negócios? Talvez porque os habitantes Malo e a Companhia das índias se
entendam como cão e gato? Ou então Companhia tem maus hábitos no que se
refere a pagamentos. Pouco imcerto é que Picot de Saint-13ucq dependente
da escolha do seu correspon)r uma primeira razão, e de monta, que ele
próprio recorda em outra carit-Malo, que como sabeis não é uma pr4ça de
câmbio.' '21

Indicação prea quem conhece a predileção que os seus habitantes sempre


tiveram pelo sonante, em suas operações comerciais.

Para uma firma, sempre é interessante ter ligações próprias que a


relacionem diretamente com as grandes praças cambiais. É o que conseguem
os irmãos Pellet, de Bordeaux, quando Pierre Pellet se casa, em 1728, com
Jeanne de Nairac, cujo irmão, Guillaume, em breve será seu correspondente
em Amsterdam, então a praça comercial por excelência22. Em Amsterdam as
mercadorias têm muita saída e é fácil remeter dinheiro vivo para lá, onde
encontra melhores aplicações do que em outros lugares; fazem-se ali
empréstimos pelas taxas mais baixas de toda a
Europa. A partir desta praça eficaz, ligada a todas as outras, pode-se
pedir auxílio aos outros nos casos complicados, fazer favores a si mesmo,
fazê-los aos outros, até a ricos mercadores holandeses.
Como causas iguais produzem efeitos iguais, a Sociedade Marc Fraissinet,
de
Sète, tinha em 1778 uma sucursal, Fraissinet Filho, em Amsterdam. Assim é
que, quando o navio holandês Jacobus Catharina, armado por Cornelis van
Castricum de
Amsterdam, chega a Sète em novembro de 1778, seu capitão, S. Gerkel, foi
recomendado à firma Fraissinet local23. Transporta 644 "cestos" de tabaco
destinados à Fazenda pública e esta paga imediatamente o frete que se
eleva a

16.353 libras. O favor solicitado pelo armador holandês é simples: que o


dinheiro da operação lhe chegue em "remessas rápidas". Mas quer a
desgraça que:

1) o capitão Gerkel confie o "mandado" da Fazenda à casa Fraissinet, que


o põe em caixa imediatamente; 2) a firma Fraissinet Filho de Amsterdam
abra falência no fim do ano de 1778, arrastando em sua derrocada a
Sociedade Marc Fraissinet de Sète. O pobre capitão Gerkel, imediatamente
envolvido em processos judiciais, ganha, depois perde pela metade.
Defronta com a evidente má-fé de Marc
Fraissinet e também com as exigências dos credores do falido. Todos se
aliam contra o credor estrangeiro, metido nesse vespeiro. Finalmente, o
retorno será feito, mais tarde e em condições catastróficas.
Quando se trata de comércio a longa distância, nas Ilhas ou no oceano
índico
- o mais frutuoso dos negócios da época -, os retornos muitas vezes criam
problemas. Às vezes é preciso improvisar e arriscar.
com intenções evidentemente especulativas, Louis Greffulhe instalara o
irmão na ilha de Saint-Eustache, uma das Pequenas Antilhas sob soberania
holandesa. A operação foi proveitosa em mais de um aspecto mas,
arriscada, termina em catástrofe. com efeito, a partir de abril de 1776,
com a guerra da Inglaterra contra suas colônias, a vida internacional se
anuvia, as ligações com a América tornam-se difíceis, suspeitas. Então,
como repatriar os fundos? O Greffulhe das
Ilhas, em desespero de causa, manda seu sócio Moulin (cunhado de Louis)
passar para a Martinica "para ter duplicatas", naturalmente sobre a
França, ainda em paz com a Inglaterra, e, de lá, sobre Amsterdam.
Absurdo, esbraveja o irmão mais velho de Ams1 ;1 4-, 7

Nota promissória do bordelês Jean Pellet (1719). (Arquivos departamentais


da
Gironda.)

123

?ue vai acontecer? Ou ele não arranjará boas e então haverá mais uma i,
se aceitar título sobre Bordeaux ou Paris, ainda que seja do mais sólite
da
Martinica, quase sempre protestado na Europa e sabe Deus onde recuperar o
dinheiro. Deus queira que isso nao aconteça se ele nos fizer )licata de
já., 24

Éum admirável instrumento, por certo, a letra de câmaldar contas-, como


diz a expressão corrente. Mas é preciso que o inssteja à mão e seja de
boa qualidade, eficaz.
tubro de 172925 Mahé de Ia Bourdormais, que então trocara a carreira.ro a
serviço da Companhia das Indias pela de mercador aventureiro, está eri.
Planeja criar ali uma nova sociedade com amigos de Saim-Malo que litaram.
Estes forneceriam fundos e mercadorias para serem empregados interno da
índia, quer em
Moka, quer em Batávia, quer em Manila, quer 'hina. Para o repatriamento
dos lucros e dos capitais investidos, não falta a Mahé. Haveria a solução
tranqüila das letras sobre a Companhia das mão retornos em mercadorias (a
um de seus comanditários que quer o nediato dos seus fundos, ele acaba de
enviar 70O camisas de tecido indiaio corre nenhum risco de confisco",
explica ele. Sabe-se que não é esse tecidos pintados" proibidos na França
na época); ou então se confiaria capitão de navio condescendente que
estivesse de volta à França (forma r o frete, cerca de 2, 5% de economia,
e de ganhar um lucro suplementar n contrapartida, Mahé não sente grande
entusiasmo pelos retornos em ue são os preferidos de muitos ingleses e
europeus das índias, pois )s francamente que não sou bastante conhecedor
para confiar em mim... bastante tolo para confiar cegamente nas pessoas
do ramo". Se não va sociedade, Mahé levará pessoalmente de volta à França
os fundos e as que tiver em mãos. Mas de preferência a bordo de um navio
portuo fazer escala no Brasil onde são lucrativas as vendas de certos
produtos ;so nos indica, de passagem, que Mahé de Ia Bourdormais conhece
pesconiventes na costa do Brasil onde já esteve. O mundo, para os grandes
rio ele, está para se tornar uma aldeia onde todos se conhecem.
i Manuel de commerce des Indes orientales et de la Chine, do capitão ird,
editado em 1806 em Paris, assinala o lucrativo jogo praticado an[os
mercadores franceses instalados na ilha de França (hoje ilha Maus vezes,
o que os enriqueceu foram os serviços, seguramente não de, que prestavam
aos ingleses instalados nas índias e desejosos de repanente para seu país
as fortunas adquiridas mais ou menos licitamente. idores davam aos
ingleses "suas letras sobre Paris a seis meses de visde 9 francos o
pagode com estrela, o que lhes fixava a rupia a 2 franta centavos"26 (OS
francos e centavos indicam que
Blancard, que es)o de Napoleão, transcreve para moeda moderna as
operações do séite). Essas letras, claro, não eram sacadas sobre o nada,
mas dos lurcio francês das índias, regularmente repatriados para as mãos
dos Lrisienses aqueles que, em seguida, honravam as letras cedidas aos
que este circuito financeiro se fechasse em benefício dos mercadores
inça, era pois necessário que os ingleses não pudessem servir-se do ;tema
de repatriamento de fundos, que o comércio dos tecidos estamias,
praticado pelos mercadores franceses, estivesse bem implantado s vezes -
no plano comercial e no cambial -, a transformação de is lhes fosse
favorável. Podemos estar certos de que zelavam por isso.

A colaboração rnercantil
Assim, as trocas traçam no mundo a sua malha quadriculada. Em cada
intersecção, em cada escala, podemos imaginar, estabelecido ou de
passagem, um mercador. E o papel deste é determinado por sua posição:
--Diz-me onde estás, dir-teei quem és.-- Se os acasos do nascimento, da
herança ou qualquer outro avatar o fixaram em Judenburg, na Alta-Estíria
(como é o caso de Clemens KõrbIer, mercador ativo de 1526 a 1548), então
tem de negociar com ferro da Estíria ou com aço de Leoben e freqüentar as
feiras de LinZ27. Se é negociante e ainda por cima em Marselha, terá de
escolher entre as três ou quatro possibilidades correntes da praça
- uma escolha quase sempre ditada pela conjuntura. Será apenas por
sensatez que o mercador atacadista, antes do século XIX, está sempre
envolvido em diversas atividades ao mesmo tempo (para não pôr, como se
dizia antigamente, "todos os ovos no mesmo cesto")? Ou terá necessidade
de utilizar plenamente as diversas correntes (que não inventou) no
preciso momento em que as tem ao alcance? Uma só não lhe basta para viver
no nível pretendido. Esta "polivalência" viria portanto de fora, dos
volumes insuficientes das trocas. Em todo o caso, o negociante que, numa
encruzilhada freqüentada, tem acesso à grande circulação mercantil é
constantemente menos especializado do que o varejista.
Toda rede comercial liga uns aos outros certo número de indivíduos, de
agentes, pertencentes ou não à mesma firma, situados em vários pontos de
um circuito ou de um feixe de circuitos. O comércio vive desses
revezamentos, dessas cooperações e ligações que se multiplicam como que
por si sós com o crescente sucesso do interessado.
Um bom, um excelente exemplo é-nos dado pela carreira de Jean Pellet
(16941764), nascido em Rouergue, negociante em Bordeaux depois de um
princípio difícil como simples mercador varejista na Martinica onde, como
lhe recordava o seu irmão quando ficaram ricos, se alimentara "de farinha
de mandioca mofada e de vinho azedo, com carne fermentada', 28. Em
171829, regressa a Bordeaux e associa-se ao irmão Pierre, dois anos mais
velho, o qual se estabelece na
Martinica. Trata-se de uma sociedade com capital muito modesto,
consagrada exclusivamente ao comércio entre a ilha e Bordeaux. Cada um
dos dois irmãos segura uma ponta da corda e estão bem no momento em que
rebenta a enorme crise do sistema de Law. Escreve o exilado nas ilhas:
"Vós me assinalastes que somos muito felizes por termos agüentado este
ano sem perdas; todos os negociantes estão trabalhando apenas com base no
crédito que têm" (8 de julho de 1721)30. Um mês mais tarde, em 9 de
agoSto30: "Considero [é sempre Pierre quem escreve] com o mesmo espanto
que vós a desolação da França e os riscos que há de perder rapidamente os
bens; felizmente encontramo-nos em situação de podermos nos safar melhor
do que outros, graças à saída que temos nesse país [a Martinica]. Deveis
empenhar-vos em não guardar nem dinheiro nem títulos" - em suma, jogar
exclusivamente com a mercadoria. Os irmãos permanecem sócios até 1730;
depois, mantêm relações de negócios. Ambos alcançaram a notoriedade com
os enormes lucros que reuniram e que escondem com maior ou menor
habilidade. Depois de

1730, seguimos apenas os negócios do mais ousado dos dois, Jean, que, a
partir de 1733, está suficientemente rico, apoiado em numerosos
comissionistas e nos "capitães gerentes" dos

grojeto para a Place ROyale, por J. Gabriel (1733). (Arquivos


departamentais, )
Embaixo, a atual Praça da Bolsa. O canto direito do prédio foi adjudicado
't em

1743, ao lado do local adquirido pelo banqueiro Pierre Policard. (Cliché

navios que possui, para já não precisar de um sócio na forma da lei. A


quantidade de suas relações de negócios e de seus negócios é simplesmente
espantosa: ei-lo armador, negociante, financista em certas ocasiões,
proprietário fundiário, produtor e mercador de vinhos, possuidor de
rendimentos;
ei-lo ligado à Martinica, a São Domingos, a Caracas, a Cádiz, à Biscaia,
a
Bayonne, a Toulouse, a Marselha, a Nantes, a Rouen, a Dieppe, a Londres,
a
Amsterdam, a Middelburgo, a Hamburgo, à Irlanda (para comprar carne
bovina salgada), à Bretanha (para comprar tecido) e não digo tudo... E
naturalmente aos banqueiros de Paris, de Genebra, de Rouen.
Note-se que essa fortuna dupla (porque Pierre Pellet também enriqueceu
milhões, se bem que, mais tímido e prudente do que o irmão mais novo, se
tenha limitado ao ofício de armador e ao comércio colonial) se constituiu
a partir de uma associação familiar. E Guillaume Nayrac, irmão da jovem
com quem Pierre se casa em 1728, foi o correspondente dos dois irmãos na
praça de AmsterdaM31. COMO o ofício de mercador não pode dispensar uma
rede de comparsas e sócios de confiança, a família oferece efetivamente a
solução mais procurada e mais natural. É isso que valoriza de modo
decisivo a história das famílias de mercadores, do mesmo modo que a
história das genealogias dos príncipes na investigação das oscilações da
política. As obras de Louis Dermigny, de Herbert
Lüthy, de Hermann Kellenbenz demonstram-no bem. Ou o livro de Romuald
Szramkiewicz, que estuda, sob o Consulado e o Império, a lista dos
dirigentes do
Banco da França32. Mais apaixonante ainda seria a pré-história desse
Banco, das famílias que o fundaram e parecem ter estado ligadas, todas ou
quase todas, à prata e à América espanhola.
A solução familiar não é, evidentemente, a única. No século XVI, os
Fugger recorrem a feitores, simples empregados a seu serviço. É a solução
autoritária.
Os AffaitadiII, originários de Cremona, preferiram as sucursais,
associadas, por vezes, a firmas locais. Antes deles, os Médicis tinham
criado um sistema de filiais 34 havendo a possibilidade de torná-las
independentes por um simples jogo de escritas se a conjuntura assim
aconselhasse - maneira de evitar, por exemplo, que uma falência local
afetasse o conjunto da firma. com o fim do século XVI tende a
generalizar-se a comissão, sistema maleável, menos dispendioso e mais
expedito. Todos os mercadores - tanto na Itália como em
Amsterdam - dão comissão a outros mercadores que lhes pagam na mesma
moeda. Das operações alheias que assumem retiram uma pequena porcentagem
e, no caso inverso, concedem a mesma retirada de suas contas. Não se
trata, evidentemente, de sociedades, mas de serviços recíprocos. Outra
prática que se generaliza é a forma bastarda de sociedade que é a
participação, a qual associa os interessados, mas apenas para uma
operação, com a possibilidade de renovação do compromisso na ação
seguinte. Voltaremos a este ponto.
Seja qual for a forma do entendimento e da colaboração mercantis, ela
exige fidelidade, confiança pessoal, exatidão, respeito pelas ordens
dadas. Uma espécie de moral comercial muito rigorosa. Hebenstreit &
Filhos, negociantes de
Amsterdam, concluíram um contrato de participação meio a meio com Dugard
Filho, em Rouen. Em 6 de janeiro de 176635, escrevem-lhe uma carta das
mais duras por terem vendido "a péssimo preço", "sem nenhuma necessidade
e mesmo contra nossa ordem expressa", a goma do Senegal que lhes tinham
enviado. A conclusão é clara:
"Exigimos de vós a reposição da nossa metade36 ao mesmo preço por que

w jace uas rri(f, (, uuu,, stes tão inoporturiamente.-- É essa pelo menos
a solução --amigável" que n "para não termos de escrever a terceiros a
este respeito". Prova de que, gócio como esse, a solidariedade mercantil,
mesmo em Roucri, jogaria a o negociante de
Amsterdam.
- confiança, ser obedecido. Simóri Ruiz, em 1564, dispõe em Sevilha de um
Gerônimo de Valladolid, certamente bem mais jovem do que ele, como ele o
castelhano 37. Bruscamente, com ou sem razão, Simón Ruiz zanga-se, acu,
em de qualquer falta ou malversação. Um segundo agente, o que informa :),
feliz com a oportunidade, não ajeita as coisas, pelo contrário. Gerônimo
-ece sem delongas, pois tem a polícia de Sevilha em seu encalço. Mas é
para cer mais tarde, em
Mediria del Campo, a lançar-se aos pés do patrão, obterxdão. O acaso de
uma leitura fez-me encontrar, entre documentos de 1570, de Gerônimo de
Valladolid.
Tornara-se então, seis anos após o incidente ), um dos mercadores
especializados em tecidos finos e rústicos de Sevilha, unfado? Este
pequeno evento, embora mal clucidado em seus pormenores, mita luz sobre a
questão primordial da confiança que um mercador exige, direito de exigir,
do seu agente, ou do seu sócio, ou do seu empregado. E i sobre as
relações entre patrão e empregado, superior e inferior, que têm "feudal".
Ainda no princípio do século XVIII, um empregado francês fala ), o", da
"dominação" de patrões dos quais se alega de ter recentemente es38
- recer confiança, aconteça o que acontecer, era, aliás, a única maneira
de angeiro penetrar no mundo desconcertante de Sevilha por pessoas
interposnica maneira de, um pouco mais tarde, em Cádiz, outra cidade
igualmente :ertante e pelas mesmas razões, participar dos tráficos
decisivos com as Amém princípio reservados a espanhóis. Sevilha e Cádiz,
cabeças-de-ponte para -ica, são cidades à parte, cidades da fraude, da
trapaça, do perpétuo escáris leis e pelas autoridades locais, autoridades
ainda por cima cúmplices. Mas, Ée dessa corrupção, há entre mercadores
uma espécie de "lei dos marginais", i existente entre os delinqüentes e
os aguazis do arrabalde de Triana ou do le San Lúcar de
Barrameda, dois pontos de encontro do submundo espa>ois, se o seu homem
de confiança o traísse, a você, mercador estrangeiro im dizer sempre em
situação irregular, o rigor das leis recairia apenas sobre sem piedade.
Ora, é raríssimo o caso. Os holandeses (já no fim do século usam corrente
e impunemente testasde-ferro para colocarem suas cargas ) das frotas
espanholas e trazer a contrapartida da América. Em Cádiz, toahecem os
metedores (passadores, contrabandistas), muitas vezes fidalgos idos que
são especialistas da passagem fraudulenta das barras de metal fino
mercadorias preciosas de além-mar, até do simples tabaco, e que não fazem
) de seu ofício. Ousados, perdulários quando podem, apontados a dedo pela
-iedade, participam por inteiro de um sistema de solidariedades que
constirópria armadura da grande cidade mercantil. Mais importantes ainda
são wdoreS39, espanhóis ou naturalizados, que embarcam com a carga que
lhes, ada na frota das índias. O estrangeiro dependerá de sua lealdade.

Redes, malhas e conquistas


Esta solidariedade mercantil é um pouco uma solidariedade de classe,
embora não exclua, claro, as rivalidades de negócios, de indivíduo a
indivíduo e, mais ainda, de cidade a cidade ou de "nação" a "nação".
Lyon, no século XVI, não é dominada pelos mercadores "italianos", como se
costuma dizer pura e simplesmente, mas pelas colônias de luquenses, de
florentinos, de genoveseS4O (antes das dificuldades de 1528 que os
afastarão), por grupos organizados e rivais que vivem cada qual como
"nação", pois as cidades italianas realizam a proeza de se detestarem,
brigarem, e se apoiarem, se preciso for, contra os outros. Temos de
imaginar esses grupos de mercadores com seus parentes1 amigos, criados,
seus correspondentes, contabilistas, escriturários. Já no século X111,
quando os Gianfigliazzi se instalam na França meridional, vêm, segundo
nos conta
Armando Sapori, "con una vera folla di altri italiani, altri mercatores
nostri'941.
Trata-se de conquistas, de malhas, de infiltração de elementos
desestabilizadores, se se quiser. Circuitos e redes são regularmente
dominados por grupos tenazes que deles se apropriam e, se necessário,
vedam-lhes a exploração aos outros. Tais grupos são fáceis de detectar,
desde que se esteja um pouco atento, na Europa e até fora da Europa. Os
mercadores banqueiros do
Chan Si atravessam a China, do rio Amarelo ao litoral de Cantão. Outra
cadeia chinesa, a partir das costas meridionais (particularmente a do Fu
Kien), delineia, direcionada ao Japão e à Insulíndia, uma China econômica
exterior que durante muito tempo terá o feitio de uma expansão colonial.
Os mercadores de
Osaka, que após 1638 dirigem o surto isolacionista do comércio interno do
Japão, representam a economia em movimento de todo o arquipélago. Já
falamos da imensa expansão dos mercadores banianos dentro e fora da
índia: seus banqueiros são muito numerosos em Ispalian, no dizer de
Tavermer 42, estão também em
Istambul, em Astrakhan, até em Moscou. Em 172343, a mulher de um mercador
indiano de Moscou solicita, quando morre o marido, autorização para ser
queimada viva a seu lado na pira funerária - o que lhe é recusado.
Imediatamente "a feitoria indiana, revoltada, decide abandonar a Rússia,
levando suas riquezas".
Perante essa ameaça, as autoridades russas cedem. O fato se reproduzirá
em 1767.
Mais conhecida e mais espetacular ainda é a expansão dos mercadores

43

da índia, "gentios" ou muçulmanos, pelo oceano índico até o litoral da


Insulíndia. As suas redes resistirão às ofensivas dos portugueses e às
brutalidades dos holandeses. Na Europa e no Mediterrâneo, no Ocidente e
no
Oriente, por toda a parte, italianos e mais italianos! Haverá caçada mais
bonita do que a corrida ao
Império bizantino, antes e, mais ainda, depois da tomada de
Constantinopla, em

1204449 A conquista mercantil italiana em breve chegará às margens do mar


Negro:
comerciantes, marinheiros, notários italianos ali se sentem em casa. Sua
conquista do Ocidente, lenta, multissecular, é mais extraordinária ainda.
Desde

1127, estão nas feiras de YpreS45. "Na segunda metade do século XIII, já
cobrem a França com suas poderosas casas, que não passam de sucursais das
grandes companhias de Florença, de Piacenza, de Milão, de Roma e de
Veneza. Encontramolos estabelecidos na Bretanha [já em 1272-12731, em
Guingamp, em Dinan, em
Quimper, em Quimperlé, em Rennes e em Nantes; [ ... ] em Bordeaux, em
Agen, em
Caliors, -46 Deram vida nova, sucessivamente, às feiras de Champagne, ao
tráfico de Bruges, mais

feiras de Genebra, mais tarde ainda às feiras triunfantes de Lyon;


criaram iras grandezas de Sevilha e de Lisboa; serão parte interessada na
fundação, rpia, mais tarde no primeiro desenvolvimento de Frankfürt;
finalmente, senhores das feiras genovesas chamadas de Besançon47 *
Inteligentes, viportáveis para os outros, tão detestados quanto
invejados, estão por toda Nos mares do Norte, em
Bruges, em Southampton, em Londres, os mari[os navios mastodontes do
Mediterrâneo invadem os cais, as tabernas dos al como os mercadores
italianos invadem as cidades. Será por acaso que campo de luta entre
protestantes e católicos tenha sido o oceano Atlântiarinheiros do Norte
inimigos dos marinheiros do Sul, esse passado expliitas cóleras tenazes.
as redes detectáveis, a dos mercadores hanseáticos, tão tenaz. A dos
mercaA . ffia Alemanha, que supera a si própria durante o "século dos
Fugger"11, L realidade, dura apenas algumas décadas, mas com que brilho!
As dos hodos ingleses, dos armênios, dos judeus, dos portugueses na
América espai contrapartida, não há grande rede externa francesa, salvo
os marselheses rrâneo e no Levante, salvo uma conquista do mercado da
península Ibérica, -iada com os bascos e os catalães, no Século XV11149 .
Este magro sucesso ignificativo: não dominar os outros é ser dominado por
eles.

os armênios e os judeus
Temos muita informação sobre os mercadores armênios e judeus. Não a
suficiente, porém, para que seja fácil reduzir essa massa de pormenores e
de monografias às suas características de conjunto.
Os mercadores armênios colonizaram todo o território da Pérsia. Foi,
aliás, a partir de Djulfa, o vasto e animado arrabalde de Ispahan onde o
xá Abbas, o
Grande, os alojou, que eles se espalharam por todo o mundo. Muito cedo
atravessaram toda a índia, particularmente - se não estamos exagerando
certas informações - do Indo ao Ganges e ao golfo de Bengala5% mas estão
também no sul, na Goa portuguesa, onde, por volta de 1750, como os
mercadores franceses ou espanhóis, obtêm empréstimos no "convento das
clarissas de Santa Rosa-51. O armênio transpõe também o Himalaia e chega
a Lassa, daí comercia até as fronteiras da China, a mais de 1.50O
quilômetros de distância52. Mas não entra muito. Curiosamente, a China e
o Japão mantêm-se-lhe fechadOS53. Mas ele pulula, e desde cedo, nas
Filipinas espanholaS54; é onipresente no imenso
Império turco, onde se revela concorrente aguerrido dos judeus e dos
outros mercadores. Do lado da Europa, o armênio está presente na
Moscóvia, bem colocado para aí desenvolver suas companhias e distribuir a
seda crua do Irã que, de troca em troca, atravessa o território russo,
chega a Arkangel (1676)55 e às regiões vizinhas da Rússia. Armênios
residem na Moscóvia, transitam por estradas intermináveis até a Suécia,
onde também chegam com suas mercadorias via
Arusterdarn55. Toda a Polônia é por eles percorrida, mais ainda a
Alemanha, e especialmente as feiras de Leipzig sempre em busca de
negóCiOS56 . Estão nos
Países Baixos, estarão na Inglaterra, na França. Na Itália, instalam-se
comodamente no século XVII, a partir de Veneza, participando da
insistente invasão de mercadores orientais, tão característica já no fim
do Século XV157.
Mais cedo ainda estão em Malta, onde os documentos falam de "poveri
christiani armeni", poveri decerto, mas que estão lá "per alcuni suoi
negoffl" (1552,

1553)58. Nem sempre os acolhem com satisfação - será necessário dizêlo?


Em julho de 1623, os cônsules de Marselha escrevem ao rei queixando-se de
uma invasão de armênios e de fardos de seda. É um perigo para o comércio
da cidade, dizem os cônsules, "não havendo nação no mundo mais cúpida do
que essa que, tendo a facilidade de vender suas sedas na grande praça de
Alepo, Esmirna e outros lugares e de obter seu lucro honesto, para ganhar
mais alguma coisa, vem correndo até o fim do mundo [claro, até Marselha]
e com uma maneira de viver tão porca que a maior parte do tempo comem
apenas ervas'959 - isto é verduras. Nem por isso os armênios serão
afastados, uma vez que, um quarto de século mais tarde, um barco inglês
apreendido pela esquadra francesa do cavaleiro Pol, perto de Malta, em
janeiro de 1649, transportava de Esmirna para Livorno e para Toulon
"cerca de 40O fardos de seda, a maior parte por conta de 64 armemos que
estavam a bordo', 60. Há armênios também em Portugal, em Sevilha, em
Cádiz, às portas da
América. Em 1601, chega a Cádiz um armênio, Jorge da Cruz, que pretende
ter vindo diretamente de Goa61.
Em suma, ei-los presentes na quase totalidade do universo mercantil. É
esse triunfo que se torna patente num livro de comércio escrito na sua
língua e por um deles, Lucas Vanantesti, impresso em Amsterdam em 169962.
Redigido para o uso

, -1 CLUI-1,
- -de todos vós outros, irmãos mercadores, que sois da nossa nação-, foi
elaborado por instigação de um mecenas, mestre Bedros, que, pormenor que
não surpreende, era de Djulfa. O livro abre sob o signo das palavras do
Evangelho:
"Não faças aos outros... " Seu primeiro cuidado: informar o mercador
sobre pesos, medidas e moedas das praças comerciais. De que praças? Todas
as do
Ocidente, claro, mas também da Hungria, de Istambul, Cracóvia, Viena,
Moscou,
Astrakhan, Novgorod, Haidebarad, Manila, Bagdá, Bassora, Alepo,
Esmirna... O estudo dos mercados e das mercadorias detalha as praças da
índia, do Ceilão, de
Java, de Amboina, de Macassar, de Manila. Nessa massa de informações que
mereceria ser analisada atentamente, passada pelo crivo, o mais curioso é
ainda um estudo comparado dos preços de estada nas diferentes cidades da
Europa, ou melhor, uma descrição, cheia de lacunas e de enigmas, da
África, que vai do
Egito a Angola, ao Monomotapa e a Zanzibar. Esse pequeno livro, imagem do
universo mercantil dos armênios, não nos dá, porém, a chave do seu
fabuloso sucesso. Sua técnica comercial limita-se, com efeito, a gabar os
méritos da regra de três (será que seria suficiente para tudo?). O livro
não aborda o problema da contabilidade e, sobretudo, não nos revela qual
terá sido a razão mercantil, capitalista desse universo. Como se fecham e
se consumam esses tráficos intermináveis? Estarão todos ligados pela
enorme escala de Djulfa e só por ela? Ou haverá, como penso, outras
escalas intermediárias? Na Polônia, em
Lwow, que é um ponto que une Oriente e Ocidente, uma pequena colônia
armênia os

46persas", como são chamados -, com suas jurisdições, suas tipografias,


suas diversas ligações de negócios, domina o enorme movimento de
recovagem em direção ao Império otomano. O chefe destas caravanas de
carroças, o caravan bacha, é sempre um armênio. Será essa recovagem que
junta os dois imensos quadros - nada menos que o Oriente e o Ocidente -
dominados pelos mercadores de Djulfa? Em
Lwow, sinal concludente, o armênio ostenta "um luxo ostensivo e
insolente"

63.
Também as redes de mercadores judeus se estendem ao mundo inteiro. Seus
sucessos são muito mais antigos do que os desempenhos armênios: desde a
Antiguidade romana que os Syri judeus e não-judeus estão por toda a
parte; no século IX da nossa era, utilizando as relações abertas pela
conquista muçulmana, os judeus de
Narbonne "chegam a Cantão passando pelo mar Vermelho ou pelo golfo
Pérsico"'; os documentos dos Geniza65 revelam-nos, com uma freqüência
impressionante, ligações mercantis em benefício dos mercadores judeus da
Ifriqya, de Cairuã no Egito, na
Etiópia e na índia peninsular. Nos séculos X-XII, no Egito (bem como no
Iraque e no Irã), riquíssimas famílias judias estão envolvidas no
comércio de longa distância, no banco e na cobrança de impostos, às vezes
em províncias inteiraSÓ6.
Legenda da página 132:

11. ITINERÁRIOS DE MERCADORES ARMIÊNIOS NO IRÃ, NA TURQUIA E NA MOSCóVIA,


NO
SÉCULO XVII
Este mapa representa apenas uma parte da rede viária dos mercadores
armênios: as ligações com o Império Turco
- Alepo, Esmirna, Istambul - e com as regiões russas pelas rotas do Cdsmo
e do
Volga. A partir de Moscou, três itinerários para Libau, Narva e
ArkhangeIsk. A
Nova Djulfa, para onde Ablias, o Grande, deportou os armênios entre 1603
e 1605, é o centro das atividades armênias em todo o mundo. A antiga
Djulfa, na Armênia, junto ao Araxe, forneceu quase toda a população
mercante da nova cidade. Cumpre notar que a qualidade de mercador de Nova
Djulfa equivale à de grande mercador é de negociante. Mapa elaborado por
Keram Kevonian, --Marchants arméniens au
XV11` siécIe-, in Cahiers du monde russe et soviétique, 1975, extratexto.

Js mercadores judeus perpctuarn-se assim

1 muito a longevidade italiana que há poucnum tempo multissecular,


superaóno nos deslumbrava. Mas sua hist o esabelecer o recorde da
duração, estabelece também o recorde das asceneguidas de sinistras
derrocadas. Contrariamente aos armênios agrupados por i, pátria secreta
do dinheiro e do coração Israel vive desenraizada, transplansendo esse o
seu drama, O fruto també da sua vontade obstinada de não turar com os
outros. No entanto, não se deve ver somente e comparar demaas catástrofes
que cortam selvagemente um destino dramático, interrompenrepente
adaptações já antigas e i-edes mercantis cheias de saúde.
Houve tamnportantes sucessos na França6-7 do século XIII, ou triunfais na
Polônia do XV, em diversas regiões da Itália, na Espanha medieval e em
outros lugares. pulsos da Espanha e da Sicília em 1492, de Nápoles em
154168, os exilados ]em entre duas direções: o Isla rnediterrâneo, os
países do Atlântico.
Na Turm Salônica, em Brussa, em Istarribul, em Andrinopla, os mercadores
judeus já no século XVI, enormes fortunas como comerciantes ou
arrematantes de

69

:)s. Portugal, que os tolera até depois de 1492, é o ponto de partida de


ouride emigração. Amsterdam, Hamburgo são os pontos de chegada privileJe
mercadores já ricos ou que depressa enriquecem de novo. Não há dúvida
-ontribuíram para a expansão comercial da Holanda direcionada à penínsu-a
- tanto para Lisboa como para Sevilha, Cádiz e Madri. Também direà
Itália, onde se mantêm há rnuito tempo colônias ativas, no Piemonte, ,
za, em Mântua, em Ferrara, e onde vai desabrochar, graças a eles, no
sé'11, o sucesso de Livorno. Não há dúvida de que estejam também entre os
das primeiras grandezas coloniais da América, especialmente no que diz à
expansão da cana e ao comércio do açúcar no Brasil e nas Antilhas. Asbém,
estão no século XVIII, em Bordeaux, em Marselha, na
Inglaterra, haviam sido expulsos em 129O e para onde regressaram com
Cromwell
56). Este boom de judeus sefarditas, dos judeus do Mediterrâneo dispersos
intico, encontrou seu historiador na pessoa de Hermann Kellenberiz10. A
âo de seu sucesso com o recuo sentido mais ou menos precocemente da
americana de prata levanta curiosos problemas. Se urna conjuntura os (mas
será verdade?) é porque não eram tão vigorosos como se supõe.
saparecimento dos sefardins abre a Israel um período, se não de silêncio,

3s de relativa retração. O outro êxito judaico vai elaborar-se


lentamente, :)s mercadores ambulantes do centro da Europa. Será o século
dos ashkejudeus originários da Europa central cujo primeiro fulgor é
assinalado fo dos "judeus de Corte", na Alemanha dos príncipes do século
XVIIIII. ta, a despeito de certo livro hagiográfiCO12, do surto
espontâneo de "em> excepcionais. Numa Alemanha que perdeu grande parte de
seus quaalistas com a crise da guerra dos Trinta
Anos, criara-se um vazio que o udaico preencheu no fim do século XVII,
sendo sua ascensão visível bem 'eiras de Leipzig, por exemplo. Mas o
grande século dos ashkenazim será m a espetacular fortuna internacional
dos Rothschild.
Dsto, acrescentemos, contra Sombart73, que os judeus por certo não in)
capitalismo, isto supondo (o que também não acredito) que o capitalisi.do
inventado tal dia, em tal lugar, por tais ou tais pessoas. Se os judeus
inventado, ou reinventado, teria sido na companhia de muitos outros.

A economia em jace aos mercaaos


Não é por se encontrarem em pontos quentes do capitalismo que os
mercadores judeus os criaram. A inteligência judaica é hoje luminosa em
todo o mundo: por isso vamos dizer que foram eles que inventaram a física
nuclear? Em Amsterdam, tornaram-se seguramente os dirigentes do jogo de
reportes e prêmios sobre as ações, mas não se vêem, no início destas
manipulações, não-judeus como Isaac
Lemaire?
Quanto a falar, como Sombart, de um espírito capitalista que coincidiria
com as linhas diretrizes da religião de Israel, isso é aproximar-se da
explicação protestante de Max Weber, com tão bons ou tão maus argumentos.
Poder-se-ia dizer o mesmo sobre o Islã, cujos ideal social e quadros
jurídicos "se forjaram desde a origem em consonância com as idéias e
objetivos de uma classe ascendente de mercadores", mas sem "que, nem por
isso, houvesse relação com a própria religião do ISlã9 974.
os portugueses e a América espanhola:

1580-1640

O papel dos mercadores portugueses, diante da imensa América espanhola,


acaba de ser esclarecido por novos estudOS75.
De 158O a 1640, as duas coroas, de Portugal e de Castela, encontram-se
reunidas na mesma régia cabeça. Essa união dos dois países, mais teórica
do que real (pois Portugal conserva a ampla autonomia de uma espécie de
"dominion"), contribuiu no entanto para apagar as fronteiras, também elas
teóricas, entre o imenso Brasil, ocupado pelos portugueses em alguns
pontos essenciais da costa atlântica, e a distante região espanhola do
Potosí, no coração dos Andes. Aliás, devido a um vazio mercantil quase
absoluto, a América espanhola abria-se por si só à aventura dos
mercadores estrangeiros e fazia muito tempo que os marinheiros e
mercadores portugueses entravam clandestinamente em território espanhol.
Para cada um que avistamos, escapam-nos cem. Tomo por prova um testemunho
isolado de
1558, relativo à ilha de Santa Margarita, no mar das Antilhas, a ilha das
pérolas, objeto de muitas cobiças. Naquele ano, ali chegaram "algumas
caravelas e navios do Reino de Portugal com tripulações e viajantes
portugueses a bordo".
Diziam dirigir-se ao Brasil, mas uma tormenta e o acaso os teriam lançado
na ilha. "Parecem-nos muito numerosos", acrescenta nosso informante, "os
que vêm desta maneira e tememos que seja com más intenções",
maliciosamente76. A presença portuguesa, logicamente, haveria de se
acentuar a seguir, a ponto de penetrar em toda a América espanhola e
particularmente em suas capitais, Cidade do México, Lima, e em suas
portas essenciais: São Domingos, Cartagena de Ias
Indias, Panamá, Buenos Aires.
Esta última cidade, fundada uma primeira vez em 154O e desaparecida em
conseqüência de algumas vicissitudes, foi fundada outra vez, em 1580,
graças à contribuição decisiva de mercadores portugueseS77. Do Brasil
para o rio da
Prata, um tráfico contínuo de pequenas naus de umas quarenta toneladas
trazia à socapa açúcar, arroz, tecidos, escravos negros, talvez ouro.
Regressavam "carregados de reaes deprata". Paralelamente, pelo rio da
Prata, vinham mercadores do Peru com espécies para comprar mercadorias em
Pernambuco, Bahia,
Rio de Janeiro. Os lucros destes tráficos ilegais, segundo um mercador,
Francisco Soares (1597), iam de

10007o a 500% e, se acreditarmos no que ele diz, chegavam a 1.000%. "Se


os mer135

uma loja deprodutos alimentícios da Cidade do México, no século XVIII, -


os clientes peus. (México, Museu Nacional de História, clichê Giraudon.)
[... 1 soubessem deste tráfico", acrescenta, "não arriscariam tantas
mercaor
Cartagena de Ias Indias. É que o rio [da Prata] é um grande comércio, ]o
mais curto e o mais fácil para chegar ao Peru."78 Para um pequeno
grurcadores portugueses bem informados, o rio da Prata foi, com efeito,
até

1662, uma porta de saída clandestina da prata de Potosí. Em 1605,


calculava-se xabando em 50O mil cruzados por ano79. Só a criação da
alfândega interuana seca de Córdoba (7 de fevereiro de 1662) parece ter-
lhe posto fim". avia, a penetração portuguesa não se limitou à margem
atlântica das pos;panholas. Em

1590, um mercador português de Macau, João da Gamas', o Pacífico e atraca


em
Acapulco. Aliás, foi maIsucedido. Entretanto, no em Lima, portugueses
abriam lojas onde se vendia de tudo, "desde um até o vulgar cominho,
desde o negro mais vil até a mais preciosa péron esquecer, luxo em terra
colonial, os bens da pátria distante: o vinho, i farinha de trigo, os
tecidos finos, mais as especiarias e as sedas do Orien, rande comércio da
Europa ou das Filipinas trazia consigo, mais - tam

1, 1 ecurturUIU eL bém aí - um enorme contrabando de prata do Peru, que é


o verdadeiro motor de todos esses tráficoS83. Mesmo numa cidade ainda
pequena, como Santiago do Chile (com uns 1O mil habitantes no século
XVII), encontramos um mercador português,
Sebastião Duarte, que, anteriormente, estivera na Guiné africana e,
associado a um compatriota, João Baptista Peres, entre 1626 e 1633, viaja
até o Panamá e a
Cartagena de Ias Indias onde compra escravos negros, mercadorias
diversas, madeiras preciosas - compras efetuadas com empréstimos que
atingiam 13 mil pesOS84.
Mas tal esplendor dura pouco. Esses lojistas portugueses, usuários ainda
por cima, enriquecem depressa demais. O povo das cidades amotina-se
facilmente contra eles - como em Potosí em 163485. A opinião pública
acusa-os de serem cristãos-novos - o que muitas vezes é verdade -, de
judaizarem secretamente - o que é possível. A Inquisição acabará por se
meter no assunto e uma epidemia de processos e autos-de-fé põe fim a essa
prosperidade rápida. Estes últimos acontecimentos são bem conhecidos: são
os processos do México de 1646, 1647 e

1648, ou o auto-de-fé de 11 de abril de 1649, em que figuraram vários


grandes mercadores

86

de origem portuguesa. Mas essa é outra história.


Centralizado em Lisboa, estendido às duas margens do Atlântico, africana
e americana, ligado ao Pacífico e ao Extremo-Oriente, o sistema português
é uma imensa rede que se expande pelo Novo Mundo em dez ou vinte anos.
Esta viva expansão é forçosamente um fato de importância internacional.
Sem ela, talvez
Portugal não se teria --restaurado" em 1640, isto é, não teria recuperado
a sua independência diante da Espanha. Explicar a restauração, como se
faz habitualmente, pelo surto do açúcar brasileiro não poderia, de todo
modo, ser suficiente. Aliás, nada nos garante que o --CiCIO-81 do açúcar
brasileiro não esteja ele próprio ligado a essa opulência mercantil.
Também nada nos garante que esta não tenha concorrido para a glória um
tanto breve da rede dos sefardins, tanto em Amsterdam como em Lisboa e em
Madri. A prata clandestina de
Potosí, graças aos cristãosnovos portugueses que emprestavam a Filipe IV,
o rei
Planeta, juntava-se deste modo à prata oficial que desembarcava
legalmente nos cais de Sevilha. Mas o vasto e fragil sistema deveria
durar apenas algumas décadas.
Redes em conflito, redes em desaparecimento
As redes completam-se, associam-se, sub stituem-se, afrontam-se também.
Afrontar-se nem sempre quer dizer destruir-se. Há "inimigos
complementares", há coexistências hostis, feitas para durar. Frente a
frente ao longo de séculos, os mercadores cristãos e os mercadores da
Síria e do Egito afrontam-se, é verdade, mas sem que a balança se
desequilibre entre esses adversários indispensáveis uns aos outros. O
europeu quase não ultrapassa as cidades na orla do deserto, Alepo,
Damasco, Cairo. Mais além, o mundo das caravanas é para os muçulmanos e
para os mercadores judeus uma reserva privativa. O Islã perdeu, porém,
com as Cruzadas, o mar Interior, enorme área de circulação.
Assim também, no vasto Império turco, é discreta a presença dos
venezianos ou dos ragusanos, compradores de tecidos de pêlo de cabra e
que alguns documentos nos mostram estabelecidos em Brussa ou Ancara. O
avanço ocidental mais importante em território turco opera-se em
benefício dos ragusanos, mas, em geral,
ltrapassa a Península dos Bálcãs. o mar Negro é mesmo, ou volta a ser com
lo
XVI, o lago privativo de Istambul e só se abrirá de novo aos tráficos
criso fim do século XVIII, depois da conquista da Criméia pelos russos
(1783)., erior do
Império turco, a reação antiocidental ocorrerá em benefício dos mer-s
judeus, armênios ou gregos.
riálogas resistências são encontradas em outros lugares. Em Cantão, a
partir 0, o Co-Hong dos mercadores chineses é uma espécie de contra-
Companhia dias88.
Na índia propriamente dita, a resistência da rede dos banianos so-rã, ao
que se crê, à ocupação inglesa.
[aro que a hostilidade, o ódio acompanham resistências e competições. O
mais sempre um alvo preferencial. Quando reside em Surate, MandeIS1089
(1638) a: "Por serem orgulhosos e insolentes [os muçulmanos, muitas vezes
iamercadores] tratam os Benjin [banianos] quase como escravos e com
despremesmo modo que se faz na
Europa com os judeus, nos lugares onde os toleMudando de lugar e de
época, observa-se a mesma atitude, no Ocidente do XVI, para com os
genoveses, prontos para engolir tudo, no dizer de Simóri de seus
amigos90, e sempre conluiados para manobrar os outros. Ou para
holandeses, no século XVII. Mais tarde, para com os ingleses.
idas as redes, mesmo as mais fortes, conhecem um ou outro dia recuos,
osciE qualquer falência de uma rede, em seu centro, transmite suas
conseqüênconjunto de suas posições e, talvez mais do que a qualquer outro
ponto, !ria. É o que acontece em toda a Europa com o que chamamos, de
forma discutiVel, a decadência da Itália. "Decadência" decerto não é a
palavra,, mas, já no fim do século XVI, a Itália passa por complicações e
dificuldade então suas posições na Alemanha, na Inglaterra, no Levante.
Fatos anãapresentam, no século XVIII, na área do
Báltico, com o declínio da Hoerante o poderio crescente da Inglaterra.
s, onde declinam os mercadores dominantes, emergem pouco a pouco
essubstitutivas. A "Toscana francesa", isto é, os italianos residentes na
Frana por volta de 1661, talvez mais cedo, a partir da crise financeira
de 1648;
)landesa na França, fortemente arraigada, experimenta dificuldades no
prinséculo
XVIII. E, como que por acaso, é por volta de 17209', data aproxiue
negociantes franceses, mais numerosos, organizam o desenvolvimento lar
dos portos do país, esboçam as primeiras estruturas capitalistas
franceande envergadura. Este surto de negociantes franceses deu-se em
parte com )s "indígenas", em parte com curiosas reimplantações de
protestantes oudos da França. Adivinha-se o mesmo fenômeno de
substituição na Alemabenefício dos judeus de Corte; na Espanha, com a
ascensão dos mercadoks e bascos e também com a dos mercadores madrilenos
dos
Cinco GreYores, promovidos à categoria de financiadores do Estado92.
s surtos só são possíveis, evidentemente, em virtude dos crescimentos
ecoÉ a prosperidade francesa, é a prosperidade alemã, é a prosperidade
esPae permitem, no século XVIII, o novo florescimento de fortunas locais,
ou iacionais. Mas se não tivesse havido ruptura prévia, na França, na
AlemaEspanha, dominações comerciais estrangeiras, o surto do século XVIII
se nvolvido de outro modo, decerto com algumas dificuldades
suplementares. ivia, uma rede ativa posta em xeque sempre tem tendência a
compensar as. Rechaçada desta ou daquela região, vai lançar suas
potencialidades
, "- 1, A economia em Jace aos mercaaos e seus capitais numa outra. Essa
é a regra, pelo menos todas as vezes que está em jogo um capitalismo
poderoso e já muito acumulador. É o caso dos mercadores genoveses do mar
do Norte, no século XV. Um quarto de século depois da tomada de
Constantinopla (1453), quando os turcos ocupam seus postos na Criméia e,
especialmente, na importante feitoria de Caffa (1479), os genoveses não
abandonam logo todos os seus postos no Levante: ficarão presentes, por
exemplo, em Quio até 1566. Mas o melhor de sua atividade reforça e
desenvolve a rede já existente de seus negócios no Ocidente, na Espanha,
no Marrocos, em breve em
Antuérpia e em Lyon. Perdem um império a leste, constituem outro a oeste.
Da mesma forma, combatido em todo o oceano índico e na Insulíndia, o
Império português, ferido de morte no campo de suas antigas proezas,
volta-se com os últimos anos do século XVI e os primeiros do século XVII
para o Brasil e para a
América espanhola. Do mesmo modo, no princípio do século XVII, apesar dos
recuos sensacionais de grandes firmas florentinas, é através da Europa
central, num amplo leque de estradas aberto a partir de Veneza, que os
mercadores italianos encontraram uma compensação, pequena, porém segura,
para os dissabores que lhes trouxe a conjuntura depois de 160093. Não é
bem por acaso que Bartolomeo
ViatiS94, de Bergamo, portanto súdito de Veneza, se torna em Nuremberg um
dos mais ricos mercadores (ou mesmo o mais rico) da cidade de adoção; que
os italianos desenvolvem grande atividade em Leipzig, em Nuremberg, em
Frankfürt, em Amsterdam, em Hamburgo; que as mercadorias e as modas da
Itália continuam a chegar a Viena e mais ainda à Polônia pelas ativas
escalas de Cracóvia e de
Lwow. Correspondências conservadas em arquivos poloneses9' mostram, no
século
XVII, mercadores italianos nas cidades e feiras da Polônia. São
suficientemente numerosos para que todos reparem neles, a julgar por esta
historieta: em 1643, um soldado espanhol é enviado como mensageiro para
levar dos Países Baixos à rainha da PolÔnia, em Varsóvia, presentes de
rendas e uma boneca vestida à moda da França, que ela mesma pedira "para
que os costureiros a seu serviço lhe fizessem roupas de acordo com essa
moda, pois a da Polônia apertavalhe o pescoço e não era de seu gosto". O
mensageiro chega, é tratado como um embaixador. Conta ele: "O fato de
saber latim ajudou-me bastante, pois senão não teria conseguido entender
nem uma única palavra da língua deles... e da nossa, eles só sabem a
maneira de dar a senhoria (dar sefloria) usada na Itália, pois naquele
país há muitos mercadores italianos. " No caminho de regresso, pára em
Cracóvia, a cidade "onde se coroam os Reis da PolÔnia", e, lá também,
nota "muitos mercadores italianos que traficam sobretudo com sedas"
naquele grande centro comercial. Testemunho minúsculo, sem dúvida, mas
significativo 96.
Minorias conquistadoras
Os exemplos precedentes assinalam o fato freqüente de os grandes
mercadores, senhores dos circuitos e das redes, pertencerem a minorias
estrangeiras, quer pela nacionalidade (os italianos na França de Filipe,
o Belo, e de
Francisco 1 ou na Espanha de Filipe 11), quer pelo credo que professam -
como os judeus, os armênios, os banianos, os parses, os rascoInitas na
Rússia ou os coptas cristãos no Egito muçulmano. Por que esta tendência?
É claro que qualquer minoria tem urna tendência natural para a coesão,
para a ajuda mútua, para a autodefesa: no

139
waça da Bolsa: o edifício éflanqueado pela Casados Genoveses epela dos
Florenti~nho tangível da expansão e da dominação dos mercadores
italianos. (A.
C.L., iro, um genovês é conivente com um genovês, um armênio com um
armêfles Wilson (num artigo de publicação próxima) acaba de assinalar,
com ça, a espantosa intrusão nos maiores negócios de Londres dos
huguenotes ; no exílio dos quais se tinha assinalado sobretudo a
importância como diLe técnicas artesanais. Ora, eles sempre formaram e
formam ainda, na caesa, um grupo compacto que preserva ciosamente sua
identidade. Por oué fácil para uma minoria sentir-se oprimida, mal-amada
pela maioria, o pensa de ter muitos escrúpulos com ela. Será essa a
maneira de ser de um

9 capitalista? Escreve Gabriel Ardant97: "O homo oeconomicus [para ele,


inteiramente conquistado pelo sistema capitalista] não nutre sentimentos
or seu semelhante. Só quer, diante dele, outros agentes econômicos,
comvendedores, prestamistas, credores, com quem mantém, em princípio,
warnente econômicas. " Na mesma linha, Sombart atribui a superioridaleus
na formação do "espírito capitalista" ao fato de as suas prescrições lhes
autorizarem para com os "gentios" o que lhes proíbem para com gionários.
a explicação cai por si só. Numa sociedade que tem suas próprias
proibiconsidera ilícitos os ofícios da usura e até do dinheiro - fonte de
tantas não apenas mercantis -, não é o jogo social que encerra os
"anormais" s desagradáveis, mas necessarias ao todo da sociedade? Se
acreditarmos idre Gerschenkron98, foi realmente o que se passou, na
Rússia, com os

A economía em Jace dos mercaaos heréticos ortodoxos que são os


rascoInitas. O papel deles é comparável ao dos judeus ou dos armênios. Se
não existissem, não teria sido preciso inventá-los? -Os judeus são tão
necessários a um país como os padeiros-, exclama o patrício de
Veneza, Marino Sanudo, indignado com a idéia de medidas que lhes fossem

99

contrárias.
Neste debate, seria melhor falar da sociedade do que de "espírito
capitalista-. As lutas políticas e as paixões religiosas da Europa
medieval e moderna excluíram de suas comunidades numerosos indivíduos
que, no estrangeiro, para onde os leyou o exílio, se tornaram
minoritários. As cidades italianas são, como as cidades gregas da época
clássica, ninhos de vespas briguentas: há os cidadãos no interior das
muralhas e os exilados - categoria social tão difundida que lhes foi dado
um nome genérico: os fuorusciti. Terem conservado seus bens, suas
ligações de negócios no próprio âmago da cidade que as escorraça para as
acolher de novo um belo dia, esta é a história da grande maioria das
famílias genovesas, florentinas, luquenses. Estes fúorusciti, sobretudo
se eram mercadores, não terão sido desse modo empurrados para o caminho
da fortuna? O grande comércio é o "comércio de longa distância". Estão
condenados a ele. Exilados, prosperam por causa do próprio afastamento.
Assim, em 1339, um grupo de nobres de Gênova rejeita o governo popular
que acaba de se instaurar com os doges ditos perpétuos, e abandonam a
cidade100. Esses nobres exilados são chamados os nobili vecchi, ao passo
que os que ficaram em Gênova sob o governo popular são os nobili novi - a
ruptura se manterá, mesmo depois do regresso dos exilados à sua cidade.
E, como que por acaso, foram os nobili vecchi que se tornaram, e de
longe, os detentores dos grandes negócios no estrangeiro.
Outros exilados: os marranos portugueses e espanhóis que, em Amsterdam,
voltam ao judaísmo. Exilados notórios também: os protestantes franceses.
A revogação do edito de Nantes, em 1685, por certo não criou ex Whilo o
Banco protestante, que viria a assenhorar-se da economia francesa, mas
garantiu-lhe o desenvolvimento.
Estes fúorusciti de tipo novo conservaram suas ligações no interior do
reino e até no coração dele, Paris. Terão conseguido, mais de uma vez,
transferir para o estrangeiro uma parte considerável dos capitais que
deixaram para trás. E, como os nobili vecchi, um dia, regressaram,
numerosos poderosos.
Uma minoria, em suma, é uma rede como que construída de antemão e
solidamente construída. O italiano que chega a Milão só. precisa, para se
instalar, de uma mesa e de uma folha de papel, com que se espantam os
franceses. Mas é porque tem ali associados naturais, informantes,
fiadores e correspondentes nas diversas praças da Europa. Em suma, tudo
quanto faz o crédito de um mercador e que em geral ele leva anos e anos
para adquirir. Do mesmo modo, em Leipzig ou em Viena
- cidades que, à margem da Europa de povoamento denso, o desenvolvimento
do século XVIII levanta -, não podemos deixar de nos impressionar com a
fortuna dos mercadores estrangeiros, gente dos Países Baixos, refugiados
franceses depois da revogação do edito de Nantes (os primeiros chegam a
Leipzig em 1688), italianos, saboianos, tiroleses. Não há exceções, ou
quase nenhuma: o estrangeiro tem a sorte a seu favor. Sua origem o liga a
cidades, a praças, a países longínquos que logo o atiram para o comércio
de longa distância, o grande comércio.
Deveríamos pensar, mas seria bonito demais, que "há males que vêm para o
bem"?

141

VALIA MERCANTIL, FA E A PROCURA des e circuitos desenham um sistema.


como, numa estrada de ferro, o conos trilhos, das suspensões catenárias
portadoras de corrente, do material rolo pessoal. Tudo está disposto para
o movimento. Mas o movimento se mosproblema em si.
or demais evidente que a mercadoria, para se deslocar, deve aumentar de )
longo da viagem. A isso chamarei a mais-valia mercantil. Será uma lei
-ções? Sim, ou quase. No fim do século XVI, a moeda de oito espanhola
réis em Portugal e 48O na índia101. No fim do século XVII, uma vara de
vale 3 reais nas fábricas do Mans,

6 na Espanha, 12 na América102. E asdiante. Daí o preço espantoso, em


determinados lugares, da mercadoria vem de longe. Por volta de 1500, na
Alemanha, uma libra de açafrão (itaespanhol) custava tanto quanto um
cavalo, uma libra de açúcar tanto quanto es 103; no Panamá, em 1519, um
cavalo valia 24

pesos e meio, um escravo pesos, um odre de vinho 10O pesos101... Em


Marselha, em

1248, 3O mecido comum de Flandres valiam entre duas e quatro vezes o


preço de um sarraceno105. Mas já Plínio o Velho dizia que os produtos
indianos, a do-reino ou as especiarias, eram vendidos em Roma pelo
cêntuplo do pre)dução`1. É claro que, em semelhante trajeto, era
necessário que o lucro rio meio para que o circuito começasse a
funcionar, a cobrir as despesas prio movimento. Porque, ao preço de
compra de uma mercadoria, junta-se e seu transporte, que outrora era
particularmente oneroso. Tecidos comts feiras de Champagne, em 1318 e
1319, levados até Florença, pagam pe)rte, incluindo taxas, embalagem e
outras despesas (trata-se de seis remes0; 12, 53; 15, 96; 16, 05; 19, 21;
20, 34% do preço de compra, do "primo Essas despesas variam, para um
mesmo trajeto e para mercadorias idênsimples ao dobro.
Mesmo assim as porcentagens são relativamente baiÀdos são mercadoria
cara, além disso pesam pouco. Uma mercadoria pepreço baixo - trigo, sal,
madeira, vinho não circula, em princípio, s itinerários terrestres, salvo
em caso de absoluta necessidade - e nesse -se a necessidade além do
transporte. O vinho de Chianti, já conhecido orne em 1398, é um vinho
barato, um "povero" que custa um florim o (o vinho de Malvasia vale 1O a
12). Transportado de Greve para Flocm), seu preço aumenta 25 a 4007o; se
a viagem se prolongasse até Milão, de preço108. Por volta de 1600, de
Vera Cruz ao
México, o transporte pa de vinho custa tanto quanto o seu preço de compra
em
Sevilha109. ainda, no tempo de Cantillon, "o carreto dos vinhos de
Borgonha para

1 muitas vezes mais do que o próprio vinho na origem"110.


imeiro volume desta obra, insistimos no obstáculo que constitui um
sisansportes sempre oneroso e sem maleabilidade. Federigo Melis111 de

Em Nuremberg, entre 164O e 1650, chegada do açafrão e das especiarias: da


esquerda para a direita, entrega, registro, pesagem dospacotes, que são
examinados e reexpedidos. (Museu Nacional de Nuremberg, cliché do museu.)
monstrou que, entretanto, fora realizado um enorme esforço nos séculos
XIV e XV, no que toca aos transportes maritimos, com o aumento dos
cascos, e portanto dos porões, e a instauração de tarifas progressivas
que tendem a estabelecer-se ad valorem: as mercadorias valiosas pagam
assim, em parte, pelas mercadorias comuns. Mas é uma prática que leva
tempo para generalizar-se. Em Lyon, no século
XVI, calcula-se o preço do transporte por via terrestre conforme o peso
das mercadorias112.
Seja como for, o problema permanece o mesmo aos olhos do mercador: é
preciso que a mercadoria que chega até ele, transportada por veleiro de
carga, carroça ou animal, se valorize no final do trajeto de tal maneira
que ele possa pagar, além das despesas imprevistas, o preço da compra
aumentado pelo transporte, aumentado ainda pelo lucro com que conta o
mercador. Senão, para que arriscar dinheiro e trabalho? A mercadoria
consegue-o com maior ou menor facilidade. Evidentemente, com as
"mercadorias régias" - expressão de Simón Ruiz para designar a pimentado-
reino, as especiarias, a cochinilha, diríamos também as moedas de oito
- não há problemas: a viagem é longa, mas o lucro garantido. Se a cotação
me decepcionar, esperarei; um pouco de paciência e tudo fica novamente em
ordem, pois, por assim dizer, nunca falta comprador. Cada país, cada
época teve as suas mercadorias régias", mais prometedoras do que outras
de mais-valia mercantil. As viagens de Giambattista Gemelli Careri,
leitura apaixonante por muitos motivos, ilustram maravilhosamente essa
regra. Este napolitano que, muito mais por prazer do que por lucro,
empreendeu, em 1694, a volta ao mundo, encontrou a solução para custear
as despesas de seu longo itinerário: comprar numa praça mercadorias que
se sabe que hão de se valorizar muito na praça a que se vai. Em Bandar
Abbas, no golfo Pérsico, carregam-se "tâmaras, vinho, aguardente e [ ...
1

todas as frutas da Pérsia que se levam secas para a índia, ou conservadas


em vinagre [... 1 com o que se obtém grande lucro`13; ao embarcar no
galeão de
Manila para a Nova Espanha, leva-se mercúrio chinês: "Dá 30O por cento de
lucro", confessa

E assim por diante. Viajando com o proprietário, a mercadoria torna-se


para im capital que frutifica a cada passo, paga as despesas do viajante
e chega o a assegurar-lhe, no regresso a Nápoles, lucros substanciais.
Francesco, til 15

que, em 1591, quase um século antes, empreendera também a volta ao o,


escolhera como primeiro investimento mercantil escravos negros,
"mercarégia" das melhores, comprados na ilha de São Torné e depois
revendidos irtagena de Ias Indias.
ara as mercadorias comuns, as coisas são evidentemente menos fáceis; a
opecomercial só será proveitosa à custa de mil precauções. Teoricamente,
tudo les, pelo menos para um economista como Condillac' 16 : a boa regra
da tro, stância é pôr em comunicação um mercado onde um bem é abundante
com rcado onde o mesmo bem é raro. Na prática, para dominar essas
condições, so ser tão prudente quanto informado. A correspondência
comercial provaidantemente.
;tamos em abril de 1681, em Livorno, na loja de Giambattista SardiIII.
Liporto essencial da Toscana 'abre-se amplamente ao Mediterrâneo e a toda
pa, pelo menos até Amsterdam. Nesta cidade, Benjamin BurIamacchi,
natu_uca, dirige uma feitoria onde ele trabalha com mercadorias do
Báltico, da das índias ou de outras paragens. Acaba de chegar uma frota
da Companhia ias Orientais que fez baixar os preços da canela, no momento
em que se estai correspondência entre os dois mercadores. O livornense
imagina uma opeom esta "rnercadoria régia". Cheio de projetos, escreve a
Burlamacchi e -lhe que deseja "fazê-la por sua conta", isto é, sem a
partilhar com o seu corlente. O negócio acaba fracassando, e
Sardi, dessa vez disposto a uma particom Burlamacchi, só vê uma
mercadoria interessante para levar de Amsterra Livorno, as "vachette", ou
seja, os couros da Rússia que em breve vão os mercados da Itália. No ano
de 168 1, são já regularmente cotados em Li)nde às vezes chegam mesmo
diretamente de Arkangel, acompanhados de caviar. Se os couros forem "de
cor bonita, tanto por fora como por dentro, 'inos e não excederem o peso
de 9 a 1O libras de Florença", então
Burlamacrã mandar carregar certa quantidade deles em dois navios (de
maneira que
Lm os riscos), navios "de buona difesa, che venghino con buon convoglio",
tes do encerramento de inverno da navegação no Norte. Os couros que são
em Amsterdam a

12 são cotados a 26 V2 e a 28 na praça de Livorno, portando dobro. É


necessário, escreve Sardi, que o preço de custo, pago em Livorultrapasse
24: espera assim um lucro de 10%. Serão embarcados no Texel tes de
couros, e BurIamacchi será reembolsado da metade dos custos da comido uma
letra, segundo instruções de
Sardi, sobre um banqueiro de Veneza.
, tudo foi calculado. E, no entanto, o negócio afinal não será brilhante.
Grannbarques de mercadorias farão baixar os preços em Livorno para 23, em
682; as peles, que se revelam de fraca qualidade, não serão bem vendidas:
outubro do mesmo ano, ainda havia peles armazenadas. Tudo isso, decerva
pouco para a casa Sardi, envolvida, em 1681 e 1682, em várias operações
ilmente a exportação de azeite e limões do litoral genovês -, e que
negocia te com
Amsterdam e com a Inglaterra, por vezes carregando, sozinha, na'os. Mas o
episódio tem o interesse de mostrar quanto era difícil prever a e
organizar a mais-valia mercantil.

A economia em lace dos mercados


A tarefa sempiterna de um mercador é fazer e refazer cálculos
prospectivos, imaginar a operação mais de dez vezes antes de tentá-la. Um
negociante metódico de Amsterdam118 pensa num negócio qualquer na França,
escreve a Dugard Filho, comissionista em Rouen, para --me enviar na
resposta a cotação do preço dos artigos mais correntes aí, bem como
enviar-me uma fatura de venda simulada [isto é, uma previsão de todos os
custos]... Sobretudo, enviai-me a cotação dos preços das barbatanas de
baleia, do óleo de baleia vermelha, da garança, cacho fino e com casca,
do algodão de Esmirna, da madeira amarela, do arame de aço [ ... ], do
chá verde". Por seu lado, o mercador francês` (16 de fevereiro de 1778)
informa-se junto de um mercador de Amsterdam: "... Não conhecendo o modo
como as aguardentes são vendidas em vosso país, muito agradeço que me
informeis quanto valem

3O quartilhos convertidos em dinheiro da França e com o que farei meu


cálculo e depois, se vir uma certa vantagem, decidir-me-ei a enviar-vos
certa quantidade..."
É tão óbvio que a mais-valia mercantil é o princípio necessário a
qualquer troca comercial, que parece absurdo insistir nesse ponto.
Contudo, ela explica mais coisas do que parece. E, especialmente, ela
favorece automaticamente os países vítimas, por assim dizer, da vida
cara? Esses países são os faróis mais brilhantes, os centros de atração
prioritários. A mercadoria é atraída por esses preços altos. Veneza, que
dominou o mar Interior, viveu durante muito tempo sob o signo da vida
cara e vive ainda no Século XV111120. A Holanda tornou-se um país de vida
cara: as pessoas subsistem com dificuldades, sobretudo os pobres, até os
menos pobres121. A Espanha, desde a época de Carlos V, é um país de vida
horrivelmente cara122: "... Aprendi lá um provérbio que diz que tudo é
caro na
Espanha, menos o dinheiro", conta um viajante francês em 1603123. E assim
continua no século XVIII. Mas em breve a Inglaterra estabelece um recorde
imbatível: é, por excelência, a terra das despesas cotidianas elevadas:
alugar uma casa, alugar uma carruagem, sustentar a mesa, hospedar-se num
hotel, é tudo ruinoso para os estrangeiros 124. Seria esse aumento do
custo de vida e dos salários visível já antes da revolução de 1688, o
preço, ou o sinal, ou a condição da preponderância inglesa já em vias de
se estabelecer? Ou de uma preponderância qualquer? Um viajante inglês,
Fynes Moryson, que, de 1599 a 1606, morou na Irlanda como secretário de
Lord Mountjoy e antes, de 1591 a 1597, viajara pela França, Itália,
Países Baixos, Alemanha, Polônia, born observador aliás, tem esta
reflexão espantosa: "Tendo encontrado na Polônia e na Irlanda preços
estranhamente módicos para todos os víveres necessários, ao passo que há
falta de prata, que é por isso mais estimada, estas observações conduzem-
me a uma opinião muito contrária à comum, a saber, que não há sinal mais
seguro de um
Estado florescente e rico do que a carestia dessas coisas...""' É também
o que afirma Pinto. É também o paradoxo de Quesnay: "Abundância e
carestia são riqueza." 126 Em 1787, de passagem por Bordeaux, Arthur
Young127 observava: --O aluguel das casas e dos apartamentos sobe todos
os dias; a alta foi considerável depois da paz [de 1783], na mesma época
em que tantas casas novas foram e estão sendo construídas, o que coincide
com a alta geral dos preços: há quem se queixe de que o custo de vida
aumentou 3O por cento em dez anos. Nada prova mais claramente os
progressos da prosperidade." É o que já dizia, vinte anos antes, em 175
1, o i ovem abade Galiani em seu livro sobre a moeda: "Os preços altos
das mercadorias são o guia mais seguro para saber onde se encontram as
maiores riquezas.,, 128 E pensamos nas considerações teóricas de Léon
Dupriez129 sobre o tempo presente a propósito dos "países em flecha" que
têm um nível de remuneração e de preços "nitidamente superiores ao dos
países de evolução

145

- asada". Mas teremos de regressar ao porquê de tais desníveis.


Superiorida;trutura, de organização, é fácil de dizer. Na realidade, é de
estrutura do que deveremos falar130.
ia evidentemente tentador reduzir a essa realidade básica o destino da
In. Os preços altos, os salários altos são, para a economia insular,
ajudas, ibém entraves. A indústria têxtil, favorecida na base por uma
excepcional o lanígera a preço baixo, supera essas dificuldades. Mas
ocorrerá o mesmo outras atividades industriais? A Revolução das máquinas
do século XVIII )nheçamo-lo, uma bela saída.
vidente que o principal estímulo à troca vem da oferta e da procura, das
- das procuras, atores bem conhecidos, mas cuja banalidade não os torna
eis de definir ou de discernir. Apresentam-se às centenas, aos milhares.
For.ia corrente, dão-se as mãos, são a eletricidade dos circuitos. A
economia explica tudo por meio delas e assim nos envolve em discussões
sem saída respectivo papel da oferta e da procura como elementos motores
- discuscontinuam até hoje e conservam seu lugar nas motivações das
políticas cas.
no sabemos, não há oferta sem procura e vice-versa: ambas nascem da
troundamentam e que as fundamenta. O mesmo se poderia dizer da compra da,
da ida e volta mercantil, do dom e do contradom, até do trabalho e al, do
consumo e da produção - estando o consumo do lado da procura produção
está do lado da oferta.
Para Turgot, se ofereço o que possuo, desejo e na mesma hora you pedir o
que não tenho na mão. Se procuro o possuo, é porque estou resignado, ou
decidido, a fornecer a contraparti, recer uma mercadoria, um serviço ou
uma soma em dinheiro. Portanto, Furgot, quatro elementos: "Duas coisas
possuídas, duas coisas desejaE um economista atual escreve: "É evidente
que cada oferta e cada prossupõem uma contrapartida.--132

i nos apressemos a classificar essas observações de argúcias ou de


ingenuidadam a eliminar distinções e afirmações factícias. Aconselham a
prudência e interroga para saber qual é a mais importante, a oferta ou a
procura, ou, uivale ao mesmo, qual das duas desempenha o papel de primum
mobile. i sem verdadeira resposta mas que nos leva ao cerne dos problemas
da troca. de-me freqüentemente ao espírito o exemplo, tão bem estudado
por Pierre

33, da Carrera de Indias. Após 1550, tudo está claro, desenhado em gran,
em termos mecânicos: uma correia roda no sentido dos ponteiros de um de
Sevilha às
Canárias, aos portos da América, ao estreito das Bahamas Flórida, depois
aos
Açores e a Sevilha novamente. A navegação concreti'cuito. Para Pierre
Chaunu, não restam dúvidas: no século XVI, o "movi)niunturalmente motor"
é "o movimento das idas" da Espanha para a, Especifica: "A expectativa
dos produtos da Europa destinados às índias s principais preocupações dos
sevilhanos, no momento das partidas' 134: de Idria, cobre da Hungria,
materiais de construção do Norte e navios

Vinheta ilustrativa dos conselhos a um jovem negociante alemão que


comercia num pais estrangeiro (século XVII). (Museu Nacional de
Nuremberg, clichê do museu.)
inteiros de fardos de tecidos finos e rústicos. No princípio, incluem-se
ainda azeite, farinha e vinho, produtos fornecidos pela própria Espanha.
Esta não é, portanto, a única animadora do grande movimento
transoceânico. A Europa ajuda e depois exige sua parte do maná no
regresso das frotas. Os franceses pensam que, sem as suas remessas, o
sistema não funcionaria. Os genoveses135, que desde o início e até cerca
de 1568 financiam a crédito as longas e lentas operações comerciais com o
Novo Mundo, são também indispensáveis, e muitos outros ainda. O movimento
necessário em Sevilha, por ocasião das partidas, mobiliza portanto
numerosas forças do Ocidente, é um movimento largamente exterior à
Espanha, pelas suas fontes, e que implica simultaneamente o dinheiro dos
homens de negócios genoveses, as galerias das minas da Idria, os teares
fiamengos e uma vintena de mercados semialdeãos onde se vendem os tecidos
da Bretanha.
Contraprova: tudo pára em Sevilha, e mais tarde em Cádiz, à vontade dos
"estrangeiros". A regra perdura: em fevereiro de l739136 "a partida dos
galeões foi outra vez retardada até o começo de março próximo para dar
tempo aos estrangeiros de mandar carregar uma grande quantidade de
mercadorias que ainda não puderam chegar a Cádiz por causa dos ventos
contrários", narra uma gazeta.
Vamos por isso chamar-lhe movimento motor, primum mobile? Em princípio,
uma "correia" pode ser posta em movimento num ponto qualquer do seu curso
- posta em movimento ou, ao contrário, parada. Ora, tudo leva a crer que
nesse caso o primeiro arrefecimento prolongado, em 161O ou 1620, se deveu
a uma quebra da produção das minas de prata da América. Talvez por causa
da "lei" dos rendimentos decrescentes, seguramente por causa da
diminuição da população indígena que fornecia a mão-de-obra
indispensável. E quando, nas imediações de

1500

- MENTE ATÉ 1660

DO OS JORNAIS HOLANDESES E DOCUMENTOS ANEXOS

12. CHEGADAS À EUROPA DE DINHEIRO AMERICANO lorineau (in Anuario de


histeria economica y social, 1969, pp. 257-359), graças a uma utilização
crítica das glandesas e das notícias cifradas dadas pelos embaixadores
estrangeiros em Madri, reconstituiu a curva das

5es de metais preciosos, no século XVII. Vê-se nitidamente o patamar,


depois a queda das chegadas a partir a vigorosa recuperação a partir de
166O (escala: 10,
20, 30... milhões de pesos).
udo recomeça a funcionar em Potosí, bem COMO nas minas de prata da Noanha
enquanto a Europa, ao que parece, ainda está às voltas com uma ite
estagnação -, o impulso vem da América, dos mineiros indígenas que n de
novo seus fornos tradicionais131 antes mesmo de se reanimarem as
grantalações mineiras "modernas". Em resumo, pelo menos por duas vezes, o
)rimordial (negativo, depois positivo) situou-se do outro lado do
Atlântico, érica.
as não é uma regra. Após 1713, quando, graças ao privilégio do asiento e,
rabando, os ingleses entram no mercado da América espanhola, logo o sub.i
com seus produtos, sobretudo os tecidos, vendidos a crédito aos revendea
Nova
Espanha e de outros lugares, em quantidades consideráveis. Deduz) retorno
em dinheiro. Dessa vez, o forcing inglês, impulso poderoso, é o do lado
europeu do oceano. Defoe explica candidamente, a propósito do processo em
Portugal, que se trata de "force a vend abroad"138, impor à venda no
exterior. Mas é preciso que os tecidos não demorem muito tempo r vendidos
no Novo Mundo.
is como distinguir, nesse caso, a oferta e a procura sem recorrer ao
esquema plo de Turgot? Em Sevilha, o total das mercadorias que se
amontoam nos da frota que está de partida e que os mercadores só
conseguem reunir esgos reservas pessoais de dinheiro e de crédito, ou
sacando, em desespero de etras sobre o estrangeiro (na véspera de cada
partida e até o regresso de )ta não há um maravedi para emprestar na
praça!), essa oferta que incenti)dução múltipla e diversificada do
Ocidente é acompanhada por uma pro)jacente, insistente e imperiosa, de
modo algum discreta: a praça e os merque investiram seus capitais nessas
exportações querem ser pagos com reIm prata, em metal branco. Do mesmo
modo, em Vera Cruz,
Cartagena ibre de Dios (mais tarde em Porto Belo), a procura de bens da
Europa, os erra ou de sua indústria (pagos geralmente muito caros), é
acompanhada i oferta evidente. Em 1637, na feira de Porto Belo, vêem-se
lingotes de pra

A economia em face dos mercados ta empilhados como montes de pedras"'.


Claro, sem esse "objeto do desejo- nada andaria. Também aí há ação
simultãnea da oferta e da procura.
Deveremos dizer que as duas ofertas - isto é, as duas produções que se
delineiam uma em face da outra - prevalecem sobre as duas procuras, sobre
os desejos, sobre "o que não tenho"? Não deveremos antes dizer que elas
existem apenas relativamente a procuras previstas e previsíveis?
De qualquer maneira, o problema não se coloca apenas nesses termos
econômicos (se bem que oferta e procura estejam longe de ser "puramente"
econômicas, mas isso é outra história). com toda a evidência, o problema
tem de ser colocado em termos de poder. Há uma rede de mando que passa de
Madri para Sevilha e, mais além, para o Novo Mundo. É de praxe escarnecer
das leis das índias, das Leyes de
Indias, em suma, da ilusão de uma autoridade real dos Reis Católicos do
outro lado do oceano. Admito que, naquelas terras distantes, nem tudo é
feito consoante a vontade deles. Mas esta atinge certos objetivos, aliás
é como que materializada pelo conjunto dos funcionários régios que não
zelam apenas pelos interesses pessoais. Não obstante, arrecada-se
regularmente um quinto em nome do rei, e os documentos mencionam sempre a
parte deste, nos retornos, ao lado da dos mercadores. Nas primeiras
ligações, esta parte era relativamente enorme, as naus voltavam, por
assim dizer, em lastro, mas já um lastro de barras de prata.
E a colonização não estava ainda bastante avançada para atrair muitas
mercadorias da Europa no outro sentido. Havia então mais exploração do
que troca, exploração que não parou nem desapareceu mais tarde. Por volta
de 1703, um relatório francês diz que

6 os espanhóis tinham-se acostumado [antes da guerra da Sucessão da


Espanha que acaba de rebentar, em 17011 a levar cerca de 4O milhões [de
libras tornesas] de mercadorias e a trazer cerca de 15O milhões em ouro,
prata e outras mercadorias"
isto de cinco em cinco anos140. Tais números representam apenas, claro, o
valor bruto das trocas. Mas seja qual for a correção necessária para
estabelecer o volume dos lucros reais, tendo em conta os custos da ida e
da volta, é um exemplo claro da troca desigual, com todas as implicações
econÔmicas e políticas que tal desequilíbrio pressupõe.
É certo que, para haver exploração, troca desigual ou forçada, não é
necessária a intervenção de um rei ou de um Estado. O galeão de Manila é
um circuito excepcional do ponto de vista comercial, mas não nos deixemos
enganar: a dominação é exercida em benefício dos mercadores do MéXiCO141.
Visitantes apressados das curtas feiras de Acapulco mantêm às suas
ordens, a meses e a anos de distância, os mercadores de Manila (que se
vingam nos mercadores chineses) tal como os mercadores da Holanda
mantiveram muito tempo às suas ordens os mercadores comissários de
Livorno. Quandohá uma relação de forças como esta, que significam
exatamente os termos "procura" e "oferta"?
A procura apenas
Dito isto, deixa de haver inconvenientes, penso, em separar
momentaneamente a procura em si do contexto em que se insere. A isso me
incentivam as observações dos economistas que, na atualidade, se debruçam
sobre o caso dos países sub149

, ju(_t uuN mercaaos


Ividos. Ragnar Nurkse 142 écategórico: é o cordão da procura que se deve
jando se quer dar partida ao motor. Pensar apenas em aumentar a produria
a falhas do motor. Bem sei que o que é válido para o Terceiro Mundo c) o
é, ipso facto, para as economias e para as sociedades do A ncien Régia
comparação leva a refletir, e nos dois sentidos. Esta observação de
Ques6): nunca faltam -consumidores que não podem consumir tanto quanto n:
aqueles que só comem pão preto e só bebem água gostariam de poder o
branco e beber vinho; aqueles que não podem comer carne gostariam comê-
la; aqueles que só têm roupas ordinárias gostariam de ter boas; aque[ão
têm lenha para se aquecer gostariam de poder comprá-la, etC.1143 _ da
apenas para o passado? Aliás, essa massa de consumidores não pára ntar.
Eu diria que há sempre, mutatis mutandis, uma "sociedade de conm
potencial. Só o volume de suas rendas, de que ela devora regularmente,
cilidade noventa por cento, limita-lhe o apetite. Mas é um limite que se
-, implacável, sobre a grande maioria dos homens. Os economistas france,
ulo XVIII estão, tanto quanto os economistas do Terceiro Mundo de
hoientes deste limite, procuram receitas capazes de aumentar as rendas e
o, cuja ruína, já dizia Boisguilbert, "é a ruína da renda"144. Em suma,
au, procura.
, evidentemente, há procura e procura. Quesnay, hostil ao "luxo
decorati2nde o "consumo de subsistência" 145 isto é, a ampliação da
procura coa "classe produtiva". Tem razão: essa procura é essencial
porque dura)lumosa, capaz de manter ao longo do tempo sua pressão e suas
exigênwto, de orientar a oferta sem erros. Qualquer aumento dessa procura
é al para o crescimento.
bido que essas procuras básicas derivam de opções antigas (o trigo, o
armilho)
cujas conseqüências e "derivações" 146 sãó muitas; de necessida- o homem
não pode escapar: o sal, a madeira, os têxteis... É decerto essas
necessidades primordiais, cuja história raras vezes foi feita, que de,
aliar as procuras maciças, essenciais, e as proezas que lhes corresponma
proeza que a
China tenha conseguido transportar para o Norte, até pela grande fluvial
do canal Imperial, o arroz, o sal, a madeira das proSul; que na índia se
efetuassem os transportes por mar do arroz de
Benencaminhamento, desta vez terrestre, do arroz e do trigo por caravanas
es de bois; que, em todo o Ocidente, circulem o trigo, o sal, a madeira;
de Peccais, no Languedoc, suba todo o Ródano até Seysse1147; que o diz,
de Setúbal, da baía de Bourgneuf vá do Atlântico para o mar do ara o
Báltico. Por isso, no fim do século XVI, bloquear o abastecimento [a um
meio de pôr as Províncias Unidas de joelhos. A Espanha sempre )M iSSO148.
to à madeira, cuja utilização maciça indicamos em nosso primeiro volusem
admiração que imaginamos os enormes tráficos que ela ensejou em os da
Europa ou da China: jangadas, comboios de madeira, troncos transmediante
flutuação nos rios, barcos que são demolidos quando chegam parte baixa do
Loire e em tantos outros cursos de água), navios marítigados de pranchas,
de barrotes ou até construídos especialmente para le) Oeste e para o Sul
os incomparáveis mastros do Norte. A substituição

A economia em jace aos mercaaos da madeira pelo carvão, pelo óleo


combustível, pela eletricidade requer muito mais de um século de
adaptações sucessivas. Quanto ao vinho, que está na base da civilização
da Europa, quase não há descontinuidades. Pierre Chaunu exagera um pouco,
mas só um pouco, ao dizer que as frotas do vinho são, nas economias do
Ancien Régime, o que o transporte de carvão será no século XVIII e mais
ainda no século XIX119. Por sua vez, o trigo, pesado, relativamente
barato, circula tão pouco quanto possível, na medida em que é cultivado
por toda a parte. Mas se uma má colheita fizer com que falte, se houver
déficits, fará então enormes viagens.
Ao lado dessas personagens maciças, pesadonas, a mercadoria de luxo é uma
pessoa esguia, mas brilhante e que faz muito barulho. O dinheiro corre
para ela, obedece-lhe as ordens. Há assim uma superprocura com tráficos
próprios e com suas variações de humor. O desejo, nunca muito fiel a si
próprio, a moda, pronta para trair, criam "necessidades" fictícias e
imperiosas, instáveis mas que só desaparecem para ceder o lugar a outras
paixões na aparência gratuitas igualmente: o açúcar, o tabaco, o álcool,
o chá, o café. E com freqüência, embora se continue a fiar e a tecer
muito em casa para o uso diário, são também a moda e o luxo que ditam as
procuras ao têxtil nos seus setores mais avançados, mais bem
comercializados.
No fim do século XV, os ricos trocam os tecidos de ouro e de prata pela
seda.
Esta, que se difunde e, em certa medida, se vulgariza, vai tornar-se
sinal de promoção social e, ao longo de mais de cem anos, acarretar um
último surto de prosperidade na Itália, antes que as manufaturas da seda
se desenvolvam em toda a Europa. Tudo muda de novo com a voga da fazenda
à inglesa, durante as últimas décadas do século XVII. No século seguinte,
é a irrupção brusca dos "tecidos pintados", ou seja, algodões estampados,
primeiro importados das índias, depois imitados na Europa. Na França, as
autoridades responsáveis lutaram desesperadamente para proteger as
manufaturas nacionais contra a invasão desses tecidos finos. Mas nada
adiantou, nem a vigilância, nem as apreensões, nem as prisões, nem as
multas, nem a imaginação desenfreada dos conselheiros - como
Brillon de Jouy, mercador da rua dos Bourdormais, em Paris, que propunha
que se pagasse a três esbirros, 50O libras cada um, "para despirem
[ ... ] em plena rua as mulheres vestidas com tecidos das índias" ou, se
a medida parecesse demasiado radical, enfarpelar "mulheres da vida com
tecidos das índias" para as despir publicamente, a título de exemplo
salutar150. Um relatório ao inspetor geral Desmaretz, em 1710, inquieta-
se seriamente com tais campanhas: irão obrigar as pessoas, numa época em
que os víveres estão tão caros, a moeda rareia, os títulos do governo tão
incômodos e pouco utilizáveis, a refazer os guarda-roupas? Aliás, como
agir contra a moda"'? Quando muito, ridicularizá-la, como Daniel Defoe,
em 1708, num artigo da Weekly Review: "Vemos pessoas de categoria
enfarpelar-se com tapetes da índia que, ainda há pouco tempo, suas
criadas de quarto achavam ordinários demais para si próprias; as chitas
levaram um empurrão, subiram do chão para as costas: de tapetes,
transformaram-se em saias, e até a Rainha, naquele tempo, gostava de se
mostrar vestida de China e de Japão, quero dizer, de sedas e de calicôs
da China. E não é tudo, pois nossas casas, nosso escritório, nosso quarto
também foram invadidos: cortinas, almofadas, cadeiras e até as próprias
camas, passaram a ser de calicôs e chitas."
Ridícula ou não, a moda, procura insistente, múltipla, desnorteante,
acaba sempre por prevalecer. Na França, mais de trinta e cinco decretos
não conseguiram "curar uns e outros dessa mania do contrabando [das
chitas]; de modo que, ao

151

eda chinês (lampa) da época de Lu(s XV, Museu Histórico dos Tecidos.
(Clichê

1-1 CLUflufIttU.11, j- ~ frtU1(_UU", confisco das mercadorias e da multa


de mil escudos aplicada a quem compra e a quem vende, fomos obrigados,
por edito de 15 de dezembro de 1717, a acrescentar também penas
corporais, entre outras trabalhos forçados perpétuos e outras ainda
maiores, se for preciso...- 152. A proibição acabou sendo retirada em
1759152 e estabeleceram-se no reino indústrias de chitas que logo fizeram
concorrência às da Inglaterra, dos Cantões suíços ou da Holanda - e até
às da índia152.
Os economistas que se interessam pelo mundo pré-industrial estão de
acordo num ponto: nele a oferta desempenha um papel reduzido. Falta-lhe
elasticidade; ela não é capaz de se adaptar depressa a qualquer
procura153. Mas há que distinguir entre oferta agrícola e oferta
industrial.
O essencial da economia, nessa época, é a atividade agrícola. Por certo
em algumas regiões do globo, particularmente na Inglaterra, a produção e
a produtividade dos campos aumentaram "revolucionariamente" graças a
certos fatores técnicos e sociais conjugados. Mas, mesmo na Inglaterra,
os historiadores verificaram com freqüência que foi o acaso das
sucessivas boas colheitas dos anos 1730-175O 154 que contou muito por
ocasião do progresso econômico da ilha. Em geral, a produção agrícola é o
domínio da inércia.
Em contrapartida, há dois setores - o da indústria, em primeiro lugar, e
o do comércio - nos quais são evidentes alguns progressos, se bem que,
até a mecanização de um lado e enquanto uma proporção muito grande a
população viver na semiautarcia da pequena agricultura, um teto ao mesmo
tempo interno e externo limite qualquer impulso um pouco mais vigoroso.
Quanto à indústria, porém, eu diria, segundo considerações discutíveis
que visam apenas a uma ordem de grandeza, que o volume de sua produção
foi multiplicado, na Europa, pelo menos por cinco, entre

160O e 1800. Creio igualmente que a circulação modificou, ampliou seus


serviços.
Houve interligação das economias antes separadas, multiplicação das
trocas. No vasto espaço francês, desse ponto de vista um ótimo campo de
observação, essa interligação foi o fato mais marcante do século XVIII,
na opinião dos historiadores 155.
Portanto, e era a isso que eu queria chegar, a oferta que, no fim do
século
XVIII, se apresenta perante o ogre que é o consumo, já não é tão franzina
e discreta como antes se poderia supor. E ela vai, claro, fortalecer-se
com os progressos da Revolução industrial. Por volta de 1820, ela já é
uma grande personagem. E é muito natural que os economistas fiquem
atentos ao papel que desempenha, e seus admiradores. A oferta recebe uma
enorme promoção com o enunciado e divulgação da "lei`56 chamada de Jean-
Baptiste Say (1767-1832).
Este admirável vulgarizador, não um "homem de gênio", afirmava Marx, não
foi o autor dessa lei (também chamada "dos escoamentos" ou "dos
mercados"), assim como
Thomas Gresham não criou a célebre lei que tem seu nome. Mas só se
empresta aos ricos e J.-B. Say dava a impressão de dominar o pensamento
dos economistas do seu tempo. com efeit , o, elementos da lei dos
mercados já se encontram em Adam
Smith, e mais ainda em James Stewart (1712-1780). E Turgot já não lhe
esboça a fórmula quando atribui a Josiah Child esta "máxima
incontestável: o trabalho de um homem proporciona trabalho a outro
homem"1579 Em si,

ia lei muito simples de enunciar: urna oferta no mercado provoca


regularmente
Procura. Mas, como essa simplicidade esconde, como sempre, uma complexi,
de fundo, cada economista desenvolveu tal enunciado como quis. Para John
rt Mil]
(1806-1873), --qualquer aumento da produção, se é distribuído sem erle
cálculo por todos os tipos de produtos, conforme as proporções requeridas
interesse privado, cria, ou melhor, constitui a sua própria procura' 158.
ISSO rica claro, com o pretexto de sê-]o em demasia. Em Charles Gide
(1847-1932), or desprevenido não compreenderá imediatamente. "Cada
produto encontra mais escoamento quanto maior é a variedade e a
abundância de outros pro;'3159 - em suma, uma oferta encontra sua procura
com mais facilidade quansuperabundância de ofertas. Escreve Henri Guitton
(1952): "As duas mãos estendidas, uma para dar, a outra para receber [...
1 A oferta e a procura são as expressões de uma mesma realidade.-- 16O E
é verdade. Outra maneira de ar as coisas com mais lógica: a produção de
um bem qualquer, que num pra, is ou menos curto será oferecido no
mercado, acarretou, por seu próprio prouma distribuição de dinheiro..foi
preciso pagar as matérias-primas, liquidar de transporte distribuir
salários aos operários. Uma vez distribuído, o desormal desse dinheiro é
reaparecer, mais cedo ou mais tarde, sob a forma de -a ou, se se
preferir, de compra. A oferta marca encontro consigo mesma. sta lei de
Say terá sido a lei, a explicação de várias gerações de economistas iase
nunca a puseram em dúvida, com poucas exceções, até cerca de 1930. leis,
ou pretensas leis econômicas, duram talvez o quanto duram as realidas
desejos de uma época econômica de que foram os espelhos e as
interpretaais ou menos fiéis. Outra época traz novas "leis". Por volta de
1930, Keynes a sem esforço a lei centenária de Say. Entre outros
argumentos, pensa ele beneficiários da oferta em vias de se criar não
estão forçosamente dispostos entar-se imediatamente no mercado como
compradores. O dinheiro dá posde de escolha: guardá-lo, gastá-lo ou
investi-]o. Mas o nosso objetivo não, ntar com maior profundidade a
crítica de Keynes, que certamente foi ferealista no seu tempo. Keynes ter
tido ou não razão, em 1930, não nos a. E J-B.
Say ter tido ou não razão em 1820, também não. Teria ele razão aplicar-
se-ia a sua lei) quanto ao período anterior à Revolução industrial?
-gunta e só ela nos diz respeito, mas não estamos certos de poder dar-lhe
posta satisfatória.
es da Revolução industrial, encontramo-nos perante uma economia que
freente emperra, na qual os diversos setores não se correlacionam bem,
não ) mesmo ritmo, seja qual for a conjuntura. Se um toma impulso, não
ar, çosamente os outros. E podem até desempenhar todos, um de cada vez,
[e gargalo de estrangulamento num processo nunca regular. Sabemos bem
iercadores daquele tempo se queixam por princípio e exageram. Mas,
enmentem sistematicamente, não inventam suas dificuldades nem as
reviraconjuntura, as rupturas, as avarias, as falências, mesmo no topo
dos pontos Éro do dinheiro. O setor da produção "industrial" - aquele em
que Say a não pode esperar, em tais condições, que sua oferta receba uma
acolhida, e duradouramente calorosa. O dinheiro que esta produção
distribuiu e de modo desigual por fornecedores de ferramentas,
fornecedores de

3rimas, transportadores e operários. Estes últimos representam o grande


espesa.
Ora, trata-se de singulares "agentes" econômicos. Entre eles o

dinheiro vai imediatamente, como se costumava dizer, I 'da mão para a


boca--.
Por isso é que --a circulação da moeda se torna mais rápida à medida que
passa pelas classes subalternas', 161 sendo a mais ágil a do dinheiro
miúdo, explica lsaac de Pinto. Um parlamentar alemão, F. W. von
Schrõtter162 prega o desenvolvimento da atividade manufatureira como meio
de desenvolver a circulação monetária (1686). Distribuir dinheiro aos
artesãos é perdê-lo apenas por momentos: ele regressa a galope à
circulação geral. Acreditamos piamente, uma vez que Ricardo, ainda em
1817, considera que o "salário natural" do operário, em torno do qual
oscila o "salário corrente", é o que lhe fornece os meios de subsistir,
de perpetuar a espécie' 63. Ganhando apenas o estritamente necessário,
submete-se primeiro à procura alimentar: responde sobretudo à oferta
agrícola e, aliás, é o preço dos gêneros alimentícios que lhe determina o
salário. Não se trata portanto de uma procura dos objetos manufaturados
que ele produziu, muitas vezes objetos de luxo 164. E, neste caso, a
oferta considerada apenas criou, a favor destes, uma procura quando muito
indireta.
Quanto à produção agrícola, seus excedentes irregulares não são tão
grandes para que a venda dos gêneros acarrete, por parte do meeiro, do
diarista ou do pequeno proprietário, uma procura indireta considerável de
produtos manufaturados.
Em suma, é nesse pesado contexto que devemos entender o pensamento, para
nós tão facilmente aberrante, dos fisiocratas. Será tão errado assim pÔr
no primeiro plano a produção e a riqueza agrícolas, numa época em que a
oferta de gêneros agrícolas teve sempre dificuldade em corresponder à
procura, em seguir os surtos demográficos? lnversamente, não se deverão
os acidentes tão freqüentes da indústria à procura demasiado débil, quer
da população rural, quer dos artesãos e operários citadinos? A distinção
que F. J. Fisher 165 faz entre uma agricultura freada pela oferta e uma
indústria freada pela procura é uma síntese que descreve bastante bem as
economias do Ancien Régime.
Nestas condições, temo que a lei de Say valha ainda muito menos no que
concerne aos séculos anteriores à Revolução do que no que concerne ao
nosso século.
Aliás, os manufatores do século XVIII só lançam seus grandes
empreendimentos com subvenções, empréstimos sem juros, monopólios que lhe
são concedidos antecipadamente. Empresários abusivos, pensarão. Ora, nem
todos são bemsucedidos, muito pelo contrário, nessas condições miríficas.
A oferta crescente, capaz de fabricar integralmente necessidades novas, é
o futuro, a ruptura que a mecanização tornou possível. Ninguém disse
melhor do que Michelet quanto a
Revolução industrial foi, na verdade, uma revolução da procura, uma
transformação dos "desejos", para empregar a palavra de Turgot que não
deve desagradar a alguns filósofos atuais. Em 1842, escreve ele, "a
fiação estava em apuros. Sufocava; os armazéns estavam abarrotados, não
havia vendas. O fabricante, aterrado, não ousava trabalhar, nem parar de
trabalhar com aquelas máquinas devoradoras. [ ... 1 Os preços baixavam em
vão; novas baixas, até que o algodão caísse para seis soldos. [ ...] Aí,
houve algo inesperado. Estas palavras, seis soldos, foram um alerta.
Milhões de compradores, gente pobre que nunca comprava nada, puseram-se
em movimento. Viu-se então que imenso e poderoso consumidor é o povo,
quando se volta para isso. Os armazéns esvaziaram-se num instante. As
máquinas recomeçaram a trabalhar furiosamente. [...] Foi uma revolução na
França, pouco notada, mas grande; revolução na higiene, embelezamento
súbito do lar do pobre; roupa de vestir, roupa de cama, de mesa,
cortinas: classes inteiras, que nunca as tiveram desde a origem do mundo,
passaram a tê-las'9166.

ADOS TÊM A GRAFIA parágrafo anterior, esquecemo-nos do mercador para só


vermos o papel ;ões e regras econômicas. Esquecê-lo-emos novamente no
parágrafo que para considerarmos apenas os mercados em si proprios: o
espaço que ocui volume, seu peso, em suma sua geografia retrospectiva.
Pois qualquer ipa um espaço e nenhum espaço é neutro, isto é, não
modificado ou não do pelo homem.
oricamente falando, é portanto útil desenhar o espaço instável dominado
firma, uma praça comercial, uma nação, ou ocupado por determinado : o
trigo, o sal, o açúcar, a pimenta-do-reino, até os metais preciosos. É
ieira de pôr em destaque o impacto da economia de mercado num dado uas
lacunas, suas imperfeições freqüentes e, da mesma forma, seus
dinapermanentes.
mercador está sempre em contato com compradores, fornecedores, emres,
credores.
Marquemos o domicílio desses agentes num mapa: desenha)aço que, no seu
conjunto, rege a própria vida do mercador. Quanto maior -spaço, maior a
possibilidade de o mercador em questão ser importante ípio e quase sempre
de fato.
)na dos negócios tratados pelos Gianfigliazzi167 mercadores de Florença s
na
França durante a segunda metade do século XIII, abarca os Alpes, :) o
Delfinado, o vale do Ródano; para oeste, atuam até Montpellier e CarTrês
séculos mais tarde, em 1559, segundo suas cartas e seus registros, os de
Antuérpia167 - da grande família toscana de importância e renome
- operam no interior de um fuso longo e estreito que vai do mar do
Norditerrâneo, até Pisa e Florença, e se ramifica para o Sul. É este
mesmo c)utro quase igual, dos Países Baixos à Itália, que, durante a
primeira me, culo
XVI, dirige e contém as atividades dos Salviati de Pisa, cujos
monuxquivos estão ainda praticamente inexplorados. No século XVII, as
redes Lêni tendência para se estender por todo o Mediterrâneo ao mesmo
tempo in o domínio do Norte. Um registro de "c~essioni e ordini" (1652-
1658) a toscana dos Saminiati168, que instalou em Livorno o centro dos
seus newela uma rede essencialmente mediterrânea: Veneza, Esmirria,
Trípoli da poli da Barbária, Messina, Gênova e
Marselha ocupam os primeiros lugatantinopla, Alexandreta, Palermo, Argel
aparecem muitas vezes. Os pon.itato com o norte são Lyon e, sobretudo,
Amsterdam. Os barcos utilizam geral holandeses ou ingleses. Mas Livorno é
Livorno e encontramos, lamentos da firma, menção de dois navios que
carregam em
Arkangel cou-lhos da Rússia. A exceção que confirma a regra!
spuséssemos de centenas ou de milhares de levantamentos desse gênero, ;e-
ia por si só uma tipologia útil do espaço mercantil e das firmas. Apren

13. AS RELAÇÕES COMERCIAIS DA FIRMA SAMINIATI NO SÉCULO XVII


Afirma Saminiati, instalada em Florença e em Livorno, cujos numerosos
documentos salvos in extremis por Armando Sapori são conservados na
Bocconi (Milão). A zona tracejada (centro e norte da Itdlia) corresponde
às relações intensas da firma.
Esta está presente em todo o Mediterrâneo: em Cddiz, em Lisboa; e também
no
Norte (Paris, Lyon, Frankfürt-am-Main, Lille, Londres, Amsterdam,
Hamburgo e
Viena). Mapa elaborado por M.-C. Lapeyre.
deríamos a opor, a explicar um pelo outro o espaço das compras e o espaço
das vendas, a distinguir o que se junta e o que se dispersa. A distinguir
o espaço fuso, praticamente linear, que parece a imagem de uma dobra
sobre o eixo essencial, e o círculo de grandes proporções que
corresponderia aos períodos de desenvolvimento e de trocas fáceis. Ao
segundo ou terceiro exemplo, deixaríamos de duvidar que o mercador faz
fortuna - o que é óbvio - quando se incorpora solidamente à área de uma
grande praça comercial. Já dizia Cotrugli, ragusano do século XV: "É nos
grandes lagos que se pescam os grandes peixes.`69 Também gosto da
história contada por Eric Maschke17O sobre um mercador e cronista de
Augsburgo cujas primeiras tentativas foram muito difíceis e que só
começou a equilibrar a vida quando foi para Veneza. Do mesmo modo, as
duas datas características da fortuna dos Fugger são: setembro de 1367 -
Hans Fugger abandona a aldeia natal de Graben para ir à vizinha
Augsburgo, onde se instalará com a família como tecelão de Barchent
(fustão) - e 1442: seus herdeiros tornamse mercadores de longa distância,
relacionados com as grandes cidades vizinhas e com Veneza111. Trata-se de
fatos que se repetem cem vezes, fatos banais.
Federigo Melis cita o caso dos Borromei, originários do contado de Pisa,
"che allafine del secolo XVsi milanesizzarono", se "milanizaram" e logo
fizeram fortunal72.

14. OS BUONVISI CONQUISTARAM TODA A EUROPA a Europa mercantil é coberta


pela rede das firmas dos Buonvisi, mecadores de
Luca instalados em através dos parentes e correspondentes em todas as
praças importantes. AS letras de câmbio tecem os mais diversos
negócios--. Trata-se aqui do número de letras trocadas, não do seu
montante. Emboconfiar inteiramente na imPressào, dada por este grdfico,
de uma posição beneficiária dafirma por (vo em Nantes e em Toulouse.
Seria interessante conhecer a realidade do pequeno trdfico de letras yon
e o trdfico anormal para Luca, a cidade de onde são origindrios os
Buonvisi. (Mapa elaborado sboço de Françoise Bayard, --Les
Buonvisi, marchands banquiers de Lyon, 1575-1629-- in Annales

9. 1.242 e 1.243.)

O espaço do mercador é um pedaço do espaço nacional ou internacional numa


dada época. Se a época está sob o signo do desenvolvimento, a superfície
comercial onde atua o negociante tem possibilidades de ampliar-se
rapidamente, sobretudo se ele está ligado aos grandes negócios, letras de
cãmbio, moedas, metais preciosos, "mercadorias régias" (como as
especiarias, a pimenta-do-reino, a seda) ou à moda, por exemplo o algodão
da Síria necessário aos tecelões do fustão. Uma consulta muito imperfeita
dos arquivos de Francesco Datini, de
Prato, deixou-me com a impressão de que o grande negócio, por volta de
1400, é a circulação de letras de câmbio de Florença para Gênova, para
Mompellier, para
Barcelona, para Bruges, para Veneza. No final do século XIV e primeiros
anos do século XV, o espaço financeiro seria mais precoce, mais extenso
do que qualquer outro?
Se o progresso do século XVI conduz, como já afirmei, à ativíssima
superestrutura das feiras e das praças, compreender-se-á melhor a brusca
expansão do espaço que abriga os múltiplos negócios dos Fugger e dos
Welser de
Augsburgo. Na escala do século, são enormes empresas que assustam os
outros mercadores e a opinião pública apenas pela sua dimensão. Os Welser
de Augsburgo estão presentes em toda a Europa, no Mediterrâneo, no Novo
Mundo, na Venezuela em 1528, onde a perfídia espanhola e terríveis
atrocidades locais os conduzem ao fracasso que já conhecemos. Mas não
estão estes Welser, deliciados, onde quer que haja riscos para correr,
fortunas para edificar ou perder? Cem vezes mais racionais, os Fugger
representam um triunfo ainda maior, mais sólido também. São donos das
maiores empresas mineiras da Europa central, na Hungria, na Boémia, nos
Alpes. Estão solidamente estabelecidos, mediante terceiros, em Veneza.
Dominam Antuérpia que, no princípio do século XVI, é o centro ativo do
mundo.
Chegam cedo a Lisboa, à Espanha, onde alinham ao lado de Carlos V; vamos
encontrá-los no Chile em

1531, embora o abandonem um tanto rapidamente, em 1535 173. Em 1559,


abrem em Fiume (Rijecka) e em Dubrovnik174 uma janela pessoal para o
Mediterrâneo.
No fim do século XVI, quando passam por enormes dificuldades, participam,
por uns tempos, do consórcio internacional da pimenta-do-reino, em
Lisboa. Enfim, estão na índia por intermédio do compatriota, Ferdinand
Cron, que chega à índia em 1587, aos 28 anos, e representará em Cochim,
depois em Goa, os Fugger e os
Welser. Ficaria no país até 1619, tendo tido tempo para fazer uma enorme
fortuna, para prestar inúmeros serviços a seus patrões distantes da
Espanha e, localmente, a patrões portugueses de quem conhecerá, em 1619,
a maior ingratidão, as prisões e a iniqüidade175. Em suma, o império da
enorme firma foi mais vasto do que o império de Carlos V e de Filipe II
no qual, como é sabido, o sol nunca se punha.
Mas não são esses colossos, personagens de vulto da história, os mais
significativos. O que nos interessa são as médias, portanto firmas de
diversos portes, e suas variações de conjunto. No século XVII, seu volume
parece, em média, restringir-se. No século XVIII, tudo aumenta de novo: a
finança vai até os limites da Europa, ou mesmo do mundo. A internacional
dos muito ricos está mais bem instalada do que nunca. Mas para dar
justificação a esse esquema seria necessário multiplicar os exemplos e as
comparações. Todo um trabalho minucioso que está por fazer.

ia cidade está no centro de espaços ligados entre si: há o círculo dos


abastes;
o círculo dos utilizadores de sua moeda, de seus pesos e medidas; o
círcude lhe vêm seus artesãos e seus novos burgueses; o círculo de seus
negócios to (é o círculo mais extenso); o círculo de suas vendas e de
suas Compras; os sucessivos atravessados pelas notícias que chegam a ela
ou que dela saem. o a loja ou o armazém do mercador, a cidade ocupa o
espaço econômico outorgam sua situação, sua fortuna, a longa conjuntura
que estiver atra). Define-se a cada momento pelos círculos que a rodeiam.
Mas a sua menstá ainda por interpretar.
im testemunha perante nós a cidade de Nuremberg por volta de 1558, ano ;e
publica o Handelsbuch do nuremberguês Lorenz Meder. Neste livro colue
acaba de ser reeditado e comentado por Hermann Kellenbenz 176, Lorenz
propõe a dar aos concidadãos informações práticas, não resolver o
problespectivo que nos preocupa, ou seja, o levantamento e a
interpretação correspaços comerciais de
Nuremberg. Mas suas indicações, completadas por

1 Kellenbenz, permitiram elaborar o mapa bastante rico de dados da página


Ele fala por si só. Nuremberg, cidade de primeira grandeza, industrial,
merrianceira, ainda é, no segundo terço do século XVI, levada pelo
impulso mas décadas antes, fizera da Alemanha um dos motores da atividade
euroremberg está, portanto, associada a uma economia de raio amplo e seus
que são enviados para longe, chegam ao Oriente Próximo, às índias, à Novo
Mundo.
Contudo, suas atividades permanecem circunscritas ao es)peu. A zona
central dos seus tráficos estende-se praticamente por toda a a, mediante
ligações de curto e médio alcance. Veneza, Lyon, Medina del.isboa,
Antuérpia, Cracóvia, Breslau,
Posen, Varsóvia são as escalas e os sua ação de longo alcance, praças
onde, de algum modo, atua.
es MüIler 177 mostrou que Nuremberg fora, durante a primeira parte do
sécomo que o centro geométrico da vida ativa da Europa. Não há nisso
exairrismo. Mas por que foi assim? Decerto por causa do aumento de
ativiransportes terrestres. E também pelo fato de Nuremberg se situar a
meio ntre Veneza e Antuérpia, entre o
Mediterrâneo, espaço antigo, e o Atlântis que dele dependem), novo espaço
da fortuna da Europa. O eixo Venezapermanece sem dúvida, durante todo o
século XV, o "istmo" europeu de todos. Os Alpes interpõem-se, é certo,
mas são teatro de um contínuo que tange a transportes - como se a
dificuldade tivesse fabricado um comunicações superior aos outros.
Portanto, não nos admiremos demais rmos que a pimenta-do-reino, no fim do
século XVI, chega a Nuremberg ntuérpia como por
Veneza. A pimenta-do-reino do sul e a do norte estão e igualdade, que a
mercadoria pode muito bem ir, e desta vez sem parar, )ia a Veneza ou de
Veneza a
Antuérpia. Por mar e por terra.
que esta é uma situação da economia alemã em determinada época. A c),
ocorre um movimento de gangorra a favor da Alemanha oriental, da mais
continental. Esta subida do Leste concretiza-se já no século XVI, Jepois
das falências de 157O em
Nuremberg e em Augsburgo, com a as-ciPzig e de suas feiras. Leipzig
consegue impor-se às minas da Alema

15. UM ESPAÇO URBANO: A IRRADIAÇÃO DE NUREMBERG POR VOLTA DE 1550

Segundo Das Meder'sche HandeIsbuch, pp. Hermann Kellenbenz, 1974, Lõblem


é o nome alemão de Lublin.
nha, reunir dentro dela o mercado mais importante dos Kuxen, ligar-se
diretamente a Hamburgo e ao Báltico libertando-se da escala de
Magdeburgo. Mas mantém-se também fortemente ligada a Veneza, as
"rnercadorias de Veneza"
sustentam um setor inteiro da sua atividade. Torna-se, além disso, o
lugar por excelência de passagem dos bens entre oeste e leste. com os
anos, afirma-se esse desenvolvimento. Em 1710, pode-se dizer que as
feiras de Leipzig são "weit importanter und considerabler" que as de
Frankfürt-am-Main, pelo menos quanto a mercadorias, porque a cidade do
Meno ainda é, nessa época, um centro financeiro de importância superior à
de Leipzig178. Os privilégios do dinheiro têm sete vidas.
Como vemos, os espaços urbanos são de interpretação difícil, uma vez que
os documentos não correspondem muito às nossas exigências. Mesmo um livro
tão rico como o de Jean-Claude Perrot, recentemente publicado, Genèse
d'une ville moderne, Caen au XVIIIe siècle (1975), não pode resolver
todos os problemas por ele examinados com minúcia e inteligência
exemplares. Não é de admirar que o esquema teórico de Van Thünen seja
válido para Caen: é fácil fixar ao redor da cidade, grudado a ela, até a
invadindo, "um cinturão hortícola e leiteiro";
depois, uma zona de cereais179; uma zona de gado. Porém seria mais
difícil distinguir as áreas onde são difundidos os produtos industriais
fabricados pela cidade e os mercados e feiras pelos quais são
distribuídos. O mais significativo não é o jogo duplo entre espaço
regional e espaço internacional que a cidade tem de praticar: duas
circulações diferentes, a primeira capilar e de curta distância,
contínua; a segunda, intermitente e que, em casos de crise alimentar, tem
de lançar mão dos transportes flu

[o Sena, ou dos tráficos marítimos a partir de Londres e de Amsterdam, is


sistemas se ajustam, se opõem, ou se somam, ou se sucedem. A maneira LI a
vida internacional afeta uma cidade qualifica-a tanto, e por vezes mais,
i sua ligação perene com as que lhe são próximas. A história geral se
sobrestória local.
muitas dificuldades, poderíamos escrever uma história dos grandes
mermatériasprimas, entre os séculos XV e XVIII, a exemplo do manual
clásernand Maurette sobre o mundo dos anos 1920110. E, se quiséssemos
sene cingir-nos a exemplos significativos, só teríamos o embaraço da
escolha: mercadorias de grande saída se oferecem para testemunhar, e seus
testeembora muito diferentes, convergem ao menos num ponto: as cidades
mais s mercadores mais considerados, os mais brilhantes destes tráficos
impliiços enormes. A extensão é o sinal obstinado da riqueza e do
sucesso. O das especiarias - "palavra que abrange uma espantosa
diversidade de prolesde os que servem para "ressaltar o sabor dos
pratos... [até os] produtos [e as] matérias necessárias à tintura dos
tecidos"181 - é a tal ponto coclássico, que hesitamos em propô-lo como
modelo. Sua vantagem estaria entar um crescimento de longa duração, com
episódios alternados e deséculo XVII, um evidente refluxo182. Mas já nos
explicamos sobre esse
O açúcar, pelo contrário, é um produto relativamente novo que, do séio
século
XX, não cessou de ampliar num ritmo rápido tanto o seu consuo seu espaço
de distribuição. À parte algumas exceções minúsculas (o bordo, o açúcar
de milho), o precioso produto é obtido, até a época do continental e a
utilização da beterraba açucareira, a partir da cana-desta, como já
demonstramos

184, deslocou-se da índia para o Mediterrâa o Atlântico (Madeira,


Canárias,
Açores, São Tomé, Príncipe, depois stas tropicais do continente
americano,
Brasil, Antilhas... ). Tal progresda mais notável porque exigia, dados os
meios da época, elevados Itos.
ri, o açúcar, que continua, como outrora, a figurar no arsenal do
boticáásta cada vez mais as cozinhas e as mesas. Nos séculos XV e XVI, é
ainda to de alto luxo, objeto de presentes principescos. Em 18 de outubro
de i de Portugal oferece ao soberano pontífice a sua efígie em tamanho
naada por doze cardeais e trezentos círios de um metro e meio cada um,
eccionado por um paciente confeiteiro18. Mas, embora ainda não seja
consumo do açúcar faz progressos. Em 1544, diz-se correntemente na
"Zucker verderbt keine Speis", o açúcar não estraga nenhuma comirasil
começou seus fornecimentos: em média, 1.60O toneladas por ano XVI. Em
1676, são 40O navios carregados, em média, de 18O toneladas (ou seja, 72
mil toneladas) que largam da
Jamaica181. No século XVIII, rigos produzirá outro tanto, quando não
mais188.
ao vamos imaginar um mercado europeu submerso pelo açúcar do Atlânam
surto açucareiro que seria a principal razão do surto oceânico e, indi

Engenho de açúcar no Brasil. Desenho atribuído a F. Post, c. 1640. Notar


no primeiro plano o característico carro de bois de rodas maciças e as
juntas de animais que movimentam as moendas. (Fundação Atlas van Sto1k.)
retamente, da modernidade crescente da Europa. Esse determinismo
elementar seria, aliás, derrubado sem dificuldades: não será o progresso
da Europa que, incentivada também pela paixão, possibilitou o surto do
açúcar, depois o do café?
É impossível seguirmos aqui a maneira pela qual foram instalados, peça a
peça, os elementos da extensa história açucareira: os escravos negros, os
senhores de engenho, as técnicas de produção, a refinação do açúcar
bruto, o abastecimento dos engenhos com víveres baratos, pois não podem
alimentar-se a si próprios;
enfim as ligações marítimas, os armazéns e a revenda na Europa. Por volta
de

1760, quando tudo está em ordem, são oferecidos em Paris e em outros


mercados os açúcares "mascavados, cristalizados, açúcar de sete libras,
açúcar real, açúcar semireal, açúcar cande e açúcar vermelho, também
chamado de Chipre. O born mascavado deve ser esbranquiçado, o mais fino
possível e quase sem sabor de queimado.
O cristalizado, também chamado Açúcar das Ilhas, deve ser escolhido
branco, seco, granuloso, com gosto e cheiro de violeta. O melhor*vem do
Brasil, mas seu comércio quase desapareceu; o de Caiena tem o segundo
lugar e a seguir o das
Ilhas. Os confeiteiros usam muito açúcar cristal do Brasil e das Ilhas
nos seus preparados, dão-lhe até mais importância do que ao açúcar
refinado, pois os doces feitos com ele são mais bonitos [ ... 1 e menos
sujeitos a açucarar`89. É óbvio que nessa época o açúcar perdeu o
prestígio da raridade. Tornou-se artigo de mercearia e de confeitaria.
Mas o que nos interessa aqui é mais o significado das experiencias
açucareiras que conhecemos um pouco para o homem de negócios. E, acima de
tudo, que o açúcar se mostrasse, desde o início da sua carreira
mediterrânica, um excelente negócio. A este respeito, o exemplo de Veneza
e do açúcar de Chipre é claro, uma vez que se apresenta, em benefício da
família dos Corner - --reis do açúcar" -, como um monopólio em vão
contestado. Em 1479, quando Veneza ocupa Chipre, ganha uma guerra do
açúcar.
Estamos mal informados sobre a empresa açucareira dos Corner. Mas as
outras experiências conhecidas deixam uma impressão que, a priori, não
surpreende

a PrOduÇão, na cadeia das operações açucareiras, nunca é o setor do


grande

1 Sicília, nos séculos XV e XVI, os engenhos de açúcar, sustentados por


movês, revelam-se negócios medíocres ou mesmo maus. Do mesmo mo>m do
açúcar nas ilhas atlânticas, no princípio do século XVI, pôde
ensesubstanciais. Mas, quando os
Welser, grandes capitalistas, compram, em as nas Canárias e lá formam
plantações de açúcar, acham a empresa poul e a abandonam em 1520190. A
situação é a mesma, no século XVI, com ios brasileiros: provêm a
subsistência do fazendeiro, o senhor do engenão o deixam riquíssimo. Não
é diferente a impressão em São
Domingos, sua produção recorde. Será por essa razão peremptória que a
produção ia para o plano inferior do trabalho servil? Só aí ela encontra,
pode enequilíbrio.
i constatação vai mais longe. Todo mercado capitalista tem seus elos su,
no centro, um ponto mais alto e remunerador do que os outros. Por io
comércio da pimenta-do-reino, esse ponto alto será durante muito tempo >
dei Tedeschi: nele se acumula a pimenta-do-reino veneziana, depois
torpara os compradores alemães.
No século XVII, o centro da pimenta-do)s grandes armazéns da Oost
Indische
Compagnie. Para o açúcar, intei., eso nas malhas da troca européia, as
ligações são mais complicadas por[so possuir a produção para possuir o
ponto alto do comércio. O açúcar ó adquire grande importância com a
segunda metade do século
XVII e vimento, em datas diferentes (conforme as ilhas), das Antilhas. Em
1654, rdem o Nordeste brasileiro, os holandeses sofrem uma derrota que os
decisivos da produção inglesa e francesa vão agravar ainda mais. Em ve
partilha da produção, depois partilha da refinação (operação
essenalmente, partilha do mercado.
- rã havido mais que esboços de um mercado dominante do açúcar: em por
volta de

1550, cidade que conta então com 19 refinarias de açúcar; a, depois da


deterioração do mercado de Antuérpia, em 1585. Amstere proibir, em 1614,
a utilização de carvão-de-pedra nas refinarias porava a atmosfera; seu
número porém aumenta sem parar: 40, em 1650;

1. Mas, nesse século mais representativo do mercantilismo, as econoiais


defendem-se, conseguem reservar para si o seu próprio mercado., 'rança,
onde
Colbert protege o mercado nacional com as tarifas de 1665, prosperar
refinarias em Dunquerque, em Nantes, em Bordeaux, em La n Marselha, em
Orléans... Por conseguinte, a partir de 1670, o açúcar estrangeiro deixa
de entrar na França;
pelo contrário, é exportado, em ma espécie de incentivo à exportação
devido a uma redução retrospecitos aduaneiros arrecadados, à entrada,
sobre os açúcares brutos, quando portados sob a forma de açúcar refinado.
O que também favorece

3 francesa é o fato de o consumo nacional ser baixo (1/1O da produção


itra 9/1O na Inglaterra) e de as fazendas receberem da metrópole um to
mais barato (dado o nível inferior dos preços franceses) do que a
astecida sobretudo pela
Inglaterra, apesar da contribuição da América screve o Journal du
Commercel 92:
"Antes da Guerra [aquela que será ; Sete Anos], os açúcares das colÔnias
inglesas eram em Londres até Lros do que os das colônias francesas nos
portos da França, ambos de

igual qualidade. Este excesso de preço não pode ter outra causa senão o
preço excessivo dos gêneros alimentícios que a Inglaterra fornece às suas
colônias; e, a tal preço, que pode a Inglaterra fazer dos excedentes do
seu açúcar?"
Evidentemente, consurni-los. Uma vez que, é preciso acrescentar, o
mercado interno inglês já é capaz disso.
Em todo o caso, apesar das exportações e revendas dos grandes países
produtores, a nacionalização dos mercados do açúcar, mediante a compra do
açúcar bruto e instalação de refinarias, propagou-se por toda a Europa. A
partir de 1672, aproveitando as dificuldades da Holanda, Hamburgo
desenvolve suas refinarias e aperfeiçoa processos novos cujo segredo
tentará guardar. E criam-se refinarias até na Prússia, na Áustria e na
Rússia, onde são monopólios do Estado. Para conhecermos com exatidão os
movimentos dos mercados do açúcar e os verdadeiros pontos de lucro, seria
necessário reconstituir a complicada rede das ligações entre as zonas
produtoras, as praças financeiras que dominam a produção, as refinarias
que são um meio de controlar parcialmente a distribuição por atacado.
Abaixo destas "manufaturas", as inúmeras lojas de revenda conduzem-nos ao
nível normal do mercado e seus lucros modestos, submetidos a rigorosa
concorrência.
No conjunto da rede, onde situar o ou os pontos altos, os elos
lucrativos?
Agradar-me-ia dizer, a partir do exemplo de Londres, que é na fase do
mercado por atacado, nas imediações dos armazéns onde se empilham caixas
e barris de açúcar, perante os compradores de açúcar branco ou de açúcar
escuro (o melaço)
conforme se trata de refinadores, de confeiteiros ou de simples
compradores. A fabricação do açúcar branco, reservado às refinarias
metropolitanas, acaba por se estabelecer nas ilhas, apesar das primeiras
proibições. Mas não será esse esforço industrial um sinal das
dificuldades que as ilhas produtoras atravessam?
A posição chave no mercado atacadista, em nossa opinião, situa-se depois
das refinarias, que, ao que parece, não tentaram os grandes mercadores.
Mas, para termos certeza disso, seria necessário conhecer melhor as
relações entre negociantes e refinadores.
Mas deixemos o açúcar, ao qual, aliás, teremos ainda ocasião de voltar.
Temos algo melhor à nossa disposição: os metais preciosos, que envolvem
todo o planeta, que nos levam ao plano mais alto das trocas, que
assinalariam, se necessário, essa hierarquização permanentemente retomada
da vida economica que se empenha em realizar proezas e em bater recordes.
Há sempre oferta e procura dessa mercadoria onipresente, sempre cobiçada,
que dá a volta ao mundo.
Mas a expressão "metais preciosos", que vem tão facilmente à pena, é
menos simples do que parece. Designa diferentes objetos:

1) os metais brutos, tal como saem das minas ou das areias da lavra;

2) os produtos semiprocessados, lingotes, barras ou pinhas (as pinhas,


massas de metal irregular, poroso e leve, tal como é deixado pela
evaporação do mercúrio utilizado na amálgama, são em princípio refundidas
em barras e lingotes, antes de serem distribuídas no mercado);

3) os produtos processados, as moedas, que, aliás, são constantemente


refundidas para a cunhagem de novas: como na índia onde, com valor facial
e peso iguais,

>vês, com fechaduras complicadas, do tipo utilizado para o transporte de


barras (e prata, da Espanha para Gênova. (Gênova, Caixa Econômica, cliché
A. Colin.)
le conforme a data de emissão, sendo a dos anos precedentes menos apre4ue
a do ano em curso.
stas diversas formas, o metal precioso não pára de se deslocar, e
depresálbert já dizia que o dinheiro "só é útil quando está em movimento
percom efeito, a moeda circula incessantemente. "Nada se transporta com
idade e menos perda", observa Cantillon 194, que, segundo Schumpeter,
utível), teria sido o primeiro a falar da velocidade de circulação das
moelocidade tal, por vezes, que chega a transtornar a ordem das
sucessivas entre o lingote e a cunhagem. Isto desde meados do século XVI
e depois i: nas costas do Peru, no princípio do século
XVIII, os navios de Saint, gam às escondidas moedas de oito, mas também
pinhas de prata "não ' (isto é, prata de contrabando que não pagou o
imposto de um quinto

, q econumiu em jace aos mercaaos cobrado pelo rei). Aliás, as pinhas são
sempre de contrabando. A prata legal não amoedada fica em lingotes e
barras que se vêem circular muitas vezes na Europa.
Mas a moeda é ainda mais ágil. As trocas fazem-na "fazer acrobacias", a
fraude permite-lhe transpor todos os obstáculos. Para ela, --não há
Pirineus", como diz Louis Dermigny 196. Em 1614, nos Países Baixos,
circulam 40O tipos diferentes; na França, por volta da mesma época,
82197. Não há nenhuma região conhecida da Europa, mesmo entre as mais
pobres, onde as mais inesperadas moedas de vez em quando não se deixam
apanhar, quer no Embrunois alpino do século
X1V198, quer numa região isolada como é Gévaudan dos séculos XIV e XV199.
Por mais que os títulos multipliquem, muito cedo, seus serviços, o
numerário, o "dinheiro na mão", conserva suas prerrogativas. Na Europa
central, onde os europeus do Oeste adquiriram o cômodo hábito de
resolver, ou tentar resolver, seus próprios conflitos, o poder dos
adversários - França ou Inglaterra - é medido por distribuições de
dinheiro vivo. Em 1742, informações venezianas assinalam que a frota
inglesa trouxe grandes somas destinadas a Maria Teresa, "a rainha da
Hungria" 200. O preço da aliança de Frederico 11, em 1756, é, a expensas
da poderosa Albion, trinta e quatro carroças carregadas de moedas a
caminho de BerliM201. E tão logo se anuncia a paz, na primavera de 1762,
os favores passam para a Rússia: "O correio de 9 [de março] de Londres",
escreve um diplomata, "trouxe para Amsterdam e Rotterdam letras de câmbio
para melhor do que [sic] cento e cinqüenta mil moedas para fazer essa
soma passar à corte da
Rússia. 1 1202 Em fevereiro de 1799, transitam por Leipzig "cinco
milhões" de prata inglesa, em lingotes e em espécies; vindo de Hamburgo,
este dinheiro encaminha-se para a Áustria203.
Dito isto, o único, o verdadeiro problema é discernir, se possível, as
causas, pelo menos as modalidades dessa circulação que atravessa o corpo
das economias dominantes de um extremo ao outro do mundo. Parece-me que
essas causas e modalidades ficarão mais compreensíveis se distinguirmos
as três etapas evidentes: produção, transmissão, acumulação. Pois houve
mesmo países produtores de metal bruto, países exportadores regulares de
moeda, países receptáculos de onde a moeda ou metal nunca mais saem. Mas
houve também casos mistos, os mais reveladores, entre os quais a China e
a Europa, ao mesmo tempo importadoras e exportadoras.
Os países produtores de ouro ou de prata são quase sempre países ainda
primitivos, até selvagens, quer se trate do ouro de Bornéu, de Sumatra,
da ilha de Hainan, do Sudão, do Tibete, das Celebes ou das zonas mineiras
da Europa central, nos séculos XI-XIII e, depois, de 147O a 1540, quando
do seu segundo florescimento. Alguns garimpeiros se mantiveram - até o
século XVIII e mais tarde - à beira dos cursos de água da Europa, mas
trata-se de uma produção miserável que não conta muito. Nos Alpes, nos
Cárpatos ou no Erz Gebirge, nos séculos XV e XVI, é preciso imaginar
campos mineiros no meio de perfeitos ermos.
Os homens que lá trabalham levam uma vida muito dura, mas pelo menos são
livres!
Em contrapartida, na África, no Bambuk, que é o núcleo aurífero do Sudão,
as "minas" estão sob o controle dos chefes de aldeia. Lá existe, pelo
menos, uma serni-escravidão204. A situação é ainda mais nítida no Novo
Mundo, onde, para a exploração dos metais preciosos, a Europa recriou em
grande escala a antiga escravatura. Os índios da Mita (o recrutamento
mineiro), que são eles senão escravos? Como, mais tarde, os negros dos
garimpos do Brasil central no século
XVIII. Surgem estranhas cidades, a mais estranha, a de Potosí, a 4 mil
metros de altitude,

167

[to dos Andes, colossal acampamento de mineiros, cancro urbano onde )am
mais de

10O mil seres humanOS205. Ali a vida é absurda, mesmo para uma galinha
chega a valer oito reais, um ovo dois reais, uma libra de cera a dez
pesos, o resto nessa proporção206. Que dizer, senão que o dinheiro v,
alor? E não é o mineiro, nem sequer o dono das minas que ganha aqui as o
mercador, que adianta o.dinheiro em moeda, os víveres, o mercúrio ) às
minas, sendo reembolsado calmamente em metal. No Brasil do século.-odutor
de ouro, é a mesma história. Pelos cursos fluviais e pelos varas
expedições chamadas de monçõeS207 provenientes de São
Paulo, vão senhores e escravos negros das lavras de Minas Gerais e Goiás.
Só esses es enriquecem. Muitas vezes, o que resta aos mineiros é levado
pelo jogo, ão um pouco à cidade. O México será uma capital do jogo por
excelência. te, a prata ou o ouro pesam menos nas balanças do lucro do
que a farinha oca, o milho, a carne seca ao sol, a carne de sol, do
Brasil.
o poderia ser de outro modo? Na divisão do trabalho na escala mundial, ,
e mineiro cabe, repita-se, aos mais miseráveis, aos mais deserdados dos D
que está em jogo é demasiado importante para que os poderosos deste -jam
eles quem forem e estejam onde estiverem, não intervenham com toE também
não deixam fora do seu controle, pelas mesmas razões, a prosdiamantes ou
de pedras preciosas. Tavernier

208, em 1652, visitou, na quacomprador, a célebre mina de diamantes "que


se chama Raolkonda... a de Golconda". Tudo ali está maravilhosamente
organizado em proveito e e dos mercadores, e até para a comodidade dos
clientes. Mas os mineiros iveis, nus, maltratados e suspeitos - aliás com
razão - de contínuas tenfraude. Os garimpeiros29 de diamantes do Brasil,
são, no século XVIII, , os cujas pegadas não conseguimos seguir em suas
incríveis viagens, mas Ia aventura acabam indo para os mercadores, para o
soberano de Lisboa arrematantes da venda dos diamantes. Quando uma
exploração mineira :)b o signo de relativa independência (como na Europa
da Idade Média), , rteza de que, mais dia menos dia, ficará presa nas
cadeias mercantis. O Ias minas prenuncia o universo industrial e seu
proletariado.
i categoria, a dos países receptáculos, sobretudo a Ásia, onde a
economia, está mais ou menos implantada e os circuitos do metal precioso
são me]o que na
Europa. Neles a tendência é portanto para reter os metais preesourá-los,
subempregá-los. São países esponjas ou, como se dizia, "nepara metais
preciosos.
)is maiores reservatórios são a índia e a China, bastante diferentes
entre recebe quase com a mesma satisfação o metal amarelo e o metal
branco, ro em pó da Contracosta (ou Monomotapa, se se preferir), como a
prata e, mais tarde, do
Japão. O afluxo de metal branco da América, segundo res indianos,
determina mesmo uma subida dos preços, com uns vinte xaso em relação à
"revolução"
européia dos preços do século XVI. É prova de que a prata importada ficou
no mesmo lugar. Prova também ibuloso tesouro do Grão-Mogol não esteriliza
toda a massa das remessas de prata, uma vez que os preços subiram'10. Não
é a prata americana ita as incessantes refundições e cunhagens de moedas
da índia?
stamos decerto tão bem informados sobre o que se passa na China. Fato be-
se que a China não atribui ao ouro uma função monetária e o expor

1, 1 efLurtuffitu c- J, ta, para lucro de quem o quiser trocar por prata,


a uma taxa excepcionalmente baixa. Os portugueses foram os primeiros
europeus a constatar, no século XVI, essa espantosa preferência do chinês
pela prata e a lucrar com ela. Em 1633, um deles escreve ainda com
convicção: --Como os chinos sentirão prata, em montões trouxerão fazenda.
1, 211 Mas não acreditemos em Antonio de Ulloa, um espanhol que pretende,
em 1787, que "os chineses trabalham continuamente para adquirir a prata
que não se encontra no seu país- quando é "uma das nações que menos
necessita dela', 212. A prata, pelo contrário, é a moeda superior e muito
difundida nas trocas chinesas (é talhada em finas lâminas para pagar as
compras), ao lado da moeda baixa, as caixas ou sapecas de cobre e chumbo
misturados.
Um historiador recente da China213 pensa que pelo menos a metade da prata
produzida na América entre 1571 e 1821 terá achado o caminho da China
para dela não mais sair. Pierre ChaunU214 falou de um terço, incluindo a
exportação direta da Nova Espanha para as Filipinas pelo Pacífico que,
por si só, já seria enorme.
Nenhum desses cálculos é seguro, mas várias razões os tornam plausíveis.
Primeiro, o lucro (que só diminui lentamente em meados do século XVIII)
da operação que consiste em trocar na China prata por oUro215. É um
tráfico que se pratica até a partir da índia e da Insulíndia. Por outro
lado, em 1572, iniciase um novo trajeto da prata americana através do
Pacífico pelo galeão de
Manila216, que liga o porto mexicano de Acapulco à capital das Filipinas,
trazendo prata para recolher sedas, porcelanas da China, luxuosos
algodões da índia, pedras preciosas, pérolas. Essa ligação, que terá
altos e baixos, manterse-á ao longo de todo o século XVIII e mais além. O
último galeão retornará a
Acapulco em 1221217. Mas teríamos de incriminar todo o Sudeste asiático.
Um episódio, embora não explique tudo, ajuda a compreender. O grande
veleiro inglês
Industan, que leva à China o embaixador Macartney, conseguiu, em 1793,
fazer subir a bordo um velho cochinchinês. O homem não se sente à
vontade. "Mas quando lhe meteram na mão piastras da Espanha pareceu
conhecer-lhes o valor e embrulhou-as cuidadosamente numa ponta das suas
roupas esfarrapadas.' 218

Entre os países da produção e os países da acumulação, o Islã e a Europa


têm uma posição singular: são escalas, intermediários.
Do Islã, que desse ponto de vista se encontrou na mesma situação da
Europa, não há muito que dizer. Insistamos apenas no que se refere ao
vasto Império turco.
Na realidade, ele foi considerado uma zona econÔmica neutra que o
comércio europeu atravessaria impunemente, conforme lhe apetecesse: no
século XVI pelo
Egito e pelo mar Vermelho ou pela Síria, com as caravanas que se dirigem
à
Pérsia e ao golfo Pérsico; no século XVII, por Esmirna e pela Ásia Menor.
Todas essas rotas do comércio do Levante teriam sido portanto neutras,
isto é, os fluxos de prata as teriam atravessado sem nelas atuarem, quase
sem se deterem, com pressa de chegar às sedas da Pérsia ou aos tecidos
pintados da índia. Tanto mais que o Império turco tinha sido e continuava
a ser acima de tudo uma zona do ouro - ouro esse que, originário da
África, do Sudão e da Abissínia, fazia escalas no Egito e no Norte da
África. com efeito, a subida de preços comprovada (no tocante ao século
XVI em sentido lato) pelos trabalhos de õmer Lufti
Barkar1219 e de seus discípulos prova que o Império participou da
inflação de dinheiro nele provocada, em grande parte, pelas crises do
aspre, pequena moeda branca essencial, uma vez que tem a ver com a vida
de todos os dias e paga o soldo dos janízaros. Intermediário, portanto,
mas de modo algum neutro.

via, seu papel é modesto, comparado com as funções que a Europa assuala
mundial.
Já antes da descoberta da América, a Europa encontrava -ritório, bem ou
mal, a prata ou o ouro necessários para cobrir o déficit ança comercial
no Levante. com as minas do Novo Mundo, foi confiraigou-se nesse papel de
redistribuidora do metal precioso.
os historiadores da economia, essa corrente monetária, num único sentii-
se uma desvantagem para a Europa, uma perda de substância. Não sear
segundo preconceitos mercantilistas? Imagem por imagem, prefiro dizer )pa
inunda constantemente os países com suas moedas de ouro e sobretu, a,
países que, de outro modo, lhe fechariam ou pouco lhe abririam as ioda
economia monetária vitoriosa não tende a substituir a moeda dos a sua
própria moeda - decerto por uma espécie de tendência natural, ija nisso
uma manobra intencional da sua parte? Assim é que, já no séducado
veneziano (então moeda real) substitui os dinares de ouro egípevante logo
se enche de moedas brancas da Zecca de Veneza enquanto com as últimas
décadas do século XVI, a inundação das moedas de oito ;, batizadas depois
plastras, que são, a distância, as armas da economia [ante do Extremo-
Oriente. Mahé de Ia
Bourdormais11O (outubro de 1729) iigo e sócio de Saim-Malo, Closrivière,
que arrecade fundos e lhos envie Icheri em piastras, para investi-los nas
diversas possibilidades do comérda índia. Se seus comanditários lhe
enviassem grandes capitais, explica nnais, ele poderia tentar a viagem à
China, que requer muito dinheiro, !nte reservada, como meio de fazer
fortuna, aos governadores ingleses a. Torna-se evidente que, neste caso,
uma grande quantidade de moea é a maneira de abrir um circuito, de entrar
nele à força. Aliás, acresDurdormais, "é sempre vantajoso manipular
grandes fundos porque assenhor do comércio, pois os rios sempre correm
para o mar".
i à vista esses efeitos de ruptura também na Regência de Túnis onde, ,
VII, a moeda de oito espanhola se tornou a moeda padrão do paíS221 . a
Rússia, onde a balança de pagamentos acarreta uma larga penetração
primeiro holandesas, depois inglesas. Na verdade, sem essa injeção
monorme mercado russo não poderia ou não quereria responder à procura
- No século XVIII, o sucesso dos mercadores ingleses provirá de seus tos
aos mercadores moscovitas, coletores ou agenciadores dos produdos pela
Inglaterra.
Em contrapartida, os primeiros passos da Companas índias foram difíceis
enquanto esta se obstinou em mandar tecidos r pouco dinheiro vivo aos
seus feitores desesperados, obrigados a constimos localmente.
pa está portanto condenada a exportar uma parte considerável de suas
prata e, às vezes, mas sem a mesma generosidade, de suas moedas de certo
modo, a sua posição estrutural, na qual ela se encontra desde

1 e se mantém ao longo dos séculos. É pois bastante cômico ver os


es)rimeiros
Estados territoriais para impedir a saída de metais preciosos. os meios
de reter [num Estado] o ouro e a prata sem permitir que saiam" em 1646, o
máximo de toda "grande política". O mal, acrescenta ele, o ouro e a prata
que trazem [para a
França] parece ser lançado num ido e a França não ser mais que um canal
onde a água corre incessante

Moeda veneziana de 1471: a lira do doge Niccoló Tron. É o único doge cuja
efígiefoi reproduzida na cunhagem das moedas. (Clichê B.N.)
mente sem se deter'1222. Claro que é o contrabando ou o comércio
clandestino que aqui se encarregam desse papel econômico necessário. Há
fugas por todo o lado.
Mas são meros expedientes. Onde quer que o comércio esteja no primeiro
plano das atividades, é preciso, mais dia menos dia, que as portas se
abram de par em par e o metal circule intensa, livremente, como uma
mercadoria.
A Itália do século XV reconheceu essa necessidade. Em Veneza, tomou-se
uma decisão liberal quanto à salda de moeda, pelo menos desde 1396 223,
decisão renovada em 1397224, depois em 1O de maio de 1407 por uma medida
dos Pregadi225

que comporta uma única restrição: o mercador que extrair dinheiro (prata,
sem dúvida do Levante) deverá tê-lo importado primeiro e depositará um
quarto dele na Zecca, a casa da moeda da Signoria. Depois, ficará livre
para levar o resto "per qualunque luogo". É tamanha a vocação de Veneza
para exportar a prata para o Levante ou para o Norte da África, que a
Signoria sempre superestimou o ouro, fazendo deste (se assim se pode
dizer) uma "má" moeda abundante na praça e que, evidentemente, expulsa a
boa - a prata. Não é esse objetivo que se tem de atingir? Poderíamos
também demonstrar como Ragusa ou Marselha organizam essas saídas
necessárias e lucrativas. Marselha, vigiada pelas autoridades
monárquicas, só encontra junto delas intrigas e incompreensão. Se lhe
proibirem a livre circulação de piastras na cidade e o envio delas para o
Levante - ela se esforça por explicar, em 1699 -, se exigirem que elas
sejam refundidas nas casas da moeda, irão muito

ite para Gênova ou para Livorno. O sensato seria permitir que não só nas
também as cidades marítimas --corno Toulon ou Antibes ou outras, , em os
pagamentos à marinha' 1226, as exportassem.

1 dificuldades desse gênero na Holanda, onde o negócio comanda tudo: le


ouro e de prata entram e saem à vontade. A mesma liberdade acabará )r
numa Inglaterra em progresso. Apesar de acaloradas discussões que n do
século XVII, as portas se escancaram cada vez aos metais amoedada
Companhia das índias dependia disso. A lei inglesa votada pelo Par1663,
precisamente por pressão da Companhia, é bastante reveladora , mbulo:
"Ensina a experiência que a prata [entenda-se as moedas] aflui
- abundância aos locais onde se lhe reconhece a liberdade de
exporifluente sir
George Downing pode afirmar: "A prata que, outrora, serão às mercadorias
tornouse hoje, por sua vez, uma mercadoria. 1 228 os metais preciosos
circulam à vista de todos. No século XVIII cessa 'ência. Por exemplo, as
gazetas anunciam (16 de janeiro de 1721), sedeclaração da alfândega de
Londres, o envio de 2.217

onças de ouro nda; em 6 de março, 288 onças de ouro para o mesmo destino
e 2.656

a as índias orientais; em 2O de março, 1.607 onças de ouro para a Fran229

- a a Holanda, etc. Já não é possível voltar atrás, mesmo durante a


Inanceira que grassa depois da conclusão do tratado de Paris, em 1763.
bem gostariam de frear um pouco "a saída excessiva de ouro e prata
Guinéu de ouro de Carios 11, 1678. (Foto B.N.)

"I ecuflufritu um JULU ""


que em pouco tempo se fez, para a Holanda e para a França-, mas "querer
impediIa seria dar um golpe mortal no crédito público que importa manter
sempre inviolável""'.
Mas sabemos não ser essa a atitude de todos os governos europeus. O jogo
da porta aberta não se generalizará de um dia para o outro e as idéias
demoração, de certo modo, a atualizar-se. A França com certeza não foi
pioneira na matéria.
Um emigrante francês, o conde de Espinchal, ao chegar a Gênova em
dezembro de

1789, julga necessário observar que --o ouro e a prata [são] mercadorias
no Es231

tado de Gênova", como se isso fosse algo estranho, digno de nota.


Condenado a longo prazo, o mercantilismo custou a morrer.
Todavia, a imagem de conjunto que se deve reter não é a de uma Europa que
se esvaziaria cegamente dos seus metais preciosos. As coisas são mais
complicadas.
É preciso levar em conta o duelo constante entre metal branco e metal
amarelo para o qual F. C. Spooner 232 de há muito chamou a atenção. A
Europa deixa sair a prata, que corre mundo. Mas sobrevaloriza o ouro, é
uma maneira de retê-lo, de guardá-lo em casa, de mantê-lo no serviço
interno da "economia-mundo" que é a
Europa, para todos os pagamentos europeus importantes, de mercador a
mercador, de nação a nação. É também um meio de ter a certeza de importá-
lo da China, do
Sudão, do Peru. A seu modo, o Império turco - esse europeu - pratica a
mesma política: guardar o ouro, deixar correr os rios velozes da prata. A
rigor, para explicar claramente o processo teríamos de reformular a
chamada lei de Gresham a má moeda expulsa a boa. com efeito, umas moedas
expulsam outras que são correntes, todas as vezes que seu valor fica
elevado em comparação com o nível relativo desta ou daquela economia. A
França, no século XVIII, valoriza a prata até a reforma de 3O de outubro
de 1785 "que faz a relação ouro-prata passar de

1 para 14, 4 a 1 para 15, 5`33. Resultado: a França do século XVIII é uma
China em miniatura: a prata aflui para ela. Veneza, Itália, Portugal,
Inglaterra,
Holanda, até a Espanha234 valorizam o ouro. Bastam, aliás, diferenças
mínimas para que o ouro corra para essas valorizações; torna-se então
"uma má moeda", pois expulsa a prata, obriga-a a correr mundo.
A saída maciça da prata não deixou de criar, no interior da economia
européia, freqüentes contratempos. Mas por isso mesmo concorreu para o
triunfo dos títulos, esses paliativos; provocou prospecções mineiras
além-mar; incentivou o comércio a procurar sucedâneos para os metais
preciosos, a enviar para o Levante tecidos, para a China algodão ou ópio
indianos. Enquanto a Ásia se esforçava por pagar a prata com produtos
têxteis, mas sobretudo com produtos vegetais, especiarias, drogas, chá, a
Europa, para equilibrar sua balança, redobrou seus esforços mineiros e
industriais. Não encontrou ela, a longo prazo, um desafio que reverteu em
seu proveito? O certo é que, seja como for, não devemos falar, como
tantas vezes se faz, de uma hemorragia perniciosa para a Europa, como se,
em suma, ela tivesse pagado o luxo das especiarias e das chinesices com o
próprio sangue!

173
AS NACIONAIS `A COMERCIAL ;e trata aqui de estudar o mercado nacional no
sentido clássico da palaJ se desenvolveu de modo bastante lento e
desigual conforme os países.
- seguinte, voltaremos com vagar à importância dessa formação progresi
inacabada no século XVIII, e que fundou o Estado moderno.
ra, gostaríamos apenas de mostrar como é que a circulação coloca frente ;
diversas economias nacionais (para não falar de mercados nacionais), is e
as avançadas, como as contrapõe e classifica. A troca igual e a troca
equilíbrio e o desequilíbrio dos tráficos, a dominação e a sujeição
desenapa geral do universo. A balança comercial permite traçar um
primeiro bal deste mapa. Não que esta seja a melhor ou a única forma de
abordar a, mas, praticamente, são os únicos números que possuímos. E
mesmo rudimentares e incompletos.
, nça comercial é, numa dada economia, algo comparável ao balanço que or
faz no final do ano: ou ganhou, ou perdeu. Lê-se no Discours of the Veal
of this Realm of England (1549), atribuido a sir Thomas Smith: sempre ter
cuidado em não comprar dos estrangeiros mais do que lhes '235 Esta frase
diz o essencial do que é preciso saber sobre a balança, ue sempre se
soube a seu respeito. Pois tal sensatez não é nova: assim, ; de 1549, não
foram os mercadores ingleses obrigados pelo governo a xa a Inglaterra uma
parte das suas vendas superavitárias no estrangeiro i de espécies
monetárias? Por seu lado, os mercadores estrangeiros tinvestir em
mercadorias inglesas o produto de suas vendas antes de abanilha. O
Discourse of Trade... de Thomas Mun, escrito em

1621, aprecoria da balança que é correta e corresponde a uma tomada de


cons. Seu contemporâneo, Edward Misselden, pode escrever em 1623: " Wee F
in sense; but now wee know it by science" - antes o pressentfamos, emos
cientificamente236.
Claro que se trata de uma teoria elementar, ite das concepções modernas
que conjugam uma série de balanças si, omercial, de contas, de mão-de-
obra, de capitais, de pagamentos). Na, a balança comercial era apenas a
pesagem em valor das mercadorias re duas nações, o balanço das
importações e das exportações recíproior, das dívidas recíprocas. Por
exemplo, "se a França deve 100.00O ;panha e esta deve 1.500.00O libras à
França", valendo a pistola 15 lica em igualdade. "Como esta igualdade é
muito rara, torna-se neces-Iação que deve mais mande transportar metais
pela parte das dívidas e comperisar."237 O déficit pode ser
temporariamente coberto por leio, isto é, ser diferido. Se persiste, há
forçosamente transferência me

16. AS BALANÇAS DA FRANÇA E DA INGLATERRA NO SÉCULO XVIII


Exportações e importações na França de 1715-1780

Exportações e importações na Inglaterra de 1700-1785

Como mostram as balanças comerciais, a Inglaterra e a França vivem


confortavelmente em detrimento do mundo atéperto de 1770. Surgem então
saldos inferiores ou negativos. Por causa da conjuntura, de uma
deterioração do capitalismo mercantilou, oqueémais verossimil, das
perturbações acarretadas pela guerra da Independência --americana"? Para
a França, segundo o artigo de
Ruggiero Romano, --Documenti e prime considerazioni intorno alla 'balance
du commerce' della Francia, 1716-1780-, in Studi in onore di Armando
Sapori, 1957,
11, pp, 1.268-1.279. As fontes inéditas desta obra são indicados na jo.
1.268, nota 2.
Para a Inglaterra, como se pretende demonstrar apenas por alto o
andamento do comércio inglês, a curva foi extraída de William Playfair,
um dos primeiros estatísticos ingleses, Tableaux d'arithmétique linéaire,
do commerce, des finanes et de la dette nationale de I'Angleterre,
1789;... The Exports and
Imports and General Trade of England, the National Debt... 1786.

L transferência, quando nós, historiadores, podemos observá-la, é que gr


desejado e apresenta com clareza o problema das relações entre duas
onômicas, uma obrigada pela outra a despojar-se, quer queira quer não,
rte de suas reservas monetárias ou metálicas.
jer política mercantilista procura uma balança mais ou menos equilia-se
de evitar por todos os meios a saída de metais preciosos. Assim, ,
fevereiro de

1703, se, em vez de comprar no local as provisões das tro; que combatiam
na
Holanda, fossem despachados "cereais, produtos idos e outros produtos- da
Inglaterra, as somas de dinheiro corresponderiam ficar" na ilha. Uma
idéia destas só pode acudir ao espírito de ) obcecado pelo temor de
perder as reservas metálicas. No mesmo ano, como tivesse de pagar os
subsídios em numerário prometidos a Portutado de Methuen, a Inglaterra
propõe saldá-los com exportações de ce, igo "de maneira que se
satisfizessem ao mesmo tempo suas obrigações ) de não deixar sair
numerário efetivo do reino"238.

239 eguir a balança" , equilibrar exportações e importações é, aliás, ape


limo.
Melhor seria ter uma balança favorável. É o sonho de todos os
ercantilistas que identificam riqueza nacional com reservas monetárias.
idéias surgiram, com bastante lógica, ao mesmo tempo que os Estados mal
são esboçadas, defendem-se, têm de se defender. A partir de outu, Luís X1
tomava medidas para controlar e limitar a saída, em direção lo ouro e da
prata em espécie de bilhão e outras, que poderiam ser alielos e
transportados para fora deste nosso reino' 240.
vimentos da balança comercial - quando os conhecemos - nem semples para
interpretar. E não há regras que se possam aplicar, tal como im, a cada
caso.
Assim, não se diria que a balança da América espanhoria pelo exame das
enormes exportações metálicas a que está condenaengana P. Mercado (1564):
nesse caso, diz ele, "o ouro e a prata em i todas estas regiões da
América, são tomados por uma espécie de mer:) valor aumenta ou diminui
pelas mesmas razões da mercadoria vula propósito da Espanha, explica
Turgot que "a sua comida é a prata; ido trocar por dinheiro, tem de
trocá-la por cornida"242. Tampouco não pesar os prós e os contras, que a
balança entre a Rússia e a Inglaterra, favorável àquela e desfavorável a
esta porque a Rússia, normalmente, do que compra de sua parceira.
Mas tampouco se sustentará o contrá- esforçou por fazer John Newmann, em
outubro de 1786. Cônsul da

1u11, o grande porto onde então chegam, vindos em linha reta dos
esmarqueses, os navios ingleses pesadamente carregados que regressam
- ele vê, julga ver o problema com os próprios olhos. Retoma números o
peremptórios: em 1785, nas alfândegas russas, 1.300.00O ú de mercaiadas à
Inglaterra; no outro sentido, 500.000: a vantagem para o Impériria Il é
de

800.00O libras. "Mas, não obstante este lucro aparente e ara a Rússia",
escreve ele, "sempre afirmei e continuo a afirmar que não

, q economia em jace aos mercaaos é a Rússia, mas a Grã-Bretanha a única


[eis o ponto onde está o excesso] a ganhar com esse cornércio.-- com
efeito, pensemos, explica ele, no que acompanha a troca, no frete de
cerca de 40O navios ingleses "cada um com capacidade de 30O toneladas de
carga, cerca de 7.000-8.00O marinheiros-, no aumento de preço das
mercadorias russas assim que tocam em solo inglês (15 Olo), em tudo o que
estes carregamentos propiciam à indústria, depois nas reexportações da
ilha243. Vê-se que John Newrnann suspeita que a balança entre os dois
países só pode ser avaliada com base em toda uma série de elementos. Há
aqui intuição das teorias modernas da balança. Quando Thomas Mun (1621)
diz, mais resumidamente: --O dinheiro exportado para as índias acaba por
devolver cinco vezes o seu valor244 diz quase a mesma coisa, mas também
diz outra.
Além disso, uma balança, em particular, só tem significado quando
reinserida numa totalidade comercial, no somatório das balanças de uma
mesma economia. Uma única balança Inglaterra-índias ou Rússia-Inglaterra
não esclarece o verdadeiro problema. Precisaríamos, quer de todas as
balanças da Rússia, quer de todas as balanças da índia, quer de todas as
balanças da Inglaterra. É realmente dessa maneira que atualmente uma
economia nacional estabelece todos os anos o balanço global da sua
balança externa.
O mal é que, para o passado, quase so conhecemos balanças parciais, de
país a país. Algumas são clássicas, outras mereciam sê-lo: no século XV,
a balança é favorável à Inglaterra, exportadora de lã, relativamente à
Itália; mas, a partir da Flandres, é à Itália que a balança é favorável;
é positiva durante muito tempo para a França com relação à Alemanha, mas
passa a sê-lo para esta última, se não a partir do primeiro bloqueio
decretado pelo Reichstag em 1676, pelo menos depois da chegada dos
protestantes franceses, depois da revogação do edito de Nantes (1685). Em
contrapartida, a balança foi por muito tempo favorável à
França com relação aos Países Baixos e assim permanecerá sempre do lado
da
Espanha. Não devemos criar dificuldades aos espanhóis nos nossos portos,
diz um documento francês oficial de 1700245 ; disso depende "o bem geral
e o particular", uma vez que

44 a vantagem do comércio entre a Espanha e a França está toda do lado da


França". Não se dizia já, no século anterior (1635), de maneira crua mas
verídica, que os franceses eram "piolhos que sugavam a Espanha'12469

Aqui ou ali, a balança oscila, até muda de sentido. Observemos apenas,


sem darmos a essas indicações um significado geral, que favorecia a
França em relação ao Piemonte em 1693; que em 1724, é entre a Sicília e a
República de
Gênova, desfavorável a esta última; que em 1808, segundo o testemunho
apressado de um viajante francês, o comércio da Pérsia "com as índias é
[então]
vantajoso'9247.
Uma única balança parece ter ficado emperrada de uma vez por todas na
mesma posição, desde o Império romano até o século XIX: a do comércio do
Levante, sempre passiva, como sabemos, em detrimento da Europa.
França e Inglaterra antes e dePois do ano de 1700

Vamos deter-nos por momentos no caso clássico (será, porém, tão bem
conhecido como se pretende?) da balança franco-inglesa. Durante o último
quartel do século
XVII e ao longo dos primeiros anos do século XVIII, afirmou-se repetida e
categoricamente que a balança se inclinava a favor da França. Um ano pelo
ou177

wd Mayor de Londres, de Canaletto, por volta de 1750. O cortejo


tradicional, ?
outubro, enche o Tâmisa de embarcações. Ao lado das corporações da
cidatidade de barcospequenos, decerto aqueles a que um viajantefrancês
que visi?m 1728 chamou
- -gôndolas- (cf. cap. 1, nota 84) porque desempenhavam no >el de fiacres
fluviais, como nos canais de Veneza. (Praga, Galeria Nacional, 'on.)

A economia em Jace aos mercados tro, esta tiraria de suas relações com a
Inglaterra um lucro anual de um milhão e meio de libras esterlinas.
Seja como for, é o que se afirma na Câmara dos Comuns, em outubro de
1675, e o que repetem as cartas do agente genovês em Londres, Carlo
Ottone, em setembro de

1676 e em janeiro de 1678111. Ele diz mesmo que cita esses números
baseado numa conversa que teve com o embaixador das Províncias Unidas,
observador pouco benevolente das atividades dos franceses. Uma das razões
admitidas para esse superávit favorável à França vem de seus produtos
manufaturados --vendidos na ilha muito mais em conta do que os que se
fabricam no local, pois o artesão francês contenta-se com ganhos
moderados ..... Estranha situação, uma vez que esses produtos franceses,
proibidos de fato pelo governo inglês, é a fraude que se encarrega de
introduzi-los. Isso só leva os ingleses a desejarem mais "di bilanciare
questo commercio", como explica nosso genovês, numa frase excelente.
E, para tal, obrigar a França a utilizar largamente os tecidos
ingleSeS249.
Nessas condições, a superveniência da guerra é boa oportunidade para pôr
um fim na invasão detestável e detestada do comércio francês. De
Tallard250, embaixador extraordinário em Londres, escreve a
Pontchartrain, em 18 de março de 1699: "...
O que os ingleses tiravam da França antes da declaração da última guerra
[a guerra chamada da Liga de Augsburgo, 1689-1697] chegava, na opinião
deles, a somas muito mais consideráveis do que o que passava da
Inglaterra para nosso país. Estão tão imbuídos desta crença e ficaram tão
persuadidos de que a nossa riqueza vinha de seu país, que, assim que
começou a guerra, fizeram um capital [no sentido de ponto capital?] de
impedir que o vinho ou qualquer mercadoria da
França entrasse no país deles, direta ou indiretamente." Para que este
texto faça sentido, é preciso recordar que, outrora, a guerra não rompia
todas as ligações mercantis entre beligerantes. Portanto, essa proibição
absoluta era em si algo contrário aos costumes internacionais.
Passam-se os anos. Recomeça a guerra, pela sucessão de Carlos 11 da
Espanha (1701). Depois, terminadas as hostilidades, as duas coroas têm de
reorganizar as relações comerciais que, desta vez, foram seriamente
perturbadas. É assim que, durante o ano de 1713, dois "especialistas",
Anisson, deputado de Lyon no
Conselho de Comércio, e Fénellon, deputado de Paris, se dirigem para
Londres.
Como a discussão começa mal e se arrasta interminavelmente, Anisson tem
tempo para compulsar as deliberações dos Comuns e os levantamentos das
alfândegas inglesas. Então, qual não é o seu espanto ao verificar que
tudo o que foi dito a respeito da balança das duas nações é totalmente
inexato! E que "fazia mais de

5O anos que o comércio da Inglaterra era superior em vários milhões ao da


França'1251. Tratase, evidentemente, de milhões de libras tornesas. Eis o
fato brutal, inesperado. Será possível? Como uma grande hipocrisia
oficial pôde esconder de modo tão sistemático números que registravam sem
ambigüidades a superioridade da balança a favor da ilha? No caso, seria
útil uma investigação minuciosa nos arquivos de Londres e de Paris. Mas
não é seguro que ela fornecesse a última palavra a este respeito.
Interpretar números oficiais comporta erros inevitáveis. Os mercadores,
os executantes, vivem mentindo aos governos e os governos mentindo a si
próprios. Bem sei que uma verdade de 1713

não é, sem tirar nem pôr, uma verdade de 1786, e vice-versa. Mesmo assim,
após o tratado de Eden (assinado em 1786 entre a França e a Inglaterra),
uma correspondência russa de Londres (1O de abril de 1787) que

179

ace aos mercaaos

3te as informações correntes indica que os números --dão apenas uma


imperfeita da natureza e da extensão desse comércio [franco-inglês] uma
ibemos de fonte limpa que o comércio legítimo entre os dois reinos só
iando muito uma terça parte da sua totalidade e que dois terços são
feitrabando, o que este tratado de comércio saneará com vantagem para
ernos" 252. Nessas condições, por que discutir os números oficiais?
TeJispor, além do mais, de uma balança do contrabando.
ipécias das longas negociações comerciais franco-inglesas de 1713 não
sobre esse ponto. A repercussão que tiveram na opinião pública inglesa )s
reveladora das paixões nacionalistas que o mercantilismo implica. E

1 18 de junho de 1713, o projeto foi rejeitado na Câmara dos Comuns os


contra

185, a explosão de alegria popular foi muito mais viva do que rou o
anúncio da paz. Houve em Londres fogos de artifício, ilumina3s variados.
Em Coventry, os tecelões manifestaram-se num longo corm tosão de carneiro
na ponta de uma vara, na ponta de outra uma garinscrição: "no english
woolforfrench wine!" E tudo isso vivia, não om a razão econômica, mas sob
o signo da paixão nacional e do erro"', [temente, teria sido do interesse
bem compreensível das duas nações abrir ente as suas portas. Quarenta
anos mais tarde, David Hume observará que "a maior parte dos ingleses
achariam que o
Estado estava perto os vinhos franceses pudessem ser transportados para a
Inglaterra em ndância [... ] e nós vamos buscar na Espanha e em Portugal
um vinho menos agradável do que aquele que a França poderia fornecer-
nos".
o se fala do Portugal do século XVIII, os historiadores clamam em cozão o
nome de lord Methuen, o homem que vai buscar, em 1702, no je será a longa
guerra de
Sucessão da Espanha, a aliança com o peque1 para apanhar pelas costas a
Espanha fiel ao duque de Anjou, Filipe aceses. A aliança concluída teve
grande repercussão, mas ninguém achou :)rdinário o tratado comercial que
a acompanhava, simples cláusula de se haviam assinado tratados análogos
entre Londres e Lisboa em 1642, Mais ainda, franceses, holandeses,
suecos, em diversas datas e condin obtido as mesmas vantagens. O destino
das relações anglo-portuguesas então atribuído apenas ao tão célebre
tratado. É conseqüência de promicos que acabaram por se fechar sobre
Portugal como uma armadilha. iar do século XVIII, Portugal praticamente
abandonou o oceano índi)os em tempos, envia para lá um navio carregado
com seus delinqüenjoa para os portugueses o que Caiena será para os
franceses ou a Auss ingleses. Essa antiga ligação só readquire interesse
comercial para Por[o as grandes potências estão em guerra. Então, um,
dois, três navios io português, aliás equipados por outros, encaminham-se
para o cabo erança. No regresso, os estrangeiros que participaram desse
jogo perivezes abrem falência; o português tem demasiada experiência para
dei)rudente.

A economia em lace dos mercados


A sua constante preocupação, em contrapartida, é o Brasil, cujo
crescimento vigia, explora. Os donos do Brasil são os mercadores do
reino, o rei primeiro, a seguir os comerciantes de Lisboa e do Porto e
suas colônias mercantis instaladas em Recife, na Paraffia, na Bahia, a
capital brasileira, depois no Rio de
Janeiro, nova capital a partir de 1763. Esses portugueses, detestados,
com grandes anéis nos dedos, sua baixela de prata - caçoar deles é um
prazer para um brasileiro! Mas, primeiro, é preciso vencer. Cada vez que
o Brasil inicia uma nova atividade, o açúcar, depois o ouro, depois os
diamantes, mais tarde o café, é a aristocracia mercantil de Portugal que
aproveita e descansa ainda mais. Ao estuário do Tejo chega um dilúvio de
riquezas: couros, açúcar, açúcar mascavo, óleo de baleia, madeira de
tinturaria, algodão, tabaco, ouro em pó, pequenos cofres cheios de
diamantes...
O rei de Portugal é, diz-se, o soberano mais rico da Europa: seus
castelos, seus palácios nada têm a invejar de Versalhes a não ser a
simplicidade. A enorme cidade de Lisboa cresce como uma planta parasita;
as favelas substituíram os campos que outrora tinha em suas margens. Os
ricos ficaram mais ricos, ricos demais, os pobres, miseráveis. E
entretanto os altos salários levam a Portugal "um número prodigioso de
homens vindos da província da Galícia [na Espanha] a que aqui chamamos
galegos, que têm nesta capital, bem como nas principais cidades
portuguesas, os ofícios de carregadores, trabalhadores braçais e criados
a exemplo dos saboianos em Paris e nas grandes cidades da França"255.
Quando o século chega ao fim, ligeiramente maçante, a atmosfera se torna
mais pesada: os ataques noturnos a pessoas ou casas, os assassinatos, os
roubos dos quais participam respeitáveis burgueses da cidade tornaram-se
seu quinhão diário.
Lisboa, Portugal, aceitam com indolência a conjuntura do oceano
Atlântico: será favorável? Todos se refestelam. Será má? As coisas vão-se
decompondo lentamente.
É em meio à prosperidade preguiçosa desse pequeno país que o inglês obtém
suas vantagens. Modela-o como bem entende; desenvolve os vinhedos no
Norte, criando a fama dos vinhos do Porto; encarrega-se de abastecer
Lisboa de trigo, de barris de bacalhau; introduz seus tecidos, em fardos
fechados, o suficiente para vestir todos os camponeses de Portugal e
submergir o mercado longínquo do Brasil. O ouro, os diamantes, pagam
tudo, o ouro do Brasil que, depois de ter tocado em
Lisboa, continua seu caminho para o norte. Poderia ser de outro modo:
Portugal poderia proteger seu mercado, criar uma indústria, é o que vai
pensar Pombal.
Mas a solução inglesa é a solução da facilidade. Os terms of trade até
favorecem
Portugal: enquanto o preço dos tecidos ingleses diminui, o dos produtos
portugueses para exportação aumenta. com esse jogo, os ingleses vão-se
apoderando do mercado. O comércio com o Brasil, chave da fortuna
portuguesa, requer capitais, imobilizados num circuito longo. Os ingleses
desempenham em
Lisboa o papel outrora desempenhado pelos holandeses em Sevilha: fornecem
a mercadoria que parte para o Brasil e a crédito. A ausência de um centro
comercial na França, da dimensão de Londres ou de Amsterdam, poderosa
fonte de crédito a longo prazo, foi "provavelmente o fator que prejudicou
mais seriamente os mercadores franceses"256 que, entretanto, formam
também uma importante colônia em Lisboa. A discrição holandesa nesse
mercado é que em contrapartida constitui problema.
Seja como for, a sorte está lançada antes mesmo que o século XVIII
encontre seu verdadeiro impulso. Já em 1730, um francês pôde escrever256:
"O comércio dos ingleses em Lisboa é o mais considerável de todos; é
mesmo, segundo muita gente, tão forte como o das outras Nações juntas."
Grande êxito, que se deve imputar

181

Xw W , 1, 1 t - J _, N1

, 1 li -1-- %, 1 - 1 _;
corn lí

5* k

3MU z,

4f
Lisboa no século XVII. (Clichê Giraudon.)
a portuguesa, mas não menos à tenacidade dos ingleses. Em 1759, o futuro
Constituinte, atravessa Portugal, a seus olhos "uma colônia explica:
"Todo o ouro do Brasil passava para a Inglaterra, que mantial sob o seu
jugo. Citarei um único exemplo que denigre a administrabal. Os vinhos do
Porto, único objeto de exportação interessante para, eram comprados em
massa por uma companhia inglesa à qual todos !rios eram obrigados a
vender a preços fixados por comissários ingleque Malouet tem razão. Há
realmente colonização comercial quando ^o tem acesso ao mercado em
primeira mão, à produção.
Ita de 1770-1772, porém, numa época em que parece findo o grande ouro
brasileiro
- mas continuam a chegar navios com ouro e diamanue a conjuntura, em seu
todo, sofre na Europa uma mudança negativa, nglo-portuguesa começa a
mexer-se. Irá inverter-se? Levará ainda al. Em 1772, quanto mais não seja
pelas tentativas de comércio com o Lisboa tenta afrouxar o domínio
inglês, "deter na medida do possível )uro" para LondreS258. Sem grande
sucesso. Entretanto dez anos mais ise uma solução. O governo português
decide finalmente "cunhar muitas prata e muito poucas de ouro". Para
grande descontentamento dos in"não vêem vantagem [em repatriar] prata,
mas sim ouro. É uma pequeconclui o cônsul russo em Lisboa, "que Portugal
trava em surdina' 9259. -eciso esperar ainda dez anos, no dizer do mesmo
cônsul, Borchers, um -rviço de Catarina II, para se contemplar o
espetáculo assombroso de

A economia em face dos mercados um navio inglês fazendo escala em Lisboa


sem carregar ouro! "A fragata Pega~ sus-, escreve ele em dezembro de 179
126% --talvez seja a primeira que, desde que há relações comerciais entre
os dois países, regressa à pátria sem ter exportado ouro. " com efeito,
acaba de se operar uma reviravolta: --Todos os paquetes ou embarcações
que vêm da Inglaterra" trazem para Lisboa "uma parte das moedas
portuguesas [... 1 importadas [para a Inglaterra] há quase um século- (no
dizer de um historiador, não menos do que 25 milhões de libras esterlinas
de

170O a 1760)261 . Um único paquete, no mesmo mês de dezembro de 1791,


acaba de desembarcar o equivalente a 18.00O libras esterlinaS262.
Faltaria analisar o problema em si. Ou, então, reinseri-lo numa história
geral que em breve se tornará trágica, com o princípio da guerra da
Inglaterra contra a França revolucionária. Não é essa a nossa intenção.
Europa de Leste, Europa de Oeste 263

Todos estes exemplos são bastante claros. Há casos mais difíceis. Assim,
a
Europa de Oeste, em linhas gerais, tem uma balança desfavorável em
relação ao
Báltico, Mediterrâneo do Norte que liga entre si povos hostis e economias
similares: a Suécia, a Moscóvia, a Polônia, a Alemanha além-Elba, a
Dinamarca. E tal balança suscita mais de uma questão embaraçosa.
com efeito, desde o artigo sensacional de S. A. Nfisson (1944) - que só
hoje chega ao pleno conhecimento dos historiadores ocidentais - e após
outros estudos, especialmente o livro de Arthur Attmann traduzido para o
inglês em

1973, parece que o passivo da balança ocidental só foi coberto muito


inperfeitamente pelas remessas metálicas diretaS264. Em outras palavras,
as quantidades de prata que se encontram nas cidades do Báltico, cujo
volume é calculado pelos historiadores (é o caso de Narva), estão abaixo
das quantidades que reequilibrariam os déficits do Ocidente. Falta prata
ao encontro e não se vê muito bem por que outro meio a balança, neste
caso, poderia ser reequilibrada.
Os historiadores andam à procura de uma explicação que é esquiva.
Não há aqui outra via senão a que tomou S. A. Nilsson, reinserindo a
balança comercial nórdica no conjunto das trocas e tráficos da Europa
chamada oriental.
Ele pensava que uma parte do excedente do comércio báltico voltava para a
Europa em virtude de trocas em cadeia entre a Europa oriental, a Europa
central e a
Europa ocidental, mas desta vez pelas vias e tráficos continentais da
Polônia e da Alemanha. Deficitária no Norte, a balança do Ocidente é em
parte compensada por uma balança vantajosa desses comércios terrestres -
fazendo-se os retornos, e esta é a hipótese sedutora do historiador
sueco, por intermédio das feiras de
Leipzig. Ao que Miroslaw Hroch 265 opõe o argumento de que essas feiras
só serão freqüentadas de modo contínuo por mercadores da Europa de Leste
(especialmente com o aumento do número de mercadores judeus poloneses) a
partir do princípio do século XVIII. Pôr Leipzig no centro do
reequilíbrio da balança seria enganar-se de época. Quando muito, poder-
se-ia aceitar, segundo M. Hroch, certos tráficos por Poznan e Wroclaw que
parecem ter sido deficitários para os países de Leste. Mas trata-se
apenas de peixes pequenos.

183

7rsóvia na segunda metade do século XVIII. Pormenor de um quadro de


CanaWiodowa.
(Foto Alexandra Skarzynska.)
a, a hipótese de Nilsson não pode estar errada. Talvez seja apenas
nepliá-la mais. Sabemos, por exemplo266, que a Hungria, país produtor,
continuamente a sua boa moeda pesada fugir para o estrangeiro )arte, para
o Ocidente. E o vazio e preenchido por pequenas moedas misturadas com
prata, que asseguram, por assim dizer, toda a circularia da Hungria.
Inda, ao lado das mercadorias, há as letras de câmbio. É um fato que nas
terras do Leste, desde o século XV1; que se tornam mais numeroo seguinte.
Nesse caso, serão a presença, a ausência ou o pequeno núrcadores do Leste
europeu nas feiras de Leipzig um argumento peremprve-se de passagem que,
contrariamente ao que diz
M. Hroch, os ju, ses já são numerosos nas feiras de Leipzig no Século
XV11267

Mas, freqüentar pessoalmente essas feiras, Marc'Aurelio Federico268,


armaiano estabelecido em Cracóvia, saca em 1683-1685 letras de câmbio
so4ue tem em Leipzig. A letra de câmbio, quando vai diretamente do
Bálnsterdam ou vice-versa, é quase sempre conseqüência de um
empréstiadiantamento sobre mercadorias. Esses pagamentos adiantados, e
que s, não serão um saque sobre o excedente metálico que o Estado adquiia
adquirir? O leitor deve reportar-se ao que direi, mais adiante, a
proolanda e de seu comércio chamado de aceitação269.
Também não deve e o Báltico é uma região dominada, explorada pela Europa
ocidental.

A economia em Jace dos mercados


Há uma estreita correlação de preços entre Amsterdam e Gdansk - mas é
Amsterdam que fixa esses preços, que comanda o jogo e escolhe o que lhe é
vantajoso.
Concluindo: o clássico comércio do Báltico já não pode ser concebido como
um circuito fechado em si mesmo. Comércio multipartido, movimenta
mercadorias, dinheiro vivo e crédito. Os caminhos do crédito proliferam
sem parar. Para compreendê-los, impõem-se viagens a Leipzig, a Wroclaw, a
Powan, mas também a
Nuremberg, a Frankfürt, até, se eu não estiver inteiramente errado, a
Istambul ou a Veneza. Iria o Báltico, conjunto econômico, até o mar do
Norte ou o
AdriátiC02709 Seja como for, há correlação entre os tráficos bálticos e a
economia da Europa oriental. É uma música com duas, três ou quatro vozes.
A partir de 15 8 1, quando os russos ficam privados de Narva271, a água
do Báltico perde sua atividade em benefício das rotas terrestres por onde
então se exportam as mercadorias da Moscóvia. Basta irromper a guerra dos
Trinta Anos, e rompem-se as rotas profundas do centro da Europa. Segue-se
uma intensificação dos tráficos do Báltico.
Mas deixemos de lado os binômios: França-Inglaterra, Inglaterra-Portugal,
Rússia-Inglaterra, Europa de Oeste-Europa de Leste... O importante é
observar unidades econômicas apreendidas no conjunto de suas relações com
o exterior. Era o que já defendiam em 1701, perante o Conselho de
Comércio, os "deputados do
Ponant" (leia-se dos portos atlânticos) opondo-se aos deputados de Lyon:
"o seu princípio, relativamente à balança", não é "fazer uma particular
de nação a nação, mas antes uma geral do Comércio da França com todos os
Estados" - o que, na sua maneira de ver, deveria ter incidência sobre a
política comercia1272.
Estas totalidades, quando as apreendemos, só nos revelam, a bem dizer,
segredos fáceis de descobrir de antemão. Assinalam a modesta proporção
dos volumes do comércio externo em relação ao conjunto da renda nacional
- mesmo que, contra todas as normas razoáveis, entendamos comércio
externo como a soma das exportações e importações, quando estes dois
movimentos devem ser subtraídos um do outro. Mas se examinamos apenas a
balança, positiva ou negativa, trata-se então apenas de uma pequena
parcela da renda nacional que parece não poder afetá-la, quer se some
quer se subtraia. É neste sentido que compreendo uma frase de Nicholas
Barbon (1690), um desses inúmeros redatores de libelos graças aos quais a
ciência da economia é criada na Inglaterra, quando escreve: " The
Stock of a Nation fis] Infinite and can never be consumed", o estoque
[mais do que por capital, eu traduziria por patrimôniol de uma nação é
infinito e nunca pode ser consumido ou destruído273.
Todavia, o problema é mais complexo e interessante do que parece. Não me
deterei nos casos muito claros das balanças gerais, no século XVIII, da
Inglaterra ou da
França (a este respeito, consultar os gráficos e os comentários da p.
175).
Preferi interessar-me pelo caso da França, em meados do século XVI, não
em razão dos dados que possuímos a esse respeito, nem sequer porque esses
números globais esboçam ante nossos olhos a emergência imperfeita de um
mercado nacional, mas sim porque a verdade geral que constatamos no
tocante à Inglaterra e à

185

éculo XVIII já é tangível duzentos anos antes das estatísticas do século


iça de Henrique 11 tem por certo saldos positivos com todos os países im
exceto um. Portugal, Espanha, Inglaterra, Países Baixos, Alemai em
relação à
França. Por essas inclinações que lhe dão vantagem, a ta moedas de ouro e
de prata em troca do trigo, dos vinhos, dos tecidos ins que exporta, sem
contar as remessas de uma emigração regular orienEspanha. Mas a essas
vantagens opõe-se um déficit perene relativamenoperando-se a retirada
sobretudo por intermédio da praça de Lyon e -as: a França aristocrática
gosta muito de seda, de veludos caros, de reino e de outras especiarias,
de mármores; recorre com muita freqüência nunca gratuitos, dos artistas
italianos e dos negociantes transalpinos, comércio atacadista e das
letras de câmbio. As feiras de Lyon, o serviilismo italiano, são uma
eficaz bomba de sucção, como, no século ante1 sido as feiras de Genebra e
provavelmente também, em larga medida, iras da
Champagne. Todo o ganho das balanças vantajosas é desse modo itregue, ou
quase, às lucrativas especulações do italiano. Em 1494, quan111 se
prepara para transpor os Alpes, tem de obter a cumplicidade, icia dos
homens de negócios italianos instalados no reino e ligados às,, mercantis
da península274. Estes, avisados a tempo, correm para a corm sem grandes
dificuldades, mas "obtêm em troca a reposição das quaiuais de Lyon" -
prova, por si só, de que elas estão a serviço deles.
PAíSES BAIXOS e ANTUÉRPIA
ALEMANHA
ITÁLIA e
LEVANTE
ESPANHA
DRO DAS IMPORTAÇõES FRANCESAS EM MEADOS DO SÉCULO XVI uscritos 2085 e
2086 da
B.N. (-Le commerce Ximportation en France au milieu du XVIe siècle'

7berland, in Revue de géographie, 1892-1893.)

1, 1 (fuUflUfritu erli Ju- - --- --Prova também de que Lyon, presa numa
superestrutura estrangeira, já era uma capital muito à parte, ambígua, da
riqueza da França.
Um documento excepcional chegou até nós, infelizmente incompleto: fornece
com minúcias as importações francesas em cerca de 1556 275 mas o "livro"
seguinte, onde figuravam as exportações, desapareceu. O gráfico da página
186 resume enumeração dessas cifras. O total situa-se entre 35 e 36
milhões de libras; e, como balança de uma França ativa é então certamente
positiva, as exportações ultrapassam em vários pontos essa soma de 36
milhões. Portanto, exportações e importações se elevam, no total, a 75
milhões de libras pelo menos, ou seja, uma soma enorme. Mesmo que acabem
por se anular na balança, essas duas correntes que andam lado a lado,
confluem, criam meandros e movimentos circulares, são milhares de ações e
de trocas sempre prontas a renovar-se. Mas esta economia ágil não é,
repita-se, a atividade total da França - essa atividade total a que
chamamos a renda nacional, que naturalmente não conhecemos, mas podemos
imaginar.
A partir de cálculos que veremos reaparecer ainda uma ou duas vezes no
decorrer de nossas explicações, estimei o rendimento per capita dos
venezianos, por volta de 1600, em 37 ducados; o dos súditos da Signoria
em Terraferma (isto é, no território italiano dependente de Veneza) em
cerca de 1O ducados. Esses números, evidentemente não garantidos, são por
certo demasiado baixos no que se refere à própria cidade de Veneza. Mas
marcam de qualquer modo uma prodigiosa distância entre as rendas de uma
cidade dominante e as do território por ela dominado.
Isto posto, se aceitarmos, em 1556, como renda per capita francesa um
número vizinho do da Terra Firme veneziana (dez ducados, ou seja, 23 ou
24 libras tornesas), poderemos estimar a renda de vinte milhões de
franceses em 46O milhões de libras - soma enorme, mas não mobilizável,
porque avalia em dinheiro uma produção em grande parte não
comercializada. Posso também partir para um cálculo da renda nacional,
das receitas do orçamento da monarquia. São da ordem dos

15 a 16 milhõeS276. Se aceitarmos que estas são cerca da vigésima parte


da renda nacional, esta se situará entre 30O e 32O milhões de libras.
Estamos abaixo do primeiro número, mas bem acima dos volumes do comércio
externo. Voltamos a encontrar aqui o problema, tantas vezes discutido, do
peso respectivo de uma vasta produção (sobretudo agrícola) e de um
comércio externo relativamente pequeno
- o que não quer dizer, em minha opinião, que seja economicamente menos
importante.
Em todo o caso, sempre que está em causa uma economia relativamente
avançada, a sua balança é, regra geral, superavitária. Foi esse
seguramente o caso das cidades dominantes de outrora, Gênova, Veneza; o
caso também de Gdansk (Danzig)
já no Século XV277. No século XVIII, vejam-se as balanças do comércio
inglês e do comércio francês: delineiam ao longo de quase todo o século
situações superavitárias. Não é de admirar que, em 1764, o resultado do
comércio externo da Suécia, que é estudado pelo economista sueco Anders
ChydeniUS278 seja, também ele, de superávit: a Suécia, cuja marinha
conhece então um enorme desenvolvimento, conta, no plano das exportações,
com 72 milhões de dalers (moeda de cobre) contra 66 na importação. A
"nação" ganha, portanto, mais de 5

milhões.
Claro que nem todos podem ganhar nesse jogo. "Ninguém ganha sem que outro
perca:
a reflexão de Montchrestien tem a seu favor o born senso. Outros perdem,
com efeito: como as colônias sangradas até a exaustão, como os países
mantidos na dependência.

entura pode surgir mesmo para os Estados "desenvolvidos" e que pare3,


idos. Creio que a Espanha do século XVII, entregue pelos governantes das
circunstâncias à inflação devastadora do cobre, foi um desses ca)ém, em
linhas gerais, a França revolucionária, da qual um agente russo z "faz a
guerra com seu capital enquanto os inimigos a fazem com a ;-279. Esses
casos mereceriam um exame demorado, pois, ao manter a olítica à custa da
inflação do cobre e do déficit acarretado pelos paga-rnos em prata, a
Espanha desorganizou-se internamente. E a derrocada França
revolucionária, mesmo antes das provações de

1792-1793, peduramente sobre seu destino. O câmbio francês, de 1789 à


primavera spencou rapidamente em Londres 28% sendo tal movimento
acompanhai ampla evasão de capitais. Em ambos os casos, parece que um
déficit ) da balança comercial e da balança de pagamentos provocou uma
deslo menos uma deterioração da economia interna.
) quando a situação não é tão dramática, se o déficit se instala de
modo,, é certa, num prazo mais ou menos longo, a deterioração
estrutural )nomia. Ora, tal situação se delineia de maneira concreta, no
tocante )ois de 1760, e no tocante à China depois de 182O ou 1840.
essivas chegadas dos europeus ao Extremo-Oriente não acarretaram rupatas.
Também não trouxeram problemas imediatos às estruturas do co, tico. Fazia
muito tempo séculos antes da passagem do cabo da Boa
- que uma vasta circulação se estendia pelo oceano índico e pelos maes do
Pacífico. Nem a ocupação de Malaca, tomada à força em 1511, lação dos
portugueses em Goa, nem sua instalação mercantil em Macau s velhos
equilíbrios.
As depredações iniciais dos recém-chegados permiipoderar-se de cargas sem
as pagar, mas em breve se restabeleceram as leve e do haver, como a
bonança depois da tempestade.
regra de sempre era: as especiarias e outras mercadorias asiáticas só is
em troca de prata; por vezes, mas com menor freqüência, de cobre, ção
monetária é importante na índia e na China. A presença européia á nesse
ponto. Veremos portugueses, holandeses, ingleses, franceses condos
muçulmanos, dos banianos, dos prestamistas de Kioto, empréstita sem a
qual nada andava, de Nagasaki a
Surate. É para resolver esse isolúvel que os portugueses, depois as
grandes
Companhias das índias,

1 Europa moedas de prata, mas os preços das especiarias sobem na pro-


uropeus, que se trate de portugueses de Macau ou de holandeses tenir-se
no mercado chinês, contemplam impotentes montanhas de mercanão estão ao
seu alcance.
Escreve um holandês em 1632: "Até agora, os de encontrar mercadorias [...
1

temos é falta de dinheiro para comprá;oluÇão, para o europeu, acabará


sendo inserir-se nos tráficos locais, petuosamente o comércio de
cabotagem que é o comércio "interno da portugueses auferem lucros
substanciais assim que chegam à
China e

O delta de Cantão (10.00O km2). Três rios do Leste, do Norte e do Oeste


(Si
Kiang) juntam as uguas, lamas e areias nesse largo golfo coalhado de
ilhas montanhosas. O conjunto resulta, tal como as rias da Bretanha, de
uma antiga invasão marinha. Uma barra, baixios. Todavia, um canal
(profundidades em toesas,
Im 949, distâncias em léguas marítimas, 5 km 4 ou 3 milhas inglesas)
permite aos grandes navios da época subir quase até Cantão (3 m de
calado). Mas lui as vazantes dos rios e as marés. Cantão, ao lado do rio
das Pérolas, são duas cidades (a tdrtara e a chinesa). Exiguidade do
território de Macau, na mão dos portugueses (16 km'), na extremidade de
uma grande ilha. Mais um passo, e cairiam no mar.
ao Japão. Depois deles, e melhor do que todos os outros, os holandeses
adaptamse ao sistema.
Tudo isto só é possível à custa de um enorme esforço de implantação. Já
os portugueses, muito pouco numerosos, tiveram dificuldade em manter suas
fortalezas. Para o comércio interno da índia, têm de construir localmente
os barcos, recrutar localmente tripulações - os lascares dos arredores de
Goa, "que têm o hábito

o conclusão dos dois capítulos precedentes, será possível tentar "situar"


o no seu verdadeiro lugar? Não é tão simples como parece porque a palai
só, é muito equívoca. Por um lado, aplica-se, num sentido muito amplo,
formas de troca desde que ultrapassem a auto-suficiência, a todas as
enelementares e superiores que acabamos de descrever, a todas as catego,
izem respeito às áreas mercantis (mercado urbano, mercado nacional) ou
àquele produto (mercados do açúcar, dos metais preciosos, das
especiaalavra é então o equivalente de troca, de circulação, de
distribuição. Por o, a palavra mercado designa muitas vezes uma forma
bastante ampla da nbém chamada econom;a de mercado; ou seja, um sistema.
ficuldade é que:
complexo do mercado só se compreende se reinserido no conjunto de uma
iômica e também de uma vida social que mudam com os anos; próprio
complexo evolui e se transforma constantemente, deixando porer, de um
momento para outro, o mesmo significado ou o mesmo alcance. defini-lo em
sua realidade concreta, vamos abordá-lo por três vias: as teomáticas dos
economistas; o testemunho da história lato sensu, tomada, porsua mais
longa duração; as lições confusas mas talvez úteis do mundo atual.
conomistas têm privilegiado o papel do mercado. Para Adam Smith, o é o
regulador da divisão do trabalho. Seu volume rege o nível que será pela
divisão, esse processo, esse acelerador da produção. Mais ainda, o é o
lugar da "mão invisível", nele a oferta e a procura se encontram e ram
automaticamente por intermédio dos preços. A fórmula de Oskar Lanmelhor:
o mercado foi o primeiro computador posto a serviço dos hoia máquina
auto-reguladora que assegura sozinha o equilíbrio das atividamicas.
D'Averie1293 dizia, na linguagem da época, a do liberalismo de ia
tranqüila: "Mesmo que nada fosse livre num Estado, ainda assim o coisas
continuaria a sê-lo e não se deixaria subjugar por ninguém. O preheiro,
da terra, do trabalho, os preços de todos os gêneros e mercadorias xaram
de ser livres: nenhuma coerção legal, nenhum acordo privado consubjugá-
lo."
opiniões admitem implicitamente que o mercado, que não é dirigido por é o
mecanismo motor de toda a economia. O crescimento da Europa, do mundo,
seria o de uma economia de mercado que não parou de amterreno, prendendo
na sua ordem racional cada vez mais homens, cada tráficos próximos e
distantes que tendem a criar, para todos eles, uma lo mundo. A maior
parte das vezes, a troca suscitou sempre ao mesmo )ferta e a procura,
orientando a produção, acarretando a especialização

em ju- uus mercaaos de vastas regiões econômicas, desde então solidárias,


pela sua própria existência, da troca tornada necessária. Será preciso
dar exemplos? A viticultura na Aquitânia, o chá na China, os cereais na
Polônia, na Sicília ou na Ucrânia, as sucessivas adaptações econômicas do
Brasil colonial (madeiras tintoriais, açúcar, ouro, café)... Em suma, a
troca une as economias umas às outras. A troca é anel, é ponto de junção.
Entre compradores e vendedores, o preço é o maestro. Na Bolsa de Londres,
conforme sobe ou desce, o preço transforma os bears em bulis e vice-versa
- sendo os bears, na gíria bolsista, os que jogam na baixa, os bulls na
alta.
A margem e até no cerne das economias ativas, há por certo zonas mais ou
menos extensas que são pouco afetadas pelo movimento do mercado. Apenas
alguns traços, a moeda, a chegada de produtos raros estrangeiros, mostram
que esses pequenos universos não são inteiramente fechados. Ainda se
encontram idênticas inércias ou imobilidades na Inglaterra dos Jorges ou
na França superativa de Luís XVI.
Mas, justamente, o crescimento econômico seria a redução dessas zonas
isoladas, progressivamente chamadas para participar da produção e do
consumo gerais vindo finalmente a Revolução industrial generalizar o
mecanismo de mercado.
Um mercado auto-regulador, conquistador, capaz de racionalizar toda a
economia tal seria essencialmente a história do crescimento. Carl
Brinkrnann 294 pô_ de dizer recentemente que a história econômica era o
estudo das origens, do desenvolvimento e da eventual decomposição da
economia de mercado. Essa visão esquemática está de acordo com o
ensinamento de gerações de economistas. Mas não pode ser a dos
historiadores, para quem o mercado não é um fenômeno meramente endógeno.
Também não é o conjunto das atividades econômicas, nem sequer uma fase
precisa da sua evolução.
Através do tempo multissecular
Uma vez que a troca é tão velha como a história dos homens, um estudo
histórico do mercado deve estender-se à totalidade dos tempos vividos e
situáveis e, pelo caminho, aceitar a cooperação das outras ciências do
homem, das suas possíveis explicações, sem o que não poderia apreender as
evoluções, as estruturas de longo alcance, as conjunturas criadoras de
nova vida. Mas, se aceitamos tal ampliação, somos lançados numa
investigação imensa, na realidade sem princípio nem fim. Todos os
mercados dão testemunhos: em primeira instância, os lugares de trocas
retrógradas, formas ainda visíveis, aqui e ali, de antigas realidades,
semelhantes a especies ainda vivas de um mundo antediluviano. Confesso
que me apaixonei pelos mercados atuais de Cabília que surgem
regularmente, no meio do espaço ermo, abaixo das aldeias empoleiradas a
toda a volta 295 ; ou pelos mercados atuais do Daorné, muito pitorescos,
eles também fora das aldeiaS296 ;
ou pelas feiras rudimentares do delta do rio Vermelho, há pouco
observadas com minúcia por Pierre GourOU297. E tantas outras, como ainda
há pouco as do sertão da Bahia, em contato com os pastores e rebanhos
semi-selvagens do interior298.
Ou, mais arcaicas, as trocas cerimoniais no arquipélago de Trobriand, no
sudeste da Nova Guiné inglesa, vistas por Malinowski299. Aqui, juntam-se
o atual e o antigo, a história, a pré-história, a antropologia, in loco
uma sociologia retrospectiva, uma economia arcaizante.

193

?, mercado tradicional do Daomé, em plena natureza, fora das aldeias.


(Foto ichê
Picou.)
Polanyi30O seus discípulos e partidários fiéis enfrentaram o desafio que
i de testemunhos constitui. Penetraram-na com dificuldade para poder ima
explicação, quase uma teoria: a economia, que não é mais do que
onjunto"301 da vida social que esta engloba em suas redes e em suas só
tardiamente se desvencilhou (e ainda assim!) desses múltiplos víncuido
Polanyi, teríamos mesmo de aguardar a plena explosão do capitaséculo XIX,
para que se produzisse "a grande transformação", para -cado "auto-
regulador" assumisse suas verdadeiras dimensões e subjucial até então
dominante. Antes dessa mutação, não haveria, por assim is do que mercados
sem liberdade de ação, falsos mercados ou idos.
) exemplos da troca que não dependeria do comportamento dito
--econô)lanyi invoca as trocas cerimoniais condicionadas pela
reciprocidade; ou uição dos bens pelo Estado primitivo que confisca a
produção; ou ainda trade, esses lugares de troca neutra onde o mercador
não dita a lei, cujo emplo seriam pequenos portos da colonização fenícia
onde, num dado..-i recinto delimitado, se pratica o comércio discreto ao
longo das costas ieas. Em suma, seria preciso distinguir entre o trade (o
comércio, a trotrket (o mercado auto-regulador dos preços) cujo
aparecimento foi, no sado, uma revolução social de primeira grandeza.

O mal é que toda a teoria parte dessa distinção baseada (quanto muito) em
algumas sondagens heterogéneas. Por certo nada proíbe que se introduza
numa discussão sobre --a grande transformação" do século XIX o potIatch
ou o kula (em vez da organização mercantil muito diversificada dos
séculos XVII e XVIII).
É o mesmo que recorrer, a propósito das regras do casamento na Inglaterra
no tempo da rainha Vitória, às explicações de Lévi-Strauss sobre os laços
de parentesco. com efeito, não se fez nenhum esforço para abordar a
realidade concreta e diversificada da história e depois partir daí. Nem
uma referência a
Ernest Labrousse, ou a Wilhelm Abel, ou aos numerosos trabalhos clássicos
sobre a história dos preços. Vinte linhas, e está resolvida a questão do
mercado na chamada época "mercantilista' '302. Sociólogos e economistas
no passado, antropólogos hoje, habituaram-nos, infelizmente, ao seu quase
total desconhecimento da história, o que lhes facilita mais a tarefa.
Além disso, a noção de --mercado auto-regulador- que nos é proposta303 é
isto, é aquilo, não é tal coisa, não admite esta ou aquela linha - está
relacionada com um gosto teológico pela definição. Esse mercado em que
"só intervêm a procura, o custo da oferta e os preços, que resultam de um
acordo recíproco"304, na ausência de qualquer "elemento externo", é uma
criação da mente. É demasiado fácil batizar de econÔmica uma forma de
troca e de social uma outra. Na realidade, todas as formas são
econômicas, todas são sociais. Houve, por séculos a fio, trocas sócio-
econômicas muito variadas que coexistiram, a despeito ou por causa da sua
diversidade. Reciprocidade, redistribuição são também formas econômicas
(D. C. North305 tem toda a razão neste ponto), e o mercado a título
oneroso, muito cedo implantado, é também ao mesmo tempo uma realidade
social e uma realidade econômica. A troca é sempre um diálogo e, de vez
em quando, o preço é imprevisível. Sofre certas pressões (a do príncipe,
ou da cidade, ou do capitalista, etc.), mas também obedece forçosamente
aos imperativos da oferta, rara ou abundante, e não menos da procura. O
controle dos preços, argumento essencial para negar o aparecimento, antes
do século XIX, do "verdadeiro"
mercado auto-regulador, sempre existiu e continua a existir. Mas, no que
se refere ao mundo pré-industrial, seria um erro pensar que as listas
oficiais de preços dos mercados suprimem o papel da oferta e da procura.
Em princípio, o controle severo do mercado é feito para proteger o
consumidor, isto é, a concorrência. Em última análise, seria mais o
mercado "livre", por exemplo o private market inglês, que tenderia a
suprimir ao mesmo tempo o controle e a concorrência.
Historicamente, temos de falar, a meu ver, de economia de mercado tão
logo há flutuação e consonância dos preços entre os mercados de uma dada
zona, fenômeno tanto mais característico por se produzir em diferentes
jurisdições e soberanias. Neste sentido, há economia de mercado muito
antes dos séculos XIX e
XX, os únicos que, ao longo de toda a história, segundo W. C. Neale306
teriam conhecido o mercado auto-regulador. Desde a Antiguidade os preços
flutuam; no século XIII, já flutuam conjuntamente em toda a Europa. A
seguir afirmar-se-a a consonância, dentro de limites cada vez mais
restritos. Até os minúsculos burgos do Faucigny, na Sabóia do século
XVIII, numa região de altas montanhas pouco propícia às ligações, vêem
seus preços oscilarem, no mesmo ritmo, de uma semana para outra, em todos
os mercados da região, conforme as colheitas e as necessidades, conforme
a oferta e a procura.

Sto, não pretendo, pelo contrário, que essa economia de mercado,


próxiicorrência, abarque toda a economia. Não o consegue mais hoje do que
mbora em proporções e por razões totalmente diferentes. O caráter par~mia
de mercado pode dever-se, com efeito, quer à importância do se)-
suficiência, quer à autoridade do Estado que subtrai uma parte da pro,
rculação mercantil, quer, na mesma medida ou mais ainda, ao simples
mheiro que pode, de mil maneiras, intervir artificialmente na formação.
Nas economias atrasadas ou muito avançadas, a economia de mercado anto
ser minada pela base ou pelo topo.
é certo é que, a par dos não-mercados caros a Polanyi, houve também, pre,
trocas a título puramente oneroso, por mais modestas que fossem. rcados
desde tempos remotos, ainda que modestos, no âmbito de uma de várias
aldeias, podendo o mercado apresentar-se então como uma alante à imagem
da grande feira, espécie de cidade fictícia e ambulante. so essencial
dessa interminável história é a anexação, um dia, pela cidacados até
então pequenos. Ela os engole, os alarga à sua própria dimeno que, por
sua vez, ela própria se submeta a sua lei. O fato determinante -P te a
entrada da cidade no circuito econômico, da unidade pesada. O rbano teria
sido inventado pelos fenícioS307 é bem possível. Seja como ides gregas
quase contemporâneas instalaram todas um mercado na ágo)raça centra1308;
inventaram também, pelo menos propagaram, a moelicador evidente,
conquanto não seja, por certo, a condição sine qua non 0.
ide grega conheceu mesmo o grande mercado urbano, o que se abastece leria
ser de outro modo? Como cidade, ei-la incapaz, assim que atinge de viver
do campo próximo, pedregoso, seco, muitas vezes infértil. Impõeo a
outrem, como mais tarde às cidades-Estados da Itália já no século ntes.
Quem há de alimentar
Veneza, uma vez que ela nunca teve mais )res hortas conquistadas à areia?
Mais tarde, para dominar os circuitos comércio de longa distância, as
cidades mercantes da Itália ultrapassalos grandes mercados, instalarão a
arma eficaz e de certo modo cotidiaiiões de ricos mercadores. Não tinham
Atenas e Roma criado já os patariores do banco e de reuniões que
poderíamos qualificar de "bolsistas"? ma, a economia de mercado se formou
passo a passo. Como dizia
Mar"foram as nossas sociedades do Ocidente que há bem pouco tempo fizemem
um animal econômico"309. Mas falta entendermo-nos quanto ao "há bem pouco
tempo".
ução não parou ontem, nos belos tempos do mercado auto-regulador. s áreas
do planeta, para enormes massas de homens, os sistemas sociao controle
autoritário dos preços, puseram fim à economia de mercado. iste, é porque
usou rodeios, se contentou com minúsculas atividades. mcias, em todo
caso, põem um termo, não o único, à curva desenhada

11 CLUfluflitu ClIt JULe UU.3 friercuUUN de antemão por Carl Brinkrnann.


Não o único, uma vez que, aos olhos de certos economistas atuais, o mundo
"livre" está passando por uma transformação singular. O poder acrescido
da produção, o fato de os homens em grandes nações não todas, bem
entendido - terem ultrapassado a fase da escassez e da penúria e não
terem sérias preocupações quanto à vida de todos os dias, o prodigioso
enriquecimento de grandes empresas, em geral multinacionais - todas estas
transformações derrubaram a antiga ordem do mercado rei, do cliente rei,
da economia de mercado decisiva. Já não existem leis do mercado para as
grandes empresas capazes de influenciar a procura com uma publicidade
altamente eficaz, capazes de fixar arbitrariamente os preços. J. K.
Galbraith acaba de descrever, num livro muito claro, o que ele chama o
sistema industria1110. Os economistas de língua francesa preferem falar
de organisation. Num artigo recente do Le
Monde (29 de março de 1975), François Perroux chega a dizer: "a
organização, esse modelo muito mais importante do que o mercado...- Mas o
mercado subsiste:
posso ir a uma loja, a uma feira qualquer e "testar" a minha realeza
muito modesta de cliente e de consumidor. Do mesmo modo, para o pequeno
fabricante tomemos o exemplo clássico da confecção -, imperativamente
apanhado no jogo de uma concorrência múltipla, a lei do mercado existe
sempre plenamente. Não se propõe J. K. Galbraith, no seu último livro, a
estudar "muito atentamente a justaposição das pequenas empresas - o que
eu chamo [diz ele] o sistema de mercado - e do sistema industrial"311,
refúgio das grandes empresas? Mas Lenin dizia quase o mesmo a propósito
da coexistência do que ele chamava o "imperialismo" (ou capitalismo de
monopólio recém-criado, no princípio do século
XX) e do simples capitalismo, este útil, na base de concorrência, julgava
ele312.
Estou plenamente de acordo tanto com Galbraith como com Lenin, apenas com
a pequena diferença de que a distinção setorial, entre o que eu chamo
"economia"
(ou economia de mercado) e "capitalismo-, não me parece uma
característica nova, mas uma constante da Europa, desde a Idade Média. E
com esta outra diferença: é preciso acrescentar ao modelo pré-industrial
um terceiro setor - o andar térreo da não-economia, espécie de humo onde
o mercado lança suas raizes, mas sem o prender integralmente. Este andar
térreo é enorme. Acima dele, a zona mais representativa da economia de
mercado multiplica as ligações horizontais entre os diversos mercados;
nela um certo automatismo liga habitualmente oferta, procura e preços.
Finalmente, ao lado, ou melhor, acima desta camada, a zona do
contramercado é o reino da esperteza e do direito do mais forte. É aí que
se situa por excelência o domínio do capitalismo - ontem como hoje, antes
como depois da Revolução industrial.

197

Capítulo 3

A PRODUÇÃO OU O CAPITALISMO
EM CASA ALHEIA
Será prudência? Será negligência? Ou o tema é que não lhe era propício? A
palavra capitalismo, até aqui, só me veio à pena umas cinco ou seis vezes
e eu poderia ter-me eximido de empregá-la. Mas não o fez! - exclamarão
todos aqueles que acham que se deve refugar, de uma vez por todas, esta
"palavra de combate"', ambígua, pouco científica, utilizada a torto e a
direito2. E sobretudo, sobretudo, impossível de empregar sem anacronismo
censurável antes da era industrial.
Pessoalmente, após prolongada tentativa, renunciei a expulsar a
importuna.
Pensei que não haveria nenhuma vantagem em me livrar, ao mesmo tempo que
da palavra, das discussões que ela acarreta e que chegam até nós com
certa vivacidade. Pois, compreender ontem e compreender hoje, para um
historiador, é a mesma operação. Será possivel imaginar a paixão da
história detendo-se bruscamente, a uma distância respeitosa da
atualidade, em que seria indecente, até perigoso, dar mais um passo? De
qualquer maneira, a precaução é ilusória.
Põe-se o capitalismo porta afora, ele entra pela janela. Porque há, quer
se queira quer não, mesmo na época pré-industrial, uma atividade
economica que evoca irresistivelmente a palavra e não aceita nenhuma
outra. Embora ela ainda não recorra muito ao "modo de produção"
industrial (que, por meu lado, não creio ser a particularidade essencial
e indispensável de todo capitalismo), mesmo assim não se confunde com as
trocas clássicas do mercado. Tentaremos defini-Ia no capítulo 4.

u uuvílulíà;rrio em cuNa aineia ue a palavra é controversa, começaremos


por um estudo prévio do vocafim de seguirmos a evolução histórica das
palavras capital, capitalista, qo, todas três solidárias, de fato
inseparáveis. É uma maneira de afastar ão certas ambigüidades.
pitalismo, assim situado como o lugar do investimento e da alta taxa de
do capital, tem de ser reinserido na vida econômica, cujo volume não r
inteiro. Há, pois, duas zonas onde o situar, a que ele ocupa e é como
sede preferencial; a que ele aborda de esguelha, na qual se insinua, mas
m sempre domina. Até a
Revolução do século XIX, momento em que se -à da produção industrial
promovida à categoria do grande lucro, é na cirue o capitalismo se sente
mais em casa. Ainda que, ocasionalmente, não [e incursões em outros
domínios. Ainda que a circulação não o interesse talidade, uma vez que
controla, que procura controlar, apenas alguns dos inhos.
uma, vamos estudar, neste capítulo, os diferentes setores da produção
em )italismo está em casa alheia - antes de abordar, no capítulo
seguinte, s prediletos onde se encontra verdadeiramente em casa.

CAPITAL, CAPITALISTA, CAPITALISMO


Comecemos por recorrer aos dicionários. Seguindo os conselhos de Henri
Berr e de
Lucien Febvre 3, as palavras-chave do vocabulário histórico só devem ser
utilizadas depois de interrogadas, e duas vezes é melhor do que uma. De
onde vêm elas? Como chegaram até nós? Não irão confundir-nos? Quis
responder a este ponto de ordem a propósito de capital, capitalista,
capitalismo - três palavras surgidas na ordem por que as enumero.
Operação um tanto fastidiosa, concordo, mas imperativa.
O leitor deve estar prevenido de que se trata de uma pesquisa complexa da
qual o resumo que se segue não apresenta a centésima parte4. Todas as
civilizações, já a babilônica, já a grega, a romana e, sem dúvida, todas
as outras às voltas com as necessidades e os litígios da troca, da
produção e do consumo tiveram de criar vocabulários especiais cujas
palavras, depois, não pararam de se deformar.
As nossas três palavras não escapam a essa regra. Mesmo a palavra
capital, a mais antiga das três, só adquire o sentido em que a entendemos
(depois de
Richard Jones, Ricardo, Sismondi, Rodbertus e sobretudo depois de Marx)
ou só começa a adquiri-lo por volta de 1770, com Turgot, o maior
economista de língua francesa do século XVIII.
A palavra --capitalCapital (palavra do baixo latim, de caput, cabeça)
emerge ao redor dos séculos
X11-XIII com o sentido de fundos, de estoque de mercadorias, de massa
monetária ou de dinheiro que rende juros. Não é imediatamente definida
com rigor, incidindo então a discussão sobretudo sobre o juro e sobre a
usura aos quais os escolásticos, moralistas e juristas acabarão por abrir
caminho à consciência elástica, por causa, dirão eles, do risco que corre
quem empresta. A Itália, amostra do que a seguir será a modernidade,
encontra-se no centro dessas discussões. É lá que a palavra se cria, se
torna familiar e, de certo modo, amadurece. É incontestavelmente
detectada em 1211 e a partir de 1283 no sentido de capital de uma
sociedade comercial. No século XIV, ela está quase em toda a parte, em
Giovanni Villani, em Boccaccio, em Donato Velluti... Em 2O de fevereiro
de 1399, Francesco di Marco Datini escrevia de Prato a um de seus
correspondentes: -É evidente que eu quero que, se tu comprares veludos ou
tecidos, faças um seguro do capital (il chapitale) e do ganho [a
realizar];
depois, faz como quiseres. " 1 A palavra, a realidade por ela designada
encontram-se nos sermões de São Bernardino de Siena (1380-1444): "...
quandam seminalem rationem lucrosi quam communiter capitale vocamus",
esse meio prolífico de lucro a que comumente chamamos capita16.
Pouco a pouco, a palavra tende a significar o capital dinheiro de uma
sociedade ou de um mercador, o que na Itália se chama também muitas vezes
corpo e em Lyon, ainda no século XVI, corps1. Mas afinal a cabeça ganhará
do corpo ao fim de longos e confusos debates, na escala de toda a Europa.
Talvez a palavra tenha partido da Itália para se propagar depois pela
Alemanha e pelos Países Baixos.
Por
o capiralismo em casa alheia iria para a França, onde entra em conflito
com outros derivados de caput: eptel, cabal8. Diz Panúrgio: --A ceste
heure [... 1 il my va du propre cagrt, Pusure et les interests, je
pardonne. "9 Seja como for, a palavra capitra-se no Thrésor de la
languefrançoise (1696) de Jean Nicot. Não condaí que seu sentido se tenha
então fixado. Continua perdida entre uma de palavras rivais: sort (no
sentido antigo de dívida), richesses, facultés,

21eur, fonds, biens, pécunes, principal, avoir, patrimoine, que com


faciliibstituem precisamente onde nós esperaríamos que fosse usada.
, lavra fundos (fonds) conservará por muito tempo o estrelato. Diz La
Foneu epitáfio: "Jean sen alla comme il était venulMangeant son fonds
avec U."* Ainda hoje dizemos: emprestara fundo Ifonds] perdido. Não nos
sur)ortanto ler que um navio de Marselha foi a Gênova buscar "seus fundos
as para ir ao Levante- 1O (1713), ou que um mercador, ocupado em
liquiegócio, só tem de "recuperar seus fundos"" (1726). Em contrapartida,
-m 1757, Véron de Forbormais escreve: "Só os fundos que têm a vanta em

9 )roporcionar rendimento parecem merecer o nome de riquezas"", a palaas,


usada em lugar de capital (como o especifica a continuação do texto), s.,
a nós, incongruente. Outras expressões surpreendem ainda mais: um dosobre
a lnglaterra13 (1696) calcula que "esta nação tem ainda o valor in[e
seiscentos milhões [de libras; é, por alto, o total adiantado por Gregory
terras e em fundos de toda a espécie". Turgot, em 1757, onde diríamos
-amente capitais variáveis ou circulantes, fala de "adiantamentos
circulanipresas de todo o gênero" 14. Adiantamentos tende a assumir, em
Turgot, de investimentos: está aí o conceito moderno de capital, exceto a
palavra. i divertido ver que, na edição de 1761 do Dictionnaire de Savary
des Brusala, a propósito das companhias mercantis, de seus "fonds
capitaux" 15. a palavra reduzida ao papel de adjetivo.
Claro que a expressão não foi inor Savary. Uns quarenta anos antes, "o
fundo capital da Companhia [das -va-se a 143 milhões de libras", diz um
documento do
Conselho Superior cio". Mas quase na mesma data (1722) uma carta de Vam--
obais, o Velho17 ite de Abbeville, calcula, depois do naufrágio de seu
navio, o Charles de que o prejuízo "elevou-se a mais de metade do
capital".
tal só se imporá definitivamente depois do lento desgaste das outras
palaial pressupõe a instauração de conceitos renovados, uma "ruptura do
saa Michel
Foucault. Condillac (1782) diz com mais simplicidade: "Cada quer uma
língua própria porque cada ciência tem idéias que lhe são próece que se
deveria começar por fazer essa língua; mas começa-se por falar e a língua
fica por fazer.`8 A língua espontânea dos economistas clásfalada ainda
por muito tempo depois deles.
J. -B. Say confidencia (1828) ivra riqueza é "um termo mal definido nos
nossos dias"19, mas utilizadi fala sem reservas de "riquezas
territoriais" (no sentido de fundiárias), i nacional, de riqueza
comercial, servindo esta última expressão até de seu primeiro ensaio20.
tanto, a palavra capital vai-se impondo aos poucos. Já em Forbormais, e
"capital produtivo, 521 ; em Quesnay, que afirma: "Todo o capital é um to
de produção.9922 E já, sem dúvida, na língua corrente, uma vez que

1 como metáfora: "O senhor de Voltaire vive, desde que está em Paris, i
como chegou/comendo seus fundos com sua renda. (N.T.)
O Comércio, tapeçaria do século XV. (Museu de Cluny, foto Roger-Viollet.)
do capital das suas forças"; seus amigos deveriam "desejar que vivesse
apenas da sua renda", diagnosticava justamente o Dr. Tronchin, em
fevereiro de 1778, alguns meses antes da morte do ilustre escritor23.
Vinte anos mais tarde, na época da campanha de Bonaparte na Itália, um
cônsul russo, refletindo sobre a situação excepcional da França
revolucionária, dizia (já o citei): "faz a guerra com o seu capital",
seus adversários apenas --com os seus rendimentos"!
Observe-se ainda que, neste brilhante comentário, o sentido de capital
designa o patrimônio, a riqueza de uma nação. Já não se trata da palavra
tradicional para uma soma de dinheiro, para o montante de uma dívida, de
um empréstimo ou de um fundo comercial, sentido que encontramos tanto no
Thrésor des trois langues de
Crespin (1627), no Dictionnaire universel de Furetière (1690), como na
Encyclopédie de 1751 ou no Dictionnaire de l'Académiefrançoise (1786).
Mas não estará este sentido antigo ligado ao valor dinheiro, tanto tempo
aceito de olhos fechados? Substituí-lo pela noção de dinheiro produtivo,
de valor trabalho, requererá muito tempo. Percebese, no entanto, esse
sentido em Forbormais e em
Quesnay, já citados; em Morellet

u em u~ aineia ue distinguia os capitais ociosos dos capitais atuanteS24;


mais ainda em )ara quem os capitais já não são exclusivamente o dinheiro.
Um empure chegaríamos ao --sentido que Marx dará explicitamente (e
exclusivapalavra: o de meio de produção' '25. Vamos deter-nos neste
limite ainda o a que teremos de voltar.
)s capitalistas .talista data decerto de meados do século XVII. O
Hollandische Mercu-ega o termo uma vez em 1633, uma vez em 1654 26. Em
1699, um texto ssinala que uma nova imposição, estabelecida pelos
Estados-Gerais das [s Unidas, distingue os "capitalistas", que pagarão 3
florins, e os outros, m 3O soldoS27. A palavra é pois conhecida há muito
tempo quando JeanZousseau escreve a um dos amigos, em

1759: "Não sou grande senhor, [alista. Sou um homem pobre e contente. -28

Todavia, capitalista figura adjetivo na Encyclopédie. O substantivo, é


verdade, tem muitos rivais. ianeiras de designar os ricos: pessoas de
dinheiro, os fortes, os mãos-cheias, )s, milionários, novos-ricos,
fortunosos (se bem que esta última palavra :) posta no índex pelos
puristas). No tempo da rainha Ana da
Inglaterra, todos riquíssimos, eram designados "gente de carteira" ou
"monneyed todas essas palavras assumem facilmente um torn pejorativo:
Quesnay, falava dos detentores de "fortunas pecuniárias" que "não
conhecem rei [a' 29. Para
Morellet, os capitalistas formam um grupo, uma categoria, a classe à
parte na sociedade 30.
ntores de "fortunas pecuniárias" é o sentido estrito que a palavra
capita.ne na segunda metade do século XVIII, quando designa os
possuidores s públicos", de valores mobiliários ou de dinheiro líquido
para investir. uma sociedade de armadores, largamente financiada por
Paris, estabele[e na capital, rua "coqueron" (Coq Héron), porque,
explica-se aos intele Honfleur, --os capitalistas que residem [em Paris]
gostam muito de ter vestimentos ao alcance e de verificar continuamente o
seu estado"". Um politano em Haia escreve (em francês) ao seu governo (7
de fevereiro de erá muito difícil que os capitalistas deste país exponham
o dinheiro deles a das conseqüências da guerra' 32 - tratase da guerra
travada entre a L Turquia. Voltando mentalmente, em 1775, à fundação,
pelos holandelônia do Suriname, nas Guianas, Malouct, o futuro
constituinte, distinempresários e capitalistas: os primeiros traçaram, no
local, as plantações s de drenagem; "dirigiram-se em seguida a
capitalistas da Europa para.undos, associando-os à sua empresa' 3 3.
Capitalistas equivale cada vez.nipuladores de dinheiro e a fornecedores
de fundos. Um panfleto escrito i em

1776 intitula-se: Uma palavra aos capitalistas sobre a dívida da

34 : não são os fundos ingleses, a priori, negócio de capitalistas? Em


ju3, na França, procura-se dar plena liberdade aos mercadores para derem
o papel de atacadistas. Por intervenção de Sartine, então chefe da aris
fica excluída dessas medidas. Senão, diz-se, seria expor a capital à e um
grande número de capitalistas [que] iria fazer açambarcamentos e )ossível
a vigilância do magistrado da polícia sobre o abastecimento a Pam se vê
que a palavra, que já tem má reputação, designa as pessoas pro

,, i proaução ou o captiatismo em casa aineta vidas de dinheiro e prontas


a empregá-lo para obterem ainda mais. É neste sentido que um opúsculo,
publicado em Milão em 1799, distingue proprietários fundiários e
possessori di ricchezze mobili, ossia i capitalisti36. Em 1789, alguns
livros de reclamações, no senescalato de Draguignan, queixam-se dos
capitalistas definidos como

4'aqueles que têm fortunas na carteira" 37 e que, por isso, escapam ao


imposto.
Resultado: --Os grandes proprietários desta província vendem seu
patrimônio para com ele formar capitais e se protegem dos subsídios
exorbitantes a que são sujeitas as propriedades, aplicando seus fundos a
5 % sem a menor moderação.
'138 Na Lorena, em

1790, a situação seria oposta: "As terras mais consideráveis estão na mão
de habitantes de Paris", escreve uma testemunha, --várias foram compradas
há pouco tempo por capitalistas; voltaram as suas especulações para esta
província porque é nela que os fundos são mais baratos, em proporção com
os seus rendimentos."

39

O tom, como se vê, nunca é amistoso. Marat, que desde 1774 adotou o
estilo da violência, chega a dizer: "Nas nações comerciantes, os
capitalistas e os que vivem de renda [fazem] quase todos causa comum com
os arrematantes de impostos, os financistas e os agiotas." 4O com a
Revolução, sobe o tom. Em 25 de novembro de

1790, na tribuna da Assembléia Nacional, o conde de Custine se exalta:


--A
Assembléia, que destruiu todos os gêneros de aristocracia, fraquejará
contra a dos capitalistas, esses cosmopolitas que só reconhecem a pátria
onde possam acumular riquezas?' 941 Cambon, na tribuna da Convenção, em
24 de agosto de
1793, é mais categórico ainda: "Há neste momento uma luta de morte entre
todos os mercadores de dinheiro e a consolidação da República. Cumprirá
pois matar essas associações destruidoras do crédito público, se
quisermos estabelecer o regime da liberdade." 42 Se a palavra capitalista
não está presente, é sem dúvida porque Cambon quis um termo ainda mais
depreciativo. Todos sabem que o setor financeiro, que aceitou participar
dos primeiros jogos revolucionários para depois se deixar surpreender
pela Revolução, acabará tirando o corpo fora.
Daí a raiva de Rivarol que, no exílio, escreve sem pestanejar: "Sessenta
mil capitalistas e o formigueiro dos agiotas decidiram a RevolUção. '41
Maneira despachada e atrevida, evidentemente, de explicar 1789.
Capitalista, como vemos, não designa ainda o empresário, o investidor. A
palavra, tal como capital, continua agarrada à noção de dinheiro, de
riqueza em si.
Capitalismo: uma palavra muito recente
Capitalismo, do nosso ponto de vista o mais apaixonante dos três termos
porém o menos real (existiria ele sem os dois outros?), foi acirradamente
perseguido pelos historiadores e lexicólogos. Segundo Dauzat44,
apareceria na Encyclopédie (1753), mas com um sentido muito especial:
"Estado daquele que é rico."
Infelizmente, esta afirmação parece estar errada. O texto invocado ainda
não foi encontrado. Em 1842, encontra-se a palavra nos Enrichissements de
la languefrançaise, de L-B. Richard45. Mas foi por certo Louis Blaric
que, na sua polêmica com Bastiat, lhe deu seu novo sentido quando
escreveu, em 1850: " ...
O que chamarei 'capitalismo' [e emprega as aspas], isto é, a apropriação
do capital por uns com exclusão dos outros."46 Mas a utilização da
palavra continua a ser rara. Proud.hon emprega-a algumas vezes e com
correção. "A terra é ainda a fortaleza do capitalismo", escreve ele - é
toda uma tese. E define a palavra otimamente: --Regirrie eco205

social no qual os capitais, fonte de renda, em geral não pertencem


àquefazem render com o seu próprio trabalho.--47 Contudo, dez anos mais

1867, a palavra é ainda ignorada por MarX48.


vamente, apenas no princípio do nosso século ela surge com toda a
força ;sões políticas como o antônimo natural de socialismo. Será lançada
nos -itíficos pelo brilhante livro de W. Sombart, Der moderne
Kapitalismus ?02). Muito naturalmente, a palavra que Marx não utilizou
incorpora-se :) marxista, a ponto de se dizer correntemente: escravismo,
feudalismo, io, para designar as grandes etapas distinguidas pelo autor
do Capital. into, uma palavra política. Daí talvez o lado ambíguo do seu
destino. Ex- muito tempo pelos economistas do princípio do século -
Charles Gide, Warshall,
Seligman ou Cassel -, só figura no Dictionnaire des sciences depois da
guerra de

1914 e só em 1926 terá direito a um artigo na Ency?ritannica; entra para


o
Dictionnaire de l'Académiefrançaise somente em esta definição ridícula:
"Capitalismo, o conjunto dos capitalistas." A iição de 1958 só um pouco
mais adequada é: "Regime econômico no qual or que não os meios?] de
produção pertencem a particulares ou a socie, adas. "
to, a palavra, cujo sentido ficou cada vez mais carregado desde o início
éculo e da Revolução russa de 1917, inspira manifestamente a muita
genécie de constrangimento. Um historiador de qualidade, Herbert Heaton,
a e simplesmente excluí-Ia: "De todas as palavras em ismo, a mais turbui
palavra capitalismo.
Infelizmente, reuniu em si tamanha mixórdia de de definições, que [... 1,
tal como imperialismo, deve ser cortada do vocatodo o erudito que se
preze.--49 O próprio Lucien Febvre teria gostado -Ia, achando que já
tinha sido demasiado usada50. SiM mas, se dermos -sses conselhos
sensatos, desaparecida, a palavra logo nos fará falta. Coidrew Shonfield
(l971)51 uma boa "razão para continuar a empregá-la uém, nem sequer os
mais severos dos seus críticos, propôs um termo mea substituir".
dos, os historiadores foram os mais seduzidos pela palavra nova, numa que
ela ainda não cheirava muito a enxofre. Sem se preocuparem com nos,
abriram-lhe todo o campo da prospecção histórica, a antiga Babilô`cia
helenística, a China antiga, Roma, a nossa Idade Média ocidental,
;maiores nomes da historiografia recente, de Theodore Mortirríseri a
Henri stão implicados nesse jogo que viria a desencadear uma autêntica
caça Os imprudentes foram repreendidos. Primeiro
Mominsen, e pelo próNa verdade, com certa razão: pode-se confundir, sem
mais nem menos, ipital? Mas uma palavra parece bastar a Paul Veyrie 52
para fulminar
Mivtsef, o maravilhoso conhecedor de economia antiga. J. C. Van Leur

7rs na economia do Sudeste asiático. Karl Polanyi ridiculariza o mero


historiadores poderem falar de "mercadores" assírios - e no entanto
tabuinhas mostram-nos sua correspondência; e assim por diante. Em

3s, trata-se de reduzir tudo a uma ortodoxia pós-marxiana: não há capites


do fim do século XVIII, antes do modo de produção industrial. erto, mas é
uma questão de palavras. Será necessário dizer que nenhum tdores das
sociedades do Ancien
Regime, afortiori da Antiguidade, quania a palavra capitalismo, pensa na
definição que lhe dá tranqüilamente

A produção ou o capitalismo em casa alheia


Alexandre Gerschenkron: "Capitalism, that is the modem industrial
system"531?
Já disse que o capitalismo de ontem (ao contrário do de hoje) ocupava
apenas uma estreita plataforma da vida económica. Então, como é que se
falaria, a seu respeito, de "sisterna- extensivo ao conjunto social? Nem
por isso deixa de ser um mundo em si, diferente, até estranho em relação
à globalidade social e econômica que o rodeia. E é em relação a esta
última que se define como "capitalismo", não apenas em relação às novas
formas capitalistas que surgirão mais tarde. com efeito, ele é o que é em
relação a um não-capitalismo de proporções imensas. E recusar admitir
esta dicotomia da economia de ontem, a pretexto de que o "verdadeiro"
capitalismo dataria do século XIX, é renunciar a compreender o
significado, essencial para a análise desta economia, do que se poderia
chamar a topologia antiga do capitalismo. Se há lugares onde ele se
implantou por eleição, não por inadvcrtência, é, com efeito, porque estes
eram os únicos favoráveis à reprodução do capital.
Ultrapassadas as considerações anteriores, o importante é esclarecer a
mutação que ocorreu a propósito da palavra capital (e conseqüentemente
das duas outras)
entre Turgot e Marx; saber se o novo conteúdo da palavra não designa
verdadeiramente nada de uma situação anterior, se a realidade capitalista
surge na verdade totalmente nova ao mesmo tempo que a Revolução
industrial. Os historiadores ingleses atuais recuam as suas origens pelo
menos a 175O ou mesmo a um século mais cedo. Marx situa os primórdios da
"era capitalista" no século
XVI. Admite, porém, que "os primeiros esboços da produção capitalista"
(não, portanto, da mera acumulação) foram precoces nas cidades italianas
da Idade
Média 54. Ora, um organismo que nasce, mesmo que ainda esteja longe de
ter desenvolvido todas as suas características, traz em si essa expansão
potencial;
e seu nome já lhe pertence. Tudo bem ponderado, a nova noção de capital
apresenta-se como uma problemática indispensável para compreender os
séculos deste livro.
Há cinqüenta anos, dizia-se que o capital era uma soma de bens capitais
expressão que saiu de moda, embora tenha suas vantagens. Um bem capital,
com efeito, é pego, tocado com o dedo, definido sem ambigüidade. Sua
primeira característica? É "resultado de um trabalho anterior', é
"trabalho acumulado".
Assim é o campo, nos confins da aldeia, liberto de pedras sabe Deus
quando;
assim é a roda do moinho construída há tanto tempo que já ninguém sabe a
época;
assim são os caminhos vicinais, pedregosos, ladeados de espinhos negros
que, segundo Gaston Rouprie155, remontariam à Gália primitiva. Esses bens
capitais são heranças, construções humanas mais ou menos duradouras.
Outra característica: os bens capitais são retomados nos processos da
produção e só são o que são com a condição, justamente, de participarem
do trabalho reiterado dos homens, de o provocarem, pelo menos de o
facilitarem.
Tal participação permite-lhes regenerar-se, ser reconstruidos e
aumentados, produzir um rendimento. com efeito, a produção absorve e
refabrica continuamente capital. O trigo que semeio é um bem capital,
germinará; o carvão lançado na máquina de Newcomen é um bem capital, o
emprego da sua energia terá uma conse207

capital. Nafloresta de Trançais (Allier) subsistem ainda hoje alguns


carva"t mandou plantar em 167O e que, em sua idéia, deveriam fornecer à
frota s de qualidade, a partir do século XIX. Colbert tinha previsto
tudo, excelo vapor.
(Foto Hêraudet.)

A produção ou o capitalismo em casa alheia qüência; mas o trigo que como


sob a forma de pão, o carvão queimado na minha lareira ficam
imediatamente fora da produção: são bens de consumo imediato. Assim como
a floresta que o homem não explora, o dinheiro que o avarento conserva,
também eles fora da produção, não são bens capitais. Mas o dinheiro que
anda de mão em mão, que estimula a troca, paga os aluguéis, as rendas, os
rendimentos, os lucros, os salários - esse dinheiro que entra nos
circuitos, força-lhes as portas, acelera-lhes a velocidade, esse dinheiro
é um bem capital. Só é lançado para regressar a seu ponto de partida.
David Hume tem razão em dizer que o dinheiro é "um poder de mando sobre o
trabalho e os bens`6. Villalón já dizia em

1564 que certos mercadores ganham dinheiro com dinheiro57.


Por conseguinte, é um jogo acadêmico perguntar se determinado objeto,
determinado bem é ou não é capital. Um navio o é a priori. O primeiro
navio que chega a São Petersburgo, em 1701, um navio holandês, recebe de
Pedro, o Grande, o privilégio vitalício de não pagar direitos
alfandegários. A astúcia o fará durar quase um século, três ou quatro
vezes mais do que era normal na época 58.
Que maravilhoso bem capital!
É também o caso das florestas do HarZ59 entre Seesen, Bad Harzburg,
Goslar e
Zellerfeld, que receberam o nome de kommunionharz, de 1635 a 1788, quando
foram propriedade indivisa das casas dos príncipes de Hanover e de
Wolfenbüttel.
Indispensáveis à alimentação de carvão vegetal dos altos-fornos da
região, essas reservas de energia bem cedo foram organizadas para impedir
uma utilização espontânea e desordenada por parte dos camponeses das
imediações. O primeiro protocolo de exploração conhecido é de 1576. O
maciço foi então dividido em distritos, conforme o ritmo do crescimento
variável das espécies. E foram feitos mapas e também planos para
organizar o transporte fluvial dos troncos, para a vigilância da floresta
e para as inspeções a cavalo. Assim se assegurava a preservação da zona
florestal e sua organização com vistas à exploração no mercado. Aí está
um born exemplo de melhoramento e preservação de um bem capital.
Dada a multiplicidade das funções da madeira na época, a aventura do Harz
não é única. Buffo-i organiza o corte das árvores em seus bosques de
Montbard, na
Borgonha. Na França, nota-se a exploração racional das florestas já no
século
X11; portanto, coisa antiga que não começa - embora se acelere - com
Colbert.
Nas grandes reservas florestais da Noruega, da Polônia, do Novo Mundo,
mal chega o ocidental, logo a floresta muda de categoria e, pelo menos
nos lugares onde ela é acessível por mar ou por rio, torna-se bem
capital. Em 1783, a Inglaterra fez seu acordo definitivo com a Espanha
depender do livre acesso às madeiras tintoriais das florestas tropicais
da região de Campeche. Acaba por obter trezentas léguas de costas
florestais: "Administrando sabiamente esse espaço", diz um diplomata,
"haverá madeira para toda a eternidade." 60

Mas para que multiplicarmos os exemplos? Todos eles nos levam, sem
hesitação nem mistérios, às reflexões conhecidas dos economistas sobre a
natureza do capital.
Capitais fixos e capitais circulantes
Capitais ou bens capitais (são a mesma coisa) dividem-se em duas
categorias: os capitais fixos, bens de longa ou bastante longa
duraçãofísica que servem de pontos

209

9 capitansmo em casa altzeía io trabalho dos homens: uma estrada, uma


ponte, um dique, um aquedu.-co, uma ferramenta, uma máquina, e os
capitais circulantes (outrora chagiro) que se precipitam, se afogam no
processo de produção: o trigo das as matérias-primas, os produtos semi-
acabados e o dinheiro de muitos contas (rendimentos, lucros, rendas,
salários), sobretudo os salários, o
Todos os economistas fazem a distinção, Adam Smith, Turgot, que
falantamentos primitivos e de adiantamentos anuais, e Marx, que oporá
catante a capital variável.
)nomista Henri Storch`, por volta de 1820, explica aos alunos, os
grãocolau e
Miguel, da corte de São Petersburgo. "Suponhamos", diz o preima nação que
tenha sido extremamente rica, que tenha, em conseqüên> [os grifos são
meus] um capital imenso para melhorar a terra, construir ;, montar
fábricas e oficinas e fabricar instrumentos. Suponhamos de~ ma irrupção
de bárbaros se apodera, imediatamente após a colheita, de )ital
circulante, de toda a sua subsistência, dos materiais e da obra feita,
ses bárbaros, quando levam o saque, não destruam as casas nem as oficio
trabalho industrial (isto é, humano) cessará imediatamente. Porque,
tividade à terra, é preciso cavalos e bois para lavrar, grãos para semear
o pão para manter os operários vivos até a colheita seguinte. Para que ;
trabalhem, é preciso cereal no moinho, metal ou carvão na forja; é
preias-primas nos teares e, em toda a parte, o alimento do trabalhador.
Não trá por causa do tamanho dos campos, do número de fábricas e de
teares ibalhadores, mas por causa do pouco capital circulante que escapou
aos Feliz o povo que, depois de tal catástrofe, puder tirar de debaixo da
terra s que o medo aí tiver enterrado! Os metais preciosos e as pedras
finas, is capitais fixos, também não podem substituir a verdadeira
riqueza cirqueza tem aqui seu sentido freqüente de capital]; mas o uso
que se dará exportá-los a todos para tornar a comprar fora o capital
circulante ne?uerer impedir essa exportação seria condenar os habitantes
à inação e.te viria a seguir."
exto é, por si só, interessante pelo vocabulário e pelo arcaísmo da vida
russa que ele sugere (cavalos, bois, teares, fomes, tesouros
enterrados)., ros"
comportaram-se como bons alunos deixando ficar o capital fixo, in eles o
capital circulante para demonstrar o papel insubstituível deste is, se,
mudando de idéia ou de programa, tivessem preferido destruir o ) em vez
do capital circulante, a vida econômica também não se teria do na nação
conquistada, saqueada e depois libertada.
cesso da produção é uma espécie de motor de dois tempos, os capitais são
destruídos imediatamente para serem reproduzidos ou mesmo auQuanto ao
capital fixo, ele se desgasta mais ou menos rapidamente, mas.: a estrada
deteriora-se, a ponte cai, o barco ou a galera, um belo dia, de lenha a
algum mosteiro veneziano de religiosaSÓ2, as engrenagens de is máquinas
se estragam, a relha da charrua parte-se. Esse material deve tuído; a
deterioração do capital fixo é uma doença econômica pernicioica se
interrompe.

Barco alemão, de vela quadrada e leme de cadaste. Gravura tirada de


Peregrinationes, por Brendenbach, Mogúncia, 1486. A partir dessa época, o
navio passa a ser um capital que é vendido por "ações" e dividido entre
vdrios proprietdrios. (Clichê Giraudon.)
Prender o capital numa rede de cdlculos
Hoje calcula-se melhor o capital no âmbito das contabilidades nacionais,
em que tudo é medido: as variações do produto nacional (bruto e líquido),
a renda per capita, a taxa de poupança, a taxa de reprodução do capital,
o movimento demográfico, etc., sendo o objetivo medir globalmente o
crescimento. O historiador, com toda a evidência, não tem meios para
aplicar à economia antiga este quadro de cálculo. Mas, mesmo que faltem
os números, o mero fato de encarar o passado através dessa problemática
atual muda obrigatoriamente as maneiras de ver e de explicar.
Esta mudança de ótica é visível nas raras tentativas de quantificação e
de cálculo retrospectivo, mais obra de economistas do que de
historiadores. É o caso de Alice Hanson Jones que, em artigo e livro
recenteSÓ3 conseguiu calcular com cer

milhança o patrimônio ou, se preferirem, o estoque dos capitais


existente, em
New Jersey, na Pensilvânia e no Delaware. Sua pesquisa começou pede
testamentos, pelo estudo dos haveres que eles revelam, seguindo-se a i
dos inventários sem testamento. O resultado é bastante curioso: a soma
capitais C é três ou quatro vezes a renda nacional R, o que significa, em
-ais, que esta economia tem atrás de si, imediatamente disponível, uma
três ou quatro anos de rendas acumuladas. Ora, nos seus cálculos, Keye
aceitou, no tocante aos anos trinta, a proporção: C = 4R. O que indica
-spondência entre o passado e o presente. É verdade que a economia "ameo
princípio da
Independência dá a impressão de já estar completamente uanto mais não
seja em razão de uma alta produtividade do trabalho e, el de vida médio
(a renda per capita) mais elevado, sem dúvida, do que da Europa e mesmo
da Inglaterra.
paralelo inesperado vai no sentido das reflexões e dos cálculos de
Simon )
economista americano especializou-se, como é sabido, no estudo do cresas
economias nacionais do fim do século XIX aos nossos diasó4. A tenue
felizmente cedeu, era remontar a mais além do século XIX para seguir iar
as evoluções possíveis do século XVIII, utilizando os sólidos gráficos os
ao crescimento inglês por PhyIlis Deane e W. A. Cole65 e depois, por,
ressivas, chegar a 150O e mesmo antes. Não entremos nos pormenores e
condições dessa exploração no tempo, levada a cabo muito mais para dentes
problemas, para propor programas de pesquisas e comparações os países
subdesenvolvidos modernos, do que para impor soluções -ias.
=o for, que esse recuo no tempo seja tentado por um economista
res)ersuadido do valor explicativo da longa duração econômica, só pode
rie. Leva a um questionamento geral das problemáticas possíveis da
ecoAncien Régime. Neste panorama, só o capital nos deterá, mas ele se
cocoloca no âmago do debate.
de Simon Kuznets pensar que as correlações do tempo presente (que nos
seus movimentos e evolução ao longo de oito ou dez décadas de estaorosas
estabelecidas para uma dezena de países desde o fim do século iermitem
mutatis mutandis ir à origem do curso da história prova que, .iá, entre
passado longínquo e presente, laços, semelhanças, continuida)ora haja
também rupturas, descontinuidades de época para época. Em ão crê numa
mudança brusca da taxa de poupança que explicaria, como A. Lewis e W. W.
Rostow, o crescimento moderno.
Está continuamenos tetos, aos limites altos que essa taxa essencial
parece nunca ultrapas:) em países com rendas muito elevadas. E escreVe66:
--Seja qual for a )nto essencial é que mesmo os países mais ricos do
mundo atual, cujas ossibilidades ultrapassam de longe tudo o que era
possível imaginar no

11O XVIII ou no princípio do século XIX, não ultrapassam um nível


moproporções da formação do capital - na verdade, níveis que,
considepoupança líquida, não teriam sido impossíveis, talvez até nem
muito tingir por muitas sociedades antigas." Poupança, reprodução do
capimo debate. Se o consumo atinge 85 % da reprodução, 15 07o desta
inscreve1 poupança e, eventualmente, da formação do capital reprodutível.
Es

A produção ou o capitalismo em casa alheia tes números são conjecturas.


Exagerando, podemos afirmar que nenhuma sociedade ultrapassa os 20% de
poupança. Ou então ultrapassa-os, momentaneamente, apenas em condições de
pressão eficaz que não são próprias das sociedades antigas. Dito isto, à
fórmula de Marx --Nenhuma sociedade pode eximir-se de produzir e de
consumir" deve-se acrescentar --e de poupar--. Este trabalho profundo,
estrutural, depende do número de indivíduos da referida sociedade, da sua
técnica, do nível de vida que ela atingiu - e não menos da hierarquia
social que nela determina a distribuição das rendas. O caso imaginado por
S. Kuznets a partir da Inglaterra de 1688, ou a partir das hierarquias
sociais das cidades alemãs dos séculos XV e XVI, daria, por alto, uma
elite de 507o da população (decerto um máximo), que reúne a seu favor 25%
da renda nacional. A quase totalidade da população (9507o) dispunha
apenas de 75 % da renda nacional, vivendo portanto abaixo do que seria,
devidamente calculado, a renda média per capita. A exploração dos
privilegiados condena-a a um regime de restrição evidente (melhor do que
qualquer outro, demonstrou-o Alfred Sauvy há muito tempo)67. Em suma, a
poupança só pode formar-se na parte privilegiada da sociedade. Suponhamos
que o consumo dos privilegiados seja de três a cinco vezes o de um homem
qualquer: a poupança seria, no primeiro caso, de 13% da renda nacional;
no segundo caso, de 5%. Portanto, as sociedades antigas, apesar de sua
fraca renda per capita, podem poupar, poupam; o jugo social não se opõe a
isso;
de certo modo, até contribui.
Nestes cálculos, variam dois elementos essenciais: o número de homens,
seu nível de vida. De 150O a 1750, em toda a Europa, pode-se estimar a
taxa de crescimento da população em 0, 17% ao ano - contra 0, 9507o de
175O até os nossos dias. A longo prazo, o aumento do produto per capita
estabelece-se em 0, 2% ou 0, 3 07o.
Todos esses números e outros são hipotéticos, claro. Está contudo fora de
dúvida que na Europa, antes de 1750, a taxa de reprodução do capital se
mantém em níveis muito modestos. Mas com uma particularidade que me
parece atingir o próprio cerne do problema: a sociedade produz, todos os
anos, certa quantidade de capital, é o capital bruto do qual uma parte
deve cobrir o desgaste dos bens capitais fixos, imobilizados no processo
da vida econômica ativa. O capital líquido é, em linhas gerais, o capital
bruto menos punção imputável ao desgaste.
A hipótese de S. Kuznets, a saber, que a diferença entre formação do
capital bruto e formação do capital líquido seria bem maior numa
sociedade antiga do que nas modernas, parece-me fundamental e pouco
discutível, mesmo que a abundante documentação que pode apoiá-la seja
mais qualitativa do que quantitativa. com toda a evidência, as economias
antigas produzem uma quantidade notável de capital bruto, mas em certos
setores esse capital bruto derrete como neve ao sol. Há aí uma
fragilidade congénita do enquadramento do trabalho; daí as falhas que é
preciso preencher com quantidades suplementares de labor. A própria terra
é um capital muito frágil, sua fertilidade se destrói de ano para ano;
daí os afolhamentos que não param de girar sobre si próprios; daí a
necessidade dos adubos (mas como criá-los em quantidade suficiente?); daí
o empenho do camponês em multiplicar as lavouras, cinco, seis

1 (sulcos" e, na Provença, segundo Quiqueran de BeaujeU68, até catorze;


daí a elevadíssima proporção da população ocupada pelo trabalho rural -
condição que, por si só, como sabemos, é um fator anticrescimento. As
casas, os navios, as pontes, os canais de irrigação, as ferramentas e
todas as maquinas já inventadas pelo homem para facilitar-lhe o trabalho
e utilizar as formas de energia ao seu dispor
- tudo isso tem pouca durabilidade. Assim, o fato minúsculo de que a
porta da cida213
(a vida urbana: o incêndio. Esta ilustração da Crônica de Berna (1472) de
Dieg representa o êxodo das mulheres, das crianças e dos padres, que
levam a moUar contra o fogo só há escadas de madeira e baldes enchidos
nos fossos da

7foi quase totalmente destruída: segundo a Crônica, o incêndio


ter~seiapropavarto de hora. (Burgerbibliothek, Berna, clichê G. Howald.)

A produção ou o capitalismo em casa alheia de de Bruges tenha sido


reparada em 1337-1338, depois reconstruída em 1367-1368, modificada em
1385, 1392 e 1433, de novo reconstruída em 1615, não me parece
inteiramente insignificante, pois são os pequenos fatos insignificantes
que preenchem, estruturam a vida de todos os dias 69. A correspondência
do intendente de
Bonneville, na Sabóia, no século XVIII, está cheia de monótonas
referências a diques que é preciso refazer, pontes para reconstruir,
estradas que se tornaram intransitáveis. Leiam-se as gazetas: aldeias,
cidades incendeiam-se por completo, Troyes em 1547, Londres em 1666,
Nijni Novgorod em 170110,
Constantinopla em 28 e 29 de setembro de 1755 - deixando o incêndio --um
vazio no çarsi ou cidade comercial de mais de duas léguas de
circunferência" 71.
Exemplos eníre milhares de outros.
Em suma, creio que S. Kuznets tem toda a razão de escrever: "Com o risco
de exagerar, poderíamos perguntar-nos se houve verdadeiramente qualquer
formação de capital fixo e duradouro, nos tempos anteriores a 1750,
'monumentos' à parte, e se houve qualquer acumulação importante de bens
capitais com longa vida física que não tenha requerido manutenção
corrente (ou substituição), representando uma proporção muito grande do
valor total de origem. Se a maior parte do equipamento não durasse mais
de cinco ou seis anos, se a maior parte das berafeitorias da terra
exigissem, para se manterem, uma contínua reconstituição que
representasse, todos os anos, algo como um quinto do seu valor total, se
a maior parte dos imóveis se deteriorasse numa taxa que lhes significasse
a destruição quase total num prazo de 25 a 5O anos, então não restaria
grande coisa para contar como capital duradouro... Todo o conceito de
capitalfixo talvez seja produto exclusivo da época econômica moderna e da
tecnologia moderna. 972 O que equivale a dizer, exagerando, que a
Revolução industrial foi acima de tudo uma mutação do capital fixo, um
capital desde estão mais caro, porém muito mais duradouro e aperfeiçoado,
que mudará radicalmente as taxas de produtividade.
O interesse de uma análise setorial
Tudo isso pesa, evidentemente, no conjunto da economia. Mas basta ter
passeado um pouco pelo Germanisches Museum de Munique, ter visto (por
vezes em movimento)
os modelos reconstruídos das inúmeras máquinas de madeira que eram os
únicos motores energéticos, ainda há dois séculos, com suas engrenagens
extraordinariamente complicadas e engenhosas que se acionavam umas às
outras e transmitiam a força da água, do vento ou mesmo a força animal,
para compreender qual setor é, de preferência a qualquer outro, atingido
pela fragilidade do equipamento: o da produção que, de perto ou de longe,
pode chamar-se "industrial". Neste caso, não é apenas a hierarquia social
que reserva a 5% de privilegiados, como há pouco dizíamos, as altas
rendas e a possibilidade de poupar; é a estrutura econômica e técnica que
condena certos setores particularmente a produção "industrial" e agrícola
- a uma pequena formação de capital. Sendo assim, não é de admirar que o
capitalismo do passado tenha sido mercantil, que tenha reservado o melhor
do seu esforço e dos seus investimentos à "esfera da circulação". A
análise setorial da vida econômica, anunciada no início deste capítulo,
justifica sem ambigüidade a escolha capitalista e suas razões.

215

> capitalismo em casa alheia


- a também uma aparente contradição da economia do passado, ou seja, íses
visivelmente subdesenvolvidos o capital líquido, facilmente acumuetores
preservados e privilegiados da economia, seja por vezes supera- incapaz
de ser investido de modo útil em sua totalidade. Instala-se semoroso
entesouramento. O dinheiro estagna, "apodrece"; o capital é sulo. No
momento oportuno apresentarei, a este propósito, alguns textos Terentes à
França no início do século XVIII. Não vamos dizer, por gosto oxo, que é o
dinheiro o que menos falta. Na realidade, o que mais falta, zões ao mesmo
tempo, é a ocasião de lançá-lo numa atividade que seja mente profícua. É
o caso da Itália, ainda brilhante no fim do século XVI. um período de
intensa atividade, vê-se às voltas com uma superabuniumerário, com uma
"largueza- de prata a seu modo destruidora, como iltrapassado a
quantidade de bens capitais e de dinheiro que sua econoa consumir. Então
chega a hora das compras de terras pouco rentáveis, magníficas casas de
campo construídas nessa época, do desenvolvimenental, das explosões
culturais. A explicação, se válida, não resolve em itradição, apontada
por
Roberto Lopez e Miskimin73, entre a conjuntu~ Úca desencorajadora e os
esplendores da Florença de Lourenço, o blema-chave está em saber por que
razões um setor da sociedade de onão hesito em classificar de
capitalista, viveu em sistema fechado, como tado; por que não pôde
expandir-se facilmente, conquistar a sociedade [vez fosse efetivamente a
condição da sua sobrevivência, pois a socieda)ra só permitia uma taxa
importante de formação do capital em determires, mas não no conjunto da
economia de mercado da época. Os capitais ituraram para fora dessa zona
de abundância eram pouco rentáveis, quanperdiam por inteiro.
exatamente onde se estabelece o capitalismo de ontem tem pois interesse

1, pois essa topologia do capital é a topologia inversa da fragilidade e


ro das sociedades antigas. Mas, antes de situarmos o capitalismo nos seje
está verdadeiramente em casa, começaremos por examinar os setores ige de
forma oblíqua e sobretudo limitada: a agricultura, a indústria, -tes. O
capitalismo invade muitas vezes essas terras alheias, mas também fitas
vezes, e sempre a retirada é significativa: as cidades de Castela, por
-nunciam a investir na agricultura dos seus campos circundantes, depois
do Século XV174, ao passo que o capitalismo mercantil veneziano, uns inos
mais tarde, pende, pelo contrário, para os campos, e os senhores dores da
Boémia do Sul, na mesma época, afogam suas terras em granara criar carpas
em vez de produzirem centeio75; os burgueses da FranJe fazer empréstimos
aos camponeses depois de 155O e só adiantam digrandes senhores e ao rei76
; os grandes mercadores, já antes do fim do, retiram-se de quase todas as
empresas mineiras da Europa central cujas idade e gestão o Estado é
forçado a assumir - em todos estes casos, -nte contraditórios, como em
muitos outros, verifica-se que as empresas as haviam deixado de ser
suficientemente rentáveis ou seguras e que ham em investir em outra
coisa. Como dizia um mercador, "mais vale iar" do que "trabalhar em Vão,
977 . A procura do lucro, a maximização o já as regras implícitas do
capitalismo daquele tempo.
A TERRA E O DINHEIRO
Na vida rural, a intrusão do capitalismo, ou melhor, do dinheiro urbano
(dos nobres e dos burgueses) começou muito cedo. Não há uma cidade na
Europa cujo dinheiro não transborde pelas terras vizinhas. E, quanto mais
importante é a cidade, mais a auréola das propriedades urbanas se estende
para longe, empurrando tudo à sua frente. Aliás, também se concluem
aquisições fora dessas áreas urbanas, a enormes distâncias: vejam-se os
mercadores genoveses compradores, no século XVI, de senhorias, no
longínquo reino de Nápoles. Na
França, no século XVIII, o mercado imobiliário estende-se aos próprios
limites do mercado nacional. Compram-se em Paris senhorias bretãS78 ou
terras lorenaS79.
Essas compras correspondem muitas vezes à vaidade social. " Chi ha danari
compra feudi ed é barone", diz o provérbio napolitano: quem tem dinheiro
compra feudos e fica barão. A terra não é imediatamente a nobreza, mas é
o caminho para a nobreza, uma promoção social. O aspecto econômico, que
não é o único em causa, tem porém influência. Posso comprar uma terra
próxima da minha cidade para garantir o simples abastecimento da minha
casa; é a política de um born pai de família. Ou então para aplicar meus
capitais e deixá-los protegidos: a terra, dizia-se, nunca mente e os
mercadores sabiam-no bem. Dê Florença, em 23 de abril de 1408, Luca del
Sera escreve a Francesco Datini, o mercador de Prato:
"Recomendei-vos comprar propriedades e faço-o hoje ainda com mais calor,
se possível. As terras, pelo menos, não estão expostas ao risco do mar,
ao dos comissários desonestos ou das companhias mercantes ou das
falências. Por isso vo-lo aconselho e peço [piú ve ne conforto epregho']'
980.
O aborrecido, no entanto, para um mercador, é que não se vende nem se
compra a terra com a mesma facilidade de uma ação na Bolsa. Por ocasião
da falência do banco Tiepolo Pisani de Veneza, em 1548, os fundos de
terras exigidos como garantia são liquidados lentamente e com perda". No
século XVIII, é verdade, os mercadores de La Rochelle, que gostam de
empregar seus capitais na compra de vinhedoS82 ou de parcelas de
vinhedos, pensam que o dinheiro deixado assim de reserva pode ser
recuperado, chegado o momento, sem demasiada dificuldade ou perda. Mas
trata-se de vinhedos, e numa região que exporta largamente sua produção
de vinho. Uma terra tão especial pode desempenhar o papel de um banco!
Decerto é o que se passa com as terras que os mercadores de Antuérpia
compram ao redor de sua cidade no século XVI. Podem usá-las como caução
de empréstimos, servir-se delas para aumentar o crédito, e os rendimentos
por elas fornecidos não são de desprezar 83.
Isto posto, seja qual for sua origem, a propriedade urbana (acima de tudo
a burguesa) não é ipsofacto capitalista, tanto mais que com muita
freqüência, e cada vez mais a partir do século XVI, não é explorada
diretamente pelo proprietário.
O fato de que este possa ser, ocasionalmente, um autêntico capitalista,
um indiscutível manipulador de dinheiro, em nada altera a questão. Os
Fugger, mercadores riquíssimos de Augsburgo, multiplicam, no fim do seu
esplendor, as compras de senhorias e de principados na Suábia e na
Francônia. Administram-nos, naturalmente, segundo os bons princípios
contábeis, mas nem por isso modificamlhes a estrutura. Suas senhorias
continuam a ser senhorias, com seus velhos direitos e seus camponeses
censitárioS84. Do mesmo modo, os mercadores italianos de Lyon ou os
homens de negócios genoveses em Nápoles, que compram, com um domínio,
títulos de nobreza, não se tornaram empresários da terra.
nsportadores ocasionais. Na ístria, quando, com o fim do século XVI, s se
enchem com a segunda servidão, muitos camponeses escapolem:,
transportadores e mascates nos portos do Adriático e multiplicam uma
elementar do ferro, com altos-fornos campestres99. No reino de Nápo.ri
sério relatório da Sommaria, --muitos são os bracciali que não vivem )
seu trabalho de diaristas e que, todos os anos, semeiam seis tomola de le
cevada [... 1, que cultivam legumes e os levam ao mercado, racham e,
ladeira e fazem transportes com seus animais; depois, pretendem pagar
penas como bracciali"'00. Um estudo recente mostra-os, além disso,
munutuários de dinheiro, pequenos usurários, pecuaristas atentos.
; exemplos mostram por si sós em que é que Gorki não tem razão. Há iras
de ser camponês, mil maneiras de ser miserável. Lucien Febvre tinha le
dizer, pensando nas diferenças entre as províncias: "a França chama-se
Je". Mas o mundo também se chama diversidade. Há o solo, há o clima,
uras, há as "variações" da história, as escolhas antigas; e há também o
[a propriedade e das pessoas. Os camponeses podem ser escravos, servos,
ivres, meeiros, rendeiros; podem depender da Igreja, do rei, de grandes
de fidalgos de segunda ou terceira ordem, de grandes rendeiros. E, todas
seu estatuto pessoal se revela diferente.
uém contesta tal diversidade no espaço. Mas, no interior de cada
sistema.listoriadores da vida camponesa têm, hoje, a tendência de
imaginar situa, eis no tempo, eminentemente repetitivas. Para Elio Conti,
o admirável hisIa Toscana rural, ela só se explica por meio de um milênio
de observações las101. Dos campos ao redor de Paris, diz um historiador
que "as estrutunão sofreram muitas transformações entre o tempo de Filipe
o Belo e o IIp102.
Predomina a continuidade. Werner Sombart já dizia há muito e a
agricultura européia não havia mudado de Carlos Magno a Napoleão:, o uma
maneira de zombar de certos historiadores do seu tempo. Hoje, a ião
chocaria mais ninguém. Otto
Brüner, historiador das sociedades rurais i, vai bem mais longe: "O
campesinato", afirma ele sem pestanejar, "consJe a sua formação no
Neolítico até o século XIX o fundamento da estrutuedade européia e, ao
longo dos milênios, quase não foi atingida sua subso as mudanças de
estrutura das formas políticas dos estratos superiores." 103

ivia, não vamos acreditar cegamente numa imobilidade total da história


;a. Sim, a paisagem de tal aldeia não mudou de Luís XIV aos nossos dias.
-lhos primos de uma historiadora do Forez "são ainda [hoje] deveras pa)m
as sombras tão próximas dos testadores do século X1V9, 104. E o gado
campos não parecem --ser muito diferentes, em 1914, do que seriam em
Identidade dos campos, das casas, dos animais, dos homens, das
intenprovérbios... Sim, mas quantas coisas, quantas realidades não
pararam r! Em Mitsclidorf, pequena aldeia da Alsácia do Norte, por volta
de a espelta, velho cereal, cede o lugar ao trigo106: será pouco? Na
mesentre 1705

e 1816 (provavelmente por volta de 1765), realiza-se a passa

gem de um sistema trienal para um sistema bienal107: será pouco? Pequenas


mudanças, dirão, mas algumas são enormes. Toda longa duração se
interrompe mais dia menos dia, nunca de uma vez, nunca em sua totalidade,
mas surgem fraturas.
No tempo de Branca de Castela e de S. Luís, é decisivo que o mundo
camponês ao redor de Paris, composto por servos (identificáveis pelos
três encargos recognitivos: chevage*, direito deformariage**,
mainmorte***), mas também por homens livres, conquiste a liberdade contra
os senhores e que se multipliquem as alforrias, as manumissões - porque o
homem livre, misturado com os servos, arriscava-se sempre a ser um dia
confundido com eles. Também é decisivo que, sendo favorável à vida
econômica, os camponeses resgatem conjuntamente, em troca de dinheiro,
seus tributos, em Orly, Sucy-en-Brie, Boissy e em outros lugares
movimento destinado a alastrar-se amplamente 108. É decisivo que a
liberdade camponesa caminhe através de uma certa Europa como uma
epidemia, atingindo de preferência as zonas ativas, mas também, por força
da vizinhança, regiões menos privilegiadas. É assim que é atingido o
reino de Nápoles e mesmo a Calábria que por certo não é, na
circunstância, uma zona pioneira; mas foi em vão que o conde
Sinopoli reclamou em 1432 os últimos camponeses fugitivos I". A servidão
camponesa, a vinculação à gleba desaparceram. E as palavras antigas
(adscripti, villani, censiles, redditici) saem do vocabulãrio calabrês,
só se fala então de vassalli11(). É também importante que o camponês
liberto da Alta-Áustria possa arvorar, em sinal da sua alforria, um
chapéu vermelho"'. É ainda importante que a triagem, que é a partilha dos
bens comunais entre camponeses e senhores, fracasse generalizadamente na
França no século XVIII, ao passo que, na
Inglaterra, o mesmo processo redundou nas enclosures. À Pinverse, é
importante que a segunda servidão polonesa volte a colocar a canga, no
século XVI, num camponês que já tinha experiência do mercado direto com a
cidade ou mesmo com os mercadores estrangeiros' 12. Tudo isso é decisivo:
uma única destas reviravoltas altera em profundidade a situação de
milhares de homens.
Neste caso, Marc Bloch111 tem razão contra Ferdinand Lot, que via o
campesinato francês como "um sistema de tal modo cimentado que não há
fissuras, é impossível". Ora, há fissuras, desgastes, rupturas,
reviravoltas. Tal como as relações senhores-camponeses, estas rupturas
resultam da coexistência entre cidades e campos que, ao desenvolver
automaticamente uma economia de mercado, abala o equilíbrio rural.
E o mercado não é o único responsável. A cidade não transfere tantas
vezes seus teares para os campos para escapar aos entraves corporativos
instituídos em seu seio? Pronta, aliás, para os trazer de volta para
dentro de seus muros quando tem vantagem nisso. O camponês não vem
continuamente à cidade, atraído pelos salários altos? E o senhor não
constrói sua casa, até seu palácio, na cidade? A
Itália, avançada em relação ao resto da Europa, é a primeira a passar por
este inurbamento. E, ao se tornarem citadinos, os senhores trazem com
eles o feixe apertado dos seus clãs rurais que, por sua vez, influem
sobre a economia e sobre a vida da cidade' 14. Enfim, na cidade estão os
conhecedores das leis que escrevem para quem não sabe escrever, o mais
das vezes falsos amigos, mestres da chicana, ou mesmo usurários que
mandam assinar reconhecimentos de dívidas, cobram pesados juros,
apoderam-se dos bens dados como penhor. Desde o século XIV a casana do
Lombardo é a armadilha em que se enreda o camponês que pede emprestado.
Começa
Capitação devida pelo servo ao senhor. (N.R.)
Sem a Permissão do senhor feudal, o servo não podia casar fora da
senhoria ou com mulher livre. (N.R.) *** Estado dos servos que não tinham
o direito de dispor de seus bens em testamento. Os bens (imóveis,
heranças) concedidos pelo senhor voltavam a ele à morte do servo. (N.R.)

empenhar os utensílios de cozinha, os --vasos vinários", as ferramentas


agríco- depois o gado, por fim a terra] 15. A usura atinge taxas
fantásticas assim que yravam as dificuldades. Em novembro de 1682, o
intendente da Alsácia denuncia ;uras intoleráveis de que são vítimas os
camponeses: "Os burgueses obrigaram-nos nceder até 3007o de juro", alguns
exigiram que das terras lhes fossem empenhacomo juros, "metade da fruta [
... 1, o que se revela todos os anos ser tanto quanprincipal do
empréstimo..." Não é engano, são empréstimos a 100% 116.
e, um regime senhorial >rreu
A, organização senhorial fincada na vida camponesa, mesclada com esta,
tanprotege como a oprime. Seus traços são reconhecíveis, até hoje, em
todas as gens do Ocidente. Conheço duas modestas aldeias, entre o Barrois
e a Cham, ambas incluídas outrora num pequeno senhorio. O castelo
continua lá, peruma das aldeias, tal como foi decerto restaurado e
reformado no século XVIII, ;eu parque, suas árvores, seus espelhos de
água, uma gruta. Do senhor depenos moinhos (estão fora de uso, mas
continuam lá), os açudes (ainda há pouco )
existiam). Os camponeses, por sua vez, dispunham de hortas, de plantações
ihamo, de cercados, de pomares e dos campos ao redor das casas da aldeia,
das umas às outras. Os campos, até há pouco tempo eram divididos em três
(trigo, aveia, alqueive = versaines) que se revezavam todos os anos.
Depenfiretamente do senhor, como proprietário, os bosques próximos, no
topo dos s, e duas "reservas", uma por aldeia. Um desses conjuntos de
terras deixou )me a um lugar chamado La Corvée; o segundo deu origem a
uma fazenda Icta, enorme, anormal no meio das pequenas propriedades dos
camponeses. bosques distantes estavam abertos à utilização dos aldeões.
Tem-se a impresum universo fechado em si próprio, com seus artesãos-
camponeses (o ferrei-arpinteiro de carroças, o sa ateiro, o correeiro, o
marceneiro), obstinado p )duzir tudo, até o seu vinho *Além do horizonte,
outras aldeias agrupadas, Ias;
outras senhorias que não conhecem bem e de que, de longe, falam mal. lore
está cheio dessas antigas zombarias.
ilta completar o cenário: o senhor, qual senhor? Quais são os tributos em
diem gêneros, em trabalho (as corvéias)? No caso banal que evoco, os
tributos

9 são leves, as corvéias pouco numerosas, dois ou três dias por ano
(lavra e )rte); os litígios mais violentos se referem apenas à utilização
dos bosques. as muitas coisas mudam de lugar para lugar. Precisaria
multiplicar as viaa Neuburg, na Normandia, com André Plaisse 117 ; a
Montesarchio, no reiápoles, com Gérard
Delille'18; com Yvorme Bézard a Gémeaux, na Borgodentro em breve iremos a
Montaldeo, na companhia de Giorgio Doria. Nauala, evidentemente, a uma
visão direta e precisa, oferecida, na maior parte es, por monografias em
geral excelentes.
is não é esse o nosso único problema. Perguntemo-nos antes, num plano )r
que razões o regime senhorial, milenar, que remonta pelo menos aos
graniínios do
Baixo-Império, conseguiu sobreviver ao princípio da modernidade. io
entanto não lhe faltaram provações. O senhor está preso por cima aos
feudais. E tais vínculos não são fictícios, ocasonam o pagamento de
ren[ais nem sempre leves, há "declarações", ocasião de chicanas; há
também

Dominando a aldeia, um castelo de telhas douradas, à moda da Borgonha:


Rochepot, na estrada que sobe para Arnay-le-Duc, na Côte-d'Or. (Foto
Rapho, cliché
Goursat.)
1--. -titUIU )ramos um parêntese para viver em imaginação, por momentos,
numa peildeia da
Itália. A história nos foi maravilhosamente contada por um histoGiorgio
Doria, herdeiro dos papéis da grande família genovesa, descendenritigo
senhor e dono de
Montaldeo111.
deia bastante miserável, 30O e poucos habitantes, um pouco menos de 50O s
de terrenos, Montaldeo situa-se nos limites do Milanês e do território da
ica de
Gênova, em contato com a planície lombarda e com os Apeninos. ninúsculo
território de colinas era um --feudo" dependente do imperador.
0, os Doria compraram-no dos Grimaldi. Tanto Doria como Grimaldi perà
nobreza mercantil de Gênova, a essas famílias que não desgostam de faira
de "senhores feudais", embora ponham seus capitais em lugar seguro -nham
um refúgio às portas da cidade (precaução útil, pois ali a vida
polítiigitada). Não obstante, tratarão seu feudo como mercadores
cautelosos, sem ilidade, mas não como empresários, nem como inovadores.
livro de G. Doria, destacam-se com grande vivacidade as posições
reciprocamponeses e do feudatário. Camponeses livres que vão para onde
querem, m com quem querem, mas são tão miseráveis! O consumo mínimo, que
o xa para uma família de quatro pessoas em 9, 5 quintais, entre cereais e
case 56O litros de vinho por ano, apenas é atingido ou ultrapassado por 8
entre Para os outros, é a subalimentação crônica. Nas suas cabanas de
madeira as famílias podem aumentar, mesmo durante os períodos
calamitosos, "os arecem estimular à procriação", mas quando essas
famílias ficam reduzidas -ctare de solo ruim devem buscar a pitança
noutro lugar, trabalhar no dornífeudatário, nos campos dos três ou quatro
detentores de terras do lugar. cer para a planície, alugar seus braços no
tempo das ceifas. Não sem terrí.-presas: pode acontecer que o ceifeiro,
que tem de garantir o seu próprio c), gaste para comer mais do que recebe
do empregador. Foi o que sucedeu

5, em 1735, em 1756. Ou então, tendo chegado aos lugares de contratação,


anjam trabalho: têm de ir mais longe - alguns, em 1734, irão até a
Córsega. -sses males vêm juntar-se os excessos do feudatário e dos seus
representantes, dos quais o intendente, ilfattore. Contra eles, a
comunidade aldeã, com seus não pode fazer muito. Todos têm de pagar os
tributos, saldar os arrendaaceitar que os patrões lhes comprem as
colheitas a preço baixo e as revenm lucro, que tenham o monopólio dos
adiantamentos usurários e os lucros inistração dajustiça. As multas são
cada vez mais caras, consistindo a astúcia ientar a sanção dos delitos
menores, os mais freqüentes. Em relação às mul459, as de 1700, levando em
conta a desvalorização da moeda, foram multis por 12

para os ferimentos; por 73 para as injúrias; por 94 para o jogo, por:)go


é proibido; por 157 para os delitos de caça; por 18O por apascentar em
alheios. A justiça senhorial, aqui, não pode ser mau negócio.
aldeia pequena vive numa certa defasagem em relação às grandes
conjuntueconomia.
Conhecerá, porém, as espoliações e alienações camponesas do XVII. Depois,
o impulso do século das Luzes, que abre a aldeia, liga-a ao ': o vinhedo
desenvolve-se como monocultura invasora; a troca torna-se a avorece os
almocreves. Instala-se um simulacro de burguesia aldeã. Logo erto
espírito de contestação, embora não haja revolta declarada. Mas, se
yf(JUU5~ U" - cf11 "-u3u UtrwiU uni desses pobres-diabos sai da ordem,
isso é uma indecência aos olhos do privilegiado muito intransigente sobre
suas prerrogativas; se ainda por cima é insolente, é um autêntico
escândalo. Em Montaldeo, um certo Bettoldo, huomo nuovo, atrai sobre si a
vingança do marquês Giorgio Doria. Trata-se de um desses almocreves que
fazem uma pequena fortuna (estamos em 1782) transportando o vinho da
aldeia até Gênova, e decerto tem a violência que se costuma atribuir aos
almocreves. o marquês escreve a seu administrador: "A insolência do dito
Bettoldo muito me inquieta, e a facilidade com que ele blasfema. [ ... 1
É preciso castigá-lo, tanto mais que é indomável [ ... ] De todo modo,
destituí-lo de qualquer emprego em nossa casa; talvez a fome o torne
menos ruim."
Não se tem certeza disso, porque blasfemar, injuriar, zombar é uma
tentação, uma necessidade. Para o homem humilhado, que alívio é murmurar,
nem que seja em voz baixa, esse motto da Lombardia na mesma época: "Pane
di mostura, acqua difosso, lavora ti, Patron, che io non posso! ", pão de
raspa, água do fosso, trabalha tu, Patrão, que eu não agüento mais!
Alguns anos mais tarde, em 1790, é lugarcomum dizer de Giorgio Doria: "É
marchese delfatto suo, e non di piá. " É marquês para que lhe convém, e
mais nada. Em contraponto dessas palavras revolucionárias, cura de
Montaldeo, deplorando os novos tempos, escreve ao marquês, em 1780:, ,...
faz alguns anos que a impostura, a vendetta, a usura, a fraude e outros
vícios progridem a passos largos". Reflexões análogas se fazem ouvir em
toda a ltália daquela época, até na pena de um economista liberal como
Genovesi. Consternado com o estado de espírito dos trabalhadores
napolitanos, por volta de 1758 só via um remédio: a disciplina militar e
o bastão, "bastonate, ma bastonate all'uso militare'91351 Desde então, a
situação ficou cada vez mais sombria num reino de Nápoles onde alastra
uma espécie de epidemia de desobediência social. Os diaristas agrícolas,
a partir dos anos de 1785, não exigem que lhe paguem o dobro dos anos
anteriores, quando o preço dos gêneros baixaram? E prolongam a pausa do
meio do dia para ir às bettole e perder dinheiro bebendo e jogando nessas
baiucas 136.
Em determinadas circunstâncias, o capitalismo transpõe ou contorna as
barreiras erguidas por senhores e camponeses. A iniciativa dessas
mudanças estruturais vem ora do próprio interior do sistema senhorial,
ora de fora.
De dentro, pode ser o capitalismo que o próprio senhor pratica, imita ou
tenta inventar; pode ser um capitalismo de origem camponesa, a partir do
sucesso dos grandes lavradores.
De fora, são as intrusões mais importantes. O dinheiro urbano corre
continuamente para os campos. Aí se perde a metade quando se trata de
compra determinada pela promoção social ou pelo luxo. Mas às vezes
revolve e transforma tudo, mesmo que não resulte, imediatamente, numa
exploração de tipo capitalista perfeito.
O toque de varinha de condão é sempre a vinculação de uma produção
agrícola à economia geral. É por exigência de um mercado externo
lucrativo que os homens de negócios genoveses, no século XV, instalam a
cultura da cana e o engenho de açúcar (trapeto) na Sicília; que os
negociantes de Toulouse, no século XVI, incenti229

edos do Beaujolais (perto de Belleville-sur-Saône) vistos por Henri


CartierBresson. 'artier-Bresson-Magnum.)

A proaução ou o capitatismo em casa ameia vam em sua região as culturas


industriais de pastel-dos-tintureiros; que os vinhateiros do Bordelais ou
da Borgonha se expandem, no século seguinte, em propriedades bastante
grandes, em benefício das sólidas fortunas dos presidentes e conselheiros
dos parlamentos de Bordeaux e de Dijon. O resultado é uma divisão das
tarefas e das funções, a instauração de uma cadeia capitalista de
exploração, muito nítida em Bordeaux1 37 (o administrador dirige toda a
exploração, o homem de negócios comando o setor vinícola, assistido pelo
capataz encarregado da lavoura e pelo mestre vinhateiro que se ocupa das
vinhas e da vinificação e dirige os operários especializados). Na
Borgonha 138 a evolução é menos avançada, os vinhedos de qualidade, os
crus das encostas ainda eram, no princípio do século XVII, propriedades
eclesiásticas. Mas os parlamentares de
Dijon propuseram preços vantajosos e os Senhores de Citeaux alienaram
seus vinhedos - um exemplo entre muitos. Os novos proprietários souberam
lançar e comercializar os produtos dos seus "cercados". Foram até
instalar-se pessoalmente nas aldeias de montanha, situadas a meia
encosta, com suas ruelas estreitas, seus casebres, seus "celeiros
miseráveis" e, na base das suas "ruas altas", algumas lojas e barracas de
artesãos. De repente, vêem-se surgir ali lindas casas dos mestres;
pequenas aldeias, Brochon, Gevrey, logo contam, a primeira com 36, a
segunda com 47, casas assim. Trata-se de uma espécie de colonização, de
exercício da tutela, de vigilância direta de uma produção com boa saída e
que garante altos lucros.
Das margens para o coração da Europa
Poderíamos, em busca desse primeiro capitalismo agrário, perder-nos em
centenas de casos particulares. Tentaremos portanto escolher alguns
exemplos significativos. É evidente que ficaremos dentro dos limites das
experiências européias, quer na Europa propriamente dita, quer em suas
margens orientais, quer em suas margens ocidentais, no extraordinário
laboratório que foi a América européia. Teremos ocasião de ver, em
contextos diferentes, até que ponto o capitalismo pode penetrar em
sistemas que lhe são estruturalmente estranhos, abrir-lhe brechas
frontais, ou contentar-se em dominar de longe a produção, segurando a
garrafa pelo gargalo da distribuição.
Capitalismo e segunda servidão
O título deste parágrafo não corresponde a um desejo de paradoxo. A
"segunda servidão" é a sina reservada aos campesinatos do Leste europeu
que, ainda livres no século xV, viram alterar-se o seu destino ao longo
do século XV1. E depois tudo recaiu na servidão em áreas imensas, do
Báltico ao mar Negro, aos Bálcãs, ao reino de Nápoles, à Sicília, e da
Moscóvia (caso muito especial) pela Polônia e pela Europa central, até
uma linha aproximativa traçada de Hamburgo a Viena e
Veneza.
Que papel tem o capitalismo nesses espaços? Nenhum, parece, já que é de
regra falar, no caso, de refeudalização, de regime ou de sistema feudal.
E o belo livro de Witold Kula139, que analisa passo a passo o que pode
ser, do século XVI ao sé231

- - u c;upiluitõ;mo em casa aineia


VIII, o "cálculo económico" dos camponeses servos da Polônia e o dos seus
-es, explica bem em que é que os senhores não são --verdadeiros"
capitalistas o serão até o século XIX.
ma conjuntura com efeitos duplos ou triplos impeliu, no início do século
XVI, )pa oriental para um destino colonial de produtor de matérias-
primas, destique a segunda servidão é apenas o aspecto mais visível. Em
toda parte, corn
5es conforme as épocas e os lugares, o camponês, fixado à terra, deixa,
de ou de fato, de ser móvel, de usufruir as facilidades e casar com quem
quiser, bertar, mediante dinheiro, dos tributos em gêneros e das
prestações em traA corvéia amplia desmedidamente suas exigências. Na
Polônia14% por vol500, ela era insignificante: os estatutos de 1519 e
1529 fixam-na em um dia nana, ou seja, 52 por ano; em 1550, passa para 3
dias por semana; em 1600, is dias. Na Hungria, a mesma evolução: um dia
por semana em 1514, depois lepois três, logo uma semana sim, outra não,
e, por fim, supressão de toda, amentação, dependendo a corvéia apenas do
arbítrio do senhor141 . Na Trana, quatro dias por semana: além do
domingo, os camponeses tinham dois.eis a seu dispor. Mas em

1589-1590, na Livônia142 "jeder gesinde [trabaitt Ochsen oder Pferdt alle


Dage":
não há engano possível, todos que são s à corvéia trabalham com uma junta
de bois ou de cavalos todos os dias..culos mais tarde (1798), na Baixa-
Silésia, diz-se oficialmente que "as coramponesas não têm limites" 143.
Na Saxônia há como que uma espécie de imento de jovens, alistados para
dois ou três anos de serviço ao senhor144. ssia, foi o endividamento
camponês que permitiu aos nobres obterem de seus s contratos que os fixam
à terra, uma espécie de "servidão voluntária", cofoi chamada, que mais
tarde seria legalizada 145.
n suma, mitigada, organizada desta ou daquela maneira, a regra dos seis
dias, éia por semana tende a estabelecer-se quase sem exceção. Talvez
devamos de lado os camponeses dos domínios dos príncipes e das pequenas
possesis cidades. Talvez o regime seja até menos pesado na Boémia ou na
Prússia il. Na verdade, nenhuma estatística e, conseqüentemente, nenhuma
cartosão possíveis; a corvéia ajusta-se incessantemente às realidades
locais da so- e do trabalho camponeses. As corvéias com as juntas de bois
são prestadas wradores mais bem dotados de terras, que para tal mantêm
maior quantidainimais de tiro e que encarregam um filho ou um criado
atleta desses servias estas corvéias com juntas (Spanndienste ou
Spannwerke, em terras aleão dispensam as corvéias manuais (Handwerke) e,
como há nas aldeias ses pequenos camponeses e diaristas sem terra, há
toda uma série de regimes belas especiais. Tanto mais que a corvéia serve
para tudo, para os trabalhos Ácos, para as lidas nas cavalariças, nos
celeiros, nos currais, nas lavouras, e de feno, na ceifa, nos
transportes, nos aterros, no corte de lenha. Em suiia enorme mobilização,
tornada como que natural, das forças de trabalho rido rural. Apertar mais
um pouco é sempre fácil: basta modificar os horátrabalho, segurar gado de
trabalho, aumentar o peso da carga que deve ser )rtada, alongar os
percursos. E, se for preciso, ameaçar.
se agravamento generalizado da corvéia nas regiões do Leste europeu tem
ao mesmo tempo externas e internas. Externas: a procura maciça da Europa
te, que é preciso alimentar e abastecer de matérias-primas. Segue-se um
poapelo à produção exportável. Internas: na corrida competitiva entre o
Estacidades e os senhores, estes últimos estão quase por toda a parte
(salvo na

Vindo do Vistula, o cereal chega a Gdansk (Danzig) a granel, em barcaças


ou em simples batelões, por vezes em jangadas de troncos de tirvores. Bem
embaixo, à esquerda, a ponta de um barco e seus puxadores de suga. (Foto
Henryk
Romanowski.)

, u u em cusu aineia ) em posição dominante. À decadência das cidades e


dos mercados urbanos, ileza do Estado corresponde o arresto da mão-de-
obra (e também da terra Áva) que impulsiona o sucesso dos feudais. A
corvéia é um imenso motor ço daquilo a que os historiadores alemães
chamam Gutsherrschaft, em opok senhoria tradicional, a
Grundherrschaft. Na Silésia, no século XVIII, -am-se, num ano, 373.621
dias de corvéia com parelhas de cavalos, 495.127 intas de bois. Na
Morávia, estes números são respectivamente de 4.282.00O.409.114146.

3se regime pesado não pôde estabelecer-se de um dia para o outro; houve
pro), aclimatação; e não faltaram as violências. Na Hungria, foi logo
depois rota da sublevação de Dosza (1514)147 que o Código de Werbõcz
proclamou etua rusticitas, isto é, a servidão perpétua do camponês. Será
proclamada, o, um século depois, na Assembléia dos Estados de 1608, após
o episódio levação dos Haiduks, os camponeses em fuga que viviam de saque
e de pis contra os turcos.
:)m efeito, a arma dos camponeses contra um senhor muito exigente é a
fuga.
apanhar o homem que, chegada a noite, foge com sua carroça, levando a mus
filhos, os bens empilhados, as vacas? Basta-lhe andar um bocado para enr,
ao longo da estrada, a cumplicidade dos irmãos de miséria; e por fim o
aco, to em outro domínio senhorial ou entre o bando dos fora-da-lei. Em
Lusace, ada a guerra dos Trinta Anos, multiplicam-se as cóleras e as
queixas dos selesados perante o Landtag148. Castiguem-se pelo menos
aqueles que ajudam tivos e os acolhem, pedem; arranquem as orelhas,
cortem o nariz, marquem n ferro em brasa a fronte dos fugitivos. Não será
possível obter do príncipe [a Saxônia, em
Dresden, um Reskript? Mas a lista infindável dos rescritos que im a livre
movimentação dos servos (na Morávia, 163 8, 165 8, 1687, 1699, 1712; sia,
1699,

1709, 1714, 1720) prova a impotência da legislação nesse ponto. ri


contrapartida, os senhores conseguiram incorporar o campesinato em uni-
conômicas fechadas, por vezes muito extensas: vejam-se os condes Czerny
mia, os Radziwill ou os Czartoriski da PolÔnia, os magnatas da Hungria,
lores de vinho e de gado.
Estas unidades econômicas vivem isoladas. O campraticamente deixa de ter
acesso aos mercados urbanos, aliás muito reduziuando o consegue, é para
transações miúdas que lhe permitam reunir o pouieiro de que necessita
para pagar certos tributos ou ir beber um copo de ceri de álcool na
estalagem, que também é propriedade do senhor.
as essa unidade econômica acaba não sendo auto-suficiente, uma vez que a
em cima. O senhor, proprietário de servos e de terras como outrora,
pro'eal, madeira, gado, vinho, mais tarde açafrão ou tabaco, conforme os
pedium cliente distante. Um verdadeiro rio de cereal senhorial desce o
Vístula i a Gdansk. Da
Hungria, é o vinho, o gado vivo que são exportados para nas províncias
danubianas, o trigo, os carneiros destinados ao apetite insale Istambul.
Por toda a parte, na zona da segunda servidão, a economia doabarca tudo,
cerca as cidades, subjuga-as - estranha vingança do campo. ém do mais,
pode acontecer que esses domínios possuam seus próprios burrvarn de base
a empresas industriais:
olarias, destilarias de álcool, fábricas eia, moinhos, louçarias, altos-
fornos (como na Silésia). Essas manufaturas n uma mão-de-obra coagida a
servir e muitas vezes também matérias-primas as que por esse motivo não
devem ser incluídas numa contabilidade estrita
A produção ou o capitalismo em casa alheia de deve e haver. Durante a
segunda metade do século XVIII, na Áustria, os senhores participam da
instalação das manufaturas têxteis. São particularmente ativos e
conscientes das suas possibilidades; prosseguem incansavelmente o
Arrondierung dos seus domínios, usurpam as florestas e os direitos
jurisdicionais do príncipe, lançam novas culturas, como o tabaco, e
subjugam todas as pequenas cidades ao seu alcance, pois os direitos de
barreira destas reverte em proveito deles149.
Mas voltemos à nossa pergunta: o que há, nos múltiplos aspectos da
segunda servidão, que se reporte ao capitalismo? Nada, responde o livro
de Witold Kula, e seus argumentos por certo são pertinentes. Partindo do
retrato tradicional do capitalista, aceitando este retrato-robô:
racionalização, cálculo, investimento, maximização do lucro - então, está
certo, o magnata ou o senhor polonês não são capitalistas. Para eles tudo
é demasiado fácil, entre o plano do dinheiro a que ascendem e o plano da
economia natural em que se movem. Não calculam, porque a máquina funciona
sozinha. Não procuram por todos os meios reduzir seus custos de produção,
não se preocupam muito em melhorar, nem sequer em manter a produtividade
do solo que, no entanto, é o capital deles, recusam-se a fazer qualquer
investimento real, contentam-se tanto quanto possível com seus servos,
mão-deobra gratuita. A colheita, seja ela qual for, é sempre lucro para
eles:
vendem-na em Danzig para trocá-la automaticamente por produtos
manufaturados do
Ocidente, geralmente de luxo. Por volta de 182015O (sem que o autor
consiga localizar com exatidão a mudança operada), a situação revela-se
muito diferente:
grande número de proprietários passam então a considerar a terra um
capital que é urgente preservar, melhorar, seja qual for o custo;
desembaraçam-se o mais depressa possível dos servos que representam
muitas bocas para alimentar e pouco trabalho eficaz: preferem os
assalariados. O seu "cálculo econômico" já não é o mesmo: ei-lo
tardiamente de acordo com as regras de uma gestão ciosa de comparar
investimento, preço de custo e produto líquido. Tal contraste é por si só
um argumento peremptório para colocar os senhores poloneses do século
XVIII entre os senhores feudais, não entre os empresários.
Claro que não é este argumento que contesto. Parece-me, todavia, que a
segunda servidão é o reverso de um capitalismo mercantil que encontra
suas vantagens na situação do Leste e até, numa parte de si, a sua razão
de ser. O grande proprietário não é um capitalista, mas é um instrumento
e um colaborador a serviÇo do capitalismo de Amsterdam ou de outro lugar.
Faz parte do sistema. O maior senhor da Poffinia recebe adiantamentos do
mercador de Gdansk e, por intermédio deste, do mercador holandês. Em
certo sentido, encontra-se na mesma situação de inferioridade que o
criador de Segóvia que, no século XVI, vende, muito antes da tosquia, a
lã dos carneiros aos mercadores genoveses; ou na situação dos
agricultores, necessitados ou não, mas sempre à procura de adiantamentos
que, em todas as épocas e em toda a Europa, vendem o trigo no pé a
mercadores de toda espécie, minúsculos ou importantes, a quem tal
situação permite lucros ilícitos e oferece uma escapatória às regras e
aos preços do mercado. Diremos então que os nossos senhores se encontram
entre as vítimas e não entre os atores ou participantes de um capitalismo
que, de longe, por interpostas pessoas, mantém ao sabor dos seus gostos e
das suas necessidades tudo o que é mobilizável pelos caminhos do mar,
pelas vias fluviais e pela complacência comedida das estradas terrestres?

235
ou o capitalismo em casa alheia im e não. Há uma diferença entre o
criador de Segóvia ou o cerealicultor, que itam a sujeitar-se à lei de um
usurário, e o senhor da Polônia que, desfavorecipraça de Gdansk, é todo-
poderoso em casa. Ele se serviu dessa onipotência )rganizar a produção de
maneira a atender a procura capitalista que só o ssa em função da sua
própria procura de produtos de luxo. Em 1534, escreveo regente dos Países
Baixos o seguinte: --Todos os grandes senhores e mestres lônia e da
Prússia encontraram há cerca de vinte e cinco anos meios de enviar rtos
rios todos o seu trigo a Danzig e ali vendê-lo aos habitantes dessa
cidade. esta causa o reino da Polônia e os grandes senhores se tornaram
muito ri151 Seguindo este texto à letra, imaginaríamos gentlemenfarmers,
empresários impeter. Não é nada disso. Foi o empresário ocidental que
lhes foi bater à pors era o senhor polonês que tinha o poder - como ficou
provado - de pôr erviço os camponeses e boa parte das cidades, de dominar
a agricultura e mesmanufatura, a produção inteira, por assim dizer.
Quando ele mobiliza esse io a serviço do capitalismo estrangeiro, torna-
se ele próprio ator do sistema. le, não há segunda servidão; e sem
segunda servidão o volume da produção cais exportáveis seria
infinitamente menor. Os camponeses prefeririam comer trigo ou trocá-lo no
mercado por outros bens se, por um lado, o senhor não açambarcado todos
os meios de produção, e se, por outro, não tivesse simente matado uma
economia de mercado já bem viva ao reservar para si todos os de troca.
Não é um sistema feudal, uma vez que, longe de ser uma econo, ais ou
menos auto -suficiente, se trata de um sistema em que, como diz o pró.
Kula, o senhor procura por todos os meios tradicionais aumentar as
quantide trigo comercializáveis. Mas é certo que também não se trata de
uma agria capitalista moderna, à inglesa. É uma economia de monopólio,
monopólio )dução, monopólio da distribuição, tudo a serviço de um sistema
internacioimbém ele forte e indubitavelmente capitalista152.
Europa recomeça na América. Oportunidade imensa para ela. Recomeça sua
diversidade, a qual se sobrepõe à diversidade do novo continente.
Í resultado é um feixe de experiências. No Canadá frances, o regime
senhorial uído a partir de cima falha logo de saída. Nas colônias
inglesas, o Norte é egião livre como a Inglaterra - o futuro lhe
pertence. Mas o Sul é escravosão regimes de escravos todas as fazendas,
particularmente as de cana-denas Antilhas e no interminável litoral do
Brasil. Regimes senhoriais esponprosperam nas zonas de pecuária, como a
Venezuela ou o interior do Brasil. imes feudais fracassam na
América espanhola de forte povoamento indíge; camponeses índios chegam a
ser concedidos a senhores espanhóis, mas as iiendas, dadas a título
vitalício, são mais concessões do que feudos: o goverianhol não quis
transformar em feudalidade o mundo reivindicador dos enideros, teve-o
muito tempo na mão.
ntre essas experiências, só nos interessarão as fazendas. Mais
diretamente do domínios da segunda servidão, elas são criações
capitalistas por excelência:

Naprovincia de Pernambuco, umafazenda: moradia e engenho de açúcar


(moinho hidrdulico, mós, carreto de canas, caldeiras). Em segundo plano,
a casa-grande e, no fundo, as senzalas. Cartela de um mapa tirado de C.
Barlaeus, Rerum per octennium in Brasilia et alibi gestarum... historia,
Amsterdam, 1647. (Foto
B.N.)
o dinheiro, o crédito, os tráficos, as trocas ligam-nas à margem oriental
do oceano. É de Sevilha, de Cádiz, de Bordeaux, de Nantes, de Rouen, de
Amsterdam, de Bristol, de Liverpool, de Londres que tudo é controlado a
distância.
Para criar as fazendas, foi preciso mandar vir tudo do velho continente,
os patrões, colonos de raça branca; a mão-de-obra, a dos negros da África
(pois o índio das regiões litorâneas não suportou o choque dos recém-
chegados); as próprias plantas, exceto o tabaco. No que se refere à cana-
de-açúcar, foi preciso importar, ao mesmo tempo que a planta, a técnica
açucareira, implantada pelos portugueses na Madeira e nas longínquas
ilhas do golfo de Guiné (ilha do
Príncipe, de São Tomé), de forma que estes mundos insulares foram todos
préAméricas, pré-Brasis. Nada mais revelador, porém, do que a
inexperiência dos franceses perante a cana-de-açúcar na baía do Rio de
Janeiro, para onde os impeliu, em 1555, o sonho de grandeza do almirante
de Coligny: deixam-na macerar na água para obter uma espécie de vinagre
1531

É no litoral do Nordeste brasileiro e no sul , na ilha de São Vicente,


que, por volta de 1550, se instalam os primeiros campos americanos de
cana-de-açúcar, com suas moendas, os "engenhos de açúcar". Essas
primeiras paisagens do açúcar são todas iguais: mangues reverberantes de
água, barcos de transporte nos rios litorâneos, carros de boi de rodas
rangendo nas pistas de terra, depois a tríade, ainda há pouco tempo de pé
nos arredores de Recife ou de São Salvador: a casa do dono, a casa
grande; os casebres dos escravos, as senzalas; e por fim o engenho de
açúcar.
O dono passeia a cavalo; reina sobre a família - uma família
desmesuradamente ampliada pela liberdade de costumes que não se detém
perante a cor da pele dos escravos - e exerce sobre os seus uma justiça
sumária e inapelável: estamos na
Lacedemônia ou na Roma dos Tarquínios151.
Como dispomos de contabilidades pormenorizadas, podemos desde já afirmar
que o engenho de açúcar brasileiro não é em si uma aplicação excelente.
Os lucros,

PLAN DE UHABITATION EN 1753,


P. DEFFONTAINE,
DES51UTEUR DES FOIRTIFICÀTIONS DE SÁM-DOMINGUE.
(Conservé chez M. le COMte du ForL)

18. UM ENGENHO DE AÇúCAR EM SÃO DOMINGOS 'afazendo de Galbauddu Fort não


éde uma clareza perfeita. Épreciso lê-lo pacientemente e com lupapara os
Pormenores assinalados na legenda e a que se refere o nosso texto ao
lado. Vale a pena a operação.

A protiução ou o capitansmo em casa alheia calculados com certa


verossimilhança, elevam-se a 4 ou 5%155. E há contratempos.
Nesse mundo à antiga, apenas o senhor de engenho está envolvido na
economia de mercado: comprou os escravos, contraiu empréstimos para
construir o engenho, vende a colheita e por vezes a colheita de pequenos
engenhos que vivem à sua sombra. Mas está, por sua vez, sob a dependência
dos mercadores, instalados na cidade baixa de São Salvador ou em Recife,
perto da cidade senhorial de Olinda.
Por meio deles, está ligado aos negociantes de Lisboa que adiantam os
fundos e as mercadorias, tal como os negociantes de Bordeaux e de Nantes
farão com os fazendeiros de São Domingos, da Martinica e de Guadalupe. É
o comércio da Europa que controla a produção e a venda de além-mar.
Nas Antilhas, a cultura da cana e a indústria açucareira foram levadas
provavelmente por marranos portugueses expulsos do Nordeste brasileiro
após a partida dos holandeses, em 1654 156. Mas só por volta de 168O o
açúcar chega à parte ocidental de São Domingos, na mão dos franceses
desde meados do século
XVII (de direito apenas depois da paz de Ryswick, em 1697).
Gabriel Debien 157 descreveu com detalhes uma das fazendas da ilha, por
certo não das mais belas, entre Léogane, a oeste, e Port-au-Prince, a
leste, um pouco distante do mar que se avista do alto do morro onde se
situava a moradia principal. Foi em 1735 que Nicolas Galbaut du Fort
entrou na posse desse engenho de açúcar em ruínas. Quando ali chegou para
fazê-lo funcionar de novo, restaurou as construções, deu nova disposição
às moendas e à caldeira, completou o contingente de escravos negros e
refez o canavial. Uma planta deficiente traçada em 1753 (e que aqui
reproduzimos) dará ao leitor uma idéia do que podia ser a fazenda, se bem
que seus limites sejam imprecisos, o relevo apenas esboçado, a escala
desrespeitada. A água é fornecida por um riacho, o Court Bouillon,
visitante às vezes perigoso, mas quase sem água "por causa das secas". A
moradia dos donos não é uma casa grande: três côrnodos, paredes de
tijolos caiadas, uma abertura redonda, uma imensa cozinha. A dois passos,
o depósito. Mais longe, a choça do administrador, vigilante e guarda-
livro cuja pena e números são indispensáveis à direção da propriedade, a
horta, a fábrica, a casa de purga, as moendas, a forja, a guildiverie
158. A nossa fazenda não está instalada "no branco" - isso quer dizer que
só produz açúcar bruto, não branqueado -, mas destila espumas e xaropes
na guildiverie: o tafiá, aguardente fabricada e vendida localmente, que
proporciona entradas de dinheiro mais rápidas do que a exportação para a
França. No mapa, encontramos o "barracão" de cabrouets (carroças que
transportam as canas cortadas), o sino que chama os escravos à oração e
principalmente ao trabalho; a cozinha, o hospital, as choças dos escravos
(são mais de uma centena); e, finalmente, as lavouras (cada lavoura tem
pouco mais de um hectare) plantadas de cana e os espaços reservados às
culturas hortícolas (batatas, bananeiras, arroz, milhete, mandioca,
inhaMe), culturas por vezes entregues aos escravos que revendem uma parte
delas à fazenda. Nas savanas ao redor dos morros - eventual reserva para
novos canaviais bois, mulas e cavalos alimentam-se como podem.
Por ocasião de uma segunda estada em Lécigane (1762-1767) para
restabelecer uma situação de novo pouco brilhante, Nicolas du Fort
procurará inovar: alimentar melhor os animais, praticar uma cultura
intensiva com adubação anormalmente densa, Política em princípio
discutível. Mas a política oposta não é menos criticável: a extensão da
cultura significa forçosamente o reforço do contingente de es239

v o capitalismo em casa alheia


Ora, os escravos são caros. Além disso, quando o fazendeiro se faz
substium -procurador- ou por um gerente e estes recebem, haja o que
houver, -centagem sobre a produção, aumentam-na sem se preocupar com os
custos: ietário arruínase, e eles enriquecem.
'azendeiro, mesmo tendo organizado sua "roça" com açúcar, café, índigo,
dão, não costuma nadar em dinheiro. Os produtos coloniais são vendidos
Europa. Mas a colheita só é comprada uma vez por ano: é preciso tempo
idê-la e recuperar os custos, ao passo que a despesa é diária e
particularmente
O que o fazendeiro compra para o sustento pessoal ou para a sua
propriedapor mar, onerado pelas despesas de transporte e, sobretudo,
pelos lucros que -adores e revendedores fixam conforme querem. com
efeito, como o if'* impede as ilhas de negociar com o estrangeiro, estas
ficam à mercê do Slio metropolitano. Os colonos não se privam de recorrer
ao contrabando, ; fornecimentos baratos e aos seus escambos frutuosos.
Mas tais fraudes não is, nem suficientes. Em 1727, uma esquadra francesa
ataca inopinadamente. um mercador da Martinica: "Os habitantes ficaram
muito mortificados; em [sação, isso agradou aos negociantes, pois podemos
dizer que os interesses o inteiramente incompatíveis." 119 Como escapar
também às manhas dos ars? Sabem (Savary, aliás, aconselha-os muito
claramente nesse sentido) em ; devem chegar para encontrar o açúcar a
preço baixo, em que momento, deo calor tropical ter provavelmente azedado
os vinhos, será oportuno chegar i born número de barris que "então não
deixarão de vender tudo o que se à vista" 160. Além do mais, os preços
inflacionam por si sós à medida que XVIII avança. Nessa época, portanto,
tudo é absurdamente caro nas ilhas:
- es, as miudezas, as caldeiras de cobre para o açúcar, os vinhos de
Bordeaux, os têxteis, e por fim os escravos. "Não faço nenhuma despesa",
escreve Nialbaut du
Fort em 1763. E no ano seguinte: a minha ceia "consiste em um le pão com
geléia"

161. A seguir, a situação não cessa de se agravar. E um j olono escreve


(13 de maio de 1782): "Desde a guerra [a da América] que os sapateiros
cobram por um par de sapatos 3 [piastras], o mesmo que 24 libras Idos, e
preciso de um par por mês. [ ... 1 As meias do fio mais grosseiro são is
a 9 libras o par. O tecido rústico para as camisas de trabalho custa 6
libras. libras e 1O soldos de feitio. 16 libras e 1O soldos é o preço de
um chapéu razoáo magnífico. [... 1 Os alfaiates cobram 6O libras pelo
feitio de um traje com5 libras por um casaco, outro tanto pelas calças.
Quanto à comida [ ... 1

chega)agar a farinha a [... 133O libras [o barril], a pipa de vinho 60O a


70O libras, :a de carne de boi a 15O libras, o presunto a 75 libras, as
velas a 4

libras e os a libra.-- 162 É certo que se trata de uma situação de


guerra, mas a guerra itaria não são raras nos mares da América.
ianto à saída de seus produtos, o fazendeiro, quando vende localmente, é
ado pelas diferenças sazonais que fazem desabar os preços em 12, 15 e
1807o mentos em que se fabrica o açúcar com abundância. Se recorre a um
comisi metropolitano, espera meses, às vezes anos pelo pagamento, dada a
lentis comunicações. Quanto aos preços com que se pode contar, o mercado
dos os coloniais está, nos portos da Europa - como em Bordeaux -, entre
os speculativos. Os mercadores têm o hábito de jogar na alta ou na baixa
legime comercial, vigente até 1784. (N.R.)

, I ptuuuç;uu UU U UM LéuNU UIrItfIU e, quanto aos revendedores, têm a


boa desculpa de que é preciso guardar as mercadorias em armazém à espera
de melhor preço. Daí as prolongadas esperas que muitas vezes significam,
para o fazendeiro, falta de dinheiro, obrigação de fazer empréstimo. Se,
ainda por cima, acreditando caminhar para a fortuna, ele se endividou
logo de início, para comprar parte ou a totalidade de sua fazenda e de
seus escravos, rapidamente ficará à mercê de seus financiadores.
Os negociantes, comissionistas e armadores de Bordeaux que impoem os
serviços dos seus navios, dos seus capitães (muitas vezes encarregados de
lhes venderem as cargas), dos seus armazéns, dos seus adiantamentos
salvadores, são portanto os donos da máquina de produzir riquezas
coloniais. Qualquer colono que acompanhemos em sua atividade de todos os
dias o diz na sua correspondência. É o caso dos Raby e dos Dolle, sócios
especialmente na exploração da vasta fazenda dos Vazes, numa das melhores
zonas de São Domingos, que rapidamente se vêem obrigados a entregar-se,
de mãos e pés atados, em 1787, à grande casa Frédéric
Romberg e Filhos, de Bruxelas, cuja sucursal em Bordeaux passava (sem
razão) por eixo inabalável de toda a vida do grande porto 163.
Tudo isso não se ajusta bem, sem dúvida, aos números globais de que
dispomos. Em
Bordeaux, onde se faz a metade do comércio das colônias francesas, as
exportações representam apenas um terço, depois um quarto, depois de novo
um terço das importações bordelesas de produtos de São Domingos, de
Guadalupe e da
Martinica164. As mesmas defasagens em Marselha165. Não haverá contradição
nisso?
Se a balança das mercadorias favorecesse do mesmo modo as ilhas, estas
deveriam estar em plena prosperidade. Depois, por compensação, deveria
vir dinheiro da
França. Ora, São Domingos, para falar apenas desta ilha, é continuamente
esvaziada de suas piastras; vindas por contrabando da vizinha América
espanhola, limitamse a atravessar a ilha e, o que é extraordinário,
encaminham-se a seguir para Bordeaux, em quantidades enormes depois de
1783166. Não se deverá o paradoxo aparente ao fato de a balança ser
calculada nos portos franceses em preços locais? Se nos colocamos nas
ilhas para fazer o mesmo cálculo, a massa dos produtos franceses aí
vendidos representa uma soma mais elevada do que em
Bordeaux, ao passo que a exportação colonial tem menos valor antes de sua
transferência para a metrópole, que incorporará nos preços de compra as
despesas de transporte, de comissão, etc. Diminui-se assim a diferença
entre as duas cifras. Cumpre assinalar também a diferença artificial
entre as moedas de conta:
a "libra colonial" é depreciada em 3307o relativamente à libra da
metrópole.
Finalmente, as remessas de dinheiro às famílias de colonos que ficaram na
França e aos proprietários absenteístas afeta a balança de contas.
Todavia, o item mais importante deste ponto de vista continua a ser,
efetivamente, o item financeiro, o pagamento dos juros e o reembolso dos
empréstimos.
Em resumo, os fazendeiros ficam presos num sistema de trocas que os
afasta dos grandes lucros. Já no século XV as refinarias de açúcar
sicilianas, a despeito ou por causa da intervenção do capitalismo
genovês, curiosamente eram, segundo
Carmelo Trasselli, máquinas de perder dinheiro. Retrospectivamente,
sentimos certa pena dos castelos de areia erguidos por tantos compradores
de fazendas, às vezes ricos mercadores. Marc Dolle, mercador de Grenoble,
escreve ao irmão:
"Acabei de esvaziar a carteira, meu caro amigo, para te mandar esta
remessa [de dinheiro] e fiquei sem fundos livres. [... 1 Tenho a certeza
de que ao adiantarte o investimento [na compra de uma enorme fazenda]
terei feito a tua fortuna e aumentado a minha" (1O de fevereiro de
1785)167. As desilusões vêm depois. Não é como fa241

- - --, ~U UtrwiU os, mas como mercadores - primeiro lojistas, por fim
grandes negociantes os irmãos Pellet, de quem já falamos, fazem a sua
grande fortuna a partir tinica.
Souberam escolher o lado certo da barreira e, no momento oporturessar a
Bordeaux e a suas posições dominantes. Ao passo que os prestamisN,
msterdam que julgaram poder fazer adiantamentos calmamente a fazenJas
ilhas dinamarquesas ou inglesas, tal como fariam com negociantes da, ça,
tiveram um belo dia a desagradável surpresa de se verem proprietários
ndas penhoradas168.
caso da Jamaica inglesa condiz com o que dissemos de São Domingos. Na,
lesa, vamos encontrar a Casa grande, the Great House, os escravos
negros ) para cada branco), a onipresença da cana, a exploração pelos
mercadores ies de navios, uma libra colonial inferior à libra esterlina
(uma libra da InL vale 1, 4 da libra jamaicana), as piratarias e as
pilhagens de que, desta vez, a é a Inglaterra, sendo o francês o agressor
(mas nem um nem outro, nos lo Caribe, podem ter a última palavra).
Encontram-se também as chagas igos dos escravos fugitivos, os "maroons",
que se refugiam nas montanhas vindos às vezes do litoral e das ilhas
vizinhas. Desse ponto de vista, a situa169

al foi muito crítica durante a Maroon War, de 173O a 1739.


ssa ilha, grande para a escala da época, desenvolveram-se à vontade
grandes is, sobretudo a partir dos anos 1740-1760, que assistem ao início
do grande, ucareiro 170

. Então, tal como nas ilhas francesas, passam para o segundo pla, mílias
dos primeiros colonos que em geral trabalhavam com as próprias mãos jenas
lavouras de tabaco, de algodão, de índigo. A cana-de-açúcar exige gran,
stimentos. É o advento dos possuidores de capitais e das grandes
propriedaestatísticas dão até a impressão de uma propriedade mais vasta e
mais povoacravos, talvez mais rica do que em São Domingos. É um fato,
porém, que bastecida de carne salgada e de farinha pelos ingleses ou
pelas colônias inglekmérica, com o encargo de fornecer à Inglaterra a
metade do seu açúcar, -o a preços mais elevados do que os de São
Domingos e outras ilhas francesas. a como for, tal como as outras ilhas
de açúcar, a Jamaica é uma máquina riqueza, uma máquina capitalista, a
serviço dos ricos171. Como as mesmas ?roduzem os mesmos efeitos, tudo se
passa quase como em
São Domingos, ) grosso da riqueza produzida na colônia incorpora-se à
riqueza da metrós lucros dos fazendeiros seriam de 8 a 101% no MáXiMO172.
O essencial do o de importação e de exportação (para não falar dos lucros
do comércio ivos, que é feito apenas a partir da Inglaterra) "retorna e
circula no reino" os mesmos lucros "que o comércio nacional, como se as
colônias da Amévessem de algum modo grudadas na Cornualha": estas
declarações são de

1, defensor da utilidade, para a vida econômica inglesa, das West India


Isque chamou energicamente a atenção para o que há de enganador, no caso,
neros da balança.
realidade, a balança comercial da Jamaica, mesmo calculada em libras codá
à ilha uma ligeiríssima vantagem (1.336.00O contra 1.335.000); mas pelo

Negociantes ingleses das Antilhas embalando suas mercadorias. Vinheta que


ilustra o mapa das Antilhas. Atlas royal de Herman MolI, 1700. (Fototeca
A.
Colin.)
menos metade do montante das importações e das exportações chega à
metrópole de maneira invisível (frete, seguros, comissões, juros de
dívidas, transferências de fundos a proprietários ausentes). No total, em
1773, o lucro da Inglaterra seria de cerca de um milhão e meio de libras.
Em Londres, tal como em Bordeaux, os lucros do comércio colonial
transformam-se em casas de comércio, em bancos, em fundos do Estado;
sustentam famílias poderosas cujos representantes mais ativos se
encontram na Câmara dos Comuns e na Câmara dos Lordes. Há porém algumas
famílias de colonos muito ricas, mas, como que por acaso, não são
unicamente fazendeiros: fazem o papel de banqueiros com outros
fazendeiros endividados; têm laços de família com mercadores de Londres,
quando não é o próprio filho que se encarrega de comercializar a produção
da fazenda, de fazer as compras necessárias e de servir de comissionista
a jamaicanos. Essas famílias acumulam, em suma, os lucros da produção
açucareira, do comércio, da comissão e do banco. Não surpreende pois que,
instalados em Londres, gerindo de longe ou revendendo as propriedades das
ilhas, sejam capazes de investir largamente na
Inglaterra, não apenas no comércio, mas também numa agricultura de
vanguarda e em diversas indústrias174. Tal como os Pellet, esses
fazendeiros compreenderam que é na metrópole que se tem de aplicar para
ganhar dinheiro nas colônias!
Será necessário recomeçar a demonstração, analisar de novo o tabaco da
Virgínia, os rebanhos de Cuba, os cacaueiros da Venezuela, com a
fundação, em 1728, da
Companhia de Caracas 1759 iríamos encontrar mecanismos semelhantes. Se
quisermos escapar desta história monótona, teremos de ir onde, longe da
atenção interesseira dos mercadores da Europa, crescem sozinhas Américas
selvagens, cada qual com a sua aventura peculiar: ao Brasil, ao redor de
São Paulo de onde partirão as bandeiras, as expedições dirigidas ao
interior em busca de ouro e de escravos; ao sertão da Bahia, ao longo do
vale do São Francisco, o rio dos currais, dos cercados abarrotados de
imensos rebanhos de bovinos; aos Pampas argentinos, nos primeiros tempos
de seu destino "europeu"; ou ainda ao sul da
Venezuela, através dos Ilanos da bacia do Orenoco, onde senhores de
origem espanhola, uma profusão de rebanhos e de boiadeiros a cavalo
(índios ou mestiços de índio e branco) criam uma autêntica sociedade
senhorial, com suas poderosas famílias de proprietários. Um "capitalismo"
à antiga (em que gado é igual a moeda), ou mesmo primitivo, capaz de
encantar Max Weber que por um momento se interessou por ele.

urn cusu aineia hamo de "coração da Europa" o extremo ocidental do


continente, aquém a linha
Hamburgo-Veneza. Essa Europa privilegiada oferece-se mui amplaà
exploração das cidades, das burguesias, dos ricos e dos senhores empreen!
s para que o capitalismo não se tenha imiscuído de mil maneiras na
atividaa estrutura dos antiqüíssimos campos do Ocidente.
:)deremos, para discernir um esquema claro, proceder como os matemáticos
r o problema resolvido? Na Europa camponesa e senhorial, o capitalismo
ata-se como uma nova ordem que não ganha sempre, longe disso, mas ga.1
certas regiões particulares. Partamos, então, dessas regiões, dessas
expes bem-sucedidas, uma vez que o problema cuja solução buscamos foi
nelas do.
Inglaterra é o modelo em que pensamos logo de início. Não vamos deter[a
agora, uma vez que teremos ocasião de voltar a ela mais tarde. Reduzido
linhas mestras, o modelo inglês servirá apenas de quadro de referência
para :)s casos específicos de que vamos tratar. É claro que essa
revolução inglesa erou transformações em toda a ilha onde subsistem, à
margem dos grandes s, regiões atrasadas, algumas arcaizantes, mesmo por
volta de 1779 e em contão evoluídos como o Essex e o SuffoIk 176.
)memos então como exemplo uma região onde a novidade se impõe
inconImente, por exemplo o Norfolkshire, a East Anglia. No artigo
"Culture" -yclopédie, Véron de
Forbormais177
descreve, precisamente no âmbito de k, as maravilhas de uma economia
agrícola que propõe como exemplo: a n, a margagem das terras, o paring (a
queimada por combustão lenta do mantrodução de raízes forrageiras, a
extensão dos prados artificiais, o desenento das drenagens, a melhor
adubação das terras, a atenção prestada a uma ia seletiva, o
desenvolvimento das enclosures e em conseqüência a extensão )priedades, a
maneira pela qual estas têm seus limites cercados de sebes vijue acentua
e generaliza a arborização dos campos ingleses. Outras caracteque se
devem considerar: a superabundância e a qualidade dos utensílios as, a
benevolência da aristocracia fundiária, a velha presença de grandes
arientos agrícolas, a instalação precoce de cadeias capitalistas de
gestão, as fa-s do crédito, a complacência do governo, menos preocupado
com a vigilânregulamentação dos mercados do que com as rendas e o
abastecimento das ;
e que, mediante um sistema de escala móvel, favorece e subvenciona a exio
de cereais.
critérios com maiores conseqüências nesta evolução são:
o desaparecimento, nos campos ingleses avançados, de um sistema senhoe
cedo começou a desvanecer-se. Marx refere-se a isso energicamente"':
restauração dos
Stuarts, os proprietários fundiários... aboliram a constituidal do solo,
ou seja, aliviaram-no das servidões que o oneravam, indenizanstado
mediante impostos a serem cobrados dos camponeses e do resto do
reivindicaram a título de propriedade privada, no sentido moderno, bens
sse provinha de títulos feudais."
Isto é, uma vassourada na vida tradicional; a cessão por arrendamento das
propriedades rurais a rendeiros capitalistas responsabilizam pela sua
direção;

A produção ou o capitalismo em casa alheia

3) o recurso a trabalhadores assalariados que assumem o aspecto de


proletários: só têm para vender, aos patrões, a sua força de trabalho;

4) a divisão vertical do trabalho: o proprietário cede o solo- e recebe a


renda;
o rendeiro faz papel de empresário; o operário assalariado encerra o
cortejo.
com base nestes critérios, vamos encontrar, na história do continente,
exemplos que se assemelham em maior ou menor medida ao modelo inglês - o
que prova, de passagem, que a Revolução agrícola é também um fenômeno
europeu, tal como a
Revolução industrial que a acompanhará.
A ordem na qual abordaremos esses exemplos - a Brie (século XVII), a
Venécia (século XVIII), a zona rural romana (princípio do século XIX), a
Toscana (séculos XV-XVI) - não é por si só importante. E a nossa intenção
não é estudar estes diferentes casos por si sós nem procurar com que
elaborar uma lista exaustiva para a Europa. Queremos apenas esboçar um
raciocínio.
Perto de Paris: a Brie no tempo de Luís XIV
Ao redor de Paris, faz séculos que a propriedade urbana devora a terra
camponesa e senhoria1179. Ter uma casa de campo; arranjar desse modo
abastecimento regular: trigo, lenha nas vésperas do inverno, aves de
criação, frutas; e não pagar o imposto de barreira na porta da cidade (o
que é de norma quando a declaração de propriedade está devidamente
registrada) - tudo isso faz parte da tradição dos manuais da perfeita
economia doméstica que proliferaram em quase toda a parte,
particularmente na Alemanha, onde a Hausvãterliteratur foi muito prolixa,
mas também na França. Lagriculture et Ia maison rustique, de Charles
d'Estienne, publicado em 1564, revisto por seu genro Jean Liébaut, terá
103

reedições entre 157O e 1702, 80. As compras de terras pela burguesia, às


vezes simples chácaras, pomares, hortas, prados ou verdadeiras
propriedades rurais, verificam-se ao redor de todas as grandes cidades.
Mas às portas de Paris, no planalto humoso da Brie, o fenômeno tem outro
significado. A propriedade urbana, uma grande propriedade, nobre ou
burguesa, estende-se ao sol mesmo antes do princípio do século XVIIII81.
O duque de
Villars, "que sob a Regência mora no seu castelo de Vaux-le-Vicomte,
explora pessoalmente apenas 5O jeiras de terra das 22O que possui. [ ...
1O titular do feudo da Comuna (paróquia de Éct--ermes), burguês
residente, proprietário de

332 jeiras [ ...1 reservou para si apenas a exploração de 21 jeiras de


prados`82. Assim, praticamente, tais propriedades não são gerQas pelos
proprietários; estão a cargo de grandes rendeiros que quase sempre reúnem
nas mãos as terras de vdrios proprietários, cinco, seis, às vezes oito.
No centro das suas explotações, erguem-se essas grandes propriedades
ainda hoje visíveis, "fechadas por altos muros, recordação de épocas
turbulentas... [com as suas]
construções distribuídas à volta do pátio interior principal. [... 1 À
volta de cada uma delas aglomeram-se algumas pequenas casas, 'casebres',
por sua vez rodeados de hortas e de um pouco de terra, onde mora a
arraiamiúda, os trabalhadores braçais que alugam o seu trabalho ao
rendeiro'1183.
Por tais sinais se reconhecerá uma organização "capitalista", a mesma que
a
Revolução inglesa institui: proprietário, grandes rendeiros, operários
agrícolas. Tirando um fator, que é importante: nesta zona nada mudará
quanto à técnica, até o Século XIX184. Tirando outro fator: a organização
imperfeita dessas unida245

ju o capitatismo em casa alheia produção, sua especialização cerealífera,


sua elevada porcentagem de autono e o valor elevado dos arrendamentos
tornam-nas excessivamente sensícotações do trigo. Uma baixa de dois ou
três pontos, no mercado de Melun, am as dificuldades, até mesmo a
falência se as más colheitas ou os anos de

5aixo se sucedem com muita freqüência'8'. Nem por isso esse rendeiro
deier um personagem novo, possuidor de um capital lentamente acumulado
que wna um empresário.
!j a como for, os amotinados da guerra das farinhas (1775) não se
enganarão: a os grandes rendeiros que voltarão a sua ira, nos arredores
de Paris e em regiões186. Há pelo menos duas razões para isso: de um
lado, a grande ex!o, objeto de inveja, é quase sempre obra de um
rendeiro; do outro, este é ideiro dono do mundo aldeão, tanto quanto o
senhor que reside na sua terra com maior eficácia, pois está mais próximo
da vida camponesa. É ao mesipo o armazenador de grãos, o criador de
empregos, prestamista ou o usurámitas vezes é encarregado pelo
proprietário da "receita dos censos, dos fos banalidades, até do
dízimo...
Em toda a região parisiense [estes rendeiros], a a Revolução, resgatarão
alegremente os bens dos antigos senhores`87. ;e realmente de um
capitalismo que tenta crescer de dentro para fora. É só um pouco e tudo
lhe sorrirá.
nossa apreciação seria ainda mais clara se nos fosse dado ver melhor
esses s rendeiros, conhecer-lhes a vida, julgar, de visu, o modo como
tratam os os cavalariços, os lavradores ou os carroceiros. É oportunidade
que nos e depois nos furta, o início dos Cahiers do capitão Coignet188,
nascido em m Druyes-les-Belles-Fontaines, no atual departamento de Yorme,
mas que, eras ou no princípio da Revolução, se encontra a serviço de um
grande merle cavalos de
Coulommiers, logo ligado aos serviços de coudelaria do Exérolucionário;
esse mercador tem pastos, terras de lavoura, rendeiros, mas ) não nos
permite avaliar a sua posição real. Será ele sobretudo mercador, Iário
explorador ou vive das rendas de suas terras arrendadas? Decerto as sas
ao mesmo tempo. Decerto é, oriundo do meio de grandes camponeses los. Sua
atitude paternal, afetuosa para com seus servidores, a grande mesa )dos
se reúnem, o patrão e a mulher à cabeceira, o "pão alvo como neve", ;o é
muito sugestivo. O jovem Coignet visita uma das grandes propriedades !o,
extasia-se perante a leiteria, "com torneiras por toda a parte"; o
refeitóe tudo reluz de limpeza; a bateria de cozinha, a mesa, encerada,
tal como os. "De quinze em quinze dias", diz a dona da casa, "vendo uma
carroça jos; tenho 8O vacas..." Infelizmente, essas imagens são sumárias
e o velho ) que escreve essas linhas desfia às pressas as suas
recordações.
iós a conquista de seus territórios da Terra Firme, Veneza tornou-se, no
prin)
século XV, uma grande potência agrícola. Já antes dessa conquista os seus
s possuíam terras, tais como "além-Brenta" na rica planície de Pádua.
Mas, Im do século XVI e sobretudo depois da crise das primeiras décadas
do sé11, a riqueza patrícia, numa verdadeira reviravolta, larga o
comércio e, com seu peso, volta-se para a exploração agrícola.

A produção ou o capiratismo em casa alheza


Muitas vezes, o patrício obteve sua terra tirando-a da propriedade
camponesa
- longa e corriqueira história - de forma que, a partir do século XVI,
são freqüentes os crimes agrários, contra o proprietário, sua família ou
seus bens.
Ele tambérn se aproveitou, quando da conquista da Terra Firme, dos
confiscos operados pela Signoria e das vendas que se seguiram. E, cada
vez mais, novos solos são obtidos pelos trabalhos hidráulicos que
permitem, com canais e eclusas, sanear os baixios. Estas benfeitorias
são, com a colaboração ou a vigilância do Estado e a participação, nem
sempre teórica, das comunidades aldeãs, operações tipicamente
capitalistas 189. Não é de admirar que, ao cabo dessa longa experiência,
no século das Luzes, a Venécia verde seja a sede de uma revolução
agrícola perseverante que se orienta nitidamente para a pecuária e para a
produção de carne190.
Assim, em frente de Rovigo, além do Adige, perto da aldeia de Anguillara,
a velha família patrícia de Tron possui 50O hectares seguidos. Em 1750,
trabalham ali 36O pessoas (das quais 177 com cargo fixo, 183 contratadas
a curto prazo como salariati) em equipes de 15 homens no máximo.
Portanto, uma exploração capitalista. A propósito desta palavra, escreve
Jean Georgelin: "Não cometemos anacronismo. A palavra é de uso corrente
no século XVIII na Venécia (e no
Piemonte). Os alcaides semi-analfabetos - como atesta a sua escrita - da
região bergarnasca respondem sim, sem hesitar, a um inquérito do
podestade de B , érgamo: 'Vi sono capitalisti qui?' E, por capitalista,
entendem quem vem de fora dar trabalho aos camponeses com capitais
próprios."191

Anguillara é uma espécie de manufatura agrícola. Nela tudo se passa sob a


vigilância do intendente. Os chefes de equipe ficam grudados nos
calcanhares dos operários assalariados, que têm direito a apenas uma hora
de descanso por dia: o vigilante verifica-o orologio alla mano. Tudo é
feito com método e disciplina: a manutenção das valas, dos pombais, as
plantações de amoreira, a destilação das frutas, a piscicultura, o
lançamento precoce, a partir de 1765, da cultura de batata, os diques de
proteção contra a água perigosa do Adige ou até para conquistar dele
novas terras. "A propriedade é uma colméia que não pára de zumbir, mesmo
no inverno-192: lavrar com a enxada, revolver a terra com a charrua ou o
alvião, mas também cavar fundo e abrir sulcos; culturas do trigo
(rendimento de 1O a 15 quintais por hectare), de milho, sobretudo de
cânhamo;
por fim, criação intensiva de bovinos e de carneiros. Grandes
rendimentos, portanto grandes lucros, variáveis, evidentemente, conforme
os anos. Num ano de crise, o de 1750, o lucro (não contando com a
amortização de fundos) é de 28%,

29%. Mas em 1763, ano excelente, é de 130%! Nos bons solos da Brie, entre
1656 e

1729, o lucro de um born ano mal ultrapassaria os 12%, se os cálculos


estão certos193.
Estes fatos recentemente estabelecidos obrigam a repensar nossa maneira
de ver no que diz respeito a Veneza. Essa guinada da fortuna patrícia em
direção da amoreira, do arroz, das plantações de trigo e de cânhamo da
Terra Firme não é apenas uma aplicação de refúgio, depois do abandono do
comércio que se tornara difícil e aleatório desde o fim do século XVI,
por causa, entre outros perigos, da recrudescência da pirataria no
Mediterrâneo. Aliás, Veneza, graças aos navios estrangeiros, continua um
porto muito freqüentado, talvez ainda no século XVII o mais freqüentado
do Mediterrâneo. Portanto, os negócios não pararam de um dia para o
outro. Foi a subida dos preços e dos lucros agrícolas que empurrou o
capital veneziano para a terra. Aqui, com efeito, a terra não enobrece: é
só uma questão de investimento, de aplicações, de rendimentos.

247

a três. Pintura veneziana de G. TiePOIO, século XVIII. (Foto 0. Boehm.)

A produção ou o capitalismo em casa alheia


Também de gostos: se os ricos de Veneza, no tempo de Goldoni, abandonam
seus palácios urbanos por vilas que são verdadeiros palácios rurais, é em
parte por uma questão de moda. No princípio do outono, a Veneza dos ricos
despovoavase, "as vilegiaturas, os bailes campestres, os jantares ao ar
livre realizavamse com aplicação e sucesso". Tantas descrições e relatos
nos falaram isso que temos de acreditar: tudo é "artificial" nessas casas
lindíssimas, as salas decoradas, as mesas riquíssimas, os concertos, as
peças de teatro, os jardins, os labirintos, as sebes cortadas, as aléias
ladeadas de estátuas, a criadagem superabundante. Imagens para um filme
que nos encantaria. A última, a da grande dama que foi visitar os
vizinhos, voltando para casa ao cair da noite com o seu cão, seus
criados, "apoiada no braço do seu abade [ ... 1 que iluminava a estrada
com uma lanterna`91. Mas isto dirá tudo sobre essas residências luxuosas?
Têm celeiro, lagar, adegas, são também centros de explotação rural,
lugares de vigilância. Em 1651, publicava-se em Veneza um livro de título
revelador, L'economia del cittadino in villa, traduzindo livremente, "a
economia do burguês no campo". O autor, um médico, Vincenzo Tanara,
escreveu um dos mais belos livros rústicos jamais publicados. Multiplica
os conselhos judiciosos ao novo proprietário que chega às suas terras:
que escolha o melhor possível o local, as condições climáticas e as águas
próximas da sua vila. Que pense em escavar um lago para criar tencas,
percas, barbos: que meio melhor, efetivamente, de alimentar a família a
baixo custo e de conseguir com poucas despesas o companatico necessário
aos operários agrícolas? Porque no campo trata-se também, trata-se
sobretudo de fazer os outros trabalharem.
Há portanto uma grande dose de ilusão na curiosa carta de Andrea Tron ao
amigo
Andrea Quirini (22 de outubro de 1743). O jovem patrício que escreve
passou muito tempo na Holanda e na Inglaterra. "Pois digo-te [ ... ] que
eles [os homens que governam Veneza, patrícios como ele] podem fazer os
decretos que quiserem que nunca chegarão a lugar algum em matéria de
comércio no nosso país [... 1 Não há comércio útil ao Estado, em nenhum
país, quando os mais ricos não se dedicam aos negócios. Em Veneza, seria
preciso persuadir a nobreza a aplicar seu dinheiro nos negócios [... ] e
atualmente é impossível persuadi-Ia disso. Os holandeses são todos
mercadores, e essa é a principal razão por que o comércio deles é
florescente. Se se introduzisse [... 1 esse mesmo espírito no nosso país
logo veríamos ressuscitar um grande comércio.--195 Mas por que os
patrícios haveriam de renunciar a uma ocupação tranqüila, agradável e que
lhes proporciona rendimentos confortáveis, para se lançar na aventura
marítima com lucros provavelmente menores e aleatórios, uma vez que os
bons lugares já estão ocupados? com efeito, ser-lhes-ia difícil apoderar-
se de novo do comércio do
Levante cujos fios estão todos nas mãos de estrangeiros ou de mercadores
judeus e da burguesia dos cittadini de Veneza. Contudo, o jovem Andrea
Tron não estava errado: abandonar àqueles que não são "os mais ricos" da
cidade o cuidado dos negócios e do comércio do dinheiro era sair da
grande partida internacional em que Veneza desempenhara outrora os
principais papéis. Comparando a sorte de
Veneza e a de Gênova, a cidade de São Marcos, a longo prazo, não fez
certamente a melhor escolha capitalista.
O caso aberrante dos campos romanos no Principio do século XIX
Ao longo dos séculos, os vastos campos romanos mudaram várias vezes de
asPccto.
Por quê? Decerto porque ali se constrói no vazio. Simonde de Sismondi196

249

w o capitalismo em casa alheia or nós em 1819 e descreve-os como um


admirável exemplo de divisão do 0.
guns pastores a cavalo cobertos de andrajos e de peles de carneiro;
alguns os, algumas éguas com seus potros e raras e vastas propriedades
isoladas, le distância umas das outras - habitualmente isso é tudo o que
se vê com )s campos ermos a perder de vista. Não há culturas, não há
aldeias; silvas, uma vegetação selvagem e odorífera reocupam
constantemente o solo livre tenazmente, matam as pastagens. Para lutar
contra essa peste vegetal, o o é obrigado, a intervalos regulares, a
proceder a arroteamentos seguidos, leadura de trigo. É uma maneira de
reconstituir a pastagem por vários anos. uma região sem camponeses, como
levar a cabo os duros trabalhos, do arro, to à colheita, desses anos
excepcionais?
solução é recorrer à mão-de-obra estrangeira: mais de "dez classes de
opediferentes, cujos nomes "não se conseguem dizer em nenhuma língua...
[Para, rabalhos] diaristas que descem das montanhas da Sabina; [para
outros] ope/indos da Marca e da Toscana; em sua maioria, indivíduos que
vêm sobretuAbruzos;
finalmente, para... a construção dos palheiros [as medas], emprembém os
ociosos das praças públicas de Roma (os piazzaiuoli di Roma) que -vem
para mais nada.
Tal divisão dos trabalhos permitiu adotar os processos purados de
agricultura;
os trigais são mondados pelo menos duas vezes... nas vezes mais; como
cada qual se exercitou numa determinada operação, -a com mais presteza e
precisão. Quase todos estes trabalhos são feitos por tada, sob a inspeção
de grande número de feitores e subfeitores; mas o renempre fornece a
alimentação, pois seria impossível o operário arranjá-la naleserto. Deve
a cada um uma medida de vinho, o valor de 4O baiocs de pão nana e três
libras de qualquer outra substância nutritiva, como carne salgajueijo.
Esses operários, durante os trabalhos de inverno, vão dormir no ca=de
construção desprovida de móveis que fica no centro de uma imensa -dade
rural. [... 1 No verão dormem nos locais onde trabalharam, quase ao ar
livre".
quadro está evidentemente incompleto. Trata-se de impressões de viagem.
Surido por um espetáculo altamente pitoresco, Sismondi não vê as muitas
somem sequer a malária, muito mortífera nessa região mal administrada
pelo hoZão se interroga seriamente sobre a questão do sistema de
propriedade. Ora, tema é curioso, e os problemas que acarreta
ultrapassam, aliás, o âmbito do )mano. As terras nas cercanias de Roma
pertencem a grandes feudatários e essenta estabelecimentos religiosos.
São muitas vezes grandes propriedades, is do príncipe Borghese, do duque
Sforza, do marquês Patrizi, 97. Mas nem latários, nem as casas religiosas
se ocupam diretamente da gestão das suas terido caiu nas mãos de alguns
grandes rendeiros, curiosamente chamados negoou mercanti) di campagna.
Não são muito mais de uma dúzia e formam uma ição que ainda estará de pé
no século XIX. De origens sociais muito diversas, cadores, advogados,
corretores, coletores de impostos, administradores de dades -, não se
asemelham, na realidade, aos grandes rendeiros ingleses, , qüentemente
reservam para si a exploração direta das melhores terras, geraltransferem
parte do arrendamento a vários pequenos rendeiros, até a pastores )oneses
estrangeiros. Querendo ter os movimentos livres, foram expulsando
iticamente os camponeses possuidores das antigas concessões198.

Pormenor do mapa dos campos romanos por Eufrosino della Volpaia (1547).
Trata-se de uma região relativamente cultivada do N.-O. de Roma. com
efeito, vemos algumas lavouras, umajunta de bois, mas também enormes
espaços vazios, salpicados de ruinas romanas e de arbustos.

U U (, Ul-ntutiNflu em (-UNU UtrICIU ata-se de uma intrusão capitalista


evidente, que se define em meados do séVIII, da qual os campos romanos
são um exemplo entre muitos na Itália. os a encontrar o fenômeno em
certas partes da Toscana, na Lombardia ou nonte em plena transformação do
século XVIII. Esses appaltatori têm má ão entre os proprietários, os
camponeses e o Estado: têm fama de especulauros, desejosos de tirar o
máximo de dinheiro possível, e o mais rápido pose terras cujo rendimento
não se preocupam muito em preservar. Mas pre.ri o futuro: estão na origem
da grande propriedade italiana do século XIX. nbém, nos bastidores, os
inspiradores das reformas agrárias, benéficas e noo mesmo tempo, do fim
do século XVIII. A sua preocupação: libertar-se igas condições de
propriedade, das concessões, dos morgadios e das mãos, armar-se contra os
privilegiados e os camponeses e também contra o Estavigiava com demasiado
rigor a comercialização. Quando se inicia o "perfoicês" e os bens dos
antigos privilegiados são lançados em massa no mercagrandes rendeiros
encontram-se entre os primeiros compradores, 99.
interesse da descrição de Sismondi está no caráter exemplar dos campos
ro, que oferecem uma autêntica e inegável divisão do trabalho agrícola de
que ima falar pouco. Adam Smith101 resolveu o problema um tanto
apressadaa divisão do trabalho vale para a indústria, não para a
agricultura, em que, o ele, a mesma mão semeia e lavra. com efeito, sob o
A ncien Régime, a vida a consiste em cem tarefas ao mesmo tempo, e, mesmo
na's regiões pouco evoos camponeses são obrigados a dividir entre si,
especializando-se, todas as des da economia aldeã. São necessários um
ferreiro, um carpinteiro de carrocorreeiro, um marceneiro, mais o
inevitável e indispensável sapateiro. Não samente a mesma mão que semeia,
lavra, guarda os rebanhos, poda a vinha lha na floresta. O camponês que
abate as árvores, racha a lenha, confecciona es tende a ser um personagem
à parte. Todos os anos, na época das ceifas, )ulhas ou das vindimas,
acorre uma mão-de-obra suplementar, mais ou me)ecializada. Vejam-se os
"podadores, carregadores e pisadores", sob a autodo "mestre de vindima".
No caso dos arroteamentos, como no
Languedoc, , igilância de Olivier de SerreS201 os trabalhadores dividem-
se em grupos ses: os lenhadores, os encarregados das queimadas, os
lavradores com os ara:)m fortes juntas de bois, depois os "maceiros" que
"reduzem a pó os torrões tes e demasiado duros". Finalmente, a grande
divisão dos campos foi, desde, entre pecuária e cultivo: Abel e Caim,
dois universos, dois povos diferentes detestam, sempre prontos ao
confronto. Os pastores são quase intocáveis. O e guarda até hoje
vestígios disso: é o caso de uma canção dos Abruzos que Lmponesa
apaixonada por um pastor: "Nenna mia, mutapensiere [ ... 1 'nnanhiate nu
cafam ca é ommi de società", muda de idéia, garota, escolhe um cam:lue é
um homem de boa convivência, um homem civilizado, não um desses, s
"malditos" que não "sabem comer no prato"2021

- ntamente, sob o impacto da fortuna dos mercadores de Florença, os


camscanos se modificaram profundamente. As aldeias de outrora, as explota

,, i proaução ou a capitatismo em casa alheta ções fragmentadas de


camponeses mal aquinhoados mantiveram-se apenas nas regiões altas e em
algumas zonas retiradas. Nas terras baixas e nas vertentes das colinas,
muito antes de 1400, instalou-se a parceria agrícola (o podere a
mezzadria, abreviado, podere). Sem interrupção, com uma extensão que
varia conforme a qualidade das terras, o podere é cultivado por um meciro
e sua família, é a regra. No centro, uma casa camponesa com celeiro e
estábulo, forno, eira; à volta, ao alcance da mão, a terra arável,
vinhas, pés de vime de caules claros, oliveiras, terras a pascolo e a
bosco, de pasto e de lenha. A explotação foi calculada para fornecer o
dobro da renda necessária à vida do camponês e da sua família, pois
metade da renda global vai para o oste, o proprietário, outra metade para
o mezzadro, o meeiro. o oste, às vezes, tem a sua vila, nem sempre
luxuosa, perto da casa do camponês. Nos seus Ricordi, escritos entre 1393
e

1421, Giovanni di Pagolo Morelli111 recomenda aos filhos: "Metam bem na


cabeça que são vocês que têm de ir à vila, percorrer a propriedade campo
a campo com o meeiro, repreendê-lo pelos trabalhos malfeitos, calcular a
colheita de trigo, de vinho, de azeite, de grãos, de frutas e do resto e
comparar as cifras dos anos anteriores com a colheita do ano. " Será que
essa vigilância meticulosa já é a "racionalidade capitalista"? Seja como
for, trata-se de um esforço para levar a produtividade ao máximo. Por seu
lado, o meeiro enche o patrão de pedidos e recriminações, obriga-o a
investir, a fazer reparações, encrenca com ele a todo o momento.
Donatello recusou o podere que lhe foi oferecido e graças ao qual poderia
ter vivido "comodamente". Gesto louco ou sábio? Simplesmente, não queria
ter um contadino atrás dele três dias por semana204.
Nesse sistema, o camponês, que ainda assim goza de certa iniciativa, está
condenado a produzir, a utilizar melhor os solos, a escolher as produções
mais rentáveis, o azeite, o vinho. E foi, diz-se, a competitividade do
podere que lhe assegurou a vitória sobre as antigas formas de cultura. É
possível, mas o sucesso vem também do fato de Florença ter meios para
comprar seu trigo na
Sicília, reservando suas próprias terras para culturas mais
remuneradoras. O trigo siciliano é em parte responsável pelo sucesso
burguês dos poderi.
Quem não concorda que o podere é em certo sentido, como escreve Elio
Conti, "urna obra de arte, uma expressão do mesmo espírito de
racionalidade que, em
Florença, impregnou tantos aspectos da economia, da política e da cultura
na época comunal'32059 OS campos da Toscana, hoje infelizmente em vias de
desaparecimento, foram os mais belos do mundo. Vê-se aí, se não um
triunfo do capitalismo, o que seria um exagero, pelo menos o triunfo do
dinheiro empregado por mercadores atentos ao lucro e capazes de calcular
em termos de investimento e de rendimento. Mas, em face do oste, não há
um camponês despojado dos seus meios de produção: o meeiro não é um
trabalhador assalariado. Mantém relações diretas com uma terra que
conhece, de que cuida admiravelmente e que é transmitida de pai para
filho ao longo dos séculos; é geralmente um camponês abastado, bem
nutrido, que vive numa casa decente, quando não luxuosa, com abundância
de roupa branca e vestuários tecidos e confeccionados em casa. São
abundantes os testemunhos deste equilíbrio bastante raro entre o
proprietário e o lavrador, entre o dinheiro e o trabalho. Mas também não
faltam as notas discordantes, e alguns historiadores italianos afirmaram
mesmo que a parceria agrícola era uma forma vizinha da servidão206. com
efeito, parece que o sistema se deteriorou no decorrer da prinieira
metade do século XVIII em virtude de circunstâncias gerais, do aumento
dos impostos, das especulações com cereais.

253

sagem chíssica dos campos toscanos, vinha, olival e trigo. Segundo o


afresco do "Buon rno- que ornamenta o Palazzo Civico de Siena. (Foto F.
Quilici.)
.A, experiência toscana chama também a atenção para um ponto evidente:
sem[ue há especialização das culturas (azeite e vinho na Toscana, arroz,
prados Ldos e amoreira na Lombardia, uvas passas nas ilhas venezianas e
mesmo, de modo, o trigo de grande exportação), a agricultura tende a
enveredar pela )resa"
capitalista porque se trata obrigatoriamente de colheitas comercializana
dependência de um grande mercado, interno ou externo, e que, mais dia )s
dia, buscarão, exigirão a produtividade. Outro exemplo, idêntico, apesar
iferenças que saltam aos olhos: quando os pecuaristas húngaros se dão
conta, culo XVII, do lucro da exportação de bovinos para o Ocidente
europeu e da rtância desse mercado, renunciam à cultura intensiva de suas
terras e à produe seu próprio trigo. Compram-no207 . Assim, já fizeram
uma opção capitalisssim como os pecuaristas holandeses que se
especializam, um pouco à força, aticínios e na exportação maciça de
queijo.

r. ' q proaução ou o capitansmo em casa alheia


As zonas avançadas são minoritdrias
Há assim zonas avançadas que prefiguram o futuro capitalista. Mas na
Euro~ pa as zonas atrasadas, se assim se pode dizer, ou estagnadas
prevalecem, o número está do seu lado. O mundo camponês, em sua maioria,
mantém-se bastante distante do capitalismo, das suas exigências, da sua
ordem e dos seus progressos. Temos apenas a dificuldade da escolha para
encontrar e situar estas regiões ainda envoltas num passado que as domina
solidamente.
Se formos para o sul da Itália, o espetáculo, em Nápoles, depois da
selvagem repressão de Masaniello, em 1647, e da violenta e prolongada
revolta camponesa que a acompanha, será o de uma implacável
refeudalização208. Ainda nas primeiras décadas do século XVIII, segundo
uma testemunha da época, Paolo Mattia Doria, que não ataca o sistema
feudal mas os abusos que dele se fazem: "O barão tem o poder de
empobrecer e de arruinar um vassalo, de mantê-lo na prisão sem permitir
que o governador ou o juiz da aldeia intervenham; tendo o direito de
perdão, manda assassinar quem quer e agracia o homicida. [ ... 1 Abusa do
seu poder contra os bens e contra a honra dos vassalos. [... 1 É
impossível provar o delito de um barão. O próprio governo [ ... ] é só
indulgência para com o poderoso barão. [... 1 Tais abusos mostram que
certos barões são como soberanos em suas terras. 1209 As estatísticas
confirmam este poderio anormal, uma vez que, ainda no século das Luzes, a
jurisdição feudal no reino de Nápoles se exerce quase por toda a parte
sobre mais da metade da população e, em certas províncias, sobre 70, 8O e
até 88% da população global110.
Na Sicília, inegavelmente, a segunda servidão está ainda em pleno vigor
em

1798, quando é publicada a Nuova descrizione storica e geografica della


Sicilia, de G. M. Galanti. Às vésperas da Revolução francesa, os vice-
reis reformadores (Caracciolo e Caramanico) não conseguiram mais do que
reformas menoreS211. Outra região de servidão ou pseudo-servidão, Aragão,
pelo menos antes do século XVIII, a ponto de os historiadores alemães
falarem a seu respeito de Gutsherrschaft, isto é, do mesmo tipo de
senhorio que, além do Elba, acompanha a segunda servidão. Assim também o
Sul da Espanha, onde a conquista cristã instalou um sistema de grandes
propriedades, continua envolto no passado. Cumpriria também mencionar os
atrasos evidentes da Escócia montanhosa e da Irlanda.
Em suma, é na sua periferia que a Europa ocidental manifesta mais
claramente seus atrasos, se excetuamos a posição aberrante de Aragão
(embora devamos observar que no mundo complexo da península Ibérica
Aragão foi durante séculos um fenÔmeno marginal, periférico). De qualquer
maneira, se imaginássemos um mapa das zonas avançadas - algumas apenas,
bastante reduzidas - e das zonas atrasadas, remetidas para os confins,
faltaria ainda pintar com uma cor especial as zonas estagnadas ou de
evolução lenta, ao mesmo tempo senhoriais e feudais, atrasadas e, no
entanto, dadas certas modificações, em processo de lenta transformação.
No conjunto da Europa, o papel do capitalismo agrário acaba por ser poucO
considerável.

255

A França, por si só, resume bastante bem essas mesclas e contradições do


conto europeu. Tudo o que ocorre em outros lugares também ocorre em geral
na inça, numa ou noutra de suas regiões. Formular uma questão a seu
respeito sigIca formulá-la sobre qualquer outro de seus vizinhos. Assim,
a França do século '111

é atingida pelo capitalismo fundiário, seguramente muito menos do que a


laterra, porém mais do que a Alemanha entre o Reno e o Elba. Nas mesmas
idições, sem tirar nem pôr, que as regiões rurais modernas da Itália, às
vezes Is avançadas do que as suas, está porém menos atrasada do que o
mundo ibérise excetuarmos uma
Catalunha em profunda transformação no século XVIII, )em que o regime
senhorial nela conserve posições fortes"'.
Mas, se a França é exemplar, é sobretudo durante a segunda metade do
século III, pela sua evolução progressiva, pela exacerbação e
transformação dos con)s que nela nascem. É então seguramente o teatro de
um progresso demográfico -to de 2O milhões de franceses sob Luís XIV,
talvez 26 sob Luís XVI)213. E há iramente aumento da renda agrícola. Nada
de mais natural do que o proprietáem geral, e mais especialmente o
proprietário nobre, querer a sua parte. Após Dngos anos de penitência, de
166O a 1730, a nobreza fundiária queria compendepressa, o mais depressa
possível, os jejuns anteriores, esquecer a sua "travesdo deserto" 214.
Daí uma reação senhorial, decerto a mais espetacular que a riça moderna
conheceu. Todos os meios lhe servem: os lícitos, aumentar, duplias
rendas; os ilícitos, recorrer aos velhos títulos de propriedade,
reinterpretar )ontos duvidosos da lei (são iumeráveis), deslocar os
limites, tentar partilhar )ens comunais, multiplicar as rixas a ponto de
o camponês já não ver muito s, na sua fúria, do que esses entraves
"feudais" que se reforçam contra ele. i sempre se aperceberá da evolução,
para ele temível, em que se esteia a ofensi[os proprietários fundiários.
Porque essa reação senhorial, mais do que por um retorno à tradição, é
deterada pelo espírito dos tempos, pelo novo clima, na França, dos jogos
de negó, da especulação bolsista, das aplicações miríficas, da
participação da aristoia no comércio de longa distância e na abertura de
minas, pelo que eu chamaria

3 tentação como espírito capitalista. Porque um verdadeiro capitalismo


fun[o, uma administração moderna à inglesa são ainda raros na França. Mas
chemos lá.
Começou-se a confiar na terra como fonte de lucro e a acreditar nos )dos
modernos de administração. Em 1762, foi editado um livro de sucesso, t de
senrichir promptement par Pagriculture, de Desporruniers; em 1784, L'art
gmenter et de conserver son bien, ou règles généralespour Padministration
d'une de Arnould. Multiplicam-se as vendas e compras de propriedades. A
propriefundiária é atingida pela loucura geral da especulação. Um artigo
recente de hard Weiss (1970)215 analisa essa situação francesa que ele vê
tanto como uma io capitalista quanto uma reação senhorial. A partir do
dominio direto, pela venção continuada dos rendeiros ou dos próprios
senhores, fez-se um esforço nuo para reestruturar a grande propriedade.
Daí agitações, comoções no mundo )onês.
E uma evolução que Weiss avalia por contraste com a situação campoalemã
entre o
Reno e o Elba, nas regiões da Grundherrschaft, isto é, o senho

Um rico rendeiro recebe o proprietdrio. Rétif Monument du costume,


gravura segundo Moreau de Jeune, 1789. Aqui, não há relação senhor-
camponês. A cena poderia ser inglesa. (Foto Bulloz, )
rio no sentido clássico da palavra. Os senhores alemães, com efeito, não
tentaram apoiar-se na reserva ou no dominio próximo para tentar apoderar-
se diretamente da exploração das suas terras. Contentam-se em viver das
rendas do solo e equilibram a existência entrando para o serviço dó
príncipe, do duqueeleitor da Baviera por exemplo. A reserva é então
fragmentada e arrendada aos camponeses que, desde então, não têm as
inquietações nem as contrariedades dos camponeses franceses. Aliás, a
linguagem da Revolução francesa, a denúncia dos privilégios da no

- za não encontrarão na Alemanha o eco que pareceria natural. É de


admirar, Ia vez mais, que um historiador estrangeiro, no caso alemão (a
exemplo dos hisiadores russos tão inovadores de anteontem e de ontem,
como Lutchinsky e
Porchv), tenha vindo tão a propósito revolucionar a historiografia
francesa.
Um artigo recente de Le Roy Ladurie216 (1974) modera, graças a excelentes
mografias - entre as quais a sua -, o ponto de vista de Weiss. Procura
especifi- em que regiões a reação senhorial assume na França novos
aspectos. A existênde rendeiros triunfantes e senhores irrequietos é um
fato que já conhecemos, dmirável livro de Pierre Saint-Jacob prova-o, de
uma vez por todas, no contexda
Alta Borgonha. Recordemos o caso um tanto caricatural por ele citado, o
um certo
Varenne de Lonvoy 217 empenhado em remembrar, em reagrupar suas )
priedades, em expulsar os camponeses, em apoderar-se das terras comunais,
mas ribém em inovar, irrigando suas terras, desenvolvendo pastos
artificiais. Todapara cada senhor expansionista e inovador, há dez ou
vinte senhores tranqüique às vezes vivem, indiferentes, de suas rendas.
Poderemos medir e avaliar a extensão deste avanço capitalista subjacente
a partir reivindicações, agitações e comoções dos camponeses? Sabemos que
tais agitas são praticamente contínuas. Mas no século XVII foram mais
antifiscais do, anti-senhoriais e situaram-se sobretudo no Oeste da
França. No século XVIII, , evoltas tornam-se anti-senhoriais e delineiam
nova zona de contestação: o Norte e o Leste do país, isto é, as grandes
regiões cerealíferas do reino, progressistas i zona da tração a cavalo)"'
e superpovoadas. A Revolução irá demonstrar ainmais claramente que são
esses os campos mais vigorosos. Não poderemos então isar que foi em parte
porque a linguagem anticapitalista não encontrou ainda vocabulário,
perante uma situação nova e surpreendente, que o camponês francês )rreu à
velha linguagem, na qual é craque, do antifeudalismo? É esta linguai, de
fato, e apenas ela, que surge nos livros de reclamações de

1789.
Restaria destrinçar as opiniões um pouco contraditórias, verificar a
oposição iasiado simples entre séculos XVII e XVIII. Ver o que se
esconde, por exemplo, :)rovença sob os movimentos anti-senhoriais que,
uma em cada três vezes, parei ter animado as revoltas dos camporieses119.
Um fato é certo: imensas regiões rança, a Aquitânia, o Maciço central, o
Maciço armoricano, estão tranqüilas
Final do Ancien Régime porque nelas subsistem as liberdades, porque nelas
se itêm as vantagens de uma propriedade camponesa ou porque se conseguiu
a ição à obediência e à mediocridade, como na Bretanha. Evidentemente,
pode; perguntar o que teria acontecido às terras da França se não tivesse
ocorrido volução. Pierre
Chauriu admite que a terra camponesa, quando da reação do po de Luís XVI,
se reduziu a 5007o ou 40% da propriedade francesa220. Prosiindo neste
caminho, teria a França chegado rapidamente a uma evolução a ina,
favorável à constituição generalizada de um capitalismo agrário? Esta
pera é do tipo das que ficarão eternamente sem resposta.

CAPITALISMO E pRÉ-INDúSTRIA
Indústria, a palavra não chega a libertar-se completamente do seu sentido
antigo: trabalho, atividade, habilidade - para adquirir, no século XVIII,
e nem sempre, quase o sentido específico com que a conhecemos, num campo
em que as palavras arte, manufatura, fábrica lhe fazem concorrência
durante muito tempo221. Triunfante no século XIX, a palavra tende a
designar a grande indústria. Portanto, aqui falaremos muitas vezes de
pré-indústria (embora a palavra não nos agrade muito). O que não nos
impedirá de, no meandro da frase, escrever indústria sem muitos remorsos
e falar de atividades industriais em vez de pré-industriais. É impossível
qualquer confusão, uma vez que nos situamos antes das máquinas a vapor,
antes de Newcomen, Watt ou Cugnot, Jouffroy ou
Fulton, antes do século XIX a partir do qual "a grande indústria nos
cercou por todos os lados".
Um modelo quádruplo
Por sorte, nesse campo não teremos de fabricar o modelo das nossas
primeiras explicações. Já há muito tempo, em 1924, Hubert Bourgin222
criou um modelo, tão pouco utilizado que ainda hoje é novidade. Para
Bourgin, qualquer vida industrial, entre os séculos XV e XVIII, entra
forçosamente numa das quatro categorias, que ele distingue a priori.
Primeira categoria: dispostas em "nebulosas", as inúmeras, as minúsculas
oficinas familiares, isto é, um mestre, dois ou três companheiros, um ou
dois aprendizes, ou uma família sozinha. É o caso do pregueiro, do
cuteleiro, do ferreiro da aldeia, tal como ainda há pouco tempo o
conhecíamos, e tal como hoje é na África Negra ou na índia, trabalhando
ao ar livre com os ajudantes. Entram nesta categoria a oficina do
tamanqueiro ou do sapateiro, bem como a oficina do ourives, com seus
instrumentos meticulosos e seus materiais raros, ou a atulhada oficina do
serralheiro, ou o quarto onde trabalha a rendeira, quando não o faz à
porta de casa. Ou então, no Delfinado do século XVIII, nas cidades e fora
das cidades, a --horda de pequenos estabelecimentos de caráter restrito,
familiar ou artesanal": após a ceifa ou a vindima, todos põem mãos à
obra... numa família fia-se, noutra tece-se223. Em cada uma dessas
unidades elementares, "mononucleares", "as tarefas são indiferenciadas e
contínuas", a ponto de muitas vezes a divisão do trabalho ser-lhes
inatingível. Familiares, quase escapam ao mercado, às normas habituais do
lucro.
Incluirei também nesta categoria algumas atividades que costumam ser
qualificadas, por vezes apressadamente, de não setoriais: as do padeiro
que entrega o pão, do moleiro que fabrica a farinha, dos queijeiros, dos
destiladores de aguardente ou de bagaceira, e dos açougueiros que, a
partir de uma matéria "bruta", fabricam de certo modo a carne comestível.
Quantas operações a cargo destes últimos, diz um dOcumento inglês de
1791: " They must not only know how to kill, cut up and dress their meat
to advantage, but how to buy a bullock, sheep or calf, standing. 1, 224

ia familiar de cuteleiro, codex de Balthasar Behem. (Foto Morch


Rortwonrski.,

~ uu U- - cm CUSU aincia
A característica essencial dessa pré-indústria artesanal é sua
importãncia majorítária, a maneira pela qual, igual a si própria, resiste
às novidades capitalistas (enquanto estas, às vezes, cercam um ofício
perfeitamente especializado que, um belo dia, cai como fruta madura nas
mãos de empresários com grandes recursos). Seria necessária toda, uma
investigação para elaborar a longa lista dos ofícios e artesanatos
tradicionais que se manterão ativos muitas vezes até o século XIX, ou
mesmo O século XX. Ainda em 1838, nos campos genoveses, existia o velho
telaio da velluto, o tear para veludo 225. Na França, a indústria
artesanal tanto tempo prioritária só se tornará secundária em relação à
indústria moderna por volta de

1860226.
Segunda categoria: as oficinas dispersas, porém ligadas entre si. Hubert
Bourgin designa-asffibricas disseminadas (expressão bastante feliz,
tirada de G. Volpe).
Eu preferiria manufaturas disseminadas, mas não importa! Em se tratando
da fabricação de tecidos de lã no Mans, no século XVIII, ou, alguns
séculos antes, por volta de 1350, no tempo de Villani, da Arte della lana
florentina (6O mil pessoas num raio de uns cinqüenta quilômetros ao redor
de Florença e dentro da cidade)227 1 encontramos pontos distribuídos por
grandes extensões, mas ligados entre si. O coordenador, o intermediário,
o mestre-de-obras, é o mercador empresário que adianta a matéria-prima,
leva-a da fiação à tecelagem, ao pisoamento, à tinturaria, à tosadura dos
panos, e cuida do acabamento dos produtos, paga os salários e arrecada,
no fim, os lucros do comércio local ou de longa distância.
Esta fábrica disseminada constitui-se a partir da Idade Média, e não só
no têxtil, mas também "desde muito cedo na cutelaria, na pregaria, nas
ferragens que, em certas regiões, Normandia, Champagne, conservaram até
os nossos dias as características das suas origens' 1228. O mesmo se
passa com a indústria metalúrgica da região de Colônia, já no século XV,
de Lyon no século XVI, ou perto de Brescia, desde o Val Camonica, onde
ficam as serralherias, até as lojas de armeiros da cidade 229. Trata-se
sempre de uma sucessão de trabalhos que dependem uns dos outros até o
acabamento do produto fabricado e a operação comercial.
Terceira categoria: a "fábrica aglomerada", constituída tardiamente, em
datas diferentes conforme os ramos de atividade e as regiões. As forjas a
água do século XIV já são fábricas aglomeradas: diversas operações
encontram-se reunidas num mesmo local, Também as cervejarias, os
curtumes, as vidrarias. Enquadramse melhor ainda na categoria as
manufatUraS23% sejam elas do Estado ou privadas, manufaturas de toda
espécie - mas em sua maioria têxteis - que se multiplicam por toda a
Europa, sobretudo na segunda metade do século XVIII. Sua característica é
a concentração da mão-de-obra em construções maiores ou menores, o que
permite a vigilância do trabalho, uma divisão avançada das tarefas, em
suma um aumento da produtividade e uma melhoria da qualidade dos
produtos.
Quarta categoria: as fábricas equipadas com máquinas que dispõem da força
adicional da água corrente e do vapor. No vocabulário de Marx, são apenas
"fábricas". Na verdade, as palavras fúíbrica e manufatura são empregadas
correntemente uma pela outra, no Século XV111231. Mas nada nos impede de
distinguir, para nossa melhor compreensão, as manufaturas das fábricas. A
fábrica mecanizada, diremos para maior clareza, afasta-nos da cronologia
desta obra e nos introduz nas realidades do século XIX, pelos caminhos da
Revolução industrial. Contudo, eu consideraria a mina moderna típica do
século XVI, tal como a vemos na Europa central por meio dos desenhos do
De re metaltica de
Agricola (15 55), um exemplo,

261

Data desconhecida da fundação


Casa de correção
L da extinção

168O 170O 172O 174O 176O 178O .180O 182O 184O 186O 1880

19. MANUFATURAS E FÁBRICAS rincipados de Ansbach e de Bayreuth são


minúsculos territórios, mas muito populosos, da Alemanha 'ftanco5ligados
à Baviera em 1806-1810. O levantamento de quase uma centena de
manufaturas tem valor de sondagem da a dirimir as controvérsias Sombart-
Marx a respeito das manufaturas que não se tornam (segundo o primeirol
tornam (de acordo com o segundo) fcíbricas, isto é, ffibricas modernas.
Umas vinte manufaturas sobrevivem

950, isto é, mais ou menos uma em cada cinco. Como tantas vezes, a
verdade não está nem de um nem de outro Grdfico elaborado por 0. Reuter,
Die Manufaktur im
Frânkischen Raum, 1961, p. 8.

A produção ou o capitalismo em casa alheia e bem importante, da fábrica


mecanizada, ainda que o vapor só devesse ser-lhe introduzido dois séculos
mais tarde e com a parcimônia e a lentidão que conhecemos.
Do mesmo modo, na região cantábrica, "no princípio do século XVI, o uso
da água corno força motriz havia determinado uma verdadeira revolução
industrial""'.
Outros exemplos: os estaleiros navais de Saardam, perto de Amsterdam, no
século
XVII, com suas serras mecânicas, suas gruas, suas maquinas de erguer os
mastros;
e tantas pequenas "usinas" que utilizavam rodas hidráulicas, moinhos de
papel, moinhos de pisão, serrarias; ou as pequenas fábricas de espadas em
Vienrie, no
Delfinado, onde as mós e os foles são mecânicos 233.
Portanto, quatro categorias, quatro tipos mais ou menos sucessivos, se
bem que, "sucedendo-se, as diferentes estruturas não se substituem
bruscamente umas às outras" 234. Sobretudo, não há - por uma vez,
Sombart235 ganha de Marx passagem natural e lógica da manufatura à
fábrica. O quadro que tomo emprestado a 0.
Reuter236 sobre as manufaturas e as fábricas nos principados de Ansbach e
de
Bayreuth, de 168O a 1880, mostra, a partir de um exemplo preciso, que
houve, de umas para as outras, alguns prolongamentos. Mas não uma
seqüência obrigatória e como que natural.
o esquema de H. Bourgin será válido fora da Europa?
Este esquema simplificador estende-se facilmente às sociedades densas do
mundo.
Fora da Europa, encontram-se sobretudo as duas primeiras fases - oficinas
individuais, oficinas interligadas -, continuando as manufaturas a ser
excepcionais.
com seus ferreiros, um pouco feiticeiros, com seus tecelões e seus
ceramistas primitivos, a África Negra situa-se inteiramente na fase A. A
América colonial talvez seja mais desfavorecida nesse plano elementar.
Contudo, onde a sociedade ameríndia se manteve, ainda estão ativos
artesãos, fiandeiras, tecelões, ceramistas, e aqueles operários capazes
de construir igrejas e conventos, obras colossais que os nossos olhos
podem ainda contemplar no México ou no Peru. O ocupante aproveitou-se
mesmo disso para instalar obrajes, oficinas onde uma mãode-obra forçada
trabalha a lã, o algodão, o linho, a seda. Há também, no plano mais
elevado das nossas categorias, as enormes minas de prata, de cobre, de
mercúrio, e em breve, no interior do Brasil, vastas lavras um tanto
largados de garimpeiros negros. Ou ainda, tanto no Brasil como nas ilhas
e zonas tropicais da América hispânica, os engenhos de açúcar que são, em
suma, manufaturas, concentrações de mão-deobra, de força hidráulica ou
animal, com as oficinas de fabricação que produzem o mascavado, os
diversos açúcares, o rum e a tafiá.
Mas sobre essas Américas coloniais pesa o interdito dos monopólios
metropolitanos, tantos impedimentos, tantas interdições! Em suma, as
diversas camadas "industriais" não se desenvolveram harmoniosamente.
Falta, na base, a profusão, a riqueza do artesanato da Europa, com seus
êxitos tantas vezes prestigiosos. É o que diz a seu modo um viajante da
segunda metade do Século
XV11237: "Nas índias só há maus artesãos [e, acrescentaremos, nenhum
engenheiro]
para tudo o que diz respeito à guerra e até para muitas outras coisas.
Por exemplo, não há ninguém que saiba fazer bons instrumentos para
cirurgia. Ignorase totalmente a fabricação dos instrumentos relacionados
com as matemáticas e a navegação." E por certo

263

eu.Nu umeia iitos outros, infinitamente mais usuais: todas as caldeiras


de cobre e de ferro das nas de açúcar e os pregos, para dar apenas estes
exemplos, chegam de alémmar. nontarite da população e, não menos, a
miséria extraordinária dos indígenas são

1 dúvida responsáveis pela ausência, na base, do artesanato exuberante da


EuroAinda por volta de 1820, quando Kotzebue, oficial da marinha a
serviço do r (e filho do poeta assassinado, em 1819, pelo estudante
alemão Karl Sand), chega
Rio, o Brasil, essa mina de ouro e de diamantes para Portugal, surge-lhe
"em nesmo como um país pobre, oprimido, pouco povoado, inacessível a
qualquer

238

iura do espírito" .
Na China, pelo contrário, na índia, pelo contrário, há na base a riqueza
de artesanato numeroso e hábil, urbano ou rural. Por outro lado, a
indústria têxtil
Gujarate ou de Bengala é uma espécie de constelação de "fábricas
dissemina9 e uma via láctea de oficinas minúsculas. E não faltam as
indústrias da terceira, em ambos os lados. Ao norte de Pequim, as minas
de carvão evocam uma já, centração nítida, apesar do controle do Estado e
da insignificância dos capitais stidoS239. O trabalho do algodão na China
é acima de tudo camponês e famimas, já no final do século XVII, as
manufaturas de Songjiang, ao sul de
Xanempregam de modo permanente mais de 20O mil operários, sem contar os
feiroS240. Su-tcheu, capital do Kiang Su, conta de 3 mil a 4 mil teares
que traiam a seda241. É como Lyon, diz um historiador recente, como Tours
"ou, me.ainda, uma espécie de Luca"242. Também "Kin te chun" possui, em
1793, , s mil fornos para cozer a porcelana [... ] todos acesos ao mesmo
tempo. O que a com que, à noite, a cidade parecesse estar toda em
chamas'>243.
O espantoso é que, tanto na China como na índia, esse artesanato
extraordiamente hábil e engenhoso não tenha produzido a qualidade das
ferramentas i que a história nos familiarizou na Europa. Mais ainda na
índia do que na ChiUm viajante que atravessa a índia em 1782 observa: "Os
ofícios dos indianos cem-nos simples porque em geral empregam poucas
máquinas e eles se servem.ias das mãos e de duas ou três ferramentas para
obras nas quais empregamos s de cem.,, 244

Assim, o europeu só pode espantar-se diante do ferreiro chinês

44carrega sempre consigo suas ferramentas, sua forja, seu forno e


trabalha onuer que o queiram empregar. Monta a forja diante da casa de
quem o chama; terra triturada, faz uma mureta junto da qual acende o
fogo; por trás da muficam dois foles de couro que o aprendiz põe para
funcionar apertando altermente um e outro, atiçando assim o fogo; uma
pedra serve-lhe de bigorna, ias únicas ferramentas são uma tenaz, um
martelo, um malho e uma lima' 245. iesmo espanto diante de um tecelão, do
campo, imagino, pois há magníficos

3s chineses: "De manhã, à porta, debaixo de uma árvore, monta o tear que
ionta ao pôr-do-sol. O tear é muito simples; consiste apenas em dois
rolos pous em quatro pedaços de madeira fincados no chão. Dois paus que
atravessam Jidura e são sustentados nas pontas, um por duas cordas
amarradas à árvore lixo da qual está montado o tear, o outro por duas
cordas atadas aos pés do ário [... 1 dãolhe a possibilidade de afastar os
fios da urdidura para passar nela, ma. 1 245 É o tear horizontal
rudimentar usado ainda hoje por certos nômades orte da África para fazer
seus tapetes de tenda.
Por que essas ferramentas imperfeitas que só trabalham à custa do esforço
dos ens? Será por estes serem, na India e na China, demasiado numerosos,
misera- vis? Porque há correlação entre ferramenta e mão-de-obra. Os
operários per

q proaução ou o uupítuii3mu em (, uNu UirtUIU ceberão isso quando as


máquinas chegarem, mas, muito antes das manias --luddistas" do princípio
do século XIX, os responsáveis e os intelectuais já haviam tomado
consciência do fato. Informado sobre a invenção de uma mirabolante serra
mecânica, Guy Patin aconselhou o inventor a não deixar que os operários o
conhecessem, se tivesse amor à vida 246. Montesquieu deplorava a
construção de moinhos: para ele, todas as máquinas reduzem o número dos
homens e são "perniciosas'1247. E a mesma idéia, mas invertida, que Marc
Bloch 248 assinala numa passagem curiosa da Encyclopédie: "Onde quer que
a mão-de-obra seja cara, é preciso supri-Ia por máquinas; é o único meio
de se alcançar o mesmo nível daqueles para quem ela custa pouco. Faz
muito tempo que os ingleses estão ensinando isso à Europa.-- Afinal, esta
observação não surpreenderá ninguém. O que surpreende muito mais, um
século antes, sem satisfazer a nossa curiosidade, é uma notícia
sumariamente transcrita em duas cartas de um cÔnsul genovês em
Londres, em agosto de 1675: lo mil operários da seda sublevam-se na
capital contra a introdução de teares franceses para fabricar fitas que
permitiam a uma pessoa sozinha tecer 1O ou 12 ao mesmo tempo; os teares
novos são queimados e teria acontecido o pior se não fosse a intervenção
dos soldados e das patrulhas da guarda burguesa 249.
Não há divórcio entre agricultura e pré-indústria
O modelo de Hubert Bourgin enfatiza a técnica; daí sua simplificação.
Daí, também, seu inacabamento. É preciso complicá-lo muito.
Há uma primeira observação óbvia: a pré-indústria, apesar de sua
originalidade, não é um setor com fronteiras nítidas. Antes do século
XVIII, ainda não está bem separada da vida agrícola onipresente que a
acompanha e por vezes a submerge.
Existe mesmo uma indústria camponesa rasteira, no domínio restrito do
valor de uso, que trabalha apenas para a família ou para a aldeia. Quando
criança, vi com meus próprios olhos a aplicação de aros nas rodas de
carroça, numa aldeia do
Mosa: o aro de ferro dilatado ao fogo era passado, ainda rubro, em torno
da roda de madeira que imediatamente se inflamava; tudo era mergulhado na
água, onde o ferro resfriava, apertando-se na madeira. A operação
mobilizava toda a aldeia.
Mas seria infindável a enumeração de tudo o que outrora se fabricava nos
lares camponeses. Até entre os ricoS25% mas sobretudo entre os pobres,
que confeccionam para uso próprio lençóis, camisas de pano grosseiro,
móveis, arreios de fibra vegetal, cordas de casca de tília, cestos de
vime, cabos de ferramentas e rabiças de arado. Nos países pouco evoluídos
do Leste europeu, como a Ucrânia ocidental ou a Lituânia, essa autonomia
é ainda mais acentuada do que no oeste da Europa 251. No Ocidente, com
efeito, sobrepõe-se à indústria de uso familiar uma indústria igualmente
rural, mas, esta, destinada ao mercado.
Esse artesanato é bem conhecido. Em toda a Europa, nas vilas, nas
aldeias, nos sítios, chegado o inverno, uma imensa atividade "industrial"
substitui a atividade agrícola. Até em lugarejos muito afastados: em
1723, umas trinta aldeias do Bocage normando "de difícil acesso" e, em
1727, aldeias de Saintonge apresentarani no mercado produtos não
conformes com as normas dos ofícios

252. Dever-seà castigar? Os inspetores das manufaturas pensam que seria


melhor ir ao local e explicar "os regulamentos relativos às manufaturas"
a pessoas que certamente os

265

noram, em seus rincões perdidos. Ao redor de Osnabrück, em 1780, a


indústria )
linho consiste no camponês, na mulher, nos filhos, nos empregados. Pouco
im)rta o rendimento desse trabalho complementar! É inverno: "O criado tem
de r sustentado, quer trabalhe, quer não.1, 253 Então, é melhor que
trabalhe! O rito das estações, o --calendário", como diz Giuseppe
Palomba, regula todas as atiJades. No século XVI, até os mineiros das
minas de carvão de Liège abandonam fundo das galerias todos os anos no
mês de agosto para irem às ceifaS254.
Seja [al for o ofício, a regra quase não tem exceções. Uma carta
comercial datada de orença, de 1? de junho de 1601, diz, por exemplo: "A
venda das lãs arrefeceu, bem que não Seja de admirar: trabalha-se pouco
porque faltam operários, foram dos para o campo." 255 Em Lodève, tal como
em Beauvais ou em
Antuerpia, em alquer cidade industriosa, chegado o verão, os trabalhos do
campo ditam as reis. com o retorno do inverno, o trabalho artesanal volta
a ser rei, mesmo à luz velas, apesar do temor dos incêndios.
Claro que podemos assinalar exemplos inversos, ou pelo menos diferentes.
Um, balho operário ininterrupto tenta entrar em cena. Assim, em Rouen, em
1723, s operários do campo [que outrora] largavam seus ofícios para fazer
a colheita ]
deixaram de fazê-lo porque agora tiram mais lucros continuando a fabricar
idos de lã e de outros tipos". Resultado: o trigo ameaça germinar "nos
campos escassez de operários que o colham". O Parlamento propõe-se
proibir o trabadas manufaturas "durante o tempo da colheita dos trigos e
outros grãos' 12561

ibalho contínuo, trabalho descontínuo? Não esqueçamos que Vauban, em seus


culos, atribui ao artesão 12O dias úteis por ano; os feriados - que são
numero- e as ocupações sazonais absorvem o resto do ano.
A separação faz-se, portanto, mal e tardiamente. E Goudar 211 decerto
está ero em falar de um divórcio geográfico entre a indústria e a
agricultura. Do mesmodo, não acredito muito na realidade dessa linha que
"de Laval a Roucn, nbrai e Fourmies" separaria, segundo Roger Dion 258,
duas Franças, uma ao., te, por excelência a dos ofícios tradicionais, a
outra ao Sul, a da vinha. O
Landoc, coalhado de vinhedos, não contava, segundo o intendente de
BasVille259

mil operários têxteis em 1680? E numa zona vinícola como era a généralité
de.ans, o recenseamento de 1698 enumera 21.84O vinicultores proprietários
e.171

artesãos espalhados pelos burgos e aldeias". É verdade, em contrapartida,


não é nas famílias de vinhateiros, em que a regra é a abastança, que o
trabalho iiciliar encontra mais braços. Por exemplo, na zona de Arbois,
terra de vinho, dústria têxtil não conseguiu estabelecer-se por falta de
mão-de-obra 260. Em
Leya atividade têxtil, tão vigorosa no século XVII, não consegue
encontrar apoio m nos campos próximos, que são muito ricos. Quando, no
século XVIII, tiver ssidade absoluta desse apoio, terá de dirigir-se a
zonas rurais pobres e afastaO curioso é que essas zonas se tornaram os
grandes centros têxteis modernos
Iolanda261.
A indústria só pode ser explicada por uma multiplicidade de fatores e de
invos.
Luca, a cidade das sedas, tornou-se no século XIII "por falta de territó

Tintureiros em Veneza, século XVII. (Museu Correr, Coleção Viollet.)


rio [ao redor dela e pertencente a ela]... a tal ponto industriosa que é
proverbialmente chamada de República das formigas", pretende Ortensio
Landi num dos seus Paradossi (1543)262. Na Inglaterra, na costa de
Norfolk, instala-se inopinadamente, no século XVI, uma indústria de meias
tricotadas coloridas. Não é por acaso. Essa costa é uma sucessão de
pequenos portos de pesca, com cais repletos de redes. Os homens, quando
não vão até a Islândia, perseguem no mar do
Norte os arenques, as cavalas, as petingas. Uma numerosa mão-de-obra
feminina, empregada para salgar o peixe nas Salthouses, encontra-se
desocupada fora das estações de pesca. Foi essa mão-de-obra
semidesempregada que atraiu os comerciantes empreendedores, sendo
implantada uma nova indústria263.
Assim, é a pobreza que muitas vezes conduz a pré-indústria pela mão.
Colbert, diz-se, pÔs para trabalhar uma França que se imagina rebelde,
indisciplinada, quando a conjuntura desencoraj adora, o peso fiscal
teriam bastado para lançar o reino na atividade industrial. Embora ela
seja em geral modesta, não é "como que uma segunda providência", uma
saída? Savary des Bruslons (1760), comumente

encioso, afirma: --Sempre vimos os prodígios da indústria [repare-se na


palausada sem hesitações] despontar do ventre da necessidade." A última
palavra portante. Na Rússia, as terras ruins cabem ao campesinato "negro"
- os cam-ses livres que chegam a importar trigo para sobreviver. Ora, foi
entre eles que

1264

- senvolveu principalmente a indústria artesana . Da mesma forma, os


moneses das cercanias do lago Constança, no Jura suábio ou nas montanhas
da ia, trabalham o linho desde o século XV para suprir a pobreza das suas
ter3. E, nos HighIands, os camponeses ingleses, que não viveriam de suas
parcas iras, safam-se tornando-se, uns, mineiros, outros, tecelõeS266. Os
mercados dos os para onde os aldeões do Norte e do Oeste da Inglaterra
levam suas peças cido tecidas em casa, ainda besuntadas de óleo e de
suarda, fornecem boa parprodução reunida pelos mercadores londrinos que
se encarregam de preparántes de as vender no mercado dos tecidoS267.
D artesanato, quanto menos ligado à terra, mais citadino é e menos
enraizado )stra. Acima da mão-de-obra campesina, que também tem sua
mobilidade (soido em regiões pobres), o artesanato stricto sensu é a mais
móvel das PopulaIsso se deve à própria natureza da produção pré-
industrial que passa sempre ubidas bruscas e descidas na vertical. As
curvas em parábola reproduzidas na a 303 dão uma idéia disso. Há uma hora
para a prosperidade: depois, tudo )s trilhos. Um esboço das imigrações
artesanais que pouco a pouco criaram -indústria inglesa o provaria de
maneira admirável. Sempre mal pagos, os ars, a quem o alimento obriga a
passar pelas forcas caudinas do mercado, são eis a qualquer movimento dos
salários, a qualquer decréscimo da procura. ) nada corre segundo seus
desejos, são perpétuos migrantes, "um corpo am, te e precário que se pode
transplantar ao menor acontecimento '268. Haverá 'transmigração dos
operários para os países estrangeiros" se as manufaturas m falência,
escreve-se de
Marselha em 1715 269. A fragilidade da indústria, exMirabeau27% o "Amigo
dos
Homens", é que "todas as suas raízes estão pre)s dedos dos operários
sempre prontos a emigrar para ir atrás da abundância continuando a ser
"homens precários". "Poderemos responder pela consdos nossos artistas
[artesãos], como pela imobilidade dos nossos camPOS9" mente que não,
responde Dupont de NernourS271, e Forbonnais vai mais M: "As artes são
ambulatórias, não há dúvida alguma."
ão-no por tradição (as associações de companheiros); são-no por
necessidada vez que suas míseras condições de vida se agravam de modo
insuportável. assim dizer, só vivem o dia-a-dia", diz no seu Didrio
(1658) um burguês de que não gosta muito deles. Cinco anos mais tarde,
passando por tempos diconstata: --O povo [... 1 vende o seu trabalho, mas
a preço assaz modesto, do que só os mais experientes subsistem"; os
outros encontram-se nos asilos ndigando e "vagabundeando" pelas ruas. No
ano seguinte, em 1664, os opeabandonam o seu ofício, "tornam-se
trabalhadores braçais ou regressam às ;19273. Londres parece um pouco
mais favorecida. Uma gazeta francesa274

de 2 de janeiro de 1730, ao noticiar que o pão baixara dois "soldos"


(cerca de

907o), acrescenta: "Assim os operários agora têm condições de viver de


seus salários." Por volta de 1773, segundo o relatório de um inspetor das
manufaturas, muitos tecelões do Languedoc, "sem pão e sem recursos para o
obterem" (há desemprego), são forçados a "expatriar-se para viver'1275.
Se ocorre um acidente, um choque, o movimento se precipita. Como a partir
da
França, logo após a revogação do edito de Nantes (1685); como na Nova
Espanha, em 1749, e, mais ainda, em 1785-1786, quando rebenta a fome nas
minas do Norte, com a interrupção das remessas de milho. Há uma corrida
para o Sul e para o
México, a cidade de todas as baixezas, "lupanar de infâmias y
disoluciones, cueva de pícaros, inflerno de caballeros, purgatorio de
hombres de bien..." Uma testemunha de boa fé propõe, em 1786, murar as
entradas da cidade para defendêla desta nova turba 276.
Em contrapartida, toda indústria que quer desenvolver-se consegue aliciar
em outras cidades, mesmo estrangeiras e distantes, os operários
especializados de que necessita. E ninguém deixa de proceder assim. Já no
século XIV as cidades flamengas tentam opÔr-se a política do rei da
Inglaterra que atrai seus companheiros tecelões prometendo-lhes "boa
cerveja, boa carne, boa cama e ainda melhores companheiras, pois as moças
inglesas são famosas pela formosura"

277. No século XVI, ainda no século XVII, os deslocamentos da mão-de-obra


correspondiam muitas vezes a abandonos, a completos desregramentos da
divisão internacional do trabalho. Daí, por vezes, uma política feroz
para impedir a emigração dos operários, para detê-los nas fronteiras ou
nos caminhos e trazêlos de volta à força. Ou, nas cidades estrangeiras,
negociar seu regresso ao país.
Em 1757, na França, esta política finalmente prescreveu. De Paris chega
às autoridades de Lyon, do Delfinado, do Roussillon e do Bourbormais a
ordem para sustar qualquer perseguição contra os operários fugitivos:
seria desperdiçar dinheiro público 278. De fato, os tempos mudaram. No
século XVIII, há generalização, ubiqüidade da atividade industrial,
multiplicidade das ligações.
Manufaturas por toda a parte; indústrias rurais por toda a parte. Não há
uma cidade, uma vila, um burgo (sobretudo), uma aldeia que não possua
teares, forjas, olarias, serrarias. A política dos Estados,
contrariamente ao que sugere a palavra mercantilismo, é a
industrialização, que se desenvolve sozinha, já exibe seus danos sociais.
Esboçamse enormes concentrações de operários: 3O mil pessoas nas minas de
carvão de Newcastle279 ; 45O mil empregadas pela tecelagem no Languedoc
já em 1680, como vimos; 1.500.00O operários têxteis, em 1795, nas cinco
províncias do Hainaut, de Flandres, de Artois, de Cambrésis, da Picardia,
segundo Paires, um representante so do povo em missão. Uma indústria e um
comércio colossais'.
com a ascensão econômica do século XVIII, a atividade industrial
generaliza-se.
Localizada no século XVI, quanto ao essencial, nos Países Baixos e na
Itália, desenvolveu-se em toda a Europa até os Urais. Daí tantos ímpetos
e arrancadas rápidas, inumeráveis projetos, invenções que nem sempre são
invenções e a nuvem já espessa dos negócios escusos.

Os às cidades e das w campos


Considerados globalmente, os deslocamentos dos artesãos não são
fortuitos: nalam fenÔmenos de grande amplitude. Quando a indústria da
seda, por exempassa quase de uma só vez, no século XVII, do Mezzogiorno
para o Norte tália; quando a grande atividade industrial (e além disso
mercantil) se afasta, o fim do século
XVI, das regiões mediterrâneas para encontrar suas terras de ão na
França, na
Holanda, na Inglaterra e na Alemanha - todas as vezes in, m um movimento
de gangorra, prenhe de conseqüências.
Mas há outras inversões bastante regulares. O estudo de J. A. Van Houtte'
ria a atenção para o vaivém da indústria entre cidades, burgos e campos,
nos -s Baixos da Idade Média ao século XVIII, e mesmo até meados do
século XIX. riício desses dez ou doze séculos de história, a indústria é
espalhada pelos camDaí a impressão de se tratar de algo original,
espontâneo, ao mesmo tempo imvel de desenraizar. Todavia, nos séculos
XIII e XIV, a pré-indústria emigra larmte para as cidades. A essa fase
urbana seguir-se-á um poderoso refluxo, logo a longa depressão de 135O a
1450: então o campo é de novo invadido pelos teaanto mais que o trabalho
urbano, preso no espartilho corporativo, se tornou

1 de manejar e sobretudo caro demais. A recuperação industrial da cidade


se iria em parte no século XVI, depois o campo se desforraria no século
XVII, recomeçar a perder parcialmente no século XVIII.
ste resumo simplificado diz o essencial, ou seja, a existência de um
teclado, campos e cidades, por toda a Europa e talvez por todo o mundo.
Assim -oduziu na economia de ontem uma alternativa, portanto uma certa
flexibiliuma possibilidade de manobra aberta aos mercadores
empreendedores e ao o. Terá J. A. Van Houtte razão ao afirmar que o
sistema fiscal do príncipe, rme incide apenas sobre a cidade ou atinge
também o campo, contribui para liferentes regimes e alternâncias de
progresso e de retração? Só um estudo so tiraria o assunto a limpo. Mas
um fato é indiscutível: preços e salários penham o seu papel.
ão será um processo análogo que, no fim do século XVI e princípio do
sécu11, suprime a indústria urbana da Itália e a faz pender para as
cidades de [a ordem, as vilas, os burgos e as aldeias? O drama industrial
da Itália, entre

1630, é um drama de concorrência com os preços baixos da indústria nórdis


soluções se lhe oferecem, explica, em linhas gerais, Domenico Sella a

282

ito de Veneza, onde os salários se tornaram proibitivos: o recuo para os


camespecialização em produtos luxuosos, o recurso às máquinas de motor
hio para suprir a insuficiência de mão-de-obra. Na situação de urgência,
torês foram utilizadas. O mal foi que a primeira, o retorno como que
natural anato rural, não teve, nem podia ter, pleno sucesso: o campo
veneziano, !ito, precisa de todos os seus braços: consagram-se, no século
XVII, a novas ;, a amoreira, o milho, e a agricultura torna-se
particularmente compensa, s exportações venezianas de arroz para os
Bálcãs e para a Holanda aumenularmente. As da seda crua e fiada
quadruplicam de 160O a 1800283. A seolução, o luxo, e a terceira, a
mecanização, desenvolvem-se em virtude da de mão-de-obra. Quanto à
mecanização1

Carlo Poni284 apresentou recenobservações úteis. A Itália do século XVII


surgenos assim, uma vez mais, ienos inerte do que costumam afirmar as
histórias gerais.

Indústria do branqueamento de tecidos nos campos de Haarlem, século XVII.


Até a utilização do cloro, as peças de tecido eram submetidas a uma
sucessão de banhos (de soro de leite), lavagens (com sabão negro) e
secagens no prado. (Copyright,
Rijksmuseum Amsterdam.)
A indústria espanhola, florescente ainda em meados do século XVI e tão
deteriorada quando o século chega ao fim, não caiu numa armadilha
semelhante? O patamar camponês não pôde servir-lhe de zona de recuo,
quando, por volta de

1558, a indústria artesanal transbordava das cidades sobre os campos. É


isso que, por contraste, esclarece a robustez da posição inglesa, onde o
plano rural é tão sólido e desde cedo ligado pela lã à importante
indústria têxtil.
Houve indústrias-piloto?
Neste ponto de nossas explicações, começamos a perceber os contornos
imprecisos e complicados da pré-indústria. Levanta-se naturalmente uma
questão, embaraçosa, talvez prematura, que o mundo atual insidiosamente
sugere: houve ou não, sob o A ncien Régime, indústrias-piloto?
Atualmente, e talvez no passado, tais indústrias são aquelas que atraem
para si os capitais, os lucros e a mão-deobra, aquelas cujos ímpetos
podem, em princípio, repercutir nos setores vizinhos, impulsioná-los -
podem, apenas. com efeito, falta coerência à economia antiga, é mesmo
muitas vezes desarticulada, como nos países subdesenvolvidos de hoje. Por
conseguinte, o que se passa num setor não lhe transpõe forçosamente os
limites. De modo que, à primeira vista, o universo pré-industrial não
teve, não pôde ter, o relevo acidentado da indústria de hoje, com seus
desníveis e seus setores de ponta.

Mais ainda, considerada em seu todo, essa pré-indústria, por maior


importânrelativa que tenha, não faz pender para si toda a economia. Até a
Revolução lustrial, com efeito, longe de dominar o crescimento, é antes o
movimento incerdo crescimento, o andamento conjunto da economia que, com
suas panes e seus avancos, domina a pré-indústria e lhe confere seu andar
hesitante e suas curvas copadas. É todo, ou quase todo, o problema do
valor matricial da produção
- está em questão. Iremos compreendê-lo melhor se destacarmos as
indústrias c)minantes" autênticas antes do século XIX, situadas
sobretudo, como foi assiado milhares de vezes, no setor variado e vasto
dos têxteis.
Tal localização torna-se hoje surpreendente. Mas as sociedades do passado
vazaram o tecido, a roupa, o vestuário de gala. Também o interior das
casas requer dos, as cortinas, o revestimento de paredes, as tapeçarias,
os armários cheios de -óis e tecidos finos. A vaidade social intervém
plenamente aqui e a moda é soberaNicholas Barbon congratula-se (1690): "A
moda, a alteração do traje, é um grande motor do comércio, porque leva a
gastar em roupas novas antes que as antigas j am gastas: é a alma e a
vida do comércio; [... 1 conserva o movimento do grande )o comercial; é
uma invenção que faz com que um homem se vista como se vivesn perpétua
primavera: nunca vê o outono de seu vestuário. 9

285 Viva pois o teci[ue incorpora em si tal quantidade de trabalho e que


tem mesmo, para o mercaa vantagem de viajar facilmente, sendo leve
relativamente ao seu valor!
Mas chegaremos a dizer, como Georges Marçais (1930), que o tecido foi oui
o equivalente do aço, guardadas as devidas proporções, opinião que
William p endossa (1975)2869 A diferença é que o têxtil, naquilo que tem
de industrial, da majoritariamente uma produção de luxo. Mesmo quando de
qualidade mea, continua a ser um artigo caro que os pobres preferem
muitas vezes fabricar )róprios, que, em todo caso, compram com parcimônia
e não renovam seguins conselhos de Nicholas
Barbon. Só com a indústria inglesa e, mais especiale, com os
algodãozinhos do fim do século XVIII é que a clientela popular é rnente
conquistada. Ora, uma indústria verdadeiramente dominante implica ampla
procura. É pois com prudência que devemos ler a história dos têxteis.
icessivas dinastias que ela apresenta não correspondem, aliás, apenas a
muis da moda, mas também a sucessivas modificações e recentragens da
produo topo das trocas. Tudo se passa como se algumas concorrentes
disputassem mamente entre si a supremacia do têxtil.

4o século XIII, a lã é simultaneamente os Países Baixos e a Itália'81; no


sécuuinte, é sobretudo a Itália: "O Renascimento italiano? Mas é a lã!",
exclaGino Barbieri num simpósio recente. A seguir, a seda torna-se quase
preponte e a Itália deve-lhe os últimos tempos de prosperidade
industrial, no século Mas o precioso têxtil em breve alcança o Norte, os
Cantões suíços (Zurique), nanha (Colônia), a Holanda depois da revogação
do edito de Nantes, a
In.-a e sobretudo Lyon, que inicia então uma carreira prosseguida até os
nossos :)mo grande centro da seda. Mas, no século XVII, nova mudança, e
as lãs inglesa fazem uma entrada triunfante, a expensas da seda, por
volta de 1660, lo os armarinheiros franceseS288, e a voga se estenderá
até o Egito181. Por Iltimo combatente e novo vencedor, o algodão. Há
muito que está na a290. Mas, impelido pelos algodões indianos cujas
técnicas de impressão e de, ria, inéditas na
Europa, suscitam grande entusiasmo291, ei-lo em breve na

- 1 ptuuuç;uu U" " .111 1.-primeira fila 292. Irá a índia inundar a
Europa com seus tecidos? O intruso derruba todas as barreiras. A Europa
tem então de começar a imitar a índia, a tecer, a estampar o algodão. Na
França, a partir de l759293 o caminho fica inteiramente aberto para a
fabricação de tecidos de algodão. As chegadas de matéria-prima a Marselha
serão de 115.00O quintais em 1788, ou seja, dez vezes mais do que em

1700294.
É verdade que, durante a segunda metade do século XVIII, a grande
atividade geral da economia acarreta um grande aumento da produção em
todos os ramos do setor têxtil. Uma febre de novidade e de engenhosidade
técnica invade então as velhas manufaturas. Todos os dias nascem novos
processos, novos tecidos. Só na
França, zona imensa de oficinas, surgem "mignonettes, grisettes,
férandines e burats que são fabricados em Toulouse, em Mimes, em Castres
e em outras cidades e lugares" do Languedoc 295; chegam as
"espagnolettes" apreendidas na Champagne por não obedecerem às normas de
comprimento e largura e que parecem vir de
ChâlonS296; e as étamines de lã, moda nova, fabricadas no Mans, com
urdidura branca e trama castanha297; eis a "gaze soufflée", uma seda
muito leve e estampada por uma prensagem que faz aderir, graças a um
mordente, uma "poeira feita de linho triturado e amido" (grave problema:
deverá pagar direitos como tecido de linho ou como tecido de seda, já que
esta constitui um sexto do seu peso?)298 ; em Caen, uma mescla de linho e
algodão chamada "grenade" e que obteve muita saída na Holanda299 e a
"sarja de Roma" fabricada em ArnienS300, e o burel da Normandia301, etc.
Tal profusão de nomes tem no entanto significado.
E não menos significativa é a multiplicidade dos inventos, em Lyon, entre
os fabricantes de seda, ou as novas máquinas que surgem uma após a outra
na
Inglaterra. Compreende-se que Johann Beckmann302 um dos primeiros
historiadores da tecnologia, se regozige ao ler, na pena de D'Alembert:
"De todos os gêneros que há, acaso se imaginou coisa que revele mais
sutileza do que adamascar o veludo?"
Isso não impede que a primazia do têxtil na vida pré-industrial tenha, a
nossos olhos, algo de paradoxal. É o primado "retrógrado" de uma
atividade "iniciada na mais profunda Idade Média' 303. E, no entanto, as
provas estão à nossa frente.
A julgar por seu volume, por seu movimento, o setor dos têxteis sustém a
comparaÇão com a indústria carbonífera, que no entanto é moderna, ou,
melhor ainda, com as forjas da França para as quais os resultados da
averiguação de

1772 e os do inquérito de 1788 mostram até recU0304. Finalmente, o


argumento decisivo em que não é necessário insistir: primum mobile ou
não, o algodão foi muito importante na preparação da Revolução industrial
inglesa.
Mercadores e corpos de ofício
Reinserimos as atividades industriais nos seus diversos contextos. Resta
determinar o lugar ocupado pelo capitalismo, o que não é simples. O
capitalismo é, antes de tudo, o dos mercadores urbanos. Mas esses
mercadores, negociantes ou empresários, foram, de início, introduzidos na
ordem corporativa criada pelas cidades a fim de organizar no seu seio
toda a vida artesanal. Mercadores e artesãos foram apanhados nas malhas
de uma mesma rede de que nunca se libertaram por completo. Daí as
ambigüidades e os conflitos.

ficio ficam ricos; os outros, a maioria, continuam modestos. Em Florença,


nguemse abertamente: são as Arti Maggiori e as Arti Minori - já il popolo
so e ilpopolo magro. Por toda a parte se acentuam diferenças, desníveis.
As maggiori passam progressivamente para as mãos dos grandes mercadores,
pois tema das Arti ja não passa então de um meio de dominar o mercado de
trabaA organização que ele dissimula é o sistema a que os historiadores
chamam agssystem. Começou uma nova era.
Foi em toda a Europa que se instalou o VerlagSSystem ou Verlagswesen,
ex;ões equivalentes que a historiografia alemã criou e impôs, sem querer,
a todos storiadores. Em inglês, diz-se o putting out system, em francês o
travail à dore ou àfaçon. A melhor equivalência seria sem dúvida a
proposta recentemente
Wichael Keul: travail en commandite, mas a palavra comandita designa
tamuma forma de sociedade comercial. Prestar-se-ia a confusões.
O Verjagssystem é uma organização da produção em que é o mercador, o
Verquem dá o trabalho, adianta ao artesão a matéria-prima e parte do
salário, o restante pago mediante entrega do produto acabado. Tal regime
surge muito bem mais cedo do que se costuma dizer, seguramente logo após
a expansão culo XIII. Como interpretar de outro modo uma decisão do
preboste dos merres de
Paris, em junho de 1275111, "que proíbe às fiandeiras de seda empe-m a
seda que os armarinheiros lhes dão para trabalhar, a venderem ou a tron
sob pena de banimento"? À medida que o tempo vai passando, multiplise os
textos significativos; com o impulso da modernidade, o sistema se
difun.itre mil exemplos só temos a dificuldade da escolha. Em Luca, em 31
de janei1400, constitui-se uma sociedade entre Paolo Balbani e Pietro
Gentili, ambos adores de seda. O contrato de sociedade especifica que "il
trafficho loro será r maggiore parte in fare lavorare draperie di seta",
que sua atividade consisti;encialmente em mandar fabricar tecidos de
seda311. "Fare lavorare", textuale "fazer trabalhar", compete aos
empresários - quifaciunt laborare, como expressão latina, também ela
corrente. Os contratos firmados com os tecelões m geral registrados em
cartório e suas disposições são variáveis. Por vezes, m contestações
posteriores: em 1582, um empregador genovês quer que um eiro de seda
reconheça ser seu devedor e solicita uma testemunha, a qual deestar ao
corrente por ter sido companheiro de Agostino Costa e ter visto, na
teste, do empregador, o mercador Battista Montorio, "quale il portava
sete ianifaturar et prendeva delle manifatturrate", que lhe levava sedas
para maurar e as apanhava manufaturadaS312. A imagem é o mais clara
possível. orio é um Verleger. Assim também, na pequena cidade de Puy-en-
Velay, em o mercador manda fazer rendas a domicílio: fornece às operárias
fio da HoCípor peso e apanha o mesmo peso de renda"313. Em Uzès, por
volta da mesoca, 25 fabricantes põem para funcionar, na cidade e aldeias
vizinhas, 6O teaie tecem sariaS314. Diego de Colmenares, o historiador de
Segóvia, já falava ; "fabricantes de tecidos" do tempo de Filipe

11 a quem impropriamente charn mercadores, verdadeiros pais de família,


pois tanto em casa como fora da

A produção ou o capitalismo em casa alheia vam de comer a grande número


de pessoas [muitos deles a 20O pessoas, outros a

3001, fabricando assim mediante mãos alheias toda a espécie de tecidos


rnagnífiCOS315. Outros exemplos de Verleger, os mercadores de cutelaria
de
Solingen, curiosamente chamados Fertigmacher (acabadores), ou os
mercadores chapeleiros de LondreS316.
Nesse sistema de trabalho por peça, o mestre dos corpos e ofícios torna-
se muitas vezes, por sua vez, um assalariado. Depende do mercador que lhe
fornece a matéria-prima, em geral importada de longe, que depois
assegurará a venda, para exportação, dos fustões, dos tecidos de lã ou de
seda. Assim, todos os setores da vida artesanal podem ser atingidos e o
sistema corporativo então se destrói, embora mantendo as mesmas
aparências. O mercador, ao impor seus serviços, subordina a si as
atividades de sua escolha, tanto para o trabalho do ferro como para o dos
têxteis ou da construção naval.
Em Veneza, no século XV, nos estaleiros privados da construção naval
(isto é, fora do enorme arsenal da Signoria), os mestres da Arte dei
Carpentieri e da
Arte dei Calafati vêm trabalhar com seus ajudantes (um ou dois fanti para
cada um) a serviço de mercadores armadores, co-proprietários do barco em
construção.
E ei-los na pele de simples assalariados317. Em Brescia, por volta de
1600, os negócios vão mal. Como reanimar a fabricação de armas? Chamando
à cidade um certo número de mercanti, mercadores que pusessem mestres e
artesãos para trabalhar318. Uma vez mais, o capitalismo aloja-se em casa
alheia. Também acontece de o mercador tratar com um corpo de ofício
inteiro, como para os tecidos da Boémia e da Silésia: é o sistema chamado
Zunftkauf319.
Toda essa evolução encontrou certas cumplicidades no interior dos corpos
de ofício urbanos. O mais das vezes, chocou-se com sua oposição feroz.
Mas o sistema tem o terreno livre nos campos, e o mercador não se priva
dessa vantagem. intermediário entre o produtor de materia-prima e o
artesão, entre o artesão e o comprador do produto acabado, entre o perto
e o longe, ele é também o intermediário entre a cidade e o campo. Para
lutar contra a má vontade ou contra os altos salários das cidades, pode,
se necessário, recorrer largamente às indústrias rurais. A tecelagem
florentina é atividade conjugada dos campos e da cidade. Do mesmo modo,
está dispersa pelas cercanias de Mans (14 mil habitantes no século XVIII)
toda uma indústria de étamines, tecidos leves de lUX0320. Ou, nos
arredores de Vire, a indústria do papel321.
Em junho de 1775, no Erzgebirge, de Freiberg a Augustusberg, um viajante
atento atravessa a longa sucessão de aldeias onde se fia o algodão e onde
se fabricam as rendas pretas, brancas ou "louras", conjugando os fios de
linho, de ouro e de seda. É verão: todas as mulheres estão do lado de
fora, na soleira das casas, à sombra de uma tília, um círculo de jovens
rodeia um velho granadeiro. E todos, inclusive o velho soldado, estão
aferrados ao trabalho. É preciso viver: a rendeira só suspende o
movimento dos dedos para comer um pedaço de pão ou uma batata cozida,
temperada com um pouco de sal. No fim da semana, levará a obra ou à feira
vizinha (o que é excepcional) ou ao Spitzenherr (traduza-se por senhor da
renda) que lhe adiantou a matéria-prima, forneceu os desenhos, vindos da
Holanda ou da França, e reservou antecipadamente para si a produção.
Então ela comprará azeite, um pouco de carne, arroz para o festim
dorninical322.
O trabalho a domicílio redunda assim em redes de oficinas corporativas ou
familiares, ligadas entre si pela organização mercantil que as anima e as
domina.

277

ou o capitalismo em casa alheia iistoriador escreve com justeza: -No


fundo, a dispersão era apenas aparente; se passava como se os ofícios
domiciliares estivessem presos numa invisível Je aranha financeira cujos
fios seriam puxados por alguns negociantes.-- 323 isso não significa,
porém, que tal teia de aranha tenha envolvido tudo. Há vastas es onde a
produção permanece fora do domínio direto do mercador. Decerto que se
passou com o trabalho da lã em muitas regiões da Inglaterra; talvez
rredores de
Bédarieux, no Languedoc, com a animada população dos preguei-orn certeza
em
Troyes, onde o trabalho do linho, ainda no século XVIII, esao Verleger. E
em muitas outras regiões, mesmo no século XIX. Essa produivre só é
possível a partir de uma matéria-prima facilmente acessível no merca.-
óximo, onde geralmente será vendido também o produto acabado. No século
nas grandes feiras espanholas do fim do inverno, viam-se os operários da
lã r eles próprios os tecidos como fazem, ainda no século XVIII, tantos
aldeões

1eiras locais inglesas.


Tampouco há Verleger no Gévaudan, região particularmente pobre do
Macintral, por volta de 1740. Nesta região rude, uns 5 mil camponeses se
instalam, s os anos, em seus teares quando são "empurrados para dentro de
casa pelo
- pela neve que, por mais de seis meses, cobrem as terras e os povoados".
Quanabam uma peça, "levam-na à feira mais próxima [ ... 1, de maneira que
ali se o mesmo tanto de vendedores que de peças; o preço é sempre pago à
vista", -m dúvida isso que atrai esses camponeses miseráveis. Seus
tecidos, embora cados com lãs locais bastante boas, são "de fraco valor,
uma vez que vendile dez a onze soldos, até vinte, excetuando-se as sarjas
chamadas escocesas. Os compradores mais freqüentes são mercadores da
província do Gévaudan, , hados por sete ou oito pequenas cidades onde se
encontram as oficinas de pi-m, como
Marvéjol, Langogne, La Canourgue, Saint-Chély, Saugues e [soido] Mande".
As vendas são efetuadas nas feiras regionais e locais. "Em duas és horas,
tudo é vendido, o comprador faz a escolha e o preço [ ... 1 na frente na
loja onde lhe apresentam as peças" e onde, feita a transação, mandará
veir o comprimento com a vara. Essas vendas são anotadas num registro,
com me do operário e o preço pago324.
É decerto pela mesma época que um empresário chamado Colson tenta acli,
r, no
Gévaudari primitivo, o Verlagssystem ao mesmo tempo que a fabricação
cidos chamados do Rei na Inglaterra e de Marlborough na França. Conta
ele, memorando dirigido aos Estados do LanguedoC325 suas iniciativas,
seus êxia necessidade de auxílio se quiserem que persevere nos seus
esforços. Colson Verleger, além de empresário, que forceja por impor seus
teares, suas cubas, processos (especialmente, uma máquina que inventou
"para queimar o pêlo" cido "ou a lanuagem à chama de espírito de vinho").
Mas o essencial do emidimento é criar uma rede eficaz de trabalho a
domicílio, treinar em especial mdeiras "a formar pouco a pouco fio limpo,
fino e liso". Tudo isso custa canto mais que "tudo é pago à vista no
Gévaudan, e as fiações bem como a gem são pagas metade adiantado, pois a
miséria dos habitantes da região dumuito tempo os impedirá de mudar este
costume". Nem uma palavra sobre 'el das retribuições, mas juramos, mesmo
sem saber, que são baixas. Senão, que tantos esforços, numa região
atrasada!

O descanso do tecelão, por A. van Ostade (1610-1685). Exemplo t1qico do


trabalho a domicz7io. O tear tem seu lugar na sala comum. (Bruxelas,
Museus Reais de
Belas-Artes. Copyright A. C. L.)
O Verlagssystem na Alemanha
Embora detectado, batizado, inventariado e explicado, em primeiro lugar,
pelos historiadores alemães a propósito do seu país, o sistema de
trabalho a domicílio não nasceu ali para depois se difundir no exterior.
Se tivéssemos de lhe encontrar uma pátria de origem, só teríamos de
hesitar entre os Países Baixos (Gand, Ypres) e a Itália industrial
(Florença, Milão). Mas o sistema, muito depressa onipresente

- -uu uu u capitansmo em casa aitzeía em toda a Europa ocidental,


proliferou largamente por terras alemãs que são, dado o estado da
pesquisa histórica, um local privilegiado de observação. Um artigo de
Hermann Kellenbenz, que aqui resumo, apresenta dele uma imagem
aprofundada, diversificada e convincente. As redes do sistema são as
primeiras características inegáveis de um capitalismo mercantil cujo
intuito é dominar, e não transformar a produção artesanal. Na verdade, o
que mais lhe interessa é a venda. Concebido desse modo, o Verlagssystem
pode aplicar-se a qualquer atividade produtiva, desde que o mercador
obtenha uma vantagem em se lhe sujeitar. Tudo favorece essa proliferação:
o desenvolvimento geral da técnica, a aceleração dos transportes, o
aumento do capital acumulado, manipulado por mãos hábeis e, por fim, o
surto das minas alemãs, a partir de 1470.
A atividade da economia alemã é assinalada por múltiplos sinais, quanto
mais não seja pela arrancada precoce dos preços ou pela forma como seu
centro de gravidade passa de uma cidade para outra: no princípio do
século XV, tudo gira em torno de Ratisbona, no Danúbio; depois, Nuremberg
impõe-se; a hora de
Augsburgo e de seus mercadores financistas soará mais tarde, no século
XVI: tudo se passa como se a Alemanha não cessasse de arrastar a Europa
que a rodeia e de se adaptar a ela - e também de se adaptar ao seu
próprio destino. O
Verlagssystem beneficia-se, na Alemanha, destas condições favoráveis. Se
transcrevêssemos num mapa todas as ligações que ele cria, todo o
território alemão seria cortado por seus traços múltiplos e finos. Umas
após as outras, as atividades prendem-se a essas redes. Em Lübeck, é o
caso precoce das oficinas de tecelagem do século XIV; em Wismar, o da
cervejaria que reúne Brãuknechte e
Brãumãgde, já assalariados; em Rostock, a moagem e a fabricação do malte.
Mas no século XV é o vasto setor dos têxteis o campo operatório mais
característico do sistema, dos Países Baixos, onde as concentrações são
bem mais intensas do que na Alemanha, até os Cantões suíços (tecidos de
Basiléia e de St. Gall). A fabricação dos fustões - mescla de linho e
algodão -, que implica a importação, por Veneza, do algodão da Síria, é
por natureza um ramo em que o mercador, que detém a matéria-prima
longínqua, desempenha forçosamente o seu papel, seja em
Ulm, seja em Augsburgo, onde o trabalho a domicílio favorecerá o
desenvolvimento do Barchent326. O sistema, aliás, alcança a tanoaria, a
fabricação de papel (primeiro moinho de papel nuremberguês, em 1304), a
tipografia e até a fabricação de rosários.
minas e o capitalismo ustrial com as minas, na Alemanha inteira, ou
melhor, na Europa central lato sensu, até a Polônia, a Hungria e os
países escandinavos, foi dado um passo decisivo rumo ao capitalismo.
Aqui, com efeito, o sistema mercantil apodera-se da produção e a
reorganiza. Nesse setor, a inovação situa-se no fim do século XV. Na
verdade, essa época decisiva não inventa a mina nem o ofício de mineiro,
mas modifica as condições da exploração e do trabalho.
O ofício de mineiro é um ofício antigo. Em toda a Europa central, desde o
século
XII encontramos grupos de artesãos, de companheiros mineiros -
Gewerkschaften,
Knappschaften327 -, e as regras das suas organizações se generalizam nos
séculos
XIII e XIV com os vários movimentos dos mineiros alemães em direção

A produção ou o capitalismo em casa aos países do Leste. Tudo correu bem


para essas minúsculas comunidades enquanto o minério pôde ser atingido na
superfície do solo. Mas, quando a exploração teve de aprofundar-se,
levantou difíceis problemas: escavação e entivação de longas galerias,
aparelhos de elevação ao topo dos poços profundos, escoamento da água
sempre presente - tudo isso, por sinal, mais fácil de resolver
tecnicamente (os novos processos como que nascem por si sós no mundo do
trabalho) do que financeiramente. Daí em diante a atividade mineira
exigia a instalação e a renovação de um material relativamente enorme. A
mutação, no fim do século XV, abre a porta aos mercadores ricos. De
longe, apenas com a força dos seus capitais, vão apoderar-se das minas e
das empresas industriais a elas associadas.
A evolução se realiza quase em toda a parte na mesma época, o final do
século
XV: nas minas de prata do Harz e da Boémia; nos Alpes do Tirol, por muito
tempo o centro de exploração do cobre; nas minas de ouro e de prata da
Baixa Hungria, de Kõnigsberg a Neusolil, à margem do pequeno vale
encravado do Gran328. E, conseqüentemente, os operários livres dos
Gewerkschaften tornam-se em toda a parte assalariados, operários
dependentes. Aliás, é nessa época que surge a palavra operário, Arbeiter.
O investimento de capital se traduz em progressos espetaculares da
produção e não só na Alemanha. Em Wielicza, perto de Cracóvia, a
exploração camponesa do sal-gema, por evaporação da água salgada em
recipientes de ferro pouco profundos, está ultrapassada. Escavam-se
galerias e poços de até 30O metros de profundidade. Enormes máquinas
movidas por malacates de cavalo trazem para a superfície as placas de
sal. No seu apogeu (século XVI), a produção é de 4O mil toneladas por
ano; emprega 3 mil operários. A partir de 1368, obtém a colaboração do
Estado polonês"'. Sempre perto de Cracóvia, mas na Alta Silésia, as minas
de chumbo perto de 01kusz que, no fim do século XV, produziam entre 30O e
50O toneladas por ano, passam a fornecer de mil a 3 mil nos séculos XVI e
XVII. A dificuldade, aqui, não era tanto a profundidade (5O a 8O metros
apenas), mas a abundância de água. Foi preciso escavar grandes galerias
entivadas, em declive, que permitissem o escoamento por gravidade,
multiplicar as bombas movidas por cavalos, aumentar a mão-de-obra. Ainda
por cima, a dureza da rocha era tal que em oito horas de trabalho um
operário escavava apenas 5 centímetros de galeria. Tudo isso requeria
capitais e, assim, as minas passavam automaticamente para as mãos de quem
os possuía: assim, um quinto dos poços coube ao rei da Polônia,
Sigismundo Augusto, que vivia de suas rendas; um quinto à nobreza, aos
oficiais do rei e aos habitantes abastados das cidades novas das
imediações; os três quintos restantes aos mercadores de Cracóvia, que se
apoderaram do chumbo polonês tal como os mercadores de Augsburgo
souberam, se bem que a boa distância, apoderar-se do ouro, da prata, do
cobre da Boémia, da
Eslováquia e da Hurigrm ou do Tiro1330.
Para os homens de negócios, era grande a tentação de monopolizar tão
importantes fontes de receita. Mas era ter olhos maiores que a barriga:
até os Fugger fracassaram, embora por pouco, em estabelecer um monopólio
do cobre; os
Hõchstetter se arruinaram ao se obstinar em constituir um truste do
mercúrio, em

1529.
O montante do capital para o investimento impedia, em geral, que algum
mercador, sozinho, se encarregasse sequer de uma só mina. É verdade que,
durante muitos anos, os Fugger assumiram a exploração total das minas de
mercúrio de Almadéri, na Espanha, mas os Fugger são os Fugger.
Habitualmente, tal como a propriedade de um navio se divide em partes, em
carats, a propriedade de uma mina
~U UtrICIU

7ide em Kuxen, freqüentemente em 64 ou até em 128331. Tal divisão permite


iar à empresa, graças a algumas ações distribuídas gratuitamente, o
próprio ipe que, aliás, conserva o direito efetivo sobre o subsolo. Em
1580, Augusto Saxônia possui 2.822 Kuxen331. Deste modo, o Estado está
sempre presente mpresas mineiras.
vIas essa fase gloriosa, direi fácil, da história das minas não se
prolonga desme-iente. A lei das rendas decrescentes iria impor-se de
forma inexorável: as explos mineiras prosperam, depois declinam. As
insistentes greves operárias na
Baiingria, em 1525-1526, já são sem dúvida a indicação de um recuo. Dez
anos s, multiplicam-se os sinais de uma queda progressiva. Tem-se dito
que a resbilidade foi da concorrência das minas da América ou da
contração econômi- corta temporariamente o impulso do século XVI. Seja
como for, o capitalisercantil, rápido em intervir no final do século XV,
não tarda a tornarse prue a abandonar o que já não passa de um negócio
medíocre. Ora, o desinvesti) é, tal como o investimento, característico
de qualquer atividade capitalista: -onjuntura impele-o para a frente, uma
conjuntura põe-no fora de jogo. Jonam-se ao Estado minas célebres: já vão
para ele os maus negócios. Se os r ficam em Schwaz, no Tirol, é porque a
presença simultânea no minério de e de prata ainda permite lucros
substanciais. Nas minas de cobre da Hungria bstituídos por outras firmas
de Augsburgo: os l, angnauer, os Haug, os Link, iss, os Paller, os
Stainiger e, para terminar, os Henckel von Donnersmark e ilinger. Eles
mesmos cederão o lugar a italianos. Essas sucessões fazem pensar ucessos
e em derrotas, pelo menos em lucros menores aos quais, um belo dia, rível
renunciar.
odavia, embora tenham abandonado a maior parte das minas aos príncipes,
cadores mantêm-se no papel menos arriscado de distribuidores dos produtos
os e metalúrgicos. De repente, deixamos de ver a história mineira e, mais
além, iria do capitalismo, pelos olhos, no entanto experientes, de Jacob
Strieder332.
plicação apresentada for exata - e deve ser exata -, os capitalistas
envolvi~ prestes a envolver-se na atividade mineira só desertam, em suma,
dos lugares sos ou pouco seguros da produção primária; recuam para a
fabricação de prosemiacabados, para os altos-fornos, fundições e forjas,
ou, melhor ainda, mera distribuição. Voltaram a guardar distâncias.
;tes avanços e recuos requereriam dez, cem testemunhos, por certo não
inúas o problema essencial para nós não está aqui. Não é no fim dessas
poderoes mineiras que vemos surgir um verdadeiro proletariado operário -
a força alho em estado puro, o "trabalho a nu", isto é, segundo a
definição clássica talismo, o segundo elemento que lhe assegura a
existência? As minas provoenormes concentrações de mão-de-obra, para a
época, entenda-se. Por volta ), nas minas de Schwaz e de
Falkenstein (Tirol), há mais de 12 mil operários ionais, 50O a 60O
assalariados só se ocupam em retirar a água que ameaça.^ias da mina.
Nessa massa, é verdade, o salariado ainda marca passo perante 'xceções:
assim, subsistem pequenos empresários nos transportes ou mimisrupos de
mineiros independentes. Mas todos, ou quase todos, dependem do :imento
fornecido pelos grandes empregadores, do
Trucksystem, que é uma LÇão suplementar dos trabalhadores, vendendo-lhes,
a preços vantajosos parnecedor, trigo, farinha, gordura, roupas e outras
Pfennwert (mercadorias ). Esse tráfico suscitava entre os mineiros,
violentos por natureza, também
Mercado do minério de prata em Kutna-hora (Boémia), no século XV. A venda
éfeita sob a1vigilância do responscível da mina que representa o rei. Os
compradores sentam-se à volta da mesa onde os mineiros expõem o minério.
Pormenor do
Kuttenberger Gradual. (Viena, Osterreischische NationaIbibliothek, clichê
da
Biblioteca.)

ontos em ir-se embora, freqüentes contestações. Apesar de tudo, constrói-


se, )oça-se fortemente um mundo do trabalho. No século XVII, surgem casas
ope-ias ao redor das fundições de ferro do Hunsrück. Habitualmente, a
fundição apitalista, mas a mina de ferro continua controlada pela livre
empresa. Enfim, tala-se por toda a parte uma hierarquia do trabalho, um
enquadramento: no to, o Werkmeister, o mestre-de-obra, representante do
mercador; abaixo dele, os genmeister, os contramestres. Como não ver,
nessas realidades que surgem, o núncio dos tempos futuros?
Esse recuo, moderado mas evidente, do capitalismo diante da mina , a
partir neados do século XVI, é um fato de envergadura. A Europa,
precisamente por ;a da sua expansão, age então como se julgasse acertado
desonerar-se dos cui3s sua indústria mineira e metalúrgica nas regiões
que, na periferia, estão sob a dependência. com efeito, na Europa, não
apenas as rendas regressivas limio lucro, mas as "usinas a fogo" destroem
as reservas florestais, o preço do ão vegetal e da lenha se torna
proibitivo, os altos-fornos ficam condenados a alhar intermitentemente,
imobilizando de forma inútil o capital fixo. Por ouado, os salários
sobem. Não é de admirar, portanto, que a economia européia, como um todo,
se volte, no tocante ao ferro e ao cobre, para a Suécia; quanto )bre,
para a Noruega; e em breve, quanto ao ferro, para a distante indústria
ússia; quanto ao ouro e à prata, para a América; quanto ao estanho (não
con:) a Cornualha inglesa), para o Sião; quanto ao ouro, para a China;
quanto ita e ao cobre, para o Japão.
:ontudo, nem sempre é possível a substituição. É o caso do mercúrio,
indiswel às minas de prata da América. Descobertas em cerca de 1564 e
postas muito iiente em serviço, as minas de mercúrio de Huancavelica333
no Peru, são inentes, e o abastecimento pelas minas européias de Almadén
e de ídria tornouÁspensável. É significativo verificar que o capital não
se desinteressou dessas ;. Almadén continuou sob a direção única dos
Fugger até 1645111. Quanto a cujas minas, descobertas em 1497, são
exploradas a partir de 1508-1510, os dores nunca deixaram de disputar-lhe
o monopólio com o Estado austríaco,

31tou a entrar na posse de todas elas a partir de 1580335.


[as minas distantes, terá o capitalismo participado plenamente da
produção que a de abandonar na Europa? Sim, até certo ponto, na Suécia e
na Noruega; !o no que diz respeito ao Japão, ou à China, ou ao Sião, ou à
própria América. a América, o ouro, de produção ainda artesanal, nas
imediações de Quito u, e nos vastos garimpos do interior do Brasil,
contrasta com a prata, produgundo uma técnica já moderna, pelo processo
do amálgama importado da t e utilizado na Nova Espanha desde 1545, no
Peru desde 1572. No sopé do Je Potosí, as grandes rodas hidráulicas
trituram o minério e facilitam o amálExistem ali dispendiosas
instalações, dispendiosas matérias-primas. É possíali se aloje um certo
capitalismo: em Potosí, na Nova Espanha, temos co, ento de repentinas
fortunas de mineiros bafejados pela sorte. Mas constixceção. A regra,
urna vez mais, é o lucro caber ao mercador.
O Cerro do Potosi no fundo: homens e caravanas sobem as encostas. No
primeiro plano, um patio onde se processa o minério de prata: uma roda
hidráulica permite triturd-1o e os martelos reduzem-no apó, a 'fàrinha",
que será misturada afrio com o mercúrio, nos cercados pavimentados, - a
pasta era pisada com os pés pelos índios. O canal que vai dar na roda é
alimentado a partir da montanha pelas águas do degelo das chuvas que
enchem reservatórios Oagunas). Ao lado do Cerro são visíveis os
acampamentos dos índios (rancherías); do outro lado, na frente do patio,
a cidade (tem de se imaginar) apresenta suas ruas, muitas vezes
representadas no século XVIII. Segundo Marie Helmer, --Potosi à la fin du
XVIIIe sikle", in Journal des Amóricanistes, 1951, p. 40. Fonte: Library
of the
Hispanic Society of America, Nova York.
O mercador local, primeiro. Como na Europa, mais do que na Europa, as
populações mineiras instalam-se no ermo, como no Norte do México; ou num
verdadeiro deserto, no Peru, no coração das montanhas andinas. A grande
questão é, portanto, o abastecimento. Ela já se colocava na Europa, onde
o empresário fornecia os víveres necessários ao mineiro e ganhava muito
com esse tráfico. Na
América, o abastecimento domina tudo. É o caso dos garimpos brasileiros.
É o caso do México, onde as minas do Norte exigem grandes remessas de
gêneros provenientes do Sul. Zacatecas, em 1733, consome mais de 85 mil
fanegas de milho (uma fanega = 15 kg); Guanajuato, em cerca de 1746, 20O
mil, e 35O mil em

1785336. Ora, aqui, não é o minero (proprietário que explora as minas)


que assegura o pró

rio abastecimento. O mercador adianta-lhe, a troco de ouro ou de prata,


víveres, ecidos, ferramentas, mercúrio, aprisionando-o num sistema de
escambo ou de conandita. É o dono indireto, discreto ou não, das minas.
Mas não o senhor último tessas trocas que as diversas etapas de uma
cadeia mercantil comandam, em
Lima, Èo Panamá, nas grandes feiras de Nombre de Dios ou de Porto Belo,
em
Cartageia de Ias Indias, finalmente em Sevilha ou em Cádiz, pontos de
partida de outra ede européia de redistribuição. Há também uma cadeia do
México a Vera
Cruz, Havana, a Sevilha. É aí, ao longo de todo o percurso e das fraudes
por ele permidas, que se situam os lucros - não tanto na fase da produção
mineira.
Entretanto, certas atividades mantiveram-se européias: é o caso das
produções sal, de ferro e de carvão. Nenhuma mina de sal-gema foi
abandonada, e o porte is instalações bem cedo as entregou aos mercadores.
As salinas, pelo contrário, o organizadas em pequenas empresas; só há
concentração na mão dos mercadoem relação aos transportes e à
comercializaÇão, tanto em Setúbal, em Portugal, mo em Peccais, no
Languedoc. Supõe-se que havia grandes empresas de venda sal no
Atlântico, bem como ao longo do vale do Ródano.
Quanto ao ferro, as minas, os altos-fornos e as forjas permaneceram por
muitempo unidades de produção limitadas. O capital mercantil não intervém
diretante. Na
Alta Silésia, em 1785, de 229 Werke (altos-fornos), 191 pertencem a gran;
proprietários fundiários (Gutsbesitzer), 2O ao rei da Prússia, 14 a
diferentes prinados, 2 a fundações e apenas 2 a mercadores de Breslau
337. É que a indústria ferro tende a constituir-se verticalmente e, no
início, os proprietários dos terremineiros e das florestas indispensáveis
têm importância capital. Na Inglaterra, entry e a nobreza investem
freqüentemente em minas de ferro, altos-fornos e ias situados nas suas
terras. Mas serão por muito tempo empresas individuais, i mercados
incertos, técnica rudimentar, com instalações fixas baratas. A
granlespesa é o fluxo necessário das matérias-primas, do combustível e
dos salários. rédito provê a isso. Contudo, será preciso esperar pelo
século XVIII para que odução em grande escala se torne possível e os
progressos técnicos e os investitos acompanhem a ampliação do mercado. O
altoforno gigante de Ambrose wley, em 1729, é urna empresa de menor porte
do que uma grande cervejaria poca338.
As pequenas e médias empresas foram também prioritárias, e por muito
temria extração do carvão. No século XVI, na França, há apenas camponeses
na )ração do carvão superficial, para as suas próprias necessidades ou
para exições fáceis, como ao longo do Loire ou de Givors a Marselha. Da
mesma fora enorme riqueza de
Newcastle deixou instalada uma tenaz e antiga organizaorporativa. No
século
XVII, em toda a Inglaterra, "para cada poço profundo pado de maneira
moderna], havia doze superficiais, trabalhados a baixo custo, om algumas
ferramentas simples'1339. Se há inovação, lucro, jogo mercantil,
listribuição cada vez mais ampla do combustível. Em 173 1, a South Sea
Complaneia enviar a Newcastle e aos portos do Tyne, para carregar carvão,
seus s de volta da pesca da baleia 340.

, í proaução uu u erti Lu3u


Mas eis-nos no século XVIII em que tudo já mudou. Mesmo na França,
atrasada em relação à Inglaterra, o Conselho de Comércio e as autoridades
competentes estão sobrecarregados de pedidos de concessões - como se não
houvesse uma região na França que não encerrasse no solo reservas de
carvão ou, mais exatamente, de turfa. É verdade que o uso do carvão-de-
pedra aumenta, embora mais lentamente do que na Inglaterra. É utilizado
nas novas vidrarias do
Languedoc, nas cervejarias da região Norte, por exemplo em Arras ou em
Béthune341 ou mesmo nas forjas, em Alès. Daí, mais ou menos conforme as
circunstâncias e as regiões, o novo interesse dos mercadores e
financiadores, tanto mais que as autoridades responsáveis se dão conta de
que os amadores, nesses domínios, não podem arcar com os custos. É isso
que o intendente de
Soissons escreve a um requerente, em março de 1760: há que "recorrer a
companhias semelhantes às de Beaurin e de M. de Renausan", únicas capazes
de "reunir os fundos necessários para a despesa destas verdadeiras
extrações de minas que só podem ser feitas por gente do ramo-342. Assim
se formarão as minas de Anzin, cuja gloriosa história nos interessa
apenas por seu início. Depressa tomariam o lugar de Saint-Gobain como
segunda empresa francesa, em ordem de importância, depois da Companhia
das índias: teriam tido já em 175O "bombas a fogo", isto é, máquinas de
Newcomen111. Mas não vamos entrar mais no que já é a
Revolução industrial.
Manufaturas e fábricas
Em sua maioria, a pré-indústria apresenta-se sob a forma de inúmeras
unidades elementares da atividade artesanal e do Verlagssystem. Acima
dessas dispersões emergem organizações mais francamente capitalistas, as
manufaturas e as fábricas.
Ambas as palavras são regularmente empregadas uma pela outra. Foram os
historiadores que, seguindo os passos de Marx, preferiram reservar a
palavra manufatura para as concentrações de mão-de-obra de tipo
artesanal, com trabalho manual (particularmente nos têxteis), e a palavra
fábrica para os equipamentos e mdquinas já utilizados nas minas, nas
instalações metalúrgicas e nos estaleiros navais. Mas lemos, na pena de
um cônsul francês em Gênova, que assinala a criação, em Turim, de um
estabelecimento com mil tecelões de sedas brocadas de ouro e prata: esta
"fábrica [... 1, com o tempo, há de causar considerável prejuízo às
manufaturas da França'1344. Para ele, as duas palavras são sinônimas. com
efeito, a palavra usina, tradicionalmente reservada ao século
XIX, conviria melhor ao que os historiadores irão chamarffibrica; pouco
freqüente, a palavra existe desde o século XVIII. Em 1738, é pedida
autorização para criar uma usina perto de Essone, "para fabricar todas as
espécies de fio de cobre próprio para trabalhos de caldeiraria"345 (o
fato é que a mesma usina, em

1772, é chamada manufatura de cobre!); ou então, em 1768, ferreiros e


amoladores da região de Sedan pedem para estabelecer perto do moinho de
Illi346 "a usina que lhes é necessária para a fabricação das suas Jorces"
(as forces são grandes tesouras para tosar tecidos de lã); ou ainda é o
barão de Dietrich que, em 1788, queria que não lhe aplicassem a proibição
que atinge "os estabelecimentos com muitas usinas", no caso "fornos,
forjas, martinetes, vidrarias" e "martelos'

347. Nada impediria, portanto, falar de usinas no

287

século XVIII. Encontrei também o emprego, já em 1709, da palavra


empresário

348 se bem que seja muito rara. E, segundo Dauzat, "industrial", no


sentido de diretor de empresa, surge em 177O na pena do abade Galiani; só
se tornará corrente a partir de 1823, com o conde de Saint-Simon 349.
Isto posto, permaneçamos fiéis, para a comodidade da exposição, à
habitual distinção entre manufatura e fábrica. Em ambos os casos, sendo
minha intenção apreender o progresso da concentração, não levarei em
conta as pequenas unidades. Pois a palavra manufatura aplica-se às vezes
a empresas liliputianas.
Eis, em Sainte-Meneliould, uma "manufatura de sarjas" que, por volta de
1690, agrupa cinco pessoas 350; em Joinville, uma "manufatura de droguete
de 12

operários' 351. No principado de Ansbach e de Bayreuth, no século XVIII,


segundo o estudo de 0. Reuter 352 que tem valor de uma sondagem, uma
primeira categoria de manufaturas não tem mais que 12 a 24 operários. Em
1760, em Marselha, 38

fábricas de sabão contam ao todo com cerca de mil empregados. Embora, ao


pé da letra, tais estabelecimentos correspondam à definição de
"manufatura", pelo
Dictionnaire de Savary des Bruslons (1761): "local onde se reúnem vários
operários e artesãos para trabalhar num mesmo tipo de labor' 9353, há o
risco de eles nos reduzirem à dimensão da vida artesanal.
É evidente que há manufaturas de outro porte, se bem que, geralmente,
essas grandes unidades não sejam unicamente concentradas. Essencialmente,
estão alojadas num edifício central, é verdade. Já em 1685, um livro
inglês de título promis54

sor, The Discovered Gold Mine' conta como "os manufatureiros, com muitas
despesas, mandam construir grandes edifícios onde os selecionadores de
lã, os cardadores, os fiandeiros, os tecelões, os pisoeiros e mesmo os
tintureiros trabalham juntos". Adivinha-se: a "mina de ouro" é uma
manufatura de tecidos de lã. Mas
- e esta é uma regra quase sem exceções - a manufatura possui sempre,
além de seus operários reunidos, operários dispersos na cidade onde se
situa, ou nos campos próximos, todos trabalhando a domicílio. Está
portanto verdadeiramente no centro de um Verlagssystem. A manufatura de
tecidos finos de Varirobais, em
Abbeville, emprega quase 3 mil operários, mas, deste total, não se
saberia dizer quantos trabalham para ela a domicílio, nos arredoreS355.
Uma manufatura de meias em Orléans, em 1789, tem na sede 80O pessoas, mas
utiliza o dobro fora356.
A manufatura de tecidos de lã fundada por Maria Teresa em Linz conta com
15.60O operários (26 mil em 1775) - não há erro neste número colossal;
aliás, é na
Europa central, onde a indústria tem um atraso para recuperar, que se
encontram os efetivos mais consideráveis. Mas, deste total, dois terços
dizem respeito a fiandeiros e tecelões que trabalham a dorniCílic, 357.
Em geral, na Europa central, as manufaturas recrutam muitas vezes
trabalhadores entre os servos camponeses - como na Polônia, na Boémia -,
o que prova de passagem, uma vez mais, que uma forma técnica se mostra
indiferente ao contexto social que encontra. Aliás, no Ocidente, também
há esse trabalho escravo, ou quase, uma vez que certas manufaturas
utilizam a mão-de-obra das workhouses, das casas onde são presos os
ociosos e os delinqüentes, os criminosos, os órfãos. E isso não os impede
de utilizar, além dessa, a mão-de-obra a domicílio, como as outras
manufaturas.
Poder-se-ia pensar que a manufatura se multiplica, assim, de dentro para
fora, à medida que vai crescendo. Mas é antes o inverso que é verdadeiro,
se pensamos na própria gênese da manufatura. Na cidade, ela é muitas
vezes o término de redes de trabalho a domicílio, o local onde, em última
instância, se completa o processo

Trabalho do vidro, ilustração tirada das Voyages de Jean Mandeville, por


volta de 1420. (British Library.)
de produção. E esse acabamento, conta-nos Daniel Defoe referindo-se à lã,
é quase metade do trabalho todo358. Trata-se portanto de certo número de
operações finais alojado num edifício que depois tem de aumentar. Assim,
nos séculos XIII e XIV, a indústria da lã na Toscana é um enorme
Verlagssystem. A Compagnia dell'Arte della lana que Francesco Datini
funda ao regressar a Prato (fevereiro de

1383) abrange umas dez pessoas trabalhando numa loja, enquanto outras
mil, dispersas por mais de 50O kM2 ao redor de Prato, estão a seu
serviço. Mas, pouco

'0, uma parte do trabalho tende a concentrar-se (tecelagem, cardagem);


esboçaa manufatura, se bem que com extrema lentidão359.
Ias por que tantas manufaturas se contentaram com o acabamento? Por que
outras, encarregando-se do ciclo de produção quase completo, deixaram
larrgem ao trabalho a domicílio? Primeiramente, os processos de
acabamento, em, tinturaria, etc., são os mais delicados tecnicamente e
requerem instalaelativamente grandes.
Ultrapassam, é lógico, a fase da produção artesanal Lmam capitais. Por
outro lado, para o mercador, garantir o acabamento é itrole sobre o que
mais lhe interessa, a comercialização do produto. As difede preço entre
trabalho citadino e trabalho rural também pesaram: Londres, , emplo, tem
todas as vantagens em continuar a comprar tecidos brutos nos dos de
província, regiões de preços baixos, encarregando-se do preparo e da
iria, que contam muito para o valor do tecido. Enfim, e sobretudo,
utilizar alho a domicílio é ter liberdade de ajustar a produção a uma
procura muito -1 sem reduzir ao desemprego os operários qualificados da
manufatura. Quan-ia a procura, basta aumentar ou diminuir o trabalho
feito fora. Mas, com evidência, é também necessário que os lucros de uma
manufatura sejam basreduzidos, seu futuro relativamente incerto, para que
ela não seja autonte e prefira mergulhar em parte no Verlagssystem. Não
por gosto, claro, or necessidade - numa palavra, por fraqueza.
liás, a indústria manufatureira mantém-se deveras minoritária. Todos os
lenentos o afirmam. Para Friedrich Lütge36O "o conjunto das manufaturas
penhou na produção um papel muito mais restrito do que levaria a supor
iência com que se fala delas". Na Alemanha, terá havido cerca de mil
manus de todos os tamanhos.
Se tentarmos calcular, no caso da Baviera 361 o seu -lativamente à massa
do produto nacional, é abaixo de 1 % que teremos de :). Claro que
necessitaríamos de outros números, mas apostamos que não sai; muito
dessas conclusões pessimistas.
em por isso as manufaturas deixaram de ser modelos e instrumentos de
protécnico.
E a cota-parte modesta da produção manufatureira prova mesmo ima coisa:
as dificuldades encontradas pela pré-indústria no contexto em que nvolve.
É para romper esse círculo que o Estado mercantilista intervém tan'es;
que financia e conduz uma política nacional de industrialização. com Lual
exceção da Holanda, qualquer Estado europeu poderia servir de exemlusive
a Inglaterra cuja indústria se desenvolveu, na origem, por trás de uma, a
de tarifas muito protecionistas.
a França, a ação do Estado remonta pelo menos a Luís XI, que instala a em
da seda em Tours: o problema já consiste, ao produzir internamente a
loria em vez de comprá-la ao estrangeiro, em diminuir as saídas de metais
;OS362. O Estado mercantilista, já "nacionalista", é essencialmente
metalisleria ir buscar a sua divisa em Antoine de Montchrestien, o "pai"
da econolítica: "que o país forneça o país' 9363. Os sucessores de Luís
XI, quando puagiram como ele. com particular atenção Henrique IV: em
1610, ano da )rte, das 47 manufaturas existentes, 4O haviam sido criadas
por ele. Colbert mesmo. As suas criações corresponderam além disso, como
pensa Claude ao desejo de lutar contra uma conjuntura econômica
desencoraj adora.
se-á creditar a seu caráter artificial o fato de a maior parte delas ter
desaparapidamente? Subsistirão apenas as manufaturas públicas ou
largamente pri

vilegiadas pelo Estado, como Beauvais, Aubusson, a Savonnerie, os


Gobelins e, entre as manufaturas chamadas "régias", a manufatura
Vanrobais de Abbeville, que, fundada em 1665, sobreviverá até 1789, a
manufatura dos vidros, fundada no mesmo ano, instalada em parte em Saint-
Gobain em 1695 e que continua de pé em

1979; ou uma manufatura régia do Languedoc, tal como a de Villeneuve,


ativa ainda em 1712, com seus 3 mil operários, prova de que o comércio do
Levante mantém suas vendas 365.
No século XVIII, o desenvolvimento econômico faz brotar da terra toda uma
série de projetos de manufaturas. Os responsáveis expõem ao Conselho de
Comércio suas intenções e seus monótonos pedidos de privilégio, que eles
justificam em nome do interesse geral. Seu apetite ultrapassa
regularmente o âmbito local. O mercado visado é o nacional, prova de que
este começa a existir. Uma fábrica do Berry,

44para ferro e aço acalmado" 366 solicita sem rodeios um privilégio


extensivo a toda a França. Mas a maior dificuldade para as manufaturas
existentes ou em vias de aparecimento parece ser a cobiçada abertura do
enorme mercado de Paris, tenazmente defendido em nome dos corpos de
ofício pelos Seis Corpos que constituem sua elite e representam, por sua
vez, grandes interesses capitalistas.
Os papéis do Conselho de Comércio, entre 1692 e 1789, incompletos e em
desordem, registram numerosos pedidos, quer de manufaturas já instaladas
que desejam obter uma ou outra benesse, ou uma renovação, quer de
manufaturas que querem criar-se.
Uma amostragem mostra a crescente diversidade desse setor de atividade:
1692, rendas de fio em Tonnerre e Chastillon; 1695, folha-de-Flandres em
Beaumont-enFerrière; 1698, marroquins vermelhos e pretos, à moda do
Levante, e couros de bezerro à moda da Inglaterra, em Lyon; 1701,
porcelana e faiança em Saint-Cloud;
branqueamento de fios finos em Anthony, perto do Bièvre; 1708, sarjas em
SaintFlorentin; goma em Tours; 1712, tecidos de lã à moda da Inglaterra e
da Holanda em Pont-de-l'Arche; 1715, cera, círios e velas em Anthony;
tapetes em Abbeville;
sabão preto em Givet; tecidos em Châlons; 1719, faiança em SaintNicolas,
arrabalde de Montreau; tecidos em Pau; 1723, tecidos em Marselha,
refinaria de açúcar e sabões em Sète; 1724, faiança e porcelana em Lille;
1726, ferro e aço fundido em Cosne; cera, círios e velas em Jagonville,
arrabalde do Havre;

1756, seda em Puy-en-Velay; 1762, arame de ferro e foices em Forges, na


Borgonha; 1763, candeias imitando velas em Saint-Mamet, perto de Moret;
1772, cobre no moinho de Gilat, perto de Essonnes; velas em Tours; 1777,
telhas e faianças em Gex; 1779, papelaria em Saint-Cergues, perto de
Langres; garrafas e vidros para vidraças em Lille; 1780, trabalho de
coral em Marselha (três anos depois, a manufatura anuncia 30O operários);
"ferros redondos, quadrados e em tiras à moda da Alemanha" em Sarrelouis;
papelaria em Bitche; 1782, veludo e tecidos de algodão em Neuville; 1788,
tecidos de algodão em Saim-Véron; 1786, lenços à inglesa, em Tours; 1789,
ferro fundido e moldado em Marselha.
Os requerimentos das manufaturas e os pareceres dos comissários do
Conselho que fundamentam as decisões fornecem preciosos apanhados sobre a
organização das manufaturas. Assim, Carcassonne, em 1723, seria a cidade
da França "mais abundante em manufaturas de tecidos", "o centro das
manufaturas do Languedoc".
Quando Colbert, uns cinqüenta anos antes, instalou manufaturas régias no
Languedoc para que os marselheses, a exemplo dos ingleses, pudessem
exportar tecidos de lã para o Levante e não mais apenas moeda, o início
foi difícil, apesar da considerável ajuda dos Estados da província. Mas
em seguida a indústria prosperou tão bem que fabricantes sem privilégios
se mantiveram ou se instalaram no
ra de tecidos pintados, em Orange (fragmento da pintura mural de uma
casapartiidade executada por J. G. Rossetti em 1764). Na sala de
estampagem, o fundador

2tura, o suíço Jean Rodolphe Wetter, a esposa e um amigo suiço a quem um


emlostra uma prancha de impressão.

À esquerda e à direita, duas outras oficinas. Os opercírios são


numerosos: 60O em 1762. Mas a manufatura não prosperou como a de Jouy-en-
Josas, perto de
Versalhes. Depois de diversas remodelações, fecha definitivamente as
portas em

1802. (Foto N. D. Roger- Viollet.)

iedoc, particularmente em Carcassonne. Eles asseguravam, sozinhos, quatro


)s da produção e, desde 1711, era-lhes mesmo concedida uma pequena
gratifipor peça de tecido fabricada --a fim de não haver tão grande
desigualdade entre m empresários das manufaturas régias--. Estas
continuavam, com efeito, a recebsídios todos os anos, sem contar a
vantagem de escaparem às visitas dos guarramentados dos ofícios que
verificavam se a qualidade dos tecidos corresponnormas exigidas pela
profissão. É verdade que as proprias manufaturas régias

3itadas, mas de longe em longe, pelos inspetores das manufaturas e são


obriga'abricar todos os anos as quantidades previstas pelo seu contrato,
ao passo que ras "têm a liberdade de cessar o trabalho quando nele não
encontram lucro, restia das lãs, interrupção do comércio pela guerra ou
outra causa". Isso não e que haja um clamor de protestos entre "a
comunidade dos fabricantes e as iidades dos tecelões, acabadores,
torcedores, tintureiros", etc., quando um dos intes de Carcassonne faz
intrigas para ser admitido entre as manufaturas réo consegue
temporariamente. Remetida ao Conselho de Comércio, a decisão er-lhe-á
desfavorável. Ficamos sabendo, de passagem, que o Conselho de Co) já não
vê vantagem "no tempo presente em multiplicar as manufaturas
réespecialmente nas cidades onde, como provou a experiência parisiense,
elas são te numerosos conflitos e fraudes. Que teria acontecido se o
senhor de Saintaig. o nome do intrigante - tivesse triunfado? Sua empresa
se teria tornado o de encontro de operários não-qualificados que, graças
ao privilégio, poderiam iar por conta própria. Desse modo, teria havido
drenagem de operários a seu

1. Logo, fica claro que há luta entre oficinas submetidas à norma e


oficinas tentam o título régio, o que coloca tal unidade produtiva como
que fora da ium.
Um pouco como as companhias de navegação privilegiadas, estão, tamas, mas
por motivos ainda mais consideráveis, fora da lei comum.
manufatura régia de tecidos fundada em Abbeville, em 1665, por iniciativa
Jert, pelo holandês Josse Vanrobais, é uma empresa aparentemente sólida:
encerrada em

1804. De início, JossIe Vanrobais trouxera consigo uns cinoperários da


Holanda, mas, salvo essa primeira leva, os efetivos da manu(3 mil
operários, em 1708)
foram recrutados exclusivamente no local.
w muito tempo, a manufatura estivera dividida entre uma série de grandes
s dispersas pela cidade. Só mais tarde, de 1709 a 1713, é que foi
construída, alojar, fora da aglomeração urbana, a enorme casa chamada das
Ramas mas" são "compridas barras de madeira [...] onde se penduravam os
tecia secar"). O edifício comporta um corpo principal para os mestres e
duas -a os tecelões e tosadores. Rodeado de fossos e de sebes, encostado
nos muidade, constitui um mundo fechado: todas as portas são guardadas
por "suístidos, como é de norma, com a libré do rei (azul, branco e
vermelho). Isso a vigilância, a disciplina, o respeito pelos regulamentos
(entre outras coisas, ários são proibidos de ali introduzir aguardente).
Aliás, de sua residência, ) "fica de olho na maior parte dos operários".
Todavia, a enorme constru;to: 30O mil libras) não contém nem os
depósitos, nem as lavanderias, nem

Este tecido estampado (cartão de J. B. Huet, colaborador artístico do


fundador da man ufatura de Jouy-en-Jasas, Oberkampf) mostra as
instalações da manufatura naquela época de prosperidade e as novas
mdquinas criadas, uma após outra, desde a suafundação em 1760.
Particularmente destinadas ao desengorduramento e à estampagem dos
tecidos por chapa de cobre em vez de blocos de madeira. (Coleção
Viollet.)

- cobLreoarias, nem a forja ou as mós de afiar as --tesouras de tosar--.


As fiandeiras estão distribuídas Por várias Oficinas urbanas. A isto
acrescenta-se muito trabalho a domicllbatente" '0' Pois são necessárias
Oito fiandeiras para cada um dos cem "teares de da manufatura. Longe da
cidade, junto às águas límpidas do Bresle, foi construído um Pisão para o
desengorduramento dos tecidos.
A concentração, bastante avançada, não é perfeita. Mas a organização é
resolutamente moderna. A divisão do trabalho é a regra: a fabricação de
tecidos finos, objetivo principal da empresa, passa.'Ipor 52
trabalhadores diferentes".
E a própria manufatura assegura seu abastecimento, tanto em terra de
Pisoeiro (pequenos barcos, as balandras, importam-na da região de
Ostende), COMO em lãs finas de Segóvia, as melhores da Espanha,
carregadas em Bayonne ou em Bilbao pelo Charles-de-Lorraine, depois, após
o naufrágio deste, pelo Toison d'Or.
Estes dois navios sobem, ao que parece, o Soma até Abbeville.
Tudo deveria funcionar às mil maravilhas e de fato funciona relativamente
bem.
Haverá brigas sórdidas da família Varirobais: deixemo-las de lado. Há
sobretudo, continuamente, as incisivas exigências do deve e haver. Entre
174O e 1745, vendemse todos os anos, em média, 1.272 peças a 50O libras
cada, isto é, 636 mil libras. Essa soma é o capital de giro (salários,
matérias-primas, despesas diversas), mais o lucro. O grande problema
consíste em retirar as 15O a 20O mil libras da Massa salarial e em
amortizar um capital que deve ser da ordem do milhão ou mais e exige
Periodicamente reparações e renovação. Há Momentos difíceis, tensões, e
sempre, COMO Solução simples, despedimento de pessoal. Em

1686, rebenta um primeiro Protesto dos operários, depois uma greve


tumultuosa, em 1716. com efeito, os operários vivem numa espécie de
semidesemprego perpétuo,
Pois a manufatura só mantérn, em caso de regressão'seu Pessoal mais
graduado os contramestres e os Operarios qualificados. Trata-se, aliás,
de uma evolução característica das empresas novas: o leque cada vez mais
aberto de salários e de funções.
A greve de 1716 só cedeu com a chegada de uma pequena tropa armada. Os
agitadores foram presos, pois há agitadores, depois perdoados. O
subdelegado de
Abbeville não é, evidentemente, favorável aos amotinados, essa gente que
"em tempos de abundância se entrega ao desregramento em vez de economizar
para os temPos de fome" e que "não atentam a que a manufatura não foi
feita para eles, eles e que foram feitos para a manufatura". A ordem será
restabelecida com firmeza a julgar pelas reflexões de um viajante que,
alguns anos mais tarde em

1728, ao passar Por Abbeville, admira tudo da manufatura: os edifícios "à


holandesa", os "3.50O operários e 40O moças" que lá trabalham, "os
exercícios [que] fazem ao sorri do tambor99, s moças que são "dirigidas
Por mestras e trabalham separadaTiente". "Não há nada mais bem ordenad
'onclUi369.
0, mais corretarnente mantido", De fato, sem as complacências do governo,
a empresa não se teria mantido w tanto tempo, visto que'para seu
infortúnio, se instalara numa cidade indus'iosa, "cOrporativa", tal como
uma enorme pedra jogada no charco. A hostilidae contra ela é
generalizada, inventiva, competitiva. Passado e presente não coexisM de
modo paCífiC0370.

111. 114U Ubu 178O 180O 18-20

20. AS VITóRIAS DE SAINT-GOBAIN wrtar-se às explicações do texto,


principalmente no que diz respeito ao denier.
Este grdficofoi tirado da tese datilofada de Claude Pris, La Manufacture
royale de Saint-Gobain, 1665-1830, 1.297 pdginas, cuja publicação seria
de nde interesse.
antigo renome que durante 9O anos pertencera à mesma família, tem 6O mil
liIs a descoberto. Tais dificuldades são devidas a um incêndio, à morte
de Laurent isson, que obrigou a manufatura (em conseqüência de partilhas,
imagino eu) a ler uma parte de seus locais e a construir outros, por fim
a um investimento infenas exportações para a Nova Inglaterra, isto é,
para os Insurgents logo após a i independência - fundos que "ainda não
têm rendimento""'.
Pelo contrário, o caso da Saint-Gobain11O apresenta-se como um êxito,
depois

1725-1727. A manufatura dos vidros, fundada no tempo de Colbert, em 1665,


, eve a renovação dos seus privilégios até a Revolução, a despeito dos
protestos, lentos, por exemplo, em 1757, dos partidários da livre
empresa. O fato de, em Q, uma má gestão redundar em falência é um grande
acidente de percurso, mas smo assim a empresa prossegue, com nova direção
e novos acionistas. Graças monopólio exclusivo que reserva à manufatura a
venda de vidros na França e portação, graças ao surto generalizado do
século XVIII, define-se com nitidez a expansão depois de 1725-1727. O
gráfico acima indica o movimento geral de ócios, a curva do juro
distribuído aos acionistas, finalmente a evolução do prelo "denier" que
não deve ser assimilado a uma ação comum, cotada na Bolsa. nPouco se deve
atribuir à empresa a liberdade de ação de uma Joint Stock Comy inglesa da
época ou das sociedades anônimas formadas na França consoante 'ódigo de
Comércio de

1807.
Em 1702, o restabelecimento da manufatura foi feito graças a arrematantes
Isienses, entenda-se, banqueiros e financistas preocupados então em
proteger

A produção ou o capitalismo em casa alheia o dinheiro com a compra ou de


terras ou de participações. Nessa altura, o fundo de capital da sociedade
foi dividido em 24 --sols-, dividindo-se cada sol por sua vez, em 12
"deniers", num total portanto de 288 deniers, repartidos de modo desigual
entre os 13 acionistas da recuperação. Essas partes ou ações são
divididas pelas mãos de sucessivos detentores, ao sabor de heranças e de
algumas cessões. Em

1830, Saint-Gobain conta com 204 acionistas, alguns possuindo frações por
vezes ínfimas - oitavos, dezesseis avos - de deniers. Os preços destes
últimos, quando são estimados como parte de heranças, permitem
reconstituir a alta da cotação atravês dos tempos.
com toda a evidência, o capital aumentou muito. Mas talvez o fato deva
ser atribuído, em parte, ao comportamento dos acionistas. Em 1702,
tratava-se de homens de negócios, de arrematantes; mas, a partir de 1720,
as partes pertenciam às grandes famílias da nobreza em cujas fileiras os
herdeiros dos arrematantes haviam contraído casamento. É o caso da
senhorita Geoffrin, filha do tesoureiro da manufatura, e da senhora
Geoffrin, tornada célebre pelo seu salão, que se casou com o marquês de
La Ferté-Imbault. A manufatura foi portanto passando para o controle de
nobres que viviam de rendas e não de verdadeiros homens de negócios -
nobres que se contentavam com dividendos regulares e comedidos em vez de
exigirem a parte integral dos lucros. Não uma maneira de aumentar, de
salvaguardar o capital?
Sobre os lucros industriais
Seria evidentemente exagerado avançar, arriscar, em matéria de lucros
industriais, um juizo de conjunto. Essa dificuldade, para não dizer essa
quase impossibilidade, pesa muito sobre a nossa compreensão histórica da
vida econômica de outrora e mais precisamente ainda do capitalismo.
Precisaríamos de números, números válidos, séries de números. Se a
investigação histórica, que outrora nos deu uma profusão de curvas de
preços e de salários, nos oferecesse hoje o registro, de forma correta,
da taxa de lucro, os resultados poderiam traduzir-se em explicações
válidas: compreenderíamos melhor por que o capital hesita em procurar na
agricultura outra coisa além de uma renda: por que o universo instável da
pré-indústria se apresenta ao capitalista como uma armadilha ou um
terreno perigoso; por que este tem vantagem em se manter à margem desse
campo de atividade difuso.
O que é certo é que a opção capitalista só pode aumentar a distância
entre os dois andares - a indústria, o comércio. Estando o poder do lado
do comércio, senhor do mercado, os lucros industriais são constantemente
comprimidos pelas retiradas comerciais. Vemo-lo claramente em centros em
que uma indústria moderna não teria tido dificuldade alguma em prosperar:
por exemplo, as malharias de máquina ou a indústria da renda. Esta, em
Caen, no século XVIII, não é, nem mais nem menos, senão a constituição de
escolas de aprendizagem, o aproveitamento da mão-de-obra infantil, a
constituição de oficinas, de "manufaturas", por conseguinte, uma
preparação para a disciplina de grupo sem a qual a Revolução industrial
não teria realizado tão depressa seus "enxertos dilacerantes". Ora, essa
indústria de Caen ficou realmente periclitante e certa firma só se
reergueu porque um jovem empreendedor se lançou no comércio atacadista -
inclusive o de rendas.
299

- - uincia
De modo que quando o negócio prospera de novo é impossível calcular o
lugar ocu)ado pela manufatura.
Naturalmente, nada mais simples do que explicar, em face do enorme setor,
ndustrial, a carência das nossas medições. A taxa de lucro não é uma
grandeza acilmente apreensível; sobretudo, ela não tem a regularidade
relativa da taxa de uro381 que se pode, de certo modo, apreender por
sondagem. Variável, traiçoeia, ela se esquiva. O livro, em tantos pontos
de vista inovador, de Jean-Claude
Perot, demonstrou, porém, que tal busca não era ilusória, que se
conseguia definir personagem, que se poderia mesmo escolher, se
necessário, como unidade de re-rência, na falta da empresa (que aliás nem
sempre nos escapa), a cidade ou a proíncia. A economia nacional? É
preciso não pensar muito nisso.
Em suma, a investigação é possível, embora seja tremendamente cheia de
difiLildades. O lucro é o ponto imperfeito382 de intersecção de inúmeras
linhas;
portrito, essas linhas devem ser determinadas, traçadas, reconstruídas,
imaginadas se reciso. Inumeráveis variáveis, é certo, mas afinal Jean-
Claude
Perrot demonstra ue é possível aproximá-las, juntá-las segundo relações
relativamente simples. Há, -ve haver coeficientes aproximativos de
correlação que podem ser discernidos: colecendo x posso ter uma idéia da
grandeza de y... O lucro industrial está portancomo sabíamos, na
intersecção do preço do trabalho, do preço da matéria-prima, preço do
capital e, para terminar, situa-se na entrada do mercado. É a oportuniide
de J.-C. Perrot constatar que o lucro, o ganho do mercador todopoderoso,
rrói continuamente o "capitalismo" industrial.
Em suma, o que mais falta à investigação histórica nesse domínio é o
modelo um método, o modelo de um modelo. Sem Fraçois Simiand e,
sobretudo, sem nest
Labrousse, os historiadores não teriam empreendido alegremente, como fiam
ontem, o estudo dos preços e dos salários. Faltava encontrar um novo
imIso.
Assinalemos, então, se não as articulações de um eventual método, pelo
mes as exigências que ele deveria satisfazer:

1) Coletar, em primeiro lugar, boas ou más (depois se terá tempo para


separáas taxas de lucro conhecidas ou pelo menos assinaladas, mesmo que
limitadas tempo, até pontuais. Ficamos sabendo assim que:
- uma usina siderúrgica "de monopólio feudal", dependente do bispo de
Cra, ia e situada nas imediações da grande cidade, atinge, em 1746, uma
taxa de lude 150%, depois decai, durante os anos seguintes, para 25%383 ;
- em Mulhouse184, em cerca de 1770, os lucros elevam-se talvez, quanto às
Ias, de 23 a 25%, mas, em 1784, situam-se nuns 8, 50%;
- quanto ao moinho de papel de Vidalon-lès-Annonay'85, dispomos de uma e
de 1772

a 1826, com um contraste marcado entre o período anterior a 180O as de


lucro inferiores a 10%, salvo em 1772, 1793 e 1796) e o período posterior
registra um rápido aumento;
- convém reter as substanciais taxas de lucro que conhecemos relativas à
Aleiha da época em que Von Schüle, o rei do algodão de Augsburgo, realiza
um ho anual de 15, 407o entre 1796 e 1781; em que uma manufatura de seda
de Crevê seus lucros oscilarem, em cinco anos (1793-1797), entre 2, 5 e
17, 25%; em as manufaturas de tabaco dos irmãos Bolongaro, fundadas em
Frankfürt e em hst em

1734-1735, possuem, em 1779, dois milhões de tálereS386...

Cardagem do algodão em Veneza, século XVII. (Museu Correr, Coleção


Viollet.)
- minas de carvão de Littry, na Normandia, não longe de Bayeux, para um
investimento amortizado de 70O mil libras, produzem, entre 1748 e 1791,
um lucro compreendido entre 16O mil e 195 mil libraS387.
Mas interrompo esta enumeração, dada apenas a título indicativo. Depois
de transportar esses números para um gráfico adequado, eu marcaria com
tinta vermelha a barra dos 1001o que, provisoriamente, poderia servir de
linha de referência e de divisão: teríamos os recordes acima de 10, os
sucessos nas imediações da barra, os fracassos óbvios estariam perto de
0, até abaixo de 0.
Primeira constatação, mas sem surpresa: as variações são muito
acentuadas, inesperadas, nessa população de números.

2) Classificar conforme as regiões, conforme os ramos industriais,


antigos ou novos, conforme as conjunturas, aceitando de antemão tudo o
que estas conjunturas têm de desconcertante: as indústrias não entram em
declínio ou em ascensão conjuntamente.

3) Tentar, por fim, a qualquer preço, tomar distância, recuando, tanto


quanto possível, até os séculos XVI, XV e até XIV, isto é, escapar ao
estranho monopólio estatístico do final do século XVIII, tentar colocar o
problema nas dimensões da longa duração. Recomeçar, em suma, o que foi
conseguido de modo brilhante pela história dos preços. Será possível?
Garanto que é possível calcular, em Veneza, em

1600, o lucro do empresário fabricante de tecidos. Em Schwaz, no Tirol,


os
Fugger, no seu comércio chamado Eisen und Umschlitthandel (que, adivinha-
se, mis

indústria com troca), obtêm, em 1547, um lucro de 23%388. Mais ainda, um


riador,
A. H. de Oliveira MarqUeS389 conseguiu elaborar, para o fim do séXVI em
Portugal, uma análise bastante desenvolvida do trabalho artesanal. ;eguiu
distinguir, num dado produto, o que cabia, na base, ao trabalho T e
téria-prima
M. Nos sapatos, M = 68 a 78 0/o; T 32 a 2207o; a mesma proporias
ferraduras;
para os produtos de selaria (M 79 a 91 %), etc. Em seguida, -abalho T
extrai-se o excedente (ganho e cabedal) reservado ao mestre, essa parte -
o lucro - varia entre metade, um quarto, um sexto, dezoito avos muneração
do trabalho, isto é, entre 5O e 5, 507o. Uma vez incluído no cálculo ço
do material, a taxa de lucro pode ficar reduzida a uma ninharia.
Partir, em suma, da produção. Ora, nesses imensos setores mal
prospectados, possível distinguir "regras tendenciais" que nos dêem
alguma luz?
Ãá uns dez anos, em colaboração com Frank Spooner391 demonstrei que as is
da produção industrial que conhecemos no século XVI têm geralmente a a de
parábolas. Os exemplos das minas americanas, da fábrica de sarja de
lã :)ndschoote, dos tecidos de lã de Veneza, da produção têxtil de Leyde
são por eloqüentes. Claro que estava fora de questão generalizar a partir
de tão pouados: temos muitas curvas de preços, muito poucas curvas de
produção. Conessa curva de subida rápida e queda brutal é a que permite
imaginar, com probabilidade, no tempo da ecomomia pré-industrial, o
esplendor breve de dústria citadina ou de tal exportação episódica, que
some quase tão depressa, o uma moda; ou o jogo de produções rivais em que
uma liquida a outra; ou.tínua migração de indústrias que parecem renascer
ao deixar o lugar onde ram.
) recente livro de Jean-Claude Perrot sobre a cidade de Caen no século
XVIII riga e confirma essas observações a propósito de quatro ramos
industriais esos minuciosamente no âmbito das atividades da cidade
normanda onde se sum: os tecidos de luxo e de baixa qualidade; as malhas;
as lonas; e, para ter, o caso "exemplar" da indústria da renda. É, por
alto, a história de sucesso íssimo prazo, o que equivale a dizer que é
uma sucessão de pardbolas. Alguifluências externas naturalmente atuam:
por exemplo, a ascensão das étami) Mans atingiu duramente o setor têxtil
de Caen. Mas impõe-se uma constatauanto ao destino local dessas quatro
indústrias: o declínio de uma acarreta nsão de outra, e vice-versa.
Assim, "a manufatura de meias de tear [será]

1 privilegiada- da indústria de lanifícios, abandonada no momento em


que ) rende quase nada392. "A prosperidade das malharias e o recuo dos
lanifí!o...
perfeitamente simultâneos entre os anos 170O e 1760.--393 Por sua vez,
.iaria vai progressivamente cedendo o lugar ao trabalho dos tecidos de
algo)epois, as chitas perdem para a renda, a qual vai por sua vez
progredir, decuar segundo uma parábola perfeita, como se a regra não
tivesse exceções. feito, tudo se passa em
Caen como se cada indústria em ascensão prosperaspensas de uma indústria
em declínio, como se as disponibilidades da cidade,

21. SERÃO PARABóLICAS AS CURVAS DAS PRODUÇõES INDUSTRIAIS?


Já no século XVI as curvas da produção industrial têm formas parabólicas
análogas às que W. G. Hoffmann (British Industry 1700-1950, 1955) traça
para a época contemporânea. Deve-se notar a aberração que é a curva das
minas de estanho do Devon. Em Leyde, há sucessão de duasparábolas.
Gráfico executado por
F. C. Spooner, Cambridge Economic History of Europe, IV, jo. 484.
não tanto em capitais como em mercados dos produtos acabados e em acesso
às matérias-primas e sobretudo em mão-de-obra, fossem limitadas demais
para permitir a expansão simultânea de várias atividades industriais.
Nessas condições, a escolha incide progressivamente sobre a mais rentável
das produções possíveis.
Tudo isso parece natural numa época de economias setoriais ainda muito
mal ligadas entre si. A surpresa, em contrapartida, é descobrir, no livro
de Walther
G. Hoffmann, com a sustentação de numerosas provas estatísticas, a mesma
curva pa

M1NS àR_AIS
- GÕIÃS-1

22. PRODUÇÃO DE OURO NO BRASIL NO SÉCULO XVIII 'ladas. Segundo Virgi7io


Noya Pinto, O ouro brasileiro e o comércio angloportuguês, 1972, ja. 123.
Mais uma ~Urvas são de forma parabólica.
ca, apresentada como uma espécie de "lei" geral que se aplica ao mundo
su;envolvido dos Séculos XIX e XX. Para Hoffmann, qualquer indústria
parti:as exceções confirmam a regra) passaria por três fases: expansão,
teto, reflu, mais explicitamente, uma "fase de expansão com elevação das
taxas de cresto da produção; uma fase de desenvolvimento com taxa de
crescimento em [o; uma queda absoluta dá produção". Para os séculos
XVIII, XIX e XX, cas exceções que
Hoffmann encontrou foram quatro indústrias atípicas: o 0, o papel, o
tabaco, o cânhamo. Mas, considera ele, talvez sejam indústrias -o mais
longo do que as ouiras, sendo o ritmo a distância cronológica entre.o de
partida e o ponto de queda da parábola, distância variável conforme dutos
e, sem dúvida, conforme as épocas. Coisa curiosa, Spooner e eu haviaotado
que o estanho, no século XVI, não seguia a regra.

A produção ou o capitalismo em casa alheia


Tudo isso deve ter um sentido, o que não quer dizer que tenhamos de
imediato a explicação. com efeito, a operação difícil é a de distinguir o
vínculo entre a indústria particular considerada e o conjunto econômico
que a envolve e do qual depende seu próprio movimento.
O conjunto pode ser uma cidade, uma região, uma nação, um grupo de
nações. Uma mesma indústria pode morrer em Marselha e crescer em Lyon.
Quando, no início do século XVII, os espessos tecidos de lã crua que a
Inglaterra enviava antigamente em grandes quantidades para toda a Europa
e para o Levante bruscamente saem de moda, no Ocidente, e se tornam
demasiado caros na Europa de Leste, instala-se uma crise de vendas e de
desemprego, particularmente no Wiltshire, mas também em outros pontos.
Segue-se uma reconversão a tecidos mais leves, tingidos no local, que
obrigam a transformar não apenas os tipos de tecelagem nos campos, mas
também o equipamento dos centros de acabamento. E essa reconversão faz-se
de modo desigual conforme as regiões, de forma que, após a introdução das
New
Draperies, as produções especiais regionais já não são as mesmas: houve
novos crescimentos, quedas que não se recuperaram. O resultado é um mapa
modificado da produção nacional inglesa394.
Mas há invólucros mais vastos do queumanação. Que a Itália, por volta de

1600, perca grande parte de sua produção industrial, que também a


Espanha, por volta da mesma data, tenha perdido grande parte da atividade
de seus teares em
Sevilha, Toledo, Córdoba, Segóvia, Cuenca395, e que essas perdas
italianas e espanholas se tenham inscrito, invertidas, no ativo das
Províncias Unidas, da
França e da Inglaterra, haverá melhor prova de que a economia européia é
um conjunto coerente e, portanto, a seu modo explicativo? E de que tal
ordem é circulação, estruturação, hierarquização econÔmica do mundo, com
correspondência de sucesso e revés numa interdependência bastante
estreita? Pierre Goubert396

sonhou em classificar as fortunas e as riquezas individuais por idades,


as jovens, as maduras e as velhas. É pensar segundo a parábola. Também há
indústrias jovens, maduras e velhas: as jovens brotam na vertical, as
velhas desabam verticalmente.
Todavia, a expectativa de vida das indústrias, tal como a dos homens,
terá aumentado com o tempo? Se tivéssemos, para o período dos séculos XV-
XVIII, nurnerosas curvas análogas às que Hoffmann elaborou, provavelmente
se evidenciaria uma diferença considerável: ritmos muito mais curtos e
irregulares, curvas muito mais estreitas do que hoje. Toda produção
industrial, naquela época de economia antiga, corria o risco de encontrar
rapidamente um gargalo de estrangulamento, no nível das matérias-primas,
da mão-de-obra, do crédito, da técnica, da energia, do mercado interno e
externo. É uma experiência que podemos ver todos os dias nos países em
desenvolvimento de hoje.

>ORTES E EMPRESA, LISTA )s meios de transporte, que existem desde que o


mundo é mundo, tendem a nter tal como são por séculos a fio. No primeiro
volume desta obra, falei desra-estrutura arcaica, com recursos numerosos
e medíocres: barcas, veleiros, ;, carroças, animais de carga, filas de
beIlhorses (cavalos com guizos tilintane levam para
Londres a cerâmica de Staffordshire ou os fardos de tecidos )víncia),
tropas de mulas à moda da Sicília, cada animal atado à cauda do Iente397
ou os 40O mil burlaki, os trabalhadores que sirgam ou conduzem os ; ao
longo do Volga, por volta de 1815398.
s transportes são o remate necessário da produção: quando se aceleram,
tubem, ou melhor. Para Simon Vorontsof, embaixador de Catarina 11 em Loni
escalada da prosperidade inglesa reside numa circulação que, em cinqüenta
se multiplicou pelo menos por cinco199. A arrancada do século XVIII coinm
suma, com uma circulação que tende à perfeita utilização dos recursos s,
sem novidades técnicas verdadeiramente revolucionárias. Isso não quer
diri novos problemas.
Quanto à França, antes mesmo que se construíssem as !s estradas nacionais
do reino, Cantillon40O coloca o dilema: se a circulação licar demais os
cavalos, será preciso alimentá-los em detrimento dos homens. s
transportes são, por si só, uma "indústria", como recordam Montchrestien,
iu Defoe, ou o abade Galiani.
Diz este último: "O transporte... é uma espécie iufatura.--401 Mas uma
manufatura arcaica em que o capitalista não se enfundo. E com razão: só a
circulação dos eixos essenciais se revela "compen". A outra circulação, a
secundária, a comum, a miserável, fica entregue a e contente com um lucro
modesto. Neste caso, calcular a dominação capita, nifica calcular a
modernidade ou o arcaísmo, ou melhor, o "rendimento" -rentes ramos dos
transportes:
dominação fraca sobre o transporte terrestre, a sobre os "veículos
fluviais", mais acentuada quando se trata do mar. E, nto, também aqui o
dinheiro escolhe, não se preocupa em apoderar-se de tudo.
transportes terrestres são habitualmente apresentados como ineficazes.
Duculos, as estradas mantêm-se tais como a natureza as oferece, ou quase.
) ineficácias relativas: as trocas de outrora correspondem a uma economia
)ra. Carros, animais de carga, correios, mensageiros, cavalos de posta
de.iam seu papel em função de uma certa procura. E, feitas as contas, não
-iiu a devida importância à antiga demonstração de W. Sombart402, hoje
Ia, que estabelece o que o born senso nega apriori, isto é, que o
transporte encaminha muito mais produtos do que o transporte pela água
doce dos inais.
álculo de Sombart, conduzido com bastante engenho, fixa uma ordem de i
para a
Alemanha do fim do século XVIII. Sendo o número de cavalos

As empresas de transporte de Ludlow (Shropshire). Quadro de J.-L. Agasse


(17671849). Técnica rodoviária tradicional levada a seu máximo
rendimento: estrada boa, reforço das parelhas. Comparar com as estradas
antigas tantas vezes pintadas por Brueghel. (Basiléia, Offentliche
Kunstsammlung, foto do museu.)

r u cupuansmo em casa aineia )s para os transportes estimado em cerca de


4O mil, podemos estabelecer nilhões de toneladas quilométricas por ano os
transportes em carroça ou de carga (notese de passagem que o total dos
transportes por via férrea vezes superior, para o mesmo espaço, em 1913,
sinal impressionante da a interligação operada pela revolução das
estradas de ferro). Quanto aos e água, o número de barcos, multiplicado
pela sua capacidade média e pe, vindas, dá um total anual compreendido
entre os 8O e 9O milhões de toneilométricas. Portanto, para o conjunto da
Alemanha, entre o fim do sécue o princípio do século XIX - apesar do
importante tráfico fluvial do Elba e do
Oder -, a relação entre as capacidades globais da água doce terrestre
seria favorável a esta última, 5 para 1. Na realidade, o total de avalos
refere-se apenas aos animais de transporte especializado, não aos Je
lavoura, em número muito elevado (no tempo de Lavoisier, 1.200.00O a).
Ora, esses cavalos camponeses asseguram muitos transportes, mais ou !
gulares e sazonais. O transporte terrestre é portanto subestimado por
Soms o cálculo fluvial deixa também de lado, é verdade, o considerável
transmadeira por flutuação.
, er-se-á generalizar a partir do exemplo alemão? Certamente que não no
-espeito à Holanda, onde se faz a maioria dos transportes por água.
Tamalvez, no que se refere à Inglaterra, cortada por numerosos rios
navegáveis
- onde Sombart calcula proporcionais os dois tipos de transporte. Em
con[a, o resto da Europa é, antes, menos dotado do que a Alemanha em vias
Um documento francês de 1778 chega a dizer, exagerando: "Os
transporfeitos quase todos por terra, por causa da dificuldade dos
rioS.--403 É /erificar que em 1828, para
DuteriS404, de 46 milhões de toneladas postas lação, 4, 8 seguem por via
fluvial, o resto por terra (pequena carga: 30, 9; arga: 10, 4). A relação
seria, por alto, de 1 para 10. É verdade que, de 180O Juplicou o número
de carros de carga 405.
volume de transportes rodoviários explica-se, de um lado, pela abundância
os a curtíssima distância, pois, num pequeno trajeto, o carro não é
mais :)so do que a barcaça: em 1708, para transportar trigo de Orléaris
para Papesa é a mesma, seja pela Estrada do Rei, seja pelo canal de
Orléans - duas lernaS411. Por outro lado, dado que o transporte por água
é descontínuo, es obrigatórias e às vezes difíceis entre sistemas
fluviais. O equivalente, em portagens da Sibéria ou da
América do Norte: entre Lyon e Roanne, isto Ródano e o Loire, são usadas
de modo contínuo 40O a 50O juntas de bois. a razão essencial é a oferta
permanente e superabundante do transporte S, pago, como todas as
atividades complementares, abaixo do seu verda!ço de custo. Todos podem
ir beber dessa fonte. Certas regiões rurais Hunsrück renano, o Hesse, a
Turíngia 407 _ certas aldeias, como ourt-aux-Pots, no Barrois, cujos
"carretões", no século XVI, vão até a408

como as aldeias alpinas que, ao longo das estradas, há muito se torcalas


de viagens curtas - especializaram-se no transporte409. Todavia, ao es
Profissionais, a grande massa é a dos camponeses, carreteiros
ocasioexercício dos transportes de carga deve ser absolutamente livre",
declara -dito francês de

25 de abril de 1782; "não deve ter outra restrição a não ivilégios das
messageries [entendendo-se por tal os transportes regulares Ies e de
pacotes que não excedam determinado peso]... Nada se deve fa

A produção ou o capitalismo em casa alheia zer, portanto, que possa


alterar o âmbito dessa liberdade tão necessária ao comércio: é necessário
que o lavrador, que se fez momentaneamente recoveiro para utilizar e
sustentar seus cavalos, possa retomar e largar essa profissão sem
qualquer formalidade. '10

O único defeito desse trabalho camponês é ser sazonal. Contudo, muitos


gostam dele. Assim, o sal do Languedoc, de Peccais, que sobe o Ródanc, em
grandes comboios de barcos sob o controle de importantes mercadores,
quando é desembarcado em Seyssel tem de ir por terra à aldeiazinha de
Regonfle, perto de
Genebra, onde retoma a via fluvial. Um mercador, Nicolas Burlamachi,
escreve de
Genebra, em 1O de julho de 1650: " [... 1 e se não fosse o começo das
ceifas, receberíamos [o sal] em poucos dias"; 14 de julho: "O nosso sal
avança, recebemo-lo todos os dias e, se a ceifa não nos atrasar, espero
em quinze dias ter tudo aqui. [ ... 1 Recebemos dessa partida cerca de
75O carros"; 18 de setembro: "[ ... ] o resto chega de um dia para o
outro, embora presentemente as semeaduras sejam causas [sic] para os
carros não serem tão freqüentes. Mas uma vez tudo semeado, receberemos
imediatamente.' 1411

Um século mais tarde, ei-nos no Faucigny, em Bonneville, em 22 de julho


de

1771. Falta trigo, o intendente quer transportar com urgência centeio:


"Quando há fome, não se delibera sobre o tipo de pão que se há de comer."
Mas, escreve ele ao síndico de Sallanches, "estamos na época mais
premente das ceifas e [ ... 1, sem as prejudicar notavelmente, não
podemos dispor dos carros do campo como

412

seria de desejar" . Saboreemos esta reflexão do capataz de um mestre


ferreiro (23 ventoso ano VI): "As charruas [leia-se as lavras] impedem
totalmente os recoveiros de andar.11413

Entre essa mão-de-obra que se oferece espontaneamente assim que o


"calendário"
agrícola o permite e o sistema de postas e messageries com datas fixas,
instaurado pouco a pouco e muito cedo por todos os Estados, há também um
transporte especializado e que tende a organizar-se mas só o consegue,
nove em cada dez vezes, de modo elementar. Trata-se de pequenos
empresários com alguns cavalos e cocheiros. Um levantamento relativo a
Hanover, em 1833, indica que o caráter artesanal do transporte terrestre
é aí ainda a regra. A Alemanha continua a ser atravessada, de norte a
sul, como no século XVI, por transportes "livres" ou "selvagens por
direito" (Strackfuhrbetrieb, diz-se nos Cantões suíços) assegurados por
carreteiros que vão ao acaso, à procura do frete, "navegando como
marinheiros", longe de casa meses a fio, e que às vezes ficam parados por
causa de avarias. O século XVIII assiste ao seu apogeu. Mas ainda existem
no século XIX. E tudo leva
414

a crer que sejam os seus próprios empresários .


Todos os transportes fazem escala nas estalagens - o que se observa na
Venécia já no século XV1415, na Inglaterra de um modo muito mais claro
ainda no século
XVII, onde a estalagem se torna um centro comercial que nada tem a ver
com uma hospedaria atual. Em 1686, Salisbury, pequena cidade do condado
de Wilts, podia alojar em suas estalagens 548 viajantes e 865 cavaIOS416.
Na França, o hoteleiro é na realidade o agente dos transportadores. De
modo que, em 1705, o governo, que quer criar cargos de "agentes dos
carreteiros", o que conseguirá, apenas temporariamente, em Paris, fica
numa boa situação atirando toda a culpa nos hoteleiros: "Todos os
carreteiros do Reino se queixam de que há vários anos os hoteleiros e
estalajadeiros, tanto de Paris como de outras cidades, se tornaram
senhores de todo o transporte viário, de maneira que são obrigados a
passar pelas mãos destes, não conhecem mais as pessoas que geralmente
fazem as remessas e só recebem,

309

- -- "tfwía )s seus carretos, o preço que agrada a tais hoteleiros e


estalajadeiros pagarlhes; tais estalajadeiros os levam a consumir em
despesas nos seus estabelecimentos s permanências inúteis que neles têm
de fazer, o que faz com que comam o preço seus carretos e i à não possam
sustentar-se.' 417 O mesmo documento indica que Paris o transporte viário
deu origem a umas cinqüenta ou sessenta estalagens.

1712, no Parfait Négociant, Jacques Savary41 8 apresenta os hoteleiros


como os [adeiros "agentes dos carreteiros" que, além disso, se encarregam
de pagar as rsas taxas, direitos aduaneiros e de barreira e de receber
dos mercadores o preço transportes, que adiantam aos transportadores. A
imagem é igual à que apresenm acima, mas desta vez benevolente, sem que
seja forçosamente mais justa.
Isto posto, compreende-se melhor a opulência de tantas estalagens de
províriUm italiano deslumbra-se, em 1606, com os requintes de uma
estalagem de es, com estalajadeira e filhas de "nobre comportamento",
"belas como gre', a mesa com suntuosa prataria, dosséis dignos de um
cardeal, iguarias delicao gosto inesperado do óleo de noz aliado ao do
peixe e "um vinho de Borgo_branco...
muito turvo, como o vinho corso, e que dizem ser natural, melhor aladar
do que o tinto". Pois este italiano acrescenta acidentalmente: "e quai
cavalos de carruagem e mais nas estrebarias", decerto sem se dar conta de

419

uma coisa explica em grande parte a outra.


Mais do que entre carreteiros e estalajadeiros, o conflito e as
rivalidades são transportes privados e transportes públicos. Os
"carreteiros concessionários"
nessageries régias, que transportam viajantes e pequenas encomendas,
queriam.- o monopólio de todo o transporte viário. Mas os editos a seu
favor nunca am efeito, pois os mercadores sempre se lhes opuseram
vigorosamente. De faque está em jogo é não só a liberdade do transporte
viário mas também o reço. "Esta última, a liberdade do preço dos carros,
é tão... importante para nércio", conta
Savary des Bruslons, "que os Seis Corpos dos mercadores [de ], num
documento apresentado em 1701... denominam-na Braço Direito do !rcio e
não temem afirmar que o que lhes custaria 25 ou 3O libras, pelo porte uas
mercadorias por
Messagers, coches e carruagens arrendadas, só lhes cus5 libras pelos
Rouliers, por causa da fixação do preço que os Carreteiros
Conmários nunca diminuem e do preço voluntário que se combinava com os
ou, em que os mercadores mandavam tanto quanto os carreteiros-
transportado42O Épreciso reler as últimas linhas desse texto para
entender-lhes o sabor e ince, entender, assim, o que protegeu e perpetuou
a liberdade de transporte das pessoas modestas e dos pequenos
empresários. Se bem interpreto uma passagem das Métnoires de Sully, este
dirige-se a pequenos transportadores mandar levar para Lyon os pelouros
necessários à artilharia real envolvida erra da Sabóia:
"Tive o prazer de ver tudo isso chegar a Lyon em dezesseis ao passo que
pelas vias comuns teriam sido necessários dois ou três meses e Jespesa
infinita para fazer esse transporte. 99421

4o entanto, nos eixos dos grandes tráficos nacionais e internacionais -


como
Antuérpia ou de Hamburgo para o Norte da Itália -, surgem grandes
firmas )ortadoras, os Lederer, os CleinhaUS422 os Armone, os Zolhier423.
Em 1665, nações sucintas assinalam uma sociedade de transportes nesse
trajeto, ou parte trajeto, a dos senhores Fieschi e Cia. Uns vinte anos
mais tarde, solicitando as vantagens, cantando louvores a si própria, ela
afirma que todos os anos gasta triça 30O mil libras, "dinheiro que se
distribui e espalha ao longo das estradas,

> Paris ~Troyes

23. IDA E VOLTA PARIS-TROYES-PARIS NOS BARCOS DE PASSAGEIROS DO SENA


O gráfico de Jacques Bertin mostra que o trdfico descendente rende mais
do que o trdfico montante, se nos ativermos apenas às receitas. 108
viagens de descida,

111 de subida: há equivalência entre as duas correntes, o que dá, por mês
e nos dois sentidos, um pouco menos de quatro viagens, por alto, um ritmo
semanal. A falia de uma ou duas viagens, em dezembro de 1705, explica a
brusca subida das receitas para a primeira descida de janeiro de 1706.
Segundo A.N., 2209.
: dezembro janeiro
- i fevereiro
- = março abril maio junho n
D julho agosto setembro outubro

novembro dezembro janeiro fevereiro março abril maio (D junho o r- julho


agosto setembro outubro novembro dezembro janeiro fevereiro março abril

18001200

0
600

1200

Cocheiros: Brigault Millou Missonet

60O receita em libras

24. A CIRCULAÇÃO RODOVIÁRIA EM SEINE-ET-MARNE: 1798-1799

to produto da taxa de manutenção das estradas do l Frimário ao 3O


Prairial Ano
VII. Mapa elaborado Irbellot. -Les barrières de l'An VII", in Annales
E.S.C., julho-agosto 1975, p. 760.

, -1 ~UuÇ;uu UU U cuy(~13rflu em "3U ut, tetu tanto aos agentes


previamente estabelecidos nas cidades de passagem do trânsito como aos
hoteleiros, ferradores, carpinteiros de carroças, correciros e vários
outros súclitos do rei' 424. A maior parte dessas grandes sociedades têm
suas bases nos Cantões suíços ou na Alemanha do Sul onde os carros
desempenham um papel decisivo, sendo o grande negócio, na ocasião,
interligar as regiões ao norte e ao sul dos Alpes. A organização abrange
cidades como Ratisbona, Ulm,
Augsburgo, Chur, mais ainda talvez Basiléia, onde se encontra tudo: os
carros, a água do Reno, as caravanas de mulas utilizadas na montanha. Uma
sociedade de transportes não possuía sozinha um milhar de mulas 4259 Em
Amsterdam, naturalmente, uma organização muito moderna já está em
serviço. Observa Ricard filho426 : "Temos aqui pessoas muito abastadas e
ricas a quem chamamos
Expedidores, e basta aos mercadores se dirigirem a elas quando têm
algumas mercadorias para enviar [por terra]. Estes expedidores têm
cocheiros e carreteiros contratados que só viajam para eles." EM Londres,
as facilidades são as mesmas, ao passo que no resto da Inglaterra, a
especialização dos transportadores será por certo tardia, entre o mundo
de mercadores e de fabricantesviajantes que anima todas as estradas da
Grã-Bretanha, nos Séculos
XVII e XV111427. Na Alemanha, mesmo no princípio do século XIX, os
mercadores chegam às feiras de Leipzig com suas próprias parelhas e suas
mercadoriaS428.
Também na França a evolução não é muito rápida: "Só depois de 1789 é que
nascem as grandes empresas de transporte. São cerca de 5O em 1801, 75 em
1843.99429

Em toda essa organização tão tradicional, mas tão vigorosa, só coube ao


mercador deixar-se levar. Por que haveria ele de intervir para organizar
(outros diriam ' racionalizar") de modo capitalista um sistema em que uma
concorrência abundante joga a seu favor, em que, como "não temiam
avançar", os mercadores dos Seis
Corpos, em 1701, "mandavam tanto quanto os carreteiros transportadores"?
Tanto, ou mais?
Os transportes fluviais
Muito se tem louvado a água doce que leva barcaças, bateiras, barcos ou
jangadas, ou troncos de árvores mediante flutuação, a água doce e seus
transportes fáceis e a preço baixo. Ora, trata-se de verdades
circunscritas, limitadas.
Defeito mais freqüente do transporte fluvial: a lentidão. Naturalmente,
com a corrente a favor, vai-se de barco de Lyon a Avignon em 24 horas"'.
Mas, para um comboio de barcaças ligadas umas às outras que deve subir o
Loire de Nantes a
Orléans, o intendente desta cidade (2 de junho de 1709) "contratou com os
barqueiros para levar os trigos, [da Bretanhal com quaisquer ventos e
águas sem detença [isto é, sem fazer escalas] porque de outro modo não os
teríeis antes de três meses" 431. Estamos longe dos 12 quilômetros
diários que Werner Sombart concede aos barqueiros dos rios alemães. Lyon,
vítima de uma escassez que se está transformando em penúria, espera os
barcos que sobem da Provença carregados de trigo: o intendente (16 de
fevereiro de 1694) pensa com inquietação que não podem chegar antes de
seis semanas 432. Além da natural lentidão, o transporte fluvial depende
dos "caprichos dos rios", das águas altas ou baixas, dos ventos e
"geleiras". Em Roanne 433 quando o barqueiro se atrasa por causa das
águas, está previsto que fará uma declaração perante o notário. E tantos
outros obstáculos: os destroços que não são retirados, as barragens de
pesca, as represas dos moinhos, as balizas que desaparecem, os bancos de
areia ou os rochedos que nem sempre

313

25. PORTAGENS E ALFÃNDEGAS AO LONGO DO SAõNE E DO RóDANO EM MEADOS DO


SÉCULO XVI
- s Carrière afirma que asportagens do Ródimo (mas no seculo XVIII) não
são o terrivel obstáculo de quefilam adores e contemporâneos. Mesmo
assim, no dia-adia dos transportes, quantasparadas, quantas complicaçóes
V! Esboço extraído do livro de Richard Gascon, Grand Commerce et vie
urbaine au XVIII siècle, Lyon et ses inds, 1971, 1, p. 152, figuras 20-
21.
Vitados. E finalmente as numerosas portagens onde todos param: contam-se
zenas no Loire Ou no Reno, como que para desencorajar o transporte
fluvial. ranÇa, no século XVIII, uma política sistemática tenderá a
suprimir as portanstaladas mais ou menos recentemente e de modo
arbitrário; quanto às outras, larquia hesita perante a indenização que
deveria acompanhar a supresSão434.

Os canais são uma solução moderna e racional: mas neles a lentidão


recobra os seus direitos com as eclusas. o canal de Orléans, em 18
léguas, conta com 3O eclusas; o canal de Briare, em 12 léguas, 41 eclusas
435. O canal de Lübeck a
Hamburgo também tem tantas que, segundo um viajante, em 1701, "às vezes
são necessárias cerca de três semanas para passar de Hamburgo para Lübeck
por essa via; [contudo] não deixa de haver um born número de barcos que
vão e vêm pelo canal' 436.
última dificuldade, e não a menor: os próprios barqueiros, pessoas vivas,
independentes, unidas e que se apóiam mutuamente. Uma humanidade à parte,
cuja singularidade é visível ainda no século XIX. Por toda a parte, o
Estado tentou disciplinar este mundo agitado. As cidades controlam-nos,
recenseiam-nos. Em
Paris, já em 1404, elabora-se uma lista dos barqueiros por "portos" das
margens do Sena. Até os "passadores", que levam pessoas e mercadorias de
uma margem para a outra, estão submetidos às regras de uma
pseudocomunidade, estabelecida pela cidade em 1672 437.
O Estado preocupa-se também em criar serviços regulares de coches com
partida em dias fixos. Daí algumas concessões: assim, o duque de La
Feuillade recebe o direito de colocar coches fluviais "no rio de Loire"
(março de 1673)438; o duque de Gesvres (1728) consegue a outorga do
"privilégio dos coches do Ródano", que aliás venderá por 20O mil libras,
uma fortuna 439. Esboça-se toda uma regulamentação, tarifas, condições de
acolhimento, em terra e na água, tanto para os coches fluviais como para
os veículos, e para a sirga. Criam-se no Sena, de Rouen a Paris, alvarás
de mestres transportadores, a 1O mil libras cada, o que institui um
monopólio em seu benefício 440. Surgem milhares de contendas entre
transportadores e transportados, coches e "veículos fluviais", mercadores
e barqueiros.
Assim um acirrado conflito opõe os barqueiros do Soma e os mercadores de
Amiens, de Abbeville e de Saim-Valery, em 1723 e 1724441. Tais barqueiros
são chamados gribaniers, em virtude do nome de seus barcos - as gribanes
- que não devem ultrapassar 18 ou 2O toneladas, segundo os regulamentos
vigentes. Queixam-se das tarifas demasiado baixas, fixadas cinqüenta anos
antes, em 1672. Dado o aumento dos preços desde aquele longínquo ano,
pedem a duplicação das tarifas.
Chauvelin, intendente da Picardia, preferia suprimir qualquer tarifação e
deixar funcionar, como diríamos hoje, a oferta e a procura entre
barqueiros e mercadores, tendo estes a "liberdade de fazer transportar
suas mercadorias por quem bem entenderem e pelo preço que combinarem com
os transportadores". Os gribaniers perderiam nesses ajustes feitos de
comum acordo uma vantagem corporativa: a que impõe aos carregadores pegar
uma carga segundo uma lista de espera.
A discussão dá-nos informações úteis sobre as regras do ofício. Entre
outras, qualquer desvio e alteração das mercadorias transportadas implica
castigos corporais para o responsável. O barqueiro que carrega em Saim-
Valery mercadorias para Amiens não terá o direito de ficar ancorado "por
mais de uma noite em
Abberville, sob pena de se tornar responsável pelas perdas e danos que
daí possam resultar, pelos quais a gribane... ficará vinculada por
privilégio e preferência aos seus credores, sejam eles quem forem, mesmo
ao proprietário".
Estas três últimas palavras colocam o problema do proprietário da
gribane, -meio de produção" utilizado por um não-proprietário442.
Vemos ainda melhor o problema num caso como o de Roanne 443. Situada às
margens do Loire no ponto onde este se torna navegável, Roanne é, além
disso, ligada por terra a Lyon, isto é, ao Ródano, ocupando uma posição
estratégica no

coche fluvial, por Ruysdaêl. É densa a circulação nos cursos de tigua da


Holanda, rios, eirões, canais. o coche típico é puxado à sirga por um
cavalo.
Mas há maiores e mais, uosos, com cabines e viagens noturnas. (Haia,
Coleção
Marcel Wolf, clichê Giraudon.)
w médio que, de Lyon, pelo Loire e pelo canal de Briare, permite a
conexão direentre a capital e o Mediterrâneo. Roanne deve às suas
sapinières [pequenas bars de pinho] que transportam as mercadorias na
descida (e são desmanchadas no n da viagem) e às suas barcaças de
carvalho equipadas com uma cabine para os issageiros ricos, pelo menos a
metade da atividade direta e indireta de seus habintes, mercadores,
carreteiros, carpinteiros, marinheiros, remadores, carregados... Depressa
se estabeleceu uma distinção entre os mestres condutores que trabaam
pessoalmente em barcas que lhes pertencem com companheiros e aprendizes,
m comerciantes do transporte fluvial, capitalistas modestos, donos de
barcos mas ie têm prepostos e marinheiros para os conduzir. Há assim,
mais de uma vez, paração entre os trabalhadores e seus instrumentos de
trabalho. Morando em cas decentes, casando-se no seu meio, os mercadores
dos transportes fluviais consmem uma elite onerosa para o difícil
trabalho dos outros, pois rude é a tarefa descer o Loire, sobretudo
quando o rio, muito agitado, for aberto a uma naveição heróica e
perigosa, a montante de Roanne, desde Saint-Rambert, onde era nbarcado o
carvão-de-pedra da bacia de Saint-Étienne, a partir de 1704. O tráfi)
do Loire acha-se assim transformado pela descida desse carvão destinado a
Pas (especialmente às vidrarias de Sévres) e pela chegada a Roanne e aos
portos a isante, levados por carretas, dos tonéis de vinho de Beaujolais,
sempre para
Pas. Os mercadores transportadores, instalados em Roanne, em Decize, em
Digoin, ram grandes vantagens dessa dupla oportunidade. Alguns deles
estão então à frente e verdadeiras empresas transportadoras. A dos Berry
Labarre, a mais importante,

associou-se a uma oficina para a construção de barcos. Seu grande êxito


foi estabelecer quase um monopólio do transporte de carvão. Quando, em 25
de setembro de 1752, em Roarme, uns mestres condutores se apoderam dos
barcos carregados de carvão dos Berry Labarre, com a pretensão de eles
mesmos conduzilos a Paris, fica evidente, nesse preciso momento, um
conflito social que nem por isso é dirimido. Sim, há aí certo
capitalismo, mas as tradições, os inúmeros entraves - administrativos ou
corporativos - não lhe deixam largo campo de ação.
Comparativamente, a Inglaterra parecerá ainda mais livre do que é. Nada
mais simples para um estalajadeiro, mercador ou qualquer intermediário do
que organizar um transporte. O carvão-de-pedra, taxado somente no mar,
viaja sem nenhum entrave por todas as estradas e rios da Inglaterra e até
de rio para rio pelo estuário niarítimo do Humber. Se o carvão sobe de
preço ao longo dessa viagem é apenas devido às despesas de transporte e
de transbordo, que aliás não são pequenas: em Londres, o carvão de
Newcastle é pago cinco vezes mais caro, pelo menos, do que no depósito da
mina. Quando torna a partir da capital para a província, em outras
embarcações, o seu preço à chegada pode ser dez vezes maior444 . Na
Holanda, a liberdade e a simplicidade da circulação na rede de canais são
ainda mais evidentes. Os coches fluviais são barcos relativamente
pequenos, com 6O passageiros, 2 condutores, um único caval0445, que
partem das cidades de hora em hora. Chegam a viajar de noite e alugam-se
quartos a bordo.
Pode-se partir de Amsterdam à noite, dormir e chegar a Haia no dia
seguinte de manhã.
Por mar, o volume e a importância dos investimentos são maiores. O mar é
a riqueza. Contudo, também aqui nem todos os transportes estão sob o
controle do capital. Por toda a parte existe uma vida marítima elementar
e dinâmica: barcos, às vezes sem ponte, às centenas, transportam seja o
que for, de Nápoles para
Livorno ou para Gênova, do cabo Corso para Livorno, das Canárias para as
Antilhas, da Bretanha para Portugal, de Londres para Dunquerque; ou os
inumeráveis barcos de cabotagem das costas inglesas ou das Províncias
Unidas; ou as tartanas ligeiras dos rios genoveses e provençais, que
oferecem a tentação de uma viagem rápida aos viajantes apressados que não
temem o mar.
com efeito, esse nível inferior do transporte marítimo se equipara à
efervescência dos transportes camponeses no interior das terras. Insere-
se no âmbito das trocas locais. É que os campos desembocam no mar, ligam-
se a ele numa união elementar. Seguindo o traçado do litoral da Suécia,
da Finlândia, dos países bálticos, depois do SchIeswig, do HoIstein, da
Dinamarca, depois as costas de Hamburgo até o golfo do Dollart onde se
situa a atividade obstinada e variada do pequeno porto de Ernden, e
depois a costa toda sinuosa da Noruega, até pelo menos a altura das ilhas
Lofoten - observam-se regiões (com exceções que confirmam a regra) mal
urbanizadas ainda no século XVI. Ora, todas essas costas fervilham de
barcos de aldeãos, em geral modestos, de construção simples e que
transportam de tudo (multa non multum): trigo, centeio, madeira (ripas,
barrotes, pranchas, asnas, adueIas para tonéis), alcatrão, ferro, sal,
especiarias, tabaco, tecidos. Pelo fiorde norueguês, perto de Oslo, lá
vão eles em longas caravanas, transportando sobretudo madeira destinada à
Inglaterra, à
Escócia ou à vizinha Liibeck446.

Quando a Suécia se instala nos estreitos, e se estabelece solidamente na


província de Halland (paz de Brõmsebro, 1645), herda uma ativa frota
camponesa, que leva ao estrangeiro pedra Para construção, madeira, e às
vezes traz carregamentos de tabaco, a não ser que, depois de terem
navegado durante o verão dos portos da Noruega para os do Báltico, esses
barcos voltem aos estreitos nas vésperas do mau tempo de inverno, com
seus ganhos em dinheiro sonante. Esses "Schuten" serão importantes na
guerra da Escânia (1675-1679) e são eles que, em

1700, transportarão o exército de Carlos XII até a vizinha ilha de


Seeland447.
Ao sabor da documentação, vamos encontrando camponeses finlandeses,
marinheiros, pequenos mercadores, freqüentadores de Revel, mais tarde de
Helsingfors (fundada em 1554); ou então camponeses da ilha de Rügen e das
aldeias portuárias da foz do Oder, atraídos por Danzig; ou ainda os
pequenos cargueiros de Hobsum, onde começa a Jutlândia, que levam para
Amsterdam trigo, toucinho ou presuntos da região448.
Todos estes exemplos e muitos outros - entre os quais, claro, o Egeu -
evocam a imagem de uma navegação arcaica em que eram os próprios
construtores de barcos que carregavam as mercadorias a bordo e com elas
navegavam, acumulando assim todas as tarefas e funções implicadas pelas
trocas por mar.
Nada mais evidente no que se refere à Europa medieval. A julgar pelas
leis de
Bergen (1274), os rolos de Oléron (1152) ou o costume antigo de Olonne, o
navio mercante viaja no início comuniter (traduza-se "por conta
COMUM-)449. É propriedade de um pequeno grupo de usuarios: como dizem os
rolos de Oléron, "a nau é de vários companheiros". Estes possuem a bordo
lugares marcados onde, chegado o mómento, carregam suas mercadorias: é a
chamada gestão per loca. A pequena comunidade decide a viagem, o dia da
partida, e cada qual estiva no seu "lugar" suas mercadorias, ajuda o
vizinho, recebe ajuda deste. A bordo, cada qual faz também a "sua parte",
participa nas manobras nas vigílias e nas tarefas, embora a regra fosse
dispor de um "criado" assalariad que vivia, como se dizia, "do pão e do
vinho" do seu empregador, substituindo-o nas tarefas e sobretudo, ao
chegar ao porto de destino, liberando-o para que pudesse "fazer seus
negócios". A condução do navio era assegurada por três oficiais
marinheiros, o piloto, o arrais, o contramestre, todos três assalariados
pelo conjunto dos companheiros, postos sob a autoridade do mestre ou
patrão, este escolhido entre eles e que certamente não é quem manda a
bordo depois de Deus.
Companheiro por sua vez, consulta seus pares e recebe, por esse cargo
temporário, apenas presentes honoríficos: um chapéu, calças, um jarro de
vinho.
O barco carregado de mercadorias é portanto urna república, perfeita ou
quase, desde que reine o entendimento entre os companheiros, como
recomenda o costume.
É de certo modo semelhante às associações de companheiros das minas,
antes da dominação capitalista. Entre esses mercadores proprietários e
navegadores, tudo se passa sem grandes cálculos ou divisões: não há frete
para pagar, pois todos pagam em gêneros ou então em serviços; quanto às
despesas gerais - provisões de jornada, despesas "de apresto", etc. -,
eram arcadas por uma caixa comum, chamada conta comum em Marselha, bolsa
gorda em Olonne, etc. Portanto, "tudo se resolve sem contabilidade", e
esta expressão que extraio do livro de Louis-A. BoitettX45O é
perfeitamente clara.
Ora, eis que, mesmo antes do século XV, o volume de alguns cascos aumenta
desmesuradamente. Construí-los, mantê-los, dirigi-]os tornam-se tarefas
tecnica

"7 ? J E 9>001-fft à ^ - ', s ID


M aitre pro & _, ]g u cliv;ron ét du rert, ra a à Uierbourg. poilr du p,,
p qu 11 p] ira a dioit-routeà teffl; zorino, s &c chag dam le bord de
moiidit Nav;re 's ]o F1nC-TiLfaC.
d'icejui, de vous Aleflicurs 1OTEL, Fures fOL

1 1< 1co

1, 11- 4

le tmit fec & bien cwdt!ojn & njzrqtié de Ia n-i, rque en m, r, -e ;


ieiqueijes le promets & m'obli Porrer & conduire dans mond;t_N-vire fauf
les -i audit lieu de-, & ]à les dê]: . 1 81 de Ia Aler, , vrr a AI ú 07,
e) en me payant pour mon Fret, Ia forime de

2 /w~ ZZu(-, avec les avaries felon les Us & Coutumes de lá M "' Et pour
ce ei, ir & aCCOMP;1 ie m'obl;ge corps & biens avec mondit Navire, Fret &
Apparaux d'ce1ui.
En témoip-nage de vérize, j'ai fÍg,, trois CotinoitTemens Xune même
tencur, dQnt l'un accorrípli, les autres de null'. V-lCUr.
V A 1 T à Cherb ourg. ce e ) jour d Z-C, ' mil fept celic
- -Conhecimento ou apólice de carga de um patrão de navio de Cherbourg. -
A.N.,

62 AQ

33. Para comparar, cf. Dictionnaire de Savary, II, pp. 171-172.


mente impossíveis para os companheiros de ontem. Em vez de ser dividido
per loca, o navio grande é dividido per partes, em ações, se se preferir,
o mais das vezes em 24 carats (embora a regra não seja universal: uma nau
marselhesa, segundo um contrato de 5 de março de 1507, é "dividida em
undécimos, por sua vez subdivididos em meios ou três quartos de
undécimo"). O proprietário da parte, o parsonier, receberá todos os anos
seu quinhão dos lucros. Claro que não navega.
E é à autoridade do juiz que recorrerá se tiver dificuldade em que lhe
paguem aquilo a que chamaríamos, para abreviar, o cupom do seu carat.
Encontramos um perfeito exemplo desse sistema de propriedade nos grandes
cargueiros ragusanos do século XVI que às vezes atingem e ultrapassarn,
mas mesmo assim raramente, umas mil toneladas, e cujos co-proprietários
se repartem, eventualmente, por todos os portos cristãos do Mediterrâneo.
Quando um destes veleiros chega a um porto, Gênova, Livorno, os
proprietários dos carats tentam receber a sua parte dos lucros, de modo
amigável ou recorrendo à ameaça: o capitão deve então se justificar,
apresentar as contas.
Essa é uma boa imagem de uma evolução que vai reproduzir-se nas marinhas
do
Norte, a das Províncias Unidas e a da Inglaterra. A bem dizer, uma
evolução dupla ou tripla.
Por um lado, multiplicam-se os vínculos entre o navio e os fornecedores
de capital. Conhecemos os possuidores de partes (certo ricaço inglês do
século XVII
Possui participações em 67 navioS451) e os abastecedores que, como no
caso da pesca do bacalhau, abastecem o barco de víveres, ferramentas, com
a condição de receberem no regresso um terço ou outra porção dos lucros.

chuvas

1 manhã tarde fim de tarde noite pouco fresco fresco bem fresco muito
fresco muito forte constantes intermitentes muito nublado rublado
ligeiramente nublado tempo encoberto claro ito agitado, ondas altas
agitado calmo m

26. SAIR DO PORTO


A corveta La Levrette, navio francês, entrou na baía de Cddiz quarta-
feira, 22

de dezembro de 1784; terá a sorte de esperar apenas até 9 dejaneiro de


1785 para prosseguir sua rota. As indicações do --diário dos ventos-
feito a bordo do navio permitem reconstituir, no correr dos dias, as
condições atmosféricas no oceano. As flechas, que indicam o vento, dão
sua força e direção. Esta pequena obra-prima de registro deve-se ao
interesse e habilidade de Jacques Bertin. A documentação, Arquivos
Nacionais, A.N., A.E., BI, 292.

Por outro lado., é preciso ter em mente - a par da participação que é uma
operação verdadeiramente comercial, com partilha, numa ou noutra
proporção, dos riscos e dos lucros - a prática freqüente do empréstimo de
câmbio marítimo que, pouco a pouco, quase se separa da operação em curso,
da viagem que o barco vai realizar, para se tornar uma especulação quase
puramente financeira. O Com~ pagnon ordinaire du marchand452 tradução
francesa manuscrita de uma obra inglesa escrita em 1698, explica de
maneira saborosa o que pode ser um contrato de câmbio marítimo. Trata-se,
como se sabe, de um empréstimo marítimo, dizia-se mesmo outrora - repare-
se na palavra - usura marina. Para o mutuante, o melhor método é
emprestar para uma viagem a 30, 4O ou 5007o, conforme a extensão da ida e
da volta (tratando-se das índias, ela pode levar três anos ou mais).
Concedido o empréstimo, o mutuante segura imediatamente o dinheiro,
especifiquemos bem: o capital emprestado, mais o juro combinado - seguro
em boa forma, que será concluído a 4, 5 ou 6%. Se o navio naufraga no mar
ou é tomado por um corsário, recupera-se o haver inicial e o lucro
esperado, menos o prêmio do seguro. Ainda se sai ganhando e muito. E o
nosso guia prossegue: "Há hoje gente tão astuta que não só quer que lhes
hipotequem [sic] os navios mas também exigem um born mercador como caução
de seu dinheiro." Se, com mais astúcia ainda, obtémse o dinheiro do
investimento mediante empréstimo, na Holanda, por exemplo, onde o juro
está dois ou três pontos abaixo das cotações inglesas, ganhar-se-á, se
tudo correr bem, sem ficar privado do capital. Trata-se portanto de uma
espécie de transposição, para a área do aparelhamento marítimo, das
práticas bolsistas da época, e o cúmulo da astúcia está em jogar sem
sequer ter dinheiro no bolso.
Entretanto, realiza-se paralelamente outra evolução. Ao crescer, o
transporte marítimo divide-se em diversos ramos. Verdade primeiro
holandesa, depois inglesa. Primeiro sinal: as construções navais
apresentam-se como uma indústria autônoma. Em Saardam, em Rotterdatu453,
empresários independentes recebem as encomendas dos mercadores ou do
Estado e estão aptos a corresponder-lhes com brio, embora a indústria
continue a ser semi-artesanal. E, no século XVI,
Amsterdam não é apenas um mercado de navios novos ou em vias de
construção:
torna-se um enorme mercado para os navios em segunda mão. Por outro lado,
corretores especializam-se nos fretes, encarregando-se de arranjar
mercadorias aos transportadores ou navios aos mercadores. Há também,
claro, seguradores que já não são apenas, como outrora, mercadores que,
entre outras atividades, praticam a dos seguros. E os seguros
generalizam-se, se bem que nem todos os transportadores e mercadores
recorram forçosamente a eles. Mesmo na Inglaterra, onde já assinalei os
seguradores do Lloyd's, que tiveram o brilhante destino que conhecemos.
Há portanto, inegavelmente, uma mobilização de capitais e de atividades,
no século XVII e sobretudo no século XVIII, no setor das grandes viagens
marítimas.
Os financiadores, os armadores (embora a palavra só apareça raramente)
são indispensáveis aos "aprestos- e aos longos circuitos que se estendem
ao longo de anos. Até o Estado insiste em envolver-se, situação que, em
si, não é nova: as galere da mercato, nos séculos XV e XVI, eram barcos
construídos pela Signoria de Veneza e postos à disposição dos mercadores
patrícios para as longas viagens mercantis; também as carracas
portuguesas, esses gigantes dos mares do século
XVI, são bar

ro naval em Amsterdam. Água-forte de L. Backuysen (1631-1708).


(Rijksmuseum, lo museu.)
rei de Lisboa; e os grandes navios da Companhia das índias (de que
voltarei.-)
são, podemos dizê-lo, capitalistas e não menos estatais.
ifelizmente, ainda não conhecemos bem os pormenores desses
aparelhamenorigem, seguramente muito diversificada, dos capitais
investidos. Daí o inde alguns casos aparentemente mal escolhidos, uma vez
que se trata de fraMas o historiador está ligado a seus documentos, e os
fracassos seguidos cesso deixam muito mais vestígios do que as viagens
felizes.
m'dezembro de 1787, dois banqueiros de Paris ainda ignoram como irá tero
caso do
Carnate, um navio aparelhado para a firma Bérard Frères et Cie. rient, em
1776, doze anos antes, para uma viagem às ilhas de France e de on, depois
a
Pondicheri, a Madrasta e à China. Os banqueiros haviam adianm "câmbio
marítimo e sobre o corpo e a carga do referido navio 18O mil a 2807o de
lucros marítimos"
por um prazo de trinta meses. Prudentes, haeito em Londres um seguro,
junto de amigos. Ora, o Carnate nunca chegou ia. Um rombo o danificara na
passagem do cabo da Boa Esperança. Depois sertado, seguiu mesmo assim da
ilha de France para
Pondicheri, onde o rombo u novamente. Deixa então a enseada aberta de
Pondicheri, sobe o Ganges andernagor, onde é consertado e passa a monção
de inverno de 25 de setemW de dezembro de 1777. Depois, tendo carregado
mercadorias em Bengala, Je novo por Pondicheri e regressa normalmente à
Europa... onde é tomado

, -1 ~UuÇ:UU U. -1--.
por corsários ingleses nas costas da Espanha, em outubro de 1778. Teria
sido agradável obrigar os seguradores londrinos a pagar (o que acontecia
muitas vezes), mas no Tribunal do rei os advogados dos seguradores
sustentam que o
Carnate fora voluntariamente desviado de sua rota a partir da ilha de
France, e ganham o processo. Os banqueiros voltam-se então para os
armadores. Se houve desvio, o erro é-lhes imputável. E eis novo processo
em perspectiva454.
Outro caso: a falência da casa Harelos, Menkenhauser et Cie., de Nantes,
em

177 1455, que em setembro de 1788 ainda não estava resolvida. Entre os
credores encontra-se um certo Wilhelmy, "estrangeiro" (nada mais sabemos
dele) que ficara com uma participação de 9/64 (sobre quase 61.30O libras)
em cinco navios dos armadores, já no mar. Como de costume, os credores
foram divididos em privilegiados (proprietários) e quirografários (de
segunda linha). Encontraramse bons argumentos para classificar Wilhelmy
entre estes últimos - o que é confirmado pelo Conselho de Comércio (25 de
setembro de 1788) contra um aresto do Parlamento da Bretanha (13 de
agosto de 1783). Wilhelrny decerto não recuperou o seu dinheiro. Teria
seguro? Não sabemos. Seja como for, a moral da história é que se pode
perder com todos os trunfos na mão, diante de advogados que desenvolvem
imperturbavelmente a lógica dos seus argumentos. Confesso que me diverti
ouvindo-os.
Mesmo o câmbio marítimo, coberto pelo seguro, está portanto sujeito ao
risco, mas um risco limitado, e o jogo é tentador, sendo o juro
substancial sempre que há comércio de longa distância envolvido, com
grandes fundos investidos, prazos longos, lucros consideráveis. Não é de
admirar que o empréstimo de câmbio marítimo, operação sofisticada e
especulativa que, em profundidade, se dirige mais ao lucro comercial do
que ao lucro do transportador, seja quase a única maneira de o grande
capital se envolver no transporte marítimo. Para os transportes de rotina
a pequena distância (ou por itinerários que, no tempo de
São Luís, teriam parecido desmedidos mas se tornaram familiares), o
grande capital deixa o caminho livre aos pequenos empreiteiros. A
concorrência intervém, e muito, para comprimir o frete em proveito do
mercador. É exatamente a mesma situação dos transportadores das vias
terrestres.
Assim, em 1725, pequenos barcos ingleses se atiram literalmente aos
fretes disponíveis, em Amsterdam e nos outros portos das Províncias
UnidaS456. Oferecem seus serviços para excursões até o Mediterrâneo a
preços tão abaixo da cotação, que os freqüentadores do itinerário,
embarcações holandesas ou francesas de boa tonelagem, com grandes
tripulações e canhões para se defenderem, caso seja necessário, dos
piratas barbarescos, ficam, por assim dizer, sem serviço. Prova, se tal é
preciso, de que os grandes navios não levam vantagem, ipso facto, sobre
as pequenas tonelagens. O contrário é mais provável numa profissão em que
a margem de lucro, quando a podemos calcular, parece comedida. Um
historiador belga, W. Brulez, escreve-me a este respeito: "A
contabilidade de treze viagens de navios neerlandeses durante os últimos
anos do século XVI, quase todas entre a península Ibérica e o Báltico,
bem como uma viagem a Gênova e a Livorno, revela um lucro total líquido
de cerca de 607o. Certas viagens proporcionam, claro, um lucro mais
elevado, mas outras redundam em perdas para o armador, outras apenas
equilibram lucros e perdas." Donde o fracasso, em Amsterdam, em

1629 e em 1634, de projetos para a criação de uma companhia que teria o


monopólio dos seguros marítimos. Os mercadores opõem-se, e um dos seus
argumentos foi que as taxas de

, uro propostas ultrapassariam a taxa de lucros previsível ou, em todo


caso, os
- judicariam desmedidamente. Tudo isso, é verdade, no princípio do século
XVII.
is depois disso continua a haver muitos barcos pequenos para pequenos
empre-ios, como o prova o fato de muitas vezes terem apenas um
proprietário em vez se dividirem por vários "parsoniers". É o caso da
grande maioria dos navios landeses que faziam o comércio do Báltico ou
participavam nos beurts (do ho[dês
Beurt = volta), isto é, nas viagens aos portos próximos de Rouen,
Saintlery,
Londres, Hamburgo, Bremen, onde os barcos carregam cada um por sua É
também o caso da grande maioria dos barcos de Hamburgo, no século XVIII.
Tal como para a atividade industrial, para calcular com exatidão o lucro
seria, essário ver as coisas por dentro, esboçar um modelo contábil. Mas
um modelo rejeição do acessório, do atípico, do acidental. Ora, quando se
trata da navegado passado, há uma legião de variáveis acidentais e
acessórias. Elas contam )rmemente nos preços de custos; fogem à regra, se
é que há regra. Na designa)
fortunas de mar insere-se um número incalculável de catástrofes: há a
guerra, irataria, as represálias, as requisições, os seqüestros; há as
inconstâncias do venque ora imobiliza os navios nos portos e os reduz à
inatividade, ora os põe à
- iva ao longe. Há as contínuas avarias (rombos, mastros partidos, leme
em repaão); há os naufrágios, junto à costa ou em alto-mar, com ou sem
mercadorias uperáveis, e as tempestades que obrigam a deslastrar o navio,
lançando ao mar a parte da carga; há o incêndio e o navio que se
transforma em tocha e queima smo abaixo da linha de flutuação. A
catástrofe pode até surgir em frente ao porde chegada: quantos navios da
Carrera de Indias não sucumbiram ao passar a -ra de
San Lúcar de Barrameda, a algumas horas das águas tranqüilas de Sevi! Um
historiador pode afirmar que um navio de madeira é feito para durar de te
a vinte e cinco anos. Digamos que é essa a sua expectativa máxima de
vida, de que tenha a sorte a seu favor.
Em vez de criar modelos, será mais sensato ater-se a casos concretos,
seguir barcos ao longo de toda a sua carreira. Mas as contabilidades não
se interessam ito pelo rendimento de um navio a longo prazo. Apresentam-
se antes como baços de viagens de ida-e-volta, nem sempre claros no que
se refere à disribuição capítulos das despesas. As contas relativas à
expedição de sete navios de Saint10457, em 1706, à costa do Pacífico
fornecem, ainda assim, algumas indicações
Idas. Tomemos um deles, o Maurepas, a título de exemplo: em números
redon, a sua despesa na partida (o que se chama "apresto") eleva-se a
235.217 libras; -ante a viagem, a 51.710; no regresso, a 89.386, isto é,
uma despesa global de.411

libras. Se desdobrarmos essas despesas segundo se referem ao capital fixo


mpra do barco, reparações, equipamentos, despesas gerais - estas muito
penas) ou ao capital circulante (víveres e ordenados dos tripulantes),
obteremos ;eguintes números: para o capital circulante 251.236 contra
125.175 de capital ), isto é, dois para um. O nosso gráfico apresenta,
além destes números, os rela)s a seis outros navios: seu testemunho é
análogo. Sem dar demasiada importân

MAUREPAS
PHELYPEAUX
BONNú NOUVELLE
NECESSAIRE
COMTE DE ROUSSY
PONTCHARTRAIN
ELEONOR DE ROYE
Despesas antes da partida:
Compra do barco Reparações
Equipamento Víveres
Ordenados
Despesas ger,

27. CAPITAL FIXO, CAPITAL CIRCULANTE, CONTAS DE SETE NAVIOS DE SAINT-MALO


Esses navios estiveram nos mares do Sul e, de regresso a França, fazem as
suas contas, por volta de 1707. A grande despesa são os viveres e o
ordenado da tripulação. É o capital circulante que desempenha os
principais papéis. Os documentos provêm dos Arquivos Nacionais, A.N.,
Colônia, F2, A, 16. Gráfico elaborado por Jeannine Field-Recurat.
cia à coincidência, note-se que a contabilidade, conhecida com precisão,
de um barco japonês que se dirige à China, em 1465 458, numa viagem
comercial de longo curso, testemunha também no mesmo sentido. Enxárcia e
casco custaram

40O kwanmon; a alimentação da tripulação para os doze meses previstos de


viagem se eleva a 340, seus salários a 490. A relação entre o fixo e o
circulante é da ordem de 1 Para 2.
Portanto, até o século XVIII, num navio, como na maior parte das
manufaturas, as despesas em capital de giro seriam muito superiores ao
montante do capital fixo.
Basta pensar na extensão dos circuitos e no que ela acarreta - circulação
lenta do dinheiro e do capital investido, muitos meses de salário e de
sustento da tripulação - para achar este resultado bastante lógico. Mas,
tal como para as manufaturas, parece que essa relação do fixo com o
circulante, de F para C, tende a inverterse ao longo do século XVIII.
Temos, quanto à segunda metade do século, as contas completas das viagens
de três navios de Nantes, o Deux Nottons (1764), o Margueritte (1776, São
Domingos), o Bailiii de Suffren (1787,
Antilhas). Nessas três viagens, as relações de C para F são
respectivamente

47.781 libras para 111.517; 46.194 para 115.574; 28.095 para 69.827
(convém notar que se trata de viagens mais curtas do que a dos navios de
Saim-Malo até as costas do Perii)459. Nesses três casos, muito por alto,
2C = F. Quer dizer que se inverteu a situação revelada nos nossos números
de 1706.

Capítulo 4

O CAPITALISMO EM CASA
Se o capitalismo está em casa na esfera da circulação, nem por isso lhe
ocupa todo o espaço. Onde, só onde as trocas são ativas, ele encontra
habitualmente suas linhas e lugares de eleição. Interessa-se pouco pelas
trocas tradicionais, pela economia de mercado de reduzido alcance. Mesmo
nas regiões mais desenvolvidas, há tarefas que ele assume, outras que
partilha, outras que não lhe interessam e deixa claramente de lado.
Nessas escolhas, o Estado ora é seu cúmplice, ora o importuno, o único
importuno que às vezes pode substituí-lo, afastá-lo ou, pelo contrário,
impor-lhe um papel que não teria desejado.
Em contrapartida, o grande negociante não tem dificuldade em se
descartar, todos os dias, passando-as aos lojistas e revendedores, de
certas tarefas de concentração, armazenagem e revenda, ou do
abastecimento normal do mercado, operações menores ou excessivamente
reguladas pelas rotinas e antigos meios de vigilância para deixarem
grande liberdade de manobra.
O capitalismo situa-se assim no interior de um "conjunto" cada vez mais
vasto do que ele, que o transporta e levanta no seu próprio movimento.
Essa posição elevada, no topo da sociedade mercantil, é provavelmente a
mais importante realidade do capitalismo, em virtude do que permite: o
monopólio de direito ou de fato, a manipulação dos preços. Seja como for,
é desse plano elevado que convém descobrir e observar o panorama do
presente capítulo para compreender-lhe o desenvolvimento lógico.

', Mercador banqueiro negociante nos países estrangeiros--. Gravura de


1688.
(Foto B.N, )
, <o TOPO DA SOCIEDADE MERCANTIL
EM todo lugar onde se moderniza, a vida mercantil fica às voltas com uma
poderosa divisão do trabalho. Não que esta seja uma força por si só. É a
amplitude cresceote do mercado, o volume da troca, tal como o
diagnosticou Adam
Smith, que a impulsiona, conferindo-lhe suas dimensões. Afinal de contas,
o motor é o próprio ímpeto da vida econômica e é ele que, reservando a
uns o progresso mais animado, deixando a outros as tarefas subalternas,
tende a criar as grandes desigualdades da vida mercantil.
A hierarquia Inercantil
Porque é certo que nunca houve um país, em qualquer época que fosse, onde
os mercadores se encontrassem num único e mesmo nível, iguais entre si e
como que intercambiáveis. A lei dos visigodos já fala de negotiatores
transmarinil, mercadores à parte que comerciam, além-mar, em produtos de
luxo do Levante decerto os Syri, presentes no Ocidente desde o fim do
Império romano.
Na Europa, as desigualdades tornam-se cada vez mais visíveis depois do
despertar econômico do século XI. As cidades italianas, desde o seu
reaparecimento nos tráficos do Levante, vêem afirmar-se no seu seio uma
classe de grandes comerciantes, em pouco tempo donos dos patriciados
urbanos. E essa hierarquização consolida-se com a prosperidade dos
séculos seguintes. Não serão as atividades financeiras o ápice dessa
evolução? Ora, no tempo das feiras de
Champagne, os Buonsignori de Siena dirigem a Magna Tavola, grande
sociedade puramente bancária
- Rotschild del Duecento é o título do livro que lhes consagrou Mario
Chiaudan02. E a Itália fará escola em todo o Ocidente. Na França, por
exemplo, a ação dos grandes mercadores é visível, no século XIII, em
Bayonne, em Bordeaux, em La Rochelle, em Nantes, em Rouen, etc. Em Paris,
os Arrode, os Popin, os
Barbette, os Piz d'Oe, os Passy, os Bourdon são conhecidos como grandes
comerciantes, e no livro da talha de 1292 Guillaume Bourdon é um dos
burgueses mais tributados de PariS3. Na Alemanha, já no século XIV,
segundo Frederico
Lütgel, esboça-se a separação entre varejistas e atacadistas devido ao
alongamento das distâncias comerciais, à necessidade de manejar
diferentes moedas, à divisão das tarefas (caixeiros, agentes,
armazenistas), à contabilidade que o uso cotidiano do crédito já impõe.
Até então, o mercador importante conservara sua loja de varejo; vivia no
mesmo nível que os criados e aprendizes, como um mestre com seus
companheiros. Inicia-se a ruptura, sem dúvida imperfeita: durante muito
tempo e um pouco por toda a parte, mesmo em
Florença, mesmo em Colônia, alguns atacadistas continuam a vender no
varejo5.
Mas a imagem do grande comércio se destaca nitidarnente, tanto no plano
social como no plano econômico, do pequeno comércio corrente. E isso é o
que conta.
Todas as sociedades comerciais, mais cedo ou mais tarde, engendraram
hierarquias semelhantes, reconhecíveis na linguagem de todos os dias. O
tayir, no Is

lã, é um grande importador-exportador que dirige, de sua casa, agentes e


comissionistas. Nada tem em comum com o hawanti, o lojista do suk6. Na
índia, em
Agra, ainda uma cidade enorme Por volta de 1460, quando Maestre Maririque
passa por ela, designam pelo nome de SOdagor --aquele que entre nós, na
Espanha, chamaríamos mercader, mas alguns se adornam com o nome especial
de Katari, o título mais eminente entre aqueles que professam, naquelas
terras, a arte mercantil e que significa mercador riquíssimo e de grande
crédito" 7. No
Ocidente, o vocabulário assinala análogas diferenças. O "négociant" é o
Katari francês, o dono da mercadoria; a palavra surge no século XVII sem
eliminar de imediato os termos já correntes, marchand de gros, marchand
grOSSier ou apenas grossier, ou marchand bourgeois, em Lyon. Na Itália, é
grande a distância entre o mercante a taglio e o negoziante; também na
Inglaterra, entre o tradesman e o merchant, que, nos portos ingleses, se
ocupa apenas do comércio de longa distância; na Alemanha, entre o Krámer
e o Kaufmann ou Kaufherr. Já para
Cotrugli, em 1456, um fosso separava a prática da mercatura, a arte
mercantil, do exercício da mercanzia, a vulgar mercadoria8.
Não se trata de meras palavras, mas de diferenças sociais manifestas de
que os homens sofrem ou se envaidecem. No vértice da pirâmide, está o
orgulho daqueles que, necpIus ultra, "entendem de câmbio"9. É o desprezo
que os genoveses, que emprestam à Madri de Filipe 11, têm por qualquer
comércio de mercadorias, egundo eles ofício de "bezarioto e de gente piá
bassa", de mercanti e de gente = posses; é também o desprezo do
negociante pelo lojista: "Não sou nenhum nercador de balcão [leia-se
varejista]", exclama um grande comerciante de Honleur,
Charles Lion, em 1679. "Não sou mercador de bacalhau, sou comissionisa",
trabalha por comissão, portanto mercador atacadista". No outro sentido, é
i inveja, quase a cólera. Não será acerbo o veneziano de Antuérpia
(1539), que por erto só obtém relativo sucesso nos negócios e invectiva
contra os homens das randes companhias comerciais, solidamente odiados
pela Corte e mais ainda pelo ovo" que "têm prazer em ostentar a riqueza"?
Todos dizem que "esses grandes anqueiros comem os humildes e os pobres",
inclusive, é claro, os pequenos iercadores11. Mas não desprezam estes,
por sua vez, os lojistas artesãos que traalham com as mãos?
zação apenas
Nos níveis inferiores da hierarquia agita-se uma multidão de mascates, de
pre)eiros de gêneros alimentícios, de "travelling marketfolks, as we call
them1'12 revendedores, de lojistas, de miseráveis armarinheiros, de
farinheiros, de regaes: cada língua forneceria um sortimento de nomes
para designar as categorias sse Proletariado mercantil. Ao que se
acrescentam todas as profissões engendras pelo mundo comercial e que
vivem largamente dele: caixeiros, guardalivros, ermediários,
comissionistas, corretores com diversos nomes, carreteiros, marieiros,
mensageiros, embaladores, carregadores, estivadores... Quando chega a,
ris um coche fluvial, antes de acostar ao cais do Sena, um enxame de
estivadores ta das barcas dos "passadores" e o toma de assalto13. O
universo mercantil é

Pregões de Roma. Pelo menos 192 pequenos ofícios especializados que


indicam a divisão do trabalho na base. Vendedores de todos os produtos
agricolas (inclusive a palha), produtosfiorestais (de cogumelos a carvão
vegetal), de pesca, de pequeno artesanato (sabão, vassouras, tamancos,
cestos... ), revendedores (arenques, papel, agulhas, vidros, aguardente,
ferrovelho... ), vendedores de serviços (amoladores, rachadores de lenha,
tira-dentes, cozinheiros ambulantes). (Foto Oscar Savio.)

;o, com suas coerências, suas contradições, suas cadeias de dependência,


desde ão que bate os campos isolados à procura de um saco de trigo a
preço baixo c)jistas, elegantes ou miseráveis, até os armazenistas da
cidade, os burgueses
Ios que abastecem os barcos dos pescadores, os atacadistas de Paris, os
nees de
Bordeaux. Toda essa gente forma um bloco. E sempre o acompanha, do mas
indispensável, o usurário, desde o que serve os grandes deste mundo
esquinho prestamista sobre penhores. Segundo Turgot (1770)11, não há
usuforte "do que a conhecida em Paris pelo nome de empréstimo à la petite
?; às vezes chegou a dois soldos por semana por um escudo de três libras:
se de 173 libras 1/3 por cento.
E, no entanto, é ao redor desta usura verda, nte enorme que gira o varejo
[o grifo é meu] dos gêneros alimentícios que didos no mercado e nas
feiras de
Paris. Os mutuários não se queixam das es deste empréstimo sem o qual não
poderiam praticar o comércio de que e os mutuantes não enriquecem muito
porque esse preço exorbitante não e compensação do risco que o capital
corre. com efeito, a insolvência de -o devedor anula o lucro que o
mutuante pode fazer com trinta".
portanto uma sociedade mercantil no interior da sociedade que a rodeia.
wtante apreendê-la no seu conjunto e não a perder de vista. Filipe Ruiz

5 tem razão em ser como que obcecado por tal sociedade, pela sua hieraro
própria, sem o que o capitalismo seria mal compreendido. A Espanha, ós a
descoberta da América, dispõe de uma oportunidade inaudita, mas o ;mo
cosmopolita vem disputá-la com sucesso. Constrói-se então toda uma e de
ações escalonadas: na base, os camponeses, os pastores, os cerealiculs
artesãos, os regatones mascates e os emprestadores usuários; acima deles
alistas castelhanos que os têm nas mãos; finalmente, acima destes, a or-
o conjunto, os agentes dos Fugger e em breve, ostentando seu poder, os
es...
a pirâmide mercantil, essa sociedade à parte, nós vamos encontrá-la, sem,
I, por todo o Ocidente e em todas as épocas. Tem seus movimentos pró,
especialização, a divisão do trabalho operam-se habitualmente de baixo
ia. Se chamamos modernização, ou racionalização, ao processo de
distintarefas e de fragmentaçãe das funções, é uma modernização que se
manirimeiro na base da economia. Qualquer ímpeto das trocas determina uma
zação crescente das lojas e o surgimento de profissões especiais entre os
iuxiliares do comércio.
é curioso que o negociante, por sua vez, não siga a regra e, por assim
muito raramente se especialize? Mesmo o lojista que, ao fazer fortuna,
forma em negociante, passa imediatamente da especialização à nãozação. Em
Barcelona, no século XVIII, o botiguer que supera sua situação negociar
com qualquer produto16. Em Caen, um empreendedor fabricandas, André, em
1777, salva a casa paterna, à beira da falência; recupera-a Jo a zona de
compras e de vendas, visitando para isso cidades afastadas, Lorient,
Rotterdam, Nova York... Ei-lo mercador: será de admirar que tão se ocupe
não apenas de rendas, mas de musselinas, gêneros alimentí, S179 A regra
comercial impÔs-se-lhe. Tornar-se e sobretudo ser negocianião o direito,
mas a obrigação de lidar, quando não com tudo, pelo menos tas coisas. Já
disse que essa polivalência, a meu ver, não se explica pela

u capitaiísmo em casa prudência que se atribui ao grande mercador (e por


que não ao pequeno?), desejoso de dividir seus riscos. Este fenõmeno,
tendo tamanha regularidade, não requer uma explicação mais ampla? O
grande capitalismo, hoje, não é também polivalente?
Não poderíamos facilmente comparar um dos nossos grandes bancos
comerciais, mutatis mutandis, à grande firma milanesa de Antonio Greppi,
às vésperas da
Revolução francesa? Em princípio um banco, ela se ocupa também das
concessões de tabaco e de sal na Lombardia, da compra, em Viena, de
mercúrio de ídria por conta do rei da Espanha, e em quantidades enormes.
No entanto, nada investiu nas atividades industriais. Suas numerosas
filiais, na Itália, em Cádiz, em
Amsterdam, até em Buenos Aires, estão envolvidas em diversos negócios,
mas unicamente comerciais, desde o cobre da Suécia para revestir o casco
dos navios da Espanha até especulações com o trigo em Tânger, comissões
relativas a tecidos, a sedas e tecidos com seda da Itália e a inúmeros
produtos que a praça de Amsterdam oferece, sem esquecer a utilização
sistemática, para o comércio de letras de câmbio, de todas as ligações
que a grande praça mercantil de Milão mantém com as diversas praças
cambiais do mundo. Deveremos acrescentar uma ou outra operação de
contrabando puro e simples de lingotes de prata americana embarcados
fraudulentamente em Cádiz189 Do mesmo modo, a grande firma holandesa dos
Trip, no século XVII, não pára de mudar seus centros de ação e de
modificar o leque de negócios. Interfere, de certo modo, em um monopólio
e em outro, em um acordo e em outro e não hesita muito em combater
concorrentes que a apertem demasiado. Na verdade, e de modo contínuo e
por preferência, ocupa-se do comércio de armas, de alcatrão, de cobre, de
pólvora (e portanto de salitre da
Polônia, das índias ou mesmo da África); participa amplamente das
operações da
Oost Indische Compame e fornecerá à imensa empresa vários de seus
diretores;
possui também navios, faz adiantamentos, ocupa-se também de forjas, de
fundições e de outras empresas industriais, explora jazidas de turfa na
Frísia e em
Grõningen, tem interesses consideráveis na Suécia, onde possui enormes
propriedades fundiárias, comercia com a Guiné africana e com Angola e até
com as duas Américas". Sem dúvida, no século XIX, quando se lança de modo
espetacular na imensa novidade industrial, o capitalismo parece
especializar-se, e a história geral tende a apresentar a indústria como o
remate que afinal teria dado ao capitalismo sua "verdadeira" face. Será
assim tão certo? Parece-me antes que, depois do primeiro surto de
mecanização, o capitalismo mais alto voltou ao ecletismo, a uma espécie
de indivisibilidade, como se a vantagem característica de estar nesses
pontos dominantes fosse precisamente, tanto hoje como no tempo de Jacques
Coeur, não ter de se cingir a uma única opção. Ser eminentemente
adaptável, portanto não-especializado.
A divisão racional do trabalho opera pois abaixo do negociante: essa
profusão de intermediários e de escalões que a obra de R. B.
Westerfield19 enumera para
Londres, no fim do século XVII, os caixeiros, os comissionistas, os
corretores, os caixas, os seguradores, os transportadores, ou os
"armadores" que, a partir do fim do século XVII, como em La Rochelle e
certamente em outros lugares, se encarregam do "apresto" de um navio -
são todos auxiliares eficazmente especializados que oferecem ao mercador
os seus serviços. Mesmo o banqueiro especializado (não o "financista",
claro) está às ordens do negociante - e este não hesita, se a ocasião se
apresenta com vantagens, em desempenhar ele próprio o papel de segurador,
de armador, de banqueiro ou de comissionista. E é sempre para ele que

335

1tfr1" Ufri UU3U ;tá reservada a melhor parte. Em Marselha, contudo, uma
das grandes praças coÉerciais do século XVIII, observe-se, segundo
Charles Carrière 20, que os banquei)s não são reis.
Em suma, há, na constante reestruturação da sociedade mercantil, uma
posiio por muito tempo intangível que, na sua inexpugnabilidade, não
cessa de se eleir, de se valorizar à medida que se vão operando divisões
e subdivisões inferiores: a do negociante polivalente. Na Inglaterra, ele
cresce, em Londres e em todos os )rtos ativos já no século XVII, sendo, a
bem dizer, o único ganhador em tempos m difíceis. Em 1720, Defoe observa
que os negociantes de Londres têm cada vez, ais criados, querem mesmo
terfootmen, lacaios, como os fidalgos. Daí o número finitc, de librés
azuis, tão comuns que são chamados "librés de mercador-, e a cusa dos
nobres em usar essa cor para vestir seus serviçaiS21. Para o grande
merLdor, tudo muda, seu tipo de vida, suas distrações. O exportador-
importador, o erchant, enriquecido no mundo inteiro, torna-se um grande
personagem, de uma asse muito diferente da dos mercadores de middling
sort que se contentam com comércio interno e que, "embora muito úteis nos
seus postos, não têm qualquer reito às honrarias das posições elevadas",
diz uma testemunha de 1763 22.
Também na França, pelo menos a partir de 1622, os grandes mercadores adem
ao luxo. "Vestidos com roupas de seda, casaco de pelúcia", mandam os
empreidos fazer todas as tarefas inferiores. "De manhã, vemo-los no
câmbio [ ... 1, nem trecem mercadores, ou na Pont-Neuf, falando de
negócios no jogo de malha'

923 stamos em Paris, o jogo de malha fica no cais de Ormes, perto dos
Célestins, e "câmbio" no atual Palácio da Justiça). Em todas essas
atitudes, não há nada que mbre o lojista. Aliás, um decreto de 1629 não
permitia aos nobres a prática, sem rda dos foros de nobreza, do tráfico
marítimo? Muito mais tarde, o decreto de

101 abria-lhes o exercício do comércio atacadista. Era uma maneira de


revalorizar estatuto dos mercadores numa sociedade que continuava a olhá-
los sobranceiraente. Os mercadores franceses não se sentem à vontade,
como se vê pela curiosa tição que apresentam, em 1702, ao Conselho de
Comércio. O que pedem: nem ais nem menos que uma purga da profissão que
distinga de uma vez por todas o ercador de todos os trabalhadores
manuais, boticários, ourives, peleiros, fabrintes de malhas, mercadores
de vinho, fabricantes de meias em tear, adeleiros "e d outros
profissionais que são operários [sic] e têm qualidade de mercadores".
Numa Javra, a qualidade de mercador pertenceria apenas àqueles "que
vendem a merca)ria sem nada incluir de seu e sem nada acrescentar de si
próprios"".
O século XVIII verá assim, em toda a Europa, o apogeu do grande
comercianInsista-se apenas no fato de ser graças ao desenvolvimento
espontâneo da vida onômica, na base, que os negociantes avançam. Flutuam
sobre ela. Ainda que.déia de Schumpeter sobre a primazia do empresário
contenha uma parte de ver, de, a realidade observada demonstra, nove
entre dez vezes, que o inovador é ledo pelo fluxo da maré que sobe. Mas,
então, qual é o segredo do seu êxito? Por itras palavras, como incluir-se
entre os eleitos?
Uma condição rege as outras: já estar, no início da carreira, numa certa
altuOs que triunfam a partir de zero são tão raros outrora como hoje. E a
receita

Frontispicio do Parfait NÓgociant, de Jacques Savary, 1675. (ColeCdo


Viollet.)

337

1 em casa servada a melhor parte. Em Marselha, contudo, uma das grandes


praas coIs do sóculo XVIII, observe-se, segundo Charles Carri6re 20, que
os banqueio sdo reis.
m suma, hd, na constante reestruturado da sociedade mercantil, uma posir
muito tempo intangfvel que, na sua inexpugnabilidade, ndo cessa de se
elese valorizar
A medida que se vdo operando divisóes e subdivisóes inferiores:
negociante polivalente. Na Inglaterra, ele cresce, em Londres e em todos
os ativos jd no sóculo XVII, sendo, a bem dizer, o 6nico ganhador em
tempos [ffceis. Em 1720,
Defoe observa que os negociantes de Londres tm cada vez riados, querem
mesmo terfootmen, lacaios, como os fidalgos. Dai o m1mero o de librós
azuis, tdo comuns que sdo chamados "librós de mercador", e a dos nobres
em usar essa cor para vestir seus serviaiS21. Para o grande mertudo muda,
seu tipo de vida, suas distra6es. O exportador-importador, o gnt,
enriquecido no mundo inteiro, tornase um grande personagem, de uma muito
diferente da dos mercadores de middling sort que se contentam com.rcio
interno e que, "embora muito 6teis nos seus postos, ndo tm qualquer s
honrarias das posi6es clevadas", diz uma testemunha de

1763 22.
ambóm na Frana, pelo menos a partir de 1622, os grandes mercadores
adeluxo.
"Vestidos com roupas de seda, casaco de pelilcia", mandarn os emprefazer
todas as tarefas inferiores. "De manhd, vemo-los no cdmbio [ ... ], nem m
mercadores, ou na Pont-Neuf, falando de negócios no jogo de malha' 23 os
em Paris, o jogo de malha fica no cais de Ormes, perto dos Ulestins, e
ribio" no atual
Paldcio da Justia). Em todas essas atitudes, ndo hd nada que o lojista.
Alids, um decreto de 1629 ndo permitia aos nobres a prdtica, sem dos
foros de nobreza, do trdfico marftimo? Muito mais tarde, o decreto de
bria-lhes o exercfcio do comórcio atacadista. Era uma maneira de
revalorizar uto dos mercadores numa sociedade que continuava a olhd-los
sobranceiraOs mercadores franceses ndo se sentem A vontade, como se v
pela curiosa que apresentam, em 1702, ao Conselho de
Comórcio. O que pedem: nem em menos que uma purga da profissdo que
distinga de uma vez por todas o Jor de todos os trabalhadores manuais,
boticdrios, ourives, peleiros, fabride malhas, mercadores de vinho,
fabricantes de meias em tear, adeleiros "e xos profissionais que sdo
operdrios [sic] e tm qualidade de mercadores". Numa a, a qualidade de
mercador pertenceria apenas dqueles "que vendem a merca;em nada incluir
de seu e sem nada acrescentar de si próprios"".
sóculo XVIII verd assim, em toda a Europa, o apogeu do grande
comercianista-se apenas no fato de ser graas ao desenvolvimento
espontdneo da vida nica, na base, que os negociantes avanam. Flutuam
sobre ela. Ainda que de Schumpeter sobre a primazia do empresdrio
contenha uma parte de veri realidade observada demonstra, nove entre dez
vezes, que o inovador 6 leelo fluxo da maró que sobe. Mas, entdo, qual 6
o segredo do seu &ito? Por palavras, como incluir-se entre os eleitos?
ma condido rege as outras: id estar, no infcio da carreira, numa certa
altuque triunfam a partir de zero sdo tdo raros outrora como hoje. E a
receita
Frontispicio do Parfait NÓgociant, de Jacques Savary, 1675. (Cole(do
Viollet.)

- -11 luau
F, que Claude Carrre dd a respeito da Barcelona do sóculo XV - "A mclhor
manei, 25

- vale para todas ra de ganhar dinheiro no grande comórcio [6] jd o ter'


as 6pocas. Antoine Hogguer, um jovem de uma farnflia de mercadores de St.
Gall, recebe do pai, em 1698, logo após a paz de Ryswick, que
proporcionard apenas uma curta trógua, um capital de 10O mil escudos
"para ver do que 6 ele capaz".
O jovem realiza em Bordeaux "negócios tdo felizes que, no espaqo de um
rns, triplica o capital". Durante os cinco anos seguintes, amealha na
Inglaterra, na
Holanda e na Espanha somas considerdveis26 - Em 1788, Gabriel-Julien
Ouvrard, aquele quo vird a ser o grande Ouvrard, tem apenas dezoito anos;
com o dinheiro recebido do pai (rico fabricante de papel de Entiers, na
Vendóe), jd realizou grandes lucros no exercfcio do comórcio em Nantes.
No infcio da Revoluqdo, especula com papel, de que tem enormes estoques.
Novo xito. Vai em seguida para
Bordeaux, onde continuard a ganhar em todas as operaq6es 27.
Para quem comea, ter uma carteira recheada vale por todas as
recomendaq6es. Por ocasido do contrato com um comissionista de Rouen,
afianqado por trs grande mercadores, Remy Bensa, de FrankfUrt, hesita, e
escreve: "Estou inclinado para
M. Dugard porque 6 um jovem trabalhador, rigoroso na sua escrita. O mal
6 que ndo tem bens, polo menos que on saiba." 28

Outro fator de sorte para um principiante 6 iniciar em bom tempo


económico. Mas isso ndo garante c, sucesso. A conjuntura mercantil 6
instdvel. Quando vira para bom tempo, geralmente entram em campo pequenos
empresdrios ingnuos. A maró, o vento sdo favordveis: ei-los confiantes,
um pouco fanfarróes. O mau tempo que vem a seguir os surpreende, engole-
os sem piedade. SÓ os mais hdbeis on os mais afortunados ou aqueles que
tinham reservas no infcio escapam a tal massacre de inocentes. Vemos bem
para que conclusdo nos encaminhamos: o grande mercador 6

aquele que, justarnente, atravessa sem acidentes a md conjuntura. Se o


consegue

6, claro, porque tem trunfos na m5o e sabe servir-se deles; ou, se tudo
corre mal, 6 porque tem meios do se eclipsar, do se pór a salvo como
convóm. Estudando as cifras dos negócios em banco das seis maiores firmas
de Amsterdam, M. G.
Buist verifica que todas atravessarn sem danos a crise brusca e grave de
1763

- salvo uma que, alids, rapidamente se restabelecerd das perdas 29. Ora,
essa crise capitalista de 1763, no desfecho da guerra dos Sete Anos,
abalou o cerne económico da Europa e so assinalou por uma sórie de
falncias e bancarrotas em cadeia, de Amsterdam a Hamburgo, a Londres e a
Paris. SÓ lhe escaparam os prfncipes do grande comórcio.
Dizer que o xito capitalista assenta no dinheiro 6 evidentemente um
trufsmo, se pensamos apenas no capital indispensdvel a todas as empresas.
Mas o dinheiro

6 algo muito diferente da capacidade de investir. 1 a considerado social,


donde uma sórie de garantias, de privilógios, de cumplicidades, de
prote6es. P a possibilidade de escolher entre os negócios e as ocasi6es
que se oferecem - e escolher 6 ao mesmo tempo uma tentado e um privilógio
-, entrar A fora num circuito reticente, defender vantagens ameaqadas,
compensar perdas, afastar rivais, aguardar retornos muito lentos mas
promissores, obter ató os favores e as complacncias do principe. Enfim, o
dinheiro 6 a liberdade de ter mais dinheiro ainda, pois só se empresta
aos ricos. E o cródito 6 cada vez mais a ferramenta indispensdvel do
grande mercador. O seu capital pessoal, o seu 11

principal", só raramente estd A altura das suas necessidades. Escreve


Turgot30:
"Ndo hd na face da terra uma praa de col mórcio onde as empresas ndo
vivam de dinheiro emprestado; talvez ndo haja um imico, negociante que
ndo precise recorrer A bolsa alheia." "Que sistema!", exclanum artigo do
Journal de Commerce (175 9)31, "que calculismo, ma um anónimo que
combinaqdo de idóias e que coragem ndo exige a ocupado de um homem que, A
frente de uma casa cornercial, realiza todos os anos, com um fundo de 20O
mil, a

30O mil libras, negócios de vdrios milh6es! "


No entanto, segundo palavras de Defoe, toda a hierarquia mercantil, de
cima a baixo, estd no mesmo barco. Do pequeno lojista ac, negociante, do
artesdo ao fabricante, todos vivem do cródito, isto 6, da compra e venda
a prazo (at time), sendo precisamente isso que permite obter, com um
capital de, por exemplo, 5 mil libras, um volume anual de negócios de 3O
mil libras12. Os prazos de pagamento quo todos ddo e recebem por sua vez,
e que sdo uma "maneira de contrair empróstiMo,, 33, sdo ató eldsticos:
"Nem uma pessoa em cada vinte cumpre o prazo combinado e em geral ndo se
espera que o cumpra, tamanhas sdo as facilidades entre mercadores nesse
dominio." 34 No balanqo de qualquer comerciante, ao lado do estoque de
mercadorias, hd regularmente um ativo de cróditos e um passivo de
dividas. A sabedoria estd em salvaguardar o equilibrio, mas em ndo
renunciar a essas formas de cródito que, afinal, representarn uma massa
enorme, que multiplica por

4 ou 5 o volume das trocas 35. Todo c, sistema mercantil depende disso.


Cessando esse cródito, o motor enguiaria. O importante 6 que se trata de
um cródito inerente ao sistema mercantil, gerado por ele - um cródito
"interno" e sem juros. O son particular vigor na Inglaterra parece a
Defoe o segredo da prosperidade inglesa, do overtrading 36 que lhe
permite impor-se tambóm no estrangeiro.
Tambóm o grande comerciante aproveita e faz com que os clientes
aproveitem essas facilidades internas. Mas pratica tambóm regularmente
outra forma de cródito, recorrendo ao dinheiro dos prestarnistas e
financiadores que estdo fora do sistema. Trata-se do empróstimos em
dinheiro sonante que passam regularmente pela porta dos juros. Diferenqa
crucial, porque a operaqdo mercantil que assenta nesta base deve, no
final, garantir uma taxa de lucro nitidamente superior d taxa de juro.
Ndo

6 o caso do comórcio corrente, avalia Defoe, para quem "o empróstimo a


juros & um verme que rói o lucro", capaz, mesmo A taxa "legal" de 5%, de
anular os ganhos37. A fortiori, o recurso usura seria suicfdio. Portanto,
se um grande mercador pode recorrer incessantemente ao empróstimo, A
"bolsa alheia", ac, cródito externo, 6 seguramente porque seus lucros
normais sdo muito superiores aos da maioria dos mercadores. Encontramo-
nos uma vez mais diante de uma linha divisória que assinala as
particularidades de urn setor privilegiado da troca.
Num livro do que muito extrairemos, K. N. Chaudhuri3l pergunta-se por que
as prestigiosas Companhias das fndias se detm, nas suas operaq6es, no
limiar da distribuiqdo; por que vendem suas mercadorias em leildo, A
porta dos armazóns, em datas previamente anunciadas. Nao serd
simplesmente porque essas vendas sdo feitas d vista? t uma maneira de
evitar as regras e prdticas do comórcio atacadista, com os seus longos
prazos de pagamento, de recuperar e tornar a lanqar o mais rdpido
possfvel os capitais no comórcio frutuoso do ExtremoOriente - de ndo
perder tempo.
0S fornecedores de capitais "Acumulai! Acumulai! t o que manda a lei!"
para uma econorma capitalista'9.
Tambóm se poderia dizer: "Cródito! Cródito! E o que manda a lei!" Todas

o catnbista- A vocaqdo de Sao Mateus, quadro de Jan Van Hemessen, 1536.


(Bayewtsgemdidesammlungen, clicU do museu.)
as sociedades acumulam, dispóem de um capital que se divide entre uma
poupan';a entesourada e entdo imItil, mantida A espera, e um capital
cujas dguas benóficas passam pelos canais da economia ativa, outrora
sobretudo a economia mercantil.
Se esta ndo for suficiente para abrir ao mesmo tempo todas as comportas
possfveis, haverd quase forqosamente um capital imobilizado, desnaturado,
poderse-ia dizer. O capitalismo só estarA plenamente instalado quando o
capital acumulado for utilizado ao mdximo, sem nunca se atingir,
evidentemente, os 100%.
Essa inserqdo do capital na vida ativa rege as varia6es da taxa de juros,
um dos principais indicadores da salide económica e da troca. E se esta
taxa, na
Europa, do sóculo XV ao sóculo XVIII, baixa quase continuamente, se, em
Gnova, por volta de 1600, 6 ridiculamente baixa, se, na Holanda, e depois
em Londres, descresce de forma espetacular no sóculo XVII, 6 acima de
tudo porque a acumulaqdo aumenta a massa do capital, porque este 6
abundante e entAo sua taxa de juros baixa e porque muitas vezes o
rendimento mercantil, a despeito do seu crescimento, ndo segue o mesmo
ritmo da formado do capital. P tambóm porque nesses centros exuberantes
da economia internacional o apelo ao empróstimo 6

suficientemente forte e freqiiente para ter organizado precocemente o


encontro entre o capitalista e o poupador, para ter criado um mercado
acessfvel de dinheiro. Em Marselha tambóm, ou em Cddiz, um negociante
pode obter empróstimos com mais facilidade c a menor preqo do que, por
exemplo, em PariS40.
No universo dos fornecedores de capitais, ndo esqueqamos a massa dos
modestos poupadores, destinada a aumentar. t o dinheiro dos inocentes.
Houve sempre, nos portos da Hansa ou nos portos da ItAlia, hA ainda em
Sevilha, no sóculo XVI, quem empreste pouco, quem arrisque pouco,
microfretadores que póem algumas mercadorias nos barcos que estdo de
partida. No regresso, 6 muitas vezes com eles que se realizam os melhores
negócios, pois tm necessidade imediata de dinheiro. O grande party de
Lyon, em 1557, atraiu um m1mero considerdvel de pequenos subscritores, de
"microemprestadores". Encontram-se pecilios 'de gente modesta entre os
fundos reunidos pelos H6chstetter de Augsburgo que, perdendo o monopólio
do mercdrio, irdo A falncia em 1529. Ndo deixa de ser interessante
observar, no princfpio do sóculo XVIII, "o criado de J.-B. Bruny [grande
negociante marselUs] aplicar 30O libras no Le Saint-Jean-Baptiste, ou
Marguerite
Truphme, criada de R. Bruny [tambóm este grande negociante], participar
com 10O libras no armamento do La Marianne - quando seu saldrio anual 6
de 6O libras"41.
0u uma criada de Paris dispor de mil escudos sobre as Cinq Grosses Fermes
pelo que diz um libelo de 1705 que nada nos obriga a tomar ao pó da
letra42.
Pequenos, mas tambóm módios emprestadores. Assim, os mercadores genoveses
que organizarn os empróstimos a curto prazo a Filipe 11 apóiam-se por sua
vez em emprestadores espanh6is e italianos que alguns intermediArios
recrutam para eles. O rei cede aos genoveses titulos de renda espanh6is
(juros) como garantia da soma que lhe 6 ou serA adiantada. Estes tftulos,
que lhes sdo entregues em branco, sdo depois colocados entre o pdblico: o
banqueiro financista genovs assegurard
O pagamento dos juros, mas jA recebeu logo de saida o montante do capital
contraindo assim, por sua vez, um empróstimo a juros baixos. Quando
finalmente for reembolsado pelo rei, ele lhe restituirA juros do mesmo
valor e com taxa igual a dos recebidos como cauao. Talvez seja possfvel
encontrar nos arquivos de
Simancas as listas dos subscritores que responderam desse modo ao apelo
dos genoveses.
volvido em todo o tipo de empresas, entre as quais o comórcio com as
Ilhas.
Deveria resolver facilmente urn problema de crddito. Tanto mais, e ai
estA o paradoxo, que ndo faltarn fundos na praqa de Paris. Assim, o banco
Le Couteulx, instalado em Paris, Rouen e C.Adiz, recusa-se a receber
dinheiro em depósito, "pois temos excesso de dinheiro", "fundos parados
em caixa" - e isto por vArias vezes, cm

1734, 1754, 1758, 176753.


No dmbito da Europa medieval e moderna, o banco certamente ndo 6 uma
criagdo ex nihilo. A Antiguidade teve bancos e banqueiros. O IsM muito
cedo dispóe dos seus prestamistas judeus e utilizou desde os sdculos X-
Xi, muito antes que o
Ocidente, os instrumentos de cródito, entre os quais a letra de cdmbio.
No sóculo X111, no Mediterrdneo cristdo, os cambistas estdo entre os
primeiros banqueiros, sejam eles itinerantes, indo de feira em feira, ou
instalados em praqas como Barcelona, Genova ou Veneza 54. Em Florenqa,
segundo Federigo
MeliS55, e decerto em outras cidades toscanas, o banco nasceria dos
serviqos que as sociedades ou companhias comerciais prestam umas As
outras. Para essa operaqAo, seria decisiva a sociedade "ativa", a que
requer cródito e obriga sua parceira, a "passiva", a fornecedora de
capitais, a tomar indiretamente parte num processo de negócios que, em
principio, lhe 6 estranho.
Mas deixemos esses problemas de origem. Deixemos tambóm de lado a
evolugdo geral dos bancos privados, antes e depois das cria6es decisivas
dos bancos pdblicos (Tauld de Cambis em Barcelona, 1401; Casi di San
Giorgio em Genova, 1407, que interromperd sua atividade bancdria de 1458
a 1596; Banco di Rialto, 1587; Banco de Amsterdam, 1609; Banco Giro, de
Veneza, 1619). Sabemos que antes do Banco da
Inglaterra, fundado em 1694, os bancos pdblicos se ocupavam
exclusivamente de depósitos e transfer8ncias bancdrias, ndo de
empróstimos e adiantamentos, nem da gestdo do que nós chamarfamos
carteiras. Ora, essas atividades desde cedo foram da competencia dos
bancos privados, por exemplo dos bancos venezianos chamados di scritta,
ou dos bancos napolitanos de que se conservaram tantos registros
relativos ao sóculo XV1.
Mas o nosso objetivo, aqui, ndo 6 insistir em histórias particulares; 6
apenas ver quando e como o cródito tenta tornar-se institucional, quando
e como a atividade bancdfia se insinua nas posigóes dominantes da
economia. Grosso modo, houve no Ocidente, por tres vezes, visfvel a olho
nu, urn inchaqo anormal do banco e do cródito: antes e depois de 1300, em
Florenga; durante a segunda metade do sóculo XVI e as duas primeiras
dócadas do sóculo XVII, em Genova; no sóculo XVIII, em. Amsterdam.
Poderemos tirar uma conclusdo do fato de, por tres vezes, a evolu0o
vigorosamente entabulada e que parece preparar, a mais ou menos prazo
longo, o triunfo de certo capitalismo financeiro paralisar-se no meio do
caminho? Serd necessArio esperar pelo sóculo XIX para que esta evoluqdo
se conclua. Tres experiencias, portanto, trs grandes exitos, depois, para
concluir, trZs fracassos, pelo menos tr8s recuos evidentes. A nossa
intenqao 6 ver essas experiencias em suas grandes linhas para assinalar
sobretudo suas curiosas coincid8ncias.

Em Florenga, no Duecento e no Trecento, O cródito implica toda a história


t própria cidade, mas tambóm das outras cidades italianas suas rivais, de
todo
MediterrAneo e de todo o Ocidente. t no renascimento da economia
europdia, Jo menos a partir do sdculo XI, que se deve compreender a
formar'do das grandes, mpanhias comerciais e bancdrias de Florenga,
levadas pelo próprio movimento te deveria colocar a ltQia no primeiro
lugar da Europa durante sóculos: no sóculo
III, navios genoveses singram no Cdspio; viaiantes e mercadores italianos
chem A india e A China; venezianos e genoveses campeiam. nos cruzamentos
das ros do mar
Negro; italianos procuram nos Portos do Norte da Africa o pó de ouro i
SudAo;
outros estdo na Franga, na Espanha, em Portugal, nos Pafses Baixos, .
Inglaterra. E por toda a parte os mercadores florentinos sdo compradores
e vendores de especiarias, de las, de ferragens, de metais, de tecidos de
Id e de seda, , róm, mais ainda, mercadores de dinheiro. Suas companhias,
rneio mercantis, meio.ncdrias, encontrarn em Florenqa dinheiro sonante em
abunddncia e um cródito !ativamente barato. Daf a eficAcia e a forga das
suas redes.
Compensagóes, trans.-8ncias bancdrias e de dinheiro sAo feitas sem
dificuldade de filial para filial, de uges para Veneza, de Aragdo W para
a Armenia, do mar do Norte para o mar -gro; as sedas da China sdo
vendidas em Londres em troca de fardos de 15... O 'dito, o papel, quando
tudo corre bern, ndo serdo dinheiro no superlativo? Corn, voarn, sAo
infatigdveis.
A proeza das sociedades florentinas 6 seguramente a conquista, a tutela
do loniquo reino da Inglaterra. Para tomar a ilha, foi-lhes necessdrio
suplantar os presnistas judeus, os mercadores da Hansa e dos Paises
Baixos, os comerciantes inses, adversdrios tenazes, afastar tambóm os
concorrentes italianos. Florena subsaiu, na ilha, a agdo pioneira dos
Riccardi, mercadores de Luca que haviam finciado a conquista do Pais de
Gales por Eduardo 1. Um pouco mais tarde, os scobaldi de Florena
adiantavarn dinheiro para a guerra de Eduardo II contra, scócia; os Ba.rd
e os Peruzzi permitirdo depois as operagóes de Eduardo III contra i ,
ranga, no conflito que abre a guerra chamada dos Cem Anos. O triunfo
dos !rcadores florentinos ndo consistim apenas em manter A sua merce os
soberanos ilha, mas em se apoderar da Id inglesa indispensdvel aos teares
do continente
Arte della lana de Florenga.
Mas a aventura inglesa termina, em 1345, com a catdstrofe dos Bardi,
"coloscom pós de barrol I, houve quem dissesse, mas seguramente colossos.
Nesse ano
LmAtico, Eduardo III devia-lhes, assim como aos Peruzzi, uma soma enorme
(900

florins aos Bardi, 60O mil aos Peruzzi), uma soma desproporcional ao
capital duas sociedades - prova de que haviam comprometido nesses
empróstimos giitescos o dinheiro dos seus depositantes (podendo a
proporgdo ir de I a 10). Essa
Astrofe, "a mais grave de toda a história de Florenga" segundo o cronista
Villapesa sobre a cidade por causa das outras catdstrofes que a
acompanham.
Tanto into Eduardo III, incapaz de pagar suas dividas, a culpada 6 a
recessao que corEto meio O sóculo XIV e traz a peste negra na garupa.
A fortuna bancdria de Florenqa desaparece entao perante a fortuna
mercantil
Genova e de Veneza, e 6 a mais mercantil das suas rivais, Veneza, que
prevaleceio final da guerra de Chioggia, em 1381. A experiencia
florentina, de uma monidade bancdria evidente, nAo sobreviveu A crise
económica internacional.
Reslo a Florenga suas atividades comerciais e sua indfistria; no sóculo
XV, chegard

3mo a reconstituir sua atividade bancdria, mas jd ndo terd o papel


pioneiro, coque mundial, de outrora. Os MÓdicis ndo sdo os Bradi.
r- u capitalismo em casa
- Segunda experiencia: a de Genova. Entre 155O e 1560, houve, ao mesmo
tempo que certo arrefecimento da dinAmica expansdo do inicio do sóculo,
uma ton;&o da economia europóia. O fluxo de prata proveniente das minas
da Amórica, por un, lado, desfavoreceu os grandes mercadores alemdes,
senhores, W entdo, da produqjo de prata da Europa central; por outro
lado, valorizou o ouro, doravante mais rwo, mas que continua a ser a
moeda de pagamento das transagóes internacionais e das letras de cambio.
Os genoveses foram os primeiros a compreender tal reviravolta.
Oferecendo-se para substituir os mercadores da Alta Alemanha nos
empróstimos ao Rei Católico, apropriararn-se dos tesouros da Amórica e
sua cidade tornouse o centro de toda a economia europóia, tomando o lugar
de
Antu6rpia. Vemos entio desenvolver-se uma experiencia ainda mais estranha
e mais moderna do que a de Florenga no sóculo XIV, a de um cródito
baseado em letras de cAmbio e de recAmbio, reformadas de feira em feira
ou de praga em praga. t certo que as letras de cambio eram conhecidas,
utilizadas em Antu6rpia, em Lyon ou em
Augsburgo, em Medina del Campo e em outros lugares, e essas pragas ndo
serdo abandonadas da poite para o dia. Mas, com os genoveses, o papel tem
uma importancia cada vez mais maior. Conta-se mesmo que, para os Fugger,
negociar com os genoveses era negociar com papel, mit Papier, ao passo
que com eles tratava-se de bom dinheiro sonante, Baargeld - palavras de
negociantes tradicionais ultrapassados por urna tócnica nova. Pois, ao
contrdrio, com seus adiantamentos ao rei da Espanha, reembolsados em
moedas de oito ou em barras de prata por ocasifto do regresso das frotas
da Amórica, os genoveses transformaram sua cidade no grande mercado da
prata. E, com suas letras de cAmbio e as que compram com moedas de prata
em Veneza ou Florenqa, tornam-se senhores da circulaqdo do ouro. Com
efeito, conseguem a proeza de pagar ao Rei Católico, em ouro, na praga de
Antu6rpia (para as necessidades da guerra, pois os soldos eram pagos
sobretudo em moedas de ouro), as somas que recebem em prata, a partir da
Espanha.
A mdquina genovesa organiza-se em toda a sua eficdcia em 1579, com a
instalaqAo das grandes feiras de Piacenza, de que jó falamos56. Essas
feiras centralizam as mdltiplas operaq6es de negócios e de pagamentos
internacionais, organizam-lhes o clearing ou, como entAo se dizia, o
scontro. SÓ em 1622 se desorganizard essa mAquina tAo bem montada, pondo
finalmente termo ao reinado exclusivo do cródito genoves. Por que essa
derrocada? Terd sido conseqii8ncia do decróscimo dos desembarques de
prata da Amórica, como por tanto tempo se pensou? Mas, desse ponto de
vista, os estudos revoluciondrios de Michel Morineaull inverteram os
termos do problema. Ndo houve um decróscimo catastrófico dos "tesouros"
da
Am&rica. Tampouco houve suspensdo das chegadas a Genova de caixas de
moedas de oito. Temos mesmo ao nosso dispor provas do contrdrio. Genova
continuard ligada ao afluxo dos metais preciosos. Com a retomada
económica do fim do sóculo XVII, a cidade absorve ainda, ou pelo menos v8
passar por ela, por exemplo em
1687, 5 a 6 milh6es de pezze da otto 58. Nessas condi6es, o problema do
relativo retraimento de Genova torna-se assaz obscuro. Segundo Felipe
Ruiz
Martin, os comPradores espanh6is de juros teriam deixado de fornecer os
capitais necessdrios ao jogo dos mercadores banqueiros genoveses,
credenciados para empróstimos ao Rei Católico. Abandonados As próprias
foras, estes teriam repatriado em massa seus cróditos da Espanha. t bem
possivel. Tenta-me outra explicado: o jogo do papel, das letras de
cdmbio, só 6 possfvel se as pragas entre as quais ele circula estdo em
niveis diferentes: 6 preciso que a letra que viaja se valorize. Em caso
de "bestial larghezza"59 do dinheiro vivo (a expressdo 6 de um
contempordneo), a letra de

347

le Marselha no sjculo XVIII (Pormenor), Por JosePh Vernet. (TOtoteca


Artna, d encontrava uma 6nica letra de cdmbio para negociar. O cónsul de
Veneza em G& nova descreve em vdrias cartas as dificuldades da praqa, mas
acaba por suspeitar que a "stretezza" 6 diplomdtica, que 6 alimentada
pelos homens de negócios para motivar sua recusa 65. Serd fdcil
acreditar, se contarmos os rcais que os genoveses da Espanha expedem na
mesma 6poca, As caixas cheias, para a sua cidade e que, com certeza, se
acumulam nos cofres dos paldcios.
Alids, eles os tirardo de Id. Porque o dinheiro mercantil só 6
entesourado enquanto aguarda nova ocasido. Eis o que escrevem de Nantes,
em 1726, quando se trata de romper o privilógio da Companhia francesa das
fndias Orientais: "SÓ ficarnos conhecendo a forga e os recursos da nossa
cidade por ocasido do projeto feito por nossos mercadores de entrarem por
conta própria nos negócios do Rei [a
Companhia], ou de para isso se associarem aos de Saint-Malo, que sdo
muito poderosos. Optou-se por esta liltima soluqdo para ndo nos
atropelarmos uns aos outros e ficard tudo no nome de Companhia de Saint-
Malo. Acontece que as subscriq6es dos nossos mercadores se elevam a
dezoito milhbes [de libras] quando acreditdvamos que, todos juntos, ndo
conseguiriam fazer mais de quatro milh6es.
[ ... I Temos esperanqa de que as grandes somas oferecidas A Coroa para
retirar o privilógio exclusivo da Companhia das fndias, [ ... ] que
arrufna o Reino, consigarn tornar por toda a parte o comórcio livre."66
Tudo indtil, uma vez que o privilógio da Companhia acabard sobrevivendo
As tempestades e conseqUncias do sistema de Law. No entanto, funcionou
aqui a regra geral: com efeito, assim que volta a calma e as boas
ocasi6es, "o dinheiro que hd no Reino retorna ao comórcio"67.
Mas retornard todo? Ndo escapamos A impressdo de que, mesmo e sobretudo
no sóculo XVIII, o dinheiro acumulado ultrapassa, e de longe, a procura
de capitais. O fato 6 que a Inglaterra por certo ndo lanou mdo de todas
as suas reservas para financiar sua Revoluqdo industrial e que seus
esforqos e seus investimentos poderiam ter sido bem mais considerdveis do
que o foram. E que a reserva monetdria francesa, durante a guerra da
Sucessdo da Espanha, ultrapassava largamente os 8O ou 10O milh6es de
notas emitidas pelo governo de
Luis XJVÓ8. E que a fortuna mobilidria da Franqa ultrapassava, e em
muito, as necessidades da indóstria antes da Revoluqdo industrial, o que
explica que movimentos como os de Law possam. ter ocorrido e que as minas
de carvdo, no sóculo XVIII, tenharn constituido sem demora nem
dificuldade, quando assim quiseram, o capital fixo e circulante
necessdrio A Sua exploraqdo69. A correspond&cia comercial7O prova A
saciedade que a Frana de Luis XVI estd cheia de dinheiro ocioso, "cheio
de tódio", para retomar a expressdo de J. Gentil da
Silva, e que ndo sabe onde se empregar. Em Marselha, por exemplo, na
segunda metade do sóculo XVIII, os possuidores de capitais que oferecem
aos negociantes dinheiro a 5076 só raramente encontram tomadores. E, se
encontram um, agradecemlhe por "ter tido a bondade de guardar os nossos
fundos" (1763). Com efeito, hd na praqa capitais suficientes para que os
mercadores trabalhem com os fundos próprios e os dos sócios com quem
partilham os riscos, em vez de trabalhar com empróstimos a juros. Em
Cddiz, as mesmas atitudes. Os negociantes recusam as ofertas de dinheiro,
mesmo a 4076, dizendo-se "embaraados com os fundos próprios". E isto em
1759, portanto em tempo de guerra, mas tambóm em 1754, portanto em tempo
de paz.
Ndo convóm concluir daf que os negociantes nunca contraem empróstimos
durante a segunda metade do sóculo XVIII - o contrdrio 6 que 6 verdadeiro
- e

que os capitais sdo oferecidos Por toda parte em VdO. A aventura de


Robert
Dugard em Paris prova o contrdrio. Digamos apenas que os momentos de
dinheiro fdcil, excedente, com falta de investimento, sao mais
freqiientes do que habitualmente se julga. Desse ponto de vista, nada
mais revelador do que uma viagem a Mildo, As vósperas da Revoluao
francesa. A cidade e a Lombardia sdo entdo teatro de uma renovaqdo da
mdquina fiscal e financeira, pois a ascensdo da vida económica desafogou
o Estado. Diante dos Monti, dos bancos, das famflias, das instituigóes
religiosas, dos arrendatdrios de impostos, dos grupos poderosos de homens
de negócios, o Estado, com efeito, tornou-se suficientemente forte para
empreender a reforma de antigos abusos, tornados quase estruturais, tendo
a burguesia e a nobreza milanesa e lombarda pouco a pouco devorado o
Estado e transformado em rendas privadas quase todos os cargos dos
regalia, dos tributos pliblicos. SÓ hd um remódio: resgatar as rendas
alienadas pelo Estado a diversos tftulos; donde um enorme reembolso de
capitais. Prosseguida num ritmo relativamente rdpido, tal politica
submerge a Lombardia em dinheiro vivo e cria um problema para os antigos
arrendatdrios: que fazer com tal massa de capitais inesperadamente
surgida? Embora ndo conhegamos com perfeita exatiddo o uso que se lhes
deu, sabemos que serviram relativamente pouco para comprar terras ou
tftulos a 3, 507o propostos pelo Estado, ou imóveis urbanos; que, por
intermódio dos banqueiros e dos cambios, participaram da corrente de
negócios internacionais que atravessa Mildo e de que a firma Greppi
constitui um exemplo.
Mas o fato significativo 6 que esse manA ndo 6 proveitoso aos
investimentos industriais, embora existam na Lombardia manufaturas
t8xteis e empresas metaldrgicas. Muito simplesmente, os fornecedores de
capitais ndo cr&rn que tais aplicaq6es possam ser lucrativas. E para tal
baseiam-se em antigas desconfianas ou antigas experincias. E, no entanto,
a Revoludo industrial jd havia comeqado na Inglaterra7l.
Devemos, pois, evitar considerar a poupanqa e a acumulaqdo como fenómenos
puramente quantitativos, como se determinada taxa de poupanqa ou
determinado volume de acumulado fossem, de algum modo, dotados do poder
de desencadear quase autornaticamente o investimento criador e uma nova
taxa de crescimento. As coisas sdo mais complicadas. Cada sociedade tem
suas maneiras de poupar, suas maneiras de gastar, seus preconceitos, seus
incentivos ou seus entraves ao investimento.
E a polftica tambóm influi na formaqdo e na utilizado do capital. O
fisco, por exemplo, represa, desvia, restitui de maneira mais ou menos
11til ou rdpida o dinheiro que arrecada. Na Franga, o sistema dos
impostos consiste na chegada de enormes somas As mdos dos arrendatdrios
gerais e dos oficiais de finanqas.
Segundo estudos recenteS72, estes teriam redistribuido largamente as
riquezas assim adquiridas em investimentos construtivos. Desde o tempo de
Colbert, desde a 6poca de Luis XIV, que hd muitos deles investindo em
empresas comerciais e ató manufatureiras, particularmente nas companhias
e manufaturas com privilógio.
Talvez. Mas admitiremos, com Pierre Vilar, que os arrendamentos dos
direitos rógios e senhoriais, na Catalunha do sóculo XVIII, sejam um
canal de redistribuigdo bem mais eficaz do que a Ferme G&6rale dos
franceses, pois, "dispersas entre as mdos de comerciantes e de mestres
artesdos, introduzem seu produto no circuito do capital comercial e por
fim industrial, W no da modernizado agrfcola"73. Quanto ao sistema ingls,
em que o imposto se torna garantia do servigo de uma dfvida pdblica
consolidada e dd ao Estado um equilfbrio e uma fora sem equivalente, ndo
6 ele outra maneira, mais eficaz ainda, de reintroduzir o dinheiro dos
impostos na circulaqAo geral? Embora os contempordneos nem sempre
tivessem conscincia disso.
I opqOES E ESTRATEGIAS CAPITALISTAS
O capitalismo ndo aceita todas as possibilidades de investimento e de
progresso que a vida económica the propóe. Vigia constantemente a
conjuntura para nela intervir segundo certas direq.6es preferenciais - o
que equivale a dizer que sabe e pode escolher o campo de sua ado. Ora,
mais do que a própria escolha que varia incessantemente, de conjuntura em
conjuntura, de sóculo para sóculo -,

O próprio fato de ter os meios de criar uma estratógia e os meios de


modificd-la que define a superioridade capitalista.
No que tange aos sóculos que nos interessam, teremos de mostrar que os
grandes mercadores, embora pouco numerosos, se apoderaram das chaves do
comórcio de longa distdncia, a posiqdo estratógica mais representativa;
que tm, a seu favor, o privilógio da informado, arma sem igual em 6pocas
de lenta e onerosfssima circulagdo das notfcias; que dispunham, em geral,
da cumplicidade do Estado c da sociedade e, por conseguinte, podiam mudar
constantemente, com a maior naturalidade do mundo, sem peso na
consci6ncia, as regras da economia de mercado. O que 6 obrigado para
outros ndo o 6 forosamente para eles. Turgot"
pensa que um mercador ndo escapa ao mercado, A imprevisibilidade dos seus
preos:
só em parte 6 verdade, e mesmo assim...
Um espirito capitalista
Deveremos, por isso, atribuir a nossos atores um "espfrito" que seria a
fonte de sua superioridade e que os caracterizaria de uma vez por todas,
que seria cdlculo, razdo, lógica, indiferena pelos sentimentos comuns,
tudo a servio de uma desenfreada apetncia de ganho? Esta opinido
apaixonada de Sombart perdeu muito de sua credibilidade. O mesmo sucedeu
A opinido t5o difundida de
Schumpeter sobre o papel decisivo da inovado e do entusiasmo do
empresdrio.
Poderd o capitalista reunir em sua pessoa todas essas qualidades c todos
esses dons? Na nossa explicado, escolher, poder escolher, n5o 6 discernir
sempre com olhar de dguia o melhor caminho e a melhor resposta. O nosso
ator, 6 preciso ndo esquecer, estd instalado num patamar da vida social e
tem quase sempre presentes as solu6es, os conselhos, a sabedoria dos seus
pares. Julga atravós deles. A sua eficdcia depende tanto de si próprio
como do ponto em que se encontra, na conflu&ncia ou A margem dos fluxos
essenciais da troca e dos centros de decisdo
- os quais, precisamente, tm em cada

6poca sua localizaqdo exata. Louis Dermigny 75 c Christof Glamman 76 tm


boas razóes para pór em ddvida a genialidade dos Heeren Zeventien, os
I'Dezessete
Senhores" que dirigem a Companhia holandesa das fndias Orientais. Mas
terd de ser um ge^nio, para fazer excelentes negócios, aquele que a sorte
fez nascer holan&s, no sóculo XVII, e colocou entre os donos da enorme
rnquina da 00st
Indische Compagnie? Escreve La Bruyre": "Hd [ ... I estópidos, ouso dizer
imbecis, que se colocam em bons cargos e sabem morrer na opulMcia, sem
que de algum modo se deva suspeitar que para isso tenham contribufdo com
seu trabalho ou com a minima indds

Os regentes holandeses da Companhia das fndias. Gravura tirada de


"Histoire abrjgee des Provinces-Unies des Pays-Bas... ", Amsterdam, 1701.
(Cliche daFundado Atlas van Stolk.)
tria; algu6m os conduziu A nascente de um rio, ou entdo foi apenas o
acaso que os levou a encontrd-la; disseram-lhes: 'Quereis dgua? Tirai', e
eles tiraram."
Tampouco devemos acreditar que a maximiZaCdo, tantas vezes denunciada,
dos lucros e dos ganhos explique tudo sobre o comportamento dos
mercadores capitalistas. Evidentemente, temos a frase tantas vezes
repetida de Jakob
Fugger, o Rico, dita a quem o aconselhava a retirar-se dos negócios "que
tencionava ganhar diriheiro enquanto pudesse", ató o fim da vida". Mas
esta frase, um tanto suspeita 'Omo todas as frases históricas, seria
absolutamente aut8ntica caracterizando um ndivfduo num momento de sua
vida e de seu discurso, nao toda uma classe ou toJa uma categoria de
pessoas. Os capitalistas sdo homens e, tal como os outros honens, tm
comportamentos diferentes, uns calculistas, os outros jogadores, uns
ava'Os, OS outros pródigos, uns geniais, os outros, quando muito,
"sortudos". Um )anfieto cataldo (1809)'9, que afirma que "o negociante SÓ
v e só pensa no que ende a multiplicar-lhe o capital, seia qual for a
via", encontraria mil confirma6es ia corresponUncia dos negociantes a que
temos acesso: trabalham, disso ndo teihamOs &Ividas, para ganhar
dinheiro. Dai a explicar O advento do capitalismo lioderno pelo espfrito
do lucro, ou da economia, ou da razão, ou pelo gosto pelo isco calculado,
hd uma grande distdncia. Jean Pellet, um mercador de Bordeaux, iarece
ilustrar a sua movimentada vida de homem de negócios quando escreve: "No
comórcio, fazem-se os grandes lucros nas especulagóes. 18O SiM, mas este
temerdrio tinha um irmao, dos mais sensatos, e ambos fizeram fortuna ao
mesmo tempo, o prudente e o imprudente.

A explicaqdo "idealista", univoca, que faz do capitalismo a encarnagdo de


uma certa mentalidade, 6 apenas a safda encontrada, A falta de outra, por
Werner
Sombart e Max Weber, para escaparem ao pensamento de Marx. Nada nos
obriga, com toda a imparcialidade, a segui-los. Ndo creio, por
conseguinte, que tudo seja material, ou social, ou relagdo social no
capitalismo. A meu ver, hd um ponto fora de ddvida: ele ndo pode ser
oriundo de uma finica e obscura origem; a economia teve uma palavra a
dizer; a polftica teve uma palavra a dizer; a cultura e a civilizaao
tiveram uma palavra a dizer. E tambóm a história, que em geral decide em
61tima instdncia as relagóes de forga.
O comircio de Ionga distdncia ou a sorte grande
O comórcio de longa distdncia teve, por certo, o papel principal na g&ese
do capitalismo mercantil; foi por muito tempo a sua ossatura. Verdade
banal, mas que hoje 6 necessdrio estabelecer custe O que custar, uma vez
que o concerto dos historiadores atuais lhe 6 freqiientemente hostil. Por
bons e por ndo tao bons motivos.
Por bons motivos: 6 evidente que o comórcio externo (a expressao
encontra-se jd em Montchrestien, que a contrapóe a comórcio interno) 6
uma atividade minoritdria. Ningu6m discorda. Se Jean Maillefer, rico
mercador de Reims, fanfarreia quando escreve a um de seus correspondentes
da Holanda, em janeiro de

1674: "Nao acrediteis sequer que as minas de Potosf valham o rendimento


dos vinhos finos das nossas montanhas [de Reims] e dos de Borgonha"81, o
abade
Mably, por sua vez, diz com sensatez: "O comórcio dos cereais vale mais
do que o
Peru'182 - entendase que pesa mais na balanga, representa um volume de
dinheiro superior ao metal precioso produzido no Novo Mundo. Jean-
Baptiste Say (1828), para melhor surpreender o leitor, prefere falar de
"sapateiros da Frana [que]
criam mais valor do que todas as minas do Novo Mundo"11.
Bem estabelecida esta verdade, os historiadores ndo tiveram a menor
dificuldade em ilustrd-la com suas próprias observagóes, mas nem sempre
estou de acordo com as conclusóes que tiram. Jacques Heers, a propósito
do sóculo XV mediterrdneo, repete (1964) que a primazia dos trdficos
cabia ao trigo, A Id, ao sal, portanto a grande quantidade de trdficos
próximos, ndo As especiarias ou A pimenta-doreino. Com os mmeros em maos,
Peter Mathias estabelece que, ds vósperas da
RevoluAo industrial, o comórcio externo da Inglaterra 6 muitissimo
inferior ao comórcio interno84. Do mesmo modo, numa discussdo "de
doutoramento" na Sorborme,
V. Magalhdes Godinho concordava plenamente com Ernest Labrousse, que lhe
fornecera a questdo, em que o produto rural de Portugal ultrapassava o
valor do comórcio de longa distdncia da pimenta-do-reino e das
especiarias. Dentro do mesmo espirito, Friedrich Utge", sempre atento a
minimizar a importancia da descoberta da Amórica no curto prazo, afirma
que o comórcio inter-regional, colado A Europa, ganhava de cem a um no
sóculo XVI da minguada rede de trocas iniciada entre o Novo Mundo c
Sevilha. E tambóm ele tem razdo. Eu próprio escrevi que o tri

no sóculo XV1, no MediterrAnco, se elevava quancio muito a urn milhdo de


quintais, isto 6, nienos de I 016 do consurno da sua populak, 5o,
portanto um trófico irrisório em relaqdo ao conjunto da produdo
cerealffera e As trocas locais 86.
Por si sós, essas observa6es indicariam, se fosse preciso, que a
historiografia atual estA A procura dos destinos majorildrios, aqueles
que a história de ontem esquecia: os camponeses, e nAo mais os senhores;
os "2O millibes de franceses" e nao mais Lufs XIVII. Mas isso ndo
desvaloriza uma história minoritdria que terd sido muitas vezes mais
decisiva do que essas massas de pessoas, de bens ou de
Mercado88, num artigo sólido, consegue derias, valores enormes, mas
inertes, Enrique
Otte monstrar que os mercadores espanh6is representam, na nova Sevilha
que nasce para sua vocado americana, volumes de negócios superiores aos
operados pelos meros e que criem o crecadores banqueiros genoveses. Isso
n5o impede que estes d1tim ' dito transocednico, sem o qual o circuito
mercantil da Carrera de Indias teria sido quase impossfvel. Por isso
ficam numa posi5o de fora, livres para atuar,
Para intervir como quiserem sobre o Mercado de Sevilha. Tal como hoje, as
decisbes históricas do passado ndo sdo tomadas segundo as normas
racionais do sufrdgio universal, E hd muitos argumentos para explicar que
o fato minoritdrio possa prevalecer sobre o majoritdrio.
Para comegar, o comórcio de longa distdncia, o Fernhandel dos
historiadores alemaes, cria os grupos de Fernhiindler, mercadores de
longa distdricia, desde sempre atores, parte. A cidade onde vivem 6
apenas urn elemento no seu jogo.
Maurice Dobb 89 mostra bem como eles se inserem nos circuitos entre o
artesdo e a distante mat&ria-prima - 15, seda, algoddo... Inserem-se,
alóm disso, entre o produto acabado e a venda a distAncia do dito
produto. Os grandes armarinheiros de Paris
- na verdade Fernhdndler - explicam o processo, em 1684, numa longa
petido ao rei contra os fabricantes de tecidos que queriam impedi-los de
vender tecidos le

15, autorizaqdo que obtiveram fazia uns vinte anos como recompensa por
sua )articipaAo na criado das grandes manufaturas novas. Os armarinheiros
expli-am que "mant8m e permitem a subsistncia ndo só das manufaturas de
tecidos ias tambóm de todas as outras manufaturas txteis [as sedas] de
Tours, Lyon e utras cidades do Reino"90. E explicam ainda como, em Sedan,
em Carcassonne em
Louviers, com suas iniciativas e vendas, derarn origem As manufaturas de
teci:)s
A maneira da Inglaterra e da Holanda; vendendo-lhes a produ5o no
estrangeiassegurando sozinhos o seu abastecimento em Id da Espanha e
outras matóriasimas, sdo eles que lhes sustentain presentemente a
atividade. Que melhor demons ido de que essa vida industrial estd em suas
mdos?
Tambóm os bens dos paises distantes terminam por chegar As mdos do
portadorexportador: a seda da China ou da PÓrsia, pimenta-do-reino da
fndia de Sumatra, a cancla do Ceildo, o cravo-da-fndia das Molucas, o
atlcar, o tao, o cafó das

11has, o ouro da regiAo de Quito ou do interior do Brasil, os lingobarras


ou moedas de prata do Novo Mundo. Neste jogo, o mercador de longe podera
tanto da "mais-valia" do trabalho das Minas e das fazendas como dala do
labor do campons primitivo da costa do Malabar ou da Insulindia. No ante
a volumes mfnimos de mercadoria, haverA quem diga. Mas, quando lemos, ena
de urn historiador9l, que os cerca de 1O mil quintais de pimenta-do-reino

1O mil quintais de outras especiarias que a Europa consumia antes dos


grandes _j cup... 41, 31flu a (istO 6, O equivalente a quilos de Prat e
homens), s cram tr0cados por 65 mil .1ihao e Mejo d obriynento . capazes
de alimentar um 11 c juy desc.1 toneladas de centc'O, .do col-nóycio d 'o
njjo 6 subestimada

30O M1 untar se a inciUncia económica dos lucros desse

6 licito Pe1g.f concreta com excessiva acilidade, autor dd urna idóa


muitc'', valia I ou clue na PrOdiiOO nas indias, ais que O Mesmo ria 14 a
18 eM Tanto M do-rcl'10, in Alexand:

14 grarnas e M, rclo. urn quilo de p1menta


Co - ata, atingia C) preo de 1O a 6rcio de jongo curso cria

2 gramas de Pr umidores da _uopa. O corn


Verieza', 2O a 3O nos paises con rcados afastados entre s1, os de dois me
por intervencon' Os Pr amente, SÓ se encontram te sobrelucros.. 309

seguranien norando-se mutu cyado entrc e procura i9

aedidrios, SCM 1'9

e cu)aS oferta Seriam necessarics , rnuitos interl' ba por fur'c10-


intermedi6riO. Mercado f uncionasse - Oral sc el, aca vel encolitrdqao do
nurna dada linha, 6 POSsi pirfientasi,
Para que a concorrncia do ; desaparecom ) de outras mercadoTias. Se a nar
urn belo dia os sobrelucro 5sit( ;utros itinerdrios e a prop( ecidos da
india aPresentamlos de novo em ( o cafe, os t longa distancia significa
vulgariza, se baixa de preQo, o chd, rcio de do-reiric' Se demasiado
.idoso. O cOn" mente, muitO freqiientemente, se sucessao do soberatio
cros excepc, onais. Frequente digna do gran'in mais ainda 1u oria,
lre'gia", riscos, Pore loteria. At& o ifigo, quc ndo & uma mercad
circunstancias _em caso de

6ganharna mas que passa a S&_lo em determinadas presenta o desvio Para O


Sul de negociante, MediterrdneO re pen, Tia, claro _ F-m 159 1, a pendria
no S poróes abaTrotados de trigO ou de centeio . istas do comórcio de
cereais, e COM de centenas develeiros do norte, cOm O diwida, Para sc nao
forosamente especial operado. Sern
Grande omerciantes, am a espetacular mr suas cargas eles
O grao-duque da'fOscaria, execut tas habituais, tiveram. de pag ada. Os
inveveleiros do Bditico das suas ro uma ltdiia esfairn desviar 0S -O Mas
a peso de OUTO que as revendem a adores, 0S
O lucro desses grandes mere a alto prey 1 sido de 30007O jtIW'i0sos
disseram que havi; dos em kntu6rpia e logo pre, entes na estinamente a
Pones, POrtugueses instala eses que se dirigiarn cland do, Falamos dos
mercadores Portugu o brasileira, ou pelo caminho , mais cóMO.
tosi ou a Lima, indo ajm da imensida ercadores russos, na Sibria, s
Aires. Seus ganhos Sao fantdsticOs- 0S in chineses, quer por via de
Bueno Jes aos conipradores 93 (isso 1hes realizarn enormes lucrOs
vendendO Pe to tardia de Kiatka isto 6, ao Sul de Irkutsk, na feira de
cri aO s), quey PCIo coni6rcio claiioficial, s ano investimento inicial
em t' 94. Serao falatóriOS9 Mas tampermite quadruplicat
O lucro por quatro em na. posslbilidade destino, multiplicando-se ent5O C
dinheiro quando atinar aderise e Os combóM os ingleses nao apanharao pds
de eies do Norte can as primeiras dMesma conexdo entre as p una Toi O
jap5o d de realizar, por MaT, a com a fort Todos. 95, )
Outro encontro pradores da China . tiva dos Portugueses por muito tempo'

11, jeserva priva conduzia a Nagasaki ató 20O Mercadas do s&culo Xv acau
- a nau de trato - 6 25O os anos, a caraca de M oito meses no Japdo,
gastando h vontade a' ay Sete ou veitava e que foi uma cadores que !am
Pass que o Popular japons MU!" aPro . 96- apamil e 3oo mil taels, "c0m e
Inuito arnist0sos a seu respeito -ledo uais eles foram sempr falamos da
viagem anual do ga das razóes pelas q s de urn festim. Tambm id iais dois
mercado5 dispares cujos nhavarn as migalha la. Uma vez n m sentido ou
noutro, de Acapulco, em diretao a Mani ente ao cruzar O oceano nl f
antasticam grandes difereriqas produtos se vajoTizani inicos a lucray
cOn" essas neo aiguns homens, Os ibade
BeliardY, urn cOntempora cobrem de ourO rcadores do Mxico-, diz O, 6rcio
[a viagem do gade preo, -os me s 1nicos iliteressados CM mai"ter tal com
de Choiseul, "sdo 0

leão] por causa do fornecimento das mercadorias da China que todos os


anos lhes dobra o dinheiro que lá empregam... Esse comércio é feito
atualmente [em Manila]
por um número restrito de negociantes que mandam vir por conta própria as
mercadorias da China e depois as despacham para Acapulco, em troca das
piastras que lhes são destinadas. 597 Em 1695, no dizer de um viajante,
ganhava-se 300% no transporte de mercúrio da China para a Nova Espanha98.
Estes exemplos, cuja lista seria fácil alongar, mostram que, numa época
de informações difíceis e irregulares, basta a distância para criar as
condições banais e cotidianas de um sobrelucro. Um documento chinês de
1618 diz: "Como aquele país [Sumatra] é distante, quem para lá se dirige
obtém lucros dobrados.
"99 Quando Giambattista Gemelli, durante sua viagem ao redor do mundo,
transportava de escala em escala uma ou outra mercadoria, sempre
escolhida com cuidado para mudar de preço à chegada e cobrir
generosamente as despesas de jornada do viajante, limitava-se, como é
óbvio, a imitar a prática dos mercadores encontrados pelo caminho.
Escutemos, em 1639, um viajante europeu100, indignado com o modo como os
mercadores de Java enriquecem: "vão buscar nas cidades de Macassar e de
Surabaia arroz que compram por uma sata de caixas o gantans e, ao
revendê-lo, tiram o dobro. Em Balambuam, compram [ ... 1 os [cocos] a mil
caixas o cento e, fornecendo-os no varejo em Bantam, vendem oito cocos
por duzentas caixas. Compram também óleo o mesmo fruto. Compram o sal do
loartam, de Gerrici, de Pati e de Ivama por cento e cinqüenta mil caixas
cada oitocentos gantans e, em Bantam, três gantans valem mil caixas.
Levam muito sal para Sumatra". Para entender o alcance desse texto, pouco
importa o valor exato do gantans, unidade de capacidade. O leitor terá
reconhecido, de passagem, a caixa, moeda típica chinesa difundida na
Insulíndia; a sata é provavelmente a fiada de mil caixas. Seria mais
interessante fixar os pontos de abastecimento enumerados e medir as
distâncias em relação ao mercado de Bantam. A título de exemplo, são mais
de 1.20O quilômetros entre Bantam e Macassar. Contudo, a diferença entre
os preços de compra e de venda é tal que, deduzidos os custos do
transporte, o lucro tem de ser considerável. E, note-se de passagem, que
não se trata das mercadorias preciosas e leves, que J.-C. Van Leur indica
como o comércio de longa distância típico do ExtremoOriente. Trata-se de
gêneros alimentícios que as ilhas das especiarias têm de importar
continuamente. Nem que seja de longe.
últimos argumentos, decerto os melhores: dizer que o trigo vale mais,
comercialmente, em Portugal do que a pimenta-do-reino e as especiarias
não é totalmente exato. Pois pimenta-do-reino e especiarias passam
integralmente pelo mercado, ao passo que é a imaginação do historiador
que avalia o valor do trigo produzido, não vendido. O trigo transita
apenas por uma estreita fatia do mercado, destruindo-se a grande maioria
no autoconsumo. Por outro lado, o trigo posto à venda dá aos camponeses,
aos proprietários e aos revendedores apenas pequenos lucros, ademais
espalhados por uma porção de mãos, como já observava
Galiani101. Portanto, na Passagem, nenhuma ou pouca acumulação. Simóri
Ruiz102, por uns tempos importador de trigo bretão para Portugal,
recorda-o com mau humor. O essencial do lucro, diz ele, cabia então aos
transportadores, verdadeiros senhorios do tráfico. Recordemos também as
reflexões de Defoe sobre o comércio interno inglês, admirável porque
passa por grande número de intermediários e todos recebem, na passagem,
um pouco do maná. Mas bem pouco, a julgar pelos exemplos que o próprio
Defõe apresenta no final103. A superioridade incontestável do Fernhandel,
do co

mércio de longo curso, é a concentraÇão por ele permitida e que o torna


um motor ftnpar da reprodução e do aumento rápidos do capital. Em suma,
impõe-se a concordância com os historiadores alemães ou com Maurice Dobb,
que viram no comércio de longa distância um instrumento essencial da
criação do capitalismo mercantil. E também da criação da burguesia
mercantil.
Tampouco há capitalismo mercantil sem aprendizagem, sem instrução prévia,
sem o conhecimento de meios muito acima de rudimentares. Florença, já no
século XIV, organizara um ensino laico104. Segundo Villani, em 1340,
aprendem a ler na escola primária (a botteghuzza) de 8 mil a 1O mil
crianças, meninos e meninas (a cidade tem então menos de 10O mil
habitantes). Foi à botteghuzza dirigida por
Matteo, mestre de gramática, "alpiè delponte a Santa Trinità", que
Niccoló
Machiavelli foi levado, em maio de 1476, para aprender a ler pelo
compêndio do gramático Donato
- chamavam-lhe o Donatello. Dessas 8 mil a 1O mil crianças, mil a 1.20O
iam depois à escola superior, criada especialmente para os aprendizes de
mercador. O menino permaneceria lá até os quinze anos, estudando
aritmética (algorismo) e contabilidade (abbaco). Ao sair desses cursos do
"técnico", já era capaz de manter os livros de contabilidade que ainda
podemos folhear e que registram com exatidão as operações de venda a
crédito, de comissões, de compensações entre praças, de divisão dos
lucros entre participantes das companhias. Pouco a pouco, a aprendizagem
na loja ia completando a educação dos futuros mercadores. Alguns deles
entravam por vezes no "superior" e iam especialmente estudar direito na
Universidade de Bolonha.
Assim, a formação prática se alia às vezes, entre os mercadores, a uma
verdadeira cultura. Na Florença que em breve será a dos Médicis, ninguém
se admirará que os mercadores sejam amigos dos humanistas, que alguns
deles sejam bons latinistas; que escrevam bem, gostem de escrever; que
conheçam a Divina
Comédia de fio a pavio, a ponto de se abandonarem a reminiscências ao
correr da pena; que garantam o êxito das Cento Novelle de Boccaccio; que
tenham apreciado a obra rebuscada de Alberti, Della Famiglia; que militem
por uma arte nova, a favor de Brunelleschi contra o medieval Ghiberti; em
suma, que tragam consigo uma parte importante da nova civilização que a
palavra Renascimento nos sugere.
São também virtudes do dinheiro: um privilégio chama outros. Richard
Ehrenberg105 afirmou, a propósito de Roma, que onde moram os banqueiros,
há artistas.
Não vamos imaginar toda a Europa mercantil segundo este modelo. Mas por
toda a parte se impõem os estudos práticos e técnicos. Jacques Coeur
formou-se na loja do pai e, mais ainda, por ocasião da viagem a bordo da
galé de Narbonne
106 que, em 1432, o levou ao Egito, fato que, ao que parece, decidiu-lhe
o destino. Jakob Fugger, aquele a quem chamarão o Rico, der Reiche (1459-
1525), homem pura e simplesmente genial, terá aprendido em Veneza a
partita doppia, então praticamente desconhecida na Alemanha. Na
Inglaterra do século XVIII, a aprendizagem dos negócios era, segundo os
estatutos, de sete anos. Os filhos dos mercadores ou os filhos mais novos
das grandes famílias destinados aos negócios faziam muitas vezes estágio
no Levante, em Esmirna, onde eram tratados com deferência pelo

cônsul inglês e logo de saída se interessavam pelos lucros comerciais que


tinham fama de ser nessa praça, com ou sem razão, os mais elevados do
mundo107

já no século XIII as cidades da Hansa mandavam seus aprendizes de


mercad .
Mas ra suas distantes feitorias. or paEm suma, não devemos subestimar os
conhecimentos que cumpria adquirir:
fixação dos preços de compra e venda, cálculo dos preços de custo e das
taxas de câmbio, correspondência de pesos e medidas, cálculo dos juros
simples e dos juros compostos, arte de preparar o "balanço simulado" de
uma operação, manejo das moedas, das letras de câmbio, das notas
promissórias, dos títulos de crédito. Ao todo, não é pouca coisa. Por
vezes, alguns mercadores experientes sentiam mesmo a necessidade de, como
diríamos hoje, "reciclar". Aliás, quando vemos as obrasprimas que são os
livros contábeis do século XIV, impõe-se a admiração retrospectiva. Hoje,
cada geração de historiadores, em todo o mundo, não produz muito mais que
dois ou três especialistas capazes de destrinchar esses enormes registros
e tiveram de aprender sozinhos a lê-los e interpretálos. Para consegui-
lo, os manuais de mercador da época são um auxiliar precioso, desde o de
Pegolotti (1340), que não foi o primeiro, até o Parfait négociant, de
Jacques Savary (1675), que não foi o último. Mas não bastam para esta
aprendizagem de tipo especial.
Ofarmacêutico faz suas contas. Afresco do castelo de Issogne, fim do
século XV.
(Foto Scala.)

r u capiratismo em cas1 N É mais fácil começar pelas correspondências


comerciais, há alguns anos descobertas em grande número - desde que houve
a preocupação de procurá-las. Ã parte certas cartas, ainda inábeis, dos
séculos XIII e XIV venezianos, a correspondência comercial depressa
atingirá o alto nível que depois conservará, pois esse nível é a sua
razão de ser, a justificação da troca dispendiosa desse superabundante
correio. Informar-se conta mais ainda do que se formar, e a carta é,
acima de tudo, informação. As operações que interessam aos dois
missivistas, ordens expedidas e recebidas, avisos de remessa ou de venda
ou compras de mercadorias e de títulos de pagamento, etc., constituem
apenas uma parte.
Seguem-se obrigatoriamente as notícias úteis passadas de boca em boca:
notícias políticas, notícias militares, notícias sobre as colheitas,
sobre as mercadorias esperadas; o correspondente também anota
minuciosamente as flutuações do preço das mercadorias, do numerário e do
crédito na sua praça; quando necessário, assinala o movimento dos navios.
Por fim, são infalivelmente terminadas por uma lista de preços e a
cotação dos câmbios, quase sempre em pós-escritos: temos milhares de
exemplos. Vejam-se também as Coletâneas de notícias que constituem os
Fugger Zeitungen108 esses noticiários que a firma de Augsburgo recebia de
toda uma série de correspondentes no estrangeiro.
O ponto fraco dessa informação está na lentidão e incerteza dos correios,
mesmo no fim do século XVIII, a ponto de um mercador sério tomar sempre a
precaução de enviar, com cada carta, uma cópia da anterior. Quando uma
carta leva uma ordem urgente ou uma informação confidencial importante,
"manda vir imediatamente teu corretor", subito habi il sensale: este
conselho dado ao mercador em 136O por outro mercador109 é válido para
todas as épocas. É preciso aproveitar a ocasião.
E a primeira condição é mesmo receber e enviar uma porção de cartas,
participar de várias redes de informação que assinalam os bons negócios,
no momento ideal, bem como aqueles de que convém fugir como da peste. O
conde de Avaux, embaixador de Luís XIV nas Províncias Unidas, está
atento, em 1688, aos protestantes que, vindos da França, não param de
para lá afluir, mesmo três anos depois da revogação do edito de Nantes.
Acaba de chegar um deles, um tal Monginot, "grande como um gigante, creio
que gascão. [ ... ] Fez passar cerca de quarenta mil escudos. Falei com
ele esta manhã. É homem com muitos negócios, escreve dia e noite"110.
Grifo esta última frase, inesperada, mas que não devia sê-lo: condiz com
a imagem tradicional de Alberti, a do mercador "com os dedos sempre
manchados de tinta".
Nem por isso a informação deixa de ser aleatória. As circunstâncias se
modificam, "a medalha tem reverso". Um erro de cálculo, um atraso do
correio, e o mercador vê-se diante de uma oportunidade perdida. Mas de
que serve recapitular "os bons negócios que perdemos", escreve Louis
Greffulhe ao irmão (Amsterdam, 3O de agosto de 1777). "Na carreira do
comércio, não é para trás, e sim para frente, que é preciso olhar, e se
aqueles que a seguem se ocupam em analisar o passado, não há um que não
tenha tido 10O vezes a oportunidade de fazer fortuna ou de se arruinar, e
se, no que me diz respeito, eu fizesse a enumeração dos bons negócios que
deixei escapar, teria por que me enforcar.""'
Sobretudo, a informação frutuosa é a que não foi demasiado divulgada. Em

1777, Louis Greffulhe escrevia a um mercador de Bordeaux, seu sócio num


negócio de índigo: "Recorde-se de que se o negócio se espalha estamos
f... Acontecerá com esse artigo o que aconteceu com muitos outros: assim
que há concorrência,

acaba-se a água para beber." 112 Em 18 de dezembro do mesmo ano, quando a


guerra da América transformava~se em guerra geral, escrevia ele:
"Conseqüentemente, é essencial fazer O impossível para termos com
segurança e antes de qualquer outro notícias do que se passar.--113
"Antes de qualquer outro: se receberes um maço de cartas para ti e outros
mercadores", recomenda um
Trattato dei buoni costumi cujo autor é um mercador, "começa por abrir as
tuas.
E age. Acertados os teus negócios, terás tempo para entregar as cartas
dos outros. y 114 Isso em 1360. Mas nos nossos dias e nos países de livre
concorrência como todos sabemos, aqui está a carta que alguns happyfew
podiam receber em 1973, convidando-os a fazer uma assinatura muito cara e
preciosa em troca de algumas folhas datilografadas semanais de informação
prioritária: "Está
V. S. perfeitamente consciente de que uma informação divulgada perde 90%
do seu valor. Vale mais saber [as coisas] duas ou três semanas antes dos
outros"; sua ação ganhará "consideravelmente em segurança e eficácia". Os
nossos leitores "não esquecerão tão cedo que foram os primeiros a ser
informados da iminência da demissão do Primeiro-Ministro e da próxima
desvalorização do dólar"!
Os especuladores de Amsterdam, de quem já dissemos o quanto seus
movimentos estavam ligados às notícias, verdadeiras ou falsas, também
tinham imaginado um serviço de informações prioritárias. Damos com ele
por acaso, em agosto de 1779, no momento de pânico provocado pela entrada
da armada francesa na Mancha. Em vez de utilizar o serviço regular dos
paquetes, os especuladores holandeses organizaram, com barcos leves,
ligações ultra-rápidas entre a Holanda e a
Inglaterra: partida de Catwyk, perto de Skervenin, na Holanda, chegada
perto de
Harwisht, na Inglaterra, a SoaIs "onde não há Porto mas uma simples
enseada, o que não atrasa nada...". E eis os tempos recordes: Londres-
Soals, 1O horas;
Soals-Catwyk, 12 horas; Catwyk-Haia, 2 horas; Haia-Paris, 4O horas. Isto
é,
Londres-Paris em 72 horas"'.
Notícias especulativas à parte, o que os mercadores de outrora queriam
ser os primeiros a conhecer é o que hoje chamaríamos a conjuntura curta,
em linguagem
Ia época a largueza ou estreiteza dos mercados. Estas palavras (tiradas
por todas is línguas da Europa da gíria dos mercadores italianos:
larghezza e strettezza) assinaam os fluxos e refluxos da conjuntura.
Ditam o jogo variável que interessa adotar onforme a mercadoria, ou o
numerário, ou o crédito (isto é, as letras de câmbio) ejam abundantes ou
não no mercado. Em 4 de junho de 1571, em Antuérpia, escrevm os Buonvisi:
"A largueza do dinheiro sonante persuade-nos a voltar a atenção iara a
mercadoria.'9116 Simón Ruiz não é tão ponderado, como vimos, quando, uns
uinze anos mais tarde, as praças de Itália se acham subitamente inundadas
de diheiro vivo. Enfurece-se e considera quase uma ofensa pessoal que a
demasiada rrghezw de Florença tenha desarticulado seus habituais tráficos
com letras de câmbio.
É verdade que ele compreende mal a situação. Naquela época, a
observação )mercial já acumulara experiência; o negociante sabe jogar no
curto prazo, opeição a operação. Mas levou tempo para que as regras
elementares que nos eluciIm sobre a economia passada entrassem no saber
coletivo, mesmo no dos merca)res, mesmo no dos historiadores. Em 1669, a
Holanda e as Províncias Unidas tão desoladas com uma abundância de
mercadorias não vendidas I I I: todos os pres caem, os negócios
adormecem, já não se fretam barcos, os armazéns da cidade :, urgitam de
estoques encalhados. Alguns grandes mercadores, porém, continuam 'omprar:
é a única maneira, pensam eles, de impedir uma excessiva depreciação

u capiratismo em casa seus estoques e eles têm recursos bastante sólidos


para se permitirem esta polítieu

5 antibaixa- Em contrapartida, quanto às causas desta anomalia


anormalmente ant a ' olongada e que progressivamente congela os negócios,
todos os mercadores holo 01 eses, e com eles os embaixadores
estrangeiros, a discutem durante meses sem des d preenderem grande coisa.
Todavia, acabaram por se aperceber do papel dein inpl ['qot e, nhado
pelas más colheitas da Polônia e da Alemanha.-' elas desencadearam pe
que, para nós, é uma crise típica do Ancien Régime. Houve greve dos
compradou . Mas será suficiente a explicação9 A Holanda tem tantos
trunfos na mão afora M
K , e o centeio da Alemanha e da Polônia, que forçosamente se trata de
uma trigo se mais geral, por certo européia, e ainda hoje este tipo de
crise com repercus[L~ nunca fica perfeitamente claro.
Não vamos, portanto, pedir demais a homens a quem até a reflexão
econômiCa do seu tempo é muitas vezes estranha. Se se arriscam, uma vez
por outra, é por obrigação: precisam de argumentos para convencer o
príncipe ou o ministro, para evitar ou fazer revogar uma decisão, um
decreto que os ameaça, para defender um projeto mirífico, tão útil ao
interesse geral que mereceria, claro, ser apoiado por privilégios,
monopólios ou subsídios. Mesmo assim não saem muito, nessa ocasião, do
âmbito restrito e cotidiano do ofício. Na verdade, só sentem indiferença
ou irritação para com os primeiros economistas, seus contemporâneos.
Quando surgiu A riqueza das nações (1776), sir John Pringle comentou que,
nesse domínio, nada de born se podia esperar de um homem que não tivesse
praticado o comércio, tal como de um advogado que quisesse falar de
física1181 E nisso era intérprete de muitos homens do seu tempo. Os
"economistas" facilmente faziam sorrir, pelo menos os nossos homens de
letras. Entre os caçoístas, Mably, ou o encantador Sébastien Mercier, ou
mesmo Voltaire (Lhomme aux quarante écus).
oncorrência sem orrentes"119

Outra morosidade, outro incômodo para o mercador é a regulamentação


precisa e pesada do mercado público em geral. O grande mercador não é o
único a querer libertar-se dela. O sistema do mercado privado, descrito
por A. Everitt12% é a resposta visível em toda a parte às exigências de
uma economia de mercado que cresce, se acelera, se transforma, solicita o
espírito empreendedor em todos os níveis. Mas, na medida em que este
sistema é em geral ilegal (muito menos tolerado na França, por exemplo,
do que na Inglaterra), fica restrito a grupos de homens ativos que, tanto
no que se refere a preços como ao volume e rapidez das transações,
trabalham deliberadamente para se desvencilhar das coerções e das
vigilânCias administrativas que continuam a atuar sobre os mercados
públicos tradicionais.
Há, portanto, duas circulações, a do mercado vigiado, a do mercado livre
ou que se esforça por sê-lo. Se nos fosse possível mapeá-las, uma em
azul, a outra em vermelho, veríamos que se distinguem, mas também que
andam lado a lado e se completam. A questão seria saber qual é a mais
importante (no início e mesmo dePois, é a antiga); qual é mais leal, mais
honestamente competitiva e reguladora; além de saber se uma é capaz de
apanhar a outra, de captá-la, de aprisioná-la. Olhando com atenção, a
velha regulamentação dos mercados, aquela cujos pormenores

363

descobrimos, quanto mais não seja, no Daité de lapolice de Delamarre,


revela intenções que visam a Preservar a verdade do mercado e o interesse
do consumidor urbano. Se todas as mercadorias devem obrigatoriamente
confluir para o mercado público, este se torna instrumento de um
confronto concreto entre a oferta e a procura, e a tarifação instável do
mercado passa a ser apenas a expressão desse confronto e uma maneira de
preservar a concorrência real tanto entre produtores como entre
revendedores. O aumento das trocas condenava inevitavelmente, num prazo
mais ou meno longo, essa regulamentação manietante até o absurdo. Mas as
negociações diretas do mercado privado não visam apenas à eficácia;
tendem também a eliminar a concorrência, a promover na base um
microcapitalismo que segue, substancialmente, as mesmas vias que o
capitalismo das atividades superiores da troca.
O procedimento mais habitual desses microcapitalistas que constroem, às
vezes depressa, pequenas fortunas é, na realidade, o de se colocarem fora
dos preços do mercado, graças aos adiantamentos de dinheiro e aos jogos
elementares do crédito: comprar o trigo antes da colheita, a lã antes da
tosquia, o vinho antes da vindima, dirigir os preços utilizando a
armazenagem dos gêneros alimentícios e, finalmente, manter o produtor à
sua mercê.
Todavia, nos setores relacionados com o abastecimento cotidiano, é
difícil ir mais longe sem despertar a vindita e o descontentamento
populares, sem ser denunciado - e na França as denúncias são dirigidas ao
juiz de polícia da cidade, ao intendente ou mesmo ao Conselho de
Comércio, em Paris. As deliberações deste provam que mesmo casos
aparentemente insignificantes são por ele levados muito a sério: sabe-se
assim, nas altas esferas, que "é muito perigoso" tomar medidas
precipitadas "relativamente aos trigos", é expor-se tanto a erros de
cálculo como a reações em cadeia121. E, quando pequenos negócios
fraudulentos ou pelo menos ilegais conseguem, ao menos por uns tempos,
escapar aos olhares indiscretos e instalar um monopólio lucrativo, é
porque ultrapassam o escalão do mercado local e estão nas mãos de grupos
bem organizados, providos de capitais.
Foi portanto um negócio de envergadura o montado por um grupo de
mercadores associados a grandes açougueiros para controlarem o
abastecimento de carne de
Paris. Trabalham para eles, na Normandia, Bretanha, Poitou, Limousin,
Bourbonnais, Auvergne e Charolais, companhias de mercadores feirantes que
se conchavam para desviar para as grandes feiras que freqüentam, elevando
os preços, os animais que normalmente iriam para as feiras locais, e para
dissuadir os "pegureiros" (os criadores) de os enviarem diretamente para
Paris onde, garantem, os açougueiros são péssimos pagadores. Compram
então eles próprios do produtor, o que, como explica um circunstanciado
relatório ao inspetor-geral das
Finanças (junho de 1742), "tem grandes conseqüências, pois tendo comprado
os animais em sociedade, mais de metade do mercado de Poissy, põem-lhes o
preço que querem porque é preciso comprar deles' '122. Foram necessárias
indiscrições parisienses para que se visse a verdadeira natureza deste
tráfico que concentra em Paris atividades aparentemente inocentes e
disseminadas por várias zonas de pecuária, muito afastadas umas das
outras.
Outro negócio de envergadura: em 1708, um relatório ao Conselho de
Comércio123

denuncia "o corpo [... ] muito numeroso" dos "inercadores de manteiga,


queijo e outras mercadorias de boca [... 1, vulgarmente chamados
graisseux em Bordeaux".
Atacadistas ou varejistas, agruparam-se todos numa "sociedade secreta" e,
quando da declaração de guerra, em 1701, "haviam feito grandes ar

Os monopólios Ou pretensos monopólios dos mercadores de ferro, para se


apoderarem da totalidade ou de parte da produção das forjas do reino são
decerto negócios mais sérios. Gostaríamos de estar plenamente informados,
mas os documentos de que dispomos são demasiado breves. Por volta de
1680, um relatório denuncia

4 'a cabala formada entre todos Os mercadores de Paris" que se


abasteceram de ferro no estrangeiro para poderem deixar à sua mercê os
mestres ferreiros franceses. Os comparsas reúnem-se todas as semanas na
casa de um deles, na Praça
Maubert, fazem Compras em comum, impondo aos produtores preços cada vez
mais módicos sem por isso alterarem a sua própria tarifa de revenda 128.
Outra tentativa, em 1724, envolve "dois ricos negociantes" de Lyon129.
Ambas as vezes, os culpados ou pretensos culpados replicam, juram por
todos os santos que são injustamente acusados e encontram autoridades que
testemunham a seu favor. Seja como for, escapam à vindita pública. Prova
de inocência ou de força? A questão volta a levantar-se quando lemos, uns
sessenta anos mais tarde, em março de

1789, da pena dos deputados do Comércio, que o ferro desempenha um papel


muito importante na praça de Lyon e que "são os mercadores lyoneses",
freqüentadores das feiras de Beaucaire "que financiam os mestres das
forjas do Franco-Condado e da Borgonha"130. '
De qualquer maneira, há certamente alguns pequenos monopólios, oblíquos,
Protegidos por hábitos locais, que entram tão bem nos costumes que nem
sequer suscitam protestos, ou quase. Admiremos, desse ponto de vista, a
astúcia simples dos mercadores de trigo de Dunquerque. Quando um navio
estrangeiro vai àquele porto vender a carga de cereais (como, no final do
ano de 1712 uma série depequeníssimos navios ingleses de 15 a 3O
toneladas, no momento em ue são reatadas as relações comerciais, pouco
antes do fim da guerra da sucessão da
Espanha), a norma é nunca vender no cais quantidades inferiores a cem
razières a razière "marftima", um oitavo superior à razière norma1131.
Portanto, só os grandes mercadores e alguns notáveis que têm recursos
compram no porto; todos os outros terão de comprar o trigo na cidade, a
algumas centenas de metros dali.
Ora, essas centenas de metros correspondem a um singular aumento de
preços: em 3

de dezembro de 1712, as cotações são respectivamente de 21 de um lado,


26-27 do outro. A esses cerca de 25% de lucro acrescente-se a vantagem do
oitavo de bonificação representado pela diferença de -apacidade entre a
razière marítima e a normal, e compreende-se que o modesto ob'ervador que
redige tais relatórios destinados à inspeção geral se indigne um belo
lia, embora por meias palavras, com esse monopólio das compras reservado
às bolas bem providas: "O povo não ganha nada com isso, pois não pode
fazer compras ao grandes. Se se ordenasse que cada particular desta
cidade tivesse ordem de comrar 4 a 6 razières cada um, isso aliviaria o
público.--132

Mas mudemos de escala e passemos ao grande comércio dos


exportadores[portadores.
Os exemplos anteriores deixam prever que facilidades e impunidade
-omércio longínquo de longa distância pode proporcionar - na realidade
isento igil^ cia, dadas as distâncias entre os diversos lugares de venda
e entre os atoImplicados nessas trocas - a quem quer moldar o mercado,
apagar a concor

" cupítu113frtu em Lu3U rência com um monopólio de direito ou de fato,


afastar de tal forma a oferta e a procura que os terms of trade dependam
unicamente do intermediário, único a par da situação dos mercados nas
duas pontas da longa cadeia. Condições sine qua non para entrar nos
circuitos do grande lucro: ter capitais suficientes, crédito na praça,
boas informações, relações, e finalmente sócios nos pontos estratégicos
dos itinerários e que partilhem o segredo do negócio. O Parfait negociant
ou mesmo o Dictionnaire de commerce de Savary des Bruslons nos enumeram,
na escala da concorrência internacional, toda uma série de procedimentos
mercantis discutíveis e decepcionantes, para quem acredita nas virtudes
da liberdade de empresa para alcançar o ótimo econômico e o equilíbrio
dos preços, da oferta e da procura.
O Pe. Mathias de Saint-Jean (1646) denuncia-os veementemente como obra da
opressão estrangeira que pesa sobre o pobre reino da França. Os
holandeses são grandes compradores de vinhos e aguardentes. Nantes, para
onde afluem 44os vinhos de Orléans, de Bois-gency [Beaugency], Blois,
Tours, Anjou e Bretanha", tornou-se um dos seus campos de ação, a ponto
de se terem multiplicado as vinhas e de, nessas terras do Loire, a
cultura do trigo ter recuado perigosamente. A superabundância de vinho
obriga os produtores a queimar uma grande quantidade dele e a
"transformá-lo em aguardente", mas a aguardente requer um enorme consumo
de lenha para a destilação; reduzem-se então as reservas das florestas
próximas e aumenta o preço do combustível. Nessas circunstâncias já
difíceis, os mercadores holandeses têm condições propícias para contratar
a compra antes da colheita: adiantam dinheiro aos camponeses, "o que é
uma espécie de usura que as próprias leis da consciência não permitem".
Em contrapartida, não infringem as regras admitidas se se contentem em
"arrar", dar arras, ficando entendido que o vinho será pago pela cotação
do mercado, depois da colheita. Mas, logo após as vindimas, fazer abaixar
as cotações é a infância da arte. Diz o nosso guia: "Os senhores
estrangeiros tornam-se assim donos e árbitros absolutos do valor dos seus
vinhos." Outro achado: levam aos viticultores barris, mas "à moda da
Alemanha, para fazer crer aos da terra para onde transportam o vinho que
são vinhos do Reno" - sendo estes, como se adivinha, de preço mais
elevado133.
Outro processo: rarefazer sabiamente a mercadoria nos mercados que se
abastecem
- se, claro, se tiver o dinheiro necessário Para esperar o quanto for
preciso.
Em 1718, a Companhia Inglesa da Turquia, também chamada Levant Company,
decide "adiar por dez meses a data da partida dos seus barcos para a
Turquia; prazo que ela prolongou depois por diversas vezes e do qual
anunciou abertamente o motivo e a intenção, a saber, elevar o preço das
manufaturas inglesas na Turquia e o da seda na Inglaterra" 134. É matar
dois coelhos com uma cajadada só. Do mesmo modo, os negociantes de
Bordeaux calculam as datas de suas viagens e o volume das cargas que
enviam para a Martinica de tal modo que as mercadorias da Europa sejam
bastante raras na ilha para fazer subir os preços, às vezes
fabulosamente, e para que os açúcares que vão buscar sejam comprados
suficientemente perto da colheita para ainda estarem com born preço.
A tentação mais freqüente, na verdade a solução mais fácil, é conseguir
instituir um monopólio de uma ou outra mercadoria de larga difusão. Claro
que sempre houve monopólios fraudulentos, escondidos ou ostentados com
insolência, conhecidos por todos, às vezes garantidos pela bênção do
Estado. No início do século XIV, segundo Henri Pirenne135 em Bruges,
Robert de Cassel foi acusado de "pro367

balança de Nuremberg, escultura de Adam Kraft, 1497. (Fototeca A. Colin.)


rar instituir uma enninghe para comprar todo o alúmen importado de
Flandres lominar-lhe os preços". Aliás, todas as firmas tendem a criar o
seu ou os seus )nopólios. Mesmo sem o querer explicitamente, a Magna
Societas que, no fim século XV, controla metade do tráfico externo de
Barcelona, tende a monopolir esse precioso tráfico. Aliás, já naquela
época, quem não sabe o que é um mopólio? Konrad Peutinger, historiógrafo
da cidade de Augsburgo, humanista e ritudo amigo dos mercadores - é
verdade que se casou com uma filha dos Wel, diz sem rodeios que
monopolizar é "bona et merces omnes in manum unam uortare", juntar numa
só mão a riqueza e todas as mercadorias"'.
com efeito, na Alemanha do século XVI, a palavra monopólio tornou-se um
dadeiro cavalo de batalha. Aplicam-na indistintamente aos cartéis, aos
sindicaaos açambarcamentos e até à usura. As firmas colossais - os
Fugger, os Welos
Hochstetter e alguns outros - impressionam a opinião pública com a imenão
das suas redes, mais extensas do que a Alemanha inteira. As empresas
peque; e médias temem pela existência. Entram em guerra contra os
monopólios dos

r' u capiransmo em casa gigantes, um apoderandose do mercúrio, o outro do


cobre e da prata. O Reichstag de Nuremberg (1522-1523) pronuncia-se
contra eles, mas as firmas gigantescas são salvas por dois editos que
Carlos V prolonga a seu favor, em 1O de março e em

13 de maio de 1525137. Nessas condições, é curioso que o verdadeiro


revolucionário que foi Ulrich de Hütten ataque, em suas diatribes, não a
exploração dos metais, de que são repletos os solos da Alemanha e dos
países vizinhos, mas as especiarias asiáticas, o açafrão da Itália ou da
Espanha, a seda: "Abaixo a pimenta, o açafrão e a seda!", exclamava ele.
" [... ] O meu maior desejo é que não se cure da pelagra ou do mal-
francês nenhum daqueles que não conseguem passar sem pimenta-do-reino.
"138 Banir a pimenta-do-reino para lutar contra o capitalismo será uma
maneira de acusar o luxo, ou o poder do comércio de longa distância?
Os monopólios são uma questão de força, de astúcia, de inteligência. Os
holandeses, no século XVII, tornaram-se mestres nessa arte. Sem nos
determos na história muito conhecida dos dois príncipes do comércio das
armas, Louis de
Geer, graças à sua fundição de canhões na Suécia, e o cunhado, Elias
Tripp, graças ao domínio do cobre sueco, note-se que todo o grande
comércio de
Amsterdam é dominado por grupos restritos de grandes mercadores que ditam
os preços de um grande número de produtos importantes: barbatanas e óleo
de baleia, açúcar, sedas italianas, perfumes, cobre, salitre139. Arma
prática de tais monopólios, os enormes armazéns, maiores, mais caros do
que os grandes navios, onde se consegue armazenar uma quantidade de trigo
equivalente a dez ou doze anos do consumo das Províncias Unidas14O
(1671), arenques ou especiarias, tecidos ingleses ou vinho francês,
salitre da Polônia ou das índias orientais, cobre da Suécia, tabaco de
Maryland, cacau da Venezuela, peles russas e lã espanhola, cânhamo do
Báltico, seda do Levante. A regra é sempre a mesma:
comprar a preço baixo, do produtor, à vista, melhor, mediante um
adiantamento, armazenar e esperar (ou provocar) a subida das cotações. Se
se anuncia uma guerra, promissora de preços elevados para os produtos
estrangeiros que escasseiam, os mercadores de Amsterdam enchem até
rebentar os cinco ou seis andares dos seus armazéns, a ponto de, às
vésperas da guerra da Sucessão da
Espanha, por exemplo, os barcos não conseguirem descarregar por falta de
espaço.
Aproveitando sua superioridade, o comércio holandês explora até a
Inglaterra do princípio do século XVIII, tal como explora a região do
Loire: compras diretas do produtor, "at first and the cheapest seasons of
the year" 141 (e isto acrescenta um matiz ao private market descrito por
Everitt), por intermédio de agentes ingleses ou holandeses que percorrem
campos e cidades; redução nos preços de compra obtidos contra pagamento à
vista, ou contra pagamento adiantado de panos ainda não tecidos, de peixe
ainda não pescado. Resultado: os produtos franceses ou ingleses são
entregues no estrangeiro pelos holandeses a preços iguais ou inferiores
aos das mercadorias na França ou na Inglaterra - situação que não deixa
de esPantar os observadores franceses e para a qual não encontram outra
explicação além do baixo preço dos fretes holandeses!
No Báltico, uma política análoga garantirá por muito tempo aos holandeses
uma dominação quase absoluta dos mercados do Norte.
Em 1675, quando é publicado Le parfait négociant de Jacques Savary, os
ingleses já conseguiram infiltrar-se no Báltico, se bem que a partilha
entre eles e os holandeses ainda seja desigual. Para os franceses que,
por sua vez, gostariam de lá se estabelecer, as dificuldades se
multiplicam como que por encanto. E a me369

ão é reunir os enormes capitais necessários para entrar no jogo. As


mercadovadas ao Báltico são efetivamente vendidas a crédito, ao passo que
tudo o li se compra é vendido à vista, a rijksdalier de prata "com
cotação em todo -te".
Essas moedas têm de ser compradas em Amsterdam ou em Hamburgo; preciso
ter lá correspondentes para as remessas. É também necessário ter
corridentes nos portos do Báltico. últimas dificuldades: os obstáculos
constituí-los ingleses e mais ainda pelos holandeses. Estes fazem "tudo o
que podem... ] afastar e desiludir [os franceses]... vendendo mais barato
suas mercadonesmo com muitas perdas, e comprando as da região mais caras,
para que nceses, vendo que têm perdas, percam a vontade de voltar. Há uma
infinidaexemplos de negociantes franceses que comerciaram no Norte, lá se
arruínaor causa desta má maneira de agir dos holandeses, por terem sido
obrigados egar suas mercadorias com perdas consideráveis, do contrário
não as teriam

10-142. Essa política holandesa é, evidentemente, muito consciente. Em


seo de

1670, quando se organiza a Companhia Francesa do Norte, De Witt é lo


pessoalmente a Dantzig para obter novos privilégios da Polônia e da PrúsL
fim de ficar à frente do tráfico que os franceses ali pudessem
introduzir"143. o ano anterior, durante a terrível crise de vendas de que
falamos, as refle[os holandeses narradas por Pomponne não são menos
reveladoras. Chega)u estão para chegar, dezoito barcos das índias. Que
fazer com essa nova renuma cidade sobrecarregada de estoques? A Companhia
só vê uma solução: ar a Europa de "tanta pimenta-do-reino e tecidos de
algodão, e tão baratos re das outras nações o lucro de ir buscá-los,
particularmente da Inglaterra. ; armas com que a gente daqui sempre
combateu seus vizinhos no comércio. n, elas poderão tornar-se-lhes
nocivas se, para tirar o ganho dos outros, os deses tiverem de se privar
dele"144. com efeito, os holandeses são suficiente ricos para praticar
este gênero de jogo ou qualquer outro. As mercadorias as em grande
quantidade por essa frota serão vendidas durante o verão de tendo os
mercadores de Amsterdam comprado tudo barato para manter o dos seus
estoques anteriores145.
Ias a busca do monopólio internacional é peculiar a todas as grandes
praças, ciais. Assim é em Veneza. Assim é em Gênova. Jacques Savary
explica-o mi;amente quanto ao precioso mercado da seda bruta146, que
desempenha um essencial na vida industrial francesa. As sedas cruas de
Messina servem espe, nte para a fabricação de fernandinas e de
adamascados de Tours e de Paris. acesso a elas é mais difícil do que às
sedas do Levante, pois são cobiçadas omércio e pelas tecelagens de
Florença, Luca, Livorno ou Gênova. Os franião têm praticamente acesso às
compras em primeira mão. com efeito, são oveses que dominam o mercado da
seda siciliana e tem-se de passar obrigatoite por eles. Contudo, a seda é
vendida pelos camponeses produtores nas feialdeia: uma única condição, o
mercador pagar à vista. Em princípio, portanliberdade de comércio. Na
realidade, quando os genoveses, como tantos mer% italianos, investiram o
dinheiro em terras, como no fim do século XVI, -scolha recaiu nos
"lugares melhores e mais abundantes em seda". Por conte, é-lhes fácil
comprar antecipadamente dos camponeses produtores e, se Dlheita abundante
ameaça baixar os preços, bastalhes comprar nas feiras res e locais alguns
fardos a preço alto para fazer subir de novo as cotações e

>alorizar os estoques de antemão constituídos. Além disso, como gozam dos


dileitos de cidadania de Messina, são isentos dos tributos que incidem
sobre os estrangeiros. Daí a amarga decepção de dois mercadores de seda
de Tours, em lig .ação com um siciliano, que chegam a Messina com 40O mil
libras, com as quais, pensavam, iriam quebrar o monopólio genovês.
Falham, e, tão hábeis quanto os holandeses, os genoveses imediatamente
lhes dão uma lição, entregando em Lyon seda a um preço inferior ao que os
mercadores de Tours haviam obtido em
Messilaa. É certo que há lioneses, em geral agentes de mercadores
genoveses naquela época, que são coniventes com eles, segundo um
relatório de 1701147.
Aproveitam para prejudicar as manufaturas de Tours, Paris, Rouen e Lille,
concorrentes das suas. Entre 168O e 1700, o numero de teares teria
passado, em
Tours, de 12 mil para 1.200.
Naturalmente, os maiores monopólios são os de direito e não apenas de
fato, das grandes companhias comerciais, sobretudo as das indias. Mas
esse é um problema diferente, uma vez que as companhias titulares de
privilégio se constituem com a conivência regular do Estado. Em breve
voltaremos a estes monopólios, assentes na economia e na política.
tentativa falhada de monopólio: reado da cochonilha, em 1787

A quem pensar que sobrestimamos o papel do monopólio, propomos a


espantosa história de uma especulação com a cochonilha tentada pelos
Hope, em 1787, época em que a firma era uma enorme empresa ocupada com o
lançamento, em grande escala, de empréstimos, russos e outros, na praça
de Amsterdam148. Por que se lançaram esses grandes manipuladores de
dinheiro em tal negócio? Primeiro, porque os responsáveis da firma pensam
que durante uma crise que remonta, segundo eles, pelo menos a 1748, ao
fim da "quarta" guerra contra a Inglaterra, o comercio foi muito
descurado em proveito dos empréstimos e que talvez seja o momento
apropriado para lançar a mercadoria. A cochonilha, fornecida pela Nova
Espanha, é um produto de luxo para o tingimento de têxteis que, pormenor
importante, tem a vantagem de se conservar. Ora, segundo suas
informações, Henri
Hope está persuadido de que a colheita seguinte será pequena, de que os
estoques existentes na Europa são escassos (1.75O fardos, afirmam-lhe,
armazenados em
Cádiz, Londres e Amsterdam), de que, estando os preços há vários anos em
baixa, os compradores tiveram tendência a só comprar na medida das suas
necessidades.
Seu plano é, nada mais nada menos, comprar a preço baixo e, para não
alertar o mercado, em todas as praças ao mesmo tempo, pelo menos três
quartos dos estoques existentes. Depois, fazer subir o preço e revender.
Custo previsto do investimento: 1, 5 a 2 milhões de guilders - uma soma
enorme. H. Hope avaliava que não haveria perdas possíveis, mesmo que os
grandes ganhos esperados não se realizassem. Assegurou a cumplicidade de
uma firma em cada praça, tendo os
Baring de Londres entrado mesmo com um quarto do negócio.
A operação acabou sendo um fiasco. Primeiro, por causa da crise latente:
os preços não subiram o suficiente. Em virtude também da morosidade dos
correios que impôs atrasos na transmissão das ordens e na sua execução.
Finalmente, e sobretudo, porque, à medida que as compras iam sendo
feitas, foram-se apercebendo

de que os estoques existentes eram infinitamente maiores do que haviam


dito os informantes. Hope se obstinará em comprar tudo, em Marselha, em
Rouen, em
Hamburgo, até em São Petersburgo, não sem dissabores pelo caminho. Acaba
ficando com um estoque duas vezes maior do que o esperado. E encontrará
dificuldades mil para o escoar, por causa da quebra das vendas no
Levante, devida à guerra russoturca, e da quebra das vendas na França,
conseqüência da crise da indústria têxtil.
Em suma, a operação terminará com perdas consideráveis, que a riquíssima
firma
Hope absorverá sem queixas e sem interromper suas especulações lucrativas
com empréstimos estrangeiros. Mas todo o clima da vida comercial da época
fica esclarecido com este episódio e com a abundante correspondência
conservada nos arquivos da firma.
Seja como for, a partir desse exemplo preciso, duvidamos da pertinência
dos argumentos de P. W. Klein, o historiador da grande firma dos
Tripp149. Ele não nega um instante sequer, pelo contrário, que o grande
negócio de Amsterdam fosse construido, desde o século XVII, com base em
monopólios mais ou menos perfeitos, em todo caso sempre renascentes,
sempre procurados. Mas a justificação do monopólio, a seu ver, é que ele
seria a condição do progresso econômico, até do crescimento. Pois o
monopólio, tal como o explica, é o seguro contra os numerosos riscos que
espreitam o negócio, é a segurança, e sem segurança não há investimentos
repetidos, não há ampliação contínua do mercado, não há pesquisa de novas
técnicas. Ainda que a moral talvez o condene, a economia e, por que não
dizer, o bem geral se aproveitam do monopólio.
Para aceitar esta tese, cumpriria estar desde logo persuadido das
virtudes exclusivas do empresário,. Não é de admirar que Klein se refira
a J. Schumpeter.
Mas o progresso econômico, o espírito empreendedor e a inovação técnica
virão sempre de cima? Será o grande capital o único capaz de suscitá-los?
E se voltássemos ao caso preciso dos Hope em busca do monopólio da
cochonilha, em que procuram eles segurança? Não será antes uma aceitação
do risco de especular? E, afinal, em que inovam eles? Em que servem eles
o interesse econômico geral? Há bem mais de um século que, sem a
intervenção dos holandeses, a cochonilha se tornou a rainha dos corantes,
uma mercadoria "régia" para todos os negociantes de Sevilha. Os estoques
que os Hope perseguem por toda a Europa estão distribuídos segundo a
regra das necessidades industriais e são essas necessidades que conduzem,
ou deveriam conduzir o jogo. Que vantagem teria a indústria européia em
que esses estoques de cochonilha, reunidos numa só mão, aumentassem
brutalmente de preço, objetivo confesso de toda a operação?
com efeito, P. W. Klein não vê que é o conjunto da posição de Amsterdam
que é um monopólio em si e que o monopólio não é a busca da segurança,
mas da dominação.
Toda a sua teoria só seria válida se o que fosse born para Amsterdam
fosse born para o resto do mundo, para parafrasear uma fórmula por demais
conhecida. rfídia oeda
Há outras superioridades comerciais, outros monopólios que permanecem
invisíveis para os próprios beneficiários, de tal forma são naturais. A
atividade econômica superior, aglomerando-se ao redor dos possuidores de
grandes capitais, cria,

Em Haarlem, grua de descarga e cais do canaL Quadro de Gerrit Berckeyde,


16381698. (Museu de Douai, clichê Giraudon.)
efetivamente, estruturas de rotina que os favorecem no dia-a-dia, sem que
eles estejam sempre conscientes disso. Particularmente, no plano da
moeda, encontramse na cÔrnoda posição de um possuidor de divisas fortes
que vivesse hoje num país de moeda desvalorizada. Pois os ricos são
praticamente os únicos que manejam largamente e conservam na sua posse as
moedas de ouro e prata, ao passo que os humildes nunca têm na mão mais do
que moedas de bilhão e de cobre. Ora, essas diversas moedas jogam umas
com as outras, como jogariam, justapostas numa mesma economia, moedas
fortes e moedas fracas entre as quais se pretendesse manter
artificialmente uma paridade fixa - operação impossível, a bem dizer. As
flutuaÇões são contínuas.
com efeito, no tempo do bimetalismo, ou melhor, do trimetalismo, não há
unia, mas vdrias moedas. E são hostis umas às outras, opostas como a
riqueza e

)enúria. Jakob van Klaveren'50, economista e historiador, está errado ao


pensar e o dinheiro é apenas dinheiro, seja qual for a forma em que se
apresente: ouro, ata, cobre ou mesmo papel. Assim como o físiocrata
Mercier La Rivière que es, ve na EncycIopédie: "O dinheiro é uma espécie
de rio pelo qual se transportam isas comerciáveis." Não, ou então ponha-
se a palavra rio no plural.
Ouro e prata entram em choque. A ratio entre os dois metais acarreta
incesites e vivos movimentos de um país para outro, de uma economia para
outra.

13O de outubro de 1785, uma decisão francesa151 faz a relação ouro-prata


pas- de 1 contra 14, 5 para 1 contra 15, 3 - isto para deter a fuga do
ouro para fora reino. Em Veneza, tal como na Sicília, no século XVI e
mais tarde, como já se, a alta excessiva do ouro torna este uma má moeda,
nem mais nem menos, e expulsa a boa, segundo a lei chamada de Gresham. A
boa, no caso, é a prata, , ão necessária ao comércio do Levante. Na
Turquia, notam essa anomalia e, em )3, chega a Veneza uma quantidade de
zecchini, moedas de ouro, que se trocan com vantagem, dadas as cotações
da praça. Toda a Idade Média monetária, Ocidente, viveu sob o signo do
jogo duplo do ouro e da prata, com solavancos, iravoltas, surpresas que a
modernidade ainda conhecerá, mas em menor grau.
Aproveitar tal jogo, escolher entre os metais conforme a operação que se
tem realizar, conforme se paga ou se recebe, não é dado a todos, mas aos
privilegia;
que vêem passar pelas mãos grandes quantidades de numerário ou de títulos
.rédito. O senhor de Malestroit podia escrever, sem risco de se enganar,
em
1567: ioeda é "uma cabala que poucos entendem" 152. E, naturalmente, quem
entenaproveita. Assim, em meados do século XVI, há uma verdadeira
reclassificação fortunas quando o ouro restabelece, e por muito tempo,
sua primazia sobre rata, em conseqüência das chegadas contínuas de prata
da América.
Até aí, a ta fora o valor (relativamente) raro, e portanto seguro, "a
moeda orientada paentesouramento, cabendo ao ouro o papel de moeda das
transações importan'. Entre

155O e 156O 153 inverte-se a situação e os mercadores genoveses serão )


rimeiros a jogar, na praça de Antuérpia, o ouro contra a prata e a tirar
proveile um juízo pertinente e avançado em relação aos outros.
Um jogo mais geral e menos visível, que de certo modo entrou nos hábitos
dianos, é o das moedas elevadas - ouro e prata - contra as moedas
fracas )ilhão (cobre mais um pouco de prata) ou cobre puro. Para designar
essas relas, Carlo M.
Cipolla utilizou muito cedo a palavra câmbio, não sem irritar Ray-id de
Roover, por causa das confusões evidentes que o termo implica154. Mas !r,
como propõe este último, "câmbio interno", ou, como J. Gentil da Silva,
mbio vertical" sendo o "verdadeiro" câmbio o das moedas e das letras de i
praça para outra, chamado 'ccâmbio horizontal" - não nos adianta muito.
alavra câmbio subsiste e é razoável, uma vez que se trata do poder de
compra, moeda inferior, de moedas de ouro ou de prata; de uma relação
imposta (mas respeitada e portanto instável)
entre moedas cujo valor real não corresponde uas cotações oficiais. Não
usufruía o dólar, na Europa do pós-guerra, um prêautomático em relação às
moedas locais?
Ou era vendido acima da cotação ial, no "mercado negro", ou então, com
toda a legalidade, uma compra em ires beneficiava-se de um desconto de 1O
a 20% do preço. É essa imagem que rxite compreender melhor a punção
automática que os possuidores de moedas wo e prata operavam sobre o
conjunto da economia.

Efetivamente, de um lado, é em má moeda que se pagam todas as transações


miúdas do comércio varejista, os gêneros do campo no mercado, os salários
dos diaristas ou dos artesãos. Como dizia Montanari (1680)155, as moedas
inferiores são "Per uso della plebe che spende a minuto e vive a lavoro
giornaliere", para a plebe, que gasta em pequenas despesas e vive do
trabalho diário.
Do outro lado, as moedas inferiores não param de se desvalorizar
relativamente às moedas fortes. Seja qual for a situação monetária em
escala nacional, o povo sofre portanto, ao longo do tempo, os malefícios
de uma desvalorização ininterrupta. Em Milão, no princípio do século
XVII, o dinheiro miúdo é constituído por pequenas moedas, as terfine e as
sesine que, outrora de bilhão, se tornaram simples pedaços de cobre;
contendo um pouco de prata, as parpagliole têm um valor mais elevado.
Terline e sesine, com a ajuda da negligência do
Estado, são em suma moedas fiduciárias cuja cotação está continuamente em
baixa"'. Também na França, em agosto de 1738, d'Argenson anota no seu
Didrio:
"Houve esta manhã uma diminuição das moedas de dois soldos, a qual é de
dois liards; é um quarto do total, o que éMuito. 157

Tudo isso acarreta conseqüências. Nas cidades industriais com


proletariado e subproletariado, os salários monetários são puxados para
baixo em relação aos preços, que sobem mais facilmente do que eles. É uma
das razões que levam o artesanato lionês a sublevar-se em 1516 e em 1529.
No século XVII, essas desvalorizações internas, que até então haviam
atingido sobretudo as grandes cidades, comunicamse como a peste às
pequenas cidades, aos burgos onde a indústria e a massa dos artesãos
procuraram refúgio. J. Gentil da Silva, de quem tira esse pormenor
importante, pensa que Lyon, no século XVII, lança a rede da sua
exploração monetária aos campos circundantes111. Cumpriria,
evidentemente, provar a realidade dessa possível conquista. Seja como
for, está demonstrado que a moeda não é o fluido neutro de que os
economistas ainda falam. A moeda, maravilha da troca, sim, mas também
embuste a serviço do privilégio.
Para o mercador ou para as pessoas abastadas, o jogo continua a ser
simples:
repor o bilhão em circulação assim que o recebem, conservar apenas as
moedas válidas, com poder de compra muito mais elevado do que a sua
contrapartida oficial em "moeda negra", como se dizia. É o conselho que
dá ao caixa um manual de comércio (1638)159: "Nos pagamentos que fizer,
que utilize a moeda que, no lomento, tiver menor estima. " E, claro, que
amealhe o máximo de moedas fortes.
E a política de Veneza, que regularmente se desembaraça do seu bilhão,
enviando barris cheios dele para suas ilhas do Levante. É o estratagema
infantil dos mercadores espanhóis do século XVI que levam cobre para
cunhar na casa da moeda de Cuenca, na Nova Castela: emprestam essa moeda
de bilhão aos mestres tecelões da cidade que dela precisam para comprar
as matérias-primas necessárias às suas oficinas e especificam que o
reembolso será feito em moedas de prata, nas cidades ou feiras onde os
mestres vão vender os tecidos 160. Em Lyon, cerca de

1574, proíbese aos corretores "ir ao encontro das mercadorias para as


açambarcar", mas também "correr as hospedarias ou as habitações privadas
para comprar as moedas de ouro e de prata e pôr o preço que lhes
apetecer"161. Em
Parma, em 1601, pretendese pôr fim, de uma vez por todas, à atividade dos
cambistas de moeda, os "bancherotti", acusados de recolher as boas moedas
de ouro e de prata e de fazê-las desaparecer da cidade, para introduzirem
moedas inferiores ou de má qualidade162.

O capitalismo em casa
Veja-se como procedem os mercadores estrangeiros na França, sobretudo
holandeses (1647): "... mandam aos seus agentes e comissários moedas do
seu país, muito alteradas ou de liga muito inferior às nossas. E pagam
com essas moedas a mercadoria que compram, guardando os melhores
espécimes de nossa moeda que enviam ao seu país" 163.
Nada mais simples, mas, para consegui-lo, é preciso ocupar uma posição
forte.
Eis o que desperta a nossa atenção para as invasões regulares de más
moedas de que está cheia a história geral do monetarismo. Nem sempre são
operações espontâneas e inocentes. Dito isto, que é o que sugere,
exatamente, Issac de
Pinto164 quando dá à Inglaterra, que freqüentemente tem falta de
numerário, este conselho à primeira vista um tanto surpreendente, mas
sério: ela deveria "multiplicar mais a moeda miúda, a exemplo de
Portugal"? Será uma maneira de ter mais moeda para manobrar no nível
superior da vida mercantil? Português e banqueiro, Pinto sabia sem dúvida
do que estava falando.
Mas teremos examinado todos os problemas perversos da moeda? Claro que
não. Não será a inflação o essencial do jogo? Charles Mathon de La Cour
(1788) o diz com espantosa clareza. "O ouro e a prata", explica ele, -que
se extrai contiCasa de câmbio, gravura sobre madeira, século XVI.
(Coleção Viollet.)

377

nuamente das entranhas da terra, espalham-se todos os anos pela Europa,


aumentando-lhe a massa do numerário. As nações não ficam realmente mais
ricas, mas suas riquezas tornam-se mais volumosas; o preço dos gêneros e
de todas as coisas necessárias à vida aumenta sucessivamente, é preciso
dar mais ouro e prata para ter um pão, uma casa, uma roupa. Os salários,
sobretudo, não aumentam na mesma proporção [como sabemos, estão
efetivamente atrasados em relação aos preços]. Os homens sensíveis
observam pesarosos que, quando o pobre tem necessidade de ganhar mais
para viver, essa mesma necessidade faz por vezes baixar os salários, ou
pelo menos serve de pretexto para mantê-los por muito tempo no nível
antigo, que já não é proporcional ao de suas despesas, e é assim que as
minas de ouro fornecem armas ao egoísmo dos ricos para oprimir e subjugar
cada vez mais as classes Industriosas.-- 165 À parte a explicação
puramente quantitativista da alta dos pre;os, quem não reconheceria hoje,
com o autor, que a inflação, no sistema capitalis, a, está longe de
prejudicar a todos?
excepcionais, ?xcepcionais
Examinamos quase todos os jogos capitalistas, mais ou menos conscientes.
Mas, ara compreender suas superioridades, nada melhor do que alguns
números que fiam as taxas do lucro mercantil, para os compararmos com os
que podemos calcuLr em relação aos melhores negócios da agricultura, dos
transportes ou dá indúsia.
Chegar assim "ao cerne dos resultados econômicos'9166 seria a única
operação
- verdade. Onde o lucro atinge altas voltagens, aí e somente aí, está o
capitalismo, item como hoje. É certo que, no século XVIII, quase em toda
a
Europa, o grande cro comercial é muito superior ao grande lucro
industrial ou agrícola.
Infelizmente, os trabalhos não foram muito aprofundados neste setor. O
hisriador encontra-se aqui como um jornalista que penetrasse numa área
reservada. fivinha o que deve acontecer, mas raramente tem provas disso.
Não faltam nú-ros, mas são ou incompletos, ou fictícios, ou ambas as
coisas ao mesmo tempo. riam mais claros para um homem de negócios atual
do que para um simples hisiádor? Duvido.
Temos o levantamento anual, relativo a cinqüenta anos ró2-1815), dos
capitais envolvidos e dos lucros da firma Hope de Anisterdam, n a
indicação das somas entregues a seus diferentes sócios. Na aparência,
indiões tão preciosas quanto exatas, e lucros razoáveis, em geral ao
redor de 10%. Ls, observa o historiador dos Hope, M. G. Buist, é claro
que não foi a partir ses lucros, que aliás parecem ser quase
integralmente recapitalizados, que se consiiu a crescente fortuna da
família. com efeito, cada um dos sócios tinha suas isações e contas
privadas, que não conhecemos, sendo aí que apareceriam "the (profits 167.
É melhor examinar sempre duas vezes cada documento. Um negócio desses
contabilizável quando é fechado, levado de A a Z. Como aceitar, por
exemplo, wina como a Companhia francesa das índias apresenta suas contas,
dizendo, mais, que de 1725 a 1736 a diferença entre suas compras nas
índias e suas venna França resultou em média numa vantagem de 96, 12% a
seu favor 168? Nu, érie de transações que se ordenam como um foguete
multiestágio, a última não

em casa conta por todas as outras. Gostaríamos de conhecer os custos de


apresto, as despesas de viagem e de desarmamento, o montante das
mercadorias e do dinheiro vivo na partida, as operações e lucros
paralelos no Extremo-Oriente, etc. Só então poderíamos calcular, ou
tentar calcular.
Do mesmo modo, duvido que um dia se chegue a uma conclusão sobre as
contas dos mercadores genoveses, emprestadores de Filipe 11 e de seus
sucessores. Emprestam ao Rei Católico somas enormes (quase sempre
emprestadas a taxas módicas, e esta primeira fase permanece obscura);
ganham com os câmbios de praça a praça, em condições que muitas vezes nos
escapam; ganham com os juros de resguardo, como já explicamos (mas
quanto?); enfim, pagos geralmente com prata, a própria revenda em Gênova
das moedas ou lingotes vale-lhes habitualmente mais 10% de lucro169.
Quando os hombres de negocios genoveses discutem com os oficiais do
Rei Católico, dizem com razão que a taxa de juros dos contratos é módica;
os oficiais respondem que os verdadeiros lucros chegam a 30%, o que é
apenas meio exagero 170.
Outra regra: a taxa de lucro, por si só, não é tudo. É preciso
considerar, evidentemente, a quantidade de dinheiro envolvida. Se esta é
enorme, graças ao empréstimo (é o caso dos genoveses, é também o caso da
firma gigantesca dos Hope e, em geral, de todos os grandes emprestadores
aos Estados do século XVIII), o lucro, mesmo a uma taxa modesta, acaba
por representar somas consideráveis.
Compare-se esta situação à do usurário que empresta a curto prazo de que
fala
Turgot, ou ao usurário de aldeia; praticam taxas de juro às vezes
exorbitantes, mas adiantam dinheiro próprio e a pequenos tomadores;
amealharão um born pé de meia ou terras arrancadas ao camponês, mas serão
necessárias:várias gerações para que constituam uma fortuna comum.
Outra observação que tem importância: os lucros se enxertam em cadeias
mais ou menos longas. Um barco parte de Nantes, regressa: a despesa que
ele implica não é liquidada na partida (salvo exceções) em dinheiro vivo,
mas em notas promissórias de seis ou dezoito meses. Acontece portanto que
eu, mercador interessado na operação, só pago no regresso, no momento do
"desarmamento", e as promissórias que entreguei são crédito, geralmente
obtido de prestamistas holandeses ou de oficiais de finanças da praça ou
de outros fornecedores de capitais. Se as contas estão todas corretas, a
minha especulação situa-se entre a taxa de juro (dinheiro emprestado) e a
taxa do lucro realizado; joguei a descoberto, com vento. Naturalmente há
riscos, tal como nas especulações da
Bolsa. O Saint-Hilaire 17 1 regressa a Nantes, em 31 de dezembro de 1775.
Bertrand filho realizou um belo lucro (150.053 libras para 28O mil de
capital investido, isto é, 53%). Mas o retorno abre muitas vezes as
portas a adiamentos, as contas não são imediatamente apuradas, há
"filas"172. Tais esperas são um abacaxi da vida mercantil. Bertrand filho
terá seu capital pago logo, mas o lucro só lhe será entregue vinte anos
mais tarde, em 1795!
Este é, evidentemente, um caso extremo. Mas tudo se passa sempre como se
as quantias disponíveis, atraídas pelos investimentos, fizessem falta
para os acertos imediatos das contas em andamento. Pelo menos na França.
Por certo em outros lugares.
Enfim, não se cultiva o setor dos grandes lucros como um campo cuja
colheita seria colhida tranqüilamente, todos os anos. Porque a taxa de
lucro varia, não pára de variar. Excelentes negócios tornam-se medíocres;
há uma tendência bastante freqüente para a acumulação de lucros numa dada
linha, mas o grande capital con379

"gue quase sempre lançar-se então numa outra direção. E os lucros


florescem de
Dvo. O ramo dos tabacos da Companhia francesa das índias, entre a América
e
França, apoiado por privilégios, conhece taxas de lucro simplesmente
fabulosas, as em declínio: 500% em 1725 (antes da distribuição dos
dividendos aos acioniss); 300% em 1727-1728; 206% em 1728-1729173.
Segundo as contas do
LAssompm, um navio de Saint-Malo de regresso do Pacífico, os interessados
recebem "2.447 )ras como principal e um lucro de mil libras", isto é, um
lucro de 144, 7%. No ? Saint-Jean-Baptiste, o lucro é de 141 %, num outro
barco é de

148%174. Uma igem a Veracruz, no México, cujas contas São acertadas em


1713, rende ao mes) grupo de sócios 180%174. Às vésperas da Revolução
francesa, há decréscimo s lucros do comércio com as Ilhas e com os
Estados Unidos, estagnação do co, reio do Levante com uma taxa de lucro
médio de 10%; só o comércio do oceano lico e da China está em alta e é
para ele que, de preferencia, se volta o grande )ital mercantil, à margem
das companhias. Calculando a taxa de lucro do setor r mês de navegação, a
viagem de 2O meses (se for lenta) até a costa do Malabar olta inscreve-se
nos 2-L %; a da China, que antes conhecera melhores dias, nos %; a de
Coromandel, nos 3-1 %; o comércio interno na índia, nos 6 (isto é, a uma
viagem de 33 meses, 200%) 175. Um recorde. Em 1791, L'Mústre Suffren,
partiu de
Nantes para as ilhas de France e de Bourbon (despesas 160.206 libras, .-o

204.075), rende mais de 120%, ao passo que em 1787 um navio idêntico, com
rie parecido, Le Bailli de Suffren, parte igualmente de Nantes, mas para
as Anas (despesas 97.922, lucros 34.051), e rende apenas 28% 176. E assim
por dianom as conjunturas, mudam os elementos em jogo... Em toda a parte.
Por exemem Gdansk, a compra do centeio no interior da Polônia e a sua
revenda aos indeses, entre 1606

e 1650, daria o enorme lucro médio de 29, 7%, mas com flu:ões
desconcertantes:
máximo, 201, 5% em 1633; mínimo, menos 45, 4% em [177. As conclusões são
naturalmente difíceis.
Entretanto, é certo que o paraíso dos altos lucros só é acessível aos
capitalistas manipulam grandes somas de dinheiro - suas ou alheias. A
rotatividade dos ais - que é também a lei inabalável do capitalismo
mercantil desempenha )apel decisivo. Dinheiro, e mais dinheiro! É
necessário para atravessar as espeis contracorrentes hostis, os percalços
e os atrasos, que nunca faltam. Por exemos sete navios de Saint-Malo que,
em 1706, chegam ao Peru

178 fazem, para r, uma despesa enorme, 1.681.363 libras. A bordo foram
carregadas mercado[o valor de apenas 306.199 libras. Tais mercadorias são
o coração da empresa, vez que o navio nunca leva dinheiro vivo para o
Peru. 12

preciso que, vendidas 'ru, trazidas para a França sob nova forma, o seu
valor se multiplique pelo s por cinco para cobrir, mais ou menos, a
despesa. Se apesar disso o lucro, n, se elevasse a 145% (como é o caso de
um barco de que temos conhecimen1 mesma época e no mesmo trajeto), seria
necessário, mantendo-se todas as s condições, que o valor inicial da
mercadoria tivesse sido multiplicado por Não nos causará portanto
surpresa ouvir Thomas Mun, o diretor da Companglesa das índias
Orientais1explicar, em 1621, que o dinheiro enviado às ín179

- gressava à Inglaterra multiplicado por 5. Em suma, para participar


desse o das trocas é preciso ter na mão, de uma maneira ou de outra, a
quantidade heiro necessária à partida. Senão, é melhor não partir! Van
Lindschoten, viaolandês, em parte espião, chega a Goa em 1584. Dessa
cidade longínqua,

O senhor chega ao campo, de Pietro Longhi (1702-1785). Comparar esta


visita com a da pág. 257. Aqui, o senhor não encontra um rendeiro
próspero. É um desses patrícios de Veneza que reinvestiram
suafortunafeita no comércio em terras que administram pessoalmente, de
modo capitalista, e são assalariados quefazem uma vénia profunda quando
ele chega. (Foto André Héld, Ziolo.)
escreve: "Sinto-me muito inclinado a viajar até a China e o Japão, que
ficam à mesma distância daqui que Portugal, o que quer dizer que quem vai
para lá leva três anos no caminho. Se possuísse ao menos duzentos ou
trezentos ducados facilmente os converteria em 60O ou 700. Mas entrar num
negócio desses de mãos abanando parece-me uma loucura. É preciso começar
razoavelmente para ter lucro."180

Fica portanto a impressão (pois só podemos falar de impressões, dada a


insuficiência de uma documentação esparsa) de que sempre houve setores
especiais da vida econômica condicionados pelo alto lucro e que esses
setores variam.
Sempre que, sob o impacto da própria vida econômica, há uma dessas
modificações, um capital ágil vai ao seu encontro, instala-se, prospera.
Note-se que, regra geral, ele não os criou. Essa geografia diferencial do
lucro é uma chave para compreender as variações conjunturais do
capitalismo, que balança entre o
Levante, a América, a Insulíndia, a China, o tráfico negreiro, etc. - ou
entre o comércio, o banco, a

[ústria ou mesmo a terra. Às vezes um grupo capitalista (por exemplo,


Veneza século XVI) abandona uma POsiÇão comercial eminente para investir
numa instria (no caso a lã), mais ainda na terra e na pecuária; mas isso
porque suas liga-s com a vida mercantil deixaram de ser as do grande
lucro. Veneza é ainda exemLr no século XVIII, uma vez que tentará
reintegrar-se no comércio do Levante, e tornou a ser lucrativo. Mas se
não se empenhou muito nisso foi talvez porque erra e a pecuária ainda
eram para ela, temporariamente, negócios de ouro. Por [ta de 1755, um
curral, "num born ano", rende 40% por ano do seu capital iniJ, resultado
seguramente suscetível de "despertar o amor de qualquer capitalis,, da
inamorare ogni capitalista 181. Tais rendimentos não são, por certo, os
de Ias as terras - muito diferentes - da Venécia, mas, no conjunto, como
diz o ornale
Veneto de 1773, "o dinheiro empregado nessas atividades [agrícolas]
rensempre mais do que qualquer outro modo de investimento, inclusive o
risco irítimo' 182.
Vê-se bem que é difícil estabelecer uma classificação deveras válida
entre os ros industrial, agrícola e comercial. Grosso modo, a habitual
classificação de, scente - mercadoria, indústria, agricultura -
corresponde a uma realidade, mas m toda uma série de exceções, que
justificam as passagens de um setor para tro

183.
Insistamos nessa qualidade essencial para uma história de conjunto do
capitamo:
sua plasticidade a toda a prova, sua capacidade de transformação e de
adap, ão.
Se há, como penso que haja, uma certa unidade no capitalismo, desde a
Itádo século XIII até o Ocidente de hoje, é aí que temos de situá-la e
observá-la i primeira instância. Apenas com algumas atenuantes, não
poderíamos aplicar Ústória do capitalismo europeu, de fio a pavio, estas
palavras de um economista iiericano atual184 sobre o seu próprio país,
cuja "história do século passado pro, que a classe capitalista sempre
soube dirigir e controlar as mudanças a fim de eservar sua hegemonia"? Na
escala da economia global, é preciso evitar a imam simplista de um
capitalismo a que as etapas de crescimento tivessem feito pasr, de fase
em fase, da mercadoria para as atividades financeiras e para a indústria
correspondendo a fase adulta, a da indústria, ao único "verdadeiro"
capitaliso.
Na fase chamada mercantil, tal como na sua fase chamada industrial -
abarndo ambos os termos uma grande variedade de formas -, o capitalismo
teve, mo característica essencial, sua capacidade de passar quase
instantaneamente de na forma para outra, de um setor para outro, em caso
de crise grave ou de dimiiição acentuada das taxas de lucro.

VIEDADES E MPANHIAS
Sociedades e companhias interessam-nos menos por si próprias do que como
"indicadores", como oportunidade de ver, para além dos seus próprios
testemunhos, o conjunto da vida econômica e do jogo capitalista.
A despeito das suas semelhanças e das funções análogas, é preciso
distinguir sociedades e companhias: as sociedades - sociedades comerciais
- interessam o capitalismo em si, e suas formas, que diferem na sua
própria sucessão, assinalam a evolução capitalista; as companhias de
grande porte (como as Companhias das índias) se reportam ao capital e ao
Estado ao mesmo tempo, e este, quando cresce, impõe sua intervenção; cabe
aos capitalistas submeter-se, protestar e, finalmente, tirar o corpo
fora.
edades.- os primórdios ma evolução
Desde sempre, desde que o comércio começou ou recomeçou, alguns
comerciantes se associaram, trabalharam juntos. Poderiam agir de outro
modo? Roma teve sociedades comerciais cuja atividade se estendia, com
facilidade e lógica, a todo o Mediterrâneo. Aliás, os "comercialistas" do
século XVIII ainda se reportam aos precedentes, ao vocabulário, por vezes
ao próprio espírito do direito romano, e sem cometerem grandes desvios.
Para encontrar as primeiras formas dessas sociedades no Ocidente, temos
de remontar a muito longe, se não a Roma, pelo menos ao despertar da vida
mediterrânea, aos séculos IX e X. Amalfi, Veneza e outras cidades, ainda
minúsculas como estas, dão a partida. Reaparece a moeda. Restabelecem-se
os tráficos em direção a Bizâncio e às grandes cidades do Islã, o que
pressupõe o domínio dos transportes e as reservas financeiras necessárias
para longas operações, e portanto unidades mercantis reforçadas.
Uma das soluções precoces é a societas maris, a sociedade marítima
(também chamada societas vera, sociedade verdadeira, "o que leva a supor
que tal forma de sociedade tenha sido, na origem, a única
existente'9)185. É também chamada, com variantes, collegantia ou
commenda. Em princípio, trata-se de uma associação binária entre um
socius stans, um sócio que fica no local, e um socius tractator, que
embarca no navio que vai partir. Seria uma divisão precoce do capital e
do trabalho, como pensou Marc Bloch, depois de alguns outros, se o
tractator - o portador, traduziríamos o mascate - não participasse,
embora de maneira em geral modesta, do financiamento da operação. E são
possíveis combinações inesperadas. Mas deixemos esta discussão, retomada
mais adiante

186. A societas maris, habitualmente, é feita para uma única viagem;


funciona a curto prazo, não esquecendo, entretanto, que as viagens no
Mediterrâneo duravam então meses. Encontramos essa sociedade tanto no
Notularium do notário genovês
Giovanni Scriba (1155-1164) (mais de 40O menções) como nas atas de um
notário marselhês do século XIII, Amalfic (36O menções)187. Assim como
nas cidades marítimas da Hansa. Essa forma primitiva de sociedade se
manterá muito tempo por causa da sua simplicidade. Volta

mos a encontrá-la em Marselha e em Ragusa, no século XVI. E em Veneza,


naturalmente. E também em Outros lugares. Em Portugal, já tarde, em 1578,
um tractato distingue dois tipos de contratos de companhia (=
sociedades); o segundo - que imediatamente reconhecemos - é estabelecido
entre duas pessoas "quando hum põe o dinheiro e outro o trabalho" 188.
Veio como que um eco dessa espécie de reunião de trabalho e de capital na
complicada frase de um negociante de Reims (1655), que escreve em seu
diário: "'** é certo que não podeis fazer sociedade com gente que não
tenha fundos; porque eles compartilham os lucros; e todas as perdas caem
em cima de vós. No entanto bastantes são feitos assim, mas eu nunca os
aconselharia" 189.
Mas voltemos à societas maris. Na opinião de Federigo Melis, ela só se
explica pelas sucessivas partidas de navios. O navio parte; haverá de
regressar. É ele que cria a ocasião e a obrigação. A situação é diferente
para as cidades do interior. Aliás, é com certo atraso que participam dos
tráficos da Itália e do
Mediterrâneo. Para se inserirem na rede das trocas, tiveram de superar
dificuldades e tensões particulares.
A compagnia é o resultado dessas tensões. 12 uma sociedade familiar -
pai, filhos, irmãos e outros parentes - e, tal como o nome indica (cum,
com, epanis, pão), uma união cerrada onde tudo é partilhado, o pão e os
riscos cotidianos, o capital e o trabalho. Mais tarde, chamar-se-á a esta
sociedade "em nome coletivo", pois todos os seus membros são
solidariamente responsáveis, e em princípio ad infinitum, ou seja, não
apenas no limite da sua cota-parte, mas com todos os seus bens. Em breve
a compagnia admite sócios estrangeiros (que trazem capitais e trabalho) e
dinheiro de depositantes (que, se pensarmos nos colossos de Florença,
representa facilmente dez vezes o próprio capital - o corpo - da
companhia), e assim se compreende que tais empresas sejam instrumentos
capitalistas de um peso anormal. Os Bardi, instalados no Levante e na
Inglaterra, dominam durante certo tempo a Cristandade na sua rede. Essas
companhias fortes surpreendem também pela sua duração. Quando morre o
patrão, o maggiore, elas se reformam e prosseguem, quase sem alterações.
Os contratos conservados e que nós, historiadores, podemos ler são quase
todos contratos não de fundação, mas de recondução111. É por isso que
para falar abreviadamente dessas companhias dizemos: os Bardi, os
Peruzzi...
Finalmente, as grandes sociedades das cidades italianas do interior são
muito mais importantes, consideradas uma a uma, do que as das cidades
marítimas, onde as sociedades são numerosas mas pequenas e de curta
duração. Longe do mar, há concentrações necessárias. Federigo Melis
contrapoe, por exemplo, às 12 empresas individuais dos Spinola em Gênova,
s 2O sócios e os 4O dipendenti só da firma dos Cerchi, em Florena, por
volta do 1250191.
com efeito, essas grandes unidades foram ao mesmo tempo meio e
conseqüência da irrupção de Luca, de Pistóia, de Siena, e, fechando o
cortejo, de Florença, no concerto econômico de grandes relações mercantis
onde de início não se contaria com elas. A porta foi mais ou menos
forçada, e a excelência dessas cidades ficou vigorosamente marcada nos
"setores" ao seu alcance: o secundário, a indústria; o terciário os
serviços, o comércio, o banco. A compagnia não foi, em suma, uma
descobert fortuita das cidades no meio das terras, mas um meio de ação,
elaborado ao sabor das necessidades.
Nas linhas precedentes, não fiz mais do que retomar as idéias de André-E.
Sayous192 que partindo do exemplo de Siena, tratou apenas das cidades do
interior da Itália. èreio que a regra funcionou em outros lugares, no
tocante às socie

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Ducatea ptr Baliot vau s a. tot 14.
Stacken, go gmoter naer adveaante Selikiz ~k do Gaztens en **der
Manufaduten, tilas out gett ais voor de pr~tica - eu díto Schip fal met
Godt. w4:dtr tode vint dic~c, =ylen op deu a 6. a t:r. Mey 17 1 s. gott
ofte geeo - die dacr ia gelleven te Ladei;liitleu, boa addrejffgrtn aen
14'8"r Thomos R, of doia b~m.Sa~m Capiteyn tot OOSTENDE.
lei* ~a hM ~ h~
Folheto publicitário que anuncia a partida de Ostende para Cádiz da nau,
-extraOrdinariamente bem navegante-, Juffrouw Mary e indica a tarifa para
exPediçãO das cargas: --rendas, dois reais por um valor cem fiorins
tecido cru, dois ducados por fardo de doze a dezesseis peças- (A. N., G,
1704,

67). (Clichê dos Arquivos Nacionais.)

les mercantis implantadas fora da península, no interior das terras. Foi


o que nteceu no centro da Alemanha. Foi o caso da Grande Sociedade de
Ravensburg, uena, cidade da Suábia, na zona de relevo acidentado vizinha
do lago Constan)nde se cultivava e trabalhava o linho. A Magna Societas,
a Grosse
RavensburGesellschaft, reunião de três sociedades familiares 193, haveria
de durar um sé) e meio, de 138O a 1530. E, no entanto, ao que parece, foi
renovada de seis seis anos. No fim do século XV, graças aos seus 8O
sócios, seu capital elevava-se U mil florins - soma enorme, situada a
meio caminho do capital que, por volta rnesma época, reuniam os Welser
(66 mil) e os Fugger (213 Mil)194.
Seus pontos icipais, além de Ravensburg, eram Memmingen, Constança,
Nuremberg,
Lin, St. Gall; suas filiais situavam-se em Gênova, Milão, Berna, Genebra,
Lyon, ges (depois Antuérpia), Barcelona, Colônia, Viena, Paris. Seus
representantes ima multidão de sócios, comissionistas, funcionarios,
aprendizes de mercador reqüentavam as grandes feiras da Europa,
especialmente as de Frankfürt-amin, todos eles viajando por vezes a pé.
Os mercadores reunidos na sociedade atacadistas que se limitam à
mercadoria (tecidos de lã e linho, especiarias, aça), etc.), que quase
não negociam com dinheiro, praticamente não concedem crê>s, só têm loja
de varejo em Saragoça e Gênova - exceções raríssimas numa ta rede que
abrange tanto o comércio terrestre pelo vale do Ródano como o co-cio
marítimo a partir de Gênova, de Veneza ou de Barcelona. Os papéis da
solade, encontrados por acaso em 1909, permitiram a Aloys Schulte191
escrever livro essencial sobre os tráficos europeus na virada do século
XV para o XVI, , por detrás desses mercadores alemães e no amplo leque da
sua atividade, o surge é o conjunto da vida mercantil, quase a de toda a
Cristandade.
Firma-se como traço característico o fato de a Magna Societas não ter
seguido novações que se impuseram com os grandes descobrimentos, não se
ter instala-m
Lisboa ou em Sevilha. Deveremos imaginá-la enterrada num sistema antigo )
r isso incapaz de abrir caminho até o novo e vivo fluxo de negócios que
iria -car o início da modernidade? Ou terá sido impossível modificar uma
rede que Ia duraria sem alterações até 1530? Os velhos métodos tiveram
sua responsabide. O número de sócios diminuiu; os patrões, os Regierer,
compram terras e.-am-se dos negócios

196. Todavia, com a Magna Societas não desapareceu a comhia duradoura e


de grandes dimensões de tipo florentino. Irá manter-se até o do XVIII e
mesmo depois. Centrada na família, modelada por ela, preserva-lhe
itrimônio, alimenta o clã, assegura-lhe a continuidade. Uma sociedade
fami, com as sucessões, está sempre desfazendo-se e reconstruindo-se por
si só. Os mvisi, mercadores luquenses instalados em Lyon, mudam
regularmente de rasocial: de 1575 a 1577, a casa chama-se Herdeiros Louis
Buonvisi & Cia.; de

3 a 1584, Bencft, Bernardin Buonvisi & Cia.; de 1584 a 1587, Benoit,


BernarÉtienne, Antoine Buonvisi & Cia.; de 1588 a 1597, Bernardin,
Étienne,
Antoi3uonvisi & Cia; de 160O a 1607, Paul, Étienne, Antoine Buonvisi &
Cia... Asa
Companhia nunca é e é sempre a mesma197.
Tais sociedades, chamadas gerais por decreto francês de 1673, vão sendo
pouL
Pouco designadas pelo nome de sociedade livre ou então em nome coletivo.
sta-se no caráter familiar ou quase familiar que as caracteriza, mesmo
quando se trata de uma verdadeira família, e até data bem tardia. Eis o
texto de um [rato de sociedade realizado em Nantes (23 de abril de 1719)
[os contratantes

não são parentes]: "Não serão tomados bens da sociedade a não ser para
sustento e manutenção do lar de cada um, a fim de não alterar os fundos,
e não para outra coisa; e quando um tirar dinheiro avisará o outro, que
tirará o mesmo tanto, e isto para não manter contas a esse respeito..."
198 Essa "interpenetração entre o privado e o comercial é mais exagerada
ainda nas pequenas sociedades comerciais e inanufatureiras - 199es andita
Todas as sociedades em nome coletivo têm de enfrentar a difícil distinção
das responsabilidades - limitadas ou ilimitadas. Mais tarde, surge uma
solução - a da

comandita - que distingue a responsabilidade dos que gerem a empresa da


respon1 sabilidade daqueles que se contentam em trazer sua contribuição
financeira e enten, dem ser responsáveis apenas por esse aporte de
dinheiro, e nada mais,
Essa responsa.^ bilidade limitada se introduzirá mais depressa na França
do que na Inglaterra, onde, a sociedade em comandita terá por muito tempo
o direito de pedir aos socii novas ' entradas de dinheiro'. Para Federigo
MeliS201 foi em
Florença (mas não antes do início do século XVI, datando o primeiro
contrato conhecido de 8 de maio de 1532)
que o sistema da comandita se desenvolveu claramente (accomandita), o que
permitirá ao capital florentino, na tendência à sua grande expansão,
participar ainda de toda uma série de operações que se assemelham às
holdings atuais.
Graças aos registros das accomandite, podemos seguir-lhes a persistência,
o volume e a dispersão.
A comandita progridirá por toda a Europa, substituindo, embora
lentamente, a sociedade de base familiar. Na realidade, só prospera na
medida em que, ao resolver novas dificuldades, corresponde à crescente
diversidade dos negócios e à prática cada vez mais freqüente das
associações a longa distância. E também na medida em que pode abrir-se a
participantes desejosos de manter-se discretos. A comandita é a
possibilidade que tem um mercador irlandês de Nantes de se associar
(1732) a um mercador irlandês de Cork 202 e de "Contornar... as
prescrições da legislação francesa vigentes até a Revolução e que proíbem
o nãoreinícola de participar das empresas [nacionais] de navegação". É a
possibilidade que tem um mercador francês de associar-se a comandantes
dos postos portugueses na costa da África ou a

202

"funcionários" espanhóis da América, até mesmo a capitães de navios mais


ou menos inescrupulosos; de dispor de um sócio comanditado e mantido à
rédea curta em São Domingos, ou em Messina, ou em outro lugar. Nas
sociedades registradas em
Paris, parece que nem todos os participantes, apesar de domiciliados na
capi` tal, eram parisienses. Assim, em 12 de junho de 1720, constituiu-se
uma sociedade

que durará apenas um ano, "voltada para o banco, compra e venda de


mercado:1nas, entre Joseph Souisse, antigo juiz-cônsul em Bordeaux,
residente em Paris, à rua
Saint-Honoré, Jean e Pierre Nicolas, à rua do Bouloi, François Imbert, à
rua
Grande do Faubourg-Saint-Denis, e Jacques Ransson, negociante em
Bilbao"203. >
Esse Jacques Ransson, na ata de dissolução da sociedade, apresenta-se
como deputado da nação francesa e banqueiro em Bilbao.
Mas como distinguir, quando os nossos documentos, pouco loquazes, não o
dizem expressamente, a sociedade em comandita (ou, como também se diz,
uma Sociedade "condicionada" ou "de comodidade")204 de uma sociedade em
nome COletivo? Sempre que, diremos nós, houver restrição da
responsabilidade de um ou

xo sócio. O decreto francês de 1673 o diz expressamente: "Os sócios em


comani só serão obrigados à prestação da sua parte. 11205 Aqui temos uma
escritura (ou ipta) de sociedade realizada em Marselha, em 29 de março de
1786: a comandiia (trata-se de uma mulher) "não poderá ser responsável em
caso algum nem qualquer pretexto pelas dívidas e compromissos da referida
sociedade para além fundos que houver aplicado`06. Aqui, as coisas são
bem claras, mas nem semé o caso. Outros comanditários escolhem essa
associação por lhes permitir ficar sombra, mesmo que entrem com capitais
importantes e partilhem riscos. com ito, como o decreto de

1673 (que impõe a declaração das sociedades em comanperante o notário,


com assinatura dos interessados) fala apenas das "sociedaentre
comerciantes e negociantes", a interpretação aceita é de que qualquer soa
que não exerça profissão mercantil" está dispensada de figurar entre os
sós na escritura registrada na jurisdição consular207. Os nobres ficam
assim ao -igo da perda dos foros de nobreza; os oficiais do rei escondem
seus interesses ta ou naquela empresa. Isso decerto explica o sucesso da
comandita na
França, le o mercador é ainda mantido à margem da boa sociedade, mesmo
quando ocorre ervescência especulativa do século XVIII. Paris não é
Londres, nem
Amsterdam.
As sociedades em comandita são ao mesmo tempo, como se costuma dizer,
iedades de pessoas e sociedades de capitais. A sociedade por ações, a
última a gir, é uma sociedade apenas de capitais. O capital social
constitui uma única ssa, como que soldada à própria sociedade. Os sócios,
os parceiros, possuem -ções desse capital, partes ou ações. Os ingleses
chamam a estas sociedades Joint ck
Companies, tendo a palavra Stock o sentido de capital ou de fundos.
Para os historiadores do direito, só há verdadeiras sociedades por ações
quanessas ações são não só transferíveis mas também negocidveis no
mercado.
Desde ! não se observe com rigor esta última cláusula, pode-se dizer que
a
Europa teve ito cedo sociedades por ações, muito antes da constituição,
em 15531555, da scovy Companie, a primeira sociedade por ações inglesa
conhecida, provaveltite precedida de alguns anos por outras. Já antes do
século XV, os navios do diterrâneo são muitas vezes propriedades
divididas em ações - chamadas parem Veneza, luoghi em Gênova, caratti na
maior parte das cidades italianas, qui7 ou carats em Marselha. E essas
partes são vendidas. Do mesmo modo, em to1 Europa, algumas minas são
propriedades partilhadas: como, já no século XIII, a mina de prata perto
de Siena, desde muito cedo as salinas e marinhas de sal, estabelecimento
metalúrgico de Leoben, na Estíria, uma mina de cobre na Franda qual
Jacques Coeur tem partes. com o desenvolvimento do século XV, as ias da
Europa central vão para as mãos de mercadores e príncipes, suas
proprieles são divididas em partes, as Kuxen, e estas Kuxen,
transferíveis, são objeto especulaçõeS208. Assim também os moinhos são,
aqui e ali, soèiedades, em aai, em
Colônia, em Toulouse. Nesta última cidade209 já no século XIII, os Inhos
são divididos em partes, em "uchaux", que seus possuidores, os "pariers",
[em vender como qualquer outro bem imóvel. Aliás, a estrutura das
sociedades

1 1 1 ~wi~ I-Isp 1-1h dros planos. (Foto 'p~eira venda conhecida, em


1695, de um denier da Manufatura de Vi
Saint-Gobain.)
, de moinhos de Toulouse se manterá sem alterações desde o fim da Idade
Média até o século XIX, tornando-se muito naturalmente os "pariers", nas
vésperas da
Revolução francesa, nos próprios textos da sociedade, "Messieurs les
Actionnaim", os Senhores AcionistaS210.
O lugar tradicionalmente atribuído a Gênova nessa busca dos antecedentes,
por mais curioso que pareça, poderá parecer abusivo. A República de São
Jorge, por causa das suas necessidades e debilidades políticas, consentiu
que se constituíssem em seu seio uma espécie de sociedades, compere e
maone. As maone são associações, divididas em partes, e que se encarregam
de tarefas que, na realidade, competem ao Estado: agir contra Ceuta
(viria a ser, em 1234, a primeira das maones) ou, em 1346, colonizar
Quio: a operação é executada com êxito pelos Giustiniani e a ilha ficará
sob o seu controle até 1566, ano em que é conquistada pelos turcos. Os
compere são empréstimos ao Estado, divididos em loca ou luoghi,
avalizados Pelos rendimentos da Dominante. Em 1407, compete e maone são
reunidas na Casa di San Giorgio, na verdade um Estado dentro do
Estado, uma das chaves da secretíssima e paradoxal história da República.
Mas serão compere, maone, Casa, verdadeiras sociedades por ações? A
questão vem sendo discutida, tanto num sentido como no outro211.
Seja como for, à parte as grandes companhias comerciais com privilégios,
a sociedade por ações não se difundirá rapidamente. A França constitui um
born exemPlo dessa lentidão. A própria palavra ação se aclimata
tardiamente na França e, mesmo quando pode ser lida preto no branco, não
se trata forçosamente de ações facilmente transferíveis. Muitas vezes
aparece a palavra, mas não ainda a coisa.

]o (com o nome de "companhias") as sociedades à florentina e aberto para


raças a essa arma, os circuitos do Mediterrâneo e da Europa, assim também
rovíncias
Unidas e a Inglaterra se serviram das suas companhias para conquis)
mundo.
Tal afirmação, que não deixa de ser exata, situa mal o espantoso fenômeno
erspectiva da história. Os monopólios das grandes companhias têm, com
efei~ ma dupla ou tripla característica: implicam um jogo capitalista
nervosíssimo;
mpensáveis sem o privilégio concedido pelo Estado; confiscam zonas
inteiras )mércio de longa distância. Uma das "Companhias" que precede a
Oost Ine
Compagnie recebe a característica designação de Compagnie Van Verre,
comia do distante. Ora, nem o comércio de longa distância, nem a
concessão de [égios estatais, nem as façanhas do capital datam do
princípio do século XVII. -nário do Fernhandel, capitalismo e Estado
relacionam-se muito antes da consão da
Moscovy Companie inglesa, em 1553-1555. Assim, o grande comércio neza, já
no início do século XIV, abrange todo o Mediterrâneo e toda a
Euroessível, incluindo o Norte: em 1314, as galeras de Veneza chegavam a
Bruges. ;culo XIV, diante da regressão econômica que se generaliza, a
Signoria orga; sistema das galere da mercato. Seu arsenal constrói os
grandes navios e armaicarrega-se do apresto), aluga-os e favorece os
tráficos dos seus mercadores Ios. Trata-se de um poderoso dumping, que
não escapou à observação atenta no Luzzato. As galere da mercato
desempenham seu papel até as primeiras as do século XV1; são uma arma
para Veneza, na sua luta hegemônica. 'riam-se sistemas análogos para um
espaço ainda maior, depois da descoberAmérica e do périplo de Vasco da
Gama. O capitalismo europeu, embora tre nisso novas e prodigiosas
vantagens, não realiza conquistas sensacionais. o Estadwespanhol impõe o
Consejo de Indias, a Casa de la Contrataci6n, rera de Indias. Como
ultrapassar tais coerções e vigilância acumuladas? Em i, há o Rei
mercador e, na feliz expressão de Nunes DiaS225 "o capitalismo.-quico" da
Casa da índia, com frotas, feitores, monopólio de Estado.
Os hode negócios terão de se acomodar.
esses sistemas perduram: o português até 1615-1620, o espanhol até 1784.
se os países ibéricos são por muito tempo recalcitrantes quanto a
implantagrandes companhias comerciais, é porque o Estado, a partir de
Lisboa, de i, depois de
Cádiz, deu aos mercadores facilidades para agir. A máquina funUma vez
lançada, quem a deterá? É freqüente dizer que a Espanha, com, rrera de
Indias, imita
Veneza, e é verdade. E que Lisboa imita Gênova, mas mparação não é tão
exata226.
Em Veneza, tudo é para o Estado; em Gêno[o para o capital. Ora, em
Lisboa, onde precisamente existe um Estado mopassa-se tudo menos o
laisser-aller de Gênova.
tado e capital são duas forças mais ou menos gêmeas. Como funciona o
acor-e elas nas Províncias Unidas e na Inglaterra? É essa a questão
essencial da

1 das grandes companhias.


monopólio de uma companhia depende da confluência de três realidades: o o
Estado, mais ou menos eficaz, nunca ausente; o mundo mercantil, isto

,,, Fjtaleiro naval e entreposto da Oost Indische Compagnie em Amsterdam.


Estampa de Mulder, c. 1700. (Clichê Fundação Atlas van Sto1k.)

4, os capitais, o banco, o crédito, os clientes - um mundo hostil ou


cúmplice, ou às duas coisas ao mesmo tempo; e por fim uma zona de
comércio para ser explorada de longe, a qual, por si só, determina muitas
coisas.
O Estado nunca está ausente, é ele que distribui e garante os privilégios
no mercado nacional, base essencial. Mas não são dádivas gratuitas. Toda
companhia corresponde a uma operação fiscal, ligada às dificuldades
financeiras que são o eterno quinhão dos Estados modernos. As companhias
pagam e repagam incessantemente seus monopólios, todas as vezes renovados
após longas discussões. Mesmo o Estado aparentemente pouco coerente das
Províncias Unidas resolve taxar a prolífica Oost Indische, a obriga a
adiantar dinheiro, a pagar tributos, a deixar que o imposto sobre os
capitais atinja os acionistas e, pormenor agravante, tendo em conta o
valor real das ações conforme as cotações da Bolsa. Como diz o advogado
Pieter Van Dam, o homem que melhor conhecia a Oost
Indische Compagnie (e a reflexão Pode estender-se às companhias rivais):
"O
Estado deve regozijar-se com a existência de uma associação que todos os
anos lhe entrega somas tão vultosas que o país retira do comércio e da
navegação das índias três vezes mais lucro do que os acionistas. 227

wismo em casa
Inútil insistir nesse capítulo banal. Todavia, graças à sua própria ação,
o
Estalo confere às suas companhias um andamento especial. São mais livres
na
Inglatera, depois da Revolução de 1688, do que na Holanda, onde o peso de
um êxito anti;o se faz sentir. Na França, limitando-nos à Compagnie des
Indes, o governo moiárquico a faz e refaz a seu bel-prazer, a mantém sob
tutela, como que subtraída vida do país, suspensa no ar, incessantemente
administrada por homens pouco cometentes ou incompetentes. Qual o francês
que não nota essas diferenças?
De LonIres, em julho de 1713, um correspondente anuncia a constituição de
uma compahia do Asiento (virá a ser a Compagnie de Ia Mer du Sud, dotada
desde o início o privilégio, obtido há pouco pelos franceses, de
abastecer a América espanhola e escravos negros). Diz a nossa carta: "É a
uma companhia de particulares que stá entregue esse fornecimento; e aqui
as ordens da Corte em nada influenciam os, iteresses dos
particulares...,, 228 É, evidentemente, ir longe demais. Mas, nos
neócios, mesmo em 1713, já há uma grande diferença entre os dois lados da
Mancha.
Em suma, cumpriria poder marcar em que altura e de que modo se desenroim
as relações entre Estado e companhias. Estas só se desenvolvem se aquele
não itervém à francesa. Quando, pelo contrário, a regra é uma certa
liberdade econôiica, o capitalismo entra na praça, adapta-se a todas as
dificuldades e esquisitices dministrativas. Reconheçamos que a Oost
Indische Compagnie - alguns meses iais nova do que a East India Company
inglesa, mas o primeiro êxito espetacular fascinante entre as grandes
companhias -, reconheçamos que ela tem uma arqui-tura complicada e
estranha. com efeito, divide-se em seis câmaras independentes Ãolanda,
Zelândia, DeM, Rotterdam, Hoorn, Enkhuizen) acima das quais fica direção
comum dos XVII Senhores (Heeren Zeventien), dos quais 8

pertencem Câmara da Holanda. Por intermédio das câmaras, a burguesia dos


governantes as cidades tinha acesso à imensa e lucrativa empresa. Os
diretores das câmaras wais (os Gewindhebbers, que escolhiam os Heeren
XVII) tinham por sua vez aces) à direção geral da Companhia. Sublinhe-se,
de passagem, nessa fragmentação iracterística, o afloramento de economias
urbanas sob as águas aparentemente ilmas da economia geral das Províncias
holandesas. O que em nada impede a doáriação de Amsterdam e a presença
permanente, no labirinto da Oost
Indische 'ompagnie, de dinastias familiares. Nas listas dos Heeren XVII e
dos
Heeren XIX liretores da Companhia das índias Ocidentais criada em 1621),
perpetuam-se alimas famílias poderosas, como os Bickers de Amsterdam ou
os
Lampsins da Ze, ndia. Nao era o Estado que os impunha, mas o dinheiro, a
sociedade. Poderiaos fazer as mesmas observações a respeito da East India
Company inglesa, ou i South Sea Company, ou ainda do Banco da Inglaterra,
ou, para dar um exemo mais restrito porém sem nenhuma ambigüidade, da
Companhia
Inglesa da Baía ) Hudson. Todas essas grandes empresas vão dar em
pequenos grupos dominans, tenazes, agarrados a seus privilégios, nem um
pouco interessados em mudanis ou inovações, conservadores ao extremo.
Abonadíssimos, não podem ter o gosto, lo risco. Avancemos até a idéia
ousada de que não representam a verdadeira inligência mercantil. É muito
freqüente dizer que a
Oost Indische Compagnie apo-eceu pela raiz: ela apodreceu também pela
copa. Na verdade, o que a preservou nto tempo foi o fato de estar ligada
às mais lucrativas trocas do seu tempo.
O destino das companhias, com efeito, é determinado em função do espaço
~rcial do seu monopólio. Primeiro, a geografia! Ora, na prática, o
comércio L Ásia se revelará a base mais sólida para essas vastas
experiências. Nem o Atlân

1- - tráfico da África e comércio das Américas - nem os mares da


Europa, .o jWtico, o mar Branco e o imenso Mediterrâneo, oferecerão
campos operacionais proveitosos por tanto tempo. Veja-se, no âmbito da
história inglesa, o destino da .. ifiAfoscovy Company, da Levant Company,
da African Company, ou, mais sign vo no âmbito da história holandesa, o
fracasso final da Companhia das Indias ,.0cidentais. Houve, para as
grandes companhias comerciais, de modo algum for., tuita, uma geografia
do sucesso. Seria por o comércio da Ásia ser condicionado "clusivamente
pelo luxo? A pimenta-do-reino, as especiarias finas, a seda, os al-
Sodãozinhos, o ouro chinês, a prata japonesa e logo depois o chá, o café,
a laca, k porcelana? A Europa, às voltas com um crescimento certo, vê
aumentar seu ape5- tite de luxo. E a derrocada do Império do Grão-Mogol,
no princípio do século
XVIII,

`entrega a índia à cobiça dos mercadores do Ocidente. Mas também a


distância,

95 dificuldades do comércio da Ásia, seu caráter sofisticado fazem dela


um mercado privativo do grande capital, o único capaz de pôr em
circulação enormes somas

1 de dinheiro vivo. Essa enormidade no início afasta a concorrência ou


pelo menos -a torna difícil; coloca a barreira a determinada altura.
Escreve um inglês em 1645: Tfivate men cannot extend to making such long,
adventurous and costly voyaVS.11229 Reflexão na verdade interesseira,
defesa das companhias mil vezes repeti' da, na Inglaterra e fora da
Inglaterra, e que não é inteiramente justa:
muitos priva, 1

te men poderiam ter reunido os capitais necessários, como depois se verá.


último presente da Ásia: alimenta localmente o europeu que lá presta
serviço. O comércio interno da índia, excepcionalmente lucrativo,
alimentou o Império português um século a fio, irá alimentar o Império
holandês por dois séculos seguidos, até a Inglaterra engolir a India.
Mas tê-la-á engolido? Os tráficos locais, que estão na base do sucesso
europeu construído sobre a regularidade deles, são a prova da robustez de
uma economia implantada, destinada a durar. A Europa, nesses séculos de
exploração, tem a vantagem de encontrar pela frente civilizações densas,
evoluídas, produções agrícolas e artesanais já organizadas para a
exportação e, por toda a parte, cadeias comerciais e intermediários
eficazes. Em Java, por exemplo, os holandeses confiaram aos chineses a
coleta na produção e a concentração dos gêneros alimentícios. Em vez de
criar, como na América, a Europa explora e capta no Extremo-Oriente o que
está solidamente construído. Sua prata lhe permite, por si só, forçar as
portas da casa. Somente no final é que a conquista militar e política,
que dará o domínio à Inglaterra, perturbará profundamente os antigos
equilíbrios.
>Mpanhias wS
A fortuna inglesa não se formou muito cedo. Por volta de 1500, a
Inglaterra é um
País "atrasado", sem marinha poderosa, com uma população sobretudo rural
e apenas duas riquezas: uma enorme produção lanígera e uma forte
indústria têxtil (desenvolvendo-se esta a ponto de pouco a pouco absorver
aquela). Essa indústria largamente rural produz no Sudoeste e no Leste da
Inglaterra o sólido broad clOth e, no West Riding, os kersies, tecidos
macios e felpudos. Esta Inglaterra, com os 75 mil habitantes de sua
capital, que em breve se tornará, mas não é ainda, um

monstro, com uma monarquia forte no desfecho da guerra das Duas Rosas,
com suas corporações sólidas, suas ativas feiras, continua a ser um país
de economia tradicional. Mas a vida mercantil começa a apartar-se da vida
artesanal; a separação é, em linhas gerais, análoga à que se verifica nas
cidades italianas do préRenascimento.
É, obviamente, no âmbito das trocas exteriores que se constituem as
primeiras grandes sociedades inglesas. As duas maiores que podemos
observar - os mercadores exportadores de lã, os Merchants of the Staple,
sendo o entreposto em questão o de Calais, e os Merchant Adventurers,
negociantes de tecidos - têm ainda uma organização arcaica. Os Staplers
representam a lã inglesa, mas esta deixará de ser exportada. Deixemo-la,
portanto, na sombra. Os Merchant
AdventUrerS23O , que mobilizam em proveito próprio a imprecisa palavra
adventurers (que de fato designa todos os mercadores empresários que
participam do comércio externo), são exportadores de tecido cru para os
Países Baixos, com os quais é firmada uma série de acordos (em 1493-1494,
em 1505). Pouco a pouco, os mercers e os grocers de Londres ganham o
primeiro lugar entre todos os adventurers e esforçam-se por afastar os
homens da província que constituem o grupo rival dos mercadores ao norte
do Tweene. A partir de 1475, esses mercadores londrinos passam a agir
todos concertadamente, fretam os mesmos barcos para suas remessas,
organizam-se para o pagamento das alfândegas e para a obtenção de
privilégios, sob a ditadura em breve ostensiva dos mercers. Em 1497, a
realeza intervém para obrigar a companhia, centralizada em Londres, a
aceitar os mercadores de fora da capital. Mas estes só são aceitos numa
posição inferior.
A primeira característica que impressiona na organização dos Merchant
Adventurers é o fato de o seu verdadeiro centro se situar fora da
Inglaterra, por muito tempo em Antuérpia e em Berg-op-Zooni, cujas feiras
disputam entre si a clientela. Estar nos Países Baixos possibilita à
companhia jogar entre as duas cidades e preservar melhor seus
privilégios. Acima de tudo, é nesses mercados do continente que se fazem
as transações essenciais - venda de têxteis, compra de especiarias e
retornos em dinheiro. É aí que é possível se agarrar à mais ativa
economia mundial. Em Londres reinam os mercadores mais idosos, a quem
assustam a viagem e os mercados movimentados. Os jovens estão em
Antuérpia. Em 1542, os que residem em Londres queixam-se ao Privy Council
de que "os jovens de Antuérpia"
não fazem o menor caso da opinião dos seus "amos e senhores" de
LondreS231.
Mas o que nos interessa aqui é que a Merchant Adventurers Company
continua a ser uma "corporação". A disciplina que pesa sobre os
mercadores é análoga à que os corpos de ofícios exercem sobre seus
participantes no espaço restrito de uma cidade. Os seus regulamentos,
concedidos pelo Estado - como a codificação régia de 1608 232 -, definem-
no de forma saborosa. Os membros da companhia são "irmãos" entre si, e
suas mulheres, "irmãs". Os irmãos devem ir todos juntos aos ofícios
religiosos, aos enterros. Estão proibidos de se portar mal, de pronunciar
palavras grosseiras, de se embriagar, de tornar-se espetáculo para os
outros - indo, por exemplo, buscar apressadamente o correio em vez de
esperar na loja, ou carregando em pessoa as mercadorias, de costas
vergadas pelos pesados fardos; estão também proibidas as discussões, os
insultos, os duelos. A companhia é uma entidade moral, uma personalidade
jurídica. Tem o seu governo (governador, deputados, juizes, secretários).
Dispõe de um monopólio comercial e do privilégio da

Sala do tribunal na sede dos Merchants Adventurers, em York. (Foto


Country
Life.)
sucessão perpétua (o direito de suceder a si própria). Todas estas
características são designadas (decerto a partir do vocabulário tardio de
Josias
Child) pelo nome regulated company, companhia com regulamentos, isto é,
mutatis mutandis, algo de semelhante às guildas e às hansas que existiram
nos países do mar do Norte.
Não se trata, portanto, de uma novidade, de uma criação original. Os
MerChant
Adventurers, cujas origens remontam, sem dúvida alguma, a uma época
anterior ao século XV, não esperaram a boa vontade da realeza da
Inglaterra para se formarem. O aparecimento da companhia, como supõe
Michael Postan 233 é por certo conseqüência da queda das vendas de
têxteis, daí a necessidade de cerrar fileiras para reagir. Mas não se
trata de uma sociedade por ações. Seus membros (que Pagam tributos quando
entram, a menos que recebam o lugar por herança ou no termo de
aprendizagem com um membro da companhia) negociam cada qual por sua conta
e risco. É, em suma, uma velha formação que se introduziu numa função
preparada pela evolução da economia inglesa - a passagem da lã bruta para
a lã trabalhada - e nela desempenha admiravelmente seu papel, soma eficaz
de atividades individuais combinadas entre si, mas não confundidas. Ter-
lhe-ia sido fácil Passar para uma grande companhia unificada com capital
comum, uma Joint
Stock Company. Ora, a Merchant Adventurers, em decadência, é certo,
conserva a antiga organização até 1809, data em que, com a tomada de
Hamburgo por Napo

(onde a companhia estava firmemente instalada desde lóll234) seu destino,


a ao fim.
Estes pormenores sobre Os Merchant Adventurers bastam para o leitor ter
uma

3, em do que pode ser uma regulated company. Na realidade, as primeiras


compas por ações que proliferam na Inglaterra com a brusca arrancada do
fim do sécuNI e do princípio do Século XV11235 não se tornam
imediatamente a maioria, ;e disso.
Insinuam-se no meio de sociedades de outro tipo que prestam os
messerviços; por vezes, parecem mesmo ser-lhes superiores, uma vez que
algumas panhias por ações, como a da Moscóvia, fundada em 1555, ou a do
Levante, )elecida em 1581, foram depois transformadas em companhias
regulamentadas, imeira em 1622, depois em

1669, a segunda em 1605, e a Companhia da África

750. Mesmo a Companhia inglesa das índias Orientais, fundada em 1599,


priviida em 1600, passou por uma crise, no mínimo curiosa, de 1698 a
1708, período nte o qual voltou a ser parcialmente uma companhia
regulamentada.
Aliás, durante o seu primeiro século de existência, não se pode dizer que
a
Comiia inglesa das índias Orientais, constituída com um capital muito
inferior ao

, ompanhia holandesa, tenha sido uma verdadeira companhia por ações. O


seu tal era formado apenas para uma viagem, recuperando os mercadores, no
re;o, seus investimentos e seus lucros. Durante muito tempo, cada
acionista teve.-eito de retirar sua participação. Pouco a pouco as coisas
se modificaram. A Ir de 1612, começaram a fazer as contas não só para a
viagem seguinte, mas uma série de viagens projetadas. Por fim, a partir
de 1658, o capital social im-se intangível. E por volta de 1688 as ações
eram negociadas na Bolsa de Lon, tal como as da Companhia holandesa na
Bolsa de Amsterdam. Foi portanto :o a pouco que se alcançou o modelo
holandês das sociedades por ações. Foi ssário quase um século.
O sucesso global das Companhias do Noroeste europeu é também uma ques[e
conjuntura e de cronologia. Os primórdios da fortuna de Amsterdam situam,
s imediações dos anos 1580-1585. Em 1585, a retomada de Antuérpia por
Alere
Farnese marca o destino da cidade do Escaut. Sua destruição comercial,
rio incompleta, assegura o triunfo da cidade rival. Ora, em 1585, estamos
quavinte anos de distância da formação (em 1602) da Oost Indische. Esta
é, por>, posterior à fortuna de Amsterdam. Pelo menos não a criou, sendo
até em ! criada por ela. No entanto, seu êxito foi quase imediato, tal
como o da Comia inglesa, fundada um pouco mais cedo.
O fracasso dos franceses em seus esforços para constituir companhias
comersituase entre 1664 e 1682: a Companhia das índias Orientais fundada
em 1664 o depara com dificuldades financeiras" e o privilégio é-lhe
retirado em 1682; ada em

1670, uma Companhia do Levante entra em declínio já em 1672- crian


1669236, a
Companhia do Norte foi "um fiasco"; a Companhia das indias entais,
formada em

1664 236 seria suprimida em 1674. Uma série de fracassos, into, mal
compensados pelo relativo sucesso da Companhia oriental das ínEm face
desses fracassos, o êxito inglês e holandês. Tal contraste requer
expli's. Importaria inscrever como entrave das empresas francesas a
desconfiança

dos mercadores contra o governo monárquico, a relativa debilidade dos


seus meios m capitalismo francês. Mas também, por cere a imaturidade do
que poderia ser u
1to, a dificuldade de se introduzir nas redes já organizadas: os bons
lugares estão tomados e a luta por eles é renhida. Escreveu Jean.
Meuvret"': "Além do mais, [... ] as Companhias estrangeiras, fundadas na
primeira metade do século, tinham tido lucros espetaculares que, em
conseqüência das mudanças da conjuntura, não voltariam a verificar-se."
Os franceses escolheram mal o momento. Colbert chega tarde demais. Tanto
mais que meio século de desenvolvimento sem precedentes dera ao Norteg
sobretudo aos Países Baixos, um avanço que os tornava capazes de resistir
a eventuais competições e mesmo ao empecilho das conjunturas
desfavoráveis.

1 com efeito, uma mesma conjuntura acarreta conseqüências diferentes


conforme os lugares. Por exemplo, a virada do século (1680-1720) foi dif
cil em toda a
Europa, mas foi marcada na Inglaterra por reviravoltas e crises que dão
uma impressão de progresso geral. Será por haver, em períodos de refluxo
ou de estagnação, economias protegidas ou menos atingidas do que outras?
Seja como for, depois da Revolução de 1688, tudo se ativa na Inglaterra:
instaura-se um poderoso cr"to público "à holandesa"; a fundação do Banco
da Inglaterra, conseguida graças a um rasgo de audácia em 1694,
estabiliza o mercado dos fundos do Estado o dá um impulso suplementar aos
negócios. Estes vão o melhor possível:
a letra de câmbio, o cheque conquistam um espaço crescente no mercado
interno238. O comércio exterior cresce e diversifica-se: para Gregory
King e para Davenant, é o

239

1, setor que se desenvolve com mais rapidez. O entusiasmo se revela pelos


investi1,
N mentos nas joint stock companies: estas eram em número de 24 (incluindo
a
Escócia) em 1688; de 1692 a 1695, fundam-se 15O sociedades por ações,
que, aliás, não sobreviverão todasm. A refundição de moedas, durante a
crise de 1696, é uma advertência terrível e não afeta apenas os negócios
duvidosos. Mesmo assim, houve milhares de subscritores atingidos. Daí o A
ct de 1697, que reduziu a 10O o número de corretores de ações, os stock
jobbers, e pôs fim às facilidades dos intermediários241. Ainda assim o
boom dos investimentos continuou até 1720, ano do escândalo do Sea
Bubble. Portanto, -um período inteiro agitado, fecundo apesar das grandes
retiradas de dinheiro do governo de
Guilherme In e da rainha Ana.
Nesse clima, as companhias tiveram dificuldade em conservar seus
privilégios, diante da iniciativa privada. São suprimidos os monopólios
das companhias da
Rússia e do Levante. Irá a East India Company naufragar também, no
momento em que seu capital aumentou consideravelmente? com ás novas
liberdades, instalouse uma segunda companhia, e a luta entre a antiga e a
nova, na Bolsa, teve os seus rasgos de suspense, até 1708.
Sem querer denegrir o capitalismo agressivo que se instaura durante esses
anos, citemos um incidente curioso. Em agosto de 1698, os mercadores da
velha companhia tencionaram ceder alguns dos seus estabelecimentos na
índia, quer aos mercadores da nova companhia, quer, imagine-se, à
Companhia francesa das índias
Orientais! Escrevia Pontchartin a Tallard, em 6 de agosto de 1698 242:
"Os
Diretores da Companhia das Indias da Françaforam notificados de que os da
antiga companhia da Inglaterra queriam vender seus estabelecimentos de
Masulipatam, na costa de COrOmandel, e de quepoderiam tratar o assunto
com eles. É desejo de Sua
Majestade que trateis de saber discretamente se tal notícia é verdadeira
e, nesse caso, se eles terão o poder de entregá-los e que pretendem com
isso. " As palavras em itá

da de um East Indiaman, por volta de 1620. Pintura de A dam Willaerts.


(National
Mae Museum Greenwich, Londres.)
, stavam cifradas no texto. Tallard, ainda em Utrecht, responde ao
ministro,

1 de agoSto242: "É verdade que os Diretores da antiga feitoria das


Indias, tais da Inglaterra querem vender os estabelecimentos que ld têm e
que os da companhia, para obtê-los mais baratos, lhes dizem que não os
querem e popassar sem eles, mas duvido que os primeiros, que são ricos
mercadores de Ires e têm muito a perder, ousem negociar com
estrangeiros." Dez anos mais, tudo se restabelecia com a fusão das duas
companhias inglesas em uma só. rudo isso deve ser comparado com a atitude
dos holandeses que, irritados com )nopólios persistentes que lhes vedam o
comércio, em seu país, com o Extremoite, suscitaram ou tentaram suscitar
o nascimento de Companhias das índias ança, na
Dinamarca, na Suécia, na Toscana, fornecendo-lhes capitais. E isso :a
também o clima reinante no final do século XVIII e no início do século
XIX dia inglesa, onde a pressão dos mercadores ingleses contra os
privilégios da rndia (que só serão abolidos em 1865) se apóia na
cumplicidade não só dos

r agentes locais da companhia, mas num enxame de negociantes europeus de


todas as nacionalidades, que participam ativamente de um comércio de
contrabando, direcionado sobretudo à China e à Insulíndia, e do tráfico
lucrativo das remessas de dinheiro clandestino na Europa.
"hias e liberdade X*1

Peter Laslett243 quis fazer-nos crer que a Companhia inglesa das índias
Orientais e o Banco da Inglaterra, que "já constituíam o modelo das
instituições que finalmente iriam dar forma aos 'negócios' tais como os
concebemos'% não tiveram "antes do início do século XVIII mais do que uma
influência ínfima sobre o conjunto da atividade comercial e industrial"
da Inglaterra. Charles Boxer é ainda mais taxativo, sem apresentar
nenhuma precisão que o apóie244. Para ele, o essencial não _são as
grandes companhias comerciais. W. R. Scott é mais preciso:
estima, em 1703 (após uma subida evidente), a massa dos capitais reunidos
pelas sociedades por ações era 8 milhões de libras esterlinas, ao passo
que, já em

1688, segundo King, a renda nacional atingia 45 milhões e o patrimônio


nacional mais de 600245.
Mas nós conhecemos a música e a letra: sempre que se compara o volume de
uma atividade de ponta com o volume considerável do conjunto da economia,
o todo repõe a exceção na ordem a ponto de a anular. Não estou
convencido. Os fatos importantes são os que têm conseqüências, e quando
tais conseqüências são a modernidade da economia, o "modelo" dos
"negócios" futuros, a formação acelerada do capital e o despertar da
colonização, é preciso pensar duas vezes. Aliás, a tempestade de
protestos contra os monopólios das companhias não mostra que a parada
valia a pena?
Já antes de 1700, o mundo dos mercadores não parava de protestar contra
os monopólios. Já se haviam manifestado queixas, cóleras, esperanças,
compromissos.
Mas, se não forçamos excessivamente os testemunhos, parece que o
monopólio desta ou daquela companhia, suportado sem grandes clamores ao
longo do século XVII, é tido como insuportável e escandaloso no século
seguinte. Descazeaux, deputado do comércio por Nantes, o diz sem rodeios
num dos seus relatórios (1701)2": --Os privilégios das companhias
privativas [leia-se exclusivas] são prejudiciais ao comércio", pois há
hoje "tanta capacidade e emulação nos súditos como havia indolência e
incapacidade por ocasião do estabelecimento dessas companhias".
Agora, os mercadores podem ir pessoalmente às índias orientais, à China,
à Guiné para o tráfico negreiro, ao Senegal para o ouro em pó, os couros,
o marfim, a goma. Também para Nicolas Mesnager, deputado pela praça de
Rouen (3 de junho de

1704)247: "... é princípio incontestável em matéria de comércio que todas


as comPanhias exclusivas são muito mais apropriadas para contraí-lo do
que para ampliálo e que é muito mais vantajoso para o Estado que seu
comércio esteja nas mãos de todos os súditos do que ser restrito a um
pequeno número de pessoas. "
Segundo um relatório oficial de 1699248, mesmo os partidários das
companhias pensavam que, mesmo assim, não se deveria "tirar dos
particulares essa liberdade de comérCio e que num Estado não deve haver
privilégios exclusivos". Na
Inglaterra, "os entrelopos linterlopers] ou aventureiros praticam o
comércio nos mesmos lugares

Dnde podem fazê-lo as companhias inglesas"24. com efeito, em 1661, a


Comparihia abandonara aos particulares o tráfico interno da índia. E após
a Revolução Je

1688, que foi a dos mercadores, a opinião pública está tão exaltada que o
priviégio da East India é suspenso e proclamada a liberdade do comércio
com as ínlias. Mas tudo volta a entrar na ordem em 1698, ou melhor, em
1708, voltando - exclusivo" a ser a norma.
A França passou por idênticas flutuações. Em 1681 (2O de dezembro) e em
1682

2O de janeiro), Colbert manda proclamar a liberdade do comércio com as


índias,
Icando para a Companhia apenas o transporte e os entrepostos de
mercadorias249.
Uiás, em 1712, a Companhia abandonava voluntariamente, por dinheiro, seu
priÍlégio a uma empresa de Saint-Mal0250. Existiria ainda Companhia das
índias de>ois disso? "A nossa companhia das índias orientais francesas
[sic] cujo descalawo envergonha o pavilhão Rei e a nação", escreve
Anisson de Londres, em

2O de riaio de 1713251. Mas as instituições moribundas custam a morrer. A


Companhia ealmente atravessa os anos agitados do Sistema de Law, é
reconstituída em
722-1723, com um fundo de bens tangíveis, mas sem dotação suficiente de
dinheio líquido. As lutas e os lucros perduram até as imediações dos anos
1760. Em 1769, ma formidável campanha orquestrada pelos economistas põe
fim ao monopólio abre os caminhos das índias e da China ao comércio
francês, que lucra com ;so 252. Em

1785, Calonne, ou melhor, o grupo que gravita a seu redor, tira a


Comanhia das índias das dificuldades financeiras, na realidade colocada à
sombra da ompanhia inglesa e que, após algumas especulações escandalosas,
será suprimida ela
Revolução em 179()253.

iDA UM ESQUEMA TRIPARTIDO


Portanto, é preciso situar o capitalismo, de um lado, relativamente aos
diversos setores da economia e, do outro, relativamente à hierarquia
mercantil cujo vértice ele ocupa. E assim voltamos à estrutura proposta,
desde as primeiras páginaS254, nesta obra: na base, uma "vida material"
variada, auto-suficiente, rotineira; em cima, uma vida econômica mais bem
definida e que, em nossas explicações, tendeu a confundir-se com a
economia de concorrência dos mercados;
enfim, no último andar, a ação capitalista. Tudo estaria claro se essa
divisão operatória estivesse claramente marcada no terreno, por linhas
reconhecíveis à primeira vista. É evidente que a realidade não tem tal
simplicidade.
Particularmente, não é simples traçar a linha que materializaria a
oposição, a nosso ver decisiva, entre capitalismo e economia. A economia,
no sentido em que gostaríamos de utilizar a palavra, é o mundo da
transparência e da regularidade onde cada qual pode saber de antemão,
instruído pela experiência comum, como se desenrolarão os processos da
troca. É o que sempre ocorre, no mercado urbano, com as compras e vendas
necessárias à vida de todos os dias, dinheiro em troca de mercadorias e
mercadorias em troca de dinheiro, e que se resolvem logo, no preciso
instante da sua conclusão. É também o que ocorre com as lojas de varejo.
É também o que ocorre com todos os tráficos regulares, mesmo quando têm
largo raio de ação, aqueles cujos origem, condições, rotas, destino são
notórios: o trigo da Sicília, os vinhos e as uvas passas das ilhas do
Levante, o sal (se o
Estado não intervier) ou o azeite da Apúlia, ou o centeio, a madeira, o
alcatrão do mar Báltico, etc. Em suma, inumeráveis percursos, geralmente
antigos, cujos traçado, calendário, desníveis, todos conhecem de antemão
- por conseguinte, normalmente abertos à concorrência. Tudo se complica,
é verdade, se essa mercadoria, por uma ou outra razão, adquire interesse
aos olhos do especulador:
ela será então estocada num armazém, depois redistribuída, geralmente
para longe e em grandes quantidades. Por exemplo, os cereais do Báltico
dependem do comércio regular da economia de mercado: a curva do preço de
compra em Dantzig segue regularmente o preço de venda em Amsterdam 255.
Mas, uma vez acumulado nos armazéns da cidade, o trigo muda de nível;
passa a depender de jogos privilegiados, em que só os grandes mercadores
têm direito de opinar, e que o expedirão para os mais variados lugares,
onde quer que a fome faça subir-lhe o preço sem proporção nenhuma com o
preço de compra, onde quer que possa ser trocado por mercadorias
cobiçadas. É certo que há, na escala nacional, especialmente para uma
mercadoria como o trigo, possibilidades de pequena especulação, de
microcapitalismo, mas são absorvidas pelo conjunto da economia.
Os grandes jogos capitalistas situam-se no inusual, no fora de série ou
na conexão remota, a meses ou mesmo a anos de distância.
Nessas condições, poderemos colocar de um lado a economia de mercado a
transparência, para utilizar uma última vez esta palavra - e do outro o
capitalisInO, a especulação? Tratar-se-á apenas de uma questão de
palavras? Ou estaremos numa fronteira concreta de que os próprios atores
estariam relativamente conscientes? Quando o Eleitor da Saxônia quer
gratificar Lutero com quatro Kuxen, ações mineiras que rendem 30O Gulden,
este replica256: "Ich will kein Kuks haben! Es ist Spielgeld und will
nicht wuddeIn dasselbig Geld. 11

Não quero ações! É dinheiro

lativo e não quero fazer prosperar tal dinheiro. Comentário


significativo, de[o significativo talvez, uma vez que o pai e o irmão de
Lutero eram pequenos ;ários nas minas de cobre de Mansfeld - do lado mau,
portanto, da barreira ista. Mas é igual a restrição de J.-P. Richard, no
entanto observador tran[a vida em
Amsterdam, ante a especulação multiforme: "O espírito do coreina de tal
maneira em Anisterdam, que aqui é absolutamente necessário r seja como
for."257 É seguramente um outro mundo. Para Johan Georg autor de uma
história do comércio de Hamburgo, as complicações bolsistas sterdam e das
outras grandes praçaS258

"não são negócios para um homem mas para um apaixonado pelo jogo". Uma
vez mais, a linha está traçada. do outro lado dessa fronteira, eis o
discurso que Émile Zola (1891)259 põe i de um homem de negócios em vias
de lançar uma nova sociedade bancária: a remuneração legítima e medíocre
do trabalho, com o equilíbrio sensato nsações cotidianas, a existência é
um deserto de uma monotonia extrema, rasmo em que todas as forças dormem
e vegetam [ ... ] Mas a especulação prio chamariz da vida, o eterno
desejo que impele a lutar e a viver Sem ação, não se fariam negócios."
prime-se aqui sem rebuço a consciência de uma diferença entre dois
munmômicos e duas maneiras de viver e de trabalhar. Literatura? Sim,
claro. ma linguagem muito diferente o abade Galiani (1728-1787), um
século mais ssinala a mesma ruptura econômica e, não menos, humana. Nos
seus Dialor le commerce des bleds (l770)26O lança, contra os fisiocratas,
a idéia es>sa de que o comércio do trigo não pode fazer a riqueza de um
país. E eis rionstração: não somente o trigo é o gênero alimentício "que
vale menos fionalmente ao peso e ao espaço que ocupa", sendo portanto de
transporte Lioso; não somente é perecível, destruído pelos insetos e
pelos ratos, difícil ervar; não somente "atreve-se a vir ao mundo em
pleno verão" e deve ser e ao comércio "na estação mais contrária", a dos
mares encapelados e dos Ds impraticáveis do inverno, como o pior é que
"há trigo por toda a parte. ta em nenhum reino". Nenhum reino tem sua
prerrogativa. Compare-se com e com o vinho, produtos dos climas quentes:
"Seu comércio [é] seguro, te, regular. A Provença há de vender sempre seu
azeite à Normandia [ ... 1 )s anos se faz o pedido de um lado e a entrega
do outro; isso não poderia ... 1 Os verdadeiros tesouros da França, em
matéria de produção do solo, inhos e o azeite. Todo o Norte precisa deles
e o Norte não os produz. Enomércio se estabelece, abre seu canal, deixa
de ser especulação e torna-se 'Quando se trata de trigo, é de esperar que
não haja regularidades; nunca de onde surgirá a procura, nem quem poderá
prover-lhe, nem se chegará mais, depois de outro já ter atendido as
necessidades. Os riscos são granor isso que "pequenos mercadores com
poucos recursos" podem fazer o D do azeite ou do vinho com lucro: "chega
a ser mais lucrativo se feito em i escala. A economia, a probidade fazem-
no prosperar [... ] Mas, para o coem grande escala] dos trigos, há de
procurar as mãos mais poderosas e os aais longos de todo o corpo dos
comerciantes". Só esses poderosos estão dos; só eles podem correr riscos
e, "como a perspectiva do risco suprime ão", ei-los "monopolizadores",
com "lucros na proporção do risco". Tal ção "do comércio externo do
trigo". No plano interno, entre as diversas

províncias da França, por exemplo, a irregularidade das colheitas,


conforme os lugares, permitia também certa especulação, mas sem os mesmos
lucros.
"Entregamno aos carreteiros, aos moleiros e aos padeiros que a fazem por
miúdo e por conta própria. Assim, [ao passo que] o comércio externo [ ...
] do trigo é demasiado vasto C tão [... 1 arriscado e difícil que gera,
pela sua própria natureza, o monopólio, o comércio interno, feito entre
curtas distâncias, é, pelo contrário, muito exíguo." Passa por muitas
mãos e apenas deixa a cada qual um pequeno lucro.
Assim, mesmo o trigo, mercadoria onipresente na Europa, se separa, sem
erro possível, segundo o esquema que nos retém a atenção: é autoconsumo e
situa-se no andar térreo da vida material; é comércio regular de pequena
distância, dos celeiros habituais até a cidade próxima que tem sobre eles
"uma superioridade de situação"; é comércio irregular e às vezes
especulativo de província a província; finalmente, de grandes distâncias,
quando das crises agudas e freqüentes de penúria, é objeto de intensas
especulações por parte do grande comércio. E, cada vez que se muda de
andar no seio da sociedade mercantil, são outros os atores, outros os
agentes econômicos que intervêm.

Capínilo 5

A SOCIEDADE OU "O CONJUNTO DOS


CONJUNTOS99

Introduzir no debate as dimensões do social é retomar todos os problemas


expostos e mais ou menos resolvidos ao longo dos capítulos anteriores. E
é acrescentar-lhes as dificuldades e os pontos obscuros que a sociedade,
por si só, implica.
Dada a sua realidade difusa, onipresente, e que, por vezes, não sentimos
mais do que o ar que respiramos, a sociedade envolve-nos, penetra-nos,
orienta-nos toda a vida. O jovem Marx escrevia: "É a sociedade que pensa
em mim."' Então o historiador não confia muitas vezes nas aparências
quando pensa ter na sua frente, retrospectivamente, apenas indivíduos
cujas responsabilidades pode pesar à vontade? Na verdade, sua tarefa não
é apenas encontrar o "homem", fórmula de que se tem abusado, mas
reconhecer grupos sociais de diversas dimensões, todos comprometidos
entre si. Lucien Febvre2 lamentava que os filósofos, ao criarem a palavra
sociologia, tivessem retirado o único título que conviria a uma história
do seu agrado. Não restam dúvidas de que, para o conjunto das ciências
sociais, o aparecimento da sociologia, com Émile Durkheim (l896)3 foi uma
espécie de revoluÇão copernicana, ou galileiana, uma mudança de paradigma
cujas conseqüências ainda hoje se fazem sentir. Na época, Henri Berr
saudou-a, como um retorno, após anos de pesado positivismo, às "idéias
gerais"': "Ela reintroduzia filosofia na história." Hoje em dia, nós,
historiadores, julgaríamos antes que gosto pelas idéias gerais ela tem de
sobra, o que lhe falta mais é o sentido da história. Embora haja

ciedade ou -O conjunto dos conjuntosuma economia histórica, não há ainda


sociologia históricas. E são por demais evidentes as razões dessa
carência.
Em primeiro lugar, a sociologia, contrariamente à economia que de certo
modo é uma ciência, não consegue definir bem seu objeto. O que é a
sociedade? Agora nem sequer se formula a questão depois do
desaparecimento de Georges Gurvitch (1965), cujas definições já não
conseguiam contentar plenamente o historiador. A sua "sociedade global"
apresenta-se como uma espécie de invólucro geral do social, tão fino como
uma redorna de vidro transparente e frágil. Para o historiador, sob a
dependência estrita do concreto, a sociedade global só pode ser uma soma
de realidades vivas, ligadas ou não umas às outras. Não um continente,
mas continentes, e conteúdos.
Foi neste sentido que adquiri o hábito de falar da sociedade, na falta de
termo melhor, como conjunto dos conjuntos, como soma integral de todos os
fatos que nós, historiadores, abordamos nos diversos ramos da nossa
pesquisa. É pedir emprestado aos matemáticos um conceito tão côrnodo que
eles próprios desconfiam dele. E, talvez, empregar uma expressão muito
sonora para enfatizar uma verdade banal, a saber, que tudo é, só pode
ser, social. Mas o interesse de uma definição é fornecer uma problemática
prévia, regras para uma primeira observação. Se ela facilita essa
observação, no seu início e no seu desenvolvimento, se, em seguida, há
uma classificação aceitável dos fatos, depois uma superação lógica, a
definição é útil e justifica-se. Ora, não será a expressão conjunto dos
conjuntos útil para recordar que toda realidade social, observada em si,
se situa num conjunto superior; que, feixe de variáveis, chama, implica
outros feixes de variáveis ainda mais amplos? Jean-François Melon, o
secretário de Law, já dizia, em 1734: "Há uma ligação tão intima entre as
partes da Sociedade, que não se poderia atingir uma sem que o contragolpe
atinja as outras.1, 6 O que equivale a dizer hoje: "o processo social é
um todo indivisível"7 ou "toda história é geral"8, para citar apenas
algumas das muitas fórmulas9.
Claro que esta globalidade, na prática, tem de cindir-se em conjuntos
mais restritos, mais acessíveis à observação. De outro modo, como
manipular essa enorme massa? Escreve Schumpeter7: "Com sua mão
classificadora, o pesquisador destaca artificialmente os fatos econômicos
da grande corrente [unitária] da sociedade." Outro pesquisador destacará,
a seu gosto, ou a realidade política ou a realidade cultural... Em sua
brilhantíssima Histoire sociale de l'Ang1eterre,
G. M. TrevelyanIO entende, sob este título, a "história de um povo
separada da política", como se fosse possível uma divisão que separasse o
Estado, realidade social primordial, das outras realidades que o
acompanham. Mas não há historiador, não há economista ou sociólogo, que
não proceda a divisões desse gênero, embora todas sejam, em princípio,
artificiais, tanto a de Marx (infraestrutura, superestrutura) como o
esquema tripartido em que assentei o essencial das explicações
precedentes. Trata-se, sempre, apenas de processos explicativos, o que
importa é saber se eles permitem ou não uma compreensão eficaz dos
problemas importantes.
Aliás, não foi assim que procederam todas as ciências sociais ao
delimitarem e dividirem seu campo? Desse modo, fragmentaram o real, por
espírito sistemático mas também por necessidade: qual de nós não se
especializou, de certa maneira de nascença, por capacidade ou por
tendência para penetrar este ou aquele setor do conhecimento e não outro?
As duas ciências sociais em princípio generalizado

q sacteaaae ou o conjunto aos conjunrosras - a sociologia e a história -


dividem-se entre muitas especializações:
sociologia do trabalho, sociologia econômica, política, do conhecimento,
etc. história política, econômica, social, história da arte, das idéias,
da ciência, das técnicas, etc. É portanto uma divisão banal distinguir,
como fazemos, no interior do grande conjunto que é a sociedade, vários
conjuntos e dos mais bem conhecidos: o econôinico, evidentemente, em
lugar de destaque; o social hierárquico ou o âmbito social (para não
dizer a sociedade que, para mim, é o conjunto dos conjuntos); o político;
o cultural - decompondo-se cada um desses conjuntos, por sua vez, em
subconjuntos, e assim por diante. Nesse esquema, a história global (ou
melhor, globalizante, isto é, pretendendo-se total, tendente a sê-lo, mas
nunca o conseguindo plenamente) é o estudo de, pelo menos, quatro
"sistemas" em si mesmos, depois em suas relações, suas dependências, as
suas sobreposições, sendo múltiplas as correlações e as variáveis
próprias de cada grupo que, a priori, não devem ser sacrificadas às
intervariáveis, e vice-versa11.
O ideal impossível seria apresentar tudo num único plano e num só
movimento. A prática recomendável é, ao dividir, conservar na mente uma
visão globalizadora:
ela surgirá forçosamente na explicação, tenderá a recriar a unidade,
aconselhará a não acreditar numa falsa simplicidade da sociedade, a não
utilizar essas expressões correntes - sociedades de ordens, de classes ou
de consumo - sem pensar de antemão no juízo de conjunto que implicam.
Portanto, não acreditar nas igualdades côrnodas: mercadores = burgueses;
ou mercadores = capitalistas; ou aristocratas = proprietários
fundiários12; não falar de burguesia ou de nobreza como se tais palavras
designassem, sem erro, conjuntos bem delimitados, como se limites fáceis
de detectar separassem as categorias ou as classes, quando essas
separações têm "a fluidez da água'113.
Importa mais ainda não imaginar a priori que este ou aquele setor possa
ter, de uma vez por todas, precedência sobre um outro, ou sobre todos os
outros. Não creio, por exemplo, na superioridade incontestável e
permanente da história política, no sacrossanto primado do Estado.
Conforme os casos, o Estado pode determinar quase tudo ou não ocasionar
quase nada. Paul Adam, no original de uma
Histoire de France, que está para ser publicada, afirma que, no meu livro
sobre o Mediterrâneo, se destaca a esmagadora superioridade do papel
político de
Filipe II. Não será a sua maneira de ver sobreposta a um quadro complexo?
com efeito, os setores, os grupos, os conjuntos não param de jogar uns
com os outros numa hierarquia que permanece movediça, no seio da
sociedade global que os envolve mais ou menos estreitamente, mas nunca os
deixa inteiramente livres.
Na Europa, onde vemos as coisas melhor do que nos outros lugares, nesta
Europa avançada em relação ao mundo, a economia em rápido desenvolvimento
sobrepujou muitas vezes os outros setores a partir do século X1 ou do
XII, mais seguraniente ainda a partir do século XV1; obrigou-os a
definir-se relativamente a ela e, sem sombra de dúvida, tal primazia é
uma das raízes da modernidade precoce do pequeno continente. Mas seria
vão pensar que, antes desses séculos de arrancada, a economia não tivesse
muita importância e que ninguém poderia ter escrito, COMO um panfletário
francês de 162214, que "toda cidade, república ou reino se sustenta
principalmente de trigo, vinho, carne e madeira". Seria também vão pensar
que, diante da força ascendente da economia, prenhe de mutações
múltiplas, revolucionárias, os outros setores, toda a sociedade, não
tivessem desempenhado

zae ou -o conjunto dos conjuntos"


;eu papel, constituído (raramente) aceleradores, mais freqüentemente
barreiras, ntraforças, freios que se mantiveram atuantes séculos a fio.
Qualquer sociedade itravessada por correntes, sobrecarregada de
obstáculos, de sobrevivências obstidas que barram os caminhos, de
estruturas longas cuja permanência é, aos olhos historiador, a
característica reveladora. Essas estruturas históricas são visíveis,
tectáveis, de certo modo mensuráveis: a medida é a sua duração.
Falando outra linguagem, num livrinho polêmico e construtivo, François
wquet15

reduz esses confrontos a um conflito entre o "desejo" e o poder: de, 1


lado, o indivíduo, não guiado por suas necessidades, mas carregado de
desejos mo uma massa em movimento o pode estar de eletricidade; do outro,
o aparelho ?ressivo do poder - seja qual for esse poder - que mantém a
ordem em nome equilibrio e do rendimento da sociedade. Penso, com Marx,
que as necessidades :) uma explicação, com Fourquet que os desejos são
uma explicação igualmente sta (mas poderão os desejos não incluir as
necessidades?), que o aparelho do por, político e não menos econômico, é
uma explicação. Mas que não são essas as icas constantes sociais; há
outras.
E é neste conjunto de forças em conflito que o desenvolvimento econômico
organiza, da Idade Média ao século XVIII, trazendo consigo o capitalismo
cujos ogressos são mais ou menos lentos conforme os países, e muito
diversos. São as, istências, os obstáculos por ele encontrados que, nas
páginas que se seguem, seD colocados no primeiro plano da explicação.

IE, w
IERARQUIAS SOCIAIS
No singular ou no plural, hierarquia social equivale a designar o
conteúdo banal, mas essencial, da palavra sociedade, aqui promovida, para
facilitar nossa exposição, a um nível superior. Prefiro dizer hierarquias
a estratos, ou categorias, ou mesmo classes sociais. Embora qualquer
sociedade de certo volume possua seus estratos, suas categorias, até suas
castas16 e suas classes, estas exteriorizadas ou não, isto é,
conscientemente sentidas, ou não, com eternas lutas de classes. Todas as
sociedades. Não estou, portanto, de acordo, desta vez, com Georges
Gurvitch, quando este sustenta que a luta das classes implica, condição
sine qua non, a consciência nítida dessas lutas e oposições, consciência
essa que, segundo ele, não existiria antes da sociedade industria118.
Ora, há inúmeras provas do contrário. E, sem dúvida, Alain
Touraine tem razão de escrever: "Toda a sociedade em que uma parte do
produto é retirada do consumo e acumulada" abriga um "conflito de clasyJ9

wS . É o mesmo que dizer todas as sociedades.


Mas voltemos à palavra que preferimos, a palavra hierarquia. Aplica-se
por si só, sem muitas dificuldades, a toda a história das sociedades de
povoamento denso: nenhuma dessas sociedades se desenvolve na horizontal,
num plano de igualdade. Todas são abertamente hierarquizadas. Daí o
espanto dos descobridores portugueses quando, em cerca de 1446, entram em
contato com minúscujas tribos berberes, na época vendedoras de escravos
negros e de ouro em pó, na costa do
Saara atlântico, na altura do cabo de Rescate e em outros pontos: "Não
têm ReW '2O No entanto, olhando com mais atenção, vemos que formam clãs e
que os clãs têm chefes. Os holandeses não ficam menos espantados com os
Povos primitivos de
Formosa, em cerca de 1630: "Não têm Rei, nem soberano. Estão sempre em
guerra, isto é, aldeia contra aldeia. 21 Contudo uma aldeia é um
agrupamento, uma ordem.
Mesmo as sociedades utópicas, imaginadas às avessas das sociedades reais,
são normalmente hierarquizadas. Até a sociedade dos deuses gregos, no
Olimpo, é hierarquizada. Concluindo: não há sociedade sem uma ossatura,
sem estrutura.
As sociedades atuais, seja qual for seu sistema político, não são muito
mais igualitárias do que as de outrora. Pelo menos, o privilégio
asperamente contestado perdeu um pouco da sua ingénua boa consciência. No
passado, pelo contrário, nas sociedades de ordens, conservar a posição
era uma forma de dignidade, uma espécie de virtude. Só era ridículo e
condenável aquele que arvorava sinais de uma posiÇão social que não lhe
pertencesse. Vejamos o que propõe um inventor de projetos dos primeiros
anos do Século XV11122 contra os malefícios da mudança de classe e do
luxo, dissipador da poupança: que o rei da
França conceda aos príncipes, aos duques, às pessoas com títulos e às
suas esposas um cordão azul "como os usados pelos comendadores de Malta e
de São
Lázaro"; aos outros nobres, um cordão vermelho; que todos os oficiais,
sargentos e soldados andem sempre fardados; que Para os criados,
inclusive camareiros e mordomos, seja obrigatória a libré "sem que possam
entrar nas abas de chapéus nem galões, nem nenhum ouro ou prata". A
solução ideal não seria a que, suprimindo as despesas suntuárias,
"reduzisse os pequenos à impossibilidade de se confundirem com os
grandes"?
Habitualmente, o que impede essa confusão é, mais simplesmente, a divisão
da riqueza, luxo de um lado, miséria do outro, e a do poder, autoridade
de um

- .17w.^O Banco do Rei, sob Henrique VI: os juízes, os escrivães e,


embaixo, os condenados. Ilustração de um manuscrito inglês do século XV,
Biblioteca do Inner
Temple. (Fotografia da biblioteca.)

22: ado, obediência do outro. Diz um texto italiano de 1776 -Uma parte da
huma,, nidade é maltratada até a morte para que a outra se empanturre até
rebentar."
das
A ordem hierárquica nunca é simples, uma sociedade é diversidade,
pluralidade;
divide-se contra si própria e essa divisão é provavelmente o seu próprio
ser.
Tomemos um exemplo: a sociedade chamada "feudal", da qual os
historiadores e economistas marxistas ou marxizantes, que forcejam para
defini-Ia, tiveram de reconhecer e explicar o pluralismo intrínseco23.
Deixem-me dizer, antes de ir niais longe, que sou tão alérgico quanto
Marc Bloch ou Lucien Febvre à palavra feudalismo, utilizada com tanta
freqüência. Este neologiSM02`, derivado do baixo latim (feodum, o feudo),
refere-se, tanto para eles como para mim, apenas ao feudo e ao que dele
depende - nada mais. Não tem mais lógica subordinar a esse vocábulo toda
a sociedade da Europa, entre os séculos X1 e XV, do que à palavra
capitalismo a totalidade dessa mesma sociedade entre os séculos XVI e o
XX. Mas abandonemos esta discussão. Aceitemos mesmo que a sociedade
chamada feudal, outra fórmula corrente, possa designar uma grande etapa
da história social da
Europa, que seja lícito utilizar a expressão como um rótulo côrnodo
quando, afinal de contas, poderíamos dizer igualmente Europa A, usando a
Europa B para designar a etapa seguinte. Seja como for, a articulação de
A para B se delineou a partir da época denominada por ilustres
historiadoreS25 de verdadeiro
Renascimento, entre os séculos X e XIII.
A meu ver, a melhor exposição sobre a sociedade chamada feudal continua a
ser o resumo, seguramente muito breve e autoritário, de Georges
Gurvitch26 que, concebido a partir da leitura atenta do maravilhoso livro
de Marc BIoch27

prolonga singularmente as suas conclusões. Essa sociedade "feudal",


moldada por séculos de sedimentação, de destruição, de germinação, é a
coexistência de pelo menos cinco "sociedades", cinco hierarquias
diferentes. Na base, a mais antiga, desarticulada, é a sociedade
senhorial que se perde na noite dos tempos e agrupa, nas suas pequenas
unidades, senhores e camponeses próximos. Menos antiga, mas mergulhando
suas raízes muito longe, até o Império romano, e suas raízes espirituais
mais longe ainda, uma sociedade teocrática que a Igreja romana construiu,
com força e tenacidade, pois ela necessita não apenas conquistar, mas
também conservar e, portanto, recuperar continuamente seus fiéis. Uma
parte importante dos excedentes da primeira Europa alimenta essa enorme e
vasta empresa: as catedrais, as igrejas, os mosteiros, as rendas
eclesiásticas, será isso um investimento ou um desperdício de capital? Em
terceiro lugar, uma sociedade mais jovem, mediando no meio das outras,
buscandolhes o apoio, organiza-se em torno do Estado territorial. Este
naufragou com os últimos carolíngios, mas o naufrágio, como só ia
acontecer, não foi total.
Quarto subsetor: o feudalismo em sentido restrito, superestrutura tenaz
que se insinua no topo, nos vazios deixados pela falência do Estado e que
une os senhores numa longa cadeia hierárquica e tenta, por meio dessa
hierarquia, segurar tudo, manobrar tudo. Mas a Igreja não será
inteiramente apanhada nas malhas do Sistema; o Estado, um dia, há de
rasgar a rede; e, quanto ao camponês, viverá em

geral à margem dessa agitação no plano superior. Finalmente, quinto e


último sistema, do nosso Ponto de vista o mais importante de todos: as
cidades.
Surgiram, ou ressurgiram, a partir dos séculos X e XI, Estados à parte,
sociedades à parte, civilizações à parte, economias à parte. São filhas
de um passado longínquo: Roma revive muitas vezes nelas. Filhas, porém,
de um presente que as faz florescer, são também novos seres: em primeiro
lugar, o resultado de uma colossal divisão do trabalho - campos de um
lado, cidades do outro -, de uma conjuntura obstinadamente favorável, do
comércio que renasce, da moeda que reaparece. com a moeda, principal
multiplicador, é a uma espécie de eletricidade que, a partir de Bizâncio
e do Islã, fica ligado o Ocidente, através da imensidão do Mediterrâneo.
Quando, depois, todo o mar se tornar cristão, a primeira Europa
deslanchará e se transformará radicalmente.
Em suma, portanto, várias sociedades que coexistem, que se apóiam melhor
ou pior umas nas outras. Não um sistema, mas sistemas; não uma
hierarquia, mas hierarquias; não uma ordem, mas ordens; não um modo de
produção, mas modos de produção; não uma cultura, mas culturas, tomadas
de consciência, línguas, artes de viver. Deve-se pôr tudo no plural.
Georges Gurvitch não se furtou a afirmar, um tanto precipitadamente, que
as cinco sociedades em questão, que partilham entre si o volume da
sociedade feudal, são antinômicas, estranhas umas às outras; que sair de
uma é cair no vazio e no desespero. com efeito, essas sociedades viveram
juntas, misturaramse, implicam uma certa coerência. As cidades-Estado
foram buscar seus homens nessas terras e nos campos senhoriais que as
rodeiam, anexando não apenas camponeses, mas também senhores, melhor,
grupos de senhores nascidos no campo e que, ao se instalar na cidade,
continuam a ser clãs sólidos com vínculos indefectíveis11. No coração da
Igreja, o papado, a partir do século XIII, dirigiu-se aos banqueiros da
cidade de Siena para cobrar os impostos que lançou sobre a cristandade. A
realeza da Inglaterra, com Eduardo 1, dirige-se aos prestamistas de Luca,
depois de Florença. Bem cedo os senhores são vendedores de trigo e de
gado: é preciso que os mercadores os comprem deles. Quanto às cidades,
sabemos que são o protótipo da modernidade e que, quando nascem o
Estado moderno e a economia nacional, são os modelos seguidos que
continuam a ser, em detrimento das outras sociedades, os lugares
prediletos da acumulação e da riqueza.
Dito isto, qualquer sociedade, ou subsociedade, ou grupo social, a
começar pela família, tem a sua hierarquia própria: tanto a Igreja como o
Estado territorial;
tanto a cidade comercial, com o seu patriciado, como a sociedade feudal
que, em resumo, não passa de uma hierarquia; como o regime senhorial, com
o senhor de um lado e o camponês do outro. Uma sociedade global coerente
não será uma hierarquia que conseguiu impor-se ao conjunto, sem
forçosamente destruir as outras?
Isso não impede que, de todas as sociedades que compartilham uma
sociedade global, haja sempre uma ou várias que, tendendo a sobrepujar as
outras, preparam uma mutação do conjunto - mutação que se delineia sempre
muito lentamente, depois se afirma, até que uma nova transformação se
opere mais tarde, desta vez contra a ou as vitoriosas. Tal pluralidade
revela-se um fator essencial de movimento, tanto quanto de resistência ao
movimento. Qualquer esquema de evolução, mesIno o de Marx, torna-se mais
claro perante tal constatação.

- ou8cuuc4c ~ - 1--~-- - -,.J.


"Orvar na vertical. o número, oito dos privilegiados
Todavia, se olhamos de cima o conjunto da sociedade, não são essas
subcategorias que primeiro saltam à vista, mas sim a desigualdade
intrínseca que divide a massa, do topo à base, segundo a escala da
riqueza e do poder. Qualquer observação revela essa desigualdade visceral
que é a lei contínua das sociedades. Tal como reconhecem os sociólogos,
esta é uma lei estrutural, sem exceção. Mas essa lei, como explicá-la?
O que se vê imediatamente, no alto da pirâmide, é um punhado de
privilegiados.
Tudo converge normalmente para essa sociedade minúscula: cabe a eles o
poder, a riqueza, uma grande parte dos excedentes da produção; cabe a
eles governar, administrar, dirigir, tomar decisões, assegurar o processo
do investimento, portanto da produção; a circulação de bens e de
serviços, os fluxos monetários convergem para eles. Abaixo deles
escalona-se a multidão dos agentes da economia, dos trabalhadores de
qualquer categoria, a massa dos governados. E, abaixo de todos, um enorme
detrito social: o universo dos que não têm trabalho.
Claro que as cartas do jogo social não estão distribuídas de uma vez por
todas, mas as redistribuições são raras, sempre parcimoniosas. Por mais
que as pessoas

1. se aferrem a subir na hierarquia social, em geral são necessarias


varias gerações e, tendo chegado mais acima, não mantêm o posto sem luta.
É uma guerra social contínua desde que há sociedades vivas, com suas
escadarias majestosas e seus estreitos acessos ao poder. Sabemos de
antemão que não há nada que conta realmente - Estado, nobreza, burguesia,
capitalismo ou cultura - que não tenha, de uma maneira ou de outra, se
apossado dos pontos altos da sociedade. É nesse nível que se governa, que
se administra, que se julga, que se doutrina, que se amealham riquezas e
até se pensa; é nele que se fabrica e se refabrica a cultura brilhante.
O espantoso é que os privilegiados sejam sempre tão pouco numerosos. Uma
vez que a promoção social existe, uma vez que essa minúscula sociedade
depende dos excedentes que o trabalho dos não-privilegiados põe à sua
disposição, se estes excedentes aumentam, a pequena população do topo
deveria crescer. Ora, hoje como ontem, é raro isso acontecer. Segundo o
slogan da Frente Popular, a França de

1936 dependia inteiramente de "20O famílias", relativamente discretas,


mas onipotentes - slogan político que facilmente provocaria risos. Mas
Adolphe
Thiers, um século antes, escrevia sem emoção: " [ ... 1 num Estado como a
França, [em] doze milhões de famílias, [... ] sabemos que há [... 1
quando muito, duas ou três centenas que dispõem de opulência.,, 29 E
outro século antes, um partidário da ordem social tão convicto como
Thiers, Jean-François
Melon30, explicava que "o luxo de uma Nação restringe-se a um milhar de
pessoas relativamente a vinte milhões de outras, não menos felizes do que
elas", acrescentava, --se uma boa Polícia as dei-. xar fruir
tranqüilamente os frutos do seu trabalho".
Serão democracias atuais tão diferentes? Conhece-se pelo menos o livro de
C. W.
Mil131 sobre The Power Elite, que insiste na impressionante exigüidade do
grupo de que depende qualquer decisão importante acerca do conjunto dos
Estados Unidos atuais. Também lá a elite nacional é composta por algumas
famílias dominantes, e tais dinastias mudam pouco com os anos. Mutatis
mutandis, já é a linguagem de
Claudio Tolomei, um escritor sienense, numa carta de 21 de janeiro de

1531 a Gabriele Cesano32: "Em toda república, mesmo grande, em todo


Estado,

ompa e cerimonial acompanham a mulher do Lord Mayor de Londres. Esboço


tirado do 'bum de George Holzschuer, que visita a Inglaterra entre 1621 e
1625. (Fototeca
A. Colin.)
iesmo popular, é raro que mais de cinqüenta cidadãos ascendam aos cargos
de manD. Nem em Atenas ou em Roma, nem em Veneza ou em Luca, são muitos
os cidaos que governam o Estado, benchési reggano queste terresotto nome
di republica, bem que esses Estados sejam governados sob o nome de
república." Em suma, o haveria, seja qual for a sociedade ou a época
considerada, numa região qualquer ) mundo, uma lei insidiosa do número
exíguo? Lei na verdade irritante, pois não scernimos bem as suas razões.
No entanto, é uma realidade que, insolentemente, !o cessa de se nos
oferecer. Inútil discutir: todos os testemunhos estão de acordo.
Em Veneza, antes da peste de 1575, os Nobili são quando muito (homens,
mueres e crianças) 1O mil pessoas, o total mais elevado da história
veneziana, ou se, 5% da população global (Veneza, mais o Dogado), que
oscila em torno de 20O il habitanteS33. E ainda é preciso eliminar desse
pequeno número os nobres em)brecidos, muitas vezes reduzidos a uma
espécie de mendicidade oficial e que, regados para o modesto bairro de
San Barnaba, são designados pela alcunha irônide Barnabotti. E até, feita
esta subtração, o resto do patriciado conta apenas In negociantes
opulentos. Após a peste de 1630, o número destes últimos reduziu-se Ponto
de já não haver muito mais de 14 ou 15 pessoas capazes de servir nos mais
os cargos do Estado34. Em Gênova, cidade tão tipicamente capitalista,
segundo na listagem de 1648, a nobreza que tem nas suas mãos a
República (em nome s seus títulos e não menos do seu dinheiro) consta,
quando muito, de umas 70O ssoas (não contando as famílias) em, talvez, 8O
mil habitanteS35.
E essas porcentagens de Veneza e de Gênova estão entre as mais elevadas.
Em

1remberg36 o poder está, desde o século XVI, nas mãos de uma aristocracia
res

(43 famílias patrícias segundo a lei), isto é, 15O a 20O dos 2O mil
habitantes cidade, mais os 2O mil do seu distrito. Essas famílias têm o
direito exclusivo de 'da ear representantes ao Conselho interno e este
escolhe os Sete Anciãos (que, na oW idade, decidem tudo, governam,
administram, julgam e não prestam contas a,."~ém)
entre as poucas antigas famílias históricas e opulentas que em geral re.
Ulontam ao século XIII. Tal privilégio explica que se repitam sempre os
mesmos --nomes nos fastos de Nuremberg. Miraculosamente indene, a cidade
atravessará os sucessivos tumultos da Alemanha dos séculos XIV e XV. Em
1525, com um gesto decidido, os Herren ÃIteren enveredam para a Reforma.
E tudo estará dito. Em
Londres, em 1603, no fim do reinado de Elisabeth, todos os assuntos estão
sob a tutela de menos de 20O grandes mercadoreS37. Nos Países Baixos, no
século XVII, a aristocracia governante, a dos Regentes das cidades e dos
cargos provinciais, é de lo mil. pessoas para uma população de dois
milhões de indivíduOS38. Em
Lyon,
Os patricios de Nuremberg dançam no salão da Câmara Municipal. Não hd
multidão!
(Stadtbibliothek Nümberg, clichê A. Schmidt.)

:idade à parte devido às suas liberdades e à sua riqueza, as irônicas


repreensões lo clero aos conselheiros da cidade (8 de novembro de 1558)
não contêm ambigüi_ lades: "Vós, Senhores Conselheiros [na realidade, os
donos do governo da cidale], que sois quase todos mercadores. [... 1 Não
há na cidade trinta pessoas que pos;am ter esperança de vir a ser
conselheiros... 9 9 39 o mesmo grupo restrito em Anuérpia, no século XVI,
o dos "Senadores-, os ingleses dizem os "Lords" da :idade40. Em Sevilha,
em 1702, segundo um mercador francês, "o consulado coniste em quatro ou
cinco particulares que manipulam o comércio segundo os seus ins
particulares" e são os únicos que enriquecem a expensas dos outros
negocianes. Um memorial de 1704 não hesita em falar de "terríveis
iniqüidades do Consuado de Sevilha' 41. Em Mans, em 1749, a fabricação e
o comércio das étamines [e lã que fazem a riqueza da cidade são dominados
por oito ou nove negociantes,

4os senhores Cureau, Véron, des Granges, Montarou, Garnier, Nouet, Fréart
e
Bo[ier"42. Dunquerque, no fim do Ancien Régime, enriquecida por seu porto
frano, é uma cidade com pouco mais de 2O mil habitantes, nas mãos de uma
aristocraia de dinheiro, nem um pouco tentada a perder-se deliberadamente
nas fileiras de ma nobreza que, aliás, não está presente intra muros. Na
verdade, para que obter ítulo de nobreza quando se é habitante de uma
cidade franca onde todos têm o norme privilégio de não pagar talha, nem
gabela, nem selo? A exígua burguesia e
Dunquerque constituiu-se numa casta fechada, com "verdadeiras dinastias:
os

1aulconnier, Tresca, Coffyn, Lhermite, Spyns' 43. A mesma realidade em


Marseia.
Segundo A. Chabaud44, "o corpo dos escabinos esteve, durante um período e
15O anos [antes de 1789], nas mãos de algumas famílias, quando muito uma
deena, cujas sucessivas alianças, casamentos, compadrios, rapidamente
fizeram uma

5". Contemos, com Ch. Carrière45 os negociantes marselheses do século


XVIII: Nem sequer 1 % [da população]; [ ... ] insignificante minoria, mas
que detém a riueza e domina a atividade de toda a cidade, cuj a
adminsitração reserva para si." m Florença, os benefiziati são 3 mil ou
mais no século XV; de 80O a mil apenas, or volta de 1760, de modo que os
Habsburgo-Lorena, que se tornam grãoduques a Toscana em 1737, depois da
extinção dos Médicis, são obrigados a criar novos Dbres 46. Em meados do
século XVIII, uma pequena cidade tão comum como
Pia, nza (3O mil habitantes) conta com 25O a 30O famílias nobres, isto é,
1.25O a 1.50O rivilegiados (homens, mulheres e crianças), 4 a 5% da
população. Mas essa por, ntagem, relativamente elevada, inclui nobres de
todos os gêneros e níveis de forina. E, sendo a nobreza urbana a única
classe rica dessa região rural, seria preciso rescentar à população de
Piacenza os 17O mil camponeses da zona rural. com se total de 20O mil
pessoas, 'a porcentagem cairia para menos de

1%47.
Não cremos ter aqui um resultado aberrante: uma estimativa para o século
VIII cifra em 1 %, para toda a Lombardia, a porcentagem da nobreza
relativaente à população total das cidades e dos campos, e esse pequeno
número de privigiados detém quase metade da propriedade fundiária48. Num
caso mais restrito, is imediações de Cremona, por volta de 1626, em
1.600.00O pertiche de terras,

18 famílias feudais possuem, sozinhas, 833 mil", isto é, mais da


metade49.
Os cálculos na dimensão de um Estado territorial falam uma linguagem
análoEm suas estimativas que a pesquisa histórica confirma em linhas
gerais, GrerY King (1688)5O recenseia na Inglaterra cerca de 36 mil
famílias cuja renda anual trapassa 20O libras, enquanto a Inglaterra
conta com cerca de 1.400.00O famílias úmero arredondado por mim), isto é,
uma porcentagem próxima de 2, 6. E, para egar a esse nível, foi preciso
somar de cambulhada lordes, baronetes, squires,

Nobres poloneses e mercadores em conversas de negócios, em Gdansk.


Vinheta do século XVII que ilustra o A tlas de J. -B. Haman. (Fo to A
lexandra Skaryúska.)
gentlemen, "oficiais" do rei, mercadores importantes, mais 1O mil homens
da lei que, aliás, vão então de vento em popa. Talvez também o critério -
acima de 20O libras - alargue demais esse pelotão de frente em que
existem grandes desigualdades, uma vez que as rendas mais volumosas, as
dos grandes proprietários de terras,

51

são estimadas em 2.80O libras anuais em média. Os números dados por


Massie, em

1760, na subida ao trono de Jorge III, indicam uma nova redistribuição da


riqueza, com a classe mercantil ficando então acima da classe fundiária.
Mas se quisermos contar os verdadeiramente ricos, os verdadeiramente
poderosos, política e socialmente, em todo o reino, serão recenseadas
então, no dizer dos especialistas,

52

apenas 15O famílias, isto é, 60O a 70O pessoas. -Na França, por volta da
mesma época, a antiga nobreza consta de 8O mil pessoas, o total da
nobreza de 30O mil, "isto é, 1 a 1, 5%" dos franceseS53. Quanto à
burguesia, como distingui-Ia?
Sabemos mais o que ela não é do que o que ela é, e faltam os números. No
total, arrisca Pierre Léon, 8, 4% do conjunto, mas, neste número, quantos
grandes burgueses? A única porcentagem crível refere-se à nobreza bretã
(2%), mas a
Bretanha, com seus 4O mil nobres, está muito acima, como é sabido, da
média do reino 54.
Para encontrar uma porcentagem superior, estabelecida com certa
segurança, temos de trazer à baila a Polônia55, onde os membros da
nobreza representam 8 a 10% da população, "sendo a porcentagem mais
elevada da Europa". Mas esses nobres poloneses não são todos magnatas,
muitos deles são mesmo muito pobres, alguns simples vagabundos "cujo
nível de vida não diferia do dos camponeses". A classe mercantil rica é
mínima. Portanto, aqui, tal como nos outros lugares, a

sexo masculino

260025002400

2300'

22002100'

20001900

1800

1700

1600

15001400

150O 2O 4O 6O 8O 160O 2b 4b à 8'O 17bO 2b


28. OS NOBRES EM VENEZA
Exemplo característico. toda aristocracia Praticamente fechada diminui o
número dos seus membros. Em Veneza, novasfamt7ias que se agregam são
insuficientes.
Corresponderd a ligeira recuperação, depois de 1680, a uma melhoria s
condições de vida? Segundo o quadro fornecido por Jean Georgelin, Venise
au siècle des
Lumières, 1978 p. 653, e retoma os números de James Davis, The Decline of
the
Venetian Nobility as a Rulling Class, 1962, p. 13 7.
imada privilegiada e que verdadeiramente conta representa uma minúscula
pro)rção do total da população.
Relativamente menores ainda são, por certo, algumas minorias restritas:
os no-es a serviço de Pedro, o Grande, os mandarins da China, os daimios
do Japão, rajás e omerás da índia do Grão_Mogol56 ou o punhado de
soldados e mariieiros aventureiros que dominam e aterrorizam as
populações rudes da Regência Argel, ou a fina camada de proprietários,
nem sempre ricos, que se implantará, um modo ou de outro, na imensa
América espanhola. A importância dos gran!s mercadores nesses diversos
países é extremamente variável, mas permanecem imericamente fracos.
Concluímos como Voltaire: num país bem organizado, os lucos "põem para
trabalhar os muitos, são por eles alimentados e governam-nos".
Mas será isto uma conclusão? Quando muito é constatar, mais uma vez, sem
mpreender deveras. Trazer à baila as conseqüências da "concentração" tão
visíis no setor econômico e em outros é aumentar e enlear o problema. com
efeito, mo explicar a própria concentração? Contudo, os historiadores
concentraram nes;
ápices sociais todas as suas luzes. Optaram "pelo caminho mais fácil",
como E
Charles Carrière 57. Afinal de contas não é assim tão certo, uma vez que
o peieno número dos privilegiados se apresenta como um problema que
escapa às so, ões fáceis. Como ele consegue se manter, mesmo em meio a
revoluções? Como põe respeito à enorme massa que se desenvolve abaixo
dele? Por que, na luta, e às vezes o Estado trava contra os
privilegiados, estes nunca perdem por inteiro definitivamente? Talvez Max
Weber tivesse razão, afinal, quando, recusando Lxarse hipnotizar pelas
profundezas da sociedade, insiste na importância de "quaicar
Politicamente as classes dominantes e ascendentes "58. Não é a natureza
da i elite (segundo os laços de sangue ou segundo os níveis de fortuna) o
que qualia, logo de saída, uma sociedade antiga?

As classes ascendentes, as substituições no topo, a mobilidade social -


esses le da ou das burguesias e das classes chamadas médias, apesar de
serem clásb]
b. não são muito mais claros do que os anteriores. A reconstituição e a
reprodu[ das elites processam-se por movimentos e deslocamentos
habitualmente tão Iend d e tão frouxos que escapam à medição e até à
observação precisa. E, com mais e e e razão, a uma explicação
peremptória. Lawrence Stone19 pensa que as conjune e ascensionais
precipitam as escaladas sociais, e é provável. No mesmo sentido 'd modo
ainda mais geral, Hermann KelleribenZ6O observa que, nas cidades mere i s
litorâneas, onde a vida econômica gira e avança mais depressa, a
mobilidade ti *al desenvolve-se com mais facilidade do que nas cidades do
interior. Assim, vol.a a os a encontrar a oposição quase clássica entre
os litorais e o interior dos contie e es. As diferenças sociais são
menores em Lübeck, Bremen ou Hamburgo do que t( tC t reacionária cidade
de Nuremberg. Mas não encontraremos a mesma fluidez em re re arselha, ou
mesmo em Bordeaux? Inversamente, o declínio econômico fecharia ,, Os
portas da promoção, fortaleceria o status quo social. Por sua vez, Peter
Laslettó1,, &firmaria de born grado que a queda social, o inverso da
mobilidade, sempre preva]eceria na Inglaterra pré-industrial. E, nesse
plano geral, não é o único a ter essa 0pinião62. Então, se pudéssemos
fazer um balanço, no topo de cada sociedade, das, chegadas e partidas,
leríamos a modernidade como uma concentração da riqueza e do poder, ao
invés de como um alargamento? Em Florença, em Veneza ou em Gê:nova,
números bastante precisos mostram que as famílias privilegiadas declinam
regularmente e algumas se extinguem. Assim também, no condado de
Oldenburg, de

20O famílias nobres identificadas na Idade Média, restavam apenas 3O nas


imediações de 160063. Em virtude de uma propensão biológica que tenderia
a restringir a pequena população do topo, há concentrações de heranças e
de poder em algumas mãos, porém com limiares críticos que às vezes são
atingidos, como em
Florença em 1737, como em Veneza em 1685, 1716, 177564. Então, é preciso
abrir as portas a qualquer preço, aceitar a "agregação" de novas famílias
"per denaro", por dinheiro, como se dizia em Veneza65. Ao precipitarem o
processo de debilitação, tais circunstâncias aceleram o preenchimento
necessário, como se a sociedade recuperasse a vocação para cicatrizar
suas feridas e preencher seus vazios.
Em certas circunstâncias, a observação torna-se mais fácil. É o que se
passa quando Pedro, o Grande, remodela a sociedade russa. Ou, melhor
ainda, na
Inglaterra, por ocasião da crise desencadeada pela guerra das Duas Rosas.
Quando o morticínio chega ao fim, Henrique VII (1485-1509) e, depois
dele, seu filho,
Henrique VIII (1509-1547), têm diante de si apenas os sobejos da antiga
aristocracia que com tanta força se opusera ao poder monárquico. A guerra
civil a devorou: em

1485, de 5O lordes, sobreviveram 29. Terminou a era dos warlords, dos


senhores da guerra. Na tormenta, desapareceram as grandes famílias hostis
aos Tudors:
Pole, Stafford, Courtenay... Então, fidalgos de menor envergadura,
burgueses compradores de terras, até gente de origem modesta ou obscura,
favoritos da realeza, preenchem o vazio social de cima, graças à mudança
profunda da "geologia política" do solo inglês, como se disse. O fenômeno
em si não é novo, é-o apenas por seu volume. Por volta de 1540, encontra-
se instalada uma nova aristocracia, nova

da, mas já respeitável. Ora, antes da morte de Henrique VIII e, depois,


sob os vimentados e frágeis reinados de Eduardo VI (1547-1553) e de Maria
Tudor

53-1558), essa aristocracia vai ficando cada vez mais à vontade e em


breve se

5e ao governo. A Reforma, as vendas das propriedades eclesiásticas e dos


bens
Coroa, a crescente atividade do Parlamento a favorecem. Por trás do
brilho,
Lrentemente tão intenso, do reinado de Elizabeth 1 (1558-1603), a
aristocracia isolida, amplia suas vantagens e privilégios. Será um sinal
dos tempos que a reai, que, até 1540, multiplicara as construções
suntuosas, prova da sua vitalidade, ha parado depois dessa data? O fato
não está relacionado. com a conjuntura, a vez que o papel de construtor
passa então efetivamente para as mãos da arisracia. com o final do
século, multiplicam-se, pelos campos da
Inglaterra, as refficias quase principescas, Longleat, Wollaton, Worksop,
BurghIey House, lenby66... A ascensão ao poder dessa nobreza acompanha a
primeira grandeza rítima da ilha, o aumento dos rendimentos agrícolas e o
desenvolvimento a que J. Nef chama, com muito boas razões, a primeira
revolução industrial. A aris.-acia já não precisa tanto da Coroa para
aumentar e consolidar a sua fortuna. luando, em 1640, esta tenta
restabelecer a sua autoridade sem controle, é tarde lais. A aristocracia
e a grande burguesia - que em breve a segue a pouca disfia - atravessarão
os anos difíceis da guerra civil e desabrocharão com a res., ação de
Carlos Il (1660-1685). "Depois do imbroglio suplementar dos anos

8-1689, [... ] podemos considerar que a Revolução inglesa (iniciada em


164O e, =to ponto de vista, até mais cedo) cumpriu o seu ciclo... -67
Voltou a formarima classe dirigente inglesa.
O exemplo expansivo da Inglaterra é claro, o que não impediu que
suscitasse tas discussões entre historiadoreSÓ8. Noutros lugares também,
por toda a Eui, os burgueses se nobilitam ou casam as filhas nas fileiras
da aristocracia. Tola, para seguirmos as oscilações de tal processo,
seriam necessárias pesquisas ementares e também admitir, de saída, que a
tarefa essencial de qualquer socie, é reproduzir-se no topo, confiar,
portanto, retrospectivamente na sociologia bativa de Pierre Bourdieu69;
admitir também, de saída, na linha de pensamento tistoriadores como
Dupâquier, Chaussinand-Nogaret, Jean Nicolas e decerto ns outros, que há
conjunturas sociais absolutamente decisivas: há uma hierar,, uma ordem
que se desgastam continuamente, depois, um belo dia, ruem; noIndivíduos
chegam então ao cimo e, nove em cada dez vezes, é para reproduzi, ou
quase, o antigo estado de coisas. Para Jean Nicolas, na Sabóia, no
reinado arlos Emanuel

1 (1580-1630), em meio a incontáveis calamidades, pestes, peas, más


colheitas, guerras, "em virtude da conjuntura perturbada... uma
noristocracia oriunda dos negócios, da chicana e dos serviços tende a
suplantar tiga nobreza feudal'970.
Assim, novos ricos, novos privilegiados se insinuam igar dos antigos,
enquanto o forte abalo que abateu alguns privilégios anteriopermitiu esse
novo surto acarreta, na base, graves deteriorações da condição ?onesa.
Tudo tem um preço.

- --juntu uus conjuntosTudo simples, sem dúvida simples demais. Lento,


mais lento do que habitualmente se supõe. Claro que um movimento social
desse gênero não é muito mensurável, mas talvez se consiga discernir uma
ordem de grandeza se tentarmos calcu[ar, grosso modo, relativamente à
nobreza ou ao patriciado dominantes, o número de candidatos sérios à
promoção social, isto é, a parte mais rica da burguesia. os historiadores
têm o hábito de fazer uma distinção um tanto esquemática entre alta,
média e pequena burguesia; cumpre, desta vez, tomá-los à letra. Na
realidade, só a camada superior deveria intervir no nosso cálculo,
podendo-se admitir que não atinge um terço do total da burguesia. Quando
se diz, por exemplo, que a burguesia francesa do século XVIII representa
cerca de 801o de toda a população do país, a camada superior não pode
ultrapassar os 2%, o que significa, sempre em linhas gerais, que teria
mais ou menos o mesmo volume da nobreza. Esta igualdade é uma mera
suposição, mas, no caso de Veneza, onde os cittadini constituem uma alta
burguesia, bem delimitada, em geral rica ou pelo menos abastada, que
fornece quadros às repartições governamentais da Signoria (pois os cargos
inferiores são venais) e desempenha mesmo, a partir de 1586, funções tão
destacadas como as de -ônsul de Veneza no estrangeiro, que se ocupa
também do comércio, do trabalho Industrial - esses cittadini são em
número igual ao de nobiliII. A mesma equivalência no bem estudado e
quantificado caso da classe média alta de Nuremberg, por volta de 1500: o
número de patrícios e o de mercadores ricos equiparam-se72.
Evidentemente, é entre o patriciado (ou a nobreza) e a camada
imediatamente inferior dos mercadores ricos que se dá a promoção social.
Em que proporção? Eis o que é difícil medir, salvo em casos especiais.
Como a camada dominante só diminui a longo prazo e se mantém por muito
tempo no mesmo nível, a promoção social deveria, quando muito, preencher
vazios. Segundo Hermann KellenbenZ73. o que se passa em Lübeck no século
XVI. A classe Patrícia, a dos grandes negoziantes, que comporta 15O a 20O
famílias, perde em cada geração um quinto dos seus membros, o qual é
substituído por um número quase equivalente de recém:hegados. Se
admitirmos que uma geração representa uns vinte anos e se, para
simplificar, escolhermos o número de 20O famílias, há, no máximo, nessa
cidade de

25 mil habitantes, duas famílias novas que, todos os anos, transpõem o


limiar da :lasse dominante para se integrar num grupo cem vezes superior.
Como esse grupo zomporta por sua vez patamares (no vértice, 12 famílias
têm na mão a realidade do poder), como imaginar que o recém-chegado
modificará radicalmente as regras do meio em que se insere? Isolado, mais
cedo ou mais tarde entrará na linha; a radição, os hábitos se lhe
imporão; mudará de vida, até de traje; se necessário, mudará de
ideologia.
Isto posto, como tudo é complexo, também pode acontecer que a própria
clas;e dominante mude de ideologia, de mentalidade, aceite ou pareça
aceitar a dos recém-chegados, ou melhor, a que lhe propõe o meio sócio-
econômico, que renegue a si própria, pelo menos em aparência. Mas tal
abandono nunca é simples ou Ompleto, nem forçosamente catastrófico para a
classe dominante. com efeito, o surto econômico que traz os recém-
chegados nunca deixa indiferentes as pessoas 'm alta Posição. Elas também
são afetadas. Alfons Dopsch74 chamou a atenção para as sátiras precoces
do pequeno Lucidarius, que zomba daqueles senhores do

^ ^fescuauc U14

fim do século XIII, incapazes de conversar sobre alguma coisa, na corte


do príncipe, que não seja o preço do trigo, dos queijos, dos ovos, dos
leitões, do rendimento das vacas leiteiras, do resultado das safras.
Então essa nobreza estaria aburguesada desde o século XIII? Mais tarde, a
aristocracia há de enveredar ainda mais profundamente pelos caminhos da
empresa. Na Inglaterra, já no fim do século XVI, aristocracia e gentry
participam francamente das novas sociedades por ações criadas pelo
comércio externo75. Uma vez iniciado, o movimento não mais se deterá. No
século XVIII, as nobrezas da Hungria, da
Alemanha, da Dinamarca, da Polônia, da Itália 11mercantilizam-se"76. Sob
o reinado de Luís XVI, a nobreza francesa é mesmo tomada por uma
verdadeira paixão pelos negócios. No dizer de um historiador, é ela que
mais arrisca, que mais especula; em comparação, a burguesia faz triste
figura: prudente, timorata, vive de rendaS77. Talvez não seja de admirar,
pois, se a nobreza francesa só então começa a lançar-se na empresa
privada; há muito que ela especula ousadamente noutro setor dos "grandes
negócios", o das finanças reais e do crédito "com rendas".
Em suma, se as mentalidades, no topo da hierarquia, aqui ou ali, se
"aburguesam", como muitas vezes se disse, não é por causa dos novos
membros que entram para suas fileiras, embora estes, no fim do século
XVIII, sejam um pouco mais numerosos do que de costume, mas sim em função
da época, da Revolução industrial que se delineia na França. com efeito,
é então que a alta nobreza, "nobreza de espada e nobreza dos cargos das
casas dos reis e dos príncipes", participa "de toda a espécie de grandes
empreendimentos lucrativos, quer se trate do comércio atlântico, de
habitações coloniais ou de explotações mineiras"77 . Essa nobreza dos
negócios daí em diante estará presente em todos os grandes pontos de
encontro da nova economia: as minas de Anzin, de Carmaux, as empresas
siderúrgicas de Niederbronn e do Creusot, as grandes sociedades
capitalistas que então proliferam e impulsionam o comércio marítimo. Não
é portanto de estranhar que esta nobreza, cuja fortuna continua enorme,
mude de opinião, se torne diferente, se aburguese, pareça renegar-se, se
torne liberal, deseje restringir o poder real, trabalhe para uma
revolução sem estrago nem tumultos, análoga à ruptura inglesa de 1688.
Evidentemente, o futuro lhe preparará amargas surpresas. Mas deixemos o
futuro. Durante os anos que precedem

89, é a economia que, ao transformar-se, transforma as estruturas e as


mentalidades da sociedade francesa, tal como fizera, muito mais cedo, na
Inglaterra ou na Holanda; mais cedo aindw no caso das cidades mercantis
da
Itália.
íMcronismo das conjunturas lais na Europa
Quem se admirará de que a economia tenha participação ativa na promoção
social?
O que é mais surpreendente é que, apesar das evidentes discrepâncias de
país para país, as conjunturas sociais, tais como as conjunturas
econômicas banais cujo movimento seguem ou traduzem, tendem a ser
sincrônicas em toda a Europa.
Por exemplo, o século XVI, em seu vigor, digamos, até cerca de 147O a
1580, é, a meu ver, em toda a Europa, um período de promoção social
acelerada, quase, em sua espontaneidade, um impulso biológico. A
burguesia oriunda da mercadoria chega por si só ao topo da sociedade da
época. A vivacidade da economia fabrica

- -Vffi, stu, V grandes fortunas comerciais, às vezes rápidas, e as


portas da promoção social estão todas abertas de par em par. Nos últimos
anos do século, pelo contrário, com a inversão da tendência secular, Ou
pelo menos com um entreciclo prolongado, as sociedades do continente
europeu vão trancar-se de novo. Na França, na
Itália, na Espanha, tudo se passa como se, no topo da sociedade
senhorial, depois de um período de ampla renovação das pessoas de posição
elevada, depois de uma série de nobilitações compensadoras, a porta ou a
escada da promoção social tornasse a fechar com certa eficácia. Isso
acontece na Borgonha 78.
Acontece em Roma78. Acontece na Espanha onde, nos vazios criados, se
precipitaram os regidores das cidades. Acontece também em Nápoles, onde
"se fabricaram alguns duques e príncipes que poderiam ter sido evitados'
979.
O processo é, portanto, generalizado. E duplo: durante esse longo século,
mal uma parte da nobreza desaparece, imediatamente é substituída, mas,
ocupado o lugar, as portas voltam a fechar-se atrás dos recém-chegados.
Então não há motivo para sermos céticos quando Pierre Goubert explica com
a Liga e as suas encarniçadas lutas a deterioração evidente da nobreza
francesa, sendo "de rejeitar a influência das condições econômicas, [...
1 especialmente a da conjuntura"81? Claro que não ponho de parte a
própria Liga e suas catástrofes que, aliás, de certo modo, se incorporam
no refluxo conjuntural do fim do século e são uma forma desse refluxo. É
mesmo normal que uma conjuntura assim assuma diferentes formas nas
diversas sociedades da Europa. A explicação de Georges
Huppert, a que voltarei, é específica da França, mas ainda assim está
ligada à ascensão econômica de uma nova classe, diretamente oriunda da
fortuna mercantil.
E este processo é geral. A conjuntura social e econômica é a mesma por
toda a parte no século XVI, ela é o mestre-de-obras. O mesmo acontecerá
no século
XVIII, quando a promoção social voltar a atuar plenamente, em toda a
Europa. Na
Espanha, a sátira ridiculariza os novos nobres, tão numerosos que já não
havia um rio, uma aldeia ou um campo a que não estivesse vinculado um
título nobiliário81.
)ria de Henri !ne
A teoria de Henri Pirenne sobre Les périodes de Phistoire sociale du
capita82

lisme, que conservou seu valor, coloca-se fora da explicação conjuntural.


Propõe a de um mecanismo social regular que se verificaria no âmbito de
atividades individuais, ou melhor, familiares.
O grande historiador belga, atento ao capitalismo pré-industrial que
reconhece na Europa já antes do Renascimento, observa que as famílias
mercantis duram pouco: duas, no máximo três gerações. Depois, abandonam a
profissão para ocupar, se tudo está correndo bem, situações menos
arriscadas e mais honoríficas, para comprar um cargo ou, com mais
freqüência ainda, uma terra senhorial, ou ambas as coisas. Não há,
portanto, dinastias capitalistas, conclui Pirenne: uma época tem os seus
capitalistas, a época seguinte já não terá os mesmos. Mal colhem os
frutos de uma estação que lhes foi favorável, os homens de negócios
apressam-se a desertar, ingressando, se possível, nas fileiras da nobreza
- e não só por ambiÇão social, mas porque o espírito que havia assegurado
o sucesso dos seus pais os torna incapazes de se adaptar às empresas dos
novos tempos.

F . A sociedade ou --o conjunto dos conjuntosEste ponto de vista foi


geralmente aceito, pois muitos são os fatos que o apóiam.
Herman KellenbenZ83, reportando-se às cidades do Norte da Alemanha, vê as
faniflias de mercadores, uma vez esgotada a sua força criadora ao cabo de
duas ou três gerações, passar gradualmente para uma vida tranqüila,
baseada nas rendas, desde logo preferindo aos seus balcões os bens
fundiários que lhes permitem a fácil obtenção de foros de nobreza. É
exato, principalmente na época em questão, os séculos XVI e XVII. Eu
apenas poria em discussão a expressão "força criadora" e a imagem do
empresário por ela sugerida.
Seja como for, com ou sem força criadora, tais recuos e translações são
de todas as épocas. Já em Barcelona, no século XV, os membros de velhas
dinastias mercantis, um dia, "passam para o estament dos honrats", numa
época em que viver de rendas não é por certo entre o gosto dominante do
meio barcelonêS84. Mais impressionante ainda é a relativa rapidez com que
desaparecem, como num alçapão, no Sul da Alemanha, "os nomes de prestígio
do século XVI, os Fugger, os Welser, os Hõchstetter, os Paumgartner, os
Manfich, os Haug, os Herwart de Augsburgo; ou os Tucher e os Iinhoff de
Nuremberg - e tantos outrosV85. J. Hexter86, a propósito do que ele chama
"o mito da classe média na Inglaterra dos Tudors", demonstra que cada
historiador considera as passagens graduais da burguesia mercantil para a
gentry e para a nobreza um fenômeno característico da "sua"
época - aquela que estuda -, ao passo que o fenômeno em questão é de
todos os tempos. E J. Hexter não tem dificuldades em prová-lo no tocante
à própria
Inglaterra. Na França, "não se queixam Colbert e Necker, com um século de
intervalo, dessa fuga constante dos homens de dinheiro para as posições
tranqüilas do proprietário fundiário e do fidalgo?"81 Em Rouen, no século
XVIII, desaparecem familias mercantis, seja porque se extinguem pura e
simplesmente, seja porque abandonam os negócios, trocando-os por cargos
da magistratura, como os Le Gendre (que têm a reputação local de ser a
mais rica família mercantil da
Europa), como os Planterose88... O mesmo se passa em Amsterdam. "Se
contarmos", diz um observador em 1788, "as boas casas [da cidade],
encontraremos muito poucas cujos antepassados tenham sido negociantes no
tempo da Revolução [15661648]. As casas antigas não mais subsistem: as
que atualmente fazem mais comércio são casas novas, estabelecidas e
formadas há não muito tempo; e é assim que o comércio passa continuamente
de uma casa para outra, porque se volta naturalmente para o mais ativo e
mais econômico daqueles que lhe são ligados."

89 Exemplos entre muitos outros. Mas com isso a questão estará dirimida?
Se esses desaparecimentos regulares das firmas comerciais se devem de
algum modo a um desgaste do espírito empresarial, cumpre concluir que a
conjuntura nada tem com isso? Mais ainda, ver nesse fenômeno o aspecto
social mais significativo do capitalismo, que representaria apenas um
momento da vida de uma linhagem familiar, é confundir comerciante com
capitalista. Ora, se todo grande comerciante é um capitalista, a
recíproca não é forçosamente verdadeira. Um capitalista pode ser um
financiador, um fabricante, um financista, um banqueiro, um rendeiro, um
administrador de fundos do Estado... Donde a possibilidade de etapas
internas, ou seja, um comerciante pode tornar-se banqueiro, um banqueiro
mudar para financista, uns e outros passarem a viver das rendas do
capital e assim sobreviver enquanto capitalistas, durante muitas
gerações. Os mercadores genoveses, que se tornam banqueiros e financistas
já antes do século XVI, atravessam indenes os séculos seguintes. O mesmo
se passa em Anisterdam:
cumpriria saber o que se tor

Despedidas no pdtio de uma casa de campo holandesa. Quadro de Pieter


Hooghe (c.

1675). (Clichê Giraudon.)


naram aquelas famílias que já não são mercantis, segundo a nossa
testemunha de

1778, se não terão passado para outro ramo da atividade capitalista, como
é provável, dado o contexto holandês do século XVIII. E mesmo quando esse
capital troca efetivamente a mercadoria pela terra ou pelo cargo, se
pudéssemos seguir durante tempo suficiente o seu caminho através do corpo
social, veríamos que não ficou ipsofacto definitivamente fora do circuito
capitalista, que há voltas à mercadoria, ao banco, às participações, aos
investimentos mobiliários ou imobiliários, até inJustriais ou mineiros,
às vezes estranhas aventuras, quando mais não seja por inermédio dos
casamentos e dos dotes "que fazem os capitais circularem"9'. Não
- espantoso ver, um século depois da colossal falência dos Bardi, alguns
dos seus lerdeiros diretos entre os sócios do banco Médicis919

Outro problema: no plano das etapas do capitalismo em que se coloca Henri


Pirerme, mais do que a família mercantil conta (ainda hoje) o grupo de
que ela faz )arte, que a apóia e, em suma, a alimenta. Se considerarmos
não os Fugger, mas odos os grandes mercadores de Augsburgo seus
contemporâneos, não a fortuna los Thélusson e dos Necker, mas a do banco
protestante, ficará realmente visível
Jue, periodicamente, um grupo substitui outro, mas que a duração de cada
episó

A sociedade ou --o conjunto aos conjuntos' dio é muito superior às duas


ou três gerações que, segundo Pirenne, seriam a norma e, sobretudo, que
as razões do abandono e da substituição são, mesmo desta vez,
conjunturais.
A única demonstração a este propósito (mas que conta) é a de G.
ChaussinandNogaret a respeito dos financistas do Languedoc 92, esses
homens que foram ao mesmo tempo empresários, banqueiros, armadores,
negociantes, fabricantes e, além do mais, financistas e oficiais das
finanças. Todos, ou quase todos, vêm do comércio, que por muito tempo foi
conduzido com prudência e sucesso. E todos se integram num sistema local
de negócios vinculados e de famílias aparentadas que se apóiam
estreitamente umas às outras. Se os observarmos numa das dioceses
(unidade administrativa) do Languedoc, veremos sucederem-se três
formações diferentes em suas composições, ligações de negócios e uniões
familiares. De ambos os lados, há ruptura e substituição, renovação dos
homens. A primeira formação, detectável de 152O a 1600, não vai além da
reviravolta conjuntural do fim do século XV1; a segunda, de 160O a

1670, perdura até os anos de mudança de 1660-1680; finalmente, uma


terceira prolongase de 167O a 1789, isto é, durante mais de um século. Em
linhas gerais, portanto, confirmam-se as intuições de Henri Pirenne, mas
é claro que se trata de movimentos coletivos, não de destinos
individuais; e de movimentos de duração bastante longa.
Enfim, só há etapas sociais do capital se a sociedade oferece uma opção:
a loja, o entreposto, o cargo, a terra, ou qualquer outra solução. Ora,
uma sociedade pode perfeitamente dizer não e obstruir os caminhos. Veja-
se o caso aberrante, mas significativo, dos mercadores e capitalistas
judeus: no Ocidente não lhes é permitido escolher entre o dinheiro, a
terra e o cargo. É certo que não somos obrigados a acreditar cegamente
nos seis séculos de duração do banco judaico dos
Norsa93 mas há muitas possibilidades de que ele tenha estabelecido um
máximo absoluto de longevidade. Os mercadores-banqueiros da índia estão
numa condição análoga, condenados por sua casta a permanecer na
manipulação exclusiva do dinheiro. Do mesmo modo, para os ricos
mercadores de Osaka, no Japão, o acesso à nobreza é dos mais restritos.
Conseqüentemente, ficam enleados na profissão. Em contrapartida, segundo
o último livro de André Raymond94, as famílias dos mercadores do Cairo
duram ainda menos do que o tempo das etapas assinaladas por
Henri Pirenne: a sociedade muçulmana devoraria seus capitalistas enquanto
jovens. Não foi também o que se passou durante a primeira fase, entre os
séculos
XVI e XVII, com a fortuna mercantil de Leipzig? Os seus ricos nem sempre
o são durante a vida inteira e seus herdeiros fogem literalmente às
carreiras para o refúgio das senhorias e para a vida tranqüila que eles
proporcionam. Mas não teremos aí como responsável, no início de um
processo de desenvolvimento, uma economia que vai aos trancos, brutal, e
não tanto a sociedade?
'rança, gentry ou ^eza de toga?
Em seu todo, qualquer sociedade deve normalmente a complexidade à sua
própria longevidade. É certo que varia, pode mesmo modificar-se
totalmente nurn dos seus setores, mas mantém obstinadamente as suas
opções e construções principais, evolui, de fato, bastante semelhante a
si própria. Portanto, se tentamos com

- - - -v-- -- conjuntoseendê-la, ela é ao mesmo tempo aquilo que foi, o


que é e o que há de ser, apresentacomo uma acumulação, a longo prazo, de
permanências e de alterações sucessiS. O exemplo, deveras complicado, da
alta sociedade francesa dos séculos
XVI KV11 mostra-se, a esse propósito, como um teste realmente válido. É
um caso iginal, por si só explicativo de um destino em particular, mas
que também testeinha, a seu modo, sobre as outras sociedades da Europa.
Tem, além disso, a vanYem, de ser esclarecido por numerosos estudos que o
excelente livro de George ippert, The French Gentry", reinterpreta com
vigor.
A palavra gentry para designar a parte superior de uma burguesia francesa
enuecida pelo comércio, mas que há uma ou duas gerações se situa fora da
loja do entreposto, emancipada, em suma, da mercadoria e da sua mácula,
sustentaem sua riqueza e abastança pela exploração de grandes
propriedades fundiárias, o comércio contínuo do dinheiro, pela compra de
cargos régios incorporados patrimônio de famílias prudentes,
parcimoniosas e conservadoras - esta palai gentry, obviamente aberrante,
desagradará todos os historiadores especialistas ;
realidades francesas daqueles séculos. Mas a discussão aberta a este
propósito p se revela benéfica; com efeito, ela propõe uma questão prévia
necessária: a
Inição de uma classe, de um grupo, de uma categoria, que se dirige em
marcha ta para a nobreza e seu tradicional triunfo social, uma classe
discreta e compli[a que nada tem a ver com a faustosa nobreza da corte,
nem com a deprimente Dreza de uma "nobreza rural", uma classe que, em
suma, evolui para a sua próa idéia de nobreza, para uma arte de viver que
lhe seja própria. Esta classe, ou categoria, reclama ao vocabulário dos
historiadores uma palavra ou uma exssão que facilmente a individualizem
no cortejo das formas sociais, entre Fran:o 1 e os primeiros tempos do
reinado de Luís XIV. Quem não quiser dizer gentry ipouco poderá dizer
alta burguesia.
A palavra burguesia teve a mesma sorte da palavra burguês, ambas em uso
certo desde o século XIL O burguês é o cidadão privilegiado de uma
cidade. s, conforme as regiões e as cidades francesas interrogadas, a
palavra só se proa no fim do século XVI ou no fim do século XV11; será
seguramente o século

111 que a generalizará e a Revolução que a tornará famosa. No lugar da


palavra guês, onde contaríamos com ela e onde às vezes aparece, a
expressão corrente por muito tempo honorable homme. Expressão com valor
de teste: designa ineelmente o primeiro escalão da promoção social, o
desnível, difícil de transpor, ^e a "condição da terra", a dos
camponeses, e a das profissões chamadas libeTais profissões são acima de
tudo as funções judiciárias, as dos advogados, procuradores, dos
notários. Entre uns e outros, muitos práticos foram formapor um confrade
mais velho e não passaram pela Universidade e, entre aqueles receberam
esses ensinamentos, muitos terão feito apenas estudos pro forma.
Lencem também a essas profissões honrosas os médicos e os cirurgiões
barbeie, entre estes, raros são os "cirurgiões de S. Cosme ou de toga
comprida", isto lídos das escolas96. Acrescentem-se os boticários que,
tal como os outros, trans'm muitas vezes as suas funções "dentro de uma
mesma família' 97. Mas, no io dos honorables hommes, embora não exerçam
as chamadas profissões libe, situam-se também, de pleno direito, os
mercadores, entendendo-se por tal, de erência (mas não exclusivamente),
os negociantes. Em Châteaudun, pelo meaparentemente, é marcante a
diferença entre o mercador burguês (o negocian! o mercador artesão (o
lojista)98.

Mas a profissão, por si só, não basta para criar a honorabilidade, é


preciso também que o privilegiado possua certa riqueza, disponha de
relativa abastança, viva com dignidade, tenha comprado algumas terras
perto da cidade e, condição sine qua non, more numa casa com "fachada
para a rua". Veja-se como a expressão ainda soa bem em nossos ouvidos. O
"frontão", "como hoje nas igrejas", explica
Littré,

6'compunha a fachada da casa", estabelecendo sua plena legitimidade...


Tal é, onde quer que o historiador o encontre, por toda a França, mesmo
nos burgos, retrospectivamente, nos parecem medíocres, o pequeno punhado
dos honorables hommes, acima da massa dos artesãos, dos pequenos
lojistas, dos "braços fortes" e dos camponeses dos arredores. A partir
dos arquivos notariais, é possível reconstituir a fortuna desses
privilegiados do primeiro grau. Nada têm a ver, evidentemente, com a
gentry em questão. Para atingi-Ia ou começar a avistá-la, é preciso subir
mais um escalão, atingir o patamar dos "nobles hommes". Cumpre
especificar que o "noble homme" não é juridicamente um nobre, é uma
denominação proveniente da vaidade e da realidade social. Mesmo que o
noble homme possua senhorias, mesmo que "viva nobremente, isto é, sem
exercer mister nem mercadoria", não pertence à verdadeira nobreza, mas a
uma "nobreza honorária, imprópria e imperfeita a que, por desprezo,
chamam Nobreza de cidade, e que, na verdade, é mais burguesia"99. Pelo
contrário, se, numa escritura notarial, o nosso "noble homme" é, além
disso, tratado por escudeiro, tem todas as possibilidades de ser
reconhecido como pertencente à nobreza.
Mas o fato de pertencer é mais um fato social do que um fato jurídico, um
fato social, isto é, oriundo espontaneamente da prática corrente.
Insistamos nessas condições normais de passagem para as fileiras da
nobreza. A partir de 1520, tais passagens se multiplicam, sem
dificuldades, de modo mais visível e mais amplo do que antes. Não poremos
em discussão as raríssimas cartas de nobreza, vendidas pelo rei, a compra
de cargos nobilitantes ou o exercício de funções do corpo de escabinos
que implicam a nobreza (chamada de campandrio). Transpõe-se a linha da
nobreza sobretudo por inquérito judicial, após simples audição de
testemunhas que dão garantias de que a pessoa em questão "vive
nobremente" (isto é, de rendas, sem trabalhar com as mãos) e que seus
pais e os pais dos seus pais também viveram, à vista de todos,
nobremente. Essas transições só são fáceis na medida em que a riqueza
crescente dos privilegiados permite um estilo de vida nobre, na medida em
que essas classes ascendentes têm a cumplicidade dos juízes que muitas
vezes são seus parentes, na medida, enfim, em que no século XVI, como já
vimos, a nobreza existente não cerra fileiras. Na França daquele tempo,
não há nada que possa recordar a fórmula de Peter Laslett100, segundo o
qual, entre nobres e não-nobres, a linha de demarcação seria tão brutal
como entre o Cristão e o Infiel. É de zonas fronteiriças transponíveis,
zonas de maquis, de no man's land que se deveria falar.
E o que complica tudo é que essa nova nobreza nem sempre tem o desejo de
se fundir nas fileiras da nobreza tradicional. Se Georges Huppert tem
razão, e é mais que provável que a tenha, os "nobles hommes" de alta
posição por certo não devem ser vistos com os traços do Bourgeois
gentilhomme. A data da primeira representação desta peça de Molière é
tardia (1670), estamos então longe da primavera do século XVI e a
caricatura é feita para agradar à nobreza da corte.
Claro que mestre Jourdain não é pura invenção, mas corresponde a uma
burguesia muito mediana e seria inexato ver os nossos quase nobres, ou já
nobres, do século XVI per

iindo com singular paixão a incorporação à nobreza "como se ela fosse o


elixir ida" 101. Que a vaidade social não lhesé alheia, disso não restam
dúvidas. Mas ião os leva a partilhar os gostos ou os preconceitos da
nobreza de espada; não em a menor admiração pela carreira das armas, pela
caça, pelos duelos; pelo rário, sentem desprezo pelo estilo de vida de
pessoas que consideram sem sabea nem cultas, um desprezo que não hesita
em exprimir-se, até por escrito. Aliás, a opinião de toda a burguesia, a
alta e a média, é unânime nesse ponto. [os dar a palavra a uma testemunha
tardia, Ourdard Coquault102, simples burde Reinis, mas mercador assaz
rico. Nas suas memórias, na data de 31 de agosto

550, escreve: "Tal é o estado, a vida e a condição desses senhores, os


fidalgos,

3e dizem de grande raça; e grande número da nobreza não vive muito


melhor, !rvem para maltratar e comer algum camponês na sua aldeia. Sem
comparaos honrados burgueses das cidades e bons mercadores são mais
nobres do que s eles: pois são mais indulgentes, levam melhor vida e dão
melhor exemplo, Família e casa mais regradas do que as deles, cada qual
conforme as suas posião dão azo a murmurações, pagam a quem trabalha para
eles e, sobretudo, a cometem ações covardes; e a maior parte destes
pequenos espadachins faprecisamente o contrário. Quando se trata de
comparações, julgam-se tudo o burguês só deve considerá-los com os olhos
com que os olham seus campo[... ] Nenhuma pessoa honrada faz caso deles.
É o estado presente do mundo, rião se deve procurar a virtude entre a
nobreza."
..'4ossos grandes burgueses tornados nobres continuam, de fato, a levar a
vida, vavam antes, equilibrada, sensata, entre suas belas residências
citadinas e seus [os ou residências campestres. A alegria de viver, o
orgulho deles são a sua ra humanista; suas delícias são suas bibliotecas,
ocorre o melhor de seus lazefronteira cultural que os envolve e melhor os
caracteriza é sua paixão pelo, pelo grego, pelo direito, pela história
antiga e pátria. Estão na origem da ío de inúmeras escolas laicas, nas
cidades e até nos burgos. Os únicos traços

1
- em comum com a nobreza autêntica são a recusa do trabalho e do
comérgosto pela ociosidade, isto é, pelo lazer para eles sinônimo de
leitura, de dises eruditas com os seus pares. Esta maneira de viver
implica, pelo menos, a inça, e geralmente esses novos nobres têm mais do
que abastança, têm uma fortuna de tríplice origem: a terra explorada com
método; a usura, praticada udo a expensas dos camponeses e fidalgos; os
cargos de magistratura e de, as, tornados transmissíveis e hereditários
desde antes da instauração da Ye, em 1604.
Todavia, mais do que de fortunas construídas, trata-se de fortu!rdadas.
Consolidadas, é certo, até ampliadas, já que dinheiro chama
dinheirmitindo êxitos e conquistas sociais. Mas, no início, a entrada em
órbita foi e a mesma:
a gentry saiu do comércio, o que procura esconder dos olhares retos e
deixa ciosamente na sombra.
Ião que enganem alguém! O Didrio de VEstoile111 nos relata - mas todos an
naquele tempo
Nicolas de Neufville,
- que senhor de Villeroi (1542-1617), ffio de Estado, à frente do governo
durante quase toda a sua vida, lutando maços de papéis [... 1 peles de
pergaminho...
riscos de pena' 1104 é neto de xcador de peixe que comprara três
senhorias em

1500, depois cargos, herdeicasamento da senhoria de Villeroi, perto de


Corbeil.
Georges Huppert cita ifinidade de exemplos análogos. Ninguém se deixa,
pois, enganar, porém,

Pierre Séguier (1588-1672) faz parte da nova --nobreza- que, no século


XVI, construiu uma fortuna sólida à custa da terra, dos cargos e da usura
(ver infra p. 530). Fará grande carreira política como servidor
incondicional da monarquia.
Chanceler a partir de 1635, juiz implacável no processo de Fouquet, é no
entanto um homem de cultura: poi .s não, escolheu ser representado de
livro na mão, na prestigiosa biblioteca que legará à abadia de Saint-
Germaindes-Prés? (Coleção
Viollet.)

uma vez, no século XVI, a soci'_pelo contrário, é sua cúmplice. E só


edade não cria obstáculo à promoção social, mação de uma verdadeira
classe de nesse clima é que se pode compreender a forgram mal na nobreza
'já existente novos nobres que não se integram ou se inteprópria rede de
relaçõe , apoiados em seu próprio poder
Político, na sua não se perpetuará. s no seio de um mesmo grupo. Fenômeno
anormal que, aliás,
Pois no século XVII tudo muda. A Pseudonobreza passara até aí Por duras e
dramáticas Provações: a Reforma, as Guerras religiosas, mas as
atravessara, nem protestante, nem "partidária da Liga", mas 4 galicana",
"política", seguindo a via exatamente do meio, onde se recebem golpes dos
dois lados, mas onde a manobra mantém os seus direitos. Após 1600, tudo
evolui, a atmosfera social, a economia, a política, a cultura. Já não se
fica nobre com algumas testemunhas depondo perante um juiz complacente; é
preciso fornecer títulos genealógicos, submeter-se a tremendas
investigações, e a nobreza já adquirida não está livre de verificações. A
mobilidade social que provia gentry francesa de homens tornase menos
natural e, sobretudo, menos abundante. Será porque a economia estava
menos ativa do que no século anterior? A monarquia, restaurada por
Henrique IV,
Richefleu e Luís XIV, torna-se opressiva, quer ser obedecida pelos seus
funcionários, a começar pelos próprios parlamentares. Além disso, o rei
tirou das dificuldades financeiras uma nobreza de corte, permitindo-lhe
viver, prosperar, ocupar o proscénio ao redor do Rei-Sol, um --rei de
teatro", dizia um dos seus familiares'05, mas o teatro conta, porque
reúne num círculo estreito e visível todas as possibilidades e
facilidades do poder. Essa nobreza de corte ergue-se contra a "de toga".
E esta colide não só com este obstáculo, mas também com a monarquia que
lhe confere a um só tempo o poder e seus limites. Eis todo o grupo de
nossos quase nobres numa posição ambígua, tanto no plano político como no
plano social. E, ainda por cima, é em parte contra ele que a
ContraReforma se enfurece, contra suas idéias e suas posições
intelectuais. O grupo estava de antemão do lado das Luzes, interessado
por uma certa racionalidade, prestes a inventar uma forma "científica" da
história106. Ora, tudo se inverte, tudo lhe corre contra a maré, e ei-lo
transformado em alvo preferido dos ataques dos jesuítas... Por isso terá
um Papel ambíguo e complexo quando explode o jansenismo e por ocasião da
Fronda. No princípio de 1649 e até a paz de Rueil (11 de março), os
parlamentares são os senhores de Paris "sem nada ousarem fazer com a sua
conquista' > 107.
É em meio a essas dificuldades, essas crises sucessivas que a gentry
pouco a pouco se transforma naquilo a que se vai chamar nobreza de toga,
a segunda nobreza, sempre contestada pela primeira sem nunca se confundir
com ela.
Doravante, haverá uma hierarquização nítida entre as duas nobrezas que o
jogo monárquico opõe uma à outra para melhor reinar. Decerto não foi por
acaso que a expressão nObreza de toga aparece apenas no princípio do
século XVII, quando muito em

1603108, segundo os recenseamentos atuais. Não é de desprezar esse


testemunho da linguagem. Termina então uma fase do destino da toga. Ei-la
mais bem definida, menos tranqüila e menos soberba, seguramente, do que
no século anterior, mas continua a pesar muito no destino da França. Para
se manter, utiliza todas as hierarquias: a hierarquia fundiária
(senhorial), a hierarquia do dinheiro, a hierarquia da Igreja, a
hierarquia do Estado (bailiados, presidiais, parlamentos, conselhos do
rei), mais as hierarquias, compensadoras com o tempo, da cultura.
Tudo isso complicado condicionado pela lentidão, or certo imobilismo, por
um sucesso adquirido graçs à perseverança. Para Georges Huppert, esta
nobreza

A sociedade ou --o conjunto dos conjuntos' de toga, desde as suas


origens, no século XVI, até a Revolução, esteve no cerne do destino da
França, "criando a sua cultura, gerindo a sua riqueza e inventando ao
mesmo tempo a Nação e as Luzes, inventando a França". Acodem ao espírito
tantos nomes célebres que é muito tentador endossar essa opinião. Mas com
uma importante restrição: essa classe frutuosa, expressão de uma certa
civilização francesa, a França inteira a sustentou com muito esforço,
pagou o preço do seu conforto, da sua estabilidade - ousaremos dizer da
sua inteligência? Foi a própria nobreza de toga que geriu esse capital
material e cultural. Para o bem do país? Isso é outra questão.
Não há, sem dúvida, um país da Europa que não tenha passado, de uma
maneira ou de outra, por tais desdobramentos no topo da hierarquia e por
esses conflitos, latentes ou abertos, entre uma classe que já chegou e
outra que está chegando. O livro de Georges Huppert tem, porém, a
vantagem de circunscrever com rigor as particularidades francesas, de
sublinhar a originalidade da nobreza de toga, em sua gênese e em seus
papéis políticos. E com isso chama proveitosamente a atenção para o
caráter único de cada evolução social. As causas são por toda a parte
muito próximas, mas as soluções diferem.
vs cidades aos Estados.- w e luxo ostentatório
Não há, portanto, muitas regras discerníveis no que se refere à
mobilidade social, às atitudes ante o prestígio do dinheiro, ou o
prestígio do nascimento e do título, ou o prestígio do poder. Desse ponto
de vista, as sociedades não têm nem a mesma idade, nem as mesmas
hierarquias, nem, coroando o todo, as mesmas mentalidades.
No que se refere à Europa, há ainda assim uma distinção visível entre
duas grandes categorias: de um lado, as sociedades urbanas, entendendo-se
por tal as sociedades das cidades comerciais, precocemente enriquecidas,
da Itália, dos
Países Baixos e até da Alemanha e, do outro, as sociedades de raio amplo
dos
Estados territoriais que lentamente se libertaram (e nem sempre) de um
passado medieval cujas marcas às vezes conservavam ainda há pouco. Há não
mais de um século escrevia Proudhon: no "organismo econômico tal como no
corpo político real, na administração da justiça, na instrução pública, a
feudalidade ainda nos asfixia" 109.
Tem-se dito e repetido que alguns traços fortes distinguiram esses dois
universos. Poderíamos dar umas cem versões, antigas ou modernas, dessa
observação de um documento francês de cerca de 1702: "Nos Estados
monárquicos, os mercadores não conseguem chegar por si sós aos mesmos
graus de consideração que teriam nos Estados em República, onde,
geralmente, são negociantes que governam.>11O Mas não vamos insistir
nesta idéia evidente que não surpreenderá ninguém. Estejamos simplesmente
atentos ao comportamento das elites conforme se situem numa cidade há
muito trabalhada pelos tráficos e pelo dinheiro, ou nos grandes Estados
territoriais onde a Corte (a da Inglaterra ou a da França, por exemplo)
dá o torn a toda a sociedade. "A cidade [leia-se Paris], diz-se,
macaqueia a Corte., "" Em resumo, uma cidade governada por mercadores
viverá de uma maneira diferente daquela que é governada por um príncipe.
Um arbitrista espanhol (isto é, um conselheiro, freqüentemente propenso a
moralizar), Luiz
Ortiz, contemporâneo de Fi435

ulheres mascaradas em Veneza. Quadro de Pietro Longhi (1702-1785). (Roger


Viollet.)
)e II, o diz sem rodeios. Estamos em 1558, numa Espanha muito inquieta; o
rei, lipe II, está ausente do reino, nos Países Baixos onde o prendem as
necessidades guerra e da política internacional. Em Valladolid, ainda por
uns tempos capital
Espanha, o luxo, a ostentação, as peles, as sedas, os perfumes caros são
a nora, apesar das dificuldades do momento e dos dramas da vida cara. No
entanto, rifica o nosso espanhol, tal luxo não existe nem em Florença,
nem em Gênova, m nos
Países Baixos, nem mesmo no mercantil Portugal vizinho: "En Portugal, gun
viste seda", ninguém veste seda' 12. Mas Lisboa é uma cidade mercante, dá
torn a
Portugal.
Nos Estados-cidades da Itália, depressa tomados pelos mercadores (Milão
em
29, Florença em 1289, Veneza pelo menos em 1297), o dinheiro é o cimento
efiz e discreto da ordem social, "a cola forte", como diziam os
tipógrafos parisien, do século XvIIII13. Para governar, o patriciado não
tem grande necessidade deslumbrar, de fascinar. Segura as rédeas do
dinheiro e isso basta. Não que igre o luxo, mas este esforça-se por ser
discreto ou mesmo secreto. Em Veneza,

A sociedade ou --o conjunto dos conjuntoso nobre usa uma longa toga negra
que nem sequer é sinal de sua posição, uma vez que, COMO explica Cesare
VecelliO, nos comentários da sua coletânea de "habiti antichi e moderni
di diverse~ del mundo" (fim do século XVI), a toga é também vestida pelos
'Icittadini, dottori, mercanti et altri". Os jovens nobres, acrescenta,
gostam de usar embaixo da toga negra roupas de seda de cores delicadas,
mas dissimulam tanto quanto possível essas manchas de cor "per una certa
modestia propria di quella Republica"... Não é portanto involuntária a
ausência de ostentação do vestuário por parte do patrício veneziano.
Também o uso da máscara, que não é reservado apenas ao Carnaval e às
festas públicas, é uma maneira de se perder no anonimato, de se misturar
com a multidão, de se divertir sem se exibir. As venezianas nobres
utilizam-na para irem aos cafés, a lugares públicos em princípio
proibidos às senhoras de sua posição. "A máscara, que comodidade!", dizia
Goldoni. "Por trás da máscara, todos são iguais e os principais
magistrados podem diariamente [... ] averiguar pessoalmente todos os
pormenores que interessam ao povo. [... ] Por trás da máscara pode estar
o Doge, que assim passeia muitas vezes." Em Veneza, o luxo é reservado ao
aparelho público, em geral grandioso, ou à vida estritamente privada. Em
Gênova, os nobili vestem-se com certa severidade. As festas decorrem
discretamente nas casas de campo ou no interior dos palácios urbanos, mas
não nas ruas ou nas praças públicas. Bem sei que em Florença, com o
século XVII, se instala o luxo das carruagens, impensável em Veneza,
naturalmente, impossível em Gênova, com as suas ruas estreitas, mas a
Florença republicana morreu com o regresso de
Alexandre de Médicis, em 1530, e a criação do grão-ducado da Toscana, em
1569.
No entanto, mesmo nessa época, Florença vive com simplicidade, quase
burguesmente, aos olhos de um espanhol. Do mesmo modo, o que faz de
Amsterdam a derradeira polis da Europa é, entre outras coisas, a modéstia
voluntária dos seus ricos que impressiona até os visitantes venezianos.
Numa rua de Amsterdam, quem é capaz de distinguir o Grande Pensionário da
Holanda dos outros burgueses com que cruza1149

Passar de Amsterdam ou de uma das cida des italianas de antiga riqueza


para a capital de um Estado moderno ou para a corte de um príncipe é
mudar absolutamente de atmosfera. Aqui, a modéstia ou a discrição já não
são convenientes. A nobreza, que ocupa as primeiras fileiras sociais,
deixa-se deslumbrar pela magnificência dos príncipes e quer por sua vez
deslumbrar.
Pavoneia-se, é obrigada a exibirse. Brilhar é impor-se, destacar-se do
comum dos mortais, marcar, de uma maneira quase ritual, que se é de outra
raça, manter os outros a distância. Contrariamente ao privilégio do
dinheiro, que é óbvio, que se tem na mão, o privilégio do nascimento e da
posição só tem valor na medida em que é reconhecido pelos outros. Se o
príncipe RadziwilI, na Polônia, no século das Luzes, capaz de reunir
sozinho (como em 1750) um exército e de o dotar de artilharia, se põe um
dia a distribuir vinho a rodo na sua pequena cidade de
Niewicz "aparenternente indiferente à quantidade que se derrama e se
perde na sarjeta", é, observa W. Kula, para impressionar os espectadores
(o vinho, na
Polônia, é um artigo de importação caríssimo), para "fazer crer nas suas
possibilidades ilimitadas, conquistar a docilidade deles para com as suas
vontades [... 1 Tal esbanjamento é portanto um ato racional, no âmbito de
uma dada estrutura sociaI"115. A mesma ostentação em Nápoles: no tempo de
Toramaso
Campanella, o revolucionário de alma iluminada da Città del sole (1602),
costumava-se dizer que Fabrizio Carafa, príncipe Della Rocella, gastava
seu dinheiro "alla

437

o que no século XVIII, e sobretudo durante o longo reinado de Jorge In

50-1820), os ricos e os poderosos da Inglaterra em breve passam a


preferir ao rato o luxo do conforto. Simon Vorontsof, embaixador de
Catarina 11 123, haado aos faustos emproados da Corte de São Petersburgo,
saboreia a liberdade ;e mundo "onde se vive como se quer e não há a menor
formalidade de etiqueta negócios".
Mas isso não quer dizer que a ordem social inglesa fique claramente nida
com essas observações. Na realidade, trata-se de uma ordem complexa e
rsificada, desde que observada com vagar. A nobreza, ou melhor, a
aristocranglesa, tendo chegado ao topo da hierarquia social a partir,
grosso modo, da )rma, é de estirpe recente. Mas, por mil razões em que o
interesse conta, dá-se de aristocracia fundiária. Uma grande família
inglesa só é fundada a partir m vasto domínio e, no centro desse domínio,
o sinal do sucesso é uma residênm geral principesca. É uma aristocracia
ao mesmo tempo, como alguém disse, tocrática e feudal". Enquanto feudal,
reveste-se do indispensável lustre, um ) teatral. Em

1766, em Abingdon, instalam-se novos senhores e "oferecem uma ção a


várias centenas de gentlemen, de rendeiros, de habitantes das vizinhanOs
sinos repicam com toda a força". Passa um cortejo a cavalo precedido de
irras, à noite iluminações... 121. Não há nada de "burguês" nesse
espalhafato palhafato por certo necessário, socialmente falando, quanto
mais não fosse estabelecer o indispensável poder local da aristocracia.
Mas esse jogo faustoso, xclui o gosto e a prática dos negócios. Desde o
tempo de Elizabeth que a alta ma dos peers é a que mais gosta de investir
no comércio de longa distância125. 'a Holanda, as coisas decorreram de
outro modo, foram os Regentes das ci;, aqueles a que na
França se chamaria "nobreza de campanário", que se insun no topo da
hierarquia.
Constituem uma aristocracia burguesa.
qa França, tal como na Inglaterra, o espetáculo é bastante complicado: a
evoé diferente na capital - dominada pela Corte - e nas cidades
comerciais, )mam consciência da sua crescente força e da sua
originalidade. Os negocianoos de
Toulouse, de Lyon ou de Bordeaux ostentam pouco o seu luxo. vam-no para o
interior das suas belas casas urbanas e, mais ainda, "para suas ncias
campestres, as casas de recreio à volta das cidades, no raio de um dia
LIO-126.
Em Paris, pelo contrário, os riquíssimos financistas do século XVIII
penharão em exagerar e imitar o luxo que os rodeia e em copiar o tipo de
[a mais alta nobreza.
massa da sociedade subjacente é mantida na rede da ordem estabelecida.
nexe demais, as malhas são apertadas e reforçadas, ou então se inventam
maneiras de esticar a rede. O Estado está lá para salvar a desigualdade,
pontal da ordem social. Lá estão a cultura e quem a represente, quase
sempre regar a resignação, a submissão, a sensatez, a obrigação de dar a
César o le César. O melhor ainda e que a massa "orgânica" da sociedade
evolua ó dentro de limites que não comprometam o equilíbrio geral. Não é
proibife 'um degrau in rior da hierarquia para o degrau baixo
imediatamente supe

r A SOCtedade OU ""o conjunto aos conjuntos' rior. A mobilidade social


não funciona apenas na fase mais elevada da ascensão; também funciona na
passagem de camponês para mercador lavrador, para manda-chuva da aldeia;
ou de manda-chuva da aldeia para pequeno senhor local, para
"adjudicatários de direitos, rendeiros à inglesa, essas sementes fecundas
da burguesia', 127 OU no acesso do pequeno-burguês aos cargos, às rendas.
Em
Vèneza128 "aquele cujo nome não figurasse nos registros de uma confraria
[Scuola] era considerado o último dos homens". Mas nada impedia que ele
ou um dos seus filhos entrasse pelo menos para uma Arte, para um corpo de
ofícios e transpusesse uma primeira etapa.
Todos esses pequenos dramas da "etapa" social, essas lutas para "el ser
quien soy11, para ser quem sou, como diz um personagem de um romance
picaresco (1624)129, podem ser lidos como sinais de certa consciência de
classe. Aliás, provam-no as revoltas 13O contra a ordem estabelecida, que
são inúmeras. YvesMarie Bercé arrolou, no território da Aquitânia, entre
159O e 1715, quinhentas insurreições ou pseudo-insurreições camponesas.
De 1301 a 1550, num levantamento que abrange uma centena de cidades
alemãs, verificam-se duzentos choques, muitas vezes sangrentos. Em Lyon,
de 1173 a 1530, em 357 anos, os tumultos se elevam a

126 (um pouco mais de um para cada três anos). Podemos chamar a estes
choques ou a estas tumultuosas revoltas, motins, tensões, lutas de
classes, incidentes, brigas populares - mas alguns têm tal vigor selvagem
que só lhes convém a palavra revolução. Na escala da Europa, ao longo dos
cinco séculos que este livro abarca, tratase de dezenas de milhares de
fatos, ainda nem todos rotulados como conviria, nem todos ainda retirados
dos arquivos onde dormem. As pesquisas até agora realizadas permitem
porém algumas conclusões, com possibilidades de exatidão no que se refere
aos tumultos camponeses, com muitas possibilidades de engano, em
contrapartida, no que concerne às agitações operárias, essencialmente
urbanas.
Quanto aos tumultos camponeses, e no que concerne à França, foi realizado
um enorme trabalho a partir do livro revolucionário de Boris Porchnev
131. Mas é evidente que a França não é o único caso a considerar, se bem
que, por causa dos historiadores, se tenha tornado, por ora, exemplar.
Seja como for, não há erro possível quanto ao conjunto dos fatos
conhecidos: o mundo camponês não pára de lutar contra o que o oprime, o
Estado, o senhor, as circunstâncias externas, as conjunturas
desfavoráveis, os bandos armados, contra o que o ameaça ou, pelo menos,
incomoda as pequenas comunidades aldeãs, condição da sua liberdade. E
tudo isso tende a unificarse em sua mente. Por volta de 1530, um senhor
manda seus porcos para os bosques comunitários, e uma pequena aldeia do
condado napolitano de Nolise subleva-se para defender seus direitos de
pasto aos gritos de: " Viva il popolo e muora il signore!'Y 13 Donde uma
série contínua de incidentes que dão testemunho das mentalidades
tradicionais, das particulares condições de vida do camponês, e isso até
meados do século XIX. Se, como observava Ingomar Bog, procurarmos uma
ilustração do que possa ser a "longa duração", suas repetições, seu
lenga-lenga, sua monotonia, a história dos camponeses fornecerá com
abundância exemplos perfeitos 133.
A primeira leitura dessa vastíssima história deixa a impressão de que
toda essa agitação nunca acalmada quase consegue triunfar. Revoltar-se é
"cuspir para o alto-134: ai.acquerie da ile-de-France, em 1358; a
sublevação dos trabalhadores ingleses, em 1381: a Bauernkrieg, em 1525; a
revolta das comunas da Guyenne contra a gabela, em 1548; a violenta
sublevação de Bolotnikov, na Rússia, no princípio do século XVII; a
insurreição de Dosza, na Hungria (1614); a enorme guerra camponesa que
sacode o reino de Nápoles em 1647 - todos esses furiosos surtos fra441

meses atacam um soldado isolado, Jean de Wavrin. Crônicas de Inglaterra,


século :7ichê B.N.)
n regularmente. Assim como os motins menores que conscientemente vão tea
teia.
Em suma, a ordem estabelecida não pode tolerar a desordem campojue, dado
o enorme predomínio dos campos, deitaria abaixo todo o edifício -iedade e
da economia. Contra o camponês, há coligação quase constante do o, dos
nobres, dos proprietários burgueses, até da Igreja e seguramente das.s.
Nem por isso o fogo deixa de estar latente sob as cinzas.
, ontudo, o fracasso é menos completo do que parece. O camponês é sempre
iente reconduzido à obediência, é certo, mas por mais de uma vez alguns
pro

gressos foram adquiridos no termo destas rebeliões. Não asseguraram os


Jacques, em 1358, a liberdade camponesa nas cercanias de Paris? A
deserção, depois o repovoamento dessa região capital talvez não bastem
para explicar totalmente o processo dessa liberdade uma vez adquirida e
depois retomada e conservada. A
Bauernkrieg de 1525, um fracasso total? Nem tanto. O camponês revoltado,
entre o
Reno e o Elba, não se tornou, como o camponês de além-Elba, um novo
servo;
salvaguardou suas liberdades, seus antigos direitos. Em 1548135, a
Guyenne é esmagada, é verdade, mas a gabela é suprimida. Ora, com o
imposto do sal, a monarquia destruía, abria à força a economia aldeã para
o exterior. Dir-se-á também que a ampla revolução dos campos no outono e
durante o inverno de 1789

fracassou de certo modo: quem se apoderará dos bens nacionais? Todavia, a


supressão dos direitos feudais não foi um presente irrisório.
Quanto aos tumultos operários, estamos tanto mais mal informados quanto
os fatos são muito dispersos, dada a instabilidade congénita do emprego e
a derrocada regular das atividades "industriais". O mundo operário é
incessantemente concentrado, depois dispersado, empurrado para outros
lugares de trabalho, às vezes para outras ocupações, e isso priva a
agitação operária da estabilidade das solidariedades, condição do
sucesso. Assim, o início do desenvolvimento dos fustões lyoneses,
imitação das tramas do Milanês e do Piemonte, fora muito rápido e
empregava até 2 mil mestres e operários. Depois, foi a decadência, até a
derrocada, ainda por cima numa época de carestia. "Os operários desta
arte, como ganham pouco, já não estão em condições de viver na cidade;
tendo-se alguns [... ] retirado para o Forez e para o Beaujolais onde
trabalham", mas em tão más condições que seus produtos "já não têm a
menor reputação"136. A indústria dos fustões, com efeito, mudou-se,
encontrou novos centros, em Marselha e em
Flandres. E o relatório de 1698 que temos seguido conclui: "A ruína desta
fábrica é uma perda para Lyon, tanto mais sensível quanto ainda se vêem
por lá uma parte dos operários, todos indigentes, quase inúteis, a cargo
do público.' 1

Se tivesse havido - o que ignoramos - um movimento reivindicativo


qualquer entre os 2 mil trabalhadores têxteis de Lyon, ter-se-ia
extinguido por si só.
Outra fraqueza: a concentração do trabalho operário continua imperfeita,
na medida em que a mão-de-obra se apresenta, o mais das vezes, em
pequenas unidades (mesmo no interior de uma cidade industrial), na
medida, também, em que o operário (o companheiro) gosta de ser
itinerante, ou então está entre o campo e a cidade, ao mesmo tempo
camponês e assalariado. Quanto ao mundo citadino do trabalho, em toda a
parte está dividido contra si próprio, imobilizado em parte pelo jugo das
antigas corporações e do privilégio -cerrado e mesquinho dos mestres. Um
pouco por toda a parte, esboça-se o trabalho livre, mas também ele não
está impregnado pela coesão: no topo, privilégios relativos, os artesãos
"salariantes", que trabalham para um patrão mas dão, por sua vez,
trabalho para companheiros e serventes mais ou menos numerosos (são,
afinal, subcontratadores); abaixo deles, aqueles que, nas mesmas
condições, só podem contar com a mão-de-obra familiar; finalmente, o
amplo universo dos operários assalariados e, ainda abaixo, os diaristas
sem formação particular, carregadores, moços de recados, trabalhadores
braçais, "ganhadeiros", dos quais os mais afortunados são pagos por dia,
os mais desfavorecidos por tarefa.
Nessas condições, é natural que a história das reivindicações e
movimentos operários se apresente numa série de episódios curtos sem
muitas conexões entre si e Pouca continuidade. É uma história puntiforme.
Concluir, como tantas vezes se tem feito, pela ausência de qualquer
mentalidade de classe é provavelmente um

julgar por episódios que conhecemos razoavelmente. A verdade é que todo o


operário está imobilizado entre uma remuneração medíocre e a ameaça
lesemprego sem remédio. Só pela violência poderia libertar-se, mas, na
rea-ncontra-se tão desarmado como um operário atual num período de
desemgudo. Violência, cólera, rancor, nem por isso é menos verdade que
para cesso, ou meio sucesso, como o foi o caso particular dos operários
do, na França, às vésperas da Revolução, cem tentativas fracassam. Não se
n facilmente esses muros.
Lyon 1^ o primeiro prelo estaria instalado em 1473. Em 1539, na véspera
eira grande greve (não a primeira agitação), estão em ação uns cem prelos
pressupõe, entre aprendizes, companheiros (compositores, empregados, e
mestres, uns mil trabalhadores - vindos, na sua maior parte, de outras
rancesas ou da
Alemanha, da Itália, dos Cantões suíços, todos, portanto, de Lyon. Trata-
se de pequenas oficinas. Os mestres, habitualmente, posis prelos, e
alguns com mais sucesso chegam a ter seis. O material que se nir é sempre
caro; depois, é preciso dispor de um capital de giro para pagar para as
compras de papel e de tipos. Todavia (e disto não se dão conta xios), os
mestres não são os verdadeiros representantes do capital: estão, vez, nas
mãos dos mercadores, dos "editores", personagens assaz impordguns não
fazem parte do Consulat, ou seja, do governo da cidade. Inútil tar que as
autoridades estão do lado dos editores e que os mestres, quer quer não,
tratam com deferência esses homens poderosos de que depenra eles, a única
maneira de viver e aumentar proventos é, afinal, reduzir :>s, aumentar o
tempo de trabalho, e, nesta política, o apoio das autoridaesas é
precioso, indispensável.
nto aos meios, há mais que um. Primeiro, mudar de modo de pagamento: -s
os alimentam e os víveres não param de subir; então, ele afastará esses "
da mesa dele e lhes pagará unicamente com dinheiro, condenando-os a r-se,
sem prazer, nas tabernas. E ei-los horrivelmente vexados por serem da
mesa do mestre. Outra solução oblíqua: recorrer a aprendizes que não s e
deixá-los, se necessário, manejar o prelo, o que, em princípio, lhes está
Mais diretamente: diferenciar os salários fixos abrindo o leque das remuo
mais baixo possível: oito soldos por dia para o compositor, dois e meio
soldos para o servente. Finalmente, exigir deles jornadas intermináveis,
horas da manhã às dez horas da noite com quatro horas de pausa para, Ses
(é possível acreditar?), tendo cada um a obrigação de imprimir mais olhas
por dia! Compreende-se que os jovens tenham protestado, reclamaires
condições de trabalho, denunciado os ganhos imoderados do mestre.
Lham recorrido à arma da greve. Fazer greve é dizer 'Wic`39: os
comparonunciam esta palavra mágica ao sair da loja quando, por exemplo,
um por ordem do mestre, se põe a operar o prelo, ou em outra ocasião. E
o: os grevistas sovam os "furadores", a que chamamfourfants (da
palaiafurfante, Patife, malandro); lançam panfletos, movem ações
judiciais.

:'Melhor ainda, abandonando a antiga confraria dos tipógrafos que, no


princípio do século XVI, reunia mestres e operários, formaram a sua
própria associação, chaniada dos Griffarins (de uma velha palavra
francesa que significa glutão), e para a sua propaganda criaram, nas
festas regulares e nos cortejos burlescos da boa cidade de Lyon, o
personagem grotesco mas que todos cumprimentarão e reconhecerão ao
passar, o senhor da Concha. Não admira muito que tenham perdido, voltado
a perder em 1572, depois de ganharem alguma coisa.
O que impressiona, em contrapartida, é que tudo, nesse minúsculo
conflito, se reporta a uma franca modernidade. É verdade que a tipografia
é um ofício modemo, capitalista, e por toda a parte - em Paris, nas
mesmas datas, de 1539 e

1572, em Genebra em cerca de 1560, e em Veneza, na casa de Aldo Manuzio,


já em

1504 -, como as mesmas causas produzem os mesmos efeitos, se


desencadearam greves e tumultos significativos 140.

4 W testemunho, tal precocidade não são excepcionais. Não deveria o


Trabalho sentir-se logo de início, mais cedo do que se costuma dizer, de
natureza diferente do Capital? A indústria têxtil, implantada cedo, com
seus fornecedores de trabalho e suas concentrações anormais de mão-de-
obra, é um campo muito favorável a essas tomadas de consciência precoces
e repetidas. É o que vemos em
Leyde, poderosa cidade manufatureira do século XVII. Vemo-lo também, não
tão claro, em 1738, em Sarum, no coração da velha indústria de lanificios
do
Wiltshire, perto de Bristol.
A característica de Leyde141 não é apenas ser, no século XVII, maior
cidade têxtil da Europa (em cerca de 1670, talvez 7O mil habitantes, dos
quais 45 mil operários; em 1664, ano recorde, quase 15O mil peças
produzidas), ter atraído a si, para impulsionar sua produção, milhares de
operários vindos do sul dos
Países Baixos meridionais e do norte da França - sua característica é
realizar sozinha as diferentes tarefas exigidas pela fabricação de suas
lãs, baetas e sarjetas. Não devemos imaginá-la, como Norwich ou como a
Florença da Idade
Média, largamente apoiada na tecelagem ou mesmo na fiação dos campos
circundantes. Estes são muito ricos: exportam o produto das suas terras
para o mercado vantajoso e insaciável de Amsterdam. E, como é sabido, só
os campos pobres aceitam amplamente o trabalho a domicílio. Aí temos
portanto, em meados do século XVII, época da sua grandeza, uma cidade
industriosa condenada a fazer tudo e fazendo realmente tudo sozinha,
desde a lavagem, cardagem e fiação da lã até a tecelagem, pisoamento,
tosadura e acabamento dos panos. Só o consegue empregando uma mão-de-obra
numerosa. Difícil é alojá-la decentemente: os operários não cabem todos
nas verdadeiras cidades operárias construídas para eles. Muitos são os
que se amontoam em quartos alugados por semana ou por mês.
Mulheres e crianças fornecem grande parte da mão-de-obra necessária. E,
como tudo isso não basta, surgem as máquinas: moinhos de pisão movidos
por cavalos Ou pelo vento, máquinas que se impõem nas grandes oficinas
"para a prensagem, calandragem, secagem" das lãs. Os quadros conservados
no museu da cidade e que outrora ornamentavam o Lakenhall - o mercado dos
panos - falam com clareza desta relativa mecanização de uma indústria
puramente urbana.
Tudo isso sob um imperativo evidente: enquanto Amsterdam fabrica tecidos
de luxo e Haarlem se aplica em seguir a moda, Leyde especializa-se no
têxtil barato, a partir de lãs de qualidade inferior. É sempre preciso
comprimir os custos. Por isso o regime corporativo, que se mantém,
permite que se desenvolvam paralela

wrbana em Leydé.- rocas deflar. Este quadro de Isaac van Swanenburgh


(1538-1614)
le uma série que ilustrava o trabalho da lã, no mercado dos panos de
Leydê. Caa de todos os quadros: uma mecanização tão avançada quanto a
técnica da época i.
(Foto A. Dingian.)
ipresas novas, oficinas, já manufaturas, e o trabalho a domicílio, que é
amente explorado, ganha terreno. Como a cidade cresceu depressa (em a
apenas 12 mil habitantes), não construiu, apesar da fortuna de
alguns.mpresários, os quadros do seu próprio capitalismo. Toda a
atividade de semboca nos mercadores de
Amsterdam, que a controlam solidamente. :oncentração operária só podia
favorecer o confronto e os choques entre Trabalho. Sendo numerosíssima, a
população operária de Leyde não por de ser inquieta e agitada, tanto mais
que os empresários da cidade não urso de se voltar, em caso de
necessidade, para a mãode-obra dos camfácil tip rJ;r;"; fN P-- - Haia, ou
pelo cônsul que mora em Amstei

descontentamentos crônicos, na expectativa nem sempre frustrada de tirar


alguns operários para reforçar as manufaturas francesas142. Em suma: se
há na Europa >unia cidade verdadeiramente "industrial", uma concentração
operária verdadeira1, mente urbana, é realmente essa.
Nada mais natural que rebentem greves. Tripla surpresa, porém: serem
essas greves tão pouco numerosas, segundo o levantamento rigoroso de
Posthumus (1619,
1637, 1644, 1648, 1700, 1701); serem episódicas e relativas apenas a um
ou outro grupo operário, por exemplo tecelões e pisoeiros, salvo os
movimentos de 1644 e de 1701, que tiveram foros de movimentos de massas;
enfim, e sobretudo, estarem tão mal esclarecidas pela pesquisa histórica,
decerto por falta de documentação.
Temos, pois, de nos render à evidência: o proletariado operário de Leyde
dividese em categorias funcionais - o pisoeiro não é o fiandeiro ou o
tecelão.
Está integrado, parte em corporações sem grande solidez, parte no âmbito
de um artesanato livre (na realidade rigorosamente vigiado e controlado).
Nessas condições, não consegue criar em seu favor uma coesão que seria
perigosa para aqueles que o dirigem e exploram, os mestres manufatureiros
e, acima desses patrões próximos, os mercadores que dirigem todo o jogo.
No entanto, há assembléias regulares de operários e uma espécie de
cotizações que alimentam as caixas beneficentes.
Mas a característica dominante da organização do têxtil em Leyde é
realmente a força implacável dos meios de coerção existentes: vigilância,
repressão, prisões, execuções capitais são uma ameaça constante. Os
regentes da cidade são ferozmente a favor dos privilegiados. Mais ainda,
os fabricantes agrupam-se numa espécie de cartel que se estende a toda a
Holanda e até ao conjunto das
Províncias Unidas. Não se reúnem de dois em dois anos num "sínodo" geral
para eliminar as concorrências nocivas, fixar os preços e salários e,
eventualmente, decidir que medidas tomar contra os tumultos operários,
reais ou possiveis. Esta organização moderna leva Posthumus a concluir
que, no plano dos patrões, a luta das classes é ao mesmo tempo mais
consciente e mais combativa do que no nível dos trabalhadores. Mas não
será uma impressão de historiador atido à sua documentação? Embora os
operários não nos tenham deixado muitas provas das suas lutas e dos seus
sentimentos, não terão ainda assim, como a situação os obrigava, pensado
nisso? Qualquer organização operária oficialmente destinada a defender os
interesses da mão-de-obra era proibida. Nas assembléias regulares que
realizavam, os operários não podiam, portanto, agir nem falar livremente.
Mas a reação patronal, por si só, prova que o silêncio deles certamente
não era indiferença, ignorância ou aceitação143.
O último episódio que gostaríamos de evocar é muito diferente. Trata-se
de uma indústria mais modesta e muito mais conforme, em sua organização,
às normas da época. Mais representativa, portanto, de certo modo, do que
o caso monstruoso de
Leyde.
Estamos em Sarum, no Wiltshire, não longe de Bristol, em 1738. Sarum fica
no centro de uma velha zona de atividade vinculada à lã, sob o controle
dos donos de lanificios, mais mercadores do que manufatureiros, os
clothiers. Surge uma curta revolta. Alguns dos bens dos clothiers são
saqueados. A repressão é rápida, três amotinados são enforcados, a ordem
é restabelecida. Mas não se trata de um incidente sem conseqüências.

Para começar, nesse Sudoeste inglês onde se situa a cólera de 1738, a


agitação ;ocial é freqüente, pelo menos desde 1720. Foi lá que nasceu a
canção popular,
The :Yothiers Delight, a que Paul Mantoux deu fama no seu livro
cláSsico144.
Remona decerto ao reinado de Guilherme de Orange (1688-1702). É,
portanto, uma canào relativamente antiga, cantada e recantada nas
tabernas durante anos a fio.
Nea, pretensos fabricantes de fazendas de lã contam, confidencialmente,
seus atos procedimentos, suas satisfações e inquietações. "Acumulamos
tesouros", canam eles, "ganhamos enormes riquezas, à custa de despojar e
oprimir os pobres... 1 É graças ao trabalho deles que nós enchemos a
bolsa." Não é difícil pagar mal we trabalho, ou descobrir na obra
defeitos, mesmo que inexistentes, baixar os saários "dando a entender que
o comércio vai mal. [ ... ] Se melhorar, [os trabalha[ores] nunca
perceberão". Não vão as peças que entregam para alémmar, para aíses
distantes fora do seu controle? O que é que podem saber, esses pobres-
diabos [ue trabalham dia e noite? E, depois, só podem escolher entre
"esse trabalho e a usência de trabalho".
Outro pequeno fato significativo: o incidente de 1738 enseja, em 1739 e
1740, publicação de panfletos que não são de redação operária, mas obra
de bons apósDIos desejosos de restabelecer a harmonia. Se tudo corre mal
no ofício, não será w causa da concorrência estrangeira, particularmente
da França? Claro que os "trões deveriam modificar a atitude, mas, enfim,
não podemos "obrigá-los a rruinar-se, que foi a sina de muitos deles
nestes últimos anos". Tudo isso acaba or se tornar muito claro. As
posições estão nitidamente delineadas de ambos os idos da barreira. E a
barreira está bem firme. Tornar-se-à mais firme com as cresentes
agitações do século XVIII.
Todavia, estas agitações são locais, limitadas a espaços reduzidos.
Outrora, m
Gand já em 1280, ou em Florença em 1378, quando da sublevação dos Ciompi,
s revoltas operárias eram igualmente circunscritas, mas a cidade onde
rebentavam ra, por si só, um universo autônomo. O objetivo estava ao
alcance da mão. As ueixas dos operários tipógrafos lyoneses, em 1539,
pelo contrário, abriram camiho até o Parlamento de Paris. Deveremos então
pensar que o Estado territorial, ada a sua extensão e a inércia dela
decorrente, isola, limita de antemão, bloqueia iesmo essas insurreições e
movimentos pontuais? Seja como for, esta efetiva disersão,
simultaneamente no espaço e no tempo, complica a análise dessas famílias
iúltiplas de acontecimentos. Não será fácil enquadrá-las em explicações
gerais cu)s traços mais se imaginam do que se verificam.
Imaginam-se, porque desordem e ordem estabelecida se reportam a uma mesa
e única problemática, e o debate amplia-se, assim, por si mesmo. A ordem
esta-lecida é, ao mesmo tempo, o Estado, as bases da sociedade, os
reflexos culturais as estruturas da economia, mais o peso da evolução
múltipla do conjunto. Peter aslett pensa que uma sociedade em evolução
rápida exige uma ordem mais rígida :)
que o habitual; A. Vierkand afirma que uma sociedade diversificada deixa
ao idivíduo mais liberdade de movimentos, favorecendo, portanto,
eventuais reivincações145. Estas afirmações gerais deixam-nos céticos:
uma sociedade controlada

não evolui à vontade; uma sociedade diversificada tolhe o indivíduo de


todos os lados ao mesmo tempo, um obstáculo pode ser derrubado, mas os
outros ficam de pé.
Entretanto, está fora de discussão que qualquer fraqueza do Estado - seja
qual for a sua causa - abre a porta à agitação. Esta, por si só, assinala
muito bem o afrouxamento da autoridade. Assim, na França, são muito
agitados os anos de

1687-1689 e também os de 1696-1699146. Nos reinados de Luís XV e Luís


XVI, quando ' Ca autoridade começa a escorregar das mãos do governo",
todas as cidades da França, por pouco importantes que sejam, têm seus
"motins" e suas "cabalas". Paris estava à frente, com mais de sessenta
revoltas. Em Lyon, em

1744 e em 1786, o movimento de protesto rebenta com violência 147.


Confessemos, porém, que o enquadramento político ou mesmo econômico
fornece, quando muito, neste como em outros casos, apenas um princípio de
explicação. Para organizar como ação o que é emoção, mal-estar social,
são necessários um enquadramento ideológico, uma linguagem, slogans, uma
cumplicidade intelectual da sociedade que habitualmente falta.
Todo o pensamento revolucionário das Luzes, por exemplo, se volta contra
o privilégio da classe ociosa e senhorial e, em nome do progresso,
defende a população ativa, a que pertencem os mercadores, os donos das
manufaturas, os proprietários fundiários progressistas. Nessa polêmica, o
privilégio do capital é como que escamoteado. Na França, o que embasa o
pensamento político e as atitudes sociais dos séculos XVI a XVIII é um
conflito de autoridade entre a monarquia, a nobreza de espada e os
representantes dos Parlamentos. Encontra-se em pensamentos tão diversos e
contraditórios como os de Pasquier, de Loyseau, de
Dubos, de Boulainvilliers, de Fontenelle, de Montesquieu e dos outros
filósofos das Luzes. Mas a burguesia endinheirada, força ascendente
daqueles séculos, é como que esquecida nestes debates. Não é curioso ver
exprimir-se, nos livros de reclamações de 89, fotografia de uma
mentalidade coletiva, uma agressividade inquebrantável contra os
privilégios da nobreza, sendo o silêncio quase completo, pelo contrário,
no que diz respeito à realeza e ao capital?
Se o privilégio do capital, já bem estabelecido nos fatos para quem
percorre com a mentalidade de hoje os documentos de ontem, levou tanto
tempo para aparecer como privilégio - grosso modo, é preciso esperar pela
Revolução industrial -, não foi apenas porque os "revolucionários" do
século XVIII eram por sua vez "burgueses". Foi também porque o privilégio
capitalista tirou proveito, no século XVIII, de outras tomadas de
consciência, da denúncia revolucionária de outros privilégios. Atacase o
mito que protegia a nobreza (as fantasias de Éoulainvilliers sobre a
"autoridade natural" da nobreza de espada, descendente do "sangue novo,
do sangue puro" dos guerreiros francos "reinando sobre a terra
submissa"), ataca-se o mito de uma sociedade de ordens. Logo, a
hierarquia do dinheiro - oposta à hierarquia do nascimento
- deixa de se destacar como uma ordem autÔnoma e nociva. À ociosidade e
inutilidade dos grandes deste mundo opõe-se o trabalho, a utilidade
social da classe ativa. É esta, sem dúvida, a fonte onde o capitalismo do
século XIX, chegado à plenitude do poder, foi buscar a sua imperturbável
boa consciência. É aí que nasce antecipadamente a imagem do empresário
modelo - artífice do bem público, representante dos sadios costumes
burgueses, do trabalho e da economia, em breve fornecedor de civilização
e de bem-estar aos povos colonizados - e também a imagem das virtudes
econômicas do laissez-faire que geram automaticamente o equilíbrio e a
felicidade social. Ainda hoje esses mitos estão bem vivos, embora
refutados todos os dias pelos fatos. E o próprio Marx não identificava
capitalismo com progresso econômico até chegar o tempo das contradições
internas?

ou --o conjunto aos curíju,,,, - '94

o que também refreia a agitação social é a existência, em todas as


sociedades de um enorme subproletariado., as - inclusive as sociedades da
Europa 'hina, na india, esse subproletariado leva a uma escravatura
endêmica, a meio inho entre a miséria e a caridade condescendente. A
escravatura atravessa a isidão islâmica, encontra-se na Rússia, permanece
incrustada na Itália meriial;
está ainda presente na Espanha e em Portugal e medra para além do Atlân,
no Novo
Mundo.
A maioria da Europa está ao abrigo dessa peste, mas ainda há vastíssimas
res onde impera a servidão que custa a desaparecer. Não se pense, porem,
que )cidente, apesar de tudo privilegiado, tudo corre da melhor maneira
no melhor mundos "livres". Exceto os ricos e os poderosos, nela todos os
homens estão amente vinculados à sua condição laboriosa. Haverá realmente
uma grande dinça entre o servo da Polônia e da Rússia e o meeiro rural de
tantas regiões lentais148? Na Escócia, até a lei de 1775 e sobretudo até
o Act de 1799, muitos teiros, vinculados por um contrato vitalício, "são
verdadeiros servos'1149. En, as sociedades do Ocidente nunca são
delicadas com a arraia-miúda, a ralé, zépovinho" 150. Nelas vive
constantemente um enorme subproletariado de gente i trabalho, de
perpétuos desempregados, sendo esta uma velhíssima maldição.
No Ocidente, tudo se passou como se a divisão profunda do trabalho, nos
séos X1

e X11 - cidades de um lado, campos do outro -, tivesse deixado fora


partilha, e de modo definitivo, uma enorme massa de desgraçados para quem
nca mais houve emprego. A responsabilidade caberia à sociedade, às suas
habitis iniqüidades, mas também, e mais ainda, à economia, por causa da
sua incacidade para criar o pleno emprego. Muitos destes inativos
vegetam, acham aqui di algumas horas de trabalho, um abrigo temporário.
Os outros, os doentes, os ilios, os que nasceram e cresceram nas
estradas, só com muita dificuldade enLm na vida ativa. Esse inferno tem
os seus graus de degradação, rotulados pela iguagem dos contemporâneos:
os pobres, os mendigos, os vagabundos.
É pobre em potencial o indivíduo que vive apenas do seu trabalho. Se
perder vigor físico, se a morte atingir um dos cônjuges, se os filhos
forem demasiado imerosos, o pão excessivamente caro, o inverno mais
rigoroso do que de costue, se os patrões recusarem dar emprego, se os
salários caírem - a vitima terá
- encontrar auxilio para sobreviver até melhores dias. Quando a caridade
urbana encarrega dele, es tá quase salvo: a pobreza ainda é um estado
social. Todas as dades têm os seus pobres. Em Veneza, se aumentam
excessivamente, é feita uma iagem para escorraçar os que não nasceram na
cidade; aos outros é fornecido, n papel ou em medalha, um signo di San
Marco que os distinguira151.
Mais um passo adiante na desgraça, e abrem-se então as portas da
mendicidae e da vagabundagem, situações inferiores em que, ao contrário
do que dizem os ons apóstolos, por certo não se vive "sem cuidados, a
expensas de outrem". Inistamos nesta distinção, tão freqüente nos textos
da época, entre o pobre - miseável, mas não desprezível - e o mendigo ou
o vagabundo, ocioso, intolerável aos lhos das pessoas honestas. Oudard
Coquault, mercador e burguês de Reinis, em evereiro de 1652, fala de um
grande número de pobres-diabos que acabam de enrar na cidade, "não
daqueles que procuram tratar da vida [isto é, procuram ganháVagabundo nos
camposfiamengos. O Filho Pródigo, por J. Bosch, princípio do século XVI.
(Museu Baymans van Beuningen de Rotterdam.)

~O ~&J"rt&Ua >s pobres razoáveis, dignos de auxilio], mas de pobres


vergonhosos que mendii, comem pão de farelo, ervas, talos de couve,
caracóis, cães e gatos; e para ar a sopa usam a água com que se dessalgam
mexilhões` 52. Eis o que distinirremediavelmente o bom, o "verdadeiro
pobre" 153, do mau, o "mendigo".
om pobre é o pobre aceito, arrolado, inscrito nas listas da repartição
dos po;, o que tem direito à caridade pública, a quem se permite mesmo
solicitá-la à ia das igrejas dos bairros ricos, depois da missa, ou então
nos mercados, como >bre de Lille (1788) que imaginou, como meio discreto
de mendigar, apresentar vendedores, nas suas bancas, um braseiro para
acenderem os cachimbos. Oudos seus irmãos em pobreza preferia tocar
tambor diante das casas de Lille on54

;e habituara a esmolarl.
Os arquivos das cidades mostram habitualmente o born pobre, o limite
infede uma vida dura mas ainda aceitável. Em Lyonl55 onde uma enorme
docuttação permite medidas e cálculos para o século XVI, esse limite
inferior, "esse ar de pobreza"
é estabelecido segundo uma relação entre o salário real e o cus[e vida,
isto é, o preço do pão. Regra geral: a renda diária disponível para as )
esas alimentares é metade da renda global. É pois necessário que essa
metade, superior ao custo do consumo de pão da família. Ora, a escala dos
salários uito larga: fixando em

10O o salário do mestre, o do companheiro situa-se em o do servente "que


faz de tudo" em 50, o do "ganhadeiro" em 25. São estas, s últimas
categorias que roçam a linha inferior e pendem muito facilmente para do
errado. De 1475 a 1599, os mestres e companheiros de Lyon mantêm-se bem
na do precipício, os serventes têm dificuldades entre 1525 e 1574 e
atravessam fim de século (1575-1599) muito duro; os ganhadeiros estão em
dificuldades lesde antes do princípio do século, e sua situação, depois,
piora sem parar, iando-se catastrófica a partir de 1550. O quadro abaixo
resume claramente esdados. Confirma-se a deterioração do mercado de
trabalho no século XVI em, sem dúvida, tudo progride, inclusive os
preços, mas em que estes progressos, io sempre, são largamente pagos
pelos trabalhadores.
Em Lyon: o limiar da pobreza (número dos anos em cujo curso o limiar da
pobreza foi transposto)
Companheiros Trabalhadores braçais Ganhadeiros

1475-1499 o 1 5

1500-1524 o o 12

1525-1549 o 3 12

1550-1574 o 4 20

1575-1599 1 17 25

undO Richard GASCON, "Éconowie et pauvreté aux XVI et XVIII siècles:


Lyon, ville exemplaire", in Michael MOLLAT, Études
Ustoire de Ia pauvreté, 11, 1974, p. 75 1, o limiar de pobreza é atingido
quando "o rendimento diário disponível é igual às despesas D. É
transposto quando lhe é inferior" (p. 749).
Abaixo desse "limiar de pobreza", a documentação elucida mal o inferno
dos gabundos" e dos "mendigos". Quando se afirma que, na Inglaterra dos
Stuarts, quarto ou metade da população vive abaixo ou nas imediações
dessa linha

dendigos dos Países Baixos, quadro de Brueghel, o Velho, 1568. Esses


aleijados com uma Wtra, um chapéu de papel ou um cilindro vermelho na
cabeça e vestidos com opas celebram carnaval e organizam procissões na
cidade. (Cliché dos Museus
Nacionais.)
is sobreviventes para o Lazareto onde, por sorte, não se encontra nenhum
pestífeo de quarentena. "Dizem os médicos... que essas doenças são
provenientes excluivamente da miséria que os pobres sofreram no inverno
passado e dos maus aliilentos que ingeriram.'9171 O inverno passado, o de
1709.
E, no entanto, nem a morte, incansável obreira, nem os confinamentos
brutís extirpam o mal. O que perpetua os indigentes é o seu número, em
constante econstituição. Em março de 1545, são a dado momento mais de 6
mil em Veneza; m

1587, em meados de julho, apresentam-se 17 mil junto aos muros de Paris

172. m Lisboa, em meados do século XVIII, há permanentemente "1O mil


vagabunos... [que] dormem ao acaso, marinheiros vadios, desertores,
ciganos, vendedoes ambulantes, nômades, saltimbancos, aleijados",
mendigos e malandros de toa espécie173. A cidade que, no seu perímetro,
se espraia em hortas, terrenos balios e no que nós chamaríamos favelas
fica todas as noites às voltas com uma inseurança dramática. Batidas
policiais intermitentes enviam de cambulhada delinqüenIs e pobres-diabos,
como soldados forçados, para Goa, a enorme e longínqua peitenciária de
Portugal. Em Paris, na mesma época, na primavera do ano de 1776, -gundo
Malesherbes, "há cerca de noventa e uma mil pessoas que aqui vivem sem
brigo certo, que pernoitam em espécies de casas ou casebres para isso
destinados se levantam sem saber que recursos terão durante o dia" 174.
Na verdade, a polícia é impotente contra esta massa oscilante que em todo
luar encontra cúmplices, às vezes até (mas raramente) por parte dos
verdadeiros

^ ~Ute~C U" - -j-- -andrajosos", bandidos instalados no coração das


grandes cidades onde constituem,

pequenos universos fechados, com suas hierarquias, seus "bairros da


mendicidade'
I, seu recrutamento, sua gíria própria, seus pátios de milagres. San
Lúcar de
Barrameda, perto de Sevilha, ponto de encontro dos marginais da Espanha,
é uma cidadela impenetrável que estende a sua rede de cumplicidades até
entre os aguazis da grande cidade vizinha. A literatura, na Espanha e
depois fora da
Espanha, ampliou o seu papel; fez do picaro, o mais característico dos
marginais, o seu herói predileto, capaz de incendiar sozinho, com toda a
facilidade, uma sociedade bem constituída, como uma brasa lançada em
palha seca.
Todavia, não nos deixemos iludir por este papel glorioso, "de esquerda".
O picaro não é um verdadeiro miserável.
A despeito do crescimento econômico, por causa do aumento demográfico que
em sentido inverso, o pauperismo acentua-se com o século XVIII. Aumenta
ainda mais a torrente dos miseráveis. A razão disso será, como pensa J.-
P. Gutton175, a propósito da França, uma crise do mundo rural iniciada já
no fim do século XVII, com suas seqüelas - carestias, fomes e
dificuldades suplementares criadas pela concentração da propriedade,
segundo uma espécie de modernização embrionária desse antigo setor?
Milhares de camponeses são lançados nas estradas, a exemplo do que se
passara muito tempo antes na Inglaterra, com o princípio das enclosures.
No século XVIII, há de tudo nessa lama humana de que ninguém consegue
desvencilhar-se: viúvas, órfãos, mutilados (como o amputado das duas
pernas que se exibe nas ruas de Paris em 1724, sem roupa176),
companheiros desvinculados de suas associações, os trabalhadores braçais
que não arranjam trabalho, padres sem prebenda nem moradia fixa, velhos,
vítimas de incêndios (os seguros mal estão começando), vítimas das
guerras, desertores, soldados e até oficiais reformados (estes altivos,
por vezes exigindo a esmola), pretensos vendedores de mercadorias fúteis,
pregadores vagabundos, com ou sem autorização, "criadas grávidas, mães
solteiras expulsas de todos os lugares" e as crianças, enviadas "ao pão
ou à pilhagem". Sem contar os músicos ambulantes cuja música serve de
álibi, esses "tocadores de instrumentos com os dentes tão compridos como
as sanfonas e o ventre tão oco como as rabecas"177. Muitas vezes
misturam-se nas fileiras da pilhagem ou do banditismo as tripulações de
navios "desativados"178

e, sempre, soldados em debandada. É o caso, em 1615, da pequena tropa


desmobilizada pelo duque da Sabóia. Na véspera, pilhavam os campos. Agora
pedem "a passada [a caridade] aos camponeses de quem no inverno anterior
depenaram prazeirosamente as galinhas [... ] E agora são soldados de
bolsa vazia, tornaram-se sanfoneiros que cantam diante das portas:
fanfara hélas! fanfara bourse plate!" 179 O exército é o refúgio, o
exutório do subproletariado: os rigores do ano de 1709 proporcionaram a
Luís XIV o exército que haveria de salvar o país, em 1712, em Denain. Mas
a guerra dura pouco e a deserção é um mal endêmico que atulha
continuamente as estradas. Em junho de 1757, no princípio do que virá a
ser a guerra dos Sete Anos, conta um edital que "é incrível a quantidade
de desertores que passa todos os dias [por Ratisbona]; a maioria dessa
gente, que vem de toda a espécie de nações, só se queixa da disciplina
demasiado rígida, ou então de terem sido recrutados à forÇa`10. Passar de
um exército para outro é acidente banal. Nesse mês de junho de

1757, os soldados austríacos, mal pagos pela imperatriz, "para se safarem


da miséria arranjaram serviço entre os prussianos"181. Prisioneiros
franceses de
Rossbach combatem entre as tropas de Frederico II, e o conde de La
Messelière, estupefato,

'-os surgir de um talude, na fronteira da Morávia (1758), com suas


"fardas do regiiento do Poitou", no meio de uns vinte uniformes russos,
suecos e austríacos, tom desertores182. Em 1720, quase quarenta anos
antes, o senhor de
La Motte foi itorizado pelo rei a recrutar em Roma um regimento de
desertores franceses183.
O desenraizamento social, em tal escala, surge como o maior problema
dessas )ciedades antigas. Nina Assodorobraj1", socióloga experiente,
estudou-o no âm[to da Polônia do fim do século XVIII, onde a população
"flutuante" - servos n fuga, nobres decadentes, judeus miseráveis,
indigentes urbanos de todos os tipos
- tentou as primeiras manufaturas do reino, à procura de mão-de-obra. Mas
o núero de empregos foi insuficiente para ocupar tantos indesejáveis, e o
pior é que ;tes não se deixavam facilmente apanhar e domesticar.
Constatou-se então que eles >rmam uma espécie de não-sociedade. "O
indivíduo, uma vez separado do seu gru:) de origem, torna-se um elemento
eminentemente instável, sem nenhum vínculo )m um trabalho específico, com
uma casa ou com um senhor. Ousaremos mesmo Irmar que se furta
conscientemente a tudo o que poderia estabelecer novos víncus de
dependência pessoal e estável, no lugar dos vínculos que acabavam de se
rom-r."
Estas observações vão longe. com efeito, poder-se-ia pensar, a priori,
que tal assa de homens desocupados pesava imensamente sobre o mercado de
trabalho
- e por certo pesou, pelo menos no que se refere aos trabalhos agrícolas
de urgêna, intermitentes, a que todos acorrem; ou aos diversos trabalhos
desqualificados s cidades. Mas teve relativamente menos influência sobre
o mercado normal de abalho e sobre os salários do que seria de supor, na
medida em que não era sisteaticamente recuperável. Condorcet, em 1781,
comparava os preguiçosos a "uma pécie de aleijados"185, inaptos para o
trabalho. O intendente do Languedoc, em

775, chegava a dizer: "Essa numerosa porção de súditos inúteis [ ... ]


causa o enca-cimento da mão-de-obra, tanto nos campos como nas cidades,
pela subtração de ntos trabalhadores, e torna-se um aumento, para o povo,
das imposições e trabaos solidários." 186 Mais tarde, com a indústria
moderna, haverá passagem direta, * todo caso rápida, do campo ou do
artesanato para a fábrica. O gosto pelo traba* ou a resignação ao
trabalho não terão tempo de se perder em tão curto caminho.
O que desarma o subproletariado dos vagabundos, apesar do temor que
inspié a sua falta de coesão: suas violências espontâneas não têm
seqüência. Não é na classe, é uma multidão. Alguns archeiros da ronda, a
patrulha dos caminhos irais bastam para deixá-los sem condições de causar
danos. Embora haja furtos pancadaria quando chegam trabalhadores braçais
agrícolas, ou alguns incêndios iminosos, são incidentes que se perdem no
tecido normal das coisas que acontem. Os "vadios e vagabundos" vivem à
parte, e as pessoas de bem tentam esquecer sa "escumalha, o excremento
das cidades, a peste das Repúblicas, material para %amentar cadafalsos
[ ... 1 há tantos e de tantos lados que seria bem difícil contá-los só
prestam [... 1 para meter nas galés ou enforcar, para que sirvam de
exemplo".
?Lmentá-los? E por quê? "Tenho ouvido falar, e soube que quem costuma
levar esse )o de vida não consegue deixá-la; não têm cuidados, não pagam
renda, nem talha, [o receiam perder nada, são independentes, aquecem-se
ao sol, dormem, riem-se
- bêbados, ajeitam-se em qualquer canto, têm o céu por cobertor e a terra
por colião, são aves de arribação que vão atrás do verão e do born tempo,
só andam por rras ricas onde lhes dão ou onde encontram o que pegar [ ...
1 são livres em toda parte [... 1 e, enfim, não se preocupam com nada.--
181 É assim que um burguês merÚor de Reims explica aos filhos os
problemas sociais do seu tempo.

, q socíeaaae ou u cunjun, u uutiumu,,


Será possível sair do inferno? Por vezes, sim, mas nunca se sai só, nunca
sem aceitar imediatamente uma estreita dependência de homem para homem. É
preciso ir para as margens da organização social, seja ela qual for, ou
fabricar uma nova, com leis próprias, no interior de alguma contra-
sociedade. Os bandos organizados de falsos salineiros, de
contrabandistas, de moedeiros falsos, de salteadores, de piratas, ou os
grupos e categorias à parte que são o exército e a vasta criadagem -são
quase os únicos refúgios para foragidos que recusam o inferno. A fraude,
o contrabando, para existirem, reconstituem uma ordem, disciplinas,
solidariedades sem conta. O banditismo tem seus chefes, seus acordos,
seus quadros muitas vezes senhoriais 118. Quanto ao corso e à pirataria,
pressupõem, no mínimo, uma cidade por trás. Argel, Trípoli, Pisa, La
Valeta ou Segna são bases dos corsários da Barbária, dos cavaleiros de
Santo Estêvão, dos cavaleiros de Malta e dos Uscoques, inimigos de
Veneza189. E o exército, que tem sempre gente nova a despeito da
disciplina impiedosa e dos desdéns190, oferece-se como um asilo de vida
regular; é pela deserção que vai dar ao inferno.
Finalmente, a "libré", o mundo imenso da criadagem, é o único mercado de
trabalho sempre aberto. Cada aumento demográfico, cada crise econômica
multiplicam os novos membros. Na Lyon do século XVI, conforme os bairros,
os criados representam 19 a 26% da população191. Em Paris, conta um
"guia" de 1754, ou melhor, no conjunto da aglomeração parisiense, "... há
cerca de 12 mil carruaL
São muitas as criadas nessa cozinha espanhola. Cartão para tapeçaria, de
Francisco Bayen (1736-1795). (Foto Mas.)

457

tcuuuc - - -ni-u auy conjuntosgens, cerca de um milhão de pessoas, entre


as quais se devem contar cerca de 20O mil criados" 192. Na realidade,
desde que uma família, mesmo modesta, não tenha de morar num côrnodo só,
pode albergar criadas e criados. Até o camponês tem seus lacaios. E todo
esse submundo tem de obedecer, mesmo quando o patrão é sórdido. Um
decreto do Parlamento de Paris, em 175 1, condena um criado à golilha e
ao banimento por insultar o patrão193. Ora, é difícil escolher o patrão:
é-se escolhido por ele, e qualquer criado que abandona o emprego ou é
despedido, se não arranja logo outro, é considerado vagabundo: as moças
desempregadas, surpreendidas nas ruas, são açoitadas, têm a cabeça
raspada, os homens mandados para as galés"'. Um roubo, uma suspeita de
roubo, é a corda.
Malouet, 95, o futuro Constituinte, conta que, tendo sido roubado por um
criado, soube com horror que este, apanhado e julgado, seria devidamente
enforcado à sua porta. Salva-o por pouco. Será de admirar que, nestas
condições, a "libré", quando se apresenta a ocasião, dê uma ajuda aos
marginais quando se trata de sovar um cavaleiro da ronda? E também que o
pobre Malouet tenha sido muito mal recompensado pelo criado desonesto que
ele arrancara à forca?
Trouxe aqui à baila apenas a sociedade francesa, mas ela não constitui
exceção.
Por toda a parte, o rei, o Estado, a sociedade hierarquizada exigem
obediência.
O miserável pode escolher, quando à beira da mendicidade, entre depender
de alguém ou ser abandonado. Quando Jean-Paul Sartre (abril de 1974)
escreve que é preciso romper com a hierarquia, vedar que um homem dependa
de outro homem diz, na minha opinião, o essencial. Mas será possível?
Parece que dizer sociedade é sempre dizer hierarquia'96. Todas as
distinções que Marx não inventou, a escravatura, a servidão, a condição
operária, evocam sempre grilhões. O fato de não serem sempre os mesmos
grilhões não muda grande coisa.
Suprime-se uma escravatura, surge outra. Eis que as colônias do passado
se tornaram livres. Todos os discursos o dizem, mas os grilhões do
Terceiro Mundo fazem um barulho infernal. A tudo isso os abonados, as
pessoas protegidas se acomodam alegremente, ou, pelo menos, se resignam
facilmente: "Se os pobres não tivessem filhos", escreve sensatamente o
abade Claude Fleury, em 1688, "onde é que se iriam buscar operários,
soldados, criados para os ricos?--197 E escreve
Melon: "A utilização de escravos nas nossas colônias ensina-nos que a
Escravatura não é contrária nem à Religião, nem à Moral." 198 Charles
Lion, honesto mercador de Haonfleur, recruta "contratados", trabalhadores
livres para
São Domingos (1674-1680). Confia-os a um capitão de navio. Este, em
troca, trazlhe rolos de tabaco. Mas quantos dissabores para o pobre
mercador: os moços para contratar são muito raros, "e o que causa
desgosto é que, depois de termos alimentado durante algum tempo aqueles
malandros, no dia da partida a maior parte foge' 199.

ESTADO INVASOR
O Estado é a confluência, a principal presença. Fora da Europa, há
séculos impõe um peso insuportável. Na Europa, com o século XV, recomeça
resolutamente a crescer. Os fundadores da sua modernidade são os "três
Magos", como os denomina
Francis Bacon: Henrique VII de Lancaster, Luís XI, Fernando, o Católico.
O seu Estado moderno é inovação, tal como o exército moderno, o
Renascimento, o capitalismo, a racionalidade científica. Um movimento
enorme, na verdade engatilhado muito antes dos Magos. O reino das Duas
Sicílias, de Frederico 11, (1194-1250?) é unanimemente considerado pelos
historiadores o primeiro Estado moderno. Ernst Curtius20O divertia-se
mesmo ao dizer que Carlos Magno havia sido, nessa área, o grande
iniciador.
As tarefas do Estado
Seja como for, o Estado moderno deforma ou quebra as formações e
instituições anteriores: os estados provinciais, as cidades livres, os
senhorios, os Estados de dimensões muito reduzidas. Em setembro de 1499,
o rei aragonês de Nápoles sabe que está, vê-se ameaçado de ruína: Milão
acaba de ser ocupada pelos exércitos de Luís XII, chega a sua vez. Jura
"que se for preciso se fará judeu, não quer perder tristemente o seu
reino. E parece que até com os turcos ameaça"101. Palavras de quem vai
perder tudo - e são uma legião aqueles que, na época, estão perdendo ou
vão perder. O novo Estado alimenta-se da substância deles, levado pelo
impulso da vida econômica que o privilegia. A evolução, porém, não vai
até o fim: nem a Espanha de Carlos V, nem a de Filipe 11, nem a
França de Luís XIV, que se quer imperial, conseguem recriar e confiscar
em seu proveito a antiga unidade da Cristandade. Para esta, a "rnonarquia
universal" é um chapéu que, decididamente, já não lhe cai bem. Todas as
tentativas são frustradas, uma após outra. Será que está velho demais o
jogo praticado por essas políticas ofuscantes de ostentação? É chegada a
hora das primazias econômicas, cuja realidade discreta ainda escapa ao
olhar dos contemporâneos.
Aquilo que Carlos V não consegue - tomar a Europa -, a Antuérpia obtém
com a maior naturalidade. Onde Luís XIV falha, a minúscula Holanda
triunfa: ela é o coração do universo. Entre jogo velho e novo, a Europa
escolhe o segundo ou, mais precisamente, este impõe-se-lhe. O resto do
mundo, pelo contrário, continua a baralhar suas velhas cartas: o Império
dos turcos osmanlis, vindo do fundo da história, repete o Império dos
turcos seljúcidas; o Grão-Mogol aproveita a mobília do sultanato de
Delhi; a China dos manchus continua a China dos Ming, à qual abateu
selvaticamente. Só a Europa inova politicamente, e não só politicamente.
Remodelado, ou até francamente novo, o Estado permanece o que sempre foi,
um feixe de funções, de poderes diversos. As suas principais funções
nunca variam muito, embora os meios estejam sempre mudando.
Primeira tarefa: fazer-se obedecer, monopolizar em proveito próprio a
violência virtual de uma dada sociedade, esvaziá-la de todas as suas
fúrias possíveis, substituindo-as por aquilo a que Max Weber chama a
"violência legítima"202.

- ~AU4 LarCla: controlar de de longe a vida ecOnÔniica, organizar, com


ousem lucidez a circulação dos`benso, sobretudo apropriar-se de uma Parte
considerável da renda nacional Para assegurar suas despesas, seu luxo,
sua "administraÇão" ou a guerra. Quando necessário, o príncipe
imobilizará em seu proveito uma Parte enorme da riqueza pública: pensemos
nos tesouros do Grão-Mogol, n o imenso Palácio-armazém do imperador da
China em Pequim ou nos 34 milhões de ducados, em moedas de ouro e de
prata, encontrados em novembro de 173O nos aposentos do sultão que acaba
de morrer em IstambUI203.
Últinia tarefa: Participar da vida espiritual, sem a qual nenhuma
sociedade se mantém. Tirar, se Possível, uma força suplementar dos
Poderosos valores religiosos, fazendo uma escolha ou cedendo perante
eles. Vigiar tmbém, e sempre os vivos movimentos da cultura que inuitas
vezes contestam a tradição. E, sobretudo, nunca se deixar ultrapassar por
suas inovações inquietantes: as dos humanistas no tempo de Lourenço, o
MagnífIcO ou as dos --Filósofos- nas vésp eras da Revolução francesa.
manutenção ordem
Manter a ordem, mas que ordem? com efeito, quanto mais inquietas ou
divididas são as.sociedades, mais o Estado, árbitro nato, born ou mau
Policial, deve punir com rigor.
Para o Estado, a ordem é, evidentemente, um compromisso entre forças pró
e forças contra. Prd consiste quase sempre em socorrer a hierarquia
social, como as pessoas do topo, tão franzinas, agüentariam o tranco se
não tivessem sempre uni Policial ao lado? Mas, reciprocamente, não há
Estado sem classes dominantes que não sejam cúmplices: não veio Filipe 11
controlando a Espanha e o enorme
Império espanhol sem os Grandes do seu reino. Contra são sempre os muitos
que é preciso conter, encaminhar ao dever, isto é, ao trabalho.
Portanto, o Estado cumpre o seu dever quando pune, quando ameaça para CO
y 204.
m ser obedecido. Tem "o direito de supri ir os indivíduos em nome do bem
públiÉ o carrasco de serviço, ainda Por cima inocente. Embora puna de
modo espetacular ainda é legítimo. A multidão que se apinha, com uma
curiosidade mórbida, ao reáOr dos cadafalsos e das forcas nunca está do
lado do supliciado. Em Palermo (8 de agosto de 1613), efetua-se uma vez
mais uma execução na Piazza Marina, com o cortejo dos Bianchi, os
penitentes brancos. A seguir, a cabeça do suPliciado será exposta,
rodeada por 12 tochas negras. Diz o cronista: "Todas as carruagens de
Palermo compareceram a essa execução e havia tanta gente que já não se
via o chão", che ilPiano non Pareva201. Em 1633 a multidão que se juntOu
Para assistir a um auto-de-fé em Toledo lapidaria os ondenados que
avançavain Para a fogueira, se estes não estivessem rodeados de
soldadOS206. Em 12 de setembro de 1642, em
Lyon, na praça de Terreaux, "dois homens de qualidade, OS senhores de
Cinq Mars e de Thou, foram decapitados; naquele dia foi possível alugar
uma janela das casas à volta da praça por cerca de ui dobrão"207.
Em Paris, o local habitual dos suplícios era a praça de Greve. Sem querer
nos entregar a uma im ' aginação macabra, pensemos (já que um diretor
acaba de produzir, em 1974, um filme sobre a Place de Ia Reptíblique,
considerada por si só repre;entativa do corpo de Paris), pensemos no que
seria um documentário filmado no

século XVIII, no tempo das Luzes, na praça de Grève, onde se sucediam sem
parar as missas de suplício e seus lúgubres preparativos. O povo se
apinha para ver a execução de Lally-Tollendal, em 1766. Ele quer falar no
cadafalso? É amordaçado208. Em

1780, o espetáculo se realiza na praça Dauphine. Um parricida altivo


aparenta indiferença. É com aplausos que a multidão frustrada saúda o seu
primeiro grito de dor209.
Sem dúvida, as sensibilidades estão embotadas pela freqüência dos
suplícios, muitas vezes infligidos por coisas que consideraríamos
pecadilhos. Em 1586, nas vésperas de se casar, um siciliano deixa-se
tentar por um magnífico casaco que rouba de uma dama nobre. Arrastado à
presença do vice-rei, é enforcado dentro de duas hora5210. Em Caliors,
segundo um memorialista que parece estar organizando um repertório de
todas as formas de suplício, "na quaresma do referido ano de

1559, foi queimado o Carput, natural de Rovergue; supliciado na roda


Ramon;
torturado por tenazes Arnaut; Boursquet feito em seis quartos; Florimon
enforcado; o Négut enforcado junto à ponte de Valandre, diante do jardim
de
Fourié; foi queimado Pouriot, perto de Roque des Arcs [a 4 kin da cidade
atual].
No ano de

1559, na Quaresma, o Dr. Étienne Rigal foi degolado na praça da Conque de


Cahors... -211. Essas forcas, esses enforcados em pencas nos galhos das
árvores, cujas silhuetas se recortam no céu em tantos quadros antigos,
não passam, portanto, de um pormenor realista: faziam parte da paisagem.

1 - ---~4tuY
Até a Inglaterra passa por tais rigores. Em Londres, as execuções eram
efetua>ito vezes por ano, os enforcamentos são feitos em série, em
Tyburn, mais além nuralhas de Hyde Park, fora da cidade. Em 1728, um
viajante francês assiste wnove enforcamentos simultâneos. Lá estão alguns
médicos, à espera do corpo ompraram dos próprios supliciados, que beberam
"o dinheiro antes". Os pais, ondenados assistem à execução e, como as
forcas são baixas, puxam as vítimas ç pés para abreviar-lhes a agonia.
Contudo, segundo o nosso francês, a Inglater, ria menos impiedosa do que
a França. com efeito, acha ele que "a justiça na aterra não é
suficientemente rigorosa. Creio que há uma política de condenar
ilteadores de estrada apenas ao enforcamento para os impedir de chegarem
ao ssinato, o que raramente fazem". Em contrapartida, os roubos são
freqüentes, mo ou sobretudo ao longo da estrada dos carros rápidos, as
"carruagens voado' de
Dover a Londres. Então não conviria torturar, impor a marca da infâmia
ses ladrões, como na França? Assim, "seriam mais raros'1212.
Fora da Europa, o Estado tem a mesma feição, mais atroz ainda, pois na
Chino
Japão, no Sião, na índia, a execução está banalmente associada ao
cotidia, desta vez, à indiferença pública. No Islã, a justiça é rápida,
sumária. Em 1807, a entrar no palácio real de Teerã, um viajante tem de
passar por cima dos cadá-s de supliciados. Nesse mesmo ano, em Esmirna, o
mesmo viajante, irmão do eral
Gardanne, quando vai visitar o paxá local encontra "um enforcado e um
apitado estendidos na soleira de sua porta" 213. Em 24 de fevereiro de
1772, uma eta anunciava: "O novo paxá de Salônica, com sua severidade,
restabeleceu a na nesta cidade. À sua chegada, mandou estrangular alguns
turbulentos que perDavam a tranqüilidade pública, e o comércio, que
estava suspenso, retomou toa sua atividade.' 1214

E não são os resultados que contam? Essa violência, esse pulso rude do
Estado garantia da paz interna, da segurança das estradas, do
abastecimento seguro ;
mercados e das cidades, da defesa contra os inimigos externos, da
condução, az das guerras que se sucedem umas após outras. Paz interna,
não há bem que he compare! Jean Juvénal des Ursins, por volta de 1440,
durante os últimos anos guerra dos Cem Anos, dizia "que se viesse um Rei
capaz de a dar [aos france1, nem que fosse sarraceno, ter-se-iam colocado
sob sua obediência' 215. Bem is tarde, se Luis XII torna-se o "Pai do
Povo" é por ter tido a sorte, e o favor ; circunstâncias, de restabelecer
a tranqüilidade no reino e de prolongar "o temdo pão barato". Graças a
ele, escreve Claude Seyssel (1519), a disciplina é "tão (r)rosamente
mantida, com a punição de apenas um pequeno número dos mais pados, a
pilhagem í ... 1 a tal ponto castigada que os homens de armas nem ousam
pegar num ovo de um camponês sem o pagar' 216. E não foi por ter
salvaardado esses bens preciosos e precários - a paz, a disciplina, a
ordem que caleza da França, depois das Guerras Religiosas e dos graves
tumultos da
Fron, se restabeleceu tão depressa e se tornou "absoluta"?
Yas superam as receitas:, ao empréstimo
O Estado tem cada vez mais necessidade de dinheiro para realizar todas as
suas refas, à medida que amplia e diversifica a sua autoridade. Já não
pode, como outro, viver das propriedades do príncipe. Tem de deitar mão à
riqueza que circula.

onoml r, - - ue Há mais de uma coinÉ, portanto, no âmbili6_ a mo e certa


modernidade do Estado -se, em ambos Os mo tempo, certo caPitalis analogia
essencial é tratar imentos. A etacular e ostencidência entre os dois
mov .uma discreta, a outra esp casos, da instauração de urna hierarquia,
Estado moderno, tal Como o capitalismo, tatória, a do Estado. outra
analogia, o os portugueses à pimenta;
os espanhóis, s monopólios para enriquecer: Lp, ao alúmen' 217. Ao que
recorre ao sal. os suecos ao cobre; o PO à prata; os franceses, ac ta,
monopólio da transumanse deveria acrescentar, no tocante à Espanha, a Mes
m o Novo Mundo
Contrataciórig monopólio da ligação cO cia ovina, e a Casa de Ia o
desenvolver-seg não suprime as atividades capitalismo, a 218 . também o
EsMas, assim Como o --como em muletas' assin, tradicionais em que às
vezes se apóia. elas para lhes im políticas anteriores e se insinua no
meio d. stiça, a língua tado aceita construções oridade, sua moeda, seus
impostos, sua ju conquistas por, como pode, sua aut tempo, infiltração e
sobreposiÇãO, em que dá ordens. Há, ao mesmo introduziu em 1203 Augusto,
uma vez senhor da Touraine, e acomodações. Filipe ular ao lado do
dinheiro parísis, no reino o dinheiro tornês que desde então vai circ no
reinado de Luís X1V219.
Foi sistema parisiense que só desaparecerá muito tarde, em todo o reino a
moeda real, com seu decreto de 1262220, impôs s anos mais tarde. São Luís
que,
- ará no século XVI, trezento mas a conquista iniciada só termin :
Filipe, o Bel03 que foi O primeiro a introdu ao imposto, a mesma lentidão
e prudência. Em Quanto o faz com astúcia zir o imposto do rei sobre as
terras senhoriais, eus agentes: --Contra a vontade dos barões não
pratiqueis es1302, recomenda a s da: "E deveis fazer essas arrecadações e
finan sãs finanças nas suas terras"; ou ain ão sobre a peble e tratai de
pôr ível de escândalo e de coaç ??221 Será necessáças com o mínimo POss
xecutar as vossas ordens.
s e afáveis para e prometida sob sargentos indulgente ob Carlos V; corn
ara ganhar essa partida, s rio quase um século P é de novo ganha sob
Carlos VI: o decreto de 2 de novem o reinado de Carlos VII, -222. das pôr
a talha à mercê do rei zação imperfeita bro de 1439 volta a
Dado o lento progresso do sistema fiscal, dada a organi: despesas
ultrapas até absurda: as suas finanças, o Estado vive em situação
difícil, pensáveis, inevitáveis no dia-a-dia, sam regularmente as
receitas, e aquelas são indis de ter.
Portanto, em enquanto estas são o que se terá e nem sempre se está certo
sabedoria burguegeral, o príncipe não concebe o andamento do Estado
segundo a . iro e inscrever as despesas nas receitas e não em gastar
prime sã que consiste.em em à frente; pensa-se ir depois arranjar os
recursos necessários. As despesas corr al não se consegue. em alcançá-
las; mas, como a exceção confirma a regra, em ger ostos, criar
loteRecorrer aos contribuintes, persegui-lOs, inventar novos imp Não é
possível rias - nada resolve a questão; O déficit cava-se como um
ab'snlo* introduzir nos cofres do Estado a totalidade das reservas ir
além de certos limites, ez em quando, a sua monetárias do reino. A
astúcia do contribuinte é eficaz e, de v .ii di Pagolo Morelli ao dar aos
seus cólera. Uni florentino do século xiV,
Giovani s, escreve:, Foge orno do fogo de selhos em matéria de negócio
que isso é permitido, descendentes con salvo no que se refere aos
impostos, em dizer mentiras" - ar com os bens alheios, mas para impedir
que te as revolpois então "não o fazes para fic Luís X111 e de Luís
XIV, .
levem indevidaniente os teus 9223. No tempo de pesada demais. das por
urna exação fiscal tas na França são quase origina 463

Então, só resta uma solução ao Estado: contrair empréstimos. Mas ainda é


preciso saber fazê-lo: o crédito não se maneja com facilidade e a dívida
pública no Ocidente generaliza-se tarde, no século XIII: na França com
Filipe, o Belo (1285-1314), decerto mais cedo na Itália, onde o Monte
Vecchio veneziano perdese na noite dos tempOS224. Atraso, mas inovação, o
que permite a Earl J.
Hamilton escrever: "A dívida pública é um dos raríssimos fenômenos cujas
raízes não remontam à Antiguidade greco-romana. , 225

Para corresponder às formas e exigências do financiamento, o Estado foi


obrigado a elaborar toda uma política, difícil de conceber de uma
assentada, mais difícil ainda de aplicar. Se Veneza não tivesse escolhido
a solução do empréstimo forçado, não tivesse coagido os ricos a
subscrever e, finalmente, não tivesse tido, devido às guerras,
dificuldades em reembolsar seus empréstimos, poderia passar por modelo
precoce de sabedoria capitalista. com efeito, já no século
XIII ela inventara a solução que será a da Inglaterra triunfante do
século
XVIII: a um empréstimo veneziano, tal como a um empréstimo inglês,
corresponde sempre o resgate de um grupo de rendimentos no qual se
baseiam os juros e o reembolso; e, tal como na Inglaterra, os títulos da
dívida, negociáveis, são vendidos no mercado, às vezes acima, geralmente
abaixo da paridade. Uma instituição especial fica encarregada de
controlar a gestão do empréstimo e de assegurar o pagamento bianual dos
juros, à taxa de 5% (ao passo que os empréstimos privados estão, na mesma
época, a

2007o). A palavra Monte designa essa instituição, tanto em Veneza como em


outras cidades da Itália. Ao Monte Vecchio, que conhecemos mal, sucede,
em l482224 o
Monte Nuovo; mais tarde, será criado o Monte Nuovissimo. Em Gênova, uma
situação análoga leva a uma solução diferente. Enquanto em Veneza o
Estado continuara a ser o dono das fontes de rendas que garantiam o
empréstimo, os credores genoveses apoderam-se de quase todas as rendas da
República e formam, para as gerir em benefício próprio, um verdadeiro
Estado dentro do Estado, a célebre
Casa di San Giorgio (1407).
Nem todos os Estados da Europa conheceram logo de início tais técnicas
financeiras elaboradas, mas qual não contrai empréstimos, e muito
cedo226'? Os reis da Inglaterra, já desde antes do século XIV, se dirigem
aos luquenses e durante mais tempo aos florentinos; os Valois da Borgonha
às suas boas cidades;
Carlos VII a Jacques Couer, seu argentário; Luís XI aos Médicis,
instalados em
Lyon. Francisco 1 cria, em 1522, as rendas sobre a Câmara de Paris: é uma
espécie de Monte, tendo o rei cedido à Câmara rendimentos que garantem o
pagamento dos juros. O papa muito cedo apela ao crédito para equilibrar
as finanças pontifícias que não podem viver apenas das receitas do Estado
da Santa
Sé, numa época em que desaparecem ou diminuem os tributos da Cristandade.
Carlos
V teve de fazer empréstimos proporcionais à sua política grandiosa:
assim, sobrepuja todos os seus contemporâneos. Seu filho, Filipe II, não
lhe ficará atrás. E, mais tarde, o empréstimo público continuará sempre a
aumentar. Muitos capitais acumulados em Amsterdam são, no século XVIII,
absorvidos pelos cofres dos príncipes da Europa. Entretanto, mais do que
essa praça do crédito internacional a que voltaremos com vagar, e que é o
reino dos mutuantes e dos mutuários, é o mecanismo do Estado à procura de
dinheiro que queremos examinar mais de perto, segundo o exemplo pouco
conhecido de Castela e o exemplo clássico da Inglaterra.

No século XV os reis de Castela Constituíram rendas UUros) cancionadas


por rendimentos para isso alienados. A localização do rendimento dá o
nome aos juros que, conforme os casos, passam depois a chamar-se da Casa
de la Contratación, dos Maestrazgos, dos PuertOs Secos, do
AS12M280jari/aZgo dinheiro, diz um personagem de Cervante , como
quiedetiIenndiausn, jeutero sobre las Yerbas de E Aplicar o Xtremadura,
"Corno quem tem um juro sobre as ervas (as pastagens dos Mãestrazgos) da
Estremadura".
A grande difusão das rendas data dos reinados de Carios V e de Filipe 11.
o juro apresenta-se então sob diversas formas: renda perpétua (juro
Perpetuo), vitalícia (depor vida), reembolsável (al quitar). Conforme os
rendimentos régios mais ou menos seguros que as garantem, há juros bons e
não tão bons. Outro motivo de diversidade é a taxa de juros, que pode
variar de 5 a 14 Olo e mesmo mais. Embora não haja mercado organizado de
títulos tal como o veremos funcionar mais tarde em Amsterdam ou em
Londres, Os juros são vendidos e trocados, e sua cotação é variável, mas
geralmente abaixo da paridade. Em 18 de março de 1577, é certo que em
plena crise financeira, negociam-se juros a 55% do seu valor.
Acrescente-se que haverá por uns tempos juros de cauci6n (de caução)
dados como
Penhores aos homens de negócios que, por contrato (asientos) adiantam
enormes somas a Filipe 11. Esses asientos, aceitos sobretudo pelos
meradores genoveses a partir de 1552-1557, logo correspondem a uma enorme
dívida flutuante, e o governo castelhano, quando das suas sucessivas
bancarrotas (1557, 1560, 1576,

1596,

1606, 1627), opera sempre da mesma maneira: transforma em dívida


consolidada parte da dívida flutuante - operação que não nos surpreende.
Entrementes, de

156O a 1575, é verdade, consentirá que os juros confiados aos seus


emprestadores deixem de ser simplesmente cauci6n para passarem a serjuros
de resguardo que o homem de negócios tem o direito de vender diretamente
ao público, desde que assegure o pagamento dos cupons e restitua ao rei
outros juros (com o mesmo rendimento) na hora do acerto final das contas.
Tais práticas explicam que os hombres de negocios genoveses tivessem na
mão o mercado dos juros, comprando na baixa vendendo na alta, trocando os
"Mal situados" pelos "bem situados". SenhOres'do mercado, podiam jogar
quase sem nscos. O que não impede que o mais célebre dentre eles, Nicolao
Grimaldi, príncipe de Salerno (comprara com dinheiro esse prestigioso
título napolitano), abra faência, em 1575, em conseqüência de
especulações demasiado arriscadas, precisanente com juros. Aliás'com o
tempo, o governo espanhol percebeu que a bancarota, recurso drástico, não
era o único ao seu alcance: podia suspender o pagameno dos rendimentos
dos juros, diminuir a taxa, converter as rendas. Em fevereiro e 1582,
sugerem a Filipe 11 uma conversão dos rendimentos dos juros referentes s
alcabalas de Sevilha que andam pelos 6 ou 7%. Os investidores poderiam
escoler entre conservar seus títulos na nova taxa (que o documento não
define) ou ob!r o reembolso: para tal, seria depositado um "milhão de
ouro" logo que chegasse frota das índias. Mas o veneziano que nos informa
pensa que, dada a lentidão )s reembolsos, os investidores preferirão
revender seus títulos a um terceiro que contentar com a nova taxa de
juros. A operação acabaria por não se realizar.

Jakob Fugger e o seu contador, estampa alemã do século XVI, época em que
a casa de A ugsburgo, a primeira do mundo, empresta somas enormes a
Carlos V. Nos escaminhos de arquivo, os nomes das grandes praças
mercantis da Europa.
(Fototeca A. Colin.)
O drama das finanças espanholas é terem de recorrer sempre a novos
asientos. No tempo de Carlos V, os protagonistas desses adiantamentos, em
geral exigidos inopinadamente, foram os banqueiros da Alta Alemanha, os
Welser e, mais ainda, os Fugger. Não lamentemos esses príncipes do
dinheiro. No entanto, têm razões para se preocupar: bem vêem o dinheiro,
sonante e de lei, sair dos seus cofres.
Para fazê-lo retornar cumpre sempre esperar, ameaçar um pouco, apoderar-
se das fianças: os Fugger se tornarão assim senhores dos Maestrazgos (as
pastagens das
Ordens de Santiago, Calatrava e Alcantara) e exploradores das minas de
mercúrio de Almadén. Pior ainda, para recuperar o dinheiro emprestado é
preciso emprestar mais. Praticamente fora do jogo dos asientos a partir
da bancarrota de 1557, os
Fugger regressam a ele no fim do século, na expectativa de recuperar o
irrecuperável.
Por volta de 1557, começa o reinado dos banqueiros genoveses, os
Grimaldi, os
Pinelli, os Lomellini, os Spinola, os Doria, todos nobili vecchi da
República de
São Jorge. Organizam a partir de 1579, em Piacenza, para as suas cada vez
mais vastas operações, as feiras de câmbio chamadas de Besançon, que irão
durar muito tempo. Desde então passam a ser simultaneamente donos da
fortuna da Espanha, pública e privada (quem na Espanha, nobres ou gente
da Igreja e sobretudo "oficiais", não lhes confiava dinheiro?), e,
indiretamente, de toda a fortuna, pelo menos a mobilizável, da Europa. Na
Itália, todos jogarão nas feiras de
Besançon e emprestarão dinheiro aos genoveses, sem sequer o saber,
arriscando-se a serem surpreendidos9 como os venezianos, pela bancarrota
espanhola de 1596, que lhes saiu muito cara.

, --Jurg~
O que torna os mercadores genoveses indispensáveis ao Rei Católico é eles
transirmarem nunifluxo contínuo a corrente intermitente que traz para
Sevilha a prata L América. A partir de 1567, é preciso pagar
regularmente, todos os meses, às Dpas espanholas que combatem nos Países
Baixos. Exigem ser pagas em ouro, was exigências serão atentidas até o
fim do reinado de Filipe 11 (1598). É portannecessário, ainda por cima,
que os genoveses transformem em ouro a prata da mérica. Terão êxito nessa
tarefa dupla e continuarão a servir o Rei Católico até bancarrota de
1627.
Então, saem de cena. Depois dos banqueiros alemães, é a segunda montaria
ie o cavaleiro espanhol estoura. Nos anos 1620-1630, é a vez dos
cristãos-novos )rtugueses. O conde-duque de Olivares chamou-os com
conhecimento de causa: m efeito, são os homens-de-palha, os testas-de-
ferro dos grandes mercadores prostantes dos Países Baixos. Por meio
deles, a Espanha aproveita os circuitos do édito holandês quando, em
1621, recomeça a guerra contra as Províncias
Unidas.
Não há dúvida de que, no tempo de sua grandeza, a Espanha não soube
coniir empréstimos e deixou-se espoliar pelos credores. Seus dirigentes
tentaram às zes reagir, até vingar-se: Filipe II organizou a bancarrota
de 1575 para se desemiraçar dos genoveses. Em vão. E é voluntariamente
que estes, em 1627, renunciao, ou melhor, se recusarão a renovar os
asientos. O capitalismo em escala intericional já pode agir como dono do
mundo.
ção financeira inglesa:

A Inglaterra do século XVIII levou a born termo sua política de


empréstimos, rnelhor ainda aquilo a que P. G. M. Dickson229 chamou sua
"revolução finanira" expressão adequada, pois se aplica a uma novidade
evidente, porém distível se pensarmos na lentidão de um processo
entabulado pelo menos em 166O lue se desenvolveu a partir de 1688, para
só vir a concluir-se no início da guerra s
Sete Anos (1756-1763). Exigiu, portanto, uma longa maturação (quase um
sélo), circunstâncias favoráveis, mais um surto econômico acentuado.
Essa revolução financeira que redunda numa transformação do crédito
públisó foi possível graças a uma profunda reorganização prévia das
finanças ingles cujo sentido global é claro. De um modo geral, em 1640,
ainda em 1660, as tanças inglesas, em sua estrutura, assemelham-se
bastante às da França daquele npo. Nem de um nem do outro lado da Mancha
há finanças públicas, centralizas, unicamente na dependência do Estado.
Muitas coisas são abandonadas à iniLtiva privada de coletores de impostos
que são, ao mesmo tempo, os emprestado, oficiais do rei, financistas com
negócios próprios e funcionários fora da depenncia do Estado, que
compraram os cargos, sem contar um recurso constante à tY de Londres, tal
como o rei da França recorre à sua boa cidade de Paris. A.orma inglesa,
que consistiu em desembaraçar-se dos intermediários que parasi7am o
Estado, realizou-se com discrição e de modo contínuo sem que se
discer;se, todavia, um fio condutor qualquer. As primeiras medidas foram
a estatizaD das alfândegas (1671) e do excise (1683), imposto de consumo
copiado da Hoida; uma das últimas, a criação do cargo de Lord Treasurer,
em 1714, que cria o

~ - ~O 4.unjun~
Board of Treasury, um Conselho do Tesouro, em suma, que vigiará o
trânsito das rendas para o Exchequer. Na nossa linguagem atual, diríamos
que houve nacionalização das finanças implicando, nesse lento processo, o
controle do
Banco da Inglaterra (controle que se instaura apenas em meados do século
XVIII, embora o banco tivesse sido fundado em 1694), depois, já em 1660,
a intervenção decisiva do Parlamento no voto dos créditos e dos novos
impostos.
Uma reflexão incisiva, embora infelizmente muito breve, de observadores
franceses permitir-nos-á verificar que essa nacionalização é uma
transformação burocrática profunda, que altera todas as relações sociais
e institucionais dos agentes do Estado. O governo de Luís XIV enviou à
Inglaterra, por duas vezes,
Anisson, deputado de Lyon, e Fenellon, deputado de Bordeaux no Conselho
de
Comércio, para lá negociarem um acordo comercial que, aliás, não se
concluirá.
Eis o que eles escrevem de Londres, em 24 de janeiro de 1713, a
Desmarets, inspetor geral das Finanças: -... como os agentes aqui estão,
como aliás em toda a parte, muito interessados, esperamos chegar a termo
com dinheiro, tanto mais que os presentes que lhes oferecemos não podem
de maneira nenhuma cheirar a corrupção, uma vez que tudo aqui está
estatizado.'y23O A corrupção de um funcionário seria menos visível por
ele em princípio representar o Estado - é o que falta provar. O que é
certo é que, aos olhos dos observadores franceses, a organização inglesa,
bem próxima de uma burocracia no sentido moderno, é original e diferente
da que eles conheciam: "Aqui tudo é estatizado."
Em todo caso, sem esta reapropriação do aparelho financeiro do Estado, a
Inglaterra não poderia ter desenvolvido, como desenvolveu, um sistema de
crédito eficaz, embora por muito tempo vilipendiado pelos contemporâneos.
Não devemos valorizar excessivamente a influência de Guilherme III, o
stadthoudèr da Holanda que se tornou rei da Inglaterra, na instauração do
sistema. E certo que, logo de início, ele contraiu grandes empréstimos,
"à holandesa", para angariar para a sua causa, ainda precária, grande
número de titulares de rendas sobre o Estado.
Mas foi ainda segundo processos tradicionais, até obsoletos, que o
governo inglês pediu empréstimos para fazer face às dificuldades da
guerra da Liga de
Augsburgo (1689-1697), depois da guerra da Sucessão da Espanha (1701-
1713). A novidade decisiva, o empréstimo de longa duração, vai-se
aclimatando lentamente.
Os governantes aos poucos aprendem que há um mercado possível para
empréstimos a longo prazo, a uma taxa de juro baixa; que há uma
proporção, como que preestabelecida, entre o volume real dos impostos e o
volume possível dos empréstimos (podendo este elevar-se sem prejuízo até
um terço da totalidade), entre a massa da dívida a curto prazo e a da
dívida a longo prazo; que o verdadeiro, o único perigo seria destinar ao
pagamento dos juros recursos incertos ou de antemão mal calculados. Essas
regras, longamente discutidas, só ficarão evidendes no momento em que o
jogo for conduzido com lucidez e em grande escala. Pouco a pouco, a
dialética curto prazo-longo prazo será compreendida, o que não é ainda o
caso em 1713, o ano de Utrecht, em que os empréstimos a longo prazo ainda
são chamados "repayable or seIf-fiquidating". Foi como que naturalmente
que o empréstimo a longo prazo se transformou em empréstimo perpétuo. Por
conseguinte, deixa de ser reembolsável pelo Estado, podendo este, ao
transformar sua dívida flutuante em dívida consolidada, não esgotar seus
recursos em crédito ou em dinheiro líquido. Quanto ao credor, pode
transferir o seu crédito para um terceiro - o que era admitido já em 1692
- e portanto reaver sempre que quiser a quantia adiantada. É o milagre: o
Estado não reembolsa, o credor recupera seu dinheiro à vontade.

w uu o conjunio aos conjuntosO milagre não foi gratuito. Foi preciso que
os adversários da dívida, logo monssa, perdessem o grande debate que se
estabeleceu. Tal sistema se baseava no '-dito" do Estado, na confiança do
público; a dívida, portanto, só podia existir ártude da criação, pelo
Parlamento, de rendimentos novos, destinados, a cada ao pagamento regular
de juros. Esse jogo dá a certas camadas da população, roprietários
fundiários (que entregam ao Estado, com o land tax, um quinto eu
rendimento), os consumidores ou os mercadores deste ou daquele produto
do, a sensação de arcar com os custos da operação, diante de uma classe
de Lsitas, de oportunistas: capitalistas, financistas, negociantes (cujos
rendimenrião são tributados), os moneyed men que se pavoneiam e, zombam
da nação alhadora. Não será do interesse desses oportunistas tornar-se
agitadores, dado só têm a lucrar com uma nova guerra que acarrete ao
Estado novos empréstie uma alta das taxas de juros? A guerra contra a
Espanha (1739), primeira ide fratura política do século, será em grande
parte obra deles. Por conseguinnatural que o sistema da dívida
consolidada, em que hoje se pode ver a base ncial da estabilidade
inglesa, tenha sido asperamente criticado pelos contempoos, em nome dos
bons princípios de uma economia sadia. com efeito, não pasde fruto
pragmático das circunstâncias.
São os grandes mercadores, os ourives, as casas bancárias especializadas
no amento de empréstimos, numa palavra, é o mundo dos negócios de
Londres, Lção decisivo e exclusivo da nação, que assegurou o sucesso da
política de emtimos. O estrangeiro também desempenhou seu papel. Em torno
dos anos de ), no limiar do período Walpole e durante todo este período,
o capitalismo holês revela-se artífice decisivo da operação. De Londres,
em 19 de dezembro de ), anunciam-se "novas remessas de mais de cem mil
libras esterlinas com o deio de as empregar nos nossos fundos' 1231.
Funds é a palavra inglesa que desig)s títulos da dívida inglesa. Também
se dirá às vezes securities, annuities. Como explicar as compras maciças,
pelos holandeses, de títulos ingleses? A taxa aros na Inglaterra é muita,
s vezes (nem sempre) superior às taxas praticadas nas dncias Unidas. E os
fundos ingleses, ao contrário das anuidades de Amsterdam, livres de
impostos, o que é uma vantagem. Por outro lado, a Holanda dispõe,
nglaterra, de um saldo comercial positivo: para as casas holandesas
instaladas, ondres, os fundos ingleses representam uma aplicação fácil e
comodamente moável dos seus lucros.
Alguns chegam a reinvestir os rendimentos dos seus títulos. raça de
Amsterdam, a partir de meados do século, forma assim, um bloco com
Londres. A especulação com os fundos ingleses, à vista ou a prazo, é em
ambas raças muito mais ativa e diversificada do que a especulação com as
ações das Comhias holandesas. Em linhas gerais, embora tais movimentos
não possam ser redus a um esquema simples,
Amsterdam serve-se do mercado paralelo dos fundos -ses para reequilibrar
suas operações de crédito a curto prazo. Pretendiam até que olandeses
teriam, em dado momento, possuído um quarto ou um quinto dos funingleses.
É um exagero. Escreve
Isaac de Pinto (1771): "Sei, por todos os banquei]e Londres, que o
Estrangeiro não vai além de um oitavo da dívida nacional., 9 232 Pouco
importa, entretanto!
Não é de admirar que a grandeza da Inglaterra Lça em detrimento de
outrem, dos emprestadores holandeses, mas também dos ceses, dos suíços ou
dos alemães. Nos séculos XVI e XVII, as rendas de Flo:a, de Nápoles ou de
Gênova não teriam sido tão vigorosas sem o subscritor

, -1 YUejeauac UU V LUF8JI4F99U UUO ~8JUntUai estrangeiro. Os ragusanos


deteriam, em 1600, 30O mil ducados dessas rendaS233.
OS capitais desconhecem fronteiras. ]Buscam a segurança. Todavia, terá
sido o sistema em si, terá sido a revolução financeira que assegurou a
grandeza da
Inglaterra? Os ingleses acabaram por se convencer disso. Em 1769, na
sétima edição de Every man his broker, Thomas Mortimer fala do cródito
pfiblico como do "standing miracle in politics, which at once astonishes
and over-awes the states of Europe 134. Em

1771, o tratado de Pinto, que muitas vezes citamos, põe-no nas nuvens235.
Pitt, em

1786, dizia-se "convencido de que nessa questão da dívida nacional


assentam o vigor e mesmo a independência da Nação`36.
Todavia, Simolin, o embaixador russo em Londres, embora também consciente
das vantagens da dívida consolidada inglesa, vê nela uma das razões para
a crescente carestia que se tornara em Londres, a partir de 178 1,
"enorme e ultrapassando toda imaginação' 1237. Não podemos deixar de
pensar que essa escalada das dívidas e dos preços poderia ter tido
resultados muito diferentes se a
Inglaterra não tivesse, ao mesmo tempo, se assenhoreado da dominação do
mundo.
Por exemplo, se não tivesse passado à frente da França na América do
Norte e nas índias, nessas duas regiões que foram os pontos de apoio
evidentes de seu desenvolvimento.
, vmentos, conjunturas roduto nacional
Só se compreendem as finanças públicas se enquadradas no conjunto da vida
econômica de um país. Mas precisaríamos de números exatos, finanças
claras, economias controláveis. Não temos nada nisso. Possuímos, porém,
orçamentos, melhor dizendo (pois esta palavra só assume o seu pleno
sentido no século XIX), levantamentos de receitas e de despesas
governamentais. Seria ingénuo da nossa parte considerá-los preciosos,
leviano não os levar em consideração.
Temos, por exemplo, os Bilanci venezianos desde o século XIII até
1797238; as contas dos Valois da Borgonha de 1416 a 1477239. Poderíamos
reconstituir os números referentes a Castela, isto é, à Espanha mais
ativa, nos séculos XVI e
XV11240: a documentação está em Simancas. Temos números bastante
completos relativos à Inglaterra, mas ainda está por fazer a sua crítica
acurada. Quanto à
França, só há quase ordens de grandeza241. Quanto ao Império Otomano,
está em curso uma investigação242. Quanto à China, ternos mesmo números,
embora bastante duvidosos243. Ao acaso de um relatório ou de um relato de
viagem, encontramos alguns sobre as rendas do Grão-Mogo1244 ou sobre as
do "czar' 1245.
Entretanto, os responsáveis têm apenas uma vaga idéia do que se passa em
sua própria casa. A noção de previsão orçamentária é, por assim dizer,
inexistente.
O estado geral das finanças elaborado em I? de maio de 1523 pelo governo
francês e que constitui, com certo atraso, uma previsão para o ano de
1523, é uma

246

raridade. Assim como, no século XVII, a ordem dada pelo Rei Católico à
Sommaria247, o tribunal de contas napolitano, para enviar uma previsão
orçamentária e um orçamento recapitulativo no fim do ano. Essa
racionalidade das repartições madrilenas explica-se pelo desejo de
explorar a fundo todos os recursos do reino de Nápoles. Chegam até a
ameaçar os conselheiros da Sommaria de uma suspensão do total ou da
metade dos seus emolumentos no caso de nãoexecução das

L~6jurstu UU.Y L-Unjunrosordens recebidas. Ora, os conselheiros encontram


dificuldades consideráveis.
Explicam que o ano fiscal não se ajusta bem ao orçamento anual de
Nápoles: o imposto do sal nos Abruzos começa em 1? de janeiro, mas nos
armazéns portuários da Calábria, em 15 de novembro; o imposto sobre as
sedas é arrecadado a partir de 1? de junho, e assim por diante. Enfim, o
imposto varia localmente, de um ponto para outro do reino. O trabalho
pedido por Madri só pode ser feito com previsíveis atrasos, e quem quiser
que proteste! com efeito, o balanço recapitulativo de

1622 chega a Madri em 23 de janeiro de 1625; o balanço de 1626, em junho


de

1632; o de 1673, em dezembro de 1676. Entre as conclusões, emerge uma


advertência: que não se preconize a dispensa dos arrendatários de
impostos e a estatização des~ tes: equivaleria a pô-los in 'mano del
demonio, na mão do demônio!
Na França, a mesma situação. Será necessário esperar pelo edito do mês de
junho de 1716 para que seja introduzida nas finanças públicas a
verificação das contas "pondo-as... em partidas dobradas"248. Mas trata-
se aí de um controle das despesas, não de um meio de as orientar
antecipadamente. Na realidade, o que falta na elaboração desses
orçamentos é um cálculo das previsões. Fiscaliza-se o ritmo das despesas
só pela observação da liquidez. O nível dos cofres assinala os limites
críticos, cria o verdadeiro calendário da ação financeira. Quando
Calonne chega, rias dramáticas circunstâncias que sabemos, à Inspeção
geral de
Finanças, em 3 de novembro de 1783, terá de esperar meses até conhecer a
exata situação do tesouro.
Os orçamentos imperfeitos que possuímos ou que reconstituímos valem,
quando muito, como "indicadores".
Ensinam-nos que os orçamentos flutuam conforme a conjuntura ascendente
dos preços; em linhas gerais, o Estado não sofre, portanto, com os
movimentos Je alta, acompanha-os. Não lhe acontece o que sucede aos
senhores cujos rendimentos, muitas vezes, ficam a reboque do índice
geral. Portanto, nunca um
Estado Ficará bruscamente entalado entre as rendas no nível da véspera e
as despesas no.lível do dia seguinte. A demonstração, esboçada nos
gráficos da página 473 no lue tange às finanças francesas do século XVI,
é mais bem elaborada quando se, rala das finanças espanholas ou
venezianas no mesmo período. E. Le Roy Ladu-ie249 pensa, porém, baseado
no exemplo do Languedoc, que teria havido, no sé, ulo XVI, certo atraso
da progressão das receitas do Estado em comparação com i vigorosa subida
dos preços, atraso recuperado a partir de

1585. Mas o que está 'ora de dúvida é o aumento das receitas do Estado
francês no século XVII. Se a :onjuntura conduzisse o jogo, essas receitas
deveriam refluir com a queda dos preos. Ora, no tempo de Richefleu (1624-
1642), elas duplicam ou triplicam, como se ) Estado nesse período
desanimador fosse "a única empresa protegida" capaz de Lumentar à vontade
as suas receitas. Não recorda o cardeal, no testamento, que )s
superintendentes das Finanças "igualaram imposto do sal sobre as Salinas,
sozitho às índias do rei da Espanha' 92501?

W3 4 4 9 O 15'00

1. O caso de Veneza

59 69 78á287 94 102d9 I 3j3à8'41

1 em libras tomesas índice 100: 1498

E w
- 1498 1514 21

2. O caso da França

57 60

96 160O ]o

O caso da Espanha
O índice dos preços da prata é tirado de Earl J. Hamilton, Os orçamentos
são calculados em milhões de ducados yteIhanos, moeda de cálculo que não
variou durante o período considerado. As avaliações orçamentárias são
tiradas ! um trabalho inédito de Alvaro Castillo Pintado. Desta vez,
apesar das imperfeições de cálculo das receitas, a coinci!ncia entre a
conjuntura dospreços e o movimento das receitasfiscais é muito mais
nítida do que nos casosprecedens.
Épossíveícalcularfacilmentegráficosprovisórios, análogos aos que traçamos
relativos à Sicilia e ao Reino de NdÚes, e mesmo ao Império0tomano, coisa
que o grupo de OmerLuftiBarkanid empreendeu por sua conta. Fernand,
audel, La
Méditerranée et le monde méditerranéen à 1'époque de Philippe II, 11,
1966 p.

33.
O vínculo que explicaria mais de uma anomalia é o que existe entre a
massa scal e o produto nacional do qual ela é apenas uma cota-parte.
Segundo um cálculo ferente a Veneza21' - mas temos de admitir que Veneza
é um caso muito espeal -, esta cota-parte poderia ser da ordem dos 1O a
15 % do produto nacional bru). Se
Veneza tem uma receita de 1.200.00O ducados em 1600, penso que o produto
acional bruto pode ser da ordem dos 8 a 12 milhões. Os especialistas da
história e
Veneza, com quem discuti o assunto, acham estes últimos números baixos,
senão tensão fiscal seria muito elevada. Seja como for, é evidente (sem
querer arrastar leitor para demasiados cálculos e análises) que a tensão
fiscal de um território mais isto e menos urbanizado do que o de Veneza é
forçosamente inferior, da ordem, ) que parece, dos 5%252. A extensão do
Estado territorial não terá sido favorecii por exigências fiscais menores
do que as dos Estadoscidades de reduzidas dimenSes? Tudo isso é
hipotético.
Mas, se os historiadores tentassem fazer o mesmo cálculo a propósito de
váos países, talvez se pudesse verificar, com a ajuda de algumas
comparações, se

1 ou não um meio de entrever o movimento do produto nacional. Sem isso,


qualier transferência para o passado das explicações e elucidações
tiradas dos estudos, uais sobre crescimento se tornaria ilusória. Pois é
em relação à massa global da nda nacional que tudo deve ser comparado e
medido. Por exemplo, se um histoador afirma ultimamente, a propósito da
Europa ocidental do século XV, que ; despesas de guerra oscilavam entre 5
e 15% da renda nacional, mesmo que tais, rcentagens sejam imprecisas e
não rigorosamente medidas, projeta-se uma nova z sobre esses velhíssimos
problemaS253. Porque 5%, o limite inferior, represengrOssO Modo, naqueles
tempos remotos, a taxa de um orçamento normal; 15 % um excesso que não
poderia durar sem catástrofes.

Alto-relevo do palacete de Jacques Coeur em Bourges, meados do século XV.


Representa um galeazzo de J. Coeur que, argentário do rei, participa
também do grande comércio internacional do seu tempo, o do Levante. (Foto
E. JanetLecaisne.)
"alemos de

7nancistas
A dupla imperfeição do sistema fiscal e da organização administrativa do
Estado, o recurso sistemático ao empréstimo explicam a posição
precocemente preponderante dos financistas. Constituem um setor à parte
do capitalismo, sólida, estreitamente ligado ao Estado, sendo por isso
que não o abordamos no capítulo anterior. Devíamos apresentar primeiro o
Estado.

A própria palavra não deixa de ser ambigüa. É sabido que o inancista, na


linfil guagem de outrora, não é um banqueiro. Em princípio, ocupa-se da
pecúmia do
Estado, ao passo que o banqueiro se ocupa de sua própria pecúnia e, mais
ainda, da dos seus clientes. Mas esta distinção revela-se bastante vã. E
do mesmo modo a distinção posterior entre financista público e financista
privado254. Na realidade, nenhum financista se limita ao ofício restrito
da finança. Faz sempre outra coisa particularmente, banco -, e essa outra
coisa integra-se num jogo global, em geral muito amplo e diferenciado.
E isso desde sempre. Jacques Coeur é o argentário de Carlos VIl; ao mesmo
tempo, é mercador, empresário de minas, armador; nesta qualidade, anima,
a partir de
Aigues-Mortes, um comércio do Levante que se quer independente do
monopólio veneziano. Os documentos do seu processo fornecem-nos a
interminável enumeração dos seus numerosíssimos negócios e empresaS255. A
seguir, "contratadores de impostos", "concessionários", "homens de
negócios", que encontramos em tão grande número na história financeira da
monarquia francesa, todos eles estarão também apenas meio envolvidos nas
finanças públicas; muitas vezes são, mesmo sem forçar os termos,
banqueiros a serviço do rei e, acima de tudo, a serviço de si próprios. O
dinheiro que emprestam, é preciso que o tomem emprestado e, forçosamente,
que se metam nos complicados jogos do crédito. É o que fazem, por
exemplo, os financistas italianos a serviço de Mazarino, Serantone,
Cenami,
Contarini, Airoli, Valenti, que o cardeal, com boas razões, colocou em
Gênova ou em Lyon, o que lhe permite um jogo incessante e lucrativo, se
bem que muitas vezes arriscado, com as letras de câmbio256. Mesmo quando
o financista é "oficial de finanças", como sói acontecer na França, de
forma que empresta ao rei o próprio dinheiro que recebeu dos
contribuintes, ele não se contenta com seu ofício de agente fiscal e de
prestamista. Vejamos, por exemplo, uma poderosa família de financistas do
Languedoc, a dos Castanier, na época de Luís Xkr257. A sua fortuna começa
com a guerra da Sucessão da Espanha. Uns recebem a talha em
Carcassonne, os outros são diretores da Companhia das índias, seus filhos
ou sobrinhos estão no Parlamento de Toulouse, antes de se tornarem
ministros de
Estado. Em Carcassonne, funcionam manufaturas Castanier. Em Paris, há um
banco
Castanier. Armadores de Cádiz e de Bayonne são comanditados por
Castanier. No tempo do Sistema de Law, há em Anisterdam um banco
Castanier. Mais tarde,
Dupleix, para sua política indiana, pedirá emprestado a Castanier. Outros
exemplos do que Chaussinand-Nogaret chama mercador-banqueiro-empresário-
armador-financista" da primeira metade do século
XVIII, os Gilly ou os Crozat. Antoine Crozat, um dos principais
emprestadores do rei e que queria regenerar a Companhia das índias (ao
lado de Samuel Bernard), participou da formação da Companhia do cabo
Negro, da Companhia da Guiné, do tratado do asiento (introdução de negros
na América espanhola), da Companhia do
Mar do Sul. Em suma, em todo o grande comércio internacional francês. Em
1712, obtinha o monopólio do comércio da Louisiana.
Mas a situação é diferente quando o financista, em vez de emprestar ao
Estado de que faz parte, vende seus serviços, no exterior, a outros
príncipes ou a outros
Estados. Será um ofício diferente, melhor? É o que afirma em todo caso
uma testemunha que, em 1778, representa o ponto de vista da Holanda: "É
preciso não confundir a arte do financista com essa arte destruidora,
funesto presente dado outrora pela Itália à França; com essa arte que
formou contratadores, arrematantes e

'3iUcteuaue UU U L;unjurstu UU'> cunjuntuy rendeiros de impostos,


conhecidos na Inglaterra pelo nome de pessoas de expedientes, cuja
habilidade algumas vezes foi tolamente louvada e cuja utilização qualquer
governo esclarecido deveria proibir-1, 258 Este tipo de financista
"superior", de qualidade internacional, desenvolve-se largamente, no
século XVIII, em Gênova, em Genebra, mais ainda em Amsterdam.
Nesta última cidade259, a distinção entre negociantes e banqueiros-
financistas se aprofunda com o fim do século XVII, e o fosso aberto
aumenta depressa. A responsabilidade do fato recai sobre o grande número
dos tomadores de empréstimos que se apinham na praça de Amsterdam. O
primeiro desses grandes empréstimos de Estado mediante emissão de
obrigações foi o "empréstimo austríaco de um milhão e meio de florins
tomado da casa Deutz, em 1695'9260. Assiste-se ao rápido desenvolvimento
desse ramo de negócios que movimenta, para além das "sucursais" que
tratam do negócio no atacado, uma multidão de corretores e
subcontratantes que distribuem entre o público títulos e obrigações e, de
passagem, recebem uma comissão. "Fechado" o empréstimo, os títulos são
introduzidos na Bolsa. Então, é um jogo corrente fazê-los subir, e
liquidar acima da paridade os títulos que muitas vezes foram obtidos em
condições especiais e vantajosas, depois efetuar uma operação análoga,
com condição de deixar de ser "encarregado de uma parte do empréstimo
anterior". É assim que o colossal banco de Henry Hope, sucessor da firma
de Smeth como emprestador de
Catarina II, consegue lançar, entre 1787 e

1793, dezenove empréstimos russos de três milhões de florins cada, ou


seja, um valor total de 57 milhõeS261. Foi portanto com a ajuda do
dinheiro holandês, escreve J. G. Van Dillen, que a Rússia pôde
conquistar, a expensas da Turquia, um grande território que ia até o
litoral do mar Negro. Outras firmas, Hogguer,
Horneca & Cia., Verbruge & GolI, Fizeaux, Grand & Cia., Smeth, participam
dessas aplicações de empréstimos que interessam a toda ou a quase toda a
Europa política. Entretanto, esses jogos fáceis passaram por alguns
desastres (mas são os riscos do ofício): um empréstimo austríaco
contraído mediante canções silesianas, em

1736, ruiria em 1763, com a conquista da Silésia por Frederico II; mais
tarde, será a catástrofe dos empréstimos contraídos pela França, a partir
de 1780.
Este domínio da finança de Amsterdam não é, em si, uma novidade: sempre
houve, desde a Idade Média, num ou noutro país, um grupo financeiro
dominante que impôs seus serviços a toda a Europa. Mostrei com pormenores
a Espanha da Casa da Áustria à mercê dos mercadores da Alta Alemanha no
tempo dos Fugger, depois, após 1552-1557, dos hombres de nègocios
genoveses; a França, séculos a fio sujeita à habilidade dos mercadores
italianos; a Inglaterra do século XIV, controlada em rédea curta pelos
banqueiros mutuantes de Luca e de Florença. No século XVIII, a França
submete-se finalmente à internacional do banco protestante. E é o momento
em que triunfam na Alemanha os Hofjuden, os judeus da corte que
contribuíram para o desenvolvimento e para o funcionamento, em geral
difícil, mesmo para Frederico II, das finanças do príncipe.
A Inglaterra, como tantas vezes, revela-se um caso à parte. Quando
recuperou o controle de suas finanças, afastou a intervenção dos
mutuantes que outrora, como na França, haviam dominado o crédito. Assim,
uma parte do capital da nação foi desviada para os negócios, acima de
tudo para o comércio e para o banco. Mas, enfim, o crédito público não
deixava fora do jogo as potências financeiras do passado. Claro que o
sistema dosfunds, precocemente generalizado, para créditos tanto

477

;amento dos tributos (Pormenor), de Bruehgel, O MOÇO (c. 1565-c. 1637).


(Gand,
Museu gelas Artes, foto Giraudon.)
a curto como a longo prazo, era dirigido a todo o público. O admirável
estudo de P. G. M. Dickson fornece a lista das categorias de
subscritores: vão de alto a baixo na escala social. Mas o autor não teve
dificuldades em provar que, sob essa aparente abertura, um reduzido grupo
de mercadores e de financistas, acostumados aos jogos da especulação,
domina o processo dos empréstimos ao
Estado, realizando assim a sua desforra262. Em primeiro lugar, porque a
parte dos numerosos pequenos subscritores representa apenas uma pequena
proporção do total dos empréstimos subscritos. Em segundo, porque, tal
como em Amsterdam, os manipuladores de dinheiro que lançam o empréstimo
não se contentam em colocar as subscrições; compram por sua conta enormes
carteiras de títulos de que se servem quase em seguida (às vezes mesmo
antes de fechados os registros) para especular, aproveitam um novo
empréstimo para jogar com o anterior. Ao denunciar ao
Parlamento o monopólio das finanças do Estado que se arrogaram aqueles a
que, com desprezo, chama undertakers, Sir John Barnard acaba por
conseguir que os empréstimos de

1747 e 1748 sejam abertos diretamente ao público, sem a intermediação dos


financistas. Mas a especulação não teve dificuldade em dar a volta ao
novo sistema de subscrição e percebeu-se, uma vez mais, que o governo não
podia dispensar esses profissionais se quisesse conseguir um empréstimo
263. De tal modo, conclui P. G. M. Dickson, que é preciso reconhecer um
sólido fundamento nas queixas dos tories contra o mundo do dinheiro e não
ver nisso simples ignorância e preconceito de quem foi excluído264.
ontratadores no Arrendamento !ral
A França monárquica não conseguiu "estatizar" suas finanças. Talvez não o
tenha tentado seriamente, a despeito dos esforços do abade Terray, de
Turgot e, sobretudo, de Necker. Mas a monarquia acabou por morrer disso.
Se a Revolução conseguiu realizar logo de início a reforma financeira,
foi porque a maior dificuldade era acima de tudo de ordem social e
institucional265. J. F. Bosher tem razão em dizer (1970) que o que conta,
na longa história das finanças monárquicas, é menos o equilíbrio das
receitas e das despesas, que, evidentemente, teve relevância, do que a
estrutura de um sistema em que, ao longo de séculos, triunfam os
interesses privados.
com efeito, a França não tem finanças públicas, nem sistema centralizado;
portanto, nem a ordem nem a previsão são possíveis. Todas as engrenagens
estão fora de um verdadeiro controle governamental. As finanças dependem,
na realidade, de intermediários que asseguram as entradas de impostos, de
tributos, de somas emprestadas. Esses intermediários são as cidades,
mormente Paris (rendas sobre a Câmara Municipal) e Lyon, os estados
provinciais, a Assembléia do clero, os rendeiros que recebem os impostos
indiretos, oficiais de Finanças que administram os impostos diretos.
Imagine-se o que aconteceria ao Tesouro
Público francês, hoje, se não tivesse a seu lado o Banco da França e, às
suas ordens e sob as suas ordens, os coletores, os fiscais e toda a
administração, pesada sem dúvida, um bastião sem dúvida, da rua Rivoli! E
se toda a máquina estivesse nas mãos de empresas privadas ou
semiprivadas? A monarquia encontravase nessa situação:

krrecadamento Geral. É fruto tardio, perfeitamente maduro quando, em


1730, icrativo monopólio do tabaco veio juntar-se ao imenso domínio
anterior do
Ardamento. De seis em seis anos, o arrendamento da gabela era adjudicado
a um ade-ferro, habitualmente um camareiro do inspetor-geral. Os quarenta
arrenários gerais eram os fiadores da execução do contrato. Haviam
depositado enor; fianças (até 1.500.00O libras por pessoa) cujos juros
lhes eram entregues. Essas ias garantiam os primeiros pagamentos
antecipados ao fisco, mas, precisamenor seu enorme volume, tornavam os
arrendatários gerais inamovíveis, ou quadas suas funções. Para os
expulsar - pois isso acontecia -, era preciso nbolsá-los e, dificuldade
adicional, encontrar um substituto igualmente abonado.
Conforme os termos do contrato, o Arrendamento pagava antecipado ao rei o
itante previsto no contrato - na realidade, apenas uma parte da renda
anual dos tiplos impostos que se encarregava de arrecadar. Terminada a
operação, uma parintástica da riqueza do país ficava nas mãos dos
arrendatários, arrecadada do do tabaco, do trigo, de importações e
exportações de toda a espécie. Evidenteite, o Estado aumentava as suas
pretensões de contrato em contrato: 1726, 8O mis; 1738, 91;

1755, 110; 1773, 138. A margem de lucro, porém, mantinha-se enorme.


Naturalmente, não entrava quem queria nesse clube de riquíssimos
financistas.
preciso ser também riquíssimo, ter a aprovação do inspetor geral, dar
sinais de ide respeitabilidade, ter feito carreira nas repartições de
finanças, ter ocupado um o de intendente ou participado da Companhia das
índias. E, sobretudo, ser acei-lo próprio clube. Como eram os
arrendatários gerais que faziam, direta ou indinente, as nomeações para
uma série de cargos decisivos, dispunham dos meios )ntrolar as entradas
individuais, de prepará-las de antemão ou de impediIas. Toindidatura
coroada de êxito, quando podemos segui-Ia de ponta a ponta, revela
ativas, esperas, proteções, compromissos e presentes. O Arrendamento
Geral é vamente uma espécie de clã familiar em que casamentos, antigos e
novos parens, cruzam e recruzam os seus laços. Se procedêssemos a um
estudo genealógico Wo desses quarenta potentados (são exatamente 44 em
1789), dadas as suas nusas alianças, "não é de excluir que [tal]
comparação [... ] tivesse como resultado -los todos em duas ou três, ou
até numa só família"272. Vejo aqui mais uma proL insistente regra do
pequeno número, da centralização estrutural da atividade alista. Estamos
em presença de uma aristocracia de dinheiro que, muito naturale, transpôs
a porta de entrada da alta nobreza.
k grande prosperidade do Arrendamento Geral situa-se, por alto, entre
1726

6, um período de meio século. Tais datas têm importância. O Arrendamento

1 é o remate de um sistema financeiro construído, pedaço a pedaço, pela


mojia.
Ao criar seus quadros de "oficiais", ele oferecera às atividades
financeibase do seu desenvolvimento. Tinham-se instaurado poderosos e
tenazes sis; de origem familiar, e duravam. Mas, com o Sistema de Law,
começa, para ancistas, uma nova era de inaudita prosperidade. Não são os
especuladores inados que constituem o grosso dos "homens do Mississipi"
enriquecidos, im as pessoas do meio financeiro. Ao mesmo tempo, o centro
econômico da 'rancesa passa então de Lyon para Paris. Os provincianos vem
para a capital, plicam os vínculos úteis e ampliam o horizonte de seus
interesses e atividades. ponto de vista, nada mais característico do que
o exemplo, de que já falados languedocianos. A sua província representa
um décimo da população do ora, eles formam, em Paris, nas atividades
financeiras em sentido lato (in

clusive os municionários), o grupo mais numeroso. Terão um sucesso


considerável em escala nacional. Mas a história da França não é, em todos
os campos (guerra, literatura, política... ), a riqueza das províncias
que chegam, uma após outra, como que alternadamente, à frente do palco?
Claro que não foi o acaso que levou o Languedoc para o primeiro plano das
atividades financeiras francesas. Suas exportações de sal (salinas de
Peccais), de trigo, de vinho, de tecidos, de sedas, voltam-no
naturalmente para o exterior. Outra vantagem: o fato de que nele o mundo
dos negócios é tanto protestante como católico. A revogação do edito de
Nantes só mudou as coisas na aparência. O lado protestante é o exterior -
ao mesmo tempo Gênova, onde os protestantes têm pouso, Genebra,
Frankfürt, Amsterdam, Londres. Não é de admirar que os homens de negócios
católicos ponham de lado suscetibilidades religiosas:
o vínculo entre católicos e protestantes é um vínculo econômico
necessário interna e externamente. E impõe-se em todos os centros
mercantis do reino. Mas, com este jogo, o banco protestante acabará por
colonizar a França. Apresenta-se como um capitalismo de ordem superior,
um caldeamento dos negócios de tal modo mais amplo do que o das
atividades financeiras francesas que, pouco a pouco, se distancia desta e
a deixa para trás. Em 1776, a chegada de Necker à inspeção geral das
Finanças (embora não lhe seja então concedido o título de inspetor) é um
momento decisivo de todo o sistema financeiro da França. Necker é o
inimigo do Arrendamento: o estrangeiro ergue-se contra o manipulador de
dinheiro autóctone.
O mal, para o mundo financeiro francês, é que, ao mesmo tempo que se
afasta cada vez mais dos seus antigos hábitos de investimento ativo, se
concentra em suas próprias atividades e perde visivelmente terreno, mesmo
aos olhos de um parisiense médio como Sébastien Mercier: "O que há de
singular é que quiseram absolver o mundo financeiro por ganhar hoje menos
do que outrora, mas seus ganhos ainda devem ser imensos, uma vez que ele
batalha tão vigorosamente pela manutenção de suas operações.11273

O Arrendamento Geral durará até a Revolução, que reservará aos seus


membros um fim trágico: 34 execuções em floral, prairial, termidor ano 11
(maio-julho de

1794). Suas fortunas ostensivas, seus vínculos com a alta nobreza, as


enormes dificuldades financeiras do Estado às vésperas da Revolução os
destinavam à vindicta pública. Não tiveram a sorte de tantos negociantes
e banqueiros da província ou de Paris que souberam dissimular seus
capitais até o momento de se tornarem, oportunamente, os municionários e
os emprestadores de dinheiro dos novos regimes.
Política econômica dos Estados: mercantiliSM0274

Poder-se-á falar de uma política econômica dos Estados europeus, sempre a


mesma, quando sua ação é forçosamente diversificada e tão dominada por
contingências particulares ou mesmo contraditórias? Imaginar tal ação sob
aspectos uniformes e nitidamente definidos seria certamente dar-lhe uma
coerência que ela não poderia ter. É o que Sombart faz, em sua busca de
uma equação impossível do mercantilismo.
T. W. Hutchinson275 por certo tem razão quando convida historiadores e
economistas a eliminar a própria palavra, mercantilismo, "uma das mais
lamentáveis e mais vagas palavras terminadas com ismo dos nossos
dicionários", tardiamente

iiada a partir do mercantil system a que Adam Smith faz guerra na sua
obra clásde 1776. Todavia, por pior que seja, o rótulo reúne comodamente
uma série de
- s e atitudes, projetos, idéias, experiências que marcam, entre o século
XV e o

111, a primeira afirmação do Estado moderno relativamente a problemas


concrejue é preciso enfrentar. Em suma, segundo a fórmula de H.
KelleribenZ276 (1965), nercantilismo é a principal orientação da política
econômica (e do pensamento implícito) no tempo dos príncipes absolutos da
Europa". Talvez fosse melhor r, em vez de príncipes absolutos (a
expressão é abusiva), Estados territoriais, ou idos modernos, a fim de
destacar a evolução que os impeliu a todos para a sua ternidade. Mas por
vias e segundo etapas diferentes. De maneira que um historiapode dizer
(1966), sem risco de se enganar: "Há tantos mercantilismos quantos
-antilistas.-- 277 Esboçado no século XIV, talvez no século XIII com o
espantoso [erico 11 da Sicília278 presente ainda no século XVIII, esse
mercantilismo de tão a direção por certo não é um "sistema" fácil de
definir de uma vez por todas, a coerência que Adam Smith lhe atribui para
melhor o desmascarar 279.
Um estudo rigoroso deveria distinguir conforme os lugares e as épocas. Já
Ri-d
Hãpke falava, reportando-se ao período entre o século XIII e o XVIII, de
um, de um Hoch (na época de CoIbert), depois, após a morte deste (1683),
de pãtmerkanti1ismus280. Henri Hauser, pelo contrário, assinalava um
"colbertisantes de CoIbert' '281. com efeito, o mercantilismo não é mais
do que o avanço tente, egoísta, logo veemente do Estado moderno. Garante
Daniel Villey:
"Foos mercantilistas que inventaram a nação' 9282, a menos que tenha sido
a nação, pseudonação em gestação que, inventando-se a si própria, tenha
inventado o -antilismo. Este, em todo caso, facilmente se dá ares de uma
religião de
Estado. zombar de todos os economistas oficiais, o príncipe de Kaunitz,
um dos grandes dores de Maria Teresa, não hesitava em dizer-se um
"ateísta da economia'

283. Seja como for, logo que houve um surto de nacionalismo, de defesa ao
longo fronteiras mediante direitos aduaneiros às vezes "violentos' 9284
logo que uma ia de egoísmo nacional se fez sentir, o mercantilismo pôde
reivindicar o seu

4. Castela proíbe as exportações de trigo e de gado em 1307, 1312, 1351,


1371, ', 1390285 ; assim também a França bloqueia a exportação de cereais
no tempo ilipe o Belo, em 1305 e 1307 285. Melhor ainda: houve no século
XIII um Acto avigación aragonês, antepassado do inglês; na Inglaterra, em
1355 286 é proia importação de ferro do estrangeiro; já em 1390, o
Statute of Employment sa aos estrangeiros o direito de exportar ouro ou
prata, têm de transformar lucros em mercadorias inglesaS287 . E se
perscrutássemos atentamente a históomercial das cidades italianas sem
dúvida iríamos encontrar uma profusão de idas análogas.
Não há, portanto, nada de novo nas grandes decisões do merIlismo
clássico: o Ato de Navegação inglês de 1651; os direitos impostos por )
ert sobre as cargas dos navios estrangeiros (1664, 1667); ou o
Produktplakat estabelece, em 1724, os direitos do pavilhão nacional da
Suécia 288, excluindo arcos holandeses que, até então, lhe haviam
transportado o sal do Atlântico. Inuiu a quantidade de sal importado,
aumentou o seu preço, mas o golpe deso no concorrente favoreceu o
desenvolvimento de uma marinha sueca que em, seria vista em todos os
mares do mundo. Tudo isso mostra que o mercantilisIão passa, afinal, da
política do cada um por si. Tanto Montaigne como Volo afirmaram, o
primeiro sem pensar muito nisso, falando em general: "A vanii de um não
pode deixar de ser o prejuízo do outro"; o segundo, abertamenÉ claro que
um país não pode ganhar sem que outro perca" (1764).

Jean-Baptiste Colbert, por Cl. Lefebvre. (Museu de Versalhes, ColeCdo


Viollet.)

Ora, a melhor maneira de ganhar, segundo os Estados mercantilistas, é


atrair i si uma parte, a maior possível, da reserva mundial de metais
preciosos e em seguiIa impedi-Ia de sair do reino. O axioma de que a
riqueza de um Estado corresponle a uma acumulação de metais preciosos
dirige, na realidade, toda uma
Política le múltiplas conseqüências e implicações econômicas. Guardar
para si as matérias)rimas, trabalhá-las, exportar produtos manufaturados,
reduzir, mediante tarifas )rotecionistas, as importações estrangeiras -,
essa política que nos parece uma poítica de crescimento através da
industrialização é, de fato, dirigida por motivações liferentes. Já um
edito de Henrique IV (anterior a 1603)
propunha o desenvolviriento das manufaturas "por ser o único meio de não
transportar para fora do reiio o ouro e a prata para enriquecer os nossos
vizinhos' 9289. F. S. Malivsky, advoado do território de Brno, enviou ao
imperador Leopoldo 1, em 1663, um volu..-ioso relatório no qual indicava
que "a
Monarquia habsburguesa paga ao estraneiro anualmente alguns milhões por
mercadorias estrangeiras que seria Possível roduzir no país' '290. Para
La
Pottier de La Hestroy (setembro de 1704), o prolema é de luminosa
simplicidade:
se o excesso da balança se traduz pela chegada e mercadorias, "essas
mercadorias só servem para o luxo e para a sensualidade Jos habitantes] e
não para enriquecer o Reino, porque as mercadorias acabam por
- destruir com o uso. Pelo contrário, se a troca é feita em dinheiro, que
o uso ão destrói, o dinheiro deve ficar no Reino e, aumentando todos os
dias cada vez iais, deve tornar o Estado rico e poderoso""'. Seguindo-lhe
os passos, Werner ombart afirma que "desde as Cruzadas até a Revolução
francesa" houve, entre
Estado e as minas de prata e as lavras de ouro, uma estreita dependência:
"por atras palavras, o mesmo tanto de prata (e mais tarde ouro), o mesmo
tanto de )rça do Estado", so viel Silber (spãter Gold), so viel Staat`11

Portanto, não esbanjar as espécies monetárias é idéia que obceca os


Estados.
ouro e a prata são "tiranos", dizia RichelieU293. Numa carta de I? de
julho de

69294 CoIbert, primo do grande Colbert, antigo intendente da Alsácia,


embaiidor de Luís XIV em Londres, comenta a decisão do governo inglês que
proíbe Irlanda de exportar bois. Isso priva a França e a sua marinha de
um abastecimenbarato de barricas de carne salgada. Que fazer? Importar
bois da Suíça ou da lemanha "como vi efetivamente ser praticado [pelos
açougueiros] quando estive Alsácia"?
Talvez. Mas "vale mais comprar o boi bem caro dos súditos do Rei, ier
para os navios, quer para a necessidade dos particulares, do que o obter
mais rato dos estrangeiros. Ficando o dinheiro que se gasta no primeiro
dentro do reie servindo para dar aos pobres súditos de Sua Majestade
meios de pagar seus butos, ele volta aos cofres do Rei, ao passo que o
outro sai do reino". Tratase, m toda a evidência, de lugares-comuns, tal
como as palavras do outro
Colbert, lerdadeiro, que julgava estarem "todos [... ] de acordo em
reconhecer que a granza e o poderio de um Estado se medem unicamente pela
quantidade de dinheiro e ele poSSUi"295. Cinqüenta anos antes, em 4 de
agosto de 1616, Don
Hernando Carrillo recordava a Filipe 111 que "tudo se mantém à força de
dinheiro... e a, ça de Vossa Majestade consiste essencialmente no
dinheiro; no dia em que ele tar, a guerra estará perdida"296. Palavras
lógicas, sem dúvida, na boca do preente do Conselho de Finanças de
Castela. Mas não faltam os seus equivalentes, pena dos contemporâneos de
Richefleu ou de Mazarin. "Sabeis,
Excelência", reve ao chanceler Séguier (26 de outubro de 1644) o
referendário
Baltazar,

enviado em missão a Montpellier, "que, do modo como agora se faz a


guerra, o derradeiro grão de trigo, o derradeiro escudo e o derradeiro
homem decidem a vitória.' 9297 É certo que a guerra, cada vez mais
dispendiosa, contou para o desenvolvimento mercantilista. com o progresso
da artilharia, dos arsenais, das frotas de guerra, dos exércitos
permanentes, da arte das fortificações, as despesas dos Estados modernos
aumentam muito depressa. Guerra é dinheiro e mais dinheiro. E o dinheiro,
a acumulação do metal precioso, torna-se obsessão, razão fundamental das
ponderações e dos juizos.
Dever-se-á condenar tal obsessão por pueri19 Considerar, numa óptica
moderna, que era absurdo, até pernicioso, deter e vigiar o fluxo de
metais preciosos? Ou será o mercantilismo a expressão de uma verdade
básica, isto é, que os metais preciosos serviram, séculos a fio, de
garantia e de motor à economia do Ancien
Régime? Apenas as economias dominantes deixam circular livremente as
especies monetárias: a Holanda no século XVII, a Inglaterra no século
XVIII, as cidades cornerciais da Itália alguns séculos antes (em Veneza,
prata e ouro entravam seril dificuldade e tornavam a sair contanto que
tivessem sido cunhados de novo na Zecca). Será de concluir que a livre
circulação dos metais preciosos, sempre excepcional, foi a escolha
inteligente da economia dominante, um dos segredos da sua grandeza? Ou,
pelo contrário, que só a economia dominante podia permitir-se o luxo de
tal liberdade que só a ela não oferecia perigos?
Nas palavras de um historiador, a Holanda não teria conhecido nenhuma
forma de mercantiliSM0298. É possível, porém é ir muito longe. É
possível, porque a
Holanda teve a liberdade de agir que o poder confere. De portas abertas,
sem temer ninguém, sem sequer ter necessidade de refletir muito sobre o
sentido da sua ação, é objeto de meditação para os outros mais ainda do
que para si própria. Mas é ir muito longe, pois o exemplo das outras
políticas é contagioso, o espírito de represália natural. A força
holandesa não exclui inquietações, nem certas dificuldades, nem certas
tensões. Então, impõe-se-lhe a tentação mercantilista: assim,
bruscamente, sente-se inferiorizada ante as estradas novas e modernas
construídas em

1768 nos Países Baixos austríacoS299. Mais ainda, ao acolher os


huguenotes franceses com as suas indústrias de luxo, se empenhará a fundo
em protegêlaS300. Terá sido um cálculo judioso, no contexto das
atividades holandesas?
Isaac de Pinto sustenta que teria valido mais manter-se fiel a um
"comércio de economia", a um regime de portas abertas, e acolher sem
restrições excessivas os produtos industriais tanto da Europa como da
índia101.
Na verdade, a Holanda não podia escapar ao espírito do seu tempo. Suas
liberdades comerciais não passam de aparência. Toda a sua atividade
redunda em monopólios de fato, que ela vigia atentamente. Aliás, no seu
Império colonial, comportou-se como os outros, pior do que os outros.
Ora, todas as colônias da
Europa foram consideradas reservas privativas submetidas ao regime do
Exclusivo.
Se a regra não for infringida, nem um prego será forjado, nem uma peça de
tecido será fabricada, na América espanhola, por exemplo, a não ser que a
metrópole autorize. Felizmente para elas, as colônias ficam a meses, a
anos de navegação da Europa. Por si só tal distância cria liberdade, pelo
menos para alguns: as leis das índias, dizia-se na América espanhola, são
teias de aranha: apanham os pequenos, não os grandes.
Mas voltemos à questão: o mercantilismo foi um simples erro de juizo, uma
obsessão de ignorantes que nao compreendiam que os metais preciosos não
são a substância do valor, que a substância do valor é o trabalho? Não é
assim tão certo,

>agalnento do soldo aOs soldados do qq )IS a vida


OcOnÔMica desenvolve exérlitO, Por Callot. (Foto Bulloz.)
ilação do papel, se é que Podem -se em dois Planos: a circulação da
moeda, a cirziain Os franceses do século XVos confundir sob esta de
' ,,,, para grande escânda SIgnação cÔrnoda (corno s os títulos
"artificiais, ' de cr ]o de Isaac de Pinto) totra. Todo o piso édIto-
Dessas duas ci-rculaç; banqueir^ superior Pertence ao papel 'os, urna
está acima da s dos negociantes . As Operações dos cOntratadores, 'or,
Ma, no plano exprimem-se essencialme n da vida cotidian, só se atua co
nte nessa linguagem suás.Nesse piso nesse térreo O papel é mal aceito,
cim , boas Os Pequenos transPortadore' esPécies sonantes

1601 s que vão levar a art rcula mal, Não se rernUnecom Pape1302.
ilharia fr nheiro. Já em 1567, com papel, não se arranjará nem ancesa
para a Sabóia, quando o duque de Alba chega a um soldado, nem um xérc'tO,
Os soldos e1as.desPesas são pa Os Países Baixos com ) Filipe Ruiz MartIn
Já demonstrou gos 0111 Ouro, o brigatoriam ente em ouro
O soldado Por falta de melhor, a há m U, -to tempo303 1 que Pode, a troca
por ouro. ceitará a Prata. Ma" Só a Partir de 1598 Trazer a fortuna
S' logo que a recebe, Oedas que se Podem enfiar numa bolsa Ou n consigo'
so , em, uma necessidade b a forma de pequeum cinto, é para O soldado uma

7eis como o pão. A guerra são moedas de ouro Ou de Prata, tão indis
- - -- - citos nem realizar todas as suas tarefas, obrigado, de fato, a
dirigir-se a Outrem e sofrendo as conseqÜências disso.
Se essa obrigação se lhe impõe em todas as direções, é acima de tudo
Porque não dispõe de um aparelho administrativo suficiente. A França
monárquica é apenas um exemplo entre todos os outros. Por volta de 150(),
segundo a estimativa bastan Otimista de um historiador30% ela disporia de
12 mil pessoas a seu ser te viço, numa população de 15 a 2O milhões de
habitantes. E há o risco de este número, 12 mil, ser Um teto: ao que
parece, não fora ultrapassado no reinado de Luís Xjv. Por volta de

1624, um born observador, um tanto desencantado, Rodrigo ViVer0310

o Rei Católico nomeia para , indica que "70.00O Plazas, oficios y


dignidades,, numa Espanha menos povoada do que a -França, mas dotada de
um Imperio enorme. A burocracia moderna, tão do agrado de Max Weber, é
portanto essa reduzida População. E tratarse-á realmente de uma
burocracia no sentido que hoje se dá ao termo3119

Ninguém poderá garantir esses números de 12 mil ou 7O mil do


Cristianíssimo ou do Católico. Tânibém é certo que o Estado in Pessoas a
serviço oderno não cessa a partir dessa base, de ampliar os círculos de
sua ação, sem nunca conseguir, aliás incluir neles a nação inteira. Mas
este e muitos Outros esforços análogos são comba tes perdidos de antemão.
Na França, o intendente que é, em cada généralité, O representante direto
do governo central quase não tem colaboradores ou s bdelegados. Daí a
necessidade que tem o homem do rei de elevar a voz para ser ouvido e
obedecido e, muitas vezes, de punir para servir de exemplo. O próprio
exército é insuficiente, mesmo em tempo de guerra, a fortiori em tempo de
paz. Em 1720, para estender ) cordão sanitário que Protege o país da
peste de Marselha, são chamadas todas as )atrulhas, todas as tropas
regulares. O País, as fronteiras ficam abandoriadOS312. Mas Ião ficarão
todas essas ações perdidas num espaço cem vezes mais vasto do que o tua],
relativamente? Tudo aí se dilui, desgasta a sua força.
A monarquia francesa só mantém O Prestígio colocando a sociedade ou as
soiedades e, ademais, a cultura, a seu serviço - a sociedade, isto é, as
classes que
Dminam pelo prestígio, pelas funções, pela riqueza; a cultura, isto é, os
milhões ' vozes, os milhões de ouvidos, tudo o que se diz, se pensa ou se
repete de um Irerno ao outro do reino.
As estruturas sociais mudam tão lentamente que o esquema de Georges Gur,
ch, imaginado para o século XIII, pode ainda servir de guia válido. Mesmo
em m

89, cinco sociedades se destaca nos planos elevados da hierarquia: os


oficiais erviço do rei, a aristocracia de caráter feudal, a classe dos
senhores, as cidades, cidades com fora], e por fim a Igreja. com cada uma
delas, a monar
Compromissos, um tno uia estabedus vivendi. A Igreja é controlada -
poder-se-á dizer foi comprada pelo menos duas vezes e a alto preço: pela
Concordata de 1516, entrega a nomeação do alto clero ao rei (mas nesse
momento a monarquia esieu entre Roma e a Reforma, uma escolha dramática,
talvez inelutável, mas prede conseqÜências); e outra vez em 1685, quando
da revo ação do edito de Nanque custa ao reino uma parte considerável da
sua Prospgridade? Quanto à no:a senhorial e à alta nobreza, o ofício das
armas é ainda assim uma carreira basc Promissora, numa época de guerras
contínuas. E a Corte e o pactolo das pensão um constante chamariz. Aliás,
não se poderia dizer até que ponto, indelentemente deste jogo, a
monarquia se une à sua, às suas nobrezas. Norbert , sociólogo, pensa que
uma sociedade fica marcada para empre, é determinaelas suas fases
anteriores e não menos fortemente pelsas suas origens pri n rei calos IX.
(FOto N.D. Roger- Viollet.)
Is um monarca como Luís XIV arrecada, Por meio dos cargos úblicos, uma
p :)s
PatriMÔnios burgueses - é uma espécie de . Os oficiais são controlados
tege as classes inferiores de eventuais exações imposto eficaz; Por outro
Ia;tante firmeza. Contudo, depois do reinado autoritário de Luís XIV, as
coi-essa tomam mau rumo. A partir de meados do século XVIII, a opinião
esciarecida ergue-se contra a venalidade dos cargos que, tendo sido algum
worável ao regime
Monárquico, deixa de Sê-lo315. Isso não impede que em Holanda, fale-se em
estabelecer um regime à francesa para lutar contra Juia das cidades e a
sua corrúpção316.

- 1 3UC1L1UUUt UL4 - -j-- -- --J-.


Assim, portanto, a monarquia na França - e em toda a Europa moderna é
toda a sociedade. Deveríamos talvez dizer, acima de tudo, a alta
sociedade. Mas por meio dela é a massa dos súditos que é controlada.
Toda a sociedade, mas também toda, ou quase toda a cultura. Do ponto de
vista do
Estado, a cultura é uma linguagem ostentatória e que surte efeito, deve
surtir.
A sagração em Reims, a cura das escrófulas, os palácios magnificenteS317
são admiráveis trunfos, garantias de êxito. Mostrar o rei é outra
política ostentatória e que dá bons resultados. De 1563 a 1565, dois anos
a fio, Catarina de Médicis obstina-se em apresentar, em todo o reino, o
jovem Carlos IX aos seus súditos 318. Que desejava a Catalunha em 1575
3199 Ver o rosto de seu rei, "ver el rostro a su rey". Uma coletânea
espanhola de preceitos que remonta a

1345 já afirma que "o Rei é para o povo conio a chuva é para a
terra'1320. E a propaganda cedo oferece os seus serviços, uma propaganda
tão velha quanto o mundo civilizado. Na França, a este respeito, a única
dificuldade está na escolha. Diz um panfletista de

1619321: "Vemo-nos como pequenos mosquitos diante da águia real. Que


agrida, que mate, que faça em pedaços aqueles que forem rebeldes às suas
ordens! Mesmo que sejam as nossas mulheres, os nossos filhos, os nossos
parentes próximos."
Impossível exprimir-se com mais clareza. Apraz-nos, porém, saber que
houve, de tempos em tempos, algumas notas discordantes. "Não estás
ouvindo, caro leitor, as trompetas, os oboés e a melodia da marcha do
nosso grande monarca, traterá, traterá, traterá? Sim, eis o incomparável,
o invencível que acaba de se fazer sagrar" em Reims, onde vive e escreve
o nosso burguês mercador, Maillefer322 (3

de junho de 1654). Deveremos ver nele o burguês típico que Ernest


Labrousse descrevia como um recalcado socia13239 O burguês que foi
sucessivamente partidário da Liga do janseniSMo324 da Fronda. Mas, até o
grande movimento do século das Luzes, grunhe quase sempre à porta
fechada.
Sobre o campo operacional da cultura e da propaganda, haveria muito que
dizer.
Tal como sobre a forma assumida pela oposição esclarecida: parlamentar,
hostil ao absolutismo real ou ao privilégio nobiliário, mas não ao
privilégio do capital. Voltaremos a este ponto. Também não vamos
introduzir no debate o patriotismo e o nacionalismo. São ainda recém-
chegados, quase na sua primeira juventude. Não estão de modo algum
ausentes entre os séculos XV e XVIII, tanto mais que as guerras não param
de favorecer-lhes o fortalecimento, de atiçar-lhes a chama. Mas não
antecipemos. Também não vamos inscrever a Nação no ativo do
Estado. Como sempre, a realidade é ambígua: o Estado cria a Nação, dá-lhe
um contexto, um ser. Mas o inverso é verdadeiro e, por mil canais, a
Nação cria o
Estado, traz-lhe suas águas vivas e suas paixões violentas.
Estado, economia, caPitalismo
Pelo caminho, fomos pondo também de lado toda uma série de problemas
interessantes, mas será que valeriam uma demora mais prolongada? Assim,
eu deveria ter dito metabolismo sempre que os metais preciosos ocuparam o
primeiro plano, e não mercantilismo? Embora este implique
obrigatoriamente aquele que, sejam quais forem as aparências, é a sua
razão de ser. Deveríamos ter dito e repetido fiscalismo cada vez que se
tratasse de impostos? Mas o fiscalismo não acompanha,

ii o largar um instante, o Estado, que é, como dizia Max Weber325, uma


empre da mesma forma que uma fábrica, e, por isso, obrigado a pensar
constantemen.ias suas entradas de dinheiro, sempre insuficientes, como
vimos?
Enfim, e sobretudo, deveríamos deixar para trás, sem resposta formal, a
perita tantas vezes formulada: o Estado promoveu ou não o capitalismo?
Deu-lhe )ulso?
Mesmo fazendo restrições à maturidade do Estado moderno, se, arrimano
espetáculo da atualidade, tomarmos distância com relação a ele, teremos,
onstatar que, entre o século XV e o século XVIII, ele abarca tudo e
todos, é das forças novas da Europa. Mas será que explica tudo, que
submete tudo ia ordem? Não, mil vezes não. Aliás, não é preciso jogar com
a reciprocidade perspectivas? O Estado favorece o capitalismo e vem em
sua ajuda, sem dúviMas inverta-se a afirmação: o
Estado desfavorece o desenvolvimento do capimo que, por sua vez, o pode
prejudicar. Ambas as coisas são exatas, sucessiva imultaneamente, já que
a realidade é sempre complicações previsíveis e impre, eis. Favorável,
desfavorável, o Estado moderno foi uma das realidades por onde pitalismo
abriu caminho, ora dificultado, ora favorecido, muitas vezes progre[o em
terreno neutro. Como poderia ser de outro modo? Embora o interesse stado
e o da economia nacional no conjunto coincidam com freqüência, sendo
osperidade dos seus súbitos, em princípio, condição dos lucros da
empresado, o capitalismo, por seu lado, encontra-se sempre na faixa da
economia que e a inserir-se no meio das correntes mais rápidas e mais
lucrativas dos negócios nacionais. Acontece-lhe, assim, jogar num plano
muito mais vasto do que o, onomia comum de mercado, como dissemos, e do
que o do Estado e das suas cupações particulares. Por isso é natural que
os interesses capitalistas, ontem ) hoje, passem por cima dos interesses
do espaço restrito da Nação. Isso fal3u, pelo menos, complica o diálogo e
as relações entre o Capital e o
Estado..isboa, que escolhi para exemplo de preferência a outras dez
cidades, o capitados negociantes, dos homens de negócios, dos poderosos,
ninguém o vê agitaranifestar sua existência. É que, para ele, o essencial
se passa em Macau, porta Éa aberta para a China, em Goa, na índia, em
Londres, que impõe suas ordens s exigências, na longínqua Rússia, quando
se trata de vender um diamante nanho excepcional326 e no vasto Brasil
escravista dos fazendeiros, dos minees de ouro e dos garimpeiros
(mineradores de diamantes). O capitalismo está e calçado com botas de
sete léguas, ou, se se preferir, tem as pernas intermi; de Micromegas.
É desta dimensão, acima de tudo, que se ocupará o terceiro -no volume
desta obra.
k conclusão que se deve reter, por ora, é que o aparelho do poder, força
que issa e envolve todas as estruturas, é muito mais do que o Estado. É
uma soma rarquias, políticas, econômicas, sociais, culturais, um
amontoado de meios rção em que o Estado sempre pode fazer sentir a sua
presença, em que é muizes o próprio Estado a pedra angular do conjunto e
quase nunca o único r327. Pode mesmo acontecer-lhe apagar-se, desfazer-
se; mas tem sempre de )nstituir e reconstitui-se infalivelmente, como se
fosse uma necessidade bioda sociedade.

NS CIVILIZAÇõES
NEN4 SEMPRE DIZEM NÃO
As civilizações ou as culturas - aqui as duas palavras se confundem sem
inconvenientes - são oceanos de hábitos, de pressões, de consentimentos,
de conselhos, de afirmações, todas elas realidades que, para cada um de
nós, parecem pessoais e espontâneas embora nos cheguem em geral de muito
longe. São uma herança, do mesmo modo que a língua que falamos. Numa
sociedade, todas as vezes que tendem a abrir-se fendas ou abismos, a
onipresente cultura as fecha, ou pelo menos as dissimula, acaba por nos
aprisionar na nossa tarefa. O que
Necker dizia da religião (o próprio coração da civilização) - que é para
os pobres "urna forte cadeia e uma consolação cotidiana" 328 _ poder-se-
ia dizer da civilização e para todos os homens.
Na Europa, quando a vida renasce com o século XI, a economia de mercado,
a sofisticação monetária são novidades "escandalosas". Em princípio, a
civilização, pessoa idosa, é hostil à inovação. Dirá portanto não ao
mercado, não ao capital, não ao lucro. Pelo menos, mostrar-se-á
desconfiada, reticente.
Depois, os anos passam, renovam-se as exigencias e as pressões da vida de
todos os dias. A civilização européia é apanhada num conflito permanente
que a divide.
Acontece-lhe então dar, contra a vontade, o sinal verde. E esta
experiência não é apenas a do Ocidente.
Tomar parte na difusão cultural: o modelo do Islã
Uma civilização é ao mesmo tempo permanência e movimento. Presente num
espaço, aí se mantém, grudada, ao longo dos séculos. Ao mesmo tempo,
aceita certos bens que lhe são propostos por civilizações próximas ou
afastadas e propaga fora os seus próprios bens. A imitação, o contágio
funcionam como certas tentações internas contra o hábito, o já feito, o
já conhecido.
O capitalismo não escapa a tais regras. A cada momento da sua história,
ele se apresenta como uma soma de meios, de instrumentos, de práticas, de
hábitos de pensamento que são incontestavelmente bens culturais e que,
como tais, viajam e são trocados. Quando Luca Paccioli publica em Veneza
De Arithmetica (1495), resume, no que toca à contabilidade em partidas
dobradas, soluções há muito conhecidas, por exemplo, em Florença desde o
fim do Século X111329. Quando Jakob
Fugger der Reiche passa algum tempo em Veneza, estuda as partidas
dobradas, que levará na bagagem para Augsburgo. Por uma ou por outra via,
essa contabilidade acabou por conquistar uma parte da Europa mercantil.
Também a letra de câmbio se impôs de praça em praça, mediante difusão, a
partir das cidades italianas. Mas não vinha ela de muito mais longe? Para
E. Aslitor
330, a sutfaya islâmica nada tem a ver com a letra de câmbio do mundo
ocidental.
É profundamente diferente na textura jurídica. Seja. Mas não há dúvida de
que existe muito antes da letra de câmbio européia. Como supor que os
mercadores italianos, que muito cedo freqüentaram os portos e mercados do
Islã, tenham sido desatentos a esse meio de assegurar, por simples
escrita, a transferência para longe de dada soma de dinheiro? A letra de
câmbio (de que os italianos seriam os

wio nas Escalas do Levante, segundo uma miniatura das Viagens de Marco
Polo.
(Covinfl, t ;tos inventores) resolve na Europa o mesmo problema, embora
tenha tido, na ide, de se adaptar a condições diferentes das do Islã,
especialmente às prescriIa
Igreja que proíbem o empréstimo a juros. A inspiração oriental parece-me,
itanto, provável.
>oderia sê-lo igualmente no que se refere à associação comercial do tipo
ienda que, muito antiga no Islã (o Profeta e sua mulher, uma viúva rica,
haconstituído uma commenda33% é a forma habitual do comércio de longa
disL, até a índia, a
Insulíndia, a China. O certo é que, espontânea ou importada, menda surge
na
Itália só nos séculos XI-XII. Começa então a caminhar de uma para outra e
é sem surpresa que vamos encontrá-la nas cidades da Hansa, no XIV, embora
modificada, pois as influências locais desempenham o seu paluitas vezes,
na Itália, o agente
- o contratante que dá seu trabalho e viaja mercadoria - participa do
lucro da operação, ao passo que no meio hanseátiVener recebe
habitualmente uma soma fixa de quem lhe fornece o capital, assuassim o
perfil de assalariado332. Mas há também casos de participação.
lá portanto, às vezes, alteração do modelo. E, em certos casos, a
possibilida;e ter imposto uma mesma solução em lugares diferentes, sem
que tenha sido amente copiada. Neste caso, os séculos obscuros da Alta
Idade Média ocinão nos permitem certezas. Mas, dados os hábitos
itinerantes dos mercadodievais e as rotas conhecidas dos seus tráficos,
deve ter havido transferência, ienos de certo número de formas de troca.
É o que sugere o vocabulário que

o Ocidente copiou do Islã: alfândegas, armazéns, rnaona, fonduk, mohatra


(venda a prazo com revenda imediata a que os textos latinos do século XIV
relativos à usumohatrae). outros sinais são as dádivas do Oriente à
Eurora chamam contractus pa: a seda, o arroz, a cana-de-açúcar, o papel,
o algodão, os algarismos indianos, o sistema de cálculo do ábaco, a
ciencia grega recuperada através do
Islã, a pólvora, a bússola - todos eles bens preciosos e retransmitidos.
nte dos historiaAceitar a realidade dessas dívidas significa renunciar ao
Ocide dores tradicionais, um Ocidente totalmente inventado por si
próprio, genialmente, que trilha sozinho, progressivamente, as vias da
racionalidade técnica e científica. Significa não reconhecer aos
italianos das cidades medievais o mérito da descoberta dos instrumentos
da vida comercial moderna.
Significa também, de dedução em dedução, tomar posição contra o papel
matricial do Império romano. Porque esse Império tão louvado, umbigo do
mundo e da nossa própria história, extensivo a todas as margens do
Mediterrâneo com algumas protuberâncias continentais aqui e além, é
apenas parte de uma economia mundial antiga bem mais vasta do que ele e
destinada a sobreviver-lhe séculos a fio.
Estava ligado a uma vasta zona de circulação e de troca de Gibraltar à
China, uma Weltwirtschaft em que, durante séculos, os homens terão
circulado por intermináveis estradas, transportando na sua trouxa
mercadorias preciosas, lingotes, moedas, objetos de ouro ou de prata,
pimenta-do-reino, cravo-da-índia, gengibre, laca, aliníscar, âmbar
cinzento, brocados, algodões, musselinas, sedas, cetins brocados a ouro,
madeiras aromáticas ou corantes, jades, pedras preciosas, pérolas,
porcelanas da China - porque estas viajaram muito antes das gloriosas
Companhias das índias.
É desses tráficos de um extremo ao outro do mundo que vivem ainda, no seu
esplendor, Bizâncio e o Islã. Bizâncio, a despeito de bruscas
recuperações de vigor, um mundo à parte, enredado em sua pesada pompa que
serve para fascinar príncipes bárbaros, para dominar povos a seu serviço,
sem nada ceder a não ser por ouro. O Islã, pelo contrário, vivo, inserido
no Oriente Próximo e nas suas realidades subjacentes, e não no velho
mundo greco-romano. Os países submetidos pela conquista muçulmana tinham
um papel ativo nos tráficos do Oriente e do
Mediterrâneo antes da chegada do conquistador; voltarão a tê-lo assim que
os hábitos - por momentos abalados - retomarem seus direitos. Os dois
instrumentos essenciais da economia muçulmana - uma moeda de ouro, o
dinar; uma moeda de prata, o dirrã - são um de origem bizantina (dinar =
denarius), o outro de origem sassanida. O Islã herdou países, uns fiéis
ao ouro (Arábia, Norte da África), outros à prata (Pérsia, Khorasan,
Espanha) e que assim se mantiveram, pois tal bimetalismo "com
distribuição territorial" variou aqui e ali, mas volta a encontrar-se
séculos depois. Aquilo a que chamamos economia muçulmana é portanto a
execução de um sistema herdado, uma corrida de revezamento entre
mercadores da Espanha, do Magrebe, do Egito, da Síria, da Mesopotâmia, do
Irã, da Abissínia, do Gujarate, da costa do Malabar, da China, da
Insulíndia... Aí a vida muçulmana encontra por si só seus centros de
gravidade, seus sucessivos "pólos": Meca, Damasco, Bagdá, Cairo -
impondo-se a escolha entre Bagdá e o
Cairo, conforme a rota para o Extremo-Oriente utiliza o golfo Pérsico, a
partir de Basra e Saraf, ou o mar Vermelho a partir de Suez e Djeda, o
porto de Meca.
Antes mesmo de existir, o Islã era, graças às suas heranças, uma
civilização comercial. Os mercadores muçulmanos usufruíram, pelo menos
junto dos mestres

avara. O Própr - --u-tção Precoce de que a Europa, Por sua vez, será
bastante io Profeta teria dito- "O mercador usufrui
Mundo como no outro,,., felicidade tanto neste o bastante para i uem
ganha dinheiro agrada a Deus." E isso é quase magina; O c irria de
respeitabilidade ligado à vida qual temos exemplos preci mercantil e do
atrair à Síria e ao
Egito o'sOs. m maio de 1288, o governo dos mamelucos tenta Imagine-se, no
O s mercadores de Sinda, da india, da China e do Iêmen. do seguinte modo*
"D' * ' cidente, um decreto governamental a esse respeito, exprimindo-se
ciantes desejo

1r191MOS um convite aos ilustres personagens grandes negosos de lucro ou


pequenos varejistas. (... ) Todo aquele que vier à nossa terra poderá
aqui ficar, ir e vir à vontade (... ) é um verdadeiro jardim do
Paraíso para quem mora aqui. (... ) Está garantida a bênção divina para a
viagem de todo aquele que suscita a beneficência pedindo emprestado e
realiza uma boa aÇão em:)restando." Dois séculos mais tarde, eis Os
conselhos tradicionais dados ao prínci)e em terras Otomanas (segunda
metade do século XV). "C onsidera favoravelmene os mercadores neste país-
cuida sempre deles; não permitas a ninguém que os, loleste, que lhes dê
ordens: pois raças às suas mercadorias, ' o pre com os seus tráficos o
país torna-se próspero
C, ço baixo reina em todo o mundo.11333

Que podem escrúpulos Ou Inquietações religiosas contra esse peso das


CConoiias mercantis? No entanto, O Islã, tal como a Cristandade foi
torturado por uma
Pécie de horror pela usura9 gangrena recrudescida e generalizada pela
circulação espécies monetárias. Favorecidos pelos prí idade do povo,
sobretudo a ncipes, Os mercadores suscitam a hostdas corporaÇões, das
confrarias, das autoridades reiosas. Palavras Originalmen e neutras
"corno baZingun e MatrabaZ, com as quais textos oficiais designam os
mercadores assumem, na linguagem Popular, o senO Pejorativo de
aproveitadores e velhcOS11334. Mas essa sanha Popular é tamri sinal da
Opulência e do orgulho dos mercadores. Sem pedirmos demais a urna
nparação, surpreendem-nos as palavras que o Islã põe na boca de Maomé:
"Se is permitisse que os habitan es do Paraíso fizessem comércio, eles
negoci ' tecidos e especiarias 5 335. ariam ao passo que, na
Cristandade, se diz proverbialmen'O Comércio deve ser livre sem
restrições, até no Infer 0*" Essa imagem do Islã é urna' imagem
antecipada da evolu não futura da Europa antil. O comércio de longa
distância do primeiro capitaliÇ 'idades italianas, não deriva do Império
romano. Sucede SMO europeu, a partir s dos séculos XI aos esplendores
islâ-XII, do Islã que viu nascer t2ntas indústrias e produções para
rtação, tantas economias de raio amplo. As navegações de longo curso as
caias regulares iniplicarri um capitalismo ativo e eficaz. Por todo o
Islã á corões, e as alterações que elas sofrem (ascensão dos mestres,
trabalho domicirabalho fora das cidades) lembram muitas das situações que
a Europa conhe)ara que não haja uma lógica econÔmica na sua base Outras
semelhanças: mias citadinas que escapam às autoridades tradicionais, COMO
em Ormuz, como ta do Malabar e, na costa da
Africa, o caso tardio de Ceuta, ou mesmo, na ha, o de Granada. Todas elas
cidades-Estados. Finalmente, O Islã suporta as dficitárias, paga em Ouro
suas compras feitas na MOscóvia, no Báltico,

111O Indico até nas cidades italianas que cedo estavam a seu serviço
Amalfi, . Mais uM vez prenuncia futuro da Europa ia superioridade
Inonetário comercial, também a. ela apoiassas condições, se fosse Preciso
escolher uma data para marcar o fim das zagens da Europa mercantil na
escola das cidades do Islã e de Bizâncio, a

FF A societiaae ou -o conjunto aos conjuntos de 1252 - o retorno do


Ocidente à cunhagem de moedas de ouro336 - pareceria defensável, na
medida em que se possa propor uma data para um processo de evolução tão
lento. Seja como for, aquilo que no capitalismo ocidental possa ter sido
um bem de importação é sem dúvida alguma de origem islâmica.
Cristandade e mercadoria:
discórdia da usura
A civilização ocidental não teve as facilidades iniciais e como que
gratuitas do
Islã. Começa no plano zero da história. O diálogo entre religião - a
civilização por excelência - e economia foi entabulado logo nos seus
primeiros passos. Mas, à medida que o caminho se prolonga, um dos
interlocutores - a economia - aperta o passo, formula novas exigências.
Diálogo difícil entre dois mundos pouco conciliáveis: o daqui e o do
além. Mesmo nos países protestantes, os Estados da
Holanda esperarão 1658 para declarar oficialmente que as práticas
financeiras, ou seja, o empréstimo a juros, só diziam respeito ao poder
CiVil337. Na
Cristandade fiel a Roma, uma reação vigorosa levará o papa Bento XIV a
reafirmar, na bula Vix pervenit338, em 1? de novembro de 1745, as antigas
restrições a respeito do empréstimo a juros. E, em 1769, alguns
banqueiros de
Angoulême perderam um processo que moviam contra maus pagadores, sob o
pretexto de "terem emprestado a juros" 339. Em 1777, uma resolução do
Parlamento de Paris vedava "toda espécie de usura (entenda-se, empréstimo
a juros) proibida pelos santos cânones'1340, e a legislação francesa só
em 12 de outubro de 1789

deixará de proibi-Ia oficialmente, como delito. Mas o debate prosseguirá.


A lei de 1807 fixa a taxa de juros em 517o em matéria civil, em 6% em
matéria comercial; acima disso, é usura. Do mesmo modo, o decreto-lei de
8 de agosto de

1935 classifica como usura, legalmente re341

preensível, as taxas de juros excessivas .


Um longo drama, portanto. Se acabou por nada impedir, ainda assim
correspondeu a profundas crises de consciência, ao mesmo tempo que as
mentalidades iam evoluindo em face da exigência capitalista.
Num livro original, Benjamin Nelson342 propõe um esquema simples: no
âmago da cultura ocidental, a discussão da usura representaria uma
persistência, durante vinte e cinco séculos, de uma antiga prescrição do
Deuteronômio: "Não emprestarás com usura ao teu irmão, seja a usura
relativa a dinheiro, a víveres ou ao que quer que seja que possa ser
emprestado desse modo. Se se tratar de um estranho, poderás emprestar-lhe
com usura." Belo exemplo da longevidade das realidades culturais, essa
fonte longínqua, perdida no fundo dos tempos, foi a origem de um rio
inexaurível. A distinção entre emprestar ao irmão e emprestar ao estranho
não podia, com efeito, satisfazer a Igreja cristã que se pretendia
universalista. O que era válido para o pequeno povo judeu rodeado de
inimigos perigosos já não é para a Cristandade: com a nova lei, todos os
homens são irmãos. Portanto, empréstimo usurário é proibido a todos. É o
que explica S.
Jerônimo (340-420). S. Ambrósio de Milão (340-397), seu contemporâneo,
aceita porém a usura para com inimigos em caso de guerrajusta (ubijus
belli, ibijus usurae). Deste modo, terá aberto de antemão a porta ao
empréstimo usurário nas trocas com o Islã questão que virá a levantar-se
mais tarde, com as Cruzadas.

499

ia aos usurdrios. Gravura sobre madeira do século XV. Deus condena os


seus cri'ary of Congress.)
a travada pelo papado e pela Igreja conservou todo o rigor, tanto mais ra
estava longe de ser um mal imaginário. O segundo concílio de Latrão idiu
que o usurário que não se arrependesse seria privado dos sacrameneja e
não poderia ser enterrado em terra cristã. E a discussão ressurge, itor
para outro: S. Tomás de
Aquino (1225-1274), S. Bernardino de Sie444), S. Antonino de Florença
(1389-1459). A Igreja é obstinada, a tarer continuamente recomeçada343.
ido, no século XIII, parece receber um espantoso reforço. O
pensamenóteles chega à Cristandade por volta de 124O e repercute através
da obra ás de Aquino. Ora, a posição de Aristóteles é formal: "Tem...
perfeita le que odeia o empréstimo a juros. Desse modo, com efeito, o
dinheiro mbém produtivo e acha-se desviado do seu fim, que é facilitar as
trocas. multiplica o dinheiro; daí1 justamente, o nome que recebeu em
grego, hamado rebento (tokos). Assim como os filhos são de natureza semes
pais, assim o juro é dinheiro filho de dinheiro."344 Em suma, "o di
A soctedade ou --o conjunio aos conjuntosnheiro não dá cria" ou não devia
dar, fórmula tantas vezes retomada por Frei
Bernardino e, em 1563, pelo concílio de Trento: pecunia pecuniam non
parit.
É revelador o fato de encontrarmos as mesmas hostilidades em sociedades
diferentes da judaica, da helênica, da ocidental ou da muçulmana. com
efeito, encontramos situações análogas tanto na índia como na China. Max
Weber, habitualmente tão relativista, não hesita em escrever: "... a
proibição canônica do juro [... 1 tem equivalente em quase todas as
éticas do mundo.11345 Não virão tais reações da intrusão da moeda -
instrumento da troca impessoal - no círculo das velhas economias
agrárias? Houve reação contra esse.poder estranho. Mas a moeda,
instrumento de progresso, não pode desaparecer. E o crédito é uma
necessidade das economias agrícolas antigas, expostas ao acaso recorrente
do calendário, às catástrofes em que ele é pródigo, às esperas: lavrar
para semear, semear para colher, e o ciclo recomeça. com a precipitação
da economia monetária que nunca tem, para girar, moedas suficientes de
ouro ou de prata, era infalível que se acabasse por reconhecer à
"vituperável" usura o direito de agir às claras.
Foi preciso tempo, um grande esforço de adaptação. O primeiro passo
decisivo foi dado com S. Tomás de Aquino, que Schumpeter considera
"talvez o primeiro homem a ter uma visão geral do processo econômico',
346. O papel do pensamento econômico dos escolásticos, diz com ironia mas
com acerto Karl Polanyi, é comparável ao de
Adam Smith ou de Ricardo no Século XIX347. Os princípios básicos
(estribados em
Aristóteles) permanecerão, porém, intactos: a usura, continua a dizer-se,
não depende da altura do juro (como pensaríamos hoje), ou do fato de se
emprestar a um pobre que se tem inteiramente à mercê; há usura sempre que
o empréstimo mutuum - propicia um lucro. O único empréstimo não-usurário
é aquele em que o emprestador não espera mais do que o reembolso, no
prazo previsto, da soma emprestada, seguindo o conselho: mutuum date inde
nil sperantes. De outro modo tratar-se-ia de vender o tempo durante o
qual o dinheiro foi cedido; ora, o tempo só a Deus pertence. Que uma casa
renda aluguel, que um campo renda frutos e foros, de acordo; mas o
dinheiro estéril deve permanecer estéril. Aliás, esses adiantamentos
gratuitos foram seguramente praticados: a caridade, a amizade, o
desinteresse, o desejo de agradar a Deus, esses sentimentos contaram. Em
Valladolid, no século XVI, encontramos empréstimos "pela honra e pelas
boas

348

obras", para hacer honra y buena obra.


Mas o pensamento escolástico abriu uma brecha. Que concessão fez? O juro
tornase lícito quando há, para o emprestador, ou. risco (damnum emergens)
ou falta de ganho (lucrum cessans). Tais distinções abrem muitas portas.
Assim, sendo o cambium, o câmbio, uma transferência de dinheiro, a letra
de câmbio que o concretiza pode correr em paz, de praça em praça, uma vez
que o lucro que comporta, habitualmente, não é garantido de antemão, uma
vez que há risco. Só o câmbio seco, sobre letras fictícias, sem
deslocamento da letra de uma praça para outra, é considerado usurário -
não sem razão, pois o câmbio seco serve efetivamente para dissimular o
empréstimo a juros. Também são autorizados pela
Igreja os empréstimos ao príncipe e ao Estado; e os lucros que resultam
de associações comerciais (commenda genovesa, colleganza veneziana,
societas florentina). Mesmo o dinheiro posto no banco - os depositi a
discrezione - que a
Igreja condenava tornar349 se-á lícito, pois está dissimulado sob o nome
de participação na empresa.
É que, numa épocà em que a vida econômica tem um desenvolvimento
vertiginoso, impedir que o dinheiro desse frutos seria um risco. A
agricultura acaba de

501

mais terras para cultivo do que conquistara dede o neolítiC0350. As


cidascem como nunca. O comércio ganha força e vigor. Como é que O crédito
i deixar de proliferar nas regiões ativas da Europa: Flandres, Brabante,
Haikrtois, Ile-deFrance, Lorena, Champagne, Borgonha, Franco-Condado,
DelProvença, Inglaterra,
Catalunha, Itália? Abandonar em princípio, mais dia dia, a usura aos
judeus dispersos pela Europa e a quem só se deixou essa de do comércio de
dinheiro para ganhar a vida - é uma solução, não a soluu melhor, é uma
espécie de utilização da prescrição do Deuteronômio, do dos judeus de
praticarem a usura em relação a não-judeus, isto é, ao crise desempenha
aqui o papel de estranho. Mas sempre que tomamos conheciJa atividade
usurária dos judeus, como nos banchi que têm na
Itália a partir ilo XV, sua atividade está misturada com a de
prestamistas cristãos.
m efeito, a usura é praticada por toda a sociedade, príncipes, ricos,
mercadote humilde, e ainda por cima pela Igreja - uma sociedade que tenta
esconder a proibida, a reprova, mas a ela recorre, se afasta dos seus
atores, mas os toleise à casa do prestamista às escondidas, como se vai à
casa da mulher públimas vai-se. "E se eu, Mario Sanudo, tivesse feito
parte dos Pregadi, como passado, teria tomado a palavra ( ... ) para
demonstrar que os judeus são tão rios como os padeiros."352 Tal é a
declaração de um nobre veneziano em 1519. tso, aliás, os judeus tinham as
costas largas, pois os lombardos, toscanos e )s, por mais cristãos que
fossem, praticavam abeitamente adiantamentos de ) com penhores e outros
empréstimos a juros. Aqui ou ali, contudo, os prestaudeus souberam
conquistar o mercado da usura, particularmente ao norte a, a partir do
século
XIV. Em Florença, foram por muito tempo mantidos cia; entram em 1396,
instalamse com força quando Cosme de Médicis reo exílio (1434), e, três
anos mais tarde, um grupo judeu obtém o monopólio wéstimos na cidade.
Pormenor característico, instalam-se "nos mesmos banm os mesmos nomes
[dos prestamistas cristãos que os haviam precedido]:

99353
fella Vacca, Banco dei quatro Pavoni...
a como for, judeus ou cristãos (quando não se trata de membros da Igreja)
os mesmos meios: vendas simuladas, falsas letras de feira, números
fictíescrituras notariais. Tais procedimentos entram nos costumes. Em
Floreni do capitalismo precoce, sente-se isso desde o século XIV, até no
torn de lente ocorrido com
Paolo Sassetti, homem de confiança e sócio dos Médi1384, ele escreve, a
propósito de um câmbio, que seu ganho foi de "piá, zi)
quatrocento cinquanta di interesse, o uxura si voglia chiamare", mais
lorins de juros, ou de usura, se assim se quiser chamar. Não é curioso
ver xgir a palavra juro num contexto que a liberta do sentido pejorativo
da usura3549 Veja-se também com que naturalidade Philippe de Commynes i,
tendo depositado dinheiro na sucursal dos Médicis em Lyon, de ter receps
muito baixos: "Tal rendimento é muito magro para mim" (novembro

355

. Uma vez lançado nessa via, o mundo dos negócios logo não terá mais =er
das medidas da Igreja, ou muito pouco. No século XIV, um cambista, o não
empresta a uma taxa que oscila em torno de 20% e muitas vezes S356? A
Igreja tornou-se tão misericordiosa para com os deslizes dos mercomo para
com os pecados dos príncipes.
isso não elimina os escrúpulos. Ã última hora, antes de comparecer peus,
os remorsos provocam restituições de usuras: 20O menções para um urário
piacentino estabelecido em Nice 357. Segundo B. Nelson, tais arre
Capitel do século XII, catedral de Autun. O diabo representado com um
saco de moedas na mão. (Fototeca A. Colin.)
pendimentos e restituições, que enchem profusamente as escrituras
notariais e os testamentos, já não são muito encontrados depois de
l330358. Entretanto, mais tarde, Jakob Welser, o Velho, ainda se recusa,
por escrúpulo de consciência, a participar dos monopólios que afligem a
Alemanha do Renascimento. Seu contemporâneo, Jakob Fugger, o Rico,
inquieto, consulta Johann Eck, futuro adversário de Lutero, e lhe
financia viagem a Bolonha, para colher informações

359. Por duas vezes, a segunda em 1532, os mercadores espanhóis de


Antuérpia pedem conselho aos teólogos da Sorbonne, sobre esses mesmos
assuntoS360. Em

1577, por escrúpulo, Lazzaro Doria, mercador genovês instalado na


Espanha, retira-se dos negócios e todos comentarn361. Em resumo, as
mentalidades nem sempre mudaram tão depressa como as práticas econômicas.
Provam-no as turbulências provocadas pela bula In earn que Pio V promulga
em 1571 para regulamentar a matéria tão controversa dos câmbios e
recâmbios e que, sem o querer expressamente, acaba por ser muito
rigorosa: proíbe pura e simplesmente o deposito, isto é, o empréstimo de
uma feira para a feira seguinte, à taxa normal de 2, 50lo, recurso
habitual dos mercadores que vendem e compram a crédito. Os
Buonvisi, em apuros como tantos outros negociantes, escrevem de Lyon a
Simórt
Ruiz, em 21 de abril de 1571: "Deveis saber que Sua Santidade proibiu o
depósito, que é coisa muito côrnoda para os negócios, mas há que ter
paciência e, nesta feira, não se fixaram taxas para o dito depósito, de
sorte que tivemos grandes dificuldades para servir os amigos e foi
preciso dissimular um pouco.
Fez-se o melhor que se pôde mas, doravante, uma vez que todos terão de
obedecer, também nós queremos fazer o mesmo e será preciso fazer câmbio
sobre as praças da
Itália, de Flandres, da Borgonha." 362 o

i" U curijuritu UUN (;unjurtiw;


o está proibido, voltemos ao cambio puro e simples, pois esse é permitido
ortanto, a conclusão dos nossos negociantes de Luca. Fecha-se uma porta,
e por outra. Podemos acreditar no Pe. Lainez (1512-1565), que sucedeu a
InáLoyola como geral dos Jesuítas: "A astúcia dos mercadores inventou
tantas artificiosas que mal podemos perceber o fundo das coisas."363 o
Século XVI, , entou o pacto de ricorsa, isto é, o empréstimo a longo
prazo pelo sistema dos ;os e recâmbios", o hábito de fazer uma letra de
câmbio correr, durante muito de praça em praça, para aumentar-lhe o
montante reembolsável todos os anos, c)pagou-lhe o uso.
Denunciada esta prática como usura pura e simples, a repú- Gênova
interveio amplamente e acabou por obter do papa Urbano VIII, em ;etembro
de 1631, que fosse reconhecida como lícita364.
rá de admirar o laxismo da Igreja? Mas como poderia lutar contra as
forças adas da vida cotidiana? Os ultimos escolásticos, os espanhóis e,
entre eles, de Luís de Molina, deram o exemplo do liberaliSM0365. "Como
Marx se teertido com as frases sobre o câmbio dos teólogos espanhóis,
empenhados tificar o lucro, se ele as pudesse ter conhecido!", exclama
Pierre Vilar366. mas poderiam esses teólogos sacrificar a economia de
Sevilha ou de Lisboa iomentaneamente unida àquela depois de 1580)?
Igreja, aliás, não é a única a capitular. O Estado segue-a ou precede-a,
conos casos. Em 1601, Henrique IV juntou ao reino da França, pelo tratado
n, o Bugey, o Bresse e a região de Gex arrancados à força do duque de
Sassas pequenas regiões têm seus privilégios e seus hábitos,
especialmente em a de rendas, de juros e de usura. O governo monárquico,
que colocou essas na alçada do parlamento de Dijon, procura introduzir-
lhes suas próprias Donde, quase de saída, uma redução à taxa 16 das
rendas até aí na taxa %). Depois, em

1629, são abertos processos contra os usurários dos quais m condenações.


"Esta busca causou terror, já ninguém ousava fazer contrarenda", mas, em
22 de março de 1642, um decreto do rei no seu Conselho, lecia o antigo
costume do tempo dos duques de Sabóia, ou seja, o direito Lipular os
juros exigíveis" como nas províncias estrangeiras vizinhas, "onde Igações
com estipulações são legais"

367.
medida que o tempo vai passando, desaparecem as objeções. Em 1771, um
bservador se pergunta francamente "se um monte-de-socorro, uma casa de
-es não seriam muito úteis à França e o meio mais eficaz de prevenir as
griusuras que arruínam tantos particulares" 368. Às vésperas da
Revolução, Séi Mercier assinala em
Paris as usuras dos notários que enriquecem particute depressa e o papel
dos "adiantadores", agiotas que são, afinal, a providos pobres, uma vez
que o
Estado, com os seus muitos empréstimos, mobii seu proveito as
possibilidades do crédito 368. Na Inglaterra, a Câmara dos em 3O de maio
de 1786, rejeita um bill que lhe fora proposto, "cuja finalidaautorizar
até 25% de juros às pessoas que emprestam com penhores com detrimento do
poVol'369.
)davia, nessa época, na segunda metade do século XVIII, a página está
defiriente virada. Alguns teólogos retardatários ainda podem esbravejar.
Mas a ão entre usura e taxa de juros está feita. Em 29 de dezembro de
1798, Jeane Roux, mercador opulento e honesto de Marselha, escreve ao
filho: "Penlo vós que a lei do empréstimo gratuito só diz respeito àquele
que é feito -m que toma emprestado por necessidade e não pode ser
aplicado ao nego ciante que contrai empréstimos para realizar
empreendimentos lucrativos e especulações vantajosas." 37O Já um quarto
de século antes o financista português lsaac de Pinto declarava sem
rodeios (1771): "O juro do dinheiro é útil e necessário a todos; a usura
é destruidora e terrível. Confundir esses dois objetos é como querer
proibir o uso útil do fogo porque queima e consome quem se aproxima muito
dele." 371

puritnisMO igual capitalismo? A atitude da Igreja ante a usura se insere


numa lenta evolução de conjunto das mentalidades religiosas. Acaba por se
consumar uma ruptura - uma ruptura como houve tantas outras. O
aggiornamento do Vaticano 11 por certo não foi o primeiro de uma longa
história. Para Augustin Renaudet371, a Suma de S.
Tomás de Aquino fora já um primeiro '4modernismo" - e dera resultado. O
humanismo é também, a seu modo, um aggiornamento, nem mais nem menos do
que a recuperação sistemática global, no âmago da civilização do
Ocidente, de toda a herança greco-latina. Ainda vivemos disso.
Que dizer enfim da ruptura da Reforma? Terá favorecido o surto de um
capitalismo liberto de inquietações, de arrependimentos, ou seja, de má
consciência? É essa, em linhas gerais, a tese de Max Weber, num pequeno
livro publicado em

1904, A ética protestante e o espírito do capitalismo. E certo que,


depois do século XVI, se verifica uma correlação evidente entre os países
afetados pela
Reforma e as zonas onde o capitalismo mercantil, mais tarde industrial,
vai expandir-se com as glórias de Anisterdam, que as glórias de Londres
eclipsarão.
Não pode ser mera coincidência. Então Max Weber tem razão9

A sua demonstração é bastante desconcertante. Perde-se numa meditação


muito complexa. Ei-lo à procura de uma minoria protestante que seria
portadora de uma mentalidade especial, tipo ideal do "espírito
capitalista". Tudo isso implica uma série de pressupostos. Complicação
suplementar: a demonstração é feita às avessas do tempo, do presente para
o passado.
No início, estamos na Alemanha, por volta de 1900. Uma pesquisa
estatística na região de Bade, em 1895, acaba de estabelecer a primazia
dos protestantes sobre os católicos no que se refere à riqueza e à
atividade econômica. Aceitemos este resultado como válido. Que pode ele
significar numa escala mais vasta? O responsável pela pesquisa, Martin
Offeribacher, discípulo de Weber, afirma logo de saída: "O católico é...
mais tranqüilo, possui menor sede do lucro; prefere urna vida segura, nem
que seja com um pequeno rendimento, a urna vida arriscada e excitante,
nem que esta lhe traga riqueza e honrarias. A sabedoria popular diz com
graça: comer bem, ou dormir bem. Neste caso, o protestante prefere comer
bem enquanto o católico quer dormir tranqüilo." E é com este viático
bastante cômico
- protestantes do lado bom, católicos do lado mau da mesa e do
capitalismo - que
Max Weber remonta ao passado. Ei-lo de uma hora para outra ao lado de
Benjamin
Franklin. Que excelente testemunha! Já em 1748, terá dito: " Lembra-te de
que tempo é dinheiro ( ... ) Lembra-te de que crédito é dinheiro. Lembra-
te de que o dinheiro é por natureza gerador e prolífico."
Para Max Weber, temos em Benjamin Franklin um elo de uma corrente
privilegiada, a dos seus antepassados e precursores puritanos, Dando mais
um passo decidido em direção ao passado, Max Weber coloca-nos diante de
Richard Baxter,

ou -o conjunio aos conjuniosr contemporâneo de Cromwell. Façamos um


resumo da conversa desse digno m: não desperdiçar nenhum instante da
nossa breve existência terrena; enconossa recompensa na realização da
nossa profissão, onde Deus nos pôs; trabande Ele quis que trabalhássemos.
Deus sabe de antemão quem será eleito e quen, ondenado às penas eternas,
mas o sucesso profissional é uma indicação de que [os entre os eleitos
(uma maneira de ler as cartas de Deus, em suma!). O mercaue faz fortuna
verá no seu êxito a prova de ser um eleito de Deus. Mas atenção, riua
Baxter, não ides empregar vossas riquezas na fruição delas, isso
significaria ihar em linha reta para o Inferno. com essas riquezas,
deveis servir o bem públirnar-vos útil. Assim, o que alegra Max Weber, o
homem é, uma vez mais, engapelos seus atos; cria um capitalismo ascético,
piamente condenado à maximizao lucro, e terá, porém, uma ciosa
preocupação de refrear o espírito do lucro. inal em suas conseqüências,
irracional em suas raizes, o capitalismo surgiria desse itro inesperado
entre a vida moderna e o espírito puritano.
, is o que resume depressa e mal um pensamento rico de meandros e
simplifica ivamente uma maneira sutil e confusa de raciocinar a que me
confesso tão alérorno o era o próprio Lucien Febvre. Mas isso não é razão
para fazermos Max r dizer o que não disse. Onde ele via apenas uma
coincidência, um encontro, xam-no de ter afirmado que o protestantismo é
a própria gênese do capitalismo. )mbart foi um dos primeiros a exagerar
dessa forma a argumentação weberiana melhor a destruir. O protestantismo,
no início, argumenta ele, ironizando, é afima tentativa de retorno à
pobreza evangélica, um verdadeiro perigo, em suma, a vida econômica em
suas estruturas e em seus progressos. Quanto às regras da ascética, já as
encontramos em S. Tomás e nos escolásticos! O puritanismo é, do muito,
uma escola de sovinice violenta à escocesa, um ensinamento para mos
lojistas113.
Tudo francamente ridículo, diga-se, como muitos argumentos poos. Tão
ridículo como seria querer ir buscar argumentos contra Max Weber, no
sentido, no luxo desenfreado dos holandeses em Batávia, no século XVIII,
ou stas que eles organizam um século antes em Deshima, para enganar o
tédio de m presos na ilha para onde os japoneses cuidadosamente os
relegaram. Fudo seria mais simples se o surto capitalista estivesse
francamente ligado à de Calvino sobre a usura, que devemos datar de 1545.
Teríamos aí um turning '. Essa exposição vivaz dos problemas da usura por
um espírito rigoroso, inado sobre as realidades econômicas, é das mais
claras. Para ele, é preciso lem conta a teologia, uma espécie de infra-
estrutura moral intangível, e também umanas, o juiz, o jurista, a lei. Há
uma usura lícita (contanto que seja modeda ordem dos 5%) entre
mercadores, e uma usura ilícita, quando vai contra Idade. "Deus não
proibiu todos os ganhos e um homem pode obter lucro. Do ário, o que
aconteceria?
Teríamos de abandonar todas as mercadorias..." Claro ) preceito
aristotélico continua a ser verdadeiro: "Confesso o que as crianças n; ou
seja, se fechardes o dinheiro no cofre, ele será estéril." Mas com o dio
"compra-se um campo...
(desta vez) não se dirá que o dinheiro não gera, iro". Inútil "deter-se
nas palavras", é preciso "olhar para as coisas". Henri er"', de quem
transcrevo estas citações escolhidas com acerto, pensa, para uir, que o
surto econômico dos países protestantes vem de um empréstimo fácil, e
portanto com menor taxa de juros, do dinheiro. "É o que explica o
ivolvimento do crédito em lugares como a
Holanda ou Genebra. Este desenmento, foi Calvino quem, sem o saber, o
tornou possível." Uma maneira co[ualquer outra de ir ao encontro de Max
Weber.

Sim, mas em 1600, em Gênova, cidade católica, núcleo ativo de um


capitalismo ja com dimensões mundiais, a taxa de juros do dinheiro está
em 1, 2070375. Quem faria melhor? Essa taxa reduzida, talvez seja o
capitalismo em expansão que a cria na mesma medida em que é criado por
ela. E depois, nesses campos da usura,
Calvino não arromba nenhuma porta. Há muito tempo que a porta está
aberta.
tjrna geografia retrospectiva eXplica muitas coisas
Para sairmos deste debate que seria inútil prolongar - ou então
deveríamos falar de uma série de contendores simpáticos, de R. H. Tawney
a H. Luthy -, talvez haja à nossa disposição explicações gerais mais
simples, menos rebuscadas e frágeis do que essa sociologia retrospectiva
assaz aberrante. Foi o que Kurt
SamueIsson 376 tentou dizer (1957 e 1971) e eu afirmei em 1963377. Mas os
nossos argumentos não são iguais.
É inegável, a meu ver, que a Europa protestante, considerada em bloco,
ganhou vantagem sobre a brilhantíssima economia mediterrânea, já há
séculos trabalhada pelo capitalismo - penso particularmente na Itália.
Mas tais transferências são moeda corrente em história: Bizâncio apaga-se
perante o Islã, o Islã fica abaixo da Europa cristã, a Cristandade
mediterrânea ganha a primeira corrida através dos Sete Mares do mundo,
mas a Europa inteira pende, nas imediações dos anos

1590, para o Norte protestante que e então privilegiado. Até aí, talvez
até

1610-1620, é para o Sul que poderíamos reservar a palavra capitalismo, a


despeito de Roma e a despeito da Igrej a. Amsterdam mal começa a mostrar
suas capacidades. Observe-se, aliás, que o Norte nada descobriu, nem a
América, nem a rota da Boa Esperança, nem os vastos caminhos do mundo:
foram os portugueses os primeiros a chegar à Insulíndia, à China, ao
Japão; tais recordes devem ser inscritos no ativo de uma Europa
meridional reputada de preguiçosa. O Norte tampouco inventou as
ferramentas do capitalismo: vêm todas do Sul; mesmo o Banco de Amsterdam
reproduz o modelo do Banco veneziano de Rialto. E é lutando contra a
força estatal do Sul - Portugal e Espanha - que se forjarão as grandes
companhias comerciais do Norte.
Isto posto, se estivermos atentos, num mapa da Europa, aos cursos do Reno
e do
Dartúbio e se esquecermos a episódica presença romana na Inglaterra,
dividiremos em dois o pequeno continente: de um lado, uma velha região
trabalhada pela história e pelos homens, enriquecida por suas labutas; do
outro, uma Europa nova, por muito tempo selvagem. É a vitória dos séculos
da Idade Média, a colonização, a educação, a exploração dos solos, a
construção urbana por toda essa Europa selvagem, até o Elba, o Oder e o
Vístula, até a Inglaterra, a
Irlanda, a Escócia, a Escandinávia. As palavras colônia ou colonialismo
exigiriam matizes, mas, de modo geral, tratou-se realmente de uma Europa
colonial que a velha latinidade, que a Igreja, que Roma repreendem,
catequizam, exploram tal como a Companhia de Jesus dirigirá, modelará,
sem afinal ser bem sucedida, suas reservas do Paraguai. A Reforma é
também, para as terras coladas ao mar do Norte e ao Báltico, o fim de uma
colonização.
A esses países pobres, apesar das façanhas dos hanseáticos e dos
marinheiros do mar do Norte, cabem as tarefas inferiores, as entregas de
matérias-primas, lã

nórdicosvencem. Um enorme navio português atacado ao largo de MdIaca por


pequenos ?iros ingleses e holandeses, em 16 de outubro de 1602. J. Th. de
Bry,
India Orientalis, s septima. (Foto B.N.)
lesa, madeira da Noruega, centeio do Báltico. Em Bruges, em Antuérpia, o
merlor e o banqueiro do Sul ditam as leis, dão o tom, irritam pequenos e
grandes. te-se que a revolução protestante é ainda mais virulenta nas
águas do que nos aços sólidos: o Atlântico, acabado de conquistar pela
Europa, será o grande es,, o, quase sempre esquecido pelos historiadores,
dessas lutas religiosas e mates. O fato de a sorte se decidir pelo Norte,
com seus salários mais baixos, sua ústria em breve imbatível, seus
transportes baratos, seu enxame de cabotadores e veleiros de carga que
navegam a preços baixos, deve-se principalmente a caumateriais
relacionadas ao deve e ao haver, a custos competitivos. No Norte, [o é
produzido mais em conta: o trigo, os tecidos de linha e de lã, os navios,
, iadeira, etc. A vitória do Norte é por certo a do proletário, do
biscateiro, do ' come pior ou menos do que o outro. Ao que vem somar-se,
por volta de 1590, iversão da conjuntura, a crise que, ontem como hoje,
atinge primeiro os países is avançados, de maquinarias mais complexas.
Para o Norte, apresenta-se uma ie de oportunidades, entendidas,
reconhecidas como tais, aproveitadas por hons de negócios vindos para a
Holanda da Alemanha, da França e não menos Antuérpia.
Isso levará ao grande avanço de Amsterdam, que arrasta consigo a

boa saúde geral dos países protestantes. A vitória do Norte é a dos


concorrentes com exigências mais modestas - até o dia em que, segundo o
esquema clássico, tendo eliminado os rivais, passam a ter, por sua vez,
todas as exigências dos ricos. Até o dia em que suas redes de negócios,
largamente ampliadas, criam um pouco por toda a parte, na Alemanha,
evidentemente, mas também em Bordeaux, por exemplo, e em outros lugares,
grupos protestantes mais ricos, mais ousados, mais experientes do que os
naturais da terra - tal como os italianos outrora nas regiões do Norte,
em Champagne, em Lyon, em Bruges, em Antuérpia, eram tidos como técnicos
imbatíveis do comércio e do banco.
Considero a explicação pertinente. O espírito não está sozinho no mundo.
E esta mesma história, tantas vezes encenada no passado, delineia-se de
novo no século
XVIII. Se a Revolução industrial não tivesse sido, para a Inglaterra dos
Hanover, um new deal, o mundo teria então pendido para uma Rússia em
rápida ascensão, ou, mais certamente, para os Estados Unidos,
constituídos, não sem dificuldades, como uma espécie de república das
Províncias Unidas, com barcos proletários, análogos, tudo igual aliás,
aos dos flamengos do século XV1. Mas houve, surgida dos acasos técnicos e
políticos e das complacências econômicas, a revolução das máquinas,
enquanto o Atlântico, graças ao steamer, ao navio de ferro movido a
vapor, era reconquistado no século XIX pelos ingleses.
Desapareciam então os finos clippers bostonianos, o ferro derrotava o
casco de madeira. E, além disso, é o momento em que a América abandona o
mar para se voltar para a conquista das terras interiores, no oeste do
continente.
Isso quer dizer que a Reforma não pesou nos comportamentos, nas atitudes
dos homens de negócios, com evidentes repercussões sobre toda a vida
material? Seria absurdo negá-lo. Para começar, a Reforma cria a coesão
dos países do Norte.
Ergue-os, unidos, contra os concorrentes do Sul. Não é pouco. Depois, as
guerras religiosas deixaram atrás de si, originada pela comunidade de
crenças, uma solidariedade de redes protestantes que foi decisiva nos
negócios, pelo menos temporariamente, até que as rixas nacionais
prevaleceram sobre qualquer outra preocupação.
Além disso, se não estou enganado, a Igreja, mantendo-se, reforçando-se
mesmo na
Europa católica, é cCmo que um cimento para a sociedade antiga. Os
diversos andares da Igreja, suas sinecuras que são uma moeda social,
sustentam a arquitetura tradicional e as outras hierarquias. Consolidam
uma ordem social que, nos países protestantes, será mais maleável, menos
segura. Ora, o capitalismo exige, de certo modo, uma evolução da
sociedade que seja favorável à sua expansão. O processo capitalista da
Reforma não deve, portanto, pura e simplesmente ser encerrado.
Capitalismo igual a razão?
Outra explicação mais geral foram os progressos do espírito científico e
dá racionalidade, no âmago do Ocidente, que teriam assegurado o
desenvolvimento econômico generalizado da Europa, impulsionando no seu
próprio movimento o capitalismo, ou melhor, a inteligência capitalista e
seu construtivo sucesso. É ainda dar a parte do leão ao "espírito", às
inovações dos empresários, à justificação do capitalismo como ponta de
lança da economia. Tese discutível, mesmo não aceitando o argumento de M.
Dobb111 - a saber, mesmo que o espírito capitalista tenha ge rado o
capitalismo, falta explicar a origem de tal espírito. O que não é deveras
evidente, Pois é Possível imaginar uma reciprocidade constante entre o
conjunto dos meios e o espírito que os observa e os manipula.
O mais ruidoso defensor desta tese é Werner Sombart, que vê aí mais uma
ocasião de valorizar em bloco os fatores espirituais, em detrimento dos
outros. Mas falta seguramente peso aos argumentos expostos. Que quer
dizer exatamente sua afirmação teatral, que a racionalidade (mas qual
racionalidade?) vem a ser o sentido profundo, o trend pultissecular, como
hoje diríamqs, da evolução ocidental, seu destino histórico, como prefere
dizer Otto Brunner"', e que tal racionalidade arrastou ao mesmo tempo no
seu movimento o Estado moderno, a cidade moderaa, a ciência, a burguesia,
enfim, o capitalismo? Em suma, espírito capitalista e -azão seriam uma e
a mesma coisa.
Para Sombart, a razão em questão é sobretudo a racionalidade dos
instrumenos e dos meios de troca. Já é, em 1202, o LiberAbaci, o Livro do
ábaco, do pisano eonardo Fibonacci. Primeiro marco, bastante mal
escolhido, uma vez que o ábao é árabe e foi em Bugia, no Norte da África,
onde seu pai se estabelecera como riercador, que Fibonacci aprendeu a
manejá-lo, junto com os algarismos árabes, om a maneira de apreciar o
valor de uma moeda pela quantidade de metal fino, e calcular altitudes,
latitudes, etc.380. Portanto, Fibonacci seria, antes, uma proa da
racionalidade científica dos árabes! Outro marco precoce: os livros de
conibilidade, sendo o primeiro que conhecemos florentino (1211). A julgar
pelo landIungsbuch, redigido em latim, dos Holzschulier (l304-l307)381 é
a necessiade de manter um registro das mercadorias vendidas a crédito,
mais do que um esejo abstrato de ordem, que inspirou essa primeira
contabilidade. Seja como for, assará muito tempo até que os livros de
contabilidade sejam um memorial perfeiEm geral, os mercadores contentam-
se em "anotar suas operações em pedaços papel que colam na parede",
recorda Matthãus Schwartz, o atualizadíssimo iarda-livros da firma dos
Fugger, já em 1517 382. Contudo, naquela época, há muique frei Luca di
Borgo, cujo verdadeiro nome era Luca Pacioli, forneceu, no pítulo X1 da
sua
Summa di arithmetica, geometria, proportioni eproportionalità

494), o modelo completo da contabilidade em partidas dobradas. Dos dois


livros senciais de contabilidade, o Manuale ou Giornale, onde se
registram as operaes na sua ordem sucessiva, e o livro principal, o
Quaderno, onde se inscreve duas zes cada operação, é este último,
redigido em partidas dobradas, que constitui.iovidade. Permite obter, a
cada momento, um equilíbrio perfeito entre deve e ver. Se o balanço não
fica em zero, foi cometido um erro que é preciso procurar ediatamente
383.
A utilidade da partita doppia explica-se por si só. Sombart fala dela com
liris"Muito simplesmente, não se pode imaginar o capitalismo sem a
contabilidaem partidas dobradas; comportam-se, um em relação ao outro,
como a forma conteúdo", wie Form und Inhalt. "A contabilidade em partidas
dobradas nasi do mesmo espirito [o grifo é meu] dos sistemas de Galileu e
de Newton e dos inamentos da física e da química modernas. [... 1 Sem a
analisar em profundida[ohne viel
Scharfsinn, estranha oração incidente], já vemos na contabilidade em
tidas dobradas as idéias da gravidade, da circulação sangüínea, da
conservação energia. 1, 384 Faz pensar na frase de Kierkegaard: "Toda
verdade só é, porém,
Jade até certo ponto. Uma vez ultrapassado esse ponto, a coisa
transforma-se

O vulgarizador da contabilidade em partidas dobradas. Este quadro de


Jacopo de
Bar, 1495, representa o franciscano Luca Paciolifazendo uma demonstração
de geometria plana para um dos seus disciqulos, por certo o filho do
duque de
Urbino, Frederico de Montefeltro. (Foto Scala.)
em não-verdade." Sombart ultrapassou esse ponto e, levados por seu
ímpeto, outros exagerarão por sua vez. Spengler põe Luca Pacioli à altura
de Cristóvão
Colombo e de Copérnico 385. C. A. Cooke (1950) afirma que "a importância
da contabilidade em partidas dobradas não reside na sua aritmética, mas
na sua metafísica"386. Walter Eucken, economista de valor, não hesita
entretanto em declarar (1950) que se a Alemanha das cidades da Hansa
falha o seu desenvolvimento no século XVI é por não ter adotado a
doppelte Buchhaltung, que se instala, ao mes387

mo tempo que a prosperidade, nos livros contábeis dos mercadores de


Augsburgo.
Quantas objeções contra tais pontos de vista! Pequenas, as primeiras. Sem
querer destronar Luca Pacioli, é preciso apontar que teve predecessores.
O próprio
Sombart assinala o livro de comércio do ragusano Cotrugli, Della
mercatura, conhecida sua segunda edição de 1573, mas datado de 1458388.
Note-se que essa reedição sem alterações, com mais de um século de
intervalo, indica que o estilo dos negócios não evoluiu muito durante
aqueles anos que, no entanto, foram de grande de volvimento econÔmico.
Seja como for, no livro 1, capítulo XIII, desse manual, consagradas
algumas páginas às vantagens de uma contabilidade em ordem, permita
equilibrar crédito e débito. E Federigo Melis, que leu centenas de reros
comerciais, vê surgir em Florença a partita doppia muito mais cedo, já no
i do século XIII, nos livros da Compagnia dei Fini e da Compagnia
Farolfi389. Mas vamos às verdadeiras objeções. Antes de mais nada, a
miraculosa partida )rada não se difunde com rapidez e não triunfa em toda
a parte. É, nos três séDs que se seguem ao livro de Luca Pacioli, não
parece ser uma revolução vitorioOs manuais para mercadores conhecem-na,
os mercadores nem sempre a pratii. Empresas enormes passarão muito tempo
sem seus serviços, e das mais i m.-, tantes: a
Companhia holandesa das índias Orientais, fundada em 1602; o Sun ?
Insurance
Office, de Londres, que só a adotará em 189O (digo bem, 1890)390.
toriadores familiarizados com a contabilidade antiga, R. de Roover, Basil
S. ney, Federigo
Melis, não vêem na contabilidade dupla o substituto necessário
=tabilidades anteriores que fossem ineficazes. No tempo das
contabilidades partidas simples, escreve R. de Roover191, --os mercadores
da Idade Média souam adaptar esse instrumento imperfeito às necessidades
de seus negócios e atino objetivo, ainda que por vias indiretas. [... ]
Encontraram soluções que nos estam pela maleabilidade e extraordinária
variedade. Nada, pois, de mais errado que a tese de... Sombart que
pretende que a contabilidade dos mercadores meais era uma confusão
(Wirwarr) tal que é impossível segui-Ia".
Para Basil Yarney (1962), Sombart exagerou o alcance da própria
contabilidade. a máquina abstrata de quantificar desempenha em todos os
negócios um papel )ortante, mas não dita as decisões do dirigente da
empresa. Mesmo os inventá, os balanços (que a escrita dupla não torna
mais fáceis do que a simples e que raros no mundo dos negócios) não se
situam no cerne das decisões que é preciso iar, portanto no cerne do jogo
capitalista. Os balanços correspondem com mais [üência à liquidação de um
negócio do que à sua gestão. E são difíceis de elaboque fazer com os
créditos pouco seguros? Como avaliar os estoques? Como inluzir, uma vez
que se utiliza uma única moeda de cálculo, a diferença entre as cies
monetárias em jogo, diferença que, por vezes, tem grande importância?
Baos de falência do século XVIII mostram que, ainda naquela época, tais
dificules não estão superadas. Quanto ao inventário, sempre muito
intermitente, só faz ido em relação a um inventário anterior. Assim, os
Fugger, em 1527, puderam iar o capital e os lucros da sua firma a partir
do inventário de 1511. Mas, entre, s duas datas, certamente não
orientaram a sua ação pelo inventário de 1511. Enfim, no registro dos
meios racionais do capitalismo, não deveríamos inserir os instrumentos
mais eficazes do que a partida dobrada: a letra de câmbio, o co, a bolsa,
o mercado, o endosso, o desconto, etc.? Ora, vamos encontrar esmeios fora
do mundo ocidental e da sua sacrossanta racionalidade. Além de m uma
herança, uma lenta acumulação de práticas, e de ter sido a vida
econônormal que, à força de agir, os simplificou e aperfeiçoou. Mais do
que o espíinovador dos empresários, pesaram o volume maior das trocas, a
insuficiência asiado freqüente da massa monetária, etc.
Mas, seja como for, a facilidade com que se admite a igualdade
capitalismo:)nalidade virá realmente de uma admiração pelas técnicas
modernas da troca? virá antes do sentimento geral - não falemos de
raciocimo - que confunde talismo e crescimento, que faz do capitalismo,
não um estímulo, mas o estímu
Banco de um cambista genovês. Iluminura de um manuscrito, fim do século
XIV.
(Fototeca A. Colin.)
lo, o motor, o acelerador, o responsável pelo progresso? Uma vez mais,
isso é confundir estreitamente economia de mercado e capitalismo,
afirmação a meu ver arbitrária, como já expliquei, mas concebível, uma
vez que ambos coexistem e se desenvolveram ao mesmo tempo e num mesmo
movimento, um por causa do outro e reciprocamente. Daí a pôr no ativo do
capitalismo a "racionalidade" reconhecida ao equilíbrio do mercado, ao
sistema em si, foi um passo dado com certa leviandade. Não haverá nisso
algo de contraditório? Porque a racionalidade do mercado, martelaram-nos
os ouvidos com isso, é a da troca espontânea, não dirigida, sobretudo,
livre, competitiva, sob o signo da mão invisível de Smith ou do
computador natural de Lange, nascendo portanto da "natureza das coisas",
do choque entre a procura e a oferta coletivas, de uma superação dos
cálculos individuais. A priori, não há aí racionalidade do próprio
empresário que, individualmente, procura, ao sabor das circunstâncias, o
melhor caminho para a sua ação, a maximização do lucro. Segundo Smith, o
empresário, tal como o
Estado, não tem de se preocupar com o andamento racional do conjunto,
que, em princípio, é automático. Porque "nenhuma sabedoria nem
conhecimento humano"
poderiam levar a born

io semelhante tarefa. Concordo que não há capitalismo sem racionalidade,


isto m adaptação dos meios aos fins, sem cálculo inteligente das
probabilidades. Mas ios de volta a definições relativas ao racional, que
varia não só de cultura para ira mas também de conjuntura para
conjuntura, de grupo social para grupo so- segundo os seus meios e fins.
Há vdrias racionalidades, mesmo no interior apeda economia. A da livre
concorrência é uma. A do monopólio, da especulação poder, outra.
Terá Sombart, no fim da sua vida (1934), tido consciência de certa
contradição
- regra econômica e jogo capitalista? Seja como for, descreve de modo
extravae o empresário às voltas com uma luta entre o cálculo econômico e
a especulaentre a racionalidade e a irracionalidade. Eis algo que, por
pouco, segundo mipróprias explicações, remeteria pura e simplesmente o
capitalismo ao "irracioda especulação"'? Mas, falando sério, penso que a
distinção entre economia iercado e capitalismo é aqui essencial. Trata-se
de não atribuir ao capitalismo rtudes e as "racionalidades" da economia
de mercado propriamente dita - o ité Marx e
Lenin fizeram, implícita ou explicitamente, ao atribuir o desenvolvito do
monopólio a uma evolução fatal mas tardia do capitalismo. Para Marx, Éema
do capital, quando sucede ao sistema feudal, é "civilizador" por ser
"mais rável ao desenvolvimento das forças produtivas e das relações
sociais", gerando )gresso, e por "fazer desabrochar uma fase de
desenvolvimento de que estão au-s a pressão e a monopolização doprogresso
social (inclusivesuas vantagens mais e intelectuais) por uma classe da
sociedade a expensas da outra-393. Se Marx incia em outra passagem "as
ilusões da concorrência", é numa análise do prósistema de produção do
século XIX, não numa crítica do comportamento dos, s capitalistas.
Pois estes últimos tiram a sua "severa autoridade dirigente" uni-nte da
sua função social enquanto produtores, não, como no passado, de uma xquia
que os tornaria "senhores políticos ou teocráticos, 9394. É a "coesão
sola produção"
que "se afirma [... 1 como uma lei natural todo-poderosa em face
-bitrário individual". Quanto a mim, defendo, antes do século XIX e
depois do o XIX, uma "exterioridade" do capitalismo.
Para Lenin, numa passagem bem conhecida (l9ló)395 o capitalismo não mude
sentido (para se tornar "imperialismo" no princípio do século XX) "a não
um grau definido, muito elevado do seu desenvolvimento, quando algumas
[ualidades essenciais do capitalismo começaram a transformar-se nas suas
anriias... O que há de essencial, do ponto de vista econômico, nesse
processo é stituição, pelos monopólios capitalistas, da livre
concorrência... [que fora] a Ierística essencial do capitalismo e da
produção mercantil em geral". Inútil que não estou de acordo neste ponto.
Mas, acrescenta Lenin, "de fato os molios não eliminam completamente a
livre concorrência de que se originaram:, m acima e ao lado dela". E aí
estou de pleno acordo com ele. Na minha lin'M, traduziria para: "O
capitalismo (de ontem e de hoje com, evidentemente, mais ou menos
fortemente monopolistas) não elimina completamente a livre )rrência da
economia de mercado de que se originou (e de que se alimenta); ! acima
dela e ao lado dela." Porque eu sustento que a economia dos séculos
(VIII, que é fundamentalmente, a partir de certos "núcleos" há muito
desendos, a conquista do espaço por uma economia de mercado e de trocas
triun, comporta, também ela, dois andares, segundo a mesma distinção na
vertical enin reserva ao "imperialismo" do fim do século XIX: os
monopólios, de

fato ou de direito, e a concorrência; por outras palavras, o capitalismo,


tal como tentei defini-lo, e a economia de rnercado em desenvolvimento.
Se eu tivesse o gosto de Sombart pelas explicações sistemáticas e
definitivas, poria de born grado, na frente do jogo, a especulação como
elemento principal do desenvolvimento capitalista. Vimos surgir, ao longo
deste livro, a idéia subjacente do jogo, do risco, da trapaça, sendo a
regra básica fabricar um contrajogo, em face dos mecanismos e
instrumentos habituais do mercado, de fazer com que este funcione de
outro modo, quando não às avessas. Seria divertido fazer uma história do
capitalismo inserida numa espécie particular de teoria do jogo. Mas seria
ir encontrar, sob a aparente simplicidade da palavrajogo, realidades
concretas diferentes e contraditórias, o jogo preventivo, o jogo normal,
o jogo lícito, o jogo às avessas, o jogo com truques... nada que possa
entrar facilmente numa teoria!
Uma nova arte de viver.na Florença do QuatIrocento
Vendo hoje, retrospectivamente, não se poderia negar que o capitalismo
ocidental tenha fabricado, com o tempo, uma nova arte de viver, novas
mentalidades, que ele acompanha e é acompanhado por elas. Uma nova
civilização? Seria um exagero.
Uma civilização é uma acumulação num período muito mais longo.
Mas, enfim, se houve mudança, data de quando? Max Weber quer que seja a
partir do protestantismo, portanto a partir do século XV1; Werner
Sombart, a partir da
Florença do século XV. Otto HintZe396 dizia que um era pela Reforma, o
outro pelo Renascimento.
Na minha opinião, não há dúvidas: Sombart tem razão neste ponto.
Florença, já no século XIII, afortiori no século XV, é uma cidade
capitalista, seja qual for o sentido que se dê a essa palavra19'. A
precocidade, a anormalidade do espetáculo impressionaram Sombart, o que é
natural. O que o é menos é basear toda análise numa única cidade,
Florença (Olivier C. Cox advogou de forma igualmente convincente a favor
da Veneza do século XI, voltaremos a esse ponto), e num único testemunho,
glorioso, é certo, o de Leon Battista Alberti (1404-1472), arquiteto,
escultor, humanista, herdeiro de uma família com destino movimentado,
durante muito tempo poderosa: alguns Alberti colonizaram economicamente a
Inglaterra do século XIV, tantos, aliás, que os documentos ingleses falam
com freqüência dos Albertynes como se, a exemplo dos hanseáticos ou dos
luquenses, mesmo dos florentinos, eles formassem, por si sós, uma nação!
O próprio Leon
Battista viveu muito tempo no exílio e, para escapar às tramóias do
mundo, professou ordens. Foi em Roma, por volta de 1433-1434, que
escreveu os três primeiros Libri della famiglia; o quarto foi concluído
em Florença, em 1441.
Neles, Sombart descobre um clima novo: o elogio do dinheiro, o valor do
tempo, a necessidade de viver parcimoniosamente, todos eles princípios
burgueses em sua primeira juventude. E o fato de esse eclesiástico
pertencer a uma longa linhagem de mercadores respeitados pela boa-fé
reforça o alcance do seu discurso. O dinheiro, "a raiz de todas as
coisas"; "com dinheiro [prefiro traduzir con denari por com cobres],
pode-se ter uma casa na cidade, ou uma vila no campo, e todos os ofícios,
todos os artesãos se afadigam como servidores para quem tem dinheiro. A
quem não o tem, tudo falta,

'anorama de Florença. Pormenor do afresco Madona da Misericórdia, século


XIV.
(Foto Ilinari-Giraudon.)
é preciso dinheiro para tudo". Eis uma atitude nova para com a riqueza:
outrora, aziam dela uma espécie de obstáculo à salvação. O mesmo para com
o tempo:
ourora, dizia-se que só a Deus pertence; vendê-lo (sob a forma de juros)
era vender on suum, o que não nos pertence. Ora, o tempo torna-se uma
dimensão da vida, m bem dos homens que, para eles, é melhor não perder. O
mesmo em relação ao Ixo: "Recordai-vos bem disto, meus filhos", escreve
Alberti, "que vossas despe sas nunca ultrapassem vossos rendânentos. -
Regra nova que condena a ostentação dos nobres. Como diz Sombart,
--trata-se de introduzir o espírito de poupança, não nas miseráveis
economias domésticas da plebe que come para matar a fome, mas nas casas
dos ricos-398. Estaria portanto aí o espírito capitalista.
Não, responde Max Weber numa nota crítica inteligente e concisa191. Não,
AIberti limita-se a repetir as lições da antiga sabedoria; algumas das
frases destacadas por Sombart encontram-se, quase com a mesma formulação,
em Cícero. E, depois, é uma tentação dizer que se trata apenas do governo
da casa, a economia no sentido etimológico da palavra e não a
crematística, ou seja, o fluxo das riquezas no mercado. É relegar Alberti
para a longa Hausvãterliteratur, a literatura da boa economia doméstica
de que tantos conselheiros alemães se servirão até o século
XVIII para prodigalizar recomendações, muitas vezes saborosas, mas que só
indiretamente concernem aos horizontes comerciais.
Todavia, é Max Weber que está errado. Para se convencer, bastar-lhe-ia
ler os
Libri dellafamiglia, de que as citações de Sombart dão uma idéia muito
estreita.
Bastar-lhe-ia tomar o depoimento de outras testemunhas da vida
florentina. Se dermos a palavra a Paolo Certaldo, a causa será
compreendida. "Se tens dinheiro, não te detenhas, não o guardes morto em
tua casa, pois mais vale trabalhar em vão do que repousar em vão, porque,
mesmo que nada ganhes trabalhando, pelo menos não perdes o hábito dos
negócios." Ou então:"'Labuta sempre e esforça-te por ganhar." Ou ainda:
"É bela coisa e grande ciência saber ganhar dinheiro, mas mais belo e
melhor qualidade é saber gastá-lo com medida e no que é preciso.--
Recorde-se que é um dos personagens dos diálogos de Alberti que diz mais
ou menos: "Tempo é dinheiro." Se o capitalismo pode ser reconhecido pelo
"espíritoe pesado pelo peso das palavras, então Max Weber está errado.
Imagina-se, porém, a sua resposta: não há aí mais do que o gosto pelo
lucro.
Ora, o capitalismo é outra coisa, é quase o contrário; é um domínio
interior, "o freio, a moderação ou pelo menos uma espécie de moderação
racional desse impulso irracional do lucro". Eis-nos no nosso ponto de
partida!
Um historiador atual pensará que essas pesquisas sobre a quintessência
têm seu valor, seus atrativos, mas que de maneira nenhuma são
suficientes. E que, se quisermos apreender a origem das mentalidades
capitalistas, teremos de ultrapassar o universo enfeitiçado das palavras.
Ver as realidades - para tal ir, e nelas se demorar, às cidades italianas
da Idade Média. O conselho vem de
Marx.
Outros tempos, outra visão do mundo
Aliás, hoje ninguém escapa à sensação de certa irrealidade ao seguir o
debate entre Sombart e Weber, à sensação de que a discussão não tem
fundamento, de que é quase fútil. Será que o que mais incomoda, neste
caso, e nos "distancia-, é a nossa própria experiência vivida? Nada mais
natural do que, em 1904, Max Weber, em 1912, Werner Sombart terem a
sensação de estarem, na Europa, no centro necessário do mundo da ciência,
da Razão, da lógica. Mas nós perdemos tal certeza, tal complexo de
superioridade. Por que uma civilização haveria de ser in aeternum mais
inteligente, mais racional que outra?

Max Weber se perguntava isso, mas, após algumas hesitações, perseverava


na
Dpinião. Qualquer explicação do capitalismo equivale, tanto para ele como
pa3mbart, a pôr em causa uma superioridade estrutural e indiscutível do
"espíriocidental. Quando essa superioridade também é oriunda dos acasos,
das violas da história, de uma má distribuição mundial das cartas. A
história do mun, vão refazê-la pelas necessidades de uma causa, ainda
menos de uma explicaMas suponhamos, por momentos, que os juncos chineses
tivessem dobrado bo da Boa Esperança em 1419, no cerne da recessão
européia a que chamamos ra dos
Cem Anos - e que a dominação do mundo tivesse atuado em favor norme país
distante, desse outro pólo do universo dos povoamentos densos... Outra
perspectiva com o sabor da época: o capitalismo parece a Max Welper
conseqüência, a descoberta de uma terra prometida da economia, o
desabrofinal do progresso. Nunca (a menos que minha leitura não tenha
sido suficiennte atenta)
como um regime frágil e talvez transitório. Atualmente, a morte pelo
menos, mutações em cadeia do capitalismo já nada têm de improvável. o
diante de nós.
Pelo menos, ele "já não nos parece a última palavra da
evoluhistórica"'0].

o CAPITALISMO FORA DA EUROPA


Tal como a Europa, o resto do mundo é há séculos obcecado pelas
necessidades de produzir, pelas- obrigações da troca, pelas precipitações
da moeda. Será absurdo procurar, no meio dessas combinações, sinais que
prenunciem ou realizem um certo capitalismo? Gostaria de dizer, como
Deleuze e Guattari402, que "de certo modo, o capitalismo esteve presente
em todas as formas de sociedade", pelo menos o capitalismo tal como o
concebo. Mas, reconheçamo-lo sem rodeios, a construção triunfa na Europa,
esboça-se no Japão, fracassa (as exceções confirmam a regra)
em quase todos os outros lugares - melhor seria dizer que não se consuma.
Para tal, há duas grandes explicações, uma econômica e espacial, outra
política e social. Explicações que apenas conseguimos esboçar. Mas, por
mais imperfeita e, em suma, negativa que se revele uma investigação dessa
ordem, através dos dados mal prospectados e mal reunidos pelos
historiadores europeus e nãoeuropeus, esses fracassos evidentes e
semitriunfos testemunham sobre o capitalismo, tanto como problema de
conjunto quanto como problema específico da
Europa.
Milagres do comércio de longa distância
As condições prévias para o capitalismo dependem da circulação; à
primeira vista, quase poderíamos dizer: apenas da circulação. E, quanto
mais espaço essa circulação percorre, mais frutuosa é. Esse determinismo
elementar atua em toda a parte. Assim, a obra recente de Evelyn Sakakida
Pawski demonstra que, no Fukien do século XVI e no Hu-nan do século
XVIII, a parte litorânea dessas duas províncias chinesas, tocada pelas
benesses do mar, aberta à troca, é povoada, progressista, com
campesinatos que parecem viver bem; ao passo que o interior das terras,
com os mesmos arrozais e os mesmos homens, encerrado em si próprio, é,
antes, miserável. Vivacidade de um lado, paralisia do outro: a regra vale
para todas as escalas e para todas as regiões do mundo.
E se esse contraste fundamental nos impressiona muito particularmente na
China e na Ásia daqueles séculos distantes é porque, aí, o espaço é
superabundante e aumenta desmesuradamente as terras, as extensões
marítimas que devem ser transpostas, as zonas semimortas do
subdesenvolvimento. A discriminação estabelecese numa escala que já não é
a da Europa. Em relação a tal imensidão, as zonas ativas parecem tanto
mais reduzidas, ao longo das linhas de circulação dos navios, das
mercadorias e dos homens. Por isso, se o Japão é um caso à parte no
conjunto do Leste asiático, é sobretudo porque o mar que o circunda
facilitalhe todas as comunicações, porque o Seto-no-Uchi é um
Mediterrâneo japones, pequeno e muito ativo. Imaginem, na França, um mar
interior que fosse de Lyon a
Paris! Por certo não se explica o Japão todo apenas pelas virtudes da
água salgada, mas, sem elas, os encadeamentos e o processo dessa história
singular seriam quase inimagináveis. Não se passa o mesmo ao longo de
toda a costa meridional da China, orlada de rias, onde o mar invade o
litoral e penetra, de
Fu-tcheu e Amoy até Cantão? Aqui a viagem, as aventuras no mar são
cúmplices de certo capitalismo chinês que

ssume sua verdadeira dimensão quando escapa de uma China vigiada e


opresi. Essa
China exterior vivaz é aquela que, mesmo depois de 1638 e do semifenento
do
Japão ao comércio externo, mantém o acesso ao mercado do cobre prata do
arquipélago nipônico, do mesmo modo e decerto melhor ainda do os
holandeses; que recolhe em Manila a prata do galeão proveniente de Acao;
que desde sempre lança para toda a Insulíndia seus homens, suas diversas,
adorias e seus inigualáveis negociantes. Mais tarde, o acirramento do
comér-uropeu "à
China" fará de Cantão um mercado em expansão, exigente, que, imenta toda
a economia chinesa e, no plano mais elevado, a habilidade dos banqueiros,
financistas e prestamistas. O Co-Hong, o grupo de mercadores em o governo
de
Pequim confia, em Cantão, o cuidado de enfrentar os euro, fundado em
1720, em funcionamento até 1771, é uma contra-Companhia das as, o
instrumento de enormes fortunas chinesas.
As nossas observações seriam análogas se abordássemos outras cidades
comerextremamente ativas, como Malaca antes de 15 10, ano da conquista
portuguew
Achem, na ilha de Sumatra, nas imediações de 1600403; ou Bantam, a Veou a
Bruges dos Trópicos antes da instalação destrutiva dos holandeses, em ou
as cidades, desde sempre comerciais, da índia ou do Islã. Neste ponto,
mos, realmente, a dificuldade da escolha.
Suponhamos então que escolhemos Surate, na India, no golfo de Cambaia.
igleses ali instalaram a sua "casa" em 1609, os holandeses em 1616, os
trance..-iuito mais tarde, com mais luxo, em 1665404. Se nos colocamos
perto dessa ia data,
Surate mostra-se em pleno desenvolvimento. Os grandes navios fazem a no
anteporto de Suali, na foz do Tapta, pequeno rio costeiro que sobe até te
mas só permite a passagem de barcos leves. Em Suali, acampamentos de nas
cobertas de junco acolhem as tripulações européias e não-européias. Mas
andes navios não se demoram muito lá porque o mau tempo é normalmente
oso: não ê* born lugar para passar o inverno. Só ficam os mercadores, que
vão as casas de Surate.

14o dizer de um francêS405 Surate em 1672 é do tamanho de Lyon. E,


generonte, abriga um milhão de habitantes, estimativa que pode deixar-nos
cépticos. raça reinam banqueiros, mercadores e comissionistas banianos,
todos justifinente orgulhosos da honestidade, habilidade, riqueza.
"Podiam-se contar até ricos de duzentos mil escudos e mais de um terço
deste número que possuía )u três milhões." Os recordes de fortuna cabem a
um rendeiro do fisco (3O es) e a um mercador "que fazia empréstimos a
juros aos mercadores mouros )peus" (25

milhões). Surate é então um dos grandes pontos de escala do oceadico,


entre o mar Vermelho, a Pérsia e a Insulíndia. É a porta de saída e de Ia
do Império mogol, isto é, a confluência de toda a índia, o ponto de
enconvorito de armadores e emprestadores de câmbio marítimo. Para lá
afluem ras de câmbio: quem vai embarcar ali tem a certeza de ericontrar
dinheiro, a Tavernier406. É lá que os holandeses se abastecem das rupias
de prata de ecessitam para seu comércio em
Bengala407. Outro sinal de grande comércio:, rfeito cosmopolitismo étnico
e religioso. Ao lado dos banianos (que ocupam neiro lugar como
intermediários) e do vasto artesanato "gentio" da cidade dores, é preciso
situar, em igualdade ou quase com os hindus, uma sociedade ntil muçulmana
que também estende seus negócios do mar Vermelho a Su
Um mercador baniano de Cambaia e sua mulher, aquarela de um português que
viveu em Goa e nas Indias, no século XVI. Biblioteca Casanatense, em
Roma. (Foto F.
Quilici.)
matra e ao resto da Insulíndia, mais uma ativa colônia de armênios. com
exceção dos chineses e dos japoneses, diz um viajante, Gautier Schouten
118 lá estão todos os viajantes internacionais "e os mercadores de todas
as nações das índias". "Fazse aí um comércio prodigioso."
Evidentemente, a boa estrela de Surate conhecerá altos e baixos. Mas em
1758, às vésperas do domínio inglês sobre Bengala, o inglês Henry Grose
fica tão estupefato quanto impressionado perante o espetáculo de Surate.
Sem dúvida contesta de passagem o exagero que atribui "ao grande mercador
Abdurgafur [ ... ] um comércio por si só tão considerável como o da
Companhia Inglesa", mas mesmo assim assinala que este envia "todos os
anos para o mar vinte embarcações mercantes de trezentas a oitocentas
toneladas, carregadas com pelo menos vinte mil libras esterlinas de
mercadorias, algumas com vinte e cinco mil". Fica um tanto atônito com os
corretores banianos, ainda por cima honestos, que "no espaço de meia hora
[... 1 concluem com poucas palavras um negócio de trinta mil libras
esterlinas". No entanto, suas lojas têm fraca aparência, mas "não há
mercadoria que não se encontre lá" e "os mercadores têm o hábito de
guardar seus gêneros alimentícios em outros armazéns; mas na loja têm o
necessário para vender por amostra". Os tecidos indianos, particularmente
certos motivos florais, certos fundos vermelhos, não agradam muito ao
nosso inglês, mas basta pegar na mão um xale de Caxemira, diz ele, que se
fica extasiado com o material "macio [ ... ] e tão prodigiosamente fino
que se pode fazer passar uma dessas peças por um anel""'.

Imaginemos, nas costas da india e da Insulíndia, dezenas de cidades quase


tão iadas como Surate, milhares de mercadores, de empresários, de
transportadode corretores, de banqueiros, de fabricantes. Então não há
capitalistas, capita3? Hesitaremos em dizer não. Existem todos os
elementos característicos da )pa da época: os capitais, as mercadorias,
os corretores, os negociantes, o ban)s instrumentos do comércio, até o
proletariado dos artesãos, mesmo as ofici, om jeito de manufaturas nos
grandes centros têxteis como Ahmedabad, até balho domiciliar encomendado
por mercadores e garantido por corretores es, lizados (o mecanismo está
bem descrito num ou noutro artigo sobre o comériglês de Bengala),
incluindo, sobretudo, o comércio de longa distância. Mas o é que essa
realidade mercantil de alta tensão está presente apenas em alguns )s,
ausente em territórios imensos. Será a Europa dos séculos XIII e XIV?
mentos e intuições .lacobs , ntes de chegarmos à segunda explicação
anunciada - política e social -, mos um longo e útil parêntese, inspirado
pelo livro de Norman Jacobs, editaHong-Kong em

1958, The Origin of Modem Capitalism and Eastem Asia., parentemente, o


objetivo de N. Jacobs é simples. No Extremo-Oriente, verifisó o Japão é
hoje capitalista.
Dizer que o capitalismo industrial foi ali mera ão da industrialização
européia não é explicação suficiente. Pois, nesse caso, e os outros
países do ExtremoOriente foram e são incapazes, por sua vez, de uzir o
modelo? É provável que haja estruturas antigas responsáveis por tal apu
não-aptidão para acolher o capitalismo. Caberia assim ao pré-capitalismo
sposta, ao passado explicar o ponto de chegada. com esse intuito,
compara) antigo Japão com: 1) a China, culturalmente próxima, porém muito
diferenEuropa que, culturalmente, está muito longe do Japão, mas talvez
tenha certas inças com ele. E, se é a sociedade, a organização social, o
aparelho político o a cultura - que representam a dissemelhança entre o
Japão e a China, a Lnça entre o Japão e a Europa assume uma dimensão
significativa. Talvez pospor esse processo, ter sobre o capitalismo em
geral e sobre as suas origens son sentido lato, esclarecimentos bastante
novos.
m efeito, o livro de N. Jacobs erra ao supor conhecidas de antemão as
caicas essenciais do pré-capitalismo europeu; a seguir, limitar-se-á a
uma comminuciosa, passo a passo, entre a China e o Japão, aceitando que o
caso a, sendo o caso não capitalista, seja válido, mutatis mutandis, para
a índia seguramente discutível). Também não se faz alusão ao Islã, o que
por cera importante lacuna. Mas o mais grave inconveniente da redução a
dois ue nos é proposta é por certo marcar demasiado os contrastes entre
China Chega-se a um díptico: o que é preto de um lado é branco do outro,
com Oposições entre claro e escuro, como num quadro de Georges La Tour.
co de simplificações arbitrárias.
Nem por isso a comparação deixa de ser rite e instrutiva do princípio ao
fim.
dois pratos da balança, N. Jacobs não hesita em colocar todo o passado e
do
Japão, o que eu aprovo, como juiz muito parcial, diga-se de passa
Uma bela --imagem exaguada": menino prodígio, Yoritomo (1147-1199), mata,
com a idade de 13 anos, os ladrões que o tinham atacado. (Tsukioga Nogin
Sai
Massanobu, Biografia dos homens célebres... 1759, B.N., Grav. DD 161,
clichê
Giraudon.)
gem: não fiz eu a mesma coisa relativamente à Europa, remontando
freqüentemente à ruptura do século X1 e mesmo mais além dessa inflexão
decisiva? Na obra de
Jacobs, uma regra análoga invoca tanto determinada decisão dos Han
(século 111

a.C.) sobre o regime da propriedade individual chinesa, ou os editos


japoneses do século VII isentando de impostos as terras concedidas a
certas categorias sociais
- principal fundamento da feudalidade japonesa -, como certos pormenores
significativos do período Ashikaga (1368-1573) pelos quais já se afirma a
vocação marítima do Japão e o poderoso impulso da sua pirataria pelos
mares do
Extremo-Oriente, ao mesmo tempo que os êxitos de uma economia em busca da
sua, ou melhor, das suas liberdades - entendendo-se por liberdades algo
comparável às "liberdades" da Europa medieval, isto é, privilégios,
defesas contra os outros.
Portanto, implícita e explicitamente, Norman Jacobs reduz os pressupostos
do capitalismo a uma evolução multissecular de longuíssima duração, sendo
à acumulação de provas históricas que ele deixa o cuidado de dirimir o
problema levantado. Vindo de um sociólogo, demonstra rara confiança na
história.
Jacobs invocará, portanto, acerca de séculos e séculos, as diversas
atividades funcionais das sociedades, das economias, das políticas
governamentais, dos organismos religiosos. Tudo será abordado: as trocas,
a propriedade, a autoridade política, a divisão do trabalho, a
estratificação e a mobilidade sociais, o parentesco,

uw; cunjunros)s sistemas de herança, o lugar da vida religiosa - sendo o


problema verificar tolas as vezes o que, nessas permanências, se
assemelha mais ao passado europeu se revela portanto, em princípio,
portador de um futuro capitalista. O resultado um livro original e
prolixo que resumiremos um tanto à nossa maneira, acrescenando, no
caminho, nossas notas de leitura e nossas interpretações.
Na China, o obstáculo é o Estado, a coesão de sua burocracia - acrescento
longevidade desse Estado que decerto fica desarticulado por longos
intervalos, [ias se reconstitui sempre igual a si próprio: centralizador,
moralizador também, gindo rigorosamente segundo uma moral confueiana
freqüentemente atualizada, rias de modo geral fiel a princípios diretores
que poem a seu serviço cultura, ideo:)gia, religião; e o próprio Estado,
isto é, os mandarins de todos os escalões, a seriço do bem comum. Obras
públicas, correção dos rios, estradas, canais, segurana e administração
das cidades, luta nas fronteiras contra as ameaças externas, tuo isso
compete ao Estado. Igualmente a luta contra a fome, o que significa ao
iesmo tempo proteger e garantir a produção agrícola, pedra angular de
toda a ecoomia; conceder ocasionais empréstimos aos camponeses, aos
produtores de seda, os empresários; encher os celeiros públicos para
constituir reservas de segurança; nalmente, contrapartida necessária
dessa intervenção onipresente, reconhecer apeas ao Estado o direito de
taxar os súditos. Claro que, se o imperador deixasse de r moral, o céu o
abandonaria: o soberano perderia toda sua autoridade. Mas, ormalmente,
sua autoridade é plena e íntegra, teoricamente dotada de todos os
ireitos. A propriedade individual da terra remonta aos Han, é certo, mas
o govero continua a ser, em princípio, o dono do solo. Camponeses e mesmo
importantes roprietários fundiários podem ser deslocados autoritariamente
de um ponto para utro do Império, mais uma vez em nome do bem comum e das
necessidades da Aonização agrícola. O governo reserva igualmente para si,
como um enorme emresário, todas as corvéias camponesas. É certo que há
uma nobreza fundiária insLlada às costas dos camponeses e que se
aproveita do trabalho deles, mas sem ne, um direito legítimo e apenas na
medida em que aceita, nas aldeias onde nenhum incionário exerce
vigilância direta, representar o Estado, particularmente arrecadarie o
imposto. A própria nobreza depende, portanto, da benevolência do Estado.
O mesmo se passa com os negociantes ou os fabricantes que a administração
)m cem olhos sempre pode chamar à ordem, manter em rédea curta e limitar-
lhes atividades. Nos portos, os barcos são controlados, na partida e na
chegada, pelo andarim da região. Certos historiadores pensam mesmo que as
vastas operações arítimas do início do século XV teriam sido uma maneira
de o Estado controlar lucros do comércio externo privado. É possível, não
certo. Todas as cidades são ualmente vigiadas, providas de armadilhas,
divididas em bairros, em ruas difentes que, todas as noites, fecham suas
barreiras. Nessas condições, nem os merdores, nem os usurários, nem os
cambistas, nem os fabricantes que o Estado por !zes subvenciona para
agirem neste ou naquele sentido têm a faca e o queijo na ão. O governo
tem o direito de punir e de taxar quem quiser em nome do bem mum que
condena a opulência excessiva dos indivíduos como uma desigualdade ioral
e uma injustiça. O delinqüente devolvido ao born caminho não poderia
ieixar-se:
foi a moral pública que o puniu. Só o funcionário, o mandarim ou o
divíduo protegido por esses todo-poderosos escapam à norma, mas seu
privilégio inca está garantido. Sem querer forçar o significado de um
caso individual,

A socieaaae ou o conjuniu uuN curijutitu, 5

Heshen, o ministro favorito do imperador Qianlong, quando este morre, em


1799, é condenado à morte por seu sucessor e sua fortuna confiscada.
Tratava-se de um homem ávido, corrupto, odiado, mas, sobretudo, que
possuía coisas em excesso, uma coleção de velhos mestres, várias casas de
penhores, uma enorme reserva de ouro e de jóias - em suma, era demasiado
rico e, defeito suplementar, já não exercia nenhum cargo.
Outras prerrogativas do Estado: o direito discricionário de cunhar más
moedas (as pesadas caixas de cobre e chumbo misturados), muitas vezes
falsificadas (nem por isso deixam de circular) e que se desvalorizam
quando as inscrições que as autenticavam se apagam ou são apagadas;
também o direito discricionário de emitir papel-moeda cujos possuidores
nem sempre têm certeza de um dia serem reembolsados. Os mercadores, os
numerosos usurários, os banqueiros cambistas que muitas vezes ganham sua
parca vida coletando os tributos devidos ao Estado, vivem no temor de
serem taxados ao primeiro sinal de riqueza ou denunciados por um rival
desejoso de dirigir contra eles a força igualitária do Estado.
Em tal sistema, a acumulação só é possível ao Estado e ao aparelho de
Estado,
Finalmente, a China terá vivido sob certo regime "totalitário" (se
retirarmos da palavra o sentido odioso que recentemente adquiriu). E, a
dado momento, o exemplo da China vem apoiar nossa obstinação em
distinguir fortemente economia e capitalismo. Pois (contrariamente ao que
Jacobs quer crer por uma espécie de raciocínio a priori: sem capitalismo,
não há economia de mercado), a China tem uma sólida economia de mercado
que já descrevemos várias vezes, com as suas guirlandas de mercados
locais, a efervescência dos seus pequenos grupos de artesãos e de
mercadores itinerantes, a profusão de lojas e de pontos de encontros
urbanos. Na base, portanto, trocas muito ativas e volumosas, favorecidas
por um governo para quem os bons resultados agrícolas são o essencial;
mas, acima, a tutela onipresente do aparelho de Estado - e sua nítida
hostilidade contra qualquer indivíduo que enriqueça "anormalmente". A tal
ponto que as terras próximas das cidades (na Europa fonte de rendimentos
e de rendas substanciais para os citadinos que as compram a alto preço)
são pesadamente taxadas na China para compensar a vantagem que tiram,
sobre os campos mais afastados, da proximidade dos mercados urbanos.
Então não há capitalismo a não ser no interior de grupos definidos,
caucionados pelo Estado, por ele vigiados e sempre mais ou menos à sua
mercê, tais como os mercadores de sal do século XIII ou o Co-Hong de
Cantão. Quando muito, podese falar, no tempo dos Ming, de uma certa
burguesia. E de uma espécie de capitalismo colonial, que se perpetuou até
hoje, entre os emigrantes chineses, particularmente na Insulíndia.
No Japão, sem forçarmos as explicações de N. Jacobs, os dados de um
futuro capitalista estão lançados já na época Ashikaga (1368-1573), com a
instauração de forças econômicas e sociais independentes do Estado (quer
se trate das corporações, do comércio de longa distância, das cidades
livres, dos mercadores associados que em geral não têm de prestar contas
a ninguém). Os primeiros sinais dessa relativa falta de autoridade
estatal aparecem mesmo mais cedo, assim que se instala um sistema feudal
sólido. Mas essa data inicial é problemática: dizer que em 127O o sistema
feudal emergiu, reconhecível, é ser demasiado preciso num campo em que há
o risco de a precisão ser enganadora e é deixar na sombra os pressupostos
dessa gênese, da constituição, a expensas dos domínios do imperador, de
grandes

'iedades individuais que, antes mesmo de se tornarem hereditárias de


direito, pe, em armas para se perpetuar e defender a autonomia. Tudo isso
acarreta a criae fato, num prazo mais ou menos longo, de províncias quase
independentes, osas, que protegem suas cidades, mercadores, misteres,
interesses particulares.
) que talvez tenha salvado a China de um regime feudal durante o período
ling (1368-1644) e mesmo depois, apesar das catástrofes da conquista
mongol -1680), foi a permanência de uma forte massa humana, a qual
implica uma midade, possíveis retornos ao equilíbrio. Na verdade, tendo a
colocar, na orio sistema feudal, uma situação zero e um parco povoamento,
resultado ou dentes, ou de catástrofes, ou de fortes despovoamentos, mas
também, evenente, de um primeiro ponto de partida num país ainda
relativamente novo. ão, no princípio, é um arquipélago com três quartas
partes vazias. Para Miié41O o "fato dominante [é seu] atraso
relativamente ao continente", relati[te à Coréia e, sobretudo, à
China. Naqueles séculos distantes, o Japão corre lo reflexo da
civilização chinesa, mas falta-lhe a densidade do número. A [cia de suas
guerras intermináveis, selvagens, em que pequenos grupos difite conseguem
subjugar o ou os adversários, mantém um subdesenvolvimenlico e o
arquipélago permanece dividido em unidades autônomas que a coero consegue
unir bem e que, na primeira ocasião, retomam o livre curso de, istências.
As sociedades japonesas assim constituídas foram caóticas, desi-
ompartimentadas. Se bem que haja, em face de sua fragmentação, a autorio
Termo (o imperador residente em Kyoto), bem mais teórica e sacra do que
-al; e também, a partir das sucessivas capitais que perduram mais ou
menos a autoridade violenta e contestada do xógum, uma espécie de
prefeito do à merovíngia. Finalmente, é o xogunato que criará o governo
do bakufu, , nderá a todo o Japão com ledoshyi, fundador da dinastia dos
ToIçugawa

868), que governará até a revolução Meiji.


ra simplificar, podemos dizer que, com uma anarquia que lembra a da Idaia
européia, tudo cresceu ao mesmo tempo no cenário diversificado do Ja-ante
os séculos da sua lenta formação: o governo central, os senhores
feucidades, os camponeses, os artesãos, os mercadores. A sociedade
japonesa iredada em liberdades análogas às da Europa, liberdades que são
outros tanilégios atrás dos quais se enclausuram, se defendem,
sobrevivem. E nada ibelecido de uma vez por todas, nada aceita uma
solução unilateral. Have:)ém aí, algo da pluralidade das sociedades
"feudais" da Europa, criadora litos e de movimento? com os Tokugawa que
chegam no fim da corrida, imaginar um equilíbrio que deve ser
reconstituído continuamente, cujos elesão obrigados a ajustar-se uns aos
outros, não um regime organizado totaente, à chinesa. A vitória dos
Tokugawa, que os historiadores têm tendênexagerar, tinha de ser uma
semivitória - real mas incompleta - como onarquias da Europa.
a vitória, por certo, foi a da infantaria e das armas de fogo
provenientes pa (sobretudo os arcabuzes, pois a artilharia japonesa faz
mais barulho do. Mais cedo ou mais tarde, os daimios tiveram de ceder,
aceitar a autorida1 governo ágil, apoiado num exército sólido, dispondo
de grandes estradas tos de muda organizados que facilitam vigilância e
intervenção eficazes. de aceitar passar um em cada dois anos em Edo
(Tóquio), a nova e excênital do xógum, e morar lá numa espécie de
residência vigiada. É o dever

de sankin. Quando regressam a seus feudos, deixam atrás de si mulheres e


filhos como reféns. Há também um parente do Termo residindo em Edo, onde
serve de refém. Em comparação, a escravidão dourada da nobreza francesa,
no Louvre e em
Versalhes, parecerá uma singular liberdade. A relação de forças inverteu-
se, portanto, a favor do xógum. Ainda assim a tensão é evidente e a
violência está na ordem do dia. Prova disso é a encenação que o xógum
lemitsu, ainda um jovem quando sucede ao pai, em 1632, acha necessário
organizar para convencer todos da sua autoridade de soberano. Convoca os
daimios. Quando estes chegam ao palácio e se encontram, como de costume,
na última antecâmara, ficam sozinhos. Esperam;
são surpreendidos por um frio penetrante; nenhum alimento lhes é
oferecido; o silêncio, a noite abatem-se sobre eles. De repente, puxam-se
os painéis e o xógum aparece ao clarão das tochas. Fala como senhor:
"Pretendo tratar todos os daimios, mesmo os maiores, como meus súditos.
Se entre vós houver algum a quem essa submissão desagrade, que parta, que
volte ao seu feudo e se prepare para a guerra; entre ele e mim, as armas
decidirão.11411 É esse mesmo xógum que, em

1635, instituirá o sankin e pouco depois fechará o Japão ao comércio


externo, salvo para alguns barcos holandeses e alguns juncos chineses.
Maneira de controlar os mercadores tal como controlava a nobreza.
Os senhores feudais foram, portanto, domados, mas seus feudos
subsistiram, intactos. O xógum procede a confiscos, mas também à
redistribuição de feudos. E as famílias feudais se multiplicarão assim
até a época atual - belo teste de longevidade. Aliás, tudo favorece a
longevidade das linhagens, particularmente o direito de primogenitura, ao
passo que na China a herança dos pais é partilhada entre todos os filhos
varões. À sombra dessas poderosas famílias (das quais algumas chegarão
firmes e vitoriosas ao capitalismo industrial), mantêm-se por muito tempo
as clientelas de pequenos nobres, os samurais, que, por sua vez,
concorrerão para a revolução industrial que seguirá Meiji.
Entretanto, o mais importante, do nosso ponto de vista, é a instalação
tardia e depressa eficaz de mercados livres, de cidades livres, tendo a
primeira destas sido, em 1573, o porto de Sakai. De uma cidade para
outra, poderosas corporações estendem suas redes e seus monopólios, e as
sociedades comerciais, organizadas como corporações, presentes já no fim
do século XVII, reconhecidas oficialmente em

1721, assumem aqui e ali o aspecto de companhias comerciais


privilegiadas, análogas às do Ocidente. Finalmente, última característica
forte, afirmam-se as dinastias mercantis e, apesar de algumas
catástrofes, prolongam-se para além de todos os prazos fixados por Henri
Pirerme, às vezes por séculos a fio: os
Konoike, os Sumitono, os Mitsui. O fundador deste último grupo,
ultrapoderoso ainda hoje, foi "um fabricante de saquê, estabelecido, em
1620, na província de
Ise", cujo filho haveria de tornar-se em 1690, em Edo (Tóquio), "o agente
financeiro tanto do xógum como da casa imperial`12.
Assim, temos mercadores que perduram, que exploram os daimios, o bakufu,
até o
Termo; mercadores experientes que muito cedo saberão tirar vantagens das
manipulações da moeda - a moeda multiplicador, instrumento indispensável
de uma acumulação moderna. Quando o governo resolver manipulá-la em
proveito próprio, desvalorizando-a, no fim do século XVII, encontrará tão
fortes oposições que dará marcha à ré alguns anos mais tarde. E os
mercadores todas as vezes se livrarão dos apuros, à custa do resto da
população.

japonês do século XVIII. Por Shunsho, que foi um dos mestres de Hokusai.
.tudo, a sociedade não favorece sistematicamente os mercadores; não lhes
ienhum prestígio social, pelo contrário. O primeiro economista japonês,
va Banzan (1619-1691)111, não gosta muito deles e cita, de modo
significaleal da sociedade chinesa. Um primeiro capitalismo japonês, com
toda a i endógeno, autóctone, não deixa, porém, de crescer por si só. Por
meio ra do arroz que os daimios ou os criados dos daimios lhes entregam,
os res estão no próprio ponto de junção da economia japonesa, na linha
deci[ue o arroz (antiga moeda) se monetariza realmente. Ora, o preço do
arroz da colheita, é certo, mas também dos mercadores que dominam o
exceencial da produção. São também senhores do eixo decisivo que liga
Osaitro da produção, a Edo, o centro do consumo, enorme capital parasita

3 de um milhão de habitantes. Finalmente, são os intermediários entre


um )rata (Osaka) e um pólo do ouro (Edo), e os dois metais jogam um
contra sobrepondo-se de longe à antiga circulação do cobre, regulamentada
em ' é a moeda dos pobres, no andar térreo das trocas. A essa corrente
monelice adicionam-se as letras de câmbio, os cheques, as notas de banco,
os um verdadeiro Stock Exchange. Enfim, de um imenso artesanato
tradiirgem manufaturas. Tudo converge assim no sentido de um primeiro
capi[ue não saiu nem de uma imitação do estrangeiro, nem de um enquadra
(Foto Bulloz.)
mento religioso qualquer, sendo o papel dos mercadores muitas vezes o de
eliminar a concorrência, a princípio muito viva, dos mosteiros budistas
que o próprio xogunato, aliás, se empenhou em destruir.
Em suma, tudo resultou, em primeira instância, de um avanço da economia
de mercado, antiga, ativa, proliferante: os mercados, as feiras, as
navegações, as trocas (quanto mais não seja a distribuição do peixe nas
terras do interior). A seguir, de um comércio de longa distância, também
ele cedo desenvolvido, particularmente com a China, gerador de lucros
fantásticos (1. 10O por cento quando das primeiras viagens, no Século
XV)414. Os mercadores, aliás, foram muito generosos com seu dinheiro para
com o xógum, nos anos de 1570, quando contavam com a conquista das
Filipinas. Infelizmente para eles, esse ingrediente necessário e decisivo
de uma superestrutura capitalista - o comércio externo em breve faltará
ao Japão. Depois do fechamento de 1638, o comércio externo foi
rigorosamente restringido, se não extinto pelo xogunato. Alguns
historiadores afirmam que o contrabando mitigou as conseqüências dessa
medida, particularmente a partir de Kiushu, a ilha meridional, e pela
ilhota deserta chamada do
Silêncio, a caminho da Coréia. É um exagero, mesmo com as provas de um
contrabando ativo dos mercadores de Nagasaki, entre outros, ou do senhor
da poderosa família dos Shimatzu, senhor de Setsuma que, em 1691, tinha
correspondentes na China para melhor orga is tráficos ilíCitOS415. Mesmo
assim é inegável que os entraves e restrições ime

1638 a 1868, durante mais de dois séculos, retardaram uma expansão


ecoprevisível. A seguir, o Japão recuperou muito rapidamente seu atraso.
E isso as razões, das quais algumas conjunturais. Mas acima de tudo,
decerto, por Jo, para seu recente surto industrial imitado do Ocidente,
de um capitalismo U antigo que já soubera construir, pacientemente e
sozinho. Durante muito 'o trigo cresceu sob a neve". Tomei esta imagem do
velho livro (1930) de ii416 que também acha alucinante a semelhança
econômica e social entre uma
- um Japão desenvolvidos cada qual do seu lado, segundo processos análoIa
que os resultados não sejam absolutamente os mesmos.
erremos este longo parêntese e retomemos o problema no seu conjunto. :)s
de chegar num tema conhecido, banal, apaixonante. Em termos
marxisidalismo prepararia o caminho ao capitalismo - passagem que Marx,
co[do, nunca analisou demoradamente. E Jacobs, por sua vez, apenas a
aborda ar, de um lado, que o feudalismo seja a fase prévia necessária ao
capitalisutro, para sugerir que "historicamente... os elementos que
deviam desencapitalismo" encontraram em "certos valores, relativos aos
direitos e pri, stabelecidos no tempo do feudalismo com outros
objetivos", um clima para "institucionalizar a sua própria posição". E
assim que, pessoalmente, )isas. Salvo nas cidades que se desenvolveram
cedo de maneira autónoma, , entes - Veneza, Gênova ou Augsburgo -, onde
um patriciado oriundo rcio ocupa o último andar da sociedade, as famílias
mercantis de classe no Ocidente ou no Japão, são apenas, quando a
modernidade da econoo Estado as impele para a frente, secundárias.
Deparam com um limite, , a planta que encontra um muro. Se a barreira
resiste, caules e raízes cresnvolvem-se ao longo do muro. É a sorte das
burguesias. No dia em que i é transposta, há, para a família vitoriosa,
uma mudança de status. Esitro livro, que a burguesia então traía. É um
exagero. com efeito, ela nunca )letamente;
torna a formar-se encostada ao obstáculo.
s famílias contidas, trancafiadas, e que crescem em direção da luz, dos
lo sucesso social, ei-las, enquanto o obstáculo se mantém, condenadas à
ia, ao cálculo, à prudência, às virtudes da acumulação. Mais ainda, como
acima delas é perdulária, ostentatória, economicamente frágil, o que esa
abandona ou deixa apanhar é agarrado pela classe vizinha. A título de
-ápido, mas convincente, veja-se a atividade, melhor, a política usurária

1 francesa dos Séguier. Não é apenas mediante compras de cargos, de


terióveis, ou pensões obtidas do rei, ou mediante dotes amealhados com
ree, ou mediante gestão dos pais de família que as fortunas da burguesia,
eza de toga, essa outra burguesia, progridem, já no século XV1; é mea uma
série de serviços (usurários e outros, mas sobretudo usurários)
presgrandes deste mundo. O presidente Pierre
Séguier (1504-1580) aceita de3z empréstimos, desconta letras, recupera
penhores, recebe juros. Fecha rutuOsos com Marie d'Albret, duquesa de
Nevers; no momento dos pa, esta vende um dia a
Séguier "o senhorio de Sorel, perto de Dreux, me
A socíeaaae ou -o conjunto aos conjuntosdiante 9 mil escudos dos quais
recebe apenas 3.600, servindo o resto de reembolso"417.
E este é apenas um negócio entre muitos outros. O presidente estabelece
também relações de usurário com os Montmorency, que se defendem bem dele,
e com diversos membros da família dos Silly. Na seqüência destes
negócios, faz-se menção, à conta de Pierre Séguier, de uma --floresta
adulta" perto de Melun, de uma propriedade rural em Escury, perto de
Auneau, e assim por diante"'. Há aqui parasitismo, exploração,
fagocitismo. A classe superior, fruto lentamente amadurecido das riquezas
fundiárias e do poder tradicional, revela-se um alimento excepcional,
consumido com alguns riscos, mas com muitas vantagens. O processo é o
mesmo no Japão, onde o mercador de Osaka tira proveito das infelicidades
e dos esbanjamentos dos daimios. Há aí, segundo a linguagem de
Marx, centralização em detrimento de uma classe, em benefício de outra. A
classe dominante torna-se de um dia para o outro o repasto dos
seguidores, tal como os
Eupátridas, em Atenas e em outros lugares, foram comidos pelas cidades,
as poleis. Claro que, se essa classe tiver força para se defender e
reagir, a ascensão dos outros para a riqueza e para o poder será difícil,
ou temporariamente impossível. Até na Europa houve conjunturas assim.
Mas, de qualquer maneira, a mobilidade social não basta. Em suma, para
que uma classe seja consumível por outra, de modo eficaz, isto é, a longo
prazo, com continuidade, é ainda necessário que ambas tenham a faculdade
de acumular e de transmitir essa acumulação, de geração em geração, como
uma bola de neve.
Na China, a sociedade burocrática recobre a sociedade chinesa com uma
única camada superior, praticamente indestrutível e que, eventualmente,
se reconstitui como que por si só. Nenhum grupo, nenhuma classe consegue
aproximar-se do imenso prestígio dos mandarins letrados. Nem todos esses
representantes da ordem e da moral pública são perfeitos. Muitos
mandarins, particularmente nos portos, aplicam dinheiro nos negócios dos
mercadores, que de boa vontade compram-lhes a benevolência. Uma anotação
de um viajante europeu em Cantão mostra-nos os mandarins locais
praticando uma corrupção quase natural, enriquecendo sem remorsos. Mas de
que vale a acumulação de uma fortuna que é só de um homem? Uma acumulação
vitalícia, em resultado da função, fruto de estudos superiores e de um
concurso aberto a um recrutamento bastante dernocrátiC04191? O prestígio
dos mandarins em geral leva as famílias de mercadores abastados a impelir
os filhos para essas posições invejáveis e brilhantes, é a sua maneira de
"trair". Mas o filho do mandarim nem sempre será mandarim. A ascensão
familiar corre o risco de se interromper abruptamente. Nem a fortuna, nem
o poder dos mandarins se perpetuam sem escolhos nas linhagens das
famílias dominantes.
Nos países islâmicos a situação tem raízes diferentes, mas os resultados
são curiosamente os mesmos. Situação diferente: a classe superior não
pára, não de mudar, mas de ser mudada. O sultão Osmânli, em Istambul,
oferece o exemplo típico disso: muda a alta sociedade a todo instante,
como quem muda de camisa.
Pense-se no recrutamento dos janízaros entre as crianças cristãs. A
feudalidade otomana, de que se fala com freqüência, é apenas uma pré-
feudalidade de beneficiários; os timars, os sipahiniks são concessões a
título vitalício. Será preciso aguardar o fim do século XVI para que se
esboce uma verdadeira feudalidade otomana, numa linha capitalista de
bonificações e de instauração de novas culturas 420. Uma aristocracia
enfeudada instala-se então, particularmente na península dos Bálcãs, e
consegue manter suas terras e suas senhorias sob dependências familiares
de longa duração. Para um historiador,
Nicolai TodoroV421 uma luta para se apoderar da renda fundiária teria
terminado com uma vitória completa da camada dominante que já ocupava
todos os

531

4 o cunjunio aos conjunros- gos administrativos do Estado. Vitória


completa? Conviria um exame mais ) certo é que essa reviravolta social é
a causa e a conseqüência de uma grande Ita da história, da decomposição
do velho Estado militar, belicoso e con)r, já um "doente". Em países
muçulmanos, a imagem comum e normal ma sociedade contida, de vez em
quando sacudida pelo Estado, para semirada da terra que a alimenta. Em
toda a parte o espetáculo é o mesmo, a, onde os cãs são senhores a título
vitalício, ou na índia do Grão-Mogol, o do seu esplendor.
Delhi, com efeito, não há "grandes famílias" que se perpetuem. François
doutor da Faculdade de Medicina de Montpellier e contemporâneo de
Colslocado no meio da sociedade militar que rodeia o Grão-Mogol, faz-nos
uavilhosamente o que essa sociedade tem de desconcertante para ele.
Omerás.ão passam afinal de mercenários, senhores a título vitalício. O
Grão-Mogol os, mas não lhes garante a sucessão aos filhos. Claro que não:
ele necessita rande exército e paga seus homens com o que nós chamaríamos
um benefísipahinik, para falar como na Turquia, um bem que o soberano - a
quem ?rra pertence por direito - atribui e que recuperará por morte do
titular. ia nobreza pode, portanto, deitar raízes num solo que
regularmente lhe é. Explica Bernier: "Como todas as terras do reino são
propriamente dele -Mogol], segue-se que não há nem ducados, nem
marquesados, nem alguília rica em terras e que subsista dos seus
rendimentos e patrimônios." É in perpétuo New Deal, com redistribuição
regular e automática das cartas. esses guerreiros não têm sobrenomes como
no Ocidente. "Usam apenas lignos de guerreiros: lançador de trovão,
lançador de raio, rompedor de o senhor fiel, o perfeito, o sábio, e
outros parecidos.' '422 Não há, portannomes saborosos, como no Ocidente,
a partir de denominações geográfiries de aldeias ou de regiões. No topo
da hierarquia, apenas os favoritos ipe, aventureiros, instáveis,
estrangeiros, "gente do nada", até antigos esÉ normal que esse estranho
vértice de pirâmide, provisório, aéreo, seja deselas conquistas inglesas,
uma vez que dependia do poder do príncipe e tie afundar com ele. O que é
menos normal é a presença inglesa ter fabricado nente grandes famílias
com patrimônios hereditários. Sem querer, os invam para a índia suas
imagens, seus hábitos de europeus. Projetam-nos m de si próprios, e esses
hábitos impedem-nos de compreender e de levar estrutura social inédita
que tão fortemente cativara
Bernier. O erro inglês, numa mescla de ignorância e corrupção, será tomar
os zamindars (que são )res de impostos nas aldeias sem possuidor fixo)
por verdadeiros proprietánsformando-os desse modo numa hierarquia à
ocidental dedicada ao novo.ijas famílias perduraram até os nossos dias.
nica classe de famílias dominantes que a índia conhecia - a dos
mercadoÁcantes e banqueiros que, tradicionalmente, de pai para filho,
dirigiam a mpo a economia e a administração das cidades comerciais,
fossem os granOS Ou uma vigorosa cidade têxtil como Ahmedabad - se
defenderá melhor tis tempo com a arma que conhece bem: o dinheiro.
Corrompera o invasor ir-se corromper por ele.
a-se o que diz lord Clive 423 no seu dramático discurso na Câmara dos Com
3O de março de 1772, quando defende a honra e a vida contra as
acusa)revaricação que contra ele são lançadas e que o levarão ao
suicídio, alguns

O imperador mongol Akbar (1542-1605) a caminho da guerra. (Clichê B.N.,


gravura)

- - -j-ttU U", Lunjurilus ais tarde. Evoca o caso do jovem inglês que,
como escrivão (nós diríamos xqueno burocrata), chega a Bengala. "Um
desses novatos passeia pelas ruas cutá, pois seus rendimentos ainda não
lhe permitem ir de carro. Vê escriilguns pouco mais antigos no serviço do
que ele, os vê, digo, deixar-se levar brilhante carruagem puxada por
soberbos cavalos magnificamente ajaezaentão serem transportados com todo
o conforto num palanquim. Vem para conta ao Benjam (baniano), em cuja
casa mora, a figura que faz o seu comro. E que vos impede de igualá-lo em
magnificência?, diz o Benjam. Tenho.-o que chegue, só tendes de o receber
e nem sequer é necessário que vos deis )alho de pedi-lo...O jovem morde a
isca; tem seus cavalos, sua carruagem, [anquim, seu harém; e, ao procurar
fazer uma fortuna, gasta três. Mas, enisso, como é que o Benjam se
indeniza? Sob a autoridade do senhor escrije ascende sempre na carreira e
avança a passos largos para ocupar seu lugar selho, o Benjam ascende
também e comete grande número de exações com dade, estando a prática tão
generalizada que ele dispõe de toda a segurança. assegurar-vos que não
são os nativos da Grã-Bretanha que exercem diretaas opressões, mas os
indianos que, acobertados pela sua autoridade e meobrigações pecuniárias,
abriram caminho para ficar livres de qualquer suação.
[... ] Será [... l de admirar que os homens sucumbam às diferentes tena
que estão expostos? [ ... 1 Um indiano vai a vossa casa; mostra-vos sua
bola de prata. Pede-vos que a aceiteis como presente. Se tiverdes uma
virtude i dessas tentações, ele volta no dia seguinte com a mesma bolsa
cheia de ou) vosso estoicismo se mantiver, ele volta uma terceira vez, e
a bolsa está cheia.iantes.
Se, com medo de serdes descobertos, recusais até essa oferta, ele abre
rdos de mercadorias, armadilha na qual um homem de comércio não pode de
cair. O funcionário fica com essas mercadorias a preço baixo e envia-as n
mercado afastado [note-se, de passagem, esta homenagem prestada ao code
longa distância]
onde ganha 3000lo. Eis, portanto, mais um gatuno à sol)ciedade. " Este
discurso, que cito a partir de uma tradução francesa da époachei
saborosa, é uma defesa pessoal, mas a imagem traçada não é inexata. )
italismo indiano, antigo, ativo, debate-se contra a "subordinação"
perante senhor, vara a pele nova da dominação inglesa.
dos estes exemplos, embora muito condensados e abordados muito depressa,
ineiam uma explicação de conjunto capaz de ser bastante justa, na medida
esses diversos casos têm pontos em comum e, tendo pontos em comum, nos m
uma problemática satisfatória? A Europa teve uma alta sociedade, no
míupla, que, apesar das transformações da história, pôde desenvolver suas
lis sem dificuldades insuperáveis, pois não teve diante de si a tirania
totalizante rania do príncipe arbitrário. Assim, a Europa favorece a
acumulação pacienquezas e, numa sociedade diversificada, o
desenvolvimento de forças e hie; múltiplas cuj as rivalidades podem jogar
em sentidos muito diversos. No que e ao capitalismo europeu, a ordem
social baseada no poder da economia sem aproveitou a sua posição
secundária: ao contrário da ordem social baseada no privilégio do
nascimento, fez-se aceitar por estar sob o signo do comedida sensatez, do
trabalho, de uma certa justificação. A classe politicamente nte
monopoliza a atenção, tal como os picos atraem os raios. O privilégio or
fez, portanto, uma vez mais, esquecer o privilégio do mercador.

CONCLUSÃO
No termo deste segundo livro - Osjogos da troca - parece-nos que o
processo capitalista, considerado em seu todo, só pôde desenvolver-se a
partir de certas realidades econômicas e sociais que lhe abriram ou, pelo
menos, facilitaram o caminho:

1) Primeira condição evidente: uma economia de mercado vigorosa e em


progresso. Para tal concorre uma série de fatores, geográficos,
demográficos, agrícolas, industriais, comerciais. É claro que tal
desenvolvimento se operou na escala do mundo, cuja população cresce por
toda a parte, na Europa e fora da
Europa, através do espaço islâmico, na índia, na China, no Japão, até
certo ponto na África e já através da América, onde a Europa recomeça o
seu destino. E em toda a parte há o mesmo encadeamento, a mesma evolução
criadora: cidades praças fortes, cidades mosteiros, cidades
administrativas, cidades no cruzamento das estradas portadoras de
tráficos, na beira dos rios e dos mares. Essa onipresença é a prova de
que a economia de mercado, por toda a parte a mesma, com poucas
modificações, é a base necessária, espontânea, banal, em suma, de
qualquer sociedade que ultrapasse certo volume. Atingido o limiar, a
proliferação das trocas, dos mercados e das mercadorias faz-se por si só.
Mas essa economia de mercado subjacente é a condição necessária, não
suficiente, para a formação de um processo capitalista. A China, repita-
se, é a demonstração perfeita de que uma superestrutura capitalista não
se instala, ipso facto, a partir de uma economia de ritmo animado e de
tudo o que ela implica. São necessários outros fatores.

2) Na verdade, cumpre ainda que a sociedade seja cúmplice, que dê sinal


verde e com muito tempo de antecedência, aliás sem saber, nem por
momentos, em que processo está entrando ou a quais processos deixa assim
a via livre, a séculos de distância. Segundo os exemplos que conhecemos,
uma sociedade acolhe os antecedentes do capitalismo quando, hierarquizada
de uma maneira ou de outra, favorece a longevidade das linhagens e essa
acumulação contínua sem a qual nada seria possível. É necessário que as
heranças se transmitam, que os patrimônios cresçam, que as alianças
frutuosas se concluam à vontade; que a sociedade se divida em grupos,
alguns dominadores ou potencialmente dominadores, que tenha degraus,
escadas, em que a ascensão social seja, quando não fácil, pelo menos
possível. Tudo isso implica uma longa, uma longuíssima gestação prévia.
De fato, foi necessária a intervenção de mil fatores, políticos e
"históricos", se assim podemos dizer, mais ainda do que especificamente
econÔmicos e sociais. O que está em jogo é um movimento de conjunto
multissecular da sociedade. O Japão e a
Europa, cada qual a seu modo, aí estão para prová-lo.

3) Mas nada seria possível, em última instância, sem a ação especial e


como que libertadora do mercado mundial. O comércio de longa distância
não é tudo, mas é a passagem obrigatória para um plano superior do lucro.
Ao longo de todo o terceiro e último volume desta obra, voltaremos ao
papel das economias-mundos, desses espaços fechados que se constituíram
como universos particulares, pedaços autônomos do planeta. Têm a sua
própria história, pois seus limites foram mudando com o decorrer do
tempo, cresceram, ao mesmo tempo que a Europa se lançava à conquista do
mundo. com estas economias-mundo, chegaremos a outro nível da
concorrência, a outra escala da dominação. E a regras tantas vezes
repetidas que,

- j-- - 'U'tjUrítus ima vez, poderemos segui-Ias sem erro através de uma
história cronológica da opa e do mundo, através de uma sucessão de
sistemas mundiais que são, na Jade, a crônica global do capitalismo.
Dizia-se outrora - mas a fórmula coni boa e diz bem o que quer dizer: a
divisão internacional do trabalho e, claro, s que dela resultarão.

NOTAS
Prefdcio

1. Jacques ACCA, RIAS DE SERIONNE, Les intjrets des nations de I'Europe


diveloppis relativement au commerce, 1766, 1, particularmente p. 270.

2. Frederic W. MAITLAND, Domesdaybook and Beyond, 2 ed., 1921, p. 9.


"Simplicity is the outcome of technical subtlety; it is the goal, not
starting point."
Capftulo I

1. Oeuvres, ed. La P16iade, 1965, 1, p. 1.066.

2. Ibid., I, p. 420.

3. Jean ROMEUF, Dictionnaire des sciences &onomiques, 1956-1958, no


verbete:
"Circulation".

4. Oeuvres de Turgot, G. Schelle ed., 1913-1923, 1, p. 29.

5. Veja-se a "majoraq5o" da circulaq5.c) na obra de Guillaume de GREFF,


Introduction 6 la sociologie, 2 vols., 1886-1889.

6. Gabriel ARDANT, Thiorie sociologique de Pimpót, 1965, p. 363. "Uma


produgdo & muito diffcil de apreender enquanto tal."

7. P. MOLMENTI, La vie priv& Venise, 1896, 11, p. 47.


8. Julien FREUND, resenha de: C. B. MACPHERSON, "La th6orie politique de
Findividualisme possessif de Hobbes Lockes", Critique, junho

1972, p. 556.

9. Principalmente no livro editado com a colaborado de C. M. ARENSBERG e


H. W.
PEARSON, Trade and Market in the Early Empires, Economics in History and
Theory,

1957; trad. franc.: Les systmes iconomiques dans Phistoire et dans la


thiorie,

1975.

10. Gaston IMBERT, Des mouvements de longue durje Kondratieff, 1959.

11. Um acaso conservou algumas imagens da feira de Puyloubier, pequena


aldeia da
Provena, dos anos

1438-1439, 1459-1464. Ali se vendia trigo, aveia, vinho, carneiros,


menons (bodes castrados), peles c couros, uma mula, um burro, um potro,
porcos, peixe, legumes, azeite, sacos de cal. Cf. NoO COULET, "Commerce
et marchands dans un village provengal du XVY siMe. La leyde de
Puyloubier", budes rurales, n?s 22,

23, 24, julhodezembro 1966, pp. 99-118; Alan EVERITT, "The Marketing of
Agricultural Produce", in The Agrarian History of England and Wales, p.p.
M. P. R. FINBERG, IV, 1500-1640, 1967, p. 478.

12. Paul-Louis HUVELIN, Essai historique sur le droit des marches et des
foires,

1897, p. 240.

13. Em Luca, 144 lugares numerados na praa San


Michele. A.d.S. Lucca, Officio sopra la Grascia,

196 (1705).

14. the BRACKENHOFFER, Voyage en France,

1643-1644, 1927, p. 47.

15. B.N., Ms. Fr., 21.633, 133, a propósito da feira do cemitório Saint-
Jean.

16. Edouard FOURNIER, Varijtjs historiques et littiraires, 1855-1863, V,


249

(1724).
17. B. N., Ms. Fr., 21.633, 153.

18. Varijtjs... op. cit., II, p. 124 (1735).

19. G. von BELOW, Probleme der Wirtschaftsgeschichte, 1926, p. 373.

20. Etienne BOILEAU, Livre des mitiers, ed. Depping, 1837, pp. 34-35,
citado por
Paul CLAVAL, Gjographie ginirale des marches, 1962, p. 115, notas 9 e 10;
p.

125.

2 1. Werner SOMBART, Der moderne Kapitalismus,

15 a ed. 1928, 11, p. 482.

22. Ferdo GESTRIN, Le trafic commercial entre les contries des SlovMes de
Pintirieur et les villes du littoral de I'Adriatique du XHF au XVP sicle,

1965, resurno em frances, p. 265.

23. P.-L. HUVELIN, op. cit., p. 18.

24. P. CHALMETTA GENDRON, "El Sefior del Zoco" en Espafia, 1973, prefdcio
de
Maxime Rodinson, p. XXXI, nota 46; referncia a Bernal DIAZ DEL CASTILLO,
Historia verdadera de la conquista de la Nueva Espafia.

25. Pe. Jean-Baptiste LABAT, Nouvelle relation de IAfrique occidentale,


1778,

11, p. 47.

26. Simon D. MESSING, in Markets in Afrika, p. p. Paul Bohannan e Georges


Dallon, 3 ed., 1968, pp. 384 s.

537

kRY DES BRUSLONS, Dictionnaifu commerce, 1761, 111. col. 778. fttc di
Palermo, dal secolo XVI al, in Biblioteca storica e letteraria de

3. di Matzo.
FURIER, Recherches sur les strucde Chdteaudun, 1525-1789, 1969, irestadas
por Jean NAGLE, que estd m trabalho sobre ofaubourg Saint;6culo XVII.
, art. cit., p. 488, nota 4. HMANN, Lefiere del regno di Na7gonese, 1969,
p. 28.
raphy of William Stout ofLancasado por T. S. WILLAN, Abraham

5y Stephen, 1970, p. 12. NNEAU, Histoire du commerce de

39, p. 197.
LINA, A Comparative Dictionary -overbs, 1972.
DE, Pierre VERGER, "Contribuique des march6s Nagó du Bas'ahiers de
lInstitut de science icoiquie, n? 95, nov. 1959, pp. 33-65, p. 53.
_ 21.633, 49, out. 1660. etembro de 1667.
.-., 21.782, 191.

43, 19 setembro de 1678.

44, 28 de junho de 1714.

210, 5 de abril de 1719.

46 e 67.
NTARINI, Voyage de Perse... en col. 53, in Voyages faits principae dans
les annóes X11' - XIF, acle, 11, 1785.
WALKER, Manners and Customs

7s, 1803, p. 10.


.P. Inglaterra, 122, P 52, Londres, de 1677.
janeiro-7 de fevereiro 1684, A.d.S. liceo 4.213.
.NSON, The Early English Coffee -, 1893, 2! ed., 1972, pp. 176-177.

4EAU, Les halles de Paris, des ori1960.


ET, Foires et marchis de Carpenm Age au dibut du XIXI sikle, )53, P. 11.
.kRE, Barcelone, centre jeonomides difficultis, 1380-1462, 1967,
T, Der moderne Kapitalimus, op. *485.
Y, The City of London, 1975, p. neviève FRÈCHE, Le prix des ins et des
ligumes d
Toulouse

967, p. 28.
T, op. cit., I, P. 231.

56. A. EVERITT, art. cit., pp. 478 e 482.

57. Pierre DEYON, Amiens, capitale provinciale, Etude sur la sociologie


urbaine au XVIF sikle,

1967, P. 181.

58. Marcel BAUDOT, "Halles, marches et foires dtvreux", in Annuaire du


dopartement de PEure,

1935, p. 3.

59. Albert BABEAU, Les artisans et les domestiques d'autrefois, 1886, p.


97.

60. Giuseppe TASSINI, Curiositi veneziane, 4' ed.,

1887, pp. 75-76.

61. B.N., Ms. Fr., 21.557, f? 4 (1.188).


62. J. MARTINEAU, op. cit., p. 23.

63. Ibid., p. 150.

64. "Lonornie et architecture módi6vales. Cela aurait-il tu6 ceci?", in


Annales
E.S.C., 1952, pp.

433-438.

65. J. MARTINEAU, op. cit., p. 150. A restauragdo dos Halles de 1543 a


1572, segundo LÓon BIOLLAY, "Les anciennes halles de Paris", in Mimoires
de la Soci&e de Phistoire de Paris et de Pflede-France, 1877, pp. 293-
355.

66. J. SAVARY DES BRUSLONS, op. cit., III, col.

261.

67. Journal du voyage de deux jeunes Hollandais (MM. de Villers) i Paris


en

1656-1658, p. p. A. P. FAUGERE, 1899, p. 87.

68. J. A. PIGANIOL DE LA FORCE, Description de Paris, 1742, 111, p. 124.

69. Louis BATIFFOL, La vie de Paris sous Louis XIII, 1932, p. 75.

70. Dorothy DAVIS, A History of Shopping, 1966, pp. 74-79 e 80-90.

71. Voyage en Angleterre, 1728, Victoria and Albert Museum, 86 NN 2, V 5.

72. J. SAVARY DES BRUSLONS, III, col. 779. Quanto à manteiga, ovos,
queijos,
Abraham du PRADEL, Le livre commode des adresses de Paris pour 1692, p.p.
E.
FOURNIER, 1878, 1, pp. 296 ss.

73. J. MARTINEAU, op. cit., p. 204.

74. J. SAVARY DES BRUSLONS, IV, col. 1. 146.

75. J. BABELON, Demeuresparisiennes sous Henri IV et Louis X111, 1965,


pp. 1518.

76. Journal du voyage de deuxjeunes Hollandais, op. cit., p. 98. "Le


march6 aux chevaux au bout du faubourg Saint-Victor", A. DU PRADEL, op.
cit., 1, p. 264.

77. Journal du citoyen, 1754, 0. 306-307.

78. A.N., G 7, 1.511.


79. A.N., G 7, 1668-1670, 1707-1709. Cf. Annales, 1, p. 304.

80. A.N., G 7, 1.511.

8 1. Jean MEUVRET, in Revue d'historie moderne et contemporaine, 1956.

82. A.N., G 7, 1701, 222, Paris, 4 dez. de 1713, "... desde que o mar se
tornou livre, todas as mercadorias vêm por Rouen a Paris, desembarcar no
porto SaintNicolas.....

83. P. de CROUSAZ CRETET, Paris sous Louis XIV, 1922, pp. 29-31, 47-48.

84. Voyage en Angleterre, 1728, to 36.

85. David R. RINGROSE, "Transportation and economic Stagnation in


eighteenth
Century Castille", The Journal ofEconomic History, marqo de

1968.

86. TIRSO DE MOLINA (Gabriel Tellez, dito), "El Burlador de Sevilla", in


Theatre de Tirso de Molina, "Le SÓducteur de SÓville", 1863, p. 54.

87. Embora por vezes "os corsdrios turcos os tomem em frente de Lisboa",
British
Museum, Sloane,

1572.

88. Numerosas referncias. Por exemplo, A.d.S. Veneza, Senato Terra 12,
maro de

1494.

89. W. HAHN, Die Verpflegung Konstantinopels durch staatliche


Zwangswirtschaft nach hirkischen Urkunden aus dem 16. Jahrhundert, 1926.
Sobre o mesmo assunto:
DERSCA-BULGARU, "Alguns dados sobre o abastecimento de Constantinopla no
sóculo
XVI", in Congresso de estudos balcdnicos, Sofia, 1966.

90. Ingomar Bog, "Das Konsurnzentrum London und seine Versorgung", in


Munich

1965, pp. 109-118. Melhor, do mesmo autor, com o mesmo titulo, in


Melanges
Liitge, 1966, pp. 141-182.

91. The Evolution of the english Com Market, 1915.

92. Ibid., p. 122. A. S. USHER, The History of the Grain Trade in France,
14001710, 1913, pp. 82,
84, 87.

93. Dorothy DAVIS, A History of Shopping, 3 ed.,

1967, p. 56.

94. 1. BOG, in Melanges Liitge, op. cit., p. 150.

95. Ibid., p. 147. A estimativa mais alta 6 a de L. Stone.

96. Alan EVERITT, "The Food Market of the English Town", in Munich 1965,
p. 60.

97. Voyage en Angleterre, 1728 f?, 14 e 161.

98. Veja-se, para o Pais de Gales e Escócia, as observa6es de Michael


HECHTER,
International Colonialism, 1975, pp. 82-83.

99. Daniel DEFOE, En explorant l7le de GrandeBretagne, ed. de 1974, p.


103.

100. A. EVERITT, in The Agrarian Hist., op. cit., pp.

468, 470, 473.

101. Eckart SCHREMMER, Die Wirtschaft Bayerns, pp. 613-616.

102. Ibid., p. 608.

103. A. EVERITT, in The Agrarian Hist., p. 469.

104. Ibid., pp. 532 ss.

105. Ibid., p. 563.

106. G. von BELOW, op. cit., p. 353.

107. N. DELAMARE, TraW de police, 1705, 11, p.

654.

108. Ibid., 1710, 11, p. 1.059, 16 de janeiro de 1699. Entre os


açambarcadores de trigo, um fabricante de tecidos, um vendedor de lã, um
boticário, um mercador, um médico, um rendeiro das alfândegas, um
padeiro, um lavrador...

109. M. BAUDOT, art. cit., p. 2.

110. R. CAILLET, op. cit., pp. 23-24.


I 11. A mesma coisa em Saint- J ean-de-Losne em 1712 e 1713, Henri
JACQUIN, "Le ravitaillement de
Saint Jean-de-Losne an XVIII"', in Annales de Bourgogne, 1974, pp. 131-
132.

112. Moscou, A.E.A., 50/6, 474, f?, 6O e 61, 13/24 de abril de 1764.

113. A. N., Ms. Fr. 12.683.

114. Saint-Malo, 29 de junho de 1713, A.N., G 7,

1701, fo 120.

115. R. L. REYNOLDS, "In Search of a Business Class in Thirteenth Century


Genoa", in J. ofEconomic History, 1945.

116. Franck SZENURA, L'espansione urbana di Firenze nel Dugento, 1975.

117. Emmanuel LE ROY LADURIE, Le Territoire de Phistorien, 1973, "Le


mouvement des loyers parisiens de la fin du Moyen Age an XVIII' siecle",
pp. 116 ss.

118. Cesena, Bib. Malatestiana, CassettaXVI, 165, 39.

119. Varietes, IV, pp. 105 ss.

120. J. BABELON, op. cit., pp. 15-18.

121. Segundo o trabalho inódito de Jean NAGLE.

122. Museo Correr, P. D., C. 903, f 1 12, Andrea Dolfin, embaixador


veneziano em
Paris, para Andrea Tron, 13 de agosto de 1781.

123. G. HUPPERT, obra a ser publicada, tftulo provdvel: Vivre noblement,


datil., p. 127.

124. Wilhelm ABEL, Agrarkrisen und Agrarkonjunktur, 2 ed., 1966, pp. 124
ss.

125. Eugenio ALBERI, Relazioni degli ambasciatori veneti durante il


secolo XVI,

1839-1863, VIII, p.

257.

126. Jean MEYER, La noblesse bretonne au XV111' sicle, 1966, 11, p. 897.

127. A. DU PRADEL, op. cit., 1, p. XXVI, II, pp.

333 ss.
128. Yvonne BEZART, La vie rurale dans le Sud de la region parisienne,
14501560, 1929, pp. 68 ss.

129. E. SCHREMMER, op. cit., passim e especialmente pp. 219, 685.

130. Le Capital, Ed. Sociales, 11, p. 352: "...o mercado do trabalho que
6

preciso distinguir do mercado dos escravos". Entre outros exemplos,


comórcio de escravos a partir da istria c da Dalmdcia com destino a
Florena, Siena e
Bolonha, A.d.A. Veneza, Senato Mar, 6, F 136 v?, 17 de agosto de 1459.

131. J. FREUND, resenha de: Bernhard WILLMS, "Die Antwort des Leviathan,
Th.
Hobbes politische Theorie", in Critique, 1972, p. 563.

132. A. N., A. E., B', 598, Gnova, 31 de marqo de

1783; David RICARDO, Principes de Peconomie politique, ed. de 1970, p.


67.

133. Eric MASCHKE, "Deutsche Stddte am Ausgang des Mittelafters", in Die


Stadt am Ausgang des Mittelalters, p.p. W. RAUSCH, tiragem à parte, p.
20.

134. Acta hungarica, XX1V, p. 30.

135. Marcel POÈTE, Une vie de cite, Paris de sa naissance nos jours,
1924, 1, p.

301.

136. Robert-Henri BAUTIER, "A propos d'une soci6tó lucquoise a Lyon au


XIII' siMe. Les contrats de travail au Moyen Age", in Bulletin phi539

torique (avant 1610), 1964, pp.


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OSSE, "Les vignerons d'Auxersi&les)", Annales de Bourgogjan.-mar. 1948,
pp. 22

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Ansich-Nieder
Deutschen [do por F. LOTGE, 1968, p. 35. ', Die gewerblichen
Eigenbetriemburg im
Spitmittelalter, 1974. Les artisans et les domestiques. cit., p. 273,
nota 1,
Tallemant )-1692).
IEZ, LeFconomie rurale de la ari IV, 1897, p. 55.
re de Gouberville, 1892, p. 400. de A. TOLLEMER, Un sire de. 27 ss.
, DURIE, op. cit., p. 202. irt. cit., p. 8.
O, a propósito da généralité de igo de Renó GAUCHET.
21.672, V 16 v'.
ING, "Der Arbeitsmarkt der

17., i8. und 19. Jahrhundert", litik undArbeitsmarkt, p.p. HerBENZ, 1974,
p.

174.

49. ', Un monde que nous avons perE. H. PHELPS-BROWN e S.


ilarn apenas de urn terqo da poa assalariada, citado por ImmaMSTEIN, The
Modem
World.82.
R, "Zur Rolle der Lohnarbeit im hen Zunfthandwerk der HansesIt
hauptsdchlich am
Beispiel der

1sund", in Jb. f. RegionalgesW, Les noms des rois, 1974, pp.

48.

44-448.

3ABEAU, op. cit., p. 40.


PO, Libro, di spese diverse. Pietro ZAMBELLI; Paolo FA!1e 1573-1606, p.p.
Lioneflo PUPibid., p. XLIII, nota 116.
ez. de 1704. D. Francisco de Araidice. Biblioteca Comunale, PaF 452 ss. e
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476.
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160. "Vida y hechos de Estebanillo Gonzdlez", in La novela picaresca


espafiola,

1966, p. 1.830.

161. 12 de abril de 1679, A. N., G 7, 491, 505.

162. Yves-Marie BERCt, Histoire des croquants. Etude des soul&ements


populaires au XVIF sicle dans le Sud-Ouest de la France, 1974, 1, p. 41.

163. Louis-SÓbastien MERCIER, Tableau de Paris, VIII, 1783, pp. 343-345.

164. Y.-M. BERCt, op. cit., 1, p. 242.

165. Aldo de MADDALENA, Semana de Prato, abril de 1975.

166. Bistra A. CVETKOVA, "Vie 6conomique des villes et ports balkaniques


aux XV' et XVI' sicles", in Revue des etudes islamiques, 1970, pp.

277-278, 280-281.

167. Stefan OLTEANU, "Les mótiers en Moldavie et en Valachie (Xe_XVII,


siMes)", Revue roumaine d'histoire, VII, 1968, p. 180. Aqui, com toda a
evidncia, feira = mercado.

168. Young's Travels in France during the Years 1787,

1788, 1789, ed. Betham-Edwards, 1913, p. 112.

169. Lazslo MAKKA1, Semana de Prato, abril de 1975.

170. É Michelet quem nos diz: havendo uma venda de terra, "não se
apresentando nenhum comprador, chega o camponês com a sua moeda de ouro",
Le peuple, ed. 1899, p. 45.

171. Maurice AYMARD, Semana de Prato, abril de

1975, a propósito da Sicilia.

172. Emiliano FERNANDEZ DE PINEDO, Crecimiento económico y


transformaciones sociales del pai vasco 1100-1850, 1974, ver sobretudo
pp. 233 ss.

173. F. Sebastidn MANRIQUE, Itinerario de las Missiones, 1649, p. 59.

174. Michel MORINEAU, "A la halle de Charleville: fourniture et prix des


grains, on les mócanismes du march6 (1647-1821)", in 95e Congrs national
des soci&js savantes, 1970, 11, pp. 159-222.

175. Marco CATTINI, "Produzione, auto-consumo e mercato dei grani a San


Felice sul Panaro,

1590-1637", in Rivista storica italiana, 1973, pp.

698-755.

176. Ver supra, nota 162.

177. VarieFtis, 1, 369, nota 1.

178. Journal du voyage de deux jeunes Hollandais a Paris en 1656-1658,


op. cit., p. 30.

179. E. BRACKENHOFFER, op. cit., p. 116.

180. Ignace-Frangois LIMOJON DE SAINT-DIDIER, La ville et la ripublique


de
Venise, 1680, p. 68.

181. Charles CARRItRE, Nigotiants marseillais au XV111' sicle, 1973, 1,


p. 165.

182. G. William SKINNER, "Marketing and Social Structure in Rural China",


in
Journal of Asian Studies, novembro de 1964, p. 6. Mercados posteriores no
Setchuan, ver infra, pp. 96-97.

183. Abade PRtVOST, Histoire gin&ale de voyages... (1750), VIII, p. 533.

184. Marcel MARION, Dictionnaire des institutions de la France aux XV1, r


et
XVIIF siecles, p. 195, artigo "Lhoppe".

185. A. EVERITT, in The Agrarian HistorY... op. cit., p. 484.

186. Robert MARQUANT, La vie économique à Lille soas Philippe le Bon,


1940, p.

82.

187. Uma imagem de Karl Marx, Oeuvres, 1, p. 902.

188. R. MARQUANT, op. cit., p. 82.

189. A. H. de OLIVEIRA MARQUES, op. cit., p.

201.

190. E. BRACKENHOFFER, op. cit., p. 97.

191. B. N., Ms., Fr., 21.633 UI. 1, 14, 18, 134.

192. A.d.S. Florença, Mediceo 4.709, Paris, 27 de junho de 1718.

193. Friedrich LOTGE, Deutsche Sozial-und Wirtschaftsgeschichte, 1966,


passim e pp. 143 ss.

194. A. N., G 7, 1686, 156. Memória sobre a decoração dos comerciantes.

195. A. N., F12, 724, 11 de abril de 1788.

196. O desprezo social na Itália, por exemplo em Lucá, é pelo pequeno


lojista, não pelo verdadeiro mercador, Marino BERENGO, Nobili e mercanti
nella Lucca del
Cinquecento, 1963, p. 65.

197. Alfred FRANKLIN, La vieprivée d'autrefois au temps de Louis XIII, I.


Les magasins de nouveautés, 1894, pp. 22 ss,

198. P. BOISSONNADE, Essai sur Vorganisation da travail en Poitou, 1, p.


287.

199. Arquivos de Cracóvia, correspondência de Federigo Aurelio (3 de


setembro de

1680-2O de março de 1683), fundo ital. 3.206.


200. W. SOMBART, op. cit., loja de um armarinheiro judeu, 11, pp. 455 ss.
sobre todo o problema.

201. T. S. WILLAN, Abraham Dent of Kirkby Stephen, op. cit.

202. Segundo T. S. WILLAN, op. cit.

203. E. SCHRENIMER, op. cit., pp. 173-175.

204. A. N., E 12 116, f?, 58 ss., 28 de maio de 1716.

205. A. N., G', 1686, 156 - cerca de 1702.

206. Journal de voyage de deuxjeunes Hollandais, op. cit., p. 76.

207. E. BRACKENHOFFER, op. cit., p. 117.

208. Journal de voyage de deuxjeunes Hollandais, op. cit., p. 50.

209. TIRSO DE MOLINA, op. cit., p. 107.

210. Y.-M. BERCÉ, op. cit., 1, pp. 222 e 297 e nas referências à palavra
"cabaret" no índice.

211. Miguel CAPELLA e Antonio MATILLA TAS, CON, Los cinco Gremios mayores
de
Madrid,

1957, p. 13 e nota 23. Cf. LOPE DE VEGA, La nueva victoria de Don Gonzalo
de
Córdoba.

212. E. SCHRENIMER, op. cit., p. 595.

213. A. N., A. E., C. P. Inglaterra, 108, f' 28.

214. The Complete English Tradesman, Londres, 1745, II, pp. 332 e 335.

215. Voyage en Angleterre, op. cit., Us 29.

216. L. BATIFFOL, op. cit., pp. 25-26.

217. Ver o primeiro volume da presente obra, ed. 1967, pp. 193-194.

218. W. SOMBART, op. cit., 11, p. 465; Métnoires de Ia baronne


d'Oberkirch,

1970, p. 348 e nota 1, p. 534.

219. A. FRANKLIN, La vie privée d'autrefois au temps de Louis XIII, 1,


Les magasins de nouveautés, op. cit., passim, pp. 2O e 40.
220. A, de MALTA, 6.405, princípio do século XVIII.

221. Jean-BaptisteSAY, Del'AngleterreetdesAnglais,

1815, p. 23.

222. A pesquisa está por fazer. Eis alguns pontos de referência. Em


Valladolid, em 1570, para 4O mil habitantes, 1. 87O lojas de artesãos e
mercadores, ou seja, mais ou menos uma para cada 2O habitantes
(Bartolorné BENASSAR, Valladolid au siècle d'or, 1967, p. 168). Em Roma,
em 1622, a mesma proporção: 5.578 lojas para 114 mil habitan~ tes (Jean
DELUMEAU, Vie économique et sociale de Rome dans
Ia seconde moitié da XVI' siècle, 1957-1959, 1, pp. 377 e 379). Ver
também, quanto a Veneza, Daniele BELTRAMI, Storia della popolazione di
Venezia dallefine del secolo XVI alla caduta dalla Republica, 1954, p.
219, e, quanto a Siena, um levantamento de todos os ofícios da cidade, em
1762 (A.d.S. Sierma, Archivio
Spannochi B 59). Quanto a Grenoble, em 1723, ver E. ESMONIN, Études sur
la
France des XVII' et XVIII' siècles, 1964, p. 461 e nota 80.

223. W. SOMBART, op. cit., 11, p. 454.

224. Wirtschafts-und Sozialgeschichte zentraleuropãÍsche Stãdte in


neuerer Zeit,

1963, pp. 183 ss. Em Basiléia, do século XVI ao fim do século XVIII, os
mercadores de armarinhos e varejistas aumentam em 40%, o conjunto dos
outros ofícios mantémse ou tende a descer.

225. Devo a Claude LARQU1É o inventário por óbito da loja de uma


aguardientero da Plaza Mayor, Archivo de los Protocolos, n? 10. 598, f "
372-516,

1667.

226. Sondagens de Maurice AYMARD: 1548, Tribunale del Real Patrimonio


137,
Livelli U, 3.561 e

1.584; ibid., Privilegiati, f' 8.

227. Moscou, A.E.A., 35/6, 390, 84, Londres, 7 de março de 1788.

228. Albert SOBOUL, Les Sans-Culottes parisiens en Pan 11, 1958, passim e
especialmente pp. 163, 267,

443, 445.

229. A.N., F 2, 724.

230. Cônego François PEDOUE, Le bourgeois poli,


1631.

231. Adam, SMITH, Recherches sur la nature et les causes de Ia richesse


des nations, trad. franc., ed. de

1966, 1, p. 18.

232. Médit..., 1, p. 93.

233. Jean-Jacques HEMARDINQUER, "La taille, impor marqué sur un bâton


(Landes,
Pyrenées, Bourgogne) ", in Bulletin philologique et historique (até

1610), 1972, pp. 507-512.

234. Lucien GERSCHEL, "L'Ogam et le nom", in Études celtiques, 1963, pp.


531532; supra, 1, ed. de

1967, pp. 357-358.

235. D. DEFOE, op. cit., I, p. 356.

236. A. DU PRADEL, op. cit., 11, p. 60.

237. A. de Paris, 3 B 6 27, 26 de fevereiro de 1720.

238. Variétés, 11, p. 136.

239. Variétés, VI, p. 163.

240. A.D. Isère, 11 E, 621 e 622.

541

Oires de Jean Maillefer, marchand bourReims (1611-1684), 1890, p. 16.

2, 863-7, 7 de outubro de 1728.


ção fornecida por Troian OVICIL _IVET, "Les Savoyards à Strasbourg au
XVI1P siècle", Cahiers d'histoire, IV, p.

132.
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, ULCZYKOWSKI, "En Pologne au '-ele: industrie paysane et formation du
ational", in A nnales E. S. C., 1969, pp.
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, OMBARD, "L'évolution urbaine penaut Moyert Age", in Annales E.S.C.,
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PERROY, Histoire du Moyen ri, c'est-à-dire juifs et chrétiens de lanue",
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111, p. 36.
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Bibliothèque bleue de

964, p. 56.

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60-1792), 1971, p. 36.


informações fornecidas por Andrzej SKI.

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LeipJe janeiro de 1799.

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392, nota 286., ENHOFFER, op. cit., pp. 115 e 144. ivas, uvas passas, ver
LITTRÉ, no ver;in",
RGELIN, Venise au siècle des Lumièlo, datil., p. 213, segundo o
testemuadenigo,
N, Lettres, III, p. 246.
'CARIAS DE SÉRIONNE, La Richesollande, 1778, 11, p. 173.

267. B.N., Ms. Fr., 14.667, 131.

268. La response de Jean Bodin à M, de Malestroit,

1568, p.p. Henri HAUSER, 1932, p. XXXVIII.

269. Acervo do doutor Morand, Borme-sur-Méne, ge (Alta-Sabóia).

270. J. SAVARY DES BRUSLONS, op. cit., 11, col.

679; V, col. 915-916.

271. Acervo Morand, Joseph Perollaz ao pai, Lucerna, 13 de maio de 1819.

272. Gazette de France, Madri, 24 de maio de 1783, p. 219.

273. Ver II libro dei vagabondi, p.p. Piero Camporesi, 1973, introdução,
numerosas referências às literaturas européias.

274. Ernst SCHULIN, HandeIsstaat England, 1969, pp. 117 e 195. Mascates
portugueses do princípio do século XVI nos Países Baixos. J. A. GORIS,
Étude sur les colonies marchandes méridionales... à Anvers 1488-1567,
1925, pp. 25-27.

275. David ALEXANDER, Retailing in England during the Industrial


Revolution,

1970, pp. 63 ss. Em 1780, um projeto de lei, em Londres, para suprimir a


mascateagem, depara com a reação muito viva dos fabricantes ingleses (lã
e algodão) que assinalam, com suas petições à Câmara dos Comuns, a enorme
quantidade de mercadorias que vendem, D. DAVIS, op. cit., pp. 245-246.

276. Jean DROUILLET, Folklore du Nivernais et du Morvan, 1959; Suzanne


TARD1EU,
La vie domestique dans le Mâconnais rural et pré-industriel,

1964, pp. 190-193.

277. Acervo Morand, I. C. Perollaz à sua mulher, Genebra, 5 de agosto de


1834.

278. A. N., E 12 2.175, Metz, 6 de fevereiro de 1813.

279. A. N., F 12 2.175, Paris, 21 de agosto de 1813.

280. Basile H. KER13LAY, Les marchés paysans en U.R.S.S., 1968, pp. 10O
s.

281. Jean-Paul POISSON, "De quelques nouvelles utilisations des sources


notariales en histoire éconornique (XVII, _XXe siècles)", Revue
historique, n?

505, 1973, pp. 5-22.

282. Ver infra, pp. 331 ss.

283. A. N., F 12 149, 77.

284. A, N., F 12, 721, Périgueux, 11 de junho de 1783.

285. W. SOMBART, op. cit., 11, p. 566. Prioridade, decerto, à Hamburger


Kommerzdeputation, nascida em 1663.

286. J. GEORGELIN, op. cit., p. 86.

287. Picro BARGELLINI, Il bicentenario della Camera di commercio


fiorentina

1770-1970, 1970.

288. A.N., G', 1965, 12.

289. A. N., E 12 151, 195.


290. A.N., F'2, 683, 23 de dezembro de 1728.

291. Michel MITTERAUER, "Jahrmãrkte in Nachfolge antiker Zentralortes",


in
Mitteilungen des Institutsfür osterreichische Geschichtsforschung,

1967, pp. 237 ss.

292. J. SAVARY DES BRUSLONS, op. cit., no verbete "Landi", col. 508.

293. Félix BOURQUELOT, Études sur les foires de Champagne, 1865, p. 10.

294. E. BRACKENHOFFER, op cit., p. 105, sabe-o em sua passagem por Lyon;


cita
Eusóbio, IV, cap. 3.

295. A.N., F12, 1.259, D, Livry-sur-Mcuse, Vindimdrio ano VIII.

296. LITTRÉ, no verbete "Marché". Os mercados e as feiras só podem


estabelecerse com autorizaqdo do rei. FERRET, Traite de Pabus, I , 9.

297. A.N., K 1.252.

298. GÓrard BOUCHARD, Un village immobile, Sennely-en-Sologne au XVIIr


sikle,

1972, p. 200.

299. J. SAVARY DE BRUSLONS, op. cit., 11, col.

668.

300. Ibid., col. 663.

301. Ibid., col. 668.

302. Ibid., col. 671.

303. Jean MERLEY, La Haute-Loire de lafin de VA ncien Rgime aux dibuts de


la
Troisime Ripublique, 1776-1886, 1974, 1, pp. 146-147.

304. Ver mapa, supra, p. 30.

305. Farnesiana, 668, 17. Valentano, 14 de maio de

1652.

306. R. GASCON, op. cit., 4, 1, pp. 241-242.

307. J. SAVARY DES BRUSLONS, op. cit., 11, col.


676.

308. Ernst KROKER, Handelsgeschischte der Stadt Leipzig, 1925, p. 85.

309. Cristobal ESPEJO, Las Antiguas Ferias de Medina del Campo,


Valladolid,

1908.

310. Jean BARUZI, Saint Jean de la Croix et le proWme de 1expórience


mystique,

1931, p. 73.

311. H. MAUERSBERG, Wirtschafts-und Sozialgeschichte zentral-europdischer


Stddte in neuerer Zeit, op. cit., p. 184.

312. E. KROKER, op. cit., pp. 113-114.

313. Friedrich LIDTGE, "Der Untergang der Niimberger Heiltumsmesse", in


Jahrbiicherfiir National(5konomie und Statistik, Band 178, Heft 1/3,

1965, p. 133.

314. Ruggiero NUTI, La Fiera di Prato attraverso i tempi, 1939.

315. R. CAILLET, op. cit., pp. 155 ss.

316. Varijtes, IV, 327, e 1, 318, nota 2.

317. Moscou, A.E.A. 84/12, 420, 7. Leipzig, 18/29 setembro de 1798.

318. Francisque MICHEL, tdouard FOURNIER, Le livre d'or des mitiers,


Histoire des h6telleries, cabarets, h6tels garnis et cafis..., Paris,
1851, 2, 1O (1511).

319. R. CAILLET, op. cit., pp. 156 e 159.

320. Ibid., p. 156.

321. A.d.S. Ndpoles, Affari Esteri, 801, Haia, 17 de maio de 1768 e 8 de


maio de

1769.

322. Gazette de France,, p. 513, Florena, 4 de outubro de 1720.

323. A.d.S. Florena, Fondo Riccardi 309, Leipzig, 18 de outubro de 1685,


Gio.
Baldi a Francesco Riccardi.
324. Midit..., I, p. 347 e nota 6.

325. P. MOLMENTI, op. cit., II, p. 67, nota 1.

326. Insignia Bologne, X-8, 1676.

327. Henry MORLEY, Memoirs ofBartholomew Fair, Londres, 1859; J. SAVARY


DES
BRUSLONS, op. cit., 11, col. 679, verbete "Foirq7.

328. Citado por P.-L. HUVELIN, op. cit., p. 30, nota l; referência a
LEROUX DE
LINCI, Proverbes, II, p. 338.

329. J. SAVARY DES BRUSLONS, op. cit., 11, col

656; B.N., Ms. Fr., 21.783, 170.

330. Voyage de deuxieunes Hollandais... op. cit., P.

75.

331. A. GROHMANN, op. cit., p. 31.

332. R. GASCON, op. cit., 1, p. 169.

333. Y.-M. BERCE, op. cit., p. 206.

334. E. KROKER, op. cit., p. 132.

335. Lodovico GUICCIARDINI, Description de tout le Pays-Bas (1568), Y


ed., 1625, p. 108.

336. Gazette de France, abril de 1634.

337. Oliver C. Cox, The Foundation of Capitalism,

1959, p. 27. Em sentido inverso, P. CHALMETTA GENDRON, op. cit., p. 105.

338. Alfred HOFFMANN, Wirtschaftsgeschichte des Landes Oberbsterreich,


1952, p.

139.

339. E. KROKER, op. cit., p. 83.

340. Corrado MARCIANI, Lettres de change auxfoires de Lanciano au XVF


sibcle,
Paris, 1962.

341. Louis DERMIGNY, "Les foires de PÓzenas et de


Montagnac an XVIIV si&le", in Actes du congrs rigional des fódirations
historiques de Languedoc, Carcassonne, maio de 1952, especialmente pp.
18-19.

342. Robert-Henri BAUTIER, "Les foires de champagne", in Recueds de la


Sociito
Jean Bodin, V: Lafoire, pp. 1-51.

343. F. BOURQUELOT, budes sur les foires de Champagne, II, op. cit., pp.
301320.

344. Medit... 1, p. 458 e nota 3.

345. Ibid., 1, 314.

346. Josó GENTIL DA SILVA, Banque et cridit en Italie au XVIF sikle,


1969, p.

55.

347. Ibid., ver indice, "Mercanti di conto".

348. Domenico PERI, 11 negoziante, Gênova, 1638; Midit..., I, p. 461.

349. J. GENTIL DA SILVA, op. cit., p. 55.

350. Giuseppe MIRA, 'Vorganizzazione fieristica nel quadro dell'economia


della'Bassa' Lombardia alla fine del medioevo e nell'et moderna", in
Archivio storico lombardo, vol. 8, 1958, pp. 289-300.

351. A. GROHMANN, op. cit., p. 62.

352. A. HOFFMANN, op. cit., pp. 142-143.

3 53. Henri LAURENT, Un grand commerce dexportation au Moyen Age: la


draperie des Pays-Bas en France et dans les pays meditirraneens, XITXV
sikles, 1935, pp.

37-41.

354. A. GROHMANN, op. cit., p. 20.

355. F. BOREL, Les foires de Genve au XV sikle,

1892 e documentos anexos; Jean-Franqois BERGIER, Les foires de Genve et


P&onomie internationale de la Renaissance, 1963.

356. R. GASCON, op. cit., 1, p. 49.

357. A.N., F'2, 149, fo 59, 27 de setembro de 1756.

543
tigo "Foire" em LEncyclopedie, ARY DES BRUSLONS, op. cit., e", col. 647.
X, op. cit., 11, pp. 472 e 479. NN, op. cit., p. 143; E. KROKER, . Note-
se que a palavra Messe (feirn Frankftirt, só passa a set usada irante a
segunda metade do sóculo iando as palavras Jahrmdrkte ou p. 7 1.

479. T, op. cit., IL p. 473..AY, op. cit., pp. 85 ss. ANABRAVA, O com&cio
portuPrata (1580-1640), 1944, pp. 21 ss. )ES BRUSLONS, op. cit., V, col.,
ualmente artigo consagrado a Vera agena.
'HEZ ALBORNOZ, "Un testigo tdiano: Tomds de Mercado y Nueva ?vista de
historia de A merica, 195 9,
W. DAHLGREN, Relations comaritimes entre la France et les cóPacifique,
1909, p.

21.
DA SILVA, "Trafic du Nord, margiorno', finances gónoises: recher2nts sur
la conjoncture A la fin du Revue du Nord, XLL n? 162,

1959, pp. 129-152, especialmente


GNY, in Histoire du Languedoc,

6. O projeto ndo serd aceito. A udo 6 a atual praqa da Concorde. BART,


Apogje du capitalisme, ró E. Sayous, p. XXV.
F, Der moderne Kapitalismus, 11,

38 ss.
ES BRUSLONS, op. cit., III, verid", col. 765 ss.
, it., verbete "Corde", p. 808.
.', Der moderne Kapitalismus, 11,
CARD, Le Njgoce dAmsterdam ce que doivent savoir les maruiers, tant ceux
qui sont jtatlis a ? ceux des pays itrangers, Amster. 5-7.
mt. 1261-1, 774, p. 18.

1, op. cit., 11, p. 490.


imerce de Marseille, 11, p. 466; IV, pp. 51O ss.
op. cit., 11, p. 490.

36.
RLE, "L'6volution des finances le financement de l'industrialisasi6cle",
Comitj des travaux hisin de la section dhistoire moderraine, n? 8, 1971,
pp, 93-94.
)is-DÓsiró MATHIEU, LAncien
Regime en Lorraine et Barrois... (1658-1789), Paris, 1878, p. 35,

383. Jacqueline KAUFFMANN-ROCHARD, Origines d'une bourgeoisie russe, XV1'


et
XVIT sikles,

1969, p. 45.

384. J. SAVARY DES BRUSLONS, op. cit., 11; verbete "Entrepót", col. 329-
330.

385. A. N., F 12, 70, V 102, 13 de agosto de 1722.


386. R. GASCON, op. cit., t. 1, p. 158.

387. MÓdit... 1, p. 525.

388. C. CARRtRE, op. cit., p. 9.

389. Roberto CESSI e Annibale ALBERTI, Rialto,

1934, p. 79.

390. Maurice LfiVY-LEBOYER, Les banques europ4knnes et Vindustrialisation


internationale dans la premire moitij du XIX' sikle, 1964, pp.

254 ss.

391. Mateo ALEMAN, "Guzmdn de Alfarache", in La novela picaresca


espafiola, op.
cit., p. 551.

392. VIEIRA DA SILVA, Dispersos, 111, 34O e IX,

807. P a partir de 176O que se constrói a Real PraCa do Com&cio. Estas


indica6es foram-me fornecidas per J. GENTIL DA SILVA.

393. Raimundo de LANTERY, Memorias, p. p. Alvaro PICARDO Y GOMEZ, Cddiz,


1949.
In Melanges Braudel, artigo de Pierre PONSOT, pp.

151-185.

394. R. CESSI e A. ALBERTI, op. cit., p. 66.

395. Richard EHRENBERG, Das Zeitalter des Fugger, 3 ed., 1922, 1, p. 70.

396. Segundo uma informado de Guido PAMPALONI.

397. A loggia dei Mercanti ai Banchi encontra-se a

40O m da Strada Nuova, segundo as indica6es de Giuseppe FELLONI (carta de


4 de setembro de 1795).

398. R. EHRENBERG, op. cit., p. 70.

399. R. MARQUANT, op. cit., p. 61.

400. Jean LEJEUNE, La formation du capitalisme moderne dans la


principaute de
Lige au XVI' sikle, 1939, p. 27.

401. Claude LAVEAU, Le monde rochelais de IAncien Regime au Consulat.


Essai dhistoire economique et sociale (1744-1800), tese datil., 1972, p.
146.

402. Scripta mercaturae, 1, 1967, entre a p. 38 e a p.

39, gravura sobre cobre de Gaspar Merian, 1658.

403. E. KROKER, op. cit., p. 138.

404. A.N., G', 698, 24.

405. Diarii di Palermo, op. cit., 11, p. 59.

406. A.d.S. Gnova, Lettere Consoli, 1/26-28.

407. Charles CARRERE, op. cit., 1, p. 234.

408. Moscou, A.E.A., 35/6, 744, 9 ss.

409. C. CARRtRE, op. cit., p. 50.

410. Ibid., p. 51.

411. R. EHRENBERG, op. cit., 1, p. 70.

412. Raymond BLOCH, Jean COUSIN, Rome et son destin, 1960, p. 126.

413. Ch. CARRIPHRE, op. cit., 1, pp. 232-233.

Notas

414. L -A. BOITEUX, La fortune de mer, le besoin de sicurite et les


debuts de passurance maritime,

1968, p. 165.

415. D. DEFOE, op. cit., I, p. 108.

416. J.-P. RICARD, Le negoce dAmsterdam... op. Cit., Pp. 6-7.

417. Ibid., p. 6.

418. F. BRAUDEL, supra, 1, ed. 197 p. 360; Gino LUZZATTO, Storia


economica di
Venezia dall'XI al XVI secolo, Veneza, 196 1, pp. 147 ss.

419. Federigo MELIS, Tracce di una storia economica di Firenze e della


Toscana in generale dal 1252 al 1550, curso datilografado, 1966-1967;
Alfred DOREN,
Storia economica dell'Italia nel Medio Evo, 1936, pp. 559.

420. Adam WISZNIEWSKI, Histoire de la banque de Saint-Georges de Genes,


Paris,
1865.

421. E. MASCHKE, art. cit., editado a parte, p. 8.

422. Midit... 11, pp. 44-45.

423. Bernard SCHNAPPER, Les rentes au XVF si& cle, Historie d'un
instrument de credit, Paris,

1957; Registres de PH6tel de Ville pendant la Fronde, p. p. LEROUX DE


LINCY e
DOUET D'ARCQ, 1846-1847, t. 11, p. 426.

424. R. SPRANDEL, Der stddtische Rentenmarkt in Nordwestdeutschland im


Sptitmittelalter, 1971, pp. 14-23.

425. Armando SAPORI, Una Compagnia di Calimalo ai primi del Trecento,


1932, p.

185.

426. Heinrich Johann SIEVEKING, Wirtschaftsgeschichte, 1935, p. 87.

427. John FRANCIS, La Bourse de Londres, 1854, p.

13; N. W. POSTHUMUS, "The Tulipomania in Holland in the years 1636 and


1637", in
Journal of Economic and Business History, 1, 1928-1929, pp. 434-466.

428. Amsterdam 1688, reediAo Madri 1958.

429. J. G. VAN DILLEN, "Isaac le Maire et le commerce des actions de la


Compagnie des Indes orientales", Revue d'historie moderne, jan.-fev. e
mar.-maio de 1935, especialmente pp. 24 e 36.

430. J. G. VAN DILLEN, art. cit., pp. 15, 19, 21.

431. A.N., K 1.349, 132, F 82.

432. A.N., A.E., B', 757.

433. A.N., K 1.349, 132, f' 81.

434. Isaac de PINTO, Traite de la circulation et du credit, 177 1, p.


311.

435. C. R. BOXER, The Dutch Seaborn Empire

1600-1800, 1965, P. 19.

436. Pierre JEANNIN, LEurope du Nord-Ouest et du Nord aux XV11' et XVIIF


si&cles, 1979, p. 73.

437. J. de LA VEGA, op. cit., p. 322.

438. Le Guide dAmsterdam, 1701, p. 65, menciona o "Cat`6 Frangois". Os


outros indicados por J. de LA VEGA, Die Verwirrung der Verivirrungen, ed.
Otto
Pringsheim, 1919, p. 192, nota 2, segundo BERG, Reugies, p. 328.

439. Michele TORCIA, Sbozzo del commercio di A msterdam, 1782.

440. A.N., 61 AQ 4.

44 1. Herbert LOTHY, La Banque protestante en France de la Revocation de


PEdit de Nantes a la Revolution, 1959-1961, 11, p. 515.

442. A.N., 61 AQ 4, Paris, 2 de marqo de 1780.

443. H. LOTHY, op. cit., 11, reportar-se ao fridice.

444. A.N., 61 AQ 4. Por "conta a 3/3" entenda-se a trs teros, entre


Marcet, Pictet e Cramer.

445. A.N., 61 AQ, 77 E 88.

446. J. FRANCIS, OP. Cit., pp. 23 e 87.

447. Ibid., p. 27.

448. A.N., G 7, 1699, Londres, 29 de maio de 1713.

449. J. FRANCIS, OP. cit., p. 32.

450. Jean SAVANT, Telfut ouvrard, 1954, p. 55.

451. Cf. P. G. M. DICKSON, The Financial Revolution in England, 1967, pp.


505510; E. V. MORGAN e W. A. THOMAS, The Stock Exchange,

1962, pp. 60-61.

452. Ibid., p. 65.

453. E. SCHULIN, OP. cit., pp. 249 e 295.

454. P. G. M. DICKSON, OP. cit., p. 504.

455. E. V. MORGAN e W. A. THOMAS, op. cit., p.

17.

456. P. G. M. DICKSON, op. cit., p. 506.


457. Jakob van KLAVEREN, "Rue de Quincampoix and Exchange Alley, Die
Spekulationjahre 1719 und 172O in Frankreich und England" in
Vierteljahrschriftfiir Sozial - und Wirtschaftsgeschichte, 1963, 48, 3,
pp. 331359.

458. Robert BIGO, "Une grammaire de la Bourse en

1789", Annales dhistoire 6conomique et sociale, 11, 1930, pp. 50O c 507.

459. Marie-Joseph DÓsiró MARTIN, Les itrennesfinanci&es, 1789, pp. 97 ss.

46O Ibid., cap. VI, "Bourse", p. 68.

461.* Robert BlGO, La Caisse dEscompte (1776-1793) et les origines de la


Banque de France, Paris, 1927, especialmente pp. 95-116.

462. Mjmoires du comte de Tilly, 1965, p. 242.

463. Moscou, A.E.A., 93/6, 428, p. 40, Paris, 15 de agosto de 1785.

464. A.N., 61 AQ 4.

465. Roland de LA PLATItRE, Encyclopedie mithoclique, 11, p. 2, segundo


C.
CARRItRE, op. cit.,

1, p. 244, nota.

466*. Maurice LEVY-LEBOYER, op. cit., p. 420, nota 17.

467. Jacques GERNET, Le monde chinois, Paris,

1972, p. 231.

468. Pierre GOUBERT, Beauvais et le Beauvaisis de

160O 1730, Paris, 1960, p. 142.

469. 1. de PINTO, op. cit., p. 69.

470. t o nómero proposto Para a Holanda por ocasido da crise de 1763,


A.E.
Holanda, 513, p. 64.

471. M. LEVY-LEBOYER, op. cit., p. 709; Guy


THUILLIER, "Le stock monótaire de la France en Fan X", in Revue dhistorie
&onomique et sociale, 1974, p. 253. Unt libelo ingls anónimo, de cerca de
1700, distingue trinta categorias diferentes de papóis, E. SCHULIN, op.
cit., p. 287, nota

191.
472. A.N., G 7, 1622.

545

Sbozzo del commercio di A msterp. 4 1.

266. Z ESTRADA, Muerte y transfigutin Fierro, 1948, passim e, em par134-


135.
JRNEAU, Fés avant leprotectorat,

949, citado por P. CHALMETTA,

8.
rTA, op. cit., PP. 133-134, referênWZ1, Kitab az-Jitat. Handeisgeschichte
Ãgyptens im

1171-1517, 1965, pp. 277, 29O e


EEFF, Nur-atI~Din, 111, p. 856, ci2HALMETTA, p. 176.
NELLI, Folco QUILICI, L'alba

974, p. 219.
OU, Leçons de géographie tropicale, Pour une géographie humaine, 197 3,
encial da informação no livro cole-Fverest, Londres, 1963.
NER, art. cit.
NTILLON, Essai sur ia nature du

1 général, INED, 1952, pp. 5 ss. EUR, Indonesian Trade and Society,

60, 63, etc., e, particularmente, pp., 200. A posição de VAN LEUR é r


NieIs
STEENSGAARD, The Asian ution of the Seventeenth Cent., 1973. posição, uma
nota que me foi dirigiel THORNER e a obra de M. A. P. OELSFSZ, Asian
Trade and
Euroice in the Indonesian A rchipelago betind 1630, 1962. Este debate
situa-se história mundial. A ele voltarei no desta obra, capítulo 5.
LEUR, op. cit., pp. 3 ss. nha T, 46, pp. 256 ss.
sboa, F.G. 7970; tradução de levon IAN', "Le registre d'un marchand
arlerse, en
Inde et au Tibet (1682-1693)", E.S.C., março-abril de 1967. NTRAN,
Istanbul dans la seconde VM' siècle, 1962.
'iickie otnochenia v XVIII veke (As reD-indianas no século XVIII).
Coletâ, umentos, pp. 29 ss., 56-55, 74, 82,

32, 51-55, 67.


, p. 263; 11, pp. 577-578.
LI, Introduzione à Due Trattati inedirro Gozzolini da Osimo, economista e
del sec. XVI, Turim, 1892, pp. 2-6. J, pp. 142 ss.
VILLAMONT, Les voyages du Seigillamont, 1600, p. 102 frente e verso.
-IABIB, "Banking in Mughol India", Wion to Indian Economic History, 1,

960, pp. 1-20.

496. C. R. BOXER, "Macao as Religious and Commercial Entrepot in the 16th


and
17th Centuries", in Acta asiatica, 1974, p. 71.

497. "Voiage de Flenri Hagenaar aux Indes orientales", in R.-A.


Constantin de
RENNEVILLE, Recucil des voiages qui ont servi à Pétablissement et au
progrès de la Compagnie des Indes orientales, V, 1796, pp. 294 e 296-297.

498. Médit... 11, p. 149.

499. Abade PRÉVOST, op. cit., VIII, 629; W. H. MORELAND, From Akbar to
Aurangzeb, 1923, pp.

153-158.

500. Jean-Henri GROSE, Voyage aux Indes orientales, 1758, pp. 155 ss. "O
grande comerciante Abdurgafur que dizem ter feito, sozinho, um comércio
tão considerável como o da companhia inglesa..."

501. Jeari-Baptiste TAVERNIER, Les six voyages de Jean-Baptiste


Tavernier...
qu'il a faits en Turqui.e, en Perse e aux Indes... Paris, 1676, 1, pp.
192,

193.

502. Louis DERMIGNY, Les métnoires de Charles de Constant sur le commerce


à Ia
Chine, 1964, pp.

76 e 189-190.

503. Dominique e Janine SOURDEL, La civilisation de PIslam classique,


1968, p.

584.

504. Robert BRUNSCI--1VIG, "Coup d'oeil sur Phistorie des foires à


travers
I'Islam", in Recueds de Ia société Jean Bodin, t. V: La foire, 195 3, p.
44 e nota 1.

505. J. C. VAN LEUR, op. cit., p. 76.

506. R. BRUNSCI-1VIG, art. cit., pp. 52-53.

507. Ludovico de VARTHEMA, Les voyages de Ludovico di Varthema ou le


viateur en la plus grande partie d'Orient, Paris, 1888, p. 21. "Tomamos o
nosso caminho e levamos três dias para ir a um lugar chamado Mezeribe e
lá demoramos três dias para que os mercadores se fornecessem e aceitassem
camelos e tudo o que lhes era necessário. O senhor do dito Mezeribe
chamado Zambey é senhor do campo, isto é, dos árabes.-- tem quarenta mil
cavalos e para a sua corte tem dez mil éguas e trezentos mil camelos."
508. S. Y. LABIB, HandeIsgeschichte Ãgyptens im Spãtmittelalter... op.
cit., pp. 193-194.

509- Ibid., p. 194.

510. R. BRUNSCI-1VIG, art. cit., pp. 56-57.

511. S. Y. LABIB, op. cit., p. 197.

512. Médit... 1, p. 190; referência a Henry SIMONSFELD, Der Fondaco dei


Tedeschi und die deutsch-venetianischen Handelsbeziehungen,

1887; Hans HAUSHERR, Wirtschaftsgeschichte der Neuzeit vom Ende des 14.
bis zur
Hõhe des

19. J., 3 ed., 1954, p. 28.

513. William CROOKE, Things Indian, 1906, pp.

195 ss.

514. Para os pormenores que se seguem, cf. Abade PRÉVOST, op. cit., 1,
p . 414, e VIII, pp. 139 ss.

515. W. HEYD, Historie du commerce du Levant au Moyeri Age, 1936, t. li,


pp.

662-663

516. Denys LOMBARD, Le sultanat dAtjéh au temps d'Iskandar Muda, 1607-


1636,

1967, p. 46; referência a John DAVIS, A BriefRelation OfMaster John


Davis, chiefe pilote to lhe Zelanders in their East India Voyage... 1598,
Londres,.

1625.

517. François-MARTIN, Description du premier vo .- yage faict aux Indes


Orientales par les Français de Saint-Malo, 1604, citado por D. LOMBARD,
op.
cit., p. 25, ri? 4.

518. D. LOMBARD, op. cit., pp. 113~114; referência a Guillaume DAMPIER ,


Supplément du voyage autour du monde... 1723. ichel

519. Segundo as indicações que me forneceram M CARTIER, Denys LOMBARD e


Étienne
BALAZS.

520. Étienne BALAZS, "Les foires cri Chine", in Recueils de Ia société


Jean
Bodin, V, Lafoire, 1953, pp. 77-89.

Capítulo 2

521. Ercyclopedia t)riíannicu, xiii, p. -.

522. Louis DERMIGNY, La Chine et l'Occident. Le commerce à Canton au


XVIlF siècle, 1964, 1, p.

295, 111, P. 1.151.

523. La tradition scientifique chinoise, 1974.

524. "Le marché monétaire au Moyen Age et au debut des Temps moderries",
in
Revue historique,

1970, p. 28.

525. C. VERLINDEN, J. CRAEY13ECKX, E. SCHOLLIERS, "Mouvements des prix et


des salaires cri Belgique au XVI' siècle", Annales E. S. C., 1955, ri? 2,
p. 187, nota 1: "No estado ual da pesquisa, podemos mesmo perguntar-nos
at se o século XVI se caracterizaria pela concentração do grande comércio
nas mãos de alguns..."

526. "Rue de Quincampoix und Exchange Alley1', in VierteIjahrschrift...


art.
cit., 1963.

1. Para não dizer leis, conforme o conselho de Georges GURVITCH.

2. Penso sobretudo nos Arquivos de Simón Ruiz em Valladolid e de


Francesco
Datini em Prato.

3. MAILLEFER, op. cit., p. 102.

4. F. BRAUDEL e A. TENENTI, "Michiel da Lezze, marchand vénitien (1497-


1514)", in Mélanges Friedrich Lütge, 1956, p. 48.

5. Ibid., p. 64.

6. L. DERMIGNY, La Chine et 1'Occident..., 11, p.

703 e nota 5.

7. A, N., 62 AQ 44, Le Havre, 26 de março de 1743.

8. F. BRAUDEL e A. TENENTI, art. cit., p. 57.

9. Médit... 1, pp. 56O ss.


10. Ibid., 1, p. 285.

11. Toda a passagem que se segue segundo o longo relatório de Daniel


Braems (1687) no seu regresso das índias, onde ocupara durante muito
tempo um cargo de primeiro plano na Companhia. A.N., B 7, 463, PI 235-
236, 253, 284.
' 125.

12. Ibid., f

13. Supra, 1, ed. 1967, p. 366.

14. Felipe RUIZ MARTIN, Lettres marchandes échangées entre Florence et


Medina dei Campo, Paris, 1965, p. 307.

15. AX, 62 AQ 33, 12 de maio de 1784.

16. A.N., 62 AQ 33, 29 de novembro de 1773. Este Dugard é o filho de


Robert
Dugard, fundador da grande tinturaria de Darnetal, que abrira falência em
1763.

17. Ibid., 34, 31 de outubro de 1775.

18. O sentido deste adjetivo deve ser entendido a partir do de


extinction: "Ato que põe fim a uma obrigação" (LITTRÉ).

19. AX, 62 AQ 34, 14 de março de 1793.

20. AX, 94 AQ 1, dossiê n' 6.

21. AX, 94 AQ 1, dossiê ri' 6, P 35.

22. Jean CAVIGNAC, Jean Pellet, commerçant de gros 1694-1772, 1967, p.


37.

23. A.., F", 721, 25 de fevereiro de 1783.

24. AX, 61 AQ 1, f1 28 v', 4 de abril de 1776.

25. AX, 94 AQ 1, dossiê 11, carta de Pondicher; de

1? de outubro de 1729.

26. Pierre BLANCARD, Manuel de commerce des Indes orientales et de Ia


Chine,

1806, pp. 40-41.

27. Ferdinand TREMEL, Das HandeIsbuch des Judenburger Kaufmannes Clemens


Kõrber,
1526-1548, 1960.

28. J, CAVIGNAC, op. cit., p. 152.

29. Ibid., p. 153.

30. Ibid., p. 154.

31. Ibid., p. 37.

32. Romuald SZRANIKIEWICZ, Les régents et censeurs de la Banque de France


nommés sous le Consulat et I'Empire, 1974.

33. Clemens BAUER, Unternehmung und Unternehmungsformen im


Spãtmirtelalter und in der beginnenden Netizeit, 1936, p. 45.
i dalle ori3 4. Raymond de ROOVER, Il Banco Medic gim al declino (1397-
1494) (ed. inglesa, 1963),

1970, pp. 127 ss.

35. A.N., 62 AQ 33.

36. com toda a evidência, associaram-se a meias para este negócio, a


Dugard, o que, na correspondência, se escreve 2/2. Também 3/3 é uma
associação ao terço entre três pessoas.

37. Fernand BRAUDEL, "Réalités économiques et prises de conscience:


quelques témoignages sur le XVI, siècle", in Annales E.S.C., 1959, p.
735.

38. AX, G, 1698, 132, 12 de abril de 1713.

39. Sobre os metedores, E. W. DAHLGREN, Relations commerciales et


maritimes entre la France et les côtes de Pocéan Pacifique, op. cit., 1,
p. 42. Sobre os cargadores, John EVERAERT, De internationale en coloniale
handel der vlaamse
Firma's te Cadiz, 1670-1740, 1973, p. 89940. R. GASCON, op. cit., pp.
204-205.

41. Armando SAPORI, Studi di storia economica, 3' ed., 1955, 11, p. 933.

547

aptiste TAVERNIER, Voyage en Perse, ;cal Pia, 1930, p. 69.


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NTANO, Le origini del capitalismo, 1954, nã, 1916, p. 9.
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Mittelmeergebiet", in Studi in onore ando Sapori, 1957, 1, p. 276.
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plusieurs hommes illustres de Pro1752, pp. 144-173.
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as,
Estado Napoles, 1097, P 107.
ão do título: Tesouro das medidas, pesos, s e moedas do mundo inteiro; ou
conhe)
de todas [as] espécies de pesos, medidas as que regem o comércio do mundo
inteiúdas... pelos cuidados do vil iluminista Luanand à custa e a pedido
do
Senhor Peo do Xac'atur de Djulfa. Impresso pelos )s e com o acordo do
grandíssimo e sublitor e santo bispo Thomas de Vanand da Golt'n. No ano
do
Senhor de 1699, aos meiro. Em Amsterdam.
Jre WOLOWSKI, La vie quotidienne en e au XVIII siècle, 1972, pp. 179-180.
WGNY,
La Chine et POccident, I, p.
IAKED, A Tentative Bibliography of Ge)cuments, 1964; S. D. GOITEIN, "The
reniza as a Source for the History of Mus4lisation", in Studia islamica,
111, pp. ABIB in Journal of Economic History, .

84.

74.

75.

67. H. PIGEONNEAU, op. cit., I, pp. 242-245.

68. Médit... 11, p. 151; Attilio MILANO, Storia degli Ebrei in Italia,
1963, pp. 218-220.

69. H. INALCIK in Journal of Economic History,

1969, pp. 121 ss.

70. Sephardint an der unteren Elbe, 1958.


71. F. LÜTGE, op. cit., pp. 379-380, e sobretudo H. SC14NEE, Die
Hoffinanz und der MOderne Staat,

3 vols., 1953-1955.

72. Pierre SAVILLE, Le Juifde Cour, histoire du Résident royal Berend


Lehman (1661-1730), 1970.

73. Werner SOMBART, Die Juden und das WirtschaftsIeben, 1922.


H. INALCIK, art. cit., pp. 101-102.
Lewis HANKE, "The Portuguese in Spanish America", in Rev. de Hist. da
América, junho de 1961, pp. 1-48; Gonzalo de REPARAZ Hijo, "Os
portugueses no Peru nos séculos XVI e XVI I", in Boletim da Sociedade de
Geografia de Lisboa, jan.-mar.
de 1967, pp. 39-55.

76. Pablo VILA, "Margarita en Ia colonia 155O a

1600", in Revista Nacional de Cultura, Caracas, outubro de 1955, p. 62.

77. A. P. CANABRAVA, O comércio português no Rio da Prata, op. cit., pp.


36-3 8, e, em nota, referências a L. HANKE e outros.

78. Ibid., pp. 116 ss.; L. HANKE, art. cit., p. 15.

79. L. HANKE, ibid., p. 27.

80. A. P. CANABRAVA, op. cit., pp. 143 ss.; Emanuel SOARES DA VEIGA
GARCIA,
Buenos Aires e Cádiz. Contribuição ao estudo do comércio livre (1789-
1791), in
Revista de História, 1970, p.

377.

8 1. L. HANKE, art. cit., p. 7.

82. Ibid., p. 14. Citação de José TORIBIO MEDINA, Historia del Tribunal
del
Santo Oficio de la Inquisición de Cartagena de Ias Indias, Santiago do
Chile,

1899, p. 221.

83. Gonzalo de REPARAZ, "Los Caminos del contrabando", in El Comercio,


Lima, 18

de feverei~ ro de 1968.

84. Nota comunicada por Alvaro JARA, segundo as contas de Sebastião


Duarte conservadas no Arquivo Nacional de Santiago.
85. Jakob van KLAVEREN, Europãische Wirtschaftsgeschichte Spaniens im 16,
und

17. J., 1960, p. 15 1, n. 123.

86. Genaro GARCIA, Autos de Fé de Ia Inquisición de México con extractos


de sus causas, 19 10; GUIJO, Diario, 1648-1664, México, 2 vols., 1952,
crônica diária que relata o auto-da-fé de 11 de abril de 1649, 1, pp. 39-
47, 92-93.

87. No sentido de João Lucio de AZEVEDO, Épocas do Portugal econômico,


esboços de história,

1929; o autor entende por tal os sucessivos períodos durante os quais


domina uma produção: o açúcar, o café, etc.

88. L. DERMIGNY, La Chine et l'Occident... op. cit., 1, p. 77.

89. Johann Albrecht MANDELSLO, Voyage aux Indes orientales, 1659, 11, p.
197.

90. Balthasar Suarez a Simón Ruiz, em, 15 de janciro de 1590; Simón Ruiz
a Juan de Lago, 26 de agosto de 1584; S. Ruiz aos Buonvisi de Lyon, 14 de
julho de

1569, Arquivos Ruiz, Arquivo histórico provincial, Valladolid.

91. Ver infra, 111, cap. 4.

92. M. CAPELLA e A. MATILLA TASCON, op. cit., pp. 181 ss.

93. MÓdit... 1, 195.

94. G. AUBIN, "Bartolomdus Viatis. Ein mimberger Grosskaufmarm vor dem


dreissigjdhrigen Kriege", in Vierte1j. flir Sozial-und
Wirtschaftsgeschichte,

1940, e Werner SCHULTHEISS, "Der Vertrag der mimberger


Handelsgesellschaft
Bartholomdus Viatis und Martin Peller von 1609-15", in Scrima mercaturae,
1,

1968.

95. Arquivos de Cracóvia, Ital. 382.

96. La novela picaresca, op. cit., Estebanillo Gonzales, pp. 1.812,


1.817,

1.818. Mercadores italianos em Munique, em Viena, em Leipzig, E. KROKER,


op.
cit., p. 86.
97. Op. cit., p. 361.

98. Europe in the Russian Mirror, 1970, pp. 21 ss.

99. Diarii, 9 nov. de 1519.

100. H. SIEVEKING, op. cit., p. 76.

101. Francesco CARLETTI, Ragionamenti sopra le cose da lui vedute ne'


suoi viaggi, 1701, p. 283.

102. Franois DORNIC, L'industrie textile dans le Maine (1650-1815), 1955,


P. 83.

103. F. LOTGE, op. cit., p. 235.

104. G. LOHMANN VILLENA, Las minas de Huancavelica en los siglos XVI y


XVIT,

1949, p. 159.

105. GÓrard SIVERY, "Les orientations actuelles de


I'histoire 6conomique du Moyen Age, dans I'Europe du Nord-Ouest", in
Revue du
Nord, 1973, p. 213.

106. Jacques SCHWARTZ, "L'Empire romain,

1'8gypte et le commerce oriental", in Annales E.S.C., XV (1960), p. 25.

107. A. SAPORI, Una Compagnia di Calimala aiprimi del Trecento, op. cit.,
p. 99.

108. Federigo MELIS, "La civiltA economica nelle sue esplicazioni dalla
Versilia alla Maremma (secoli X-XVIII)", in Atti del 60' Congresso
internazionale della "Dante Alighieri", p. 26.

109. Pierre e Huguette CHAUNU, S&ille et IAtlantique de 1504 1650, 1959,


VIIIA, p. 717.
I 10. R. CANTILLON, Essai sur la nature du commerce en gineFral, op.
cit., p.

41.

111. F. MELIS, art. cit., pp. 26-27, c "Werner Sombart e i problemi della
navigazione nel medio evo", in L'opera di Werner Sombart nel centenario
della nascita, p. 124.

112. R. GASCON, op. cit., p. 183.

113. G. F. GEMELLI CARRERI, Voyage autour du monde, 1727, 11, p. 4.

114. Ibid., IV, p. 4.


115. F. CARLETTI, op. cit., pp. 17-32.

116. CONDILLAC, Le commerce et le gouvernement, ed. E. Daire, 1847, p.


262.

117. Michel Morineau teve a gentileza de me comunicar o microfilme da


correspon&ncia da casa Sardi, de Livorno, com Benjamin Burlamachi,
conservada nos Arquivos municipais de Amsterdarri (Familie-papieren 1.
Archief Burlamachi).

118. A.N., 62 AQ 33, Amsterdam, 27 de maro de

1766.

119. Arquivos de Paris, D'B' 4433, f' 48.

120. Arquivos Vorontsov, Moscou, 1876, vol. 9, pp.

1-2. Veneza, 3O de dezembro de 1783. Simón a Alexandre Vorontsov: "Tudo


aqui, exceto os tecidos de seda, 6 prodigiosamente caro."

121. Claude MANCERON, Les Vingt Ans du roi,

1972, p. 471.

122. Midit... 1, p. 47 1.

123. Barth6lómy JOLY, Voyage en Espagne,

1603-1604, p.p. L. BARRAU DIHIGO, 1909, p. 17.

124. Bohrepans, Londres, 7 de agosto de 1686 (A.N., A.E., B',


757);7Anisson,
Londres, 7 de maro de

1714 (A.N., G, 1699); Carlo Ottone, dez. 167O (A.d.S. Gnova, Lettere
Consoli, 12628); Simolin, Londres, 23 maro/3 abril de 1781 (Moscou,
A.E.A. 35/6, 320, fl

167); Hermann, 1791 (A.N., A.E., BI, 762, ff 461 v').

125. Fynes MORYSON, An Itinerary containing his Ten years Travell, 1908,
VI, p.

70, citado por Antoine MACZAK, "Progress and Underdevelopment in the Ages
of
Renaissance and Baroque Man", in Studia Historicae Oeconomicae IX,

1974, p. 92.

126. 1. DE PINTO, op. cit., p. 167: "Onde hd mais riqueza, 6 tudo mais
caro... t o que me leva a conjecturar que a Inglaterra 6 mais rica do que
a Frana";
FranCois Quesnay et la physiocratie, ed. do INED, 1966, 11, p. 954.

127. Voyages en France, 1931, 1, p. 137.

128. De la monnaie, trad. fr. de G. M. BOUSQUET e J. CRlSAFULLI, 1955, p.


89.

129. Le6n F. DUPRIEZ, "Principes et problemes d'interprótation", in


Diffusion du progr&s et convergence des prix. Etudes internationales,
1966, p. 7.

130. Ver infra, 111, cap. 1. E. J. ACCARIAS DE SERIONNE, op. cit., 1766,
1, pp.

27O ss.

131. TURGOT, OEuvres, 1, op. cit., pp. 378-379.

132. Pierre DES MAZIS, Le vocabulaire de Viconomie politique, 1965, p.


62.

133. H. e P. CHAUNU, Siville et IAtlantiquede 1504

1650, op. cit., 12 vols.

134. Ibid., VIII-1, pp. 260, nota 2, 293, nota I.

135. Felipe RUIZ MARTIN, El siglo de los genoveses, no prelo, Ruth PIKE,
Enterprise and Adventure. The Genoese in Seville, 1966.

136. Gazette de France, 14 de fevereiro de 1739, de Madri, p. 102.

137. Obtive este pormenor importante de J.-P. BERTHE.

138. D. DEFOE, op. cit., 1, p. 354.

139. Thomas GAGE, Nouvelle relation contenant les voyages de Thomas Gage
dans la
NouvelleEspagne, 1676, 4' parte, p. 90.

549

', A, 2 1.

3CHURZ, The Manilla Galleon, 1959,


NURKSE, Problems of Capital FormaUnderdeveloped Countries, 1958.
Quesnay... op. cit., II, p. 756.
o Boisguilbert ou la naissance de Vjconotique, ed. do INED, 1966, 11, p.
606. F
Quesnay... op. cit., II, pp. 664 e ido ent que Pierre Gourou emprega a
[0.
I, p. 409. p. 233.
CHAUNU, op. cit., VIII-1, p. 445., 7

1695, 252.
RY DES BRUSLONS, op. cit., IV, 1762, D, acórddos de 5 de setembro de 1759
e e outubro do mesmo ano, col. 1.022 c
IROCH, RÓvolution industrielle et sousgement, Paris, 1963, p. 201.
[ARTWELL, The Industrial Revolution momic Growth, 1971, pp. 181-182.
a, 111, cap. 4.
SOWELL, The Say's Laws, 1972; Ch. EUNIER, Essai sur la theForie des
dibouJ.B. Say, 1942.
, op. cit., 1, p. 452.
or R. NURKSE, op. cit., p. 16. ) J. ROMEUF, op. cit., 1, p. 372. UITTON,
Lesfluctuations iconomiques,

173.
INTO, op. cit., p. 184.
iECKSCHER, La epoca mercantilista,

653.
A, RDO, op. cit., 1970, p. 66.
, pftulo sobre os lucros, especialmente pp.
y's Century", in Essays in Economic and listory of Tudor and Stuart
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LET, Lepeuple, 1899, pp. 73-74.
i Gianfigliazzi, Armando SAPORI, Sturia economica, 3 ed., 1955, 11, pp.
933 c os
Copponi, registro pertencente a Ariapori, que teve a gentileza de me
facul;pectivo microfilme.
s conservados na Universidade Bocconi D.
RUGLI, op. cit., p. 145.

7ges Hermann Aubin, 1965, 1, pp. 235 ss. ERING, Die Fugger, 1940, pp. 23
e 27.
IS, "La civilt economica nelle sue espliJalla Versilia alla Maremma",
art. cit.,

35.
GE, OP. cit., p. 288. rRIN, op. cit., p. 116.
n KELLENBENZ, "Le front hispaigais contre FInde et le róle d'une agencc
de renseignements an service des marchands allemands et flamands", in
Estudia
XI, 1963; C. R. BOXER, "Uma raridade bibliogrdfica sobre Ferndo Cron", in
Boletim internacional de bibliografia luso-brasileira, 1971.

176. Das Meder'sche Handelsbuch und die Welser'schen Nachtrdge, 1974.

177. Johannes MCLLER, "Der Umfang und die Hauptrouten des niimbergischen
Handelsgebietes im Mittelalter", in V. Jahrschriftfiir Sozialund
Wirtschaftsgeschichte, 1908, pp. 1-38.

178. E. KROBER, op. cit., pp. 71, 163 e passim.

179. J.-C. PERROT, op. cit., pp. 181 ss.


180. F. MAURETTE, Les grands marcAs des matires premi&es, 1922.

181. R. GASCON, op. cit., 1, p. 37.

182. Cf. supra, I, pp. 187-190.

183. Ver supra, 1, ed. 1967, p. 162.

184. Ibid., p. 165.

185. Jacob BAXA e Guntwin BRUHNS, Zucker im Leben der VÓ1ker, 1967, pp.
24-25.

186. Ibid., p. 27.

187. Ibid., p. 32.

188. Supra, 1, ed. 1967, p. 166.

189. J. SAVARY DES BRUSLONS, IV, col. 827.

190. J. BAXA e G. BRUHNS, op. cit., p. 27.

191. Ibid., pp. 40-41 e passim.

192. 1759, p. 97.

193. Pierre de Boisguilbert... op. cit., 11, p. 621.

194. R. CANTILLON, Essai sur la nature du Commerce en gónóral, op. cit.,


p. 150.

195. Joseph SCHUMPETER, History of Economic Analysis, 1954, ed. italiana,


1959, p. 268.

196, L. DERMIGNY, op. cit., 1, p. 376.

197. B. E. SUPPLE, "Currency and Commerce in the Early Seventeenth


Century", in
The Economic Historical Review, jan. 1957, pp. 239-264.

198. G. DE MANTEYER, Le livre-journal tenu par Fazy de Rame, 1932, pp.


166-167.

199. LÓon COSTELCADE, Mentalitj givaudanaise au Moyen Age, 1925, resenha


de Marc
BLOCH, in Annales dhistoire jconomique et sociale, 1, 1929, p. 463.

200. Public Record Office, 30/25, Portfoglio 1, 2 de novembro-2 de


dezembro de

1742.
201. A.d.S. Ndpoles, Affari Esteri, 796, Haia, 28 de maio de 1756.

202. Moscou A.E.A., 50/6, 470.

203. Ibid., 84/2, 421, F 9 v', carta de Facius.

204. Abade PREVOST, Histoire giMirale des voyages... op. cit., II, p.
641.
Viagent de Compagnon em 1716.

205. A. P. CANABRAVA, O comircio portugu6s... op. cit., p. 13; Lewis


HANKE, La villa imperial de Potosi. Un capitulo, in&ito en la historia
del Nuevo Mundo,

1954.

206. P. V. CA&ETE Y DOMINGUEZ, Guia histórica, p. 57, citado por Tibor


WITTMAN, "La riqueza empobrece; problemas de crisis del Alto Peru
colonial en la Guia de
P. V. Cahete y Dominguez", in Acta historica, Szeged, 1967, XXIV,, p. 17.

207. SÓrgio BUARQUE DE HOLANDA, Mon0es,

1945.

208. J.-B. TAVERNIER, op. cit., II, p. 293.

209. Fundador em 1844 da zona cacaueira de Ilh6us, Pedro CALMON, Histdria


social do Brasil, 1937, P. 190.

210. Nziza HAZAN, "En Inde aux XVI' et XVII' liecles; trósors amóricains,
monnaie d'argent et prix dans I'Empire mogol", in Annales E.S. C., jul.-
ago. de

1969, pp. 835-859.

211. C. R. BOXER, The Great ship from A macom. Annals of Macao and the
old Japan
Trade,

1555-1640, Lisboa, 1959, p. 6, nota 1, 12 de setembro de 1633, carta de


Manuel da Cdmara de Noronha.

212. Antonio de ULLOA, Mimoiresphilosophiques, historiques, physiques,


concernant la dicouverte de IAmirique, 1787, 1, p. 270.

213. J. GERNET, Le monde chinois, op. cit., p. 423.

214. P. CHAUNU, Les Philippines, op. cit., PP.

268-269.
215. Por exemplo, por volta de 1570, a reiado 6 de cerca de 6 na China
contra 12

em Castela; em 1630, respectivamente de 8 contra 13. Pierre CHAUNU,


"Manille et
Macao", inAnnalesES.C., 1962, p. 568.

216. W. L. SCHURZ, op. cit., pp. 25-27.

217. Ibid., p. 60.

218. George MACARTNEY, Voyage dans Vint&ieur de la Chine et en


Tartariefait dans les annies 1792,

1793 et 1794... Paris, 1798, 1, p. 431.

219. Midit... 1, p. 299. Leia-se tambóm o artigo de Omer L. BARKAN, "Les


mouvements des prix en Turquie entre 149O et 1655", in Melanges Braudel,
1973,

1, pp. 65-81.

220. A.N., 94 AQ 1, dossi 11, Pondicheri, I' de outubro de 1729. 221. M.


CHERIF, "Introduction de la piastre espagnole ('ryAl') dans la rógence de
Tunis an dóbut du XVII' si6cle", in Les cahiers de Tunisie, 1968, n" 61-
64, pp. 45-55.

222. J. EON (como religioso, Pe. MATTHIAS DE SAINT-JEAN), Le commerce


honorable,

1646, P. 99.

223. A.d.S. Veneza, Senato Misti, reg. 43, f' 162.

224. Ibid., reg. 47, f' 175 v'. Devo estas informa6es a R. C. Mfiller.

225. Museo Cotter, DonA delle Rose, 26, fo 2.

226. A.N., A.E., B111, 235, e Ch. CARRlP-RE, op. cit., 11, pp. 805 ss.

227. E. F. HECKSCHER, op. cit., p. 695.

228. State Papers Domestic, 1660-1661, p. 411, citado por E. LIPSON, The
Economic History of England, 1948, 111, p. 73.

229. Gazette de France, 16 de j aneiro, p. 52; 6 de maro, p. 135; 2O de


marqo de

1721, p. 139. Aruntcios andlogos: 6 de maro de 1730, p. 13 1; 16 de


setembro de
1751, p. 464.

230. Moscou, A.E.A., 50/6, 472, pp. 26-27.

23 1. Le Journal dimigration do conde de Espinchal foi publicado por


Ernest d'Hauterive, 1912. A passagem citada, inódita, encontra-se no
manuscrito, Bibl. Univers. de Clermont-Ferrand, f' 297.

232. F. C. SPOONER, Leconomie mondiale et les frappes monitaires en


France,

1493-1680, 1956, edi5o inglesa aumentada em 1972.

233. M. MARION, Dictionnaire..., op. cit., p. 384.

234. Jean-Franois de BOURGOING, Nouveau voyage en Espagne, ou Tableau de


Petat actuel de cette monarchie, Paris, 1788, 11, p. 87.

235. E. F. HECKSCHER, op. cit., p. 466, atribui a obra a John HALES;


segundo os estudos de Edward HUGHES (1937) e Mary DEWAR (1964), deve-se
atribuf-la a sir
Thomas SMITH. Ver E. SCHULIN, op. cit., p. 24.

236. E. SCHULIN, op. cit., p. 94.

237. M.-J. D. MARTIN, op. cit., pp. 105-106.

238. A.d.S. Veneza, Inghifterra, 76, e Londres, 13/34, agosto de 1703.

239. B.N., Paris, Ms. 21.779, 176 O (1713).

240. Renó GANDILHON, Politique economique de Louis XI, 1941, pp. 416-417.

241. N. SANCHEZ ALBORNOZ, "Un testigo del comercio indiano: Tomds de


Mercado y
Nueva Espafia", in Revista de Historia de America, art. cit., p. 122.

242. TURGOT, op. cit., p. 378.

243. Moscou, A.E.A., 35/6, 765.

244. Thomas MUN, A Discourse of Trade from England unto the East Indies,
1621, p. 26.

245. A.N., G', 1686, 53.

246. Renó BOUVIER, Quevedo, "homme du diable homme de Dieu", 1929, pp.
305-306.

247. Frana-Piemonte, A.N., G7, 1685, 108. SiciliaRep0lica de Gnova,


Geronimo de UZTARIZ, Thiorie et pratique du commerce et de la marine,
1753, pp. 52-53.
P&sia-indias, Voyage de Gardane, manuscrito da Biblioteca Lenin, Moscou,
p. 55.

248. A.d.S. Gnova, Lettere Consoli, 1, 26-29.

249. Margaret PRIESTLEY, "Anglo-French Trade and the Unfavourable


Controversy

1660-168511, in The Economic History Review, 195 1, pp. 37 ss.

250. A.E., C.P. Inglaterra, 208-209.

251. A.N., G', 1699.

252. Moscou, A.E.A., 35/6, 381.

253. E. SCHULIN, op. cit., pp. 308 ss. e sobretudo

319-320.

254. Foi utilizada toda a correspon&ncia do cónsul russo ent Lisboa, J.


A.
Borchers, de 177O a 1794, Moscou, A.E.A., a partir de 72/5, 217, 58. O
tratado de Methuen durou ató 1836, E. Schulin, op. cit., p. 290.

255. Moscou, A.E.A., 725, 226, 73 v', 1O de novembro de 1772; 273, 25 v'.

256. H. E. S. FISCHER, The Portugal Trade, 1971, pp. 38 e 35.

257. Pierre-Victor MALOUET, McFmoires, 1874, t. 1, pp. 10-11.

258. Moscou, A.E.A., 72/5, 226, F 59, Lisboa, 6 de outubro de 1772,


Borchers a
Ostermann.

259. Ibid., 72/5, 270, f' 52 e v', 23 de abril de 1782.

551

1., 72/5, 297, ff 22, 13 de dezembro de 1791. E. S. FISCHER, op, cit., p.


136.
scou, ibid., 72/5, 297, ff 25, 2O de dezembro

1791.
)re o conjunto, Ingomar BOG, Der A ussendel Ostmitteleuropas, 1450-1650,
1971.
k. NILSSON, Den ryska marknaden, citado M. HROCH, "Die Rolle des
zentraleuropdisn Handels im Ausgleich der Handelsbilanz schen Ost- und
Westeuropa, 1550-1650", in :)rnar BOG, op. cit., p. 5, nota 1; Arthur
ATT, NN,
The Russian and Polish Markets in Inational Trade, 1500-1600, 1973.
HROCH, art. cit., pp. 1-27.
AAKKAI, Semana de Prato, abril de 1975 * st KROKER, op. cit., p. 87, 6
formal quanto te ponto.
uivos de Cracóvia, Ital., 382. infra, III, cap. 3.
ripre notar a presenqa de moedas polonesas na rgia (R. KIERSNOWSKI,
Semana de
Prato,

1 de 1975). Em 1590, o transporte de mercaas polons leva a Istambul reais


da
Espanha nmaso ALBERTI, Viaggio a Constantinopo509-1621, Bolonha, 1889;
Medit..., 1, pp. 183 Mercadores da Polónia e da
Moscóvia cheA fridia com risdales da Alemanha (TAVERR, op. cit., 11, p.
14).
infra, 11, cap. 5.
., G7, JÓ86, 99, 31 de agosto de 1701. CHULIN, op. cit., p. 220.
jASCON, op. cit., p. 48.
rt CHAMBERLAND, "Le commerce d'imation en France au milieu du XVY siMe",
evue de
Giographie, 1892-1893, pp. 1-32. SGUILBERT, op. cit., II, p. 586, J. J.
CLA3ERAN, Histoire de l'impót en France, 11, , p. 147.
ryk SAMSONOWICZ, Untersuchungen tiber lanziger Birgerkapital in der
zweiten
Hd1fte

15. Jahrhunderts, Weimar, 1969.


crs CHYDENIUS, "Le benófice national

5)", trad. do sueco, introd. de Philippe JTY, in Revue d"Histoire


Lconomique et
So, 1966, p. 439.
rência infelizmente perdida, ficha proveniente loscou, A.E.A.
,, A.E., B1, 762, f' 401, carta de Hermann, al da França em Londres, 7 de
abril de 1791. XN RECHTEREN, Voiage aux Indes orien, 1706, V, p. 124.
- PANIKKAR, LAsie et la domination ocitale du XV' sWle i nos jours, pp.
68-72.

283. Ibid.

284. Ibid., pp. 95-96.

285. Fródóric MAURO, Lexpansion europcFenne,

1964, p. 141.

286. William BOLTS, Etat civil, politique et commercial du Bengale, ou


Histoire des conquites et de Vadministration de la Compagnie anglaise de
ce pays, 1775,

1, p. XVII.

287. G. UNWIN, "Indian Factories in the 18th century", in Studies in


Economic
History, 1958, pp.

352-373, citado por F. MAURO, op. cit., p. 141.


288. Gazette de France, 13 de março de 1763, de Londres, p. 104.

289. A.E., Asia, 12, P 6.

90. Moscou, A.E.A., 50/6, 474, fo 23, Amsterdam,

12/33, margo de 1764.

291. Gazette de France, abril de 1777.

292. PANIKKAR, op. cit., pp. 120-121.

293. G. d'AVENEL, Dicouvertes de Phistoire sociale, 1920, p. 13.

294. In Finanzarchiv, 1, 1933, p. 46.

295. A. HANOTEAU e A. LETOURNEUX, La Kabylie et les coutumes kabyles,


1893; mais o admirdvel livro de Pedro CHALMETTA, op. cit., pp. 75 ss.

296. Roger BASTIDE e Pierre VERGER, art. cit., pp.

75 ss.

297. Pierre GOUROU, Les paysans du delta tonkinois,

2 ed., 1965, pp. 54O ss.

298. Viagens pessoais em 1935.

299. Bronislaw MALINOWSKI, Les argonautes du Pacifique occidental, 1963,


p. 117.

300. Karl POLANYI, toda a sua obra e especialmente K. POLANYI e C.


ARENSBERG,
Les systemes 6conomiques, 1975.

301. Ver infra, p. 409.

302. Walter C. NEALE, in K. POLANYI e C. ARENSBERG, op. cit., p. 342.

303. Ibid., pp. 336 s.

304. Ibid., p. 341.

305. "Markets and Other Allocation Systems in History: the Challenge of


K.
Polanyi", in The Journal of European Economic History, 6, inverno de

1977.

306. W. C. NEALE, op. cit., p. 343.


307. Maxime RODINSON, in Pedro CHALMETTA, op. cit., pp. LIII s.

308. Ibid., pp. LV ss.

309. In Annales E.S.C., 1974, pp. 1.311-1.312.

310. Trad. fr., 1974.

311. Ibid., p. 22.

312. OEuvres, t. XXII, 1960, pp. 237, 286 ss., 322 ss.
;Ois PERROUX, Le capitalisme, 1962, p. 5. ert HEATON, "Criteria of
Periodization in Ornic History", in The Journal of Economic >ry, 1955,
pp. 267 ss.

3. Especialmente Lucien FEBVRE, "Les mots et les choses en histoire


6conomique", in Annales dhistoire &onomique et sociale, 11, 1930, pp. 231
ss.

4. Para mais amplas explicações, ver o livro claro

e meticuloso, infelizmente diffcil de consultar, de Edwin DESCHEPPER,


L'histoire du mot capital et dirivis, tese datilografada, Universidade
Livre de Bruxelas,

1964. Utilizei-o largamente nas linhas que se seguem.

5. Arquivos de Prato, n? 700, Lettere Prato-Firenze, documento comunicado


por F.
Melis.

6. Edgar SALIN, "Kapitalbegriff und Kapitallehre von der Antike zu den


Physiokraten", in Vierteliahrschriftfir Sozial- und
Wirtschaftsgeschichte, 23,

1930, p. 424, nota 2.

7. R. GASCON, Grand commerce et vie urbaine. Lyon au XVI, 1971, p. 238.

8. E. DESCHEPPER, op. cit., pp. 22 ss.

9. Frangois RABELAIS, Pantagruel, ed. La P16iade, p. 383.

10. A.N., A.E., B1, 531, 22 de julho de 1713.

11. J. CAVIGNAC, op. cit., p. 158 (carta de Pierre Pellet, da Martinica,


em 26

de julho de 1726).

12. Franqois VtRON DE FORBONNAIS, Principes jconomiques (1767), ed.


Daire, 1847, p. 174.

13. A.E. Memórias e Documentos, Inglaterra 35, fo

43, 4 de maio de 1696.

14. TURGOT, op. cit., II, p. 575.

15. J. SAVARY DES BRUSLONS, Dictionnaire, 11,

1760, col. 136.

16. A.N., G7, 1705, 121, depois 1724.

17. A.N., G7, 1706, 1, carta de 6 de dezembro de

1722.

18. CONDILLAC, op. cit., p. 247.

19. J.-B. SAY, Cours complet d'jconomie politique,

1, 1828, p. 93.

20. SISMONDI, De la richesse commerciale, 1803.

21. Op. cit., p. 176.

22, DU PONT DE NEMOURS, Maximes du docteur Quesnay, ed. 1846, p. 391,


citado por
Jean ROMEUF, Dictionnaire des sciences jconomiques, no verbete "Capital",
p.

199.

23. C. MANCERON, op. cit., p. 589.

24. MORELLET, Prospectus d'un nouveau dictionnaire A commerce, Paris,


1764, citado por E. DESCHEPPER, op. cit., pp. 106-107.

25. E. DESCHEPPER, op. cit., p. 109.

26. Ibid., p. 124.

27. A.N., K 1349, 132, V 214 v'.

28. E. DESCHEPPER, op. cit., p. 125.

29. Lucien FEBVRE, "Pouvoir et privifte" (Louis Philippe May: "L'Ancien


RÓgime devant le Mur d'Argent"), in Annales hist. 6c. et soc., X (1938),
p. 460.
30. E. DESCHEPPER, op. cit., p. 128.

31. A.N., Z 1, D 102 B.

32. AAS. Ndpoles, Affari Esteri, 801.

33. Pierre-Victor MALOUET, Memoires, 1874, 1, p. 83.

34. A.E., M. e D., Inglaterra, 35, f" 67 ss.

35. A.N., F 12, 731, 4 de julho de 1783.

36. Luigi DAL PANE, Storia del lavoro in Italia, 2 a ed., 1958, p. 116.

37. Caderno de reclamagóes, Terceiro Estado de Garde-Figanires.

38. Caderno de reclamaq6es de Saint-Pardoux, Sei calato de Draguignan.

39. D. MATHIEU, LAncien Wgime dans lapro, ce de Lorraine et Barrois,


1879, p.

324.

40. C. MANCERON, op. cit., p. 54.

41. Henry COSTON, Les financiers que mMem monde, 1955, p. 41; 24 de
setembro de

1790, A niteur, t. V, p. 741.

42. Moniteur, t. XVII, p. 484.

43, H. COSTON, op. cit., p. 41. RIVAROL, Mjm res, 1824, p. 235.

44. A. DAUZAT, Nouveau dictionnaireetymolc que et historique, 1964, p.


132. Mas n5o enc4 trei esta indicagdo na Encyclopidie. Tratar-s de um
engano?

45. J.-B. RICHARD, Les enrichissements de la 11 guefranCaise, p. 88.

46. Louis BLANC, Organisation du travail, 9 q

1850, pp. 161-162, citado por E. DESCHEPPI op. cit., p. 153.

47. J. ROMEUF, Dictionnaire des sciences &ono, ques no verbete


"Capitalisme", p.

203, e J, HtRMARDINQUER, in Annales E. S.C., 19 p. 444.

48. Jean-Jacques HtMARDINQUER, resenha dq vro de Jean DUBOIS: Le


vocabulairepoliti4 , et social en France de 1869 i 1872, a travers
oeuvres des 6crivains, les revues et les journa
1963, in Annales E. S.C., 1967, pp. 445-446. N ENGELS a utilizard e, jd
em 1870,
Kapitalisn aparece na pena do econornista alemdo Alt Schdffle (Edmond
SILBENER,
A nnales dhiste sociale, 1940, p. 133).

49. H. HEATON, art. cit., p. 268.

50. Lucien FEBVRE, "L'6conomie li6geoise XVI' siMe" (Jean LEJEUNE: La


formation capitalisme moderne dons la principauti de j ge au XVT sikle),
in A nnales E.
S.C., XII,

256 ss.

51. Andrew SHONFIELD, Le capitalisme d jourhui, 1967, pp. 41-42.

52. Annales E.S.C., 1961, p. 213.

53. Alexandre GERSCHENKRON, Europe in Russian Mirror, 1970, p. 4.

54. K. MARX, op. cit., 1, p. 1.170.

5 5. Histoire de la campagne franVaise, 2 ed., 1O pp. 71 ss.

56. Citado por SALIN, art. cit., p. 434.

57. J. GENTIL DA SILVA, op. cit., I, p. 20.

58. J.-P. CATTEAU-CALLEvILLE, Tableau d mer Baltique, 11, 1812, pp. 238-
239.

59. Ernst PITZ, "Studien zur Entstehung des K talismus", in Festschrift


Hermann
A ubin, 1, IS pp. 19-40.

60. A.E., Moscou/A, 35/6 341/71 v1-72, Londi

26 de maio-6 de junho de 1783.

6 1. Cours diconomie politique, 1823, 1, pp. 24662. AAS. Veneza,


Notatorio di Collegio, 12, 128

27 de julho de 1480.

63. Alice HANSON JONES, "La fortune priv& Permsylvanie, New Jersey,
Delaware (1774)"

C., 1969, pp. 235-249, e Wealth Ese American Middle Colonies, 1774,

8.
;obretudo seu relatório, no congresso

1965), "Capital Formation in Moc Growth and Some Implications for


Terceira conferencia internacional conómica, 1, pp. 16-53.
)mic Growth, 1688-1959, 2 ed., art. cit., p. 23.
ale de la population, 1, 1954, espe58.

4 DE BEAUJEU, De laudibus Pro1551, obra editada em francs com -ovence


louie, Lyon, 1614, citado )URDE,
Agronomie et agronomes XVIIF sikle, p. 50. Cf. tambóm La Baronnie de
Neubourg,

1961, por Charles Estienne: "E preciso a lavrar de maneira que a terra
fi)6 se possivel."
)SSON, "Pour une approche 6cociale du bdtiment. L'exemple des s A Bruges
aux
XIV' et XV' si!tin de la Commission Royale des des Sites, t. 2, 1972, p.
144. LRON, "The Fate of the Gosti in leter the Great.
Appendix: Gost', 's reply to the Government Inquiry 'ah' , iers du monde
russe et sovieti1973, p. 512.
'40VICH, Colóquio da Unesco soout. 1973, p. 33.
art. cit., p. 48.
H. A. MISKIMIN, "The Econoof the Renaissance", in The EcoReview, 1962, n?
3, pp.

408-426. ecidas por Felipe RUIZ MARTIN., ionado por Alois MIKA, La
granBoh6me du sud, XIV-XVI'sieistoricky 1, 1953, e por Josef PEduction
agricole en Bohme dans oith du XVT et au commencesikle, 1964. (Recebi
estas inforANACEK.)
Les rentes au XVF siecle, Paris,

110.
)p. cit., p. 212, 13 de novembro cit., p. 619.
op. cit., p. 324.
:o Prato, Arch. Datini Filza 339, ! abril de 1408.
)sos documentos do A.d.S. de Velencia deste banco, a liquidado, nAo
terminou, 31

de margo de, Dond delle Rose, 26, fl 107. )p. cit., p. 340.
'le 'Betrayal' of the Sixteenthoisie: A Myth? Some Considera84.

85.

86.

87.

88.

89.

90.

91.
92.

93.

94.

95.

96.

97.

98.

99.

100.

1O 1.

102.

103.

104.

105.

106.

107.

108.

109.

110.

111.

112.

113

114

115.
tions on the Behaviour Pattem of the Merchants of Antwerp in the
Sixteenth
Century", in Acta Historiae Neerlandicae, vol. VIII, pp. 31-39. Robert
MANDROU,
Les Fugger, proprieFtaires fonciers en Souabe, 1560-1618, 1968.
Gilles CASTER, Le commerce du pastel et de Pipicerie i Toulouse, 1450-
1561,

1962.
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G. GALASSO, Economia e societ& nella Calabria del Cinquecento, p. 78.
A. BOURDE, op. cit., 1975, pp. 1.645 ss. GÓrard DELILLE, "Types de
dóveloppement dans le royaume de Naples, XVIII-XVIIII si&cles ", in A
nnales E. S. C., 1975, pp. 703 -725. Moscou, Acervo Dubrowski, Fr. 18-4,
f' 86-87. Ldszló MAKKAL in
Histoire de la Hongrie, Budapeste, 1974, pp. 141-142.
Georg GROLL, Bauer, Herr und Landesfurst,

1963, pp. I ss.


Andre MALRAUX, Anti-memoires, 1967, p. 525. A. BOURDE, op. cit., p. 53.
Wilhelm ABEL, Crises agraires en Europe (XIII-XX' siecles), 1973, p. 182.
Wilhelm ABEL, Geschichte der deutschen Landwirtschaft, 1962, p, 196.
Paul BOIS, Paysans de I'Ouest, 1960, pp.

183-184.
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F. GESTRIN, op. cit., cf. resumo em francs, pp.

247-272.
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1, p. VIL
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Sozialgeschichte, ed. ital.

1970, p. 138.
M. GONON, La viefamiliale en Forez et son vocabulaire d'aprs les
testaments,

1961, p. 16. Ibid., p. 243.


E. JUILLIARD, Problemes alsaciens vus par un giographe, 1968, p. 110.
Ibid., p. 112.
G. FOURQUIN, op. cit., pp. 16O ss. G. GALASSO, op. cit., pp. 76-77.
Ibid., p.

76.
Georg GRULL, op. cit., pp. 30-31.
Evamaria ENGEL, Benedykt ZIENTARIA, Feudaistruktur, Lehnbiirgertum unit
Fernhandel im Spdtmittelalterlichen Brandenburg, 1967, pp.

336-338.
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116. Georges LIVET, L'intendance d'Alsace sous Louis XIV, 1648-1715,


1956, p.

833.

117. André PLAISSE, La Baronnie de Neubourg,

1961.

118. G. DELILLE, art. cit., 1975.

119. Yvonne BÉZARD, Unefamille bourguignonne au XVIIT siècle, Paris,


1930.

120. J. MEYER, op. cit., p. 780.

121. VAUBAN, Le projet d'une dixme royale (ed. Coornaert, 1933), p. 181,
citado por J. MEYER, op. cit., p. 691, nota 1.

122. A. PLAISSE, op. cit., p. 61.

123. Y. BÉZARI), op. cit., p. 32.

124. Gaston ROUPNEL, La ville et Ia campagne au XVIII siècle, 1955, p.


314;
Robert FORSTER, The House af Saulx-Tavanes, 1971.

125. Albert SOBOUL, La France à Ia veille de Ia Révolution, 1; Économie


et société, p. 153.

126. A. PLAISSE, op. cit., 1974, p. 114.

127. Louis MERLE, La métairie et 1'évolution agraire de Ia Gâtine


poitevine,

1958, pp. 5O ss.

128. G. GROLL, op. cit., pp. 30-31.

129. Pierre GOUBERT, Beauvais et le Beauvaisis, op. cit., pp. 18O ss.

130. Michel CAILLARD, A travers Ia Normandie des XVIT et XVIII' siècles,


1963, p. 81.

13 1. Vital CHOMEL, "Les paysans de Terre-basse et Ia dime à Ia fin de


l'Ancien
Régime", in Évocations, 18? ano, n.s., 4' ano, n' 4, março-abril,

1962, p 100.

132. Citado por L. DAL PANE, op. cit., p. 183.

133. Michel AUGÉ-LARIBÉ, La révolution agricole,

1955, p. 37.

134. Giorgio DORIA, Uomini e terre di um borgo collinare, 1968.

135. Aurelio LEPRE, Contadmi, borghesi ed operai nel tramonto


delfeudalesimo nopoletano, 1963, p. 27.

136. Ibid, pp. 61-62.

137. Paul BUTEL, "Grands propriétaires et production des vins du Médoc au


XVI1P siècle", in Revue historique de Bordeaux et du département de Ia
Gironde, 1963, pp. 129-141.

138. Gaston ROUPNEL, op. cit., pp. 206-207.

139. Witold KULA, Théorie économique du système féodal. Pour un modèle de


Péconomie polonaise, XVI-XVIII' siècles, 1970.

140. J. RUTKOWSKI, "La genèse du régime de Ia corvée dans I'Europe


centrale depuis Ia fin du Moyen Age", in La Pologne au V1` Congrès
internationale des sciences historiques, 1930; W. RUSINSKI, in Studia
historicae oeconomicae, 1974, pp. 27-45.

141. L. MAKKA1, in Histoire de Ia Hongrie, op. cit., p. 163.

142. A. VON TRANSEHE-ROSENECK, Gutsherr und Bauer im 17. und 18. Jahr.,
1890, p.

34, nota 2.

143. J. ZIEKURSCH, Hundert Jahre Schlesischer Agrargeschichte, 1915, p.


84.

144. F. J. HAUN, Bauer und Gutsherr in Kursachsen,

1892, p. 185.

145. 1. WALLERSTEIN, op. cit., p. 313 e nota 58. No fim do século XVI, as
corvéias raramente atingiam 4 dias por semana; no século XVIII, as
plantações camponesas do mesmo tamanho eram obrigadas a fornecer, regra
geral, 4 a 6 dias de corvéia por semana. Esses números referem-se às
plantações camponesas de maiores dimensões, sendo as corvéias fornecidas
pelas outras menores, pois variavam em função das dimensões da plantação.
Mas a tendência para o aumento dos encargos e especialmente das corvéias
era geral. Cf. Jan RUTKOWSKI, art.
cit., pp. 142 e 257.

146. Ficha perdida.

147. Charles UESZLARY, "La situation des serfs en Hongrie de 1514 à


1848", in
Revue dHistoire Économique et Sociale, 1960, p. 385.

148. J. LESZCZYNSKI, Der Klassen Kampf der Oberlausitzer Bauem in den


Jahren

1635-1720, 1964, pp. 66 ss.

149. Alfred HOFFMANN, "Die Grundherrschaft aIs Unternehmen", in


ZeitschriftfürAgrargeschichte undAgrarsoziologie, 1958, pp. 123-131.

150. W. KULA, op. cit., p. 138.

151. Jean DELUMEAU, La civilisation de Ia Renaissance, 1967, p. 287.

152. Sobre o caráter capitalista ou não das empresas senhoriais, ver a


controvérsia entre J. N1CHTWEISS e J. KUCZYNSKI, in Z. für
Geschichtswissenschaft, 1953 e 1954.

153. Jean de LÉRY, Histoire d'un voyagefaict en Ia terre de Brésil, p.p.


Paul
GAFFAREL, 11, 1880, pp. 20-21.

154. Gilberto FREYRE, Casa Grande e Senzala, 5' ed., 1946.

155. Frédéric MAURO, Le Portugal et PA tlantique au XVI]e siècle, 1960,


pp. 213

ss.

156. Alice PITFER CANABRAVA, A indústria do açúcar nas ilhas inglesas


efrancesas do mar das Antilhas, tese datilografada, São Paulo, 1946, pp.
8 ss.

157. Gabreil DEBIEN, "La sucrerie Galbaud du Fort (1690-1802)", in Notes


d'histoire coloniale, 1,

1941.

158. Guildiverie vem de guildive, a aguardente tirada dos "xaropes de


açúcar e da espuma das primeiras refinações". Tafia, palavra sinônima,
seria usada pelos negros e pelos índios. (Segundo LITTRÉ.)

159. J. CAVIGNAC, op. cit., P. 173, nota 1.

160. SAVARY, citado por CAVIGNAC, op. cit., p.

49, nota 3.
161. G. DEBIEN, art. cit., pp. 67-68.

162. G. DEBIEN, "A Saim-Dorningue avec deux jeunes économes de plantation


(17771788)", in Notes d'histoire coloniale, VII, 1945, p. 57. A expressão
"piastra gourde" vem do espanhol gorda.

163. Pierre LÉON, Marchands et spéculateurs dauphi555

nonde antillais, les Dolle et les Raby,


OUZET, in Charles HIGOUNET, ?ordeaux, t. V, 1968, p. 224; Pierre RAUDEL,
LABROUSSE, Histoire et sociale de la France, 11, 1970, p.

2.
[BERT, in Histoire du commerce de, pp. 654-655.
)ZET, in Histoire de Bordeaux, op nota 40.
Marchands et spiculateurs... op.
LTIST, At spes non fracta, Hope & ;, 1974, pp. 20-21.
DAN, "The Wealth of Jamaica in

1 Century", in Economic and Histoiol. 18, n' 2, agosto de 1965, p. 297.


, ES, The Historian's Business and Oxford, 196 1. Id., Merchants
and.iomic
History Review Supplement, dge, 1960, citado por R. B. SHEcit.
DAN, art. cit., p. 305.

3 HUSSEY, The Caracas Company

34.
IN, Beitrage zur Oekonomie, Techizei und Cameralwissenschaft, ). 4. Sobre
esta diversidade fundidra, cf. Joan THIRSK, in Agrarian md, op. cit.,
passim, e pp. 8

ss. t. IV, 1754, col. 56O ss.


.e capital, Ed. Sociales, 1950, t. 111,
UART, La crise rurale en lle-de670, 1974.
)E, op. cit., 1, p. 59.
, UX, Une Province franCaise au id Roi, la Brie, 1958.

3KY, "Voltaire et la guerre des faales historiques de la Rivolution, pp.


127145.
RT, in BRAUDEL, LABROUSonomique et sociale de la France, an MISTLER,
1968, pp. 4O e 46. 'it., 1, pp. 7O ss.
LIN, Venise au sikle des Lumi!32 ss.
LIN, "Une grande propri6tó en II' siMe: Anguillara", in Anna8, p. 486 e
nota 1.
- cit., pp. 148 ss.

194. P. MOLMENTI, op. cit., pp. 138 ss. e 141.

195. Citado por Jean GEORGELIN, Venise au sikle des Lumi&es, op. cit.,
pp. 758-759.

196. J. C. LÓonard SISMONDE DE SISMONDI, Nouveaux principes diconomie


politique ou de la richesse dans ses rapports avec la population (1819),
1971, p. 193.

197. A. REUMONT, Della Campagna di Roma, 1842, pp. 34-35, citado por DAL
PANE, op. cit., p. 53.

198. DAL PANE, ibid., pp. 104-105 (e nota 25); N.


M. NICOLAL Memorie, leggi ed osservazioni sulle campagne di Roma, 1803,
citado por DAL PANE, ibid., p. 53.

199. Ibid., p. 106.

200. Adam SMITH, La richesse des nations, reediçdo Osnabrdck, 1966, 1,


pp. 8-9.

201. Olivier de SERRES, Le thedtre d'agriculture et mesnage des champs, 3


ed.,

1605, p. 74.

202. Canções populares italianas, I dischi del Sole, Ediziom del Gallo,
Mildo (s.d.).

203. Giovanni DI PAGOLO MORELLI, Ricordi, p.p. Vittore BRANCA, 1956, p.


234.
Esta crónica pessoal refere-se aos anos 1393-1421.

204. Elio CONTI, Laformazione della struttura agraria moderna nel contado
fiorentino, 1, p. 13.

205. Ibid., p. 4.

206. Renato ZANGHERI, "Agricoltura c sviluppo del capitalismo", in Studi


storici, 1968, n? 34.

207. Informaç6es fornecidas por L. MAKKAL

208. Rosario VILLARI, La rivolta antispagnola a Napoli, 1967.

209. Citado por Pasquale VILLANI, Feudalitd, riforme, capitalismo


agrario, 1968, p. 55.

210. Ibid., pp. 97-98.

211. Jean DELUMEAU, LItalie de Botticelli a Bonaparte, 1974, pp. 351-352.

212. Pierre VILAR, La Catalogne dans VEspagne moderne, t. 11, p. 435.

213. Pierre GOUBERT, in BRAUDEL, LABROUSSE, op. cit., pp. 12 e 17.

214. Jean MEYER, La noblesse bretonne au XVIIF sikle, 1966, t. 11, p.


843.
215, Eberhard WEISS, "Ergebnisse eines Vergleichs der
grundhertschaftlichen
Strukturen Deutschlands und Frankreichs vom 13. his zurn Ausgang des 18.
Jahrhunderts", in Vierte1jahrschrift far Sozial-und
Wirtschaftsgeschichte, 1970, pp.

1-74.

216. E. LE ROY LADURIE, "RÓvoltes et contestations rurales en France de


1675 A

1788", in Annales E.S.C., n? 1, jan.-fev. 1974, pp. 6-22.

217. Pierre de SAINT-JACOB, Les paysans de la Bourgogne du Nord au


dernier sikle de IAncien Rgime, 1960, pp. 427-428.

218. Civilisation mateFrielle, 1, p. 88.

219. Renó PILLORGET, "Essai d'une typologie des mouvements


insurrectionels ruraux survenus en Provence de 1596 A 1715", in Actes du
quatrevingt-douzime
Congrs national des Soci&js Savantes, Sedo de história moderna, 1967, t.
1, pp.

371-375.

220. P. CHAUNU, La civilisation de 1, Europe classique, 1966, p. 353.

221. Paul HARSIN, "De quand date le mot industrie?", in Annales dhistoire
&onomique et sociale, 11, 1930.

222. Hubert BOURGIN, L'industrie et le marche,

1924, p. 3 1.

223. Pierre LtON, La naissance de la grande industrie en Dauphim (fin du


XVIT si,, cle-1869),

1954, t. 1, p. 56.

224. W. SOMBART, op. cit.1 11, p. 695.

225. Luigi BULFERETTI e Claudio COSTANTINI, Industria e commercio in


Liguria nell'etd del Risorgimento (1700-1861) 1 1966, p. 55.

226. T. J. MARKOVITCH, lvinóstric franaise de

1789 1964", in Cahiers de VISEA, sórie AF, n?

4, 1965; n?s 5, 6, 7, 1966, especialmente n? 7, p.


321.

227. Federigo MELIS, Conferncia no Collge de France, 1970.

228. Hubert BOURGIN, op. cit., p. 27.

229. Midit... 1, p. 396.

230. Ver infra, pp. 287 ss.

231. W. SOMBART, op. cit., 11, p. 732.

232. Henri LAPEYRE, Unefamille de marchands, les Ruiz..., 1955, p. 588.

233. Jacques de VILLAMONT, Les voyages du seigneur de Villamont, 1600, f'


4 v'.

234. Hubert BOURGIN, op. cit., p. 31.

235. W. SOMBART, op. cit., 11, p. 731.

236. Ortulf REUTER, Die Manufaktur im frankischen Raum, 1961.

237. Franqois COREAL, Relation des voyages de FranCois Coreal aux Indes
occidentales... depuis 1666 jusqu'a 1697, Bruxelas, 1736, p. 138.

238. Otto von KOTZEBUE, Entdeckungs-Reise in die Siid-See und nach der
BeringsStrasse... 1821, p.

22.

239. M. CARTIER e TENG T'O, "En Chine, du XVII au XVIII' si&le: les mines
de charbon de Men-t'ou-kou", in Annales E.S.C., 1967, pp.

54-87.

240. Louis DERMIGNY, op. cit., 1, p. 66; Jacques GERNET, op. cit., p.
422.

241. Louis DERMIGNY, op. cit., 1, p. 65.

242. Ibid., p. 65.

243. Lord MACARTNEY, Voyage dans Pinterieur de la Chine et en Tartarie...


fait dans les annies 1792,

1793 et 1794, Paris, 1798, IV, p. 12; J. GERNET, op. cit., p. 422.

244. P. SONNERAT, Voyage aux Indes orientales et a la Chine fait par


ordre du
Roi depuis 1774 jusqu'en 1781, 1782, t. 1, p. 103.
245. Ibid., pp. 104-105; gravuras c. XX e XXIL

246. Guy PATIN, Lettres, 1, p. 2.

247. De I'Esprit des Lois, XXIII, p. 15.

248. Marc BLOCH, Melanges historiques, 1963, t. 11, pp. 796-797.

249. A.d.S. Gnova, Lettere Consoli, 1/2628.

250. Charles de RIBBE, Une Grande Dame dans son minage au temps de Louis
XIV, cl'aprs le journal de ia comtesse de Rochefort (1689), Paris,

1889, pp. 142-147. it,, p. 156, nota 84, Ucr5nia

25 1. Witold KULA, op. c em 1583, Litudnia em 1788.

252. A.N., F. 12, 681, f' 112.

253. J. BECKMANN, op. cit., III, pp. 430-431.

254. Jean LEJEUNE, op. cit., p. 143.

255. C. e S. Suarez a Cosme Ruiz, Florenqa, I' de junho de 1601. Arquivos


Ruiz,
Valladolid..... que todos acuden a la campafia".

256. A .N., G. 7, 1706, 1 167.

257. Ange GOUDAR, Les intirets de la France mal entendus, Amsterdam,


1756, t.

111, pp. 265-267, citado por Pierre DOCKES, Lespace dans la pensee
jconomique, op. cit., p. 270.

258. Roger DION, Histoire de la vigne et du vin en France des origines au


XIX' sikle, 1959, p. 33.

259. Germain MARTIN, La grande industrie sous le rgne de Louis XIV (mais
particularmente de 166O a 1715), 1898, p. 84.

260. E. TARLE, L'industrie dans les campagnes de France a la fin de VA


ncien
Regime, 19 10, p. 45, nota 3.

261. lnformabes que me foram dadas por 1. SCHOFFER.

262. Ortensio LANDI, Paradossi cio sententiefuori del comun parere,


novellamente venute in luce,

1544, p. 48 frente.
263. Joan THIRSK, in The Agrarian History of England and Wales, 1967, IV,
p.

46.

264. Jacqueline KAUFMANN-ROCHARD, op. cit., pp. 60-61.

265. Heinrich BECHTEL, op. cit., I, p. 299.

266. Joan THIRSK, in op. cit., IV, p. 12 e passim.

267. DEFOE, op. cit., I, pp. 253-254.

268. Isaac de PINTO, op. cit., p. 287.

269. A.N., G 7, 1704, fo 102.

270. MIRABEAU, Lami des hommes ou traite de la population, 1756-1758.

271. P. S. DUPONT DE NEMOURS, De 1'exportation et de Pimportation des


grains,

1764, pp.

90-91, citado por Pierre DOCKES, L'espace dans la pensie jconomique du


XVl' au
XV11, r siecle,

1969, p. 288.

272. Franois VtRON DE FORBONNAIS, Principes et observations 4konomiques,


1767, t. 1, p. 205, citado por Pierre DOCKES, op. cit., p. 288.

273. Mmoires de Oudard Coquault (1649-1668) bourgeois de Reims, ed. 1875,


11, p.

371.

274. Gazette de France, 1730, p. 22.

275. Moscou, Bibl. Lenin Fr. I 100, f 76-77.

276. Enrique FLORESCAO, Precios del maiz y crisis agricolas en Mexico


(17081810), 1969, p. 142.

277. Germain MARTIN, op. cit., P. 80.

278. A .N., F 12, 149, fo 80.

279. DEFOE, op. cit., P. 125.

280. E. TARLt, op. cit., p. 43.


281. Semana de Prato, abril de 1968.

282. Domenico SELLA, European Industries (1500-1700), 1970.

283. Ibid., pp. 88-89.

557

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(Memória de 1684). IIGNY, op i cit., 11, p. 756, nota 3.

3OURQUELOT, Etudes sur lesfoipagne, 1865, 1, p. 102.


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111), 1961, p. 41.

51, 148 v', 29 de abril de 1729.

32, 29 de agosto de 1726.


06, f' 81, 19 de janeiro de 1723.

314. Ibid., f, 121.

315. Diego de COLMENARES, Historia de la insignia ciudad de Segovia, 2


ed.,

1640, P. 547.

316. Hermann KELLENBENZ, "Marchands capitalistes et classes sociales", p.


14 (dat.).
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318. Museo Correr, Don delle Rose, 160, f' 53 e 53 V..

319. Hermann KELLENBENZ, art. cit., nota 316.

320. Frangois DORNIC, Lindustrie textile dans le Maine, 1955.


321. Raoul

7. it., V, p. 345, nota 2. )0, f' 86.


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Studi in onore )ri, 1957, 1, P. 308 bis, , "Die Stellung des Reichsstadt
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322. Johann BECKMANN, op. cit' 1, pp. log ss.

323. F. DORNIC, OP. cit., p. 307. "

324. Moscou, Bibl'Lenin, Fr. 374, 1`1 16O v1.

325. Londres Victoria and Albert Museum, 86-HH, Box 1, sm data.

326, Barchent = fustdo.

327. Forma de empresa mineira que remonta d Idade MÓdia ató o Tridentiner
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1208.

328. Gdnther V. PROBSZT, Die niederungarischen Bergstddte, 1966.

329. Antonina KECKOWA, As salinas da regido de Cracóvia do siculo XVI ao


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XVIII, em polons, 1969.

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mesmo autor, Gornictwo Kruncowe

331

332

na terenie Z10Z slaskokrarowsk-ich do Polowy Xvr, wleku,

1963, p. 410

F. LUTGE, OP.
Cit., p. 265. des .Zur Genesis modernen Kapitaftsmus 1935.

333. G. LOHMANN VILLENAI Las minas de IHuancavelica en los siglos XVI y


XVII, pp. I I ss.
334. A. MATILLA TASCÓN, Historia de las minas de A maden, I (195 s), pp.
181202.

335. F. LOTGE, op. cit., p. 304; Encyclopidie italienne, no verbete


"Idria".

336. Enrique FLORESCANO, Precio del mafzy crisl.s agricolas en Mjx1co


(17081810), 1969, p. 150, nota 33.

337. F. LOTGE OP. cit., p. 378.

338. L. A. CLAKSON, The Preindustrial Economy in England, 1971, p. 98

339. Ibid.
? le Bel d'apres des documents H. GERARD, 1837.
fo 9.
' della vita economica medielivio Datini di Prato, I, P. 458. ; de
Genova, 572, f' 4.
in, Fr. 374, fo 171.

340. Gazette de France, 6 de agosto de 1731, p. 594.

341. A.N., F 12, 682, 9 de janeiro de 1727.

342. Marcel ROUFF Les mines de charbon en France au XVIIP siicle, ' 1922,
p.

245, nota 1.

343. Germain MARTIN, La grande industrie en France sous le regne de Louis


XIV

1900,

344.
p. 184. AX, A.E., B', 531, 18 de'fevereiro de 1713.

345. A.N., F 12, 515, fo 4, 23 de maio de 1738.

346. Departamento das Ardenas. E a aideia de lily, Clue a guerra de 187O


notabilizard.

Notas

47. A.N., F 12, 724.

48. A.N., G 7, 1692, 101.

49. J. A. ROY, Histoire du patronat du Nord de Ia France, 1968, dat.

50. H. SEE, "L'Etat 6conomique de la Champagne la fin du XVII' si6cle,


cl'aprs les mómoires des intendants de 1689 e de 1698", in Mjmoires et
documents pour servir a Phistoire du commerce et de Vindustrie, dir. pot
J. Hayem, X sórie,

1966, p. 265.

51. Guy ARBELLOT, Cinq paroisses du Vallage, XVIII-XVIIF sikles, 1970,


tese clat.

52. Ortulf REUTER, op. cit., pp. 14-15.

53. SAVARY DES BRUSLONS, op. cit., t. III, col.

721.
;4. F. L. NUSSBAUM, A History of the Economic Institutions of Modem
Europe,

1933, p. 216.

5. Cf. infra, pp. 294 s.


;6. F. L. NUSSBAUM, op. cit., pp. 212-213.

7. F. LUTGE, op. cit., p. 366.

8. DEFOE, op. cit., 11, pp. 271-272.

9. Federigo MELIS, Aspetti della vita economica medievale, 1962, pp. 286
ss.,

455 ss., e Tracce di una storia economica di Firenze e della Toscana, p.


249.
0. F. LOTGE, op. cit., p. 366.

1. Eckart SCHREMMER, Die Wirtschaft Bayerns,

1970, p. 502.

2. Renó GANDILHON, op. cit., p. 176.

3. Citado pot Pierre DOCKES, Lespace dans la pensóe ikonomique du XVI' au


XVIIT sikle, P. 108.

4. Claude PRIS, La manufacture royale des glaces de Saint-Gobain, 1665-


1830,

1973, tese dat. em

5 vols., Introdudo.

5. A.N., G 7, 1697, 2, 3 de janeiro de 1712.

5. A.N., F 12, 682.


7. A.N., G 7, 1706, 126, maro de 1723 (para todo o pardgrafo anterior).

3. O estudo bAsico 6 de M. COURTECUISSE, "La manufacture de draps fins


Vanrobais aux XVIT' et XVIIF sikles", in Mjmoires de la Soci&o
d'imulation dAbbeville, t.
XXV, 1920.
). Viagem Inglaterra, documento citado, V 4. ). Georges RUHLMAN, Les
corporations, les manufactures et le travail libre ii Abbeville au XVHP
sikle,

1948.
F. L. NUSSBAUM, op. cit., p. 215. Ibid., p. 213.
Ibid., p. 213. Ibid., p. 216.
L. A. CLARKSON, op. cit., P. 99. A.N., G 7, 1697, 6.
Ibid. A.N., F 12, 681, 9. A.N., F 12, 516, 13.
Claude PRIS, op. cit., dat., forneceu todos os dados que se seguem.
Sidney HOMER, A History of Interest Rates,

1963.
. Entendo pot ponto imperfeito algo de semelhante ao "chapéu" dos
levantamentos topográficos, em que as linhas de direção coincidem
imperfeitamente.

383. Segundo W. KULA, a informado foi-me retransmitida pot Andrei


WICZANSKY.

384. Raymond OBERL8, "L'6volution des fortunes A Mulhouse et le


financement de l'industrialisation an XVIII' sikle", in comitó des
travaux historiques,
Bulletin des travaux historiques, 197 1, p. 151 e nota 32, refer&cia a
Histoire documentaire de Vindustrie de Mulhouse et de ses environs au
XIX' sikle, 1902, pp. 287 e 698.

385. Segundo o trabalho inódito de R. ZUBER, que pesquisou os arquivos


Montgolfier (Biblioteca da Sorbonne).

386. Handbuch der Deutschen Geschichte, p.p. AUBIN e ZORN, 1971, 1, p.


550.

387. J.-C. PERROT, Gense d' une ville moderne: Caen au XVIIr sikle, 1975,
1, p.

372.

388. Ludwig SCHEUERMANN, DieFuggeralsMontanindustrielle in Tirol und


Kdrnten,

1929, p. 27.

389. Daily Life in Portugal in the Late Middle Ages,

1971, especialmente p. 198.


390. Walther G. HOFFMANN, British Industry,

1700-1950, 1955.

391. Cambridge Economic History of Europe, IV,

1967, p. 484, figura 33.

392. Jean-Claude PERROT, op. cit., 1, p. 400.

393. Ibid., p. 408.

394. Sidney POLLARD, David W. CROSSLEY, The Weafth of Britain, 1968, pp.
134 ss.

395. Informafto comunicada pot F. RUIZ MARTIN.

396. Beauvais et le Beauvaisis... op. cit., p. 327.

397. Orazio CANCILA, "I prezzi su un mercato dell'interno della Sicilia


alla metd del XVII secolo", in Economia e Storia,

1966, p. 188.

398. Basile KERBLAY, "Les foires commerciales et le march6 intórieur en


Russie dans la premire moiti6 du XIX' siMe", in Cahiers du monde russe et
sovijtique,

1966, p. 424.

399. Arquivos Vorontsov, 10, p. 129. Simon VORONTSOV, Southampton, 12-24


de setembro de

1801.

400. CANTILLON, Essai sur la nature du commerce en giniral, ed. INED,


1952, p.

36. Falso dilema, diz-me Pierre Gourou. Muitos cavalos significam muito
estrume, e portanto melhores colheitas.

401. GALIANI, Dialoque sur le commerce des bles, citado pot Pierre
DOCKES, p.

321.

402. W. SOMBART, op. cit., 11, pp. 357 ss.

403. A.N., G 7, 1510.

404. DUTENS, Histoire de la navigation hauturi&e en France, 1828, citado


pot J.C. TOUTAIN, Les transports de France, 1830-1965, 1967, p. 38.
405. TOUTAIN, ibid., p. 38.

406. A.N., G 7, 1646, Orleans, 26 de dezembro de

1708.

407. Jacob STRIEDER, Aus Antwerpenen Notariatsarchiven, 1930, p. XXV,


nota 4.

408. Emile COORNAERT, Les FranCais et le commerce international a Anvers,


1, pp.

269-270.

559

JLTE, Geschichte des mittelalterlichen d Verkehrs, 1, pp. 357 ss.


, 721.
Archiv, Brigue, sch. 31, n?s 2939,
Sabóia, C 138-307, f' 92 v'.

159/2.
LRT, 11, pp. 330-332. P. 191.
'T, in op. cit., IV, P. 559.

1510.
ARY, Le parfait negociant, 1712, 1,

1. 208-209.
... de Bernardo BIGONI, in Viaggiap. Marziano Guglielminetti, 1967,
DES BRUSLONS, op. cit., IV ria 1251.
, moires, 111, p. 42.
LEZ, De Firma della Faille en de invandel van vlaamse Firma's in de 161
p. 577.

4BENZ, Der Meder'sche HandelsWelser'schen Nachtrdge, 1974, p.

1685, 77.
RT, op. cit., 11, p. 334.
.D, Le nigoce dA msterdam, p. 218, . SOMBART, 11, p. 338. STERFIELD,
Middlemen in English rticulary between 166O and 1760,
ZT, op. cit., 11, p. 329.
UN, op. cit., p. 14.
DES BRUSLONS, op. cit., I (1759), caq6es que se seguent sobre Roan[as da
memória datilografada de De7tellerie et gens de rivi&e 4 Roanne le de
IAncien Regime, Universidade

2.
c H 2933 (em especial o memorane retoma o histórico do problema).

435. Michel de BOISLILE, Memoires des Intendants,


1 (1881), pp. 5-6.

436. A.N., K 1352, n? 63, fl 1.

437. J. SAVARY DES BRUSLONS, 1, coluna 430.

438. B.N., Fr. 21702, fl, 71-73.

439. Ibid., f" 120-126.

440. A.N., G 7, 1532, agosto de 1705.

441. A.N., F 12, 681, 6O e 44.

442. P. DEYON, Amiens, capitaleprovinciale, 1967, pp. 91 ss.

443. Ver supra, nota 433.

444. DEFOE, op. cit., 11, pp. 253-256.

445. J. SAVARY DES BRUSLONS, op. cit., 1, coluna 42.

446. K. KELLENBENZ, "B5uerliche Unternehmertdtigkeit im Bereich der Nord-


und
Ostsee von Hochmittelafter bis zurn Ausgang der neueren Zeit ", in
Vierte1jahrschriftftir Sozial- und Wirtschaftsgeschichte, maro de 1692.

447. Ibid.

448. Ibid.

449. L. -A. BOITEUX, La fortune de mer, le besoin de sjcuritj et les


debuts de
Passurance maritime, pp. 45 ss.

450. Ibid., p. 48.

451. Ralph DAVIS, Alippo and Devonshire Square, p. 34, nota 2.

452. A.N., K 1351.

453. SEIGNELAY, Journal de voyage en Holande, ed.

1867, pp. 293 e 297.

454. A.N., F 12, 724.

455. A.N., F 12, 724, 25 de setembro de 1788.

456. A.N., A.E., B', 627, 2 de agosto de 1725.

457. AX, Colónias, F 2 A 16.


458. Yosaburo TAKEKOSHI, The Economic Aspects of the Political History of
Japan,

1930, 1, pp.

223-224.

459. Os documentos utilizados foram-me passaclos por Jean MEYER.

460. Fródóric C. LANE, "Progrs technologiques et productivitó dans les


transports maritimes de la fin du Moyen Age au dóbut des Temps modernes",
in
Revue historique, abril-junho de 1974, pp. 277-302.

461. Germain MARTIN, La grande industrie sous le règne de Louis XIV, p.


213.
PIDAL, Historia de Espafia, 111, 'e di Storia Patria, VI, 1935.

4EAU, Histoire du commerce en p. 237.

10. LOW, Probleme der Wirtschafts

16, p. 381. Ver igualmente, no tosóes honorfficas entre "negocianes


varejistas",
J. ACCARIAS DE
StRIONNE, Les inicWts des nations de I'Europe, 1766, 11, p. 372.

6. P. CHALMETTA, op. cit., pp. 103 e 117.

7. F. Sebastidn MANRIQUE, Itinerario de las Missiones, 1649, p. 346.

8. Sobre tradesman e merchant, cf. D. DEFOE, op. cit., 1, pp. 1-3; sobre
mercatura e mercanzia, cf. COTRUGLI, op. cit., p. 15.

9. CONDILLAC, op. cit., p. 306.

10. Sobre os genoveses em Madri, cf. MMiterranje,

1, p. 462 e nota 4; sobre Charles Lion, cf. Paul

RS, in Revue du Nord, janeiro de -107; Peter MATHIAS, The First ion, an
Economic
History of Bri4, 1969, p. 18.
p. cit., p. 294.

386.
ERT, Louis XIV et vingt millions

966.
, "Das Genuesische Unternehrnerrika unter den Katolischen Kõni-buch für
Geschichte von Staat, d Gesellschaft Latem-amerikas, . 30-74.
B, Studies in the Development of ed., 1950, pp. 109 ss., 191 ss.
65, 75.
USCHAT, Gewürze, Zucker und istriellen Europa... citado por WilEmige
Bemerkungen zum Land, im spãtmittelalter, p. 25.
z a Simórt Ruiz, 26 de fevereiro de s Ruiz, Valladolid.

5ritannica, 1969, XIII, p. 524. )ES BRUSLONS, V, coluna 668. ivos


Centrais,
Alex. Baxter a Vo5, 1788.
,, The Great Ship from Amacon,

6.
IARDY, Idée du commerce, B.N.,

31O v'.
LI CARERI, op. cit., IV, p. 4. N, RD, op. cit., p. 113.
r MANDELSLO, op. cit., 11, p.
Dialogues sur le commerce des austo Nicolini, 1959, pp. 178-180

altasar Suarez, 24 de abril de 1591, Valladolid.


cit., 11, pp. 149 ss.
enores que se seguem, ver Chrismarchands écrivains à Florence,

7, pp. 383 ss.


'NBERG, Das Zeitalter der Fug. 273, n? 4.
KI, Histoire des chefs dentreprise, ss.
A leppo and Devonshire Square,
V. VON KLARWILL, The Fugrs, 1924-1926, 2 vols.
rALDO, citado por C. BEC, op.
P 18, carta de 18 de dezembro da CERTALDO, citado por C. p. 106.

115. A.E,, C.P., Inglaterra 532, f` 90-91, Beaumarchais a Vergennes,


Paris, 31

de agosto de 1779.

116. Bonvisi a S. Ruiz, citado por J. GENTIL DA SILVA, op. cit., p. 559.

117. Sobre esta crise prolongada, correspondência de Pomporme, A.N.,


A.E., W,
Holanda, 619 (1669).

118. James BOSWELL, The Life ofSamuel Johnson,

8' ed., 1816, 11, p. 450.

119. A expressão é do autor de uma brochura de 1846 que denunciava o


ministro das Obras Públicas, que havia adjudicado fraudulentamente as
estradas de ferro do Norte ao Banco Rotlischild, aceitando que fosse o
único proponente. Citado por Henry COSTON, Les financiers qui mènent le
monde, 1955, p. 65.

120. Ver supra, pp. 32 ss.


121. A.N., F 12, 681.

122. A.N., G 7, 1707, p. 148.

123. A.N., G 7, 1692, pp. 34-36.

124. Ibid., f1 68.

125. A.N., F 12, 662-670, l' de fevereiro de 1723.

126. AX, G 7, 1692, f 1 211 v' (1707 ou 1708). O vale do Biesme, em


Argonne.

127. A.N., F 12, 515, 17 de fevereiro de 1770.

128. A.N., G 7, 1685, p. 39.

129. A.N., F 12, 681, UI 48, 97, 98, 112, e A.N., G

7, 1706, n?, 237 e 238. Uma carta de 26 de dezembro de 1723 alude a


medidas governamentais de 1699 e 1716, anulando todos os negócios
fechados anteriormente a fim de impedir "essa espécie de açambarcamento"
em matéria de comércio de lãs.

130. A.N., F 12, 724, n' 1376.

13 1. J. SAVARY DES BRUSLONS, op. cit., IV, col.

406, peso respectivo das razières ou rasières,

280-29O libras contra 245.

132. A.N., G 7, 1678, fo, 41 e P 53, novembro e dezembro de 1712.

133. Jean 12ON (Pe. Mathias de Saint-Jean), Le commerce honorable, op.


cit., pp.

88-89.

134. John NICKOLLS (Plumard de Dangeul), Remarques sur les avantagens et


les désavantagens de la France et de la Grande-Bretagne, 1754, p. 252.

135. Henri PIRENNE, Histoire économique de VOccident medieval, 1951, p.


45, nota

3.

136. Joseph HõFFNER, Wirtschaftsethik und Monopole, 1941, p. 58, nota 2.

137. Hans HAUSHERR, Wirtschaftsgeschichte der Neuzeit, 1954, pp. 78-79.

138. UIrich de HOTTEN, Opera, ed. 1859-1862, 111, pp. 302 e 299, citado
por
HõFFNER, op. cit., p. 54.

139. Violet BARBOUR, op. cit., p. 75.

140. Ibid., p. 89. (Declaração de De Witt aos EstadosGerais em 1671. Este


trigo não é armazenado apenas em Amsterdam, mas em várias cidades da
Holanda.)

141. Samuel LAMBE, Seasonable Observations...

1658, pp. 9-10, citado por V. BARBOUR, op. cit., P. 90.

142. J. SAVARY, Le parfait negociant, op. cit., ed.

1712, 11, pp. 135-136.

143. A.N., A.E., 13% 619, Haia, 25 de setembro de 1670.

144. Ibid., 4 de julho de 1669.

145. Ibid., 26 de setembro de 1669.

146. J. SAVARY, op. cit., II, PP. 117-119.

147. A.N., G 7, 1686-99.

148. Marteng G. BUIST, op , cit., pp. 431 ss.

149. P. W. KLEIN, op. cit., pp. 3-15, 475 ss.

150. Jakob VAN KLAVEREN, Europdische Wirtschaftsgeschichte Spaniens, op.


cit., p. 3. Erstens ist es I& die Wirtschaft an sich von kemer Bedeutung,
ob das
Geld aus Silber, Gold oder Papier besteht."

15 1. Marcel MARION, Dictionnaire des institutions, p. 384, 2 coluna.


Louis
DERMIGNY, "La rancc a la fin de I'Ancien RÓgime, une carte monetaire", in
Annales E.S.C., 1955, p. 489.

152. MALESTROIT, "MÓmoires sur le faict des monnoyes..... 1567, in


Paradoxes inidits, ed. L. ElNAUDI, 1937, pp. 73 e 105.

153. F. C. SPOONER, L'economie mondiale et les froppes mon&aires en


France,

1493-1680, 1956, pp. 128 ss.

154. C. M. CIPOLLA, Studi di storia della moneta: i moviment dei cambi in


Italia dal sec. X111 al XV,
1948, e c.r. por R. DE ROOVER, in Annales,

1951, pp. 31-36.

155. Geminiano MONTANARL Trattato del valore delle monete, cap. 111, p.
7, citado por J. GENTIL DA SILVA, op. cit., p. 400.

156. C. M. CIPOLLA, Mouvements mon&aires de PEtat de Milan (1580-1700),


1952, pp. 13-18.

157. Marqus de ARGENSON, MÓmoirs et journal inódit., ed. 1857-1858, 11,


p. 56. Para refazer o cdlculo, o leitor deve lembrar que um soldo vale

12 dinheiros e que o liard representa 3 dinheiros. Logo, desvalorizaram


em 6

dinheiros uma moeda de 24 dinheiros, on seja, uma taxa de 2507o.

158. J. GENTIL DA SILVA, Banque et crMit en Italie an XVIT siacle, I, pp.


711716.

159. Giov. Domenico PERL 11 negoziante, ed. 1666, p. 32.

160. F. RUIZ MARTIN, Lettres marchandes de Florence, op. cit., p.


XXXVIII.

161. R. GASCON, op. cit., 1, p. 251.

162. J. GENTIL DA SILVA, op. cit., p. 165.

163. Jean EON, op. cit., p. 104.

164. Isaac de PINTO, op. cit., pp. 90-91, nota 23.

165. 1tats et tableaux concernant lesfinances de France depuis


17.58jusqu'en

1787, 1788, p. 225.

166. J. BOUVIER, P. FURET e M. GILLET, Le mouvement du profit en France


an
XIXsicle, 1965, p. 269.

167. M. G. BUIST, op. cit., pp. 520-525 e nota p. 525.

168. Louis DERMIGNY, Cargaisons indiennes. Solier et Cv, 1781-1793, 1960,


11, p.

144.

169. Giorgio DORlA, in Melanges Borlandi, 1977, pp.


377 ss.

170. F. RUIZ MARTiN, Elsiglodelosgenoveses, no prelo.

171. 1. MEYER, LArmement nantais, op. cit., pp.

22O ss.

172. Ibid., p. 219.

173. Jacob M. PRICE, France and the Chesapeake,

1973, 1, pp. 288-289. Estes cd1culos foram-me transmitidos por J.-J.


116mardinquer.

174. A.N., 94 AQ 1, F 28.

175. L. DERMIGNY, Cargaisons indiennes, op. cit., pp. 141-143.

176. J. MEYER, op. cit., pp. 290-291.

177. M. BOGUCKA, Handel zagraniczny Gdanske...

1970, p. 137.

178. A. N., Colónias, F 2 A tó.

179. Thomas MUN, A Discourse of Trade from England into the East Indies,
Londres, 1621, p. 55, citado por P. DOCKES, op. cit., p. 125.

180. HACKLUYT (1885), pp. 70-71, citado por J.-C. VAN LEUR, op. cit., p.
67.

18 1. Jean GEORGELIN, Venise an sicle des Lumieres (1669-1797), p. 436 do


texto datilografado.

182. Ibid., p. 435.

183. Veja-se o modo como os capitais libertados pelo abandono de grandes


indóstrias em Caen sdo reinvestidos em outros lugares. J.-C. PERROT, op.
cit.,

1, pp. 381 ss.

184. Stephan MARGLIN, in Le Nouvel Observateur,

9 de junho de 1975, p. 37.

185. J. KULISCHER, op. cit., trad. ital., 1, p. 444.

186. Cf. infra, 111, cap. 2.


187. J. KULISCHER, op. cit., 1, p. 446.

188. J. GFNTIL DA SILVA, op. cit., p. 148.

189. Jean MAILLEFER, op. cit., p. 64.

190. C. BAUER, op. cit., p. 26.

19 1. F. MELIS, Tracce di una storia economica... op. cit., p. 29.

192. A.-E. SAYOUS, "Dans l'Italie, a l'intórieur des teses: Sienne de


1221 a

1229", in A nnales, 193 1, pp. 189-206.

193. Hermann AUBIN, Wolfgang ZORN, Handbuch... op. cit., p. 351.

194. J. KULISCHER, op. cit., ed. alemd, 1, pp.

294-295.

195. A. SCHULTE, Geschichte der grossen Ravensburger Handelsgesellschaft,


13801530, 1923, 3 vols.

196. H. HAUSHERR, op. cit., p. 29.

197. Franoise BAYARD, "Les Bonvisi marchands banquiers Lyon, 1575-1629",


in A imales E. S.C., nov.-dez. 1971, p. 1.235.

198. Jean MEYER, L'armement nantais... op. cit., p. 105, nota 8.

199. Ibid., p. 112, nota 2.

200. Ibid., pp. 107-115.

201. F. MELIS, Tracce di una storia economica, op. cit., pp. 50-51.

202. Jean MEYER, Varmement nantais... I op. cit., p. 107 e nota 6.

203. Arquivos da Cidade de Paris (A.V.P.), 3 B 6, 21.

204. J.-P. RICARD, op. cit., p. 368.

563

a 8, citado por Ch. CARREERE,

886.
e parfait nigociant, ed. 1712, se:). 15 ss.
E, "Deutsche Stddte am Ausgang ", in Die Stadt am A usgang des

74, tiragem especial, pp. 8 ss. le Toulouse é admiravelmente exmain


SICARD, Aux origines des nes: les moulins de Toulouse au

153.
iota 26.
HER, op. cit., pp. 316, 385 e

66.
A, f's 19 v1-2O v'.
MELON, Essai politique sur le

4, pp. 77-78.
L'armement nantais..., op. cit.,
L'armement nantais... op. cit., 'E, op. cit., 11, pp. 879 ss.
cit., 1, p. 215.
se nao aparece. Citado por LITise", p. 1.438, em FENELON, Tj1699,
casional reflexdo de Isaac de PIN). 335.
'TTI, Greffuthe, Montz et C'.,

16; cf. J. EVERAERT, op. cit., p. alemds em Cddiz por volta de 170O
aerosas.
, The London Merchant, with the y of George Barnwell, 173 1, p. 27. r,
op. cit.,
II, p. 580.
Z DIAS, O capitalismo mondrqui1415-1549), Sdo Paulo, 1957, tese Ito.
INDEN, Les origines de la civiliue, 1966, pp. 11-12 e 164. GNY, La
Chine*et
POccident, le 'anton... op. cit., 1, p. 86.

1', 760, Londres, julho de 1713. 'ON, England's Apprenticeship, ed.,


1967, pp.

172-173.
peito, a explicação (que remete a iografia) de Eirgen WIEGANDF,
Adventurers'
Company auf dem Zeit der Tudors und Stuarts, 1972. CHER, op. cit., p.
310.
- 304.

233. M. M. POSTAN, Medieval Trade and Finance,

1973, pp. 302-304.

234. F. LOTGE, op. cit., p. 342.

235. Segundo as explicaç6es de J. U. NEF, de K. W. TAYLOR, de L


WALLERSTEIN e de
Th. K. RABB, Enterprise and Empire, 1967, pp. 19 ss.,

26 ss.

236. Para a Companhia do Norte, cf. A.N. G 7, 1685,

1; para a Companhia das Indias Ocidentais, cf. A.E., M. e D., 16.


237. Etudes d'histoire contemporaine, 1971, p. 33.

238. S. POLLARD e D. W. CROSSLEY, op. cit., pp.

150-151.

239. Ibid., pp. 143, 146, 147, 163.

240. P. JEANNIN, LEurope du Nord-Ouest et du Nord aux XVIT et XVIIF


sikles,

1969, p. 192.

241. S. POLLARD e D. W. CROSSLEY, op. cit., p.

149.

242. Carta de Pontchartrin a Tallard (6 de agosto de

1698), cf. A.E., CP. Ing., 208, f' 115: carta de Tallard a Pontchartrin
(21 de agosto de 1698), cf. A.N., A.E., B', 759.

243. Op. cit., ed. francesa, p. 172.

244. Charles BOXER, The Dutch Seaborne Empire,

1600-1800, 1965, p. 43.

245. Maurice DOBB, Studies in the Development of Capitalism, 4 ed., 1950,


p.

191, nota 1.

246. A.N., G 7, f' 85.

247. A.N., Marinha, B 7, 230, citado por Charles FROSTIN, "Les


Pontchartrin et la pónótration commerciale franqaise em Amórique
espagnole (1690-1715)", in
Revue Historique, 1971, p. 311, nota 2.

248. A.N., K 1349, V 14 v' e f' 15.

249. Paul KAEPPELIN, La Compagnie des Indes orientales et FranCois


Martin, 1908, pp. 135-136.

250. Ibid., p. 593.

251. A.N., G 7, 1699.

252. Charles MONTAGNE, Histoire de la Compagme des Indes, 1899, pp. 223-
224.
253. M. LtVY-LEBOYER, op. cit., p. 417, nota 2.

254. A civilizaCdo material, I, pp. 10-11 e 437.

255. Walter ACHILLES, "Getreidepreise und Getreidehandelsbeziehungen


europdischen Raum in XVI und XVIL Jahr. ", in Zeitschrift flir
Agrargeschichte,

59, pp. 32-55.

256. E. MASCHKE, art. cit., p. 18.

257. J.-P. RICARD, Le negoce dAmsterdam, 1722, p. 59.

258. Schriften, 1800, 1, p. 264, citado por W. SOMBART, 2, p. 500.

259. E. ZOLA, L'argent, ed. Fasquelle, 1960, p. 166, citado por P.


MIQUEL,
L'argent, 1971, pp.

141-142.

260. GALIANI, op. cit., pp. 162-168, 178-180, 152.

Capftulo 5

1. Citado por Louis DUMONT, Homos hierarchicus, 1966, p. 18.

2. Reporto-me a uma conversa de novembro de

1937.

3. Emile DURKHEIM (185 8-1917) segue a linha de Auguste COMTE, defende a


tese Da divisdo do
- trabalho social, em 1893, e funda L'annie socio logique, em 1896. Foi
esta

61tima data que escolhemos.

4. In Revue de Synthse, 1900, p. 4.

5. A despeito de ensaios antigos como os de Alfred WEBER,


Kulturgeschichte als
Kultursoziologie,

1935, ou de Alfred von MARTIN, Soziologie der Renaissance... 1932; on,


mais recentemente, a poderosa sintese de Alexander RUSTOW, Ortsbestimmung
der
Gegenwart, 3 vols., 1950-1957.

6. Op. cit., p. 9.
7. Josef SCHUMPETER, op. cit., 1, p. 23.

8. NOVALIS, EncyclopMie, 1966, p. 43 ,

9. Observaç6es andlogas em Renó CLEMENS, Raymond ARON, Wilhelm RORKE,


Jacques
ATTALI, Joseph KLATZMANN, Marcel MAUSS.

10. English Social History, 1943; trad. esp., 1946.

11. Numerosas opimóes contrdrias. Como Edward J. NELL, "Economic


Relationship in the Decline of Feudalism: an Economic Interdependence",
in History and Theory,

1957, p. 328: "considerar mais as relagóes entre as varidveis do que as


próprias varidveis". Para Evans PRITCHARD, a estrutura social reduz-se is
inter-relagóes dos grupos, segundo Siegfried Frederik NADEL, La thiorie
de la structure sociale, 1970, p. 30.

12. 1. WALLERSTEIN, op. cit., p. 157.

13. Jack H. HEXTER, Reappraisals in History, 1963, p. 72.

14. Vat-Wis, III, p. 312, Advis de Guillaume Hotteux s Halles.

15. L'idóal historique, 1976.

16. Karl BOSL, "Kasten, Stdnde, Klassen in mittelalterlichen


Deutschland", in
ZBLG 32, 1969. Impossível empregar a palavra em sentido restrito.

17. A propósito das castas na índia, ver o artigo de Claude MEILLASSOUX,


"Y a-til des castes aux Indes?", inCahiersinternationauxdesociologie,

1973, pp. 5-29.

18. La vocation actuelle de la sociologie, 1963, 1, pp.

365 ss.

19. Pour la sociologie, 1974, p. 57.

20. PREVOST, op. cit., t. 1, p. 8.

21. VAN RECHTEREN, Voyages, 1628-1632, V, p. 69.

22. A.N., K 910, 27 bis.

23. Para Arthur Boyd HIBBERT, in Past and Present, 1953, n' 3, e ClauUe
CAHEN, in La Pensée, julho de 1956, pp. 95-96, o feudalismo não é a
negação do comércio. Ponto de vista ortodoxo: Charles PARAIN e Pierre
VILAR, "Mode de production féodal et classes sociales ensystóme
prócapitaliste", 1968, Les cahiers du Centre dEtudes et Recherches
marxistes, n?

59.

24. Data, se tanto, da Restauração, não está ainda em La nóologie, de L.-


S.
MERCIER, 1801; em N. LANDAIS, Dictionnaire ginYal et grammatical, 1934,
11, p.

26.

25. Armando SAPORI e Gino LUZZATTO.

26. Georges GURVITCH, Diterminismes sociaux et libert humaine, 2 ed.,


1963, pp.

261 ss.

27. Marc BLOCH, La societefiodale, 2 vols., 1939,

1940.

28. Jacques HEERS, Le clan familial au Moyen Age,

1974.

29. A. THIERS, De la propriite, 1848, p. 93.

30. Jean-Franois MELON, op. cit., p. 126.

31. Charles W. MILLS, The Power Elite, 1959.

32. Delle lettere di Messer Claudio Tolomei, Veneza, 1547, f" 144 v'-145.
Esta passagem foi-me assinalada per Sergio BERTELLI.

33. Frederic C. LANE, Venice, a Maritime Republic,

1973, p. 324. Ver tambóm K. J. BELOCH, Bev(511kerungsgeschichte Italiens,


t.

111, 1961, pp.

21-22.

34. F. C. LANE, op. cit., pp. 429-430.

35. SAINTOLON, Relazione della Republica di Genova, 1684, Veneza,


Marciana,

6045, c. 11-8.

36. Gerald STRAUSS, "Protestant Dogma and City


Government. The Case of Nuremberg", in Past and Present, n' 36, 1967, pp.
38-58.

37. C.A.B.F. de BAERT-DUHOLAND, Tableau de la Grande-Bretagne, ano VIII,


IV, p.

7.

38. C. R. BOXER, The Dutch Seaborne Empire,

1600-1800, 1965, p. 11.

39. R. GASCON, op. cit., 1, p. 107.

40. G. D. RAMSAY, The City of London, 1975, p. 12.

41. E. W. DAHLGREN, Les relations commerciales et maritimes entre la


France et les cótes du Pacifique, 1, 1909, pp. 36-37, nota 2.

42. Franqois DORNIC, op. cit., p. 178.

43. Jacques TENEUR, "Les commerants dunkerquois à Ia fin du XVIIII siècle


et les problèmes écortorniques de leur temps", in Revue du Nord,

1966, p. 21.

44. Citado por Ch. CARRIP-RE, op. cit., 1, pp.

215-216.

45. Ibid., p. 265.

46. Referencia perdida.

47. Emilio NASALLI ROCCA, " Il patriziato piacentino nell'etd del


principato.
Considerazioni di storia giuridica, sociale e statistica", in Studi in
onore di
Cesare Manaresi, 1952, pp. 227-257.

48. J. M. ROBERTS, in The European Nobility in the Eighteenth Century,


ed. por
A. GOODWIN,

1953, p. 67.

49. 1. GENTIL DA SILVA, op. cit., pp. 369-370, nota 92.

50. Phyllis DEANE e W. A. COLE, British Economic Growth, 2' ed., 1967,
pp. 2

ss.; S. POLLARD
565

ZOSSLEY, op. cit., pp. 153 ss.


RD e D. W. CROSSLEY, op. cit., .REAUX, La socijt anglaise de 1760

6, p. 8.
BERT, LAncien RÓgime, 1969, 1, pp.
in Histoire iconomique et sociale de

1, 1970, p. 607; Jean MEYER, La nowne au XV111' sicle, P. 56.


ZACZEK, "Permóabilité des barridans la Pologne du XVI' siMe", in iae
Historica,

1971, 24, pp. 3O e 39. RSON, "Decline of the Moghol Eme Journal of Asian
Studies, fevereip. 223: 8 mil privilegiados num Ima 7O milh6es de homens.
- - "
The 8. 00O he empire."
P. VIII.
Julien FREUND, op. cit., p. 25. TONE, "The Anatomy of the Eliza;tocracy",
in The
Economic History

48, pp. 37-41.


NBENZ, Der Merkantilismus in Eu, e soziale Mobilitãt, 1965, pp. 49-50.
-ETT, op.
cit., p. 44.
j'BERT, L`Ancien Régime, op. cit., 1, ler deutschen Wirtschafts-und
Sozialop. cit., p. 371.
za, La civilt( veneziana nell'eta bart., p. 307, fevereiro de 1685; La
civila del Settecento, pp. 244 e 274.

14. jeat, cf. New Encyclopedia BritanniVI, p. 319; sobre Wollaton Hall,
ibid sobre Burghley House, cf. J. AlfQ rchitecture of the Renaissance in
En)4, pp. 13; sobre Holdenby, cf. Henry etails of Elizabethan
Architecture, '-ETT, op. cit., p. 166.
'REVOR-ROPER. "The General Criventeenth Century", in Past and Pre:nov.
1959), pp. 31-64, e discussdo des)r E. H. KOSSMANN, E. J. HOBSH. HEXTER,
R. MOUSNIER,
J. H. L. STONE e resposta de H. R.
OPER, in Past and Present, n? 18, pp. 8-42. O livro geral de Lawrence es
causes de la Rivolution anglaise, )74; J. H. HEXTER, Reappraisals in

63, pp. 117 ss.


iIEU e J. C. PASSERON, La repro'iments pour une thiorie du systme nent,
1970.
de la Savoie, p.p. GUICHONNET, 0.
LTRAMI, Storia della popolazione di

54, pp. 71, 72, 78. As proporaes, rcao conjunto da populaAo, sdo, para
1581, 4, 5% de nobres e 5, 30/o de cittadini, e, para 1586, de 4, 30/o e
5,

107o, respectivamente.
72. Werner SHULTHEISS, "Die Mittelschicht Niimbergs im Sp5tmittelalter",
in
Stddtische Mittelschichten, p.p. E. MASCHKE e J. SYDOW, nov. de 1969.

73. "Marchands capitalistes et classes sociales", datilografado, p. 9; em


LÓbeck, no século XVI, os Fernhdndler sdo 5O on 6O casas para uma cidade
de 25

mil habitantes.

74. Verfassungs-und Wirtschaftsgeschichte des Mittelalters, 1928, p. 329.

15. Th. K. RABB, Enterprise and Empire, 1967, pp.

26 ss.

76. Segundo Andi-6 PIETTRE, Les trois dges de V&onomie, 1955, p. 182,
citado por
Michel LUTFALLA, Litat stationnaire, 1964, p. 98.

77. G. CHAUSSINAND-NOGARET, "Aux origines de la RÓvolution: noblesse et


bourgeoisie", in A nnales E.S.C., 1975, pp. 265-277.

78. [Borgonhaj: Henri DROUOT, Mayenne et la Bourgogne, itude sur la Ligue


(15871596), 1937,

1, pp. 45, 51; [Roma]: Jean DELUMEAU, op. cit., 1, p. 458: "Quando inicia
o século XVIL os grandes senhores de outrora [nos campos romanos],
esmagados pelas suas dívidas, liquidam seus bens imóveis e desaparecem
perante uma aristocracia nova e dócil, sem passado guerreiro."

79. B. N., F. Esp., 127, por volta de 1610.

80. Beauvais et le Beauvaisis... p. 219; F. BRAUDEL, in Annales E.S.C.,


1963, p. 774.

8 1. Raymond CARR, "Spain", in The European Nobility in the Eighteenth


Century, op. cit., p. 44.

82. Henri PIRENNE, Les piriodes de Phistoire sociale du capitalisme,


Bruxelas,

1922.

83. H. KELLENBENZ, texto datilografado, op. cit., p. 17.

84. Claude CARRERE, op. cit., 1, p. 146.

85. Friedrich LUTGE, op. cit., p. 312.

86. J. H. HEXTER, op. cit., pp. 76 ss.


87. G. TAYLOR, "Non capitalist Wealth and the Origins of the French
Revolution", in American Historical Review, 1967, p. 485.

88. Pierre DARDEL, op. cit., pp. 154-155.

89. ACCARIAS DE SERIONNE, La richesse de la Hollande, op. cit., 11, p.


31.

90. F. DORNIC, op. cit., p. 161.

9 1. R. DE ROOVER, The Medici Bank, 1948, p. 20, nota 50.

92. Guy CHAUSSINAND-NOGARET, Les financiers du Languedoc au XV111' sicle,


1970.

93, Paolo NORSA, "Una famiglia di banchieri, la famiglia Norsa (1350-


1950)", in
Bolletino dellArchivio, storico del banco di Napoli, 1953.

94. Andró RAYMOND, Artisans et commerCants au Caire au XVIII' si&cle,


1973, 11, pp. 379-380.

95. Tftulo primitivo do livro que utilizei datilografado, editado em 1977


com o titulo Les bourgeois-gentilshommes.

96. Guy PATIN, op. cit., 11, p. 196.

97, Romain BARON, "La bourgeoisie de Varzy au XVIP siècle", in Annales de


la
Bourgogne, 1964, p. 173.

98. M. COUTURIER, op. cit., pp. 215-216. Pot exemplo, nos curtumes
distingue-se o "mestre curtidor" e os "mercadores de curtumes", chamando-
se a estes últimos, 'respeitáveis".

99. C. LOYSEAU, Cinq livres du Droict des Offices,

1613, p. 100.

100. Op. cit., pp. 43-44.

101. G. HUPPERT, op. cit., datilografado.

102. Op. cit., pp. 128-129.

103. Publicado por L. Raymond LEFEBVRE, 1943, pp. 131-133.

104. Joseph NOUAILLAC, Villeroi, secrétaire du roi,

1909, p. 33105. Seu astrólogo, Primi Visconti, segundo Henry MERCIER, Une
vie d'ambassadeur du Roi-Soleil,
1939, p. 22.

106. G. HUPPERT, L'idêe de Phistoire parfaite, 1970.

107. R. MANDROU, La France aux XVIr et XVIII' siècles, 1970, p. 130.

108. No Cayerprésentéau royparceuxdu tiersestat de Dauphiné, Grenoble, 1


ed.,

1603, citado por David BITTON, The French Nóbility in Crisis 1560-1644,
1969, pp. 96 e 148, nota 26.

109. Citado por BANCAL, Protulhon, 1, p. 85, n? 513.

110. AX, G 7, 1686, 156.

111. SAINT-CYR, Le tableau du siècle, 1759, p. 132, citado por Norbert


ÉLIAS, La
Société de Cour,

1974, p. 11.

112. Manuel FERNANDEZ ALVAREZ, Economia, sociedad y corona, 1963, p. 384.

113. Variétés, V, 235 [17101.

114. Ver infra, t. III, cap. 3.

115. Witold KULA, "On the Typology of Economic Systems", in The Social
Sciences,
Problems and Orientations, 1968, p. 115.

116. Torrimaso CAMPANELLA, Monarchia di Spagna, in Opere, 1854, 1, p.


148, citado por Carlo de FREDE, in Studi in onore di Amintore Fanfani, V,
pp. 5-6 e

32-33.

117. Giuseppe GALASSO, op. cit., p. 242.

118. FÉNELON, Dialogues des morts, 11, 1718, p. 152.

119. R. PERNOUI), Histoire de la bourgeoi .si.e en France, 11, 1962, p.


10.

120. Paolo CARPEGGIANI, Mantova, profilo di una città, 1976, appendice:


Sabbioneta, pp. 127 ss. A palavra casino (p. 139) designa a vila privada
do príncipe e seu jardim.

121. Para o parágrafo que se segue, cf. A.d.S. Veneza, a título de


exemplos:
Senato Terra, 24, 9 de janeiro de 1557; 32, Pádua, 9 de janeiro de 1562;
P.
MOLMENTI, op. cit., 11, p. 111.

122. Jürgen KUCZINSKI, op. cit., p. 71.

123. Arquivos VORONTOF, VIII, p. 34, 18-29 dez.

1796.

124. André PARREAUX, La société anglaise de 176O à 1810, 1966, p. 12.


Abingden, na margem do Tâmisa, no BerksItire.

125. Entre 1575 e 1630, cerca de metade dos peers investiu no comércio,
ou seja, um em cada dois, ao passo que, se considerarmos o conjunto da
nobreza e da gentry, a proporção será de um para cinqiienta. Th. K.
RABB, Enterprise and Empire, 1967, nota 16 e p. 27.

126. R. GASCON, op. cit., 1, p. 444.

127. Intervenção de Pierre VILAR, Congresso Internacional das Ciências


Históricas, Roma, 1955.

128. P. MOLMENTI, op. cit., 11, p. 75.

129. Jerónimo de ALCALÁ, El donador hablador,

1624, in La Novela picaresca espaflola, 1966, p,

1.233.

130. Para os exemplos que se seguem: Y.-M. BERCE, op. cit., 11, p. 681

[Aquitânial; E. MASCI-1KE, art. cit., p. 21 [cidades alemãs]; René FÉDOU,


"Le cycle médiéval des révoltes lyonnaises", in Cahiers d'histoire, 3,
1973, p. 24O [Lyon].

13 1. Les soulèvements populaires en France de 1623 à 1648, 1963.

132. Carlo de FIDE, in Mélanges Fanfani, V, 1962, pp. 1-42.

133. Ingomar BOG, in Z. für Agrargeschichte, 1970, pp. 185-196.

134. Variétés, VII, p. 330, 7 de junho de 1624.

135. Y.-M. BERCÉ, op. cit., p. 300.

136. B.N., Fr. 21773, f' 31.

137. Henri GACHET, "Conditions de vie des ouvriers papetiers en France au


XVIll' siècle", Communication à l'InstitutJrançais d'histoire sociale, 12
de junho de
1954.

138. Todo o parágrafo seguinte segundo Naffialie ZEMON DAVIS: "Strikes


and
Salvation at Lyons", inArchivfürReformationgeschichte, LVI (1965), pp.
48-64, e
Henri HAUSER, Ouvriers du temps passé, 1927.

139. H. HAUSER, op. cit., p. 18O e nota 1.

140. Ibid., pp. 203 e 234, nota 1, e A. FIRMINDIDOT, Aldo Manuce et


VhélIenisme à Venise,

1875, p. 269.

141. N. W. POSTHUMUS, De Geschiedenis van de Leidsche lakenindustrie, 3


vols.,

1908-1939; Érnile COORNAERT, "Une capitale de Ia laine: Leyde", in


Annales
E.S.C., 1946.

142. AX, A.E., BI, 619, 8 e 29 de outubro de 1665.

143. Para os três parágrafos seguintes, cf. POSTHUMUS, op. cit., 111, pp.
721729; 656-657, 674;

691-696; 869 ss; 722-724; 876-878144. Paul MANTOUX, La Révolution


industrielle au XVIjf siècle, 1959, pp. 57-59.
Carlos GUILHERME MOTA, "Conflitos entre capital e trabalho: anotações
acerca de uma agitação no Sudoeste inglês, em 1738", in Revista de
História, São Paulo,

1967, suscitou-me o desejo de destacar o episódio relatado adiante.

145. Peter LASLETT, Un monde que nous avonsperdu, 1969, pp. 172- 173; A.
VIERKANI), Die Stetigkeit im Kulturwandel, 1908, p. 103: "Quanto menos
desenvolvido for o homem mais sujeito estará a sofrer esta influência do
odeIo da tradição e da sugestão." Citado por W. SOMBART,

567

27. Mas quem explicará a vio- 162. ientos populares na Rússia?


:zRT, Les corporations en France 163. ed., 1941, p. 167.

9. in Studi storici, 1968, p. 5 3 8; JéFhc Condition of the European Eve


of
Eríiancipation", in J. of

1974.
La Révolution industrielle en e, 1970, P. 19- 164. ires... op. cit., 111,
p. 107. Ou a intes àa mendicidade pública", 165.
129. Na Espanha, os hampones, kEN, op. cit., P. 187, nota 36; na, Aurelio
LEPRE, op. cit., p. 27.

1636, Civiltà veneziana, op. cit., 166. cit., 1875, 1, p. 215167.

7 1709.
)grafada da Sra. BURIEZ, L'as? au XVIII' siècle, Faculdade de, ON
"Economie et pauvreté aux siècies: Lyon, ville exemplaire et in Études
sur Phistoire de Ia paup. M. MOLLAT, 11, 1974, pp. 747, -srno sentido,
uma observação de NG, art.
cit., p. 27.
, op. cit., pp. 54-55. p. cit., p. 382.
rmações que me foram fornecidas p(r)r M. KIJUCYKOWSKY e M. ;ra. BURIEZ,
op. cit.
Em Cahors, 0O pobres para 1O mil habitantes, RIM, estudo inédito,
Toulouse, da). 53; nas
Causses, em Chanac, 6O ra 338 contribuintes de talha, Paul Uéconomie des
Causses du GévauI' siècle", in Congresso de Mende, em La Rochelle, em
1776, 3.668 para

3, ntes, LAVEAU, op. cit., p. 72; os im sexto da população em Avallon


DURAND, op. cit., p. 42; sobre os, os "sem haveres", de Augsburgo,
BECHTEL, op, cit.,

11, p. 52, nota e geral, Olweri HUFION, "Towards nding of the Poor of
Eighteenth
Cen', in French Government and Society, ).p. J. F. BOSMER, 1975, pp. 145
ss.
referências para 1749, 1759, 1771, , rquivos departamentais da Alta Sa,
P1 2938; C 135, H.S.; C 142, 194,

5, f' 81 v'; IC 111, 51, P, 4O a 47. s existem, são superabundantes, M.


ER, op.
cit., Châteaudun, 1697; Abel

8: "constituindo os, AU, op. cit., p. 60

camada inferior de toda a população


VAUBAN, Projet d'une Wme royale, ed. Daire,

1843, p. 34.
Yves DURAND, in Cahiers de doléances des paroisses du bailliage de Troyes
pour les Étáts généraux de 1614, 1966, pp. 39-40. Não se deve perder de
vista a distinção pobres-mendigos e pobresdesempregados. Jakob van
KLAVEREN, "Población y ocupación", in Económica, 1954, n? 2, assinala com
razão que MaltIms fala de pobres, não de desempregados.
Nas cidades da Alemanha em 1384, 1400, 1442,

1446, 1447.
E. COYECQUE, "L'assistance publique à Paris au milieu du XVY siècle", in
Bulletin de Ia société de Phistoire de Paris et de l'!1e-de-France,

1888, p 117.
Ibid., pp. 129-230, 28 de janeiro de 1526: 50O pobres de Paris enviados
para as galés.
Variétés, VII, p. 42, nota 3 (1605). Envio para o Canadá de "vagabundos"
irlandeses que se encontram em Paris. Vagabundos de Sevilha mandados para
o estreito de Magalhães. A.d.S Veneza, Senato Spagna Zane ao Doge. Madri,
3O de outubro de 1581.
d Protector Somer168. C. S. L. DAVIES, "Slavery an set; the Vagrancy Act
of 1547", in Economic History Review, 1966, pp. 533-549.

169. Ogier Ghislain de BUSBECQ, Ambassades et voyages en Turquie et A


masie,

1748, p. 25 1.

170. Cf. Ol~ H. HUFTON, The Poor of the 18th Century France, 1974, pp.
139-159.

171. A., A.E., B1 521, 19 de abril de 1710. Cf. AI) XI, 37 (1662), ao
redor de
Blois poucos são os caminhos que não estão cobertos de cadáveres".

172. A.d.S. Veneza, Senato Terra 1 [Venezal; DELAMARE, op. cit., 1710, p.
Ló12

[Paris]. Três mil pobres diante de Chambéry, François VERMALE, Les


classes rurales en Savoie au XVIIle siècle, 1911, p. 283.

173. Suzanne CHANTAL, La vie quotidienne au Portugal après le tremblement


de terre de Lisbonne de 1755, 1962, p. 16. Muitas indicações na
correspondência do cônsul russo em Lisboa, especialmente Moscou, A.G.A.
72/5 , 260, 54 v',
Lisboa,

3O de maio de 1780.

174. C. MANCERON, op. cit., 1, pp. 298-299, segundo P. GROSCLAUDE,


Malesherbes, p. 346.

175. L-P. GUTTON, La société et les pauvres.


L'exemple de Ia généralité de Lyon, 1970, pp.

162 ss.

176. L-P. GUTTON, "Les mendiams dans Ia société parisienne au début du


XVIlY siècle", in Cahiers dHistoire, XIII, 2, 1968, p. 137.

177. Variétés, V, p. 272.

178. Ambos os centros - consulados franceses de Rotterdam e de Gênova -


de recuperação de marinheiros "degradados", mandados para terra, oferecem
abundante correspondência, especialmente: AX, A.E., W, 971-973
(Rotterdara) e A.E. W, 53O e seguintes para Gênova. Homens mise ráveis,
descalços, sem camisa andrajosos, no Xí_ meio dos quais, na esperança &
encontrar au érie lio ou de serem repatriados, se imiscui uma s de
aventureiros de Ilandarilhos% B1, 971, fo 45,

1 muitos estavam

31 de dezembr de 1757; _los lavar-se cobertos de bichos, foi preciso


mandá e pôr-lhes os trapos no fogo"... V p. 222179. Variétés, eri, 796.

180. A.d.S. Napoles, Affari Est

181. Ibid- 1E, Voyage à Saint182. Conde de LA MESSELIER petersbourg, an


XI-1803, pp. 262-263.

183 A.N., Marinha, W, 48 f' 113.. ns da classe As orige francês,

184. Nina ASSODOROBRA.1

operária (em polonês), 1966; resumo em pp- 321-325. p. cit., 1, p. 423,


nota. PERROT, o

185 .Citado por 3

232. doc

186. Robert MOLIS , I 'De Ia rnendicité en Langue (1775-1783)", in Revue


d'hist. écon. et sociale,

1974, p. 483.

187. 1. MAILLEFER, Mérnoires pp. 12O e 122.

188. Gaston ZELLER, Aspects je Ia politique frantis PAncien Régime, 1964,


pp.

375-385.
çaise so 1 pp. 425, 438, 512, etc.

189. Médit..
MANCERON, oP. cit., LINffi, citado por

190. De

1, p. 169: "No exército, dar-se bem menos valor pora ipador do que a um
cavalo de carg a um s, que o cavalo de carga é muito caro e o soldado.."
Seria melhor quantificar do não custa nada. z uma que descrever, mas
faltam números. Talve gundo uma notícia de ordem de grandeza: se e agosto
de 1783, os efeFrankfürtam-Main, 9 d, elevar-se-iam a dois mida tica, se
- -- 1 1 XVIII antes do século Xviii e durante o secu o migrações
compensatórias de pobres?

198. op. cit., p. 58. Declarações análogas, e muitO ulail tardias na pena
de
BAUDRY DES LoZIÈRES, é à ia Louisiane, 1802, pp. 103 ss.
Voyage it., P. 119.
199. P. DECHARME, op. p. 40.

200. Literatura europea y Edad Media, 1955, 1tus de

201. A.d.S Mântua, Archivio Gonzaga, Dona


B. 1438. ao marquês de Mântua
Bretis

202. Le savant et le politique, 1963, p. 101

203. Gazette de France, p. 599204. Max WEBER, Economia e società, 2, p.


991.

184 e 196.

205. Diarii, OP. cit- 1, PP- ane, 42.

206. British Museuni, Mss- SI()


. cit., P. 111.

207- Élie BRACKENHOFFER, OP cit., III, p. 278.

208. Louis-Sébastieri MERCIER, OP

209- Ibid., III, p. 279.

210. Diarii OP. cit., I, P- 111* -1598), ed. crí211. Livre e main des Du
Pouget (1522 use, 1964, tica por M. i. PRIM, D.E.S.,
Toulo datilografado.
ajante anônimo, 1728, Victoria and Albert Mu212. Vi seum 86 NN2, f's 196
ss Biblio213. Segundo a cópia conservada no F. Fr. da teca Lenin, em
MOscOu f0.s 5 e 54.
reiro de 1772, p. 327.

214. Gazette de France, 29 de feve ociété en ND, pouvoir et s

215. Françoise AUTRA 2.


France, XI1, _XV siècles, 1974, p. 1 1 sociale in Histoire économique e

216. R. GASCON, SSE, ed. de Ia France, BRAUDEL-LABROU de SEYSSEL,


Histoire sin1976, 1, p. 424; Clau XII, 1558, P. 14.
gulière du roy Loys Sir Horatio Palia217. L. STONE, An Elizabethan:

42.

1956, i p. tivos militares


Europ2 pouco mais de 1, 301o vlcino, lhões de homens, isto é, um 218. A
expressão é de Marx.
p. 206. da população, supondo que a Europa contasse cri- ire économique,
1965

o milhões de habitantes. Gazette de Fran- 219. 3 ean IMBERT, Histo,


torique des

15 220- Ibid., p. 207, e LE BLANC, Traité his

175-176.
tão ce, p. 3071, p. 400191. R. GASCON, OP- Cit- yen, 1754, p. Journal du
Cit monnoyes de France, 1692, PPL de

192. JÈZE
Paris, do Parlamento

193. Extraído dos Registros f O 427 Sentença de 14 de agosanos 1750-1751,


Pizel. to de 1751 condenando o criado Pierre nce, p.

194. Marius MITTRE, Les domestiques en Fra

14. Variétés, V, p. 253 em nota: referência ao Traité de Ia police,


título 9, capítulo 3. louet,

195. Pierre_Victor MALOUET, Mémoires de Ma

1874, t. 1, pp. 48-49.

196. Claude VEIL, "Phenornénologie du travail", in olution psychiatrique,


no 4,

1957, p. 701. L'6 i não é es"Mesmo ligado à máquina, o homerr da máquina.


Nunca é escravo senao de ou>is'de France de Ia troisième

221. Ordonnances des r( -e 1723, 1. 1, p. 371 (instrurace, ed. de


Lauriei, ções sobre o decreto relativo à subvenção por cau sa da guerra
de Flandres,

1302).
ôt, 1971, 1,

222. Gabriel ARDANT, Histoire de MMP p. 238.

223. C. BEC, op. cit., p. 62.

224. G. LUZZATTO, Storia economica di Venezia, op. cit., p. 208. [ the


National Debt in Wes225. --Origin and Growth o: . Review, D' tem EuroPc",
!ri American
Economic

2 maio de 1947, p. 118, NNE OP. cit- P século XIII H. PIRE esde e;préstin
- to da o

226.. eiro grande onto de vista, e mutatis mu~ 35 nota 2. O Prun lia da
Gucravo tros homens. Deste p Frnça seria o de 1295 para a canipan tandis
sempre houve galés." atres et yerme contra a
Inglaterra: Ch. FLORANGE, CuAbade C. FLEURY, Les devoirs des M iosités
financières *, 1928, P. I. e podem ser des domestiques, 1688 , p.
73. Análoga reflexão 227. rão quis multiplicar. as referências qu em dar
c0leva 1. de PINTO, quase um século depois (1771), facilmente encontradas
em Medir... r, ipe RUIZ, a escrever (OP. cit- P- 257): 1

Imaginemos por mo- mo referência a obra, no prelo, de Fel mentos um


Estado em que todos fossem ricos; não El si91O de los genoveses, de que
há alguns anos poderia subsistir sem mandar vir indígenas do es- tive
conhecimento.
trangeiro para o servir." Frase prof-1569

197.

Ila, Novelas eiemplares, ed. Nelson,


KSON, The Financial Revolution

1 Study in lhe Development ofPu688-1756, 1967.

69.

1, F. Radziwill, 26 de dezembro de op. cit., p. 1, nota 2.


de Jorjo TADIC.
UIMER, Every Man his Own Bro165.
TO, op. cit., que em 1771 se gaba ;ido o primeiro a ter sustentado que
ional tinha enriquecido a Inglaterlica admiravelmente a vantagem do )
arando-o, aliás, ao da França, afir;leses em geral, e não os mais
insigmoram a natureza" e opõemse-lhe

43).
.A., 35/6, 390, 114.
.A., 3516, 320, 167, Carta de Simo23 de março-3 de abril de 1781.

2li, Serie seconda, Veneza, 1912. LAT, Comptes généraux de l'État entre
1416 et

1420, 1964.
p. 33 e gráfico. li.
o de S. J. SHAW (The Budget of t, 1596-1597, 1968) de um orçamentomano. E
sobretudo os trabalhos Dmer Lufti BARKAN.
MACARTNEY, op. cit., IV, p. 119 iões de libras; por exemplo, R. VIi
Museum,
Acid. 18287, fO 49, ló32 [e escudos de ouro).
'OST, Voyages, op. cit., X, pp, (1720) ou A.E., Rússia M. e D., (por
volta de 1779).
,.T, LÉtat desfinances de 1523, 1923. RACCIOLO, Il regno di Napoli nei,
VVII,

1966, 1, p. 106.
ORBONNAIS, Recherches... sur e France, 1758, pp. 429 ss.
ROY LADURIE, Les paysans du

966, 1, pp. 295-296.


ICHEL1EU, Testament politique,
4DRÉ, 1947, p. 438. Texto citado, ON, Essaipolitique súr le commer7.
capítulo 2.

4. CIPOLLA, Semana de Prato,


TAMINE, Semana de Prato, abril [RI, Le financier, 193 1, p. 2. AT, Les
affaires de Jacques Coeur. 'OCureur
Dativet, 2 vols., 1952. TIN e Marcel BESANÇON, op.

257. G. CHAUSSINAND-NOGARET, Lesfinanciers ou Languedoc au XVI1P siècle,


1970, e
Gens de finance au XVIII' siècle, 1972. Numerosas referências. Ver:
"Castanier"
no índice.

258. Richesse de Ia Hollande, op. cit., li, p. 256.

259. J. G. VAN DILLEN, Munich V, pp. 181 ss.

260. Ibid., p. 182.

261. Ibid., p. 184.

262. P. G. M. DICKSON, op. cit., pp. 253-303.

263. Ibid., pp. 289-290.

264. Ibid., p. 295.

265. J. F. BOSHER, French Finances 1770-1795. From Business to


Bureaucracy,

1970, p. XI. Insistência nas reformas institucionais de Necker, pp. 15O


ss.

266. Ibid., pp. 304, e 17 nota 2.

267. M. MARION, Diclionnaire, op. cit., p. 236.

268. Daniel DESSERT, "Finances et société au XVIIP siècle à propos de Ia


chambre de jusice de 1661 ", in A nnales E. S. C., ri' 4, 1974.

269. Daniel DESSERT e Jean-Louis JOURNET, "Le lobby CoIbert: un royaume


ou une aff`aire de famille?", inAnnaleSE.S.C., 1975, pp. 1.303-1.337.

270. Mas com uma série de acidentes de percurso: 1522, execução de


Semblançay e afastamento dos funcionários de finanças; a seguir, recurso
aos capitais das praças de Paris e de Lyon; bancarrota de

1558, que resultará, no fim do século XVI, numa oligarquia de


financistas, etc.
Cf. R. GASCON, in Histoire économique et sociale de Ia France, op. cit.,
pp. 296
ss.

271. Marcel MARION, op. cit., p. 232.

272. G. CHAUSSINAND-NOGARET, op. cit., p. 236.

273. L.-S. MERCIER, op. cit., 111, p. 201,

274. Sobre todo o problema, o excelente livro de Pierre DEYON, Le


mercantilisme,

1969.

275. In Z. für Nationalõkonomie XVII.

276. Der Merkantilismus, 1965, p. 5.

277. Henri CHAMBRE, "Posokov et le mercantilisme", in Cahiers du monde


russe,

1963, p. 358.

278. A palavra escapa a Paul MANSELLI, Semana de Prato, abril de 1974.

279. Adam SMITH, op. cit., III, p. 1,

280. H. BECHTEL, op. cit., 11, p. 58.

28 1. Henri HAUSER, Les débuts du capitalisme, 193 1, pp. 181 ss.

282. In Revue dhistoire économique et sociale, 1959, p. 394.

283. Franz von POLLACK-PARNAU, I IlEine õsterreischiche-ostendische


HandeIsCompagnie

1775-1785 ", in Vierteljahrschriftfür Sozial- und Wirtschaftsgeschichte,


1927, p. 86.

284. A.N., G 7, 1698, f 1 154, 24 de junho de 1711.

285. Werner SOMBART, op. cit., I, p. 364.

286. J. KULISCHER, op. cit., ed. alemã, 11, p. 203.

287. H. HAUSHERR, op. cit., p, 89.

288. Eli F. HECKSCHER, op. cit., p. 480.

289. ISAMBERT, Recueil général des anciennes lois françaises, 1829, XV,
p. 283

(edito de estabelecimento de uma manufatura de roupas de lã e de


tecidos de ouro, prata e seda em Paris, agosto de

1603).

290. A. KLIMA, J. MACUREK, "La question de Ia transition du féodalisme au


capitalisme en Europe centrale (Xv11-Xvil, siècles)", in Congresso
Internacional de Ciências Históricas, Estocolmo,

1960, IV, p. 88.

291. A.N., G 7, 1687.

292. W. SOMBART, op. cit., 1, p. 366.

293. Cardeal de RICHEL1EU, Testament politique, ed. de 1947, p. 428294.


A.N., A.E., B1, 754, Londres, l de julho de

1669.

295. Ch. W. COLE, Colbert and a century of French mercantilism, l99, 1,


p. 337.

296. SIMANCAS, Consultas y juntas de hacienda, leg.

391, f' 542.

297. A. D. LUBLINSKAYA, Lettres et mérnoires adressés au chancelier


Séguier (1633-1649), 1966,

11, p. 88.

298. H. KELLENBENZ, Der Merkantilismus, op. cit., p. 65, é a opinião de


VAN
DILLEN.

299. A.d.S. Nápoles, Affari Esteri, '801, Haia, 2 de setembro e 15 de


novembro de 1768.

300. Isaac DE PINTO, op. cit., p. 247.

301. Ibid., p. 242.

302. Ver supra, p. 310.

303. El siglo de los genoveses.

304. A.N., G, 7, 1725, 121, 6 de fevereiro de 1707.

305. A.N., 94 A Q 1, 28.

306. John FRANCIS, La Bourse de Londres, 1854, p.


80.

307. Danier DESSERT, art. cit.

308. As exceções confirmam a regra, LAVISSE Histoire de France, VII, 1,


pp. 5

ss.; Médit... Il, pp.

34-36.

309. Roland MOUSNIER, Les XVI' et XVIP si -ecles,

1961, p. 99.

310. British Museum, Add. 18287, P 24.

311. L-F. BOSHER, op. cit., pp. 276 ss.; a palavra burocracia surge pela
primeira vez em GOURNAY, 1745, cf. B. LESNOGORSKI, Congresso
Internacional de
Ciências Históricas, Moscou,

1970.

312. A. G., Varsóvia, Acervo Radziwill.

313. Ou refeudalização, no sentido em que Giuseppe GALASSO emprega a


palavra, op. cit., p. 54, isto é, certa volta a uma feudalização
anterior.

314. J. VAN KLAVEREN, "Die historische Erscheinung der Korruption..... in


Vierteljahrschriftfür Sozial- und Wirtschaftsgeschichte, 1957, pp. 304
ss.

315. Segundo MOUSNIER e HARTUNG, só depois da guerra da Sucessão da


Áustria é que a venalidade na França se tornou insuportável. Congresso
Internacional de
Ciências Históricas, Paris, 1950, citado por 1. WALLERSTEIN, op. cit., p.
137, nota 3.

316. J. VAN KLAVEREN, art. cit., p. 305.

317. Ver o brilhante quadro de Régine PERNOUI), op. cit., 11, pp. 8 ss.

3 1 S. Pierre CHAMPION, Catherine de Médicis Présente à Charles IXson


royaume,

1564-1566, 1937.

319. Britisli Museum, Add. 28368, f' 24, Madri, 16 de junho de 1575.
320. L. PFANDL, Philipp II. Gemalde eines Lebens und einer Zeit, 1938;
trad. fr.

1942, p. 117.

321. Variétés, 11, p. 291.

322. Op. cit., p. 55323. E. LABROUSSE, Le XvIIII siècle, in Hist.


générale des civilisations, p.p.
M. CROUZET, 1953, p. 348.

324. gundo Pierre GOUBERT, Beauvais..., op. cit., Se p. 338.

325. Op.cit., 11, p. 338.

326. Moscou, A.E.A.1 72/5-299, 22, Lisboa, 22 de fevereiro de 1791.

327. Sobre esta fragmentação do aparelho do poder, cf. F. FOURQUET, op.


cit., especialmente pp.

36-37.

328. "De l'irriportance des idées religieuses", in Oeuvres complètes de


M.
Necker, publicadas pelo barão de Staêl, seu neto, 1820, 1. XII, p. 34,
citado por Michel LUTFALLA, "Necker ou Ia révolte de 1'économie politique
circonstancielle contre le despotisme des maximes générales", in Revue
dHistoire Économique et Sociale, 1973, ri' 4, p.

586.

329. F. MELIS, Tracce di una storia economica.-- op. cit., p. 62.

330. E. ASI4TOR, Semana de Prato, abril de 1972.

331. S. LABIB, "Capitalism in medieval Islam", in Journal of Economic


History, marqo de 1969, p.

91.

332. Hans HAUSHERR, op. cit., p. 33, e Philippe DOLINGER, La Hanse, 1964,
pp.

207 e 509.

333. Halil INALCIK, "Capital Formation in the Ottornan Empire", in The


Journal of Economic History, 1969, p. 102.

334. Ibid., pp. 105-106.

335. M. RODINSON, Islam et capitalism, op. cit., p.34.


336. E a data da cunhagem do florim de ouro. Cf. F. MELIS, artigo
"Fiorino", in
Enciclopedia Dantesca, 1971, p. 903.

337- H. DU PASSAGE, artigo "Usure" do Dictionnaire de théologie


catholique, t.
XV, 2' parte,

1950, col. 23116.

338. Ibid., col. 2377-2378.

339. TURGOT, Mémoire sur les prêts d'argent, ed. Daire, 1844, p. 110. In
OEuvres, ed. Schelle, 111, pp. 180-183.

340. Ch. CARRIERE, "Prêt à intérêt et fidélité religieuse", in Provence


historique, 1958, p. 107.

341. Lei de 3 de setembro de 1807 e decreto-lei de 8

de agosto de 1935. Cf. Nouveau répertoire Dalloz, 1965, no verbete


"Usure", IV, p. 945.

342. Benjamin N. NELSON, The Idea of Usuryfrom


Tribal Brotherhood to Universal Otherhood,

1949. Ver, para o conjunto do problema, Gabriel LE BRAS e H. DU PASSAGE,


artigo " Usure"

571

aire de thiologie catholique, t. XV,

150, col. 2336-2390.


, S, art. cit., col. 2344-2346. LES, Polftica, 1-111, 23.
R, Lithiqueprotestante et Vesprit du

1964, p. 76, nota 27.


TER, Storia dell'analisi economica,

3.
NYI, in K. POLANYI e Conrad ZG, Les systmes jconomiques dans dans ta
th6orie,

1975, p. 94., SSAR, Valladolid au si&le d'or,


VER, The Medici Bank, 1948, p. 57. H, Les caract&es originaux de
Phisfran7aise,

1952, 1, p. 5.
kKOF, Les banchierijuifs et le SaintIII, au XVIF sicle, p. 81. iovembro
de 1915, citado por L. POp. cit., p. 59, nota 5.
.OF, op. cit., p. 96.
?s marchants icrivains Florence, ). 274.
)VER, op. cit., p. 56, nota 85.
A RONCIP-RE, Un changeurflorenuto..., 1973, pp. 25, 97, 114, nota 5,

4, "The Usurer and the Merchant an Businessmen and the


Eccleciasti.estitution,

1100-1550", in The Tasks., History (Supplemental Issue of The conomic


History),
VII (1947), p. 116.
iLNITZ, Jakob Fugger, 1949, 1, p. LSON, The Idea of Usury, op. cit.,

5, Les colonies marchandes m&idioers, 1925, p. 507.

4NIN, Les marchands au XVF si&

169.
vincial Valladolid, acervo Ruiz, ciLAPEYRE, Une famille de marRuis, 1955,
p. 135

e nota 139.
EZ, Disputationes tridentinae... t.

28 (... subtilitas mercatorum, ducentate... tot technas invenit ut


vixfacta ?rspici possint...).
DICH, Le Pacte'de Ricorsa et le mar?s changes au XVIF siacle, 1953, p.
R, Wirtschaftsethik und Monopole, e B. NELSON, Idea of Usury, p.
T, Traitj des usures... 1690, "na rO, Traiti de la circulation et du
crj36; L.-S. MERCIER, Tableau dePaPp. 49-50.
.A., 35/6, 370, p. 76. RE, art. cit., p. 114.

371. 1. de PINTO, op. cit., pp. 213-214.

372. A. RENAUDET, Dante humaniste, 1952, pp.

255-256.

373. Werner SOMBART, Le bourgeois, 1926, p. 313.

374. H. HAUSER, Les dibuts du capitalisme, 1931, pp. 51 e 55.

375. C. M. CIPOLLA, "Note sulla storia del saggio d'interesse, corso,


dividendi e sconto dei dividendi del Banco di S. Giorgio nel sec. XVI",
in Economia internazionale, vol. 5, maio de 1952, p. 14.

376. Economie et religion, une critique de Max Weber, ed. sueca 1957,
francesa

1971.

377. F. BRAUDEL, Le monde actuel, 1963, pp.

394-395.
378. Studies in the Development of Capitalism, 1946, P. 9.

379. 0. BRUNNER, op. cit., pp. 16-17.

380. Aldo MIELI, Panorama general de historia de la ciencia, 11, pp. 260-
265.

381. Edigdo de H. PROESLER, 1934.

382. W. SOMBART, op. cit., 11, p. 129 e nota 1.

383. F. MELIS, Storia della Ragioneria, 1950, pp.

633-634.

384. W. SOMBART, op. cit., II, p. 118.

385. Oswald SPENGLER, Le diclin de VOccident,

1948, 11, p. 452.

386. C. A. COOKE, Corporation, Trust and Company, 1950, p. 185.

387. Citado por Basil S. YAMEY, "Accounting and the Rise of Capitalism",
in
MÓ1anges Fanfani,

1962, t. VI, pp. 833-834, nota 4. Sobre a lentiddo da penetragdo na


Franga, R.
GASCON, op. cit., 1, pp. 314 ss.

388. W. SOMBART, op. cit., 11, p. 155.

389. F. MELIS, Tracce di una storia economica di Firenze e della Toscana


dal

1252 al 1550, 1966, p. 62.

390. B. S. YAMEY, art. cit., p. 844 e nota 21.

391. R. DE ROOVER, in Annales dhist. 6conomique et sociale, 1937, p. 193.

392. W. SOMBART, Die Zukunft des Kapitalismus,

1914, p. 8, citado por B. S. YAMEY, art. cit., p. 853, nota 37.

393. K. MARX, Le Capital, in OEuvres, pp. 1.457 ss. e 1.486-1.487.

394. Ibid., p. 1.480.

395. LENIN, OEuvres, 1960, t. 22, p. 286.


396. Otto HINTZE, Staat und Verfassung, 1962, 11, pp. 374-431: Der
moderne
Kapitalismus als historisches Individuum. Ein kritischer Berich t iiber
Sombarts
Werk.

397. W. SOMBART, Le bourgeois, p. 129.

3-98. W. SOMBART, ibid., pp. 132-133.

3W M. WEBER, Lithique protestante et Pesprit du capitalisme, p. 56, nota


11 e pdginas seguintes.

400. C. BEC, Les marchands jcrivains a Florence,

1375-1434, pp. 103-104.

401. Otto BRUNNER, op. cit., pp. 16-17.

402. Gilles DELEUZE e FÓ1ix GUATTARI, Capitalisme et schizophrime. Lanti-


OEdipe,

1972, p. 164.

403. Denys LOMBARD, Le sultanat dA tjeh au temps d'Iskandar Muda (1607-


1636),

1967.

404. J. SAVARY, V. col. 1217.

405. PREVOST, op. cit., Vill, p. 628.

11, p. 21.

406. TAVERNIER, op. cit.,

407. A.N., Marinha, B 7 46 , 253.Relatório do holan dEs Braems, 1687.

408. Gautier SCHOUTEN, voiage... aux Indes orientales, commence en Pan


1658

etfini en Pan 1665,

11, pp. 404-405.

409. Jean-Henri GROSE, Voyage aux Indes orientales, 1758, pp. 156, 172,
184.

410. Michel VM Histoire du Japon des originesti Meiji, 1969, p. 6.

411. DE LA MAZEIARE, Histoire du Japon, 1907,


111, pp. 202-203.

412. D. e V. ELISSEEFF, La civilisation japonaise,

1974, p, 118.

413. N. JACOBS, op. cit., p. 65.

414. Y. TAKEKOSHI, The Economic Aspects of the Political History of


Japan, 1930,

1, p. 226.

415. N. JACOBS, op. cit., p. 37.

416. Y. TAKEKOSHI, op. cit., 1, p. 229.

417. Denis RICHET, Unefamille de robe, Paris du XVF au XVIIF si&le, les
Siguier, tese datil., p. 52.

418. D. RICHET, ibid., p. 54. Toda uma sórie de exemplos no livro de


George
HUPPERT, Les bourgeois gentilshommes, op. cit., capitulo V.

419. PING-TI HO, "Social Mobility in China", in Comparative Studies in


Society and History, 1,

1958-1959.

420. Wdit... 11, p. 65.

421. Nicolai TODOROV, "Sur quelques aspects du passage du fóodalisme au


capitalisme dans les territoires balkaniques de I'Empire ottoman", in
Revue des itudes sud-est europeennes, t. 1, 1963, p.

108.

422. Frangois BERNIER, Voyages... contenant la description des 9tats du


Grand
Mogol, 1699, 1, pp.

286-281.

423. Lord CLIVE, Discurso Cdmara dos Comuns; extratos dados aqui segundo
uma traduqdo francesa, Cracóvia, acervo Czartorisky.

SUMARIO
PREFÁCIO ........................ ***""'*"'*
CAPITULO 1 - OS INSTRUMENTOS DA TROCA 7

A Europa: as engrenagens no limite inferior das trocas ............... 14


Feiras regulares, como hoje,
14 - Cidades efeiras,
15 Os mercados efeiras se multiplicam e se especializam, 17
- A cidade deve intervir,

22 - O caso de Londres, 25 - Melhor seria contar, 28 - Verdade

1 inglesa, verdade européia, 33 - Mercados e mercados.- o mercado de


trabalho, 35 - O mercado é um limite que se desloca, 39 - Por baixo do
mercado, 43 - As lojas, 45 - Especialização e hierarquização em marcha,
51 - As lojas conquistam o mundo, 52 - As razões de um desenvolvimento,
54 - A superabundante atividade dos mascates, 58

- Será arcaica a mascateagem?, 62.


A Europa: as engrenagens no limite superior das trocas ............... 64
As grandesfeiras, velhas ferramentas constantemente remodeladas,

64 - Cidades em festa, 67 - A evolução das feiras, 72 - Feiras e


circuitos, 74 O declínio dasfeiras, 75 - Depósitos, entrepostos,
armazéns, celeiros, 76 - As
Bolsas, 79 - Em A msterdam, o mercado de valores, 81 - Em Londres, tudo
recomeça, 87 - Será necessário ir a Paris?, 9O - Bolsas e moedas, 92.
E o mundo fora da Europa?
.......................................... 94 Mercados e lojas em toda a
parte, 94 - A superfície variável das áreas elementares de mercado, 97 Um
mundo de pedlars ou de negociantes?, 98 - Banqueiros hindus, 103 - Poucas
Bolsas, mas grandes feiras, 105 - A Europa em igualdade com o mundo?,
111.
Hipóteses para concluir ...............................................
113

CAPíTULo 2 - A ECONOMIA EM FACE DOS MERCADOS ..................... 115


Mercadores e circuitos mercantis ......................................
117

Idas e voltas, 117 - Circuitos e letras de câmbio, 119 - Fechamento


impossível, negócio impossível, 121 - Sobre a dificuldade dos retornos,
122 - A colaboração mercantil, 125 - Redes, malhas e conquistas, 129 - Os
armênios e os judeus, 131

- Os portugueses e a América espanhola: 1580-1640, 135 - Redes em


conflito, redes em desaparecimento, 137 - Minorias conquistadoras, 139.
A mais-valia mercantil, a oferta e a procura ..........................
142 A mais-valia mercantil, 142 - A oferta e a procura: o primum mobile,
146 - A procura apenas, 149 - A oferta apenas, 153.

.......................... ............... 1_U Asfirmas em seu espaço,


156 - Espaços urbanos, 16O - Os mercados de matérias-primas, 162 - Os
metais preciosos, 165.
conomias nacionais e balança comercial ............................. 174
A --balança comercial", 174 Números para interpretar, 176 França e
Inglaterra antes e depois de 1700, 177 Inglaterra e Portugal, 18O -
Europa de Leste, Europa de Oeste, 183 - Balanças globais, 185 - A -índia
e a China, 188.
tuar o mercado ..................................................... 192
O mercado auto-regulador, 192 - Através do tempo multissecular,

193 - Pode o tempo atual testemunhar?, 196.


'ULo 3 - A PRODUÇÃO OU O CAPITALISMO EM CASA ALHEIA .........

199

apital, capitalista, capitalismo .......................................


201

A palavra --capital-, 201 - O capitalista e os capitalistas, 204


Capitalismo:
uma palavra muito recente, 205 - A realidade do capital, 207 - Capitais
fixos e capitais circulantes, 209 - Prender o capital numa rede de
cálculos, 211 - O interesse de uma análise setorial, 215.
terra e o dinheiro .................................................. 217
As precondições capitalistas, 218 - Número, inércia, produtividade das
massas camponesas, 22O - Miséria e sobrevivência, 221 - A longa duração
não exclui a mudança, 222 - No Ocidente, um regime senhorial que não
morreu, 224 Em Montaldeo, 228 - Transpor barreiras, 229 - Das margens
para o coração da
Europa, 231

- Capitalismo e segunda servidão, 231 - Capitalismo e fazendas da


América, 236 Asfazendas da Jamaica, 242 - Regresso ao coração da Europa,
244 - Perto de
Paris: a Brie no tempo de Lu(s XIV, 245 - Veneza e a Terra Firme, 246 - O
caso aberrante dos campos romanos no principio do século XIX, 249 - Os
poderi da toscana, 252 - As zonas avançadas são minoritárias, 255 - O
caso da França, 256.
ipitalismo e pré-indústria ...........................................
259 Um modelo quádruplo, 259 - O esquema de H. Bourgin será válido fora
da Europa?, 263 - Não há divórcio entre agricultura e préindústria, 265 -
A indústria-providência, 266

- Localizações instaveis, 268 - Dos campos às cidades e das cidades aos


campos, 270

- Houve indústrias-piloto *9, 271 - Mercadores e corpos de oficio,

273 - O Verlagssystem, 276 - O Verlagssystem na Alemanha, 279

- As minas e o capitalismo industrial, 28O - As minas do Novo Mundo, 284


- Sal, feno, carvão, 286 - Manufaturas e ffibricas,

- Sobre os lucros industriais, 299 - A lei de Walther G. Hojjmann (1955),


302.
Transportes e empresa capitalista .....................................
306 Os transportes terrestres, 306 - os transportes fluviais, 313 - Por
mar, 317 - Verdades contábeis: capital e trabalho, 324.
Um balanço bastante negativo .................................
*** ...... 327
CAPITULO 4 - O CAPITALISMO EM CASA .................................. 329
No topo da sociedade mercantil .......................................
331

A hierarquia mercantil, 331 - Especialização apenas na base, 332

- o sucesso mercantil, 336 - Os fornecedores de capitais, 339 Crédito e


banco,

344 - O dinheiro ou se esconde ou circula, 348.


Opções e estratégias capitalistas .......................................
353 Um espirito capitalista, 353 - O comércio de longa distância ou a
sorte grande, 355 Instrução, informação, 359 - A --concorrência sem
concorrentes-, 363 - Os monopólios em escala internacional,

366 - Uma tentativa falhada de monopólio: o mercado da cochonilha, em


1787, 3 71

- A perfidia da moeda, 3 72 - Lucros excepcionais, prazos excepcionais,


378.
Sociedades e companhias ............................................. 383
Sociedades.os primórdios de uma evolução, 383 - As sociedades em
comandita, 387 - As sociedadespor ações, 388 - Uma evolução pouco
acentuada, 391 - As grandes companhias comerciais têm antecedentes, 391
Regra de três, 392 - As companhias inglesas, 395 - Companhias e
conjunturas, 398

- Companhias e liberdade comercial, 401.


Ainda um esquema tripartido ......................................... 403

CAPíTULo 5 - A SOCIEDADE OU "CONJUNTO DOS CONJUNTOS"


............ 407 As hierarquias
sociais ................................................ 411

Pluralidade das sociedades, 413 Observar na vertical: o número restrito


dos privilegiados, 415 - A mobilidade social, 421 - Como compreender a
mudança *>, 424 - O sincronismo das conjunturas sociais na Europa, 425 -
A teoria de
Henri Pirenne, 426 - Na França, gentry ou nobreza de toga 9. 429 - Das
cidades aos Estados: luxo e luxo ostentatório, 435 - Revoluções e lutas
de classes, 44O
Alguns exemplos, 444 - Ordem e desordem, 448 - Abaixo do nível zero, 45O
- Sair do inferno, 457.
O Estado invasor .....................................................
459 As tarefas do Estado, 459 - A manutenção da ordem, 46O - As despesas
superam as receitas: o recurso ao empréstimo, 462 - Juros

rcvult<su- trigiesa:

1688-1756, 468 - Orçamentos, conjunturas e produto nacional, 471

- Falemos de financistas, 475 - Contratadores no Arrendamento Geral, 479


- A política econômica dos Estados: o mercantilismo,
483 - O Estado inacabado ante a sociedade e a cultura, 489 - Estado,
economia, capitalismo, 493.
s civilizações nem sempre dizem não ................................ 495
Tomar parte na difusão cultural:
o modelo do Islã, 495 - Cristandade e mercadoria: a discórdia da usura,
499 Puritanismo igual a capitalismo?, 505 - Uma geografia retrospectiva
explica muitas coisas, 507 Capitalismo igual a razão, 509 - Uma nova arte
de viver: na Florença do
Quattrocento, 515 - Outros tempos, outra visão do mundo, 517.
capitalismo fora da Europa .....................
.................... 519 Milagres do comércio de longa distância, 519
Alguns argumentos e intuições de Norman Jacobs, 522 - A política, mais
ainda a sociedade, 530.
_USÃO

535

\537

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